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1 UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO LINHA DE PESQUISA EDUCAÇÃO E LINGUAGENS Parecer, análise e comentários da Dissertação de Mestrado Cinema de animação no ensino de arte: a experiência e a narrativa na formação da criança em contexto campesino, de autoria de Thalyta Botelho Monteiro. PALAVRAS INICIAIS Mais uma vez gostaria agradecer à Thalyta e à Professora Gerda pelo convite para participar desse momento. Aproveito, também, para cumprimentar aos colegas da banca e a todo/as presentes. Tentarei, na medida do possível, ser breve. De antemão eu parabenizo à Thalyta e à Gerda pelo trabalho realizado, pelo esforço de dois anos de trabalho condensado nas mais de duzentas páginas dessa dissertação. Com certeza percebe-se um avanço significativo do trabalho apresentado na defesa de qualificação e este da defesa final. Houve um avanço em termos de conteúdo, de análise, das relações estabelecidas o que a meu ver é o mais significativo em uma pesquisa: a capacidade de estabelecer relações. COMENTÁRIOS GERAIS Thalyta nos alerta nos fez um alerta: de que o trabalho não passou por revisão técnica e ortográfica, o que obviamente deverá ser feito para a versão final que será depositada na secretaria do PPGE/UFES e que será encaminhada para a Biblioteca. Por isso, não vou me ater a essas filigranas. Sua pesquisa, Thalyta, apresenta todos os principais elementos que compõe uma dissertação: problema (apesar de oculto), objetivos, discussão teórica, levantamento bibliográfico, metodologia. A articulação entre as temáticas (educação do campo, cinema de animação, conceitos filosóficos) é realizada de forma a contemplar o que é anunciado na introdução e desta forma considero que o trabalho corresponde ao que se exige para uma dissertação. PRIMEIRA QUESTÃO Minha primeira questão diz respeito ao seu problema de pesquisa. Em qual momento você o anuncia? Tudo indica que ele aparece nos seus objetivos. Por acaso, Thalyta, o problema da sua pesquisa é esse: como a experiência coletiva (Erfrahung) e a experiência individual (Erlebnis) manifestam-se no processo de produção de cinema de animação, em especial na formação das crianças, quando passam de espectadoras a autoras/produtoras? É isso que você quis investigar? Posso estar enganado, mas você também lança um problema derivado, qual seja: Mediada pela imagem em movimento, a pesquisa analisa as narrativas das crianças e suas manifestações de experiência que engendram o aprendizado escolar e também suas vivências sócio-histórico-culturais, em outras palavras: como essas experiências são expressas em suas narrativas orais e visuais?”.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

LINHA DE PESQUISA EDUCAÇÃO E LINGUAGENS

Parecer, análise e comentários da Dissertação de Mestrado Cinema de animação no

ensino de arte: a experiência e a narrativa na formação da criança em contexto

campesino, de autoria de Thalyta Botelho Monteiro.

PALAVRAS INICIAIS

Mais uma vez gostaria agradecer à Thalyta e à Professora Gerda pelo convite

para participar desse momento. Aproveito, também, para cumprimentar aos colegas da

banca e a todo/as presentes.

Tentarei, na medida do possível, ser breve. De antemão eu parabenizo à Thalyta

e à Gerda pelo trabalho realizado, pelo esforço de dois anos de trabalho condensado nas

mais de duzentas páginas dessa dissertação. Com certeza percebe-se um avanço

significativo do trabalho apresentado na defesa de qualificação e este da defesa final.

Houve um avanço em termos de conteúdo, de análise, das relações estabelecidas – o que

a meu ver é o mais significativo em uma pesquisa: a capacidade de estabelecer relações.

COMENTÁRIOS GERAIS

Thalyta nos alerta nos fez um alerta: de que o trabalho não passou por revisão

técnica e ortográfica, o que obviamente deverá ser feito para a versão final que será

depositada na secretaria do PPGE/UFES e que será encaminhada para a Biblioteca. Por

isso, não vou me ater a essas “filigranas”.

Sua pesquisa, Thalyta, apresenta todos os principais elementos que compõe uma

dissertação: problema (apesar de oculto), objetivos, discussão teórica, levantamento

bibliográfico, metodologia. A articulação entre as temáticas (educação do campo,

cinema de animação, conceitos filosóficos) é realizada de forma a contemplar o que é

anunciado na introdução e desta forma considero que o trabalho corresponde ao que se

exige para uma dissertação.

