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1 Transcrição da entrevista da participante 2 (EER) Pergunta: Então vamos começar pela parte da empresa, caracterização da empresa independentemente…pronto os dados mais gerais estão disponíveis no site, já estive a ver, mas gostava que me explicasse basicamente como é que se tornou empresária, ou seja, quando é que começou a pensar criar uma empresa, as principais motivações e expectativas, sozinha ou com colegas… Resposta: Ok, então as coisas passaram pelo seguinte, quando terminámos o nosso curso de Educação Especial, como a maior parte dos Licenciados, não tínhamos emprego não é…e então fomos experimentar o emprego por aí… e experimentámos colégios de ensino especial, que não nos estava a satisfazer muito e também como eu, pessoalmente, tinha estagiado com o Professor F surgiu a ideia de, e porque não criarmos uma, uma clínica para atendermos as crianças com Dificuldades de Aprendizagem. Depois de termos trabalhado um ou dois meses nesse tipo de colégios pensámos então na hipótese …porque não? Vamos avançar…vamos arriscar. E então eu e outro colega meu que é o J, que fizemos o estágio com o professor F, falámos com mais outros dois colegas nossos que estagiaram na Casa da Praia e nós os quatros pensámos então, com a ajuda do professor em termos do nome, de criarmos mesmo uma empresa. Criámos uma empresa, alugámos umas instalações em Alcântara, uma cave que só tinha dois espaços, e então o professor F dava as consultas e nós fazíamos a parte da intervenção. Como isto começou a correr muito bem e em cerca de três, quatro meses começámos a não ter espaço para continuar a acompanhar as crianças, e então tentámos voos mais altos, que foi tentámos alugar um espaço maior que é este espaço aqui, então em Linda-a-Velha. Continuámos os quatro a gerir a clínica…mais ou menos, porque nós nem sequer tínhamos bases de gestão, não é, mas acima de tudo tentámos conseguir dar resposta às dificuldades das crianças e das famílias. Continuámos com a ajuda do Professor F, que se mantém… a única diferença é que desde o início até agora, portanto já lá vão treze, catorze anos de empresa, os quatro sócios passaram a três sócios, um deles que nos vendeu a posição dele e está noutros sítios a trabalhar… e nós também passámos os três a dar consultas de avaliação. Depois…também como os casos continuaram a surgir de forma muito rápida, optámos então por começar a pedir a colegas nossos do nosso curso, após terem terminado o curso, de virem trabalhar connosco…pronto e foi então assim que aconteceu, começámos a alargar a nossa equipa em termos de intervenção, não só em termos das Dificuldades de Aprendizagem, como

Transcrição da entrevista da participante 2 (EER) Resposta · humanos, não só em termos dos recursos humanos para os próprios pais… não é, como a gestão dos horários e

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Page 1: Transcrição da entrevista da participante 2 (EER) Resposta · humanos, não só em termos dos recursos humanos para os próprios pais… não é, como a gestão dos horários e

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Transcrição da entrevista da participante 2 (EER)

Pergunta: Então vamos começar pela parte da empresa, caracterização da empresa

independentemente…pronto os dados mais gerais estão disponíveis no site, já estive a

ver, mas gostava que me explicasse basicamente como é que se tornou empresária, ou

seja, quando é que começou a pensar criar uma empresa, as principais motivações e

expectativas, sozinha ou com colegas…

Resposta: Ok, então as coisas passaram pelo seguinte, quando terminámos o nosso

curso de Educação Especial, como a maior parte dos Licenciados, não tínhamos

emprego não é…e então fomos experimentar o emprego por aí… e experimentámos

colégios de ensino especial, que não nos estava a satisfazer muito e também como eu,

pessoalmente, tinha estagiado com o Professor F surgiu a ideia de, e porque não

criarmos uma, uma clínica para atendermos as crianças com Dificuldades de

Aprendizagem. Depois de termos trabalhado um ou dois meses nesse tipo de colégios

pensámos então na hipótese …porque não? Vamos avançar…vamos arriscar. E então eu

e outro colega meu que é o J, que fizemos o estágio com o professor F, falámos com

mais outros dois colegas nossos que estagiaram na Casa da Praia e nós os quatros

pensámos então, com a ajuda do professor em termos do nome, de criarmos mesmo uma

empresa. Criámos uma empresa, alugámos umas instalações em Alcântara, uma cave

que só tinha dois espaços, e então o professor F dava as consultas e nós fazíamos a parte

da intervenção. Como isto começou a correr muito bem e em cerca de três, quatro meses

começámos a não ter espaço para continuar a acompanhar as crianças, e então tentámos

voos mais altos, que foi tentámos alugar um espaço maior que é este espaço aqui, então

em Linda-a-Velha. Continuámos os quatro a gerir a clínica…mais ou menos, porque

nós nem sequer tínhamos bases de gestão, não é, mas acima de tudo tentámos conseguir

dar resposta às dificuldades das crianças e das famílias. Continuámos com a ajuda do

Professor F, que se mantém… a única diferença é que desde o início até agora, portanto

já lá vão treze, catorze anos de empresa, os quatro sócios passaram a três sócios, um

deles que nos vendeu a posição dele e está noutros sítios a trabalhar… e nós também

passámos os três a dar consultas de avaliação. Depois…também como os casos

continuaram a surgir de forma muito rápida, optámos então por começar a pedir a

colegas nossos do nosso curso, após terem terminado o curso, de virem trabalhar

connosco…pronto e foi então assim que aconteceu, começámos a alargar a nossa equipa

em termos de intervenção, não só em termos das Dificuldades de Aprendizagem, como

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também alargámos para a parte da Psicologia e da Terapia da Fala. E pronto, foi assim

que surgiu… As coisas têm andado a correr relativamente bem, portanto a procura é

muito grande, na altura era uma coisa muito inovadora e neste momento

também…portanto, abrimos há dois anos o espaço também em Telheiras com o mesmo

tipo de resposta às pessoas…portanto esta foi a ideia inicial.

Pergunta: Relativamente aos sócios, inicialmente…pronto, eram quatro, não é?

Resposta: humm, humm;

Pergunta: E nessa fase inicial como é que era? Eram sócios de… com igual…?

Resposta: Quotas, sim… quotas, quotas iguais…

Pergunta: Não havia qualquer diferenciação, mesmo a nível de responsabilidades e

isso?

Resposta: Não…não e sempre funcionámos assim e continuamos a funcionar assim.

Pergunta: Enquanto três agora?

Resposta: Sim…exactamente, exactamente.

Pergunta: Ou seja…mas como é que é relativamente aos cargos que os três sócios

ocupam?

Resposta: É assim, neste momento nós estamos divididos, em tipo de organigrama,

estamos mais ou menos divididos em áreas, mas para resolver os problemas, apesar de

estarmos responsáveis por diferentes áreas fazemos sempre reuniões em conjunto

para…limarmos bastantes arestas, não é…portanto, o Dr. J é responsável pela parte

financeira, neste caso a parte financeira e a parte do material, portanto o desuso e o

gasto do material; eu sou responsável pelo funcionamento da parte dos recursos

humanos, não só em termos dos recursos humanos para os próprios pais… não é, como

a gestão dos horários e a gestão dos próprios técnicos, e depois a minha colega com

parte mais do exterior, portanto com tudo o que tem a ver com da publicidade, não é, do

marketing… tem a ver com ela. Depois também em simultâneo, somos

também…quando criamos um projecto, criamos os três, não é…pronto.

Pergunta: Já percebi…não há um que seja…que assuma uma maior liderança?

Resposta: Não… Talvez… o empurrão desta empresa, sobretudo há cerca de dois anos,

em que nós estávamos estagnados um pouco, há algum tempo, já não fazíamos

congressos há muito tempo, começou a surgir no mercado mais empresas relacionadas

com a parte das Dificuldades de Aprendizagem, esse empurrão de mudança, inovadora,

não só do logótipo e por aí fora fui eu, pronto, isso de facto fui eu que dei, fui eu que

puxei no fundo pelos meus dois sócios para de alguma forma não estarmos estagnados,

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porque parar é morrer e nesta área acima de tudo essa é bastante válida. Obviamente que

o facto de termos ficado parados durante tanto tempo também tem a ver um bocado com

questões pessoais de casar, ter filhos e mesmo a parte também das formações que às

vezes é complicado, não é?

Comentário entrevistador: Claro.

Entrevistado: Pronto, e agora achamos que estamos já com uma dinâmica um

bocadinho diferente, mais aberta…pronto.

Pergunta: E… pronto, quando… eu isso acho que já no primeiro contacto, me tinha

explicado, mas quando a empresa surgiu existiam outras empresas que fornecessem

estes serviços?

Resposta: Não, que nós saibamos não. Pronto….na altura não havia muitas empresas

relacionadas com o mesmo tipo de trabalho que nós fazíamos, havia sim, como ainda há

actualmente clínicas que têm o apoio do psicólogo, não é, e há centro de explicações,

mas nós queremos inovar, ir mais além e um pouco com os conhecimentos do nosso

curso colocar a questão do aprender a pensar e a parte da psicomotricidade, pronto.

Houve depois também na altura, passado para aí três ou quatro anos de nós estarmos

abertos uns colegas nossos do nosso curso que queriam abrir uma clínica semelhante em

Oeiras e vieram cá pedir-nos conselhos, e nós de facto dissemos quais os passos que

demos, porque mesmo em termos dos passos, nós na altura pensámos que tipo de apoios

é que o estado pode dar ao empreendimento de uma empresa, nós…não havia nada,

agora é que já há algum tipo de apoio, que também não temos, mas nessa altura

andámos a percorrer o que é poderia haver a termos de subsídios, porque no fundo isto

tudo foi formado com dinheiro nosso e depois mais tarde com o dinheiro que vai

surgindo de lucro, entre aspas, das próprias coisas de cá. Agora na altura não havia

grandes coisas relacionadas com isto, sobretudo relacionadas com a parte da

Psicomotricidade e das Dificuldades de Aprendizagem.

Pergunta: Acha que inovaram ao nível dos serviços oferecidos ou dos processos que

utilizavam para oferecer esses serviços ou de ambos?

