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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC SP ANDRÉ RIBEIRO DANTAS TUTELAS DE URGÊNCIA E TUTELAS DE EVIDÊNCIA NA ARBITRAGEM MESTRADO EM DIREITO SÃO PAULO 2013

TUTELAS DE URGÊNCIA E TUTELAS DE EVIDÊNCIA NA ARBITRAGEM Ribeiro... · pontifÍcia universidade catÓlica de sÃo paulo puc – sp andrÉ ribeiro dantas tutelas de urgÊncia e tutelas

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC – SP

ANDRÉ RIBEIRO DANTAS

TUTELAS DE URGÊNCIA E TUTELAS DE

EVIDÊNCIA NA ARBITRAGEM

MESTRADO EM DIREITO

SÃO PAULO

2013

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André Ribeiro Dantas

TUTELAS DE URGÊNCIA E TUTELAS DE

EVIDÊNCIA NA ARBITRAGEM

Mestrado em Direito

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, como exigência

parcial para obtenção do título de

MESTRE em Direito, na área de

concentração de Direito Civil, sob a

orientação do Prof. Dr. Eduardo Pellegrini

de Arruda Alvim.

São Paulo

2013

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Banca Examinadora

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RESUMO

O presente estudo versa sobre a possibilidade de

concessão de tutelas de urgência e de evidência na

arbitragem.

Na primeira parte, de cunho mais teórico, são

analisados o conceito, as características e as funções

próprias à jurisdição – bem como os poderes concedidos,

pela lei, ao árbitro –, para se concluir acerca da natureza

jurisdicional da arbitragem.

Já na segunda parte, após considerações sobre o

fundamento constitucional das tutelas de urgência e de

evidência, são estudadas as diversas hipóteses de

concessão dessas tutelas provisórias – antes ou durante

a arbitragem – nos casos em que a convenção de

arbitragem permita, seja omissa ou proíba a concessão

de tutelas de urgência ou de evidência.

Por fim, são consideradas as possibilidades de

revisão, pelo árbitro, de medidas urgentes concedidas

pelo Judiciário, e vice-versa.

Palavras chaves: Arbitragem – Tutelas de urgência – Tutelas de evidência.

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ABSTRACT

The present study focuses on the possibility of

granting measures of urgency and evidence in arbitration.

We divided this study in two parts, the first part, more

theoretical, we analysed the concept, features, the

specifics functions of this type of jurisdiction and also the

powers granted by law to the arbitrator or

compromissarius, to conclude about the legal

classification of the arbitration

At the second part, after considerations related to the

constitutional basis of measures of urgency and evidence

used in the arbitration, we studied several hypothesis for

granting such temporary measures, before or even after it

had started the arbitration, in cases that the Arbitration

Agreement or the arbitration clause allows, or the clause

omit or even prohibit , to grant measures of urgency and

evidence.

Finally, we considered the possibilities of review by

the referee, of urgent measures granted by the Judicial

System, and vice versa.

Keywords: Arbitration – Measures of urgency – Measures of evidence.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO: ............................................................................................... 7

PARTE I

JURISDIÇÃO E ARBITRAGEM – PODERES DO ÁRBITRO

I.1. Conceito de jurisdição:............................................................................. 9

I.2. Características da atividade jurisdicional: ............................................ 15

I.3. Atividades próprias à função jurisdicional: .......................................... 16

I.4. Os poderes do árbitro: ............................................................................ 19

I.5. Natureza jurisdicional da arbitragem: .................................................... 21

I.6. Diversas posições doutrinárias sobre a questão: ............................... 24

I.7. Cooperação entre árbitros e juízes: ....................................................... 39

PARTE II

TUTELAS DE URGÊNCIA E DE EVIDÊNCIA NA ARBITRAGEM

II.1. Tutela de urgência e tutela de evidência: ............................................ 44

II.2. Fundamento constitucional das tutelas de urgência e de evidência: 46

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II.3. Aplicam-se, à arbitragem, as garantias constitucionais do processo: 52

II.4. Tutelas de urgência na arbitragem: .......................................................... 53

II.5. Tutelas de evidência na arbitragem: ........................................................ 67

II.6. Tutelas de urgência e de evidência na convenção de arbitragem: .... 72

II.6.a. Omissão na convenção de arbitragem: ............................................... 73

II.6.b. Proibição na convenção de arbitragem: ............................................... 75

II.7. Tutelas antecedentes à instauração da arbitragem: .............................. 81

II.7.a. Da impossibilidade de concessão de tutelas de evidência anteriores à

instauração da arbitragem: ............................................................................... 82

II.7.b. Tutelas de urgência antecedentes à instituição da arbitragem: ..... 83

II.8. Revisão, pelo árbitro, de decisão liminar concedida pelo Judiciário: 98

II.9. Revisão, pelo Judiciário, de decisão liminar concedida pelo árbitro: 106

II. 10. As Medidas cautelares ou de urgência no anteprojeto elaborado pela

da Comissão para a reforma da lei de arbitragem: ..................................... 112

CONCLUSÃO: ....................................................................................................114

BIBLIOGRAFIA: ............................................................................................... 120

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INTRODUÇÃO

Desde a edição da Lei 9.307/96, a arbitragem vem se firmando no

Brasil, cada vez mais, como valioso meio alternativo para a solução de

controvérsias e contribuindo para um acesso à Justiça efetivo e razoavelmente

célere.

Pari passu, foram sendo superadas algumas incompreensões iniciais,

referentes à almejada e indispensável simbiose entre o Poder Judiciário e a

arbitragem.

De um lado, ninguém põe em dúvida que a arbitragem, ao desviar do

Judiciário causas de especial complexidade, vem contribuindo para que a

Justiça estatal dê efetividade à garantia constitucional da razoável duração do

processo. De outro lado, é indiscutível que a arbitragem depende do Judiciário

para o seu adequado funcionamento. E foi justamente por essa dependência,

que a Lei de arbitragem estabeleceu um verdadeiro “regime de cooperação”

entre árbitros e juízes.

O presente estudo tem por objeto um dos principais itens desse regime

de cooperação existente entre os juízos estatal e arbitral: a concessão e a

execução de tutelas de urgência e de evidência nas controvérsias submetidas

à arbitragem.

Para a correta intelecção da matéria, num primeiro momento será

analisado o entendimento de diversas correntes doutrinárias sobre o conceito

de jurisdição, as características e os elementos próprios à atividade

jurisdicional, e os poderes do árbitro e do juiz, para, depois, se concluir acerca

da natureza jurídica da arbitragem.

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Numa segunda etapa, será abordado o tema propriamente dito do

trabalho: as tutelas de urgência e de evidência na arbitragem.

Ao adentrar na matéria, será feito breve esclarecimento sobre a

denominação adotada pelo projeto de novo Código de Processo Civil, em

avançada tramitação no Congresso Nacional, que reclassificou as atuais

medidas provisórias assecuratórias e antecipatórias em “tutelas de urgência” e

“tutelas de evidência”.

Essa mesma classificação será utilizada para a análise da matéria no

âmbito da arbitragem.

Inicialmente, serão analisados os fundamentos constitucionais das

tutelas de urgência e de evidência e constatado que as garantias

constitucionais do processo também se aplicam à arbitragem.

Para abordar o tema da concessão de tutelas provisórias – de urgência

e de evidência – na arbitragem, primeiramente será considerada, em tese, a

possibilidade da decretação, e da execução, dessas tutelas pelo árbitro.

Num segundo momento serão estudadas as hipóteses em que a

convenção de arbitragem seja omissa ou proíba a concessão de tutelas de

urgência.

Por fim, será analisado o atual entendimento doutrinário e

jurisprudencial a respeito da concessão de tutelas anteriores à instauração da

arbitragem e de revisão, pelo árbitro, de decisões liminares concedidas pelo

Judiciário; bem como verificar-se-á a possibilidade de revisão, pelo Judiciário,

de decisão liminar concedida pelo árbitro.

Como se vê, trata-se de estudo com abrangência delimitada e que não

tem a pretensão de esgotar a matéria. Pelo contrário, o que aqui se deseja é,

apenas e tão somente, colacionar o atual entendimento da doutrina e da

jurisprudência sobre questões referentes à concessão de tutelas de urgência e

de evidência na arbitragem e, de alguma forma, contribuir para a melhor

compreensão desse instituto.

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PARTE I

JURISDIÇÃO E ARBITRAGEM – PODERES DO ÁRBITRO

Para a adequada análise das tutelas de urgência e de evidência no

âmbito da arbitragem, a primeira questão a ser abordada é a discussão acerca

do próprio instituto da arbitragem, como exercício de verdadeira jurisdição ou

simples forma convencional de resolução de conflitos.

Em outras palavras, importa analisar a natureza jurídica da arbitragem.

Até o advento da Lei 9.307/96 havia acirrada polêmica doutrinária

sobre a natureza jurídica da arbitragem.

Se bem que, após a edição da Lei de Arbitragem, essa polêmica tenha

arrefecido bastante – pois, hoje em dia, a grande maioria da doutrina e da

jurisprudência reconhece a natureza jurisdicional do instituto –, afigura-se

importante delinear os argumentos pró e contra tal entendimento.

Porém, antes de se analisar o porquê do caráter jurisdicional da

arbitragem, é preciso definir o conceito de jurisdição.

I.1. Conceito de jurisdição

A palavra “jurisdição” é derivada do vocábulo latino jurisdictio, formado

pelas expressões jus dicere, juris dictio, ou seja, a ação de “dizer o direito”, ou

de “administrar a justiça”.1

1 Cfr. De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, Editora Forense, 21

a Edição, 2003, p. 466.

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Nas sociedades estruturadas, onde é proibido a autotutela – ou “fazer a

justiça pelas próprias mãos” – a jurisdição costuma ser exercida

exclusivamente pelo Estado. É o princípio do monopólio estatal da jurisdição.

É verdade que há exceções a essa proibição da autotutela. No Brasil,

por exemplo, é permitida a legítima defesa (causa de exclusão de ilicitude, nos

termos dos artigos 23, II, e 25 do Código Penal) e o desforço imediato, nos

termos do art. 1210, § 1º, do Código Civil.

Contudo, mesmo nesses casos, a atividade jurisdicional não fica

excluída, sobretudo para verificar se houve excessos quando da legítima

defesa ou do desforço imediato.

Escreve a respeito Marcus Vinicius Rios Gonçalves:

“Com a evolução das instituições, o Estado assumiu para si,

em caráter exclusivo, a responsabilidade de dar solução aos

conflitos, proibindo que os próprios envolvidos o fizessem, de

forma unilateral.”2

A jurisdição é, assim, uma das funções do Estado.

Nos Estados modernos, influenciados pelas idéias da Revolução

Francesa, o poder único e soberano do Estado se manifesta, ou é exercido,

através de três funções. É a clássica “tripartição dos poderes”: a função

administrativa ou executiva, que cabe sobretudo ao Poder Executivo, a função

legislativa, que é atributo do Poder Legislativo e a função jurisdicional que

compete ao Poder Judiciário.

A jurisdição tem por finalidade, antes de tudo, a preservação da ordem

jurídica e da paz social e ela compreende não só a tarefa de “dizer o direito”,

mas de realizá-lo coativamente.3

2 Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novo Curso de Direito Processual Civil, Vol 1, Editora

Saraiva, 3a ed., p. 46.

3 Cfr. Arruda Alvim, Araken de Assis e Eduardo Arruda Alvim, Comentários ao Código de

Processo Civil, Ed. GZ, 2012, p. 1.

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Assinala Arruda Alvim que o sistema de jurisdição única é aquele que

surgiu da separação dos poderes. Uma vez separadas as funções estatais,

ficou afeto ao Poder Judiciário aquilo que “naturalmente, segundo as

condicionantes históricas contemporâneas às grandes e marcantes diretrizes

criadoras do Estado moderno, lhe deveria caber”. Ao Poder Judiciário –

prossegue Arruda Alvim – coube “a função de dizer o direito no processo de

conhecimento e, quando necessário, de realizá-lo coativamente (processo de

execução). De nada adiantaria a simples manifestação do Estado dizendo o

direito. É imprescindível que a sua atividade se complete através da efetivação

do direito declarado.”4

No Estado de Direito, a jurisdição decorre dos preceitos da lei e só

pode ser exercida nos limites que a própria lei estabelece, pois a própria noção

de Estado de Direito pressupõe a submissão de todos, sem exceção, aos

preceitos legais.

Escreve Eduardo Arruda Alvim que a submissão de todos à lei é a

característica mais marcante do Estado de Direito:

“A característica mais marcante do Estado de Direito é a de

que nele todos se submetem à lei, governantes e governados,

indistintamente. A idéia de tripartição de Poderes (ou, se

preferir, tripartição das funções estatais do Poder, já que o

Poder, enquanto expressão da soberania estatal, é uno) é tida

hoje como verdadeiro pressuposto para que se possa falar,

efetivamente, em Estado de Direito”.5

E Arruda Alvim acrescenta que, no Estado de Direito, o próprio

Estado autolimita seu âmbito de atuação pelas balizas legais:

“No Estado de Direito, o próprio Estado submete-se à própria

regra jurídica, dizendo-se, consequentemente, que o próprio

4 Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, 13

a Edição, Editora Revista dos Tribunais,

2010, p. 174. 5 Eduardo Arruda Alvim, Direito Processual Civil, Editora Revista dos Tribunais, 2

a Edição,

2008, p. 38.

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Estado autolimita o seu âmbito de ação, dentro das balizas da

lei”.6

A jurisdição caracteriza-se como sendo de índole substitutiva. Ou seja,

a pretensão ou a “vontade” da parte é substituída pela aplicação da lei ao caso

concreto, realizada por aquele que detém o poder jurisdicional. Segundo

Arruda Alvim, “em virtude da atividade jurisdicional o que ocorre é a

substituição de uma atividade/vontade privada por uma atividade pública, que é

a ‘vontade da lei’ a imperar”.7

Aquilo que é proibido através da autotutela pode ser concedido pela

atividade do juiz que, de modo imparcial, aplica a lei e verifica a quem assiste a

razão.

Cândido Rangel Dinamarco assinala que, na atividade jurisdicional, os

atos proibidos de autotutela são substituídos pela atuação do juiz:

“Pelo aspecto técnico, a atividade jurisdicional é sempre

substitutiva das atividades dos sujeitos envolvidos no conflito, a

quem a ordem jurídica proíbe atos generalizados de

autodefesa. Seja quando o sujeito aspira a um bem negado

pela pessoa que lho podia dar (p. ex. pretensão a uma soma

de dinheiro, etc), seja nos casos em que o processo é o único

caminho para obtê-lo (anulação de casamento), a atividade

jurisdicional é sempre substitutiva de alguma atividade das

pessoas. Os atos proibidos de autotutela são substituídos pela

atividade do juiz que, serenamente e com imparcialidade,

verifica se o sujeito tem ou não razão e, por ato seu, propicia-

lhe a obtenção do bem.” 8

A tal respeito, é clássica a definição de jurisdição dada por Chiovenda:

“Jurisdição: a função do Estado que tem por escopo a atuação

da vontade concreta da lei por meio da substituição, pela

6 Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, 13

a Edição, Editora Revista dos Tribunais,

2010, p. 173. 7 Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, 13

a Edição, Editora Revista dos Tribunais,

2010, p. 176. 8 Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil, Malheiros Editores, Vol.

I, 2001, pp. 306-307.

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atividade de órgãos públicos, já no afirmar a vontade da lei, já

no torná-la, praticamente, efetiva”.9

Como assinala Marcus Vinicius Rios Gonçalves, “jurisdição é uma das

funções do Estado, que se substitui às partes na solução dos conflitos de

interesses”.10

No mesmo sentido, o ensinamento de Antônio Carlos de Araújo Cintra,

Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, que definem a jurisdição

como uma das funções do Estado, por meio da qual é substituída a vontade

das partes em conflito pelo que preceitua o direito objetivo:

“Jurisdição: é uma das funções do Estado, mediante a qual

este se substitui aos titulares dos interesses em conflito para,

imparcialmente, buscar a atuação da vontade do direito

objetivo que rege a lide que lhe é apresentada em concreto

para ser solucionada; e o Estado desempenha essa função

sempre mediante o processo, seja expressando

autoritativamente o preceito (através de uma sentença de

mérito), seja realizando no mundo das coisas o que o preceito

estabelece (através da execução forçada)”.11

Essa substituição da vontade da parte pela aplicação da lei se

consolida definitivamente com a formação da coisa julgada. Por isso, a coisa

julgada é considerada, por muitos, como a essência da jurisdição.

Assinala Arruda Alvim que na quase totalidade dos casos a síntese

da função jurisdicional é caracterizada pela sentença – mais especificamente a

parte dispositiva da sentença – com a autoridade da coisa julgada.12

9 Giuseppe Chiovenda, Instituições de Direito Processual Civil, Vol. II, Bookseller Editora e

Distribuidora, 3a edição, 2002, Campinas, SP, p. 8-9.

10

Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novo Curso de Direito Processual Civil, Vol 1, Editora Saraiva, 3

a ed., p. 46.

11

Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover, Cândido Rangel Dinamarco, Teoria Geral do Processo, 2

a ed., Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1979, p. 83.

12

Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, 13a Edição, Editora Revista dos Tribunais,

2010, p. 176.

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Em igual sentido, assinala Athos Gusmão Carneiro que é a

circunstância de as decisões judiciais se revestirem da autoridade da coisa

julgada que efetivamente distingue a atividade jurisdicional:

“O que efetivamente distingue a atividade jurisdicional é que as

decisões do Judiciário se revestem da autoridade de coisa

julgada. Ou seja, esgotados os recursos cabíveis no processo

em que são proferidas, desde que tenha havido resolução do

mérito, tornam-se imutáveis, não podendo, em linha de

princípio, ser rediscutida, nem naquele, nem em outros

processos. (...)

A coisa julgada, ao levar à imutabilidade do que haja sido

decidido, cristaliza essa substituição, tornando-se, portanto,

definitiva”.13

Essa é a razão pela qual no processo administrativo não há exercício

da jurisdição. Ou seja, como as decisões emanadas pelos tribunais

administrativos não transitam em julgado e estão sujeitas à revisão do

Judiciário, elas não se revestem de caráter jurisdicional.

Veremos adiante que outra característica da jurisdição é o julgamento

feito por pessoa imparcial e alheia à lide, diferentemente do que ocorre no

processo administrativo, onde a própria Administração julga os seus processos.

Vale dizer, a Administração Pública não exerce função jurisdicional ao

julgar processo administrativo. E isso, tanto pelo fato de que suas decisões não

transitam em julgado e podem ser revistas pelo Judiciário, como porque seus

julgamentos não são proferidos por pessoa imparcial.

Marcus Vinicius Rios Gonçalves ressalta que é justamente esse caráter

de “definitividade” que caracteriza os atos jurisdicionais:

“Somente os atos jurisdicionais tornam-se imutáveis, porque a

partir de determinado momento não podem mais ser discutidos.

Os atos administrativos podem ser revistos e não têm o caráter

de definitividade que caracteriza a jurisdição”.14

13

Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e Competência, pp. 40/41. 14

Marcus Vinicius Rios Gonçalves, Novo Curso de Direito Processual Civil, Vol 1, Editora Saraiva, 3

a ed., p. 46.

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15

Vemos, portanto, que a jurisdição deve ser entendida como a função

do Estado através da qual a vontade da parte é substituída pela aplicação da

lei e que se consolida, definitivamente, com a formação da coisa julgada. Por

tal motivo, muitos consideram – acertadamente – que a coisa julgada é a

essência da jurisdição.

I.2. Características da atividade jurisdicional

Uma vez assentado no que consiste a jurisdição, importa considerar as

principais características que devem estar presentes na atividade jurisdicional,

para que esta seja exercida de modo legítimo.

Pode-se afirmar que essas características são, fundamentalmente,

três: a imparcialidade do juiz, o respeito ao contraditório e a inércia inicial.

A necessidade de imparcialidade impõe que deve ser afastado do

processo o juiz impedido ou suspeito. O respeito ao contraditório acarreta a

observância de um procedimento regular e anteriormente estabelecido. E a

inércia inicial significa que o Poder Judiciário só age quando provocado pela

parte.

Para Arruda Alvim, as características marcantes da atividade

jurisdicional são as seguintes:

“A terzietà do juiz, que tem de ser desinteressado do litígio,

conceito este universalmente aceito e tradicional, e há de ser

ocupante de órgão constitutivo do Poder Judiciário; daí, como

consequência, afastar-se do processo o juiz impedido ou

suspeito (art. 134 e ss), pois o seu desinteresse (=

imparcialidade) está comprometido; ademais, no caso de

impedimento, a própria sentença, ou acórdão, é suscetível de

desconstituição por ação rescisória, dentro de certo prazo (art.

485, II, do CPC). (...)

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16

É característica, ainda, da atividade jurisdicional, o seu

desenvolvimento através de um contraditório regular, o que

implica fundamentalmente, além de outros aspectos, a

obediência a um procedimento regular e preestabelecido.

Outro princípio informador da atividade jurisdicional é o da sua

inércia inicial (arts 2o e 262 do CPC), o que significa que só

mediante solicitação da parte é que se instaura o processo

contencioso, e, ainda, somente através de pedido do

interessado é que o juiz poderá agir no campo da jurisdição

voluntária. A regra, pois, é a de que o Poder Judiciário somente

age quando regularmente provocado. Desta forma, não pode

um juiz, sem pedido preordenado a tanto, instaurar um

processo para o qual não tenha sido provocado pela parte.” 15

Uma vez consignado que a atividade jurisdicional deve ter por

características a imparcialidade do juiz, o respeito ao contraditório e a inércia

inicial, analisaremos, a seguir, as atividades inerentes à função jurisdicional.

I.3. Atividades próprias à função jurisdicional

Pode-se dizer que a função jurisdicional é exercida por meio de duas

atividades fundamentais: a principal delas – que corresponde à própria

essência da jurisdição – é a atividade de “dizer o direito” (iuris dictio). Essa

atividade é exercida no processo de conhecimento e, como vimos, trata-se de

uma atividade de índole substitutiva, onde o julgador “diz” qual é o direito

aplicável ao caso concreto. A partir de então, esse direito aplicável “substitui” a

vontade da parte, sendo que essa substituição se torna definitiva quando se

opera o trânsito em julgado da decisão.

E a segunda das atividades jurisdicionais é a de realizar,

compulsoriamente, o direito aplicável ao caso concreto. Essa atividade é

exercida por meio da execução.

Lecionam a respeito Arruda Alvim, Araken de Assis e Eduardo Arruda

Alvim: 15

Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, 13a Edição, Editora Revista dos Tribunais,

2010, p. 176.

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17

“A função jurisdicional é aquela que, por força da tripartição dos

poderes, coube ao Poder Judiciário. Compreende não apenas

a tarefa de dizer o direito, mas de realizá-lo coativamente (o

que se faz através da execução). Tem em vista, antes de tudo,

a preservação da ordem jurídica e da paz social.”16

No mesmo sentido, escrevem José Antonio Fichtner e André Luís

Monteiro:

“O exercício da jurisdição no processo civil se expressa através

do binômio cognição-execução, conforma lição da doutrina

tradicional. A cognição e a execução, já dizia Piero

Calamandrei, são os dois momentos da jurisdição.”17

Essas duas principais atividades – ou elementos – da função

jurisdicional – cognição e execução (cognitio e imperium) – podem, por sua

vez, ser subdivididas ou detalhadas.

De Plácido e Silva divide os elementos da jurisdição em notio, coercio,

judicium, imperium e executio:

“O conceito de jurisdição, pois, tomado no sentido lato do

vocábulo: total da competência ou poder do magistrado,

encerra ou contém a compreensão de todos os elementos que

a compõem: notio, coercio, judicium, imperium e executio.

A notio, entendida como o poder de conhecer a questão,

derivada da competência do juiz, é a própria jurisdição,

simplesmente considerada.

A coercio, a coerção judiciária, fundada no poder de conhecer

a matéria e a julgar, entende-se o poder de sujeitar às regras

legais o objeto da questão e as pessoas que dela participam.

O judicium, que promove praticamente o exercício da

jurisdição, ou a atividade do juiz ou da autoridade, mostra-se a

formação da discussão, pela qual se promove o esclarecimento

da demanda, para a elucidação da verdade.

O imperium, elemento gerador da jurisdição, exprime a

delegação do poder de julgar, provinda do Estado, pela qual se

16

Arruda Alvim, Araken de Assis e Eduardo Arruda Alvim, Comentários ao Código de Processo Civil, ed. GZ, 2012, p. 1. 17

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série, Ed. Renovar, 2010, p. 120.

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18

investe a autoridade administrativa ou judicial da atribuição e

da competência necessárias, para cumprir e realizar a sua

missão.

A executio, resultante do próprio poder de julgar conferido, é o

poder de fazer cumprir a decisão tomada, em solução do que

se levou ao conhecimento da autoridade, para seu

julgamento.”18

Por seu lado, Giuseppe Saredo classificou os elementos essenciais da

jurisdição em notio, vocatio, coertio, iudicium e executio.

Notio: é a faculdade de conhecer de uma causa, de estar

regularmente investido da faculdade de decidir uma

controvérsia. Vocatio: é a faculdade de chamar a juízo aqueles

cuja presença seja útil à justiça e ao conhecimento da verdade.

Coertio: é o direito de fazer-se respeitar, de reprimir as ofensas

feitas ao exercício de suas funções. Iudicium: é o direito de

julgar e de proferir sentença. Executio: é o direito de tornar

obrigatória e coativa, em nome do poder soberano, a

obediência às suas próprias ordens e decisões.19

Ademais, cumpre assinalar que os dois elementos principais da

jurisdição – cognitio e imperium – encontram-se presentes numa terceira

atividade que também é própria à função jurisdicional: a atividade cautelar.

A exposição de motivos do Código de Processo Civil (cap. IV, nº 11)

classifica o processo cautelar como um “tertium genus”, ou seja, um gênero

intermediário entre os outros dois, “que contém a um tempo as funções do

processo de conhecimento e de execução” e que “tem por elemento específico

a prevenção”.

Vale dizer, a “função jurisdicional cautelar” (expressão utilizada pela

exposição de motivos do CPC) é divida em dois momentos, que correspondem

às funções do processo de conhecimento e de execução: o juiz, num primeiro

momento, conhece a questão e decreta a medida (cognitio); e, num segundo

momento – se não houver o cumprimento espontâneo – executa a medida

(imperium). 18

De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, Editora Forense, 21a Edição, 2003, p. 466.

19

Giuseppe Saredo, Istituzioni di Procedura Civile, vol. I, 3ª ed., Firenze: Giuseppe Pellas Editore, 1887, p. 198.

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19

Ernane Fidelis dos Santos inclui o dever de prestar cautela entre os

elementos da jurisdição:

“Jurisdição: o poder-dever do Estado de compor os litígios, de

dar efetivação ao que já se considera direito, devidamente

acertado, e de prestar cautela aos processos em andamento

ou a se instaurarem, para que não percam sua finalidade

prática”.20

No mesmo sentido, Darci Guimarães Ribeiro assinala que “a jurisdição

se não esgota no declarar (‘cognitio’) ou realizar (‘executio’) o direito. A

jurisdição se exerce também assecurativamente, cautelarmente”.21

A propósito, Fredie Didier Jr. identifica três tipos de tutela jurisdicional:

“Podem ser identificados três tipos de tutela jurisdicional: a) de

certeza, ou de conhecimento, ou declaratória: busca-se do

Poder Judiciário a certificação, com a coisa julgada, de

determinada relação jurídica; b) de efetivação ou executiva:

pretende-se a efetivação de direitos subjetivos; c) de

segurança ou cautelar.” 22

Uma vez analisado o conceito de jurisdição, suas principais

características e elementos constitutivos e as atividades a ela próprias, cumpre

considerar os poderes conferidos pela lei ao árbitro, para assim poder chegar a

uma conclusão acerca da natureza jurídica da arbitragem.

I.4. Os poderes do árbitro

Das duas principais atividades ou elementos próprios à jurisdição –

cognição e execução – o árbitro possui apenas a cognição.

20 Ernane Fidelis dos Santos, Manual de Direito Processual Civil, Editora Saraiva, 11

a Edição,

Vol. 1., p. 9. 21

Darci Guimarães Ribeiro, Aspectos relevantes da teoria geral da ação cautelar inominada,

Revista de Processo | vol. 86 | p. 56 | Abr / 1997DTR\1997\566.

22 Fredie Didier Júnior, Esboço de uma teoria da execução civil, Revista de Processo | vol. 118 |

p. 9 | Nov / 2004DTR\2004\783.

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20

Com efeito, a Lei de Arbitragem brasileira assegurou ao árbitro a

plenitude do poder de cognição, ao declarar, no caput do art. 18, que “o árbitro

é juiz de fato e de direito”. Essa formulação já se encontrava tanto no Código

de Processo Civil (art. 1.078), como no Código Civil de 1916 (art. 1.041) e

servia para indicar que a atividade do árbitro era idêntica à do juiz estatal.

Carlos Alberto Carmona assinala que, ao declarar que o árbitro “é

juiz de fato e de direito”, o objetivo da Lei de Arbitragem foi deixar claro que a

atividade do árbitro é de todo equivalente à do juiz estatal:

“Resulta claro desta fórmula, verdadeiramente histórica, que o

intuito da Lei foi o de ressaltar que a atividade do árbitro é

idêntica à do juiz togado, conhecendo o fato e aplicando o

direito.” 23

Porém, a Lei de arbitragem não concedeu ao árbitro o poder de

execução. O árbitro não possui poderes para fazer valer, coercitivamente, as

suas decisões.

Escrevem a respeito José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro,

assinalando que o poder jurisdicional do árbitro restringe-se às atividades

próprias ao processo de conhecimento, e não às de execução:

“O poder jurisdicional do árbitro está restrito à atividade típica

de processo de conhecimento, não possuindo ele poderes para

implementar, de maneira forçada, no mundo real, as suas

decisões. Em outras palavras, o árbitro detém o ius cognitio,

mas não o ius imperium, esse sim exclusividade do Estado,

através do Poder Judiciário”. 24

No entanto, veremos a seguir que o fato de o árbitro deter apenas o

poder de cognição e não o de execução, não impede que a arbitragem seja

uma atividade de natureza eminentemente jurisdicional.

23

Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo – Um Comentário à Lei n 1º 9.307/96, Editora Atlas, 3ª Edição, 2009, p. 269. 24

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série, Ed. Renovar, 2010, p. 121.

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21

I.5. Natureza jurisdicional da arbitragem

Como vimos acima, a jurisdição se caracteriza pela substituição da

vontade da parte pela aplicação da lei. Substituição que se consolida,

definitivamente, com a formação da coisa julgada. Por tal motivo, muitos

consideram a coisa julgada a própria essência da jurisdição.

Isso posto – e antes de qualquer consideração acerca da ausência do

poder de execução dos árbitros –, importa assinalar, desde logo, que

indiscutivelmente o juízo arbitral possui a própria essência da jurisdição.

Sim, pois a sentença arbitral produz, entre as partes e seus

sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder

Judiciário, nos termos do art. 31, da Lei de Arbitragem. Ou seja, a sentença

arbitral faz coisa julgada e é um título executivo judicial, por expressa

determinação do art. 475-N, IV, do CPC.

Portanto, pelo fato de a sentença arbitral produzir os mesmos efeitos

das sentenças do Poder Judiciário, por fazer coisa julgada e ser um título

executivo judicial, em suma, por substituir a vontade da parte pela aplicação da

lei, a arbitragem, evidentemente, está revestida da própria essência da

atividade jurisdicional.

É o que assinalam Paulo Furtado e Uadi Lammêgo Bulos, ao escrever

que “o caráter de substitutividade está, aqui, no juízo arbitral, tão presente

como na jurisdição exercida pelos órgãos estatais. Em verdade, a atividade do

árbitro substitui a dos particulares em conflito.”25

Por outro lado, também já vimos acima que as características

fundamentais da jurisdição são a imparcialidade do juiz, o respeito ao

contraditório e a inércia inicial.

