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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE EDUCAÇÃO MÉDICA NO BRASIL: DO REGIME BOM SERÁ À RESIDÊNCIA MÉDICA Por: Maria Cristina Pereira de Sá Orientador Profa. Diva Nereida Maranhão Rio de Janeiro 2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE EDUCAÇÃO MÉDICA NO BRASIL: DO REGIME BOM SERÁ À RESIDÊNCIA MÉDICA Por: Maria Cristina Pereira de Sá Orientador Profa. Diva Nereida Maranhão Rio de Janeiro 2007

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2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “ LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE EDUCAÇÃO MÉDICA NO BRASIL: DO REGIME BOM SERÁ À RESIDÊNCIA MÉDICA

Apresentação de monografia à Universidade Candido

Mendes como requisito parcial para obtenção do grau

de especialista em Docência do Ensino Superior.

Por: Maria Cristina Pereira de Sá

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AGRADECIMENTOS A meus pais, João Walkyrio e Lailda, pela eterna doação

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DEDICATÓRIA

A meus filhos Daniel e Juliana, e a Cleber meu marido pela

compreensão por minhas ausências involuntárias.

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5 RESUMO

Instituído em 1808, o ensino médico no Brasil evoluiu seguindo as

transformações da sociedade brasileira. No início para o ingresso, bastava saber

ler e escrever com a recomendação que , bom será que também saiba as línguas

inglesa, francesa...As reformas se sucederam visando um ensino mais eficiente,

inicialmente atrelado ao modelo português e posteriormente à influência francesa.

Com a criação da Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro , novo passo é dado

agora na estruturação das atividades dos profissionais e ensino médico no Brasil.

O país passa por várias mudanças políticas e sociais , várias reformas no

ensino médico visam a adaptação aos novos conceitos científicos, abandona-se o

modelo francês altamente teórico em busca de um modelo cientifico e prático,

mais próximo da experiência da reforma de Flexner ( 1910 ) nos Estados Unidos,

que modificaram as relações do ensino e de mercado de trabalho com a

implantação das especialidades médicas.

No Brasil o reflexo das mudanças de paradigmas no ensino é

representado principalmente com a criação da Residência médica em 1944 ,

ensino de pós-graduação, visando a especialização médica, na forma de

treinamento em serviço.

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METODOLOGIA

O tema educação médica, foi decidido na ocasião em que cursava a

disciplina Políticas Públicas e Educacionais, durante a explanação sobre a

educação no período colonial, o papel dos jesuítas e reforma Pombalina , decidi

que dissertaria sobre a criação do curso de medicina no Brasil. Parti então para

pesquisa inicialmente pela internet , levantei os títulos e onde achá-los , a maior

parte estava nas bibliotecas da FIOCRUZ, alguns pude acessar on line . Portanto,

o assunto estava decidido, o material já estava catalogado , bastava então juntar

as informações e ir adiante e foi o que fiz, após a avaliação do material delimitei

o período: colônia com a chegada da família Imperial e a criação das Escolas de

Cirurgia e a criação da residência médica em 1944, então surgiu o tema: A

educação médica no Brasil: do Regime Bom Será à Residência médica.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08

CAPÍTULO I

SAÚDE NO BRASIL COLONIAL 09

CAPÍTULO II

FUGA PARA COLÕNIA – SAÚDE NO BRASIL IMPERIAL 14

CAPÍTULO III

CRIADA A ESCOLA DE MEDICINA : REGIME BOM SERÁ 17

CAPÍTULO IV

A MEDICINA É DOS MÉDICOS 20

1.1 MEDICINA POPULAR VERSUS MEDICINA ACADÊMICA

1.2 A MULHER E A MEDICINA 24

CAPITULO V

AS REFORMAS DO ENSINO 27

CAPÍTULO VI

HOSPITAL DE ENSINO – CRIAÇÃO DA RESIDÊNCIA MÉDICA 37

CONCLUSÃO 42

BIBLIOGRAFIA 44

ANEXO 47

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INTRODUÇÃO

A transferência da Família Real para o Brasil, representou o início de

uma nova era, por conta das modificações que se fizeram necessárias para

tornar a vida da Corte mais suportável. Entre as mudanças “civilizatórias” : a

criação das Escolas de Cirúrgica da Bahia e do Rio de Janeiro, com a finalidade

de facilitar o acesso daqueles que pretendiam iniciar-se na arte de curar sem

precisar ir a Portugal, mesmo assim, durante alguns anos os que aqui concluíam

o curso precisavam complementá-lo nas faculdades da Europa, por conta do

ensino incipiente , a maioria não retornava , logo por conta do número

insuficiente de cirurgiões e médicos e a inexistência de uma estrutura de

assistência à saúde, proliferaram práticos, curandeiros e boticários. Esse

panorama de “medicina empírica ” começa a mudar no momento em que é

fundada a Sociedade Médica do Rio de Janeiro que inicia a estruturação das

atividades profissionais e ensino médico no Brasil.

As escolas de cirurgia seguiam o modelo francês que era iminentemente

teórico foi posteriormente abandonado. A partir da reforma de 1879 mulheres são

aceitas nos cursos de medicina e a Reforma Sabóia (1882) de orientação

germânica dá inicio a um ensino mais experimental, reformas se seguem por

conta dos avanços científicos, na percepção das doenças e na relação com o

paciente. O país passa por transformações políticas importantes que por algum

tempo retardaram avanços na educação.

A partir de 1930 novas instituições são criadas, organizando as relações

da sociedade e Estado, o curso de medicina ganha novas disciplinas, estimulo à

pesquisa, ampliação de técnicas e práticas baseadas no hospital de ensino,

modelo das reformas ocorridas a partir do relatório de Flexner (1910) que

modificaram as relações entre ensino e mercado de trabalho a partir da criação

das especialidades médicas nos Estados Unidos. O estreitamento científico com

aquele país, culminou com a criação dos primeiros programas de residência

médica na década de 1940. Passamos então a dissertar sobre a educação

médica do período da colônia à criação da Residência médica.

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CAPÍTULO I

SAÚDE NO BRASIL COLONIAL

Do descobrimento até a instalação do Império no Brasil, não havia

nenhuma preocupação com aqueles que aqui viviam a não ser no que se referia

aos tributos recolhidos, portanto, não havia nenhum modelo e nem interesse por

parte do governo colonizador em uma atenção à saúde da população, logo, o

atendimento às questões da saúde limitavam-se aos próprios recursos da terra

(plantas,ervas) e àqueles que por conhecimentos empíricos (curandeiros)

desenvolveram habilidades na arte de curar.

O primeiro médico a pisar em terras brasileiras, foi o espanhol Mestre

João ( João Farás), cirurgião Del Rei e cosmógrafo que acompanhava a frota de

Cabral com a função de observador dos astros.

Aos portugueses recém chegados à terra de Santa Cruz se impunha o

desafio administrativo de assentar colonos, organizar engenhos açucareiros e o

enfrentamento de uma geografia, fauna e flora desconhecidos. Com a migração

crescente e surgimento de epidemias aumenta a necessidade de internação de

pacientes destituídos de recursos ou recém chegados ao Brasil, são então criadas

as Santas Casas da Misericórdia nos moldes daquela originada em Lisboa.

Formada por uma irmandade leiga, a Santa Casa da Misericórdia teve origem

em Portugal no final do século XV, em 15 de agosto de 1498, quando foi fundada

a Confraria da Misericórdia , sob a real proteção de Dona Leonor, viúva de Dom

João III. A primeira Santa Casa da Misericórdia no Brasil é fundada em 1543 na

cidade de Olinda , logo após em 1543 a de santos e em 1549 a da Bahia.

Seguiram-se outras, com o as do Rio de Janeiro , do Pará e de São Luís de

Maranhão.

O Governador-geral do Brasil , Tomé de Souza , em 1549 trouxe um

cirurgião-mor , o cristão-novo Jorge de Valadares, o primeiro profissional

diplomado a exercer a medicina no Brasil e alguns inacianos, liderados por padre

Manoel da Nóbrega, primeiro Provincial na colônia, que tinha como meta a

catequese , a organização das aldeias e conversão dos indígenas. Manoel da

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10Nóbrega foi responsável em 1553 pela criação do primeiro estabelecimento de

ensino, o Colégio da Bahia, pontuando assim metas de desenvolvimento da

missão no Brasil: atividade missionária e educacional. Os jesuítas ,soldados da

Companhia de Jesus, que fora fundada em 1540 por Inácio de Loyola, tinham

uma natureza desbravadora e muitos desafios neste novo continente: clima

instável, animais peçonhentos e ataques de grupos de nativos . Alguns desses

missionários tinham formação nas artes médicas, mas, a maioria acabou atuando

informalmente e aprendendo na prática o oficio de curar, o exemplo mais

conhecido foi José de Anchieta, outros missionários também tiveram fundamental

importância ao descreverem propriedades de ervas e plantas curativas, sendo

responsáveis pelos primeiros escritos da farmacopéia brasileira.

