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Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Revista Jurídica: órgão nacional de doutrina, jurisprudência, legislação e crítica judiciária. Ano 64, nº 470, Dezembro de 2016.

Diretor: Elton José Donato

Bimestral: 1953-1962; trimestral: 1963-1965; irregular: 1966-1967; anual: 1968; trimestral: 1977; bimestral: 1982; mensal: 1988

Tiragem: 4.000 exemplares

ASSINATURAS: São Paulo: (11) 2188-7507 – Demais Estados: 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico:São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188-7900

Demais Estados: 0800.7247900

Os conceitos emitidos em trabalhos assinados são de responsabilidade de seus autores. Os originais não serão devolvidos, embora não publicados. Os artigos são divulgados no idioma original ou traduzidos.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias dos originais obtidas na Secretaria do Supremo Tribunal Federal e dos demais tribunais.

Proibida a reprodução parcial ou total, sem autorização dos editores.

E-mail para remessa de artigos: [email protected]

© Revista Jurídica®

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036-060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

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ISSN 0103-3379

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ANO 64 – DEZEmBRO DE 2016 – Nº 470

RepositóRio AutoRizAdo de JuRispRudênciASupremo Tribunal Federal: 03/85

Superior Tribunal de Justiça: 09/90Tribunais Regionais Federais 1ª, 2ª e 4ª Regiões

FundAdoR

Professor Angelito Asmus Aiquel

diRetoR executivo

Elton José Donato

GeRente editoRiAl e de consultoRiA

Eliane Beltramini

cooRdenAdoR editoRiAl

Cristiano Basaglia

conselho editoRiAlAda Pellegrini Grinover – Alexandre Pasqualini – Alexandre Wunderlich

Anderson Vichinkeski Teixeira – Antonio Janyr Dall’Agnol Jr.Araken de Assis – Arruda Alvim – Carlos Alberto molinaro

Cezar Roberto Bitencourt – Daniel Francisco mitidiero – Daniel UstárrozDarci Guimarães Ribeiro – Eduardo Arruda Alvim – Eduardo de Oliveira Leite

Eduardo Talamini – Ênio Santarelli Zuliani – Fátima Nancy AndrighiFredie Didier Júnior – Guilherme Rizzo Amaral – Humberto Theodoro Júnior

Ingo Wolfgang Sarlet – Jefferson Carús GuedesJoão José Leal – José Carlos Barbosa moreira – José maria Rosa TesheinerJosé Roberto Ferreira Gouvêa – José Rogério Cruz e Tucci – Juarez Freitas

Lúcio Delfino – Luis Guilherme Aidar Bondioli Luís Gustavo Andrade madeira – Luiz Edson Fachin – Luiz Guilherme marinoniLuiz manoel Gomes Júnior – Luiz Rodrigues Wambier – márcio Louzada Carpena

mariângela Guerreiro milhoranza – Paulo Luiz Netto LôboRolf madaleno – Salo de Carvalho – Sergio Cruz Arenhart

Sérgio Gilberto Porto – Teresa Arruda Alvim Wambier – William Santos Ferreira

colAboRAdoRes destA ediçãoAna Kelly Rolim Assunção, Daniel Ustárroz, Ezequiel morais, Leonardo Alves de Oliveira,

Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson

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Sumário

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Doutrinas

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

1. Artigo 733 do CPC: Procedimento Extrajudicial FacultativoEzequiel Morais e Ana Kelly Rolim Assunção ................................9

2. O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 3.146/2015), Seus Direitos e o Novo Paradigma da Capacidade CivilLeonardo Alves de Oliveira ..........................................................43

PareCer JurídiCo

1. Sentença Disponibilizada em Cartório em Dia Distinto Daquele Anunciado em Audiência. Embargos de Declaração Opostos por um Litisconsorte. Interrupção do Prazo para a Interposição de Recursos pelas Demais Partes. Aferição da Tempestividade e do Interesse Recursal. Exegese dos Artigos 1.026 do NCPC e 897-A da CLT. Valorização dos Princípios Constitucionais do ProcessoDaniel Ustárroz ...........................................................................55

Penal e ProCessual Penal

1. Um Breve Estudo sobre a Questão da Redução da Maioridade Penal: Uma Involução em Matéria PenalRocco Antonio Rangel Rosso Nelson ...........................................73

Jurisprudência

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ..........................................................105

2. Superior Tribunal de Justiça .......................................................111

3. Superior Tribunal de Justiça .......................................................119

4. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .....................................127

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ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial ....133

Penal e ProCessual Penal

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça .......................................................157

2. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .....................................165

3. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .....................................179

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Penal e Processual Penal .....................191

Índice Alfabético e Remissivo ...................................................215

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EDITORIAL

A Revista Jurídica trata de temas atuais e de suma relevância aos profissionais do direito. Os trabalhos doutrinários, de autoria de relevantes juristas, são divididos nas áreas cível e penal.

Doutrina Cível

O Mestrando Ezequiel Morais e a Especialista Ana Kelly Rolim Assunção asseveram que o procedimento extrajudicial era facultativo, não era obrigatório, que a Lei nº 11.441/2007 não impunha, exclusivamente, o caminho extrajudicial. O debate foi intenso nas searas doutrinária e judicial. E continuou depois, em 2010, com a aprovação da Lei nº 11.965/2009 e da Emenda Constitucional nº 66/2010 (“PEC do Divórcio”). Mas agora acredita-mos que a questão está, finalmente, resolvida com o advento do CPC/2015 e com a interpretação e fundamentos que sempre adotamos. Tanto é verdade que no CPC então projetado (art. 667 da redação original do Projeto de Lei no Senado nº 166/2010, e, depois, art. 699, com as alterações apresentadas no relatório geral do Senador Valter Pereira), um pouco antes das discussões finais, constava o termo “serão realizados”, porém, nos últimos instantes, foi substituído por “poderão ser realizados”. Parece-nos, portanto, bem clara a intenção do legislador no texto definitivo, aprovado e sancionado (art. 733, que substituíra o art. 1.124-A do CPC/1973).

O Especialista Leonardo Alves de Oliveira traz algumas reflexões acer-ca dos direitos assegurados aos deficientes e de institutos insculpidos no re-ferido diploma, tais como a curatela e a tomada de decisão apoiada, bem como analisar a nova perspectiva da capacidade civil em face do advento da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, buscando averiguar as alterações realizadas com o advento da Lei nº 13.146/2015 no ordenamento jurídico pátrio.

O Professor Daniel Ustárroz elaborou um Parecer Jurídico com a se-guinte questão: “Sentença Disponibilizada em Cartório em Dia Distinto Da-quele Anunciado em Audiência. Embargos de Declaração Opostos por um

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Litisconsorte. Interrupção do Prazo para a Interposição de Recursos pelas Demais Partes. Aferição da Tempestividade e do Interesse Recursal. Exegese dos Artigos 1.026, NCPC e 897-A, CLT. Valorização dos Princípios Constitu-cionais do Processo”.

Doutrina Penal

O Jurista Dr. Rocco Antonio Rangel Rosso Nelson teceu um breve estu-do sobre a questão da redução da maioridade penal.

Os Editores

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Doutrina

Do

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Cível

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Artigo 733 do CPC: ProCedimento extrAjudiCiAl FACultAtivo

EzEquiEl Morais

Mestrando em Direito Civil pela USP (Faculdade de Direito do Largo São Francisco), Advogado, com estágio no Studio Legale Associato Pezone

(Itália), Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), Professor em pós-graduações. Autor e coautor de obras jurídicas.

ana KElly roliM assunção

Advogada, Pós-Graduada em Direito Civil e Processual Civil.

SUMÁRIO: 1 Introdução e breves notas sobre a evolução do tema, desde 2007, na doutrina, legislação e jurisprudência brasileiras; 2 Inexistência de “instância” administrativa obri-gatória [ressalvadas as exceções]; 3 Jurisdição voluntária, pre-ceitos constitucionais e facultatividade; 4 Mens legis e mens legislatoris; 5 O artigo 1.124-A do CPC/1973 e a jurisprudência; 6 As mudanças trazidas pelo CPC/2015 e a consolidação da “facultatividade”; 7 Considerações finais; Referências.

1 introduÇÃo e BreveS notAS SoBre A evoluÇÃo do temA, deSde 2007, nA doutrinA, legiSlAÇÃo e juriSPrudÊnCiA BrASileirAS

Nous voyons tous les jours la société refaire la loi, on n’a jamais vu la loi refaire la société. (Jean Cruet)1

1 CRUET, Jean. A vida do direito e a inutilidade das leis (original: La vie du droit et l’impuissance des lois. Paris, 1908). Antiga Casa Bertrand-José Bastos e Cia, Livraria

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O ordenamento jurídico pátrio passou por considerável avanço duran-te as três últimas décadas e rompeu paradigmas seculares. O advento dos novos códigos e as reformas trazidas pelo Pacote Republicano – destinadas a imprimir celeridade aos processos e a “desafogar” o Poder Judiciário – trou-xeram substanciais alterações nos âmbitos civil e processual.

Com tal desiderato, por exemplo, foram aprovadas a Lei nº 11.441/2007 e a Emenda Constitucional nº 66/2010 [chamada anteriormente de “PEC do Divórcio”]. A primeira tornou possíveis os inventários, as partilhas e o di-vórcio pela via administrativa; e a segunda, que alterou o § 6º do art. 226 da Constituição Federal, extinguiu a separação judicial e a extrajudicial [espécies da separação de direito]. Ambas as normas trouxeram redução de despesas e de tempo, tanto para o Estado quanto para os cidadãos.

Seguindo essa tendência, entrou em vigor o novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.03.2015), que, entre tantas outras bem-vindas ino-vações, previu a possibilidade de extinção consensual da união estável no âmbito extrajudicial e ampliou as hipóteses de reconhecimento de usucapião.

E mais, no que diz respeito às novidades legislativas: brevemente [espera-se!], o Projeto do Estatuto das Famílias2 constituir-se-á, também, em marco importantíssimo no Direito pátrio.

Esse intenso movimento legislativo mostra-se essencial para acompa-nhar a realidade sócio-jurídica e para consagrar e efetivar os valores recep-cionados pela Constituição Cidadã de 1988. Para tanto, em um diálogo ainda em etapa de construção, mister interpretar as normas e os princípios que re-gulam o direito de família e das sucessões, tendo em vista o respeito à digni-dade da pessoa humana3, ou seja, é preciso valorar mais o afeto do que a estrita

Editora: Lisboa, 1908 (Bibliotheca de Philosophia Scientifica), em epígrafe à abertura da obra. Tradução livre dos autores do presente trabalho: Nós vemos, todos os dias, a sociedade refazer a lei; jamais vimos a lei refazer a sociedade.

2 O Projeto do Estatuto das Famílias (PL 2.285/2007, de autoria do Deputado Sérgio Carneiro – PT-BA) e a EC 66/2010 (“PEC do Divórcio”) foram sugeridos pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

3 Nesse sentido, afirmamos em outra obra que “o novo Código Civil, na esteira da evolução doutrinária e jurisprudencial, estabeleceu novos direitos e, por consequência, novos deveres; oportunizou inéditas leituras de novos princípios – e releitura de antigos também” (MORAIS, Ezequiel. Resolução por onerosidade excessiva: inovação legal benéfica ou maléfica? In: CARVALHO NETO, Inácio de (Coord.). Os novos direitos após seis anos de vigência do Código Civil de 2002. Curitiba: Juruá, capítulo 09, 2009. p. 186).

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legalidade, como prefaciou Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka a obra de Flávio Tartuce e José Fernando Simão4.

Inclusive, no intuito de reduzir obstáculos legais desnecessários e injus-tos nos procedimentos extrajudiciais, o legislador previu agora no CPC/2015 a assistência por defensor público, a qual foi introduzida no ordenamento por meio da Lei nº 11.965/2009 – antes disso, as partes interessadas deveriam ser assistidas somente por advogado5.

De fato, tais modificações legislativas são relevantes, mas não é o bas-tante! Necessária, portanto, a mudança de mentalidade no seio jurídico – nos seus mais diversos matizes – e na própria sociedade.

Se a instituição do divórcio extrajudicial pela Lei nº 11.441/2007 gerou grandes dúvidas e questionamentos de ordem administrativa e processual, notadamente pela ausência de um prazo razoável de vacância [o que fez com que a doutrina e a jurisprudência aclarassem o texto legal na tentativa de sanar as eventuais omissões], a promulgação do novel CPC acena para paci-ficação das questões controvertidas mencionadas.

A propósito, assim dispõe o art. 733, cuja redação é bastante semelhan-te àquela do 1.124-A do CPC anterior:

O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual da união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura públi-ca, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731.

Aproveitamos a oportunidade para abrir breve parêntese e dizer que concluímos pela extinção da separação de direito em nosso sistema após a Emenda Constitucional nº 66/2010. E já fechando o parêntese, nesse mes-mo sentido posicionam-se Flávio Tartuce6, Giselda Hironaka, Maria Berenice

4 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil – Direito de família. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2008.

5 Arts. 610, § 2º, e 733, § 2º, do novo CPC (Lei nº 13.105/2015), respectivamente: “[...] § 2º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial”. “[...]. § 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os interessados estiverem assistidos por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial”.

6 Frisa-se, como já dito, que a separação judicial foi extinta no nosso sistema com o advento da Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, que alterou o § 6º do art. 226 da Constituição Federal, com a seguinte redação: “O casamento civil pode ser dissolvido

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Dias, Rodrigo da Cunha Pereira, José Fernando Simão, Paulo Lôbo e Zeno Veloso [entre tantos outros].

Continuando, da rápida leitura do CPC/2015, poderiam surgir os mes-mos questionamentos referentes à lei anterior: o divórcio, a partilha e o in-ventário, desde que satisfaçam as exigências legais, devem ser realizados ex-trajudicialmente, isto é, o procedimento extrajudicial é obrigatório? Será esse o espírito da lei – restringir direitos? Limitar em vez de ampliá-los? Serão essas a mens legis e a mens legislatoris?

Antes, pois, de uma análise mais acurada da controvérsia, cumpre ob-temperar que já se passou o tempo [nada nostálgico, diga-se en passant] da exigência de exaurir a instância administrativa para, somente após, ser pos-sível acessar o Judiciário. As incessantes mudanças conceituais e estruturais bradam por leis modernas, por interpretações finalísticas e extensivas, em prestígio às novas gerações [ou dimensões] de direitos humanos e ao princí-pio da dignidade da pessoa humana – megaprincípio.

Na moldura ora delineada, vale ressaltar a vontade expressa e indubi-tável do legislador na aprovação do art. 733 do CPC. Nesse diapasão, pro bono publico, veremos adiante que a Lei nº 13.105/2015 não obsta [nem deveria!] a utilização da via judicial7.

Sempre afirmamos, desde 2007, que o procedimento extrajudicial era facultativo, não era obrigatório, que a Lei nº 11.441/2007 não impunha, ex-clusivamente, o caminho extrajudicial. O debate foi intenso nas searas dou-trinária e judicial. E continuou depois, em 2010, com a aprovação da Lei nº 11.965/2009 e da Emenda Constitucional nº 66/2010 (“PEC do Divórcio”). Mas agora acreditamos que a questão está, finalmente, resolvida com o ad-vento do CPC/2015 e com a interpretação e fundamentos que sempre ado-tamos.

pelo divórcio”. O novo texto tem aplicação imediata e eficácia horizontal, o que quer dizer, segundo Flávio Tartuce, que a emenda tem plena incidência nas relações privadas, independentemente de qualquer norma infraconstitucional.

7 Situação semelhante ocorre em um dos procedimentos de jurisdição voluntária: a notificação (e a interpelação também) – que pode ser feita tanto na esfera administrativa quanto na judicial. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ mostra-se uníssona: “1. A notificação judicial ou administrativa deve observar as exigências legais, de molde a afastar qualquer dúvida razoável de que o objetivo do ato foi alcançado, principalmente quando envolvida pessoa física [...]” (STJ, 1ª T., REsp 379332/RS, Rel. Min. José Delgado, J. 19.02.2002, DJ 25.03.2002, p. 207. Decisão: por unanimidade, recurso especial desprovido).

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Tanto é verdade que no CPC então projetado (art. 667 da redação origi-nal do Projeto de Lei no Senado nº 166/2010, e, depois, art. 699, com as alte-rações apresentadas no relatório geral do Senador Valter Pereira), um pouco antes das discussões finais, constava o termo “serão realizados”, porém, nos últimos instantes, foi substituído por “poderão ser realizados”. Parece-nos, portanto, bem clara a intenção do legislador no texto definitivo, aprovado e sancionado (art. 733, que substituíra o art. 1.124-A do CPC/1973).

2 inexiStÊnCiA de “inStÂnCiA” AdminiStrAtivA oBrigAtÓriA [reSSAlvAdAS AS exCeÇÕeS]

A Constituição Federal de 1967 dispunha em seu art. 153, § 4º (com redação dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977), que “[...] o ingresso em juízo poderá ser condicionado a que se exauram previamente as vias ad-ministrativas, desde que não exigida garantia de instância, nem ultrapassado o prazo de cento e oitenta dias para a decisão sobre o pedido”.

Entrementes, a necessidade de exaurimento da via administrativa ex-posta no referido mandamento constitucional foi afastada pela diretriz con-tida no art. 5º, XXXV, da atual CRFB/1988: “A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”8. Trata-se do princípio da ina-fastabilidade da jurisdição – tema que será abordado a seguir em item pró-prio. Desde então, há a possibilidade [leia-se faculdade] de se optar pela via administrativa ou judicial. As exceções, nesse caso, são (i) a justiça desporti-

8 Para a caracterização do interesse processual e para o ingresso em juízo, é desnecessário o esgotamento das vias administrativas. Em nosso sistema jurídico-constitucional, não deve haver oportunidade para contestar a supremacia da atividade jurisdicional em relação à atuação e às decisões proferidas em sede administrativa. Os efeitos da coisa julgada só emanam dos órgãos judiciários (art. 92 da CF/1988). Nesse sentido: “O prévio exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação judicial [...], eis que em plena vigência o comando da Súmula nº 213 do extinto Tribunal Federal de Recursos, que afasta por completo dita exigência; ademais, admitir-se tal condicionamento importaria em violação ao princípio do livre acesso ao Poder Judiciário, insculpido no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal” (STJ, 6ª T., REsp 158165/DF, 1997/0088172-5, Rel. Min. Fernando Gonçalves, J. 24.03.1998, DJ 03.08.1998, p. 341, decisão: por maioria, conhecer do recurso, vencido o ministro relator).

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va9, (ii) o habeas data10 e (iii) a reclamação de ato administrativo que contrarie súmula vinculante11.

Em igual sentido, explica Alexandre de Moraes que “inexiste obrigato-riedade de esgotamento da instância administrativa para que a parte possa acessar o Judiciário”12. E, mediante retrospecto legislativo, conclui:

A Constituição Federal de 1988, diferentemente da anterior, afastou a ne-cessidade da chamada jurisdição condicionada ou instância administrativa de curso forçado, pois já se decidiu pela inexigibilidade de exaurimento das vias administrativas para obter-se o provimento judicial, uma vez que excluiu a permissão, que a Emenda Constitucional nº 7 à Constituição ante-rior estabelecera, de que a lei condicionasse o ingresso em juízo à exaustão das vias administrativas, verdadeiro obstáculo ao princípio do livre acesso ao Poder Judiciário.13

Noutro vértice, convém frisar que não existe óbice para criação de me-canismos administrativos, como nos casos previstos, por exemplo, na Lei nº 9.307/1996 [arbitragem], na Lei nº 11.441/2007 [que instituiu o divórcio na esfera extrajudicial] e na Lei nº 11.977/2009 [que possibilitou o reconheci-

9 CF/1988: “Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não formais, como direito de cada um, observados: [...] § 1º O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva, regulada em lei”.

10 Deve ser utilizado o habeas data para conhecer ou retificar informações pessoais somente após a recusa na prestação de informação pelo Poder Público ou em virtude de sua omissão. É necessário, via de regra, o esgotamento da instância administrativa.

11 Em decorrência da Emenda Constitucional nº 45/2004, a Lei nº 11.417/2006 regulamentou a súmula vinculante e a reclamação [quando houver decisão judicial ou ato administrativo em sentido contrário ao da súmula], ambas previstas no art. 103-A da Carta Magna. Entretanto, a reclamação perante o STF apenas será conhecida se esgotadas todas as vias administrativas, nos termos do art. 7º, § 1º, da citada lei. Implantou-se, então, uma espécie de contencioso administrativo obrigatório mitigado. Vale dizer que não podemos confundir o acesso ilimitado ao Poder Judiciário, tal como exposto no art. 5º, XXXV, da CF/1988, com o acesso direto ao STF (justiça constitucional concentrada ou final) – órgão este dotado de jurisdição restrita. Por tal motivo, consideramos que a reclamação mencionada no art. 103-A, § 3º, está inserida no rol das exceções à inafastabilidade da jurisdição, com a justiça desportiva e o habeas data, ou seja, deve prevalecer nas três hipóteses referidas a obrigatoriedade do prévio esgotamento das instâncias administrativas, sob pena de não cumprir a finalidade da lei (súmulas vinculantes e impeditivas de recursos) e inviabilizar o próprio Supremo Tribunal Federal.

12 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 72.13 Ibidem.

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mento administrativo da usucapião]14. Tais normas visam, entre outros fins, a subtrair do Poder Judiciário considerável parte das ações de jurisdição con-tenciosa ou voluntária que ali possam tramitar, no afã de imprimir mais cele-ridade e gerar menos onerosidade.

No que se refere à arbitragem, necessário dizer que a própria lei, per si, não veda o acesso ao Poder Judiciário – desde que as partes não tenham firmado o compromisso arbitral [e ainda: CDC, art. 51, VII]. Ora, eis mais uma faculdade conferida ao cidadão: escolher a Corte arbitral ou optar pelo Judiciário. Observa-se, portanto, que foi respeitado o direito de “ação proces-sual”, de acesso à jurisdição.

Do mesmo modo, o art. 60 da Lei nº 11.977/2009 admite a possibilida-de [não obrigatoriedade] de reconhecimento da usucapião no ofício de regis-tro de imóveis, nas hipóteses previstas em lei.

E não é só. A Lei nº 13.105/2015 também alterou e dispôs sobre outras normas, como, por exemplo, o seu art. 1.071, que acrescentara o art. 216-A na Lei de Registros Públicos (6.015/1973). Ei-lo, o texto:

Art. 216-A. Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reco-nhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o cartório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado, instruído com [...].

Acerca do comando legal supratranscrito, frisamos: “sem prejuízo da via jurisdicional”. Enfim, é indubitável que são vários os dispositivos que for-necem opção ao cidadão para escolher a via jurisdicional ou administrativa. Não haveria razão para restringir a uma só via.

Diante disso, urge destacar que normas infraconstitucionais não po-dem afastar negócios e vínculos jurídicos da apreciação judicial. A restrição de direitos, conforme a história demonstra, é totalmente desaconselhável. Já havíamos mencionado em recente obra que, no âmbito processual civil, sur-gem de todos os lados várias insurgências quanto às novas leis, pois

a processualidade democrática vem sendo completamente desconsiderada sob o pretexto de imprimir celeridade à prestação jurisdicional. Vivemos

14 Cumpre destacar que a Lei nº 11.977/2009 – que instituiu o Programa “Minha Casa, Minha Vida” – inovou ao prever a possibilidade do reconhecimento extrajudicial de usucapião em áreas de interesse social.

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o auge da ditadura processual. Hoje, é evidente o sacrifício de princípios para a consecução de objetivos a curto prazo.15

Mas há outras alternativas na processualística civil que provam ser possível a existência simultânea – ou “a convivência pacífica” – de procedi-mentos judiciais não contenciosos e de procedimentos extrajudiciais [admi-nistrativos] que têm a mesma finalidade, a mesma ratio legis. Destacam-se, em especial, a notificação, o protesto e a interpelação (art. 397 do CCB/200216 e arts. 726, 727, 728 e 729 do CPC/2015).

No caso, tanto a lei quanto a doutrina não exigem o exaurimento dos meios extrajudiciais disponíveis como “pré-requisito” para acessar o Poder Judiciário.

Do raciocínio aqui expendido afigura-se pertinente o entendimento de Humberto Theodoro Júnior:

O protesto, a notificação e a interpelação são procedimentos não conten-ciosos, meramente conservativos de direitos, que não podem ser incluídos tecnicamente entre as medidas cautelares. [...] De regra, são formas de ex-teriorização de vontade ou de representação ou ideia, porém são negócios judiciais, muito embora se subordinem às normas de direito material re-lativas às declarações de vontade em geral e às de capacidade processual (omissis). O novo Código Civil deu maior flexibilidade ao procedimento da interpelação, pois admite que a constituição em mora tanto se dê por meio da interpelação judicial como pela extrajudicial.17

Como visto, é evidente que a “disponibilidade” e a “facultatividade” são vocábulos aptos a habitar o art. 733 do CPC, no sentido de manter para os casais alternativa para divorciarem-se, consensualmente, por meio de proces-so judicial ou de procedimento extrajudicial. Ademais, a sistemática adotada na CF/1988 prestigia o acesso pleno e incondicional ao Judiciário (considera-

15 MORAIS, Ezequiel. A inexistência de novação na confissão de dívida bancária. In: HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes (Coord.). A outra face do Poder Judiciário: decisões inovadoras e mudanças de paradigmas. Belo Horizonte: Del Rey, v. 2, 2007. p. 1.

16 CCB/2002: “Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor. Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação judicial ou extrajudicial”.

17 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Processo cautelar. 21. ed. rev. e atual. São Paulo: Leud, 2004. p. 381 e 383.

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do esse acesso um direito fundamental), ou seja, não é conditio sine qua non o exaurimento da via administrativa.

Acionar o Estado-administrador não deve ser pré-requisito, salvas as exceções legais, para requerer ao Estado-juiz pronunciamentos oriundos de jurisdição contenciosa ou voluntária [meramente administrativa]. Por tal ra-zão, o colendo Superior Tribunal de Justiça18 tem proclamado: “Processual civil. Administrativo. Esgotamento de vias administrativas. Desnecessida-de. O STJ possui entendimento firmado no sentido de ser desnecessário o exaurimento das vias administrativas para o ingresso em juízo”. Seguindo a mesma linha do STJ e do Conselho Nacional de Justiça (art. 2º da Resolução nº 35), vários tribunais estaduais (TJSP19, TJMG20 e TJMT21) formaram grupos de estudos compostos de Magistrados, promotores, advogados, professores e representantes dos notários e concluíram, em resumo, que a utilização do Estado-juiz é uma faculdade das partes.

18 REsp 764560/PR, 5ª T., 2005/0110122-6, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, J. 07.03.2006, DJ 01.08.2006, p. 529. Decisão: recurso especial conhecido e parcialmente provido, por unanimidade.

19 Grupo de Estudos da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo, instituído pela Portaria CG nº 01/2007 (DOE-SP de 11.01.2007) e Provimento CG nº 33/2007. As conclusões do Grupo de Estudos da CGJ-SP, após um breve período de discussão, foram aprovadas pelo TJSP e publicadas no dia 08.02.2007 (DOE-SP, Judiciário, Caderno 1, Parte I, p. 3, de 08.02.2007). Transcrevem-se, a seguir, no que importa ao tema aqui abordado, duas conclusões de caráter geral: [...] (i) “Ao criar inventário e partilha extrajudiciais, separações e divórcios também extrajudiciais, ou seja, por escrituras públicas, mediante alteração e acréscimo de artigos do Código de Processo Civil, a Lei nº 11.441, de 04.01.2007, não obsta a utilização da via judicial correspondente; (ii) Pela disciplina da Lei nº 11.441/2007, é facultado aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial. A qualquer momento, podem desistir de uma, para promoção da outra; não podem, porém, seguir com ambas simultaneamente” [...].

20 Provimento nº 164 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, publicado no Diário do Judiciário-MG em 02.03.2007: “[...] Art. 9º A existência de processo judicial em andamento, desde que não tenha sido proferida a sentença objetivando a separação consensual, o divórcio consensual, o inventário ou a partilha, não impede que o mesmo ato seja feito por escritura pública. Parágrafo único. Havendo processo judicial, constará da escritura o juízo onde tramita o feito, o qual será comunicado pelo tabelião, no prazo de trinta dias do ato, sobre sua lavratura [...]”.

21 Provimento nº 02/2007 da Corregedoria Geral de Justiça do Estado do Mato Grosso: [...] Item 9.7.1. “A possibilidade de lavrar escrituras de separação, divórcio, inventário e partilha e, por extensão, de sobrepartilha e de restabelecimento da sociedade conjugal, na separação, antes do divórcio, não impede que os respectivos atos sejam realizados judicialmente, podendo começar pela via judicial e, desistindo as partes, reiniciarem pela via notarial, bem como, iniciados os procedimentos para a escritura, as partes podem desistir e ingressar com a ação competente pela via judicial” [...].

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Então, a considerar tal premissa, não se pode concluir que o simples advento de norma que possibilita atuação na esfera administrativa provo-que a extinção dos respectivos meios judiciais – antes unicamente dispo-níveis. Reconhecemos, sem dúvida, que, desde a entrada em vigor da Lei nº 11.441/2007, e agora ratificada pelo novo CPC, temos a redução da inter-venção do Poder Judiciário nas relações jurídicas [com conteúdo patrimonial ou não] entre os casais que não têm filhos menores, visto estarem aptos a deliberar acerca de seu futuro. Contudo, vale ressaltar que a formalização do divórcio, da extinção da união estável, da partilha e do inventário pela via extrajudicial22 é uma faculdade dos cônjuges.

Certo é que a legislação em análise, sem excluir a opção pelo Judiciá-rio, contribui para desobstruí-lo e liberará caminhos para uma atuação mais célere23 deste em outras contendas, racionalizará a congestionada atividade jurisdicional que atualmente impera nos foros.

3 juriSdiÇÃo voluntÁriA, PreCeitoS ConStituCionAiS e FACultAtividAde

As nossas leis processuais têm sempre como pilares básicos e indisso-ciáveis os princípios expostos na Constituição Federal, principalmente no que concerne à atividade judiciária, à estrutura dos respectivos órgãos, aos direitos e garantias individuais e à jurisdição. Todavia, o conceito e o alcance

22 Mais além, Romualdo Baptista dos Santos entende que a Lei nº 11.441/2007 é aplicável aos pedidos de divórcio por conversão, nas hipóteses legais: “A Constituição não impõe que a dissolução da sociedade conjugal só possa ser obtida por via judicial, nem tampouco que o divórcio, direto ou por conversão, deve ser necessariamente judicial. Sendo assim, não há óbice constitucional a que a dissolução da sociedade conjugal, seja judicial ou extrajudicial, possa ser convertida em divórcio. Nem a que essa conversão também seja feita extrajudicialmente. [...]. Se as partes conseguem, com a intervenção dos seus advogados, chegar a um bom termo, não faz sentido que tal solução deva ser submetida obrigatoriamente ao juiz, apenas para cumprir uma formalidade” (SANTOS, Romualdo Baptista dos. A aplicabilidade da Lei nº 11.441/2007 aos pedidos de divórcio por conversão. In: COLTRO, Antônio Carlos Mathias; DELGADO, Mário Luiz (Coord.). Separação, divórcio, partilhas e inventários extrajudiciais. Questionamentos sobre a Lei nº 11.441/2007. São Paulo: Método, 2007. p. 63 e 66).

23 Sabe-se que a Lei nº 11.441/2007 – que instituiu o divórcio extrajudicial – integrou o “pacote” do “Pacto de Estado em Favor de um Judiciário mais Rápido e Republicano” – firmado entre os representantes dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário. As finalidades do pacto são, entre outras, criar, discutir e efetivar propostas e traçar diretrizes destinadas à melhoria da prestação jurisdicional.

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da jurisdição voluntária são objetos de profundas controvérsias tanto no Bra-sil quanto em outros países.

Entre nós, José Frederico Marques escreveu valiosa monografia sobre a jurisdição. No tocante ao tema24, eis um trecho da clássica obra:

A jurisdição voluntária é uma função estatal que se filia, ao que Zanobini denomina, com muita precisão, de “amministrazione pubblica del diritto pri-vato”. Não se trata de atividade jurisdicional, malgrado o nome que osten-ta; e, no entender de muitos, é função que pode ser atribuída com igual nomen juris, a órgãos não judiciários. Alcalá-Zamora fala em jurisdição voluntária judicial e extrajudicial. [...] A impropriamente denominada jurisdição vo-luntária, que não é voluntária nem jurisdição, constitui função estatal de administração pública de direitos de ordem privada, que o Estado exerce, preventivamente, através de órgãos judiciários, com o fito e objetivo de cons-tituir relações jurídicas, ou de modificar e desenvolver relações já existentes”.25

Esse abalizado entendimento coaduna-se com a intenção do legislador exposta nas últimas normas aprovadas, desde a Lei nº 11.441/2007 até o novo CPC, no sentido de que nenhuma norma pode limitar, condicionar ou excluir o direito do cidadão à prestação jurisdicional por meio dos órgãos judiciários (art. 92 da CF/1988), ou seja, a realização do divórcio pela via administrativa, nas hipóteses legais (art. 1.124-A do CPC/1973 e art. 733 do CPC/2015), é uma faculdade, uma opção conferida aos interessados – e não uma obrigação.

E no que condiz ao inventário e à partilha instituídos pela Lei nº 11.441/2007 [e mantidos na Lei nº 13.105/2015], Euclides de Oliveira co-menta:

As inovações trazidas pela Lei nº 11.441/2007 possibilitam a realização de inventário e partilha amigável por escritura pública, quando todos os inte-ressados sejam capazes e não haja testamento. Não mais subsiste a exclusivi-dade do procedimento judicial, de que tratava o Código de Processo Civil em seus arts. 982 e seguintes.26

24 Válido mencionar outra importante obra sobre o instituto da jurisdição: CAMBI, Eduardo. Jurisdição no processo civil: compreensão crítica. 1. ed. 2. tir. Curitiba: Juruá, 2003.

25 MARQUES, José Frederico. Ensaio sobre a jurisdição voluntária. 1. ed. rev., atual. e compl. Ovídio Rocha Barros Sandoval. Campinas: Millennium, 2000. p. 15 e 59.

26 OLIVEIRA, Euclides de. Aspectos práticos da Lei nº 11.441/2007 com relação ao inventário e partilha. Disponível em: <http://www.ibdfam.org.br/public/artigos.aspx?codigo=293>. Acesso em: 27 abr. 2016.

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Portanto, tendo ou não o procedimento homologatório função de juris-dição, mister conservar os dois meios [judicial e extrajudicial] para a realiza-ção do divórcio, do inventário e da partilha consensual. A razão de manter o poder do Estado-juiz – mesmo com a abertura da via administrativa – reside na necessidade de garantir os preceitos legais constitucionais que regem as relações de vida e evitar a insegurança jurídica.

Ao contrário da anterior determinação do art. 153, § 4º, da Constitui-ção Federal de 1967 (EC 07, de 1977)27, a regra exposta no art. 5º, XXXV, da CF/198828 consagra amplamente o direito subjetivo de ação e a indeclinabi-lidade da prestação jurisdicional e, de consectário, impede o legislador de limitar, condicionar ou substituir esse direito.

A preservação – e o monopólio – da jurisdição ao Estado-juiz na última Constituição Federal não teve o intuito de impedir o surgimento de qual-quer outro meio de composição extrajudicial ou de efetivação dos negócios entre os particulares. O intento, na realidade, foi declarar o repúdio social aos abusos praticados durante a ditadura [evitando que ocorram novamente] e extinguir órgãos administrativos que afastavam a atuação do Poder Judi-ciário. Visou-se, enfim, banir eventuais irregularidades oriundas dos Poderes Executivo e Legislativo.

Entretanto, entendemos que inexiste óbice – repete-se(!) – para o sur-gimento e aperfeiçoamento de mecanismos extrajudiciais que possam ver-sar sobre a Administração Pública de direitos de ordem privada, desde que não seja excluída a opção pelo Poder Judiciário. Tanto é verdade que a Lei nº 9.307/1996 [arbitragem] mostra-se como grande exemplo: não foi declara-da inconstitucional, não há necessidade de homologação judicial nem afastou

27 CF/1967: Art. 153 – com redação do § 4º dada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977. “A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] § 4º A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual. O ingresso em juízo poderá ser condicionado a que se exauram previamente as vias administrativas, desde que não exigida garantia de instância, nem ultrapassado o prazo de cento e oitenta dias para a decisão sobre o pedido”. Vale lembrar que a redação do referido § 4º, antes da EC 07, de 1977, era: “A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual”.

28 CF/1988. “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

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o direito do indivíduo de acessar o Judiciário. Assim, é forçoso convir que não ocorre, nesse prisma, o fenômeno da “desjudicialização”29.

A par dessas considerações, conclui-se que não houve desjudicialização (i) na Lei nº 11.441/2007, (ii) na Lei nº 9.307/1996, (iii) na Lei nº 11.977/2009, (iv) no CPC (Lei nº 13.105/2015) e muito menos (v) nos procedimentos extra-judiciais pertinentes à notificação, ao protesto e à interpelação30.

Em verdade, não foi retirada a jurisdição dos órgãos estatais integran-tes do Poder Judiciário. O que se fez foi estender – e não extirpar! – a ju-risdição voluntária ou contenciosa à esfera administrativa, aos órgãos não judiciários e ao particular31. Haveria a desjudicialização nos casos citados se o acesso ao Judiciário fosse vedado – e aí importaria dizer que acarretaria cristalina afronta ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal e aos princípios que o regem.

Então, o legislador, para evitar a inconstitucionalidade, adotou senti-do oposto ao da desjudicialização e facultou ao particular o acesso ao Po-der Judiciário ou aos órgãos administrativos nos casos de que tratam a Lei nº 11.441/2007 e a Lei nº 13.105/2015, o que não enseja em retrocesso legis-lativo nem fere o Pacto de Estado em Favor de um Judiciário Mais Rápido e Repu-blicano.

Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior têm lúcido entendimento sobre o tema:

29 Embora tal vocábulo não tenha sido dicionarizado, entende-se o termo desjudicializar como retirar totalmente do Poder Judiciário a jurisdição. Explica-se: o mencionado termo não é o mais adequado porque o prefixo “des” – de origem latina – significa desviar, desfazer e tem o sentido de oposição, negação, separação, ação contrária (Pesquisa realizada em: HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2001; FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda Ferreira. Op. cit.; CUNHA, Celso; CINTRA, Luis Filipe Lindley. Nova gramática do português contemporâneo. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. p. 85).

30 Impende recordar que a notificação, a interpelação e o protesto podem ser realizados em ambas as esferas – extrajudicial e judicial (art. 397 do CCB/2002 e arts. 301, 726, 727, 728 e 729 do novo CPC/2015).

31 A arbitragem, segundo os contratualistas [que privilegiam o ato que lhe deu origem – assinatura de cláusula compromissória, por exemplo], traduz-se em uma atividade de natureza privada, totalmente desligada do exercício da jurisdição pelo Poder Judiciário.

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O percurso administrativo, no entanto, não é obrigatório, sendo facultado apenas ao administrado, que, em caso de não interesse, poderá socorrer-se imediatamente do Poder Judiciário.32

Nessa hipótese, se houve a opção pelo meio judicial (manifestada no instante do ajuizamento da ação e com todos os seus requisitos legais sa-tisfeitos), não se devem julgar as partes interessadas carecedoras da ação de divórcio – inexiste, por consequência, lugar para a extinção do processo sem resolução de mérito33 –, sendo incabível uma sentença terminativa. A decisão que estiver em sentido contrário fere normas infraconstitucionais e consti-tucionais, pois a extinção do processo sem análise meritória caracteriza negativa de prestação jurisdicional, digna de ser combatida por meio dos recursos especial e extraordinário.

Sobre o interesse de agir/processual, discorrem Fernanda Tartuce e Flávio Tartuce:

O interesse de agir decorre, naturalmente, da demonstração de que a ou-tra parte omitiu-se ou praticou ato justificador do acesso ao Judiciário34. Assim, é de questionar se seria possível conceber a existência de efetivo interesse apenas quando a parte tiver comprovado o esgotamento de todas

32 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 167.

33 CPC/1973: “Art. 267. Extingue-se o processo, sem resolução de mérito: I – quando o juiz indeferir a petição inicial; [...] VI – quando não concorrer qualquer das condições da ação, com a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual”. CPC/1973: “Art. 295. A petição inicial será indeferida: [...] III – quando o autor carecer de interesse processual”. CPC/2015: “Art. 330. A petição inicial será indeferida quando: [...] III – quando o autor carecer de interesse processual”. CPC/2015: “Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: I – indeferir a petição inicial; [...] VI – verificar a ausência de legitimidade ou de interesse processual”.

34 ALVIM, Arruda. Manual de direito processual: parte geral. São Paulo: RT, v. 1, 2006. p. 391. O autor, porém, ressalva que tal afirmação pode ser integralmente aceita no âmbito do direito privado, mas não no direito público; neste, “diferentemente, e, na medida em que as regras são cogentes, o agir da Administração está normativamente traçado, ainda que, de fato, a Administração não tenha agido, vale dizer, não haja feito o que lhe impendia fazer. Nem pelo fato de a Administração não ter agido – quando deveria ter agido –, isto retira do administrado o dever de agir sendo o mandamento normativo incontornável, disto se segue que, por isso mesmo, existe o interesse de agir, quando a Administração, ainda que não praticado o ato, deva praticá-lo a qualquer momento, por imposição normativa” (p. 399).

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as possibilidades de tentar sanar a controvérsia. Dentre estas, situar-se-ia a hipótese de tentar a realização extrajudicial da separação ou do divórcio.35

Tratando-se de direito disponível, o Estado-juiz deve assegurar o direi-to das partes de optar pela via administrativa ou via judicial; enfim, deve ser garantido o meio que for mais conveniente ao jurisdicionado-administrado. Eis o interesse processual [necessidade e utilidade], a liberdade e a autono-mia da vontade.

Ainda, entre os fatores que influenciam os cônjuges no momento de decidir qual o meio para efetivar o divórcio, podemos alistar os seguintes – principais: (i) rapidez, menor onerosidade e desburocratização [na via admi-nistrativa] e (ii) segredo de justiça, reduzida possibilidade de fraude e maior confiança no Estado-juiz [na via judicial]36.

Além disso, há mais um outro fator relevante, de ordem processual, inclusive. Fredie Didier Júnior37 abordou com precisão o tema:

A homologação judicial confere às partes algo além daquilo que se pode ob-ter pelo procedimento cartorário: a indiscutibilidade da decisão, a coisa jul-gada [...], que somente pode ser desconstituída por ação rescisória (art. 485, VIII, do CPC)38, como reflexo da rescisão da sentença homologatória. Não é razoável dizer que um negócio jurídico formalizado em cartório tem a mesma estabilidade de outro que passou pelo crivo do órgão jurisdicional.

35 TARTUCE, Fernanda; TARTUCE, Flávio. Lei nº 11.441/2007: diálogos entre direito civil e direito processual civil quanto à separação e ao divórcio extrajudiciais. Revista Brasileira de Direito de Família, São Paulo: Síntese, a. IX, n. 41, abr./maio 2007.

36 Os ora autores entendem que os fatores “segredo de justiça” e “maior confiança no Estado-juiz” geram, per si, o interesse [necessidade] das partes em utilizar a via judicial [em detrimento da via administrativa] para obter o provimento que pretendem [utilidade], visto que o segredo de justiça não é resguardado nas escrituras públicas. Aliás, no que se refere ao interesse processual, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery explicam com clareza: “Trata-se do interesse processual, condição da ação, e não do interesse de direito material, que respeita ao mérito. O interesse processual se consubstancia na necessidade de o autor vir a juízo e na utilidade que o provimento jurisdicional poderá lhe proporcionar” (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante. 14. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2014).

37 DIDIER JUNIOR, Fredie. Coisa julgada material em jurisdição voluntária. O exemplo do pedido de homologação de separação/divórcio/partilha consensual. Lei Federal nº 11.441/2007. Disponível em: <http://www.frediedidier.com.br/main/noticias/detalhe.jsp?CId=200>. Acesso em: 20 abr. 2016.

38 CPC/1973: “Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando: [...] VIII – houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que se baseou a sentença”.

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É preciso dar a situações tão díspares consequências jurídicas também di-versas. Para compreender a “facultatividade” do procedimento cartorário e a consequente permanência da opção judicial, é preciso superar o dogma da ausência de coisa julgada na jurisdição voluntária.

De qualquer forma, consoante a necessidade das partes em cada caso concreto, há de prevalecer a liberdade de escolha. A liberdade e o princípio da autonomia da vontade foram consagrados, com as devidas limitações, na CF/1988.

Assim, da mesma forma que a imposição de “judicialização” das de-mandas [ou dos meros requerimentos de ordem administrativa] é extrema-mente desaconselhável, também o é a obrigatoriedade de desjudicialização.

Acerca do direito de escolha do interessado e da importância do Poder Judiciário em relação à Lei nº 11.441/2007, comenta o Ministro do STF, Pro-fessor Luiz Edson Fachin:

Trata-se de uma faculdade e não imposição, o que veda, aliás, que juízes decretem a extinção dos feitos sem julgamento de mérito quando preen-cherem as condições da nova lei; é uma opção das partes recorrer à nova lei e não uma imposição. Não creio, em princípio, que trará desvalorização a atuação jurisdicional das Varas de Família; ao contrário, refina e engrande-ce na medida em que a lei tem alcance limitado (filhos maiores e capazes, ausência de controvérsia, separações e divórcios somente consensuais etc.), e deixa para o Estado-juiz as questões de fundo: guarda, partilha litigiosa e assim por diante. A presença do Estado-juiz parece-me imprescindível como regra geral.39

Sob o enfoque principiológico e consoante as cláusulas gerais, é evi-dente que o legislador não objetivou restringir situações, hipóteses. Bom exemplo é o nosso Código Civil: repleto de cláusulas abertas! Primou-se por uma legislação que pudesse atender aos anseios sociais.

39 FACHIN, Luiz Edson. Comentários à Lei nº 11.441/2007. Boletim IBDFAM, n. 42, jan./fev. 2007. Disponível em: <http://www.notariado.org.br/docs/Boletim_IBDFAM_42.pdf>. Acesso em: 07 abr. 2016.

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Nessa linha, cabe destacar a preleção de Flávio Tartuce40: “A autono-mia privada é muito bem conceituada por Daniel Sarmento41 como o poder que a pessoa tem de autorregulamentar os próprios interesses”. E continua a lição em nota de rodapé:

Ensina o autor fluminense que “esse princípio tem como matriz a concep-ção do ser humano como agente moral, dotado de razão, capaz de decidir o que é bom ou ruim para si, e que deve ter a liberdade para guiar-se de acordo com estas escolhas, desde que elas não perturbem os direitos de ter-ceiros nem violem outros valores relevantes para a comunidade (Direitos fundamentais e relações privadas).

Finalizando esse item, importa dizer que, tal como a prorrogação de competência (faculdade) é admitida na processualística pátria em observân-cia ao interesse privado das partes ou dos interessados, a facultatividade – na condição de vertente dos direitos e garantias individuais – também deve ser observada na interpretação do art. 733 do CPC, que dispôs com clareza: “O divórcio consensual, a separação consensual42 e a extinção consensual da união estável [...] poderão ser realizados por escritura pública [...]”.

4 menS legiS e menS legiSlAtoriS

Descrever esta dimensão, desenhar a modelagem de hoje, esmiuçar os labi-rintos da crise e pinçar o quadro da evolução do direito civil é tarefa a um tempo hercúlea, delicada e merecedora de todos os cuidados e desvelos. Há um perigo iminente de se escorregar nas margens do exagero e acabar por registrar como tendências ou marcos, para o tempo novo, assuntos e si-tuações que não revelam exatamente o senso comum, o querer socialmente apreciável. (Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka)43

40 TARTUCE, Flávio. Novos princípios do direito de família brasileiro. Artigo destinado ao Seminário Virtual Temas atuais de Direito de Família, do site Âmbito Jurídico (www.ambitojuridico.com.br), ocorrido entre os dias 9 e 11.05.2006.

41 SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. p. 188.

42 Ressalta-se novamente que a separação judicial foi extinta com o advento da EC 66/2010, que alterou o § 6º do art. 226 da CF, tal como já expusemos no item “introdução”. Eis a nova redação: “O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”.

43 HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Tendências do direito civil no século XXI (Palestra proferida em 21.09.2001, por ocasião do encerramento do Seminário Internacional de Direito Civil promovido pelo NAP – Núcleo Acadêmico de Pesquisa da Faculdade Mineira de Direito da PUC/MG). In: FIÚZA, César; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira;

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Desde a promulgação da Lei nº 11.441/2007, o legislador forneceu um outro caminho à sociedade no sentido de ser possível promover, fora do âm-bito judicial, o divórcio, o inventário e a partilha dos bens.

Logo, com fincas nos princípios norteadores dos modernos direito civil [sob o enfoque constitucional] e processo civil – quanto a este último, no-tadamente, a efetividade e a celeridade –, a legislação em análise procurou atender aos anseios sociais por uma justiça menos lenta e eficaz.

No contexto, observa-se que a intenção do legislador ao criar as nor-mas em foco (art. 1.124-A do CPC/1973 e art. 733 do CPC/2015) foi disponi-bilizar [direito disponível...] um outro meio – extrajudicial – sem obstaculizar aquele de outrora [judicial].

Por isso, no art. 733 do CPC foi mantida tal possibilidade em prol de uma prestação jurisdicional44 mais rápida, que poderá ser exercida tanto pelo Estado-juiz quanto pelo Estado-administrador.

As questões surgidas em torno da facultatividade ou obrigatoriedade de adoção do procedimento administrativo requerem, para sua solução, aná-lise mais acurada sobre hermenêutica.

Nesse fértil campo, Maria Helena Diniz lança o seguinte questiona-mento e, ao final, apresenta uma solução:

A ciência jurídica enquanto teoria da interpretação, ao buscar o sentido e o alcance da norma, tendo em vista uma finalidade prática, criando condi-ções para uma decisão possível, ou melhor, condições de aplicabilidade de norma com um mínimo de perturbação social, encontra problemas: qual o critério para a interpretação autêntica? Ao interpretar uma norma, deve-se buscar a vontade da lei ou a do legislador? [...] O ato interpretativo tem um sentido problemático, de modo que é pressuposto de hermenêutica jurídi-ca a liberdade do intérprete na escolha das múltiplas vias interpretativas, pois deve haver uma interpretação e um sentido que prepondere, pondo um fim prático à cadeia das várias possibilidades interpretativas, criando, como já foi dito, condições para uma decisão possível.45

SÁ, Maria de Fátima Freire de (Coord.). Direito civil: atualidades. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 93-130.

44 A polêmica sobre a natureza jurídica da jurisdição voluntária, o alcance da atividade jurisdicional e as novas funções conferidas aos órgãos não judiciários serão abordados pelos autores em outro estudo específico sobre o tema.

45 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de introdução à ciência do direito. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. p. 204.

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Assim, antes de tecer considerações sobre a mens legis46 e a liberdade do hermeneuta quanto à escolha dos métodos de interpretação, é oportuno analisar a exposição de motivos, a justificativa e os textos dos Projetos de Lei nº 4.725/2004 e 731/2003 – predecessores do Projeto de Lei nº 6.416-B/200547, que, na forma do substitutivo apresentado, deram origem à Lei nº 11.441/2007 – pioneira na previsão do divórcio extrajudicial na nossa legislação.

Para tanto, colhemos dos referidos projetos originários os seguintes fragmentos:

Projeto de Lei da Câmara nº 4.725/200448

Separação, divórcio e inventário consensuais

Autor: Poder Executivo

Exposição de Motivos

“[...] 4. A proposta prevê a possibilidade de realização de inventário e partilha por escritura pública, nos casos em que somente existam interessados ca-pazes e concordes. Dispõe, ainda, a faculdade de adoção do procedimento citado em casos de separação consensual e de divórcio consensual, quando não houver filhos menores do casal.

5. Entendo não existir nenhum motivo razoável de ordem jurídica, de or-dem lógica ou de ordem prática que indique a necessidade de que atos de disposição de bens, realizados entre pessoas capazes – tais como os supracitados, devam ser necessariamente processados em juízo, ainda mais onerando os interessados e agravando o acúmulo de serviço perante as repartições forenses.

Márcio Thomaz Bastos – Ministro de Estado da Justiça.

Texto do Projeto

Altera dispositivos da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil – possibilitando a realização de inventário, partilha, separa-ção consensual e divórcio consensual por via administrativa.

46 Mens legis significa, basicamente, o espírito, o intento, a razão da lei. Já a mens legislatoris tem acepção diversa: diz respeito ao pensamento, à vontade do legislador.

47 Projeto de Lei nº 6.416-B/2005 e seu substitutivo, de autoria do Senador César Borges, que teve como relator o Deputado Maurício Rands.

48 Referido projeto foi apensado ao Projeto de Lei nº 731/2003, de autoria do Deputado Léo Alcântara. Ambos os projetos tiveram a relatoria do Deputado Ricardo Fiúza. Foram apresentadas sete emendas ao PL 4.725/2004.

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O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º Os arts. 982 e 983 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil – passam a vigorar com a seguinte redação:

Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.

[...] Art. 3º A Lei nº 5.869, de 1973 – Código de Processo Civil – passa a vi-gorar acrescida do seguinte art. 1.124-A:

Art. 1.124-A. A separação consensual e o divórcio consensual, não haven-do filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo dos cônjuges quanto à retomada pela mulher de seu nome de solteira ou à manutenção do nome adotado quando do casamento.”

Projeto de Lei da Câmara nº 731/200349

Separação e divórcio por mútuo consentimento

Autor: Deputado Léo Alcântara

O Congresso Nacional decreta:

[...] Art. 2º Os arts. 982 e 983 da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Có-digo de Processo Civil – passam a vigorar com a seguinte redação:

Art. 2º A separação e o divórcio, realizados por mútuo consentimento, po-derão ser efetuados mediante escritura pública.

Justificativa

Na verdade, o Código de Processo Civil, nos arts. 1.031 a 1.038 (Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973), preceitua que as partes civilmente capazes podem requerer a homologação judicial das partilhas dos bens. Porém, é necessário que se faculte, em lei, a utilização das escrituras públicas para a realização de procedimentos que dispensam a homologação judicial [...]”.

49 O projeto em tela (731/2003) foi apensado ao Projeto de Lei nº 4.725/2004, de autoria do Poder Executivo, e, como dito na nota pretérita próxima, ambos tiveram a relatoria do Deputado Ricardo Fiúza. Não foi apresentada nenhuma emenda ao PL 731/2003.

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Após a análise desses textos e das suas justificativas, não há como olvi-dar que, desde o início, a intenção do legislador (mens legislatoris) foi oferecer opção aos casais para divorciar [frisamos que, com a EC 66/2010, foi extinta a separação no nosso sistema], consensualmente, por meio de processo judicial ou de escritura pública.

A mens legis origina-se de um contexto, e não da interpretação de um dispositivo isolado. Aliás, recordamos que outras normas também dispõem sobre a opção de via judicial ou via administrativa.

Nesse ponto específico, a Lei nº 11.441/2007 não se mostra isolada, como vanguarda50, nem exclusiva, como fator de desjudicialização.

No que diz respeito ao novo CPC (art. 733), é evidente o mesmo intuito da lei precursora, uma vez que foi mantido o vocábulo “poderão”, em detri-mento de palavras de ordem, mandamentais, como “deverão” ou “serão”.

A propósito, muito embora defendamos a facultatividade no presente trabalho, não basta afirmar que só pela mera permanência da palavra “pode-rão” no texto legal (art. 733 do CPC) já se conclui que o procedimento admi-nistrativo é uma faculdade. Isso só não basta! Tornar-se-ia cômodo defender este ponto de vista: é facultativo porque a lei diz que “poderão”; se quisesse dizer “deverão” ou “serão”, teria dito – e então seria obrigatório o proce-dimento administrativo. Ao contrário, caro leitor! Diversamente da suposta facilidade de descrever a intenção do legislador pela simples leitura e inter-pretação do vocábulo “poderão”, entendemos que a questão não deve ser analisada de modo perfunctório.

Em que pese a entrada em vigor do CPC/2015, o fato de a essência do art. 1.124-A do CPC/1973 ter sido mantida no agora art. 733 possibilita a aplicação dos pronunciamentos jurisprudenciais emitidos em razão da Lei nº 11.441/2007. Isso, aliado ao uso do método de interpretação sistemática e, também, declarativa [especificadora], conduz à apropriada aplicação da nova legislação. A lição do saudoso Professor Rubens Limongi França51 vem bem a calhar: “A interpretação declarativa é aquela cujo enunciado coincide,

50 Como exemplo, citamos a Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/1996), o Código de Processo Civil, arts. 867 usque 873 (notificação, a interpelação e o protesto), e o Código Civil em seu art. 397. Normativas semelhantes à Lei nº 11.441/2007 podem ser encontradas em Portugal, na Espanha, no Japão etc.

51 LIMONGI FRANÇA, Rubens. Hermenêutica jurídica. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 11.

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na sua amplitude, com aquele que, à primeira vista, parece conter-se nas ex-pressões do dispositivo”.

Traçadas as diretrizes interpretativas, faz-se necessária a análise do histórico de introdução, no ordenamento jurídico brasileiro, do divórcio ex-trajudicial, especialmente das emendas e justificativas apresentadas após as etapas iniciais de tramitação dos dois projetos que resultaram no texto final do Projeto de Lei nº 6.416/2005 [que deu origem à Lei nº 11.441/2007]. Foram propostas sete emendas ao PL 4.725/2004, das quais se destacam a seguir as três primeiras, no que importa:

Emendas apresentadas ao Projeto de Lei da Câmara nº 4.725/2004

Emenda 1 – (aditiva) – Deputado Vicente Arruda

Art. [...] Fica acrescido à Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – Código de Processo Civil – o art. 867-A da Seção X do Capítulo II do Título Único do Livro III:

“Art. 867-A. As medidas judiciais previstas nesta Seção poderão ser rea-lizadas pela via extrajudicial, a critério da parte interessada, através do Oficial do Registro Público competente, e produzirão os mesmos efeitos legais.”

