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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” INSTITUTO A VEZ DO MESTRE O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO NA IDENTIFICAÇÃO, INTERVENÇÃO E REDUÇÃO DO BULLYING ESCOLAR Por: Viviane Matos Orientador Prof. Dayse Serra Rio de Janeiro 2010

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO … · defendem que o fenômeno bullying é extremamente multifacetado e altamente doloroso para as partes envolvidas, destacando que

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO NA IDENTIFICAÇÃO,

INTERVENÇÃO E REDUÇÃO DO BULLYING ESCOLAR

Por: Viviane Matos

Orientador

Prof. Dayse Serra

Rio de Janeiro

2010

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO NA IDENTIFICAÇÃO,

INTERVENÇÃO E REDUÇÃO DO BULLYING ESCOLAR

Apresentação de monografia ao Instituto A Vez do

Mestre como requisito parcial para obtenção do grau

de especialista em Psicopedagogia.

Por: Viviane Matos

3

AGRADECIMENTOS

....aos amigos e futuros colegas de

profissão, em especial à Roberta que

muitas vezes “puxou minha orelha”, me

impedindo de faltar as aulas...

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DEDICATÓRIA

....Dedico este trabalho ao meu esposo

Marcelo Weiler e a minha amada filha

Marianna, por todo apoio e compreensão

de minha ausência. Amo vocês!!!

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EPÍGRAFE

Se uma criança vive sendo criticada

Aprende a condenar.

Se uma criança vive com hostilidade

Aprende a brigar.

Se uma criança vive envergonhada

Aprende a sentir-se culpada.

Se uma criança vive com tolerância

Aprende a confiar.

Se uma criança vive valorizada

Aprende a valorizar

Se uma criança vive com igualdade

Aprende a ser justa.

Se uma criança vive em segurança

Aprende a ter fé.

Se uma criança vive com compreensão

Aprende a acreditar em si própria.

Se uma criança vive com amizade e carinho

Aprende a encontrar amor no mundo.

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RESUMO

O presente estudo se refere às configurações do fenômeno bullying e

suas implicações psicológicas, nele procuro analisar as manifestações da

agressão escolar configurada no fenômeno bullying, buscando compreender

as nuances psicológicas acarretadas por ele, assim como seu possível

tratamento psicopedagógico. Nesta direção, os pressupostos da pesquisa

defendem que o fenômeno bullying é extremamente multifacetado e altamente

doloroso para as partes envolvidas, destacando que várias são as causas que

o geram, mas as conseqüências muitas vezes, culminam em tragédias sociais

como assassinatos, suicídios e anulação do sujeito em relação a sua auto-

estima. Destaca-se ainda que o tratamento psicopedagógico deve ser

personalizado e analisado em cada caso, pois as características do bullying

desencadeiam problemas diferentes em cada indivíduo, por isso é preciso

muita acuidade no seu trato. Defende-se também neste, que a principal forma

para combater-se o bullying é a conscientização baseada no respeito mútuo,

na ética e na cidadania, ou seja, o respeito entre os indivíduos.

Palavras-chave: Bullying, Psicopedagogia, Instituição escolar

.

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METODOLOGIA

Trata-se de uma pesquisa teórica, de abordagem bibliográfica. Os

dados foram coletados através de livros, artigos e documentos.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 09

CAPÍTULO I - Bullying, a brincadeira que não tem graça 11

CAPÍTULO II - O papel do psicopedagogo, frente a esse mal invisível 19

CAPÍTULO III – Conclusão 24

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO 27 ÍNDICE 29 FOLHA DE AVALIAÇÃO 30

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INTRODUÇÃO

Neste trabalho procuro analisar o papel do psicopedagogo na

intervenção, redução e identificação do Bullying escolar.

Através deste estudo pretendo perseguir o seguinte problema: Em que

medida a atuação do psicopedagogo na escola pode facilitar a identificação,

intervenção e redução do Bullying escolar?

A escolha deste tema como marco de investigação se deve à realidade

na qual presenciamos com constância na prática docente, e que infelizmente

vem crescendo de forma alarmante e assustadora. Todos os dias, alunos no

mundo todo sofrem com um tipo de violência que vem mascarada na forma de

“brincadeira”. E esse comportamento, que até há bem pouco tempo era

considerado inofensivo e que recebe o nome de bullying, pode acarretar sérias

conseqüências ao desenvolvimento psíquico dos alunos, gerando desde queda

na auto-estima até, em casos mais extremos, o suicídio e outras tragédias.

