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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR
A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO PELO
INDIVÍDUO SEGUNDO VYGOTSKY
Por : Adail Maria Rezende Ferreira
Orientadora:
Profª Mary Sue Pereira
Rio de Janeiro
junho/2003
2
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR
A CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO PELO
INDIVÍDUO SEGUNDO VYGOTSKY
Apresentação de Monografia à
Universidade Cândido Mendes como
condição prévia para a conclusão do Curso
de Pós-Graduação “Lato Sensu” em
Docência do Ensino Superior.
Por: Adail Maria Rezende Ferreira
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço especialmente a Deus,
pela oportunidade de estar aqui
realizando esse trabalho e também aos
meus colegas que compartilharam
comigo momentos difíceis nessa
caminhada.
4
DEDICATÓRIA
Dedico esse primeiro trabalho de
monografia especialmente à minha
família: ao meu pai, ao meu querido
marido que muito me incentivou, aos
meus queridos filhos Guilherme e
Gustavo e também à minha saudosa mãe
que, de outra forma, também esteve
torcendo pelo meu sucesso.
5
RESUMO
O presente trabalho de Monografia surgiu da percepção de que uma nova
abordagem deveria ser feita sobre a prática educacional à luz de uma teoria que vem
ganhando cada vez mais espaço entre os círculos acadêmicos.
Embora muito citada, a teoria vygotskyana não é ainda bem conhecida, fato
este que despertou o nosso interesse em buscar um maior aprofundamento no
conhecimento da citada teoria.
A leitura de obras a respeito do trabalho desenvolvido por Vygotsky e
também de algumas das suas próprias publicações deixou-nos perceber a importância
especial que confere à Educação.
Através do estudo minucioso da bibliografia disponível, conseguiu-se
também um maior aprofundamento sobre o autor e suas idéias, deixando-nos
capacitados para a utilização dessa abordagem em nosso trabalho pedagógico.
6
METODOLOGIA
Primeiramente procedeu-se a um levantamento bibliográfico sobre as idéias
postuladas pelo autor a ser estudado neste trabalho.
A bibliografia conseguida foi exaustivamente estudada, pois embora as idéias
do autor não sejam recentes, só no final do século passado começaram a ser
divulgadas aqui no Brasil, sendo portanto praticamente desconhecidas para nós.
Após o estudo, foi feita uma síntese da biografia do autor e das principais
contribuições do autor a nível educacional.
Feito isto, procurou-se estabelecer quais as aplicações que as teorias do autor
estudado poderiam ter no âmbito da sala de aula.
Como finalização, apresentamos nesta Monografia o resultado do trabalho de
pesquisa bibliográfica e as possíveis aplicações práticas que podemos aferir da
aquisição deste novo conhecimento em nosso trabalho pedagógico. Enfocamos ainda
a atualidade da teoria de Vygotsky e sua importância para a melhoria da qualidade do
ensino.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I – Vygotsky: Biografia e Contextualização 9
CAPÍTULO II – Os Pressupostos Básicos da Teoria Histórico-cultural 13
de Vygotsky
CAPÍTULO III – Contribuições de Vygotsky 16
CAPÍTULO IV – O Processo de Formação dos Conceitos 23
CAPÍTULO V – Aplicações em Sala de Aula 32
CONCLUSÃO 34
BIBLIOGRAFIA 37
ÍNDICE 39
8
INTRODUÇÃO
Na primeira parte deste trabalho desenvolvemos uma breve biografia do autor
estudado e sua inserção no contexto da época em que desenvolveu suas idéias, época
essa que muita influência exerceu sobre o seu trabalho.
Como segunda parte do trabalho, podemos encontrar os principais
pressupostos teóricos que foram desenvolvidos por Vygotsky , com ênfase para a
interação do indivíduo com o meio social onde vive, onde, ao mesmo tempo que
absorve a cultura, sobre ela exerce influência, deixando sua marca pessoal
principalmente através do uso que faz da linguagem.
Na terceira parte do trabalho detalha-se mais especificamente as contribuições
de Vygotsky, como a idéia da construção dos significados que a criança vai fazendo
do mundo através da linguagem e importância da cultura na construção do indivíduo.
No quarto capítulo parte-se para a análise dos processos de formação dos
conceitos segundo Vygotsky, onde se estabelece a importância da linguagem e do
uso dos signos. A zona de desenvolvimento proximal e a diferenciação entre os
conceitos cotidianos e os científicos, idéias defendidas por Vygotsky, também são
abordados nesse capítulo.
No quinto e último capítulo, estudaremos a aplicabilidade das idéias
postuladas por Vygotsky em nosso trabalho pedagógico na sala de aula.
Na conclusão, destacaremos a atualidade da teoria de Vygotsky e a
importância das suas contribuições para a melhoria da qualidade do ensino.
9
CAPÍTULO I
VYGOTSKY: BIOGRAFIA E CONTEXTUALIZAÇÃO
Vygotsky foi um visionário em seu tempo e os trabalhos desenvolvidos por
ele há mais de sessenta anos continuam valendo para os dias de hoje.
10
Vygotsky é um autor bielo-russo que nasceu em 1896 e faleceu 1934, aos 37
anos de idade, vítima de tuberculose.
Vygotsky formou-se em Direito, e fez também cursos de Medicina, História e
Filosofia. Sua produção intelectual foi intensa e ambientou-se na União Soviética
pós-revolucionária, tendo o clima em que viveu marcado fortemente sua produção. O
clima da sociedade soviética, na época era de efervescência intelectual em busca da
construção de ‘um novo homem”, de “uma nova ciência” e de “uma nova
psicologia”.
Por motivos políticos, suas obras foram censuradas e só chegaram ao
Ocidente na década de sessenta e no Brasil apenas nos anos oitenta. E só agora está
começando a penetrar em nosso ideário pedagógico.
