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TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL BOLETIM Nº7 ABRIL DE 2009 TORTURA, NÃO OBRIGADO!

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Boletim nº 7 do CAES

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TERRA LIVRE PARA A CRIAÇÃO DE UM COLECTIVO AÇORIANO DE ECOLOGIA SOCIAL

BOLETIM Nº7 ABRIL DE 2009

TORTURA, NÃO OBRIGADO!

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Não à sorte de varas nem aos touros de morte nos Açores Apelo a todos os cidadãos e cidadãs e a todas as organizações ambientalistas/ecologistas e de defesa dos animais Depois de várias tentativas frustradas de introduzir na ilha Terceira corridas picadas e touros de morte, tem-

se assistido nos últimos anos a uma imposição das touradas à corda em ilhas onde não há qualquer tradição,

como Santa Maria ou São Miguel, com a conivência ou apoio governamental ou autárquico.

Numa altura que as vozes de sempre aproveitando a revisão constitucional de 2004 e o novo Estatuto

Político dos Açores, se preparam para fazer aprovar, na Assembleia Legislativa Regional, legislação que

legalize a sorte de varas e depois os touros de morte, um grupo de cidadãos e cidadãs decidiu começar a luta

em defesa dos direitos dos animais de que as touradas são uma parte do problema.

Considerando que não é aceitável que nenhum animal seja torturado para entretenimento do ser humano.

Considerando que todo o acto que implique a morte de um animal, sem necessidade, é um biocídio, ou seja,

um crime contra a vida (Artigo 11º da Declaração Universal dos Direitos dos Animais). Considerando ainda

que os direitos dos animais devem ser defendidos pela Lei, assim como o são os direitos do homem (Artigo

14º) e por acreditarmos que a evolução cultural irá sobrepor-se à tradição e à ignorância, vimos manifestar a

nossa profunda discordância com a referida pretensão e apelar para que:

1- Não sejam promovidas nem apoiadas, com recurso a dinheiros públicos, touradas à corda, nas ilhas onde

tal prática não é tradição;

2- Não venham a ser legalizadas as corridas picadas e os touros de morte, por serem alheias à nossa cultura,

na Região Autónoma dos Açores.

3- Seja aprovada legislação regional de protecção dos animais que tenha em consideração o disposto na

legislação europeia e na Declaração Universal dos Direitos dos Animais que foi proclamada em 15 de

Outubro de 1978 e aprovada pela Unesco.

Primeiros Subscritores: Aíridas Dapkevicius (investigador-bolseiro), Almerinda Valente (professora), Ana Carina Ávila da Silva (consultora comercial), André Magalhães de Barros (recém-licenciado em direito), Aníbal Pires (professor, António Serpa (bancário), Artur Gil (engenheiro), Carla Silva (bióloga), Catarina Furtado (professora), Cláudia Tavares (professora), Eduardo Santos (técnico de comunicações), Eva Lima (Geóloga), Gabriela Mota Vieira (enfermeira), George Hayes (professor), Helena Primo (professora), Herondina Meneses (professora), Hugo Evangelista (biólogo/investigador), Humberta Maria Ferreira de Medeiros (funcionária publica), Isabel Albergaria (professora), João Pacheco (professor), João Pinto (professor), José Andrade Melo (professor), José Guerra (professor), José Luís Q. Mota Vieira (aduaneiro), José Lopes Basílio (professor), José Pedro Medeiros (bancário), Leonor Galhardo (bióloga), Lubélia Travassos (secretária), Lúcia Ventura (professora), Luís Noronha Botelho (professor), Lurdes Valério e Cunha (professora), Manuel Araújo (engenheiro), Manuel Sá Couto (professor), Maria José Vasconcelos (professora), Maria Manuela Borges Gonçalves do Livro (professora), Mário Furtado (professor), Miguel Fontes (estudante), Nélia Melo (professora), Olinda Costa (professora), Patrícia Costa (professora), Paulo Borges (professor universitário), Pedro Albergaria Leite Pacheco (professor), Rita Melo (bióloga), Ricardo Nuno Espínola de Ávila (educador de infância), Rui Soares Alcântara (professor), Sandra Câmara (bióloga), Sérgio Diogo Caetano (geólogo), Teófilo Braga (professor), Vitor Medina (professor), Zuraida Soares (professora)

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A TOURADA, RAZÃO DA EXISTÊNCIA DO TOURO BRAVO?

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Um dos argumentos frequentemente mencionados

em debates sobre touradas é o da importância em

manter a espécie do touro bravo.

Os proprietários das ganadarias mantêm os touros

nos seus terrenos, não porque tenham uma grande

consciência ecológica e ambiental, mas porque daí

retiram dinheiro. Muito dinheiro. No dia em que

os touros deixarem de ser vendidos a 2000 euros

cada (sem contar com chorudos subsídios

europeus), cerca de 2600 animais por ano (DN,

2007), os proprietários das ganadarias

rapidamente se esquecerão de qualquer

importância ecológica ou da biodiversidade do

touro bravo.

É esta a principal, senão a única, verdadeira razão

para a continuação das touradas no nosso país -

um forte interesse económico de um pequeno

grupo de pessoas.