Resposta: As duas coisas…as duas coisas.

Pergunta: Qual era a reunião de serviços que vocês ofereciam?

Resposta: Prestação de serviços em termos de Dificuldades de Aprendizagem; a parte

da Psicomotricidade e sobretudo a relação entre nós, a escola, a família e a criança,

obviamente. E também um pouco que parcerias é que nós temos em termos de médicos

que acompanham cada um destes casos também.

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Pergunta: Ou seja a vertente saúde…

Resposta: Sim, Sim, Sim. Aliás, a vertente da saúde mesmo, nós estamos aqui naquele

meio; nós temos as duas vertentes, não é? A saúde e a educação.

Comentário do entrevistador: Ok.

Pergunta: Como é que compara o X com as outras empresas do ramo existentes

actualmente?

Resposta: Diferenças entre nós e outros, é isso? É assim, as outras empresas têm

bastante a vertente médica, portanto mais pediatras do desenvolvimento que depois têm

uma equipa da reeducação ou da reabilitação… Técnicas de Educação Especial, pronto.

Mais … achamos que mesmo em termos de diferenças nós e eles tem muito a ver com a

relação e com a disponibilidade que nós prestamos às famílias em termos de apoio.

Sentimos muito essa parceria e sentimos que os pais gostam … das dicas, das sugestões

que damos em termos também técnicos e mesmo no próprio dia-a-dia das famílias e

muito apoio em termos também da escola, o que é que nos podemos resolver nas

escolas juntamente com os professores de apoio e com o professor da regular que possa

ajudar essa criança em termos de estratégias de actuação das dificuldades que ela tem,

não é…

Pergunta: Como é que foi no início, ainda se lembra?

Resposta: Lembro-me pois…Andávamos a pintar as paredes …

Pergunta: Conte-me lá algumas situações engraçadas.

Resposta: Lembro-me de uma situação de aproveitarmos, por exemplo, as férias para

pintarmos todas as paredes e o chão porque não tínhamos dinheiro para o fazer. No

inicio éramos nós que fazíamos as limpezas de tudo, da casa de banho, de … tudo o que

isso implica, não é que agora não o façamos, mas é de forma diferente … pronto essas

situações… porque temos que ser nós às vezes a fazer um grande esforço para conseguir

suportar o barco…isso foi muito engraçado. Custou-nos um bocadinho a ideia de que

nós somos capazes, não é… às vezes questionávamo-nos de como é que nós acabámos

de ter um curso podemos dar sugestões a um pai, que já é pai, e que precisa de ajuda

para as dificuldades da sua criança. De facto, nós somos capazes e acho que no início

todos nós temos alguma dificuldade em falar com os pais porque achávamos que não

tínhamos maturidade suficiente para acontecer isso. E a outra situação foi, será que tudo

o que o nosso curso nos ensinou vai ser suficiente para ajudar este caso específico? E

tivemos que fazer um grande esforço da nossa parte para, cada caso é um caso, e cada

vez que surgia um caso nós investíamos muito em termos de ir procurar mais e saber

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mais e criarmos mesmo os nossos próprios materiais para trabalhar com essa criança.

Mas no início falar com os pais era um bocadinho complicado. Éramos muito mais

novos, achavam que nós éramos uns miúdos, quem é que são estes que agora vêm aqui

ensinar-me como é que eu vou tratar da minha criança, mas depois foi muito

engraçado… e fomos aprendendo com isso obviamente.

Pergunta: E a Y ou alguns dos sócios mudaram de concelho de residência ou concelho

de trabalho por causa da empresa que criaram? Viviam num sítio e tiveram que se

mudar de… para outro sítio?

Resposta: Sim, eu por exemplo vivia em Sintra e mudei-me primeiro aqui para Linda-

a-Velha e depois para Carnaxide onde estou actualmente. A minha colega … - não, por

acaso comprou casa nesta zona e nem sabíamos que vínhamos para aqui trabalhar - ,

mas neste momento está a viver em Lisboa, pronto … e está a usar mais as instalações

de Telheiras, obviamente por proximidade não é?

E o outro colega nosso vivia no concelho de Oeiras, pronto na Parede, na altura vivia na

Amadora, pronto, mas não por causa, não é … se bem … é um factor bastante

preponderante mesmo em termo de disponibilidade não é?

Comentário Entrevistador: Claro … É que já houve entrevista que fiz que as pessoas

disseram “sim, sim …vivo cá em cima” … estão na empresa e eles mudam-se …

pronto.

Entrevistado: Não …não … já vivi aqui muito perto, mas não … agora estou em

Carnaxide.

Pergunta: Que factores a nível de recursos, apoios, sócios, formação, contribuíram para

a criação da empresa? E depois se me podia dar exemplos específicos.

Resposta: Em termos financeiros nenhum apoio … ok … Pedimos parcerias em termos

da própria Câmara Municipal de Oeiras, estou a lembrar-me que por exemplo uma vez

até pedimos apoio para tentarmos pôr uma plataforma para as cadeiras de roda se

eventualmente pudesse acontecer e falámos com a Câmara de Oeiras e eles disseram

que podiam participar em 2% ou em 5% e para nós foi incomportável e obviamente não

fomos com isso para a frente. Mas em termos financeiros não foi dado nenhum tipo de

apoio … mais parcerias que tenhamos feito … portanto apoio financeiro não foi dado.

Em termos de material também não foi dado, portanto, tudo isso tem sido à custa dos

próprios clientes que andam cá e o dinheiro que cá deixam é gasto todo na totalidade;

aliás nós achamos que aí também, em termos de gestão, temos que aprender um bocado

porque parece que andamos sempre com a corda no pescoço; é mesmo assim que se diz

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não é? Queremos pagar às técnicas, não pagamos aquilo que queríamos em termos

daquilo que achamos mais justo obviamente, mas depois também é muito complicado

nós gerirmos, dar consultas, fazermos intervenção, gerir a empresa, ter a família

obviamente e portanto isto torna-se um bocado complicado porque não temos ajuda de

ninguém. Ainda pensámos fazer parcerias com a ADSE, SAMS, seguros e por aí fora …

não conseguimos porque em termos do Estado são muito maus pagadores, não é, e nós

ano podemos estar à espera que nos paguem, para nós tem que ser imediato porque

também temos que pagar aos técnicos dessa forma. O único acordo que fizemos há

pouco tempo, há cerca de 4 anos, foi com a Medis, que tem acordo connosco mas só em

termos da Terapia da Fala porque depois a nossa profissão não é muito reconhecida em

lado nenhum. E em termos da ADSE conseguimos contornar algumas das situações e

para pormos nos recibos para os pais poderem receber. Mas são eles que fazem isso,

portanto pagam na totalidade e depois os pais entregam os recibos na ADSE e SAMS e

conseguem uma pequena percentagem que depende do nome que nós lá pomos, Terapia

da Reeducação e pronto aí conseguimos. Agora assim por direito não temos direito a

nada.

Pergunta: A nível de… Com quantos empregados é que a empresa começou? Às

tantas…às vezes são só os sócios…

Resposta: hum, humm…

Pergunta: Pronto, e agora?

Resposta: No início éramos só os quatro sócios a trabalhar e o professor F a dar

consultas. Actualmente…temos, em termos de efectividade, a secretária e temos uma

colega - que foi esta que entrou -. Todos os outros técnicos fazem prestação de serviços

a recibos verdes e os Psicólogos e os Terapeutas da Fala fazem um regime de darem

uma percentagem sobre aquilo que ganham.

Pergunta: E os dos recibos verdes…

Comentário entrevistado: Estão há anos e anos a recibos verdes.

Comentário entrevistador: Sim, sim… Mas pensei que todos dessem uma

percentagem do…

Comentário entrevistado: Não, não …ganham à hora. Portanto cada caso tem x horas

e é contabilizado ao final do mês e eles passam os recibos sobre o valor que ganham.

Comentário entrevistador: Ah… ok, já percebi.

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Pergunta: Qual o volume de negócios? Como é que ele evoluiu? E se actualmente a

empresa gera lucros suficientes que o sustentem a si próprio e a todas as despesas

inerentes?

Resposta: Sim…Obviamente que o volume de negócios foi aumentando à medida que

os clientes foram aumentando. Mas nós também fizemos sempre questão de quando há

um bocadinho de nada de lucro, em vez de dividirmos pelos sócios investimos em

material ou em formação, porque também estabelecemos que, por ano cada técnico tem

direito a ir a uma formação paga por nós, ou paga uma parte do valor da formação, não

é…Agora, fazemos mais questão de investir…investimos ao máximo, quer seja em

computadores, quer seja em material de psicomotricidade, quer seja em livros…portanto

em termos de lucro…É assim, claro que a empresa tem que se sustentar a ele próprio,

não é? Os sócios não podem andar a pôr dinheiro, mas há sempre um mês que é muito

problemático que é Agosto. Todos os clientes pagam onze meses, nós pagamos às

técnicas onze meses, excepto às efectivas que pagamos os doze, catorze aliás… e

portanto no mês de Agosto nós temos despesas e não temos entradas de dinheiro

nenhum e isso é muito complicado de gerir…muito complicado. Normalmente temos

sempre nas férias de avançar com algum, o que é complicado para nós, não é? Pronto

mas obviamente que o número de negócios tem vindo a aumentar, mas é sempre

proporcional ao número de casos que existem…não conseguimos criar um lucro

suficiente… de maneira nenhuma. Tudo o que entre um bocadinho a mais, se naquele

mês houve mais 200 euros que não estavam previstos e até surgiram em termos de lucro

de uma criança que entrou mais e não estávamos à espera, isso é imediatamente

investido em termos de material ou formação…sem dúvida.

Pergunta: Como é que foi na altura…as pessoas aderiram com alguma facilidade?

Houve uma rápida adesão das pessoas ou não?

Resposta: É assim, no início aderiram bem, aderiram bem. Depois como é que se fez a

publicidade? Acho que a melhor publicidade é das pessoas que cá andavam, não é?

