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Tristezas Tropicais Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

Tristezas Tropicais: Mais histórias tristes das florestas da Zambézia (2009)

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Estudo elaborado pela JA em parceria com a ORAM nas florestas da Zambézia

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Mais Histórias Tristes das Florestas da

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Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

Ficha técnica

Título: Tristezas Tropicais: Mais Histórias Tristes das Florestas da ZambéziaPublicação: JA & ORAMPor: Mackienzie, Catherina com Ribeiro, DanielFoto da capa: Daniel RibeiroTradução: BESTEXTDesign e layout: Lourenço Dinis PintoTiragem: 300 exemplares Distribuição gratuita

Maputo, Agosto de 2009

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Índice1. Introdução: ................................................................................................................................................7

2. Corte anual autorizado e volumes licenciados .............................................................................9

3. Número de Operadores de Licença Simples ................................................................................ 10

4. Aumento do número de concessões .............................................................................................. 13

4.1 Situação das concessões ...............................................................................................................................144.2 Propriedade das concessões ......................................................................................................................144.3 Qualidade dos Planos de Gestão de Concessões ...............................................................................154.4 Qualidade da Gestão das Concessões ....................................................................................................164.5 Reflorestamento .............................................................................................................................................174.6 O Património Florestal Permanente ......................................................................................................184.7 Concessões Comunitárias ............................................................................................................................18

5. Aplicação da Lei das Florestas (Fiscalização) ............................................................................. 19

5.1 Pontos de fiscalização ...................................................................................................................................195.2 Cooperação com as comunidades locais ..............................................................................................205.3 Base de dados computorizada dos SPFFBZ ........................................................................................205.4 Infracções: Contas oficiais ...........................................................................................................................215.5 Leilão de madeira ilegal ..............................................................................................................................225.6 Infracções: contas não oficiais e opinião local sobre a aplicação da lei florestal e sobre a

corrupção ...........................................................................................................................................................236. “Os 20%” ................................................................................................................................................. 25

6.1 Problemas ...........................................................................................................................................................266.2 Irregularidades.................................................................................................................................................27

7. Processamento no país, capacidade industrial e emprego .................................................... 29

7.1 Produção de Madeira serrada, serrações e capacidade industrial ............................................317.2 Mercados para Madeira serrada na China ............................................................................................327.3 Emprego no Sector das Florestas ............................................................................................................367.4 Apoio do Governo à indústria: China vs Moçambique ...................................................................36

8. Controlo da Exportação de Madeira ............................................................................................... 38

8.1 Gestão dos Portos ............................................................................................................................................388.2 Alfândegas ..........................................................................................................................................................388.3 Estatísticas oficiais ........................................................................................................................................388.4 Casos de exportação ilegal .........................................................................................................................398.5 Investigações Oficiais ....................................................................................................................................44

9. Reservas remanescentes de madeira comercial ....................................................................... 46

10. Conclusões e Recomendações .......................................................................................................... 48

11. Referências ............................................................................................................................................. 51

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Tabela 1: Actual licenciamento e colheita na Zambézia; 2000-2007 ......................................................9Tabela 2: Número de licenças simples e de concessões emitidas, e volumes licenciados na

Zambézia, 2003-2007 ...........................................................................................................................10Tabela 3: Origem nacional dos donos das concessões (com planos de gestão aprovados) na

Zambézia .....................................................................................................................................................15Tabela 4: Esforços de reflorestamento do governo: viveiros, mudas e áreas florestadas, 2000-

2007. ............................................................................................................................................................18Tabela 5: Aplicação da lei das florestas na Zambézia: Número de funcionários, infracções,

produtos confiscados e total de multas, 2001-2007 ...............................................................21Tabela 6: Progresso na Distribuição dos 20% às comunidades na Zambézia, 2005-2008 .........25Tabela 7: Produção de madeira serrada na Zambézia, 2001-2007 .......................................................31Tabela 8: Preços de exportação a partir de Quelimane para Umbila serrada (FOB - livre de

despesas de transporte), 2008 ..........................................................................................................35Tabela 9: Estatísticas oficiais sobre a exportação de madeira e de madeira serrada: SPFFBZ,

Alfândegas e Cornelder, 2002-2007 ...............................................................................................39Tabela 10: Titulares de licenças de pau preto, licenciamento e direito legal (de planos de gestão

aprovados) .................................................................................................................................................41Tabela 11: Registos das alfândegas relativos às exportações de pau preto .........................................42Tabela 12: Sub-reporte das exportações de pau preto ................................................................................42

Fotografia 1: Controlo espacial de corte da madeira, pelos SPFFBZ em 2009. ..................................15Fotografia 2: Leilão público de madeira confiscada: preço inicial de cerca de $100/m3, cerca de

1/3 do valor do mercado local para a madeira. ...................................................................23Fotografia 3: Camião carregado com madeira chanfuta, partindo do local de transacções ilegais

em Licuari .............................................................................................................................................23Fotografia 4: “Madeira serrada” de pau ferro a caminho do porto de Quelimane ...........................29Fotografia 5: Serração de baixa qualidade, dum comprador de madeira asiático em Quelimane. ...31Fotografia 6: Toros moçambicanos num parque de toros perto do Porto de Zhang Jia Gang, Xangai 33Fotografia 7: Mondzo utilizada para fazer mobiliário adornado, perto de Xangai ..........................33Fotografia 8: Jambire utillizada para fazer tamboretes para pés para turistas, Nanxun, perto de

Xangai .....................................................................................................................................................33Fotografia 9: Mesas Chinesas antigas, mostrando grãos correspondentes .........................................34Fotografia 10: Entalhe chinês de alta qualidade, incorporando carácter de material em bruto ..34Fotografia 11: Componentes semi-processados vindo do Vietname numa fabrica perto de Xangai .34Fotografia 12: Operações de serrações chinesas e os seus produtos não são todos especialmente

de alta tecnologia ...............................................................................................................................35Fotografia 13: Pau preto da Zambézia num armazém em Furen Market, Xangai, China .................40Fotografia 14: Extremidade dum toro de pau preto, com sigla do madeireiro zambeziano de

licença simples ....................................................................................................................................40Fotografia 15: Comunidade do distrito de Mocuba, sentados em um dos muitos toros abando-

nados por um dos operadores de licença simples que cortou a madeira nas suas florestas em 2007. .............................................................................................................................47

Caixa 1: História dum Madeireiro de Licença Simples .............................................................................11Caixa 2: A gerir uma concessão ...............................................................................................................................Caixa 3: Comentários sobre a Aplicação da Lei pelo Chefe Interino dos SPFFBZ, Engº. Chibite ...22Caixa 4: História de um Furtivo .........................................................................................................................24Caixa 5: A experiência de corte da madeira e os 20% duma comunidade: Bive/Makwia .......28Caixa 6: Um exportador – TTT Timber ..........................................................................................................32Caixa 7: Criar uma indústria florestal na Zambézia .................................................................................37

Figura 1: Exportação de toros e madeira serrada de Quelimane em quatro trimestres de 2007..30

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Agradecimentos A pesquisa para este estudo foi uma colaboração entre a Justiça Ambiental, a ORAM e os Amigos da Floresta. Eduardo Nhabanga da Justiça Ambiental e Gil Jaime da ORAM Zambézia colaboraram no trabalho de campo na Zambézia. No trabalho de campo na China, Shao Yang e Zhang Xue Mei prestaram um inestimável aconselhamento técnico, apoio logístico, tradução e um enorme com-panheirismo nas 2 semanas de trabalho de campo. Toby Dewar, da Christian Aid em Moçambique prestou apoio logístico durante o estudo. O documento final foi traduzido para Português pela BESTEXT. Muitos outros, que desejam permanecer anónimos, ofereceram generosamente o seu tempo e informação, pelos quais estamos gratos. Tal como o estudo original, este trabalho foi generosamente financiado pela Christian Aid, e devemos os nossos agradecimentos a Salomão Maxeiai pelo seu apoio. A Oxfam Novib apoiou amavelmente o trabalho de campo na China.

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AbreviaturasAAC Corte Anual Autorizado DDA Director Distrital da Agricultura DNFFB Direcção Nacional de Florestas e Fauna Bravia (tornou-se DNTF em 2006)DNTF Direcção Nacional de Terras e FlorestasDPA Director Provincial da AgriculturaMTN Metical Novo (Abril 2008 $US 1 = 24 MTN) OIIL Orçamento de Investimento de Iniciativas Locais ORAM Associação Rural de Ajuda Mútua (ONG local)PROAGRI Programa Nacional de Desenvolvimento Agrário SPFFBZ Serviços Provinciais de Florestas e Fauna Bravia da Zambézia

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1. Introdução: Opiniões contradictórias “Não há mais madeira!” Um concessionário industrial com quem falámos estava firmemente con-vencido de que esta era a maneira como devíamos começar a nossa actualização sobre “Um Take-Away Chinês!”1, o estudo da silvicultura de 2004, na província da Zambézia em Moçambique. “Nem vale a pena incomodar-se a fazer esta pesquisa agora,” continuou ele, “já é tudo demasiado tarde. A madeira valiosa já está toda na China; só ficaram as árvores pequenas e de fraca qualidade. Aqui já não há futuro para a indústria do processamento”. Outros operadores industriais concordaram com ele, juntando “ O sector das florestas, está muito pior do que estava há quatro anos atrás.” e “Está tudo descontrolado. A situação já está “pós-crise”.

“As coisas melhoraram imenso desde 2004”. Isto é como o Governador da Zambézia, Exc. Car-valho Muaria, começou a sua reacção à nossa questão introdutória acerca do desempenho e dos desenvolvimentos no sector florestal na província ao longo dos últimos 4 anos. Ele e o Director Provincial da Agricultura (DPA) Engh. Mohamad Vala, continuaram a explicar como é que se ti-nham estabelecido 3 novos pontos de fiscalização florestais, em locais estratégicos na província e como havia mais planeados, uma empresa internacional tinha reabilitado e assumido a gestão do porto, assim a exportação da madeira estava muito melhor controlada, as comunidades tinha começado a receber os 20% das taxas das licenças tal como requerido pela Lei 1999, o número de licenças simples anuais estava a diminuir e, em seu lugar, o número de concessões para 50-anos estava a aumentar2. O licenciamento está agora bem dentro do corte anual autorizado estabele-cido pelo inventário da Zambézia, e agora todas as 7 principais espécies comerciais têm que ser processadas no país antes de serem exportadas, resultando numa capacidade industrial e numa criação de empregos muito maiores. Os viveiros para espécies nativas estavam a funcionar e os Serviços Provinciais das Florestas e Fauna Bravia da Zambézia (SPFFBZ) e a DPA tinham boas relações de trabalho com a sociedade civil. Ele esperava que o nosso relatório fosse positivo.

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1 Era mais justo dizer “pronto a levar para a China” – enfatizando o destino em vez dos actores. Nem todos os comerciantes são actualmente Chineses, também há Indianos, Malaios, Singapurenses, Taiwaneses, Euro-peus e há algumas multinacionais envolvidas – tal como a OLAM. Tal como com outros segmentos da eco-nomia, a indústria de processamento da madeira na China inclui muitos investidores estrangeiros que estão a manufacturar na China para abastecer o mercado estrangeiro.

2 A Lei de Florestas e Fauna Bravia Moçambicana de 1999, permite dois “regimes” de colheita florestal, as licen-ças simples e as concessões. As licenças simples são válidas para um ano, para um máximo de 500m3 numa área específica de cerca de 5000 ha, e só os nacionais moçambicanos é que são elegíveis para as mesmas. Os pedidos devem ser efectuados em Janeiro de cada ano, e o processo de aprovação inclui a demonstra-ção duma capacidade técnica do operador elegível. As concessões são válidas para 50 anos e devem ser suficientemente vastas para suportar uma indústria. São elegíveis os indivíduos e as empresas internacionais. Os pedidos podem ser iniciados em qualquer altura. O processo de aprovação deveria demorar cerca de 9 meses (embora demore normalmente 2-5 anos), e envolve vários passos, os quais incluem a aprovação preli-minar a nível provincial, a preparação dum inventário florestal e um plano de gestão que estabelece uma cota de colheita anual e a sua aprovação pela DNTF, e culmina num contrato oficial entre o operador e os SPFFB e o estabelecimento duma indústria. A política do governo é acabar gradualmente com as licenças simples e operar apenas com base nas concessões.

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A julgar pela aparência, estas eram palavras encorajadoras. De facto, os pontos levantados res-ponderam a algumas das principais preocupações e recomendações do relatório “O Take-Away Chinês”, e pareciam de ajudar a explicar porque é que muitos oficiais do governo tinham rejeitado o relatório, como “desactualizado”, no seu lançamento em Moçambique em inícios de 2007.

Como dar sentido a pontos de vista tão dramaticamente opostos? Este documento pretende explorar os factos por detrás de ambos os grupos de respostas, e outros desenvolvimentos no sec-tor florestal entre 2004 e 2008. Tal como o “Pronto-a-levar Chinês”, este relatório mantém-se tão objectivo quanto possível: não há vantagem na crítica só por si, mas há sim muitas desvantagens se esta levar ao abandono de iniciativas positivas. Também queremos ser práticos e realistas, e não deixar que “o melhor se torne o inimigo do bom”.

Para manter este relatório breve, pegamos simplesmente em cada uma das 8 principais afir-mações feitas pelo Governador e pelo Director Provincial da Agricultura (DPA) respeitantes ao progresso na governação do sector florestal, analisamos a situação em 2004, e examinamos os factos subjacentes à situação encontrada em 2008. Terminamos com algumas conclusões e reco-mendações3.

MétodosO trabalho de campo na Zambézia decorreu desde 28 de Abril até 27 de Maio de 2008. Também se inclui alguma informação adicional obtida em Abril de 2009, e há um relatório separado disponível sobre o impacto da crise global financeira no sector florestal na Zambézia (Mackenzie 2009). Tal como em 2004, os principais métodos empregados foram análises de dados secundários, a maior parte deles provenientes de fontes governamentais, análises de entrevistas a informadores funda-mentais, visitas de campo a comunidades florestais e observação directa. Embora em 2004 algumas pessoas tenham sido apanhadas desprevenidas e tenham sido bastante francas connosco, desta vez muitos dos informadores fundamentais foram mais cautelosos, e muitas pessoas recusaram ou evi-taram encontrar-se connosco. Tal como se descreve abaixo, tivemos uma fraca cooperação do Di-rector Provincial da Agricultura e dos SPFFB Zambézia, mas as Alfândegas e a Corneldes (a empresa privada que está a gerir o porto) foram bastante francos e de grande auxílio.

Para este relatório de actualização, tivemos a fascinante oportunidade de seguir a madeira moçambicana para os mercados e fábricas de produtos florestais da China, para ver ali algumas das realidades da indústria florestal incrivelmente bem sucedida e para explorar a viabilidade do processamento pelas concessões comunitárias na Zambézia. As observações dessa visita serão incorporados neste relatório desde que sejam relevantes, e haverá um relatório completo dispo-nível em separado.

3 Para aqueles que estiverem interessados, há uma versão integral de 60 páginas deste relatório, disponível, mas apenas em Inglês.

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2. Corte anual autorizado e volumes licenciados

Em 2004, o corte anual autorizado (AAC) para a Zambézia foi uma questão contenciosa e foi dis-cutida em detalhe no ““Um Take-Away Chinês!”. O inventário que estava em uso oficial nessa altu-ra era o inventário nacional de 1994 de Saket, que prescrevia um AAC para a Zambézia de 17,600 m3 para as sete espécies comerciais mais importantes. Apesar disto, tal como indica a Tabela 1, desde 2000-2004, os SPFFBZ licenciaram rotineiramente cerca de 65-239% acima do limite. Al-guns operadores industriais objectaram que isto já era colheita excessiva.

Um novo inventário provincial, efectuado em 2002-044, concluiu que Saket tinha sido uma sub-estimativa massiva, e recomendou a quadruplicação do AAC, para aquelas espécies, para 72,533 m3.5 Embora a Direcção Nacional de Florestas e Fauna Bravia (DNFFB) tenha admitido que houve problemas técnicos com os resultados, e tenha atrasado o seu lançamento oficial até 2005, os SPFFBZ começaram a utilizar os números em 2004 para justificar os seus elevados níveis de licenciamento. Argumentámos, então, que o novo AAC não era sustentável, e que dados os pro-blemas metodológicos, este devia ser sujeito a uma análise técnica independente.

Em 2008, o novo AAC foi firmemente estabelecido, conforme se ilustra mais adiante na Tabela 1. Contra estas estimativas extraordinariamente elevadas de colheita sustentável, a afirmação do Governador e do DPA, de que o licenciamento se mantivera dentro do AAC encontra-se, deste modo, ostensivamente correcta. Além disso, o licenciamento oficial reportado pelos SPFFBZ é, actualmente, substancialmente menos do que o novo AAC – normalmente por volta dos 35,000 m3/ano – que os SPFFBZ usam para reclamar que a sua abordagem à gestão é positivamente con-servadora. Além disso, de acordo com os relatórios anuais dos SPFFBZ, na maior parte dos anos, só 70-80% do volume licenciado é que é actualmente colhido.

Conclusão:

Os números do governo apoiam realmente as suas afirmações de que as florestas da Zambézia estão a ser geridas duma maneira sustentável, usando o critério do licenciamento como uma pro-porção do AAC. Os SPFFBZ licenciam consistentemente menos do que o volume anual de corte autorizado, estabelecido pelo último inventário. A questão é, devemos confiar no inventário e portanto no AAC, e acreditar nos números dos SPFFBZ? Os dados que se apresentam nas secções seguintes sugerem que não o devemos fazer.

4 Como parte do Projecto de Maneio Sustentável de Recursos Florestais apoiado pelos Finlandeses

5 No Apêndice 1 dão-se detalhes dos AAC, desagregando a quota por espécies e distrito. O que não se per-cebe imediatamente a partir dos números de AAC é que estes cobrem todos os tipos de florestas e toda a área provincial de floresta de 12 milhões ha. Só os tipos de florestas L1 e L2 é que são suficientemente densas para serem exploráveis comercialmente, e ali só se encontra 44% do volume comercial.