A nova colônia americana assistiu a chegada impiedosa de

inúmeras moléstias trazidas pela migração de portugueses e,

ainda , pelos escravos vindos da África, precariamente atochados

nos tumbeiros desde do século XVI. Assolada então por surtos

epidêmicos de doenças como malária, sarampo. Febre amarela ,

disenteria e varíola , contou com a enorme habilidade dos

jesuítas na observação dos sintomas , na evolução destas

moléstias e na aplicação da terapêutica possível . Todos os

aldeamentos indígenas foram alvo da ação jesuítica na área da

saúde. Em 1574, o Provincial Inácio de Tolosa determinou que em

todas as aldeias fossem criadas enfermarias e casas isoladas,

que funcionassem como hospital (SANTOS FILHO, LYCURGO,

HISTORIA GERAL DA MEDICINA BRASILEIRA , p.26)

Entre os anos de 1654 e 1681, houveram várias tentativas por

parte dos religiosos e das autoridades locais em transformar o Colégio da Bahia

em universidade.Embora este propósito tenha sido negado pela Coroa

Portuguesa, os jesuítas acabaram por fazer do Colégio dos Jesuítas da Bahia

uma casa de estudos gerais comparável à Universidade de Évora em Portugal

(LOBO,1964,TORRES, 1946).

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11A escassez de médicos leigos formados por escolas de medicina na

Europa ,pelo menos até o século XVIII, fez dos jesuítas os responsáveis quase

exclusivos pela assistência médica no primeiro século de colonização do Brasil ,

era comum a instalação de boticas e hospitais nos colégios da Companhia de

Jesus. Com a expulsão dos jesuítas das colônias em 1759 pelo Marques de

Pombal (Sebastião José de Carvalho), o aprendizado e obtenção da licença para

curar na colônia que geralmente se dava nos hospitais da Misericórdia ou nos

hospitais militares, toma outros rumos passando a um treinamento informal,

ocorrendo até nas residências dos mestres das principais cidades e vilas. Na

Bahia durante o ano de 1799, o Cirurgião–mor do 4°Regimento de Milícias, José

Xavier de Oliveira Dantas ministrava um curso de anatomia e cirurgia em sua

própria casa e tentou solicitar prerrogativa de “aula régia”, não obtendo

êxito.(LOBO,1964).

A carência de profissionais de médicos no Brasil Colônia e Império era

enorme , para se ter uma idéia, no Rio de Janeiro, em 1789, só existiam quatro

médicos exercendo a profissão (SALLES, 1971). Em outros estados brasileiros

era mesmo inexistente. Diante desse quadro anárquico de inexistência médica

estruturada, proliferaram pelo país os Boticários (farmacêuticos), a eles cabia a

manipulação das fórmulas prescritas pelos poucos médicos existentes, e na

verdade na maioria das vezes eles próprios tomavam a iniciativa de indicá-las. O

processo de habilitação na função de Boticário consistia tão somente em

acompanhar um serviço de uma botica já estabelecida durante um certo tempo,

ao final do qual prestavam exame perante a Fisicatura e se aprovado , o

candidato recebia a “carta de habilitação” e estava apto a instalar sua própria

botica (SALLES, 1971)

Pouquíssimos eram os médicos que aqui aportavam e os que vinham

eram chamados físicos , em sua maioria cristãos- novos, ou seja , judeus recém

convertidos ao catolicismo que viam na jornada à nova colônia a oportunidade

de fugir à Inquisição. Em maior numero vieram os cirurgiões, dos quais havia três

categorias : os “cirurgiões–barbeiros”, os “cirurgiões aprovados” e os “cirurgiões

diplomados”. Predominavam os “cirurgiões – barbeiros “ , que praticamente

monopolizaram a prática da medicina nos séculos XVI e XVII. Os assistentes

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12quase sempre mestiços ou mulatos aprenderam o oficio e se tornaram também

“cirurgiões –barbeiros. Sem nenhum preparo, , iniciavam-se como aprendizes e

após alguma prática eram examinados e recebiam a carta que os habilitava ao

exercício da profissão. Praticavam tratamento de fraturas , luxações , curavam

feridas , faziam sangria , aplicavam ventosas , sanguessugas e extraiam dentes.

Durante os séculos XVII e XVIII a Universidade de Coimbra acolheu 147

brasileiros , a maioria estudantes, que após diplomarem-se em físicos preferiram

permanecer na Europa ao invés de enfrentar a realidade colonial no Brasil. Os

poucos que retornavam à colônia, concentravam-se na cidade e vilas maiores ,

ficando o interior totalmente desprovidos desses profissionais . O pequeno

número de médicos e a concentração nas cidades, possibilitava àqueles

cirurgiões-barbeiros ou mesmo os chamados barbeiros e curandeiros em geral, o

exercício de toda medicina. Ao cirurgião-barbeiro era permitido oficialmente a

cirurgia, ao barbeiro a aplicação de ventosas , sarjaduras e sanguessugas, corte

de cabelo ou barba e extração de dentes ; ao sangrador e algebrista, o tratamento

de fraturas, luxações e torceduras; à parteira ou aparadeira, o atendimento aos

partos normais; e ao boticários , a preparação e o comércio de medicamentos. Os

diplomas eram muitas vezes vendidos aos pretendentes aos cargos citados, sem

terem cursado o período de estágio necessário. A licença ou a carta oficializava

os práticos em uma única função, indicava o alcance e o limite de sua atividade e

os instrumentos que deveriam utilizar, por exemplo, os curandeiros poderiam

tratar com plantas medicinais onde não houvesse médicos e caso houvesse

algum deveria este opinar primeiro . A imensa maioria desses práticos, também

conhecidos pelos nomes de curiosos, anatômicos , algebristas e entendidos(

HOLANDA, 1960), tinham pouco interesse em tornar oficial suas atividade , por

várias razões de ordem sócio-cultural . As licenças são provisórias , em geral

renováveis a cada ano, enquanto as cartas são definitivas, (PIMENTA 1998)

As parteiras e os curandeiros freqüentavam ambientes muito distantes da

clientela dos boticários , cirurgiões e médicos , que também conservavam entre si

uma hierarquia, baseada na proximidade ou distancia do trabalho manual

(FIGUEIREDO, 2002).

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13Grande parte do público que se tratava com práticos não oficializados, por

conta de sua situação social, não tinha o menor interesse e nem poder para exigir

deles reconhecimento oficial. Muitas dessas práticas se confundem com magia e

religiosidade, o que impossibilitava o credenciamento.

Nas lojas de barbeiros , podiam ser encontrados amuletos fabricados por

negras velhas ,com finalidade de proteção ( KARASH, 2000), eram locais onde

a profissão podia ser exercida oficialmente , desde que estivesse de acordo com

as exigências das autoridades. Através desta atividade, a obtenção de licença,

revela uma intenção e uma possibilidade de ascensão social , já que os negros

que aí trabalhavam compravam escravos , a quem ensinavam seu oficio, e que ,

por sua vez acabavam conseguindo comprar a alforria, ao passo quem aos

brancos pobres interessava a licença para enquanto cirurgiões, estarem próximos

à categoria médica ( FIGUEIREDO, 2002).

No ano de 1800, visando diminuir a deficiência de médicos , um édito real

de 1º de maio , ordenava que a municipalidade do Rio de Janeiro designasse

anualmente dois rapazes para estudarem em Portugal, um na faculdade de

Medicina de Coimbra e o outro no Hospital real de São José de Lisboa, sendo que

o primeiro voltaria físico e o segundo cirurgião.

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CAPÍTULO II

FUGA PARA A COLÔNIA – SAÚDE NO BRASIL IMPERIAL

A organização profissional e regulamentação da educação médica no

Brasil, como atividade diferente da exercida por práticos e curandeiros, inicia

então, apenas no começo da século XIX,no momento em que a Corte

Portuguesa, ameaçada pelas tropas do general Jean Andoche Junot foge para o

Brasil.

Em 24 de janeiro de 1808 desembarca na Bahia , o Príncipe Regente D.

João e sua Corte, foram recepcionados pelo então governador, D. João de

Saldanha da Gama de Mello e Torres , Conde de Ponte , acompanhado pelo

arcebispo Frei José de Escholástica e o povo que via na chegada do Príncipe

esperança para o desenvolvimento da até então precariamente assistida terra

brasileira.

Dias depois o cirurgião- mor da real Câmara e Lente Jubilado da

faculdade de Coimbra, Dr José Correia Picanço, pernambucano, depois , Barão

de Goyana, que viera de Lisboa com o Príncipe regente , argumenta sobre a

necessidade da criação de uma Escola de Cirurgia, onde os moços aprendessem

a arte de curar sem necessidade de irem à Coimbra para o estudo da medicina.

Então é criada em Salvador a Escola de Cirurgia, pela decisão régia de 18 de

fevereiro de 1808 , expedida pelo Ministro do Reino D. Fernando José de Portugal

ao Capitão –general da Bahia Conde da Ponte ( João Saldanha da gama) na qual

ressalta:

´IImo e Exmo .Sr

O Príncipe regente Nosso Senhor, anuindo à proposta que

lhe fez o Doutor José Correa Picanço , Cirurgião Mor do

reino e do seu conselho, sobre a necessidade que havia de

uma escola de Cirurgia no Hospital Real desta cidade para

instrução dos que se destinam ao exercício desta Arte , tem

cometido ao sobretido Cirurgião Mor a escolha dos

Professores , que não só ensinem a Cirurgia propriamente

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15dita , mas a anatomia como base essencial dela e a Arte

Obstétrica tão útil como necessária o que participo a V.Exª

por ordem do mesmo senhor para que assim o tenha

entendido ,e contribua para tudo o que for promover este

importante Estabelecimento. Deus guarde a V.Exª.