Então as próprias famílias e muitas delas professoras, acabam depois também por falar

dentro dos seus locais de trabalho sobre aquilo que se está a fazer com os filhos delas. E

depois, nós disponibilizámo-nos a ir às escolas fazer a formação das áreas que eles

necessitassem, fossem Dificuldades de Aprendizagem, fosse só de Dislexia e por aí

fora. E depois em congressos…tentámos também investir alguma coisa em congressos.

Essas são talvez as melhores formas de fazer publicidade…pronto. As pessoas aderiram

bem, não quer dizer que durante estes anos todos não tenha havido casos de desistência,

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casos dramáticos e casos de não pagamento e por aí fora, não é? Há sempre… há

histórias…de facto, há bastantes histórias em relação a isso e continua a haver, não é, e

cada vez mais…no estado em que nós estamos custa muito aos pais pagarem o que quer

que seja. Mas temos que instituir multas para quem não paga a horas, porque nós

também temos os nossos compromissos que queremos regularizar e depois temos

também que ter tudo em ordem com o estado, não é…também temos que pagar o IRS e

Seguranças Sociais e por aí fora. Mas aderiram bem…pronto, sobretudo…mais pelo

trabalho que íamos fazendo e pelos resultados que os próprios pais iam vendo nas suas

crianças. E depois é quase boca a boca, eles vão falando. Aliás o marketing em termos

de e-mail, mandámos para os médicos e pediatras e reunimo-nos com eles quando é

necessário…quando eles têm disponibilidade não é, é mais assim, e pronto, e há pouco

tempo é que temos o site e começámos também a investir um pouco de e-mail e na parte

informática.

Pergunta: Acha que as mentalidades, na forma de encarar e lidar com a deficiência e

com todos os tipos de dificuldades, tem vindo a mudar?

Resposta: Têm…tem vindo a mudar bastante. Primeiro a situação de que não acontece

só aos outros e depois obviamente nós aqui apanhamos muitos estados de pessoas, por

exemplo, aquelas pessoas que têm crianças mesmo com deficiências, têm um percurso

um bocadinho diferente, não é…aquelas pessoas que têm a criança que tem algumas

dificuldades e que fazem disso um drama depois isso vais ser desmontado aos

bocadinhos. Portanto aqui a ideia é assim…há sempre coisas a fazer, há sempre um bom

potencial em qualquer criança e tem é que se chegar lá através de estratégias.

Obviamente que é fundamental que a família adira e aceite que é necessário. Quando

isso não acontece, de facto as pessoas vão-se embora. Agora, quando começa a haver

resultados as coisas funcionam bem…mas têm mudado, eu acho que as pessoas já

aceitam muito mais facilmente a diferença, já aceitam que não é um grave problema

uma criança ter uma Dificuldade de Aprendizagem, que tudo é possível ser aceite…isso

eu acho que sim.

Pergunta: Até que idade, na sua opinião, faz sentido, e isto é uma pergunta

completamente pessoal, faz sentido intervir numa dislexia?

Resposta: Até que idade? Sempre.

Pergunta: Acha que faz sempre?

Resposta: É muito mais eficaz…quanto mais cedo melhor, ou seja a partir do segundo

ou terceiro ano de escolaridade do primeiro ciclo. Agora, já temos aí casos de pessoas

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com 18… com…na semana passada com vinte e sete anos que vieram cá para uma

dislexia, isso não faz muito sentido.

Comentário entrevistador: Pois…

Entrevistado: O que normalmente nos acontece é assim, a dislexia não tem cura,

pronto, é um sindroma que se mantém, não é…aqui nós não curamos a dislexia, nós

ensinamos à criança a ter estratégias adequadas para quando chega a situação em que

ela vai trocar aquela letra, tenha a estratégia para automatizar e não fazer a troca, ou ter

as suas próprias formas de dar a volta. O que acontece com…se a pessoa nunca teve

apoio, há pessoas que nunca tiveram apoio mas devido até à inteligência, à capacidade

de estratégias que têm, conseguem dar a volta digamos, à situação. Agora com idades

muito mais avançadas é muito difícil reverter isto, não é… portanto achamos que isto é

um bocado absurdo, sinceramente acho absurdo. Às vezes o que acontece é o seguinte

se calhar alguém tem uma dislexia, mas o grande problema dessa de vinte e sete anos, se

calhar, não é dislexia, se calhar é organização de pensamento e o aprender a pensar e a

organizar. E aí sim, aí, em parte das funções cognitivas, nós podemos actuar.

Obviamente que ao actuar nas funções cognitivas, melhoramos tudo o resto,

pronto…mas nessas idades não faz muito sentido…só durante a escolaridade

obrigatória.

Pergunta: Quais são os vossos projectos futuros para a empresa? Já me tinha falado de

algumas coisas…

Resposta: Projectos futuros para a empresa…portanto, o que nós delineámos acerca de

um ano e meio, dois anos atrás foi…criámos uma meta. Até onde é que nós queremos ir

nesta fase iniciar? Queremos ir pela parte da divulgação, em termos de congressos, e

então o ano passado fizemos um congresso, umas jornadas, e vamos tentar todos os

anos repetir umas jornadas. Com muita…muitas das comunicações são nossas, de toda a

equipa, sobretudo para mostrarmos o trabalho que nós fazemos e como é que o fazemos,

como depois também convidamos os Psicólogos e os Terapeutas da Fala para dentro das

vertentes deles também falarem sobre isso e depois vamos buscar algumas pessoas de

fora que achamos que são, médicos e por aí fora, que são relevantes para a

população…por exemplo a R da faculdade para falar sobre hiperactividade. Então o

projecto é manter congressos anualmente, até porque os professores nos pedem muito.

O outro projecto em que estamos envolvidos, que vamos começar também em Abril,

tem a ver com a parte dos seniores, portanto com os jovens com mais de cinquenta e

cinco anos, como nós dizemos… e então tentámos apresentar um projecto que se chama

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“Corpo e Mente” que tem a ver com a parte da gerontomotricidade e as funções

cognitivas e abarcar isso em termos da população idosa. Tentámos apresentar isto nos

centros de saúde, obviamente que toda a gente achava muito engraçado - mas dinheiro

não há - e neste momento quem pegou no projecto, e vai pegar, e que para nós vai ser

engraçado porque é quase um projecto-piloto, vai ser então a CSL, aqui em Carnaxide e

vamos começar a trabalhar com eles sobretudo ao nível da demência. O outro projecto,

que também nos está a dar muito gozo fazer, obviamente que não é com a equipa toda

da empresa mas neste momento somos três que estamos mais direccionadas para

isso…fizemos uma parceria com o dinheiro da investigação número cinco da FN e

estamos a fazer a…estamos a fazer mesmo material de reeducação pedagógica, onde

queremos abranger as crianças com dificuldades, não só, da leitura e escrita, como os

pais e os próprios técnicos que trabalham com estas crianças, quer seja na escola, quer

seja em casa, quer seja num centro de explicações…pronto…e com uma certa

orientação em termos de cadernos, que vão ser compostos por três cadernos organizados

em termos de idade. Neste momento estamos na fase…fizemos o primeiro caderno, em

termos de corte e costura, e de parte toda teórica de construção do material e estamos na

fase de apresentação às editoras, pronto. Já temos uma reunião, para a semana vamos ter

outra reunião e estamos na fase de perceber o mundo das editoras e dos ilustradores. E

depois as parecerias que vão surgindo, pronto, a pareceria dos EO do site em que vamos

dando também a parte dos textos em termos teóricos, e para já é isto. Também

gostaríamos, mas isso vai ser um bocado difícil de fazer projectos com as câmaras

municipais, em termos quase de consultadoria ou de avaliarmos as crianças de um

concelho ou de uma escola mas sempre com a ajuda da Junta de Freguesia…Junta de

Freguesia não…da Câmara Municipal, mas isso tem sido mais complicado por ainda

não elaborámos, como estamos a gastar muito tempo no resto ainda não nos dedicámos

a esse…mas isto em termos futuros é assim. Depois tentar, de alguma forma, ganhar

mais dinheiro para pagar melhor…pagar melhor aos técnicos.

Pergunta: Ou seja, até agora as vossas expectativas iniciais foram superadas?

Resposta: Foram…Foram…

Pergunta: Nunca foi uma opção da qual se arrependessem?

Resposta: Não, há sempre os altos e baixos não é?

Comentário entrevistador: Claro…

Entrevistado: Às vezes é complicado gerir a situação financeira … é … sem dúvida

alguma…de tentarmos dar respostas a todos e querermos o melhor em termos de

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ambiente, material e que as pessoas, para estarem satisfeitas também têm que ganhar.

Gostaríamos de ter mais gente efectiva, o que também não o conseguimos fazer por

enquanto porque em termos de Estado isso é muito complicado mas é assim, foram

largamente ultrapassados … há altos e baixos. Eu talvez, de dentro de nós os três, sou

aquela que gosta muito de projectos novos … e acho que nunca estou satisfeita, quero

sempre mais e quero sempre mais projectos porque acho que só andando para a frente é

que nós conseguimos fazer isso. Se calhar por isso é que às vezes eu sou sempre aquela

referida em termos de dar força em termos da empresa. E já me passou pela cabeça

desistir obviamente, sobretudo em termos financeiros porque é demasiado trabalho que

depois não é recompensado … e toda a gente tem que viver, não é? Porque às vezes as

pessoas têm ideia de que quem tem uma empresa é rico, não é … e é muito complicado.

Porque quem está na área vê perfeitamente que é assim, ou se é um bom gestor, e nós

não temos nada em termos de gestão … que nos falha … mas nós no fundo… a nossa

profissão não é ser gestores, mas também é. Portanto isto torna-se um bocadinho

complicado. Por outro lado dá-nos muito gozo fazer aquilo que nós gostamos. Eu acho

que acima de tudo as pessoas que cá trabalham fazem aquilo que gostam. No fundo

tirámos um curso por alguma razão e aquilo que estamos a fazer é aquilo que nos dá

prazer fazer e isso sim … agora que é uma profissão desgastante é … isso é.

