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CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 14 (02): 2302.1-15 2016 2302.1 UM PROGRAMA DE ENSINO DE CORRENTE ALTERNADA ANCORADO NOS TRÊS MOMENTOS PEDAGÓGICOS AN EDUCATION PROJECT REGARDING ALTERNATING ELECTRIC CURRENT BASED ON THE THREE PEDAGOGIC STAGES Guilherme Dionisio 1 , Luiz Eduardo S. Spalding 2 Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática, UPF, Passo Fundo, Brasil 1 [email protected]; 2 [email protected] Neste trabalho apresentamos um programa de ensino de corrente elétrica alternada para o ensino médio baseado na proposta de Delizoicov & Angotti presente no livro Física. Partimos do tema central “Geração, transporte e distribuição de energia elétrica” e abordamos os fundamentos do eletromagnetismo usando vídeos e simulações computacionais como instrumentos mediadores. Após apresentar a situação atual do ensino de eletromagnetismo, descrevemos os três momentos pedagógicos e relatamos a atividade desenvolvida em sala de aula. Por fim, apresentamos os resultados da pesquisa de aprendizagem constituída pela análise de memórias de aula e de um questionário. Palavras-chave: Corrente Alternada, Energia Elétrica, Ensino de Física, Simulação Computacional, Momentos Pedagógicos This paper presents a high-school educational project for teaching alternate electric current based on the proposal of Delizoicov & Angotti as presented in the book Física. We start from the central theme Generation, transmission and distribution of electric energy, approaching the electromagnetism fundamentals using videos and computer simulations as mediation instruments. After introducing the current situation regarding the teaching of electromagnetism, we describe the three pedagogic stages and report the activities performed in class. Lastly, we present the results of the learning research through class memories and a questionnaire. Keywords: Alternating Electric Current, Electric Energy, Physics Teaching, Computer Simulations, Pedagogic Stages 1 INTRODUÇÃO As pesquisas em Ensino de Física têm avançado rapidamente, surgindo muitas propostas e metodologias que visam uma aprendizagem significativa. Contudo, o ensino de eletricidade e magnetismo ainda é carente de propostas didáticas em nível médio. A abstração do conteúdo o torna, sem dúvida, uma dificuldade a ser superada no processo de ensino-aprendizagem. Uma análise em livros de Física de ensino médio aponta para uma abordagem matemática mais fundamentada em notações e equações matemáticas do que nos fenômenos eletromagnéticos e suas aplicações no cotidiano, ao contrário do que se observa com outros conteúdos da disciplina. Ainda que a abordagem fenomenológica esteja gradativamente mais presente em obras recentes, se faz necessário trazer o conteúdo a um nível menos abstrato para o estudante de forma que ele possa dar sentido ao estudo de eletromagnetismo no ensino médio. Segundo Erthal e Gaspar (2006), são comuns as críticas ao currículo de Física, especialmente no que se refere ao desligamento do conteúdo com a realidade do aluno, que é retratado na “produção de textos e materiais didáticos tão ou ainda mais desligados dessa realidade é o caso do enfoque dado apenas à corrente elétrica contínua e a omissão da apresentação da corrente elétrica alternada, embora esta esteja bastante presente na vida dos alunos(p. 346). Ainda, segundo os autores, parece ser consenso entre professores de Física de que o estudo da corrente alternada está em um patamar além das capacidades dos estudantes do ensino médio. Além disto, afirmam que o pequeno número de trabalhos publicados na área aponta para um desinteresse por parte dos professores pesquisadores sobre o tema.

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CADERNO DE FÍSICA DA UEFS 14 (02): 2302.1-15 2016

2302.1

UM PROGRAMA DE ENSINO DE CORRENTE ALTERNADA

ANCORADO NOS TRÊS MOMENTOS PEDAGÓGICOS

AN EDUCATION PROJECT REGARDING ALTERNATING ELECTRIC CURRENT BASED ON THE THREE

PEDAGOGIC STAGES

Guilherme Dionisio1, Luiz Eduardo S. Spalding2

Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências e Matemática, UPF, Passo Fundo, Brasil

[email protected]; [email protected]

Neste trabalho apresentamos um programa de ensino de corrente elétrica alternada para o ensino médio baseado na

proposta de Delizoicov & Angotti presente no livro Física. Partimos do tema central “Geração, transporte e

distribuição de energia elétrica” e abordamos os fundamentos do eletromagnetismo usando vídeos e simulações

computacionais como instrumentos mediadores. Após apresentar a situação atual do ensino de eletromagnetismo,

descrevemos os três momentos pedagógicos e relatamos a atividade desenvolvida em sala de aula. Por fim,

apresentamos os resultados da pesquisa de aprendizagem constituída pela análise de memórias de aula e de um

questionário.

Palavras-chave: Corrente Alternada, Energia Elétrica, Ensino de Física, Simulação Computacional, Momentos

Pedagógicos

This paper presents a high-school educational project for teaching alternate electric current based on the proposal of

Delizoicov & Angotti as presented in the book Física. We start from the central theme “Generation, transmission and

distribution of electric energy”, approaching the electromagnetism fundamentals using videos and computer

simulations as mediation instruments. After introducing the current situation regarding the teaching of

electromagnetism, we describe the three pedagogic stages and report the activities performed in class. Lastly, we

present the results of the learning research through class memories and a questionnaire.