Bahia , 18 de fevereiro de 1808

IImo e exmo Sr Conde da Ponte

D.Fernando José de Portugal”

Foram então selecionados dois cirurgiões-mor para exerceram a função

de professor no Hospital Real Militar, instalado nas antigas dependências dos

padres jesuítas , no Terreiro de Jesus : José Soares de Castro, português ,

nascido em 1772 e graduado no Colégio de S. José de Lisboa, a quem foi

concedido o ensino de Anatomia e a Manuel José Estrella, natural do Rio de

Janeiro foi confiada a cadeira de Cirurgia.

Com a mudança da Corte para o Rio de Janeiro , outro estabelecimento

da mesma natureza , a Escola Anatômica e Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro

é criada a 05 de novembro de 1808. Porém, há alguma controvérsia quanto a

data de criação , alguns estudiosos admitem que a verdadeira data da fundação

da Escola Cirúrgica do Rio de Janeiro se deu a 02 de abril de1808, quando da

nomeação do cirurgião Joaquim da Rocha Mazarém, por decreto na mesma data

que estabelecia uma cadeira de Anatomia no Hospital Militar da Corte , sendo no

mesmo instrumento o dito cirurgião indicado para lente da referida cadeira. Em

05 de novembro de 1808 ao se ausentar do Rio, por força de ser cirurgião da

Armada , Mazarém foi substituído, por meio de Carta Régia da mesma data pelo

cirurgião -mor do Reino de Angola , Joaquim José Marques , devendo todavia , é

dito na Carta que Joaquim da Rocha Mazarém terá de prosseguir nas lições de

Anatomia no Hospital Militar da Corte enquanto não chega aquele Lente

proprietário, mas passará a ensinar Medicina Operatória e o Curso de Partos ,

ser encarregado de uma das enfermaria do Hospital Militar da Corte . Destarte, a

fundação da Escola Anatômica Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro foi realmente

criada na data de 02 de abril de 1808. A nomeação do cirurgião Joaquim da

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16Rocha Mazarém para a cadeira de anatomia, em 02 de abril de 1808, é

considerada por Lycurgo de Castro Santos Filho (1991, p.45) como o marco da

criação da Escola Anatômica. O currículo desta escola era mais amplo do que a

da Bahia , precisando de sede maior, por isso a escola foi mudada do Real

Hospital Militar de Ultramar para a Santa Casa ( BRIQUET,1971). A finalidade

dessas escolas visava, principalmente a um conhecimento mais formal da

anatomia , fisiologia e medicina para os cirurgiões .

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CAPÍTULO III

CRIADA A ESCOLA MÉDICA: REGIME BOM SERÁ

Para o ingresso nas duas escolas, a exigência era que se soubesse ler e

escrever , com a recomendação de que:

Bom será que entendam as línguas inglesa, francesa etc.., daí haver

passado a história com o nome de “Regime Bom Será” (SALLES, 1971)

O curso tinha duração de quatro anos , a matrícula custava 6$400, os

praticantes , como eram chamados os alunos, deviam ter conhecimento da língua

francesa , os que tivessem 60 faltas por doença , perdiam o ano. Também

perdiam o ano , por ” vadiação” , se houvesse o registro de 20 ausências . Ao

término ao aluno recebia uma certidão que o habilitava a realizar exame final

perante a Fisicatura–mor. Aprovados, prestavam juramento aos santos

evangélicos, de dignamente exercerem a nobilíssima profissão, podiam curar

onde não houvesse médicos. ( BRITO,2003)

O Cirurgião–mor , Picanço , estruturou normas para orientar o lente de

cirurgia Manoel Estrella onde fica clara a distância entre a teoria e a prática no

incipiente ensino:

“ As práticas ou demonstrações sobre cada um dos objetos

cirúrgicos que se tiverem tratado se farão em uma das

enfermarias que lhe será franqueada duas vezes por

semana, sem contudo fazer reflexões à cabeceira do

doentes, mas sim na sua respectiva aula, pois que o curativo

pertence ao Cirurgião-mor do Hospital, que só para isso tem

essa atividade” .

A Escola de Cirurgia tinha finalidade de formar cirurgiões, com intuito de

extinguir aqueles cirurgiões habilitados por cirurgiões-mor oficiais da Junta do

Promedicato¹, a escola não formava médicos e sim cirurgiões, somente poderia

_________________________________________________________________

¹ Instituição portuguesa de regulamentação das diversas práticas médicas coloniais, substituída

pela Ficatura-mor , em 1808.

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18ter título de médico os que estudavam em Portugal e outras faculdades na

Europa. O alvará de 07 de janeiro de 1809concedeu ao cirurgião-mor Picanço,

autoridade para conferir diploma de médico ou cirurgião no Brasil a quem

prestasse exame perante a Junta por ele nomeada.

A Escola de cirurgia da Bahia durou oito anos e funcionou no prédio do

antigo Hospital Real Militar, situado no Terreiro de Jesus. Em 29 de dezembro de

1815, por Carta Régia de D. João, dirigida a D. Marcos de Noronha e Brito, Conde

de Arcos, governador e capitão-general da Capitania da Bahia, é transformada

em Colégio Médico-Cirúrgico, de acordo com o seguinte texto:

“ Hei por bem criar um curso completo de cirurgia nessa

cidade , segundo plano que mandei por Manuel Luis de

Carvalho, diretor dos estudos de medicina e cirurgia desta

Corte e Reino do Brasil”

Os cirurgiões² cumpriram o papel de médicos durante os longos anos

coloniais e mantiveram uma larga tradição ainda ao longo do século XIX no Brasil.

Em geral, após a graduação os recém-formados no Brasil recorriam às

faculdades européias para complementação de estudos. Até o fim do século XVIII

esses estudos eram realizados em Coimbra . No inicio do século XIX, as escolas

mais procuradas passaram a ser as de Montpellier, Edimburgo e Paris , ganhando

esta ultima mais prestígio no decorrer do século até tornar-se referência mais

importante para vários países (KURY, p.108)

Pela lei de 9 de setembro de 1826, modificou-se a expedição da cartas de

cirurgião ( 5 anos de curso) e de “cirurgião formado” ( 6 anos de curso ), que

passariam a ser emitidas pelos diretores e assinadas pelos lentes das

academias da Bahia ou do Rio de Janeiro e subscritas pelo Secretário de Estado

dos Negócios do Império. A primeira carta habilitava o cirurgião a curar apenas

no ramo da cirurgia em todas as partes do Império mediante à sua apresentação

a autoridade local, já a segunda , também mediante a sua apresentação

________________________________________________________________

² Cirurgiões, durante o Império, se distanciavam dos barbeiros e se aproximavam dos médicos, com o intuito de ascenderem socialmente (FIGUEIREDO, 2000)

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19permitia curar nos ramos da cirurgia e medicina em todas as partes do Império.

A reduzida corporação medica até o fim do século XIX se concentrava na

Corte do Rio de Janeiro e em salvador, com expressão secundária na capitais de

algumas províncias como Recife, Porto Alegre, Ouro Preto e São Paulo. Havia

uma completa carência de médicos nas vastas regiões rurais, por onde se

dispersava o grosso da população brasileira. O número de médicos no Brasil só

aumentaria no século XX, com a criação de novas escolas médicas. Em 1900,

havia no país apenas três faculdades de medicina: a do Rio de Janeiro , a de

Salvador e a de Porto Alegre, esta última fundada em 1898.

A vinda da família real ao Brasil resultou então, na organização de uma

estrutura sanitária mínima que tinha como finalidade principal, dar suporte ao

poder que se instalava no Rio de Janeiro. Porém, até 1850 as atividades de

saúde estavam limitadas ao controle de navios e portos sendo que as atribuições

sanitárias eram de responsabilidade das juntas municipais. O interesse primordial

estava limitado ao estabelecimento de um controle sanitário mínimo da capital do

Império, tendência que se alongou por quase um século. Portanto, a falta de um

modelo sanitário para o país , deixou as cidades brasileiras a mercê de

epidemias, a inexistência de uma assistência medica melhor estruturada fez com

proliferassem pelo país boticários, práticos e curandeiros .

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CAPÍTULO IV

A MEDICINA É DOS MÉDICOS

1.1- Medicina acadêmica versus medicina popular

Há exemplos de tolerância pelas autoridades com atividades de alguns

curandeiros na década de 1810, o preto forro Adão obteve autorização dos

médicos para praticar , não sem criticas mordazes a essa tolerância por outros

grupos.

A reformulação do ensino médico sofria revezes por conta das

transformações decorrentes das mudanças política do país, mesmo com a

participação da elite médica brasileira participante , que via necessidade de

mudanças. Na realidade , tal participação vinculava-se a um projeto mais

abrangente , destinado a organizar e disciplinar o conjunto da vida nacional ,

subordinando-a ao movimento de centralização político–administrativo ditado

pela Coroa, por meio do controle dos quadros dessa elite, assim como do ensino

e das instituições médicas( EDLER, FERRREIRA E SANTOS , 1992 ).

A evidência da dificuldade de reformulação do ensino pode ser

reconhecida pelo tempo entre a aprovação da lei que criava as Faculdades de

Medicina do Rio e da Bahia, em 1832 e a reforma de seus estatutos , que

ocorreria em 1854, apesar das pressões da categoria nesse sentido.