O Fenômeno Bullying vem se disseminando nos últimos anos, tendo como resultado, os nefastos massacres em escolas localizadas nas mais diversas partes do mundo e ultimamente no Brasil. O que antes ocorria de forma esporádica, após a década de 90, transformou-se numa seqüência de trágicos assassinatos e suicídios nas escolas. (FANTE, 2005).

Pesquisei a atuação do psicopedagogo na identificação, redução e

intervenção do Bullying escolar, por considerar de suma importância tanto

pessoal, quanto para os demais atuantes da área, algumas reflexões acerca

deste tema. Temos visto que muitos estudantes sofrem com este tipo de

agressão e para os pais, professores e demais profissionais da escola, nem

sempre esta violência é explícita.

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De acordo com Fante (2005, p.11), as crianças vitimizadas pelo

comportamento bullying sofrem terrivelmente ao longo dos anos, muitas vezes

sob a vista de seus professores no ambiente escolar, nas salas de aula.

Trata-se de uma pesquisa teórica, de abordagem bibliográfica. Os

dados foram coletados através de livros, artigos e documentos.

Esta pesquisa foi fundamentada principalmente em Fante (2005),

FANTE e Pedra (2008), Middelton-Moz (2007), Calhau (2009), Beauclair

(2004). Para discutir bullying me fundamentarei em Fante (2005), FANTE e

Pedra (2008), Middelton-Moz (2007) e Calhau (2009). Para conceituar a

psicopedagogia, me basearei em Beauclair (2004).

Este trabalho está organizado em 3 capítulos, sendo que no primeiro

conceituarei o de acordo com Fante (2005) “Fenômeno” bullying e suas

diferentes formas de atuação. No segundo capítulo farei um breve histórico

sobre a psicopedagogia e suas abordagens, e o terceiro capítulo será a

conclusão desta pesquisa monográfica.

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CAPÍTULO I

BULLYING, A BRINCADEIRA QUE NÃO TEM GRAÇA

Tem gente que lhe arranca o coração e tem gente que o coloca de volta em seu lugar.

Elizabeth David

Começarei meu trabalho com uma pequena história, que marcou muito

o início de minha pesquisa.

Houve um tempo em que nosso planeta era habitado somente por animais. Era um tempo de grande harmonia entre as espécies. Querendo registrar em livros essa época da história, a bicharada resolveu criar a escola. Todos se empenharam em descobrir como participar da sua construção. Resolveram, então, dividir as tarefas, para que todos colaborassem. Os elefantes, os camelos e os pássaros ficaram responsáveis pelo fornecimento de água. Os leões, os rinocerontes, os búfalos e as zebras foram encarregados de fornecer toda a madeira necessária. Já os porcos, os hipopótamos e os jacarés cuidaram da confecção dos tijolos. Os castores, os veados e as hienas, com o apoio dos joões-de-barro, se comprometeram em levantar as paredes. Como o trabalho exigia altura e agilidade, as girafas e os macacos se propuseram a construir o telhado. Os camaleões, os pavões e as borboletas cuidaram da pintura e da decoração. Depois da escola pronta, fizeram uma grande festa, para comemorar o resultado dos seus esforços. Descobriram que, graças à solidariedade e à cooperação de todos, poderiam finalmente, estudar todos juntos. As boas relações entre as diferentes espécies favoreciam tanto os que ensinavam quanto os que aprendiam. Porém, numa manhã fria de inverno, surgiu na escola um bicho muito estranho. Seu olhar de valentão dava medo, causava até arrepios! Ninguém sabia de onde ele tinha vindo e a que espécie pertencia.Não se parecia com nenhum habitante do planeta. Por suas características e pelo tipo de influência que provocou em outros bichos, chamaram-no de BULLYING. Os animais que com ele tiveram contato mudaram o comportamento e a maneira de agir com os colegas. Tornaram-se agressivos, prepotentes e perversos. Adotaram formas de “brincar” muito diferentes das adotadas até então. Suas “brincadeiras’ geravam sofrimento, chateação, vergonha e constrangimento aos colegas, inibindo o aprendizado e a maneira de ser de cada espécie. Suas atitudes tornaram-se hostis com os mais fracos e indefesos. As diferenças existentes entre eles, que antes eram consideradas normais, passaram a ser motivo de chacotas e ridicularizações. Os que apresentavam dificuldades de aprendizagem eram apelidados, e muitos desistiram da escola. Outros sofriam calados, temendo represálias. A maioria dos bichos presenciava o comportamento dos colegas, mas, por alguma razão, nada faziam. Essas mudanças de comportamento provocaram sérios problemas de convivência na escola e o interesse pelos estudos ficou prejudicado. Assim, o leão tornou-se o valentão da escola, agindo de maneira dominadora e