O materialismo dialético, que estava fortemente presente na sociedade
soviética pós 1917, serviu como embasamento para o pensamento vygotskyano. Ele e
seus colaboradores, entre os quais se destacaram Luria e Leontiev, trabalharam a
idéia de construção de uma nova psicologia, para tentar superar uma espécie de crise
da Psicologia no começo do século passado. Na época, a Psicologia possuía dois
ramos bem distintos. Um, de cunho filosófico, mais mentalista, considerava que o
homem era composto de mente, espírito, consciência e vontade, dirigindo-se aos
processos mais complexos, tipicamente humanos. O outro tomava como modelo as
ciências naturais, a Física, a Química, entre outras, na tentativa de consolidar-se
como ciência. Esta vertente buscava analisar os processos psicológicos em partes
bem pequenas, que poderiam ser facilmente observáveis de modo científico, em
situações de laboratório.
A nova psicologia que Vygotsky e seus colaboradores procuravam construir
tinha como objetivo juntar essas duas abordagens, buscando estudar os processos
mais sofisticados do ser humano (processos esses intencionais, que envolveriam
consciência, vontade, ações voluntárias, ações planejadas, linguagem, entre outros)
11
com uma metodologia que a ciência pudesse aceitar, saindo da filiação filosófica e
passando ao plano da ciência material, mensurável.
Essas abordagem de Vygotsky é, para nós, muito contemporânea e não por
acaso já entrou na moda aqui no Brasil e vem sendo muito prestigiada em outros
países do Ocidente. Ao tentar reunir a Psicologia enquanto ciência experimental com
a Psicologia enquanto ciência que cuida da parte mais global do homem, acaba
agregando diferentes disciplinas que, na ordenação natural das ciências, geralmente
não se aproximam. Tal interdisciplinariedade, bem como sua abordagem qualitativa,
aproxima Vygotsky das nossas preocupações contemporâneas. Outro ponto de nossa
compatibilidade com o pensamento vygotskyano encerra-se em sua abordagem
genética, visto que Vygotsky encarava os fenômenos em termos de sua gênese, ou
seja, como processos dinâmicos e não como momentos estáticos.
Três grandes pressupostos fundamentam a linha de pensamento de Vygotsky.
Em primeiro lugar, sua concepção é de cunho materialista, onde as funções
psicológicas baseiam-se no funcionamento cerebral. O cérebro seria o substracto do
funcionamento psicológico. A filogênese, ou seja, a evolução da espécie, torna-se
objeto importante da Psicologia já que a espécie humana têm uma história própria
que define como o homem é hoje, em termos de suas possibilidades e dos limites do
seu funcionamento psicológico.
Em segundo lugar, e tocando o outro extremo do homem, encontra-se a idéia
vygotskyana de que o fundamento psicológico do funcionamento humano é de cunho
sócio-histórico. Isso significa que, se por um lado o homem funciona como um
organismo biológico, por outro a espécie humana tem seu funcionamento inserido
em um contexto sócio-histórico. Privando-se o homem de sua inserção cultural,
perderia ele a sua humanidade. A matéria–prima do funcionamento psicológico
humano, os conteúdos psicológicos, são determinados pelo contato do homem com a
cultura, pela sua interação com o outro social.
12
Por último, temos a idéia de Vigotsky de que o funcionamento psicológico do
homem é mediado, isto é, não se dá diretamente. Enquanto sujeito do conhecimento,
o homem não tem acesso direto aos objetos. Esse acesso é mediado por significados
e por símbolos que carregam esses significados.
Através da linguagem, que consiste no principal sistema simbólico de que o
ser humano dispõe, é que se absorve esse conjunto de informações sobre o mundo,
que se constitui numa espécie de filtro entre o sujeito e o mundo.
Convém ressaltar que, embora a força da teoria vigotskyana esteja no
componente social, ela não supõe que a transmissão cultural seja entregue como um
pacote pronto para o indivíduo. Na realidade, ela afirma que o indivíduo vai
construindo, enquanto ser psicológico, ao longo de seu percurso de desenvolvimento,
onde a interação com o grupo e com o outro social é essencial, a nível individual, o
material que recebe do contexto social. O jeito de cada um aprender o mundo é,
portanto, individual.
O processo de desenvolvimento então, seria um processo de reconstrução
individual do material recebido de fora, onde aquilo que era inicialmente
interpsíquico torna-se intrapsíquico. No pensamento de Vygotsky esse momento
constitui-se em um marco extremamente importante. As coisas acontecem de fora
para dentro. Primeiramente, elas acontecem a nível social, para depois serem
incorporadas pelo indivíduo no nível pessoal. Mas a influência do contexto social
não se dá de forma mecânica: o indivíduo não absorve de forma passiva a
informação oferecida pelo contexto cultural; pelo contrário, ele negocia, agindo
como ator na cultura que funcionaria como um “palco de negociações” constantes. A
maior prova disso é que a própria cultura não é uma coisa estática, está em constante
transformação pela ação dos indivíduos. Essa relação entre indivíduo e cultura
constitui-se em um eixo fundamental da teoria de Vygotsky.
13
CAPÍTULO II
OS PRESSUPOSTOS BÁSICOS DA TEORIA
HISTÓRICO-CULTURAL DE VYGOTSKY
Vygotsky concebe a cultura , a sociedade e o indivíduo como sistemas
complexos e dinâmicos, que são submetidos a ininterruptos e recíprocos processos de
desenvolvimento e transformação.