PRIMEIRA QUESTÃO

Minha primeira questão diz respeito ao seu problema de pesquisa. Em qual

momento você o anuncia? Tudo indica que ele aparece nos seus objetivos. Por acaso,

Thalyta, o problema da sua pesquisa é esse: como a experiência coletiva (Erfrahung) e a

experiência individual (Erlebnis) manifestam-se no processo de produção de cinema de

animação, em especial na formação das crianças, quando passam de espectadoras a

autoras/produtoras? É isso que você quis investigar?

Posso estar enganado, mas você também lança um problema derivado, qual seja:

“Mediada pela imagem em movimento, a pesquisa analisa as narrativas das crianças e

suas manifestações de experiência que engendram o aprendizado escolar e também suas

vivências sócio-histórico-culturais, em outras palavras: como essas experiências são

expressas em suas narrativas orais e visuais?”.

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Se tenho alguma razão na minha pergunta, talvez seja o caso de você deixar

tanto o problema central como o derivado mais bem apresentado.

SOBRE OS CONCEITOS DE EXPERIÊNCIA, VIVÊNCIA E A IDEIA DE

CULTURAS

A Erfahrung é uma experiência do indivíduo em contato com as narrativas da

tradição, com a possibilidade de construir sua própria individualidade. É uma relação

que se estabelece entre o que foi e o que é. Na Erlebinis essa condição de formação da

individualidade é subsumida pela completa perda de contato com as narrativas, com a

memória coletiva e dessa forma o sujeito é envolvido pela lógica de uma espécie de

palavrório vazio, fugaz. O que vale não é o contato com o que foi, com a memória

histórica da coletividade, mas sim com o consumo fugaz, com a vivência do momento,

do aqui e agora: “Pois qual o valor de todo o nosso patrimônio cultural, se a experiência

não mais o vincula a nós?”, é a pergunta que Benjamin (1994) faz em Experiência e

pobreza (1933). Para ele, a pobreza da experiência não era mais privada, mas de toda a

humanidade. O conceito de experiência ele interpreta a partir de dois substantivos da

língua alemã: Erfahrung e Erlebinis. O primeiro advém de fahren, que significa

conduzir, guiar, levar e também pode ser traduzido por viajar, no sentido do verbo

reisen. Erfahren diz respeito a chegar a, saber; sofrer, versado, esperto, experimentado.

Erfahrung, segundo Benjamin, vincula-se ao conhecimento obtido por meio de uma

experiência que se acumula, prolonga-se e desdobra-se, como em uma viagem (fahren).

O sujeito, integrado em uma comunidade dispõe de critérios que lhe permitem

sedimentar as coisas com o mesmo universo de linguagem e de práticas. Ele associa a

vida particular à vida coletiva e estabelece um fluxo de correspondência/relações

alimentado pela capacidade da memória que lhe foi herdada pela geração que dele

cuidou. Para Benjamin, sob os auspícios do capitalismo tardio, devido ao domínio da

dimensão técnico-instrumental que move a existência pragmatizada, há uma pobreza da

experiência, o que significa uma incapacidade para narrar, contar (Erzahlen),

compartilhar experiências/estórias.

Benjamin demonstra o enfraquecimento da “Erfahrung” e toma como antípoda o

conceito de “Erlebnis”, que significa vivência, característica do indivíduo solitário. Ele

esboça uma reflexão sobre a necessidade de sua reconstrução para garantir uma

memória e palavra comuns apesar da desagregação e do esfacelamento do social nos

tempos modernos. Tempos nos quais até o romance perde a capacidade de narrar a

experiência. Erlebnis conjuga a fugacidade do ato de vida e a memória que o conserva e

transmite. É a vivência do indivíduo isolado em sua história pessoal cotidiana e

ordinária, a impressão forte que precisa ser assimilada às pessoas e que produz efeitos

imediatos. Tudo a ver com o capitalismo tardio. É uma vida sem laços com o passado,

atropelada pelo excesso de apelos da sociedade de consumo.

O empobrecimento da experiência significa, em Benjamin, a perda da

capacidade de narrar, de contar estória, de lembrar, de trazer à tona a dor, o sofrimento

reprimido que aguarda o momento propício para se revelar em barbárie. O silêncio que

toma conta da vida urbana é acompanhado da cacofonia ensurdecedora promovida pelas

máquinas, buzinas, sirenes e as conversas das massas que falam, dos filmes e programas

de televisão que nada têm nada a dizer e, alucinadamente reverberam na audição

regredida da experiência moderna.

É justo nessa contraposição entre o silenciar da dor e do sofrimento das gerações

passadas e a “esquizofrênica” experiência da agitação sonora e imagética das cidades

que reside o potencial de emancipação ou barbárie que pode se configurar na sociedade.