É claro que, para desculpar o indesculpável,

atiram para os olhos o argumento de se querer

proteger uma espécie. Mas nem o touro bravo é

uma espécie, porque é sim uma raça ou

subespécie, nem a extinção desta raça é

irremediável e obrigatória quando as touradas

acabarem.

A extinção desta raça não é irremediável nem

obrigatória porque nada impede a criação parques

naturais, santuários ou outras soluções viáveis

para a conservação destes animais.

O que não pode nunca acontecer é justificarmos a

crueldade para com uma animal para o poder

"conservar".

Cabe na cabeça de alguém que a conservação do

panda passe por lhe espetar bandarilhas no dorso?

Que o repovoamento do lince ibérico na Península

Ibérica passe por lhe cortar as orelhas e rabo?

A conservação de espécies / raças, não é

argumento para continuar as touradas. É um papel

que tem de ser assumido pelos portugueses e pelo

Estado e não por empresas que da exploração

desses animais retiram avultados lucros.

Existe outro argumento frequente, que é o da

conservação dos ecossistemas, mas este é ainda

mais frágil. É que estamos a falar de um animal

totalmente domesticado, que só existe por

selecção artificial de características de interesse,

que no caso do touro bravo é essencialmente a

bravura. Ou seja, o touro bravo não existe no

campo por estar em total equilíbrio e conjugação

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com a Natureza. Está lá porque os ganadeiros

assim o fizeram e ali o colocaram. Isto significa

que um touro bravo é, no mínimo, um elemento

supérfluo na manutenção dos montados

portugueses.

Voltamos então ao único argumento de peso para

a manutenção das touradas. Os interesses

económicos. Interesses esses que vivem de um

espectáculo que promove a ideia de que existe

justiça e igualdade em colocar um animal num

local estranho e com regras definidas pelos

humanos; que coloca animais numa luta que estes

não desejam mas são forçados a entrar; que vive

da diabolização da imagem de um herbívoro

territorial e faz disso um espectáculo de

entretenimento.

É vital rejeitarmos esta visão subversiva da

realidade. É preciso dizer que a tourada não é uma

fatalidade e que podemos acabar com uma das

formas mais indignas e desumanas de tratamento

dos animais da actualidade. O caso muito recente

de Viana do Castelo dá-nos força e entusiasmo. É

vital agora a maioria silenciosa que se opõe às

touradas mostrar o seu descontentamento, de

forma pró-activa e com um único compromisso: o

respeito pelos animais e pela Natureza.

Hugo Evangelista – Biólogo

VOLTAR AO TEMPO DOS ROMANOS

Muito obrigado pelo mail sobre as touradas. Fico

satisfeito por saber que pretendem fazer alguma

coisa, mas creio que de pouco servirá. Não

consigo compreender como gente dita civilizada

`capaz de servir-se da dor e do sofrimento de

qualquer ser vivo para se divertir. Talvez

gostassem de voltar aos tempos dos Romanos

quando havia as lutas de feras, gladiadores e até os

Cristãos eram lançados às feras também. Tudo isto

parece-me completamente selvagem.

GH

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TOURADAS E DINHEIROS PÚBLICOS

Subscrevo inteiramente a vossa indignação pela

iniciativa de promover acções públicas de maus-

tratos a animais no sentido de as "tradicionalizar".

Fico, de facto, espantada, por ver a falta de

empenhamento em proporcionar espectáculos de

natureza artística em zonas mais fechadas, como

são as realidades insulares, substituída por um

grande empenhamento em espectáculos de

violência real.

Foi nos Açores que se realizou há pouco um

encontro internacional para inverter o declínio da

ignóbil indústria tauromáquica, que vive hoje em

dia à custa de patrocínios comerciais e dinheiros

públicos (quer sejam os subsídios europeus

destinados à agricultura e ardilosamente desviados

para os ganadeiros, quer sejam as verbas

atribuídas pelas autarquias na compra e oferta de

bilhetes, cedência de espaços publicitários, etc,

quer ainda o vergonhoso envolvimento da RTP,

utilizando discricionariamente dinheiro público na

produção e transmissão de programas regulares,

cobertura e transmissão de touradas, festejo dos

seus aniversários com a encomenda de uma

corrida de touros, publicidade a eventos

tauromáquicos, encomenda e transmissão de

filmes promotores, recusa em transmitir

programas/filmes que mostrem a verdade que se

esconde por trás do brilho das lantejoulas e

defenda pontos de vista contrários). A RTP devia

manter uma posição isenta numa questão tão

polémica como esta e não misturar os objectivos

públicos da estação com os interesses privados de

alguns dos seus quadros dirigentes.

Desculpem ter aproveitado o mail de subscrição

da vossa moção para incluir um "manifesto" mas

acho que só com acções concertadas e

amplamente difundidas no sentido de

responsabilizar cada cidadão individualmente pela

existência social e pública de práticas cruéis,

iremos conseguir vencer o lobby das touradas e

afins. Agora que estamos em época de crise, em

que o Estado não consegue apoiar financeiramente

indústrias e PMEs e as deixa fechar lançando no

desemprego os seus trabalhadores, temos que

aproveitar todas as oportunidades de tornar

públicas as verbas que continuam a ser desviadas

para este fim. Essas verbas são silenciosas, há

pouco tempo soube-se através de uma denúncia

por falta de pagamento, que a CM de Santarém -

cujo presidente viajou para os Açores à custa da

autarquia para o tal encontro internacional - devia

66.000€ em bilhetes que adquiriu para oferecer

durante um período de pouco mais de um ano.