25

Paulo Furtado e Uadi Lammêgo Bulos, Lei de Arbitragem Comentada, Editora Saraiva, 1997, p. 17.

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22

Ora, essas são, igualmente, as características fundamentais da

sentença arbitral.

Com efeito, a imparcialidade do árbitro26 e o respeito ao contraditório

são requisitos essenciais do procedimento arbitral, nos termos do § 2º do art.

21 da Lei de Arbitragem, sendo que o seu desrespeito acarretará a nulidade da

sentença arbitral (art. 32, VIII).

E a inércia inicial também constitui característica fundamental da

arbitragem, vez que a arbitragem tem sua origem numa convenção entre as

próprias partes e que dentre os requisitos obrigatórios da sentença arbitral está

o dispositivo, onde os árbitros resolverão as questões que lhes forem

submetidas (art. 26, III). Sendo nula a sentença que não respeitar esse

requisito e/ou for proferida fora dos limites da convenção de arbitragem (art. 32,

III e IV).

Vemos, portanto, que a arbitragem possui todos os requisitos

essenciais da jurisdição, visto que a sentença arbitral substitui a vontade da

parte pela aplicação da lei – substituição que se consolida pelo transito em

julgado da sentença arbitral – além de possuir as mesmas características

fundamentais da jurisdição estatal, quais sejam, a imparcialidade do árbitro, o

respeito ao contraditório e a inércia inicial.

Uma vez assentadas essas premissas, importa analisar se o fato de a

arbitragem carecer do poder de execução retira-lhe a natureza jurisdicional.

Adolfo Armando Rivas assinala que dos cinco elementos que compõe o

poder dos juízes – notio, vocatio, coertio, iudicium e executio – o árbitro possui

apenas os dois primeiros e o quarto, faltando-lhe a coertio e a executio. Porém,

isso não impede que o árbitro exerça uma verdadeira jurisdição. Observa, a

propósito, Adolfo Rivas:

26

Recorde-se que o art. 14, da Lei de Arbitragem, proíbe o árbitro de atuar, caso ele tenha com as partes relações que caracterizam as causa de impedimento ou suspeição dos juízes, previstas no Código de Processo Civil.

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23

“O fato de serem cinco os elementos que compõe a jurisdição,

não significa que todos eles sejam necessários e de igual valor

para indicar a existência de jurisdição. (...) Obviamente, se

existe o iudicium, é conatural e indispensável a notio e a

vocatio; porém, nem a coertio nem a executio podem existir

sem iudicium, mas creio ter demonstrado que este último

elemento [iuditium] pode existir sem a presença dos dois

anteriores [coertio e executio]”.27

No mesmo sentido, escreve J. E. Carreira Alvim, assinalando que, em

certas situações, o próprio magistrado carece da coertio e da executio, mas

nem por isso deixa de exercer uma atividade eminentemente jurisdicional.

Carreira Alvim recorda também – em reforço da tese de que a simples

atividade cognitiva constitui atividade jurisdicional – que as sentenças

meramente declaratórias, apesar de não serem executáveis, são

inegavelmente de natureza jurisdicional.

“O juiz togado carece, muitas vezes, da coertio, não podendo,

por exemplo, compelir as partes acorrer a uma audiência de

conciliação, mas nem por isso seus atos escapam ao campo

jurisdicional, o que demonstra que o poder de coerção é

relativo e não absoluto; pode inexistir coerção e, não obstante,

existir o poder jurisdicional. Os acórdãos são, igualmente,

executados pelso juízos de primeira instância, carecendo os

tribunais do poder de fazê-lo, por lhes faltar, para este fim, a

executio; nem por isso os acórdãos deixam de ser produto da

jurisdição estatal. Ademais, fossem corretas as premissas

contrárias, as sentenças meramente declaratórias, igualmente

desprovidas de exequibilidade, não estariam compreendidas no

âmbito da jurisdição”.28

Abordando a questão por outro ângulo, Athos Gusmão Carneiro

observa que a executoriedade não é atributo exclusivo da jurisdição, pois

certos atos administrativos – que não possuem natureza jurisdicional e podem

ser revistos pelo Judiciário – possuem essa característica.

“Veja-se, por exemplo, que há atos administrativos que

possuem o atributo da executoriedade. É o que diz Celso

Antonio Bandeira de Mello, segundo o qual “o Poder Público

27

Adolfo Armando Rivas, El arbitraje según el derecho argentino, Revista de Processo, Ano XII, Janeiro-Março de 1987, n

o 45, p. 72.

28

J. E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, Editora Forense, 2a edição, 2004, Rio de Janeiro, p. 62.

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24

pode compelir materialmente o administrado, sem precisão de

buscar previamente as vias judiciais, ao cumprimento da

obrigação que impôs e exigiu”. Nota-se, portanto, que a

coatividade não é característica exclusiva da função

jurisdicional, estando também presente na atividade

administrativa, ainda que essa eficácia possa ser obstada pelo

Judiciário se não informada pela legalidade”.29

Ademais, é óbvio que mesmo as sentenças condenatórias nem sempre

necessitarão ser executadas, pois, proferida a sentença, poderá haver o

adimplemento da obrigação, sem necessidade de se recorrer à execução.

Vê-se, portanto, que a atividade exclusivamente cognitiva pode ser

qualificada como jurisdicional. Donde se conclui que o árbitro, juiz de fato e de

direito, cuja sentença produz os mesmos efeitos da sentença proferida pelos

órgãos do Poder Judiciário, exerce verdadeira atividade jurisdicional.

I.6. Diversas posições doutrinárias sobre a questão

Como dito acima, após a edição da Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/96),

a imensa maioria da Doutrina adotou o acertado entendimento de que a

arbitragem no Brasil possui natureza jurisdicional.

O intenso debate prévio à Lei de Arbitragem, que contrapunha a teoria

privatista (contratual) e publicista (jurisdicional) perdeu muito sentido, diante do

disposto na Lei nº 9.307/96.

Joel Dias Figueira Junior relata a evolução do entendimento doutrinário

a respeito da natureza jurisdicional da arbitragem, antes e depois da edição da

Lei nº 9.307/96:

“No que tange especificamente à natureza jurídica do instituto

da arbitragem, constatamos que as doutrinas nacional e

alienígena têm sido pródigas ao longo das décadas em

desenvolver e defender fundamentalmente duas correntes

29

Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e Competência, p. 39.

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25

antagônicas. De um lado, encontra-se a teoria privatista (ou

contratual) de outro, a publicista (ou jurisdicional).

Nada obstante, a doutrina mais moderna já procurava conciliar

as duas correntes referidas, e, de forma eclética, considerar o

instituto da arbitragem como portador de uma natureza sui

generis , porquanto nasce da vontade das partes (caráter

obrigacional = privado) e concomitantemente regula

determinada relação de direito processual (caráter público). (...)

Se no passado, ainda que próximo, justificavam-se o confronto

e as polêmicas acirradas que se formavam entre as duas

teorias, hoje em dia, em face do novo regime estatuído através

da Lei 9.307/96, essas questões passaram a adquirir outras

conotações e reflexos, à medida que o legislador deixou

transparecer com nitidez a sua verdadeira intenção, mormente

insculpida nos Capítulos V e VI.

Em outros termos, se antes do advento da referida norma o

juízo arbitral significava um julgamento que só se aperfeiçoava

quando recebia a força e a autoridade do Estado por

intermédio da homologação do laudo, e, portanto, não era

considerado atividade jurisdicional, hoje assim deixou de ser.

(...)

Se no regime anterior da arbitragem, que se processava nos

moldes do Código Instrumental Civil a controvérsia merecia

maior atenção dos estudiosos e aplicadores do direito, os

termos claros e precisos utilizados pelo legislador no sistema

da Lei , objeto desses comentários, parece-nos que colocou pá

de cal sobre a questão.(...)

Vê-se, com meridiana clareza que o legislador aproximou ou

melhor, equiparou a sentença arbitral à sentença proferida pelo

Estado-juiz, como ato de autoridade que decide o conflito e

vincula as partes litigantes ao cumprimento da declaração,

constituição, condenação, mandamento ou execução exarada

pelo juiz ou tribunal privado, gerando todos os efeitos

decorrentes da coisa julgada.(...)

Podemos afirmar categoricamente que o juízo arbitral instituído

pela Lei 9.307/96 apresenta natureza jurisdicional. Está-se,

portanto, diante de verdadeira jurisdição de caráter privado.

Aliás, o novo microsistema que contempla o juízo arbitral não

permite, ao nosso entender, outra conclusão”.30

30 Joel Dias Figueira Junior, Manual de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 1997, p. 92-

96.

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26

Analisaremos, a seguir, alguns argumentos – pró e contra – o

entendimento de que a arbitragem possui natureza jurisdicional.

Dentre os que negam o caráter jurisdicional da arbitragem, destaca-se

Teori Albino Zavascki. Para ele, atribuir natureza jurisdicional à arbitragem

importaria em romper o preceito constitucional do monopólio estatal da

jurisdição:

“Nem se poderia, mediante lei ordinária, igualar ato privado

com ato de jurisdição, já que isso importaria rompimento do

monopólio da função jurisdicional, que pertence ao Estado por

força da Constituição (art. 5o, XXXV).” 31

E, por tal motivo, Teori Zavascki considera "inapropriada” “a inclusão

da sentença arbitral entre os títulos executivos judiciais."32

No mesmo sentido, escreve Alexandre Freitas Câmara. Para ele, não

há como se atribuir natureza jurisdicional à arbitragem, pois o Estado, apesar

de não possuir o monopólio da Justiça, possui o da jurisdição.

“Pensar de outra forma, a meu ver, seria infringir o monopólio

estatal da jurisdição, o que não me parece possível. Relembre-

se agora o que já disse anteriormente: o Estado não possui o

monopólio da Justiça, mas possui o da jurisdição. (...) Ademais,

não se faz presente na arbitragem a relação jurídica processual

jurisdicional, qual seja, aquela que estabelece entre as partes e

o Estado juiz. Não há, portanto, como se admitir a natureza

jurisdicional da arbitragem, embora não se possa negar o

múnus público exercido pelo árbitro, em sua atividade privada,

de busca da pacificação social”.33

Cândido Rangel Dinamarco inicialmente adotou o entendimento de que

a arbitragem deveria ser qualificada como atividade “parajurisdicional”, visto

que ela não teria, dentre os seus objetivos, o de dar efetividade ao

31 Teori Albino Zavascki, Processo de Execução Parte Geral, Ed. Revista dos Tribunais, 3ª

Ed., 2004, p. 294. 32

Teori Albino Zavascki, Processo de Execução Parte Geral, Ed. Revista dos Tribunais, 3ª Ed., 2004, p. 295. 33

Alexandre Freitas Câmara, Arbitragem, 3a ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2002, pp. 12 e

15.

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27

ordenamento jurídico substancial, nem seria dotada do requisito da

inevitabilidade que caracteriza a jurisdição. Porém, escreveu ele, a arbitragem

possui "o que há de substancialmente relevante no exercício da jurisdição, pelo

aspecto social do proveito útil que é capaz de trazer aos membros da

sociedade, está presente também nessas outras atividades: é a busca da

pacificação das pessoas e grupos mediante a eliminação de conflitos que os

envolvam." 34 Portanto, considerou Dinamarco que nesse “escopo social

pacificador reside algo muito mais forte a aproximar a arbitragem da jurisdição

estatal.”35-36

Posição semelhante é a de Masami Uyeda, para quem a arbitragem

não seria jurisdição, pelo fato de as decisões proferidas pelo árbitro não terem

coercitividade e de estarem sujeitas ao controle de legalidade do Poder

Judiciário, quanto aos aspectos formais:

“O instituto da arbitragem não se confunde com a Jurisdição,

ao menos em seu sentido técnico. As decisões proferidas pelo

Juízo Arbitral, sem se descurar de sua inequívoca utilidade

social na pacificação dos conflitos, não são imunes ao controle

de legalidade do Poder Judiciário quanto aos aspectos formais,

quanto à sua eleição, propriamente, e, tampouco possuem o

caráter de coercibilidade. A Jurisdição, a seu turno, dotada da

34

Cândido Rangel Dinamarco, Instituições de Direito Processual Civil, vol. I, Malheiros, 5ª ed., 2005, p. 141 e 141. 35

Cândido Rangel Dinamarco, Nova Era do Processo Civil. 3ª ed., São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2009, p. 39. 36 Posteriormente, Dinamarco alterou sua posição e adotou o entendimento de que a

arbitragem possui, sim, caráter jurisdicional. Confira-se: “Andei inicialmente pensando em uma

natureza parajurisdicional das funções do árbitro, a partir da ideia de que, embora ele não as

exerça com o escopo jurídico de atuar a vontade da lei, na convergência em torno do escopo

social pacificador reside algo muito forte a aproximar a arbitragem da jurisdição estatal.3 Hoje,

todavia, não vejo razão para ficar assim a meio caminho. O árbitro exercia sim uma atividade

parajurisdicional, ou seja, algo um pouco aquém da própria jurisdição, quando a eficácia de seu

laudo dependia da homologação pelo Estado-juiz – sendo assim, mutatis mutandis, a posição

do juiz leigo que atua nos Juizados Especiais Cíveis (art. 93, I, da CF/1988 (LGL\1988\3) e arts.

7.º, 22, 37 e 40 da Lei dos Juizados Especiais).4 Eliminada a necessidade de homologação e

portanto sendo a sentença arbitral eficaz por si própria, ela é, tanto quanto a do juiz, um ato de

pacificação social e, portanto, jurisdicional - não havendo razão para ficar a meio caminho com

a ideia da parajurisdicionalidade”. (POSSIBILIDADE DE EMENDAS E ALTERAÇÕES A

PEDIDOS E O PRINCÍPIO DA ESTABILIZAÇÃO NO PROCEDIMENTO ARBITRAL, Revista de

Arbitragem e Mediação | vol. 35 | p. 227 | Out / 2012DTR\2012\451122).

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28

inevitabilidade e vocacionada a conferir efetividade ao

ordenamento jurídico, aplicando-o às lides, em substituição à

vontade das partes e com a força da coisa julgada, provém,

decorre, diretamente da soberania Estatal, circunstância

absolutamente inocorrente na arbitragem, ressalte-se.”37

Por seu lado, Chiovenda afirmava que a função jurisdicional emana

exclusivamente do Estado.38 Enquanto que Carnelutti classificou a arbitragem

como um equivalente ao processo civil, pois a lide é resolvida por um terceiro

sem potestade judicial. Para ele, o processo perante o árbitro seria um

equivalente ao processo contencioso de cognição.39

Em sentido contrário, como veremos a seguir, a grande maioria da

Doutrina reconhece a natureza jurisdicional da arbitragem.

Iniciemos com uma citação de Carreira Alvim, na qual é respondida a

objeção de que a arbitragem seria um mero equivalente jurisdicional:

“O objetivo visado tanto na jurisdição arbitral como na estatal é

idêntico – a resolução do conflito –, pois o árbitro, como o juiz,

também decide, e ambos exercem a sua função segundo

determinadas regras (procedimento). A arbitragem não pode

ser considerada simples equivalente jurisdicional, porquanto

não proporciona resultado equivalente à sentença, mas uma

verdadeira e própria sentença, em tudo e por tudo idêntica, em

valor jurídico e eficácia, à que se obtém através da jurisdição

estatal (que contém o judicium mais o imperium), mas também

não se detém nos lindes dos meros equivalentes jurisdicionais,

que dependem de uma “integração” por novo ato jurisdicional.

A decisão do árbitro não “equivale” a uma sentença; ela é uma

sentença; a eficácia de uma sentença arbitral e a autoridade de

coisa julgada que resulta dela não tem nenhuma diferença

daquela que qualifica a sentença judicial.”40

37

Masami Uyeda, Acórdão STJ – Conflito de Competência 122439, Data da Publicação 22/05/2012. 38

Giuseppe Chiovenda, Instituições de Direito Processual Civil, Vol. II, Bookseller Editora e Distribuidora, 3

a edição, 2002, Campinas, SP, p. 8-9.

39

Cfr. Francesco Carnelutti, Instituições do Processo Civil, ClassicBook Editora e Distribuidora de livros Ltda., Vol. I, p. 157, 163. 40 J. E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, Editora Forense, 2

a edição, 2004, Rio de Janeiro.

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29

Eduardo Arruda Alvim adota o mesmo entendimento, ao afirmar que a

arbitragem “não se trata propriamente de um substitutivo da jurisdição, mas de

uma espécie de jurisdição privada”.41

Saliente-se – com o devido e merecido respeito – que não se afigura

inteiramente correto o argumento utilizado por Teori Zavaski, para afastar o

caráter jurisdicional da arbitragem, ou seja, de que não seria possível

“mediante lei ordinária, igualar ato privado com ato de jurisdição, já que isso

importaria rompimento do monopólio da função jurisdicional, que pertence ao

Estado por força da Constituição (art. 5o, XXXV)”.

Em primeiro lugar, porque não está demonstrado que o art. 5º, XXXV,

da CF imporia o monopólio – absoluto, excludente e irrenunciável – da função

jurisdicional ao Estado. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o pedido de

homologação de sentença estrangeira SE 5.206-7, da Espanha, já adotou o

entendimento de que a lei de arbitragem não excluía da apreciação do Poder

Judiciário lesão ou ameaça a direito (art. 5º, XXXV da CF).

Nesse acórdão, publicado no DJ de 30/04/2004 – no qual foi suscitada

a questão da constitucionalidade da lei de arbitragem – apesar do

entendimento contrário de alguns ministros, o STF considerou a lei de

arbitragem um grande avanço e não viu nela nenhuma ofensa ao texto

constitucional.

Em seu voto, o Ministro Carlos Velloso ressaltou que a lei só é

aplicável em relação a direitos patrimoniais e disponíveis e que as partes têm a

faculdade de renunciar a seu direito de recorrer à Justiça, pois o “direito de

ação” não significa “dever” de ação judicial: “a lei não institui a arbitragem em

termos obrigatórios, caso em que ocorreria ofensa ao inciso XXXV do art. 5º da

Constituição Federal, mas simplesmente, faculta às partes prevenirem ou

terminarem o litígio mediante a arbitragem”.

41

Eduardo Arruda Alvim, Direito Processual Civil. 4ª ed., São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 65.

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30

Além disso – e desde que preservado o direito constitucional de ação

(art. 5º, XXXV, da CF) – nada impede que uma lei ordinária confira a jurisdição

a um árbitro privado, livremente escolhido pelas partes.

Esse é o entendimento da grande maioria da Doutrina, assim

condensado por Arruda Alvim:

“Para aqueles que, como nós, estão convencidos pela natureza

jurisdicional da arbitragem, esta substitutividade pode decorrer

da atividade privada da lei à luz do entendimento do árbitro.”42

E De Plácido e Silva adota o mesmo entendimento, ao afirmar que a

jurisdição – sempre decorrente da lei, que delimita os poderes concedidos –

pode advir de delegação do Poder Público ou da vontade das pessoas:

“Seja decorrente de uma delegação do poder público, seja em

consequência de ato voluntário das pessoas, a jurisdição

somente existe quando decorrente de preceitos de lei, que lhe

assinalam ou determinam os limites dos poderes concedidos.”43

Por seu lado, Athos Gusmão Carneiro explica as razões pelas quais

considera equivocado o entendimento adotado por Teori Zavascki ao negar a

natureza jurisdicional do processo arbitral:

“Se temos uma sentença arbitral, capaz de trânsito em julgado,

a etapa antecedente à formação da sentença reveste-se de

caráter jurisdicional: "Ora, não há processo administrativo que

possa gerar um título executivo judicial como, no caso, a

sentença condenatória arbitral; tampouco gerar sentenças

declaratórias e constitutivas que adquirem qualidade de coisa

julgada formal e material" (João Alberto de Almeida, Processo

Arbitral, Del Rey, 2002, p. 141). Neste ponto, aliás, revela-se o

equívoco de Teori Zavascki ao negar natureza jurisdicional ao

processo arbitral, eis que a sentença arbitral não pode ser

'reformada' pela justiça estatal; se nula, será desconstituída

para que nova sentença arbitral venha a ser proferida (Lei da

Arbitragem, art. 33).

42

Arruda Alvim, Manual de Direito Processual Civil, 13a Edição, Editora Revista dos Tribunais,

2010, p. 176. 43 De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, Editora Forense, 21

a Edição, 2003, p. 466.

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31

Podemos portanto concluir, com J. E. Carreira Alvim (de quem

é recomendável a leitura da excelente exposição a respeito),

que o atual sistema de arbitragem brasileiro, "por natureza e

por definição, tem indiscutível caráter jurisdicional, não

cabendo mais, depois da Lei 9.307/96, falar-se em

contratualidade, salvo no que concerne à sua origem, por

resultar da vontade das partes" (Direito Arbitral, Forense, 2ª

ed., 2004, p. 46).”44

João Otávio de Noronha, ao considerar o art. 4º da Lei 9.307/96,

conclui que a convenção de arbitragem possui um caráter híbrido, pois nasce

como obrigação contratual e possui o elemento jurisdicional, visto que as

decisões do árbitro produzem os mesmos efeitos das sentenças proferidas

pelos órgãos do Poder Judiciário:

“Da definição do instituto, exsurge o caráter híbrido da

convenção de arbitragem, na medida em que se reveste, a um

só tempo, das características de obrigação contratual,

representada por um compromisso livremente assumido pelas

partes contratantes, e do elemento jurisdicional, consistente na

eleição de um árbitro, juiz de fato e de direito, cuja decisão irá

produzir os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos

do Poder Judiciário.”45

Joel Dias Figueira Júnior, afirma categoricamente que o juízo arbitral

possui natureza jurisdicional. E explica os motivos:

“O juízo arbitral não exclui ou se sobrepõe ao Estado-juiz,

figurando num amplo contexto sociopolítico e jurídico como

mais uma forma diferenciada de prestação de tutela e desde

que assim as partes litigantes convencionem livremente,

ampliando o espectro do acesso à justiça, como expressão

ontologicamente sinônima ao acesso à jurisdição. Outro, aliás,

não é o sentido que merece ser atribuído ao princípio da

inafastabilidade da jurisdição estatal, insculpido no art. 5.º,

XXXV, da CF.

Segundo Gerard Cornu e Jean Foyer, a justiça estatal e a

justiça arbitral são dois modos distintos de jurisdição e,

44

Athos Gusmão Carneiro, Arbitragem. Cláusula Compromissória. Cognição e “Imperium”. Medidas Cautelares e Antecipatórias. “Civil Law” e Common Law”. Incompetência da Justiça Estatal. 45 Recurso Especial 612.439-RS (2003/0212460-3). Rel. Min. João Otávio de Noronha.

Julgado em 25/10/2005

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32

portanto, de composição dos conflitos. Magistrados e árbitros

são todos os dois juízes; apenas um é um juiz público,

nomeado pelo Estado, enquanto o outro um juiz privado,

escolhido pelas partes. Idênticas as suas funções, sendo que a

do árbitro decorre de investidura contratual. Justiça arbitral e

justiça estatal distinguem-se apenas pelos órgãos que as

exercem.

Podemos firmar então, categoricamente, que o juízo arbitral

instituído pela Lei 9.307/96 apresenta natureza jurisdicional.

Está-se, portanto, diante de verdadeira jurisdição de caráter

privado. Aliás, o novo microssistema que contempla o juízo

arbitral não permite, a nosso entender, outra conclusão.” 46

Fátima Nancy Andrighi, após analisar argumentos pró e contra, conclui

que não há motivos para que se afaste o caráter jurisdicional da arbitragem,

pois os argumentos da doutrina favoráveis à jurisdicionalidade da arbitragem

revestem-se de coerência e racionalidade:

“A crítica mais pungente, no entanto, é a de Luiz Guilherme

Marinoni (Teoria Geral do Processo. São Paulo: RT, 2006, p.

147 e seguintes), para quem arbitragem e jurisdição não se

confundem pelos seguintes motivos, em linhas gerais: (i) a

escolha, pelas partes, da solução do conflito por arbitragem

implica renúncia à jurisdição; (ii) o exercício da jurisdição

pressupõe investidura por concurso público; (iii) a arbitragem

não observa o princípio do juiz natural; (iv) o árbitro não tem

aptidão para executar suas decisões.

Todas essas críticas, contudo, foram adequadamente

respondidas por Fredie Didier (Curso de Direito Processual

Civil, Salvador: Ed. Jus Podivm, 11ª edição, 2009, p. 82 a 85).

Em resumo, argumenta o professor baiano: (i) ao escolher a

arbitragem o jurisdicionado não renuncia à jurisdição, mas à

jurisdição prestada pelo Estado; (ii) a jurisdição, mesmo

Estatal, não é exercida apenas por pessoas aprovadas em

concurso público, do que seriam exemplos as vagas

destinadas aos advogados pelos arts. 94, 104, 107, I, 111-A, I,

115, 118, II, 119, II, 120, §1º, III, e 123, parágrafo único, I, da

CF; (iii) o princípio do juiz natural tem como principal elemento

a garantia de julgamento por um órgão cuja competência tenha

sido pré-estabelecida, de modo a assegurar a imparcialidade

46 Joel Dias Figueira Júnior, Acesso à jurisdição arbitral e os conflitos decorrentes das relações

de consumo, Revista de Direito do Consumidor | vol. 37 | p. 92 | Jan / 2001DTR\2001\699.

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33

do julgador. Os dois aspectos estão contemplados na

arbitragem. A imparcialidade é prevista de maneira expressa

pelo art. 21, § 2º da LArb. A prévia competência é fixada no

momento em que firmada a convenção de arbitragem.

Assim, os argumentos da doutrina favoráveis à

jurisdicionalidade do procedimento arbitral revestem-se de

coerência e racionalidade. Não há motivos para que se afaste o

caráter jurisdicional dessa atividade.”47

Nelson Nery Junior também atribui natureza jurisdicional à arbitragem,

por considerar o juízo arbitral uma exteriorização do poder jurisdicional, visto

que a sentença arbitral decide a lide substituindo a vontade das partes, não

está sujeita a recurso, nem necessita ser homologada pelo Judiciário e possui

força de coisa julgada material:

“Instituído o juízo arbitral por convenção de arbitragem

celebrada entre as partes, nele o árbitro é juiz de fato e de

direito (Larb. 18), decide a lide substituindo a vontade das

partes, e sua sentença não fica sujeita a recurso nem precisa

ser homologada pelo Poder Judiciário, tendo força de coisa

julgada material. Conquanto não seja juiz nomeado mediante

concurso de provas e títulos, exerce jurisdição”. 48

“Qual a diferença efetiva que existe entre a sentença judicial e

a arbitral? Ambas, a nosso ver, constituem exteriorização do

poder jurisdicional. Apenas se distanciam quanto ao aspecto

confiança, que preside o negócio jurídico de compromisso

arbitral, estando ausente na jurisdição estatal, cujo órgão não

pode ser escolhido pelas partes e cuja sentença é imposta

coativamente aos litigantes. Enquanto no compromisso arbitral

as partes convencionam acatar a decisão do árbitro, na

jurisdição estatal o réu é compelido a responder ao processo,

ainda que contra a sua vontade, sendo as partes obrigadas a

obedecer o comando emergente da sentença. (...) A sentença

arbitral como é aplicação do direito ao caso concreto por juiz

não estatal, é manifestação de atividade jurisdicional. A

consequência disso é que se reveste da autoridade da coisa

julgada.”49

47 Fátima Nancy Andrighi, Conflito de Competência nº 113260/SP - 2010/0139887-0.

48

Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, Código de Processo Civil Comentado e Legislação extravagante, 10

a edição, Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 165.

49

Nelson Nery Junior, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, 2a ed., São Paulo,

RT, 1992, p. 70.

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34

“Com a celebração do compromisso, as partes não estão

renunciando ao direito de ação nem ao juiz natural. Apenas

estão transferindo, deslocando a jurisdição que, de ordinário, é

exercida pelo órgão estatal, para um destinatário privado.

Como o compromisso só pode versar sobre matéria de direito

disponível, é lícito às partes assim proceder”. 50

Carlos Alberto Carmona assevera que o legislador optou por adotar a

tese da jurisdicionalidade da arbitragem, pondo fim à atividade homologatória

do juiz estatal. E, após referir-se aos diferentes entendimentos acerca da

natureza jurídica da arbitragem, conclui ser inegável que a arbitragem,

contratual em sua origem, se desenvolve com a garantia do devido processo e

termina com uma sentença que produz os mesmos efeitos da sentença judicial.

"O conceito de jurisdição, em crise já há muitos anos, deve

receber novo enfoque, para adequar-se a técnica à realidade.

É bem verdade que muitos estudiosos ainda continuam a

debater a natureza jurídica da arbitragem, uns seguindo as

velhas lições de Chiovenda para sustentar a idéia

contratualista, outros, preferindo seguir idéias mais modernas,

defendendo a ampliação do conceito de jurisdição, de forma a

encampar também a atividade dos árbitros; outros, enfim

tentam conciliar as duas correntes. (...) O fato que ninguém

nega é que a arbitragem, embora tenha origem contratual,

desenvolve-se com a garantia do devido processo e termina

com ato que tende a assumir a mesma função da sentença

judicial”.51-52

50 Nelson Nery Junior, Princípios do Processo Civil na Constituição Federal, v. 1 p. 119-120.

51 Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, Ed. Atlas, 3ª Edição, 2009, pp. 26-27. 52 Carmona resume as razões pelas quais deve-se entender que a arbitragem tem natureza

jurisdicional: “Nunca me convenci a respeito da restrição imposta ao conceito de jurisdição, e

temo afirmar que as idéias de Chiovenda e de Carnelutti, que tanto impressionaram nossos

autores mais ilustres, envelheceram e paulatinamente deixaram de refletir o real significado de

iuris dicere. Tanto o árbitro como o Juiz togado dizem autoritativamente o direito, concretizando

a vontade da lei; tanto o árbitro como o Juiz exercem função, atividade e poder que

caracterizam a jurisdição; tanto o árbitro como o Juiz proferem decisões vinculativas para as

partes; tanto o árbitro como o Juiz julgam! Assim sendo, no momento em que o árbitro aceita o

encargo, recebe das partes o poder de decidir um dado litígio, impondo em caráter obrigatório

e vinculativo a solução para o caso concreto, caracterizando-se a substituição da vontade das

partes pela do árbitro, que expressa e sintetiza a vontade da lei. A função do árbitro, como se

vê, não é diferente daquela do Juiz. Quanto à atividade do árbitro, não difere ela

substancialmente daquela desempenhada pelo Juiz togado: tanto um como outro conhecem as

questões de fato e de direito deduzidas pelas partes, analisando-as e valorando-as para formar

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35

Por outro lado, Caio Cesar Vieira Rocha assinala que,

independentemente de quaisquer considerações teóricas que se façam a

respeito do tema, o fato concreto é que a Lei 9.307/96 conferiu à arbitragem

uma indiscutível natureza jurisdicional, pois a sentença arbitral produz os

mesmos efeitos da sentença do juiz togado, fazendo coisa julgada e

constituindo um título executivo judicial:

“Abstraindo-se quaisquer considerações teóricas a respeito, a

Lei de Arbitragem, declarada constitucional pelo STF, impõe à

arbitragem natureza jurisdicional. É dizer: o ordenamento

jurídico confere à arbitragem caráter jurisdicional.

De partida, a Lei atribuiu à sentença arbitral o mesmo efeito da

sentença proferida pelos juízes estatais, possuindo ambas,

quanto às consequências jurídicas que produzem, o mesmo

alcance. Tal sucede por força do disposto no art. 31, cumulado

com o que estabelece o art. 18, ambos da Lei de Arbitragem. A

par disso, verifica-se que o art. 475-N, IV, do CPC

(LGL\1973\5) incluiu a sentença arbitral como título executivo

judicial, equiparando-a definitivamente à sentença judicial. Para

todos os efeitos, por força da lei, a sentença arbitral é título

executivo judicial, e, independente de tal inclusão estar certa

ou errada na visão da doutrina, é realidade inarredável.