A Erfahrung diz respeito àquela disposição social, à própria experiência de narrar a

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experiência coletiva, a memória histórica que definhou com o avanço do capitalismo.

Dessa tradição que se esvai, surgem novas formas narrativas, como é o caso do romance

e a informação jornalística. Há, também, uma analogia entre enfraquecimento ou

desaparecimento da Erfahrung e a perda da aura na obra de arte, tema que Benjamin

problematiza em A obra de arte na era da sua reprodutibilidade técnica (1935/1936).

Nesse luminoso artigo, não obstante ele ter abordado a fotografia e o cinema, e dadas as

condições objetivas da época, Benjamin sequer imaginava que a pobreza da experiência

se expandiria ainda mais nos anos seguintes. Eis a diferenciação clássica desenvolvida

por Benjamin.

Isso nos remete à uma outra questão que a meu ver vincula-se à essa ideia de

Benjamin. No início da p. 36 você faz a seguinte consideração: “Neste contexto de

inúmeras culturas e na tentativa de darmos vez a essas narrativas e experiências [...]” E

continua. Bom, em que sentido você considera que estamos em um contexto de

inúmeras culturas? Tenho percebido que atualmente vivemos uma pobreza da

experiência (da Erfahrung) justamente porque vive-se uma aversão à cultura, à

memória coletiva, à elaboração, à narração. O que se tem é uma espécie de reprodução

de determinados hábitos de consumo relativos aos produtos lançados pela indústria do

entretenimento que são compartilhados pelas crianças e adolescentes,

independentemente de etnia, credo religioso, nacionalidade, se do meio rural ou urbano.

Os filmes, as músicas, os jogos eletrônicos, HQs, a maioria desses produtos

tendem a reproduzir um padrão de falsa universalidade porque não determinado pelo

particular. Ainda que adaptado à uma determinada especificidade local, isso não

significa diferenciação. Em outras palavras, é no âmbito da circulação e consumo dos

produtos lançados no mercado pela indústria do entretenimento que atualmente se

percebe um padrão de comportamento que tende a ajustar os indivíduos à sociedade do

espetáculo. É muito difícil aceitar o fato de que, ao menos no caso da população

infanto-juvenil residente na região rural que é objeto da pesquisa, haveria algo que

efetivamente se possa considerar uma cultura diferente e, nesse sentido, considerar o

argumento de que se trata de culturas, ao invés de uma cultura massificada pelo capital.

Então, Thalyta, caso se trate de culturas, o que determina ou determinaria a

possível distinção a ponto de você se referir a culturas? A literatura, o cinema e a

experiência com e no mundo tem mostrado que tanto na Inglaterra como na Alemanha

ou mesmo na tão aguerrida e combativa Irlanda, os desenhos animados, os filmes, os

mangás, os jogos eletrônicos são os mesmos que circulam e são acessados pelas

crianças e adolescentes no Brasil, em Tokyo, em Buenos Aires. Nesse sentido, por mais

que haja aparentes nuances, ou mesmo surtos passageiros de diferenciação entre os

produtos produzidos pela indústria do entretenimento, muito pouco, para não dizer nada

dessa suposta diferenciação afeta a estrutura, a lógica de massificação proposta por essa

indústria. Os filmes infanto-juvenis que neste exato momento são exibidos nos cinemas

de Tokyo, Londres, Berlin, Dublin, Boston, Lisboa, Madrid, Buenos Aires são os

mesmos exibidos nas salas Multiplex, Cinemark dos cinemas em São Paulo, Rio de

Janeiro, Belo Horizonte. O mesmo acontece com os jogos eletrônicos da moda; com as

HQs – aqui, com alguma pequena e leve distinção que tampouco chega a desestruturar a

lógica do entretenimento vinculado a um padrão e protocolo estético vinculado às

promessas da utopia capitalista.

Por mais que aparentemente haja uma suposta diferenciação na forma como

esses produtos são recebidos/consumidos, em linhas gerais a intenção não é promover

qualquer desenvolvimento das potencialidades de uma comunidade local, mas apenas

ampliar as formas de minar o potencial do restante de uma possível manifestação de

resistência e manutenção dos resquícios de uma cultura local. Em geral, o que prevalece

