Uma análise da evolução do spread bancário no Brasil após a implantação do Plano Real

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO SCIO-ECONMICO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA CURSO DE CINCIAS ECONMICAS

UMA ANLISE DA EVOLUO DO SPREAD BANCRIO NO BRASIL APS A IMPLANTAO DO PLANO REAL

Fernanda Dalila Pereira

FLORIANPOLIS, JULHO DE 2007.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CURSO DE GRADUAO EM CINCIAS ECONMICAS

UMA ANLISE DA EVOLUO DO SPREAD BANCRIO NO BRASIL APS A IMPLANTAO DO PLANO REAL.

Monografia submetida ao Departamento de Cincias Econmicas para obteno de carga horria na disciplina CNM 5420 Monografia (TCC).

Por: Fernanda Dalila Pereira Orientador: Professora Patrcia Fonseca Ferreira Arienti rea de Pesquisa: Macroeconomia Palavras Chaves: 1 - Spread Bancrio 2 - Sistema Financeiro 3 - Crdito

Florianpolis, julho de 2007.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CURSO DE GRADUAO EM CINCIAS ECONMICAS

A Banca Examinadora resolveu atribuir nota 8,0 a aluna Fernanda Dalila Pereira na Disciplina CNM 5420 Monografia (TCC), pela apresentao deste trabalho.

Banca Examinadora:

___________________________________ Prof. Patrcia Fonseca Ferreira Arienti Presidente

__________________________________ Prof. Fernando Seabra Membro

__________________________________ Prof. Renato Ramos Campos Membro

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AGRADECIMENTOS

A toda minha famlia, pelo apoio e pela confiana que depositaram em mim em todos os momentos de minha vida, em especial, aos meus pais Nilton e Dalila e meu irmo Fernando. A meu marido Rodrigo, pela compreenso e carinho que sempre demonstrou, mesmo nos momentos mais difceis que passamos juntos. professora Patrcia, pelo conhecimento transmitido e pela orientao atenciosa, meu agradecimento e admirao. Aos meus amigos, Beatriz, Cleri, Sabrina, Juliano, Rafael e Antnio pela amizade sincera e apoio que sempre me demonstraram ao longo desses cinco anos de universidade, e que guardarei para sempre com muito carinho. Enfim, a todos os meus amigos e demais pessoas, que se fizeram presente e de alguma forma colaboraram para que este trabalho se concretizasse.

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RESUMO

Frente ao problema de alto custo e escassez do crdito no Brasil, este trabalho tem o objetivo de analisar a evoluo do spread bancrio das instituies financeiras no pas e compreender, assim, os fatores responsveis por este quadro que tanto dificulta o desenvolvimento social. Foi utilizado como fonte principal os estudos realizados pelo Banco Central do Brasil, publicados a partir do ano de 1999. Como resultado, esse trabalho demonstra que o spread bancrio no pas influenciado tanto por fatores microeconmicos como fatores macroeconmicos. E no que diz respeito aos componentes do spread bancrio nacional, podem ser reduzidos atravs da sua diluio com o aumento no nmero de operaes creditcias, ou ainda, dependem da estabilidade macroeconmica e aes externas para serem diminudos.

Palavras-chave: Spread Bancrio. Sistema Financeiro. Crdito.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Demonstrativo das Taxas de Juros Praticadas - Dezembro/2006 .......................... 27 Tabela 2 - Resumo: Juros Rotativos e por Atraso (% ms).................................................... 28 Tabela 3 - Nmero de Bancos no Brasil (1994/2003) ........................................................... 38 Tabela 4 - Evoluo da Composio do Spread Bancrio do Perodo de fev/99 a ago/03 (%)51

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Crdito do Sistema Financeiro Nacional, em % ao PIB (Jan/90 a Fev/04.............24 Figura 2 Relao entre Crditos Livres e Juros Bancrios no Brasil (out/96 a Fev/04).......26 Figura 3 Evoluo do Spread Bancrio Brasileiro (1994/2003)...........................................32 Figura 4 Taxa Selic acumulada no ms anualizada (ago/1994 a dez/2003)..........................33 Figura 5 - Spread Bancrio no Brasil (jul/94 a out/03)............................................................49 Figura 1 Spread Bancrio e o Volume de Crdito (out/1996 a jan/2003)............................50

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ABREVIATURAS E SIGLAS

BACEN - Banco Central do Brasil COPOM - Conselho de Poltica Monetria FEBRABAN - Federao Brasileira das Associaes de Bancos FGC - Fundo Garantidor de Crdito IPEA - Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada WEF - World Economic Frum

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SUMRIO

LISTA DE TABELAS.......................................................................................................... 5 SUMRIO............................................................................................................................ 8 1 INTRODUO ................................................................................................................. 9 1.1 Contextualizao do Problema...................................................................................... 9 1.2 Objetivos.................................................................................................................... 10 1.2.1 Objetivo Geral............................................................................................................. 10 1.2.2 Objetivos Especficos .................................................................................................. 10 1.3 Metodologia ............................................................................................................... 11 2 O SISTEMA FINANCEIRO BRASILEIRO E SUA ESTRUTURA............................. 12 2.1 O Sistema Financeiro.................................................................................................. 12 2.1.1 A Evoluo do Sistema Financeiro Nacional ............................................................. 17 2.2 O Crdito.................................................................................................................... 23 2.2.1 O Risco de Crdito ...................................................................................................... 24 2.3 A Taxa de Juros.......................................................................................................... 25 2.3 O Acordo da Basilia.................................................................................................. 28 3 O SPREAD BANCRIO BRASILEIRO........................................................................ 31 3.1 Definio do Spread ................................................................................................... 31 3.2 Os Fatores que Influenciam o Spread.......................................................................... 32 3.2.1 Os Fatores Microeconmicos ..................................................................................... 35 3.2.1.1 A Concorrncia e Concentrao Bancria no Brasil..................................... 35 3.2.1.2 A Regulao Prudencial................................................................................ 40 3.2.1.3 A Assimetria de Informaes......................................................................... 42 3.2.2 Os Fatores Macroeconmicos .................................................................................... 46 3.2.2.1 As Incertezas do Ambiente Econmico .......................................................... 47 4 A DECOMPOSIO DO SPREAD BANCRIO BRASILEIRO ................................ 49 5 CONCLUSO ................................................................................................................. 56 REFERNCIAS ................................................................................................................. 58

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1 INTRODUO

1.1 Contextualizao do Problema

fundamental o papel do crdito na economia tanto para as empresas quanto para os indivduos. Para as empresas o crdito possibilita a elevao do seu nvel de atividade e para os indivduos facilita a obteno de moradia e aumenta o consumo. O banco possui um importante papel como transmissor do crdito, medida que responsvel por direcion-lo na economia, tanto para consumo como para o investimento, favorecendo novos investimentos, que por sua vez, acabam fomentando a atividade econmica. Por estas razes, o papel do crdito bancrio um dos fatores mais importantes para o desenvolvimento econmico. Partindo dessa constatao, de que o crdito um dos fatores mais importantes para o desenvolvimento econmico, destaca-se a importncia de se examinar os determinantes do spread bancrio brasileiro, assim como, a sua evoluo. O spread a diferena entre o custo de captao dos bancos e o custo cobrado por essas instituies quando elas concedem um emprstimo. A oferta de crdito a base para os investimentos produtivos e seu encarecimento pode conduzir o pas a um crescimento abaixo de seu potencial. Ressalta-se que o Brasil possui altos nveis de spread, e isso interpretado como sinal de ineficincia do sistema bancrio, resultando em efeitos negativos sobre a poupana e o investimento domstico. O spread bancrio serve para cobrir os custos gastos com impostos, despesas administrativas, inadimplncia, alm de ajudar a compor o lucro das instituies financeiras. Ele uma varivel importante em qualquer sistema financeiro e quando muito elevado gera restries ao crescimento econmico, devido ao baixo retorno obtido nos depsitos e poupanas, alm do encarecimento do crdito. O que, por sua vez, acaba desestimulando tanto o investidor quanto o poupador. Convm ressaltar que no relatrio de competitividade1 do World Economic Frum (WEF- 2006/2007), segundo Arruda, Tello e Araujo (2007), o Brasil ficou em 66, devido ao pssimo posicionamento no ranking Macroeconmico (114 lugar). De acordo com eles, no

O conceito de competitividade para eles refere-se capacidade de uma economia de manter taxas de crescimento econmico no curto e mdio prazo, gerando prosperidade para sua populao.

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relatrio, o Brasil continua com problemas como, o alto spread bancrio e o crdito escasso e caro. Esses resultados no relatrio de competitividade, mostram o adiamento das medidas mais definitivas no que se refere reduo do spread bancrio e, conseqentemente, ao desenvolvimento do pas. Este trabalho analisar o perodo aps a implantao do Plano Real (1994). A economia brasileira com a implantao desse plano, ainda que a custa de alguns desequilbrios macroeconmicos, saiu de uma situao de alta para baixa inflao e isso resultou em importantes mudanas no comportamento dos bancos, no que diz respeito ao volume de crdito ofertado e principalmente no nvel de spread bancrio.

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo Geral

O objetivo geral deste trabalho analisar a evoluo do spread bancrio no Brasil aps a implantao do Plano Real (1994).

1.2.2 Objetivos Especficos

Em termos especficos pretende-se: Avaliar teoricamente a importncia do sistema financeiro nacional; Analisar o comportamento do crdito na economia brasileira desde o Plano Real (1994); Analisar os componentes do spread bancrio brasileiro a fim de mostrar quais os de maior impacto no perodo de 1999 a 2003.

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1.3 Metodologia

Para alcanar os objetivos, geral e especfico, o referencial deste trabalho foram os estudos realizados pelo Banco Central do Brasil de 1999 a 2003 ( uma vez que, o Banco Central comea a divulgar os relatrios a partir de 1999) e dados apresentados pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA) e pela Federao Brasileira das Associaes de Bancos (FEBRABAN). A principal fonte deste trabalho foram os estudos realizados pelo Banco Central. O Banco Central do Brasil, para identificar e mensurar os determinantes do spread das instituies bancrias, partiu de dados obtidos de uma amostra composta por 17 bancos, em forma de mdias no perodo de julho de 1994 a 1999. Aps isto, foram feitos constantes aperfeioamentos nas frmulas utilizadas no decorrer dos anos. Foi feito tambm uma observao e acompanhamentos dos assuntos, estudos e pronunciamentos relacionados ao spread bancrio, assim como, a comparao entre dados de perodos e fontes diferentes. Estruturalmente, este trabalho apresenta cinco captulos. O primeiro captulo apresenta uma breve introduo contendo a situao do problema e os objetivos pretendidos; o segundo apresenta uma reviso terica sobre o sistema financeiro e sua estrutura, analisando o sistema financeiro nacional e o comportamento da oferta de crdito brasileiro; o terceiro captulo aborda os fatores que influenciam o spread bancrio no Brasil, fatores micro e macroeconmicos; o quarto contm os componentes do spread bancrio e sua evoluo, identificando dentre eles o que tem maior impacto e, por ltimo, o quinto captulo traz uma concluso do trabalho.