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procurando impor sua autoridade. A cobra, que até então era amiga e conselheira, começou a espalhar boatos difamando a galinha, dizendo que esta era namoradeira. Como tinha habilidade para desenhar, retratava a galinha em situações constrangedoras e passava para os colegas. O cachorro, que antes protegia a todos, também mudou seu comportamento e passou a agir com perversidade rosnando e fazendo ameaças. A hiena, temendo tornar-se a “próxima vítima”, ria da maldade que os colegas faziam. Como estratégia, passou a criticar a gralha, responsável pelo sinal da troca de aulas, devido ao seu tom de voz estridente. A gralha sentindo-se humilhada, foi aos poucos se retraindo, até que desenvolveu uma gagueira e não pode mais tocar o sinal da escola. A anta, cheia de dúvidas, evitava fazer perguntas para a professora, pois se sentia envergonhada pela “zoação” que recebia, prejudicando sua aprendizagem. Com a preguiça algo semelhante aconteceu. Aos poucos foi excluída do grupo. Tão chateada ficou que perdeu a motivação e suas notas despencaram. Nem o alegre e estudioso pingüim escapou aos maus tratos. Sofria perseguição porque estava sempre bem vestido e elegante. Depois de algum tempo tornou-se estressado e mal humorado. Com o veado, os valentões da escola pegaram pesado: excluíram-no do time de futebol, dizendo que era demasiadamente sensível para os esportes. O tucano tornou-se agressivo por causa das piadinhas que faziam com seu bico, e durante o recreio procurava os galhos mais altos e afastados para comer sozinho o seu lanche. O gambá decidiu abandonar a escola porque implicavam com o seu cheiro. O sapo com medo do jacaré acabou adoecendo. Em conversa com sua mãe, ele contou que sentia muita raiva dos seus colegas, que não queria voltar para escola e que pensava em se vingar. O elefante, coitado, ia para escola de casaco, num calor danado, para disfarçar sua gordura. Um dia, cansado das chacotas dos colegas, decidiu emagrecer, mas acabou desenvolvendo anorexia (perdeu a vontade de se alimentar) e teve que interromper seus estudos para tratamento. A mãe coruja, notando que sua filha chegava da escola agressiva, com ar de superioridade, querendo intimidar seus irmãos mais novos, resolveu ficar atenta. Procurou a direção da escola e contou o que estava acontecendo, querendo saber se lá ela agia assim. Nessa época, vários pais procuraram a escola para tentar entender os problemas apresentados por seus filhos. Outros ameaçavam tirar os filhos da escola. Até os professores não agüentavam tanta violência. Após reunir a equipe de professores e analisar os problemas enfrentados, a direção da escola percebeu que toda essa mudança de comportamento foi promovida por aquele bicho estranho, que haviam chamado de BULLYING. Assim, a escola resolveu convocar todos os seus profissionais, os pais e os alunos para uma grande reflexão. O grupo concluiu que o medo, a insensibilidade, a dificuldade de compreender e se colocar no lugar do outro e a intolerância às diferenças individuais de cada um estavam prejudicando o ensino, a aprendizagem, as relações sócias entre as espécies, e a violência crescia no ambiente escolar. O papai búfalo lembrou a todos que, na construção da escola, cada um contribuiu conforme as suas habilidades e o resultado foi extraordinário. Todos cooperaram com alegria, e a amizade foi fortalecida entre eles. O diretor considerou que a maior dificuldade dos alunos não estava na aprendizagem das disciplinas curriculares, mas sim na convivência, e disse que, doravante, todos na escola se empenhariam em educar os alunos para a paz, a fim de que a escola se tornasse um lugar onde todos pudessem ser incluídos. Por isso, resolveram ensinar sobre a importante participação das diferentes espécies na história da

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evolução e da manutenção do planeta. Dessa forma, os alunos aprenderam que as diferenças sempre existirão, mas são os diferentes que fazem a diferença. E não encontrando mais espaço para suas maldades, o BULLYING sumiu para sempre daquele lugar...” (FANTE E PEDRA, 2008).