14
Um dos pressupostos básicos da teoria vygotskyana é que, para Vygotsky, as
origens da vida consciente e do pensamento abstrato deveriam ser procuradas na
interação do organismo com as condições de vida social, e nas formas histórico-
sociais de vida da espécie humana e não no mundo espiritual do homem. Para ele,
deve-se procurar analisar o reflexo do mundo exterior no mundo interior dos
indivíduos, a partir da interação destes sujeitos com a realidade. Tal teoria enfatiza o
resgate da importância do social na construção de conhecimentos que o indivíduo
faz, durante a sua vida, através das relações que estabelece.
Segundo Vygotsky, há um papel ativo do sujeito, e a ação deste sobre o meio
pode modificá-lo. Nesta atuação sobre a realidade, o próprio homem se modifica
também.
2.1 – A Linguagem
Para Vygotsky, a linguagem é o comportamento mais importante dos signos
culturais construídos na coletividade, visto que é ela a responsável primeira pelas
interações sociais. Percebida neste sentido, a linguagem é a fonte do conhecimento.
È através da linguagem que se dá a apropriação do saber. O seu
desenvolvimento é utilizado como paradigma e é a partir dela que as demais funções
psicológicas superiores tais como memória, raciocínio, capacidade de solucionar
problemas estabelecem relações umas com as outras.
Em seus trabalhos, o autor aponta a linguagem como instrumento do
pensamento, afirmando que a função planejadora da fala introduz mudanças
qualitativas na forma de cognição da criança, reestruturando diversas funções
psicológicas.
15
A criança, para Vygotsky, é um sujeito social criador e recriador de cultura.
Tendo como base a construção de uma epistemologia sociogenética, conclui ele que,
ao mesmo tempo em que a criança é transformada pelos valores culturais do seu
ambiente, ela também transforma esse ambiente.
No início, a criança usa a linguagem de forma difusa, passando depois, de
maneira gradativa, a estabelecer elos entre sua ação difusa e a organizada por outra
pessoa; tendo como ponto de partida pai, mãe, colegas, professores e os meios de
comunicação em geral, ela vai construindo seu próprio sistema de significados.
Deste modo, Vygotsky afirma que a linguagem é o sistema simbólico de
todos os grupos humanos, sendo a principal mediadora entre o sujeito e o objeto do
conhecimento. Assim, em cada situação de interação, o sujeito está em um momento
de sua trajetória particular, trazendo consigo determinadas possibilidades de
interpretação do material que obtém do mundo.
16
CAPÍTULO III
CONTRIBUIÇÕES DE VYGOTSKY
Para Vygotsky, os processos psicológicos complexos têm sua origem nas
relações entre indivíduos humanos e se desenvolvem ao longo do processo de
internalização de formas culturais de comportamento.
17
Para Vigotsky, como já dissemos antes, a linguagem tem um papel importante
não apenas na construção do conhecimento escolar, mas também no
desenvolvimento dos diferentes processos psicológicos.
De maneira gradativa, as crianças vão construindo significados,
conhecimentos, valores através de um diálogo com o mundo. levantando opiniões
sobre os mais variados assuntos.
Para o autor, a transação entre pensamento e palavra passa pelo significado,
tanto que ele nos dirá que “Um pensamento é como uma nuvem descarregando uma
chuva de palavras...” (Vygotsky, 1987, 129).
A idéia de que as funções mentais superiores são construídas ao longo da
história social do homem constitui-se em um dos pilares do pensamento de
Vygotsky. Em suas relação com o meio físico e social , mediada pelos instrumentos e
símbolos desenvolvidos no seio da vida social, o ser humano cria e transforma sua
ação no mundo. Esta visão sobre o funcionamento psicológico está na base das
concepções de Vygotsky sobre o funcionamento do cérebro: não se pode pensar o
cérebro como um sistema fechado, com funções previamente delimitadas, inalterável
no processo de relação do homem com o mundo. Segundo Vygotsky, o cérebro é um
sistema aberto, que encontra-se em constante interação com o meio e transforma suas
estruturas e mecanismos de funcionamento durante esse processo de interação.
Para o funcionamento cerebral na execução de qualquer atividade
psicológica, a atividade cerebral e o estado de vigília devem estar regulados, isto é,
os processos mentais requerem que o organismo esteja desperto para se
desenvolverem. O sistema nervoso controla assim o seu próprio nível de atividade, o
que lhe dá condição adequada de funcionamento, de acordo com a situação em que
se encontre o organismo. A partir daí, as informações são recebidas, analisadas e
armazenadas. Após a elaboração das informações, dá-se a programação, a regulação
e o controle da ação física e mental do indivíduo sobre o ambiente.
18
Nos estágios iniciais do desenvolvimento, as atividades mentais apoiam-se,
de maneira geral, em funções mais elementares. Nos estágios posteriores torna-se
mais importante a participação de funções superiores, em especial as que envolvem a
linguagem.
Convém notar ainda que , em nenhuma espécie animal, o funcionamento do
organismo está completamente definido na hora do nascimento. Embora existam
limites e possibilidades de desenvolvimento dos organismos característicos de cada
espécie, sempre há uma certa flexibilidade que possibilita a variação de
comportamentos típicos da espécie. Com isso se garante a capacidade de adaptação
dos seres vivos a ambientes diversificados e, por conseqüência, o processo de
evolução das espécies.
Na espécie humana, os indivíduos nascem muito pouco preparados para a
sobrevivência independente dos cuidados dos adultos. Psicologicamente, isto
significa que o organismo humano não nasce pronto, mas com muitas características
em aberto, que serão desenvolvidas no contato com o mundo externo e, em
particular, com outros membros da espécie. A imaturidade dos organismos humanos
no momento do nascimento e a plasticidade do seu sistema nervoso permite que o
cérebro adapte-se a diferentes necessidades, servindo a diversas funções
estabelecidas no decorrer da história do homem.