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2 O SISTEMA FINANCEIRO BRASILEIRO E SUA ESTRUTURA

2.1 O Sistema Financeiro

De acordo com Carvalho (2000),Sistemas financeiros so definidos pelo conjunto de mercados financeiros existentes numa dada economia, pelas instituies financeiras participantes e suas interrelaes e pelas regras de participao e interveno do poder pblico nesta atividade (CARVALHO, 2000 p. 293).

Em outras palavras, o sistema financeiro pode ser visto como um conjunto de subsistemas, em que cada um responsvel por sua atividade, obedecendo a regras de relacionamento. Dentre os principais objetivos de um sistema financeiro, podemos destacar os seguintes: Canalizao dos recursos gerados pelas unidades superavitrias para as deficitrias, permitindo o uso mais eficiente dos recursos econmicos; Maximizao de sua capacidade de crescimento e de manuteno do emprego e do bem estar da populao; Organizao e operao dos sistemas de pagamentos da economia, permitindo o funcionamento adequado dos mercados; Criao de ativos de acordo com o volume e o perfil, necessrios para a satisfao das demandas dos poupadores por meio de acumulao de riqueza. O modo como acontece a interao entre os tomadores e emprestadores de recursos forma a estrutura do sistema que o define:Essas estruturas so, por sua vez, o resultado de dois conjuntos de influncias. De um lado, encontramos os determinantes tcnicos da atividade financeira, como o desenvolvimento de sistemas modernos de contabilidade financeira ou a possibilidade de aplicao de inovaes tecnolgicas desenvolvidas nos setores de comunicaes e informtica atividade bancria e financeira. Esses fatores aumentam a eficincia com que operam os sistemas financeiros e acentuam eventuais vantagens que um tipo de estrutura possa ter sobre os outros, imprimindo uma tendncia homogeneizao das estruturas financeiras. (CARVALHO, 2000, p. 249).

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A estrutura do sistema financeiro varia conforme o tipo de contrato resultante da operao entre as partes envolvidas e da funo exercida pelas instituies na elaborao desse contrato. Os sistemas financeiros podem ser baseados em Crdito ou em Mercados de Capitais. Os sistemas financeiros baseados em crdito, so operaes em que prevalecem as relaes de crdito aceitas por indivduos especficos, mas no so necessariamente dominadas por bancos comerciais. Em outras palavras, as transaes so individualizadas. Ocorre a realizao de um emprstimo resultante em obrigaes que, a princpio, so intransferveis e os contratos so moldados de acordo com a satisfao das partes envolvidas. J os sistemas baseados em mercados, de acordo com Carvalho (2000),So aqueles em que a proporo significativa ou majoritria das necessidades de financiamento colocadas pelos agentes econmicos so satisfeitas atravs da colocao de papis nos mercados monetrio e de capitais. (CARVALHO 2000, p.296)

Nesse caso, as regras so mais genricas e padronizadas, no qual alguns contratos podem ser negociados e, com isto, ganham liquidez. Mas em ambos os mercados ocorrem subdivises de acordo com regras e necessidades distintas. Segundo Carvalho (2000 p. 295), as sociedades econmicas mais avanadas tm tendido a exibir estruturas financeiras onde o mercado de capitais cresce continuamente em importncia como canal de circulao dos recursos em relao ao mercado de crdito. Isso ocorre principalmente pela rpida expanso dos mercados de ttulos, como acontece, por exemplo, com a economia americana, considerada uma das economias mais sofisticadas do ponto de vista financeiro, no qual possui um forte mercado de papis, tanto de curto quanto de longo prazo. Em paralelo a diferenciao entre os sistemas de mercado e de crdito, para Carvalho (2000), h uma segunda distino a destacar: os sistemas financeiros segmentados e sistemas de banco universal. Segundo Carvalho (2000, p. 301), os sistemas financeiros segmentados so aqueles em que diferentes segmentos do mercado financeiro so operados por instituies especficas. Por exemplo, as operaes como tomada de depsitos e oferta de emprstimos de prazos mais curtos, so exclusivos de bancos comerciais, enquanto que a operao com papis privados exclusiva dos bancos de investimentos, que no podem captar depsitos vista. Em outras palavras, so sistemas financeiros que operam por instituies especializadas, como o caso dos Estados Unidos.

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A outra forma de organizao baseia-se na figura de banco universal, que de forma contrria, a princpio, so autorizados a realizar operaes em todos os segmentos do mercado. O banco universal pode, por exemplo, fazer emprstimos tanto de longo como de curto prazo. O exemplo de um pas que trabalha com essa forma de organizao a Alemanha. Na Alemanha, o banco universal pode operar tanto no mercado de crdito quanto no mercado de capitais. Em um sistema financeiro existem vrias instituies divididas em bancrias e no bancarias. Dentre as primeiras, uma das mais importantes o banco, mais especificamente o comercial. Para Carvalho (2000, p.252) Embora no exista uma definio universalmente aceita do que seja um banco, em contraste com outras instituies financeiras, define-se usualmente um banco como uma instituio depositria. Com isso nota-se que o banco comercial tem destaque devido sua operacionalidade, como tambm devido criao de depsitos vista, no qual repassado sob a forma de emprstimos, principalmente de curto prazo para os tomadores, tais como, empresas e pessoas fsicas. Por isso, ele tambm alvo de regulamentaes e supervises com o objetivo de preservar o sistema de pagamentos e manter sua solvncia. Segundo Carvalho (2000), os depsitos so diferenciados de acordo com sua maturidade: Depsitos vista: podem ser resgatados a qualquer momento sem prvio aviso e sem nenhuma penalidade; Depsitos a prazo: s podem ser resgatados com datas pr-contratadas; Depsitos de poupana: podem ser resgatados a qualquer momento, normalmente aps um prazo de carncia inicial. Entretanto, os depsitos podem ser concedidos sob duas formas, de acordo com o modo pelo qual so criados: Depsitos primrios, que caracterizam o banco como intermedirios de poupana, so criados quando uma pessoa resolve fazer uma aplicao em um banco sob a forma de depsitos sem nenhum aviso prvio. Para Carvalho (2000 p.270) a criao de depsitos primrios exgena ao sistema bancrio. Depsitos secundrios so resultados de operaes do prprio banco, criados endogenamente pelo sistema bancrio. Ocorre, por exemplo, quando um banco concede emprstimos e credita recursos na conta corrente do tomador. E os

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recebedores desses emprstimos, realizam pagamentos a outros, que por sua vez colocam parte deles de volta nos bancos, sob a forma de depsitos, os quais podem servir de base para a concesso de novos crditos. De acordo com Carvalho (2000),Depsitos so promessas de entrega de meio circulante. Se o pblico aceita essas promessas como substitutos perfeitos do prprio meio circulante, possvel criar depsitos mesmo sem se ter em caixa o meio circulante corresponde aos depsitos existentes. (CARVALHO, 2000, p. 270).

No entanto, como representam exigibilidades imediatas junto aos bancos, esses depsitos (secundrios) representam um meio de pagamento semelhante ao dinheiro em cdulas ou moedas (moeda manual) que a populao dispe. Atravs de transferncias bancrias on-line ou via cartes de dbito ou mesmo da emisso de cheques, os dbitos podem ser liquidados to eficientemente como se tratasse de uma movimentao material de dinheiro entre as partes envolvidas. De todo modo, as instituies bancrias tm a capacidade de "criar" moeda atravs do processo de multiplicao dos depsitos bancrios. Os emprstimos concedidos pelos bancos do origem a novos depsitos. Essa capacidade dos bancos denomina-se de Sistema de Reservas Fracionrias, isso quer dizer que, os bancos tm a capacidade de manter em caixa apenas uma frao de seus depsitos totais. Como a maioria da parte dos valores em depsito dificilmente resgatada, os bancos podem operar na suposio desses passivos terem durao indefinidamente longa. Para Carvalho (2000 p.272), essa caracterstica d aos bancos o privilgio de criao de depsitos para alm de sua capacidade efetiva de resgate, dando origem ao multiplicador bancrio. Decorrente dessa capacidade dos bancos de criar moeda, os governos de todo o mundo atualmente exercem um rigoroso controle do seu sistema bancrio, atravs de bancos centrais, como acontece no Brasil. Segundo Carvalho (2000), pelo fato de os bancos poderem criar depsitos, foram criados meios de coibir o abuso e conseqentes crises de confiana, meios estes, como as reservas compulsrias que so impostas pelos reguladores (Banco Central).A capacidade de um banco em conceder crdito, e os depsitos correspondentes, est , em principio, limitada pelas reservas de que dispe, no da poupana do pblico. (CARVALHO, 2000, p.271). Por conseguinte, os Bancos, em especial o comercial, tm duas maneiras de conservar suas reservas: as reservas compulsrias que so obrigadas a manter junto ao Banco Central e as reservas excedentes que os bancos desejam manter para atender s necessidades de liquidez

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inerentes atividade bancria. No primeiro caso, as reservas podem oferecer algum rendimento, quando mantidas em ttulos de alta liquidez, como papis da dvida pblica. No segundo caso, seria sob a forma de moeda em caixa. A nica vantagem para o banco que gera liquidez devido sua disponibilidade, mas no rende juros. No entanto, na maioria das vezes, os bancos preferem ter em sua carteira ttulos pblicos, que rendem juros, ao invs de reservas bancrias que no so remuneradas. de fundamental importncia salientar que os bancos so obrigados a depositar uma proporo de seus depsitos vista no Banco Central que so os chamados depsitos compulsrios2, que servem de garantia contra eventuais demandas de saques bancrios alm do previsto. Tal fato constituiu-se como uma limitao para possveis abusos de criar depsitos e evitar crises de confiana. Entretanto, para Carvalho (2000), essa necessidade de reserva satisfaz a credibilidade do banco frente ao pblico, mas por outro lado, implica perda de lucros aos bancos pela impossibilidade de obter receita de juros sobre os emprstimos que poderiam ser realizados. O banco, portanto, enfrenta o dilema entre ser lucrativo, ou ser seguro para o pblico em geral. Como destacou Hyman Minsky:Bancos comerciais vivem sob a ameaa de ter que refinanciar suas dividas todos os dias. Este risco, por sua vez, molda as escolhas de ativos do banco. por sua causa que bancos comerciais mantm reservas primrias e secundrias, evitam a compra de ativos de maturidade desproporcionalmente longos, e administram continuamente os riscos de crdito, mercado e liquidez que cercam seus portflios. (MINSKY APUD CARVALHO, 2000, p. 269).