Keywords: Alternating Electric Current, Electric Energy, Physics Teaching, Computer Simulations, Pedagogic

Stages

1 INTRODUÇÃO

As pesquisas em Ensino de Física têm avançado rapidamente, surgindo muitas propostas e

metodologias que visam uma aprendizagem significativa. Contudo, o ensino de eletricidade e magnetismo

ainda é carente de propostas didáticas em nível médio. A abstração do conteúdo o torna, sem dúvida, uma

dificuldade a ser superada no processo de ensino-aprendizagem. Uma análise em livros de Física de

ensino médio aponta para uma abordagem matemática mais fundamentada em notações e equações

matemáticas do que nos fenômenos eletromagnéticos e suas aplicações no cotidiano, ao contrário do que

se observa com outros conteúdos da disciplina. Ainda que a abordagem fenomenológica esteja

gradativamente mais presente em obras recentes, se faz necessário trazer o conteúdo a um nível menos

abstrato para o estudante de forma que ele possa dar sentido ao estudo de eletromagnetismo no ensino

médio.

Segundo Erthal e Gaspar (2006), são comuns as críticas ao currículo de Física, especialmente no

que se refere ao desligamento do conteúdo com a realidade do aluno, que é retratado na “produção de

textos e materiais didáticos tão ou ainda mais desligados dessa realidade – é o caso do enfoque dado

apenas à corrente elétrica contínua e a omissão da apresentação da corrente elétrica alternada, embora

esta esteja bastante presente na vida dos alunos” (p. 346). Ainda, segundo os autores, parece ser

consenso entre professores de Física de que o estudo da corrente alternada está em um patamar além das

capacidades dos estudantes do ensino médio. Além disto, afirmam que o pequeno número de trabalhos

publicados na área aponta para um desinteresse por parte dos professores pesquisadores sobre o tema.

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Portanto, neste trabalho propomos a contextualização do processo de geração e distribuição de

energia elétrica, aliado ao uso de simuladores virtuais no ensino de conceitos elementares do

eletromagnetismo. Temos como foco o estudo da corrente alternada, objetivando avaliar a acomodação

dos objetos digitais de aprendizagem dentro dos padrões de ensino atuais. A metodologia utilizada está

fundamenta pela teoria sócio-interacionista de Vygotsky, na qual as interações sociais conduzem ao

processo de ensino-aprendizagem, e, neste caso, os vídeos e experimentos virtuais são os instrumentos de

mediação aluno-professor.

As atividades foram organizadas tomando dois referencias. O primeiro é a proposta de Delizoicov

& Angotti apresentada no livro Física (1990), na qual sugerem abordar os estudos de eletricidade e

magnetismo partindo de um tema central: produção, distribuição e consumo de energia elétrica. Nesta

mesma obra, os autores propõem uma dinâmica de aula distribuída em três momentos pedagógicos assim

chamados por eles. O segundo é a proposta de Erthal & Gaspar (2006) na qual utiliza um conjunto de

quatro experimentos como elemento motivador às discussões com quais os conceitos de

eletromagnetismo são introduzidos. Entretanto, na abordagem do presente trabalho os experimentos

físicos foram substituídos por experimentos virtuais, através de simuladores PhET gratuitos e disponíveis

na internet (https://phet.colorado.edu/pt_BR/).

Nas seções seguintes apresentaremos um panorama da situação atual do ensino de eletricidade e

magnetismo, descreveremos os três momentos pedagógicos e a proposta de atividade didática e

apresentaremos os resultados obtidos em relação à aprendizagem dos conceitos que nos propusemos

ensinar. Esta análise foi realizada partindo das intervenções orais dos estudantes durante a atividade, do

diário de bordo do professor (ZABALZA, 2004) e pela análise de dois instrumentos pós-atividade: uma

memória de aula redigida por cada aluno e um questionário formado por questões objetivas e

dissertativas.

2 OS RECURSOS DIGITAIS COMO FERRAMENTAS DE ENSINO

Em um estudo feito com 300 alunos de universidades públicas brasileiras, Costa (apud ABEGG,

2013, p. 33) afirma que “uma pequena parte (15%) adquiriu conhecimento conceitual suficiente para

poderem analisar circuitos sem fazer cálculos”. Pacca et al (2003, p. 152) relatam que os professores

consideram o conteúdo de eletricidade mais difícil, mas, como é preciso ensiná-lo, optam por resolver

problemas relacionados aos circuitos elétricos e à eletrostática sem aprofundamento que propicie uma

discussão conceitual dos fenômenos. No mesmo texto, afirmam que muitos termos da eletricidade fazem

parte do vocabulário cotidiano dos alunos, contudo, fazem uso incorreto deles e relações distorcidas com

a realidade. No estudo, a autora e colaboradores partem das concepções prévias dos alunos sobre energia

e corrente elétrica, fomentando discussões para quebrar as barreiras conceituais do senso comum de modo

a construir um modelo científico dentro de uma aprendizagem significativa.

A mesma análise feita por Pacca et al (2003) aplica-se aos fenômenos do eletromagnetismo, visto

que ambos estão intrinsicamente correlacionados. Com o mesmo objetivo, Erthal e Gaspar (2006),

buscaram uma alternativa metodológica para o ensino de eletromagnetismo com foco em atividades

experimentais tradicionais selecionadas a partir do resultado de um pré-teste para o levantamento dos

conhecimentos prévios e dificuldades dos alunos.

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Paralelamente, o uso de recursos computacionais como auxiliares ao ensino tem sido objeto de

extensivos estudos. A introdução de tecnologias digitais, tais como vídeos ilustrativos, animações,

simuladores e softwares especializados na sala de aula, permitem aos alunos, segundo Abegg e Ramos

(2013, p. 33), “uma absorção mais adequada dos pré-requisitos técnico-teóricos necessários para o

desenvolvimento de seu aprendizado”. O computador passa a ser extensão das capacidades cognitivas

humanas, e as novas tecnologias, a operar como uma extensão dos sentidos do homem (PRETTO apud

ABEGG, 2013, p. 34).

Arante, Miranda & Studart (2010) fazem um estudo acerca do uso de objetos de aprendizagem, em

especial as simulações computacionais do grupo do PhET, e apresentam uma proposta de ensino de

corrente elétrica em nível médio. Para estes autores, as simulações são ferramentas que ajudam o

professor a introduzir um novo tópico, construir conceitos ou competências, reforçar ideias ou fornecer

reflexão e revisão final, podendo ser usadas em aulas expositivas, atividades em grupo, em lições de casa,

ou laboratório.