O legislador, ao fazer tal inclusão no rol de títulos executivos

judiciais, estendeu à sentença arbitral os mesmos efeitos

produzidos pelas sentenças judiciais, capaz, inclusive, de

produzir coisa julgada, qualidade esta que só poderá ser

afastada nas hipóteses previstas para a ação anulatória

inseridas no art. 32 da Lei de Arbitragem.”53-54

seu convencimento, propiciando as bases para a decisão da pretensão que lhes foi submetida

(esta, aliás, a característica básica da atividade cognitiva). Por derradeiro, árbitro e Juiz

ostentam poder: a decisão que proferem um e outro é obrigatória e vinculante para os

contendentes”. (Carlos Alberto Carmona, Das boas relações entre árbitros e juízes, Revista de

Processo | vol. 87 | p. 81 | Jul / 1997DTR\1997\298).

53 Caio Cesar Vieira Rocha, Conflito positivo de competência entre árbitro e magistrado,

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 34 | p. 263 | Jul / 2012DTR\2012\450623.

54 José Arnaldo da Fonseca, baseado na análise dos dispositivos da Lei de Arbitragem,

também adota o entendimento de que o árbitro exerce jurisdição: “Diversos artigos da Lei

9.307/1996 atribuem à arbitragem caráter jurisdicional: Art. 18: 'o árbitro é juiz de fato e de

direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou à homologação pelo Poder

Judiciário'; art. 31: 'a sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos

efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui

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36

Pedro A. Batista Martins também resume as razões pelas quais deve-

se entender que a Lei 9.307/96 adotou a teoria publicista (jurisdicional) da

arbitragem:

“Não resta dúvida de que o legislador optou por conferir ao

sistema legal brasileiro a natureza publicista da arbitragem.

Essa assertiva podemos extrair de várias passagens da Lei n.

9307/96. Em conformidade com seus termos, a sentença

arbitral produz entre as partes e seus sucessores, os mesmos

efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário

e, sendo condenatória, constitui título executivo (art. 30).

De forma didática, a lei brasileira de arbitragem adotou a

terminologia “sentença” em substituição a “laudo” e conferiu à

decisão proferida em sede arbitral as naturezas declaratória,

constitutiva e condenatória.

Caso a decisão precise ser executada perante o Poder

Judiciário, é ela título executivo judicial, o que restringe

sobremaneira os argumentos de defesa da parte condenada ao

cumprimento de uma obrigação (art. 41).

Essa equiparação dos efeitos da decisão arbitral àqueles

produzidos pela sentença estatal conduz à sua qualidade de

res judicata. Transita, pois, em julgado.

A solução do conflito por arbitragem é irrecorrível (art. 18),

exceto nos restritos casos de nulidade elencados no artigo 32

da lei.

Foi suprimida, expressamente, a necessidade de homologação

da decisão arbitral nacional (art. 18), bem como aquela emitida

no exterior (art. 35), que fica a depender, neste último caso, do

exequatur pelo Supremo Tribunal [atualmente, pelo STJ], em

conformidade com a Constituição brasileira.

Por fim, caberá ao árbitro o exame e a decisão das necessárias

medidas cautelares ou coercitivas (art. 22, § 4º). Caso a parte

não as cumpra espontaneamente, deverá o juiz estatal

determinar a imposição de tais provimentos.

título executivo'; art. 8.º, parágrafo único, e art. 20, os quais asseguram ao árbitro decidir, em

primeiro lugar, sobre a existência e eficácia da cláusula compromissória arbitral, em corolário

ao princípio da competência-competência ( Kompetenz-Kompetenz). Assim, o Tribunal Arbitral

se reveste de natureza jurisdicional, como destaca a doutrina, à luz dos referidos dispositivos

legais”.( José Arnaldo da Fonseca, Jurisdição estatal e jurisdição arbitral: conflito aparente,

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 23 | p. 49 | Out / 2009DTR\2009\860).

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37

Do exposto, extrai-se ter a lei brasileira optado por conferir

poderes jurisdicionais ao árbitro. Enquanto árbitro, é ele juiz de

fato e de direito, nos termos do art.18 da lei de arbitragem.”55-56

A nós também nos parece indiscutível a natureza jurisdicional da

arbitragem, pois a sentença arbitral produz os mesmos efeitos das sentenças

do Poder Judiciário, faz coisa julgada e é um título executivo judicial. Ou seja,

o juízo arbitral, ao substituir a vontade da parte pela aplicação da lei, está

revestido da própria essência da atividade jurisdicional.

O fato é que – independentemente da posição que se adote acerca da

natureza jurídica da arbitragem – afigura-se indiscutível a relevante utilidade

social da arbitragem na distribuição de justiça e pacificação dos conflitos.57

Por outro lado, por mais que o poder de cognição conferido ao árbitro

possa representar a essência da “jurisdição”, é indiscutível que a arbitragem

possui limitações, tanto no que diz respeito a seu objeto (pode versar apenas

sobre direitos disponíveis) quanto no que se refere aos próprios poderes

55

Pedro A. Batista Martins, A Arbitragem no Brasil, in www.batistamartins.com

56 Clávio de Melo Valença Filho defende, com lastro na doutrina nacional e estrangeira, a

natureza jurisdicional da arbitragem, ainda que a jurisdição arbitral não esteja adstrita ao Poder

Público. (Poder Judiciário e Sentença Arbitral – Curitiba, Juruá, p. 46 e ss., Apud, Donaldo

Armelin, Arbitragem, Antecipação dos efeitos da tutela. Ação de Instituição de arbitragem

procedente. Eficácia Imediata. Embora pendente Apelação sem efeito suspensivo.

Competência do tribunal arbitral para a concessão de antecipação dos efeitos da tutela, in

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 6 | p. 217 | Jul / 2005DTR\2011\4431).

57 Escreve a propósito Cândido Rangel Dinamarco: “Constitui tendência moderna o abandono

do fetichismo da jurisdição, que por muito tempo fechou a mente dos processualistas e os impediu de conhecer e buscar o aperfeiçoamento de outros meios de tutela às pessoas envolvidas em conflitos. Os meios alternativos para a solução destes ocupam hoje lugar de muito destaque na preocupação dos processualistas, dos quais vêm recebendo especial ênfase a conciliação e a arbitragem.

85 Não visam a dar efetividade ao direito material, ou à

atuação da vontade concreta da lei – isto é, não são movidos pelo escopo jurídico que por muitas décadas se apontou como a mola legitimadora do exercício da jurisdição pelo Estado. Mas, tanto quanto esta, têm o escopo pacificador que é o verdadeiro fator de legitimidade da jurisdição mesma na Estado moderno. Por isso é que, ao falar do direito substancial como portador dos critérios para a tutela

jurisdicional e ao examinar as técnicas processuais capazes de efetivá-la em casos concretos,

é preciso sempre ressalvar esses meios alternativos. Não importa se são ou não fiéis ao direito

substancial, em cada caso: o importante é que sejam aptos a pacificar as pessoas e eliminar

seus conflitos, fazendo-lhes justiça.6 Afinal, tudo que interessa ao processualista moderno é o

aclaramento e agilização dos meios de acesso à ordem jurídica justa, num sistema em que é

estrela de primeira grandeza a preocupação pelos resultados”. (Tutela Jurisdicional, Doutrinas

Essenciais de Processo Civil | vol. 1 | p. 907 | Out / 2011DTR\2012\44887).

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38

concedidos ao árbitro (não possuem poder de execução). Portanto, a

arbitragem não pode ser colocada no mesmo patamar que a Justiça Estatal.

Escrevendo a respeito, Antonio Fichtner e André Luís Monteiro

ressaltam as diferenças fundamentais existentes entre o juízo estatal e o

arbitral:

“É inequívoco, no entanto, que as duas complementares

esferas de atuação na distribuição de justiça – estatal e privada

– não podem ser colocadas no mesmo patamar, por

apresentarem características essenciais diferentes e que

devem ser respeitadas para a garantia e convivência

harmônica dos dois diferentes métodos de resolução de

conflitos de interesses. Com efeito, as cláusulas que

estabelecem a indeclinabilidade da jurisdição e o acesso ao

Poder Judiciário têm estatura constitucional. A autonomia da

vontade, por seu turno, assegura a resolução do conflito pela

via arbitral, mas depende de uma manifestação de vontade

válida e eficaz para produzir o efeito pretendido.

O exercício da jurisdição estatal reúne em si, intrinsecamente,

sem qualquer outro requisito, os poderes de resolver o litígio -

conhecimento –, os poderes de protegê-lo e às partes –

cautelar – e os de implementar no mundo real as decisões

proferidas, interferindo na esfera jurídica do adversário do

beneficiário – execução ou cumprimento de sentença. A

atuação arbitral, por outro lado, desenvolve-se nos limites do

que foi deliberado na convenção de arbitragem, na qual não se

permite em hipótese alguma outorgar ao árbitro poderes típicos

de execução em sentido lato.58

Resta, assim, evidenciado que atualmente a quase totalidade da

doutrina considera que a arbitragem possui natureza jurisdicional.

No entanto, devido à ausência de poderes de execução (imperium) dos

árbitros, afigura-se indispensável um regime de cooperação harmônico entre os

órgãos arbitrais e judiciais, para se garantir a efetiva prestação da tutela aos

litigantes.

58

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série, Ed. Renovar, 2010, p. 119.

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39

I.7. Cooperação entre árbitros e juízes

É claro que a arbitragem, enquanto meio de pacificação de conflitos e

satisfação de direitos, preenche um importante papel em desafogar o Judiciário

e, assim, ajudá-lo no cumprimento do preceito constitucional da razoável

duração do processo. 59

No entanto, devido à ausência de poder de coação dos árbitros, muitas

vezes a arbitragem manifesta-se impotente para prestar uma efetiva tutela aos

litigantes. Por tal motivo, a Lei de Arbitragem estabeleceu, para diversos

momentos do procedimento arbitral, a cooperação que deve haver entre o

árbitro e os órgãos do Poder Judiciário.

Esse relacionamento, entre o árbitro e o juiz, não há de ter qualquer

traço de rivalidade ou contraposição, mas, pelo contrário, deve constituir-se em

harmônica cooperação em prol da realização do fim comum a ambos: a

composição dos conflitos.

Após recordar a advertência de Bruno Oppetit, de que entre a instância

arbitral e a judicial havia "dualidade de legitimidade, mas comunhão de ética e

de fim; diversidade de vias e meios, mas unidade funcional; paralelismo, mas

também convergência", Selma Lemes observa:

“Em perfeita consonância com essa assertiva, a Lei de

Arbitragem nos arts. 8.º, parágrafo único, 18 e 22, § 4.º, e o

CPC (LGL\1973\5) no art. 267, VII, fixaram tanto os poderes do

árbitro (idênticos ao do juiz com exceção da ausência do poder

de constrição) e os parâmetros processuais dessa cooperação

e comunhão de esforços para, dando cumprimento ao

livremente pactuado pelas partes, conceder efetividade e

operacionalidade à arbitragem como forma extrajudicial de

59

A respeito, observa André Ramos Tavares: “Não se pode ignorar que ao desviar do

Judiciário algumas das questões mais complexas do Direito, a arbitragem promove a

consequente liberação do sistema oficial, que poderá mover-se com maior agilidade e, dessa

forma, atender a uma das demandas por acesso à Justiça, a celeridade”. (Apontamentos

acerca do princípio constitucional do acesso à Justiça, Boletim Científico da Escola Superior do

Ministério Público da União, Brasília, a. II – nº 6, p. 9-36 – jan./mar. 2003, p. 15.)

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40

solução de conflitos e de acesso à Justiça no tempo e modos

devidos (art. 5.º, LXXVIII, da CF/1988).” 60

A Lei 9.307/96 contém dispositivos que regulam expressamente essa

desejada cooperação entre árbitros e juízes. São eles:

a) o art. 7º, que dispõe sobre a ação que deve ser proposta perante o

Judiciário para a instauração da arbitragem, diante da resistência de uma das

partes quanto à instituição da arbitragem (apesar da existência de cláusula

compromissória);

b) o art. 11, parágrafo único, que trata da fixação dos honorários do

árbitro na ausência de estipulação;

c) o art. 13, §2º, que regula a nomeação de árbitro para completar o

tribunal arbitral, na ausência de acordo;

d) o art. 16, §2º, que dispõe sobre a nomeação de árbitro substituto, na

ausência de acordo;

e) o art. 22, §2º, in fine, que prevê o requerimento à autoridade

judiciária para a condução de testemunha renitente;

f) o art. 22, §4º, que dispõe sobre as medidas coercitivas e cautelares;

g) o art. 25, que regula a resolução de questões prejudiciais relativas a

direitos indisponíveis;

h) o art. 33, que dispõe sobre a ação judicial para decretar a nulidade

da sentença arbitral; e

i) os artigos 35 e seguintes, referentes à homologação e execução de

sentença arbitral estrangeira.

Essa cooperação entre o árbitro e o juiz deve se pautar pelo mesmo

regime de cooperação existente entre os diversos juízos estatais, de diferentes

60

Selma Maria Ferreira Lemes, Medidas cautelares prévias à instituição da arbitragem, Revista

de Arbitragem e Mediação | vol. 20 | p. 231 | Jan / 2009DTR\2009\688.

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41

competências territoriais, que atuam em harmonia para realizar determinados

atos processuais (realizar citações, inquirir testemunhas ou efetuar penhoras)

mediante a expedição de cartas.

A importância dessa integração entre o árbitro e o juiz, para que a

arbitragem seja eficaz, é bem ressaltada por Pedro Batista Martins, que

assinala terem os juízos, estatal e arbitral, funções complementares e não

concorrentes:

“É necessária a integração das duas justiças para que haja

convergência do interesse do particular e do Estado, qual seja,

a tutela do direito do jurisdicionado. As relações dos tribunais

estatais com o juízo arbitral devem ser frutíferas, com os olhos

voltados para a realização da justiça, a satisfação do direito

das partes, especialmente no que tange às medidas

cautelares, gargalo do sistema arbitral, pois é sobremaneira

importante a cooperação e o suporte do Judiciário na

assistência da providência determinada pelo árbitro. (...) O

juízo estatal atua em conjunto com o arbitral, dando assistência

às medidas adotadas pelo árbitro. A eficácia da arbitragem,

nesse particular, depende substancialmente da cooperação e

suporte a ser prestado pelo Poder Judiciário. É preciso

assimilar o entendimento de que os órgãos judiciais e privados

de realização de justiça têm funções complementares e não

concorrentes. Essa cultura é fundamental para a boa prática e

regular condução do processo arbitral”.61

Adriana Braghetta observa que a lei de arbitragem não regulamentou

como deveria se formalizar essa comunicação entre árbitros e juízes:

“A lei de arbitragem não criou mecanismo formal para que o

árbitro - ou a parte - busque, no judiciário, a coerção da medida

proferida na arbitragem.

Acredito que não é necessário que a lei de arbitragem

disponha a respeito, especialmente porque o procedimento

arbitral é marcado pela flexibilidade em contraposição a um

processo judicial bastante formal. Carlos Alberto Carmona

comenta: "O árbitro dirigir-se-á ao juiz através de mero ofício,

instruído com cópia da convenção de arbitragem e do adendo

de que trata o art. 19, parágrafo único, da Lei de Arbitragem, se

existir. Enquanto não houver regulamentação para os trâmites

61

Pedro Batista Martins, Da Ausência de Poderes Coercitivos e Cautelares do Árbitro, in Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem, Martins, Lemes, Carmona (Coord) Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 370.

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42

necessários ao cumprimento da solicitação do concurso do juiz

togado, o melhor método será o da distribuição do ofício a um

dos juízes cíveis competentes para o ato. Recebido o ofício e

os documentos, o juiz verificará se a convenção arbitral é

regular e se os dados recebidos permitem-lhe avaliar (sempre

formalmente) se a solicitação preenche os requisitos que

levarão ao seu cumprimento. Em caso positivo, determina as

providências deprecadas (solicitadas, pedidas, rogadas) pelo

árbitro; em caso negativo, informará ao árbitro o motivo da

recusa de cumprimento, devolvendo o ofício recebido."

De fato, nada mais necessário que um ofício instruído com a

convenção arbitral, o comprovante da constituição do Tribunal

Arbitral e a decisão.

O juiz togado deverá se ater às questões formais. Nas palavras

de Pedro Batista Martins: "Ao Juiz togado não compete

modificar ou limitar o remédio determinado pelo árbitro,

devendo, normalmente, deferir a providência adotada no

procedimento arbitral, excetuados os casos em que se apure

que a medida ordenada contenha algum vício de formalidade

insuperável, daqueles que a lei comina de nulidade (cf. art. 244

do CPC), ou que haja violado dispositivo de ordem pública, vez

tratar-se de preceito de caráter indisponível. Fora desses

casos, não tem o juízo estatal o poder de modificar ou alterar a

decisão arbitral , por incompetência e por ferir o preceito legal

contido no art. 18 da lei de arbitragem que veda a revisão, pelo

Judiciário, das determinações impostas pelo Tribunal

Arbitral".62

E foi justamente para regulamentar esse regime de cooperação

harmônica que deve haver entre árbitros e juízes, que o projeto de novo Código

de Processo Civil, atualmente em avançada tramitação no Congresso Nacional,

previu, no Livro IV, Título II, “Da Comunicação dos Atos Processuais”, a figura

da “carta arbitral” para que o órgão jurisdicional nacional pratique, ou determine

o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado por

árbitro. Sendo que a recusa do cumprimento da carta arbitral deverá ser

62

Adriana Braghetta, Medida Cautelar e Arbitragem, in site da Câmara de Mediação e Arbitragem de Joinville.

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43

fundamentada pelos mesmos motivos que justificam o não cumprimento de

uma carta precatória.63

Essa proposta de criação da carta arbitral foi encaminhada, como

emenda ao Projeto de Lei de iniciativa do Senado Federal (PL 166/2010),

através do Grupo de Pesquisa em Arbitragem GPA, junto à PUC-SP, do qual é

líder o Prof. Francisco José Cahali, contando com a parceria da OAB/RJ e

apoio de diversas outras instituições.

Uma vez considerado o conceito de jurisdição – suas principais

características e as atividades a ela próprias – e visto o entendimento

doutrinário acerca dos poderes conferidos ao árbitro, bem como sobre a

natureza jurídica da arbitragem, cumpre analisar a possibilidade de concessão

de tutelas de urgência e de evidência no âmbito da arbitragem.

63

Em 17/07/2013, comissão especial da Câmara dos Deputados instituída para analisar o

projeto do novo CPC, PL 8.046/10, aprovou o parecer apresentado pelo relator, deputado

Paulo Teixeira. A versão atual do projeto dispõe o seguinte:

Livro IV – Dos Atos Processuais, Título II – Da Comunicação dos atos processuais, Capítulo II

– Das Cartas – Art. 260. São requisitos das cartas de ordem, precatória e rogatória: I – a

indicação dos juízes de origem e de cumprimento do ato; II – o inteiro teor da petição, do

despacho judicial e do instrumento do mandato conferido ao advogado; III – a menção do ato

processual que lhe constitui o objeto; IV – o encerramento com a assinatura do juiz. (...) § 3º A

carta arbitral atenderá, no que couber, aos requisitos a que se refere o caput e será instruída

com a convenção de arbitragem e com as provas da nomeação do árbitro e da sua aceitação

da função.

Art. 267. O juiz recusará cumprimento à carta precatória ou arbitral, devolvendo-a com

despacho motivado: I – quando não estiver revestida dos requisitos legais; II – quando faltar-

lhe competência em razão da matéria ou da hierarquia; III – quando tiver dúvida acerca de sua

autenticidade. Parágrafo único. No caso de incompetência em razão da matéria ou da

hierarquia, o juiz deprecado, conforme o ato a ser praticado, poderá remeter a carta ao juiz ou

ao tribunal competente.

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44

PARTE II

TUTELAS DE URGÊNCIA E DE EVIDÊNCIA NA ARBITRAGEM

II.1. Tutela de urgência e tutela de evidência

São conhecidas as distinções existentes entre medida cautelar e

antecipação da tutela e fugiria aos estreitos limites desse trabalho aprofundar a

questão.

Para o que aqui nos interessa, podemos dizer, em apertadíssima

síntese, que na antecipação da tutela, o juiz se adianta e concede à parte,

provisoriamente, um provimento que normalmente seria dado na prolação da

sentença, enquanto que com a medida cautelar, visa-se resguardar o direito

que será definido posteriormente.

O fato é que – como observa Eduardo Arruda Alvim – a medida

cautelar e a antecipação de tutela (quando calcada no inc. I do art. 273) são

“sub-espécies de um gênero maior a que se pode denominar de tutelas de

urgência”:

“O que há de comum a ambos os casos é que o magistrado,

com base em cognição sumária do caso, profere uma decisão

de caráter provisório, que tem por escopo garantir a efetividade

do processo. Em ambas as hipóteses, colima-se garantir uma

prestação jurisdicional eficaz. Tanto num como noutro caso, a

tutela será de urgência e terá como fundamento o risco de

ineficácia do provimento final.”64

Por tal motivo, a Lei nº 10.444/02 acrescentou o § 7º, ao art. 273 do

CPC, estabelecendo a fungibilidade entre os dois institutos:

64

Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010, p. 161.

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45

“§ 7o Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer

providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando

presentes os respectivos pressupostos, deferir a medida

cautelar em caráter incidental do processo ajuizado”.

Já a antecipação da tutela prevista no § 6º – também introduzido no art.

273 do CPC pela Lei nº 10.444/02 – poderá ser concedida quando um ou mais

dos pedidos cumulados, ou parcela deles, mostrar-se incontroverso.65 Tanto

nesse caso, como nas situações calcadas no inciso II, do mesmo art. 273

(quando fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto

propósito protelatório do réu), são hipóteses de tutelas de evidência.

Ou seja, pode-se afirmar que, na sistemática de nosso processo civil,

admite-se a antecipação da tutela jurisdicional tanto por motivos de “urgência”,

como em casos de “evidência”.

Por essa razão, o projeto do novo Código de Processo Civil, aprovado

pelo Senado Federal e em avançada tramitação na Câmara dos Deputados,

adota nova classificação: “tutelas de urgência” e “tutelas de evidência”.66

Em linhas gerais, pode-se afirmar que as “tutelas de urgência”

correspondem tanto às atuais medidas cautelares, como à antecipação de

tutela do inciso I, do art. 273, e do § 3º, do art. 461, do CPC. Já as “tutelas de

evidência” correspondem às antecipações de tutela previstas no inciso II e no §

65

Nesse caso, observa Eduardo Arruda Alvim, “não se trata, propriamente, de antecipação de tutela, mas de hipótese de julgamento conforme o estado do processo”. (Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010, p. 39.) 66 Segundo o projeto de novo CPC, as “tutelas de urgência” (cautelar ou satisfativas) serão

concedidas “quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo na

demora da prestação da tutela jurisdicional”. E as “tutelas de evidência”, serão concedidas,

“independentemente da demonstração de perigo da demora da prestação da tutela

jurisdicional”, quando: I- ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto

propósito protelatório do réu; II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas

documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula

vinculante, ou III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada

do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado,

sob cominação de multa”. Sendo que a decisão baseada nos incisos II e III poderá ser

proferida liminarmente.

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6º, do art. 273 do CPC, e poderão ser concedidas em outras situações de alto

grau de probabilidade do direito do autor.

Para a concessão das “tutelas de urgência” é exigido, além do fumus

boni iuris, o periculum in mora (salientando-se que, para a tutela antecipada, a

lei exige a demonstração da verossimilhança da alegação e o fundado receio

de dano irreparável ou de difícil reparação); enquanto que para as “tutelas de

evidência” não se requer o periculum in mora.

Adotaremos, no presente trabalho, essa mesma classificação do

projeto de novo CPC.

Isso posto, veremos a seguir que a antecipação da tutela jurisdicional,

tanto por motivos de urgência, como por razões de evidência, possui um

indiscutível fundamento constitucional.

II.2. Fundamento constitucional das tutelas de urgência e de

evidência

Eduardo Arruda Alvim destaca que as tutelas de urgência (tanto os

provimentos cautelares quanto as decisões antecipatórias de tutela) possuem

fundamento constitucional e visam dar efetividade ao art. 5º, XXXV da CF, que

garante a todos o acesso à Justiça.

O inciso XXXV, do art. 5º, da CF, ao determinar que “a lei não excluirá

da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, por óbvio,

protege não só a lesão, mas também a ameaça a direito. O que legitima – ou

até mesmo impõe – a concessão de tutelas de urgência, ante a ameaça ao

direito.

“Soa-nos inegável estar prevista na Constituição Federal (art.

5.º, inc. XXXV), tanto a proteção à lesão de direito,

restaurando-o, como à ameaça, o que, em nosso entender,

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47

abrange as medidas antecipatórias de tutela e as ações

cautelares”.67

Já as tutelas de evidência, além de amparar-se também no mesmo

inciso XXXV, encontram sua fundamentação constitucional mais próxima no

inciso LXXVIII, do mesmo art. 5º da CF, segundo o qual “a todos, no âmbito

judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os

meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Com efeito, diante do preceito constitucional que garante a celeridade

da tramitação e a razoável duração do processo, não há porque retardar a

entrega da prestação jurisdicional se o pedido é incontroverso, o que ocorre,

por exemplo, nas hipóteses em que o réu – a quem compete o ônus de alegar

em contestação toda a matéria de defesa (princípio da eventualidade ou

concentração da defesa) – não se opôs a um ou mais pedidos.68

Em suma, podemos concluir que quando a Constituição garante o

acesso ao Poder Judiciário, está assegurando também uma resposta efetiva, e

em tempo hábil, pois, evidentemente, um acesso sem resposta não seria

verdadeiro acesso, mas simples simulacro.

Veja-se, a propósito, a lição de Kazuo Watanabe:

67

Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão,

2010, p.

68 Observa Eduardo Alvim que, “não tem aplicabilidade, nesse caso, a regra do § 4º do art. 273,

quanto à possibilidade de revogação/modificação da decisão antecipatória de tutela”. E, por

outro lado, salienta que sempre deverá ser observado o princípio do devido processo legal e a

garantia da ampla defesa e do contraditório, insculpidos nos incisos LIV e LV do art. 5º da CF:

“A noção de segurança jurídica pressupõe um iter processual em que sejam amplamente

asseguradas a bilateralidade da audiência e a ampla defesa, o que necessariamente demanda

tempo. Se o fator tempo se coloca como fator de risco à efetividade da entrega da prestação

jurisdicional àquele que muito provavelmente tem direito, justifica-se, então, com esteio no

precitado art. 273, caput, e inc. I, a antecipação de tutela.

Assim, para a antecipação de tutela, é preciso que tenhamos presente a posição do réu, que também tem direito ao devido processo legal (CF/88, art. 5.º, LIV) e ao qual a mesma Constituição Federal, no inciso LV do art. 5.º, assegura a bilateralidade da audiência e a ampla defesa. Daí decorre, por exemplo, a necessidade de que a antecipação de tutela não gere uma situação irreversível, porque, se gerasse, viria a ser inócua a defesa que viesse a ser apresentada ou que pudesse vir a ser apresentada, como didaticamente preceitua o § 2.º do art. 273”.(Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010, p.)

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“O inc. XXXV do art. 5º da Constituição Federal deve ser

interpretado, como ficou acima sublinhado, não apenas como

garantia de mero acesso aos órgãos do Poder Judiciário, mas

como garantia de acesso à ordem jurídica justa, de forma

efetiva, tempestiva e adequada”.69

No mesmo sentido, escreve Fredie Didier Jr., para quem “não basta a

simples garantia formal do dever do Estado de prestar a Justiça; é necessário

adjetivar esta prestação estatal, que há de ser rápida, efetiva e adequada.”70

Portanto, pode-se afirmar que a possibilidade de se decidir e decretar

medidas urgentes, em sede de cognição sumária, e antes de formada a

cognição exauriente dos fatos, decorre da constatação de que, se o juiz, em

tais casos, não decidisse, implicaria em verdadeira negativa de prestação

jurisdicional, pois o pleno acesso à Justiça implica no “dever de eficiência do

Estado na prestação da tutela jurisdicional”.71

Afirma, com acerto, Marcos Destefenni que a existência de tutelas

urgentes provisórias se fundamenta no direito à tutela jurisdicional, efetiva e

prestada em tempo razoável:

“O direito de acesso à jurisdição estatal também significa direito

à obtenção de uma tutela jurisdicional efetiva, prestada em

prazo razoável, quer dizer, sem dilações indevidas. Há, nestes

termos, a garantia constitucional à tutela efetiva [....] Por isso,

devem existir tutelas urgentes provisórias, únicas aptas a

assegurar a efetividade e a utilidade da prestação jurisdicional

nesses casos onde há o perigo da demora, embora propiciem

decisões não definitivas da lide”.72

69 Kazuo Watanabe, Política Pública do Poder Judiciário Nacional para tratamento adequado

dos conflitos de interesses, in www.tjsp.jus.br.

70 Fredie Didier Jr., Notas sobre a garantia constitucional do acesso À Justiça: o princípio de

ação ou da inafastabilidade do Poder Judiciário, Revista de Processo | vol. 108 | p. 23 | Out /

2002DTR\2011\1509

71 Cf. Marcos Destefenni, Natureza constitucional da tutela de urgência, Porto Alegre: Sérgio

Antonio Fabris, 2002, p. 290. Apud. Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010. 72

Cf. Marcos Destefenni, Natureza constitucional da tutela de urgência, Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 2002, pp.294-295. Apud Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010.

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49

A esse propósito, Pedro Antônio Batista Martins observa que as tutelas

de urgência “agem como verdadeiro antídoto ao tempo que o processo

demanda para sua definitiva conclusão”.73

Ademais, saliente-se que a Jurisdição é um poder-dever. O julgador

não pode deixar de decidir a lide que lhe é submetida. Esse é o sentido da

regra do art. 126 do CPC que consagra a plenitude lógico-jurídica do

ordenamento jurídico, como bem assinala Arruda Alvim:

“A referência, em texto de direito escrito, isto é, no art. 126 do

Código de Processo Civil a estas fontes subsidiárias do direito,

demonstra claramente a plenitude lógico-jurídica do sistema,

precisamente tendo em vista a realidade de que, inocorrendo

norma especificamente regradora da espécie, o juiz tem meios

fornecidos pelo próprio sistema, para, precisamente porque é

pleno, solucionar a controvérsia a ele submetida”.74

E Eduardo A. Alvim, após recordar que norma de teor equivalente

encontra-se albergada no art. 4ª da Lei de Introdução às Normas do Direito

Brasileiro (nova denominação da Lei de Introdução ao Código Civil),

acrescenta, que “à plenitude lógica do ordenamento jurídico corresponde, no

plano do direito constitucional e sua disciplina regulatória infra constitucional, o

pleno acesso à Justiça”.

Ou seja, a garantia de pleno acesso à Justiça implica na vedação à

negativa de prestação jurisdicional (e prestação jurisdicional efetiva, célere e

em tempo razoável) mesmo diante de lacunas da lei. Sejam essas lacunas

referentes ao direito material, ou digam respeito ao direito processual.

73 Pedro Antônio Batista Martins, Medida Cautelar de arresto visando garantir execução futura

de sentença arbitral estrangeira, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 21 | p. 257 | Abr /

2009DTR\2009\708.

74 Cf. Arruda Alvim, Código de Processo Civil comentado, vol.V, São Paulo: RT, 1979, p.116.

Nas palavras de Fredie Didier Jr.: “(...) ainda que a situação concreta não esteja prevista expressamente na legislação, caberá ao magistrado dar uma resposta ao problema, classificando-a como lícita ou ilítica, acolhendo ou negando a pretensão do demandante” (Cf. Fredie Didier Jr., Curso de direito processual civil – teoria geral do processo e processo de conhecimento, 6.ª ed., vol. 1, Salvador: JusPODIVM, 2006, p. 78). Apud Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010.