Justificativa

“[...] Em consonância com a filosofia que o inspirou, impõe-se a permissão de as notificações, protestos e interpelações, previstos nos arts. 867 ut 873 do CPC, serem realizadas pela via administrativa, otimizando custo e tempo, além de retirar do juiz um acúmulo de serviço que pode ser realizado per-feitamente, com segurança, pelos ofícios de registro de títulos e docu-mentos.”

Emenda 2 – (aditiva) – Deputado Paes Landim

Justificação

“O projeto de lei em questão confere à sociedade brasileira a possibili-dade de realização de inventários, partilhas, separações consensuais e divórcios de forma menos onerosa e demorada, que conta com nosso apoio.”

Emenda 3 – (aditiva) – Deputado Nelson Marquezeli

Dê-se ao texto proposto, pelo art. 1º do projeto, para constituir o art. 982 do Código de Processo Civil a seguinte redação:

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“Art. 982. Havendo interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.

§ 2º Havendo testamento cerrado, particular ou especial, deverão os interessados promover o procedimento judicial de abertura, registro e cumprimento e, com a conclusão deste, poderão fazer o inventário e a partilha por escritura pública.”

Justificativa

“A cautela do texto proposto para constituir o novo art. 982 é de todo justificável [...]. Porém, deve-se prever a posterior possibilidade de rea-lização do inventário e partilha por escritura pública. Isto confere conte-údo mais efetivo à diretriz que inspirou o projeto: retirar do Poder Judiciário expressiva carga de serviços e tarefas. Assim, resolvida a fase da abertura e registro desses tipos de testamento, que requerem formalidades e cautelas específicas e especiais, nada mais natural do que se permitir aos interessados que promovam a partilha por meio de escritura pública.”

Como visto, tanto nos projetos de lei (nºs 4.725/2004 e 731/2003) quanto nas suas emendas e condizentes justificativas, o legislador sempre pretendeu disponibilizar, sim(!), dois meios para dissolução da sociedade conjugal. Ora, antes do advento da Emenda Constitucional nº 66/2010, a Lei nº 11.441/2007, que resultou dos projetos acima referidos, não havia revo-gado nem modificado os arts. 1.120/1.124 do Código de Processo Civil – e muito menos deveríamos falar em revogação tácita.

Nesse sentido, foram usadas por diversas vezes palavras que estão longe de significar obrigatoriedade, como “poderá”, “podem”, “poderão”, “possibilidade”, “possibilitando”, “permitir”, “faculte”, “faculdade” etc. Portanto, resta indubitável e inquestionável o propósito legislativo de dotar a norma de facultatividade – e não de obrigatoriedade.

Ademais, após a polêmica instaurada com a promulgação da norma, o legislador teve outras duas grandes oportunidades para tornar obrigatório o procedimento extrajudicial de divórcio, partilha e inventário. Primeiro, com a edição da Lei nº 11.965/2009, na qual bastava dispor sobre a obrigatoriedade da via administrativa, dentro das hipóteses legais. Mas não foi isso o que ocor-

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reu. O referido regramento52 manteve incólume a facultatividade, não mudou a linha mestra adotada pela Lei nº 11.441/2007. Vejamos a mencionada alte-ração parcial conferida aos arts. 982 e 1.124-A do CPC/1973:

Lei nº 11.965, de 3 julho de 2009.

Art. 1º Esta lei dispõe sobre a participação do defensor público na lavratura da escritura pública de inventário e partilha, de separação consensual e de divórcio consensual.

Art. 2º Os arts. 982 e 1.124-A da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, pas-sam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 982. [...].

§ 1º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes inte-ressadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.

§ 2º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se decla-rarem pobres sob as penas da lei.”

“Art. 1.124-A. [...].

§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. [...].”

Art. 3º Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 3 de julho de 2009; 188º da Independência e 121º da República.

Por derradeiro, o legislador teve a possibilidade de ser taxativo e tor-nar forçosa a via extrajudicial na elaboração do novo Código de Processo Civil. Contudo, mais uma vez, primou-se pela livre escolha do interessado, que poderá acionar o cartório ou o Poder Judiciário em caso de divórcio e de extinção consensual da união estável.

É importante recordar: no CPC então projetado (art. 667 da redação ori-ginal do Projeto de Lei no Senado nº 166/2010, e, depois, art. 699, com as alte-rações apresentadas no relatório geral do Senador Valter Pereira), um pouco

52 Publicado no Diário Oficial da União de 06.07.2009.

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antes das discussões finais, constava o termo “serão realizados”, porém, nos últimos instantes, foi substituído por “poderão ser realizados”.

A encerrar esse tópico, não há como negar que o texto da Lei nº 13.105/2015 (art. 733, que substituiu o art. 1.124-A), corroborando a legis-lação anterior no que condiz à opção de processo judicial ou procedimento administrativo, é bastante claro ao demonstrar o seu espírito53, a sua razão e o seu intento.

5 o Artigo 1.124-A do CPC/1973 e A juriSPrudÊnCiA

Como outrora mencionado, a essência do art. 1.124-A do CPC/1973 foi mantida na nova processualística de 2015 (art. 733), o que possibilita a aplica-ção analógica dos respectivos julgados.

Assim como ocorria no dispositivo revogado, a superficial e ligeira lei-tura do art. 733 do CPC/201554 pode conduzir o leitor à duvidosa conclusão de que ele torna obrigatória a adoção do procedimento extrajudicial nos ca-sos previstos em lei.

Todavia, essa suposta facilidade interpretativa cai por terra quando constatamos o vasto manancial de jurisprudência dos nossos tribunais sobre a polêmica questão da “facultatividade ou obrigatoriedade”, aliado aos estu-dos dos grupos criados para solucionar os questionamentos acerca das ino-vações da Lei nº 11.441/2007, aprovada sem sequer observar o prazo mínimo de vacância, contrariando o bom-senso e a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (art. 1º)55.

A propósito, merece destaque a lição de Inácio de Carvalho Neto56:

53 Sobre o tema, valiosos são os ensinamentos de Eduardo J. Couture na sua celebrada obra: Interpretação das leis processuais. Trad. Gilda Maciel Corrêa Meyer Russomano. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

54 Lei nº 13.105/2015 (novo CPC). “Art. 733. O divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual de união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731”.

55 Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. “Art. 1º Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada”.

56 CARVALHO NETO, Inácio de. O Código Civil e a Lei de Introdução ao Código Civil. Disponível em: <http://www.professorsimao.com.br/artigo_Inacio.pdf>. Acesso em: 25 abr. 2016.

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A Lei de Introdução ao Código Civil é, na verdade, uma lei de sobre di-reito, uma lei de introdução ao direito como um todo, com normas gerais sobre aplicação do direito e sobre direito internacional privado. [...] Salvo disposição em contrário, a lei começa a vigorar em todo o País quarenta e cinco dias depois de publicada. Trata-se de importante disposição que, na prática, é muitas vezes relegada. A maioria das leis tem sido veiculada com disposições contrárias a esta regra, determinando que entre em vigor tão logo publicada, o que acaba por prejudicar aqueles a quem a lei se destina. O período de vacatio legis previsto no art. 1º (45 dias) pode ser aumentado ou diminuído pela lei, conforme a sua importância, a sua extensão, a ne-cessidade de ampla divulgação etc. Para exemplificar, o novo Código Civil (Lei nº 10.406/2002) teve sua vacatio legis fixada em um ano (art. 2.044).

Quanto ao posicionamento dos tribunais no que se refere à facultativi-dade do procedimento extrajudicial para o divórcio, partilhas e inventários (art. 1.124-A do CPC/1973), selecionamos a seguir alguns julgados emble-máticos.

Inicialmente, transcrevemos trecho de acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, no qual, inclusive, acolheram-se os fundamentos do presente estudo:

Tribunal de Justiça de São Paulo

Inventário. Extinção do processo judicial em razão de homologação de pe-dido de desistência do inventariante, que pretende a conversão em proce-dimento extrajudicial, com base na Lei nº 11.441/2007. Legislação que não veda a utilização da via judicial. Insurgência da interessada, suposta com-panheira do falecido que pretende o reconhecimento do direito de residir na moradia e a sua participação sucessória no imóvel que afirma ter adqui-rido com o de cujus. Ação de reconhecimento e dissolução de união estável em andamento. Litigiosidade entre as partes que reclamam a continuidade do processo judicial. Inteligência do princípio constitucional que consagra a inafastabilidade da jurisdição. Recurso provido.

Acórdão: [...] Em que pese o entendimento manifestado em primeiro grau, inclusive quanto ao “desafogamento do Poder Judiciário”, comporta aco-lhida o reclamo da apelante. Segundo a referida lei, tornou-se possível pro-mover a separação e o divórcio consensuais, o inventário e as respectivas partilhas dos bens por escritura pública, utilizando o legislador a expressão “se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a par-tilha [...]”.

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Entretanto e ainda que não fosse o caso, surgiu questionamento, conforme Ezequiel Morais, sobre se “desde que satisfaçam as exigências legais, podem ou devem ser realizados extrajudicialmente?” [...]

Aliás, o simples fato de a lei aludir, além da capacidade, ao fato de quere-rem dela se valer os interessados, já serve como fundamento para a con-clusão sobre ficar ao alvedrio dos interessados a promoção, ou não, das medidas sobre que dispõe e segundo a forma nela prevista! [...] Desta for-ma, dúvida não há, como para muitos não havia, de que a edição da Lei nº 11.441/2007 não passou a obstar ou proibir que o interessado opte pela via judicial para ver atendida sua pretensão, atento sempre ao disposto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal [...] estando presente, assim o inte-resse de agir necessário [...]. (TJSP, 5ª CDPriv., Rel. A. C. Mathias Coltro, DJ 30.04.2014)

No mesmo sentido:

Ação de inventário. 1. Extinção do feito com base no art. 982 do Código de Processo Civil, com a alteração introduzida pela Lei nº 11.441/2007. Afas-tamento. Esgotamento da via administrativa. Inexigibilidade. Obstáculo vedado pela Constituição Federal. Princípio da inafastabilidade da juris-dição. Interesse de agir reconhecido. 2. Precedente. Extinção do feito afas-tada. Apelo provido, com determinação de prosseguimento do inventário. (Rel. Donegá Morandini, Comarca: São Paulo, 3ª CDPriv., DJ 15.04.2014)

Apelação. Inventário. Via judicial vs. via extrajudicial. Para fazer partilha por inventário, a escolha pela via extrajudicial (se cabível) é faculdade e opção das partes. O juiz não pode impor ou obrigar via extrajudicial, nem negar via judicial, se isso for o que as partes pedirem. Precedentes jurispru-denciais. Deram provimento. (TJRS, AC 70056437072, 8ª C.Cív., Rel. Rui Portanova, J. 10.04.2014)

Processo civil. Pedido de separação judicial consensual. Faculdade de op-ção pela via extrajudicial. Extinção do processo por falta de interesse de agir. Não cabimento. A formalização da separação e do divórcio consen-suais pela via extrajudicial, quando presentes as condições indicadas no art. 1.124-A do Código de Processo Civil, que foi acrescentado pela Lei nº 11.441/2007, constitui faculdade posta à disposição dos interessados e não autoriza a recusa da prestação jurisdicional requerida, ao argumento da falta do interesse processual de agir dos postulantes. Recurso provi-do. (TJMG, AC 1.0327.09.036972-6/001, 4ª C.Cív., Rel. Des. Almeida Melo, J. 08.10.2009)

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Apelação cível. Inventário judicial. Sentença que julga extinto o pro-cesso, sem resolução de mérito, por ausência superveniente de interes-se processual, diante da nova redação do art. 982 do CPC, dada pela Lei nº 11.441/2007. Entendimento contrário à melhor interpretação legal e vio-lador da garantia fundamental de inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal). Resolução nº 35 CNJ, art. 2º. Inteligência. Escolha da via extrajudicial, para o inventário, que se constitui opção dos interessados. Recurso provido para cassar a sentença apelada e dar prosse-guimento ao processo em primeira instância. (TJPR, AC 726462-4/Faxinal, 11ª C.Cív., Rel. Antonio Domingos Ramina Junior, un., J. 06.04.2011)

Em arremate, Flávio Tartuce e José Fernando Simão explicam que

a Resolução nº 35 do CNJ, em seu art. 2º, dispõe que é facultada aos interes-sados a opção pela via judicial ou extrajudicial, podendo ser solicitada, a qualquer tempo, a suspensão, pelo prazo de trinta dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial.57

Cumpre-nos dizer que o texto do referido art. 2º da Resolução nº 35/2007 do CNJ, no que condiz ao tema, foi mantido incólume pelas poste-riores resoluções do mesmo órgão, de nºs 120/2010, 179/2013 e 220/2016. Tais resoluções disciplinam a aplicação das Leis nºs 11.441/2007 e 11.965/2009 pelos serviços notariais e de registro e podem, perfeitamente, com as devidas adaptações, claro, “disciplinar” o art. 733 do CPC.

6 AS mudAnÇAS trAZidAS Pelo CPC/2015 e A ConSolidAÇÃo dA “FACultAtividAde”

O advento da Constituição Federal, da Lei nº 11.441/2007 e da Emenda Constitucional nº 66/2010 [outrora chamada de “PEC do Divórcio”] – entre tantas outras normas – gerou a ruptura de paradigmas seculares. Princípios antes considerados intocáveis foram relativizados, a bem do justo e dos an-seios da nossa sociedade pós-moderna. E o mesmo pretende o CPC/2015: mudança de mentalidade.

Observa-se que a doutrina e o Poder Judiciário têm destinado imensu-ráveis esforços para acompanhar essa evolução social e contribuir para o pro-

57 TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito civil – Direito de família. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Método, 2008. p. 192.

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gresso legislativo, ainda mais no caso específico (no fértil campo do direito de família e sucessões).

Assim, merecem detalhada análise o texto e as mudanças trazidas pela Lei nº 13.105/2015. Logo após a entrada em vigor da Lei nº 11.441/2007 [que incluiu o art. 1.124-A do CPC/1973], inúmeras dúvidas pairavam sobre a obrigatoriedade e a facultatividade do procedimento extrajudicial de separa-ção, divórcio, partilhas e inventários.

Ocorreram importantes debates a respeito do “poderão” ou “deverão”, visto que o texto do referido artigo conduzia o aplicador da lei a caminhos di-ferentes a depender da forma de interpretação. Surgiram, pois, divergências doutrinárias e jurisprudenciais.

Fato é que, transcorrido certo tempo, a “poeira” assentou-se e a juris-prudência resultou uníssona, ou seja, as partes interessadas podem optar entre o procedimento judicial e o procedimento extrajudicial de separação, divórcio, partilhas e inventários. Em resumo: é uma faculdade. Ainda, disse-mos no decorrer deste estudo que a razão e o espírito da Lei nº 11.441/2007 apontavam, desde o projeto na Câmara dos Deputados, para a facultativida-de do procedimento extrajudicial de separação, divórcio, inventários e par-tilhas.

O advento de norma que possibilita atuação na esfera administrativa não deve provocar a extinção dos respectivos meios judiciais. No tema em análise, quando as partes optam pelo procedimento judicial querem mesmo é a segurança do Poder Judiciário e, muitas vezes, o sigilo – o que não se con-segue totalmente no procedimento extrajudicial.

Não obstante, na contramão do entendimento mencionado, foi apre-sentado o Projeto de Lei nº 8.046/2010, que originou o novo CPC, cuja reda-ção inicial proposta para o art. 699 dispunha que “o divórcio e a extinção de união estável consensuais, não havendo filhos menores ou incapazes e ob-servados os requisitos legais, serão realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 697”.

Percebe-se que a utilização do termo “serão realizados” implicaria a obrigatoriedade do procedimento extrajudicial, que, por consequência, desa-guaria na vedação do acesso ao Poder Judiciário.

Contudo, durante a tramitação do projeto, o legislador já sinalizava que não poderia apoiar tal inconstitucionalidade. Na Emenda nº 253, apre-sentada pelo Deputado Vicente Cândido, foi sugerido o retorno do vocábulo

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“poderão ser realizados”, para garantir o direito das partes de eleger [e não o dever de adotar] o procedimento extrajudicial.

Nesse sentido, foi aprovado novo texto, agora destinado ao art. 733, segundo o qual “o divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual da união estável, não havendo nascituro ou filhos incapazes e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições de que trata o art. 731”.

Embora a mudança do verbo “ser” para “poder” seja louvável e torne evidente a intenção do legislador, é certo que o dispositivo poderia ter sido mais claro, dizendo expressamente que o acesso ao Judiciário não está veda-do em tais hipóteses, para dirimir, desde já, eventuais discordâncias – que ocorreram anteriormente.

Registra-se, ainda, o acerto do legislador ao incluir a previsão de extin-ção consensual da união estável na norma, encerrando, definitivamente, as discussões acerca dessa possibilidade extrajudicial.

Outra novidade, em breves palavras, constante do CPC/2015, reforça o fenômeno de divisão [concorrência] de competências, sem, entretanto, extin-guir o direito de ingressar em juízo. É o caso da extensão do reconhecimento extrajudicial de usucapião, que está disposto tanto na Lei de Registros Pú-blicos (inédito art. 216-A, acrescentado pelo art. 1.071 da Lei nº 13.105/2015) quanto na Lei nº 11.977/2009 (que regulou o Programa “Minha Casa, Minha Vida”). Notemos, por exemplo, o texto do art. 216-A:

Sem prejuízo da via jurisdicional, é admitido o pedido de reconhecimento extrajudicial de usucapião, que será processado diretamente perante o car-tório do registro de imóveis da comarca em que estiver situado o imóvel usucapiendo, a requerimento do interessado, representado por advogado [...].

Por fim, importa salientar que, em todos os casos citados, os textos le-gais são taxativos ao admitir que a via jurisdicional está preservada, o que reforça, mais uma vez, a tese aqui adotada – aliás, desde 2007.

7 ConSiderAÇÕeS FinAiS

Demonstrou-se, num primeiro momento, que foi banida do nosso sis-tema legal a instância administrativa forçada [resguardadas as exceções], de origem que nos remete, em lembrança nada saudosa, aos porões e ao Poder Judiciário de outrora – fragilizado pela interferência constante e violenta dos

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regimes ditatoriais e de seus tentáculos não judiciários, que muitas vezes im-pediam o cidadão de reivindicar e efetivar os seus direitos.

Nesse tão propalado pós-modernismo, é imperioso continuar a luta para manter direitos que, com muito sacrifício [nos amplos sentidos da pa-lavra!], o cidadão conseguiu conquistá-los. Viver a pós-modernidade não significa renunciar às conquistas legislativas e desprezar princípios constitu-cionais que resguardam o amplo acesso ao Judiciário. Necessário, sim, abrir novas portas na seara administrativa, mas sem fechar ou obstruir as que hoje estão disponíveis no âmbito judicial.

Célere ou não, o Poder Judiciário deve estar à disposição da sociedade, para que esta, quando desejar, possa acessá-lo sem qualquer impedimento. Desjudicializar não é a solução; porém, estender algumas competências e fun-ções antes exclusivas do Judiciário pode ser uma salutar alternativa.

Todos os direitos e princípios constitucionais dão suporte ao assenta-mento da facultatividade em terras firmes. O procedimento do divórcio, de ex-tinção da união estável, da partilha e dos inventários realizados por escritura pública deve ser uma faculdade, e não uma obrigação; o cidadão sempre terá a opção de escolha [Judiciário ou cartório]. Aliás, não se pode perder de vista que a figura da facultatividade também impera em outros dispositivos do nosso sistema legal: é o que ocorre com a arbitragem, com a usucapião e com as notificações, interpelações e protestos [mantidos no próprio CPC/2015].

Enfim, reafirmamos que a razão e o espírito do CPC (Lei nº 13.105/2015, art. 733), em comunhão com a vontade do legislador – expressa ainda na edição das Leis nºs 11.441/2007 e 11.965/2009 –, apontam, desde a alteração do projeto originário (PL 8.046/2010) na Câmara dos Deputados, desde o projeto no Senado até a sanção pelo Presidente da República, para a facultati-vidade do procedimento extrajudicial de divórcio, extinção da união estável, inventário e partilha, conforme a tendência jurisprudencial e doutrinária já consolidada. O texto da lei é cristalino e está sob um céu azul límpido que ilumina a sua vigência. E quando, por acaso, for alegada a falta de interesse processual, teremos luz para demonstrar a verdadeira mens legis e a real mens legislatoris.

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o eStAtuto dA PeSSoA Com deFiCiÊnCiA (lei nº 13.146/2015), SeuS direitoS e o novo

PArAdigmA dA CAPACidAde Civil the StAtute oF the PerSon with diSABilitieS

(lAw nº 13.146/2015), Your rightS And the new PArAdigm oF Civil CAPACitY

lEonardo alvEs dE olivEira

Especialista em Direito Administrativo, Pós-Graduando em Direito Constitucional, Servidor Público do Tribunal de Justiça

do Estado de Mato Grosso, Assessor de Gabinete da 1ª Vara Especializada de Família e Sucessões de Rondonópolis/MT.

RESUMO: O presente trabalho objetiva trazer algumas re-flexões acerca dos direitos assegurados aos deficientes e de institutos insculpidos no referido diploma, tais como a curatela e a tomada de decisão apoiada, bem como analisar a nova perspectiva da capacidade civil em face do advento da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), buscando averiguar as alterações realizadas por meio dessa lei no ordenamento jurídico pátrio.

PALAVRAS-CHAVE: Lei nº 13.146/2015; deficiência; capaci-dade civil; curatela.

ABSTRACT: This scientific paper objectives to bring some re-flections of the rights granted to deficient people and about the institutes sculptured, such as curatorship and supported decision, and analyze the new perspective of civil capacity in light of the advent of the Brazilian Inclusion Law of People with Deficiency (Law nº 13.146/2015), seeking to conclude the changes made through this law in the Brazilian legal order.

KEYWORDS: Law nº 13.146/2015; deficiency; civil capacity; curatorship.

SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Desenvolvimento e análise do tema; 2.1 Definição de deficiência; 2.2 Dos direitos assegura-dos aos deficientes; 2.3 Ação de curatela (interdição); 2.4 Tu-tela penal em favor da pessoa com deficiência; 2.5 O instituto da tomada de decisão apoiada; 2.6 Novo paradigma da capa-cidade civil; 3 Conclusão.

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1 introduÇÃo

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, chamada de Estatuto da Pessoa com Deficiência, é uma verdadeira revolução no ordena-mento jurídico pátrio.

Em um sumário volver da Lei nº 13.146/2015, mais especificamente em sua parte final, pode-se constatar que houve revogações, inclusões e retifica-ções normativas nas áreas do direito previdenciário, direito do trabalho, di-reito eleitoral, direito do consumidor, direito administrativo, direito urbanís-tico, direito civil, direito processual civil e até mesmo na legislação de trânsito brasileira, além de essa lei conter disposições criminais em seu rol de artigos.

Trata-se de um microssistema normativo que irradia seus efeitos para diversos ramos da ciência do Direito, causando severas modificações em con-ceitos e institutos sólidos, em que era difícil conceber alguma mudança, a exemplo do instituto da capacidade, disciplinada pelo Código Civil, mudan-ça substancial que causará grandes impactos nas searas jurídica e social.

Sob esse enfoque, o presente trabalho busca tecer apontamentos acer-ca da nova legislação e as principais inovações e institutos trazidos consigo, além da nova roupagem jurídica conferida aos deficientes, sobretudo no to-cante à sua capacidade, no afã de demonstrar que resta integralmente supe-rado seu status de desigual perante as demais pessoas.

2 deSenvolvimento e AnÁliSe do temA

2.1 Definição de deficiência

Tecidas as considerações acerca dos direitos estampados aos deficien-tes, mister se faz a averiguação do conceito de deficiente.

Conforme interpretação filológica do art. 2º da referida legislação, con-sidera-se pessoa com deficiência aquela acometida de impedimento de longo prazo de natureza mental, intelectual, sensorial ou física, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

Importante asseverar que eventual avaliação da deficiência, quando (e se) necessária, será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar, e considerará os impedimentos nas funções e nas estruturas

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do corpo; os fatores socioambientais, psicológicos e pessoais; a limitação no desempenho de atividades; e a restrição de participação.

2.2 Dos direitos assegurados aos deficientes

Como não poderia deixar de ser, a lei em comento inicia o largo rol de direitos assegurados às pessoas portadoras de deficiências dispondo que é atribuição do poder público garantir a dignidade da pessoa com deficiência ao longo de toda a vida, corolário da pedra de toque insculpida na Constitui-ção, princípio da dignidade da pessoa humana.

O direito à saúde da pessoa com deficiência em todos os níveis de complexidade, extensão do direito à vida, é assegurado expressamente por intermédio do Sistema Único de Saúde, garantindo-se o acesso universal e igualitário.

Por constituir direito de todas as pessoas, a educação aos deficientes resta garantida por um sistema educacional inclusivo em todos os níveis e aprendizado ao longo de toda sua vida, de modo a atingir o máximo desen-volvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais, intelec-tuais e sociais, segundo suas particularidades, interesses e necessidades de aprendizagem.

Comumente, pode-se observar que as pessoas com deficiência, na maioria das vezes, residem com seus familiares; entretanto, elas têm direito à moradia digna, no seio de sua família (natural ou substituta) ou desacompa-nhadas, em moradia para a vida independente ou com seu cônjuge ou com-panheiro.

A pessoa com deficiência tem direito ao trabalho de sua livre escolha e aceitação, em ambiente acessível e inclusivo, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

Como não poderia deixar de ser, o deficiente tem direito à cultura, ao esporte, ao turismo e ao lazer em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

O Estatuto da Pessoa com Deficiência dispõe também que os serviços, programas, projetos e benefícios no âmbito da política pública de assistência social à pessoa com deficiência e sua família têm como objetivo a garantia de instrumentos para aferição de renda, para habilitação e reabilitação de-senvolvimento da autonomia, da convivência familiar e comunitária, para promover o acesso a direitos e a plena participação social.

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É garantido expressamente o direito ao transporte e à mobilidade da pessoa com deficiência (ou com mobilidade reduzida), que se dará em igual-dade de oportunidades com as demais pessoas, por meio de identificação e de eliminação de todos os obstáculos e barreiras ao seu acesso.

Assim como a acessibilidade física, é também assegurada a acessibi-lidade nos sítios da Internet mantidos por empresas com sede ou represen-tação comercial no País ou por órgãos de governo para uso da pessoa com deficiência, garantindo-lhe acesso às informações disponíveis, conforme as melhores práticas e diretrizes de acessibilidade adotadas internacionalmente.

O poder público deve garantir e propiciar à pessoa com deficiência todos os direitos políticos e a oportunidade de exercê-los em igualdade de condições com as demais pessoas. À pessoa com deficiência será assegurado o direito de ser votada e de votar, sendo possível, para tanto, sempre que necessário e a seu pedido, permissão para que seja auxiliada na votação por pessoa de sua escolha.

É também dever do Estado, da sociedade e da família assegurar, com prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à sexualida-de, à paternidade e à maternidade, à alimentação, à habitação, à educação, à profissionalização, ao trabalho, à Previdência Social, à habilitação e à reabi-litação, ao transporte, à acessibilidade, à cultura, ao desporto, ao turismo, ao lazer, à informação, à comunicação, aos avanços científicos e tecnológicos, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária aos deficientes.

Entre outros direitos ainda preconizados pela nova norma, o que se pode concluir da sua análise é que em nenhum momento se permite colocar o deficiente como submisso, inferior ou incapaz. A Lei nº 13.146/2016 é cate-górica ao dispor que a pessoa com deficiência é igual aos demais, devendo, guardadas as devidas proporções, ser-lhe assegurados os mesmos direitos de qualquer outra pessoa, isto é, o grande objetivo do legislador foi positivar e promover a igualdade, direito constitucionalmente consagrado1.

2.3 Ação de curatela (interdição)

A curatela já é instituto antigo e conhecido no ordenamento jurídico pátrio. Desde o advento do Código Civil bevilaquiano, de 1916, está prevista

1 Art. 5º, caput, da CRFB/1988.

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como forma de proteção (ainda que de modo pejorativo à época) àquela pes-soa com alguma forma de limitações.

O art. 446 do aludido digesto rezava que estavam sujeitos à curatela os loucos de todo o gênero, os surdos-mudos, sem educação que os habilite a enunciar precisamente a sua vontade, e os pródigos2.

Com a entrada em vigor do Código Civil realiano, de 2002, o instituto continuou a ser previsto legalmente, não recebendo significativas modifica-ções, alocado topograficamente nos arts. 1.767 e seguintes, recebendo a deno-minação de curatela de interditos, ou simplesmente interdição.

Entretanto, felizmente, o diploma legal estudado, Estatuto da Pessoa com Deficiência, teve a perspicácia de não mais utilizar a terminologia “in-terdição”, para designar as ações envolvendo a suspensão da capacidade da pessoa com deficiência, mantendo-se, tão somente, a nomenclatura ideal, qual seja, curatela, o que demonstra uma evolução legislativa no sentido de primar pela almejada igualdade, já prevista constitucionalmente como direi-to fundamental.

No que diz respeito à capacidade, a curatela pode ser utilizada em ca-sos excepcionais e temporários, uma vez que a pessoa com deficiência não é relativamente capaz nem absolutamente capaz, tampouco incapaz, é igual-mente capaz, possuindo capacidade civil plena (de fato e de direito) para regular exercício de todo e qualquer ato da vida civil.

Portanto, pode-se afirmar que a pessoa com deficiência tem assegura-do o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas.

Excepcionalmente, quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela, conforme a lei, que constitui medida protetiva extra-ordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, de-vendo durar o menor tempo possível. Conforme expressa disposição legal do art. 85 do Estatuto da Pessoa com Deficiência, a curatela afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, sendo que os curadores são obrigados a prestar, anualmente, contas de sua admi-nistração ao juiz, apresentando o balanço do respectivo ano.

2 Arts. 446 e seguintes do Código Civil de 1916 – Lei nº 3.071/1916.

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Entretanto, é salutar ter em mente que a definição da curatela não al-cança o direito ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacida-de, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto, de modo que, para emissão de documentos oficiais, não será exigida a situação de curatela da pessoa com deficiência, como para emissão de um passaporte, por exemplo.

Há, ainda, a possibilidade da nomeação de um curador provisório ao deficiente em casos de relevância e urgência (a fim de proteger os interesses da pessoa com deficiência, ouvido o Ministério Público), que ficará incumbi-do das obrigações atinentes ao múnus de curador até a prolação da sentença.

Ademais, importante repisar que a Lei nº 13.146/2016 teceu diversas retificações e inovações no bojo dos artigos que disciplinam o procedimento da ação de curatela no âmbito do Código Civil. Assim, doravante, antes de deliberar acerca dos termos da curatela, o juiz, que deverá ser assistido por equipe multidisciplinar, entrevistará pessoalmente o interditando3. Ou seja, a audiência para oitiva do deficiente, que antes se chamava interrogatório, pas-sou a ter o nomen juris de audiência de entrevista, o que demonstra a patente humanização do processo de curatela envolvendo a pessoa com deficiência.

Importa asseverar, também, que a interdição a ser deliberada pelo juí-zo afetará tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimo-nial e negocial, não alcançando os direitos do curatelado ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto.

Isso se dá porque a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para se casar, constituir união estável, exercer os direitos sexuais e reprodutivos, exercer o direito sobre decidir o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar, conservar sua fertilidade, exercer o direito à família e à convivência familiar comunitária, além de exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotado, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.

O escopo da norma é, claramente, o de preservar, ao máximo, na medi-da do possível, a autonomia do deficiente, considerando-o plenamente capaz, respeitadas as limitações do caso concreto. A regra de que a curatela atinja tão somente os negócios jurídicos concernentes às relações patrimoniais deve

3 Art. 1.771 do Código Civil.

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ser interpretada segundo esse contexto, de modo que, sempre que possível, o curador não deverá interferir nas relações mantidas pelo deficiente interdita-do, a fim de preservar sua a autonomia e a sua dignidade.

2.4 Tutela penal em favor da pessoa com deficiência

Além de todo arcabouço de normas penais já existentes, a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência foi criteriosa ao disciplinar outras con-dutas como sendo práticas criminosas em desfavor da pessoa com deficiência como forma de melhor salvaguardar os interesses dos deficientes.

A título de exemplo, vale recordar, é certo, que, não poucas vezes, o deficiente tem postulada sua interdição com o escopo de obter uma tutela previdenciária em seu favor, sobretudo o benefício do LOAS4, bem como, também na maioria dessas vezes, não é o próprio deficiente quem administra provento advindo do referido benefício assistencial.

Diante dessa realidade fática, o legislador, neste ponto, foi deveras cauteloso, tipificando diversas condutas que poderiam ser praticadas por um curador em desfavor de um curatelado. Ademias, aproveitou o ensejo para penalizar condutas como abandono de deficientes por aqueles que têm a obrigação de cuidado ou que o discriminam.

Em suma, da análise do segundo título insculpido na Lei nº 13.146/2016, nota-se que praticar, induzir ou incitar discriminação de pessoa em razão de sua deficiência; apropriar-se ou desviar seus bens, proventos, pensão, benefí-cios, remuneração ou qualquer outro rendimento do deficiente; abandoná-la em hospitais, casas de saúde, entidades de abrigamento ou congêneres; ou reter/utilizar seu cartão magnético, qualquer meio eletrônico ou documento destinado ao recebimento de benefícios, proventos, pensões ou remunera-ção ou à realização de operações financeiras, com o fim de obter vantagem indevida, são crimes praticados contra a pessoa com deficiência, cujas penas variam entre 6 (seis meses) a 4 (quatro) anos, conforme disposições expressas dos arts. 88 a 91 da aludida lei.

Dessarte, o que se pode concluir é que, em que pese o deficiente não ser tido como inferior ou incapaz e estar em total igualdade perante a lei às de-mais pessoas, o legislador ainda deu-lhe guarida em algumas situações para

4 Lei nº 8.742/1993. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras pro-vidências.

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não permitir que sobre ele paire nenhum prejuízo por conta de sua condição, tutelando, especialmente, a relação entre curador e curatelado.

2.5 O instituto da tomada de decisão apoiada

Como exposto linhas alhures, doravante, a pessoa com qualquer defi-ciência não é presumidamente incapaz, relativa ou absolutamente, ao con-trário, em que pese possuir alguma limitação, é considerada integralmente capaz civilmente.

Nessa linha de ideias, o legislador trouxe a possibilidade de esse defi-ciente que pretende tomar decisões (sobretudo negociais e patrimoniais) es-colher pessoas de sua confiança para lhe apoiar em decisões.

A denominada tomada de decisão apoiada é uma importante inovação inserida no mundo jurídico com o advento da Lei nº 13.146/2016. Não se pode olvidar que se trata de uma verdadeira inovação, haja vista que antes dela não se podia observar nada semelhante no ordenamento brasileiro.

Por expressa disposição inserida no art. 116 do Estatuto da Pessoa com Deficiência, o aludido instituto é responsável pela inclusão no Diploma Civi-lista brasileiro do art. 1.783-A, que norteia a aplicação da tomada de decisão apoiada em favor dos necessitados, os deficientes que a requeiram.

A tomada de decisão apoiada nada mais é, em síntese, do que o proces-so judicial pelo qual a pessoa com deficiência elege ao menos duas pessoas, idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo--lhes os elementos e informações necessárias para que possa exercer sua ple-na capacidade.

Importante registrar que, para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com deficiência, juntamente com os apoiadores escolhidos, deve apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito à vontade, aos direitos e aos interesses das pessoas que devem apoiar o deficiente, isto é, o pedido de tomada de decisão apoiada será reque-rido pela pessoa a ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a lhe prestarem o referido apoio para tomada de decisões nos atos da vida civil.

Note-se a tamanha sensibilidade do tema, prevendo a lei, inclusive, que, antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão apoiada, o juiz (que deverá estar assistido por equipe multidisciplinar e proceder à

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oitiva do Ministério Público) ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe prestarão apoio. Ou seja, para garantir a lisura daqueles que apoiarão o deficiente em eventuais atos da vida civil, eles pôr-se-ão, literalmente, de fronte ao juiz para serem ouvidos. Assim, o magistrado deliberará acerca da possibilidade (ou não) da pretensão da pessoa com deficiência em manter relação de apoio com as pessoas escolhidas.

Após a prolação de decisum, a decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre terceiros, sem restrições, desde que esteja inserida nos limites do apoio acordado. O terceiro com quem a pessoa apoiada mante-nha relação negocial, por sua vez, pode solicitar que os apoiadores contra-as-sinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado, o que gera maior segurança jurídica junto ao negócio celebrado.

2.6 Novo paradigma da capacidade civil

A pessoa humana é um ser singular, possui vida própria, particulari-zada e desempenha papel no âmbito da sociedade e da família. Identifica--se por um conjunto de atributos, alguns comuns aos semelhantes e outros peculiares. Cada ente humano possui a sua personalidade, e este é o modo individual de ser da pessoa, suas características, seus valores e atitudes.

Afirmar que o homem tem personalidade é o mesmo que dizer que ele tem capacidade para ser titular de direitos5. Portanto, o Código Civil é pragmático ao tratar da capacidade civil, tanto que cuida do tema em seus primeiros artigos. Preconiza que toda pessoa, natural ou jurídica, é capaz de direitos e deveres na ordem civil. Dispõe, ainda, que a pessoa humana passa a ter personalidade civil desde o seu nascimento com vida.

Nesse sentido, a doutrina realiza sua hermenêutica e, teleologicamen-te, ensina que a capacidade jurídica advém do simples existir, do ato de nas-cer e ter vida, passando a ser sujeito de direitos e obrigações na órbita civil6.

O legislador civilista, na redação original do Codex Civil, preocupou-se em distinguir as capacidades, atribuindo limites àqueles com menor grau de inteligência (em tese), discernimento e condição de discernir o prejudicial do vantajoso e o permitido do proibido. Não significava que a capacidade em si

5 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil esquematizado. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 98.6 SANTOS, José Carlos Van Cleef de Almeida; CASCALDI, Luis de Carvalho. Manual de

direito civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 56.

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era limitada, mas havia uma mitigação, uma necessidade de representação ou assistência para validar determinados atos da vida civil.

É nesse sentido que reside a maior alteração realizada pela Lei nº 13.146/2015 no tocante à capacidade fática e jurídica da pessoa com defi-ciência. Antes, qualquer pessoa com deficiência era presumidamente consi-derada incapaz de gozar plenamente de sua capacidade civil. Doravante, em dicção diametralmente oposta à realidade normativa anterior, com o novo paradigma estabelecido pela Lei de Inclusão da Pessoa Portadora de Defi-ciência, passam seus portadores a possuir a integral capacidade para os atos da vida civil.

O rol das incapacidades fica, assim, radicalmente alterado. Absoluta-mente incapazes são somente os menores de 16 anos, haja vista que a lei sob análise revogou todos os incisos do art. 3º do Código Civil. Relativamente incapazes são os maiores de 16 e menores de 18 anos, os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, os que, por causa permanente ou transitória, não pude-rem exprimir sua vontade, além dos pródigos. Isto é, trocando em miúdos, é certo afirmar que a idade passou a ser o único critério para se estabelecer a incapacidade absoluta7.

Doravante, com o advento da Lei nº 13.146/2016, a deficiência não afe-ta a plena capacidade civil da pessoa. Ou seja, toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofre-rá nenhuma espécie de discriminação, não havendo motivos para lhe tolher direitos, sequer para lhe considerar relativamente capaz em relação aos de-mais, não deficientes.

Ademais, vale ressaltar que a Convenção Internacional sobre os Di-reitos das Pessoas com Deficiência, aprovada nos Estados Unidos em 2007 e confirmada no Brasil pelo Decreto Legislativo nº 186/2008, não considera a deficiência mental uma enfermidade. A Lei nº 13.146/2015 confirma tal ma-gistério. Por meio dela, foram alterados substancialmente os arts. 3º, 4º, 1.548 e 1.557 do Código Civil8.

Portanto, é correto afirmar que aos deficientes é assegurada livremente a possibilidade de convolar núpcias ou constituir união estável, exercer di-reitos sexuais e reprodutivos, exercer o direito de decidir sobre o número de

7 FUIZA, Cézar. Direito civil. 18. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 84.8 NADER, Paulo. Curso de direito civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 1, 2016. p. 241.

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filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planeja-mento familiar, conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização com-pulsória, exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária e exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, além de poder servir como testemunha em juízo, direitos que anteriormente à entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência lhes eram impedidos ou, no mínimo, dificultados.

3 ConCluSÃo

A Lei Fundamental brasileira estabelece, em seu art. 5º, caput, que to-dos são iguais perante a lei. Entende-se, dessarte, em concorde unanimidade, que o alcance do princípio da isonomia não se restringe a nivelar os cidadãos diante da norma posta, mas também que a própria lei não pode ser editada em desconformidade com a igualdade, tampouco com a dignidade da pessoa humana.

O preceito magno da igualdade, como já assinalado, é norma voltada quer para o aplicador da lei, quer para o próprio legislador. Deveras, não só perante a norma posta se nivelam os indivíduos, mas a própria edição dela sujeita-se ao dever de dispensar tratamento equânime às pessoas.

Nesse sentido, andou bem o legislador ao extirpar do ordenamento ju-rídico qualquer diferenciação entre a capacidade das pessoas com deficiência das demais, eis que não há motivos para tanto. O fato de alguém ter alguma necessidade especial não pode ser pressuposto para o direito lhe ferir com uma interdição tácita, razão pela qual o Estatuto da Pessoa com Deficiên-cia advém para garantir igualdade formal e material aos deficientes no meio social.

O instituto da curatela permanece, porém, agora não mais como regra, mas sim como sendo um exceção, servindo tão somente para limitar parcial-mente os atos negociais dos sometidos à curadoria, não se vendando nenhum ato alheio à seara patrimonial. A relevante inovação é com instituição da to-mada de decisão apoiada.

Estabelece-se, dessarte, um novo paradigma no tocante à capacidade do cidadão brasileiro. Há mais de 100 (cem) anos, desde o Código Civil de 1916, os deficientes eram tratados como inferiores, presumidamente incapa-zes de tomar suas decisões e realizar plenamente os atos da vida civil. Do-

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ravante, com a sistemática inaugurada pela Lei nº 13.146/2015, tal cenário desaparece, sendo eles postos em situação de igualdade com qualquer pes-soa, suprimindo-se a deficiência como causa pressuposta de incapacidade relativa ou absoluta.

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SentenÇA diSPoniBiliZAdA em CArtÓrio em diA diStinto dAquele AnunCiAdo em AudiÊnCiA.

emBArgoS de deClArAÇÃo oPoStoS Por um litiSConSorte. interruPÇÃo do PrAZo PArA A

interPoSiÇÃo de reCurSoS PelAS demAiS PArteS. AFeriÇÃo dA temPeStividAde e do intereSSe

reCurSAl. exegeSe doS ArtigoS 1.026 do nCPC e 897-A dA Clt. vAloriZAÇÃo doS

PrinCíPioS ConStituCionAiS do ProCeSSodaniEl ustárroz

Professor Adjunto da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio

Grande do Sul (UFRGS), Advogado inscrito na OAB/RS 51.548. Autor, entre outras obras, do Manual dos Recursos Cíveis (5. ed., 2016).

SUMÁRIO: I – Da consulta; II – Dos fatos relevantes; III – Notas so-bre a aferição do interesse recursal no Direito brasileiro. Exegese dos artigos 6º e 499, ambos do CPC/1973, e 18 do CPC/2015; IV – A interrupção dos prazos pela oposição dos embargos de declaração por qualquer das partes. Interpretação dos artigos 538 do CPC/1973, 1.026 do NCPC e 897-A da CLT. Efeitos no caso concreto; V – Abor-dagem da incidência dos princípios constitucionais do processo. Projeção do acesso à justiça. Valorização dos precedentes jurispru-denciais quanto ao tema; VI – Opinião legal.

i – dA ConSultA

A Empresa X, por meio de seus advogados, os eminentes Drs. Roberto e Antônio, em demanda em que tem como parte adversa o Senhor N, com a exibição de documentos que entenderam necessários e suficientes, cópia integral dos autos e, em especial, razões e decisões, formula quesitos, ques-tionando a oportunidade e o conteúdo de decisão proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho, nos autos do Recurso Ordinário nº Y, que não admitiu esse recurso ordinário por considerá-lo intempestivo.

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Objetiva a consulente verificar se o recurso ordinário que interpôs pre-enchia os requisitos de admissibilidade. Indaga, igualmente, se haveria inte-resse recursal, uma vez que o col. Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região considerou ausente este pressuposto.

Para análise de sua indagação, é essencial fixar os fatos acertados pela instância ordinária e, em especial, a movimentação processual ocorrida entre outubro de 2015 e o presente.

ii – doS FAtoS relevAnteS

A sentença do juízo de primeira instância, bem como as petições de embargos de declaração, as suas respectivas decisões e os acórdãos proferi-dos no recurso ordinário e em embargos de declaração, no âmbito do Tribu-nal Regional, permite a identificação dos fatos relevantes para a formulação das respostas.

Consoante análise dos autos, em audiência ocorrida em 20 de outubro de 2015 (fl. 209), foi anunciado pelo magistrado que a sentença estaria dis-ponibilizada no dia 10 de novembro de 2015, de sorte que se considerariam intimadas as partes nesta data do seu conteúdo. Assim foi redigida a ata da solenidade.

Às 08h39min., aberta a audiência, foram, de ordem da Exmo(a). Juíza do Trabalho, apregoadas as partes.

Ausentes as partes.

Sem outras provas, resta encerrada a instrução processual.

Razões finais oportunizadas.

Proposta final de conciliação prejudicada.

Para leitura e publicação da sentença, designa-se o dia 10.11.2015 às 17:30 horas.

Cientes as partes, conforme fls. 170.

Audiência encerrada às 8h40min.

Nada mais.

Ocorre que, na data anunciada, a sentença não fora proferida. Ela apenas viria a ser assinada e disponibilizada em 12 de novembro de 2015 (fl. 210-224).

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Em 17 de novembro de 2015, a primeira reclamada (J.) opôs embargos de declaração (fl. 225), os quais não foram conhecidos por terem sido consi-derados intempestivos (fl. 227). Considerou a decisão judicial que o prazo recursal teria principiado em 10 de novembro de 2015, conforme estabelecido na audiência.

Opostos novos declaratórios por J. a fim de corrigir alegado erro mate-rial (fl. 229), igualmente restaram desacolhidos, sendo que a publicação de tal decisão se deu em 28 de janeiro de 2016 (fl. 231, 232 e 234).

No octídio legal, foi interposto pela consulente o recurso ordinário, em 5 de fevereiro de 2016 (fl. 234-252), o qual não veio a ser conhecido, por con-siderar o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região que os embargos de de-claração opostos pela primeira reclamada não teriam interrompido o prazo para a interposição do recurso ordinário da segunda reclamada (fl. 265-278).

A motivação do acórdão é a seguir transcrita:

Embora a segunda reclamada argumente, no recurso ordinário, que o Juízo de origem se equivocou na contagem do prazo alusivo aos primeiros embargos declaratórios (chegando, inclusive, a arguir nulidade processual por esse motivo e a mencionar o “flagrante equívoco da magistrada ao declarar intempestivos os embargos declaratórios opostos, devendo tal sentença ser cassada e devolvida os autos para apreciação pelo magistrado singular dos embargos de declaração opostos em 17.11.2015 ou seja conhecido o presente recurso e provido em seu mérito” – fls. 239/240), isso não favorece a recorrente. Como apon-tado acima, os embargos declaratórios que acabaram sendo declarados intempestivos foram opostos pelo primeiro reclamado (J.), e não pela re-corrente (a segunda reclamada, X). Sendo assim, a segunda reclamada (X) não possui legitimidade para postular, na via recursal, o afastamento da intempestividade e o conhecimento dos embargos declaratórios opostos pelo primeiro réu (J.), porque tal pretensão constitui hipótese de substitui-ção processual não autorizada nos arts. 6º do CPC/1973 e 18 do CPC/2015. Incumbia ao próprio embargante (o primeiro réu, J.) interpor recurso ordi-nário para obter, nessa via, o reconhecimento da tempestividade de seus embargos declaratórios. Considerando que o primeiro réu (J.) não interpôs recurso ordinário para discutir a declaração de intempestividade dos em-bargos declaratórios por ele opostos, tem-se (a) que a sentença que não conheceu desses embargos já transitou em julgado e (b) que tais embargos não interromperam o prazo recursal. Posto isso, não se admite o recurso or-dinário interposto pela segunda reclamada (X) por intempestivo. (retira-dos os nomes das partes)

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Com base nesse contexto fático, pacífico nos autos, indaga a consulente se essa decisão foi acertada e se o seu recurso ordinário merecia conhecimen-to, à luz dos princípios constitucionais do processo e da legislação infracons-titucional.

A formulação da resposta passa, necessariamente, pela análise do inte-resse recursal, o qual não foi reconhecido pelo eg. TRT.

iii – notAS SoBre A AFeriÇÃo do intereSSe reCurSAl no direito BrASileiro. exegeSe doS ArtigoS 6º e 499, AmBoS do CPC/1973, e 18 do CPC/2015

No direito processual, o interesse recursal é uma projeção do interesse em agir, como reconhece Marco Tullio Zanzucchi: “Interesse che non è se non un particolare aspetto del generale interesse ad agire”1.

Nesse sentido, em sede jurisprudencial, anota o Ministro Luiz Fux que “o interesse em recorrer é instituto ontologicamente semelhante ao interesse em agir como condição da ação e é mensurado à luz do benefício prático que o recurso pode proporcionar ao recorrente”2.

No plano concreto, enfocando a relação entre o prejuízo ocasionado pela decisão e o eventual benefício do provimento do recurso, Flávio Cheim Jorge assinala que:

De um modo geral, o interesse em recorrer vem sempre ligado, de uma forma ou de outra, à questão relacionada ao prejuízo que a arte teve com a prolação da decisão. Ibañez Frocham afirma, peremptoriamente, que é re-quisito indispensável a existência de um prejuízo, uma lesão, um gravame. O interesse em recorrer relaciona-se diretamente com o interesse proces-sual, como condição para o ajuizamento da ação. Inexistindo o interesse em recorrer, a parte não terá o recurso, no caso específico, de apelação, conhecido e julgado no seu mérito. Esse requisito de admissibilidade pode ser buscado em função da conjugação do binômio necessidade + utilidade.3

Nessa linha, José Carlos Barbosa Moreira destaca a relevância de ser adotada uma “óptica prospectiva” para a aferição do interesse em recorrer, a

1 Diritto Processuale Civile, II, p. 185. 2 EDcl-EDcl-EDcl-REsp 474.475/SP, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJe 25.05.2010. 3 Teoria geral dos recursos cíveis. Rio de Janeiro: Forense, 2004. p. 104.

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fim de se perquirir eventual utilidade no julgamento do recurso. Vale trans-crever o seu raciocínio:

A construção de um conceito unitário do interesse em recorrer, ao que nos parece, exige a adoção de uma óptica antes prospectiva que retrospectiva: a ênfase incidirá mais sobre o que é possível ao recorrente esperar que se decida, no novo julgamento, do que sobre o teor daquilo que se decidiu, no julgamento impugnado. Daí preferimos aludir à utilidade, como outros aludem, como fórmula afim, ao proveito que a futura decisão seja capaz de proporcionar ao recorrente. Essa maneira de considerar a questão permite uniformizar-lhes os termos, quer se trate de recurso de parte, quer de ter-ceiro prejudicado, quer do Ministério Público enquanto fiscal da lei.4

Agrega o mestre fluminense:

Deve aferir-se ao ângulo prático a ocorrência da utilidade, isto é, a relevân-cia do proveito ou vantagem cuja possibilidade configura o interesse em recorrer. A razão de ser do processo não consiste em proporcionar ocasião para o debate de puras teses, sem consequências concretas para a fixação da disciplina do caso levado à apreciação do juiz. Não pode a atividade do aparelho judiciário do Estado servir de instrumento para a solução de questões acadêmicas. Por isso, não entra em linha de conta a veleidade, que alguma das partes tenha, de obter satisfação psicológica com o acolhi-mento in totum, pelo órgão ad quem, da argumentação utilizada na defesa do seu direito, se a decisão já assegura a este tutela eficaz. Daí se tiram im-portantes corolários. O mais gritante deles costuma a doutrina formulá-lo dizendo que não legitima a interposição de recurso a simples discrepância entra as razões de decidir e os argumentos invocados pela parte: ou, em outras palavras, que só se admite recurso contra o dispositivo, e não contra a motivação.5

Sintetizando as lições anteriormente citadas, compreende-se que o recurso não existe para satisfazer caprichos, mas sim para cumprir missões constitucionais: propiciar o controle dos atos estatais, exercitar a cidadania e, principalmente, viabilizar que o jurisdicionado busque uma melhor resposta para as suas pretensões. Quando identificado prejuízo oriundo do eventual cumprimento do ato judicial, em tese, estará presente o interesse recursal. A contrario senso, se observado que o julgamento de determinado recurso não

4 Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 1999. p. 296.5 Idem, p. 298.

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trará ao recorrente a satisfação almejada, então deve ser abortado de pronto o caminho, evitando-se o prolongamento inútil de um procedimento fadado ao fracasso6. Cumpre, nesse cenário, ao recorrente convencer o Tribunal de que algum interesse, por mínimo que seja, ainda lhe resta para ultrapassar este pressuposto de admissibilidade.

Aplicadas essas lições ao caso concreto, conclui-se que havia interesse recursal, na medida em que necessário o rejulgamento da causa, para se con-cluir pela existência e pela extensão do direito do reclamado.

Não é correto, portanto, o fundamento indicado pela decisão recorrida:

Os embargos de declaração que acabaram sendo declarados intempestivos foram opostos pelo primeiro reclamado (J.) e não pela segunda recorren-te (a segunda reclamada, X). Sendo assim, a segunda reclamada (X) não possui legitimidade para postular, na via recursal, o afastamento da in-tempestividade e o conhecimento dos embargos declaratórios opostos pelo primeiro réu (J.) porque tal pretensão constitui hipótese de substituição processual não autorizada pelos arts. 6º do CPC/1973 e 18 do CPC/2015. Incumbia ao próprio embargante (o primeiro réu, J.) interpor recurso ordi-nário para obter, nessa via, o reconhecimento da tempestividade de seus embargos declaratórios. Considerando que o primeiro réu (J.) não inter-pôs recurso ordinário para discutir a declaração de intempestividade dos embargos declaratórios por ele opostos, tem-se (a) que a sentença que não conheceu desses embargos já transitou em julgado e (b) que tais embargos não interromperam o prazo recursal. Posto isso, não se admite o recurso or-dinário interposto pela segunda reclamada (X) por intempestivo. (fl. 275 e 276) (alterados os nomes)

Na medida em que a sentença condenara ambos os litisconsortes, os embargos de declaração interpostos por qualquer deles interromperiam o prazo para a interposição do recurso ordinário pelas demais partes, consoan-te a melhor interpretação do art. 538 do CPC/1973 e do art. 1.026 do NCPC, a seguir apresentada. Deveria, portanto, o TRT da 9ª Região ter reconhecido o interesse recursal da consulente e enfrentado o tema expressamente indicado

6 “A parte recorrente não restou sucumbente quanto à matéria impugnada, circunstância que caracteriza, portanto, a ausência de interesse recursal a justificar o conhecimento do apelo.” (AgRg-REsp 945.059/RS, 6ª T., Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 15.03.2010).

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no seu recurso ordinário: a tempestividade dos embargos de declaração da litisconsorte J.

Esta conclusão parcial passa pela melhor interpretação, em sede dou-trinária e jurisprudencial, dos arts. 538 do CPC/1973, 897-A da CLT e 1.026 do NCPC, adiante abordada.

iv – A interruPÇÃo doS PrAZoS PelA oPoSiÇÃo doS emBArgoS de deClArAÇÃo Por quAlquer dAS PArteS. interPretAÇÃo doS ArtigoS 538 do CPC/1973, 1.026 do nCPC e 897-A dA Clt. eFeitoS no CASo ConCreto

Segundo o art. 1.026 do CPC, a interposição dos embargos declarató-rios interrompe o prazo para a interposição de outros recursos. Contudo, a redação do art. 1.026 não é inovadora em nosso sistema: “Os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a in-terposição de recurso”.

Em verdade, ela mantém uma orientação consolidada na vigência do Código de Processo Civil de 1973 por meio da interpretação jurisprudencial e doutrinária do vetusto art. 538, que assim dispunha: “Os embargos de de-claração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes”.

No âmbito específico da Justiça Trabalhista, incide o art. 897-A, invoca-do no recurso de revista, o qual possui a seguinte redação:

Art. 897-A. Caberão embargos de declaração da sentença ou acórdão, no prazo de cinco dias, devendo seu julgamento ocorrer na primeira audiência ou sessão subseqüente a sua apresentação, registrado na certidão, admi-tido efeito modificativo da decisão nos casos de omissão e contradição no julgado e manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso. § 1º Os erros materiais poderão ser corrigidos de ofício ou a re-querimento de qualquer das partes. § 2º Eventual efeito modificativo dos embargos de declaração somente poderá ocorrer em virtude da correção de vício na decisão embargada e desde que ouvida a parte contrária, no prazo de 5 (cinco) dias. § 3º Os embargos de declaração interrompem o prazo para interposição de outros recursos, por qualquer das partes, salvo quando intempestivos, irregular a representação da parte ou ausente a sua assinatura.

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Todos os dispositivos legais, quanto ao ponto, destacam que a inter-posição dos embargos de declaração, por qualquer das partes, interrompe o prazo para a interposição dos demais recursos7. Excetuam-se as hipóteses igualmente arroladas no § 3º: (a) intempestividade; (b) irregularidade de re-presentação; ou (c) ausência de assinatura.

No que toca à regra geral, tanto o art. 1.026 do NCPC quanto o art. 897-A deixam claro de que se trata de uma hipótese de interrupção do prazo recur-sal, e não de suspensão, como ocorria no início da vigência do CPC/19738. Desta forma, uma vez julgados os aclaratórios e intimadas as partes de seu teor, o prazo para a interposição do recurso futuro será contado de maneira integral, desimportando quantos dias tenham transcorrido entre a prolação de decisão embargada e a oposição dos embargos. A contagem do prazo re-começa ab initio.