Vale destacar que um banco, principalmente o comercial, no sobrevive sem credibilidade. Sua existncia depende de sua credibilidade perante o pblico, que se apia na percepo de que os bancos sero capazes de honrar seus compromissos financeiros quando da necessidade de um resgate de recursos por parte do pblico. Segundo Carvalho (2000, p.256), a operao eficiente e segura dos bancos passa a ser um interesse da sociedade e no apenas dos agentes diretamente envolvidos. Dentre os diferentes riscos corridos por este tipo de banco, os principais so o de crdito e o de liquidez. O primeiro est ligado probabilidade de no pagamento por parte dos tomadores de crdito e utiliza um sistema de anlise dos clientes e exigncias de garantias. J o segundo medido pela perda esperada na venda de ativos e controlado com a manuteno

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A Lei 4595 da Reforma Bancria estabeleceu que o Banco Central pudesse criar recolhimentos compulsrios sobre os depsitos das instituies financeiras.

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dos prazos dos ativos e passivos equilibrados. Para tratar desse risco necessrio o acompanhamento os ndices de liquidez da instituio. Dado sua importncia dentro do sistema financeiro, os bancos comerciais so regulamentados e supervisionados pelo Banco Central, que ainda responsvel pela emisso de papel moeda e tambm controla a liquidez da economia. Na verdade, uma espcie de banqueiro dos bancos e por ltimo o regulador do sistema financeiro e depositrio de reservas internacionais do pas. Vale destacar que como banqueiro dos bancos, o Banco Central tem a funo de emprestador de ltima instncia.

2.1.1 A Evoluo do Sistema Financeiro Nacional

O sistema financeiro atual foi estruturado na dcada de 1960 e gradualmente transformado, marcado principalmente pelo regime de alta inflao. O incio dessa dcada foi assinalado por uma forte crise poltico-institucional que teve incio com a renncia do presidente Jnio Quadros, em 1961, aps oito meses de governo. Aps a renncia, em seu lugar, assumiu o vice-presidente Joo Goulart, sob forte oposio dos setores militares e polticos, em virtude de suas posies polticas de esquerda. Como soluo para esse impasse, o Congresso reformou a Constituio, alterando o regime de Governo, do presidencialismo para o parlamentarismo. Durante os trs anos do governo de Joo Goulart, as medidas econmicas adotadas levaram forte oposio de determinados setores, que culminou com um golpe de estado, em 31.3.1964 e sua deposio por foras militares, no dia seguinte. Aliada crise poltica gerada pelo Governo Jnio Quadros, sua poltica econmica, de atendimento s regras do FMI, restringiu o crdito e congelou salrios, sem, no entanto, estabilizar a inflao. Logo aps a renncia, porm, o acordo foi rompido, reiniciando o ciclo de instabilidade econmica. As reformas de base foram postas em prtica com o Plano Trienal, em 1963, que fracassou rapidamente. Sem apoio poltico, as reformas foram impossibilitadas, ampliando a crise institucional que vinha desde o incio de seu governo. A partir do Governo Castelo Branco, o objetivo era reformar o sistema econmico e moderniz-lo. Para isso, era necessrio enfrentar a difcil situao econmico-financeira que vinha dos ltimos meses do governo Joo Goulart, em que a tendncia de alta da inflao

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agravara-se ainda mais. Para isso, foi lanado o PAEG (Programa de Ao Econmica do Governo), sob a responsabilidade dos ministros Roberto Campos (Planejamento) e Otvio Gouveia de Bulhes (Fazenda). O PAEG tinha como objetivo reduzir o dficit do setor pblico, contrair o crdito privado e comprimir os salrios. Buscava-se controlar os gastos dos Estados, ao propor uma lei que proibia que eles se endividassem sem autorizao federal. O programa alcanou seus objetivos nos anos imediatamente posteriores, reduzindo o dficit pblico e, gradativamente, tambm a inflao. Ao mesmo tempo, o PIB voltou a crescer. No perodo entre 1964 e 1965, aps o golpe militar, o sistema financeiro sofreu grandes transformaes No Sistema Financeiro nacional, veio necessidade de maior movimentao de capitais e, sobretudo, de financiamentos de longo prazo. A partir de ento, ocorreu implantao da Lei do Sistema Financeiro Nacional ("Lei da Reforma Bancria"), em dezembro de 1964 e em julho de 1965 a Lei de Regulamentao do Mercado de Capitais, e com isso, foram estabelecidas nova estrutura e as novas regras dentro das quais o sistema financeiro nacional deveria operar. O Banco Central do Brasil e o Conselho Monetrio Nacional passaram a determinar a conduo da poltica monetria e de crdito no pas. Aconteceram mudanas tambm com relao aos sistemas financeiros privados, at ento restrito operao de bancos comerciais, instituies de poupana e companhias de financiamentos. Pretendia-se criar no pas uma estrutura segmentada de acordo com o mercado dos Estados Unidos, sendo, ento, definidos papis especficos para cada instituio financeira: Bancos Comerciais, operar com o sistema de depsitos e emprstimos de curto prazo; Bancos de Investimento, promover o desenvolvimento de um mercado de capitais adaptado especialmente ao financiamento do investimento privado; Instituies de Poupana e Emprstimos, fomentar o financiamento do setor habitacional; Companhias de Crdito, de financiamento e investimento, promover os crditos especficos aos consumidores e; Corretoras e Distribuidoras de Valores, apoiar o desenvolvimento das bolsas de valores. Mas, de acordo com Carvalho (2000):Esse sistema comeou a ser transformado pela ao de duas foras. Por um lado, lacunas legais permitiram que a segmentao pretendida fosse substituda pela conglomerao financeira. Por outro, a acelerao da inflao a partir dos anos 70

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levou ao desaparecimento dos segmentos voltados para a oferta de crdito de longo prazo. Tambm a acumulao de desequilbrios fiscais, especialmente resultantes da intensificao do processo inflacionrio, acabou tornando o governo o principal tomador de recursos do sistema, distorcendo sua operao. (CARVALHO, 2000, p. 312).

Diante disso, em 1988 a conglomerao bancria foi reconhecida de direito, quando o Banco Central autorizou a criao dos bancos mltiplos.O banco mltiplo aquele que combina pelo menos duas carteiras de um conjunto de quatro, entre as quais as mais importantes so as carteiras de banco comercial e banco de investimento. A separao dessas duas funes o fulcro sobre o qual repousa o conceito de segmentao. CARVALHO, 2001, p. 312).

Nos anos de 1990 o sistema financeiro nacional volta a passar por um perodo de importantes transformaes. Segundo Carvalho (2000), o sistema financeiro passou a ser dominado pelos bancos universais que juntamente com a alta inflao e os desequilbrios dela resultante, levou o sistema a especializar-se no financiamento do Estado, por meio da absoro de ttulos da dvida pblica, que rendiam elevadas taxas de juros e um alto prmio de liquidez. Nesse perodo, de acordo com Soares (2001), a economia brasileira foi marcada por uma instabilidade econmica, ocasionado, principalmente, pela alta inflao. Mesmo assim, os grupos bancrios extraram vantagens atravs dos ganhos com a arbitragem do dinheiro, que eram os altos ganhos proporcionados pelas transferncias inflacionrias, o floating ( que foi uma importante fonte de recursos para os bancos). Os altos ganhos obtidos a partir do floating ocorriam porque a correo do valor dos depsitos bancrios estava abaixo do valor da inflao. As instituies financeiras aumentavam sua rentabilidade atravs da aplicao dos recursos provenientes dos depsitos vista em ttulos pblicos com taxas de juros elevadas. Assim, a poltica da dvida pblica continha o crdito e os juros das operaes de crdito aumentavam, acompanhando o comportamento das taxas de juros dos ttulos da dvida pblica. Com a alta inflao, segundo Aronovich (1994) o diferencial cobrado por estas instituies entre as suas taxas de captao e aplicao de recursos, o denominado spread bancrio, era extremamente alto. Isto porque a instabilidade de preos impunha a necessidade de incorporao de uma margem de segurana nas operaes de emprstimos de maneira que protegesse estas instituies de movimentos imprevistos da inflao. Com a implantao do Plano Real e a estabilizao de preos em 1994, os bancos nacionais perderam os ganhos inflacionrios (arbitragem). A economia passa a viver um

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perodo de estabilidade econmica, sendo assim, a estrutura operacional dos bancos, teria que se ajustar a um novo contexto de forma a recompor a perda de lucratividade. O fim da inflao acabou por forar um profundo ajuste nos bancos brasileiros. Neste ajuste podemos destacar trs fases. Em um primeiro momento verificou-se uma forte elevao nas operaes de crdito, devido busca, pelos bancos, de um modo de compensar a perda com o fim da inflao e tambm a instalao de um quadro de otimismo juntamente com uma melhor previsibilidade acerca do comportamento dos preos relativos na economia. No segundo momento, verificou-se, junto com a forte elevao dos ndices de inadimplncia, graves dificuldades no sistema bancrio, o que levou o governo a adotar vrias medidas, das quais a mais popular foi o Programa de Estmulo Reestruturao e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro (PROER). Enfim, a terceira fase pode ser caracterizada pelo processo de fuses, aquisies e, principalmente, pela entrada de algumas instituies estrangeiras. O Programa de Estmulo Reestruturao e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER) 3, teve o mrito de permitir a retirada organizada das instituies insolventes do mercado financeiro. Seu objetivo principal foi o de assegurar a liquidez e a solvncia do sistema, resguardando os interesses de depositantes e investidores. Essa primeira fase do processo de ajustamento por que passaram os bancos nacionais, aproveitando-se da expanso abrupta dos depsitos que ocorreram com a estabilizao de preos, aumentaram suas operaes de crdito no pas. Segundo Corazza (2000), esse crescimento significativo nos depsitos bancrios que ocorreu nesse perodo foi, principalmente, devido ao aumento de credibilidade na economia domstica, em decorrncia da estabilidade econmica, tendo como conseqncia a elevao na demanda por operaes de crdito. Tanto o pblico em geral como as empresas passaram a demandar mais crdito para o consumo e investimento respectivamente. De acordo com Barros (1996), os depsitos vista cresceram 165,45 nos primeiros meses do Plano Real, e os depsitos a prazo cresceram cerca de 40% para o mesmo perodo. (BARROS, 1996). Em seguida, o governo com medo que essa rpida expanso do crdito causasse um crescimento exagerado do consumo ameaando a estabilizao dos preos conquistada, adotou medidas para restringir o mercado de crdito. Para Cerqueira (1998), essa expanso do crdito ocorreu aps uma demanda reprimida causada por quase duas dcadas de inflao elevada. O pblico em geral passou a demandar mais crdito para o

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O PROER foi criado pela Medida Provisria nmero 1179/95.