Apoio inteiramente o vosso apelo,

Cristina D' Eça Leal

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A Liga Portuguesa dos Direitos do Animal está

convosco na "Luta" contra o retrocesso cultural e

humanitário; o regresso à barbárie ao sangue e à

tortura de Bois e cavalos.

Regresso que uma elite hipocritamente invoca em

nome das tradições, quando os povos evoluem e

as tradições se humanizam.

É inadmissível que em nome de uma cultura

hipócrita se continuem a torturar animais.

Acreditamos que o povo dos Açores não o irá

permitir se for bem informado.

A defesa das tradições é uma falácia; trata-se é de

defender a exploração de animais em proveito

próprio. Se assim não fosse há muito que as

touradas tinham acabado.

Acreditamos que o povo dos Açores não se

deixará manobrar regredindo cultural e

humanitariamente. Os Açores não necessitam de

vender a tortura de animais como meio turístico.

Aliás seria um erro fazê-lo uma vez que esta

aberrante prática está banida dos países mais

desenvolvidos.

Como se pode aceitar que as touradas se

justifiquem como tradição quando tal espectáculo

perpetua as Arenas da decadência do Império

Romano onde milhares e milhares de Cristãos

foram trucidados?

Que um espectáculo de tortura e morte de animais

(bois e cavalos), e de potencial estropiamento e

morte de pessoas, pode ser considerado como uma

manifestação de Arte e Cultura?

TORTURAR ANIMAIS EM NOME DA CULTURA

Sabiam que o Papa Pio V decretou que, aqueles

que praticassem ou assistissem a touradas fossem

excomungados - e que tal excomunhão se

mantém, porque as decisões dos Papas, sendo

inspiradas por Deus são irrevogáveis?

Tinham conhecimento que o Primeiro - Ministro

Dr. Passos Manuel (em 1856) aboliu as touradas

em Portugal, " por serem espectáculos impróprios

de povos civilizados" -nunca tendo sido o

respectivo Decreto formalmente revogado?

São capaz de conceber que, nunca tendo havido

touradas, algum Governo, hoje, aprovaria

legislação a autorizar espectáculos com

características mais gravosas (como as picadas e

de morte) tortura de animais e de possível

estropiamento e morte de seres humanos?

A resposta não temos dúvida seria não! Então

porquê reintroduzi-las hoje?!

Se não é viciado,"aficionado" de touradas picadas

e de morte, porque admite que tais espectáculos

"impróprios de povos civilizados" continuem a

envergonhar os Portugueses para insana satisfação

de uns escassos milhares de viciados?

NÃO FIQUE INDIFERENTE, EXIJA QUE TAL

PRÁTICA NÃO VENHA A SER

REINTRODUZIDA NOS AÇORES EXIJA A

SUA ABOLIÇÃO DEFINITIVAMENTE EM

PROL DE UMA EVOLUÇÃO CULTURAL E

HUMANITÁRIA.

MCSampaio

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Pela civilidade, pelos animais, pelos Açores Como já é sabido, recentemente, após sobeja

polémica (que, ainda não acabou), foi aprovado o

Novo Estatuto Político e Administrativo dos

Açores, documento fulcral ao reforço da

Autonomia dos Açores, contendo, entre outras

conquistas, o poder da ALRA, poder legislar sobre

assuntos de interesse específico para a Região.

O Documento veicula o sentir dos Açorianos de

Santa Maria ao Corvo, tendo estado todos ao lado

de quem se esgrimiu ousadamente, na fase da sua

aprovação, lutando contra resquícios do

centralismo que votou os Açores, ao

esquecimento, aos ostracismo e ao

subdesenvolvimento, advenientes de uma

“condução à distância” de feição colonialista.

Se é de sentir orgulho de termos à cabeça da nossa

governação pessoas que lutaram tenazmente por

um documento que dá um pouco de “mais corda”

à auto-condução do destino dos Açores pelos

Açorianos e pela União Açórica conseguida à sua

volta, é de ficar estarrecido, que logo à saída de

tão nobre Documento, que deverá ser “rendido”

para o interesse global dos Açores, sua evolução,

boa imagem e acreditação nacional e

internacional, venha a lume, por parte de um

grupo de aficionados taurinos da Terceira, a

“saída” que ele permitirá para a introdução, nos

Açores da sanguinária tourada com “sorte de

varas”, prática oriunda de Espanha sem qualquer

tradição no arquipélago.

É vergonhoso!

CONTRA A “SORTE DE VARAS”

É vergonhoso e preocupante, porque nesse grupo

perfilam pessoas que já tiveram e alguns têm,

responsabilidades sociais e políticas, e, ainda na

frescura de um documento, de teor central para os

Açores, que deverá permitir o espelho do bons

exemplos e das descriminações positivas face ao

Continente, venham reivindicar a estreia do

mesmo para facultar a legalização de uma prática

de tortura e desrespeito para com os animais e a

vida, de incivilidade gritante e de total

desinteresse público e específico para a Região.