Esta história traz à tona um questionamento sobre toda a dor e

sofrimento que o bullying causa. De acordo com a literatura pesquisada, pude

ter um amplo panorama de como realmente é o bullying escolar, e de como

sua ação maléfica traumatiza sua vítima, acarretando uma série de danos em

seu psiquismo.

Para os alvos de tamanha brutalidade, as conseqüências podem ser

depressão, angústia, baixa auto-estima, estresse, absentismo ou evasão

escolar, atitudes de autoflagelação e suicídio, enquanto os autores dessa

prática podem adotar comportamentos de risco, atitudes delinqüentes ou

criminosas e acabar tornando-se adultos violentos.

Para Fante e Pedra (2008), bullying é um problema epidêmico,

específico e destrutivo, motivo pelo qual deve ser considerado questão de

saúde pública.

De acordo com Rabelo Jr. (2007), o bullying começou a ser pesquisado

cerca de vinte anos atrás na Europa, quando se descobriu o que estava por

trás de muitas tentativas de suicídio entre adolescentes. Sem receber a

atenção da escola ou dos pais, que geralmente achavam as ofensas bobas

demais para terem maiores conseqüências, o jovem recorria a uma medida

desesperada. Porém, descobriu-se que bullying é um fenômeno mundial tão

antigo quanto a própria escola. Apesar dos educadores terem consciência da

problemática existente entre agressor e vítima, poucos esforços foram

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despendidos para o seu estudo sistemático até princípios da década de 80.

Um dado alarmante, é que este mal vem se disseminando largamente nos

últimos anos, atingindo faixas etárias cada vez mais baixas, como crianças dos

primeiros anos de escolarização.

A palavra bullying é de origem inglesa, e adotada em muitos países para

definir “ o desejo consciente e deliberado de maltratar uma outra pessoa e

colocá-la sob tensão. (Tatum e Hebert, 1999 apud Fante e Pedra, 2008) Porém

o conceito é o mais variado, em geral, é descrito como atitudes de intimidação,

agressão física e psicológica e abuso sistemático do poder. Segundo Ballone

(2005), o termo bullying compreende todas as formas de atitudes agressivas,

intencionais e repetidas, que ocorre sem motivações evidentes, adotadas por

um ou mais estudantes contra outro(s), executadas dentro de uma relação

desigual de poder.

Para a Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e

à Adolescência (ABRAPIA), por não existir uma palavra na língua portuguesa

capaz de expressar todas as situações de bullying, as ações que podem estar

nele presentes são: colocar apelidos, ofender, zoar, gozar, encarnar, sacanear,

humilhar, fazer sofrer, discriminar, excluir, isolar, ignorar, intimidar, perseguir,

assediar, aterrorizar, amedrontar, tiranizar, dominar, agredir, bater, chutar,

empurrar, ferir, roubar e quebrar pertences. Pode também ser praticado por

meios eletrônicos. Mensagens difamatórias ou ameaçadoras circulam por e-

mails, sites, blogs (os diários virtuais), pagers e celulares.

De acordo com Leite (1999), alguns sinais são comumente observados

na manifestação da prática do bullying: roupas excessivamente sujas, livros

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rasgados, hematomas não justificados, objetos em falta, necessidade de mais

material escolar ou de dinheiro extra.

Outros indicadores como demonstrar falta de vontade de ir à escola,

sentir-se mal perto da hora de sair de casa, pedir para trocar de escola, revelar

medo de ir ou voltar da escola, pedir sempre para ser levado à escola, mudar

freqüentemente o trajeto entre a casa e a escola são também muito comuns.

O bullying é disseminado por todas as classes sociais, em escolas públicas e

privadas, podendo se manifestar verbalmente, fisicamente e psicologicamente,

e de forma diferenciada entre gêneros.

Para Rabelo Jr. (2007), bullying é diferente de uma brincadeira inocente,

sem intenção de ferir. São atitudes hostis, que violam o direito à integridade

física e psicológica e à dignidade humana. As vítimas se sentem indefesas,

vulneráveis, com medo e vergonha, o que favorece o rebaixamento de sua

auto-estima e a vitimização continuada e crônica. Essa forma de violência,

muitas vezes interpretada como brincadeiras próprias da idade, traz uma série

de danos, que se refletem não apenas no processo de aprendizagem e

socialização, mas, sobretudo, na saúde do individuo.