Por outro lado, os estudos de Vygotsky também concluem que os sistemas
funcionais utilizados pelo cérebro podem recorrer a componentes diferentes deste, de
acordo com as situações, ou seja, tarefas constantes, desempenhadas por mecanismos
variáveis, podem produzir um resultado constante, sendo esta uma das características
básicas que distingue o funcionamento de cada sistema funcional.
Quanto mais as tarefas se distanciam do funcionamento psicológico básico e
mais ligadas estão à relação do indivíduo com o meio sociocultural onde vive, mais
se torna evidente, para Vygotsky, a complexidade dos sistemas funcionais que
dirigem a realização dessas tarefas. Como exemplo desta complexidade, podemos
19
citar as diferentes maneiras de se chegar ao resultado de uma simples conta. Essa
mesma conta pode ser resolvida contando-se nos dedos, fazendo-se cálculo mental,
usando-se uma máquina de calcular ou utilizando-se de informações já armazenadas
na memória.
Cada uma dessas rotas para resolver a mesma conta vai mobilizar diferentes
partes do funcionamento cerebral: contar nos dedos implica em uma atividade
motora que não acontece nas outras maneiras; o uso da calculadora requer o
conhecimento da técnica necessária para o seu manuseio e lembrar de um resultado
memorizado anteriormente exige uma operação específica relacionada com a
memória.
A relação desses procedimentos serve para evidenciar a íntima relação que
existe entre o desempenho de tarefas ligadas ao funcionamento mental e a inserção
do indivíduo em um contexto sócio-econômico específico. As múltiplas
possibilidades de funcionamento cerebral a serem desenvolvidas e mobilizadas na
execução de uma determinada tarefa serão definidas pelos símbolos e instrumentos
determinados socialmente. Uma operação que exija a utilização de lápis e papel, por
exemplo, inexistiria no conjunto de sistemas funcionais de um participante de uma
sociedade onde não existisse a escrita.
Consequentemente, um indivíduo que vive em um grupo cultural que não
dispõe da escrita jamais será alfabetizado, embora disponha da possibilidade física
para aprender a ler e escrever, enquanto membro da espécie humana.
Enquanto sistema aberto, o cérebro humano encontra-se preparado para
realizar diversas funções, dependendo dos diferentes modos com que o homem se
insere no mundo.
No decorrer da história da espécie humana, onde o surgimento do trabalho
propiciou o desenvolvimento da atividade coletiva, das relações sociais e do uso de
instrumentos, as representações da realidade foram se articulando em sistemas
20
simbólicos. Os signos passaram a ser compartilhados pelo conjunto dos membros do
grupo social, permitindo a comunicação entre os indivíduos e a melhoria da
qualidade da interação social.
Os sistemas de representação da realidade são socialmente dados e a
linguagem constitui-se no sistema simbólico básico de qualquer grupo humano. Esse
grupo cultural onde o indivíduo se desenvolve vai lhe fornecendo formas de perceber
e organizar o real, formas estas que vão se constituir nos instrumentos psicológicos
que servirão de mediação entre o indivíduo e o mundo.
Agindo como mediadores entre o homem e o mundo real, esses sistemas de
representação da realidade funcionarão como uma espécie de “filtro” pelo qual o
homem torna-se capaz de ver o mundo e agir sobre ele. Se um indivíduo se encontra
diante de uma televisão, por exemplo, ele é capaz de interpretá-la como uma
televisão e não como um amontoado de informações perceptuais incompreensíveis.
O conceito de televisão, socialmente construído, consiste na representação mental
que serve de mediação entre indivíduo e o objeto real inserido no mundo. A palavra
“televisão”, que designa uma certa categoria de objetos do mundo real, funciona
como mediador entre o indivíduo e a televisão enquanto elemento concreto.
Supondo a existência de um grupo cultural onde, por qualquer razão, nunca se
tenha visto uma televisão, o indivíduo não terá condições de interpretá-la como tal.
Ao se deparar pela primeira vez com uma televisão, este indivíduo não disporá da
representação simbólica, do instrumento psicológico que lhe permita compreender
esse objeto.
A partir da sua experiência com o mundo objetivo e do contato com as formas
culturalmente determinadas de organização do real (e com os signos fornecidos pela
cultura) é que os indivíduos vão construindo seu sistema de signos, que consistirá em
um “código” que lhe permitirá decifrar o mundo.
21
Um dos pressupostos de Vygotsky constitui-se exatamente no fato de que os
grupos culturais em que as crianças nascem e se desenvolvem produzem adultos que
operam psicologicamente de uma maneira particular, de acordo com os modos
culturalmente construídos de ordenar o real. Convém ressaltar que para Vygotsky
cultura não se constitui apenas em fatores abrangentes como o país onde o indivíduo
vive, seu nível econômico ou a profissão de seus pais. Para ele, o grupo cultural
fornece ao indivíduo todo um ambiente estruturado, onde todos os elementos são
carregados de significado. A vida humana encontra-se impregnada de significações e
a influência do mundo social se dá por meio de processos que ocorrem em diversos
níveis. A multiplicidade de fatores existentes na cultura é que vai definir de que
maneira o indivíduo vai se desenvolver.
A interação direta entre indivíduos particulares representa papel fundamental
na construção do ser humano; através da relação interpessoal concreta é que o
indivíduo vai interiorizando formas culturalmente estabelecidas de funcionamento
psicológico. Assim, a interação social com outros membros da cultura ou através dos
diversos elementos do ambiente culturalmente estruturado, fornece a matéria-prima
para o desenvolvimento psicológico do indivíduo.
A cultura, para Vygotsky, não se constitui em algo pronto, um sistema
estático ao qual o indivíduo é submetido. Para ele, a cultura pode ser entendida
como um “palco de negociações”, onde seus membros estão num constante
movimento de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significados.