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50

Em outras palavras, deve-se entender que, mesmo se não existissem

as normas de direito processual que permitem ao juiz a adoção de medidas

cautelares ou a antecipação da tutela, essas medidas seriam cabíveis, por

força dos mandamentos constitucionais que garantem o pleno acesso à

jurisdição, a celeridade na tramitação e a razoável duração do processo.

Assinala, com acerto, Nelson Luiz Pinto que seria possível a

concessão de tutelas provisórias – cautelares e antecipatórias –, ainda que

não houvesse previsão legal, em virtude das garantias constitucionais do

direito de ação, da inafastabilidade do Poder Judiciário na apreciação da

lesão ou ameaça de direito:

“Ainda que não houvesse expressa previsão legal no sentido

de ser possível a concessão de tutela provisória, quer no

âmbito cautelar, quer no âmbito da antecipação de tutela, ainda

assim poder-se-ia cogitar a outorga do provimento jurisdicional

equivalente, em função das regras pertinentes à

inafastabilidade do Poder Judiciário quanto à apreciação da

lesão ou ameaça de direito (CF, art. 5.º, XXXV) e à garantia do

exercício constitucional de petição, nele incluído o exercício do

direito de ação (CF, art. 5.º, XXXIV, a), invocando inclusive, os

princípios constitucionais da isonomia, assim entendida como a

paridade de armas para que haja igualdade processual e,

ainda, o princípio da proporcionalidade, na medida em que não

seria razoável sacrificar o direito daquele que tem razão

apenas e tão-somente para se prestigiar o formalismo

processual”.75

O mesmo entendimento encontramos em James Marins, para quem a

amplitude do poder de cautela conferido aos magistrados é consequência da

garantia constitucional do acesso à Justiça:

“Não pode o legislador infraconstitucional pretender cercear o

poder geral de cautela conferido aos magistrados, pois, desse

modo, ao tolher-se a preventividade da atividade jurisdicional,

estar-se-ia comprimindo a dimensão constitucional da garantia

individual do acesso à justiça expressada no art.5.º, inc. XXXV

75

Cf. Nelson Luiz Pinto, A antecipação de tutela como instrumento de efetividade do processo e de isonomia processual, in: Revista de Processo, n.º 105, São Paulo: RT, 2002, p. 51. Apud, Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010.

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51

da Constituição Federal de 1988 (norma intangível e de

eficácia plena)”76.

Por seu lado, Luiz Guilherme Marinoni assinala que o instituto da

antecipação de tutela decorre da garantia constitucional prevista no art. 5.º,

XXXV do Diploma Maior, concluindo com acerto que “a tutela antecipatória,

portanto, nada mais é do que instrumento necessário para a realização de um

direito constitucional [de acesso efetivo ao Judiciário, garantido pelo inc. XXXV

do art.5.º do Texto Supremo]” 77 78

Por tais motivos, parece-nos inquestionável que as tutelas de urgência

e de evidência decorrem diretamente dos preceitos constitucionais insculpidos

nos incisos XXXV e LXXVIII, do art. 5º da Constituição Federal, o que as

legitimaria, ainda que para elas não houvesse previsão na legislação

infraconstitucional.

Uma vez assentado que a possibilidade de concessão de tutelas de

urgência e de evidência tem fundamento constitucional e decorre do próprio

poder-dever inerente à jurisdição, analisaremos o tema no âmbito da

arbitragem.

76

James Marins, Tutela jurisdicional efetiva em matéria tributária no Brasil – aspectos da antecipação de tutela no processo tributário, in: Justiça tributária, São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 309, Apud Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010. 77

Luiz Guilherme Marinoni, A antecipação da tutela, 8.ª ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 166, Apud Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010. 78

A tal respeito, vale destacar trecho do voto do Min. Celso de Mello, proferido em julgamento de pedido de liminar na ADI 223/DF: “O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional representa, pelo seu caráter global e abrangente, instrumento de defesa do direito à ação de conhecimento, do direito à ação de execução e do direito à ação cautelar. Particularizar qualquer dessas situações e, em consequência, exclui-la da tutela constitucional, significaria, em última análise, repudiar conquista de inegável valor político-jurídico” (RTJ 132/571, trecho transcrito da p. 584, Apud Eduardo Arruda Alvim, Antecipação da Tutela, Juruá Editora, 1ª Edição, 3ª reimpressão, 2010). A ADI 223-DF questionava a Medida Provisória 173, de 18.3.90, a qual vedava a concessão de medida liminar em mandado de segurança e em ações ordinárias e cautelares decorrentes das Medidas Provisórias números 151, 154, 158, 160, 161, 162, 164, 165, 167 e 168. No caso concreto, o pedido de liminar foi indeferido, vencido o Ministro Celso de Mello. Posteriormente, a ADI restou prejudicada pela perda de objeto, pois a Medida Provisória perdeu sua eficácia, por não ter sido apreciada pelo Congresso Nacional no prazo constitucional.

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52

II.3. Aplicam-se, à arbitragem, as garantias constitucionais do

processo

Inicialmente, cumpre assinalar que aplicam-se, à arbitragem, as

garantias constitucionais do processo.

Assevera Cândido Rangel Dinamarco que “a expressiva aproximação

entre o processo arbitral e o estatal é suficiente para abrigá-lo sob o manto

superior do direito processual constitucional, o que importa encarar seus

institutos à luz dos superiores princípios e garantias endereçados pela

Constituição aos institutos processuais”.79

Dinamarco afirma existir uma “plena incidência, sobre o processo

arbitral, dos princípios e garantias constitucionais inerentes à tutela

constitucional do processo”. E acrescenta:

“Quando se pensa no acesso à justiça, que é a magna

condensação de todas as garantias constitucionais do

processo, hoje é imperioso incluir nesse pensamento as

aberturas para a tutela jurisdicional pela via da arbitragem,

como alternativa às vias estatais. Quando se pensa no

contraditório e na ampla defesa, deve-se pensar na

participação dos sujeitos processuais no processo estatal e no

arbitral também. Quando enfim se pensa no due process of law

como princípio tutelar da observância de todos os demais

princípios, não se pode excluir o devido processo legal arbitral,

como fonte de tutelas jurisdicionais justas e instrumento

institucionalizado de pacificação social.

Fiel a essas premissas, a Lei da Arbitragem afirma de modo

muito categórico e incisivo a aplicação dos grandes princípios

integrantes da tutela constitucional do processo. “Serão sempre

respeitados no procedimento arbitral os princípios do

contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do

árbitro e de seu livre convencimento” (art. 21, § 2.º). Esse

dispositivo é praticamente inócuo no sistema do processo

79 Cândido Rangel Dinamarco, Possibilidade de emenda e alterações a pedidos e o princípio da

estabilização no procedimento arbitral, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 35 | p. 227 |

Out / 2012DTR\2012\451122.

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53

arbitral porque, com ele ou sem ele, os princípios

constitucionais portadores de tais garantias impor-se-iam do

mesmo modo. O Código de Processo Civil (LGL\1973\5) não

contém dispositivo algum como esse e ninguém dúvida de que

seja regido pelos grandes princípios e garantias

constitucionais”. 80

Por tal motivo, e a despeito de a lei de arbitragem dispor

expressamente sobre a obrigatoriedade da observância aos princípios do

contraditório, da igualdade entre as partes, da imparcialidade do árbitro e de

seu livre convencimento, também se aplicam à arbitragem todos os demais

“princípios e garantias constitucionais inerentes à tutela constitucional do

processo”. E, dentre esses princípios e garantias, encontra-se a possibilidade

do julgador conceder medidas cautelares e antecipatórias, a fim de que seja

assegurado o due process of law e para que não seja excluída da tutela

jurisdicional qualquer ameaça a direito da parte (art. 5º, XXXV, da CF), bem

como seja garantida a celeridade e a razoável duração do processo arbitral

(art. 5º, LXXVIII, da CF).

Portanto, uma vez que o árbitro exerce, com exclusividade, o poder

jurisdicional sobre a lide que lhe é submetida, ainda que a Lei de Arbitragem

nada dispusesse a respeito, parece-nos que seria lícito ao árbitro conceder

tutelas de urgência e de evidência, no decorrer da arbitragem.

Analisaremos, a seguir, os diferentes aspectos da questão.

II.4. Tutelas de urgência na arbitragem

Como visto anteriormente, o poder jurisdicional do árbitro restringe-se

às atividades de conhecimento (cognitium), não possuindo poderes de

80 Cândido Rangel Dinamarco, Possibilidade de emenda e alterações a pedidos e o princípio da

estabilização no procedimento arbitral, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 35 | p. 227 |

Out / 2012DTR\2012\451122.

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54

execução (imperium). O poder de execução é exclusivo do Estado, através do

Judiciário.

Por tal motivo, foram suscitadas dúvidas acerca da possibilidade de

decretação de tutelas de urgência (ou evidência) no processo arbitral.

Sim, pois como o árbitro não detém o imperium, havia quem

argumentasse que a decretação de medidas de urgência seria de competência

do Judiciário.

Some-se a isso o fato de que a Lei de Arbitragem não é

suficientemente clara a respeito.

O § 4º, do art. 22, da Lei nº 9.307/96, estipula que, em havendo

necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-

las ao órgão do Judiciário que seria originalmente competente para julgar a

causa. Confira-se:

“Art. 22. (...) §4º Ressalvado o disposto no §2º, havendo

necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros

poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria,

originariamente, competente para julgar a causa”.

Ou seja, o verbo “solicitar”, utilizado nesse dispositivo legal, podia

deixar margem a dúvidas sobre o poder do árbitro quanto às medidas

coercitivas e cautelares. Vale dizer: havendo necessidade, o árbitro poderia

decretar medidas coercitivas ou cautelares e, caso não houvesse cumprimento

espontâneo, “solicitar” ao Judiciário que as executasse, ou caberia aos árbitros

somente “solicitar” a decretação de tais medidas ao Judiciário?

Entendendo como correta a segunda hipótese, Paulo Furtado e Uadi

Lamêgo Bulos sustentaram que o árbitro ou o tribunal arbitral não teriam

“competência para processar e julgar a ação cautelar, que porventura se faça

necessária no curso do procedimento arbitral”. Escreveram, logo após a

promulgação da Lei de Arbitragem, esses autores:

“No procedimento arbitral, podem também estar presentes,

além do fumus boni iuris, o periculum in mora autorizadores da

prestação cautelar. Mas, em havendo necessidade da

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propositura de ação cautelar, é ao juiz de direito, perante a

Justiça Comum, que se haverá de pedir a providência de

assegurar a prova, ou bens, ou, ainda, para obstaculizar a

ameaça de dano, iminente ou irreparável, ao interesse tutelado

no processo principal”81

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro adotou posição diversa, ao entender

que o árbitro somente poderá conceder medidas cautelares se houver previsão

nesse sentido na convenção de arbitragem: “Não dispondo a convenção de

arbitragem sobre a possibilidade do árbitro conceder tais medidas, poderão as

partes requerê-las diretamente ao juiz que seria competente para o julgamento

da causa”. 82

No entanto, o entendimento da Doutrina e da Jurisprudência se

consolidou no sentido de que é permitido ao árbitro conceder tutelas de

urgência e de evidência, visto não ser necessário o poder de execução

(imperium) para se decretar uma medida urgente ou de evidência, seja de

natureza cautelar ou dita satisfativa. Para isso, basta o poder de cognição

(cognitio). A ausência do poder de execução impede apenas o árbitro de

implementar, de maneira forçada, a medida decretada, caso esta não seja

cumprida espontaneamente pela parte.

Com efeito, como visto anteriormente, a exposição de motivos do

Código de Processo Civil, adotando o entendimento de Carnelutti, classifica

função jurisdicional cautelar como um “‘tertium’ genus que contém a um tempo

as funções do processo de conhecimento e de execução”. Ou seja, o poder de

cautela é exercido em dois momentos: num primeiro momento, o julgador

conhece a questão e decreta a medida (e, para isso, exerce o poder de

cognição); e, num segundo momento – se não houver o cumprimento

espontâneo – o julgador implementa a medida de maneira forçada (exercendo

o poder de execução).

81

Paulo Furtado, Uadi Lamêgo Bulos, A Lei de Arbitragem Comentada, Saraiva, São Paulo, 1997, p. 93. 82

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, Aspectos Processuais da Lei de Arbitragem, in Arbitragem, a nova lei brasileira e a praxe internacional, Coord. Paulo Borba Casella, Editora LTr, São Paulo, 1997, p. 152.

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56

Como bem assinala Athos Gusmão Carneiro, por mais que a execução

da ordem dada a uma das partes exceda o limite da cognitio, e passe ao

domínio do imperium, privativo do juízo estatal, “antes da expedição da ordem,

há que verificar seu pressuposto, ou seja, se o contratante é titular do direito

invocado, e esta constatação, em havendo convenção de arbitragem, será feita

no juízo arbitral”.83

Em suma: por possuírem o poder de cognição, os árbitros podem

decretar medidas cautelares ou satisfativas. No entanto, ao carecer do poder

de execução, não podem executá-las, caso não haja o cumprimento

espontâneo.

Na verdade, o poder jurisdicional conferido ao árbitro para conhecer

plenamente da causa inclui a necessidade de resolver todas as questões

concernentes a ela, inclusive a adoção de providências para que as partes não

sejam prejudicadas em seus direitos84. Assim, se durante a arbitragem, houver

necessidade de se adotar medidas cautelares para garantir a utilidade e

eficácia da sentença arbitral futura, o árbitro poderá decretá-las. E, caso essas

medidas não sejam cumpridas espontaneamente pela parte, deverá solicitar ao

órgão competente do Poder Judiciário que as efetive.

A propósito, escreve Carreira Alvim, assinalando que o fato de o árbitro

não poder efetivar uma medida constritiva, por lhe faltar o imperium, não

significa que não possa decretá-la, pois, para isso, basta a cognitio:

“Podem também tornar-se necessárias, em sede arbitral,

medidas cautelares (preparatórias ou incidentes), para garantir

83

Athos Gusmão Carneiro, Arbitragem. Cláusula Compromissória. Cognição e “Imperium”. Medidas Cautelares e Antecipatórias. “Civil Law” e Common Law”. Incompetência da Justiça Estatal. 84 Escrevem a propósito Ricardo Soares Stersi dos Santos, Eduardo de Avelar Lamy e Rafael

Peteffi da Silva: “A medida cautelar, na arbitragem, possui a mesma finalidade da tutela

cautelar no processo judicial. Fundamenta-se, também, no valor justiça adotado pela

Sociedade no sentido de atuar como instrumento garantidor para que a demora da prestação

jurisdicional não venha a se refletir na sua utilidade e efetividade, ameaçada por perigo de

dano ao direito aparente”. (Ricardo Soares Stersi dos Santos, Eduardo de Avelar Lamy e

Rafael Peteffi da Silva, Competência para a concessão de medidas cautelares na arbitragem,

Revista de Processo | vol. 213 | p. 313 | Nov / 2012DTR\2012\450792).

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57

a eficácia da futura sentença arbitral, caso em que, não

podendo o árbitro efetivá-las, deve pedir a colaboração do

órgão do Poder Judiciário para este fim. Mas o fato de não

poder o árbitro efetivar uma medida constritiva, porque lhe falta

império, não significa não possa decretá-la, para o que basta a

jurisdição, na qual se compreende a cognitio”.

No mesmo sentido, o entendimento de José Antonio Fichtner e André

Luís Monteiro, os quais ressaltam que o poder jurisdicional do árbitro, exercido

através da plena cognição da causa a ele submetida, permite a concessão de

medidas urgentes:

“O árbitro exerce seu poder jurisdicional através de plena

cognição da causa, o que lhe permite a concessão de medidas

urgentes. Basta o exercício da cognição para a decretação

dessas medidas. Não há qualquer impedimento legal neste

sentido. Muito ao contrário, pois, conforme leciona Pedro

Batista Martins, “o sistema legal brasileiro não veda ao julgador

privado a ordenação de medidas da espécie, apenas não

confere a seu ato imposição legal”.85

Além disto, na medida em que cabe ao árbitro decidir todo o mérito do

litígio, não há razão lógica para negar-lhe o poder para conhecer e decretar

medidas urgentes no curso do processo arbitral. Em outras palavras, se as

partes conferem ao árbitro o poder de processar e julgar conflito de interesses

em sua inteireza, não há razão legal ou lógica para proibi-lo de conhecer de

medidas urgentes, cujo objeto, dada sua natureza instrumental ou de

continência, nunca será mais abrangente do que a lide principal, a ser resolvida

na sentença arbitral. Trata-se de mera aplicação da regra de quem pode o mais

pode o menos (cui licet quod est plus, licet utique quod est minus).

E, por seu lado, assinala Pedro Batista Martins que as partes, ao

celebrarem o compromisso arbitral, derrogam a jurisdição estatal e conferem

ao árbitro a competência para resolver todas as questões relativas ao litígio.

Portanto, compete a ele adotar todas as providências cabíveis para o efetivo

exercício de sua jurisdição, o que inclui os provimentos cautelares que se

fizerem necessários:

85

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série, Ed.

Renovar, 2010, p. 125.

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58

“Quando os compromitentes firmam o compromisso,

derrogando a jurisdição estatal, conferem ao árbitro a

competência e o poder para resolver todas as questões

atinentes à espécie, assumindo este o dever de zelar para que

as partes não sejam prejudicadas nos seus direitos, o que

inclui, obviamente, a competência para determinar medidas

cautelares e coercitivas.

Assim, cabe ao julgador privado adotar todas as providências

cabíveis ao efetivo exercício da jurisditio, abrangendo,

naturalmente, os remédios cautelares, vez que de natureza

incidental, acessório e, consequentemente, necessários ao

justo deslinde da controvérsia.”86

Com efeito, se – como visto acima – as tutelas de urgência e de

evidência decorrem diretamente das garantias constitucionais de acesso à

Justiça e de razoável duração do processo (art. 5º, XXXV e LXVIII, da CF), não

é possível que, com a derrogação da jurisdição estatal e transferência, para o

juízo arbitral, da competência para conhecer e decidir o litígio, as partes se

vissem privadas desses direitos e garantias fundamentais.

Seguindo essa linha de raciocínio, Carlos Augusto da Silveira Lobo e

Rafael de Moura Rangel Ney consideram um verdadeiro dever do árbitro a

decretação de medidas urgentes para assegurar a decisão de mérito final da

arbitragem:

“Em verdade, não seria exagero afirmar que constitui genuíno

dever do árbitro, no exercício pleno da jurisdição privada,

decretar as medidas cautelares que tenham como propósito

assegurar a efetividade da decisão de mérito que, ao final do

procedimento arbitral, lhe caberá proferir”.87

Sérgio Bermudes, em acurada análise do art. 22 da Lei de arbitragem,

demonstra que os árbitros possuem a competência para decretar medidas

86 Pedro Antônio Batista Martins, Da Ausência de Poderes Coercitivos e Cautelares dos

Árbitros, in Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem, Pedro Batista MARTINS, Selma M.

Ferreira LEMES e Carlos Alberto CARMONA, Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 363.

87 Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, Revogação de Medida

Liminar Judicial pelo Juízo Arbitral, Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da

Arbitragem - 04-06/2001.

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coercitivas e cautelares, faltando-lhes apenas a competência para a efetivação

dessas medidas, havendo necessidade.

“O § 4o do art. 22 da Lei de Arbitragem é claro ao estabelecer

que , “havendo necessidade de medidas coercitivas”, os

árbitros poderão solicitá-las ao Judiciário. Esse verbo, junto

com a frase “ressalvando o disposto no § 2o”, constantes

ambos do § 4o do art. 22, mais a sistemática da lei e a

finalidade da arbitragem apontam no sentido de que o tribunal

arbitral, salvo quanto à condução de testemunha, tem

competência para aplicar medidas coercitivas (v.g., multa,

exibição de documentos, determinação de prestação de

informações, entrega de coisas).

A Segunda parte do § 2o do art. 22 mostra que aos árbitros, ou

árbitro, falta apenas a competência para a efetivação da

medida coercitiva, quando ela depender do uso da força.

Nesse caso, só resta ao tribunal arbitral pedir ao juiz togado a

providência que assegure o efeito prático da medida

determinada. A lei, portanto, é peremptória ao proibir a

execução de medidas coercitivas de força pelo próprio tribunal

arbitral; não, porém, a decretação delas. O juízo arbitral as

decreta. O togado as executa mediante solicitação daquele.

(...) Diga-se o mesmo quanto às medidas cautelares”.

E acrescenta Bermudes que seria um verdadeiro absurdo pretender

que o árbitro, cuja sentença produz os mesmos efeitos da sentença proferida

pelos órgãos do Poder Judiciário, e é considerada um título executivo judicial,

não pudesse determinar providências que assegurassem a eficácia desse

julgado. Portanto, deve-se entender que os árbitros possuem o poder cautelar

necessário para garantir a eficácia de suas decisões:

“Seria um non sense sustentar que o tribunal arbitral careça de

ir ao juiz togado para solicitar a inquirição de testemunha, nas

condições do art. 847 do CPC, disposta ela a prestar o seu

depoimento, apenas porque essa inquirição, antecipada do

momento próprio, seja uma providência cautelar. Idem, quanto

– sempre para ilustrar – à caução, ou a obras de conservação

em coisa litigiosa, ou judicialmente apreendida. De novo, tal

qual se disse das medidas coercitivas, o árbitro decreta essas

providências cautelares e poderá buscar, no juízo comum, a

efetivação delas, havendo necessidade. (...)

Não faria sentido poderem os árbitros proferir sentença

produtora (por certo, dentro dos limites subjetivos da coisa

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julgada) dos mesmos efeitos da sentença proferida pelos

órgãos do Poder Judiciário (art. 31), consistente, quando

condenatória, num título executivo judicial (CPC, art. 585, III),

sem que pudessem determinar as providências assecuratórias

da eficácia desses julgados.

Por isso, há que se entender que os árbitros, posto que algo

insuficiente a lei quanto à explicitação desse aspecto, dispõem

do poder cautelar necessário à garantia da eficácia das suas

decisões. Falta-lhes, isso sim, o poder de efetivar essas

decisões pela força. Podem, contudo, decretá-las, pressupondo

o acatamento das partes, possível também a cooperação do

órgão judicial. Não se esqueça de que, alternativa do processo

judicial, a arbitragem, conquanto não se destine a aliviar o

judiciário, embora produza também essa consequência prática,

não deve onerá-lo, pela instauração de um processo judicial

paralelo ao arbitral.”88

No mesmo sentido, assevera Duval Vianna que se os árbitros não

pudessem conceder a cautela, o § 4º do art. 22, da Lei 9.307/96 seria letra

morta, pois não se pode pretender que o verbo “solicitar”, constante nesse

dispositivo legal, indique que o árbitro deva litigar perante o juiz estatal para

obter uma medida cautelar:

“Das duas, uma: ou o árbitro pode conceder a cautela,

bastando solicitar ao juiz que providencie a sua execução

(demonstrando, naturalmente, a existência da convenção de

arbitragem, como é exigido para a condução de testemunhas –

§ 2o do artigo 22); ou se não puder fazê-lo, o disposto no § 4o

do artigo 22 é letra morta, por ser absolutamente inimaginável

o árbitro litigando perante o juiz estatal, para obter uma

providência cautelar.”89

Carlos Alberto Carmona escreve no mesmo sentido, afirmando que

cabe ao árbitro a decretação de medidas cautelares que se fizerem

necessárias, devendo apenas solicitar ao Judiciário a sua implementação, em

caso de resistência da parte. Observa, ainda, que admitir o contrário – ou seja,

imaginar o árbitro como um simples interlocutor, junto ao juiz togado, para a

88 Sergio Bermudes, in Reflexões sobre a arbitragem, Coordenadores: Pedro A. Batista

Martins e José Maria Rossani Garcez, In memoriam do Desembargador Cláudio Vianna de Lima, Editora LTr, São Paulo, 2002, pp. 279/281. 89 Duval Vianna, Lei de Arbitragem - Comentários à Lei 9.307, de 23.9.96, Editora Esplanada,

1998, p. 169.

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61

obtenção de uma medida cautelar –, acarretaria situações insustentáveis, e

transformaria o árbitro em mero substituto processual da parte, a qual apenas

instaria o árbitro a requerer (em nome próprio) a tutela de um pretenso direito

do litigante.

Escreve Carmona:

“É do árbitro a competência para decidir demanda cautelar

encetada por qualquer dos litigantes acerca da matéria sujeita

à decisão arbitral. E para configurar tal competência, não é

preciso encontrar na convenção arbitral poderes expressos

para proferir decisão que diga respeito a tutela cautelar. Insisto

nesse ponto: se as partes concederam poderes ao árbitro para

resolver suas pendências Acerca de um determinado contrato,

para solucionar uma disputa de sócios de uma determinada

companhia, para estabelecer a responsabilidade pela prática

de dado ato, estes poderes também envolvem os decorrentes

da tutela cautelar (eventual e instrumental).

Surgindo então a necessidade de adotar-se providência

cautelar, o árbitro será instado pela parte interessada a

manifestar-se sobre o cabimento da medida; julgando-a

pertinente – e o contraditório, sempre necessário, poderá ser

diferido por conta da urgência na concessão da medida –

oficiará ao juiz competente para que dê cumprimento às

providências cautelares por ele, árbitro, deliberadas (desde que

haja resistência da parte em face de quem tais medidas foram

manejadas)”.90-91

Por outro lado, José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro fazem

notar que o regime de cooperação entre árbitros e juízes não admite “incursões

indevidas de um juízo na jurisdição do outro”. Portanto, instituída a arbitragem,

a parte interessada já não poderá requerer a medida de urgência diretamente

ao Poder Judiciário. A matéria em discussão estará sob a jurisdição do árbitro,

que deverá decretar a medida de urgência adequada, “cabendo ao Poder

90

Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo – um comentário à Lei nº 9.307/96, 3ª Edição, Editora Atlas, p. 325. 91

No mesmo sentido, escreve Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme: "Diante da

necessidade de se obter uma medida cautelar de urgência, a parte pode solicitá-la ao árbitro,

mas, se houver resistência no acatamento, o árbitro deverá encaminhar solicitação de

execução ao juiz togado." (Manual de Arbitragem. 2. ed. São Paulo: Método, 2007. p. 71).

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62

Judiciário, mediante solicitação do árbitro, a sua efetivação no mundo dos

fatos”.92

Francisco José Cahali assevera que o juízo arbitral tem total autoridade

para apreciar e deferir medidas cautelares que se fizerem necessárias no curso

da arbitragem, pois “a jurisdição do árbitro (ou painel) é completa para o

conhecimento de todas as questões relativas ao conflito”. Portanto, após ter

sido instaurado o juízo arbitral, podem ser avaliadas medidas cautelares para

se garantir o resultado útil da arbitragem. “E cabe ao árbitro a autoridade sobre

a questão, independentemente da omissão a respeito na convenção de

arbitragem, pois contida essa atribuição na jurisdição que lhe é outorgada pelas

partes”.

Assim – conclui Francisco Cahali – “o árbitro decide a respeito da

medida (pertinência, providência e extensão). Se não atendida

espontaneamente pela parte, e inviável o cumprimento de outra forma, será

necessária a cooperação do juízo estatal, para a prática de atos necessários à

efetivação da tutela cautelar deferida”.93-94

Selma Lemes assinala que com a sistemática introduzida pela Lei de

Arbitragem, o árbitro passou a contar com a possibilidade de decretar medidas

cautelares, mas não de executá-las: “tendo sido constituído o tribunal arbitral, a

decisão quanto à pertinência e concessão da medida de urgência é conferida

ao tribunal arbitral. Quando necessária a execução forçada, será ela

92

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série –

Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, 128.

93 Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, pp. 232-

233. 94

Manuel Pereira Barrocas, ao comentar a legislação de diversos países referentes à

arbitragem, assinala que “no Brasil, o árbitro que tenha concedido as medidas cautelares é

também competente para solicitar ao juiz a sua execução”. (Algumas notas sobre medidas

cautelares no direito comparado da arbitragem, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 30 | p.

51 | Jul / 2011DTR\2011\2565).

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63

desenvolvida pelo juiz togado em perfeita harmonia com a instância arbitral”. 95-

96-97

José Arnaldo da Fonseca entende que as jurisdições da arbitragem e

do juízo estatal são “complementares no limite de suas competências", ou seja,

não são concomitantes e a presença de uma afasta a outra:

“O exercício dessas competências é que não pode ser

concomitante, vale dizer, a presença de uma afasta a da outra.

Sejam exemplos: as medidas cautelares e tutelas de urgência

em geral se inserem na competência do juízo arbitral, assim

como decidir sobre o mérito do litígio, não detendo, porém, o

juízo arbitral, força coercitiva, a sua execução compete ao juízo

estatal. Sob esse aspecto é que se diz que se

complementam.98

E Humberto Theodoro Júnior também adota o entendimento de que a

competência, para aplicar as medidas preventivas sobre os direitos e bens

disputados na arbitragem, é do árbitro, não sendo dado à parte, durante o

procedimento arbitral, dirigir-se diretamente ao juiz estatal para pleitear uma

medida cautelar:

95

Selma Maria Ferreira Lemes, A inteligência do art. 19 da Lei de Arbitragem (instituição da Arbitragem) e as medidas cautelares preparatórias, Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais | vol. 20 | p. 411 | Abr / 2003DTR\2003\218. 96 Heitor Vitor Mendonça Sica escreve a respeito: ”tem prevalecido a opinião de que o art. 22, §

4.º, da Lei 9.307/1996 prevê a necessidade de recurso ao Poder Judiciário apenas para

executar ou materializar medidas cautelares que o árbitro já tenha determinado e que não

tenham sido espontaneamente cumpridas pelas partes. Atende-se, assim, à idéia bem assente

de que o árbitro é detentor de poder jurisdicional para solução do litígio que lhe for submetido

pelas partes, e que isso compreende as medidas instrumentais cabíveis para que o resultado

do processo seja útil e efetivo”. (A nova legislação espanhola em matéria de arbitragem,

Revista de Processo | vol. 132 | p. 141 | Fev / 2006DTR\2006\167).

97 No mesmo sentido, Marina Mendes Costa assinala que a doutrina entende – e a prática da

arbitragem no Brasil confirma – “que o tribunal arbitral pode e deve decretar tais medidas

desde que solicitado pelas partes. A intervenção do juiz permanece necessária para a

execução dessas medidas”. (Os poderes do tribunal arbitral para decretar medidas cautelares,

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 28 | p. 109 | Jan / 2011DTR\2011\1298).

98 José Arnaldo da Fonseca, Jurisdição estatal e jurisdição arbitral: conflito aparente, Revista de

Arbitragem e Mediação | vol. 23 | p. 49 | Out / 2009DTR\2009\860

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64

“Não é dado à parte dirigir-se diretamente ao juiz togado para

requerer-lhe medida preventiva a ser aplicada sobre os direitos

e bens disputados no procedimento extrajudicial.

Originariamente, a competência sobre o incidente é do árbitro

ou do órgão arbitral. Uma vez, entretanto, que a este falta o

imperium necessário à atividade executiva, é ao juiz togado

que a lei confere o poder de providenciar a implementação das

medidas coercitivas, mesmo quando dentro do juízo arbitral”.99

Flávio Yarshell igualmente assinala que “não parece haver dúvida, no

direito brasileiro em vigor, quanto ao poder do árbitro, tanto que regularmente

instituído o juízo arbitral, de editar medidas cautelares.”100

Ademais, é preciso notar que quando a Lei de arbitragem estipula que

as medidas coercitivas e cautelares poderão ser solicitadas ao órgão do Poder

Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa, atribui

essa função aos próprios árbitros. Não se trata, portanto, de um ato

postulatório da parte interessada.