Tabela 1: Actual licenciamento e colheita na Zambézia; 2000-2007

Ano Licenciado** Colhido* Colhido como m3/ano m3/ano % do licenciado

2000 28,043 n/a

2001 32,822 26,622 81

2002 42,175 33,200 78

2003 31,744 25,395 79

2004 35,870 23,932 66

2005 35,900 25,084 69

2006 31,259 24,765 79

2007 36,693 14,533 40

Fonte: Relatórios anuais dos SPFFB * Cortado e removido da floresta ** Para as sete principais espécies comerciais

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3. Número de Operadores de Licença Simples

Em 2004, uma das mais sérias críticas feitas à governação florestal na Zambézia era que havia demasiados operadores a serem licenciados, e que apesar da política oficial do governo para pro-mover o regime de concessão e de anulação progressiva das licenças simples, os números de ope-radores de licenças simples aumentaram todos os anos desde 2000-20046.

Na campanha da colheita de 2003, havia 138 operadores de licença simples a cortarem madeira oficialmente na Zambézia, e mais 12 operadores industriais a colherem ao abrigo de licenças simples, enquanto esperavam a aprovação das suas concessões. Isto era de longe muito mais do que os SPFFB tinham capacidade para supervisionar, e foi em parte responsável pela situação caótica na província. As áreas de abate não foram devidamente inspeccionadas antes do licenciamento para assegurar que havia realmente madeira disponível, não houve um registo permanente da sua localização e, de facto, houve muito poucos esforços para garantir que os operadores só cortavam nas áreas para as quais eles tinham licença. Muitos operadores foram aprovados sem se ter consultado devidamente as comunidades locais. Os operadores obtiveram licenças para 200-300 m3, quando tinham capaci-dade para colherem 3000 m3. Os controlos eram tão frouxos, que a maior parte deles fez isto.

Em 2008, de acordo com o Governador e com o DPA, uma das mudanças mais significativas que ocorreu desde 2004, foi uma diminuição do número de operadores de licenças simples, e um con-sequente aumento do número de concessões. Esta alteração no equilíbrio entre os dois regimes de licenças, afirmaram, demonstra não só que se está a implementar a política do governo, como também que a gestão florestal está a mudar para uma base mais racional e sustentável.

O DPA e os SPFFBZ recusaram-nos o acesso aos dados sobre o licenciamento (por operador, es-pécies e distrito) que precisávamos, para avaliar exactamente as suas afirmações e, portanto, tive-mos que depender da informação disponível nos relatórios anuais dos SPFFBZ. Tal como em 2004, estes relatórios estão incompletos e a informação que neles se encontra é inconsistente de ano para ano. O resumo na Tabela 2 mostra que o número de operadores de licenças simples baixou dum má-

Tabela 2: Número de licenças simples e de concessões emitidas, e volumes licenciados na Zambézia, 2003-2007

2001 2002 20031 2004 2005 20063 2007

Número de licenças emitidas 276 336 706 863 115 101 113

Nr de operadores de LS licenciados 57 124 138 128 104 91 99

Nr de requerentes de concessões, a utilizarem licenças LS 20 16 n/a n/a n/a

Número de concessões licenciadas 2 2 11 10 14

Número Total de Operadores 160 146 112 101 113

Volume licenciado em LS 32,682 42,175 29,4772 n/a 20,983 23,1514 22,203

Volume médio por LS 186 215 254 224

% volume total para LS 92 65 74 61

Volume licenciado CF 2,267 11,340 8,1084 14,490

% volume total para CF 8 38 26 39

Volume médio por CF 1,134 1,030 811 1,035

Volume Total licenciado 32,682 42,175 31,744 35,870 32,323 31,259 36,693

Source: Relatórios Anuais dos SPFFB; 1 alguns números de Mackenzie (2006). 2 inclui 3721 m3 para requerentes de concessões a usarem licenças simples; 3 A partir de 2006, acabou a prática de emitir licenças múltiplas a um operador individual. 4 dados provenientes do relatório anual de 2006 da DNTF.

6 É preciso admitir que uma parte do aumento dos madeireiros de licenças simples deveu-se à tomada de medidas severas contra o corte de madeiras totalmente sem licença, que ocorreu em finais dos anos 90.

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ximo de 138 em 2003 para 91 em 2006, mas depois aumentou de novo para 99 em 2007. Os SPFFBZ só puderam estimar que deveria haver cerca de 100 em 2008. Isto representa uma redução total de 28%. A proporção de madeira licenciada para os possuidores de licenças simples, em oposição às concessões, também diminuiu de 92% para 61%. Mas será que isto demonstra uma mudança em direcção a uma gestão florestal mais sustentável, e um cumprimento da política do governo?

A primeira coisa a notar, tal como referido acima é que, embora tenha realmente havido uma redução de licenças simples entre 2003 e 2006, esta aumentou de novo nas duas campanhas seguintes. De modo semelhante, embora a proporção de madeira colhida pelos madeireiros de licenças simples tenha baixado de 93% para 65% entre 2003 e 2006, esta manteve-se persisten-temente elevada, em mais de 60% desde essa altura, apesar do aumento do número de conces-sões7. Assim, a implementação da política do governo chegou, pelo menos, a um impasse, e talvez reverteu-se mesmo.

Caixa 1: História dum Madeireiro de Licença Simples

Abilio está no negócio do corte da madeira desde 2005, a trabalhar na Zambézia e na vizinha Nampula, usando as suas próprias licenças simples, as licenças de outros e a comprar/vender madeira aos donos de licenças simples.

Antes de começar a cortar madeira, ele estava envolvido num negócio de hotel, em que dava formação ao pessoal em como servir os clientes, especialmente para o restaurante. Depois disso ele trabalhou como um controlador dum armazém de stocks e tornou-se comerciante. Primeiro começou a comprar carne no Malawi e a vendê-la para os talhos Moçambicanos e a comprar o milho Moçambicano e a vendê-lo para o Malawi. Em 2005 ele envolveu-se na madeira.

Ele começou a trabalhar com pau ferro, mondzo e muaga e depois juntou jambire, chanfuta e umbila, que vende para o mercado local na Beira.

Este ano ele vai comprar uma licença simples doutra pessoa. Ou ele vai concordar em organizar e fazer todo o trabalho e depois partilhar o lucro com o dono da licença ou ele vai pagar o dobro nas taxas da licença. Ele prefere a segunda opção.

Os lucros estão a diminuir. Em 2005, o custo do transporte era cerca de 15,000 MTN, a mão-de-obra era cerca de 5000 MTN e o lucro por cada carga de camião podia chegar a cerca de 10,000 MTN. Em 2006, os custos eram muito semelhantes, mas os preços melhores permitiram que os lucros mais elevados chegassem a 15,000 MTN por carga de camião. Em 2007, os custos aumentaram muito, especialmente para o transporte. O aluguer de tractores aumentou em 500mt por dia, e por causa da madeira estar distribuída tão escassamente, eles são indispensáveis. Os preços dos camiões aumentaram de 25,000 MTN para 35,000 MTN. Os preços da madeira, no en-tanto, mantiveram-se semelhantes ou baixaram, portanto os lucros desceram mesmo e, agora, é raro conseguir 10,000 MTN por carga de camião.

Muitos operadores não tiveram lucros, mas ele teve, porque ele carregou bem o camião… transportando 35-45 toros. Ele tem a sua própria motosserra e corta alguma da sua madeira, mas obteve a maior parte dos seus toros junto das comunidades. Pa-gou 100 MTN por cada toro e só ficou com os bons (em média 6-7 toros dum total de 10). Só os toros bons é que dão um bom lucro porque os Chineses descontam muito na medição. O espaço do camião também é caro, e é um desperdício carregar toros maus. Está-se a tornar muito difícil encontrar pau ferro de boa qualidade, e mondzo tornou-se rara… Ele agora está considerar outras espécies e o mercado nacional.

Ele cortou pau ferro no ano passado quando havia muita procura. No total, ele cortou uma carga dum camião de 11 toneladas e ganhou $300/tonelada a partir de Olam. Ele ganhou 20,000 MTN ($833) de lucro com essa carga de camião.

7 Em média, um dono duma concessão ainda só colhe cerca de 1000 m3 por ano – isto é exactamente o dobro do máximo a que os operadores de licenças simples têm legalmente direito, e quatro vezes o volume que está reportado que eles cortam.

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A questão fundamental, no entanto, é se o licenciamento oficial representa todos os madei-reiros que estão activos na Zambézia. De acordo com a maior parte dos informantes com quem falámos, houve uma explosão no licenciamento ilegal e houve corte de madeira totalmente sem licença. Em 2004, os compradores asiáticos seguraram os seus toros através da oferta de crédito aos operadores de licenças simples, para estes pagarem as suas licenças e custos operacionais. Mas dar crédito tornou-se demasiado arriscado. Houve demasiados operadores a venderem em paralelo, ou inteiramente em falta e, tal como se descreve abaixo em detalhe, em 2005, os com-pradores asiáticos começaram a adquirir as suas próprias concessões, e obtiveram licenças para eles próprios. Portanto, muitos dos antigos madeireiros de licenças simples tiveram que começar a adquirir licenças doutras maneiras (Veja Caixa 1).

Uma maneira popular de obter uma licença é comprá-la ilegalmente junto do pessoal dos SPFFBZ em Quelimane ou junto dos inspectores de campo. Aparentemente, este tipo de corrup-ção é agora comum, havendo muito mais pessoal não autorizado a emitir licenças ilegalmente, fal-sificando a assinatura do director dos SPFFBZ. Um observador gracejou dizendo que é muito mais provável que você encontre o pessoal das florestas na rua a fechar negócios com os madeireiros, do que no escritório a fazer os seus verdadeiros trabalhos.

Outra opção que parece ser mais prevalecente em 2008, era comprar guias de trânsito ou licenças inteiras a outro madeireiro. Em 2008, ouvimos frequentemente falar do comércio em licenças simples. Parte do fenómeno aparece ser que há muitas licenças simples que são conce-didas ano após ano a pessoas que não são verdadeiramente madeireiros. Elas são normalmente pessoas ligadas estreitamente ao governo e à FRELIMO, e simplesmente vendem as suas licenças com um lucro, efectivamente, ganhando dinheiro sem fazerem nada. Isto pôs em questão outra afirmação dos SPFFBZ feita em 2004 para demonstrar as suas sólidas práticas de gestão, de que tinham concedido licenças de acordo com os anos de experiência do madeireiro, dando maiores quotas àqueles madeireiros mais experientes.

Também houve um aumento de furtivos, os madeireiros totalmente sem licença. Alguns fur-tivos cortam e vendem eles próprios a madeira, mas há muitas comunidades que também estão envolvidas nisto. Os furtivos dão a volta às aldeias a comprar os toros directamente nas mesmas, e vendem-nos em vários pontos de recolha ou a operadores licenciados. Às vezes as comunidades cortam por encomenda dos furtivos, e outras vezes as comunidades cortam primeiro e depois vão à procura de um mercado. Um dono duma concessão reportou que um madeireiro da comunidade lhe ofereceu 100 m3 de pau preto no recente aumento de actividade (veja abaixo).

A regulamentação do corte de madeira de licença simples foi concebida para garantir algum nível de colheita sustentável, a competência do operador e o consentimento da comunidade. O licenciamento ilegal descrito acima ultrapassa todas estas verificações e equilíbrios e traz o caos às florestas da Zambézia.

Em 2004, outro grande problema que houve com os madeireiros de licença simples foi a co-lheita em excesso, e isto ainda está a acontecer, provavelmente num grau ainda maior. As ques-tões são basicamente as mesmas. Nenhum operador obtém um direito total de 500 m3 e a maior parte só obtém 200-300 m3. Esta quota pode ficar esgotada num par de semanas, mas a época dura 9 meses, e as equipas de corte de madeira (se é que existem) continuam a cortar. Às vezes, a madeira não licenciada fica abandonada na floresta, porque não há autorização (ou dinheiro) para o transporte, para a passar pelo ponto de fiscalização e até à cidade.

Conclusão:

De acordo com os números oficiais, é certamente verdade que o número de operadores de licen-ças simples diminuiu em 28% desde 2003, mas parece que isto tem sido acompanhado duma ex-plosão do número de licenças ilegais e de furtivos. Ainda continua a haver um corte excessivo por parte dos operadores licenciados. O impacto da medida que se pretende, de exercer um grande controlo sobre o sector, ainda é um objectivo muito distante.

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4. Aumento do número de concessões

Em 2004, só havia 2 concessões a operarem na Zambézia, a Madal e a Sociedade Móveis Licungo, e foi aprovado um terceiro plano de gestão, aquele da Timberworld em Pebane. O “Um Take-Away Chinês!” demonstrou que dois dos planos aprovados eram tecnicamente débeis e não iam garantir uma gestão sustentável. Nessa altura, havia outros 34 pedidos de concessões da parte de 20 empresas, que esta-vam no processo de aprovação. Havia muitos que tinham estado em processo durante vários anos e alguns que eram simplesmente estratagemas e que nunca foram seriamente considerados, mas que permitiram que os operadores obtivessem os direitos exclusivos de colheita sobre uma vasta área, para um período de alguns anos. Alguns operadores sérios queixaram-se que os seus pedidos tinham ficado atrasados devido aos custos para preparar os planos de gestão – tornados proibitivamente ele-vados pelo facto do governo limitar o número de consultores autorizados para os preparar.

Nesta altura, a maior parte dos Asiáticos em Quelimane estavam apenas a comprar madeira. Embora cerca de 15 empresas com ligações asiáticas tivessem pedidos de concessões, elas não tinham direito a licenças simples, portanto, em vez disso, elas financiaram as pessoas locais para obterem as suas licenças simples e equipamento, e compravam-lhes a madeira a eles.

Em 2008, o Governador e o DPA disseram-nos que o número de concessões tinha agora au-mentado. Embora os dados oficiais sobre as concessões sejam inconsistentes e se baseiem em definições duvidosas8, de acordo com a nossa análise destas e com os pedidos de concessões, ha-via 32 concessões aprovadas e contratadas, cobrindo mais de 1.2 milhões de hectares. De acordo com o Chefe Interino dos SPFFBZ, 21 destas concessões (com uma área total de 908,288 ha) esta-beleceram a indústria necessária e estão a operar oficialmente. Isto é cerca de 10 vezes mais do que em 2004, e um aumento de 70% em relação a 2007. A informação acerca destas concessões, extraída dos planos de gestão e dos arquivos dos SPFFBZ, encontra-se resumida no Apêndice 2.

Outras 16 concessões, cobrindo 611,545 ha, estão no processo de aprovação. Os requerentes incluem 2 concessões comunitárias (veja abaixo), um nacional moçambicano e 3 operadores in-dustriais locais zambezianos, 2 operadores de licenças simples estabelecidos há muito tempo, 1 do Malawi, 2 Líbios e 5 Chineses.

Uma das razões para este aumento de concessões, é sem dúvida o facto de o governo ter finalmente tido que reforçar o prazo para terminar os processos de candidatura, de forma a cumprir os indica-dores de desempenho estabelecidos pelos doadores para o PROAGRI II. Cerca de 2004, os operadores já tinham sido autorizados a prorrogar aquele processo de candidatura que é suposto durar 9 meses, para até 3 anos. Na sequência de vários protestos por parte dos doadores e de promessas por parte do governo, houve 13 planos produzidos e aprovados num único lote no início de 2005 e mais 10 em finais de 2006. O projecto florestal financiado pelos Finlandeses na Zambézia também disponibilizou um conselheiro técnico para dar assistência a analisar os planos ao nível provincial, o que ajudou a fazer avançar o processo. Outra razão é que o preço para preparar os planos de gestão baixou de cerca de $1/ha para cerca de $0.30/ha. Surpreendentemente, isto aconteceu sem que o governo aumentas-se significativamente o número de consultores autorizados a prepararem os planos.

Portanto, o número de concessões aumentou de facto, tal como o reportou o Governador e o DPA. Mas, tal como com a diminuição das licenças simples, a questão importante a perguntar é se estas mudanças do licenciamento trouxeram as melhorias que se reclamavam à gestão e à

8 Uma característica perturbadora das estatísticas oficiais sobre as concessões, é como são inconsistentes entre os anos e entre as agências. Os relatórios anuais, tanto da DNTF como dos SPFFBZ, ofuscam mais a situação do que a clarificam. Os termos usados são “concessão aprovada”, “planos de gestão aprovados”, mas não “contratado” e “concessões a funcionarem”. Nenhuma agência declara actualmente quantas con-cessões estão a operar activamente, nem reporta as espécies e os volumes licenciados a cada uma delas.

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governação das florestas, e o desenvolvimento industrial pretendido. Para comprovar, a próxima secção examina a situação das concessões, a situação de todo o património florestal na Zambézia, a qualidade dos planos de gestão de concessões e a implementação dos mesmos, incluindo a ques-tão de replantar após a colheita.

4.1 Situação das concessõesDas 32 concessões aprovadas e contratadas, 11 ainda não estabeleceram as indústrias necessá-rias para iniciar as operações. Estas incluem três empresas influentes, a Green Crown, a Timber World e a OLAM, algumas das quais parecem ter começado a cortar madeira nas suas concessões de qualquer maneira.

O grupo Green Crown inclui 7 destas concessões não-operacionais, e são todas empreendi-mentos conjuntos entre o homem de negócios de Singapura de descendência China, Cheng Kee Meng, e pessoas estreitamente ligadas ao Governo e à FRELIMO. Juntos, eles cobrem alguma da melhor floresta remanescente na província (veja Mackenzie 2006:). O conceito original para a Green Crown foi preparado e os pedidos da concessão foram feitos em 2002. Os planos de gestão para estas concessões foram aprovados entre Agosto de 2003 e Outubro de 2006, e os contratos foram assinados entre Março de 2005 e Dezembro de 2006. O processo foi prorrogado por 6 anos para garantir que os parceiros mantinham o controlo destas valiosas florestas, enquanto interme-diavam junto do governo e esperavam a reparação e a reabertura duma ponte estratégica perto de Mocuba, que iria tornar as florestas facilmente (e duma maneira barata) acessíveis.

Cheng Kee Meng também controla duas concessões ao abrigo da empresa Timberworld. A Timberworld ainda não estabeleceu a sua indústria (relatório anual de 2007 dos SPFFBZ), no entanto os SPFFBZ admitiram que a Timberworld estava a cortar madeira na sua concessão em 2007 (Chibite, comunicação pessoal).