Pergunta: Além das…pronto, além do X e da leccionação das diferentes disciplinas no

ensino superior tem outra actividade profissional actualmente ou já … chega?

Resposta: Mãe!

Comentário entrevistador: Pronto … Porque a professora R no outro dia disse-me “ e

a Y além daquilo tudo ainda tem 4 filhos!”. E eu “4?!”

Comentário entrevistado: Tenho 4 filhos e o mais velho tem problemas, portanto é

complicado … é muito complicado gerir isso, muito complicado. Mas tem que ser não

é? Não se pode estar parado, nem desanimar. Por outro lado acho que também o facto

de sermos mães e estarmos um pouco nesta área também nos ajuda a perceber as

dificuldades dos outros pais. E sem dúvida alguma acho que todos nós crescemos a

parte do momento em que somos pais e mães e que trabalhamos em áreas com crianças

porque percebemos melhor o que aquele pai está a dizer e às vezes cria-se uma relação

tão íntima com os pais em termos quase de confidentes que acabamos por dar muita

força para eles perceberem que vale a pena, vale a pena continuarmos todos a trabalhar

em função daquela criança. E isso é o mais importante … eu acho que isso, se calhar faz

a diferença … é a entrega, eu acho que aqui toda a gente se entrega muito aos casos,

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demais não é … demais por causa de não conseguirmos fazer uma barreira de protecção

que às vezes…e isso é complicado. Mas sim, tenho conseguido gerir isso tudo.

Pergunta: Podia-me dar um exemplo de empreendedorismo que para si seja

representativo na área de Educação Especial? E porquê?

Resposta: Bem, eu acho que nós somos um exemplo de empreendedorismo, sem

dúvida alguma. Não tivemos apoios.

Pergunta: Sem ser o vosso que outro é que … que existe e que acha seja

representativo? Se é que tem conhecimento … Há pessoas que dizem “Ah … também

não tenho muito conhecimento…”

Resposta: Eu não tenho muito conhecimento. É assim as coisas que mais conhecemos

tem a ver com o CC e com o DD, não é, em que a ideia que, e que pode estar errada, a

ideia que nós temos é que têm em termos financeiros, um suporte tão grande que podem

investir em áreas de forma mais fácil do que nós, não é?

Comentário entrevistador: Sim.

Entrevistador: Portanto apesar de tudo o dinheiro nisto conta muito…

Comentário entrevistador: Claro.

Entrevistador: Aqui … às vezes não tem a ver com empreendedorismo, tem a ver com

a capacidade financeira que as pessoas têm ou não tem não é? Ou com a máquina

financeira que há por trás.

Entrevistado: Agora nessa área … assim … não tenho … Pronto é assim; há muitos

colegas vossos aqui que trabalham em várias coisas e acho que são funções muito

dinâmicas … agora assim em termos de empreendedorismo não … não sei. Acho que

tenho que conhecer mais coisas.

Pergunta: A nível de atributos e características pessoais quais são as qualidades que a

considera importantes para se criar e desenvolver um empresa, por um lado, e depois

para se fazer isso na área da Educação Especial e Reabilitação?

Resposta: Bem … acima de tudo acho que é preciso criar objectivos. O que é que nós

queremos fazer de facto, criar metas, que foi uma coisa que nos falhou no início penso

eu. Acho que fomos aprendendo também … às vezes temos o defeito de confiarmos em

tudo o que nos dizem em termos de aquilo que é financeiro, o que é que os bancos nos

dizem, o que é que nos oferecem e sermos um bocadinho enrolados nessas situações.

Agora acho que é criar metas e tentar fazer uma linha condutora e saber o que nós

queremos fazer para lá chegar. Nem que para isso a gente tenha que fazer parcerias,

gastar mais horas, o que quer que seja. Portanto aqui a ideia é chegar à meta. Portanto

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eu acho que é preciso ter muito dinamismo, sem dúvida alguma. Não ser egoísta, é

impossível sermos egoístas, sermos solidários e tentarmos muitas vezes pormo-nos no

lado das outras pessoas, isto quer que seja para a educação especial quer seja para a

empresa. Para a educação especial mais ainda, quem trabalha com pessoas tem que se

colocar no lugar das outras pessoas. Temos que ser muito diplomatas e temos que ter,

em termos da educação especial, a lidar com os pais, temos que ter um bocado o senso

comum bem aguçado porque muitas vezes as dicas que damos são do senso comum e

não perdermos também os limites, o que é que nós temos que dizer aos pais que eles

devem fazer com aquela criança, mas também perceber que cada pessoa tem o seu ritmo

de vida e tentar transmitir também isso … pronto. E a empresa tem muito a ver com

isso, com a parte de ser activo, nós não podemos estar parados, mesmo em termos de

formação temos que ter mais, temos que conhecer mais, temos que ir a congressos,

temos que ver o que é que se passa, temos que … nos entrosar nos sítios, temos que ir às

escolas e perceber como é que é, temos que lidar com os professores para saber quais é

que são as dificuldades que eles têm, para nós de alguma forma também estarmos

dentro do problema quando um professor nos fala de uma coisa, não é? Pronto, acho

que é sobretudo isso. É a capacidade de analisar os problemas dos outros? Isso eu acho

que sim…

Pergunta: Agora passando à família, acha que a sua família a influenciou de alguma

forma neste percurso de criação da empresa?

Resposta: Eu acho que me ajudou e termos de me dar confiança…Sempre fui um

bocado insegura e acho que não tenho jeito para negócios e continuo a achar que não

tenho jeito para negócios…acho que tenho jeito para as pessoas, não é, e acho que aí a

minha família me influenciou em termos de…as pessoas ouvem-te, tu convences as

pessoas quando queres e consegues mostrar a razão e portanto damos-te força para, não

é…eu acho que isso foi importante…

Pergunta: Eles apoiaram-na?

Resposta: Apoiaram-me sempre, sempre. Mesmo em termos de força, “acho que sim,

que deves continuar”, mesmo agora que estou a iniciar o mestrado…foi importante

receber o apoio dos meus pais para iniciar o mestrado, devido à vida que eu levo

atribuladíssima, mas sempre me deram força em termos do ir mais além, do “se não

estás satisfeita…vai, procura o que é que tu queres, que nós ajudamos naquilo que for

necessário. Obviamente que não conseguiram ajudar em termos financeiros mas em

termos de força que é sempre o principal, não é? Pronto, eu acho que isso comigo e com

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todos os meus sócios. Todas as famílias foram muito…nos ajudaram em termos de

incentivo, “Força…vocês são capazes!”, quase como aquele voto de confiança de “não é

por terem acabado o curso que vocês não vão ser capazes…vocês vão ser capazes, têm

que fazer é por isso e não podem ficar parados à espera que as coisas venham ter com

vocês”. E o professor F também nos deu muita ajuda que acaba quase por ser uma

família, porque nós temos um carinho muito especial por ele e ele também sempre

acreditou em nós, o que nem sempre acontece, porque é complicado um professor às

vezes acreditar nos seus pupilos, não é, mas nós temos por ele uma grande

adoração…sempre o ouvimos….às vezes é complicado e é complicado gerir às vezes os

conflitos, mas sempre nos deu forças, do género “vocês são capazes…por isso vamos

para a frente e vamos continuar”, isso sim.

Pergunta: Existe alguém na sua família, ou eventualmente na família dos outros sócios

que tenha tido um percurso semelhante? Que tenham criando o seu próprio local de

trabalho? Que tenham criado alguma empresa?

Resposta: Sim, na família da sócia, da minha sócia. Os pais são médicos e criaram uma

clínica. Mas tínhamos uma grande diferença em termos de dinâmica…pronto…a nossa

dinâmica é mais de grupo e os pais dela são médicos e como médicos são mais…cada

um faz a sua tarefa, não é…e nós fazemos mais…equipa. Influenciaram em termos

de…”obviamente que vão conseguir, vocês vão conseguir…isto não é assim tão

complicado”, agora em termos de dar ajuda não, isso não…

Pergunta: E o seu pai ou a mãe, algum deles teve…criou uma empresa?

Resposta: Não, não são os dois funcionários públicos.

Pergunta: Ok…e irmãos…algum deles também teve essa…?

Resposta: Um deles tentou fazer uma empresa…é assim, nós somos quatro, portanto

somos muitos. O mais velho…

Comentário entrevistador: Então já percebi que o problema aí é o número

quatro…quatro irmãos, quatro filhos….

Comentário entrevistado: Não…eu sou a única que tenho quatro mesmo, de facto…O

mais velho é investigador nos Estados Unidos e ele tentou em tempos fazer uma

empresa, mas ele não tem jeito nenhum para ser empreendedor nessas coisas…ele tem

jeito é para ser cientista maluco e mais nada…pronto. A minha irmã está na parte da

genética, agora está na universidade também na parte de investigação…não…não tem

jeito para isso….

Comentário entrevistador: Bem que giro...eles seguiram a vertente da investigação!

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Comentário entrevistado: O mais novo foi o único que seguiu a parte das electrónicas

e computadores. Tentou ainda criar uma empresa, acho que tem uma empresa com a

mulher…não tenho bem a certeza, mas acho que ele não é sócio sequer… e talvez de

nós os quatro é aquele que também tem um sentido um bocado mais empreendedor.

Mas quem me deu muita força também em termos de arriscar, em termos de empresa foi

o meu marido…Ele é muito empreendedor e também tem empresas. E é professor…

Pergunta: Ele é professor? E tem empresas dele?

Resposta: Tem…

Comentário entrevistador: Que engraçado…

Comentário entrevistado: Tem… também tem uma empresa, mas…ele deu-me muita

força…ele arrisca muito e eu não. Eu tenho medo de dar o passo, pronto… ele é do

género “vocês deviam era de ter dez empresas porque se fizessem quase um franchising,

fizessem um modelo assim…” ele é muito da parte da gestão… adora aquela parte mas

não tem nada de gestão. Ele deu-me muita força nisso e dá-me muitas ideias aqui para a

clínica. E acho que no fundo também foi ele que me fez esta de “tu tens que abanar os

teus sócios, temos que ir para a frente, eu ajudo-te a fazer os planos, a linha da meta, os

objectivos”. E foi ele que me deu um bocado este tipo de força, pronto… em termos do

alcançar, “vocês conseguem”…”ah mas eles são muito moles”… “não interessa,

começa tu…alguém tem que ser o motor de arranque”. E ele dá-me muita força nisto,

muita… ele tem pena é a nós ficamos só por aqui, ele acha que isto…

Comentário entrevistador: Para ele, ele arranjava um franchising….