Outrossim, é tranquila na doutrina e na jurisprudência a conclusão de que a interrupção se estende aos recursos de todas as partes, uma vez que, com o julgamento dos embargos de declaração, em tese, poderá ocorrer mu-

7 Por ilustração: “RECURSO ORDINÁRIO – AGRAVO REGIMENTAL – TEMPESTIVIDADE – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – INTERRUPÇÃO DO PRAZO RECURSAL – A oposição de embargos de declaração, desde que tempestivos, interrompe o prazo para interposição de outros recursos, por qualquer das partes (art. 538 do CPC). Tendo ocorrido a interposição de agravo regimental dentro do octídio posterior à publicação da decisão dos embargos declaratórios opostos anteriormente, tempestivo é o apelo. Também não se há falar em descabimento da medida, em face de a decisão embargada ter sido proferida monocraticamente, ante o seu conteúdo decisório (indeferimento da petição inicial do mandado de segurança). Inteligência da Orientação Jurisprudencial nº 74 desta SBDI-2. Recurso provido para determinar o retorno dos autos ao TRT de origem, a fim de que prossiga no julgamento do agravo regimental, como entender de direito, afastada a intempestividade” (TST, RO-Ag 1384500-20.2006.5.02.0000, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, J. 30.09.2008, Data de Publicação: DEJT 10.10.2008)

8 Quanto ao tema, ensina José Carlos Barbosa Moreira: “No sistema originário do Código, os embargos suspendiam, desde que admissíveis, o prazo para interpor quaisquer recursos, com a ressalva de novos embargos declaratórios a decisão já embargada por outrem. A Lei nº 8.950 modificou, no sentido que preconizarmos em edições anteriores deste livro, o efeito do oferecimento dos embargos, o qual – sempre sob a condição da respectiva admissibilidade – passou a interromper (e não mais a suspender) o prazo de interposição de outros recursos. Tal prazo, portanto, recomeça a fluir ab initio, sem que se leve em conta o tempo porventura já decorrido ao se oferecerem os embargos” (Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, v. 5, 1999. p. 550).

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dança na fundamentação e eventualmente no resultado do julgado embar-gado9.

Outro ponto importante diz respeito à irrelevância de os embargos te-rem ou não sido acolhidos10. A mera interposição já gera o efeito interrupti-vo11. Tampouco será lícito retirar do jurisdicionado o benefício legal na hi-pótese de os declaratórios atacarem apenas parcela da decisão (capítulos). Ainda assim, o prazo terá sido interrompido, pela incidência da norma legal.

Quanto ao ponto específico, por ilustração, recorda-se precedente de lavra do Ministro Augusto César Leite de Carvalho que censurou orienta-ção do Tribunal Regional que havia negado o aproveitamento da interrupção pelo fato do não preenchimento das hipóteses autorizadoras dos embargos de declaração (omissão, obscuridade, contradição ou erro material). Asseve-rou o Ministro, de forma correta, que:

Segundo o disposto no art. 538, caput, do CPC, os embargos de declaração interrompem o prazo recursal. Tal efeito, porém, não é alcançado quan-do os embargos de declaração não são conhecidos por intempestividade ou por inexistência jurídica. No caso dos autos, todavia, os embargos de declaração do autor (fls. 857-861) foram conhecidos pelo juízo de origem e julgados improcedentes (fl. 867), ante a inocorrência das hipóteses pre-

9 A este respeito, anota Araken de Assis: “A interrupção (ou a suspensão nos juizados especiais) beneficia ‘qualquer das partes’. A disposição debelou a dúvida que se formara na vigência do CPC de 1939 quanto à extensão do benefício ao litigante que não embargara. Em consequência, o efeito interruptivo alcança – para beneficiá-lo, equiparando-o à parte que embargou – o adversário do embargante. Essa repercussão não é isenta de dificuldade” (Manual dos recursos. 6. ed. São Paulo: RT, 2014. p. 664).

10 Por ilustração, no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho: “RECURSO DE REVISTA – INTEMPESTIVIDADE – RECURSO ORDINÁRIO – EMBARGOS DECLARATÓRIOS NÃO CONHECIDOS POR AUSÊNCIA DOS VÍCIOS DO ART. 535 DO CPC/1973 – EFEITO INTERRUPTIVO DO PRAZO RECURSAL – Hipótese em que se impõe afastar a intempestividade do recurso ordinário da reclamada, eis que o não conhecimento dos embargos de declaração por ela opostos contra a sentença, em virtude da ausência dos vícios do art. 535 do CPC/1973, gera a interrupção do prazo recursal para qualquer das partes, nos termos do disposto no art. 538 do mesmo diploma legal. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido” (RR 1867-86.2011.5.02.0446, 2ª T., Relª Min. Delaíde Miranda Arantes, J. 28.09.2016, DEJT: 07.10.2016).

11 Entre farta jurisprudência, Recurso Especial nº 711.954/MG, Rel. Min. Castro Meira: “Processual civil. Embargos de declaração. Prazo para interposição de recurso. Interrupção. Art. 538 do CPC. 1. A Corte Especial pacificou o entendimento no sentido de que os embargos de declaração, independentemente do resultado de seu julgamento, interrompem o prazo para oposição de recurso (EREsp 159.317/DF). 2. Recurso especial conhecido e provido”.

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vistas nos arts. 535 do CPC e 897-A da CLT. Tal decisão foi publicada em 21.07.2009, conforme certidão à fl. 868. Assim sendo, a decisão regional que julgou intempestivo o recurso ordinário do autor de fls. 897-923, interposto em 24.07.2009, por considerar que os embargos de declaração por ele opos-tos contra a sentença não interromperam o prazo para a interposição do recurso ordinário, viola o art. 5º, LV, da CF.12

Em síntese, este é o regramento geral do sistema.

Entretanto, a título excepcional, a jurisprudência passou a identificar uma situação na qual o efeito interruptivo é obstado. É o caso da apresen-tação intempestiva dos embargos13. É que, nessa hipótese, caso admitida a reabertura do prazo, jamais haveria como transitar uma decisão em julgado, uma vez que, em tese, a todo momento, seria possível ao interessado opor embargos, livrando-se da preclusão operada ou mesmo da coisa julgada. A intempestividade do recurso, portanto, em linha de princípio, impede o be-nefício do efeito interruptivo14.

Cumpre esclarecer, todavia, que, mesmo na hipótese da intempestivi-dade dos embargos, em determinadas situações, a jurisprudência protege o

12 Ementa: “RECURSO DE REVISTA – TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ORDINÁRIO – Segundo o disposto no art. 538, caput, do CPC, os embargos de declaração interrompem o prazo recursal. Tal efeito, porém, não é alcançado quando os embargos de declaração não são conhecidos por intempestividade ou por inexistência jurídica. No caso dos autos, todavia, os embargos de declaração do autor foram conhecidos pelo juízo de origem e julgados improcedentes. Assim sendo, a decisão regional que julgou intempestivo o recurso ordinário do autor viola o art. 5º, LV, da CF. Recurso de revista conhecido e provido” (RR, 115600-77.2008.5.03.0035, 6ª T., Rel. Min. Augusto César Leite de Carvalho, Data de Julgamento: 28.09.2016, Data de Publicação: DEJT 07.10.2016).

13 Sobre o tema, por ilustração, no Superior Tribunal de Justiça: “Esta Corte já pacificou o entendimento de que os embargos declaratórios, quando manifestamente intempestivos, não interrompem o prazo para a interposição de outros recursos” (AgRg-Ag 586.430/RS, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ: 02.05.2005). “Embargos de declaração considerados intempestivos não interrompem o prazo para interposição de outros recursos” (AgRg-Ag 720251/RR, 1ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 04.05.2006, p. 139).

14 Ementa: “PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL – EMBARGOS DECLARATÓRIOS – INTEMPESTIVIDADE – NÃO INTERRUPÇÃO DO PRAZO RECURSAL – 1. Os embargos de declaração, quando não conhecidos por intempestividade, não interrompem o prazo para a interposição de qualquer outro recurso (AgRg-EDcl-AgRE-RE-EDcl-REsp 760.216/PA, Corte Especial, Rel. Min. Ari Pargendler, DJe 06.08.2010). 2. Agravo regimental não conhecido” (AgRg- -EDcl-REsp 1526574/SP, 2ª T., Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 17.12.2015, DJe 18.12.2015. No mesmo sentido: AgRg-Ag 1336539/BA, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJe 28.10.2010).

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cidadão, oferecendo-lhe o benefício da interrupção. É o que ocorre quando há séria dúvida quanto à tempestividade ou quando é a outra parte que figura como embargante. Argumenta-se, corretamente, que, nesta última hipótese, o embargado não tem meios de identificar a intempestividade do recurso alheio, de sorte que merece a proteção jurisdicional. Correta a ponderação do Ministro Sidnei Beneti, do Superior Tribunal de Justiça, a este respeito, quando destaca que, “quanto ao embargante, os embargos de declaração in-tempestivos não interrompem o prazo para a interposição de novos recursos, mas interrompem quanto ao embargado, que não tem como verificar de pla-no a referida intempestividade”15.

Diante do exposto, no caso concreto, são alcançadas duas conclusões relevantes: (a) a oposição dos declaratórios pela primeira reclamada inter-rompeu o prazo para a interposição do recurso ordinário pela segunda recla-mada; e (b) existe interesse recursal da segunda reclamada em postular a rea-nálise da decisão de primeiro grau que reputou intempestivos os aclaratórios da primeira reclamada, conforme observado no tópico anterior.

Por fim, a presente opinião legal enfrentará o tópico da tempestividade do recurso ordinário, matéria que deverá ser enfrentada pelo Tribunal Regio-nal do Trabalho após o provimento do recurso de revista.

v – ABordAgem dA inCidÊnCiA doS PrinCíPioS ConStituCionAiS do ProCeSSo. ProjeÇÃo do ACeSSo à juStiÇA. vAloriZAÇÃo doS PreCedenteS juriSPrudenCiAiS quAnto Ao temA

A Constituição Federal assegura o livre e efetivo acesso à Justiça em seu art. 5º, XXXV. Dispõe a norma que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”. Discorre acerca da importância do acesso à justiça o Professor José Joaquim Gomes Canotilho, destacando que

15 Ementa: “PROCESSUAL CIVIL – RECURSOS – PRESSUPOSTOS RECURSAIS – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO INTEMPESTIVOS – INTERRUPÇÃO DO PRAZO PARA INTERPOSIÇÃO DE NOVOS RECURSOS – I – Quanto ao embargante, os embargos de declaração intempestivos não interrompem o prazo para a interposição de novos recursos, mas interrompem quanto ao embargado, que não tem como verificar de plano a referida intempestividade. II – Recurso especial provido” (REsp 869.366/PR, 3ª T., Rel. Min. Sidnei Beneti, J. 17.06.2010, DJe 30.06.2010).

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a imposição de clareza na concretização legal do direito de acesso aos Tri-bunais não significa a necessidade da adopção da forma processual mais simples nem desvincula o particular do seu dever de informação quanto à possibilidades de acesso à via jurisdicional. Pressupõe, porém, que a deter-minação legal da via judiciária adequada não se traduza, na prática, num jogo formal sistematicamente reconduzível à existência de formalidades e pressupostos processuais cuja “desatenção” pelos particulares implica a “perda automática das causas”.16

É por essa razão que afirmamos, em sede doutrinária, que a interpreta-ção dos requisitos de admissibilidade recursal deve ocorrer com grãos de sal, sob pena de se frustrar a aplicação do direito pela excessiva valorização do fe-tiche formalista17. Nesse compasso, é correto concluir que, diante de dúvidas quanto à ultrapassagem dos requisitos de admissibilidade, deve ser tutelado o recorrente, com o conhecimento de seu recurso, especialmente em sede de recurso ordinário, pois é a única forma de valorizar o duplo de grau de juris-dição e, mais do que isto, encontrar a melhor solução para o caso concreto.

De um lado, é correta a iniciativa dos juízes de primeiro grau quan-do anunciam, em audiência, a data em que a sentença estará disponível em cartório. Nessa situação, uma vez que o ato judicial existe e o seu conteúdo é de fácil acesso às partes, conclui-se que o dies a quo para a interposição dos recursos é aquele posterior ao da data indicada.

Não é disso que se trata o caso concreto, entretanto.

Como indicado na movimentação processual, disponível no site do TRT9, a sentença apenas foi registrada nos sistema do processo eletrônico em 12.11.2015, embora o magistrado tivesse intimado as partes de que ela estaria disponível em cartório em 10.11.2015. Nesse contexto, o correto seria a inti-mação das partes pelos meios tradicionais, com a publicação da intimação no Diário de Justiça, o que não houve. Aqui reside outra violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa.

De toda sorte, em 17.11.2015, foram opostos os embargos de declara-ção, dentro do quinquídio legal, que não foram conhecidos mediante equivo-cada decisão, tomada em 02.12.2015, que considerou o recurso intempestivo. Deveria ter o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região enfrentado o tema

16 Direito constitucional e teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000. p. 485.17 Manual dos recursos cíveis. 4. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. p. 90.

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da tempestividade dos embargos de declaração, uma vez que, se confirma-das as premissas anteriormente citadas, o recurso ordinário aviado pela con-sulente seria conhecido.

Mostra-se correta, no ponto, a argumentação do recorrente, quando afirma que, na medida em que a sentença não existia em 10.11.2015, não ha-via como se considerar intimada qualquer das partes de seu conteúdo e que o dies a quo do prazo recursal ocorreu em 13.11.2015 (primeiro dia útil posterior à data da disponibilização da sentença no sistema eletrônico).

Provavelmente surpreendida pela decisão judicial que deixou de co-nhecer os embargos, em face de sua pretensa intempestividade, a parte opôs novos embargos de declaração em 09.12.2016, novamente dentro do quin-quídio legal. Entretanto, o recurso não foi acolhido em decisão prolatada em 20.01.2016 e publicada em 28.01.2016. Em 05.02.2016, foi protocolado o recur-so ordinário, dentro do octídio legal.

No caso em análise, o tema relativo à sentença que não é publicada no dia anunciado em audiência não é novo.

Em situação absolutamente análoga à dos autos, assim concluiu a col. 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho:

RECURSO DE REVISTA – NULIDADE – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – Tendo em vista a possibilidade de julgamento de mé-rito em favor da parte a quem aproveitaria a decretação de nulidade do acórdão por negativa de prestação jurisdicional, invoca-se o disposto no § 2º do art. 249 do CPC para deixar de apreciá-la. RECURSO ORDINÁ-RIO – TEMPESTIVIDADE – DATA DE DISPONIBILIZAÇÃO E PUBLI-CAÇÃO DA SENTENÇA – CONTAGEM DO PRAZO – CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA – 1. A Corte de origem considerou intempestivo o recurso ordinário do reclamado, sob o fundamento de que o apelo foi apresentado após o transcurso do prazo recursal. Para contagem do prazo, considerou certidão dos autos datada de 02.03.2012, a qual previu que a publicação do decisum ocorreria em 05.03.2012. 2. Contudo, constatando--se que a decisão foi efetivamente publicada apenas em 06.03.2012, já que disponibilizada no Diário Eletrônico da Justiça do Trabalho em 05.03.2012 (§§ 3º e 4º do art. 4º da Lei nº 11.419/2006), e tendo em vista que o recurso ordinário foi apresentado em 14.03.2012, não há falar em intempestividade do apelo patronal. 3. Violação do art. 5º, LV, da CF caracterizada. Recurso de revista conhecido e provido no tema. (TST, RR 1833-86.2011.5.03.0025, 1ª T., Rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, J. 25.03.2015, DEJT: 31.03.2015)

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Os fundamentos do voto do insigne Relator do recurso anteriormente apontado são de todo idênticos aos do caso concreto:

Contudo, verifica-se não houve efetiva publicação da decisão em 05.03.2012, pois apenas nesta data a decisão foi disponibilizada no Diário Eletrônico de Justiça, conforme documento de fl. 669, trazido com os embargos de declaração da reclamada (em pesquisa realizada no sítio do Diário Ele-trônico da Justiça do Trabalho, consta efetivamente a disponibilização da decisão em 05.03.2012, conforme endereço eletrônico <http://aplicacao2.jt.jus.br/dejt/f/n/diariocon>). Desse modo, disponibilizada a decisão em 05.03.2012, segunda-feira, considera-se publicada em 06.03.2012, a teor dos §§ 3º e 4º do art. 4º da Lei nº 11.419/2006, findando o prazo recursal em 14.03.2012, quarta-feira. Apresentado o recurso ordinário em 14.03.2012 (fl. 604), não há falar em intempestividade do apelo patronal.

Como se observa, no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, são valorizados os princípios constitucionais do devido processo legal, do con-traditório e da ampla defesa. O mesmo raciocínio é adotado pelos Regionais, como se vê ilustrativamente dos julgados a seguir:

INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ORDINÁRIO – SÚMULA Nº 197 DO TST – SENTENÇA NÃO PUBLICADA NA DATA APRAZADA – CON-TAGEM DO PRAZO – NÃO DEVE SER ADOTADO O PROCEDIMENTO DA SÚMULA Nº 197 DO TST PARA EFEITO DE CONTAGEM DO PRA-ZO RECURSAL – Se a publicação da sentença recorrida efetivamente não ocorreu na data e horários aprazados em audiência de encerramento da instrução processual. Agravo de instrumento conhecido e provido. Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento oriundos da 3ª Vara do Trabalho desta capital, em que figuram como agravante Wilson Bernardo de Sousa e como agravada BF Utilidades Domésticas Ltda., acor-dam os Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região, por unanimidade, conhecer do agravo e, no mérito, dar-lhe provimento, nos termos deste voto. (TRT16, AI 00678-2005-003-16-00-7, 1ª T., Rel. Des. José Evandro de Souza, J. 15.08.2007)

AGRAVO DE INSTRUMENTO – SENTENÇA NÃO PUBLICADA NA DATA PREVIAMENTE DESIGNADA – AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DAS PARTES DA PUBLICAÇÃO EM DATA POSTERIOR – AGRAVO PROVIDO – Se a sentença não é publicada na data designada, para a qual as partes estavam previamente cientes, impõe-se sua notificação quando da publicação posterior, não servindo o despacho de adiamento, sem no-tificação das partes, como ciência da nova data aprazada. Agravo de ins-

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trumento provido para afastar a intempestividade declarada na origem e determinar o regular processamento do feito. (TRT4, AI-RO 0000347-48.2011.5.04.0022, 4ª T., Des. Hugo Carlos Scheuermann, J. 02.06.2011)

A este respeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal vem chamando a atenção para a boa-fé que se exige do Estado-juiz, no sentido de que o jurisdicionado deve ser protegido frente ao formalismo desmesurado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – RECURSO INTERPOSTO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO – CONHECIMENTO – INSTRUMENTA-LISMO PROCESSUAL – PRECLUSÃO QUE NÃO PODE PREJUDICAR A PARTE QUE CONTRIBUI PARA A CELERIDADE DO PROCESSO – BOA-FÉ EXIGIDA DO ESTADO-JUIZ – DOUTRINA – RECENTE JURIS-PRUDÊNCIA DO PLENÁRIO – MÉRITO – ALEGAÇÃO DE OMISSÃO E CONTRADIÇÃO – INEXISTÊNCIA – RECURSO CONHECIDO E REJEI-TADO – 1. A doutrina moderna ressalta o advento da fase instrumentalis-ta do direito processual, ante a necessidade de interpretar os seus institu-tos sempre do modo mais favorável ao acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CRFB) e à efetividade dos direitos materiais (OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. O formalismo-valorativo no confronto com o formalismo exces-sivo. Revista de Processo, São Paulo: RT, n. 137, p. 7-31, 2006; DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 14. ed. São Paulo: Malhei-ros, 2009; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e téc-nica processual. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2010). 2. “A forma, se imposta rigidamente, sem dúvidas conduz ao perigo do arbítrio das leis, nos mol-des do velho brocardo dura lex, sed lex” (BODART, Bruno Vinícius Da Rós. Simplificação e adaptabilidade no anteprojeto do novo CPC brasileiro. In: FUX, Luiz (Org.). O Novo Processo Civil Brasileiro – Direito em expectativa. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 76). 3. As preclusões se destinam a permi-tir o regular e célere desenvolvimento do feito, por isso que não é possível penalizar a parte que age de boa-fé e contribui para o progresso da marcha processual com o não conhecimento do recurso, arriscando conferir o di-reito à parte que não faz jus em razão de um purismo formal injustificado. 4. O formalismo desmesurado ignora a boa-fé processual que se exige de todos os sujeitos do processo, inclusive, e com maior razão, do Estado-Juiz, bem como se afasta da visão neoconstitucionalista do Direito, cuja teoria proscreve o legicentrismo e o formalismo interpretativo na análise do sis-tema jurídico, desenvolvendo mecanismos para a efetividade dos princí-pios constitucionais que abarcam os valores mais caros à nossa sociedade (COMANDUCCI, Paolo. Formas de (neo)constitucionalismo: un análisis metateórico. Trad. Miguel Carbonell. Isonomía. Revista de Teoría y Filosofía

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del Derecho, n. 16, 2002). 5. O Supremo Tribunal Federal, recentemente, sob o influxo do instrumentalismo, modificou a sua jurisprudência para permi-tir a comprovação posterior de tempestividade do recurso extraordinário, quando reconhecida a sua extemporaneidade em virtude de feriados lo-cais ou de suspensão de expediente forense no Tribunal a quo (RE 626.358-AgRg/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, Julg. 22.03.2012). 6. In casu: (i) os embargos de declaração foram opostos, mediante fac-símile, em 13.06.2011, sendo que o acórdão recorrido somente veio a ser publicado em 01.07.2011; (ii) o paciente foi denunciado pela suposta prática do crime do art. 12 da Lei nº 6.368/1979, em razão do alegado comércio de 2.110 g (dois mil cento e dez gramas) de cocaína; (iii) no acórdão embargado, a Turma reconheceu a legalidade do decreto prisional expedido pelo Tribu-nal de Justiça do Estado do Maranhão em face do paciente, para assegurar a aplicação da lei penal, em razão de se tratar de réu evadido do distrito da culpa, e para garantia da ordem pública; (iv) alega o embargante que houve omissão, porquanto não teria sido analisado o excesso de prazo para a instrução processual, assim como contradição, por não ter sido conside-rado que à época dos fatos não estavam em vigor a Lei nº 11.343/2006 e a Lei nº 11.464/2007. 7. O recurso merece conhecimento, na medida em que a parte, diligente, opôs os embargos de declaração mesmo antes da publicação do acórdão, contribuindo para a celeridade processual. 8. No mérito, os embargos devem ser rejeitados, pois o excesso de prazo não foi alegado na exordial nem apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça, além do que a Lei nº 11.343/2006 e a Lei nº 11.464/2007 em nada interferem no julgamento, visto que a prisão foi decretada com base nos requisitos do art. 312 do CPP identificados concretamente, e não com base na vedação abstrata à liberdade provisória, prevista no art. 44 da Lei de Drogas de 2006. 9. Embargos de declaração conhecidos e rejeitados. (HC 101132-ED, 1ª T., Min. Luiz Fux, J. 24.04.2012, DJe 21.05.2012, p. 22.05.2012; RT, v. 101, n. 922, 2012, p. 719-725)

Daí se conclui que, na medida em que a sentença apenas inserida e registrada, no processo eletrônico, em 12.11.2015, o mais correto, à luz dos princípios constitucionais, seria a intimação das partes quanto ao seu conteú-do na forma tradicional, com a expedição de nota de expediente. Consoante a movimentação processual, essa cautela – essencial à luz do devido processo legal e do contraditório – não foi tomada, daí a ocorrência de nulidade. De toda sorte, se opostos embargos de declaração em 17.11.2015, não havia como deixar de reconhecer a sua tempestividade.

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vi – oPiniÃo legAl

Do que foi exposto, respondemos aos questionamentos apresentados da seguinte forma:

a) o fato de a sentença não estar disponível em cartório em 10.11.2015 e ter sido prolatada em 12.11.2015 gera a necessidade de intimação dos procuradores pelos meios tradicionais. No caso concreto, con-siderando que houve a interposição de embargos de declaração por J., dispensa-se a intimação pela demonstração de ciência ine-quívoca em 17.11.2015 (data da interposição do recurso). Em rela-ção à X, considerando inexistir nos autos a sua intimação, reputa--se intimada a parte em 05.02.2015 (data da interposição do recurso ordinário), em obediência ao devido processo legal;

b) o fato de um litisconsorte embargar uma decisão judicial determi-na a interrupção do prazo para a interposição dos recursos pelas demais partes, consoante a melhor interpretação dos arts. 897-A da CLT, 538 do CPC/1973 e 1.005 do NCPC;

c) considerando que a análise do interesse recursal passa pela apre-ciação do binômio interesse-utilidade e que, no caso concreto, a reapreciação da tempestividade dos embargos de declaração in-terpostos por J. era essencial ao conhecimento do recurso ordinário interposto pela litisconsorte X, havia nítido interesse recursal por parte da consulente, ex vi dos arts. 6º e 499 do CPC/1973 e 18 e 996 do NCPC;

d) no contexto da presente causa, o recurso de revista deve ser conhe-cido e provido pela contrariedade aos artigos anteriormente apon-tados, determinando-se que o col. Tribunal Regional da 9ª Região, ao apreciar o mérito do recurso ordinário, enfrente expressamen-te o tema relativo à tempestividade dos embargos de declaração opostos em 17.11.2015 pelo litisconsorte J.

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Penal

um Breve eStudo SoBre A queStÃo dA reduÇÃo dA mAioridAde PenAl: umA

involuÇÃo em mAtériA PenAl*

A BrieF StudY on the queStion oF the reduCtion oF CriminAl mAjoritY: A involution in CriminAl mAtterS

rocco antonio rangEl rosso nElson

Especialista em Ministério Público, Direito e Cidadania pela Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande do Norte, Especialista em Direito Penal e Criminologia pela Universidade Potiguar, Mestre

em Direito Constitucional pela UFRN, Ex-Professor do curso de direito e de Outros cursos de graduação e Pós-Graduação do Centro

Universitário Facex, Membro do Grupo de Estudo e Pesquisa em Extensão e Responsabilidade Social, vinculado à linha de Pesquisa “Democracia,

Cidadania e Direitos Fundamentais” do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, Campus Natal-Central, Professor Efetivo de Direito do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, Campus João Câmara.

* Artigo de investigação elaborado de estudo desenvolvido na linha de pesquisa “Democracia, Cidadania e Direitos Fundamentais”, inscrito no Grupo de Estudo e Pesquisa em Extensão e Responsabilidade Social, do Instituto Federal do Rio Grande do Norte – IFRN, Brasil.

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“Quem é capaz de fazer você acreditar em absurdos é capaz de fazer você cometer atrocidades.”

Voltaire

RESUMO: Em decorrência do agravamento da violência, no seio da sociedade brasileira, a qual atinge todos os estratos sociais, desde a periferia até a alta classe, onde a impotência dos órgãos e entidades estatais de segurança apresenta-se palmar. O estado de insegurança amplia-se em decorrência de um jornalismo sensacionalista, de mo-mento, que espalha terror e infla os ânimos sociais. Nesse diapasão, as entidades governamentais recorrem ao Direito Penal, como solu-ção milagrosa, no qual busca-se a criminalização de mais condutas e o enrijecimento das penas. É nesse cenário de caos institucional face à violência, que de fato há, que tramita a Proposta de Emenda à Constituição nº 171, de 1993, a qual tem o fito de reduzir a maiorida-de penal, de 18 anos para 16 anos, como uma das frentes de combate da expansão da criminalidade. A pesquisa em tela, fazendo uso de uma metodologia de análise qualitativa, usando-se os métodos de abordagem hipotético-dedutivos de caráter descritivo e analítico, tem por linha de fundo analisar o tema da redução da idade penal e sua (in)adequação aos vetores axiológicos sociais esculpidos, na Constituição Federal.

PALAVRAS-CHAVE: Ofensa à essência da Constituição; Proposta de Emenda à Constituição nº 171/1993; imputação penal; redução da maioridade penal.

ABSTRACT: Due to the worsening of violence, within the Brazi-lian society, which affects all social strata, from the periphery to the upper class, where the impotence of the bodies and state security bodies is presented clearly. The state of insecurity has widened due to a sensationalist journalism at the moment, spreading terror and inflates the social mood. In this vein, government entities resort to criminal law as miracle cure, which seeks to criminalize more beha-viors and the stiffening of penalties. It is this institutional chaos sce-nario face violence, that in fact there, which clears the draft propo-sed amendment to the Constitution nº 171 of 1993, which has the aim of reducing the legal age of 18 years to 16 years as one of the fronts expansion of crime fighting. The research in question, making use of a qualitative analysis methodology, using the methods of hypo-thetical-deductive approach of descriptive and analytical character, is the bottom line analyze the theme of reduction of the penal age and (in) appropriateness to social axiological vectors carved in the Federal Constitution.

KEYWORDS: Offense the essence of the Constitution; Proposed Amendment of the Constitution Project nº 171/93; criminal imputa-tion; reduction of legal age.

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SUMÁRIO: Das considerações iniciais; 1 Contextualização do cer-ne da contenda; 2 Por um discurso refratário à redução da idade penal; 2.1 Dos status dos direitos fundamentais: o desenvolver da função limitadora da Constituição; 2.2 Da constitucionalização do direito das crianças e dos adolescentes; 2.2.1 Do patamar constitu-cional da convenção sobre direitos da criança – Integrante do bloco de constitucionalidade; 2.2.2 Princípios constitucionais sensíveis; 2.3 Da normatividade constitucional simbólica da PEC 171/1993; 2.3.1 Do Direito Penal simbólico; 3 Um breve retrato da realidade e da consequência prática da redução da maioridade penal com suas respectivas críticas; 3.1 Do descaso do Estado na manutenção e na adequação das casas de internação nos moldes do Estatuto da Crian-ça e do Adolescente; 3.2 Um sério problema prático: vaga e estrutura nos presídios brasileiros; Considerações finais; Referências.

dAS ConSiderAÇÕeS iniCiAiS

O legislador estabeleceu, no art. 27 do Código Penal, uma presunção legal absoluta de que os menores de 18 anos não possuem capacidade para o entendimento da conduta criminosa, ficando os mesmos sujeitos a legislação especial1.

A opção pela idade de 18 anos é fruto de política criminal, o qual busca não contaminar o jovem infrator com os efeitos deletérios do convívio peni-tenciário, como bem é descrito no item 23 da exposição de motivos do Código Penal, referente à reforma de 1984:

1 Sobre um breve relato histórico da idade penal, aferir Maximiliano e Maximilianus Führer: “É antiga a relação da idade com o grau de responsabilidade penal. Em Roma (Lei das XII Tábuas) os menores eram classificados em púberes e impúberes, sendo que os últimos estavam sujeitos a medidas administrativas (castigatio). Em alguns momentos a responsabilidade criminal foi fixada aos sete anos de vida. Durante O primitivo Direito Bárbaro pouco importava a idade do autor do fato, já que O objetivo principal do Direito Penal era a reparação de danos. A idade somente começou a ter relevância para os alemães quando passaram a considerar também os aspectos subjetivos do delito. No Direito Canônico os impúberes, em princípio, eram inimputáveis, mas isto dependia de o juiz verificar no caso concreto o discernimento do réu. As Ordenações Filipinas adotaram um sistema semelhante. A pena era aplicada integralmente aos maiores de 20 anos, ficando ao arbítrio do julgador a redução do castigo no caso de agente maior de 17 e menor de 20 anos. Nesta hipótese, a sanção poderia ser integral se o menor demonstrasse suficiente malicia. As legislações atuais fixam o limite da responsabilidade penal de forma não harmônica, variando a idade mínima, conforme o país, de 12 a 20 anos de idade” (FÜHRER, Maximiliano Roberto Ernesto; FÜHRER, Maximilianus Cláudio Américo. Código penal comentado. 3. ed. Malheiros: São Paulo, 2010. p. 58-59).

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Manteve o projeto a inimputabilidade penal ao menor de 18 (dezoito) anos. Trata-se de opção apoiada em critérios de Política Criminal. Os que pre-conizam a redução do limite, sob a justificativa da criminalidade crescen-te, que a cada dia recruta maior número de menores, não consideram a circunstância de que o menor, ser ainda incompleto, e naturalmente anti--social na medida em que não é socializado ou instruído. O reajustamento do processo de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal. De resto, com a legislação de menores recentemente edita-da, dispõe o Estado dos instrumentos necessários ao afastamento do jo-vem delinqüente, menor de 18 (dezoito) anos, do convívio social, sem sua necessária submissão ao tratamento do delinqüente adulto, expondo-o à contaminação carcerária.

O menor de 18 anos que pratica conduta nos termos das prescrições cri-minais ou das contravenções penais realiza o chamado ato infracional, como dispõe o art. 103 da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente)2.

Quando da prática do ato infracional, poder-se-á aplicar as seguintes medidas socioeducativas, segundo o art. 112 do ECA:

I – advertência;II – obrigação de reparar o dano;III – prestação de serviços à comunidade;IV – liberdade assistida;V – inserção em regime de semi-liberdade;VI – internação em estabelecimento educacional;VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.3

2 ECA, art. 103: “Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal”.

3 ECA, art. 101: “Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:

I – encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II – orientação, apoio e acompanhamento temporários; III – matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV – inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao

adolescente; V – requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou

ambulatorial; VI – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a

alcoólatras e toxicômanos; [...]”.

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Chama-se a atenção ao inciso VI, recente a internação em estabeleci-mento educacional, a qual perdurará pelo prazo máximo de 3 anos, com rea-valiação do comportamento a cada 6 meses.

No interstício entre a publicação do Código Penal de 1940 e o Estatu-to da Criança e do Adolescente de 1990, sucedem-se diversas constituições, havendo, com a Constituição cidadã de 1988, o processo de constitucionali-zação dos direitos da criança e do adolescente, elevando a status de norma constitucional o critério da menoridade penal, inferior a 18 anos de idade (já adotado pelo Código Penal), como limite a imputabilidade penal e, conse-quentemente, da aferição da culpabilidade delitiva, nos termos do art. 228 da Constituição: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”.

Entretanto, com os meios tecnológicos de acesso à informação, houve, sem dúvida, um processo de amadurecimento e conscientização do jovem, em um patamar superior do adolescente da década de 1940.

Agrega-se a isso um crescente índice de violência, o qual só tem au-mentado, década após década, onde, nesse bojo, tem-se aferido o aumento dos atos infracionais perpetrados por crianças e adolescentes, não apenas em quantidade, mas também em gravidade.

Com o jornalismo policial que explora de forma sensacionalista4, olvi-dando das melhores razões da norma constitucional e legal, tem-se um esta-do de insegurança e de terror extremamente potencializado.

É nessa seara que se recorre às novas proposições, em matéria penal, de caráter demagógicas, nas quais imputa-se ao Direito Penal a culpa pela brandura de suas penas, vindo a propugnar por um Estado de exceção, onde a pena seria aplicada com o seu rigor máximo de formar e intimidar a “ban-didagem”.

Em um plexo de variáveis determinantes para a conduta criminosa e para os atos infracionais, vende-se a ideia de que a solução é que deve haver mais condutas criminalizadas e penas mais duras.

4 “Alardeia-se pela mídia, sem dados, a criminalidade do menor de dezoito anos, dentro de uma visão tacanha da ‘lei e da ordem’, que de má ou boa-fé crê resolver a questão da criminalidade com repressão penal, como se por um passe de mágica a imputabilidade aos dezesseis anos viesse a reduzir comodamente, sem políticas sociais, a criminalidade.” (REALE JÚNIOR, Miguel. Instituições de direito penal – Parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. I, 2004. p. 213)

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É nesse execrável contexto de um claro Direito Penal simbólico que tem em trâmite, de forma mais avançada, a Proposta de Emenda à Constituição nº 171/1993, que altera a redação do art. 288 da Constituição Federal, redu-zindo a idade penal para 16 anos, ventilando-se, assim, a ideia de que a apli-cação da sanção penal, ao invés da sanção prevista do Estatuto da Criança e do Adolescente, conteria a alta das estatísticas referente à violência perpetra-da pelo jovem entre 16 e 18 anos.

É desnecessário ressaltar o debate hercúlea que a temática da redução da idade penal gera em âmbito político, acadêmico, jurídico e no seio da po-pulação.

Destaca-se que, em pesquisa simples, no sítio da Câmara dos Deputa-dos, localizou-se, entre propostas arquivadas e em trâmite, a “bagatela” de 52 Propostas de Emenda à Constituição alterando, de alguma forma, a redação do art. 228 da Constituição Federal, seja reduzindo a idade penal para 16 anos5; outro a redução seria para 12 anos6; já, em outras, seria para 14 anos a idade penal7; propugnou-se para a imputabilidade penal fosse determinado pelo magistrado, no caso concreto8; que a imputabilidade fosse determinado por uma junta médica, nos termos da lei9; em certa proposta, a imputabili-dade, quando de menores de 18 anos, seria determinado quando da rein-cidência10; por fim, em outros, a redução da idade para 16 anos em caso do cometimento de crimes específicos, como crimes hediondos11.

Fazendo uso de uma metodologia de análise qualitativa e utilizando--se os métodos de abordagem hipotético-dedutivos de caráter descritivo e analítico, buscar-se-á fazer uma apreciação da incompatibilidade normativa da Proposta de Emenda à Constituição nº 171/1993 com os princípios funda-mentais da Constituição Federal de 1988, ressaltando o caráter simbólico de tal proposta, bem como do aumento do desarranjo estatal, caso da redução da idade penal para 16 anos.

5 Por exemplo: PEC 426/1996; PEC 167/1999; PEC 37/1995; PEC 260/2000; PEC 633/1999; PEC 531/1997; PEC 91/1995; PEC 133/1999; PEC 179/2003.

6 PEC 302/2013; PEC 345/2004; PEC 137/2003.7 PEC 169/1999; PEC 242/2004; PEC 399/2009.8 PEC 125/2007; PEC 73/2007; PEC 489/2005.9 PEC 321/2001.10 PEC 309/2004.11 PEC 95/1992.

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1 ContextuAliZAÇÃo do Cerne dA ContendA

Reafirma-se o fato de que a imaturidade natural referente à idade de 18 anos gera acaloradas querelas, vindo, atualmente, dividir a sociedade quan-to à questão da redução da maioridade penal dos 18 anos para os 16 anos, visto o aumento vertiginosos de atos infracionais de caráter violento, estes explorados maciçamente pela mídia, na qual a aplicação das medidas socio-educativas, esculpidas no ECA, ficam a desejar frente a esse anseio do desejo de “vingança social”12.

O debate jurídico que permeia as correntes conflitantes entre a redução ou não da maioridade penal tem em seu âmago um embate sobre qual a na-tureza jurídica da norma constitucional prescrita no art. 228 da Constituição Federal: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial”.

A corrente contrária a redução da maioridade argumenta que o conte-údo normativo do art. 228 da Constituição seria um direito individual fun-damental, de tal sorte, constituindo-se em uma cláusula pétrea (art. 60, § 4º, da Constituição)13, o qual constitui um dos limites materiais para reforma constitucional.

12 “Tal presunção, nos dias de hoje, tem gerado revolta na sociedade, que presencia, com impressionante frequência, menores de 18anos praticando toda sorte de injustos penais, valendo-se, até mesmo, da certeza da impunidade que a sua particular condição lhe proporciona.

O argumento de que ao inimputável por imaturidade natural que pratica um ato infracional será aplicada uma medida socioeducativa, nos termos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), não tem o condão de convencer a sociedade, que cada dia pugna pela redução da maioridade penal para os 16 anos.” (GRECO, Rogério, Curso de direito penal – Parte geral. 13. ed. Rio de Janeiro: Impetus, v. I, 2011. p. 388)

“Outro ponto profundamente negativo no ECA é a internação máxima por três anos, desprezando-se inclusive o exame criminológico para aferição da cessação ou não da periculosidade. Tal liberalidade representa séria ameaça à coletividade. Imagine-se, apenas para argumentar, um garoto de 13 anos que matou 10 pessoas. Após três anos ele será colocado em liberdade, sob a vigilância dos ‘pobres e impotentes’ educadores de rua! O que fatalmente ocorrerá é que esse menor reincidirá no infracional.” (FERNANDES, Valter; FERNANDES, Newton. Criminologia integrada. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 432)

13 Constituição Federal, art. 60: “[...] § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos Poderes; IV – os direitos e garantias individuais”.

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A ala que propugna pela redução da maioridade penal para a faixa dos 16 anos não vislumbra como direito fundamental do indivíduo a matéria veiculado no art. 228, pois encontra-se fora do rol do art. 5º da Constituição (título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais), no qual o constituinte originário destinou, especificamente, para os direitos e deveres individuais. De tal maneira, seria possível a redução da maioridade penal, desde, é claro, que emendada a Constituição em seu disposto 22814.

Nesses termos, é defensor o professor Guilherme de Sousa Nucci:

A única via para contornar essa situação, permitindo que a maioridade penal seja reduzida, seria através de emenda constitucional, algo perfei-tamente possível, tendo em vista que, por clara opção do constituinte, a responsabilidade penal foi inserida no capítulo da família, da criança, do ado-lescente e do idoso, e não no contexto dos direitos e garantias individuais (Capítulo I, art. 5º, CF).

Não podemos concordar com a tese de que há direitos e garantias humanas fundamentais soltos em outros trechos da Carta, por isso também cláusulas pétreas, inseridas na impossibilidade de emenda prevista no art. 60, § 4º, IV, CF, [...]15

Assim, também, se lapida o professor Rogério Greco:

Apesar da inserção no texto de nossa Constituição Federal referente à maio-ridade penal, tal fato não impede, caso haja vontade política para tanto, de ser levada a efeito tal redução, uma vez que o mencionado art. 228 não se encontra entre aqueles considerados irreformáveis, pois não se amolda ao

14 Aferir Proposta de Emenda à Constituição de nº 171, de 1993, que propõe pela redução da maioridade penal, a qual está em trâmite há 22 anos.

15 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 295-296. “Por isso, a maioridade penal, além de não ser direito fundamental em sentido material (não há notícia de reconhecimento global nesse prisma), também não o é no sentido formal. Assim, não há qualquer impedimento para emenda constitucional suprimindo ou modificando o art. 228 da Constituição. Não se pretende, com tal modificação, combater a criminalidade, como muitos pensam. De fato, não é a redução da maioridade penal que poderá solucionar o problema do incremento da prática delitiva no País, embora seja recomendável que isso seja feito para adaptar a lei penal à realidade. O menor de 18 anos já não é o mesmo do início do século, não merecendo continuar sendo tratado como uma pessoa que não tem noção do caráter ilícito do que faz ou deixa de fazer, sem poder conduzir-se de acordo com esse entendimento.” (Idem, p. 296)

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rol das cláusulas pétreas elencadas nos incisos I a IV, do § 4º, do art. 60 da Carta Magna.A única implicação prática da previsão da inimputabilidade penal no texto da Constituição Federal é que, agora, somente por meio de um procedi-mento qualificado de emenda, a menoridade penal poderá ser reduzida, ficando impossibilitada tal redução via lei ordinária.16

É esse, também, o entendimento de Miguel Reale Junior:Entendo que não constitui regra pétrea não por não estar o dispositivo in-cluído no art. 5º da Constituição Federal, referente aos direitos e garantias individuais mencionados no art. 60, IV, da Constituição. Não é a regra do art. 228 da Constituição Federal regra pétrea, pois não se trata de um direito fundamental ser reputado penalmente inimputável até completar dezoito anos. A medida foi adotada pelo Código Penal e depois pela Constituição Federal em face do que se avaliou como o necessário e conveniente, tendo em vista atender aos interesses do adolescente e da sociedade.17

Chama-se atenção que no parecer da comissão de constituição e justiça e cidadania da Câmara dos Deputados de 31 de março de 2015, a qual vali-dou a Proposta de Emenda à Constituição nº 171 de 1993, quando a questão do art. 228 ser cláusula pétrea sustentou que a mesma não se enquadra em nenhuma hipótese dos incisos do § 4º do art. 60 da Constituição18.

Há uma corrente, intermediária, por assim dizer, que vislumbra a pos-sibilidade da redução da idade de 18 anos para 16 anos, tendo em vista que não se está abolindo um direito fundamental, mas sim modificando-o. Ou seja, para essa vertente, o limite de idade, no que tange à responsabilidade penal, seria um limite garantista ao ius puniendi estatal, só sendo limite mate-rial, a emenda constitucional, a sua abolição e não sua modificação19.

16 GRECO, Rogério. Op. cit., p. 389. No mesmo sentido, Alberto Silva Franco. (Cf. FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui (Coord.). Código penal e sua interpretação. 8. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 217)

17 REALE JÚNIOR, Miguel. Op. cit., p. 212. Destaca-se que o professor Miguel Reale, apesar de entender que a regra do art. 228 da Constituição Federal não constitui uma cláusula pétrea, tornando-a, assim, suscetível à modificação, não entende por conveniente a redução da idade penal de 18 anos, por uma questão de política criminal. (Idem, ibidem)

18 Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=B1FDD32DA9A53F4E4CD5D291B4680226.proposicoesWeb2?codteor=1316041&filename=Parecer-CCJC-31-03-2015>. Acesso em: 30 maio 2015.

19 “[...] para nós é possível a redução de 18 para 16 anos, uma vez que apenas não se admite a proposta de emenda (PEC) tendente a abolir direito e garantia individual. Isso não significa, como já interpretou o STF, que a matéria não possa ser modificada.

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De tal sorte, desde que a atividade do poder constituinte derivado não venha por manchar o núcleo essencial da cláusula pétrea, maculando a sua essência, não haveria impedimento à sua modificação, não se constituindo, assim, a cláusula pétrea em algo intangível20. Nesses termos, o núcleo duro da normatividade do art. 228 da Constituição Federal está na limitação de uma idade penal, sendo a idade, em si, um elemento modificável, a partir dos novos valores e realidade social.

Afigura, no Estatuto de Roma, no qual o Brasil é signatário21, que ins-titui o Tribunal Internacional Penal, em seu art. 26, que a idade penal é de 18 anos: “O Tribunal não terá jurisdição sobre pessoas que, à data da alegada prática do crime, não tenham ainda completado 18 anos de idade”.

Lembra o professor Cezar Roberto Bitencourt, que, no Código Penal espanhol de 1996, este um dos mais modernos dos países europeus, elevou a idade do menor de 16 anos para 18 anos22.

Reduzindo a maioridade penal de 18 para 16 anos, o direito à inimputabilidade, visto como garantia fundamental, não deixará de existir.

A sociedade evoluiu, e, atualmente, uma pessoa com 16 anos de idade tem total consciência de seus atos, tanto é que exerce os direitos de cidadania, podendo propor a ação popular e votar. Portanto, em nosso entender, eventual PEC que reduza a maioridade penal de 18 para 16 anos é totalmente constitucional. O limite de 16 anos já está sendo utilizado e é fundamentado no parâmetro do exercício do direito de votar e à luz da razoabilidade e maturidade do ser humano.” (LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 1357-1358)

20 “A garantia de permanência em que consiste a cláusula pétrea, em suma, imuniza o sentido dessas categorias constitucionais protegidas contra alterações que aligeirem o seu núcleo básico ou debilitem a proteção que fornecem. Nesse sentido se deve compreender o art. 60, § 4º, da CF, como proibição à deliberação de proposta tendente a abolir, isto é, a reduzir, o significado e a eficácia da forma federativa do Estado, do voto direto, secreto, universal e periódico, a separação dos Poderes e os direitos e garantias individuais.” (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva. p. 152).

21 Decreto nº 4.388, de 25 de setembro de 2002 – promulga o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional.

22 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal – Parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 2010. p. 415. Francisco Muñoz Conde, já nos idos da década de 1980 já criticava a lacuna no sistema jurídico espanhol referente a um Direito Penal para os menores, onde se utiliza-se medidas reeducativas ao invés da pena: “[...]. A falta de um Direito Penal específico para jovens delinquentes (de 16 a 21 anos) é uma das mais lamentáveis lacunas do ordenamento jurídico espanhol. A Proposta de Anteprojeto de 1983 fixa a maioridade penal em 18 anos (art. 22, § 39) e prevê a adoção de medidas reeducativas substitutivas da pena para menores entre dezoito e vinte e um anos (art. 99) e a criação de um Direito Penal juvenil” (CONDE, Francisco Muñoz. Teoria geral do delito. Trad. Juarez Tavares e Luiz Regis Prado. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris editor, 1988. p. 140).

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Destaca-se, ainda, a prescrição do art. 50 do Código Penal Militar23, que reconhece a imputabilidade do menor de 18 anos e do maior de 16 anos quando comprovada a capacidade de entendimento quanto da ilicitude da conduta perpetrado, aplicando, todavia, a pena de forma diminuída. Basta dizer que tal dispositivo não foi recepcionado pela Constituição de 1988, não manifestando eficácia.

Genival Veloso é refratário à ideia de redução da maioridade penal, apontando o equívoco de se analisar a figura do criminoso pela idade. Sobre a temática, assim disserta:

Ultimamente, quase de maneira obstinada, vem-se tentando reduzir a inimputabilidade para 16 anos, justificando-se pela mudança de mentali-dade que o jovem brasileiro sofreu nestes últimos anos. Mesmo assim, é evidente que não compartilhamos com essa idéia, pois o que se pretende não é comprometê-lo com a nova realidade ou antecipar-lhes a responsabi-lidade, mas tão-só “mandá-los mais cedo para a cadeia”. O fato de encarar a criminalidade pelo prisma da idade é um equívoco. Outro fato propalado pelos defensores do endurecimento das medidas aos jovens infratores é o aumento do tempo de internamento, hoje fixado em três anos, com limite em 21 anos de idade para sua liberação. Se analisarmos melhor, veremos que, para um adulto cumprir uma pena em penitenciárias por 3 anos, teria ele sua pena situada em tomo de 18 anos de reclusão, e depois de cumprido 1/6 da pena terá o direito de deixar o cárcere. Três anos de internamento para um adolescente ê tempo bastante para se fazer algo de bom em favor de sua ressocialização e reintegração nos meios familiar e social.

[...]

Certo é que o jovem e mesmo a criança têm o necessário discernimento de saber desde cedo que muitas coisas são reprováveis como furtar ou matar. E por que não submetê-los também ao rigor da legislação penal? Por um fato muito simples: é inconveniente e perverso colocar essas crianças e es-ses adolescentes no mesmo sistema penitenciário. Resulta inconvenientes aos programas de prevenção e repressão da criminalidade: submetê-los a um sistema que já é inviável e ineficaz para os próprios adultos.

23 Código Penal Militar, art. 50: “O menor de dezoito anos é inimputável, salvo se, já tendo completado dezesseis anos, revela suficiente desenvolvimento psíquico para entender o caráter ilícito do fato e determinar-se de acôrdo com êste entendimento. Neste caso, a pena aplicável é diminuída de um têrço até a metade”.

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O que está faltando é o cumprimento das regras constitucionais em fa-vor da criança e do adolescente, por meio de políticas sociais apropriadas em que eles possam desenvolver-se normalmente. A verdade é que não existem políticas públicas para dar a estes adolescentes oportunidades de vida.24

Contra a fala anteriormente apresentada, é dificultoso rebater em face da lógica irretorquível e do senso de humanidade que se faz sentir.

2 Por um diSCurSo reFrAtÁrio à reduÇÃo dA idAde PenAl

2.1 Dos status dos direitos fundamentais: o desenvolver da função limitadora da Constituição

Jellinek explicita os quatro status dos direitos fundamentais: status pas-sivo, status ativo, status negativo e status positivo25.

É de importância nuclear, à temática ora proposta, a figura do status ne-gativo26, o qual refere-se a um espaço de liberdade do qual goza o indivíduo contra as ingerências da atividade estatal.

24 FRANÇA, Genival Veloso. Medicina legal. 8. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008. p. 433. “Os adolescentes são muito mais vítimas de crimes do que autores, contribuindo este fato para a queda da expectativa de vida no Brasil, pois se existe um ‘risco Brasil’, este reside na violência da periferia das grandes e médias cidades. Dado impressionante é o de que 65% dos infratores menores vivem em família desorganizada, junto com a mãe abandonada pelo marido, que por vezes tem filhos de outras uniões também desfeitas, e lutam para dar sobrevivência à sua prole.” (REALE JÚNIOR, Miguel. Op. cit., p. 213)

25 “No final do século XIX, Jellinek desenvolveu a doutrina dos quatro status em que o indivíduo pode encontrar-se em face do Estado. Dessas situações, extraem-se deveres ou direitos diferenciados por particularidades de natureza.” (MENDES, Gilmar; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 289)

26 “[...]. O status negativo em sentido estrito – e original de Jellinek diz respeito exclusivamente a liberdades jurídicas não-protegidas. O status negativo em sentido amplo – que extrapola a sistemática de Jellinek – diz respeito aos direitos a ações negativas do Estado (direitos de defesa), que protegem o status negativo em sentido estrito. Ao status positivo em sentido amplo pertencem direitos tanto a ações positivas quanto a ações negativas. Já ao status positivo em sentido estrito pertencem somente direitos a ações positivas. As conseqüências sistemáticas dessa divisão para o sistema de Jellinek são simples e claras. Os direitos que são acrescentados ao status negativo em sentido estrito para que se possa convertê-lo em um status negativo em sen tido amplo (direitos de defesa) são uma subespécie dos direitos do status positivo em sentido amplo.” (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 267)

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De tal sorte, os direitos fundamentais esculpidos na carta constitucio-nal seriam limitadores da atuação estatal, em relação ao cidadão, convolan-do-se em arbitrariedade quando não respeitadas.

Ou seja, as normas constitucionais, tidas como direitos fundamentais, seriam um feixe de direitos constituidores de um patamar ético mínimo civi-lizatório, no qual qualquer norma infraconstitucional que assim não se sub-suma a esse escopo ético basilar será uma norma eivada com a inconstitucio-nalidade, devendo ter sua invalidade decretada, sendo expurgada do sistema jurídico vigente.

2.2 Da constitucionalização do direito das crianças e dos adolescentes

Tendo em vista a doutrina da proteção integral, que permeou a década de 1980, fruto das normativas das Nações Unidas, tem-se com a Constituição de 1988 a constitucionalização de premissas normativas no que tange ao bojo do direito das crianças e dos adolescentes.

Ou seja, tem-se um microssistema jurídico de proteção às crianças e aos adolescentes, sejam eles menores infratores ou não, constituindo um fei-xe normativo protetivo que limita a intervenção Estatal e, ao mesmo tempo, acarreta o dever do Estado em relação à prestação positiva, gerando direito subjetivo às crianças e aos adolescentes.

É com esse escopo que se deu a redação do art. 227 da Constituição Federal, com destaque ao seu § 3º:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à crian-ça, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

[...]

§ 3º O direito a proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:

I – idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observado o disposto no art. 7º, XXXIII;

II – garantia de direitos previdenciários e trabalhistas;

III – garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola;

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IV – garantia de pleno e formal conhecimento da atribuição de ato infra-cional, igualdade na relação processual e defesa técnica por profissional habilitado, segundo dispuser a legislação tutelar específica;

V – obediência aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, quando da aplicação de qualquer medida privativa da liberdade;

VI – estímulo do Poder Público, através de assistência jurídica, incentivos fiscais e subsídios, nos termos da lei, ao acolhimento, sob a forma de guar-da, de criança ou adolescente órfão ou abandonado;

VII – programas de prevenção e atendimento especializado à criança, ao adolescente e ao jovem dependente de entorpecentes e drogas afins.

No artigo supra da Constituição se tem um conjunto de direitos fun-damentais específicos à pessoa vulnerável, que é a criança e o adolescente, os quais vêm por agregar, e não excluir, os demais direitos fundamentais da pessoa humana, como, v.g., os encampados no art. 5º da Carta Constitucional.

É com esse espírito de proteção integral, impregnado na norma consti-tucional, destinado às pessoas das crianças e dos adolescentes, os quais estão em processo de formação e amadurecimento, que concebe a inimputabili-dade penal dos menores de 18 anos como um direito fundamental, de status negativo, das crianças e dos adolescentes, quanto poder de punir do Estado.

É fulcral destacar que a Constituição brasileira é vanguardistas em vá-rios aspectos, um deles é exatamente a especificação cronológica da inimpu-tabilidade como garantia constitucional, não havendo dispositivo semelhan-te nas constituições brasileiras passadas.

Não se pactua com o entendimento de que os direitos fundamentais se restringem ao âmbito do art. 5º da Constituição27, só ficando o Estado limi-tado em sua intervenção, na esfera de espaço do cidadão, ao conteúdo desse artigo, pois a essência máxima das constituições modernas, pós-Revolução Francesa, é a limitação do poder estatal, pois esse sempre tendeu abusar, for-mando, ao longo da história, direitos valorados como fundamentais.

27 “A propósito, foi dito que apesar de as normas (arts. 227 e 228) se encontrarem no Capítulo VII do Título VIII da Constituição, não há como negar-lhes a natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias fundamentais.” (CANOTILHO, J. J. Gomes; LEONCY, Léo Ferreira; MENDES, Gilmar Ferreira; SARLET, Ingo Wolfgang; STRECK, Lenio Luiz (Coord.). Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 2138)

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A liberdade é um direito tido como prerrogativa fundante do cidadão. O art. 228 da Constituição está a limitar a intervenção do Estado nessa esfe-ra de liberdade, ao impedir a punição penal a menores de 18 anos. Não se vislumbra como essa normatividade do art. 228 não possa ser considerada direito fundamental?