Abegg e Ramos (2013) trazem um estudo sobre o ensino de corrente alternada com uso de três

ferramentas digitais: vídeo introdutório sobre corrente alternada, aplicativo JAVA simulador de um

gerador de corrente alternada e um programa de simulação de circuitos. Dentre os objetivos do trabalho,

destaca-se o de observar o processo de adaptação do professor e dos estudantes às novas ferramentas. O

processo de adaptação acena não apenas ao uso corriqueiro dos recursos digitais. Vai além, exigindo uma

readequação do tempo e espaço (KENSKI, 1998 apud ABEGG, 2013, p. 34), compreensão do docente de

como empregar estes recursos para a prática de ensino (GUERRERO, 2010 idem) e modificações nos

padrões comportamentais (ALVES, 2003 ibid, p. 35) no ambiente de ensino.

3 MOMENTOS PEDAGÓGICOS

Na concepção de uma prática construtivista estruturamos a atividade em três momentos

pedagógicos, assim propostos por Delizoicov & Angotti (1990):

- Primeiro momento: problematização inicial. O conteúdo é apresentado aos alunos que são

instigadas à discussão, partindo de questões ou situações problema trazidas pelo professor. Este momento

tem função maior do que apenas a motivação pelo estudo, mas caracteriza-se por aproximar o conteúdo às

situações reais vivenciadas pelo aluno. O professor assume uma postura mais voltada a “questionar e

lançar dúvidas sobre o assunto que para responder e fornecer explicações” (DELIZOICOV apud

MUENCHEN & DELIZOICOV, 2014, p. 623). A problematização pode ocorrer em dois sentidos:

De um lado, estão as concepções alternativas dos alunos, aquilo de que o aluno já tem

noções, fruto de aprendizagens anteriores. De outro, um problema a ser resolvido,

quando o aluno deve sentir a necessidade de conhecimentos que ainda não possui

(MUENCHEN & DELIZOICOV, 2014, p. 623).

- Segundo momento: organização do conhecimento. Neste momento desenvolve-se o conteúdo

necessário para responder aos questionamentos e dúvidas do momento anterior de forma a se chegar à

compreensão do tema e da problematização inicial (ibid, p. 624). Para este fim, o professor pode utilizar

de diferentes estratégias e atividades como textos, vídeos, experimentos, simulações, trabalhos

extraclasse, formulação de questões, entre outras.

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- Terceiro momento: aplicação do conhecimento. É a etapa em que o aluno sistematiza e utiliza

o conhecimento adquirido para explicar/compreender tanto o problema inicial quanto outros não

abordados até então, mas relacionados ao mesmo conhecimento.

4 DESCRIÇÃO DO PROGRAMA DE ENSINO

As atividades foram desenvolvidas em duas aulas de noventa minutos cada com alunos do terceiro

ano do ensino médio, assim distribuídas:

4.1 Primeiro momento: apresentação da problemática e contextualização

Assim como proposto no livro Física (DELIZOICOV & ANGOTTI, 1990), a atividade teve início

partindo do tema central “produção e distribuição de energia”. Na ocasião, abordamos a matriz energética

do Brasil no ano atual, fazendo um levantamento das fontes de energia utilizadas, custos e capacidades de

produção. A Figura 1 foi projetada aos alunos e serviu como base de discussão e levantamento de

hipóteses em relação à produção de energia elétrica e ao uso de fontes de energia renovável.

Figura 1: À esquerda, a matriz energética brasileira para produção de energia elétrica. Fonte:

http://www.climatempo.com.br/noticias/289370/chuvaaguaenergia. À direita, o sistema de bandeiras tarifárias adotadas em

2015. Fonte: http://noticias.reclameaqui.com.br/noticias/energia-eletrica-bandeira-vermelha-continua-no-mes-de-

junho_1532.

Para promover a discussão, usamos como recurso dois vídeos: um sobre a produção de energia

hidrelétrica e o funcionamento da usina e outro sobre a substituição de energias não renováveis pela

energia solar fotovoltaica. Os vídeos foram escolhidos propositalmente de forma a contrapor opiniões e

assim estimular a participação. O primeiro trata-se de um vídeo de apoio ao uso e construção de

hidrelétricas, enquanto que o segundo, de apoio ao uso de energia solar como substituta de outras fontes

não renováveis.

Posteriormente, abordamos as questões do transporte e distribuição de energia elétrica (Figura 2).

Estas etapas fundamentam-se nos princípios do eletromagnetismo os quais nos propusemos ensinar:

corrente elétrica contínua (CC ou DC1) e alternada (CA ou AC), campo magnético gerado por corrente

elétrica e indução eletromagnética. Além destes tópicos, também levantamos o questionamento quanto ao

tipo de corrente elétrica (AC ou DC) usado nos sistemas de distribuição de energia. Como objeto

norteador desta investigação fizemos uso de um fragmento do documentário ‘Nikola Tesla, o gênio da

1 DC é a abreviatura de Direct Current, que significa corrente contínua na língua inglesa. Da mesma forma, AC significa

Alternating Current.

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eletricidade’. Neste vídeo é mostrada a diferença entre os dois tipos de corrente elétrica, assim como a

escolha, do ponto de vista funcional, pelo sistema de corrente alternada de Nikola Tesla em vez do

sistema de corrente contínua de Thomas Edson no final do século XIX.

Figura 2: Ilustração mostrando o caminho percorrido pela energia elétrica desde a sua geração até o seu uso. A

ilustração é utilizada para apresentar os transformadores de tensão e justificar o uso da corrente alternada nos sistemas de

distribuição. Fonte:

http://www.copel.com/hpcopel/root/pagcopel2.nsf/arquivos/energia_eletrica_sem_riscos_01/$FILE/01_caminho_energia.gif.