Comentário entrevistado: Exactamente, exactamente. Para nós é muito complicado

porque nós temos muita relação, eu já lhe expliquei isso mais é um bocadinho difícil. A

relação é super importante e fazer um franchising da relação é muito difícil. Nós temos

que estar em cima da relação, nós temos que ver como é que elas falam com os pais, nós

temos…pronto, se calhar é errado, se calhar se tivéssemos um espírito mais de gestor,

não tínhamos esta vertente. Mas achamos que isto é a alma da empresa, é a relação, e é

nisso que nós apostamos. Por isso é que não fazemos um franchising ou fazer dez

empresas ou assim uma coisa desse género…

Pergunta: Pronto…aqui havia uma questão era perceber um bocadinho qual era o ponto

de vista dos seus pais relativamente à criação do próprio emprego, porque há alguns

pais que dizem “não, não…tu tens é que estar no quadro daquela empresa e trabalhar

para aqueles”. Há outros que dizem que…

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Resposta: Não….a única coisa que eles nos chamam a atenção foi seguinte, eles acham

que foi excepcional, orgulham-se muito, como eles dizem, do percurso que eu vou

levar, mas acham que por exemplo em termos financeiros é importante que um de nós

esteja nos quadro, ok?! Ah, e nisso são só mesmo os meus pais que têm essa ideia, dos

outros sócios não. Portanto, o meu pai por isso foi, por exemplo, em relação ao o meu

marido sempre disse “Tu não saias da posição de professor. Essa é a base...porque se

acontecer alguma coisa tu tens a garantia que tens um emprego para a família. Mesmo

que queiras outro emprego ou que faças não sei o quê não podes desistir do Ministério

da Educação”. E eu também sou um bocado apologista disso. E ele neste momento está

bem, é presidente do conselho executivo e do agrupamento e as coisas estão a correr

bem, mas…sempre tive essa ideia de “é preciso estar segura em algum lado”. Os meus

pais, os meus pais mesmo.

Comentário entrevistador: Está bem…

Pergunta: Agora relativamente a aspectos mais sociais, acha que a nossa sociedade, de

uma forma geral, apoia ou não, os empreendedores? E porquê?

Resposta: Eu acho que apoia talvez as grandes empresas, as pequenas acho que não,

não mesmo. Por outro lado andam neste momento com grandes políticas de que as

pessoas devem criar os seus próprios empregos, mas depois não dão o reverso da

medalha que é as condições necessárias para que isso aconteça, não é…baixarem o IRC,

a parte das Seguranças Sociais…estamos sempre a pagar e…acho que não. Por outro

lado eu acho que as pessoas também…há pessoas que têm capacidade para criar os seus

próprios empregos, mas acho que na sociedade há pessoas que não têm capacidade de

criar emprego e que têm que ser mandados por outros. E eu acho que….pronto….

Comentário do entrevistador: Cada um é como a sua….

Comentário do entrevistado: Exactamente, exactamente. Mas acho que a sociedade

não apoia muito, não…

Pergunta: Acha que…pronto isso já respondeu…

Resposta: Ou melhor, corrigindo…. Acho que apoia mas não ligada à parte das

relações humanas. Apoia mais coisas de computadores, informáticas…

Comentário entrevistador: Empreendedorismo da parte tecnológica…eles apoiam

imenso.

Comentário entrevistado: Exacto, exactamente…pronto. Isso apoiam imenso…Parte

humana não apoiam tanto…

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Comentário entrevistador: Aliás, a maior parte dos projectos que eu vejo que é

empreendedorismo e isso, é tudo a parte tecnológica e engenharias. Até agora não vi um

para a parte das ciências sociais e humanas ainda não vi…

Comentário entrevistado: Exactamente, exactamente…nada, nada…não há, não há….

Pergunta: Pronto, havia outra questão aqui que era saber se as políticas actuais do

IAPMEI e de uma série de instituições para…pró empreendedorismo, se acha que

realmente podia ser, podia-se fazer mais alguma coisa?

Resposta: É assim, aí nós pecamos por falta de informação porque temos que procurar

tanta coisa que depois acabamos por não ir a esses sítios procura que tipos de apoios é

que nos pode dar. Aí é falha nossa porque não temos tempo e optamos por outras coisas.

Mas nós próprios não estamos muito bem informados que tipos de apoios é que há… se

calhar daí estar a responder, às vezes, um bocadinho erradamente…se calhar a

sociedade até apoia muito e nós não conhecemos por falta nossa. Portanto não sei… não

estamos mesmo a par do que é que eles fazem.

Pergunta: Pronto, vocês não tiveram nenhum tipo de apoio para a criação da empresa,

pois não?

Resposta: Não.

Pergunta: Acha que eventualmente, porque às vezes há questões que eles apoiam mais

se for implementado no interior, nas ilhas, no litoral…acha que…concorda que teria

sido diferente, ou como nem se quer se informaram, ou não sabiam a nível dos apoios,

não me sabe dizer se apoiariam mais?

Resposta: Não…não sei. Eu tenho a ideia de que, por exemplo na Madeira eles apoiam

muito tudo o que é Educação Especial, por exemplo. Mas tenho essa ideia porque temos

cá meninos que vêm cá ser avaliados. E pelas recomendações que nós damos, eles

pagam, quase regra. Se calhar é mais fácil mas não sei…

Comentário entrevistador: Está bem.

Pergunta: Ah pronto, queria que me desse exemplos práticos de situações reais que

tenham ocorrido a nível das maiores dificuldades que encontraram no vosso percurso.

Financeiras ou não. E como é que lidaram com elas, como é que as ultrapassaram.

Resposta: Há dificuldades muito grandes que é quando os pais não pagam, ok. E casos

de pessoas que dizem que pagam e depois vão-se embora e ficámos a arder, entre aspas,

em dinheiro. Isso já aconteceu ao longo…

Pergunta: Como é que resolvem isso? Não resolvem?

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Resposta: Não resolvemos. Fazemos umas quantas ameaças entre aspas, a dizer que a

parte da contabilidade precisa mesmo disso…talvez o valor mais alto que já nos tenham

ficado a dever foi cerca de seiscentos euros, o que é muito, porque nós em respeito à

criança, fomos continuando a dar as sessões e depois os pais disseram que pagavam,

pagavam e não pagaram. Essas situações são muito complicadas. Outras situações

complicadas com que nos deparámos foi com situações trágicas, nós aqui na empresa já

tivemos todo o tipo de situações trágicas. Tivemos um miúdo que morreu, não, já

tivemos dois miúdos que morreram, um deles ligado à excessiva obesidade que tinha e à

parte cardíaca e a todos os problemas que tinha…Nós tivemos uma grande….foi mesmo

no início e ainda éramos os quatro sócios e tivemos uma grande ligação à família…e de

repente os pais vieram dizer que ele tinha morrido. Essa foi complicada. A outra foi um

rapaz que nós soubemos, pelas notícias, que o pai tinha matado o miúdo e se suicidado

logo a seguir, isso deu nas noticias, ainda andava cá, era um jovem, um juiz. Essa foi

muito trágica porque ficámos um bocado abananados, ver assim…”mas nós falámos

com o pai…como é que foi?”…estava desesperado, chegou a casa matou o filho, o

jovem, matou a mulher e matou-se a seguir a ele. Isto acontece de facto…essas foram

situações um bocado trágicas, não é? Mais situações trágicas…

Comentário entrevistador: Ou dificuldades que…ou obstáculo…obstáculo que tivesse

sido difícil de ultrapassar…

Entrevistado: Um obstáculo continua a ser a situação do Agosto que é complicado de

pagar, não é… e de muitas vezes não conseguirmos pagar a horas, às nossas colegas e se

temos que pagar até dia oito às vezes é dia quinze e estamos a pagar…isso é

complicado. Sobretudo nós os três sofremos….eu sofro muito com isso, porque acho

que cada um tem as suas responsabilidades e elas não têm culpa se não temos em atraso

o IRS ou a Segurança Social, ou se temos que pagar a parte do marketing e da

publicidade, elas não têm nada a ver com isso, elas são nossas funcionárias e nossas

amigas e essas coisas fazem-me muita confusão…eu fico em pânico. De nós os três sou

a que fica mais preocupada com o bem-estar dos colegas. Também de nós os três

também sou aquela, se calhar, que cria a relação mais próxima com todos eles, também

estou mais tempo com o grosso da equipa porque em Telheiras eles são menos e aqui

sou sempre eu que estou cá, eu estou cá todos os dias a todas as horas e acabo por estar

a viver o dia-a-dia de cada um de nós. E acabo por dar a força aqui e ali e de facto

somos um grande grupo de amigos mesmo… e às vezes é complicado gerir a amizade, e

o ser a patroa entre aspas, isso é muito difícil, sobretudo quando criamos amizades, em

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que para além disso…eu ontem por exemplo, estava a ser um dia um bocadinho

complicado, uma das minhas filhas fazia anos e eu estava naquela “não me apetece nada

trabalhar” obviamente não é…pronto, e tanto a secretária como uma outra colega que cá

estava, estavam um bocado em baixo, porque andamos todos muito cansados. E eu

cheguei cá eram duas horas…ok, vamos fechar, porque só tínhamos miúdos às quatro e

a secretária tinha que cá estar, obviamente, por causa da hora do almoço, e eu peguei

nelas e disse “vamos embora, vamos tomar um café”… e pronto, optei….achei que foi

super importante termos saído daqui, irmos ao Alegro tomar um café e voltar. Falámos,

discutimos, uma data de problemas, não sei quem, falámos, e achei que isso foi

fundamental. Eu acho que este género de toque, eu sou a mais sensível nessas coisas e

eu acho que isso tem ajudado muito em termos da relação do grupo, não é…do vestir a

camisola. Eu acho que isso tem ajudado muito, mas é muito complicado gerir. O que eu

gostava de lhes dar a elas não posso dar por uma questão também da posição que tenho,

não é?