Nesse sentido, corrobora o pensamento de Karyna Batista Sposato:

[...] não é necessário que o direito ou garantia individual esteja expressa-mente descrito no art. 5º da CF/1988 para impedir a deliberação da pro-posta. Basta que esteja no texto constitucional como um direito ou garantia que diga respeito diretamente à vida, à liberdade, à igualdade e até mesmo à propriedade, e que no caput do citado art. 5º venha reforçado por uma cláusula de inviolabilidade. [...]28

Aduz René Ariel Dotti, sobre a inimputabilidade como garantia fun-damental:

A inimputabilidade assim declarada constitui uma das garantias funda-mentais da pessoa humana, embora topograficamente não esteja incluída no respectivo Título (lI) da Constituição que regula a matéria. Trata-se de um dos direitos individuais inerentes à relação do art. 5º, caracterizando, as-sim, uma cláusula pétrea. Consequentemente, a garantia não pode ser objeto de emenda constitucional visando à sua abolição para reduzir a capacidade penal em limite inferior de idade – dezesseis anos, por exemplo, como se tem cogitado. A isso se opõe a regra do § 4º, IV, do art. 60 da CF.29

Também não se referenda a chamada “corrente intermediária”, a qual defende a redução da maioridade penal para 16 anos, pois não se estaria abo-lindo o direito fundamental, mas sim modificando-o.

Quando se propugna a redução da maioridade penal para uma idade abaixo de 18 anos, está-se a ferir o núcleo duro dessa cláusula pétrea, pois, por mais que não se esteja a abolir, está-se a ampliar consideravelmente a esfera de ingerência penal do Estado no âmbito de liberdade do cidadão.

28 SPOSATO, Karyna Batista. A constitucionalização do direito da criança no Brasil como barreira à redução da idade penal. In: PIOVESAN, Flávia; GARCIA, Maria (Org.). Doutrinas essências: direitos humanos. São Paulo: RT, v. IV, 2011. p. 671.

29 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal – Parte geral. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 496.

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Com esse mero simplismo de afirmar a tese da redução da imputa-bilidade penal para 16 anos, pois não estar-se-ia por abolir, mas apenas a modificar, indaga-se, por que não reduzir a 14 anos, como em alguns países da Europa? E por que não para 12 anos? Se reduzisse a idade penal para 8 anos não se estaria a abolir a premissa garantista constitucional, mas apenas a modificar.

Ironia à parte, tal argumentação jurídica, no caso em tela, de fato, seria válido quando propugna-se pelo aumento da idade penal, como, por exem-plo, 21 anos, pois, nesse caso, o núcleo duro do direito fundamental estaria sendo, de fato, respeitado, pois estar-se-ia a aumentar ainda mais o alcance do poder de persecução penal, sendo condizente com a doutrina da proteção integral que inspirou o processo de constitucionalização do direito das crian-ças e dos adolescentes.

Assevera-se as palavras de Jorge Figueiredo Dias, quando disserta que a barreira etária para intervenção penal do estado se dá por uma questão de humanidade30:

[...] a colocação desta barreira etária intransponível à intervenção penal funda-se – em estrita perspectiva político-criminal – em um princípio de humanidade que deve caracterizar todo o direito penal de um Estado de direito material. Deve evitar-se a todo o custo a submissão de uma criança ou adolescente às sanções mais graves previstas no ordenamento jurídico e ao rito do processo penal, pela estigmatização que sempre acompanha a passagem pelo corredor da justiça penal e pelos efeitos extremamente gravosos que a aplicação de uma pena necessariamente produz ao nível dos direitos de personalidade do menor, marcando inevitavelmente o seu crescimento e toda a sua vida futura. Ao que acrescem outras razões. Por um lado, a necessidade – a que o nosso CP oferece base legal no art. 20-3 e que, como vimos no § 51, é directamente relevante para outros efeitos – de compreensão da pena pelo agente e, consequentemente, de poder ser por ela influenciado no sentido da sua socialização. E, por outro lado, mas na mesma direcção, a inidoneidade da pena, especialmente da pena de prisão, para realizar essa finalidade de (re)socialização do delinquente menor. É em relação aos menores, dado serem particularmente influenciáveis e se

30 Poderiam questionar a validade da presente citação, tendo em vista que no sistema jurídico penal português adota-se a idade penal de 16 anos, a mesma propugnada na PEC 171/1993. Todavia, deve-se lembrar que a inimputabilidade penal cronológica não fora elevada ao status constitucional.

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encontrarem numa situação de especial vulnerabilidade, que mais se fa-zem sentir os efeitos criminógenos da pena de privação da liberdade, que, as mais das vezes, não promoverá a sua reinserção social, mas poderá antes contribuir para a sua dessocialização, integrando-os definitiva e irremedia-velmente no “mundo do crime”.31

2.2.1 Do patamar constitucional da Convenção sobre direitos da criança – Integrante do bloco de constitucionalidade

A matéria sobre tratados internacionais sofreu uma nova modelagem a partir da reforma promovida pela Emenda Constitucional nº 45/2004, a qual ficou conhecida como “reforma do poder judiciário”, acrescentando o § 3º no art. 5º com a seguinte prescrição:

Art. 5º [...]

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Além disso, em 2006, por meio do Recurso Extraordinário nº 466.343/SP, o STF completa esse processo de redesenhamento do direito dos tratados. Doravante, é fulcral definir a figura do tratado internacional.

O tratado internacional seria um acordo escrito entre os Estados ou organizações internacionais, sobre uma matéria de interesse comum, regi-do pelo Direito internacional, o qual pode conter dois ou mais documentos, como anexos e protocolos, os quais auxiliam na regulamentação do docu-mento principal32.

O tratado internacional assim é conceituado por Valério Mazzuoli:

[...]. Portanto, sob o aspecto que ora nos ocupa, entende-se por tratado todo acordo formal, concluído entre os sujeitos de Direito Internacional Público,

31 DIAS, Jorge de Figueiredo. Direito penal – Parte geral. São Paulo: RT, t. I, 2007. p. 595-596.32 Assim, encontra-se definida a figura do tratado na Convenção de Viena sobre o direito

dos tratados, firmado em 1969: “‘tratado’ significa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer conste de um instrumento único, quer de dois ou mais instrumentos conexos, qualquer que seja sua denominação específica”.

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regido pelo direito das gentes e visando à produção de efeitos de direito para as partes contratantes. [...]33

Era consolidado, na jurisprudência do STF, a teoria da equivalência legislativa entre os tratados internacionais e as leis ordinárias, ou seja, os tra-tados internacionais, ratificados pelo Congresso Nacional, adentravam no sistema jurídico brasileiro com status de lei ordinária. Essa teoria prevaleceu por mais de três décadas na jurisprudência do STF.

A partir de uma decisão, em sede de Recurso Extraordinário (RE 466343/SP, Rel. Min. Cezar Peluso, 22.11.2006)34, ao tratar da prisão civil do depositário infiel, previsto no art. 5º, LXVII e sua análise conforme a Conven-ção Americana de Direitos Humanos, reconheceu que tratados internacionais de direito humanos que não foram aprovados com o quórum de 3/5, em dois turnos, em cada casa do congresso (procedimento respectivo das emendas constitucionais) deveriam portar o status normativos de supralegalidade. Ou seja, acima na lei ordinária e abaixo da norma constitucional.

De tal sorte, em matéria de tratados internacionais, tem-se as seguin-tes equivalências: tratados internacionais que não sejam de direitos humanos aderem ao patamar de leis ordinárias; tratados internacionais de direitos hu-manos que obedecerem à regra do art. 5º, § 3º, da Constituição, teriam status de emendas à constituição; por fim, tratados internacionais de direitos huma-nos não aprovados segundo os trâmites de emenda constitucional teriam o porte de dispositivos supralegais.

33 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de direito internacional público. 2. ed. São Paulo: RT, 2007. p. 133.

34 “Em seguida, o Min. Gilmar Mendes acompanhou o voto do relator, acrescentando aos seus fundamentos que os tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil possuem status normativo supralegal, o que torna inaplicável a legislação infraconstitucional com eles conflitantes, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação e que, desde a ratificação, pelo Brasil, sem qualquer reserva, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), não há mais base legal para a prisão civil do depositário infiel. Aduziu, ainda, que a prisão civil do devedor-fiduciante viola o princípio da proporcionalidade, porque o ordenamento jurídico prevê outros meios processuais-executórios postos à disposição do credor- -fiduciário para a garantia do crédito, bem como em razão de o DL 911/69, na linha do que já considerado pelo relator, ter instituído uma ficção jurídica ao equiparar o devedor-fiduciante ao depositário, em ofensa ao princípio da reserva legal proporcional. Após os votos dos Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Marco Aurélio, que também acompanhavam o voto do relator, pediu vista dos autos o Min. Celso de Mello.” (RE-466343, Informativo nº 449, de 20 a 24 de novembro de 2006 do STF – grifos nossos)

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Fonte: Elaborado pelo próprio autor.

Diga-se que, até a presente data, o único tratado/convenção interna-cional ratificado segundo a regra constitucional do art. 5º, § 3º, da Constitui-ção Federal foi a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu protocolo facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, promulgado por meio do Decreto nº 6.949/2009.

Lembrar o ensinamento da professora Flávia Piovesan, que, ao inter-pretar o § 2º do art. 5º da Constituição Federal35, entende que os tratados internacionais de proteção aos direitos humanos, independentemente do quórum de aprovação ser de emenda constitucional, vêm por incorporar-se ao sistema jurídico brasileiro com status de norma constitucional em face, entre outras coisas, do caráter materialmente constitucional dos direitos fun-damentais, vindo tais tratados, especialmente aqueles anteriores à EC 45/04, a compor o bloco de constitucionalidade da ordem brasileira36.

35 Art. 5º, § 2º: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

36 PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional internacional. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 120-121. “A Constituição de 1988 recepciona os direitos

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Segue a lapidar lição da professora Flávia Piovesan:

Ao efetuar a incorporação, a Carta atribui aos direitos internacionais uma natureza especial e diferenciada, qual seja, a natureza de norma constitu-cional. Os direitos enunciados nos tratados de direitos humanos de que o Brasil é parte integram, portanto, o elenco dos direitos constitucionalmente consagrados. Essa conclusão advém ainda de interpretação sistemática e teológica do Texto, especialmente em face da força expansiva dos valores da dignidade humana e dos direitos fundamentais, como parâmetros axio-lógicos a orientar a compreensão do fenômeno constitucional.37

Nessa ótica interpretativa, a Convenção sobre os Direitos da Crian-ça, promulgada por meio do Decreto nº 99.710/1990, teria status de norma constitucional, independentemente da obediência do quórum qualificado38, determinado no art. 5º, § 3º, da Constituição, compondo o plexo de direitos fundamentais, tendo em vista o caráter especial desses tratados, que remete diversas obrigações entre o Estado e o cidadão, em atendimento ao princí-pio da prevalência da norma mais favorável, consolidando, assim, a visão da Constituição como uma ordem jurídica fundamental aberta.

Além do mais, por tratar-se de direitos e garantias fundamentais da pessoa, a Convenção supra tem aplicação imediata, nos termos do art. 5º, § 1º, da Constituição Federal, o que acarreta a desnecessidade de legislação infra-constitucional para lhe dar eficácia, constituindo, desde já, direito subjetivo do cidadão passível de exigibilidade.

enunciados em tratados internacionais de que o Brasil é parte, conferindo-lhe natureza de norma constitucional. Isto é, os direitos constantes nos tratados internacionais integram e complementam o catálogo de direitos constitucionalmente previsto, o que justifica estender a esses direitos o regime constitucional conferido aos demais direitos e garantias fundamentais.” (Idem, p. 124)

37 PIOVESAN, Flávia. Op. cit., p. 118.38 “Reitere-se que, por força do art. 5º, § 2º, todos os tratados de direitos humanos,

independentemente do quorum de sua aprovação, são materialmente constitucionais, compondo o bloco de constitucionalidade. O quórum qualificado está tão somente a reforçar tal natureza, ao adicionar um lastro formalmente constitucional aos tratados ratificados, propiciando a ‘constitucionalização formal’ dos tratados de direitos humanos no âmbito jurídico interno. Como já defendido por este trabalho, na hermenêutica emancipatória dos direitos há que imperar uma lógica material e não formal, orientada por valores, a celebrar o valor fundante da prevalência da dignidade humana. À hierarquia de valores deve corresponder uma hierarquia de normas, e não o oposto. Vale dizer, a preponderância material de um bem jurídico, como é o caso de um direito fundamental, deve condicionar a forma no plano jurídico-normativo, e não ser condicionado por ela.” (Idem, p. 138)

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A incorporação automática do Direito Internacional dos Direitos Humanos pelo direito brasileiro – sem que se faça necessário um ato jurídico comple-mentar para sua exigibilidade e implementação – traduz relevantes conse-quências no plano jurídico. De um lado, permite ao particular a invocação direta dos direitos e liberdades internacionalmente assegurados, e, por ou-tro, proíbe condutas e atos violadores a esses mesmos direitos, sob pena de invalidação. Consequentemente, a partir da entrada em vigor do tratado internacional, toda norma preexistente que seja com ele incompatível per-de automaticamente a vigência”. Ademais, passa a ser recorrível qualquer decisão judicial que violar as prescrições do tratado – eis aqui uma das sanções aplicáveis na hipótese de inobservância dos tratados.39

2.2.2 Princípios constitucionais sensíveis

Seguindo essa linha de raciocínio, considerando de tal sorte que o conteúdo veiculado na Convenção sobre os Direitos da Criança (Decreto nº 99.710/1990), sem maiores assombros, trata-se de matéria classificada como de direitos humanos, o qual tem-se o status de princípio constitucional sensível.

Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:

[...]

VII – assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:

a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;

b) direitos da pessoa humana;

c) autonomia municipal;

d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.

e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desen-

39 Idem, p. 156. “Em outras palavras, não será mais possível a sustentação da tese segundo a qual, com a ratificação, os tratados obrigam diretamente aos Estados, mas não geram direitos subjetivos para os particulares, enquanto não advém a referida intermediação legislativa. Vale dizer, toma-se possível a invocação imediata de tratados e convenções de direitos humanos, dos quais o Brasil seja signatário, sem a necessidade de edição de ato com força de lei, voltado à outorga de vigência interna aos acordos internacionais.” (Idem, ibidem)

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volvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde. (grifos nossos)

De tal sorte, só se pode reconhecer como direito da pessoa humana com idade abaixo de 18 anos de ser processado e responsabilizado por uma legislação especial, diversa daquela aplicada aos maiores de 18 anos40.

2.3 Da normatividade constitucional simbólica da PEC 171/1993

O professor Marcelo Neves trata sobre o constitucionalismo simbólico e, a partir da teoria tricotômica de Kindermann, disserta que o conteúdo da legislação simbólica versa sobre a confirmação de valores sociais; demonstra-ção da capacidade de ação do Estado; e a postergação de soluções de conflitos sociais por meio de comportamentos dilatórios41.

Assim, o grande catedrático define legislação simbólica:

[...]. Considerando-se que a atividade legiferante constitui um momento de confluência concentrada entre sistemas político e jurídico, pode-se definir a legislação simbólica como produção de textos cuja referência manifesta à realidade é normativo-jurídica, mas que serve, primária e hipertrofica-mente, a finalidades políticas de caráter não especificamente normativo--jurídico.42

No caso da PEC 171/1993, vislumbra-se o caráter simbólico, cujo conte-údo está imerso nestas três situações descritas por Marcelo Neves, apesar da predominância maior da “demonstração da capacidade de ação do Estado”.

Na “confirmação de valores sociais” há o conflito de valores entre gru-pos, cuja aprovação de determinado disposto legislativo representa “vitória” e demonstra sua “superioridade” em relação ao demais, ficando em segundo plano a eficácia normativa43.

40 Cf. SPOSATO, Karyna Batista. A constitucionalização do direito da criança no Brasil como barreira à redução da idade penal. In: PIOVESAN, Flávia; GARCIA, Maria (Org.). Op. cit., p. 672.

41 Cf. NEVES, Marcelo. A constitucionalização simbólica. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 33.42 Idem, p. 30.43 “[...]. Nesses casos, os grupos que se encontram envolvidos nos debates ou lutas pela

prevalência de determinados valores vêem a ‘vitória legislativa’ como uma forma de reconhecimento da ‘superioridade’ ou predominância social de sua concepção valorativa, sendo-lhes secundária a eficácia normativa da respectiva lei. Dessa maneira, procuram influenciar a atividade legiferante, no sentido de que sejam formalmente proibidas

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Isso acontece no desenrolar da PEC 171/1993, cuja a mesma está im-pregnada dos valores oriundos do movimento da “lei e ordem” que prega pela criminalização de condutas insignificantes e o severo aumento das pe-nalidades privativas de liberdades, propugnando até mesmo por penas de caráter perpétuo e de morte. Do outro lado da mesa está a ala dos garantistas que defendem um Direito Penal Mínimo em obediência aos princípios basi-lares da intervenção mínima e da fragmentariedade, no qual o Jus Puniendi estatal só se legitima dentro dos valores constitucionais.

Quanto à “postergação de soluções de conflitos sociais através de com-portamentos dilatórios”, explicita o professor supra que dar-se quando da divergência entre grupos políticos tem-se a aprovação consensual do ato le-gislativo, o qual não revolve a desavença, mas transfere o conflito para um momento futuro indeterminado, confiando na ineficácia normativa44.

No presente estudo, não se vislumbra a convergências entre os grupos políticos (“lei e ordem” e “garantistas”) para a aprovação da PEC 171/1993, todavia, há uma postergação para o futuro que é o problema da violência causada pelo menor infrator, é cristalino que a redução da maioridade penal para 16 anos não irá resolver esse sério problema social. A ineficácia normati-va é premente, e algum agente político sabe e está contando com isso.

Por fim, na situação da “demonstração da capacidade de ação do Estado”45, também chamada de “legislação-álibi”, tem-se a criação normativa

aquelas condutas que não se coadunam com os seus valores, assim como permitidos ou obrigatórios os comportamentos que se conformam aos seus padrões valorativos, satisfazendo-se as suas expectativas basicamente com a expedição do ato legislativo.” (NEVES, Marcelo. Op. cit., p. 33) “Outro caso consiste na discussão que se desenvolve sobre o aborto na Alemanha, especialmente a partir dos anos setenta. Blankenburg enfatiza que os participantes da discussão em tomo da legalização do aborto estão informados de que as violações do §218 do Código Penal Alemão (StGB) ‘são muito freqüentes e que punições ocorrem apenas em casos excepcionais’. Conclui, então, com base inclusive em decisões do Tribunal Constitucional Federal, que no conflito sobre a legalização do aborto trata-se da ‘confirmação simbólica de pretensões normativas’, e não da ‘imposição efetiva’ dessas.” (Idem, p. 34)

44 “[...]. Nesse caso, as divergências entre grupos políticos não são resolvidas por meio do ato legislativo, que, porém, será aprovado consensualmente pelas partes envolvidas, exatamente porque está presente a perspectiva da ineficácia da respectiva lei. O acordo não se funda então no conteúdo do diploma normativo, mas sim na transferência da solução do conflito para um futuro indeterminado.” (Idem, p. 41)

45 “[...]. Nesse caso, não se trata de confirmar valores de determinados grupos, mas sim de produzir confiança nos sistemas político e jurídico. O legislador, muitas vezes sob pressão direta do público, elabora diplomas normativos para satisfazer as expectativas

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em resposta a um fato social que gerou um alarde ou estado de emergência na população, vindo o noval dispositivo legislativo justificar o fazer do Es-tado, buscando produzir confiança em âmbito jurídico e político, tendo forte repercussão na seara eleitoral.

[...]. Em face da insatisfação popular perante determinados acontecimentos ou da emergência de problemas sociais, exige-se do Estado muito freqüen-temente uma reação solucionadora imediata. Embora, nesses casos, em regra, seja improvável que a regulamentação normativa possa contribuir para a solução dos respectivos problemas, a atitude legiferante serve como um álibi do legislador perante a população que exigia uma reação do Es-tado.46

Esse conteúdo de “legislação-álibi” está no cerne da PEC 171/1993. Ela é uma resposta do Estado ao fator violência alardeado e explorado pela mídia de forma sensacionalista e irresponsável, onde se enxerga um claro conteúdo ideológico47. Está-se, aqui, a vender uma ilusão da solução em relação a um dos aspectos da violência urbana (atos infracionais perpetrados por crianças e adolescentes), na crença de que os atos legislativos são capazes de modificar a realidade, desconsiderando a interferências de um feixe de variáveis não normativas indispensáveis48.

dos cidadãos, sem que com isso haja o mínimo de condições de efetivação das respectivas normas.” (Idem, p. 36)

46 NEVES, Marcelo. Op. cit., p. 37.47 “[...]. Também em relação à escalada da criminalidade no Brasil a partir das duas

últimas décadas do século XX, a discussão em tomo de uma legislação penal mais rigorosa apresenta-se como um álibi, uma vez que o problema não decorre da falta de legislação tipificadora, mas sim, fundamentalmente, da inexistência dos pressupostos socioeconômicos e políticos para a efetivação da legislação penal em vigor.” (Idem, p. 38)

48 “A legislação-álibi decorre da tentativa de dar a aparência de uma solução dos respectivos problemas sociais ou, no mínimo, da pretensão de convencer o público das boas intenções do legislador. Como se tem observado, ela não apenas deixa os problemas sem solução, mas além disso obstrui o caminho para que eles sejam resolvidos. A essa formulação do problema subjaz uma crença instrumentalista nos efeitos das leis, conforme a qual se atribui à legislação a função de solucionar os problemas da sociedade. Entretanto, é evidente que as leis não são instrumentos capazes de modificar a realidade de forma direta, pois as variáveis normativo-jurídicas defrontam-se com outras variáveis orientadas por outros códigos e critérios sistêmicos [...]. A resolução dos problemas da sociedade depende da interferência de variáveis não normativo-jurídicas. Parece, portanto, mais adequado afirmar que a legislação-álibi destina-se a criar a imagem de um Estado que responde normativamente aos problemas reais da sociedade, embora as respectivas relações sociais não sejam realmente normatizadas de maneira conseqüente conforme o respectivo texto legal.” (Idem, p. 39)

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2.3.1 Do Direito Penal simbólico

Não se tem dúvida que, ao se tentar reduzir a idade penal para 16 anos, está-se diante de um Direito Penal simbólico, o qual não surtirá o efeito dese-jado: a redução da criminalidade. Mais uma vez quer se usar o Direito Penal para remendar a omissão e ineficácia na implantação das políticas públicas devidas em arrepio aos ditames constitucionais49.

Não será com o uso da sanção penal que se combaterá os atos antis-sociais dos menores, pois não será a partir da reclusão que se implementa-rá o acesso à educação, à saúde, à segurança em todos os seus aspectos, à promoção do desenvolvimento dos milhares de menores que se abrigam na rua, sendo alvejados por valores morais deturpados quando do processo de formação e desenvolvimento50.

“E entre todos fatores exógenos da criminalidade desponta em primei-ro lugar a miséria. A miséria é a principal razão dos atos infracionais dos menores.”51

Sobre essa temática, o Ministro da Justiça, Francisco Campos, na expo-sição de motivos da parte geral do Código Penal de 1940, diz que a formação

49 “É notória a situação incompatível ou irregular da criança e do adolescente nos países onde o poder público não cumpre sua função social, máxime no que tange À assistência familiar.” (FERNANDES, Valter; FERNANDES, Newton. Op. cit., p. 424) “Enfim, para se admitir a redução da idade para a ‘responsabilidade penal’, exige-se competência e honestidade de propósitos, aspectos nada comuns no tratamento do sistema repressivo penal brasileiro como um todo. Aliás, a incompetência e a falta de seriedade no trato dessas questões têm sido a tônica da nossa realidade político-criminal. Por isso, temos, inclusive, receio de sustentar essa tese, porque os nossos legisladores poderão gostar da ideia, mas, como sempre acontece no Brasil, aproveitá-la somente pela metade, ou seja, adotar essa responsabilidade penal diminuída e ‘esquecer’ de criar os ‘estabelecimentos adequados’, exclusivos para os menores, com a estrutura funcional indispensável (com técnicos especializados)! Ademais, essa tese não pode ser desenvolvida satisfatoriamente neste espaço, e muito menos executada pela metade.” (BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit., p. 415)

50 “Não fosse o fato de existirem centenas de milhares de meninas atiradas à prostituição na faixa etária de 9 a 15 anos de idade, não fosse o alto percentual de meninos e meninas vivendo ou morando nas ruas, não fosse a deletéria adultização precoce da criança, tudo conduzindo o menor à marginalização, restaria o nocivo exemplo da pulverização dos valores morais incentivada e até imposta pela má imprensa escrita, falada e televisada, principalmente por seu prestígio persuasório. [...].” (FERNANDES, Valter; FERNANDES, Newton. Op. cit., p. 424)

51 Idem, p. 425.

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do caráter do menor de 18 anos deve ser dada com educação ao invés do uso do Direito Penal:

Os que preconizam a redução do limite, sob a justificativa da criminalidade crescente, que a cada dia recruta maior número de menores, não conside-ram a circunstância de que o menor, ser ainda incompleto, é naturalmente antissocial na medida em que não é socializado ou instruído. O reajusta-mento do processo de formação do caráter deve ser cometido à educação, não à pena criminal.52

Tem-se um verdadeiro engodo, sendo o menor infrator estigmatizado pela mídia e servindo de bode expiatório para o problema generalizante da crescente violência.

É com clarividência que a redução da menor idade penal não conterá a problemática da violência, tendo sérios riscos de aumento, ainda mais, da criminalidade53, a título de “efeito colateral” da norma constitucional emen-dada, vindo a responder, tão somente, ao caráter ideológico de um setor da política, transferindo ao Estado a satisfação da “vingança” pelo injusto, em contraposição aos antigos processos de linchamento feitos pela população54.

Nesses termos, segue a dissertar Ney Moura Teles:

Propostas como essas, longe de resolver qualquer problema da espécie existente no país, constituem verdadeiro engodo, e só podem ser compre-endidas dentro da ideologia da corrente da lei e da ordem.

52 Exposição de motivos da redação primeira da parte geral do Código Penal.53 “No plano do direito penal, fala-se da função ou efeito criminógeno da própria lei penal.

Poder-se-ia objetar que se trata aqui de um caso de antiefetividade. Mas a hipótese é mais abrangente. A pesquisa criminológica aponta situações em que a atuação coercitiva do aparelho estatal contra a criminalidade juvenil leva a estreitar os laços entre os respectivos jovens, que, em reação, passam a praticar atos puníveis mais graves. Em muitos casos, à promulgação de uma nova lei penal seguem-se contra-reações, atos de resistência e de ajuda aos autores, implicando outras condutas puníveis. [...].” (NEVES, Marcelo. Op. cit., p. 49).

54 Cf. Idem, p. 50. “[...]. No plano do direito penal, fala-se da função ou efeito criminógeno da própria lei penal. Poder-se-ia No campo do direito penal, tem-se salientado que a legislação serviria para satisfazer, de forma sublimada, a ‘necessidade de vingança’ do povo, evitando-se, então, a justiça por linchamento. Analogamente, satisfaz-se por leis punitivas ou restritivas de direitos à necessidade de ‘bodes expiatórios’, estigmatizando-se determinados membros da sociedade e descarregando outros de responsabilidade ou sentimento de culpa. Porém, nessa hipótese, em não havendo eficácia dos preceitos legais, estaremos num típico caso de legislação simbólica.” (Idem, ibidem)

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As crianças e os adolescentes que cometem fatos típicos e ilícitos, que são usados por delinqüentes adultos, são, em verdade, filhos de uma sociedade injusta, assentada em bases econômicas e sociais perversas. A eles não fo-ram proporcionadas oportunidades de vida digna, com habitação, família, educação, saúde, lazer, formação moral, enfim, não tiveram oportunida-des de apreender os valores ético-sociais importantes e, por isso, quando atuam contra o direito, estão, na verdade, simplesmente, respondendo aos “cidadãos de bem” com o gesto que aprenderam: a violência e o desrespei-to à lei.

Nunca se pode esquecer que não é o Direito Penal o purificador das almas, nem sua missão é a de combater a violência, adulta ou juvenil. Sua tarefa é proteger os bens jurídicos mais importantes, das lesões mais graves.55

3 um Breve retrAto dA reAlidAde e dA ConSequÊnCiA PrÁtiCA dA reduÇÃo dA mAioridAde PenAl Com SuAS reSPeCtivAS CrítiCAS

3.1 Do descaso do Estado na manutenção e na adequação das casas de internação nos moldes do Estatuto da Criança e do Adolescente

Torna-se importante frisar que as casas de internações para os adoles-centes, o qual era para ter o caráter educacional, padecem da mesma falta de infraestrutura do sistema penitenciário, configurando um verdadeiro com-plexo prisional, só que destinados a adolescentes, onde a integridade física e mental dessas pessoas em formação é deixada à margem, configurando em antros permeados por abusos físicos, relações sexuais forçadas e pela perver-são das drogas56.

3.2 Um sério problema prático: vaga e estrutura nos presídios brasileiros

Não se pode olvidar o problema de faltas de vagas no sistema peniten-ciário brasileiro.

55 TELES, Ney Moura. Direito penal – Parte geral. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 298-299.56 É claro que se faz a ressalva de alguma intuição de internação espalhada pelos rincões

do Brasil que porventura seja um caso de sucesso, conseguindo perfilhar os ditames normativos do Estatuto da Criança e do Adolescente, onde este é modelo de excelência de uma construção legislativa do qual o Brasil padece de escassez.

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Tem-se, no Brasil, segundo dados do Ministério da Justiça, uma popu-lação carcerária de 607.731 mil presos. Entretanto, tem-se apenas 376.669 mil vagas, totalizando um déficit de 231.062 mil vagas57. Somam-se a esse caos os mandados de prisão em aberto, os quais, segundo os dados do Banco Nacio-nal de Mandados de Prisão, tem-se 486.258 mil mandados não cumprido58. De tal sorte, tem-se a necessidade, hoje, de, pelo menos, 717.320 novas vagas no sistema prisional.

Tabela 01 – População carcerária/vagas no sistema prisional/déficit, 201459

População carcerária Vagas Déficit imediato

607.731 mil 376.669 mil 231.062 mil

Mandados de prisão em aberto Déficit

486.258 mil 717.320 mil

Fonte: Elaborada pelo próprio autor.

Isso é um dado expressivo, o qual não se pode ignorar ou fazer pouco caso. Nesses termos, com a redução da idade penal para 16 anos, onde estará a vaga, no sistema prisional, para o menor infrator?

Não se tem vagas nem estrutura nas casas de detenção para menor, nos moldes do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual necessita de uma proteção especial e integral, quiçá no sistema prisional. Diga-se ainda mais: é certo que não será pela publicação de uma lei, veiculadora de um “dever--ser”, que, em um “passe de mágica”, esse problema será resolvido.

Destaca-se que, na presente pesquisa, não se conseguiu levantar dados para poder determinar o quanto a redução da maioridade penal afetaria o sistema prisional brasileiro, tendo em vista a ausência de um centro de infor-mações nacional sobre a prática de atos infracionais e o número de menores em cumprimentos da sanção de internação.

57 Brasil, Levantamento nacional de informações penitenciárias – Infopen – junho de 2014. Ministério da Justiça. Brasília, 2014. p. 11. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/relatorio-depen-versao-web.pdf>. Acesso em: 11 dez. 2015.

58 Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/bnmp/#/relatorio>. Acesso em: 11 dez. 2015.59 Brasil, Levantamento nacional de informações penitenciárias – Infopen – junho de 2014.

Ministério da Justiça. Brasília, 2014. Disponível em: <http://www.justica.gov.br/seus- -direitos/politica-penal/relatorio-depen-versao-web.pdf>. Acesso em: 11 dez. 2015.

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Destaca-se, por exemplo, o Estado do Rio Grande do Norte, onde os dados estatísticos entre a Fundac (Fundação Estadual da Criança e do Ado-lescente) e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte são completamente divergentes, o que impossibilita um real diagnóstico do cenário dos atos in-fracionais perpetrados no respectivo Estado60.

Em ácida crítica, pronuncia-se o professor Ney Moura Teles:

Soa, por fim, como piada a proposta, uma vez que o Estado brasileiro não tem sido capaz de construir estabelecimentos prisionais para atender às necessidades atuais de vagas para os condenados a penas privativas de liberdade. Se a capacidade penal alcançar os adolescentes, como se propõe, então a falência do sistema penitenciário será ainda mais estrondosa.61

ConSiderAÇÕeS FinAiS

Pelos termos apresentados, vislumbra-se que o conteúdo normativo do art. 228 da Constituição Federal constitui um direito individual fundamental de que crianças e adolescentes sejam processados e punidos por uma legisla-ção especial diversa da reservada aos maiores de 18 anos, constituindo-se em uma verdadeira cláusula pétrea inspirada na doutrina da proteção integral do menor e na normatividade do princípio da intervenção mínima do Direito Penal.

De tal sorte, outro entendimento não poderia ser além daquele que re-puta flagrantemente inconstitucional a Proposta de Emenda à Constituição nº 171/1993, sendo uma legislação meramente simbólica, embebecido em ca-ráter ideológico e como parca justificava do Estado, em relação à sociedade, no que tange às suas ações no combate à criminalidade.

Está-se a vendar uma ilusão sobre a problemática. Em caso de apro-vação da respectiva PEC, ter-se-á um aumento da violência, marginalizará ainda mais os jovens em formação e, derradeiramente, contribui-se para o agravamento do caos do sistema penitenciário brasileiro.

O Direito Penal não é e nunca foi a solução para as ondas de violência e de crimes. Caso não se trabalhe em políticas capazes de elevar o ensino de qualidade, promover diminuição das desigualdades sociais, e, no que tange

60 Disponível em: <http://tribunadonorte.com.br/noticia/faltam-estata-sticas-para-nortear- -debate-sobre-maioridade/316996>. Acesso em: 11 dez. 2015.

61 TELES, Ney Moura. Op. cit., p. 299.

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Revista JuRídica 470doutRina Penal

dezembRo/2016

aos menores, efetivar os seus direitos nos exatos termos do Estatuto da Crian-ça e do Adolescente, o Direito Penal produzido no Brasil continuará sendo um Direito Penal simbólico.

Lembrar que aquele menor infrator, marginalizado pela sociedade e pelo Estado, provindo, muitas vezes, de uma família desestruturada, o qual só conheceu a violência, quer aquilo que todo mundo quer: amor e carinho. O Direito Penal não fornece nenhum dos dois.

reFerÊnCiAS

ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2008.

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Doutrina Penalrevista JuríDica 470

Dezembro/2016

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Jurisprudênciacível

STFSupremo Tribunal Federal

25.11.2016 PlenárioAgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 953.249Distrito FederalRelator: Ministro PresidenteAgte.(s): Banco do Brasil S/AAdv.(a/s): Louise Rainer Pereira GionedisAgdo.(a/s): Adilson Julio RosaAgdo.(a/s): Carlos Alberto TrevisanAgdo.(a/s): Catia Sebastiana Goncalves PerdizAgdo.(a/s): Cloves Jose Vasconcelos Agdo.(a/s): Edilson Pereira da CostaAgdo. (a/s): Elcia Emiko MoriAgdo.(a/s): Ibraim José FerreiraAgdo.(a/s): Jorge Hideo TakahachiAgdo.(a/s): Lucia Maria Rossato ChrunAgdo.(a/s): Luis Carlos dos SantosAdv.(a/s): Samuel Rego Alves Vilanova

EMENTA

AgrAvo regimentAl no reCurSo extrAordinÁrio Com AgrAvo – ProCeSSuAl

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Civil – AÇÃo Civil PÚBliCA – exeCuÇÃo de SentenÇA – legitimidAde AtivA – CoiSA julgAdA – mAtériA

inFrAConStituCionAl – AuSÊnCiA de rePerCuSSÃo gerAl – temA nº 848 – verBA honorÁriA mAjorAdA em

1%, PerCentuAl que Se SomA Ao FixAdo nA origem, oBedeCidoS oS limiteS do Art. 85, § 2º, § 3º e § 11, do

CÓdigo de ProCeSSo Civil/2015, reSSAlvAdA eventuAl ConCeSSÃo do BeneFíCio dA juStiÇA grAtuitA, e

multA APliCAdA no PerCentuAl de 1%, ConForme Art. 1.021, § 4º, do CÓdigo de ProCeSSo Civil – AgrAvo

regimentAl Ao quAl Se negA Provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Su-premo Tribunal Federal, em Sessão Virtual do Plenário, e conformidade com a ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, em negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Relatora.

Brasília, 25 de novembro de 2016.

Ministra Cármen Lúcia Presidente

RELATÓRIO

A Senhora Ministra Cármen Lúcia (Presidente):

1. Em 17.06.2016, o Presidente do Supremo Tribunal Federal negou se-guimento ao agravo nos autos do recurso extraordinário interposto por Ban-co do Brasil S/A, por ter este Supremo Tribunal assentado inexistência de repercussão geral nas questões trazidas no recurso (doc. 9, fl. 1).

2. Publicada essa decisão no DJe de 23.06.2016, Banco do Brasil S/A interpõe, em 29.7.2016, tempestivamente, agravo regimental (doc. 10, fls. 1-9).

3. O Agravante alega que, “ao contrário do que decidido no ARE 901.963-RG, não há discussão dos limites da coisa julgada, pois não se de-bate o direito material objeto da ação civil pública do Idec, mas sim se seria possível a alguém, associado ou não, sem ter dado autorização específica à

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Jurisprudência civilrevista Jurídica 470

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Associação-autora, pudesse executar o título judicial advindo da procedência da ação coletiva” (sic, doc. 9, fl. 6).

Requer a reconsideração da decisão agravada ou provimento do pre-sente recurso.

4. Adilson Júlio Rosa e outros, intimados para manifestarem-se, con-forme disposto no art. 1.021, § 2º, do Código de Processo Civil, apresentam contrarrazões pelas quais defendem a manutenção da decisão agravada (doc. 15, fls. 1-11).

É o relatório.

VOTO

A Senhora Ministra Cármen Lúcia (Presidente):

1. Razão jurídica não assiste ao Agravante.

2. Como afirmado na decisão agravada, o Supremo Tribunal Federal decidiu ausente de repercussão geral a controvérsia trazida nos autos:

“PROCESSUAL CIVIL – RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – EXECUÇÃO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA GENÉRICA PROFERI-DA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA POR ASSOCIAÇÃO – LE-GITIMIDADE ATIVA – LIMITES DA COISA JULGADA – MATÉRIA IN-FRACONSTITUCIONAL – AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL – 1. A presente demanda consiste em execução individual de sentença proferida em ação civil pública. O recurso extraordinário suscita a ilegitimidade ativa dos exequentes, ao argumento de que não deram autorização individual e específica à associação autora da demanda coletiva para os representarem no processo de conhecimento, tampouco demonstraram sua condição de associados. Alega-se ofensa ao art. 5º, XXI e XXXVI, da Constituição, bem como ao precedente do Plenário do Supremo Tribunal Federal formado no julgamento do RE 573.232/SC. 2. Ocorre que, conforme atestaram as ins-tâncias ordinárias, no dispositivo da sentença condenatória genérica pro-ferida no processo de conhecimento desta ação civil pública, constou ex-pressamente sua aplicabilidade a todos os poupadores do Estado de Santa Catarina. Assim, o fundamento da legitimidade ativa para a execução, no caso, dispensa exame sobre a necessidade de autorização das associações para a representação de seus associados. Em verdade, o que está em jogo é questão sobre limites da coisa julgada, matéria de natureza infracons-titucional cuja repercussão geral, inclusive, já foi rejeitada por esta Corte

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em outra oportunidade (ARE 748.371-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 01.08.2013). 3. Outrossim, ao tratar dos limites subjetivos de sentença condenatória genérica proferida nos autos de ação civil pública ajuiza-da por associação, o Tribunal de origem valeu-se de disposições da Lei nº 7.347/1985 e do Código de Defesa do Consumidor, cujo exame é in-viável em recurso extraordinário. 4. É cabível a atribuição dos efeitos da declaração de ausência de repercussão geral quando não há matéria cons-titucional a ser apreciada ou quando eventual ofensa à Carta Magna ocor-ra de forma indireta ou reflexa (RE 584.608-RG, Relª Min. Ellen Gracie, DJe de 13.03.2009). 5. Ausência de repercussão geral da questão suscitada, nos termos do art. 543-A do CPC” (ARE 901.963-RG, Relator o Ministro Teori Zavascki, DJe 16.09.2015).

3. Declarada a ausência de repercussão geral, os recursos extraordiná-rios e agravos nos quais suscitada a mesma questão constitucional devem ter o seguimento negado, conforme o § 1º do art. 327 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

4. Os argumentos do Agravante, insuficientes para modificar a decisão agravada, demonstram apenas inconformismo e resistência em pôr termo a processos que se arrastam em detrimento da eficiente prestação jurisdicional.

5. Pelo exposto, nego provimento a este agravo regimental, condeno a parte sucumbente, nesta instância recursal, ao pagamento de honorários advocatícios ma-jorados em 1%, percentual que se soma ao fixado na origem, obedecidos os limites do art. 85, § 2º, § 3º e § 11, do Código de Processo Civil, ressalvada eventual concessão do benefício da justiça gratuita, e aplico a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do Códi-go de Processo Civil no percentual de 1%.

PLENÁRIO EXTRATO DE ATA

AgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 953.249

Proced.: Distrito Federal

Relator: Ministro Presidente

Agte.(s): Banco do Brasil S/A

Adv.(a/s): Louise Rainer Pereira Gionedis (38316/BA, 38706/DF, 36134/GO, 16644-A/MS, 16691/A/MT, 08123/PR, 363314/SP)

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Agdo.(a/s): Adilson Julio Rosa

Agdo.(a/s): Carlos Alberto Trevisan

Agdo.(a/s): Catia Sebastiana Goncalves Perdiz

Agdo.(a/s): Cloves Jose Vasconcelos

Agdo.(a/s): Edilson Pereira da Costa

Agdo.(a/s): Elcia Emiko Mori

Agdo.(a/s): Ibraim José Ferreira

Agdo.(a/s): Jorge Hideo Takahachi

Agdo.(a/s): Lucia Maria Rossato Chrun

Agdo.(a/s): Luis Carlos dos Santos

Adv.(a/s): Samuel Rego Alves Vilanova (22832/DF)

Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto da Rela-tora, Ministra Cármen Lúcia (Presidente), negou provimento ao agravo regi-mental. Plenário, sessão virtual de 18 a 24.11.2016.

Composição: Ministros Cármen Lúcia (Presidente), Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli, Luiz Fux, Rosa Weber, Teori Zavascki, Roberto Barroso e Edson Fachin.

p/ Doralúcia das Neves Santos Assessora-Chefe do Plenário

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Conflito de Competência nº 147.173 – MT (2016/0162112-8)Relator: Ministro Mauro Campbell MarquesSuscitante: Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rondonópolis/MTSuscitado: Juízo de Direito da Vara Cível de Rondonópolis/MTInteres.: Sindicato dos Trabalhadores em Postos de Serviços de Combustíveis e Lubrificantes da Região Sul do Estado de Mato Grosso – MTAdvogado: Sílvio Marinha do Nascimento – MT006304Interes.: 3º Tabelionato de Notas Registro de Títulos e DocumentosAdvogado: Adalberto Lopes de Sousa – MT003948

EMENTA

ProCeSSuAl Civil – ConFlito de ComPetÊnCiA – SuSCitAÇÃo de ProCedimento de dÚvidA – regulAridAde de Ato regiStrAl – nAtureZA

AdminiStrAtivA – ComPetÊnCiA – juíZo eStAduAl de regiStroS PÚBliCoS – AuSÊnCiA

de litígio SoBre rePreSentAÇÃo SindiCAl1. O procedimento de suscitação de dúvida é disciplinado

pelos arts. 198 e seguintes da Lei nº 6.015/1973 e tem natureza administrativa, apesar de ser processado perante órgão judicial, de exigir a atuação do Ministério Público e de ser resolvido por sentença que desafia recurso de apelação. Inteligência do art. 204 da Lei nº 6.015/1973.

2. Tratando-se, portanto, de procedimento de suscitação de dúvida, é desimportante para a fixação da competência que os motivos ensejadores dela tenham relação com controvérsia sobre a regularidade de representação sindical, visto que os limites do procedimento circunscrevem-se à verificação da regularidade de ato registral.

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3. Conflito conhecido para declarar competente o suscitado, Juízo de Direito da Vara Cível da Comarca de Rondonópolis.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos esses autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, o seguinte re-sultado de julgamento:

“A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Juízo de Direito da Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, o susci-tado, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Francisco Falcão e Og Fernandes. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Herman Benjamin.

Brasília (DF), 23 de novembro de 2016.

Ministro Mauro Campbell Marques, Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator): Cuida-se de conflito negativo de competência instaurado entre o Juízo da 2ª Vara do Tra-balho de Rondonópolis, no Estado do Mato Grosso, e o Juízo de Direito da Vara Cível de Rondonópolis, do Poder Judiciário do Estado do Mato Grosso, ambos refutando-se ao processamento de procedimento de suscitação de dú-vida.

Ocorreu de o Sintrapostos Sul/MT – Sindicato dos Trabalhadores em Postos de Serviços de Combustíveis e Lubrificantes da Região Sul de Mato Grosso haver proposto o procedimento de suscitação de dúvida em face do 3º Tabelionato de Notas, Registro de Títulos e Documentos, sediado em Rondonópolis, no Estado do Mato Grosso.

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Jurisprudência civilrevista Jurídica 470

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A razão para tanto estava na recusa do titular da delegação em receber uma notificação do Sindicato para que se abstivesse de registrar uma ata sin-dical considerada fraudulenta, o Sindicato se opondo a isso porque a referida ata havia sido promovida por presidente eleito fraudulentamente.

Distribuído ao suscitado, declinou da competência por convir tratar--se de litígio envolvendo representação sindical, o que justificava, a teor do art. 114, inciso III, da Constituição da República, a jurisdição da especializada laboral.

O suscitante, a seu turno, concluiu que a controvérsia girava em torno da regularidade de ato registral, circunscrito à possibilidade de o titular da delegação poder ou não registrar a ata supostamente lavrada de forma frau-dulenta.

Parecer do Ministério Público Federal pelo conhecimento do conflito para declarar competente o suscitante, Juízo da 2.ª Vara do Trabalho (e-STJ fls. 88/92).

É, em síntese, o relatório dos autos.

EMENTA

ProCeSSuAl Civil – ConFlito de ComPetÊnCiA – SuSCitAÇÃo de ProCedimento de dÚvidA – regulAridAde de Ato regiStrAl – nAtureZA

AdminiStrAtivA – ComPetÊnCiA – juíZo eStAduAl de regiStroS PÚBliCoS – AuSÊnCiA

de litígio SoBre rePreSentAÇÃo SindiCAl1. O procedimento de suscitação de dúvida é disciplinado

pelos arts. 198 e seguintes da Lei nº 6.015/1973 e tem natureza administrativa, apesar de ser processado perante órgão judicial, de exigir a atuação do Ministério Público e de ser resolvido por sentença que desafia recurso de apelação. Inteligência do art. 204 da Lei nº 6.015/1973.

2. Tratando-se, portanto, de procedimento de suscitação de dúvida, é desimportante para a fixação da competência que os motivos ensejadores dela tenham relação com controvérsia sobre a regularidade de representação sindical, visto que os limites do procedimento circunscrevem-se à verificação da regularidade de ato registral.

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3. Conflito conhecido para declarar competente o suscitado, Juízo de Direito da Vara Cível da Comarca de Rondonópolis.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques (Relator): O conflito de competência não trata de controvérsia sobre representação sindical mas sim sobre a regularidade de ato registral, o que indica competente o juízo suscitado.

Com efeito, há aparentemente uma controvérsia sobre quem deve re-presentar o Sintrapostos Sul/MT – Sindicato dos Trabalhadores em Postos de Serviços de Combustíveis e Lubrificantes da Região Sul de Mato Grosso, um determinado setor do sindicato defendendo a legitimidade da eleição que escolheu como presidente o Sr. João Ferreira de Oliveira, a dissidência defen-dendo a regularidade da eleição do Sr. Kleber de Souza Oliveira.

Nesse contexto, aquele primeiro agrupamento sindical fez instaurar um procedimento de suscitação de dúvida inversa com a finalidade de apu-rar a regularidade de ato praticado pelo titular do 3º Tabelionato de Notas, Registro de Títulos e Documentos de Rondonópolis, consistente tanto na re-cusa ao recebimento de notificação, quanto na impossibilidade de que ele promovesse o registro de ata de eleição considerada fraudulenta.

Debate-se, portanto, em procedimento de suscitação de dúvida inver-sa, unicamente se determinada prática engendrada pelo oficial atende, ou não, aos ditames da lei, não existindo, ao contrário do esposado no parecer do Ministério Público Federal, causa (em sentido técnico-jurídico) sobre re-presentação sindical, motivo por que me parece clara a competência do juízo suscitado.

Considere-se nesse aspecto que embora a suscitação de dúvida seja processada e julgada por órgão jurisdicional, que do seu processamento par-ticipe o Ministério Público, e que a sua resolução ocorra por sentença a qual desafia recurso de apelação, todo esse procedimento tem natureza eminente-mente administrativa, sequer constituindo causa, conforme ensinava o Emi-nente Ministro Athos Carneiro, há mais de duas décadas:

RECURSO ESPECIAL – ADMISSIBILIDADE – DÚVIDA EM MATÉRIA DE REGISTRO IMOBILIÁRIO – DÚVIDA “INVERSA”, SUSCITADA PELO APRESENTANTE DE CARTA DE ARREMATAÇÃO, FACE À NE-GATIVA DO OFICIAL PUBLICO EM LANÇAR O TITULO NO RESPEC-

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TIVO REGISTRO IMOBILIÁRIO – O PROCESSO DE DÚVIDA, QUANDO DE NATUREZA PURAMENTE ADMINISTRATIVA, NÃO HAVENDO CONTRADITÓRIO ENTRE PARTES INTERESSADAS MAS APENAS DISSENSO ENTRE O REQUERENTE E O SERVENTUÁRIO, NÃO CON-FIGURA UMA “CAUSA”, NO SENTIDO CONSTITUCIONAL, A ENSE-JAR RECURSO ESPECIAL – LEI Nº 6.015/1973, ARTS. 202 A 204 – RE-CURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

(REsp 13.637/MG, Rel. Min. Athos Carneiro, 4ª T., Julgado em 27.10.1992, DJ 23.11.1992, p. 21894)

Essa compreensão, como não podia deixar de ser, mantém-se ainda nos dias atuais, conforme o elucidativo precedente oriunda da Segunda Turma, da lavra do Eminente Ministro Og Fernandes:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – RECURSO ESPECIAL – MANDADO DE SEGURANÇA – VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, DO CPC – AUSÊNCIA – IMPUGNAÇÃO DE EXIGÊNCIA IMPOSTA POR OFI-CIALA DE REGISTROS – IMPETRAÇÃO QUE NÃO SE CARACTERIZA COMO SUCEDÂNEA DE SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA

1. Não ocorre contrariedade ao art. 535, II, do CPC, quando o Tribunal de origem decide fundamentadamente todas as questões postas ao seu exame, assim como não há que se confundir entre julgado contrário aos interesses da parte e inexistência de prestação jurisdicional.

2. Ademais, o magistrado não está obrigado a responder a todas as ques-tões suscitadas em juízo, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão.

3. O incidente de suscitação de dúvida relativa à exigência feita por Oficial de Cartório, prevista pela Lei de Registros Públicos, é procedimento de natureza administrativa e a decisão que o julga não possui natureza juris-dicional, embora seja prolatada por órgão do Poder Judiciário. Preceden-tes: AgRg-Ag 985.782/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 26.11.2008; REsp 612.540/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., DJe 05.03.2008.

4. Ademais, a decisão do Juízo de Primeiro Grau – de cunho administra-tivo, repita-se – não desafia recurso, nem atrai a aplicação do art. 5º, II, da Lei nº 12.016/2009 ou da Súmula nº 267 do STF, que dispõem não caber impetração do mandado de segurança quando se tratar de decisão judicial passível de recorribilidade com efeito suspensivo.

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5. “Necessário adotar a técnica hermenêutica do distinguishing para con-cluir pela inaplicabilidade da Súmula nº 267 do STF (‘Não cabe mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição’), pois todos os seus precedentes de inspiração referem-se à inviabilidade do writ contra ato jurisdicional típico e passível de modificação mediante recur-so ordinário, o que não se amolda à espécie” (RMS 31.362/GO, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 16.09.2010).

6. Logo, o incidente de dúvida não impede o manejo da ação mandamental para sanar possíveis exigências cartorárias tidas como ilegais ou abusivas.

7. Recurso especial a que se dá provimento para afastar a preliminar de inadequação da via eleita e determinar a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a fim de que prossiga no julgamento do feito.

(REsp 1348228/MG, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., Julgado em 12.02.2015, DJe 12.05.2015)

Essa é, aliás, a expressa dicção do art. 204 da Lei nº 6.015/1973: “A de-cisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente.”

Assim, se o procedimento é administrativo e o seu âmbito é restrito à aferição da regularidade de ato registral, não há falar na hipótese do art. 114, inciso III, da Constituição da República, porque não há causa sobre repre-sentação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores.

A circunstância de o requerente do procedimento apegar-se a uma ale-gada fraude nas eleições para os órgãos diretivos do sindicato não significa que era essa a controvérsia a ser dirimida, mas apenas e tão-somente o dever de o titular da serventia extrajudicial poder ou não receber uma notificação, bem como poder ou não registrar um determinado documento.

Diante do exposto, conheço do conflito para declarar competente o juízo sus-citado, da Vara Cível de Rondonópolis.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO PRIMEIRA SEÇÃO

Número Registro: 2016/0162112-8 Processo Eletrônico CC 147.173/MT

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Números Origem: 00015507520155230022 114052220158110003 1145222015811 15507520155230022 7892462015811003

Pauta: 09.11.2016 Julgado: 23.11.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Mauro Campbell Marques

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Herman Benjamin

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Flavio Giron

Secretária: Belª Carolina Véras

AUTUAÇÃO

Suscitante: Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Rondonópolis/MT

Suscitado: Juízo de Direito da Vara Cível de Rondonópolis/MT

Interes.: Sindicato dos Trabalhadores em Postos de Serviços de Combustí-veis e Lubrificantes da Região Sul do Estado de Mato Grosso – MT

Advogado: Sílvio Marinha do Nascimento – MT006304

Interes.: 3º Tabelionato de Notas Registro de Títulos e Documentos

Advogado: Adalberto Lopes de Sousa – MT003948

Assunto: Direito administrativo e outras matérias de direito público – Or-ganização sindical

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Primeira Seção, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Juízo de Direito da Vara Cível da Comarca de Rondonópolis/MT, o susci-tado, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Regina Helena Costa, Gurgel de Faria e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Francisco Falcão e Og Fernandes.

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

AgInt no Agravo em Recurso Especial nº 839.180 – SP (2016/0000531-2)Relator: Ministro Raul AraújoAgravante: Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados PCG-Brasil MulticarteiraAdvogados: Marcelo Tesheiner Cavassani e outro(s) – SP071318

Alessandro Moreira do Sacramento – SP166822Agravado: Ricardo Aparecido GuilhenAdvogados: Carlos Roberto Guarino e outro(s) – SP044687

Bruno Catti Benedito – SP258645

EMENTA

AgrAvo interno no AgrAvo em reCurSo eSPeCiAl – ContrAto de AlienAÇÃo FiduCiÁriA – AuSÊnCiA de

veriFiCAÇÃo doS doCumentoS PeSSoAiS Por oCASiÃo dA CeleBrAÇÃo do ContrAto – Fortuito interno –

reSPonSABilidAde Civil – neCeSSidAde de reexAme de ProvAS – SÚmulA nº 7/Stj – diSSídio juriSPrudenCiAl

nÃo demonStrAdo – AgrAvo imProvido1. No julgamento do Recurso Especial Repetitivo

nº 1.197.929/PR (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 12.09.2011), processado nos moldes do art. 543-C do CPC, foi firmado o entendimento de que “as instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros – como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos –, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno”.

2. No caso dos autos, o Tribunal de origem, apreciando o conjunto probatório dos autos, concluiu que o resultado danoso

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decorreu da inércia da apelante quanto ao regular dever de fiscalização e orientação de seus prepostos, para conferir segurança e lisura nas contratações. A alteração de tal entendimento, como pretendida, demandaria a análise do acervo fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula nº 7 do STJ, que dispõe: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial.”

3. Pela alínea c do permissivo constitucional, esta eg. Corte de Justiça tem decidido, reiteradamente, que, para a correta demonstração da divergência jurisprudencial, deve haver o cotejo analítico, expondo-se as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, a fim de demonstrar a similitude fática entre os acórdãos impugnado e paradigma, bem como a existência de soluções jurídicas díspares, nos termos dos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, § 2º, do RISTJ, o que não ocorreu no caso dos autos.

4. Agravo interno a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, negar provimento ao agravo in-terno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti (Presidente), Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 17 de novembro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Raul Araújo Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo:

Trata-se de agravo interno interposto pelo Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padronizados PCG-Brasil Multicarteira, contra de-cisão monocrática desta Relatoria que conheceu do agravo e negou provi-mento ao recurso especial, pelos seguintes fundamentos: I) o Tribunal a quo foi categórico em afirmar a responsabilidade da parte ora agravante pelos alegados danos, concluindo pela presença dos requisitos ensejadores da res-

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ponsabilidade civil, de modo que a alteração do julgado nesse ponto deman-daria nova análise dos elementos de prova dos autos; II) o recorrente não logrou êxito em comprovar a divergência jurisprudencial suscitada.

Em suas razões recursais, a parte agravante alega que: a) não há falar em reexame de prova e, portanto, é impossível a aplicação da Súmula nº 7 do STJ; b) a matéria é puramente de direito, decorrendo apenas da necessidade da negativa de vigência aos arts. 333, II, do CPC/1973 e 186 do CC/2002; c) ficou demonstrado o confronto analítico entre o acórdão recorrido e o acór-dão paradigma.

Devidamente intimada, a parte agravada apresentou impugnação do agravo.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo (Relator):

Na análise dos autos, observa-se que os argumentos trazidos pela parte recorrente mostram-se insuficientes para infirmar a decisão agravada, a qual deve ser mantida.