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consumo, do mesmo modo que as empresas passaram a demandar maior volume de crdito para investimentos, segundo Corazza (2000). Diante desse comportamento apresentado pelos bancos nacionais, os quais adotaram uma postura mais ousada, expandindo o crdito no intuito de compensar a perda das receitas inflacionrias. Segundo Barros (1996), o Banco Central estabeleceu uma rigorosa poltica de controle destas operaes atravs da elevao dos depsitos compulsrios sobre depsitos vista, passando de 48 % para 100% e sobre os depsitos de poupana passando de 10% para 30%. Para Soares (2001), as autoridades econmicas da poca o crescimento exagerado do crdito podia ocasionar um tambm crescimento exagerado do consumo ameaando assim a estabilidade dos preos. Na segunda fase do processo de ajustamento, que aconteceu no segundo semestre de 1994, houve um aumento da inadimplncia devido mudana da poltica econmica, fragilizando diversos bancos. Enquanto isso, os grandes bancos mantiveram juros e spreads elevados para compensar os maus resultados da carteira de crdito. Segundo Soares (2001),Apesar do crescimento das operaes de crdito compensarem, em parte a perda do float, esse crescimento ocorreu sem os devidos cuidados quanto a capacidade de pagamento dos novos e antigos devedores. Assim a soluo de expandir rapidamente o crdito como forma de compensar a perda do float ocasionou novos problemas. (SOARES, 2001, p. 8).

Na terceira fase do processo de ajustamento, em 1995, outra mudana relacionada ao setor bancrio foi a abertura do mercado domstico bancrio s instituies financeiras estrangeiras. Estas instituies entraram no Brasil adquirindo bancos domsticos, principalmente os que estavam passando por dificuldades. Acreditava-se em geral que os bancos estrangeiros eram mais eficientes que os nacionais, afetando positivamente o mercado do ponto de vista macroeconmico. 4 De acordo com Freitas (1997), alm disso, o governo brasileiro facilitou a entrada de instituies estrangeiras5 como forma de fortalecer o sistema e aumentar a competitividade entre os participantes e tambm promover a modernizao do sistema financeiro nacional. As autoridades governamentais acreditavam que a entrada dessas instituies no setor domsticoAlves (2002) justifica esse argumento utilizando a hiptese ortodoxa de que bancos mais eficientes em termos microeconmicos (quanto a custo para oferecer servios) levariam a melhores resultados do ponto de vista macroeconmico (com a expanso da oferta de crdito e de servios financeiros). 5 A autorizao para que os bancos estrangeiros se instalassem no Brasil veio atravs do decreto presidencial em 08/08/1995, com a entrada do primeiro banco estrangeiro, o banco holands Rabobank Nederlands.4

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fosse uma estratgia positiva e favorvel, podendo assim solucionar as principais deficincias do mercado bancrio, que eram os problemas com spreads e custos elevados em relao aos padres internacionais. Acreditava-se que a entrada dos novos concorrentes estrangeiros poderia contribuir para que viesse a ocorrer uma diminuio gradual do spread bancrio, atravs de melhores tcnicas de reduo nos custos, pois os bancos estrangeiros, em mdio e em longo prazo, teriam vantagens de economias de escala 6que poderiam promover uma reduo de seus custos, o que levaria a uma reduo no spread devido a esses ganhos de escala. A transio para a estabilidade foi ainda dificultada pelos impactos da crise mexicana de 1994/5 7. O contgio da crise mexicana levou a uma forte fuga de capitais da economia brasileira, forando o Banco Central a elevar drasticamente a taxa de juros, j que o desmantelamento dos controles de capitais no incio da dcada de 1990 havia deixado a economia brasileira totalmente exposta a choques na conta de capitais. Diante desse quadro o Banco Central adotou medidas excepcionais de controle monetrio e esfriamento da economia. Os meses que se seguiram, em 1995 e 1996, foram de tenso no setor, aliviada pela criao do Programa de Financiamento de Reestruturao do Setor Bancrio (PROER), pelo quais bancos saudveis obtinham facilidades para adquirir bancos problemticos. O programa, apesar das crticas que recebeu, foi indubitavelmente eficiente para facilitar a adaptao do sistema bancrio estabilidade de preos e evitar a ameaa de uma crise bancria. Entretanto, os bancos conseguiram manter suas margens de lucro em 1995 e 1996, segundo Alves (2002), principalmente ao direcionar seus ativos para operaes com ttulos pblicos, pois o retorno da dvida pblica era muito atrativo. Contudo, a concluso de que aps o Plano Real, com a estabilidade proporcionada os bancos perderam as receitas das transferncias inflacionrias e compensaram essa perda de renda pela expanso das operaes de crdito. Entretanto, os volumes maiores de crdito na economia poderiam provocar o recrudescimento inflacionrio. Por isso foram adotadas as restries quantitativas (os compulsrios elevados) 8, as quais deveriam permitir o controle doEconomia de escala aquela que organiza o processo produtivo de maneira que se alcance a mxima utilizao dos fatores produtivos envolvidos no processo, buscando como resultado baixos custos de produo e o incremento de bens e servios. Ela ocorre quando a expanso da capacidade de produo de uma empresa ou indstria provoca um aumento na quantidade total produzida sem um aumento proporcional no custo de produo. 7 Vale destacar que o declnio da inflao foi interrompido aps as crises internacionais ocorridas no Mxico em dez/94; na Tailndia em dez/97; na sia em ago/98 e na Rssia em jan/99. 8 Em 1994, o recolhimento do compulsrio sobre depsitos a vista passou de 48% para 100%, e sobre depsitos de poupana passou de 10% para 30%. (BARROS, 1996).6

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processo de expanso do crdito. O fato que o Plano Real, ao mesmo tempo em que promoveu uma estabilizao dos preos, aumentou a vulnerabilidade externa da economia brasileira. Isso fez com que o Banco Central adotasse uma poltica de juros elevados, aliada aos altos compulsrios, o que voltou a aumentar o risco em aplicaes junto ao setor privado, priorizando-se novamente o financiamento do governo e aumentando o spread bancrio, que nesse perodo ficou entre 120% a.a. em 1994 e 150 a.a. em 1995. Fica evidente, portanto, que ofertar crdito uma atividade que s atraente medida que se possa oferecer ganhos muito altos, para compensar o custo de oportunidade, tanto em rentabilidade quanto em segurana. Diferente da aplicao em papis pblicos, em que o risco zero e os lucros so altos, ainda mais com a prtica de altas taxas de juros. Segundo Canuto (2001) aplicar liquidez em ttulos pblicos tornou-se uma estratgia corporativa" mais rentvel que captar recursos de terceiros para alavancar investimentos produtivos. Na verdade, quando os bancos passam a aplicar em papis do governo, o spread bancrio fica ainda maior, uma vez que, aumenta o custo de oportunidade envolvido nas operaes de crdito. Isso porque os bancos estabelecem um prmio de risco muito alto para a concesso de emprstimos. Entretanto, nota-se que os bancos conseguem adequar a composio de seus ativos de forma a ganhar cada vez mais lucro, independente de qualquer situao.

2.2 O Crdito

O predomnio histrico da inflao e a instabilidade econmica no Brasil tenderam a produzir volumes baixos de crditos bancrios, especialmente pelo fato dos bancos tirarem proveito atravs dos altos ganhos com as receitas inflacionrias e no investiam na concesso de crdito. Na figura 1 possvel acompanhar a Evoluo do crdito brasileiro de 1990 a 2004.

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Figura 2 - Crdito do Sistema Financeiro Nacional, em % ao PIB (Jan/1990 a Fev/2004 Fonte: Banco Central do Brasil.

Com o Plano Real e, conseqentemente, com a estabilidade de preos esperava-se que os bancos aumentassem sua oferta de crdito total. Isso aconteceu num primeiro momento, como pode ser observado na figura 1, no final do ano de 1994 at inicio do ano de 1995. No perodo que vai da metade do ano de 1995 at incio de 1999, o crdito total sofre vrias oscilaes. Aps o incio de ano de 1999, o crdito total brasileiro perde seu comportamento de crescimento, permanecendo estvel. Acontecendo o oposto do que se esperava com a implantao do Plano Real, que era a elevao do nvel de crdito.

2.2.1 O Risco de Crdito

Considerando que as decises de crdito so tomadas pensando nas conseqncias futuras a sua oferta feita mediante uma anlise cuidadosa das possibilidades de no pagamento. O Risco de crdito a possibilidade de calote por parte do tomador de um emprstimo. Em conformidade com a classificao do Core Principles for Effective Banking Supervision (Bank for Internacional Settlements/BIS, 1997), existem cinco principais tipos de risco de crdito:

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1 Risco de Inadimplncia representa a possibilidade de o tomador do emprstimo no honrar seus compromissos com a instituio. 2 Risco de degradao da garantia o risco do bem oferecido em garantia da operao de desvalorizar ou degradar. 3 Risco de concentrao de crdito ocorre quando somente uma pessoa ou grupo conseguem ter acesso aos recursos bancrios ofertados. 4 Risco de degradao do crdito a perda na qualidade de crdito do seu tomador causada por uma queda no valor de sua obrigao. 5 Risco soberano este risco est vinculado possibilidade de perda em transaes internacionais. Dentre os cinco riscos de crdito citados o mais importante o risco de inadimplncia que possui uma das maiores participaes do spreads cobrados pelas instituies bancrias do Brasil. Diante do problema de risco de crdito os bancos tomam atitudes com o objetivo de elevar a probabilidade de retorno do capital emprestado, mtodos como estes a seguir: Filtragem um mtodo utilizado para reduzir os problemas com assimetria de informaes, no qual o banco coletas dados confiveis sobre os tomadores em potenciais de recursos e os seleciona sob a tica de retorno de capital. Garantias diz respeito a uma propriedade que o tomador do emprstimo promete ao conceder no caso de no pagamento do capital que pode ser atravs de nota promissria, duplicata, letra de cmbio, endosso em preto e em branco, garantias real e garantia fidejussrias, hipoteca, penhor, cauo, alienao fiduciria, anticrese, aval. Racionamento de crdito trata-se de limitar o valor a ser emprestado mediante anlise do histrico de cada cliente, tanto para pessoas fsicas quanto jurdicas.

2.3 A Taxa de Juros

O nvel alto da taxa de juros bsica da economia mais um fator que influncia no baixo volume de crdito brasileiro. Isso pode ser observado na figura 2.

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Figura 3 - Relao entre Crditos Livres e Juros Bancrios no Brasil (out/1996 a Fev/2004) Fonte: Banco Central

De acordo com a figura 2, os perodos em que as taxas de juros esto altas o volume de crdito diminui, isso ocorre principalmente por dois motivos: o primeiro porque quando as taxas de juros esto altas, para os bancos torna-se muito mais atrativo aplicar em ttulos pblicos, em que o risco baixo e a rentabilidade alta; o segundo motivo diz respeito ao risco de inadimplncia provocado pelo ambiente macroeconmico de incertezas. As taxas de juros pagas e cobradas so definidas pelo agente financeiro, partindo da taxa bsica de juros. Uma vez por ms, ou quando necessrio, o Comit de Poltica Monetria (COPOM) se rene para a definio dessa taxa bsica. A fixao dessa taxa vai depender de um conjunto de fatores dos quais os principais so: a credibilidade do pas, seu nvel de reservas cambiais, a dvida pblica interna, a inflao, a estabilidade econmica interna e externa. Na verdade, o Banco Central determina a taxa de juros de curtssimo prazo (taxa Selic), mas as taxas de mercado em diferentes horizontes no so controladas pela autoridade monetria, como as taxas de cheque especial, cartes de crdito, taxas de emprstimos pessoais, entre outras. Inclusive, possvel ocorrer um descasamento entre a taxa Selic e as

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taxas de mercado. Uma pesquisa feita pelo Banco Central (2006)9, mostra a diferena entre as taxas de juros de mercado cheque especial e emprstimo pessoal:

Tabela 1 - Demonstrativo das Taxas de Juros Praticadas - Dezembro/2006

Bancos HSBC Banespa Bradesco Banco do Brasil CEF Ita Santander Nossa Caixa Real UnibancoFonte: Banco Central. Data da Coleta: 01/12/2006.

Emprstimo Pessoal 4,70% 5,80% 5,57% 4,62% 4,68% 5,95% 5,80% 4,25% 6,50% 5,87%

Cheque especial 8,47% 8,38% 8,01% 7,70% 7,20% 8,47% 8,38% 8,10% 8,40% 8,39%

Para pedir o emprstimo pessoal, o interessado preenche um cadastro. a partir dele que a instituio financeira avalia as possibilidades do cliente pagar corretamente ou ficar inadimplente, e determina a taxa de juros a ser cobrada. O cheque especial um limite de crdito oferecido pelos bancos a seus correntistas. O limite deste crdito estabelecido com base na renda do cliente e no seu histrico de bom pagador. No entanto, os juros cobrados costumam ser os mais caros do mercado. Podem chegar a 10% ao ms sobre o valor que ultrapassar a quantia da conta corrente. Um outro produto oferecido pelos bancos e que possui uma taxa de juros alta o carto de crdito, que nada mais que um instrumento de compra vista quando os gastos so pagos integralmente. A vantagem que o comprador tem uma data de vencimento nica para pagar todas as despesas, que aparecem discriminadas na fatura. A operao de crdito no carto caracteriza-se em duas situaes: no pagamento do dbito em parcelas e no crditoOs dados abaixo se referem s taxas mximas pr-fixadas para clientes (pessoa fsica) no preferenciais, sendo que, para o cheque especial, foi considerado o perodo de 30 dias e para o emprstimo pessoal, o prazo de contrato de 12 meses.9

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rotativo. No crdito rotativo, o comprador opta por pagar parte da dvida ou apenas o pagamento mnimo calculado pela operadora. sobre o restante do dbito financiado que incidem os juros, normalmente os mais elevados do mercado. Vale lembrar que as administradoras cobram tambm uma anuidade pelo uso do carto, cujo valor depende do tipo do carto e que instituio financeira est vinculada. No caso de atraso no pagamento, preciso ficar atento, pois os juros cobrados podem ser bem maiores, sem contar multa que costuma ser de 2% sobre o valor devido. Abaixo dados da pesquisa publicada no jornal O Estado das taxas de juros rotativos e por atraso, cobradas nos cartes de crdito.

Tabela 2 Resumo: Juros Rotativos e por Atraso (% ms)

Juros Atraso Rotativo

Mdia 9,99 7,93

Mnima 3,00 1,94

Mxima 15,40 14,10

Fonte: O Estado10. Data da pesquisa: 15/06/2007.

No geral, as taxas de juros normalmente so afetadas pelo grau de risco que os bancos percebem atravs da avaliao de critrios, como a credibilidade do tomador e o prazo da operao pretendida. Sendo que, em casos de emprstimos de maior prazo, a taxa tende a ser varivel como forma de amenizar a incerteza do recebimento e a possvel deteriorao do crdito frente a acontecimentos no previstos.

2.3 O Acordo da Basilia

Para Soares (2001), um fator que pode ter contribudo para o no crescimento do crdito como se esperava, foi adeso ao acordo da Basilia, que em sntese, estabeleceu um padro comum de determinao do capital dos bancos, na tentativa de reduzir as diferenas entre as normas aplicveis s instituies financeiras dos diversos pases. Atravs do acordo10

A taxa mdia da tabela acima corresponde a uma mdia simples de todos os tipos de carto.

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da Basilia, o governo brasileiro procurou adotar algumas medidas voltadas a privilegiar a solidez do setor bancrio nacional. A hiptese do estudo de Soares (2001) de que a adeso do pas ao Acordo cria uma restrio oramentria para alguns ativos dos bancos, o que alterou o seu padro de aplicaes e foi capaz de prejudicar o crescimento das operaes de crdito. O acordo da Basilia foi discutido e aprovado em julho de 1998 pelos representantes dos bancos centrais do grupo dos pases denominados G10, no intuito de alcanar maiores garantias para solvncia e a liquidez do sistema bancrio internacional. Segundo Soares (2001):Ao aderir ao Acordo, autoridade monetria do pas assume o compromisso de exigir dos bancos um nvel de capital que seja compatvel com o volume de suas operaes ativas na linguagem do Acordo, que o Patrimnio Lquido Ajustado (PLA) dos bancos seja igual ou superior ao Patrimnio Lquido Exigvel (PLE). (SOARES, 2001, p. 68).

Com relao adeso do Brasil ao Acordo da Basilia, a resoluo nmero 2.099, de acordo com Soares (2001), estabelece:As instituies financeiras que operam no Brasil devem calcular o capital exigvel (PLE), considerando a razo capital-ativo igual a 0,08 (alavancagem de 12,5) e quatro classificaes de risco dos ativos, com ponderao de 0%, 20%, 50% e 100%. (SOARES, 2001, p. 70).

O risco com ponderao 0% considerado com o fator de risco nulo, atribudo a ativos como ttulos pblicos federais; com ponderao 20% considerado o risco reduzido, atribudo a depsitos bancrios de livre movimentao mantidos em bancos; com ponderao 50% tambm so considerados riscos reduzidos, atribudo a ttulos estaduais e municipais, como financiamentos habitacionais e; o risco com ponderao 100% considerado com fator de risco normal, atribudos s operaes como de emprstimos e financiamento. Conforme destacado por Soares (2001), em conseqncia dessa Resoluo, tm-se que:Para cada R$ 100,00 que os bancos apliquem em crditos, necessitam ter R$ 8,00 de capital. Por outro lado, para cada R$ 100,00 aplicados em ttulos do governo federal, no necessitam comprometer nada do seu patrimnio. Essa uma maneira de dizer que esses ativos so considerados livres de risco e que, conseqentemente, nenhum capital seria necessrio para sustent-los. Ou seja, a limitao de os bancos comprarem ttulos do governo federal passa a ser a sua capacidade de captar recursos a um custo inferior ao rendimento desses ttulos. (SOARES, 2002, p. 71).

Portanto, diante do exposto acima, percebe-se que o Acordo da Basilia estimulou os bancos a aplicar em ttulos pblicos federais, uma vez que, muito mais lucrativo para o

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banco aplicar nesses ttulos, pois alm de risco zero, no precisaria comprometer seu capital. Enquanto, aumentar o volume das operaes de crdito, especialmente em emprstimos, alm do risco de 100%, implicaria aumentar, em curto ou em mdio prazo, o capital da instituio financeira. Relacionado ao crdito, segundo Soares (2001), fica visvel que as vrias normas relacionadas ao Acordo da Basilia, adotadas pelo banco Central, alm de limitares o montante das operaes de crdito, restringiram, significativamente, o crdito ao setor produtivo. Na medida em que os bancos, para maximizarem o seu retorno, passaram a direcionar o crdito para os clientes (segmentos) que aceitavam pagar taxas mais elevadas. (SOARES, 2001, p. 85). Isso aconteceu no perodo de 1994 a 1999, quando foi registrado um expressivo crescimento do crdito s pessoas fsicas (de 2% para 15% do crdito total), enquanto o crdito concedido ao setor produtivo ficou estvel com indicao de queda.

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3 O SPREAD BANCRIO BRASILEIRO

3.1 Definio do Spread

O spread um termo que nas operaes bancrias definido como sendo a diferena entre a taxa de juros de captao dos bancos (paga aos investidores) e a taxa de aplicao (cobrada dos devedores nas operaes de crdito). O custo de captao nada mais do que o custo que o banco incorre para obter o dinheiro que depois ir emprestar para seus clientes. O banco obtm o dinheiro que ele eventualmente empresta, principalmente, atravs dos depsitos feitos pelos seus clientes, ou atravs do levantamento de emprstimos no mercado. Quando ocorre um depsito em dinheiro no banco, pode ser dito que na verdade est sendo emprestado esse dinheiro ao mesmo. Dependendo da forma como efetuado esse depsito, em poupana, em fundos etc., o banco ter que pagar uma remunerao. A remunerao mdia paga por um banco (ou instituio) pelos recursos que obtm de seus clientes (depsitos) ou de investidores (no mercado) equivale ao seu custo de captao. O custo de captao do dinheiro depende, especialmente, das expectativas econmicas, da credibilidade e tambm a da necessidade de caixa da empresa, alm disso, outros fatores como a taxa bsica de juros vigente, que no caso do Brasil, como referncia usa-se a Selic. Para Reed e Gill (1994):O negcio dos bancos comerciais tomar dinheiro emprestado (na maior parte dos depositantes) e emprest-los ou investi-lo a uma taxa mais alta. este negcio de um intermedirio financeiro, que age como mensageiro para os que tm e os que precisam de fundos. A atividade de emprestar dinheiro para aqueles que tm alta reputao em termos de crdito e investir em ttulos de alta qualidade resulta em margens de lucro relativamente baixa, quando comparadas com as margens obtidas pelas corporaes no-financeiras. (REED; GILL, 1994, p. 167)

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3.2 Os Fatores que Influenciam o Spread

Conforme mostra a figura 3, ao se analisar a trajetria do spread bancrio aps o ano de 1994, percebe-se que o spread bancrio brasileiro caiu vertiginosamente desde a implantao do Plano Real, mas ainda continua em patamares elevadssimos se comparado a outros pases. At mesmo se considerarmos os pases emergentes como Argentina, Colmbia, Mxico e frica do Sul. 11 J a figura 4, apresenta a elevao da taxa Selic de 1994 a 2003, destacando-se as crises ocorridas ao longo deste perodo.

Figura 4 - Evoluo do Spread Bancrio Brasileiro (1994/2003) Fonte: Banco Central do Brasil

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Fonte: Internacional Finance Statistcs do FMI, IEDI (2004a) e Banco Central do Brasil.

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Figura 5 - Taxa Selic acumulada no ms anualizada (ago/1994 a dez/2003) Fonte: Banco Central do Brasil.

De acordo com a figura 3, percebe-se que o spread mdio

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praticado no sistema

bancrio brasileiro, em 1994, era de aproximadamente 120% a.a., um valor cerca de oito vezes maior do que a taxa de spread cobrada na Venezuela, pas que possua a segunda maior taxa de spread. Aps os primeiros anos de implantao do Plano Real, mais precisamente, em 1999, os spreads cobrados pelas instituies financeiras brasileiras continuam elevados, cerca de 60% a.a., conforme a figura 3. Sendo que em 2003, o spread mdio no Brasil reduziu para 44% a.a., mas ainda continua com patamares elevados. Aproximadamente trs vezes maior se comparado com o spread mdio dos pases latino-americano e dez vezes maior do que a taxa cobrada nos pases do leste asitico. Atravs da figura 3 percebe-se que o comportamento do spread bancrio no Brasil no ano de 1995 alcanou o seu valor mximo de 150%. Esse aumento no spread se deu em funo do aumento da taxa de juros devido crise mexicana conforme destacado na figura 4. Nesse perodo de 1994 a 1995, a manuteno dos elevados spreads 120% a.a. e 150% a.a., respectivamente, obtido pelas instituies bancrias ocorreu a partir desta expanso nas

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O spread mdio calculado pela diferena entre a taxa mdia de aplicao e taxa mdia de captao, onde a taxa mdia de aplicao a receita total de intermediao financeira sobre o ativo operacional, entendido este como o ativo total deduzido do ativo permanente e, a taxa mdia de captao calculada atravs da despesa de intermediao financeira, subtrada a proviso para crditos de liquidao duvidosa, sobre o ativo operacional.

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operaes de crdito. Os bancos estimulados por um processo de ajuste, com a perda das receitas inflacionrias, passaram a transferir os riscos destas operaes de crdito para o tomador final atravs da cobrana de elevadas taxas de juros, que proporcionava os elevados spreads bancrios. Mas, conforme a figura 3, o spread apresentou uma ntida tendncia de queda a partir de 1996, em virtude das medidas restritivas voltadas a diminuir as operaes de crdito dos bancos e tambm devido a um relaxamento das medidas de arrocho monetrio e uma diminuio da desconfiana dos agentes em relao ao processo de contgio da crise mexicana. Vale destacar, que a taxa de juros acompanha o spread tambm no ano de 1996, conforme a figura 4. Entretanto, vale destacar, que esses fatores contriburam para uma reduo significativa dos patamares de spread bancrio no pas, mas eles ainda continuavam altos de acordo com patamares internacionais. No final do ano de 1997, o spread apresenta uma tendncia de aumento conforme figura 3, acompanhando a taxa de juros, reflexo das crises asiticas (1997), conforme destacado na figura 4. A prtica de elevada taxa de juros bsica na economia, faz aumentar o spread bancrio no somente por tornar mais atrativo a aplicao em ttulos pblicos, mas tambm por elevar o custo de captao de recursos e o risco de inadimplncia envolvido nas operaes de crdito, uma vez que, altas taxas de juros esto comumente associadas a ambientes macroeconmicos cujo grau de incerteza alto. Alm do que, implicam um alto custo de oportunidade envolvido na concesso de emprstimos, aumentando ainda mais as margens envolvidas nestas operaes. Segundo o Banco Central (1999), o programa de estabilidade fiscal em curso desde o final de 1998 estabeleceu condies para um regime fiscal consistente. A partir desse fato, diminuindo as incertezas atravs de um arcabouo da poltica monetria abriu-se espao para que ocorresse uma perspectiva de queda na taxa bsica de juros e de uma reduo no spread bancrio, como pode ser observado nas figuras 3 e 4, respectivamente. A partir de 2000 o spread atingi o patamar de aproximadamente 40% ao ano. Vale ressaltar, que ele manteve-se nesses patamares, ainda elevadssimos, desde ento, inclusive com uma leve tendncia ascendente a partir de meados de 2001. No ano eleitoral de 2002, conforme destacada na figura 4, vsperas da eleio do ento Presidente Lula, a economia brasileira passou por um caos. A taxa de juros em reais simplesmente dobrou entre maro e setembro de 2002 e o spread foi acompanhando. No entanto, a situao foi mudando aps Lula se eleger, na medida em que o pessoal se

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convencia de que a poltica econmica do novo governo era uma continuidade do Real. No final de 2002, vspera da posse do presidente Lula, todos os indicadores j haviam melhorado. E no incio de 2003, as taxas de juros e o spread j apresentavam sinais de queda. Mediante o que foi exposto, ressalta-se a importncia de apresentar os principais fatores que influenciam o spread cobrado pelos bancos em suas operaes: os fatores microeconmico e macroeconmico. A partir de uma abordagem microeconmica, o sistema bancrio, conforme destacado por Fajardo e Fonseca (2004) visto como uma indstria, que utiliza como insumo, em sua produo, os depsitos de seus correntistas, e que produz emprstimos, que so vendidos aos tomadores de recursos. Com relao aos fatores macroeconmicos, a nfase maior foi atribuda s incertezas macroeconmicas ocasionadas pela instabilidade econmica.

3.2.1 Os Fatores Microeconmicos

Nesta seo sero apresentados os principais fatores microeconmicos que influenciam o spread bancrio no Brasil. Dentre eles foram destacados a concentrao bancria no Brasil, a regulao prudencial e a assimetria de informaes.

3.2.1.1 A Concorrncia e Concentrao Bancria no Brasil

A baixa concorrncia existente no setor bancrio tambm um dos motivos que influncia no elevado spread brasileiro e est relacionada principalmente ao movimento de reduo no nmero de instituies bancrias operando no pas e a concentrao bancria existente. Segundo Pinheiro (2003), a estrutura no competitiva do setor ajuda a explicar os elevados spreads bancrios, pois os bancos teriam poucos incentivos para aumentar a sua eficincia operacional, operando com spreads elevados como forma de gerar receita suficiente

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para cobrir os seus custos. Para ele existem trs tipos de barreiras competio que explicam a baixa concorrncia nesse setor: As informaes sobre os devedores so cruciais para avaliar o risco da operao, e essas informaes no so confiveis; As garantias so de difcil recuperao, prejudicando sua capacidade de reduzir riscos em uma operao com um devedor annimo; Existem muitas regulamentaes que dificultam a migrao de clientes entre bancos, aumentando o seu poder de mercado. Dessa forma, a baixa concorrncia, influenciada pelo alto grau de risco de crdito, devido, principalmente, a essas informaes no confiveis juntamente com as dificuldades de migrao dos clientes entre bancos, aumenta a taxa de juros e, conseqentemente, aumenta o spread. Para o Banco Central (2003) as informaes pblicas e confiveis sobre os devedores so fundamentais para estimular a competio. De fato, no segmento das grandes empresas, em que a qualidade da informao publicamente disponvel melhor, a competio grande e os spreads relativamente pequenos. Segundo Henrique Meirelles (2004):A transparncia pea fundamental no processo de estmulo competio. A ampla e livre circulao de informaes condio fundamental para que sejam alcanados dois objetivos prioritrios deste governo: a expanso da oferta de crdito e a conseqente reduo dos spreads bancrios. (Banco Central, texto Palavras do Presidente do Banco Central, Dr. Henrique Meirelles, no Lanamento do Sistema de Informaes de Crdito (SCR) do Banco Central, 2004, p.3).

Entretanto, uma outra explicao que comumente tem sido dado ao comportamento dos spreads praticados no Brasil o elevado poder de mercado disputado pelos bancos, decorrente do aumento da concentrao bancria. Os bancos brasileiros, como em geral de todo o mundo, usufruem algum poder de mercado, eles no so agentes passivos subordinados s vontades de seus depositantes e s determinaes das autoridades monetrias, pois eles tm plena autonomia, por exemplo, para regular suas taxas de spread, de acordo com as expectativas dos prprios banqueiros em relao ao cenrio econmico futuro. Nos ltimos anos, observou-se, no Brasil, uma grande mudana no setor bancrio no que concerne concentrao e consolidao do mesmo. A proliferao de instituies que ocorreu desde a Reforma Bancria de 1964, instituda pela lei nmero 4595 de 31/12/196413Dispe sobre a poltica e as instituies monetrias, bancrias e creditcias, cria o Conselho Monetrio Nacional e da outras providencias.13

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fez com que surgissem grupos financeiros de vrios portes operando em bases nacionais. Essa lei financeira brasileira, adaptao da lei americana, permitia que o Brasil tivesse um sistema segmentado e com um papel preponderante para o Banco Central, que regulamenta e supervisiona o setor bancrio e executa as polticas monetrias e cambiais. Essa reforma bancria ocorreu no sentido de reestruturar o sistema financeiro brasileiro. As reformas visavam segmentar o sistema financeiro, ao induzir a especializao das instituies que operavam no mercado e ao estabelecer vnculos entre captaes e aplicao de recursos. Com isso aps a reforma de 1964, muitos grupos financeiros surgiram no Brasil. Em 1988 o Conselho Monetrio Nacional (CMN) criou atravs da Resoluo n. 1524 de 21/09/1988, a figura dos bancos mltiplos14, reorganizando as instituies oriundas das reformas anteriormente citadas. Essas instituies, embora diferenciadas entre si na organizao funcional e administrativa, apresentam em comum o fato de poderem oferecer todos os servios financeiros. As mudanas ocorridas no setor aps esta alterao e outras, como o artigo 19215 da Constituio de 1988, levaram ao aumento no nmero de instituies em operao no mercado nacional, passando de 124 em 1988 para 242 em 1995. Existe um consenso de que no perodo 1964-1988 havia uma tendncia concentrao desde a reforma bancria de 1964, resultado principalmente do incentivo das regulamentaes governamentais. O processo de concentrao foi mais intenso nas dcadas de 1960 a 1970. No entanto, o Plano Real, implantado no segundo semestre de 1994, mudou radicalmente o cenrio de atuao dos bancos no Brasil, levando o sistema a uma tendncia de reduo das instituies financeiras, processo inverso ao anterior. A reduo do nmero de bancos foi bastante expressiva, uma vez que em 1994 existiam 246 instituies no sistema contra 164 em 2002. Conclui-se, conforme dados da tabela 1, que aps esta consolidao o setor ficou mais concentrado, aumentando o poder de mercado dos agentes remanescentes.

O banco Mltiplo, segundo Carvalho aquele que combina pelo menos duas carteiras de um conjunto de quatro, entre as quais as mais importantes so as carteiras de banco comercial e banco de investimento. A separao dessas duas funes o fulcro sobre o qual repousa o conceito de segmentao. (CARVALHO, 2001, p. 312). 15 O Artigo 192 da Constituio estabelece que, a partir de ento, no haveria mais barreiras de entrada ao setor financeiro, eliminando o sistema de pontos que deveriam ser comprados para o ingresso no sistema. Aps a eliminao dessa barreira o nmero de bancos aumentou rapidamente.