O anseio por reformas no ensino e no controle da qualidade da medicina

praticada no Brasil deu corpo a criação de uma entidade que tinha como propósito

qualidade e normatização de condutas e ensino, então , em 1829 é criada a

Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, nos moldes da Academia Francesa

que fora criada em 1824. Dois médicos, brasileiros , José Martins da Cruz Jobim

e Joaquim Candido soares de Meirelles , ficaram responsáveis juntamente com os

médicos franceses Xavier Sigaud e Jean Maurice Faivre e o italiano Luiz Vicente

De-Simon, pela versão brasileira dessa instituição . como objetivo, além da

normatização do ensino, havia também o controle da higiene publica através de

pareceres e assessoria ao governo na questões de saúde pública .

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21Com a criação da Sociedade de Medicina do rio de Janeiro, foi-se

processando uma mudança paulatina na relação entre a medicina popular e a

medicina acadêmica. O estatuto de criação previa a realização de sessões a

cada 15 dias com discussão científica coordenada pelo presidente da entidade.

Entre tais discussões , incluíam-se o debate em torno das Memórias, trabalhos

apresentados por candidatos a titular da academia, pareceres a cerca desses

trabalhos, casos clínicos, experimentos clínicos, discussões sobre temas de

saúde e traduções de textos estrangeiros , em geral franceses. Estava prevista

também a formação de quatro comissões permanentes, a serem renovadas

anualmente, dentre elas uma de vacina . a regulamentação estabelecia , ainda, a

publicação de trabalhos e a premiação da melhor Memória e dos melhores

manuscritos apresentados , o que só ocorreu em 1834, quando foi enviado, por

um médico espanhol, o primeiro trabalho a disputar a premiação(

NASCIMENTO,1929, pp 56,77).

As instituições academias imperiais recém criadas : Sociedade de

Medicina do Rio de Janeiro, Academia Imperial de Medicina e Faculdade de

Medicina do Rio de Janeiro e da Bahia, representantes da elite médica do Brasil,

associaram-se a uma cultura médica emergente ( a anatomo-clínica e a

fisiopatologia experimental) que entra em conflito coma medicina colonial, tutelada

por elementos celestes , pelo vitalismo e pela ciências derivadas da alquimia. A

partir do momento em que, tanto médicos isoladamente , quanto estas instituições

medicas responsáveis pelos debates e pela divulgação da nova ciência , se

persuadiram também da sua responsabilidade sobre o controle do exercício da

medicina, buscaram apoio da autoridades imperiais , representados pelos

Delegados e Presidentes das províncias , para banir , de forma agressiva da

paisagem médica o charlatanismo e todas a ações que fossem de encontro às

suas convicções acadêmicas(SAMPAIO,2001).

As autoridades imperiais, ao contrário da Fisicatura -mor¹, não estariam

mais interessadas em enquadrar minimamente práticas populares na concepção

_________________________________________________________________

¹ Fisicatura- mor teria reconhecido um saber legitimo nos terapeutas populares, pois que era bastante maleável ( PIMENTA, 1998) no trato com os “ curiosos “, teria função reguladora

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22 da medicina acadêmica , mas simplesmente em desautorizá-las ( PIMENTA,

1998) Em de 03 de outubro de 1832, é sancionada a lei que transforma as

Academias Medico- cirúrgico das cidades do rio de janeiro e de Salvador em

Escolas ou Faculdades de Medicina. A lei além de aumentar o curso médico para

seis anos, amplia o quadro de disciplinas de cinco para quatorze, dá direitos para

os professores, autonomia relativa do ponto de vista administrativo. A duração do

curso de Farmácia é fixado em três anos , e a arte obstétrica é ensinada pelo

titular da décima cadeira ( partos, moléstias d mulheres pejadas e paridas e de

meninos recém nascidos) com duração de dois anos, a partir dessa reforma são

concedidos diploma de “ Doutor em Medicina, de Pharmaceutico e de Parteiro” ,

ficando sem efeito o título de sangrador.

Os lentes tiveram as honras e vencimentos de desembargadores e o

direito de aposentadoria aos vinte e cinco anos de magistério. Os lentes

proprietários percebiam um conto e duzentos anuais e os substitutos, oitocentos

mi réis, valores equivalentes ao dobro do que lhes cabia quando lentes do

Colégio Médico-Cirúrgico.

Outra mudança que ocorreu com a Lei de 1832, foi a obrigatoriedade dos

exames preparatórios. Para os candidatos à medicina , exigiam-se o francês ,

inglês,latim, filosofia , aritmética e geometria. Para farmácia, não era exigido latim

e filosofia. Em 1848, um decreto garantia aos cirurgiões( aprovados e formados

nas academias) o direito de exercer medicina.

As autoridades imperiais também continuariam permitindo a atividades de

diversos curandeiros, numa época em que as instituições médicas acadêmicas

mostravam-se mais intransigentes com esse tipo de licenças, como aconteceu

com o escravo Manoel, que em plena década de 1850, recebera autorização para

tratar doentes de cólera (PIMENTA, 1995)

Em 1879, diante das dificuldades de manutenção do curso, Leôncio de

Carvalho, no Rio de Janeiro, faz uma reforma onde introduz a freqüência livre , a

matricula de mulheres no curso médico e o funcionamento do curso em locais

estranhos à faculdade.

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23A insistência dos médicos no monopólio da medicina foi uma estratégia

genuína de afirmação de sua profissão , bem como de suas convicções

cientificas, certamente eles produziram uma ciência (WARNER,1992) e

puseram-na em sintonia com o ethos civilizador que regeu as instituições

acadêmicas imperiais.

A medicina cientifica da época partiu de disciplina universais, como a

antomo-patologia e a clínica, e levou em consideração fatores locais

atmosféricos,climáticos , topográficos que associados à higiene, deram aos

médicos os conhecimentos de etiologia, patogenia, diagnostico, tratamento e

profilaxia das principais doenças do Brasil ².

A partir da década de 1950, o número de escolas de medicina aumenta

por conta de instituições privadas. Em 1956, o Brasil possuía 24 escolas medicas,

das quais 13 criadas entre 1808 e 1848 e 11 entre 1948 e 1956.

A Associação Médica Brasileira em 1956 preocupada com a expansão e

qualidade do ensino oferecido nestas escolas, cria a Comissão de Ensino

Médico, com finalidade de elaborar um projeto de lei que adequasse a nova

realidade do ensino de medicina no Brasil, porém, todos esforços foram perdidos

por conta da morosidade das comissões técnicas do Congresso Nacional, tendo

o projeto de lei nº 22046, perdido o prazo de tramitação( VERAS, citado por

AMARAL, 2000).

_________________________________________________________________

² Analise apresentada por Sigaud, JFX, Du Climat et dês maladies du Brésil, Paris: Chez Fortin, Masson et Cie, Libraires. 1843. apud EDLER 2001

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241.2 - A mulher e a medicina

A Sociedade de Medicina do Rio de Janeiro, em 1829, já admitia em

seus quadros, médicos, cirurgiões, naturalistas e boticários (FERREIRA, 1996),

no entanto , a parteiras ficaram ao largo por muito tempo, não havia interesse por

parte delas na licença, pois, práticas , crenças e valores que com sua clientela

compartilhavam, já as dava prestigio suficiente. A licença apenas as autorizava a

prática do parto desde que não fosse complicado, do contrário um médico

deveria ser chamado.

O recém formado cirurgião João Mauricio Nunes Garcia , em 1830, num

manuscrito autobiográfico, em que se dizia encorajado pelos casos obstétricos

mais graves, mostra bem tal oposição entre os médicos e parteiras:

”muni-me do meu diploma de Cirurgião Formado, apresentei-

me como Parteiro, pela predileção que me nascera o estudo

da Obstetrícia , oferecendo-me a partejar mesmo de graça e

a qualquer hora, a despeito da guerra que me faziam as

comadres ou parteiras que aqui havia nesse tempo...(

GARCIA, 1860)

A dificuldade do acesso a médicos pela clientela feminina pode ser

explicada pela sociedade patriarcal, onde a exposição do corpo feminino, a um

homem , mesmo sendo médico , era inadmissível . doenças de filhas e esposas ,

foram ignoradas por muito tempo e no momento em que necessitavam de

alguma atenção eram as comadres¹ que as atendiam. Os médicos estavam

cientes dessa predileção e lamentavam , pois , só eram procurados em

circunstâncias limites , onde as doenças já não tinham cura, o que os fazia

parecer incompetentes, dificultando a popularização do atendimento médico.

Por outro lado, o campo de doenças de mulheres , teria sido , ao longo

do século XIX, pouco valorizado nos próprios cursos de medicina, de acordo com

alguns médicos baianos que lamentavam seu treinamento com “úteros e fetos

artificiais “ ou com úteros de papelão ( BARRETO, 2000)

¹ Nome pelo qual as parteiras eram conhecidas, devido a freqüência com que eram convidadas

para madrinhas dos bebes que traziam ao mundo( BARRETO, 1997, Hucitec)

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25Em 1832 tem início o ensino oficial de Obstetrícia para as mulheres, nas

duas primeiras faculdades médicas. Na do Rio de Janeiro, diplomou-se em 1834

a mais célebre das parteiras , francesa de nascimento, Marie Josefina Matilde

Durocher² , que era conhecida como Madame Durocher . Foi a primeira mulher

a ser recebida como membro titular na Academia Imperial de Medicina em 1871.

