3
02/05/2016 Textos sobre a adolescência... http://varaldeleitura.blogspot.com.br/2013/08/textossobreadolescencia.html 1/3 Educação de hoje adia fim da adolescência Há pouco tempo, recebi uma mensagem que me provocou uma boa reflexão. O interessante é que não foi o conteúdo dela que fisgou minha atenção, e sim sua primeira linha, em que os remetentes se identificavam. Para ser bem clara, vou reproduzila: "Somos dois adolescentes, com 21 e 23 anos...". Minha primeira reação foi sorrir: agora, os jovens acreditam que a adolescência se estende até, pelo menos, os 23 anos?! Mas, em seguida, eu me dei conta do mais importante dessa história: a criança pode ser criança quando é tratada como tal, e o mesmo acontece com o adolescente. E, se dois jovens adultos se vêem como adolescentes, é porque, de alguma maneira, contribuímos para tanto. A adolescência tinha época certa para começar até um tempo atrás, ou seja, com a puberdade, época das grandes mudanças físicas. E terminar também: era quando o adolescente, finalmente, assumia total responsabilidade sobre sua vida e tornavase adulto. Agora, as crianças já começam a se comportar e a se sentir como adolescentes muito tempo antes de a puberdade se manifestar e, pelo jeito, continuam se comportando e vivendo assim por muito mais tempo. Qual a parcela de responsabilidade dos adultos e educadores? Pais e professores, quando educam, visam à conquista da autonomia e não podem perder de vista esse objetivo. Assim, ensinar uma criança pequena a se calçar sozinha, por exemplo, é apenas uma parte do processo educativo que supõe que, assim que possível, ela caminhe com seus próprios passos. É claro que isso não acontece de uma hora para outra, mas em etapas. Mas há de chegar o dia em que ela vai escolher os sapatos que vai calçar, quem sabe comprálos com dinheiro fruto de seu trabalho, vai usálos para andar por onde quiser e vai ter de se responsabilizar por suas escolhas. Isso é ser adulto. Qual a diferença em relação ao adolescente? Justamente essa: o adolescente ainda está a caminho de ter autonomia sobre sua vida. Os pais, mesmo que à distância e discretamente, ainda tutelam os passos do filho adolescente e não sem razão. É que, para os adolescentes, ainda é prioritário e natural pensar primeiro no tempo presente, no prazer, na diversão e só depois às vezes, tarde demais nas consequências que suas atitudes e comportamentos podem provocar. É difícil tornarse responsável por tudo? Sem dúvida é, e os adultos sabem muito bem disso. Mas há ganhos, pelo menos em relação à vida dos adolescentes: o da liberdade possível e o da independência, por exemplo. E, certamente, um adulto que se considera adolescente aos 23 anos não deve sentirse responsável por sua vida. O que ele talvez não saiba é que isso o impede de ser independente. Hoje, por conta de diversos fatores, muitos pais agem de modo confuso, mas sempre em nome da educação para a autonomia. Garotas e garotos de 12 a 15 anos são liberados para frequentar festas noturnas quase sem limites de horário e sem adultos por perto, mas, em compensação, não têm autonomia para administrar sozinhos a vida escolar, porque os pais esperam determinados resultados e, para tanto, precisam verificar se o filho cumpre o que desejam. Professores universitários tratam seus alunos como adolescentes incapazes de discernir direitos de deveres e, depois, reclamam da falta de interesse deles pelo conhecimento. Exemplos desses não faltam numa sociedade que trata seus cidadãos de modo infantilizado e os faz acreditar e muitos acreditam que isso é feito pelo bemestar deles. Por isso é bom que os pais e educadores pensem com carinho na educação que praticam. Para que

Textos sobre a adolescência..pdf

Embed Size (px)

Citation preview

02/05/2016 Textos sobre a adolescência...