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são os clichês, as manifestações estereotipadas manifestadas na dança, na música, nos

hábitos alimentares – culinária –, no vestuário, em alguns ritos de passagem, em

especial o casamento, a forma de realizar uma negociação comercial, algum tipo de

artesanato. Mas tudo indica que essas manifestações acabam sendo incorporadas pela

estrutura ordenadamente montada pelos gerentes e operadores da indústria do

entretenimento (que aqui entra a indústria do turismo) que acabam por transformá-las

em mercadorias cujos principais consumidores são os turistas clientes que visitam as

cidades rurais em época de festividade, período de férias, etc. Nesse sentido, o que um

turista visitante dessa cidade rural acessa é o fugaz, o episódico, o anedótico, o clichê, o

estereótipo. Não há narrativa, o que há é palavrório que mantém os indivíduos presos,

submissos à lógica do mercado, do consumo, do instante, daquilo que não dura, daquilo

que se descarta com a velocidade de um supersônico. Eis a Erlebinis – a pobreza da

experiência descrita por Benjamin. Nada do que fica é capaz de ser transmitido. Não há

uma narrativa capaz de dar conta da fugacidade, do espetáculo do consumo das

mercadorias descartáveis que se desmancham como fogos de artifício.

Em hipótese alguma isso significa que os consumidores sejam estúpidos, idiotas

e que todos se enquadrem e reproduzem o que os protocolos estéticos do mainstream

desejam. Isso significa apenas que há uma tendência; a tendência não é, obviamente,

que o público consiga alcançar, como as crianças da sua pesquisa, uma autonomia e que

sejam capazes de elaborarem suas existências. Não se trata de pessimismo, mas apenas

de não sermos ingênuos e acreditarmos que o Mickey mouse do Disney Chanel ou na

Disneylândia irá concretizar o tão alardeado e propagado sonho de liberdade. Aliás,

Benjamin faz uma interessante consideração sobre o Mickey que eu senti falta em seu

trabalho. Pois, qual seria o valor de todo nosso patrimônio cultural (Disney é cultura), se

a experiência não mais o vincula a nós? A experiência é o elo que nos vincula ao

passado – o patrimônio histórico. Se essa experiência é abstraída só nos resta assumir a

pobreza da experiência que, em nenhuma hipótese representa aspirar novas

experiências, mas sim libertar-se de toda experiência, significa aspirar um mundo no

qual se possa ostentar “[...] tão pura e claramente sua pobreza externa e interna, que

algo de decente possa resultar disso”. Nem sempre as pessoas, escreve Benjamin, “[...]

são ignorantes ou inexperientes”. Muitas vezes, pode-se afirmar o oposto: elas devoram

tudo, “[...] a cultura e os homens, e ficam saciadas e exaustas (BENJAMIN). O

camundongo Mickey é citado por Benjamin com uma espécie de sonho do homem

contemporâneo: “[...] nos desenhos animados, a técnica é brinquedo onde tudo é

possível, as coisas absurdas acontecendo no imaginário sendo mesmo a própria técnica

motivo de zombaria” (MEINERZ, 2008, p. 36).

INFORMAR FONTE

Thalyta, no último § da p. 36 você faz a seguinte afirmação: “Atualmente, o

celular, a câmera fotográfica e o computador são meios digitais que existem na maioria

das residências [...]”. Isso continua quando você considera que “[...] É mínimo o

número de alunos em fase escolar inicial que tem celular. Mas, o quantitativo de

famílias que possuem computadores vem aumentando consideravelmente. Contudo,

nem todas adquirem internet e quando as tem é para o acesso as redes sociais e uso de

jogos”. Seria interessante que você apresentasse alguma fonte para corroborar essa sua

assertiva – ou então informar, em nota de rodapé, que você apresenta alguns resultados

de um levantamento feito junto aos alunos participantes da pesquisa.

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INDIVIDUALISMO E INDIVIDUALIDADE

Na p. 88 você faz a seguinte afirmação: “A experiência deve contudo ser provida

de espírito e conteúdo. Entretanto, o mundo globalizado, com suas inúmeras atividades,

pessoas e artigos 88 tecnológicos vislumbram o desaparecimento da coletividade em

detrimento da individualidade”. Talvez você queira dizer individualismo, ao invés de

individualidade.

LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO X REVISÃO DE LITERATURA

Você realiza um bom levantamento bibliográfico, mas alguns trabalhos

poderiam ter tido um tratamento analítico mais adequado e esse tópico poderia ser

considerado revisão de literatura, não apenas um levantamento bibliográfico. Você

passou muito rápido por alguns trabalhos importantes. De qualquer maneira, é possível

perceber um esforço para informar a(o) seu/sua leitor/a de como a área tem tratado da

temática. Só não tenho tanta certeza, como você, de que os trabalhos encontrados se

limitam a estabelecer manuais ou propostas da utilização do cinema de animação à

educação (MONTEIRO, 2013, p. 86-87). Talvez não tenha sido essa sua intenção, mas

é a impressão que fica. Mesmo porque, ainda que sua dissertação possa ser

transformada em um manual, pode-se considerar que a pesquisa que você realizou e a

experiência que consegue transmitir para o/a seu/sua leitor/a tem conteúdo e qualidade

suficiente para ser considerado um bom manual: apesar de ser mais que isso. Um bom

manual pode ser uma referência para quem começa a despertar para determinada

temática, por exemplo. O problema não é o manual, em si, mas sim quando ele se torna

a principal e única referência no trabalho docente e o/a professor/a vê-se paralisado/a e

com dificuldades para criar, inventar, inovar, ampliar suas referências.

