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nova Economia_Belo Horizonte_16 (1)_175-198_janeiro-abril de 2006 Transparência, condução da política monetária e metas para inflação Helder Ferreira de Mendonça Professor do Departamento de Economia da UFF Pesquisador do CNPq Resumo Dado que o regime de metas para a inflação tem sido adotado por diversos países, e que o principal objetivo dessa estrutura é servir co- mo um guia para as expectativas inflacioná- rias dos agentes econômicos, a transparência na condução da política monetária tornou-se uma exigência para o bom funcionamento desse regime monetário. Este artigo apresen- ta um levantamento da evolução observada na pesquisa teórica e empírica sobre a trans- parência na condução da política monetária. O principal resultado encontrado indica que a transparência deve ser entendida como um mecanismo que, se utilizado de forma corre- ta, pode contribuir para aumentar a credibili- dade na condução da política monetária. Abstract Given that several countries have adopted inflation targeting, and that the main objective of this regime is to function as a guide for the inflationary expectations of economic agents, transparency in the handling of the monetary policy becomes a prerequisite for the success of this regime. This paper presents a survey of the evolution in the theoretical and empirical research concerning transparency in handling monetary policy. The main conclusion suggests that transparency must be understood as a mechanism that, if used in correctly, can favor a rise in credibility in the handling of monetary policy. Palavras-chave transparência, política monetária, expectativas, credibilidade. Classificação JEL E52, E58. Key words transparency, monetary policy, expectations, credibility. JEL Classification E52, E58.

Transparência, condução da política monetária e metas para

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Page 1: Transparência, condução da política monetária e metas para

nova Economia_Belo Horizonte_16 (1)_175-198_janeiro-abril de 2006

Transparência, condução da política monetáriae metas para inflação

Helder Ferreira de MendonçaProfessor do Departamento de Economia da UFF

Pesquisador do CNPq

ResumoDado que o regime de metas para a inflaçãotem sido adotado por diversos países, e que oprincipal objetivo dessa estrutura é servir co-mo um guia para as expectativas inflacioná-rias dos agentes econômicos, a transparênciana condução da política monetária tornou-seuma exigência para o bom funcionamentodesse regime monetário. Este artigo apresen-ta um levantamento da evolução observadana pesquisa teórica e empírica sobre a trans-parência na condução da política monetária.O principal resultado encontrado indica quea transparência deve ser entendida como ummecanismo que, se utilizado de forma corre-ta, pode contribuir para aumentar a credibili-dade na condução da política monetária.

AbstractGiven that several countries have adopted

inflation targeting, and that the main objective

of this regime is to function as a guide

for the inflationary expectations of economic

agents, transparency in the handling of the

monetary policy becomes a prerequisite

for the success of this regime. This paper

presents a survey of the evolution in the

theoretical and empirical research concerning

transparency in handling monetary policy.

The main conclusion suggests that transparency

must be understood as a mechanism that,

if used in correctly, can favor a rise in credibility

in the handling of monetary policy.

Palavras-chavetransparência, políticamonetária, expectativas,credibilidade.

Classificação JEL E52, E58.

Key words

transparency, monetary policy,

expectations, credibility.

JEL Classification E52, E58.

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[...] there is widespread consensus that the

main objective of monetary policy should

be price stability, that the central bank

(CB) should have the freedom to set the in-

terest rate without political interference,

and that the objectives and the procedures

followed by the CB should be reasonably

transparent (Cukierman, 2002, p. 15).

1_ IntroduçãoPor volta dos anos 1950, havia a crençade que a política monetária era mais efeti-va quanto menos transparente ela fosse.A justificativa para essa visão é que a efi-cácia da política monetária dependeria daopacidade das ações do Banco Central,uma vez que, dessa forma, seria mais fácilobter os resultados pretendidos com aação política. Até meados dos anos 1970,a análise da política monetária tinha co-mo referencial teórico a abordagem key-nesiana associada ao trade-off inflação ver-

sus desemprego, presente na Curva dePhillips original.1 Não obstante, em ra-zão da revolução teórica provocada pelaincorporação das expectativas racionais àpolítica econômica e às sucessivas evi-dências empíricas contrárias ao trade-off

mencionado, houve a substituição do pa-radigma keynesiano na análise teórica dapolítica monetária. O triunfo das expec-tativas racionais e da taxa natural de de-

semprego teve como conseqüência a ba-se do argumento de que a política mone-tária deve ter como principal objetivouma inflação baixa e estável.

Ainda nos anos 1970, Kydland ePrescott (1977) deram início ao estudosobre a credibilidade da política monetá-ria, ressaltando a análise sobre inconsis-tência temporal. Na perspectiva dessesautores, a utilização de regras para a con-dução da política monetária representa amelhor solução para que a política atualseja consistente com a política de equilí-brio futura. Seguindo a mesma linha deargumentação, Barro e Gordon (1983)retomaram a análise efetuada por Kyd-land e Prescott e salientaram a importân-cia do papel da reputação como forma dedisciplinar a condução da política mone-tária. O ponto central da análise é que apersistência da inflação é atribuída à per-da de reputação do governo graças aonão-cumprimento dos acordos previa-mente firmados com a sociedade.2 Apartir de então, uma das principais preo-cupações da literatura passou a ser a bus-ca de uma estrutura para a política mone-tária capaz de reduzir os estímulos para aautoridade política causar inflação. Emoutras palavras, tornou-se necessário oencontro de uma solução para o proble-ma relacionado ao viés inflacionário nacondução da política monetária.3

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1 É importante salientar quenão se deve atribuir a Keynesa recomendação de falta detransparência para a conduçãoda política monetária. Naverdade, Keynes foi umdefensor da transparência, jáque acreditava que, dessaforma, seria mais rápido oalcance dos objetivosplanejados pela autoridadepolítica. Para o leitorinteressado nessa visão, verKeynes (1973).2 Outro importante trabalhopara a literatura sobre aconquista de reputação daautoridade monetáriarepresentado por um jogoestratégico entre a autoridademonetária e um sindicato é ode Backus e Driffill (1985).3 O conceito viés inflacionário

deriva do argumento deineficácia das políticas. Oâmago do conceito pode serentendido como a tentaçãoque os governos sofrem debuscar aumento do produtoe/ou redução do nível dedesemprego por meio do usode políticas monetáriasexpansionistas.

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Hoje em dia, tomando-se comoreferência os argumentos apresentadospor Taylor (1993), tem-se consolidadocomo objetivo para a política monetáriauma taxa de inflação próxima a sua metae evitar que o produto se desvie do pro-duto potencial. Para a consecução desseobjetivo, a taxa de juros de curto prazotem-se constituído o principal instrumen-to à disposição da autoridade monetária.A justificativa básica para esse procedi-mento se deve ao fato de que a inflação ea expectativa de inflação são rígidas, per-mitindo algum controle do Banco Cen-tral sobre a taxa de juros de curto prazo.Dado que a expectativa do público sobrea taxa de juros real de curto prazo futuraaltera a taxa de juros real de longo prazo,há a possibilidade de alterar os níveis deconsumo e investimento, e, por sua vez,a demanda agregada. Ademais, a expec-tativa de inflação dos agentes econômi-cos e a variação do produto afetam aformação de preços das firmas, e, dessaforma, a inflação.