4.2 Segundo momento: uso dos simuladores PhET para o estudo dos conceitos do

eletromagnetismo

O PhET é um programa de pesquisa da Universidade do Colorado que desenvolve simulações

interativas voltadas ao ensino de ciências. O desenvolvimento de cada simulador passa por exaustivos

testes, segundo o grupo, que incluem entrevistas com estudantes e observação do uso em sala de aula. Os

simuladores podem ser usados online, embutidos em sites ou blogs, ou ainda baixados no computador

para uso quando não for possível ter acesso à internet.

Para o estudo dos conceitos de eletromagnetismo necessários em nosso programa de ensino,

utilizamos o simulador PhET “Laboratório de Eletromagnetismo de Faraday”. Este pacote reúne cinco

simuladores brevemente descritos a seguir:

1. Ímã em barra: mostra o campo magnético gerado por um ímã em barra. Uma bússola pode ser

deslocada em torno do ímã para verificação da direção e sentido do campo em cada ponto.

2. Solenoide: um ímã pode ser deslocado próximo a um solenoide ligado a uma lâmpada

mostrando a indução eletromagnética. Permite visualizar uma representação do movimento dos elétrons

livres no interior do condutor.

3. Eletroímã: consiste de um solenoide ligado a uma fonte de tensão variável para o estudo do

campo magnético produzido por corrente elétrica AC ou DC.

4. Transformador: formado por dois solenoides, um ligado a uma fonte de tensão e outro a uma

lâmpada. Pode-se deslocar cada sistema em relação ao outro para indução de corrente elétrica.

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5. Gerador: sistema formado por um solenoide ligado a uma lâmpada, um ímã preso a uma roda

d’água e uma torneira com controle de vazão. O fluxo d’água faz girar a roda (e o ímã) induzindo

corrente elétrica no solenoide.

Usamos os simuladores como auxílio à apresentação de conceitos e leis, tendo como premissa a

observação do fenômeno anterior à explicação destes. A cada fenômeno simulado antecedeu indagações

aos alunos coletando deles informações, suas ideias e concepções prévias. Também, foram sendo

anotadas no quadro palavras-chave que o professor pensou ser importante para auxiliar aos alunos na

atividade referente ao terceiro momento pedagógico descrito na seção seguinte deste trabalho.

O simulador “Ímã em barra” foi utilizado como elemento de revisão de magnetismo e campo

magnético. Com o simulador “Solenoide” demonstramos o fenômeno de indução eletromagnética. O

simulador traz a opção de representar o movimento de elétrons livres no condutor. Com isso,

demonstramos que tanto o surgimento como o sentido da corrente induzida têm dependência com a

variação do fluxo magnético sobre o solenoide, conforme a Lei de Faraday-Lenz. Com este simulador

também demonstramos a origem da corrente alternada em geradores de energia. Por fim, explicamos o

funcionamento de um gerador eletromagnético como aplicação do princípio da indução eletromagnética,

com o simulador “Gerador”.

Posteriormente, reproduzimos o experimento de Öersted com o simulador “Eletroímã”,

apresentando aos alunos a Lei de Ampère. Este simulador permite alterar o valor da tensão aplicada pela

fonte, mudar sua polaridade ou trocá-la por uma fonte de tensão alternada. Assim reforçamos a diferença

entre as correntes AC e DC.

Abordamos, também, o princípio de funcionamento dos transformadores de tensão, equipamento

presente nas redes de transmissão de energia elétrica apresentados no primeiro momento da atividade.

4.3 Terceiro Momento: compreendendo o sistema geração, transmissão e distribuição de

energia elétrica.

O terceiro momento deu-se, em parte, sobreposto ao segundo em que ocorreu a organização dos

conhecimentos. À medida que os simuladores eram manipulados pelo professor, os alunos partindo da

observação, começaram a associá-la com os temas discutidos no primeiro momento. Com base nas falas

dos alunos, podemos salientar alguns aspectos transcritos do diário de bordo do professor que conduziu a

atividade.

O funcionamento de um gerador de energia veio à tona, uma vez visualizado na

simulação de indução eletromagnética [...] Alguns alunos associaram o uso da

corrente alternada na transmissão por longas distâncias às observações feitas com os

simuladores, mas a maioria deles se lembrou do vídeo sobre Tesla em que o

apresentador fala do enorme diâmetro que o cabo de transmissão deveria ter se usada

corrente contínua, mesmo para o transporte por pequenas distâncias [...] Perceberam a

importância da presença de transformadores de tensão em alguns pontos da linha de

transmissão [...] perguntaram se alguns dispositivos do cotidiano, como fontes e

carregadores de celular tinham a mesma função dos transformadores. Então, tive a

oportunidade de discutir o uso dos dois tipos de corrente e os conversores A/D.

Como atividade extraclasse foi solicitada aos alunos que redigissem uma memória de aula. Nela

eles deveriam desenvolver um texto curto podendo usar como referência as palavras-chave escolhidas

pelo professor durante o uso dos simuladores, tendo esse texto o objetivo de explicar o sistema de

geração, transmissão e distribuição de energia elétrica. Na prática relatada, as palavras-chave foram:

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tensão, corrente alternada, corrente contínua, indução eletromagnética, campo magnético, transformador e

fonte. A principal função da produção deste texto foi a de verificar se os alunos adquiriram algum

conhecimento sobre os fenômenos eletromagnéticos, se foram capazes de correlacioná-los e de aplicá-los

à problematização inicial. A prática da escrita se mostra uma estratégia cognitiva de aprendizagem

(TEIXEIRA & ALLIPRANDINI, 2013). Acreditamos desta forma, que o fato do aluno ser capaz de

reunir e organizar informações e colocá-las no papel com vocabulário próprio é um sinal de apropriação

do conhecimento.