Na verdade, atualmente a doutrina e a jurisprudência já se pacificaram

quanto à competência dos árbitros para conhecer e julgar medidas cautelares

relativas à arbitragem, como assinala Arnoldo Wald:

“No Brasil, é entendimento manso e pacífico da doutrina e da

jurisprudência, que compete exclusivamente aos árbitros

conhecer e julgar quaisquer pedidos de medidas provisórias ou

cautelares relativas ao litígio a eles submetido. Tal

competência exclusiva está fundada no fato de que o árbitro é

o juiz de fato e de direito da causa submetida à arbitragem (art.

18 da Lei 9.307/1996),3 cabendo-lhe, com exclusividade, julgar

o mérito do litígio, razão pela qual eventuais pedidos

acessórios – como os cautelares – devem ser a ele

submetidos, em aplicação analógica do art. 800 do CPC

(LGL\1973\5).

99

Humberto Theodoro Junior, Curso de Direito Processual Civil, 34ª Edição, Rio de Janeiro, Forense, 2005, Vol. III, p. 326. 100 Flávio Luiz Yarshell, Brevíssimas notas a respeito da produção antecipada de provas na

arbitragem, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 14 | p. 52 | Jul / 2007DTR\2007\887.

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65

No entanto, caso as partes não cumpram voluntariamente

decisão cautelar proferida pelos árbitros, pode ser necessário o

recurso ao Poder Judiciário para sua execução, uma vez que

os árbitros, embora possuam jurisdictio, não têm poder de

coertio. Assim, os árbitros poderão recorrer à autoridade

judiciária originalmente competente para julgar a causa (nos

termos do art. 22, § 4.º, da Lei 9.307/1996), com o fim de obter

auxílio para a execução forçada da decisão provisória

proferida, sob pena de esvaziá-la e colocar em risco não

apenas o bom funcionamento do procedimento arbitral, mas a

própria eficácia da sentença final a ser proferida pelos

árbitros”.101

De fato, a Jurisprudência já se firmou a esse respeito, como se pode

ver por excerto do seguinte julgado Superior Tribunal de Justiça:

REsp nº 1.297.974 - RJ (2011/0240991-9). Rel. Min. Nancy

Andrighi, DJe 19/06/2012

(...)

A competência do Tribunal Arbitral para processar e julgar

pedido cautelar formulado pelas partes encontra-se pacificada

na doutrina e na jurisprudência, visto que o poder é inerente ao

compromisso arbitral, estando expressamente previsto no art.

22 da Lei nº 9.307/96.

(...)

Evidentemente, a competência do juízo arbitral se limita ao

deferimento da cautelar, estando impedido de dar cumprimento

às medidas de natureza coercitiva, as quais, havendo

resistência da parte em acolher a determinação do(s) árbitro(s),

deverão ser executadas pelo Poder Judiciário, a quem se

reserva o poder de imperium .

Vê-se, portanto, que a concessão de tutelas de urgência é função do

árbitro e decorre diretamente do poder jurisdicional recebido por ele para

decidir o litígio102. No entanto, uma vez concedida a tutela de urgência, e em

101

Arnoldo Wald, Medidas Cautelares fora da sede da Arbitragem, Revista de Processo | vol. 207 | p. 305 | Mai / 2012DTR\2012\44630. 102

Manuela C. Botelho Colombo argumenta em favor de que o árbitro possa decretar tutelas de urgência : “Se o árbitro tem a soberania de regular definitivamente o mérito do litígio, sem a participação do Poder Judiciário, não há razão plausível para impedi-lo de conceder a tutela de urgência a requerimento dos interessados. De modo muito simples, quem detém competência para conhecer do processo principal, deve ter competência para os processos acessórios”. (Medidas de urgência no processo arbitral brasileiro, Revista de Processo | vol. 183 | p. 257 | Mai / 2010DTR\2010\332).

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66

havendo resistência da parte, o árbitro deverá dirigir solicitação ao juiz togado

para implementar a medida.

Essa solicitação, do árbitro ao juiz togado, não requer nenhuma

formalidade especial. Trata-se de um procedimento de todo similar à

comunicação dos atos processuais entre diferentes juízos de competências

territoriais distintas, como as cartas precatórias.

Como vimos acima, o projeto de novo Código de Processo Civil, em

avançada tramitação no Congresso Nacional, denominou essa solicitação de

“carta arbitral”. De acordo com o previsto no projeto de novo CPC, essa carta

arbitral deverá atender, no que couber, aos requisitos das cartas de ordem,

precatória e rogatória, e será instruída com a convenção de arbitragem, com as

provas da nomeação do árbitro e da sua aceitação da função. E o juiz togado

poderá recusar o cumprimento da carta arbitral pelos mesmos motivos que

justificam o não cumprimento de uma carta precatória.

Em caso de decisão judicial equivocada, assinala Carreira Alvim que

cabe à parte prejudicada recorrer ao tribunal estatal, não dispondo o árbitro de

legitimação para fazê-lo:

“Recusando-se o juiz togado a atender à solicitação do juízo

arbitral, devem as partes ser intimadas dessa decisão,

podendo interpor o recurso cabível, se for o caso. Não fica

descartada também a hipótese de reclamação ou correição

parcial, conforme previsto nos regimentos internos dos

tribunais”103

Uma vez consignado o regime das tutelas de urgência na arbitragem,

cumpre analisar a possibilidade de decretação das tutelas de evidência pelo

árbitro. É o que se fará a seguir.

103

José Eduardo Carreira Alvim, Direito Arbitral, Forense, 2002, p. 344.

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67

II.5. Tutelas de evidência na arbitragem

Como visto, consolidou-se o entendimento de que o árbitro detém a

competência para decretar tutelas de urgência no curso da arbitragem. E, caso

haja resistência da parte em cumprir a tutela concedida, o árbitro deverá

solicitar ao Judiciário que a efetive.

Esse entendimento decorre da constatação de que não é necessário o

poder de execução (imperium) para se decretar uma medida urgente. Para

isso, basta o poder de cognição (cognitio). A ausência do poder de execução

impede apenas o árbitro de implementar, de maneira forçada, a medida

decretada, caso esta não seja cumprida espontaneamente pela parte.

Essa é a já consolidada interpretação do § 4º, do art. 22, da Lei de

Arbitragem, segundo o qual “havendo necessidade de medidas coercitivas ou

cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que

seria, originariamente, competente para julgar a causa”.

No entanto, o mencionado dispositivo legal refere-se apenas a

“medidas coercitivas ou cautelares” – vale dizer: tutelas de urgência. Assim,

resta saber se o árbitro também pode conceder tutelas de evidência durante a

arbitragem.

Veremos, a seguir, que parte majoritária da doutrina entende que não

há motivos para impedir o árbitro de conceder tutelas de evidência. Cabendo,

da mesma forma, solicitação ao Judiciário para que efetive a medida

decretada, em caso de resistência da parte.

José Carlos Magalhães, no entanto, adota posição mais reticente e,

após cuidadosa análise, conclui que “a tutela antecipada, como medida

provisória que antecipa os efeitos da decisão final de mérito, pode ser adotada

no processo arbitral, desde que prevista expressamente na convenção arbitral

pelas próprias partes ou no regulamento da instituição de arbitragem por elas

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68

eleita para regular-lhes a composição da controvérsia”. 104

Fichtner e Monteiro defendem claramente a possibilidade de

concessão de tutelas de evidência pelo árbitro e afirmam que “pensar o

contrário seria limitar a atuação do árbitro dentro de uma perspectiva que não

encontra fundamento no ordenamento brasileiro, notadamente em uma quadra

que prestigia sobremaneira a natureza instrumental do processo”.105

Francisco Cahali adota o mesmo entendimento e considera que as

tutelas de evidência constituem “um útil incremento à tutela jurisdicional na

arbitragem”.106

Nilton Cezar Antunes da Costa, após assinalar que, em tese, a

arbitragem enfrenta em menor proporção e escala os percalços da morosidade

do julgamento, conclui que “os árbitros também estão autorizados a conceder

os efeitos antecipados da tutela, desde que presentes os seus requisitos.”

Carreira Alvim encampa a mesma orientação e considera que “em

curso a arbitragem, venham os provimentos antecipatórios, cautelares ou

satisfativos a ser outorgados pelo árbitro, intervindo o Poder Judiciário se

houver necessidade da adoção de atos coercitivos”.107

Alexandre Freitas Câmara também defende que “nos casos em que se

fizer cabível a antecipação, deverá o árbitro deferir a medida antecipatória.”108

Enquanto Carlos Alberto Carmona considera que “não há porque negar ao

árbitro a possibilidade de antecipar a tutela” e acrescenta:

104 José Carlos Magalhães, A tutela antecipada no processo arbitral, Revista de Arbitragem e

Mediação | vol. 4 | p. 11 | Jan / 2005DTR\2005\778.

105 José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série –

Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, 134.

106 Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 237.

107

J. E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, Editora Forense, 2a edição, 2004, Rio de Janeiro, p. 339.

108

Alexandre Freitas Câmara, Arbitragem, 3ª Ed. Lumem Iuris, Rio de Janeiro, Apud. José

Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas

Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, 135.

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69

“Considerando que a antecipação de tutela nada mais é do que

técnica que permite ao julgado desde logo conceder à parte

um, alguns ou todos os efeitos que a decisão final haverá de

produzir (no momento oportuno), é evidente que caberá ao

árbitro – e não ao juiz togado – tomar decisão a respeito,

devendo a parte interessada na obtenção do provimento dirigir-

se ao juiz privado (e não ao estatal)”.109

Assinala ainda Carmona que, como cabe apenas o árbitro proferir o

provimento final da demanda, somente ele poderá decidir se antecipa – em

parte ou no todo – os efeitos que sua decisão final irá produzir:

“Qualquer decisão relativa a eventual antecipação de tutela

somente poderá ser tomada pelos árbitros cabendo ao juiz

togado, se for necessário, tomar as providências para a

execução do provimento.

Não poderia ser diferente: o mecanismo sob enfoque permite

ao julgador antecipar os efeitos (ou alguns efeitos) da tutela, ou

seja, antecipar os efeitos da sentença – arbitral – que

futuramente será proferida. Se apenas o árbitro está autorizado

a proferir o provimento final, toca também a ele – e apenas a

ele – decidir se antecipará ou não algum, alguns ou todos os

efeitos que sua decisão irá produzir!”110-111

Athos Gusmão Carneiro, citando Joel Dias Figueira Jr., manifesta-se no

mesmo sentido, pois se o árbitro decidirá definitivamente a questão de mérito,

não há razão para impedi-lo de conceder as medidas provisórias que se façam

necessárias:

109 Carlos Alberto Carmona, Árbitros e Juízes: Guerra ou Paz?, in Aspectos Fundamentais da

Lei de Arbitragem, Pedro Batista MARTINS, Selma M. Ferreira LEMES e Carlos Alberto

CARMONA, Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 433.

110 Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 327-328.

111

Carmona explicita as razões pelas quais o árbitro pode conceder tutelas de evidência: “Não há porque negar ao árbitro a possibilidade de antecipar tutela, seja por conta da aplicação à arbitragem - por escolha das partes - das regras processuais nacionais (e, se aplicável o procedimento comum, a antecipação de tutela vem à baila), seja por conta de expressa adoção desta técnica de eficacização da tutela jurisdicional no procedimento criado ou escolhido pelas partes para solucionar seu litígio. E, considerando, que a antecipação de tutela nada mais é do que técnica que permite ao julgador desde logo conceder à parte um, alguns ou todos os efeitos que a decisão final haverá de produzir (no momento oportuno), é evidente que caberá ao árbitro - e não ao Juiz togado - tomar decisão a respeito, devendo a parte interessada na obtenção do provimento dirigir-se ao Juiz privado (e não ao estatal). Decidida pelo árbitro a antecipação de tutela, resta saber se haverá ou não necessidade de concurso de força para sua implementação”. (Carlos Alberto Carmona, Das boas relações entre árbitros e juízes, Revista de Processo | vol. 87 | p. 81 | Jul / 1997DTR\1997\298).

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70

“Instaurado o juízo arbitral e caracterizada uma situação de

perigo, conjugada com a posição de verossimilhança do direito

pleiteado, poderá a parte ‘pleitear ao árbitro ou tribunal arbitral

a concessão da tutela antecipatória, acautelatória (típica ou

atípica, voluntária ou contenciosa, nominada ou inominada) ou

inibitória’, e isso porque se o árbitro irá regular definitivamente

a questão de mérito, nos limites em que a convenção de

arbitragem assim o autoriza, ‘não se encontra qualquer razão

plausível para impedi-lo, nas mesmas condições, de conceder

incidentalmente medidas de urgência, de ofício ou a

requerimento dos interessados’ (ob. cit., 37, p. 221). Não

cumprida voluntariamente a determinação do juízo arbitral, este

oficiará ao juízo estatal, solicitando que dê efetividade à

medida já concedida; e o magistrado limitar-se-á, salvo se

ocorrer ofensa à ordem pública ou aos bons costumes, ‘a

executar coercitivamente, através da utilização do seu poder de

império, a medida deferida pelo árbitro’, salvo se dela decorrer

ofensa à ordem pública ou aos bons costumes (id., p. 223).112

Na verdade, pode-se afirmar que a Lei de Arbitragem, ao se referir às

medidas coercitivas e cautelares, pretendeu tratar de todas as tutelas

antecipatórias, fossem elas de urgência ou de evidência.

É o que afirma Donaldo Armelin, que defende não haver razão para

diferenciar, para efeitos de vedação, as tutelas cautelares das antecipatórias:

“Não há porque distiguir, para o fim de vedação de seu uso,

tutela ensejadora de antecipação dos efeitos da eventual e

futura sentença de procedência, daquela cautelar, que se

caracteriza por assegurar sem satisfazer. Embora o texto do

§4º do art. 22 da Lei 9.307/96 contemple apenas medidas

coercitivas e cautelares, evidencia-se que o Legislador, in casu,

cuidou do todo ao se reportar apenas às espécies.” 113

E, após deixar consignado que parte da doutrina restringe a

antecipação de tutela apenas aos casos expressamente autorizados pela

legislação processual adotada para a arbitragem, Donaldo Amelin discorda

112

Athos Gusmão Carneiro, Arbitragem. Cláusula Compromissória. Cognição e “Imperium”. Medidas Cautelares e Antecipatórias. “Civil Law” e Common Law”. Incompetência da Justiça Estatal. 113 Donaldo Armelin, Arbitragem, Antecipação dos efeitos da tutela. Ação de Instituição de

arbitragem procedente. Eficácia Imediata. Embora pendente Apelação sem efeito suspensivo.

Competência do tribunal arbitral para a concessão de antecipação dos efeitos da tutela, in

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 6 | p. 217 | Jul / 2005DTR\2011\4431.

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desse entendimento, por considerar que o árbitro tem a responsabilidade de

assegurar o resultado útil da arbitragem:

“Parece excessivamente restritivo esse entendimento a

respeito da matéria. O árbitro, tal como se impõe ao juiz

togado, tem responsabilidade no sentido de assegurar o

resultado útil da arbitragem, como decorre dos deveres que lhe

são impostos pelo § 6.º do art. 13 da Lei 9.307/96, bem como

pela autorização constante do § 4º do art. 22 desse mesmo

diploma legal.”114

O que se deve entender – concluem Fichtner e Monteiro – “é que o

árbitro possui competência para conhecer e decretar qualquer medida

provisória que seja necessária à utilidade do processo arbitral ou à garantia dos

direitos das partes”.115

Veja-se, a respeito, a Jurisprudência:

TRF da 2ª Região, no AgIn 117.825. Rel Des Fed. J. E.

Carreira Alvim.

Processual Civil – Agravo de Instrumento. Regra de Arbitragem

– Competência para Julgamento de Litígios – Tribunal Arbitral. I

– Admite-se o recurso à justiça estatal quando ainda não

instituída a arbitragem, dado o caráter urgente da medida. II –

Havendo convenção arbitral, é competente o tribunal arbitral

para apreciar o mérito do litígio, cabendo-lhe, igualmente,

decidir se antecipa ou não os efeitos da tutela antecipatória. III

– Agravo parcialmente provido.

Conclui-se, assim, que o árbitro que o árbitro pode decretar qualquer

medida provisória necessária para preservar o resultado da arbitrahgem, seja

de natureza cautelar ou antecipatória.

114 Donaldo Armelin, Arbitragem, Antecipação dos efeitos da tutela. Ação de Instituição de

arbitragem procedente. Eficácia Imediata. Embora pendente Apelação sem efeito suspensivo.

Competência do tribunal arbitral para a concessão de antecipação dos efeitos da tutela, in

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 6 | p. 217 | Jul / 2005DTR\2011\4431.

115 José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série –

Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, 136.

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72

Analisaremos, a seguir, a possibilidade de concessão de tutelas de

urgência e de evidência em caso de omissão, ou proibição, delas pela

convenção de arbitragem.

II.6. Tutelas de urgência e de evidência na convenção de

arbitragem

Uma vez que a Lei de Arbitragem indiscutivelmente não proíbe que os

árbitros sejam investidos, pelas partes, do poder de conceder medidas

provisórias (cautelares ou antecipatórias), parece não restar dúvidas de que a

convenção de arbitragem pode prever a possibilidade de o árbitro decretar

tutelas de urgência ou de evidência no curso da arbitragem.

Com efeito, a convenção de arbitragem é o instrumento pelo qual as

partes afastam a competência do Judiciário e escolhem a jurisdição arbitral

para a solução de seu litígio, indicando as leis substanciais e procedimentais

que nortearão a arbitragem.

Portanto, se as partes livremente pactuaram acerca da possibilidade de

concessão de tutelas de urgência e/ou de evidência no procedimento arbitral,

não há dúvidas de que tais medidas serão plenamente lícitas e cabíveis.

O problema se põe quando a convenção de arbitragem seja omissa –

ou, até mesmo, proíba – a concessão de tutelas de urgência e de evidência.

Nessas hipóteses, será lícito ao árbitro conceder essas tutelas?

É o que trataremos a seguir.

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II.6.a. Omissão na convenção de arbitragem

Há divergência na doutrina acerca da possibilidade da concessão de

tutelas de urgência ou de evidência na arbitragem, caso a convenção de

arbitragem seja omissa.

A posição minotirária entende ser necessário haver previsão expressa

para que o árbitro possa decretar a tutela provisória, enquanto a maioria

considera não ser necessária essa autorização.

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro entende que “a convenção de

arbitragem deve regular os limites do pronunciamento do árbitro sobre medidas

cautelares”116. E José Carlos de Magalhães considera que, se a convenção

não autorizar a antecipação da tutela, “não poderá o árbitro concedê-la,

precisamente por falta de jurisdição, como ocorria com o juiz, antes da

alteração da lei processual”.117

No entanto, a grande maioria da doutrina considera possível a

concessão de tutelas de urgência e de evidência na arbitragem, diante da

omissão da convenção de arbitragem. Nos filiamos a esse entendimento.

Pedro A. Batista Martins afirma que a concessão de medida cautelar ou

coercitiva é um “poder implícito à função desempenhada pelo árbitro, já que a

ele cabe julgar a questão posta e buscar viabilizar o resultado final

pretendido”.118

Nilton César Antunes da Costa também considera que “o silêncio das

partes na convenção e a não disposição nos regulamentos procedimentais

116

Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, Aspectos Processuais da Lei de Arbitragem, in Arbitragem, a nova lei brasileira e a praxe internacional, Coord. Paulo Borba Casella, Editora LTr, São Paulo, 1997, p. 151. 117

José Carlos Magalhães, A tutela antecipada no processo arbitral, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 4 | p. 11 | Jan / 2005DTR\2005\778. 118

Pedro Antônio Batista Martins, Da Ausência de Poderes Coercitivos e Cautelares dos

Árbitros, in Aspectos Fundamentais da Lei de Arbitragem, Pedro Batista MARTINS, Selma M.

Ferreira LEMES e Carlos Alberto CARMONA, Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 364.

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74

sobre a possibilidade de concessão de tutela antecipada na arbitragem ad hoc

e institucional, respectivamente, não inibe a possibilidade de que o juízo arbitral

venha a se valer dela.”119

Francisco Cahali considera que, em caso de omissão “nada impede

que seja solicitada e deferida a tutela antecipada na arbitragem”. No entanto,

pondera que essa questão vai perdendo espaço, “diante da possibilidade, cada

vez mais difundida, de se proferir sentença parcial”. 120

Carreira Alvim entende que “mesmo que a convenção de arbitragem

nada disponha a respeito, esse poder continua existindo, por ser da essência

do próprio ‘judicium’, só não podendo o árbitro exercitar os poderes que

resultam do ‘imperium’ (que ele não possui).” 121

No mesmo sentido, a posição de Luiz Roberto Ayoub, para quem o

silêncio da convenção de arbitragem a respeito de medidas acautelatórias deve

ser interpretado como uma extensão da determinação das partes de afastar a

jurisdição estatal:

“Na hipótese de não haver estipulação acerca de medida

acautelatória na convenção arbitral, entende-se que, se as

partes elegeram o juízo arbitral para dirimir suas possíveis

diferenças, não seria lógico que, no caso da necessidade de

uma tutela de urgência, se recorresse ao sistema ordinário. O

silencio deve ser interpretado como uma extensão daquela

determinação inicial, qual seja, de afastar a jurisdição estatal

tradicional, deixando a responsabilidade a cargo do árbitro ou

Tribunal Arbitral”.122

Carlos Alberto Carmona adota o mesmo entendimento, afirmando que

quando as partes revestem os árbitros de poderes para resolver todas as

119

Nilton César Antunes da Costa, Poderes do Árbitro, Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 110. 120

Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 237-238. 121

J.E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, 2ª Ed. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 341. 122

Luiz Roberto Ayoub, Arbitragem: o acesso à justiça e a efetividade do processo. Rio de Janeiro, Lumem Juris, 2005, p. 80-84. Apud, José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010.

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75

questões controvertidas, a autorização para conceder tutelas de urgência ou de

evidência é implícita:

“Não haverá necessidade de encontrar na convenção de

arbitragem autorização para que os árbitros antecipem tutela,

pois tal autorização é implícita: as partes investem os árbitros

de poderes para resolver todas as questões controvertidas que

as envolvem, cabendo aos julgadores (...) zelar pela justa

solução do litígio, adotando todas as providências necessárias

ao pleno exercício do poder jurisdicional que lhes foi concedido

pelos contendentes.”123

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro também comungam dessa

posição e afirmam que “a ausência de previsão na convenção de arbitragem

quanto à possibilidade de concessão pelo árbitro de medidas provisórias

(coercitivas, cautelares e antecipatórias) não pode servir de empecilho ao

conhecimento da matéria pelo tribunal arbitral”. Escrevem esses autores:

“A jurisdição do árbitro abrange a cognição exauriente de todo

o litígio, razão pela qual se deve entender abrangida também a

competência para decretar essas medidas com base em

cognição sumária”.124

Também concordamos com essa posição, pois o poder de conceder

medidas urgentes possui fundamento constitucional e decorre da própria

natureza jurisdicional da arbitragem.

Isso posto, importa analisar se é possível ao árbitro conceder tutelas de

urgência ou de evidência, na hipótese de expressa proibição na convenção de

arbitragem.

II.6.b. Proibição na convenção de arbitragem

Parece um tanto improvável a hipótese de uma convenção de

arbitragem que proíba, pura e simplesmente, a concessão de quaisquer

medidas cautelares. Com efeito, não seria razoável que as partes, tendo

123

Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 330. 124

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, p. 138.

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convencionado submeter o litígio à arbitragem – dentre outros motivos porque

assim obteriam uma solução mais célere da controvérsia – abdiquem

totalmente da possibilidade de concessão de tutelas de urgência.

O que poderia ocorrer, com alguma frequência, é que as partes

estipulem, numa arbitragem, que eventuais as medidas cautelares deverão ser

pleiteadas junto ao Judiciário.

Carlos Alberto Carmona considera essa hipótese e afirma que, em

virtude do princípio da autonomia da vontade dos contratantes, nada impede

que isso seja estipulado na convenção de arbitragem:

“É conveniente ressaltar que as partes podem excluir,

consensualmente, os poderes cautelares dos árbitros. De fato,

tendo em vista a autonomia da vontade dos contratantes –

prestigiada pela Lei de Arbitragem – nada impede que na

convenção de arbitragem estipulem as partes que eventuais

medidas cautelares, se necessárias, sejam diretamente

pleiteadas ao juiz togado”. 125

Contudo, não é impossível existir situação em que a convenção de

arbitragem proíba, pura e simplesmente, a concessão de qualquer tutela de

urgência.

Nessa hipótese, e levando em consideração que convenção de

arbitragem é o instrumento pelo qual as partes escolhem as leis e os

procedimentos que nortearão a arbitragem, à primeira vista pareceria que as

medidas urgentes não poderiam ser concedidas pelo árbitro.

No entanto, boa parte da doutrina entende que tal disposição seria

nula, pois, como a concessão de tutelas de urgência e de evidência possui

fundamento constitucional e são inerentes ao próprio poder jurisdicional, uma

vez que a convenção de arbitragem impede que as partes se socorram do

Judiciário para resolver o litígio, a proibição de concessão de medidas de

urgência atentaria contra o inciso XXXV, do art. 5º, da Constituição Federal,

que garante o pleno acesso à Justiça.

125

Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 326.

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77

Joel Dias Figueira Júnior, adotando esse entendimento, defende ser

inconstitucional que a convenção de arbitragem exclua a possibilidade de se

pleitear tutela acautelatória:

“Não há que se admitir a convenção das partes em excluir a

possibilidade de pleitearem tutela acautelatória. Tal convenção

será absolutamente nula por afrontar o direito constitucional de

acesso à jurisdição estatal ou privada. Assim nos parece

porque ao referir-se a Constituição Federal em seu art. 5º,

inciso XXXV, à tutela jurisdicional a ser concedida também em

hipóteses de ‘lesão ou ameaça a direito’, constata-se que

existe, em patamar constitucional, a previsão de que a tutela

cautelar faz parte do direito de acesso à Justiça, o que

definiríamos como direito subjetivo de cautela”.126

José Carlos Rosa, também considera que a convenção de arbitragem

não pode excluir a possibilidade das partes pleitearem tutelas acautelatórias:

“se a convenção assim previr, será absolutamente nula nessa parte por violar o

direito constitucional do livre acesso à jurisdição estatal ou privada”.127

No mesmo sentido, escreve Nilton César Antunes da Costa que a

vedação à possibilidade de se conceder tutelas cautelares ou antecipatórias

não terá qualquer eficácia:

“Ainda se houver vedação expressa pactuada pelas partes

quanto à eventual concessão de tutela antecipada, não terá

eficácia nenhuma, pois a tutela antecipatória, tal como a

medida cautelar, tem natureza publicista, máxime considerando

a possibilidade de existência pelas próprias partes ou, no

silêncio, pela lei, conforme já se disse”.128

Igual entendimento adotam Ricardo Soares Stersi dos Santos, Eduardo

de Avelar Lamy e Rafael Peteffi da Silva ao afirmarem que a tutela de urgência

é “um instrumento de garantia da realização dos escopos da jurisdição que não

126

Joel Dias Figueira Júnior, Arbitragem, jurisdição e execução, 2a Ed. São Paulo, RT, 1999, p. 224-225. 127

José Carlos Rosa, Medidas cautelares e arbitragem, São Paulo, Opera Nostra, 2006, p. 104, Apud, José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010. 128

Nilton César Antunes da Costa, Poderes do Árbitro, Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 111.

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78

pode ser afastado por ato de vontade das partes na convenção de arbitragem”.

Escrevem eles a respeito:

“Qualquer disposição em contrário, na convenção de

arbitragem, deve ser desprezada, sob pena de nulidade, uma

vez que infringe princípios de ordem pública ao impedir ou

limitar a consecução de mecanismos garantidores da eficácia

do próprio exercício da jurisdição, dificultando a consecução

dos seus objetivos.(...)

A escolha das regras aplicáveis ao procedimento arbitral pelas

partes deve recair sempre em regras compatíveis com a ordem

pública e estruturadas em harmonia com os princípios

processuais norteadores da ordem jurídica.

Como já indicado, a opção das partes não pode ser contrária

ao dispositivo previsto no art. 22, § 4.º, da Lei 9.307/1996, que

contém princípio de ordem pública. Nesta ordem, entende-se

que os princípios processuais que norteiam a referida norma se

sobrepõem ao princípio da autonomia da vontade que regula a

arbitragem de forma geral, até porque os princípios

processuais, de ordem pública, se constituem em elementos

limitadores da autonomia da vontade.”129

Aristóteles Atheniense também considera “inaceitável que a convenção

contemple previamente a exclusão de medida cautelar”. E fundamenta:

“Como o art. 5.º, XXXV, da CF/1988 resguarda a tutela

jurisdicional nos casos de lesão ou ameaça a direito, a hipótese

de rejeição antecipada desta providência seria ineficaz, mesmo

que assentada ocorra no juízo arbitral.”130

No entanto, parte da doutrina entende que, em caso de vedação

expressa da convenção de arbitragem, os árbitros não poderiam decretar

tutelas de urgência ou evidência e as partes deveriam aguardar o julgamento

final do litígio.

129 Ricardo Soares Stersi dos Santos, Eduardo de Avelar Lamy e Rafael Peteffi da Silva,

Competência para a concessão de medidas cautelares na arbitragem, Revista de Processo |

vol. 213 | p. 313 | Nov / 2012DTR\2012\450792.

130 Aristóteles Atheniense, As medidas coercitivas no juízo arbitral, Revista de Direito Bancário

e do Mercado de Capitais | vol. 19 | p. 313 | Jan / 2003DTR\2003\628.

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79

Essa é a posição de Carreira Alvim, por entender que o poder do

árbitro, apesar de jurisdicional, é delimitado pelo princípio da autonomia da

vontade das partes:

“Se as partes, mediante convenção, estabeleceram

expressamente que o árbitro não disporá de poderes para

conceder provimentos antecipatórios ou medidas cautelares,

então, sim, o seu poder fica circunscrito à decisão da lide

principal, porque esse poder, apesar de ser jurisdicional, tem a

medida que lhe reconhece o princípio da autonomia da vontade

das partes”.131

Luiz Roberto Ayoub adota posição similar, defendendo que, caso a

convenção de arbitragem impeça a concessão de medidas cautelares, as

partes deverão aguardar a decisão definitiva do litígio:

“No caso em que o compromisso exclua a possibilidade de

concessão de tutela acautelatória, acredita-se que o melhor

entendimento é aquele que torna essa determinação

primordial, devendo as partes aguardarem a decisão final. Não

há que se falar em nulidade, fundamentando-se que está

cláusula debate-se diretamente contra o preceito constitucional

em seu art. 5º, XXXV, CF/88, que prevê o acesso irrestrito ao

Judiciário àquele que se ver sofrendo lesão ou ameaça de

lesão”.132

Já Fichtner e Monteiro adotam posição intermediária, entendendo que

nem o árbitro pode desrespeitar o convencionado e extrapolar os poderes que

lhe foram conferidos pelas partes, nem é admissível que se impeça uma ampla

e efetiva prestação jurisdicional. Por tal motivo, na hipótese de uma convenção

de arbitragem que exclua a possibilidade de tutela acautelatória, os autores

entendem que a parte deverá dirigir seu pleito diretamente ao Judiciário.133

131

J.E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, 2ª Ed. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 341. 132

Luiz Roberto Ayoub, Arbitragem: o acesso à justiça e a efetividade do processo. Rio de Janeiro, Lumem Juris, 2005, p. 80-84. Apud, José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010 133 Confira-se: “A proibição de concessão de medidas provisórias na convenção de arbitragem

não pode ser ignorada pelo juízo arbitral, sob pena de infringência à autonomia da vontade das partes – fonte primordial da própria instauração da arbitragem – e causa de possível anulação da sentença arbitral, nos termos do art. 32, IV, da Lei de Arbitragem. Trata-se, simplesmente, de um aspecto da autonomia da vontade ínsita ao instituto da arbitragem que também floresce

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Francisco Cahali concorda com essa posição e também sustenta que o

árbitro deve se submeter às restrições, quanto a tutelas cautelares, impostas

pelas partes. No entanto, nessa hipótese, Cahali entende que estará aberto o

acesso ao Poder Judiciário:

“A convenção, como qualquer outra disposição contratual, não

tem força para retirar do lesado o acesso à Jurisdição, e assim,

diante de convenção impedindo a análise de tutela cautelar no

juízo arbitral, devolve-se ao juízo estatal a jurisdição para a

matéria, restrita, evidentemente, à tutela cautelar,

eventualmente necessária à efetividade da sentença

arbitral.”134

Adotamos esse mesmo entendimento, pois, se de um lado, não se nos

afigura possível que o árbitro possa desrespeitar o convencionado pelas

partes, tampouco é possível admitir que à parte lesada seja negada a

prestação jurisdicional. Portanto, caso a convenção de arbitragem proíba ao

árbitro a concessão de tutelas de urgência, estará franqueada, às partes, o

acesso direto ao Judiciário para solicitá-las.