A vida constitui-se em um processo dinâmico, onde ocorre a interação entre o mundo
cultural e o mundo subjetivo de cada um, e onde cada indivíduo desempenha um
papel ativo. Associada a sua filiação marxista, Vygotsky defende a interação entre os
vários planos históricos: a história da espécie, que se divide em filogênese (história
do grupo cultural) e ontogênese (história do organismo individual da espécie) e a
seqüência singular de processos e experiências vividas por cada indivíduo.
O processo de internalização da matéria-prima fornecida pela cultura não é
absorvido passivamente pelo indivíduo; pelo contrário, este a sintetiza, a transforma.
22
Esse processo, para Vygotsky, é um dos principais mecanismos que devem
ser compreendidos ao se estudar o ser humano. Ao longo do seu desenvolvimento. o
indivíduo vai se apossando das formas de comportamento oferecidas pela cultura,
num processo de transformação das atividades externas e das funções interpessoais
em atividades internas, intrapsicológicas.
O processo de desenvolvimento do ser humano, determinado por sua inserção
em um grupo cultural específico se dá de fora para dentro, ou seja, primeiro o
indivíduo realiza ações externas, que são interpretadas pelas pessoas a seu redor, a
partir dos significados culturalmente estabelecidos. Partindo dessa interpretação, o
indivíduo poderá atribuir significados a suas próprias ações e desenvolver processos
psicológicos internos que serão interpretados por ele próprio com base nos
mecanismos estabelecidos pelo grupo cultural e compreendidos por meio de códigos
compartilhados pelos membros desse mesmo grupo.
Vygotsky considera, assim, que o fundamento do funcionamento
psicologicamente humano é social e, consequentemente, histórico. Os elementos que
atuam como mediadores na relação entre o homem e o mundo, como instrumentos,
signos e todos os elementos do ambiente humano que carregam significados
culturais, são encontrados nas relações entre os homens. Os sistemas simbólicos, em
especial a linguagem, exercem um papel fundamental na comunicação entre os
indivíduos, bem como no estabelecimento de significados compartilhados que
possibilitam interpretações dos objetos, eventos e situações do mundo real. Por isso,
as origens das funções psicológicas superiores devem ser estabelecidas a partir das
relações sociais entre o indivíduo e os outros homens.
23
CAPÍTULO IV
O PROCESSO DE FORMAÇÃO DOS CONCEITOS
Vygotsky afirma que a relação do homem com o mundo não se dá
diretamente, mas é mediada pelo sistema de signos e por todos os elementos
significativamente culturais que se encontram presentes no ambiente humano.
24
Para Vygotsky, a aprendizagem é o motor do desenvolvimento.
Considerando-se que o sócio-histórico é um componente fundamental do
desenvolvimento psicológico, o caminho do desenvolvimento do indivíduo não se dá
independentemente da cultura. Assim, o caminho da trajetória que o indivíduo faz,
desde recém-nascido até se tornar um ser humano adulto, passa pela aprendizagem,
isto é, a transformação do sujeito que ocorre pela sua interação com o meio. Esse
meio, mesmo quando é físico, é carregado de informações de natureza social. Nesse
contexto, o conceito de zona de desenvolvimento proximal, desenvolvido por
Vygotsky, torna-se essencial.
A zona de desenvolvimento proximal traduz-se na distância entre aquilo que
já foi conquistado, que se consolidou no desenvolvimento do indivíduo, e aquilo que
está por se consolidar. Nesse espaço, podemos enxergar as coisas “em semente”.
Denota desenvolvimento em processo, porque o interesse é focalizado no que está
por vir e não nas conquistas passadas do desenvolvimento. Podemos dizer, assim,
que estamos olhando os “brotos” do desenvolvimento, em vez dos seus “frutos”.
Vygotsky acreditava na importância da influência do educador e dos grupos
sociais como estimuladores do alcance do potencial ainda não atingido, mas em
processo de desenvolvimento. Para ele, a troca entre os indivíduos de diferentes
níveis de aprendizagem permitiria um enriquecimento de experiências capazes de
ajudar no desenvolvimento do conhecimento.
“Quando se demonstrou que a capacidade de crianças
com iguais níveis de desenvolvimento mental, para
aprender sob a orientação de um professor, variava
enormemente, tornou-se evidente que aquelas crianças
não tinham a mesma idade mental e que o curso
subseqüente de seu aprendizado seria obviamente,
diferente. Essa diferença ..., é o que chamamos de zona de
desenvolvimento proximal. Ela é a distância entre o nível
de desenvolvimento real, que se costuma determinar
25
através da solução independente de problemas, e o nível
de desenvolvimento potencial, determinado através da
solução de problemas sob a orientação de um adulto ou
em colaboração com companheiros mais capazes”.
(VYGOTSKY, 1991, p. 97)
A importância dada por Vygotsky às interações sociais leva-o a conceber o
ensino como responsável pelas modificações no desenvolvimento infantil. A partir da
criação de zonas de desenvolvimento proximal, o ensino desperta na criança vários
processos de desenvolvimento que não viriam à tona se ela estivesse elaborando
sozinha a realidade.
4.1 – A Importância da Linguagem
Vygotsky afirma que:
“a formação de conceitos é resultado de uma
atividade complexa, em que todas as funções intelectuais
básicas tomam parte. No entanto, o processo não pode ser
reduzido à atenção, à associação, à formação de imagens,
à inferência ou às tendências determinantes. Todas são
indispensáveis, porém insuficientes sem o uso do signo, ou
palavra, como meio pelo qual conduzimos as nossas
operações mentais, controlamos o seu curso e as
canalizamos em direção à solução do problema que
enfrentamos.” (VYGOTSKY, 1996, p.50)
É através da palavra que designamos os objetos, os representamos, mas
também abstraímos e generalizamos suas características. Quando imaginamos
qualquer palavra, pensamos é na sua imagem, no seu representamen.