Pergunta: Se tivesse que escolher um aspecto que mais tivesse influenciado o seu

percurso de empreendedora qual seria? Ou se pudesse pôr ordem vários aspectos, qual

era a ordem?

Resposta: O gostar daquilo que faço, acho que isso é essencial, o acreditar naquilo que

faço…e o ser disponível, eu acho…eu acho que isso tem muito a ver. Mas sobretudo

acreditar que conseguimos mudar alguém, basta mudar uma criança que já…

Pergunta: Relativamente agora à parte aos factores académicos, qual foi o primeiro

trabalho e em que área, remunerado ou em regime de voluntariado…?

Resposta: Não, remunerada, dois meses após terminar o curso, fui trabalhar durante um

mês para um colégio de ensino especial…como professora de educação especial.

Detestei, porque era um colégio onde as crianças estavam quase como depósito e

queriam que eu fizesse coisas que não tinha a ver com aquilo que eu aprendi e a parte

humana também não gostei. Esse acho que foi o primeiro emprego remunerado…depois

é assim, durante a minha vida académica e mesmo depois de acabar a faculdade e até

começar a abrir a empresa, eu meti-me muito, durante a vida académica meti-me muitas

em associações de estudantes e essas coisas todas. E após isso meti-me também

muito… foi também o início, a origem de uma associação que é a associação AS que

tem a ver com a parte da prevenção da toxicodependência, prevenção primária. E eu e o

meu marido, a A e por aí fora fomos os primeiros criadores também, com mais algumas

pessoas claro, e aí o regime, apesar de só mais tarde ser remunerada acerca de projecto,

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era muito de “vamos fazer projectos” para mudar, sobretudo ligados à prevenção. E

depois daí, nessa associação fizemos muita coisa de projectos remunerados. Não tem

propriamente a ver com a Educação Especial mas tem a ver com populações de risco.

Portanto tem a ver com Educação Especial, pelo menos com aquilo que nós também

damos no curso, não é? E aí era remunerado em termos de projecto obviamente. Pronto,

aí também aprendi imenso em termos deste género de área…

Pergunta: Porque é que foi para a área de Educação Especial e Reabilitação? Quais

foram as outras opções?

Resposta: Primeira opção, primeira de todas foi medicina…tenho um fascínio pela

medicina, e cada vez. Obviamente que como nunca fui uma aluna muito, muito

brilhante, aliás eu considero-me isso…não me considero muito, nem nunca fui aluna

brilhante em termos de notas, mas acho que sou que muito desenrascada e isso às vezes

é o essencial para uma pessoa conseguir progredir em qualquer coisa. Pronto, a primeira

foi medicina, a segunda foi psicologia, portanto tinha que ter alguma coisa a ver com

pessoas e aí foi ponto assente, não é? E depois surgiu a hipótese da Educação Especial e

eu achei “porque não?”…acho que sim, quero ajudar alguém, já que Psicologia…vamos

lá ver…então vamos experimentar isto. E gostei, sobretudo nos últimos anos.

Pergunta: Nunca pensou em desistir e tentar outro curso novamente?

Resposta: Não, pensei em acabar aquele e partir para outro. O desistir não.

Pergunta: Durante a licenciatura na FMH, e pela análise do currículo, realmente

participou em várias actividades fora do âmbito da faculdade, acha que alguma delas lhe

proporcionou algum ganho a nível da visão empresarial e gestão de empresas? Ou

não…e ganhou outras coisas?

Resposta: Não, gestão de projectos sim. No fundo a criação de uma empresa é um

projecto. Pronto e aí sim, a AS deu-me uma visão muito grande em termos de como é

que se faz um projecto e como é que nós podemos investir nessa área. Pronto, acho que

em termos da parte empresarial foi essa.

Pergunta: Teve outras actividades que proporcionassem o contacto com o mundo

empresarial? Estágio em empresas, trabalhador estudante?

Resposta: Não…quer dizer, quando andava na faculdade o meu marido, depois mais

tarde, já tinha…não, até já estava aqui nos primeiros anos, já tinha uma das empresas

dele que era ligada a Marketing desportivo e então eu fazia parte das promotoras, da

parte da publicidade nos eventos desportivos também. E acabávamos por fazer férias

assim, tipo, a volta a Portugal de bicicleta a distribuir latas de Lipton Ice Tea e fizemos

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isso por Portugal inteiro. Foi espectacular. Aí acabo por estar ligada à parte empresarial,

se calhar porque ele era um dos sócios da empresa. Para além disso não, não tenho

muita gente à volta do mundo dos negócios, não tenho mesmo.

Pergunta: Agora passando para o tempo de aulas, enquanto o período de licenciatura,

quando faziam os trabalhos de grupo, quais eram os aspectos que achava mais

importantes e que qualidades também é que privilegiava?

Resposta: Isso já foi há tanto tempo…É assim, eu acho que é sempre difícil trabalhar

em grupo, não é…se calhar não para mim, mas eu acho que normalmente as pessoas

têm dificuldade em trabalhar em grupo, e cada vez acho mais isso. Na altura se calhar

era o saber ir buscar informações a algum lado, tipo, é preciso fazer esta bibliografia, é

preciso criar este modelo e isso era um bocado complicado de fazer. E às vezes a

disponibilidade também, porque as pessoas não estarem disponíveis para isso acontecer.

Acho que mais nada, acho as coisas não foram assim muito complicadas.

Pergunta: Lembra-se nos trabalhos de grupo… como é que era? Era das mais

organizadas…? Costumava assumir alguma posição de liderança?

Resposta: Não…talvez na organização daquilo que era preciso fazer, em termos de

etapas…”temos que fazer esta bibliografia”, “temos que consultar”….

Pergunta: Ajudava a organizar os passos iniciais?

Resposta: Sim, mas acho que era feito mesmo em termos de grupo, cada pessoa dava a

sua sugestão.

Pergunta: O grupo funcionava como um grupo?

Resposta: Sim, sim…O facto de ser representante da turma às vezes também influencia

não é?

Pergunta: Houve algum docente, algum professor que tenha tido algum tipo de

influência na criação da vossa empresa?

Resposta: O professor F.

Pergunta: Ele incentivou-vos, mas durante o período de licenciatura ele incentivou-

vos?

Resposta: Não, só no último ano de estágio…aí incentivou…

Pergunta: No ano do estágio deu uma grande força?

Resposta: Deu, deu…a nível de…

Comentário entrevistador: Que giro, naquela altura não era…

Comentário entrevistado: Não era nada usual…

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Comentário entrevistador: Não era nada normal que as pessoas daquela altura…no

ambiente académico não é…

Comentário entrevistado: Ele achou que por alguma razão valia a pena, não sei…Se

calhar essa pergunta tem que fazer a ele.

Pergunta: Houve algum colega que a tenha influenciado nessa decisão?

Resposta: Sim.

Pergunta: Eram da mesma turma os sócios?

Resposta: É assim, de nós os quatros, eles os três eram da mesma turma, eu tinha

reprovado, portanto eu apanhei-os. Portanto eu entrei um ano…primeiro do que eles. Eu

devia ter saído um ano antes. Mas como reprovei fiquei e ao ficar comecei também a

ligar-me a eles. Obviamente que quem estagiou comigo foi o Zé, influenciámo-nos

mutuamente, do género “e porque não?!”. E depois como o meu colega, o Zé, tinha feito

também a monografia com a Y e com o Z, falámos e porque não nós os quatros?!

Depois em termos de percurso de empresa, no início quem me influenciou muito e

quem…apoiámo-nos mutuamente fui eu e o outro sócio que saiu, o Z, aliás, eu senti-me

um bocadinho desfalcada quando ele se foi embora.

Pergunta: E não o primeiro? O que estava a dizer…o do local de estágio.

Resposta: Não.

Comentário entrevistador: Que giro!

Resposta: Temos uma grande afinidade, somos super, super amigos e temos uma

maneira de ver a vida muito semelhante. Somos muito terra a terra, muito práticos e isso

em termos de empresa…fazemos quatro aliados, nós os dois e eles os dois…

Comentário entrevistador: Que giro!

Entrevistado: E agora às vezes depende do assunto, obviamente. Às vezes estamos de

acordo, outras vezes não, é como diz a minha sogra, nós estamos mais juntos do que no

casamento. Isto é às vezes um bocadinho complicado. Mas ele influenciou-me muito e

continua a influenciar.

Comentário entrevistador: Que giro!

Pergunta: Porque é que ele se retirou?

Resposta: Ele retirou-se porque achou que em termos de gestão não íamos muito mais

longe e portanto não era isso que ele queria fazer, e optou por seguir a via académica.

Ele está como director de um colégio de ensino especial em termos pedagógicos e está a

dar aulas no V e é membro do concelho científico. Está agora a fazer o Doutoramento,

está a seguir essa área académica, mais de investigação e de educação especial mesmo.

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Pergunta: Houve alguma disciplina, ao longo do curso, em que as competências

empreendedoras fossem fundamentas mesmo que de modo implícito, por exemplo,

incentivar os alunos a trabalharem em grupo, a apresentarem projectos fora do contexto

faculdade, a inovarem e a lucrarem com isso…na altura?

Resposta: Não, não, nada.

Pergunta: Acha que o estágio e o seminário que realizou a influenciaram na sua

decisão da criação da empresa?

Resposta: Acho que sim, acho que o estágio influenciou, porque no estágio nós fizemos

um atendimento já um pouco individualizado em termos dos casos…

Pergunta: Parecido com o que começaram a fazer?

Resposta: Exactamente. Influenciou…achámos engraçado trabalhar assim. E respondia

muito às necessidades.

Pergunta: E o seminário...nem por isso?

Resposta: Não, o seminário foi com o Professor C….

Comentário entrevistador: Que giro. Aliás, teve duas áreas muita giras. O professor F

por um lado e o professor C que é excepcional!