O Estatuto Politico Administrativo dos Açores,

como documento de referência do Arquipélago,

deverá servir para espelhar positivamente os

Açores, até para justificar perante os opositores a

justeza da luta travada em prol do seu

enriquecimento e avanço, e, fundamentalmente,

para permitir soluções globais de clara vantagem

regional, que unam e não dividam os Açorianos.

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A propósito da divisão dos Açorianos, acerca da

barbaridade das touradas mais sanguinárias,

recorde-se que em 1998, o Dr. Adolfo Lima

apresentou para análise, em Plenário do Governo

Regional dos Açores, suportado pelo PSD, uma

proposta que havia sido elaborada pelo Dr. Álvaro

Monjardino, através da qual se pretendia que nos

Açores fosse introduzida as touradas com touros

de morte. Na altura os Amigos dos Açores

organizaram uma campanha internacional que

culminou com a apresentação de uma petição ao

Parlamento Europeu.

A intenção não avançou, tendo na altura o

presidente do Governo Regional dos Açores, Dr.

Mota Amaral, comunicado ao Director do

Eurogroup for Animal Welfare que a legislação

não avançaria devido às "reacções negativas da

opinião pública".

A 21 de Outubro de 1995, na ilha Terceira,

realizou-se numa quinta particular uma tourada à

espanhola, onde foram toureados e mortos dois

touros. Na ocasião tal acto foi contestado por

várias pessoas singulares e colectivas, como os

Amigos dos Açores, algumas sociedades

protectoras de animais e alguns partidos, na

Assembleia da República. Tais actos igualmente

foram referenciados negativamente nalguma

comunicação social e nacional, o que denegriu a

imagem dos Açores.

A 18 de Outubro de 2002, já houve uma tentativa

de legalização da “sorte de varas” nos Açores,

tendo a mesma sido “chumbada” pelo Ministro da

República Sampaio da Nóvoa já que não se

revestia de interesse específico regional. Em

pouco espaço de tempo Associação dos Amigos

dos Animais da Ilha Terceira, promoveram uma

petição reclamatória que recolheu cerca de duas

mil assinaturas.

É Vergonhosa e desrespeitadora, tal intentona: --

desrespeitadora dos animais; desrespeitadora para

com aqueles que lutaram por um documento de

interesse geral para os Açores, e desrespeitadora

dos princípios nobres da Autonomia. Esta deverá

servir para descriminar positivamente os Açores,

fomentar a qualidade de vida (inclusive a dos

animais), proporcionar a afirmação civilizacional

do Arquipélago e nunca para facultar

diferenciações que sejam apontadas como nódoas

no todo nacional e no mundo civilizado, e

repelentes para os nossos visitantes e turistas.

Numa altura em que, a nível internacional,

nacional e também regional crescem os

movimentos contra as touradas; numa altura em

que os Açores, apesar de algumas lacunas no

cumprimentos de legislação europeia, já

conseguiu uma boa imagem internacional na

conservação da natureza e respeito pela vida

animal (elogiado pela Greenpeace e referenciado

de excelência pela National Geographic Travel);

numa altura em que o Governo afirmou na BTL

2009, que o grande objectivo turístico é

“consolidar ao máximo os mercados onde já

conseguiu notoriedade, como Alemanha e

Inglaterra”, e sabendo-se que estes dois países,

assim como os do mercado norte europeu, são dos

maiores respeitadores dos directos dos animais e

contestadores da prática bárbara das touradas, é

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completamente inadmissível, descabida e

atentatória à construção da boa conta exterior dos

Açores, a proposta da tourada de “sorte de varas”,

pelo que se traduziria num retrocesso para o todo

regional, com óbvias consequências.

Alertamos todos os Açorianos e os nossos

políticos de maiores responsabilidades decisórias,

para a euforia legislativa advinda da aprovação do

Novo Estatuto dos Açores, que alguns deputados

possam ter no Parlamento de todos os Açorianos,

em transporte de facções particularizadas,

abusando da autonomia e afrontando a legislação

nacional que, em sintonia com a maioria dos

países civilizados e em respeito pelos direitos dos

animais, proíbe as touradas, ou qualquer

espectáculo, com touros de morte ou torturantes

como a sorte de varas. A isto eu chamaria “

Involução”, como escreveu João Ilhéu, e pior: -

dar razão àqueles que tanto se opuseram (opõem)

ao teor do novo Estatuto, e serviria tal aberração,

de pretexto para o crescendo do seu número.

Para ao leitores se inteirarem, indignarem contra a

vil e atroz prática da “sorte de varas”, apresento

abaixo um breve resumo dessa atrocidade

repudiante.

“As “sortes de varas” são actos

tauromáquicos extremamente violento,s típicos

das touradas em Espanha, estando em crescendo

o número de vozes e de movimentos que a

contestam. Nas “sortes de varas” (que felizmente

são ilegais em Portugal), os touros estão com os

cornos inteiros e investem desesperadamente

contra um cavalo – que tem uma imensa e muito

pesada armadura a toda a sua volta e que tem os

olhos tapados para não ter ainda mais medo do

que já sente (aqui também, é atormentado outro

animal) –, enquanto, do alto do cavalo, o

“picador” espeta uma longa lança – a vara –,

com um ferro muito comprido e afiado na

extremidade, no dorso do touro. Quanto mais o

touro faz força para se soltar e tentar defender,

mais o ferro comprido o perfura, rasgando-o e

provocando-lhe um ferimento de gravidade

extrema.”