26
Para compreendermos a perspectiva de Vygotsky sobre o desenvolvimento
dos conceitos, é necessário entender que o significado da palavra transforma-se ao
longo do desenvolvimento do sujeito; o significado da palavra evolui, posto que
integra novos sentidos, novas conotações.
Os sistemas de representação da realidade, sendo a linguagem o sistema
simbólico básico de todos os grupos humanos, são socialmente dados. Assim, o
grupo cultural no qual o indivíduo se desenvolve é quem lhe fornece formas de
perceber e organizar o real, formas essas que vão constituir-se nos instrumentos
psicológicos que servirão de mediação entre o indivíduo e o mundo.
A concepção da criança como sujeito social e a compreensão da importância
assumida pela linguagem na construção do conhecimento trazem para as práticas de
leitura e escrita uma implicação metodológica que reformula o poder conferido pela
escola à escrita, aproximando-a das experiências histórico-culturais, que se
materializam na linguagem, na oralidade.
Entender a escrita na sua aproximação com a oralidade é entendê-la como
prática interdiscursiva, o que equivale a afirmar que a construção da escrita é um
processo de interconstrução que se dá tendo como base a emergência coletiva dos
múltiplos significados assumidos pela escrita no âmbito das interações sociais.
A sala de aula, assim, deixa de ser o espaço onde sujeitos cognoscentes
interagem, objetivando o conhecimento e passa a ser o lugar no qual interlocutores
encontram-se para interpretar suas leituras e escritas.
A leitura dos gestos, dos desenhos, dos grafismos, a partir do momento em
que vão sendo compartilhadas na linguagem, na dialogia, vão criando zonas de
desenvolvimento proximal e vão ampliando a possibilidade do surgimento das
escritas.
27
Esta concepção da linguagem como fonte do conhecimento faz aflorar na
prática a noção de que a produção da escrita não alienada é aquela que se forma a
partir da consciência do escritor. Como, segundo Vygotsky, a consciência é formada
e transformada na interdiscursividade, é nesta que a escrita tem que ser produzida
para que se evite a alienação.
E se o foco do interesse é a palavra vivida, a produção do texto escrito requer
que a vida venha à tona, permitindo que a existência flua. Permitindo que a criança
exista plenamente nas leituras e escritas que produz, automaticamente se fará com
que a vida flua.
Ao ingressar na creche, a criança já se constitui como sujeito social imerso na
cultura, uma vez que já afeta os outros pelos gestos da mesma maneira que é afetado
pelos gestos destes outros.
Na pré-escola, através de brincadeiras, desenhos, modelagens, dramatizações,
entre outras atividades construídas na coletividade, a criança vai recriando
significados ou transformando a sua consciência sobre a realidade, pela análise
(embora inconsciente) dos múltiplos significados atribuídos pelos diferentes sujeitos
que com ela convivem ao mundo físico e social.
Já no ensino fundamental, ela passa a se apossar do caráter de mediador
cultural da escrita, transformando-a em manifestação de expressão da sua existência
histórico-social.
Assim como, do ponto de vista da psicologia cognitiva, a criança é o sujeito
do seu conhecimento, do ponto de vista da psicologia sociointeracionista ela é o
sujeito da cultura. Essa percepção de Vygotsky humaniza a criança, permitindo que
ela seja encarada como ser humano pleno.
28
Esta é a contribuição maior que a teoria vygotskyana pode trazer para as
práticas da leitura e escrita: mostrar para a escola a necessidade e a importância de
que seja permitido à criança se fazer presente no mundo, narrar-se.
4.2 – O uso dos Signos
Ao longo da evolução da espécie humana e do desenvolvimento de cada
indivíduo, ocorrem duas mudanças qualitativas fundamentais no uso dos signos. De
um lado, a utilização de marcas externas vai se transformar em processos internos de
mediação, mecanismo que é denominado por Vygotsky como processo de
internalização. De outro lado, vão se desenvolvendo sistemas simbólicos que
organizam os signos em estruturas complexas e articuladas.
Ao longo do processo de desenvolvimento, o indivíduo deixa de necessitar de
marcas externas e passa a utilizar signos internos, que constituem-se em
representações mentais que substituem os objetos do mundo real. Os signos
internalizados são elementos que representam, da mesma maneira que as marcas
exteriores, objetos, eventos e situações.
A idéia de que o homem é capaz de operar mentalmente sobre o mundo, ou
seja, estabelecer relações, planejar, comparar, lembrar, entre outros processos
estabelecidos pela mente, supõe um processo de representação mental. Isso significa
que os conteúdos mentais tomam o lugar dos objetos, das situações e dos eventos do
mundo real.
Essa capacidade de trabalhar com representações que substituem o próprio
real, possibilita ao homem libertar-se do espaço e do tempo presentes, estabelecer
relações mentais na ausência das próprias coisas, imaginar, fazer planos e ter
intenções. Essas possibilidades de operações mentais não se constituem numa relação
direta com o mundo real fisicamente presente; a relação sofre a mediação dos signos
29
internalizados que representam os elementos do mundo, libertando o homem da
necessidade de interação concreta com os objetos de seu pensamento.
Ao trabalharmos com os processos superiores que caracterizam o
funcionamento psicológico tipicamente humano, as representações mentais da
realidade exterior constituem-se nos principais mediadores a serem levados em
consideração na relação do homem com o mundo. e é justamente a origem dessas
representações que Vygotsky está buscando quando se refere à criação e ao uso de
instrumentos e de signos externos como mediadores da atividade humana.
4.3 – A Formação do Conceito para Vygotsky
Segundo a teoria de Vygotsky, há dois tipos de conceitos: os “cotidianos” e
os “científicos”. Por conceitos cotidianos ele compreendia aqueles que vão sendo
formulados pela criança, durante seu processo de desenvolvimento, na medida em
vai se utilizando da linguagem para nomear objetos e fatos pertinentes a sua vida
cotidiana.
Como conceitos científicos, Vygotsky considerou aqueles que vão sendo
formados a partir da aprendizagem sistematizada e, portanto, a partir do momento em
que a criança entra em contato com o trabalho escolar. Os conceitos científicos são
todos aqueles que derivam de um corpo articulado de conhecimento e que aparecem
nas propostas curriculares, como fundamentais na organização de conteúdos a serem
trabalhados com os alunos.
Geralmente, as crianças formulam os conceitos cotidianos, mas não
conseguem defini-los por meio de palavras, a não ser numa fase mais adiantada de
sua vida. Uma criança pode utilizar vários conceitos em sua vida, mas se lhe
perguntarmos a sua definição sobre eles, ela não chegará a defini-los. Na maioria das
vezes, ela responderá de acordo com seu caráter funcional. Se perguntarmos, por
30
exemplo: “O que é uma televisão?”, ela responderá que serve para ver desenhos. Ela
poderá também responder a partir de dados de sua experiência: “Na minha casa tem
duas televisões.”
Com os conceitos científicos, o processo de formação ocorre de maneira
inversa. Ao iniciar seu aprendizado na escola, auxiliada pelas explicações e
colaborações de seus professores, o aluno chega à definição dos conceitos científicos,
mas a apropriação destes conceitos só ocorre a partir das atividades escolares.
Vygotsky afirma de maneira clara, em relação à aprendizagem, que o único
ensino que é bom corresponde àquele que se adianta ao desenvolvimento. Em busca
da compreensão do desenvolvimento das situações de ensino-aprendizagem, estamos
sempre olhando para o futuro, para aquilo que está por vir. Vygotsky considera que o
interessante é captar esse momento de transição, que é justamente a zona de
desenvolvimento proximal. Assim, a idéia de um bom ensino como aquele que se
adianta ao desenvolvimento passa necessariamente pela questão da qualidade do
ensino. Cabe ressaltar ainda que aquilo que é bom para a situação de ensino-
aprendizagem não pode ser definido por um objeto externo e válido para todos, mas
depende do sujeito do processo em questão. Só levando-se em conta esse processo é
que se pode definir de maneira adequada o caminho a ser trilhado, desejável para que
haja a aprendizagem. E o que é adequado, desejável, é aquilo que se adianta ao
desenvolvimento, levando o indivíduo para frente.
Na verdade, nisto consiste o verdadeiro papel da escola: fazer com que o
aluno aprenda de forma satisfatória, desenvolvendo-se de maneira integral.
31
CAPÍTULO V
APLICAÇÕES EM SALA DE AULA
A escola, para Vygotsky, representa o elemento imprescindível para a
realização plena dos sujeitos que vivem em uma sociedade letrada, já que é neste
contexto que as crianças são desafiadas a entender as bases dos sistemas de
concepções científicas e a tomar consciência de seus próprios processo mentais.
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O ambiente de sala de aula, principalmente em nossa área, a Língua
Portuguesa, constitui-se em campo fecundo onde se pode tirar proveito da
abordagem sócio-inrteracionista de Vygotsky.
Esta abordagem serve como embasamento teórico para que possamos, nas
diferentes situações que envolvem a produção da língua escrita, analisar seus
processos constituintes e não apenas o objeto concreto representado pelo resultado
final desta produção.
Uma das contribuições de Vygotsky que mais nos despertou o interesse por
sua aplicabilidade em sala de aula é a idéia de zona de desenvolvimento proximal.
Isto porque ela permite-nos entender que o aluno que não foi capaz de cumprir os
objetivos por nós propostos pode vir a fazê-lo, a partir do momento que consigamos
trabalhar suas potencialidades, ou seja, aquilo que existe nele ainda em processo.
À luz da teoria vygotskyana, torna-se mais fácil também entender a dinâmica
de sala de aula, uma vez que já se compreende que os indivíduos que ali estão,
nossos educandos, são sistemas complexos e dinâmicos, em processo de constante
desenvolvimento e transformação, processo este que se dá através da sua interação
com a cultura, com a sociedade e com os outros educandos.
Compreendendo esta permanente interação do indivíduo com o meio, pode-se
entender melhor que um dos principais papéis que cabe a nós, educadores, é o de
proporcionar a estes educandos, além de uma maior internalização das formas
culturais da sociedade da qual participam, ferramentas para que passem a ter poder
de renovação e transformação consciente desta mesma sociedade.
Também nos é de grande valia o fato de saber que esses indivíduos não se
encontram prontos, na hora de planejar uma aula ou uma avaliação. De posse desse
conhecimento, nossa visão se amplia e a sala de aula passa a ser uma troca constante
de experiências entre indivíduos sociais.
33
Naturalmente, isto não significa que o nosso trabalho perca a importância,
pelo contrário, seremos nós que iremos orientar essa troca de experiências, intervindo
quando necessário e delas nos servindo como ganchos que nos levem a atingir
melhor os nossos objetivos.
Dentro de uma perspectiva esboçada por Vygotsky, o aprendizado é um
aspecto imprescindível no desenvolvimento das características psicológicas do ser
humano, já que as conquistas individuais resultam de um processo compartilhado
com pessoas e outros elementos da cultura, onde as experiências educativas se
revestem de grande importância.