A OLAM Moçambique, que faz parte da empresa multinacional de mercadorias agrícolas de Singapura9, tem duas concessões que cobrem 65,000 ha, estando também as situações destas pouco claras. Os planos de gestão para ambas, foram aprovados em 2004 e os contratos foram assinados em 2005 mas, 3 anos depois, ainda não estão oficialmente operacionais. No entanto, o Director da OLAM Zambézia disse-nos que eles operavam como concessionários bem como co-merciantes de madeira na província, vendendo para o mercado chinês. Sabe-se bem que a OLAM não tem instalações de processamento – assim, qualquer operação de concessão seria ilegal. Os SPFFBZ, no entanto, disseram-nos que as concessões deles não estavam operacionais, e recusa-ram dizer-nos se eles têm estado a cortar madeira na concessão deles ou não, ou qual o tamanho da sua quota. Visto que a OLAM é uma empresa internacional, eles não teriam direito a uma quota de licença simples (Lei 10/99 de 7 de Julho). Em Maio de 2008, o parque de toros deles em Que-limane estava completamente cheio com madeira estimada em 10,000 m3, havendo rumores de que 90% desta madeira é ilegal.

Tal como mencionado acima, o Director Provincial da OLAM Moçambique disse-nos que eles tinham dúvidas que a madeira na Zambézia durasse mais cinco anos, e achava que o investimento numa serração não era, provavelmente, compensador.

4.2 Propriedade das concessõesOs operadores de licenças simples ainda se queixam que “todas as concessões são dadas aos Asi-áticos, e as pessoas locais não conseguem participar”, e que “Tudo o que podemos fazer é pedir

9 OLAM works in 56 countries round the world and has offices in Shanghai and Guangzhou to distribute its tim-ber to the Chinese markets. OLAM also has well-developed Corporate Social and Environmental Respsonsi-bility statements: see: http://www.olamonline.com/home/home.asp

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10 Official figures previously reported the-se concessions to total 188,938 ha.

Fotografia 1: Controlo espacial de corte da madeira, pelos SPFFBZ em 2009.

concessões, e cortar madeira durante alguns anos, não temos dinheiro para pagar a preparação dos planos de gestão e para conseguirmos aprovar os nossos pedidos”, mas os nossos dados sugerem outra história. As 32 concessões com planos aprovados pertencem a 25 operadores diferentes. Tal como mostra a Tabela 4, os Moçambicanos constituem o maior grupo, com 9 ope-radores a controlarem 11 concessões e a maior área total (474,731 ha) – e ainda mais 176,800 ha em 7 empreendimentos conjuntos com os Asiáticos. Os Asiáticos têm o controlo exclusivo de 8 concessões, cobrindo quase 300,000 ha, e se incluirmos os 7 empreendimentos conjuntos, a área totaliza 471,134 ha. Uma única pessoa, o homem de negócios de Singapura de descendência chinesa Cheng Kee Meng tem interesses em 10 das concessões, cobrindo um total de 258,000 ha e incluindo a maior parte das melhores florestas na província.

Tabela 3: Origem nacional dos donos das concessões (com planos de gestão aprovados) na Zambézia

Moçambicanos Asiáticos Empreendimento Americanos Europeus TOTAL Conjunto Asiáticos- Moçambicanos

Operadores 9 5 7 1 3 25

Concessões 11 8 7 1 5 32

Área (ha) 474,731 294,334 176,80010 21,278 235,432 1,202,575

Área de concessão média (ha) 43,157 36,791 25,257 21,278 47,086

4.3 Qualidade dos Planos de Gestão de Concessões

Em 2004, os planos de gestão da Timberworld e da Madal foram analisados com algum detalhe, e fortemente criticados por falharem ambos no cumprimento da lei e na promoção duma gestão sólida. Nomeadamente, os planos propunham despojar as florestas das madeiras comerciais valiosas dentro do período dos primeiros 5 - 10 anos. Apesar disto, os planos foram aprovados.

Em 2008, foram examinados mais de 20 pla-nos de gestão de concessões. Apesar da publica-ção dum novo manual de gestão de concessões em 2005, e da experiência institucional signifi-cativamente maior dos SPFFB, não se encontrou nenhum melhoramento. A maior parte dos pla-nos (62%) foram preparados pelo Dr. J. Bunster da TraForest, um engenheiro florestal chileno que trabalhou em Moçambique durante várias décadas e que preparou o plano de gestão da Timberworld em 2002. Os seus planos agora se-guem um formato muito padronizado, e embora esta padronização não constitua em si um pro-blema, e possa mesmo simplificar a aprovação e a monitorização de concessões, as prescrições

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de gestão técnica também são infelizmente todas padronizadas. Portanto, embora os cientistas florestais tenham concordado que o ciclo de corte de Madeira na Zambézia devia ser de, pelo menos, 30 anos, todos os planos de gestão se baseiam numa rotação de 20-anos, e há muitos que propõem retirar toda a madeira actualmente valiosa nos primeiros 5-10 anos. Quando interro-gado acerca disto, o Dr. Bunster admitiu que o ciclo de corte era curto demais. Ele explicou que caso se utilizasse a rotação apropriada, o lucro seria baixo demais para o negócio em questão. Acrescentou que o anterior chefe da DNTF, Arlido Cuco, tinha concordado com esta rotação mais curta. Logo que se estabeleceu este precedente, todas as outras concessões o seguiram. Quando se lhe perguntou porque é que não se tinham feito simplesmente concessões maiores, ele respondeu que concessões maiores eram dispendiosas para estabelecer (especialmente o custo dos planos de gestão), difíceis de controlar, e os investidores não as queriam. Assim, resumindo, a sustenta-bilidade das florestas está a ser sacrificada pela conveniência comercial e pelo lucro.

4.4 Qualidade da Gestão das Concessões Em 2004, a principal concessão que se encontrava sob gestão era a operação de 94,000 ha da Ma-dal. Embora houvesse alguns problemas esta era, pelo menos, uma operação centralizada, tendo a Madal a organizar a mão-de-obra e o equipamento.

Em 2008, a maior parte das concessões estão elas próprias no caos. Muitos Asiáticos, que em 2004 eram compradores de madeira e que eram obrigados a trabalhar através de operadores de licenças simples para obterem a sua madeira, tornaram-se agora donos de concessões, e têm di-reito a licenças de madeira valendo milhares de metros cúbicos por ano. Mas parece que a maior parte deles não supervisionam as operações nas suas concessões. Eles simplesmente fornecem licenças aos madeireiros em quem eles confiam, ou vendem as licenças (por cerca de $10 mais do que o pagamento oficial) e depois compram a madeira de volta. Ninguém sabe quantos operado-res existem, quem tem direito a cortar que quantidade e de onde. Tal conforme descrito acima, os furtivos trabalham muitas das concessões. Os aldeões também cortam para os furtivos, ganhando 100 MTN por toro, independentemente da espécie se vender por $120 ou por $450. Realmente, as concessões estão-se a tornar numa maneira de subcontratar informalmente os donos de licenças simples, e tem havido uma total falta de transparência e de responsabilização no processo. Exis-tem demasiados actores e nenhum controlo. Aquele que era em 2004 o mal-estar das áreas de licenças simples disseminou-se agora para as concessões.

Caixa 2: A gerir uma concessão

A minha concessão é difícil de proteger. Por um lado, há a invasão agrícola e, por outro lado, há o roubo furtivo de madeira. Um dos ladrões furtivos é um dos meus próprios trabalhadores!

Os aldeões locais abatem as árvores, e cortam os toros em tábuas. Assim que hou-ver uma carga de camião, chega alguém. A madeira vai provavelmente para os mer-cados legais. Os chineses só levam os toros. E levam tudo, de qualquer qualidade. Es-traga o mercado. Em Pemba, os comerciantes sulafricanos só levam o material bom.

Os pagamentos (subornos) são prática comum. No ponto de fiscalização de Ni-coadala você tem que pagar qualquer coisa para poder passar. Cria boa vontade, e faz parte da vida em comum. Nas Alfândegas, você pode querer pagar 500 MTN ($20) para acelerar o processo.

Os Chineses não pagam nenhuns impostos nem segurança social – é impossível competir com eles. Nós pagamos impostos sobre tudo – nem podemos descontar ou legalizar as despesas do negócio contra o nosso lucro bruto porque, lá na floresta, metade dos serviços provêm do sector informal.

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Parece haver só 4 concessões que estão a operar de acordo com o regime pretendido, que é cortar a madeira com a sua própria mão-de-obra, processá-la numa serração apropriada, e exportar a madeira serrada ou os produtos manufacturados – criando empregos e valor acrescentado. Estas são as empresas muito antigas na Zambézia: Madal, MAZA, DANMO TTC e a Sociedade Móveis Licungo. Além destas, há algumas concessões e as suas serrações associadas que estão a fornecer madeira processada e mobiliário simples para o mercado local.

Mesmo nestas concessões que são “geridas”, ainda não se cumpre o básico da boa gestão. Os SPFFBZ não exigem e os operadores não trabalham com base em cortes anuais planeados. Mesmo os melhores parecem depender de observadores para lhes dizerem aonde cortar cada ano. Assim, tal como em 2004, não há um controlo espacial da madeira que está a ser colhida. O resultado, tal como mencionado acima, é que, apesar de haver madeira que fica na Zambézia, ninguém sabe realmente aonde é que ela está. Alguns operadores acreditam que é cada vez mais provável que esta esteja demasiado dispersa para explorar comercialmente.

Quais são as medidas que o governo toma para lidar com os problemas e para promover uma gestão de concessões sólida? A única acção de que ouvimos falar foi um grupo de trabalho con-junto a preparar-se para visitar todas as concessões durante Junho de 2008 – para assegurar que tinham instalado as suas tabuletas de identificação. Em vez disso, tal como demonstra a Caixa 2, o governo torna as coisas cada vez mais difíceis aos poucos operadores legítimos (veja Caixa 2).

Quando interrogado acerca da gestão das concessões, o Director da DNTF, Raimundo Cos-sa, admitiu-nos que havia muitos problemas com o sistema de concessões, nomeadamente com aquelas contratadas aos operadores asiáticos. Ele disse que, através dum novo projecto finlan-dês, eles iam estabelecer um sistema de leilão para qualquer concessão com mais de 30,000 ha, através dum novo inventário detalhado em cada província para identificar os grupos de florestas naturais apropriados para gestão.

4.5 Reflorestamento O reflorestamento é uma grande questão no sector, mas é-o basicamente pelos motivos errados. Os operadores pagam 15% de direitos adicionais para este efeito, mas os SPFFBZ não fazem qua-se nenhuma replantação e certamente nenhuma nas actuais concessões.

Em 2008, o Governador e o DPA mencionaram os viveiros operacionais de espécies nativas como um indicador de melhoramento na gestão das florestas. A Tabela 4 apresenta dados sobre a produção de mudas e a reflorestação para os últimos 8 anos. Isto mostra como a atenção dada ao reflorestamento foi balançada ao longo dos anos – com o melhor desempenho em 2000, quando a ONG Italiana Nuovo Mundo estava a dirigir projectos de viveiros baseados na comunidade. Além disso, a maior parte da reflorestação foi de casuarinas ao longo da praia em Zalala. A quantidade de mudas de espécies nativas produzidas foi de apenas 110 em 2006 e 400 em 2007. Isto é in-significante. A um espaçamento de 4mx4m, são precisas 650 mudas para replantar um simples hectare! As concessões ainda não estão a ser replantadas (ou geridas para promover uma regene-ração natural), portanto, o actual património comercial florestal permanece por gerir de qualquer maneira significativa.

Os operadores de concessões estão a pedir que se desista dos 15%, e que eles deviam usar o dinheiro poupado para fazerem a sua própria replantação. Para as áreas de licenças simples, o di-nheiro podia ser usado para financiar as comunidades para criarem viveiros e fazerem o plantio.

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4.6 O Património Florestal Permanente “Agora toda a Zambézia são concessões!” O Mapa 2 mostra porque é que as pessoas pensam isto. No entanto, ainda não se pensou num património florestal permanente para a Zambézia, baseado no planeamento sólido e participativo do uso da terra, e muito menos delimitado formalmente. Ainda só há esforços superficiais para controlar a agricultura itinerante e a produção de carvão vegetal. O único controlo especial das concessões é dado pelos limites desenhados à mão num mapa topográfico nos SPFFBZ (veja figura 2), apesar de haver disponibilidade de facilidades de sistemas de informação geográfica (GIS) nos escritórios dos Serviços Provinciais de Geografia e Cadastro. Ainda não há nenhum registo acumulado, referenciado geograficamente, das espécies e dos volumes cortados. Ninguém sabe quanta madeira ainda há, ou aonde é que ela está.

4.7 Concessões ComunitáriasDesde 2004, temos estado a discutir pelos direitos das comunidades para gerirem as suas próprias florestas, como a base para promover o desenvolvimento rural e a criação de verdadeiros empre-gos. Visto que a Lei das Terras não dá às comunidades direitos director à madeira nas suas próprias terras, eles precisam de apoio para adquirir as suas próprias concessões comerciais através dos canais oficiais. A ORAM tem estado a trabalhar com duas comunidades, Muzo (em Maganja da Cos-ta) e Nipiodes (em Mocuba) desde 2005. Os seus pedidos têm estado à espera de aprovação desde o início de 2008. O pedido de Muzo está bloqueado ao nível Distrital por uma questão técnica, e o pedido de Nipiodes, embora supostamente apoiado pelo Governador, ainda não passou por ele.

Conclusão:

Há dez vezes mais concessões do que havia dantes, mas a gestão florestal na verdade só tem piorado. Entretanto, as rotatividades curtas e o corte excessivo, estão agora institucionalizadas através da aprovação de 32 planos de gestão tecnicamente pouco sólidos. Estava previsto que as concessões trouxessem algum grau de controlo às operações de colheita, o qual não era possí-vel debaixo dum regime de licença simples, mas as concessões agora são demasiado geridas por pequenos operadores, que trabalham com licenças de concessionários, ou com outras licenças, ou sem licenças nenhumas. Os SPFFBZ só fazem gestos simbólicos ineficazes para controlarem as concessões. Os concessionários estão autorizados a cortar antes de estabelecerem as suas in-dústrias. As únicas concessões que abordam a intenção de ligar a gestão da floresta com a indus-trialização e com a criação de emprego, são as antigas empresas moçambicanas, que têm estado a operar há mais de uma década. Nenhum do novo investimento internacional tão apregoado resultou em algo de valor! Nem os concessionários nem o governo fazem qualquer replantio. Nos seus esforços para se desenvolverem a elas próprias através da gestão da floresta, as comunida-des continuam a ficar frustradas e traídas pelo seu próprio governo.

Tabela 4: Esforços de reflorestamento do governo: vivei-ros, mudas e áreas florestadas, 2000-2007.

Ano No de Viveiros No de mudas Área reflorestada (ha)

2000 2 + 31 450,000 190

2001 2 35,000 30

2002 2 64,000 20

2003 3 55,000 Not reported

2004 6 325,000 Not reported

2005 4 130,800 9

2006 4 33,400 6

2007 4 319,200 58

Fonte: Relatórios anuais dos SPFFB

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5. Aplicação da Lei das Florestas (Fiscalização)

Em 2004, a aplicação da lei das florestas era ineficaz e facilmente corruptível, mas tinha reconhe-cidamente melhorado consideravelmente desde os dias totalmente sem lei dos finais dos anos 90. Os sistemas computorizados estavam a funcionar para permitir a monitorização e o controlo do licenciamento e da colheita e a aplicação da lei, se tivesse havido vontade política e profissional. Aqui residem os problemas. Muitos funcionários públicos, políticos, apoiantes do partido e mes-mo militares, estavam ilegalmente envolvidos no corte de madeira e, juntamente com os compra-dores asiáticos e com os serviços florestais, constituíam uma máfia da madeira, que ultrapassava o sistema de controlo e a indústria local, despojando a floresta da madeira valiosa e exportando toros em bruto para os mercados ávidos da China.

Em 2008, o Governador e o DPA asseveraram que a aplicação tinha melhorado imenso, men-cionando particularmente o aumento do número de pontos de fiscalização e as relações melho-radas entre as comunidades e os funcionários florestais. O Director Interino dos SPFFBZ também reportou que ele não tinha conhecimento de nenhuma corrupção no seio do seu pessoal – embora na teoria, ele tenha aceitado que esta pudesse existir.

Olhamos primeiro para os pontos levantados pelo Governador e pelo DPA, e depois para ou-tros aspectos fundamentais da aplicação da lei das florestas, que eles não mencionaram.

5.1 Pontos de fiscalizaçãoÉ verdade que o número de pontos de fiscalização aumentou. Em 2004 havia três: Nicoadala, Por-to de Quelimane e Chimuara-Mopeia na travessia do Rio Zambeze.

Em 2008, estabeleceram-se mais dois postos de inspecção na Lua Lua em Mopeia, e em Na-macurra. Além disso, o ponto de fiscalização de Nicoadala foi totalmente renovado. Os telefones portáteis facilitaram enormemente a comunicação entre os inspectores no campo e as sedes, e entre os próprios funcionários florestais.

No entanto, aquilo que não se mencionou, foi que um dos mais importantes pontos de fiscali-zação, aquele no Porto de Quelimane, estava seriamente degradado. Quando o porto foi renova-do em 2005, o ponto de fiscalização dos SPFFBZ que ali havia foi demolido e ainda tem que ser reconstruído. Aonde dantes as instalações incluíam um par de salas com ar condicionado e ter-minais de computador, o ponto de fiscalização deles consiste agora de uma mesa debaixo duma árvore ao lado do portão principal. A reconstrução do ponto de fiscalização é da responsabilidade do DPA, e “há-de se fazer” (Chibite, comunicação pessoal)11.

Enquanto o número de pontos de fiscalização aumentou, o número de funcionários parece ter diminuído. A Tabela 5 apresenta dados disponíveis para 2001-2007. Depois dos escândalos dos finais dos anos 90, os números de pessoal aumentaram de 6 para 31, e durante o período do pro-jecto MSRN financiado pelos Finlandeses (2001-04), os números aumentaram para um máximo de 34, porque os doadores estavam interessados, e assim isto foi o que se reportou. Mas, desde 2004, os reportes sobre os números de pessoal, pararam. De acordo com o Chefe Interino, há ago-ra 28 funcionários nos SPFFBZ12.

11 De acordo com Cornelder, foi de facto uma responsabilidade deles (da Cornelder) fornecer esta acomodação e, em Junho de 2008, disponibilizaram uma sala aos SPFFBZ. Contém uma secretária e duas cadeiras, mas nenhum computador. É cobrada uma renda modesta, mas inclui todos os serviços públicos.

