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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E DESENVOLMENTO REGIONAL DEPARTAMENTO DE GESTÃO E ECONOMIA António de Jesus Fernandes de Matos Covilhã, 2000

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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO

E

DESENVOLMENTO REGIONAL

DEPARTAMENTO DE GESTÃO E ECONOMIA

António de Jesus Fernandes de Matos

Covilhã, 2000

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UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

Departamento de Gestão e economia

ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO E

DESENVOLVIMENTO REGIONAL

DISSERTAÇÃO APRESENTADA NA UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE DOUTOR EM ECONOMIA

ORIENTADOR: Professor Doutor Felisberto Marques Reigado

António de Jesus Fernandes de Matos

Covilhã, 2000

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À Valentina, à Anna

e

aos meus Pais

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AGRADECIMENTOS

Assumindo o risco, sempre presente nestas ocasiões, de ser injusto por omissão,

gostaria de expressar aqui uma palavra particular de profundo reconhecimento e

gratidão ao Prof. Doutor Marques Reigado pelo seu incondicional apoio ao longo

da minha carreira académica e pela paciência, disponibilidade e competência com

que orientou a Dissertação de Doutoramento. Manifesto, igualmente, o meu

reconhecimento aos Profs. Doutores Henrique Albergaria, Jean Paul Carrière,

Mora Aliseda pelos seus comentários e sugestões. Aos Profs. Doutores Cadima

Ribeiro, Alexandre Smirnov e Carlos Osório, o meu obrigado pelo seu apoio e

incentivo. Agradeço à UBI, na pessoa do Magnífico Reitor, Prof. Doutor Santos

Silva por me ter proporcionado a bolsa do PRODEP. À Dra. Carolina Almeida

exprimo os meus agradecimentos pelas sugestões redacionais e à Sandra Cosme

pelo seu apoio no tratamento de texto. Por último, mas perto do coração, um

agradecimento muito especial à minha esposa e à minha filha pelo tempo que lhes

retirei da minha companhia.

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SUMÁRIO

Embora, nos últimos anos, se tenha feito um esforço notável no sentido de eliminar a

deficiente organização do território nacional ainda há muito para fazer. A par da

insuficiente cobertura do território continental, pelas várias figuras de plano, parece-nos

importante, desde já, a elaboração do programa nacional de ordenamento do território

que, definindo a estratégia e políticas do território nacional, permita aprofundar o grau de

articulação horizontal e vertical dos planos de ordenamento e deia início à elaboração de

uma nova geração de Planos Directores Municipais em que a estratégia de

desenvolvimento sustentável, devidamente cartografada em suporte digital, seria uma das

suas principais características.

O modelo territorial apresentado foi elaborado numa perspectiva de “janela” ou de zoom

dado que a Beira Interior está integrada na Região Centro que, por sua vez, se integra no

país e este na Europa. O modelo da Beira Interior está, assim, intimamente ligado a um

espaço de fronteira que foi sendo construído e reconstruído, vivido e representado, ou, se

quisermos a um espaço histórico geo-económico e sócio-cultural, cuja existência fluiu no

tempo e se foi moldando em função da forma como as comunidades nele se integraram e

dele se apropriaram e manipularam. Refira-se que, numa “Europa das Regiões”, a Beira

Interior e as zonas fronteiriças espanholas de Castilla-León e Extremadura formam uma

região transnacional com fortes possibilidades de se tornar numa região piloto no sistema

de regiões europeias. Este facto deve repercutir-se de forma activa no ordenamento do

território, na regularização e aproveitamento dos recursos hídricos, no ordenamento e

valorização da floresta, no reordenamento e modernização da agricultura, na preservação

e valorização do património natural e cultural, no planeamento e gestão integradas dos

circuitos turísticos, no desenvolvimento e reforço do próprio SC&T e das suas relações

com as empresas, pelo que a estruturação territorial da Beira Interior terá de ser efectuada

numa perspectiva de cooperação transfronteiriça.

Tendo em consideração, a posição geo-estratégica, os recursos e potencialidades e os

estrangulamentos da região, o modelo territorial da Beira Interior apoia-se em quatro

tipos de acções, ou seja, acções sobre o meio físico, acções para o fortalecimento e

reequilíbrio da malha urbana, acções sobre as áreas “não urbanas” e programas de

dinamização territorial.

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ÍNDICE

ÍNDICE DE CAPÍTULOS ....................................................................................... I

ÍNDICE DE FIGURAS ............................................................................................ V

ÍNDICE DE FLUXOGRAMAS .................................................................................. V

ÍNDICE DE MAPAS ............................................................................................... VI

ÍNDICE DE QUADROS .......................................................................................... VI

GLOSSÁRIO DE SIGLAS ....................................................................................... VIII

CAPÍTULOS ................................................................................................... 1

1. MODELO DE CRESCIMENTO................................................................... 1

1.1.

INTRODUÇÃO........................................................................................................... 1

1.2. A ESCOLA CLÁSSICA............................................................................................... 5

1.2.1. A divisão do trabalho e crescimento económico............................................. 5

1.2.2. O aumento da população na óptica dos clássicos.......................................... 7

1.2.3. O “modelo do cereal” de Ricardo................................................................... 9

1.2.4. O estado estacionário na escola clássica........................................................ 12

1.3. A TEORIA MARXISTA................................................................................................ 13

1.3.1. A teoria da mais-valia e da acumulação de capital........................................ 13

1.3.2. As crises e agudização das contradições internas do capitalismo.................. 16

11

1.4

A TEORIA NEOCLÁSSICA.......................................................................................... 18

1.4.1. Os percursores da escola neoclássica............................................................. 18

1.4.2. Os modelos micro económicos e teoria da produção...................................... 22

1.5. O MODELO DE SHUMPETER...................................................................................... 26

1.5.1. Os contributos do modelo analítico shumpeteriano........................................ 26

1.5.2. Concorrência e flutuações cíclicas.................................................................. 27

1.6. OS MODELOS KEYNESIANO E NEOKEYNESIANO....................................................... 29

1.6.1. A depressão económica segundo Keynes......................................................... 29

1.6.2. A teoria do emprego........................................................................................ 31

1.6.3. O modelo de Kaldor......................................................................................... 33

1.6.4. O modelo matemático de Kalecki.................................................................... 36

1.7. AS CONDICIONANTES EXTERNAS NOS MODELOS DE CRESCIMENTO........................... 38

1.7.1. Introdução: o comércio como elemento dinamizador do crescimento............ 38

1.7.2. As relações de troca no modelo de Ronald Findlay........................................ 41

1.7.3. O crescimento desigual na perspectiva de Paul krugman............................... 42

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1.7.4. Os capitais externos como factor de crescimento........................................... 44

1.8. RESUMO E CONCLUSÕES............................................................................................

46

2. TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL..................................... 50

2.1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 50

SECÇÃO I – TEORIA E MODELOS DE LOCALIZAÇÃO........................................................ 56

2.2. MODELOS DE LOCALIZAÇÃO DAS ACTIVIDADES ECONOMICAS................................. 56

2.2.1. A teoria da localização.................................................................................... 56

2.2.2. A localização da actividade agrícola.............................................................. 58

2.2.3. A localização da indústria............................................................................... 63

2.2.3.1. O custo mínimo de transporte....................................................................... 63

2.2.3.2. A localização na óptica das áreas de mercado............................................. 68

2.2.3.3. Modelos operativos e aplicações empíricas................................................. 76

2.2.4. A Localização dos equipamentos Terciários................................................... 82

2.2.4.1. Breve abordagem teórica.............................................................................. 82

2.2.4.2. Bens de serviços centrais.............................................................................. 84

2.2.5. A teoria da localização e seus desenvolvimentos............................................ 89

SECÇÃO II –TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL.............................................. 94

2.3. TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL............................................................. 94

2.3.1. Breve Introdução............................................................................................. 94

2.3.2. A teoria da base-exportação ou export base theory........................................ 97

2.3.3. A teoria dos pólos de desenvolvimento............................................................ 100

2.3.4. A teoria do desenvolvimento desigual............................................................. 104

2.3.5. O desenvolvimento a partir dos factores endógenos....................................... 108

2.3.6. A teoria dos ciclos longos na economia regional............................................ 110

2.4. RESUMO E CONCLUSÕES............................................................................................

111

3. PLANEAMENTO REGIONAL : MÉTODOS DE ABORDAGEM................. 116

3.1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 116

SECÇÃO I – PLANEAMENTO SÓCIO-ECONÓMICO............................................................ 118

3.2. O PLANEAMENTO DOS SISTEMAS SOCIAIS................................................................. 118

3.2.1. Génese do planeamento: breve revisão bibliográfica..................................... 118

3.2.2. O sistema social no processo de planeamento................................................ 125

3.2.3. Do espaço ao território no planeamento......................................................... 133

SECÇÃO II – PLANEAMENTO DO TERRITÓRIO................................................................. 143

3.3. O PLANEAMENTO DO TERRITÓRIO............................................................................. 143

3.3.1. Os modelos de ocupação do território............................................................ 143

3.3.2. Os níveis de planeamento territorial............................................................... 152

3.3.2.1. O planeamento normativo e operacional...................................................... 152

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3.3.2.2. O planeamento estratégico: modelos a etapas............................................. 156

3.4. O PLANEAMENTO URBANO: MODELOS DE ANÁLISE ESPACIAL.................................. 165

3.4.1. Perspectiva histórica da cidade e seu planeamento........................................ 165

3.4.2. Os modelos gravitacionais............................................................................... 171

3.4.3. Modelo de localização dos parques habitacionais.......................................... 176

3.4.4. Modelo de localização do comércio a retalho................................................. 178

3.4.5. O modelo de distribuição de tráfego............................................................... 179

3.4.6. O modelo de Lowry.......................................................................................... 180

3.5. RESUMO E CONCLUSÕES............................................................................................

184

4. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO: UMA PERSPECTIVA

EUROPEIA..................................................................................................

188

4.1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 188

4.2. O ORDENAMENTO DO ESPAÇO................................................................................... 190

4.2.1. Breves notas históricas.................................................................................... 190

4.2.2. Génese e evolução do conceito “ordenamento de território”......................... 196

4.2.3. Os objectivos do ordenamento do território.................................................... 205

4.2.4. O ordenamento do espaço rural/urbano......................................................... 212

4.3. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO NA UNIÃO EUROPEIA.......................................... 217

4.3.1. Breves considerações....................................................................................... 217

4.3.2. Os sistemas de ordenamento do território na Europa..................................... 221

4.3.3. O território da União Europeia...................................................................... 226

4.3.3.1. Caracterização das grandes regiões............................................................. 226

4.3.3.2. O Esquema de Desenvolvimento de Espaço Comunitário............................ 231

4.4. RESUMO E CONCLUSÕES............................................................................................

240

5. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO NACIONAL................................... 243

5.1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 243

5.2. A INFORMAÇÃO NA ELABORAÇÃO DOS PLANOS DE ORDENAMENTO......................... 245

5.2.1. Introdução aos Sistemas de Informação Geográfica...................................... 245

5.2.2. A experiência portuguesa na utilização dos SIG............................................. 248

5.2.3. A Base de Dados do Ordenamento do Território............................................ 251

5.3. A COMPONENTE AMBIENTAL NO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO............................ 258

5.3.1. O binómio ordenamento/protecção do ambiente............................................. 258

5.3.2. A realização do planeamento ambiental através do ordenamento do

território...........................................................................................................

261

5.3.2.1. As Áreas Protegidas...................................................................................... 270

5.3.2.2. A Reserva Agrícola Nacional........................................................................ 273

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5.3.2.3. A reserva Ecológica Nacional...................................................................... 275

5.4. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO NACIONAL.......................................................... 277

5.4.1. É urgente ordenar o território português........................................................ 277

5.4.2. Os instrumentos de ordenamento do território................................................ 281

5.4.2.1. A precedência dos planos urbanísticos................................ ........................ 281

5.4.2.2. Os níveis de planeamento territorial: nacional, regional e municipal......... 285

5.4.2.3. Os Planos Regionais de Ordenamento do Território................................... 289

5.4.2.4. Os Planos Espaciais de Ordenamento do Território.................................... 293

5.4.2.5. Os Planos Locais de Ordenamento do Território......................................... 297

5.4.3. Os Planos de Ordenamento do território no terceiro milénio......................... 302

5.5. RESUMO E CONCLUSÕES............................................................................................

307

6. MODELO REGIONAL DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO................ 312

6.1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 312

6.2. A INTEGRAÇÃO DO MODELO TERRITORIAL NACIONAL NA ESTRATÉGIA EUROPEIA.... 314

6.3. OS CENÁRIOS DE EVOLUÇÃO DA REGIÃO CENTRO..................................................... 320

6.3.1. Caracterização social económica e ambiental................................................ 320

6.3.2. Organização do espaço regional..................................................................... 324

6.3.3. A estratégia de desenvolvimento da Região Centro........................................ 330

6.4. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO DA BEIRA INTERIOR............................................. 332

6.4.1. Caracterização da região................................................................................ 332

6.4.1.1. Enquadramento geofísico e demográfico..................................................... 332

6.4.1.2. Caracterização demográfica do emprego e da actividade económica......... 333

6.4.1.3. A qualidade de vida na Beira Interior.......................................................... 340

6.4.1.4. Sistema urbano e infra-estruturação do território....................................... 341

6.4.2. O potencial endógeno regional........................................................................ 343

6.4.3. O modelo territorial da Beira Interior............................................................ 350

6.5. RESUMO E CONCLUSÕES............................................................................................

359

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ......................................................................... 362

1º CAPITULO .............................................................................................................. 362

2º CAPITULO .............................................................................................................. 365

3º CAPITULO .............................................................................................................. 370

4º CAPITULO .............................................................................................................. 376

5º CAPITULO .............................................................................................................. 381

6º CAPITULO .............................................................................................................. 384

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 2.1 - Área do mercado......................................................................................... 85

Figura 3.1 - A cidade de Howard (1898)........................................................................ 167

Figura 3.2 - A cidade do pós-guerra nos anos 70........................................................... 168

ÍNDICE DE FLUXOGRAMAS

Fluxograma 1.1 - Visão sinóptica do modelo keynesiano................................................. 33

Fluxograma 2.1 - Modelo de decisional de Söderman...................................................... 78

Fluxograma 2.2 - Princípios das causas cumulativas........................................................ 93

Fluxograma 2.3 - Factores de crescimento económico..................................................... 99

Fluxograma 2.4 - Movimentação de factores de produção............................................... 106

Fluxograma 3.1 - Sistema de Informação.......................................................................... 128

Fluxograma 3.2 - O planeamento como um processo cíclico............................................ 130

Fluxograma 3.3 - Circuitos de informação no processo de planeamento.......................... 132

Fluxograma 3.4 - Modelo de utilização do espaço físico.................................................. 142

Fluxograma 3.5 - Modelo ortodoxo de planeamento estratégico...................................... 158

Fluxograma 3.6 - Modelo interaccionista de planeamento estratégico............................. 160

Fluxograma 3.7 - Envolvente económica e política do planeamento urbano

Racionalista............................................................................................

168

Fluxograma 4.1 - O trinómio recursos/território/necessidades......................................... 197

Fluxograma 5.1 - Enquadramento de Base de Dados de Ordenamento do

Território..............................................................................................

252

Fluxograma 5.2 - Fluxos de informação da BDOT........................................................... 254

Fluxograma 5.3 - Modelo de planeamento ambiental integrado....................................... 260

Fluxograma 5.4 - Interface entre Ambiente e o Ordenamento do Território.................... 280

Fluxograma 6.1 - Capital endógeno da Beira Interior....................................................... 346

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ÍNDICE DE MAPAS

Mapa 4.1 - As grandes regiões do território comunitário................................................ 228

Mapa 4.2 - Organização actual e tendências do espaço Europeu.................................... 231

Mapa 5.1 - Regiões Biogeográficas da União Europeia.................................................. 263

Mapa 5.2 - 1ª Lista Nacional de Sítios – Continente....................................................... 264

Mapa 5.3 - Planos Regionais do Ordenamento do Território.......................................... 292

Mapa 5.4 - Planos de Ordenamento de Albufeiras de Águas Públicas............................ 295

Mapa 6.1 - Eixos de desenvolvimento na Região Centro................................................ 326

Mapa 6.2 - Principais aglomerados urbanos.................................................................... 327

Mapa 6.3 - Acessibilidades aos principais centros urbanos............................................. 329

Mapa 6.4 - Modelo Territorial da Beira Interior.............................................................. 342

Mapa 6.5 - Eixos de desenvolvimento na Península Ibérica... ....................................... 347

Mapa 6.6 - Ligação multimodal Portugal-Espanha: corredores e eixos.......................... 348

Mapa 6.7. - A Raia Central Ibérica................................................................................... 351

Mapa 6.8 - Rede viária transfronteiriça........................................................................... 353

ÍNDICE DE QUADROS Quadro 2.1 - Evolução da economia espacial............................................................... 54

Quadro 2.2 - Coeficientes de correlação....................................................................... 79

Quadro 2.3 - Hierarquização dos factores de localização............................................ 81

Quadro 3.1 - Níveis e questões fundamentais do planeamento.................................... 154

Quadro 3.2 - Desafios da nova política urbana............................................................. 170

Quadro 4.1 - Índices sectoriais de desenvolvimento humano (1997)........................... 207

Quadro 4.2 - Índices sintéticos de desenvolvimento humano (1997)........................... 208

Quadro 4.3 - Evolução da população das cidades do Continente segundo a

dimensão...................................................................................................

214

Quadro 4.4 - Evolução da repartição da população citadina do Continente entre

1864-1991.................................................................................................

215

Quadro 4.5 - Principais indicadores das regiões interiores e marítimas da União em

1991..........................................................................................................

229

Quadro 5.1 - Métodos de aquisição de conhecimento.................................................. 253

Quadro 5.2 - Protocolos celebrados no âmbito do PROSIG......................................... 256

Quadro 5.3 - Monitorização dos Planos Directores Municipais................................... 257

Quadro 5.4 - Fontes de financiamento do investimento no ambiente........................... 266

Quadro 5.5 - Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas aprovados ou em

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elaboração................................................................................................. 272

Quadro 5.6 - Planos Regionais de Ordenamento aprovados ou em elaboração............ 291

Quadro 5.7 - Analise comparada dos PMOT................................................................ 298,

299

Quadro 5.8 - Planos Directores Municipais por regiões de planeamento..................... 300

Quadro 5.9 - Planos de Urbanização e de Pormenor publicados em D.R..................... 301

Quadro 5.10 - O ordenamento do território em números................................................ 310

Quadro 6.1 - Descrição sintética dos cenários.............................................................. 316,

317

Quadro 6.2 - Classificação dos eixos de desenvolvimento........................................... 319

Quadro 6.3 - Evolução demográfica entre 1981-1997.................................................. 334

Quadro 6.4 - Nível de Formação da População............................................................ 335

Quadro 6.5 - Produto Interno Bruto e da Produtividade por NUT III em 1994............ 337

Quadro 6.6 - VABpm na Beira Interior por Produto e por NUT III em 1994................ 338

Quadro 6.7 - Comércio Internacional por NUT’s III.................................................... 339

Quadro 6.8 - Despesas das Câmaras Municipais em Actividades Culturais e em

Ambiente em 1997....................................................................................

340

Quadro 6.9 - Velocidade média em linha recta............................................................. 354

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GLOSSÁRIO DE SIGLAS

APDR - Associação Portuguesa de Desenvolvimento Regional

BDAR - Base de Dados para Analise Regional

BDOT - Base de Dados do Ordenamento do Território

BP - Banco de Portugal

CCR - Comissão de Coordenação da Região

CCRC - Comissão de Coordenação da Região Centro

CE - Comunidade Europeia

CEE - Comunidade Económica Europeia

CES - Concelho Económico e Social

CGIS - Canadian Geographical Information System

CNIG - Centro Nacional de Informação Geográfica

CORDIALE - Conferência de Regiões da Diagonal Continental Europeia

CP - Caminhos de Ferro de Portugal

D.R. - Diário da Republica

DGOTDU - Direcção Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano

DPH - Domínio Público Hídrico

DPP - Departamento do Planeamento e Perspectiva

DRABI - Direcção Regional de Agricultura da Beira Interior

EDEC - Esquema de Desenvolvimento do Espaço Comunitário

ETE - Estratégia Territorial Europeia

EUA - Estados Unidos da América

FEDER - Fundo Estrutural de Desenvolvimento Regional

FEOGA - Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola

GEOCID - Interface de Acesso ao CNIG Destinado aos Cidadãos

IC - Itinerário Complementar

ICN - Instituto de Conservação da Natureza

IDE - Investimento Directo Estrangeiro

IEFP - Instituto de Emprego e Formação Profissional

IGAPHE - Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado

INATEL - Instituto Nacional para Aproveitamento dos Tempos Livres dos Trabalhadores

INE - Instituto Nacional de Estatístico

INTERREG - Programa Operacional de Desenvolvimento das Regiões Fronteiriças

IORC - Intervenção Operacional Regional do Centro

IP - Itinerário Principal

J.E. - Junta da Extremadura

JF - Jornal do Fundão

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LEADER - Iniciativa Comunitária de Apoio aos Projectos de Desenvolvimento Rural

LIFE - Sistema de Financiamento para o Ambiente (U.E.)

MEPAT - Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território

MIE - Ministério da Industria e Energia

MPAT - Ministério do Planeamento e Administração do Território

NUT - Nomenclatura de Unidades Territoriais para Fins Estatísticos

OCDE - Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico

ONU - Organização das Nações Unidas

PAC - Política Agrícola Comum

PAVC - Parque Arqueológico do Vale do Côa

PBH - Plano Bacia Hidrográfica

PCM - Presidência do Concelho de Ministros

PDAR - Plano de Desenvolvimento da Agricultura Regional

PDI - Programa de Desenvolvimento Integrado

PDM - Plano Director Municipal

PDR - Plano Regional de Desenvolvimento

PEOT - Plano Especial de Ordenamento do Território

PER - Programa Especial de Realojamento

PERSU - Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos

PIB - Produto Interno Bruto

PIDDAC - Plano de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração

Central

PMA - Plano Municipal do Ambiente

PME - Pequena e Média Empresa

PMF - Plano Municipal da Floresta

PMOT - Plano Municipal de Ordenamento do Território

PNDES - Plano Nacional de Desenvolvimento Económico e Social

PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

POAAP - Plano de Ordenamento de Albufeiras de Águas Públicas

POAP - Plano de Ordenamento de Áreas Protegidas

POOC - Plano de Ordenamento da Orla Costeira

PP - Plano de Pormenor

PPDU - Plano Prioritário de Desenvolvimento Urbano

PROCOM - Programa de Apoio à Urbanização do Comércio

PROGIP - Programa de Apoio à Gestão Informatizada de Planos Municipais de

Ordenamento do Território

PROSIG - Programa de Apoio à Criação de Nós Locais do Sistema Nacional de

Informação Geográfica

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PROSIURB - Programa de Consolidação do Sistema Urbano Nacional e Apoio à Execução

dos Planos Directores Municipais

PROT - Plano Regional de Ordenamento do Território

PROTALI - Plano de Ordenamento do Litoral Alentejano

PROTAM - Plano de Ordenamento do Alto Minho

PROTAML - Plano de Ordenamento da área metropolitana de Lisboa

PROTCL - Plano de Ordenamento do Centro Litoral

PROTO - Plano de Ordenamento do Oeste

PROZAG - Plano de Ordenamento da Zona Envolvente das Barragens da Agueira, Coiço e

Fronhas.

PROZED - Plano de Ordenamento da Zona Envolvente do Douro

PU - Plano de Urbanização

QCA - Quadro Comunitário de Apoio

RAN - Reserva Agrícola Nacional

REN - Reserva Ecológica Nacional

SC&T - Sistema Cientifico & Tecnológico

SI - Sistema de Informação

SIC - Sítio de Interesse Comunitário

SIG - Sistema de Informação Geográfica

SNIG - Serviço Nacional de Informação Geográfica

SOMEA - Sociedade de Matemática e Economia Aplicada

UE - União Europeia

USIG - Associação de Utilização dos Sistemas de Informação Geográfica

VAB - Valor Acrescentado Bruto

ZDL - Zona de Localização Prioritária

ZEC - Zona Especial de Conservação

ZPE - Zona Espacial de Conservação

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1

1. MODELOS DE CRESCIMENTO

1.1. INTRODUÇÃO

Desde há muito tempo que o crescimento económico é visto como um objectivo

central da política económica. Assumindo que a transição de um sistema

económico para outro significa desenvolvimento económico, durante largas

dezenas de anos, considerou-se que a sucessão de sistemas seguia uma

determinada sequência. Por exemplo, segundo Marx, a sociedade evoluiria num

sentido único:

civilização primitiva ⇒⇒⇒⇒ feudalismo ⇒⇒⇒⇒ capitalismo ⇒⇒⇒⇒socialismo/comunismo

Os factos, porém, parecem não confirmar esta cronologia, ficando várias questões

sem resposta, nomeadamente:

• por que razão o capitalismo vitoriano resultou no Estado do bem-estar ;

• o que levou à não concretização das revoluções na França e Alemanha,

preconizadas por Marx e Engels;

• o que esteve na base da expansão inédita das economias de mercado, na

segunda metade do século XX;

• quais as causas do aparecimento da estagflação nos anos 70.

A história poderá ser melhor compreendida se nos socorrermos de modelos

económicos. Mas, qual é a definição de modelo? Para Raymond Boudon (1970),

os modelos quanto ao seu princípio, são técnicas de ordenação, de classificação e

de construção de tipologias (cit. Reigado, 1983, p. 74). Tinbergen, em Economic

Policy, referindo-se aos modelos económicos, considera que estes são não só um

conjunto de relações económicas e de equações que traduzem a maneira como

certos instrumentos de política económica influenciam o processo económico,

mas também uma imagem simplificada da realidade (ibid., p. 74).

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2

Embora a definição de Tinbergen seja imprecisa, o modelo deve retractar

fielmente a realidade ou aspectos fundamentais da mesma, bem como a própria

transformação da mesma. Para a concepção de modelos económicos, os

economistas recorrem aos princípios que presidem à ocorrência dos factos e às

teorias subjacentes aos processos que estarão sendo representados, bem como às

leis que explicam as inter-relações das variáveis económicas em consideração,

procurando conjugar num só elemento complexo todas as hipóteses relativas aos

mecanismos que governam a realidade. Assim, os modelos de crescimento

interpretam, por um lado, o processo de crescimento económico e, por outro,

permitem efectuar projecções. Mas o que se entende por crescimento económico?

O crescimento económico é a expansão do PNB real de uma economia. Porém, se

nos recordarmos da fronteira de possibilidades de produção, podemos igualmente

considerar o crescimento económico como uma deslocação para fora desta curva,

ao longo do tempo.

O termo “crescimento” significou durante muito tempo um aumento aritmético da

produção e respectivas consequências: enriquecimento da nação, elevação do

nível material de vida. Actualmente, este termo toma um sentido cada vez mais

restrito e contrapõe-se a “desenvolvimento” que engloba o crescimento

propriamente dito e as suas repercussões sobre o bem-estar das pessoas e o

próprio sistema social. O desenvolvimento tem, assim, como objectivo principal a

melhoria crescente do bem estar económico, social e humano o que, para além do

aumento dos índices globais de produção, pressupõe uma harmonia do

crescimento nos diferentes sectores económicos e, portanto uma transformação

positiva das estruturas sociais. O homem enquanto fim último do desenvolvimento

surgirá assim, também, como meio eficiente (Reigado, 1999, p. 310).

Os recursos naturais, os transportes e comunicações, a informática (no sentido

mais lato), o conhecimento e a própria história económica e social são,

igualmente, factores importantes do desenvolvimento que se pretende sustentado a

médio/longo prazo. A sustentabilidade temporal do desenvolvimento deverá, por

um lado, apoiar-se nos recursos endógenos existentes no país/região e, por outro,

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nas ajudas exógenas que muitas das vezes se revelam de importância fulcral para

o início de um processo de relançamento da economia. O processo de

desenvolvimento implica o reconhecimento da perenidade da actividade humana,

da qualidade do ambiente, dos recursos naturais e da sua conservação em

condições satisfatórias para as gerações seguintes. A admissão de que os recursos

são finitos leva, quer ao encorajamento da reciclagem dos materiais e à sua

reutilização ao longo do processo de criação/consumo, de forma a evitarem-se os

desperdícios, quer à alteração dos padrões de comportamento humano.

A melhoria do bem estar da população, a participação na tomada de decisões, a

democracia e a sustentabilidade do desenvolvimento no longo prazo, são as

questões centrais do desenvolvimento sempre numa perspectiva de que o homem

é o seu principal destinatário. Assim, não é de admirar que a nova concepção do

desenvolvimento, partilhada pelas Nações Unidas, tenha como fim supremo o

indivíduo e como objectivo o seu bem-estar económico, social e cultural, a

melhoria do acesso aos bens e serviços, o reforço da liberdade de escolha, a

vivência democrática, as possibilidades crescentes de participação na tomada de

decisões relativas ao seu próprio destino e ao sistema onde se insere (Reigado,

1998). Nesta concepção de desenvolvimento, o rendimento e a riqueza material

são considerados, somente, como um dos muitos elementos que contribuem para o

desenvolvimento social e humano, isto é, são meios propiciadores das condições

de bem-estar social.

Apesar de crescimento não significar, necessariamente, desenvolvimento, é

frequente falar-se de modelos de crescimento ou de desenvolvimento de uma

forma indiferenciada, o que a nosso ver é incorrecto uma vez que, como já foi

referido, o crescimento do PNB, embora necessário, é insuficiente para assegurar

o desenvolvimento. Com efeito, o desenvolvimento terá que ser económico, social

e humano pelo que terá de se preocupar não apenas com a satisfação das

necessidades essenciais mas, também, com a implementação de um processo

dinâmico de participação dos agentes sociais, isto é, da população em geral, das

empresas, das organizações patronais e sindicais, das instituições públicas, etc.

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4

Por outro lado, o desenvolvimento deve ser um processo sustentável, isto é,

deverá ter na sua raiz competências, factores e recursos humanos que assegurem o

desenvolvimento como um processo continuado e dinâmico capaz de se auto

alimentar numa perspectiva de médio/longo prazo.

O processo de desenvolvimento, pelo atrás descrito, atinge e transforma

profundamente todas as dimensões da sociedade humana, pelo que, cada

experiência particular constitui uma realidade global, evolutiva e específica.

A complexidade do problema corresponde a uma enorme variedade de hipóteses,

teorias e explicações que a ciência económica tem apresentado ao longo do tempo

para compreender e analisar. Daí a nossa preocupação, ao longo deste capítulo,

em identificar os componentes básicos do mecanismo propulsor do

desenvolvimento presentes nos vários modelos de crescimento versus

desenvolvimento.

Em modelos e explicações muito distintas entre si é possível identificar quatro

“motores” essenciais do desenvolvimento – acumulação de capital, inovação,

vantagens comparativas e dimensão de mercado – a que correspondem outras

tantas forças económicas dinâmicas, nomeadamente: o investimento físico, a

iniciativa empresarial, a especialização internacional e o aproveitamento de

economias externas e de escala.

Na estruturação do capítulo, optou-se pela apresentação e análise das principais

teses e modelos apresentados pelos autores que, em nosso entender, mais se

distinguiram no estudo do processo de crescimento versus desenvolvimento.

Assim, debruçar-nos-emos sobre os modelos de crescimento clássicos, dos quais

destacamos as contribuições de Adam Smith, Malthus, Ricardo e Stuart Mill, o

modelo marxista, os modelos neoclássicos (considerados microeconómicos) de

Jevons e Walras, o modelo schumpeteriano que introduz a inovação e progresso

tecnológico como elementos dinamizadores do processo de crescimento (sendo

por isso considerado o primeiro modelo de desenvolvimento puro), o modelo

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keynesiano e os neokeynesianos de Kaldor e de Kalecki e, finalmente, os modelos

em que o comércio e condicionantes externas assumem um papel importante no

desenvolvimento, ou seja, os modelos de Ronald Findlay, de Paul Krugman, de

Arthur Lewis, e de Michael Bruno.

1.2. A ESCOLA CLÁSSICA

1.2.1. A divisão do trabalho e crescimento económico

Adam Smith viveu numa época de mudanças extraordinárias na economia,

provocadas pela introdução da máquina a vapor e outras inovações que

permitiram revolucionar a indústria têxtil nos finais do séc. XVIII. Smith, embora

tenha acompanhado a 1ª Revolução Industrial1, negligenciou o capital fixo dado

estar convicto de que a agricultura (e não a indústria) era a principal fonte de

riqueza da Grã-Bretanha. Partindo da teoria da divisão do trabalho, irá concluir

que a riqueza é criada pelo trabalho, logo a diferente produtividade do mesmo é a

causa de umas nações serem mais ricas do que as outras. Smith com a sua obra An

Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations, publicada em 1776,

embora denotando ainda a tradição mercantilista apresenta já uma preocupação

central que, na linguagem actual, designamos por teoria do desenvolvimento

económico. Antes, porém, de analisarmos a visão smithiana do desenvolvimento

relembraremos as suas concepções quanto ao problema do valor.

Em primeiro lugar, Adam Smith distingue o valor de uso do valor de troca.

Assim, segundo Smith, enquanto o valor de uso é a utilidade que um qualquer

objecto possui, o valor de troca é a quantidade que qualquer objecto tem de

oferecer vantagem para ser trocado por outro bem. O valor de troca é, por um

lado, uma função do trabalho já que a natureza nada cria, é o homem que tudo faz

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(cit. Taylor, 1997, p. 51) e, por outro, depende das variações da oferta e da

procura no mercado, aumentando na medida em que a procura é superior à oferta

e diminuindo quando a oferta é superior à procura. Aos conceitos de valor de uso

e de valor de troca estão ligados o preço natural e o preço de mercado. Enquanto

o preço natural ou normal corresponde ao custo marginal de um produto, o preço

de mercado é determinado pela situação da oferta e da procura, pelo que, nem

sempre estes dois preços coincidem. Partindo do pressuposto de que não havia

identificação entre o preço e o valor Smith, tal como os outros autores clássicos

posteriores, considerou o trabalho como medida de valor pelo que o trabalho é a

essência do valor.

A divisão do trabalho proporciona uma crescente especialização da mão-de-obra

que ao favorecer o aumento da produtividade, entretanto apropriada e acumulada

pelos detentores dos meios de produção, vem a constituir-se num factor de

desenvolvimento. Assim o processo de desenvolvimento estaria dependente, por

um lado, da crescente divisão do trabalho e, por outro, da acumulação de capital.

O contexto das forças de mercado e a mão invisível da concorrência assegurariam

o desenrolar automático do processo. Além disso, a divisão do trabalho levaria à

separação entre trabalho produtivo e não produtivo. O trabalho produtivo

acrescenta valor líquido ou, segundo as palavras de Smith, fixa-se e corporiza-se

em qualquer objecto particular ou mercadoria vendável, enquanto os serviços do

trabalho improdutivo deixam, em geral, de existir no próprio instante em que são

prestados (cit. Blaug, 1989, p. 97). Por conseguinte, quanto maior for a proporção

de trabalho que é produtivamente empregada, tanto maior será o stock existente e

tangível de meios de produção, assim como a capacidade de produção da

economia no ano seguinte. Isto leva Smith a considerar um conceito bruto e outro

líquido do rendimento da sociedade. A separação entre eles parece residir no valor

da produção2 de cada ano que é necessária para assegurar a mesma produção no

ano seguinte. O rendimento seria líquido quando constituía uma potencialidade de

1 Na altura em que Adam Smith publicou An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations (1776), a fábrica média, movida a força hidráulica, empregava 300 a 400 trabalhadores, e não havia mais do que vinte ou trinta estabelecimentos do género em todas as Ilhas Britânicas. 2 Ou rendimento bruto que compreendia a depreciação do capital fixo, o capital circulante e a remuneração dos factores de produção.

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crescimento futuro da produção, pelo que, quanto maior fosse a proporção de

trabalho produtivo na sociedade, maior seria a capacidade de aumento de

produção.

A acumulação de capital, ou criação de rendimento líquido, estaria dependente da

repartição entre classes sociais. Enquanto os trabalhadores recebiam um

rendimento praticamente equivalente às suas necessidades de consumo, o que

implica uma poupança nula, os proprietários e capitalistas dispunham de um

excedente, que era canalizado para o investimento, leia-se, aumento das

capacidades produtivas. Daí, Smith concluir que a poupança abundante dos

capitalistas a par da liberdade das trocas, são as condições necessárias e

suficientes para o crescimento económico.

1.2.2. O aumento da população na óptica dos clássicos

No final do século XVIII, discutiam-se os resultados do primeiro censo completo

da população inglesa, segundo os quais, parecia depreender-se o crescimento

rápido da mesma no final do século. Malthus (1798), ao contrário de Godwin

(1793) que defendia o aumento demográfico, enuncia o famoso princípio segundo

o qual a população tenderia, naturalmente, a crescer em progressão geométrica,

enquanto os alimentos apenas poderiam aumentar em progressão aritmética3.

Desta “lei” resultaria uma ameaça ao progresso humano já que se, por um lado, só

a muito longo prazo a mentalidade das classes trabalhadoras poderia evoluir no

sentido da diminuição da taxa de natalidade, por outro lado, nem o progresso

técnico nem o comércio internacional tinham capacidade para compensar o

crescimento demográfico.

3 A razão de ambas as progressões é 2 e o intervalo entre os termos das progressões correspondem a 25 anos.

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8

Malthus ao reconhecer que os salários tenderiam inexoravelmente a fixar-se ao

nível da subsistência - mínimo considerado indispensável pelo chefe de família,

em determinada época, para a sustentar - apelava à limitação voluntária da

natalidade, de forma a atingir-se um nível de subsistência mais elevado. O

crescimento da economia, segundo Malthus, passava pelo aumento da procura

efectiva4 dos produtos, isto é, de uma procura5 feita por aqueles que têm os meios

e a vontade de dar um preço suficiente (cit. Denis, H., 1978, p. 356). A posição de

que o crescimento da produção, em economia capitalista, se baseia no crescimento

prévio da procura vem, por um lado, reafirmar a tese de Sismondi de que toda a

poupança cria uma situação de subconsumo e, por outro lado, discordar da “lei

dos mercados”, atribuída ao francês Jean Baptiste Say (1803), segundo a qual a

oferta cria a sua própria procura, pelo que o mercado tenderia, automaticamente, a garantir o

pleno emprego dos recursos produtivos.

Embora concorde com a tese de que a economia capitalista tende para o

subconsumo, Malthus admite a possibilidade de ocorrerem crises de

superprodução provocadas pelo excesso de capital relativamente aos mercados6 e

não pela sua insuficiência tal como advogavam Say e Ricardo. A implementação

de grandes obras públicas, o desenvolvimento do comércio interno e externo a par

da manutenção ou aumento dos improdutivos (Administração Pública, corpos

judicial e militar, pessoal médico, sacerdotes) conduziria ao equilíbrio e, portanto,

ao desaparecimento das crises de sobreprodução. De ressalvar, no entanto, que

enquanto às grandes obras públicas era atribuído um efeito temporário sobre o

crescimento, a intensificação do comércio interno e externo era considerado um

elemento impulsionador do crescimento económico.

Não obstante a obra de Malthus encerrar em si uma contradição importante – se

por um lado, é impossível alcançar o crescimento económico devido ao rápido

4 A expressão “procura efectiva” entrou definitivamente no vocabulário corrente após a sua utilização por Keynes. 5 Deve haver qualquer coisa na situação anterior da procura e da oferta (...) previamente à procura ocasionada pelos novos trabalhadores (...) para que o emprego de um número adicional de pessoas na produção seja garantido (cit. Denis, H., 1978, p. 359). 6 Esta tese viria a ser retomada por Keynes após a grande crise de 1929.

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9

aumento da população, por outro o emprego e a produção podem crescer desde

que se propicie o desenvolvimento da procura efectiva -, o autor é o único

economista clássico a colocar correctamente o problema dos mercados necessários

para o crescimento da economia capitalista.

1.2.3. O “modelo do cereal” de Ricardo7

David Ricardo viveu numa época em que as contradições do sistema capitalista

começavam a manifestar-se a um ritmo crescente. Se, por um lado, se assistia à

concentração e centralização do capital enquanto a agricultura tendia para a

estagnação, por outro lado, a França e a Alemanha começavam a concorrer com a

Inglaterra nos mercados de matérias primas e de produtos fabricados. Além disto,

a independência dos EUA foi outro factor importante que contribuiu para a crise

do capitalismo inglês. Ricardo, influenciado por esta situação e preocupado em

encontrar uma saída para a crise, veio a destacar-se ao publicar os Principles of

Economy (1817). Para ele, o Comércio Internacional livre e sem restrições

proporcionaria essa saída.

Diferentemente de Smith, Ricardo defende a concepção que explica o valor das

mercadorias pela quantidade de trabalho necessário à sua produção. No trabalho

incorporado, há a considerar dois tipos de trabalho, o trabalho directo, ou seja, o

número de horas necessárias à produção de um bem e o trabalho indirecto, que

corresponde ao trabalho cristalizado nos instrumentos de produção.

Na teoria ricardiana do valor está implícita a consideração do custo como a causa

do valor8 uma vez que, por um lado, Ricardo considera, como determinante do

valor de um bem, o trabalho incorporado na sua produção e, por outro, o valor de

7 Ou teoria dos lucros em termos de trigo 8 Alguns marginalistas, entre os quais se destaca Böhm-Bawerk (1889), elaboram a sua teoria do valor a partir desta constatação.

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um bem é dado pela quantidade de horas de trabalho necessárias à sua produção.

A noção de mais-valia encontra-se, de certo modo, implícita na afirmação de que

a remuneração do trabalho real não está, necessariamente, em proporção com o

que ele produz (cit. Reigado, 1980, p.12) e continua se supusermos que o trigo e

os objectos manufacturados se vendem sempre ao mesmo preço, os lucros serão

sempre elevados ou reduzidos segundo a alta ou a baixa dos salários (cit. Denis,

1978, p. 344). Assim, o valor do rendimento nacional seria fixado e limitado pela

concorrência entre os capitalistas e os operários. Aos possuidores da terra,

contudo, é-lhes dado um tratamento diferente em virtude do seu rendimento – a

renda – ter uma natureza também diferente. Tal deve-se ao facto de a oferta do

factor terra ser inelástica pelo que à medida que a procura deste factor produtivo

aumenta, vão-se introduzindo terras menos férteis na produção9 levando os

rendimentos marginais a decrescer. Esta tendência pode, no entanto, ser

contrariada com a introdução de novas técnicas que permitem o incremento da

taxa de lucro e, portanto, a expansão da produção.

O pagamento da renda é, para Ricardo, excepcional e não afecta a lei do valor de

troca, segundo a qual as mercadorias se trocam em função do seu custo, isto é,

pelo trabalho incorporado na mercadoria produzida nas condições mais

desfavoráveis. O valor de troca de qualquer género - afirma Ricardo - (...)

depende, pelo contrário, da maior quantidade de trabalho que são forçados a

empregar aqueles que não têm semelhantes facilidades e os que, para produzir,

têm que lutar contra as circunstâncias mais desfavoráveis (ibid., p. 340). Daqui

pode-se deduzir que a renda é um pagamento independente do valor e define-se

como o pagamento que o rendeiro faz ao proprietário das terras pelo direito de

explorar as faculdades primitivas e indestrutíveis do solo. A renda resulta da

escassez da terra ou, por palavras de Ricardo, assim que, em consequência dos

progressos da sociedade, se entregam à cultura terrenos de fertilidade

secundária, começa a renda para os primeiros (proprietários), e a taxa de renda

depende da diferença na qualidade respectiva das duas espécies de terras (cit.

Taylor, 1997, p. 58).

9 Com menores níveis de produtividade.

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11

Sendo o valor da renda pré-determinado pela diferença entre o valor do produto e

o respectivo custo, o problema de repartição do rendimento coloca-se, então, entre

trabalhadores e capitalistas. De salientar que o pagamento dos factores trabalho e

capital se deve manter no mínimo, isto é, o salário real será apenas o necessário

para reproduzir a força de trabalho ao mesmo nível e os lucros serão somente os

necessários para manterem constantes os stocks de capital. O excedente entretanto

criado levará a um acréscimo da poupança tornando os investimentos mais

atractivos para os investidores (só os capitalistas têm poupanças que canalizam

para o investimento) pelo que a existência de uma taxa média de lucro

suficientemente elevada seria a única condição, necessária e suficiente, do

crescimento económico. No entanto, dado os lucros tenderem a situar-se no ponto

mínimo (garantindo a reprodução simples), o aumento da produção só é possível

desde que se verifiquem acréscimos de produtividade da mão-de-obra e,

consequentemente, dos lucros. Mas, mesmo neste caso, o equilíbrio seria

restabelecido pela concorrência levando a uma situação de estacionaridade10. É

neste ponto que se articulam as teorias do valor e da renda com a dinâmica do

crescimento, ou seja, os rendimentos marginais tenderiam a decrescer e essa

marcha implacável para uma situação de impasse só poderia ser retardada pelas

trocas comerciais entre os países ou pela introdução de novas tecnologias de

cultivo das terras. No entanto, a prazo, viria a verificar-se a saturação da

capacidade de inventividade e de utilização das terras aptas para a actividade

agrícola, pelo que o comércio internacional deveria ser considerado como o único

agente potencialmente desbloqueador do ciclo gerador de uma situação de

impasse11. Ricardo preocupou-se, fundamentalmente, com as exportações, pois

apresentava-se-lhe como a única forma de superar uma crise de sobreprodução

decorrente da exiguidade do mercado interno. As importações de bens e matérias-

primas a custos inferiores aos nacionais contribuíam para o aumento da taxa de

10 A situação de estacionaridade, segundo Ricardo, tem como características: produção estagnada; população constante; lucro igual ao prémio de risco; salário real igual ao salário natural. 11 Adam Smith tinha uma visão retrospectiva da sociedade mais optimista e Malthus levou o pessimismo de D. Ricardo às últimas consequências, baseando-se no já referido princípio de que enquanto os recursos aumentam em progressão aritmética, a população aumenta em progressão geométrica.

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12

lucro. A saída para a crise do capitalismo inglês deveria procurar-se no comércio

internacional12 que deveria ser livre, isto é, sem quaisquer restrições.

A concepção de vida económica, que está subjacente à teoria da renda e do

crescimento de Ricardo reflecte, por um lado, a importância primordial da

agricultura na determinação da taxa média de lucro de toda a economia e, por

outro, o facto de este não antever as mutações que viriam a operar-se nos países

europeus mais evoluídos, em consequência da revolução industrial. De referir, no

entanto, o papel importante de David Ricardo no aprofundamento da própria

teoria da dinâmica de crescimento das economias e dos conceitos valor de uso e

valor de troca das mercadorias.

1.2.4. O estado estacionário na escola clássica

Stuart Mill13, considerado como “revisionista” da tradição clássica, é também um

socialista moderado de tipo reformista, tendo a sua obra exercido uma influência

comparável à da Riqueza das Nações de Adam Smith. Mill ao fazer a síntese da

tradição clássica do pensamento económico modificou os fundamentos

ideológicos dessa tradição. Assim, e segundo Stuart Mill, a felicidade dos

indivíduos depende tanto de aspectos quantitativos como qualitativos, logo há

diferentes ordens de prazer ou satisfação, pois, como ele escreveu, mais vale ser

um Sócrates insatisfeito que um tolo satisfeito (cit. Murteira, 1990, p. 89).

Efectivamente, o crescimento económico ou o enriquecimento das nações, não só

não garante espontaneamente uma repartição equitativa das riquezas como

também conduz ao predomínio duma ordem inferior de satisfação humana14.

12 A Teoria dos Custos Comparativos, de David Ricardo, é a base da maior parte das modernas teorias da Economia Internacional. 13 Stuart Mill publicou a sua obra principal, Principles of Political Economy, no mesmo ano em que Marx editava o seu Manifesto Comunista (1848). 14 O exemplo dos EUA, a economia mais avançada na época, não seduzia o autor chegando a escrever ...Todas as vantagens parecem reduzir-se a que a vida de um sexo é totalmente dedicada à caça ao dólar e a do outro à criação dos caçadores de dólares (cit. Murteira, 1990, p. 90).

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13

Stuart Mill distinguiu claramente as “leis” relativas à produção das que

comandam a repartição. As primeiras seriam imutáveis, impossíveis de alterar de

acordo com a vontade humana, enquanto as outras poderiam e deveriam ser

modificadas de modo a possibilitar o progresso das classes trabalhadoras,

designadamente através da sua promoção cultural, de molde a que a limitação

voluntária do crescimento demográfico permitisse ultrapassar os estritos níveis de

subsistência. O socialismo moderado de Mill apontava para reformas mitigadas da

organização social, compatíveis com a democracia política, e traduzidas em certas

medidas do Estado (regulamentação de herança, promoção do trabalho pela

educação, tributação das fortunas, etc.) e em fórmulas de cooperação capital-

trabalho.

1.3. A TEORIA MARXISTA

1.3.1. A teoria da mais-valia e da acumulação de capital

A teoria económica marxista apareceu na segunda metade do século XIX numa

altura em que, se por um lado, as crises do capitalismo começavam a pôr em

causa o sistema económico e social, por outro, o proletariado industrial tinha-se

tornado numa poderosa força revolucionária. O desenvolvimento das forças

produtivas, proporcionado pelo processo de industrialização do séc. XVIII e início

do séc. XIX, tornou-se num factor importante de desenvolvimento social ao

permitir a emergência e consolidação do proletariado que, estando na génese da

teoria económica marxista, irá adoptá-la como sua. Apoiado no método de

pesquisa por si elaborado (o materialismo histórico e o materialismo dialéctico),

Marx conclui que todo o processo histórico tem como base o desenvolvimento da

produção material15.

15 Ver o prefácio da Contribuição à Crítica da Economia Política, (1975), pp. 27-31

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Toda a teoria económica marxista assenta na teoria da mais-valia e da acumulação

de capital. Apoiando-nos na sua obra Contribuição para a Crítica da Economia

Política verificamos que o valor de uma mercadoria é a materialização do

trabalho humano abstracto e é sempre o produto de um trabalho particular,

concreto e útil (Marx, 1975, pp. 35-66). O valor de uma mercadoria corresponde

ao trabalho abstracto cristalizado nesta, pelo que, só o trabalho cria valor. O

trabalho concreto seria, portanto, uma manifestação operacional do trabalho

abstracto. Por sua vez, o valor de troca de uma determinada mercadoria deve

expressar-se em termos quantitativos, pelo que a quantidade de trabalho

abstracto constitui a substância do valor expresso na troca (ibid.).

O valor da força de trabalho determina-se pela quantidade de trabalho necessária

à sua produção, tal como qualquer outra mercadoria, sendo a diferença entre o

custo da força de trabalho e o resultado prestado pelo trabalhador a mais-valia

que, transformando-se num rendimento, é apropriado pelo detentor dos meios de

produção. Por sua vez, o valor de um produto é superior ao valor criado num

determinado período, uma vez que parte do valor do produto resulta do valor

transferido de uma mercadoria pré existente levando-nos a definir os conceitos de

capital constante e variável. Assim, o valor do capital constante corresponde ao

valor de todos os meios de produção utilizados, enquanto o capital variável será o

valor da força de trabalho empregue na actividade produtiva. Por outro lado, o

capital constante subdivide-se em capital fixo considerado o valor das máquinas,

instrumentos de trabalho, instalações etc., e circulante que compreende os

materiais de produção, tais como matérias-primas e auxiliares e produtos

semiacabados. No processo produtivo, Marx considera somente a fracção do

capital fixo desgastada na produção, segundo uma taxa de desgaste físico, e as

matérias primas consumidas. O produto ou valor da produção é, então, o

somatório dos capitais constante e variável e da mais-valia:

Y = C + V + Mv sendo C = u . K + m

onde,

Y - Valor da produção de um dado sector económico C - Capital constante (investido e gasto)

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V - Capital variável (investido e gasto) Mv - Mais-valia u - Taxa de remuneração do capital fixo K - Capital fixo m - Matérias-primas

A mais-valia subdivide-se em absoluta e relativa. A primeira depende apenas do

horário de trabalho e do número de trabalhadores, a segunda depende da

produtividade. Os acréscimos de produtividade e, consequentemente, da mais-

valia relativa estão relacionados com a introdução de inovações tecnológicas e de

novos métodos de produção. Dadas as particularidades do processo de

acumulação capitalista, os detentores dos meios de produção e os empresários são

compelidos a substituir, progressivamente, trabalho humano por maquinaria (para

obterem um super lucro), elevando a composição orgânica do capital e baixando,

no longo prazo, a taxa de lucro. Além disto, à medida que a composição orgânica

do capital vai aumentando vai-se verificando uma redução, em termos relativos,

da procura de trabalho e da taxa de lucro que dada a sua persistência se transforma

numa lei. Segundo a Lei da Baixa da Taxa de Lucro, esta varia inversamente com

a “composição orgânica do capital” q e directamente com a taxa de mais-valia

Mv , isto é 1+

=+

=qVC

Mr

v σ onde r é a taxa de lucro (cit. Blaug, 1989, p. 325).

A baixa tendencial da taxa de lucro, estudada desde Adam Smith, levaria a uma

situação em que a acumulação de capital deixaria de se efectuar e,

consequentemente, a economia entrava num estado estacionário. Marx retoma esta

análise e deduz conclusões bastante diferentes das anteriores. Em seu entender, é

de excluir que uma economia capitalista se instale duradoiramente num estado

estacionário, antes pelo contrário, a baixa da taxa de lucro cria uma situação

instável e explosiva de subemprego das forças produtivas que conduz ao

derrubamento do sistema.

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16

1.3.2. As crises e agudização das contradições internas do capitalismo

A Lei da Baixa Tendencial da Taxa de Lucro, no sistema capitalista, é

fundamental para a análise do carácter cíclico16 do crescimento económico. Esta

questão, cuja compreensão exige o estudo do binómio

sobreprodução/insuficiência da procura, foi considerada por Schumpeter17 como o

grande capítulo não escrito da obra de Marx. Outros autores, entre os quais

destacamos Bukharine (197), Hilferding (1910), Rosa Luxemburgo (1913),

Sternberg (1926), Sweezy (1942), Baran (1957) também se debruçaram sobre este

problema.

Marx divide a esfera total da produção em dois sectores: o primeiro corresponde

aos ramos ou empresas que fabricam os meios de produção18 e o segundo sector

aos ramos ou empresas que produzem as mercadorias consumíveis, ou seja, os

bens destinados ao consumidor final. A análise19 das crises do capitalismo assenta

na diferença dos ritmos de crescimento verificada entre os sectores. A capacidade

de produção do sector II tenderia a crescer, aumentando a sua composição

orgânica do capital, pelo que aumentaria a procura de bens de equipamento

relativamente ao sector I, baixando, todavia, a fracção correspondente ao fundo

salarial distribuído. O sector I, solicitado pelo II, alargaria a sua capacidade de

produção, com o aumento simultâneo da composição orgânica. Os capitalistas do

sector II ao pretenderem uma redução dos custos provocam um acréscimo

suplementar da composição orgânica e, uma vez que o sector I produz bens de

equipamento para si próprio e para o sector II, a procura de bens de capital por

16 Marx não tem, propriamente, uma teoria especial dos ciclos económicos e não haveria necessidade de a elaborar já que as crises são meramente expressões da contradição fundamental do capitalismo, ou seja, o mecanismo que aumenta os lucros destrói as oportunidades de investimento. 17 Schumpeter, J. , (1966), Ten great economists, Unwin University Books. 18 Marx considera as matérias-primas como meios de produção. No entanto, dadas as características das matérias-primas, admite-se que estas dependem do sector I ou do sector II segundo a natureza dos produtos finais em que se incorporam. 19 Admite-se que: 1) a procura global é igual à oferta global; 2) a procura de um sector é igual à sua oferta; 3) a realização de equilíbrio num sector garante a realização de equilíbrio no outro sector e, de um modo geral, para toda a economia; 4) o investimento bruto é igual à poupança bruta quando esta seja fracção determinada do valor total da produção.

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17

parte de II produz efeitos aceleradores em I. Assim, os sucessivos aumentos da

composição orgânica do capital com a consequente diminuição da massa salarial

estão na origem de uma crise de sobreprodução.

A realidade actual parece não confirmar esta evolução. Com efeito, se olharmos

para as economias europeias20, verifica-se que o grande contributo para o

crescimento do PIB é dado pelo investimento público e privado. A título de

exemplo registe-se que, segundo o Banco de Portugal21, em 1997, enquanto o PIB

em relação ao ano anterior cresceu 4%, o crescimento das suas rubricas, na óptica

da despesa, oscilou entre 2,6% relativos ao consumo público e os 12,8% do

investimento, de onde se deduz que o aumento da composição orgânica do capital

não é o principal responsável pelas crises de sobreprodução como afirmava Marx.

O comércio internacional de mercadorias e de capitais é considerado uma

consequência do tendencial agravamento das contradições internas do sistema

capitalista. As relações entre o modo de produção capitalista e outros modos de

produção, segundo Rosa Luxemburgo, decorrem essencialmente da necessidade

de realização da parte de mais-valia destinada à acumulação o que conduz à

procura constante de novos mercados no exterior e à sua monopolização em

proveito das grandes potências industriais. Perante o facto de as taxas de lucro

tenderem a igualizar-se (processo que Marx chamou de perequação das taxas de

lucro), a mais-valia suplementar obtida nos países com salários mais baixos é

transferida para os países onde os salários são mais elevados através do

mecanismo dos preços.

Em termos gerais, as abordagens marxistas sobre a internacionalização da

produção capitalista podem dividir-se em duas correntes principais: 1) a

“ortodoxa” ou “tradicional”, segundo a qual a internacionalização da produção

tem em vista aproveitar os salários baixos praticados nos países do “centro”; 2) a

20 Pelo menos de dimensão idêntica à economia portuguesa. 21 Relatório Anual de 1997, pp. 64 – 82

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18

da Monthly Review22 que se aproxima, de certa forma, de Lenine, a qual explica a

internacionalização de produção pela necessidade de canalizar o excedente do

produto obtido nos novos mercados externos23. Estas abordagens, no entanto, não

permitem explicar quais as razões que levam as multinacionais a recorrerem,

predominantemente, ao crédito e não à transferência de capitais provenientes do

país de origem ou o que leva o investimento americano a ser canalizado para a

Europa em detrimento do Terceiro Mundo ou ainda o que leva as economias

emergentes da Ásia a efectuarem grandes investimentos nos países

industrializados do ocidente.

1.4. A TEORIA NEOCLÁSSICA

1.4.1. Os percursores da escola neoclássica

O pensamento de Karl Marx exerceu uma grande influência, não apenas no

movimento operário, mas também no meio intelectual ligado à investigação e ao

ensino das ciências humanas, provocando um facto inédito na história da

economia política: os economistas seus contemporâneos para melhor

salvaguardarem as distâncias relativamente às teses marxistas repudiaram os

ensinamentos dos economistas clássicos ingleses. Por exemplo, em 1871, o

britânico William S. Jevons, publicava a Teoria da Economia Política em que na

tentativa de renovar inteiramente a ciência económica apelava, por um lado, para

as matemáticas e, por outro, recuperava o princípio marginal24 já utilizado por

Ricardo no seu estudo sobre a distribuição do rendimento agrícola. No mesmo

ano, o austríaco Carl Menger, na obra Fundamentos da Economia Política,

analisava o comportamento do consumidor baseando-se no mesmo princípio. Nos

Elementos de Economia Política Pura, publicados em 1784, por Leon Walras

22 Baran e Sweezy foram os seus principais adeptos. 23 Canalizando o excedente do produto para os países industrializados. 24 O marginalismo assenta, fundamentalmente, nos seguintes pressupostos: 1) existência de concorrência perfeita em todos os mercados; 2) os sujeitos económicos comportam-se sempre de forma a maximizar as suas utilidades individuais; 3) as necessidades são insaciáveis.

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19

vamos encontrar concepções sobre o problema do valor, idênticas às de Jevons e

de Menger. No entanto, apesar da semelhança de resultados, o economista francês

propôs uma formalização do problema económico cuja importância ainda hoje é

reconhecida.

Jevons, Menger e Walras apresentam nas suas obras uma nova teoria do valor

apoiando-se na noção de utilidade marginal e da teoria da repartição dos

rendimentos, partindo da noção de taxa final de rendimento do capital (em

linguagem actual, produtividade marginal do capital). Daí, considerar-se estes três

autores como os fundadores da Teoria Marginalista.

A teoria neoclássica, como salientou Cláudio Napoleoni (1973), tem como centro

de orientação predominante a noção de equilíbrio – equilíbrio geral, na

formulação de Walras, da escola de Lausanne, e equilíbrio parcial, de Alfred

Marshall, da escola de Cambridge. Esta orientação leva a que os walrasianos

coloquem a questão: dadas certas quantidades iniciais de recursos, estabelecidas

as técnicas de produção e assumidas determinadas preferências dos sujeitos

económicos, como determinar as quantidades trocadas e os preços de equilíbrio?

Para Marshall, a questão é outra: como se comporta e atinge o equilíbrio cada

unidade de produção e o conjunto das unidades que produzem o mesmo bem

numa situação de concorrência ? A resposta a estas questões só é possível

recorrendo ao conceito de valor e à teoria da repartição do rendimento dos

neoclássicos.

O valor de um bem, ao contrário do que se considera nas teorias clássica e

marxista, não é determinado pelo trabalho nele incorporado, mas sim pelo grau de

utilidade. Partindo da noção da taxa final de rendimento do capital (produtividade

marginal do capital), os neoclássicos mostram que o emprego do capital é

vantajoso já que permite diferir o momento em que se goza dos frutos do trabalho

gasto na produção. Esta análise vem, de certa forma, confirmar a tese dos autores

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20

clássicos segundo a qual o valor inteiro dos produtos deriva do trabalho

despendido, tendo o emprego do capital por efeito a modificação da repartição

temporal do dispêndio de trabalho e aumentar a sua produtividade. O rendimento

marginal do capital deve, segundo os neoclássicos, ser igual em toda a parte

levando a que cada negócio empregará capital até ao ponto em que o capital tem

um rendimento justamente igual ao juro corrente (Jevons, 1871, p. 237). Em

relação aos salários, estes dependem da produtividade do trabalho, já que sendo a

taxa de juro, aqui entendida como a remuneração do capital, fixada anteriormente,

quanto mais elevado for o produto total, mais elevado é o salário. Esta tese de

determinação do salário pela produtividade líquida do trabalho será aplicada em

substituição das teorias clássicas do salário de subsistência ou do fundo de

salários25. O abandono da teoria de Smith e Ricardo sobre o valor, impulsionada

pelos neoclássicos, deverá ser entendida à luz da adopção da teoria dos três

factores de produção26: o trabalho, o capital e os agentes naturais27.

A economia política pura de Walras consiste na construção de um modelo

matemático (sistema de equações simultâneas) que permite definir, de um modo

preciso, a situação em que tende a estabelecer-se uma economia que assenta na

livre troca dos produtos, na venda livre da força de trabalho, na livre circulação

dos capitais e no livre aluguer das terras. Este é considerado o primeiro modelo28

completo do equilíbrio geral dos preços e das trocas. Aqui, o equilíbrio define-se

como uma situação tal que nem os consumidores, nem os produtores, tenham

25 A teoria de fundo do salários, defendida por Stuart Mill,, sustenta que o montante de capitais destinados ao pagamento de salários é determinado e fixo, num certo momento, de modo que o salário por operário é igual ao quociente desse fundo pelo número dos trabalhadores empregados. 26 Jean-Baptiste Say enunciou esta teoria no início do séc. XIX. 27 Entre os agentes naturais, segundo Say, só a terra deverá interessar aos economistas, uma vez que é o único elemento a ser apropriado enquanto que o usufruto dos outros elementos naturais é gratuito. 28 Na elaboração do modelo, Walras utiliza a lei de igualação das utilidades marginais ponderadas dos bens com os preços dos produtos e a teoria dos serviços produtores de Jean-Baptiste Say. Em 1803, Say publicava o Tratado de Economia Política no qual formulava a teoria segundo a qual a produção se realiza graças ao concurso de três elementos: trabalho, capital e agentes naturais, isto é, a terra devido ao facto de ser apropriável. Assim, cada um destes elementos indispensáveis ou factores de produção traz o concurso dos seus “serviços produtivos” aos chefes de empresa e obtém em troca um rendimento, que é o preço destes serviços. Os salários, os lucros e as rendas fundiárias são os preços de serviços, que se determinam em função da sua oferta e procura.

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21

interesse em modificar as quantidades de bens e de serviços que procuram ou

oferecem nos diferentes mercados. Esta situação é considerada normal e só poderá

ser modificada no caso da intervenção de causas exteriores ao sistema de trocas.

Gustavo Cassel, economista sueco, aluno de Walras, foi o primeiro a conseguir

traduzir a teoria microeconómica walrasiana num verdadeiro modelo

micro/macro. Na sua obra Theoretische Social-ökonomie, publicada em 1918,

Cassel apresenta um modelo geral de equilíbrio em forma aritmética com n

sectores e r factores de produção. A base de raciocínio deste modelo assenta no

pressuposto de que se verificará equilíbrio duradouro entre a procura e a oferta de

factores produtivos e de bens finais. A procura de factores produtivos é, segundo

o modelo, determinada pela procura de bens finais através dos coeficientes

técnicos aij considerados constantes29.

Os economistas clássicos e neoclássicos interessavam-se, antes de mais, pelo

ritmo do crescimento da economia e viam no liberalismo um meio de assegurar

um rápido crescimento económico. Jevons, um neoclássico, afirma que o

crescimento económico é possível desde que as capacidades de produção

disponíveis em determinado momento sejam utilizadas da melhor maneira

possível num clima de respeito pela liberdade das trocas. A sua não preocupação

pelo crescimento económico advém do facto de, tal como os clássicos, adoptar o

ponto de vista, segundo o qual o crescimento económico depende, essencialmente,

do montante da poupança. Segundo a sua concepção, o que certas regiões da

Europa realizam, as outras regiões do mundo também podem realizar, bastando

para isso imitar as nações mais avançadas. Esta forma de colocar o problema do

subdesenvolvimento é, igualmente, uma consequência da tese clássica sobre o

crescimento. Se, no entanto, adoptarmos as concepções de Malthus e da sua

escola de que o motor da industrialização são os mercados externos, o problema

aparece de forma diferente. Neste caso, a monopolização do comércio mundial

pelas regiões mais avançadas tende a interditar a outras regiões a sua

29 Coeficiente técnico ou, mais propriamente, coeficiente de inputs intermédios, mede a intensidade das compras que o sector j (produtor) terá que fazer ao sector i (fornecedor), por unidade de produto do sector j .

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22

industrialização. De referir que, no entanto, este problema nunca foi, de facto,

discutido em profundidade pela escola neoclássica.

1.4.2. Os modelos micro económicos e teoria da produção

Os modelos neoclássicos são, essencialmente, modelos microeconómicos, logo

aplicados ao fenómeno “empresa”. De acordo com os marginalistas, a empresa,

em termos de rendimentos, atravessa três etapas de desenvolvimento,

nomeadamente: a primeira em que os rendimentos são crescentes para pequenas

quantidades de inputs, a segunda em que os rendimentos são constantes e,

finalmente, à medida que as quantidades de inputs são cada vez maiores, os

rendimentos tornam-se decrescentes. A reacção do nível de produção a um

aumento proporcional de todos os inputs é descrita pelos rendimentos de escala.

Assim, se a produção aumentar na mesma proporção, os rendimentos de escala

são constantes para as combinações de inputs consideradas. São crescentes se a

produção aumentar mais que proporcionalmente, e decrescentes se aumentar em

menor proporção. Esta situação conduz a que uma única função de produção pode

apresentar todos os três tipos de rendimentos

A relação ou a equação que nos dá a quantidade máxima de produto que pode ser

produzida a partir de conjuntos especificados de inputs, ceteris paribus,

designamos por função da produção. Esta função, por um lado, é definida apenas

para valores não negativos dos níveis de inputs e de produtos e, por outro lado, é

construída na suposição de que as quantidades de inputs fixos estão a níveis pré-

determinados, pelo que os empresários não os podem alterar no período em

consideração. Na sua forma mais ampla, a função produção é descrita pela

formula:

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23

q = ƒ (K,L)

onde q é a taxa de produto por período de tempo, K é o fluxo de serviços do

stock de capital por período de tempo e L é o fluxo de serviços dos trabalhadores

da empresa por período de tempo. O período de tempo para o qual são definidos

estes fluxos e, portanto, da função de produção de curto prazo, estando sujeito a

três restrições, deve ser suficientemente: a) curto para que os empresários não

possam alterar os níveis de inputs fixos; b) curto de modo a que o formato da

função de produção não seja alterado devido a melhorias tecnológicas; c) longo

para permitir a realização dos processos técnicos necessários. Esta análise de curto

prazo pode, na maioria dos casos, ser transposta para o longo prazo bastando, para

isso, aumentar o número de inputs variáveis. Em termos gerais, o que esta

equação nos diz é que o produto das empresas é uma certa função dos inputs

capital e trabalho.

Das várias funções de produção existentes a mais utilizada é a função de produção

homogénea30 de Cobb-Douglas (Henderson e Quandt, 1992, p. 79)31:

αα −= 121 xAxq

onde,

Q - Produto agregado A - Constante de dimensão X1 - Quantidade de trabalho X2 - Quantidade de capital α - Elasticidade produção/trabalho, cujo valor será >0 e <1 1-α - Elasticidade produção/capital

A função de Cobb-Douglas é homogénea de 1º grau32, as produtividades

marginais - PMg - de ambos os inputs são homogéneas de grau zero e o caminho

30 Uma função é homogénea de grau k se ƒ(tx1, tx2) = t

k ƒ(x1, x2) onde k é constante e t é qualquer número real positivo. 31 Esta função foi apresentada em 1928 por dois americanos, Cobb C. W. (matemático) e Douglas, P.H. (economista).

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24

de expansão33 gerado por esta função é linear. Esta função foi um instrumento

utilizado na tentativa de uma verificação empírica da teoria marginalista da

distribuição, segundo a qual, independentemente do nível de preços do produto, o

lucro de longo prazo é nulo34.

Nos estudos económicos, utilizam-se com bastante frequência as funções de

produção homogéneas de 1º grau, apesar dos problemas de indeterminação para a

empresa individual. Este problema pode, no entanto, ser resolvido supondo que

(íbid., p. 82):

1. o tamanho e o número das firmas são determinados por algum mecanismo

arbitrário sujeito à condição de que a produção da indústria satisfaça à procura

da indústria;

2. uma indústria possui uma função de produção homogénea de 1º grau, mesmo

que as firmas que a compõem não possuam tais funções de produção.

As funções de produção pertencentes à classe CES são, igualmente, utilizadas

com alguma frequência pese embora a sua difícil manipulação. Estas funções têm

duas características principais cumulativas, ou seja, são homogéneas de 1º grau e

a sua elasticidade de substituição é constante. Refira-se que a simplicidade da

Taxa de Substituição Técnica – TST – levou à sua popularização35. As funções

de produção CES podem ser expressas por uma equação do tipo36 (ibid., pp. 84-

86):

32 Função homogénea de 1º grau tem o Custo Marginal CMg e o Custo Total Médio CTM constantes e uma função de custo total de longo prazo linear. 33 Dado pela função (1-α) r1 x1 - α r2 x2 = 0 34 Contudo, se o empresário vender o seu produto a um preço constante e possuir uma função de produção homogénea de grau um, a análise convencional da maximização dos lucros perde o seu sentido.

35 A Taxa de substituição Técnica é

1

11

+

ρ

αα

x

q

36 Com os parâmetros A<0 e 0<α<1; as produtividades marginais dos inputs são 1

11

+

=

∂∂

ρ

ρα

x

q

Ax

q e

1

22

+

=

∂∂

ρ

ρα

x

q

Ax

q

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25

( )[ ] ppp xaaxAq/1

21 1−−− −+=

onde, ρρρρ é um parâmetro intimamente relacionado com a elasticidade constante de

substituição. Sendo a TST igual à razão de preços dos inputs (ibid., p. 86), isto é:

2

1

/1

1

2

1 r

r

x

x=

σ

αα

e σ

=

2

1

1

2

r

ra

x

x

onde a=[(1-α )/α]σ . A última equação permite-nos verificar que a elasticidade

constante de substituição é também a elasticidade constante da razão de uso dos

inputs (x2/x1) em relação à razão de preços dos inputs. A mesma equação mostra,

ainda, que a razão de uso dos inputs é uma função potência da razão de preços dos

inputs37. Como já admitimos que x1 e x2 são trabalho e capital, respectivamente, a

equação anterior mostra ainda como varia a razão capital-trabalho para um dado

bem, em consequência de variações da razão salário-lucros o que se mostra

bastante útil para o estudo de problemas da teoria do comércio internacional.

Por último refira-se que as funções de produção visam determinar, por um lado, o

ponto de equilíbrio entre a oferta e a procura ao nível da empresa e, por outro, as

condições necessárias ao aumento da produção ou, por outras palavras, para o

crescimento económico. O equilíbrio micro-económico possibilita a criação das

condições necessárias ao estabelecimento do equilíbrio macro-económico e,

consequentemente, do crescimento económico, já que se pressupõe a existência de

um equilíbrio estável e prolongado no tempo entre a oferta e a procura de factores

produtivos e de bens finais.

37 como esta função é linear para os logaritmos das variáveis, os parâmetros a e σσσσ podem ser estimados através de uma análise de regressão linear de uma série temporal.

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26

1.5. O MODELO DE SCHUMPETER

1.5.1. Os contributos do modelo analítico schumpeteriano

Schumpeter38 refuta a ideia de que a economia europeia tende inexoravelmente

para um estado estacionário, bem como os argumentos de Hansen39, afirmando ser

perfeitamente gratuito admitir que as iniciativas susceptíveis de se substituírem às

iniciativas de colonização serão inevitavelmente menos importantes, qualquer

que seja o sentido que se dê a esse adjectivo. Pelo contrário, é perfeitamente

possível que a conquista do ar seja mais importante do que foi a conquista das

Índias: não temos o direito de confundir as fronteiras geográficas com as

fronteiras económicas (Schumpeter, J., 1954, p. 209). Reafirmando esta tese, em

1912, na Teoria do Desenvolvimento Económico, sustenta que a remuneração do

capital (juros ou lucro) é, essencialmente, a remuneração das inovações realizadas

pelos empresários dinâmicos.

A rotura do mundo estacionário e, consequentemente, o início de um processo de

desenvolvimento verificam-se ao nível da produção devido a acontecimentos tais

como a introdução de um novo bem ou a adopção de um novo método de

produção, a abertura de um novo mercado ou a conquista de uma nova fonte de

oferta de matérias-primas ou de produtos semi-acabados ou, ainda, o

estabelecimento de uma nova organização de uma determinada indústria que,

muitas das vezes, alteram profundamente os velhos sistemas produtivos

(Schumpeter40, 1911). O autor, designa estas alterações pelo termo inovações,

enquanto a introdução de uma inovação no sistema produtivo será um acto

38 Schumpeter, em 1912, publicou a obra de referência obrigatória - Teoria do Desenvolvimento Económico. Em 1939, já na América, publicou os Ciclos Económicos nos quais se encontram novos contributos para a teoria do desenvolvimento e em 1942 a obra Capitalismo, Socialismo e Democracia. 39 Alvin Harvey Hansen, professor em Harvard, autor da obra Restabelecimento Integral ou Estagnação (1938), embora se apoie nas análises de Keynes, é de opinião que as economias capitalistas desenvolvidas entraram num período em que se manifesta uma tendência muito clara para a suspensão do desenvolvimento da produção devido a três razões: 1) já não existem no mundo terras ricas e não povoadas para ocupar; 2) a população dos países industrializados tende a tornar-se estacionária; 3) o progresso técnico já não exige, para a sua realização, tantos capitais adicionais como outrora.

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27

empreendedor e empresário aquele que executa este acto. As inovações são, para

Schumpeter, a fonte do desenvolvimento económico que se define como as

modificações nos dados económicos que ocorrem continuamente no sentido de

que o seu acréscimo ou decréscimo podem ser correctamente absorvidos pelo

sistema sem distúrbios perceptíveis (cit. Sousa, 1997, p. 231). O desenvolvimento

económico implica, então, saltos quantitativos e modificações qualitativas no

processo económico derivados de inovações introduzidas nesse processo por

agentes interiores. Para Schumpeter (1935), o desenvolvimento é transformação

espontânea e descontínua das artérias do fluxo, distúrbio de equilíbrio que altera

e desloca para sempre o estado de equilíbrio pré existente (ibid., p. 231).

1.5.2. Concorrência e flutuações cíclicas

Para Schumpeter, a concorrência não é estática (conjunto numeroso de pequenas

empresas que, produzindo um bem idêntico, não podem ter, isoladamente,

qualquer influência sobre o preço) mas, é sim dinâmica definindo-a como aquela

que as empresas inovadoras exercem em confronto com as outras. Este processo

concorrencial foi designado como o processo da destruição criadora,

denominação com a qual se põe em evidência que a concorrência efectiva é dada

pelos efeitos que as inovações fazem incidir sobre as empresas existentes

(Schumpeter, J., 1954, cap. VII). Este conceito de concorrência traz consigo um

novo conceito de monopólio, ou seja, o monopólio temporário. Este monopólio

tem lugar entre o momento da introdução da inovação até ao momento da sua

difusão41 e varia segundo a natureza da própria inovação.

40 Schumpeter, J. (1911), Theorie der Wirtschaftlichen Entwicklung, trad. Portuguesa, A Teoria do Desenvolvimento Económico, Abril Cultural, São Paulo, (1982), p. 48 41 As empresas da indústria farmacêutica são um exemplo típico, já que ao patentear as inovações ficam no mercado com uma posição que se aproxima da do monopólio típico de carácter permanente.

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A passagem do capitalismo concorrencial ao capitalismo trustificado, isto é, a

passagem da fase em que as inovações se incorporam, geralmente em novas

empresas, à fase em que elas se implementam nas empresas já existentes, não

implica, para Schumpeter, uma diminuição de intensidade do desenvolvimento

económico ou da sua qualidade mas, pelo contrário, é possível dizer que nesta

passagem o desenvolvimento talvez se tenha acentuado. O desenvolvimento

económico, enquanto processo de transformação criativa da realidade económica,

social e humana não se desenvolve de um modo contínuo e uniforme, mas sim

através de uma sucessão periódica de ciclos42 (Schumpeter, J., 1911). A base em

que surge o processo cíclico43 consiste no facto de as inovações não se

distribuírem uniformemente no tempo, mas tenderem a concentrar-se, ou como

diz Schumpeter, a apinhar-se em determinados períodos.

Estando a periodicidade dos ciclos e a natureza das inovações inter-relacionadas e

admitindo que a cada novo ciclo corresponde um patamar mais elevado de criação

de riqueza, poder-se-á concluir que a constante introdução da inovação é uma

condição essencial para o desenvolvimento económico e, de certa forma, para a

reprodução do modo de produção capitalista. No entanto, e de acordo com o

pensamento de Schumpeter, o sucesso do capitalismo “mina” as instituições

sociais que o protegem e cria, inevitavelmente, condições em que não lhe será

possível sobreviver. O processo de desenvolvimento da economia capitalista é um

processo de destruição criadora em que, paralelamente à expansão da produção,

42 Marx já tinha posto em evidência que o ciclo económico era o modo como a economia capitalista se desenvolvia. 43 Schumpeter, numa base experimental, distingue três tipos de ciclos: a) os ciclos de Kondratieff ou as chamadas ondas largas com um período variável de 54 a 60 anos; b) os ciclos de Juglar com uma duração de 9-10 anos; c) os ciclos de Kitchin com uma duração média de 40 meses (Napoleoni, 1973). De acordo com Freeman e Perez (1988), desde a primeira revolução industrial ocorreram 5 ciclos: ciclo da primeira revolução industrial – corresponde ao último quartel do séc. XVIII e ao primeiro do séc. seguinte, que se caracterizou pela mecanização das indústrias transformadoras (têxtil e metalúrgica); ciclo da máquina a vapor – corresponde ao período entre 1830 e 1880 e caracterizou-se pela generalização da máquina a vapor e do combóio; ciclo da electricidade e da mecânica pesada – finais do séc. passado até à segunda guerra mundial, teve como sectores chave a siderurgia, a metalomecânica e a química pesada; ciclo das técnicas fordistas de produção em massa – terminou com as grandes crises dos anos 70 e caracterizou-se pela utilização intensiva da energia e pela produção em massa de bens de consumo; ciclo da informação e da comunicação – em pleno desenvolvimento, assenta no aproveitamento das potencialidades geradas pela microelectrónica.

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avanço tecnológico, redução do desemprego ou subemprego e da formação de

quadros técnicos, se assiste à destruição dos próprios fundamentos em que assenta

o sistema. Schumpeter, embora acredite no desaparecimento do capitalismo44,

está, segundo afirma, disposto a defender45 este sistema económico.

1.6. OS MODELOS KEYNESIANO E NEOKEYNESIANOS

1.6.1. A depressão económica segundo Keynes

Os problemas de reconversão da economia de guerra em economia de paz

afectaram a economia mundial até ao primeiro quarto do séc. XX. Alguns países,

como os EUA, tiveram crises de reconversão profundas, mas curtas, outros

passaram por períodos mais longos (Inglaterra) e outros ainda, experimentaram

processos inflacionistas (França) ou mesmo hiperinflacionistas (Alemanha).

Ultrapassados os problemas de reconversão, a economia ocidental entrou num

curto período de prosperidade que viria a terminar com uma das mais graves

crises económicas que o mundo já conheceu. Esta crise, habitualmente,

denominada de Grande Depressão rebentou em 1929.

Keynes com o objectivo de contribuir para a análise do problema das depressões

económicas publica, em 1936, a obra A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da

Moeda46. As suas preocupações são, fundamentalmente, os problemas do pleno

emprego e do rendimento nacional e estabelece que estas duas variáveis

económicas estão ligadas por uma determinada proporcionalidade. No seu

modelo, Keynes parte da noção de custo da produção nacional R, que se

44 Schumpeter ao abrir a 2ª parte da obra Capitalismo, socialismo e democracia, em 1942, coloca frontalmente a questão: Poderá o capitalismo sobreviver? e responde: Não, não creio que possa. Para fundamentar esta posição, Schumpeter refugia-se em considerações de natureza extra económica ou, mais precisamente, na sociologia de Vilfredo Pareto (1848-1923). 45 Ver o prefácio à 2ª edição de Capitalismo, socialismo e democracia, publicada em1944. 46 Keynes explica o desemprego, bem como a depressão económica, através da insuficiência do investimento. A sua análise é sobre o desemprego permanente, isto é, aquele que subsiste mesmo durante os períodos de expansão económica de que são exemplos o desemprego britânico dos anos 1921-1929 e o americano de 1933-1939.

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desagrega em custo de produção dos bens de equipamento R1 e custo de

produção dos bens de consumo R2. Por seu turno, os custos de produção KT são

formados pelos salários pagos na ocasião da produção e pelos lucros normais47.

Quanto ao rendimento distribuído, este divide-se em despesa para a compra de

bens de consumo C e poupança S. Se chamarmos despesa normal Cn às somas

gastas em compras de bens de consumo quando os rendimentos são normais, e

poupança normal Sn à poupança que se forma quando os rendimentos são

normais, temos:

R1 + R2 = Cn + Sn

A partir desta igualdade poderemos analisar três situações:

• Sn = R 1 ⇒⇒⇒⇒ Cn = R2 (equilíbrio ou reprodução simples)

• Sn <<<< R 1 ⇒⇒⇒⇒ Cn >>>> KT (crescimento económico)

• Sn >>>> R 1 ⇒⇒⇒⇒ Cn <<<< R2 (diminuição do nível de actividade ou depressão)

A depressão económica decorre do facto de a poupança normal ser superior ao

investimento, o que cria um desequilíbrio no mercado dos bens de consumo,

obrigando os produtores desses bens a vender a preços inferiores aos seus custos

com a consequente diminuição dos lucros e do investimento. Inversamente, a

expansão dos negócios deve-se à existência de um excesso de investimento que

origina lucros excepcionais no sector dos bens de consumo, pelo que é de incitar

as empresas a aumentarem a sua produção. Por seu lado, a paragem da expansão

explica-se recorrendo à ideia de Albert Aftalion48, segundo a qual as crises seriam

devidas ao facto de, no período de expansão, se encomendarem uma quantidade

47 Normal remuneration of entrepreneurs + interest on capital + regular monopoly gains, rent and the like, Tratado de Moeda, Londres, 1930, p. 123. 48 Albert Aftalion nos seus artigos, de 1908 e 1909, A realidade das superproduções gerais in Revue d’Économie Politique e, em 1913, na sua obra As crises periódicas de superprodução deu uma importante contribuição para o estudo do ciclo. O autor apoia-se, essencialmente, na ideia de que a construção dos bens de equipamento exige tempo.

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excessiva de meios de produção49. Contudo, de acordo com Keynes, o equilíbrio

geral e o crescimento económico (desde que a taxas pouco elevadas) podem

ocorrer na presença de vários níveis de subemprego dos factores de produção, ou

seja, o sistema económico pode funcionar duradouramente mesmo num estado

permanente de desemprego involuntário50.

1.6.2. A teoria do emprego

A questão do emprego versus desemprego é abordada por Kahn (1931) tentando

demonstrar que o investimento nos trabalhos públicos pode ser um meio eficaz

para diminuir o desemprego. Para isso, constrói um novo instrumento de análise

económica - multiplicador de investimento ββββ -, cuja formula é 1/k , onde k

designa a relação entre o consumo suplementar e os rendimentos suplementares

distribuídos, ou seja, k é a propensão marginal para a poupança51. Kahn

demostrou assim que, em certas condições, a principal das quais é a manutenção

de preços, o investimento público além da contratação directa de um certo número

de trabalhadores leva à recontratação de ββββ.N trabalhadores52. De um modo geral

quando o investimento é insuficiente relativamente à propensão marginal para a

poupança, o emprego efectivo é inferior ao pleno emprego, isto é, verifica-se uma

situação de desemprego.

49 De referir a existência de um lag de tempo entre a encomenda dos meios de produção e a sua efectiva entrada em funcionamento. Por outro lado, a penúria de produtos acabados continua a suscitar uma maior procura de equipamentos. 50 Nas economias modernas aceita-se que a taxa natural de desemprego oscile entre os 2 a 3% da população activa. A taxa natural de desemprego representa o nível mais elevado de emprego possível de sustentar sem inflação correspondendo, portanto, ao nível de produto potencial de um país. 51 Assume-se que todo o rendimento que não é consumido é poupado. 52 Por exemplo, se a sociedade tende a poupar ¼ do rendimento adicional posto em circulação, a propensão marginal para a poupança é igual a 0,25, e para N operários contratados directamente teremos, no total, o quádruplo de recontratos (4 N). O número 4 (4=1/0,25) é, portanto, o inverso da propensão marginal para a poupança.

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Keynes ao afirmar que o nível do emprego depende do montante do investimento,

isto é, do montante das compras de meios de produção adicionais realizadas pelas

empresas, assume que um verdadeiro equilíbrio económico só será atingido no

momento em que a poupança normal é igual ao investimento, proporcionando um

certo volume de produção e emprego. Por sua vez, o investimento depende, por

um lado, do comportamento das produtividades marginais do capital, isto é, das

rentabilidades que se podem esperar dos capitais adicionais investidos no decurso

de um período de tempo e da taxa de juro (fenómeno essencialmente monetário) e,

por outro lado, do valor da procura efectiva de bens de consumo. No entanto, dada

a estabilidade da propensão marginal a consumir, todo o crescimento do

rendimento implica uma aumento mais do que proporcional do investimento. Esta

relação levou Keynes a concluir que a existência de uma deficiência crónica da

procura efectiva estaria na origem do desemprego involuntário pelo que se

impunha o crescimento do investimento e, principalmente, do investimento

público, como meio de aumentar a procura e conduzir ao crescimento económico.

O mercado monetário tem, igualmente, um papel importante já que ao estabelecer

uma taxa de juro vai induzir o volume de investimento que, por sua vez, através

do multiplicador determina o rendimento nacional Y e fixa o nível de emprego L

(Saby e Saby, 1997, p. 437). Este encadeamento pode ser visualizado da seguinte

forma (fluxograma 1.1).

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Fluxograma 1.1

Visão sinóptica do modelo keynesiano Oferta de moeda taxa de juro i Procura de moeda I Y L antecipação dos multiplicador função de produção empresários macro-económica de curto período Fonte: Saby, B. e Saby, D., (1997), As grandes Teorias Económicas, Edições Asa, Porto, p. 437

1.6.3. O modelo de Kaldor

Os instrumentos analíticos introduzidos por Keynes prestavam-se facilmente ao

tratamento dos problemas relativos ao crescimento de longo prazo da economia e

é isso que, efectivamente, vem a suceder com as contribuições de Harrod-Domar,

Kaldor e Kalecki53. O economista indiano Mahalanobis, embora apresentando

algumas semelhanças formais com os modelos pós-keynesianos, tem uma lógica

interna diferente revelando a influência dos esquemas de reprodução do capital de

Marx54.

53 Posteriormente, Kalecki desenvolve a sua teoria de crescimento em economia socialista, procurando fundamentar opções básicas do planeamento económico na Polónia do pós-guerra. Entre estas opções estavam a definição da taxa de crescimento do rendimento, as características do progresso técnico, as incidências do emprego, os efeitos do comércio externo, etc.. 54 No modelo supõe-se que o investimento e o consumo são previamente determinados através da orientação do investimento no aumento da capacidade produtiva dos sectores que produzem bens de consumo e bens de capital. Embora as hipóteses admitidas sejam extremamente simplistas, o

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O modelo de crescimento económico de Kaldor, intimamente ligado à explicação

teórica da distribuição do rendimento nacional, apoia-se na função de progresso

técnico. definida como a relação entre a taxa de acréscimo anual do produto ∆∆∆∆Y/Y

e a taxa anual de acumulação de capital ∆∆∆∆K /K. Esta relação investimento/produto

é constante no tempo e o ponto de equilíbrio é atingido quando ∆∆∆∆Y/Y=∆∆∆∆K/K. Á

esquerda deste ponto, ∆∆∆∆Y/Y > ∆∆∆∆K/K ou ∆∆∆∆Y/∆∆∆∆K > Y/K, verifica-se uma situação de

“rendimentos crescentes“ a nível macro-económico dado a produtividade

marginal do capital ser crescente esperando-se, por conseguinte, uma aceleração

na acumulação do capital. Numa situação contrária, isto é, quando ∆∆∆∆Y/Y < ∆∆∆∆K/K

ou ∆∆∆∆Y/∆∆∆∆K < Y/K, os rendimentos de capital são decrescentes, tal como as

produtividades médias e marginais, verificando-se uma tendência de estabilização,

a longo prazo, do ponto de equilíbrio.

Admita-se que a economia está em equilíbrio de pleno emprego, ou seja, o

investimento I é igual à poupança S, o rendimento nacional Y desagrega-se em

salários W e lucros P, isto é, Y = W + P e a poupança, por sua vez, é composta

pela poupança dos trabalhadores Sw55 e poupança dos capitalistas Sp56. Não sendo

a taxa de investimento I/Y determinada independentemente das proporções dos

lucros e salários no rendimento nacional mas, antes, segundo a função progresso

técnico, teremos que a taxa de lucro P/Y cresce com I/Y (e diminui com W/Y) e só

estabiliza quando I/Y permanece constante. Posteriormente, Kaldor57 viria a

afirmar que a taxa de investimento I/Y e a taxa de poupança S/Y são ambas

funções das proporções dos lucros no rendimento nacional P/Y aproximando-se,

por conseguinte, de uma posição consensual acerca da dependência da taxa de

investimento em relação à parte dos lucros no rendimento nacional e à taxa de

modelo permite concluir que a prioridade à indústria pesada em detrimento da indústria ligeira sacrifica, no imediato, o nível de consumo da população mas permite, ou pode permitir, aumentá-lo significativamente a longo prazo. O modelo sugere, igualmente que, com a direcção central da economia, a poupança é imposta aos agentes económicos pela oferta planeada de bens de consumo, logo a limitação real ao crescimento não é a escassez de capital financeiro mas sim a limitação (tecnológica) na capacidade de produção de bens de capital. 55 Sw. = sw . W onde sw é propensão marginal poupar dos salários. 56 Sp = sp . P onde sp é propensão marginal poupar dos lucros. 57 A model of economic growth in The Economic Journal, Dez. 1957

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lucro. Embora Kaldor considere a existência de uma igualdade entre a poupança e

o investimento, como condição do equilíbrio económico, o processo que no seu

modelo conduz ao equilíbrio é bastante diferente do de Keynes. Neste modelo

kaldoriano, uma poupança normal superior ao investimento provoca não uma

contracção da produção, mas somente uma baixa de preços que altera a repartição

dos rendimentos sendo, portanto ignorados os fenómenos de expansão e recessão

originados pelo desequilíbrio entre o investimento e a poupança.

De referir, no entanto, que o modelo funciona somente quando as duas propensões

marginais são diferentes, isto é, a propensão marginal a poupar dos lucros sp é

superior à dos salários sw. No caso contrário, isto é, quando sp<sw, a descida dos

preços causará uma diminuição da procura a qual, por sua vez, levará a uma nova

descida de preços. O grau de estabilidade do sistema depende da diferença de

valor entre as duas propensões a poupar, ou seja, depende de (1/sp - sw). O

coeficiente de sensibilidade da distribuição do rendimento58 indica a alteração na

importância dos lucros no rendimento os quais acompanham o aumento dos

investimentos na obtenção dos outputs.

Se a diferença entre as propensões marginais é reduzida, o coeficiente terá um

valor elevado, pelo que, pequenas alterações na taxa de investimento causarão

alterações significativas na distribuição do rendimento. No caso de sw=0, o

montante de lucros é igual à soma do investimento e do consumo capitalista, ou

seja, P = (1/sp) . I, o que está implícito na parábola do jarro da viúva59 de Keynes,

segundo a qual o aumento do consumo dos empresários eleva os seus lucros num

valor idêntico. Esta conclusão é oposta à de Ricardo e de Marx já que para estes,

sendo os salários residuais, os lucros dependiam da propensão a investir e da

propensão a consumir dos capitalistas, o que representa uma espécie de custo

precedente do rendimento nacional. Em relação aos salários reais, estes aumentam

automaticamente, ano após ano, devido ao incremento do output por trabalhador.

Kaldor justifica este comportamento dos salários através da constância, quer da

58 Coefficient of sensitivity of income distribution 59 Widow’s cruse

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taxa de investimento e da poupança marginal dos capitalistas, quer da proporção

de salários no rendimento nacional.

No caso de sw ser positivo, isto é maior do que sp, o total de lucros será reduzido

em função desse aumento da poupança dos trabalhadores. No entanto, dada a

maior sensibilidade dos lucros em relação ao nível de investimentos, o total de

lucros aumenta (ou diminui) num valor mais elevado do que o das alterações no

investimento devido à consequente redução (ou aumento) da poupança dos

trabalhadores.

Com este modelo, Kaldor pretende explicar não só a razão de uma determinada

economia crescer a um certo ritmo, mas também o que leva o rendimento nacional

a ser dividido, segundo determinada proporção, entre lucros e salários.

1.6.4. O modelo matemático de Kalecki

Michel Kalecki60, economista polaco, construiu um dos primeiros modelos

matemáticos que visava explicar os ciclos económicos. Segundo o autor, o

investimento depende das taxas de lucro esperadas e estas, por sua vez, dependem

da taxa de lucro corrente. Quanto maior é o lucro P - escreve o autor - e quanto

menor é o equipamento no capital existente, maiores são em geral as taxas de

lucro esperadas de investimentos novos (Kalecki, M., 1943a, p. 63). Assumindo

que só os capitalistas têm poupança e que esta deve ser igual ao investimento,

teremos que só um determinado volume de lucros pode originar a poupança

60 Kalecki publicou em 1933, em Varsóvia, o artigo Prola Teorij Konjunctuy; em Londres publicou Studies in the theory of economic fluctuations, em 1939; Studies in economic dynamics e Theory of economic dynamics em 1943

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pretendida61, ou seja, um volume de poupança igual ao valor do investimento a ser

realizado.

Vejamos, mais pormenorizadamente, a formulação matemática deste modelo

aplicado a uma economia fechada. Sendo o rendimento nacional Y o somatório

do investimento produtivo bruto I, do aumento das existências (bens intermédios

e de consumo) ∆∆∆∆E e do consumo C e considerando que (I + ∆∆∆∆E) é a acumulação

produtiva, quais serão os componentes da variação do rendimento de um ano para

o outro ?. Assumindo m como a relação marginal capital/produto, o efeito do

investimento sobre o rendimento no ano seguinte será igual ao produto do valor

inverso da relação marginal capital/produto pelo investimento, isto é, (m-1. I).

Registe-se que, se por um lado, a capacidade do equipamento produtivo devido à

obsolescência e ao seu desgaste físico se vai reduzindo anualmente, por outro

lado, este mesmo equipamento é melhor utilizado devido à utilização de novas

tecnologias, novos métodos e técnicas de gestão, ajustamento mais perfeito das

procuras e ofertas inter industriais. A primeira alteração é quantificada pelo

produto a Y e a segunda pelo u Y.

A variação do rendimento ∆∆∆∆Y será dada pela expressão (Murteira, M., 1990,

pp. 119-120):

∆Y = 1

mI - a Y + u Y ou g =

∆ΥY

= 1

m 1

Y - a + u

Se os parâmetros m, a e u se mantiverem constantes ao longo de vários períodos,

o ritmo de crescimento económico, designado por g, será directamente

proporcional à relação I/Y logo, determinado nível de crescimento económico

exigirá que o investimento e o rendimento cresçam à mesma taxa.

61 O autor, chamando B ao lucro, C ao consumo capitalista, I ao investimento, supõe que o consumo se decompõe em consumo constante, C1, e em consumo variável igual a λ B. Temos, pois: B = C1+ λ B + I ou B = (C1 + I) / (1 - λ). Supondo que B = λ B + I, teremos B = I / (1 - λ), ou seja, o lucro é igual ao quociente do investimento pela propensão para a poupança.