Além da produção deste texto, os alunos responderam a um questionário formado por algumas das

questões (adaptadas) propostas por Erthal e Gaspar (2006), com o objetivo de verificar a aquisição de

conhecimento teórico e aplicado sobre corrente elétrica.

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

O programa de ensino proposto foi aplicado a três turmas do terceiro ano do ensino médio diurno

de uma escola da rede pública estadual do Rio Grande do Sul no ano de 2015, totalizando 96 alunos. As

memórias de aula foram elaboradas como tarefa de casa e entregues ao professor na aula da semana

seguinte à atividade com os simuladores. Junto com a entrega deste texto os alunos foram submetidos a

um teste em forma de questionário (Anexo 2). A avaliação das duas tarefas está descrita e seus resultados

analisados nesta seção.

5.1 Memórias de aula

A partir da leitura dos textos produzidos pelos alunos fizemos a análise qualitativa de conteúdo de

modo a averiguar sinais de aprendizagem dos tópicos abordados. Para isso, criamos três categorias

(PÊCHEUX apud CAREGNATO & MUTTI, 2006):

a) Produção: textos cujo conteúdo foi elaborado com vocabulário próprio do aluno e

fazendo uso correto de termos e conceitos do eletromagnetismo;

b) Apontamentos: textos sem estrutura organizada, elaborados a partir de apontamentos

feitos em aula ou com reprodução de falas do professor;

c) Reprodução: textos cujo conteúdo é reprodução de fragmentos de livros ou páginas da

internet.

Dos 96 alunos participantes, 87 entregaram o trabalho, estando assim classificados conforme os

critérios estabelecidos: produção – 27 trabalhos; apontamentos – 24 trabalhos; reprodução – 36 trabalhos.

Com a análise dos textos produzidos pelos alunos pôde-se perceber uma familiarização deles com

termos e expressões do eletromagnetismo. Atribuímos este fato, principalmente, às discussões e trocas de

ideias entre professor e alunos durante os experimentos virtuais, momento chave aonde se manifestaram

os princípios construtivistas da proposta. Todavia, o número de alunos que demonstraram se apoderar

desse conhecimento foi comparável ao número de alunos que efetivamente participaram oralmente das

discussões. No diário de bordo, o professor relata, para uma das turmas (34 alunos), que:

Não mais do que quinze alunos interviram oralmente na atividade [...]. Alguns alunos

apenas responderam as minhas perguntas sobre o que observavam nas simulações. Em

menor número, outros fizeram relações do que estavam vendo com o problema de

geração de energia da aula anterior ou com situações do dia a dia, por exemplo, a

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comparação entre o carregador de celular com o transformador de tensão. Mas, apesar

da participação ter sido menor do que eu esperava, a turma manteve atenção às

explicações.

Apesar de não ter sido possível identificar todos os alunos participantes ativamente a fim de

comparar com seus respectivos textos, este estudo aponta no sentido de que o aproveitamento da

atividade se dá no grau em que o aluno participa dela, estando de acordo com as teorias construtivistas de

aprendizagem.

No Anexo 1, estão transcritos fragmentos de textos de alguns alunos que demonstraram adquirir

conhecimento suficiente para expressar-se com clareza sobre o conteúdo.

5.2 Questionário

Na medida em que nem todos os alunos têm facilidade de expor por escrito suas ideias, de acordo

com o professor regente das turmas, aplicou-se um questionário com cinco questões objetivas seguido de

três questões dissertativas. Com mais este instrumento, pretendeu-se avaliar com maior propriedade a

aprendizagem dos alunos.

Mostramos o resultado do questionário na Tabela 1 e, em seguida, destacamos algumas questões

para análise. A estas questões estão vinculadas a existência de dois tipos de corrente elétrica (contínua e

alternada) ao funcionamento de aparelhos elétricos e eletrônicos de uso comum e às fontes e geração de

energia.

Tabela 1: Percentual de acertos por questão de um total de 96 alunos.

Questão 1 2 3A 3B 3C 4A 4B 4C 5

Acertos 35% 66% 68% 41% 39% 73% 75% 76% 65%

Pode-se salientar um baixo desempenho nas questões 1, 3B e 3C. Em relação à questão 1, houve

uma divisão entre as alternativas B e C. A redação da alternativa B leva a entender a existência da

corrente contínua e alternada. Apesar de estar errada, alguns alunos a consideraram correta, segundo

relato dos mesmos, por uma confusão entre os conceitos de direção e sentido. As outras duas questões

referem-se a dispositivos (lâmpadas e motores) que podem funcionar com os dois tipos de corrente.

Posteriormente, na correção do teste, alguns alunos expuseram uma forte associação do funcionamento da

lâmpada ao simulador Solenoide. Nele, a lâmpada liga com o movimento de um ímã, assim associando o

funcionamento dela à corrente alternada. Já o motor foi associado ao gerador de energia e reproduziram

uma fala do professor, de que ambos se tratam do mesmo dispositivo, porém com função invertida.

Embora descontextualizada na resposta dos alunos, esta fala se mostrou marcante na apresentação do

conteúdo. Contudo, é sabido que tanto a lâmpada incandescente quanto o motor elétrico podem funcionar

com os dois tipos de corrente; e esta lacuna deixada na apresentação do conteúdo pode tê-los levados ao

erro.

Esses dois casos levam a uma reflexão quanto ao uso dos simuladores (mas não somente) em

virtude de que os alunos podem dar mais atenção a alguns detalhes que não são o foco da aula, seja ela

expositiva ou experimental, com ou sem uso de recursos digitais. Além disso, é preciso ter um cuidado

especial no uso de simuladores, pois eles não reproduzem a realidade tal qual ela é, e, se isto não for bem

esclarecido aos alunos, podem levá-los a ideias erradas do fenômeno.