Assim, informações, conceitos e significados serão internalizadas pelos
educandos de modo a se constituírem em ferramentas que lhes possibilitem participar
ativamente no desenvolvimento histórico de sua sociedade, tornado-se também
independentes dentro dessa sociedade, através do pleno desenvolvimento das suas
funções psicológicas superiores, tais como o controle consciente de seu
comportamento, a capacidade de planejamento e previsões, atenção e memória
voluntária, pensamento abstrato, raciocínio dedutivo, imaginação, entre outros.
Embora a formação dessas características não se dê única e exclusivamente
pela interferência exercida por nós, educadores, nossa atuação como mediadores
dentro de sala de aula é fundamental nesses processos de formação dos
conhecimentos, .habilidades de raciocínio e procedimentos comportamentais.
34
CONCLUSÃO
Apesar de formuladas há mais de sessenta anos, as teses postuladas por
Vygotsky constituem-se em fonte extremamente contemporânea de estudos, uma vez
que Vygotsky não só defende a interação do indivíduo com o meio, muito em voga
nos dias de hoje, mas também procura perceber como se dá esse processo de
influências bidirecional. Esta consistiria, assim, em uma das principais razões para
justificar o grande interesse despertado por seus trabalhos entre estudiosos de várias
áreas do conhecimento, inclusive da Pedagogia.
Para Vygotsky, o desenvolvimento individual não se constituiria tão somente
no resultado de uma faculdade ou capacidade pré-existente (determinada por razões
biológicas ou até mesmo divinas) no sujeito nem dá-se de uma forma independente
do desenvolvimento histórico e das formas sociais da vida humana.
O aprendizado é essencial para o desenvolvimento do ser humano e se dá
sobretudo pela interação social. De acordo com Vygotsky, o desenvolvimento e o
aprendizado estão intimamente ligados, uma vez que só nos desenvolvemos se e
quando aprendemos. Além disso, o desenvolvimento não depende apenas da
maturação: apesar de ter potencial para andar ereto, articular sons, adquirir modos de
pensar baseados em conceitos, a maneira como vai efetuar todas essas coisas vai
resultar dos aprendizados que tiver ao longo da vida dentro do seu grupo social.
Assim, apesar de ter condições biológicas, uma criança só falará se estiver inserida
uma comunidade de falantes e só será alfabetizada se pertencer a uma sociedade que
é letrada.
O indivíduo, assim, não nasce pronto nem se constitui em um cópia do
ambiente externo. Sua evolução intelectual se dá por meio de uma interação
constante e ininterrupta entre processos internos e influências do mundo social.
35
Embora o desenvolvimento seja entendido por Vygotsky como fruto de uma
grande influência das experiências que o indivíduo adquire, cada um desses
indivíduos dá seu próprio significado a essas vivências.
Neste paradigma, a cultura se consistiria em parte da natureza humana, visto
que a formação das características psicológicas individuais seria determinada a partir
da internalização de modos e atividades psíquicas determinados pela história e
organizados pela cultura vigente no momento histórico a que pertence este indivíduo.
Este, além de internalizar o repertório social, vai intervindo e modificando seu meio,
sendo capaz até de renovar a própria cultura.
A idéia de que quanto maior for o aprendizado maior será o desenvolvimento
pode gerar alguns erros de interpretação e levar-nos à tentação de administrar
conteúdos enciclopédicos, na tentativa de aumentar o desenvolvimento dos alunos.
Mas isso de nada adiantaria, já que, para que sejam assimiladas, as informações
devem fazer sentido para o indivíduo. Isso ocorre quando elas incidem sobre o que
Vygotsky denominou zona de desenvolvimento proximal, que consistiria na distância
entre aquilo que a criança consegue realizar sozinha – desenvolvimento real – e o
que pode vir a realizar com ajuda de alguém mais experiente – desenvolvimento
potencial. Assim, o que hoje é zona de desenvolvimento pode vir a ser amanhã nível
de desenvolvimento real.
O bom ensino seria, por conseguinte, aquele que incide na zona de
desenvolvimento proximal. Ensinar aquilo que a criança já sabe desestimula, é pouco
desafiador e ultrapassar o que ela pode aprender não surte efeito. Deve-se partir do
que ela domina para ampliar seu conhecimento.
O estudo da obra de Vygotsky , apesar de preconizar a Educação em seu
sentido amplo, deixa entrever, por várias vezes a atenção especial que dedica à
educação escolar. A escola seria, para ele, o elemento imprescindível para a plena
realização dos sujeitos pertencentes a uma sociedade letrada. Nela, as crianças
deveriam ser desafiadas a entender concepções científicas e tomar consciência de
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seus próprios processos mentais, possibilitando assim novas formas de pensamento,
comportamento, inserção e atuação no meio.
Ao chamar a atenção para o fato de que, nos processos de formação dos
conhecimentos, habilidades de raciocínio e procedimentos comportamentais, o
indivíduo conta com o papel mediador exercido por pessoas mais experientes que do
ele no grupo social, Vygotsky deixa espaço para uma atuação mais ampla e positiva
do professor, cujo papel não pode mais ser o de simples transmissor de
conhecimentos e sim o de mediador entre os indivíduos a ele confiados e a cultura.
37
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Ícone/Edusp, 1988
_______________. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTOS 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUCAÇÃO 7
CAPÍTULO I 9
Vygotsky: Biografia e Contextualização
CAPÍTULO II 13
Os Pressupostos Básicos Da Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky
2.1 – A Linguagem 14
CAPÍTULO III 16
Contribuições de Vygotsky
CAPÍTULO IV 23
O Processo de Formação dos Conceitos
4.1 – A Importância da Linguagem 25
4.2 – O uso dos Signos 28
4.3 – A Formação do Conceito para Vygotsky 29
CAPÍTULO V 32
Aplicações em Sala de Aula
CONCLUSÃO 34
BIBLIOGRAFIA 37