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Universidade Católica de Brasília PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU EM DIREITOS HUMANOS: Assistência e Proteção às vítimas e colaboradores da justiça. ESPECIALIZAÇÃO MECANISMO DE DEMOCRATIZAÇÃO: A IMPORTÂNCIA DOS ÓRGÃOS INTEGRANTES DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E TESTEMUNHAS AMEAÇADAS PARA O AVANÇO DA POLÍTICA DE PROTEÇÃO NO CENÁRIO NACIONAL. AUTORA: MANOELA POLIANA ELEUTÉRIO DE SOUZA ORIENTADORA: KARINA APARECIDA FIGUEIREDO Brasília 2009

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Universidade Católica de Brasília

PRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO LATU SENSU EM DIREITOS HUMANOS: Assistência e Proteção às vítimas e colaboradores da justiça.

ESPECIALIZAÇÃO MECANISMO DE DEMOCRATIZAÇÃO: A IMPORTÂNCIA DOS ÓRGÃOS INTEGRANTES DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E TESTEMUNHAS AMEAÇADAS PARA O AVANÇO DA POLÍTICA DE PROTEÇÃO NO CENÁRIO NACIONAL.

AUTORA: MANOELA POLIANA ELEUTÉRIO DE SOUZA

ORIENTADORA: KARINA APARECIDA FIGUEIREDO

Brasília 2009

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MANOELA POLIANA ELEUTÉRIO DE SOUZA

MECANISMO DE DEMOCRATIZAÇÃO: A IMPORTÂNCIA DOS ÓRGÃOS INTEGRANTES DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E TESTEMUNHAS AMEAÇADAS PARA O AVANÇO DA POLÍTICA DE PROTEÇÃO NO CENÁRIO NACIONAL.

Monografia apresentada ao Programa de Pós-graduação Latu Sensu em Direitos Humanos da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Certificado de Especialista em Direitos Humanos: Assistência e Proteção às vítimas e colaboradores da Justiça. Orientadora: Karina Aparecida Figueiredo.

Brasília 2009

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A Deus pela sua infinita companhia e bondade. Ao amigo e Coordenador Eduardo Paysan Gomes, por todo incentivo e, aos demais integrantes da Equipe Técnica da Central Nacional/PROVITA pelos ensinamentos.

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RESUMO

Referência: SOUZA, Manoela Poliana. MECANISMO DE DEMOCRATIZAÇÃO: A IMPORTÂNCIA DOS ÓRGÃOS INTEGRANTES DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E TESTEMUNHAS AMEAÇADAS PARA O AVANÇO DA POLÍTICA DE PROTEÇÃO NO CENÁRIO NACIONAL. 42 folhas. Direitos Humanos – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2009.

O presente trabalho versa sobre a importância dos órgãos que integram o Conselho Deliberativo Federal, no sentido de demonstrar o quão importante é no cenário nacional à promoção de avanços para a política de proteção, assim como o comprometimento dos participantes do Conselho no aprimoramento das demandas rotineiras dos usuários, propondo uma reflexão de como vem sendo a participação dos Conselheiros federais e sua efetividade, bem como os pontos que merecem destaque para a adequação das carências do Programa Federal. Neste sentido, realizou-se um estudo conjugado, trazendo-se à baila as pretensões articuladas na Lei de Proteção e no Decreto regulamentador do Programa Federal. Desta forma, o presente trabalho objetiva, por meio de dados empíricos retratar a realidade do Conselho Federal, bem como demonstrar a importância e o significado da atuação comprometida de seus membros para a implementação da política proteção em espaços políticos legítimos, visando proporcionar ampliação da rede social, no intuito de promover em grandes números a tão almejada reinserção social. Diante disso, pretende-se ao final demonstrar a necessidade de mudanças na dinâmica do Conselho Federal, visando buscar do mesmo articulação com as demais políticas públicas e, ainda, estruturação interna para a promoção dos direitos defendidos pela política de proteção.

PALAVRAS – CHAVE:

Conselho Testemunhas Política

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ABSTRACT

Reference: SOUZA, Manoela Poliana. MECHANISM OF DEMOCRACY: THE IMPORTANCE OF THE GOVERNING COUNCIL MEMBERS OF THE FEDERAL DELIBERATIVO PROTECTION TO VICTIMS AND WITNESSES THREATENED FOR THE ADVANCEMENT OF THE PROTECTION OF THE NATIONAL SCENE. 42 pages. Human Rights - Catholic University of Brasilia, Brasilia, 2009.

This paper discusses the importance of the organs of the Federal Advisory Board, to demonstrate how important it's in the national promotion of improvements to the policy of protection, as well as the commitment of the participants of the Council on improving the routine demands users by offering a reflection of how it has been the participation of federal advisers and their effectiveness, and points that deserve emphasis on the adequacy of the shortcomings of the Federal Program. In this sense, there was a study in conjunction, bringing to the fore the aspirations articulated in the Protection Act and Decree Federal regulatory program. Thus, this paper aims, by means of empirical data to document the reality of the Federal Council, and to demonstrate the significance of the performance of its members committed to the implementation of protection policy in political interests, aiming to provide expansion of the social in order to promote large numbers in the wishful social reintegration. Given this, we want at the end demonstrate the need for changes in the dynamics of the Federal Council, in order to get the same connection with other public policies, and also internal structure for the promotion of the rights protected by the policy of protection.

Keywords Counsel Witnesses Politics

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SIGLAS

CGPT - Coordenação Geral de Proteção a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas.

GAJOP - Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares.

PPCAAM – Programa de Proteção a Criança e Adolescente Ameaçados de Morte.

PPDDH – Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos.

PROVITA – Programa de Proteção a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas.

SPDE - Serviço de Proteção ao Depoente Especial.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO................................................................................................................... 7 1 FORMAÇÃO HISTÓRICA E CRIAÇÃO DOS CONSELHOS DE DIREITO PARA A GESTAO DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL...................................

10

1.1 A ECLOSÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAS E DA PARTICIPAÇÃO POPULAR NA DÉCADA DE 80...........................................................................................................

10

1.2 O RECONHECIMENTO DA SOCIEDADE CIVIL COMO PROTAGONISTA DE POLÍTICAS PÚBLICAS.....................................................................................................

12

1.3 A IMPORTÂNCIA DA CRIAÇÃO E INCORPORAÇÃO DE CONSELHOS PARA A GESTÃO DEMOCRÁTICA DE POLÍTICAS PÚBLICAS...............................

14

2 INCORPORAÇÃO E LEGALIZAÇÃO DO PROVITA NO ORDENAMENTO JURIDICO BRASILEIRO - LEI FEDERAL N.º 9.807 DE 1990.................................

15

2.1 ORIGEM DO PROVITA NO BRASIL........................................................................ 152.2. CARACTERÍSTICAS INTRÍNSECAS DA LEI DE PROTEÇÃO............................ 172.3 DO CONSELHO DELIBERATIVO............................................................................. 192.4 BREVE EXPOSIÇÃO DOS CONSELHOS ESTADUAIS DOS PROGRAMAS DE PROTEÇÃO DA FEDERAÇÃO........................................................................................

21

2.5 A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NA EXECUÇÃO DOS PROGRAMAS DE PROTEÇÃO NO BRASIL..................................................................

23

3 REGULAMENTO DO PROGRAMA FEDERAL E SEU CONSELHO DELIBERATIVO - DECRETO LEI N.º 3.518, DE 20 DE JUNHO DE 2000.............

27

3.1 DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO.......................................................... 273.1.1 Funcionamento do Programa Federal. Atuação da Equipe Técnica, da Coordenação Geral de Proteção e do Serviço de Proteção ao Depoente Especial.......

28

3.1.2 A importância de manifestação do Órgão Acusatória antes da avaliação do caso pelo Conselho Deliberativo do Programa Federal.................................................

29

3.2 FORMATAÇÃO DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL...........................................................................................................................

30

3.2.1 A importância de efetiva atuação dos integrantes do Conselho Deliberativo..... 334 DESAFIOS E PROPOSIÇÕES PARA UM FUNCIONAMENTO MAIS EFICAZ DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL...........................

35

4.1 ATRIBUIÇÕES DO ESTADO E DA SOCIEDADE CIVIL NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA FEDERAL....................................................................................................

35

4.2 ENTRAVES NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA FEDERAL E NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO CONSELHO DELIBERATIVO.......................................

35

4.3 PROPOSIÇÕES PARA MAIOR EFICACIA DA POLITICA DE PROTEÇÃO NO AMBITO FEDERAL...........................................................................................................

37

4.3.1 Regimento interno.................................................................................................... 374.3.2 Composição paritária............................................................................................... 384.3.3 Papel político do Conselho na articulação para abrangência da política de proteção nas demais políticas públicas............................................................................

39

Considerações finais............................................................................................................ 41Referências........................................................................................................................... 42

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho pretende demonstrar a importância da atuação conjunta dos órgãos

que integram o Conselho Deliberativo do Programa Federal de Proteção a Vítimas e a

Testemunhas Ameaçadas, no intuito de garantir a eficácia no acompanhamento dos casos,

assim como na reinserção dos usuários atendidos pela política pública de proteção.

A motivação para construção do presente, baseia-se na necessidade de demonstrar a

importância e o significado da atuação comprometida do Conselho para o avanço e

aprimoramento da política de proteção, assim como sua implementação em espaços políticos

legítimos, que viabilizem a ampliação da rede social, construída para propiciar a reinserção

social das pessoas atendidas pela mesma.

Como sabido, a Lei Federal n.° 9.807, de 13 de julho de 1999 – Lei de Proteção a

Vítimas e Testemunhas, dispõe que no seu artigo 6.° que cada Programa será dirigido por um

Conselho Deliberativo, em cuja composição haverá representantes do Ministério Público, do

Poder Judiciário e de órgãos públicos e privados relacionados com a segurança pública e a

defesa dos direitos humanos.

Cumpre registrar, que, como existe um Conselho Federal e 17 (dezessete) Conselhos

Estaduais mais o Distrito Federal, de modo que no presente trabalho será feita uma análise

mais profunda da composição, atuação e efetividade do Conselho Federal, ao passo que, com

relação aos Conselhos Estaduais, os mesmos serão apresentados, todavia de forma sintética,

visando possibilitar ao leitor, tecer comparações entre o Conselho Federal e um Estadual,

assim como comparações entre os Conselhos Estaduais, considerando que a composição dos

Conselhos varia de Estado para Estado, de acordo ao que aduz cada Lei de Proteção Estadual.

O referido tema tem sido alvo de muitos debates e estudos, em face das dificuldades

enfrentadas, diante da ausência de comprometimento e participação de alguns órgãos nas

reuniões deliberativas. Isto porque, existem algumas competências definidas, que cabe aos

Conselheiros deliberar, de modo que a Equipe Técnica, precisa aguardar qual decisão será

dada para a demanda ser encaminhada, caso esta não seja analisada a Equipe precisa aguardar

nova reunião do Conselho para que o mesmo possa deliberar. Ressalve-se que é papel da

Equipe Técnica problematizar as questões, não ficando apenas, no campo passivo esperando

deliberações, de forma que em casos de urgência pode ser solicitado pela Equipe uma reunião

extraordinária.

Todos os desdobramentos do aludido tema, bem como suas nuances e perspectivas,

serão verificados a partir do estudo conjugado de construções doutrinárias e dados empíricos

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do Conselho Deliberativo do Programa Federal, assim como da conjuntura e características

comuns dos Conselhos Estaduais que integram a rede PROVITA - Programa de Proteção a

Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas.

O objetivo deste trabalho consiste justamente em demonstrar como deveria se dar a

participação dos órgãos propostos pela Lei Federal para participarem do Conselho

Deliberativo, além de expor as dificuldades e os entraves encontrados no decorrer dos

acompanhamentos dos casos acompanhados pela Equipe Técnica do Programa Federal.

Nesse diapasão, inicialmente, será realizado um histórico do fortalecimento e

adaptação dos Conselhos de Direitos no Brasil, explanando informações da década de 80 até a

Constituição Federal de 1988.

Posteriormente, serão analisados os dispositivos elencados na Lei de Proteção, além de

conceitos referentes a formatação, atribuições e competências do Conselho Federal, assim

como a importância da participação do Ministério Público, dentre outros elementos tratados

na citada lei e, que serão abordados no presente.

Na sequência, será registrado um panorama da composição do Conselho Federal e,

ainda, como dito acima, a estrutura dos Conselhos Estaduais, explicando o funcionamento da

rede de proteção, ou seja, relação do Programa Federal com o Estadual, ponderando inclusive,

que não há relação entre o Conselho Federal com os Estaduais, uma vez que estes últimos são

autônomos, de modo que ao Conselho Federal só cabe a análise e acompanhamento dos casos

Federais.

Por último, serão sintetizados no último capítulo alguns desafios e proposições para

maior efetividade das decisões do Conselho Federal, assim como adequação do mesmo às

mudanças sociais e às necessidades atuais dos usuários atendidos pela política de proteção.

Na conclusão, estarão elencados todos os pontos e pensamentos expostos sobre a

matéria, destacando-se, ao final, as conclusões decorrentes da análise do tema, referentes à

necessidade de maior atuação dos órgãos que integram o Conselho Federal, no sentido de

extrair dos mesmos toda possibilidade de articulação que podem promover via as instituições

que representam. Posto que assim, teríamos avanço e maior consolidação do Programa como

um todo, considerando que o principal objetivo da política é garantir a integridade física e

psíquica, somado a reinserção social dos usuários, objetivo que só se alcança com adaptação e

modernização das estratégias de segurança, bem como com fortificação da rede solidária e

articulação com outras políticas públicas, tais como, saúde, educação, dentre outras.

Cabe salientar, que no presente estudo foi priorizado uma análise qualitativa por meio

de pesquisa bibliografia, assim como exposição de dados empíricos, a partir do conhecimento

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técnico da dinâmica do Programa de Proteção, bem como do funcionamento do Conselho

Deliberativo Federal.

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1 FORMAÇÃO HISTÓRICA E CRIAÇÃO DOS CONSELHOS DE DIREITO PARA A GESTAO DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL 1.1 A ECLOSÃO DOS MOVIMENTOS SOCIAS E DA PARTICIPAÇÃO POPULAR NA DÉCADA DE 80

Considerando todo investimento da sociedade na conquista por espaços públicos de

relevância na tomada de decisões, que refletiriam impactos no cotidiano social, faz-se

necessário, explanar, brevemente, o contexto histórico de transformação, ocorrido em meados

da década de 80 com a superação do regime ditatorial até o estabelecimento de políticas

públicas globais.

Após a forte influência do regime ditatorial, com a concentração do poder de decisões

nas mãos do Estado, assim como ausência de regras estáveis que regesse a vida em sociedade,

surgiu a possibilidade de inserção social nas questões políticas e da participação popular nos

atos decisórios.

Foi na década de 80 que o Brasil conseguiu quebrar os laços formados no período

ditatorial, proporcionando o nascimento de um novo processo histórico, pautado na

revitalização da sociedade civil, por meio da democratização dos mecanismos utilizados pelo

Estado. Nesse sentido, com as conquistas democráticas, houve ascensão e sedimentação dos

movimentos sociais, bem como fortalecimento dos sindicatos, visibilidade das demandas

populares e aspirações por uma sociedade mais justa e igualitária.

Ressalve-se, que com a luta por novas idéias, considerando a já existente Declaração

Universal dos Direitos do Homem, datada de 10 de dezembro de 1948, apenas na década de

70, em pleno período militar, houve resistência para se implementar os Direitos Humanos no

país, assim como no âmbito internacional, onde passou-se a cobrar os ideários de uma nova

fase, tais conhecidos por liberdade, igualdade, não descriminação e fraternidade, princípios

antes esculpidos na citada Declaração e de grande valia para o estabelecimento de uma nova

concepção de garantia de direitos fundamentais para todos, independente de raça, cor,

religião, nacionalidade e outras.

No tocante a Declaração Universal, cabe colacionar trecho do autor HIDAKA, acerca

de uma reflexão do peso político e democrático existente da citada declaração:

...a Declaração Universal busca acabar com as discussões sobre a amplitude dos direitos por ela consagrados, proclamado na quase totalidade de seus artigos a universalidade dos direitos ali mencionados, uma vez que direciona a “todos” ou a “todas as pessoas”. Pode-se concluir, portanto, que os direitos elencados no texto da Declaração Universal têm como titulares todas as pessoas, independentemente de nacionalidade, cor, raça, sexo, religião ou regime político ao qual estão

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subordinadas. Isto porque os direitos humanos derivam da dignidade da pessoa humana, e não de peculiaridades sociais, culturais de uma determinada sociedade.1

Com o advento da Constituição Federal de 1988, a qual superou velhos paradigmas e

estabeleceu uma nova ordem jurídica no país, com a valorização do ser humano, enquanto

sujeito político e de direitos, inseriu todos os cidadãos, na construção de um Estado

Democrático de Direito, criando e estruturando um novo sistema de garantias de direitos

fundamentais e implementando expressamente diversas possibilidades da participação popular

nos atos decisórios do Estado.

Mesmo estando o país fortificado pelo novo contexto jurídico, dado aos procedimentos

legais antes estabelecidos, árduo foi o caminho percorrido pelos mais variados movimentos

sociais para se inserirem como pleiteadores de direitos dos cidadãos, posto que não foi fácil

formatar um novo modelo de Estado, após tantos anos de concentração do poder apenas para

o Estado.

Cumpre destacar, que nessa mesma época, a redescoberta da sociedade civil, somou-se

às experiências democratizadoras da década de 80. A dificuldade, todavia, consistia, no

aumento da exclusão social, acarretada pelo desenvolvimento do capitalista globalizado.

Nesse sentido, cumpre colacionar a avaliação abordada por RAICHELIS, vejamos:

Ao analisar as relações entre os ajustes neoliberais, a pobreza e a cidadania democrática declara que a década de 80 desencadeou um duplo movimento: por outro lado, uma supersticiosa exaltação do mercado, fechando os olhos para os resultados catastróficos que seu funcionamento autônomo havia produzido no passado[...] e absolvendo-se piedosamente de suas culpas. Por outro, uma recíproca satanização do Estado como causador de todas as desgraças e infortúnios que, de diferentes maneiras, afetaram as sociedades capitalistas.2

Pode-se dizer que a Magna Carta de 1988 trouxe em seu texto um processo de

democratização, que ensejou na inserção de novos sujeitos no cenário político com a

finalidade de conquistar novas políticas públicas. Houve ainda, fortalecimento da sociedade

civil de modo que esta ganhou maior visibilidade e legitimidade para definir novos

instrumentos democráticos de participação política, que permearam, por sua vez, no

acréscimo da democracia representativa e dos processos de participação social e política.

Cabe destacar outro acontecimento, que merece destaque na implementação e

consolidação de uma política voltada para o diálogo e participação popular, o qual se deu na II

1 HIDAKA, Leonardo Jun Ferreira. Introdução ao Direito Internacional dos Direitos Humanos. Manual de Direitos Humanos Internacionais. Acesso aos sistemas global e regional dos Direitos Humanos. São Paulo: Loyola, 2002, p. 27 e 28. 2 BÓRON apud RAICHELIS, Raquel. Esfera Pública e Conselhos de Assistência Social:caminhos da construção democrática. São Paulo: Cortez, 1998, pág. 72 e 73.

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Conferência Mundial de Direitos Humanos, realizada em 1993, Viena – Áustria, tendo em

vista a mesma ser considerada decisiva na construção de uma cultura universal dos direitos

humanos, sendo gancho para outras políticas que estavam em formação no Brasil.

Observa-se assim, que até chegarmos ao modelo exposto na Constituição de 1988, o

Brasil passou por diversos momentos históricos, onde em cada qual pesava um sentimento

social, um clamor público por uma causa, por uma conquista, fatos estes que somados

construíram em cada época uma representação social.

Nesse sentido, com a valorização da participação popular, o Estado passou a repartir

sua responsabilidade, por meio de parcerias com as organizações não-governamentais,

proporcionando assim a democratização social e política das temáticas e demandas antes

discutias só com a participação estatal.

Insta destacar, parte da obra de TEIXEIRA:

Os conselhos funcionam como mecanismos viabilizadores da descentralização administrativa – outra bandeira levantada no Brasil, no anos de 1980, ao lado da redemocratização. Foram instituídos verticalmente, como uma imposição desde o governo federal até os municípios, com aquele condicionando o repasse de recursos à instituição formal dos conselhos.3

Assim, com a utilização de novos mecanismos, como os Conselhos de Direitos, foram

criados espaços para se discutir políticas públicas, com a existência de debates públicos,

interlocução e negociações entre atores sociais e políticos.

1.2 O RECONHECIMENTO DA SOCIEDADE CIVIL COMO PROTAGONISTA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Ao longo dos últimos anos a sociedade civil tem ampliado e qualificado a sua

capacidade de intervenção na luta pela implementação de políticas públicas de direitos, na

democratização do país.

Diante de um novo cenário, com a inserção das conquistas alcançadas pelos

movimentos sociais ao longo da história, foram implementadas novas formas de garantir os

direitos da população, a exemplo, pode-se citar a possibilidade de iniciativa popular prevista

na Constituição de 1988.

As modificações na relação entre Estado e sociedade, oportunizaram a efetivação da

democracia participativa com a inserção dos atores sociais nas lutas antes eminentementes

políticas. Desse modo, a participação da sociedade civil na esfera pública tornou-se elemento

3 TEIXEIRA, Elenaldo Celso (coordenador). Sociedade Civil na Bahia. Papel político das organizações. Salvador, EDUFBA, 2008, p. 120.

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fundamental para a democratização das esferas governamentais. Nestes termos, cabe expor, a

proposição feita por HABERMAS, ao afirmar a importância da institucionalização de direitos

para o funcionamento da sociedade civil:

Por estar apoiada em direitos fundamentais esta esfera fornece as primeiras referências acerca de sua estrutura social. A liberdade de opinião e de reunião, bem como o direito de fundar sociedades e associações, definem o espaço para as associações livres que interferem na formação da opinião pública, tratam de temas de interesse geral, representam interesses de grupos de difícil organização, perseguem fins culturais, religiosos ou humanitários, formam comunidade confessionais. 4

O antigo entendimento de que a sociedade civil seria a esfera privada e, o Estado a

esfera pública, restou superada, por não mais existir a separação entre sociedade e poder.

Nesse sentido, aduz, RAICHELIS o seguinte:

Conforma-se uma esfera pública como espaço de luta social para onde convergem distintos e antagônicos interesses, revelando a insuficiência da esfera privada para tramitar e processar novas relações sociais que, por essa razão metamorfoseada em esfera pública.5

Sob este prisma nasceu o Programa de Proteção, sendo o mesmo oriundo de

proposições feitas pela sociedade civil, na perspectiva de reafirmação dos Direitos Humanos e

de enfrentamento da impunidade, de forma que houve reconhecimento por parte do Estado de

seus limites para executar a política pública de proteção.

A sociedade civil por sua vez, assumiu o papel de gerenciar e operacionalizar o

Programa de Proteção a Testemunha no Brasil, compartilhando, todavia, a responsabilidade

da gestão com o Estado. Simplesmente, pelo fato de ser este o responsável constitucional de

garantir a integridade física e psicológica dos seus cidadãos, inclusive dos ameaçados por

serem testemunhas ou vítimas em procedimentos judiciais, na grande maioria criminais.

Assim, tendo em consideração a construção democrática da democracia participativa,

a sociedade civil, a partir do momento que é reconhecida pelo Estado, como capaz de criar e

implementar políticas públicas, passa a executar programas com a proposta de afirmação dos

direitos fundamentais, inerentes a toda população.

É com a luta pelos Direitos Humanos, por políticas públicas de direitos e por um

Estado comprometido, que a sociedade civil pode ser tida como protagonista na construção

4 HABERMAS. Jurgen. Direito e Democracia: entre factividade e a validade. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro. 1997, p. 101. 5BÓRON apud RAICHELIS, Raquel. Esfera Pública e Conselhos de Assistência Social: caminhos da construção democrática. São Paulo: Cortez, 1998, p. 81

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das políticas públicas, não sendo apenas mera executora de serviços terceirizados que o

Estado não queira realizar ou delegue para a sociedade civil.

1.3 A IMPORTÂNCIA DA CRIAÇÃO E INCORPORAÇÃO DE CONSELHOS PARA A GESTÃO DEMOCRÁTICA DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Como poderá ser observado ao longo do presente trabalho, por meio de um estudo

aprofundado do Conselho Federal do Programa Federal, afirma-se a importância da

organização do mesmo para a incorporação de novos parâmetros teóricos, técnicos e políticos

no trato com as políticas públicas executadas.

Assim, pode-se dizer que é por meio da criação dos conselhos que se viabiliza a

publicidade das decisões e encaminhamentos a serem dados para as demandas avaliadas, de

modo que será demonstrada nos tópicos seguintes a potencialidade que pode ter um conselho

para proporcionar avanço na gestão democrática de políticas públicas.

Todavia, cabe avaliar que os conselhos não podem atuar por si só, pois para sua maior

efetividade, o mesmo precisa atuar coletivamente com outras forças políticas para alcançar os

objetivos almejados.

Desta forma, a criação dos conselhos, para assessorar as políticas sociais, demonstra

uma conquista da sociedade civil organizada, pelo fato da mesma atualmente, ser participante

deste espaço democrático, consoante estabelecem várias leis, ao elencarem o rol de

participantes dos mais variados tipos de conselhos, seja da criança e do adolescente, idoso,

questões de gênero ou mesmo no de proteção às vítimas e testemunhas ameaçadas.

Assim sendo, a implementação de inúmeros conselhos em diferentes setores com a

participação da sociedade civil, demonstra que este modelo, proporciona conquistas e avanços

para a gestão pública compartilhada com o Estado.

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2 INCORPORAÇÃO E LEGALIZAÇÃO DO PROVITA NO ORDENAMENTO JURIDICO BRASILEIRO - LEI FEDERAL N.º 9.807 DE 13 DE JULHO DE 1999. 2.1 ORIGEM DO PROVITA NO BRASIL

No ano de 1996 no estado de Pernambuco, o Gabinete de Assessoria Jurídica às

Organizações Populares – GAJOP, propôs diante do cenário de violência do Estado e do alto

nível de impunidade, a política pública de proteção, nacionalmente e internacionalmente

conhecida por PROVITA – Programa de Proteção a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas.

O Programa foi pensando visando garantir a reinserção social de pessoas em situação

de risco, em novos espaços, de forma sigilosa, contando com a participação da sociedade civil

para a construção de uma rede solidária.

Em meados de 1998, o Ministério da Justiça, no âmbito da Secretaria de Estado dos

Direitos Humanos, estabeleceu a primeira parceria oficial com o Governo pernambucano,

assinando convênio para execução do programa.

A necessidade pela criação do Programa no âmbito da sociedade civil, surgiu como

um enfrentamento a criminalidade, somado a necessidade de garantir a proteção de indivíduos

que prestavam importantes depoimentos. Desta forma, antes do advento da Lei Federal de

Proteção, alguns estados da Federação seguiram a iniciativa do GAJOP e formularam no ano

de 1998, seus respectivos Programas Estaduais. A exemplo, temos Espírito Santo e Bahia,

conforme, observa-se na avaliação feita por PANNUZIO:

Em vista dos significativos resultados que vinham sendo alcançados em Pernambuco, em 1998, o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, passou a apoiar essa iniciativa, seguindo diretriz estabelecida pelo Programa Nacional de Direitos Humanos. O sucesso dessa experiência-piloto fez com que, naquele mesmo ano, fosse ela expandida para os Estados da Bahia e Espírito Santo, que também implantaram seus programas de proteção aproveitando a metodologia desenvolvida pelo GAJOP.6

Assim, após termos explanado acerca da inserção da sociedade civil na espera política

do Estado, pode-se perceber a importância da citada organização não-governamental na

formulação de uma política, antes isolada do estado de Pernambuco e, atualmente, difundida

em todos os Estados da federação, considerando que os 09 (nove) estados que, atualmente,

não possuem PROVITA Estadual, são acompanhados e atendidos pelo Programa Federal.

6 PANNUNZIO. Eduardo. O Programa Brasileiro: resultados e perspectivas. Revista de Direitos Humanos: Proteção a Testemunhas no Brasil. GAJOP, n.º 7. 2001.p. 34.

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Ademais, a iniciativa da sociedade civil na aérea de segurança pública ao implementar

o PROVITA, com uma perspectiva de política pública para a proteção de testemunhas,

vítimas e familiares a partir da concepção de Direitos Humanos, direcionou a estruturação dos

Programas de Proteção no Brasil, pelo viés de garantir que os indivíduos atendidos pela

política, figurem a todo tempo, enquanto sujeito de direitos.

Após a iniciativa do GAJOP e do envio de projeto de Lei, para implementar um

sistema de proteção nacional, amparado por legislação infraconstitucional, adveio a Lei

Federal de Proteção n.º 9.807, de 13 de julho de 1999, regulamentada, posteriormente pelo

Decreto n.º 3.518, de 20 de junho de 2000, o qual analisaremos no próximo capítulo.

Cumpre salientar, que com relação à temática desenvolvida no presente trabalho, qual

seja, Conselho Deliberativo, esta expressão foi inicialmente, integrada ao texto da proposta de

projeto de Lei encaminhado pelo GAJOP ao Congresso Nacional em 1997, consoante citação

de SILVEIRA, no texto de CALANDRINI FILHO, vejamos:

Finalmente, a expressão ‘Conselho Deliberativo’, apareceu no Projeto de Lei Federal encaminhado pelo GAJOP após o I Encontro Interestadual sobre Proteção à Testemunha, realizado em junho 1997, em Recife, à Secretaria Nacional dos Direitos Humanos do Ministério da Justiça, e enviado por esta ao Congresso Nacional, para tramitação, tendo como primeira composição a de ‘representantes de órgãos públicos e de pelo menos duas entidades não-governamentais’ e, por atribuição, decidir sobre o ingresso do protegido no programa ou a sua exclusão, as medidas de proteção a serem aplicadas a cada caso e as providencias necessárias ao cumprimento do programa.7

Ademais, a referida Lei instituiu o Sistema de Proteção a Vítimas e a Testemunhas

Ameaçadas, tecendo normas para a organização dos Programas Estaduais e instituindo no

âmbito da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, o Programa Federal de Assistência a

Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas. Dispôs ainda a referida Lei, sobre a figura do réu

colaborador e inovou ao inserir no Direito Penal Brasileiro, o instituto da delação premiada.

Com dito acima, 09 (nove) estados da Federação, ainda não contam com Programas

Estaduais, sendo, portanto, atendidos pelo Programa Federal, dentre eles, temos: Amapá,

Rondônia, Roraima, Paraíba, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe, Tocantins e Mato Grosso.

Cabendo ressalvar que, encontra-se em fase de implantação os Programas Estaduais do Mato

Grosso e Rio Grande do Norte.

Por fim, cumpre salientar que a legislação Federal aduz que os Programas seriam

executados por meio de convênios entre Governo Federal e Estadual, com as respectivas 7 CALLANDRINI FILHO apud SILVEIRA, José Braz. A Proteção à Testemunha & o crime organizado no Brasil. Curitiba: Juruá, 2008,p.71.

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entidades gestoras, organização da sociedade civil, no intuito de consolidar a estrutura de uma

rede solidária.

2.2. CARACTERÍSTICAS INTRÍNSECAS DA LEI DE PROTEÇÃO

Dentre as peculiaridades da Lei de Proteção, temos que a mesma se destina a

direcionar a criação de Programas de Proteção, conferindo responsabilidade pela execução do

mesmo a União, estados e Distrito Federal, elencando, ainda, acerca de requisitos para

avaliação de enquadramento do caso no perfil proposto pelo Programa.

Seguindo, aborda a lei, que cada Programa será dirigido por um Conselho

Deliberativo, composto por representantes do Ministério Público, do Poder Judiciário e de

órgãos públicos e privados relacionados com segurança pública e a defesa dos Direitos

Humanos.

Aduz ainda a lei acerca das possibilidades de ingresso e exclusão da testemunha, a

importância da participação do Ministério Público, as medidas isoladas, fazendo, inclusive

previsão de excepcional possibilidade de alteração de nome. Acrescentando ainda atenção à

figura dos réus colaboradores, e por fim, a previsão da delação premiada e do perdão judicial.

Considerando o teor da Lei de Proteção, pode-se dizer que, o funcionamento dos

Programas no País possui a mesma diretriz, tendo em vista que o texto base, para qualquer

construção legal no âmbito Estadual e Federal, teria que respeitar ao disposto na Lei Federal,

o que de fato ocorreu.

Desse modo, a formatação geral do Programa de Proteção no País é que este possui na

sua composição um órgão executor, conselho deliberativo, equipe técnica e rede solidária.

Ademais, dentre os requisitos para ingresso, temos os seguintes: situação de risco; relação de

causalidade; personalidade e conduta compatíveis; inexistência de limitações à liberdade e

anuência do protegido.

Desta forma, as pessoas que em face da contribuição para elucidação de fatos

criminosos, passem a ser ameaçadas e/ou coagidas, podem ser encaminhadas por iniciativa

própria, pelo Ministério Público, autoridade policial, juiz competente pela instrução criminal e

órgãos públicos e entidades com atribuições de defesa dos Direitos Humanos, para triagem no

Programa.

Insta destacar, que a situação de risco do indivíduo deve estar relacionada com os

depoimentos que ensejaram a solicitação de sua inclusão no Programa de Proteção, de modo

que os indivíduos que não se adequarem aos requisitos legais supracitados para inclusão no

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Programa, após coerente avaliação do Conselho Deliberativo, receberão dos órgãos de

segurança pública o atendimento necessário para garantir a sua proteção.

Cabe frisar, que o ingresso no Programa é voluntário assim como sua permanência e

solicitação por desligamento, a qualquer tempo. Sendo todos os procedimentos acompanhados

por órgãos públicos parceiros do Programa, a título de resguardar este em relação a futuros

acontecimentos com o pleiteante pelo desligamento.

O objetivo inicial do Programa é esclarecer para a testemunha, vítima e familiares, que

o intuito do sistema de proteção é proporcionar o deslocamento do local do risco para

ambiente seguro, com o objetivo de minimizar o risco, evitar represálias e possibilitar a

reinserção e construção de um novo projeto de vida em outra localidade. Às vezes dentro do

mesmo estado de origem, ou na maioria dos casos, em outros estados.

Assim, o interesse do Programa e das Equipes Técnicas que atuam junto aos usuários,

é dar meios de inserção para que aquele indivíduo não retorne mais ao local do risco. Todavia,

a decisão final cabe aos usuários do Programa e não ao corpo técnico que os acompanha,

razão pela qual, normalmente todos os procedimentos de desligamento e exclusão terem sua

formalização na presença de autoridade pública.

É importante registrar que a lei prevê a extensão da proteção para o cônjuge ou

companheiro, ascendente, descendente e dependente que tenham convivência habitual. Desta

forma, em casos que o risco se estenda ao núcleo familiar, ou este de fato deseja permanecer

integrado mesmo sem situação de risco para os familiares, os mesmos ingressam na proteção.

Isto porque somado a situação de risco, levam-se em consideração os laços afetivos dos

indivíduos que pleiteiam ingresso no Programa.

Outro ponto que merece destaque é o prazo de dois anos previsto no artigo 11 da

citada lei, para acompanhamento da vítima ou testemunha pela Equipe Técnica do Programa,

de forma que concluído tal prazo existe uma avaliação do risco. Esta será realizada pelo órgão

do Ministério Público demandante, somada a uma avaliação da Equipe Técnica que

acompanha o caso, para análise do processo de reinserção do núcleo familiar.

Assim, caso o Ministério Público ateste que não existe mais risco e que não existe

mais a previsão da realização de novos depoimentos, o Programa passa a trabalhar com a

avaliação da reinserção social para projetar um prazo para o desligamento, cabendo reforçar,

que tal desligamento não é imediato, existe toda uma avaliação e planejamento para

efetivação do mesmo.

Todavia, caso o Ministério Público ateste pela permanência do risco e possibilidade de

novos depoimentos, o prazo é renovado, permanecendo a testemunha protegida enquanto

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perdurar o risco. Ressalve-se que, após um longo período de proteção, mesmo que ainda

exista possibilidade da testemunha prestar declarações em juízo, no entanto a mesma já tenha

condições de viver sem o auxílio do Programa, a lei prevê a figura das “medidas isoladas”,

que de praxe, são utilizadas para proporcionar apoio em momentos pontuais, a exemplo de

audiências, com a disponibilização de escolta e acompanhamento do corpo Técnico do

Programa ou manutenção dos vencimentos sem prejuízo, apesar do afastamento funcional.

Tornar todo o procedimento sigiloso e confidencial é outra importante característica da

lei, de modo que no artigo 2.º, § 5º, consta o seguinte: “As medidas e providências

relacionadas com os programas serão adotadas, executadas e mantidas em sigilo pelos

protegidos e pelos agentes envolvidos na execução.”

No tocante a alteração de nome prevista em lei, esta possibilidade é pouco utilizada no

cenário nacional devido às implicações e perdas que acarreta para a vida das testemunhas, de

modo que carece de reformulação, posto que a inserção no Programa de Proteção, por si

restringe diversos direitos e a mudança de nome que poderia ser considerada um beneficio,

termina sendo outro motivo de perda de mais direitos e restrições. Considerando a forma

como foi proposta pela norma, assim como da ausência de construção de mecanismos para

torná-la efetiva em relação aos procedimentos necessários perante os diversos órgãos de

registro.

Por fim, o perdão judicial pode ser concedido em casos que o agente colaborar com a

Justiça Criminal, delatando comparsas, permitindo a localização da vítima do crime ou

recuperação total ou parcial dos produtos do crime. Assim, por meio da delação premiada o

réu pode receber beneficio legal de diminuição da pena ou mesmo o perdão judicial. Cabendo

ressalvar, que tal beneficio recai sobre o processo que originou o ingresso do indivíduo no

Programa, isto porque, por vezes, acontece do beneficiário passar a solicitar benefícios legais

para processos que não têm qualquer relação com situação de proteção, o que não é cabível.

2.3 DO CONSELHO DELIBERATIVO

De acordo com o diploma federal em comento, o Conselho é órgão superior, de

deliberação colegiada, vinculado a órgão da Administração Pública, responsável pela

coordenação do Programa de Proteção.

Atua o referido conselho de forma articulada com um órgão executor, equipe técnica e

rede solidária.

No tocante ao órgão executor, este geralmente é uma organização não-governamental

comprometida com a implementação dos Direitos Humanos, sendo a responsável pela

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contratação da Equipe Técnica e demais encargos para execução do Programa, seja em âmbito

estadual e federal, cabendo ressalvar que neste último existe a figura da Coordenação Geral de

Proteção – CGPT, a qual será explicada posteriormente.

Conforme aduz o artigo 4.º da Lei de Proteção, cada Programa será dirigido por um

Conselho Deliberativo em cuja composição haverá representante do Ministério Público, do

Poder Judiciário e de órgãos públicos e privados relacionados com a segurança pública e a

defesa dos direitos humanos.

Somado a isto, o artigo 6.º do dispositivo legal supracitado, informa que o Conselho

será o responsável por decidir acerca do ingresso ou exclusão da pessoa protegida do

Programa, assim como por adotar as providências necessárias ao cumprimento deste.

Consoante, preleciona SILVEIRA:

Na verdade, o Conselho Deliberativo é o cerne do PROVITA, pois, além das suas tarefas de aprovar o ingresso ou a exclusão do beneficiário na rede de proteção, garante o equilíbrio representativo dos diversos órgãos responsáveis pela Segurança Pública, gestão da justiça, defesa dos Direitos Humanos e inclusive pela participação da sociedade nas ações do Programa. Um Conselho Deliberativo atuante é o segredo do sucesso do PROVITA. 8

Ademais, dispõe a Lei de Proteção no parágrafo único do artigo 6.º, que as

deliberações do Conselho serão tomadas por maioria absoluta de seus membros e sua

execução ficará sujeita à disponibilidade orçamentária.

Nesse sentido, questiona NUCCI, acerca do quórum, para aprovação de casos em

situação de extremo risco: “Inexiste razão para esse quorum. Ideal seria a maioria simples dos

conselheiros presentes à reunião. A decisão de proteger alguém deve ser rápida e eficiente,

motivo pelo qual, atingir a maioria absoluta (metade mais um) do conselho é inexplicável.” 9

Mesmo levando em consideração, a coerente reflexão feita pelo autor no parágrafo

anterior, a própria dinâmica do Programa solicitou que outros instrumentos fossem

adequados, justamente para atender as situações de emergência e de inviabilidade de garantir

a integridade física pelos meios convencionais.

Nesse sentido, no âmbito federal por exemplo, existe o Serviço de Proteção ao

Depoente Especial - SPDE, Programa da Polícia Federal responsável pelo acolhimento

provisório de casos atendidos pelo Programa Federal, conforme será abordado no próximo

capítulo. Somado a isto, existe também a deliberação ad referendum, quando antes da reunião

8 SILVEIRA. José Braz. A Proteção à Testemunha & o crime organizado no Brasil. Curitiba: Juruá, 2008, p. 69. 9 NUCCI. Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 942.

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mensal do Conselho, a Presidência do Conselho Deliberativo, delibera por situações que não

podem aguardar. De praxe, refere-se a situações de inclusão nas redes acolhedoras. A

posteriori, no momento formal da reunião ordinária, a deliberação provisória, via de regra, é

formalmente confirmada pelos integrantes do Conselho.

2.4 BREVE EXPOSIÇÃO DOS CONSELHOS ESTADUAIS DOS PROGRAMAS DE PROTEÇÃO DA FEDERAÇÃO É importante tecer esclarecimentos acerca dos Programas de Proteção Estaduais,

cabendo inicialmente registrar que atualmente existem 17 (dezessete) estados da Federação,

mais o Distrito Federal com PROVITAS estaduais, dentre eles temos: Acre, Amazonas,

Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará,

Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Alagoas, Paraná

e Distrito Federal.

Todos os Programas Estaduais são executados pela sociedade civil, com exceção do

Programa do Estado do Rio Grande do Sul, o qual é executado pela Secretaria de Justiça do

Estado, atuando assim, com a parceria de uma célula de segurança do Estado, ou seja, com

participação do corpo policial para elaborar e executar a segurança das testemunhas atendidas.

Ressalve-se que existe uma Equipe Técnica interdisciplinar, como nos demais Programas

Estaduais, todavia a mesma não integra a sociedade civil, mais sim a estrutura estatal.

Cada Programa Estadual conta com o apoio de uma entidade gestora, uma Equipe

Técnica e um Conselho Deliberativo, o qual é previsto em leis estaduais que regem a política

de proteção nos estados. Desse modo, cada Conselho estadual apresenta uma formatação

diferenciada, considerando que cada um é regido por sua própria lei.

Nesse sentido, cumpre destacar que diversas dificuldades são enfrentadas nos

Programas Estaduais. Assim, o que pode-se relatar acerca da realidade dos Conselhos dos

PROVITAS estaduais é a fragilidade da formação dos mesmos e a necessidade de

representação política nos estados para ampliar as redes de articulação, visando promover e

ampliar as possibilidades de reinserção das vítimas, testemunhas e familiares atendidos pela

política de proteção, para que estes possam ter acesso a outras políticas públicas, com

segurança, devido às restrições de sigilo inerentes ao Programa de Proteção.

A desmobilização dos Conselhos estaduais é outra característica presente no panorama

geral, que fragiliza sobremaneira o acompanhamento realizado pela Equipe Técnica estadual,

tendo em vista que certos pleitos dos usuários apenas podem ser definidos e encaminhados

após deliberação do Conselho. Todavia, na falta de reuniões mensais e de comprometimento

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dos participantes para com os casos atendidos (núcleos familiares) e para com as demanda do

Programa, resta inviabilizado e comprometido o bom andamento do acompanhamento, assim

como da reinserção dos atendidos pela política de proteção.

Conforme alude o tema do presente trabalho, nos Programas estaduais, existe a mesma

demanda do Programa Federal, de forma que mister se faz a existência de articulação externa

dos órgãos que integram os Conselhos estaduais com as demais instituições públicas, visando

promover a articulação com outras políticas públicas, dentre elas, pode-se citar educação,

saúde, moradia, previdência social, dentre outras.

A formação de uma rede solidária é característica recorrente nos Programas estaduais,

que coletivamente Equipe Técnica e Conselho, tornam-se responsáveis por construir uma rede

de parceiros, contando assim com órgãos locais, protetores, colaboradores, prestadores de

serviço. Para tanto, é necessário não só empenho da Equipe Técnica que diariamente lida com

os anseios e necessidades dos usuários, mas primordialmente dos órgãos que integram os

Conselhos Estaduais, tendo em vista que cada um atua em uma esfera diversificada, o que

pode proporcionar um leque de possibilidades para os usuários do PROVITA.

Nesse sentido, cumpre destacar informações contidas no Relatório do Monitoramento

do PROVITA, realizado no Estado do Espírito Santo, dando um panorama do modelo de

Conselho esperado para os demais Estados, assim como da rede solidária, vejamos:

O Conselho de ES (sic...), destaca-se por ser presidido por representante da Entidade Gestora do Programa, denotando reconhecimento da sociedade civil na política de proteção do Estado. Reúne-se uma vez por mês, e tem mantido a participação ativa e o envolvimento dos conselheiros com as ações do Programa. Destaca-se também pela existência de um profissional da Secretaria de Justiça que atua na secretaria do CONDEL. A rede ES demonstra uma base social consolidada no Estado, favorecendo o acompanhamento qualificado e diferenciado, se comparado aos demais Programas integrantes do Sistema Nacional, que têm apresentado fragilidade em suas redes solidárias.10

Outros estados também apresentam conquistas consideráveis e de grande valia para a

consolidação e aprimoramento da política de proteção, dentre elas temos o PROVITA Bahia,

que destaca-se pela sua rede solidária que conta com 126 colaboradores, 61 prestadores de

serviço, 37 protetores e 58 instituições parceiras. O PROVITA Pernambuco que construiu

relação com o sistema de proteção de acolhimento provisório da Secretaria de Justiça e

Direitos Humanos do Estado. O PROVITA São Paulo, que firmou parceria informal com a

Secretaria de Educação, permitindo a matrícula de crianças com nomes fictícios. O PROVITA

10 MONITORAMENTO DO SISTEMA NACIONAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E A TESTEMUNHAS AMEAÇADAS. Espírito Santo, novembro de 2005. Monitores: Cássia Rosato (Psicóloga GAJOP-PE), Cibele Silva (Assistente Social – AATR-BA) e Paulo Moraes (Advogado GAJOP-PE).

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do Mato Grosso do Sul, que promoveu articulação com a secretaria de saúde do Estado,

conquistado junto ao SUS – Sistema Único de Saúde, uma cota de números para usuários do

Programa utilizarem a rede de saúde de forma sigilosa.

Ademais, proporcionar prioridade no julgamento dos processos que envolvem vítimas

e testemunhas inseridas na política de proteção é uma das atribuições do Conselho e, que mais

refletem no acompanhamento dos casos, pela aflição das vítimas ou testemunhas de terem

conhecimento do andamento processual ou mesmo da possibilidade de prestar novos

depoimentos em juízo, de encontrar novamente com os algozes, dentre outras situações.

Por fim, cabe registrar ainda a existência das permutas, casos monitorados pela Equipe

do Programa Federal, porém da responsabilidade de duas Equipes estaduais, sendo uma do

estado do risco, e uma segunda do estado que recebe a permuta, denominado acolhedor.

Financeiramente, o caso é sustentado pelo PROVITA do estado do risco, e o Conselho deste

Estado é o responsável pelas deliberações do caso. O estado acolhedor, por sua vez é o

responsável pelo acompanhamento e execução das deliberações do Conselho Estadual da

origem do caso.

Ao passo que à Equipe do Programa Federal, cabe realizar a intermediação entre as

Equipes, realizando consultas de redes, acompanhando diariamente os encaminhados dados

pelas equipes envolvidas e interferindo em momentos que necessitam de uma maior atenção

para encaminhamento da demanda relacionada aos núcleos familiares.

2.5 A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL NA EXECUÇÃO DOS PROGRAMAS DE PROTEÇÃO NO BRASIL

A construção histórica do nascimento do PROVITA no Brasil, que se deu nas

formações do que chamamos hoje de sociedade civil organizada, lhe conferiu características

bastante peculiares em relação aos programas de proteção mais conhecidos do mundo, entre

eles podemos citar, os programas dos Estados Unidos, Canadá, Inglaterra e Itália, todos

operados pelas suas respectivas policias e têm como característica central a proteção das

testemunhas, salvo o programa inglês que tem por foco principal a vítima.

Nesse sentindo, cumpre destacar para esclarecimento, que o Programa inglês é

desenvolvido em espaço público, no Poder Judiciário. Todavia conta com a participação,

inclusive na execução, de membros da sociedade civil, consoante citação de SILVEIRA, da

obra de LIMA JÚNIOR, no seguinte trecho:

O programa inglês chama a atenção pelo fato de se desenvolver em espaço público – o Poder Judiciário – mas contar com a participação, inclusive na execução, de

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membros da sociedade civil, que também realizam campanhas de arrecadação de fundos para o funcionamento do serviço e o pagamento de alguns profissionais. Os serviços prestados pelo Victim Support são, estritamente, de apoio social e psicológico, favorecendo a participação das testemunhas nos tribunais, com vistas à responsabilização dos criminosos. Um serviço especializado, de natureza exclusivamente estatal, sediado em Manchester, cuida de poucos casos em que é necessária a proteção propriamente dita das testemunhas...11

No Brasil, o PROVITA aborda desde sua criação que o foco seria utilizar a política de

proteção como instrumento de acesso à justiça e combate à impunidade. Assim, trabalhar o

sistema de proteção a testemunhas pelo viés dos Direitos Humanos, assim como em precípua

colaboração da sociedade civil, visando promover o pleno exercício da cidadania dos

protegidos, que de alguma forma tem alguns direitos cerceados, em face da situação de

proteção.

Nesse contexto, resta demonstrada a importância da participação da sociedade civil

como suporte no processo de reinserção dos usuários, considerando ser esta que viabiliza a

construção de uma rede solidária, conquista parcerias e protetores com a finalidade de criar

uma retaguarda possível de colaborar com a segurança com a política de proteção.

A formatação dada ao Programa de Proteção no Brasil, tem relação direita com o

protagonismo exercido pela sociedade civil, comprometida com a defesa dos Direitos

Humanos e a democracia na construção desta política pública.

A política de proteção a testemunhas tem outras características muito específicas e

peculiares, por seu caráter sigiloso e reservado. Tanto na execução cotidiana como na sua

instância deliberativa – o Conselho Deliberativo – esta política proporciona e exige uma

relação contínua e intensa entre muitos sujeitos do Estado e da sociedade civil.

Questiona-se em outros países, a exemplo da Itália, que possui o Programa Antimáfia,

como, conseguiu-se consolidar um Programa de Proteção sem auxílio diário do corpo policial

nas intervenções diárias do Programa e junto aos usuários.

Pois bem. Ao longo dos anos o PROVITA se consolidou enquanto política pública,

alcançou espaços de prestígio no combate a impunidade no País. No entanto, o fato é que se

trata de um Programa operacionalizado por meio de estratégias de segurança, sigilo e

articulação em rede com todos os PROVITA’s do país.

De fato, com o passar do tempo, a política se fragilizou em face do novo perfil de

criminalidade e atuação de grandes organizações criminosas, de modo que não pode-se dizer

que o Programa, atende a um dado público, posto que o perfil de testemunhas, vítimas e

11 LIMA JÚNIOR, Jayme Benvenuto apud SILVEIRA, José Braz. A Proteção à Testemunha & o crime organizado no Brasil. Curitiba: Juruá, 2008, p. 56.

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familiares varia por demais nas capitais do país, o que acarreta na necessidade de criar para

cada caso estratégias específicas para garantir o deslocamento com segurança para local

seguro.

A participação da polícia no Programa Brasileiro, justamente pelo histórico de

envolvimento do corpo policial na grande maioria dos crimes, desde o princípio, se deu em

momento pontuais, a exemplo, audiência, inclusive, os policiais destinados para as atividades

do Programa, seja no âmbito estadual ou federal, são policiais qualificados e com perfil para

trabalhar com a temática de Direitos Humanos, além de haver por parte da própria corporação

um estudo social da vida pregressa do policial, no intuito de inviabilizar que qualquer

envolvido tivesse contato com as testemunhas ou vítimas ou mesmo Técnicos do Programa.

As interlocuções com o corpo policial, no âmbito estadual são promovidas pela

própria Equipe Estadual, por vezes com intermédio dos respectivos Conselhos estaduais, ao

passo que no âmbito federal, as interlocuções para participação da Polícia Federal são

promovidas pelo Órgão executor do estado, denominado Coordenação Geral de Proteção a

Testemunhas - CGPT, sendo esta a responsável pela articulação com escolta policial para as

audiências dos casos federais.

Existem iniciativas no Brasil em inserir o corpo policial, chamado célula de segurança,

na estrutura do PROVITA, o que já acontece no Estado do Rio Grande do Sul. Onde além da

Equipe Técnica interdisciplinar, o Programa conta com outra Equipe formada por policiais

militares, disponibilizados especificamente para as atividades do Programa.

No caso do citado Programa, existe toda uma seleção dos policiais, assim como

avaliação da disponibilidade do mesmo de trabalhar com a temática, visando evitar a

rotatividade, justamente para estabelecer um vínculo da sociedade civil com tal grupo de

policiais, destinados apenas as atividades do Programa.

Outra realidade que tem se modificado diz respeito ao estado de Pernambuco, que

atualmente conta com um Sistema de Proteção Provisória, gerenciado pelo Estado e

responsável pelo acolhimento inicial dos casos, enquanto o mesmo passa por uma triagem

pelos Técnicos do Programa Estadual. Assemelhando-se assim a estrutura fornecida pela

Policia Federal em Brasília, por meio do Serviço de Proteção ao Depoente Especial, o qual

acolhe provisoriamente casos do Programa Federal. O citado Sistema, cabe ressalvar, atende a

todos os Programa destinados a Segurança no Estado de Pernambuco, a exemplo, PPCAAM –

Programa de Proteção a Criança e Adolescente Ameaçados de Morte, PPDDH – Programa de

Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, dentre outros.

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Desse modo, percebe-se que existe uma busca incessante da sociedade civil de alargar

as barreiras que atualmente existem no Programa, buscando promover a adequação da política

a realidade que já não é a mesma de treze anos atrás. No entanto, sabemos que sozinha a

sociedade civil não vai conseguir se inserir em alguns espaços ou mesmo obter algumas

conquistas, que caberiam a interlocução do Estado.

É justamente por conta da omissão do Estado, que em alguns momentos a política de

proteção tem se mostrado engessada, estagnada e morosa para aqueles que dela precisam.

Como dito acima, não podemos ter um Programa para atender a um tipo de indivíduo, temos

que ter um Programa apto a proteger testemunhas, independente se esta é rica, pobre,

analfabeta, universitária, com curso superior, funcionária pública, dentre outras características

que por vezes inviabilizam que as pessoas atendidas possam acessar minimamente o que

tinham antes de ingressar na proteção, somado as questões de segurança.

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3 REGULAMENTO DO PROGRAMA FEDERAL E SEU CONSELHO DELIBERATIVO - DECRETO N.º 3.518, DE 20 DE JUNHO DE 2000

3.1 DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO Conforme exposto até o presente momento, após o advento da Lei de Proteção, surge

como colorário para regulamentação do Programa de Proteção no âmbito Federal, o Decreto

n.º 3.518, de 20 de junho de 2000.

Assim, a ementa dispõe que o decreto é destinado a regulamentar, no âmbito da

Secretaria de Estado dos Direitos Humanos do Ministério da Justiça, o Programa Federal de

Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas ou coagidas, em virtude de colaborarem com a

investigação ou o processo criminal.

Ademais, aduz o Decreto acerca das medidas aplicadas para garantir a integridade

física e psíquica de vítimas, testemunhas e familiares que estejam vivenciando situação de

risco, podendo as mesmas serem aplicadas de forma isolada ou cumulativa. O que, na

realidade do Programa, incide na maioria dos casos, enquanto cumulativas, havendo muita

discussão em torno da aplicação de medidas isoladas, diante da necessidade de estabelecer um

acompanhamento apropriado, de acordo com as características de cada caso.

No artigo 2.º do referido decreto, temos que integram o Programa Federal: o Conselho

Deliberativo Federal; o Órgão Executor Federal e a rede de proteção. Diante disto, temos que

a Central Nacional do PROVITA tem por Órgão Executor, no âmbito do Ministério da

Justiça, a CGPT, somada a atuação da sociedade civil, atualmente, representada pelo GAJOP,

responsável pela “operacionalização” do Programa Federal.

Desse modo, o Programa Federal é lastreado por uma atuação técnico-política de suas

duas equipes técnicas, quais sejam, a da entidade da sociedade civil que operacionaliza a

Central Nacional/PROVITA (GAJOP) e a da (própria) CGPT (órgão executor). Estas

representam nacionalmente o Programa, tanto pelas demandas que recebe dos estados que não

contam com Programas Estaduais, assim como pelos acolhimentos que promovem nos demais

estados da Federação que contam com Programas estaduais.

A equipe da entidade da sociedade civil que operacionaliza o Programa Federal,

denominada Central Nacional do PROVITA, constitui-se como espaço de produção de

conhecimento e compartimentalização das informações no âmbito de todo o sistema de

proteção. Sendo, além de responsável pelo acompanhamento indireto dos casos federais e

permuta, é intermediador, na indicação de encaminhamentos para as demandas polêmicas do

programa e, ainda, “condutor” das permutas.

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3.1.1 Funcionamento do Programa Federal. Atuação da Equipe Técnica, da Coordenação Geral de Proteção e do Serviço de Proteção ao Depoente Especial

Ao longo do presente, já foram citadas algumas características do Programa Federal,

de tal forma que abordaremos nesse momento, a questão mais sistemática do Programa, ou

seja, seu funcionamento diário.

Assim, tem-se que o Programa Federal - composto, de forma articulada, pelos

integrantes da CGPT e da Central Nacional do PROVITA - é o responsável pela atuação e

intervenção operacional dos casos federais, realizando acompanhamento dos casos federais

acolhidos em Programas Estaduais, procedendo com inclusão, transferência, realizando

audiência, encontro familiar, dentre outras atividades/atendimento que porventura surgirem.

Por outro lado, a Coordenação Geral de Proteção a Testemunha – CGPT, é a entidade

executora, responsável pela articulação com as autoridades demandantes dos casos,

acompanhamento jurídico dos processos em que os usuários figuram como testemunha, além

de funcionar como Secretaria Executiva do Conselho Deliberativo do Programa Federal.

Desse modo, a CGPT recebe os casos e sua respectiva documentação enviada por

autoridades públicas dos estados que não possuem Programas Estaduais. Posteriormente tal

documentação é encaminhada para a Equipe Técnica da Central/PROVITA junto à solicitação

de triagem. Após a triagem, momento em que são colhidos dados jurídicos e psicossociais, a

Equipe passa a possuir elementos para elaborar o Parecer Interdisciplinar, o qual subsidia a

futura decisão do Conselho Deliberativo pelo ingresso do caso na proteção, cabendo ressalvar

que a Equipe Técnica opina no citado Parecer se é favorável ou não ao ingresso da

testemunha. Todavia, a decisão final cabe, de fato, ao Conselho.

Ademais, cabe registrar que cada documento produzido pela Equipe Técnica tem sua

peculiaridade para repassar um determinado tipo de informação. Desse modo, a finalidade dos

Relatórios, Pareceres, Termos de Declarações e outros, que sempre são encaminhados para

ciência ou deliberação do Conselho, apresentam relatos que visam problematizar acerca da

garantia de direitos, uma vez que os mesmos são os instrumentos utilizados para trabalhar as

demandas e dar encaminhamento para as solicitações do usuários, dentro dos limites da

situação de proteção.

O trabalho realizado pela Central Nacional conta com o apoio de uma Equipe

interdisciplinar, de modo que as temáticas, mesmo que avaliadas conjuntamente, são

analisadas especificamente pelos profissionais de acordo com a necessidade do usuário,

buscando extrair daquele profissional toda sua potencialidade na intervenção junto aos

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usuários, a qual se engrandece quando existe integração dos conhecimentos para a formação

de um entendimento mais completo, um verdadeiro conjunto de esforços.

Assim sendo, para obtenção de um bom resultado no acompanhamento dos casos, faz-

se necessária uma intervenção jurídica ágil e comprometida, um acompanhamento

psicossocial das vítimas e testemunhas que englobe processos de adaptação no âmbito

emocional e social e um trabalho de estímulo para a continuação consciente do papel de

cidadão dos usuários, mesmo diante das dificuldades vivenciadas, além de um Conselho

Deliberativo envolvido com as temáticas do Programa. É nesta perspectiva que atua a equipe

interdisciplinar da Central Nacional do PROVITA, a qual é composta por advogados,

psicólogos e assistentes sociais, além de outros profissionais de apoio.

3.1.2 A importância de manifestação do Órgão Acusatório antes da avaliação do caso pelo Conselho Deliberativo do Programa Federal

De acordo com o disposto no artigo 5º, § 1º do Decreto, tem-se que: “O Ministério

Público manifestar-se-á sobre todos os pedidos de admissão, antes de serem submetidos à

apreciação do Conselho”. Além desta ressalva dada pela Lei, em diversos outros momentos,

pode-se citar a imprescindível participação do Ministério Público, como parte ou como custos

legis, em todo o processo de acolhimento das testemunhas, detendo-se à avaliação dos casos

do Programa Federal, com base nos requisitos legais, previstos na Lei 9.807/99.

Sendo o Ministério Público o titular da ação penal pública, este é o principal

interessado na produção da prova, para a instauração de procedimentos criminais,

envolvendo, por vezes, grandes grupos criminosos, articulados, e responsáveis pela alta

criminalidade nos estados. Concomitantemente, além da colheita do depoimento, cabe ao

Parquet, zelar pela integridade física e psíquica das testemunhas, que, em face da colaboração

com a justiça, passarem a ser coagidas ou expostas a grave risco, de modo que reste

impossibilitado prevenir ou reprimir a ameaça pelos meios de segurança convencionais.

Nesse diapasão, cabe colacionar trecho do texto de BARBOSA, vejamos:

A exigência legal, creio, levou em consideração a qualidade de dominus litis do Ministério Público, pois, sendo o titular privativo da ação penal pública regra geral no Processo Penal, da qual é exceção a ação privada. Por disposição constitucional (art. 129, I, da Constituição Federal de 1988), é órgão o principal interessado na obtenção da prova para o fim da aplicação de justa pena aos criminosos e quem melhor pode avaliar a relevância ou não de um testemunho enquanto prova da acusação a ser deduzida em juízo. 12

12 BARBOSA. Gilson Roberto de Melo. Artigo 3.º da Lei n.º 9.807/99 sobre a inclusão e a exclusão do beneficiário. Revista de Direitos Humanos: Proteção a Testemunhas no Brasil. GAJOP, n.º 7. 2001, p. 48.

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Desse modo, no caso do Programa Federal, este recebe casos enviados pelo Ministério

Público estadual e federal, variando de acordo com a competência para atuar na persecução

criminal do crime investigado, sendo tal órgão o responsável pelo envio de um Parecer,

abordando todos os requisitos para ingresso, constantes na Lei Federal de Proteção.

Nesse sentido, existe interlocução direta da CGPT com as autoridades do Parquet, ao

passo que, in locu, existe o contato direto dos Técnicos da Equipe Central/GAJOP, com os

respectivos, Promotores ou Procuradores demandantes, o que reforça a troca de informações

acerca do caso, assim como do Programa.

3.2 FORMATAÇÃO DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL

O Decreto do Poder Executivo que regulamenta a formatação e atribuições do

Conselho Federal, aduz em seu artigo 7o, que o mesmo será composto pelos seguintes

membros, designados pelo Ministro de Estado da Justiça: um representante da Secretaria de

Estado dos Direitos Humanos; um representante da Secretaria Nacional de Segurança Pública;

um representante da Secretaria Nacional de Justiça; um representante do Departamento de

Polícia Federal; um representante do Ministério Público Federal; um representante do Poder

Judiciário Federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justiça; e um representante de entidade

não-governamental com atuação na proteção de vítimas e testemunhas ameaçadas, indicado

pelo Secretário de Estado dos Direitos Humanos.

Nesse sentido, na prática, existe a indicação por cada órgão acima indicado de um

titular e um suplente, de modo que a reunião apenas acontece se houver quorum. Para a

contagem do quorum, só poderá ser levada em consideração a presença do titular ou do

suplente que representa formalmente aquele órgão, respeitando assim ao princípio da

representatividade.

A publicação dos escolhidos para representarem suas respectivas instituições ocorre no

diário oficial, de tal forma que só estão legitimados a participar das reuniões ordinárias, os

formalmente designados como titular ou suplente.

Desta forma, atualmente, temos que o Conselho Federal é composto pelos seguintes

órgãos: Secretaria Especial de Direitos Humanos - SEDH/PR; GAJOP; Poder Judiciário;

Poder Judiciário Federal; Ministério Público Federal; Polícia Federal/Ministério da Justiça –

SPDE; Secretaria Nacional de Segurança Pública - SENASP/MJ; Secretaria Nacional de

Justiça - SNJ/MJ.

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Desse modo, verifica-se que a participação prevista no artigo 7º, vem sendo respeitada

pelo Conselho Deliberativo do Programa Federal, que se reúne mensalmente, para efetivar a

avaliação dos casos federais.

Uma novidade no ano de 2009 refere-se ao pré-agendamento das reuniões, de modo

que foi construída uma agenda anual com datas fixas para realização das reuniões ordinárias.

Em tais reuniões, segue-se a seguinte pauta: primeiramente, aprova-se a ata da reunião

ordinária anterior, após isto, é feita por parte da CGPT a apresentação dos relatórios para

deliberação acerca de pedidos de ingresso no Programa Federal ou o encaminhamento para o

SPDE.

Ademais, são analisados os casos em instrução, os relatórios de acompanhamentos, as

situações pendentes de inclusão, atualização de casos para arquivo, casos que necessitam de

deliberação, atualização das deliberações anteriores, assim como acompanhamento do

cumprimento das mesmas.

As demandas específicas de alguns núcleos familiares, que seguem para deliberação

do Conselho, seguem juntamente com considerações de duas Equipes, a da Equipe Central e

Estadual, que acompanha diariamente o caso. Como a reunião acontece apenas uma vez por

mês e o número de casos e demandas para deliberação são grandes, não resta tempo para

aprofundamento de discussões políticas ou mesmo de avaliação dos integrantes do Conselho

das possibilidades que os mesmos poderiam articular junto aos órgãos de atuação, pois esta é

a finalidade da composição do Conselho, agregar valores, e atribuições diversificadas,

justamente para expandir e consolidar a política de proteção.

No tocante, ainda ao artigo 7.º o mesmo preleciona em seu parágrafo único, que

membros do Conselho têm mandato de dois anos, sendo permitida a recondução, tempo hábil

para se inteirar da dinâmica e dos casos do Programas, das demandas que precisam avançar e,

que, para tanto, precisam de articulação política, estabelecimento de compromisso com o

PROVITA, visando produzir uma intervenção qualificada junto aos casos que aguardam

deliberação.

Ademais, cumpre destacar a competência exposta no artigo 6.º do Decreto, senão vejamos:

Art. 6o Ao Conselho Deliberativo Federal, instância de direção superior, compete:

I - decidir sobre os pedidos de admissão e exclusão do Programa; II - solicitar às autoridades competentes medidas de proteção;

III - solicitar ao Ministério Público as providências necessárias à obtenção de medidas judiciais acautelatórias;

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IV - encaminhar as pessoas que devem ser atendidas pelo Serviço de Proteção ao Depoente Especial, de que trata o Capítulo II deste Decreto; V - adotar as providências necessárias para a obtenção judicial de alteração da identidade civil; VI - fixar o valor máximo da ajuda financeira mensal aos beneficiários da proteção; e

VII - deliberar sobre questões relativas ao funcionamento e aprimoramento do Programa. § 1o As decisões do Conselho são tomadas pela maioria dos votos de seus membros. § 2o O Presidente do Conselho, designado pelo Ministro de Estado da Justiça dentre seus membros, pode decidir, em caráter provisório, diante de situações emergenciais e na impossibilidade de imediata convocação de reunião do Colegiado, sobre a admissão e a adoção de medidas assecuratórias da integridade física e psicológica da pessoa ameaçada.

Diante deste extenso rol de atribuições, visualiza-se a importância do funcionamento

do Conselho para o Programa Federal, de forma que não existe a política de proteção sem o

Conselho, posto que todo o trabalho executado pelas Equipes Técnicas envolvidas precisa ser

analisado, avaliado e corroborado pelo mesmo.

Ressalve-se que as Equipes, de fato, têm autonomia para determinadas situações.

Todavia, grande parte das demandas, que são gerais, nos núcleos familiares são encaminhadas

para avaliação do Conselho, dentre elas podemos citar as seguintes: avaliação da assinatura de

carteira de trabalho; possibilidade de realização de concurso público; permissão para cursar

universidade pública ou de custeio de particular; viabilidade de acessar a rede particular de

saúde, em situações de precariedade da rede pública; permissão para uso de aparelho celular;

uso de internet, dentre outras.

Em casos mais delicados, existe inclusive, a indicação para relatoria, que ocorre

quando um dos integrantes do Conselho é designado para se aprofundar no caso, para emitir,

ao final, um relatório, que posteriormente será trabalhado por todos do Conselho.

Cabe destacar ainda, a importância da participação da sociedade civil nas reuniões

ordinárias, posto ser esta a responsável pela execução do acompanhamento dos casos, estando

apta para dirimir dúvidas e incompreensões no momento da reunião ou mesmo reforçar alguns

pleitos dos usuários, tecendo os devidos esclarecimentos.

Insta frisar acerca da figura da deliberação ad referendum, já citada neste trabalho,

porém cabe resgatar que se trata da possibilidade de haver uma decisão antecipada do

Conselho, conforme aduz, o § 2.º do artigo 6.º do já citado Decreto, antes da reunião ordinária

mensal, situação que acontece diante da necessidade de incluir com urgência a testemunha na

rede acolhedora, que tal decisão é monocraticamente tomada e corroborada na próxima

reunião, após a decisão provisória.

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3.2.1 A importância de efetiva atuação dos integrantes do Conselho Deliberativo

Ademais, aprofundando-se na intervenção dos órgãos que integram o Conselho, cabe

analisar das instituições na dinâmica do Programa de Proteção.

A formatação do Conselho deixa clara a junção e estreitamento nas relações da

sociedade civil e Poder Público, sob uma perspectiva de participação política e legitimação

das atividades realizadas pela sociedade civil no cenário da política de proteção.

Nesse sentido, muito além da separação de um dia para “votação” dos casos

acompanhados pelo Programa Federal, cabe aos integrantes do Conselho aproveitar o espaço

público para redimensionar a política de proteção, a partir do compartilhamento de

conhecimentos e da evolução, que de praxe, acontece no acompanhamento dos núcleos

familiares.

Assim sendo, de acordo com o exposto no título anterior, tem-se no Conselho

Deliberativo instâncias da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos, Secretaria Nacional de

Segurança Pública, Secretaria Nacional de Justiça, Polícia Federal, Ministério Público

Federal, Poder Judiciário Federal e Entidade não-governamental com atuação na proteção de

vítimas e testemunhas ameaçadas.

Todos estes integrantes têm, além do dever coletivo, realizado conjuntamente no

momento das reuniões ordinárias, o dever especifico relacionado a cada área ali representada,

considerando justamente a capacidade e possibilidade de surgirem novas proposições, novas

articulações, novas projeções para encaminhamento de demandas que atualmente, encontram-

se estagnadas, sem evolução.

Desta forma, existe, acima da especificidade da representação dos órgãos, o caráter

político, inerente a todos que compõem o Conselho Deliberativo, o que faz emergir a

necessidade de maior eficiência da gestão e efetividades da política pública de proteção, posto

que a participação e atuação está diretamente relacionada com proposição de mudanças e

adequação da política à necessidade social atual.

Deve, portanto, existir no Conselho interesse com as problemáticas do Programa,

assim como intervenção sistemática dos integrantes, de modo a proporcionar uma real

reciclagem da política de proteção, bem como fortalecimento da intervenção realizada pela

Equipe Técnica, a qual é “assessorada” pelo Conselho e, responsável pela execução das

deliberações exaradas nas reuniões ordinárias.

O que de fato existe é uma co-gestão de responsabilidade, o que requer habilidade e

conhecimentos técnico e específicos acerca das demandas trabalhadas no Conselho.

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Os conselhos são sujeitos a aperfeiçoamentos, seja no âmbito da legislação ou na

proposição e implementação de ingerência para o avanço da política de proteção, visando

minimizar as deficiências estruturais e enriquecer a democracia participativa.

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4 DESAFIOS E PROPOSIÇÕES PARA UM FUNCIONAMENTO MAIS EFICAZ DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL 4.1 ATRIBUIÇÕES DO ESTADO E DA SOCIEDADE CIVIL NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA FEDERAL

Na execução do Programa é perceptível a existência de duas forças, as quais integram

o Estado e a sociedade civil. Nesse panorama, existem atribuições especificas de cada um, que

se não forem implementadas e garantidas na execução da política pública de proteção, geram

estagnação e engessamento do sistema de proteção como um todo.

Nessa perspectiva, cumpre destacar algumas atribuições inerentes ao Estado, na

intenção de avanço no trabalho realizado pelo Programa Federal, dentre as quais temos: a

necessidade de garantir recursos necessários para o funcionamento adequado e ininterrupto do

Programa de Proteção; garantia de capacitação periódica dos atores envolvidos no Sistema;

supervisão das metas dos convênios; controlar e fiscalizar administrativa e financeiramente a

execução do Programa; articular o programa, no âmbito de sua competência, com outras

políticas públicas (educação, saúde, habitação, previdência, etc.); prestar, através dos órgãos

policiais, a colaboração e o apoio necessários à execução do programa; executar o Serviço de

Proteção ao Depoente Especial.

Por outro lado, no tocante a sociedade civil, que executa o Programa Federal, cabe as

seguintes atribuições: criar, manter e ampliar a rede solidária sigilosa; trabalhar a reinserção

social das testemunhas, vítimas e familiares; garantir o acesso dos usuários a todas as políticas

públicas necessárias e pertinentes com sua reinserção social; executar o monitoramento do

Sistema de Proteção; acompanhar e executar as permutas.

Nesse diapasão, resta demonstrada a necessidade de movimentação no cenário político

do Estado e sociedade civil, para garantir, cada vez mais, a consolidação da política de

proteção, promovendo adequação da mesma à realidade social do século XXI.

4.2 ENTRAVES NA EXECUÇÃO DO PROGRAMA FEDERAL E NECESSIDADE DE FORTALECIMENTO DO CONSELHO DELIBERATIVO

Ademais, no tocante aos principais entraves na execução do Programa Federal, pode-

se contemplar que a burocracia, ocupa destaque dentre as demais barreiras enfrentadas

diariamente na execução da política. Isto porque, por conta da própria estrutura do Programa,

de garantir o sigilo e construir estratégias de segurança, o “tempo” para os usuários atendidos

é bem mais longo do que os dos demais cidadãos que vivem na sociedade sem as aflições dos

inseridos na proteção.

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Diante da necessidade de não expor o usuário, precisa-se construir artifícios que

garantam o acesso às demais políticas, com as devidas medidas preventivas atendidas, o que

dificilmente acontece e, torna a política, por vezes morosa para as pessoas atendidas. Posto

que, em muitos casos por questões de segurança e falta de articulação, um pleito de um

usuário passa até seis meses, um ano, ou mais para ser atendido, existindo inclusive situações

em que o caso é desligado ou excluído, após dois anos e não teve uma dada demanda

atendida.

A título de esclarecimento, atualmente na política de proteção, existe articulação para

efetivar a justificativa eleitoral das testemunhas, vítimas e familiares atendidos e também a

realização da declaração de isento dos usuários, no entanto, carece de articulação para a

retirada de documentação como CPF, RG, Certidão de Nascimento, Alistamento Eleitoral,

regularização do CPF, embarque diferenciado nas companhias aéreas, acesso à saúde com as

devidas estratégias de segurança, realização de concurso público, dentre outras. O que

demonstra que a vida das pessoas inseridas na política, continua, no entanto, por vezes é

paralisada pelo sistema e pela falta de articulação.

A morosidade do Judiciário no andamento dos processos que contam com a

colaboração de testemunhas e/ou vítimas inseridas no Programa de Proteção, é outro ponto

que merece destaque, de modo que tal situação carece de urgente provocação ao Conselho

Nacional de Justiça para que sejam construídas recomendações para os magistrados, através

dos Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais Regionais Federais e justiça federal, sobre a

necessidade de prioridade para tais procedimentos, devendo, para tanto, o representante do

Conselho ser o elo com o Poder Judiciário.

Ademais, existe a necessidade de aperfeiçoamento dos métodos de capacitação dos

membros do conselho, devendo-se destacar que cada membro do colegiado deve promover

articulação com a entidade que representa. Deve, assim, o Conselho atuar como um agente

multiplicador de boas práticas na instituição que representa, tornando mais qualificada sua

representação no conselho.

O fortalecimento da rede de proteção, é outro ponto de grande valia para se viabilizar a

reinserção dos usuários, devendo para tanto, haver empenho da sociedade civil somado a

integração do Poder Judiciário, Ministério Público, órgão policial e demais integrantes do

Conselho, devendo estes promoverem um canal de comunicação eficaz e ágil para divulgar o

Programa e conseguir a participação de outras instituições em cooperação com a política de

proteção.

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Por fim, existe a necessidade de fortalecimento dos mecanismos de segurança,

devendo-se haver uma avaliação junto as Equipes Técnicas acerca da necessidade de

capacitação, ou mesmo inclusão de um especialista técnico na área de segurança ou a

viabilização da criação de uma célula de segurança, no âmbito do Programa Federal.

4.3 PROPOSIÇÕES PARA MAIOR EFICACIA DA POLITICA DE PROTEÇÃO NO AMBITO FEDERAL 4.2.1 Regimento interno

Um Conselho Deliberativo, aprimorado, com os instrumentos legais que regem o

programa, exposto na Lei de Proteção e no Decreto regulamento, faz emergir a necessidade da

elaboração de um Regimento Interno, destinado a definir procedimentos necessários para o

bom funcionamento do Conselho e, na mesma direção definir a ampliação de sua composição,

o que demandaria mudanças no Decreto.

Nesse sentido, cumpre salientar que toda e qualquer política está sujeita a mudanças e

aprimoramentos, especialmente após nove anos de existência, como é o caso do Decreto

regulamentador da política de proteção no âmbito federal.

No tocante à política de proteção a testemunhas, devido as suas especificidades, a

mesma exige cuidados especiais no que tange a sua continuidade e estabilidade, considerando

ser uma política que não pode ser fragilizada na sua capacidade de garantir plenamente a

proteção e a vida dos usuários, da equipe técnica e da rede solidária, sob pena de

comprometer o próprio sentido de sua existência.

Assim, qualquer modificação e adaptação precisaria ser bem estudada e executada,

visando aprimorar a política, sem todavia, desqualificar sua efetividade, da forma como vem

sendo executada ao longo de anos em todo o cenário na nacional.

A título propositivo, um regimento interno, quando criado pode prever dentre outras

características, as seguintes: Definição e Composição; eleição; deveres; atribuições do

Conselho, do Presidente, da Secretaria do Conselho; funcionamento; disposições finais. Desse

modo, percebe-se que o regimento interno, permite que exista uma troca qualificada e

instrumentalizada, entre o que está regulamentado com a praticidade do Conselho Federal.

No tópico acerca das obrigações dos membros dos Conselhos, poderiam constar as

seguintes exigências: comparecimento assíduo e pontual, às reuniões ou justificar suas faltas;

exame antecipado dos assuntos que serão discutidos na reunião; proposição de assuntos a

serem incluídos na pauta do dia das reuniões; discussão e votação com responsabilidade dos

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assuntos debatidos em reuniões; constar em Ata, quando couber e, for solicitado por quaisquer

de seus membros, o seu voto e a sua fundamentação, dentre outras.

Assim, ao se especificar as tarefas, atribuições e deveres dos Conselheiros, tem-se uma

ampliação do entendimento da complexidade do trabalho, assim como das implicações

políticas, normativas e legais que envolvem a atuação do Conselho Deliberativo para política

pública de proteção.

Além do posto, outro elemento imprescindível para um eficaz funcionamento do

Conselho Deliberativo, é o engajamento político e identificação causal do Conselheiro com a

Política de Proteção, acreditando no ideário político e prático das suas possibilidades positivas

nas vidas dos usuários que ao Programa acessam.

Outro ponto concernente ao bom funcionamento do Conselho é além da sua

articulação externa, com a rede integrada do Programa de Proteção, é a sua articulação interna

entre Conselheiros, entre os pares que possuem a objetivação em assegurar a segurança da

testemunha/usuário do Programa, para que não votem ou operem decisões particularizadas,

sem adesão igualitária de entendimentos.

Nesse sentido, acerca da importância da elaboração de Regimento foi devidamente

registrado como recomendação na Carta de Fortaleza – Elaborada na X Reunião Nacional dos

Programas de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, ocorrida entre 17 a 19 de

outubro de 2007, a qual aduz, que os Conselhos Deliberativos devem elaborar seus

regimentos, pois estes irão compor o marco legal, no sentido de garantir a atuação tranqüila

dos programas de proteção.

4.2.2 Composição paritária

Ainda, nas recomendações presentes na Carta de Fortaleza – Elaborada na X Reunião

Nacional dos Programas de Proteção a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, ocorrida entre 17

a 19 de outubro de 2007, tem-se que: Os Conselhos Deliberativos dos Programas de Proteção

devem ser constituídos de acordo com o princípio da paridade na representação entre Estado e

Sociedade Civil.

Assim, tem-se que o princípio da paridade e da representatividade, caracteriza a

composição dos conselhos de direitos, visando fortalecer sua existência e eficiência, por meio

do critério de formação ser por igual número de representantes do poder público e da

sociedade civil e ser representado por pessoas com representatividade e legitimidade para

defender as questões que representam.

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Desse modo, paridade, retrata a idéia de igualdade quantitativa, onde passa-se a

preservar a representação governamental em número correspondente à representação das

organizações da sociedade civil.

Nesse sentido, a importância da garantia da paridade, demonstra-se na necessidade de

ter uma forma legítima de se criar uma espaço de construção democrática e igualitária entre os

pares, no caso do Conselho Federal, onde participam entes governamentais e não-

governamentais, seguindo o critério dos pares, poderia uma suplência compor par dentro do

órgão que representa ou com outro do mesmo segmento.

Atualmente, devido a fragilidade existentes no Decreto aludido acima, a composição

do Conselho Federal, se distancia do modelo de paridade, tendo em vista que no mesmo

existe apenas um representante da sociedade civil e seis ou sete representantes do Estado, fato

que urge ser resiginificado para potencializar e propiciar por parte da sociedade civil debates

políticos relevantes do Programa de Proteção.

4.2.3 Papel político do Conselho na articulação para abrangência da política de proteção nas demais políticas públicas

Como exposto no presente, efetivar direitos nos momentos das reuniões deliberativas

é tarefa difícil da estrutura do Programa e, da sua peculiaridade sigilosa de garantir, via

estratégias de segurança, a proteção do usuário inserido na política.

Desse modo, restou demonstrado que mecanismos “extra-conselho”, ou seja,

articulação fora, junto às entidades representadas no Conselho Federal são de fundamental

importância para avanço e sedimentação do sistema de proteção.

Nesse sentido, reflete coerentemente RAICHELIS, ao expor que:

Põe-se em relevo a capacidade do Conselho para estabelecer vínculos orgânicos com suas bases sociais, que gerem organização e mobilização de cada seguimento e a possibilidade de estabelecer alianças em torno de propostas políticas. 13 E ainda:

A consideração de que os Conselhos são instâncias de interesse quase que exclusivos da sociedade civil traz como conseqüência sua desqualificação como espaço público, na medida em que o outro, o interlocutor governamental, peça-chave de legitimação desse espaço como mecanismo de articulação e negociação entre o governo e sociedade civil, nem sempre está presente e, quando está, sua intervenção não é investida de representatividade. 14

13 RAICHELIS. Raquel. Esfera Pública e Conselhos de Assistência Social: caminhos da construção democrática. São Paulo: Cortez, 1998, p. 143. 14 Op cit. p. 203.

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Assim necessário se faz que o Conselho Federal, busque articulação junto aos mais

variados órgãos públicos (previdência privada, secretaria de saúde, segurança pública) e,

alterando o andamento que é dado de praxe para algumas demandas que, por vezes, passam a

ser unificadas dentro dos Programas.

O que a Equipe Técnica juntamente com o Conselho Federal faz hoje é “flexibilização

de normas”, minimizar as restrições de direitos, desde que haja garantia e segurança para

tanto, todavia, para oportunizar a reinserção do usuário no novo ambiente em que vive,

tentando proporcionar ao mesmo conquistas viáveis e possíveis para qualquer cidadão que

não esteja inserido na proteção. Desse modo, garantida uma efetiva reinserção social, bem

como uma resignificação psicológica da testemunha, os fatos que a fizeram ingressar na

Política de Proteção tornam-se distanciados de sua realidade cotidiana, e, portanto,

diminuídos e também distanciados o seu grau de risco.

Ademais, na dinâmica do funcionamento do Conselho Federal, urge a necessidade de

criação de comissões, destinadas a construir instâncias legitimadas para encaminhar demandas

e serem, portanto legitimadas a subsidiar as decisões tomadas em plenária, sem, contudo

deslegitimar a ordem hierárquica da composição do Conselho e, nem da respectiva

Coordenação. A exemplo das citadas comissões, pode-se elencar, comissões para finanças,

ética, comunicação, pedagógica, dentre outras.

Oportunizar momentos de debates, de abertura de plenária para outras instâncias da

sociedade civil e governo, em espaços como seminários e capacitações, para que os

conselheiros e a sociedade civil, possam divulgar a política e promover o monitoramento e

construção de pautas temáticas. Devendo portanto, haver um momento para avaliação e

reflexão dos casos encaminhados para votação, assim como das temáticas paralelas ao sucesso

da política .

Todavia, para atentar para tais temáticas paralelas, seria necessário articulação dentre

as políticas básica, intersetorias de assistência e segurança, e demais temáticas presentes e

especificas em direitos humanos.

Por fim, mister se faz, permitir a reflexão de que o Conselho, enquanto instância de

deliberação da política de proteção, também necessita ser acompanhado, monitorado, o que

em geral é feito pela sociedade civil, a qual é legitimada nos espaços de embate políticos, no

sentido de fazer valer as diretrizes legais que criam o Conselho.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com o surgimento o fortalecimento dos Conselhos de Direitos no Brasil, foi

oportunizado a diversas instâncias políticas se inserirem na dinâmica do Estado, a exemplo a

inserção da sociedade civil na promoção de políticas públicas, assim como integrantes de

espaços políticos legitimados, tais como os conselhos deliberativos.

Com a ativa atuação da sociedade civil, enquanto protagonista da estruturação e

criação do PROVITA, o mesmo passou a ser implementado em diversos Estados da

Federação, de modo que os Estados que atualmente não possuem Programa Estadual, contam

com o suporte e acompanhamento do Programa Federal, o qual teve suas nuances expostas

no presente.

Nesse sentido, retratou-se posteriormente, as disposições elencadas na Lei de

Proteção, bem como no Decreto regulamentador, no intuito de fortalecer a importância do

Conselho Deliberativo Federal para a execução da política pública de proteção, no sentido de

promoção dos Direitos Humanos, objetivo fundamental para existência e permanecia do

sistema de proteção no Brasil.

Assim, foi devidamente abordada a composição legal do Conselho Federal, assim

como sua estrutura atual, reforçando a importância da efetividade do trabalho realizado pelas

instâncias ali representadas, no intuito de obter das mesmas além da contribuição técnica

especifica de cada formação representada, articulação com outras políticas públicas, por meio

dos veículos de acesso disponíveis a cada órgãos representado no Conselho.

Com essência, restou demonstrada, por meio das proposições feitas no último capítulo,

a possibilidade de reorganização e maior participação dos integrantes do Conselho, assim

como demonstração dos resultados que podem ser obtidos quando existem integrantes

envolvidos com as temáticas debatidas e responsáveis pelas mais diversas articulações,

refletindo, ao final, que tais características possibilitam o aprimoramento da política de

proteção, assim como viabilizam a reinseção social com segurança para os usuários atendidos

pelo Programa.

Assim pode-se concluir que integrar as ações da sociedade civil com o Estado, tem

gerado garantia Direitos Humanos, dentro da política pública de proteção, dando azo para a

importância na execução de política voltada para segurança pública, antes concentrada nas

mãos do Estado, atualmente executada pela sociedade organizada, somada a importância da

integração estrutural do Conselho Deliberativo, enquanto órgão superior de deliberação

colegiada do Programa Federal.

Page 43: Universidade Católica de Brasília...MECANISMO DE DEMOCRATIZAÇÃO: A IMPORTÂNCIA DOS ÓRGÃOS INTEGRANTES DO CONSELHO DELIBERATIVO DO PROGRAMA FEDERAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E

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REFERÊNCIAS BARBOSA. Gilson Roberto de Melo. Artigo 3.º da Lei n.º 9.807/99 sobre a inclusão e a exclusão do beneficiário. Revista de Direitos Humanos: Proteção a Testemunhas no Brasil. GAJOP, n.º 7. 2001. CALLANDRINI FILHO apud SILVEIRA, José Braz. A Proteção à Testemunha & o crime organizado no Brasil. Curitiba: Juruá, 2008. HABERMAS. Jurgen. Direito e Democracia: entre factividade e a validade. Rio de Janeiro. Tempo Brasileiro. 1997. HIDAKA, Leonardo Jun Ferreira. Introdução ao Direito Internacional dos Direitos Humanos. Manual de Direitos Humanos Internacionais. Acesso aos sistemas global e regional dos Direitos Humanos. São Paulo: Loyola, 2002. MONITORAMENTO DO SISTEMA NACIONAL DE PROTEÇÃO A VÍTIMAS E A TESTEMUNHAS AMEAÇADAS. Espírito Santo, novembro de 2005. Monitores: Cássia Rosato (Psicóloga GAJOP-PE), Cibele Silva (Assistente Social – AATR-BA) e Paulo Moraes (Advogado GAJOP-PE). NUCCI. Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. RAICHELIS. Raquel. Esfera Pública e Conselhos de Assistência Social:caminhos da construção democrática. São Paulo: Cortez, 1998. PANNUNZIO. Eduardo. O Programa Brasileiro: resultados e perspectivas. Revista de Direitos Humanos: Proteção a Testemunhas no Brasil. GAJOP, n.º 7. 2001. SILVEIRA. José Braz. A Proteção à Testemunha & o crime organizado no Brasil. Curitiba: Juruá, 2008. TEIXEIRA, Elenaldo Celso (coordenador). Sociedade Civil na Bahia. Papel político das organizações. Salvador, EDUFBA, 2008.