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Ainda, na Tabela 1 é apresentado para a questão 5 um percentual de acerto de 65%, sendo que

10% destes alunos marcaram a alternativa A, e o restante, a alternativa B. Esperava-se que os alunos

assinalassem a alternativa B como correta, porém, durante a correção da atividade, verificou-se que a

alternativa A também poderia ser considerada correta.

Para as questões dissertativas (6, 7 e 8) fizemos a correção considerando resposta correta,

parcialmente correta e incorreta.

Tabela 2: Índice de acertos das questões dissertativas.

Questão 6 7 8

Corretas 35% 38% 54%

Parcialmente corretas 33% 24% -

Incorretas 32% 38% 46%

Na questão 6, as respostas assinaladas como corretas foram aquelas em que o aluno apresentou

conhecimento do fenômeno envolvido relacionando-o com a situação descrita e atribuindo a ela um

significado físico, sabendo explicá-lo de acordo com conceitos ou leis físicas. Um exemplo de uma

resposta considerada correta é: “... o movimento de aproximação ou afastamento de um ímã perto de um

fio gera movimento dos elétrons”. Foram consideradas parcialmente corretas aquelas respostas que

fizeram menção a conceitos ou leis físicas, contudo não os usando diretamente na explicação do

fenômeno, como na resposta dada por um aluno à mesma questão: “Sim, pela energia mecânica que pode

ser convertida em eletricidade”. Apesar de a resposta estar correta, o aluno não menciona a indução

eletromagnética, objetivo primeiro da questão no contexto deste programa.

Pôde-se intuir pela leitura das respostas (Anexo 3) que a maioria dos alunos relacionou a

transformação de energia mecânica em elétrica pelo movimento das águas, vento ou vapor em diferentes

tipos de usinas geradoras, sendo que cerca de um terço deles fez relação ao processo de indução

eletromagnética.

A questão 7 refere-se à existência e diferença entre as correntes contínua e alternada. As respostas

consideradas parcialmente corretas foram aquelas em que o aluno soube diferenciar os tipos de correntes,

porém afirmou erroneamente que é a corrente contínua que chega até as tomadas das casas. Identificamos,

nesta questão, três padrões de respostas usadas pelos alunos para distinguir os tipos de corrente elétrica.

Os três padrões estão presentes no vídeo 3, mas o padrão de resposta presente em (i) foi reforçado pelo

uso dos simuladores, sendo o mais frequente.

i. Mencionaram o sentido do movimento das cargas: “[...] a corrente contínua tem um movimento

constante, enquanto a alternada tem um movimento que oscila um vai-e-vem nas suas cargas”.

ii. Fizeram referência à dificuldade de usar corrente contínua para transmissão a longas distâncias:

“[...] a continua deveria ter um repetidor ou uma central a cada 2 km para repor a energia elétrica”.

iii. Relacionaram a corrente alternada à mudança da polaridade da fonte com o tempo: “Corrente

alternada: são alimentadas por fontes geradoras, alternam de forma constante sua polaridade. Contínua:

são alimentados por pilhas, baterias, a polaridade em seus terminais é fixa”.

A questão 8 teve como objetivo identificar se os alunos compreenderam que ambos tipos de

corrente elétrica são usados, assim como existem dispositivos que fazem a conversão de um tipo em

outro. Nesta questão não se considerou resposta parcialmente correta. O percentual de respostas incorretas

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apresentado na Tabela 2 inclui as respostas deixadas em branco ou sem justificativa. Já as respostas

corretas dividiram-se em eleger a corrente alternada como a mais utilizada, associando-as ao transporte de

energia a longas distâncias ou por ela estar presente nas tomadas de casa; e atribuir a ambas o uso mais

comum, justificando que alguns aparelhos podem utilizar corrente contínua, enquanto que outros,

alternada.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho foi apresentado um programa de ensino de corrente alternada. Foi assim chamado

pelos autores – e não uma metodologia de ensino – por considerarmos que as ferramentas utilizadas no

seu desenvolvimento não são únicas nem insubstituíveis. O programa sugere partir de um tema central

mais abrangente ao conteúdo, trilhar um caminho guiado por três momentos pedagógicos, e usar de

instrumentos diversos como mediadores da aprendizagem. Nestes moldes, este programa pode servir de

base para o ensino de outros conteúdos.

Na experiência descrita usamos um conjunto de objetos de aprendizagem compreendidos por

dados e informações públicas, vídeos (documentário, informativo, institucional) e simulações

computacionais. Entretanto, cada professor pode adaptá-los à realidade de sua escola e à de seus alunos,

assim como ao conteúdo que pretende ensinar.

Numa avaliação mais ampla podemos considerar que obtivemos bons resultados com a atividade

desenvolvida. Não só por haver participação e envolvimento expressivos dos alunos, mas também pelos

resultados das avaliações das memórias de aula e do questionário. Assim, pensamos ter atingido nossos

objetivos, visto que a maioria dos alunos demonstrou compreender a situação-problema apresentada,

sendo que uma parte deles conseguiu explicá-la fazendo uso de termos, conceitos e leis físicas.

Em relação ao uso de simulações computacionais, elas se demonstraram bons instrumentos de

auxílio à aprendizagem, salvo alguns cuidados inerentes ao seu uso como nas situações relatadas. Os

experimentos virtuais representam modelos teóricos e não são fidedignos à realidade (MACEDO et al,

2012, p.573). Isto deve ser deixado claro aos alunos, caso contrário, podem levar a ideias e associações

erradas como as observadas nesta pesquisa. Erthal & Gaspar (2006, p. 355) ainda alertam:

Ao contrário do que muitos professores ingenuamente pensam, a visualização dos

fenômenos apresentados não faz os alunos compreenderem ou descobrirem o que os

provoca, mas os predispõe - as vezes até os desafia - a entender o que acontece.