Os defensores das touradas defendem que as

“sortes de varas” servem para avaliar a bravura

dos touros, mas isso é uma falsidade – na verdade,

as “sortes de varas” servem para enfraquecer e

provocar um sofrimento imenso aos touros, ao que

acrescentaria: -- para demonstrar a estupidez e

malvadez de um leque de seres humanos.

Esta prática é totalmente violadora da Declaração

dos Direitos dos Animais, aprovada em Outubro

de 1978 pela UNESCO, e seguidamente pela

ONU, nomeadamente os seguintes:

Artigo 10º

1. Nenhum animal deve ser explorado com

sofrimento para entretenimento do homem.

2. As exibições e os espectáculos que

impliquem a dor de animais, são

incompatíveis com a dignidade do animal.

Artigo 11º

1. Todo o acto que implique a morte de um

animal, sem necessidade, é um biocídio, ou seja,

um crime contra a vida.

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2. As cenas de violência nas quais os animais

são vítimas, devem ser proibidas no cinema e na

televisão, salvo se essas cenas têm como fim

mostrar os atentados contra os direitos do animal.

Mal estariam os Açores, se colasse à sua última

conquista autonómica a violação de declarações

de duas das maiores organizações de referências

mundiais ligadas aos direitos, à educação e à

ordem civilizacional do mundo.

Para além de ambientalista e de açoriano

responsável, como educador e como pai,

igualmente me preocupa a proposta descabida da

introdução da “sorte de varas nos Açores”, pela

sua incivilidade, deseducação e outras

consequências sociais graves. Para expressar essa

preocupação me recorro novamente da UNESCO

(Organização das Nações Unidas para a Educação,

a Ciência e Cultura), na sua conclusão e alerta a

respeito das corridas de touros, emanada em 1980:

- “A tauromaquia é uma arte venal de torturar e

matar animais em público, segundo

determinadas regras. Traumatiza as crianças e

os adultos mais sensíveis; agrava os estados dos

neuropatas atraídos por estes espectáculos e

desnaturaliza a relação entre o ser humano e o

animal.

Por tudo isto, constitui um desafio à Moral, à

Educação, à Ciência e à Cultura.”

Todos os educadores, pais e açorianos em geral

deverão combater a práticas torturantes e

sanguinárias nas touradas: - trata-se de uma

exigência da “Educação Cívica”, constante dos

currículos escolares obrigatórios, os quais vão

beber às linhas mestras da UNESCO.

Perante o argumento dos proponentes da “sorte de

varas”, que a sua introdução é “para enriquecer a

arte e a cultura nos Açores e colocar o

Arquipélago no centro da tauromaquia mundial”,

para além de responder que os Açorianos não

querem que a nossa região seja referenciada

negativamente como “nódoa”, desrespeitadora da

vida e de declarações internacionais, obedecidas

nacionalmente, acrescento que Cultura é tudo

aquilo que contribui para tornar a humanidade

mais sensível, mais inteligente e civilizada.

A violência, o sangue, a crueldade, tudo o que

humilha e desrespeita a vida jamais poderá ser

considerado "arte" ou "cultura". A violência e a

tortura é a negação da inteligência.

Uma sociedade justa como a açoriana não pode

admitir actos eticamente reprováveis-- (mesmo

que se sustentassem na tradição, como não é o

caso)--, cujas vítimas directas são os animais.

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Uma minoria de açorianos quer manter as

touradas e as praças de touros, bárbara e sangrenta

reminiscência das arenas da decadência do

Império Romano. De facto nas arenas de hoje o

crime é o mesmo: -- tortura, sangue, sofrimento e

morte de seres vivos para divertimento das gentes

das bancadas. Como pode continuar tamanha

barbaridade como esta, das touradas, no século

XXI?

É degradante ver que nas praças de touros

torturam-se bois e cavalos para proporcionar

aberrantes prazeres a um animal que se diz

racional.

A crueldade que humilha e mata pela dor, jamais

se poderá considerar Cultura. Vamos chamar as

coisas pelos seus nomes – negócios de crueldade,

nunca será arte nem cultura.

11

Importa que, por todo o Arquipélago, se levantem

vozes conscientes e responsáveis, e que se

assinem petições contra a pretensão

particularizada da “sorte de varas” nos Açores,

pelos animais, pela civilidade, pela nobreza

autonómica.

Que seja uma sorte e não um grande azar ser dos

Açores, para qualquer ser vivo, e que o nosso

Estatuto se paute sempre pelas varas da justiça, do

respeito pela vida, da união dos açorianos e do

bom exemplo para o país e para o mundo.

Que os políticos responsáveis, nunca compactuem

ou viabilizem legislações, que “nos envergonhem

de ser açorianos”!