Madame Durocher vestia-se como homem porque explicava, exercia uma

profissão masculina ( SOUZA,1967).

As mulheres eram proibidas de freqüentar as Faculdades de Medicina

no Brasil até 1879 e buscavam formação em outros países , como foi o caso de

Maria Augusta Generoso Estrella , nascida em 10 de abril de 1860, no Rio de

Janeiro, filha de Maria Luiza e Albino Augusto Generoso Estrella, portugueses,.

sua trajetória e determinação foi exemplo e contribuiu para a abertura das

faculdades de medicina às jovens do nosso pais. Em 1875 aos 15 anos vai aos

Estados Unidos onde presta exames e lá gradua-se em 1879 com brilhantismo,

sua luta para conclusão do curso foi fundamental para o reconhecimento de que

mulheres estavam aptas ao ensino superior no Brasil.

O esforço da jovem , que passou por problemas familiares e financeiros ,

mas que teve em D. Pedro II, um aliado, levou-o a meditar sobre a condição

feminina no país, e ele , superando o preconceito, colocou a carreira médica

antes exclusivamente masculina , ao alcance da mulher, assim apoiou a reforma

de Leôncio de Carvalho , pelo decreto n º 7247, de 19 de abril de 1879. Composto

de vinte e nove artigos , esse decreto finalmente abria as portas das faculdades

as mulheres brasileiras, quando regulamenta a liberdade de acesso aos ensinos

primário,secundário e superior em todo Império:

È completamente livre o ensino primário,secundário no

município da Corte e o superior em todo Império, salvo a

inspeção necessária para garantir as condições de

moralidade e higiene. (ATOS DO PODER EXECUTIVO,

Artigo 1, p.196)

_________________________________________________________________

² Escreveu diversos relatos clínicos sobre Obstetrícia ,curso de parteira com duração de 2 anos.

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26Ao retornar ao Brasil em 1882, Maria Augusta Estrella, solicita uma

audiência ao Imperador, que é marcada para o dia 01 de novembro. Apesar da

turbulência do período por conta do movimento abolicionista, o encontro entre o

mecenas³ e a protegida é tranqüilo. Conversam por longo tempo sobre o futuro da

medicina no Brasil, a importância papel da mulher e o serviço que ela prestaria

ao país. D. Pedro II aconselha-a a dedicar-se ao atendimento de senhoras, ao

que prontamente ela se compromete.

Ao abrirem-se as portas das faculdades , várias províncias apresentam

candidatas ao curso médico, do Rio Grande do Sul vem Rita Lobato Velho

Lopes, que inicia seu curso no Rio de Janeiro, mas por problemas políticos

relacionados ao irmão, também estudante de medicina , transfere-se com a

família para a Bahia, tendo lá concluído o curso em novembro de 1887,

defendendo a tese : Paralelo entre os métodos preconizados na operação

cesareana, considerada ousada para a época, surpreendeu mestres e colegas,

foi a primeira defesa realizada por uma mulher na faculdade. Rita Lobato passa

então a ser a primeira médica formada no Brasil.

_________________________________________________________________

³Com a ruína do pai de Maria Augusta, D. Pedro II passa a custear seus estudos fornecendo por decreto de 1877, os subsídios para continuidade dos estudos. Determinou a quantia de 100$000 réis por mês para pagar a faculdade e 300$000 por ano para gastos gerais.

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27

CAPÍTULO V

AS REFORMAS DO ENSINO

A primeira reforma elaborada , que consistia na introdução da disciplina

de Obstetrícia , já estava em vigor no Rio de Janeiro desde 1 de abril de 1813, no

entanto até 1815 o ensino na Bahia continuava como antes, lecionava-se apenas

Cirurgia e Anatomia, apesar da resolução de D. João VI, que ordenava o ensino

da arte Obstétrica, Picanço , não fez qualquer referencia a Obstetrícia até esta

data. O plano de estudos da reforma feito por D. Manoel Luiz Álvares de Carvalho

é implantado na Bahia somente em 17 de março de 1816. Nesse ano , a escola é

transferida para a Santa Casa . No novo currículo constava que , para o quarto

ano, o Prof. Manuel da Silveira Rodrigues lecionaria a disciplina Instruções

cirúrgicas e Obstetrícia, para o quinto ano , José Avelino Barbosa ensinaria

Medicina Prática e Obstetrícia .

O curso de Obstetrícia , inicialmente teve um caráter especulativo e

abstrato, por conta da precariedade das instalações , pois não havia uma

enfermaria ou serviço clínico para mulheres grávidas e parturientes em que se

pudesse fazer o ensino prático da Obstetrícia.

A reforma realizada por Álvares Carvalho, altera o tempo de duração do

curso , que passa de quatro anos para cinco anos e no currículo passam a

constar as seguintes matérias: Anatomia, Fisiologia, Higiene, Terapêutica,

Obstetrícia, etiologia, Patologia, Cirurgia, e ensino de Química farmacêutica,

lecionada pelo boticário nos meses de outubro e novembro. O estudante

aprovado em todas matérias do curso obteria a carta de Cirurgião, seria formado

em Cirurgia, sendo desde logo membro do Collégio e Opositor , podendo curar

todas as enfermidades , onde não houvesse médico e tendo prioridade em todos

partidos públicos.

Após a primeira reforma seguiram-se outras, mudanças na percepção de

doença e doente avançaram e foram necessárias novas adaptações.

A formação de profissionais de medicina no Brasil funcionou

precariamente nos primeiros anos do século XIX, pois em meio a agitação

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28política de várias ordens , que determinaram a Proclamação da Independência,

depois da abdicação do primeiro Imperador e a falta paz interna , acabaram

relegando a segundo plano quaisquer medidas de aprimoramento do ensino.

Nesses anos estabeleceu-se acentuada ma´ vontade entre médicos portugueses

e brasileiros: aqueles queriam que apenas valessem os diplomas expedidos em

Coimbra. Porém, em 9 de setembro de 1826, foi outorgado explicitamente às

escola s nacionais , o direito de conferir cartas de cirurgião ou de cirurgião

formado aos alunos por elas diplomados(SALLES, 1971)

Em 3 de outubro de 1832 ,é sancionada a lei que transforma as

academias Médico-Cirúrgicas das cidades do Rio de Janeiro e de Salvador em

Escolas ou Faculdades de Medicina , o curso de medicina passa para seis anos

e é composto por quatorze matérias, a idade mínima para entrada é 16 anos. As

faculdades passam a conceder os títulos de doutor em medicina , de

farmacêutico e parteira, sem os quais não se podia exercer nenhum desses

ofícios. Neste mesmo ano, 1832, inicia oficialmente o ensino de Obstetrícia

(parteira) para mulheres na duas faculdades.

A reforma Couto Ferraz , foi instituída pelo decreto nº 1387 de 20 de abril

de 1854, aprovada pelo Ministro do Império Barão de Bom retiro ( Luiz Pedreira

do Couto Ferraz , seguia o modelo francês e foi considerada conservadora por

recrudescer o código de penas disciplinares e os processos de exames, alem de

reduzir a autonomia concedida pela reforma anterior. O número de cadeiras

aumentou para dezoito, sendo criadas as de Química orgânica, Anatomia geral,

Terapêutica e matéria medica e associação do ensino da Anatomia topográfica à

cadeira de Medicina operatória e aparelhos. As cadeiras de Medicina legal e

farmácia foram incorporadas à seção de Ciências acessórias. Os cursos de

Farmácia e Obstetrícia continuaram funcionando anexos aos de Medicina ,

sofrendo alguma modificações.

O modelo anatômico que por volta de 1830 se irradiou de Paris para o

resto do mundo, orientou o conjunto de instituições médicas brasileiras até a

década de 1880 . Com seus preceitos epistemológicos oriundos do sensualismo

dos idéologues e sua prática clínica amparada em instrumentos e técnicas de

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29inspeção, que incluíam o exame físico de palpação , a auscultação , o

estetoscópio , as estatísticas médicas, o ensino sistemático à cabeceira do doente

, a anatomia patológica e o exame anatômico após a morte , ergueu-se todo um

sistema de autoridade profissional amparado por algumas instituições : a

Academia Imperial de Medicina, duas faculdades de medicina e a Junta Central

de Higiene pública.

Nas décadas de 1870 e 1880, os médicos membros da Academia

Imperial de Medicina no Brasil, tomaram a atitude de reformar o ensino e o

exercício da medicina no Brasil, baseados nas informações contidas nos poucos

periódicos vindos dos centros europeus e da América do Norte , onde a medicina

experimental representava um novo saber médico. Difundiu-se a crença de que a

competência atribuída à medicina nos paises que nos serviam de modelo devia-

se fundamentalmente às reforma promovidas nas instituições voltadas à pesquisa

e ensino médicos , logo a idéia do modelo centralizador francês, que servira de

base até então na organização das instituições médicas do Império estava

obsoleto. Então com intuito de conhecer os avanços na formação médica , o

Visconde de Sabóia é enviado à França, Itália, Áustria, Bélgica e Inglaterra para

visitar as escolas médicas. No seu retorno foi elaborado um relatório sobre a

faculdades de medicina visitadas, que resultaria na Reforma Sabóia em 1882, de

inspiração germânica .