Na presente demanda, a parte ora agravante, cessionária de crédito referente a mútuo para aquisição de veículo com garantia de alienação fidu-ciária, foi condenada no pagamento de indenização por danos morais ante o reconhecimento de que a contratação foi realizada por terceiro mediante fraude, pois não houve a verificação da autenticidade dos documentos pes-soais por ocasião da celebração do contrato.

Conforme afirmado na decisão ora impugnada, o col. Tribunal a quo afirmou a responsabilidade do ora agravante, concluindo pela presença dos requisitos ensejadores da reparação civil, ao asseverar que, verbis:

“É fato incontroverso nos autos o fato de que o réu-reconvinte foi vítima de fraude, já que a própria autora-reconvinda contrato em tela foi subscrito por terceiro mediante alegada fraude.

Todavia, diversamente do que alega, o resultado danoso decorreu da inér-cia da apelante quanto ao regular dever de fiscalização e orientação de seus prepostos, para conferir segurança e lisura nas contratações, do que não se cogitou ao permitir a ação indevida de terceiros.

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É, portanto, cabível a indenização por danos morais, cuja influência, na esfera morai, dos fatos articulados neste processo se presume – in re ipsa, ressalvada a possibilidade de ação de regresso da apelante contra quem eventualmente tenha ocasionado ou contribuído com o evento danoso.”

(e-STJ, fl. 186)

Como visto, a Corte de origem, analisando as provas acostadas aos au-tos, constatou que o resultado danoso decorreu da inércia da parte apelante quanto ao regular dever de fiscalização e orientação de seus prepostos, para conferir segurança e lisura nas contratações.

Nesse contexto, a modificação de tal entendimento lançado no v. acór-dão recorrido, no sentido pleiteado pela recorrente, qual seja, de que não houve falha de segurança, nos moldes em que ora postulada, demandaria o revolvimento de suporte fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7 do Superior Tribunal de Justiça.

Nesse sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – FRAUDE BAN-CÁRIA – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINAN-CEIRA PELO FORTUITO INTERNO LIGADO AO RISCO DE SUA ATI-VIDADE – SÚMULA Nº 479/STJ – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURIS-DICIONAL NÃO CONFIGURADA – AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO COM O AGENTE CAUSADOR DIRETO DO DANO – DIS-CUSSÃO QUANTO À REGULARIDADE NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO BANCÁRIO – SÚMULA Nº 7/STJ – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADO – AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO

[...]

4. Uma vez afirmado pelas instâncias de origem que a correntista foi vítima de fraude bancária cometida por terceiros e que experimentou danos mate-riais em razão disso, não é possível afastar a responsabilidade objetiva da instituição financeira sem ofensa às Súmulas nºs 7 e 479/STJ.

[...]

6. Agravo regimental a que se nega provimento.”

(AgRg-REsp 1.486.761/AL, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª T., Julgado em 15.12.2015, DJe de 03.02.2016)

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Ademais, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.197.929/PR (Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe de 12.09.2011), processado nos moldes do art. 543-C do CPC, foi firmado o entendimento de que “as instituições ban-cárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos prati-cados por terceiros – como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos –, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortui-to interno”.

Quanto ao dissídio jurisprudencial apontado, faz-se mister consignar que segue obstado o trânsito do apelo nobre em razão do descumprimento do disposto nos arts. 541, parágrafo único, do CPC e 255, § 2º, do RISTJ. Com efeito, para a caracterização da sugerida divergência jurisprudencial, não basta a simples transcrição de ementas. Devem ser mencionadas e expostas as circunstâncias que identificam ou assemelham os casos confrontados, sob pena de não serem atendidos, como na hipótese, os requisitos previstos nos mencionados dispositivos.

Confiram-se, ainda, os seguintes julgados:

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO – QUITAÇÃO DE OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA – TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA – DAÇÃO EM PAGA-MENTO – IMPOSSIBILIDADE – FALTA DE PREVISÃO LEGAL – PRECE-DENTES – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO

[...]

III – Já é firme o entendimento desta Corte, segundo o qual a simples trans-crição de ementas não basta para que se configure a divergência jurispru-dencial alegada. Impõe-se a demonstração do dissídio com a reprodução dos segmentos assemelhados ou divergentes entre os paradigmas colacio-nados e o aresto hostilizado, o que inocorreu no presente caso.

IV – Agravo regimental improvido.”

(AgRg-REsp 738.797/RS, Relator o eminente Ministro Francisco Falcão, DJ de 03.10.2005)

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – AFRONTA AO ART. 535 DO CPC – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO – FUN-DAMENTAÇÃO DEFICIENTE – SÚMULA Nº 284/STF – EXAME DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL E DE LEI LOCAL – IMPOSSIBILIDADE – DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CARACTERIZADO – ART. 255 DO RISTJ

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[...]

IV – Em casos nos quais só a comparação das situações fáticas evidencia o dissídio pretoriano, indispensável que se faça o cotejo analítico entre a decisão reprochada e os paradigmas invocados. A simples transcrição de ementas, sem que se evidencie a similitude das situações, não se presta como demonstração da divergência jurisprudencial.

Agravo regimental desprovido.”

(AgRg-REsp 754.475/AL, Relator o eminente Ministro Felix Fischer, DJ de 26.09.2005)

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUARTA TURMA

Número Registro: 2016/0000531-2

Processo Eletrônico AgInt-AREsp 839.180/SP

Números Origem: 00048950220098260127 101609 20140000466403 20140000651013 48950220098260127 990105329195

Pauta: 17.11.2016 Julgado: 17.11.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo

Presidente da Sessão: Exma. Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Humberto Jacques de Medeiros

Secretária: Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

AUTUAÇÃO

Agravante: Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padroni-zados PCG-Brasil Multicarteira

Advogados: Marcelo Tesheiner Cavassani e outro(s) – SP071318 Alessandro Moreira do Sacramento – SP166822

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Agravado: Ricardo Aparecido Guilhen

Advogados: Carlos Roberto Guarino e outro(s) – SP044687 Bruno Catti Benedito – SP258645

Assunto: Direito civil – Obrigações – Espécies de contratos – Alienação fiduciária

AGRAVO INTERNO

Agravante: Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Não-Padroni-zados PCG-Brasil Multicarteira

Advogados: Marcelo Tesheiner Cavassani e outro(s) – SP071318 Alessandro Moreira do Sacramento – SP166822

Agravado: Ricardo Aparecido Guilhen

Advogados: Carlos Roberto Guarino e outro(s) – SP044687 Bruno Catti Benedito – SP258645

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti (Presidente), Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Re-lator.

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TrF 2ª r.Tribunal regional Federal da 2ª região

Agravo de Instrumento – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0008705-33.2016.4.02.0000 (2016.00.00.008705-0) Relator: Desembargadora Federal Salete MaccalózAgravante: Associação dos Notários e Registradores do Estado do Rio de Janeiro – Anoreg/RJ e outroAdvogado: Gustavo Kloh Muller NevesAgravado: CEF – Caixa Econômica Federal Advogado: Marcelo Pupo RibeiroOrigem: 27ª Vara Federal do Rio de Janeiro (00926244020164025101)

EMENTA

AgrAvo de inStrumento – tutelA de evidÊnCiA – inventÁrio extrAjudiCiAl – levAntAmento de

vAloreS – neCeSSidAde de AutoriZAÇÃo judiCiAl – requiSitoS nÃo PreenChidoS – deCiSÃo mAntidA

1. Agravo de instrumento contra decisão que indeferiu pedido de tutela de evidência, objetivando que fosse determinado o levantamento dos valores referentes a precatórios e RPVs, depositados na Caixa Econômica Federal, em nome dos autores da herança, por meio da apresentação da escritura pública de inventário e partilha de bens.

2. É certo que o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro. No entanto, não há prova inequívoca das alegações formuladas pelos agravantes, visto que a hipótese dos autos não se encontra abarcada pelo art. 610 do CPC e art. 3º da Resolução nº 35/2007, uma vez que os valores depositados encontram-se à disposição de determinado juízo.

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3. A apresentação da escritura pública de inventário e partilha de bens não é suficiente para permitir o levantamento das importâncias referentes a precatórios e RPVs de beneficiário falecido, quando há conversão em depósito judicial, considerando que o pagamento somente poderá ser realizado mediante autorização judicial emitida pelo juízo federal competente.

4. No caso, há necessidade de dilação probatória e, somente após a oitiva da parte contrária e produção de provas, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, é que o juízo poderá dispor de elementos para formação de seu convencimento.

5. Agravo de instrumento desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas: Decidem os membros da 6ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na forma do voto da Relatora.

Rio de Janeiro, de de 2016 (data do Julgamento).

Salete Maria Polita Maccalóz Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Associação dos Notários e Registradores do Estado do Rio de Janeiro – Anoreg/RJ e Carlos Alberto Firmo Oliveira, contra decisão que indeferiu pedido de tutela de evidência, objetivando que fosse determinado o levantamento dos valores referentes a precatórios e RPVs, depositados na Caixa Econômica Federal, em nome dos autores da herança, por meio da apresentação da escritura pública de inventário e partilha de bens.

Em suas razões, sustentam os agravantes que a decisão deve ser re-formada, visto que se encontram preenchidos os requisitos para concessão da tutela de evidência. Alegam que os cartórios extrajudiciais do Estado do Rio de Janeiro lavram escrituras com fundamento na Lei nº 11.441/2007, que possibilita a realização de inventário, partilha, separação consensual e divór-cio consensual pela via administrativa, e a Resolução nº 35 do CNJ prevê

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medidas uniformes quanto à aplicação da referida Lei. Informam que os her-deiros vêm sendo obstados de exercer o direito de levantamento das quantias depositadas na Caixa Econômica Federal, sob o argumento de que a escritura pública lavrada seria insuficiente, exigindo-se alvará judicial. Requerem o provimento do recurso, para deferir a tutela de evidência a fim de que seja determinado o levantamento dos valores referentes a precatórios e RPVs, de-positados em nome dos autores da herança, por meio da apresentação da escritura pública de inventário e partilha de bens.

Contrarrazões da Caixa Econômica Federal, requerendo o desprovi-mento do agravo de instrumento, mantendo-se a decisão recorrida.

O Ministério Público Federal afirma ser desnecessária sua intervenção no feito.

É o relatório. Peço dia para julgamento.

Salete Maria Polita Maccalóz Relatora

VOTO

Conheço do recurso, eis que presentes os pressupostos de admissibili-dade.

Pretendem os agravantes o provimento do agravo de instrumento, para deferir o pedido de tutela de evidência, a fim de que seja determinado o levantamento dos valores referentes a precatórios e RPVs, depositados em nome dos autores da herança, por meio da apresentação da escritura pública de inventário e partilha de bens.

O juiz poderá conceder liminarmente a tutela de evidência quando as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vin-culante ou quando se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, nos termos do art. 311, II e III, do Código de Processo Civil.

Na presente hipótese, não se encontram presentes os requisitos neces-sários para que seja deferido o pedido: a existência de prova das alegações

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de fato da parte requerente e a probabilidade de acolhimento da pretensão processual.

O Código de Processo Civil estabelece, em seu art. 610, que o inven-tário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras, nos seguintes termos:

“Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.

§1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância de-positada em instituições financeiras.

§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes inte-ressadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.”

Por sua vez, o art. 3º da Resolução nº 35/2007 do CNJ esclarece que as escrituras públicas de inventário e partilha, separação e divórcio consensuais não dependem de homologação judicial e são títulos hábeis para o registro ci-vil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferên-cias de bens e levantamento de valores (Detran, Junta Comercial, Registro Ci-vil de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas, etc.)

No entanto, da análise dos autos, não há prova inequívoca das alega-ções formuladas pelos agravantes. Neste sentido, foi ressaltada na decisão agravada a ausência de probabilidade do direito, visto que a hipótese dos autos não se encontra abarcada pelo art. 610 do CPC e art. 3º da Resolução nº 35/2007, uma vez que os valores depositados encontram-se à disposição de determinado juízo.

Com efeito, o art. 49 da Resolução nº 168 do Conselho da Justiça Fede-ral, dispõe:

“No caso de penhora, arresto, sequestro, cessão de crédito posterior à apre-sentação do ofício requisitório e sucessão causa mortis, os valores requisi-tados ou depositados serão convertidos em depósito judicial, indisponível, a ordem do juízo da execução, ate ulterior deliberação deste sobre a desti-nação do crédito.”

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Desta forma, a apresentação da escritura pública de inventário e parti-lha de bens não é suficiente para permitir o levantamento das importâncias referentes a precatórios e RPVs de beneficiário falecido, uma vez que, em virtude da sua conversão em depósito judicial, o pagamento somente poderá ser realizado mediante autorização judicial emitida pelo juízo federal compe-tente, consoante entendimento[1] desta Corte.

Na hipótese vertente, há necessidade de dilação probatória e, somente após a oitiva da parte contrária e produção de provas, sob o crivo do con-traditório e da ampla defesa, é que o juízo poderá dispor de elementos para formação de seu convencimento.

A concessão de tutela de evidência também se insere no poder geral de cautela do juiz, cabendo sua reforma, por meio de agravo de instrumento, somente quando o juiz dá à lei interpretação teratológica, fora da razoabili-dade jurídica, ou quando o ato se apresenta flagrantemente ilegal, ilegítimo e abusivo, o que não é o caso.

Ao contrário, o decisum ora agravado restou bem fundamentado no sentido de ponderar que:

“A questão controvertida repousa na análise da legalidade da conduta da ré ao impedir o levantamento de valores mediante escritura pública fir-mada junto aos cartórios extrajudiciais, exigindo alvará judicial para tanto quando permitido por Lei.

De fato, o § 1º art. 610 do atual CPC é claro ao preceituar que a escritura pú-blica de inventário e partilha lavrada em cartório constitui documento há-bil para o levantamento de valores depositados em instituições financeiras.

No mesmo sentido é a redação do art. 3º da Resolução nº 35/2007 – CNJ prevendo que as ‘escrituras públicas de inventário e partilha, separação e divórcio consensuais não dependem de homologação judicial e são títulos hábeis para o registro civil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de valores (Detran, Junta Comercial, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas, etc.)’.

No entanto, considerando que a fundamento da conduta da CEF é a Reso-lução nº 168/2011, a qual trata de precatórios e RPVs, parece que a preten-são é especificamente a de levantar importâncias referentes a precatórios e RPV enviados e depositados em nome dos autores da herança por meio da apresentação da escritura pública de inventário e partilha de bens. Nes-

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se caso, não assistiria razão à demandante, pois se trata de hipótese não abarcada pelo art. 610 do CPC e art. 3º da Resolução nº 35/2007, já que os valores depositados encontram-se à disposição de determinado juízo. Em se tratando de depósitos judiciais, resta plenamente justificável a exigência de alvará judicial nos termos previstos na Resolução nº 168/2011 do CJF.”1

Desta forma, não se encontram preenchidos os requisitos exigidos para concessão da tutela de evidência, revelando, assim, o acerto da decisão agra-vada.

Pelo exposto, com base nas razões supra, nego provimento ao recurso, mantendo a decisão agravada, por seus próprios fundamentos.

É como voto.

Salete Maria Polita Maccalóz Relatora

1 AGRAVO DE INSTRUMENTO – PROCESSUAL CIVIL – FALECIMENTO DO AUTOR ANTES DO PAGAMENTO DO PRECATÓRIO – PROCEDIMENTO DE HABILITAÇÃO – POSSIBILIDADE – ART. 49 DA RESOLUÇÃO Nº 168/2011 DO CJF – 1. Consoante o disposto no art. 49 da Resolução nº 168 do Conselho da Justiça Federal, que regulamenta os procedimentos relativos à expedição de ofícios requisitórios, ao cumprimento da ordem cronológica dos pagamentos, às compensações, ao saque e ao levantamento do depósito, em casos de sucessão causa mortis, “os valores requisitados ou depositados serão convertidos em depósito judicial, indisponível, à ordem do juízo da execução, até ulterior deliberação deste sobre a destinação do crédito”. 2. Sobrevindo o óbito do beneficiário antes do levantamento do depósito, não está esgotada a atividade do juízo da execução, que deve converter os valores em depósito judicial e processar o regularmente os pedidos de habilitação dos herdeiros na forma devida. Inteligência do art. 43 do CPC, vigente à época da prolação da decisão, à semelhança do disposto no art. 110 do NCPC. [...] 4. Considerando que o pedido de habilitação formulado pela viúva não foi apreciado pelo Juízo a quo, descabe analisar o cumprimento dos requisitos necessários à habilitação pretendida, sob pena de supressão de instância. 5. Agravo de Instrumento parcialmente provido. (TRF 2ª R., 2016.00.00.003169-0, Des. Fed. Marcelo Pereira da Silva, 8ª T.Esp., DJ 27.10.2016)

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EmEntário CívEl

AÇÃo AnulAtÓriA C/C inexiStÊnCiA de déBito – deCiSÃo monoCrÁtiCA que nÃo ConheCeu

do reClAmo Ante A inCidÊnCiA dA SÚmulA nº 182 do Stj

34462 – “Agravo interno em agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação anulatória c/c inexis-tência de débito. Decisão monocrática que não conheceu do reclamo ante a incidência da Súmula nº 182 do STJ. Insurgência recursal do autor. 1. Razões do agravo interno que não impugnaram especificamente todos os fundamentos invocados na decisão agravada. Para se viabilizar o conhecimento do agravo regimental/interno, diante do princípio da diale-ticidade, é necessário que se impugne especificamente todos os fundamentos da decisão agravada, o que não ocorreu na hipótese em exame. Súmula nº 182 do STJ. 2. Agravo in-terno não conhecido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 879.671 – (2016/0059711-4) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 07.12.2016 – p. 1895)

AÇÃo CAutelAr – ConCeSSÃo de liminAr – AgrAvo

de inStrumento

34463 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação cautelar. Concessão de liminar. Agravo de instrumento. Prolação de sentença. Prejudicialidade. 1. A prolação de sentença julgando, simultaneamente, a demanda principal e a ação cautelar torna prejudicados o recurso especial e, consequentemente, o presente agravo em recurso especial por cuidarem apenas da liminar concedida nos autos de referida cautelar. Precedentes. 2. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 621.348 – (2014/0302264-0) – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJe 07.12.2016 – p. 1861)

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AÇÃo Civil PÚBliCA – ASSoCiAÇÃo de deFeSA de ConSumidoreS –

direitoS individuAiS diSPoníveiS – AuSÊnCiA de homogeneidAde

– legitimidAde AtivA

34464 – “Recurso especial. Fundos de investimento. Ação civil pública. Associação de defesa de consumidores. Direitos individuais disponíveis. Ausência de homogeneidade. Legitimidade ativa. Pré-constituição. Requisito temporal não satisfeito. Dispensa. Impos-sibilidade. Inexistência de interesse social relevante. Matéria de fato. Verbas de sucum-bência. Fundamento não impugnado. Divergência jurisprudencial não configurada. 1. O acórdão recorrido foi publicado antes da entrada em vigor da Lei nº 13.105/2015, estando o recurso sujeito aos requisitos de admissibilidade do Código de Processo Civil de 1973, conforme Enunciado Administrativo nº 2/2016, desta Corte. 2. A jurisprudência deste Superior Tribunal dispensa o requisito de um ano de pré-constituição da associação, nos casos de interesse social evidenciado pela dimensão do dano e pela relevância do bem jurídico a ser protegido. 3. A conclusão do acórdão recorrido, no sentido da inexistência de relevância do bem jurídico protegido, à vista de circunstâncias de fato específicas da causa, não pode ser revista no âmbito do recurso especial, por demandar o reexame do conjunto fático-probatório dos autos (Súmula nº 7/STJ). 4. A ausência de impugnação a fundamento do acórdão recorrido – de que a condenação nas verbas sucumbenciais decorre da ilegitimidade ativa da associação recorrente – enseja a aplicação da Súmula nº 283/STF. 5. À caracterização do dissídio jurisprudencial, nos termos dos arts. 541, pa-rágrafo único, do Código de Processo Civil de 1973 e 255, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, é necessária a demonstração da similitude de panora-ma de fato e da divergência na interpretação do direito entre os acórdãos confrontados. 6. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 865.493 – (2006/0144522-0) – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1890)

AÇÃo Civil PÚBliCA – CumulAÇÃo de AÇÕeS – reSPonSABilidAde de SoCiedAde mAntenedorA

de CAdAStroS reStritivoS de Crédito Por AnotAÇÕeS

indevidAS de dAdoS de SuPoStoS inAdimPlenteS

34465 – “Direito processual civil. Ação civil pública. Cumulação de ações. Responsabi-lidade de sociedade mantenedora de cadastros restritivos de crédito por anotações in-devidas de dados de supostos inadimplentes. Poder de polícia do Banco Central sobre a

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atividade relativa a cadastros de devedores. 1. A Serasa S.A. não é instituição financeira, pois não exerce coleta, intermediação nem aplicação de recursos financeiros, nem a cus-tódia de valor de propriedade de terceiros, seja como atividade principal ou acessória. 2. Ao Banco Central impõe-se o dever de exercer o controle do crédito e fiscalizar a ativida-de das instituições financeiras, bem como de aplicar as penalidades pertinentes. Não é de sua atribuição a fiscalização das atividades do Serasa, entidade que não se qualifica como instituição financeira. 3. É possível a cumulação de ações desde que haja compatibilidade de ritos e que o mesmo Juízo seja competente para o julgamento de todas elas. A com-petência para o julgamento do pedido de condenação da Serasa ao pagamento de danos materiais e morais decorrentes de inscrição indevida de dados de supostos inadimplentes não é a mesma para o julgamento de pedido de condenação do Banco Central para que cumpra suas funções institucionais. 4. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 1.178.768 – (2010/0022466-1) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 07.12.2016 – p. 1955)

AÇÃo deClArAtÓriA de inexigiBilidAde de déBito C/C

indeniZAÇÃo Por dAnoS morAiS – inSCriÇÃo indevidA em CAdAStro

de reStriÇÃo Ao Crédito

34466 – “Agravo interno em agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação declaratória de inexi-gibilidade de débito c/c indenização por danos morais. Inscrição indevida em cadastro de restrição ao crédito. Decisão monocrática negando provimento ao reclamo. Insurgência da demandada. 1. A indenização por danos morais, fixada em quantum em conformidade com o princípio da razoabilidade, não enseja a possibilidade de modificação em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. 2. Este Tribunal Superior tem prelecio-nado ser razoável a condenação no equivalente a até 50 (cinquenta) salários mínimos por indenização decorrente de inscrição indevida em órgãos de proteção ao crédito. Preceden-tes. 3. A incidência da Súmula nº 7 desta Corte impede o exame de dissídio jurispruden-cial, porquanto falta identidade entre os paradigmas apresentados e os fundamentos do acórdão, tendo em vista a situação fática do caso concreto, com base na qual a Corte de origem deu solução a causa. 4. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 886.022 – (2016/0094349-8) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 07.12.2016 – p. 1898)

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AÇÃo deClArAtÓriA de inexiStÊnCiA de déBito C/C

CAnCelAmento de ProteSto e indeniZAÇÃo Por dAnoS morAiS

34467 – “Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação declaratória de ine-xistência de débito c/c cancelamento de protesto e indenização por danos morais. Deci-são monocrática que negou provimento ao reclamo. Insurgência da instituição bancária. 1. No tocante à alegada afronta aos arts. 4º e 5º da LINDB, incide, na espécie, o óbice da Súmula nº 282/STF, em razão da ausência de prequestionamento, porquanto tais normas não tiveram o competente juízo de valor aferido, nem interpretada ou a sua aplicabilidade afastada ao caso concreto pelo Tribunal de origem. 2. A responsabilidade civil do ban-co foi aferida com base nos elementos fático-probatórios constantes dos autos; Rever tal conclusão, nos termos pretendidos pelo recorrente, encontra óbice na Súmula nº 7 do STJ. 3. A indenização por danos morais, fixada em quantum em conformidade com o princípio da razoabilidade, não enseja a possibilidade de interposição do recurso especial, ante o óbice da Súmula nº 7/STJ. Este Tribunal Superior tem prelecionado ser razoável a con-denação no equivalente a até 50 (cinquenta) salários mínimos por indenização decorrente de inscrição indevida em órgãos de proteção ao crédito. Precedentes. 4. É iterativa na jurisprudência deste Tribunal Superior ser incabível a abertura desta instância extraor-dinária para a discussão acerca da justiça na aplicação da multa por litigância de má-fé, por ser necessário o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que é obstado pelo Enunciado nº 7/STJ. 5. Pretensão de redimensionamento dos honorários advocatícios sucumbenciais arbitrados na origem. A revisão da distribuição dos ônus sucumbenciais, com o intuito de perquirir eventual sucumbência recíproca dos litigantes, envolve ampla análise de questões de fato e de prova, consoante as peculiaridades de cada caso concreto, o que é vedado no âmbito do recurso especial, nos termos da Súmula nº 7/STJ. 6. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 336.840 – (2013/0133720-1) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 07.12.2016 – p. 1847

AÇÃo de CoBrAnÇA – nÃo imPugnAÇÃo do FundAmento

dA deCiSÃo que inAdmitiu o reCurSo eSPeCiAl –

ConFirmAÇÃo dA inCidÊnCiA

34468 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de cobrança. Não impug-nação do fundamento da decisão que inadmitiu o recurso especial. Confirmação da in-cidência da Súmula nº 182/STJ. Recurso não provido. 1. A ausência de impugnação es-pecífica, na petição de agravo em recurso especial, dos fundamentos da decisão que não

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admite o apelo especial atrai a incidência do óbice previsto na Súmula nº 182 do Superior Tribunal de Justiça. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 939.012 – (2016/0161479-3) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1921)

AÇÃo de CoBrAnÇA – nÃo imPugnAÇÃo doS FundAmentoS

dA deCiSÃo que inAdmitiu o reCurSo eSPeCiAl

34469 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de cobrança. Não impug-nação dos fundamentos da decisão que inadmitiu o recurso especial. Confirmação da in-cidência da Súmula nº 182/STJ. Recurso não provido. 1. Na hipótese em exame, aplica--se o Enunciado nº 2 do Plenário do STJ: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça’. 2. A ausência de impugnação específica, na petição de agravo em recurso especial, dos fundamentos da decisão que não admite o apelo especial atrai a incidência do óbice previsto na Súmula nº 182 do Superior Tribunal de Justiça. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 952.935 – (2016/0187080-1) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1931)

AgrAvo – AdvogAdo SuBSCritor do reCurSo eSPeCiAl Sem ProCurAÇÃo noS AutoS

34470 – “Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Advogado subscritor do recurso especial sem procuração nos autos. Incidência da Súmula nº 115/STJ. 1. Na instân-cia especial, à luz da jurisprudência consolidada durante a vigência do CPC/1973, é ine-xistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos (Súmula nº 115/STJ). Vício não sanável por juntada posterior de mandato ou substabelecimento, uma vez inaplicável o disposto no art. 13 do CPC/1973 na instância extraordinária. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 699.643 – (2015/0095734-4) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 07.12.2016 – p. 1873)

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AgrAvo interno no AgrAvo em reCurSo eSPeCiAl –

CÓdigo de ProCeSSo Civil de 2015 – APliCABilidAde

34461 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Código de pro-cesso civil de 2015. Aplicabilidade. Argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Decisão que inadmitiu o recurso especial. Fundamentos. Ausência de impugna-ção específica. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento ju-risdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II – Não se conhece do agravo que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão que inadmitiu, na origem, o recurso especial. III – O Agravante não apresenta, no recurso, argumentos suficientes para desconstituir a decisão agravada. IV – Agravo Interno improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 954.884 – (2016/0191035-9) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 07.12.2016 – p. 1797)

AgrAvo interno no AgrAvo em reCurSo eSPeCiAl –

CÓdigo de ProCeSSo Civil de 2015 – APliCABilidAde

34472 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Código de Pro-cesso Civil de 2015. Aplicabilidade. Argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Decisão que inadmitiu o recurso especial. Fundamentos. Ausência de impugna-ção específica. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento ju-risdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II – Não se conhece do agravo que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão que inadmitiu, na origem, o recurso especial. III – A Agravante não apresenta, no recurso, argumentos suficientes para desconstituir a decisão agravada. IV – Agravo Interno improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 986.885 – (2016/0245425-3) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 07.12.2016 – p. 1802)

CASAmento PreCedido de longA uniÃo eStÁvel – mAtrimônio

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ContrAído Por PeSSoA Com mAiS de 60 AnoS – regime de

SePArAÇÃo oBrigAtÓriA de BenS

34473 – “Recurso especial. Direito civil. Família. Matrimônio contraído por pessoa com mais de 60 anos. Regime de separação obrigatória de bens. Casamento precedido de longa união estável iniciada antes de tal idade. Recurso especial não provido. 1. O art. 258, pa-rágrafo único, II, do Código Civil de 1916, vigente à época dos fatos, previa como sendo obrigatório o regime de separação total de bens entre os cônjuges quando o casamento envolver noivo maior de 60 anos ou noiva com mais de 50 anos. 2. Afasta-se a obriga-toriedade do regime de separação de bens quando o matrimônio é precedido de longo relacionamento em união estável, iniciado quando os cônjuges não tinham restrição legal à escolha do regime de bens, visto que não há que se falar na necessidade de proteção do idoso em relação a relacionamentos fugazes por interesse exclusivamente econômico. 3. Interpretação da legislação ordinária que melhor a compatibiliza com o sentido do art. 226, § 3º, da CF, segundo o qual a lei deve facilitar a conversão da união estável em casamento. 4. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 1.318.281 – (2012/0071382-0) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 07.12.2016 – p. 1966)

ContrAto BAnCÁrio – AuSÊnCiA de PrequeStionAmento –

SÚmulA nº 211/Stj – APliCAÇÃo do Art. 285-A do CPC/1973

34474 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil (CPC/1973). Contrato bancário. Ausência de prequestionamento. Súmula nº 211/STJ. Aplicação do art. 285-A do CPC/1973. Razões dissociadas do julgado. Súmula nº 284/STF. Dissídio não demonstrado. Revisão de honorários. Ausência de indicação do dispositivo legal vio-lado. Súmula nº 284/STF. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 743.525 – (2015/0167187-6) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 06.12.2016 – p. 1560)

ContrAto de PArtiCiPAÇÃo FinAnCeirA – ComPlementAÇÃo de AÇÕeS – FundAmentoS dA deCiSÃo

AgrAvAdA nÃo imPugnAdoS

34475 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Contrato de participação finan-ceira. Complementação de ações. Fundamentos da decisão agravada não impugnados.

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Agravo não conhecido. 1. Na hipótese em exame, aplica-se o Enunciado nº 3 do Plenário do STJ: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões pu-blicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC’. 2. É inviável o agravo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 3. O recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, no montante equivalente a 1% sobre o valor atualiza-do da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do citado artigo de lei. 4. Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 968.247 – (2016/0216380-0) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1943)

emBArgoS à exeCuÇÃo – duPliCAtA merCAntil

– reCeSSo ForenSe

34476 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Embargos à execução. Dupli-cata mercantil. Processual civil. Intempestividade do recurso especial. Recesso forense. Ausência de documento hábil para comprovar a tempestividade do recurso. Agravo im-provido. 1. A Corte Especial do STJ, no julgamento do AgRg-AREsp 137.141/SE, ocorrido em 19.09.2012, passou a adotar o entendimento de que a comprovação da tempestivida-de do recurso, em decorrência de feriado local ou de suspensão de expediente forense no Tribunal de origem que implique prorrogação do termo final para sua interposição, pode ocorrer posteriormente, em sede de agravo regimental. 2. In casu, a agravante não juntou documento hábil à comprovação do alegado, não bastando, para tanto, a simples alegação. Desse modo, não há como reconhecer a aplicação do supracitado entendimento. 3. Após a edição da Emenda Constitucional nº 45/2004, foram vedadas as férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau. O Conselho Nacional de Justiça, buscando regular o expediente forense no período de fim e início de ano, editou a Resolução nº 8, possibili-tando que os Tribunais de Justiça dos Estados definam as datas em que o expediente esta-rá suspenso, no período entre 20 de dezembro e 6 de janeiro. Nesse contexto, para fins de comprovar a tempestividade do recurso interposto nessa época do ano, é necessário que o recorrente demonstre qual o período de recesso estabelecido pelo respectivo Tribunal, pois sem essa providência a atividade jurisdicional é tida como ininterrupta, nos termos da EC/45. 4. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 963.515 – (2016/0207056-4) – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1939)

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emBArgoS de deClArAÇÃo no AgrAvo interno no reCurSo

eSPeCiAl – CÓdigo de ProCeSSo Civil de 2015 – APliCABilidAde

34477 – “Processual civil. Embargos de declaração no agravo interno no recurso espe-cial. Código de Processo Civil de 2015. Aplicabilidade. Omissão. Violação de dispositivos constitucionais. Impossibilidade de análise. Competência do Supremo Tribunal Federal. Ausência de vícios. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II – A fundamentação adotada no acórdão é suficiente para respaldar a conclusão alcançada, pelo que ausente pressuposto a ensejar a oposição de embargos de declaração, nos termos do art. 1.022 do CPC/2015. III – Não compete a esta Corte Superior a análise de suposta violação de dispositivos constitucionais, ainda que para efeito de prequestio-namento, sob pena de usurpação da competência reservada ao Supremo Tribunal Federal, ex vi art. 102, III, da Constituição da República. IV – Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgInt-REsp 1.598.423 – (2016/0124297-1) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 07.12.2016 – p. 1826)

exeCuÇÃo – AdjudiCAÇÃo de imÓvel – Co-CredoreS –

intervenÇÃo – inAdmiSSiBilidAde

34478 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Execução. Adjudicação de imó-vel. Co-credores. Reexame. Súmula nº 7 do STJ. Intervenção. Inadmissibilidade. Funda-mento. Súmula nº 283 do STF. Solidariedade ativa. Prequestionamento. Súmula nº 211 do STJ. Não provimento. 1. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-proba-tória (Súmula nº 7/STJ). 2. As questões não examinadas pelo Tribunal de origem carecem do indispensável prequestionamento, incidindo, no caso dos autos, os enunciados nº 211 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça e 282 do Supremo Tribunal Federal. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 653.391 – (2015/0008849-7) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 07.12.2016 – p. 1867)

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exeCuÇÃo – inAdimPlemento – ComPromiSSo de ComPrA e

vendA – título exeCutivo

34479 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Execução. Inadimplemento. Compromisso de compra e venda. Título executivo. Fundamentos da decisão agravada não impugnados. Agravo não conhecido. 1. Na hipótese em exame, aplica-se o Enunciado nº 3 do Plenário do STJ: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relati-vos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC’. 2. É inviável o agravo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 3. O recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, no montante equivalente a 1% sobre o valor atu-alizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depó-sito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do citado artigo de lei. 4. Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 958.475 – (2016/0198084-2) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1933)

PoSSe – direito Civil e ProCeSSuAl Civil – Bem PÚBliCo

dominiCAl – litígio entre PArtiCulAreS – interdito

PoSSeSSÓrio – PoSSiBilidAde

34480 – “Recurso especial. Posse. Direito civil e processual civil. Bem público dominical. Litígio entre particulares. Interdito possessório. Possibilidade. Função social. Ocorrência. 1. Na ocupação de bem público, duas situações devem ter tratamentos distintos: i) aquela em que o particular invade imóvel público e almeja proteção possessória ou indenização/retenção em face do ente estatal; e ii) as contendas possessórias entre particulares no to-cante a imóvel situado em terras públicas. 2. A posse deve ser protegida como um fim em si mesma, exercendo o particular o poder fático sobre a res e garantindo sua função social, sendo que o critério para aferir se há posse ou detenção não é o estrutural e sim o funcio-nal. É a afetação do bem a uma finalidade pública que dirá se pode ou não ser objeto de atos possessórias por um particular. 3. A jurisprudência do STJ é sedimentada no sentido de que o particular tem apenas detenção em relação ao Poder Público, não se cogitando de proteção possessória. 4. É possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares sobre bem público dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à pos-se. 5. À luz do Texto Constitucional e da inteligência do novo Código Civil, a função social é base normativa para a solução dos conflitos atinentes à posse, dando-se efetividade ao

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bem comum, com escopo nos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana. 6. Nos bens do patrimônio disponível do Estado (dominicais), despojados de destinação pública, permite-se a proteção possessória pelos ocupantes da terra pública que venham a lhe dar função social. 7. A ocupação por particular de um bem público abandonado/desafetado – isto é, sem destinação ao uso público em geral ou a uma atividade adminis-trativa –, confere justamente a função social da qual o bem está carente em sua essência. 8. A exegese que reconhece a posse nos bens dominicais deve ser conciliada com a regra que veda o reconhecimento da usucapião nos bens públicos (STF, Súm 340; CF, arts. 183, § 3º; e 192; CC, art. 102); um dos efeitos jurídicos da posse – a usucapião – será limitado, devendo ser mantido, no entanto, a possibilidade de invocação dos interditos possessórios pelo particular. 9. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.296.964 – (2011/0292082-2) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 07.12.2016 – p. 1963)

reCurSo – interPoSiÇÃo nA vigÊnCiA do CPC/1973 – AuSÊnCiA

de imPugnAÇÃo de todoS oS FundAmentoS dA deCiSÃo

de inAdmiSSiBilidAde

34481 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Recurso inter-posto na vigência do CPC/1973. Ausência de impugnação de todos os fundamentos da decisão de inadmissibilidade. Súmula nº 182/STJ. Decisão mantida. 1. O agravante deve atacar, de forma específica, todos os fundamentos da decisão que, na origem, inadmitiu o recurso especial. Aplicação do art. 544, § 4º, I, do CPC/1973 e, por analogia, da Súmula nº 182/STJ. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 856.973 – (2016/0033491-0) – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJe 07.12.2016 – p. 1887)

reCurSo eSPeCiAl – CÓdigo de ProCeSSo Civil de 2015 – APliCABilidAde

34482 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Código de Pro-cesso Civil de 2015. Aplicabilidade. Argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Decisão que inadmitiu o recurso especial. Fundamentos. Ausência de impugna-ção específica. Usurpação de competência desta Corte no exercício de admissibilidade do recurso. Inocorrência. Incidência da Súmula nº 123/STJ. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determi-

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nado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II – Não se conhece do agravo que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão que inadmitiu, na origem, o recurso especial. III – A Agravante não apresenta, no recurso, argumentos suficientes para desconstituir a decisão agravada. IV – É necessário a aferição de pressupostos específicos relacionados ao mérito da controvérsia, quando realizado o exercício do juízo de admissi-bilidade do Recurso Especial pelo Tribunal de origem, nos termos da Súmula nº 123/STJ. V – Agravo Interno improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 975.007 – (2016/0228480-9) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 06.12.2016 – p. 1475)

reCurSo eSPeCiAl – PrePAro A menor – intimAÇÃo dA reCorrente PArA ComPlementAÇÃo –

deSCumPrimento – deSerÇÃo

34483 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil. Recurso espe-cial. Preparo a menor. Intimação da recorrente para complementação. Descumprimento. Deserção. Embargos declaratórios contra decisão que não admite recurso especial. Recur-so manifestamente incabível. Não interrupção do prazo para interposição do agravo do art. 544 do CPC. Intempestividade. Agravo não provido. 1. Esta Corte Superior tem enten-dimento consolidado de que a insuficiência no valor do preparo só implicará deserção se o recorrente, intimado, não vier a supri-lo no prazo de cinco dias, situação configurada nos presentes autos. 2. É entendimento desta Corte Superior que a oposição de embargos de declaração contra decisão que, na instância ordinária, nega seguimento a recurso especial não interrompe o prazo para a interposição de agravo para o Superior Tribunal de Justiça, salvo nos casos em que proferida de forma genérica, o que não ocorreu no caso dos autos, em que a decisão que inadmitiu a subida do recurso especial está devidamente fundamen-tada. 3. Agravo interno não provido. (STJ – AgInt-Ag-REsp 943.739 – (2016/0159853-5) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1925)

reSPonSABilidAde Civil – ACidente de trÂnSito –

AuSÊnCiA de imPugnAÇÃo

34484 – “Processual civil e administrativo. Agravo regimental no agravo em recurso es-pecial. Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Ausência de impugnação dos funda-

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mentos da decisão que inadmitiu o recurso especial. Aplicação da Súmula nº 182/STJ que se mantém. Agravo regimental da Companhia Riograndense de Saneamento – Corsan a que se nega provimento. 1. A decisão ora recorrida não conheceu do Agravo em razão da falta de impugnação dos fundamentos da decisão que inadmitiu o Recurso Especial, no-tadamente quanto à ausência de comprovação da divergência jurisprudencial. Em razão disso, consignou-se a incidência da Súmula nº 182/STJ. 2. Como cediço, a parte, para ver seu Recurso Especial inadmitido ascender a esta Corte, precisa, primeiro, desconstituir os fundamentos utilizados para a negativa de seguimento daquele recurso, sob pena de vê-los mantidos. 3. Em nova análise do Agravo interposto, tem-se que, efetivamente, a parte Agravante não rebateu os fundamentos da decisão que inadmitiu o Recurso Es-pecial, tendo se limitado a afirmar o prequestionamento da matéria tida por ofendida e a inaplicabilidade da Súmula nº 7/STJ, deixando de se manifestar quanto à ausência de comprovação da divergência jurisprudencial. 4. Inafastável, assim, a incidência do óbice da Súmula nº 182/STJ, segundo a qual é inviável o Agravo do art. 545 do CPC/1973 que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada. 5. Ainda, é mister repetir que as razões demonstrativas do desacerto da decisão de admissibilidade do Re-curso Especial devem ser veiculadas imediatamente naquela oportunidade, pois, convém frisar, não ser admitida fundamentação a destempo, a fim de inovar a justificativa para ascensão do Recurso Excepcional, diante da preclusão consumativa. 6. Agravo Regimen-tal da Companhia Riograndense de Saneamento – Corsan a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 798.236 – (2015/0264138-7) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 07.12.2016 – p. 1762)

reSPonSABilidAde Civil – AtroPelAmento em viA FérreA

– morte dA vítimA – dAnoS morAiS AoS irmÃoS – CABimento

34485 – “Agravo interno no recurso especial. Civil e processual civil. Responsabilida-de civil. Atropelamento em via férrea. Morte da vítima. Danos morais aos irmãos. Cabi-mento. Despesas de funeral e sepultamento. Prova. Desnecessidade. Agravo desprovido. 1. Presume-se o dano moral na hipótese de morte de parente, tendo em vista que o trauma e o sentimento causado pela perda da pessoa amada são inerentes aos familiares próxi-mos à vítima. 2. Os irmãos, vítimas por ricochete, têm direito de requerer a indenização pelo sofrimento da perda do ente querido, sendo desnecessária a prova do abalo íntimo. No entanto, o valor indenizatório pode variar, dependendo do grau de parentesco ou proximidade, pois o sofrimento pela morte de familiar atinge os membros do núcleo fa-miliar em gradações diversas, o que deve ser observado pelo magistrado para arbitrar o valor da reparação. 3. Na presente hipótese, foi fixada a indenização por danos morais

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aos irmãos da vítima no valor correspondente a R$ 15.000,00 (quinze mil reais), quantia razoável e proporcional ao montante arbitrado aos genitores (R$ 30.000,00). 4. Segundo a jurisprudência desta Corte, não se exige a prova do valor efetivamente desembolsado com despesas de funeral e sepultamento, em face da inevitabilidade de tais gastos. 5. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-REsp 1.165.102 – (2009/0218978-5) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1954)

Nota:Trata-se de agravo interno interposto contra decisão que deu parcial provimento ao recurso especial para o fim de:(a) manter o valor da reparação moral arbitrada no acórdão recorrido, esclarecendo que a quantia de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) é devida para cada genitor, de forma autônoma;(b) fixar a indenização por dano moral aos irmãos da vítima no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), para cada um, devendo ser acrescida de correção monetária a partir desta data (Súmula nº 362/STJ) e de juros moratórios a partir do evento danoso (Sú-mula nº 54/STJ); e(c) condenar MRS Logística S/A ao pagamento das despesas de funeral e sepultamento da vítima falecida, limitadas ao mínimo previsto na legislação previdenciária, valor este a ser apurado em sede de liquidação.Seguiram-se embargos de declaração, os primeiros rejeitados e os segundos acolhidos para suprir a omissão quanto à inversão dos ônus sucumbenciais.Em suas razões recursais, MRS Logística S/A sustenta ser indevida a condenação ao pagamento de danos morais aos irmãos da vítima falecida, tendo em vista a inexistên-cia de provas acerca da estreita relação dos irmãos com a vítima.A parte agravante defende, ainda, o não cabimento das verbas relativas ao funeral e sepultamento, porque não houve nenhuma demonstração nos autos a respeito do pa-gamento de tais despesas.O STJ negou provimento ao agravo interno.Prima facie, é de todo oportuno trazer à baila os ensinamentos da Professora Maria Sylvia Zanella de Pietro, que informa sobre as possibilidades de exclusão e atenuação da responsabilidade do Poder Público, em especial por culpa da vítima:“São apontados como cláusulas excludentes da responsabilidade a força maior e a cul-pa da vítima.[...]Quando houver culpa da vítima, há que de distinguir se é culpa exclusiva ou concor-rente com a do Poder Público; no primeiro caso, o Estado não responde; no segundo atenua-se a sua responsabilidade, que se reparte com a da vítima.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. São Paulo: Atlas, 2004. p. 518-519)O valor a ser pago em títulos de danos morais é bastante discutido. Nesse diapasão, oportuno se faz citar as lições de Isabela Ribeiro de Figueiredo:“O dano moral pode ser definido como a lesão ao patrimônio jurídico materialmente não apreciável de uma pessoa. É a violação do sentimento que rege os princípios morais tutelados pelo direito, que podem ser decorrentes de ofensa à honra, ao decoro, à paz interior de cada um, às crenças íntimas, aos sentimentos afetivos de qualquer espécie, à liberdade, à vida e à integridade corporal.

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[...]Não resta dúvida de que o problema mais sério suscitado na reparação do dano moral está na valoração e arbitramento do valor econômico a ser oferecido ao ofendido.Sabemos que quando se trata de dano material a apuração do valor se faz com base em informações e dados concretos. Assim, chegar-se-á exatamente ao desfalque sofrido no patrimônio da vítima e a indenização consistirá no seu exato montante.Mas, no caso do dano moral, a apuração do quantum indenizatório se torna complexa porque o bem lesado (a honra, o sentimento, o nome) não se mede monetariamente, ou seja, não tem dimensão econômica ou patrimonial.[...]A lei não traça, expressamente, diretrizes exatas para a fixação do valor da indenização a título de dano moral. Não existem normas legais para esse arbitramento, e, assim, caberá ao Judiciário, atentando-se à dupla finalidade: compensar a vítima, ou o lesado, e punir o ofensor.Como podemos observar, com relação à questão da fixação do valor na reparação civil por danos morais, há princípios legais, decisões jurisprudências e soluções doutrinárias a serem consideradas, mas deverá atentar o julgador, no caso concreto, para as condi-ções das partes, a gravidade da lesão, sua repercussão e as circunstâncias fáticas.[...]Concluímos que a fixação do dano moral é complexa, e difícil a aplicação ideal para cada caso, e por essa razão, no que concerne aos critérios para fixar o valor da inde-nização, não podemos dar respostas precisas e inabaláveis, mas podemos afirmar que os critérios que estão sendo consagrados pela doutrina e jurisprudência tendem a ser seguidos.O importante é que se observe o procedimento moral, valendo-se de experiência, bom--senso, cuidado, zelo e apreciação minuciosa dos fatos, para que se estabeleça a tão esperada justiça e equidade.” (Valoração do dano moral – Publicada na Revista SÍNTESE de Direito Civil e Processual Civil, n. 10, mar./abr. 2001, p. 51)Vale trazer também entendimentos jurisprudenciais a esse respeito:“Apelação cível. Ação de reparação por danos patrimoniais e morais. Atropelamento por trem. Responsabilidade da empresa ferroviária. Obrigação de prover adequados meios de segurança no local onde passa a linha férrea. Indenização devida. Danos ma-teriais. Configurados. Fixação de pensão mensal vitalícia no equivalente a um salário mínimo vigente. Ausência de comprovação dos rendimentos mensais da vítima. Quan-tificação dos danos morais de acordo com as condições econômicas das partes litigan-tes. Recurso parcialmente provido. A empresa ferroviária deve ser responsabilizada civilmente por atropelamento na via férrea quando, no local da passagem de nível, não houver cancela, sinalização ou um guarda necessários para proteger os transeuntes. Não havendo comprovação nos autos dos rendimentos mensais auferidos pela autora--recorrente, deve ser fixada uma pensão mensal vitalícia no importe de um salário mí-nimo a título de danos materiais. Restaram evidentes os sofrimentos experimentados pela vítima em decorrência de seu atropelamento pela locomotiva de propriedade da companhia ferroviária, inclusive com piora de distúrbio emocional preexistente. Na quantificação dos danos morais, o pertinente valor deve corresponder aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade, para que se configure uma punição ao culpa-do e compensação à pessoa que suportou os prejuízos de ordem emocional, levando-

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-se, ainda, em consideração as condições econômicas das partes litigantes. Havendo sucumbência mínima da parte demandante-recorrente, deve a empresa vencida arcar integralmente com as custas e despesas processuais e, ainda, com os honorários advo-catícios.” (TJMS, AC 2005.012744-2/0000-00/Campo Grande, 3ª T.Cív., Rel. Des. Paulo Alfeu Puccinelli, J. 07.11.2005)“Responsabilidade civil. Acidente ferroviário. Vítima fatal. Vítima que transitava pela via férrea. Dever da transportadora de zelar pela segurança do leito de suas linhas de tráfego configurado. Responsabilidade objetiva da mesma caracterizada. Nexo causal no caso comprovado. Culpa exclusiva da vítima pelo atropelamento não comprovada. Travessia nos trilhos por pedestres demonstrada pela prova testemunhal ser corriquei-ra no local. Ação procedente em parte. Sentença reformada. Pensão mensal. Responsa-bilidade civil. Acidente ferroviário. Vítima fatal. Vítima que transitava pela via férrea. Pensão mensal arbitrada em valor correspondente a 2/3 do salário que percebia a ví-tima, até a data em que esta completaria vinte e sete anos de idade. Valor referente a 1/3 desta quantia considerado destinado para as despesas pessoais da vítima. Após os vinte e sete anos até a data em que a mesma completaria sessenta e cinco anos de idade, cabe ser reduzida a pensão mensal para 1/3, tendo em vista a presunção de que a vítima constituiria sua própria família, passando a contribuir com menor valor para o sustento de seus pais. Direito de acrescer entre os beneficiários da mesma assegurado no caso. Décimo terceiro salário também cabível. Verba que integra a indenização da pensão mensal. Autores que, no caso, cabem ser incluídos em folha de pagamento, dispensada a constituição de capital, por se tratar de concessionária de serviço público. Sentença reformada nesse ponto. Votos vencidos. Dano moral. Responsabilidade civil. Acidente ferroviário. Vítima fatal. Vítima que transitava pela via férrea. Verba devida no caso. Indenização que tem por finalidade compensar o ofendido pelo sofrimento injusto que lhe foi infligido, e servir de desestímulo ao agressor, para que mais volte a incidir na mesma falta. Arbitramento de tal indenização, no caso, em valor corres-pondente a 150 salários mínimos, dividido entre os autores. Sentença reformada nesse ponto. Ação procedente em parte. Recurso provido em parte para esse fim. Votos ven-cidos.” (1º TACSP, Ap 1259959-4 (57535), São Paulo, 4ª C., Rel. Juiz Oséas Davi Viana, J. 10.11.2004) (Publicado no Juris Síntese n. 59, maio/jun. 2006)

reSPonSABilidAde Civil – morte de menor Por AFogAmento –

reSPonSABilidAde do CluBe PelA FAlhA no ServiÇo – dAno morAl

– quAntum indeniZAtÓrio

34486 – “Recurso especial. Responsabilidade civil. Morte de menor por afogamento. Responsabilidade do clube pela falha no serviço. Dano moral. Quantum indenizatório. Critérios de arbitramento equitativo. Método bifásico. Núcleo familiar sujeito do dano. Necessidade de individualização da indenização. Pensão mensal devida. 1. O clube re-creativo que possui em sua estrutura piscinas e lagoas é responsável pelo afogamento e

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óbito de criança em suas dependências, quando comprovada falha na prestação do servi-ço, configurada pela não adoção de medidas preventivas adequadas ao risco de sua frui-ção: segurança dos banhistas, salva-vidas, boias para a indicação da parte funda da rasa do lago, profissional médico, aparelho de respiração artificial. 2. O Superior Tribunal de Justiça, quando requisitado a se manifestar sobre o arbitramento de valores devidos pelo sofrimento de dano moral, deve interferir somente diante de situações especialíssimas, para aferir a razoabilidade do quantum determinado para amenizar o abalo ocasionado pela ofensa. 3. O método bifásico, como parâmetro para a aferição da indenização por danos morais, atende às exigências de um arbitramento equitativo, pois, além de minimi-zar eventuais arbitrariedades, evitando a adoção de critérios unicamente subjetivos pelo julgador, afasta a tarifação do dano. Traz um ponto de equilíbrio, pois se alcançará uma razoável correspondência entre o valor da indenização e o interesse jurídico lesado, além do fato de estabelecer montante que melhor corresponda às peculiaridades do caso. 4. Na primeira fase, o valor básico ou inicial da indenização é arbitrado tendo-se em conta o interesse jurídico lesado, em conformidade com os precedentes jurisprudenciais acerca da matéria (grupo de casos). 5. Na segunda fase, ajusta-se o valor às peculiaridades do caso, com base nas suas circunstâncias (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), procedendo-se à fixação definitiva da indenização, por meio de arbitramento equitativo pelo juiz. 6. Ainda na segunda fase de fixação, tendo em vista tratar-se de um núcleo familiar como titular da indenização, há que se ponderar acerca da individualização do dano, uma vez que um evento danoso capaz de abalar o núcleo familiar deve ser individualmente considerado em relação a cada um de seus membros (EREsp 1127913/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, DJe 05.08.2014). 7. Conforme a jurisprudência do STJ, a indenização pela morte de filho menor, que não exercia atividade remunerada, deve ser fixada na forma de pen-são mensal de 2/3 do salário mínimo até 25 (vinte e cinco) anos, e a partir daí, reduzida para 1/3 do salário até a idade em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos. 8. Recurso especial parcialmente provido.” (STJ – REsp 1.332.366 – (2012/0138177-2) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 07.12.2016 – p. 1968)

reSPonSABilidAde Civil – notíCiA veiCulAdA em Sítio

eletrôniCo e Blog nA internet – dAno à honrA ConFigurAdo

34487 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Responsabilidade civil. Notícia veiculada em sítio eletrônico e blog na internet. Dano à honra configurado. Acórdão com fundamentação constitucional. Inviabilidade de exame em sede de recurso especial. Im-pugnação de fundamento não adotado pela decisão agravada. Súmula nº 284/STF. Agra-

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vo interno não provido. 1. O eg. Tribunal de origem, na hipótese dos autos, dirimiu a con-trovérsia acerca da configuração do dano moral em virtude de notícia veiculada em sítio eletrônico e blog na Internet com base na ponderação dos valores constitucionais presentes nos arts. 5º, IV, IX e XIV, e 220 da Constituição Federal, razão pela qual se torna insusce-tível de apreciação em sede de recurso especial (CF, arts. 102, III, e 105, III). 2. A decisão agravada não foi amparada na Súmula nº 7/STJ, motivo pelo qual as razões apresentadas no presente agravo interno, nesse ponto, encontram-se dissociadas do que foi decidido na decisão monocrática, circunstância que caracteriza deficiência na fundamentação do recurso especial e atrai, por analogia, o óbice da Súmula nº 284 do eg. Supremo Tribunal Federal. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 923.284 – (2016/0132024-5) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1916)

SiStemA FinAnCeiro dA hABitAÇÃo – AÇÃo ordinÁriA

– APÓliCe de Seguro de nAtureZA PÚBliCA

34488 – “Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). Sistema financeiro da ha-bitação. Ação ordinária. Apólice de seguro de natureza pública. Despacho determinando a redistribuição do apelo a uma das turmas que compõem a primeira seção. Insurgência dos autores. 1. Segundo a orientação jurisprudencial desta Corte Superior, ‘é irrecorrível o despacho que determina a redistribuição ou atribuição dos autos, haja vista tratar-se de ato meramente ordinatório bem como inexistir conteúdo decisório apto a causar gravame às partes’ (TJ, AgRg-Rcl 9.858/CE, Rel. Min. Felix Fischer, Corte Especial, DJe de 25.04.2013). 2. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 642.961 – (2014/0326797-0) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 07.12.2016 – p. 1865)

SiStemA FinAnCeiro dA hABitAÇÃo – AÇÃo ordinÁriA

– AuSÊnCiA de ProCurAÇÃo outorgAdA Ao SuBSCritor

34489 – “Agravo interno no recurso especial. Processual civil. Sistema financeiro da ha-bitação. Ação ordinária. Ausência de procuração outorgada ao subscritor do agravo in-terno. Intimação para regularização da representação processual. Não atendimento. Não conhecimento. 1. Nos termos do art. 76, § 2º, I, do Código de Processo Civil, não se conhece do recurso quando a parte recorrente descumpre a determinação para regularização da

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representação processual. 2. Agravo interno não conhecido.” (STJ – AgInt-REsp 1.207.961 – (2010/0144393-3) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1959)

SoCiedAde – diSSoluÇÃo e liquidAÇÃo – AuSÊnCiA

de PeÇA oBrigAtÓriA

34490 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Dissolução e liquidação de so-ciedade. Ausência de peça obrigatória. Art. 525 do CPC/1973. Fundamentos da decisão agravada não impugnados. Agravo não conhecido. 1. Na hipótese em exame, aplica--se o Enunciado nº 3 do Plenário do STJ: ‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC’. 2. É inviável o agra-vo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 3. O recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, no montante equivalente a 1% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do citado artigo de lei. 4. Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 931.327 – (2016/0150649-3) – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1918)

uSuCAPiÃo extrAordinÁriA urBAnA – ProCeSSuAl Civil –

reCurSo eSPeCiAl interPoSto ContrA deCiSÃo monoCrÁtiCA

34491 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Usucapião extraordinária ur-bana. Processual civil. Recurso especial interposto contra decisão monocrática. Hipótese em que não houve o exaurimento das vias ordinárias. Incidência da Súmula nº 281 do STF. Precedentes. Agravo desprovido. 1. Não cabe recurso especial interposto contra de-cisão monocrática, na medida em que um dos pressupostos para sua admissibilidade é o exaurimento das instâncias ordinárias. Portanto, incumbiria à parte interessada interpor agravo regimental, a fim de esgotar as vias recursais e, assim, viabilizar o processamento do apelo especial. 2. Confirmando esse entendimento, a Súmula nº 281/STF, aplicável, por analogia, ao recurso especial, dispõe que ‘é inadmissível o recurso extraordinário, quando couber, na justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada’. 3. Agravo interno

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a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-AgInt-Ag-REsp 904.698 – (2016/0121669-3) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 07.12.2016 – p. 1905)

Nota:Trata-se de agravo interno contra decisão monocrática da lavra deste Relator, que ne-gou provimento ao seu recurso especial, com fundamento na Súmula nº 281 do STF.Nas razões recursais, a parte agravante reproduz os argumentos do recurso especial alegando “que o acórdão, assim como decisão monocrática, são espécies do gênero ‘de-cisão’, hipótese de cabimento do art. 105, inc. III, da CF/1988. Logo, cabível o Recurso Especial interposto pela ora agravante contra a decisão recorrida, ainda que monocrá-tica”.Intimada, a parte contrária apresentou impugnação.O STJ negou provimento ao agravo interno.O Relator assim considerou:“In casu, o recurso especial foi interposto perante o eg. Tribunal de origem contra deci-são monocrática, sem que houvesse a interposição de agravo interno, para exaurimento de instância. Não houve, portanto, julgamento colegiado, a fim de esgotar as vias recur-sais e, assim, viabilizar o processamento do recurso especial.”Citamos, a seguir, trecho da doutrina de Carlos José Cordeiro:“Professor Orlando Gomes diz que a tese da autonomia da usucapião é consagrada nas modernas legislações, e traça com clareza a distinção entre os dois institutos. Assim, do ponto de vista da finalidade, a prescrição é um modo de extinguir pretensões, enquanto o usucapião é modo de adquirir direitos reais. A base dos institutos também é diversa; na prescrição, é a inércia do sujeito de direito; no usucapião, é a posse continuada. Diverso é o aspecto da aplicabilidade; o usucapião restringe-se aos direitos reais. A prescrição, por fim, tem um sentido negativo, de extinção, enquanto que o usucapião é positivo, como força geradora. E conclui: ‘Não há que falar, por conseguinte, em pres-crição aquisitiva’.No mesmo sentido, aponta Eduardo Espínola, reconhecendo que há regras comuns às duas espécies de prescrição, aquisitiva (suposto usucapião) e extintiva, porém há entre elas diferenças substanciais: a prescrição aquisitiva tem essencialmente por base a posse, e assim exige a boa-fé; a prescrição extintiva, em regra, dispensa a posse, não exige por parte do devedor o requisito da boa-fé; a prescrição aquisitiva pode ser fonte de uma ação ou de uma exceção em proveito do adquirente; a extintiva, sendo pratica-mente um meio de refletir a ação, se apresenta sempre como exceção; o campo da pres-crição aquisitiva não é tão vasto como o da extintiva: a primeira limita-se à aquisição da propriedade e dos direitos reais; a extintiva abrange todo o domínio do direito civil, aplicando-se a todas as classes de relações jurídicas.Dessa forma, entende-se não se poder, sob a análise científica, considerar a usucapião como uma espécie de prescrição aquisitiva, uma vez que diversos são os seus regimes, somente tendo incidência comum o decurso do tempo, como forma de contato entre os dois institutos. Essa afirmativa acompanha o posicionamento do Professor Nélson Luiz Pinto, que, citando Lafayette, assevera ‘ter a prescrição conotação negativa, isto é, nascer da inércia, tendo por efeito dissolver a obrigação e paralisar o direito correlato, e, consequentemente, não gerar direitos. A usucapião, ao contrário, é positivo, porque no seu modo de atuar predomina a força geradora; o proprietário perde o domínio não só por sua inércia, mas também porque o adquire o possuidor. Assim, o não uso

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do direito de propriedade não importa sua extinção, por ser imprescritível, enquanto existir o seu objeto (propriedade). De sorte que a única possibilidade que se apresenta é a da aquisição por outrem, denominada usucapião, quando, então, o objeto passará a outro titular’.Pode-se, assim, esclarecido que a usucapião é uma forma de aquisição da propriedade, dentre os vários conceitos oferecidos pela doutrina, apresentar, segundo Nélson Luiz Pinto, ‘o que mais se aproxima do nosso ordenamento jurídico’, de lavra de Modestino: ‘O usucapio este adjectio dominii per continuationem possessionis temporis lege definit, ou, o modo de adquirir a propriedade pela posse continuada durante certo lapso de tempo, com os requisitos estabelecidos na lei.’Observa-se, dessa última conceituação, bem como das outras arroladas, que dois são os elementos básicos, essenciais, para a aquisição por usucapião: posse e tempo. Exigindo--se, ainda, o animus domini. Ressalte-se que outros elementos podem se fazer presentes nas várias espécies de usucapião (ordinário, extraordinário e especial), tais como o justo título e a boa-fé, os quais serão analisados no momento oportuno.[...]Feitas as considerações iniciais sobre a usucapião e ressaltada a importância do institu-to, cabe revelar que o direito brasileiro admite cinco espécies de usucapião, quais sejam: usucapião extraordinário, previsto pelo art. 550 do CC; usucapião ordinário, definido no art. 551 do CC; usucapião mobiliário, descrito nos arts. 618 e 619 do CC, respecti-vamente nas modalidades ordinário e extraordinário; usucapião especial rural ou pro labore, regulado pela Lei nº 6.969/1981, com as alterações dadas pela CF, no art. 191; e usucapião especial urbano, introduzido pelo art. 183 da Lei Maior.Discriminadas as várias espécies de usucapião, deve-se dizer que não será objeto de estudo a distinção entre os seus diversos tipos, sendo, na verdade, continente de ou-tro tema monográfico. Disso, nota-se que fundamentalmente não divergem entre si as cinco formas de usucapir, exigindo-se sempre, dentre outros requisitos, para a sua con-cessão, coisa hábil, posse, lapso de tempo, animus domini e, em alguns casos, boa-fé e justo título.Por aí, percebe-se que para ocorrer a usucapião em geral, faz-se necessário o concur-so de certos requisitos, que dizem respeito às pessoas a quem interessa (pessoais); às coisas e direitos que podem ser adquiridos desta maneira (reais); à forma por que se constitui (formais); e à qualificação da posse (especiais).A explicação atinente a cada qual será feita nos tópicos seguintes, quando forem dis-secados os requisitos da usucapião em geral. Advirta-se, porém, como anota Antônio Macedo de Campos, ‘que capacidade (pessoal) e coisa hábil (real) não estão expressas nos dispositivos referentes à usucapião. Resultam dos princípios gerais de direito’.Os requisitos pessoais são aqueles que têm em vista o possuidor e o proprietário, de for-ma a abranger a capacidade de cada um, para a ocorrência da usucapião, concebendo--se, assim, a aquisição do domínio por um e perda da propriedade da coisa pelo outro.Deveras, é regra manifesta que somente podem usucapir as pessoas capazes para pos-suir. Nesse engate, entende Lenine Nequete que são capazes de possuir tanto as pes-soas físicas quanto morais, a comunidade hereditária, a pessoa jurídica de direito pú-blico e, inclusive, os incapazes, por intermédio de seus representantes. Inclui, ainda, os sucessores legítimos ou testamentários do possuidor, bem como os credores e demais interessados.

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Esta assertiva fundamenta-se, especialmente, no art. 162 do CC, uma vez que se per-mite a alegação da prescrição pela parte a quem aproveita. Ter-se-ia, então, terceiros interessados que seriam ‘todos aqueles que em favor dos quais constitui o possuidor um direito qualquer, que pereceria não se consolidando a propriedade nas mãos deste, v.g., o usufrutuário, o usuá rio, o fideicomissário em relação ao gravado, o enfiteuta em relação ao senhorio direto, etc.’.Com relação ao sujeito passivo, para sofrer os efeitos da perda da coisa, basta que ele seja o proprietário. Aí, incluem-se os relativamente incapazes, e excluem as pessoas jurídicas de direito público. Quanto aos primeiros, o art. 169, I, do CC não os abarca quando torna patente que não ocorre prescrição contra os incapazes de que trata o art. 5º, ou seja, os sujeitos absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quanto aos segundos, a CF determina que os bens públicos não serão adquiridos por usucapião.Em suma, o usucapiente deve ser capaz, mas, em determinados casos, essa faculdade sofre restrições decorrentes de diversos acontecimentos, inclusive familiar, obrigacio-nal, etc.Antônio Ferreira Inocêncio relaciona pessoas e situações jurídicas que não se afinam com a usucapião. Assim, tem-se:‘a) Entre cônjuges, na constância do casamento (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, I), qualquer que seja o regime de bens;b) Entre ascendentes e descendentes, durante o pátrio poder (CC, arts. 553, 619, pará-grafo único, e 168, II);c) Entre tutelados e curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (CC, arts. 553, 619, parágrafo único, e 168, III);d) Em favor de credor pignoratício, do mandatário, e, em geral, das pessoas que lhe são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e as pessoas representadas ou seus herdeiros, relativamente aos bens confiados à sua guarda (CC, arts. 553, pará-grafo único, e 168, IV).’Além dessas exceções, o mencionado autor enumera outros casos, aos quais é inaplicá-vel o usucapião.Interessante noticiar que, face à força declaratória de certeza jurídica, é possível ao pro-prietário intentar a usucapião sobre o seu imóvel, pois não há a menor ilegalidade em que o possuidor, por não ter confiança em seu título dominial, recorra à ação de usu-capião. A propósito, comenta Celso Agrícola Barbi que ‘não se justificam restrições ao uso da ação declaratória quanto à propriedade de imóveis. Pelo contrário, será de muita utili-dade, quando alguém criar incerteza em torno do domínio de um bem dessa natureza, prejudicando seu uso, ou disponibilidade, pelo proprietário também possuidor. Poderá ele mover ação contra o pretenso dono, para ver declarado que é seu o domínio’.Os requisitos reais relacionam-se com as coisas e direitos que podem ser objeto de aqui-sição por usucapião (res habilis). Desse modo, para ser objeto de usucapião, é mister que a coisa esteja no comércio, não sendo usucapíveis, pois, as que estejam fora do comér-cio, assim consideradas as insuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis, na definição do art. 69 do CC.Anote-se, conforme José Carlos de Moraes Salles, ‘haver coisas naturalmente insus-cetíveis de apropriação e, consequentemente, de usucapião, como, por exemplo, o ar,

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a luz natural e as águas livres. De outra parte, há coisas juridicamente inapropriáveis ou inusucapíveis, porque assim declaradas pelo Direito. Como exemplo, [...] os bens públicos de uso comum do povo, os de uso especial e os dominiais ou patrimoniais (art. 66 do CC)’.Confirma-se que as coisas legalmente inalienáveis também não são usucapíveis, posto que elas têm o seu destino fixado por lei, como o bem de família (art. 72 do CC); os imóveis dotais (arts. 293 e 298 do CC); os bens de menores sob pátrio poder ou tutela (arts. 386, 427, VI, e 429 do CC); e os bens dos sujeitos à curatela (arts. 446, 453 e 463 do CC). Deve-se mencionar que a doutrina, hodiernamente, entende que quando a inalie-nabilidade resulta de ato voluntário de testador ou doador, o bem assim clausulado pode ser objeto de usucapião.Quanto aos direitos suscetíveis de usucapião, a doutrina reconhece que somente os direitos reais prescritíveis podem ser adquiridos, assim os que implicam posse dos ob-jetos sobre que recaem, vale dizer, a propriedade, as servidões, a enfiteuse, o usufruto, o uso e a habitação. A propósito, ensina Wolff que ‘sólo puede adquirir-se por usucapión los derechos reales que faculten para la posesión de una cosa o de un derecho: como la propiedad, la superficie, las servidumbres’.Em regra, só podem ser usucapidos os bens do domínio particular, ao passo que os bens públicos não se subordinam a tal incidência, conforme impõe a Súmula nº 340 do STF, pois que ‘desde a vigência do Código Civil, os bens dominiais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião’. Essa orientação do Pretó-rio Excelso foi acompanhada pelo atual texto constitucional, como se nota nos seus arts. 183, § 3º, e 191, parágrafo único.A coisa hábil para usucapião é coisa corpórea e tangível, sendo indispensável para os imóveis que estes estejam perfeitamente individuados, com suas precisas característi-cas, extensão e confrontações, mesmo porque a posse ad usucapionem não seria compatí-vel com a indeterminação dos limites ou de outros aspectos da coisa possuída.Ressalta-se, entretanto, que é crescente o número de julgados que admite posse e usuca-pião sobre bens intangíveis (incorpóreos) como, v.g., o direito ao uso de linha telefônica. Vale dizer, também, que embora na usucapião de imóvel exija-se certeza e determi-nação, tem-se admitido usucapião de compossuidores, sobre partes ideais, de imóvel divisível ou não, quando a posse do todo é exercida conjuntamente.” (CORDEIRO, Carlos José. Usucapião. Juris SÍNTESE, Porto Alegre: IOB/Thomson, nov./dez. 2005. 56 CD-Rom)

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JurisprudênciaPenal

STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Conflito de Competência nº 149.464 – RN (2016/0281931-4)Relator: Ministro Reynaldo Soares da FonsecaSuscitante: Juízo de Direito da Vara Criminal de Pau dos Ferros/RNSuscitado: Juízo Federal da 12ª Vara de Pau dos Ferros – SJ/RNInteres.: Justiça PúblicaInteres.: Antonio Nunes NetoInteres.: Manoel Gomes RegoInteres.: Oseas PinheiroInteres.: Antonio Avanilson Ferreira LimaInteres.: Francisco Xavier GomesInteres.: Cantidia Carlos de Oliveira Neta LopesInteres.: Erivan Teixeira DinizInteres.: Antenor Fernandes NetoInteres.: Vicente Moises de Queiroz Filho Interes.: Jocelmo Oliveira Segundo Interes.: Maria Francielma de AlmeidaInteres.: Jose Reginaldo Fernandes Aquino Interes.: Reginaldo de Albuquerque NunesInteres.: Maria do Socorro Rabelo DantasInteres.: Fabiano Augusto Rabelo DantasInteres.: Creso Venancio Dantas

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EMENTA

ConFlito negAtivo de ComPetÊnCiA – juStiÇA FederAl x juStiÇA eStAduAl – AÇÃo PenAl –

FrAude em liCitAÇÃo deStinAdA à AquiSiÇÃo de gÊneroS AlimentíCioS PArA CreChe em muniCíPio – reCurSoS de ConvÊnio APortAdoS Pelo eStAdo e Pelo muniCíPio – PreStAÇÃo de ContAS PerAnte

o eStAdo – ComPetÊnCiA dA juStiÇA eStAduAl1. Situação em que se questiona se a verba supostamente

malversada nos delitos objeto da ação penal (fraude em licitação e falsificação de documento público) e repassada, por meio de convênio, pela Secretaria do Estado do Rio Grande do Norte a Município, contém, ou não recursos, provenientes do Fundo Nacional de Assistência Social – FNAS, gerido pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

2. Ainda que o convênio celebrado entre Estado e Município faça alusão à liberação de recursos na mesma proporção de repasses recebidos pelo Estado do Fundo Nacional de Assistência Social – FNAS, se suas cláusulas (sexta e oitava) afirmam, taxativamente, que o valor destinado à execução do convênio será proveniente de recursos da dotação orçamentária estatal e, em menor parte, de recursos próprios do Município, afirmando, ainda, que as contas deverão ser prestadas perante a Secretaria de Estado, não há como se relacionar a verba envolvida nos delitos objeto da ação penal com valores provenientes do Governo Federal.

3. O emprego irregular de verbas recebidas pela municipalidade em decorrência de convênios firmados com entidades não elencadas no art. 109, IV, da Constituição Federal, não implica em ofensa a bens ou interesses da União, de suas autarquias ou empresas públicas, o que afasta a competência da Justiça Federal para apuração dos fatos.

4. Conflito conhecido, para declarar competente para julgamento da ação penal em exame o Juízo de Direito da Vara criminal de Pau dos Ferros/RN, o Suscitante.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima in-dicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de

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Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito e declarar competente o Sus-citante, Juízo de Direito da Vara Criminal de Pau dos Ferros/RN, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Antonio Saldanha Palheiro, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Maria Thereza de Assis Moura, Jorge Mussi, Rogerio Schietti Cruz e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 23 de novembro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

Cuida-se de conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo de Direito da Vara Criminal de Pau dos Ferros/RN (e-STJ fls. 380/386) em face de decisão do Juízo Federal da 12ª Vara da Subseção Judiciária de Pau dos Ferros – SJ/RN (e-STJ fls. 356/358) que se reputou incompetente para julgar ação penal (nº 0000540-94.2011.4.05.8404 – numeração da Justiça Federal; ou nº 0102688-87.2014.8.20.0108 – numeração da Justiça Estadual) na qual Antô-nio Nunes Neto e outros são acusados da prática, no ano de 2001, dos crimes descritos no art. 89 da Lei nº 8.666/1993 (Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades perti-nentes à dispensa ou à inexigibilidade) em concurso material com o art. 297 do Código Penal (falsificação de documento público).

De acordo com a denúncia (e-STJ fls. 290/302), os acusados teriam fraudado o processo licitatório nº 002-A/2001, destinado à aquisição de gê-neros alimentícios para manutenção das Creches Comunitárias do Municí-pio de Água Nova/RN, com o objetivo de justificar a contratação direta das empresas Francisco Xavier Gomes Merceeiro – ME, C. C. de O. Neta Lopes, E. T. Diniz – ME, Antenor Fernandes Neto, Vicente Moisés de Queiroz Filho – ME, Jocelmo de Oliveira Segundo – ME, Supermercados do Oeste Ltda., José Reginaldo Fernandes Aquino e Reginaldo de Albuquerque Nunes – EPP.

O Juízo suscitado (da Justiça Federal), acolhendo parecer do Parquet Federal, declinou de sua competência ao fundamento de que o delito de fal-sificação de licitação envolveu apenas verba estadual.

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Por sua vez, o Juízo suscitante (da Justiça Estadual) defende que, ape-sar de a verba do Programa de Manutenção e Operacionalização de Creches Comunitárias/Assistência Infantil ser repassada aos Municípios pelo Esta-do do Rio Grande do Norte, ela tem origem federal, “pois advém do Fundo Nacional de Assistência Social – FNAS, o qual é gerido pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome” (e-STJ fls. 382/383), como se vê das Cláusulas I, d, e Sétima do Convênio entre a Secretaria de Estado e o Município (e-STJ fls. 344/349).

Aduz que, “Não obstante o escalonamento de destino da verba públi-ca, passando por diversos entes públicos – denominado “fundo-a-fundo”, tal fato não altera em nada a substância e a origem do valor financeiro, devendo, inclusive, ser alvo da fiscalização do Tribunal de Contas da União” (e-STJ fl. 383), fato esse que atrai a competência da Justiça Federal.

Instado a se manifestar sobre a controvérsia, o órgão do Ministério Pú-blico Federal que atua perante esta Corte opinou (e-STJ fls. 401/404) pela competência do Juízo Estadual, o Suscitante, em parecer assim ementado:

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – DISPENSA INDEVIDA DE LICITA-ÇÃO PELA PREFEITURA MUNICIPAL DE ÁGUA NOVA/RN – CON-VÊNIO FIRMADO ENTRE ENTIDADES NÃO MENCIONADAS NO ART. 109, IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL

1. A dispensa indevida de licitação que envolve verbas repassadas para o Município de Água Nova/RN, em decorrência de convênio firmado com entidade não elencada no art. 109, IV, da Constituição Federal, não implica em ofensa a bens ou interesses da União, de suas autarquias ou empresas públicas, o que afasta a competência da Justiça Federal.

2. Parecer pelo conhecimento do conflito para que seja declarada a compe-tência do Juízo Suscitante.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca (Relator):

O conflito merece ser conhecido, uma vez que os Juízos que suscitam a incompetência estão vinculados a Tribunais diversos, sujeitando-se, portan-to, à jurisdição desta Corte, a teor do disposto no art. 105, inciso I, alínea d, da Constituição Federal.

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Questiona-se, nos autos, se a verba envolvida nos delitos objeto da ação penal (fraude de licitação e falsificação de documento público) e repassada, por meio de convênio, pela Secretaria do Estado do Rio Grande do Norte a Município, contém, ou não recursos, provenientes do Fundo Nacional de Assistência Social – FNAS, gerido pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Ora, examinando-se o texto do Convênio nº 002/2002 (e-STJ fls. 344/349), celebrado entre o Estado do Rio Grande do Norte, por meio de sua Secretaria de Estado da Ação Social (Seas), de um lado, e o Município de Água Nova/RN, de outro, vê-se que ele tinha por objeto “o funcionamento do Programa de Manutenção e Operacionalização de Creches Comunitárias/Assistência Infantil” (Cláusula Primeira), por meio de “atividades nas áreas de atendimento nutricional e pedagógico e desenvolvimento físico e psico-motor de acordo com a idade e desenvolvimento da criança” (Cláusula Se-gunda).

É bem verdade que, nas Cláusulas Quarta (I, d) e Sétima do menciona-do Convênio, há menção de recebimento, pelo Governo do Rio Grande do Norte, de recursos provenientes do Fundo Nacional de Assistência Social – FNAS. Confira-se a literalidade do teor das referidas Cláusulas:

CLÁUSULA QUARTA – DAS OBRIGAÇÕES DAS PARTES

Constituem obrigações das partes:

I – DA SEAS:

[...]

d) transferir à entidade os recursos financeiros consignados na Cláusula Sé-tima do presente convênio, proporcionalmente às liberações do FNAS para o Feas/RN; (grifei)

CLÁUSULA SÉTIMA – DA LIBERAÇÃO DOS RECURSOS

Os recursos de que trata a cláusula anterior serão repassados às entidades convenentes em parcelas, proporcionais aos repasses do Governo Federal para o Fundo Estadual de Assistência Social – Feas, observando:

[...]

(grifei)

No entanto, tanto a Cláusula Sexta quanto a Cláusula Oitava do Con-vênio deixam claro que os recursos utilizados no Programa de Manutenção e

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Operacionalização de Creches Comunitárias/Assistência Infantil são oriun-dos, em sua totalidade, de verbas estaduais e municipais e que a prestação de contas dos seus valores é feita junto ao Estado do Rio Grande do Norte. Veja-se o teor das duas Cláusulas:

CLÁUSULA SEXTA – DO VALOR E DA DOTAÇÃO

Para execução deste convênio serão destinados, no presente exercício, re-cursos da ordem de R$ 22.693,33 (vinte e dois mil, seiscentos e noventa e três reais e trinta e três centavos), sendo da concedente o valor de R$ 20.424,00 (vinte mil, quatrocentos e vinte e quatro reais), procedente da Dotação Or-çamentária 26.132.08.243.049.2797 – Programa Manutenção e Operacionaliza-ção de Creches Comunitárias/Assistência Infantil; elemento de despesa 3340-41 – Transferência a Município/Contribuição; Fonte 190 – Recursos de Convênios, constante no OGE/2002/Feas, e RS 2.269,33 (dois mil, duzentos o sessenta e novo reais e trinta e três centavos), procedente de recursos próprios da convenente, a titulo de contrapartida, a serem aplicados conforme detalha-do no Plano de Trabalho, em anexo, parte Integrante deste Instrumento. (grifei)

CLÁUSULA OITAVA – DA PRESTAÇÃO DE CONTAS

A Entidade prestara contas à Seas, que enviará a Controladora-Geral do Esta-do, após análise e aval da CPCI, nos moldes das Instruções especificas do Tribunal de Contas, dos recursos repassados durante este exercido até 30 (trinta) dias após o término da vigência deste instrumento, observando as suas eventuais prorrogações, e será constituída dos seguintes documentos: (grifei)

De se concluir, como bem ponderou o parecer ministerial, que “O em-prego irregular de verbas recebidas pela [...] municipalidade em decorrência de convênios firmados com entidades não elencadas no art. 109, IV, da Cons-tituição Federal, não implica em ofensa a bens ou interesses da União, de suas autarquias ou empresas públicas, o que afasta a competência da Justiça Federal para apuração dos fatos” (e-STJ fl. 403).

Ante o exposto, conheço do conflito, para declarar competente para julgamento da ação penal em exame o Juízo de Direito da Vara criminal de Pau dos Ferros/RN, o Suscitante.

É como voto.

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Ministro Reynaldo Soares da Fonseca Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA SEÇÃO

Número Registro: 2016/0281931-4 Processo Eletrônico CC 149.464/RN

Matéria criminal

Números Origem: 00005409420114058404 01026888720148200108 1026888720148200108 5409420114058404

Em Mesa Julgado: 23.11.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Eitel Santiago de Brito Pereira

Secretário: Bel. Gilberto Ferreira Costa

AUTUAÇÃO

Suscitante: Juízo de Direito da Vara Criminal de Pau dos Ferros/RN

Suscitado: Juízo Federal da 12ª Vara de Pau dos Ferros – SJ/RN

Interes.: Justiça Pública

Interes.: Antonio Nunes Neto

Interes.: Manoel Gomes Rego

Interes.: Oseas Pinheiro

Interes.: Antonio Avanilson Ferreira Lima

Interes.: Francisco Xavier Gomes

Interes.: Cantidia Carlos de Oliveira Neta Lopes

Interes.: Erivan Teixeira Diniz

Interes.: Antenor Fernandes Neto

Interes.: Vicente Moises de Queiroz Filho

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Revista JuRídica 470JuRispRudência penal

dezembRo/2016

Interes.: Jocelmo Oliveira Segundo

Interes.: Maria Francielma de Almeida

Interes.: Jose Reginaldo Fernandes Aquino

Interes.: Reginaldo de Albuquerque Nunes

Interes.: Maria do Socorro Rabelo Dantas

Interes.: Fabiano Augusto Rabelo Dantas

Interes.: Creso Venancio Dantas

Assunto: Direito Penal

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Terceira Seção, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Seção, por unanimidade, conheceu do conflito e declarou competente o Suscitante, Juízo de Direito da Vara Criminal de Pau dos Ferros/RN, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Ribeiro Dantas, Antonio Saldanha Palheiro, Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Maria Thereza de Assis Moura, Jorge Mussi, Rogerio Schietti Cruz e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior.

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TrF 1ª r.Tribunal regional Federal da 1ª região

Habeas Corpus nº 0061397-36.2016.4.01.0000/MGProcesso na Origem: 201745220164013800Relator(a): Desembargador Federal Ney BelloImpetrante: MG00149959 – Raphael Moraes CordeiroImpetrado: Juízo Federal da 4ª Vara – MGPaciente: Jose Cleuto de Oliveira Almeida

EMENTA

ProCeSSo PenAl – hABeAS CorPuS – ContrABAndo – Art. 334-A do CÓdigo PenAl – 6.400 (SeiS mil

e quAtroCentoS) PACoteS de CigArro – queBrA de FiAnÇA – reinCidÊnCiA – reForÇo

do vAlor ArBitrAdo – hiPoSSuFiCiÊnCiA nÃo ComProvAdA – ordem denegAdA

1. “A determinação de reforço da fiança, por si só, estando bem fundamentada e justificada, não implica constrangimento ilegal passível de correção pela via processual do habeas corpus” (HC 0061934-03.2014.4.01.0000/GO, 4ª T., Relª Juíza Federal Rosimayre Gonçalves de Carvalho (Convocada), e-DJF1 de 04.11.2015).

2. In casu, o ora paciente, após ser flagrado comercializando 6.400 (seis mil e quatrocentos) maços de cigarros contrabandeados, pagou o valor arbitrado em primeiro momento – 2 (dois) salários mínimos –, resultando na expedição do alvará de soltura em seu favor. Não obstante, em 28.08.2016, aproximadamente, 4 (quatro) meses após o primeiro flagrante, o Ministério Público Federal protocolizou petição solicitando a revogação da liberdade provisória do paciente, tendo em vista nova prisão em flagrante, pelos mesmo fatos.

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Revista JuRídica 470JuRispRudência penal

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3. Não obstante a alegação, não comprovada, de incapacidade financeira do paciente para arcar com o complemento de fiança arbitrado, tendo em vista sua reincidência, não se verifica ilegalidade, teratologia ou abuso de poder por parte da autoridade apontada como coatora, de modo a afastar os termos da decisão impugnada.

4. O paciente não colacionou aos autos documentos suficientes para corroborar suas alegações, sendo insuficiente a simples consulta ao sítio da Receita Federal do Brasil.

5. Ordem de habeas corpus denegada.

ACÓRDÃO

Decide a Turma, à unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus.

Terceira Turma do TRF da 1ª Região.

Brasília, 23 de novembro de 2016.

Desembargador Federal Ney Bello Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Ney Bello (Relator):

Raphael Moraes Cordeiro impetra ordem de habeas corpus em favor de José Cleuto de Oliveira Almeida, contra decisão do Juízo Federal da 4ª Vara Criminal da Seção Judiciária de Minas Gerais, que determinou o complemen-to da fiança já paga, em 3 (três) salários mínimos.

Aduz a parte impetrante que, apesar do ora paciente possuir residência fixa, ocupação lícita e ser primário, teve sua prisão em flagrante homologada e convertida em preventiva pela suposta conduta prevista no art. 334-A do Código Penal.

Sustenta que teve seu pedido de liberdade provisória concedido, me-diante o pagamento de fiança no montante de 2 (dois) salários mínimos. Va-lor este que foi pago, resultando na expedição do alvará de soltura em favor do ora paciente.

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Alega, ainda, que apesar das condições financeiras do paciente – gar-çom – e de sua família, o Juízo de origem determinou o reforço da fiança, no valor de 3 (três) salários mínimos para complemento.

Afirma não ter condições de arcar com a fiança arbitrada e ser elegível para a liberdade provisória, inclusive, sem o recolhimento de fiança.

Pugna para que “seja revogado o despacho do Juiz da 4ª Vara Criminal da Comarca de Belo Horizonte, após as informações prestadas pela autoridade coatora, sendo definitivamente concedida a ordem, confirmando-se a liminar como medida de justiça” (fl. 6).

Informações prestadas pelo Juízo a quo às fls. 12/13v.

Decisão de fls. 15/20 indeferiu a liminar.

Parecer da Procuradoria Regional da República da 1ª Região, às fls. 22/25, pela denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Ney Bello (Relator):

A parte impetrante pretende a concessão da ordem de habeas corpus, em favor de José Cleuto de Oliveira Almeida, contra decisão que determinou o complemento da fiança já paga, em 3 (três) salários mínimos.

No mérito, ao custodiado, ora paciente, é atribuída a prática do delito tipificado no art. 334-A, § 1º, IV do Código Penal, conforme consta das infor-mações prestadas pelo Juízo a quo – cópia às fls. 12/13v. Estatui o referido dispositivo legal:

Código Penal:

Dos Crimes Praticados por Particular Contra a Administração em Geral

Contrabando

Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem:

[...]

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IV – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira;

Compulsando a documentação juntada aos autos, constato que o pa-ciente foi preso em flagrante delito, no dia 19.04.2016, quando surpreendido comercializando aproximadamente 6.400 (seis mil e quatrocentos) maços de cigarro contrabandeados.

A prisão em flagrante foi homologada e convertida em preventiva no dia 20.04.2016. No dia 20.05.2016, foi proferida nova decisão, deferindo ao paciente a liberdade provisória mediante o pagamento de fiança e cumpri-mento de outras medidas cautelares. Conforme extrai-se das informações prestadas pelo Juízo a quo, às fls. 12/13v, in verbis:

“Cuida-se de feito original de prisão em flagrante, lavrada em desfavor do paciente, na data de 19.04./2016, por suposta infração ao art. 334-A, § 1º, IV, do CP, eis que surpreendido comercializando aproximadamente 6.400 (seis mil e quatrocentos) maços de cigarro contrabandeados. Na comunicação do flagrante, a Autoridade Policial representou pela decretação da prisão preventiva do paciente.

[...]

Em regime de plantão, foi proferida a decisão de fls. 48/49, decretando a prisão preventiva do paciente e o mandado de prisão devidamente cumpri-do em 25.04.2016.

[...]

Proferida nova decisão, aos 20.05.2016, deferindo ao paciente o benefício da liberdade provisória, tendo em vista o excesso de prazo na formação da culpa, mediante o cumprimento das seguintes condições:

– Comparecimento a todos os atos do processo;

– Pagamento de fiança arbitrada em 2 salários mínimos; e

– Comparecimento bimestral em secretaria, para informar e justificar suas atividades.

[...]

Recolhido o valor da fiança e assinado o termo de compromisso, o alvará de soltura foi cumprido em favor do paciente em 21.05.2016.

[...]

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Ocorre que, na data de 09.09.2016, o Ministério Público Federal protocoli-zou petição, comunicando nova prisão em flagrante do paciente ocorrida no dia 28.08.2016 (APF 51435-35.2016.4.01.3800 – 35ª Vara Federal desta SJMG), pelos mesmos fatos, requerendo a revogação da sua liberdade pro-visória.

[...]

Destarte, este Juízo proferiu a decisão de fls. 107/108, em 21.09.2016, deter-minando o reforço da fiança, no valor de 3 salários mínimos, [...].

[...]

A defesa foi intimada na data de 27.09.2016 e o paciente foi pessoalmente intimado em 29.09.2016, dos termos da decisão.

[...]

Por fim, informo a Vossa Excelência que transcorreu in albis o prazo con-cedido, importando na expedição aos 08.10.2016 do respectivo mandado de prisão em desfavor do paciente, o qual se encontra aguardando cum-primento.”

Nos termos da fundamentação esposada pelo magistrado a quo, tam-bém não verifico nos autos motivos reais e concretos que indiquem a neces-sidade de imposição de tão grave medida – prisão preventiva –, pois o delito não foi praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, nem é daqueles que causam clamor público de forma que representa qualquer risco social co-locação da ora paciente em liberdade, mediante o cumprimento de medidas cautelares.

Ademais, vejo que o ora paciente pagou o valor arbitrado em primeiro momento – 2 (dois) salários mínimos –, resultando na expedição do alvará de soltura em seu favor. Não obstante, em 28.08.2016, aproximadamente, 4 (quatro) meses após o primeiro flagrante, o Ministério Público Federal proto-colizou petição solicitando a revogação da liberdade provisória do paciente, tendo em vista nova prisão em flagrante, pelos mesmo fatos.

Diante disso, o Juízo a quo arbitrou a fiança em 5 (cinco) salários míni-mos, exigindo o complemento dos 3 (três) salários mínimos restantes.

Dessa forma, a despeito da alegação de incapacidade financeira para arcar com o complemento de fiança arbitrado, tendo em vista sua reincidên-cia, não antevejo ilegalidade, teratologia ou abuso de poder por parte da au-

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toridade apontada como coatora, de modo a afastar os termos da decisão impugnada.

Nesse sentido, jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

PENAL – PROCESSO PENAL – HABEAS CORPUS – ESTELIONATO MA-JORADO – PRISÃO PREVENTIVA – SOLTURA – REFORÇO DE FIANÇA – PRESENÇA DOS ARTS. 319, 321, 325 E 326, TODOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – DECISÃO FUNDAMENTADA – HABEAS CORPUS DENEGADO

Omissis.

2. O reforço de fiança encontra-se suficientemente fundamentado na ca-pacidade econômica do paciente e extensão do dano estimado aos cofres públicos, de forma que devem ser mantidas as medidas impostas ao pa-ciente em substituição à prisão preventiva previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, conforme o disposto no art. 321, 325 e 326, todos do Código de Processo Penal.

3. A determinação de reforço da fiança, por si só, estando bem fundamentada e justificada, não implica constrangimento ilegal passível de correção pela via pro-cessual do habeas corpus.

4. Habeas corpus denegado. Liminar revogada.

(HC 0061934-03.2014.4.01.0000/GO, 4ª T., Relª Juíza Federal Rosimayre Gonçalves de Carvalho (convocada), e-DJF1 de 04.11.2015 – destaques nossos)

Soma-se a esse entendimento, o seguinte dispositivo expresso de lei:

Art. 340. Será exigido o reforço da fiança:

[...]

III – quando for inovada a classificação do delito.

Parágrafo único. A fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada.

(Código Penal, Lei nº 3689, de 03 de outubro de 1941 – destaque nosso)

Sobre o artigo supracitado, destaca Renato Brasileiro de Lima:

“Caso não haja o reforço da fiança, a fiança será considerada sem efeito e o réu poderá ser recolhido à prisão, desde que presentes os pressupostos que autorizam a

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prisão preventiva (CPP, arts. 312 e 313). Advirta-se, mais uma vez, que esse recolhimento à prisão não pode ser tido como automático, devendo antes o magistrado verificar a possibilidade de imposição de medida cautelar diversa da prisão.

(in Manual de processo penal. 4. ed. JusPodium, 2016, p. 1519/1520 – desta-que nosso)

Por oportuno, transcrevo, ainda, excertos do bem lançado parecer mi-nisterial (fls. 22/25), litteris:

“Pois bem, fica claro do trecho da decisão atacada [...] que, ao contrário do que o impetrante tenta fazer crer, o ato exarado pelo juiz impetrado impôs ao paciente uma situação mais favorável dentre aquelas previstas pelo Có-digo de Processo Penal: podendo decretar a prisão preventiva do paciente, optou o magistrado a quo por reforçar uma fiança que fora quebrado por aquele.

[...]

Ora, foi exatamente isso o que aconteceu: após ser preso em flagrante e ter tido sua prisão preventiva decretada, pela prática do crime tipificado no art. 334-A, § 1º, IV, do CP, e de ter sido posto em liberdade provisória, me-diante o cumprimento de determinadas condições, dentre elas, o pagamen-to de fiança arbitrada em 2 salários mínimos, o paciente, já livre, tornou a cometer a mesma infração penal dolosa que gerara seu encarceramento anterior, e, por isso, foi preso, mais uma vez.

[...]

Portanto, seria cabível, além da perda da metade do valor da fiança origi-nalmente arbitrada, a imposição de outras medidas cautelares, podendo, inclusive, ser decretada a prisão preventiva, sendo que o órgão ministerial de primeiro grau requereu exatamente a revogação da liberdade provisória concedida ao paciente.

[...]

No entanto, houve por bem o juízo impetrado, com fundamento nos arts. 326 e 340, I, ambos do CPP, proceder ao reforço da fiança.

[...]

De outra parte, quanto à alegada impossibilidade de o paciente arcar com o acréscimo de 3 salários mínimos à fiança original, caberia a ele comprová-

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-lo, já que o habeas corpus trata-se de ação constitucional que exige prova pré-constituída.

[...]

Todavia, limitou-se o impetrante a trazer informações, extraídas do site da Receita Federal na internet, dando conta de que não constam da base de dados do citado órgão as declarações de imposto de renda pessoa física referentes a 2015 e 2016.

[...]

Tal, porém, não faz prova da condição financeira do paciente, mas, somen-te, do fato de que ele não apresentou as declarações de imposto de renda referentes aos anos-calendários de 2014 e 2015, o que pode decorrer de ele não haver obtido renda nesses anos, de a renda obtida não ser tributável, de a renda obtida, embora tributável, ter advindo de atividade informal, não declarada, ou de omissão pura e simples.

[...]

Importante destacar que o impetrante sequer fez prova de que o paciente teve, conforme alegado na impetração, dificuldades em arrecadar os dois salários mínimos necessários ao pagamento do valor original da fiança.

[...]

Desse modo, não se desincumbindo a defesa de demonstrar a impossibi-lidade de o paciente arcar com o valor correspondente ao do reforço da fiança, e não tendo esse reforço sido pago no prazo fixado pelo magistrado a quo, o recolhimento daquele à prisão é a medida legalmente prevista, con-forme disposto no parágrafo único do art. 340 do CPP.”

Anoto, ainda, que o paciente não colacionou aos autos documentos su-ficientes para corroborar suas alegações, sendo insuficiente a simples consul-ta ao sítio da Receita Federal do Brasil.

Portanto, pela análise dos autos, não antevejo qualquer motivo para cassar a decisão impugnada.

Ante o exposto, denego a ordem de habeas corpus.

É o voto.

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DECISÃO

Raphael Moraes Cordeiro impetra ordem de habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de José Cleuto de Oliveira Almeida, contra decisão do Juízo Federal da 4ª Vara Criminal da Seção Judiciária de Minas Gerais, que determinou o complemento da fiança já paga, em 3 (três) salários mínimos.

Aduz a parte impetrante que, apesar do ora paciente possuir residência fixa, ocupação lícita e ser primário, teve sua prisão em flagrante homologada e convertida em preventiva pela suposta conduta prevista no art. 334-A do Código Penal.

Sustenta que teve seu pedido de liberdade provisória concedido, me-diante o pagamento de fiança no montante de 2 (dois) salários mínimos. Va-lor este que foi pago, resultando na expedição do alvará de soltura em favor do ora paciente.

Alega, ainda, que apesar das condições financeiras do paciente – gar-çom – e de sua família, o Juízo de origem determinou o reforço da fiança, no valor de 3 (três) salários mínimos para complemento.

Afirma não ter condições de arcar com a fiança arbitrada e ser elegível para a liberdade provisória, inclusive, sem o recolhimento de fiança.

Pugna pela concessão da liminar para que seja suspenso o pedido de reforço da fiança, evitando que o ora paciente seja preso antes da decisão em definitivo do presente writ e, por fim, “seja revogado o despacho do Juiz da 4ª Vara Criminal da Comarca de Belo Horizonte, após as informações prestadas pela au-toridade coatora, sendo definitivamente concedida a ordem, confirmando-se a liminar como medida de justiça” (fl. 6).

Informações prestadas pelo Juízo a quo às fls. 12/13v.

É o breve relatório. Decido

A parte impetrante pretende obter liminar em habeas corpus, em favor de José Cleuto de Oliveira Almeida, contra decisão que determinou reforço do montante da fiança, já paga, em 3 (três) salários mínimos.

Da análise da documentação carreada aos autos, constato que o ora pa-ciente foi preso em flagrante comercializando aproximadamente 6.400 (seis mil e quatrocentos) maços de cigarro contrabandeados, incorrendo no delito previsto no art. 334-A, § 1º, IV do Código Penal.

Estatui o referido dispositivo legal, litteris:

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Código Penal:

Dos Crimes Praticados por Particular Contra a Administração em Geral

Contrabando

Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida:

Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem:

[...]

IV – vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira;

De acordo com o STJ, “a concessão de liminar em habeas corpus é medida de caráter excepcional, cabível apenas quando a decisão impugnada estiver eivada de ilegalidade flagrante, demonstrada de plano” (HC 245.975/MG, 5ª T., Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, DJe de 07.12.2012). No mesmo sen-tido, confira-se o RHC 36.497/RJ, Sexta Turma, Rel. Desembargadora Marilza Maynard (Convocada do TJ/SE), DJe de 01.08/2013 e o AgRg-AREsp 419.225/SP, 6ª T., Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de 07.10.2014).

Como já decidiu esta Terceira Turma no HC 20.644/MT, Rel. Des. Fed. Plauto Ribeiro, “o pedido de liminar, formulado em sede de habeas corpus, é instrumento muito utilizado pelos advogados e aceito pelos tribunais e pela doutrina, embora não exista previsão legal para a sua concessão, razão pela qual o seu deferimento deve revestir-se, sempre, de cautelas redobradas, na medida em que, por não haver previsão na legislação processual penal em vi-gor, não existe, também, recurso contra a decisão que aprecia tal postulação”.

Das informações prestadas pelo Juízo a quo, às fls. 12/13v, destaco, in verbis:

“Cuida-se de feito original de prisão em flagrante, lavrada em desfavor do paciente, na data de 19.04.2016, por suposta infração ao art. 334-A, § 1º, IV, do CP, eis que surpreendido comercializando aproximadamente 6.400 (seis mil e quatrocentos) maços de cigarro contrabandeados. Na comunicação do flagrante, a Autoridade Policial representou pela decretação da prisão preventiva do paciente.

[...]

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Em regime de plantão, foi proferida a decisão de fls. 48/49, decretando a prisão preventiva do paciente e o mandado de prisão devidamente cumpri-do em 25.04.2016.

[...]

Proferida nova decisão, aos 20.05.2016, deferindo ao paciente o benefício da liberdade provisória, tendo em vista o excesso de prazo na formação da culpa, mediante o cumprimento das seguintes condições:

– Comparecimento a todos os atos do processo;

– Pagamento de fiança arbitrada em 2 salários mínimos; e

– Comparecimento bimestral em secretaria, para informar e justificar suas atividades.

[...]

Recolhido o valor da fiança e assinado o termo de compromisso, o alvará de soltura foi cumprido em favor do paciente em 21.05.2016.

[...]

Ocorre que, na data de 09.09.2016, o Ministério Público Federal protocoli-zou petição, comunicando nova prisão em flagrante do paciente ocorrida no dia 28.08.2016 (APF 51435-35.2016.4.01.3800 – 35ª Vara Federal desta SJMG), pelos mesmos fatos, requerendo a revogação da sua liberdade pro-visória.

[...]

Destarte, este Juízo proferiu a decisão de fls. 107/108, em 21.09.2016, deter-minando o reforço da fiança, no valor de 3 salários mínimos, [...].

[...]

A defesa foi intimada na data de 27.09.2016 e o paciente foi pessoalmente intimado em 29.09.2016, dos termos da decisão.

[...]

Por fim, informo a Vossa Excelência que transcorreu in albis o prazo con-cedido, importando na expedição aos 08.10.2016 do respectivo mandado de prisão em desfavor do paciente, o qual se encontra aguardando cum-primento.”

Nos termos da fundamentação esposada pelo magistrado a quo, tam-bém não verifico nos autos motivos reais e concretos que indiquem a neces-

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sidade de imposição de tão grave medida – prisão preventiva –, pois o delito não foi praticado com violência ou grave ameaça à pessoa, nem é daqueles que causam clamor público de forma que representa qualquer risco social co-locação da ora paciente em liberdade, mediante o cumprimento de medidas cautelares.

Ademais, vejo que o ora paciente pagou o valor arbitrado em primeiro momento – 2 (dois) salários mínimos –, resultando na expedição do alvará de soltura em seu favor. Não obstante, em 28.08.2016, aproximadamente, 4 (quatro) meses após o primeiro flagrante, o Ministério Público Federal proto-colizou petição solicitando a revogação da liberdade provisória do paciente, tendo em vista nova prisão em flagrante, pelos mesmo fatos.

Diante disso, o Juízo a quo arbitrou a fiança em 5 (cinco) salários míni-mos, exigindo o complemento dos 3 (três) salários mínimos restantes.

Dessa forma, a despeito da alegação de incapacidade financeira para arcar com o complemento de fiança arbitrado, tendo em vista sua reincidên-cia, não antevejo ilegalidade, teratologia ou abuso de poder por parte da au-toridade apontada como coatora, de modo a afastar os termos da decisão impugnada.

Nesse sentido, jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

PENAL – PROCESSO PENAL – HABEAS CORPUS – ESTELIONATO MA-JORADO – PRISÃO PREVENTIVA – SOLTURA – REFORÇO DE FIANÇA – PRESENÇA DOS ARTS. 319, 321, 325 E 326, TODOS DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – DECISÃO FUNDAMENTADA – HABEAS CORPUS DENEGADO

Omissis.

2. O reforço de fiança encontra-se suficientemente fundamentado na ca-pacidade econômica do paciente e extensão do dano estimado aos cofres públicos, de forma que devem ser mantidas as medidas impostas ao pa-ciente em substituição à prisão preventiva previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, conforme o disposto nos arts. 321, 325 e 326, todos do Código de Processo Penal.

3. A determinação de reforço da fiança, por si só, estando bem fundamentada e justificada, não implica constrangimento ilegal passível de correção pela via pro-cessual do habeas corpus.

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4. Habeas corpus denegado. Liminar revogada.

(HC 0061934-03.2014.4.01.0000/GO, 4ª T., Relª Juíza Federal Rosimayre Gonçalves de Carvalho (Convocada), e-DJF1 de 04.11.2015 – destaques nossos)

Soma-se a esse entendimento, o seguinte dispositivo expresso de lei:

Art. 340. Será exigido o reforço da fiança:

[...]

III – quando for inovada a classificação do delito.

Parágrafo único. A fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada.

(Código Penal, Lei nº 3689, de 03 de outubro de 1941 – destaque nosso)

Anoto, ainda, que o paciente não colacionou aos autos documentos su-ficientes para corroborar suas alegações, sendo insuficiente a simples consul-ta ao sítio da Receita Federal do Brasil.

Ante o exposto, indefiro a liminar.

À Procuradoria Regional da República da 1ª Região.

Após, voltem-me conclusos os autos.

Intime-se. Publique-se.

Brasília, 27 de outubro de 2016.

Desembargador Federal Ney Bello Relator

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO SECRETARIA JUDICIÁRIA

56ª Sessão Ordinária do(a) Terceira Turma

Pauta de: Julgado em: 23.11.2016

HC 0061397-36.2016.4.01.0000/MG

Relator: Exmo. Sr. Desembargador Federal Ney Bello

Revisor: Exmo(a). Sr(a).

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Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargador Federal Ney Bello

Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Bruno Caiado De Acioli

Secretário(a): Cláudia Mônica Ferreira

Impte.: Raphael Moraes Cordeiro

Impdo.: Juízo Federal da 4ª Vara – MG

Pacte.: Jose Cleuto de Oliveira Almeida

Nº de Origem: 201745220164013800 Vara: 4ª

Justiça de Origem: Tribunal Regional Federal Estado/Com.: MG

SUSTENTAÇÃO ORAL CERTIDÃO

Certifico que a(o) egrégia(o) Terceira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Juiz Federal Klaus Kuschel (convocado para substituir a Exma. Sra. Desembargadora Federal Mônica Sifuentes, nos termos do Ato Presi nº 410, de 01.06.2016) e Juiz Federal Marcelo Rebello Pinheiro (convocado para substituir o Exmo. Sr. Desem-bargador Federal Mário César Ribeiro, nos termos do Ato Presi nº 1104, de 03.11.2016).

Brasília, 23 de novembro de 2016.

Cláudia Mônica Ferreira Secretário(a)

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TrF 4ª r.Tribunal regional Federal da 4ª região

Embargos Infringentes e de Nulidade nº 5001248-25.2014.4.04.7000/PRRelator: Des. Federal Leandro PaulsenEmbargante: Timoteo Schiefelbein SiqueiraProcurador: Ricardo Henrique Alves Giuliani (DPU) DPU109Embargante: Valdemir Zen da PaixaoAdvogado: Vanilton Soares da SilvaEmbargado: Ministério Público Federal

EMENTA

direito PenAl – moedA FAlSA – extrAvio – CondenAÇÃo

O extravio posterior do papel moeda não tem o condão de afastar a materialidade delitiva, plenamente comprovada durante a instrução probatória.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, de-cide a Egrégia 4ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maio-ria, negar provimento aos embargos infringentes e de nulidade, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 07 de julho de 2016.

Desembargador Federal Leandro Paulsen Relator

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RELATÓRIO

Cuida-se de embargos infringentes e de nulidade interpostos pelas de-fesas dos réus Timoteo Schiefelbein Siqueira (evento 53) e Valdemir Zen da Paixão (evento 55) contra acórdão proferido pela Oitava Turma desta Corte ementado nas seguintes letras (evento 46 – ACOR4):

DIREITO PENAL – PROCESSUAL PENAL – MOEDA FALSA – MA-TERIALIDADE – EXTRAVIO DAS CÉDULAS FALSAS EM PRIMEIRO GRAU – PERÍCIA – AUTORIA COMPROVADA – REINCIDÊNCIA

1. O eventual extravio das cédulas falsas não gera por consequência a con-clusão de inexistência de materialidade delitiva, se laudo pericial apreciou a cédula e comprovou sua falsidade, tendo-a como apta para atingir o bem jurídico tutelado.

2. A existência de manufatura para a falsificação de cédulas, em alta resolu-ção, comprovada por perícia de informática, reforça a conclusão em torno da capacidade de as cédulas falsas serem introduzidas em circulação com êxito.

3. Autoria demonstrada pela prova testemunhal e pelas circunstâncias da prática delitiva.

4. Não decorridos mais de cinco anos da data do término do cumprimento da pena, deve incidir a agravante consubstanciada na reincidência.

5. Apelações improvidas.

Os embargantes pugnam pela prevalência do voto vencido do Desem-bargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus (evento 46 – VOTO2), restando absolvidos os acusados em face da insuficiência de provas em relação à ma-terialidade delitiva.

O Ministério Público Federal apresentou contrarrazões (evento 62).

É o relatório.

À revisão.

Juiz Federal Convocado Adel Americo Dias de Oliveira Relator

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VOTO

A questão controversa nos autos cinge-se à configuração da materiali-dade do delito de moeda falsa nas hipóteses em que extraviado o numerário quando ainda pendente o julgamento definitivo do feito.

O voto majoritário, proferido pelo Juiz Federal Marcelo Cardozo da Silva, alicerça a caracterização da materialidade delitiva nos seguintes ele-mentos (evento 46 – VOTO3):

A materialidade do delito, a meu ver, resta plenamente demonstrada no laudo pericial nº 459.958, que comprovou a falsidade das cédulas apreen-didas, constante no evento 63 do IPL; aliás, há, também, laudo pericial no evento 59 do IPL que mostra, a partir da análise dos arquivos de mídia, como as cédulas eram possivelmente produzidas. Nas conclusões desse último laudo, consta que as “imagens de cédulas de cem reais e de seus elementos de segurança” eram, em grande parte, “em alta resolução”. Por-tanto, apreendidas as cédulas falsas e os equipamentos utilizados para o fabrico, com a realização dos dois laudos periciais, o extravio posterior do papel moeda não tem o condão de afastar a materialidade delitiva, plena-mente comprovada no caso concreto pelos documentos jungidos ao IPL, que foram confirmados ainda pela prova testemunhal produzida durante a instrução probatória.

No voto vencido, o Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus, em sentido contrário, assinala restar prejudicada a caracterização da materialidade em face do extravio do numerário, valendo-se, para tanto, dos seguintes fundamentos (evento 46 – VOTO2):

Sobre a materialidade delitiva do presente caso, entendo que algumas consi-derações devem ser feitas, tendo-se em conta não apenas o exame das notas – realizado por peritos qualificados –, mas também as peculiaridades que envolvem o presente feito.

Inicialmente, insta observar que a denúncia relata a apreensão de notas fal-sas de R$ 100,00 (cem reais), constando 02 (duas) no auto de exibição e apre-ensão com as seguintes alfanumerações: “A5863088043” e “A5863088048A” (evento 04 do IPL50385359020124047000). Ato contínuo, o laudo pericial nº 456.958-1 atestou a falsidade das cédulas (evento 63, idem).

Ainda, o auto de exibição e apreensão refere os seguintes objetos apreendi-dos na residência de Valdemir (evento 04, idem, “APREENSAO6”):

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“02 (duas) impressoras jato de tinta, marca Epson T25, com cabos; 01 (um) laptop, marca positivo Mobile Z580; 01 (uma) pasta contendo cédulas de dinheiro falsas, não concluídas; vários papéis colados que seriam utiliza-dos para falsificação de dinheiro; apetrechos, sendo 01 (um) rolo de bor-racha, 04 (quatro) espátulas de borracha, 03 (três) espátulas de espuma e 01 (um) tubo de cola branca; 01 (um) pendrive marca Kingston contendo o programa Corel Draw.”

Ocorre que, em que pese respeite entendimento diverso, não entendo sufi-cientemente comprovada a materialidade nesse caso específico.

Explico.

Da análise dos elementos probatórios constantes neste feito, ainda que pre-sentes o auto de prisão em flagrante lavrado pela Polícia Civil, o laudo pe-ricial nº 2100/2012 – Setec/SR/DPF/PR (perícia no notebook e no pendrive apreendidos), o laudo nº 456.958-1 (perícia nas notas falsas apreendidas), o auto de apreensão, bem como as declarações das testemunhas e dos réus (eventos 01 do IPL50385359020124047000, “P_FLAGRANTE6”, “APREEN-SÃO11”, “OUT8”, “OUT10”, 59 e 63, idem), verifico a ausência das notas falsas apreendidas nos autos.

Com efeito, tendo sido solicitada à origem a remessa das cédulas a esta Relatoria, foi informado pela 13ª Vara Federal de Curitiba que “após inú-meras diligências, a Secretaria deste Juízo infelizmente não obteve êxito em localizar as notas falsas que, ao que consta, nunca foram remetidas para a Justiça Federal” (evento 31).

De fato, ao observar os anexos eletrônicos relacionados no processo origi-nário, constato inúmeras tentativas no sentido de encontrar as contrafações apreendidas neste feito – informações oriundas do Centro de Operações Policiais Especiais (Cope), do Instituto de Criminalística do Paraná, da 12ª Vara Criminal do Estado do Paraná (antiga Vara de Inquéritos) e da Vara Federal de origem –, restando inexitosa a sua localização. Trata-se, pois, de hipótese de extravio de notas falsas referentes ao presente feito, não sendo possí-vel determinar em que momento ocorreu.

Pois bem.

O Código de Processo Penal, em seu art. 158 dispõe ser indispensável, em infrações que deixam vestígios, que seja realizado o exame de corpo de delito. O corpo de delito é a expressão do fato criminoso, e sua perícia é de suma importância para que o julgador venha a se instruir sobre o fato, de maneira que, convencido ou não pelas provas apresentadas, possa funda-

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mentar sua decisão. No caso em tela é necessário que haja a presença da moeda apreendida e sua devida análise para que seja comprovada a mate-rialidade do suposto feito.

Tratando-se de prova documental, de maneira nenhuma as cédulas apre-endidas poderiam ter sido destruídas enquanto não proferida decisão defi-nitiva, à luz do que afirma o art. 182 do Código de Processo Penal:

“O juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte.”