Saliente-se, contudo, que essa possibilidade de acesso direto ao

Judiciário em caso de restrição da convenção de arbitragem, deve restringir-se

à solicitação de tutelas de urgência que visem assegurar o resultado útil da

sentença arbitral. O mesmo não se aplica às tutelas de evidência, cuja

na escolha das regras do procedimento arbitral e até mesmo na eleição das normas de direito material aplicáveis ao caso. Por outro lado, é evidente que a Constituição Federal, como expressão de soberania do Estado, não permite obstáculos à efetiva e ampla prestação jurisdicional, seja ela alcançada no âmbito no processo judicial ou do processo arbitral. Desta forma, não parece correto determinar que as partes, mesmo diante de situação emergencial, aguardem a prolação da sentença arbitral, até porque isto pode demandar lapso temporal incompatível com a urgência dos fatos da causa, transformando o processo arbitral em uma prisão à tutela dos interesses das partes. Diante disso, a solução aventada, e ora proposta, é que os limites da convenção de arbitragem sejam, evidentemente, obedecidos pelo juízo arbitral, abstendo-se este de decretar medidas urgentes no âmbito no processo arbitral, caso haja expressa proibição na convenção de arbitragem. Isto não impede, por óbvio, que as partes, mesmo em curso a arbitragem , requeiram, então, as medidas urgentes diretamente ao Poder Judiciário, como forma de assegurar, assim, a efetiva e célere tutela dos interesses dos jurisdicionados. Os árbitros e as partes deverão observar a tutela de urgência deferida, de natureza provisória, até que possa ela ser substituída pelo provimento definitivo consistente na sentença arbitral.” (José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, 141).

134

Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 235.

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81

concessão somente poderia ser deferida pelo árbitro, em razão de sua

jurisdição.

II.7. Tutelas antecedentes à instauração da arbitragem

Como visto, o entendimento da doutrina e da jurisprudência se

consolidou no sentido de que as tutelas de urgência ou de evidência que se

fizerem necessárias no curso da arbitragem deverão ser decretadas pelo

árbitro e, em caso de resistência da parte, o árbitro poderá solicitar sua

efetivação ao órgão do Poder Judiciário que seria originariamente competente

para julgar a causa.

Cumpre agora analisar a possibilidade da concessão de tutelas de

urgência antes de instaurada a arbitragem.

Trata-se de hipótese bastante frequente, pois a constituição do juízo

arbitral costuma não ser rápida, sendo que poderá ser ainda mais demorada do

que o habitual, caso haja resistência de uma parte quanto à instituição da

arbitragem e/ou em vista de cláusulas compromissórias vazias (quando as

regras da arbitragem não estejam predefinidas), o que poderá tornar

necessário o prévio ajuizamento da ação judicial prevista no art. 7º da Lei de

arbitragem, para que a arbitragem seja instituída.

E a arbitragem só estará instituída quando o último árbitro aceitar a

nomeação, nos termos do art. 19 da Lei de Arbitragem: “considera-se instituída

a arbitragem quando aceita a nomeação pelo árbitro, se for único, ou por todos,

se forem vários”.

Portanto, se antes de instituída a arbitragem for necessária a adoção

de qualquer medida urgente, diante do risco do perecimento do direito e em

virtude dos preceitos constitucionais que garantem o acesso à Justiça, a parte

poderá se dirigir diretamente ao órgão do Poder Judiciário que seria

originariamente competente para julgar a causa.

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II.7.a. Da impossibilidade de concessão de tutelas de evidência

anteriores à instauração da arbitragem

Antes de aprofundar a questão, importa assinalar que as

considerações feitas nesse tópico estarão restritas às “tutelas de urgência”. Ou

seja, aquelas que, segundo o estipulado pelo projeto de novo Código de

Processo Civil, serão concedidas quando houver elementos que evidenciem,

além da probabilidade do direito, o perigo na demora da prestação da tutela

jurisdicional.135 Vale dizer, os provimentos cuja concessão está condicionada à

existência do “periculum in mora” e que visam preservar o resultado útil da

demanda principal que será julgada pelo árbitro.

Quanto às “tutelas de evidência” anteriores à arbitragem, não se

afigura possível serem concedidas, pois elas são deferidas em situações onde

não existe o periculum in mora.136

Além disso, para conceder uma “tutela de evidência” é necessário que

o julgador decida acerca do mérito da demanda, tarefa que, diante da

existência de convenção de arbitragem, está reservada ao árbitro. É o

acontece, atualmente, com as antecipações de tutela concedidas com base no

§ 6º, do art. 273, do CPC, que representam, como já assinalado, um verdadeiro

julgamento antecipado parcial da lide.

Por outro lado, saliente-se que, na classificação dos provimentos

jurisdicionais provisórios entre “tutelas de urgência” e “tutelas de evidência”

(classificação adotada pelo projeto de novo CPC), não tem aplicação a regra

do § 7º, do art. 273, do CPC, que estabelece a fungibilidade entre as medidas

135

Art. 301: A tutela antecipada de urgência será concedida quando houver elementos que

evidenciem a probabilidade do direito e o perigo na demora da prestação da tutela jurisdicional.

136 Cfr. Art. 306 do projeto de novo CPC: Art. 306. A tutela da evidência será concedida,

independentemente da demonstração de perigo da demora da prestação da tutela

jurisdicional, (…).

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83

cautelares e as antecipações de tutela, “desde que presentes os respectivos

pressupostos”.

Sim, pois dentre os pressupostos necessários para haver essa

fungibilidade está a presença do periculum in mora. E, pela classificação

adotada pelo projeto de novo CPC, nas “tutelas de evidência” não existe o

periculum in mora, visto que uma “tutela de evidência” com periculum in mora

passaria a ser “tutela de urgência”.137

Isso posto, a seguir será analisado o entendimento doutrinário e

jurisprudencial a respeito da concessão de tutelas de urgência antecedentes à

instituição da arbitragem.

II.7.b. Tutelas de urgência antecedentes à instituição da

arbitragem

Diante da natural demora na instituição da arbitragem, não é raro que

ocorram situações em que seja necessária a adoção de alguma medida

urgente, a fim de evitar dano irreparável, ou de difícil reparação, a uma das

partes e se preservar a eficácia do provimento final da ação que será julgada

pelo árbitro.

Nessas situações, como assinala Thomas Clay, evidentemente, “se o

tribunal ainda não estiver constituído, é inútil recorrer a ele para uma medida

137

Vale salientar que, diante da classificação do atual CPC, existe divergência na doutrina

acerca da possibilidade de concessão de tutela antecipada preparatória ao juízo arbitral. Francisco Cahali e Luiz Antonio Scavone Jr. entendem ser impossível, mesmo diante da fungibilidade estabelecida pelo § 7º do art. 273 do CPC, pois “sendo exclusiva do árbitro a jurisdição, só a ele caberá, e quando possível, a análise da tutela antecipada”. (Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 236. Cfr. Também, Luiz Antonio Scavone Junior, Manual de Arbitragem, 4ª Ed. Ed. RT, p. 134.) Já Fichtner e Monteiro entendem que a fungibilidade prevista pelo § 7º do art. 273 do CPC “autoriza o juiz a, recebendo medida cautelar antecedente à constituição do tribunal arbitral, conceder antecipação de tutela, se este específico remédio apresentar-se tecnicamente mais adequado à proteção dos interesses das partes no litígio arbitral”. (José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, p. 136).

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84

urgente, pois é impossível obter alguma coisa do que não existe,

principalmente de forma urgente.”138

Diante dessas circunstâncias, apesar da existência da convenção de

arbitragem, por força dos preceitos constitucionais que garantem o acesso à

Justiça, a parte poderá se dirigir diretamente ao órgão do Poder Judiciário que

seria originariamente competente para julgar a causa.

Assinala a propósito Carreira Alvim que “a doutrina tem admitido o

recurso à justiça estatal quando ainda não instituída a arbitragem, dado o

caráter urgente da medida, e porque para a instituição do juízo arbitral ‘são

necessários vários passos, caminhos, assinaturas de documentos’, não

podendo a parte interessada esperar”.139

José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro assinalam que o recurso

ao juis estatal, enquanto o tribunal arbitral não estiver constituído, é uma

alternativa provisória, admitida em virtude do princípio de que qualquer lesão

ou ameaça a direito poderá ser apreciada por um órgão jurisdicional:

“A ordem jurídica vigente não permite que qualquer lesão ou

ameaça de lesão a direito individual ou coletivo não disponha

de um órgão pronto e apto a impedi-la ou repará-la. Assim, se

o tribunal arbitral não está formado e o litígio exige intervenção

jurisdicional, os órgãos da jurisdição estatal, permanentemente

à disposição dos jurisdicionados, deverão ser invocados. Trata-

se, no caso, de uma alternativa provisória, a ser utilizada

enquanto não constituído o tribunal arbitral”.140

No mesmo sentido, assevera Vera Cecília Monteiro de Barros que o

efeito negativo da convenção de arbitragem não pode impedir à parte o acesso

à tutela jurisdicional urgente, antes de constituído o tribunal arbitral:

138 Thomas Clay, Medidas cautelares requeridas ao árbitro, Revista de Arbitragem e Mediação |

vol. 18 | p. 311 | Jul / 2008DTR\2008\878.

139 J.E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, Forense, 2a Edição, Rio de janeiro, 2004, p. 335.

140 José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série –

Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, p. 131.

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85

“O efeito negativo da convenção de arbitragem não pode privar

a parte que necessita de uma medida urgente da possibilidade

de pleitear a tutela cautelar perante o Poder Judiciário.

Entendimento diverso implicaria admitir denegação de justiça,

vedada pela nossa Constituição Federal (art. 5.º, XXXV,

CF/1988), uma vez que ninguém pode ser privado de meios

eficazes de pleitear a tutela jurisdicional perante órgão

competente.

A parte que pactuou uma convenção de arbitragem tem

garantido acesso ao Poder Judiciário para pleitear medidas

urgentes e necessárias à preservação de direitos, assim como

para se evitar a consumação de um dano de difícil reparação,

especialmente enquanto não instituída a arbitragem.141

Como bem assinala Carlos Alberto Carmona, “a questão deve ser

dirimida com a invocação de tradicional princípio do direito luso-brasileiro,

segundo o qual ‘quando est periculum in mora incompetentia non attenditur’”.

Ou seja, as regras de competência podem ser desconsideradas diante da

necessidade de uma medida emergencial e da impossibilidade de se ter

acesso, em tempo hábil, ao juiz competente. É o que ocorre quando a parte

interessada não pode requerer a medida cautelar ao árbitro, por não haver sido

instituído o tribunal arbitral. Escreve Carmona:

“Diante de tal contingência, abre-se à parte interessada a via

judicial, sem que fique prejudicada a arbitragem, apenas para

que o juiz togado examine se é o caso de conceder a medida

cautelar”.142

No mesmo sentido, escrevem Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael

de Moura Rangel Ney. Para esses autores, como a demora da instauração do

tribunal arbitral poderia levar ao perecimento do direito, aplica-se, ao caso, o

princípio quando “est periculum in mora incompetentia non attenditur”:

“Formou-se o entendimento de que, nesta hipótese, é facultado

à parte requerente endereçar a medida cautelar ao órgão do

Poder Judiciário, ao qual deveria a causa ser distribuída

141 Vera Cecília Monteiro de Barros, Convenção de arbitragem. Sede em Londres e aplicação

da lei inglesa. Medida cautelar pré-arbitral concedida pelo Poder Judiciário brasileiro –

comentários ao AI 0011281-02.2010.8.19.000 do TJRJ, Revista de Arbitragem e Mediação |

vol. 27 | p. 287 | Out / 2010DTR\2010\748.

142 Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 326-327.

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86

originalmente se convenção arbitral não houvesse. De fato, a

demora na instauração do tribunal arbitral com vistas à

apreciação do pedido cautelar poderia levar ao indesejável

perecimento do direito em discussão, justificando-se, assim, a

adoção de tal procedimento, "inspirado no princípio quando est

periculum in mora incompetentia non attenditur".

O magistrado, então, considerando estarem presentes o fumus

boni iuris e o periculum in mora, em exercício de cognição

sumária, concederia o provimento de urgência, tomando,

contudo, cuidados extremos para que sua decisão não

importasse em indevida manifestação acerca do mérito da

causa, o que lhe foi vedado pelas partes em disputa, quando

da celebração da convenção arbitral”.143

Eleonora Pitombo faz notar que, embora o recurso ao Judiciário para a

obtenção de medidas urgentes, antes de instaurada a arbitragem, não esteja

expressamente prevista na Lei de Arbitragem, é perfeitamente legal, pois

decorre do princípio constitucional do acesso à Justiça:

"Antes de instaurado o juízo arbitral, isto quer dizer, de os

árbitros aceitarem a nomeação para dirimir o conflito abrangido

pela cláusula compromissória, as partes podem se socorrer do

Poder Judiciário para obter medidas cautelares, desde que de

outra forma não tenham acordado na convenção de

arbitragem. Muita embora tal hipótese não esteja

expressamente prevista na Lei 9.307/1996, é plenamente legal,

já que decorre de princípio constitucional de acesso à justiça.

Mais do que isso, decorre da aplicação do princípio de que

quando est periculum in mora incompetentia non attenditur, de

acordo com o qual as partes podem formular pleitos

emergenciais para evitar o perecimento de direito mesmo

perante juízo incompetente".144-145

143 Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, Revogação de Medida

Liminar Judicial pelo Juízo Arbitral, Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem - 04-06/2001. 144

Eleonora Coelho Pitombo, Arbitragem e o Poder Judiciário: Aspectos relevantes. Aspectos práticos da arbitragem. Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme (coord.). São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 108-109. 145

Marcelo Dias Gonçalves Vilela escreve no mesmo sentido:

“A competência exclusiva do árbitro para conceder medidas cautelares não poderá acarretar

um vácuo de jurisdição quando ainda não instaurada a jurisdição arbitral (aceitação pelos

árbitros e constituição do tribunal arbitral – art. 19 Lei 9.307/96). Identificada a necessidade de

tutela de urgência para que se assegure o resultado útil (e com menor prejuízo às partes) da

tutela principal a ser submetida à jurisdição arbitral, sempre será possível às partes requerer ao

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87

Igual entendimento é defendido por Nilton César Antunes da Costa, ao

escrever que, antes de instaurada a arbitragem, para a obtenção de medidas

urgentes, a parte deve se dirigir ao juiz que seria competente para o julgamento

da causa, se não existisse a convenção de arbitragem:

“Antes da instauração do juízo arbitral compete ao juiz estatal

que, em tese, seria competente para julgamento se não

existisse entabulada entre as partes a convenção de

arbitragem, decidir sobre a ação cautelar preparatória ajuizada

por uma das partes, haja vista que é de interesse do Estado a

boa aplicação da justiça no caso concreto, o que acontecerá na

demanda principal a ser julgada pelo árbitro quando

devidamente nomeado”.146-147

A respeito, escreve Donaldo Amelin que, embora a jurisdição estatal já

esteja afastada em virtude da convenção de arbitragem, haveria uma espécie

de “competência residual” do Judiciário para atuar em casos de urgência:

“A jurisdição arbitral inicia-se quando instituída a arbitragem,

conforme o disposto na lei de regência. Antes disso e embora a

jurisdição estatal já esteja afastada pela presença da

convenção de arbitragem, remanesce esta, exatamente por ser

mais abrangente e universal, com competência por assim dizer

residual para atuar em casos de urgência.”148

Poder Judiciário a concessão de medida cautelar urgente, demonstrada a presença do

periculum in mora.

Tal entendimento decorre de interpretação adequada do direito de ação assegurado

constitucionalmente, pois se deve garantir ao cidadão o acesso à tutela jurisdicional

tempestiva. Se ainda não constituído o juízo arbitral, é competente a jurisdição estatal para

conhecer de medidas cautelares.” (Marcelo Dias Gonçalves Vilela, Ação cautelar inominada

preparatória. Agravo de instrumento. Efeito ativo concedido. Ciência da posterior instauração

do juízo arbitral. Incompetência superveniente da Justiça Estatal. Remessa dos autos ao árbitro

para manutenção ou não da tutela concedida, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 19 | p.

191 | Out / 2008DTR\2011\4415).

146

Nilton César Antunes da Costa, Poderes do Árbitro, Ed. Revista dos Tribunais, 2002, p. 107. 147 Escrevem no mesmo sentido Luciano Timm e Luiz Moser: “Diante de uma contingência em

que se exija urgência em provimento de natureza cautelar, por exemplo, e em face da não instauração do corpo de árbitros, socorre-se excepcionalmente à jurisdição estatal, a fim de evitar uma espécie de 'hiato jurisdicional'" (Tutela de urgência pré-arbitragem. Cláusula híbrida. Segurança jurídica. Revista Brasileira de Arbitragem, São Paulo, v. 08, n. 28, p. 126-143, out./nov./dez 2010). 148

Donaldo Armelin, Arbitragem, Antecipação dos efeitos da tutela. Ação de Instituição de arbitragem procedente. Eficácia Imediata. Embora pendente Apelação sem efeito suspensivo.

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88

Caio Cesar Vieira Rocha afirma que o juiz togado possui uma

“competência subsidiária”, pois é detentor de jurisdição “provisória, a ser extinta

tão logo seja materialmente possível a instauração da arbitragem com a

constituição dos árbitros (receptum arbitrii)”.149

Pedro Batista Martins escreve no mesmo sentido, afirmando que antes

da instauração da arbitragem o pedido de medidas urgentes deverá ser

formulado junto ao Judiciário, sob pena de se impedir o acesso à Justiça:

“Antes da confirmação dos árbitros não restará às partes outra

opção do que a busca da justiça comum para fazer valer seus

direitos a um provimento de urgência, haja vista que não há

arbitragem constituída e, dessa forma, não poderá se valer a

interessada da jurisdição arbitral. E, sendo de urgência a

medida, será junto ao Judiciário que o pedido deverá ser

formulado, sob pena de se ver a parte necessitada impedida do

acesso à justiça”.150

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa também adota o entendimento de

que, antes de constituído o tribunal arbitral, “a parte interessada pode recorrer

ao Judiciário para dele obter uma medida cautelar na defesa dos seus

interesses. Mas esta intervenção do Judiciário é provisória, não sendo ela

substitutiva da competência dos árbitros”.151

Para Selma Lemes, “é pacífica e cristalina a possibilidade de propor e

obter o provimento acautelatório ou coercitivo em sede arbitral, que será

dirigido pela parte diretamente ao juiz competente, quando ainda não

Competência do tribunal arbitral para a concessão de antecipação dos efeitos da tutela, in Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 6 | p. 217 | Jul / 2005DTR\2011\4431. 149 Caio Cesar Vieira Rocha, Conflito positivo de competência entre árbitro e magistrado,

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 34 | p. 263 | Jul / 2012DTR\2012\450623

150 Pedro Batista Martins, As três fases da Arbitragem, artigo disponível no site

“www.batistamartins.com.br”.

151 Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa, O Judiciário e a valorização da arbitragem, artigo

publicado em 1/8/2012.

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89

constituído o tribunal arbitral; estando este investido, ser-lhe-á dirigida a

solicitação pela parte interessada”.152

Ricardo Ramalho Almeida assinala que “a admissibilidade de medidas

cautelares judiciais preparatórias de procedimentos arbitrais não suscita grande

controvérsia na doutrina”, pois o efeito negativo da convenção de arbitragem

não pode impedir à parte necessitada de requerer uma medida urgente, sob

pena de denegação da justiça vedada pela Constituição:

“Desde a promulgação da Lei 9.307/1996, sempre pareceu

evidente aos juristas que examinaram o problema que, não

obstante a lacuna da Lei de Arbitragem, o efeito negativo da

convenção de arbitragem não pode privar a parte que

necessita de uma medida urgente da possibilidade de pleitear a

tutela cautelar perante o Poder Judiciário, enquanto não

instituído o juízo arbitral.

Com efeito, entendimento diverso implicaria admitir denegação

de justiça, vedada pela Constituição (art. 5.º, XXXV, CF/1988

(LGL\1988\3)), pois ninguém pode ser privado de meios atuais

e eficazes de pleitear a tutela jurisdicional perante o órgão

competente”.153

Samantha Mendes Longo constata que “há muito foi pacificado o

entendimento no sentido de ser possível à parte buscar no Poder Judiciário a

medida cautelar quando ainda não instaurada a arbitragem”.154

152

Selma Maria Ferreira Lemes, A inteligência do art. 19 da Lei de Arbitragem (instituição da Arbitragem) e as medidas cautelares preparatórias, Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais | vol. 20 | p. 411 | Abr / 2003DTR\2003\218. 153 Ricardo Ramalho Almeida, Decisão monocrática em agravo. Convenção de arbitragem.

Medida cautelar pré-arbitral. Incompetência superveniente da Justiça estatal, decorrente da

instauração do juízo arbitral. Cassação da liminar, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 21 |

p. 263 | Abr / 2009DTR\2009\223.

154 Samantha Mendes Longo, Ação cautelar visando à obtenção de medida urgente ajuizada

perante o Poder Judiciário quando ainda não constituído o tribunal arbitral. Possibilidade.

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 17 | p. 234 | Abr / 2008DTR\2011\4287. Ver também:

Samantha Mendes Longo, A arbitragem e o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro,

Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 25 | p. 71 | Abr / 2010DTR\2010\523 e Samantha

Mendes Longo, Cabimento de demanda cautelar prévia à instituição de Tribunal arbitral no AI

0062809-75.2010.8.19.0000 do TJRJ, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 29 | p. 247 | Abr

/ 2011DTR\2011\1779

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Juliana Barbosa Pechincha ressalta que “é cediço na doutrina e na

jurisprudência brasileira a possibilidade de a parte recorrer ao Poder Judiciário

para a apreciação de tutela de urgência, antes da instauração efetiva do juízo

arbitral.” 155

E Marcelo Dias Gonçalves Vilela, ao adotar a mesma posição, assinala

que esse entendimento decorre da correta interpretação do direito

constitucional de ação, que garante ao cidadão o acesso à tutela jurisdicional

efetiva:

“Identificada a necessidade de tutela de urgência para que se

assegure o resultado útil (e com menor prejuízo às partes) da

tutela principal a ser submetida à jurisdição convencional,

quando ainda não instaurado o juízo arbitral, é possível às

partes requerer ao Poder Judiciário a concessão de medida

cautelar. Aliás, tal entendimento decorre de interpretação

adequada do direito de ação assegurado constitucionalmente,

pois se deve garantir ao cidadão o acesso à tutela jurisdicional

tempestiva. Assim, se não constituído o juízo arbitral, é

competente a jurisdição estatal para conhecer de medidas

cautelares. A ação cautelar preparatória deverá ser ajuizada

perante o juízo que seria competente para apreciar a questão

de mérito se esta não estivesse afeta à jurisdição arbitral.”156

155 Juliana Barbosa Pechincha, Concessão de tutela de urgência pelo Poder Judiciário antes da

instauração do juízo arbitral comentários ao REsp 1.297.974/RJ, Revista de Arbitragem e

Mediação | vol. 36 | p. 377 | Jan / 2013DTR\2013\2527. Dentre muitos outros, a autora cita, de

um lado, Fernando Moreira dos Santos, que escreve: “caso o árbitro ainda não tenha aceitado

a nomeação e a arbitragem não tenha se instituído, caberá provisoriamente a manifestação

quanto a estas medidas ao juiz estatal, uma vez que a jurisdição é una e indivisível, sendo

afastada a competência, no caso a arbitral, por razão de necessidade e urgência. Além do

mais, sempre se é permitido o recurso ao Judiciário, em razão do princípio da inafastabilidade

do controle judiciário, assegurado constitucionalmente no art. 5.°, XXXV”. (Fernando Silva

Moreira dos Santos, Medidas de urgência no processo arbitral. RT 912/327 (DTR\2011\4322)-

368. São Paulo: Ed. RT, out. 2011. E, de outro lado, Clávio Valença Filho, que rechaça

veementemente a ideia de “competência” quando se coloca o problema da decretação de

tutelas de urgência, afirmando que “não poucos operadores insistem em localizar a questão no

plano da competência, quando, de fato, o problema é pré-processual, de jurisdição”, preferindo

falar em subtração e restituição da jurisdição estatal. (Clávio Valença Filho, Tutela judicial de

urgência e a lide objeto de convenção de arbitragem. Revista Brasileira de Arbitragem 7/7-29.

São Paulo: IOB Thompson, jul.-set. 2005).

156 Marcelo Dias Gonçalves Vilela, Reflexões sobre a tutela cautelar na arbitragem, Revista

Brasileira de Arbitragem 7/41. São Paulo: CBAR-IOB, jul.-ago.-set. 2005.

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91

Pedro Batista Martins considera possível buscar a medida cautelar de

urgência junto ao juízo ordinário “mesmo após a constituição do juízo arbitral,

se atestada a falta de possibilidade de se reunir o painel arbitral ou contatar o

árbitro, adequadamente, e em tempo justo e necessário para o exame da

determinação do provimento desejado”.157

Flávio Luiz Yarshell encampa o mesmo entendimento e considera lícito

o recurso ao Judiciário para se obter uma tutela de urgência, mesmo após a

instituição do tribunal arbitral, em situações excepcionais onde não haja tempo

hábil para se recorrer ao árbitro:

“Nas hipóteses em que o juízo arbitral já esteja instituído mas

nas quais, por circunstâncias excepcionais a verificar em cada

caso concreto, não haja tempo suficiente para dele se obter a

tutela de urgência necessária, o recurso ao Poder Judiciário

será lícito na medida em que se apresente como a única forma

possível de preservar a garantia inscrita no art. 5.º, XXXV, da

CF/1988.”158-159

Igual é a opinião de Clávio Valença Filho, para quem, em situações em

que o árbitro não pode distribuir a tutela de urgência com a eficácia e

celeridade do juiz togado, o Judiciário “não pode se furtar a intervir”:

“Se o prestador jurisdicional privado não puder – e por vezes

não pode – distribuir a tutela de urgência com a mesma

eficácia e celeridade do juiz estatal, de se admitir, então, o

obrigatório retorno à origem do poder jurisdicional. Eis a única

forma de afastar a possibilidade de denegação de justiça. Não

157 Pedro Antônio Batista Martins, Da ausência de poderes coercitivos e cautelares do árbitro.

In: Selma Lemes, Carlos Alberto Carmona. Aspectos fundamentais da Lei de Arbitragem. Rio

de Janeiro: Forense, 1999. p. 373.

158 Flávio Luiz Yarshell, Brevíssimas notas a respeito da produção antecipada de provas na

arbitragem, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 14 | p. 52 | Jul / 2007DTR\2007\887.

159 Selma Lemes assevera a respeito: "É importante notar, ainda, que a convivência entre a

instância arbitral e a judicial se operaria mesmo que nada estivesse disposto na lei de

arbitragem, haja vista a aplicação do princípio constitucional da tutela jurídica efetiva. Sempre,

existindo convenção de arbitragem, seria possível o socorro prévio do Judiciário, fosse na fase

inicial em que a demanda arbitral ainda não estivesse instaurada, ou no curso do processo

arbitral." (Parecer Medidas Cautelares Prévias à Instituição da Arbitragem. Análise à luz do art.

19 da Lei 9.307/1996. (www.selmalemes.com.br/artigos).

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92

pode juiz estatal, defensor de sua ordem pública e do acesso

universal à jurisdição, se furtar a intervir.”160

A segunda fase de trabalho realizado em regime de parceria

institucional acadêmico-científica celebrada entre a Escola de Direito de São

Paulo da Fundação Getúlio Vargas e o Comitê Brasileiro de Arbitragem,

coordenado por Fabiano Robalinho e Octávio Fragata, após analisar dezenas

de decisões judiciais concluiu que a doutrina e a jurisprudência já se

pacificaram no sentido de que o efeito negativo da convenção de arbitragem

não impede que o Poder Judiciário decretar medidas cautelares, sobretudo

antes da instauração do tribunal arbitral:

“Doutrina e jurisprudência acabaram pacificando o

entendimento de que o efeito negativo da convenção de

arbitragem não retiraria do Poder Judiciário a possibilidade de

conhecer e julgar medidas cautelares, especialmente antes da

instauração do tribunal arbitral.

Esse entendimento se baseia, principalmente, no argumento de

que o juiz detém o poder geral de cautela, que autoriza um

magistrado a conceder liminares, mesmo quando

manifestamente incompetente, para evitar o perecimento de

um direito. Na situação de urgência, prevalece o princípio

‘quando est periculum in mora incompetentia non attenditur’

sobre o contrato celebrado entre as partes que retirou a

jurisdição do Poder Judiciário, podendo as partes recorrerem

ao juízo originalmente competente para conhecer da disputa

em seu aspecto cautelar ou urgente.”161

Arnoldo Wald esclarece que o recurso ao Judiciário, para a obtenção

de medidas de urgência, antes de constituído o tribunal arbitral não representa

qualquer ofensa à competência exclusiva dos árbitros para conhecer e julgar as

medidas cautelares:

“Não havendo ainda árbitro ou tribunal arbitral constituído, as

partes poderão recorrer ao Poder Judiciário para obter medidas

160 Clávio Valença Filho, Tutela judicial de urgência e a lide objeto de convenção de arbitragem.

Revista Brasileira de Arbitragem. vol. 7. p. 8-29. São Paulo: Ed. RT, out.-dez. 2005.

161 Fabiano Robalinho e Octávio Fragata (coordenadores); Ana Carolina Weber, André

Gondinho, André Smilgin, Daniel Chacur de Miranda, Katherine Spyrides, Marcos Diaz, Soraya

Nunes (pesquisadores), 2ª Fase da Pesquisa “Arbitragem e Poder Judiciário” – Medidas de

Urgência e Coercitivas, p. 10.

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93

urgentes, sob pena de violação ao direito de acesso à

jurisdição previsto no art. 5.º, XXXV, da CF/1988 (LGL\1988\3).

Tal hipótese de medida cautelar preparatória de arbitragem, é

reconhecida como exemplo de integração entre as jurisdições

estatal e arbitral, garantindo o Poder Judiciário, o resultado útil

da arbitragem a ser instituída, mediante o deferimento da

medida de urgência postulada pela parte antes da constituição

do tribunal arbitral, e equivalendo a arbitragem à ação principal

prevista no art. 806 do CPC (LGL\1973\5).7 Não há, portanto,

neste caso, qualquer ofensa à competência exclusiva dos

árbitros para conhecer e julgar tais medidas, como se colhe de

vasta doutrina e da jurisprudência dominante de nossos

tribunais.162

Na verdade, atualmente a Jurisprudência já se consolidou e os nossos

tribunais costumam admitir, pacificamente, o ajuizamento de ações cautelares

antecedentes à instauração da arbitragem.163-164

162

Arnoldo Wald, Medidas Cautelares fora da sede da Arbitragem, Revista de Processo | vol.