Em 1879 ,o decreto de nº 7247 de 19 de abril, estabeleceu a reforma do

ensino primário, secundário e superior do Império, sendo referendado pelo

Ministro do Império Carlos Leôncio de Carvalho. Em relação ao ensino médico , a

reforma Leôncio de Carvalho, como ficou conhecida, foi projetada com base nos

pareceres das faculdades e relatórios de professores comissionados para

avaliarem o ensino nos paises considerados mais adiantados. Inspirada nas

universidades alemães , estabelecia a liberdade de freqüência nas faculdades , a

permissão de repetir os exames das matérias em que não tivesse conseguido

habilitação , em época apropriada( art 20); a permissão a associações

particulares para fundação de cursos nos quais as matérias ensinadas fossem

parte integrante do programa de qualquer curso oficial de nível superior (art 21);

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30a concessão de salas do prédio da faculdade para funcionamento de cursos

livres de matérias ensinadas nos seus cursos regulares (art 22). A reforma previa

também que a cada uma faculdade de medicina ficariam anexos uma escola de

farmácia, um curso de obstetrícia e ginecologia e outro de cirurgia dentária; o

aumento dos preparatórios exigidos para a matrícula nesses cursos; o direito das

mulheres de se inscreverem nos cursos, para as quais eram reservados lugares

separados nas aulas(art 23).

Com relação ao curso médico previa o acréscimo de mais duas cadeiras

especiais ( a obstétrica, psiquiátrica, a oftalmológica e a de moléstias sifilíticas e

da pele) , além da criação de três institutos para o ensino prático.

O curso obstétrico constava das seguintes matérias : anatomia,

obstetrícia ,farmacologia, clinica obstétrica e ginecológica. Os títulos conferidos ao

final dos cursos eram os de bacharel em medicina, bacharel em farmácia e em

ciências físicas e naturais, cirurgião dentista e o de parteiro ou de mestre em

obstetrícia (art 24).

As palavras de ordem eram ensino prático e ensino livre. Este movimento

teve como resultado a introdução do ensino de Medicina experimental na

Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, e a criação da Policlínica do Rio de

Janeiro (1882). Os laboratórios então implantados ( fisiologia, patologia

experimental, histologia, parasitologia), a bancada, o microscópio o cadinho

davam materialidade, juntamente com a inauguração das novas enfermarias de

subespecialidades clínicas , ao novo ideal de ensino prático e livre, bandeira dos

reformadores. ( EDLER,1992; SODRÉ; 1929,MAGALHÂES, 1932)

Após o retorno de avaliação os avanços na formação européia, Vicente

Candido de Figueiredo Sabóia ( Visconde de Sabóia ) assume a direção da

Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro ( de 1882 a 1889) e através de recursos

particulares , reforma e amplia as instalações da faculdade , reforma o currículo

que passa a contar com vinte e seis cadeiras. A Obstetrícia continuava com

problemas, pois a sua instalação na Santa Casa era impedida pelas irmãs de

caridade que consideravam o parto uma falta de pudor, a situação foi resolvida

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31com a intervenção do Provedor Ferreira dos Santos. È então, na administração do

Visconde de Sabóia que tem início o verdadeiro ensino prático, período esse

denominado o “ Período Áureo” .

Com a inauguração de fábricas no eixo Rio-São Paulo, fim do trafico de

escravos e surgimento da ferrovia , uma nova ordem econômica provoca

crescimento populacional e o aumento na demanda de assistência à população,

determinando a mudança de perfil do medico formado no fim do século XIX..

Os novos estatutos das faculdades de medicina elaborados com a

participação de professores ( decreto 9311, de 25 outubro de 1884) e criação das

cadeiras de Medicina legal ( decreto 9360, de 17 de janeiro de 1885) completaram

o cenário de mudanças no ensino médico, permanecendo assim a prioridade da

legislação sobre a estrutura interna das instituições. A expansão do ensino, o

acesso e a distribuição geográfica de nova escolas médicas não estavam postas.

Iniciou-se nesta oportunidade a preocupação com a forma e o conteúdo dos

conhecimentos dos médicos que estavam se formando. Havia necessidade de

doutores com ais habilidades ou com adestramento prático ( FONSECA, 200,p.8)

Entretanto, o fato de terem sido postas logo em execução aquelas

medidas que estabeleciam a liberdade de freqüência e a extinção das sabatinas

e lições no ensino superior,sem antes promover a melhoria do ensino secundário,

levou os contemporâneos dessa reforma a considerá-la como implementadora

de um “ regime de vadiação e madraçaria” (CAMPOS,1944).

Com a Proclamação da República , Sabóia é demitido . No período de

1889 a 1901, ocorrem novas reformas , porém , não há evolução no ensino

médico, sendo esse período considerado como de estagnação.

A primeira reforma de ensino do regime republicano, foi instituída pelo

decreto nº 1.270 de 10 de janeiro de 1891( reforma Benjamin Constant ),

aprovado pelo Governo Provisório do Marechal Deodoro da Fonseca e

referendado pelo Ministro da Instrução Pública, Correios e Telégrafos ,Benjamin

Constant Botelho de Magalhães, reorganiza as instituições de ensino médico,

denominando-as agora de Faculdade de Medicina e Farmácia da Bahia e

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32Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro . Dá autonomia didática

para reconhecimento de habilidades e institui a presença obrigatória. O curso é

ampliado para 29 matérias.

No ano seguinte, a reforma Benjamin Constant, é modificada pelo

decreto nº 1.159 de 03/12/1892 e pelo decreto nº 1.482 de 24/07/1893, aprovados

pelo Presidente da República Floriano Peixoto e referendados pelo Ministro da

Justiça e Negócios Interiores, Fernando Lobo , é instituída "comissões e

investigações em benefício da ciência e do ensino", a Congregação de cada uma

das instituições indicará a cada dois anos um lente catedrático ou substituto para

estudar nos países estrangeiros, os melhores métodos do ensino e as matérias

das respectivas cadeiras, e examinar os estabelecimentos e instituições das

nações mais adiantadas da Europa e da América". O segundo decreto, institui

novo regulamento para as escolas médicas e altera seus currículos.

No governo Campos Salles, nova reforma é implantada pelo decreto n°

3.890 de 01/01/1901 e referendada pelo Ministro da Justiça e Negócios

Interiores, Epitácio Pessoa, dá novo código aos institutos oficiais de ensino

superior e secundário, ligados àquela pasta. Seguido do decreto nº 3.902 de

12/01/1901, estabeleceu-se novo regulamento para as faculdades de medicina

que voltaram a ser denominadas Faculdade de Medicina da Bahia e Faculdade de

Medicina do Rio de Janeiro, além de restringir a liberdade de freqüência, suprimi

várias cadeiras.

A avaliação da educação francesa conduzida pelos educadores Alfred

Binet e Theodore Simon, realizada em 1905, e a Avaliação das Escolas Médicas

nos Estados Unidos (1910), conduzida por Flexner, demonstraram a preocupação

com a qualidade e a quantidade de instituições de ensino superior naqueles dois

continentes , no Brasil no mesmo período apesar das reformas o modelo de

ensino ainda estava sobre a influencia germânica.

Em 1911, Rivadávia Corrêa, através dos decretos nº 8.659 e nº 8.611 de

05 de abril, aprova o regulamento das faculdades de medicina. Apelidada de "lei

desorganizadora do ensino", seguia os moldes das universidades alemãs.

Propondo a autonomia didática e administrativa das faculdades, os programas de

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33ensino de outras escolas ou faculdades não tinham mais a obrigatoriedade de

seguir os das faculdades de medicina do Rio de Janeiro e da Bahia,

desoficializando o ensino. A exigência de documentos que comprovassem curso

preparatório anterior deixou de ser feita para o ingresso nas faculdades e a

emissão de diplomas foi facilitada, substituindo-os pelo certificado. Foi criado o

Conselho Superior do Ensino, que substituiria a função fiscal do Estado (art. 5º do

decreto nº 8.659). O Conselho ficaria composto pelos diretores das faculdades de

medicina da Bahia e do Rio de Janeiro, de direito de São Paulo e de Pernambuco,

da Escola Politécnica do Rio de Janeiro, do diretor do Colégio Pedro II e de um

docente de cada um desses estabelecimentos (art. 12). Estabeleceu-se a livre-

docência com regalias, como a de figurar nas mesas de exame, certificar

freqüência e escolher um representante com assento na Congregação. O

princípio da liberdade profissional era o ponto fundamental da nova reforma.

As faculdades de medicina seriam designadas pelo nome da cidade em

que funcionavam, devendo oferecer os cursos de ciências médicas e cirúrgicas,

de farmácia, de odontologia e de obstetrícia (art. 1º do decreto nº 8.661). Quanto

ao currículo do curso de ciências médicas e cirúrgicas, que seria dividido em seis

séries, as cadeiras de patologia médica, patologia cirúrgica, clínica propedêutica e

obstetrícia (teoria) foram suprimidas Em contrapartida, foram introduzidas as

cátedras de física médica, patologia geral, ginecologia (desmembrada de

obstetrícia) e otorrinolaringologia. A clínica de crianças foi desdobrada em clínica

pediátrica médica e higiene infantil, e clínica pediátrica cirúrgica e ortopedia. A

clínica de operações e aparelhos juntou-se à de anatomia médico-cirúrgica. A

cadeira de bacteriologia passou a se chamar microbiologia e a de histologia

tomou o nome de anatomia microscópica Já no curso de obstetrícia foram

introduzidas as matérias de microbiologia, de clínica obstétrica (com exercícios

prévios no manequim) e de higiene infantil e anti-sepsia (art. 64).