Todavia, os experimentos virtuais, contribuem para o desenvolvimento da prática pela busca do

saber, facilita a compreensão do conteúdo estudado e favorece sua interiorização.

Outro ponto importante evidenciado nesta pesquisa se refere aos pré-requisitos para o estudo de

um conteúdo, no caso, o eletromagnetismo. Uma simples confusão entre as definições de direção e

sentido vetorial induziu alguns alunos ao erro. O erro, neste caso, teve origem na deficiência de

vocabulário científico e não na falta de compreensão do fenômeno. Desta forma, o professor precisa estar

atento às deficiências de conteúdo dos alunos para que, sempre que possível, possa saná-las, a fim de não

se tornarem obstáculos para a aprendizagem.

Evidenciou-se, ainda, nas falas dos estudantes, uma forte confusão entre os termos energia, tensão

e corrente elétrica. Apesar da diferenciação feita pelo professor durante toda a atividade, parte dos alunos

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continuou a usá-los de forma errada, na maioria das vezes, usando-os como sinônimos. Assim, verificada

esta lacuna, também observada por Pacca et al (2003), sugerimos para futuros trabalhos abordar esta

questão.

Isto posto, ponderamos que a releitura da pesquisa de Erthal & Gaspar agregando novas mídias

vinculada a metodologia de Delizoicov & Angotti trazida neste trabalho pode contribuir para o ensino de

Física, em especial de conteúdos tradicionalmente pouco desenvolvidos no ensino médio.

REFERÊNCIAS

ABEGG, Ilse; RAMOS, Diego B. Investigação de ferramentas e métodos de ensino de circuitos de

corrente alternada para Curso Introdutório de Eletrotécnica. Revista Dynamis. FURB, Blumenau,

v. 19, n. 1, p. 30-42, 2013.

ARANTES, A. R.; MIRANDA, M. S.; STUDART, N. Objetos de aprendizagem no ensino de física:

usando simulações do PhET. Física na Escola, v. 11, n. 1, p. 27-31, 2010.

CAREGNATO, R. C. A.; MUTTI, R. Pesquisa qualitativa: análise de discurso versus análise de

conteúdo. Texto e Contexto Enferm., Florianópolis, v. 15, n. 4, p. 679-684, dez. 2006.

DELIZOICOV; D.; ANGOTTI, J. A. P. Física. São Paulo: Cortez, 1990.

ERTHAL, J. P. C.; GASPAR, A. Atividades experimentais de demonstração para o ensino de corrente

alternada ao nível do ensino médio. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Florianópolis, v.

23, n. 3, p. 345-359, dez. 2006.

MACEDO, J. A.; DICKMAN, A. G.; ANDRADE, I. S. F. Simulações computacionais como ferramentas

para o ensino de conceitos básicos de eletricidade. Caderno Brasileiro de Ensino de Física,

Florianópolis, v. 29, n. especial 1, p. 562-613, set. 2012.

MUENCHEN, C.; DELIZOICOV, D. Os três momentos pedagógicos e o contexto de produção do livro

"Física". Ciência e Educação, Bauru, v. 20, n. 3, p. 617-638, set. 2014.

PACCA, J. L. A. et al. Corrente elétrica e circuito elétrico: algumas concepções do senso

comum. Caderno Brasileiro de Ensino de Física, Florianópolis, v. 20, n. 2, p. 151-167, ago.

2003.

TEIXEIRA, A. R.; ALLIPRANDINI, P. M. Z. Intervenção no uso de estratégias de aprendizagem diante

de dificuldades de aprendizagem. Psicologia Escolar e Educacional, Maringá, v. 17, n. 2, p. 279-

288, dez. 2013.

Simuladores PhET: site da Universidade do Colorado que disponibiliza simuladores. Disponível em:

<https://phet.colorado.edu/pt_BR/>. Acessado em: 20/12/2015.

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Video 1: Como funciona a Energia Solar Fotovoltaica. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=6ODHCBO2Xwk&index=6&list=PLADEA8lzWEJOUyopc

BZ-HwgO8vbf9gAKo>. Acessado em: 20/12/2015.

Video 2: Hidrelétrica principal fonte de energia do Brasil. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=9lX-

71NXnwA&index=5&list=PLADEA8lzWEJOUyopcBZ-HwgO8vbf9gAKo>. Acessado em:

20/12/2015.

Video 3: Nikola Testa, o gênio da eletricidade. Disponível em:

<https://www.youtube.com/watch?v=RNacGtEi_NY&index=8&list=PLADEA8lzWEJOUyopcBZ

-HwgO8vbf9gAKo>. Acessado em: 20/12/2015.

ZABALZA, M. Diários de Aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional. Porto

Alegre: ArtMed, 2004. 160 p.

ANEXO 1 – MEMÓRIAS DE AULA

Fragmentos dos textos “Memória de Aula” produzidos pelos alunos:

Aluno 3: “Todas as usinas utilizam alguma fonte de energia cinética para rotacionar uma turbina

com propriedade magnética que perto de um ímã produzem corrente elétrica alternada [...] As espiras são

utilizadas para amplificar (transformador) ou reduzir a energia.”

Aluno 15: “Ampère dizia que a corrente elétrica produz campo magnético, o primeiro a verificar

isso foi Öersted que ligou um circuito elétrico em sua mesa de trabalho e percebeu variação na orientação

da bússola que ele possuía sobre a mesma. Faraday afirmava o inverso de Ampère, isto é, que a variação

do fluxo magnético produz corrente elétrica.”

Aluno 16: “[...] Em relação a corrente, ela pode ser contínua, quando possui só um sentido (e não

pode ser usada em grandes distâncias) ou alternada, quando os sentidos oscilam. [...] É possível

transformar a tensão gerada em usinas elétricas, por exemplo. Para isso utilizam-se espiras (que são voltas

no fio) e solenoides (conjunto de espiras), que podem diminuir ou aumentar a tensão, dependendo da

quantidade de voltas.”