José de Andrade Melo

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12

Eu amo a galhardia mas odeio a barbaridade. Eu amo os gestos audaciosos, arrojados, mas detesto-os profundamente sempre que eles se traduzem em crueldade. E por isso eu desprezo os heróis, aqueles sobre cuja bravura se tece uma sinistra auréola de sangue. E por isso eu me tinha negado desde o início a dar a minha presença àquele número das festas com que Sevilha recebeu os jornalistas portugueses - e que era uma tourada. Da capital da Andaluzia os jardins maravilhosos, prenhes de perfumes intensos, de lagos adormecidos, de rosas, de gerânios e de cravos, desabrochando em orgias de cor, interessavam mais à minha alma do que o espectáculo bárbaro do homem a defrontar-se com o touro, naquela tarde quente, mórbida e sensual de Junho. Meus companheiros, porém, insistiam, argumentavam - faziam agigantar a meus olhos a tradicional beleza pagã que reside nas touradas. Por último o notável escritor sevilhano Muñoz San Roman, embora inimigo do espectáculo bárbaro, aconselhava-me a que assistisse a ele, para assim fazer uma ideia mais concreta sobre touro e homem, para assim melhor poder combater o homem e defender o touro... Muñoz San Roman é uma sensibilidade delicadíssima e suas palavras

A MORTE DO TOURO decidiram-me. A praça, larga, ampla, enorme, estava cheia duma multidão heterogénea, cujos olhos, descendentes dos de Nero, se fixavam impacientes sobre a arena ainda vazia. Um sol inclemente, impiedoso adusto, derramava sobre as arquibancadas da direita a sua cornucópia de luz, e milhares de mãos agitando os clássicos abanicos davam a sensação de asas encarceradas, debatendo-se nervosamente por detrás das grades duma gaiola incomensurável. Próximo de mim, nos camarotes engalanados, grupos de mulheres formosas, perturbantes, palestravam com amenidade, espraiavam seus olhos negros, profundos e misteriosos desde a trincheira até às últimas arquibancadas e irradiavam em seu redor ondas quentes de sensualidade.

Toda aquela multidão fremia ocultamente e sobre a praça pairava uma densa expectativa, uma comoção e uma curiosidade ilimitadas.

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E, pouco a pouco estabelecia-se um silêncio colectivo; aqueles milhares de lábios cerravam-se numa espera voluptuosa, trágica, de tigre aguardando a presa, de fiéis aguardando o ídolo.

Ia reaparecer Juan Belmonte - o soberano, o deus, um dos primeiros actores de toda a Espanha daquele espectáculo primitivo. E por isso aquela comoção, aquela curiosidade, aquele silêncio - só perturbado por alguns miseráveis apregoando água fresca por entre as arquibancadas. Por fim Belmonte surgiu... É uma figura pequena, sem imponência, sem trajes sumptuosos a assinalá-lo sobre o cavalo branco em que monta. Mas a multidão já delira, um frémito de alegria intensa já percorre a multidão. Eu quedo-me a contemplar o touro negro, altivo, desdenhoso, que agora entra na arena. Seu primeiro gesto é correr para o toureiro célere, mas logo se detém, certo da sua força, certo que inutilizará o inimigo numa luta leal. Há desdém, há piedade do homem forte para o homem fraco que afronta,

naquele touro negro que está parado no centro da praça a olhar Belmonte e o seu cavalo branco. Mas instigam-no. As capas amarelas e vermelhas surgem na sua frente como estandartes provocadores. E o touro avança então. E a luta estabelece-se. Nada de grandioso, de extra-humano; nada de homem lutando com um tigre, vencendo-o; nada de leão subjugado pelas melenas, sob o poderio de umas mãos hercúleas. É uma luta de ciladas, de traições, órfã de beleza, viúva de assombro. Eu não sinto mas compreendo a beleza brutal daqueles que lutaram com as feras nos circos romanos, - o que eu não compreendo nem sinto é a proclamada beleza da tourada, com um homem magro, candidato a um sanatório da Suíça, esgueirando-se ao lado do touro sobre um cavalo lesto, fazendo da fuga inteligente a principal arma de defesa... Todavia a multidão desvaira, crispa-se de entusiasmo e solta das suas mãos, delirantemente, as pombas do aplauso. O toureiro desce do seu cavalo, toma uma espada e dirige-se ao centro da arena. Vai matar o touro que está vomitando sangue, rugindo de dor. Cerro as pálpebras e quando o meu olhar converge de novo para a praça, já o animal está tombado, com a espada fundida entre as omoplatas. O golpe não foi certeiro e é necessário que o indivíduo encarregado de apagar estes fracassos venha, com um pequeno estoque, concluir a morte do touro. Entretanto, Belmonte, romano regressado das conquistas, deus descido do Olimpo, vai colhendo as rosas do triunfo, as palmas quentes, fartas, que miríades de mãos lhe dispensam, prodigamente, entusiasticamente.

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A cena repete-se com o segundo touro, - e quando na arena surgem os cavalos, o espectáculo ultrapassa os domínios da barbárie, e toureiros e espectadores dir-se-ão selvagens brotados da própria selva da Antropofagia. Têm algo de fúnebre, algo de cavalos recém desatrelados dum carro mortuário, esses que são conduzidos pelos indivíduos que os montam ao encontro do touro, - e que levam os ouvidos cerrados e uma faixa negra, lutuosa, a vendar-lhes os olhos. Eles ignoram o perigo que se acerca, ninguém os procura defender, - a multidão, lá em cima, exige, com requintes de necrófilos, que os seus intestinos se quedem espalhados pela arena, como troféus de asquerosa glória. E os cornos do touro cevam-se no ventre indefeso desses cavalos, - e destes, como a multidão deseja, as vísceras quedam-se, sangrentas, trágicas, expostas no centro da arena e para elas, com uma oculta cumplicidade, o Sol converge seus raios ardentes. Sufoco. Um ódio intenso, profundo, enorme, subjuga-me. Orgulhosamente, brutalmente, sinto-me demasiado humano, sinto-me também fera - mas no sentido inverso daqueles que me rodeiam. E parecem-me sinistros, repelentes, os lábios húmidos, grossos e vermelhos duma mulher de rara formosura que está próximo de mim, - lábios de inebriantes voluptuosidades e que agora riem de perversa satisfação, ante a carnificina que lá em baixo se consuma.