Destaco, a propósito, doutrina de Guilherme de Souza Nucci (Código de Processo Penal Comentado. 9. ed., Editora Revista dos Tribunais):

“Vinculação do juiz ao laudo pericial: é natural que, pelo sistema do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, adotado pelo Código, possa o magistrado decidir a matéria que lhe é apresentada de acordo com sua convicção, analisando e avaliando a prova sem qual-quer freio ou método previamente imposto pela lei. Seu dever é funda-mentar a decisão, dando-lhe, pois, respaldo constitucional. Por tal mo-tivo, preceitua o art. 182 que o juiz não está adstrito ao laudo, podendo acolher totalmente as conclusões dos expertos ou apenas parcialmente, além de poder rejeitar integralmente o laudo ou apenas parte dele. [...]”

Colaciono, a respeito, aresto da Sétima Turma deste Tribunal:

“PENAL – MOEDA FALSA – ART. 289, § 1º DO CÓDIGO PENAL – ELEMENTO NORMATIVO DO TIPO – JUÍZO DE VALORAÇÃO – ATIVIDADE JUDICANTE – LAUDO PERICIAL – FALSIFICAÇÃO GROSSEIRA – COMPETÊNCIA – A aferição do elemento normativo do tipo concernente à qualidade da falsificação não exige necessária conclusão por perito, devendo, ao contrário, ser avaliado pelo Juiz, interpretando a prova. Pode o magistrado, nessa tarefa, socorrer-se das impressões da perícia. Todavia, se a defesa debate a qualidade das cédulas, deve o magistra-do manifestar-se expressamente a respeito. Ao contrário dos elementos descritivos, o elemento normativo não se extrai da mera observação, sendo imprescindível um juízo de valoração jurídica, social, cultural, histórica, bem como de outros campos do conhecimento. Cabe ao juiz diferenciar, em um papel impresso, se é uma tentativa de falsificação do meio circulante, ou é uma tentativa de estelionato. Esse debate, sobre a qualidade da falsificação, é absolutamente necessário, nos ter-mos da Súmula nº 73 do Superior Tribunal de Justiça. (ACr 0000007-18.2007.404.7010, Rel. Des. Fed. Márcio Antônio Rocha, DJe 29.11.2011)”

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Ao serem extraviadas as cédulas apreendidas resta inviabilizada a análise de questões relevantes ao crime em questão, especialmente acerca da apti-dão ilusória das cédulas, o que afronta os princípios fundamentais do con-traditório e da ampla defesa. Com efeito, não sendo o laudo pericial prova absoluta, é direito do acusado contestar as provas produzidas durante o inquérito policial e durante a instrução, algo inviável considerando que o objeto do delito foi destruído.

O extravio da cédula extinguiu, assim, a própria materialidade do delito. Em hipótese análoga, já decidiu o egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

“DIREITO PROCESSUAL – PENAL – CORPO DE DELITO – SUPRES-SÃO – MATERIALIDADE – PRECARIEDADE – ABSOLVIÇÃO

I – Com a destruição da nota falsa determinada à fl. 08, retirou-se do complexo probatório o próprio corpo de delito, inviabilizando a análise da materialidade delitiva.

II – Estabelece o art. 182 do Código de Processo Penal: ‘o Juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte’.

III – Tratando-se de prova documental, que é o próprio corpo de delito, não poderia ter sido prematuramente destruída, pois necessária à ava-liação do recurso em julgamento.

IV – Mostrando-se precária a comprovação da materialidade, absolve--se o imputado com o supedâneo no art. 386, VI do Código de Processo Penal.

V – Apelação criminal provida. (ACr 1999.03.99.010095-3, Rel. Juiz Fed. Conv. Batista Gonçalvez, DJU 30.08.2000)”

Mutatis mutandis, já decidiu a Quarta Seção deste Regional, recentemente, que o magistrado não está restrito ao laudo pericial ao julgar e que a ausência do corpo de delito, no caso do crime de moeda falsa, leva à absolvição por ausência de materialidade:

“PENAL – PROCESSUAL PENAL – EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE – MOEDA FALSA – ART. 289, § 1º, DO CÓDIGO PE-NAL – DESTRUIÇÃO DAS CÉDULAS ENQUANTO NÃO PROFERI-DA DECISÃO DEFINITIVA – MATERIALIDADE – INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA – AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO – ABSOLVIÇÃO

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1. O exame pericial é imprescindível nos casos de delitos que deixam vestígios. No entanto, o julgador não pode se restringir ao laudo peri-cial ao julgar, podendo, inclusive, aceitá-lo ou rejeitá-lo, conforme os arts. 158 e 182, ambos do Código de Processo Penal.

2. Resta prejudicada a análise de questões atinentes ao crime, quando ocorrer a determinação de destruição do numerário inautêntico, en-quanto pendente de julgamento o recurso interposto, especialmente porque dificultado o conhecimento do réu sobre a inidoneidade da nota e sua aptidão em enganar, sob pena de afronta aos princípios funda-mentais do contraditório e da ampla defesa.

3. Destruídas as notas falsas, fica prejudicado o exame da materialidade delitiva, o que importa na inexistência da prova da prática delitiva.

4. Inexistindo prova da materialidade delituosa, a absolvição da ré é medida que se impõe, nos termos do art. 386, II, do Código de Processo Penal.” (EINUL 0003139-60.2005.404.7202, Rel. Des. Fed. Sebastião Ogê Muniz, DE 22.01.2015)

Ainda que o precedente paradigmático diga respeito à destruição das cé-dulas após a elaboração do laudo pericial, não diviso motivos para deixar de invocá-lo, até mesmo porque, no presente caso, o extravio do material apreendido impede, inclusive, o exame da tese de falsificação grosseira, não sendo possível concluir, ademais, que o magistrado de primeiro grau teve oportunidade de manusear as notas.

Por todas essas razões, enfim, entendo que o julgamento do presente re-curso está claramente prejudicado, não sendo possível, ao menos de minha parte, um aprofundamento do caso em tela, razão por que, em obséquio ao non liquet, devem os réus serem absolvidos, com base nos arts. 155 e 182, c/c 386, inciso II, todos do Código de Processo Penal.

As defesas dos acusados Timóteo e Valdemir pugnam pela prevalência do voto vencido.

Asseveram a ausência de comprovação em relação ao potencial lesivo das cédulas contrafeitas.

Aduzem restar inviabilizada a caracterização da materialidade, uma vez impossibilitado seu exame visual pelo julgador, bem como se apresen-tando inconclusivo no ponto o laudo pericial.

Pois bem.

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Nos termos do art. 182 do Código de Processo Penal, o laudo pericial não consiste em prova absoluta, não estando o juiz adstrito à observância de suas conclusões.

Assim, no que se refere à análise da materialidade delitiva, tem-se im-prescindível, nos delitos de moeda falsa, o exame ocular da cédula para o fim de que seja aferido pelo julgador o grau de sua inautenticidade.

O extravio do numerário quando ainda pendente o julgamento defini-tivo do feito inviabiliza a realização de tal exame, situação que atenta contra os princípios da ampla defesa e do contraditório.

Prejudica, outrossim, a contestação da prova pela defesa, o que reforça ainda o quadro de afronta aos referidos princípios.

Neste sentido, decidiu este Colegiado por ocasião do julgamento dos Embargos Infringentes nº 00031396020054047202.

PENAL – PROCESSUAL PENAL – EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE – MOEDA FALSA – ART. 289, § 1º, DO CÓDIGO PENAL – DESTRUIÇÃO DAS CÉDULAS ENQUANTO NÃO PROFERIDA DECI-SÃO DEFINITIVA – MATERIALIDADE – INSUFICIÊNCIA PROBATÓ-RIA – AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CON-TRADITÓRIO – ABSOLVIÇÃO

1. O exame pericial é imprescindível nos casos de delitos que deixam ves-tígios. No entanto, o julgador não pode se restringir ao laudo pericial ao julgar, podendo, inclusive, aceitá-lo ou rejeitá-lo, conforme os arts. 158 e 182, ambos do Código de Processo Penal.

2. Resta prejudicada a análise de questões atinentes ao crime, quando ocor-rer a determinação de destruição do numerário inautêntico, enquanto pen-dente de julgamento o recurso interposto, especialmente porque dificulta-do o conhecimento do réu sobre a inidoneidade da nota e sua aptidão em enganar, sob pena de afronta aos princípios fundamentais do contraditório e da ampla defesa.

3. Destruídas as notas falsas, fica prejudicado o exame da materialidade delitiva, o que importa na inexistência da prova da prática delitiva.

4. Inexistindo prova da materialidade delituosa, a absolvição da ré é medi-da que se impõe, nos termos do art. 386, II, do Código de Processo Penal.

(ENUL 00031396020054047202, 4ª S., Rel. Des. Fed. Sebastião Ogê Muniz, DE 21.01.2015)

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Merece, portanto, provimento a irresignação formulada pelas defesas dos acusados Timóteo e Valdemir, razão pela qual prestigio os fundamentos esposados no voto-vencido, proferido pelo Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus.

Comunique-se com urgência à Vara de origem para que expeça o com-petente alvará de soltura em relação ao acusado Valdemir Zen da Paixão, se por outro motivo não se encontrar preso.

Ante o exposto, voto por dar provimento aos embargos infringentes e de nulidade.

Juiz Federal Convocado Gilson Luiz Inácio Relator

VOTO DIVERGENTE

O Senhor Desembargador Leandro Paulsen: Peço vênia pra dissentir do e. Relator neste caso. Trata-se de crime de moeda falsa e as notas foram extraviadas no curso do processo, é verdade.

Mas chegou a ser produzida perícia conclusiva e a materialidade se-quer foi questionada na apelação.

Seguem as razões do voto que proferi, no ponto:

“O Eminente Relator concedeu habeas corpus de ofício para absolver os ape-lantes, com fundamento no art. 386, II, do CPP, entendendo que, extra-viadas as cédulas mendazes, restaria inviabilizada a análise de questões relevantes ao crime em questão, especialmente acerca do conhecimento dos réus sobre a inidoneidade das notas e sua aptidão em enganar, o que afronta os princípios fundamentais do contraditório e da ampla defesa. Aponta, ainda, que não sendo o laudo pericial prova absoluta, é direito dos acusados contestar as provas produzidas durante o inquérito policial e durante a instrução, algo inviável no presente caso diante do extravio das notas, que teria fulminado a própria materialidade delitiva.

Contudo, no caso concreto, nem mesmo, em suas muito bem apresentadas razões de recurso, a defesa põe em xeque a materialidade do delito.

A materialidade do delito, a meu ver, resta plenamente demonstrada no laudo pericial nº 459.958, que comprovou a falsidade das cédulas apreen-didas, constante no evento 63 do IPL; aliás, há, também, laudo pericial no

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evento 59 do IPL que mostra, a partir da análise dos arquivos de mídia, como as cédulas eram possivelmente produzidas. Nas conclusões desse último laudo, consta que as ‘imagens de cédulas de cem reais e de seus elementos de segurança’ eram, em grande parte, ‘em alta resolução’. Por-tanto, apreendidas as cédulas falsas e os equipamentos utilizados para o fabrico, com a realização dos dois laudos periciais, o extravio posterior do papel moeda não tem o condão de afastar a materialidade delitiva, plena-mente comprovada no caso concreto pelos documentos jungidos ao IPL, que foram confirmados ainda pela prova testemunhal produzida durante a instrução probatória.”

Desse modo, divirjo.

Dispositivo. Ante o exposto, voto por negar provimento aos embargos infringentes e de nulidade.

Desembargador Federal Leandro Paulsen

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07.07.2016

Embargos Infringentes e de Nulidade nº 5001248-25.2014.4.04.7000/PR

Origem: PR 50012482520144047000

Relator: Juiz Federal Gilson Luiz Inácio

Presidente: Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Procurador: Dra. Carla Veríssimo de Carli

Revisor: Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Embargante: Timoteo Schiefelbein Siqueira

Procurador: Ricardo Henrique Alves Giuliani (DPU) DPU109

Embargante: Valdemir Zen da Paixão

Advogado: Vanilton Soares da Silva

Embargado: Ministério Público Federal

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07.07.2016, na sequência 28, disponibilizada no DE de 17.06.2016, da qual foi intimado(a) o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

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Certifico que o(a) 4ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígra-fe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

O relator, Juiz Federal Gilson Luiz Inacio, votou no sentido de dar provi-mento aos embargos infringentes e de nulidade, no que foi acompanhado pelos Des. Federais Victor Luiz dos Santos Laus e Marcio Antonio Rocha. Divergiram os Des. Federais Leandro Paulsen, Claudia Cristina Cristofani e João Pedro Gebran Neto. Em face do empate, votou o presidente da se-ção, Des. Fed. Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, no sentido de ne-gar provimento aos embargos. Assim, a seção, por maioria, decidiu negar provimento aos embargos infringentes e de nulidade, nos termos do voto divergente do Des. Fed. Leandro Paulsen, que lavrará o acórdão.

Relator Acórdão: Des. Federal Leandro Paulsen

Votante(s): Juiz Federal Gilson Luiz Inácio Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Des. Federal Márcio Antônio Rocha Desª Federal Cláudia Cristina Cristofani Des. Federal João Pedro Gebran Neto Des. Federal Leandro Paulsen Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz

Ausente(s): Des. Federal Sebastião Ogê Muniz

Jaqueline Paiva Nunes Goron Diretora de Secretaria

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Destaque da Sessão – Processo Pautado

Réu Preso.

Divergência em 07.07.2016 11:09:59 (Gab. Des. Federal Leandro Paulsen)

DIVERGÊNCIA

Eminentes colegas, peço vênia pra dissentir do relator neste caso. Tra-ta-se de crime de moeda falsa e as notas foram extraviadas no curso do pro-cesso, é verdade.

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Mas chegou a ser produzida perícia conclusiva e a materialidade se-quer foi questionada na apelação.

Seguem as razões do voto que proferi, no ponto:

“O Eminente Relator concedeu habeas corpus de ofício para absolver os apelantes, com fundamento no art. 386, II, do CPP, entendendo que, extra-viadas as cédulas mendazes, restaria inviabilizada a análise de questões re-levantes ao crime em questão, especialmente acerca do conhecimento dos réus sobre a inidoneidade das notas e sua aptidão em enganar, o que afron-ta os princípios fundamentais do contraditório e da ampla defesa. Aponta, ainda, que não sendo o laudo pericial prova absoluta, é direito dos acusa-dos contestar as provas produzidas durante o inquérito policial e durante a instrução, algo inviável no presente caso diante do extravio das notas, que teria fulminado a própria materialidade delitiva.

Contudo, no caso concreto, nem mesmo, em suas muito bem apresentadas razões de recurso, a defesa põe em xeque a materialidade do delito.

A materialidade do delito, a meu ver, resta plenamente demonstrada no laudo pericial nº 459.958, que comprovou a falsidade das cédulas apreen-didas, constante no evento 63 do IPL; aliás, há, também, laudo pericial no evento 59 do IPL que mostra, a partir da análise dos arquivos de mídia, como as cédulas eram possivelmente produzidas. Nas conclusões desse último laudo, consta que as ‘imagens de cédulas de cem reais e de seus elementos de segurança’ eram, em grande parte, ‘em alta resolução’. Por-tanto, apreendidas as cédulas falsas e os equipamentos utilizados para o fabrico, com a realização dos dois laudos periciais, o extravio posterior do papel moeda não tem o condão de afastar a materialidade delitiva, plena-mente comprovada no caso concreto pelos documentos jungidos ao IPL, que foram confirmados ainda pela prova testemunhal produzida durante a instrução probatória.”

Desse modo, divirjo.

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EmEntário PEnal

Crime ContrA A AdminiStrAÇÃo PÚBliCA

31714 – “Processual penal. Habeas corpus. Crimes contra a administração pública. Orga-nização criminosa. Alegada ausência de fundamentação do decreto prisional. Segregação cautelar devidamente fundamentada na garantia da ordem pública e conveniência da ins-trução criminal. Ordem denegada. I – A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo, consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para as-segurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do art. 312 do Código de Processo Penal. A prisão preventiva, portanto, enquanto medida de natureza cautelar, não pode ser utilizada como instrumento de punição antecipada do indiciado ou do réu, nem permite complementação de sua fundamentação pelas instâncias superiores (HC 93.498/MS, 2ª T., Rel. Min. Celso de Mello, DJe de 18.10.2012). II – Na hipótese, todavia, o decreto prisional encontra-se devidamente fundamentado em dados extraídos dos autos, notadamente a existência de indícios de que a ora paciente, em tese, integraria organiza-ção criminosa voltada para a prática de delitos contra a administração pública. III – Ade-mais, não se pode olvidar que a r. decisão do Tribunal de origem asseverou a existência de indícios de que o ora paciente estaria escondendo documentos, dado que evidencia a indispensabilidade da prisão também por conveniência da instrução criminal (precedentes). IV – ‘A necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa, enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamen-tação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva’ (HC 95.024/SP, 1ª T., Relª Min. Cármen Lúcia, DJe de 20.02.2009). V – A presença de circunstâncias pessoais favoráveis, tais como primariedade, ocupação lícita e residência fixa, não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese. Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de apli-cação de medidas cautelares diversas da prisão. Ordem denegada.” (STJ – HC 370.885 – RS – (2016/0240224-9) – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJe 09.12.2016)

Nota:Passamos a comentar a íntegra que trata de paciente denunciado em decorrência das investigações da denominada Operação “Transfer”, como integrante de organização criminosa voltada para a prática de crimes contra a administração pública.Consta dos autos, que a ação foi deflagrada pelo Ministério Público, e teve como obje-tivo investigar suspeitas de desvio de dinheiro público e fraude em licitações no mu-nicípio gaúcho.

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O motivo da prisão foi que o prefeito teria tentado atrapalhar as investigações.No habeas corpus, a defesa alegou que tal fundamentação não seria idônea para justificar a segregação cautelar.O relator, ao analisar o voto, explicou que a prisão cautelar realmente deve ser medida excepcional, pois priva o réu de sua liberdade antes do trânsito em julgado da ação.A medida só se justifica quando é imprescindível para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal.Entretanto, para o relator, no caso analisado, não houve ilegalidade, pois a prisão cau-telar foi necessária para garantir a ordem pública.A defesa requereu, subsidiariamente, a substituição da prisão por medida cautelar di-versa, sob o fundamento de o réu ser primário, possuir ocupação lícita e residência fixa.A alegação não foi acolhida pela turma, que entendeu que os elementos citados não são suficientes para a aplicação de medidas diversas da prisão a réu contra o qual pesam fortes indícios de integrar um esquema criminoso envolvendo bens e dinheiro públicos.Vale trazer trecho do voto do relator:“Sobre o tema, cumpre colacionar o seguinte julgado proferido pelo col. Pretório Ex-celso:‘HABEAS CORPUS – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CAUTE-LAR IDÔNEA PARA A PRISÃO PREVENTIVA – AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMEN-TO ILEGAL – ORDEM INDEFERIDA – 1. Devem ser desconsiderados quaisquer funda-mentos que não tenham sido expressamente mencionados no decreto de prisão preventiva, pois, na linha da jurisprudência deste Supremo Tribunal, a idoneidade formal e substancial da motivação das decisões judiciais há de ser aferida segundo o que nela haja posto o juiz da causa, não sendo dado “ao Tribunal do habeas corpus, que a impugne, suprir-lhe as faltas ou complementá-la” (Habeas Corpus nº 90.064, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 22.06.2007; 79.248, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 12.11.1999; 76.370, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 30.04.1998). 2. A necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de or-ganização criminosa, enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva. 3. Ordem denegada’ (HC 95.024/SP, 1ª T., Relª Min. Cármen Lúcia, DJe de 20.02.2009).‘ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES – POSSE DA DROGA – PRESCINDIBILIDADE – PRISÃO PREVENTIVA – GARANTIA DA ORDEM PÚBLI-CA – REITERAÇÃO CRIMINOSA – PERICULOSIDADE DOS AGENTES – LEGA-LIDADE – RECURSO IMPROVIDO – A comprovação do crime de associação para o tráfico de entorpecentes (Lei nº 6.368/1976, art. 14) deu-se no presente caso por meio de gravações telefônicas e confissões extrajudiciais. Não é imprescindível a posse da droga para configuração desse crime. O decreto de prisão encontra-se devidamente fundamentado no resguardo da ordem pública, ante a necessidade de fazer cessar a rei-teração criminosa e em face da periculosidade dos agentes, fundada em fatos concretos, visto que há nos autos indícios de que a organização criminosa não se desfez. Recurso improvido’. (RHC 84847/SP, 2ª T., Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ de 03.06.2005).”Quanto à decretação da prisão preventiva, o CPP, ao regular o ponto, diz:“Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a apli-cação da Lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.”Em decisão unânime, o Superior Tribunal de Justiça negou a ordem.

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Crime de reSPonSABilidAde

31715 – “Agravo regimental no recurso extraordinário. Penal e processual penal. Crime previsto no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/1967. Crime de responsabilidade. Perda do cargo e inabilitação para exercício de cargo ou função pública. Penas autônomas em re-lação à pena privativa de liberdade. Prazos prescricionais distintos. Acórdão recorrido divergente da jurisprudência desta Suprema Corte. Agravo regimental desprovido.” (STF – AgRg-RE 912.894 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 25.11.2016)

denÚnCiA

31716 – “Agravo regimental em recurso especial. Arts. 149, caput, e 297, § 4º, ambos do Código Penal. Alegada inépcia da denúncia. Não ocorrência. Denúncia que atende aos requisitos do art. 41 do CPP. Agravo desprovido. I – A denúncia deve vir acompanha-da com o mínimo embasamento probatório, ou seja, com lastro probatório mínimo apto a demonstrar, ainda que de modo indiciário, a efetiva realização do ilícito penal por par-te do denunciado. Não se revela admissível a imputação penal destituída de base empíri-ca idônea, o que implica a ausência de justa causa a autorizar a instauração da persecutio criminis in iudicio. II – Na hipótese, contudo, não se vislumbra a alegada inépcia da denún-cia, porquanto a exordial acusatória preenche os requisitos exigidos pelo art. 41 do CPP, permitindo a compreensão dos fatos e possibilitando o amplo exercício do direito de defesa. III – Depreende-se da narrativa descrita na denúncia a conduta do ora recorrido, que, malgra-do não estar minudentemente individualizada, exsurge o mínimo de lastro e de nexo causal para a deflagração da persecução penal, pois, além de figurar como sócio da empresa, detinha a administração de fato das fazendas, contando inclusive com o apoio de gerentes em cada uma delas. Perscrutar se houve, de fato, qualquer tipo de ingerência – seja comissiva ou omis-siva – na contratação dos trabalhadores é matéria afeta ao mérito, que deverá ser aferida em posterior instrução probatória. Agravo Regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.424.003 – (2013/0401491-8) – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJe 23.11.2016)

emBriAgueZ Ao volAnte

31717 – “Apelação crime. Embriaguez ao volante (art. 306 do CTB). Procedência da de-núncia. Apelo da defesa. Pleito absolutório. Inviabilidade. Provas suficientes a demonstrar a autoria e a materialidade delitivas. Crime praticado na vigência da Lei nº 12.760/2012. Possibilidade de aferição da embriaguez por outros meios de prova. Testemunho de poli-ciais. Validade e relevância. Redução da pena-base ao seu mínimo legal. Não cabimento.

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Valoração desfavorável da circunstância judicial referente às consequências do crime. Co-lisão em muro devido ao estado de embriaguez, causando danos a terceiros. Pedido de re-dução da pena provisória aquém do mínimo legal, alegando preponderância da atenuante da confissão espontânea sobre a agravante prevista no art. 298, III, do CTB. Impossibilida-de compensação escorreita. Súmula nº 231 do STJ. Isenção das custas processuais. Justiça gratuita. Não conhecimento. Competência do juízo da execução. Recurso parcialmente co-nhecido, e na parte conhecida, desprovido. 1. ‘A Lei nº 12.760/2012 modificou o art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro, a fim de dispor ser despicienda a avaliação realizada para atestar a gradação alcoólica, acrescentando ser viável a verificação da embriaguez me-diante vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observa-do o direito à contraprova, de modo a corroborar a alteração da capacidade psicomotora. 2. No caso em apreço, praticado o delito na vigência da última modificação normativa, fato ocorrido em 12.12.2013, torna-se possível apurar o estado de embriaguez da acusada por outros meios de prova em direito admitidos [...]’ (STJ, RHC 49.296/RJ, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., J. 04.12.2014, DJe 17.12.2014). 2. Diante dos depoimentos dos policiais e das demais provas carreadas aos autos, resta devidamente demonstrada a prática do delito previsto no art. 306 da Lei nº 9.503/1997, havendo, assim, que ser manti-da a condenação do denunciado. 3. Constatada a ocorrência de abalroamento provocado exclusivamente pelo réu em virtude de seu avançado grau de embriaguez, tal circunstân-cia é suficiente para incidir um juízo de desvalor sobre a circunstância judicial referente às consequências do crime, na medida em que ultrapassam as consequências normais do delito do artigo do CTB. 4. ‘[...] É cabível a compensação, na segunda fase da dosimetria da pena, da circunstância agravante prevista no art. 298, III, do Código de Trânsito Brasileiro com a atenuante da confissão (art. 65, II, d, do Código Penal) [...]’ (TJPR, 2ª C.Crim., AC 1329295-8, Guaíra, Rel. José Mauricio Pinto de Almeida, Unânime, J. 25.06.2015). 5. Não há que ser conhecido o pedido de isenção das custas processuais ou relativo ao benefício da justiça gratuita, em razão de serem as matérias de competência do Juízo da Execução.” (TJPR – ACr 1545655-8 – 2ª C.Crim. – Rel. Des. Luís Carlos Xavier – DJe 13.12.2016)

eStelionAto

31718 – “Recurso especial. Art. 171, § 3º, do CP. Estelionato. Emissão de atestado médico falso para saque de FGTS. Incompetência do juízo. Princípio da especialidade. Ausência de prequestionamento. Não oposição de embargos declaratórios. Súmulas nºs 282 e 356 do STF. Inépcia da denúncia. Não ocorrência. Interceptações telefônicas. Transcrição integral. Desnecessidade. Argumentos acerca da efetiva realização de consulta médica para obten-ção do atestado médico, de absolvição na esfera administrativa, de não comprovação do ânimo associativo, de ausência de dolo para obtenção do resultado fraudulento, de inver-são do ônus da prova e de incidência da excludente de culpabilidade consubstanciada

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na inexigibilidade de conduta diversa. Ausência de indicação dos artigos de lei federal violados. Deficiência na fundamentação. Súmula nº 284/STF. Súmula nº 7/STJ. Participa-ção de menor importância. Erro de tipo. Crime impossível. Reconhecimento. Necessidade de reexame de provas. Súmula nº 7/STJ. Dosimetria da pena. Pena-base. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Culpabilidade e maus antecedentes. Motivação inidônea. I – A ausência de prequestionamento relativa ao pleito de reconhecimento da incompetência do juízo constitui óbice ao exame das matérias pela Corte Superior, a teor das Súmulas nºs 282 e 356/STF. II – A peça acusatória deve conter a exposição do fato delituoso em toda a sua essência e com todas as suas circunstâncias. Essa narração impõe-se ao acusador como exigência derivada do postulado constitucional que assegura ao réu o pleno exercí-cio do direito de defesa. Denúncias que não descrevem os fatos na sua devida conforma-ção não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito e violam o princípio da dignidade da pessoa humana (HC 86.000/PE, 2ª T., Rel. Min. Gilmar Mendes, DJU de 02.02.2007). III – No caso, observa-se que a exordial acusatória apresenta uma narrativa congruente dos fatos, de modo a permitir o pleno exercício da ampla defesa, descreven-do conduta que, ao menos em tese, configura crime. Com efeito, conforme assevera o v. acórdão guerreado, consta da exordial que o réu forneceu falso atestado médico a corréu, com o objetivo de testificar que este possuía HIV, o que resultou na obtenção, em proveito deste corréu, de vantagem ilícita, consubstanciada no saque indevido do saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), em detrimento da Caixa Econômica Federal, induzindo-a em erro mediante fraude, consistente na apresentação do mencionado docu-mento falso, já que o corréu não padecia de tal moléstia. IV – Não se mostra obrigatória a transcrição integral dos diálogos interceptados, sendo bastante que seja assegurado às partes o acesso à integralidade das gravações, com a degravação dos trechos que embasa-ram a condenação ou o oferecimento da denúncia para que esteja assegurado o exercício da ampla defesa, o que ocorreu na hipótese. (Precedentes). V – O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado no sentido de que o recorrente deve apontar os dispositivos legais que teriam sido objeto de ofensa pelo Tribunal de origem, sob pena de inviabilizar o conhecimento do apelo nobre por deficiência de fundamentação, de modo a atrair a incidência, na espécie, da Súmula nº 284 do Supremo Tribunal Federal. VI – Ade-mais, o recurso especial não será cabível quando a análise da pretensão recursal exigir o reexame do quadro fático-probatório, sendo vedada a modificação das premissas fáticas firmadas nas instâncias ordinárias na via eleita (Súmula nº 7/STJ). VII – É pacífico o enten-dimento desta Corte no sentido de que a dosimetria da pena, quando imposta com base em elementos concretos e observados os limites da discricionariedade vinculada atribuída ao magistrado sentenciante, impede a revisão da reprimenda pelo Superior Tribunal de Justiça, exceto se ocorrer evidente desproporcionalidade, quando caberá a reapreciação para a correção de eventuais desacertos quanto ao cálculo das frações de aumento ou de diminuição e apreciação das circunstâncias judiciais. Na situação destes autos, verifico que o aumento da pena-base, em razão da culpabilidade e dos maus antecedentes está idoneamente fundamentado. Recurso especial desprovido.” (STJ – REsp 1.539.634 – RS – (2015/0148157-8) – 5ª T. – Rel. Min. Felix Fischer – DJe 30.110.2016)

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Nota: O vertente acórdão trata de recurso especial interposto com base na alínea a, da Cons-tituição Federal, contra v. acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Re-gião, assim ementado:“ESTELIONATO – INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) – SAQUE DE BENEFÍCIO – CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (CEF) – SAQUE DE VALORES DO FGTS – PRESCRIÇÃO – INÉPCIA DA DENÚNCIA – INTERCEPTAÇÕES TELEFÔ-NICAS – PROVA EMPRESTADA – TRANSCRIÇÃO DOS DIÁLOGOS – DURAÇÃO DA MEDIDA – INTERROGATÓRIO DE CORRÉU – CARTA PRECATÓRIA – MATE-RIALIDADE – VANTAGEM INDEVIDA – DÚVIDA – ABSOLVIÇÃO – 1. Transitado em julgado a sentença condenatória para a acusação, a prescrição se regula pela pena aplicada, de forma que tendo transcorrido o prazo prescricional entre a data dos fatos e a do recebimento da denúncia, reconhece-se a prescrição e a extinção da punibilidade em relação a um dos fatos e a um dos réus (art. 110, § 1º, do Código Penal, na redação anterior a dada pela Lei nº 12.234, de 2010). 2. É apta a denúncia que atende aos requisi-tos previstos no art. 41 do CPP, mediante a exposição dos fatos criminosos, a narrativa das condutas dos denunciados com todas as suas circunstâncias, a qualificação dos acusados e a classificação provisória dos crimes em tese praticados por eles. 3. É legal e utilização de prova emprestada legalmente produzida em outro processo de natureza criminal. Judicialmente autorizada a interceptação telefônica, não há óbice ao compar-tilhamento das informações quando verificada a vinculação direta entre as condutas delitivas e os acusados em outras ações penais. 4. É possível a prorrogação da intercep-tação telefônica por sucessivas vezes, sem violação ao art. 5º da Lei nº 9.296, de 1996, especialmente quando o fato é complexo, a exigir investigação diferenciada e contínua. 5. Não há exigência legal no sentido da transcrição integral dos diálogos interceptados, não havendo nulidade na sua não realização, sendo suficiente a transcrição das grava-ções em que se apoiou a denúncia. 6. Não há cerceamento de defesa pela não intimação dos defensores dos réus pelo juízo deprecado acerca da audiência de interrogatório de corréu por meio de carta precatória, bastando a intimação acerca da expedição da carta. 7. Comprovados a materialidade, a autoria e o dolo dos réus pela prática do art. 171, § 3º, do Código Penal, na forma do art. 29 do Código Penal, mantém-se a sen-tença condenatória. 8. Tendo a acusação se desincumbido do seu ônus, reunido provas a sustentar a condenação, cumpre à defesa comprovar a tese defensiva, o que não carac-teriza inversão do ônus da prova. 9. Não configura participação de menor importância a ação do médico que fornece atestado falso, possibilitando o saque dos valores depo-sitados em conta do FGTS de terceiro, sendo sua ação determinante para a consuma-ção do crime. 10. O médico que fornece atestado falso e, assim, possibilita o saque de valores depositados em conta do FGTS de terceiro, no mínimo assume o risco de que o documento seja utilizado para obtenção de vantagem ilícita em detrimento de entidade de direito público, justificando-se a condenação pelo estelionato majorado. 11. Na fixa-ção da pena-base, para ensejar a valoração negativa da vetorial consequências do crime é necessário que o prejuízo ao Erário seja superior a R$ 100.000,00 (cem mil reais)”.O Superior Tribunal de Justiça rejeitou recurso de um requerente condenado a dois anos de reclusão por estelionato, por emitir falsos atestados utilizados para saque in-devido do FGTS.

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O relator afirmou que não há inépcia da denúncia, principal argumento trazido pela defesa, já que a peça acusatória descreve a participação do profissional de saúde, deta-lhando as circunstâncias do fato.Destacou trechos da denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal, com expressa menção a diálogos obtidos em interceptação telefônica, nos quais os envolvidos explici-tam a necessidade do atestado médico para efetuar o saque do FGTS.O requerente alegou, entre outros motivos, que não poderia ser condenado, pois não ti-nha como antecipar que os atestados seriam utilizados para fins ilícitos (ânimo associa-tivo), além do que atestou a doença com base em exames trazidos pelo paciente. Outro argumento é que não há evidências de que teria consentido com a prática de crime, o que impossibilitaria a condenação por estelionato.A defesa questionou ainda a utilização dos diálogos interceptados, que não foram transcritos integralmente, prejudicando a defesa.Há jurisprudência no sentido de que não é necessário transcrever todos os diálogos no processo, desde que a defesa possa ter acesso à íntegra do áudio (que pode ser via CD gravado, como no processo analisado).Vale trazer trecho do voto do relator:“Nesse sentido:‘PENAL E PROCESSUAL PENAL – HABEAS CORPUS – PECULATO – TRANCA-MENTO DA AÇÃO PENAL – AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA – INEXISTÊNCIA DE INDÍCIOS DELITIVOS – ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA – ARQUIVAMENTO IMPLÍCITO – NÃO CABIMENTO – ADITAMENTO – DENÚNCIA – POSSIBILIDA-DE – RECURSO IMPROVIDO – 1. Não padece de inépcia a denúncia que descreve os fatos tidos por criminosos, possibilitando identificar os elementos probatórios mínimos para a caracterização do delito e o pleno exercício das garantias constitucionais do con-traditório e ampla defesa, em conformidade com o art. 41, CPP. 2. Na hipótese, há a descrição da conduta típica, apontando que o recorrente, valendo-se da função pública que exerce, desviou o uso de viaturas da Polícia Civil para realizar serviços de segu-rança privada na zona rural da Cidade de Itapeva no período entre 2009 e 2010. 3. Nos termos dos precedentes desta Corte não se admite o arquivamento implícito de ação penal pública no ordenamento jurídico brasileiro. 4. É cabível o aditamento da denún-cia a qualquer tempo, desde que antes de prolatada a sentença e possibilitado ao réu o exercício do contraditório e da ampla defesa. 5. Recurso em habeas corpus improvido’ (RHC 48.710/SP, 6ª T., Rel. Min. Nefi Cordeiro, DJe de 16.05.2016).‘PROCESSUAL PENAL – RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – PECULA-TO – TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL – JUSTA CAUSA – MATÉRIA FÁTICO--PROBATÓRIA – INÉPCIA DA DENÚNCIA – NÃO OCORRÊNCIA – ABSOLVIÇÃO NA ESFERA ADMINISTRATIVA – REFLEXO NA ESFERA PENAL – INDEPENDÊN-CIA – [...] 2. O exame da alegada ausência de justa causa para a instauração da ação penal demanda incursão no acervo fático-probatório, o que é inviável na via estreita do habeas corpus. 3. Não é inepta a denúncia que, atentando aos ditames do art. 41 do CPP, qualifica os acusados, descreve o fato criminoso e suas circunstâncias. 4. O Superior Tribunal de Justiça firmou a compreensão de que as esferas cível, administrativa e pe-nal são independentes, com exceção dos casos de absolvição, no processo criminal, por afirmada inexistência do fato ou inocorrência de autoria. Daí porque não se Sustenta a tese de que eventual absolvição ocorrida em sede de processo administrativo comu-nica-se à ação penal decorrente do mesmo fato. 5. Não há ilegalidade em condenação

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lastreada em provas inicialmente produzidas na esfera administrativa e, depois, reexa-minadas na instrução criminal, com observância do contraditório e da ampla defesa. 6. Recurso ordinário desprovido’ (RHC 61.021/DF, 5ª T., Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe de 05.02.2016).Quanto ao argumento de que seria necessária a transcrição integral da conversas in-terceptadas que fundamentaram a condenação, saliento, oportunamente, que o eg. Su-premo Tribunal Federal, julgando o Inq. 2.424/RJ, decidiu que o acesso à totalidade do áudio captado durante a interceptação telefônica é suficiente para o exercício da ampla defesa, sendo prescindível a transcrição integral do conteúdo.A mesma orientação é seguida por esta Corte, que firmou entendimento no sentido de que basta a disponibilização do áudio integral, com a degravação dos trechos que embasaram a condenação ou o oferecimento da denúncia para que esteja assegurado o exercício da ampla defesa.O Superior Tribunal de Justiça negou a ordem.”

eStuPro

31719 – “Agravo regimental em recurso especial. Penal. Estupro. Tentativa. Reconheci-mento. Aplicação. Princípio da proporcionalidade. Matéria exclusivamente constitucio-nal. Discussão em recurso especial. Inviabilidade. 1. O reconhecimento da forma tenta-da do delito de estupro e a consequente redução da pena, pelo Tribunal estadual, teve por fundamento exclusivo a aplicação do princípio da proporcionalidade. Sendo assim, o julgado possui fundamento constitucional autônomo, mostrando-se inviável a sua re-visão em recurso especial. Precedentes. 2. Agravo regimental provido para não conhecer do recurso especial.” (STJ – AgRg-REsp 1.621.319 – (2016/0219623-6) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 14.12.2016 – p. 2064)

exeCuÇÃo PenAl

31720 – “Execução penal. Homologação de falta grave. Posse de bateria e chips telefô-nicos no interior de estabelecimento prisional (art. 50, VII, LEP). Alegada ausência de materialidade. Improcedência. Prescindibilidade de prova técnica para caracterização da transgressão. A posse de aparelho celular ou de qualquer de seus componentes no interior de estabelecimento prisional configura falta grave, sendo desnecessária a realização de perícia para atestar a sua funcionalidade. Recurso desprovido.” (TJPR – Ag 1578790-3 – 1ª C.Crim. – Rel. Des. Telmo Cherem – DJe 13.12.2016 – p. 351)

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31721 – “Habeas corpus. Execução penal. Trabalho externo na condição de autônomo. LEP, art. 114. A exigência de apresentação de proposta formal de emprego deve sofrer temperamentos. Precedentes. Princípio constitucional da fraternidade. Preâmbulo e art. 3º da CF/1988. ‘Regras de Mandela’. Assembleia-geral das Nações Unidas. Aplicação. 1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e este Superior Tribunal de Justiça, por sua Terceira Seção, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, pas-saram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. 2. Não se nega que, ‘se a oferta de emprego está escassa até mesmo para aqueles que não possuem algum antecedente penal, imagina-se impor tal obrigação a quem já registra alguma condenação’ (HC 217.180/RJ, Rel. Min. Gilson Dipp, DJe de 22.03.2012). 3. À vista do quadro brasileiro, que registra uma grave crise emprega-tícia, a regra do art. 114, I, da LEP, a qual exige do condenado, para ingressar no regime aberto, a comprovação de trabalho ou a possibilidade imediata de fazê-lo (apresentação de proposta formal de emprego), deve sofrer temperamentos (Precedentes das Turmas que integram a Terceira Seção desta Corte). 4. Essa particular forma de parametrar a in-terpretação da lei (no caso, a LEP) é a que mais se aproxima da Constituição Federal, que faz da cidadania e da dignidade da pessoa humana dois de seus fundamentos (incisos II e III do art. 1º). Mais: Constituição que tem por objetivos fundamentais erradicar a margi-nalização e construir uma sociedade livre, justa e solidária (incisos I e III do art. 3º). Tudo na perspectiva da construção do tipo ideal de sociedade que o preâmbulo de nossa Cons-tituição caracteriza como ‘fraterna’ (HC 94163, Rel. Min. Carlos Britto, 1ª T., Julgado em 02.12.2008, DJe-200 Divulg. 22.10.2009, Public. 23.10.2009, Ement. vol. 02379-04, p. 00851). 5. Com efeito, a interpretação dada ao art. 114, I, da LEP, pelo Superior Tribunal de Justi-ça decorre, indiscutivelmente, desse resgate constitucional do princípio da fraternidade. 6. Após a divulgação ampla pelo Conselho Nacional de Justiça das chamadas ‘Regras de Mandela’, aprovadas pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, segundo as quais, além da busca pela proteção da sociedade contra a criminalidade, a redução da reincidência e a punição pela prática do crime, também constituem objetivos do sistema de justiça criminal a reabilitação social e a reintegração das pessoas privadas de liberdade, assegurando-lhes, na medida do possível, que, ao retornarem à sociedade, sejam capazes de levar uma vida autossuficiente, com respeito às leis. 7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para permitir ao paciente o exercício do trabalho externo como autônomo, cabendo ao Juízo da VEP estabelecer as condições e o modo de fiscalização.” (STJ – HC 375.005 – (2016/0272585-4) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 14.12.2016)

extrAdiÇÃo

31722 – “Extradição instrutória. Tratado de extradição entre a República Federativa do Brasil e a República Argentina. Crime de homicídio. Dupla tipicidade atendida. Prescri-

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ção. Inocorrência. Discussão de mérito e parcialidade do juízo requerente. Via imprópria. Contenciosidade limitada. Problemas de saúde do extraditado. Circunstância que não impede a extradição. Atendimento a todos os requisitos legais. Extradição deferida. 1. A extradição instrutória, requerida em autos devidamente instruídos com os documentos exigidos pelas normas de regência, tem por fim viabilizar o julgamento de suspeitos da prática, no território do Estado Requerente, de crimes que atendam ao requisito da dupla tipicidade e que não incidam nas hipóteses legais de inadmissibilidade. 2. A contencio-sidade limitada, regra que rege o julgamento da Extradição, impede que o Supremo Tri-bunal Federal analise questões de mérito, posto incompetente ratione materiae. 3. A saúde eventualmente precária do extraditando não é suficiente para impedir sua entrega, restan-do a mesma condicionada a prévio exame médico oficial que ateste suas condições físicas para suportar adequadamente a viagem até o país requerente, nos termos do parágrafo único do art. 89 da Lei nº 6.815/1980. 3. In casu, (a) o Extraditando é acusado de ter pra-ticado crime de homicídio consumado, em horário incerto entre 31.08.2015 e 01.09.2015; (b) a prescrição da pretensão punitiva do delito de homicídio, pelo Código Penal Argen-tino, consuma-se em 2023, e pelo Código Penal brasileiro, em 2035; (c) a parcialidade de autoridades da República Argentina não se presume e sua mera alegação não inviabiliza o deferimento da extradição; (d) estão preenchidos todos os requisitos para o deferimento da extradição, previstos no Tratado Bilateral, ausentes hipóteses de inadmissibilidade. 4. Extradição deferida.” (STF – EXT 1.456 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 22.11.2016)

Furto quAliFiCAdo

31723 – “Habeas corpus. Furto qualificado. Sentença penal condenatória. Reincidência e reiteração delitiva. Regime semiaberto. Réu preso durante a instrução processual. Nega-tiva do direito de recorrer em liberdade. A negativa do direito de recorrer em liberdade, mediante a verificação da persistência dos motivos da prisão preventiva para garantia da ordem pública na sentença penal condenatória, em virtude da reincidência específica e da reiteração delitiva do paciente em crimes patrimoniais da mesma e de outras espécies, constitui fundamento suficiente, necessário e adequado. O paciente respondeu o proces-so custodiado e a carta de guia provisória já foi expedida, de sorte que os benefícios da execução penal serão concedidos pelo Juízo competente, após a unificação das reprimen-das. Inócua seria a aplicação de qualquer outra medida cautelar diversa da prisão, diante da reiteração criminosa. Habeas corpus denegado.” (TJDFT – Proc. 20160020466752HBC – (979826) – 2ª T.Crim. – Rel. Souza e Avila – J. 18.11.2016)

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homiCídio CulPoSo

31724 – “Apelação. Homicídio culposo na direção de motocicleta. Art. 302, parágrafo único, inciso I da Lei de Trânsito. Recurso defensivo, arguindo preliminar de nulidade do processo por inépcia da denúncia, porque, segundo alega, não teria descrito o fato criminoso com todas as suas circunstâncias. No mérito, requer: b) a absolvição do réu, b1) por alegada fragilidade probatória, b2) por não ter restado comprovado que o mes-mo conduzia sua motocicleta de maneira imprudente, b3) por alegada ausência de nexo causal entre a conduta do acusado e a morte da vítima. Subsidiariamente pugna: c) pela substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, d) o reconhecimento da forma tentada do delito, e e) a gratuidade de justiça. Por fim prequestiona toda a ma-téria arguida no recurso. Apelo conhecido e parcialmente provido. Inicialmente aprecia--se a preliminar de nulidade do processo arguida pela Defesa do acusado. Com efeito, a denúncia considerada inepta é aquela que não permite ao acusado exercer seu direito de defesa, porquanto não narra, ainda que de forma sucinta, o comportamento típico do agente, deixando de expor todos os elementos do fato típico, ilícito e culpável, bem como a descrição minuciosa do fato criminoso e as circunstâncias do delito. Na hipótese dos autos, porém, ao contrário do que alega a Defesa, a peça acusatória possui descrição su-ficiente do fato criminoso, com as suas circunstâncias e definição da conduta do réu João Victor de Souza Borges, ao afirmar que ‘No dia 20 de março de 2009, por volta das 15:50h, nas mediações da Rua Marques Valença, em frente ao nº 72, Parque São Mateus, nesta Comarca, o denunciado, deixando de observar devido cuidado objetivo, manifestado por meio de imprudência, praticou homicídio culposo na direção de veiculo automotor, vin-do a colher Jean Phellype Peçanha de Souza Henrique, o qual morreu em consequência das lesões causadas pelo acidente, conforme noticia o auto de exame cadavérico de fl. 17. Consta dos autos que o denunciado agiu de forma imprudente, pois trafegava com a mo-tocicleta Honda Titan, cor prata, placa KNH-5606/RJ, pela via e, no intuito de desviar-se de um tachão, ingressou na pista contrária vindo a colidir com Jean, que trafegava com a motocicleta Agrale, cor vermelha, placa KXO-0001/RJ’, ensejando claramente a adequa-ção típica, a possibilitar à saciedade o exercício da ampla defesa e contraditório, pelo réu nominado. Na ensancha, a jurisprudência do STF posiciona-se no sentido de que ‘Não é inepta a denúncia que proporciona ao acusado a plena defesa assegurada pela CF’ (RTJ 85/70 e 64/626). Este é o caso dos autos. Preliminar rejeitada. No mérito, a materialidade e autoria restaram claramente demonstradas pelo conjunto probatório dos autos. O ape-lante João Victor de Souza Borges, ao conduzir a sua motocicleta, pela rua Marques de Valença, na Comarca de Campos dos Goytacazes, ao desviar de um redutor de velocidade conhecido como tachão, para o lado esquerdo, na contramão de direção, atingiu a vítima Jean Phellype Peçanha de Souza Henrique, a qual trafegava com sua motocicleta em sua mão de direção, ceifando-lhe a vida. Foi o apelante condenado às penas de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção, em regime semiaberto e suspensão da habilitação para diri-gir veículo automotor, pelo mesmo período da condenação. Inviável o pleito absolutório. Conjunto probatório, consistente em prova oral, demonstra que, a hipótese retratada nos autos é de homicídio na modalidade culposa, considerando ter restado caracterizado que o recorrente agiu com imprudência, não observando o dever de cuidado, o qual é exigido

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dos condutores de veículo, ingressando na contramão de direção ao desviar de um sina-lizador de trânsito, vindo colidir com a vítima que trafegava na sua mão de direção, cau-sando lesões que ocasionaram a morte da mesma. O auto de exame cadavérico comprova o nexo causal entre a morte da vítima e a conduta do recorrente, restando caracterizado o resultado lesivo involuntário, a inobservância do dever de cuidado, a previsibilidade, na qual o agente deveria ou poderia evitar o resultado, e a subsunção do fato à figura típica, demonstrada a conduta culposa do apelante. Ao ser interrogado, o réu não nega os fatos, confirmando que ‘ao sair de um tachão para o lado esquerdo na contramão de direção, veio a outra moto e bateu de frente com declarante’. Quanto ao inusitado pleito de reconhecimento da forma tentada do delito em comento, sorte não assiste ao recorren-te vez que não se admite a figura da tentativa nos delitos culposos. Inviável o pleito de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, visto que o acusado não preenche o requisito previsto no art. 44, II do Código Penal, eis que reincidente em crime doloso, como se pode observar da FAC do mesmo. Deve-se realizar pequeno ajuste na penalidade acessória aplicada, pois de acordo com o disposto no art. 293 do Código de Trânsito Nacional – Lei nº 9.503/1997, a suspensão da habilitação para dirigir veículo deve ser limitada entre os prazos de 02 meses até 05 anos. Considerando que a sanção criminal foi aplicada um pouco acima do seu patamar mínimo, a penalidade acessória deverá se-guir o mesmo parâmetro, em observância ao princípio da proporcionalidade. Precedentes do STJ e desta Câmara Criminal. Quanto ao pedido de gratuidade de justiça veiculado pela Defesa do réu, Anderson Jurandir Nunes, deverá o mesmo ser objeto formulação ao Juiz da Vara de Execuções Penais, nos termos do Verbete nº 74 da Súmula deste Egrégio Tribunal de Justiça. Por fim, quanto às alegações de prequestionamento formuladas pela Defesa do réu-recorrente, para fins de interposição eventual de recursos extraordinário ou especial, as mesmas não merecem conhecimento e tampouco provimento, eis que não se vislumbra a incidência de quaisquer das hipóteses itemizadas no inciso III, letras a, b, c e d do art. 102 e inciso III, letras a, b e c do art. 105 da CRFB e, por consequência, ne-nhuma contrariedade/negativa de vigência, nem demonstração de violação de normas constitucionais ou infraconstitucionais, de caráter abstrato e geral. Apelo conhecido e no mérito parcialmente provido, apenas para modificar-se a pena de suspensão do direito de dirigir, que fica estabelecida em 03 (três) meses.” (TJRJ – Ap 0056028-58.2011.8.19.0014 – 8ª C.Crim. – Relª Elizabete Alves de Aguiar – DJe 02.12.2016)

homiCídio quAliFiCAdo

31725 – “Habeas corpus. Homicídio qualificado e corrupção de menores. Decretação de prisão preventiva. Presença dos requisitos autorizadores da custódia cautelar. Exegese do art. 312 do Código de Processo Penal. Fundamentação idônea. Decisão motivada nas circunstâncias do caso concreto. Evidente necessidade da prisão preventiva por conve-

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niência da instrução criminal. Constrangimento ilegal não verificado ordem denegada.” (TJPR – HC 1604985-7 – 1ª C.Crim. – Rel. Des. Clayton Camargo – DJe 14.12.2016)

31726 – “Recurso ordinário em habeas corpus. Homicídio qualificado. Motivo torpe. Re-curso que dificultou a defesa da vítima. Prisão temporária convertida em preventiva. Su-perveniência da pronúncia. Ausência de manifestação quanto à manutenção da custódia cautelar. Ofensa ao disposto no art. 413, § 3º, do CPP. Constrangimento ilegal evidenciado. Concessão parcial da ordem. 1. Com o advento da Lei nº 11.689/2008, o legislador ordiná-rio atribuiu ao magistrado o dever de se manifestar acerca da necessidade de manutenção ou decretação da prisão preventiva ao proferir a provisional, fazendo-o de forma funda-mentada, nos termos do art. 413, § 3º, do Código de Processo Penal. Doutrina. Precedente. 2. No caso dos autos, por ocasião da prolação da decisão de pronúncia houve verdadeira omissão por parte do magistrado singular com relação à exigência contida no mencionado dispositivo da legislação processual penal, pois em momento algum foi feita qualquer menção à necessidade ou não de preservação da custódia cautelar do paciente. 3. Recur-so parcialmente provido para substituir a custódia preventiva do recorrente, mediante a imposição das medidas alternativas à prisão previstas no art. 319, incisos I, II, III e IV, do Código de Processo Penal.” (STJ – Rec-HC 57.418 – (2015/0051286-7) – 5ª T. – Rel. Min. Ribeiro Dantas – DJe 14.12.2016)

indulto nAtAlino

31727 – “Agravo. Execução penal. Pedido de indulto natalino (Decreto Presidencial nº 8.615/2015). Indeferimento na origem. Apenado reputado como reincidente. Utilização do fracionamento de 1/3 (um terço) sobre a pena. Equívoco quanto à condição de reinci-dência. Trânsito em julgado da condenação primitiva posterior ao segundo crime prati-cado. Primariedade considerada. Fração de 1/4 (um quarto). Aspecto objetivo satisfeito. Ausência de informações acerca do preenchimento do requisito subjetivo. Determinação para que o juízo aprecie o benefício com base na situação comportamental do reeducan-do. Recurso provido em parte.” (TJSC – Ag-ExPen 0004854-81.2016.8.24.0018 – Relª Desª Salete Silva Sommariva – J. 16.11.2016)

jÚri

31728 – “Recurso em sentido estrito. Júri. Homicídio. Art. 121, § 2º, incs. I, IV e VI, CP. Prova da materialidade. Indícios de autoria. Presença. In dubio pro societate. Impronún-

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cia. Desclassificação. Impossibilidade. Qualificadoras. Decote. Inviabilidade. Na fase da pronúncia, vigora o princípio in dubio pro societate, onde as dúvidas se resolvem em favor da sociedade, não do réu. Basta prova da materialidade e indícios suficientes da autoria, sendo defeso ao Julgador incursionar demasiadamente na prova, sob pena de subtrair sua apreciação da competência do Juiz natural da causa. O fato de o laudo pericial con-signar que não houve perigo de vida não elide os indícios de que o réu agiu com animus necandi quando golpeou a vítima na cabeça. Havendo prova da materialidade e indícios suficientes da autoria delitiva e do dolo de agir, não há que se falar em impronúncia ou desclassificação para o delito de lesões corporais. O sentimento de posse do autor do ho-micídio tentando é apto para configurar o motivo torpe. Havendo mais de uma tese sobre a incidência da qualificadora do recurso que dificultou a defesa da vítima passível de pro-va, cumprirá aos membros do Conselho de Sentença deliberar sobre qual delas lhes parece mais verossímil, em homenagem ao princípio da soberania dos veredictos. Para configu-rar o feminicídio com base no inciso I do § 2º-A do art. 121 do Código Penal, basta aferir se está configurada a violência doméstica e familiar, consoante a previsão legal estampada no art. 5º da Lei nº 11.340/2006. As qualificadoras só podem ser excluídas na fase da pro-núncia quando totalmente dissociadas do conjunto probatório. Havendo indícios de sua configuração, seu exame não pode ser subtraído do Conselho de Sentença, a quem a CF determinou a competência para decidir sobre os crimes contra a vida. Recurso conhecido e não provido.” (TJDFT – Proc. 20161510000555RSE – (979803) – 2ª T.Crim. – Rel. Souza e Avila – J. 18.11.2016)

leSÃo CorPorAl SeguidA de morte

31729 – “Apelação crime. Condenação. Lesão corporal seguida de morte. Insurgência quanto à dosimetria. Pleito de afastamento das agravantes. Motivo fútil. Ausência de mo-tivação. Exclusão que se impõe. Manutenção da agravante prevista no art. 61, inc. II, e, do Código Penal, eis que praticada contra irmão. Redução da pena. Pedido de arbitramento de honorários advocatícios pela atuação do defensor dativo em segundo grau de jurisdi-ção. Acolhimento. Recurso parcialmente provido.” (TJPR – ACr 1547068-3 – 1ª C.Crim. – Rel. Des. Macedo Pacheco – DJe 14.12.2016)

Porte ilegAl de ArmA de Fogo

31730 – “Recurso em habeas corpus. Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. Prisão. Nulidade. Decretação de ofício. Inocorrência. Mera conversão da prisão em flagrante. Não