Os meninos estão mais envolvidos com o bullying, tanto como autores

quanto como alvos, observa Leite (1999). Nos meninos o bullying é mais físico.

Já entre as meninas se caracteriza, principalmente, como prática de exclusão

ou difamação.

É usual os alunos envolvidos no bullying serem da mesma sala ou do

mesmo ano. Quando em idades diferentes, o praticante tende a ser mais velho

16

que suas vítimas. Normalmente existem três tipos de pessoas envolvidas

nessa situação de violência: a vítima, o agressor e a testemunha.

Conforme Ballone (2005), os autores são comumente indivíduos que

têm pouca empatia, são antipáticos, arrogantes e desagradáveis.

Freqüentemente pertencem a famílias desestruturadas, nas quais há pouco

relacionamento afetivo entre seus membros.

A vítima costuma ser a pessoa mais frágil, com algum traço destoante

do “modelinho” culturalmente imposto pelos seus pares, traço este que pode

ser físico (uso de óculos, obesidade, alguma deficiência, muitas espinhas),

emocional (timidez, introversão) ou relacionada a outros aspectos culturais,

étnicos ou religiosos.

Sem esperanças quanto às possibilidades de se adequarem ao grupo e

com dificuldades para novas amizades, algumas vítimas crêem ser

merecedores do que lhes é imposto. Têm poucos amigos, são passivas e não

reagem aos atos de agressividade sofridos.

O agredido costuma ser uma pessoa que não dispõe de habilidades

físicas e emocionais para reagir, tem um forte sentimento de insegurança e um

retraimento social suficiente para impedi-lo de procurar ajuda.

Não são poucas as vítimas de bullying que, por medo ou vergonha, sofrem em

silêncio. A barreira do silêncio ajuda a perpetuar o bullying. As vítimas relutam

em contar o que estão sofrendo por terem medo de represálias e por achar

que suas experiências podem não ser levadas a sério.

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Em termos gerais, são normalmente rejeitadas pelos pares, ficam

isoladas, sem amigos e sem proteção pessoal, sendo mais expostas à rejeição

e à agressão social.

Os espectadores, representados pela grande maioria dos alunos,

convivem com a violência, se sentem incomodados, mas se calam em razão

do temor de se tornarem as próximas vítimas. Sua omissão pode estar

também relacionada ao prazer com o sofrimento da vítima e pelo medo de

assumir a identidade de agressor.

“ Crianças que repetem atos de intolerância e de violência

para com o outro podem estar sendo reforçada pelos pais

que a vêem positivamente como esperta, machões,

bonzões, ou por grupos que usam a intolerância, a

discriminação e a violência como meios de expressão e

de afirmação da identidade narcísica. Os que praticam o

bullying têm grande probabilidade de se tornarem adultos

com comportamentos anti-sociais e/ou violentos, podendo

vir a adotar, inclusive, atitudes delinqüentes e criminosas.”

(Calhau, 2009)

Esses conflitos quando não bem resolvidos nos anos iniciais do

desenvolvimento do indivíduo podem se perpetuar, pois como já é sabido,

ainda na infância, inscrevem-se como um modelo padrão de relação que

iremos estabelecer na idade adulta, então é comum percebemos pessoas que

assumem a condição de agressor ou de vítima em vários ambientes onde

exista relação de mando – obediência, ou de quem estabelece/monitora as

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regras e de quem tem por função cumpri-las. Nesse caso, é possível perceber

tais aspectos em empresas, família, instituições diversas, até mesmo entre

diretor-professor, professor-aluno, professor-professor, etc..

De acordo com Calhau (2009), bullying trata-se de um verdadeiro mal

invisível, que desestrutura vidas, destruindo famílias e carreiras, afetando

pessoas das mais diversas classes, fazendo com que sofram calados com o

temor gerado em suas vidas, não encontrando, por muitas vezes, ajuda em

pessoas próximas, especialistas ou autoridades públicas, principalmente diante

da falta de informação veiculada.

CAPÍTULO I I

19

O PAPEL DO PSICOPEDAGOGO, FRENTE A ESSE MAL

INVISÍVEL.

Individualmente, os flocos de neve são uma coisa frágil, mas veja só o que são capazes quando se juntam.