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Tabela 3 - Nmero de Bancos no Brasil (1994/2003)

Ano 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003Fonte: Banco Central

Nmero de Bancos 246 242 231 217 203 193 192 182 167 164

A reduo do nmero de bancos no pas, conforme tabela 3, pode ser explicado pelo perodo de transformao expressiva por que passou o setor bancrio brasileiro, fruto da estabilizao da moeda, do saneamento do sistema financeiro, da abertura aos bancos estrangeiros, da privatizao de bancos estatais e do fluxo crescente de capitais internacionais. A onda de mudanas que o sistema financeiro brasileiro experimentou em paralelo s mudanas estruturais na nossa economia, associados queda da inflao reflete se no alto spread ainda pago pelos investidores e pela taxas pagas sobre os depsitos. Foram obtidos muitos ganhos de produtividade (emprstimos, por exemplo) atravs do processo. Economias de escala16 e escopo17 foram conquistadas, porm ao se analisar a evoluo do crdito concedido (agregado) com o spread praticado no se observa este repasse aos tomadores de emprstimos. Os spreads baixaram, mas ainda encontra-se em patamares altos se comparados com outros pases.

Economia de escala aquela que organiza o processo produtivo de maneira que se alcance a mxima utilizao dos fatores produtivos envolvidos no processo, buscando como resultado baixos custos de produo e o incremento de bens e servios. Ela ocorre quando a expanso da capacidade de produo de uma empresa ou indstria provoca um aumento na quantidade total produzida sem um aumento proporcional no custo de produo. 17 Economias de escopo existem quando a produo de um bem ou servio mais barata ou lucrativa quando realizada em conjunto com a produo de outros bens e servios do que isoladamente (CARVALHO, 2000, p. 301).

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Concluindo, uma baixa concorrncia e uma alta concentrao bancria18, acabam no impulsionando o mercado de crdito no pas, o que diminui as escalas de operaes dos intermedirios financeiros, aumentando seus custos unitrios e conseqentemente aumentando seus spreads, influenciando o crdito ao consumidor, tornando-o muito caro. No entanto, segundo Pinheiro (2003), o principal problema que ao mesmo tempo que reconhece-se o problema de baixa concorrncia, ningum responsabilizado por fomentar a competio no setor bancrio. Em particular, nem o Banco Central, nem mesmo os rgos de defesa da concorrncia tm o costume de atuar pr - ativamente nessa rea O debate sobre a competio nesse setor est focado, principalmente, em quem deve decidir sobre a fuso de bancos. Ainda que haja indefinies legais a esse respeito, tem prevalecido a preocupao com a sade do sistema financeiro e a posio de que essa deciso deve caber ao Banco Central, j que ela no poderia esperar pelos demorados trmites da SEAE Secretaria de Acompanhamento Econmico, da SDE Secretaria do Desenvolvimento Econmico e do CADE Conselho Administrativo de Defesa Econmica. Diante disso, surge um conflito de interesses importante, pois o Banco Central tambm responsvel pela regulao prudencial do setor financeiro e sob esta tica a competio ruim. Em vrios casos, a regulao prudencial orientada exatamente para limitar a competio e dessa forma coibir a tendncia das instituies financeiras a correr muito risco. As exigncias de capital mnimo que formam a base do Acordo da Basilia, so exemplos, disso. De fato, foi o excesso de competio que levou crise das Savings & Loans19 americanas nos anos 80. Assim, do ponto de vista do regulador, a falta de competio positiva, pois protege a sade financeira das instituies financeiras, tornando-as menos propensas ao risco e mais resistentes a choques.

Ao longo desses anos a concentrao bancria vem aumentando e o spread bancrio est reduzindo ( mas ainda continua alto se comparado com patamares internacionais) e a prova disso o aumento da margem liquida dos bancos, um dos componentes do spread bancrio. 19 A crise imobiliria americana no incio da dcada de 80, em que uma importante falta de liquidez gerou uma forte desvalorizao dos imveis, alterando completamente o mercado. A dcada anterior havia experimentado uma brilhante fase de incorporaes imobilirias, principalmente na produo de apartamentos, armazenagem e shopping centers, em negcios que envolveram mais de US$ 130 bilhes. A crise das savings and loans (companhias e bancos de crdito imobilirio) abalou o mercado, derrubando preos e criando srios problemas para os empreendedores, que no conseguiram liquidar seus compromissos. Para saber mais sobre assunto s entrar no site fundos de investimentos experincia americana.

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3.2.1.2 A Regulao Prudencial

Justamente por ser a instituio bancria uma sociedade empresarial peculiar, que serve de canal para a formao do nvel de oferta monetria, alm de ser financiador de projetos em atividades produtivas de diversos outros ramos da economia, existe uma regulao governamental sobre ela. A falncia de um banco pode causar transtornos econmicos bastante graves. Desse modo, os governos de todo o mundo agem intensamente na regulao prudencial, destinada a reduzir a exposio do sistema financeiro a riscos que possam se propagar por todas as instituies financeiras, e dos bancos em particular, visando garantir a estabilidade do sistema. As Regras de regulao prudencial, para o setor bancrio, foram desenvolvidas historicamente em resposta percepo de que problemas em instituies bancrias individuais poderiam acabar causando turbulncias muito mais profundas em todo o setor e, eventualmente, em toda a economia. Em outras palavras, dificuldades em bancos individuais envolviam o chamado risco sistmico, que a possibilidade de todo o sistema ser contagiado, afetando dessa forma o spread bancrio, pois quanto maior o risco, maior o spread. Segundo Carvalho (2005, p.2), o Contgio se refere ao risco de que problemas em uma dada instituio venham a contagiar todo o mercado, mesmo que as outras instituies estejam tomando todos os cuidados possveis para manter a solidez de suas operaes. O temor de riscos sistmicos fez com que se tomassem duas medidas. Num primeiro momento foram definidas regras de regulao prudencial, ( normas de comportamento visando minimizar a ocorrncia de dificuldades em bancos individuais, que pudessem dar origem a fenmenos de contgio); por outro lado, foi criada uma rede de segurana sob a forma de um emprestador de ltima instncia e de seguros de depsitos (em esquemas formais ou informais) que desse ao depositante alguma segurana quanto liquidez de seus depsitos mesmo no evento extremo do fechamento de um banco, no caso do Brasil, trata-se do Banco Central20. As medidas de natureza prudencial a serem adotadas voltavam-se para a proteo da operao do banco, restringindo a sua exposio a riscos, especialmente aqueles riscos que20

A superviso das instituies financeiras participantes do SFN exercida pelo Banco Central, por meio da fiscalizao do cumprimento das normas prudenciais estipuladas para seu funcionamento, assim como do acompanhamento de sua conduta em suas atividades, e, portanto, de sua sade financeira. Age, assim, de forma preventiva, detectando com a devida antecipao sintomas que podem indicar a ocorrncia de alguma crise antes mesmo que venha a acontecer.

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pudessem afetar a liquidez dos depsitos vista e de alguma forma abalar a confiana do pblico em sua conversibilidade em moeda legal. Dessa forma, a regulao prudencial consisti prioritariamente na definio de ndices adequados de liquidez para os bancos atravs da obrigao de manuteno de reservas primrias e secundrias; a regulao prudencial servia tambm para evitar a exposio a riscos excessivos atravs, por exemplo, da imposio de limites ao descasamento de ativos e passivos, restrio de linhas de negcios permitidas aos bancos, etc. Em outras palavras o objetivo da regulao prudencial impedir crises sistmicas, de modo que a instituio possa obter os maiores retornos possveis com menores riscos individuais. No Brasil o Banco Central o responsvel pela regulao prudencial do setor financeiro. O mtodo utilizado por reguladores e supervisores bancrios era de natureza prescritiva, baseado no princpio da autoridade. Acreditava-se que os bancos, na busca de lucros, sempre tentariam aproveitar as oportunidades que se lhes aparecessem. Segundo Carvalho (2005):O descasamento de ativos21 e passivos22, por exemplo, d-se normalmente, porque as taxas de juros tendem a cai com a maturidade ou durao do contrato. Assim, passivos mais curtos do que ativos possibilitariam ao banco pagar taxas de juros sobre suas obrigaes menores que as recebidas por seus direitos, gerando-se um spread positivo que contribuiria para o lucro da instituio. Cabia ao regulador coibir o aproveitamento de oportunidades que pudessem se constituir em ameaa estabilidade do sistema e, por isso mesmo, no se acreditava que o banco pudesse simplesmente priorizar a estabilidade sistmica como sendo de seu interesse. Conseqentemente, a regulao teria de ser tutelar, prescritiva, consistindo de regras impostas ao setor bancrio. (CARVALHO, 2005, p. 5).

As regras prudenciais adotadas pelo Brasil fazem parte de um pacote de condies pactuadas no Acordo da Basilia, que inclui, entre outras medidas, a seletividade na concesso de autorizaes para funcionamento de instituies financeiras, normas relacionadas ao gerenciamento de riscos de crdito, e previso de fiscalizao das instituies. Vale destacar que o Acordo da Basilia, desde sua implantao no Brasil, em agosto de 1994, at os dias de hoje, vem sofrendo alteraes de forma a tornar o padro de regulao bancria o mais adequado possvel, de maneira a regular o sistema bancrio do pas.

Segundo Mishkin (1998), os ativos so chamados de utilizaes de recursos, e os juros recebidos, sobre estes o que faz com que os bancos tenham lucros. (MISHKIN, 1998, p. 141) 22 o conjunto de obrigaes adquiridas pelos bancos dos quais fazem parte: produtos de captao, depsitos vista, depsitos a prazo, caderneta de poupana entre outros.

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3.2.1.3 A Assimetria de Informaes

Os problemas de assimetria de informao permeiam as relaes de crdito, pois os bancos no conseguem diferenciar o bom pagador e o mau pagador, aumentando a inadimplncia. Isso faz com que os bancos aumentem o spread como forma de prmio por correr esse risco. A assimetria de informao acontece quando ocorre uma transao ou operao entre duas partes ou mais e uma das partes detm mais informaes do que a outra, seja antes ou depois de firmado o contrato (a concesso de crdito, por exemplo). Isso causa desvantagens para a parte que estiver menos informada (poupador e tomador de emprstimos, por exemplo), pois a parte mais informada pode utilizar a informao a mais que possui para seu prprio proveito. Quando a falta de informao acontece antes de firmado o contrato a situao conhecida como problema de seleo adversa (informaes imperfeitas); quando a falta de informao acontece depois de concretizado as operaes, trata-se de risco moral. Para serem lucrativas, as instituies financeiras devem superar os problemas de seleo adversa e risco moral que aumentam a probabilidade de inadimplncia em emprstimos. (MISHKIN, 1998, p. 149). O sistema bancrio brasileiro contm a presena de assimetria de informaes e isso acontece, principalmente, na concesso de crdito. Existem diversas formas de se obter informaes a respeito dos investidores no mercado. Os bancos normalmente buscam informao atravs de diversas fontes, dentre elas destacam-se: Pesquisa ao Cadastro de Cheques sem Fundo: em que so disponibilizadas as ocorrncias de emisso de cheques sem lastro para pagamento; Pesquisa ao Registro de Ttulos Protestados: no qual disponibiliza o histrico de ttulos (normalmente duplicatas mercantis) que se encontram sem pagamento. Tambm d acesso a pedidos de concordata e falncia; Pesquisa Central de Risco do Banco Central23 (CRC): que disponibiliza o montante de crdito que determinado agente tem tomado no mercado bancrio (os dados so enviados mensalmente ao BC que os resume).23

A Central de Risco de Crdito do Banco Central (CRC) foi implantada em 1997 e tambm largamente utilizada entre os bancos, contudo neste trabalho s foram computados dados referentes aos ttulos protestados e aos cheques sem fundo.