Quando o Banco Central altera ataxa de juros, as expectativas dos agenteseconômicos em relação à evolução pre-sente e futura da economia podem sofreralterações. Ou seja, um aumento da taxade juros na tentativa de evitar um aumen-to da inflação causa efeitos recessivos no

curto termo; no entanto, o Banco Cen-tral pode restabelecer a confiança no de-sempenho futuro da economia, fazendocom que as taxas de juros esperadas demédio e longo termo sejam menores.Portanto, é esperado que, no longo ter-mo, o efeito negativo sobre o produtooriundo de um aumento na taxa de jurospara evitar um processo inflacionário se-ja revertido, e que, com a recuperação danormalidade,4 seja gerado, no longo ter-mo, um estímulo ao investimento capazde promover aumento no produto.

Apesar de o Banco Central ter acapacidade de reduzir a taxa de juros reale depreciar a moeda para estimular a ati-vidade econômica, essa postura não po-de ser adotada de forma indefinida. Nolongo prazo, a taxa de juros real de equilí-brio é neutra, isto é, ela é compatível como produto ao nível potencial. De outraforma, a taxa de juros real de longo prazoé aquela que resulta da ausência de rigi-dez de preços e outras fricções. Portanto,se o Banco Central insistir em manteruma taxa de juros real abaixo da de equi-líbrio por muito tempo, a demanda agre-gada excede o produto potencial, e, co-mo conseqüência, há uma pressão paraque ocorra aumento da inflação na eco-nomia. Logo, torna-se justificável o argu-mento apresentado por Barro (1986) de

Helder Ferreira de Mendonça 177

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4 Uma boa interpretaçãosobre o critério denormalidade refere-se ao fatode que o ponto de partida nastomadas de decisões acerca depreços, investimento,produção, etc., tem por base oque o agente econômicoconsidera como normal paraque sua tomada de decisãoseja realizada. Em outraspalavras, mudanças em relaçãoao que os agentes consideramcomo normal são encaradascomo oportunidade de haveruma ação especulativa, aopasso que mudançaspermanentes no cenáriolevariam os agentes arecalcular sua decisão emrazão da mudança no própriopadrão de normalidade. Comocaso ilustrativo dessa situação,podem-se citar os processospersistentes de alta inflação,em que, por causa dasoscilações constantes eimprevistas das taxas deretorno, há um movimentoque impede que seja formadoum padrão de normalidade.

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que, no caso da política monetária nãoestar voltada para o combate à inflação,o processo de desinflação da economiapode implicar sacrifício social maior queo necessário.

Com base na idéia acima, obser-va-se que a atual preocupação das autori-dades monetárias em assegurar a estabili-dade de preços fez com que “[...] central

bankers’ obsession with ‘credibility’ is completely

rational ” (Svensson, 2003, p. 12). De ma-neira geral, a literatura econômica temdestacado a importância da adoção deuma âncora para as variáveis nominaisque sirva como guia para as expectativasdos agentes econômicos sobre o com-portamento futuro dessas variáveis. As-sim, conforme ressaltado por Santomero(2003), o uso da estratégia de metas paraa inflação deveria ancorar essas expecta-tivas de forma mais consistente, tornan-do a estabilidade de preços mais fácil deser alcançada no longo termo e aumen-tando a habilidade do Banco Central paraestabilizar o produto e o emprego nocurto termo.

No período recente, a análise so-bre a importância da transparência para acondução da política monetária tem re-cebido maior atenção dos economistas.De acordo com estudo efetuado por Fryet al. (2000), a partir de uma análise de

1994 de Bancos Centrais, a transparênciaocupa o terceiro lugar como variável maisimportante para a condução da políticamonetária.5 Dado que há o reconheci-mento de que a efetividade da conduçãoda política econômica depende de algu-ma forma da capacidade do público ante-cipar as ações do Banco Central;6 é espe-rado que a transparência ajude os agenteseconômicos a prever melhor as ações dapolítica monetária. Nesse sentido, a trans-parência contribuiria para o aumento daresponsabilidade do Banco Central no al-cance das metas anunciadas e, por conse-guinte, para o aumento da credibilidade.

Este artigo apresenta um levanta-mento da evolução observada na pesqui-sa teórica e empírica sobre a transparên-cia na condução da política monetária.Além desta introdução, o artigo encon-tra-se estruturado da seguinte forma: nasegunda seção são apresentados os fun-damentos teóricos para análise sobre trans-parência com base em uma variação domodelo de Kydland e Prescott (1977); naterceira seção é mostrada a importânciada transparência para o regime de metaspara inflação; na quarta seção são apre-sentados os principais argumentos teóri-cos e empíricos que permeiam a análisesobre transparência da política monetá-ria; por último, são apresentadas as con-clusões do artigo.

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5 O primeiro lugar é aindependência do BancoCentral; o segundo lugar, amanutenção de expectativasde baixa inflação.6 Esta observação éparticularmente válida para osmercados financeiros emrazão de que erros deinformação sobre a políticamonetária podem gerarflutuações desnecessárias eimprodutivas no preço dosdiversos ativos.

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2_ A fundamentação teóricapara a transparência

A antiga literatura sobre regras versus dis-cricionariedade focava as intenções e acapacidade do responsável pela política.Os argumentos favoráveis ao uso de re-gras levavam em conta o conhecimentoimperfeito sobre a economia e a tendên-cia da política monetária ser conduzidade forma inadequada do ponto de vistado bem-estar social. Tomando-se porbase o trabalho de Kydland e Prescott(1977), essa perspectiva foi alterada, deforma que as regras passaram a ser utili-zadas como um compromisso para a au-toridade política.

O principal argumento teórico pa-ra o aumento da transparência na condu-ção da política monetária pode ser maisbem compreendido por meio de uma va-riação no modelo padrão da análise re-gras versus discrição.7 Para tanto, assu-me-se que a autoridade monetária temcomo objetivos uma taxa de inflação pró-xima a zero e uma taxa de desempregobaixa. Ademais, é admitido que a inflaçãoé determinada, em grande medida, pelataxa de crescimento monetário, e que onível de desemprego está relacionado coma taxa não-esperada de aumento da ofer-ta de moeda. Dessa forma, pode-se ex-pressar os objetivos do Banco Central

em termos da variação monetária (�M t )e da surpresa na expansão monetária( )� �M Mt t

e� . Portanto, o objetivo da au-toridade monetária para o instante t con-siste em minimizar o valor de

La

M b M Mt t t t

e� � �2

� � �� ( ) (1)

onde a e b > 0

Admitindo-se a hipótese de que opúblico possui expectativas racionais pa-ra a variação da oferta de moeda, isso im-plica que � � ��M E Mt

e

t t1 , ou seja, namédia os agentes acertam suas expectati-vas em relação à �M t .