Fernando Bonaventura

Começarei este 2O capítulo sobre a importância do psicopedagogo,

frente a esta árdua batalha contra o bullying escolar. Todos sabem que o

docente tem uma enorme influência sobre seus alunos. A este docente,

Middelton-Moz (2007, p. 59), denomina de “cuidador”. Ainda com o autor, a

interação da criança com seu principal cuidador na escola, é a maior proteção

contra comportamentos agressivos posteriores. Esse relacionamento é o

alicerce para o desenvolvimento de vínculo e de empatia, regulando e

equilibrando as emoções e a capacidade de aprender.

Porém, trago a tona uma questão visível em muitas realidades

educacionais, que é a de que apesar de reconhecerem a existência do

bullying, muitos professores e diretores de escolas públicas e privadas ainda

têm dificuldade em lidar com o problema. A falta de tempo e a grande

quantidade de estudantes nas salas de aula não permitem que esses

profissionais façam um acompanhamento individual de cada aluno.

De acordo com minha pesquisa, minha experiência de 13 anos na área

de educação e todo o conteúdo assimilado no curso de psicopedagogia,

considero que cada escola deveria contar com uma equipe de psicopedagogos

que pudesse atuar junto aos estudantes. Vejo que algumas instituições

privadas já contam com esses profissionais, mas na rede pública, infelizmente,

20

esse acompanhamento ainda não é o adequado. Diretores e coordenadores

muitas vezes não se mostram preparados para agir nesses casos.

Conforme Beauclair (2004), o psicopedagogo cuida de questões que

transversalizam os diferentes momentos do aprender, que devem envolver as

famílias e o meio sócio-cultural. A psicopedagogia se posiciona em observar o

sujeito aprendente como um organismo biológico, afetivo, cognitivo, social e

cultural. Com isso, busca conhecer o sujeito como ser transcendente que se

constitui como pessoa, a partir do biológico e de suas múltiplas interações com

o mundo, com o saber, com o conhecimento.

De acordo com Oliveira, o saber enxergar e aceitar a diversidade do

outro, assim como encontrar tempo para e espaço para escutá-lo, vem a ser

condição de aprendizagem e de desenvolvimento saudável. Neste sentido

também, a construção da própria identidade da Psicopedagogia e do

psicopedagogo depende do valor que é dado à aprendizagem em equipe,

sempre aberta às transformações do seu tempo.

Sendo assim, na escola, o psicopedagogo deve ter o entendimento do

Projeto Político Pedagógico, do Regimento e de toda a estrutura física e

documental da instituição, intervindo nas diferentes instâncias que veiculam o

conhecimento, como este transita, como é apresentado aos alunos, avaliado,

transformado, enfim, analisando os processos e as modalidades de ensinar e

de aprender. Além disso, deve observar como ocorrem as relações de poder, o

que interfere nas relações interpessoais dos diferentes grupos e como estes

procuram dar conta dos conflitos do dia-a-dia.

21

“ A psicopedagogia se envolve no desenvolvimento

cognitivo, com o claro objetivo de conhecer como o

sujeito aprende, buscando compreender, também, os

motivos que fazem com que alguns sujeitos não

aprendam.” (BEAUCLAIR, 2004, p. 43).

Ainda com Beauclair (2006), a Psicopedagogia por ser um campo do

conhecimento interdisciplinar pode contribuir, seja no sentido de promover a

aprendizagem ou mesmo tratar de distúrbios, nesses processos instalados na

própria instituição, a qual cumpre uma importante função de socializar os

conhecimentos disponíveis, promover o desenvolvimento cognitivo e a

construção de regras de conduta, dentro de um projeto social mais amplo.

Em síntese, a atuação do psicopedagogo na escola deve ser feita frente

aos educadores e deve visar uma conscientização da problemática existente

entre agressor e vítima, encontrando soluções para prevenção do bullying e

intervenção deste fenômeno, a fim de conter sua disseminação.

Muitos profissionais da educação se assustam quando “aquela simples

brincadeira” entre grupos é sinalizada como bullying. Então é papel do

psicopedagogo atuar com intervenções que minimizem este ato de crueldade

tais como, projetos ou miniprojetos na escola sobre valores, respeito mútuo,

paz, tolerância, ser diferente, etc. Oficinas, teatro, ações que permitam aos

alunos exporem seus medos, suas opiniões sobre o assunto, como uma

espécie de terapia ocupacional, ou seja, transformar os alunos em aliados

contra esse mal. Monitorar os vários espaços da escola, mesmo fora dos

intervalos entre as aulas. E policiar as formas de ações, tendo cuidado, por

exemplo, com a forma como um professor se dirige a um aluno, evitando

22

apelidos, termos de menosprezo, etc., pois o educador é quem está na linha

de frente, quem estabelece contato direto com o aluno e, muitas vezes por

falta de cuidado com essa questão, o aluno teme conversar preferindo se

calar.