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As informaes geradas dentro da prpria instituio merecem destaque. As empresas e indivduos costumam utilizar diversos servios oferecidos pelos bancos, tais como: cobrana de recebveis, pagamento de folha de salrios, recolhimento de impostos, seguros, arrendamentos, capital de giro, desconto de duplicata, dentre outros, atravs das prticas de fidelizao do cliente. Isso faz com que os bancos tenham uma vantagem sobre seus concorrentes, porque ao emprestar para seus clientes, ele sabe mais a respeito das caractersticas deles do que seus rivais. Contudo, estas informaes no esto disponveis ao mercado, logo se entende que empresas e indivduos se beneficiam em concentrar diversos produtos em uma mesma instituio de crdito. Esta dinmica confirma a existncia de custos relacionados troca de intermedirios por parte dos agentes superavitrios e deficitrios em recursos, que so os chamados custos de transferncia. Esses custos esto presentes, sobretudo, nas modalidades de crdito relacionadas com a manuteno de contas bancrias, como, por exemplo, cheque especial para pessoas fsicas e conta garantida para pessoa jurdica, so situaes em que os clientes esto praticamente presos a suas instituies bancrias, pela dificuldade de transferir as instituies concorrentes seu histrico cadastral e sua reputao24. Por exemplo, para se ter uma idia, para conseguir um crdito pessoal numa conta corrente aberta hoje, leva-se cerca de trs a quatro meses, dependendo da instituio financeira para ser aprovado. Esse o tempo necessrio para-se fazer um levantamento do seu comportamento de crdito com aquela instituio. Devido ao resultado de elevados custos de transferncias, as taxas de juros nestas modalidades so sensivelmente mais elevadas que em modalidades de substitutos prximos. Os custos de transferncias so maiores para as pessoas fsicas do que para as pessoas jurdicas, pois estas ltimas costumam se relacionar com diversas instituies, ao contrrio das pessoas que tm seu histrico de crdito com um nico banco, em sua grande maioria. Em sntese, as assimetrias de informaes, devido aos altos custos de transferncia podem explicar os elevados spreads observados entre modalidades de crdito como cheque especial e conta garantida quando afrontado com modalidades que so substitutos prximos. Um banco tem mais informao sobre as caractersticas de seus clientes do que seus concorrentes, e devido aos problemas de seleo adversa torna-se muito difcil atrair clientes de boa qualidade (bons pagadores) sem que os benefcios e ofertas concedidos tambm atraiam clientes de baixa qualidade25

. A seleo adversa faz com que os melhores clientes

acabem sendo informacionalmente capturados pelos bancos, criando mais uma vez altos24 25

Ver modificaes na resoluo 2.808 de 21/12/00 do Banco Central. Refere-se aos clientes mau pagadores, com histricos bancrios comprometedores.

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custos de transferncia. Dessa forma, no possvel para um banco fazer ofertas para atrair os melhores clientes de seu rival sem, ao mesmo tempo, tambm atrair os de pior qualidade. Em outras palavras, quando os agentes econmicos no conseguem distinguir os bons pagadores dos maus pagadores, ocorre a assimetria de informaes e o credor eleva as taxas de juros e os spreads de todos os muturios para suprir a inadimplncia de alguns. Entretanto, custa caro aos bancos obter informaes sobre quais so os clientes bons pagadores e quais no so. Essa despesa se torna um obstculo para instituies financeiras convencerem os bons clientes dos seus concorrentes a trocar de banco. Um banco que j tem um determinado cliente conhece, pelo seu tempo de relacionamento, o quo valioso ele , e, se tem um intenso relacionamento com a instituio e se bom pagador. Para esses bons clientes, o banco j cobra juros menores do que para os demais. Se um concorrente baixar os juros para atrair os bons clientes, o banco que detm bons clientes na sua carteira vai baixar os juros ainda mais para ret-los. E provavelmente vai deixar os maus pagadores trocarem de instituio financeira. No fim, o concorrente ir atrair apenas maus clientes. com base nessa teoria que o Banco Central vem priorizando em seus projetos de reduo do spread bancrio, a adoo de medidas que procuram reduzir a assimetria de informaes que, por sinal, no um problema restrito ao Brasil, mas uma caracterstica desse setor em todo o mundo. Velloso (2007), destaca numa entrevista recente com Guido Mantega, que o governo acelerar a aprovao do Cadastro Positivo no Congresso Nacional, e que a fazenda liberar recursos para que o Banco Central agilize o aperfeioamento da sua central de risco. Isso far com que o sistema possa disponibilizar tambm informaes de tomadores de recursos, a partir de trs mil reais, pois hoje a Central s tem informaes para crditos acima de cinco mil reais. Hoje todo cliente considerado de alto risco e o Cadastro Positivo e a central de risco do Banco Central vo justamente melhorar a informao sobre cada pessoa, disse Mantega, nessa entrevista. Segundo o Relatrio Bancrio (2007), a aprovao da conta salrio um exemplo de incentivo competio bancria. Vejo que este assunto est caminhando na direo que a Febraban sempre defendeu, j que a entidade favor da concorrncia. Ficar a critrio de cada banco definir os melhores mecanismos para atrair clientes, seja via convenincias, facilidades de emprstimos, menores tarifas, relacionamento com o gerente..., disse Fabio Barbosa no relatrio. Aqui, convm salientar, que os clientes s tero a ganhar com isso, sem contar que

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contribuir para reduo dos spreads, atravs da reduo de riscos devido a maiores informaes de seus clientes. Entretanto, segundo Braga (2000), existem vrios incentivos s aes que resultem em problemas de risco moral26, a saber: Quando o custo de inadimplncia menor do que o custo de quitar a dvida; Quando, numa situao de inadimplncia, a possibilidade de renegociao para devedor mais vantajosa sob o ponto de vista do credor; Quando o esforo do devedor na conduo do empreendimento financiado no observado pelo credor. Isto tudo leva a uma averso a riscos da parte dos bancos que por esse motivo tendem a ter dificuldades em diversificar seus portflios. Um outro problema enfrentado pelo risco moral e que merece ateno a demora na cobrana e execuo das garantias (sistema judicirio), alm, claro, da dificuldade de acionar juridicamente gestores e acionistas de sociedades limitadas, tudo isso faz com que surjam barreiras aquisio de emprstimos e elevem o spread. Em uma entrevista feita com Fabio Barbosa, Presidente da Febraban (2007), ele disse que o principal trabalho da Febraban nesse momento o de fortalecer cada vez mais os instrumentos de garantia, transparncia e controle do risco. Um exemplo o cadastro positivo, que ajudar o setor a atuar de forma mais gil tambm junto pequena empresa. Segundo ele, o cadastro positivo, ser muito importante para termos mais transparncia e podermos precificar melhor o custo do crdito, e com isso reduzir os spreads. Uma outra medida importante, ao longo desses anos, ao lado da Lei de Falncias, a criao do crdito consignado27 em folhas de pagamentos. Levando em considerao as melhores garantias, podemos dizer que se trata de uma linha de crdito com as menores taxas, menores riscos e tambm reduzidos spreads. Em um estudo feito pelo Banco Central (2006), foi medido o quanto exatamente os juros nos emprstimos consignados so menores levando em conta apenas os efeitos das melhores garantias. Para chegar a esse valor, os pesquisadores selecionaram um grupo de pessoas, a partir de dados da Central de Risco de Crdito do Banco Central, que tomaram tanto emprstimos pessoais quanto crdito consignado. Foram selecionadas 34,8 mil operaes de crdito pessoal e 27,5 mil de crdito consignado, em dezembro de 2003, com valores a partir de R$ 5 mil. Os pesquisadores chegaram concluso de que existe uma26 27

O risco moral trata-se de como ser o comportamento do cliente depois que efetuar o crdito. O emprstimo consignado foi implantado pela Lei 10.820, de 17 de dezembro de 2003.

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diferena de 13 pontos percentuais entre as taxas de juros das duas modalidades de crdito que pode ser atribuda exclusivamente s melhores garantias dos emprstimos consignados. Dentre os impactos dos efeitos da assimetria de informao sobre o mercado de emprstimos, destaca-se a limitao da oferta de crdito mediante informaes negativas quanto reputao dos investidores. Diante disso, nota-se que o banco restringe o crdito em funo de informaes negativas de seus clientes. medida que os bancos tenham informaes imperfeitas a cerca dos seus clientes, eles no podem diferenci-los com relao ao baixou ou alto risco. Nesse ambiente de incertezas os riscos assumidos um dos motivos dos elevados spreads bancrios. Para Ribeiro (2007), as assimetrias de informaes produzem falhas no funcionamento do mercado, permitindo, por exemplo, o exerccio de poder de mercado para auferir lucros excessivos. Isso se deve ao fato de os bons clientes no conseguirem se diferenciar dos demais e ficando na maioria das vezes, presos aos bancos que conhecem melhor o seu histrico de pagamento de dvidas. Os bancos se aproveitam dessa situao para cobrarem spreas mais elevados. Os bancos em funo dos problemas com assimetria de informaes, como seleo adversa e risco moral, acabam influenciando o spread bancrio brasileiro. Por um lado, tende a aumentar os custos, especialmente, os custos de transferncias, aumentando o risco e a taxa de juros de emprstimos e elevando, consequentemente, os spreads. Por outro lado, os bancos tambm podem optar pelo racionamento do crdito. O risco de falncia explica este comportamento, pois, medida que os bancos detm as informaes de seus investidores sejam elas imperfeitas ou no a acerca dos projetos propostos, a dificuldade de diferenci-los (entre de baixo risco e alto risco) pode levar ao racionamento e encarecimento do crdito, aumentando mais uma vez os spreads. Dessa maneira, a reduo da assimetria de informaes entre emprestadores e tomadores de crdito acaba permitindo a ampliao do crdito e a reduo do spread bancrio.

3.2.2 Os Fatores Macroeconmicos

Nesta seo sero destacados os fatores macroeconmicos que mais influenciam o spread bancrio brasileiro.

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3.2.2.1 As Incertezas do Ambiente Econmico

Uma explicao importante para a causa dos elevados spreads bancrios seria a instabilidade macroeconmica que provoca incertezas no ambiente econmico. No caso do Brasil, dada instabilidade macroeconmica que tem caracterizado a economia desde o incio dos anos de 1980, de se esperar que os fatores macroeconmicos tenha