http://varaldeleitura.blogspot.com.br/2013/08/textos­sobre­adolescencia.html 1/3

Educação de hoje adia fim da adolescência Há pouco tempo, recebi uma mensagem que me provocou uma boa reflexão. Ointeressante é que não foi o conteúdo dela que fisgou minha atenção, e sim sua primeiralinha, em que os remetentes se identificavam. Para ser bem clara, vou reproduzi­la:"Somos dois adolescentes, com 21 e 23 anos...".Minha primeira reação foi sorrir: agora, os jovens acreditam que a adolescência se estendeaté, pelo menos, os 23 anos?! Mas, em seguida, eu me dei conta do mais importante dessahistória: a criança pode ser criança quando é tratada como tal, e o mesmo acontece com oadolescente. E, se dois jovens adultos se vêem como adolescentes, é porque, de algumamaneira, contribuímos para tanto.A adolescência tinha época certa para começar até um tempo atrás, ou seja, com apuberdade, época das grandes mudanças físicas. E terminar também: era quando oadolescente, finalmente, assumia total responsabilidade sobre sua vida e tornava­se adulto.Agora, as crianças já começam a se comportar e a se sentir como adolescentes muitotempo antes de a puberdade se manifestar e, pelo jeito, continuam se comportando evivendo assim por muito mais tempo. Qual a parcela de responsabilidade dos adultos eeducadores?Pais e professores, quando educam, visam à conquista da autonomia e não podem perderde vista esse objetivo. Assim, ensinar uma criança pequena a se calçar sozinha, porexemplo, é apenas uma parte do processo educativo que supõe que, assim que possível, elacaminhe com seus próprios passos. É claro que isso não acontece de uma hora para outra,mas em etapas. Mas há de chegar o dia em que ela vai escolher os sapatos que vai calçar,quem sabe comprá­los com dinheiro fruto de seu trabalho, vai usá­los para andar por ondequiser e vai ter de se responsabilizar por suas escolhas. Isso é ser adulto.Qual a diferença em relação ao adolescente? Justamente essa: o adolescente ainda está acaminho de ter autonomia sobre sua vida. Os pais, mesmo que à distância e discretamente,ainda tutelam os passos do filho adolescente ­e não sem razão. É que, para os adolescentes,ainda é prioritário e natural pensar primeiro no tempo presente, no prazer, na diversão e sódepois­ às vezes, tarde demais­ nas consequências que suas atitudes e comportamentospodem provocar.É difícil tornar­se responsável por tudo? Sem dúvida é, e os adultos sabem muito bemdisso. Mas há ganhos, pelo menos em relação à vida dos adolescentes: o da liberdadepossível e o da independência, por exemplo. E, certamente, um adulto que se consideraadolescente aos 23 anos não deve sentir­se responsável por sua vida. O que ele talvez nãosaiba é que isso o impede de ser independente.Hoje, por conta de diversos fatores, muitos pais agem de modo confuso, mas sempre emnome da educação para a autonomia. Garotas e garotos de 12 a 15 anos são liberados parafrequentar festas noturnas quase sem limites de horário e sem adultos por perto, mas, emcompensação, não têm autonomia para administrar sozinhos a vida escolar, porque os paisesperam determinados resultados e, para tanto, precisam verificar se o filho cumpre o quedesejam. Professores universitários tratam seus alunos como adolescentes incapazes dediscernir direitos de deveres e, depois, reclamam da falta de interesse deles peloconhecimento.Exemplos desses não faltam numa sociedade que trata seus cidadãos de modo infantilizadoe os faz acreditar ­e muitos acreditam­ que isso é feito pelo bem­estar deles. Por isso é bomque os pais e educadores pensem com carinho na educação que praticam. Para que

02/05/2016 Textos sobre a adolescência...

http://varaldeleitura.blogspot.com.br/2013/08/textos­sobre­adolescencia.html 2/3

crianças e adolescentes atinjam a vida adulta, é preciso que sejam tratados de modocoerente e sejam responsabilizados, pouco a pouco, por aquilo com que são capazes dearcar. Afinal, a adolescência tem de terminar.

Rosely Sayão (psicóloga e consultora em Educação), in  Folha de São Paulo, 25/04/2002

Qual foi a época mais feliz na sua vida? Se você pudesse escolher, queidade teria de novo? Se você tem, digamos, mais de 30 anos,provavelmente já ouviu essas perguntas muitas vezes. As respostasvariam. Muitas pessoas querem voltar à época da faculdade, outrosvoltariam à infância, outros ao início do casamento, e assim por diante.No entanto, raramente ouvimos a resposta: "Voltaria à minhaadolescência". Por que pouca gente gostaria de voltar à adolescência? À primeira vista,existe muita coisa boa nessa época: não temos de ganhar a vida,nossos pais estão vivos, temos roupa lavada e comida de graça. É,também, a época da descoberta do amor. Paradoxalmente, esse é umdos motivos pelos quais ninguém quer voltar à adolescência. A iniciaçãona vida amorosa geralmente é muito tensa, muito intensa, muitoturbulenta, muito permeada de gozos e agruras. Antes, na infância, oamor era algo que apenas víamos na TV, entre os mais velhos e, comum pouco de sorte, entre nossos pais. Agora, na adolescência, o amorestá acontecendo com os amigos mais próximos e (que espanto!)conosco. Aquelas pessoas horrorosas do sexo oposto de repente estãose tornando suportáveis... admissíveis... interessantes... altamenteinteressantes... imprescindíveis!!! Em todos os locais que freqüentoexistem vários possíveis parceiros amorosos na mesma situação queeu: com os hormônios sexuais transbordando, disponíveis e muitodispostos a se envolver amorosamente. Os meus pares já estãonamorando, a mídia, as músicas, os livros, o zunzum que ouço, tudoproclama as maravilhas de um relacionamento amoroso. Precisoarranjar um! Puxa, como seria bom ficar com aquela pessoa! Fariaqualquer coisa para dar um beijo nela! Quem sou eu? Qual meu cacifepara atrair aquele ser tão interessante? É aí que começam as agruras amorosas. Geralmente, aquelas pessoas

Apaixonar­se é bom,mas éestressante

"Amor à vista!" As turbulências deum marinheiro de primeira viagemno mundo dos relacionamentos

02/05/2016 Textos sobre a adolescência...

http://varaldeleitura.blogspot.com.br/2013/08/textos­sobre­adolescencia.html 3/3

que são mais atraentes para mim também o são para todos os meuscolegas. Assim sendo, poucos de nós seremos bem­sucedidos (é avelha questão da relação entre oferta e procura). O pior de tudo é queaquela pessoa que parecia estar interessada em mim, parecia estar mepaquerando, me rejeitou. Apaixonei­me e, quando tentei ficar com ela,levei um fora. O que agrava esse quadro é que ele é recorrente: a todomomento estou novamente me interessando por uma nova pessoa etoda a história se repete. "Como é bom e como é sofrido!!", confessou aesse respeito uma adolescente que participou de uma pesquisa que fizsobre o assunto. Se sou tímido a coisa piora de vez. Não consigo "ficar"ou namorar. Perto da pessoa amada baixa uma bobeira. Fico tenso. Nãoconsigo falar coisas inteligentes, dá um branco, faço coisas idiotas paraatrair sua atenção, o meu charme me abandona. A timidez éextremamente freqüente entre os adolescentes. Segundo Bernardo J.Carducci, famoso pesquisador da Universidade de Indiana, a timidezatinge muito mais os adolescentes (50%) do que, por exemplo, ascrianças (20%). A razão desse aumento da timidez na adolescência tema ver com a enorme insegurança que é inerente a essa época da vida,na qual o corpo passa por grandes transformações. Essas alteraçõesrápidas fazem com que o teen não reconheça o próprio corpo. Umaamostra dessa falta de parâmetros: um estudo americano verificou quedois terços das adolescentes de uma escola se consideravam as maisfeias da classe.   A primeira vez de várias atividades amorosas é muito tensa: aprimeira vez que "fico", a primeira vez que beijo, a primeira vez quetenho intimidades sexuais, a primeira vez que transo. Um levantamentoque realizei entre adolescentes mostrou que seus maiores medosquanto à primeira relação sexual são os seguintes: engravidar (atingemais fortemente as mulheres), contrair doenças (principalmente aAids), doer (mulheres), falhar (homens), o parceiro não ser a pessoa certa para mim (temor mais feminino), oparceiro me "pegar no pé" após a transa (temor mais masculino).Quanto desejo, quanta dúvida, quanta culpa! É estressante. É solitário.Mas é inevitável. Como escreveu o poeta Carlos Drummond deAndrade, amar se aprende amando. A notícia boa é que a adolescênciaacaba um dia. A ruim é que esse aprendizado dura a vida inteira.

Ailton Amélio da Silva (Psicólogo e professoruniversitário) in Veja Jovens, edição especial de Veja, ano 34, n. 38,setembro de 2001, p.87