Termino este 2o capítulo com uma história de Dennis Saddleman1 apud

Middelton-Moz (2007, p. 29), que julguei ser de grande relevância para o

entendimento da dor sentida aqueles que sofrem desta “perseguição”

desenfreada, e qual seria o papel do Psicopedagogo frente à crueldade

desmedida do bullying escolar. Nós enquanto futuros psicopedagogos,

devemos vislumbrar um futuro de paz, via educação, desde os primeiros anos

de escolarização. As crianças têm grande poder de propagação de idéias, são

multiplicadoras de toda educação que recebem. Por isso, devemos ensiná-las

a respeitar e a valorizar as diferenças individuais, resolver seus conflitos e

conviver em harmonia, disseminado em seus corações, sementes da paz.

A BATALHA DAS PALAVRAS BOAS CONTRA AS PALAVRAS MÁS

Lá fora no campo de batalha Havia uma guerra... Havia uma batalha Entre as palavras boas e as palavras más Todas as palavras espirituais se ajoelhavam De cabeça baixa Murmuravam palavras silenciosas e de oração As palavras fortes ficaram ali, paradas, com suas lanças As palavras fortes eram guarda costas do chefe das palavras O chefe das palavras falou palavras corajosas aos guerreiros das palavras “Hoje, lutamos por boas palavras

1 Dennis Sandleman é um sobrevivente do sistema de escolas residenciais do Canadá, que eram dirigidas pelo Igreja Católica e financiadas pelo estado, destinadas a resolver “o problema indígena” do país. Milhares de crianças de origem indígena no Canadá e nos Estados Unidos foram tiradas de seus lares e forçadas a freqüentar essas escolas, muitas delas dos 5 aos 17 anos. Muitas foram abusadas mental, emocional, espiritual e sexualmente, nas mãos de pessoas a quem se confiou seu cuidado.

23

Lutamos por bons pensamentos Lutamos por nossa língua.” Do oeste vinham as palavras obscuras Palavras ofensivas Palavras raivosas Palavras do mal Palavras violentas As palavras líderes fizeram o primeiro enfrentamento As palavras boas lutaram contra as palavras más No campo de batalha, havia palavras cortantes, Palavras açoitantes E depois houve muitas palavras caídas Em pouco tempo... o campo de batalha estava coberto de palavras sangrando Palavras doendo E palavras morrendo E a batalha chegara ao fim Palavras sobreviventes cantavam palavras de vitória Chegaram palavras de cura Que trataram as palavras lesionadas E sepultaram as palavras mortas E então, entre amigos Entre muitas famílias Em todo o território Houve boas palavras Bons pensamentos E boas línguas.

24

CAPÍTULO I I I

CONCLUSÃO

Há duas maneiras de enfrentar dificuldades. Podem-se alterar as dificuldades ou pode-se alterar a si mesmo para enfrenta-las.

Phyllis Bottome

O presente estudo permitiu a partir do referencial teórico selecionado,

analisar as manifestações da agressão escolar configurada no fenômeno

bullying, buscando compreender as nuances psicológicas acarretadas por ele,

assim como, possíveis programas psicopedagógicos.

Pude concluir, que muitas escolas ignoram os casos de violência, por

medo de perder seus alunos-clientes. Outro aspecto preocupante é que muitas

instituições de classe, ao sugerir apoio psicopedagógico, tentam reforçar a tese

de que crianças agredidas podem ter uma propensão a isso – como se o

problema estivesse na vítima e não na instituição. É um mecanismo sutil dos

colégios se distanciarem do problema. Temos visto muitos casos onde a

escola transfere a culpa para a família e vice-versa. Não adianta os pais

colocarem a culpa nas más companhias e o colégio dizer que é o aluno que

não sabe se defender e que a culpa é dos pais.