207 | p. 305 | Mai / 2012DTR\2012\44630. Arnoldo Wald acrescenta que “tanto a doutrina como

a jurisprudência são indiscrepantemente favoráveis à admissibilidade de ações cautelares

preparatórias, requeridas diretamente pela parte ao Poder Judiciário, quando a lide principal

tiver de ser resolvida por arbitragem e o Juízo Arbitral ainda não houver sido instaurado”.

(Arnoldo Wald, Affectio societatis na sociedade de pessoas e no acordo de acionistas.

Rompimento. Resolução do acordo de acionistas. Aprovação do quotista. Direito de bloqueio.

Ofensa à lei 8.884/94. Direito de preferência, Cabimento de medida cautelar preparatória

perante o Poder Judiciário antes de instaurado juízo arbitral. Competência do juízo, Revista de

Arbitragem e Mediação | vol. 4 | p. 207 | Jan / 2005DTR\2011\2836).

163 Arnoldo Wald colaciona os seguintes acórdãos, a título ilustrativo:

– “Agravo de instrumento – Medida cautelar – Liminar deferida para suspensão dos efeitos de cláusula do acordo de acionistas – O r. despacho hostilizado não viola a Lei 9.307/1996, porquanto a agravada não tinha outra alternativa senão socorrer-se do Poder Judiciário, uma vez que a arbitragem ainda não havia sido instituída, o que, como é notório, depende de inúmeras providências e demanda tempo (…)” (TJSP, AgIn 385.896.4/4-00, 9.ª Câm. de Direito Privado, j. 03.05.2005, rel. Des. Sergio Gomes). – “Juízo arbitral. Medida cautelar antes da instauração. Competência da Justiça comum.

Compete à Justiça comum decretar medidas cautelares e outras providências urgentes que se

fizerem necessárias antes de instituída a arbitragem, as quais não perderão o objeto mesmo

depois de instaurado o juízo arbitral, para dar efetividade às suas decisões. Provimento do

recurso” (TJRJ, Ap 2003.001.16.879, 2.ª Câm. Civ., j. 24.09.2003, rel. Des. Sergio Cavalieri

Filho, DJe-RJ 30.09.2003, RF 375/344).– “Processual civil. Agravo de instrumento. Regra de

arbitragem. Competência para julgamento de litígios. Tribunal arbitral. I – Admite-se o recurso à

Justiça estatal quando ainda não instituída a arbitragem, dado o caráter urgente da medida

(…)” (TRF-2.ª Reg., AgIn 117.825, 1.ª T., j. 22.06.2004, Des. Federal Carreira Alvim, DJU

29.06.2004). Vide, ainda, mais recentemente, no mesmo sentido: TJMG, Ag 1.0024.07.600275-

7/002 em Ag 1.0024.07.600275-7/001, 14.ª Câm. Civ., j. 17.01.2008, rel. Des. Elias Camilo,

publicado na Revista de Arbitragem e Mediação, vol. 19, p. 191 e ss. São Paulo, Ed. RT, out.-

dez. 2008; TJMG, AgIn 1.0480.06.083392-2/001, 12.ª Câm. Civ., j. 14.02.2007, rel. Des.

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94

Domingos Coelho; TJMG, AgIn 1.0003.07.023530-8/001, 12.ª Câm. Civ., j. 13.02.2008, rel.

Des. Domingos Coelho; TJSP, ApCiv 999.843/6, 20.ª Câm. de Direito Privado, j. 23.06.2008,

rel. Des. Álvaro Torres Júnior; TJSP, AgIn 614.006-4/4-00, 5.ª Câm. de Direito Privado, j.

18.02.2009, rel. Des. Roberto Mac Cracken, TJSP. AgIn 240.062-4/8, Ribeirão Preto, 1ª Câm.

de Direito Privado, rel. Elliot Akel, j. 27.08.2002.

164

Ver, também a título exemplificativo, os seguinte julgados mais recentes: TJRJ. 0007294-15.2007.8.19.0209 (2007.001.47555) – Apelação - Des. Luis Felipe Salomão - Julgamento: 03/10/2007 – 18ª Câmara Cível. Apelação Cível. Medida Cautelar. (...) Cláusula de Arbitragem que não impede a análise do pedido cautelar, por não se tratar de discussão acerca das condições do contrato, de sua validade ou existência. O provimento judicial pleiteado é meramente acautelatório, a fim de evitar, temporariamente e apenas até que haja decisão do juízo arbitral, que os direitos minerários disputados sejam transferidos a terceiros. Existência de expressa cláusula contratual tratando de medidas cautelares judiciais, elegendo o Foro da Comarca da capital do Rio de Janeiro. A possibilidade de a parte, anteriormente à instauração do juízo arbitral, buscar provimento liminar perante o Poder Judiciário vem sendo reconhecida pela doutrina e jurisprudência. Precedentes dessa Corte. Apelo provido para determinar o prosseguimento da demanda. (destacou-se). TJSP. 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial. Agravo de Instrumento nº 0119999-30.2012.8.26.0000 - São Paulo – Rel. Des. Maia da Cunha. J em 28/08/2012. Arbitragem. Lei nº 9307/96. Convenção feita em contrato que só permite a intervenção estatal para obrigar os renitentes a formular o compromisso arbitral, nos termos do art. 7º, ou em casos excepcionalíssimos que antecedem a formação do juízo arbitral, que é o caso dos autos. Concessão de liminar para suspender os efeitos de protestos de notas promissórias vinculadas a contrato antes da notícia de efetiva instauração de Tribunal Arbitral. Petição do agravante informando a instalação do Tribunal Arbitral. Recurso prejudicado. TJSP. 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial. AGRV. REG. Nº: 0034444-45.2012.8.26.0000. Rel. Des. Ligia Araújo Bisogni. J em 29/05/2012. Nenhum reparo merece a minha decisão monocrática. Com efeito, conforme deixei registrado, “não obstante a existência de cláusula contratual elegendo a Câmara de Arbitragem do Fórum Unimed, para dirimir eventuais litígios entre as partes, ainda assim é competente a justiça comum para decretar medidas cautelares e outras providências urgentes que se fizerem necessárias antes de instituída a arbitragem. No mesmo sentido a jurisprudência. (...) Pelo exposto, nega-se provimento ao agravo regimental. TJSP. 35ª Câmara de Direito Privado. Apelação Cível nº 0130492-28.2010.8.26.0100. Rel. Des. Manoel Justino Bezerra Filho, j. em 26.03.2012. Ação cautelar inominada. Existência de convenção de arbitragem entre as partes. Ação cautelar preparatória de procedimento arbitral. Possibilidade. Instauração e julgamento do procedimento arbitral. Perda superveniente de interesse processual das partes de dar prosseguimento na ação cautelar. Feito extinto por perda superveniente de interesse processual, com observação. TJSP. 10ª Câmara de Direito Privado, Apelação com Revisão n° 0117926-81.2009.8.26.0100. Rel. Des. Elcio Trujillo. J em 08/05/2012 AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA ARBITRAGEM. (...) Ação cautelar proposta perante a justiça estadual em fase pré-arbitral. Possibilidade. Admissibilidade que tem base no princípio da inafastabilidade da jurisdição. Instauração, em sequência, do procedimento arbitral. Decisão arbitral proferida no curso desta cautelar. Reconhecimento da responsabilidade da autora, ora apelante, pelo pagamento reclamado. Caracterização superveniente da falta de interesse de agir. Sentença de extinção confirmada, alterado, tão-somente, o fundamento. Aplicação do inciso VI, do artigo 267, do Código de Processo Civil. TJSP. 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial. Agravo de Instrumento nº 0028062-36.2012.8.26.0000. Rel. Des. Francisco Loureiro. J. em 08/05/2012. AÇÃO CAUTELAR À INSTAURAÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL. Juízo natural para pedidos de tutelas de urgência é o arbitral, que decidirá, de modo soberano, se o contrato se encontra extinto por força de cláusula resolutiva expressa em razão do inadimplemento da compradora, ou, ao contrário, se inexistiu descumprimento e a prestação de transferência das ações deve ser executada. Até a instauração do juízo arbitral, e com o escopo de garantir a utilidade e a

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95

À guisa de exemplo, considere-se trecho da seguinte ementa de

acórdão da Eg. Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, por

votação unânime, deu provimento a Recurso Especial:

REsp nº 1.297.974 - RJ (2011/0240991-9). Rel. Min. Nancy

Andrighi, DJe 19/06/2012

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ARBITRAGEM.

MEDIDA CAUTELAR. COMPETÊNCIA. JUÍZO ARBITRAL

NÃO CONSTITUÍDO. (...)

2. Na pendência da constituição do Tribunal Arbitral, admite-se

que a parte se socorra do Poder Judiciário, por intermédio de

medida de natureza cautelar, para assegurar o resultado útil da

arbitragem.

3. Superadas as circunstâncias temporárias que justificavam a

intervenção contingencial do Poder Judiciário e considerando

que a celebração do compromisso arbitral implica, como regra,

a derrogação da jurisdição estatal, os autos devem ser

prontamente encaminhados ao juízo arbitral, para que este

assuma o processamento da ação e, se for o caso, reaprecie a

tutela conferida, mantendo, alterando ou revogando a

respectiva decisão.

4. Em situações nas quais o juízo arbitral esteja

momentaneamente impedido de se manifestar, desatende-se

provisoriamente as regras de competência, submetendo-se o

pedido de tutela cautelar ao juízo estatal; mas essa

competência é precária e não se prorroga, subsistindo apenas

para a análise do pedido liminar.

eficácia do provimento final, se abre às partes a possibilidade de pedir tutelas de urgência ao Poder Judiciário. Liminar bem concedida na parte que determina a vedação à alienação das ações a terceiros, até que o Tribunal Arbitral decida se o contrato está ou não resolvido, com o escopo de evitar lesão aos interesses de eventuais terceiros adquirentes de boa-fé. TJSP. 25ª Câmara de Direito Privado. Apelação nº 9184314-84.2007.8.26.0000. Rel. Des. Vanderci Álvares. J. em 23/11/2011. (...) 1. A previsão contratual de juízo arbitral não impede a parte de promover ação judicial visando tutelas de emergência, máxime quando o próprio contrato traz exceção, possibilitando à parte valer-se do judiciário para obter providência urgente. 2. O caráter satisfativo da medida cautelar, que se consumou com a entrega liminar do produto, não impede a apreciação do mérito pelo juízo arbitral, conforme previsto no contrato. TJSP. 5ª Câmara de Direito Privado. Apelação Cível n° 431.916.4/3-00. Rel. Des. Silverio Ribeiro. J. em 11/06/2008. JUÍZO ARBITRAL - Extinção com fundamento no art. 267, inciso VI, do CPC - Afastamento - Embora haja cláusula compromissória para o estabelecimento de Juízo arbitrai, nada obsta possa vir a parte perante o Judiciário requerer as medidas cautelares que entender cabíveis para evitar possíveis danos, devendo-se ressaltar que o juízo arbitrai não tem poder de coerção, como também não está aparelhado para recepcionar medidas preparatórias urgentes, mormente quando ainda não instalado o juízo privado - Efetividade ao Artigo 5o, inciso XXXV, da CF - Recurso provido para anular a sentença extintiva do processo.

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96

5. Recurso especial provido.165

Veja-se, também, trechos de outro julgado do STJ:

AgRg no Conflito de Competência nº 116.395-RO

(2011/0062415-4), Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino,

17/06/2013

EMENTA. AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE

COMPETÊNCIA. AÇÃO CAUTELAR INOMINADA E

EXECUÇÃO DE CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO.

INSTALAÇÃO DE TRIBUNAL ARBITRAL. DERROGAÇÃO DA

JURISDIÇÃO ESTATAL. QUESTÕES A SEREM ANALISADAS

EM SEDE DE ARBITRAGEM. CONFLITO DE COMPETÊNCIA

JULGADO PREJUDICADO. AGRAVO REGIMENTAL

DESPROVIDO.

(...)... a pretensão cautelar fora postulada até que o juízo

arbitral fosse instituído. E este juízo não apenas já foi instituído,

como a própria agravante já reconhece a prolação de sentença

arbitral (cujos pedidos de esclarecimentos, consoante se

informa às fls. 1866/1882 - e-STJ já foram, inclusive,

examinados). (...)

É evidente que, com a instalação do procedimento arbitral,

aquele tribunal passou a ser competente à análise das

questões controvertidas relacionadas ao sinistro ocorrido

quando da construção da central hidrelétrica e à própria

exigibilidade das cártulas. (...)

Quaisquer pretensões acautelatórias, agora, deverão ser

formuladas junto ao juízo arbitral, o qual contará com o auxílio

do Poder Judiciário para eventuais medidas constritivas.

Ante o exposto, resta evidenciado que, diante da natural demora na

instituição do tribunal arbitral, a parte interessada pode pleitear junto ao

Judiciário as medidas cautelares que se fizerem necessárias para a

preservação de seus direitos. E mesmo após a instauração da arbitragem, em

situações excepcionais, nas quais seja impossível o acesso ao árbitro em

tempo hábil, é lícito o recurso ao Judiciário para a obtenção de medidas de

urgência.

165

Cfr, no mesmo sentido, AgRg na Medida Cautelar nº 19.226 - MS (2012/0080171-0) Rel. p/

Acórdão Min. Nancy Andrighi. DJe 29/06/2012.

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Importa dizer ainda uma palavra a respeito do prazo de 30 dias previsto

no art. 806, do CPC, para o ajuizamento da ação principal e do disposto no art.

808, I, do mesmo CPC.

No caso das medidas cautelares antecedentes à arbitragem ajuizadas

perante o Judiciário, a ação principal será proposta perante o juízo arbitral.

No entanto, como nem sempre será possível que a arbitragem esteja

instituída (ou seja, que os árbitros aceitem a nomeação) antes dos 30 dias

previstos no art. 806 do CPC, o Autor deverá comprovar que tomou todas as

medidas necessárias para a instituição da arbitragem.

A respeito, escreve Carlos Alberto Carmona que o autor deverá

comprovar que tomou todas as providências necessárias, não sendo exigível

que a arbitragem já esteja instaurada no trintídio legal:

“Caberá ao autor, portanto, no prazo de 30 (trinta) dias

contados na forma do art. 806 já referido, demonstrando que

tomou as medidas necessárias para a instituição da

arbitragem. A prova a que está adstrito o autor, sob pena de

cessação da eficácia da medida cautelar (art. 808, I, Código de

Processo Civil) é no sentido de que tomou as providências

tendentes à nomeação de árbitros (notificação à parte contrária

na arbitragem ad hoc, notificação ao órgão arbitral institucional

na arbitragem administrada), não sendo exigível que no

trintídio demonstre o requerente que os árbitros aceitaram o

encargo (ou seja, que a arbitragem está instituída)”166

Francisco Cahali considera que, para o cumprimento do prazo de 30

dias para a propositura da ação principal, seria suficiente até mesmo o

encaminhamento de correspondência à parte contrária convocando-a a assinar

o compromisso arbitral:

“Para efeito do cumprimento do prazo de 30 dias para a

propositura da ação principal, considera-se a iniciativa da parte

em provocar o início da arbitragem, por quaisquer das formas

possíveis. Ou seja, até mesmo o encaminhamento de

correspondência convocando o adversário para assinar o

compromisso (art. 6º da lei 9.307/96) é suficiente para atender

a exigência legal. Em outros termos, tal como para se ter por

166

Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 327.

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interrompida a prescrição, deve a parte adotar as providências

pertinentes à instauração do juízo arbitral, considerada a

diversidade de situações possíveis de acordo com a convenção

e o regulamento de arbitragem escolhido”.167

Ou seja, para o cumprimento do prazo de 30 dias previsto no art. 806,

do CPC, não é necessário que a arbitragem já esteja instituída nesse prazo,

sendo suficiente a demonstração de que a parte interessada tomou todas as

medidas necessárias para a instauração da arbitragem.

II.8. Revisão, pelo árbitro, de decisão liminar concedida pelo

Judiciário

Como vimos, antes da instauração da arbitragem, a parte poderá

ajuizar medida cautelar preparatória perante o Judiciário.

Trata-se agora de analisar se, uma vez instituída a arbitragem, o árbitro

poderá rever a decisão judicial que concedeu ou não a cautelar pleiteada.

Luiz Roberto Ayoub entende que o árbitro não poderia revogar decisão

liminar proferida pelo juízo estatal, e que tal decisão somente poderia ser

revertida quando da prolação da sentença arbitral:

“Pode ainda haver a possibilidade de o compromisso não ter

estipulado o Tribunal ou árbitro competente para dirimir o

conflito; neste caso, há uma exceção à regra, onde, uma vez

concedida a liminar pelo órgão-juiz, esta prevalecerá; mesmo

que a posteriori haja instituição do procedimento, este não tem

o poder de desconstituir uma medida que fora concedida antes

mesmo da nomeação do árbitro ou Tribunal, fruto do que a

doutrina chama de compromisso em branco, só podendo

167

Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 230-231.

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mudar esta decisão se a sentença arbitral estipular o

contrário”.168

Joel Dias Figueira Júnior adota o mesmo entendimento e afirma que o

árbitro não pode, “quando instaurado posteriormente o juízo privado, revogar

ou modificar a providência acautelatória concedida ou denegada”:

“Assim deve ser porque a soberania das decisões do Poder

Judiciário se sobrepõe à instauração posterior de jurisdição

paraestatal ou, ainda, porque os litigantes não firmaram

compromisso arbitral que viabilizasse a propositura de ação

cautelar perante o árbitro ou tribunal arbitral. Em outros termos,

não há como se questionar a tutela acautelatória concedida ou

rejeitada pelo Estado-juiz por força da coisa julgada decorrente

da decisão proferida em ação acessória preparatória".169

No entanto, esse entendimento é francamente minoritário, e – data

venia – não se afigura o mais correto.

Luiz Olavo Baptista assinala que, evidentemente, antes de constituído

o tribunal arbitral os árbitros não podem conceder medidas cautelares, e as

partes podem recorrer ao Judiciário. Porém, assevera, “ao ser instaurado o

procedimento arbitral, os árbitros podem revogar ou manter essa cautelar”.170

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa assinala que a intervenção do

Judiciário é provisória, não sendo ela substitutiva da competência dos árbitros.

Por tal motivo, “uma vez instalada a arbitragem, os árbitros decidirão

autonomamente a respeito, confirmando ou não a liminar concedida”.171

168

Luiz Roberto Ayoub, Arbitragem: o acesso à Justiça e a efetividade do processo. Rio de Janeiro, Lumem Juris, 2005, pp. 80-85, Apud. José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série – Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010. 169 Joel Dias Figueira Junior, Arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1999. P. 224.

170 Luiz Olavo Baptista, Arbitragem Comercial e Internacional, Lex Magister, São Paulo, 2011,

p. 224. 171

Haroldo Malheiros Duclerc Verçosa, O Judiciário e a valorização da arbitragem, 1/8/2012

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100

Adriana Braghetta assevera que “sempre poderão os árbitros rever a

decisão, já que têm competência para o mérito.”172 Paulo Osternack Amaral

escreve que, “após a instituição da arbitragem, cessa a competência estatal,

impondo-se a remessa dos autos (e do eventual agravo de instrumento) ao

juízo arbitral”, podendo o árbitro “rever a medida urgente anteriormente

apreciada pelo juiz estatal”.173 E Juliana Barbosa Pechincha faz notar que,

atualmente, “a maioria da doutrina entende ser possível que o Tribunal Arbitral

reveja a decisão do juízo estatal pelo fato de ser ele o competente para

conhecer o mérito da lide, assim como pode ele revisar sua própria decisão”.174

Por seu lado, Francisco Cahali afirma que a cautelar antecedente

concedida pelo Judiciário poderá ser revista pelo árbitro, pois, após a

instauração do juízo arbitral, a jurisdição sobre o conflito, bem como a

manutenção ou revogação das decisões a respeito, passam a ser de

responsabilidade exclusiva do árbitro:

“A tutela cautelar, se deferida, prevalece. Porém, ao árbitro (ou

painel) é facultada, até mesmo de ofício, a reapreciação da

medida, mantendo, revogando ou alterando a decisão.

Também se já revista a cautelar em sede de tribunal estatal (no

julgamento de agravo de instrumento ou liminar deste recurso),

mantendo ou reformando decisão original de primeiro grau, tem

o juízo arbitral a autoridade para novo exame da medida, pois a

ele, agora, é outorgada a jurisdição plena sobre a matéria”.175-176-177-178

172 Adriana Braghetta, Medida cautelar e arbitragem. Revista Direito ao Ponto

(www.direitoaoponto.com.br).

173 Paulo Osternack Amaral, A concessão de medidas urgentes em processo arbitral

envolvendo o Poder Público, Revista de Processo | vol. 157 | p. 18 | Mar / 2008DTR\2008\189.

174 Juliana Barbosa Pechincha, Concessão de tutela de urgência pelo Poder Judiciário antes da

instauração do juízo arbitral comentários ao REsp 1.297.974/RJ, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 36 | p. 377 | Jan / 2013DTR\2013\2527. 175

Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 231. Cahali afirma, ainda, que “instituída a jurisdição do árbitro (ou painel), ao Judiciário será vedado o conhecimento de ação cautelar a respeito do litígio, Até mesmo se já proposta a medida, mas ainda não apreciada, ficará prejudicado o pedido, devendo o requerimento ser promovido agora perante o juízo arbitral, como incidente, não mais antecedente”. (op. cit., p. 234.) 176 No entanto, observa Ricardo Ramalho Almeida, uma vez instaurada a arbitragem, “a ação

cautelar em curso perante o Poder Judiciário não pode ser simplesmente extinta, sob pena de

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Arnoldo Wald adota a mesma posição e assinala que, atualmente, a

doutrina e a jurisprudência179 entendem que, constituído o tribunal arbitral,

se criar um indesejável hiato de jurisdição, incompatível com a harmonia que deve prevalecer

nas relações entre o Poder Judiciário e a arbitragem, visando à eficácia da prestação

jurisdicional. Para que possa ser extinta a ação cautelar, por perda de objeto ou

reconhecimento da incompetência do Poder Judiciário, é necessário que haja uma prévia

manifestação do tribunal arbitral, no sentido de confirmar, modificar ou revogar a liminar

concedida, ou mesmo de conceder a liminar negada, e que tal manifestação seja comunicada

ao juízo estatal processante”.(Ricardo Ramalho Almeida, Decisão monocrática em agravo.

Convenção de arbitragem. Medida cautelar pré-arbitral. Incompetência superveniente da

Justiça estatal, decorrente da instauração do juízo arbitral. Cassação da liminar, Revista de

Arbitragem e Mediação | vol. 21 | p. 263 | Abr / 2009DTR\2009\223).

177 No mesmo sentido, o entendimento de Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael de Moura

Rangel Ney, no sentido de que não é correta a assertiva de que “a ação cautelar deve ser

extinta e cancelada a liminar, tão logo seja constituído o tribunal arbitral.”( Medida cautelar

inominada. Pedido de extinção da obrigação ou, alternativamente, sua revogação com relação

à entrega de vacinas. Cláusula compromissória. Recurso desprovido. Revista de Arbitragem e

Mediação | vol. 1 | p. 215 | Jan / 2004 - Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 3 | p. 249 | Set

/ 2004DTR\2011\4082)

178 A já mencionada segunda fase do trabalho realizado em regime de parceria institucional

acadêmico-científica celebrada entre a Escola de Direito de São Paulo da Fundação Getúlio

Vargas e o Comitê Brasileiro de Arbitragem, coordenado por Fabiano Robalinho e Octávio

Fragata, após analisar após analisar 57 decisões que trataram do reconhecimento do

cabimento de medidas pré-arbitrais constatou que “53 reconheceram que a atuação do Poder

Judiciário estava limitada à fase pré-arbitral e a autoridade do tribunal arbitral de, ao final,

decidir sobre o mérito da arbitragem. Conquanto tenham surgido alguns casos em que se

estendeu à medida cautelar proferida em sede judicial efeitos válidos até a prolação da

sentença final, restou-se, no Grupo, o sentimento de que a autoridade do árbitro de

eventualmente rever a medida cautelar judicial estava amplamente reconhecida”.(Fabiano

Robalinho e Octávio Fragata (coordenadores); Ana Carolina Weber, André Gondinho, André

Smilgin, Daniel Chacur de Miranda, Katherine Spyrides, Marcos Diaz, Soraya Nunes

(pesquisadores), 2ª Fase da Pesquisa “Arbitragem e Poder Judiciário” – Medidas de Urgência e

Coercitivas, p. 53.)

179 Veja-se, nesse sentido:

TJRJ. 0127362-31.2010.8.19.0001 – Apelação – Rel. Des. Ines da Trindade - Julgamento: 23/09/2010 – 13ª Câmara Cível. Ação Cautelar. Deferimento de Medida Liminar. Revogação pelo Tribunal Arbitral. Possibilidade. Cláusula Compromissória firmada por acordo de vontade instituindo o Tribunal Arbitral para dirimir quaisquer conflitos entre as partes. Artigos 3º e 4º da Lei 9.307/96 (Lei da Arbitragem). O Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que o acesso ao Poder Judiciário pelas partes contratantes que tenham optado pela via arbitral é plenamente garantido pela Lei de Arbitragem. Entretanto, este acesso não pode substituir a própria apreciação do conflito pela Corte de arbitragem, sob pena de violação ao pacta sunt servanda, às normas de direito processual que tratam da matéria e às próprias regras estabelecidas pela Lei nº 9.307/96. Ainda que a decisão cautelar tenha sido exarada pelo Estado-juiz, o Tribunal Arbitral pode revogar ou modificar a medida concedida, por se tratar de decisão de juízo substitutivo que não detém atribuição para análise do mérito, segundo cláusula compromissória convencionada pelas partes. Precedentes do STJ. Recurso ao qual se nega provimento.

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cessa por completo a competência do magistrado e as medidas concedidas

pelo Judiciário podem ser revistas pelos árbitros:

“Instituída a arbitragem, cessa por completo a competência do

magistrado para conhecer de tais medidas, inclusive em grau

de recurso de medidas anteriormente concedidas. Assim,

devem as mesmas ser pleiteadas diretamente aos árbitros, e

aquelas já concedidas pelo Poder Judiciário antes da

instituição do tribunal arbitral poderão ser reapreciadas,

mantidas, modificadas ou, até mesmo, revogadas pelos

árbitros, tendo em vista sua própria natureza temporária e

precária. Tal regra já vem sendo admitida não apenas pela

doutrina, mas, também, pela jurisprudência180, e, atualmente,

prevalece (...)”.181

180 Diversas são as decisões já proferidas nesse sentido. Vide, por exemplo:

– “É da competência plena do juízo arbitral, ao qual se submete o exame da causa, a cognição sobre a oportunidade da medida antecipatória ou acautelatória, ficando apenas sua execução afeta ao juízo estatal, mediante seu poder de coertio e executio, caso a parte resista em cumpri-la espontaneamente. Hipótese excepcional, que enseja a competência do juízo estatal, todavia, é quando, antes da instauração do juízo arbitral, com a aceitação da nomeação pelo árbitro, haja necessidade de alguma dessas medidas cautelares ou de urgência. Nesses casos, admite-se que o requerimento seja feito diretamente ao juiz togado competente para o conhecimento da causa, sujeitando-se, todavia, à ratificação pelo juízo arbitral, assim que instaurado, remetendo-lhe os autos, de forma a preservar a competência plena da jurisdição privada sobre o litígio” (TJMG, Ag 1.0024.07.600275-7/002 em Ag 1.0024.07.600275-7/001, 14.ª Câm. Civ., j. 17.01.2008, rel. Des. Elias Camilo, Revista de Arbitragem e Mediação, vol. 19, p. 191 e ss. São Paulo, Ed. RT, out.-dez. 2008). – “Ação cautelar inominada preparatória – Cláusula arbitral – Ajuizamento da ação no juízo estadual – Possibilidade – Deferimento da medida – Posterior ajuizamento do procedimento arbitral – Remessa dos autos ao árbitro para manutenção ou não da tutela concedida. Sendo a medida cautelar aviada antes de instaurada a arbitragem, é cabível ao juízo estatal a concessão da medida perseguida, devendo, contudo, serem os autos remetidos ao juízo arbitral para que o mesmo aprecie a manutenção ou não da tutela concedida assim que iniciado o procedimento arbitral. De ofício, determinaram a remessa dos autos ao juízo arbitral para manutenção ou não da tutela concedida” (TJMG, AgIn 1.0480.06.083392-2/001, 12.ª Câm. Civ., j. 14.02.2007, rel. Des. Domingos Coelho). "Agravo de instrumento - Cautelar de sustação de protesto - Juízo Arbitral - Instauração. Não obstante a eleição da arbitragem como meio de solução de conflitos, a ação cautelar de sustação de protesto, se ainda não instaurado o juízo arbitral, poderá ser ajuizada perante juiz estatal, que, comunicado da instauração do juízo arbitral, providenciará a remessa dos autos para a devida apreciação da manutenção ou não da tutela concedida." (extinto TAMG, 4ª Câm. Cív., AgIn 2.0000.00.410.533-5/000(1), rel. Juiz Alvimar de Ávila, v.u., j. 27.08.2003.) Vide, ainda, no mesmo sentido: TJMG, AgIn 2.0000.00.410533-5/000, 4.ª Câm. Civ., j. 27.08.2003, rel. Des. Alvimar de Ávila; TJMG, AgIn 1.0003.07.023530-8/001, 12.ª Câm. Civ., j. 13.02.2008, rel. Des. Domingos Coelho; TJSP, ApCiv 999.843/6, 20.ª Câmara de Direito Privado, j. 23.06.2008, rel. Des. Álvaro Torres Júnior; TJSP, AgIn 614.006-4/4-00, 5.ª Câmara de Direito Privado, j. 18.02.2009, rel. Des. Roberto Mac Cracken.

181

Arnoldo Wald, Medidas Cautelares fora da sede da Arbitragem, Revista de Processo | vol. 207 | p. 305 | Mai / 2012DTR\2012\44630.

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103

A Min. Fátima Nancy Andrighi – no acórdão em que a Terceira Turma

do STJ deu provimento, por votação unânime, ao recurso especial nº

1.297.974-RJ – vai além e afirma que, instituída a arbitragem, o juiz deverá

encaminhar os autos ao árbitro, consignando “a ressalva de que sua decisão

foi concedida em caráter precário, estando sujeita a ratificação pelo juízo

arbitral, sob pena de perder a eficácia”. Confira-se:

Há quem sustente que o Poder Judiciário deve encaminhar

apenas cópia do processo para apreciação do juízo arbitral

que, entendendo pelo não cabimento da tutela concedida,

deverá requerer ao Juiz a extinção da medida cautelar.

Arnoldo Wald se filia a essa corrente, afirmando que ‘o tribunal

arbitral é incompetente para extinguir a medida cautelar

concedida pelo juiz antes ou durante o curso da arbitragem’

(Novos rumos para a arbitragem no Brasil, in Revista de Direito

Bancário, do Mercado de Capitais e da Arbitragem . São Paulo:

RT, nº 04, out/dez 2001, p. 351).

Sou adepta, porém, da desburocratização do processo, sendo

certo que o procedimento acima sugerido implicaria

necessariamente na realização de uma série de atos que, na

prática, terão o mesmo efeito da remessa direta dos próprios

autos da ação cautelar para o juízo arbitral.

Sendo assim, me parece suficiente que o Juiz, ao encaminhar

os autos ao árbitro, consigne a ressalva de que sua decisão foi

concedida em caráter precário, estando sujeita a ratificação

pelo juízo arbitral, sob pena de perder eficácia. Com isso, e

sem que haja qualquer usurpação de competência ou conflito

de jurisdição, evita-se a prática de atos inúteis e o

prolongamento desnecessário do processo.182

Também Carlos Alberto Carmona defende que o árbitro poderá manter

ou não a medida concedida pelo Judiciário: “Concedida a medida, cessa a

competência do juiz togado, cabendo aos árbitros, tão logo sejam investidos no

cargo, manter, cassar ou modificar a medida concedida”.183

182

REsp nº 1.297.974 - RJ (2011/0240991-9). Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 19/06/2012. 183

Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 327.