Minha revolta aumenta, amplia-se, toma proporções estranhas, - e quando Belmonte é colhido pelo touro, quando se enreda nas hastes deste, minha alma, que se comove ante uma simples ferida, foi iluminada por um relâmpago de íntima alegria. Eu tinha suposto que aquele homem já não

sairia senão morto de sob a cabeça do touro... Recordo ainda com horror, com o frio das sensações inconfessáveis, esse desejo monstruoso que brotou, como uma faúlha, da minha alma revoltada contra o espectáculo bárbaro. Mas segundos depois essa faúlha apaga-se, porque já o toureiro se ergue e foge, ligeiro e ileso, do seu inimigo. E então, ante os novos cavalos que já transpunham a trincheira para serem sacrificados, eu levanto-me e protesto e abandono a praça, - abandono aquela multidão desvairada. É a mesma multidão odiosa das arenas de Roma, é a mesma multidão que nas madrugadas das execuções se proscreve dos leitos, para ir contemplar, numa bestialidade repugnante, o corpo dos condenados à morte a contorcer-se no garrote ou na forca, a cabeça dos decapitados dependurando-se sangrenta, clamando vingança, não das mãos delicadas, voluptuosas, da filha de Herodíades, mas sim das mãos imundas, indignas, do carrasco. Ferreira de Castro A Batalha Suplemento Semanal Ilustrado nº 29, 16/6/1924

(Fonte:

http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2002/0

8/33364.shtml)

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Page 15: TERRA_LIVRE_nº7

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A tourada é uma “diversão” que tem origem

remota na ilha de Creta, onde os touros eram

mortos por golpes de espada. Pelo menos o

registo pictórico mais antigo da realização de

espectáculos com touros remete à cidade

Knossos, em Creta.

No Império Romano o toureio era feito

exclusivamente a cavalo e a tourada era

organizada para celebrar eventos importantes,

desde casamentos a vitórias militares.

Existem registos de touradas em Espanha desde o

ano 815, como entretenimento aristocrático e para

comemorações festivas. No século XVIII era um

acontecimento de massas, em que as arenas eram

invadidas por multidões em fúria que matavam os

touros com espadas, punhais e facas. Muitos dos

toureiros eram açougueiros e os matadouros as

“escolas” de toureiros. Carlos IV proibiu a

tourada, mas o seu sucessor, Fernando VII,

recuperou-a fundando a Escola Real de

Tauromaquia, em Sevilha. A partir do séc. XVIII

tem início a luta taurina como espectáculo, no seu

modo actual.

A tourada é um espectáculo tradicional de

Portugal, Espanha e sul de França e de alguns

países da América Latina, como o México,

Colômbia, Peru, Venezuela e Guatemala.

Em Portugal, as touradas de morte foram

proibidas no século XVIII, no tempo do

Marquês de Pombal, que não é um exemplo de

tolerância. A única excepção foi aberta em 2002,

TOURADAS? JÁ BASTA ASSIM…

após uma campanha com forte cobertura

mediática e que teve efeitos paradoxais – a paixão

com que foi abordado o problema da morte do

touro numa festa de Barrancos, originou o “lavar

de mãos” legislativo, como Pilatos.

A principal razão invocada pelos defensores foi a

da tradição. As tradições têm origem em tempos

remotos em que as mentalidades e modos de vida

eram bastante diferentes dos actuais. As

sociedades evoluem e hoje ninguém acredita que

basta sacrificar um animal para fazer chover ou

para ganhar fertilidade. As tradições só fazem

sentido quando são compatíveis com as formas de

pensar e os conceitos vigentes. Como hoje em dia,

o respeito pelo sofrimento dos animais começa a

preocupar muita gente, as Touradas são

justamente contestadas.

Os defensores da tourada contestam a ideia do

sofrimento do animal, dizendo que é difícil

afirmar o que sente o touro na arena. No entanto,

as reacções que o touro manifesta na arena não

fazem crer que sinta uma coisa agradável. Os

mamíferos têm capacidade para sentir dor,

Page 16: TERRA_LIVRE_nº7

ansiedade, medo e sofrimento e até os defensores

das touradas de morte têm como alegação

principal a de que a morte do touro na arena o faz

sofrer menos do que o sofrimento prolongado do

touro até ao matadouro…

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Outro argumento que cai pela base é o do perigo

da extinção da espécie. Ora, animais como os

leões não se extinguiram por ter acabado o circo

romano. A arte de lutar até à morte dos

gladiadores era considerada bastante honrosa e

bonita por quem assistia. Acabou, terá sido

também uma pena?