Comentário entrevistado: Eu adoro aquele homem. Eu aprendi imenso com ele com a

situação do brincar, é uma outra visão, giríssimo, giríssimo.

Comentário entrevistador: Mas eu acho que eles até convergem em alguns pontos dos

nossos ideais, não é?!

Resposta: Sim, sim...ele influenciou-me também em termos de…que outras vertentes é

que podem ajudar uma criança, por exemplo em termos do desenvolvimento?! E isso

ajudou-me imenso, imenso…gostei muito. Houve outro professor que também nos deu

forças, já numa fase em que nós já estávamos um pouco implementados em termos de

empresa, clínica, não é…e que éramos sempre referenciados…o professor P e o

professor N e a professora A…

Comentário entrevistador: O professor P e a professora A eles gostam muito das

novas iniciativas e dão muita força e fazem uma publicidade…

Comentário entrevistado: Dão, dão… e a A sem dúvida alguma.

Pergunta: Embora… não está contemplado no currículo da Y, mas por acaso durante a

licenciatura teve alguma formação, algum contacto com aspectos relacionados com

gestão, criação de empresas, empreendedorismo?

Resposta: Não, nada.

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Pergunta: O que é que acha que houve na licenciatura que tivesse fornecido alguma

preparação para a parte da criação e manutenção de empresas?

Resposta: Nada.

Pergunta: Que razões é que a levam a iniciar o Mestrado actualmente?

Resposta: Porque sou a única licenciada a dar aulas no ensino superior. Não, isso é uma

boa razão…É assim, houve uma fase em que eu queria tirar o mestrado porque queria

aprender mais e andei na dúvida de que mestrado é que vou tirar que me satisfaça, foi

mesmo assim. Por não querer tirar mestrado por tirar mestrado, porque há professores

que tiram mestrado para tirar mestrado. Pensei na nossa área mas depois pensei, o

mestrado em Educação Especial aqui na faculdade é muito parecido com o nosso curso,

portanto também não me fazia muito sentido...

Comentário entrevistador: Também concordo.

Entrevistado: Depois como não havia nada ainda pensei num de neurociências que

uma colega nossa tirou na faculdade de medicina também achei muito engraçado, tem a

parte do cérebro e eu adora aquilo, acho aquilo muito giro, mas depois é assim, com o

ritmo de vida que levo é um bocadinho difícil, com os miúdos pequenos é difícil. Agora

esta urgência de mestrado tem a ver com a situação de Bolonha e por aí fora. Estou a

dar aulas tanto na JD como no I e neste momento sou a única licenciada a dar aulas.

Pergunta: O I é no Lumiar?

Resposta: É no Lumiar…

Comentário entrevistador: É que uma vez eu fui lá e eu não conhecia aquela

faculdade, nunca tinha ido lá. E fui lá uma vez e achei e é muita gira!

Comentário entrevistado: Ela é relativamente nova, é muita gira. Primeiro só ia para

lá dar aulas mesmo o Z, portanto o nosso outro colega sócio de quem eu sou muito

amiga. E como ele sabe exactamente o que nós fazemos aqui porque ele foi fundador ele

foi-nos levando para lá dar aulas, porque somos de extrema confiança dele apesar de ele

se ter ido embora, não ficou nenhum ressentimento. E tem sido nessa base. Depois

surgiu esta hipótese do tal mestrado e ele disse-me logo “agora já tens uma JD a fazer,

tenta na da faculdade porque seria em princípio mais barata e em termos de proximidade

era óptimo”, mas eles nunca mais abriam…

Pergunta: E qual é que a Y decidiu?

Resposta: O I foi a primeira…

Pergunta: E é em quê?

Resposta: Em necessidades educativas especiais.

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Pergunta: E depois do mestrado a nível da situação académica pretende prosseguir

estudos?

Resposta: Não sei…não é uma prioridade

Pergunta: Por agora não vê como prioridade?

Resposta: Não, não. Para mim tem mais prioridade a família e a clínica em termos de

satisfazer aquilo que é necessário do que propriamente o doutoramento. Nunca quis

seguir uma vida académica.

Pergunta: Já referiu que já sentiram necessidade de ter conhecimentos na área da

criação, da gestão de empresas. Como é que ultrapassaram essa barreira? Contrataram

alguém, foi o seu marido que ajudou?

Resposta: Não ultrapassámos…Ele ajudou muito em termos de me dar ajuda, em

termos da parte da gestão, ele gosta de estudar isso apesar de não ter nada disso na área

dele mas ele faz questão de estudar isso. Depois nós ainda tentámos pedir ajuda à

empresa de contabilidade que nos ajuda se teriam alguém que fizesse a parte da gestão,

mas teria que ser pago em termos extra e depois se também conhecia algum gestor…e

depois nós não temos dinheiro para pagar esse género de situação, não temos esse

espírito. Portanto não há nada, nós não temos ninguém que nos ajude nessa área e eu

continuo a achar que nós necessitávamos….necessitávamos de alguém que nos ajudasse

em termos de gerir uma empresa…o que é que melhor, estamos a passar uns bons

preços ou não estamos? Se calhar temos que puxar aqui ou ali…isto é um bocado

intuitivo porque nenhum de nós tem bases para isso. Claro que com a experiência

vamos ganhando alguma mas eu, pessoalmente, não me sinto satisfeita nessa área, de

maneira nenhuma. Acho que nos está sempre a faltar qualquer coisa…e nunca há

dinheiro. Porque é que estamos sempre a gastar dinheiro…porque é que há tantos gastos

de dinheiro? Se calhar temos os preços muito baixos, se calhar…Portanto, este género

de perguntas devia ser um gestor, nós não temos bases para isso. Já nos passou pela

cabeça tirar…às vezes há formações… mas depois não temos tempo e entre tirar uma

coisa de gestão ou tirar uma coisa sobre síndrome Asperger eu prefiro isso, porque tem

mais a ver com a nossa área, não é?! Acima de tudo quando perguntam “qual é a tua

profissão?” eu nunca digo que sou empresária, é engraçado…

Pergunta: Então diz que é o quê?

Resposta: Técnica Superior de Educação Especial. Quando me perguntam…mesmo

quando preencho as coisas para a escolas ponho sempre Técnica Superior de Educação

Especial…

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Pergunta: Mas também que é responsável… da empresa?

Resposta: Não, não. Só se me perguntarem mesmo “o que é que faz mais”, “trabalha na

clínica porquê?”…também sou sócia…mas não distingo empregada de empresária. É

empresária e patroa, não liga muito comigo!

Pergunta: Tenho analisado vários currículos e há pessoas que esperam oito, nove, dez

anos e que trabalham por conta de outrem até gerar o clique e ok, vamos dar aqui uma

volta qualquer. Vocês não, vocês esperaram cinco, seis meses e arrancaram logo para a

vossa iniciativa. O que é que fez nesse período de tempo? Foi o colégio?

Resposta: Tive só um mês no colégio.

Pergunta: Só?!

Resposta: Só.

Pergunta: Não teve mais nenhuma….

Resposta: Não. E estava na AS já, já…

Comentário entrevistador: Exactamente, já estava na AS

Pergunta: Foram as únicas….

Resposta: Em termos mesmo de remuneração financeira, que necessitava na altura, foi

dos projectos da AS. E aí também investi bastante em termos de ser responsável por

vários projectos e fazer as formações também…aprendi muito sobre dinâmicas de grupo

que também acho que é sempre importante nestas áreas de educação especial. Foi essa a

base nesses meses. E depois atirámo-nos de cabeça…de facto acho que foi isso.

Pergunta: E a decisão, foi…nem demorou muito tempo foi passado logo esses cinco,

seis meses arrancaram logo. Porquê? Foi por causa daquela questão de que não estavam

satisfeitos com o que fizeram?

Resposta: Exactamente. Começámos a andar muito frustrados com aquilo que

andávamos a fazer. Um colégio não correspondia às necessidades, eu não andei a

estudar para isto, isto está tão mau, não é assim, eu não quero isto…foi um bocado isto.

Pergunta: Na altura que vocês saíram foi difícil arranjar um emprego que

correspondesse às expectativas?

Resposta: Eu acho que ninguém ficou satisfeito com os empregos que arranjou, quer

seja a dar aulas de educação física, quer seja…

Comentário entrevistador: A sério?

Entrevistado: …ou mesmo ir para colégios de ensino especial, ninguém estava

satisfeito…ninguém mesmo.

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Pergunta: Acha que alguma das suas experiências profissionais anteriores, e mesmo as

posteriores à criação da empresa, contribuíram para a criação e para a própria gestão

empresarial, ou não? Contribuíram para a criação de melhores conhecimentos

científicos e técnicos, mas nunca para a parte da gestão?

Resposta: Nunca para a parte…mais científicos e técnicos, sem dúvida alguma. A parte

da gestão acho que é com o dia-a-dia que nós vamos aprendendo, quando se tem que

gerir uma família também…

Pergunta: Sempre residiu em Portugal? Nunca residiu noutro pais?

Resposta: Não eu nasci em Angola.

Pergunta: Sim eu vi, mas nasceu e veio pequenina?

Resposta: Nasci em Angola, vim com sete anos e residi em Moçambique. O meu pai

era embaixador em Moçambique.

Pergunta: Nasceu em Angola, viveu sete anos em Moçambique é isso?

Resposta: Não, entre Angola e Moçambique foram sete anos e vim para cá com sete

anos.

Comentário entrevistador: Ok.

Pergunta: Pronto, havia uma aqui que era se a criação da empresa tinha sido uma

escolha ou uma alternativa à falta de trabalho na área?

Resposta: Sim, também…

Pergunta: Falta de trabalho satisfatório?

Resposta: Falta de trabalho satisfatório sim…

Comentário entrevistador: Trabalho até podia haver mas…

Comentário entrevistado: Exactamente, não aquilo que nós queríamos.

Pergunta: Já tinha trabalhado por conta própria antes de criar a empresa, mesmo que

fossem trabalhos temporários?

Resposta: Não…em projectos…não. É assim um projecto é por conta própria, somos

um grupo não é, cada um tem a sua função…

Comentário entrevistador: É, um projecto é.