A PRODUÇÃO DAS CRIANÇAS – DESEJOS E VONTADES

Eu ainda tenho dúvidas sobre isso que você afirma: “Em suas produções (das

crianças) encontramos claramente seus elementos culturais e principalmente suas

vontades e desejos”. Talvez você pudesse ter isso mais como uma hipótese de trabalho,

ao invés de uma afirmação tão categórica. Ainda mais quando se trata de desejo, pois

como nos ensinou o velho Freud e boa parte da tradição psicanalítica, o desejo é uma

produção social – assim como o é a fantasia (em Freud, pelo menos). Qual é o conteúdo,

os elementos da cultura que mais afetam a formação/produção do desejo e a fantasia

dessas crianças? Por isso, penso que aqui você pudesse, ao invés de fazer uma

afirmação tão categórica (que você efetivamente não investigou e aprofundou, porque

não foi objeto da sua pesquisa), enfim ao invés de uma afirmação tão definitiva, você

pudesse lançar mão de uma hipótese a ser investigada na sua futura pesquisa de

doutorado.

COMPROMISSO COM A PESQUISA

Não resta dúvida, Thalyta, que seu trabalho está repleto de afetação. Você é

afetada pelo tema, pelo envolvimento e compromisso com a educação, com os seus

“colaboradores” (apesar de considerar esse termo um pouco inapropriado – essa é a

terminologia utilizada pelas empresas. No supermercado já não há mais atendente, mas

colaborador), com todo o processo da pesquisa.

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O CONCEITO DE EXPERIÊNCIA E VIVÊNCIA EM BENJAMIN

Não posso deixar de comentar que em seu trabalho há alguns pequenos deslizes,

em especial no tratamento e na interpretação do conceito de experiência e vivência em

Benjamin. Talvez você pudesse ter tido um pouco mais de paciência e ter ficado apenas

com os textos de Benjamin, em especial Experiência e pobreza, O Narrador:

considerações sobre a obra de Nikolai Leskov ou mesmo ter explorado um pouco mais

a dissertação da Andréia Meinerz. Em geral fica um ruído que dificulta acessar o real

sentido atribuído pelo próprio Benjamin. Não se trata de não poder atingir o real sentido

(não psicanalítico), mas que algumas interpretações fogem daquilo que o autor

efetivamente escreveu. Esse não é o caso do trabalho A concepção de experiência em

Walter Benjamin, dissertação da Andréia MEINERZ defendida no Programa de Pós-

Graduação em Filosofia da UFRGS. Este, a meu ver, é o principal e mais importante

trabalho comentado que você utiliza para fazer referência a este conceito – experiência.

Mas ele não foi devidamente aproveitado em suas reflexões e talvez seja o caso de você

não apenas citar, mas tentar explorar um pouco mais aquilo que este trabalho apresenta

e também incluí-lo nas referências finais da sua dissertação: na versão que você me

enviou ele só aparece na página 90.

PALAVRAS FINAIS

Paro por aqui, com apenas essas breves considerações. A meu ver sua

dissertação entra para o rol dos trabalhos de referência dessa temática e com certeza não

apenas você e seus companheiros de trabalho – que você considera colaboradores –

aprendeu nessa caminhada. Aprendi muito com a leitura do seu texto, em especial com

sua paixão pela educação, pelo envolvimento sincero a afetado com a pesquisa.

Parabéns pelo resultado. Se não for objeção da banca, penso que seu trabalho, depois de

passar por uma boa revisão de português, está devidamente aprovado e depois da leitura

final da ata você já pode oficialmente se considerar MESTRE EM EDUCAÇÃO. Faço

votos que seu trabalho renda muito mais frutos e espero vê-la em breve como

doutoranda na nossa linha de pesquisa.

Um grande e forte abraço, extensivo às minhas queridas colegas Gerda e

Valdete, para a Professora Rita Luciana Bredariolli e para aqueles que assistem à sua

defesa.

Dublin, Irlanda – primavera de 2013

Robson Loureiro