Aluno 30: “[...] Faraday – variação do fluxo magnético produz corrente elétrica. Corrente induzida,

quando altera a intensidade do campo, se aproximando, aumentando os elétrons. Não basta ter campo

magnético, tem que criar um aproximando e afastando. [...] ou pela corrente alternada posso produzir

também mais energia – transformador de tensão, se tenho 10V no primário e 1 espira, e no 2º, 3 espira

vou ter 30V.”

Aluno 41: “[...] ele também percebeu que como o campo magnético é maior quando se está perto

de quem produz, é possível manter ligado apenas mudando a distância. [...] Não basta ter campo

magnético p/ produzir corrente, é preciso ter variação de campo. Isso é o que fazem os geradores

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(hidrelétrica, termoelétrica, termonuclear, etc). [...]. É possível produzir uma pequena quantidade de

energia e ampliar pelo número de espiras.”

Aluno 47: “Corrente contínua (DC) permanece igual, uma corrente é considerada contínua quando

não altera seu sentido, ou seja, é sempre positiva ou negativa. A corrente alternada é caracterizada por um

fluxo alternado no sentido dos elétrons. Neste contexto eles estão mudando de direção a todo momento,

estima-se que 120 vezes por segundo, assim ela pode percorrer uma maior distância.”

Aluno 65: “Para geração de energia elétrica ocorre movimento alternado. O resistor é um ímã

gigante e faz com que os solenois (conjunto de espiras) girem, movimentando os elétrons, produzindo

corrente elétrica dentro do fio e gerando eletricidade.”

Aluno 86: sobre Ampère “o mesmo fala que o sentido de uma corrente elétrica altera os polos

magnéticos. Corrente contínua → 1 só sentido. Corrente alternada → sentidos oscilam. [...]

Transformador de tensão: quando uma espira produz 10V e se põe mais espiras para aumentar a

voltagem, como por exemplo 3 espiras produziram 30V.”

ANEXO 2 – QUESTIONÁRIO

1. O movimento dos elétrons dentro de um fio condutor percorrido por corrente elétrica é, em

média:

a) sempre na mesma direção e sentido.

b) sempre na mesma direção, mas num movimento de vai e vem.

c) na mesma direção e sentido ou em vai e vem.

2. Os aparelhos eletroeletrônicos de sua casa funcionam ligados à tomada que fornece uma:

a) tensão elétrica contínua.

b) tensão elétrica alternada.

c) tensão mista, contínua-alternada.

3. Preencha os parênteses abaixo com a expressão correspondente aos números: 1, corrente

contínua; 2, corrente alternada; 3, corrente contínua ou alternada.

a) Uma pilha fornece ( ) aos aparelhos eletrônicos.

b) A bateria de um carro fornece ( ) para o motor funcionar.

c) Uma lâmpada incandescente, no teto da sua casa funciona com ( ).

4. Assinale verdadeiro ou falso nas seguintes afirmativas:

( ) A tensão elétrica gerada por uma pilha é do mesmo tipo (contínua ou alternada) da tensão

elétrica gerada por uma bateria de carro.

( ) A tensão elétrica gerada por uma bateria de carro é do mesmo tipo da tensão elétrica que

chega às tomadas das casas.

( ) A tensão elétrica gerada por uma pilha é do mesmo tipo da tensão elétrica que chega às

tomadas das casas.

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5. As fontes ligadas às tomadas das casas utilizadas para recarregar telefones celulares e em alguns

outros eletroeletrônicos têm como função

a) gerar a corrente elétrica que os faz funcionar.

b) transformar a tensão elétrica alternada em contínua.

c) transformar a tensão elétrica contínua em alternada.

d) aumentar a potência desses aparelhos.

6. Pode-se gerar eletricidade por meio do movimento? Justifique.

7. Qual tipo de tensão elétrica chega através das tomadas de sua casa, a tensão alternada ou a

tensão contínua? Cite alguma diferença entre elas.

8. Qual tipo de tensão elétrica (contínua ou alternada) é mais utilizada no dia a dia? Por quê?

ANEXO 3

Algumas respostas à questão 6:

“Sim, porque a corrente elétrica é estabelecida em um circuito fechado quando um ímã permanente

estabelece corrente elétrica.”

“[...] o movimento aproximação ou afastamento de um ímã perto de um fio gera movimento dos

elétrons.”

“Sim, pois o movimento dos elétrons geram energia.”

“Sim, pois a eletricidade (energia) é gerada através do movimento dos elétrons.”

“Sim, pela energia mecânica que pode ser convertida em eletricidade.”

“[...] a queda das águas faz com que se gire uma turbina que transforma energia mecânica em

elétrica, [...]”

“Sim, como a energia hidrelétrica necessita do movimento das águas e a eólica, com o movimento

dos ventos.”

“Sim, nas hidrelétricas por exemplo gera-se energia com o movimento gera uma força, cujo ativa

turbinas gerando eletricidade.”

Algumas respostas à questão 7:

“[...] a diferença é que na corrente contínua o movimento permanece igual a seu sentido, tem

sempre negativo ou positivo, na alternada os elétrons sempre estão mudando o seu sentido.”

“[...] uma varia e outra não.”

“A contínua é uma corrente elétrica que necessita de grande manutenção de rede se caso for

implantada em alguma cidade em comparação a alternada que percorre distâncias maiores de uma forma

mais fácil, isso se deve ao movimento de vai e vem dos elétrons.”

“Na corrente alternada os polos mudam de positivo pra negativa, na contínua não.”

Algumas respostas à questão 8:

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“Alternada porque percorre distâncias maiores.”

“Alternada, pois é mais fácil percorrendo distâncias maiores.”

“[...] as duas são utilizadas pois depende do que cada aparelho da casa vai precisar.”

“As duas [...] uma nas tomadas e outra nos aparelhos.”