12 No início de 2009, o DPA propôs aumentar o número para 106. Os operadores industriais queixaram-se que não era tanto o número de inspectores, mas sim a sua formação, profissionalismo e honestidade, é que eram importantes!

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Em nenhum caso, se compara o número de pontos de fiscalização com a aplicação da lei e, com base no desempenho anterior, novos pontos de fiscalização vão resultar simplesmente em novas formas de procurar um rendimento. Por exemplo, apesar dos novos postos de fiscalização e da comunicação melhorada, há muito umbila, chanfuta e jambire ilegal que está a sair da provín-cia em direcção ao sul, pelo Rio Zambeze, para os mercados locais na Beira. As regulamentações foram mesmo aliviadas para acomodar isto. No passado, para movimentar a madeira entre as províncias, tinha que se apresentar a autorização de transporte local, e tinha que se obter uma autorização especial de trânsito. Agora, a autorização local é suficiente.

5.2 Cooperação com as comunidades locais Os SPFFBZ e o DPA reportaram uma boa cooperação entre as comunidades e os funcionários florestais; as comunidades informam as autoridades acerca das infracções, e os funcionários flo-restais respondem rapidamente. Tanto os funcionários como as comunidades deviam partilhar os valores obtidos com as multas. No entanto, quando pressionados, os SPFFBZ só puderam citar um único caso em que isto acontecera, em Muzo. A falta de casos, disseram eles, era uma indicação de quão boa era a aplicação da lei.

A comunidade em Muzo tem um relato interessante deste caso. Eles estavam particularmen-te concentrados na aplicação da lei das florestas, porque eles tinham um pedido para uma con-cessão comunitária e assim tinham um bem económico a proteger. Os membros da comunidade encontraram 2 madeireiros asiáticos com um camião carregado de pau ferro na sua floresta. Eles chamaram o funcionário florestal local e chegou alguém que levou os documentos do camião. O funcionário disse-lhes depois que os transgressores tinham pago uma multa. Quando a comuni-dade perguntou pelos seus 20% do valor da multa, disseram-lhes que tinham ido para o governo. Num segundo caso, eles encontraram serradores de motosserras a trabalharem na sua concessão proposta. Eles confiscaram a serra, mas constatou-se que esta pertencia ao Director Distrital da Agricultura (DDA) de Mocuba. O funcionário florestal veio e levou-a e eles não souberam de mais nada. O mesmo DDA também foi apanhado a caçar cudo. A comunidade escreveu a perguntar acerca do resultado destes três casos. A única resposta foi do DDA, acerca da caça, explicando que eles estavam a “controlar a população”.

5.3 Base de dados computorizada dos SPFFBZ O manuseamento de dados é fundamental para uma aplicação eficaz da regulamentação e da lei. Em 2003 e 2004, criou-se uma base de dados computorizada de cada quota dos operadores, de todas as suas licenças de corte, das autorizações de transporte e dos volumes transportados para a cidade através do ponto de fiscalização de Nicoadala13. Criou-se outra base de dados sobre as infracções. O Chefe Interino dos SPFFBZ disse-nos que o sistema ficou com problemas em 2005 e desde aí deixou de ser usado.

Em 2008, o pessoal dos SPFFBZ estava a experimentar um novo sistema computorizado mas, por enquanto, disseram-nos que só tinham os registos em papel e não nos davam o acesso a estes. O novo sistema era, de facto, impressionante14, permitindo que se produzissem perfis de opera-dores individuais, bem como resumos de quotas e de licenças15.

13 Nessa altura as licenças eram emitidas para cada espécie, e os operadores podiam pagar as licenças de corte em fases, até terem atingido toda a sua quota.

14 Interessantemente, a demonstração dada, utilizou os dados de um dos operadores industriais. Embora estas empresas sejam aquelas que fazem actualmente o maior investimento no sector e que contribuem mais para o emprego e para a economia provincial, elas são aquelas que são mais rigorosamente controladas pelos SPFFB.

15 De acordo com os SPFFBZ, está agora pronto a ser usado na campanha de 2009, mas com a crise econó-mica, ninguém está a comprar licenças.

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Embora os sistemas computorizados estejam sujeitos ao abuso, e em 2004 tenha havido evi-dências claras deste abuso, eles ao menos oferecem a possibilidade dum bom controlo. O controlo pode-se reforçar fazendo a ligação da base de dados a um sistema para imprimir as licenças, assim os dados de cada licença emitida ficam automaticamente registados na base de dados.

5.4 Infracções: Contas oficiaisNão nos autorizaram o acesso aos registos dos SPFFBZ relativos às infracções – a única informa-ção disponível provinha dos relatórios anuais, resumidos na Tabela 5, e duma entrevista com o Chefe Interino dos SPFFBZ, Engº. Chibite, resumida na Caixa 3.

Tabela 5: Aplicação da lei das florestas na Zambézia: Número de funcionários, infracções, produtos confiscados e total de multas, 2001-2007

Year No dos funcionários No das Infracções Produtos confiscados Total de multas (MTN)

2000 6 37 Toros 88,177

2001 31 96 Não reportado 315,451

2002 31 220 Não reportado 1,807,041

2003 34 Não reportado Não reportado 795.828

2004 Não reportado 267 1,116,842

2005 Não reportado 300 1182 m3 de Toros 3,955,352 8 m3 de madeira serrada

2006 Não reportado 169 1.898.471

2007 Não reportado 177 143 m3 de Toros 1.245.081 (28) 63 m3 sawn timber

Fonte: Relatórios anuais dos SPFFBZ

O ano 2000 representou um ponto de viragem. Embora o total das multas tenha sido relativamen-te baixo, apenas 88,177 MTN, estas representaram um aumento de 96% em relação 1999 – o cume do caos. Em 2005, as transgressões detectadas elevaram-se a um máximo de 300, consistindo em: 1% de corte durante a época chuvosa, 9% de corte fora da área designada, 15% autorização de transporte completada incorrectamente, 5% de corte sem licença e 70% de corte e transporte em 10 % de excesso do que o volume autorizado. A última infracção é reportada consistentemente como a mais frequente, mas não se faz nenhuma análise especial e nunca se propôs nenhuma estratégia em particular para lidar com isto.

Em 2003 e 2004, os SPFFBZ reportaram que, em resposta a uma “avalanche de transgressões”, o DPA tinha unido forças com a polícia provincial e com as associações profissionais para for-mar uma Comissão da Madeira e criaram equipas conjuntas móveis de fiscalização, constituídas por funcionários florestais e polícia (relatório anual de 2004 dos SPFFBZ). Nunca foram dados nenhuns detalhes das actividades desta equipa, e nunca mais é mencionada em relatórios subse-quentes16.

Interessantemente, não há nenhuns relatórios de detenções, julgamentos e condenações. Pa-rece que, na maior parte dos casos, as pessoas são simplesmente multadas, para transgredirem de novo. Mas um informante comentou:

16 A experiência em Cabo Delgado (“Levantamento preliminar da problematica das florestas de Cabo Delgado - Daniel Ribeiro“) mostra que as equipas de fiscalização multi-sectorial podem ser eficazes. Em 2007, fun-cionários das alfândegas, da DPA, da polícia e dos sindicatos, com observadores de ONGs, efectuaram um dia de incursões em serrações, pátios de toros e empresas exportadoras, encontrando imensos toros ilegais e trabalhadores chineses ilegais. Infelizamente, sob pressão política de Maputo, a equipa foi dispersada e as multas foram anuladas.

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“há sempre alguns casos em cada ano, as pessoas a serem detidas e punidas. Se você está bem relacionado e alguém age ilegalmente para ferir os seus interesses, as autoridades vão agir. É uma situação de ganho-ganho: boa para as estatísticas e boa para as relações. Se você não estiver bem relacionado, não espere resultados. Você pode ter uma resposta dos SPFFBZ, mas normalmente, é demasiado pequena e de-masiado tarde. Visto que uma pessoa tem que pagar as despesas para a inspecção deles do campo, é do interesse dos funcionários ir, mas se chegar suficientemente atrasado para garantir que as provas desapareceram, não precisa de perturbar o sis-tema. Também é ganho-ganho. Bom para as estatísticas e não provoca danos nas relações fundamentais.”

Os dados sobre as infracções são, na realidade, um fraco indicador da qualidade da aplicação da lei, para além das frequentes incorrecções. Quando o número de infracções aumenta, o governo explica que melhorou a detecção; se o número diminui, eles explicam que melhorou a governação no sector. Reportes de “Ganho-ganho”.

Caixa 3: Comentários sobre a Aplicação da Lei pelo Chefe Interino dos SPFFBZ, Engº. Chibite

Os operadores ilegais, os furtivos, existem realmente. Cortar na área errada também acontece – mas uma parte disto – digamos 20 – 25% - é só um atravessar acidental para a área vizinha.

Os SPFFBZ não têm licenciado nenhuns operadores novos desde 2003. O que está a acontecer, é que alguns destes operadores experientes vendem aos cowboys. Isto é ilegal, mas a linha entre isto e entre sub-contratar é muito fina, o que não é necessari-amente ilegal.

O cortar excessivo é difícil de controlar. Um operador pode obter 200 m3 por ano, mas a sua equipa só continua a cortar. Muitas vezes, a madeira não licenciada fica abandonada na floresta, porque não há licença para a levar e passar pelo ponto de fiscalização para a cidade.

Os SPFFB estão a controlar a situação o melhor que podem. A corrupção é discutível. Lamento dizê-lo, mas é a realidade. Dito isto, ele não admite ter nenhum conhecimento pessoal de corrupção. Não se deve suspeitar dos funcionários só porque eles parecem ter muitas coisas caras. A maior parte das coisas são adquiridas honestamente, por exemplo com poupanças. É importante obter primeiro os factos e analisá-los, e não

nos precipitarmos a tirar conclusões.

Com respeito aos 30 contentores confiscados em Quelimane: Bem, “roubar é rou-bar”, isso acontece. A madeira acaba vendida em leilões públicos, supervisionados pelo GIP (Gabinete de Investimento Provincial).

Está a haver exportação ilegal, tal como dantes (2004). Nesta altura, não existe nen-hum posto dos SPFFB adequado, no porto. Os funcionários só têm uma secretária de-baixo de uma árvore ao lado do portão principal. O DPA vai providenciar em breve um edifício apropriado para ponto de fiscalização.

A aplicação da lei das florestas não tem só a ver com passar multas – de facto, se estiver a andar bem, então os números das multas vão diminuir! E é isso que estamos a assistir. A coordenação é muito melhor, e desde que apareceram os 20%, as comu-nidades estão sensibilizadas para a conservação e para a boa gestão.

5.5 Leilão de madeira ilegal Em 2005 e 2007, os SPFFBZ reportaram a sua apreensão de produtos ilegais. Deve-se concluir que isto é, em primeiro lugar, para efeitos de cosmética – dado que tem pouco efeito na activida-de ilegal. Os toros são finalmente leiloados, com grande publicidade, mas normalmente permite-

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se ao dono anterior comprá-los de novo a um preço de arremate e depois pode exportá-los como normalmente. É um acordo não verbalizado entre os operadores – tal como a “honra entre ladrões”. Assim, a apreensão é apenas uma despesa inconveniente e adicio-nal.

5.6 Infracções: contas não oficiais e opinião local sobre a aplicação da lei florestal e sobre a corrupção

Os operadores, as comunidades e as ONGs com quem falámos foram quase todos unânimes em que a aplicação da lei e a corrupção tinham piorado muito nos últimos quatro anos, não só na Zambézia, mas em todo o país. Um madeireiro ilegal falou-nos das suas operações (Caixa 4).• No Gilé, um distrito a norte que faz fronteira com Nampula, descobriu-se que uma empresa

pertencente a estrangeiros, a Green Timber, tinha de facto construído uma ponte a atravessar o Rio Ligonha para a província vizinha de Nampula, para lhes permitir levarem a madeira através de Nacala. O porto aqui é famoso entre os Chineses, por ser o mais relaxado em Mo-çambique, aonde as Alfândegas e o DPA estão muito interessadas em receberem subornos.

• Licuari (entre os pontos de fiscalização dos SPFFBZ de Nicoadala e de Chimuru) é um pon-to bem conhecido de colecta de madeira ilegal na Zambézia. Pequenos camiões recolhem a madeira nas comunidades e juntos dos furtivos, e transportam-na de noite. Encontrámo-la facilmente, e um grande ca-mião apinhado de toros par-tiu, quando nós chegámos (Fotografia 3). O homem que dirige o local compra e vende espécies para o mercado local, em primeiro lugar chanfuta e umbila. Ele compra aos opera-dores sem licenças por cerca de 2000 MTN/m3 entregues, e vende a 4000 MTN/m3 e 8000MTN/m3 em Maputo. Ele vende a maior parte aos cami-õnistas que trouxeram bens de Maputo, e que querem evitar regressar vazios para o sul. Ele estimou que 50% da madeira colhida na Zambézia é ilegal.

Fotografia 2: Leilão público de madeira confisca-da: preço inicial de cerca de $100/m3, cerca de 1/3 do valor do mercado local para a madeira.

Fotografia 3: Camião carregado com madeira chanfuta, partindo do local de transacções ilegais em Licuari

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• “A corrupção em todos os sectores é agora muito pior”, disse-nos um operador industrial. “Há uma cadeia de corrupção. A nível ministerial, você ganha dinheiro com a aprovação das gran-des concessões. Ao nível da DNFFB, você ganha dinheiro a trocar os regulamentos. Ao nível provincial, você ganha dinheiro com as licenças simples, e com os operadores asiáticos”.

• “Na Zambézia vai ser difícil haver qualquer melhoramento na gestão florestal, porque os fun-cionários superiores provinciais não estão interessados. De facto, no dia em que as coisas me-lhorarem, eles e as pessoas que eles protegem, vão perder a oportunidade de fazerem o seu negócio. Existe muita protecção política; é por isso que eles são tão arrogantes.”

• “A corrupção no negócio da madeira da Zambézia funciona desde a venda dum simples toro até à lavagem de dinheiro, incluindo o tráfico e a comercialização de drogas duras”.

• “Toda a gente sabe que o anterior Chefe de Aplicação da Lei (Nemane) nos SPFFBZ aceitava subornos. E o irmão dele é um dos maiores madeireiros ilegais na província!”

• Mais sobriamente, disseram-nos: “A FRELIMO tem uma grande responsabilidade em tudo isto, e nós “pecámos” muito a este respeito. Nós avisámos o partido para não se envolver neste cenário mas, infelizmente, o interesse pela acumulação fácil da riqueza e a ganância levaram-nos a isto. Agora, vai ser difícil reverter o cenário, porque os estrangeiros, principalmente os Chineses, já dominam no nosso país, incluindo as fronteiras, com o poder económico a crescer todos os dias, o que lhes permite subornar a qualquer hora e em qualquer lugar, qualquer fun-cionário do governo miseravelmente pago, para facilitar a documentação que eles precisam para exportar a madeira de qualquer forma e a partir de qualquer lugar, sem nenhum proble-ma.”

Caixa 4: História de um Furtivo

Há muitas comunidades a cortarem madeira. Um régulo pode pedir até 1500 MTN para ter acesso à comunidade dele. Depois, ele compra mondzo por cerca de 250 MTN ($10) por toro, e organiza a recolha e o carregamento. Os tractores custam 500 MT/dia, para 3 dias; os custos de carregamento são 250 MT/pessoa para 12 pessoas, ou 3000 MTN para cada camião de 15 m3. Um camião Fuso demora 2 dias e 52,000 MTN para chegar a Quelimane (a partir dum ponto situado a uma distância de 350 km).

Ele tem que adquirir uma licença. Isto faz-se frequentemente levando a licença duma outra pessoa e dividindo os lucros com ela. Desta forma, ele pode ganhar 5000 MTN ($200) por carga, mas também pode perder tudo. Também se pode trabalhar sem uma licença e uma autorização de transporte, mas às vezes tem que se pagar metade do valor da carga para passar por Nicoadala. Tem que se telefonar antecipadamente e tratar disso. Só as pessoas muito conhecidas é que conseguem passar sem licenças. Os Chineses então descontam $10/m3 para comprarem a madeira ilegal. Normal-mente, o dono da licença vai fazer a venda aos Chineses – assim ele pode mentir sobre quanto é que ele recebeu.

Às vezes os camiões com carga ilegal viajam em caravana com outros camiões com cargas legais. Aqueles que têm toda a documentação adequada vão à frente, mas reportam para os camiões que vão atrás. Se a inspecção for séria, os camiões a seguir podem sair da estrada e esperar até depois de escurecer para continuarem o seu caminho.

Conclusão:

É simplista ao extremo comparar um aumento no número de pontos de verificação ou guardas florestais com uma aplicação melhorada da lei. A realidade é que a corrupção, a arrogância e a má gestão continuam e que estão a minar seriamente o domínio da lei.

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6. “Os 20%” Em 2004, houve muitas discussões sobre “os 20%” das taxas das licenças da madeira que as co-munidades tinham direito a receber ao abrigo da Lei das Florestas e Fauna Bravia de 199917. O go-verno tem sido criticado pelos atrasos em aprovar as necessárias regulamentações para permitir a implementação, e pela falha em reservar os fundos para as comunidades, daqueles anos antes da regulamentação ter sido aprovada.

Em Maio de 2005, o Diploma Ministerial No 93/05, que estabelece mecanismos para canalizar estas receitas para as comunidades nas áreas de corte de madeira, foi aprovado, e os SPFFBZ começaram a proceder à sua implementação. Com financiamento de vários doadores, eles apon-taram finalmente uma ONG local, a RADEZA (Rede de Organizações para o Ambiente e para o Desenvolvimento Comunitários Sustentáveis da Zambézia) para fazer a maior parte do trabalho com as comunidades18, e a disseminação da lei iniciou-se em finais de 2005.

Em 2008, houve três rondas de entregas dos 20% às comunidades. A Tabela 6 resume o pro-gresso. Em 2005, a maior parte das províncias não tinha conseguido entregar o dinheiro, princi-palmente por causa da falha em estabelecer os Comités de Gestão e em abrir contas bancárias. Na Zambézia, isto totalizou até 7,380,317 MTN (US $ 307,000) previstos para as 166 comunidades em 12 distritos. O dinheiro foi, em vez disso, para o orçamento geral dos distritos, e não se sabe bem o que é que lhe aconteceu.