Com a criação das categorias de professores ordinários e extraordinários

de acordo com a nomenclatura alemã, foram admitidos novos professores. Em

1912 ,foi criado na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro ,o curso de clínica

de doenças nervosas, funcionando, a partir de 1915, em dependências da Santa

Casa da Misericórdia, sendo ministrado por Antônio Austregésilo Rodrigues Lima.

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34Em 1926 , nova reforma reestrutura o ensino secundário e superior pelo

decreto n° 16.782-A de 13 de janeiro de 1925, assinado pelo Presidente da

República Arthur Bernardes e o Ministro da Justiça e Negócios Interiores João

Luiz Alves. A reforma recebe o nome de Rocha Vaz por conta da participação do

diretor da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Juvenil da Rocha Vaz, em

sua elaboração. Objetivando uma reorganização do ensino secundário e

superior, propunha que o ensino superior deveria abranger os cursos de direito,

de medicina, de engenharia, de farmácia e de odontologia.Os cursos anexos de

farmácia e odontologia passariam à condição de faculdades anexas às

faculdades de medicina.

O artigo 65 regulamenta a divisão do cursos de medicina em 3 níveis: 1º

curso fundamental correspondente aos três primeiros anos; 2º - curso geral de

aplicação abrangendo os dois anos seguintes; 3º - curso especializado de

aplicação compreendendo o sexto ano.

O curso médico totaliza então 36 cadeiras distribuída em 6 anos. Neste

mesmo decreto são criados os cursos de Medicina tropical , de suma importância

para a realidade do país, estabelecido o Instituto Anatômico constituído por cinco

departamentos (anatomia normal, histologia, anatomia patológica, medicina legal

e medicina operatória), também é criado o Curso Especial de Higiene e Saúde

Pública ligado à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, com finalidade de

aperfeiçoamento técnico dos médicos que se destinassem ao desempenho de

funções sanitárias. O curso teria caráter de especialização do ensino médico e

seria ministrado por técnicos do Instituto Oswaldo Cruz e constituído pelas

seguintes disciplinas: epidemiologia e profilaxia gerais, organização dos serviços

de profilaxia especial; biometria e estatística aplicada à higiene; higiene alimentar,

noções de bromatologia; saneamento urbano e rural; higiene pré-natal, higiene

infantil e higiene escolar; higiene industrial e profissional; administração sanitária,

legislação sanitária e comparada.

O fim do curso de parteiras é regulamentado peço art 133, e é instituído

um curso para as enfermeiras das maternidades anexas às faculdades de

medicina.

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35Abraham Flexner, professor da Universidade Johns Hopkins, em 1910, foi

convidado pela Fundação Carnegie dos Estados Unidos e desenvolveu uma

avaliação da educação médica em seu país e no Canadá, no começo do século

XX. O objetivo da avaliação era dar ao ensino médico uma base científica sólida. .

Embora tenha reformulado e modernizado o ensino médico, nele imprimiu

características mecanicistas, biologicistas, individualizantes e de especialização

da medicina, com ênfase na medicina curativa e exclusão das práticas

alternativas. O Relatório Flexner , como ficou conhecido, não só determinou a

diminuição quantitativa no aparelho formador americano, como se tornaria em

diversos países modelo predominante de todos os currículos das faculdades de

medicina e teve importante papel na estruturação curricular do ensino médico no

Brasil a partir dos anos 30.

Ao final da Primeira República funcionavam no Brasil apenas 12 escolas

de medicina , todas elas ligadas ao poder público. Por outro lado, até 1922, data

da criação da primeira universidade brasileira , estas faculdades funcionavam de

forma isolada, com a Revolução de 1930, instalada por Getulio Vargas, profundas

transformações ocorrem no país com repercussão no sistema educacional. A

hegemonia política entre São Paulo e Minas é quebrada , a estrutura do Estado é

modificada com o objetivo da expansão do sistema econômico e nova legislação

organiza mudanças, são criados o “ Ministério do Trabalho”, o da Indústria e

Comercio, “ Ministério da Saúde” e juntas de arbitramento trabalhista.É criado o

Ministério da Educação e estabelecidas normas universais para todo ensino

superior.

Então, no governo de Getulio Vargas através do decreto nº 19.851, de

11abril de 1931 , assinado pelo Ministro da Educação e Saúde Pública Francisco

Campos, é definido que o ensino superior no país deveria seguir o sistema

universitário, é a Reforma Francisco Campos. Na mesma data outro decreto de

nº 19.852, regulamenta a organização da Universidade do Rio de Janeiro que

passa a ser constituída pelas seguintes unidades: Faculdade de Direito,

Faculdade de Medicina, Escola Politécnica, Escola de Minas, Faculdade de

Educação, Ciências e Letras, Faculdade de Farmácia, Faculdade de Odontologia,

Escola de Belas Artes e Instituto Nacional de Música. Regulamenta o ingresso

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36por exames vestibular , a idade mínima de 17 anos , comprovação do curso

ginasial, pagamento de taxas regulamentares e define o papel formador da

faculdade no campo prático e acadêmico através de cursos normais , seriados,

livres e especialização em vários ramos da medicina (art 57)

A faculdade médica deveria fornecer , em seis anos, os conhecimentos

necessários ao exercício profissional e promover a especialização em diversos

ramos da medicina aplicada e nas ciências biológicas correlatas . O art 54,

regulamenta a obrigatoriedade das seguintes disciplinas : anatomia, histologia e

embriologia geral,fisiologia,física biológica, química fisiológica, microbiologia,

parasitologia,patologia geral, farmacologia, anatomia e fisiologia patológicas,

técnica operatória e cirurgia experimental, clínica propedêutica médica , clínica

dermatológica e sifilográfica, clínica de doenças tropicais e infectuosas, clínica

médica, clínica cirúrgica, terapêutica clínica , clínica urológica, clínica obstétrica,

higiene , medicina legal, clínica cirúrgica infantil e ortopédica, clínica pediátrica

médica e higiene infantil, clínica psiquiátrica, clínica oftalmológica,clínica

otorrinológica, clínica ginecológica, clínica oftalmológica e clínica neurológica.

Entre os cursos de especialização propostos estava o Curso de Higiene e

Saúde Pública , cujo diretor seria um professor catedrático de Higiene da

faculdade de Medicina da Universidade do Rio de janeiro, que ministraria as

seguintes disciplinas: estatística sanitária, saneamento urbano e

rural,epidemiologia e profilaxia das doenças contagiosas, epidemiologia e

profilaxia especializadas, higiene alimentar , fisiologia, aplicada à higiene, higiene

industrial e higiene infantil, organização e administração sanitárias.

Após a década de 1930, o intercambio cultural entre os estados Unidos e

o Brasil , mostra-se expressivo em detrimento do predomínio europeu anterior que

na educação médica, manifestava-se através do modelo francês,

fundamentalmente voltado para o ensino teórico( ELIAS, 1987)

Portanto, a introdução de disciplinas, estimulo à pesquisa, ampliação de

técnicas e práticas baseadas no hospital de ensino, culminam com a criação dos

primeiros programas de residência médica: em 1944 no Hospital das Clínicas de

São Paulo e em 1948 no Hospital Servidores do Estado, no Rio de Janeiro.

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CAPÍTULO VI

HOSPITAL DE ENSINO: CRIAÇÃO DA RESIDÊNCIA MÉDICA

...A especialização médica surge então como fruto da

evolução do conhecimento, pois o homem, no curto espaço

de sua vida não teria mais possibilidade para dedicar-se

integralmente a todos ramos da ciência que crescia a cada

dia. A cardiologia nasce nesse século com os trabalhos de

Giuseppe testa na Itália e o clínico francês Jean Nicholas

Corvisart foi o primeiro a auto denominar-se especialista do

coração, tendo sido médico de Napoleão Bonaparte. Nesse

sentido ainda aparece a obstetrícia , a pediatria e a

endocrinologia. Os estudos físicos sobre a luz e a cor fazem

surgir a oftalmologia ( em 1773 em Viena, Maria Tereza

fundou a primeira escola de oftalmologia). Outras

especialidades foram criadas durante todo o século

seguinte. No começo do nosso século após a Primeira

Grande Guerra, observou-se a necessidade da formação

de profissionais dedicados a reconstrução corporal , à

reparação humana e a cirurgia plástica , que vinha sendo

exercida desde os primórdios dos da humanidade, torna-se

uma especialidade . O avanço tecnológico do século XX

multiplica a especialidades surgindo radiologia, a medicina

nuclear, a fisiatria e assim por diante. Assim , a

especialização nasceu da necessidade ,qual um tributo ao

progresso da ciência. O saudosismo do eclético médico de

outrora , que adentrava os lares e cuja simples presença já

era fator de cura, tem seu lugar , entretanto seria impossível

hoje para ele , congregar todo o conhecimento( LYBIO

JUNIOR, 2004-“ História da medicina- Curiosidades&fatos”-

Editora Astúrias)

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38As primeiras residências médicas surgem na década de 1940, fruto da

reforma iniciada em 1930, no governo de Getúlio Vargas, quando houve mudança

no perfil curricular do curso de medicina. Os primeiros programas surgiram no

Hospital das Clínicas de São Paulo, em 1944, e no Hospital dos Servidores do

estado do Rio de Janeiro, em 1948 , influência das transformações curriculares

por que haviam passado as escolas americanas a partir do relatório de Flexner de

1910 e também pelo financiamento externo das Fundações Rockefeller e Kellog.