A maioria das espécies em perigo de extinção não

são mortas numa praça como divertimento,

alegadamente para evitar a sua extinção. A

tourada é um espectáculo que naturalmente se

extinguirá, à medida que as mentalidades evoluam

e considerem que não existe justificação moral

para causar sofrimento num animal para gáudio ou

entretenimento.

Abrir mais uma excepção, permitindo as touradas

picadas nos Açores, seria um retrocesso

civilizacional. Não é tolerável que o órgão

máximo da nossa autonomia se preste a ceder às

aspirações de um grupo minortário, perante a

passividade da restante população, correndo o

risco de se desprestigiar por uma decisão

contranatura e contra a evolução natural das

mentalidades.

Em relação à tourada aplica-se o que escreveu

Sérgio Godinho: Para melhor… está bem, está

bem. Para pior…já basta assim!”

Luís Noronha Botelho, professor

WWW.TERRALIVREACORES.BLOGSPOT.COM

[email protected]

Page 17: TERRA_LIVRE_nº7

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A recente campanha contra a introdução da sorte

de varas e de touradas de morte nos Açores,

iniciativa do Blogue Terra Livre/CAES -

Colectivo Açoriano de Ecologia Social e que

contou, até ao momento, com a adesão de duas

das principais associações açorianas, a Associação

de Amigos dos Animais da Ilha Terceira e os

Amigos dos Açores - Associação Ecológica, e do

CADEP, de Santa Maria, tem constituído, para

nós, uma surpresa. Surpresa pelo facto de ser um

tema que tem unido pessoas de diferentes

orientações politico - partidárias e de diferentes

organizações de várias ilhas dos Açores, tanto

junto dos defensores do bem- estar animal como

dos partidários da introdução das práticas bárbaras

e não tradicionais que são as touradas picadas e os

touros de morte.

Quer através dos depoimentos recebidos por

correio electrónico que dos que têm sido

publicados na comunicação social constata-se que

curiosamente são os terceirenses os que mais

veementemente se opõem ao desrespeito da

tradição e à introdução de práticas mais bárbaras,

POLÍTICA E TOURADAS

havendo alguns que inclusive se opõem a todo o

tipo de touradas.

Contra as corridas picadas também se manifestam

os aficionados e amantes da corrida à portuguesa

que afirmam que a sorte de varas é o prazer de

meia dúzia de pseudo - aficionados.

Curiosa, ou talvez não, é a união de alguns

conservadores da ala direita e da ala esquerda do

espectro político que, por minguarem-lhes os

argumentos, consideram que a campanha é obra

dos imperialistas micaelenses que querem acabar

com a cultura do povo da Terceira.

Embora não sejamos adeptos de qualquer tipo de

tourada, achamos que as touradas à corda valem

pelo convívio que proporcionam enquanto

consideramos imoral a venda, como espectáculo,

da tortura infligida ao touro que são as touradas de

praça. Assim, achamos que, não só pelos animais,

mas também, pelo risco de vida que correm os

próprios homens deveriam ser repensadas as

primeiras e abolidas as segundas. Felizmente,

nesta luta não estamos sós. Basta lermos João

Ilhéu que fala na evolução que sofreram as

touradas à corda ao longo dos tempos e outro

ilustre, mas pouco conhecido, terceirense que foi o

libertário Adriano Botelho que afirmou: ”fazem-se

por outro lado, reclames entusiastas de

espectáculos, como as touradas de praça onde por

simples prazer se martirizam animais e onde os

jorros de sangue quente, os urros de raiva e dor e

os estertores da agonia só podem servir para

perverter cada vez mais aqueles que se deleitam

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como aparato dessa luta bruta e violenta, sem

qualquer razão que a justifique”.

consumo que é responsável pela violação dos

direitos humanos e ambientais da maior parte da

humanidade, sendo também responsável pelo

sofrimento infligido aos animais.

A recente investida dos monjardinos e outros foi

precedida da tentativa de “exportar” para outras

ilhas touradas à corda, de que são exemplo

algumas touradas realizadas em São Miguel, sob o

comando do forcado da cara Joaquim Pires, tendo

por rabejador o presidente da Câmara Municipal

da Lagoa, João Ponte.

TB

Eles disseram

"...espectáculo de eras bárbaras (as

touradas), que a civilização,

desenvolvendo-se gradualmente por alguns

séculos, ainda não pôde desterrar da

Península, e que nos conserva na fronte o

estigma dos bárbaros, embora tenhamos

procurado esconder esse estigma debaixo

dos ouropéis e pompas de arte moderna e

pleitear a nossa vergonhosa causa perante

o tribunal da opinião da Europa com

sofismas pueris e ineptos."

Alexandre Herculano (escritor)

Em abono da verdade, ambas as investidas, têm

em comum o facto de tentar impor o que nem é

tradição e tentar expandir um negócio que não

estará a correr bem ou que se insere na lógica

capitalista de crescer a todo o custo,

desrespeitando animais e pessoas.

O silêncio dos deputados, sobretudo os do

chamado arco governamental, é sintomático de

que nos Açores poderemos assistir em breve a um

“retrocesso civilizacional” se não continuarmos a

campanha de sensibilização para a necessidade de

promover uma educação, cultura e legislação que

garantam os direitos dos animais.

Vamos desertar do medo e reforçar a luta pela

alteração do modelo actual de produção e

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