A questão relevante passa a serqual o valor de �M t da equação (1) sob ocaso de regras e de discrição.8 Se a autori-dade monetária decide obter o melhorvalor de �M t para um grande número deperíodos, ou seja, deseja adotar uma re-gra não ativista e as expectativas são ra-cionais (na média � �M Mt

e

t� ), o pro-blema passa a ser a obtenção do valor de�M t que minimiza

La

Mt t�2

� � , isto é, (1.1)

L

Ma Mt

t

t� �

�M t Lt t� � � �0 0,

(1.1.1)

Helder Ferreira de Mendonça 179

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7 O conjunto analíticoadotado para o caso de regrasque apresentam resultadosuperior ao comportamentodiscricionário baseia-se emMcCallum (1996).8 Para simplificar a análise,será admitido que osparâmetros a e b sãoconstantes, o que implicaque �M t passa a ser um

valor constante.

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Ou seja, para o caso de um com-portamento com base em regras, o me-lhor resultado possível seria oriundo docompromisso de o Banco Central não fa-zer uso de expansão monetária.

Por outro lado, se for adotado umcomportamento discricionário, isso im-plica que as escolhas são feitas período aperíodo. Nesse caso, a autoridade mone-tária pode fazer a escolha de �M t paraqualquer ponto no tempo. Considerandoa situação em que o Banco Central pro-cura definir a melhor variação monetária,por exemplo, para o instante 3, o objetivopassa a ser a escolha de �M 3 que mini-miza o valor de

La

M b M M e

3 3 3 32

� � �� � �� ( ) (2)

Em relação ao caso anterior, a di-ferença consiste no fato de que �M e

3 foideterminado no final do período 2. Por-tanto, para a autoridade monetária, �M e

3

é um número conhecido, e por conse-guinte, há a possibilidade do segundo ter-mo da equação (2) ser diferente de zero.

O valor de �M e

3 que minimiza (2)é obtido por meio de

L

Ma M b M

b

a

3

33 3� �� � � (2.1)

Sob discrição, esse resultado é vá-lido apenas para o período 3. Se o Banco

Central desejar obter o melhor resultadode �M t para o período 4, a função obje-tivo que deverá minimizar corresponde a

Repetindo-se esse procedimento,verifica-se que, independentemente doperíodo que se estiver considerando naanálise, a melhor escolha para a autorida-de monetária será dada por

� �Mb

at M

b

at t

e� � � �, (4)

Fazendo-se a substituição desse re-sultado na equação (1), obtém-se,

Lb

at �

2

2(5)

Portanto, a perda resultante do com-portamento discricionário da autoridademonetária é maior do que onde há ado-ção de regras (L L b aregras discric� �0 22

. / ).O modelo apresentado não pode

ser entendido como um resultado defini-tivo. Na maioria dos modelos que tratamo assunto, a variável choque inserida naanálise corresponde a um termo sem cor-relação serial e com média tendendo a ze-ro. Em outras palavras, os resultados deum choque sobre a economia são negli-genciáveis. Assim, admitindo-se que a polí-tica monetária não determina de forma

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação180

La

M b M M Mb

a

e

4 4 4 4 42

� � � � �� � � �� ( ) (3)

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perfeita a inflação e o desemprego, é pre-ciso acrescentar à equação (1) um termoreferente aos efeitos indesejados (perdanão prevista pelo Banco Central) que umavariação monetária causa sobre os objeti-vos supracitados (ab t� ). Ou seja, a equa-ção (1) pode ser reescrita como

La

M b M M abt t t t

et� � � �

2� � � �� ( ) (6)

Deve-se ressaltar que o termoab t� presente na equação (6) não impli-ca mudança para a determinação do me-lhor resultado da variação monetária nocaso de regras.9 Há uma diferença, po-rém, em relação ao caso anterior. O re-sultado da minimização de L t pode serdiferente de zero, visto que

L abt t� � (6)

Portanto, o resultado de (7) de-pende da magnitude do choque sobre aeconomia.

No caso de comportamento dis-cricionário, é permitido o uso da políti-ca econômica em resposta aos choques.Assim, considerando que se está admi-tindo que a variação na oferta de moeda éa responsável pela produção dos cho-ques sobre a economia, a função de per-da social dada pela equação (6) pode serreescrita para o caso discricionário comoequivalente a

La

M b M M ab Mt t t t

e

t� � � �2

� � � �� ( ) (8)

Logo, a menor perda que a autori-dade monetária pode obter é dada por

L

Ma M b ab

Mb a

a

Lb a

a

t

t

t

t

t

� �

� ��

��

( )

( )

1

12 2

(9)

Esse resultado traz implicaçõesimportantes, uma vez que, se a for iguala 1, se encontra um valor para L t quecorresponde a zero. Em outras palavras,no caso de haver um esforço adequadodo responsável pela política monetáriano combate à inflação (a = 1), é possívelobter melhor resultado para a função ob-jetivo (L t = 0).

Com base no que foi apresentado,obtém-se o seguinte corolário – na ausên-cia de choques sobre a economia, o com-portamento associado a regras apresentaresultados superiores ao comportamentodiscricionário. Por outro lado, quando é re-movida a hipótese de que o Banco Centraltem controle perfeito sobre a inflação, ocomportamento discricionário, associadoao esforço adequado do responsável pelapolítica monetária no controle da inflação,apresenta resultado superior.

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9 A justificativa para esteresultado é que respostas aoschoques não são possíveisnesse caso.

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Na busca de mecanismos que in-duzam a autoridade monetária ao com-portamento ideal para o combate à infla-ção (eliminar o viés inflacionário na condu-ção da política monetária), a literaturatem apresentado três soluções básicas:

i. o Banco Central poderia abando-nar a discrição e seguir uma regrapolítica – proposta originalmenteapresentada por Kydland e Pres-cott (1977). Conforme pode serobservado pelo resultado do mo-delo acima, essa solução é satisfa-tória para o caso de inexistência dechoques sobre a economia.

ii. o público poderia escolher um pre-sidente do Banco Central con-servador – Rogoff (1985) sugeriua adoção de um Banco Central in-dependente com um presidenteconservador (aversão à inflaçãomaior do que a da média da socie-dade) para inibir a manifestaçãodo viés inflacionário. Lohmann(1992), explorando o trade-off com-prometimento e flexibilidade, ve-rificou que, na presença de cho-ques de oferta e de conflito entrea autoridade monetária e a fiscal,seria adequada a escolha de umpresidente do Banco Central con-servador para Bancos Centraisparcialmente independentes.

iii. o Banco Central poderia ser limi-tado por contratos de incentivo– de acordo com Walsh (1995),o problema do viés inflacionárioé resolvido pela estruturação deum contrato que impõe custosao Banco Central quando a infla-ção se desvia do nível ótimo. Emoutras palavras, sob essa concep-ção, o principal (governo) assinaum contrato de incentivo comum agente (Banco Central), se-gundo o qual o agente fica sujei-to ao conjunto de penalidades ex

post, que será determinado pelodesvio da inflação à meta prees-tabelecida. A vantagem dessa es-trutura advém do fato de que omelhor resultado para a socieda-de é obtido, independentementede o governo e o Banco Centralpartilharem da mesma função, domesmo objetivo e do mesmo con-junto de informações. No mo-delo de Svensson (1997), um re-gime de meta de inflação é in-terpretado como um arranjo doagente e o principal, em que a so-ciedade (o principal) delega a po-lítica monetária ao Banco Cen-tral (o agente). Outrossim, é as-sumido que o Banco Central temcontrole perfeito sobre a inflação.O resultado encontrado indica

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação182

Page 9: Transparência, condução da política monetária e metas para

que pode ser obtido um equilí-brio que corresponda a uma re-gra ótima sob compromisso.

O terceiro ponto acima está asso-ciado à propagação do uso da estratégiade metas para a inflação. Ademais, obser-va-se que, para o sucesso no combate àinflação, a independência de meta para oBanco Central não é essencial.10 Essa ob-servação está relacionada à validade dahipótese da neutralidade da moeda, istoé, no longo prazo, a política monetáriaseria incapaz de afetar variáveis reaisda economia (produto, emprego, taxa decâmbio real, etc.). Logo, a busca pela esta-bilidade de preços seria uma meta naturalpara a autoridade monetária. Assim sen-do, seria preciso desenvolver mecanis-mos que assegurassem ao Banco Centralos instrumentos necessários para a ob-tenção de sua meta natural sem dependerde nenhuma outra autoridade política.Em outras palavras, seria necessário odesenvolvimento da independência de ins-trumento do Banco Central.11

Conforme identificado por Her-rendorf (1998), há estreita relação entreregime de metas para a inflação, indepen-dência de instrumento e transparência nacondução da política monetária.

[The] inflation targeting arrangement that

gives instrument independence to the cen-

tral bank reduces the inflationary bias of

monetary policy making. The reason for

this result is that if the inflation target is

publicly announced the arrangement is

transparent, solves the private information

problem and makes reputation more effec-

tive (Herrendorf, 1998, p. 443).

Portanto, uma explicação para anecessidade da transparência da políticamonetária é que ela serve como comple-mento para a independência do BancoCentral. Sob essa visão, algum grau detransparência é necessário para garantir aresponsabilidade na condução da políticamonetária e para salvaguardar a legitimi-dade democrática de Bancos Centrais in-dependentes. Assim, a transparência doBanco Central torna-se indispensável pa-ra reduzir o nível de incerteza na econo-mia, uma vez que ela atenuaria a existên-cia de informação assimétrica entre osresponsáveis pela política monetária e ou-tros agentes econômicos.

3_ Metas para inflaçãoe transparênciaÉ reconhecido que o sucesso de uma po-lítica antiinflacionária depende do nívelde confiança que os agentes econômicosdepositam na exeqüibilidade de a políticaanunciada ser implementada e ser cum-prida até o fim. Logo, a presença da in-

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10 A independência de metarefere-se à liberdade que oBanco Central tem paradefinir qual o objetivo a seralcançado (Fischer, 1995).11 É importante ressaltar que,embora a literatura apresenteestreita relação entre aindependência do BancoCentral e o regime de metasde inflação, não é necessária apresença de um Banco Centralindependente para aimplementação do regimemonetário em questão.

Page 10: Transparência, condução da política monetária e metas para

certeza na economia torna-se importan-te elemento para reduzir a credibilidade.No período atual há duas fontes poten-ciais de incerteza na economia (Heron,2003), a saber:

i. eventos inesperados – choques (ex-ternos e internos) sobre a econo-mia e erros de previsão para a polí-tica monetária;

ii. os agentes econômicos não com-preendem, de forma clara, quaissão os objetivos de longo prazopara a política monetária.

Com o objetivo de atenuar a fonte de in-certeza destacada no segundo ponto, oregime de metas para a inflação tem ga-nhado atenção de diversos países desdeos anos 1990.

Na análise sobre o regime de metaspara a inflação, a credibilidade do regime éresultado de dois tipos de credibilidade(Andersson; Berg, 1995), quais sejam:

i. credibilidade operacional – refere-se à habilidade de o Banco Cen-tral fazer uso da política monetá-ria, de forma que a meta de infla-ção anunciada seja cumprida;

ii. credibilidade política – reflete o te-mor dos investidores em relaçãoà probabilidade do regime mone-tário mudar e, por conseguinte, abusca da estabilidade de preços

deixar de ser prioridade para acondução da política monetária.12

A estratégia mais utilizada para aimplementação do regime de metas paraa inflação tem sido o anúncio de bandas.Uma banda mais larga implica maior fle-xibilidade e maior probabilidade de a me-ta ser alcançada. Todavia, o uso de umabanda mais larga prejudica a formaçãode expectativas dos agentes econômicos.No caso de haver falta de credibilidade, opúblico incorpora às expectativas o limi-te superior da banda, o que resulta emmais tempo para alcançar a estabilidadede preços. Portanto, se o anúncio de umameta para a inflação não é crível, torna-senecessário um substancial efeito adversosobre o produto e o emprego no curtoprazo, para tornar efetiva a expectativade queda da inflação pelo público. Nãoobstante, o benefício que pode ser obti-do pelo anúncio de uma meta inflacioná-ria explícita é que, se ela for crível, podeinduzir os agentes a refazer suas expectati-vas, fazendo com que elas convirjam, deforma rápida, para a meta anunciada.13

Outra possibilidade para a imple-mentação da estratégia de metas para ainflação é o anúncio de uma meta quetem como base um único número com apresença de cláusulas de escape.14 De-ve-se ressaltar que, no caso de os agentesserem dotados de expectativas racionais,

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação184

12 É importante salientar quea credibilidade políticadepende muito mais dosuporte político para a buscada estabilidade de preços doque propriamente dacondução da políticamonetária para esse fim.13 Apesar do argumento deque metas inflacionárias sãocapazes de aumentar atransparência e reduzir o viésinflacionário da políticamonetária, deve-se lembrarque o regime sobreditopermite a ação discricionáriado Banco Central, o que, porsua vez, não elimina porcompleto o viés inflacionário(Herrendorf, 1998). Portanto,o uso desse regime por si sónão significa que o BancoCentral seja sempre avesso àinflação.14 Em geral, as cláusulas deescape têm sido utilizadas paraexcluir os efeitos decorrentesde importantes choques deoferta, tais como: mudançasnos termos do comércio;mudanças nos impostosindiretos; desastres naturais;encargos governamentais; etaxas de juros.

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a utilização de uma banda ou de um úni-co ponto como meta não tem grande re-levância. A justificativa para essa obser-vação se deve ao fato de que os agenteseconômicos reconhecem que as autori-dades monetárias não possuem controleperfeito sobre a taxa de inflação. Logo,mesmo que seja anunciado um ponto co-mo meta, as expectativas serão formadaspara uma taxa de inflação próxima àquelaanunciada. A principal vantagem para autilização de bandas é que a transparênciaé maior, e pequenas flutuações na taxa deinflação não precisam ser justificadas àpopulação (Brunilla e Lahdenperä, 1995).

A necessidade do aumento da trans-parência na condução da política mone-tária tem-se constituído um dos princi-pais argumentos favoráveis à adoção demetas inflacionárias.15 Na maioria dospaíses que utilizam o sistema de metaspara a inflação, a transparência torna-semaior em razão do anúncio de uma metaexplícita para a inflação e do aumentoda comunicação entre a autoridade mo-netária e o público.

Uma importante observação so-bre a relação entre comunicação e trans-parência é feita por Bernanke (2004).Esse autor contrasta políticas como re-gras de Taylor que se baseiam em regrasde feedback com políticas como as asso-ciadas com o regime de metas inflacioná-

rias que se baseiam em previsões. O re-sultado obtido indica que a importânciada comunicação e da transparência é mu-ito maior no segundo grupo de políticasgraças à necessidade que a inferência dopúblico sobre o curso provável de açãodo governo tem nesses ambientes.16

Em geral, o aumento da comu-nicação da autoridade monetária com opúblico é feito por meio de relatórios deinflação, que apresentam quatro pontosbásicos (Mishkin, 1999):

i. as metas e os limites da políticamonetária;

ii. os valores numéricos da meta deinflação e como eles foram de-terminados;

iii. de que forma as metas para a infla-ção serão obtidas, dadas as con-dições atuais da economia;

iv. as razões para os possíveis desviosem relação às metas anunciadas.

Conforme ressaltado por Svensson(1999), um aumento na transparência éimportante para que se torne eficiente aestrutura de delegação da responsabilida-de da condução da política monetária emuma sociedade democrática. O esquema aseguir elucida essa afirmação:

i. a sociedade, por meio do governo(seu representante direto), anunciaa meta para a política monetária;

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15 O caso mais formalizadopara a transparência das açõesdo Banco Central é o da NovaZelândia. Nesse país, ogoverno tem o direito dedemitir o presidente do BancoCentral, caso a inflação sedesvie em 25% da taxaanunciada. Exemplo debenefícios oriundos de maiortransparência das ações doBanco Central podem serilustradas com os casos doCanadá e da Inglaterra. Parauma análise detalhada sobreesses países, ver Mishkin ePosen (1997).16 Agradeço a um pareceristapela observação que deuorigem a este parágrafo.

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ii. o Banco Central tem independên-cia operacional para perseguir ameta sem interferência de natu-reza política;

iii. o Banco Central é responsável pe-la obtenção das metas.

Assim, a transparência tem papel rele-vante para que o público compreenda ofuncionamento da política monetária, e,como conseqüência, aumente a velocida-de de convergência de suas expectativaspara as metas anunciadas.

A transparência também teria efei-to disciplinador, uma vez que o aumentoda probabilidade de o público perceberum desvio da condução da política mo-netária em relação às metas estabelecidasprovocaria um custo mais elevado para oBanco Central descumprir as metas (per-da de credibilidade). Dessa forma, maiortransparência contribuiria para aumentaro compromisso da autoridade monetáriana consecução das metas anunciadas. Emoutras palavras, a transparência funcionacomo mecanismo de comprometimentodo Banco Central com a meta de inflação.

Em suma, a importância da trans-parência para o regime de metas para in-flação se deve ao fato de que o equilíbrioótimo para essa estratégia depende doquão são garantidos a responsabilidadee o monitoramento da condução da po-

lítica monetária. Se o Banco Central tempouca informação sobre os choques in-flacionários, ou se a política é transparen-te de forma que o público consegue ve-rificar a informação do Banco Central,maior peso é dado ao alcance da meta deinflação (Walsh, 2003).

4_ A literatura sobre transparênciaA idéia de que a transparência na condu-ção da política monetária é benéfica paraa economia tem os seguintes pontos co-mo premissas:

i. redução de incerteza – conseqüên-cia do fato de que a transparênciada política monetária foca a esta-bilidade de preços, contribuin-do para a obtenção de menor in-flação média e maior estabilidadefinanceira;

ii. aumento da responsabilidade nacondução da política monetá-ria – a transparência serve comoproteção para a política monetá-ria diante das pressões de natu-reza política.

Uma indicação da importância datransparência na condução da políticaeconômica está presente no código deboas práticas para as políticas monetáriae fiscal do Fundo Monetário Internacio-nal (parágrafo 4):

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação186

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The case for transparency of monetary and

financial policies is based on two main

premises. First, the effectiveness of mone-

tary and financial policies can be streng-

thened if goals and instruments of policy

are known to the public and if authorities

can make a credible commitment to mee-

ting them. In making available more in-

formation about monetary and financial

policies, good transparency policies pro-

mote the potential efficiency of markets.

Second, good governance calls for central

banks and financial agencies to be ac-

countable, particularly where the mone-

tary and financial authorities are granted

a high degree of autonomy.

De acordo com Geraats (2002), hácinco formas diferentes de transparência:

i. transparência política – refere-seà acessibilidade do público emrelação aos objetivos políticose aos arranjos institucionais queclarificam a conduta dos respon-sáveis pela política;17

ii. transparência econômica – refere-se à informação econômica (da-dos, modelos políticos, e previ-sões do Banco Central), que éutilizada para a condução da po-lítica monetária;

iii. transparência de procedimento –descreve a forma como as deci-sões da política monetária são

tomadas (estratégia e responsa-bilidade);

iv. transparência de política – diz res-peito ao anúncio das decisõespolíticas, concomitantemente, asua explicação e uma indicaçãoda tendência para as ações políti-cas futuras;

v. transparência operacional – refe-re-se à implementação da polí-tica monetária, incluindo uma dis-cussão sobre o controle de errospara o uso de instrumentos e osmecanismos de transmissão.

Com base nos pontos acima, ob-serva-se que a transparência poderia pro-mover o aumento na responsabilidade dacondução da política monetária de diver-sas maneiras. A transparência política (naforma de objetivos formais, metas quan-titativas, e clareza sobre a estrutura ins-titucional) oferece um critério para opúblico avaliar e identificar quem é o res-ponsável pela obtenção das metas anun-ciadas. Ademais, as transparências: eco-nômica, de procedimento, e de política;estão relacionadas a um aumento da res-ponsabilidade de forma ex ante, já quepermitem examinar as motivações paraas ações políticas. Em relação à transpa-rência operacional, observa-se que há umacontribuição ex post para a responsabili-

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17 Neste caso, observa-se,como mecanismos capazesde aumentar a transparência,o uso de metas explícitasde inflação; a independênciado Banco Central; e o usode contratos.

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dade, uma vez que ela possibilita aos agen-tes econômicos fazerem uma avaliação dosresultados da política implementada.

Na maior parte da literatura, adefinição de transparência correspon-de, de forma implícita, à informação si-métrica e é modelada como o grau deinformação assimétrica sobre erros decontrole ou choques econômicos sobreinstrumentos políticos. Conforme des-tacado por Geraats (2002), existem doisefeitos que estão relacionados à análisesobre transparência:

i. efeito incerteza – a informação as-simétrica gera incerteza para osagentes econômicos que preci-sam aprender por experiência pró-pria, e permite a oportunidadepara outros explorarem a presen-ça de informação privada;

ii. efeito incentivo – os agentes eco-nômicos que possuem acesso àinformação privada podem ten-tar influenciar o comportamentodos demais por meio da divulga-ção de informações.

Partindo-se do pressuposto de quea transparência é capaz de remover a in-formação assimétrica dos agentes econô-micos, é possível fazer uma associaçãocom o primeiro teorema do bem-estar.18

Logo, um aumento na transparência de-

veria incrementar o bem-estar, visto quehaveria redução nos erros de previsão ena variabilidade esperada das variáveissujeitas à incerteza.

Faust e Svensson (2001) mostramque um elevado grau de transparênciada política monetária contribui para amelhora do bem-estar social. De acordocom a análise apresentada por esses auto-res, o aumento da transparência causa re-dução no viés inflacionário, na variabili-dade da inflação e na variabilidade doemprego. Esse resultado é obtido fazen-do uso de uma variação no modelo deBarro e Gordon (1983), em que é consi-derado que o Banco Central não anunciaa meta de emprego e que essa varia ao lon-go do tempo de acordo com um compo-nente idiossincrático. Assim, flutuaçõesnesse componente da meta do empregotenderiam a fazer com que o Banco Cen-tral se desviasse da meta de inflaçãoanunciada. Admitindo-se que não há ocontrole perfeito da inflação, e que ocomportamento dessa variável dependedas intenções do Banco Central e do seuerro de controle, a autoridade monetá-ria decide qual a extensão do erro de con-trole sobre a inflação que será reveladaao público. Com base nessa estrutura, oBanco Central transmite aos agentes eco-nômicos sua intenção para a inflação, eportanto, permite-lhes inferir qual é a

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação188

18 De acordo com o primeiroteorema do bem-estar, umaalocação de equilíbrio obtidapor meio de um conjunto demercados competitivos éeficiente de Pareto.

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meta de emprego. Nesse sentido, o au-mento da transparência seria desejável, jáque faria com que o Banco Central reve-lasse maior proporção do componenteobservável do controle de erro, e, porconseguinte, melhoraria a capacidade deo público deduzir a meta de emprego.

De forma analítica, Faust e Svensson(2001) distinguem três diferentes regimes:

i. transparência mínima – nem o ob-jetivo referente ao emprego nemas intenções do Banco Centralsão observáveis pelo público;

ii. elevado grau de transparência –permite que o público observe asintenções do Banco Central emrelação à inflação. Como conse-qüência, há obtenção de uma in-flação mais baixa para a econo-mia, uma vez que a sensibilidadeda reputação dos Bancos Centraisàs suas ações aumenta, tornan-do-se mais custoso para a autori-dade monetária buscar uma polí-tica de inflação elevada;

iii. transparência extrema – tanto ameta de emprego quanto às in-tenções do Banco Central são ob-servadas pela sociedade.

Nesse caso, as ações do Banco Centralnão representam informação adicionalsobre o viés inflacionário nem afetam asua reputação.

De forma análoga à estrutura in-formacional adotada pelos autores so-breditos, mas adotando um modelo comelementos novos-keynesianos (contratossobrepostos e concorrência monopolis-ta), Jensen (2000) verifica que o aumentoda transparência ocasiona aumento dacredibilidade. A principal justificativa pa-ra esse resultado é que maior transparên-cia incrementa o custo do Banco Centralem virtude da perda de reputação decor-rente dos desvios em relação à meta deinflação. Todavia, o modelo de Jensen re-vela que, quando as preferências da auto-ridade monetária são de conhecimentodo público, o efeito da maior transparên-cia sobre a credibilidade é redundante.Ademais, a transparência torna-se umasevera limitação para o Banco Centralresponder a choques sobre a economia.Logo, a escolha do grau ótimo de transpa-rência relaciona-se com o trade-off entreflexibilidade e credibilidade. Sob essa pers-pectiva, um elevado grau de transparênciaé desejável para Bancos Centrais com bai-xa credibilidade, mas é altamente custosopara aqueles com alta credibilidade.

Ainda em relação à questão sobreo quão desejável seria a transparência,Mishkin (2004) ressalta que transparên-cia deve ser um meio, e não um fim. Nes-se sentido, a transparência é benéfica quan-do ela simplifica a comunicação com o

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público e ajuda a criar um suporte paraBancos Centrais conduzirem a políticamonetária de forma ótima para os objeti-vos de longo prazo. Todavia, conformeressaltado pelo mesmo autor, o anúncioda função objetivo do Banco Central oudas projeções da trajetória da política dejuros não se constitui um tipo de transpa-rência desejável, já que essa não está as-sociada aos benefícios supracitados.

Além da análise do efeito da trans-parência sobre a reputação, outra parteda literatura concentra-se em avaliar asconseqüências da divulgação das infor-mações do Banco Central sobre os cho-ques estocásticos. Tomando como referên-cia o modelo de Barro e Gordon (1983) eadotando um único período para análise,Cukierman (2000) verifica o impacto dainformação privada do Banco Central naiminência de um choque. No caso detransparência limitada, o Banco Centralrevela sua preferência depois de o públicofazer suas previsões sobre o choque. Poroutro lado, no caso de haver total transpa-rência, a preferência é revelada antes de opúblico formar suas expectativas.

O resultado encontrado por Cuki-erman (2000) é que, em um ambiente ne-oclássico, os diferentes graus de transpa-rência afetam apenas a variabilidade dainflação, e não o seu nível médio. Esse re-

sultado se deve ao fato de o público estaratento aos choques de oferta, e, portanto,o Banco Central perde sua vantagem in-formacional, e não pode criar uma sur-presa inflacionária para estabilizar a eco-nomia. Com base nessa interpretação, obem-estar social esperado é sempre mai-or sob um regime de transparência limi-tada do que no caso de total transparên-cia. No caso de total transparência (tantosob previsão perfeita e imperfeita do Ban-co Central), a inflação esperada é semprezero e, por conseguinte, o Banco Centralnão pode afetar o emprego. Em relaçãoao caso de um modelo neokeynesiano, éobservado que a sociedade é indiferenteaos dois regimes de transparência (limita-da e total), desde que a taxa de juros nãoseja incluída na função de perda. Entre-mentes, no caso da variabilidade de a taxade juros ser incluída na função de perda,o regime de transparência limitada torna-se superior ao de transparência total.

Geraats (2001), também fazendouso de uma variação do modelo de Barroe Gordon (1983), realiza outra análise pa-ra transparência, concentrando-se na pu-blicação das previsões do Banco Central.Nesse modelo são considerados dois pe-ríodos para análise, e a taxa de juros real éutilizada como mecanismo de transmis-são. Ademais, o Banco Central tem infor-

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação190

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mação privilegiada sobre os choques deoferta e demanda, e não publica as metaspara a inflação.

Assim, maior transparência per-mite ao público observar os choques deoferta e demanda do primeiro períodoefazer inferências sobre a meta de infla-ção do Banco Central. Portanto, maiortransparência torna a reputação do Ban-co Central mais sensível à suas ações. Lo-go, uma política monetária opaca é carac-terizada por uma inflação mais elevadano primeiro período. A justificativa paraesse resultado é que a não-publicação dasprevisões do Banco Central implica umaperda de reputação. Graças à incertezado tipo do Banco Central (forte ou fra-co)19 em relação a sua aversão à inflação,o público tende a interpretar que a não-publicação é um indicativo de que o Ban-co Central é “fraco”. O principal resul-tado obtido é que a transparência reduz avariabilidade da inflação, mas o efeitosobre o produto é ambíguo.

Um elemento comum na literatu-ra dos modelos sobre transparência é queela faz com que a reputação seja mais de-pendente das ações da autoridade mo-netária, e, como conseqüência, há um de-sestímulo para fazer uso de políticas in-flacionárias. Entretanto, é importante re-conhecer que a transparência tem menor

efeito sobre a reputação quando as prefe-rências do Banco Central são conhecidaspelo público. Portanto, para que algumaforma de transparência seja relevante, épreciso que exista alguma assimetria deinformação na política monetária. Outroponto a ser realçado é que a transparênciacontribui para disciplinar a inflação em ra-zão da restrição imposta ao Banco Centralpara estabilizar a economia por meio deum choque de demanda agregada.

4.1_ Evidências empíricassobre transparência

A literatura teórica sobre transparênciaidentifica diversos canais de como o au-mento da transparência pode afetar osresultados da política econômica. Con-forme apontado por Chortareas, Stasa-vage e Sterne (2002), não há um conceitode transparência universalmente aceito.Diversos autores conceituam transparên-cia em direções distintas, levando em con-ta: preferências, modelos, conhecimentode choques que incidem sobre a econo-mia, ou a implementação de decisões po-líticas. Como a análise sobre a transparên-cia da política monetária ainda é muitorecente, há poucos estudos empíricos queservem para avaliar as asserções teóricas.Assim, não há característica comum paraessa literatura, e os resultados obtidos

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19 A expressão “forte” estáassociada à idéia de que hácomprometimento efetivo nocombate à inflação, ao passoque “fraco” significa que abusca pela estabilidade depreços não é prioritária.

Page 18: Transparência, condução da política monetária e metas para

são preliminares. Com o objetivo de apre-sentar um panorama dos estudos realiza-dos, é relatada, a seguir, uma síntese dediversos trabalhos.

Cecchetti e Krause (2002) analisamde que forma medidas de independên-cia do Banco Central – responsabilidade,transparência e credibilidade – estão rela-cionadas à inflação média (amostra de 63países), ao desempenho macroeconômi-co e à ineficiência política (amostra de 24países). Os resultados obtidos indicamque a média da inflação encontra-se in-versamente relacionada às medidas dasvariáveis mencionadas. Por outro lado,os resultados não se mostram satisfatóri-os quando o desempenho macroeconô-mico e a ineficiência política são conside-rados. Além de a maioria das relaçõesestatísticas mostrarem-se insignificantes,alguns sinais revelam-se contrários aoque é esperado pela teoria econômica.Entre os resultados encontrados nessadireção, observa-se que a independênciado Banco Central e a responsabilidadetendem a reduzir a efetividade da políti-ca. Ademais, apesar de as medidas detransparência e de credibilidade apresen-tarem os sinais de acordo com o espera-do, apenas o índice de credibilidade é es-tatisticamente significativo.

Chortareas, Stasavage e Sterne(2002) avaliam o efeito da transparência

sobre a inflação e a volatilidade do pro-duto. Para tanto, é elaborado um índicede transparência da autoridade monetá-ria sobre suas previsões com base emquatro questões:

i. se as previsões são publicadas;ii. se as previsões são forward looking;iii. se há uma discussão dos erros de

previsão cometidos no passado;iv. se há alguma indicação dos riscos

associados com as previsões.

Utilizando esse índice de transparência, éfeita uma análise de corte transversal,considerando uma amostra de 87 paísesentre o índice obtido e a média da taxade inflação para o período 1995-1999.20

O resultado encontrado indica que há re-lação estatisticamente significativa entreessa medida de transparência e a inflaçãoe, portanto, países que são mais transpa-rentes quanto às suas previsões têm me-nores taxas de inflação. Ademais, não fo-ram encontradas evidências de que maiortransparência esteja associada a maior vola-tilidade do produto.

Outro ponto que é alvo da análiseempírica sobre transparência diz respeitoà importância do aumento da comunica-ção, por meio de relatórios de inflação,para a condução da política monetária.Nessa perspectiva, Fracasso, Genberg eWyplosz (2003) analisaram os relatórios

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação192

20 A análise também é feitapara outras variáveis: PNB percapita, uma medida deabertura da economia, umamedida de instabilidadepolítica, e uma variável dummy.

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de inflação produzidos por 29 BancosCentrais que fazem uso do regime de me-tas para inflação. Com o objetivo de ava-liar se a previsibilidade da política mone-tária é relacionada com a qualidade dosrelatórios de inflação, os autores mencio-nados realizaram uma análise cross-country.Para tanto, foi construída uma medida desurpresa no movimento das taxas de ju-ros que está associada às reuniões dosComitês de Política Monetária. Os resul-tados obtidos sugerem que um relatóriode inflação de boa qualidade contribuipara o melhor entendimento das deci-sões de política monetária.

Bernanke, Reinhart e Sack (2004)analisaram se a comunicação do comitêde política monetária é capaz de guiar asexpectativas do público em relação aocurso futuro das taxas de juros, o que,por conseguinte, denotaria maior capa-cidade de o comitê influenciar a taxa dejuros de longo prazo e o alcance dos ob-jetivos macroeconômicos. O resultado ob-tido indica que, no caso do Federal Open

Market Committee, as informações divulga-das pelo comitê representam ferramentapoderosa para afetar as expectativas demercado sobre o curso futuro da taxa dejuros básica da economia.

5_ Uma breve reflexãosobre o caso brasileiro

Desde a introdução do regime demetas para inflação na economia brasilei-ra em junho de 1999, o debate sobrea transparência da condução da políticamonetária tornou-se relevante.

In particular, inflation targeting was

seen as providing a nominal anchor both

for monetary policy and inflation expec-

tations, making this anchor identical to

the long-run objective of monetary policy;

providing more transparency and accoun-

tability to the design and implementation

of monetary policy; facilitating its com-

munication, understanding, and assessment;

and providing effective policy guidance by

focusing policymakers’ attention on the

longrun consequences of short-term policy

actions (IMF, 1999).

Na percepção de Mishkin eSchmidt-Hebbel (2001), o Brasil fez a op-ção de adotar um regime pleno de metaspara inflação desde a sua introdução. Sen-do assim, são características do caso bra-sileiro: ausência de outra âncora nominal,compromisso institucional com a estabili-dade de preços, ausência de dominânciafiscal, independência de instrumento (ope-racional) da autoridade monetária, políticade transparência e responsabilidade.

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O fato de o Banco Central do Bra-sil (BCB) preocupar-se em revelar que aestabilidade de preços é o objetivo priori-tário, assim como a diretriz para o com-portamento da taxa de câmbio e da taxade juros, denota claro aumento na trans-parência das ações da autoridade mone-tária. Conforme Bogdanski, Tombini eWerlang (2001), a comunicação efetivadas ações do BCB tornou-se fundamen-tal para que o público pudesse compre-ender e monitorar as decisões da autrida-de monetária. Além disso, permitiu queos cidadãos entendessem os motivospara os desvios em relação à meta de in-flação anunciada.

Com o objetivo de incrementar acomunicação do BCB com os agenteseconômicos, depois da adoção do regimede metas para inflação, relatórios trimes-trais de inflação passaram a ser divulga-dos. De acordo com levantamento efetu-ado por Fracasso, Genberg e Wyplosz(2003), considerando uma amostra de 20países que divulgam relatórios de infla-ção, o Brasil aparece na terceira posição,atrás apenas do Reino Unido e da NovaZelândia. Essa é uma informação valio-sa, já que revela a preocupação do BCBde divulgar informações com qualidadesobre a condução da política monetária.

Mishkin (2004) destaca que o Bra-sil publica projeções da trajetória futura

da política de taxa de juros com base nasexpectativas de mercado. De acordo coma visão desse autor, esse tipo de informa-ção é relevante principalmente para o casode economias emergentes. A justificativaé que, na maioria das vezes, os BancosCentrais dessas economias têm baixa cre-dibilidade. Logo, torna-se necessária apublicação de previsões, de forma queaumente o nível de informação do públi-co, mesmo que tais previsões não se ba-seiem em estimações do Banco Central.

Levando em conta a classificaçãofeita por Geraats (2002 – vide seção 4),as oito principais medidas adotadas peloBCB, durante o processo de adoção doregime de metas para inflação, resultantesdo Decreto n. 3088, de 21 de junho de1999, assinado pelo então presidente daRepública, Fernando Henrique Cardoso,podem ser classificadas da seguinte forma:

Medidas de transparência política

_ as metas de inflação serão estabeleci-das com base na variação de um ín-dice de preço bastante conhecido;

_ as metas de inflação, assim comoos intervalos para flutuação, serãodefinidos pelo Conselho Monetá-rio Nacional com base em umaproposta do ministro da Fazenda;

_ as metas para os anos 1999, 2000 e2001 serão definidas até 30 de ju-

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Transparência, condução da política monetária e metas para inflação194

Page 21: Transparência, condução da política monetária e metas para

nho; para o ano 2002 e anos sub-seqüentes, até 30 de junho comdois anos de antecedência;

_ ao BCB é dada a responsabilida-de para implementar as políticasnecessárias para a obtenção dasmetas;

_ o índice de preços que será adota-do para os propósitos do regimede metas para inflação será defi-nido pelo Conselho MonetárioNacional com base na propostado ministro da Fazenda;

_ as metas serão consideradas le-vando-se em conta a inflaçãoacumulada no período de janeiroa dezembro de cada ano (medidapelo índice de preços adotadopara esse propósito), de formaque se situem dentro do interva-lo de tolerância.

Medidas de transparência de política,de procedimento e operacional

_ no caso de as metas não serem al-cançadas, o presidente do BCBemitirá uma carta aberta endere-çada ao ministro da Fazenda, ex-plicando as causas do descum-primento, as medidas a ser ado-tadas para garantir que a inflaçãoretorne para os intervalos de to-lerância, e o período de tempo

que será necessário para que asmedidas tenham efeito;

_ o BCB emitirá um relatório de infla-ção trimestral que informará o de-sempenho do regime de metaspara inflação, os resultados dasações da política monetária, e asperspectivas em relação à inflação.

Apesar de as observações acimamostrarem clara preocupação do BCB deaumentar a transparência, verifica-se queainda há espaço para que ela possa ser in-crementada. Por exemplo, em relação àtransparência econômica, percebe-se queo BCB mostra-se muito relutante em di-vulgar os dados e os modelos utilizadospara obter as previsões de inflação ou emdivulgar a votação de cada membro doComitê de Política Monetária (tal comofaz o Banco da Inglaterra).

6_ Considerações finaisDado que o regime de metas para a infla-ção tem sido adotado por diversos países,e o principal objetivo dessa estruturaé servir como guia para as expectativas in-flacionárias dos agentes econômicos, atransparência na condução da políticamonetária tornou-se uma exigência para obom funcionamento desse regime mone-tário. Não obstante, a necessidade de um

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aumento da transparência não é entendidacomo uma panacéia entre os responsáveispela condução da política monetária.

Um bom exemplo sobre a impor-tância da transparência na percepção deresponsáveis pela condução da políticamonetária pode ser extraído da XXVIConferência Anual de Política Econômicado Federal Reserve Bank de St. Louis, reali-zado no ano de 2002. Charles Freedman– representante do Banco do Canadá –salienta que a estabilidade de preços é ummeio para um fim, não o objetivo em simesmo. De acordo com essa perspectiva,a transparência seria importante porqueapresenta três vantagens potenciais quecontribuiriam para menor volatilidade dataxa de juros e do câmbio:

i. aumenta a comunicação entre osresponsáveis pela condução dapolítica econômica;

ii. serve como suporte para a buscade uma meta de baixa inflação;

iii. ajuda a estabilizar o funcionamen-to do mercado financeiro.

Apesar disso, Václav Klaus – represen-tante da República Tcheca – adverte quea transparência não é a variável-chave pa-ra a política monetária. Sob esse pontode vista, o fundamental é a qualidadedo regime monetário e a forma comoa política monetária reflete as preferên-cias da sociedade.21

Um dos principais motivos para abusca da transparência na condução dapolítica monetária consiste no fato de osgestores de política procurarem reduzir aincerteza que eles mesmos criam. Um as-pecto importante é que maior transpa-rência implica que o mercado respondeàs informações prestadas pelo Banco Cen-tral e não à figura política da autoridademonetária. É importante salientar que adefinição de transparência está associadacom a informação de que os agentes pos-suem, e não com o simples fato de di-vulgar informação. A divulgação de in-formações pode levar a erros de inter-pretação, contribuindo para o aumentoda volatilidade do mercado financeiro.Além disso, se houver a necessidade deos agentes econômicos se esforçarem pa-ra extrair alguma informação útil dos da-dos disponibilizados pelo Banco Central,a informação assimétrica pode perdurar.

Na verdade, uma boa condução dapolítica monetária demanda que o BancoCentral tome decisões corretas ante a no-vas informações. Para tanto, não é neces-sário que a autoridade monetária tenhaum conjunto de funções de reação ex ante

que indique como ela reagirá para cadaeventualidade. Em suma, a transparênciadeve ser entendida como um mecanismoque, se utilizado de forma correta, podecontribuir para aumentar a credibilidadena condução da política monetária.

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21 Na visão de Klaus, nãocaberia ao Banco Centraldecidir qual deveria ser oobjetivo de políticaeconômica, mas apenas aescolha do instrumento depolítica a ser adotado para aconsecução de uma metadefinida pelo governo. Emoutras palavras, aindependência do BancoCentral deveria estar limitadaao aspecto operacional.

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