A escola, em seu Projeto Político-Pedagógico, deve prever e aplicar, em

sua prática, uma intenção na construção de um projeto de vida, no qual as

relações interpessoais saudáveis entre professores, alunos e famílias sejam

privilegiadas. Às vezes, investe-se muito no planejamento de conteúdos e

objetivos, mas acabam se esquecendo das relações afetivas, e do acolhimento

25

daquele aluno que chega pela primeira vez à escola, cheio de sonhos e

expectativas. Até então ele estava acostumado a ser quase o centro das

atenções; a partir dali vai ter que dividir isso com 20 ou 25 ou 40 colegas. Essa

criança vai ter que se adaptar ao jeito de ser do professor e dos colegas, aos

comentários, às piadas. Sendo assim, o psicopedagogo na escola, exerce um

papel fundamental na criação e no aperfeiçoamento do clima relacional entre

professores, alunos, funcionários e famílias, muitas vezes, sendo necessário

desmistificar a manifestação de sentimentos primitivos como a inveja, a

competição, que impedem a prática educativa.

Finalizando, gostaria de enfatizar que o Psicopedagogo pode fazer

muita diferença numa instituição, com uma escuta e um olhar mais sensível

quanto às demandas de professores, alunos e famílias. Não esquecendo que

uma grande parte das crianças e dos adolescentes reconhecem a escola como

um lugar gostoso de estudo e de encontros com colegas e professores.

É unânime que a criança que apresenta este problema (bullying) deve

ser tratada e não punida, pois lidamos com jovens que sofrem, que não

encontram formas de se aproximar de seus iguais, que se percebem tão

frágeis que têm de mostrar o contrário e provar todo o tempo que são

destemidos.

Acabar definitivamente com o bullying, de acordo com Calhau (2009),

pode parecer uma utopia, em uma sociedade capitalista e individualista, onde

o ter acaba tendo mais valor do que o ser, mas é um desafio que nos inspira a

lutar por um mundo melhor, por uma sociedade mais justa, por um mundo

melhor para deixarmos para as gerações futuras e isso só poderá ser

26

conseguido quando mais nenhuma vítima do bullying se esconder por trás de

suas lágrimas, de seu sofrimento, de seu silêncio.

Concluo, portanto, que é preciso dar um basta nesta forma de violência,

para que os agressores juvenis de hoje não se tornem os criminosos de

amanhã.

27

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO

ABRAPIA - Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e a

Adolescência. Programa de Redução do Comportamento Agressivos entre

Estudantes. Rio de Janeiro, s/d. Disponível em:

http://www.bullying.com.br/BConceituacao21.htm#. Acesso em: 26 jan. de 2010

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Internet, disponível em http://www.psiqweb.med.br, revisto em 2005. Acesso em:

16 de Jan. 2010.

BEAUCLAIR, João. Psicopedagogia: Trabalhando competências, criando

habilidades. Rio de Janeiro: Editora WAK, 2004.

BEAUCLAIR, João. Para entender psicopedagogia: perspectivas atuais,

desafios futuros. Rio de Janeiro: Editora WAK, 2006.

CALHAU, Lélio Braga. Bullying: O que você precisa saber: Identificação,

prevenção e repressão. Niterói, Rj: Impetus, 2009.

DIGA NÃO AO BULLYING. Disponível em: http://www.diganaoaobullying.com.br/

Acesso em: 15 de dez. 2010.

FANTE, Cleo. Fenômeno Bullying: Como prevenir a violência nas escolas e

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respostas. Porto Alegre: Artmed, 2008.

LEITE, R.L.O. A supervisão dos recreios:Uma medida eficaz na prevenção do

bullying. in. Psicopedagogia, Internet, disponível em:

28

http://www. psicopedagogia.com.br/artigos

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MIDDELTON-MOZ, Jane; ZAWADSKI, Mary Lee. Bullying: estratégias de

sobrevivência para crianças e adultos. Porto Alegre: Artmed, 2007.

REBELO JR., Salvador Loureiro. Bullyng: Uma realidade no contexto escolar.

Disponível em:http://www.psicopedagogia.com.br/artigos/artigo.asp?entrlD=946

Acesso em: 12 de fev. de 2010.

29

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

EPÍGRAFE 5

RESUMO 6

METODOLOGIA 7

SUMÁRIO 8

INTRODUÇÃO 9

CAPÍTULO I

Bullying, a brincadeira que não tem graça 11

CAPÍTULO I I

O papel do psicopedagogo frente a esse mal invisível 19

CAPÍTULO I I I

Conclusão 24

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 27

ÍNDICE 29

30

FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

Título da Monografia: O Papel do Psicopedagogo na identificação,

intervenção e redução do Bullying escolar.

Autor: VIVIANE MATOS

Data da entrega: 05/04/2010

Avaliado por: Dayse Serra Conceito: