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Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Revista Jurídica: órgão nacional de doutrina, jurisprudência, legislação e crítica judiciária. Ano 65, nº 471, Janeiro de 2017.

Diretor: Elton José Donato

Bimestral: 1953-1962; trimestral: 1963-1965; irregular: 1966-1967; anual: 1968; trimestral: 1977; bimestral: 1982; mensal: 1988

Tiragem: 4.000 exemplares

ASSINATURAS: São Paulo: (11) 2188-7507 – Demais Estados: 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico:São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188-7900

Demais Estados: 0800.7247900

Os conceitos emitidos em trabalhos assinados são de responsabilidade de seus autores. Os originais não serão devolvidos, embora não publicados. Os artigos são divulgados no idioma original ou traduzidos.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias dos originais obtidas na Secretaria do Supremo Tribunal Federal e dos demais tribunais.

Proibida a reprodução parcial ou total, sem autorização dos editores.

E-mail para remessa de artigos: [email protected]

© Revista Jurídica®

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036-060 – São Paulo – SPwww.sage.com.br

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SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

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ISSN 0103-3379

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ANO 65 – JANEIRO DE 2017 – Nº 471

RepositóRio AutoRizAdo de JuRispRudênciASupremo Tribunal Federal: 03/85

Superior Tribunal de Justiça: 09/90Tribunais Regionais Federais 1ª, 2ª e 4ª Regiões

FundAdoR

Professor Angelito Asmus Aiquel

diRetoR executivo

Elton José Donato

GeRente editoRiAl

Milena Sanches Tayano dos Santos

cooRdenAdoR editoRiAl

Cristiano Basaglia

conselho editoRiAlAda Pellegrini Grinover – Alexandre Pasqualini – Alexandre Wunderlich

Anderson Vichinkeski Teixeira – Antonio Janyr Dall’Agnol Jr.Araken de Assis – Arruda Alvim – Carlos Alberto Molinaro

Cezar Roberto Bitencourt – Daniel Francisco Mitidiero – Daniel UstárrozDarci Guimarães Ribeiro – Eduardo Arruda Alvim – Eduardo de Oliveira Leite

Eduardo Talamini – Ênio Santarelli Zuliani – Fátima Nancy AndrighiFredie Didier Júnior – Guilherme Rizzo Amaral – Humberto Theodoro Júnior

Ingo Wolfgang Sarlet – Jefferson Carús GuedesJoão José Leal – José Carlos Barbosa Moreira – José Maria Rosa TesheinerJosé Roberto Ferreira Gouvêa – José Rogério Cruz e Tucci – Juarez Freitas

Lúcio Delfino – Luis Guilherme Aidar Bondioli Luís Gustavo Andrade Madeira – Luiz Edson Fachin – Luiz Guilherme MarinoniLuiz Manoel Gomes Júnior – Luiz Rodrigues Wambier – Márcio Louzada Carpena

Mariângela Guerreiro Milhoranza – Paulo Luiz Netto LôboRolf Madaleno – Salo de Carvalho – Sergio Cruz Arenhart

Sérgio Gilberto Porto – Teresa Arruda Alvim Wambier – William Santos Ferreira

colAboRAdoRes destA ediçãoAldem Johnston Barbosa Araújo, Gelson Amaro de Souza,

João Carlos Leal Júnior, Marlene Kempfer, Raphael Silva Rodrigues, Ricardo Moraes Cohen

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Sumário

Su

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Doutrinas

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

1. A Razoável Duração do Processo no Âmbito do Sistema Brasileiro de Defesa da ConcorrênciaJoão Carlos Leal Júnior e Marlene Kempfer ...................................9

2. O Impacto do Regime das Tutelas de Urgência do Novo Código de Processo Civil nas Medidas Cautelares Adotadas pela Administração Pública e a Possibilidade da Interposição de Agravo de Instrumento em Processos AdministrativosAldem Johnston Barbosa Araújo ..................................................39

3. Fraude à Execução e o Elemento Subjetivo no CPC/2015Gelson Amaro de Souza ...............................................................71

Penal e ProCessual Penal

1. A Figura do Inquérito Policial e do Contraditório no Novo Código de Processo CivilRaphael Silva Rodrigues e Ricardo Moraes Cohen .......................89

Jurisprudência

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ..........................................................113

2. Superior Tribunal de Justiça .......................................................121

3. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .....................................135

4. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .....................................145

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial ....151

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Penal e ProCessual Penal

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça .......................................................175

2. Superior Tribunal de Justiça .......................................................185

3. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .....................................197

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Penal e Processual Penal .....................207

Índice Alfabético e Remissivo ...................................................227

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EDITORIAL

A Revista Jurídica trata de temas atuais e de suma relevância aos profissionais do direito. Os trabalhos doutrinários, de autoria de relevantes juristas, são divididos nas áreas cível e penal.

Doutrina Cível

O Mestre João Carlos Leal Júnior e a Doutora Marlene Kempfer afir-mam que o direito fundamental à razoável duração do processo judicial e administrativo, incorporado ao Texto Constitucional com a promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004, positiva o valor da eficiência a que se refere o art. 37 da Constituição de 1988. Introduzido pela Emenda Constitu-cional nº 19/1998, este valor é o fundamento para uma gestão gerencial dos interesses públicos que deve orientar a atuação do Estado por meio dos seus três órgãos políticos. Esta interpretação dirigida aos processos administrati-vos econômicos tem especial relevância, pois a dinâmica da vida econômica contemporânea é incompatível com fluxos e exigências processuais ou impo-sições que retardam, sem motivação válida, as decisões que têm repercussão na gestão empresarial e no mercado interno. É fato que o direito à razoável duração do processo não autoriza desconsiderar os demais direitos funda-mentais como o devido processo, que possibilita o contraditório e a ampla defesa, a transparência e as demais normas que estruturam o processo para alcançar manifestação estatal justa sobre a pretensão do administrado. Sendo assim, diante dos pleitos administrativos econômicos, o Sistema Brasileiro da Concorrência (SBDC), por meio dos seus órgãos, entre eles, o Conselho Administrativo de Defesa da Concorrência (Cade) deve agir considerando as importantes consequências de sua atuação para as relações econômicas. Este destaque se comprova a partir das competências do Cade nos termos da Lei nº 12.529/2011. A sua atuação para julgar as condutas anticoncorrenciais ou a pretensão de reestruturação societária demonstra a possibilidade jurídica da forte intervenção estatal. Este grau de interferência será justificado se, além de defender o regime econômico brasileiro (art. 170, CF/1988), não preju-

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dicar os negócios jurídicos privados pela ineficiência da atuação quanto às pretensões dos administrados.

O Especialista Aldem Johnston Barbosa Araújo discorre sobre a adoção de medidas cautelares nos processos administrativos por parte da Adminis-tração Pública que visando resguardar o interesse público é uma previsão encontrada em vários dispositivos da legislação administrativa. Com a entra-da em vigor do novo Código de Processo Civil foi instituído no ordenamento jurídico pátrio um novo regime para as tutelas de urgência que engloba tanto a tutela antecipada como a tutela cautelar. Em virtude da aplicação supletiva e subsidiária das normas do novo Código de Processo Civil, faz-se necessário analisar os impactos do novo regime das tutelas de urgência nos processos administrativos.

O Doutor Gelson Amaro de Souza pretende demonstrar que vem de longe o entendimento de que para a configuração da fraude de execução não é necessário analisar o elemento subjetivo das partes (vendedor e compara-dor), bastando, tão somente o negócio visto sob o ponto de vista objetivo. Procurou-se demonstrar a necessidade de se levar em conta o elemento sub-jetivo (dolo) com as vontades livres e conscientes do vendedor e do compra-dor, sem as quais não se pode falar em fraude à execução.

Doutrina Penal

O Professor Raphael Silva Rodrigues e o Especialista Ricardo Mora-es Cohen têm por escopo analisar o inquérito policial sob o paradigma da processualidade democrática, notadamente em cotejo com o princípio do contraditório inserto no Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.03.2015).

Os Editores

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Doutrina

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Cível

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A rAzoável durAção do processo no âmbito do sistemA brAsileiro

de defesA dA concorrênciAreAsonAble durAtion of process in the

brAziliAn system of defense of competitionJoão Carlos leal Júnior

Mestre em Direito pela UEL/PR, Advogado e Professor Universitário.

Marlene KeMpfer

Doutora em Direito pela PUC/SP, Professora dos Cursos de Graduação e Mestrado da UEL/PR.

RESUMO: O direito fundamental à razoável duração do pro-cesso judicial e administrativo, incorporado ao Texto Cons-titucional com a promulgação da Emenda Constitucional nº 45/2004, positiva o valor da eficiência a que se refere o art. 37 da Constituição de 1988. Introduzido pela Emenda Constitucional nº 19/1998, este valor é o fundamento para uma gestão gerencial dos interesses públicos que deve orien-tar a atuação do Estado por meio dos seus três órgãos polí-ticos. Esta interpretação dirigida aos processos administrati-vos econômicos tem especial relevância, pois a dinâmica da vida econômica contemporânea é incompatível com fluxos e exigências processuais ou imposições que retardam, sem mo-tivação válida, as decisões que têm repercussão na gestão em-presarial e no mercado interno. É fato que o direito à razoável duração do processo não autoriza desconsiderar os demais di-reitos fundamentais como o devido processo, que possibilita o

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contraditório e a ampla defesa, a transparência e as demais normas que estruturam o processo para alcançar manifestação estatal justa sobre a pretensão do administrado. Sendo assim, diante dos pleitos administrativos econômicos, o Sistema Brasileiro da Concorrência (SBDC), por meio dos seus órgãos, entre eles, o Conselho Adminis-trativo de Defesa da Concorrência (Cade), deve agir considerando as importantes consequências de sua atuação para as relações eco-nômicas. Este destaque se comprova a partir das competências do Cade nos termos da Lei nº 12.529/2011. A sua atuação para julgar as condutas anticoncorrenciais ou a pretensão de reestruturação socie-tária demonstra a possibilidade jurídica da forte intervenção estatal. Este grau de interferência será justificado se, além de defender o re-gime econômico brasileiro (art. 170 da CF/1988), não prejudicar os negócios jurídicos privados pela ineficiência da atuação quanto às pretensões dos administrados.

PALAVRAS-CHAVE: Razoável duração do processo; processo ad-ministrativo; Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; Cade; segurança jurídica.

ABSTRACT: The fundamental right to reasonable duration of the judicial and administrative process, incorporated into the Constitu-tion with the Amendment nº 45/2004, positive the value of efficiency referred in its Article 37. Introduced by the Amendment nº 19/1998, this value is the foundation for a management of public interests that should guide state action through its three political organs. This interpretation led to economic administrative proceedings has par-ticular importance because the dynamics of contemporary economic life is incompatible with streams and procedural requirements or impositions that slow, without valid motivation, decisions that have impact on business management and the internal market. It is true that the right to reasonable duration does not allow ignore other fundamental rights such as due process, which enables the contra-dictory and full defense, transparency and other rules that struc-ture the process to achieve fair state manifestation of the intention of administered. Thus, before the economic administrative claims, the Brazilian System of Competition (SBDC), through its agencies, including the Administrative Council for the Defense of Compe-tition (Cade) must act considering the important consequences of its actions for economic relations. This highlight is proved from the powers of Cade under Law nº 12.529/2011. Its performance to jud-ge the anti-competitive conduct or claim to corporate restructuring

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demonstrates the legal possibility of strong state intervention. This degree of interference is justified if, besides defending the Brazilian economic system (art. 170, CF/1988), does not harm the private legal business by the inefficiency of acting as the claims administered.

KEYWORDS: Reasonable duration of process; administrative pro-cess; Brazilian System of Defense of Competition; Brazilian Admi-nistrative Council for the Defense of Competition; legal security.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O devido processo legal e a razoável du-ração do processo; 1.1 O devido processo legal e os princípios que regem o processo administrativo; 1.2 O processo administrativo e a razoável duração do processo; 2 O sistema brasileiro de defesa da concorrência e o processo administrativo econômico; 3 Processo ad-ministrativo econômico e a atuação do Cade; 4 A importância da razoável duração do processo administrativo econômico; 4.1 Reper-cussões econômicas e sociais; 4.2 Segurança jurídica para os negó-cios privados; Conclusões; Referências.

introdução

Conforme a lição de Cruz e Tucci1, entre os acontecimentos da natureza que mais inquietam o homem centra-se o fenômeno tempo. No âmbito jurí-dico tem, também, especial relevância na medida em que há alguns direitos que se constituem no tempo, bem como o exercício do direito de ação que precisa ser exercido em certo tempo. Neste sentido, o tempo tem valor jurí-dico, conforme se pode demonstrar por meio dos institutos da decadência e prescrição.

No contexto econômico, o tempo pode representar conquistas e esta-bilidades; portanto, em face do irreversível processo contemporâneo de glo-balização, a dinâmica econômica exige que o tempo componha o conceito de eficiência. Há negócios jurídicos que serão eficientes se realizados em ra-zoável tempo, sob pena de prejuízos que podem, inclusive, desestabilizar a empresa e seus efeitos negativos atingirem interesses públicos.

O descompasso entre a dinâmica da gestão pública e da gestão privada é indicado como um fator de injustiça e insegurança jurídica. A denominada gestão pública burocrática, sinônimo de lentidão, tem, ainda, suas raízes em todos os órgãos públicos. Tal constatação ainda se faz, apesar de o valor efi-

1 TUCCI, José Rogério Cruz e. Tempo e processo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

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ciência já integrar o regime jurídico da atuação do Executivo e do Judiciário, por meio das Emendas à Constituição nº 19/19982 e nº 45/20043.

Partindo dessas premissas, este estudo dirige-se à análise do direito fundamental à razoável duração do processo administrativo, em face da atuação dos órgãos que compõem o Sistema Brasileiro de Defesa da Concor-rência (SBDC), em especial do Conselho Administrativo de Defesa Econômi-ca (Cade), nos termos da Lei nº 12.529/2011.

O SBDC apresenta-se com importantes competências para intervenção nos negócios jurídicos privados. Esta interferência tem por fundamento dar efetividade ao regime constitucional econômico previsto no art. 170 da Cons-tituição. Assim, a atuação dos órgãos nos negócios privados, conforme com-petência do Cade, pode ser até preventiva, ou seja, exigir autorização estatal para serem realizados (Lei nº 12.529/2011, Título VI, Capítulo V). Este grau de ingerência, embora possa ser constitucionalmente justificado, exige uma atuação estatal eficiente, ou seja, deve respeitar os prazos legais do processo administrativo econômico. O respeito à lei é princípio de um Estado do Di-reito, absolutamente importante para gerar ao domínio econômico segurança jurídica.

1 o devido processo leGAl e A rAzoável durAção do processo

O processo administrativo, instrumento de exercício do poder estatal, submete-se expressamente a direitos fundamentais importantes, tais como o devido processo legal e a razoável duração processual.

Esta categoria de direitos tem por fito proteger a dignidade humana em todas as dimensões. Em razão disso, os dispositivos que os encerram en-contram-se no ápice da pirâmide jurídica do ordenamento, vinculando de forma imediata o Poder Público em qualquer de suas esferas e manifestações funcionais.

2 “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...] (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)” [grifo nosso]

3 “Art. 5º [...] LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)”

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Diante da proeminência que possuem, buscou-se assegurar a efetivi-dade das proclamações destes direitos, por meio de um conjugado de meios e recursos jurídicos, que genericamente passaram a chamar-se garantias constitucionais dos direitos fundamentais, com vistas a se obter positivação com mais alto grau de valor na ordem jurídica. Neste diapasão, como notara Hauriou4, não basta que um direito seja reconhecido e afirmado: faz-se mister garanti-lo, para que sejam devidamente enfrentadas as eventuais violações sofridas.

Estremar direitos de suas garantias constitui tarefa árdua, até mesmo para a doutrina, eis que o Texto Constitucional não forjou delimitação. As-sim, é corriqueira a existência de dispositivo constitucional retratando ambos conjuntamente. Os direitos ao devido processo e ao processo com duração razoável são exemplos disso. Por serem, mais que enunciações, garantias com sede constitucional, esforços devem ser envidados para que sejam colocados em prática.

1.1 o devido processo legal e os princípios que regem o processo administrativo

O princípio do devido processo legal é entendido como a base sobre a qual todos os demais princípios constitucionais do processo, judicial ou administrativo, se sustentam. Ele constitui, contemporaneamente, elemento fundamental em um Estado que se pretenda democrático e de direito. Por isso, de forma inovadora, veio expressamente previsto no Texto Constitucional brasileiro, além de constar da grande maioria das Constituições modernas.

A expressão origina-se do inglês due process of law, e na Constituição de 1988 está consubstanciada no inciso LIV do art. 5º: “ninguém será priva-do da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. O vocábulo “bens” é empregado em acepção ampliíssima, de forma que qualquer direito, interesse ou situação jurídica de vantagem sob algum tipo de risco se faça merecedora da proteção do princípio – e direito fundamental – em apreço5.

O devido processo pode ser estudado sob suas perspectivas: proces-sual e substancial (ou material). Neste estudo interessa a primeira dimensão,

4 HAURIOU apud LEAL JÚNIOR, João Carlos; MACHADO, Denise M. Weiss de Paula. Análise crítica do duplo grau de jurisdição sob o prisma do direito à razoável duração do processo. Revista de Processo, São Paulo, v. 35, n. 183, p. 77-118, maio 2010.

5 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Do formalismo no processo civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 85.

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motivo pelo qual a perspectiva substancial não será abordada. Na acepção processual (procedural due process), então, o princípio impõe que o processo, na esfera judicial ou administrativa, desenvolva-se de maneira regular, de acordo com as prescrições constitucionais e legais, de forma que, jurisdicio-nado e administrado, tenham oportunizado o contraditório e a ampla de-fesa, podendo participar, de forma efetiva, da formação da convicção do(s) julgador(es), e que a decisão final distribua justiça aos envolvidos/interessa-dos e promova a segurança jurídica. Percebe-se, deste modo, a estreita cone-xão da cláusula com o princípio de acesso à justiça e com valor da dignidade.

A Magna Carta inglesa de 1215 é apontada pela doutrina como marco originário do devido processo6. A finalidade da inclusão no Texto Constitu-cional foi a tentativa de colocar freios ao poder real, que se julgava absoluto7.

Na lição de Grinover, Dinamarco e Cintra8, por meio desta fórmula, tem-se “o conjunto de garantias constitucionais que, de um lado, asseguram às partes o exercício de suas faculdades e poderes processuais e, do outro, são indispensáveis ao correto exercício da jurisdição”. Transportando o conceito para o âmbito administrativo, entende-se o devido processo como essencial para a atuação da Administração Pública por meio de processo administra-tivo.

Nesta senda, pode-se dizer que todos os princípios e as garantias pro-cessuais contidos na Constituição decorrem da cláusula do devido processo. Ampla defesa, contraditório, publicidade, juiz natural, motivação das deci-sões e razoável duração do processo, inclusive9, são compreendidos, então, como decorrência direta da consagração do direito fundamental em observância, por serem indispensáveis a um processo que se pretenda justo e equitativo10.

6 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Anotações sobre o princípio do devido processo legal. In: ______; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Doutrinas essenciais – Processo Civil: Princípios e temas gerais do processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

7 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro de. Op. cit.8 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada

Pellegrini. Teoria geral do processo. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 1994. p. 82.9 Consoante Medina e Arruda Alvim Wambier, cuida-se de garantias mínimas, que

“constituem o ponto de partida para o estudo do sistema processual positivo. Impondo ao processo e à sua disciplina algumas condições básicas de legalidade e de correção, operam [...] em todos os seus momentos ou fases” (MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Processo civil moderno: parte geral e processo de conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 1, 2009. p. 58).

10 Idem.

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O due process indica “as condições mínimas em que o desenvolvimento do processo [...] deve se dar”11.

Trata-se, pois, de conformar o método de manifestação de atuação do Esta-do-juiz a um padrão de adequação aos valores que a própria Constituição Federal impõe à atuação do Estado e em conformidade com aquilo que, da-das as características do Estado brasileiro, esperam aqueles que se dirigem ao Poder Judiciário obter dele como resposta. É um princípio, destarte, de conformação da atuação do Estado a um especial modelo de agir.12

Em um Estado Democrático de Direito, o processo, visto como meio de realizar o direito e solucionar conflitos, não deve se desencadear de qualquer forma. O Estado deve seguir um modelo prévio, demarcado em dispositivos normativos, de sorte que as partes possam participar adequadamente da for-mação da cognição dos julgadores, influindo efetivamente em seu conven-cimento. Cássio Scarpinella Bueno13, aliás, chega a sustentar que o devido processo é amplo o suficiente para se confundir com o Estado Democrático de Direito.

Do princípio do devido processo derivam, como já ventilado, os prin-cípios da publicidade, da ampla defesa, do contraditório, do juiz natural, da motivação das decisões e da razoável duração do processo, aos quais o pro-cesso administrativo deve deferência.

Em linhas gerais, o princípio da publicidade impõe seja disponibiliza-do aos interessados o acesso aos processos em curso ou já concluídos, salvo quando haja risco à segurança, prejuízo à intimidade ou, mais amplamente, quando o interesse social exigir sua restrição14; a ampla defesa faculta aos en-volvidos a utilização de qualquer recurso, desde que não ilícito ou imoral, na defesa de seus direitos e interesses; o contraditório determina a ciência, e con-sequente possibilidade de reação, de todos os atos processuais realizados; o princípio do juiz natural15 proscreve o uso de tribunais de exceção, ao mesmo tempo em que exige, para o julgamento, prévio regramento acerca da compe-tência; o princípio da motivação, por fim, veda a existência de efetivas deci-

11 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2010. p. 137.

12 Idem, loc. cit.13 Idem, p. 138.14 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 4. ed. São Paulo: Atlas, 1994.15 STF, MS 28712-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 11.05.2010.

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sões desprovidas de fundamentação. Todos estes princípios constitucionais, que irradiam efeitos sobre o processo administrativo, derivam, juntamente com o direito fundamental à razoável duração do processo, da cláusula do due process, de sorte que o processo que desrespeitar algum deles ofenderá o direito fundamental ao devido processo.

Além desses, regem o processo administrativo, ainda, os seguintes princípios: i) oficialidade: o processo, que pode ser instaurado mesmo de ofí-cio, uma vez iniciado, deve prosseguir até chegar à decisão final, por ser seu resultado de interesse público; ii) informalismo: inexistindo regra específica, o processo administrativo é livre de rígidas formalidades – o que não significa, contudo, ausência de forma ou possibilidade de se dar de forma não escrita; iii) gratuidade: o processo administrativo é gratuito; iv) economia processual: decorrente do caráter instrumental do processo, pugna pelo máximo apro-veitamento dos atos processuais e veda a prática de atos inúteis.

Examinados os princípios que regem o processo administrativo, passa--se a analisar especificamente o direito fundamental à razoável duração do processo.

1.2 o processo administrativo e a razoável duração do processo

O processo é um fenômeno em movimento16, instrumento para o le-gítimo exercício do poder estatal17, cuja existência no âmbito administrativo se justifica segundo a lição de Medauar18: o ordenamento jurídico por vezes impõe a precessão de uma série encadeada de fases para que se chegue a um ato administrativo válido e legítimo. Apesar de divergências terminológicas, processo não se confunde com procedimento19, representando este o modo de ser daquele. Assim, entende a melhor doutrina20 adequado o uso da ex-pressão processo administrativo da forma como se apresenta na Constituição e em demais textos de lei no direito positivo brasileiro.

16 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Op. cit.17 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada

Pellegrini. Op. cit.18 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2010.19 PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Op. cit.20 Por exemplo, Thiago Marrara e Irene Nohara; Celso Antônio Bandeira de Mello; Odete

Medauar.

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O processo administrativo, então, além do liame entre os atos que o conformam, ostenta vínculos entre os sujeitos, englobando direitos, deveres, ônus, faculdades e poderes na relação processual que com ele surge, além de receber influxo de específicos princípios constitucionais, conforme analisado. Foca-se agora no princípio da razoável duração do processo.

Com a inclusão do inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição brasileira, ocorrida por ocasião da Emenda nº 45/2004, foi contemplado o direito de se exigir eficiência e prontidão da resposta estatal em processos judiciais e administrativos. Assim prevê o dispositivo: “a todos, no âmbito judicial e ad-ministrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (grifo nosso).

A lei suprema consagra, então, sob a forma de princípio, o direito à razoável duração do processo, em conjunto com a exigência da existência de meios que garantam a celeridade de sua tramitação. O prazo para julga-mento, deste modo, não deverá superar os limites do razoável, sob pena de inconstitucionalidade.

Tem-se manifestação da busca pelo respeito à dignidade da pessoa hu-mana, assim como ocorre com os demais direitos fundamentais.

Andrade21 afirma que o arcabouço constitucionalmente assegurado de direitos e garantias individuais já contemplava implicitamente o princípio em questão. Neste sentido, são apontados o direito de petição e o princípio do devido processo22 como veiculadores, ainda que de forma implícita, do direito à razoável duração do processo, visto que o cumprimento efetivo do que promovem pressupõe, inelutavelmente, a eficácia e a inseparável tem-pestividade da apreciação do que se pleiteia.

Neste contexto, tendo por assente que este direito é corolário dos su-pracitados, pode-se dizer que, por sua natureza, pertence à primeira geração de direitos fundamentais, posto que aqueles também a integram.

21 ANDRADE, Fábio Martins de. Ensaio sobre o inciso LXXVIII do art. 5º da CF/1988. Revista de Processo, São Paulo, v. 32, n. 147, p. 175-198, maio 2007.

22 TAVARES, André Ramos. Reforma do Judiciário no Brasil Pós-88: (Des)estruturando a Justiça. São Paulo: Saraiva, 2005.

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Alude-se, ademais, aos deveres constitucionais23 de eficiência e legali-dade24 a que se submete o Estado como elementos impositores da celeridade no tramitar dos processos administrativos.

De toda sorte, com a previsão constitucional explícita ocorrida, hou-ve maior solidez deste direito, eliminando eventuais dissídios doutriná-rios subsistentes, tornando, enfim, irrefutavelmente obrigatória a decisão em processo administrativo em prazo razoável, e submetendo o direito em questão ao regime jurídico que detêm aqueles insculpidos no art. 5º da Constituição.

É árdua sua delimitação conceitual. O termo razoável, é inconteste, mostra-se vago e de larga abertura. Tal fator, entretanto, não o torna ina-plicável, sendo necessária apenas interpretação justa e idônea a precisar a significância do conceito, o que conferiria ao direito o que se pode chamar de “sentido atuante”25.

Uma das características que naturalmente emergem é a adstrição a um tempo mínimo, razoável para a Administração conhecer da causa da forma devida. Por outro lado, impõe-se ponderação para que o deslinde processual não supere os limites do razoável, já que a eficácia da decisão, invariavelmente, guarda relação com a celeridade de todo o conjunto de atos processuais.

Entre os critérios para aferição de o que possa vir a ser termo razoável, tem-se, em primeiro lugar, que, “existindo previsão de prazos predetermi-nados em lei, os mesmos devem ser necessariamente obedecidos, não se ad-mitindo seu desrespeito por quem quer que seja, salvo fundado motivo”26.

23 “Artigo 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...].” [grifo nosso]

24 Este fundamento diz respeito à obrigação de cumprimento dos prazos previstos em lei pelos funcionários públicos atuantes no Judiciário, tais como os serventuários da Justiça e mesmo os juízes.

25 AMARO, Zoraide Sabaini dos Santos. Razoável duração do processo – Demora na prestação jurisdicional – Implicações à violação aos princípios constitucionais. Anais Congresso Nacional do Conpedi 2007, 16, Belo Horizonte/Florianópolis: Fundação Boiteux, 2007.

26 LEAL JÚNIOR, João Carlos; BALEOTTI, Francisco. Ensaio sobre o direito fundamental à razoável duração do processo. Anais do Seminário Interinstitucional de Mestrados em Direito, 1, Londrina: UEL, 2010.

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Assim, diante desta tessitura, o prazo razoável será aquele que seguiu as determinações previstas em lei. Em situações em que não houver fixação, por seu turno, afigura-se imperioso que a Administração lance mão do im-perativo de eficiência como principal elemento balizador.

A fim de se observar se a duração se afigura razoável, aponta a dou-trina que devem ser levados em conta, máxime nas últimas hipóteses, em que não há tempo prefixo, os seguintes critérios norteadores: i) a natureza e a complexidade do caso; ii) a repercussão da solução jurídica para o meio social; e iii) a afetação do litigante pelas consequências da demora27.

São traços característicos deste direito fundamental: a) universalida-de, posto destinar-se a todos indistintamente; b) limitação, por, como ou-tros direitos, não ser absoluto, sendo plausível a existência de situação que haja choque com outro direito de mesmo patamar; c) cumulatividade, já que, na maioria dos casos, acumula-se com outros direitos; d) irrenunciabi-lidade, por ser indisponível.

Avulta a dúplice natureza deste direito-garantia: por um lado, pro-move o surgimento do direito subjetivo negativo de todo e qualquer cida-dão exigir judicialmente que cessem as condutas afrontantes deste direito fundamental, sejam perpetradas por particular ou pelo Estado; sob outro vértice, como uma ordem dirigida, coloca-se como escopo a ser alcançado pela atuação positiva do Poder Público.

Quanto ao cumprimento deste comando, a situação ideal é aquela em que o Poder Público o respeita, atuando conforme a determinação constitu-cional, criando técnicas idôneas a conquistar maior celeridade.

É dever da Administração-julgadora ter papel ativo no que concerne ao zelo pelo cumprimento dos direitos fundamentais, o que equivale, in casu, à célere entrega da decisão. A morosidade cai no conceito de serviço público ineficiente, configurando verdadeira mazela social, tendo em vista que provoca danos econômicos e favorece a especulação e a insolvência, si-tuações indesejadas em qualquer país. Igualmente, acentua a discriminação entre os que têm a possibilidade de aguardar e os que, esperando, têm tudo a perder.

27 RIGHI, Eduardo. O direito à razoável duração do processo e a proibição de liminares. Revista Forense, São Paulo, v. 399, p. 65-84, set./out. 2008.

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2 o sistemA brAsileiro de defesA dA concorrênciA e o processo AdministrAtivo econÔmico

A Constituição brasileira, em seus arts. 170 e seguintes, disciplina a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre ini-ciativa, e cujo fim consiste em assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

A primeira Constituição brasileira a cuidar da temática da ordem eco-nômica foi a de 1934. O referido diploma, consoante Antunes28, foi também o primeiro a prever meios de intervenção estatal no domínio econômico. Até então, de acordo com a ideologia liberal reinante, pregava-se o Estado mí-nimo, considerando-se despicienda a intervenção estatal neste espaço. Se-guiam-se as ideias de que o próprio mercado se regularia e se desenvolveria da melhor forma, na linha da clássica teoria de Adam Smith29.

Desde 1934, então, são constitucionalmente previstas as atuações do Estado brasileiro na ordem econômica. Tais condutas podem requerer a cria-ção de instrumentos de intervenção, os quais podem assumir formas das mais diversas possíveis. Pode o Estado intervir por meio da expedição de recomendações e diretivas; constituir empresa para atuar, sob regime de di-reito privado, em determinado ramo da economia; conceder incentivos de natureza fiscal a agentes econômicos, ou mesmo sanções, entre uma gama de possibilidades30.

Deste modo, pela importância da questão, a concepção vigente no Brasil é de que “o Estado tem um papel a ser desempenhado na ordem econô-mica, que não se restringe ao de simples facilitador dos agentes econômicos”31 (grifo nosso).

Entre os princípios que norteiam a ordem econômica, destaca-se o da livre concorrência, contido no inciso IV do art. 170. Este postulado “fornece a base jurídica para impedir que os agentes econômicos possam desvirtuar as prerrogativas de liberdade de iniciativa, prejudicando a sociedade e os

28 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 13. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.29 AGUIAR, André Brugni de. Parafiscalidade, regulação e Estado na Economia Globalizada.

In: DOMINGUES, José Marcos. Direito tributário e políticas públicas. São Paulo: MP, 2008.30 Idem.31 Idem, p. 09.

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mercados”32-33. Como nenhum valor pode ser tido como absoluto, a preser-vação da liberdade e da igualdade requerem a intervenção do Estado sobre o domínio econômico impondo limites à livre iniciativa, de forma a ser ga-rantido acesso à ordem jurídica justa a toda pessoa, física ou jurídica, que pretenda vir a atuar no mercado como agente econômico.

Neste sentido, o § 4º do art. 173 impõe: “a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da con-corrência e ao aumento arbitrário dos lucros”34. Cuida-se da repressão cons-titucional, a qual se dá por meio de estratégias adotadas pelo Estado que, mediante intervenção no domínio econômico, “tem o objetivo de neutralizar os comportamentos causadores de distorção nas condições normais de mer-cado em decorrência do acúmulo de riquezas”35.

Antes da promulgação da Constituição de 1988, foi criado, pela Lei nº 4.137/1962, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade)36. Completando o processo de positivação de normas, e visando a dar efetivida-de ao dispositivo constitucional, a Lei nº 8.884/1994 transformou o conselho em autarquia federal vinculada, de modo indireto, ao Ministério da Justiça, e dispôs sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômi-ca. Foi estruturado, com a lei, o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), integrado pelo Cade, pela Secretaria de Direito Econômico (SDE) e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae).

Com a Lei nº 12.529/2011, o SBDC foi reestruturado. Passou a ser inte-grado apenas pelo Cade e pela Seae, órgão do Ministério da Fazenda (art. 3º).

32 RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert. Notas introdutórias sobre o princípio da livre concorrência. Scientia Iuris, Londrina, v. 10, p. 83-96, 2006. p. 88.

33 “O princípio da livre concorrência é um dos balizadores necessários para que a livre iniciativa possa corretamente atender à sua função social.” (Idem, p. 90-91)

34 No Brasil, a preocupação com o abuso do poder econômico é antiga, apresentando-se na vigência do Estado Novo, conforme aponta Lucia Helena Salgado (SALGADO, Lucia Helena. Defesa da concorrência no Brasil: aspectos institucionais, desempenho recente e perspectivas de reforma. Texto para discussão, Brasília, n. 1386, fev. 2009).

35 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 21. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 870.

36 Há que se sublinhar, contudo, a ineficácia da Lei nº 4.137/1962. Isso porque, em três décadas de vigência, “houve 117 casos que redundaram em condenações de práticas restritivas da concorrência, todas anuladas por decisões judiciais. A principal fragilidade da defesa da concorrência ao longo desse período era sua incompatibilidade, como instrumento de defesa do livre mercado, com um ambiente de economia comandada pelo Estado.” (SALGADO. Op. cit., p. 08 – grifo nosso).

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As atribuições da SDE foram todas transferidas à Superintendência-Geral do Cade, conforme se depreende do cotejo entre os arts. 13 da Lei nº 12.529/2011 e 14 da Lei nº 8.884/1994.

O objetivo do SBDC é a “prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico” (art. 1º da Lei nº 12.529/2011).

De acordo com os arts. 4º e 5º da nova lei, o Cade, cujas missões ins-titucionais têm natureza repressiva, preventiva e educativa, tem atribuição judicante e é constituído por três órgãos: i) Tribunal Administrativo de De-fesa Econômica; ii) Superintendência-Geral; e iii) Departamento de Estudos Econômicos.

O Tribunal é composto por um presidente e seis conselheiros. Entre outras coisas, é de sua alçada julgar denúncias de abuso do poder econômico, assim como atos de concentração entre empresas, de forma a tutelar e garan-tir a livre concorrência no território brasileiro. A Superintendência é o órgão responsável por instruir a análise dos atos de concentração, bem como inves-tigar infrações à ordem econômica, podendo, ainda, realizar diretamente o exame e a aprovação dos atos de concentração, sem necessidade de aprecia-ção ou chancela de seus atos pelo Tribunal Administrativo, nos termos dos arts. 54 a 57, nos casos em que ela entender que não há necessidade de novas diligências, ou nos casos de menor potencial ofensivo à concorrência. Já o Departamento de Estudos tem por objetivo desenvolver estudos e elaborar pareceres destinados a aprimorar as análises econômicas e fornecer maior segurança sobre os efeitos das decisões do Cade.

A Seae, por sua vez, tem por atribuição promover a concorrência em órgãos de governo e perante a sociedade, cabendo-lhe, entre outras coisas, a emissão de pareceres em propostas de alterações de atos normativos sobre concorrência.

Entre as inúmeras formas de atuação do Cade e da Seae, que são de extrema importância para o equilíbrio econômico brasileiro e que se ligam à efetivação dos princípios constitucionais da livre iniciativa e livre concorrên-cia, grande parte delas depende de processo prévio. É o que se pode deno-minar processo administrativo econômico, em virtude da natureza do processo (administrativo) e a matéria que compõe seu objeto (econômica).

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De acordo com o art. 48 da Lei nº 12.529/2011, os processos e procedi-mentos administrativos instaurados para prevenção, apuração e repressão de infrações à ordem econômica são os seguintes:

I – procedimento preparatório de inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica;

II – inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econô-mica;

III – processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica;

IV – processo administrativo para análise de ato de concentração econô-mica;

V – procedimento administrativo para apuração de ato de concentração econômica; e

VI – processo administrativo para imposição de sanções processuais inci-dentais.

O processo administrativo para imposição de sanções administrativas por infrações à ordem econômica (inc. III) e o processo administrativo para análise de ato de concentração econômica (inc. IV) são as modalidades que serão focadas neste estudo.

3 processo AdministrAtivo econÔmico e A AtuAção do cAde

Como restou consignado, o processo é um fenômeno em movimento que atua como legitimador das construções que levam à formação de deci-sões do Poder Público.

No que se refere à defesa da concorrência, a constituição dos impor-tantes atos decisórios do Cade, seja de cunho repressivo, seja de caráter pu-nitivo, pressupõe processo prévio, que naturalmente exige certo tempo para sua tramitação, em razão da diversidade de atos requeridos. Trata-se, como indicado, de processo administrativo econômico, imprescindível à tomada de decisão pelo Cade no que se refere à averiguação de prática de condutas anticoncorrenciais, bem como quanto ao controle das estruturas de mercado.

Aplicando o tema ao direito administrativo econômico, avulta sua im-portância. Assim, como já esclarecido, entre as principais funções do Cade

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encontram-se o julgamento de denúncias de abuso do poder econômico e o de atos de concentração entre empresas, de forma a tutelar e garantir a livre concorrência no território brasileiro. E essas duas espécies de decisão ventila-das demandam processo administrativo37 anterior.

O processo administrativo para análise de ato de concentração econô-mica vem disciplinado nos arts. 53 a 65 da nova lei.

O art. 88, por sua vez, preconiza que

serão submetidos ao Cade pelas partes envolvidas na operação os atos de concentração econômica em que, cumulativamente:

I – pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registra-do, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negó-cios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais); e

II – pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais).

Enquadrando-se nestas hipóteses, a empresa deve submeter-se a esta primeira hipótese de processo administrativo econômico: o processo admi-nistrativo concorrencial, ou de outorga.

De acordo com o art. 90, realiza-se um ato de concentração quando: i) duas ou mais empresas anteriormente independentes se fundem (fusão); ii) uma ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas, títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas (aqui-sição cumulada com cisão); iii) uma ou mais empresas incorporam outra ou

37 Com relação às duas hipóteses, adota-se o vocábulo processo, e não procedimento, uma vez que um simples procedimento não tem (ou, ao mesmo, não pode ter) o condão de gerar prejuízos à esfera de direitos das partes envolvidas, eis que procedimento prescinde de devido processo legal, contraditório e ampla defesa – requisitos esses indispensáveis a situações em que o Estado invade a esfera jurídica dos cidadãos. Nessa mesma linha se encontra a nova lei de defesa da concorrência, que usou a designação processo para ambas as hipóteses em estudo.

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outras empresas (incorporação); ou iv) duas ou mais empresas celebram con-trato associativo, consórcio ou joint venture (agrupamento).

O controle dos atos de concentração, a partir da nova lei, é prévio38 e será realizado em, no máximo, duzentos e quarenta dias, a contar do pro-tocolo de petição ou de sua emenda (art. 88, § 2º). Contudo, de acordo com o § 9º, este prazo poderá ser dilatado: i) por até sessenta dias, improrrogá-veis, mediante requisição das partes envolvidas na operação; ou ii) por até noventa dias, mediante decisão fundamentada do Tribunal, em que sejam especificados as razões para a extensão, o prazo da prorrogação, que será não renovável, e as providências cuja realização seja necessária para o julgamento do processo.

O processo em análise se inicia perante a Superintendência-Geral. Ins-taurado o processo, por meio de apresentação do pedido pelos requerentes, aquela fará publicar edital, indicando o nome dos requerentes, a natureza da operação e os setores econômicos envolvidos. Como já aduzido, poderá o órgão conhecer diretamente do pleito ou determinar instrução complemen-tar. Ao final, proferirá decisão aprovando o ato sem restrições ou oferecerá impugnação perante o Tribunal, caso entenda que o ato deva ser rejeitado, aprovado com restrições ou que não existam elementos conclusivos quanto aos seus efeitos no mercado39.

Impugnado, o processo seguirá para o Tribunal. Lá, o requerente po-derá oferecer, no prazo de trinta dias da data da impugnação, contrarrazões de fato e de direito contra aquela, juntando provas, estudos e pareceres em seu favor.

Distribuído o processo, por sorteio, a um Conselheiro-Relator, este, após a manifestação do requerente, proferirá decisão determinando a inclu-são do processo em pauta para julgamento, caso se encontre suficientemente instruído, ou determinará a realização de instrução complementar.

38 Sobre as críticas existentes acerca do modelo anterior, vide: LEAL JÚNIOR, J. C.; PRADO, M. Enriquez. Análise crítica ao modelo de apreciação de atos de concentração pelo Cade em cotejo com o sistema europeu de defesa da concorrência. Anais Congresso Nacional do Conpedi, 20, 2011, Vitória. Florianópolis: Fundação Boiteaux, 2011, p. 4597-4615.

39 Na impugnação do ato perante o Tribunal, deverão ser demonstrados, de forma circunstanciada, o potencial lesivo do ato à concorrência e as razões pelas quais não deve ser aprovado integralmente ou rejeitado.

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Poderá o Conselheiro-Relator autorizar, conforme o caso, precária e liminarmente, a realização do ato de concentração econômica, impondo as condições que visem à preservação da reversibilidade da operação, quando assim recomendarem as condições do caso concreto (art. 59, § 1º).

No julgamento final do pedido de concentração, o Tribunal poderá aprová-lo integralmente, rejeitá-lo ou aprová-lo parcialmente, caso em que determinará as restrições que deverão ser observadas como condição para a validade e eficácia do ato40. O art. 63 determina que os prazos previstos não se suspendem ou interrompem por qualquer motivo, ressalvada a hipótese de, em virtude de renúncia, morte, perda ou encerramento de mandato dos conselheiros, a composição do Tribunal ficar reduzida a número inferior a quatro membros, caso em que serão automaticamente suspensos os prazos e processos.

Consoante ensina Cardozo41, o legislador brasileiro adotou, no diplo-ma vigente, a instituição deste sistema de controle de atos de concentração econômica com o fito de “impedir a consumação de operações potencialmen-te lesivas à concorrência, sujeitando-as a um processo que pode culminar com a aprovação ou não desses atos”. Cuida-se do que doutrinariamente denomina-se controle das estruturas do mercado42.

De outra parte, o art. 36 da nova lei prescreve que “constituem infra-ção da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer

40 “Art. 61 [...] § 1º O Tribunal determinará as restrições cabíveis no sentido de mitigar os eventuais

efeitos nocivos do ato de concentração sobre os mercados relevantes afetados. § 2º As restrições mencionadas no § 1º deste artigo incluem: I – a venda de ativos ou de um conjunto de ativos que constitua uma atividade empresarial; II – a cisão de sociedade; III – a alienação de controle societário; IV – a separação contábil ou jurídica de atividades; V – o licenciamento compulsório de direitos de propriedade intelectual; e VI – qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação dos efeitos nocivos

à ordem econômica. § 3º Julgado o processo no mérito, o ato não poderá ser novamente apresentado nem

revisto no âmbito do Poder Executivo.”41 CARDOZO, Maria Izabel Andrade Lima. A recepção de direitos no sistema brasileiro de

defesa da concorrência. Direito, Estado e Sociedade, Rio de Janeiro, n. 30, p. 200-209, jan./jun. 2007. p. 204.

42 SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

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forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados”:

I – limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa;

II – dominar mercado relevante de bens ou serviços;

III – aumentar arbitrariamente os lucros; e

IV – exercer de forma abusiva posição dominante.

As condutas anticoncorrenciais geradoras dos efeitos retromenciona-dos foram tipificadas exemplificativamente no § 3º do dispositivo aludido (cartéis, preços predatórios, venda casada, entre outras). Os arts. 37 e seguin-tes cuidam das penas para as infrações perpetradas. A aferição da eventual infração e a aplicação da pena respectiva também requerem processo admi-nistrativo econômico prévio.

Antes de ser instaurado este processo, de cunho sancionatório, a Supe-rintendência-Geral iniciará inquérito administrativo e procedimento prepa-ratório para realizar averiguações e colher provas.

O processo administrativo para imposição de sanções vem disciplina-do nos arts. 69 a 83 da nova Lei. Sua peça inaugural é a nota técnica final do inquérito levado a efeito anteriormente. De acordo com o art. 70, na decisão que instaurar o processo administrativo, será determinada a notificação do representado para, no prazo de trinta dias (prorrogáveis por até mais dez, a pedido do representado), apresentar defesa e especificar as provas que pre-tende sejam produzidas, declinando a qualificação completa de até três tes-temunhas43.

Não apresentando defesa no prazo legal, o representado será consi-derado revel, incorrendo em confissão quanto à matéria de fato, contra ele correndo os demais prazos, independentemente de notificação. Poderá, con-tudo, intervir em qualquer que seja a fase do processo, embora sem direito à repetição de qualquer ato já praticado (art. 71).

Após a fase inicial, a Superintendência-Geral determinará a produção de provas que julgar pertinentes. Concluída a instrução, o representado será

43 “O representado poderá acompanhar o processo administrativo por seu titular e seus diretores ou gerentes, ou por seu procurador, assegurando-se-lhes amplo acesso aos autos no Tribunal.” (Art. 70, § 4º)

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notificado para apresentar novas alegações, no prazo de cinco dias úteis. Após, a Superintendência-Geral remeterá os autos do processo ao Presiden-te do Tribunal, opinando pelo seu arquivamento ou pela configuração da infração.

O Presidente do Tribunal o distribuirá, por sorteio, ao Conselheiro--Relator, que poderá, caso entenda necessário, solicitar à Procuradoria Fede-ral junto ao Cade que se manifeste no prazo de vinte dias. Poderá, ademais, determinar diligências, podendo solicitar que a Superintendência-Geral as realize, no prazo assinado. Após a conclusão das diligências, o Relator noti-ficará o representado para, em quinze dias úteis, apresentar alegações finais.

O processo será incluído em pauta para julgamento. A decisão do Tri-bunal, que em qualquer hipótese será fundamentada, quando for pela exis-tência de infração da ordem econômica, conterá: i) especificação dos fatos que constituam a infração apurada e a indicação das providências a serem toma-das pelos responsáveis para fazê-la cessar; ii) prazo dentro do qual devam ser iniciadas e concluídas as providências referidas; iii) multa estipulada; iv) multa diária em caso de continuidade da infração; e v) multa em caso de descumprimento das providências estipuladas.

Descumprida a decisão, no todo ou em parte, será o fato comunicado ao presidente do Tribunal, que determinará à Procuradoria Federal junto ao Cade que providencie sua execução judicial (art. 81).

Conforme o art. 80, não cabe medida liminar em eventual processo ju-dicial contra as decisões do Tribunal.

Deveras importante é o art. 82, por preceituar que o “descumprimento dos prazos fixados neste Capítulo pelos membros do Cade, assim como por seus servidores, sem justificativa devidamente comprovada nos autos, pode-rá resultar na apuração da respectiva responsabilidade administrativa, civil e criminal”. Trata-se de dispositivo em consentâneo com o direito fundamental à razoável duração do processo, o que mostra a repercussão do princípio no âmbito do SBDC.

A morosidade percebida em qualquer das duas modalidades de pro-cesso administrativo econômico observadas ofende ao princípio da duração razoável do processo e gera repercussões negativas à sociedade, como se de-monstrará a seguir.

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4 A importânciA dA rAzoável durAção do processo AdministrAtivo econÔmico

4.1 repercussões econômicas e sociais

Por força da previsão constitucional aventada, o trâmite processual deve também no âmbito do Cade cingir-se aos lindes do razoável. O concei-to, porém, de larga abertura, mostra-se indeterminado44, não conferindo ao administrado um parâmetro objetivo para avaliar eventual desrespeito ao Direito, razão pela qual os critérios apontados anteriormente mostram-se de grande valia.

Em termos concretos, no que concerne a processo instaurado para ave-riguar ofensa à concorrência (processo administrativo econômico sanciona-dor), eventual demora na decisão do Cade faz gerar prejuízos econômicos e sociais de grande vulto: se há de fato abuso, até que se chegue à decisão, permanecerá ele sendo perpetrado, gerando lesões ao mercado, aos consumi-dores e a outras empresas; constatada a inexistência, a demora só terá ocasio-nado delonga na insegurança e no temor da empresa injustamente acusada, com possíveis repercussões no mercado de consumo e no valor de suas ações.

Especialmente na hipótese de real infração da ordem econômica, a de-mora no julgamento e aplicação de sanções pelo Cade pode ocasionar re-percussões sociais e econômicas de proporções devastadoras. Neste sentido, pode-se citar os corriqueiros casos, por todo o território brasileiro, de cartel realizado por postos de combustíveis, em que, pela demora na apuração pelo Cade, as poucas atuações repressivas surgem em sede de ação civil pública promovida pelo Ministério Público ou entidades de proteção ao consumidor, o que, contudo, também esbarra na conhecida morosidade processual – do Poder Judiciário, no caso.

Em casos em que o agente crie dificuldades ao funcionamento/desen-volvimento de empresa concorrente, ou impeça o acesso de concorrente às fontes de insumo, matérias-primas, equipamentos ou tecnologia, a protração destas condutas no tempo pode gerar prejuízos consideráveis aos concor-rentes. Eventual incursão destes em falência, ou, ainda que em menor grau, em retração de suas atividades, atingirá o corpo de empregados, na hipótese de cessação da atividade ou demissão deles. Como se vê, a demora no julga-

44 MARRARA, Thiago; NOHARA, Irene Patrícia. Processo administrativo: Lei nº 9.784/1999 comentada. São Paulo: Atlas, 2009.

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mento repercute inevitavelmente no mercado e na sociedade, o que justifica a necessária celeridade nos processos administrativos econômicos.

Além disso, pela importância da questão, no âmbito do SBDC são pre-vistos procedimento preparatório e inquérito administrativo para apuração de infrações à ordem econômica, quando presentes indícios daquelas. Essa série de procedimentos naturalmente se delonga no tempo, assim como o processo administrativo sancionador em si. A eventual demora para a apli-cação de medidas punitivas é fator de ineficiência dos resultados esperados com as sanções.

A previsão do art. 82 da nova lei é de grande importância, na medida em que positiva o direito fundamental à razoável duração do processo, pre-vendo a responsabilização (civil, administrativa e mesmo criminal) pelo des-cumprimento injustificado dos prazos fixados, já que estes servem de balizas para que se chegue a uma solução em tempo razoável.

Por outro lado, com relação à análise de atos de concentração de em-presas (processo administrativo concorrencial), a demora na resposta da Au-tarquia também pode gerar prejuízos consideráveis.

Isso era ainda mais frequente no modelo vigente antes da nova lei anti-truste, já que era permitida a realização dos atos previamente, como facultava a lei pretérita, sendo autorizado ao Cade desaprová-lo, impondo a descons-tituição da operação. Os prejuízos repercutiam, obviamente, em uma esfera imensurável de pessoas, especialmente por conta da demora no julgamento.

Neste sentido, na sistemática da lei anterior, se uma operação era desa-provada depois de muito tempo, isso acarretava prejuízos aos empregados, acionistas, consumidores e ao próprio Poder Público; enfim, a todo o conjun-to de setores e pessoas que se ligam aos reflexos oriundos do funcionamento ou da extinção de uma empresa no mercado.

No modelo novo de análise de atos concentracionais, os efeitos de eventual demora mostram-se menos deletérios (já que prévios), mas nem por isso deixam de existir, uma vez que, normalmente, as operações em questão requerem realização célere, demandando uma análise ágil pelo órgão com-petente45.

45 A título de exemplo, pode ser citada a operação de aquisição da unidade brasileira do HSBC pelo Bradesco, submetida à análise do Cade, cujo prazo de análise vem sendo noticiado por veículos especializados como prejudicial aos investidores do primeiro.

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As repercussões econômicas e sociais de eventual demora nos proces-sos administrativos econômicos, enfim, são inegáveis, podendo impactar, ainda, na segurança jurídica essencial à existência e continuidade dos negó-cios privados, o que se discutirá a seguir.

4.2 segurança jurídica para os negócios privados

A segurança jurídica, por sua relevância, é tida como princípio, valor e direito fundamental contido na Constituição de 198846, tanto em seu preâm-bulo como no caput do art. 5º. José Augusto Delgado47 esclarece que a segu-rança mencionada nos aludidos dispositivos é a genérica:

envolve a segurança pública, a segurança jurídica, a segurança na assistên-cia à saúde, à educação, ao lazer, ao desenvolvimento econômico, à liber-dade, à vida, à valorização da cidadania, à dignidade humana, ao emprego pleno, à igualdade social, enfim, aos direitos e garantias individuais e so-ciais. (grifo nosso)

A segurança jurídica remete à ideia de estabilidade das situações individuais consumadas e previsibilidade perante o Direito. Trata-se de um valor nortea-dor da ordem jurídica brasileira, conforme explicitado no preâmbulo consti-tucional, o qual alude à segurança como algo a ser propiciado aos integrantes da sociedade, conduzida por um Estado Democrático de Direito.48

O princípio, então, é consequência lógica do modelo de Estado de Di-reito. Não se concebe um Estado fundamentado nas leis e na Constituição desprovido deste princípio. Qualquer tentativa de separação os desnaturaria.

A segurança jurídica está ligada à ideia de confiança, certeza, previ-sibilidade. A concepção preconizada pela Ciência Política dirige-se para a afirmação de que “o homem necessita de um grau de segurança para po-der conduzir, planificar e desenvolver os seus atos da vida civil, familiar e profissional”49. Ao Estado recai a responsabilidade de “assegurar esse estado

46 DELGADO, José Augusto. O princípio da segurança jurídica: supremacia constitucional. 2005. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/handle/2011/448>. Acesso em: 1º ago. 2011. p. 04.

47 Idem, p. 05.48 KEMPFER, Marlene; GOMES, Anderson Ricardo. Coisa julgada tributária diante da

decisão do STF com efeito erga omnes e vinculante. Revista de processo, São Paulo, v. 204, fev. 2012.

49 DELGADO, José Augusto. O princípio da segurança jurídica: supremacia constitucional. 2005. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/handle/2011/448>. Acesso em: 1º ago. 2011. p. 01.

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de sentimento através da conformação dos seus atos administrativos, legisla-tivos e judiciais com os ditames da segurança jurídica”50.

Consoante a lição de Pedro Frias51,

La seguridad jurídica influye en el crecimiento económico, porque la decisión de sus actores depende de sus expectativas respecto del futuro, en primer lugar, y de sus expectativas respecto de las expectativas de los otros, en segundo lugar. Los problemas que surgen de la incertidumbre, acciones no cooperativas o inconsisten-cia temporal se resuelven dentro de la lógica de las reglas.

Assim, é prejudicial para as relações negociais e econômicas um con-texto de insegurança jurídica. E por esta não se deve compreender exclu-sivamente um contexto de ausência de leis, ou de constantes alterações de sua interpretação. A insegurança jurídica vai além, fazendo-se presente em uma vasta gama de situações. No recorte proposto neste trabalho, foca-se na insegurança advinda de um contexto de demora nas decisões judiciais ou administrativas, que influam em atos da vida civil dos particulares.

Os negócios privados, especialmente no âmbito da atividade empresa-rial, devem ser celebrados e executados em tempo razoável, carente de mo-rosidade, em razão das imposições que decorrem da dinâmica da atividade econômica. Nos negócios dependentes de avaliação pelo Poder Público, a corriqueira morosidade advinda do tradicional modelo burocrático de gestão gera insegurança jurídica, desprovida de qualquer legitimidade. Os prejuízos decorrentes da demora podem desestabilizar as partes (agentes econômicos) envolvidas, e seus efeitos negativos atingirem interesses públicos.

Assim, o descompasso entre a dinâmica da gestão pública e da gestão privada é apontado como fator de injustiça e insegurança jurídica, retirando a legitimidade que se espera do Poder Público no exercício de suas funções essenciais.

No Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, a demora nos pro-cessos administrativos econômicos funciona como fator de inibição de inves-timentos e celebração de negócios de grande porte, causando arrefecimento na atividade econômica, que requer segurança jurídica para atuar.

50 Idem, loc. cit.51 FRIAS apud DELGADO, José Augusto. O princípio da segurança jurídica: supremacia

constitucional. 2005. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/handle/2011/448>. Acesso em: 1º ago. 2011. p. 07.

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Se na sistemática da lei antiga a demora na avaliação dos atos de con-centração era problema na medida em que poderia causar apreensão e incer-teza no mercado por conta da espera e mesmo impor a irreversibilidade fática da operação, na sistemática nova, embora evite o risco de desfazer operação já constituída, pode prejudicar os objetivos das empresas envolvidas. O gran-de número de processos no Cade, inversamente proporcional ao quadro de Conselheiros integrantes do Tribunal, pode fazer com que, eventualmente, processos se estendam até os limites máximos dos prazos legais, isso quando não houver dilações, mesmo não previstas, com fulcro em justificativas tais como acúmulo involuntário de serviço e ausência de recursos humanos satis-fatórios, acarretando, com isso, em morosidade e ofensa ao direito à razoável duração do processo, o que leva, em última análise, à insegurança para os negócios privados.

Não bastasse isso, como o prazo máximo previsto para a avaliação, em-bora previamente demarcado, ainda é longo, há receio de que as condições de mercado possam mudar – premissas econômicas, financeiras e mercado-lógicas – a ponto de alterar as condições do negócio.

Considerando as proporções continentais do Estado brasileiro, talvez o aumento do número de Conselheiros devesse ter sido objeto da reforma legal empreendida com a promulgação da Lei nº 12.529/2011, de forma a colabo-rar com uma melhor distribuição da carga de trabalho e aumento da rapidez no trâmite dos processos no âmbito do SBDC.

Esse aspecto de insegurança jurídica pode acabar por afugentar empre-sas internacionais que tenham interesse em se instalar, por meio de escritó-rios e filiais, no território brasileiro.

De toda sorte, a nova lei teve por propósito reestruturar o Cade e ten-tar solucionar problemas relativos à demora dos processos administrativos econômicos, bem como à insegurança jurídica existente no panorama exis-tente na vigência da lei anterior. A prática tem mostrado que as alterações refletiram em maior celeridade nos processos administrativos. Nesse sentido, dados divulgados pelo Cade demonstram que, no primeiro ano de vigência da Lei, a maior parte dos atos de concentração apresentados foi aprovada pela Superintendência-Geral, sem necessidade de participação do Tribunal, já que neles não houve necessidade de aplicação de restrição concorrencial,

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com prazo médio exíguo para apreciação dos processos administrativos em questão52.

Percebe-se que a nova estrutura do Cade, ao permitir a aprovação pela Superintendência-Geral dos atos de concentração nas hipóteses legais, viabi-lizou, portanto, evolução no que tange à celeridade na resolução dos proces-sos administrativos concorrenciais. Além disso, com a sistemática do exame prévio dos atos de concentração, tem possibilitado maior segurança jurídica para os agentes econômicos, valor essencial para a permanência destes no mercado.

Espera-se, enfim, a manutenção do cumprimento da nova lei para que atinja os seus objetivos de tutela efetiva e justa da concorrência nacional.

conclusÕes

Não são novos os debates acerca da morosidade existente no julgamen-to de processos administrativos, inclusive nos de natureza econômica, desen-volvidos no âmbito do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e, mais especificamente, do Cade. A insegurança e a incerteza geradas pela demora para o desfecho processual não interessam à sociedade, ao Poder Público e tampouco aos envolvidos.

A lentidão no trâmite processual causa desprestígio à Administração Pública e macula sua credibilidade, porquanto sua duração desarrazoada, ocasionalmente, tem o condão de causar prejuízos de grande monta a inú-meras pessoas.

A atuação do Cade, forma patente de intervenção do Estado na ordem econômica, algo imprescindível no modelo estatal desenhado na Constituição brasileira de 1988, mostra-se de grande valia, de forma a garantir os preceitos constitucionais de defesa da ordem econômica e da concorrência e, media-tamente, a justiça social e a dignidade da pessoa humana. A essencialidade de processo administrativo prévio para a confecção de uma grande gama de atos nesta seara liga-se à busca de melhor conteúdo das decisões, legitima-ção de poder, justiça efetiva e democratização da atuação estatal. Contudo, a real concretização destes intentos só será possível a partir de uma tramitação

52 TUDISCO, Laeti. A nova estrutura do Cade e a aprovação dos atos de concentração pela superintendência geral: análise e considerações acerca da Lei nº 12.529/2011. Diálogo e Interação, Cornélio Procópio, v. 8, 2014.

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ocorrida em prazo razoável, para que não haja prejuízos desnecessários e injustos para os administrados.

A morosidade nos processos administrativos econômicos ofende o princípio da duração razoável do processo, e gera repercussões negativas à sociedade e ao mercado, além de insegurança jurídica aos envolvidos. Há, portanto, prejuízo que atinge uma esfera imensurável de pessoas.

A Lei nº 12.529/2011, que veio em substituição à Lei nº 8.884/1994, demarcou prazos e previu importantes consequências aos eventuais descum-primentos, na esteira do que advém do princípio fundamental da duração razoável do processo. Cabe, agora, ao Poder Público dar continuidade a esta sequência, de forma que haja infraestrutura e recursos humanos suficientes no SBDC para garantir que os processos administrativos econômicos sejam julgados, mais que em prazo razoável, com efetiva justiça.

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o impActo do reGime dAs tutelAs de urGênciA do novo códiGo de

processo civil nAs medidAs cAutelAres AdotAdAs pelA AdministrAção públicA

e A possibilidAde dA interposição de AGrAvo de instrumento em

processos AdministrAtivosthe impAct of emerGency GuArdiAnships of

the reGime of the new civil procedure code on the precAutionAry meAsures Adopted

by the public AdministrAtion And the possibility of brinGinG An interlocutory

AppeAl in AdministrAtive proceedinGsaldeM Johnston BarBosa araúJo

Advogado, Especialista em Direito Público (Pós-Graduação Lato Sensu) pela Faculdade Estácio – Recife.

RESUMO: A adoção de medidas cautelares nos processos administrativos por parte da Administração Pública visando resguardar o interesse público é uma previsão encontrada em vários dispositivos da legislação administrativa. Com a entra-da em vigor do novo Código de Processo Civil foi instituído no ordenamento jurídico pátrio um novo regime para as tu-telas de urgência que engloba tanto a tutela antecipada como a tutela cautelar. Em virtude da aplicação supletiva e subsi-diária das normas do novo Código de Processo Civil, faz-se necessário analisar os impactos do novo regime das tutelas de urgência nos processos administrativos.

PALAVRAS-CHAVE: Tutelas de urgência; processo adminis-trativo; novo Código de Processo Civil.

ABSTRACT: The adoption of precautionary measures in ad-ministrative procedures by the Public Administration aiming to safeguard the public interest is a prediction found in va-rious provisions of administrative legislation. With the entry into force of the New Code of Civil Procedure, a new regime for urgent guardianships was established in the country’s le-

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gal system, which includes both early protection and precautionary protection. Due to the supplementary and subsidiary application of the norms of the new Code of Civil Procedure, it is necessary to analyze the impacts of the new regime of emergency safeguards in administrative processes.

KEYWORDS: Emergency tutors; administrative process; new Civil Procedure Code.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A aplicação supletiva e subsidiária das normas do Novo Código de Processo Civil aos processos adminis-trativos: as tutelas de urgência cautelares e antecipadas nos pro-cessos administrativos; 2 Da admissibilidade do uso do agravo de instrumento no âmbito dos processos administrativos; Conclusão; Referências.

introdução

No exercício da “função administrativa”1, a Administração Pública exerce seus poderes fiscalizatório e sancionador, impondo condicionamentos2

1 Sobre o conceito de função administrativa, vide Celso Antônio Bandeira de Mello: “é a função estatal, exercida normalmente pelo Poder Executivo e seus sujeitos auxiliares e atipicamente por órgãos de outros Poderes, sempre na conformidade de um regime hierárquico, e que, tal como resulta do sistema constitucional brasileiro, caracteriza-se juridicamente pelo fato de ser desempenhada mediante comportamentos infralegais ou, excepcionalmente, infraconstitucionais vinculados, submissos todos a controle de legalidade pelo Poder Judiciário” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 349, rodapé 22 apud VITTA, Heraldo Garcia. A sanção no direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 35)

2 “Na relação jurídico-administrativa decorrente dos condicionamentos administrativos, o Poder Público desfruta de poderes de autoridade, inexistentes nas relações privadas. A variedade deles torna difícil uma sistematização. Entretanto, são identificáveis ao menos quatro distintas competências manejadas pela Administração, no caso. São competências para: a) impor os condicionamentos; b) fiscalizar; c) reprimir a inobservância dos condicionamentos, em especial sancionando as infrações; e d) executar. [...] A criação de condicionamentos administrativos é, por força do princípio da legalidade, virtude exclusiva da lei. Porém, se por vezes a mera edição da lei faz nascer imediatamente a constrição, em outras esta só se opera com o ato administrativo. Têm-se, assim, duas situações: a) aquelas em que a própria lei constrange a esfera subjetiva do particular, independentemente de ato administrativo posterior; b) aqueles em que a lei apenas autoriza a Administração a, em situação por ela descrita, impor concretamente certo condicionamento. [...] À competência para impor condicionamentos se agrega a de fiscalizar sua observância. Trata-se do poder, atribuído pela lei à Administração, de verificar permanentemente a regularidade do exercício dos direitos pelos administrados. [...] Ao poder de fiscalizar corresponde a obrigação de o administrador suportar a verificação administrativa e de colaborar com ela. Aliás, suportar a fiscalização é espécie de sujeição administrativa do

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e ordens3 devidamente lastreados na lei.

Pois bem, verificada a violação às mais diversas normas às quais cabe à Administração Pública fiscalizar o cumprimento, imponível se torna a sua repressão, haja vista o caráter de poder-dever4 que reveste as ações ligadas ao Poder de Polícia do Estado.

E para apurar a ocorrência desta violação, faz-se necessário, para ga-rantir o contraditório e a ampla defesa5, promover o cotejo dialético das in-formações colhidas pela Administração Pública Fiscalizadora com os even-tuais argumentos de fato e de direito (acompanhados das respectivas provas quando assim for necessário) aos quais se deverá oportunizar ao pretenso infrator produzir.

direito. Opor óbices a ela traduz comportamento ilícito, como tal passível de sanção. [...] Entre as competências da Administração ligadas aos condicionamentos de direito, insere-se a de repressão da sua inobservância. A atividade repressiva é veiculada por instrumentos com variada finalidade e intensidade. Dentre eles, devem distinguir-se três, especialmente relevantes: a) a ordem para correção de irregularidade; b) a medida cautelar; e c) a sanção.” (SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo ordenador. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 73, 75/77)

3 “Verificado o descumprimento da lei pelo titular do direito, a Administração pratica ato determinando-lhe a correção da irregularidade. É o que chamamos de ordem. Citem-se: as ordens para demolição de prédio construído sem licença, para limpeza de terreno urbano, para diminuição, pelos comerciantes, dos preços cobrados acima do tabelado, para eliminação de aterro perigoso, para fechamento de estabelecimento clandestino. Como já citamos anteriormente, tal ato não se confunde com o impositor do condicionamento. Trata-se de medida repressiva – embora não sancionadora −, cuja finalidade é exigir formalmente a eliminação da violação produzida. Pressupõe, portanto, a existência do condicionamento, cuja inobservância é reprimida. [...] As ordens não têm efeito constitutivo da obrigação de respeitar os condicionamentos, que preexistem. No entanto, cumprem relevante função, como antecedente da aplicação de sanções administrativas, da execução forçada e da imposição de sanções penais.” (Idem, p. 77)

4 “As prerrogativas públicas, ao mesmo tempo em que constituem poderes para o administrador público, impõem-lhe o seu exercício e lhe vedam a inércia, porque o reflexo desta atinge, em última instância, a coletividade, esta a real destinatária de tais poderes” (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 20. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 40).

5 “Por ampla defesa, entende-se o asseguramento que é dado ao réu de condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender necessário, enquanto o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, impondo a condução dialética do processo (par conditio), pois a todo ato produzido pela acusação, caberá igual direito da defesa de opor-se-lhe ou de dar-lhe a versão que melhor lhe apresente, ou, ainda, de fornecer uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor [...].” (MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 124)

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Tal cotejo, por seu turno, se dará na seara de um “processo adminis-trativo de punição”, procedimento formal que instrumentaliza e possibilita a aplicação das normas do direito administrativo sancionador6 (“processo ad-ministrativo de punição”7) e do direito administrativo ordenador (emanadas, neste último caso pela Administração Ordenadora8).

6 “Tratar do Direito Administrativo Sancionador, de uma Teoria Jurídica sobre este conjunto de normas punitivas, equivale a adentrar o complexo universo do Direito Administrativo e suas fronteiras com o Direito Penal. Através do Direito Administrativo, nos sistemas predominantemente influenciados pela tradição da chamada civil law, ou cultura romano-germânica, o Estado, além de desempenhar inúmeras funções, costuma proibir e sancionar determinados comportamentos, alcançando agentes públicos e particulares. Nos mais diversos tipos de relações sociais, aí estará o Estado, regulando, condicionando, limitando o exercício de direitos e liberdades, não raro valendo-se do instrumento das sanções, além das medidas coercitivas cautelares ou persuasivas. Este mesmo papel o Estado desempenha, embora por caminhos algo distintos, descentralizados e marcados pela aparição das normas produzidas por Agências, nos moldes prevalentemente common law de funcionamento. Em todos estes espaços e campos institucionais, o Direito Administrativo divisa fronteiras muito tênues com o Direito Penal, no bojo daquilo que convenciona denominar Direito Punitivo ou Direito Sancionador.” (OSÓRIO, Fábio Medina. Direito administrativo sancionador. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 33)

7 “O processo administrativo de punição tem o objetivo de apurar violação à lei, regulamento ou contrato, cometido por servidor, administrado ou contratado. Característica precípua de tais processo (sic) é o due process legal, pois somente com a garantia ao contraditório e à ampla defesa se impede que se aplique sanção administrativa de forma arbitrária. O processo administrativo de punição é instaurado com base em auto de infração, representação, denúncia ou peça equivalente, que deve conter a exposição do ato ou fato ilegal, bem como do ilícito administrativo ou contratual, relacionando com a norma ou convenção violada. O processo é conduzido sob a responsabilidade de um agente público ou de uma comissão, que deve observar as regularidades formais de todas as suas fases para que a sanção imposta não seja invalidada. Dado o caráter punitivo, exige- -se necessariamente uma fase de defesa. Pode-se adotar, subsidiariamente, preceitos do processo penal, quando não sejam incompatíveis com as normas administrativas. Se for verificado que houve infração à lei, aplicam-se as sanções cabíveis: advertência; multa pecuniária; apreensão ou inutilização de produtos; embargos ou demolição de obra; suspensão, proibição ou interdição de atividade; suspensão proibição ou interdição de atividade; suspensão ou impedimento de exercício profissional; cancelamento de alvará de localização e de funcionamento de estabelecimento; suspensão de benefícios fiscais; proibição de negociar com a Administração e outras que a legislação dispuser. A sanção deve ser aplicada com observância dos princípios da correspondência e da proporcionalidade para com a infração cometida.” (COSTA, Nelson Nery. Processo administrativo e suas espécies. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 155/156)

8 “Administração ordenadora é a parcela da função administrativa, desenvolvida com o uso do poder de autoridade, para disciplinar, nos termos e para os fins da lei, os comportamentos dos particulares no campo de atividades que lhes é próprio.” (SUNDFELD, Carlos Ari. Op. cit., p. 20)

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Se ao fim da instrução do processo administrativo se verificar que o pretenso infrator praticou uma conduta de fato enquadrável como infração administrativa9-10-11 (“ilícito administrativo”12), cabe ao Estado aplicar-lhe a devida sanção13-14-15-

9 “Violação de uma norma de conduta que enseja consequência jurídica por parte da função administrativa.” (VERZOLA, Maysa Abrahão Tavares. Sanção no direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 59)

10 “O comportamento voluntário, violador da norma de conduta que o contempla, que enseja a aplicação, no exercício da função administrativa, de uma direta e imediata consequência jurídica restritiva de direitos, de caráter repressivo.” (FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 25 apud FERREIRA, Daniel. Teoria geral da infração administrativa a partir da Constituição Federal de 1988. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 188)

11 “É o descumprimento de um dever (conduta contrária ao comando da norma), pelo destinatário da norma jurídica, cuja sanção possa ser imposta por autoridade administrativa (no exercício da função administrativa), em virtude do ordenamento jurídico conferir-lhe tal competência.” (VITTA, Heraldo Garcia. A sanção no direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 35)

12 Sobre esta questão terminológica acerca de ilícito e/ou infração administrativa, colha-se como exemplo a lição de Regis Fernandes de Oliveira: “Em direito administrativo fala- -se também em ilícito, mas como gênero a identificar a espécie ‘infração’, que significa o comportamento contrário ao previsto na norma, seja obrigatório, seja proibido, na hipótese de a sanção ser aplicada pelo órgão administrativo.” (OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Infrações e sanções administrativas. 2. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 19)

13 “A circunstância de uma determinada conduta humana ser tornada, nestes termos, pressuposto de uma sanção significa que essa conduta é juridicamente proibida, isto é, constitui um ilícito, um delito. Este conceito de sanção e o conceito ilícito são correlativos. A sanção é consequência do ilícito; o ilícito (ou delito) é pressuposto da sanção.” (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Coimbra: Arménio Amado, 1960, p. 68 apud OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Infrações e sanções administrativas. 2. ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 15)

14 “Sanção administrativa é o ato administrativo unilateral, discricionário, pelo qual se aplicam penalidades em terceiros pela inobservância dos respectivos deveres.” (MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios gerais de direito administrativo, Rio de Janeiro: Forense, 1979, v. 1, p. 561 Apud FRANÇA, Vladimir da Rocha, “Processo administrativo sancionador na Lei Federal nº 9.784/1999”, In: NOHARA, Irene Patrícia; MORAES FILHO, Marco Antonio Praxedes de (Org.). Processo administrativo: temas polêmicos da Lei nº 9.784/1999. São Paulo: Atlas, 2011. p. 265)

15 “O ato administrativo unilateral e individual mediante o qual há a privação de bem jurídico do administrado, ou sua restrição, em virtude do descumprimento voluntário do respectivo dever jurídico-administrativo.” (FRANÇA, Vladimir da Rocha. “Processo administrativo sancionador na Lei Federal nº 9.784/1999”. In: NOHARA, Irene Patrícia; MORAES FILHO, Marco Antonio Praxedes de (Org.). Processo administrativo: temas polêmicos da Lei nº 9.784/1999. São Paulo: Atlas, 2011. p. 264/265)

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-16-17-18-19.

Entretanto, nem sempre é possível que a Administração Pública aguar-de o fim do processo administrativo para intervir na esfera de direitos do par-ticular. Visando assegurar o interesse público, o Estado adota providências cautelares20 que, não se confundindo com sanções administrativas21, posteci-pam o contraditório e a ampla defesa no processo administrativo.

16 “A direta e imediata consequência jurídica, restritiva de direitos, de caráter repressivo, a ser imposta no exercício da função administrativa, em virtude de um comportamento juridicamente proibido, comissivo ou omissivo.” (FERREIRA, Daniel. Sanções administrativas. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 25 Apud FERREIRA, Daniel. Op. cit., p. 82)

17 “Consiste a sanção administrativa, portanto, em um mal ou castigo, porque tem efeitos aflitivos, com alcance geral e potencialmente pro futuro, imposto pela Administração Pública, materialmente considerada, pelo Judiciário ou por corporações de direito público, a um administrado, jurisdicionado, agente público, pessoa física ou jurídica, sujeitos ou não especiais relações de sujeição com o Estado, como consequência de uma conduta ilegal, tipificada em norma proibitiva, com uma finalidade repressora ou disciplinar, no âmbito de aplicação formal e material do Direito Administrativo.” (OSÓRIO, Fábio Medina. Op. cit., p. 95)

18 “A medida aflitiva imposta pela Administração Pública em função da prática de um comportamento ilícito.” (MELLO, Rafael Munhoz de. Princípios constitucionais de direito administrativo sancionador. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 62/63)

19 “Desatendido, pelo titular do direito, o dever de observar os condicionamentos decorrentes da lei, seu comportamento caracterizará infração, sujeitando-o à aplicação de sanções administrativas.” (SUNDFELD, Carlos Ari. Op. cit., p. 79)

20 “Providências administrativas acautelatórias são medidas que a Administração muitas vezes necessita adotar de imediato para prevenir danos sérios ao interesse público ou à boa ordem administrativa e cuja finalidade não é − como a das sanções − intimidar eventuais infratores para que não incorram em conduta ou omissão indesejada, mas, diversamente, é a de paralisar comportamentos de efeitos danosos ou de abortar a possibilidade de que se desencadeiem. [...] Quase sempre tais providências precedem sanções administrativas, mas com elas não se confundem. Assim, e.g., a provisória apreensão de medicamentos ou alimentos presumivelmente impróprios para o consumo da população, a expulsão de um aluno que esteja a se comportar inconvenientemente em sala de aula, a interdição de um estabelecimento perigosamente poluidor, quando a medida tiver de ser tomada sem delonga alguma, são medidas acautelatórias e só se converterão em sanções depois de oferecida oportunidade de defesa para os presumidos infratores.” (MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 784)

21 “Há medidas coativas, que podem ser adotadas pela Administração Pública ou por outros Poderes Públicos na aplicação das leis, que não constituem sanções administrativas, embora causem sofrimento e efeitos aflitivos na esfera pessoal do agente atingido, assemelhando-se, inclusive, às sanções previstas no ordenamento jurídico. Diga-se que tal realidade não é privativa do Direito Administrativo Sancionador, porquanto diz respeito ao Direito Punitivo como um todo, alcançando o Direito Penal, onde até mesmo as penas privativas de liberdade – vale dizer, as privações de liberdade – podem ser antecipadas,

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Com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (de apli-cação supletiva e subsidiária aos processos administrativos) e consequente-mente da adoção de um novo regime de tutelas de urgência que engloba tanto a tutela antecipada como a tutela cautelar, resta inegável que exsurgem possibilidades de relevantes alterações nas relações entre administrados e a Administração no bojo dos processos administrativos.

1 A AplicAção supletivA e subsidiáriA dAs normAs do novo códiGo de processo civil Aos processos AdministrAtivos: As tutelAs de urGênciA cAutelAres e AntecipAdAs nos processos AdministrAtivos

Como bem observa a doutrina, o ingresso de um novo Código de Pro-cesso Civil em um ordenamento jurídico (em nosso caso o instituído pela Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015) exige uma releitura de toda a legislação processual especial/extravagante/esparsa:

A promulgação de um novo Código de Processo Civil tende a ocasionar in-fluxo em diversos diplomas legais. Isso porque tal diploma funciona como regramento processual padrão para boa parte de leis especiais, servindo ainda como regra supletiva (ou residual) para outros que possuem re-gras processuais próprias (como no caso das leis estatutárias/extravagan-tes). Assim, a nova codificação processual civil gera – imune de dúvidas – grandes impactos no ordenamento jurídico pátrio. (MAZZEI, Rodrigo; MARQUES, Bruno Pereira. “Estatuto da Cidade e o Novo Código de Pro-cesso Civil: primeiras considerações sobre o impacto e a simbiose dos di-

por motivos ligados à proteção cautelar de direitos da coletividade. O certo é que as medidas coativas ostentam um elemento teleológico distinto, diferente que caracteriza as sanções administrativas, e, portanto, não estão sujeitas aos mesmos princípios. As chamadas medidas preventivas podem ser compreendidas nesse âmbito. Tais medidas são adotadas antes de se produzir determinados perigos. O objetivo é, justamente, evitar a ocorrência de determinados fatos, impedir que se consume uma violação da ordem jurídica, considerando que há uma antecipação da ilicitude da conduta, a partir de presunções cautelares, para estancar seu prosseguimento, evitando que culminasse numa agressão maior e mais intensa ao ordenamento jurídico. As sanções administrativas, ao contrário, são consequência do cometimento de uma infração administrativa, constituindo uma repressão, uma resposta cabal a um fato ilícito, não apenas cautelar e provisório. O pressuposto é, nessa seara, a realização de um comportamento proibido, representando, enfim, um posterius em relação às medidas cautelares pertinentes, ao passo no campo das medidas preventivas outro é o pressuposto, dado que inexiste pretensão de uma resposta cabal a um fato ilícito, mas apenas de uma proteção provisória a direitos.” (OSÓRIO, Fábio Medina. Direito administrativo sancionador. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 103/104)

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plomas”. In: Novo Código de Processo Civil: impactos na legislação extrava-gante e interdisciplinar. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2016. p. 388)

Em que pese o novo Código de Processo Civil instituído pela Lei nº 13.105/2015 ser uma lei geral, o mesmo irá obrigatoriamente repercutir na legislação especial quando resta aplicável a chamada “teoria do diálogo das fontes”:

Com efeito, consoante a Teoria do Diálogo das Fontes, as normas benéficas supervenientes preferem à norma especial (concebida para conferir trata-mento privilegiado a determinada categoria), a fim de preservar a coerên-cia do sistema normativo. (STJ, AGREsp 200902235972, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 17.12.2010) (MONNERAT, Fábio Victor da Fonte; NOLASCO, Rita Dias. “A influência do Novo Código de Processo Civil no contraditório das execuções fiscais”. In: Novo Código de Processo Civil: impactos na legislação extravagante e interdisciplinar. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2016. p. 230)

O art. 15 do novo Código de Processo Civil, inspirado no Código de Processo Civil espanhol, permite que, na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, suas disposições lhes sejam aplicadas supletiva e subsidiariamente.

Explicando a diferença entre a aplicação supletiva e subsidiária disci-plinada no art. 15 do NCPC, Susy Cavalcante Koury atesta, com inequívoca precisão, o seguinte:

Há uma diferença técnica importante entre o CPC ser supletivo e subsidiário a outras leis. Quando uma lei é simplesmente omissa em relação a uma situ-ação concreta, é preciso suprir essa lacuna normativa, através de utilização supletiva de outra lei. Já quando existe texto normativo para o caso, mas sua aplicação não conduz a um resultado adequado, pode-se falar em subsidia-riedade. O CPC, como diz o art. 15, opera em ambas as dimensões: tanto supre lacunas quando serve de subsídio a casos em que a lei específica não se mostra constitucionalmente adaptada à situação concreta. (KOURY, Susy Cavalcante. “As repercussões do novo Código de Processo Civil no direito do trabalho: avanço ou retrocesso”. Revista TST, v. 78, n. 3, p. 257, jul./set. 2012 apud SCHMITZ, Leonard Ziesemer; CARVALHO, Nathalia Gonçalves de Macedo Carvalho. “Influência didática e normativa do Novo Código de Processo Civil sobre a Lei nº 9.009/1995”. In: Novo Código de Processo Civil: impactos na legislação extravagante e interdisciplinar. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2016. p. 297)

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Comentando esse mesmo dispositivo, Artur César de Souza, com am-paro no direito estrangeiro, defende a possibilidade de, com fulcro no NCPC, serem concedidas antecipações de tutela nos processos administrativos:

Este dispositivo buscou inspiração no conteúdo previsto no artigo 4º da Ley 1/2000, de Enjuiciamento Civil (Código de Processo Civil espanhol), que as-sim dispõe: “Caráter supletivo da Ley de Enjuiciamento Civil. – Na ausência de disposições nas leis que regulam os processos penais, contencioso-admi-nistrativos, trabalho e militar, será aplicada supletivamente a presente lei”. O próprio legislador processual entende que estão à margem da jurisdi-ção civil os processos, eleitorais, administrativos ou trabalhistas. Contudo, mesmo que essas matérias tenham regulamentação processual específica, nada impede que o novo CPC seja aplicado supletivamente em relação aos atos processuais que não são regulamentados nas respectivas legislações. [...] as normas processuais civis deverão ser aplicadas a outras espécies de jurisdição, como é o caso da trabalhista, eleitoral e administrativa. Também deverão ser aplicadas aos processos administrativos regulados pela Lei nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999. Pode-se pensar, inclusive, na concessão de tutelas de urgência satisfativa. Os tribunais administrativos portugueses, por exemplo, conforme ensina Isabel Celeste Fonseca, já obrigaram uma Câmara Municipal, através de uma providência cautelar não especificada, a incluir nas condições de um concurso público para escolha de um novo concessionário (para exploração do domínio público) o direito de opção de um concorrente. E os tribunais administrativos, igualmente através de uma providência cautelar, permitiram a um militar usufruir, por antecipa-ção, da situação provisória de sua passagem à situação de reserva, a qual lhe permitiria a apresentação da sua candidatura numa eleição autárqui-ca. (SOUZA, Artur César de. Código de processo civil: anotado, comentado e interpretado − Parte geral (arts. 1 a 317). São Paulo: Almedina, 2015. p. 152/154)

Pois bem, o art. 29422-23-

22 “Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.”

23 “O legislador agrupou sob o gênero tutelas provisórias tanto as tutelas satisfativas como as tutelas cautelares que podem ser prestadas mediante cognição sumária, isto é, fundadas em juízo de probabilidade (art. 300). A técnica antecipatória pode dar lugar a uma decisão provisória que satisfaça desde logo o direito da parte fundada na urgência ou na evidência. A tutela cautelar, porém, é sempre fundada na urgência (art. 301). O legislador buscou caracterizar a urgência que dá lugar à tutela provisória no art. 300 e a evidência

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-24-25-26 do NCPC introduziu no direito proces sual brasileiro a possibilidade de concessão de tutelas provisórias fundamentadas em urgência ou evidência, sendo as primeiras divididas em satisfativas (antecipadas) e cautelares27-28-29.

no art. 311.” (MITIDIERO, Daniel. Breves comentários do código de processo civil (livro eletrônico). In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.) 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.032)

24 “Cabe salientar que o novo Código de Processo (2015) estabelece como tutelas de urgência tanto a satisfativa (tutela antecipada), como a cautelar, sendo que a tutela da evidência, que constitui novidade em termos de Direito Positivo, não é considerada tutela de urgência. Todas elas, contudo, são consideradas tutelas provisórias.” (MORAES, Voltaire de Lima. Novo código de processo civil anotado/OAB. Porto Alegre: OAB/RS, 2015, p. 239)

25 “A tutela de urgência é ainda classificada, pelo art. 294, entre tutela de urgência cautelar e tutela de urgência antecipada. A tutela cautelar não tem conteúdo satisfativo, servindo à asseguração da realização futura do direito. Já a tutela antecipada tem ínsita a característica de satisfazer o direito, dado que somente com a satisfação, ainda que provisória, assegura-se a concretização futura da tutela definitiva do direito.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC. (livro eletrônico) 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 201.5 p. 764)

26 “O legislador processual adotou o termo tutela provisória para identificar modalidade de tutela jurisdicional cujo escopo não é, ao menos em princípio, solucionar definitivamente a crise de direito material.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Código de Processo Civil Anotado. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; FERREIRA FILHO, Manoel Caetano; APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho; MARTINS, Sandro Gilbert; DOTTI, Rogéria Fagundes (Coords.). Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015, p. 493)

27 “A expressão tutela de urgência serve no novo Código como gênero em que se inserem a tutela antecipada (tutela satisfativa) e a tutela cautelar.” (MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 1.045)

28 “Consagrada pela doutrina (DA SILVA, Ovídio Baptista. Curso de processo civil cit.; Alvaro de Oliveira, ‘Perfil Dogmática das Tutelas de Urgência’, Revista da Ajuris, n. 70), a expressão tutela de urgência serve no novo Código como gênero em que se inserem a tutela antecipada (tutela satisfativa) e a tutela cautelar. Teria o legislador andado melhor se tivesse percebido que a antecipação é apenas uma técnica processual que serve para viabilizar a prolação de uma decisão provisória capaz de outorgar tutela satisfativa ou tutela cautelar fundada em cognição sumária (sobre o assunto, o nosso Antecipação da Tutela – Da Tutela Cautelar à Técnica Antecipatória, cit.).” (MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 1.045)

29 “Duas são as espécies de tutela de urgência: cautelar e antecipada. A primeira caracteriza- -se pela natureza meramente conservativa. Limita-se a proteger bens, pessoas ou provas, a fim de que, quando e se possível a concessão da tutela final e definitiva, momento em que a verossimilhança transforma-se em certeza, possa o titular do direito dele usufruir. São exemplos típicos o arresto, o sequestro e a produção antecipada de provas. Já a tutela antecipada busca esse mesmo objetivo mediante a técnica da antecipação provisória de efeitos da tutela final. Sua eficácia prática confunde-se, ainda que parcialmente, com a da tutela final (alimentos provisórios, separação de corpos, liberação de mercadorias apreendidas, etc.).” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Código de Processo Civil Anotado. In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; FERREIRA FILHO, Manoel Caetano; APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho; MARTINS, Sandro Gilbert; DOTTI, Rogéria Fagundes (Coords.). Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015, p. 495)

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A tutela de urgência, antecipada ou cautelar, é disciplinada nos arts. 30030 e 30131-32-33-

30 “Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. § 1º Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la. § 2º A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. § 3º A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão.”

31 “Art. 301. A tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito.”

32 “Toda e qualquer tutela idônea para conservação do direito pode ser requerida pela parte a título de tutela cautelar (art. 301). Daí que a alusão ao arresto, sequestro, arrolamento de bens e ao registro de protesto contra alienação de bens são apenas exemplos de providências que podem ser obtidas pela parte. É possível obter atipicamente tutela cautelar no direito brasileiro – isto é, embora empregando terminologia diversa, o novo Código reconhece o poder cautelar geral do juiz (José Roberto dos Santos Bedaque, Tutela Cautelar e Tutela Antecipada: Tutelas Sumárias e de Urgência, Malheiros). O fato de o legislador não ter repetido as hipóteses de cabimento do arresto, do sequestro, do arrolamento de bens e do registro de protesto contra alienação significa que essas medidas cautelares se submetem aos requisitos comuns a toda e qualquer medida cautelar: probabilidade do direito (fumus boni iuris) e perigo na demora (periculum in mora). Significa ainda que o Código vigente incorporou o significado desses termos – tal como eram compreendidos na legislação anterior. Desse modo, arresto é uma medida cautelar que visa a resguardar de um perigo de dano o direito à tutela ressarcitória. Sequestro é uma medida cautelar que visa a proteger de um perigo de dano a tutela do direito à coisa. Arrolamento de bens é uma medida cautelar que visa a descrever, apreender e depositar determinada universalidade de bens exposta a um risco de dano. Protesto contra alienação de bens é uma medida cautelar que visa assegurar a frutuosidade da tutela do direito à reparação ou ao ressarcimento diante de um perigo de dano. Serão cabíveis arrestos, sequestros, arrolamentos de bens, protestos contra alienação de bens e quaisquer outras medidas idôneas para asseguração dos direitos quando houver perigo de infrutuosidade da tutela ao direito à reparação ou ao ressarcimento. Vale dizer: perigo de dano irreparável ou de difícil reparação (Ovídio Baptista da Silva. Curso de Processo Civil cit.; Guilherme Recena Costa, ‘Entre Função e Estrutura: Passado, Presente e Futuro da Tutela de Urgência no Brasil’, Tutelas de Urgência e Cautelares, Saraiva).” (MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 1.049/1.050)

33 “O Código de Processo Civil de 2015 consagra legislativamente a ideia da atipicidade dos meios executivos para o cumprimento da tutela cautelar. Tal perspectiva representa a correta compreensão do Poder Geral de Cautelar conferido ao juiz (e que já existia expressamente também no CPC/1973, especialmente nos arts. 798 e 799) como expressão do fato de que a tutela cautelar é fenômeno essencialmente atípico, no que tange aos meios executivos idôneos e adequados à sua efetivação, e não como uma simples regra de fechamento do sistema. [...] A norma positivada no art. 301 representa uma mudança de direção em relação ao CPC/1973, que expressamente previa uma série de procedimentos cautelares específicos, no Capítulo II do Livro III, que, em verdade, nada mais eram do que meras

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-34 do NCPC.

Para a concessão de tutelas de urgência (antecipadas ou cautelares), é essencial que a demora na tramitação ordinária do processo administrativo represente risco ou agravamento35 de lesão ao interesse público, de modo que a concessão de uma tutela de urgência está condicionada à verificação da existência de probabilidade do direito e do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (perigo da demora).

Sobre a “probabilidade do direito”, eis o que leciona a doutrina:

No direito anterior a antecipação da tutela estava condicionada à existência de “prova inequívoca” capaz de convencer o juiz a respeito da “verossimi-lhança da alegação”, expressões que sempre foram alvo de acirrado debate na doutrina (Luiz Guilherme Marinoni. Antecipação da Tutela cit.; Daisson Flach, A Verossimilhança no Processo Civil, Ed. RT; o nosso, Antecipação da

formas executivas diversas de efetivação da tutela cautelar. Justamente por isso, algumas medidas que eram previstas como procedimentos cautelares específicos no CPC/1973 foram repetidas a título de exemplos de meios executivos para efetivação da tutela cautelar, como arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem. Importa ressaltar que o legislador, todavia, expressamente consagrou a ideia da atipicidade dos meios executivos ao estabelecer que pode ser adotada ‘qualquer outra medida idônea para asseguração do direito’.” (TESSER, André Luiz Bäuml. Código de Processo Civil anotado. Coord. José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 503/504)

34 “O dispositivo quer ilustrar as medidas passíveis de concessão de tutela de urgência de natureza cautelar.” (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo código de processo civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 221)

35 “Por qualquer ângulo que se olhe a questão, independentemente da classificação que se adote, a tutela de urgência, como é curial, não pode prescindir de seu núcleo, seu elemento vital: a urgência em si mesma considerada. Avulta dessa constatação a noção de que a tutela de urgência é caracterizada por uma situação de perigo, a qual, no mais das vezes, reside no direito material, e não no plano do direito processual. Nesse sentido, trata-se de uma definição de tutela jurisdicional aderente à situação do direito material que ela visa a proteger. Em palavras simples, pode-se afirmar, como ponto de partida, que só é possível cogitar de tutela de urgência se houver uma situação crítica, de emergência. Dessa forma, a técnica processual empregada para impedir a consumação ou o agravamento do dano – que pode consistir no agravamento do prejuízo ou no risco de que a decisão final seja ineficaz no plano dos fatos, que geram a necessidade de uma solução imediata – é que pode ser classificada como a tutela de urgência. É, pois, a resposta do processo a uma situação de emergência, de perigo, de urgência.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 669)

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Tutela – Da tutela cautelar à técnica antecipatória... op. cit.). O legislador re-solveu, contudo, abandoná-las, dando preferência ao conceito de probabili-dade do direito (o nosso, Antecipação da Tutela – Da tutela cautelar à técnica antecipatória... op. cit.). Com isso, o legislador procurou autorizar o juiz a conceder “tutelas provisórias” com base em cognição sumária, isto é, ouvin-do apenas uma das partes ou então fundado em quadros probatórios incomple-tos (vale dizer, sem que tenham sido colhidas todas as provas disponíveis para o esclarecimento das alegações de fato, conforme o clássico conceito de cognição sumária de Hans Karl Briegleb, Einleitung in die Theorie der summarischen Processe, Bernhard Tauchitz). A probabilidade que autoriza o emprego da técnica antecipatória para a tutela dos direitos é a probabili-dade lógica – que é aquela que surge da confrontação das alegações e das provas com os elementos disponíveis nos autos, sendo provável a hipótese que encontra maior grau de confirmação e menor grau de refutação nesses elementos. O juiz tem que se convencer de que o direito é provável para conceder “tutela provisória”. (MITIDIERO, Daniel. Breves comentários do código de processo civil (livro eletrônico). In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coords.) 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.045-1.046)

A demonstração da probabilidade do direito pode, em alguns casos, pres-cindir de prova. É o que ocorre quando a narrativa feita pelo requerente da medida revestir-se de plausibilidade ou verossimilhança suficientes para autorizar, ainda que em caráter temporário ou provisório, a concessão da tutela de urgência cautelar ou antecipada, respectivamente. Em suma, o juiz deverá valorar todos os elementos disponíveis no momento da aná-lise do requerimento da tutela cautelar ou satisfativa – afirmações, pro-vas, contexto, direito aplicável – e empreender um juízo de probabilidade, indagando-se quem, provavelmente, possui razão: o requerente ou o requerido? Se a conclusão for a de que, provavelmente, o requerente não possui razão, deverá o juiz indeferir a medida postulada. Se, por outro lado, concluir que o requerente provavelmente possui razão, então deverá passar à análise do segundo requisito para a concessão da tutela de urgência cautelar ou antecipada, que vem a ser o “perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo”. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC. (livro eletrônico) 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 776)

Já acerca do “perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (perigo da demora)”, a doutrina assim se manifesta:

A fim de caracterizar a urgência capaz de justificar a concessão de tutela provisória, o legislador falou em “perigo de dano” (provavelmente que-

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rendo se referir à tutela antecipada) e “risco ao resultado útil do processo” (provavelmente querendo se referir à tutela cautelar). Andou mal nas duas tentativas. Em primeiro lugar, porque o direito não merece tutela tão somente diante do dano. O próprio Código admite a existência de uma tutela apenas contra o ilícito ao ter disciplinado o direito à tutela inibitória e o direito à tutela de remoção do ilícito (art. 497, parágrafo único, na esteira da ela-boração da doutrina, Luiz Guilherme Marinoni, Tutela Inibitória, ed. RT, e Técnica Processual e Tutela dos Direitos... cit.). Daí que falar apenas em perigo de dano é recair na proibição de retrocesso na proteção do direito funda-mental à tutela adequada, já que o Código Buzaid, depois das Reformas, utilizava-se de uma expressão capaz de dar vazão à tutela contra o ilícito (“receio de ineficácia do provimento final”). Em segundo lugar, porque a tutela cautelar não tem por finalidade proteger o processo (Carlo Calvosa, La Tutela Cautelare, Utet; Ferruccio Tommaseo, I Provvedimenti d’Urgenza – Struttura e Limiti della Tutela Anticipatoria, Cedam; Ovídio Baptista da Silva, Curso de Processo Civil... cit.), tendo por finalidade tutelar o direito mate-rial diante de um dano irreparável ou de difícil reparação. O legislador tinha à disposição, porém, um conceito mais apropriado, porque suficien-temente versátil, para caracterizar a urgência: o conceito de perigo na demora (periculum in mora). A tutela provisória é necessária simplesmente porque não é possível esperar, sob pena de o ilícito ocorrer, continuar ocorrendo, ocorrer novamente, não ser removido ou de dano não ser reparado ou reparável no futuro. Assim, é preciso ler as expressões perigo de dano e risco ao resul-tado útil do processo como alusões ao perigo na demora (pericolo di tardività, na clássica expressão de Calamandrei, Introduzione allo Studio Sistematico dei Provvedimenti Cautelari... cit.). Vale dizer: há urgência quando a demora pode comprometer a realização imediata ou futura do direito. (MITIDIE-RO, Daniel. Breves comentários do código de processo civil (livro eletrônico). In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coords.) 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.046-1.047)

As tutelas de urgência, porque são medidas voltadas a eliminar ou mino-rar especificamente os males do tempo do processo, têm por fundamento uma situação de perigo. Nesse sentido, o Código de Processo Civil de 2015 positivou dois “perigos” que podem dar fundamento à concessão da tutela de urgência. São eles: o perito de dano e o risco ao resultado útil do processo. Ambas as expressões, em verdade, representam igual fenômeno, qual seja os males que o tempo pode trazer para o processo ou para direito nele postulado. (TESSER, André Luiz Bäuml. Código de Processo Civil anota-do In: CRUZ E TUCCI, José Rogério; FERREIRA FILHO, Manoel Caetano;

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APRIGLIANO, Ricardo de Carvalho; MARTINS, Sandro Gilbert; DOTTI, Rogéria Fagundes (Coord.) Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 501)

Deve o requerente da medida demonstrar que há perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo com a não concessão da tutela pretendida. Este risco é o mesmo que já vinha previsto na sistemática do CPC revogado. É, assim, atual a lição de Teori Zavascki acerca do tema: “O risco de dano irreparável ou de difícil reparação e que enseja a antecipação assecuratória é o risco concreto (e não o hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo) e grave (vale dizer, o potencial-mente apto a fazer perecer ou a prejudicar o direito afirmado pela parte). Se o risco, mesmo grave, não é iminente, não se justifica a antecipação da tutela. É consequência lógica do princípio da necessidade, [...]”. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC. (livro eletrônico) 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 776)

Diga-se ainda que a concessão da tutela provisória de urgência (anteci-pada ou cautelar) pode ser concedida em caráter liminar inaudita altera pars36, e, para sua efetivação, o NCPC (art. 29737-38

36 “A legislação processual civil não limita nem estabelece um momento específico para a concessão da antecipação de tutela. Aliás, expressamente permite que a medida seja concedida liminarmente (o que significa dizer, sem a oitiva prévia da parte contrária) ou após justificação prévia (por exemplo, em audiência designada pelo juiz especialmente para a produção de provas para tal finalidade). Assim, admite-se sua concessão a qualquer momento do processo, desde que antes da decisão final definitiva. A medida pode ser concedida, então, antes da citação do réu, durante o curso do processo, e até mesmo na sentença.” (TESSER, André Luiz Bäuml. Op. cit., p. 502)

37 “Art. 297. O juiz poderá determinar as medidas que considerar adequadas para efetivação da tutela provisória. Parágrafo único. A efetivação da tutela provisória observará as normas referentes ao cumprimento provisório da sentença, no que couber.”

38 “O legislador não estabeleceu exatamente a forma de realização prática da tutela provisória, mesmo porque as providências podem variar em função do tipo de medida adequada à situação concreta. Limitou-se às normas relativas ao cumprimento provisório da sentença. [...] Caberá ao juiz, dependendo do conteúdo da tutela provisória, determinar quais as providências mais adequadas à sua efetivação. Nada obsta, portanto, a adoção de outras técnicas, principalmente se verificada a insuficiência da execução por expropriação. A fixação de multa pecuniária pelo descumprimento do provimento antecipatório constitui providência possível, adequada e útil para conferir maior efetividade à antecipação. A tutela provisória de urgência deve limitar-se à finalidade do instituto, qual seja prevenir a ocorrência de dano. Devem ser utilizados mecanismos que produzam o resultado prático necessário para evitar a lesão. Emitirá o juiz mandados e ordens destinados a alcançar essa finalidade prática, consistente em antecipar os efeitos do provável provimento definitivo.” (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit., p. 497)

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-39) autoriza a adoção, dentro do poder geral de cautela, de uma gama atípi-ca e inominada de medidas que sejam consideradas adequadas para o caso concreto.

Traçadas as linhas gerais acerca do tratamento conferido pelo NCPC ao regime das tutelas provisórias de urgência, façamos considerações espe-cíficas sobre a aplicabilidade dos institutos da tutela provisória de urgência cautelar e antecipada aos processos administrativos.

Dito isso, há de se deixar claro que a legislação é profícua em prever a possibilidade de adoção de providências administrativas acautelatórias por parte do Estado. O art. 4540 da Lei Federal de Processo Administrativo, por exemplo, prevê genericamente a postecipação do contraditório e da ampla defesa em caso de risco iminente.

Tal previsão, dado ao seu já destacado caráter genérico, revela-se inó-cua, vez que não traça limites definidos para a atuação estatal, dando a ilusão de conferir um poder geral de cautela à Administração Pública, permitindo que, hipoteticamente, o Poder Público tome medidas coativas inominadas contra os administrados sem que haja lei específica concessiva de tais po-deres.

Em outras legislações, por seu turno, são claramente delineadas não só as medidas coativas cautelares que podem ser utilizadas pela Administração

39 “Ressalvada a execução contra a Fazenda Pública, a atividade executiva pode se valer de técnicas executivas atípicas para promoção da tutela dos direitos. No desenho original do Código Buzaid, tínhamos um sistema rígido de correlação entre tipos de obrigação e tipos executivos. As Reformas introduziram um sistema parcialmente maleável, permitindo o emprego de técnicas executivas atípicas para cumprimento das situações substanciais consubstanciadas em um fazer, não fazer e no direito à coisa. Com exceção da execução contra a Fazenda Pública, o novo Código quebrou integralmente o sistema de tipicidade da técnica processual, permitindo o emprego do meio executivo mais adequado para tutela do direito em toda e qualquer situação substancial (art. 139, IV, CPC). Trata-se de quebra que visa à promoção da tutela específica dos direitos, pugnada pela doutrina preocupada com a efetividade do processo. Com isso, o direito brasileiro afasta-se de um sistema de técnica executiva rígida e avizinha-se a um sistema de técnica executiva maleável, seguindo nesse particular tendência que emerge do direito comparado. Todos os meios processuais têm de estar disponíveis para a tutela dos direitos.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 430)

40 Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999 − Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. “Art. 45. Em caso de risco iminente, a Administração Pública poderá motivadamente adotar providências acauteladoras sem a prévia manifestação do interessado”.

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Pública como as hipóteses que autorizam seu uso, diferentemente da estéril abstração do art. 45 da Lei Federal nº 9.784/1999.

No Tribunal de Contas da União, o Regimento Interno41 prevê: (i) o afastamento cautelar e temporário do responsável que, prosseguindo no exer-cício de suas funções, possa retardar ou dificultar a realização de auditoria ou inspeção, causar novos danos ao Erário ou inviabilizar o seu ressarcimento; (ii) a indisponibilidade de bens, tantos quantos considerados bastantes para garantir o ressarcimento dos danos em apuração do responsável que, prosse-guindo no exercício de suas funções, possa retardar ou dificultar a realização de auditoria ou inspeção, causar novos danos ao Erário ou inviabilizar o seu ressarcimento; e (iii) a adoção de medida cautelar, em caso de urgência, de fundado receio de grave lesão ao Erário, ao interesse público, ou de risco de ineficácia da decisão de mérito, de ofício ou mediante provocação, com ou sem a prévia oitiva da parte, que determine, entre outras providências, a suspensão do ato ou do procedimento impugnado, até que o Tribunal decida sobre o mérito da questão suscitada.

41 Regimento Interno do Tribunal de Contas da União (Resolução-TCU nº 246, de 30 de novembro de 2011)

“Art. 273. No início ou no curso de qualquer apuração, o Plenário, de ofício, por sugestão de unidade técnica ou de equipe de fiscalização ou a requerimento do Ministério Público, determinará, cautelarmente, nos termos do art. 44 da Lei nº 8.443, de 1992, o afastamento temporário do responsável, se existirem indícios suficientes de que, prosseguindo no exercício de suas funções, possa retardar ou dificultar a realização de auditoria ou inspeção, causar novos danos ao erário ou inviabilizar o seu ressarcimento. Art. 274. Nas mesmas circunstâncias do artigo anterior, poderá o Plenário, sem prejuízo das medidas previstas nos arts. 270 e 275, decretar, por prazo não superior a um ano, a indisponibilidade de bens do responsável, tantos quantos considerados bastantes para garantir o ressarcimento dos danos em apuração, nos termos do § 2º do art. 44 da Lei nº 8.443, de 1992. Art. 276. O Plenário, o relator, ou, na hipótese do art. 28, inciso XVI, o Presidente, em caso de urgência, de fundado receio de grave lesão ao erário, ao interesse público, ou de risco de ineficácia da decisão de mérito, poderá, de ofício ou mediante provocação, adotar medida cautelar, com ou sem a prévia oitiva da parte, determinando, entre outras providências, a suspensão do ato ou do procedimento impugnado, até que o Tribunal decida sobre o mérito da questão suscitada, nos termos do art. 45 da Lei nº 8.443, de 1992.”

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No Estatuto dos Servidores Públicos Federais42 e na Lei de Improbida-de Administrativa43 prevê-se a possibilidade do afastamento cautelar do ser-vidor para que o mesmo não venha a influir na apuração da irregularidade (instrução processual).

Na legislação consumerista, o Código de Defesa do Consumidor44 autoriza a autoridade administrativa aplicar, inclusive de forma cautelar, antecedente ou incidente de procedimento administrativo, as seguintes me-didas: apreensão do produto; inutilização do produto; cassação do registro do produto junto ao órgão competente; proibição de fabricação do produto; suspensão de fornecimento de produtos ou serviço; suspensão temporária de atividade; interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade; intervenção administrativa e imposição de contrapropaganda.

42 Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990 − Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.

“Art. 147. Como medida cautelar e a fim de que o servidor não venha a influir na apuração da irregularidade, a autoridade instauradora do processo disciplinar poderá determinar o seu afastamento do exercício do cargo, pelo prazo de até 60 (sessenta) dias, sem prejuízo da remuneração. Parágrafo único. O afastamento poderá ser prorrogado por igual prazo, findo o qual cessarão os seus efeitos, ainda que não concluído o processo.”

43 Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992 − Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências.

“Art. 20. [...] Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.”

44 Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 − Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.

“Art. 56. As infrações das normas de defesa do consumidor ficam sujeitas, conforme o caso, às seguintes sanções administrativas, sem prejuízo das de natureza civil, penal e das definidas em normas específicas: I − multa; II − apreensão do produto; III − inutilização do produto; IV − cassação do registro do produto junto ao órgão competente; V − proibição de fabricação do produto; VI − suspensão de fornecimento de produtos ou serviço; VII − suspensão temporária de atividade; VIII − revogação de concessão ou permissão de uso; IX − cassação de licença do estabelecimento ou de atividade; X − interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade; XI − intervenção administrativa; XII − imposição de contrapropaganda. Parágrafo único. As sanções previstas neste artigo serão aplicadas pela autoridade administrativa, no âmbito de sua atribuição, podendo ser aplicadas cumulativamente, inclusive por medida cautelar, antecedente ou incidente de procedimento administrativo.”

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A legislação sanitária45-46-47 possibilita que: (i) diante da comprovação de que determinado produto, até então considerado útil, é nocivo à saúde ou não preenche requisitos estabelecidos em lei, ele seja imediatamente retira-do do comércio e na exigência da modificação da fórmula de sua composi-ção e nos dizeres dos rótulos, das bulas e embalagens, sob pena de cancela-mento do registro e da apreensão do produto, em todo o território nacional; (ii) como medida de segurança sanitária e à vista de razões fundamentadas do órgão competente, seja suspensa a fabricação e venda de qualquer dos

45 Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976 − Dispõe sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as Drogas, os Insumos Farmacêuticos e Correlatos, Cosméticos, Saneantes e Outros Produtos, e dá outras Providências

“Art. 6º A comprovação de que determinado produto, até então considerado útil, é nocivo à saúde ou não preenche requisitos estabelecidos em lei implica na sua imediata retirada do comércio e na exigência da modificação da fórmula de sua composição e nos dizeres dos rótulos, das bulas e embalagens, sob pena de cancelamento do registro e da apreensão do produto, em todo o território nacional. Art. 7º Como medida de segurança sanitária e a vista de razões fundamentadas do órgão competente, poderá o Ministério da Saúde, a qualquer momento, suspender a fabricação e venda de qualquer dos produtos de que trata esta Lei, que, embora registrado, se torne suspeito de ter efeitos nocivos à saúde humana.”

46 Lei nº 6.437, de 20 de agosto de 1977 − Configura infrações à legislação sanitária federal, estabelece as sanções respectivas, e dá outras providências.

“Art. 23. A apuração do ilícito, em se tratando de produto ou substância referidos no art. 10, inciso IV, far-se-á mediante a apreensão de amostras para a realização de análise fiscal e de interdição, se for o caso. [...] § 4º A interdição do produto e do estabelecimento, como medida cautelar, durará o tempo necessário à realização de testes, provas, análises ou outras providências requeridas, não podendo, em qualquer caso, exceder o prazo de noventa dias, findo qual o produto ou estabelecimento será automaticamente liberado.”

47 Decreto no 30.691, de 29 de março de 1952 − Aprova o novo Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal.

“Art. 875-A. Se houver evidência ou suspeita de que um produto de origem animal represente risco à saúde pública ou tenha sido adulterado, fraudado ou falsificado, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento adotará, isolada ou cumulativamente, as seguintes medidas cautelares: (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016) I − apreensão do produto; (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016) II − suspensão provisória do processo de fabricação ou de suas etapas; ou (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016) III − coleta de amostras do produto para realização de análises laboratoriais. (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016) § 1º Sempre que necessário, será determinada a revisão dos programas de autocontrole dos estabelecimentos. (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016) § 2º A retomada do processo de fabricação ou a liberação do produto sob suspeita serão autorizadas caso o Serviço de Inspeção Federal constate a inexistência ou cessação da causa que autorizou a adoção da medida cautelar. (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016) § 3º O disposto neste artigo não afasta as competências de outros órgãos fiscalizadores, na forma da legislação. (Incluído pelo Decreto nº 8.681 de 2016)”

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produtos referidos na Lei Federal no 6.360/1976 (medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes, etc.), que, embora dotados de registro48, se tornem suspeito de ter efeitos nocivos à saúde hu-mana; (iii) como medida cautelar, promova-se a interdição (por não mais que 90 dias) do produto e do estabelecimento para a realização de testes, provas, análises ou outras providências requeridas; (iv) diante da evidência ou sus-peita de que um produto de origem animal represente risco à saúde pública ou tenha sido adulterado, fraudado ou falsificado, sejam adotadas, isolada ou cumulativamente, as medidas cautelares de apreensão do produto, sus-pensão provisória do processo de fabricação ou de suas etapas ou coleta de amostras do produto para realização de análises laboratoriais.

A Lei do Cade49 permite ao Conselho Administrativo de Defesa Eco-nômica que, em qualquer fase do inquérito administrativo para apuração de infrações ou do processo administrativo para imposição de sanções por infrações à ordem econômica, seja adotada medida preventiva (consistente na imediata cessação da prática e na reversão à situação anterior, quando materialmente possível, com fixação de multa diária), quando houver indício ou fundado receio de que o representado, direta ou indiretamente, cause ou

48 Lei no 6.360, de 23 de setembro de 1976 − Dispõe sobre a Vigilância Sanitária a que ficam sujeitos os Medicamentos, as Drogas, os Insumos Farmacêuticos e Correlatos, Cosméticos, Saneantes e Outros Produtos, e dá outras Providências

“Art. 3º Para os efeitos desta Lei, além das definições estabelecidas nos incisos I, II, III, IV, V e VII do Art. 4º da Lei nº 5.991, de 17 de dezembro de 1973, são adotadas as seguintes: [...] X − Registro: inscrição, em livro próprio após o despacho concessivo do dirigente do órgão do Ministério da Saúde, sob número de ordem, dos produtos de que trata esta Lei, com a indicação do nome, fabricante, da procedência, finalidade e dos outros elementos que os caracterizem; [...].”

49 Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011 − Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; altera a Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 − Código de Processo Penal, e a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos da Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei nº 9.781, de 19 de janeiro de 1999; e dá outras providências.

“Art. 84. Em qualquer fase do inquérito administrativo para apuração de infrações ou do processo administrativo para imposição de sanções por infrações à ordem econômica, poderá o Conselheiro-Relator ou o Superintendente-Geral, por iniciativa própria ou mediante provocação do Procurador-Chefe do Cade, adotar medida preventiva, quando houver indício ou fundado receio de que o representado, direta ou indiretamente, cause ou possa causar ao mercado lesão irreparável ou de difícil reparação, ou torne ineficaz o resultado final do processo. § 1º Na medida preventiva, determinar-se-á a imediata cessação da prática e será ordenada, quando materialmente possível, a reversão à situação anterior, fixando multa diária nos termos do art. 39 desta Lei.”

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possa causar ao mercado lesão irreparável ou de difícil reparação, ou torne ineficaz o resultado final do processo.

Na Lei Anticorrupção50, permite-se que, de forma cautelar, sejam sus-pensos os efeitos do ato ou processo objeto da investigação.

Quando no exercício de atividade de regulação, supervisão e avalia-ção de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e sequenciais no sistema federal de ensino, decreto51 autoriza o Ministério da Educação a suspender, de forma preventiva e cautelar, a admissão de novos alunos em cursos e instituições irregulares, visando evitar prejuízo a novos alunos.

Por fim, na legislação ambiental52 autoriza-se, com o objetivo de pre-venir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo, a adoção das me-didas administrativas de apreensão, o embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas, a suspensão de venda ou fabricação de produto, a suspen-são parcial ou total de atividades, a destruição ou inutilização dos produtos, subprodutos e instrumentos da infração e demolição.

50 Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013 − Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira, e dá outras providências.

“Art. 10. O processo administrativo para apuração da responsabilidade de pessoa jurídica será conduzido por comissão designada pela autoridade instauradora e composta por 2 (dois) ou mais servidores estáveis. [...] § 2º A comissão poderá, cautelarmente, propor à autoridade instauradora que suspenda os efeitos do ato ou processo objeto da investigação.”

51 Decreto nº 5.773, de 9 de maio de 2006 − Dispõe sobre o exercício das funções de regulação, supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e seqüenciais no sistema federal de ensino.

“Art. 11. [...] § 3o O Ministério da Educação determinará, motivadamente, como medida cautelar, a suspensão preventiva da admissão de novos alunos em cursos e instituições irregulares, visando evitar prejuízo a novos alunos.”

52 Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008 − Dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo administrativo federal para apuração destas infrações, e dá outras providências.

“Art. 101. Constatada a infração ambiental, o agente autuante, no uso do seu poder de polícia, poderá adotar as seguintes medidas administrativas: I − apreensão; II − embargo de obra ou atividade e suas respectivas áreas; III − suspensão de venda ou fabricação de produto; IV − suspensão parcial ou total de atividades; V − destruição ou inutilização dos produtos, subprodutos e instrumentos da infração; e VI − demolição. § 1º As medidas de que trata este artigo têm como objetivo prevenir a ocorrência de novas infrações, resguardar a recuperação ambiental e garantir o resultado prático do processo administrativo.”

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Isso posto, questiona-se: as normas do NCPC sobre a tutela provisória de urgência cautelar repercutem de alguma forma nas regras que discipli-nam as providências administrativas acautelatórias adotadas pelo Estado?

Entendemos que sim.

Para a concessão da tutela provisória de urgência cautelar, o NCPC exige a presença de dois requisitos: (a) a verificação da existência de proba-bilidade do direito e (b) do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (perigo da demora).

Ora, no tratamento conferido às providências administrativas acaute-latórias adotadas pelo Estado por algumas legislações, é comum o uso de expressões que conferem ao administrador certo grau de discricionariedade como “medida de segurança sanitária” (Lei nº 6.360/1976), “lesão irreparável ou de difícil reparação” (Lei nº 12.529/2011) ou “garantir o resultado prático do pro-cesso administrativo” (Decreto nº 6.514/2008).

A Lei nº 6.437/1977 é ainda mais discricionária ao prever que a “inter-dição do produto e do estabelecimento, como medida cautelar, durará o tempo necessário à realização de testes, provas, análises ou outras providências reque-ridas”, no que é acompanhada pela Lei nº 12.846/2013, que, de forma singela, simplesmente possibilita a suspensão cautelar dos efeitos do ato ou processo objeto da investigação sem maiores detalhamentos.

Em casos como os reportados anteriormente, caso os requisitos ne-cessários para a adoção de providências administrativas acautelatórias pelo Estado sejam interpretados à luz das exigências contidas no NCPC para a concessão da tutela provisória de urgência cautelar, ou seja, exigindo-se que, para a concessão das medidas coativas cautelares do direito processual ad-ministrativo, haja a presença da verificação da existência de probabilidade do direito e do perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (perigo da demora), ter-se-ia uma redução (sempre desejável) da discricionariedade administrativa.

Portanto, a aplicação supletiva e subsidiária do NCPC aos processos administrativos acarreta uma diminuição da discricionariedade adminis-trativa, vez que as providências administrativas acautelatórias passam a ser submetidas ao crivo dos requisitos para a concessão das tutelas de urgência cautelares.

Por outro lado, algo que certamente não terá guarita no direito proces-sual administrativo seria uma aplicação supletiva e subsidiária no art. 297 do

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NCPC, vez que ele autoriza a adoção, dentro do poder geral de cautela, de uma gama atípica e inominada de medidas que sejam consideradas adequa-das para o caso concreto, repetindo-se aqui as críticas feitas ao art. 45 da Lei Federal nº 9.784/1999.

As providências acautelatórias tomadas pelo Estado no ambiente do direito processual administrativo precisam estar especificamente discrimina-das na legislação, não podendo constar de uma previsão genérica que confira poderes inominados que se manifestarão casuisticamente.

Assim, não há a possibilidade de um “poder geral de cautela” que é conferido ao juiz no âmbito do direito processual civil ser estendido, por meio de uma aplicação supletiva e subsidiária do NCPC, à Administração Pública nos processos administrativos permitindo que órgão ou entidade interdite um estabelecimento sem ter uma norma que lhe confira tal poder por mais que se esteja diante de uma situação de urgente gravidade (por exemplo: Conselho de Farmácia interditando uma drogaria funcionando sem farmacêutico ou o Conselho de Medicina interditando um hospital em razão da presença de pessoas exercendo ilegalmente a medicina).

E quanto às normas do NCPC sobre a tutela provisória de urgência antecipada? Elas também repercutem de alguma forma no direito processual administrativo?

Igualmente entendemos que sim.

A possibilidade de concessão de tutelas antecipadas nos processos ad-ministrativos, viabilizada pela aplicação supletiva e subsidiária do NCPC, permitirá que se homenageie o princípio constitucional da duração razoável do processo, já que, uma vez verificada, no âmbito de um processo adminis-trativo, a existência de probabilidade do direito e do perigo de dano ou o ris-co ao resultado útil do processo (perigo da demora), o bem da vida persegui-do no processo administrativo poderá ser antecipado pela medida satisfativa sem a necessidade de esgotar toda a instrução processual.

Alguns exemplos práticos da possibilidade (e principalmente da ne-cessidade e da utilidade) da concessão de antecipação de tutela em processos administrativos, seja ex officio ou por provocação, inclusive podem ser facil-mente vislumbrados. A seguir nos circunscrevemos a cinco deles.

Primeiro: Determinado medicamento, objeto de diversas demandas na justiça para seu fornecimento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), não possui registro junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de modo

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que não pode ser comercializado no território nacional, embora já possua registro na Food and Drug Administration (FDA) e na European Medicines Agency (EMA). Caso os Laboratórios Farmacêuticos Oficiais ligados ao SUS resolvam fabricar o referido medicamento para que o mesmo seja incluído na lista de assistência farmacêutica do Ministério da Saúde, precisarão obter o registro do produto junto à Anvisa. Ora, como o processo administrativo para a obtenção de registro de produtos sujeitos à fiscalização sanitária pode ser deveras moroso, havendo a urgência para o fornecimento do medicamen-to (perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo) e já dispondo o mesmo de registro na FDA e na EMA (existência de probabilidade do direi-to), é lícito cogitar-se a antecipação da tutela provisória para conceder-se o registro antes do fim do trâmite do processo administrativo.

Segundo: Pequeno empresário resolve abrir uma peixaria às vésperas da Semana Santa. Para regularizar sua atividade, necessita da licença sanitá-ria do órgão competente. Faltando poucos dias para a Semana Santa (época em que sabidamente há a maior procura por pescados durante o ano), a li-cença sanitária ainda não foi expedida em razão de pequenas pendências do estabelecimento para com o órgão de vigilância sanitária. Imaginando-se que as exigências são de pequena monta (p. ex.: substituir sabonete antisséptico em barra por sabonete líquido inodoro antisséptico nos lavatórios das ins-talações sanitárias), é possível concluir que, ao fim da instrução, o pedido para obtenção de licença sanitária será deferido e ela será expedida. Neste cenário, a antecipação de tutela que permita que a licença sanitária seja ex-pedida antes do fim do trâmite do processo administrativo para possibilitar o funcionamento regular da peixaria durante a Semana Santa é uma medida extremamente desejável.

Terceiro: Aluno de instituição pública de ensino superior no último pe-ríodo do seu curso é aprovado em concurso público que exige a apresentação do diploma. Necessitando prestar exames das últimas provas das cadeiras do currículo, aluno requer à instituição que lhe seja possibilitado antecipar a re-alização dos exames e, caso aprovado, seja-lhe expedido o diploma que pos-sibilitará o ingresso no serviço público. À luz da possibilidade da aplicação supletiva e subsidiária do NCPC aos processos administrativos, a concessão de tutela antecipada nesse caso seria perfeitamente viável.

Quarto: Médico-infectologista de hospital universitário federal é con-vocado para servir à Organização Mundial de Saúde (OMS) para investigar, em 48 horas, uma perigosa epidemia de uma mutação do vírus H1N1 alta-

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mente contagiosa. O servidor requer a autorização para ausentar-se do País na forma dos arts. 9553 e 9654 da Lei nº 8.112/1990. Diante da flagrante urgên-cia, sendo da vontade do servidor e não havendo prejuízo ao serviço públi-co, não há motivo que impeça o Ministério do Planejamento55 de antecipar a tutela no processo administrativo e deferir o afastamento do servidor para servir à OMS.

Quinto: Acidente náutico provoca um derramamento de óleo que ame-aça ecossistema de reserva ambiental. Necessitando colocar barreiras físicas para tentar conter o óleo e impedi-lo de provocar mais danos, a Adminis-tração Pública vai ao mercado e descobre que só há um fornecedor para as aludidas barreiras físicas a serem colocadas no mar. Em tal situação, seria perfeitamente possível que a Administração Pública antecipe a tutela para, antes do fim do processo administrativo de contratação direta por inexigibi-lidade de licitação, promover imediatamente a compra das barreiras físicas.

Mas e se, por exemplo, no caso da peixaria, o beneficiário da tutela antecipada não cumprir as poucas exigências restantes para a obtenção da licença sanitária? Aplicando-se supletiva e subsidiariamente o NCPC, fica claro que, da mesma forma que pode ser concedida, a tutela provisória pode ser revogada (art. 29856), de modo que não haveria prejuízo para a Adminis-tração Pública.

Desta feita, resta claro que as normas do NCPC sobre a tutela provisó-ria de urgência antecipada e cautelar têm o potencial de trazer grande reper-cussão nos processos administrativos.

53 “Art. 95. O servidor não poderá ausentar-se do País para estudo ou missão oficial, sem autorização do Presidente da República, Presidente dos Órgãos do Poder Legislativo e Presidente do Supremo Tribunal Federal.”

54 “Art. 96. O afastamento de servidor para servir em organismo internacional de que o Brasil participe ou com o qual coopere dar-se-á com perda total da remuneração.”

55 Decreto nº 3.456, de 10 de maio de 2000 − Delega competência ao Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão para a prática do ato que menciona.

“Art. 1º Fica delegada competência ao Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, vedada a subdelegação, para autorizar o afastamento de servidor da Administração Pública Federal com a finalidade de servir em organismo internacional de que o Brasil participe ou com o qual coopere, de que trata o Decreto-Lei nº 9.538, de 1º de agosto de 1946, o art. 96 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e o Decreto nº 201, de 26 de agosto de 1991.”

56 “Art. 298. Na decisão que conceder, negar, modificar ou revogar a tutela provisória, o juiz motivará seu convencimento de modo claro e preciso.”

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2 dA AdmissibilidAde do uso do AGrAvo de instrumento no âmbito dos processos AdministrAtivos

Como visto anteriormente, o regime de tutelas de urgência disciplina-do pelo NCPC repercutirá junto aos processos administrativos tanto no que é pertinente à tutela cautelar como no que toca à tutela antecipada.

Há, ainda, um aspecto em que o regime de tutelas de urgência instituído pelo NCPC irá afetar tanto eventuais antecipações de tutela como providên-cias cautelares adotadas pela Administração Pública.

Trata-se do regime recursal.

Já foi dito anteriormente que, nos termos do NCPC, a tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência, e que a tutela de urgência pode ser cautelar ou antecipada.

Reiterado isso, esclareça-se que o NCPC prevê o cabimento de agravo de instrumento57 contra decisões interlocutórias que versarem sobre tutelas provisórias.

Assim, é lícito defender o cabimento de agravo de instrumento con-tra decisões interlocutórias que versarem sobre tutela provisória de urgência cautelar ou antecipada proferidas em processos administrativos.

E as hipóteses de cabimento são de fácil vislumbre.

Veja-se, no caso das medidas cautelares (providências administrativas acautelatórias) exemplificadas no tópico anterior, que a legislação só previu a possibilidade de recurso contra as decisões do Tribunal de Contas da União (agravo58) e do Cade (recurso voluntário59).

57 “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I − tutelas provisórias; [...].”

58 Regimento Interno do Tribunal de Contas da União (Resolução-TCU nº 246, de 30 de novembro de 2011)

“Art. 289. De despacho decisório do Presidente do Tribunal, de presidente de câmara ou do relator, desfavorável à parte, e da medida cautelar adotada com fundamento no art. 276 cabe agravo, no prazo de cinco dias, contados na forma do art. 183.”

59 Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011 − Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; altera a Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 − Código de Processo Penal, e a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos da Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei nº 9.781, de 19 de janeiro de 1999; e dá outras providências.

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Destarte, em homenagem ao contraditório e à ampla defesa, é total-mente lícito cogitar-se a aplicação supletiva e subsidiária do NCPC para per-mitir a interposição de agravo de instrumento contra providências adminis-trativas acautelatórias tomadas pelo Estado nos casos em que a legislação de regência for omissa quanto ao recurso cabível.

Outra hipótese de cabimento é o indeferimento de eventual pedido de tutela provisória de urgência antecipada, uma vez que, nos casos em que a concessão de antecipação no processo administrativo decorre de provocação por parte de algum interessado, resta óbvio que a negativa do pleito dá azo ao manejo de agravo de instrumento contra tal decisão interlocutória.

E como vai se dar na prática o processamento do agravo de instrumen-to no âmbito dos processos administrativos?

O primeiro efeito prático será servir de recurso hierárquico contra a decisão recorrida, submetendo a questão para a apreciação da autoridade superior (que, dependendo do organograma da Administração, pode ser até mesmo um órgão colegiado) que proferiu a decisão agravada.

Para tanto, o agravo de instrumento deverá conter (art. 1.01660 do NCPC) os nomes dos interessados (já que, a rigor, não há partes no processo administrativo), a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de re-forma ou de invalidação da decisão e o próprio pedido, o nome e o endereço completo dos advogados constantes do processo (se houver, já que, via de regra, não há a obrigatoriedade de os interessados serem assistidos por advo-gado), e ser instruído (art. 1.01761 do NCPC) com a cópia integral do processo

“Art. 84. [...] § 2º Da decisão que adotar medida preventiva caberá recurso voluntário ao Plenário do Tribunal, em 5 (cinco) dias, sem efeito suspensivo.”

60 “Art. 1.016. O agravo de instrumento será dirigido diretamente ao tribunal competente, por meio de petição com os seguintes requisitos: I − os nomes das partes; II − a exposição do fato e do direito; III − as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão e o próprio pedido; IV − o nome e o endereço completo dos advogados constantes do processo.”

61 “Art. 1.017. A petição de agravo de instrumento será instruída: I − obrigatoriamente, com cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado; II − com declaração de inexistência de qualquer dos documentos referidos no inciso I, feita pelo advogado do agravante, sob pena de sua responsabilidade pessoal; III − facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis.”

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administrativo e de prova da cientificação da decisão recorrida para fins de aferição da tempestividade.

Caberá, ainda, ao agravante, de forma obrigatória, comunicar, por meio de petição (art. 1.01862 do NCPC), a interposição do agravo de instru-mento à autoridade que proferiu a decisão agravada para fins de possibilitar a reconsideração da decisão recorrida.

Recebido o agravo de instrumento, a autoridade (ou órgão colegia-do) hierarquicamente superior à que proferiu a decisão agravada apreciará o recurso para verificar se ele é inadmissível, prejudicado, se desatente ao princípio da dialeticidade63 ou, ainda, se deve ser sumariamente improvido (art. 932, III e IV, do NCPC).

Não ocorrendo nenhuma dessas situações que impedem o conheci-mento ou o provimento do agravo de instrumento, a autoridade (ou órgão colegiado) hierarquicamente superior à que proferiu a decisão agravada po-derá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tu-tela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao prolator da decisão recorrida sua decisão, mas, diante da ausência de partes no processo administrativo, não será necessário intimar ninguém para apresentar con-trarrazões ao agravo e, obviamente, também não precisará intimar o Ministé-rio Público (art. 1.01964 do NCPC).

62 “Art. 1.018. O agravante poderá requerer a juntada, aos autos do processo, de cópia da petição do agravo de instrumento, do comprovante de sua interposição e da relação dos documentos que instruíram o recurso. § 1º Se o juiz comunicar que reformou inteiramente a decisão, o relator considerará prejudicado o agravo de instrumento. § 2º Não sendo eletrônicos os autos, o agravante tomará a providência prevista no caput, no prazo de 3 (três) dias a contar da interposição do agravo de instrumento. § 3º O descumprimento da exigência de que trata o § 2º, desde que arguido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo de instrumento.”

63 “O princípio da dialeticidade está consubstanciado na exigência de que o recorrente apresente os fundamentos pelos quais está insatisfeito com a decisão recorrida, o porque do pedido de prolação de outra decisão.” (PIMENTEL, Bernardo de Souza. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. Brasília: Brasília Jurídica, 2000. p. 147)

64 “Art. 1.019. Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I − poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; II − ordenará a intimação do agravado pessoalmente, por carta com aviso de recebimento, quando não tiver procurador constituído, ou pelo Diário da Justiça ou por carta com aviso de recebimento dirigida ao seu advogado, para que responda no prazo de 15 (quinze) dias, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do

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Contra a decisão da autoridade (ou órgão colegiado) hierarquicamente superior à que proferiu a decisão agravada serão cabíveis embargos de de-claração65 e agravo interno (art. 1.021 do NCPC66), sendo neste último caso exigível o atendimento ao princípio da impugnação especificada67, sem, con-tudo, ser necessária a intimação para contrarrazões (diante da inexistência de parte agravada).

Para finalizar, diga-se que os §§ 4º e 5º do art. 1.021 do NCPC não são aplicáveis ao direito processual administrativo, já que não há que se falar em uma “parte agravada” nos processos administrativos.

conclusão

Muito embora o ordenamento jurídico já contemplasse a possibilida-de da adoção de medidas cautelares por parte da Administração Pública na seara dos processos administrativos, é inegável que a introdução do regime das tutelas de urgência, por força art. 15 do NCPC, trará muitos benefícios

recurso; III − determinará a intimação do Ministério Público, preferencialmente por meio eletrônico, quando for o caso de sua intervenção, para que se manifeste no prazo de 15 (quinze) dias.”

65 ARAÚJO, Aldem Johnston Barbosa. A possibilidade de utilização dos embargos de declaração em processos administrativos conferida pelo novo Código de Processo Civil: um reforço ao controle dos atos administrativos pela obediência ao princípio da motivação. Revista dos Tribunais, São Paulo: RT, v. 970, a. 105, p. 137/191, ago. 2016.

66 “Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal. § 1º Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os fundamentos da decisão agravada. § 2º O agravo será dirigido ao relator, que intimará o agravado para manifestar-se sobre o recurso no prazo de 15 (quinze) dias, ao final do qual, não havendo retratação, o relator levá-lo-á a julgamento pelo órgão colegiado, com inclusão em pauta. § 3º É vedado ao relator limitar-se à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgar improcedente o agravo interno. § 4º Quando o agravo interno for declarado manifestamente inadmissível ou improcedente em votação unânime, o órgão colegiado, em decisão fundamentada, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa. § 5º A interposição de qualquer outro recurso está condicionada ao depósito prévio do valor da multa prevista no § 4º, à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que farão o pagamento ao final.”

67 “Ônus do agravante é a impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada. Não se admite, nem aqui, nem em qualquer outro pedido ou impugnação, manifestações genéricas, que dificultem tanto a defesa, quanto a decisão (do pedido ou da impugnação, em que se faz, também, um pedido).” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Op. cit., 2015, p. 2.141)

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ao direito processual administrativo, pois: (I) servirá de limitador da discri-cionariedade; (II) permitirá que a Administração antecipe a tutela, ex officio ou por provocação, do bem da vida objeto do processo administrativo; e (III) que o interessado prejudicado por decisão interlocutória da Administra-ção Pública (concessiva ou não de tutela antecipada, ou concessiva de caute-lar) em sede de processo administrativo se valha de agravo de instrumento para combatê-la.

A aplicação do regime das tutelas de urgência aos processos adminis-trativos proporcionará um maior controle dos atos administrativos (com a redução da discricionariedade administrativa), bem como certamente permi-tirá o atendimento não só dos princípios da duração razoável dos processos e da eficiência (vez que a prestação buscada no processo administrativo será obtida de forma mais célere) como também assegurará que o contraditório e a ampla defesa sejam garantidos aos interessados de forma efetiva (já que regime recursal das tutelas de urgência permitirá a interposição de agravo de instrumento contra tutelas provisórias concedidas/impostas pela Adminis-tração Pública no âmbito de processos administrativos).

Ou seja, é possível vislumbrar claramente que a introdução no direito processual administrativo do regime das tutelas de urgência (antecipadas e cautelares) instituído pelo NCPC aperfeiçoará a operacionalização dos pro-cessos administrativos, dotando-os de mecanismos que inequivocamente garantirão que a tramitação dos mesmos se dê em estrita observância aos princípios da Administração Pública (sobretudo a persecução do interesse público) e aos valores caros ao figurino delineado na Constituição Federal de 1988.

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frAude à execução e o elemento subjetivo no cpc/2015

Gelson aMaro de souza

Doutor em Direito Processual Civil pela PUC/SP, Membro do Instituto Panamericano de Derecho Procesal, Laureado com a Comenda Luciano Pinheiro de Souza do I Congresso de Direito Internacional de Direito

Processual Civil, Professor-Doutor concursado para os cursos de direito na graduação e pós-graduação em sentido strito da Universidade

Estadual do Norte do Paraná – UENP (Campus de Jacarezinho), ex-Diretor e Professor da Faculdade de Direito da Associação

Educacional Toledo − AET de Presidente Prudente/SP, Procurador do Estado (aposentado) e Advogado em Presidente Prudente/SP.

RESUMO: Neste rápido estudo pretende-se demonstrar que vem de longe o entendimento de que para a configuração da fraude de exe-cução não é necessário analisar o elemento subjetivo das partes (ven-dedor e comparador), bastando, tão somente o negócio visto sob o ponto de vista objetivo. Procurou-se demonstrar a necessidade de se levar em conta o elemento subjetivo (dolo) com as vontades livres e conscientes do vendedor e do comprador, sem as quais não se pode falar em fraude à execução.

PALAVRAS-CHAVE: Dolo, vontade livre e consciente, devedor, comprador, fraude à execução.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Capacidade; 2 Elemento subjetivo; 3 Dolo das partes; 4 Vontade livre e consciente do executado; 4.1 Vontade maculada; 5 Vontade livre e consciente do adquirente; 5.1 Concurso de vontades; 5.2 Vontade do adquirente; 5.3 Má-fé do devedor alie-nante e do terceiro adquirente; Conclusões; Referências.

introdução

O novo CPC/2015, como era de se esperar, trouxe muitos aperfeiçoa-mentos em pontos isolados do sistema. Contudo, em outros, ainda não atin-giu o estágio que se espera. Exemplo disto pode ser encontrado no tratamen-to da responsabilidade patrimonial, que, apesar de alguns poucos avanços,

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foi extremamente tímido ao tratar da fraude à execução. Em relação a esta houve um pequeno passo à frente, mas resta muito a fazer.

Preocupa-se o tratamento empírico que se tem dado aos casos de ale-gação de fraude à execução. Vem de longe o entendimento de que para a configuração da fraude à execução não é necessário analisar o elemento sub-jetivo das partes (vendedor e comparador), bastando, tão somente, o negócio visto sob o ponto de vista objetivo. Pior que isso, é, ainda, a pregação de que a fraude à execução é de natureza objetiva, e que, por isso, dispensa a análi-se do elemento subjetivo dos participantes do negócio jurídico. Sabendo-se que o direito é dinâmico, e que está em constante evolução e com frequentes aprimoramentos, procurou-se, neste estudo, demonstrar a necessidade de se levar em conta o elemento subjetivo (dolo) com as vontades livres e conscien-tes do vendedor e do comprador, sem as quais não se pode falar em fraude à execução.

A doutrina civilista desde há muito vem pregando que todo negócio jurídico deve ser realizado em presença de certos requisitos, que sem estes não terá validade. Entres estes requisitos está a capacidade de contratar, que exige do agente a vontade livre, consciente e espontânea para contratar. Da mesma forma, para que se possa considerar que determinado ato tenha sido realizado em fraude (fraude geral), exige-se sempre a presença de dolo, con-substanciado na vontade livre e consciente de estar agindo com a intenção de dar prejuízo a outrem; para fraude à execução, a exigência deve ser a mesma.

Não existe fraude objetiva, visto que a subjetividade da fraude é ele-mento essencial para que esta se configure1. No caso de fraude à execução, como qualquer outra fraude, exige-se a presença e atuação de no mínimo duas pessoas, sendo que uma pessoa sozinha não pode fraudar com prejuízo a si mesma. Toda fraude exige pluralidade de pessoas, com vontades livres e conscientes de que estão agindo com aquela intenção e finalidade. Esta inten-ção e finalidade com o objetivo de fraudar e produzir prejuízo a outrem são os elementos configuradores do dolo, sem o qual não haverá fraude alguma. Não existe fraude objetiva e nem fraude culposa, por isso é que se exige agen-te capaz, vontade livre e consciente.

1 Confira nosso: Fraude à execução e o direito de defesa do adquirente. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

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1 cApAcidAde

Toda pessoa é capaz de direito, obrigações e deveres (CC/2002, art. 1º). Mas nem todas as pessoas estão em condições de exercerem certos atos em determinado momento, mesmo sendo capazes (CC/2002, art. 3º, III). A pessoa capaz pode, em certa situação ou em determinado momento, não estar em condições de exercer livremente as suas faculdades mentais. Nestas hipóteses, a pessoa não poderá exercer livre e espontaneamente a sua vonta-de. Pode até, em determinada situação, manifestar a sua vontade, mas sem liberdade e espontaneidade, o que fragiliza a sua capacidade e afasta a impu-tabilidade de sua responsabilidade pelo ato. Assim o é, de maneira geral, no mundo dos negócios, não podendo deixar de sê-lo nos casos de alegação de suposta fraude à execução.

Por esta razão, quem não tem capacidade, como os incapazes que de maneira geral, permanente ou momentaneamente, não podem praticar frau-de, por ausência de livre manifestação de vontade. O mesmo pode acontecer com o devedor que, por qualquer razão, em determinado momento, tem a sua capacidade diminuída e, por isso, deixa de agir livre e espontaneamente. Quando isto se dá, em que o devedor se vê obrigado a alienar algum bem, ou com sua resistência abalada, perde a sua espontaneidade, não resistindo às dificuldades e/ou aos perigos do momento, acabando por ceder e alienar bem ou direito, sendo que este ato não pode ser considerado fraude à exe-cução e nem fraude contra credor, por falta de dolo. Por isso é que a pessoa em estado de incapacidade não pode cometer fraude. O mesmo se dá com o devedor que, em determinado momento, tem a sua capacidade abalada e a resistência diminuída, a ponto de não poder exercer a sua vontade de forma espontânea, também não praticando fraude à execução.

2 elemento subjetivo

A doutrina e a jurisprudência, em sua remansosa manifestação, têm propalado que para a configuração da fraude de execução não se há de inda-gar sobre o elemento subjetivo do devedor. Isto é, não se cogita da análise do adquirente agir de boa ou de má-fé2.

As posições neste sentido são respeitáveis e a elas o autor filiou-se por muito tempo. Entretanto, faz algum tempo, começou-se a repensar a questão

2 RF 267/249 e RT 514/232.

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e a fazer-se uma releitura dos textos legais e uma reanálise do sistema jurídi-co e, com isso, passou-se a suspeitar da posição antes se assumida3.

Como restou anotado anteriormente, a figura da fraude, por si mesma, já implica a existência necessária (ainda que implícita) do elemento subjetivo. Inexiste fraude objetiva. O estudo da fraude, qualquer que seja a sua moda-lidade, sempre levará ao elemento subjetivo “intenção”, que corresponde à vontade livre e consciente de fraudar alguém ou alguma relação jurídica4.

Sem a figura da “intenção”, fio condutor maior da manifestação de vontade e que é o elemento propulsor da fraude, jamais se poderá falar em existência deste vício, seja de que modalidade for. Em demonstração de que o direito é dinâmico e está em constante evolução, em julgamento recente restou reconhecido que, para que exista fraude à execução, é necessária a presença da intenção do devedor5.

De outro lado, para se ter a fraude à execução, é necessária a conjugação de duas figuras inseparáveis que sem elas não se poderá pensar em fraude. Em primeiro lugar, deve-se levar em conta a figura da fraude, que deve estar alicerçada na vontade livre, consciente e espontânea de fraudar. Em segundo lugar, a figura do dano, pois sem este não há prejuízo, e, sem prejuízo não há fraude. A fraude somente se caracteriza quando houver prejuízo.

Amilcar de Castro (1974), depois de dizer que para a caracterização da fraude de execução são necessários o dano e a fraude, e que sem a presença cumulativa desses dois elementos aquela não ocorrerá, traz à colação a lição sempre atual de Carnelutti, nestes termos:

No incisivo dizer de Carnelutti, a lei quer proteger o credor contra a redu-ção artificial, ou patológica do patrimônio do devedor; não contra os riscos naturais ou fisiológicos de sua insuficiência; em outros termos, a lei quer

3 Salvo engano, fomos o primeiro a sustentar a necessidade de se analisar o elemento subjetivo do agente para apurar se houve ou não fraude à execução. Confira nosso: Fraude à execução e o direito de defesa do adquirente. Op. cit.

4 “É absurdo pensar-se em fraude desprezando-se por completo o ânimo, o elemento subjetivo”. (TRT 15ª R., DEJT, p. 959; Agravo de Petição nº 0010896-16.2013.5.15.0031, J. 03.06.2015, 5ª Câmara, DJSP, disponibilizado em 02.06.2015, publicado em 03.06.2015, Edição 1739.

5 “Pode o executado vender o seu imóvel residencial e comprar outro em lugar diverso, sem a intenção de fraude que, conforme bem ressaltado pelo juiz a quo, deve ser demonstrada e não presumida [...]” (TRF, 4ª R, AI 1999.04.01.088953-6-RS, 2ª T, Rel. Tânia Scobar, DJU 09.08.2000, p. 146 e Revista de Estudos Tributários 17, Porto Alegre: Síntese, p. 105, jan./fev. 2001.

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amarrar as mãos do devedor desonesto, não as do devedor de boa-fé; e, se dispusesse em contrário, prejudicaria a liberdade de movimentos e inicia-tivas necessárias à prosperidade dos negócios. Em tais condições, além do dano, deve ter havido fraude, que é o conhecimento ou previsão, do dano causado.6

Nada mais correto do que este ensinamento de Carnelutti, muito bem observado por Amilcar de Castro, pois somente é possível falar-se em fraude se da atuação do agente resultar algum dano a outrem, porque o dano repre-senta prejuízo e, sem prejuízo, não se pode falar em fraude.

3 dolo dAs pArtes

Não se pode pensar em fraude sem prejuízo e nem neste sem dano. Pensar em fraude sem prejuízo é o mesmo que pensar em chuva sem água. O dano é o efeito que marca e demonstra a existência da fraude. Além do dano que se exige para a configuração da fraude, é necessário que este seja oriundo de atuação dolosa do agente. Sem o dolo e o dano não haverá fraude. Consis-te o dolo no conhecimento dos efeitos danosos e na vontade da prática de ato ilícito. O conhecimento é pressuposto da vontade, sem ele não haverá vonta-de. A junção da vontade e o conhecimento, acrescidos da intenção de praticar o ilícito, constituem o dolo. Em qualquer modalidade de fraude, deve estar presente o dolo, que se forma do conhecimento do ilícito, da vontade livre e consciente, da intenção e a finalidade de fraudar, devendo preponderar este dolo em face do fim almejado pelo agente7.

O dolo teve origem no latim dolus, que representa a vontade de pre-judicar alguém por meio da astúcia, do engano, da esperteza, do ardil, etc. Enfim, é a vontade acrescida do conhecimento e da intenção de praticar o ato ilícito.

A lei penal, no art. 179 do CP, tipifica a fraude à execução como crime doloso, visto que inexiste modalidade culposa, em caso de fraude. Todavia, a sua consumação precisa do concurso de pessoas (comprador e vendedor),

6 AMILCAR DE CASTRO. Comentários ao código de processo civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. VIII, 1974. p. 81.

7 “Não se quer dizer com isso que o encerramento da sociedade jamais será causa de desconsideração de sua personalidade, mas que somente o será quando sua dissolução ou inatividade irregulares tenham o fim de fraudar a lei [...]”. (STJ, ED-REsp 1.306.553/SC, 2ª S., J. 10.12.2014, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, RMDCPC, v. 64, p. 16, jan./fev. 2015)

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bem como o conhecimento e a intenção de praticar o delito. Não há fraude à execução sem o dolo. O agente prevê e quer o resultado ilícito. Age com a intenção de provocar um evento danoso ou resultado contrário ao direito.

A ausência de dolo afasta a tipificação do crime de fraude à execução. Se assim o é, para a esfera penal, também deve ser na órbita civil. Só poderá haver a fraude à execução se houver o concurso de vontades entre alienante e adquirente8. Não agindo o executado alienante e o terceiro adquirente em conluio e com a intenção de prejudicar o exequente, não se pode falar em fraude à execução. Para que se dê a fraude à execução, não basta a simples vontade e a intenção do alienante em fraudar o credor. Há necessidade da vontade e da intenção também do adquirente. Somente poderá haver fraude à execução se houver o concurso de vontades e intenções entre o executado e o terceiro adquirente. Sem esta conjunção de vontades e intenções de preju-dicar o credor não haverá fraude à execução9.

4 vontAde livre e consciente do executAdo

O agente da fraude age deliberadamente com a vontade de fraudar e a vítima ou copartícipe atua, quando não, com a vontade de aderir à fraude, pelo menos agirá induzida em erro por dolo ou culpa e, com isso, terá a sua vontade viciada. Para que o agente, ao alienar ou onerar o seu, pratique frau-de à execução, necessário se faz que já se saiba devedor e, ainda que também saiba, que com aquela alienação ou oneração ele está fraudando à execução de causando dano (prejuízo) ao credor. Deve saber no momento da venda que ele é devedor, porque, não sendo assim, a alienação é feita antes de ele se tornar devedor. Por esta razão é que se afirma que o negócio jurídico não

8 “Para a configuração da fraude à execução e conseqüente declaração de ineficácia do negócio de compra e venda, não basta a mera existência de demanda (ação cognitiva ou execução) contra o vendedor-executado, capaz de reduzi-lo à insolvência. É mister, também, prova de que o adquirente detinha conhecimento de demanda dirigida contra o alienante, quer por constar qualquer registro da existência da ação no cartório imobiliário, quer por qualquer outro meio que induza a tal conclusão. Exegese do art. 593, II, do CPC em harmonia com o princípio da boa-fé”. (TJMG, Ap. 1.0433.01.020951-1/001, Jurisprudência Mineira, v. 170, p. 73, out./dez. 2004.

9 “3. Inarredável a conclusão de que não estão configurados os requisitos objetivo e subjetivo à decretação da fraude à execução, pelo que a penhora do imóvel licitamente adquirido pelos terceiros-embargantes afronta diretamente os incisos XXII e XXXVI do art. 5º da Constituição. Embargos não conhecidos”. (TST 3ª R., E-RR 1795/2001-110-03-00-1, SBDI-1, Relª Juíza Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJU 1 09.02.2007); RIOB-Tr., v. 216, p. 149, jun. 2007.

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pode ficar sob condição a futura e incerta condenação que esteja em anda-mento. A certeza de que existe a dívida e de quem é a responsabilidade pelo pagamento somente se fixa após o julgamento condenatório. Antes disso, não se pode falar em fraude praticada pelo vendedor, porque ele ainda sabe de dívida alguma, pois desconhece o futuro, não sabendo nem mesmo se vai ser condenado a pagar algum valor.

Na fraude, sempre há de predominar os elementos subjetivos que é o conhecimento, vontade livre e espontânea, somadas à intenção de fraudar10. Sem a presença de um desses elementos, não haverá fraude.

Somente poderá ser autor da fraude aquele que estiver em pleno exer-cício de suas faculdades mentais. O incapaz, por exemplo, não pode ser agen-te de fraude. Além da capacidade, deve, ainda, o agente estar no exercício amplo de sua liberdade de manifestação da vontade. Essa vontade não pode estar viciada pela forte emoção e nem pelo dolo, erro ou coação.

4.1 vontade maculada

Quando se diz que para haver fraude à execução ou fraude contra cre-dor é necessária a vontade livre e consciente dos agentes (vendedor e com-prador), deve ser entendida como vontade com manifestação espontânea, sem qualquer tipo de turbação da vontade do agente.

Mesmo aquele que estiver em pleno gozo de suas faculdades mentais e que, em regra, está em condições de manifestar a sua vontade pode, excep-cionalmente, em determinadas situações, ficar impedido da sua livre mani-festação de vontade. É o que ocorre nos casos de ameaça, coação, estado de necessidade, ansiedade, medo, etc.

São casos em que a vontade do alienante acaba viciada pelo desespero em que se encontra e essa vontade não pode ser manifestada livremente e, por isso, impossível de configurar alguma modalidade de fraude, sendo que

10 “Tratando-se de regra de exceção, de restrição ao princípio da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, a interpretação que melhor se coaduna com o art. 50 do Código Civil é a que relega sua aplicação a casos extremos em que a pessoa jurídica tenha sido mero instrumento para fins fraudulentos por aqueles que idealizaram, valendo-se dela para encobrir os ilícitos que propugnaram seus sócios ou administradores” (STJ, ED-REsp 1.306.553/SC, 2ª S., J. 10.12.2014, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, RMDCPC, v. 64, p. 16, jan./fev. 2015). Esse julgado se refere à desconsideração da personalidade jurídica, mas tem plena aplicação para o caso de fraude à execução, porque ambas as situações tratam- -se de fraude e exigem o dolo que é a finalidade de fraudar.

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esta sempre exige o elemento subjetivo que é dolo fruto da livre e espontânea manifestação da vontade.

Ainda, existem situações em que, mesmo não se caracterizando como ameaça ou coação física, mesmo assim pode haver coação moral ou psicoló-gica, criando ansiedade, incômodos, medo ou desespero que não permitem que o agente exercite a sua vontade com a necessária espontaneidade.

O devedor, diante de forte coação física ou psicológica ou até mesmo de estado de necessidade poderá ser tomado por grave crise de ansiedade e desespero, o que o leva a dispor de seus bens para salvar a vida de familiares em risco de vida por questão de saúde ou até mesmo em caso de familiares vítimas de sequestro em que se tem de alienar bens para somar numerários para liberação de reféns ou pagamento de tratamento médico urgente.

Nesses casos, não se pode exigir do alienante que o faça reservando bens para pagamento de dívida que se encontra sob condição suspensiva e depende de decisão futura e incerta quanto ao resultado, e que somente a eventual condenação é quem vai dar a certeza da existência ou inexistência da obrigação pela dívida, que até então é incerta.

Não se pode reconhecer como fraude de execução todas e quaisquer alienações, simplesmente porque não teria o alienante outros bens para ga-rantir o pagamento de eventual condenação em demanda pendente, sem an-tes perquirir o seu estado emocional no ato da venda e da compra.

Imagine-se um caso real11 em que um cidadão estava sendo demanda-do e tinha patrimônio maior do que a eventual dívida discutida em demanda pendente sobre relação locatícia da qual ele era simples fiador. Em viagem de férias de fim de ano, tragicamente envolveu-se em acidente de automóveis em que sofreu ferimentos juntamente com vários familiares e alguns deles com ferimentos graves.

Para internação com tratamento hospitalar e as cirurgias urgentes, viu--se obrigado a garantir o hospital com depósito em cheque e, por não possuir fundos suficientes, viu-se obrigado a vender a quase totalidade de seus bens, com o pensamento voltado a socorrer os familiares acidentados. A vontade

11 Trata-se de uma ação de cobrança de danos causados ao imóvel depois de desocupado pelo inquilino afiançado, proposta contra o fiador e que tramitou pela Terceira Vara Cível da Comarca de Presidente Prudente/SP, sendo ao final julgada improcedente. (Ação que tramitou nos anos noventa do século passado. Informações tiradas diretamente dos autos, naquela ocasião).

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não era cometer fraude alguma, uma vez que disto nem seria capaz de pensar naquele instante. A vontade (elemento subjetivo) naquele momento era bus-car socorro para os familiares. O pensamento estava voltado para a prática do bem e não para a prática de qualquer fraude que, sabidamente, é um grande mal.

Nesse caso, o alienante acabou sendo vitorioso na demanda referen-te à ação de cobrança de aluguel e não foi condenado a pagamento algum. Todavia, é de se imaginar o contrário, caso fosse ele condenado a responder pela dívida do inquilino. Teria ele alienado ou não em fraude de execução? Parece que o bom senso, neste caso, está a indicar que não. Não se vislumbra nesta hipótese a presença de qualquer elemento subjetivo em nenhuma das suas figuras tradicionais a justificar o entendimento por fraude de execução.

Além de inexistir qualquer elemento subjetivo no sentido de fraudar eventual pagamento em que resultasse a demanda, pelo contrário, existia um ânimo de socorrer os familiares acidentados (estado de necessidade), e até mesmo os adquirentes poderiam (hipótese) ter aderido à compra mais com o espírito de solidariedade (para colaborarem com o socorro da família) em ra-zão da premente necessidade da venda pelo alienante que naquele momento somente pensava em socorrer à família.

Este e outros fatos em que impliquem necessidade da venda para so-corro ou até mesmo para salvar vidas, ocasião em que o alienante não pode nem sequer pensar em fraude de execução, e nem sobre eventual condena-ção futura em demanda de natureza condenatória, cujo eventual direito do credor está ainda sob o manto da condição suspensiva (CC/2002, art. 125)12.

Essas circunstâncias demonstram que a vetusta teoria objetiva da frau-de de execução se apresenta superada, reclamando da doutrina moderna um

12 Código Civil de 2002: “Art. 125. Subordinando-se a eficácia do negócio jurídico à condição suspensiva, enquanto esta se não verificar, não se terá adquirido o direito, a que ele visa”. Veja que o credor não tem direito em buscar a coisa e nem em alegar fraude antes da decisão a seu favor. Até aí, não há fraude. Esse direito somente surgiria com o julgamento a seu favor, quando então se perfaz a condição. Mas ocorre que a natureza da fraude não permite que ela permaneça sob condição, porque a fraude há de ser integrante do ato e, se assim é, surge junto com o negócio e não pode ficar aguardando outro acontecimento para voltar-se atrás e introduzi-la no negócio antes realizado sem vício. Isto é fruto da vetusta doutrina pensava em fraude objetiva, o que no atual estádio do direito não se pode admitir.

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reposicionamento mais consentâneo com o direito humanitário dos dias con-temporâneos.

Se o direito de crédito ainda está sujeito à condição suspensiva, em verdade esse crédito depende de julgamento e ainda é mera expectativa de crédito13. Sendo mera expectativa de crédito, ainda não é crédito e, por isso, inexiste obrigação certa de pagar, não podendo, como é óbvio, servir de obs-táculo à livre disposição do bem pelo demandado e virtualmente devedor.

Imagine-se, neste exemplo dado anteriormente, caso o alienante não tivesse vendido seus bens e nem socorrido a família e, alguns de seus fami-liares houvessem falecidos por falta de assistência médica, o que se haveria de pensar hoje?

Qual seria a lógica e o bom senso? Esperar o desfecho da ação que so-mente veio anos depois? Ou, vender os bens para socorrer as vítimas do aci-dente? A resposta, ao que se pensa, não poderia ser outra além daquela que indicasse como comportamento lícito e necessário para o momento a aliena-ção dos bens para salvar a família. Em sendo lícito o comportamento, logo estará afastada a ideia de fraude, porque esta sempre implica procedimento ilícito. O ato há de ser lícito ou ilícito no momento em que é praticado, não podendo a sua ilicitude ou licitude ficar aguardando desfecho de processo cujo resultado não se sabe qual será.

Na esfera penal, até mesmo para os delitos da mais alta gravidade (p. ex.: homicídio), tem-se afastado a incidência delictiva nos casos em que o agente age amparado pelo estado de necessidade, sob o amparo de discrimi-nante penal ou exclusão da ilicitude do art. 23, I, e 24 do Código Penal.

No Direito Penal, a análise do estado de necessidade é da mais alta re-levância. Nesse ramo do direito, antes de quaisquer incriminações, põe-se em relevo a atuação do agente se este agiu ou não em estado de necessidade. Se assim é, até em relação aos crimes gravíssimos, como não haveria de ser em relação ao devedor que, em estado de necessidade, simplesmente alienasse o seu bem para suprir as suas necessidades momentâneas e evitar risco de morte?

Na esfera penal, já foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça que, ao agente com dificuldades financeiras e que por isso promove a alienação

13 Nesse sentido já decidiu o 2º TACSP, Ap. 368.810-00/8, J. 23.11.1993, JTACSP-lex 148/201, em que a expectativa de crédito foi posta em relevância (p. 203).

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do bem sem o consentimento do credor, não se configura delito de defrauda-ção de penhor, como se vê a seguir: “Penal – Defraudação de penhor. Dolo. 1. Não se tipifica o delito de defraudação de garantia pignoratícia se o deve-dor, premido por dificuldades financeiras promove a alienação do bem sem o consentimento do credor [...]”14.

Foi reconhecido que as dificuldades financeiras equiparam ao estado de necessidade, afastando o ilícito de defraudação do penhor, situação em que em muito se assemelha à fraude à execução, que, da mesma forma, deve ser excluída quando o devedor, em caso de extrema necessidade por dificul-dades financeiras, se ver obrigado a dispor de seus bens para proteger a si ou à sua família.

5 vontAde livre e consciente do AdQuirente

Não se podendo analisar a fraude de execução sem analisar o elemento subjetivo do alienante, como restou anotado anteriormente, com maior razão não se pode desprezar este dado em relação aos adquirentes, que, na maioria dos casos, são enganados e, por isso, são vítimas sem saberem, e, às vezes, até mesmo sem terem como saber, estando diante de fraude de execução. Imagi-ne-se o caso antes mencionado em que o alienante fizesse a venda dos bens ao próprio hospital como dação em pagamento, e depois viesse o alienante sair vencido na ação de cobrança de aluguéis. Teria sido a alienação em fraude?

Ao que se pensa, é incogitável a fraude de execução neste caso, não só por faltar o elemento subjetivo (vontade de fraudar) do alienante, mas tam-bém por faltar esta mesma vontade de fraudar por parte do adquirente. A seguir o raciocínio anterior, da mesma forma, aquele terceiro adquirente, que o fez até motivado pelo ânimo de socorro aos acidentados, jamais poderá ser acoimado de copartícipe em fraude de execução.

Atribuir-se à fraude à execução, como até agora se tem feito, valor me-ramente objetivo é criar flagrante injustiça, provocar insegurança jurídica e dificultar as relações sociais, além de contrariar os mais elementares princí-pios de direito público, tais como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, bem como a dignidade da pessoa humana.

14 Superior Tribunal de Justiça, REsp 143.243, J. 15.09.1998, RSTJ 117/548.

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5.1 concurso de vontades

Toda e qualquer modalidade de fraude, além de exigir a vontade livre e consciente do agente fraudador, exige-se também a participação de pelos menos mais uma pessoa, em virtude do necessário concurso de vontades15. Na esfera penal, a questão é tratada como concurso necessário de agente ou concurso de pessoas, no sentido de que, se não houver a atuação de pelo menos dois agentes ou duas pessoas, imbuídos do mesmo fim, não haverá o crime de fraude à execução16.

Na órbita cível, o tratamento a ser dado não pode ser outro. Para a configuração da fraude à execução no âmbito cível, também é necessário o concurso de agentes (duas ou mais pessoas) e, ainda, o concurso de vontades, no sentido de que devedor (vendedor) e o terceiro (adquirente) estejam ali-mentando os mesmos propósitos de praticar a fraude à execução e, com isso, prejudicar o credor. Sem o concurso de agentes e sem o concurso de vonta-des, não se pode imaginar a ocorrência de fraude à execução. Para a configu-ração da fraude à execução, não basta a simples vontade do devedor, exige--se também a vontade com dolo específico do vendedor e do comprador em dar prejuízo ao credor. A fraude à execução somente pode existir se houver conluio entre devedor e comprador em concurso de pessoas e de vontades17.

5.2 vontade do adquirente

Além da necessária investigação sobre o ânimo do devedor (alienante) de fraudar à execução, ainda há de se analisar a participação do terceiro ad-

15 “Fraude à execução. Inocorrência. Suposto ato de consilium fraudis anterior à vigência da LC 118/2005. Alienação de imóvel realizada antes da citação do devedor e após a inscrição em dívida ativa. Aplicação do principio tempus regit actum. Hipótese do art. 185 do CTN, na sua redação original, sendo a presunção de fraude, de índole subjetiva. Inteligência da Súmula nº 375 do STJ”. (TRF 5ª R., AgIn 103.309/PE, 2ª T., J. 23.03.2010, vu. Rel. Des. Francisco Wildo, DJe 30.03.2010, RT, v. 898, p. 394, ago. 2010.

16 “Fraude à execução. Inexistência de consilium fraudis e da prévia inscrição da penhora. Lei nº 8.953/1994, Art. 659 do Código de Processo Civil, Súmula nº 375 do STJ”. (TJMG, AI 1.0024.02.741435-8/001, Rel. Des. José Affonso da Costa Côrtes, JM, v. 190, p. 273, jul./set. 2009)

17 “3. Afastada a presunção, cabe ao credor comprovar que houve conluio entre alienante e adquirente para fraudar a ação de cobrança e, ainda, que a alienação tida por fraudulenta teve o condão de reduzir o devedor à insolvência, consoante também tem exigido a jurisprudência de ambas as Turmas de Direito Público desta Corte. Precedentes. 4. Recurso especial não provido.” (STJ, REsp 1082910-MG, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 02.04.2009, RJ, v. 378, p. 167, abr. 2009)

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quirente, para saber se ele comungava com os mesmos propósitos do vende-dor que era o de fraudar à execução de forma livre e consciente e, com isso, causar prejuízo ao credor. Não basta só a vontade do devedor em fraudar à execução, e, com isso, dar prejuízo ao credor; é necessária também a vonta-de de fraudar pelo adquirente com o mesmo propósito de causar dano ao credor18.

Necessário se faz verificar se o adquirente, no momento em que foi realizado o negócio, tinha conhecimento da fraude de execução19 ou, pelo menos, tinha condições de saber, pelas informações, dados e notícias corren-tes, colocados ao alcance da pessoa comum, mormente aquelas mais simples e modestas do povo.

Fora isso, não se pode falar em fraude de execução20. Não ocorrendo a conjugação de vontades entre devedor e terceiro adquirente, não haverá fraude, e o negócio realizado é plenamente eficaz, porque realizado de boa--fé21.

Para se saber se o terceiro adquirente tinha vontade de fraudar a exe-cução em conluio com o devedor, é necessário, antes, saber se ele tinha co-nhecimento da execução e da insolvência do devedor. Sem o conhecimento da existência da execução e da precária situação financeira do vendedor (de-vedor), não se pode cogitar de fraude à execução e nem de participação de má-fé do terceiro adquirente22.

18 “Em suma: não só a fraude contra credores, mas também a fraude de execução, ambas só se configuram com o concurso dos elementos objetivos (eventus damni) e subjetivo (consilium fraudis)”. (TJRJ, Ap 10.908, J. 25.03.1980, RJTERJ 47/198; MIRANDA, Darcy Arruda. CPC nos Tribunais, p. 3.010.

19 13/51 “Não estando evidenciado que a parte tinha conhecimento da existência de qualquer pendência sobre o imóvel, descabe cogitar da fraude, sendo válida e eficaz a alienação, bem como insubsistente a penhora”. (TJMG, Ap 2.0000.00.495548-0/000, 10ª C., Rel. Des. Pereira da Silva, DJMG 26.06.2006, RMDCPC, v. 13, p. 149, jul./ago. 2008).

20 “Fraude de execução a que se refere o CPC, art. 593, I, não se contenta apenas com a existência de ação real pendente sobre o bem alienado. É preciso também, o elemento subjetivo – conhecimento da ação pelo adquirente – que se presume no caso de inscrição da causa no registro público. Não registrada a ação [...], a fraude de execução somente poderá ficar caracterizada se demonstrado o conhecimento daquele fato pelo adquirente”. (STJ, REsp 193.048, DJU 15.03.1999, p. 257)

21 “Não é ineficaz a alienação feita a terceiro que, de boa-fé, adquire bem de um sucessor do devedor, embora contra este corresse ação de cobrança capaz de reduzi-lo à insolvência, se dela o comprador não tinha conhecimento”. (STJ, REsp 185.813, Adv-Coad, n. 31, a. 19, p. 494, 1999)

22 “28689 – Embargos de Terceiro. Fraude à Execução. Ausência de comprovação de que o adquirente tinha ciência da demanda. Para ser declarada a fraude à execução fiscal, é

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Além da prova do conhecimento da demanda pendente e da insolvên-cia do devedor-alienante, necessária ainda a prova do elemento psicológico consistente na vontade (dolo) de fraudar a execução por parte tanto do alie-nante como do adquirente, para caracterizar o consilium fraudis23.

Hoje, mais do que a simples exigência do elemento subjetivo, que é a intenção (vontade livre e manifesta) do alienante, exige-se prova segura a cargo do credor que alega tal fato. Não basta o credor alegar fraude, há ne-cessidade de prová-la.

5.3 má-fé do devedor alienante e do terceiro adquirente

Para a configuração da fraude de execução, necessária se faz a presença da má-fé, tanto do devedor que vende ou onera a coisa quanto do terceiro adquirente. Não basta a má-fé apenas do vendedor para fugir ao pagamento da dívida, é necessário que a esta má-fé do vendedor se agregue também a má-fé do adquirente. O elemento subjetivo, tanto de um como de outro, deve ser exaustivamente pesquisado, pois não existe fraude sem o ânimo de frau-dar. É este ânimo de fraudar que vai constituir a má-fé dos agentes: vendedor e comprador.

O entendimento mais atualizado é o de que, para a configuração da fraude à execução, é necessário que se demonstre que o adquirente tinha co-nhecimento da ação no momento da aquisição e que o bem a ser adquirido já estava comprometido com a execução, quando se tratar de alienação de bem com penhora24.

Ora, se assim é, e se se exige que o adquirente tenha conhecimento da ação corrente contra o vendedor e, ainda, de seu estado de insolvência, está caracterizada a exigência do elemento subjetivo que é a vontade do adquiren-

necessária a prova do ato de alienação ou oneração do bem, da insolvência do devedor e, ainda, de que o terceiro adquirente tinha ciência de que contra o alienante havia demanda judicial em curso. Precedentes do STJ. (TRF 4ª R., REO 2005.70.03.002188-1, 2ª T., Rel. Eloy Bernest Justo, DJ 02.07.2008, RJ, v. 369, p. 169)

23 “Fraude à Execução. Alienação posterior à Citação do Executado, mas anterior ao Registro da Penhora. Necessidade de Comprovação do consilium fraudis”. (STJ, REsp. 913.760/RS, 2006/0281414-4, Relª Min. Eliana Calmon, J. 18.09.2008, DJe 21.10.2008, RDDP, v. 71, p. 193, fev. 2009)

24 STJ, REsp 245.064, J. 15.06.2000, DJU 04.09.2000; Bol. IOB RJ 19/404(2000), REsp 140.670, DJU 09.12.1997. No mesmo sentido, REsp 2.597, 3.259, 55.491, 76.063 e 92.507, Ementário do STJ 27/142, TJRGS Ap 599.084.233, AJURIS 78/456; STJ, REsp 106.887, Adv-Coad 37/590(2000).

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te em coadjuvar o devedor-alienante com o fim de prejudicar o credor. Sem este elemento subjetivo que é a vontade livre e consciente em agir para pre-judicar o credor, não se pode ter por configurada a fraude à execução e nem contra o credor. Sem que o adquirente também tenha agido de má-fé, não se pode afirmar que ele agiu em fraude à execução em conluio com o devedor.

Como a boa-fé é sempre presumida25, para se chegar à fraude à execu-ção é necessária a comprovação da má-fé, tanto do devedor-alienante quanto do terceiro adquirente. Por isso, neste sentido é que se tem julgado pela des-caracterização da fraude quando não se comprovar a atuação de má-fé do vendedor e também do adquirente26.

conclusÕes

Diante desse quadro anteriormente traçado, é possível extrair algumas conclusões:

1. O novo CPC/2015 não deu maior atenção ao elemento subjetivo, nada se referindo a respeito, tanto no que se diz respeito ao devedor, bem como em relação ao terceiro adquirente. Determinou-se apenas que antes da declaração da fraude à execução seja intimado o terceiro adquirente para apresentar embargos de terceiro (CPC/2015, art. 792, § 4º), sem dizer qual ou quais matérias ele pode alegar como defesa, se entre elas estão ou não as de razões subjetivas.

2. Todavia, essa omissão do legislador processual não é capaz de afas-tar as defesas fundamentadas em matérias de cunho subjetivo, que tanto po-dem ser alegadas pelo devedor alienante quanto pelo terceiro adquirente.

3. Qualquer fato ou causa que possa influenciar no elemento subjetivo tanto do devedor quanto do terceiro adquirente, a ponto de poder abalar o

25 “Sem o registro o que há é a presunção de boa-fé do terceiro que deverá ser elidida pelo credor, para fim de lograr o reconhecimento da fraude à execução e, por conseguinte, a decretação de ineficácia do ato de alienação”. (THEODORO JUNIOR, Humberto. Fraude de execução. RSDCPC, Porto Alegre/RS: Síntese, v. 05, p. 155, maio/jun. 2000)

26 “Salvo comprovada má-fé do adquirente, a escritura pública de compra e venda, aliada à entrega da coisa, ainda que não registrada, dá oportunidade a embargos de terceiro e descaracteriza a fraude à execução” (TAMG, Ap. 283.036-0, J. 10.11.1999, Revista de Julgados do TAMG, v. 76/77, p. 214). Ainda: no mesmo sentido: “Agravo de Petição. Embargos de terceiro. Adquirente de boa-fé. Ausência de animus malus. Fraude à execução não configurada” (TRT 15ª R., DEJT p. 959; Agravo de Petição nº 0010896-16.2013.5.15.0031, J. 03.06.2015, 5ª Câmara, DJSP, disponibilizado em 02.06.2015, p. 03.06.2015. Edição 1739).

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estado psíquico emocional, impedindo ou dificultando o exercício da mani-festação de vontade de forma livre, consciente e espontânea, é o bastante para afastar o dolo do agente e descaracterizar a fraude.

4. O dolo é elemento essencial para a tipificação da fraude à execução na esfera penal e assim também o é na órbita cível. Faltando o dolo na área penal, não há tipificação da fraude, o mesmo ocorrendo no campo cível, em que a sentença penal produz seus efeitos, seja o efeito condenatório ou o ab-solutório, tanto pela tipificação ou pela falta de tipicidade da conduta (art. 91, I, do CP e art. 63 do CPP).

5. A fraude à execução de que trata o Código Penal (art. 179) é a mesma de que trata o art. 792 do CPC/2015, não podendo dar tratamento diferen-ciado a uma e a outra. Seria de extrema incoerência a absolvição por falta de dolo na via penal e declaração de fraude mesmo sem dolo na esfera cível. Essa contradição é que não se pode admitir. Para evitar que isso ocorra, a lei considera o processo penal como prejudicial externa do procedimento cível de fraude à execução, devendo, por isso, a ação cível ser suspensa até que a ação penal seja julgada (CPC/2015, art. 313, V, a e b).

6. Não sendo o negócio jurídico capaz de tipificar o crime de fraude à execução na via penal, também não poderá haver configuração de fraude à execução da esfera cível, porque não existem duas modalidades de fraude à execução. Aliás, uma já é demais, porque figura exclusivamente brasileira, não se conhecendo similar em nenhuma outra legislação.

7. Desta forma, ocorrendo prescrição criminal do crime de fraude à execução, o que implica a impossibilidade de propositura da ação penal, se ainda não proposta ou na extinção da ação penal que eventualmente esteja em andamento, também ocorre a prescrição na esfera cível, pois a ação penal é prejudicial da ação cível (CPC/2015, art. 313, V, a e b).

8. Não seria lícito falar-se que, em se tratando de fraude à execução, inexiste prescrição, pelo menos por duas razões muito obvias: a) por primei-ro, porque até mesmo para a fraude contra credor (irmã gêmea) da fraude à execução, existe previsão de prescrição na esfera cível (art. 178 do Código Ci-vil); b) por segundo, porque nenhuma situação jurídica poderá se perpetuar no tempo a ponto de criar uma eterna insegurança jurídica. Aliás, a finalida-de da prescrição, é exatamente a de pôr fim à insegurança jurídica.

9. É de se lembrar que em todo negócio jurídico deve ser observada a boa-fé das partes, e isto não pode ser diferente em relação ao negócio jurídico

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acoimado de fraude, porque não pode existir fraude sem a má-fé do frauda-dor. Por isso é que hoje existe a Súmula nº 375 do STJ, impondo observância e estabelecendo a preponderância da boa-fé nas questões em que se alega fraude à execução.

10. Por fim, não se pode proclamar a ocorrência de fraude à execu-ção sem antes averiguar o ânimo das partes para determinar-se o verdadeiro ânimo dos agentes. Sem o ânimo (dolo) representado pelas vontades livres, conscientes e espontâneas dos agentes (devedor e comprador), não se pode declarar a fraude à execução.

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A fiGurA do inQuérito policiAl e do contrAditório no novo

códiGo de processo civilfiGure of the police investiGAtion And AdversAry

proceedinG in the new civil procedure code

lA fiGurA de lA investiGAción policiAl y de lo contrAdictorio en el nuevo

códiGo de procedimiento civilraphael silva rodriGues

Advogado, Professor Universitário em Cursos de Graduação (Faculdade Novos Horizontes) e de Pós-Graduação (IEC/PUC-Minas; Centro Universitário Newton Paiva; Faced em Divinópolis; CAD/Fumec;

Fupac em Mariana; IED/Fead). Possui trabalhos científicos publicados, por meio impresso, referentes a diversos temas de Direito Público.

riCardo Moraes Cohen

Advogado, Pós-Graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Fumec, Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

RESUMO: O presente artigo tem por escopo analisar o inqué-rito policial sob o paradigma da processualidade democráti-ca, notadamente em cotejo com o princípio do contraditório inserto no novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16.03.2015).

PALAVRAS-CHAVE: Inquérito policial; Contraditório no novo CPC; Processualidade democrática.

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ABSTRACT: This article has as its scope to analyze police investi-gation under the paradigm of democratic procedure, particularly in relation to the adversary proceeding inserted in the new Civil Proce-dure Code (Law nº 13.105, of 03.16.2015).

KEYWORDS: Police investigation; Adversary Proceeding in the new CPC; Democratic procedure.

RESUMEN: El presente artículo tiene por objetivo analizar la inves-tigación policial bajo el paradigma del procedimiento democrático, marcadamente en cotejo con el principio de lo contradictorio inser-to en el Nuevo Código de Procedimiento Civil (Ley nº 13.105, de 16.03.2015).

PALABRAS-CLAVE: Investigación policial, Contradictorio en el Nuevo CPC; Procedimiento democrático.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Noções de cidadania; 2 Estado e Direito; 2.1 Estado de Direito; 2.2 Estado liberal de direito; 2.3 Estado Social; 2.4 Estado Democrático de Direito; 3 Paradigmas de Estado e pro-cesso; 3.1 Processo como relação jurídica; 3.2 Processo como procedi-mento em contraditório; 3.3 Teoria neoinstitucionalista do processo; 4 Breves ponderações sobre o processo penal brasileiro; 5 Inquérito policial; 6 O contraditório e o novo CPC; Considerações finais; Re-ferências.

introdução

O presente artigo, sem a pretensão de esgotar o tema, tem por objetivo tecer considerações sobre o inquérito policial inserido no paradigma do Esta-do Democrático de Direito.

Para lograr êxito em tal desiderato, será feita uma explanação sobre o conceito de cidadania em aludido paradigma, posteriormente se apresentan-do uma relação entre direito e Estado.

É claro que o tema requer seja feita uma abordagem sobre os paradig-mas de estado, bem como sua reflexão nos conceitos de processo adotados e a atuação do juiz nos respectivos conceitos.

Necessário esclarecer que, como a ênfase está no princípio do contra-ditório e sua visão a partir do novo Código de Processo Civil, não deixará de ser abordado, concomitantemente, o processo penal, mormente por se tratar o inquérito policial de instituto pertencente a tal ramo.

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Nas considerações finais, pretende-se inferir se, mesmo tratando-se o inquérito policial de procedimento administrativo, no contexto da proces-sualidade democrática, deve observar o contraditório, sob pena de ofensa ao paradigma do Estado Democrático de Direito adotado pela Constituição Federal de 1988.

1 noçÕes de cidAdAniA

Reiteradamente, costuma-se limitar o conceito de cidadania ao sufrá-gio universal, ou seja, como o direito ao exercício do voto com o simples votar e ser votado.

Todavia, no Estado Democrático de Direito, aludido conceito não abar-ca realmente o que se deve entender por cidadania.

Rosemiro Pereira Leal aduz o seguinte conceito de cidadania:

Cidadania é um deliberado vínculo jurídico-político-constitucional que qualifica o indivíduo como condutor de decisões, construtor e reconstru-tor do ordenamento jurídico da sociedade política a que se filiou, porém o exercício desse direito só se torna possível e efetivo pela irrestrita condição legitimada ao devido processo constitucional. (Leal, 2002, p. 151)

Conforme os ensinamentos do referido autor, constata-se que cidada-nia não se limita ao direito de votar e ser votado, mas denota um alcance mais amplo, qual seja o cidadão está apto, além de exercer mencionados direitos, a atuar como construtor e reconstrutor do ordenamento jurídico ao qual se filiou.

Em relação ao tópico ora estudado, Roberta Maia Gresta nos ensina que estado e cidadania não estão em planos hierárquicos distintos, já que, na concepção exposta por Leal

a cidadania não é um beneplácito estatal, mas um vínculo que conecta a pessoa diretamente ao estatuto jurídico-político inscrito na constituição; o ordenamento jurídico não é uma doação do estado, mas objeto de constru-ção e reconstrução permanente por meio de decisões legislativas, adminis-trativas e judiciais; o cidadão não é mero destinatário da tutela estatal, pois participa dessas decisões como condutor. (Gresta, 2014, p. 09)

O Direito Processual, como ramo do Direito Público, tem suas linhas fundamentais ditadas pelo Direito Constitucional, que fixa a estrutura dos órgãos jurisdicionais, garantindo a distribuição da justiça e a declaração do

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direito objetivo, que estabelece alguns princípios processuais. Exatamente nessa ordem de ideias é que o Direito Processual Penal, por exemplo, chega a ser apontado como direito constitucional aplicado às relações entre a autori-dade e liberdade. Alguns dos princípios gerais que informam o processo são, a priori, princípios constitucionais ou seus corolários, tais como o juiz natural (art. 5º, XXXVII), a publicidade das audiências (art. 5º, LX, e 93, IX), a posição do juiz no processo e da subordinação da jurisdição à lei (imparcialidade); e, ainda, os poderes do juiz no processo, o direito de ação e de defesa, a função do Ministério Público, a assistência judiciária, entre outros mais.

A análise da Constituição Federal em vigor contém vários dispositivos que caracterizam a tutela constitucional da ação e do processo. Assim o faz quan-do estabelece a competência da União para legislar sobre direito processual, unitariamente conceituado (art. 22, I); e, quanto aos procedimentos em matéria processual, dá competência concorrente à União, aos Estados e ao Distrito Fe-deral (art. 24, XI).

O direito de ação, com o correlato acesso à justiça, é ainda sublinha-do pela previsão constitucional dos juizados para pequenas causas, civis e penais, agora obrigatórios e todos informados pela conciliação e pelos prin-cípios da oralidade e concentração (art. 98, I). E, mesmo fora dos juizados, a CF/1988 prevê e valoriza a função conciliatória extrajudicial, pela ampliação dos poderes do juiz de paz (art. 98, II).

Com o mesmo espírito inserem-se a facilitação do acesso à justiça, me-diante a legitimação do Ministério Público e de corpos representativos da so-ciedade civil organizada, na defesa dos chamados interesses difusos e coletivos, de que a Constituição Federal é extremamente rica (art. 5º, XXI e LXX; art. 8º, III; art. 129, III e § 1º; art. 232). O mesmo ocorre com relação à titularidade da ação direta de inconstitucionalidade das leis e dos atos normativos, sensivel-mente ampliados (art. 103).

2 estAdo e direito

O Estado se configura como uma instituição, que, como mencionado supra, não deve se sobrepor à cidadania, porém o Estado se utiliza do direi-to para se constituir, bem como o direito é constituído por aquele. Diversos doutrinadores já se debruçaram sobro referido assunto, entre eles Jellinek, citado por Bretas que assevera possuir o Estado duas conotações, podendo ser compreendido sobre o aspecto social ou jurídico. Como para o presente

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estudo prevalece o sentido jurídico, limitar-se-á a descrever o Estado nesse sentido exposto por Ronaldo Bretas de Carvalho Dias, com esteio em Jellinek:

Com efeito, para Jellinek, em obra clássica, o Estado pode ser considerado sob dois aspectos: um é o social, outro o jurídico. Sob o primeiro aspecto, o Estado é visto na unidade de sua natureza como fenômeno ou constru-ção social, partindo-se da constatação de que o Estado consiste em relações de vontade de uma variedade de pessoas, tendo como substrato pessoas que mandam e pessoas que obedecem, vivendo e permanecendo em um território. Sob o segundo aspecto, o Estado é considerado como formação jurídica, submetendo-se às normas do direito, em verdadeira autolimitação jurídica, convertendo-se, via de conseqüência, em sujeitos de direitos e de-veres. (Dias, 2012, p. 10)

Da explanação anterior constata-se que, concomitantemente o Estado seja uma criação do direito, o próprio Estado cria o direito.

Na função criadora do direito, esse apresentará características decor-rentes do modelo estatal que se adotar. No decorrer da história surgem três grandes paradigmas de Estado, que, via de consequência, refletirá no direito a ser adotado e em suas instituições.

2.1 estado de direito

O Estado de Direito surge na Alemanha na metade do século XIX, ten-do como característica limitar o poder do Estado pelo direito. O Estado de Direito não surge por acaso, mas em resposta ao absolutismo que depositava todo o poder nas mãos do soberano, sendo que esse agia de forma arbitrária, bem como inexistente qualquer limitação ao seu poder, que era exercido so-bre os súditos ao seu alvedrio.

Com efeito, expõem Streck e Morais:

O Estado de Direito surge desde logo como o Estado que, nas suas relações com os indivíduos, submete-se a um regime de direito, quando, então, a atividade estatal apenas pode desenvolver-se utilizando um instrumental regulado e autorizado pela ordem jurídica, assim como os indivíduos-cida-dãos – tem a seu dispor mecanismos jurídicos aptos a salvaguardar-lhes de uma ação abusiva do Estado. (Streck; Morais, 2014, p. 91-92)

É possível claramente se inferir que o desiderato precípuo do Estado de Direito é a limitação do poder do próprio Estado, a que não é mais permiti-

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do surpreender seus cidadãos com decisões arbitrárias, a margem do direito como se verificava à época do Estado Absolutista.

Todavia, como alerta os autores retromencionados, o Estado de Direito não emerge como uma instituição ausente de conteúdo ideológico, a ele se agregam qualificativos que demonstram ser um estado que extrapola a mera legalidade, o que resultará no Estado Liberal de Direito, no Estado Social de Direito e no Estado Democrático de Direito, que será abordado nos tópicos seguintes.

2.2 estado liberal de direito

Consoante mencionado no tópico anterior, o Estado de Direito não sur-ge neutro no tocante a conteúdos ideológicos, já que não reflete apenas a limitação de poder, mas também um ideário com apoio em Streck e Morais, in verbis: “Assim o Estado de Direito irá se apresentar ora como liberal em sentido estrito, ora como social, e por fim como democrático. Cada um deles molda o direito com seu conteúdo [...]” (Streck; Morais, 2014, p. 91-92).

Portanto, após as considerações tecidas pelos autores supramenciona-dos, constata-se que o Estado de Direito emerge juntamente com um ideário liberal, podendo-se apontar como características de tal estado

separação entre Estado e sociedade civil mediada pelo direito, este visto como ideal de justiça; garantia das liberdades individuais; os direitos dos homens aparecendo como mediadores das relações entre os indivíduos e o estado; a democracia surge vinculada ao ideário da soberania da nação produzido pela revolução francesa, implicando a aceitação da origem con-sensual do estado, o que aponta para idéia de representação, posteriormen-te matizada por mecanismo de democracia semidireta – referendum e ple-biscito –, bem como, pela imposição de um controle hierárquico da produ-ção legislativa através do controle de constitucionalidade; o estado tem um papel reduzido, apresentando-se como um estado mínimo, assegurando, assim, a liberdade de atuação dos indivíduos. (Streck; Morais, 2014, p. 95)

Pelo exposto, depreende-se que se trata o Estado liberal de um estado não interventor, tendo por fundamental característica manter a liberdade e segurança de seus cidadãos.

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2.3 estado social

Com o passar dos tempos, o Estado foi percebendo que sua postura não intervencionista, passiva, foi gerando graves desigualdades, bem como aumentando a exploração dos que detinham os meios de produção em detri-mento dos que não possuíam.

Em razão do ocorrido, o Estado passa a atuar ativamente, transforman-do-se em um estado intervencionista, no qual se busca a igualdade, sobre-maneira afastada pelo individualismo reinante sob o paradigma do Estado liberal, como bem pontuam Streck e Morais, a seguir transcrito:

Assim, ao direito antepõe-se um conteúdo social. Sem renegar as conquis-tas e os valores impostos pelo liberalismo burguês, dá-se-lhe um novo conteúdo axiológico-político. Destarte, o estado acolhe os valores jurídi-cos políticos clássicos; porém de acordo com o sentido que vem tomando através do curso histórico e com as demandas e condições da sociedade presente [...] Por conseguinte, não somente inclui direitos para limitar o estado, senão também direitos as prestações do estado [...]. O estado, por conseguinte, deve não só omitir tudo que seja contrário ao direito, isto é, a legalidade inspirada em uma idéia de direito, senão que deve exercer uma ação constante através da legislação e da administração que realize a idéia social de direito. (Streck; Morais, 2014, p. 97)

Sendo assim, verifica-se que o Estado Social mescla a combinação de direitos sociais e democracia, com o objetivo de conciliar direitos e liberda-des, individuais e políticas, com os direitos sociais, econômicos e culturais que até então eram afastados de plano pelos liberais.

2.4 estado democrático de direito

Após a explanação dos paradigmas dos Estados Liberal e Social, mister a explanação do Estado Democrático insculpido no art. 1º da Carta Magna de 1988. que é o que maior interesse apresenta para o presente artigo.

Como visto, o Estado Liberal caracteriza-se por um estado mínimo, não interventor, tendo por principal meta assegurar a liberdade e segurança de seus cidadãos. O Estado Social, por sua vez, não se contenta com referidas garantias e passa a atuar visando não só a liberdade e segurança de seus indi-víduos, bem como na concretização de uma maior igualdade por intermédio de ações positivas, buscando, assim, minimizar a acentuada desigualdade

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provocada no Estado liberal, sem, contudo, se desfazer das garantias con-quistadas nesses paradigmas.

Conforme acentua Streck e Morais,a novidade do estado democrático de direito não está em uma revolução das estruturas sociais, mas se deve perceber que esta nova conjugação in-corpora características inéditas ao modelo tradicional. Ao lado do núcleo liberal agregado à questão social, tem-se com este novo modelo a incor-poração efetiva da questão da igualdade como um conteúdo próprio a ser buscado garantir através do asseguramento jurídico de condições mínimas de vida ao cidadão e à comunidade. (Streck; Morais, 2014, p. 104)

Os mesmos autores ainda pontuam sobre Estado Democrático de Di-reito:

O estado democrático de direito tem um conteúdo transformador da reali-dade, não se restringindo, como o estado social de direito, a uma adaptação melhor das condições sociais de existência. Assim, o seu conteúdo ultra-passa o aspecto material de concretização de uma vida digna ao homem e passa a agir simbolicamente como fomentador da participação pública no processo de construção e reconstrução de um projeto de sociedade, apro-priando-se do caráter incerto de democracia para veicular uma perspectiva de futuro voltada à produção de uma nova sociedade, na qual a questão da democracia contém e implica, necessariamente, a solução do problema das condições materiais de existência. (Streck; Morais, 2014, p. 98)

Infere-se, pois, que, no Estado Democrático de Direito a participação pública é de suma importância.

Retomando o exposto no tópico 1, a cidadania não pode se resumir ao exercício do voto, mas deve ser reconhecido ao cidadão o direito de partici-par da construção do Estado a que se filiou.

E essa participação só será alcançada quando o indivíduo se vê como construtor e reconstrutor de seu ordenamento jurídico por meio da institui-ção do processo, que, como será abordado nos tópicos seguintes, adquire uma conotação em cada paradigma de Estado.

3 pArAdiGmAs de estAdo e processo

Os paradigmas de Estado anteriormente referidos influenciaram inten-samente a concepção de processo adotada e, por conseguinte, a postura dos sujeitos processuais.

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Com efeito, desde a autonomia da ciência processual com Oscar Von Bülow, o processo passou por diversas teorias. Não há de se mencionar to-das, mas as que mais se destacaram.

Assim assevera Cândido Rangel Dinamarco:

Essa doutrina é devida a Bulow, que a expôs em 1868 em seu famosíssimo livro Teoria dos Pressupostos Processuais e das Exceções Dilatórias, una-nimemente considerada como a primeira obra científica sobre direito pro-cessual e que abriu horizontes para o nascimento desse ramo autônomo na árvore do direito e para o surgimento de uma verdadeira escola sistemática do direito processual civil. (Cintra; Dinamarco; Grinover, 2006, p. 298)

Pois bem; após a autonomia do direito processual, que antes se fundia na relação de direito material, diversas teorias se despontaram procurando clarificar a natureza jurídica do processo.

E, como dito, nos próximos tópicos, serão tratadas as que mais se des-tacaram e não todas.

3.1 processo como relação jurídica

Em obra lapidar, Aroldo Plínio Gonçalves assim expõe a teoria do pro-cesso como relação jurídica:

A figura da relação jurídica que já se constituíra como um dogma na dou-trina civilista, para explicar direitos e deveres, faculdades e obrigações, e alcançara outros ramos do direito, alastrou-se também pelo direito pro-cessual civil que a adotou sem grandes polêmicas. (Gonçalves, 2012, p. 59)

Prossegue o autor em sua explanação:

A profundidade com que a idéia de processo como “relação jurídica” arraigou-se na ciência do direito processual civil pode ser apreendida na exposição de Cândido R. Dinamarco: A doutrina da relação jurídica pro-cessual nasceu na Alemanha há pouco mais de um século e tem hoje am-pla aceitação em toda a literatura do mundo romano-germânico. Embora a idéia já andasse pela doutrina do processo, dela não se tinha senão mera intuição e foi apenas no século passado que se observou a sua existência – ressaltando-se que se trata de relação nitidamente distinta da de direito substancial, da qual difere, em seus pressupostos, em seu objeto e em seus sujeitos. (Gonçalves, 2012, p. 59-60)

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Percebe-se, pois, que houve um avanço na ciência do direito processual com a concepção de processo como relação jurídica, pois, definitivamente o processo deixa de ser visto como uma extensão do direito material e adquire sua autonomia.

Todavia, não tardaram os estudiosos a constatarem que a concepção de processo como relação jurídica não se amolda ao paradigma do Estado Democrático de Direito.

Como bem explicita Aroldo Plínio, o conceito de processo como rela-ção jurídica possui como fundamentação a relação jurídica em termos priva-tísticos, in verbis:

O modelo clássico de relação jurídica construiu-se sobre a idéia de que ela é um enlace normativo entre duas pessoas, das quais uma pode exigir da outra o cumprimento de um dever jurídico.

A teoria da relação jurídica não se distinguiu, em suas bases fundamentais, das construções do direito privado do século XIX, impregnadas das con-cepções individualistas da época. (Gonçalves, 2012, p. 62)

A grande dificuldade em se acatar o processo como relação jurídica é que se estabelece um vínculo de subordinação entre as partes perante o juiz, vínculo esse que não pode ser sustentado em uma efetiva democracia.

Esclarecedoras são as palavras de André Cordeiro Leal:

[...] a relação jurídica que se estabelece no processo não é uma relação de coordenação, mas como já vimos de poder e sujeição, predominando so-bre os interesses divergentes dos litigantes o interesse público na resolução (processual e, pois, pacífica) dos conflitos e controvérsias. (Leal, 2002, p. 82)

Como bem ressaltado pelo referido doutrinador, o processo como rela-ção jurídica impõe um vínculo de sujeição das partes perante o juiz, vínculo esse que mantém o juiz solipsista na condução do processo e no ato de deci-dir, e não se coaduna com um processo verdadeiramente democrático.

Ao teorizar o processo como relação jurídica, o grande mérito de Bülow foi à sistematização. Deu ênfase à existência de dois planos de relações: a de direito material, que se discute no processo; e a de direito processual, que é o continente em que se coloca a discussão sobre aquela. Segundo essa teoria, a relação jurídica processual se distingue da de direito material sobre três aspectos: a) pelos seus sujeitos (autor, réu e Estado-juiz); b) pelo seu objeto

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(a prestação jurisdicional); c) pelos seus pressupostos (os pressupostos pro-cessuais).

3.2 processo como procedimento em contraditório

Em resposta ao processo como relação jurídica surge a visão de pro-cesso como procedimento em contraditório muito bem formulada por Elio Fazzalari.

Sobre o processo nessa perspectiva arremata Aroldo Plínio:

A caracterização do processo como procedimento realizado contraditório entre as partes não é compatível com o conceito de processo como relação jurídica. Ressaltou-se neste capítulo o quanto foi possível, a idéia de contra-ditório como direito de participação, o concito renovado de contraditório como garantia de simétrica paridade, o contraditório como oportunidade de participação, como direito, hoje revestido da especial proteção consti-tucional. O conceito de relação jurídica é o de vínculo de exigibilidade, de subordinação, de supra e infra ordenação, de sujeição. Uma garantia não é uma imposição, é uma liberdade protegida, não pode ser coativamente oferecida e não se identifica como instrumento de sujeição. Garantia é liber-dade assegurada. Se o contraditório é garantia de simétrica igualdade de participação no processo, como conciliá-lo com a categoria da relação jurí-dica? Os conceitos de garantia e de vínculo de sujeição vêm de esquemas teóricos distintos. O processo como relação jurídica e como procedimento realizado em contraditório entre as partes não se encontra no mesmo qua-dro, e não a ponto de identificação entre eles que permita sua unificação conceitual. (Gonçalves, 2012, p. 113)

A respeito da relação existente entre processo e contraditório, ainda esclarece Aroldo Plínio:

Há processo sempre onde houver o procedimento realizando-se em contra-ditório entre os interessados, e a essência deste está na simétrica paridade da participação, nos atos que preparam o provimento, daqueles que nele são interessados porque, como seus destinatários, sofrerão seus efeitos. (Gonçalves, 2012, p. 98)

Sobre o mesmo assunto clarifica André Cordeiro Leal:

Isso deixa entrever, de logo, que a metodologia fazzalariana de investiga-ção do processo implica penetração nos âmbitos da atividade legislativa (funzione legislativa), administrativa (funzione amministrativa) e também ju-

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risdicional (funzione giurisdizionale), como o próprio autor deixa claro nas páginas seguintes da obra.

O entretecimento do processo com todas atividades estatais implica, assim, que fazzalari percebe que todo provimento estatal (normativo, diga-se) tem origem no procedimento (ou no processo, se em contraditório) que o prepara. (Leal, 2008, p. 112)

Infere-se com Fazzalari que somente haverá processo onde se fizer pre-sente o contraditório. Nessa concepção, é imprescindível o contraditório para se caracterizar o processo, sendo sua ausência motivo de ilegitimidade do provimento alcançado.

Não obstante ser o processo visualizado como procedimento em con-traditório, pode ser considerado um avanço em relação a processo como re-lação jurídica, essa não restou imune a críticas, já que também não atendia ao Estado Democrático de Direito.

No próximo tópico será abordada a teoria neoinstitucionalista do pro-cesso, que, como se demonstrará, supera a de Fazzalari e é a que mais se compatibiliza com aludido estado.

3.3 teoria neoinstitucionalista do processo

A teoria neoinstitucionalista do processo, de autoria de Rosemiro Pereira Leal, hodiernamente, é a que mais se compatibiliza com o Estado De-mocrático de Direito previsto na Carta Magna de 1988.

Com base nas lições de Rosemiro Pereira Leal, a referida teoria se reve-la na “[...] plena constitucionalização do processo e enfatizando a conjunção dos princípios do contraditório, isonomia, ampla defesa, direito ao advogado e à gratuidade procedimental” (Leal, 2008, p. 88).

Entende-se, portanto, que o contraditório norteia o próprio conceito da função jurisdicional. Já o princípio da ampla defesa garante ao litigante o exercício de sua defesa sem restrição.

Deveras, nas palavras de André Cordeiro Leal:

Rosemiro Pereira Leal aponta uma nova perspectiva do entendimento do processo, o qual o próprio autor chama de uma visão neo-institucionalista.

Segundo essa perspectiva, o processo é manejado como instituição cons-titucionalizada ao lado de outras instituições, como é o caso do próprio

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estado. Mas há que se fazer, aqui, a advertência de que o significado de instituição é revisitado pelo autor, que chama a atenção para o fato de que

“na pós modernidade, o conceito de processo, como instituição, não se infere pelas lições de Harriou ou dos administrativistas franceses do século XIX ou posições sociológicas de Guasp e Morel, mas pelo grau de autonomia jurídica como se desponta no discurso de nosso texto cons-titucional, como conquista histórica da cidadania juridicamente funda-mentalizada em princípios e institutos de inerência universalizante e ampliativa em réplica ao colonialismo dos padrões repressores de cen-tração psicológica e política dos chamados Estados hegemônicos.”

(Leal, 2002, p. 88-89).

E arremata o mesmo autor, complementando:

Assim nessa ótica, o processo não é tido simplesmente como processo em contraditório, porque o contraditório há de ser princípio regente (direito--garantia constitucionalizado) do procedimento e não atributo consentido por leis ordinárias processuais (codificadas ou não) ou dosado pela atuação jurisdicional em conceitos e juízos personalistas de senso comum, conveni-ência ou de discricionariedade do julgador. (Leal, 2002, p. 88-89)

Com Rosemiro Pereira Leal há uma transformação radical na visão do processo, inclusive em oposição à concepção do processo como instrumento da jurisdição.

Com efeito, durante longos anos prevaleceu a visão instrumentalis-ta do processo, posição essa defendida em obra de referência de Cândido Rangel Dinamarco.

Pretendeu ainda Dinamarco atribuir escopos metajurídicos ao proces-so, como pode se extrair de sua A Instrumentalidade do Processo, verbis:

Fixar os escopos do processo equivale, ainda, a revelar o grau de sua uti-lidade. Trata-se de instituição humana, imposta pelo estado, e a sua legiti-midade a de estar apoiada não só na capacidade de realizar objetivos, mas igualmente no modo como estes são recebidos e sentidos pela sociedade. Daí o relevo de que é merecedora a problemática dos escopos do sistema processual e do exercício da jurisdição. A tomada de consciência teleológi-ca, incluindo especificação de todos os objetivos visados e do modo como se interagem, constitui peça importantíssima no quadro instrumentalista do processo: sem compreender a sua instrumentalidade assim integral-mente e apoiada nessas colunas, não se estaria dando a ela a condição de

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verdadeira premissa metodológica, nem seria possível extrair dela quais-quer conseqüências cientificamente úteis ou aptas a propiciar a melhoria do serviço jurisdicional. Em outras palavras: a perspectiva instrumentalista do processo é teleológica por definição e o método teleológico conduz in-variavelmente à visão do processo como instrumento predisposto à reali-zação dos objetivos eleitos. (Dinamarco, 2013, p. 177-178)

Na visão instrumentalista do processo, defendida por Dinamarco, esse seria o “instrumento” da jurisdição imposto pelo estado com o desiderato de dirimir as controvérsias levadas ao Estado-Juiz.

Porém, o processo não teria somente escopos jurídicos, mas metajurí-dicos concomitantemente.

Ocorre que, hodiernamente, mormente no paradigma do Estado De-mocrático de Direito, definir processo como “instrumento da jurisdição” foi superada, como bem acentua André Cordeiro Leal:

[...] a jurisdição, face ao estágio da ciência processual e do direito proces-sual, não tem qualquer valia sem o processo, hoje considerado no plano do direito processual positivo como complexo normativo constitucionalizado e garantidor dos direitos fundamentais da ampla defesa, contraditório e isonomia das partes e como mecanismo legal de controle da atividade do órgão jurisdicional (juiz) que não está mais autorizado a utilizar o processo como método, meio, ou mera exteriorização instrumental do exercício da jurisdição. (Leal, 2002, p. 90)

Há muito, tanto a doutrina quanto a jurisprudência vêm reconhecendo que o direito de defesa não se resume na simples apresentação de petição nos autos do processo pelas partes; muito pelo contrário, já que tal garantia constitucional se estende à real possibilidade de as partes verem seus argu-mentos considerados e/ou ponderados de forma a privilegiar os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e isonomia.

Exatamente por isso que o princípio do devido processo legal deve ser efetivo e irrestrito, a fim de que as partes verdadeiramente possam participar do processo, produzir provas e acompanhar a sua produção, podendo, ainda, manifestar-se sobre elas.

Com base na respectiva teorização, o magistrado deve atuar com de-dicação na busca da verdade real e na efetivação dos direitos e das garantias constitucionais aos litigantes, não se acomodando com meros formalismos

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que muitas vezes podem estar destituídos de relevância material para confe-rir a cada um aquilo que lhe é devido.

Dessa forma, o devido processo legal proporciona uma atuação juris-dicional em conformidade com a Constituição, garantindo a efetividade dos direitos fundamentais à sociedade.

4 breves ponderAçÕes sobre o processo penAl brAsileiro

Não há como se falar em inquérito policial sem tecer algumas consi-derações, ainda que breves, sobre o processo penal. É o que se propõe no pressente tópico.

Segundo as lições de Eugênio Pacelli:

Inspirado na legislação penal italiana produzida na década de 1930, em pleno regime fascista, o código de processo (CPP) penal brasileiro foi ela-borado em bases notoriamente autoritárias, por razões óbvias e de origem. E nem poderia ser de outro modo, a julgar pelo paradigma escolhido e justificado, por escrito e expressamente, pelo responsável pelo anteprojeto de lei, Min. Francisco Campos, conforme se observa em sua exposição de motivos. (Pacelli, 2015, p. 05)

Por sua vez, Guilherme de Souza Nucci assim define Processo Penal:

Portanto, Direito Processual Penal é o corpo de normas jurídicas cuja fina-lidade é regular o modo, os meios, e os órgãos encarregados de punir do estado, realizando-se por intermédio do Poder Judiciário, constitucional-mente incumbido de aplicar a lei ao caso concreto. (Nucci, 2011, p. 79)

Constata-se que falar de processo penal é falar de repressão, punição, o que por si só não é compatível com um Estado democrático.

Ademais, o Código de Processo Penal teve por paradigma um estado totalitário, fascista, qual seja o Codice de Procedura Penale italiano ou código de Rocco.

Como dito nos tópicos anteriores, o paradigma estatal adotado irá in-fluenciar intensamente o direito vigente e aplicado nesse Estado.

Como o Código Penal brasileiro foi de inspiração fascista (paradigma à época adotado no Estado italiano), outro não seria o reflexo em seus institu-tos, incluindo o inquérito policial, objeto do presente trabalho.

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Todavia e felizmente, o Estado brasileiro não se encontra sob a égide de tal paradigma, e sim sob um Estado Democrático de Direito, razão pela qual esse modelo deve pautar toda sua legislação, seja cível ou penal.

5 inQuérito policiAl

O inquérito policial, sob a óptica dogmática, sempre foi enquadrado sob a rotulação de “procedimento administrativo”. Com base nessa visão, te-mos que o inquérito é mero procedimento administrativo que visa à colheita de provas para informações sobre o fato infringente da norma e sua autoria.

Com efeito, ensinam Reis e Gonçalves que o inquérito policial “é um procedimento investigatório instaurado em razão da prática de uma infração penal, composto de uma série de diligências, que tem como objetivo obter elementos de prova para que o titular da ação possa propô-la contra o crimi-noso” (Reis; Gonçalves, 2013, p. 49).

Não destoa do conceito supra aludido o exposto por Nucci, in verbis: “O inquérito policial é um procedimento preparatório da ação penal, de cará-ter administrativo, conduzido pela polícia judiciária e voltado à colheita pre-liminar de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria” (Nucci, 2011, p. 148).

Depreende-se dos conceitos elencados, e outros poderiam ser men-cionados, que é praticamente uníssono o entendimento do inquérito policial como procedimento administrativo, o que justifica a ausência do contradi-tório.

Tarefa dificílima é encontrar e poucas vozes se levantam para assegu-rar a presença do contraditório no inquérito.

Quando se encontra, é de forma tímida que podemos perceber a defesa da garantia do contraditório no inquérito.

Guilherme de Souza Nucci assim preceitua:

Assim sendo, em nível ideal, somente deveríamos admitir que as provas colhidas no inquérito policial fossem usadas para instruir a peça inicial acusatória, já que a razão de sua existência e sua finalidade não condizem com outra conclusão.

Não se poderia pensar em coletar provas sem a participação do investigado ou de seu defensor para depois utilizá-las livremente durante a instrução do processo criminal. Seria nítido contraste com o princípio constitucional

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da ampla defesa infringindo ainda o contraditório. Esse é seu caráter confli-tuoso: pretende ser um instrumento de garantia contra acusações levianas, mas acaba funcionando contra o próprio investigado/réu, que não pode contrariar a prova colhida pela polícia. (Nucci, 2011, p. 149)

De grande valia para o presente trabalho são as considerações tecidas por Aury Lopes Jr., que assevera:

É lugar comum na doutrina a afirmação genérica e infundada de que não existe direito de defesa e contraditório no inquérito policial.

Está errada a afirmação, pecando por reducionismo.

Basta citar a possibilidade de o indiciado exercer no interrogatório policial sua autodefesa positiva (dando sua versão aos fatos); ou negativa (usando seu direito de silêncio).

O verdadeiro problema nasce daqui. Existe é exigível, mas sua eficácia é insuficiente deve ser potencializada.

É uma potencialização por exigência constitucional.

O ponto crucial nessa questão é o art. 5, LV, da CB, que não pode ser objeto de leitura restritiva. A postura do legislador foi claramente protetora, e a confusão terminológica (falar em processo administrativo quando deveria ser procedimento) não pode servir de obstáculo para sua aplicação no in-quérito policial, até porque o próprio legislador ordinário cometeu o mes-mo erro ao tratar como “do processo comum”, “do processo sumário” etc., quando na verdade queria dizer “procedimento”. (Lopes Jr., 2015, p. 170).

No mesmo sentido se manifesta Lauria Tucci, citado por Aury, senão vejamos:

[...] Ora assim sendo, se o próprio legislador nacional entende ser possí-vel a utilização do vocábulo processo para designar procedimento, nele se encarta, à evidencia, a noção de qualquer procedimento administrati-vo e, consequentemente de procedimento administrativo-persecutório de instrução provisória, destinado a preparar a ação penal, que é o inquérito policial. (Lopes Jr., 2015, p. 171)

Infere-se que, antes do advento do novo CPC, já havia a defesa do con-traditório no inquérito policial, mas essa se restringia a caráter terminológico entre processo e procedimento.

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Ora, será que simplesmente pelo fato de se entender que a fase prévia representada pelo inquérito policial constitui mero procedimento adminis-trativo (sem exercício da jurisdição, sem litigantes e mesmo acusado), seria defensável a ideia de que a ausência do contraditório não contraria a exigên-cia constitucional do processo acusatório?

É cediço que a necessidade de consolidação e aperfeiçoamento cons-tante do Estado Democrático de Direito brasileiro se reveste na realização de esforços para sua implantação concreta na realidade fática de todos os jurisdicionados, os quais ainda têm muitos desafios para o pleno e regular exercício da cidadania e conscientização sobre seus direitos e deveres em prol do bem comum.

Com o advento do novo CPC, o que se busca demonstrar é que se trata de uma questão principiológica e, independentemente de processo ou proce-dimento, o contraditório deve ser observado no inquérito.

6 o contrAditório e o novo cpc

O novo Código de Processo Civil foi o primeiro código gestado e pu-blicado em regime democrático, como ressalta Dierle Nunes, membro da co-missão para elaboração do novo diploma: “toda essa mudança conduziu a busca de se adotar um modelo processual coparticipativo/cooperativo em inúmeros países, com as ressalvas anteriormente pontuadas” (Bahia; Junior; Nunes; Pedron, 2015, p. 82).

Referido modelo, de viés nitidamente democrático, acarreta profundas mudanças no conceito de processo e naturalmente no princípio do contradi-tório.

Sobre aludido modelo, esclarece Dierle:

A percepção democrática do direito rechaça a possibilidade de um sujeito solitário captar a percepção do bem viver em sociedades altamente plurais e complexas e, no âmbito jurídico, a aplicação do direito e/ou o proferi-mento de provimentos, fazendo-se necessária a percepção de uma procedi-mentalidade na qual todos os interessados possam influenciar na formação das decisões. (Nunes, 2012, p. 203)

Infere-se, pois, que o novo CPC pretendeu adequar as normas proces-suais e o próprio direito no paradigma do estado efetivamente democrático.

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Assim sendo, o princípio do contraditório não se resume ao “dizer e contradizer”, tampouco o juiz não pode atuar de forma solipsistana constru-ção dos provimentos

Para que um provimento seja proferido, há de ser construído com a participação de todos nele interessados e o contraditório exerce papel funda-mental nessa construção.

Sobre o princípio do contraditório esclarece Aroldo Plínio:

O contraditório não é o dizer e o contradizer sobre matéria controvertida, não é a discussão que se trava no processo sobre a relação de direito mate-rial, não é a polêmica que se desenvolve em torno dos interesses divergen-tes sobre o conteúdo do ato final. Essa será a sua matéria, o seu conteúdo possível.

O contraditório é a igualdade de oportunidade no processo, é a igual opor-tunidade de igual tratamento, que se funda na liberdade de todos perante a lei.

É essa igualdade de oportunidade que compõe a essência do contraditó-rio enquanto garantia de simétrica paridade de participação no processo. (Gonçalves, 2013, p. 109)

A esse respeito, vejamos as considerações de Rosemiro Pereira Leal, para quem,

por conseguinte, o princípio do contraditório é referente lógico-jurídico do processo constitucionalizado, traduzindo, em seus conteúdos, a dialogici-dade necessária entre interlocutores (partes) que se postam em defesa ou disputa de direitos alegados, podendo, até mesmo, exercer a liberdade de nada dizerem (silêncio), embora tendo direito-garantia de se manifesta-rem. Daí o direito ao contraditório ter seus fundamentos na liberdade jurí-dica tecnicamente exaurida de contradizer, que, limitada pelo tempo finito (prazo) da lei, converte-se em ônus processual se não exercida. Conclui-se que o processo, ausente o contraditório, perderia sua base democrático--jurídico-principiológica e se tornaria um meio procedimental inquisitório em que o arbítrio do julgador seria a medida colonizadora da liberdade das partes. (Leal, 2014, p. 99)

Verifica-se que o contraditório, em uma democracia, expressa-se como princípio regente do processo, sob pena de sua ausência caracterizar meio procedimental inquisitório como ressaltado por Leal.

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Ora, o contraditório é princípio regente do processo, independente-mente do conteúdo de direito material nele veiculado, seja civil, penal, admi-nistrativo, tributário etc., sua presença é de observância obrigatória!

Sobre a importância do contraditório como meio de evitar decisão sur-presa, manifesta Nunes:

O principal fundamento da comparticipação é o contraditório como garan-tia de influência e não surpresa.

Nesse sentido, o princípio do contraditório receberia uma nova significa-ção, passando a ser entendido como direito de participação na construção do provimento, sob a forma de uma garantia processual de influência e não surpresa para a formação das decisões.

Isso representa uma transformação do conceito persistente em parte da doutrina processual nacional, que ainda reduz a participação em contradi-tório a mero direito à bilateralidade de audiência – mero direito de dizer e contradizer. (Bahia; Junior; Nunes; Pedron, 2015, p. 93)

Os princípios e valores fundamentais do Estado Democrático de Direi-to, insculpidos na Carta Magna de 1988, levam a uma nova compreensão do Direito Processual. A esse respeito, ainda afirma Rosemiro Pereira Leal:

É que, quando escrevemos, em direito democrático, sobre cidadania, como conteúdo de processualização ensejadora da legitimidade decisória, o que se sobreleva é o nivelamento de todos os componentes da comunidade jurí-dica para, individual ou grupalmente, instaurarem procedimentos proces-sualizados à correição (fiscalização) intercorrente da produção e atuação do direito positivado como modo de auto-inclusão do legislador-político--originário (o cidadão legitimado ao devido processo legal) na dinâmica testificadora da validade, eficácia, criação e recriação do ordenamento jurí-dico caracterizador e concretizador do tipo teórico da estabilidade consti-tucionalizada. Em direito democrático, o processo abre, por seus princípios institutivos (isonomia, ampla defesa, contraditório), um espaço jurídico--discursivo de auto-inclusão do legitimado processual na comunidade jurídica para construção conjunta da sociedade jurídico-política. Tem-se, assim, no legitimado ao processo, por si próprio, o agente legal (remetente--receptor do exercício e alto-entrega de sua pessoal cidadania no Estado Democrático de Direito). E tal se esclarece para retirar do conceito vulgar de cidadania conotações ligadas a um aleatório e ocasional exercício do voto ou a mobilizações sociais como formas tidas como importantes para pro-vocar significativas transformações ou controles estruturais da sociedade

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política. Percebe-se, logo, a fragilidade e engano de se conceber a cidadania como núcleo central mitológico da usinagem da liberdade e dignidade hu-mana. Cidadania é deliberado vínculo jurídico-político-constitucional que qualifica o indivíduo como condutor de decisões, construtor e reconstru-tor do ordenamento jurídico da sociedade política a que se filiou, porém o exercício desse direito só se torna possível e efetivo pela irrestrita condição legitimada ao devido processo constitucional. Somente assim, a partir da legalidade, nas comunidades jurídicas pós-seculares, é atingível a concre-ção geral do Estado Democrático de Direito que é, nessa versão, um status (espaço aberto a todos de validação e eficácia processual contínua, negativa ou afirmativa, do ordenamento jurídico). (Leal, 2002, p. 151)

Ressalta-se que os princípios processuais anteriormente referidos, com base no modelo de processo constitucional, são todos aqueles que expres-sam os objetivos fundamentais do Estado Democrático de Direito, bem como os seus valores supremos como a dignidade da pessoa humana e a ideia de justiça social, a serem necessariamente observados pelo Estado, sob pena da atividade jurisdicional carecer de fundamentação constitucional.

Conclui-se, portanto, que o inquérito policial, independentemente da terminologia utilizada, se processo ou procedimento administrativo, não há como negar que se integrará ao processo penal e, com base nele, o provimen-to será construído, e, não raras vezes, o juiz o utilizará para a condenação do réu sem que aquele tenha se submetido ao crivo do contraditório em nítida afronta ao Estado Democrático de Direito.

considerAçÕes finAis

Em vista do exposto, objetivou-se com o presente artigo demonstrar, ainda que de forma sintética, que o princípio do contraditório, em um Estado que se intitula Democrático de Direito, é de aplicação obrigatória ao inquérito policial pelos seguintes argumentos:

1. Procurando a melhor compreensão do conceito de cidadania, no qual essa deve ser compreendida não somente no direito de votar e ser votado, mas sim por ser o cidadão construtor e reconstrutor do ordenamento jurídico ao qual se filiou;

2. Apontando que o conceito de processo como relação jurídica ou procedimento em contraditório não se adéquam ao paradigma do Estado Democrático de Direito;

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3. O processo é uma entidade complexa, podendo ser encarado sob o aspecto dos atos que lhe dão corpo e da relação entre esses mes-mos atos (procedimento) e igualmente sob o aspecto das relações entre os seus sujeitos (relação processual). O processo não é mero procedimento (como entendia a antiga doutrina), mas também não se exaure no conceito simplista de relação jurídica processual;

4. Desde a compreensão da problemática do presente ensaio, perce-be-se que a ideia do fundamento normativo principal da concep-ção moderna do direito processual para proteção dos direitos e bens jurídicos fundamentais do cidadão reside no modelo de pro-cesso constitucional;

5. Independentemente da natureza do inquérito policial como pro-cesso ou procedimento administrativo, o mesmo deve observar o contraditório;

6. O princípio do contraditório não se resume ao “dizer e contradi-zer, mas como garantia de influência, bem como de evitar decisão surpresa”;

7. O novo Código de Processo Civil trouxe ao ordenamento jurídico pátrio novas ideias, princípios e regras com o objetivo de trazer mais credibilidade ao sistema processual civil, reforçando as deci-sões judiciais, bem como tornando mais eficiente e útil a atuação judicante do Estado-Juiz;

8. O modelo de processo visado no novo CPC prioriza a compartici-pação de todos os afetados pelo provimento, devendo o magistra-do zelar pela efetivação do contraditório e atuar como dialogador;

9. Aliado a esse modelo, temos que o Brasil adota o sistema processu-al penal de partes, em que o acusador e acusado se encontram em pé de igualdade; é, ainda, um processo de ação, com garantias da imparcialidade do juiz, do contraditório e da publicidade;

10. O inquérito é incluído no processo, utilizado como prova, e muitas vezes utilizado para condenação do réu que não participou de sua construção em contraditório podendo acarretar a inquisitoriedade procedimental e ofensa a um real Estado Democrático de Direito.

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referênciAs

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Jurisprudênciacível

stfSupremo Tribunal Federal

09.12.2016 Segunda TurmaAgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 986.628 BahiaRelator: Min. Ricardo LewandowskiAgte.(s): Companhia do Metrô da BahiaAdv.(a/s): Caroline Santos Sobral NevesAgdo.(a/s): Robson Souza da SilvaAdv.(a/s): Andre Luiz da Cruz Moura

EMENTA

AGrAvo reGimentAl no recurso extrAordinário com AGrAvo –

responsAbilidAde civil – complexidAde dA provA – incompetênciA do juizAdo – temAs

nºs 339, 424, 433 e 660 – AusênciA de repercussão GerAl – ofensA Ao princÍpio dA leGAlidAde – súmulA nº 636 do stf – AGrAvo A Que se neGA

provimento, com AplicAção de multA

I – O Supremo Tribunal Federal já definiu que a violação dos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal, quando implica-

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Revista JuRídica 471JuRispRudência civil

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rem em exame de legislação infraconstitucional, é matéria sem re-percussão geral (Tema nº 660 – ARE 748.371-RG).

II – O acórdão impugnado pelo recurso extraordinário não ofendeu os arts. 5º, XXXV, e 93, IX, da Constituição, na interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Tema nº 339 (AI 791.292 QO-RG) da repercussão geral.

III – O STF considerou infraconstitucional a discussão referen-te ao indeferimento de produção de provas no âmbito do processo judicial, bem como a alegação de incompetência dos juizados espe-ciais em face da alegação de complexidade da prova, no ARE-RG 639.228 (Tema nº 424) e no ARE-RG 640.671 (Tema nº 433), respecti-vamente.

IV – Este Tribunal entende não ser cabível a interposição de recurso extraordinário por contrariedade ao princípio da legalidade quando a verificação da ofensa envolva a reapreciação de interpre-tação dada a normas infraconstitucionais pelo Tribunal de origem (Súmula nº 636/STF).

V – Agravo regimental a que se nega provimento, com aplica-ção de multa (art. 1.021, § 4º, do CPC).

ACÓRDÃO

Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão virtual da Segunda Turma, na conformidade da ata de julgamentos, por unanimida-de, negar provimento ao agravo regimental, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 9 de dezembro de 2016.

Ricardo Lewandowski – Relator

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto de decisão proferida por minha antecessora na relato-ria do feito, Ministra Cármen Lúcia, abaixo transcrita:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO – PROCESSUAL CIVIL – RESPONSABILIDADE CIVIL – INDENIZAÇÃO – DANOS – INCOM-PETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS PELA COMPLEXIDADE DA

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Jurisprudência civilrevista Jurídica 471

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PROVA – AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL – ALEGAÇÃO DE INOBSERVÂNCIA DO ART. 5º, INCS. LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA: AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL – CONTRA-RIEDADE AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE: SÚMULA Nº 636 DO SU-PREMO TRIBUNAL FEDERAL – INEXISTÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO ART. 93, INC. IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA – AGRAVO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

Relatório

1. Agravo nos autos principais contra inadmissão de recurso extraordiná-rio interposto com base no art. 102, inc. III, al. a, da Constituição da Repú-blica contra o seguinte julgado da Quarta Turma Recursal dos Juizados Especiais de Salvador/BA:

‘RECURSOS INOMINADOS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DA-NOS MORAIS – COMPANHIA DO METRÔ E EMBASA – PRELIMI-NAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO EM RAZÃO DA COMPLEXI-DADE DA CAUSA AFASTADA – DESNECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA – PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO EM RA-ZÃO DA AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO DESCABIDA – COMPANHIA DO METRÔ – FORNECEDORA POR EQUIPARAÇÃO – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA – APLI-CAÇÃO DA TEORIA DA ASSERÇÃO – ROMPIMENTO DE ADU-TORA NA BR-324 – SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ÁGUA POR 07 (SETE) DIAS – PRESENÇA DE MÍNIMA PROVA DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO DA PARTE AUTORA – INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO – INEXISTÊNCIA DE PROVA DA EFETIVA E REGULAR PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS NO PERÍODO INFOR-MADO NA INICIAL – PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DOS SERVI-ÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS – DEMORA NO RESTABELECIMENTO DO SERVIÇO – MÁ PRESTAÇÃO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS (ART. 37, § 6º, DA CF/1988 E ART. 22 DO CDC) – DANO MORAL IN RE IPSA CON-FIGURADO – REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO, FIXA-DO EM DESACORDO COM OS CRITÉRIOS DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS’ (doc. 30)

Os embargos de declaração opostos foram rejeitados.

2. A Agravante alega contrariados os arts. 5º, incs. II, XXXV, LIV e LV, e 93, inc. IX, da Constituição da República, argumentando a incompetência

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dos juizados especiais para o julgamento da causa e a inexistência de dano indenizável.

3. O recurso extraordinário foi inadmitido ao fundamento de ausência de ofensa constitucional direta.

Examinados os elementos havidos no processo, decido.

4. Razão jurídica não assiste à Agravante.

5. A alegação de nulidade do acórdão por contrariedade ao art. 93, inc. IX, da Constituição da República não pode prosperar. Embora em sentido con-trário à pretensão da Agravante, o acórdão recorrido apresentou suficiente fundamentação.

Este Supremo Tribunal Federal assentou:

‘o que a Constituição exige, no art. 93, IX, é que a decisão judicial seja fundamentada; não, que a fundamentação seja correta, na solução das questões de fato ou de direito da lide: declinadas no julgado as premis-sas, corretamente assentadas ou não, mas coerentes com o dispositivo do acórdão, está satisfeita a exigência constitucional’ (RE 140.370, Rela-tor o Ministro Sepúlveda Pertence, RTJ 150/269).

6. A assertiva de inobservância do art. 5º, inc. II, da Constituição da Re-pública esbarra no óbice da Súmula nº 636 do Supremo Tribunal Federal, pela qual se dispõe não caber ‘recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pres-suponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida’, como ocorre na espécie vertente (Código de Defesa do Consumidor). Confiram-se, por exemplo, os julgados a seguir: ‘Recurso extraordinário: descabimento: questão relativa ao pagamento de horas in itinere decidida pelo acórdão recorrido à luz da legislação infraconstitucio-nal: incidência, mutatis mutandis, da Súmula nº 636; inocorrência de nega-tiva de prestação jurisdicional ou violação dos princípios constitucionais apontados no recurso extraordinário’ (AI 233.548-AgR, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, 1ª T., DJ 18.03.2005).

‘Inviável o prosseguimento do recurso extraordinário quando a ave-riguação da afronta ao princípio da legalidade demanda análise de legislação infraconstitucional. Verbete nº 636 da Súmula desta Corte. 3. Ausência de argumentos suficientes para infirmar a decisão recorri-da. 4. Agravo regimental a que se nega provimento’ (AI 745.965-AgR, Relator o Ministro Gilmar Mendes, 2ª T., DJe 26.06.2011).

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‘EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO – CONVERSÃO EM AGRAVO REGIMENTAL – PROCESSUAL CIVIL – ALEGAÇÃO DE CONTRARIEDADE AO PRINCÍPIO DA LEGALI-DADE E DE JULGAMENTO EXTRA PETITA – NECESSIDADE DE EXAME PRÉVIO DE NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS – INCI-DÊNCIA DA SÚMULA Nº 636 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – OFENSA CONSTITUCIONAL INDIRETA – AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO’ (RE 631.736-ED, de minha rela-toria, 1ª T., DJe 08.04.2011).

7. No julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário nº 748.371, Rela-tor o Ministro Gilmar Mendes, este Supremo Tribunal assentou inexistir repercussão geral nas alegações de contrariedade aos princípios do con-traditório, da ampla defesa e do devido processo legal quando o exame da questão depende de prévia análise da adequada aplicação de normas infraconstitucionais:

‘Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa de-pendente de prévia análise da adequada aplicação das normas infra-constitucionais. Rejeição da repercussão geral’ (DJe 01.08.2013).

8. No julgamento do Agravo em Recurso Extraordinário nº 640.671-RG, Relator o Ministro Cezar Peluso, este Supremo Tribunal assentou sem re-percussão geral a alegação de incompetência dos juizados especiais pela complexidade da prova, pois o exame da questão dependeria de prévia análise da adequada aplicação de normas infraconstitucionais:

‘RECURSO – Agravo convertido em Extraordinário. Inadmissibilida-de deste. Competência dos juizados especiais. Complexidade da prova. Tema infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão ge-ral recurso extraordinário que, tendo por objeto a competência dos jui-zados especiais, face à alegação de ser necessária a produção de prova complexa para o deslinde da controvérsia submetida ao Poder Judiciá-rio, versa sobre tema infraconstitucional’ (DJe 06.09.2011).

Declarada a ausência de repercussão geral, os recursos extraordinários e agravos nos quais suscitada a mesma questão constitucional devem ter o seguimento negado pelos respectivos relatores, conforme o art. 327, § 1º, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal.

Nada há a prover quanto às alegações da Agravante.

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9. Pelo exposto, nego provimento ao agravo [...]” (doc. eletrônico 82).

No presente agravo regimental, sustenta, em síntese, que a não produ-ção de prova pericial, inviabilizou o direito de defesa da recorrente.

No mais, reitera a ocorrência de violação dos arts. 5º, II, XXXV, LIV e LV, 93, IX, e 98, I, da Constituição Federal.

É o relatório.

VOTO

O Senhor Ministro Ricardo Lewandowski (Relator): Bem reexamina-dos os autos, verifico que a decisão ora atacada não merece reforma.

O Supremo Tribunal Federal já definiu que a violação dos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal, quando implicarem em exame de legislação infraconstitucio-nal, é matéria sem repercussão geral (Tema nº 660). Confira-se a ementa do leading case:

“Alegação de cerceamento do direito de defesa. Tema relativo à suposta violação aos princípios do contraditório, da ampla defesa, dos limites da coisa julgada e do devido processo legal. Julgamento da causa dependente de prévia análise da adequada aplicação das normas infraconstitucionais. Rejeição da repercussão geral” (ARE 748.371 RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 01.08.2013).

A jurisprudência desta Corte vem seguindo pacificamente essa orien-tação: ARE 955.777-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª T., Julgado em 28.06.2016, DJe de 24.08.2016; RE 888.772-AgR, Relator(a): Min. Teori Zavascki, 2ª T., DJe de 06.09.2016.

Ademais, o acórdão impugnado pelo recurso extraordinário não ofen-deu os arts. 5°, XXXV, e 93, IX, da Constituição, pois na interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao julgar o Tema nº 339 da repercussão geral, a Constituição exige apenas que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamen-tos da decisão. Transcrevo a ementa do paradigma:

“Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extra-ordinário (CPC, art. 544, §§ 3º e 4º). 2. Alegação de ofensa aos incisos XXXV

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e LX do art. 5º e ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Inocorrên-cia. 3. O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. 4. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribu-nal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral” (AI 791.292 QO-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 13.08.2010).

Outrossim, esta Corte apreciou a discussão referente ao indeferimento de produção de provas no âmbito do processo judicial, bem como a compe-tência de juizados especiais em face da alegação de complexidade da prova, nos ARE-RG 639.228 (Tema nº 424) e no ARE-RG 640.671 (Tema nº 433), res-pectivamente. Nessas oportunidades, este Supremo Tribunal Federal rejeitou a repercussão geral, tendo em vista a natureza infraconstitucional das ques-tões postas. A seguir, transcrevo as ementas desses precedentes:

“RECURSO – Agravo convertido em Extraordinário. Inadmissibilidade deste. Produção de provas. Processo judicial. Indeferimento. Contraditó-rio e ampla defesa. Tema infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão geral recurso extraordinário que, tendo por objeto a obrigato-riedade de observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, nos casos de indeferimento de pedido de produção de provas em processo judicial, versa sobre tema infraconstitucional” (ARE-RG 639.228, Rel. Min. Presidente, DJe 31.08.2011).

“RECURSO – Agravo convertido em Extraordinário. Inadmissibilidade deste. Competência dos juizados especiais. Complexidade da prova. tema infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão geral recurso ex-traordinário que, tendo por objeto a competência dos juizados especiais, face à alegação de ser necessária a produção de prova complexa para o des-linde da controvérsia submetida ao Poder Judiciário, versa sobre tema in-fraconstitucional” (ARE-RG 640.671, Rel. Min. Presidente, DJe 06.09.2011).

Por fim, conforme consignado na decisão ora recorrida, o Tribunal en-tende não ser cabível a interposição de RE por contrariedade ao princípio da legalidade, quando a verificação da ofensa envolva a reapreciação de inter-

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pretação dada a normas infraconstitucionais (Código de Defesa do Consumi-dor) pelo Tribunal a quo (Súmula nº 636 do STF).

O que autoriza concluir que o presente recurso tem intuito meramente protelatório, refletindo, tão somente, o inconformismo do agravante com o decidido e sua recalcitrância em aceitar a decisão proferida por este Tribunal, revelando uma insatisfação injustificada com o resultado da causa.

Isso posto, nego provimento ao agravo regimental. Por reconhecer a manifesta improcedência do agravo regimental, aplico multa no valor de 5% (cinco por cento) do valor atualizado da causa (art. 1.021, § 4º, do CPC).

SEGUNDA TURMA EXTRATO DE ATA

AgRg no Recurso Extraordinário com Agravo nº 986.628

Proced.: Bahia

Relator: Min. Ricardo Lewandowski

Agte.(s): Companhia do Metrô da Bahia

Adv.(a/s): Caroline Santos Sobral Neves (19830/BA)

Agdo.(a/s): Robson Souza da Silva

Adv.(a/s): Andre Luiz da Cruz Moura (40620/BA)

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo re-gimental, com aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015, nos termos do voto do Relator. 2ª Turma, Sessão Virtual de 02 a 08.12.2016.

Composição: Ministros Gilmar Mendes (Presidente), Celso de Mello, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Teori Zavascki.

Ravena Siqueira Secretária

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Recurso Especial nº 1.628.245 – SP (2011/0285556-3)Relator: Ministro Raul AraújoRecorrente: L. M.Advogado: Reginaldo Ap. D. da Silva – SP225064Recorrido: L. C. Z.Recorrido: V. de A.Advogado: sem representação nos autos – SE000000M

EMENTA

recurso especiAl – civil e processuAl civil – direito de fAmÍliA – Adoção intuitu personAe

– pretendente não inscritA no cAdAstro de AdotAntes – impossibilidAde jurÍdicA do pedido

– AplicAção do princÍpio do melhor interesse do menor – estAbelecimento de vÍnculo Afetivo

dA criAnçA com A pretensA AdotAnte não cAdAstrAdA – recurso especiAl provido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indica-das, decide a Quarta Turma, por unanimidade, dar provimento ao recur-so especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira (Presidente), Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão vo-taram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti.

Brasília, 13 de dezembro de 2016 (data do Julgamento).

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Ministro Raul Araújo Relator

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Raul Araújo:

L. M. ajuizou ação de adoção contra L. C. Z. e V. de A., em relação ao menor N. de A., então com um mês de vida, alegando estar cuidando da criança desde o seu nascimento (17.05.2010), com o consentimento dos geni-tores.

Sustentou que os pais biológicos não são casados, não residem sob o mesmo teto e possuem outros cinco filhos menores, sendo que três filhos mo-ram com os avós paternos e os outros dois com os avós maternos. Afirmou que, “embora sejam crianças saudáveis e bem cuidadas, os avós já não têm mais condições de arcar com as despesas de outro integrante em suas famí-lias, motivo pelo qual optou o casal, em benefício ao próprio menor N., pela adoção em favor da requerente” (e-STJ, fl. 4).

Ressaltou que “os próprios genitores, mediante documento escrito de-claram que não se opõem quanto à adoção do menor N., pela ora requerente, L. M., sendo que, como já acima mencionado, desde o nascimento do menor, vêm lhe proporcionando amor, carinho, cuidados com vacinas, vestuários, e todos os cuidados necessários ao seu crescimento saudável, como boa ali-mentação” (e-STJ, fl. 4).

O Juiz de Direito julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, tendo em vista a falta de prévia ins-crição da autora no Cadastro Central de Adotantes (e-STJ, fls. 43/45).

Seguiu-se apelação, a que o eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou provimento, nos termos do acórdão assim ementado:

“ADOÇÃO – Pretendente não inscrita no Cadastro Central de Adotantes. Menor de apenas 01 mês à época do pedido. Não enquadramento da hipó-tese fática em qualquer das situações excepcionais previstas pelo art. 50, § 13, do ECA. Inexistência sequer de vínculos de socioafetividade a serem preservados, ou mesmo de descrição fática de situação enquadrável em adoção intuitu personae. Impossibilidade jurídica do pedido devidamente caracterizada. Intervenção judicial necessária em ordem a reprimir a frau-de ao cadastro, cuja observância expressa inexorável interesse público.

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Apelo não provido. Não se admite, por impossibilidade jurídica, pedido de adoção de criança recém-nascida por pretendente não cadastrado previa-mente pela Central de Adotantes, tanto mais inexistindo qualquer vínculo de socioafetividade a ser preservado, ou mesmo descrição de situação fáti-ca hábil a evidenciar adoção intuitu personae, circunstâncias a potencializar a possibilidade de burla ao sistema legal, em situação não enquadrável nas exceções expressamente cominadas pela lei de regência.” (e-STJ, fl. 74)

Daí o presente recurso especial, interposto por L. M. com base nas alí-neas a e c do permissivo constitucional, em que se alega ofensa ao art. 6º da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), bem como diver-gência jurisprudencial.

Sustenta que, não obstante a autora recorrente não constar do Cadastro de Adotantes e não ter passado por processo de habilitação, tais requisitos não são considerados “absolutos por grande parte da doutrina e da jurispru-dência, ao passo que, não desprezando os preceitos legais, deve-se acima de tudo, observância ao fim social a que se destina a lei e ao princípio do melhor interesse do menor” (e-STJ, fl. 91).

Afirma que o “vínculo socioafetivo já se estabeleceu nestes 10 (dez) me-ses de vida, eis que, desde o seu nascimento em 17 de maio de 2010, o menor encontra-se sob seus cuidados, cumprindo ressaltar que é uma criança muito saudável e alegre, fato que corrobora que a ora recorrente está perfeitamente apta a adotá-lo” (e-STJ, fl. 95).

Originalmente não admitido, sobreveio agravo nos próprios autos, o qual foi provido para melhor exame do recurso especial (e-STJ, fl. 173).

O Ministério Público Federal opina pelo improvimento do recurso.

Foi determinada a intimação da recorrente para que manifestasse seu interesse no julgamento do presente recurso, apresentando informações com-pletas sobre a atual situação do menor (e-STJ, fl. 181).

A recorrente informou que subsiste seu interesse no julgamento do re-curso, pois o menor permanece consigo desde o nascimento, ressaltando que ”conta atualmente com 06 (seis) anos de idade”, “desde então, vem cuidando da sua saúde, educação e lazer” e ”encontra-se devidamente matriculado no Colégio Meta de Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio, com sede na cidade de Indaiatuba/SP, considerado, inclusive, um dos melhores da cidade” (e-STJ, fls. 185/186).

É o relatório.

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VOTO

O Senhor Ministro Raul Araújo (Relator):

Os elementos dos autos dão conta de que a recorrente ajuizou ação de adoção visando regularizar guarda de fato estabelecida com relação ao infante N. de A. Para tanto, noticiou que, desde o nascimento do menor, o qual se deu em 17 de maio de 2010, vem cuidando da criança, com o consentimento dos pais biológicos, que voluntariamente lhe entregaram o recém-nascido e se manifestaram favoráveis à adoção em favor da requerente.

De plano, o processo foi julgado extinto, sem resolução do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido, tendo em vista a falta de prévia inscrição da autora no cadastro de adotantes.

O Tribunal de origem confirmou a sentença, ressaltando não identi-ficar no caso vínculo de socioafetividade a ser preservado, ou mesmo des-crição fática de situação enquadrável em adoção intuitu personae. Observou, ainda, o exíguo lapso de convivência estabelecido, inferior a um mês, quando da propositura da ação, e mesmo quando do julgamento da apelação.

Com efeito, confira-se a fundamentação do acórdão recorrido:

“Segundo a exordial, sem condições de criar Natan, recém nascido em 17.05.2010, seus genitores, ora apelados, entregaram-no aos cuidados da apelante, e subscreveram declarações para fins de concordância com a ado-ção (fls. 19 e 22).

Assim, a apelante iniciou convívio com Natan, logo, após o nascimento do infante, vindo a postular a regularização da guarda de fato em Juízo, nestes autos, ação distribuída em 14.06.2010 com pedido de liminar.

Constitui fato incontroverso, no entanto, que a apelante não passou pelo procedimento prévio de habilitação para a adoção e não consta, bem por isso, do cadastro de adotantes da Comarca de origem.

De resto, a exordial sequer se preocupa em justificar, ainda que superfi-cialmente, o porquê da confiança depositada pelos apelados na apelante, circunstância mercê da qual se afasta, por ausência de causa de pedir espe-cífica, a possibilidade de se cogitar de adoção intuitu personae.

[...]

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De se ponderar, uma vez mais, não se entrever natureza intuitu personae na relação estabelecida entre as partes, nada tendo sido deduzido a título de causa de pedir sob esse enfoque.

Tampouco se pode cogitar, na espécie, da existência de vínculo de socioa-fetividade entre a apelante e a criança, considerado o exíguo lapso de con-vivência estabelecido, inferior a um mês quando da propositura da ação.

Contexto fático de tal ordem, notadamente pela evidência inexorável do intuito da apelante, em ‘forçar’ situação e convivência mediante estabe-lecimento de guarda de fato à margem da lei (rememore-se o disposto no parágrafo único, do art. 13 do ECA), para ao depois buscar a regularização de tal situação em Juízo, e detrimento da ordem preferencial do cadastro de adotantes desnuda, para além de qualquer dúvida – ainda que se admi-tisse, por epítrope, a possibilidade jurídica do pedido –, a inviabilidade de acolhimento da pretensão de direito material deduzida.

Sobretudo a incontroversa origem espúria da convivência familiar instau-rada entre a apelante e o menor permite entrever conduta incompatível com a boa-fé objetiva que seria de se exigir na espécie, enquanto comporta-mento conforme ao senso ético de todo esperado, cláusula geral a permear todas as relações jurídicas indistintamente.

[...]

Vai daí não se divisar viabilidade de sustentação à posição, da apelante no pedido de adoção deduzido, ao menos sob os fundamentos fáticos postos à apreciação nessa lide.

A ressalva se impõe, porquanto nada obsta busque a apelante a regular ha-bilitação e cadastramento perante o D. Juízo a quo, quiçá vindo a lograr, em momento posterior, a adoção do infante, caso não tenha ainda despertado interesse por outro pretendente previamente cadastrado.

Nesta hipótese, em tese, poderá a apelante até mesmo postular preferên-cia sobre eventuais pretendentes previamente cadastrados, tendo em vista o tênue vínculo já formado com o infante, malgrado viciado pela origem espúria.

[...]

Bem por isso, não se compraz com o metaprincípio do superior interesse da criança conferir guarida a conduta avessa à sistemática legal, pautada pela busca do fortalecimento da instituição, precisamente em ordem a potencia-lizar o acolhimento em família substitutiva via adoção.

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Anoto, por fim, não importar, o entendimento ora adotado, contradição com posição anteriormente assumida por essa, relatoria, como fundamen-to da possível mitigação da inexistência de prévia inscrição no cadastro de adotantes, mas, sim a obstar-se a consecução da burla à ordem prefe-rencial que nele se consagra, em situação não enquadrada nas hipóteses excepcionais contemplada pelo § 13, do art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com a redação conferida pela Lei nº 12.010, de 03.08.2009, e, sobretudo, em afronta à boa-fé objetiva, entendida como diretriz funda-mental de postura ética exigível em toda e qualquer relação jurídica, con-forme alhures ponderado.” (e-STJ, fls. 75/82)

Ocorre que a situação fática acima considerada atualmente é outra, pois, apesar da extinção do pedido de adoção pelas instâncias ordinárias, o menor permanece com a promovente, desde que foi-lhe entregue pelos pais biológicos até hoje e já conta com mais de seis anos de idade. Não foi removi-do para abrigo e nesta Corte não se identificou oportunamente a urgência de exame deste recurso especial.

Então, a questão discutida consiste em saber se o cadastro de adotan-tes deve prevalecer em detrimento da pretensão da ora recorrente de adotar criança que está sob sua guarda desde o nascimento.

Passados seis anos desde a propositura da ação, constata-se que a con-trovérsia deve ser analisada sob a perspectiva da dinâmica dos fatos. A ques-tão não se pode limitar a verificar o acerto, ou não, do julgamento nas instân-cias ordinárias, que entenderam pela impossibilidade jurídica do pedido e não identificaram, na época, vínculo de socioafetividade a ser preservado ou situação enquadrável em adoção intuitu personae.

Esta Corte não pode ignorar o desenrolar dos acontecimentos, negando o processamento da ação de adoção à vista de premissas fáticas que, atual-mente, já não são as mesmas, estando agora certamente estabelecido o víncu-lo socioafetivo durante os anos de convivência.

Não se olvida os nobres propósitos do art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que preconiza a manutenção, em comarca ou foro regional, de um registro de pessoas interessadas na adoção.

É certo, contudo, que a observância de tal cadastro, vale dizer, a pre-ferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança, não é absoluta. E nem poderia ser. Excepciona-se tal regramento, em observância ao princípio do melhor interesse do menor, basilar e norteador

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de todo o sistema protecionista do menor, na hipótese de existir vínculo afe-tivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que este não se encontre sequer cadastrado no referido registro.

Em casos similares, assim se manifestou esta Corte:

RECURSO ESPECIAL – FAMÍLIA – ADOÇÃO – GÊMEOS – PODER FA-MILIAR – NULIDADE DA RENÚNCIA – NÃO OCORRÊNCIA – MÃE BIOLÓGICA EM SITUAÇÃO DE EXTREMA VULNERABILIDADE – INE-XISTÊNCIA DE INSCRIÇÃO NO CADASTRO DE ADOÇÃO – VÍNCULO AFETIVO CONSOLIDADO – MELHOR INTERESSE DOS MENORES – RE-CURSO PROVIDO.

(REsp 1.567.812/SC, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., Julgado em 25.10.2016, DJe de 05.12.2016)

HABEAS CORPUS – DIREITO DE FAMÍLIA – GUARDA E ADOÇÃO – MENOR IMPÚBERE (3 MESES DE VIDA) ENTREGUE PELA MÃE A CA-SAL – ALEGAÇÃO DE SE TRATAR DE PAI BIOLÓGICO – INDÍCIOS DE BURLA À LISTA DE ADOÇÃO – AÇÃO CAUTELAR – ACOLHIMENTO DETERMINADO EM 1º GRAU DE JURISDIÇÃO – LIMINAR NEGADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM – MEDIDA TERATOLÓGICA – MELHOR INTERESSE DO MENOR – ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO

1. A jurisprudência do STF e do STJ evoluiu no sentido de não se admitir a impetração originária de habeas corpus como sucedâneo recursal, ressalva-da a hipótese excepcional de concessão ex officio da ordem quando consta-tada flagrante ilegalidade ou decisão teratológica. Precedentes.

2. Também está consolidado no STF e no STJ não caber habeas corpus contra decisão de indeferimento de liminar, a fim de evitar indevida supressão de instância, ressalvada, contudo, a possibilidade de concessão, de ofício, da ordem na hipótese de evidente e flagrante ilegalidade. Precedentes.

3. Ainda, em se tratando de questão atinente à guarda/adoção de menor – afeta, portanto, ao Direito de Família, costumando exigir, como tal, ampla dilação probatória –, tem-se por inadequada a utilização de habeas corpus para defesa dos interesses do infante. Precedentes.

4. Na espécie, contudo, está-se diante de uma situação bastante delicada e que im-põe a adoção de cautela e cuidado ímpar, dada a potencial possibilidade de ocorrên-cia de dano grave e irreparável aos direitos da criança, ora paciente, de modo a se afastar, excepcionalmente, todos os óbices que, em princípio, acometem o presente writ e que, ordinariamente, culminariam no seu não conhecimento.

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5. Apuração de suposta irregularidade no registro de nascimento do me-nor, cuja paternidade poderia ter sido reconhecida como forma de burlar a lista de adoção.

6. Situação anômala que, entretanto, não importaria em prejuízo ao infante, pois, ainda que momentaneamente, a guarda de fato teria se revelado satisfatória aos seus interesses, haja vista a manifestação de interesse do casal em dispensar cui-dados (médicos, assistenciais, afetivos etc.) suficientes à elisão de qualquer risco imediato à integridade física e/ou psíquica do menor.

7. Não se descura que a higidez do processo de adoção é um dos objetivos pri-mordiais a ser perseguido pelo Estado, no que toca à sua responsabilidade com o bem-estar de menores desamparados, tampouco que, na busca desse desiderato, a adoção deve respeitar rígido procedimento de controle e fiscalização estatal, com a observância, v.g., do Cadastro Único Informatizado de Adoções e Abrigos (Cuida), o qual, aliás, pelos indícios probatórios disponíveis, teria sido vulnerado na busca de uma adoção intuito personae.

8. Contudo, o fim legítimo não justifica o meio ilegítimo para sancionar aqueles que burlam as regras relativas à adoção, principalmente quando a decisão judicial implica evidente prejuízo psicológico para o objeto primário da proteção estatal para a hipótese: a própria criança.

9. Ademais, dita burla ainda está no campo do juízo perfunctório, o que igualmente torna temerária a adoção de um procedimento que, por sua natural demora, pode prolongar a permanência do menor em abrigo ou instituição de acolhimento, numa verdadeira inversão da ordem legal imposta pelo ECA, na qual esta opção deve ser a última e não a primeira a ser utilizada.

10. Medida que, na hipótese, notoriamente beira a teratologia, pois inconcebível se presumir que um local de acolhimento institucional possa ser preferível a um lar estabelecido, onde a criança não sofreria nenhum tipo de violência física ou moral.

11. Ordem concedida de ofício.

(HC 298.009/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., Julgado em 19.08.2014, DJe de 04.09.2014)

HABEAS CORPUS – AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR C/C COM ADOÇÃO – DETERMINAÇÃO DE ACOLHIMENTO INSTITU-CIONAL – CADASTRO DE ADOTANTES – MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA – ORDEM CONCEDIDA

1. Não é do melhor interesse da criança o acolhimento institucional ou fa-miliar temporário, salvo diante de evidente risco à sua integridade física

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ou psíquica, circunstância que não se faz presente no caso dos autos. Pre-cedentes.

2. A observância do cadastro de adotantes, não é absoluta. A regra legal deve ser excepcionada em prol do princípio do melhor interesse da criança, base de todo o sistema de proteção ao menor. Tal hipótese configura-se, por exemplo, quando exis-tir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, como no presente caso.

3. Ordem concedida.

(HC 294.729/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., Julgado em 07.08.2014, DJe de 29.08.2014)

DIREITO CIVIL – FAMÍLIA – RELAÇÃO DE PARENTESCO – ADOÇÃO – BUSCA E APREENSÃO DE MENOR – SUSPEITA DE SIMULAÇÃO – MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL – HABEAS CORPUS

1. O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, ao preconizar a doutrina da proteção integral (art. 1º da Lei nº 8.069/1990), torna imperativa a obser-vância do melhor interesse da criança. As medidas de proteção, tais como o acolhimento institucional, são adotadas quando verificada quaisquer das hipóteses do art. 98 do ECA.

2. No caso em exame, a avaliação realizada pelo serviço social judiciário constatou que a criança E. K. está recebendo os cuidados e atenção adequados às suas necessi-dades básicas e afetivas na residência do impetrante. Não há, assim, em princípio, qualquer perigo em sua permanência com o pai registral, a despeito da alegação do Ministério Público de que houve adoção intuitu personae, a chamada “adoção à brasileira”, ao menos até o julgamento final da lide principal.

3. A hipótese dos autos, excepcionalíssima, justifica a concessão da ordem, porquanto parece inválida a determinação de acolhimento de abrigamento da criança, vez que não se subsume a nenhuma das hipóteses do art. 98 do ECA.

4. Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que, salvo evidente risco à integridade física ou psíquica do infante, não é de seu melhor in-teresse o acolhimento institucional ou o acolhimento familiar temporário.

5. É verdade que o art. 50 do ECA preconiza a manutenção, em comarca ou foro regional, de um registro de pessoas interessadas na adoção. Porém, a observância da preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar criança não é absoluta, pois há de prevalecer o princípio do melhor interesse do menor, norteador do sistema protecionista da criança.

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6. As questões suscitadas nesta Corte na presente via não infirmam a ne-cessidade de efetiva instauração do processo de adoção, que não pode ser descartado pelas partes. Na ocasião, será imperiosa a realização de estudo social e aferição das condições morais e materiais para a adoção da me-nor. Entretanto, não vislumbro razoabilidade na transferência da guarda da criança – primeiro a um abrigo e depois a outro casal cadastrado na lista geral -, sem que se desatenda ou ignore o real interesse da menor e com risco de danos irreparáveis à formação de sua personalidade na fase mais vulnerável do ser humano.

7. Ordem concedida.

(HC 279.059/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 10.12.2013, DJe de 28.02.2014)

RECURSO ESPECIAL – ADOÇÃO – CADASTRO DE ADOTANTES – RE-LATIVIDADE – PRINCÍPIO DA PREVALÊNCIA DO INTERESSE DO ME-NOR – VÍNCULO AFETIVO DA MENOR COM CASAL DE ADOTANTES DEVIDAMENTE CADASTRADOS – PERMANÊNCIA DA CRIANÇA POR APROXIMADAMENTE DOIS ANOS, NA SOMATÓRIA DO TEMPO ANTERIOR E DURANTE O PROCESSO – ALBERGAMENTO PROVISÓ-RIO A SER EVITADO – ART. 197-E, § 1º, DO ECA – PRECEDENTES DES-TA CORTE – RECURSO ESPECIAL PROVIDO

1. A observância do cadastro de adotantes, ou seja, a preferência das pes-soas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança, não é absoluta. A regra comporta exceções determinadas pelo princípio do me-lhor interesse da criança, base de todo o sistema de proteção. Tal hipótese configura-se, por exemplo, quando já formado forte vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que no decorrer do processo ju-dicial. Precedente.

2. No caso dos autos, a criança hoje com 2 anos e 5 meses, convivia com os recorrentes há um ano quando da concessão da liminar (27.10.2011), per-manecendo até os dias atuais. Esse convívio, sem dúvida, tem o condão de estabelecer o vínculo de afetividade da menor com os pais adotivos.

3. Os Recorrentes, conforme assinalado pelo Acórdão Recorrido, já estavam inscritos no Cuida – Cadastro Único Informatizado de Adoção e Abrigo o que, nos termos do art. 197-E, do ECA, permite concluir que eles estavam devidamente habilitados para a adoção. Além disso, o § 1º, do mesmo dis-positivo legal afirma expressamente que “A ordem cronológica das habili-tações somente poderá deixar de ser observada pela autoridade judiciária

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nas hipóteses previstas no § 13 do art. 50 desta Lei, quando comprovado ser essa a melhor solução no interesse do adotando”.

4. Caso em que, ademais, a retirada do menor da companhia do casal com que se encontrava há meses devia ser seguida de permanência em institui-ção de acolhimento, para somente após, iniciar-se a busca de colocação com outra família, devendo, ao contrário, ser a todo o custo evitada a interna-ção, mesmo que em caráter transitório.

5. A inobservância da preferência estabelecida no cadastro de adoção competente, portanto, não constitui obstáculo ao deferimento da adoção quando isso refletir no melhor interesse da criança.

6. Alegações preliminar de nulidade rejeitadas.

7. Recurso Especial provido.

(REsp 1.347.228/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., Julgado em 06.11.2012, DJe de 20.11.2012)

RECURSO ESPECIAL – AFERIÇÃO DA PREVALÊNCIA ENTRE O CA-DASTRO DE ADOTANTES E A ADOÇÃO INTUITU PERSONAE – APLI-CAÇÃO DO PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR – VEROS-SÍMIL ESTABELECIMENTO DE VÍNCULO AFETIVO DA MENOR COM O CASAL DE ADOTANTES NÃO CADASTRADOS – PERMANÊNCIA DA CRIANÇA DURANTE OS PRIMEIROS OITO MESES DE VIDA – TRÁFI-CO DE CRIANÇA – NÃO VERIFICAÇÃO – FATOS QUE, POR SI, NÃO DENOTAM A PRÁTICA DE ILÍCITO – RECURSO ESPECIAL PROVIDO

I – A observância do cadastro de adotantes, vale dizer, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança não é absoluta. Excepciona-se tal regramento, em observância ao princípio do melhor interesse do menor, basilar e norteador de todo o sistema pro-tecionista do menor, na hipótese de existir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que este não se encontre sequer cadastrado no referido registro.

II – É incontroverso nos autos, de acordo com a moldura fática delineada pelas Instâncias ordinárias, que esta criança esteve sob a guarda dos ora re-correntes, de forma ininterrupta, durante os primeiros oito meses de vida, por conta de uma decisão judicial prolatada pelo i. desembargador-relator que, como visto, conferiu efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento nº 1.0672.08.277590-5/001. Em se tratando de ações que objetivam a adoção de menores, nas quais há a primazia do interesse destes, os efeitos de uma

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decisão judicial possuem o potencial de consolidar uma situação jurídica, muitas vezes, incontornável, tal como o estabelecimento de vínculo afetivo.

III – Em razão do convívio diário da menor com o casal, ora recorrente, durante seus primeiros oito meses de vida, propiciado por decisão judicial, ressalte-se, verifica-se, nos termos do estudo psicossocial, o estreitamen-to da relação de maternidade (até mesmo com o essencial aleitamento da criança) e de paternidade e o consequente vínculo de afetividade.

IV – Mostra-se insubsistente o fundamento adotado pelo Tribunal de ori-gem no sentido de que a criança, por contar com menos de um ano de ida-de, e, considerando a formalidade do cadastro, poderia ser afastada deste casal adotante, pois não levou em consideração o único e imprescindível critério a ser observado, qual seja, a existência de vínculo de afetividade da infante com o casal adotante, que, como visto, insinua-se presente.

V – O argumento de que a vida pregressa da mãe biológica, dependente química e com vida desregrada, tendo já concedido, anteriormente, outro filho à adoção, não pode conduzir, por si só, à conclusão de que houvera, na espécie, venda, tráfico da criança adotanda. Ademais, o verossímil esta-belecimento do vínculo de afetividade da menor com os recorrentes deve sobrepor-se, no caso dos autos, aos fatos que, por si só, não consubstanciam o inaceitável tráfico de criança;

VI – Recurso Especial provido.

(REsp 1.172.067/MG, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ª T., Julgado em 18.03.2010, DJe de 14.04.2010)

CIVIL – FAMÍLIA – GUARDA PROVISÓRIA – COMÉRCIO DE MENOR – INEXISTENTE – FAMÍLIA AFETIVA – INTERESSE SUPERIOR DO ME-NOR – OBSERVÂNCIA DA LISTA DE ADOÇÃO

Mesmo em havendo aparente quebra na lista de adoção, é desaconselhável remover criança que se encontra, desde os primeiros dias de vida e por mais de dois anos, sob a guarda de pais afetivos. A autoridade da lista cede, em tal circunstância, ao superior interesse da criança (ECA, art. 6º).

(REsp 837.324/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, 3ª T., Julgado em 18.10.2007, DJ de 31.10.2007, p. 325)

Na hipótese, de acordo com a moldura delineada pela dinâmica dos fatos, a criança está sob a guarda da recorrente, de forma ininterrupta, desde

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os primeiros dias de vida, quando foi entregue pelos pais biológicos, até os atuais seis anos de idade.

Tem-se que a guarda de uma criança, sem interrupções, como é o caso dos autos, durante os seus primeiros anos de vida, tem o condão de estabele-cer o vínculo de afetividade do menor com a pretensa mãe adotiva.

Nessa linha, in casu, deve-se, preponderantemente, perscrutar o estabe-lecimento de vínculo afetivo entre a criança e a recorrente, determinando-se o processamento da ação de adoção, a fim de propiciar às partes envolvidas e, sobretudo, ao menor em proteção a definição de sua situação familiar.

A formalidade do cadastro de adotantes não pode constituir um óbice intransponível para o processamento do pedido, devendo, acima de tudo, observar-se o fim social a que se destina a lei e o princípio do melhor interesse do menor.

Com efeito, o art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente determi-na que “na interpretação desta lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento”.

Como já se expressou, não se objetiva prestigiar uma burla à lei. O que se busca, na espécie, é priorizar o direito da criança de ser adotada pela mãe com a qual já estabeleceu laços de afetividade.

Assim, diante dos fatos que se apresentaram supervenientemente ao ajuizamento da ação, é de se reformar o acórdão recorrido para afastar a im-possibilidade jurídica do pedido e determinar-se o retorno dos autos à ins-tância de origem para processamento da ação.

Por todo o exposto, dá-se provimento ao recurso especial para determi-nar o retorno dos autos à instância de origem a fim de que, afastada a impos-sibilidade jurídica do pedido, a ação tenha prosseguimento.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUARTA TURMA

Número Registro: 2011/0285556-3

Processo Eletrônico REsp 1.628.245/SP

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Números Origem: 201102855563 2402010 2480120100084422 8442412010 84424120108260248 990103660595

Pauta: 13.12.2016 Julgado: 13.12.2016

Segredo de Justiça

Relator: Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Antonio Carlos Ferreira

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins

Secretária: Dra. Teresa Helena da Rocha Basevi

AUTUAÇÃO

Recorrente: L. M.

Advogado: Reginaldo Ap. D. da Silva – SP225064

Recorrido: L. C. Z.

Recorrido: V. de A.

Advogado: sem representação nos autos – SE000000M

Assunto: Direito da criança e do adolescente – Seção cível – Adoção de criança

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quarta Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira (Presidente), Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti.

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TrF 1ª r.Tribunal regional Federal da 1ª região

Apelação Cível nº 0007530-28.2012.4.01.3700/MARelator: Desembargador Federal Néviton GuedesApelante: Caixa Econômica Federal – CEFAdvogado: MA00007292 – Remberto Artigas Prazeres Liberato e outros(as)Apelado: Cleony Rodrigues LimaAdvogado: MA00010426 – Melhem Ibrahim Saad NetoRec. adesivo: Cleony Rodrigues Lima

EMENTA

direito civil – Ação de indenizAção – instituição finAnceirA – fAlhA nA prestAção do serviço – bloQueio de cArtão bAncário – cliente em

viAGem impossibilitAdo de efetuAr sAQues pArA suA subsistênciA e pArA reAlizAr trAtAmento de sAúde – dAno morAl confiGurAdo – vAlor

indenizAtório – binÔmio repArAção/prevenção – redução do QuAntum compensAtório

1. Apelação interposta contra sentença que julgou parcialmen-te procedente o pedido e arbitrou indenização por danos morais em R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em razão do cancelamento do cartão bancário do autor quando em viagem para tratamento de saúde.

2. O juízo a quo entendeu que não se mostra razoável o blo-queio de cartão de saques de cliente, estando este fora de seu domicí-lio, uma vez que necessita de recursos para arcar com suas despesas pessoais, notadamente quando, no caso específico, o cliente compa-receu pessoalmente à agência bancária e não conseguiu autorização para movimentar sua conta.

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3. O autor viajou para São Paulo para realizar tratamento de saúde, estando preparado financeiramente para arcar com suas des-pesas, conforme documentação acostada aos autos. Durante a via-gem foi surpreendido com a impossibilidade de sacar valores da sua conta em razão do cancelamento de seu cartão e, mesmo dirigindo-se a uma agência da CEF para solucionar o problema, não conseguiu a respectiva liberação, fato que o fez interromper os exames médicos que realizava, e passar por situações vexatórias, eis que desprovido de recursos financeiros fora de seu domicílio.

4. Ficou comprovado que a CEF efetivou o cancelamento do cartão bancário do autor sem aviso prévio, acarretando a ele o cons-trangimento de ser surpreendido com a impossibilidade de utilizar seu cartão para dar continuidade ao seu tratamento de saúde e arcar com suas necessidades básicas, notadamente porque estava fora de seu domicílio, o que provoca constrangimento e humilhação que su-peram o mero dissabor e aborrecimento do dia a dia, caracterizando a existência de dano moral passível de reparação.

5. A reparação por dano moral deve ser arbitrada moderada-mente, a fim de se evitar a perspectiva do locupletamento indevido da parte indenizada, observando-se os critérios relativos à extensão do dano, à capacidade financeira do ofensor e à situação socioeco-nômica da vítima, além de servir como desestímulo à repetição da conduta do réu.

6. Não merece provimento a apelação adesiva da parte autora na qual pleiteia a majoração do valor da indenização e dos honorá-rios, razoavelmente arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.

7. Recurso adesivo da parte autora a que se nega provimento. 8. Apelação da CEF a que se dá parcial provimento para refor-

mar a sentença e reduzir o valor da indenização por danos morais para R$ 10.000,00 (dez mil reais), conforme precedentes desta Corte.

ACÓRDÃO

Decide a Quinta Turma, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e negar provimento ao recurso adesivo.

Quinta Turma do TRF da 1ª Região.

Brasília, 10 de agosto de 2016.

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Desembargador Federal Néviton Guedes Relator

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta pela Caixa Econômica Federal – CEF contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de indenização por danos materiais e morais por suposto constrangimento sofrido pelo autor em razão de tentativa de saque de valores em caixa eletrônico e posterior-mente pelo cancelamento do seu cartão, quando se encontrava em viagem.

O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido ao fundamen-to de que não se mostra razoável o bloqueio de cartão de saques de cliente, estando este fora de seu domicílio, uma vez que necessita de recursos para arcar com suas despesas pessoais, notadamente quando, no caso específico, o cliente compareceu pessoalmente à agência bancária e não conseguiu a auto-rização para movimentar sua conta (fls. 56/59).

A sentença condenou a CEF ao pagamento de danos morais no valor de R$ 30.000 (trinta mil reais), argumentando que há comprovação da regula-ridade na conta, bem como havia créditos suficientes para garantir os saques. De tal sorte que o gerente da agência deveria ter tomado as providencias cabíveis a fim de proceder a liberação dos valores.

No tocante aos danos materiais indeferiu o pedido, uma vez que des-tituído de relação com o saque frustrado de valores de sua conta-corrente.

A CEF, em suas razões de apelação (fls. 64/71), aduz que não está com-provado nos autos a existência de ilícito que venha a ensejar sua responsa-bilidade civil. Nega ter tido o recorrido qualquer prejuízo, inexistindo prova de que tenha ele sofrido abalo de ordem moral tão grave e insuportável a legitimar reparação extrapatrimonial, por ter conseguido efetuar o saque de-sejado, consubstanciando em enriquecimento ilícito. Alega que o valor fixado a título de dano moral é exorbitante, merecendo ser reduzido.

Em sede de recurso adesivo (fls. 77/80) o autor postula a majoração do valor arbitrado para compensar os danos morais sofridos. Também requer a fixação dos honorários advocatícios no percentual de 20% (vinte por cento).

E o relatório.

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VOTO

O estudo dos autos revela ser o autor portador de Esteatose Hepática, sendo que teve que viajar a São Paulo, em 24.01.2012, para tratamento de saúde, estando preparado para arcar com suas despesas (fls. 17/23). No dia 27.01.2012 foi surpreendido com a mensagem no caixa eletrônico de que o cartão estava cancelado, assim em razão da impossibilidade de concretizar saque em terminal de autoatendimento, dirigiu-se a uma agência, contudo, não conseguiu a liberação do cartão, sendo que teve que suportar diversas situações constrangedoras, inclusive a interrupção dos exames médicos.

A sentença acolheu em parte a pretensão deduzida na petição inicial e condenou o réu ao pagamento do valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) a título de indenização por danos morais.

O banco busca a reforma da sentença para julgar improcedente o pedi-do inicial ou, subsidiariamente, para que seja reduzido o valor fixado a título de danos morais.

Quanto aos danos morais, o Magistrado a quo andou bem ao entender cabível a condenação, na medida em que houve conduta ilegal por parte do banco e o nexo de causalidade entre esta e o dano moral alegado pela parte autora.

No aspecto, é de se ressaltar que a pessoa jurídica que atua no merca-do financeiro, desempenhando atividade econômica de grande vulto e aufe-rindo significativas vantagens, está sujeita aos riscos da atividade, devendo, portanto, arcar com a responsabilidade pela má prestação do serviço. O nexo causal entre o defeito do serviço e o dano advém da própria natureza do serviço prestado, em razão de caber ao banco zelar pelas correções de suas operações financeiras.

Na presente hipótese, ficou demonstrado que o recorrente efetuou o cancelamento do cartão de crédito do autor sem qualquer aviso prévio, não se podendo afastar o constrangimento de ser surpreendido com a impossi-bilidade de utilizá-lo, no momento de sacar valores para dar continuidade às suas necessidades básicas, o que provoca constrangimento e humilhação que superam o mero dissabor e aborrecimento do dia a dia, caracterizando a existência de dano moral passível de reparação.

Desse modo, vislumbra-se com clareza que houve falha na prestação do serviço, o que possibilitou o cancelamento do cartão bancário do autor, quando em viagem para o Estado de São Paulo com o fim de realizar trata-

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mento de saúde, o que lhe causou, por certo, diversos constrangimentos, eis que encontrava-se fora de seu domicílio.

Forçoso concluir que a instituição bancária, como prestadora de ser-viços, responde, objetivamente, pelos danos causados ao consumidor pelo cancelamento indevido do cartão de crédito, a teor dos ditames dos arts. 3º, § 2º, e 14, do Código de Defesa do Consumidor.

Com efeito, a relação jurídica enfocada retrata uma relação de consumo e o requerido, para furtar-se à responsabilidade que lhe é atribuída, haveria de demonstrar a ausência de defeitos nos serviços prestados ou a culpa exclu-siva da vítima ou de terceiros, nos moldes do art. 14, § 3º da Lei nº 8.078/1990, o que não fez.

Nesse descortino, o bloqueio do cartão, sem razão legítima e sem a prévia comunicação, configura ato ilícito, apto a gerar o dever de indenizar. Confira-se os seguintes precedentes a respeito:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO – BLOQUEIO INDEVIDO DE CARTÃO BAN-CÁRIO – DANO MORAL CONFIGURADO – PROCEDÊNCIA DO PEDI-DO – RECURSO PROVIDO

Para a caracterização do dano moral é indispensável a ocorrência de ofen-sa a algum dos direitos da personalidade do indivíduo. Esses direitos são aqueles inerentes à pessoa humana e caracterizam-se por serem intrans-missíveis, irrenunciáveis e não sofrerem limitação voluntária, salvo res-tritas exceções legais (art. 11, CC/2002). A título de exemplificação, são direitos da personalidade aqueles referentes à imagem, ao nome, à honra, à integridade física e psicológica. O fato de o autor ficar impossibilitado de utilizar o cartão bancário, durante determinado período, sendo-lhe ne-gada a autorização para pagamento das compras efetivadas, não consti-tuiu mero descumprimento contratual ou percalço comum do dia a dia. Ao contrário, afetou sua honra e bem-estar, vez que foi visto como devedor, causando-lhe vexame e transtornos que ultrapassam o limite do tolerável. Recurso provido.

(TJMG, Apelação Cível nº 1.0145.12.082278-1/001, Relator (a): Des.(a) Eduardo Mariné da Cunha, 17ª C.Cív., Julgamento em 14.11.2013, Publica-ção da Súmula em 26.11.2013)

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – CARTÃO DE CRÉDITO – BLOQUEIO INDEVIDO – DANO MORAL – OCORRÊNCIA – INDENIZAÇÃO – VA-LOR – REDUÇÃO – CABIMENTO

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O bloqueio de cartão de crédito, realizado de forma ilícita pela instituição bancária, configura o dano moral indenizável. A indenização por danos morais não deve implicar enriquecimento ilícito, tampouco pode ser irrisó-ria, de forma a perder seu caráter de justa composição e prevenção.

(TJMG, Apelação Cível nº 1.0145.11.028195-6/001, Relator (a): Des.(a) Evandro Lopes da Costa Teixeira, 17ª C.Cív., Julgamento em 06.06.2013, Publicação da Súmula em 18.06.2013)

APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS – CANCELAMENTO INJUSTIFICADO DE CARTÃO DE CRÉDITO SEM PRÉVIA COMUNICAÇÃO – DANO MORAL CONFIGURADO – INTE-RESSE DE AGIR – QUANTUM – VALOR RAZOÁVEL E PROPORCIO-NAL – ALTERAÇÃO – INVIABILIDADE – HONORÁRIOS DE SUCUM-BÊNCIA – BAIXA COMPLEXIDADE DA MATÉRIA – MÍNIMO LEGAL

1. Presente o interesse de agir se, apesar de solucionada situação conflituosa a que deu causa deficiente execução de serviços bancários, demonstra inte-resse o consumidor, que se diz vítima de ofensa a direito de personalidade, em se ver indenizado pelo prejuízo extrapatrimonial suportado em virtude da conduta da instituição financeira.

2. A instituição bancária, como prestadora de serviços, responde objetiva-mente pelos danos causados ao consumidor que, em viagem ao exterior, teve seu cartão de crédito cancelado sem comunicação prévia e injustifi-cadamente, a teor dos ditames dos arts. 3º, §2º, e 14, ambos do Código de Defesa do Consumidor.

3. O quantum indenizatório deve ser aferido com moderação e proporcio-nalidade ao dano causado, a fim de que não estimule reparações além do razoável e enriquecimento indevido.

4. A fixação dos honorários advocatícios nos casos de condenação por da-nos morais deve observar o disposto no art. 20, § 3º, do Código de Processo Civil.

5. Nos casos em que a demanda se revela de baixa complexidade, que dis-pensa a produção de provas em audiência, não se justifica a estipulação de honorários advocatícios acima do mínimo legal.

6. Recurso parcialmente provido. Unânime.

(TJDFT 20100112055233APC, 0065257-51.2010.8.07.0001, Res. 65 CNJ. Re-gistro do Acórdão Número: 776166. Data de Julgamento: 26.03.2014. Órgão

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Julgador: 3ª T.Cív., Rel. Otavio Augusto Barbosa, Publicação: Publicado no DJe : 07.04.2014, p. 52)

Ultrapassado o debate quanto ao reconhecimento do dever indenizató-rio, passo à análise do quantum debeatur.

A “reparação de danos morais ou extrapatrimoniais, deve ser es-tipulada cum arbitrio boni iuri, estimativamente, de modo a desestimular a ocorrência de repetição de prática lesiva; de legar à coletividade exemplo expressivo da reação da ordem pública para com os infratores e compen-sar a situação vexatória a que indevidamente foi submetido o lesado, sem reduzi-la a um mínimo inexpressivo, nem elevá-la a cifra enriquecedora” (AC 96.01.15105-2/BA, Des. Fed. Mário César Ribeiro).

Verificando-se, pois, as circunstâncias, a conduta do requerido, levan-do-se em conta que o requerente estava em viagem para tratamento de saúde, que detinha de crédito suficiente para efetivar saque (fls. 17/23), bem como a situação econômica das partes e os parâmetros supra deduzidos, entendo que a quantia fixada na instância singular deve ser reformada a fim de redu-zir a indenização para o valor de R$ 10.000 (dez mil reais), evitando assim enriquecimento sem causa, ao mesmo tempo em que serve como desestímulo à repetição da conduta da ré.

Em casos semelhantes, a Quinta e Sexta Turma deste Tribunal cos-tumam fixar quantum indenizatório entre R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e R$ 10.000,00 (dez mil reais), considerando as peculiaridades do caso concreto.

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – DEPÓSITOS EFE-TUADOS PELA AUTORA NAS SUAS CONTAS BANCÁRIAS – ESTOR-NO EFETIVADO PELA CEF – ILICITUDE – INDENIZAÇÃO DEVIDA

1. Apelante recorre da sentença pela qual o Juízo Federal julgou improce-dente o pedido de indenização por dano moral, por ela formulado contra a Caixa Econômica Federal (CEF ou Caixa), em virtude do estorno de valo-res, depositados em sua conta corrente e na sua conta poupança, oriundos de restituição do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF).

2. Apelante sustenta, em suma, que, em janeiro de 2007, recebeu doa-ção de sua avó, consistente no valor da restituição do IRPF, no valor de R$ 25.929,92; que, em 15.01.2007, parte dessa quantia foi depositada em sua conta poupança na CEF (R$ 20.929,92) e o restante foi depositado em sua conta corrente, também na CEF (R$ 5.000,00); que os depósitos foram feitos em dinheiro; que, no dia 16.01.2007, ao retirar o extrato das aludidas con-

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tas, verificou que os depósitos, efetuados em dinheiro, tinham sido estor-nados; que formulou reclamação verbal naquele mesmo dia, e, por escrito, em 17.01.2007; que os valores depositados somente retornaram às contas acima referidas em 18.01.2007; que houve violação de seu sigilo bancário diante do estorno dos valores depositados, sem sua autorização; que, dian-te do indevido estorno, as contas ficaram devedoras; que, assim, sofreu dano moral caracterizado pelo estorno ilícito dos depósitos por ela realiza-dos, em dinheiro, em suas contas bancárias; e que a condenação da CEF ao pagamento de dano moral deve ser em valor substancial, tendo em vista a gravidade do dano e as condições econômicas das partes envolvidas.

3. Hipótese em que a autora recebeu doação de sua avó, no montante de R$ 25.929,92, provenientes de restituição do IRPF. Depósito da referida quantia, efetivado pela autora, no dia 15.01.2007, em dinheiro, nas suas contas bancárias – caderneta de poupança e conta corrente –, mantidas na CEF. Estorno dos valores depositados efetuado pela CEF no dia seguinte: 16.01.2007. Retorno dos valores depositados às contas bancárias da autora em 18.01.2007. Alegação da CEF de que procedeu ao estorno atendendo a determinação da Receita Federal. Inexistência de prova idônea, inequívoca e convincente para suportar essa alegação. Irrelevância, ademais, da exis-tência da aludida determinação, dado que a relação tributária entre a avó da autora e a Receita nada tem a ver com a relação civil entre a autora e a sua avó. Ilegalidade do procedimento da CEF. Dano moral. Ocorrência. “O dano moral caracteriza-se como lesão ao patrimônio não material, aí inseridas as ofensas à honra, às crenças internas, à liberdade, à paz interior de cada um e aos sentimentos afetivos de qualquer espécie.” (TRF 1ª R., AC 0033041-94.2008.4.01.3400/DF)

4. Dano moral fixado em R$ 10.000,00, considerando a condição da ré de instituição financeira; a condição da autora, à época, de estudante univer-sitária; a extrema gravidade da ação da CEF, consistente no estorno dos depósitos realizados pela autora; o tempo de duração do estorno, de dois dias; e a necessidade de enfatizar, no caso, a função pedagógica.

5. Apelação provida.

(TRF 1ª R., AC 2007.35.00.003230-3/GO, Apelação Cível, Rel. Juiz Fed. Leão Aparecido Alves, Órgão 5ª T., Publicação: 18.02.2016 e-DJF1 p. 999, Data Decisão 16.12.2015)

RESPONSABILIDADE CIVIL – CEF – INSCRIÇÃO INDEVIDA DO NOME DO AUTOR EM ÓRGÃOS DE SERVIÇO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO –

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ERRO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA – DANOS MORAIS – INDENI-ZAÇÃO

1. Embora o autor tenha efetuado o pagamento com mais de trinta dias de atraso, o adimplemento ocorreu na data de vencimento do novo boleto fornecido pelo banco, 12.08.2009, inclusive, com orientação de que o paga-mento poderia ser efetuado em qualquer agência bancária, inexistindo o suposto dever de comunicar a quitação à instituição financeira.

2. Ocorreu má prestação do serviço da CEF na inclusão do nome do autor em cadastro restritivo, mesmo já paga a parcela.

3. O ato ilícito de negativar indevidamente o nome da autora junto a enti-dade de proteção ao crédito, praticado pela Caixa Econômica Federal, gera obrigação de indenizar por danos morais, independentemente de compro-vação de abalo suportado pela apelante.

4. Condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a título de indenização por danos morais.

5. Apelação provida.

(TRF 1ª R., Ac. 2009.38.00.022893-2/MG, Rel. Des. Fed. João Batista Moreira, Órgão 5ª T., Publicação 30.11.2012 e-DJF1 p. 702, Data Decisão 07.11.2012)

Em seu recurso adesivo (fls. 77/80) o autor postula a majoração do valor arbitrado a título de danos morais e do percentual dos honorários ad-vocatícios, de 10% (dez por cento) para 20% (vinte por cento).

O recurso não merece provimento. Conforme acima consignado, a in-denização deve ser reduzida para o valor de R$ 10.000 (dez mil reais) e os ho-norários advocatícios foram arbitrados em percentual razoável pela sentença: 1% (dez por cento).

Ante o exposto dou parcial provimento à apelação da CEF para reduzir o quantum da indenização no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e nego provi-mento ao recuso adesivo.

É como voto.

Desembargador Federal Néviton Guedes Relator

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TrF 2ª r.Tribunal regional Federal da 2ª região

Apelação Cível – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0003352-18.2005.4.02.5102 (2005.51.02.003352-3)Relator: Desembargador Federal Ricardo PerlingeiroApelante: Lucia Cavalcanti de Castro MoraisAdvogado: Ronaldo Gotlib CostaApelado: CEF – Caixa Econômica FederalAdvogado: Marilene Maria Tavares Bastos ParreiraOrigem: 04ª Vara Federal de Niterói (00033521820054025102)

EMENTA

sistemA finAnceiro de hAbitAção – revisão de cláusulAs contrAtuAis – juÍzo de retrAtAção –

Art. 543-c, § 7º, ii do cpc/1973 – seGuro hAbitAcionAl – obriGAtoriedAde – livre escolhA dA empresA

seGurAdorA pelo mutuário – possibilidAde – recurso especiAl representAtivo de

controvérsiA nº 969.129 – súmulA nº 473 do stj

1. Autos encaminhados a esse órgão julgador pela Vice-Pre-sidência dessa Corte sob o rito do art. 543-C, § 7º, II do CPC/1973, para reapreciação do acórdão recorrido, em face do pronunciamento definitivo do STJ, que pacificou a matéria no âmbito de todos os Tri-bunais.

2. O E. STJ, ao apreciar o REsp 969.129 pela sistemática do art. 543-C do CPC/1973, consignou que a despeito da obrigatorie-dade de contratação de seguro habitacional no âmbito do sistema fi-nanceiro de habitação, é inválida a cláusula que exige a aquisição de tal seguro junto à própria instituição financeira ou a seguradora por essa indicada. Entendimento posteriormente consolidado na Súmu-

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la nº 473 STJ, a qual determina que o mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a ins-tituição financeira mutuante ou com a seguradora por ela indicada.

3. Reconsideração do posicionamento exarado no acórdão re-corrido, a teor do § 7º do art. 543-C do CPC/73, para adequá-lo à orientação firmada pelo E. STJ por ocasião do julgamento do REsp Representativo de Controvérsia nº 969.129, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 15.12.2009, acerca da forma de contratação de seguro habitacional no âmbito do SFH, assentando a inexistência de obriga-toriedade de aquisição de seguro oferecido pela instituição mutuan-te ou por seguradora por ela designada.

4. Recurso de apelação parcialmente provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma Especializada do Tribunal

Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, dar parcial provi-mento à apelação, na forma do relatório e do voto constantes dos autos, que passam a integrar o presente julgado.

Rio de Janeiro, 13 de dezembro de 2016 (data do Julgamento).

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

RELATÓRIO

Cuida-se de juízo de retratação, com fulcro no art. 543-C, § 7º, II, do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973), em face do acórdão proferido por esta Turma Especializada que, em julgamento de agravo interno em ape-lação, ao negar provimento ao recurso, manteve a improcedência do pedido de revisão de cláusulas e prestações referentes a contrato de mútuo habitacio-nal vinculado ao sistema financeiro de habitação (SFH). A ementa do acórdão recorrido possui o seguinte teor (fls. 283/284):

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO – AGRAVO INTERNO – INOVAÇÃO RECURSAL – VIO-LAÇÃO AOS ARTS. 128 E 517 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – IM-

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POSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE MATÉRIA NÃO SUSCITADA EM SEDE DE APELAÇÃO – SISTEMA DE AMORTIZAÇÃO SACRE – CON-TRATAÇÃO DE SEGURO – PREVISÃO LEGAL – INOCORRÊNCIA DE VENDA CASADA – DECISÃO MANTIDA PELOS SEUS PRÓPRIOS FUN-DAMENTOS – RECURSO IMPROVIDO

1. Não se conhece do Agravo Retido quando não requerida expressamente, nas razões da apelação, a sua apreciação pelo Tribunal, em razão do des-cumprimento da regra contida no art. 523, § 1º do CPC.

2. É defeso ao Magistrado conhecer, em sede de Agravo Interno, de temas que não foram suscitados na Apelação.

3. Persistem imaculados e impassíveis os argumentos nos quais o entendi-mento foi firmado, subsistindo em si as mesmas razões expedidas na deci-são agravada.

4. Nos contratos regidos pelo Sistema Sacre, a amortização é muito mais significativa do que nos demais, vez que as prestações sofrem um decrésci-mo com o decorrer do tempo, não afetando o comprometimento de renda estabelecido inicialmente.

5. A obrigatoriedade da contratação de seguro tem previsão na legislação do SFH, não se podendo falar em “venda casada”, devendo ser observadas as normas estabelecidas pela Susep, sendo certo que não há prova nos au-tos de que o agente financeiro tenha descumprido os parâmetros legais na cobrança do encargo.

6. Agravo Interno improvido.

A demandante interpôs Recurso Especial (fls. 287/295) fundado no art. 105, III, alínea a, da Constituição Federal, sob o argumento de que: (a) a cláusula contratual, afeta ao sistema de amortização, viola o art. 4º do De-creto Lei nº 22.626/1933 e os arts. 122 e 489, ambos do Código Civil (CC); (b) a cobrança da taxa de administração e de risco de crédito não tem previ-são legal se confrontadas com o disposto no art. 6º, da Lei nº 4.380/1964; e (c) a manutenção da cláusula impositiva do seguro habitacional por segura-dora nomeada pelo próprio ente interessado, configura venda casada e viola o inciso I do art. 39 da Lei nº 8.078/1990.

Contrarrazões às fls. 298/303.

A Vice-Presidência desta Corte, em decisão de fls. 305/306, identificou que o acórdão recorrido apresenta-se, no que concerne unicamente à contra-

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tação de seguro habitacional, em divergência com a orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) no julgamento do REsp 969.129, submetido ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973). Na ocasião, o E. STJ assentou entendimento quanto à não obrigatoriedade de contratação de seguro habitacional diretamente com o agente financeiro ou por seguradora por esse indicada, exigência que configura hipótese de “venda casada”, proibida pelo art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). Diante de tal fato, determinou o retorno dos autos para esse órgão julgador, a fim de possibilitar o eventual exercício do juízo de retratação pre-visto no art. 543-C, § 7º, inciso II do CPC.

É o relatório. Peço dia para julgamento.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

VOTO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Ricardo Perlingeiro (Relator):

Consoante relatado, trata-se de juízo de retratação, com fulcro no art. 543-C, § 7º, inciso II, do CPC/1973, em face do acórdão proferido por esta Turma Especializada, que negou provimento a recurso de apelação interpos-to por Lúcia Cavalcanti de castro Morais, objetivando a revisão das cláusulas de contrato de financiamento habitacional.

O cerne da controvérsia a ser dirimida reside tão somente na análise da questão afeta à obrigatoriedade de contratação pelo mutuário de seguro habitacional oferecido diretamente pelo agente financeiro ou por seguradora por esse indicada.

O acórdão recorrido posicionou-se no sentido de que a obrigatoriedade da cláusula contratual sobre o seguro habitacional tem previsão na legisla-ção do SFH, não se podendo falar em venda casada, devendo ser observadas as normas estabelecidas pela Susep e que não há nos autos prova de que o agente financeiro tenha descumprido os parâmetros legais da cobrança do encargo.

Todavia, o Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o REsp 969.129 pela sistemática do art. 543-C do CPC/1973 (recurso representativo de con-trovérsia), decidiu que a despeito da necessidade de contratação de seguro

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habitacional no âmbito do sistema Financeiro da Habitação (SFH), não está o mutuário obrigado a contratar o referido seguro diretamente com o agente financeiro ou com a seguradora por ele indicada, uma vez que tal exigência configuraria “venda casada”, conduta vedada pelo art. 39, I do CDC.

Com efeito, esclareceu o STJ que:

O seguro habitacional é exigência presente no Sistema Financeiro da Habi-tação desde sua origem, a qual assentou-se, por primeiro, no art. 14 da Lei nº 4.380/1964, que estava assim redigido: “Os adquirentes de habitações financiadas pelo Sistema Financeiro da Habitação contratarão seguro de vida de renda temporária, que integrará, obrigatoriamente, o contrato de financiamento, nas condições fixadas pelo Banco Nacional da Habitação”.

[...]

A celeuma que emerge da contratação obrigatória do seguro habitacio-nal (além daquela relativa à forma de seu reajuste), no que interessa para o caso posto em julgamento, decorre do confronto entre o art. 14 da Lei nº 4.380/1964 e o art. 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que se encontra com a seguinte redação: Art. 39. É vedado ao forne-cedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: I – condi-cionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos; São duas as proibições estampadas no dispositivo, quais sejam, a de condicio-nar a aquisição de um produto ou serviço à aquisição de outro, a chamada “venda casada”, e a de limitação quantitativa na aquisição de determinado produto.

[...]

Assim, muito embora o seguro habitacional seja uma exigência legal – e mesmo um benefício tanto para o mutuário quanto para o sistema, por-quanto, a um só tempo, confere maior garantia a ambos, barateando, em úl-tima análise, o custo do financiamento, tendo em vista a redução dos riscos –, deve ser observada, na contratação deste seguro, a absoluta liberdade contratual, a qual, se já era reconhecida pela legislação comum, ganhou reforço com a edição do Código de Defesa do Consumidor.

[...]

O que a lei prevê é a obrigatoriedade do seguro habitacional, e não uma contratação obrigatória desse seguro com o agente financeiro, prática ho-dierna que, à toda evidência, vulnera as garantias legais e constitucionais

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dos consumidores, configurando, de fato, a “venda casada” a que alude o art. 39, inciso I, do CDC.

[...]

Tanto é assim, que a legislação mais recente sobre o tema prevê a possibi-lidade de contratação com seguradora escolhida pelo próprio consumidor. Nesse sentido, é a previsão do art. 2º da MP 2.197-43, de 24 de agosto de 2001, com a redação dada pela recente Lei nº 11.977, de 7 de julho de 2009: art. 2º Os agentes financeiros do SFH somente poderão conceder financia-mentos habitacionais com cobertura securitária que preveja, no mínimo, cobertura aos riscos de morte e invalidez permanente do mutuário e de danos físicos ao imóvel. § 1º Para o cumprimento do disposto no caput, os agentes financeiros, respeitada a livre escolha do mutuário, deverão: I – disponibilizar, na qualidade de estipulante e beneficiário, uma quan-tidade mínima de apólices emitidas por entes seguradores diversos, que observem a exigência estabelecida no caput; II – aceitar apólices individuais apresentadas pelos pretendentes ao financiamento, desde que a cobertura securitária prevista observe a exigência mínima estabelecida no caput e o ente segurador cumpra as condições estabelecidas pelo Conselho Nacional de Seguros Privados – CNSP, para apólices direcionadas a operações da espécie.

(STJ, 2ª S., REsp 969.129, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 15.12.2009) – grifo nosso.

Cumpre ressaltar que o mencionado recurso especial deu origem à Sú-mula nº 473/STJ, a qual determina que o mutuário do SFH não pode ser compelido a contratar o seguro habitacional obrigatório com a instituição fi-nanceira mutuante ou com a seguradora por ela indicada.

De tal forma, deve o recurso de apelação ser parcialmente provido tão somente para possibilitar à interessada a livre escolha do seguro habitacio-nal, mantidos os demais termos do acórdão lavrado por essa Turma Especia-lizada.

Ante o exposto, exercendo o juízo de retratação com base no art. 543, § 7º, II do CPC/1973, dou parcial provimento ao recurso de apelação.

É como voto.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

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EmEntário CívEl

Ação declArAtóriA – loteAmento fechAdo – despesAs

condominiAis – prestAção de serviços em prol dos morAdores

34492 – “Civil. Processual civil. Agravo interno no recurso especial. Recurso manejado sob a égide do NCPC. Ação declaratória. Loteamento fechado. Despesas condominiais. Prestação de serviços em prol dos moradores, ofensa ao art. 535 do CPC/1973. Alegação genérica. Associação de moradores. Condomínio de fato. Cobrança de taxa de manuten-ção de não associado ou que a ela não anuiu. Impossibilidade. Decisão mantida. Agravo interno desprovido. 1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enuncia-do Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recur-sos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. A questão se restringe à impossibilidade de cobrança de taxa de manuten-ção de não associado, nos termos da jurisprudência desta Corte fixada no julgamento dos recursos representativos da controvérsia, REsps 1.439.163/SP e 1.280.871/SP, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. 3. A decisão objeto desta irresignação se encontra em consonância com a jurisprudência do STJ que consolidou o entendimento de que as taxas de manutenção criadas por associações de moradores não obrigam os não associa-dos ou que a elas não anuíram. 4. Assim, não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos. 5. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-REsp 1.589.773 – (2016/0062126-0) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 19.12.2016 – p. 4548)

Ação de despejo – condenAção pArA pAGAmento de multAs

contrAtuAis e AluGuéis

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vincendos – princÍpio dA conGruênciA

34493 –“Civil. Processual civil. Agravo interno no recurso especial. Recurso manejado sob a égide do NCPC. Ação de despejo. Condenação para pagamento de multas contratuais e aluguéis vincendos. Princípio da congruência. Decisão recorrida em consonância com o entendimento desta corte. Súmula nº 83 do STJ. Decisão mantida. Agravo interno despro-vido. 1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administra-tivo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. O julgamento não se mostra extra petita quando o juiz promove uma interpretação lógico--sistemática dos pedidos deduzidos, ainda que não expressamente formulados pela parte. 3. A decisão objeto desta irresignação encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte, que admite, nos termos do art. 290 do CPC/1973, a inclusão das condena-ção nas parcelas vincendas. 4. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo interno não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, deven-do ele ser integralmente mantido em seus próprios termos. 5. Agravo interno não provi-do.” (STJ – AgInt-REsp 1.523.945 – (2014/0161635-1) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 19.12.2016 – p. 4527)

nota:O caso em comento trata de ação de despejo por falta de pagamento pleiteando o pa-gamento de R$ 11.667,55 (onze mil seiscentos e sessenta e sete reais e cinquenta e cinco centavos) referentes aos aluguéis, taxas de condomínio e IPTU do imóvel de sua pro-priedade que foi objeto da locação.Em primeira instância, a ação foi julgada procedente para declarar rescindido o con-trato de locação celebrado entre as partes e para condenar ao pagamento dos aluguéis vencidos desde junho/2008 e vincendos até a data da devolução do imóvel, com os acréscimos de juros legais e multas contratuais.A apelação interposta não foi provida pelo Tribunal de origem, nos termos do acórdão assim ementado:“Apelação Cível. Despejo por Falta de Pagamento. Sentença procedente, que decretou a rescisão do contrato de locação, condenou o apelante ao pagamento dos aluguéis, acessórios e encargos contratuais, vencidos e vincendos, bem assim, em honorários ad-vocatícios no percentual de 15% sobre o valor da condenação. Devida observância do Princípio da congruência entre o pedido e a sentença. Quando a obrigação consistir em prestações periódicas, considerar-se-ão elas incluídas no pedido, independentemente de declaração expressa do autor (art. 290, do CPC).Quanto ao pedido de pagamento das multas contratuais, verifica-se a formulação ex-pressa nesse sentido pela simples leitura da petição inicial, em interpretação restritiva, na forma do art. 293 do CPC. No que se refere à execução provisória da sentença, fica evidenciada a falta de interesse de agir do recorrente neste ponto, pela perda super-veniente do objeto uma vez que, prestada a devida caução (fl. 168), foi cumprido o

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mandado de desocupação e despejo (Certidão, fls. 174/176), com a efetiva entrega das chaves (fls.171/173). De mais a mais, em sede de ação de despejo a regra do efeito ape-nas devolutivos em que há de ser recebida a apelação, encontra-se encartada no art. 58, V, da Lei nº 8.245/1991, bem como, por conseguinte, a possibilidade de execução pro-visória, no art. 63, § 4º e art. 64, §§ 1º e 2º, da mesma Lei. Assim, uma vez reconhecida a relação locatícia havida entre as partes e não demonstrado o pagamento dos alugueis e acessórios, inafastável se toma o acolhimento do pedido exordial. Sentença mantida. Recuso não provido.”Irresignada, interpôs recurso especial com fulcro no art. 105, III, a, da CF alegando a vio-lação do art. 460 do CPC/1973, uma vez que foi condenada ao pagamento dos aluguéis vincendos e das multas contratuais sem que fosse realizado o pedido nesse sentido.O relator aduziu que em decisão de sua relatoria, o recurso especial não foi conhecido, em virtude da incidência da Súmula nº 83 do STJ. E ainda, que, nas razões do presen-te agravo interno, afirmou que (1) o princípio da congruência ou adstrição deve ser afastado sob pena de ofensa aos princípios da ampla defesa e do contraditório; (2) não foi formulado pedido de condenação ao pagamento de aluguéis vincendos e da multa contratual.O STJ negou provimento ao agravo.Sobre a questão do despejo, vale trazer as lições de Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior:“As ações de despejo fundadas na falta de pagamento de aluguel e acessórios da lo-cação, de aluguel provisório, de diferenças de aluguéis, ou somente de quaisquer dos acessórios da locação, sofreram alterações significativas de modo a torná-las mais dinâ-micas e, sobretudo, pacificar-se antigas controvérsias jurisprudenciais.Com efeito, resolveu-se definitivamente a questão da legitimidade passiva para figurar nas ações de despejo. O fiador deveria ser réu na ação de despejo quando sua responsa-bilidade é apenas pelo pagamento do débito?Pela nova redação do art. 62, I, da Lei nº 8.245/1991, o pedido de rescisão da locação poderá ser cumulado com o pedido de cobrança dos aluguéis e acessórios da locação. Nessa hipótese, citar-se-á o locatário para responder ao pedido de rescisão, e o locatário e os fiadores para responderem ao pedido de cobrança, devendo ser apresentado, com a inicial, cálculo discriminado do valor do débito.Assim, o polo passivo contará com o locatário e o fiador. O objeto imediato pretendido nos pedidos é plúrimo: despejo e cobrança. E cada réu responderá pelo objeto mediato que lhe toca (pagamento, no caso do fiador; pagamento e despejo, no caso, o locatário).Por outro lado, o locatário e o fiador poderão evitar a rescisão do contrato purgando a mora no prazo de 15 (quinze) dias contado de suas citações, desde que promova o pagamento do débito atualizado mediante depósito judicial, incluídos neste valor: a) os aluguéis e acessórios da locação que vencerem até a sua efetivação; b) as multas ou penalidades contratuais, quando exigíveis; c) os juros de mora; d) as custas e os ho-norários do advogado do locador, fixados em dez por cento sobre o montante devido, se do contrato não constar disposição diversa.Haja vista que a lei não fez menção sobre o início do prazo para a purgação da mora, entendemos que se aplica a regra dos arts. 214, III, e 191, todos do Código de Processo Civil. Assim, quando houver vários réus (fiador e locatário), o prazo para purgação inicia-se a partir da data de juntada aos autos do último aviso de recebimento ou man-

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dado citatório cumprido. E se os réus possuírem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos e inclusive purgar a mora.Eis que o valor a ser depositado corre por conta e risco do locatário ou do fiador, o locador poderá discordar do quantum apurado. Nessa hipótese, o depositante será inti-mado através de seu advogado para complementar a diferença em 10 (dez) dias.Não sendo integralmente complementado o depósito, o pedido de rescisão prosseguirá pela diferença, podendo o locador levantar a quantia depositada (art. 62, IV).Esse depósito complementar é denominado emenda da mora pela lei. Na sua redação antiga, não se admitia a emenda da mora se o locatário já houvesse utilizado essa facul-dade por duas vezes nos doze meses imediatamente anteriores à propositura da ação.Agora se arrocharam ainda mais as possibilidades do locatário. A nova redação deli-mitou que não se admitirá a emenda da mora se o locatário já houver utilizado essa fa-culdade nos 24 (vinte e quatro) meses imediatamente anteriores à propositura da ação.Proferida a sentença de procedência do pedido, o juiz determinará a expedição de man-dado de despejo, que conterá o prazo de 30 (trinta) dias para a desocupação voluntária, com redução para 15 (quinze) dias se: a) entre a citação e a sentença de primeira instân-cia houverem decorrido mais de quatro meses; ou b) o despejo houver sido decretado com fundamento em mútuo acordo; infração legal ou contratual; falta de pagamento de aluguéis e acessórios; para reparos urgentes determinados pelo Poder Público; ou nas denúncias vazias de contratos ajustados por escrito com prazo superior a 30 (trinta) meses e prorrogados indeterminadamente.Contudo, nessa última hipótese, e apenas nela (denúncia vazia de contratos com prazo superior a 30 (trinta) meses prorrogado indeterminadamente), será necessária a caução de valor não inferior a 6 (seis) meses nem superior a 12 (doze) meses do aluguel, atua-lizado até a data da prestação da caução.Desse modo, tem-se por novidade importante e de destaque pela nova redação da lei: em caso de inadimplência de aluguéis ou acessórios, proferida a sentença de desocupa-ção, essa fixará prazo de 15 dias para desocupação, podendo ser executada provisoria-mente independentemente de caução.” (Inovações da lei de locações. Revista SÍNTESE Direito Imobiliário, São Paulo: IOB, v. 1, n. 1, 2011)

Ação de indenizAção por dAnos morAis – fundAmentos

dA decisão AGrAvAdA não impuGnAdos – AGrAvo

não conhecido

34494 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Fundamentos da decisão agravada não impugnados. Agravo não conhecido. 1. É inviável o agravo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da de-cisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 2. O recurso mostra-se manifestamente inad-

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missível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, no montante equivalente a 1% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do cita-do artigo de lei. 3. Agravo interno não conhecido, com aplicação de multa.” (STJ – AgInt--Ag-REsp 944.660 – (2016/0172285-4) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 19.12.2016 – p. 4648)

transcriçãoCódigo de Processo Civil:“Art. 1.021. Contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respec-tivo órgão colegiado, observadas, quanto ao processamento, as regras do regimento interno do tribunal.§ 1º Na petição de agravo interno, o recorrente impugnará especificadamente os funda-mentos da decisão agravada.[...]”

Ação de indenizAção por dAnos morAis – ofensA prAticAdA

por mAGistrAdo contrA outro mAGistrAdo – QuAntum

indenizAtório – rAzoAbilidAde

34495 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de indenização por danos morais. Ofensa praticada por magistrado contra outro magistrado. Quantum in-denizatório. Razoabilidade. Agravo improvido. 1. O Superior Tribunal de Justiça firmou orientação de que somente é admissível o exame do valor fixado a título de danos morais em hipóteses excepcionais, quando for verificada a exorbitância ou a índole irrisória da importância arbitrada, em flagrante ofensa aos princípios da razoabilidade e da propor-cionalidade. 2. No caso dos autos, o montante arbitrado a título de dano moral no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) não se mostra irrisório ou desproporcional aos danos so-fridos pelo autor, Juiz de Direito, em razão da troca de agressões verbais a que deu início o recorrido. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 933.197 – (2016/0152051-5) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 19.12.2016 – p. 4644)

Ação de obriGAção de fAzer – plAno de sAúde – cláusulA de

copArticipAção – lei

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nº 9.656/1998 – possibilidAde – previsão contrAtuAl expressA

34496 – “Direito civil e direito do consumidor. Ação de obrigação de fazer. Plano de saú-de. Cláusula de coparticipação. Lei nº 9.656/1998. Possibilidade. Previsão contratual ex-pressa. 1. Ação de obrigação de fazer ajuizada em 22.01.2014. Recurso especial concluso ao gabinete em 02.09.2016. Julgamento. CPC/1973. 2. Cinge-se a controvérsia a definir a legalidade de cláusula, em contrato de assistência médica, que impõe coparticipação do contratante à razão de 50% (cinquenta por cento) do valor das despesas, após o período de 30 (trinta) dias de internação para tratamento psiquiátrico. 3. A lei especial que regu-lamenta a prestação dos serviços de saúde autoriza, expressamente, a possibilidade de coparticipação do contratante em despesas médicas específicas, desde que figure de forma clara e expressa a obrigação para o consumidor no contrato. 4. Na hipótese, a coparticipa-ção foi utilizada para redimensionar, contratualmente, ‘a franquia, os limites financeiros ou o percentual de coparticipação do consumidor ou beneficiário’, previstos para as des-pesas com tratamento psiquiátrico na apólice de seguro saúde escolhida pelo recorrente. 5. O acórdão recorrido acompanha o entendimento deste órgão julgador, no sentido de que ‘não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor, para a hipótese de internação superior a 30 (trinta) dias decorrentes de transtornos psiquiátricos, pois destinada à manutenção do equilíbrio entre as prestações e contraprestações que envolvem a gestão dos custos dos contratos de planos de saú-de’. Precedentes. 6. Recurso especial conhecido e não provido.” (STJ – REsp 1.587.271 – (2016/0050309-0) – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – DJe 19.12.2016 – p. 4547)

Ação de obriGAção de fAzer c/c pedido de AntecipAção de

tutelA – decisão monocráticA

34497 – “Agravo interno em agravo (art. 544 do CPC/1973). Ação de obrigação de fazer c/c pedido de antecipação de tutela. Decisão monocrática que negou provimento ao re-clamo. Insurgência recursal do autor. 1. Pretensão de redimensionamento dos honorários advocatícios sucumbenciais arbitrados na origem. Consoante cediço nesta Corte, somente é permitido modificar valores fixados a título de honorários advocatícios no âmbito de recurso especial, se estes se mostrarem irrisórios ou exorbitantes, o que não ocorreu na hipótese. Incidência da Súmula nº 7 do STJ. 2. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt--Ag-REsp 620.411 – (2014/0306579-3) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 19.12.2016 – p. 4594)

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Ação de prestAção de contAs – primeirA fAse – neGAtivA de prestAção

jurisdicionAl – inocorrênciA

34498 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil (CPC/1973). Negócios jurídicos bancários. Ação de prestação de contas. Primeira fase. Negativa de prestação jurisdicional. Inocorrência. Alegação de carência da ação por inadequação do procedimento. Pedido genérico. Inocorrência. Jurisprudência consolidada deste STJ. Sú-mula nº 83/STJ. Revisão. Súmula nº 7/STJ. Ausência de fundamentos que justifiquem a al-teração da decisão recorrida. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 694.183 – (2015/0096866-6) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 19.12.2016 – p. 4302)

Ação rescisóriA – procedênciA – omissão

QuAnto Ao ArbitrAmento de honorários AdvocAtÍcios

34499 – “Ação rescisória. Procedência. Omissão quanto ao arbitramento de honorários advocatícios. 1. Acolhidos os Embargos de Declaração opostos pelo contribuinte com efei-to modificativo para julgar improcedente a Ação Rescisória, não cabe mais arbitramento de honorários advocatícios em favor da Fazenda Distrital. 2. Embargos de Declaração pre-judicados.” (STJ – EDcl-AR 4.640 – (2011/0034402-3) – 1ª S. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2016 – p. 3149)

ApelAção interpostA por ApenAs um dos litisconsortes – prAzo em dobro – Art. 191 do

cpc/1973 – inAplicAbilidAde

34500 – “Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. recurso ma-nejado sob a égide do CPC/1973. Apelo nobre apresentado fora do prazo legal. Apela-ção interposta por apenas um dos litisconsortes. prazo em dobro. Art. 191 do CPC/1973. Inaplicabilidade. Intempestividade do recurso especial. Juízo de admissibilidade bifásico. Não vinculação do STJ. Recurso não provido. 1. Inaplicabilidade do NCPC neste julga-mento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do STJ

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na sessão de 09.03/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (re-lativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. Se a decisão recorrida é prejudicial aos litisconsortes, mas apenas um recorre, o prazo em dobro existe em relação ao prazo des-se recurso, mas passa a ser simples para os recursos posteriores (AgRg-Ag 630.734/PR, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 02.05.2005). 3. Na hipótese dos autos, apenas a entidade previdenciária apelou da sentença, quedando-se inerte a patrocinadora. Assim, inviável a aplicação do prazo em dobro previsto no art. 191 do CPC/1973, devendo ser reconhecida a intempestividade do recurso especial. 4. O juízo de admissibilidade é bifásico, ou seja, o primeiro juízo realizado no Tribunal de origem não tem o condão de vincular a decisão de admissibilidade do STJ, que é soberana àquele. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.544.109 – (2015/0173885-7) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 19.12.2016 – p. 4533)

coisA julGAdA – reclAmAção não conhecidA diAnte dA existênciA

de AlterAção substAnciAl dA leGislAção de reGênciA – inexistênciA de omissão

35001 – “Processual civil e administrativo. Juízes federais. Quintos incorporados em vir-tude de cargos exercidos anteriormente. Coisa julgada. Reclamação não conhecida diante da existência de alteração substancial da legislação de regência. Inexistência de omissão. Falta de interesse em agir para alegação de contradição. 1. Inexistem as omissões aponta-das no acórdão recorrido, pois ele, louvando-se em precedente anterior, concluiu que não é cabível a reclamação quando o ato impugnado se fundamenta em substancial alteração legislativa, porquanto tal procedimento pressupõe tenha havido voluntária inobservância de decisão oriunda do Superior Tribunal de Justiça. Foi feito amplo histórico da questão para mostrar a existência da referida alteração substancial da legislação relativa à remu-neração dos magistrados com o processo de implantação do regime de subsídio e, tendo a conclusão sido pelo não conhecimento da Reclamação, não seria cabível exigir o exame de teses relativas ao mérito. 2. Falece ao embargante interesse em recorrer para alegar que o voto teria caminhado no sentido da improcedência, pois eventual alteração da conclu-são seria para este efeito, o que representaria reformatio in pejus, já que um julgamento de improcedência seria muito mais desfavorável a ele do que a extinção do processo sem julgamento do mérito, que é o que ocorreu, diante do não conhecimento da Reclamação. 3. Considerações do voto do relator que eventualmente possam ser vistas como condu-zindo a ideia de inexistência de violação da coisa julgada representam obiter dictum, pois

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a conclusão do colegiado foi pelo não conhecimento da Reclamação. 4. Embargos de De-claração rejeitados.” (STJ – EDcl-RCL 6.008 – (2011/0119666-1) – 1ª S. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2016 – p. 3151)

conflito de competênciA – enunciAdo AdministrAtivo

nº 3/stj – Ação ordináriA – polo pAssivo – AssociAção civil de direito privAdo e fundAção

públicA federAl – competênciA

35002 – “Processual civil. Conflito de competência. Enunciado Administrativo nº 3/STJ. Ação ordinária. Polo passivo. Associação civil de direito privado e fundação pública fede-ral. Competência. Justiça Federal. Critério ratione personæ. Competência absoluta. Súmula nº 150/STJ. 1. A teor do art. 109, inciso I, da Constituição da República, compete à justiça federal processar e julgar causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho. 2. Assim, proposta uma ação ordinária em que se verifique no polo passivo um desses entes, a competência será obrigatoriamente da Justiça Federal, ainda que o órgão julgador limite a sua atuação à rejeição da legitimidade ou do interesse do ente federal, e, com isso, exclua-o da demanda, somente a partir de quando, então, poderá declinar da competência, salvo se remanescer motivo outro para que a causa continue a tramitar pe-rante a Justiça Federal. 3. Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas. Inteligência da Súmula nº 150/STJ. 4. Conflito conhecido para julgar competente o suscitado, Juízo Federal da Vara de Barreiras, na Seção Judiciária da Bahia.” (STJ – CC 149.906 – (2016/0306466-6) – 1ª S. – Rel. Min. Mauro Campbell Marques – DJe 19.12.2016 – p. 3213)

dAno morAl – mAtériA jornAlÍsticA veiculAdA em jornAl impresso, internet e televisão – Ato ilÍcito –

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responsAbilidAde – QuAntum indenizAtório – vAlor rAzoável

35003 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Matéria jornalística veiculada em jornal impresso, internet e televisão. Danos morais. Ato ilícito. Responsabilidade. Quantum indenizatório. Valor razoável. Agravo regimental desprovido. 1. O Tribunal de origem, com fundamento no conjunto probatório dos autos, reconheceu a prática de ato ilícito e a responsabilidade das agravantes pela divulgação de matéria jornalística inverí-dica, em jornal impresso, internet e televisão, em que vincula a imagem do autor a pro-cesso criminal do qual não era parte e o qualifica como ‘chefe da quadrilha’. 2. O valor arbitrado pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto por esta Corte tão somente nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso, em que fixado em R$ 30.000,00 (trinta mil reais). 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 296.025 – (2013/0035965-0) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 19.12.2016 – p. 4583)

execução – indeferimento dA iniciAl por inépciA –

exceção de pré-executividAde – ArGumentos divorciAdos do contexto dA execução – honorários AdvocAtÍcios

35004 – “Processual civil. Embargos de declaração no agravo regimental no agravo em recurso especial. Execução. Indeferimento da inicial por inépcia. Exceção de pré-execu-tividade. Argumentos divorciados do contexto da execução. Honorários advocatícios. Rediscussão do julgado. Impossibilidade. Omissão e contradição. Inexistência. Embargos rejeitados. 1. Os embargos de declaração têm como objetivo sanar eventual obscuridade, contradição ou omissão existente na decisão recorrida, sendo, portanto, inadmissível a sua oposição para rediscutir questões tratadas e devidamente fundamentadas na decisão embargada, já que não são cabíveis para provocar novo julgamento da lide. 2. A omissão que autoriza a oposição do recurso declaratório diz respeito à questão posta nos autos, relevante ao deslinde da controvérsia, e que deixou de ser analisada, o que não ocorre na espécie, na medida em que o v. aresto embargado adotou fundamentação suficiente e coerente, decidindo integralmente a controvérsia. 3. A contradição apta a abrir a via dos embargos declaratórios é aquela interna ao decisum, existente entre a fundamentação e a conclusão do julgado ou entre premissas do próprio julgado, o que igualmente não se ob-serva no presente caso. 4. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-Ag-REsp 309.302 – (2013/0064077-2) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 19.12.2016 – p. 4585)

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execução de Alimentos – foro competente – AplicAção

dA reGrA do Art. 100, ii, do cpc/1973 – foro do domicÍlio ou

residênciA do AlimentAndo

35005 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Recurso mane-jado sob a égide do NCPC. Execução de alimentos. Foro competente. Aplicação da regra do art. 100, II, do CPC/1973. Foro do domicílio ou residência do alimentando. Exceção à regra do art. 575, II, do mesmo diploma legal. Precedentes. Incidência da Súmula nº 83 do STJ, que se aplica aos recursos especiais interpostos com fundamento em ambas as alíneas do permissivo constitucional. Ausência de debate pelo tribunal de origem sobre o conte-údo do art. 475-P do CPC/1973. Prequestionamento. Inexistência. Incidência da Súmula nº 282 do STF, aplicada por analogia. Agravo interno não provido. 1. Aplica-se o NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os re-quisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. Merece ser confirmado o acórdão do Tribunal de Justiça local que decidiu em harmonia com a jurisprudência desta eg. Corte Superior no sentido de que o foro competente para execução de alimentos é o foro do domicílio ou residência do alimentando, ainda que a sentença exequenda tenha sido proferida em foro diverso. A competência prevista no art. 100, II, do CPC prevalece sobre a prevista no art. 575, II, do CPC. Incidência da Súmula nº 83 do STJ que se aplica aos recursos especiais interpostos com fundamento em ambas as alíneas do permissivo constitucional. 3. A matéria contida no art. 475-P do CPC/1973 não foi objeto de debate prévio nas instâncias de origem e não foram opostos embargos de declaração para que o Tribunal de origem examinasse o tema. Ausente, portanto, o devido prequestionamento nos termos da Súmula nº 282 do STF, aplicável por analogia. 4. Agravo interno não pro-vido.” (STJ – AgInt-REsp 1.560.639 – (2015/0201849-7) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 19.12.2016 – p. 4542)

nota:Foi promovida, em face de dois menores, ação de execução de alimentos contra seu genitor, visando a cobrança da pensão alimentícia fixada na ação de divórcio de seus pais e não paga desde janeiro de 2013.Sustentaram que, a teor do art. 575, II, do CPC/1973, a execução deveria ser distribuída e processada no juízo que prolatou a sentença que gerou o título judicial que se executa, qual seja, o da 1ª Vara de Família Digital da Comarca de Campo Grande/MS.A Juíza da aludida Vara de Família entendeu que a distribuição dos autos deveria ser de forma livre, pois a ação que julgou os alimentos já foi sentenciada e finalizada, e a obrigação alimentar era de trato sucessivo, que se prorrogava durante longo período temporal, tratando-se de relação jurídica continuativa.Inconformados, os exequentes interpuseram agravo de instrumento, no qual alegaram que o juízo competente para executar um título judicial é o mesmo que exarou a sen-

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tença que originou tal título, e que deveria se aplicar a regra do inciso II do art. 575 do CPC/1973.O Desembargador relator negou seguimento ao agravo de instrumento com base no art. 557, caput, do CPC/1973, porque entendeu que ao caso se aplicava a regra do in-ciso II do art. 100 do mesmo diploma legal haja vista que não se trata de competência absoluta.O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul negou provimento ao agravo regimental dos exequentes em acórdão que recebeu a seguinte ementa:“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE ALI-MENTOS – COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR O FEITO – AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO COM O JUÍZO NO QUAL TRAMITOU A AÇÃO DE ALIMENTOS – INTELIGÊNCIA DO ART. 100, INCISO II, DO CPC – REDISCUSSÃO DA MATÉRIA – INEXISTÊNCIA DE FATOS NOVOS QUE DEMONSTREM A ALEGADA INJUSTI-ÇA DO DECISUM – RECURSO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.É competente para processar e julgar a ação de execução de alimentos o foro do domi-cílio ou residência do alimentando, inexistindo qualquer vinculação com o juízo que prolatou a sentença objeto do título executivo.Inconformados, os exequentes interpuseram, então, recurso especial com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, no qual alegaram ofensa aos arts. 575, II, 100, II, e 475-P, do CPC/1973.Sustentaram, em síntese, que a regra para fixar a competência da execução de alimentos é a do inciso II do art. 575 do CPC/1973, sendo a do inciso II do art. 100 do mesmo diplo-ma legal deve ser entendida como uma faculdade do exequente e não uma exigência.Asseveram que o Juízo da 1ª Vara de Família da Comarca de Campo Grande é compe-tente para o processamento da execução de alimentos, pois foi quem fixou os alimentos que se executada, além de ser o foro que mais lhes favorecem.Não foram apresentadas contrarrazões.O apelo especial foi inadmitido na origem sob o fundamento de incidência da Súmula nº 83 do STJ, o que ensejou a interposição de agravo em recurso especial.O Ministério Público opinou pelo provimento do recurso.O recurso especial não foi provido, em decisão monocrática de minha lavra, que rece-beu a seguinte ementa:“PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – FAMÍLIA – EXECUÇÃO DE ALI-MENTOS – RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO CPC/1973 – FORO COMPE-TENTE – DOMICÍLIO OU RESIDÊNCIA DO ALIMENTANDO – APLICAÇÃO DO ART.100, II, DO CPC/1973 –EXCEÇÃO À REGRA DO ART. 575, II, DO MESMO DI-PLOMA LEGAL – PRECEDENTES –AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – SÚ-MULA Nº 282 DO STJ – RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.”Nas razões do presente agravo interno, alegaram que deve ser aplicado o art. 575, II, do CPC/1973 porque não existe motivo para aplicar a exceção, bem como os exequentes cabe escolher o foro que mais favorável a eles.O STJ negou provimento ao agravo.Vale trazer trecho do voto do relator:“De outra parte, no que tange ao art. 475- P do CPC/1973, consignei na decisão agra-vada que a leitura dos fundamentos do acórdão recorrido revelou que o Tribunal de Justiça local não se manifestou acerca do conteúdo inserto no referido dispositivo legal,

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e nem foram opostos embargos de declaração a fim de provocar debate sobre ele pela Corte de origem, de modo que não está presente o indispensável requisito do preques-tionamento do tema federal, razão pela qual incide a Súmula nº 282 do STF, segundo a qual é inadmissível o recurso extraordinário quando não ventilada, na decisão recor-rida, a questão federal suscitada. Ademais, a jurisprudência do STJ firmou o entendi-mento de que, para que se configure o prequestionamento, há que se extrair do acórdão recorrido pronunciamento sobre as teses jurídicas em torno dos dispositivos legais ti-dos como violados, a fim de que se possa, na instância especial, abrir discussão sobre determinada questão de direito, definindo-se, por conseguinte, a correta interpretação da legislação federal (AgRg-AREsp 621.867/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., Julgado em 24.03.2015, DJe 27.03.2015), o que, no caso, não ocorreu.Assim, porque os argumentos que J. V. M. F. e A. L. M. F. trouxeram não demonstraram a incorreção do fundamento da decisão agravada, deve ser ela mantida.”A ilustre Jurista Maria Berenice Dias, discorrendo sobre a Súmula nº 309, assim nos ensina:“Na tentativa de assegurar o uso dessa forma executória, a jurisprudência consolidou--se no sentido de admitir o rito do apenamento somente com referência a três presta-ções alimentícias vencidas à data da propositura da demanda. O fundamento, de todo insubsistente, é que dívida anterior a tal período perde sua natureza alimentar, passan-do, em um passe de mágica, a dispor de feição indenizatória.De outro lado, como a lei fala em ‘execução de sentença ou decisão’, há quem negue tal rito quando os alimentos foram fixados por acordo, ainda que referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria ou pelos advogados dos transatores e apesar de tais avenças constituírem títulos executivos extrajudiciais (CPC, art. 585, II). Há, inclu-sive, decisões que olvidam a regra que determina a aplicação supletiva do processo de conhecimento (CPC, art. 598) e sequer admitem a citação do devedor por hora certa ou edital.Também sob o mesmo fundamento havia expressivo número de julgados que negavam a aplicação de distinto dispositivo da lei processual. Diz o art. 290 do Código de Proces-so Civil que, em se tratando de obrigação constituída em prestações periódicas – como o é a obrigação de pagar alimentos –, a condenação compreende as prestações vencidas no curso do processo. Porém, enorme era a dificuldade de invocar dita regra para o processo executório, impondo ao credor que, a cada três meses, ingressasse com nova ação, transformando a cobrança dos alimentos em um punhado de demandas.Apesar de todos esses desencontros, a jurisprudência tendia a admitir o uso da execu-ção coacta para a cobrança das três parcelas vencidas antes da propositura da demanda, safando-se o devedor da prisão somente mediante o pagamento de toda a dívida: as parcelas objeto da execução e mais as que se venceram até a data do efetivo pagamento.A falta de uniformidade das decisões judiciais levou o STJ a sumular a matéria (Súmula nº 309): ‘O débito alimentar que autoriza a prisão do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores à citação e as que se vencerem no curso do processo’. Ainda que correta a definição do que deve ser considerado adimplemento da dívida, ou seja, que no seu montante se incluem as parcelas vencidas durante a tramitação da execu-ção, o Enunciado contém mácula que impõe imediata retificação. De forma absoluta-mente equivocada, estabelece que o período de abrangência da execução corresponde somente às prestações vencidas antes da citação do devedor, e não às impagas antes da propositura da ação. Tal assertiva se afasta dos próprios antecedentes indicados como

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parâmetro para sua edição, que não sufragam o mesmo entendimento. Sete deles, de modo expresso, indicam como marco a data do ajuizamento da ação e somente três dos julgados invocados fazem referência à data da citação.Urge, portanto, que a Súmula seja retificada, pois baseada em jurisprudência que não serve para referendar a normatização levada a efeito. A mudança, frise-se, se faz urgen-te, sob pena de se incentivar que o devedor se esquive da citação, esconda-se do oficial de justiça e, de todas as formas, busque retardar o início da execução, pois, enquanto não for citado, não se sujeita a ser preso. Claro que o devedor vai tornar-se um fugitivo! Quanto mais tempo levar para ser citado, mais parcelas serão relegadas à modalidade executória cuja efetividade é consabidamente ineficaz em se tratando de obrigação de alimentos. Significa que as mensalidades pretéritas só poderão ser cobradas pelo rito da penhora, sujeitando-se o credor a esperar pela venda em hasta pública de algum bem de que o devedor eventualmente seja proprietário (CPC, art. 732).Assim, ainda que o Enunciado mereça aplausos pela definição do termo final da dívida, o retrocesso em que incidiu o STJ, no que diz com o início da obrigação a ser cumprida sob pena de prisão, acaba deixando de assegurar o direito à sobrevivência para privi-legiar a liberdade daquele que não tem a responsabilidade de garantir a subsistência a quem deve alimentos.” (Súmula nº 309: um equívoco que urge ser corrigido. Disponível em: online.sintese.com)

execução de tÍtulo extrAjudiciAl – propositurA

Após julGAmento de Ação revisionAl e de consiGnAção em pAGAmento – depósito de

QuAntiA incontroversA

35006 – “Recurso especial. Execução de título extrajudicial. Propositura após julgamento de ação revisional e de consignação em pagamento. Depósito de quantia incontroversa. Valores não ressalvados. Conduta maliciosa do exequente. Má-fé evidente. Pagamento em dobro. Aplicação do art. 940 do CC/2002. 1. Na esteira da jurisprudência consolidada do STJ, a incidência da sanção prevista no art. 940 do CC/2002 depende da demonstração concreta de má-fé do exequente. 2. O mero ajuizamento de ação revisional não impede que o credor promova a execução lastreada no título extrajudicial sub judice. Preceden-tes. 3. No caso, o Tribunal de origem reconheceu que o exequente demandou o valor do título após o julgamento de mérito da demanda revisional, deixando de informar acerca de sua existência, bem como omitindo-se quanto ao valor incontroverso depositado judi-cialmente e colocado à sua disposição em virtude da prévia demanda de consignação em pagamento. À evidência da conduta maliciosa, configura-se a má-fé, impondo-se o paga-mento em dobro da quantia não ressalvada. 4. Recurso especial parcialmente provido.” (STJ – REsp 1.529.545 – (2015/0100192-9) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.12.2016 – p. 4528)

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transcriçãoCódigo Civil:“Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao deve-dor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.”

honorários de AdvoGAdo contrAtAdos exclusivAmente

pelo sindicAto – retenção pelo ente sindicAl –

impossibilidAde – AusênciA de AutorizAção dos filiAdos

35007 – “Honorários advocatícios contratados exclusivamente pelo sindicato. Retenção pelo ente sindical. Impossibilidade. Ausência de autorização dos filiados. I – O contrato pactuado exclusivamente entre o sindicato e o advogado não vincula os filiados subs-tituídos, em face da ausência de relação jurídica contratual entre estes e o advogado. II – A retenção sobre o montante da condenação em honorários advocatícios contratuais so-mente é possível com a juntada do contrato celebrado individualmente com os filiados subs-tituídos ou a autorização desses para a referida retenção. Precedentes: REsp 931.036/RS, Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 02.12.2009 e REsp 1.464.567/PB, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 11.02.2015. III – Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-REsp 1.569.957 – (2015/0302883-2) – 2ª T. – Rel. Min. Francisco Falcão – DJe 19.12.2016 – p. 3933)

penhorA – nomeAção de bens – bem imóvel – tÍtulo

trAnslAtivo não AverbAdo no reGistro de imóveis –

propriedAde não comprovAdA – direito de recusA dA fAzendA

públicA Ao bem oferecido

35008 – “Processual civil. Ofensa ao art. 535 do CPC/1973 não configurada. Omissão. inexistência. execução fiscal. Nomeação de bens à penhora. Bem imóvel. Título transla-tivo não averbado no registro de imóveis. Propriedade não comprovada. Direito de re-cusa da fazenda pública ao bem oferecido. Princípio da menor onerosidade do devedor. Ausência de comprovação da necessidade de flexibilização da ordem legal. Divergência

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jurisprudencial. Exame prejudicado. 1. Não se configura a alegada negativa de prestação jurisdicional, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada. Registre-se que não é o órgão julgador obri-gado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as questões relevantes e im-prescindíveis à sua resolução. 2. A mera insatisfação com o conteúdo da decisão embarga-da não enseja Embargos de Declaração. Esse não é o objetivo dos Aclaratórios, recurso que se presta tão somente a sanar contradições ou omissões decorrentes da ausência de análise dos temas que foram trazidos à tutela jurisdicional no momento processual oportuno. 3. Consoante se extrai dos arts. 1.227 e 1.245 do Código Civil, a comprovação da proprieda-de de imóvel somente se faz através da apresentação da escritura devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente. 4. In casu, o Tribunal de origem consignou expressamente que a escritura pública de compra e venda do imóvel dado em garantia não foi averbada no Registro de Imóveis, razão pela qual não merece prosperar a irresig-nação. 5. Ademais, a jurisprudência da Primeira Seção do STJ, ratificada em julgamento submetido ao regime do art. 543-C do CPC, é no sentido de que a Fazenda Pública pode recusar o bem oferecido à penhora, se não observada a ordem legal dos bem penhoráveis, pois inexiste preponderância, em abstrato, do princípio da menor onerosidade para o de-vedor sobre o da efetividade da tutela executiva. Exige-se, para a superação da ordem prevista nos arts. 655 do CPC/1973 e 11 da LEF, argumentação baseada em elementos do caso concreto (REsp 1.337.790/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª S., DJe 07.01.2013). 6. Desse modo, não se verifica a existência de direito subjetivo da parte executada à acei-tação do bem oferecido à penhora. 7. Fica prejudicada a análise da divergência jurispru-dencial quando a tese sustentada já foi afastada no exame do Recurso Especial pela alínea a do permissivo constitucional. 8. Recurso Especial não provido.” (STJ – REsp 1.635.909 – (2016/0280146-1) – 2ª T. – Rel. Min. Herman Benjamin – DJe 19.12.2016 – p. 4230)

penhorA pArciAl – mAnutenção do nome em cAdAstro de

inAdimplentes – AleGAção de dissÍdio jurisprudenciAl

35009 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Penhora parcial. Manutenção do nome em cadastro de inadimplentes. Alegação de dissídio jurisprudencial sem a indi-cação dos dispositivos aos quais teria sido dada interpretação divergente. Incidência da Súmula nº 284/STF. Razões recursais insuficientes. Agravo desprovido. 1. A indicação do dispositivo tido como objeto da divergência jurisprudencial é imprescindível para a correta configuração do dissídio, nos termos do art. 105, III, c, da Constituição Federal. Incidência da Súmula nº 284/STF. 2. Razões recursais insuficientes para a revisão do jul-

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gado. 3. Agravo interno desprovido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 940.391 – (2016/0164331-9) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.12.2016 – p. 4428)

prAzo processuAl – suspensão – tribunAl locAl –

comprovAção por documento idÔneo – não demonstrAção

– intempestividAde

35010 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Recurso ma-nejado sob a égide do NCPC. Suspensão dos prazos processuais no tribunal local. Com-provação por documento idôneo. não demonstrada. intempestividade. Decurso do prazo legal. Art. 544 do CPC. Agravo interno não provido. 1. Aplica-se o NCPC a este julgamen-to ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 09.03.2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, eventual suspensão do prazo recursal decorrente de ausência de expediente ou de recesso forense, feriados locais, entre outros, nos tribunais de justiça estaduais deve ser comprovada por documento idôneo. 3. É intempestivo o agravo em recurso especial interposto após o prazo de 10 dias previsto no art. 544 do CPC/1973. 4. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 886.501 – (2016/0087128-3) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 19.12.2016 – p. 4362)

previdênciA privAdA – neGAtivA de prestAção jurisdicionAl –

não ocorrênciA – denunciAção dA lide do pAtrocinAdor

– inAdmissibilidAde

35011 – “Recurso especial. Civil. Previdência privada. Negativa de prestação jurisdicio-nal. Não ocorrência. Denunciação da lide do patrocinador. Inadmissibilidade. Ausência de direito de regresso. Migração de planos de benefícios. Desistência de participantes. Possibilidade. Notícia divulgada no site oficial. Oferta ao público. Vinculação ao conteúdo. Dever de não enganar. Ação coletiva. Exclusão de alguns representados. Sucumbência re-cíproca. Não configuração. Associação civil em regime de representação. 1. Ação ordinária em que se discutem as práticas de oferta ao público e de propaganda enganosa por fundo

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de pensão e de indevida migração compulsória de participantes do plano de benefícios REG/Replan para o plano REB. 2. Nas ações que discutem somente o plano de benefícios, incluídos os casos de migração de participantes e assistidos, não cabe a denunciação da lide (art. 70, III, do CPC/1973) do patrocinador da entidade fechada de previdência com-plementar. Eventual sucumbência do ente de previdência privada será suportada pelo fundo mútuo pertencente aos participantes, assistidos e demais beneficiários, não se po-dendo falar em pretensão de regresso contra o patrocinador. Precedentes. 3. A oferta ao público, entendida como a divulgação de produto ou serviço a uma coletividade de pes-soas utilizando um meio de comunicação de massa, equivale à proposta, caso apresente os requisitos essenciais do contrato, possuindo, portanto, o efeito de vincular o ofertante a partir da difusão da informação ao público-alvo (arts. 427 e 429 do CC). 4. É direito do aceitante exigir o cumprimento forçado do que foi declarado se a oferta dirigida ao públi-co for feita apropriadamente, não sendo permitido ao ofertante arrepender-se. Tal tipo de divulgação faz parte do risco da atividade, sendo ínsitos os deveres de bem informar e de não enganar, de modo que há completa vinculação com o conteúdo divulgado. 5. O efeito vinculativo da proposta ou da oferta ao público constitui instrumento de estímulo à atua-ção responsável e à atuação ética não apenas de empresas, mas também das entidades de previdência privada. 6. A oferta, caso perca a eficácia obrigatória, poderá se transmudar em propaganda enganosa ou abusiva, sobretudo se induzir no público-alvo uma falsa per-cepção da realidade, ao frustrar as legítimas expectativas criadas pela informação veicu-lada, em desprestígio à boa-fé objetiva e ao princípio da confiança. 7. Na hipótese dos au-tos, as declarações da Funcef feitas em seu site oficial caracterizaram verdadeira oferta ao público, integrando, pois, o contrato de previdência complementar, a tornar obrigatório o seu cumprimento por quem quisesse cancelar a opção de migração do plano REG/Replan para o plano REB se tal processo não tivesse sido concluído. 8. A informação divulgada meses após, de que todos os pedidos de desistência da migração seriam sumariamente indeferidos, acabou por não observar as expectativas geradas no público, que confiou na mensagem outrora veiculada, incitando, no lugar, o erro e o engano. Tanto o ofertante quanto o aceitante devem pautar suas condutas conforme os parâmetros da boa-fé, da probidade e da transparência (arts. 113 e 422 do CC). 9. A revogação da proposta ou da oferta ao público, veiculada no mesmo meio de comunicação, opera somente efeitos ex nunc, não alcançando a situação daqueles que, em tempo, já a aceitaram. 10. A exclusão de alguns representados da demanda não possui o condão de atrair a sucumbência recíproca na ação coletiva ajuizada por associação civil. Os pedidos formulados na inicial foram in-tegralmente acolhidos, ou seja, a autora não foi sucumbente. Incidência, ademais, da regra do art. 87 do CDC, aplicada de forma subsidiária nas ações coletivas não consumeristas. Por outro lado, trata-se de sentença genérica cuja individualização será feita em execução individual ou em ação de cumprimento. 11. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.447.375 – (2014/0071957-2) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 19.12.2016 – p. 4503)

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recurso especiAl – AdvoGAdo sem procurAção

nos Autos – viGênciA do cpc/1973 – impossibilidAde

de conhecimento

35012 – “Processual civil. Agravo interno no recurso especial. Recurso especial subscrito por advogado sem procuração nos autos, na vigência do CPC/1973. Impossibilidade de conhecimento. Súmula nº 115 do STJ. Inaplicabilidade dos arts. 13 e 37 do CPC/1973, na instância especial, nos termos da legislação vigente à época. Precedentes. Agravo interno improvido. I – Agravo interno interposto contra decisão publicada em 17.08.2016, que, por sua vez, julgara recurso interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/1973. II – Considerando que o Recurso Especial foi interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/1973, devem ser observados, in casu, os Enunciados Administrativos nºs 2 (‘Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões pu-blicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Supe-rior Tribunal de Justiça’) e 5 (‘Nos recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), não caberá a abertura de prazo prevista no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, § 3º, do novo CPC’), aprova-dos pelo Plenário do STJ, em 09.03.2016. III – Esta Corte firmou jurisprudência, na vigência do CPC/1973, considerando inexistente o recurso endereçado à instância especial, no qual o advogado subscritor não possui procuração ou substabelecimento regular nos autos (Sú-mula nº 115/STJ), devendo a regularidade da representação processual ser comprovada no ato da interposição do recurso. IV – De igual modo, firmou-se a compreensão, à luz do CPC/1973, no sentido de ser impossível a ‘aplicação dos arts. 13 e 37, segunda parte, ambos do Código de Processo Civil, a fim de que o defeito seja sanado, porquanto tal pro-vidência revela-se incompatível com a instância especial’ (STJ, AgRg-AREsp 321.374/SP, Relª Min. Regina Helena Costa, 1ª T., DJe de 07.04.2015). V – Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-REsp 1.618.047 – (2016/0203934-3) – 2ª T. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 19.12.2016 – p. 4144)

recurso especiAl – códiGo de processo civil de 2015 – AplicAbilidAde – prepAro

– AusênciA de cópiA do comprovAnte de pAGAmento

dAs custAs do recurso especiAl e do porte de remessA

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Revista JuRídica 471JuRispRudência civil

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e retorno dos Autos – peçAs obriGAtóriAs – deserção

35013 – “Processual civil. Agravo interno no agravo em recurso especial. Código de Pro-cesso Civil de 2015. Aplicabilidade. Argumentos insuficientes para desconstituir a deci-são atacada. Preparo. Ausência de cópia do comprovante de pagamento das custas do recurso especial e do porte de remessa e retorno dos autos. Peças obrigatórias. Deserção. Art. 511 do Código de Processo Civil de 1973. Súmula nº 187/STJ. Incidência. I – Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015 no julgamento do Agravo Interno. II – É deserto o recurso especial, porquanto nos termos do art. 511 do Código de Processo Civil de 1973, o recolhimento do preparo deve ser comprovado no momento de sua interposição. Incide, na hipótese, o óbice da Súmula nº 187/STJ. III – Os Agravantes não apresentam, no agravo, argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorri-da. IV – Agravo Interno improvido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 926.017 – (2016/0124213-7) – 1ª T. – Relª Min. Regina Helena Costa – DJe 19.12.2016 – p. 3328)

recurso especiAl – intempestividAde – expediente

forense – suspensão – AusênciA de comprovAção

– juntAdA posterior – impossibilidAde – preclusão

35014 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil. Intempesti-vidade. Expediente forense. Suspensão. Ausência de comprovação. Juntada posterior. Impossibilidade. Preclusão. 1. A Corte Especial modificou o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de admitir a comprovação da tempestividade quando da interposição do agravo regimental, ônus do qual não se desincumbiu a parte agravante. 2. Na hipótese, a parte comprovou a suspensão do expediente forense mediante petição protocolizada após a interposição do agravo interno. Ocorrência de preclusão. 3. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 967.003 – (2016/0213302-4) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 19.12.2016 – p. 4461)

recurso especiAl interposto viA e-mail – inAdmissibilidAde – não

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eQuipArAção Ao fAc-simile – intempestividAde

35015 – “Processual civil. Agravo interno no recurso especial. Recurso especial interpos-to via e-mail. Inadmissibilidade. Não equiparação ao fac-simile. Intempestividade. Prece-dentes do Superior Tribunal de Justiça. Agravo improvido. I – O Superior Tribunal de Justiça não admite a interposição de recurso via e-mail, na medida em que não equipara este meio eletrônico ao fac-simile, nos termos do que prevê o art. 1º da Lei nº 9.800/1999. II – Com efeito, ‘a jurisprudência pacífica desta Corte firmou entendimento, no sentido de que: “o encaminhamento de petição ao STJ via correio eletrônico (e-mail), por ausência de norma regulamentar, não se mostra apto a afastar a intempestividade do recurso cuja petição original foi protocolizada fora do prazo legal” (AgRg-EREsp 1.119.463/RO, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Corte Especial, Julgado em 15.05.2013, DJe 29.05.2013). Pre-cedentes’ (STJ, AgInt-EAREsp 304.645/MG, Rel. Min. Humberto Martins, Corte Especial, DJe de 04.11.2016). III – No caso, a parte ora agravante transmitiu seu Recurso Especial, via e-mail, na data de 04.09.2014, tendo tal petição sido protocolada em 05.09.2014, enquan-to o original do Recurso Especial foi apresentado apenas em 08.09.2014, ou seja, após o encerramento do prazo recursal, ocorrido em 04.09.2014. IV – Agravo interno improvido.” (STJ – AgInt-REsp 1.512.726 – (2015/0014134-7) – 2ª T. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 19.12.2016 – p. 3884)

reGistro civil – Art. 2º dA lei nº 8.560/1992 – AveriGuAção oficiosA de pAternidAde –

procedimento AdministrAtivo – jurisdição voluntáriA –

AnuênciA dA GenitorA – AusênciA

35016 – “Recurso especial. Processual civil. Direito de família. Registro civil. Art. 2º da Lei nº 8.560/1992. Averiguação oficiosa de paternidade. Procedimento administrativo. Ju-risdição voluntária. Anuência da genitora. Ausência. Extinção. Possibilidade. Via judicial. 1. O procedimento de averiguação oficiosa de paternidade previsto na Lei nº 8.560/1992 não constitui condição para a propositura de ação judicial de investigação de paternidade por versar procedimento administrativo de jurisdição voluntária. 2. A lei prevê categori-camente, em seu art. 2º, que o oficial deve remeter ao juízo de registros públicos a certidão de nascimento de menor na qual conste apenas informações acerca da sua maternidade. 3. A averiguação oficiosa não está condicionada a informações da genitora, podendo o juízo extinguir o rito previsto no art. 2º, § 1º, da Lei nº 8.560/1992 por ausência de provas, remanescendo incólume a via judicial da investigação de paternidade. 4. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.376.753 – (2013/0097818-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 19.12.2016 – p. 4494)

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transcriçãoLei nº 89.560/1992:“Art. 2° Em registro de nascimento de menor apenas com a maternidade estabelecida, o oficial remeterá ao juiz certidão integral do registro e o nome e prenome, profissão, identidade e residência do suposto pai, a fim de ser averiguada oficiosamente a proce-dência da alegação.§ 1° O juiz, sempre que possível, ouvirá a mãe sobre a paternidade alegada e mandará, em qualquer caso, notificar o suposto pai, independente de seu estado civil, para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída.§ 2° O juiz, quando entender necessário, determinará que a diligência seja realizada em segredo de justiça.§ 3° No caso do suposto pai confirmar expressamente a paternidade, será lavrado termo de reconhecimento e remetida certidão ao oficial do registro, para a devida averbação.§ 4° Se o suposto pai não atender no prazo de trinta dias, a notificação judicial, ou negar a alegada paternidade, o juiz remeterá os autos ao representante do Ministério Público para que intente, havendo elementos suficientes, a ação de investigação de paternidade.§ 5º Nas hipóteses previstas no § 4o deste artigo, é dispensável o ajuizamento de ação de investigação de paternidade pelo Ministério Público se, após o não comparecimento ou a recusa do suposto pai em assumir a paternidade a ele atribuída, a criança for encami-nhada para adoção. (Redação dada pela Lei nº 12,010, de 2009) Vigência§ 6º A iniciativa conferida ao Ministério Público não impede a quem tenha legítimo interesse de intentar investigação, visando a obter o pretendido reconhecimento da pa-ternidade. (Incluído pela Lei nº 12,010, de 2009) VigênciaArt. 2º-A. Na ação de investigação de paternidade, todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, serão hábeis para provar a verdade dos fatos. (Incluído pela Lei nº 12.004, de 2009).Parágrafo único. A recusa do réu em se submeter ao exame de código genético – DNA gerará a presunção da paternidade, a ser apreciada em conjunto com o contexto proba-tório. (Incluído pela Lei nº 12.004, de 2009).”

seGuro dpvAt – correção monetáriA – não impuGnAção

35017 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Seguro DPVAT. Correção mo-netária. Não impugnação dos fundamentos da decisão que negou seguimento ao recurso. Incidência do § 1º do art. 1.021 do CPC e da Súmula nº 182/STJ. Recurso não conhecido. 1. É inviável o agravo interno que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada nos termos do art. 932, III, e 1.021, § 1º, do CPC de 2015 e da Súmula nº 182 do Superior Tribunal de Justiça. 2. Agravo interno não conhecido, com a aplica-ção de multa.” (STJ – AgInt-Ag-REsp 660.928 – (2015/0035898-7) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 19.12.2016 – p. 4598)

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Jurisprudência civilrevista Jurídica 471

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seGuro obriGAtório – cessão de direitos – dispositivos

violAdos – AusênciA de preQuestionAmento

35018 – “Agravo interno no recurso especial. Seguro obrigatório. Cessão de direitos. Dis-positivos violados. Ausência de prequestionamento. Súmula nº 282/STF. 1. Ausente o prequestionamento, até mesmo de modo implícito, de dispositivos apontados como vio-lados no recurso especial, incide o disposto na Súmula nº 282/STF. 2. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-REsp 1.579.156 – (2016/0012955-5) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 19.12.2016 – p. 4545)

seGuro-sAúde – demorA nA AutorizAção de cirurGiA

– dAnos morAis – vAlor – rAzoAbilidAde

35019 – “Agravo interno no agravo em recurso especial. Plano de saúde. Demora na autorização de cirurgia. Danos morais. Valor. Razoabilidade. 1. O Superior Tribunal de Justiça, afastando a incidência da Súmula nº 7/STJ, tem reexaminado o montante fixado pelas instâncias ordinárias a título de danos morais apenas quando irrisório ou abusivo, circunstâncias inexistentes no presente caso. 2. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt--Ag-REsp 962.914 – (2016/0206010-2) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 19.12.2016 – p. 4455)

sociedAde – dissolução irreGulAr – execução fiscAl – redirecionAmento – AusênciA

de poder de GerênciA à épocA do fAto GerAdor – impossibilidAde

35020 – “Tributário. Agravo interno no recurso especial. Execução fiscal. Redireciona-mento. Dissolução irregular. Ausência de poder de gerência à época do fato gerador. Im-possibilidade. Súmula nº 83/STJ. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça de-finiu as seguintes orientações: a) o redirecionamento da execução fiscal ao sócio, em razão de dissolução irregular da empresa, pressupõe a respectiva permanência no quadro socie-tário ao tempo da dissolução; e b) o redirecionamento não pode alcançar os créditos cujos fatos geradores são anteriores ao ingresso do sócio na sociedade. 2. Na situação em que fundamentado o pedido de redirecionamento da execução fiscal na dissolução irregular

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da empresa executada, é imprescindível que o sócio contra o qual se pretende redirecionar o feito tenha exercido a função de gerência no momento dos fatos geradores e da disso-lução irregular da sociedade. Precedentes: AgRg-REsp 1.497.599/SP, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 26.02.2015; AgRg-Ag 1.244.276/SC, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJe 04.03.2015; AgRg-REsp 1.364.171/PE, Relª Min. Regina Helena Costa, 1ª T., DJe 29.02.2016; AgInt-REsp 1.569.844/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., Julgado em 22.09.2016, DJe 04.10.2016; AREsp 838.948/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, 1ª T., Julgado em 15.09.2016, DJe 19.10.2016. 3. Agravo interno não provido.” (STJ – AgInt-REsp 1.430.156 – (2014/0008700-5) – 1ª T. – Rel. Min. Benedito Gonçalves – DJe 19.12.2016 – p. 3416)

suspensão do processo – óbito do exeQuente – demorA nA

hAbilitAção dos sucessores – prescrição – não ocorrênciA

35021 – “Civil e processual civil. Suspensão do processo por óbito do exequente. Demora na habilitação dos sucessores. Prescrição. Não ocorrência. Cabimento de juros de mora. Matéria não examinada pelo Tribunal a quo. Prequestionamento ficto. Ausência de culpa do devedor. Juros de mora indevidos. I – Em relação à alegada impossibilidade de cobran-ça de juros de mora no período de habilitação dos sucessores do exequente, observa-se que, apesar de a matéria não ter sido apreciada no âmbito do acórdão recorrido, o recor-rente interpôs embargos de declaração, buscando a análise dela, a qual deveria ter sido examinada diante de sua relevância, o que configurou omissão, viabilizando, assim, a efe-tivação do prequestionamento ficto do art. 396 do CC, em conformidade com o art. 1.025 do CPC/2015. II – Entre a data da suspensão do processo de execução, efetivado com a comunicação do óbito do exequente, e a data de habilitação dos seus sucessores, encontra--se suspensa a prescrição. Precedentes: REsp 1.625.947/PE, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 14.10.2016, AREsp 282.834/CE, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., DJe 22.04.2014 e AgRg-REsp 1.485.127/AL, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., DJe 12.02.2015). III – O devedor somente estará em mora quando for culpado pelo atraso no adimple-mento da obrigação, conforme dispõe o art. 396 do Código Civil. Na hipótese dos autos, verifica-se que a autarquia não contribuiu para a demora no período entre a paralisa-ção do processo e a habilitação dos sucessores do exequente falecido, não devendo as-sim ser punido pela demora na referida habilitação. IV – Recurso especial parcialmente provido.” (STJ – REsp 1.639.788 – (2016/0309808-9) – 2ª T. – Rel. Min. Francisco Falcão – DJe 19.12.2016 – p. 4273)

transcriçãoCódigo de Processo Civil:“Art. 1.025. Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante sus-citou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.”

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JurisprudênciaPenal

STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Habeas Corpus nº 369.019 – AP (2016/0225589-1)Relator: Ministro Ribeiro DantasImpetrante: Barbara Barbosa de Figueiredo e outroAdvogado: Barbara Barbosa de Figueiredo e outro(s) – DF047765Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado do AmapáPaciente: Glaucia Costa Oliveira

EMENTA

penAl e processuAl penAl – hAbeAs corpus substitutivo de recurso – Art. 89 dA lei

nº 8.666/1993 – dispensA ou inexiGibilidAde de licitAção forA dAs hipóteses previstAs em lei – dolo especÍfico – efetivo prejuÍzo Ao erário

– comprovAção – necessidAde – AtipicidAde dA condutA nArrAdA nA denúnciA – writ não

conhecido – ordem concedidA de ofÍcio

1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substituti-vo do recurso legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial impugnado.

2. A jurisprudência desta Corte Superior acompa-nha o entendimento do Pleno do Supremo Tribunal Federal

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(Inq. 2.482/MG, Julgado em 15.09.2011), no sentido de que a consu-mação do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/1993 exige a demonstração do dolo específico, ou seja, a intenção de causar dano ao Erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos, malgrado ausên-cia de disposições legais acerca dessa elementar.

3. O Ministério Público estadual, ao elaborar a denúncia, e o Tribunal a quo, recebendo-a, contrariaram entendimento jurispru-dencial consolidado, porquanto a imputação apenas concluiu pela existência do dolo geral, ou seja, a vontade consciente de executar a conduta típica de dispensa ilegal do procedimento licitatório, consis-tente na inobservância das formalidades legais de dispensa de licita-ção para celebração de contrato de locação de imóvel de propriedade do casal Eider Pena Pestana e Edna Auzier, hoje deputada estadual. Entrementes, não se demonstrou a existência de dolo específico em causar prejuízo ao erário dos coautores e partícipes, dentre eles da paciente, então Subprocuradora da Assembléia Legislativa do Es-tado do Amapá, cuja conduta imputada foi a concessão de parecer favorável à contratação direta. Outrossim, ausente qualquer men-suração de eventual dano patrimonial à Administração Pública, em razão da ausência de competitividade da locação, o que poderia ser facilmente demonstrado se acostado o parâmetro do preço médio dos alugueres de imóveis congêneres, no período da contratação. Por conseguinte, diante da ausência dos elementos típicos exigidos jurisprudencialmente, de rigor é o trancamento do processo penal por patente atipicidade formal da conduta narrada, ressalvando-se a possibilidade de nova denúncia, caso sejam minimamente demons-trados os novos fatos, pertinentes às elementares faltantes.

4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofí-cio para determinar o trancamento do processo penal de autos nº 0000547-65.2012.8.03.0000, apenas no que se refere à persecução do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/1993.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Jus-tiça, por unanimidade, não conhecer do pedido e conceder habeas corpus de ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Jorge Mussi e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Jurisprudência penalrevista Jurídica 471

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Presente na tribuna: Dr. Luís Henrique Alves Sobreira Machado (p/ Pacte.).

Brasília (DF), 13 de dezembro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Ribeiro Dantas Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Ribeiro Dantas (Relator):Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de

Glaucia Costa Oliveira contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amapá.

Consta dos autos que a paciente foi denunciada pela prática do crime de dispensa indevida de licitação (Lei nº 8.666/1993, art. 89, caput) e, poste-riormente, a peça exordial acusatória e respectivo aditamento, foram recebi-dos pelo Tribunal de Justiça do Estado do Amapá (e-STJ, fl. 1564).

Irresignada, a Defesa impetrou o presente habeas corpus, para trancar o processo penal de autos nº 0000547-65.2012.8.03.0000, sob o fundamento de ausência de justa causa para deflagração da ação penal, tendo em vista não ter sido descrito na denúncia o efetivo dano ao erário, nem o animus da paciente de perseguir esse fim. Ademais, aduz que a paciente não poderia fi-gurar no polo passivo do processo criminal, pois, como procuradora jurídica da Aleap, apenas emitiu parecer meramente opinativo, o que não constitui a prática do ato administrativo propriamente dito, consubstanciado no aluguel de imóvel pela Administração Pública com a dispensa indevida de licitação.

Postula, assim, a concessão da ordem, para que seja trancado processo penal de autos nº 0000547-65.2012.8.03.0000.

Requerimento de tutela provisória indeferida (e-STJ, fl. 1712).O Ministério Público Federal manifestou-se pela concessão da ordem

(e-STJ, fls. 1731-1734).É o relatório.

EMENTA

penAl e processuAl penAl – hAbeAs corpus substitutivo de recurso – Art. 89 dA lei nº 8.666/1993 –

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Revista JuRídica 471JuRispRudência penal

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dispensA ou inexiGibilidAde de licitAção forA dAs hipóteses previstAs em lei – dolo especÍfico – efetivo

prejuÍzo Ao erário – comprovAção – necessidAde – AtipicidAde dA condutA nArrAdA nA denúnciA – writ não conhecido – ordem concedidA de ofÍcio

1. Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orien-tação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recur-so legalmente previsto para a hipótese, impondo-se o não conheci-mento da impetração, salvo quando constatada a existência de fla-grante ilegalidade no ato judicial impugnado.

2. A jurisprudência desta Corte Superior acompanha o enten-dimento do Pleno do Supremo Tribunal Federal (Inq. 2.482/MG, jul-gado em 15.09.2011), no sentido de que a consumação do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/1993 exige a demonstração do dolo específico, ou seja, a intenção de causar dano ao Erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos, malgrado ausência de disposições legais acerca dessa elementar.

3. O Ministério Público estadual, ao elaborar a denúncia, e o Tribunal a quo, recebendo-a, contrariaram entendimento jurispru-dencial consolidado, porquanto a imputação apenas concluiu pela existência do dolo geral, ou seja, a vontade consciente de executar a conduta típica de dispensa ilegal do procedimento licitatório, consis-tente na inobservância das formalidades legais de dispensa de licita-ção para celebração de contrato de locação de imóvel de propriedade do casal Eider Pena Pestana e Edna Auzier, hoje deputada estadual. Entrementes, não se demonstrou a existência de dolo específico em causar prejuízo ao erário dos coautores e partícipes, dentre eles da paciente, então Subprocuradora da Assembleia Legislativa do Es-tado do Amapá, cuja conduta imputada foi a concessão de parecer favorável à contratação direta. Outrossim, ausente qualquer men-suração de eventual dano patrimonial à Administração Pública, em razão da ausência de competitividade da locação, o que poderia ser facilmente demonstrado se acostado o parâmetro do preço médio dos alugueres de imóveis congêneres, no período da contratação. Por conseguinte, diante da ausência dos elementos típicos exigidos jurisprudencialmente, de rigor é o trancamento do processo penal por patente atipicidade formal da conduta narrada, ressalvando-se a possibilidade de nova denúncia, caso sejam minimamente demons-trados os novos fatos, pertinentes às elementares faltantes.

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Jurisprudência penalrevista Jurídica 471

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4. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofí-cio para determinar o trancamento do processo penal de autos nº 0000547-65.2012.8.03.0000, apenas no que se refere à persecução do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/1993.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Ribeiro Dantas (Relator):

Esta Corte e o Supremo Tribunal Federal pacificaram orientação no sentido de que não cabe habeas corpus substitutivo do recurso legalmente pre-visto para a hipótese, impondo-se o não conhecimento da impetração, salvo quando constatada a existência de flagrante ilegalidade no ato judicial im-pugnado.

Confira-se o teor da denúncia e da decisão de recebimento do adita-mento pelo Tribunal a quo:

“Consta da Investigação nº 111/2011, que serve de suporte à presente de-núncia (cópia anexa) que, em maio de 2011, o primeiro denunciado (Moisés Reátegui de Souza), na qualidade de ordenador de despesas da Assembléia Legisla-tiva do Estado do Amapá, procedeu o aluguel de um imóvel localizado na Av. Pedro Baião, nº 802, com dispensa de licitação (fl. 79).

Para efetivação de seu intento, contou com a participação dos demais denun-ciados (Gláucia Costa Oliveira e Janiery Torres Everton) que contribuíram para dar aparência de legalidade e moralidade ao processo de dispensa, conforme ve-remos a seguir:

Percebe-se pela cópia do procedimento de dispensa, fls. 9/79 dos autos anexos, que não houve preocupação em avaliar outros prédios antes que se efetivasse a locação, obedecendo ao interesse público de garantir igualdade de condições aos particulares para contratarem com a Administração.

Desde o ofício do Secretário de Administração, de 22.03.2011, fl. 11, que informou a necessidade ao Presidente Moisés Souza, até a proposta feita pela Corretora de Imóveis Lia de Jesus Menezes, passaram-se apenas 7 (sete) dias (fl. 42), e nenhum outro imóvel apareceu no processo e nem se procedeu uma avaliação ou pesquisa de preços para verificar se o preço pelo qual fora ofertado estava de acordo com o mer-cado imobiliário local ou se havia outro imóvel disponível que pudesse servir aos interesses da Aleap. O correto seria proceder a uma pesquisa de mercado, fazendo constar tal pesquisa no procedimento, para justificar a dispensa de licitação, em obediência ao art. 24, X, da Lei nº 8.666/1993, abaixo transcrito:

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[…]

Apesar de tais irregularidades, o procedimento de dispensa foi aprovado pela Procuradora Jurídica da Aleap, a denunciada Glaucia Costa Oliveira, que, em parecer de fls. 65/67, opinou pelo ‘deferimento da contratação di-reta’.

A dispensa também foi justificada pelo Presidente da CPL, o denunciado Janiery Torres Everton, fls. 67/68.

O Plenário do Tribunal de Contas da União, em acórdão de nº 444/2008, assim se manifestou sobre a dispensa de licitação na locação de imóveis:

‘REPRESENTAÇÃO – POSSÍVEIS IRREGULARIDADES NO ÂMBITO DO ICMBIO – UM DOS FATOS QUESTIONADOS NÃO SE INSERE NA ESFERA DE COMPETÊNCIA DO TCU – NÃO-CONFIRMAÇÃO DE DUAS DAS TRÊS IRREGULARIDADES APONTADAS – REPRE-SENTAÇÃO IMPROCEDENTE – CONSTATAÇÃO DE AUSÊNCIA INDEVIDA DE LICITAÇÃO PARA LOCAÇÃO DE IMÓVEL – INEXIS-TÊNCIA DE PREJUÍZOS NO CASO CONCRETO – DETERMINAÇÃO

Só é cabível a utilização do art. 24, inciso X, da Lei nº 8.666/1993, quan-do se identificar um imóvel específico cujas instalações e localização evidenciem que ele é o único que atende ao interesse da administração. Relator: Ubiratan Aguiar. Diário Oficial da União: 25.03.2008.’

Pelo que foi apurado, portanto, há indícios de autoria mais do que sufi-cientes para dar início à Ação Penal, considerando-se a prova documental constante na cópia do procedimento investigatório em anexo.

A materialidade do delito encontra-se comprovada pelos diversos documentos cons-tantes nos autos, em especial a cópia integral do procedimento de dispensa de lici-tação.

Em face do exposto, entende este Órgão Ministerial que estão presentes os requisitos necessários à tipificação da prática do crime do art. 89, da Lei Federal nº 8.666/1993 c/c art. 29 do CPB, em relação aos denunciados Moisés Reátegui de Souza, Gláucia Costa Oliveira e Janiery Torres Everton.” (e-STJ, fl. 12-13 – Grifou-se)

A Excelentíssima Senhora Desembargadora Stella Ramos (Relatora) - Re-gistro que a competência desta Corte já está definida em razão do recebi-mento da denúncia em relação a Moisés Reátegui de Souza, Gláucia Costa Oliveira e Janiery Torres Everton (fls. 234-261), sendo o primeiro Deputado Estadual.

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Assim, passo a analisar os argumentos relativos ao aditamento da denún-cia em um só corpo, para fins didáticos.

Conforme dispõe o art. 569 do Código de Processo Penal: “As omissões da denúncia ou da queixa, da representação, ou, nos processos das contra-venções penais, da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser supridas a todo o tempo, antes da sentença final.”

Assim, enquanto não proferida sentença de julgamento da ação penal, é possível o aditamento da denúncia, tanto para inclusão de novos agentes dos delitos nela apontados, quanto também para que sejam inseridos ou-tros tipos penais.

Na espécie, considerando não ter o presente feito sequer ultrapassado a fase postulatória, o aditamento da denúncia não encontra óbice jurídico--processual.

Pois bem.

Segundo descreveu o Ministério Público do Estado do Amapá, no adita-mento à denúncia, a locação do imóvel situado na Av. Pedro Baião, nº 802, Bairro do Trem, nesta cidade de Macapá/AP (Guará Apart Hotel) pela As-sembleia Legislativa do Estado do Amapá, no ano de 2011, com dispensa de licitação, não observou formalidades legais, beneficiando o então par-lamentar Eider Pena Pestana, proprietário do bem, e sua companheira/es-posa, hoje Deputada Estadual, Edna Auzier, proprietária da empresa Edna Auzier – ME, pessoa jurídica responsável pelo imóvel.

A acusada Patrícia de Almeida Barbosa Aguiar, na condição de Procurado-ra-Chefe da Aleap, teria anuído com os demais acusados e com eles concor-rido para a prática dos citados crimes, criando condições necessárias para a consolidação da contratação realizada em desacordo com formalidades legais.

As alegações do órgão acusador encontram-se satisfatoriamente descritas, as quais, aliadas à farta documentação apreendida no bojo da “Operação Eclésia”, caracterizam o lastro probatório mínimo ao recebimento do adita-mento à denúncia, juízo de delibação que não se confunde com o juízo de certeza exigido para o caso de eventual condenação.

[...]

No caso, da análise dos documentos constantes da Investigação Prelimi-nar nº 111/2011-MP/AP, que servem de suporte à presente ação penal, a dispensa de licitação para contratação do imóvel descrito nos autos, pro-

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cedimento cuja legalidade será examinada neste feito, durante a instrução processual, teria beneficiado diretamente os denunciados Edna Auzier e Eider Pena Pestana, casal proprietário do imóvel, não havendo, conforme adiantei anteriormente, neste momento, como desvincular seus nomes em relação à contratação direta questionada, devendo o benefício decorrente também ser apurado por ocasião da instrução processual.

Da mesma forma, em relação à denunciada, Procuradora-Chefe da Aleap, superiora hierárquica da já denunciada Gláucia Costa Oliveira, que teria concorrido para a prática dos delitos em apuração, ratificando parecer confeccionado pela Subprocuradora Gláucia, anuindo para a contratação direta do imóvel.

[...]

Com efeito, este é o primeiro crime apurado na Operação Eclésia, cons-tituindo uma relação jurídica una e não repetitiva a contração direta que supostamente dá ensejo aos delitos em apuração.

Ora, se há apenas a descrição de um fato criminoso, sem qualquer menção à intenção da prática reiterada de outras condutas delituosas não há se fa-lar em formação de quadrilha, sendo impossível esta Relatoria aproveitar--se de questões apurados em outras ações penais para configurar o delito de associação criminosa, em relação ao fato apurado nestes autos.

Portanto, admito o aditamento à denúncia para incluir no polo passivo da presente ação penal originária a Deputada Estadual Edna Auzier e Ei-der Pena Pestana, a fim de que respondam pela prática do crime previsto no art. 89, parágrafo único, da Lei nº 8.666/1993, assim como Patrícia de Almeida Barbosa Aguiar, para que responda pela prática do crime previsto no art. 89, caput, da Lei nº 8.666/1993, afastando, todavia, a imputação aos acusados Moisés Reátegui de Souza, Gláucia Costa Oliveira, Patrícia de Almeida Barbosa Aguiar e Janiery Torres Everton do delito previsto no art. 288, do Código Penal.

[...]

“O Tribunal Pleno do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amapá, em conclusão de julgamento, o Pleno, por maioria recebeu parcialmente o aditamento à denúncia, nos termos do voto proferido pela relatora. Venci-dos em parte, o Desembargador Manoel Brito que não recebia o aditamen-to à denúncia em relação à Patrícia Barbosa Aguiar e o Desembargador Gilberto Pinheiro, que não o recebia integralmente.” (e-STJ, fls. 1561-1582)

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Como cediço, a jurisprudência desta Corte Superior acompanha o en-tendimento do Pleno do Supremo Tribunal Federal (Inq. 2.482/MG, Julga-do em 15.09.2011), no sentido de que a consumação do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/1993 exige a demonstração do dolo específico, ou seja, a inten-ção de causar dano ao erário e a efetiva ocorrência de prejuízo aos cofres públicos, malgrado ausência de disposições legais acerca dessa elementar (AgRg-AREsp 324.066/MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, 6ª T., Julgado em 12.02.2015, DJe 27.02.2015; HC 329227/SP, Min. Jorge Mussi, 5ª T., DJe 13.10.2016; HC 305.899/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, Relª p/ Ac. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., DJe 15/04/2015; AgRg-REsp 1259109/DF, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 19.10.2015; HC 321.224/PR, RHC 46102/RJ, Rel. Min. Rogerio Schietti CRUZ, 6ª T., DJe 10.11.2016).

O Ministério Público estadual, ao elaborar a denúncia, e o Tribunal a quo, recebendo-a, contrariaram entendimento jurisprudencial consolidado, porquanto a imputação apenas concluiu pela existência do dolo geral, ou seja, a vontade consciente de executar a conduta típica de dispensa ilegal do pro-cedimento licitatório, consistente na inobservância das formalidades legais de dispensa de licitação para celebração de contrato de locação de imóvel de pro-priedade do casal Eider Pena Pestana e Edna Auzier, hoje deputada estadual.

Entrementes, não se demonstrou a existência de dolo específico em causar prejuízo ao erário dos coautores e partícipes, dentre eles da paciente, então Subprocuradora da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá, cuja conduta imputada foi a concessão de parecer favorável à contratação direta. Outrossim, ausente qualquer mensuração de eventual dano patrimonial à Administração Pública, em razão da ausência de competitividade da locação, o que poderia ser facilmente demonstrado se acostado o parâmetro do preço médio dos alugueres de imóveis congêneres, no período da contratação. Por conseguinte, diante da ausência dos elementos típicos exigidos jurispruden-cialmente, de rigor é o trancamento do processo penal por patente atipicida-de formal da conduta narrada, ressalvando-se a possibilidade de nova de-núncia, caso sejam minimamente demonstrados os novos fatos, pertinentes às elementares faltantes.

Ante o exposto, não conheço do habeas corpus , mas concedo a ordem de ofício para determinar o trancamento do processo penal de autos nº 0000547-65.2012.8.03.0000, apenas no que se refere à persecução do crime do art. 89 da Lei nº 8.666/1993.

É como voto.

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CERTIDÃO DE JULGAMENTO QUINTA TURMA

Número Registro: 2016/0225589-1 Processo Eletrônico HC 369.019/APMatéria criminalNúmeros Origem: 00005476520128030000 5476520128030000Em Mesa Julgado: 13.12.2016Relator: Exmo. Sr. Ministro Ribeiro DantasPresidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Felix FischerSubprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Franklin Rodrigues da CostaSecretário: Me. Marcelo Pereira Cruvinel

AUTUAÇÃO

Impetrante: Barbara Barbosa de Figueiredo e outroAdvogado: Barbara Barbosa de Figueiredo e outro(s) – DF047765Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado do AmapáPaciente: Glaucia Costa OliveiraCorréu: Moises Reátegui de SouzaCorréu: Janiery Torres EvertonAssunto: Direito penal – Crimes previstos na legislação extravagante – Cri-mes da Lei de licitações

SUSTENTAÇÃO ORAL

Presente na tribuna: Dr. Luís Henrique Alves Sobreira Machado (P/Pacte.)

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Quinta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

“A Turma, por unanimidade, não conheceu do pedido e concedeu Habeas Corpus de ofício, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.”

Os Srs. Ministros Joel Ilan Paciornik, Felix Fischer, Jorge Mussi e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro Relator.

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Habeas Corpus nº 356.185 – SP (2016/0125461-1)Relator: Ministro Antonio Saldanha PalheiroImpetrante: Defensoria Pública do Estado de São PauloAdvogado: Diogo César PerinoImpetrado: Tribunal de Justiça do Estado de São PauloPaciente: Leandro Oliveira de Freitas (preso)

EMENTA

hAbeAs corpus substitutivo de recurso próprio – rAcionAlizAção dA utilizAção do remédio

heróico – tráfico ilÍcito de entorpecentes – cAusA especiAl de diminuição dA penA – não incidênciA –

dedicAção à AtividAde criminosA – impossibilidAde de revolvimento do suporte fático-probAtório nA viA estreitA do writ – pedidos de AlterAção

do reGime iniciAl pArA o Aberto e de substituição dA penA privAtivA de liberdAde prejudicAdos

1. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, e a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, diante da utilização crescente e sucessiva do habeas corpus, passaram a restringir a sua admissibilidade quando o ato ilegal for passível de impugnação pela via recursal própria, sem olvidar a possibilidade de concessão da ordem, de ofício, nos casos de flagrante ilegalidade.

2. Nos termos do disposto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, o agente poderá ser beneficiado com a redução de um sexto a dois ter-ços da pena, desde que seja primário, portador de bons anteceden-tes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa. A razão de ser do chamado tráfico privilegiado consiste em punir com menor rigor o “traficante de primeira viagem”, vale dizer, aquele que não faz do tráfico o seu meio de vida.

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3. Mantém-se o não reconhecimento da minorante prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, uma vez que as instâncias de origem entenderam que as circunstâncias da prática delituosa evi-denciam que o paciente integra organização criminosa e se dedica a atividades criminosas. Por outro lado, a desconstituição do entendi-mento adotado na origem demandaria a incursão no suporte fático--probatório dos autos, tarefa para a qual não se presta o habeas corpus.

4. Não reconhecida a figura do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei de Drogas), ficam prejudicados os pedidos de alteração do regime inicial para o aberto e de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

5. Habeas corpus não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Thereza de Assis Moura, Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 13 de dezembro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Antonio Saldanha Palheiro Relator

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Antonio Saldanha Palheiro (Relator):

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em bene-fício de Leandro Oliveira de Freitas, apontando como autoridade coatora o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Extrai-se dos autos que o paciente foi condenado, em primeiro grau, à pena de 8 (oito) anos, 1 (um) mês e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime inicial fechado, mais multa, pela prática do delito tipificado no art. 33, caput, c/c o art. 40, V, ambos da Lei nº 11.343/2006, pois transportava, para comer-cialização com terceiros, 15.913,28g (quinze mil, novecentos e treze gramas e vinte

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e oito centigrama) de maconha e 3.104,80g (três mil, cento e quatro gramas e oitenta centigramas) de cocaína.

Contra o édito condenatório insurgiu-se a defesa.

Entretanto, em sessão de julgamento realizada em 2 de fevereiro de 2016, a Quarta Câmara de Direito Criminal negou provimento ao apelo em acórdão assim ementado (e-STJ fl. 34):

APELAÇÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – Pleito de absolvi-ção por insuficiência probatória. Impossibilidade. Materialidade, autoria e destinação dos entorpecentes suficientemente comprovadas. Palavras dos policiais às quais se confere relevo probatório. Redução da pena. Descabi-mento. Pena-base adequadamente fixada acima do piso legal, em virtude da quantidade de drogas. Inteligência do art. 42 da Lei nº 11.343/2006. De-monstração de que o acusado se dedicava às atividades criminosas, não fazendo jus à redução prevista no art. 33, § 4º, da mesma Lei. Regime inicial fechado mantido. Fatos gravíssimos. Recurso desprovido.

No Superior Tribunal de Justiça, alega o impetrante a ausência de fun-damentação idônea para a negativa de aplicação da causa especial de dimi-nuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, visto que o paciente é primário, de bons antecedentes e não há provas de dedicação a atividades criminosas ou de que integre organização criminosa.

Argumenta que a quantidade e a natureza das drogas teriam sido uti-lizadas simultaneamente para majorar a pena-base, na primeira fase da dosi-metria, bem como serviu para justificar a negativa de incidência da minoran-te do tráfico, incorrendo no vedado bis in idem.

Defende que é cabível a aplicação do redutor na fração máxima de 2/3 (dois terços).

Sustenta que, com a redução da pena, deverá ser fixado o regime aber-to e substituída a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

Diante dessas considerações, pleiteia, em liminar e no mérito, a inci-dência da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, a fixação do regime inicial aberto para cumprimento da pena e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.

O pedido liminar foi indeferido (e-STJ fls. 47/48).

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Prestadas as informações (e-STJ fls. 57/71), foram os autos encaminha-dos ao Ministério Público Federal, que se manifestou pela concessão da or-dem de ofício (e-STJ fls. 74/84).

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Antonio Saldanha Palheiro (Relator):

A jurisprudência desta Corte Superior, à luz da orientação da Pri-meira Turma do Supremo Tribunal Federal, exarada no julgamento do HC 109.956/PR, com o fito de conceder efetividade ao disposto no art. 102, II, a, da Constituição da República, e nos arts. 30 a 32 da Lei nº 8.038/1990, assentou-se no sentido de que o habeas corpus não pode ser utilizado como substituto de recurso próprio, com vistas a não se desvirtuar a finalidade desse remédio constitucional.

No entanto, quando a ilegalidade apontada é flagrante, excepciona-se tal entendimento, justificando-se a atuação deste Superior Tribunal, caso em que se concede a ordem de ofício. Nesse mesmo sentido: HC 313.318/RS, 5ª T., Rel. Min. Felix Fischer, Julgamento em 07.05.2015, DJe de 21.05.2015; HC 321.436/SP, 6ª T., Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, Julgado em 19.05.2015, DJe de 27.05.2015.

Assim, de início, incabível o presente habeas corpus substitutivo de re-curso. Todavia, em homenagem ao princípio da ampla defesa, passa-se ao exame da insurgência, para verificar a existência de eventual constrangimen-to ilegal passível de ser sanado pela concessão da ordem, de ofício.

In casu, não vislumbro o alegado constrangimento ilegal a ensejar a concessão da ordem de ofício.

O magistrado singular, ao condenar o paciente, estabeleceu a pena nos seguintes termos (e-STJ fls. 25/32):

Atento à diretriz do art. 59 do Código Penal, verifico que o réu, apesar de primário, transportava grande quantidade de drogas (mais de três quilos de “cocaína” e mais de quinze quilos de “maconha”), de modo que aplico a pena-base em dois terços acima do mínimo legal, ou seja, em oito anos e quatro meses de reclusão e oitocentos e trinta e três dias-multa. Em face da agravante prevista no art. 40, V, da Lei nº 11.343/2006, aumento a pena de um sexto (1/6), perfazendo a pena de nove anos, oito meses e vinte dias

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de reclusão e novecentos e setenta e um dias-multa. Em face da confissão espontânea do réu, reduzo a pena de um sexto (1/6), perfazendo a pena definitiva de oito anos, um mês e seis dias de reclusão e pagamento de oi-tocentos e nove dias-multa. Não é caso de reconhecer-se a redução de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, posto que o réu, apesar de primário, e se dedica a atividades criminosas, tanto que foi preso em fla-grante e está sendo condenado por tráfico de entorpecente por transportar mais de dezoito quilos de drogas (“maconha” e “cocaína”), e também por-que ficou demonstrado que o réu foi contratado por um indivíduo chama-do “João”, que esta preso no presídio de São Cristóvão, em Sergipe, o que evidencia que o réu tem envolvimento com organização criminosa e faz do tráfico o seu meio de vida. Ademais, tal dispositivo ofende o princípio da proporcionalidade das penas, ama vez que a reprimenda deve ser propor-cional à reprovabilidade da conduta e não é aceitável que a pena do crime de tráfico de entorpecente seja reduzida de até dois terços, muito aquém de mínimo legal estabelecido, já que isso importaria na imposição de pena absolutamente desproporcional à gravidade do delito.

O Tribunal de origem, ao negar provimento ao apelo defensivo, mante-ve o édito condenatório, assim fundamentando (e-STJ fls. 59/68):

Condenação, assim, bem lançada.

A básica foi adequadamente fixada em 2/3 acima do mínimo legal em ra-zão da elevada quantidade de drogas, pois o réu transportava mais de 18kg de entorpecentes.

Frente a isso, era mesmo de rigor a valoração negativa de tal circunstância, nos termos do art. 42 da Lei nº 11.343/2006, segundo o qual a natureza e a quantidade de entorpecentes são parâmetros que devem preponderar so-bre o art. 59 do Código Penal e ser considerados na fixação da pena- base.

[...]

Em seguida, houve a redução da pena pela atenuante da confissão es-pontânea na fração de 1/6 e o aumento no mesmo quantum em função do art. 40, V, da Lei de Drogas.

Por fim, em que pese os argumentos da combativa defesa, não é caso de se aplicar o redutor previsto no art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, haja vista a demonstração de que o apelante se dedicava às atividades criminosas.

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Neste ponto, cumpre frisar que a sentença não se lastreou, exclusivamente, na circunstância “quantidade de drogas” para não incidir a aludida mino-rante.

É certo que, por si só, o transporte de 14 tijolos de duas variedades de dro-gas, totalizando cerca de 18kg já é um forte indicativo de que o réu se de-dica às atividades criminosas, vale dizer, de que a presente conduta não se tratou de um ato isolado em sua vida, mas sim de uma prática reiterada, pois, certamente, ninguém confiaria a um desconhecido o transporte entre diversos Estados da Federação de tamanha quantidade de entorpecentes.

Destarte; o dispositivo legal em apreço exige que o agente, além de primá-rio, não se dedique à atividade criminosa ou não integre organização com esse fim, ou seja, é benefício destinado apenas e tão somente ao traficante de menor quilate, neófito, que se engaja pela primeira vez no tráfico ilícito, o “traficante de primeira viagem”, nas palavras de Guilherme de Souza Nucci (Leis Penais Especiais, RT, 2. ed., 2007, p. 330), o que, à evidência, não é o caso dos autos.

[...]

O decisum; além disso, fundamentou a negativa de redução de pena em evidências de que o réu integrava organização criminosa, na medida em que foi contratado por um presidiário de Sergipe para que fosse a Mato Grosso do Sul buscar as drogas e transportá-las entre os diversos Estados da Federação com destino a Recife.

Logo, tais circunstâncias, analisadas conjuntamente, permitem concluir que o réu se dedicava às atividades criminosas sem violar o “bis in idem” sinalizado pela defesa, não fazendo jus à minorante em tela.

Sob esse prisma, verifica-se que as instâncias ordinárias fixaram a pe-na-base 2/3 (dois terços) acima do mínimo legal, considerando a quantidade das drogas apreendidas (15.913,28g – quinze mil, novecentos e treze gramas e vinte e oito centigrama de maconha e 3.104,80g – três mil, cento e quatro gramas e oitenta centigramas de cocaína), a demonstrar o alto grau de re-provabilidade de sua conduta, merecendo, por isso, tratamento mais severo, conforme o teor do art. 42 da Lei nº 11.343/2006.

No que toca à negativa de incidência da causa especial de diminuição da pena, prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, não vislumbro constrangimento ilegal.

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De acordo com o aludido art. 33, § 4º, da Lei de Drogas, o agente po-derá ser beneficiado com a redução de um sexto a dois terços da pena, desde que seja primário, portador de bons antecedentes, não se dedique a ativida-des criminosas nem integre organização criminosa.

A razão de ser do chamado tráfico privilegiado, de que trata o citado dispositivo, consiste em punir com menor rigor o “traficante de primeira via-gem”, vale dizer, aquele que não faz do tráfico o seu meio de vida. A propó-sito, confira-se a seguinte lição:

[...]. Cuida-se de norma inédita, visando à redução da punição do traficante de primeira viagem, o que merece aplauso. Portanto, aquele que cometer o delito previsto no art. 33, caput ou § 1º, se for primário (indivíduo que não é reincidente), vale dizer, não cometeu outro delito, após ter sido definiti-vamente condenado anteriormente por crime anterior, no prazo de cinco anos, conforme arts. 63 e 64 do Código Penal) e tiver bons antecedentes (su-jeito que não ostenta condenações definitivas anteriores), não se dedican-do às atividades criminosas, nem integrando organização criminosa, pode valer-se da pena mais branda. (In Lei penais e processuais penais comentadas. NUCCI, Guilherme de Souza. 9. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Fo-rense, 2015, p. 358-359)

Na hipótese, as instâncias de origem deixaram de aplicá-la por enten-derem que as circunstâncias da prática delituosa evidenciam que o paciente integra organização criminosa e se dedica a atividades criminosas, tendo o Tribunal a quo destacado no acórdão impugnado que “O decisum; além disso, fundamentou a negativa de redução de pena em evidências de que o réu integrava organização criminosa, na medida em que foi contratado por um presidiário de Ser-gipe para que fosse a Mato Grosso do Sul buscar as drogas e transportá-las entre os diversos Estados da Federação com destino a Recife” (e-STJ fl. 66). E, ao contrário do alegado pela defesa, a natureza e a quantidade de drogas não foram si-multaneamente consideradas nas duas etapas de fixação da pena.”

Por outro lado, a desconstituição dos fundamentos adotados pelo Tri-bunal de origem demanda ampla incursão no acervo fático-probatório do processo, tarefa para a qual não se presta o habeas corpus.

Sobre o tema, colaciono os seguintes julgados desta Corte:

PENAL E PROCESSUAL – HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO NÃO CONHECIMENTO – TRÁFICO DE DROGAS – PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL – FUNDAMENTO IDÔNEO – QUANTIDADE DA

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DROGA – MINORANTE DO § 4º DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/2006 – PRETENDIDA APLICAÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – NÃO PREENCHI-MENTO DOS REQUISITOS LEGAIS – PRESENÇA DE INDICATIVOS NOS AUTOS DE DEDICAÇÃO À ATIVIDADE CRIMINOSA – REVISÃO – VIA IMPRÓPRIA – IMPOSIÇÃO DE REGIME PRISIONAL MAIS GRA-VOSO – PREVISÃO LEGAL DECLARADA INCONSTITUCIONAL PELO STF – PLEITO DE SUBSTITUIÇÃO DAS PENAS – IMPOSSIBILIDADE – CONDENAÇÃO SUPERIOR A 4 ANOS – HABEAS CORPUS NÃO CO-NHECIDO – ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO

1. Ressalvada pessoal compreensão diversa, uniformizou o Superior Tri-bunal de Justiça ser inadequado o writ em substituição a recursos especial e ordinário, ou de revisão criminal, admitindo-se, de ofício, a concessão da ordem ante a constatação de ilegalidade flagrante, abuso de poder ou teratologia.

2. A pena-base fixada acima do mínimo legal, com fundamento na ex-pressiva quantidade de substância entorpecente apreendida – 537,5g de maconha –, é considerada por esta Corte Superior motivação concreta e adequada, não se revelando, assim, desproporção na dosimetria, sobretu-do porque o art. 42 da Lei nº 11.343/2006 impõe ao Juiz considerar, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da droga na fixação da pena-base. Precedentes.

3. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a quantidade e a natureza da droga podem justificar a não aplicação da minorante prevista no art. 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006, quando demonstrarem a dedicação à ativida-de criminosa. Precedentes.

4. Evidenciado que a aplicação do benefício foi afastado em virtude das circuns-tâncias do caso – em especial, a quantidade da droga –, a qual evidenciaria o não preenchimento dos requisitos legais, por se tratar de réu em relacionamento estreito com o crime organizado, inexiste constrangimento ilegal a ser sanado, sendo que a pretendida revisão do julgado implicaria o reexame do material cognitivo pro-duzido nos autos, insuscetível de ser realizada na estreita via do habeas corpus. Precedentes.

[...].

7. Habeas corpus não conhecido, mas, de ofício, concedo a ordem apenas para que o juízo das execuções – haja vista o trânsito em julgado da conde-nação – proceda à nova fixação do regime inicial de cumprimento da pena, com estrita observância às regras do art. 33 do CP, afastada a previsão legal

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do art. 2º, § 1º da Lei nº 8.072/1990, na redação da Lei nº 11.464/2007, nos termos do art. 557, § 1º-A do CPC c/c arts. 3º e 654, § 2º, do CPP.

(HC 260.983/SP, Rel. Min. Nefi Cordeiro, 6ª T., Julgado em 05.04.2016, DJe 18.04.2016, grifei)

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO – DESCA-BIMENTO – TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS (ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006) – DEDICAÇÃO À ATIVIDADE CRIMINOSA – QUAN-TIDADE DE DROGA APREENDIDA – ELEMENTO IDÔNEO PARA JUS-TIFICAR A NÃO APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA – REGIME SEMIABERTO MANTIDO – ART. 33, § 2º, B, DO CÓDIGO PE-NAL – CP – SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIREITOS – IMPOSSIBILIDADE – PATAMAR DA REPRIMENDA SUPERIOR A 4 ANOS – HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO

O Superior Tribunal de Justiça, seguindo a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, passou a inadmitir habeas corpus substitutivo de recurso próprio, ressalvando, porém, a possibilidade de concessão da ordem de ofício nos casos de flagrante constrangimento ilegal.

A causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006 não foi aplicada no caso concreto em razão da dedicação do paciente às atividades criminosas, evidenciada sobretudo pela quantidade de droga apreendida, elemento hábil a impedir a incidência dessa minorante. Ademais, para se acolher a tese de que o paciente não se dedica às atividades criminosas, seria necessário o reexame aprofundado das provas, inviável em habeas corpus.

[...]

Habeas corpus não conhecido. (HC 345.306/RJ, Rel. Min. Ericson Maranho – Desembargador Convocado do TJ/SP, 6ª T., Julgado em 03.03.2016, DJe 16.03.2016, grifei)

HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS – IMPETRAÇÃO SUBSTITU-TIVA DE RECURSO ESPECIAL – DOSIMETRIA – PENA-BASE – QUAN-TIDADE E NATUREZA – EXASPERAÇÃO JUSTIFICADA – CONFISSÃO ESPONTÂNEA – PARCIAL – UTILIZAÇÃO PARA EMBASAR A SEN-TENÇA – INCIDÊNCIA DA ATENUANTE – CAUSA ESPECIAL DE DI-MINUIÇÃO DE PENA – NÃO INCIDÊNCIA – DEDICAÇÃO ÀS ATIVI-DADES CRIMINOSAS – AFERIÇÃO – REVOLVIMENTO FÁTICO-PRO-BATÓRIO – INVIABILIDADE – FIXAÇÃO DE REGIME MAIS BRANDO – SUBSTITUIÇÃO DA PENA – IMPOSSIBILIDADE – PENA SUPERIOR A

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4 ANOS – CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL DESFAVORÁVEL – NÃO CO-NHECIMENTO – ORDEM DE OFÍCIO

1. Tratando-se de habeas corpus substitutivo de recurso especial, inviável o seu conhecimento.

[...]

4. Concluído pela Corte estadual, com arrimo nos fatos da causa, que o paciente se dedicava às atividades criminosas, não incide a causa especial de diminuição de pena, porquanto não preenchidos os requisitos previstos no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006. Para concluir em sentido diverso, há necessidade de revol-vimento do acervo fático-probatório, providência incabível na via estreita do habeas corpus.

[...].

7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, a fim de redu-zir a pena do paciente para 5 (cinco) anos de reclusão, mais 500 dias-multa mantidos os demais termos da condenação.

(HC 327.834/SP, Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., Julgado em 17.11.2015, DJe 30.11.2015, grifei)

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO – INADE-QUAÇÃO DA VIA ELEITA – TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES – ART. 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006 – PACIENTE CONDENADO À PENA DE 5 ANOS DE RECLUSÃO, EM REGIME FECHADO – PLEITO DE RECONHECIMENTO DA FIGURA DO TRÁFICO PRIVILEGIADO – INVIABILIDADE – PACIENTE QUE SE DEDICA ÀS ATIVIDADES CRI-MINOSAS – PREJUDICADO O PLEITO DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA CORPORAL POR RESTRITIVAS DE DIREITOS – REGIME PRISIONAL FECHADO – REFERÊNCIA À HEDIONDEZ DO CRIME – IMPOSSIBI-LIDADE – FUNDAMENTAÇÃO AFASTADA – CIRCUNSTÂNCIAS JU-DICIAIS FAVORÁVEIS – REGIME SEMIABERTO DEFERIDO – CONS-TRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO – HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO – ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO

[...]

Esta Corte Superior tem decidido que a quantidade, a variedade e a nocividade da droga apreendida evidenciam a dedicação às atividades criminosas e, em decorrên-cia, podem embasar o não reconhecimento da minorante do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. Precedentes.

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Hipótese em que não foi reconhecida a figura do tráfico privilegiado pelas instâncias ordinárias com base na quantidade, natureza e diversidade das drogas apreendidas (13,32g de maconha e 78,28g de cocaína) e das circuns-tâncias em que o delito ocorreu, as quais indicam que o paciente dedicava--se às atividades criminosas. Modificar tal conclusão requer o revolvimen-to fático-probatório, inviável na estreita via do habeas corpus.

[...]

Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício apenas para mo-dificar o regime de cumprimento da pena para o semiaberto.

(HC 323.628/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., Julgado em 26.04.2016, DJe 02.05.2016, grifei)

Mantida a reprimenda em 8 (oito) anos, 1 (um) mês e 6 (seis) dias de reclusão, ficam prejudicados os pedidos de modificação do regime prisional para o aberto (art. 33, § 2º, c, do CP), bem como o de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (art. 44, I, do Código Penal).

Ante o exposto, não conheço do presente habeas corpus.

É como voto.

Ministro Antonio Saldanha Palheiro Relator

CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEXTA TURMA

Número Registro: 2016/0125461-1 Processo Eletrônico HC 356.185/SP

Matéria Criminal

Números Origem: 00158700420148260032 158700420148260032 19442014 20160000050903

Em Mesa Julgado: 13.12.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Antonio Saldanha Palheiro

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Juliano Baiocchi Villa--Verde de Carvalho

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Secretário: Bel. Eliseu Augusto Nunes de Santana

AUTUAÇÃO

Impetrante: Defensoria Pública do Estado de São Paulo

Advogado: Diogo César Perino

Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Paciente: Leandro Oliveira de Freitas (preso)

Assunto: Direito penal – Crimes previstos na legislação extravagante – Crimes de tráfico ilícito e uso indevido de drogas – Tráfico de drogas e condutas afins

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Sexta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Sexta Turma, por unanimidade, não conheceu do habeas corpus, nos ter-mos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Maria Thereza de Assis Moura, Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz e Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.

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TrF 4ª r.Tribunal regional Federal da 4ª região

Habeas Corpus nº 5053207-15.2016.4.04.0000/PRRelator: Sebastião Ogê MunizPaciente/Impetrante: Andre Bueno PereiraAdvogado: Ian Anderson Staffa Maluf de SouzaImpetrado: Juízo Substituto da 12ª VF de CuritibaMPF: Ministério Público Federal

EMENTA

processuAl penAl – hAbeAs corpus – execução penAl – reGime Aberto – prisão domiciliAr – monitorAmento

eletrÔnico – possibilidAde – constrAnGimento ileGAl não verificAdo – deneGAção dA ordem

1. A Lei nº 7.210/1984, em seus arts. 115 e 116, permite ao juiz da execução penal, diante das peculiaridades do caso concreto, esta-belecer condições especiais para a concessão de regime aberto, bem como, em caso de necessidade, modificar as condições porventura estabelecidas.

2. O monitoramento eletrônico, em casos como o dos autos, encontra amparo tanto no art. 146-B, inciso IV, da Lei de Execuções Penais, quanto no art. 7º do Provimento nº 46/2016, da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, denegar a ordem, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

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Porto Alegre, 10 de janeiro de 2017.

Des. Federal Sebastião Ogê Muniz Relator

RELATÓRIO

Trata-se de habeas corpus impetrado por Ian Anderson Staffa Maluf de Souza em favor de André Bueno Pereira.

Narra que o paciente foi condenado à pena privativa de liberdade de 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, pela prática dos crimes previstos no art. 33, caput, c/c o art. 40, inciso I, da Lei nº 11.343/2006 e no art. 16, caput, da Lei nº 10.826/2003, em regime aberto.

Informa que, mesmo estando no regime aberto, o paciente está usando tornozeleira eletrônica.

Alega que, no regime aberto, todavia, não há a necessidade de fiscali-zação do apenado.

Aduz que o monitoramento eletrônico do paciente é medida despro-porcional ao regime em que ele se encontra, bem como sem previsão legal para tanto.

Invoca o disposto no art. 185 da Lei de Execuções Penais.

O pedido de liminar foi indeferido (evento 2).

A autoridade impetrada prestou informações no evento 5.

Oficiando no feito, o Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem (evento 8).

É o relatório.

Processo em mesa.

Des. Federal Sebastião Ogê Muniz Relator

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VOTO

A decisão inicial, que indeferiu o pedido de concessão da medida limi-nar, traz a seguinte fundamentação:

O paciente foi condenado, no processo nº 5049734-41.2014.404.7000/PR, pela prática dos crimes tipificados no art. 33, caput, c/c o art. 40, inciso I, ambos da Lei nº 11.343/2006 e no art. 16 da Lei nº 10.826/2003, na forma do art. 70 do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão, no regime aberto.

Não houve substituição da pena corporal por penas restritivas de direitos.

Após a detração, restou ao condenado o cumprimento de 03 (três) anos, 09 (nove) meses e 06 (seis) dias de reclusão.

Beneficiado pela deficiência estrutural do Estado, que não possui estabele-cimento adequado ao cumprimento do regime aberto (casa de albergado), foi concedida ao paciente “prisão domiciliar”, consoante as seguintes con-dições (evento 3 da execução penal):

I – permanecer recolhido em prisão domiciliar (ante a inexistência de casa de albergado ou outro estabelecimento adequado para o cumprimento de pena em regime aberto – art. 93 da LEP), no período entre 20h00 e 06h00 do dia seguinte, nos dias úteis, e em período integral nos dias de folga, feriados, sá-bados e domingos, sendo que, neste momento e à míngua de informações concretas, considero como horário de trabalho do executado o período das 08h00 às 17h00 de segunda a sexta feira e das 08h00 ao meio dia nos sábados;

II – sair para o trabalho e retornar nos horários fixados;

III – não se ausentar da cidade de residência sem autorização judicial.

O equipamento de tornozeleira eletrônica foi instalado no dia 09.12.2015 (evento 13 da execução penal).

O sistema de monitoramento eletrônico reportou 393 (trezentas e noventa e três) violações (eventos 45, 98 e 102 da execução penal), motivo pelo qual foi aprazada audiência de justificação.

Na audiência de justificação, que se realizou em 11.10.2016, o paciente foi mantido no regime em que se encontra, tendo sido estabelecidas as seguin-tes condições (evento 104 – TERMOAUD1 – da execução penal):

a) o apenado deverá informar, às segundas-feiras, o seu dia de folga se-manal;

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b) ele deverá apresentar, no prazo de 20 (vinte) dias, cópia do seu contrato de trabalho ou informar a impossibilidade, justificadamente;

c) a troca da tornozeleira e a realização de perícia;

d) o acréscimo de 01 (um) mês na pena do paciente.

A troca do equipamento foi realizada em 11.10.2016 (evento 106 da execu-ção penal).

Em 28.11.2016, o juízo da execução proferiu decisão que, na parte que im-porta a este habeas corpus, possui o seguinte teor (evento 120 da execução penal):

2. Observa-se dos autos que, mesmo ciente o executado acerca da neces-sidade de regularizar o pagamento das parcelas de multa, devendo jun-tar aos autos os respectivos comprovantes no prazo de 20 dias a contar da audiência de 13.10.2016 (evento 104), até o momento não recolheu referidas parcelas, o que demonstra falta de comprometimento com a reprimenda.

Em 03.11.2016 (evento 109), a defesa solicitou o elastecimento do prazo de 5 dias para juntar os comprovantes e até a data de hoje não o fez.

Segundo evento 85 (DARF4), foram recolhidas apenas 6 parcelas em data de 31.08.2016.

Não há explicação razoável para a ausência de recolhimento da multa, posto encontrar-se o apenado devidamente empregado, auferindo ren-da, e haver aceitado o pagamento em valores condizentes com o seu salário e de forma parcelada.

3. A cópia do contrato de trabalho igualmente deveria ser apresentada no prazo de 20 (vinte) dias a contar da audiência de 13.10.2016. Con-tudo, até o momento não o foi. No evento 109, em 03.11.2016, a defesa afirmou que o executado tem enfrentado dificuldade em conseguir a cópia do contrato de trabalho.

Conforme destacado em audiência (evento 104), é documento necessá-rio para a comprovação dos dias e horários de expediente do apenado na empresa, não podendo ser substituído pela cópia da CTPS, que ape-nas comprova a admissão em determinada empresa. Verifica-se, ain-da, que conforme registro em CTPS o apenado teria sido contratado há quase 3 (três) meses, não sendo razoável que até o momento não lhe seja possível o fornecimento da cópia do contrato de trabalho ou, ao menos, de declaração da empresa em que constem os horários de trabalho.

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Deverá, pois, a defesa proceder à juntada da cópia do contrato de tra-balho ou, ao menos, de declaração da empresa em que constem os ho-rários de trabalho.

4. Quanto ao episódio de violação em data de 13.11.2016, no período de 16h10 às 22h, reputo excepcionalmente justificado face à apresentação da declaração de comparecimento perante a UPA 24h João Samek. Entre-tanto, como bem ponderou o Ministério Público Federal, o apenado não comprovou a dependência de seu irmão e/ou a necessidade do acom-panhamento, ficando advertido que similar acontecimento futuro deve vir comprovado de outros documentos que justifiquem a sua especial atenção em relação ao irmão.

5. Em relação à nova atividade profissional a ser exercida pelo executa-do, demandando alteração da área de inclusão e dos horários de reco-lhimento, deve ser indeferida, por ora, ante a insuficiência de elementos apresentados pela defesa.

O único documento utilizado para instruir o requerimento é o compro-vante de inscrição no CNPJ (evento 113, CNPJ2), que é insuficiente para demonstrar a existência de efetivo trabalho pelo apenado.

Deve a defesa providenciar a instrução do pedido com mais dados e documentos, com a indicação dos dias e horários das jornadas, com-provante do endereço em que será exercida a atividade e outros que entender pertinentes.

Após a juntada desses documentos, deverá ser aberta nova vista ao MPF.

6. Nesse passo, intimem-se a defesa e o apenado para que providenciem, no prazo de 10 (dez) dias, a juntada aos autos da cópia do contrato de traba-lho do apenado ou de declaração da empresa em que constem os horá-rios de trabalho, bem como a juntada dos comprovantes de pagamento das parcelas de multa em atraso, em cumprimento ao determinado em audiência (evento 104). Deverá, no mesmo prazo, querendo, instruir o pedido de evento 113 com informações e documentos pertinentes, nos termos do item 5, acima.

Alerte-se novamente o executado, conforme já cientificado em audiên-cia, de que o Juízo não tolerará novo descumprimento injustificado de qualquer das condições impostas e que, constatada nova violação, es-tará sujeito à imediata regressão de cumprimento da pena privativa de liberdade para o regime semiaberto ou fechado.

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Pois bem.

A Lei nº 7.210/1984, em seus arts. 115 e 116, permite ao juiz da execução penal, diante das peculiaridades do caso concreto, estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, assim como, se for necessário, modificá-las.

O monitoramento eletrônico, em casos como o presente, encontra amparo tanto no art. 146-B, inciso IV, da Lei de Execuções Penais, quanto no art. 7º do Provimento nº 46/2016, da Corregedoria Regional da Justiça Federal da 4ª Região.

Confira-se o teor desses dispositivos:

Art. 146-B. O juiz poderá definir a fiscalização por meio da monitoração eletrônica quando: (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

[...]

IV – determinar a prisão domiciliar; (Incluído pela Lei nº 12.258, de 2010)

Art. 7º Sem prejuízo das medidas adotadas pelo Magistrado em cada caso, o monitoramento eletrônico poderá ser utilizado:

I – como medida cautelar diversa da prisão;

II – para presos que tenham sido submetidos à prisão domiciliar como punição pela regressão de penas substitutivas;

III – para presos cuja condenação tenha estabelecido o regime aberto;

IV – como instrumento de fiscalização das medidas protetivas de víti-mas ou testemunhas.

A Sétima e a Oitava Turmas deste Tribunal, a respeito da questão ora em análise, assim se manifestaram:

AGRAVO DE EXECUÇÃO PENAL – DECRETO Nº 8.615/2015 – CUM-PRIMENTO DE APENAS UMA DAS RESTRITIVAS DE DIREITO – CONCESSÃO DE INDULTO – IMPOSSIBILIDADE – PRESCRIÇÃO EXECUTÓRIA – INOCORRÊNCIA – MONITORAMENTO ELETRÔ-NICO – REGIME ABERTO DOMICILIAR – COMPATIBILIDADE – 1. O Decreto nº 8.615/2015 prevê a concessão de indulto nos casos em que substituída a pena privativa de liberdade para aqueles que tenham cumprido um quarto da pena, se não reincidentes. 2. A concessão do indulto depende do cumprimento de 1/4 de cada uma das penas restri-tivas de direitos, verificadas isoladamente. O cumprimento de apenas

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uma das penas restritivas de direito não tem o condão de preencher o requisito autorizador para a concessão do indulto. 3. O curso da prescri-ção executória, iniciada com o trânsito em julgado para ambas as partes (v.g. TRF 4ª R., Agravo em Execução Penal nº 0001263-38.2003.404.7203, 8ª T., Des. Fed. João Pedro Gebran Neto, DE 07.04.2016), interrompe-se com o início ou continuação do cumprimento da pena, a teor do dispos-to no art. 117, V, do Código Penal. 4. O cumprimento da pena no domicílio da acusada, nos termos em que determinado pelo juízo a quo, autoriza o moni-toramento eletrônico. Ao contrário do que ocorre com os presos que retornam ao final do dia para a casa do albergado, não é possível fazer um controle diário in loco do retorno para os domicílios daqueles que cumprem o regime aberto em suas residências, razão pela qual necessário o uso da tornozeleira. 5. Agravo de execução penal desprovido.

(TRF 4ª R., AGEPN 5005221-14.2016.404.7001, 8ª T., Rel. Des. Fed. João Pedro Gebran Neto, Julgado em 29.06.2016) (grifei)

EXECUÇÃO PENAL – REGIME ABERTO – MONITORAMENTO ELE-TRÔNICO – INSTALAÇÃO DE TORNOZELEIRA – CABIMENTO – Ao Juiz da execução penal é dado estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, bem como modificá-las, atendendo as peculiaridades do caso, nos termos dos arts. 115 e 116 da Lei de Exe-cução Penal. Tendo em conta ausências injustificadas do executado a atos do processo, é possível a instalação de tornozeleira, para monito-ração eletrônica (Código de Processo Penal, art. 319, IX), como medida de fiscalização que concorre para o cumprimento da pena, mormente quando estabelecido o recolhimento noturno no endereço residencial. O monitoramento eletrônico corresponde a acompanhamento à distância do apenado, que não afronta a sua dignidade.

(TRF 4ª R., AGEPN 5003597-27.2016.404.7001, 7ª T., Rel. Des. Fed. Márcio Antônio Rocha, Julgado em 05.07.2016) (grifei)

Dessa forma, não verifico máculas naquela decisão que colocou o pacien-te em regime aberto domiciliar, com monitoração eletrônica (evento 3 da execução penal).

Ante o exposto, indefiro o pedido de concessão da medida liminar.

Pois bem.

A Lei nº 7.210/1984, em seus arts. 115 e 116, permite ao juiz da execu-ção penal, diante das peculiaridades do caso concreto, estabelecer condições

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especiais para a concessão de regime aberto, bem como, em caso de necessi-dade, modificar as condições porventura estabelecidas.

O monitoramento eletrônico, em casos como o dos autos, no qual é imposto ao paciente o cumprimento da pena em regime domiciliar, encontra amparo tanto no art. 146-B, inciso IV, da Lei de Execuções Penais, quanto no art. 7º do Provimento nº 46/2016, da Corregedoria Regional da Justiça Fede-ral da 4ª Região.

Esse é o entendimento das duas Turmas que compõem a Quarta Seção deste TRF.

Em idêntico sentido, o parecer do Ministério Público Federal, da lavra da Dra. Cristianna Dutra Brunelli Nácul, Procuradora Regional da República, cuja ementa possui o seguinte teor:

HABEAS CORPUS – PENAL – PROCESSO PENAL – REGIME ABERTO – PRISÃO DOMICILIAR – MONITORAÇÃO ELETRÔNICA – CABIMEN-TO – NECESSIDADE DEMONSTRADA – INADEQUAÇÃO – CONS-TRANGIMENTO – NÃO COMPROVAÇÃO

1. Trata-se de habeas corpus que busca o afastamento da monitoração ele-trônica de apenado que cumpre pena em regime de prisão domiciliar por inexistência de estabelecimento adequado para cumprimento da pena em regime aberto.

2. Os elementos dos autos demonstram que, em quatro meses de cumpri-mento de pena, o apenado já descumpriu, em diversas oportunidades, as condições impostas pelo juízo da execução em relação aos locais em que pode permanecer, evidenciando a necessidade de fiscalização contínua do cumprimento da pena em regime de prisão domiciliar, o que somente pode ser obtido através do monitoramento eletrônico.

3. Em que pese alegue sofrer constrangimento ilegal, o apenado não apre-sentou elemento algum que comprove sua ocorrência.

4. Se, por um lado, o não cumprimento, pelo Estado, das regras da Lei nº 7.210/1984, ao não disponibilizar estabelecimento adequado para o cumprimento da pena, não pode onerar o apenado ao ponto de inviabilizar uma das condições de cumprimento desse regime, por outro, a monitora-ção eletrônica, por si só, não ofende a dignidade do apenado.

5. Parecer pela denegação da ordem.

Ante o exposto, voto por denegar a ordem.

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Des. Federal Sebastião Ogê Muniz Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10.01.2017

Habeas Corpus nº 5053207-15.2016.4.04.0000/PR

Origem: PR 50563275220154047000

Relator: Des. Federal Sebastião Ogê Muniz

Presidente: Desª Federal Cláudia Cristina Cristofani

Procurador: Dr. Ângelo Roberto Ilha da Silva

Paciente/Impetrante: Andre Bueno Pereira

Advogado: Ian Anderson Staffa Maluf de Souza

Impetrado: Juízo Substituto da 12ª VF de Curitiba

MPF: Ministério Público Federal

Certifico que o(a) 7ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu denegar a ordem.

Relator Acórdão: Des. Federal Sebastião Ogê Muniz

Votante(s): Des. Federal Sebastião Ogê Muniz Des. Federal Leandro Paulsen Desª Federal Cláudia Cristina Cristofani

Liliane Cristina Kroskinsque Palombo Koenemann Franco Secretária em substituição

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EmEntário PEnal

contrAbAndo – prescrição dA pretensão punitivA

– inocorrênciA

31742 – “Penal e processual penal. Apelação criminal. Contrabando. Prescrição da pre-tensão punitiva. Inocorrência. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. Autoria e dolo comprovados. Dosimetria da pena. Maus antecedentes. Circunstâncias do crime. Reincidência. Confissão. Regime inicial semiaberto. Impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade. 1. Considerando o prazo prescricional fixado pelo art. 109, V, do Código Penal e a pena imposta ao acusado, ora apelante, não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal. 2. A materialidade do crime está comprovada pelo auto de apresentação e apreensão, pelo auto de infração e termo de apreensão e guarda fiscal e pelos laudos de exame merceológico. 3. Tratando-se do delito de contrabando, o mero valor do tributo iludido não pode ser utilizado como parâmetro para eventual aplicação do princípio da insignificância, pois a questão relativa à evasão tributária é secundária. O bem jurídico tutelado é a saúde pública, razão pela qual o princípio da insignificância não tem, em regra, aplicação. Precedentes. 4. A autoria e o dolo encontram-se devidamente comprovados pelo auto de prisão em flagrante, pelo auto de apresentação e apreensão, pela prova oral e pelas declarações do próprio acusado, em sede de interrogatório judicial. 5. Dosimetria da pena. Maus antecedentes e circunstâncias da prática delitiva. Pena-base acima do mínimo legal. 6. Nos termos do art. 64, inc. I, do Código Penal, o termo inicial para contagem de reincidência é a data do cumprimento ou extinção da pena, e não a data do trânsito em julgado da condenação. 7. Mesmo quando imbuída de teses defensivas, descriminantes ou exculpantes, a confissão deve ser considerada na graduação da pena. Posicionamento do STJ. 8. Possibilidade de compensação da circunstância agravante da reincidência com a circunstância atenuante da confissão. Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 9. Regime inicial semiaberto e impossibilidade de substituição da pena privati-va de liberdade por restritiva de direitos em razão da reincidência, dos maus antecedentes e das circunstâncias concretas da prática do crime. 10. Apelação desprovida.” (TRF 3ª R. – ACr 0006245-53.2010.4.03.6112/SP – 11ª T. – Rel. Des. Fed. Nino Toldo – DJe 11.01.2017)

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contrAvenção penAl – viAs de fAto – violênciA domésticA

contrA A mulher – condenAção

31743 – “Penal. Habeas corpus. Contravenção penal. Vias de fato (art. 21 do Decreto-Lei nº 3.688/1941). Violência doméstica contra a mulher. Substituição da reprimenda corpo-ral. Viabilidade. Art. 44, I, do Código Penal. Imposição das restrições do art. 17 da Lei nº 11.340/2006. Ordem concedida. 1. É viável a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direito nos moldes previstos no art. 17 da Lei Maria da Penal aos conde-nados pela prática da contravenção penal de vias de fato, por se tratar de modalidade de infração penal não alcançada pelo óbice do inciso I do art. 44 do Código Penal. Precedente. 2. No particular, o paciente foi condenado à pena de 20 dias de prisão, no regime aberto, pela prática da contravenção prevista no art. 21 do Decreto-Lei nº 3.688/1941 contra pes-soa com quem manteve relacionamento amoroso, razão pela qual o Tribunal de Justiça substituiu a pena corporal por restritiva de direito. 3. Ordem concedida para restabelecer o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.” (STF – HC 131.160 – Mato Grosso do Sul – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 18.10.2016)

crime contrA A ordem tributáriA – Acesso às

movimentAçÕes bAncáriAs dos contribuintes pelA receitA

federAl – possibilidAde

31744 – “Penal. Apelação criminal. Art. 1º, I e II da Lei nº 8.137/1990. Constitucionalida-de do art. 6º da LC 105/2001. Acesso às movimentações bancárias dos contribuintes pela Receita Federal. Determinação de prosseguimento do feito. Apelação Criminal do Minis-tério Público Federal provida. 1. Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público Federal contra decisão proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Federal Criminal do Es-pírito Santo que determinou o trancamento da ação penal por força da nulidade absoluta de todo o material probatório, uma vez que fora obtido com base em quebra de sigilo fiscal pela Receita Federal, o que seria incompatível com a Constituição Federal. 2. As autorida-des tributárias tem acesso a dados de alcance muito maior do que apenas os concernentes às movimentações bancárias do contribuinte. É ínsito à atividade de fiscalização o acesso às informações financeiras. Não é razoável exigir das autoridades fiscais (neste caso, da Receita Federal) a prévia solicitação, ao Poder Judiciário, de acesso a dados bancários para o exercício de sua atribuição constitucional e legal. 3. O Supremo Tribunal Federal pacificou a questão ao julgar constitucional o dispositivo no julgamento das ADIs 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859 e do RE 601.314. O Tribunal Pleno do STF, na Repercussão Geral nº 225, fixou a seguinte tese: ‘O art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001 não ofende o direito ao

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sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal’. 4. Considerando-se a constitucionalidade do dispositivo e, portanto, a licitude das provas colhidas pela Receita Federal, não há qualquer óbice à sua utilização no processo penal, no qual serão submetidas ao contradi-tório judicial. 5. Apelação criminal provida para determinar o prosseguimento do feito.” (TRF 2ª R. – ACr 2009.50.01.001396-8 – 2ª T.Esp. – Relª Simone Schreiber – DJe 17.01.2017)

crime de denunciAção cAluniosA – princÍpio dA coleGiAlidAde – ofensA

31745 – “Agravo regimental. Habeas corpus. Processual penal. Crime de denunciação ca-luniosa. Ofensa ao princípio da colegialidade. Inocorrência. Extinção prematura da ação penal. Ausência de justa causa não configurada. 1. Não há falar em ofensa ao princípio da colegialidade, já que a viabilidade do julgamento por decisão monocrática do relator se le-gitima quando se tratar de pedido manifestamente inadmissível, improcedente ou contrá-rio à jurisprudência dominante ou a Súmula do Tribunal (art. 21, § 1º, do RISTF). Ademais, eventual nulidade da decisão monocrática fica superada com a reapreciação do recurso pelo órgão colegiado, na via de agravo interno. Precedentes. 2. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que a extinção da ação penal de forma prematura, via habe-as corpus, somente se dá em hipóteses excepcionais, quando patentemente demonstrada (a) a atipicidade da conduta; (b) a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas; ou (c) a presença de causa extintiva da punibilidade. 3. No particular, a denún-cia narrou de forma objetiva a conduta atribuída ao agravante, adequando-a, em tese, ao tipo descrito na peça acusatória (denunciação caluniosa), com a indicação dos elementos indiciários mínimos de que teria dado causa à instauração de ‘investigação policial de, pelo menos, sete das nove pessoas por ele arroladas’. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF – AgRg-HC 136.751 – Pernambuco – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 18.11.2016)

crime de desAcAto – Art. 331 do cp – SurSiS processuAl – precedentes

31746 – “Embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário. Penal e processo penal. Crime de desacato. Art. 331 do Código Penal. Sursis processual. Art. 89

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da Lei nº 9.099/1995. Controvérsia de índole infraconstitucional. Inviabilidade de verifica-ção de decurso de prazo para fins de aplicação do art. 64, I, do Código Penal. Alegação de ofensa aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal. Ofen-sa reflexa ao texto da Constituição Federal. Inexistência de ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. Efeitos infringentes. Impossibilidade. A sucessiva interposição de recursos contrários à jurisprudência consolidada pelo pretório excelso configura abuso do direito de recorrer. Precedentes. Caráter protelatório do recurso. Embargos declarató-rios desprovidos. Determinada a certificação do trânsito em julgado e a baixa imediata dos autos à origem, independentemente da publicação do acórdão.” (STF – EDcl-AgRg-RE 878.628 – São Paulo – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 09.12.2016)

crime de homicÍdio QuAlificAdo – provAs – inexistênciA

31747 – “Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Penal e processual penal. Crimes de homicídio qualificado tentado e consumado. Absolvição pelo Tribunal do júri. Inexistência de provas. Apelação ministerial provida pelo Tribunal a quo. Alega-da violação ao art. 5º, XXXVIII e LVII, da Constituição Federal. Controvérsia de índole infraconstitucional. Ofensa reflexa ao texto da Constituição Federal. Incursionamento no conjunto fático-probatório. Incidência da Súmula 279 do STF. Agravo regimental despro-vido.” (STF – AgRg-RE-Ag 991.950 – São Paulo – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 09.12.2016)

crime de importAção de mAtériA-primA com A finAlidAde de

produção de estupefAcientes

31748 – “Agravo regimental no habeas corpus. Penal e processual penal. Crime de impor-tação de matéria-prima com a finalidade de produção de estupefacientes. Art. 33, § 1º, I, da Lei nº 11.343/2006. Habeas corpus substitutivo de recurso extraordinário. Inadmissibi-lidade. Competência do Supremo Tribunal Federal para julgar habeas corpus. CRFB/1988, art. 102, I, d e i. Hipótese que não se amolda ao rol taxativo de competência desta su-prema Corte. Pretensão de reconhecimento de inviabilidade do exame do recurso espe-cial dirigido ao Superior Tribunal de Justiça. Inadmissibilidade do writ para reanalisar pressupostos de admissibilidade de recursos da competência de outros tribunais. Agravo regimental desprovido. 1. O objeto da tutela em habeas corpus é a liberdade de locomoção quando ameaçada por ilegalidade ou abuso de poder (CF, art. 5º, LXVIII), não cabendo

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sua utilização para reexaminar pressupostos de admissibilidade de recursos de outros tribunais. 2. As circunstâncias judiciais subjetivas elencadas no art. 59 do Código Penal, quando desfavoráveis, autorizam a fixação da pena-base acima do mínimo legal, desde que fundamentada a exasperação. 3. In casu, o paciente foi denunciado em razão de supos-to envolvimento da importação de matéria-prima (semente de maconha) com o intuito de preparação da droga para sua posterior mercancia. Recebida a denúncia, a defesa recorreu e o Tribunal de origem determinou o trancamento da ação penal em razão da atipicidade da conduta. Em recurso especial, o Superior Tribunal de Justiça determinou o prossegui-mento da ação. 4. A competência originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar habeas corpus está definida, exaustivamente, no art. 102, inciso I, alíneas d e i, da Constituição da República, sendo certo que o paciente não está arrolado em qualquer das hipóteses sujeitas à jurisdição desta Corte. 5. Agravo regimental desprovido.” (STF – AgRg-HC 138.099 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 09.12.2016)

crime de torturA – corrupção AtivA – elementos

concretos – possibilidAde

31749 – “Penal. Processo penal. Recurso ministerial e do réu. Crime de tortura. Art. 1º, II, § 4º, da Lei nº 9.455/1997. Corrupção ativa. Art. 317 do CP. Sentença mantida em relação ao crime de tortura e reformada para condenar corréu pela prática de tortura e aumentar a pena. Reformada sentença para condenar réu pela prática do crime do art. 317 do CP. Certeza extraída do acervo probatório. Há omissão se presente dever específico de agir imposto ao garante. Presença de capacidade jurídica para evitar o crime. Há elementos concretos a fundamentar a intensificação da pena. Apelação do Ministério Público Federal provida. Recurso do réu desprovido. 1. O depoimento da vítima em crimes dessa espécie em que se praticam na clandestinidade, longe dos olhos de testemunhas, é crucial, mor-mente no caso em questão em que encontram amparo em prova robusta produzida ao longo da instrução criminal. Por seis vezes a vítima depôs sobre os fatos e em todas elas manteve a mesma versão apresentada desde a sua fala em sede policial, duas vezes no ano de 2001, depois em 2003, 2004, 2007 e 2009. O mesmo se diga em relação às testemu-nhas que prestaram depoimento ao longo dos anos sem que caíssem em contradição, ou ainda que alguma contradição se vislumbre, há na sentença condenatória fundamentação plausível quanto a tal. 2. No tocante à absolvição de Ricardo Borgo Feitosa da imputação da prática do crime de tortura (art. 1º, II, § 4º, da Lei nº 9.455/1997), a sentença deve ser reformada para condená-lo pelo crime de tortura. Isso porque, há prova nos autos de que este acusado esteve presente nas dependências da policia rodoviária federal ao longo do tempo em que a vítima esteve detida e que presenciou, ao menos em parte, a tortura praticada pelo policial Robson. Não há justificativa plausível para um policial exercer nor-

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malmente as suas atividades enquanto outro policial tortura um cidadão, violando a lei, a Constituição da República, além de tratado internacional e, por fim, e mais importante, violando a dignidade de uma pessoa humana, pelo simples fato de que este se recusou a ceder às exigências manifestamente ilegais de pagar propina solicitada. Não em um sis-tema constitucional que tem na dignidade da pessoa humana verdadeiro meta princípio e fundamento constitucional. 3. No tocante à absolvição de Robson Helder da imputação da prática do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP), a sentença deve ser reformada também nesse ponto, para que se condene o réu pela prática deste crime. Isso porque, tal como ocorre com o crime de tortura, a análise sobre a prática do crime de corrupção pas-siva também deve levar em conta o depoimento da vítima, vez que também é crime que se comete clandestinamente, por óbvio, longe dos olhos de testemunhas. Há sim prova idônea nos autos a certificar a materialidade e autoria delitiva, afinal, a coerência dos de-poimentos da vítima Pedro Veloso, que deram suporte à condenação do réu pelo crime de tortura, continua a merecer a mesma credibilidade para o deslinde do crime em questão, posto que, não é outro o meio de prova do crime de corrupção quando praticado isola-damente. Portanto não há sentido em se desqualificar as declarações da vítima, exigindo mais do que se faria se o único crime praticado fosse o de corrupção passiva. 4. Assiste razão ao Ministério Público Federal quanto ao seu pleito relativo ao aumento da pena restritiva de liberdade aplicada ao réu Robson Helder pela prática do crime de tortura. 5. Recurso do Ministério Público Federal provido e recurso do réu desprovido.” (TRF 2ª R. – ACr 2008.50.03.000486-5 – 2ª T.Esp. – Rel. Des. Fed. Messod Azulay Neto – DJe 16.01.2017)

estelionAto e AssociAção criminosA – prisão preventivA – fundAmentAção – possibilidAde

31750 – “Recurso em habeas corpus. Estelionato e associação criminosa. Prisão preven-tiva. Fundamentação. Indicação de elementos concretos relacionados ao modus operandi do crime e probabilidade concreta de reiteração delitiva. Crimes praticados, em tese, por inúmeras vezes e por meio da rede mundial de computadores. Prejuízo de grande monta. Constrangimento ilegal. Ausência. 1. A prisão preventiva constitui medida excepcional ao princípio da não culpabilidade, cabível, mediante decisão devidamente fundamen-tada, quando evidenciada a existência de circunstâncias que demonstrem a necessidade da medida extrema, nos termos dos arts. 312 e seguintes do Código de Processo Penal. 2. No caso, o Magistrado singular logrou apresentar elementos concretos que denotam a necessidade da segregação cautelar para garantia da ordem pública, consistente no modus operandi do crime, a evidenciar a periculosidade social dos réus, corroborada, ainda, pela ousadia e suposto prejuízo causado com a empreitada criminosa, bem como a probabili-

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dade concreta de reiteração delitiva, demonstrada pelas inúmeras vezes em que a conduta foi, em tese, praticada, indicando que os réus faziam do crime seu meio de sobrevivência. 3. Recurso em habeas corpus improvido.” (STJ – RHC 73.918 – SP – (2016/0197822-1) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 19.12.2016)

nota:Passamos a comentar o acórdão que trata de denúncia realizada pelo Ministério Públi-co estadual contra os recorrentes, incursos nos crimes de estelionato simples (por cem vezes) e associação criminosa.Consta dos autos, que a empresa de propriedade do recorrente, recebia os valores de produtos comprados pela internet e não os entregava.A prisão preventiva do casal foi fundamentada no modo de operação do casal, na pro-babilidade de reiteração delitiva, na garantia da ordem pública e na periculosidade dos réus.No STJ, a defesa alegou constrangimento ilegal na decretação e manutenção da prisão, por ausência de fundamentação idônea e dos requisitos da prisão preventiva.O relator não verificou nenhuma irregularidade a ser sanada.A prisão preventiva foi suficientemente justificada na necessidade de resguardo da or-dem pública. Destacou ainda, que o modus operandi dos delitos supostamente praticados evidencia a periculosidade social dos acusados, que estariam envolvidos em quadrilha dedicada à prática de estelionato e de crimes tributários, que acarretaram elevados prejuízos às vítimas.O Superior Tribunal de Justiça negou a ordem. Vale trazer trecho do voto do relator:“No mesmo sentido:RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS – RECEPTAÇÃO – FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E PARTICULAR – PRISÃO PREVENTIVA – RÉU QUE OSTENTA DIVERSOS REGISTROS CRIMINAIS – REITERAÇÃO DELITUOSA – PRO-BABILIDADE CONCRETA – PERICULOSIDADE SOCIAL – GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA – SEGREGAÇÃO JUSTIFICADA E NECESSÁRIA – DESPROPORCIONA-LIDADE DA MEDIDA – INVIABILIDADE DA AFIRMAÇÃO – CAUTELARES ME-NOS GRAVOSAS – INSUFICIÊNCIA E INADEQUAÇÃO – CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO – Não há que se falar em ilegalidade da prisão ante tempus quando a medida encontra-se devidamente fundamentada à luz do art. 312 do CPP, mostrando-se devida para a preservação da ordem pública, evitando a reiteração de crimes pelo acusado. 2. Caso em que o recorrente está sendo investigado em 6 (seis) comarcas diversas pela prática do delito de estelionato, circunstância que revela a pro-pensão a atividades ilícitas, demonstrando sua periculosidade social e a real possibi-lidade de que, solto, cometa novas infrações penais, justificando sua manutenção no cárcere. [...] 6. Recurso ordinário improvido. (RHC 55.615/MG, Min. Jorge Mussi, 5ª T., DJe 27.04.2015)RECURSO EM HABEAS CORPUS – ESTELIONATO E FORMAÇÃO DE QUADRI-LHA – PRISÃO PREVENTIVA – FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA – GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA – MODUS OPERANDI – PERICULOSIDADE SOCIAL – 1. A jurisprudência desta Corte tem proclamado que a prisão cautelar é medida de caráter

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excepcional, devendo ser imposta, ou mantida, apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada, as exigências do art. 312 do Código de Processo Penal. Isso porque a liberdade, antes de sentença penal condenatória definitiva, é a regra, e o enclausuramento provisório, a exceção. 2. Na espécie, a prisão preventiva encontra-se suficientemente justificada na necessidade de resguardo da ordem pública. Com efeito, não a gravidade abstrata, mas, sim, o modus operandi dos delitos supostamente perpe-trados evidencia a periculosidade social do acusado, que estaria envolvido em quadri-lha dedicada à prática de estelionato em todo o Estado do Rio Grande do Sul, ocasio-nando elevados prejuízos às vítimas (empresas de grande e médio porte). 3. Recurso a que se nega provimento. (RHC 35.335/RS, Min. Og Fernandes, 6ª T., DJe 14.05.2013)”

estelionAto previdenciário – mAteriAlidAde – AutoriA

– comprovAção

31751 – “Direito penal. Estelionato previdenciário. Comprovação da materialidade, au-toria e dolo. Circunstâncias judiciais favoráveis. Manutenção da sentença de primeiro grau. Apelações não providas, por maioria. 1. Comprovação da materialidade, da autoria e dolo. Prova documental. Interrogatórios. Manutenção da sentença condenatória. 2. No tocante à culpabilidade, não restou demonstrada uma situação peculiar que fizesse incidir maior reprovabilidade da conduta do que a normalmente decorre da prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal. O conhecimento da ilicitude da conduta é pres-suposto da caracterização do dolo. O aliciamento de um servidor do INSS é essencial à própria consumação do crime de estelionato previdenciário. 3. Quanto aos motivos do cri-me, a ganância é elemento essencial à prática de todos os delitos patrimoniais e a intenção de obter vantagem indevida em detrimento da Previdência Social é elementar do crime de estelionato qualificado, já tendo sido prevista pelo legislador ao criar a figura típica. 4. No que tange às circunstâncias do delito, a prática do crime de estelionato previdenci-ário pressupõe a utilização da estrutura da Autarquia Previdenciária. 5. Quanto às con-sequências do crime, a causa de aumento do § 3º do art. 171 do Código Penal já contem-pla o prejuízo causado ‘em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência’. 6. Demais circunstâncias judiciais favoráveis. 7. Dosimetria da pena mantida. 8. Vencido o Relator, que negava provimento à apelação da defesa e dava parcial provimento à apelação da acusação. 9. Apelações não providas, por maioria.” (TRF 2ª R. – ACr 2008.51.12.000160-0 – 2ª T.Esp. – Red. p/o Ac. Juíza Fed. Conv. Helena Elias Pinto – DJe 17.01.2017)

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estelionAto QuAlificAdo – AusênciA de provA –

comprovAção – impossibilidAde

31752 – “Penal e processual penal. Estelionato qualificado tentado. Comprovação da materialidade. Ausência de prova da autoria. Impossibilidade de lastrear a condenação apenas no interrogatório policial de corréu. Princípio do contraditório. Apelação não pro-vida. 1. Materialidade comprovada. Prova testemunhal e documental. Laudo pericial. 2. Não comprovação da autoria. Corréu não interrogada em juízo. O interrogatório policial de corréu, isoladamente, não pode para lastrear a sentença condenatória. Princípio do con-traditório. Inexistência de outras provas da autoria. 3. Apelação não provida.” (TRF 2ª R. – ACr 2007.51.03.001792-4 – 2ª T.Esp. – Relª Simone Schreiber – DJe 17.01.2017)

execução penAl – indulto coletivo nAtAlino – penA – cumprimento

31753 – “Penal e processual penal. Agravo em execução penal. Indulto coletivo natalino. Constitucionalidade do Decreto nº 8.380/2014. Cumprimento de um quarto da pena res-tritiva de direitos. Extinção da punibilidade do apenado. Agravo ministerial improvido. 1. Inexiste previsão na constituição de que a aplicação deva se limitar àqueles que cum-prem Pena Privativa de Liberdade, excluindo-se do benefício os condenados que tiveram suas Penas substituídas por Restritivas de Direitos, conforme precedentes deste Egrégio Tribunal Regional Federal. 2. Caso o indulto apenas pudesse ser concedido àqueles que se encontram encarcerados, seriam desprestigiados os Apenados que vêm cumprindo regu-larmente as condições impostas para o cumprimento das penas restritivas de liberdade, visto que eles teriam de ser privados de sua liberdade em decorrência da conversão de penas para a obtenção do benefício. 3. O Agravado, até 25 de dezembro de 2014, cumpriu 1/4 (um quarto) da Pena Restritiva de Direitos, visto que, até o dia 25 de dezembro de 2014, executou ‘444 horas, restando o cumprimento de 855 horas (fl. 1451-v). Quanto à interdição temporária de direitos, verifico que o referido condenado declarou que não exerce cargo, função ou atividade pública nem mandato eletivo’, conforme Sentença que Extinguiu a Punibilidade. 4. Agravo em Execução Penal improvido.” (TRF 5ª R. – AGEXP 0002885-83.2015.4.05.0000 – (2182/PE) – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Alexandre Luna Freire – DJe 16.01.2017)

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execução penAl – prescrição dA pretensão punitivA

– não ocorrênciA

31754 – “Processo penal. Agravo. Execução penal. Prescrição da pretensão punitiva. Não ocorrência. Matéria enfrentada em sede de apelação. Prescrição executória. Não ocorrên-cia. Extinção da punibilidade. Não incidência. Recurso desprovido. I – O agravante foi condenado à pena de 02 (dois) anos de reclusão em regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa pela prática do delito previsto no art. 304 c/c art. 297 do Código Penal. II – A sentença condenatória com cópia às fls.17/29 transitou em julgado para o Parquet, que não interpôs apelação e nem recorreu do acórdão. Sendo assim, cabe observar que após o trânsito em julgado para a acusação a prescrição regula-se pela pena aplicada, conforme o art. 110, § 1º, do Código Penal, sendo de 04 (quatro) anos, uma vez que a pena aplicada foi de 02 (dois) anos, de acordo com o art. 109, V do Código Penal. III – Considerando a data do recebimento da denúncia em 11.02.2011 (fls. 08/09) e a publicação da sentença condenatória em 06.12.2013 (fl. 33), não há que se falar em prescrição, tampouco em extinção da punibilidade, eis que não trans-correu o lapso temporal de 04 (quatro) anos entre as aludidas datas. IV – Ademais, não há que se falar em prescrição da pretensão executória, eis que não transcorreu o lapso temporal de 04 (quatro) anos entre o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação e o presente momento, na forma dos arts. 110, § 1º e 112, inciso I, ambos do Código Penal. V – Recurso desprovido.” (TRF 2ª R. – Ag-ExPen-Rec.-Proc.Crim. 0500250-24.2016.4.02.5108 – 1ª T.Esp. – Rel. Antonio Henrique Correa da Silva – DJe 17.01.2017)

execução penAl – proGressão de reGime – mArco iniciAl – dAtA

em Que o reeducAndo preencheu os reQuisitos do Art. 112 dA lep – AlterAção do entendimento dA sextA turmA – AdeQuAção

à jurisprudênciA do stf

31755 – “Habeas corpus. Execução penal. Subsequente progressão de regime. Marco ini-cial. Data em que o reeducando preencheu os requisitos do art. 112 da LEP. Alteração do entendimento da 6ª T. Adequação à jurisprudência do STF e da quinta turma. Ordem con-cedida de ofício. 1. Revisão da jurisprudência da 6ª T. desta Corte Superior, para alinhar-se ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal e da 5ª T. de modo a fixar, como data--base para subsequente progressão de regime, aquela em que o reeducando preencheu os requisitos do art. 112 da Lei de Execução Penal e não aquela em que o Juízo das Execuções deferiu o benefício. 2. Consoante o recente entendimento do Supremo Tribunal, a decisão

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do Juízo das Execuções, que defere a progressão de regime – reconhecendo o preenchi-mento dos requisitos objetivo e subjetivo da lei (art. 112 da LEP) – é declaratória, e não constitutiva. Embora se espere celeridade da análise do pedido, é cediço que a providência jurisdicional, por vezes – como na espécie – demora meses para ser implementada. 3. Não se pode desconsiderar, em prejuízo do reeducando, o período em que permaneceu cum-prindo pena enquanto o Judiciário analisava seu requerimento de progressão. 4. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem de ofício, para restabelecer a decisão do Juízo das Execuções Penais.” (STJ – HC 369.774 – RS – (2016/0232298-0) – 6ª T. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 07.12.2016)

nota:O paciente estaria sofrendo coação ilegal no seu direito de locomoção, em decorrência de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no Agra-vo em Execução nº 0010022-54.2016.8.21.7000, assim ementado:“EXECUÇÃO – PROGRESSÃO DE REGIME – NOVA DATA-BASE A PARTIR DA DATA DA DECISÃO CONCESSIVA DO BENEFÍCIO – (PROGRESSÃO) – A questão a respeito da nova data-base para a progressão de regime prisional já estava pacificada. Tanto o Primeiro Grupo Criminal quanto o Superior Tribunal de Justiça firmaram o en-tendimento que a data a ser contada para efeitos de uma próxima progressão de regime será aquela da decisão concessiva do benefício citado (progressão). Decisão: Agravo ministerial provido, por maioria.”O referido caso envolveu um paciente cujo regime prisional passou do fechado para o semiaberto, por decisão judicial, no dia 2 de outubro de 2015.O juízo das execuções estabeleceu como data-base para nova progressão o dia em que o preso preencheu os requisitos da Lei de Execução Penal, ou seja, 2 de maio de 2015.O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, no entanto, estabeleceu como data-base o dia de publicação da decisão que concedeu a progressão de regime.Em recurso ao STJ, a Defensoria Pública alegou que a data para progressão deve retroagir ao dia em que o preso cumpriu os requisitos da LEP, pois, ao transcorrer o lapso tem-poral entre o direito e sua concessão, o apenado já aguarda em regime mais gravoso ao que faria jus, passando a ser ainda mais prejudicado se o cálculo de sua nova concessão tomasse a decisão concessória e não a efetiva implementação.Em seu voto, o relator ressaltou que as turmas que compõem a Terceira Seção do STJ (Quinta e Sexta) reconheciam como termo inicial para obtenção de nova progressão a data do efetivo ingresso no regime anterior.No entanto, destacou o relator, a Quinta Turma modificou, recentemente, o entendi-mento sobre o tema, alinhando-se à posição do STF. Para Schietti, o acórdão do TJRS contraria o entendimento adotado nos últimos julgamentos do STJ e do STF.Vale trazer trecho do voto do relator:“Também não se pode perder de vista projeto para atualização da Lei de Execução Penal, sob debate no Congresso Nacional, por meio do PLS 513/2013, que propõe a automatização dos benefícios na execução penal, para que as progressões aconteçam de forma automática, sem prévia deliberação judicial, exigível apenas para negá-las. Confira-se as propostas de alteração, in verbis:

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Art. 107, § 3°: ‘O juiz da execução penal será informado com antecedência de 30 dias da data de soltura do apenado e das datas de progressão e livramento. Se até esta data não houve manifestação a liberação do preso ou condenado se dará automaticamente’.Art. 112. A pena privativa de liberdade será executava em forma progressiva, com a transferência automática para regime menos rigoroso, quando o preso houver cumpri-do ao menos 1/6 da pena no regime anterior, exceto se constatado mau comportamento carcerário, lançado pelo diretos do estabelecimento no registro eletrônico de controle de penas e medidas de segurança, caso em que a progressão ficará condicionada ao julgamento do incidente [...]Por tais motivos, o período de permanência no regime mais gravoso, por mora do Judi-ciário em analisar requerimento de progressão ao modo intermediário de cumprimento da pena, deverá ser considerado para o cálculo de futuro benefício, sob pena de ofensa ao princípio da dignidade do apenado, como pessoa humana (art. 1º, III, CF) e prejuízo ao seu direito de locomoção. Entendo, assim, que o entendimento da Sexta Turma deve alinhar-se à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, para estabelecer, como marco para a subsequente progressão, a data em que o reeducando preencheu os requisitos legais do art. 112 da LEP e não aquela em que o Juízo das Execuções, em decisão decla-ratória, deferiu o benefício ou aquela em que o apenado, efetivamente, foi inserido no regime carcerário, sob pena de constrangimento ilegal ao seu direito de locomoção.”Para o relator, o período de permanência no regime mais gravoso, por demora do Judi-ciário em analisar requerimento de progressão, deverá ser considerado para o cálculo de futuro benefício, sob pena de ofensa ao princípio da dignidade do apenado e prejuízo ao seu direito de locomoção.O preso passa a ter direito a progredir de regime na data em que preenche os requisitos do art. 112 da Lei de Execução Penal, segundo decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça.Com base nesse entendimento, o STJ não conheceu a ordem.

extrAdição – crime de homicÍdio – prescrição – inocorrênciA

31756 – “Extradição instrutória. Tratado de extradição entre a República Federativa do Brasil e a República Argentina. Crime de homicídio. Dupla tipicidade atendida. Prescri-ção. Inocorrência. Discussão de mérito e parcialidade do juízo requerente. Via imprópria. Contenciosidade limitada. Problemas de saúde do extraditado. Circunstância que não impede a extradição. Atendimento a todos os requisitos legais. Extradição deferida. 1. A extradição instrutória, requerida em autos devidamente instruídos com os documentos exigidos pelas normas de regência, tem por fim viabilizar o julgamento de suspeitos da prática, no território do Estado Requerente, de crimes que atendam ao requisito da dupla tipicidade e que não incidam nas hipóteses legais de inadmissibilidade. 2. A contencio-sidade limitada, regra que rege o julgamento da Extradição, impede que o Supremo Tri-bunal Federal analise questões de mérito, posto incompetente ratione materiae. 3. A saúde

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eventualmente precária do extraditando não é suficiente para impedir sua entrega, restan-do a mesma condicionada a prévio exame médico oficial que ateste suas condições físicas para suportar adequadamente a viagem até o país requerente, nos termos do parágrafo único do art. 89 da Lei nº 6.815/1980. 3. In casu, (a) o Extraditando é acusado de ter pra-ticado crime de homicídio consumado, em horário incerto entre 31.08.2015 e 01.09.2015; (b) a prescrição da pretensão punitiva do delito de homicídio, pelo Código Penal Argen-tino, consuma-se em 2023, e pelo Código Penal brasileiro, em 2035; (c) a parcialidade de autoridades da República Argentina não se presume e sua mera alegação não inviabiliza o deferimento da extradição; (d) estão preenchidos todos os requisitos para o deferimento da extradição, previstos no Tratado Bilateral, ausentes hipóteses de inadmissibilidade. 4. Extradição deferida.” (STF – EXT 1.456 – Distrito Federal – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 22.11.2016)

inQuérito policiAl – lei dA usurA – constrAnGimento

ileGAl – AleGAção

31757 – “Penal. Processual penal. Habeas corpus. Pleito de deslocamento competencial, em prol da Polícia Civil do Estado de Pernambuco, de inquérito policial originariamente instaurado pela polícia federal, em que se investiga eventual cometimento, pelo paciente, das condutas típicas previstas no art. 4º, a, da Lei nº 1.521/1951 (usura) e no art. 147, do Código Penal (ameaça). Ausência de demonstração mínima de atual ou iminente cons-trangimento ilegal, porventura decorrente da continuidade do investigatório no âmbito da Polícia Federal. Paciente ocupante do cargo de policial federal. Necessidade de aferi-ção, no inquisitório, do grau de comprometimento do munus público desenvolvido pelo investigado no episódio delituoso em causa, para fins de determinação da competência para processamento de ação criminal, caso venha a ser efetivamente deflagrada. Inviabili-dade do precoce deslocamento da competência investigatória, à míngua de qualquer pre-juízo – atual ou iminente – a direitos e garantias do paciente. Ordem denegada. 1. Renova--se, nestes autos, visto que idênticas as causas de pedir, a pretensão, também aviada em sede de habeas corpus, porém denegada perante a Justiça Federal em Pernambuco. Deve-se realçar, in casu, a ausência de fundamentação jurídica, minimamente razoável, quanto à eventual ocorrência – ainda que hipoteticamente considerada – de constrangimento ilegal, em desfavor do paciente, porventura vinculado ao só fato de as investigações policiais prosseguirem na esfera federal, e não, como pretende a impetração, perante o aparelho policial estadual. 2. A excepcionalidade da medida requerida no presente writ, não foi minimamente justificada, notadamente, também, em face dos sólidos argumentos jurídi-cos produzidos pela MMª Juíza Federal, quando da prolação de veredicto denegatório de idêntico pedido, formulado em feito análogo – habeas corpus –, junto à primeira instância,

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aqui desde logo incorporados a este acórdão. 3. Não há que se falar, na espécie, de haver sido minimamente demonstrado qualquer prejuízo ao livre exercício do direito de defesa do investigado, ora paciente, nem de seu iminente cerceamento; Não há comprovação, sequer, de óbice ao direito de locomoção do paciente. 4. Também acerca da impropriedade dos fundamentos desta impetração, em que se discute, precocemente, acerca da incompe-tência da Justiça Federal, bem como da inviabilidade da instauração e prosseguimento, no âmbito da Polícia Federal, do investigatório em comento, colha-se a abalizada síntese do posicionamento ministerial produzido em sede do Parecer, em que se realça o fato de somente ser possível uma análise mais segura acerca dessa questão após a conclusão do apuratório, quando haverá a possibilidade de averiguar se houve ou não a utilização do munus público na prática dos delitos investigados e se os fatos narrados no boletim de ocorrência, de fato, ocorreram. 5. Impõe-se denegar a ordem de habeas corpus, ante a não subsunção da hipótese fático-jurídica aos comandos dos arts. 647, 648 e seguintes do Có-digo de Processo Penal, principalmente por não haver sido infirmada, de molde extreme de controvérsias, a legalidade da competência da Polícia Federal para o prosseguimento do investigatório em curso.” (TRF 5ª R. – HC 0002100-87.2016.4.05.0000 – (6268/PE) – 1ª T. – Rel. Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho – DJe 13.01.2017 – p. 7)

justiçA militAr – fAlecimento do beneficiário – competênciA

31758 – “Habeas corpus. Penal e processual penal militar. Saque indevido de pensão mili-tar após o falecimento do beneficiário (art. 251 do CPM). Competência da justiça militar. Lei de Organização Judiciária Militar. Julgamento de civil pelo Conselho Permanente de Justiça. Conformidade com a legislação em vigor. Dosimetria da pena. Exasperação da pena-base. Fundamentação idônea. Confissão espontânea. Não incidência. 1. É da compe-tência da Justiça Militar processar e julgar civil acusado da prática do crime de estelionato cometido mediante saque de pensão de beneficiário falecido. Precedentes. 2. No caso, a fixação da pena-base, com respaldo no art. 69 do Código Penal Militar, foi elevada em decorrência da intensidade do dolo, com esteio no modus operandi da conduta, dotada de acentuada gravidade, além da extensão do dano dela advindo. Indicou-se, para tanto, o prolongado lapso em que o paciente teria sacado o benefício previdenciário de titulari-dade de sua genitora, mediante declaração falsa de que a beneficiária continuava viva, mesmo após quase 3 anos do seu falecimento, período no qual usufruiu do recebimento do benefício, por intermédio de mais de 400 movimentações financeiras realizadas. 3. Ele-mentos dos autos indicam que a autoria delitiva já estava identificada quando o paciente admitiu sua culpa, sendo inviável em sede habeas corpus proceder ao revolvimento de fatos e provas com vistas a emprestar ao relato do paciente o grau de valoração exigido para qualificá-lo como confissão espontânea, assim entendida como aquela que decorre da

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livre disposição do agente de procurar a autoridade para informar a prática da infração penal ‘ignorada ou imputada a outrem’ (CPM, art. 72, III, d) e assim ajudar no seu pronto esclarecimento. 4. Ordem denegada.” (STF – HC 136.536 – Ceará – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 29.11.2016)

lei de imprensA – não recepção – tipos penAis – relAçÕes reGidAs

pelA leGislAção comum

31759 – “Agravo regimental em habeas corpus. Processo penal. Decisão monocrática. Ine-xistência de argumentação apta a modificá-la. Manutenção da negativa de seguimento. Lei de imprensa. Não recepção. Tipos penais. Relações regidas pela legislação comum. Agravo regimental desprovido. 1. A inexistência de argumentação apta a infirmar o julga-mento monocrático conduz à manutenção da decisão recorrida. 2. A não recepção da Lei de Imprensa não traduz automática atipicidade absoluta de delitos contra a honra, visto que, conforme decidido na ADPF 130/DF, aplicam-se ‘as normas da legislação comum, notadamente o Código Civil, o Código Penal, o Código de Processo Civil e o Código de Processo Penal às causas decorrentes das relações de imprensa’. Impossibilidade de, na via do habeas corpus, reavaliar a reincidência reconhecida pelas instâncias antecedentes. 3. Agravo regimental desprovido.” (STF – AgRg-HC 135.900 – São Paulo – 1ª T. – Rel. Min. Edson Fachin – J. 28.10.2016)

omissão de documento público – estrAnGeiro – pedido de

refúGio e AnistiA com nome fAlso – mAteriAlidAde e AutoriA

31760 – “Penal. Processo penal. Art. 299 do CP. Estrangeiro. Pedido de refúgio e anistia com nome falso. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Ausência de culpabilida-de. Inexigibilidade de conduta diversa reconhecida. 1. Autoria e materialidade delitivas comprovadas. Os extratos de tela do sistema informatizado de identificação de digitais da Polícia Federal demonstra a existência de registro anterior de pedido de anistia em nome falso de Abubakar Keita. Fatos confirmados pelo réu em seu interrogatório. 2. A conjun-tura econômica, política e social que forçou a saída do réu de seu país de origem e levou ao seu ingresso no Brasil como imigrante ilegal era grave, apta a justificar todo o receio do apelado em retornar à Guiné. A adoção da conduta ilícita foi meio de garantir sua

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permanência em solo brasileiro. Trata-se de indivíduo impelido por fatores externos, de-sencadeantes de um agir contrário às normas, conceituado como o delinquente ocasional. 3. Caracterizada a causa supralegal de excludente de culpabilidade. Nas circunstâncias apresentadas, não seria possível exigir-se do acusado comportamento de acordo com o ordenamento jurídico, uma vez que a alternativa ao cometimento de crime levaria à situ-ação demasiadamente penosa ao estrangeiro, que teria sua integridade física e a própria vida ameaçadas. 4. Apelação criminal desprovida.” (TRF 2ª R. – ACr 2012.51.01.035032-9 – 2ª T.Esp. – Relª Simone Schreiber – DJe 17.01.2017)

penA – dosimetriA – HabeaS CorpuS – meio inábil

31761 – “Agravo regimental no habeas corpus. Penal e processual penal. Ato libidinoso. Art. 214 do Código Penal (antiga redação). Menor de 14 anos. Continuidade delitiva. Habeas corpus substitutivo de recurso extraordinário. Inadmissibilidade. Competência do Supremo Tribunal Federal para julgar habeas corpus. CRFB/1988, art. 102, I, D e I. Hipótese que não se amolda ao rol taxativo de competência desta suprema Corte. Inviabilidade do writ para reanalisar pressupostos de admissibilidade de recursos. Rediscussão de critérios de dosimetria da pena. Fundamentação idônea pelas instâncias ordinárias. Revolvimento do conjunto fático-probatório. Inadmissibilidade na via eleita. Inexistência de constrangi-mento ilegal. Sucedâneo de revisão criminal. Agravo regimental desprovido. 1. A dosime-tria da pena, bem como os critérios subjetivos considerados pelos órgãos inferiores para a sua realização, não são passíveis de aferição na via estreita do habeas corpus, por demandar minucioso exame fático e probatório inerente a meio processual diverso (Precedentes: HC 114.650, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 14.08.2013, RHC 115.213, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 26.06.2013, RHC 114.965, 1ª T., Relª Min. Rosa Weber, DJe de 27.06.2013, HC 116.531, 1ª T., Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 11.06.2013, e RHC 100.837-AgR, 1ª T., Rel. Min. Roberto Barroso, DJe de 03.12.2014). 2. As circunstâncias judiciais subjetivas elencadas no art. 59 do Código Penal, quando desfavoráveis, autorizam a fixação da pena-base acima do mínimo legal, desde que fundamentada a exasperação. 3. A revisão das circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como das causas de aumento e de diminuição consideradas pelo juízo natural é inadmita da via eleita, porquanto enseja revolvimento fático-proba-tório dos autos. 4. In casu, o recorrente foi condenado a 7 (sete) anos, 04 (quatro) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, a teor do art. 33, § 3º, do Código Penal, por decisão em sede segunda revisão criminal, como incurso no art. 214 (redação anterior) e art. 9º da Lei nº 8.072/1990, pelo fato de o recorrente haver corrompido a moral de diversas menores com a prática de atos libidinosos consigo, entre os próprios menores e presenciando atos libidinosos com terceiros, inclusive fotografando tais atos e as menores. Atos esses praticados de forma reiterada em continuidade delitiva e

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mediante concurso de agentes. 5. A competência originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer e julgar habeas corpus está definida, exaustivamente, no art. 102, inciso I, alíneas d e i, da Constituição da República, sendo certo que o paciente não está arrolado em qualquer das hipóteses sujeitas à jurisdição desta Corte. 6. O habeas corpus não pode ser manejado como sucedâneo de revisão criminal. 7. Agravo regimental desprovido.” (STF – AgRg-HC 134.446 – Sergipe – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 18.11.2016)

seQuestro de bens – crime licitAtório – desvio de verbAs

públicAs – inocorrênciA

31762 – “Penal. Embargos de declaração. Sequestro de bens em ação cautelar penal para ressarcimento ao Erário. Crime licitatório e de desvio de verbas públicas. Assinatura pelo recorrente das propostas da empresa. Indícios de participação nos delitos. Proporcionali-dade da constrição em face do valor a ser ressarcido. Omissão e contradição. Inocorrência. 1. Embargos de Declaração opostos pelo particular, aduzindo omissão e contradição no acórdão, que teria incidido em erro de fato ao não considerar que o débito já se encon-tra garantido em face da constrição do valor de R$ 89.114,39 (oitenta e nove mil, cento e quatorze reais e trinta e nove centavos), em contas dos denunciados via Bacen-Jud, uma quantia suficiente para garantir o débito, calculado em R$ 76.353,18 (setenta e seis mil, trezentos e cinquenta e três reais e dezoito centavos), calculado em 07/2015, montante suficiente para ressarcir o dano, não se justificando a constrição de mais 02 (dois) veícu-los, avaliados em R$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais). 2. O acórdão embargado negou provimento ao Apelo do ora Recorrente, sob o fundamento de não haver ‘desproporcio-nalidade entre o valor dos veículos sequestrados (R$ 120.000,00) e o valor do dano a ser eventualmente ressarcido ao Erário (R$ 85.470,09), tendo em vista que a finalidade da medida constritiva não é apenas assegurar montante de eventual recomposição ao Po-der Público, mas também de eventuais despesas processuais e sanções pecuniárias, em tudo a apontar que o valor total da avaliação dos bens sequestrados pode expressar toda essa grandeza monetária, até porque o valor do dano será passível de nova atualização, até o final do processo, isso sem falar nas despesas processuais e nas penas pecuniárias’. 3. Foram bloqueados, via Bacen-Jud, valores nas contas-correntes dos Réus no montante de R$ 89.114,39 (oitenta e nove mil, cento e catorze reais e trinta e nove centavos), o que já garante, em tese, o ressarcimento ao Erário, bem como eventuais juros e correções, sendo que da conta do Recorrente apenas foi bloqueado o valor de R$ 168,62 (cento e sessenta e oito reais e sessenta e dois centavos), de forma que ele não teve valores bloqueados de for-ma suficiente para a reparação do dano. 4. Constrição via Bacen-Jud na conta do Recorren-te em montante diminuto que não tem o condão de alterar o resultado do julgado embar-

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Revista JuRídica 471JuRispRudência penal

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gado, sendo necessária a manutenção da constrição dos bens ora impugnada. Embargos de Declaração improvidos.” (TRF 5ª R. – ACr 0000544-19.2015.4.05.8202/01 – (14232/PB) – 3ª T. – Rel. Des. Fed. Cid Marconi – DJe 12.01.2017)

tráfico de droGAs – fixAção do reGime iniciAl

fechAdo – Quantum dA penA – compAtibilidAde

31763 – “Processual penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas. Fixação do regime inicial fechado. Quantum da pena compatível com regime mais brando. Quantidade e natureza da droga utilizados para calibrar o grau de redução da pena do tráfico privilegiado e para impor regime prisional mais rigoroso. Possibilidade. 1. À luz do art. 33, § 3º, do Código Penal, a jurisprudência desta Corte firmou o entendimento de que a imposição do regime inicial de cumprimento da pena não decorre somente do quantum da reprimenda, mas também das circunstâncias judiciais (CP, art. 59). No crime de tráfico de drogas, podem ser levadas em consideração, como critério adicional na fixação das penas, a natureza e a quantidade da substância ou do produto (Lei nº 11.343/2006, art. 42). 2. Assim, inde-pendentemente do momento em que os vetores referentes à quantidade e à natureza da droga forem utilizados para dosar a reprimenda (na pena-base ou na escolha da fração de redução do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006), tais circunstâncias revelam-se idô-neas para imprimir maior rigor na seleção do regime prisional, dado o óbice intranspo-nível ao julgador de considerá-los de forma cumulativa (HC 112.776/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, Pleno, DJe 30.10.2014). 3. No caso, a imposição do regime prisional inicial foi motivada pelo volume e pela variedade de drogas apreendidas, circunstâncias igualmente sopesadas negativamente quando da dosagem da fração da minorante prevista do § 4º do art. 33 da Lei nº 11.343/2006. A sanção penal, portanto, está revestida dos predica-dos de logicidade, harmonia e proporcionalidade com os dados empíricos apresentados. 4. Habeas corpus denegado.” (STF – HC 136.818 – São Paulo – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 29.11.2016)

tráfico de entorpecentes – dosimetriA dA penA –

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Jurisprudência penalrevista Jurídica 471

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QuAntidAde de droGA – biS in idem – ocorrênciA

31764 – “Penal. Agravo regimental em habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Dosime-tria da pena. Quantidade de droga. Bis in idem. Inocorrência. 1. A dosimetria da pena é questão relativa ao mérito da ação penal, estando necessariamente vinculada ao conjunto probatório, não sendo possível, em habeas corpus, a análise de dados fáticos da causa para redimensionar a pena finalmente aplicada. 2. No caso, o Tribunal Estadual afastou a apli-cação da minorante do art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, tendo em vista o envolvimento do acusado (surpreendido com 14,5kg de maconha) com o crime organizado e a sua de-dicação a atividades criminosas. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF – AgRg-HC 131.935 – São Paulo – 1ª T. – Rel. Min. Roberto Barroso – J. 09.12.2016)

uso de AlGemAs – fundAmentAção suficiente

– súmulA vinculAnte – constrAnGimento

ileGAl – inexistênciA

31765 – “Processual penal. Agravo regimental na reclamação. Uso de algemas. Funda-mentação suficiente. Súmula Vinculante nº 11. Inexistência de constrangimento ilegal. In-vestigação do substrato fático da causa. Inviabilidade. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF – AgRg-RCL 24.689 – São Paulo – 2ª T. – Rel. Min. Teori Zavascki – J. 22.11.2016)

uso de documento público fAlso – circunstânciAs

judiciAis – premeditAção – dolo – AdmissibilidAde

31766 – “Penal. Processo penal. Uso de documento público falso. Art. 304 c/c art. 297 do CP. Circunstâncias judiciais. Premeditação. Dolo. Impossibilidade de valoração negativa. Bis in idem. Organização e planejamento da ação criminosa. Circunstâncias do crime. Im-possibilidade de valoração negativa. Bis in idem. Propósito de prejudicar outrem. Motivo do crime. Consequências do crime. Abalo à credibilidade de instituição. Impossibilidade de valoração negativa. Resultado comum aos crimes contra fé pública. Propósito de ob-tenção de vantagem patrimonial. Motivos do crime. Impossibilidade de valoração negati-

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Revista JuRídica 471JuRispRudência penal

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va. Consequência natural do exercício da profissão almejada pelo agente que fez uso dos documentos falsos. Apelação exclusiva da acusação. Reformatio in melius. Possibilidade. Princípio do favor rei. Inquéritos policiais e ações penais em curso. Valoração negativa da conduta social. Impossibilidade. Presunção de inocência. Utilização de dois ou mais papéis falsificados. Mesmo contexto fático. Única finalidade. Crime único. 1. Na análise das circunstâncias judiciais, a premeditação, quando evidencie o próprio dolo necessário à configuração do tipo penal, não deve ser utilizada para valorar negativamente a culpa-bilidade, sob pena de incorrer em bis in idem. 2. Do mesmo modo, o cometimento da ação criminosa de forma organizada e planejada não deve ser utilizado para valorar negativa-mente as circunstâncias do crime quando evidenciar o próprio dolo necessário à configu-ração do tipo penal, sob pena de incorrer em bis in idem. 3. Também não deve ser utilizado para valorar negativamente as circunstâncias do crime o propósito de prejudicar outrem, justamente, por se confundir com outra circunstancia judicial, o motivo do delito. 4. As consequências do crime envolvem o conjunto de eventos danosos provocados pelo fato criminoso em desfavor da vítima, familiares ou coletividade, constituindo, na verdade, o exaurimento do delito. Esta circunstância judicial, no tocante ao crime de falso, ressalvada alguma particularidade que justifique solução diversa, não deve ser considerada desfa-vorável tão somente pelo abalo provocado à credibilidade de alguma instituição, posto que resultado comum aos crimes contra fé pública. No caso, ademais, a autarquia em face do qual foi feito o uso dos documentos falsificados sequer emitiu o registro profissional visado pelo agente. 5. Os motivos do crime não devem ser valorados negativamente pelo propósito de obtenção de vantagem patrimonial, consequência natural do exercício da profissão almejada pelo agente que faz uso de documentos falsificados, sendo comum, portanto, aos crimes da espécie. 6. O princípio do favor rei incide no processo penal, inclu-sive, para permitir que, em sede de apreciação de apelação exclusiva do órgão de acusa-ção, o Tribunal ad quem profira decisão melhorando a situação penal do réu posta na sen-tença. 7. As ações penais nas quais não tenha havido condenação definitiva transitada em julgado (ou mesmo inquéritos policiais e mandados de prisão em aberto) não autorizam o aumento da pena base, seja para fins de configuração de maus antecedentes, seja para fins de valoração negativa da personalidade e da conduta social, sob pena de violação ao prin-cípio da presunção de inocência insculpido no art. 5º, LVII, da CF. Inteligência da Súmula nº 444 do STJ. 8. Há crime único quando dois ou mais papéis falsificados forem utilizados no mesmo contexto fático com uma única finalidade, devendo, assim, ser desconsiderado o concurso formal de crimes anteriormente reconhecido na sentença e afastada a elevação da reprimenda dele decorrente. 9. Concessão da ordem de habeas corpus de ofício e apela-ção criminal desprovida.” (TRF 2ª R. – ACr 2009.51.01.806111-5 – 2ª T.Esp. – Relª Simone Schreiber – DJe 17.01.2017)

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Índice AlfAbético e Remissivo cÍvel e PenAl

Doutrina

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

assunto

Defesa Da concorrência

• a razoável Duração do Processo no Âmbito do sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (João Carlos lealJúnior e marlene Kempfer) ................................................................ 9

execução

• Fraude à execução e o elemento subjetivo no CPC/2015 (Gelson amaro de souza) ............................................................... 71

tutela De urgência

• o impacto do regime das Tutelas de urgência do Novo Có-digo de Processo Civil nas medidas Cautelares adotadas pela administração Pública e a Possibilidade da interposição de agravo de instrumento em Processos administrativos (aldemJohnston Barbosa araújo) ............................................................... 39

autor

alDem Johnston BarBosa araúJo

• o impacto do regime das Tutelas de urgência do Novo Código de Processo Civil nas medidas Cautelares adotadas pela admi-nistração Pública e a Possibilidade da interposição de agravo de instrumento em Processos administrativos ................................ 39

gelson amaro De souza

• Fraude à execução e o elemento subjetivo no CPC/2015 ............. 71

João carlos leal Júnior e marlene Kempfer

• a razoável Duração do Processo no Âmbito do sistema Bra-sileiro de Defesa da Concorrência ..................................................... 9

marlene Kempfer e João carlos leal Júnior

• a razoável Duração do Processo no Âmbito do sistema Bra-sileiro de Defesa da Concorrência ..................................................... 9

PeNal e ProCessual PeNal

assunto

inquérito policial

• a Figura do inquérito Policial e do Contraditório no Novo Có-digo de Processo Civil (raphael silva rodrigues e ricardomoraes Cohen) ................................................................................ 89

autor

raphael silva roDrigues e ricarDo moraes cohen

• a Figura do inquérito Policial e do Contraditório no Novo Có-digo de Processo Civil ..................................................................... 89

ricarDo moraes cohen e raphael silva roDrigues

• a Figura do inquérito Policial e do Contraditório no Novo Có-digo de Processo Civil ..................................................................... 89

acórDãos na íntegra

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

assunto

ação De inDenização

• Direito civil – ação de indenização – instituição financeira – Fa-lha na prestação do serviço – Bloqueio de cartão bancário – Cliente em viagem impossibilitado de efetuar saques para sua subsistência e para realizar tratamento de saúde – Dano moral configurado – valor indenizatório – Binômio reparação/preven-ção – redução do quantum compensatório (TrF 1ª r.) ............... 135

aDoção

• recurso especial – Civil e processual civil – Direito de família – adoção intuitu personae – Pretendente não inscrita no cadas- tro de adotantes – impossibilidade jurídica do pedido – aplica-ção do princípio do melhor interesse do menor – estabeleci- mento de vínculo afetivo da criança com a pretensa adotantenão cadastrada – recurso especial provido (sTJ) ........................ 121

responsaBiliDaDe civil

• agravo regimental no recurso extraordinário com agravo – res-ponsabilidade civil – Complexidade da prova – incompetência

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Revista JuRídica 471índice cível e Penal

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do juizado – Temas nºs 339, 424, 433 e 660 – ausência de repercussão geral – ofensa ao princípio da legalidade – sú-mula nº 636 do sTF – agravo a que se nega provimento, comaplicação de multa (sTF) ................................................................113

sfh• sistema financeiro de habitação – revisão de cláusulas contra-

tuais – Juízo de retratação – art. 543-C, § 7º, ii do CPC/1973 – seguro habitacional – obrigatoriedade – livre escolha da empresa seguradora pelo mutuário – Possibilidade – re-curso especial representativo de Controvérsia nº 969.129 – súmula nº 473 do sTJ (TrF 2ª r.) ............................................. 145

PeNal e ProCessual PeNal

assunto

haBeas corpus

• Penal e processual penal – Habeas corpus substitutivo de re-curso – art. 89 da lei nº 8.666/1993 – Dispensa ou inexigibi-lidade de licitação fora das hipóteses previstas em lei – Dolo específico – efetivo prejuízo ao erário – Comprovação – Ne-cessidade – atipicidade da conduta narrada na denúncia – Writ não conhecido – ordem concedida de ofício (sTJ) ............... 175

pena

• Habeas corpus substitutivo de recurso próprio – racionaliza-ção da utilização do remédio heróico – Tráfico ilícito de entor-pecentes – Causa especial de diminuição da pena – Não in-cidência – Dedicação à atividade criminosa – impossibilidade de revolvimento do suporte fático-probatório na via estreita do writ – Pedidos de alteração do regime inicial para o aberto e desubstituição da pena privativa de liberdade prejudicados (sTJ) ... 185

regime aBerto

• Processual penal – Habeas corpus – execução penal – re-gime aberto – Prisão domiciliar – monitoramento eletrônico – Possibilidade – Constrangimento ilegal não verificado – De-negação da ordem (TrF 4ª r.) ..................................................... 197

emeNTário Civil

assunto

ação Declaratória – loteamento fechaDo – Despesas conDo-miniais – prestação De serviços em prol Dos moraDores

• Civil. Processual civil. agravo interno no recurso especial. re-curso manejado sob a égide do NCPC. ação declaratória. lo-teamento fechado. Despesas condominiais. Prestação de ser-viços em prol dos moradores, ofensa ao art. 535 do CPC/1973. alegação genérica. associação de moradores. Condomínio de fato. Cobrança de taxa de manutenção de não associado ou que a ela não anuiu. impossibilidade. Decisão mantida. agravo interno desprovido. 1. aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do enunciado administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do sTJ na sessão de 09.03.2016: aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. a questão se restringe à impossibilidade de cobrança de taxa

de manutenção de não associado, nos termos da jurisprudência desta Corte fixada no julgamento dos recursos representati-vos da controvérsia, resps 1.439.163/sP e 1.280.871/sP, de relatoria do ministro ricardo villas Bôas Cueva. 3. a decisão objeto desta irresignação se encontra em consonância com a jurisprudência do sTJ que consolidou o entendimento de que as taxas de manutenção criadas por associações de mo-radores não obrigam os não associados ou que a elas não anuíram. 4. assim, não sendo a linha argumentativa apresen-tada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, de-vendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos. 5. agravo interno não provido ............................................ 34492, 151

ação De DespeJo – conDenação para pagamento De multas contratuais e aluguéis vincenDos – princípio Da congruência

• Civil. Processual civil. agravo interno no recurso especial. recurso manejado sob a égide do NCPC. ação de despejo. Condenação para pagamento de multas contratuais e alu-guéis vincendos. Princípio da congruência. Decisão recorrida em consonância com o entendimento desta corte. súmula nº 83 do sTJ. Decisão mantida. agravo interno desprovido. 1. aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do enunciado administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do sTJ na sessão de 09.03.2016: aos recursos interpostos com fun-damento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. o jul-gamento não se mostra extra petita quando o juiz promove uma interpretação lógico-sistemática dos pedidos deduzidos, ainda que não expressamente formulados pela parte. 3. a de-cisão objeto desta irresignação encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte, que admite, nos termos do art. 290 do CPC/1973, a inclusão das condenação nas parcelas vincendas. 4. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invoca-dos pela decisão agravada, o presente agravo interno não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, de-vendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos. 5. agravo interno não provido ............................................ 34493, 152

ação De inDenização por Danos morais – funDamentos Da Deci-são agravaDa não impugnaDos – agravo não conheciDo

• agravo interno no agravo em recurso especial. ação de inde-nização por danos morais. Fundamentos da decisão agra-vada não impugnados. agravo não conhecido. 1. É inviável o agravo interno que deixa de impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (CPC/2015, art. 1.021, § 1º). 2. o recurso mostra-se manifestamente inadmissível, a ensejar a aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC, no montante equivalente a 1% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º do citado artigo de lei. 3. agravo interno não conheci-do, com aplicação de multa ............................................... 34494, 154

ação De inDenização por Danos morais – ofensa praticaDa por magistraDo contra outro magistraDo – quantum inDenizató-rio – razoaBiliDaDe

• agravo regimental no agravo em recurso especial. ação de indenização por danos morais. ofensa praticada por magis-trado contra outro magistrado. Quantum indenizatório. razoa- bilidade. agravo improvido. 1. o superior Tribunal de Justiça

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 471

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firmou orientação de que somente é admissível o exame do valor fixado a título de danos morais em hipóteses excepcio-nais, quando for verificada a exorbitância ou a índole irrisória da importância arbitrada, em flagrante ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 2. No caso dos au-tos, o montante arbitrado a título de dano moral no valor de r$ 10.000,00 (dez mil reais) não se mostra irrisório ou despro-porcional aos danos sofridos pelo autor, Juiz de Direito, em ra-zão da troca de agressões verbais a que deu início o recorrido. 3. agravo interno a que se nega provimento ..................... 34495, 155

ação De oBrigação De fazer – plano De saúDe – cláusula De coparticipação – lei nº 9.656/1998 – possiBiliDaDe – previ-são contratual expressa

• Direito civil e direito do consumidor. ação de obrigação de fazer. Plano de saúde. Cláusula de coparticipação. lei nº 9.656/1998. Possibilidade. Previsão contratual expressa. 1. ação de obri-gação de fazer ajuizada em 22.01.2014. recurso especial concluso ao gabinete em 02.09.2016. Julgamento. CPC/1973. 2. Cinge-se a controvérsia a definir a legalidade de cláusula, em contrato de assistência médica, que impõe coparticipação do contratante à razão de 50% (cinquenta por cento) do valor das despesas, após o período de 30 (trinta) dias de internação para tratamento psiquiátrico. 3. a lei especial que regulamenta a prestação dos serviços de saúde autoriza, expressamente, a possibilidade de coparticipação do contratante em despesas médicas específicas, desde que figure de forma clara e expres-sa a obrigação para o consumidor no contrato. 4. Na hipótese, a coparticipação foi utilizada para redimensionar, contratual-mente, ‘a franquia, os limites financeiros ou o percentual de coparticipação do consumidor ou beneficiário’, previstos para as despesas com tratamento psiquiátrico na apólice de seguro saúde escolhida pelo recorrente. 5. o acórdão recorrido acom-panha o entendimento deste órgão julgador, no sentido de que ‘não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor, para a hipótese de in-ternação superior a 30 (trinta) dias decorrentes de transtornos psiquiátricos, pois destinada à manutenção do equilíbrio entre as prestações e contraprestações que envolvem a gestão dos custos dos contratos de planos de saúde’. Precedentes. 6. re-curso especial conhecido e não provido ............................ 34496, 156

ação De oBrigação De fazer c/c peDiDo De antecipação De tu-tela – Decisão monocrática

• agravo interno em agravo (art. 544 do CPC/1973). ação de obri-gação de fazer c/c pedido de antecipação de tutela. Decisão monocrática que negou provimento ao reclamo. insurgência recursal do autor. 1. Pretensão de redimensionamento dos honorários advocatícios sucumbenciais arbitrados na origem. Consoante cediço nesta Corte, somente é permitido modificar valores fixados a título de honorários advocatícios no âmbito de recurso especial, se estes se mostrarem irrisórios ou exorbitan-tes, o que não ocorreu na hipótese. incidência da súmula nº 7 do sTJ. 2. agravo interno desprovido ................................ 34497, 156

ação De prestação De contas – primeira fase – negativa De prestação JurisDicional – inocorrência

• agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil (CPC/1973). Negócios jurídicos bancários. ação de prestação de contas. Primeira fase. Negativa de prestação jurisdicional. inocorrência. alegação de carência da ação por inadequação do procedimento. Pedido genérico. inocorrência. Jurispru-dência consolidada deste sTJ. súmula nº 83/sTJ. revisão. súmula nº 7/sTJ. ausência de fundamentos que justifiquem

a alteração da decisão recorrida. agravo interno desprovido ........................................................................................... 34498, 157

ação rescisória – proceDência – omissão quanto ao arBitra-mento De honorários aDvocatícios

• ação rescisória. Procedência. omissão quanto ao arbitramento de honorários advocatícios. 1. acolhidos os embargos de De-claração opostos pelo contribuinte com efeito modificativo para julgar improcedente a ação rescisória, não cabe mais arbitra-mento de honorários advocatícios em favor da Fazenda Distrital. 2. embargos de Declaração prejudicados ......................... 34499, 157

apelação interposta por apenas um Dos litisconsortes – pra-zo em DoBro – art. 191 Do cpc/1973 – inaplicaBiliDaDe

• Processual civil. agravo regimental no agravo em recurso especial. recurso manejado sob a égide do CPC/1973. apelo nobre apresentado fora do prazo legal. apelação interposta por apenas um dos litisconsortes. prazo em dobro. art. 191 do CPC/1973. inaplicabilidade. intempestividade do recurso especial. Juízo de admissibilidade bifásico. Não vinculação do sTJ. recurso não provido. 1. inaplicabilidade do NCPC neste julgamento ante os termos do enunciado administrativo nº 2 aprovado pelo Plenário do sTJ na sessão de 09.03/2016: aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do superior Tribunal de Justiça. 2. se a decisão recorrida é pre-judicial aos litisconsortes, mas apenas um recorre, o prazo em dobro existe em relação ao prazo desse recurso, mas passa a ser simples para os recursos posteriores (agrg-ag 630.734/Pr, rel. min. Franciulli Netto, DJ 02.05.2005). 3. Na hipótese dos autos, apenas a entidade previdenciária apelou da sentença, quedando-se inerte a patrocinadora. assim, inviável a aplicação do prazo em dobro previsto no art. 191 do CPC/1973, deven-do ser reconhecida a intempestividade do recurso especial. 4. o juízo de admissibilidade é bifásico, ou seja, o primeiro juízo realizado no Tribunal de origem não tem o condão de vincular a decisão de admissibilidade do sTJ, que é soberana àquele. 5. agravo regimental não provido ...................................... 34500, 157

coisa JulgaDa – reclamação não conheciDa Diante Da exis-tência De alteração suBstancial Da legislação De regência – inexistência De omissão

• Processual civil e administrativo. Juízes federais. Quintos incor-porados em virtude de cargos exercidos anteriormente. Coisa julgada. reclamação não conhecida diante da existência de alteração substancial da legislação de regência. inexistência de omissão. Falta de interesse em agir para alegação de con-tradição. 1. inexistem as omissões apontadas no acórdão re-corrido, pois ele, louvando-se em precedente anterior, concluiu que não é cabível a reclamação quando o ato impugnado se fundamenta em substancial alteração legislativa, porquanto tal procedimento pressupõe tenha havido voluntária inobservância de decisão oriunda do superior Tribunal de Justiça. Foi feito amplo histórico da questão para mostrar a existência da refe-rida alteração substancial da legislação relativa à remuneração dos magistrados com o processo de implantação do regime de subsídio e, tendo a conclusão sido pelo não conhecimento da reclamação, não seria cabível exigir o exame de teses relati-vas ao mérito. 2. Falece ao embargante interesse em recorrer para alegar que o voto teria caminhado no sentido da improce-dência, pois eventual alteração da conclusão seria para este

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Revista JuRídica 471índice cível e Penal

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efeito, o que representaria reformatio in pejus, já que um jul-gamento de improcedência seria muito mais desfavorável a ele do que a extinção do processo sem julgamento do mérito, que é o que ocorreu, diante do não conhecimento da reclamação. 3. Considerações do voto do relator que eventualmente possam ser vistas como conduzindo a ideia de inexistência de violação da coisa julgada representam obiter dictum, pois a conclusão do colegiado foi pelo não conhecimento da reclamação. 4. embar-gos de Declaração rejeitados ............................................ 35001, 158

conflito De competência – enunciaDo aDministrativo nº 3/stJ – ação orDinária – polo passivo – associação civil De Direito privaDo e funDação púBlica feDeral – competência

• Processual civil. Conflito de competência. enunciado adminis-trativo nº 3/sTJ. ação ordinária. Polo passivo. associação civil de direito privado e fundação pública federal. Competência. Justiça Federal. Critério ratione personæ. Competência ab-soluta. súmula nº 150/sTJ. 1. a teor do art. 109, inciso i, da Constituição da república, compete à justiça federal processar e julgar causas em que a união, entidade autárquica ou empre-sa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de aci-dentes de trabalho e as sujeitas à Justiça eleitoral e à Justiça do Trabalho. 2. assim, proposta uma ação ordinária em que se verifique no polo passivo um desses entes, a competência será obrigatoriamente da Justiça Federal, ainda que o órgão julgador limite a sua atuação à rejeição da legitimidade ou do interesse do ente federal, e, com isso, exclua-o da demanda, somente a partir de quando, então, poderá declinar da competência, salvo se remanescer motivo outro para que a causa continue a tra-mitar perante a Justiça Federal. 3. Compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da união, suas autarquias ou empresas públicas. inteligência da súmula nº 150/sTJ. 4. Conflito conheci-do para julgar competente o suscitado, Juízo Federal da vara de Barreiras, na seção Judiciária da Bahia ............................ 35002, 159