Em 2006, houve um início hesitante, com 1,561,929 MTN a serem entregues a um número não registado de comunidades nos 5 distritos (Mocuba, Namarroi, Maganja da Costa, Mopeia e Ile). O impulso retomou-se em 2007, quando 5,799,964 MTN da campanha de 2006 foram canalizados para 91 comunidades em 37 comités.

Em 2008, o dinheiro da campanha de 2007 estava-se a preparar para ser entregue a 168 co-munidades em 8 distritos. Destas, 98 comunidades estão em áreas de licenças simples e 70 em áreas de concessões. Está estabelecido que as comunidades individuais vão receber entre 11,500 (US$540) e 450,000 MTN (US$18,750).

Esta implementação representa, de facto, um vasto melhoramento sobre a situação de 2004. No entanto, houve problemas, disputas da política e irregularidades na implementação que preci-sam de se resolver, e das quais se podem extrair lições a aprender para futura implementação.

Tabela 6: Progresso na Distribuição dos 20% às co-munidades na Zambézia, 2005-2008

Ano Distritos Comunidades Comités Total MTN

2005 - - - 7,830,317

2006 5 ? 1,561.929

2007 ? 91 37 5,799,964

2008 8 168 40 ??

17 Outros direitos da comunidade ao abrigo da lei, incluem: uso dos recursos ao nível da subsistência; partici-pação na gestão conjunta; conksulta da comunidade e aprovação antes de emitir licenças aos operadores; benefícios de desenvolvimento derivados da exploração ao abrigo dum regime de concessão; e 50% do valor das multas passadas, para as pessoas que contribuam para a aplicação da lei.

18 Isto envolveu: i) a disseminação da regulamentação e a coordenação com parceiros (ONG, sector privado e funcionários do governo); ii) cálculo do valor dos 20% para 2005; iii) inventários dos distritos e comunidades beneficiárias; iv) abertura dos Fundos Comunitários para receber os 20%); v) instruir o Fundo de Fomento Agrário para transferir o dinheiro; vi) apoio para a formação de comités locais, em como gerir os fundos e abrir contas no banco; e vi) abertura oficial das cerimónias para a primeira entrega de 20%.

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6.1 Problemas

Identificação das comunidades

Quando começou a implementação, o estado caótico do sector tornou-se imediatamente visível. Com licenças simples, devia ser fácil identificar as comunidades com direito a receberem os 20% ao abrigo do regime de licenças simples, porque as licenças cobrem uma área relativamente pe-quena (5000 ha). Mas o facto é que o licenciamento e a supervisão dos SPFFBZ foram tão irres-ponsáveis, que uma licença é emitida para um local mas o corte, muitas vezes, talvez normalmen-te, ocorre num outro local qualquer. Assim, algumas comunidades recebem os seus 20% quando não se removeu nenhuma da madeira delas, e algumas comunidades assistem às suas florestas desmatadas, mas não recebem nenhuma parte dos direitos de exploração (veja Caixa 5).

As concessões são muito maiores e mais problemáticas. Elas incluem frequentemente nume-rosas comunidades, e a única abordagem prática é partilhar igualmente entre todas elas, reduzin-do ainda mais as somas recebidas por cada uma. Se os concessionários operassem blocos de corte anuais, como era suposto, as comunidades individuais definir-se-iam mais facilmente.

Organização receptora dos 20%

Na Zambézia, os fundos dos 20% têm sido entregues não aos Comités de Gestão da Aldeia, mas ao nível administrativo superior – o Posto Administrativo (nível de governo abaixo do distrito), e ao seu Conselho Comunitário. Além disso, 11 dos 37 Postos Administrativos abriram as suas contas bancárias em Quelimane, tornando-se o seu acesso dispendioso e demorado.

Isto provocou algumas queixas à ONG que está a implementar o programa de apoio à comu-nidade, a RADEZA. Uma comunidade queixou-se da prática promovida pela RADEZA de formar comités ao nível dos Postos Administrativos. Houve imensos problemas com o transporte para chegar às reuniões do comité, e com a comunicação entre as cinco comunidades envolvidas, e com o Administrador. Era suposto que cada comunidade planeasse as suas actividades. Só houve uma formação da RADEZA, e nenhum seguimento até à “avaliação” centralizada. O DDA ajudou-os a formar o seu comité.

A RADEZA defende a sua abordagem, com o argumento que os bancos não gostam de abrir uma série de pequenas contas para as comunidades individuais. Eles também argumentaram que isto iria permitir o beneficia doutras comunidades na área. Afinal de contas porque é que os 20% só deviam ir para as comunidades perto da floresta e não para todo o Posto Administrativo, es-pecialmente se os madeireiros desmataram algumas florestas locais antes dos 20% serem imple-mentados?

O Director da DNTF admitiu que tinha sido “uma confusão” o facto de o dinheiro ter ido para os Postos Administrativos, em vez de ir directamente para as comunidades. Ele garantiu-nos que a lei irá ser alterada para esclarecer isto.

Entretanto, a ONG ORAM Zambézia tem uma visão alternativa: os 20% devem ser utilizados como um incentivo ao uso racional portanto, precisam de ser entregues o mais perto da floresta possível – i.e. às comunidades. Eles argumentam que os comités ao nível dos postos administra-tivos só são precisos se os comités ao nível comunitário quiserem formar um. Os bancos estão no negócio de abrirem contas portanto não devia haver problema nenhum com contas múltiplas19. O trabalho da ORAM no apoio a 3 comunidades para gerirem os seus 20% encontra-se descrito abaixo.

19 Em Manica e em Sofala (talvez em todos os sítios) o maior problema são as despesas que os bancos fazem nas contas comunitárias. As taxas concessionais precisam de ser negociadas.

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6.2 Irregularidades

Transparência

A maneira pela qual se determina o direito aos 20% não é transparente. Os SPFFBZ simplesmente anunciaram quem ganha o quê, sem mostrarem como é que se chegou àqueles números. No prin-cípio da campanha de corte da madeira, os SPFFBZ sabem quais os operadores que foram licen-ciados para que espécies e volumes. Devia-se dar toda esta informação e o cálculo final às comu-nidades, antes de começar o corte da madeira. As comunidades estão a começar a perceber que o corte ilegal de madeira priva-as dos seus 20% e, assim, o conhecimento acerca do licenciamento pode ser uma ferramenta eficaz para capacitar as comunidades a monitorizarem a extracção de madeira na sua área. A ORAM tem estado a dar formação comunitária sobre a identificação e a medição da madeira, para as comunidades poderem controlar as operações.

Algumas comunidades que os SPFFB disseram que receberam os 20%, nunca receberam nada: é preciso haver uma maior transparência e responsabilização. Disseram a uma comunidade que ela ia receber os seus 20% na forma dum moinho de milho. Eles nunca viram uma factura que mostrasse o valor, e o moinho veio em peças – nunca ficou devidamente montado.

Uso dos 20%

As comunidades recebem muito pouco apoio para decidirem como utilizarem os seus 20% e ge-rirem os fundos e os projectos. Aparentemente, a maior parte das comunidades compra moinhos de processamento de milho ou reabilita pequenas infra-estruturas – pontes, etc. Nalguns locais, no entanto, as comunidades estão a ser encorajadas a construírem escolas e postos de saúde, e isto causou alguma discórdia. O governo introduziu um fundo de investimento local, o Orçamento para Iniciativas de Investimento Local (OIIL), através do qual são dados anualmente 7 milhões MTN a cada distrito do país, para construir escolas, estradas, etc. Diz-se que a utilização dos 20% desta maneira, encobre a má gestão e o abuso politico do fundo.

Conclusão:

Embora a entrega dos 20% seja definitivamente um melhoramento em relação a 2004, ainda há um longo caminho a percorrer na sua implementação e na utilização dos fundos pelas comunida-des. Há uma excelente oportunidade para utilizar os 20% para alavancar uma melhor governação da floresta, e um melhor desenvolvimento comunitário, tal como a ORAM está a promover. Os SPFFBZ devem agora melhorar o seu licenciamento e supervisão. Devem assegurar que as áreas licenciadas dispõem realmente de recursos florestais suficientes, que a pessoa licenciada é quem está a proceder ao corte da madeira, que o corte da madeira é feito no local correcto, que os volu-mes são levados e que as comunidades recebem o valor total dos seus 20%.

Os 20% estão em perigo de se tornarem mais uma distracção do que um benefício! O seu valor é realmente bastante baixo (menos do que 5% do valor total da madeira) mas o assunto dominou quase 100% do debate sobre a administração florestal, em detrimento de muitos outros assuntos importantes, nomeadamente os direitos das comunidades à terra e outros direitos, e o caos con-tinuado no sector das florestas. Também se devem concentrar as atenções na utilização dos 20% para alavancar uma melhor governação florestal.

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Caixa 5: A experiência de corte da madeira e os 20% duma comu-nidade: Bive/Makwia

Há cinco madeireiros diferentes que têm estado a operar aqui durante os últimos 6 anos. Um operador chamado Pinto esteve cá no ano passado a cortar pau preto.

Só os madeireiros Dominga e Nelson é que consultaram a nossa comunidade. Eles trouxeram-nos comida, algumas cervejas, e deram 300 MTN ao régulo. Nós não pedi-mos nada – não percebemos que podíamos pedir. A maior parte dos trabalhadores vieram de fora. Só 3 ou 4 pessoas daqui é que tiveram emprego. Nelson deu-nos um moinho de milho em 2007, porque ele tinha estado aqui a trabalhar durante 4 anos.

Nunca ouvimos falar acerca dos 20% e de certeza que não os recebemos. Ouvimos falar acerca do Orçamento para Iniciativas de Investimento Local, e o chefe convocou para uma reunião para se formar uma associação para receber e para gerir os fundos. Temos um comité de 10 homens e mulheres. Abrimos uma conta bancária. Pergunta-ram-nos se queríamos dinheiro ou cabras. Mas não aconteceu nada.

Também cortamos madeira. Em 2005-07 talvez cortámos 120 toros por ano. Uma equipa de 8 homens cortou cerca de 6 árvores por dia, utilizando serras de mão. Devía-mos receber 100 MTN ($4)/árvore, mas às vezes não nos pagavam. Os furtivos disser-am que os Chineses não lhes tinham pago. Alguns dos nossos também trabalharam a carregar os camiões. Uma equipa de doze costumava receber 25 MTN por pessoa por cada camião carregado. Agora é 50 MTN. Muitas vezes, cortamos as árvores e procuramos o mercado depois.

As concessões não são nenhuma garantia de emprego justo para as pessoas lo-cais. Um concessionário deu uma parte da sua concessão a outro operador, que corta um mês num sítio e depois muda-se para outro, sem pagar a ninguém.

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7. Processamento no país, capacidade industrial e emprego

Em 2004, apesar da legislação de 1999 em contrário, quase toda a madeira de Zambézia era ex-portada em toros. Isto justificou-se com base no facto de a Zambézia ter falta de capacidade in-dustrial, em particular para processar madeiras duras tropicais. Argumentámos fortemente que a Zambézia tem na realidade a capacidade necessária, e apelámos à plena implementação das leis que exigem o processamento prévio no país, como um passo essencial para o cumprimento da política governamental no sentido de aproveitar o sector florestal e as qualificações e as energias das pessoas para promover a industrialização interna e para criar emprego.

Nessa altura, manipularam-se os regulamentos para evitar a plena implementação da lei e per-mitir a continuação da exportação de toros (e efectivamente empregos) para o mercado chinês. Em virtude de a lei permitir a exportação de toros de espécies classificadas como “preciosas”, o Ministério emitiu vários decretos, reclassificando a maior parte das principais espécies comer-ciais como tal.

Em 2005, os regulamentos que permitiam a exportação de toros de umbila, jambire e chanfuta expiraram, e esperava-se que, a partir do mês de Abril daquele ano, se fizesse cumprir o proces-samento dentro do país.

No entanto, a manipulação dos regulamentos começou de novo. Em primeiro lugar, a expor-tação de toros continuou a ser permitida, com base no facto de que tinham sido cortados ao abri-go das licenças de 2003 e 2004. A serração começou em Julho de 2005, mas os operadores não respeitaram as normas industriais de espessura e da boa esquadria (“acabamento 4x4”) portan-to, as normas de processamento tinham de se criar oficialmente através de Diploma Ministerial (185/2005), para impedir a exportação de madeira bruta serrada. A exportação destas espécies diminuiu então substancialmente, mas continuou.

Em Janeiro de 2007, um Diploma Ministerial inverteu a reclassificação de 2003 das duas espé-cies mais procuradas, o pau ferro e o mondzo para a classe de preciosas, o que tinha permitido a sua exportação como toros, e estas espécies voltaram a ser da Classe 120. Isto resultou numa redução em 75% dos direitos, mas exigia-se que estas espécies fossem processadas antes da exportação. No en-tanto, os SPFFBZ permitiram que a exportação continu-asse até 31 de Março, tal como anteriormente, com base no facto de estes toros serem de 2006. E então prorroga-ram o prazo até 31 de Maio e, em seguida, prorrogaram o prazo de novo, até 31 de Junho.

As empresas influentes, a OLAM e a Green Crown, continuaram a exportar toros em Agosto, Setembro e Outubro de 2007, totalizando um volume oficialmente declarado de mais de 3000 m3. Quando questionado, o DPA alegou que se tratava de toros antigos e autorizou a sua exportação, mas quando se inspeccionou o car-regamento da Green Crown, encontrou-se um lote de toros novos, misturados com relativamente poucos to-ros antigos... Visto que a Green Crown está bem relacio-nada, exerceu-se pressão política através de Bonifácio Grueveta, e permitiu-se a exportação.

20 In the same regulation, muaga and chanato, previously Class 3 and 4 respectively, were elevated to Class 1, raising their royalties and also introducing the processing requirement.

Fotografia 4: “Madeira serrada” de pau ferro a caminho do porto de Quelimane

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Depois, devido ao facto do mercado chinês supostamente não querer aceitar a madeira com-pletamente processada, (e de as serrações de determinados operadores não serem capazes de cumprir as especificações), a intermediação da Ásia pressionou o governo em Maputo e, em Se-tembro de 2007, conseguiu a publicação doutro Diploma, que mudou os requisitos da serração de forma a permitir a exportação de placas de madeira bruta serrada, conhecidas como pranchas (tábuas serradas em bruto) (veja Fotografia 4), em vez daquelas completamente esquadradas (acabamento 4x4). Em 2007, 1.980 m3 (28%) das exportações totais foram na forma dessas tais tábuas, sendo 780 m3 (11% do total das exportações) destas de pau ferro.

A partir de meados de Junho de 2007, a maior parte dos exportadores foram obrigados a ex-portar madeira serrada. A Figura 1 apresenta os dados aduaneiros para os quatro trimestres de 2007, demonstrando o impacto disto. Em antecipação a esta actuação mais severa, um volume recorde de 40.000 m3 de toros saíram de Quelimane, na primeira metade do ano. Na segunda me-tade do ano, não se exportaram quase nenhuns. Muitos exportadores, em vez de serrar e exportar, simplesmente armazenaram os seus toros nos seus pátios de toros, calculando que o governo iria em breve ser persuadido a permitir que a exportação de toros começasse de novo. Os parques de toros de empresas tais como a Madeiras Alman e a OLAM, ficaram repletos.

Isto coincide com as lembranças locais: “Em Fevereiro de 2007, Quelimane estava justamente a recuperar da sua última grande inundação, e a cidade ficou inundada de lama e água. No entan-to, os comerciantes asiáticos estiveram ocupados todas as horas dos dias e noites, a moverem os seus toros com tractores e camiões - danificando ainda mais as estradas, e respingando lama por cima das pessoas e edifícios. Não eram só os pátios de toros, mas toda a cidade que estava superlotada com toros. Qualquer pedaço de terra livre era preenchido, até mesmo alguns jardins das pessoas. O porto estava um frenesim de actividade. Todo o dinheiro - o valor da madeira - que podia ter sido utilizado para reabilitar a cidade, estava a ser exportado!”

As exportações de toros de Quelimane certamente diminuíram precipitadamente, como se ilustra ainda na Figura 2. Isto é significativo e poderia ter sido uma das coisas mais positivas que aconteceram desde 2004, se muitos dos toros da Zambézia não estivessem a sair através do porto de Nacala e em contentores de madeira serrada. (veja abaixo)21,

Figura 1: Exportação de toros e madeira serrada de Quelimane em quatro trimestres de 2007Fonte: Dados brutos do registo de exportação das Alfândegas

25000

20000

15000

10000

5000

0

expo

rt in

m3

quarters of 2007

Q1 Q2 Q3 Q4

Logs

Sawn wood

21 Em Nacala, ainda se vêem os navios graneleiros, e é permitido encher os contentores fora do porto. Estas são duas condições que promovem a exportação ilegal de toros.

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Fotografia 5: Serração de baixa qualidade, dum comprador de madeira asiático em Quelimane.

É então verdade que quase que se acabou com a exportação de toros, e que a produção de madei-ra serrada duplicou. No entanto, a maior parte das pessoas que entrevistámos, tanto os opera-dores como os comerciantes, concordaram que permitir a exportação de madeira bruta serrada é uma proposição contra-produtiva, em que se perde sempre. O processamento custa dinheiro, mas a madeira vende-se por menos do que os toros. Na China, os importadores consideraram que a produção de tábuas ásperas é uma maneira grosseira e esbanjadora de tratar a madeira de alta qualidade. Um grupo de investidores industriais na Zambézia sentiu duma maneira tão forte que as coisas tinham ido longe demais, que tomaram providências e exigiram que se pusesse um fim à corrupção, que se proibisse a exportação de toros e, em Fevereiro de 2008, intercederam para que se retornasse à serração apropriada. Em 18 de Março, estava previsto haver uma reunião dum departamento comercial do Fórum Nacional Florestal, mas esta foi cancelada. Dois dos ope-radores industriais estão tão frustrados que estão a tentar vender tudo e sair.

Em Maio de 2008, o Chefe da DNTF, Raimundo Cossa, disse-nos que achava que a política de permitir a exportação de pranchas era pouco sólida, e garantiu-nos que iria conseguir alterar rapidamente os regulamentos que regem o processamento, revertendo as pranchas para tábuas devidamente esquadradas22.

7.1 Produção de Madeira serrada, serrações e capaci-dade industrial

O efeito dos novos requisitos para exportar madeira serrada resultante da madeira processada mostra-se na Tabela 7. Em 2007, a produção atingiu cerca de 7.000 m3, 140% mais do que em 2006, e 40% acima do nível anterior mais alto, de 2004.