A criação das primeiras residências médicas no Brasil ocorreram em duas

instituições já tidas como de alto gabarito técnico-científico, e tinha como

finalidade precípua o adestramento profissional dirigida à especialização , com

ênfase no treinamento em serviço hospitalar.

Datam , também , data conjuntura o surgimento das entidades médicas

brasileiras: o Conselho Federal de Medicina, em 1945 e a Associação Médica

Brasileira , em 1951. a partir de 1957, surgiram os conselhos regionais de

medicina (BRIANI, 2003).

O desenvolvimento das especialidades médicas resultado da

capitalização da medicina em meados da década de 1950, que tiveram reflexos

imediatos no ensino de graduação, cujas grades curriculares passaram a adotar

disciplinas com ênfase na especialização, em detrimento da formação clínica

geral, o que passa a ser também ema perda por conta da modificação da relação

médico–paciente.

Este modelo de formação , inspirada no modelo americano¹, começa a

difundir-se no país lentamente principalmente a partir das instituições públicas,

consolidando-se na década de 60, com um aumento significativo a partir da

década de 70, período no qual houve grande incremento no número de escolas

de medicina no país e aumento concomitante dos programas de residência

médica , agora também oferecidos em instituições hospitalares privadas .

¹. Em 1879, no John Hopkins Hospital, os professores Osler e Hausted, iniciam uma programação destinada ao adestramento após a graduação,, conhecida mais tarde como Residência médica.

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39Até a metade da década de 50 os programas existentes

atingiam apenas uma parte muito pequena dos egressos das

escolas médicas. Nos dez anos seguintes foi havendo uma

ampliação gradual do número de programas, geralmente em

instituições oficiais, motivada por interesse do corpo clínico

ou pela procura dos residentes, num processo de

consolidação da Residência Médica como modalidade de

especialização dos profissionais médicos em todas as

regiões do país. (BRASIL, 1989, citado por Feuerwerker,

L.2005 )

O perfil do profissional a ser absorvido pelo mercado começa mudar por

conta de inúmeros fatores: desenvolvimento tecnológico, pressões das indústrias

de medicamentos e de equipamentos sobre a organização do trabalho que refletiu

no mercado de trabalho médico. Concomitantemente , a introdução de

mecanismos de acumulação de capital no setor saúde favoreceu a adoção do

modelo de atenção baseado na utilização intensiva de tecnologia e na

especialização do médico ( COHN, 1980; DONNANGELO, 1975 citado por

FEUERWERKE, L.2005)

O aumento no número de vagas nas escolas sem organização do

mercado de trabalho, resultou numa desigualdade na distribuição desse

profissional. A manutenção de oferta de trabalho concentrado nos locais de maior

riqueza, fez com que aumentasse substancialmente a competição nesses locais

pelas melhores colocações no mercado.

A insuficiência do treinamento prático proporcionado pelas faculdades de

medicina, por conta da fragmentação que a formação de graduação vinha

sofrendo, e a existência de um mercado de trabalho mais competitivo e voltado à

especialização, foram os ingredientes essenciais à multiplicação da procura por

vagas de Residência Médica pelos recém-formados( FEUERWERKE,L 2005)

Com o crescente número de oferta de programas de residência médica e

médicos residentes, e o aumento na demanda quanto ao funcionamento e as

relações desses “ alunos “ e seus serviços, a Associação de Escolas Médicas

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40(ABEM ), ciente das questões que se acumulavam , propôs em 1964 a criação de

uma comissão de verificação dos aspectos de implantação e supervisão de

internatos e da residência médica.

Em 1967 , no II Congresso Nacional de Médicos Residentes é criada a

Associação Nacional de Médicos Residentes (ANMR), neste congresso é

cunhada a definição de residência médica como sendo uma “forma de ensino de

pós-graduação que permite ao médico recém- formado aperfeiçoar-se nos

diferentes ramos da atividade médica, trabalhando numa organização hospitalar

de bom padrão, em regime de tempo integral e devotamento exclusivo, por prazo

suficiente e sob supervisão de colegas mais experimentados” (ALVES,2007,

CREMERJ, p.09). Outras questões se seguiram nos anos seguintes. Na década

de 70 a ANMR, busca a regulamentação da residência Médica, tendo como

resposta do MEC a criação da Comissão Nacional de Residência Médica em 05

de novembro 1977.

A Residência Médica foi instituída pelo Decreto nº 80.281, de

05 de setembro de 1977 e constitui uma modalidade de

ensino de pós-graduação destinada a médicos, sob a forma

de curso de especialização, funcionando em Instituições de

Saúde, sob a orientação de profissionais médicos de elevada

qualificação ética e profissional, sendo considerada o

“padrão ouro” da especialização médica. O mesmo decreto

cria a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM). O

Programa de Residência Médica, cumprido integralmente

dentro de uma determinada especialidade, confere ao

Médico Residente o titulo de especialista(.SESu,

www.portalmec.gov.br)

A Residência Médica tem hoje na formação dos médicos no Brasil papel

fundamental para a capacitação do egresso da faculdade, a constatação é clara

no valor de duplo papel na formação dos médicos no que diz respeito a

complementação do processo de graduação, por conta as deficiências

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41amplamente reconhecidas pela fragmentação do ensino já explanadas

anteriormente e na inserção no mercado de um profissional melhor qualificado ..

A explicação para a procura dos médicos recém-formados pela

Residência podemos entender como alternativa importante à necessidade de

complementação da formação de graduação pela importância histórica da prática

no processo da formação do médico e as conseqüências da especialização nesse

mesmo processo de formação, pois é no processo de combinar os

conhecimentos teóricos adquiridos com a experiência clínica, relação médico-

paciente, que se encontra a “mágica” da prática profissional. Somente a

experiência adquirida na prática pode completar a formação científica do médico:

é a experiência clínica que permite a possibilidade da relação com o doente e

não somente com a doença .

É pela prática que se constrói a experiência clínica e é mediante o

aprendizado em serviço que o futuro profissional constrói também a ética de suas

relações com os pacientes, baseada no exemplo e na experimentação.

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CONCLUSÃO

O ensino médico no Brasil iniciado oficialmente há 199 anos atrás por

conta de um acidente político, fuga da Família Imperial para o Brasil, trouxe a

chance de crescimento para então colônia, que a partir daquele momento

passaria por transformações , entre muitas , com a criação da “escola de

medicina”. Criadas inicialmente de acordo com o modelo francês e influência

germânica , sofreram adaptações curriculares em resposta a um grande número

de situações internas e externas, que podemos constatar através das reformas

de ensino que se sucederam ao longo dos anos e principalmente a partir de 1882

com a Reforma Sabóia, renegando o modelo francês fundamentado no ensino

teórico e que em outros países já havia sido abandonado. Na maior parte das

vezes ,as reformas ocorreram em resposta aos avanços científicos , porém, em

outras por questões políticas, mas , em todos os momentos buscou-se uma

relação mais estreita entre as necessidades na atenção à saúde da população e o

ethos cientifico.

A criação da Residência Médica no Brasil em 1944, resultado de uma

tendência mundial iniciada nos Estados Unidos em 1879 , foi implantada por

conta da grande quantidade e velocidade das novas técnicas e avanços

científicos, impossíveis de serem acompanhadas no período de graduação com

um currículo extenso e pouco espaço para as atividades práticas necessárias

para o enfrentamento das situações reais do dia a dia do médico.

O treinamento em serviço, conhecido como Residência médica, exigia na

sua implantação que o participante residisse na instituição onde desenvolveria o

programa como requisito básico para o desenvolvimento da proposta de

adestramento. O médico residente deveria estar à disposição do Hospital em

tempo integral , praticamente à beira do leito, para acompanhar a evolução dos

doentes internados. Então define-se que a Residência médica, consiste no

treinamento em serviço hospitalar, dirigida à especialização médica nas

diferentes especialidades.

A capitalização da medicina a partir da década de 50, foi também fator

preponderante para o surgimento da Residência médica, por conta da lei de

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43mercado, com o aumento do número de escolas médicas ,acarretando um maior

numero de profissionais, um currículo extenso a ser cumprido e a busca de

capacitação no que se referia ao campo de saber das especializações que

cresceram resultante das novas percepções e tecnologias.

Após esse período outras regulamentações surgiram modificando as

relações entre discente,docente e faculdade assim como na especialização

médica que passa a ser fiscalizada a partir de 1977 pela Comissão Nacional de

Residência Médica, órgão ligado ao SESu/MEC.

Concluímos então, que a educação médica oficial no Brasil evoluiu

através dos tempos , que o curso de medicina é dotado de um número

expressivo de disciplinas que são oferecidas ao longo de 6 anos de graduação ,

porém , apesar das reformas instituídas dando um perfil mais prático ao curso,

ainda são insuficientes por conta dos avanços científicos e é pela prática que se

constrói a experiência clínica , e é mediante o aprendizado em serviço que o

futuro profissional constrói também a ética de suas relações com os pacientes,

baseada no exemplo e na experimentação, portanto a complementação através

do programa de Residência médica, especialização em forma de treinamento em

serviço, é fundamental para a capacitação após a graduação médica.

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ANEXO