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Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, em

artigo escrito especificamente sobre o tema, assinalam que tendo as medidas

cautelares a finalidade de assegurar o resultado útil da ação, é certo que o

julgador do mérito da demanda poderá revogá-las, se já tiverem alcançado

esse objetivo:

“Consistindo a finalidade precípua das medidas cautelares em

assegurar ao autor da demanda a utilidade do meio de que

dispõe para buscar a satisfação de sua pretensão, afastando,

desse modo, a probabilidade de que o direito alegado venha a

se deteriorar, é indubitavelmente lícito, por exemplo, conferir ao

julgador do mérito poderes bastantes para revogar uma medida

cautelar que já teria alcançado seu objetivo, estando, assim,

fadada ao desaparecimento.

Some-se a isso o fato de que a medida cautelar teria sido

concedida pelo juízo estatal anteriormente à instauração da

arbitragem, mediante, portanto, cognição sumária,

necessariamente limitada, até mesmo diante da

impossibilidade de o Judiciário invadir o mérito da discussão,

vez que este foi deslocado à alçada do julgador privado. Nesse

contexto, salta aos olhos o acerto de o árbitro, após examinar

as razões das partes e sopesar a prova produzida, agindo por

força de lei com a mesma diligência exigida do magistrado,

manifestar-se em definitivo sobre a matéria”.184

Os mesmos autores, assinalam que Fouchard, Gaillard e Goldman

“afirmam categoricamente que a natureza precária das medidas acautelatórias

permite aos árbitros rever decisões judiciais, sendo certo que, na hipótese de

se instaurar um conflito entre as medidas decretadas pelo Judiciário e as que o

tribunal arbitral entender cabíveis, prevalecerá o entendimento dos árbitros,

pois somente eles detêm jurisdição para deliberar sobre o mérito da causa”.185

Fichtner e Monteiro adotam o mesmo entendimento, assinalando que

as medidas urgentes possuem natureza provisória, são concedidas após

cognição sumária e, portanto, podem ser reapreciadas:

184 Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, Revogação de Medida

Liminar Judicial pelo Juízo Arbitral, Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem - 04-06/2001. 185 Carlos Augusto da Silveira Lobo e Rafael de Moura Rangel Ney, Revogação de Medida

Liminar Judicial pelo Juízo Arbitral, Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem - 04-06/2001.

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“Com o devido respeito que merecem as opiniões em contrário,

entendemos que o árbitro ou o tribunal arbitral poderá

reexaminar a matéria inerente às tutelas de urgência, seja para

revogá-la ou para concedê-la, caso o pedido tenha sido

concedido ou indeferido na seara estatal. As medidas urgentes

possuem natureza provisória e são concedidas ou denegadas

a partir de uma cognição sumária, reapreciáveis, por essa

razão, a qualquer tempo. Aplica-se aqui, analogicamente, a

regra que permite ao novo órgão judicial, nas hipóteses de

modificação de competência ou de declínio por incompetência,

o pleno exame da matéria em questão, independentemente até

mesmo de fato novo. (...)

Afinal, dúvidas não há a respeito da não vinculação dos

árbitros, quando da prolação da sentença, na arbitragem, à

decisão antecedente proferida pelo órgão estatal. Assim,

dentro do princípio da provisoriedade das medidas urgentes e

da circunstância de que a tais decisões sempre se aplica a

regra da modificabilidade própria da cláusula rebus, sempre é

lícito ao tribunal arbitral rever a medida, inclusive para adequá-

la a uma nova situação de fato”.186

No mesmo sentido, a Jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de

Justiça, como se depreende dos seguintes trechos de acórdão já citado acima:

“Superadas as circunstâncias temporárias que justificavam a

intervenção contingencial do Poder Judiciário e considerando

que a celebração do compromisso arbitral implica, como regra,

a derrogação da jurisdição estatal, os autos devem ser

prontamente encaminhados ao juízo arbitral, para que este

assuma o processamento da ação e, se for o caso, reaprecie a

tutela conferida, mantendo, alterando ou revogando a

respectiva decisão. (...)

Na hipótese específica dos autos, o Juiz de primeiro grau de

jurisdição indeferiu a liminar e julgou o pedido cautelar

improcedente, sendo que, no julgamento da apelação pelo

TJ/RJ, momento em que houve a concessão da tutela, o

Tribunal Arbitral já estava devidamente instituído.

A rigor, portanto, o Tribunal Estatal já era incompetente, de

sorte que sequer deveria ter julgado o recurso.187

186 José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série –

Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, p. 143-144.

187 REsp nº 1.297.974 - RJ (2011/0240991-9). Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 19/06/2012.

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106

Ante o exposto, afigura-se induvidoso que, após a instauração da

arbitragem, o árbitro poderá rever a decisão cautelar que tenha sido concedida

pelo Poder Judiciário.

Por fim, resta analisar a hipótese contrária, ou seja, se seria possível

ao Judiciário rever decisão cautelar proferida pelo árbitro.

II.9. Revisão, pelo Judiciário, de decisão liminar concedida pelo

árbitro

Como regra, não é dado ao Poder Judiciário rever as decisões

cautelares proferidas pelo árbitro. O juiz estatal não deve apreciar o mérito das

decisões arbitrais, mas apenas dar-lhe efetividade, por solicitação do árbitro.

Como bem assinala Francisco Cahali, “são funções complementares, e

não concorrentes. A um juízo caberá a decisão; ao outro, a efetivação do

decidido. Tudo sem hierarquia ou subordinação, pois são tarefas distintas

decorrentes dos poderes e atribuições de cada qual no sistema jurídico”.188

No mesmo sentido, escreve Carlos Alberto Carmona, ressaltando não

existir qualquer relação de subordinação entre a jurisdição estatal e a arbitral:

“Árbitro e juiz togado estão em posição de colaboração

(Coordenação, portanto) e não de subordinação. Isto explica

por que o juiz togado não poderá, por exemplo, examinar o

mérito da decisão do árbitro relativamente à necessidade e

conveniência de ouvir uma testemunha que se recusa a

comparecer à audiência por ele, árbitro, designada. Do mesmo

modo, se o árbitro antecipar tutela ou conceder medida

cautelar, não caberá ao juiz reexaminar a presença dos

requisitos para a concessão da tutela de urgência. Em outros

termos, a função jurisdicional será dividida entre árbitros e juiz,

segundo a competência de cada um: ao árbitro toca decidir, ao

juiz tocar executar, sem que se possa imaginar qualquer

188

Francisco José Cahali, Curso de Arbitragem, Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 240.

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107

demérito para o juiz estatal ou subordinação deste ao

árbitro”.189

Vale dizer: em princípio, não é dado a juiz estatal reexaminar o

conteúdo de uma decisão cautelar decretada pelo árbitro. No entanto, parece-

nos evidente que, em determinadas hipóteses, o magistrado poderá se recusar

a cumprir uma solicitação do árbitro. Por exemplo, nos mesmos casos em que

o art. 209 do CPC autoriza o não cumprimento de uma carta precatória.190

Fichtner e Monteiro elencam outros motivos que autorizariam ao juiz

togado recusar o cumprimento de decisão arbitral:

“Sustentamos que o juízo togado, em regra, realmente não

poderá imiscuir-se no mérito da decisão arbitral, mas deverá

recusar o seu cumprimento nos casos em que (i) a decisão

arbitral manifestamente ofender a ordem pública; (ii) for nulo o

compromisso; (iii) emanou de quem não poderia ser árbitro; (iv)

a decisão carecer de fundamentação; (v) a decisão for

proferida fora dos limites da convenção de arbitragem; (vi) for

comprovado que a decisão tenha sido proferida por

prevaricação, concussão ou corrupção passiva; (vii) houver

razoáveis dúvidas quanto à autenticidade dos documentos

encaminhados pelo árbitro”.191

Ou seja, é certo que, diante de determinadas circunstâncias, o juiz

togado poderá recusar o cumprimento de decisão cautelar arbitral.

Porém, uma coisa é recusar-se a cumprir, outra coisa, bem diferente, é

rever uma decisão. Assim, permanece a pergunta: o juiz estatal poderá rever

uma decisão liminar arbitral?

189 Carlos Alberto Carmona, O Processo Arbitral, Revista de arbitragem e mediação, São Paulo,

RT, ano 1, nº 1, jan/abr de 2004, p. 30.

190 O art. 267 do projeto de novo Código de Processo Civil repete os mesmos os motivos, do

atual art. 209, pelos quais o juiz recusará o cumprimento de carta precatória ou arbitral.

191 José Antonio Fichtner e André Luís Monteiro, Temas de Arbitragem – Primeira Série –

Medidas Urgentes no Processo Arbitral Brasileiro, Ed. Renovar, 2010, 145/146.

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108

Para responder a essa pergunta, vale recordar que a sentença arbitral

não está sujeita a recurso ao Poder Judiciário, pelo expressamente disposto no

art. 18 da Lei de Arbitragem.192

O inciso II, do art. 30 da Lei 9.307/96 prevê que, no prazo de cinco

dias, a parte solicite ao árbitro esclarecimentos sobre alguma “obscuridade,

dúvida ou contradição da sentença arbitral”.193

Em qualquer caso – assinalam Antonio Celso e José Roberto Pinheiro

Franco, a respeito dos “embargos de declaração” arbitrais – “quando o objetivo

é alargar o voto, com nítidos contornos infringentes, o recurso é inadmissível

no juízo arbitral”.194

Portanto, deve-se entender que a sentença arbitral é irrecorrível.195-196

192

Art. 18: “O árbitro é juiz de fato e de direito, e a sentença que proferir não fica sujeita a recurso ou a homologação pelo Poder Judiciário”. 193

Esclarece Carmona que a “dúvida” foi mencionada como hipótese autorizadora dos “embargos de declaração” arbitrais, porque o legislador desejou reproduzir os casos do art. 464 do CPC, a fim de não estabelecer diferenças que levassem o intérprete a imaginar que os “embargos” arbitrais teriam menos abrangência dos que os previstos no CPC. No entanto, durante a tramitação no Congresso Nacional do projeto que deu origem à Lei 9.3907/96, o art. 464 foi revogado pela Lei 8.950/94 e o art. 535 do CPC, que passou a reger a matéria, omitiu a dúvida como autorizadora dos embargos de declaração. (Cfr. Carlos Alberto Carmona, Arbitragem e Processo, p. 386-387). 194 Antonio Celso Pinheiro Franco e José Roberto Pinheiro Franco. 1 Notas sobre a prestação

da Tutela arbitral no Brasil, Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo | vol. 23 | p. 9 |

Jan / 2009DTR\2011\2995

195 Escreve a respeito Rodrigo Garcia da Fonseca: “um dos pontos mais importantes em

matéria de segurança jurídica, no mundo arbitral, é a garantia de que o Poder Judiciário não se

arvorará em revisor do mérito das sentenças arbitrais, seja ao analisar a respectiva execução,

ou um pedido de anulação, seja no reconhecimento das sentenças estrangeiras”. (A arbitragem

na jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça, Revista de Arbitragem e Mediação |

vol. 19 | p. 16 | Out / 2008DTR\2008\894).

196 Sobre o posicionamento do Judiciário diante das sentenças arbitrais, vale assinalar que, no

ano de 2008, foi celebrada uma parceria institucional acadêmico-científica entre a Escola de

Direito de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas e o Comitê Brasileiro de Arbitragem a fim de

realizar pesquisa empírica para mapear as decisões judiciais sobre o tema da arbitragem

desde que a lei entrou em vigor em 1996. A primeira etapa dessa pesquisa teve por principais

participantes Adriana Braghetta, Daniela Monteiro Gabbay, Eleonora Coelho Pitombo, Rafael

Francisco Alves e Selma Ferreira Lemes (coord. geral).

Após analisarem centenas de decisões judiciais relativas à aplicação da lei de arbitragem, a pesquisa concluiu que, no que diz respeito a invalidações de sentenças arbitrais, de forma geral “o Judiciário respeitou (i) as estritas hipóteses do artigo 32 da lei de arbitragem (ainda

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109

O mesmo se diga quanto às tutelas de urgência ou de evidência

decretadas pelo árbitro. Somente ao árbitro cabe decidir acerca da

conveniência ou oportunidade da decretação de tais medidas, não cabendo

recurso ao Judiciário.

Flávio Yarshell escreve a respeito, asseverando que não está sujeito

ao controle judicial o mérito da decisão que concede, ou nega, a tutela de

urgência:

“Quando se trata de decidir se a medida de urgência deve, ou

não, ser determinada, essa prerrogativa é exclusiva do árbitro e

escapa ao controle judicial o mérito da correspondente decisão.

Em contrapartida, deduzido o pedido perante o árbitro - como

deve ocorrer - não poderá a parte, diante de eventual negativa,

pretender o socorro estatal subsidiário”.197

No mesmo sentido, escreve Pedro Batista Martins que “caso o pedido

cautelar ou coercitivo não seja acatado pelos árbitros, não pode a parte

requerente buscar a via judicial visando a atingir o que já lhe foi indeferido pelo

juízo privado”.198

No que diz respeito às sentenças arbitrais, é possível, apenas e tão

somente, nos termos do art. 33 da Lei de Arbitragem, que a parte interessada

pleiteie, ao órgão do Poder Judiciário competente, a sua decretação da

nulidade, nos termos previstos na própria Lei de Arbitragem, ressaltando-se

que essa decretação de nulidade também poderá ser arguida nos embargos do

devedor.

que não as indicando expressamente), (ii) a convenção de arbitragem, quando existente, válida e eficaz e (iii) o poder dos árbitros de decidir o conflito, limitando-se a analisar eventuais errores in procedendo, tudo de acordo com a doutrina mais referenciada no âmbito nacional e internacional.” (Adriana Braghetta, Daniela Monteiro Gabbay, Eleonora Coelho Pitombo, Rafael Francisco Alves e Selma Ferreira Lemes (coord. geral), Arbitragem e o Poder Judiciário, uma radiografia dos casos de arbitragem que chegaram ao Judiciário brasileiro, Cadernos Direito GV, v.6, n.6, novembro de 2009, pp. 63-64.) 197 Flávio Luiz Yarshell, Brevíssimas notas a respeito da produção antecipada de provas na

arbitragem, Revista de Arbitragem e Mediação | vol. 14 | p. 52 | Jul / 2007DTR\2007\887

198 Pedro A Batista Martins, Apontamentos sobre a Arbitragem no Brasil, in site

www.batistamartins.com.br.

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110

A propósito, assinala Arnoldo Wald que a sentença arbitral é

irrecorrível, sendo anulável somente nas hipóteses do art. 32 da Lei de

Arbitragem, que, em linhas gerais, repete os motivos de anulação previstas na

Convenção de Nova York:

“Com relação às hipóteses de desconstituição de uma

sentença arbitral, temos que, segundo os princípios que

informam o instituto, consagrados na nossa lei de arbitragem, a

sentença é irrecorrível, mas somente passível de anulação nas

hipóteses do art. 32 da Lei 9.307/1996 c/c o art. 33 da Lei

9.307/1996. Grosso modo, pode-se fazer uma comparação

entre as hipóteses previstas na Convenção de Nova Iorque

para as ações anulatórias e a nossa lei.199

No mesmo sentido, escreve Leon Frejda Szklarowsky:

“A Lei da Arbitragem não admite qualquer recurso, a não ser a

correção de erro material da sentença arbitral ou

esclarecimento de obscuridade, dúvida ou contradição, pelo

próprio árbitro ou pelo tribunal arbitral. Somente a ação de

nulidade da sentença arbitral e os embargos do devedor são

admitidos (art. 33 da Lei da Arbitragem).”200

Assim sendo, a pergunta que se põe é a seguinte: se é possível

pleitear, junto ao Judiciário, a nulidade da sentença arbitral, porque não seria

possível, diante de circunstâncias de excepcional urgência e gravidade,

recorrer ao Judiciário para atacar decisão liminar arbitral que tenha concedido,

ou negado, uma tutela de urgência?

Joel Dias Figueira Junior, após esclarecer que cabe exclusivamente ao

árbitro decidir acerca da necessidade e conveniência da medida de urgência

pleiteada e que, de sua decisão, não cabe qualquer forma de impugnação ao

Poder Judiciário, admite exceções nas mesmas hipóteses ensejadoras de

nulidade da sentença final (arts. 32 e 33 da Lei 9.307/96).201

199 Arnoldo Wald, Oito anos de jurisprudência sobre arbitragem, Revista de Arbitragem e

Mediação | vol. 3 | p. 111 | Set / 2004DTR\2004\520.

200 Leon Frejda Szklarowsky, A arbitragem – uma visão crítica, Revista de Processo | vol. 212 |

p. 203 | Set / 2012DTR\2012\450635. 201 Joel Dias Figueira Junior. Arbitragem, jurisdição e execução. 2. ed. São Paulo: Ed. RT,

1999,p. 222.

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111

O mesmo entendimento é adotado por Aristóteles Atheniense, para

quem “ao Judiciário não é permitido rever ou modificar a decisão concessiva da

tutela emergencial proferida em juízo arbitral (...) a não ser que esta contenha

algum vício formal ou nulidade de ordem pública, que comporte o decreto de

nulidade”. E, mais adiante, o mesmo autor acrescenta: “as decisões proferidas

pelo árbitro sobre medidas cautelares podem sujeitar-se a ação anulatória na

justiça comum, nas mesmas condições em que a sentença arbitral a ela se

sujeita (art. 33 da Lei 9.307/96)”.202

Em sentido contrário, Carreira Alvim entende que "a ação de nulidade

de que trata o art. 33 da Lei de Arbitragem subordina-se a alguma das causas

de nulidade da sentença arbitral, previstas no art. 32 da mesma lei, não se

aplicando evidentemente à hipótese de liminar ou antecipatória concedida na

esfera arbitral".203

O fato é que pode haver situações excepcionais em que a parte

prejudicada, por uma decisão arbitral flagrantemente inválida, que concede (ou

nega) uma tutela de urgência ou de evidência, não poderá esperar até a

prolação da sentença para, só então, ingressar com a ação de decretação de

nulidade, sob pena de inevitável perecimento de seu direito.

Com o devido respeito aos entendimentos em sentido contrário, quer

nos parecer que, se uma decisão arbitral – flagrantemente ilegal – concessiva

ou denegatória de uma tutela de urgência ou de evidência, causar à parte

prejudicada dano irreparável e não puder ser imediatamente anulada em

virtude do previsto no art. 33 da Lei 9.307/96, contra ela caberá, ao menos,

mandado de segurança.

Sim, porque o árbitro, ao estar investido do poder jurisdicional,

certamente se equipara a autoridade pública.

202 Aristóteles Atheniense, As medidas coercitivas no juízo arbitral, Revista de Direito Bancário

e do Mercado de Capitais | vol. 19 | p. 313 | Jan / 2003DTR\2003\628.

203 J. E. Carreira Alvim, Direito Arbitral, Editora Forense, 2ª Edição, Rio de Janeiro, 2004, p.

342 .

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112

E se a doutrina e a jurisprudência admitem o mandado de segurança

contra decisões judiciais irrecorríveis e teratológicas, porque não se admitiria o

mandado de segurança contra uma decisão arbitral irrecorrível e, igualmente,

teratológica?

II. 10. As Medidas cautelares ou de urgência no anteprojeto

elaborado pela da Comissão para a reforma da lei de

arbitragem

No começo de 2013 foi instalada no Senado Federal uma comissão de

juristas, presidida pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça Luis Felipe

Salomão, para apresentar proposta de reforma da Lei de Arbitragem e de

criação da primeira Lei de Mediação no país204.

Após seis meses de trabalhos e debates, nos quais foram ouvidas as

sugestões de 46 entidades, a comissão entregou ao Senado Federal os dois

anteprojetos.

No que diz respeito às tutelas cautelares e de urgência, o anteprojeto

propôs alterações que tornam explícito, no texto da lei, o entendimento já

consolidado pela doutrina e pela jurisprudência.

As alterações propostas na Lei 9.307/96, referentes às tutelas

cautelares e de urgência são as seguintes:

“Capítulo IV-A

Das Tutelas Cautelares e de Urgência

Art. 22-A. Antes de instituída a arbitragem, as partes poderão

recorrer ao Poder Judiciário para a concessão de medidas

cautelares ou de urgência.

204

Além do Ministro Salomão, compuseram a comissão Adacir Reis; Adriana Braghetta; André Chateaubriand Pereira Diniz Martins; Caio Cesar Rocha; Carlos Alberto Carmona; Eduardo Pellegrini de Arruda Alvim; Eleonora Coelho; Ellen Gracie Northfleet; Francisco Antunes Maciel Müssnich; Francisco Maia Neto; José Antônio Fichtner; José Roberto de Castro Neves; José Rogério Cruz e Tucci; Marcelo Henrique Ribeiro de Oliveira; Marcelo Rossi Nobre; Marco Maciel; Pedro Paulo Guerra de Medeiros; Roberta Maria Rangel; Silvia Rodrigues Pereira Pachikoski; Tatiana Lacerda Prazeres; e Walton Alencar Rodrigues.

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113

Parágrafo único. Cessa a eficácia da medida cautelar ou de

urgência se a parte interessada não requerer a instituição da

arbitragem no prazo de trinta (30) dias, contados da data da

efetivação da respectiva decisão.

Art. 22-B. Instituída a arbitragem, caberá aos árbitros manter,

modificar ou revogar a medida cautelar ou de urgência

concedida pelo Poder Judiciário.

Parágrafo único. Estando já instituída a arbitragem, as medidas

cautelares ou de urgência serão requeridas diretamente aos

árbitros.”205

Como se vê, o anteprojeto elaborado pela comissão de juristas propôs

a inclusão, na lei de arbitragem, de pontos já consolidados pela doutrina e

jurisprudência, referentes às tutelas cautelares e de urgência, a respeito dos

quais discorremos no presente trabalho.

Formulamos os nossos votos no sentido de que o anteprojeto tenha

uma tramitação célere no Congresso Nacional e que esses oportunos

aperfeiçoamentos sejam incluídos na Lei de Arbitragem dentro do menor prazo

possível.

205 O anteprojeto também propõe acrescentar, na Lei de Arbitragem, o seguinte artigo referente

à carta arbitral: “Capítulo IV-B. Da Carta Arbitral. Art. 22-C. O árbitro ou o tribunal arbitral poderá expedir carta arbitral, para que o órgão jurisdicional nacional pratique ou determine o cumprimento, na área de sua competência territorial, de ato solicitado pelo árbitro. Parágrafo único. No cumprimento da carta arbitral será observado o segredo de justiça, desde que comprovada a confidencialidade estipulada na arbitragem.”

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114

CONCLUSÃO

Ao longo desse estudo, tivemos a oportunidade de analisar múltiplas

questões referentes à possibilidade de concessão e execução das tutelas de

urgência e de evidência na arbitragem.

Para a adequada compreensão da matéria, foram de grande utilidade

as considerações iniciais acerca do caráter jurisdicional da arbitragem e dos

poderes conferidos, pela lei, ao árbitro.

Após a análise dos diferentes conceitos de “jurisdição”, foi possível

concluir – como uma espécie de “resultante” dos diversos entendimentos

doutrinários – que a jurisdição deve ser considerada como uma das funções do

Estado que tem por finalidade, antes de tudo, a preservação da ordem jurídica

e da paz social.

A Doutrina costuma entender que a jurisdição se caracteriza como

sendo de índole substitutiva. Ou seja, aquele que detém o poder jurisdicional

faz com que a pretensão, ou a “vontade”, da parte seja substituída pela

aplicação da lei ao caso concreto. E essa substituição se consolida,

definitivamente, com a formação da coisa julgada. Por isso, muitos consideram

que a coisa julgada é a essência da jurisdição.

Foi visto também que a função jurisdicional é exercida por meio de

duas atividades, ou elementos, fundamentais: a cognição (cognitio) e a

execução (imperium).

A cognição é o elemento principal, e o seu exercício corresponde à

própria essência da jurisdição. É a atividade de “dizer o direito” (iuris dictio),

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115

exercida no processo de conhecimento, onde o julgador “diz” qual é o direito

aplicável ao caso concreto. A partir de então, esse direito aplicável “substitui” a

vontade da parte, sendo que essa substituição se torna definitiva quando se

opera o trânsito em julgado da decisão.

E a segunda das atividades jurisdicionais é a de realizar,

compulsoriamente, o direito aplicável ao caso concreto. Essa atividade é

exercida por meio da execução.

Dessas duas principais atividades ou elementos próprios à jurisdição –

cognição e execução – a lei conferiu ao árbitro apenas a cognição. O árbitro

não possui o poder de execução.

Mas isso não impede que a arbitragem seja uma atividade de natureza

eminentemente jurisdicional, pois a sentença arbitral, por produzir os mesmos

efeitos das sentenças do Poder Judiciário, por fazer coisa julgada e por ser

considerada um título executivo judicial, substitui a vontade da parte pela

aplicação da lei. Portanto, pode-se dizer que a arbitragem está revestida da

própria essência da atividade jurisdicional.

Esse é o atual entendimento da imensa maioria da Doutrina sobre a

matéria.

No entanto, cabe salientar que, devido à ausência de poderes de

execução (imperium) dos árbitros, afigura-se indispensável um regime de

cooperação harmônico entre os órgãos arbitrais e judiciais, para se garantir a

efetiva prestação da tutela aos litigantes que se submetem à arbitragem.

* * *

Após essas considerações teóricas acerca da natureza jurisdicional da

arbitragem, dos poderes que a lei conferiu aos árbitros e da necessária

cooperação entre os juízos estatal e arbitral para o adequado desenvolvimento

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116

da arbitragem, foram analisados diferentes aspectos das tutelas de urgência e

de evidência, em tese, e no âmbito específico da arbitragem.

Inicialmente foi demonstrado que a garantia constitucional de acesso à

Justiça é o fundamento das tutelas de urgência e de evidência.

Analisou-se que o inciso XXXV, do art. 5º, da CF, protege não só a

lesão, mas também a ameaça a direito. E essa proteção legitima – ou impõe –

a concessão de tutelas de urgência, ante a ameaça ao direito. Já as tutelas de

evidência, além do mesmo inciso XXXV, elas também encontram

fundamentação constitucional no inciso LXXVIII, do art. 5º da CF, que garante

a todos a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade

de sua tramitação. Sim, pois não há sentido em retardar um provimento

jurisdicional, ante a evidência do direito da parte.

Da doutrina analisada, chegou-se à conclusão que a possibilidade de

se decidir e decretar tutelas, em sede de cognição sumária, decorre da

constatação de que, em determinadas circunstâncias, se o julgador assim não

decidisse, estaria negando a prestação jurisdicional, pois o pleno acesso à

Justiça supõe uma prestação jurisdicional efetiva, célere e em tempo razoável.

Portanto, pode-se afirmar que, mesmo se não existissem as normas

infraconstitucionais que permitem ao juiz a adoção de certas medidas

cautelares ou antecipatórias, elas seriam cabíveis, por força das garantias

constitucionais que asseguram o pleno acesso à jurisdição, a celeridade na

tramitação e a razoável duração do processo.

E essas garantias constitucionais também se aplicam à jurisdição

exercida pelo árbitro.

Ou seja, uma vez que o árbitro exerce, com exclusividade, o poder

jurisdicional sobre a lide que lhe é submetida, e tendo em vista as garantias

constitucionais do pleno acesso à jurisdição e da razoável duração do

processo, seria lícito ao árbitro conceder tutelas de urgência e de evidência,

mesmo se a Lei de Arbitragem nada dispusesse a respeito.

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117

E, de fato – apesar de a Lei de Arbitragem não ser suficientemente

clara a respeito, visto que o § 4º, do art. 22, estipula que, em havendo

necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-

las ao órgão do Judiciário –, o entendimento da Doutrina e da Jurisprudência

se consolidou no sentido de que é permitido ao árbitro conceder tutelas de

urgência e de evidência.

E isso porque a função jurisdicional cautelar é um “’tertium genus’ que

contém a um tempo as funções do processo de conhecimento e de

execução”206.

Ou seja, o processo cautelar é dividido em dois momentos, que

correspondem às funções do processo de conhecimento e de execução: o

julgador, num primeiro momento, conhece a questão e decreta a medida

cautelar (cognitio); e, num segundo momento – se não houver o cumprimento

espontâneo – executa a medida (imperium).

Portanto, não é necessário que o árbitro tenha o poder de execução

(imperium) para decretar uma medida urgente ou de evidência. Para isso,

basta o seu poder de cognição (cognitio). A ausência do poder de execução

impede, tão somente, que o árbitro implemente, de maneira forçada, a medida

decretada.

Na verdade, as partes, ao celebrarem o compromisso arbitral,

derrogam a jurisdição estatal e conferem ao árbitro a competência para

resolver todas as questões relativas ao litígio. Portanto, só a ele compete

adotar as providências cabíveis para o efetivo exercício de sua jurisdição, o

que inclui os provimentos cautelares que se fizerem necessários.

No entanto, se antes de instituída a arbitragem for necessária a adoção

de qualquer medida urgente, diante do risco do perecimento do direito e em

virtude dos preceitos constitucionais que garantem o acesso à Justiça, a parte

poderá se dirigir diretamente ao órgão do Poder Judiciário que seria

originariamente competente para julgar a causa. E isso não representa

206

Exposição de motivos do Código de Processo Civil, Capítulo IV, nº 11.

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118

qualquer ofensa à competência exclusiva dos árbitros para conhecer e julgar as

medidas cautelares.

Atualmente, esse é o pacífico entendimento da doutrina e da

jurisprudência.

Contudo, uma vez constituído o tribunal arbitral, cessa por completo a

competência do magistrado. E, como analisado, o entendimento doutrinário e

jurisprudencial também se pacificou no sentido de que as medidas de urgência

concedidas pelo Judiciário podem ser revistas pelos árbitros.

Já o contrário não acontece. Ou seja, via de regra, não é dado ao

Poder Judiciário rever as decisões cautelares proferidas pelo árbitro. O juiz

estatal não deve apreciar o mérito das decisões arbitrais, mas apenas dar-lhe

efetividade, por solicitação do árbitro.

As sentenças arbitrais não estão sujeitas a recurso ao Poder Judiciário,

pelo expressamente disposto no art. 18 da Lei de Arbitragem. E o mesmo vale

em relação às tutelas de urgência ou de evidência decretadas pelo árbitro.

É claro que, em determinadas hipóteses, o magistrado poderá se

recusar a cumprir uma solicitação do árbitro. Por exemplo, nos mesmos casos

em que o art. 209 do CPC autoriza o não cumprimento de uma carta precatória.

Mas, em princípio, o juiz estatal não pode rever uma decisão liminar arbitral.

No que diz respeito às sentenças arbitrais, é possível, apenas, nos

termos do art. 33 da Lei 9.307/96, que a parte interessada pleiteie, ao órgão do

Poder Judiciário competente, a decretação da sua nulidade, ressaltando-se que

essa decretação de nulidade também poderá ser arguida nos embargos do

devedor.

Já quanto às tutelas de urgência ou de evidência concedidas (ou

negadas) pelo árbitro, a doutrina se divide. Uns consideram que não cabe

qualquer forma de impugnação da decisão junto ao Judiciário. Outros

entendem que os mesmos motivos que autorizariam a decretação de nulidade

de uma sentença arbitral, possibilitariam também que o Judiciário anulasse

uma tutela liminar.

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119

Enfim, dentre todas as conclusões a que se chegou, vale salientar o já

consolidado entendimento doutrinário e jurisprudencial no sentido de que é

permitido ao árbitro conceder tutelas de urgência e evidência durante a

arbitragem, bem como rever as medidas cautelares concedidas pelo Judiciário

antes da instauração do tribunal arbitral. E isso representa não só o

reconhecimento do caráter jurisdicional da arbitragem, como um grande avanço

na plena consolidação desse instituto no Brasil.

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