Comentário entrevistado: Os projectos da AS….exactamente.

Pergunta: Agora mesmo para finalizar, que aspectos é que considera relevantes

fomentado no Ensino Superior para se promover o empreendedorismo e a criação do

próprio negócio? Ensino Superior de uma forma geral e depois se quiser pode referir

especificamente na FMH, no nosso curso.

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Resposta: Eu acho que o nosso curso tem que dar…tem que dar mais experiências

práticas primeiro que tudo, tem que ir ao encontro às famílias em termos de

necessidades. Em termos de empreendedorismo, desde que se coloque sempre a questão

do…deve-se trabalhar sempre em equipa, nós não somos detentores do saber e então

uma equipa tem que ser composta por várias pessoas de várias áreas. Às vezes dá a

sensação de que falam um bocado disso em termos teóricos na faculdade, falam…A

outra situação é que às vezes as pessoas que saem da faculdade têm a mania de que já

sabem tudo e eu acho que não sabemos nada quando saímos da faculdade, eu acho que

sabemos alguma coisa mas acho que quem quer ir mais além tem que estar sempre a

aprender, eu acho que isso…não sei se é empreendedorismo, se é ser activo, ser

dinâmico, não sei o que é que hei-de chamar a isso.

Pergunta: Queria mesmo que me desse umas dicas porque é assim, a sociedade

portuguesa, as mentalidades infelizmente ainda hoje pecam por a maior parte dos pais

diz aos filhos que o ideal é irem trabalhar por conta de outrem, para terem alguma

segurança…À partida ainda a maior parte não aconselha “bem se tu quiseres criar uma

empresa damos-te todo o apoio porque isso é que é o caminho”, a maior parte….

Comentário entrevistado: Não, não…é uma questão quase financeira.

Pergunta: Pois, mas que aspecto é que acha que a nível dessa mudança de mentalidade

e se nós formos fazer um levantamento por questionários aos jovens que estão nos

últimos das licenciaturas, a maior parte deles quer um emprego estável, não quer abrir a

sua empresa. Alguns já começam a querer, juntam-se entre os colegas, mas poucos…e

então em faculdades que não têm muito a ver com gestão ainda menos. O que é que a

acha que se devia fazer a nível da licenciatura para fomentar esta apetência para a

criação do….

Resposta: Eu acho que tem a ver com a criação de projectos. A partir do momento em

que se ensina a criar um projecto, temos um ideal, temos um projecto, como é que o

vamos fomentar, estamos quase a tocar no ponto do ser empreendedor, na criação de

uma coisa.

Comentário entrevistador: Completamente…

Entrevistado: Mas sempre com a noção de que nós não somos os melhores, eu acho

que isso vai muito…

Pergunta: A modéstia, a humildade para a …

Resposta: Está a falhar redondamente. Eu acho que mesmo muito jovens que saem

agora da faculdade têm a mania que sabem tudo…

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Comentário entrevistador: Uma arrogância, não é?

Comentário entrevistado: Completamente.

Comentário entrevistado: Aliás há uma psicóloga cá que por natureza chega

atrasada… é dela…. Nós ficamos e dizemos “não pode ser”, nós é que temos que

esperar por eles e não são eles que têm que esperar por nós. As horas são para se

cumprir e isso faz toda a diferença, porque quando eu vou a um médico e estou duas

horas à espera do médico, eu acho errado porque eu não faço isso aos meus clientes, e

não faço, recuso-me a fazê-lo…E se não posso, digo que não posso...não vou dizer

“Está bem, agora vais esperar por mim”. E isso eu acho que actualmente tem sido muito

complicado, é a responsabilidade. E a outra coisa é assim, se são responsáveis por

aquilo temos que ir até ao fim. Se somos responsáveis pela criança temos que ir à

escola, temos que falar com os pais, temos que nos disponibilizar, ter o telemóvel ligado

para quando precisarem de ajuda, mesmo que seja fora de horas. Às vezes há pais que

dizem que não incomodam, que não fazem, mas nós temos que ter a capacidade de dizer

que estamos aqui, que podemos ajudar…eu acho que actualmente as pessoas não

têm…senso comum, situação dos limites, saber dizer que não, mesmo em termos do

nosso trabalho, não é?! Se eu acho que não tenho capacidade para fazer….

Comentário entrevistador: Claro, perceber onde…às vezes as pessoas querem abarcar

tudo e acabam por fazer um mau trabalho e metem em causa, às vezes, as instituições e

mesmo os cursos…

Comentário entrevistado: Isso faz-me muita confusão. Aliás quando alguma coisa

corre mal aqui com alguma de nós em termos de uma reunião, eu fico um bocadinho

aflita porque a imagem é o que conta…

Comentário entrevistador: Claro…sem dúvida.

Pergunta: Na sua opinião até que ponto o empreendedorismo é um dom pessoal ou

pode aprender-se?

Resposta: Eu acho que há pessoas que têm dom mesmo para isso…eu acho que há

outras que podem aprender. Eu fui aprendendo, mas mesmo assim não considero que

arrisque muito…mas as pessoas que me conhecem dizem que sim, que eu arrisco e

gosto de ir mais além. Mas eu não me considero segura ao ponto de me mandar de

cabeça para as coisas…parece uma contradição…Eu acho que me mandei de cabeça

porque tinha a certeza de que gostava do que estava a fazer…não é facilmente que me

meto em coisas malucas.

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Pergunta: Acha que tinha sido uma mais-valia enquanto a teve, e os colegas tiveram,

durante o curso terem uma cadeira que abordasse alguns aspectos a nível da gestão? E

vocês para gerirem fazem um plano de negócios com metas e objectivos? Resposta:

Acho que faz todo o sentido porque mesmo dentro do curso da faculdade nós podemos

querer seguir a via clínica. E para clínica, e sobretudo na nossa área que não somos

médicos, e que…

Comentário entrevistador: Nem somos reconhecidos.

Entrevistado: Nem somos reconhecidos, andamos agora também com essa…andamos

a ver se mudamos alguma coisa nisso…Era fundamental dar essa força porque é

possível…há mercado para toda a gente, a ideia também é esta…e cada vez mais. Acho

que sim, acho que era fundamental haver, nem que fosse opcional…

Comentário entrevistador: Exactamente, nem toda a gente tem que criar uma

empresa. Uns são bons para liderar e outros são bons para trabalhar.

Comentário entrevistado: Exactamente, exactamente.

Pergunta: Pronto, da minha parte é isto. Quer acrescentar alguma coisa, alguma coisa

que ache relevante mencionar e que não tenha mencionado?

Resposta: Há outra coisa que também me ajudou em termos de…pronto, o projecto não

só a AS, como também dentro de colónias de férias.

Comentário entrevistador: Pois eu vi…

Entrevistado: E isso também foi engraçado porque acabaram por me dar também um

bocado a situação do coordenar e eu acho que às vezes o coordenar não tem só a ver

com o espírito empreendedor, acho que tem muito a ver muito com a parte humana,

saber gerir conflitos. Eu lembro-me por exemplo de nós os quatro irmãos…Ainda

agora, de nós os quatro, sou eu que giro os conflitos…

Comentário entrevistador: É a gestora ali dos conflitos familiares.

Entrevistado: Mas de conflitos…tem a ver com a parte humana, não propriamente com

as partes económicas…aí detesto números, detesto dinheiro, essas coisas não suporto

mesmo ter que pensar nelas, faz-me doente. Agora gerir a relação…sim, sempre me

coube a mim gerir isso. E eu acho que se calhar por isso também fui tão coordenadora

de tanta coisa…porque tem a ver com isto do gerir, o saber falar, aí aprendi muito

também, na maneira de falar com as pessoas, antes era um bocado mais bruta, por

exemplo… porque…eu acho que o que tem razão tem que ir para a frente. O escrever

no livro das reclamações…passo a vida a fazê-lo, por muito que me olhem de

lado…mas acho que é um dever que nós temos para a sociedade evoluir…

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Comentário entrevistador: É um dever cívico…

Entrevistado: Eu às vezes acho que as pessoas têm medo e ficam caladas, eu tento ser

assertiva, não a agressiva nem a passiva, eu tento ser a assertiva…e tento gerir isso. E

eu acho que as colónias também me ajudaram um pouco não só as crianças, mas

também os monitores, mais uma vez a parte humana, não é?!

Comentário entrevistador: A gestão de recursos humanos, não é?!

Entrevistador: É, sem dúvida alguma. E mesmo assim quando nós os três dividimos as

áreas eu digo que não quero a financeira, não quero mesmo….prefiro a publicidade,

prefiro os pais, prefiro os miúdos, isso do que…mas sobretudo a equipa, prefiro

trabalhar com a equipa.

Pergunta: Mas mesmo a parte financeira, o sócio que está com a parte financeira

também não tem formação de…

Resposta: Não, não…nenhuma. Já pensámos nisso mas ainda efectivámos nada. Já

pensámos nisso, era importante ter.

Pergunta: O que é que achou da entrevista? Por si as questões…acha que estão bem

formuladas, acrescentaria alguma questão, alguma nova categoria?

Resposta: Não. Acho que estão bem e acho que mesmo a vertente do falar muito sobre

o que é que em termos de sociedade e o que é que em termos de formação inicial nos

podem dar acho que é fundamental. Porque acho que isso é uma nova visão, acho que é

super importante nós temos que correm, as pessoas têm que aprender a fazer alguma

coisa de que gostem nem que seja criando o seu próprio local de trabalho. E acho que a

faculdade peca nisso, profundamente. Aliás nós achamos que neste momento a

faculdade está a pecar muito pelo nome, porque não nos deu nome. Não temos nome,

quem é que somos nós?! Nós ainda optámos em ir ver à Internet, fomos à lista de

profissões, agora vamos tentar marcar uma entrevista mesmo….vamos ao Ministério do

trabalho perguntar e se for preciso vamos escrever à Ministra, isso é a nossa próxima…

Comentário entrevistador: Pois…é verdade. Bem, concluímos então aqui a entrevista.