Dano moral – matéria Jornalística veiculaDa em Jornal im-presso, internet e televisão – ato ilícito – responsaBiliDaDe – quantum inDenizatório – valor razoável

• agravo interno no agravo em recurso especial. matéria jornalís-tica veiculada em jornal impresso, internet e televisão. Danos morais. ato ilícito. responsabilidade. Quantum indenizatório. valor razoável. agravo regimental desprovido. 1. o Tribunal de origem, com fundamento no conjunto probatório dos autos, re-conheceu a prática de ato ilícito e a responsabilidade das agra-vantes pela divulgação de matéria jornalística inverídica, em jornal impresso, internet e televisão, em que vincula a imagem do autor a processo criminal do qual não era parte e o qualifica como ‘chefe da quadrilha’. 2. o valor arbitrado pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto por esta Corte tão somente nas hipóteses em que a con-denação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso, em que fixado em r$ 30.000,00 (trinta mil reais). 3. agra-vo interno a que se nega provimento ................................ 35003, 160

execução – inDeferimento Da inicial por inépcia – exceção De pré-executiviDaDe – argumentos DivorciaDos Do contexto Da execução – honorários aDvocatícios

• Processual civil. embargos de declaração no agravo regimental no agravo em recurso especial. execução. indeferimento da inicial por inépcia. exceção de pré-executividade. argumentos divorciados do contexto da execução. Honorários advocatícios.

rediscussão do julgado. impossibilidade. omissão e contra-dição. inexistência. embargos rejeitados. 1. os embargos de declaração têm como objetivo sanar eventual obscuridade, contradição ou omissão existente na decisão recorrida, sendo, portanto, inadmissível a sua oposição para rediscutir questões tratadas e devidamente fundamentadas na decisão embargada, já que não são cabíveis para provocar novo julgamento da lide. 2. a omissão que autoriza a oposição do recurso declaratório diz respeito à questão posta nos autos, relevante ao deslinde da controvérsia, e que deixou de ser analisada, o que não ocorre na espécie, na medida em que o v. aresto embargado adotou fundamentação suficiente e coerente, decidindo integralmente a controvérsia. 3. a contradição apta a abrir a via dos embargos declaratórios é aquela interna ao decisum, existente entre a fun-damentação e a conclusão do julgado ou entre premissas do pró-prio julgado, o que igualmente não se observa no presente caso. 4. embargos de declaração rejeitados .............................. 35004, 160

execução De alimentos – foro competente – aplicação Da regra Do art. 100, ii, Do cpc/1973 – foro Do Domicílio ou resiDência Do alimentanDo

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso espe-cial. recurso manejado sob a égide do NCPC. execução de alimentos. Foro competente. aplicação da regra do art. 100, ii, do CPC/1973. Foro do domicílio ou residência do alimentando. exceção à regra do art. 575, ii, do mesmo diploma legal. Pre-cedentes. incidência da súmula nº 83 do sTJ, que se aplica aos recursos especiais interpostos com fundamento em ambas as alíneas do permissivo constitucional. ausência de deba-te pelo tribunal de origem sobre o conteúdo do art. 475-P do CPC/1973. Prequestionamento. inexistência. incidência da súmula nº 282 do sTF, aplicada por analogia. agravo interno não provido. 1. aplica-se o NCPC a este julgamento ante os termos do enunciado administrativo nº 3 aprovado pelo Plená-rio do sTJ na sessão de 09.03.2016: aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. merece ser confirmado o acórdão do Tribunal de Justiça local que decidiu em harmonia com a jurisprudência desta eg. Corte superior no sentido de que o foro competente para execução de alimentos é o foro do domicílio ou residência do alimentando, ainda que a sentença exequenda tenha sido proferida em foro diverso. a competência prevista no art. 100, ii, do CPC prevalece sobre a prevista no art. 575, ii, do CPC. incidência da súmula nº 83 do sTJ que se aplica aos recursos especiais interpostos com fundamento em ambas as alíneas do permissivo constitucional. 3. a matéria contida no art. 475-P do CPC/1973 não foi objeto de debate prévio nas instâncias de origem e não foram opos-tos embargos de declaração para que o Tribunal de origem examinasse o tema. ausente, portanto, o devido prequestio-namento nos termos da súmula nº 282 do sTF, aplicável por analogia. 4. agravo interno não provido ............................ 35005, 161

execução De título extraJuDicial – propositura após Julga-mento De ação revisional e De consignação em pagamento – Depósito De quantia incontroversa

• recurso especial. execução de título extrajudicial. Propositu-ra após julgamento de ação revisional e de consignação em pagamento. Depósito de quantia incontroversa. valores não ressalvados. Conduta maliciosa do exequente. má-fé evidente. Pagamento em dobro. aplicação do art. 940 do CC/2002. 1. Na esteira da jurisprudência consolidada do sTJ, a incidência da sanção prevista no art. 940 do CC/2002 depende da demonstra-ção concreta de má-fé do exequente. 2. o mero ajuizamento de ação revisional não impede que o credor promova a execução

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lastreada no título extrajudicial sub judice. Precedentes. 3. No caso, o Tribunal de origem reconheceu que o exequente de-mandou o valor do título após o julgamento de mérito da deman-da revisional, deixando de informar acerca de sua existência, bem como omitindo-se quanto ao valor incontroverso deposi-tado judicialmente e colocado à sua disposição em virtude da prévia demanda de consignação em pagamento. À evidência da conduta maliciosa, configura-se a má-fé, impondo-se o pagamento em dobro da quantia não ressalvada. 4. recurso especial parcialmente provido ........................................... 35006, 164

honorários De aDvogaDo contrataDos exclusivamente pelo sinDicato – retenção pelo ente sinDical – impossiBiliDaDe – ausência De autorização Dos filiaDos

• Honorários advocatícios contratados exclusivamente pelo sin-dicato. retenção pelo ente sindical. impossibilidade. ausência de autorização dos filiados. i – o contrato pactuado exclusiva-mente entre o sindicato e o advogado não vincula os filiados substituídos, em face da ausência de relação jurídica contratual entre estes e o advogado. ii – a retenção sobre o montante da condenação em honorários advocatícios contratuais somente é possível com a juntada do contrato celebrado individualmen-te com os filiados substituídos ou a autorização desses para a referida retenção. Precedentes: resp 931.036/rs, relª min. Nancy andrighi, DJe 02.12.2009 e resp 1.464.567/PB, rel. min. Herman Benjamin, DJe 11.02.2015. iii – agravointerno improvido ............................................................... 35007, 165

penhora – nomeação De Bens – Bem imóvel – título transla-tivo não averBaDo no registro De imóveis – proprieDaDe não comprovaDa – Direito De recusa Da fazenDa púBlica ao Bem ofereciDo

• Processual civil. ofensa ao art. 535 do CPC/1973 não confi-gurada. omissão. inexistência. execução fiscal. Nomeação de bens à penhora. Bem imóvel. Título translativo não averbado no registro de imóveis. Propriedade não comprovada. Direito de recusa da fazenda pública ao bem oferecido. Princípio da menor onerosidade do devedor. ausência de comprovação da necessidade de flexibilização da ordem legal. Divergência juris-prudencial. exame prejudicado. 1. Não se configura a alegada negativa de prestação jurisdicional, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada. registre-se que não é o órgão julgador obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos tra-zidos pelas partes em defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as questões relevan-tes e imprescindíveis à sua resolução. 2. a mera insatisfação com o conteúdo da decisão embargada não enseja embargos de Declaração. esse não é o objetivo dos aclaratórios, recurso que se presta tão somente a sanar contradições ou omissões decorrentes da ausência de análise dos temas que foram tra-zidos à tutela jurisdicional no momento processual oportuno. 3. Consoante se extrai dos arts. 1.227 e 1.245 do Código Civil, a comprovação da propriedade de imóvel somente se faz através da apresentação da escritura devidamente registrada no Car-tório de registro de imóveis competente. 4. in casu, o Tribunal de origem consignou expressamente que a escritura pública de compra e venda do imóvel dado em garantia não foi averbada no registro de imóveis, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. 5. ademais, a jurisprudência da Primeira seção do sTJ, ratificada em julgamento submetido ao regime do art. 543-C do CPC, é no sentido de que a Fazenda Pública pode recusar o bem oferecido à penhora, se não observada a ordem legal dos bem penhoráveis, pois inexiste preponderância, em abs-trato, do princípio da menor onerosidade para o devedor sobre

o da efetividade da tutela executiva. exige-se, para a supe-ração da ordem prevista nos arts. 655 do CPC/1973 e 11 da leF, argumentação baseada em elementos do caso concreto (resp 1.337.790/Pr, rel. min. Herman Benjamin, 1ª s., DJe 07.01.2013). 6. Desse modo, não se verifica a existência de di-reito subjetivo da parte executada à aceitação do bem oferecido à penhora. 7. Fica prejudicada a análise da divergência juris-prudencial quando a tese sustentada já foi afastada no exame do recurso especial pela alínea a do permissivo constitucional. 8. recurso especial não provido ....................................... 35008, 165

penhora parcial – manutenção Do nome em caDastro De inaDimplentes – alegação De DissíDio JurispruDencial

• agravo interno no agravo em recurso especial. Penhora par-cial. manutenção do nome em cadastro de inadimplentes. alegação de dissídio jurisprudencial sem a indicação dos dispositivos aos quais teria sido dada interpretação diver-gente. incidência da súmula nº 284/sTF. razões recursais insuficientes. agravo desprovido. 1. a indicação do dispositivo tido como objeto da divergência jurisprudencial é imprescin-dível para a correta configuração do dissídio, nos termos do art. 105, iii, c, da Constituição Federal. incidência da súmula nº 284/sTF. 2. razões recursais insuficientes para a revi-são do julgado. 3. agravo interno desprovido ................................ 166

prazo processual – suspensão – triBunal local – compro-vação por Documento iDôneo – não Demonstração – intem-pestiviDaDe

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso espe-cial. recurso manejado sob a égide do NCPC. suspensão dos prazos processuais no tribunal local. Comprovação por documento idôneo. não demonstrada. intempestividade. De-curso do prazo legal. art. 544 do CPC. agravo interno não pro-vido. 1. aplica-se o NCPC a este julgamento ante os termos do enunciado administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do sTJ na sessão de 09.03.2016: aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, eventual suspensão do prazo recursal decorrente de ausência de expediente ou de recesso forense, feriados locais, entre outros, nos tribunais de justiça estaduais deve ser comprovada por documento idôneo. 3. É intempestivo o agravo em recurso especial interposto após o prazo de 10 dias previsto no art. 544 do CPC/1973. 4. agravo interno não provido ............................................ 35010, 167

previDência privaDa – negativa De prestação JurisDicional – não ocorrência – Denunciação Da liDe Do patrocinaDor – inaDmissiBiliDaDe

• recurso especial. Civil. Previdência privada. Negativa de pres-tação jurisdicional. Não ocorrência. Denunciação da lide do pa-trocinador. inadmissibilidade. ausência de direito de regresso. migração de planos de benefícios. Desistência de participantes. Possibilidade. Notícia divulgada no site oficial. oferta ao públi-co. vinculação ao conteúdo. Dever de não enganar. ação coleti-va. exclusão de alguns representados. sucumbência recíproca. Não configuração. associação civil em regime de representa-ção. 1. ação ordinária em que se discutem as práticas de oferta ao público e de propaganda enganosa por fundo de pensão e de indevida migração compulsória de participantes do plano de benefícios reG/replan para o plano reB. 2. Nas ações que discutem somente o plano de benefícios, incluídos os casos de migração de participantes e assistidos, não cabe a denunciação

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Revista JuRídica 471índice cível e Penal

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da lide (art. 70, iii, do CPC/1973) do patrocinador da entidade fechada de previdência complementar. eventual sucumbência do ente de previdência privada será suportada pelo fundo mú-tuo pertencente aos participantes, assistidos e demais benefici-ários, não se podendo falar em pretensão de regresso contra o patrocinador. Precedentes. 3. a oferta ao público, entendida como a divulgação de produto ou serviço a uma coletividade de pessoas utilizando um meio de comunicação de massa, equivale à proposta, caso apresente os requisitos essenciais do contrato, possuindo, portanto, o efeito de vincular o ofertante a partir da difusão da informação ao público-alvo (arts. 427 e 429 do CC). 4. É direito do aceitante exigir o cumprimento forçado do que foi declarado se a oferta dirigida ao público for feita apro-priadamente, não sendo permitido ao ofertante arrepender-se. Tal tipo de divulgação faz parte do risco da atividade, sendo ínsi-tos os deveres de bem informar e de não enganar, de modo que há completa vinculação com o conteúdo divulgado. 5. o efeito vinculativo da proposta ou da oferta ao público constitui instru-mento de estímulo à atuação responsável e à atuação ética não apenas de empresas, mas também das entidades de previdên-cia privada. 6. a oferta, caso perca a eficácia obrigatória, poderá se transmudar em propaganda enganosa ou abusiva, sobretudo se induzir no público-alvo uma falsa percepção da realidade, ao frustrar as legítimas expectativas criadas pela informação veiculada, em desprestígio à boa-fé objetiva e ao princípio da confiança. 7. Na hipótese dos autos, as declarações da Funcef feitas em seu site oficial caracterizaram verdadeira oferta ao pú-blico, integrando, pois, o contrato de previdência complementar, a tornar obrigatório o seu cumprimento por quem quisesse can-celar a opção de migração do plano reG/replan para o plano reB se tal processo não tivesse sido concluído. 8. a informação divulgada meses após, de que todos os pedidos de desistên-cia da migração seriam sumariamente indeferidos, acabou por não observar as expectativas geradas no público, que confiou na mensagem outrora veiculada, incitando, no lugar, o erro e o engano. Tanto o ofertante quanto o aceitante devem pautar suas condutas conforme os parâmetros da boa-fé, da probidade e da transparência (arts. 113 e 422 do CC). 9. a revogação da proposta ou da oferta ao público, veiculada no mesmo meio de comunicação, opera somente efeitos ex nunc, não alcançando a situação daqueles que, em tempo, já a aceitaram. 10. a exclu-são de alguns representados da demanda não possui o condão de atrair a sucumbência recíproca na ação coletiva ajuizada por associação civil. os pedidos formulados na inicial foram integralmente acolhidos, ou seja, a autora não foi sucumbente. incidência, ademais, da regra do art. 87 do CDC, aplicada de forma subsidiária nas ações coletivas não consumeristas. Por outro lado, trata-se de sentença genérica cuja individualização será feita em execução individual ou em ação de cumprimento. 11. recurso especial não provido .......................................35011, 167

recurso especial – aDvogaDo sem procuração nos autos – vigência Do cpc/1973 – impossiBiliDaDe De conhecimento

• Processual civil. agravo interno no recurso especial. recurso especial subscrito por advogado sem procuração nos autos, na vigência do CPC/1973. impossibilidade de conhecimento. súmula nº 115 do sTJ. inaplicabilidade dos arts. 13 e 37 do CPC/1973, na instância especial, nos termos da legislação vi-gente à época. Precedentes. agravo interno improvido. i – agra-vo interno interposto contra decisão publicada em 17.08.2016, que, por sua vez, julgara recurso interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/1973. ii – Considerando que o recurso especial foi interposto contra acórdão publicado na vigência do CPC/1973, devem ser observados, in casu, os enunciados administrativos nºs 2 (‘aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas

até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do superior Tribunal de Justiça’) e 5 (‘Nos recursos tempestivos interpostos com fun-damento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), não caberá a abertura de prazo prevista no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, § 3º, do novo CPC’), aprovados pelo Plenário do sTJ, em 09.03.2016. iii – es- ta Corte firmou jurisprudência, na vigência do CPC/1973, con-siderando inexistente o recurso endereçado à instância espe-cial, no qual o advogado subscritor não possui procuração ou substabelecimento regular nos autos (súmula nº 115/sTJ), devendo a regularidade da representação processual ser com-provada no ato da interposição do recurso. iv – De igual modo, firmou-se a compreensão, à luz do CPC/1973, no sentido de ser impossível a ‘aplicação dos arts. 13 e 37, segunda parte, ambos do Código de Processo Civil, a fim de que o defeito seja sanado, porquanto tal providência revela-se incompatí-vel com a instância especial’ (sTJ, agrg-aresp 321.374/sP, relª min. regina Helena Costa, 1ª T., DJe de 07.04.2015). v – agravo interno improvido ............................................. 35012, 169

recurso especial – cóDigo De processo civil De 2015 – apli-caBiliDaDe – preparo – ausência De cópia Do comprovante De pagamento Das custas Do recurso especial e Do porte De re-messa e retorno Dos autos – peças oBrigatórias – Deserção

• Processual civil. agravo interno no agravo em recurso especial. Código de Processo Civil de 2015. aplicabilidade. argumentos insuficientes para desconstituir a decisão atacada. Preparo. au-sência de cópia do comprovante de pagamento das custas do recurso especial e do porte de remessa e retorno dos autos. Pe-ças obrigatórias. Deserção. art. 511 do Código de Processo Civil de 1973. súmula nº 187/sTJ. incidência. i – Consoante o decidi-do pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015 no julgamento do agravo interno. ii – É deserto o recurso especial, porquanto nos termos do art. 511 do Código de Processo Civil de 1973, o recolhimento do preparo deve ser comprovado no momento de sua interposição. incide, na hipótese, o óbice da súmula nº 187/sTJ. iii – os agravantes não apresentam, no agravo, argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. iv – agravo interno improvido ........................................... 35013, 170

recurso especial – intempestiviDaDe – expeDiente forense – suspensão – ausência De comprovação – JuntaDa posterior – impossiBiliDaDe – preclusão

• agravo interno no agravo em recurso especial. Processual civil. intempestividade. expediente forense. suspensão. ausência de comprovação. Juntada posterior. impossibilidade. Pre- clusão. 1. a Corte especial modificou o entendimento do su-perior Tribunal de Justiça no sentido de admitir a comprovação da tempestividade quando da interposição do agravo regimen-tal, ônus do qual não se desincumbiu a parte agravante. 2. Na hipótese, a parte comprovou a suspensão do expediente fo-rense mediante petição protocolizada após a interposição do agravo interno. ocorrência de preclusão. 3. agravo interno nãoprovido ............................................................................... 35014, 170

recurso especial interposto via e-mail – inaDmissiBiliDaDe – não equiparação ao fac-simile – intempestiviDaDe

• Processual civil. agravo interno no recurso especial. recurso especial interposto via e-mail. inadmissibilidade. Não equipara-ção ao fac-simile. intempestividade. Precedentes do superior

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 471

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Tribunal de Justiça. agravo improvido. i – o superior Tribunal de Justiça não admite a interposição de recurso via e-mail, na medida em que não equipara este meio eletrônico ao fac-simile, nos termos do que prevê o art. 1º da lei nº 9.800/1999. ii – Com efeito, “a jurisprudência pacífica desta Corte firmou en-tendimento, no sentido de que: ‘o encaminhamento de petição ao sTJ via correio eletrônico (e-mail), por ausência de norma regulamentar, não se mostra apto a afastar a intempestivida-de do recurso cuja petição original foi protocolizada fora do prazo legal’ (agrg-eresp 1.119.463/ro, rel. min. João otá-vio de Noronha, Corte especial, Julgado em 15.05.2013, DJe 29.05.2013). Precedentes” (sTJ, agint-earesp 304.645/mG, rel. min. Humberto martins, Corte especial, DJe de 04.11.2016). iii – No caso, a parte ora agravante transmitiu seu recurso especial, via e-mail, na data de 04.09.2014, tendo tal petição sido protocolada em 05.09.2014, enquanto o original do recurso especial foi apresentado apenas em 08.09.2014, ou seja, após o encerramento do prazo recursal, ocorrido em 04.09.2014. iv – agravo interno improvido ....................... 35015, 171

registro civil – art. 2º Da lei nº 8.560/1992 – averiguação oficiosa De paterniDaDe – proceDimento aDministrativo – Ju-risDição voluntária – anuência Da genitora – ausência

• recurso especial. Processual civil. Direito de família. registro civil. art. 2º da lei nº 8.560/1992. averiguação oficiosa de pa-ternidade. Procedimento administrativo. Jurisdição voluntária. anuência da genitora. ausência. extinção. Possibilidade. via judicial. 1. o procedimento de averiguação oficiosa de paterni-dade previsto na lei nº 8.560/1992 não constitui condição para a propositura de ação judicial de investigação de paternidade por versar procedimento administrativo de jurisdição voluntária. 2. a lei prevê categoricamente, em seu art. 2º, que o oficial deve remeter ao juízo de registros públicos a certidão de nascimento de menor na qual conste apenas informações acerca da sua maternidade. 3. a averiguação oficiosa não está condicionada a informações da genitora, podendo o juízo extinguir o rito previs-to no art. 2º, § 1º, da lei nº 8.560/1992 por ausência de provas, remanescendo incólume a via judicial da investigação de pater-nidade. 4. recurso especial não provido ........................... 35016, 171

seguro Dpvat – correção monetária – não impugnação

• agravo interno no agravo em recurso especial. seguro DPvaT. Correção monetária. Não impugnação dos fundamentos da decisão que negou seguimento ao recurso. incidência do § 1º do art. 1.021 do CPC e da súmula nº 182/sTJ. recurso não conhecido. 1. É inviável o agravo interno que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada nos ter-mos do art. 932, iii, e 1.021, § 1º, do CPC de 2015 e da súmula nº 182 do superior Tribunal de Justiça. 2. agravo interno não conhecido, com a aplicação de multa ................................ 35017, 172

seguro oBrigatório – cessão De Direitos – Dispositivos vio-laDos – ausência De prequestionamento

• agravo interno no recurso especial. seguro obrigatório. Cessão de direitos. Dispositivos violados. ausência de prequestiona-mento. súmula nº 282/sTF. 1. ausente o prequestionamento, até mesmo de modo implícito, de dispositivos apontados como violados no recurso especial, incide o disposto na súmula nº 282/sTF. 2. agravo interno não provido ....................... 35018, 173

seguro-saúDe – Demora na autorização De cirurgia – Danos morais – valor – razoaBiliDaDe

• agravo interno no agravo em recurso especial. Plano de saúde. Demora na autorização de cirurgia. Danos morais. valor. razoa-

bilidade. 1. o superior Tribunal de Justiça, afastando a incidên-cia da súmula nº 7/sTJ, tem reexaminado o montante fixado pelas instâncias ordinárias a título de danos morais apenas quando irrisório ou abusivo, circunstâncias inexistentes no pre-sente caso. 2. agravo interno não provido ........................ 35019, 173

socieDaDe – Dissolução irregular – execução fiscal – re-Direcionamento – ausência De poDer De gerência à época Do fato geraDor – impossiBiliDaDe

• Tributário. agravo interno no recurso especial. execução fiscal. redirecionamento. Dissolução irregular. ausência de poder de gerência à época do fato gerador. impossibilidade. súmula nº 83/sTJ. 1. a jurisprudência do superior Tribunal de Justiça definiu as seguintes orientações: a) o redirecionamento da execução fiscal ao sócio, em razão de dissolução irregular da empresa, pressupõe a respectiva permanência no quadro so-cietário ao tempo da dissolução; e b) o redirecionamento não pode alcançar os créditos cujos fatos geradores são anteriores ao ingresso do sócio na sociedade. 2. Na situação em que fun-damentado o pedido de redirecionamento da execução fiscal na dissolução irregular da empresa executada, é imprescindí-vel que o sócio contra o qual se pretende redirecionar o feito tenha exercido a função de gerência no momento dos fatos geradores e da dissolução irregular da sociedade. Preceden-tes: agrg-resp 1.497.599/sP, rel. min. Napoleão Nunes maia Filho, DJe 26.02.2015; agrg-ag 1.244.276/sC, rel. min. sér-gio Kukina, DJe 04.03.2015; agrg-resp 1.364.171/Pe, relª min. regina Helena Costa, 1ª T., DJe 29.02.2016; agint-resp 1.569.844/sP, rel. min. Benedito Gonçalves, 1ª T., Julgado em 22.09.2016, DJe 04.10.2016; aresp 838.948/sC, rel. min. Gurgel de Faria, 1ª T., Julgado em 15.09.2016, DJe 19.10.2016. 3. agravo interno não provido ............................................ 35020, 173

suspensão Do processo – óBito Do exequente – Demora na haBilitação Dos sucessores – prescrição – não ocorrência

• Civil e processual civil. suspensão do processo por óbito do exequente. Demora na habilitação dos sucessores. Prescri-ção. Não ocorrência. Cabimento de juros de mora. matéria não examinada pelo Tribunal a quo. Prequestionamento fic-to. ausência de culpa do devedor. Juros de mora indevidos. i – em relação à alegada impossibilidade de cobrança de juros de mora no período de habilitação dos sucessores do exequen-te, observa-se que, apesar de a matéria não ter sido apreciada no âmbito do acórdão recorrido, o recorrente interpôs embargos de declaração, buscando a análise dela, a qual deveria ter sido examinada diante de sua relevância, o que configurou omissão, viabilizando, assim, a efetivação do prequestionamento ficto do art. 396 do CC, em conformidade com o art. 1.025 do CPC/2015. ii – entre a data da suspensão do processo de execução, efe-tivado com a comunicação do óbito do exequente, e a data de habilitação dos seus sucessores, encontra-se suspensa a pres-crição. Precedentes: resp 1.625.947/Pe, rel. min. Herman Ben-jamin, 2ª T., DJe 14.10.2016, aresp 282.834/Ce, rel. min. og Fernandes, 2ª T., DJe 22.04.2014 e agrg-resp 1.485.127/al, rel. min. mauro Campbell marques, 2ª T., DJe 12.02.2015). iii – o devedor somente estará em mora quando for culpa-do pelo atraso no adimplemento da obrigação, conforme dispõe o art. 396 do Código Civil. Na hipótese dos autos, verifica-se que a autarquia não contribuiu para a demora no período entre a paralisação do processo e a habilitação dos sucessores do exequente falecido, não devendo assim ser punido pela demora na referida habilitação. iv – recurso es-pecial parcialmente provido ............................................... 35021, 174

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Revista JuRídica 471índice cível e Penal

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emeNTário PeNal

assunto

contraBanDo – prescrição Da pretensão punitiva – inocor-rência

• Penal e processual penal. apelação criminal. Contrabando. Prescrição da pretensão punitiva. inocorrência. Princípio da insignificância. inaplicabilidade. autoria e dolo comprovados. Dosimetria da pena. maus antecedentes. Circunstâncias do crime. reincidência. Confissão. regime inicial semiaberto. impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade. 1. Considerando o prazo prescricional fixado pelo art. 109, v, do Código Penal e a pena imposta ao acusado, ora apelante, não ocorreu a prescrição da pretensão punitiva estatal. 2. a materialidade do crime está comprovada pelo auto de apre-sentação e apreensão, pelo auto de infração e termo de apre-ensão e guarda fiscal e pelos laudos de exame merceológico. 3. Tratando-se do delito de contrabando, o mero valor do tributo iludido não pode ser utilizado como parâmetro para eventual aplicação do princípio da insignificância, pois a questão relativa à evasão tributária é secundária. o bem jurídico tutelado é a saúde pública, razão pela qual o princípio da insignificância não tem, em regra, aplicação. Precedentes. 4. a autoria e o dolo encontram-se devidamente comprovados pelo auto de prisão em flagrante, pelo auto de apresentação e apreensão, pela prova oral e pelas declarações do próprio acusado, em sede de interrogatório judicial. 5. Dosimetria da pena. maus antece-dentes e circunstâncias da prática delitiva. Pena-base acima do mínimo legal. 6. Nos termos do art. 64, inc. i, do Código Pe-nal, o termo inicial para contagem de reincidência é a data do cumprimento ou extinção da pena, e não a data do trânsito em julgado da condenação. 7. mesmo quando imbuída de teses de-fensivas, descriminantes ou exculpantes, a confissão deve ser considerada na graduação da pena. Posicionamento do sTJ. 8. Possibilidade de compensação da circunstância agravante da reincidência com a circunstância atenuante da confissão. Precedente do superior Tribunal de Justiça. 9. regime inicial semiaberto e impossibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em razão da reincidência, dos maus antecedentes e das circunstâncias concretas da prá-tica do crime. 10. apelação desprovida ............................. 31742, 207

contravenção penal – vias De fato – violência Doméstica contra a mulher – conDenação

• Penal. Habeas corpus. Contravenção penal. vias de fato (art. 21 do Decreto-lei nº 3.688/1941). violência doméstica contra a mulher. substituição da reprimenda corporal. viabilidade. art. 44, i, do Código Penal. imposição das restrições do art. 17 da lei nº 11.340/2006. ordem concedida. 1. É viável a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direito nos moldes previstos no art. 17 da lei maria da Penal aos condenados pela prática da contravenção penal de vias de fato, por se tratar de modalidade de infração penal não alcançada pelo óbice do inciso i do art. 44 do Código Penal. Precedente. 2. No parti-cular, o paciente foi condenado à pena de 20 dias de prisão, no regime aberto, pela prática da contravenção prevista no art. 21 do Decreto-lei nº 3.688/1941 contra pessoa com quem manteve relacionamento amoroso, razão pela qual o Tribunal de Justiça substituiu a pena corporal por restritiva de direito. 3. ordem concedida para restabelecer o acórdão do Tribunal de Justiça do estado do mato Grosso do sul ......................... 31743, 208

crime contra a orDem triButária – acesso às movimentações Bancárias Dos contriBuintes pela receita feDeral – possi-BiliDaDe

• Penal. apelação criminal. art. 1º, i e ii da lei nº 8.137/1990. Constitucionalidade do art. 6º da lC 105/2001. acesso às mo-vimentações bancárias dos contribuintes pela receita Federal. Determinação de prosseguimento do feito. apelação Criminal do ministério Público Federal provida. 1. Trata-se de apelação criminal interposta pelo ministério Público Federal contra de-cisão proferida pelo mm. Juiz da 1ª vara Federal Criminal do espírito santo que determinou o trancamento da ação penal por força da nulidade absoluta de todo o material probatório, uma vez que fora obtido com base em quebra de sigilo fiscal pela receita Federal, o que seria incompatível com a Constituição Federal. 2. as autoridades tributárias tem acesso a dados de alcance muito maior do que apenas os concernentes às mo-vimentações bancárias do contribuinte. É ínsito à atividade de fiscalização o acesso às informações financeiras. Não é razoável exigir das autoridades fiscais (neste caso, da receita Federal) a prévia solicitação, ao Poder Judiciário, de acesso a dados bancários para o exercício de sua atribuição constitucio-nal e legal. 3. o supremo Tribunal Federal pacificou a questão ao julgar constitucional o dispositivo no julgamento das aDis 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859 e do re 601.314. o Tribunal Pleno do sTF, na repercussão Geral nº 225, fixou a seguinte tese: ‘o art. 6º da lei Complementar nº 105/2001 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos ci-dadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal’. 4. Considerando-se a constitucionalidade do dispositivo e, portanto, a licitude das provas colhidas pela receita Federal, não há qualquer óbice à sua utilização no processo penal, no qual serão submetidas ao contraditório judicial. 5. apelação criminal provida para determi-nar o prosseguimento do feito ........................................... 34744, 208

crime De Denunciação caluniosa – princípio Da colegialiDaDe – ofensa

• agravo regimental. Habeas corpus. Processual penal. Crime de denunciação caluniosa. ofensa ao princípio da colegialidade. inocorrência. extinção prematura da ação penal. ausência de justa causa não configurada. 1. Não há falar em ofensa ao prin-cípio da colegialidade, já que a viabilidade do julgamento por decisão monocrática do relator se legitima quando se tratar de pedido manifestamente inadmissível, improcedente ou contrário à jurisprudência dominante ou a súmula do Tribunal (art. 21, § 1º, do risTF). ademais, eventual nulidade da decisão monocrá-tica fica superada com a reapreciação do recurso pelo órgão co-legiado, na via de agravo interno. Precedentes. 2. a jurisprudên-cia desta Corte firmou-se no sentido de que a extinção da ação penal de forma prematura, via habeas corpus, somente se dá em hipóteses excepcionais, quando patentemente demonstrada (a) a atipicidade da conduta; (b) a ausência de indícios mínimos de autoria e materialidade delitivas; ou (c) a presença de causa extintiva da punibilidade. 3. No particular, a denúncia narrou de forma objetiva a conduta atribuída ao agravante, adequando-a, em tese, ao tipo descrito na peça acusatória (denunciação ca-luniosa), com a indicação dos elementos indiciários mínimos de que teria dado causa à instauração de “investigação policial de, pelo menos, sete das nove pessoas por ele arroladas”. 4. agra-vo regimental a que se nega provimento ........................... 31745, 209

crime De Desacato – art. 331 Do cp – sursis processual – preceDentes

• embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário. Penal e processo penal. Crime de desacato.

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 471

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art. 331 do Código Penal. sursis processual. art. 89 da lei nº 9.099/1995. Controvérsia de índole infraconstitucional. inviabilidade de verificação de decurso de prazo para fins de aplicação do art. 64, i, do Código Penal. alegação de ofensa aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal. ofensa reflexa ao texto da Constituição Fe-deral. inexistência de ambiguidade, obscuridade, contradição ou omissão. efeitos infringentes. impossibilidade. a sucessiva interposição de recursos contrários à jurisprudência consolida-da pelo pretório excelso configura abuso do direito de recorrer. Precedentes. Caráter protelatório do recurso. embargos decla-ratórios desprovidos. Determinada a certificação do trânsito em julgado e a baixa imediata dos autos à origem, independente-mente da publicação do acórdão ....................................... 31746, 209

crime De homicíDio qualificaDo – provas – inexistência

• agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Penal e processual penal. Crimes de homicídio qualificado tentado e consumado. absolvição pelo Tribunal do júri. inexistência de provas. apelação ministerial provida pelo Tribunal a quo. alegada violação ao art. 5º, XXXviii e lvii, da Constituição Federal. Controvérsia de índole infraconstitucional. ofensa reflexa ao texto da Constituição Federal. incursionamento no conjunto fático-probatório. incidência da súmula 279 do sTF. agravo regimental desprovido ........................................... 31747, 210

crime De importação De matéria-prima com a finaliDaDe De pro-Dução De estupefacientes

• agravo regimental no habeas corpus. Penal e processual penal. Crime de importação de matéria-prima com a finalidade de pro-dução de estupefacientes. art. 33, § 1º, i, da lei nº 11.343/2006. Habeas corpus substitutivo de recurso extraordinário. inadmissi-bilidade. Competência do supremo Tribunal Federal para julgar habeas corpus. CrFB/1988, art. 102, i, d e i. Hipótese que não se amolda ao rol taxativo de competência desta suprema Cor-te. Pretensão de reconhecimento de inviabilidade do exame do recurso especial dirigido ao superior Tribunal de Justiça. inad-missibilidade do writ para reanalisar pressupostos de admissibi-lidade de recursos da competência de outros tribunais. agravo regimental desprovido. 1. o objeto da tutela em habeas corpus é a liberdade de locomoção quando ameaçada por ilegalidade ou abuso de poder (CF, art. 5º, lXviii), não cabendo sua utiliza-ção para reexaminar pressupostos de admissibilidade de recur-sos de outros tribunais. 2. as circunstâncias judiciais subjetivas elencadas no art. 59 do Código Penal, quando desfavoráveis, autorizam a fixação da pena-base acima do mínimo legal, desde que fundamentada a exasperação. 3. in casu, o paciente foi de-nunciado em razão de suposto envolvimento da importação de matéria-prima (semente de maconha) com o intuito de prepara-ção da droga para sua posterior mercancia. recebida a denún-cia, a defesa recorreu e o Tribunal de origem determinou o tran-camento da ação penal em razão da atipicidade da conduta. em recurso especial, o superior Tribunal de Justiça determinou o prosseguimento da ação. 4. a competência originária do supre-mo Tribunal Federal para conhecer e julgar habeas corpus está definida, exaustivamente, no art. 102, inciso i, alíneas d e i, da Constituição da república, sendo certo que o paciente não está arrolado em qualquer das hipóteses sujeitas à jurisdição desta Corte. 5. agravo regimental desprovido ............................ 31748, 210

crime De tortura – corrupção ativa – elementos concretos – possiBiliDaDe

• Penal. Processo penal. recurso ministerial e do réu. Crime de tortura. art. 1º, ii, § 4º, da lei nº 9.455/1997. Corrupção ativa. art. 317 do CP. sentença mantida em relação ao crime de tor-

tura e reformada para condenar corréu pela prática de tortura e aumentar a pena. reformada sentença para condenar réu pela prática do crime do art. 317 do CP. Certeza extraída do acervo probatório. Há omissão se presente dever específico de agir im-posto ao garante. Presença de capacidade jurídica para evitar o crime. Há elementos concretos a fundamentar a intensificação da pena. apelação do ministério Público Federal provida. recur-so do réu desprovido. 1. o depoimento da vítima em crimes des-sa espécie em que se praticam na clandestinidade, longe dos olhos de testemunhas, é crucial, mormente no caso em questão em que encontram amparo em prova robusta produzida ao lon-go da instrução criminal. Por seis vezes a vítima depôs sobre os fatos e em todas elas manteve a mesma versão apresentada desde a sua fala em sede policial, duas vezes no ano de 2001, depois em 2003, 2004, 2007 e 2009. o mesmo se diga em re-lação às testemunhas que prestaram depoimento ao longo dos anos sem que caíssem em contradição, ou ainda que alguma contradição se vislumbre, há na sentença condenatória funda-mentação plausível quanto a tal. 2. No tocante à absolvição de ricardo Borgo Feitosa da imputação da prática do crime de tor-tura (art. 1º, ii, § 4º, da lei nº 9.455/1997), a sentença deve ser reformada para condená-lo pelo crime de tortura. isso porque, há prova nos autos de que este acusado esteve presente nas dependências da policia rodoviária federal ao longo do tempo em que a vítima esteve detida e que presenciou, ao menos em parte, a tortura praticada pelo policial robson. Não há justifi-cativa plausível para um policial exercer normalmente as suas atividades enquanto outro policial tortura um cidadão, violando a lei, a Constituição da república, além de tratado internacional e, por fim, e mais importante, violando a dignidade de uma pessoa humana, pelo simples fato de que este se recusou a ceder às exigências manifestamente ilegais de pagar propina solicita-da. Não em um sistema constitucional que tem na dignidade da pessoa humana verdadeiro meta princípio e fundamento constitucional. 3. No tocante à absolvição de robson Helder da imputação da prática do crime de corrupção passiva (art. 317 do CP), a sentença deve ser reformada também nesse ponto, para que se condene o réu pela prática deste crime. isso porque, tal como ocorre com o crime de tortura, a análise sobre a prática do crime de corrupção passiva também deve levar em conta o depoimento da vítima, vez que também é crime que se comete clandestinamente, por óbvio, longe dos olhos de testemunhas. Há sim prova idônea nos autos a certificar a materialidade e autoria delitiva, afinal, a coerência dos depoimentos da vítima Pedro veloso, que deram suporte à condenação do réu pelo cri-me de tortura, continua a merecer a mesma credibilidade para o deslinde do crime em questão, posto que, não é outro o meio de prova do crime de corrupção quando praticado isoladamente. Portanto não há sentido em se desqualificar as declarações da vítima, exigindo mais do que se faria se o único crime praticado fosse o de corrupção passiva. 4. assiste razão ao ministério Público Federal quanto ao seu pleito relativo ao aumento da pena restritiva de liberdade aplicada ao réu robson Helder pela prática do crime de tortura. 5. recurso do ministério Público Fe-deral provido e recurso do réu desprovido .........................31749, 211

estelionato e associação criminosa – prisão preventiva – funDamentação – possiBiliDaDe

• recurso em habeas corpus. estelionato e associação crimino-sa. Prisão preventiva. Fundamentação. indicação de elementos concretos relacionados ao modus operandi do crime e proba-bilidade concreta de reiteração delitiva. Crimes praticados, em tese, por inúmeras vezes e por meio da rede mundial de com-putadores. Prejuízo de grande monta. Constrangimento ilegal. ausência. 1. a prisão preventiva constitui medida excepcional ao princípio da não culpabilidade, cabível, mediante decisão

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devidamente fundamentada, quando evidenciada a existência de circunstâncias que demonstrem a necessidade da medida extrema, nos termos dos arts. 312 e seguintes do Código de Processo Penal. 2. No caso, o magistrado singular logrou apre-sentar elementos concretos que denotam a necessidade da segregação cautelar para garantia da ordem pública, consisten-te no modus operandi do crime, a evidenciar a periculosidade social dos réus, corroborada, ainda, pela ousadia e suposto prejuízo causado com a empreitada criminosa, bem como a probabilidade concreta de reiteração delitiva, demonstrada pe-las inúmeras vezes em que a conduta foi, em tese, praticada, in-dicando que os réus faziam do crime seu meio de sobrevivência. 3. recurso em habeas corpus improvido .......................... 31750, 212

estelionato previDenciário – materialiDaDe – autoria – com-provação

• Direito penal. estelionato previdenciário. Comprovação da ma-terialidade, autoria e dolo. Circunstâncias judiciais favoráveis. manutenção da sentença de primeiro grau. apelações não providas, por maioria. 1. Comprovação da materialidade, da autoria e dolo. Prova documental. interrogatórios. manutenção da sentença condenatória. 2. No tocante à culpabilidade, não restou demonstrada uma situação peculiar que fizesse incidir maior reprovabilidade da conduta do que a normalmente de-corre da prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal. o conhecimento da ilicitude da conduta é pressuposto da caracterização do dolo. o aliciamento de um servidor do iNss é essencial à própria consumação do crime de estelionato previdenciário. 3. Quanto aos motivos do crime, a ganância é elemento essencial à prática de todos os delitos patrimoniais e a intenção de obter vantagem indevida em detrimento da Previ-dência social é elementar do crime de estelionato qualificado, já tendo sido prevista pelo legislador ao criar a figura típica. 4. No que tange às circunstâncias do delito, a prática do crime de estelionato previdenciário pressupõe a utilização da estru-tura da autarquia Previdenciária. 5. Quanto às consequências do crime, a causa de aumento do § 3º do art. 171 do Código Penal já contempla o prejuízo causado ‘em detrimento de en-tidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência’. 6. Demais circunstâncias judiciais favoráveis. 7. Dosimetria da pena mantida. 8. ven-cido o relator, que negava provimento à apelação da defesa e dava parcial provimento à apelação da acusação. 9. apela-ções não providas, por maioria .......................................... 31751, 214

estelionato qualificaDo – ausência De prova – comprovação – impossiBiliDaDe

• Penal e processual penal. estelionato qualificado tentado. Comprovação da materialidade. ausência de prova da autoria. impossibilidade de lastrear a condenação apenas no interroga-tório policial de corréu. Princípio do contraditório. apelação não provida. 1. materialidade comprovada. Prova testemunhal e do-cumental. laudo pericial. 2. Não comprovação da autoria. Cor-réu não interrogada em juízo. o interrogatório policial de corréu, isoladamente, não pode para lastrear a sentença condenatória. Princípio do contraditório. inexistência de outras provas da auto-ria. 3. apelação não provida .............................................. 31752, 215

execução penal – inDulto coletivo natalino – pena – cum-primento

• Penal e processual penal. agravo em execução penal. indulto coletivo natalino. Constitucionalidade do Decreto nº 8.380/2014. Cumprimento de um quarto da pena restritiva de direitos. extin-ção da punibilidade do apenado. agravo ministerial improvido.

1. inexiste previsão na constituição de que a aplicação deva se limitar àqueles que cumprem Pena Privativa de liberdade, excluindo-se do benefício os condenados que tiveram suas Penas substituídas por restritivas de Direitos, conforme pre-cedentes deste egrégio Tribunal regional Federal. 2. Caso o indulto apenas pudesse ser concedido àqueles que se encon-tram encarcerados, seriam desprestigiados os apenados que vêm cumprindo regularmente as condições impostas para o cumprimento das penas restritivas de liberdade, visto que eles teriam de ser privados de sua liberdade em decorrência da conversão de penas para a obtenção do benefício. 3. o agra-vado, até 25 de dezembro de 2014, cumpriu 1/4 (um quarto) da Pena restritiva de Direitos, visto que, até o dia 25 de de-zembro de 2014, executou ‘444 horas, restando o cumprimento de 855 horas (fl. 1451-v). Quanto à interdição temporária de direitos, verifico que o referido condenado declarou que não exerce cargo, função ou atividade pública nem mandato eleti-vo’, conforme sentença que extinguiu a Punibilidade. 4. agravo em execução Penal improvido .......................................... 31753, 215

execução penal – prescrição Da pretensão punitiva – não ocorrência

• Processo penal. agravo. execução penal. Prescrição da preten-são punitiva. Não ocorrência. matéria enfrentada em sede de apelação. Prescrição executória. Não ocorrência. extinção da punibilidade. Não incidência. recurso desprovido. i – o agra-vante foi condenado à pena de 02 (dois) anos de reclusão em regime aberto, substituída por duas penas restritivas de direitos, e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa pela prática do delito previsto no art. 304 c/c art. 297 do Código Penal. ii – a sentença condenatória com cópia às fls.17/29 transitou em julgado para o Parquet, que não interpôs apelação e nem recorreu do acórdão. sendo assim, cabe observar que após o trânsito em julgado para a acusação a prescrição regula-se pela pena aplicada, confor-me o art. 110, § 1º, do Código Penal, sendo de 04 (quatro) anos, uma vez que a pena aplicada foi de 02 (dois) anos, de acordo com o art. 109, v do Código Penal. iii – Considerando a data do recebimento da denúncia em 11.02.2011 (fls. 08/09) e a publi-cação da sentença condenatória em 06.12.2013 (fl. 33), não há que se falar em prescrição, tampouco em extinção da punibili-dade, eis que não transcorreu o lapso temporal de 04 (quatro) anos entre as aludidas datas. iv – ademais, não há que se falar em prescrição da pretensão executória, eis que não transcorreu o lapso temporal de 04 (quatro) anos entre o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação e o presente mo-mento, na forma dos arts. 110, § 1º e 112, inciso i, ambos do Código Penal. v – recurso desprovido ............................ 31754, 216

execução penal – progressão De regime – marco inicial – Data em que o reeDucanDo preencheu os requisitos Do art. 112 Da lep – alteração Do entenDimento Da sexta tur-ma – aDequação à JurispruDência Do stf

• Habeas corpus. execução penal. subsequente progressão de regime. marco inicial. Data em que o reeducando preencheu os requisitos do art. 112 da leP. alteração do entendimento da 6ª T. adequação à jurisprudência do sTF e da quinta turma. ordem concedida de ofício. 1. revisão da jurisprudência da 6ª T. desta Corte superior, para alinhar-se ao posicionamento do supremo Tribunal Federal e da 5ª T. de modo a fixar, como data-base para subsequente progressão de regime, aquela em que o reedu-cando preencheu os requisitos do art. 112 da lei de execução Penal e não aquela em que o Juízo das execuções deferiu o be-nefício. 2. Consoante o recente entendimento do supremo Tri-bunal, a decisão do Juízo das execuções, que defere a progres-são de regime – reconhecendo o preenchimento dos requisitos

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objetivo e subjetivo da lei (art. 112 da leP) – é declaratória, e não constitutiva. embora se espere celeridade da análise do pe-dido, é cediço que a providência jurisdicional, por vezes – como na espécie – demora meses para ser implementada. 3. Não se pode desconsiderar, em prejuízo do reeducando, o período em que permaneceu cumprindo pena enquanto o Judiciário anali-sava seu requerimento de progressão. 4. Habeas corpus não conhecido, mas concedida a ordem de ofício, para restabelecer a decisão do Juízo das execuções Penais ....................... 31755, 216

extraDição – crime De homicíDio – prescrição – inocorrência

• extradição instrutória. Tratado de extradição entre a repú-blica Federativa do Brasil e a república argentina. Crime de homicídio. Dupla tipicidade atendida. Prescrição. inocorrência. Discussão de mérito e parcialidade do juízo requerente. via imprópria. Contenciosidade limitada. Problemas de saúde do extraditado. Circunstância que não impede a extradição. aten-dimento a todos os requisitos legais. extradição deferida. 1. a extradição instrutória, requerida em autos devidamente instru-ídos com os documentos exigidos pelas normas de regência, tem por fim viabilizar o julgamento de suspeitos da prática, no território do estado requerente, de crimes que atendam ao requisito da dupla tipicidade e que não incidam nas hipóteses legais de inadmissibilidade. 2. a contenciosidade limitada, regra que rege o julgamento da extradição, impede que o supremo Tribunal Federal analise questões de mérito, posto incompe-tente ratione materiae. 3. a saúde eventualmente precária do extraditando não é suficiente para impedir sua entrega, restan-do a mesma condicionada a prévio exame médico oficial que ateste suas condições físicas para suportar adequadamente a viagem até o país requerente, nos termos do parágrafo único do art. 89 da lei nº 6.815/1980. 3. in casu, (a) o extraditando é acusado de ter praticado crime de homicídio consumado, em horário incerto entre 31.08.2015 e 01.09.2015; (b) a prescri-ção da pretensão punitiva do delito de homicídio, pelo Código Penal argentino, consuma-se em 2023, e pelo Código Penal brasileiro, em 2035; (c) a parcialidade de autoridades da re-pública argentina não se presume e sua mera alegação não inviabiliza o deferimento da extradição; (d) estão preenchidos todos os requisitos para o deferimento da extradição, previstos no Tratado Bilateral, ausentes hipóteses de inadmissibilidade. 4. extradição deferida ........................................................ 31756, 218

inquérito policial – lei Da usura – constrangimento ilegal – alegação

• Penal. Processual penal. Habeas corpus. Pleito de deslo-camento competencial, em prol da Polícia Civil do estado de Pernambuco, de inquérito policial originariamente instaurado pela polícia federal, em que se investiga eventual cometimento, pelo paciente, das condutas típicas previstas no art. 4º, a, da lei nº 1.521/1951 (usura) e no art. 147, do Código Penal (amea- ça). ausência de demonstração mínima de atual ou iminente constrangimento ilegal, porventura decorrente da continuidade do investigatório no âmbito da Polícia Federal. Paciente ocu-pante do cargo de policial federal. Necessidade de aferição, no inquisitório, do grau de comprometimento do munus público desenvolvido pelo investigado no episódio delituoso em causa, para fins de determinação da competência para processamento de ação criminal, caso venha a ser efetivamente deflagrada. inviabilidade do precoce deslocamento da competência inves-tigatória, à míngua de qualquer prejuízo – atual ou iminente – a direitos e garantias do paciente. ordem denegada. 1. renova--se, nestes autos, visto que idênticas as causas de pedir, a pretensão, também aviada em sede de habeas corpus, porém denegada perante a Justiça Federal em Pernambuco. Deve-se

realçar, in casu, a ausência de fundamentação jurídica, mini-mamente razoável, quanto à eventual ocorrência – ainda que hipoteticamente considerada – de constrangimento ilegal, em desfavor do paciente, porventura vinculado ao só fato de as investigações policiais prosseguirem na esfera federal, e não, como pretende a impetração, perante o aparelho policial esta-dual. 2. a excepcionalidade da medida requerida no presente writ, não foi minimamente justificada, notadamente, também, em face dos sólidos argumentos jurídicos produzidos pela mmª Juíza Federal, quando da prolação de veredicto denegatório de idêntico pedido, formulado em feito análogo – habeas corpus –, junto à primeira instância, aqui desde logo incorporados a este acórdão. 3. Não há que se falar, na espécie, de haver sido minimamente demonstrado qualquer prejuízo ao livre exercí-cio do direito de defesa do investigado, ora paciente, nem de seu iminente cerceamento; Não há comprovação, sequer, de óbice ao direito de locomoção do paciente. 4. Também acer-ca da impropriedade dos fundamentos desta impetração, em que se discute, precocemente, acerca da incompetência da Justiça Federal, bem como da inviabilidade da instauração e prosseguimento, no âmbito da Polícia Federal, do investigatório em comento, colha-se a abalizada síntese do posicionamento ministerial produzido em sede do Parecer, em que se realça o fato de somente ser possível uma análise mais segura acerca dessa questão após a conclusão do apuratório, quando haverá a possibilidade de averiguar se houve ou não a utilização do munus público na prática dos delitos investigados e se os fatos narrados no boletim de ocorrência, de fato, ocorreram. 5. impõe--se denegar a ordem de habeas corpus, ante a não subsunção da hipótese fático-jurídica aos comandos dos arts. 647, 648 e seguintes do Código de Processo Penal, principalmente por não haver sido infirmada, de molde extreme de controvérsias, a legalidade da competência da Polícia Federal para o prossegui-mento do investigatório em curso ...................................... 31757, 219

Justiça militar – falecimento Do Beneficiário – competência

• Habeas corpus. Penal e processual penal militar. saque indevi-do de pensão militar após o falecimento do beneficiário (art. 251 do CPm). Competência da justiça militar. lei de organização Judiciária militar. Julgamento de civil pelo Conselho Permanente de Justiça. Conformidade com a legislação em vigor. Dosimetria da pena. exasperação da pena-base. Fundamentação idônea. Confissão espontânea. Não incidência. 1. É da competência da Justiça militar processar e julgar civil acusado da prática do cri-me de estelionato cometido mediante saque de pensão de bene-ficiário falecido. Precedentes. 2. No caso, a fixação da pena-ba-se, com respaldo no art. 69 do Código Penal militar, foi elevada em decorrência da intensidade do dolo, com esteio no modus operandi da conduta, dotada de acentuada gravidade, além da extensão do dano dela advindo. indicou-se, para tanto, o pro-longado lapso em que o paciente teria sacado o benefício pre-videnciário de titularidade de sua genitora, mediante declaração falsa de que a beneficiária continuava viva, mesmo após quase 3 anos do seu falecimento, período no qual usufruiu do recebi-mento do benefício, por intermédio de mais de 400 movimen-tações financeiras realizadas. 3. elementos dos autos indicam que a autoria delitiva já estava identificada quando o paciente admitiu sua culpa, sendo inviável em sede habeas corpus proce-der ao revolvimento de fatos e provas com vistas a emprestar ao relato do paciente o grau de valoração exigido para qualificá-lo como confissão espontânea, assim entendida como aquela que decorre da livre disposição do agente de procurar a autoridade para informar a prática da infração penal ‘ignorada ou imputada a outrem’ (CPm, art. 72, iii, d) e assim ajudar no seu pronto esclarecimento. 4. ordem denegada ................................ 31758, 220

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Revista JuRídica 471índice cível e Penal

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lei De imprensa – não recepção – tipos penais – relações regiDas pela legislação comum

• agravo regimental em habeas corpus. Processo penal. Decisão monocrática. inexistência de argumentação apta a modificá--la. manutenção da negativa de seguimento. lei de imprensa. Não recepção. Tipos penais. relações regidas pela legislação comum. agravo regimental desprovido. 1. a inexistência de ar-gumentação apta a infirmar o julgamento monocrático conduz à manutenção da decisão recorrida. 2. a não recepção da lei de imprensa não traduz automática atipicidade absoluta de delitos contra a honra, visto que, conforme decidido na aDPF 130/DF, aplicam-se ‘as normas da legislação comum, notadamente o Código Civil, o Código Penal, o Código de Processo Civil e o Có-digo de Processo Penal às causas decorrentes das relações de imprensa’. impossibilidade de, na via do habeas corpus, reava-liar a reincidência reconhecida pelas instâncias antecedentes. 3. agravo regimental desprovido ....................................... 31759, 221

omissão De Documento púBlico – estrangeiro – peDiDo De refúgio e anistia com nome falso – materialiDaDe e autoria

• Penal. Processo penal. art. 299 do CP. estrangeiro. Pedido de refúgio e anistia com nome falso. materialidade e autoria deliti-vas comprovadas. ausência de culpabilidade. inexigibilidade de conduta diversa reconhecida. 1. autoria e materialidade deliti-vas comprovadas. os extratos de tela do sistema informatizado de identificação de digitais da Polícia Federal demonstra a exis-tência de registro anterior de pedido de anistia em nome falso de abubakar Keita. Fatos confirmados pelo réu em seu interro-gatório. 2. a conjuntura econômica, política e social que forçou a saída do réu de seu país de origem e levou ao seu ingresso no Brasil como imigrante ilegal era grave, apta a justificar todo o re-ceio do apelado em retornar à Guiné. a adoção da conduta ilícita foi meio de garantir sua permanência em solo brasileiro. Trata--se de indivíduo impelido por fatores externos, desencadeantes de um agir contrário às normas, conceituado como o delinquen-te ocasional. 3. Caracterizada a causa supralegal de excludente de culpabilidade. Nas circunstâncias apresentadas, não seria possível exigir-se do acusado comportamento de acordo com o ordenamento jurídico, uma vez que a alternativa ao cometimen-to de crime levaria à situação demasiadamente penosa ao es-trangeiro, que teria sua integridade física e a própria vida amea-çadas. 4. apelação criminal desprovida ............................ 31760, 221

pena – Dosimetria – haBeas corpus – meio ináBil

• agravo regimental no habeas corpus. Penal e processual pe-nal. ato libidinoso. art. 214 do Código Penal (antiga redação). menor de 14 anos. Continuidade delitiva. Habeas corpus subs-titutivo de recurso extraordinário. inadmissibilidade. Competên-cia do supremo Tribunal Federal para julgar habeas corpus. CrFB/1988, art. 102, i, D e i. Hipótese que não se amolda ao rol taxativo de competência desta suprema Corte. inviabili-dade do writ para reanalisar pressupostos de admissibilidade de recursos. rediscussão de critérios de dosimetria da pena. Fundamentação idônea pelas instâncias ordinárias. revolvi-mento do conjunto fático-probatório. inadmissibilidade na via eleita. inexistência de constrangimento ilegal. sucedâneo de revisão criminal. agravo regimental desprovido. 1. a dosimetria da pena, bem como os critérios subjetivos considerados pelos órgãos inferiores para a sua realização, não são passíveis de aferição na via estreita do habeas corpus, por demandar mi-nucioso exame fático e probatório inerente a meio processual diverso (Precedentes: HC 114.650, 1ª T., rel. min. luiz Fux, DJe de 14.08.2013, rHC 115.213, 1ª T., rel. min. luiz Fux, DJe de 26.06.2013, rHC 114.965, 1ª T., relª min. rosa Weber, DJe de 27.06.2013, HC 116.531, 1ª T., rel. min. rosa Weber, DJe

de 11.06.2013, e rHC 100.837-agr, 1ª T., rel. min. roberto Barroso, DJe de 03.12.2014). 2. as circunstâncias judiciais subjetivas elencadas no art. 59 do Código Penal, quando des-favoráveis, autorizam a fixação da pena-base acima do mínimo legal, desde que fundamentada a exasperação. 3. a revisão das circunstâncias agravantes e atenuantes, bem como das causas de aumento e de diminuição consideradas pelo juízo natural é inadmita da via eleita, porquanto enseja revolvimento fático--probatório dos autos. 4. in casu, o recorrente foi condenado a 7 (sete) anos, 04 (quatro) meses e 20 (vinte) dias de reclu-são, a ser cumprida inicialmente em regime fechado, a teor do art. 33, § 3º, do Código Penal, por decisão em sede segunda revisão criminal, como incurso no art. 214 (redação anterior) e art. 9º da lei nº 8.072/1990, pelo fato de o recorrente haver corrompido a moral de diversas menores com a prática de atos libidinosos consigo, entre os próprios menores e presenciando atos libidinosos com terceiros, inclusive fotografando tais atos e as menores. atos esses praticados de forma reiterada em continuidade delitiva e mediante concurso de agentes. 5. a competência originária do supremo Tribunal Federal para co-nhecer e julgar habeas corpus está definida, exaustivamente, no art. 102, inciso i, alíneas d e i, da Constituição da república, sendo certo que o paciente não está arrolado em qualquer das hipóteses sujeitas à jurisdição desta Corte. 6. o habeas corpus não pode ser manejado como sucedâneo de revisão criminal. 7. agravo regimental desprovido ....................................... 31761, 222

sequestro De Bens – crime licitatório – Desvio De verBas púBlicas – inocorrência

• Penal. embargos de declaração. sequestro de bens em ação cautelar penal para ressarcimento ao erário. Crime licitatório e de desvio de verbas públicas. assinatura pelo recorrente das propostas da empresa. indícios de participação nos de-litos. Proporcionalidade da constrição em face do valor a ser ressarcido. omissão e contradição. inocorrência. 1. embargos de Declaração opostos pelo particular, aduzindo omissão e contradição no acórdão, que teria incidido em erro de fato ao não considerar que o débito já se encontra garantido em face da constrição do valor de r$ 89.114,39 (oitenta e nove mil, cento e quatorze reais e trinta e nove centavos), em contas dos denunciados via Bacen-Jud, uma quantia suficiente para garantir o débito, calculado em r$ 76.353,18 (setenta e seis mil, trezentos e cinquenta e três reais e dezoito centavos), calculado em 07/2015, montante suficiente para ressarcir o dano, não se justificando a constrição de mais 02 (dois) veí-culos, avaliados em r$ 120.000,00 (cento e vinte mil reais). 2. o acórdão embargado negou provimento ao apelo do ora recorrente, sob o fundamento de não haver ‘desproporciona-lidade entre o valor dos veículos sequestrados (r$ 120.000,00) e o valor do dano a ser eventualmente ressarcido ao erário (r$ 85.470,09), tendo em vista que a finalidade da medida cons-tritiva não é apenas assegurar montante de eventual recompo-sição ao Poder Público, mas também de eventuais despesas processuais e sanções pecuniárias, em tudo a apontar que o valor total da avaliação dos bens sequestrados pode expres-sar toda essa grandeza monetária, até porque o valor do dano será passível de nova atualização, até o final do processo, isso sem falar nas despesas processuais e nas penas pecuniárias’. 3. Foram bloqueados, via Bacen-Jud, valores nas contas--correntes dos réus no montante de r$ 89.114,39 (oitenta e nove mil, cento e catorze reais e trinta e nove centavos), o que já garante, em tese, o ressarcimento ao erário, bem como eventuais juros e correções, sendo que da conta do recorren-te apenas foi bloqueado o valor de r$ 168,62 (cento e ses-senta e oito reais e sessenta e dois centavos), de forma que ele não teve valores bloqueados de forma suficiente para a

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 471

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reparação do dano. 4. Constrição via Bacen-Jud na conta do recorrente em montante diminuto que não tem o condão de alterar o resultado do julgado embargado, sendo necessária a manutenção da constrição dos bens ora impugnada. embar-gos de Declaração improvidos .......................................... 31762, 223

tráfico De Drogas – fixação Do regime inicial fechaDo – quantum Da pena – compatiBiliDaDe

• Processual penal. Habeas corpus. Tráfico de drogas. Fixação do regime inicial fechado. Quantum da pena compatível com regime mais brando. Quantidade e natureza da droga utilizados para calibrar o grau de redução da pena do tráfico privilegiado e para impor regime prisional mais rigoroso. Possibilidade. 1. À luz do art. 33, § 3º, do Código Penal, a jurisprudência des-ta Corte firmou o entendimento de que a imposição do regime inicial de cumprimento da pena não decorre somente do quan-tum da reprimenda, mas também das circunstâncias judiciais (CP, art. 59). No crime de tráfico de drogas, podem ser levadas em consideração, como critério adicional na fixação das pe-nas, a natureza e a quantidade da substância ou do produto (lei nº 11.343/2006, art. 42). 2. assim, independentemente do momento em que os vetores referentes à quantidade e à natureza da droga forem utilizados para dosar a reprimenda (na pena-base ou na escolha da fração de redução do § 4º do art. 33 da lei nº 11.343/2006), tais circunstâncias revelam-se idôneas para imprimir maior rigor na seleção do regime pri-sional, dado o óbice intransponível ao julgador de considerá--los de forma cumulativa (HC 112.776/ms, rel. min. Teori Zavascki, Pleno, DJe 30.10.2014). 3. No caso, a imposição do regime prisional inicial foi motivada pelo volume e pela varieda-de de drogas apreendidas, circunstâncias igualmente sopesa-das negativamente quando da dosagem da fração da minorante prevista do § 4º do art. 33 da lei nº 11.343/2006. a sanção penal, portanto, está revestida dos predicados de logicidade, harmonia e proporcionalidade com os dados empíricos apresentados. 4. Habeas corpus denegado .............................................. 31763, 224

tráfico De entorpecentes – Dosimetria Da pena – quantiDaDe De Droga – Bis in iDem – ocorrência

• Penal. agravo regimental em habeas corpus. Tráfico de en-torpecentes. Dosimetria da pena. Quantidade de droga. Bis in idem. inocorrência. 1. a dosimetria da pena é questão relativa ao mérito da ação penal, estando necessariamente vinculada ao conjunto probatório, não sendo possível, em habeas cor-pus, a análise de dados fáticos da causa para redimensionar a pena finalmente aplicada. 2. No caso, o Tribunal estadual afastou a aplicação da minorante do art. 33, § 4º, da lei nº 11.343/2006, tendo em vista o envolvimento do acusado (surpreendido com 14,5kg de maconha) com o crime orga-nizado e a sua dedicação a atividades criminosas. 3. agravo regimental a que se nega provimento ............................... 31764, 225

uso De algemas – funDamentação suficiente – súmula vincu-lante – constrangimento ilegal – inexistência

• Processual penal. agravo regimental na reclamação. uso de algemas. Fundamentação suficiente. súmula vinculante nº 11. inexistência de constrangimento ilegal. investigação do subs-trato fático da causa. inviabilidade. agravo regimental a quese nega provimento ........................................................... 31765, 225

uso De Documento púBlico falso – circunstâncias JuDiciais – premeDitação – Dolo – aDmissiBiliDaDe

• Penal. Processo penal. uso de documento público falso. art. 304 c/c art. 297 do CP. Circunstâncias judiciais. Premedita-ção. Dolo. impossibilidade de valoração negativa. Bis in idem. organização e planejamento da ação criminosa. Circunstâncias do crime. impossibilidade de valoração negativa. Bis in idem. Propósito de prejudicar outrem. motivo do crime. Consequên-cias do crime. abalo à credibilidade de instituição. impossibi-lidade de valoração negativa. resultado comum aos crimes contra fé pública. Propósito de obtenção de vantagem patrimo-nial. motivos do crime. impossibilidade de valoração negativa. Consequência natural do exercício da profissão almejada pelo agente que fez uso dos documentos falsos. apelação exclusiva da acusação. reformatio in melius. Possibilidade. Princípio do favor rei. inquéritos policiais e ações penais em curso. valora-ção negativa da conduta social. impossibilidade. Presunção de inocência. utilização de dois ou mais papéis falsificados. mes-mo contexto fático. Única finalidade. Crime único. 1. Na análise das circunstâncias judiciais, a premeditação, quando evidencie o próprio dolo necessário à configuração do tipo penal, não deve ser utilizada para valorar negativamente a culpabilidade, sob pena de incorrer em bis in idem. 2. Do mesmo modo, o co-metimento da ação criminosa de forma organizada e planejada não deve ser utilizado para valorar negativamente as circuns-tâncias do crime quando evidenciar o próprio dolo necessário à configuração do tipo penal, sob pena de incorrer em bis in idem. 3. Também não deve ser utilizado para valorar negativamente as circunstâncias do crime o propósito de prejudicar outrem, justamente, por se confundir com outra circunstancia judicial, o motivo do delito. 4. as consequências do crime envolvem o conjunto de eventos danosos provocados pelo fato criminoso em desfavor da vítima, familiares ou coletividade, constituindo, na verdade, o exaurimento do delito. esta circunstância judicial, no tocante ao crime de falso, ressalvada alguma particularidade que justifique solução diversa, não deve ser considerada des-favorável tão somente pelo abalo provocado à credibilidade de alguma instituição, posto que resultado comum aos crimes contra fé pública. No caso, ademais, a autarquia em face do qual foi feito o uso dos documentos falsificados sequer emitiu o registro profissional visado pelo agente. 5. os motivos do crime não devem ser valorados negativamente pelo propósito de obtenção de vantagem patrimonial, consequência natural do exercício da profissão almejada pelo agente que faz uso de documentos falsificados, sendo comum, portanto, aos cri-mes da espécie. 6. o princípio do favor rei incide no processo penal, inclusive, para permitir que, em sede de apreciação de apelação exclusiva do órgão de acusação, o Tribunal ad quem profira decisão melhorando a situação penal do réu posta na sentença. 7. as ações penais nas quais não tenha havido con-denação definitiva transitada em julgado (ou mesmo inquéritos policiais e mandados de prisão em aberto) não autorizam o au-mento da pena base, seja para fins de configuração de maus antecedentes, seja para fins de valoração negativa da perso-nalidade e da conduta social, sob pena de violação ao princípio da presunção de inocência insculpido no art. 5º, lvii, da CF. inteligência da súmula nº 444 do sTJ. 8. Há crime único quan-do dois ou mais papéis falsificados forem utilizados no mesmo contexto fático com uma única finalidade, devendo, assim, ser desconsiderado o concurso formal de crimes anteriormente re-conhecido na sentença e afastada a elevação da reprimenda dele decorrente. 9. Concessão da ordem de habeas corpus de ofício e apelação criminal desprovida ................................ 31766, 225