Tabela 7: Produção de madeira serrada na Zambézia, 2001-2007

Ano Produção Total Maior produtor

Ano Volume (m3) No de produtores Nome Volume (m3)

2000 2468 6 Madal 1369

2001 2336 6 Madal 1280

2002 3215 11 MAZA 915

2003 4205 10 Madal 1491

2004 4941 >12 MAZA 1550

2005 3458 >10 Madal 923

2006 2933 16 n/a n/a

2007 6999 > 19 MAZA 1292

Fonte: relatórios anuais dos SPFFBZ

A Tabela 7 mostra também como o número de produtores de madeira serrada aumentou em quase 60%, de cerca de 12 em 2004, para mais de 19 em 2007. No entanto a lista não é definitiva, e a situação destes produtores, e o seu impacto fi-nal na capacidade industrial na província, não são claros. Os SPFFBZ não reportaram a capacidade industrial na província desde 2001, quando registaram 8 instalações, com uma ca-pacidade total de processamento de 51.000 m3 de madeira

22 Em Novembro de 2008, ouvimos dizer que a decisão tinha sido tomada em Julho, altura em que, dizia-se, os novos regulamentos entrariam em vigor num prazo de duas semanas. Mas, em Novembro, parecia que as autoridades ainda estavam a trabalhar no assunto. Em Maio de 2009, ainda se estão a exportar pranchas.

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redonda por ano. Provavelmente percebendo que isto debilitava a sua justificação para permitir a exportações de toros, desde essa altura que só se reporta a “situação” ou produção actual, e isto apesar de haver, no mínimo, dois estudos sobre a capacidade industrial provincial nos últimos 5 anos (Chitara 2001, Rural Consult 2006).

Muitas das novas serrações são instalações baratas de $ 10-15000, incapazes de serrar tábuas de dimensões específicas. Estas serrações precárias empregam cerca de 5 trabalhadores e só são utilizadas para serrar pranchas em bruto, para satisfazer os mínimos requisitos para a exporta-ção. Isto compara-se com 16 trabalhadores e 30-40 toros por dia, no processamento verdadeiro. Além disso, muitas vezes trazem-se operadores chineses para a Zambézia, para gerir as serrações e manter as serras. Devido aos seus baixos custos de investimento, algumas pequenas serrações ganham algum dinheiro e têm, de facto, inundado o mercado do processamento e têm rebaixado os preços das verdadeiras serrações. Os informantes locais foram enfáticos ao afirmar que este não é o tipo de desenvolvimento industrial que o sector florestal e Moçambique necessitam.

Caixa 6: Um exportador – TTT Timber

A TTT Timber é a empresa cujos 30 contentores de madeira ilegal foram apreendidos. Eles tentaram contrabandear toros de pau ferro, declarando-os como uma espécie exportável, a saber mucarala.

O gerente da TTT Timber disse-nos que os novos requisitos da serração foram uma grande dor de cabeça. Eles podiam comprar toros, mas se quisessem exportar, tinham que os processar. Eles perdem dinheiro com isto – um toro redondo de pau ferro pode-se vender por $ 400/m3 – enquanto um toro serrado vale apenas $ 200/m3.

Problemas por trabalhar na Zambézia. O licenciamento de exportação demora muito tempo, em comparação com Mianmar, aonde só demora 3 dias. Aqui é preciso muito tempo e dinheiro extra. Também é preciso investir – digamos $ 100,000 à cabeça, in-cluindo a aquisição de terra. O porto está a tornar-se um problema. Os grandes navios não chegam, portanto têm que usar navios porta-contentores. Isto é um processo mo-roso e dispendioso. Os portos de Nacala e da Beira são melhores.

Eles montaram uma serração - mas só com uma pequena serra de fita, só adequa-da para serrar pau ferro rude. Não dá para processar mondzo, por exemplo.

O plano da TTT Timber para o futuro próximo é esperar, e ter esperança que recomece a expor-tação de toros redondos. Se não houver alternativa, vão serrar, ou exportar pau preto, chacate ou algumas outras espécies que se podem enviar como toros. Eles estão especialmente à espera que a exportação de pau preto recomece, visto que têm mais de 100 m3 prontos para despachar.

7.2 Mercados para Madeira serrada na ChinaEm 2004 e até em 2008, muitos funcionários florestais e madeireiros insistiram que não havia um mercado na China para a madeira serrada - que eles só queriam toros. Visitámos a China, em Julho de 2008, e investigámos este argumento para exportar toros moçambicanos.

Na China, as madeiras moçambicanas utilizam-se para quatro objectivos principais: i) a re-produção de mobiliário das dinastias Ching e Ming, para a qual as espécies africanas (pau ferro, mondzo, pau preto e jambire) são substitutos das espécies mais dispendiosas de “pau-rosa”, utili-

23 Embora o DPA nos tenha garantido que haveria um embargo às exportações adicionais de pau preto para um período de, pelo menos, 2 anos, a TTT Timber exportou 155 m3 de pau preto, em Abril de 2009.

24 Pau ferro é favorecido em particular, e a Zambezia é a fonte principal desta espécie.

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zadas tradicionalmente (Veja Fotografia 7, 9), ii) piso de madeira sólida (jambire e chanfuta); iii) folheados, para piso laminado; iv) escultura (Veja Fotografia 10). A maior parte destes produtos são vendidos no mercado interno, embora se exporte algum soalho.

Mesmo no topo dos mercados de mobiliário e de escultura, os artesãos exigem toros. Eles fa-zem itens refinados para os quais o grão da madeira é muito importante, e em grandes esculturas, a forma do toro em bruto pode ser motivo de inspiração para a peça (veja Fotografias 9 e 10). No entanto, para a maior parte dos demais utilizadores, a primeira coisa que o comprador chinês faz, após receber os toros moçambicanos, é levá-los para uma serração independente, para o primeiro processamento. Fomos informados que os com-pradores chineses de toros muitas vezes nem sequer confiam nas serrações locais, porque os operadores desviam uma parte da madeira ser-rada para venderem eles próprios. Se um utili-zador de madeira pudesse importar a madeira serrada, com uma especificação suficientemente elevada, podia-se evitar este problema. No en-tanto, neste momento, eles ainda confiam menos nas serrações moçambicanas. O que é importan-te ao lidar com a China é criar a confiança, mas há tanta aldrabice no comércio moçambicano, que nenhum Chinês quer lidar directamente com um Africano. Esta é aparentemente uma das principais razões pela qual os comerciantes asiáticos estabeleceram um controle tão grande do mercado - muitos deles são agentes directos para importadores de toros. Se Moçambique ti-vesse um bom produto, e os empresários fossem

Fotografia 6: Toros moçambicanos num parque de toros perto do Porto de Zhang Jia Gang, Xangai

Fotografia 7: Mondzo utilizada para fazer mobiliário adornado, perto de Xangai

Fotografia 8: Jambire utillizada para fazer tamboretes para pés para tu-ristas, Nanxun, perto de Xangai

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comprovadamente confiáveis, haveria um mer-cado na China. Nestes dias de telefones celula-res e a internet, os clientes chineses de madeira comunicarem as suas exigências em termos de madeira serrada a Moçambique já não é mais difícil do que comunicarem-no à sua serração local ao fundo da rua. Moçambique até devia poder entrar no mercado para fornecer com-ponentes semi-processados às fábricas chine-sas de mobília (veja Fotografia 11). Os preços serão bons, devido ao valor acrescentado do processamento e, duma maneira importante, a margem de lucro de aproximadamente 30% praticada actualmente pelos comerciantes asi-áticos na exportação de toros será capturada localmente - e os Moçambicanos vão ter postos de trabalho indispensáveis.

Outro factor na procura chinesa de toros é que as empresas estatais são responsáveis por 40-60% das importações de madeira de Mo-çambique (Base de Dados das Alfândegas da China, 2007, 2008), e o governo chinês prosse-gue uma política de apoio à sua própria indús-tria local. As serrações que visitámos perto de Xangai, não são as instalações de alta tecnologia que nos quiseram fazer crer. As serras de fita não são mais sofisticadas do que aquelas que se usam nas grandes operações industriais na Zambézia. Do mesmo modo, a tecnologia de secagem da madeira não é particularmente avançada, e geralmente só é usada em produtos semi-acabados - como tá-buas de soalho. O produto que eles enviam para a fábrica e basico. (veja Fotografia 12). Na China, a capacidade média de produção de uma serra de fita com alimentação mecanizada de toros estima-

Fotografia 9: Mesas Chinesas anti-gas, mostrando grãos correspon-dentes

Fotografia 10: Entalhe chinês de alta qualidade, incorporando carácter de material em bruto

Fotografia 11: Componentes semi-processados vindo do Vietname numa fabrica perto de Xangai

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se em 50 m3 por dia. Embora isto seja provavelmente uma produtividade maior do que aquela que se obtém em Moçambique, os custos de produção são provavelmente maiores na China.

Contrariamente aos relatórios (TCT Dalman 2003), Moçambique tem uma grande vantagem comparativa sobre a China nos custos do trabalho, com um salário mínimo de cerca de $ 50/mês. A lei de trabalho da China exige agora um salário mínimo, para além de muitos outros benefícios do trabalhador – portanto, para empregar um trabalhador semi-qualificado típico custa $400/mês, e mesmo um trabalhador não qualificado custa $150 por mês. Por este motivo, há uma parte do processamento que está agora a ser transferido para o Vietname. É óbvio que neste momento existem problemas de produtividade em Moçambique, mas com um investimento em instalações e especialmente na formação dos trabalhadores, e com apoio do governo para o desenvolvimento de negócios (incluindo intermediar junto do governo chinês para obter um tratamento preferen-cial), pode-se fazer este processamento em Moçambique.

Outra afirmação utilizada para justificar as exportações de toros é que as taxas de utilização de madeira na China são muito mais elevados do que em Moçambique. Diz-se que isto se deve, em grande parte, ao facto de se utilizarem os resíduos de madeira em linhas de produção secundária. Verificou-se que, em geral, isto também não é o caso. O governo chinês dá in-centivos fiscais às suas indústrias que utilizam desperdícios de madeira, e na verdade, algu-mas operações que vimos, tal como o fabrico de tábuas de soalho de madeira dura, vendem-se os desperdícios aos fabricantes de lamelados. A casca de algumas espécies também se pode vender. Também vimos alguns desperdícios de espécies preciosas que estão a ser vendidos para fazer leques. Mas nas fábricas de mobili-ário que visitámos, os desperdícios só se ven-dem para lenha. Em Moçambique, empresas tal como a TCT Dalmann, também desenvolveram uma série de produtos secundários lucrativos, tais como telhas, painéis compostos e itens tor-neados, e outras empresas moçambicanas po-dem seguir este exemplo.

As indústrias da Zambézia já estabelecidas continuam a processar e encontram bons mer-cados de exportação. A Madal por exemplo, vende regularmente para a África do Sul, Espanha, Itália e Bélgica, com taxas semelhantes às apresentados na Tabela 8. Com um pouco de esforço e de investimento, podem-se desenvolver mercados rentáveis na China.

Tabela 8: Preços de exportação a partir de Quelimane para Umbila serrada (FOB - livre de despesas de transporte), 2008

Espécies Classe Dimensão Preço $/ m3 Destino

Umbila Classe Super 25 mm Longo 820 África do Sul

Classe Super 25 mm Curto 660 África do Sul

Classe 2 25 mm Longo 650 África do Sul

Classe 2 25 mm Curto 520 África do Sul

Fonte: Documentos de Exportação

Fotografia 12: Operações de serra-ções chinesas e os seus produtos não são todos especialmente de alta tecnologia

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7.3 Emprego no Sector das Florestas Embora o DPA e o governador estivessem desejosos de chamar a atenção para o aumento de em-prego provocado pelo requisito de processar a madeira dentro do país, os SPFFBZ nunca repor-taram realmente sobre o emprego no sector florestal, pelo que estes pretensos aumentos ainda precisam de ser demonstrados.

Desde 2004, tem havido uma crescente preocupação com a chegada de técnicos e trabalhado-res chineses para trabalharem nos escritórios, nas florestas e nas serrações da Zambézia. O De-partamento de Imigração reportou 35 cidadãos chineses que residem legalmente em Quelimane, em Maio de 2008, 21 dos quais estavam empregados como mecânicos, engenheiros florestais e contabilistas no sector florestal, por empresas tais como a Green Crown, Green Timber, Pacific International, Goodyear e Boleyn Internacional.

Empregam-se também trabalhadores, mas estas pessoas não aparecem nas estatísticas. A Ma-deiras Alman utiliza uma grande quantidade de mão-de-obra chinesa, e há histórias de gestores e trabalhadores chineses a baterem em trabalhadores moçambicanos. Os trabalhadores queixaram-se ao Governo e os Chineses desapareceram durante alguns dias, mas depois voltaram de novo.

O Director da Imigração confirmou que não tem havido praticamente nenhum controlo na entrada de Chineses na Zambézia, e estima-se que 75% dos estrangeiros na Zambézia estejam lá ilegalmente. Eles entram com um visto de entrada convencional de um mês, e depois não saem. O governo deve tomar medidas coercivas para que eles saiam e, em seguida, deve insistir para que a sua situação seja regularizada antes de poderem regressar. Como indivíduos, estes imigrantes ilegais chineses não são um grande problema, tendem a ser relativamente tímidos, disciplinados e respeitosos. O Departamento de Imigração efectuou um recenseamento de distritos, mas este não está desagregado por sector económico, ou por nacionalidade. No caso da imigração ilegal por parte da empresa Madeiras Alman, o gerente e 6 trabalhadores chineses foram expulsos. Contudo, eles voltaram. A Zambézia é também um ponto de entrada e um corredor para a imigração ilegal para o Malawi, e está-se a formar uma comissão entre a província e o seu vizinho, semelhante à comissão existente entre Maputo, Gaza, África do Sul e Suazilândia.

Entretanto, tem que se admitir que os problemas da mão-de-obra nacional persistem. A maior parte dos trabalhadores florestais não receberam nenhuma formação formal, faltam-lhes habili-dades e diz-se que são preguiçosos e que não têm nenhuma ética de trabalho. Existe uma escola de formação industrial em Quelimane, que forma 500 licenciados por ano, nas áreas de mecânica, electrónica, contabilidade, etc - mas, aparentemente, poucos estão disponíveis para a indústria florestal e, certamente, não existe um enfoque específico em competências relacionadas com a silvicultura. O governo provincial não prevê qualquer apoio nesta área fundamental, apesar da sua importância para a economia local.

7.4 Apoio do Governo à indústria: China vs Moçambique

A China apoia a sua indústria. Os Chineses criam zonas industriais, com infra-estruturas excelen-tes, serviços públicos e benefícios fiscais. Oferecem assistência empresarial, crédito e oportuni-dades de formação aos trabalhadores. Protegem as suas indústrias. Em Moçambique, no entanto, muitas agências governamentais são predadores na indústria e, em vez de facilitar, prejudicam o desenvolvimento económico (veja a Caixa 7). Qualquer pessoa com dinheiro para investir é um alvo aberto à extorsão.

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Caixa 7: Criar uma indústria florestal na Zambézia

Um operador industrial que encontrámos, sofreu daquilo que sintetiza a abordagem do governo ao desenvolvimento industrial. Ele tem uma indústria bem sucedida, em Ma-puto, e como a madeira está a ficar cada vez mais escassa, quis garantir matéria-prima de alta qualidade para as suas linhas de produção de parquet e soalhos, adquirindo a sua própria concessão. Tal como a TCT Dalmann em Sofala, ele está a experimentar formas inovadoras de utilizar os desperdícios da sua linha principal de produção, tais como nos painéis pré-fabricados de baixo custo para a habitação, para estabelecer linhas de produção na Zambézia.

Visto que a província não oferece nenhuma assistência ao investimento, ele pediu um empréstimo através do esquema da Assistência Nórdica aprovado pelo Governo, com o qual ele estabeleceu uma instalação de processamento primária, que tem al-guns dos melhores equipamentos na província. A instalação tem uma capacidade de 5000 m3 e já emprega 9 pessoas a tempo inteiro. Todos os seus trabalhadores são Moçambicanos, a maior parte provém da Zambézia. Há três anos, ele pediu uma con-cessão - uma das condições do empréstimo nórdico - mas este pedido foi rejeitado. Foi rejeitado quatro vezes com base em pormenores técnicos, mesmo depois de se ter mudado para a Zambézia há 18 meses. Cada pedido está cheio de dificuldades. Tam-bém teve dificuldades enormes para obter electricidade: após ter pago pela linha, es-perou mais de um ano pela instalação, antes de desistir e alugar um gerador a 12,000/mês. Os serviços de água rurais FIPAG só estavam preparados para fornecer um furo de 120 m, a 145.000 MTN, enquanto tudo o que ele precisava era de um furo de 9,5 m, que custava 15.000 MTN. Diz que, por ser estrangeiro e por estar legal, e sujeito a ser subornado, os funcionários atormentam-no com multas.

O ambiente empresarial continua a ser terrível. O governo não tem interesse no desenvolvimento económico. Não há investimento na formação de trabalhadores para o sector. Não há nenhum lugar onde obter ajuda com o investimento. O balcão único (um balcão para o registo de empresas), é desesperador. Os funcionários públicos são corruptos. Para registar a sua empresa em Quelimane, ele foi obrigado a ter um seg-undo número de segurança social nacional. Se ele for importar, ele vai fazê-lo e pagar em Maputo porque, na Zambézia, o dinheiro vai provavelmente directamente para o bolso de alguém e não será registado, tornando-o vulnerável às multas.

Conclusões:

O Governador e o DPA estão correctos quando dizem que todas as espécies comerciais principais precisam de ser processadas no país antes da exportação. Isto é o que aconteceu de mais posi-tivo no sector desde 2004. No entanto, demorou 8 anos para implementar esta política simples, e a sua implementação plena está actualmente a ser minada por regulamentos que permitem a exportação de madeira bruta serrada. A finalidade da exigência de se fazer o processamento é es-timular a industrialização interna de alta qualidade do sector florestal, é criar postos de trabalho e é fortalecer a criatividade e a energia das pessoas. Em vez disso, há uma proliferação de serrações baratas, a empregarem trabalhadores estrangeiros, e capazes de produzir apenas tábuas ásperas serradas. A política industrial para a silvicultura continua pouco desenvolvida e a implementação das poucas prescrições simples existentes está a comprometer o sector e a economia provincial em vez de os fortalecer. A comercialização de madeira serrada na China não apresenta nenhum problema, se as empresas de Moçambique se puderem tornar transparentes, fiáveis e mantive-rem padrões elevados de qualidade. Na verdade, Moçambique poderia aprender muito com a abordagem chinesa às indústrias florestais.

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8. Controlo da Exportação de MadeiraEm 2004, documentámos a exportação ilegal de madeira, apontando irregularidades com o licen-ciamento da exportação, o manuseamento portuário e o despacho alfandegário. Comparando as estatísticas de exportação de agências diferentes, estimámos que pelo menos 40-50% da madeira que saía da Zambézia era ilegal.

Em 2008, o DPA e o governador citaram as melhorias do porto como um indicador de que a exportação da madeira estava agora muito melhor controlada.

8.1 Gestão dos PortosEm 2005, a empresa privada Cornelder assumiu a gestão do porto, substituindo os Caminhos de Ferro de Moçambique. Cornelder fez muitas melhorias na infra-estrutura e na operação do porto. Pavimentou toda a área e renovou os armazéns, ergueu novas vedações seguras, com um novo portão seguro e um posto de guardas.

Desde o final de 2007 que a Cornelder deixou de permitir que os contentores fossem cheios fora do porto, e insiste para que toda a madeira seja primeiro trazida para o porto e, depois, car-regada nos contentores, por empregados da Cornelder. Isto levou aparentemente a reduções na actividade ilegal. Anteriormente, os exportadores enchiam os contentores normalmente nos seus próprios pátios de toros. Embora fosse previsto que os funcionários das Alfândegas e dos SPFFBZ estivessem presentes para supervisionar as operações, este passou a ser o caminho principal para exportar espécies ilegais e volumes clandestinos de toros.

8.2 AlfândegasOs procedimentos aduaneiros, aparentemente, também melhoraram muito. O Reino Unido forne-ceu assistência técnica até 2005, e todas as sedes provinciais já estão informatizadas e ligadas a um computador central, em Maputo. Existe um departamento de investigações. Foi-nos concedi-do pleno acesso aos seus documentos.

Mesmo assim, continua a existir corrupção. Além da pequena corrupção para “acelerar” a tra-mitação de documentos, aparentemente não é nada fora de comum os exportadores pagarem às Alfândegas para “perderem” os seus documentos depois de se efectuar a exportação. E um caso notório discutido abaixo, demonstra como é fácil, através de subornos, preparar o caminho para as exportações saírem do país.

Embora tenha havido claramente algumas melhorias importantes nestes dois aspectos do pro-cesso de exportação da madeira, a análise das estatísticas oficiais e dois casos recentes notórios de exportação ilegal, sugerem que estas melhorias não tiveram um grande impacto.

8.3 Estatísticas oficiais Os SPFFBZ controlam o passo mais importante da exportação de madeira – emitir as licenças de exportação de madeira. As Alfândegas e a Cornelder só processam simplesmente as licenças de exportação. A Tabela 9 apresenta as estatísticas de exportação de madeira destas três agências. Tal como em 2004, há discrepâncias enormes entre os valores reportados pelos SPFFBZ e os da-dos fornecidos pelas outras agências. Esta é uma prova clara dos problemas que persistem, e que apontam para o papel dos SPFFBZ a facilitar a exportação ilegal.

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Tristezas Tropicais

Tabela 9: Estatísticas oficiais sobre a exportação de madeira e de madeira ser-rada: SPFFBZ, Alfândegas e Cornelder, 2002-2007

Agência/item 2002 2003 2004 2005 2006 2007

SPFFBZ

Toros 28,461 20,684 11,432 12,093 10,576* 15,529

Serrada 948 1,494 962 577 1,795 3,926

TOTAL 29,409 22,178 12,394 12,670 12,371 18,487

Alfândegas

Toros 29,699 32,642 27,308 42,658

Serrada 2,156 1,839 2,420 4,599

TOTAL 31,855 34,481 29,728 47,257

% dif com SPFFBZ +257 +272 +240 +255

Cornelder

Toros 34311 26,735 31,167 18,779.4 30,448 37,241

Serrada em falta 136 em falta 2,963.6 1,179 4,164

TOTAL 34,311 26,871 31,167 21,743 31,627 41,405

% dif com SPFFBZ (+251) +171 +255 +223

Fontes: relatórios anuais dos SPFFBZ; Alfândegas: registo de exportações; Cornelder: manuseamento mensal* reportaram-se só 3 espécies: pau ferro, mondzo, muaga.

As estatísticas oficiais na Tabela 9 são apenas uma parte da história. Uma análise mais aprofun-dada dos documentos de transporte marítimo revela mais irregularidades. A maior parte das ma-deiras sai de Quelimane em contentores de 20 pés. Estes têm uma capacidade máxima de 33 m3 ou 28.200 kg e, normalmente, contêm 15-20 m3 de toros. O transporte marítimo é cobrado por uma taxa fixa por contentor, dependendo da distância (China $ 2000), portanto os exportadores devem tentar maximizar o volume de madeira que carregam por contentor. No entanto, os docu-mentos oficiais sugerem que os contentores saem apenas com uma fracção desse volume. A tabela 12 abaixo apresenta exemplos relacionados com a exportação de pau preto. A declaração da Gre-en Crown de 3 m3 por contentor é equivalente a pelo menos 80% de exportação ilegal.

8.4 Casos de exportação ilegal

i) Pau preto

Nos finais de 2007 e no início de 2008, houve um grande escândalo que envolveu o corte e a ex-portação de pau preto - (Dalbergia melanoxylon).

Sendo uma espécie preciosa, a cota anual disponível para os titulares de licenças simples é fixada pelo Ministro. Em 2007, esta cota total foi de 100 m3, mas de acordo com os regulamentos, as licenças têm que ser solicitadas em Janeiro. Visto que, no início do ano, não houve procura de pau preto, não foram efectivamente pedidas nem emitias licenças. Os titulares de concessões têm direito a colher aquilo que estiver indicado no seu contrato de gestão. Na Zambézia, 12 contratos de concessão25 incluem pau preto, com um total de 720 m3.

Por volta de Setembro, a procura começou a aumentar. Não foi claro se isto aconteceu porque os operadores identificaram o pau preto como uma espécie que se podia exportar na forma de

25 veja nota 2, pagina 7.

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Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

toros, ou porque os fabricantes chineses compreenderam que este poderia servir para substituir madeiras asiáticas muito mais caras, em móveis e folheados. Os operadores começaram a ofere-cer $190-$350/m3, os operadores de licenças simples começaram a pedir licenças (apesar de o prazo para o licenciamento já ter passado), também como o fizeram alguns titulares de conces-sões. O assunto difundiu-se e iniciou-se uma onda de corte ilegal em toda a província.

O DPA alegou que os SPFFBZ licenciaram um total de 494m3, dos quais 249 m3 foram para 3 titulares de concessões e 245 m3 para operadores de licenças simples. Os detalhes encontram-se na Tabela 10. Dos três titulares de concessões que obtiveram licenças, apenas a Calibu Timber, uma empresa especializada em pau preto, tinha efectivamente direito a ter uma licença. A Me-talwood tinha realmente 180 m3 incluídos no seu plano de gestão, mas, pormenor importante, não tinha nenhum volume no seu contrato de concessão actual. Ali Ossene obteve uma licença de 50 m3, mas só tinha 5 m3 no seu plano de gestão e, segundo os SPFFBZ, a sua concessão já tinha sido anulada.

Isto já são 339 m3 a mais daquilo que era estritamente e teóreticamente legal. No entanto, observadores estimam que tenham entrado mais de 3500 m3 em Quelimane, antes do final do ano. Um operador reportou que, a certa altura, entravam cerca de 30 camiões por dia na cidade, carregados com pau preto, e que surgiam pequenos parques de toros por toda a parte. Quando começou a procura, citaram-se preços de $ 700/tonelada. Passado um par de meses, como os madeireiros rebaixavam o preço uns dos outros, o preço baixou para $400/tonelada e, por fim, eles só recebiam 150 dólares por metro cúbico, e os compradores asiáticos estavam novamente a vigarizá-los nas medições.

Fotografia 13: Pau preto da Zam-bézia num armazém em Furen Ma-rket, Xangai, China

Fotografia 14: Extremidade dum toro de pau preto, com sigla do madeirei-ro zambeziano de licença simples

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Tristezas Tropicais

Tabela 10: Titulares de licenças de pau preto, licenciamento e direito legal (de planos de gestão aprovados)

Operador Licenciado

(m3) Direito actual (m3)

Concessão

Metalwood 180 0

Calibu Timber 19 50

Ali Ossene 50 5

SUBTOTAL 249 55

Licença Simples teóretico 100

Santos Munene 25 0

Inacio Davane 25 0

Amiro Brahim Hussene 40 0

Moh Iqbal 20 0

N. Samamad 20 0

Carlos Ditiane 30 0

Aires Baronet 25 0

Adriano J Maria 15 0

Rafael C. Mubaniane 10 0

Rui Silva Borges 20 0

Candida Alves 15 0

SUBTOTAL 245 100

TOTAL 494 155

Houve tantas pessoas a queixarem-se na Zambézia que o governo teve de agir. Lançou-se um inquérito especial a partir de Maputo, e o Ministério insistiu para que as cargas fossem pesadas antes de serem exportadas. Isto foi efectuado pela associação dos operadores industriais ADI-MAZ, nas balanças de Madal SARL. Pesaram-se mais de 900 m3, o dobro do volume licenciado. A exportação começou e, de acordo com os relatórios oficiais, autorizaram-se 615 m3 a serem exportados (mais do que os SPFFBZ admitiram terem licenciado). No entanto, a análise do registo dos despachos alfandegários (Tabela 11), revela que se tenham exportado, pelo menos, 899 m3.

Uma análise mais aprofundada dos dados aduaneiros sugere que, mesmo este número é um caso grave de sub-reporte. A maior parte do pau preto saiu em contentores de 20 pés. Tal como mencionado acima, estes contentores normalmente contêm 15-20 m3 de madeira. A Tabela 12 mostra como se sub-reportaram os transportes marítimos. Parece que se declaram os toros legais (documentados) e, depois, adicionam-se os toros ilegais para encher os contentores.

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Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

Tabela 11: Registos das alfândegas relativos às exportações de pau preto

Empresa Navio/viagem m3

TTT Timber Songo 163 30.3

TTT Timber Songo 164 29.78

Gordon Kenny Songo 164 76.85

Calibu Optima 408 7.5

Flaminga Optima 408 84.4

Alman Optima 408 43.73

Green Crown Optima 408 51.84

Good Year Optima 408 51.4

OLAM Chopol 254.23

Weida UAFL 54.73

TTT Timber UAFL 63.59

MJB Filhos Optima 62.7

Weida Songo 167 88.37

TOTAL 899.42

Fonte: Alfândegas: registo de despachos

Em Março de 2008, a OLAM declarou a exportação de 256 m3 de pau preto no navio Chopol 2. Fez parte dum transporte misto de cerca de 1450 m3, incluindo mais de 800 m3 de pranchas de pau ferro e cerca de 300 m3 de mucarala. Como veremos adiante, mucarala - uma madeira de valor relativamente baixo da Classe 3, que se pode exportar como toro - está a ser usada para encobrir a exportação de toros doutras espécies. Do mesmo modo, os transportes supostamente de tábuas de pau ferro, são utilizados para encobrir a exportação de toros de pau ferro. O volume total também é bastante baixo para um navio como o Chopol. Não existe nenhuma prova directa de que tenha havido algo irregular. Mas, em Maio de 2008, a OLAM tinha uma reserva estimada de 10.000 m3 de madeira. Isto era tão ilegal que já estavam a exportar para a China, com base nas licenças de corte para 2008, antes da época de corte ter sequer começado.

Tabela 12: Sub-reporte das exportações de pau preto

Exportador Data/navio No de contentores (m3)

Declarados m3 equivalentes

/contentor m3 ilegais *

TTT Timber 12/07: Songo 163 10 30 3 120

TTT Timber 01/08: Songo 164 10 62 6 88

Gordon Kenny 01/08: Songo 164 10 124.2 12.4 26

Madeiras Alman 02/08: Optima 4 43.7 10.92 17

Green Crown 03/08:Optima 409 16 51.8 3.23 188.2

Weida 04/08: UAFL exp 12 54 4.5 126

Weida 04/08: Songo 167 13 88 6.8 107

Fonte: Documentos das Alfândegas; * assumindo 15 m3 num contentor de 33 m3

No total, a OLAM Moçambique admitiu (a nós) ter comprado, pelo menos, 600 m3 de pau preto. Tam-bém nos disseram que todo o pau preto, que se encontrava na altura no seu parque de toros era legal, mas que eles não tinham conseguido exportá-lo, devido ao corte ilegal massivo por parte doutros ope-radores. Eles fizeram-se passar por vítimas infelizes da desonestidade doutras pessoas e estavam a peticionar a nível ministerial. Eles esperavam que a proibição de exportação fosse abolida em breve.

A explicação dos SPFFBZ para este fiasco é que eles nunca tinham manuseado toros de forma tão irregular como o pau preto e, por isso, não tinham a capacidade para avaliar os volumes que

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Tristezas Tropicais

se estavam a apresentar para exportação. Registaram a pesagem a qual, dizem, ajudou, e quando perceberam que tinham exportado 30 vezes a cota anual de pau preto, decidiram ser severos e tomaram as medidas políticas adequadas. Agora dizem que já não se permite a exportação de pau preto, durante dois anos. Isto pode ser verdade: na China fomos informados que o mercado de pau preto está completamente saturado, havendo aproximadamente 30.000 m3 de toros não vendidos nos parques.

Soubemos posteriormente dum outro desenvolvimento. Nos finais de 2008, os SPFFBZ/DPA confiscaram 16,000 toros de pau preto nos parques de toros dos principais comerciantes asi-áticos. Estes foram postos à venda em leilão, mas ninguém fez propostas para os comprar. Em seguida, pressionado pelos comerciantes, o governo assinou um memorando a devolver os toros aos respectivos operadores, pelo preço duma taxa da licença. Assim, resolveu-se o escândalo: os autores não foram multados nem punidos doutra forma qualquer; na verdade - foi-lhes devolvida a sua madeira ilegal, e foram autorizados a lucrarem com isso! Não houve investigação nenhuma, sobre o modo como foi possível os toros chegarem aos pátios, em primeiro lugar, ou sobre o modo como se permitiu que a situação se desenvolvesse daquela maneira, mas pode-se olhar para as autoridades como tendo tentado fazer o que era correcto.

ii) 30 contentores de toros de pau ferro

Em Setembro de 2007, houve uma informação acerca duma exportação ilegal de toros provenien-te de Quelimane, no navio MV Songo. Inicialmente, o governador e o DPA resistiram firmemente a proceder a qualquer acção ou investigação, mas as queixas foram dirigidas às Alfândegas em Maputo, que ordenaram o descarregamento dos 30 contentores do navio, e mandaram uma equi-pa proveniente da Beira, para investigar o assunto. Os contentores eram supostos conter toros de mucarala mas, durante a inspecção, encontraram-se muitos toros de pau ferro misturados com estes. Os toros pertenciam à empresa TTT Timber, uma das quatro empresas que operam em Quelimane, propriedade de Ken Ho, um empresário taiwanês. O gerente da TTT Timber ad-mitiu ter pago 300.000 MTN a pessoal identificado dos SPFFBZ, para emitir licenças falsas de exportação, e 150,000 MTN às Alfândegas, para facilitar o despacho. Este pessoal não foi preso, nem mesmo suspenso e, em vez de serem expulsos de Moçambique, a TTT Timber foi autorizada a continuar as suas operações. No inquérito, o DPA disse que o caso estava “sob investigação”. O Chefe Interino dos SPFFBZ, disse que “roubo é roubo, isso acontece e as autoridades provinciais estão a tomar as medidas adequadas”. Não foi até Agosto de 2008 que o caso ficou finalmente resolvido. O Chefe da Unidade de Execução dos SPFFBZ Humberto Filipe e Ana Pinheiro foram presos, e serão acusados no âmbito da legislação anti-corrupção. O funcionário das Alfândegas não foi identificado.

Apesar daquilo que aconteceu, a TTT Timber ainda não estava a serrar os seus toros em Maio de 2008. O gerente disse-nos, “é uma grande dor de cabeça”, e ele está simplesmente a armazenar os toros no parque, à espera que o governo permitir a exportação de toros redondos outra vez. “Se não tivermos alternativa, então vamos serrar, ou apenas comerciar as espécies que podem ser exportados como toros - pau preto e chacate”. A TTT Timber tem pelo menos 100 m3 de pau pre-to prontos para serem exportados. Entretanto, os toros ilegais foram vendidos em hasta pública por $160.000, mas os “toros legais” provenientes da carga marítima, no valor de $30.000, foram devolvidos à TTT Timber e exportados (notícias da televisão).

Nos últimos 12 meses, houve pelo menos duas outras apreensões de contentores ilegais - 47 em Pemba, pertencentes à empresa chinesa MOFID, e um número espectacular de 531 em Naca-la26, pertencentes a 8 empresas chinesas, incluindo algumas que também operam na Zambézia.

26 Veja http://www.integridadepublica.org.mz/index_en.asp?sub=actual&doc=6, e http://www.citizen.co.za/in-dex/article.aspx?pDesc=50465,1,22

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Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

iii) Outros casos

Para além destes grandes casos, cometeram-se algumas novas fraudes de menor dimensão nos úl-timos 4 anos. Uma empresa, Flying Dragon, um comprador chinês, tem estado a exportar através do Malawi. Estabeleceram dois parques de toros em Milange, depois exportaram para o Malawi e, a partir daí, reexportam para a China, de comboio através da África do Sul, e de navio a partir de Durban. As estatísticas do comércio de madeira da China, agora apresentam o Malawi como um parceiro comercial.

8.5 Investigações Oficiais

Em Outubro de 2008, as Alfândega de Maputo lançaram uma investigação oficial sobre a expor-tação de madeira de Quelimane. Encontraram casos generalizados de exportação de madeira ser-rada, fora das dimensões permitidas pelo Diploma Ministerial 142/07. Isto foi reportado ao DPA, para que tomasse medidas. O DPA decidiu multar os operadores, em vez de proibir a exportação e de confiscar a madeira, e essas multas nunca foram aplicadas.

Mais importante (e confirmando as evidências produzidas no relatório “Um Take-Away Chi-nês”), encontraram a prática muito generalizada de sub-notificação dos volumes exportados, es-timada em 50%. A conivência é evidente, porque a documentação oficial dos comerciantes e do DPA todas parecem corresponder. Também encontraram uma sub-facturação generalizada de valores de madeira exportada, para evitar impostos locais e chineses27, estimada em 75%. Conclu-íram que houve uma extrema negligência por parte das Alfândegas e do DPA. Visto que a madeira é a principal exportação de Quelimane, o pessoal não pode alegar desconhecer as regras ou os métodos. Embora a responsabilidade por garantir a exportação legal da madeira resida no DPA, as Alfândegas têm um papel a desempenhar, verificando os documentos contra a própria merca-doria. Eles recomendaram a acção disciplinar e a substituição do pessoal, seguido de transferên-cias regulares para outros lugares e províncias, mencionando o tempo de serviço num único posto como algo que conduz à complacência, arrogância e corrupção. O seu relatório foi apresentado ao DPA em Quelimane, mas sua publicação foi suprimida, e não se tomaram medidas nenhumas.

8.6 O que dizem os operadores:

“A exportação ilegal não está a ficar muito mais difícil, mas está a ficar cada vez mais cara para o operador”. A OLAM Moçambique disse-nos que em 2006/07, a madeira ilegal (sem qualquer tipo de documentação), foi comprada pelos Chineses a um valor de menos $10-$15 por m3 - mas agora o desconto é mais provavelmente de $40-$60”.

“Houve uma mudança no clima. Oficialmente, a exportação tem vindo a estabilizar. Os grandes navios agora são coreanos, com o frete pré-pago no destino. Declaram 1000 m3, mas os verda-deiros papéis que estão com a empresa referem 10.000 m3. É mais difícil aldrabar com os con-tentores - mas ainda acontece, com a conivência das autoridades da silvicultura e aduaneiras. De qualquer maneira - as grandes quantidades continuam a sair a granel”28.

“Existem dois conjuntos de documentos, um para os funcionários, e um para a empresa marí-tima, que tem de declarar o volume real e cobrar a taxa correcta.”

Em Moçambique, os operadores de licenças simples continuam a reclamar sobre a forma como os compradores asiáticos medem os toros. Muitas vezes medem apenas o diâmetro do cerne, ou, se o toro tiver uma forma irregular, a distância mais curta através do centro do toro. Normal-

27 Na China cobra-se 13% IVA na importação de toros e 17% na importação de madeira processada. Isto ajuda também explicar a preferência declarada pelos toros.

28 Isto foi verdade até aos finais de 2007, quando o último graneleiro veio para Quelimane.

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mente, qualquer defeito é subtraído do volume total. Citam-se as procuras da parte do mercado chinês para justificar estas práticas. Contudo, na China nós aprendemos que, no ponto de venda, a medição do volume se baseia em toda a circunferência do toro no seu meio-ponto. Portanto, em Quelimane as práticas chinesas são uma vigarice flagrante ao produtor zambeziano e às florestas zambezianas.

Conclusão:

O porto pode ter sido reabilitado, mas as estatísticas oficiais, os documentos alfandegários, os casos de notoriedade e os relatos dos informadores documentados, ainda demonstram que a ex-portação ilegal continua a um passo acelerado. As coisas podem ter-se tornado um pouco mais difíceis para os exportadores ilegais, mas agora há muito mais madeira a sair da Zambézia através de Nacala e do Malawi.

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9. Reservas remanescentes de madeira comercial

Voltamos à nossa declaração inicial – “não há mais madeira!”. Esta afirmação pode ser um exage-ro, mas as reservas remanescentes da madeira constituem a questão fundamental para qualquer estudo sobre o sector florestal, e a linha de fundo para o seu futuro.

Em 2004, o objectivo do estudo “Um Take-Away Chinês!” não era exigir a interrupção da sil-vicultura na Zambézia, mas apelar à gestão sustentável das florestas e ao seu fortalecimento, de forma a ajudar aliviar a pobreza. Uma das conclusões principais foi de que o abate de madeira na Zambézia estava fora de controlo, ameaçando a disponibilidade a longo prazo das principais espé-cies comerciais, e comprometendo o seu papel no desenvolvimento económico da província.

Em 2008, talvez a diferença de opinião mais persistente na silvicultura zambeziana, se refira às reservas remanescentes de madeira: o governo a declarar que se estabeleceu a gestão susten-tável e que se mantém uma abundância de madeira, e os operadores a lamentarem que a madeira valiosa esteja quase a acabar, e que a indústria não tem futuro.

Infelizmente, não podemos terminar com um veredicto categórico. Seria necessário realizar um inventário para determinar a situação real. Houve dois inventários recentes na Zambézia mas, tal como se discutiu anteriormente, ambos foram conduzidos por empresas ligadas à DNFFB, e provavelmente representam avaliações excessivas das reservas de madeira, para justificar a ma-nutenção dos níveis de abate. A terminar este estudo, ficamos com as opiniões e com as provas acessórias:

Só os funcionários do governo acreditam que ainda há muita madeira boa. O engenheiro Chi-bite, Chefe Interino dos SPFFBZ, disse que não sabia porque é que as pessoas estavam a dizer que não havia mais madeira. Ele citou o inventário de 2002 da Zambézia, e acrescentou que algumas áreas, tais como Lugela, nunca tinham sido exploradas. Ele admitiu que, no Distrito de Morrum-bala, o mondzo (Combretum imberbe) foi completamente esgotado, mas afirmou que noutros lugares as reservas de mondzo ainda são boas.

O mondzo é um caso interessante e instrutivo. É uma madeira dura e pesada, de crescimen-to extremamente lento, que se encontra principalmente nas planícies aluviais. O inventário da Zambézia publicado em 2005, estabeleceu um corte anual autorizado (AAC), de 899 m3, 89% dos quais se encontravam em Morrumbala. Apenas quatro outros distritos tinham algum mondzo, portanto as reservas existentes certamente não são boas noutros lugares. Em 2005 começou a haver uma grave preocupação com a exploração excessiva de mondzo, quando o antigo DPA Jone, proibiu o corte nos distritos de Morrumbala, Mocuba e Mopeia, devido à terrível exploração ex-cessiva que tinha ocorrido. Não obstante, em 2005, a última vez que os SPFFBZ reportaram a ex-portação de toros por espécie, exportaram-se 3.484 m3 - quase quatro vezes o AAC! O novo DPA restabeleceu a exploração em 2006.

A maior parte dos nossos outros informantes estavam preocupados com as reservas de madei-ra, e os comentários e o comportamento dos operadores são particularmente reveladores:

“O inventário estava completamente errado – já não havia mais nada. O novo Inventário Nacio-nal também está errado - 80% das espécies comerciais desapareceram, e aquelas que sobraram estão tão dispersas que não se podem colher comercialmente. Dizem que a Zambézia tem 92.000 m3 de mondzo - mas estes já desapareceram há muitos anos”.

O director da OLAM Moçambique na Zambézia, um dos maiores exportadores de madeira na província disse-nos que, ao actual ritmo e intensidade do corte, a empresa duvida que existam quantidades industriais de madeira num futuro próximo. Os custos de encontrar, cortar, extrair e transportar a madeira, já estão a reduzir os seus lucros até a um nível insustentável. Ele citou “operadores em geral” como os que acreditam que as reservas de madeira comercial se manterão

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apenas por mais 5 anos. Esta é provavelmente a razão pela qual a OLAM não estabeleceu, até agora, a sua própria serração.

Um furtivo que encontrámos em Morrumbala disse-nos que agora se está a tornar difícil en-contrar pau ferro (Swartzia madagascarensis) com uma qualidade razoável e que o mondzo de-sapareceu quase todo.

Em 2008 muitas pessoas, incluindo o governador e o DPA, já estavam a falar da necessida-de de começar a tentar comercializar as espécies subutilizadas de 38-40. Os consultores são tão indiferentes como os operadores e tão desinteressados como os doadores. Eduardo Mansur, há muito tempo consultor da FAO em Moçambique29, repudiou as preocupações sobre a governação florestal na Zambézia, destacando quão insignificantes eram as florestas, em comparação com os países da África Central, e que as práticas corruptas eram simplesmente típicas de África. Sim, provavelmente levaram todas as boas madeiras - o que Moçambique tem de fazer agora, é come-çar a comercializar as suas outras espécies. O facto infeliz é que o maneio florestal em Moçambi-que provavelmente só foi economicamente viável com base nas espécies de grande valor. Agora que estas já foram extraídas, poucos investidores estarão interessados e, sendo madeiras duras pesadas, estas espécies não voltarão a aparecer tão cedo.

Há a possibilidade preocupante de o maneio florestal em Moçambique poder ter sido econo-micamente viável só com base nas espécies de grande valor, que ocuparam um nicho especial a substituir as madeiras muito preciosas e raras no mercado, na reprodução de mobiliário tra-dicional, na China. Mesmo estas poucas espécies enfrentam uma concorrência considerável das espécies dos países tropicais húmidos da África e Ásia, com propriedades semelhantes, mas com toros maiores com uma melhor forma. As espécies subutilizadas da Zambézia são susceptíveis de enfrentar uma concorrência semelhante. Assim que tiverem desaparecido as principais espécies comerciais, haverá poucos investidores industriais interessados na Zambézia e, sendo madeiras duras pesadas, estas espécies não voltarão a aparecer tão cedo.

Fotografia 15: Comunidade do distrito de Mocuba, sentados em um dos muitos toros abandonados por um dos operadores de licença simples que cortou a ma-deira nas suas florestas em 2007

29 A esposa de Mansur, Carla Pereira, redigiu o plano de gestão para a Madal.

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10. Conclusões e RecomendaçõesRigorosamente falando, a maior parte das declarações do DPA e do governador foram, de facto, verdadeiras – o licenciamento anual manteve-se abaixo dos 50.000 m3, o número de madeireiros com licenças simples diminuiu, o número de concessões aumentou, há mais postos de inspecção, algumas comunidades ajudam na aplicação da legislação, o porto é controlado de forma melhor, as exportações de toros diminuíram drasticamente, há um maior número de serrações e mais processamento de madeira no país e, provavelmente, mais postos de trabalho na silvicultura. No entanto, não podemos oferecer o relatório positivo que o Governador procurava.

A conclusão deste estudo é que o problema fundamental encontrado em 2004 , de uma “elite predadora” extraindo tanto do sector das florestas para o seu beneficio pessoal e que actualmente impede o seu desenvolvimento sustentavel30 ainda nao foi resolvido. As a result, the implemen-tation of national policies for poverty alleviation, sustainable management of natural resources, industrial development and job creation,good governance and fighting corruption in the forest sector in Zambezia remains a complete and abject failure. Entretanto a situação se deteriorou de modo significativo desde de 2004 e com as eleicoes nacionais daqui a algum tempo, concerteza que vai piorar. “O Take-Away Chines” de toros Zambezianos continua agora via o porto de Nacala, e as estorias da floresta da Zambezia continuarao a ser muito tristes.

Fotografia 15 apresenta a comunidade do distrito de Mocuba, sentados em um dos muitos toros abandonados por um dos operadores de licença simples que cortou a madeira nas suas florestas em 2007. Alguns destes homens trabalham para o operador toda a estacao, mas ele fugiu sem pagar a ninguem. Um outro operador fez a mesma coisa em 2008. Esta comunidade da floresta tem sido virtualmente despojada da sua valiosa madeira e tem sido deixados ainda mais pobres do que antes.

Indústrias legais também continuam a sofrer. Solapados pela politica nacional e a falta da apli-cação da lei, sobe-apoiada pelo Governo local e sobre-fiscalizados pelos SPFFBZ e outras autori-dades locais, agora lutam pela proliferação de serrações de qualidade baixa, levando o negocio que poderia ser deles. Os doadores continuam a olhar para o outro lado, acreditando que as suas politicas estará a criar um modelo de desenvolvimento para África em Moçambique e desenhando programas florestais como se o problema não existisse31. Mais que triste estas estoiras são um re-flexo vergonhoso no progresso de “desenvolvimento” em Moçambique e uma traição aos pobres pelo seu Governo e os doadores.

Os principais pontos de preocupação são:• O sector florestal continua a não desempenhar quase papel nenhum na redução da pobreza

nas áreas rurais. • A continuação da exportação de tábuas ásperas serradas está a minar a proibição da expor-

tação de toros, bem como o desenvolvimento da indústria florestal e a verdadeira criação de emprego. As indústrias locais sérias continuam a não ter apoio do Governo, e permitiu-se a proliferação de serrações de fraca qualidade.

• A corrupção e as actividades ilegais têm paralisado o desenvolvimento do sector e desta pro-víncia.

30 Ver Hanlon 2008 para uma discussao e uma analise mais detalhada

31 Um dos mais perturbadores factos neste estudo e a facilidade com que se manipula os criterios e indicadores simplistas usados pelos doadores e Governo para monitorar a politica de implemantacao.

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Tristezas Tropicais

• A falta de controlo que observámos no sector das licenças simples em 2004, espalhou-se para o agora muito maior sector das concessões. A colheita continua a estar fora de controlo.

• A gestão insustentável das florestas tem estado consagrada em 32 planos de gestão, aprova-dos apesar da sua violação do ciclo de corte recomendado de 30 anos.

• Não se fazem esforços para aplicar a lei, mas sim para criar maneiras de contornar os regula-mentos.

• O acesso à informação, a transparência de relatórios e a responsabilização do governo perante os seus cidadãos, deterioraram-se significativamente. O reporte dos SPFFBZ piorou. Nunca se permitiria a uma empresa privada a apresentação de contas tão incompletas - e relatório anual dos SPFFBZ é efectivamente uma prestação de contas à nação.

• A prioridade dada pelo Governo aos direitos das comunidades à terra, reduziu-se a um “campo de actuação ao mesmo nível”, no qual as comunidades têm que competir nas mesmas condi-ções que os investidores mais poderosos. Não se aprovam os pedidos de concessão das comu-nidades.

• Uma das observações mais perturbadoras deste estudo é precisamente a facilidade com que se subvertem os critérios e os indicadores simplistas utilizados pelos doadores e pelo gover-no, para monitorizar a implementação de políticas. Os apoiantes de PROAGRI provavelmente teriam aceitado as informações e os dados do Governador e do DPA sem reflectir, teriam con-cluído que as coisas tinham melhorado, teriam aplaudido e renovado o apoio ao sector.

Recomendações:

• Tal como se recomendou em 2006, pôr em prática uma moratória sobre licenças simples e novas concessões; e sujeitar todas as concessões existentes a uma avaliação independente, e quaisquer operadores aprovados continuarem a ser sujeitos a uma monitorização florestal independente habitual31.

• Rever a política de concessões para garantir a existência de menos e maiores concessões, com AACs baseados num ciclo de pelo menos 30 anos, que são suficientes para apoiar uma indús-tria viável.

• Restabelecer o requisito do processamento total; acabar com a serragem bruta e a exportação de pranchas.

• Está a haver localmente algum processamento de alta qualidade na Zambézia - pode haver mais. Investir nisto. Apoiar as indústrias locais no seu desenvolvimento económico sustentá-vel. Faz disponivel credito numa taxa razoavel. Oferecer formação técnica aos trabalhadores da indústria florestal.

• Realizar análises independentes dos dois inventários florestais existentes e desenvolver uma avaliação realista dos recursos florestais remanescentes.

• Como parte das bases de dados informatizados e reactivados do licenciamento florestal e das infracções, imprimir licenças e autorizações de transporte directamente a partir do computa-dor, com números de referência únicos ligados à base de dados.

• Publicar os detalhes de todas as licenças emitidas em cada ano, e informar as comunidades interessadas sobre os volumes e as espécies que serão extraídas e sobre o valor dos direitos de 20% que podem prever receber.

32 O período de recessão económica global e os requisitos do processamento enfraqueceram os mercados em Quelimane desde 2008, apresentando uma excelente oportunidade para implementar uma moratória total ou parcial. Um documento em separado discutirá os impactos da crise económica global na sector florestal na Zambézia.

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Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

• Fortalecer a aplicação da lei no ponto de fiscalização em Nicoadala – visto que se encontra na única estrada para o porto de Quelimane, é o ponto chave para qualquer aplicação da legisla-ção florestal.

• Como uma questão de urgência, deve-se restabelecer o ponto de fiscalização completamente informatizado dos SPFFBZ, no porto de Quelimane.

• Estabelecer ligações de informática completas entre Nicoadala e os pontos de fiscalização no porto, e a sede provincial.

• Ligar as bases de dados de licenciamento e das infracções a um sítio da internet, com acesso aberto ao público.

• Conceber um formato nacional anual normalizado de reporte para a silvicultura, que seja sig-nificativo, e assegurar o seu acabamento rigoroso todos os anos.

• Apoiar as concessões de base comunitária, como uma estratégia alternativa para estabelecer o maneio florestal sustentável em benefício dos pobres.

• Desenvolver um sistema para utilizar o fundo de 15% para replantações, para pagar às comu-nidades para estas estabelecerem viveiros e efectuarem os trabalhos de replantio.

• Investir em pesquisa e desenvolvimento, para mercados de produtos de madeira processada e de produtos fabricados de madeira, na China e noutros países.

• Interceder junto do governo chinês, para promover a importação de madeira processada de Moçambique, por parte das suas empresas estatais.

• Tal como se recomendou em 2006, tirar os políticos, os militares e os funcionários públicos da floresta. Impedir as empresas tais como a OLAM e a Green Crown de operarem ilegalmente e com impunidade.

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Tristezas Tropicais

11. Referências(2007) The Legal Framework for Recognising and Acquiring Rights to Rural Land in Mozambi-que

Centro de Integridade Pública (2007) [http://www.integridadepublica.org.mz] Moçambique

CHITARA, S (2003) Instrumentos para a Promoção do Investimento Privado na Indústria Flores-tal Mocambicana. MADER, DNFFB, DFID.

HANLON J and T SMART (2008). Do Bicycles Equal Development in Mozambique? James Curry, London.

MACKENZIE Catherine (2006), Administração da Floresta na Zambézia, Moçambique: Um Take-Away Chinês!, Moçambique.

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Mais Histórias Tristes das Florestas da Zambézia

Apêndice 1

Corte anual admíssivel para as espécies comerciais por Distritos (Ciclo de corte 40 anos, factor de segurança 0,8)

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Mais Histórias Tristes das Florestas da

Zambézia