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submissão do acusado a audiência de custódia. Superação pela decretação da prisão pre-ventiva. Segregação devidamente fundamentada. Histórico criminal do agente. Reinci-dência. Periculosidade concreta evidenciada. Ausência de flagrante ilegalidade. Recurso em habeas corpus desprovido. 1. Não houve decretação, de ofício, de custódia preventi-va pelo Magistrado, mas, sim, conversão da prisão em flagrante em segregação cautelar. Com efeito, ‘comunicado acerca da prisão em flagrante (art. 306 do Código de Processo Penal – CPP), deve o Magistrado decretar a prisão preventiva, caso verifique a legalidade do cárcere e a inviabilidade de substituição por medida diversa, se reconhecer a existência dos requisitos preconizados nos arts. 312 e 313 da mesma norma, inexistindo, nesse ato, qualquer ilegalidade’ (RHC 66.497/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., DJe 11.03.2016). 2. A ausência de submissão do acusado à audiência de custódia é suprida com a superveniência de novo título que justifique a segregação, como, in casu, a decretação de prisão preventiva pelo Magistrado de origem. Precedentes. 3. Considerando a natureza excepcional da prisão preventiva, somente se verifica a possibilidade da sua imposição quando evidenciado, de forma fundamentada e com base em dados concretos, o preen-chimento dos pressupostos e requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal – CPP. Deve, ainda, ser mantida a prisão antecipada apenas quando não for possível a aplicação de medida cautelar diversa, nos termos do previsto no art. 319 do CPP. Na hipó-tese dos autos, estão presentes elementos concretos a justificar a imposição da segregação antecipada. As instâncias ordinárias demonstraram, com base em elementos concretos, a periculosidade do recorrente, uma vez que é reincidente, ostentando condenação ir-recorrível por tráfico ilícito de drogas, e responde a outras ações penais pelos delitos de receptação, porte ilegal de arma, tráfico de drogas e homicídio. Forçoso, portanto, concluir que a prisão processual está devidamente fundamentada na garantia da ordem pública e para evitar a reiteração delitiva, não havendo falar, portanto, em existência de evidente flagrante ilegalidade. Esta Corte Superior possui entendimento firme no sentido de que a presença de condições pessoais favoráveis do agente, como primariedade, domicílio cer-to e emprego lícito, não representa óbice, por si só, à decretação da prisão preventiva, quando identificados os requisitos legais da cautela. Recurso em habeas corpus a que se nega provimento.” (STJ – Rec-HC 77.501 – (2016/0277624-1) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 14.12.2016)

reCePtAÇÃo

31731 – “Penal. Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. Receptação. Regime fecha-do. Carência de fundamentação idônea. Pena-base acima do mínimo legal. Regime semia-berto cabível. Substituição da pena corporal por restritiva de direitos. Maus antecedentes. Impossibilidade de concessão do benefício. Writ não conhecido e habeas corpus concedido de ofício. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido

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de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado. No caso, não se observa flagrante ilega-lidade a justificar a concessão do habeas corpus, de ofício. 2. A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, ca-bendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. Dessarte, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e os critérios concretos de individua-lização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, pois exigiriam revolvimento probatório. 3. Estabelecida a pena-base acima do mínimo legal, por ter sido desfavoravelmente valorada circunstância do art. 59 do Código Penal, admite-se a fixação de regime prisional mais gravoso do que o indicado pelo quantum de reprimenda imposta ao réu, sem que se possa falar em malferimento das Súmulas nºs 718 e 719 do STF, bem como da Súmula nº 440 do STJ. Entrementes, tratando-se de réu primário e estabelecida pena inferior a 4 (quatro) anos de reclusão, cumpre reconhecer que ele faz jus ao regime semiaberto de cumprimento da pena. 4. O art. 44 do CP estabelece que será admitida a conversão da pena corporal por restritiva de direitos se ‘a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circuns-tâncias indicarem que essa substituição seja suficiente’. No caso em análise, o Tribunal de origem asseverou não ser admissível a concessão do benefício, máxime em razão dos antecedentes do réu, sem que possa inferir arbitrariedade em tal conclusão. 5. Writ não conhecido e habeas corpus concedido, de ofício, tão somente para estabelecer o regime pri-sional semiaberto para o início do cumprimento da reprimenda imposta ao réu, salvo se, por outro motivo, ele estiver descontando pena em meio mais gravoso.” (STJ – HC 363.066 – (2016/0186359-2) – 5ª T. – Rel. Min. Ribeiro Dantas – DJe 23.11.2016)

reinCidÊnCiA

31732 – “Processual penal. Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Reincidência. Art. 61, I, do Código Penal. Dispositivo constitucional (RE 453.000-RG, Rel. Min. Marco Aurélio, Tema nº 114). Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF – AgRg-RE-Ag 972.370 – São Paulo – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 25.11.2016)

rouBo CirCunStAnCiAdo

31733 – “Recurso ordinário em habeas corpus. Roubo circunstanciado (concurso de pes-soas e uso de arma de fogo). Prisão preventiva. Preenchimento dos requisitos. Gravidade

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concreta do delito. Necessidade de garantir a ordem pública. Condições pessoais favo-ráveis. Irrelevância. Medidas cautelares do art. 319 do CPP. Inviabilidade. Coação ilegal não demonstrada. Recurso desprovido. 1. A privação antecipada da liberdade do cida-dão acusado de crime reveste-se de caráter excepcional em nosso ordenamento jurídico (art. 5º, LXI, LXV e LXVI, da CF). Assim, a medida, embora possível, deve estar embasada em decisão judicial fundamentada (art. 93, IX, da CF), que demonstre a existência da pro-va da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes da autoria, bem como a ocorrência de um ou mais pressupostos do art. 312 do Código de Processo Penal. Exige-se, ainda, na linha perfilhada pela jurisprudência dominante deste Superior Tribunal de Jus-tiça e do Supremo Tribunal Federal, que a decisão esteja pautada em motivação concreta, vedadas considerações abstratas sobre a gravidade do crime. 2. Na hipótese, havendo prova da materialidade do delito e indícios suficientes de autoria, a prisão preventiva encontra-se devidamente justificada na necessidade de garantia da ordem pública, em razão da gravidade concreta do delito, revelada pelo modus operandi da conduta, pois cuida-se de roubo com a participação de três pessoas, com uso de arma de fogo, não se intimidando o acusado nem quando percebeu que a vítima era policial militar, retornando para subtrair sua arma, o que demonstra a sua periculosidade. 3. Eventuais circunstâncias pessoais favoráveis ao agente, como primariedade e bons antecedentes, ou residência no distrito da culpa e exercício de atividade laborativa lícita, não são suficientes à conces-são de liberdade provisória, se presentes os requisitos autorizadores da custódia cautelar. 4. Recurso ordinário desprovido.” (STJ – Rec-HC 77.670 – (2016/0282772-0) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 14.12.2016)

SuPerior triBunAl militAr

31734 – “Habeas corpus. Penal e processual penal militar. Saque indevido de pensão mili-tar após o falecimento do beneficiário (art. 251 do CPM). Competência da justiça militar. Lei de Organização Judiciária Militar. Julgamento de civil pelo Conselho Permanente de Justiça. Conformidade com a legislação em vigor. Dosimetria da pena. Exasperação da pena-base. Fundamentação idônea. Confissão espontânea. Não incidência. 1. É da compe-tência da Justiça Militar processar e julgar civil acusado da prática do crime de estelionato cometido mediante saque de pensão de beneficiário falecido. Precedentes. 2. No caso, a fixação da pena-base, com respaldo no art. 69 do Código Penal Militar, foi elevada em decorrência da intensidade do dolo, com esteio no modus operandi da conduta, dotada de acentuada gravidade, além da extensão do dano dela advindo. Indicou-se, para tanto, o prolongado lapso em que o paciente teria sacado o benefício previdenciário de titulari-dade de sua genitora, mediante declaração falsa de que a beneficiária continuava viva, mesmo após quase 3 anos do seu falecimento, período no qual usufruiu do recebimento do benefício, por intermédio de mais de 400 movimentações financeiras realizadas. 3. Ele-

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mentos dos autos indicam que a autoria delitiva já estava identificada quando o paciente admitiu sua culpa, sendo inviável em sede habeas corpus proceder ao revolvimento de fatos e provas com vistas a emprestar ao relato do paciente o grau de valoração exigido para qualificá-lo como confissão espontânea, assim entendida como aquela que decorre da livre disposição do agente de procurar a autoridade para informar a prática da infração penal ‘ignorada ou imputada a outrem’ (CPM, art. 72, III, d) e assim ajudar no seu pronto esclarecimento. 4. Ordem denegada.” (STF – HC 136.536 – Ceará – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 29.11.2016)

torturA

31735 – “Recurso em habeas corpus. Tortura. Conversão da prisão preventiva em prisão domiciliar. Lei nº 13.257/2016. Acusada que possui duas filhas menores de 12 anos. Pos-sibilidade. Acusada primária, com bons antecedentes e residência fixa. Recurso provido. 1. Embora o pedido originário tenha ocorrido antes da edição da Lei nº 13.257/2016, o presente recurso será analisado à luz do inciso III e do inciso V, introduzido pela refe-rida lei, por se tratar de lei posterior mais benéfica. 2. O inciso V, introduzido pela Lei nº 13.257/2016, não trouxe maiores detalhamentos sobre os requisitos subjetivos a serem atendidos para conversão da prisão preventiva em domiciliar. No caput do art. 318 do Có-digo de Processo Penal encontra-se a previsão de que o Juiz poderá converter a prisão pre-ventiva em domiciliar. Dessa forma, essa análise deve ser feita caso a caso, pois se por um lado não existe uma obrigatoriedade da conversão, por outro a recusa também deve ser devidamente motivada. O requisito objetivo está atendido, uma vez que a recorrente pos-sui duas filhas menores, uma com 7 e outra com 9 anos. No tocante ao preenchimento do requisito subjetivo, ainda que se trate de crime equiparado a hediondo, pesa em favor da paciente o fato de se tratar de acusada primária, com bons antecedentes, residência fixa e cuja atenuante da confissão espontânea foi reconhecida na sentença condenatória. Assim, considerando que a presente conduta ilícita se trata de fato isolado na vida da paciente, acrescido ao fato de que até o momento da prisão era ela a responsável pela guarda, cria-ção e orientação das menores, mostra-se adequada a conversão da custódia cautelar em prisão domiciliar. 3. Recurso ordinário provido para converter a custódia cautelar em pri-são domiciliar, cujas condições ficarão a cargo do Juízo de primeiro grau, com advertência de revogação no caso de descumprimento.” (STJ – RHC 71.697 – SP – (2016/0146181-9) – 5ª T. – Rel. Min. Joel Ilan Paciornik – DJe 23.11.2016)

Nota:O vertente acórdão trata de recurso ordinário em habeas corpus interposto contra acór-dão do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferido no julgamento do HC 2027916- -19.2016.8.26.0000.A recorrente foi denunciada e encontra-se presa preventivamente pela prática, em tese, dos delitos tipificados no art. 159, caput, do Código Penal, art. 1º, inciso I, alínea a, da Lei nº 9.455/1997 e art. 14 da Lei nº 10.826/2003, todos na forma do art. 69 do Código Penal

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(extorsão mediante sequestro, tortura e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, tudo em concurso material).Na audiência de instrução realizada em 20.01.2016, a defesa da recorrente requereu fosse concedida prisão domiciliar à acusada.O Juiz de primeiro grau indeferiu o referido pedido.Irresignada com a manutenção da constrição cautelar, a defesa impetrou writ perante o Tribunal a quo, cuja ordem foi denegada.No presente recurso, a defesa da recorrente informa que a acusada possui duas filhas, uma com 7 e outra com 9 anos de idade à época da impetração, e sustenta que estão presentes elementos autorizadores para conversão da prisão domiciliar uma vez que a Lei nº 13.257/2016, em vigor desde o dia 9 de março, alterou a redação do art. 318 do Código de Processo Penal para incluir dentre as hipóteses de substituição a de “mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos”, que é exatamente o caso do presente writ.O relator considerou que o requisito objetivo da lei está atendido, uma vez que a mãe tem duas filhas menores, uma com sete e outra com nove anos. Para o ministro, apesar de a tortura ser crime equiparado a hediondo, pesou em favor da mãe o fato de se tratar de acusada primária, com bons antecedentes, residência fixa e cuja atenuante da confis-são espontânea foi reconhecida na sentença condenatória.Vale trazer trecho do voto do relator:“Antes de passar à análise do mérito do presente recurso ordinário, cabe destacar que, após a impetração do writ originário em primeiro grau e antes do julgamento do acór-dão recorrido pela Corte Estadual, entrou em vigor a Lei nº 13.257, de 8 de março de 2016, que acrescentou o inciso V ao art. 318 do Código de Processo Penal. O referido artigo após a modificação passou a ter a seguinte redação:‘Art. 318. Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:I – maior de 80 (oitenta) anos;II – extremamente debilitado por motivo de doença grave;III – imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência;IV – gestante;V – mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos;VI – homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade;Parágrafo único. Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabe-lecidos neste artigo.’Por se tratar de lei posterior mais benéfica, o presente recurso será analisado também à luz do inciso V, introduzido pela Lei nº 13.257/2016.A paciente foi condenada à pena de 6 anos de reclusão pela prática de tortura contra vítima Fábio Alves. Colhe-se dos autos que a vítima convenceu a paciente a investir no lançamento de sua carreira como modelo e que para isso ela deveria pagar taxas de casting, cabeleireiros, professional style, confecção de books, além de outros gastos. A paciente acreditando na possibilidade apresentada, realizou diversos pagamentos que totalizaram R$ 7.000,00 (sete mil reais).

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Ao descobrir que estava sendo vítima de um golpe, cometeu o crime pelo qual foi con-denada, na tentativa de reaver os valores pagos.Em que pese as instâncias ordinárias terem entendido que não restou evidenciada a im-prescindibilidade da conversão da prisão preventiva em domiciliar, tenho que a ordem deve ser concedida.O novo inciso V, introduzido pela Lei nº 13.257/2016, não trouxe maiores detalhamen-tos sobre os requisitos subjetivos a serem atendidos para conversão da prisão preven-tiva em domiciliar. No caput do art. 318 do Código de Processo Penal encontra-se a previsão de que o Juiz poderá converter a prisão preventiva em domiciliar. Dessa for-ma, essa análise deve ser feita, caso a caso, pois se por um lado não existe uma obriga-toriedade da conversão, por outro a recusa também deve ser devidamente motivada.”O STJ deu provimento ao recurso.

trÁFiCo de drogAS

31736 – “Habeas corpus substitutivo. Tráfico de drogas. Aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.340/2006. Impossibilidade. Dedicação à atividade criminosa. Reexame de provas. Regime prisional fechado. Ilegalidade não evidenciada. Não conhe-cimento. 1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado. 2. Não há constrangimento ilegal se as instâncias ordinárias entenderam que o paciente não atende aos requisitos legais expres-sos no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas, à vista de elementos concretos que indicaram a dedicação do acusado à atividade criminosa do tráfico. Concluir de modo diverso neces-sariamente implica no revolvimento do conjunto fático-probatório amealhado durante a instrução criminal, o que é incabível na via estreita do habeas corpus. 3. Condenação à pena definitiva de 7 (sete) anos de reclusão, fixada acima do mínimo legal, justifica, a teor do art. 33, § 2º, alínea b, e § 3º, do Código Penal, a imposição do regime fechado para cum-primento inicial da reprimenda (precedentes). 4. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 332.371 – (2015/0192373-7) – 5ª T. – Rel. Min. Ribeiro Dantas – DJe 23.11.2016)

31737 – “Processual penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas. Fixação do regime inicial fechado. Quantum da pena compatível com regime mais brando. Quantidade e natureza da droga utilizados para calibrar o grau de redução da pena do tráfico privilegiado e para impor regime prisional mais rigoroso. Possibilidade. 1. À luz do art. 33, § 3º, do Código Penal, a jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que a imposição do regime inicial de cumprimento da pena não decorre somente do quantum da reprimenda, mas também das circunstâncias judiciais (CP, art. 59). No crime de tráfico de drogas, podem ser levadas em consideração, como critério adicional na fixação das penas, a natureza e a quantidade da substância ou do produto (Lei nº 11.343/2006, art. 42). 2. Assim, inde-pendentemente do momento em que os vetores referentes à quantidade e à natureza da droga forem utilizados para dosar a reprimenda (na pena-base ou na escolha da fração

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de redução do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006), tais circunstâncias revelam-se idô-neas para imprimir maior rigor na seleção do regime prisional, dado o óbice intranspo-nível ao julgador de considerá-los de forma cumulativa (HC 112.776/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, Pleno, DJe 30.10.2014). 3. No caso, a imposição do regime prisional inicial foi motivada pelo volume e pela variedade de drogas apreendidas, circunstâncias igualmente sopesadas negativamente quando da dosagem da fração da minorante prevista do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. A sanção penal, portanto, está revestida dos predica-dos de logicidade, harmonia e proporcionalidade com os dados empíricos apresentados. 4. Habeas corpus denegado.” (STF – HC 136.818 – São Paulo – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 29.11.2016)

trÁFiCo de entorPeCente

31738 – “Art. 543-C, § 7º, II, CPC c/c art. 1.040, II, do NCPC. Juízo de retratação em re-curso especial. Tráfico privilegiado. Art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006. Caráter hediondo do delito afastado pelo pleno do STF. Retificação do levantamento de penas. Necessidade. Fixação de regime prisional aberto. Viabilidade. Substituição da pena. Possibilidade. Re-curso provido. A aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas, segundo o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nº 118.533. Sendo fixada a repri-menda corporal entre os patamares de um e quatro anos e as circunstâncias judiciais am-plamente favoráveis ao agente, primário, deve ser fixado o regime prisional aberto para o cumprimento da pena. A ré tem direito à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, se preenche os requisitos do art. 44 do Código Penal.” (TJMG – ACr 1.0145.10.024922-9/001 – 2ª C.Crim. – Relª Beatriz Pinheiro Caires – DJe 21.11.2016)

31739 – “Habeas corpus substituto de recurso. Inadequação da via eleita. Tráfico ilícito de entorpecentes. Crime cometido na vigência da Lei nº 6.368/1976. Pena-base. Expressi-va quantidade de entorpecentes. Critério idôneo para a exasperação. Pleito de aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. Combinação de leis. In-viabilidade. Súmula nº 501/STJ. Paciente reincidente. Não preenchimento dos requisitos para a incidência do redutor. Regime inicial fechado. Paciente reincidente, com análise negativa das circunstâncias judiciais, condenado à pena superior a 4 anos de reclusão. Ilegalidade não configurada. Substituição. Pena mantida em patamar superior a 4 anos. Inviabilidade. Constrangimento ilegal não configurado. Habeas corpus não conhecido. 1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade. 2. A natureza e a quantidade dos entorpecentes envolve as circunstâncias do crime, sendo que a respectiva valoração negativa constitui motivação

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idônea para a exasperação da pena-base, consoante os critérios previstos no art. 59 do Código Penal, ainda que o crime tenha sido praticado na vigência da Lei nº 6.368/1976. 3. No caso, a fixação da pena-base acima do mínimo legal teve por fundamento a ex-pressiva quantidade dos entorpecentes apreendidos. 4. O Superior Tribunal de Justi-ça consolidou entendimento no sentido de que ‘é cabível a aplicação retroativa da Lei nº 11.343/2006, desde que o resultado da incidência das suas disposições, na íntegra, seja mais favorável ao réu do que o advindo da aplicação da Lei nº 6.368/1976, sendo vedada a combinação de leis’ (Súmula nº 512/STJ). 5. Ademais, não há falar em retroatividade integral da Lei nº 11.343/2006 na hipótese de não preenchimento dos requisitos previstos no § 4º do art. 33 do referido estatuto. 6. O paciente não faz jus a regime diverso do fecha-do, pois trata-se de réu reincidente, com análise desfavorável das circunstâncias judiciais e foi condenado à pena privativa de liberdade superior a 4 e que não excede 8 anos de reclusão. 7. Mantida a condenação em patamar superior a 4 anos, é inviável a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. 8. Habeas corpus não conhecido.” (STJ – HC 319.653 – (2015/0068027-4) – 5ª T. – Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca – DJe 14.12.2016)

uSo de AlgemAS

31740 – “Embargos de declaração nos embargos de divergência nos embargos de decla-ração no agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Embargos recebidos como agravo regimental. Art. 335, § 2º, RISTF. Penal. Penal e processo penal. Condena-ção. Art. 121, § 2º, IV c/c art. 14, II, CP. Tribunal do júri. Uso de algemas. Julgamento do júri anterior à publicação da Súmula Vinculante nº 11 do STF. Ausência de impugnação específica da decisão agravada. Inexistência de demonstração objetiva do dissenso juris-prudencial. Alegada extinção da punibilidade pelo decurso do prazo prescricional. Ino-corrência. Recursos inadmitidos na origem não obstam o trânsito em julgado do decreto condenatório. Precedentes. A sucessiva interposição de recursos contrários à jurisprudên-cia consolidada pelo pretório excelso configura abuso do direito de recorrer. Precedentes. Caráter protelatório do recurso. Determinada a certificação do trânsito em julgado com a consequente baixa imediata dos autos. Agravo regimental desprovido.” (STF – EDcl-ED--EDcl-AgRg-RE-Ag 653.964 – São Paulo – Plen. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 09.11.2016)

violÊnCiA doméStiCA

31741 – “Apelação criminal. Violência doméstica. Crime de lesão corporal (art. 129, § 9º do CP). Princípio da desnecessidade da pena. Incabível no caso concreto. Pedido de

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afastamento da indenização mínima e pleito de redução de juros. Inviabilidade. Pleito na denúncia. Mantida a condenação á reparação de danos. Juros de mora mantidos. Recurso improvido. Mesmo que após o fato, apelante e vítima tenham se reconciliado, necessária a imposição da pena, devido à gravidade da conduta, que foi lesão corporal (art. 129, § 9º do Código Penal). De acordo com o art. 387, IV, CPP, o juiz deve fixar valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, ademais, no caso presente ocorreu pleito ex-presso do MP na denúncia, do qual o réu teve ciência e do qual pôde se defender durante toda a instrução do feito. Os juros moratórios devem fluir a partir do evento danoso, em atenção jurisprudência da Súmula nº 54 do Superior Tribunal de Justiça. Com o parecer, recurso improvido.” (TJMS – Ap 0022648-73.2014.8.12.0001 – 1ª C.Crim. – Relª Desª Maria Isabel de Matos Rocha – DJe 24.11.2016)

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Índice AlfAbético e Remissivo cÍvel e PenAl

Doutrina

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

assunto

CóDigo De ProCesso Civil

• artigo 733 do CPC: Procedimento extrajudicial Facultativo (ezequiel morais e ana Kelly rolim assunção) ................................. 9

estatuto Da Pessoa Com DefiCiênCia

• o estatuto da Pessoa com Deficiência (lei nº 3.146/2015), seus Direitos e o Novo Paradigma da Capacidade Civil (leonardoalves de oliveira) ............................................................................. 43

autor

ana Kelly rolim assunção e ezequiel morais

• artigo 733 do CPC: Procedimento extrajudicial Facultativo .............. 9

ezequiel morais e ana Kelly rolim assunção

• artigo 733 do CPC: Procedimento extrajudicial Facultativo .............. 9

leonarDo alves De oliveira

• o estatuto da Pessoa com Deficiência (lei nº 3.146/2015), seus Direitos e o Novo Paradigma da Capacidade Civil .......................... 43

PareCer JuríDiCo

assunto

sentença

• sentença Disponibilizada em Cartório em Dia Distinto Daquele anunciado em audiência. embargos de Declaração opostos por um litisconsorte. interrupção do Prazo para a interposi-ção de recursos pelas Demais Partes. aferição da Tempes-tividade e do interesse recursal. exegese dos artigos 1.026 do NCPC e 897-a da ClT. valorização dos Princípios Cons-titucionais do Processo (Daniel ustárroz) ........................................ 55

autor

Daniel ustárroz

• sentença Disponibilizada em Cartório em Dia Distinto Da-quele anunciado em audiência. embargos de Declaração

opostos por um litisconsorte. interrupção do Prazo para a interposição de recursos pelas Demais Partes. aferição da Tempestividade e do interesse recursal. exegese dos artigos 1.026 do NCPC e 897-a da ClT. valorização dos PrincípiosConstitucionais do Processo ........................................................... 55

PeNal e ProCessual PeNal

assunto

reDução Da maioriDaDe Penal

• um Breve estudo sobre a Questão da redução da maio-ridade Penal: uma involução em matéria Penal (roccoantonio rangel rosso Nelson) ........................................................ 73

autor

roCCo antonio rangel rosso nelson

• um Breve estudo sobre a Questão da redução da maiori-dade Penal: uma involução em matéria Penal ............................... 73

aCórDãos na íntegra

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

assunto

ComPetênCia

• Processual civil – Conflito de competência – suscitação de procedimento de dúvida – regularidade de ato registral – Natureza administrativa – Competência – Juízo estadual de registros públicos – ausência de litígio sobre representaçãosindical (sTJ) ..................................................................................111

Contrato De alienação fiDuCiária

• agravo interno no agravo em recurso especial – Contrato de alienação fiduciária – ausência de verificação dos documen-tos pessoais por ocasião da celebração do contrato – Fortuito interno – responsabilidade civil – Necessidade de reexame de provas – súmula nº 7/sTJ – Dissídio jurisprudencial nãodemonstrado – agravo improvido (sTJ) .........................................119

sentença

• agravo regimental no recurso extraordinário com agravo – Processual civil – ação civil pública – execução de sentença

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Revista JuRídica 470índice cível e Penal

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– legitimidade ativa – Coisa julgada – matéria infraconstitucio-nal – ausência de repercussão geral – Tema nº 848 – verba honorária majorada em 1%, percentual que se soma ao fixado na origem, obedecidos os limites do art. 85, § 2º, § 3º e § 11, do Código de Processo Civil/2015, ressalvada eventual concessão do benefício da justiça gratuita, e multa aplicada no percen- tual de 1%, conforme art. 1.021, § 4º, do Código de Processo Civil – agravo regimental ao qual se nega provimento (sTF) ....... 105

tutela De eviDênCia

• agravo de instrumento – Tutela de evidência – inventário ex-trajudicial – levantamento de valores – Necessidade de auto-rização judicial – requisitos não preenchidos – Decisão man-tida (TrF 2ª r.) .............................................................................. 127

PeNal e ProCessual PeNal

assunto

ComPetênCia

• Conflito negativo de competência – Justiça federal x justi-ça estadual – ação penal – Fraude em licitação destinada à aquisição de gêneros alimentícios para creche em município – recursos de convênio aportados pelo estado e pelo municí-pio – Prestação de contas perante o estado – Competência daJustiça estadual (sTJ) ................................................................... 157

ContrabanDo

• Processo penal – Habeas corpus – Contrabando – art. 334-a do Código Penal – 6.400 (seis mil e quatrocentos) pacotes de cigarro – Quebra de fiança – reincidência – reforço do valor arbitrado – hipossuficiência não comprovada – ordemdenegada (TrF 1ª r.) ................................................................... 165

• Direito penal – moeda falsa – extravio – Condenação(TrF 4ª r.) ................................................................................... .179

emeNTário Civil

assunto

ação anulatória C/C inexistênCia De Débito – DeCisão mono-CrátiCa que não ConheCeu Do reClamo ante a inCiDênCia Da súmula nº 182 Do stJ

• agravo interno em agravo (art. 544 do CPC/1973). ação anu-latória c/c inexistência de débito. Decisão monocrática que não conheceu do reclamo ante a incidência da súmula nº 182 do sTJ. insurgência recursal do autor. 1. razões do agravo interno que não impugnaram especificamente todos os fun-damentos invocados na decisão agravada. Para se viabilizar o conhecimento do agravo regimental/interno, diante do prin-cípio da dialeticidade, é necessário que se impugne especifi-camente todos os fundamentos da decisão agravada, o que não ocorreu na hipótese em exame. súmula nº 182 do sTJ. 2. agravo interno não conhecido ....................................... 34462, 133

ação Cautelar – ConCessão De liminar – agravo De instru-mento

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso especial. ação cautelar. Concessão de liminar. agravo de instrumento.

Prolação de sentença. Prejudicialidade. 1. a prolação de sen-tença julgando, simultaneamente, a demanda principal e a ação cautelar torna prejudicados o recurso especial e, consequen-temente, o presente agravo em recurso especial por cuidarem apenas da liminar concedida nos autos de referida cautelar. Precedentes. 2. agravo interno desprovido ....................... 34463, 133

ação Civil PúbliCa – assoCiação De Defesa De ConsumiDores – Direitos inDiviDuais DisPoníveis – ausênCia De homogeneiDaDe – legitimiDaDe ativa

• recurso especial. Fundos de investimento. ação civil pública. associação de defesa de consumidores. Direitos individuais disponíveis. ausência de homogeneidade. legitimidade ativa. Pré-constituição. requisito temporal não satisfeito. Dispensa. impossibilidade. inexistência de interesse social relevante. ma-téria de fato. verbas de sucumbência. Fundamento não impug-nado. Divergência jurisprudencial não configurada. .......... 34464, 134

ação Civil PúbliCa – Cumulação De ações – resPonsabiliDaDe De soCieDaDe manteneDora De CaDastros restritivos De Cré-Dito Por anotações inDeviDas De DaDos De suPostos inaDim-Plentes

• Direito processual civil. ação civil pública. Cumulação de ações. responsabilidade de sociedade mantenedora de cadastros restritivos de crédito por anotações indevidas de dados de su-postos inadimplentes. Poder de polícia do Banco Central sobre a atividade relativa a cadastros de devedores. 1. a serasa s.a. não é instituição financeira, pois não exerce coleta, interme-diação nem aplicação de recursos financeiros, nem a custó-dia de valor de propriedade de terceiros, seja como atividadeprincipal ou acessória. ....................................................... 34465, 134

ação DeClaratória De inexigibiliDaDe De Débito C/C inDenização Por Danos morais – insCrição inDeviDa em CaDastro De res-trição ao CréDito

• agravo interno em agravo (art. 544 do CPC/1973). ação decla-ratória de inexigibilidade de débito c/c indenização por danos morais. inscrição indevida em cadastro de restrição ao crédi-to. Decisão monocrática negando provimento ao reclamo. in-surgência da demandada. 1. a indenização por danos morais, fixada em quantum em conformidade com o princípio da razoa-bilidade, não enseja a possibilidade de modificação em sede derecurso especial, ante o óbice da súmula nº 7/sTJ .......... 34466, 135

ação DeClaratória De inexistênCia De Débito C/C CanCelamento De Protesto e inDenização Por Danos morais

• agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). ação declaratória de inexistência de débito c/c cancelamento de protesto e indenização por danos morais. Decisão monocrática que negou provimento ao reclamo. insurgência da instituição bancária. 1. No tocante à alegada afronta aos arts. 4º e 5º da liNDB, incide, na espécie, o óbice da súmula nº 282/sTF, em razão da ausência de prequestionamento, porquanto tais normas não tiveram o competente juízo de valor aferido, nem interpretada ou a sua aplicabilidade afastada ao caso concretopelo Tribunal de origem. .................................................... 34467, 136

ação De Cobrança – não imPugnação Do funDamento Da DeCisão que inaDmitiu o reCurso esPeCial – Confirmação Da inCiDênCia

• agravo interno no agravo em recurso especial. ação de co-brança. Não impugnação do fundamento da decisão que inadmitiu o recurso especial. Confirmação da incidência da

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 470

dezembRo/2016

217

súmula nº 182/sTJ. recurso não provido. 1. a ausência de impugnação específica, na petição de agravo em recurso especial, dos fundamentos da decisão que não admite o apelo especial atrai a incidência do óbice previsto na súmula nº 182 do superior Tribunal de Justiça. 2. agravo interno aque se nega provimento .................................................... 34468, 136

ação De Cobrança – não imPugnação Dos funDamentos Da DeCisão que inaDmitiu o reCurso esPeCial

• agravo interno no agravo em recurso especial. ação de co-brança. Não impugnação dos fundamentos da decisão que inadmitiu o recurso especial. Confirmação da incidência da súmula nº 182/sTJ. recurso não provido. 1. Na hipótese em exame, aplica-se o enunciado nº 2 do Plenário do sTJ: “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do superior Tribunal de Justiça” ............................................. 34469, 137

agravo – aDvogaDo subsCritor Do reCurso esPeCial sem Pro-Curação nos autos

• agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). advoga-do subscritor do recurso especial sem procuração nos autos. incidência da súmula nº 115/sTJ. 1. Na instância especial, à luz da jurisprudência consolidada durante a vigência do CPC/1973, é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos (súmula nº 115/sTJ). vício não sanável por juntada posterior de mandato ou substabelecimento, uma vez inaplicável o disposto no art. 13 do CPC/1973 na ins- tância extraordinária. Precedentes. 2. agravo regimental des-provido ............................................................................... 34470, 137

agravo interno no agravo em reCurso esPeCial – CóDigo De ProCesso Civil De 2015 – aPliCabiliDaDe

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso especial. Código de processo civil de 2015. aplicabilidade. argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Decisão que inadmitiu o recurso especial. Fundamentos. ausência deimpugnação específica ...................................................... 34471, 138

agravo interno no agravo em reCurso esPeCial – CóDigo De ProCesso Civil De 2015 – aPliCabiliDaDe

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso especial. Código de Processo Civil de 2015. aplicabilidade. argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Decisão que inadmitiu o recurso especial. Fundamentos. ausência deimpugnação específica. .................................................... 34472, 138

Casamento PreCeDiDo De longa união estável – matrimônio ContraíDo Por Pessoa Com mais De 60 anos – regime De sePa-ração obrigatória De bens

• recurso especial. Direito civil. Família. matrimônio contra-ído por pessoa com mais de 60 anos. regime de separação obrigatória de bens. Casamento precedido de longa união es-tável iniciada antes de tal idade. recurso especial não provido ........................................................................................... 34473, 139

Contrato banCário – ausênCia De Prequestionamento – sú-mula nº 211/stJ – aPliCação Do art. 285-a Do CPC/1973

• agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil (CPC/1973). Contrato bancário. ausência de preques-tionamento. súmula nº 211/sTJ. aplicação do art. 285-a do

CPC/1973. razões dissociadas do julgado. súmula nº 284/sTF. Dissídio não demonstrado. revisão de honorários. ausência de indicação do dispositivo legal violado. súmula nº 284/sTF.agravo interno desprovido” ................................................ 34474, 139

Contrato De PartiCiPação finanCeira – ComPlementação De ações – funDamentos Da DeCisão agravaDa não imPugnaDos

• agravo interno no agravo em recurso especial. Contrato de participação financeira. Complementação de ações. Funda-mentos da decisão agravada não impugnados. agravo não co-nhecido .............................................................................. 34475, 139

embargos à exeCução – DuPliCata merCantil – reCesso forense

• agravo interno no agravo em recurso especial. embargos à execução. Duplicata mercantil. Processual civil. intempesti-vidade do recurso especial. recesso forense. ausência de documento hábil para comprovar a tempestividade do recurso.agravo improvido. .............................................................. 34476, 140

embargos De DeClaração no agravo interno no reCurso es-PeCial – CóDigo De ProCesso Civil De 2015 – aPliCabiliDaDe

• Processual civil. embargos de declaração no agravo interno no recurso especial. Código de Processo Civil de 2015. apli-cabilidade. omissão. violação de dispositivos constitucionais. impossibilidade de análise. Competência do supremo Tribunal Federal. ausência de vícios ............................................... 34477, 141

exeCução – aDJuDiCação De imóvel – Co-CreDores – interven-ção – inaDmissibiliDaDe

• agravo interno no agravo em recurso especial. execução. adjudicação de imóvel. Co-credores. reexame. súmula nº 7 do sTJ. intervenção. inadmissibilidade. Fundamento. súmula nº 283 do sTF. solidariedade ativa. Prequestionamento. súmula nº 211 do sTJ. Não provimento. 1. Não cabe, em recurso es-pecial, reexaminar matéria fático-probatória (súmula nº 7/sTJ). 2. as questões não examinadas pelo Tribunal de origem care-cem do indispensável prequestionamento, incidindo, no caso dos autos, os enunciados nº 211 da súmula do superior Tribunal de Justiça e 282 do supremo Tribunal Federal. 3. agravo inter--no a que se nega provimento ............................................ 34478, 141

exeCução – inaDimPlemento – ComPromisso De ComPra e ven-Da – título exeCutivo

• agravo interno no agravo em recurso especial. execução. inadimplemento. Compromisso de compra e venda. Título exe-cutivo. Fundamentos da decisão agravada não impugnados. agravo não conhecido. 1. Na hipótese em exame, aplica-se o enunciado nº 3 do Plenário do sTJ: “aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC”. 2. É invi-ável o agravo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 3. o recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, no montante equivalente a 1% sobre o valor atua- lizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro re-curso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do citado artigo de lei. 4. agravo interno não conhecido, com aplicação de multa ................................... 34479, 142

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Revista JuRídica 470índice cível e Penal

dezembRo/2016

Posse – Direito Civil e ProCessual Civil – bem PúbliCo Do-miniCal – litígio entre PartiCulares – interDito Possessório – PossibiliDaDe

• recurso especial. Posse. Direito civil e processual civil. Bem pú-blico dominical. litígio entre particulares. interdito possessório. Possibilidade. Função social. ocorrência .......................... 34480, 142

reCurso – interPosição na vigênCia Do CPC/1973 – ausênCia De imPugnação De toDos os funDamentos Da DeCisão De inaD-missibiliDaDe

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso es-pecial. recurso interposto na vigência do CPC/1973. au-sência de impugnação de todos os fundamentos da decisão de inadmissibilidade. súmula nº 182/sTJ. Decisão mantida. 1. o agravante deve atacar, de forma específica, todos os fundamentos da decisão que, na origem, inadmitiu o recurso especial. aplicação do art. 544, § 4º, i, do CPC/1973 e, por analogia, da súmula nº 182/sTJ. 2. agravo interno a que senega provimento ................................................................ 34481, 143

reCurso esPeCial – CóDigo De ProCesso Civil De 2015 – aPli-CabiliDaDe

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso especial. Código de Processo Civil de 2015. aplicabilidade. argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Decisão que inadmitiu o recurso especial. Fundamentos. ausência de im-pugnação específica. usurpação de competência desta Corte no exercício de admissibilidade do recurso. inocorrência. inci-dência da súmula nº 123/sTJ ........................................... 34482, 143

reCurso esPeCial – PreParo a menor – intimação Da reCor-rente Para ComPlementação – DesCumPrimento – Deserção

• agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil. recurso especial. Preparo a menor. intimação da recorrente para complementação. Descumprimento. Deserção. embargos declaratórios contra decisão que não admite recurso especial. recurso manifestamente incabível. Não interrupção do prazo para interposição do agravo do art. 544 do CPC. intempes-tividade. agravo não provido. ............................................ 34483, 144

resPonsabiliDaDe Civil – aCiDente De trânsito – ausênCia De imPugnação

• Processual civil e administrativo. agravo regimental no agra-vo em recurso especial. responsabilidade civil. acidente de trânsito. ausência de impugnação dos fundamentos da deci-são que inadmitiu o recurso especial. aplicação da súmula nº 182/sTJ que se mantém. agravo regimental da Compa-nhia riograndense de saneamento – Corsan a que se negaprovimento ......................................................................... 34484, 144

resPonsabiliDaDe Civil – atroPelamento em via férrea – mor-te Da vítima – Danos morais aos irmãos – Cabimento

• agravo interno no recurso especial. Civil e processual civil. responsabilidade civil. atropelamento em via férrea. morte da vítima. Danos morais aos irmãos. Cabimento. Despesas de funeral e sepultamento. Prova. Desnecessidade. agravo des-provido ............................................................................... 34485, 145

resPonsabiliDaDe Civil – morte De menor Por afogamento – resPonsabiliDaDe Do Clube Pela falha no serviço – Dano moral – quantum inDenizatório

• recurso especial. responsabilidade civil. morte de menor por afogamento. responsabilidade do clube pela falha no

serviço. Dano moral. Quantum indenizatório. Critérios de ar-bitramento equitativo. método bifásico. Núcleo familiar sujeito do dano. Necessidade de individualização da indenização.Pensão mensal devida ...................................................... 34486, 148

resPonsabiliDaDe Civil – notíCia veiCulaDa em sítio eletrôniCo e blog na internet – Dano à honra ConfiguraDo

• agravo interno no agravo em recurso especial. responsabilida-de civil. Notícia veiculada em sítio eletrônico e blog na internet. Dano à honra configurado. acórdão com fundamentação cons-titucional. inviabilidade de exame em sede de recurso especial. impugnação de fundamento não adotado pela decisão agra-vada. súmula nº 284/sTF. agravo interno não provido ..... 34487, 149

sistema finanCeiro Da habitação – ação orDinária – aPóliCe De seguro De natureza PúbliCa

• agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC/1973). sistema financeiro da habitação. ação ordinária. apólice de seguro de natureza pública. Despacho determinando a redistribuição do apelo a uma das turmas que compõem a primeira seção. in-surgência dos autores. 1. segundo a orientação jurisprudencial desta Corte superior, “é irrecorrível o despacho que determina a redistribuição ou atribuição dos autos, haja vista tratar-se de ato meramente ordinatório bem como inexistir conteúdo decisório apto a causar gravame às partes” (TJ, agrg-rcl 9.858/Ce, rel. min. Felix Fischer, Corte especial, DJe de25.04.2013). 2. agravo regimental não conhecido ............ 34488, 150

sistema finanCeiro Da habitação – ação orDinária – ausênCia De ProCuração outorgaDa ao subsCritor

• agravo interno no recurso especial. Processual civil. sistema financeiro da habitação. ação ordinária. ausência de procura-ção outorgada ao subscritor do agravo interno. intimação para regularização da representação processual. Não atendimento. Não conhecimento. 1. Nos termos do art. 76, § 2º, i, do Có-digo de Processo Civil, não se conhece do recurso quando a parte recorrente descumpre a determinação para regulariza-ção da representação processual. 2. agravo interno não co-nhecido .............................................................................. 34489, 150

soCieDaDe – Dissolução e liquiDação – ausênCia De Peça obrigatória

• agravo interno no agravo em recurso especial. Dissolução e liquidação de sociedade. ausência de peça obrigatória. art. 525 do CPC/1973. Fundamentos da decisão agravada nãoimpugnados. agravo não conhecido. ................................ 34490, 151

usuCaPião extraorDinária urbana – ProCessual Civil – reCur-so esPeCial interPosto Contra DeCisão monoCrátiCa

• agravo interno no agravo em recurso especial. usucapião extra-ordinária urbana. Processual civil. recurso especial interposto contra decisão monocrática. Hipótese em que não houve o exaurimento das vias ordinárias. incidência da súmula nº 281 do sTF. Precedentes. agravo desprovido. ........................ 34491, 151

emeNTário PeNal

assunto

Crime Contra a aDministração PúbliCa

• Processual penal. Habeas corpus. Crimes contra a adminis-tração pública. organização criminosa. alegada ausência de

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 470

dezembRo/2016

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fundamentação do decreto prisional. segregação cautelar devidamente fundamentada na garantia da ordem pública econveniência da instrução criminal. ordem denegada ...... 31714, 191

Crime De resPonsabiliDaDe

• agravo regimental no recurso extraordinário. Penal e processual penal. Crime previsto no art. 1º, i, do Decreto-lei nº 201/1967. Crime de responsabilidade. Perda do cargo e inabilitação para exercício de cargo ou função pública. Penas autônomas em relação à pena privativa de liberdade. Prazos prescricionais distintos. acórdão recorrido divergente da jurisprudência desta suprema Corte. agravo regimental desprovido ................. 31715, 193

DenúnCia

• agravo regimental em recurso especial. arts. 149, caput, e 297, § 4º, ambos do Código Penal. alegada inépcia da denún-cia. Não ocorrência. Denúncia que atende aos requisitos doart. 41 do CPP. agravo desprovido. .................................. 31716, 193

embriaguez ao volante

• apelação crime. embriaguez ao volante (art. 306 do CTB). Procedência da denúncia. apelo da defesa. Pleito absolutó-rio. inviabilidade. Provas suficientes a demonstrar a autoria e a materialidade delitivas. Crime praticado na vigência da lei nº 12.760/2012. Possibilidade de aferição da embriaguez por outros meios de prova. Testemunho de policiais. validade e relevância. redução da pena-base ao seu mínimo legal. Não cabimento. valoração desfavorável da circunstância judicial re-ferente às consequências do crime. Colisão em muro devido ao estado de embriaguez, causando danos a terceiros. Pedido de redução da pena provisória aquém do mínimo legal, alegando preponderância da atenuante da confissão espontânea sobre a agravante prevista no art. 298, iii, do CTB. impossibilidade compensação escorreita. súmula nº 231 do sTJ. isenção das custas processuais. Justiça gratuita. Não conhecimento. Competência do juízo da execução. recurso parcialmente co-nhecido, e na parte conhecida, desprovido. ...................... 31717, 193

estelionato

• recurso especial. art. 171, § 3º, do CP. estelionato. emissão de atestado médico falso para saque de FGTs. incompetência do juízo. Princípio da especialidade. ausência de prequestio-namento. Não oposição de embargos declaratórios. súmulas nºs 282 e 356 do sTF. inépcia da denúncia. Não ocorrência. interceptações telefônicas. Transcrição integral. Desnecessi-dade. argumentos acerca da efetiva realização de consulta médica para obtenção do atestado médico, de absolvição na esfera administrativa, de não comprovação do ânimo as-sociativo, de ausência de dolo para obtenção do resultado fraudulento, de inversão do ônus da prova e de incidência da excludente de culpabilidade consubstanciada na inexigibilida-de de conduta diversa. ausência de indicação dos artigos de lei federal violados. Deficiência na fundamentação. súmula nº 284/sTF. súmula nº 7/sTJ. Participação de menor importân-cia. erro de tipo. Crime impossível. reconhecimento. Necessi-dade de reexame de provas. súmula nº 7/sTJ. Dosimetria da pena. Pena-base. Circunstâncias judiciais desfavoráveis. Cul-pabilidade e maus antecedentes. motivação inidônea ..... 31718, 194

estuPro

• agravo regimental em recurso especial. Penal. estupro. Ten-tativa. reconhecimento. aplicação. Princípio da proporciona-lidade. matéria exclusivamente constitucional. Discussão emrecurso especial. inviabilidade. ......................................... 31719, 198

exeCução Penal

• execução penal. Homologação de falta grave. Posse de bate-ria e chips telefônicos no interior de estabelecimento prisional (art. 50, vii, leP). alegada ausência de materialidade. improce-dência. Prescindibilidade de prova técnica para caracterização da transgressão. a posse de aparelho celular ou de qualquer de seus componentes no interior de estabelecimento prisional configura falta grave, sendo desnecessária a realização de perícia para atestar a sua funcionalidade. recurso desprovido ........................................................................................... 31720, 198

• Habeas corpus. execução penal. Trabalho externo na condi-ção de autônomo. leP, art. 114. a exigência de apresentação de proposta formal de emprego deve sofrer temperamen-tos. Precedentes. Princípio constitucional da fraternidade. Preâmbulo e art. 3º da CF/1988. “regras de mandela”. as-sembleia-geral das Nações unidas. aplicação. .................. 31721,199

extraDição

• extradição instrutória. Tratado de extradição entre a repú-blica Federativa do Brasil e a república argentina. Crime de homicídio. Dupla tipicidade atendida. Prescrição. inocorrência. Discussão de mérito e parcialidade do juízo requerente. via imprópria. Contenciosidade limitada. Problemas de saúde do extraditado. Circunstância que não impede a extradição. atendi-mento a todos os requisitos legais. extradição deferida ... 31722, 199

furto qualifiCaDo

• Habeas corpus. Furto qualificado. sentença penal condena-tória. reincidência e reiteração delitiva. regime semiaberto. réu preso durante a instrução processual. Negativa do direi-to de recorrer em liberdade. a negativa do direito de recorrer em liberdade, mediante a verificação da persistência dos motivos da prisão preventiva para garantia da ordem pública na sentença penal condenatória, em virtude da reincidência específica e da reiteração delitiva do paciente em crimes patri-moniais da mesma e de outras espécies, constitui fundamento suficiente, necessário e adequado. o paciente respondeu o processo custodiado e a carta de guia provisória já foi ex-pedida, de sorte que os benefícios da execução penal serão concedidos pelo Juízo competente, após a unificação das reprimendas. inócua seria a aplicação de qualquer outra me-dida cautelar diversa da prisão, diante da reiteração crimino-sa. Habeas corpus denegado ............................................ 31723, 200

homiCíDio CulPoso

• apelação. Homicídio culposo na direção de motocicleta. art. 302, parágrafo único, inciso i da lei de Trânsito. recurso defensivo, arguindo preliminar de nulidade do processo por inépcia da denúncia, porque, segundo alega, não teria descrito o fato criminoso com todas as suas circunstâncias. No méri-to, requer: b) a absolvição do réu, b1) por alegada fragilidade probatória, b2) por não ter restado comprovado que o mesmo conduzia sua motocicleta de maneira imprudente, b3) por ale-gada ausência de nexo causal entre a conduta do acusado e a morte da vítima. subsidiariamente pugna: c) pela substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, d) o reconhecimento da forma tentada do delito, e e) a gratuidade de justiça. Por fim prequestiona toda a matéria arguida no recur-so. apelo conhecido e parcialmente provido ..................... 31724, 201

homiCíDio qualifiCaDo

• Habeas corpus. Homicídio qualificado e corrupção de menores. Decretação de prisão preventiva. Presença dos requisitos auto-

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Revista JuRídica 470índice cível e Penal

dezembRo/2016

rizadores da custódia cautelar. exegese do art. 312 do Código de Processo Penal. Fundamentação idônea. Decisão motivada nas circunstâncias do caso concreto. evidente necessidade da prisão preventiva por conveniência da instrução criminal. Cons-trangimento ilegal não verificado ordem denegada ........... 31725, 202

• recurso ordinário em habeas corpus. Homicídio qualificado. motivo torpe. recurso que dificultou a defesa da vítima. Pri-são temporária convertida em preventiva. superveniência da pronúncia. ausência de manifestação quanto à manutenção da custódia cautelar. ofensa ao disposto no art. 413, § 3º, do CPP. Constrangimento ilegal evidenciado. Concessão parcialda ordem ............................................................................ 31726, 203

inDulto natalino

• agravo. execução penal. Pedido de indulto natalino (Decreto Presidencial nº 8.615/2015). indeferimento na origem. ape-nado reputado como reincidente. utilização do fracionamento de 1/3 (um terço) sobre a pena. equívoco quanto à condição de reincidência. Trânsito em julgado da condenação primitiva posterior ao segundo crime praticado. Primariedade consi-derada. Fração de 1/4 (um quarto). aspecto objetivo satis-feito. ausência de informações acerca do preenchimento do requisito subjetivo. Determinação para que o juízo aprecie o benefício com base na situação comportamental do reedu-cando. recurso provido em parte ...................................... 31727, 203

Júri

• recurso em sentido estrito. Júri. Homicídio. art. 121, § 2º, incs. i, iv e vi, CP. Prova da materialidade. indícios de auto-ria. Presença. in dubio pro societate. impronúncia. Desclas-sificação. impossibilidade. Qualificadoras. Decote. inviabili-dade. Na fase da pronúncia, vigora o princípio in dubio pro societate, onde as dúvidas se resolvem em favor da socie-dade, não do réu. Basta prova da materialidade e indícios suficientes da autoria, sendo defeso ao Julgador incursionar demasiadamente na prova, sob pena de subtrair sua aprecia-ção da competência do Juiz natural da causa ................... 31728, 203

lesão CorPoral seguiDa De morte

• apelação crime. Condenação. lesão corporal seguida de mor-te. insurgência quanto à dosimetria. Pleito de afastamento das agravantes. motivo fútil. ausência de motivação. exclusão que se impõe. manutenção da agravante prevista no art. 61, inc. ii, e, do Código Penal, eis que praticada contra irmão. redução da pena. Pedido de arbitramento de honorários advocatícios pela atuação do defensor dativo em segundo grau de jurisdição. acolhimento. recurso parcialmente provido ..................... 31729, 204

Porte ilegal De arma De fogo

• recurso em habeas corpus. Porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. Prisão. Nulidade. Decretação de ofício. inocor-rência. mera conversão da prisão em flagrante. Não sub-missão do acusado a audiência de custódia. superação pela decretação da prisão preventiva. segregação devidamente fundamentada. Histórico criminal do agente. reincidência. Periculosidade concreta evidenciada. ausência de flagrante ilegalidade. recurso em habeas corpus desprovido ......... 31730, 204

reCePtação

• Penal. Habeas corpus substitutivo de recurso próprio. recep-tação. regime fechado. Carência de fundamentação idônea. Pena-base acima do mínimo legal. regime semiaberto cabível.

substituição da pena corporal por restritiva de direitos. maus antecedentes. impossibilidade de concessão do benefício. Writ não conhecido e habeas corpus concedido de ofício ........ 31731, 205

reinCiDênCia

• Processual penal. agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. reincidência. art. 61, i, do Código Penal. Dispo-sitivo constitucional (re 453.000-rG, rel. min. marco aurélio, Tema nº 114). agravo regimental a que se nega provimento ........................................................................................... 31732, 206

roubo CirCunstanCiaDo

• recurso ordinário em habeas corpus. roubo circunstanciado (concurso de pessoas e uso de arma de fogo). Prisão preventi-va. Preenchimento dos requisitos. Gravidade concreta do delito. Necessidade de garantir a ordem pública. Condições pesso-ais favoráveis. irrelevância. medidas cautelares do art. 319 do CPP. inviabilidade. Coação ilegal não demonstrada. re-curso desprovido ............................................................... 31733, 206

suPerior tribunal militar

• Habeas corpus. Penal e processual penal militar. saque indevi-do de pensão militar após o falecimento do beneficiário (art. 251 do CPm). Competência da justiça militar. lei de organização Judiciária militar. Julgamento de civil pelo Conselho Permanen-te de Justiça. Conformidade com a legislação em vigor. Dosi-metria da pena. exasperação da pena-base. Fundamentação idônea. Confissão espontânea. Não incidência ................. 31734, 207

tortura

• recurso em habeas corpus. Tortura. Conversão da prisão pre-ventiva em prisão domiciliar. lei nº 13.257/2016. acusada que possui duas filhas menores de 12 anos. Possibilidade. acusada primária, com bons antecedentes e residência fixa. recurso provido. 1. embora o pedido originário tenha ocorrido antes da edição da lei nº 13.257/2016, o presente recurso será analisado à luz do inciso iii e do inciso v, introduzido pela referida lei, por se tratar de lei posterior mais benéfica. ....................... 31735, 208

tráfiCo De Drogas

• Habeas corpus substitutivo. Tráfico de drogas. aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da lei nº 11.340/2006. impossibilidade. Dedicação à atividade criminosa. reexa-me de provas. regime prisional fechado. ilegalidade não evidenciada. Não conhecimento. 1. esta Corte e o supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmen-te previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de fla-grante ilegalidade no ato judicial impugnado. .................... 31736, 210

• Processual penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas. Fi-xação do regime inicial fechado. Quantum da pena com-patível com regime mais brando. Quantidade e natureza da droga utilizados para calibrar o grau de redução da pena do tráfico privilegiado e para impor regime prisional mais rigoroso. Possibilidade ...................................................... 31737, 210

tráfiCo De entorPeCente

• art. 543-C, § 7º, ii, CPC c/c art. 1.040, ii, do NCPC. Juízo de retratação em recurso especial. Tráfico privilegiado. art. 33, § 4º, da lei nº 11.343/2006. Caráter hediondo do delito afasta-

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 470

dezembRo/2016

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do pelo pleno do sTF. retificação do levantamento de penas. Necessidade. Fixação de regime prisional aberto. viabilidade. substituição da pena. Possibilidade. recurso provido. a aplica-ção da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da lei nº 11.343/2006 afasta a hediondez do crime de tráfico de drogas, segundo o entendimento adotado pelo supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus nº 118.533. sendo fixa-da a reprimenda corporal entre os patamares de um e quatro anos e as circunstâncias judiciais amplamente favoráveis ao agente, primário, deve ser fixado o regime prisional aberto para o cumprimento da pena. a ré tem direito à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, se preen-che os requisitos do art. 44 do Código Penal .....................31738, 211

• Habeas corpus substituto de recurso. inadequação da via eleita. Tráfico ilícito de entorpecentes. Crime cometido na vigência da lei nº 6.368/1976. Pena-base. expressiva quan-tidade de entorpecentes. Critério idôneo para a exasperação. Pleito de aplicação da minorante prevista no § 4º do art. 33 da lei nº 11.343/2006. Combinação de leis. inviabilidade. súmula nº 501/sTJ. Paciente reincidente. Não preenchi-mento dos requisitos para a incidência do redutor. regime inicial fechado. Paciente reincidente, com análise negativa das circunstâncias judiciais, condenado à pena superior a 4 anos de reclusão. ilegalidade não configurada. substitui-ção. Pena mantida em patamar superior a 4 anos. inviabilida-de. Constrangimento ilegal não configurado. Habeas corpusnão conhecido ....................................................................31739, 211

uso De algemas

• embargos de declaração nos embargos de divergência nos embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. embargos recebidos como agra-

vo regimental. art. 335, § 2º, risTF. Penal. Penal e processo penal. Condenação. art. 121, § 2º, iv c/c art. 14, ii, CP. Tri-bunal do júri. uso de algemas. Julgamento do júri anterior à publicação da súmula vinculante nº 11 do sTF. ausência de impugnação específica da decisão agravada. inexistência de demonstração objetiva do dissenso jurisprudencial. alegada extinção da punibilidade pelo decurso do prazo prescricional. inocorrência. recursos inadmitidos na origem não obstam o trânsito em julgado do decreto condenatório. Precedentes. a sucessiva interposição de recursos contrários à jurisprudência consolidada pelo pretório excelso configura abuso do direito de recorrer. Precedentes. Caráter protelatório do recurso. De-terminada a certificação do trânsito em julgado com a conse-quente baixa imediata dos autos. agravo regimental desprovido ........................................................................................... 31740, 212

violênCia DoméstiCa

• apelação criminal. violência doméstica. Crime de lesão corporal (art. 129, § 9º do CP). Princípio da desnecessidade da pena. incabível no caso concreto. Pedido de afastamento da indeni-zação mínima e pleito de redução de juros. inviabilidade. Pleito na denúncia. mantida a condenação á reparação de danos. Juros de mora mantidos. recurso improvido. mesmo que após o fato, apelante e vítima tenham se reconciliado, necessária a imposição da pena, devido à gravidade da conduta, que foi le-são corporal (art. 129, § 9º do Código Penal). De acordo com o art. 387, iv, CPP, o juiz deve fixar valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, ademais, no caso presente ocorreu pleito expresso do mP na denúncia, do qual o réu teve ciência e do qual pôde se defender durante toda a instrução do feito. os juros moratórios devem fluir a partir do evento da-noso, em atenção jurisprudência da súmula nº 54 do superior Tribunal de Justiça. Com o parecer, recurso improvido..... 31741, 212