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Supondo, igualmente, que o aumento das existências S é proporcional ao aumento

do rendimento nacional ∆∆∆∆Y, teremos S = µµµµ . ∆∆∆∆Y em que µµµµ será o período médio

de rotação das existências. Utilizando a formulação anterior, o ritmo de

crescimento será:

g = 1

m + µ .

I S

Y

+ -

m

m + µ . (a - u)

Seja i a taxa de acumulação produtiva igual a (I S

Y

+) e k à soma (m+µ), ou

seja, à relação marginal global capital/produto, teremos:

g = i

k -

m

k (a - u)

Como se vê pela equação, a taxa de crescimento económico g é função da taxa

de acumulação, da relação marginal capital/produto incluindo a variação de

existências, da relação marginal, excluindo aquela variação, e dos parâmetros u e

a que medem, respectivamente, a melhoria da “produtividade” do investimento e

o efeito do desgaste do equipamento.

1.7. AS CONDICIONANTES EXTERNAS NOS MODELOS DE

CRESCIMENTO

1.7.1. Introdução: o comércio como elemento dinamizador do crescimento

Em 1937, Denis Robertson proferiu a célebre declaração o comércio internacional

é o motor do desenvolvimento62. A interacção entre as relações internacionais e o

progresso encontram-se entre as mais controversas das questões de

62 Robertson, D., (1939), A frase completa explica claramente a componente do comércio internacional em que o autor estava a pensar: As especializações do século XIX não foram

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desenvolvimento. A discussão começa na consideração da possibilidade da

existência de potencial dinâmico no comércio internacional. Este foi afirmado

desde o início por Adam Smith (1776) e, como diz Findlay (1984), toda a teoria

do comércio internacional provém do capítulo 7 dos Princípios da economia de

David Ricardo (1817). Mas, para muitos, a vantagem comparativa não é uma

teoria dinâmica, mas um conceito estático.

Aceitando o carácter dinâmico dos contactos internacionais é normal alguns

autores discutirem o sentido da sua influência. Trata-se daquilo a que Hirschman

(1981) chamou a hipótese do benefício mútuo, isto é, será que os contactos entre

economias são benéficos ou prejudiciais ao desenvolvimento, sobretudo para os

países mais pobres ?

A maioria dos autores clássicos e neoclássicos aceitam esta hipótese do benefício

mutuo do comércio internacional. Marx (1867) parecia rejeitá-la. Em 1902, John

Hobson apresenta a tese do “imperialismo” segundo a qual os contactos entre a

metrópole e as colónias eram considerados como os principais promotores do

atraso relativo destas últimas. A importância que esta tese virá a ter deve-se a dois

factos essenciais. Em primeiro lugar, Lenine incorpora o conceito de imperialismo

no modelo marxista e coloca esta visão no centro do problema sócio-económico

fundamental do século XX. Se a questão social63 entre proletários e capitalistas

fora o fenómeno social mais importante do século XIX, as relações entre regiões

ricas e pobres viria a ter a correspondente importância no nosso século64. Os

modelos de interacção entre comércio internacional e desenvolvimento continuam

a ser elaborados, pelo que se multiplicam os modelos em que o comércio com o

exterior é benéfico65 ou maléfico66.

simplesmente um meio para tirar o maior partido dos trabalhos de um dado número de seres humanos: elas foram acima de tudo um motor de crescimento. 63 V. Leão XIII (1891) 64 Paulo VI (1967) 65 Entre os muitos modelos referidos por Findlay (1984), saliente-se o do próprio autor (1980) que iremos analisar neste capítulo. 66 Bhagwati (1958) é um dos maiores defensores da liberdade do comércio. No entanto, no seu modelo, hoje clássico, o crescimento é prejudicado pelo comércio.

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Embora aceitando a tese de que o comércio externo contribui para o

desenvolvimento é necessário, contudo, uma dimensão mínima de partida. Esta

tese anteriormente defendida, entre outros, por Smith, Young e Marshall é

retomada por Rosenstein, em 1943, ao afirmar que o desenvolvimento não

consegue verificar-se por evolução normal. É preciso um grande empurrão inicial

para criar as estruturas básicas económicas (infra-estruturais e produtivas) que

suportem um crescimento auto-sustentado. Esta tese, que será desenvolvida no

conceito de balanced growth de Ragnar Nurkse (1952-1953)67 partia de uma

desconfiança nas potencialidades do comércio internacional.

Ranis e Fei (1961), embora reconheçam ao comércio internacional alguma

importância no crescimento, reservam à expansão do sector industrial o papel

principal. O seu modelo pretende esquematizar o processo de acordo com o qual

uma economia68 sai do estado de estagnação secular e chega a um crescimento

auto sustentado, depois de superada uma fase de arranque. Tal como Arthur

Lewis, Ranis e Fei, partindo de uma economia dualista69, afirmam que o

crescimento é possível desde que se assista à expansão do segundo sector

sustentada pela oferta de trabalho, entretanto, libertada pelo sector agrícola devido

aos baixos salários aí praticados.

As relações comércio externo/desenvolvimento, como verificamos, são complexas

e os modelos apresentados são inúmeros. Não sendo um dos nossos objectivos a

apresentação e análise de todos os modelos faremos uma abordagem sintética dos

que consideramos serem os mais representativos.

67 Esta tese havia de ser desafiada, entre outros, por Albert Hirschman (1959) defendendo o unbalanced growth. 68 As características desta economia são: 1) dotação pouco variada de recursos; 2) grande percentagem da população activa na agricultura; 3) taxas elevadas de crescimento demográfico; 4) elevado desemprego oculto no sector agrícola; 5) papel pouco dinamizador do comércio externo. 69 A economia dualista tem dois sectores produtivos, sendo um tradicional (agricultura) e outro moderno (indústria).

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1.7.2. As relações de troca no modelo de Ronald Findlay

O modelo de Ronald Findlay (1980) pretende demonstrar a importância das

relações de troca, entre países desenvolvidos e países subdesenvolvidos, no

desenvolvimento da economia mundial. Tendo-se baseado no trabalho de Raul

Prebish e Hans Singer, que estudaram as relações de troca como factor chave da

divisão internacional do trabalho, Findlay de forma a simplificar a realidade,

propõe a divisão do mundo em duas regiões, isto é, o Norte industrializado e o Sul

menos desenvolvido. Os modelos neoclássico de Solow70 (caracterização das

economias do Norte) e o dualista de Arthur Lewis71 (caracterização das economias

do Sul) são a base para a elaboração da teoria de Findlay sobre as relações de

troca externas e o desenvolvimento. No tocante às relações comerciais a nível

internacional, o autor recorre à teoria desenvolvida por Harry Johnson72

(problemática dos direitos alfandegários).

No modelo, as economias do Norte e do Sul, inicialmente, encontram-se numa

situação de equilíbrio. Verificando-se um aumento do rendimento no Norte,

regista-se, consequentemente, um acréscimo da procura de bens manufacturados e

de bens importados. Surge, então, o desequilíbrio uma vez que o Sul não tem

capacidade para responder imediatamente a esta procura adicional, aumentando o

70 Ver Solow, R. (1956), A Contribution to the Theory of Economic Growth in The Quaterly Journal of Economics, LXX, Fevereiro, pp. 65-94, reed. em Stiglitz e Uzawa (eds.) (1969); Solow, R., (1970), Growth Theory: an Exposition, Oxford University Press, Nova Iorque; Solow, R. (1987), Nobel Lecture – Growth Theory and After in Mäler, K. (ed.) (1992) Nobel Lectures, Economic Sciences 1981-1990, World Scientific, Singapura. 71 O modelo dualista de Lewis pretende demonstrar a importância das relações de troca entre países desenvolvidos e países subdesenvolvidos, no desenvolvimento da economia mundial. Segundo Lewis, o processo de crescimento económico baseia-se no desenvolvimento do sector moderno através da transferência de mão-de-obra do sector tradicional para a indústria e na reaplicação sucessiva dos lucros gerados pelo sector moderno. O modelo aplicando-se facilmente às economias subdesenvolvidas, parte de três pressupostos: 1) a oferta de mão-de-obra é ilimitada no sector tradicional (agrícola); 2) no sector tradicional a produtividade marginal do trabalho é reduzida ou mesmo nula, pelo que a redução do número de trabalhadores neste sector não conduz à redução da produção; 3) o sector moderno, ainda que incipiente, é composto pelo pequeno comércio, Administração Pública e, eventualmente, por um sector industrial. 72 Ver Johnson, H. G. (1964), Tariffs and Economic Development: some Theoretical Issues in Journal of Development Studies, vol. I, pp. 3-30; Johnson, H. G. (1965), The Theory of Tariff Structure, with Special Reference to World Trade and Development: some Theoretical Issues in Johnson, h. G. e Kenen, P. B. (eds.) Trade and Development, Librairie Droz, Genebra, pp. 1-22

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preço dos bens primários e das razões de troca73 θθθθ. No entanto, dado que as razões

de troca têm tendência para se situarem no nível inicial torna-se necessário

aumentar o nível de emprego, ou seja, o número de trabalhadores no Sul. Desta

forma, a oferta de produtos primários cresce e chega para satisfazer o aumento da

procura por parte dos países da região Norte.

O aumento das razões de troca significa uma melhoria para o Sul, na medida em

que recebe mais manufacturas por cada unidade de bem primário entregue o que

leva a um aumento da sua taxa de crescimento, de forma a que o rácio do

emprego74 λλλλ vai aumentando gradualmente, e a razão de troca θθθθ diminuindo até

estabilizar no longo prazo, passando-se para um novo ponto de equilíbrio a que

corresponde a razão de troca inicial ou de longo prazo θθθθ* e o novo rácio de

emprego λλλλ1 .

De acordo com o exposto, verifica-se a existência de uma relação de sinal positivo

entre o desenvolvimento do Norte e o do Sul ou, por outras palavra, ambas as

regiões têm benefícios com o incremento das trocas comerciais entre si.

1.7.3. O crescimento desigual na perspectiva de Paul Krugman

De acordo com a “teoria do desenvolvimento desigual” existe uma tendência para

o agravamento do crescimento desigual. Esta teoria que está associada a radicais

como Baran e Wallerstein, tendo sido defendida, igualmente, por autores mais

moderados como, por exemplo, Myrdal (1957).

Considere-se o mundo dividido em duas regiões, em que o sector industrial com

economias externas cresce graças à acumulação de capital. Assume-se,

73 A razão de troca define-se como o quociente entre os Preços no Sul e os Preços no Norte. 74 O rácio de emprego define-se como o quociente entre o Emprego no Sul e o Emprego no Norte

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igualmente, que um pequeno sector de arranque a liderar as manufacturas para a

periferia poderia possibilitar uma acumulação de capital que impedisse a futura

industrialização das regiões menos desenvolvidas. Daí que, em termos de

distribuição do rendimento, se possam identificar dois cenários:

• parte da mão-de-obra empregada é utilizada na agricultura;

• a mão-de-obra está completamente especializada na indústria.

No primeiro caso, a taxa salarial média tenderá a ser mais baixa podendo

considerar-se que, em termos de produtos agrícolas, a taxa salarial é unitária e, em

termos de manufacturas é (PM)-1. A rendibilidade por unidade de capital, medida

em unidades agrícolas é, também, igual à taxa de lucro:

PN = P V

C

M N

N

− e PS =

P V

C

M S

S

em que,

PN ; PS - Taxa de lucro do Norte e do Sul PM - Preço do bem manufacturado (incluindo os bens de capital75) VN ; VS - Custo da mão-de-obra por unidade produzida no Norte e no Sul CN ; CS - Custo de investimento em capital fixo por unidade produzida no Norte

e no Sul

Considerando uma região completamente especializada na indústria, a taxa de

lucro é determinada de acordo com uma metodologia kaldoriana76 ou seja, a

poupança é igual a zero se não existir investimento estrangeiro ou, então, a

poupança é por este determinada. Admitindo uma simplificação do lado da

procura, isto é, considerando o comportamento clássico77 das poupanças e que

uma proporção fixa u dos salários é despendida em manufacturas e (1 – u) em

bens agrícolas teremos, dada a inexistência de investimento internacional, taxas de

crescimento do stock de capital e de lucro iguais em cada região.

75 No modelo, por uma questão de simplificação analítica, os bens de capital ou de equipamento são produzidos, apenas, pelo factor produtivo trabalho. 76 Este modelo foi apresentado neste capítulo.

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Supondo, agora, que estamos numa fase inicial de desenvolvimento da economia

mundial e que ambas as regiões não são especializadas, embora o Norte tenha

acumulado mais capital. Como ambas as regiões têm o mesmo preço relativo de

manufacturas, então, as taxas de lucro e de crescimento são maiores na região que

apresente um maior stock de capital, o que constitui a “base de divergência” ou

do “crescimento desigual”.

A especialização das economias do Norte e do Sul, tal como o aumento de stock

de capital numa das regiões, conduz à divergência até se atingir um ponto de

exaustão dos factores de especialização Kmax. Neste ponto, inicia-se um processo

de reaproximação resultante de uma multiplicidade de factores (de natureza

histórica, política, técnico-económica e cultural) que se caracteriza por um fluxo

de capitais mais intenso para as economias de rendimento médio em detrimento

das mais pobres. Assim, o crescimento de stock de capital nas regiões semi-

periféricas passa a ser mais rápido do que nas regiões periféricas e do que nas

próprias regiões mais desenvolvidas levando, por um lado, à diminuição das

desigualdades entre o centro e essa semi-periferia e, por outro, ao agravamento

das disparidades entre esta última e a periferia.

1.7.4. Os capitais externos como factor de crescimento

A moeda, segundo a teoria monetarista, tem um papel importante no

desenvolvimento económico, sendo vários os autores a debruçarem-se sobre

aspectos particulares desta problemática. Por exemplo, enquanto Kouri investiga o

impacto78 de uma sobrevalorização da moeda de um país correspondente a uma

pequena economia aberta, Branson e Katseli comparam as taxas de câmbio

flutuantes com as fixas na tentativa de analisar uma política de ligação entre a

77 Numa pequena economia aberta, todos os lucros, e só estes, são poupados. Este pressuposto só é aplicável a pequenas economias abertas com investimento estrangeiro. 78 Distorção dos preços em termos de investimento e crescimento da economia.

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moeda nacional e uma outra (principal) ou a um cabaz de moedas79. Já M. Bruno

se debruça sobre a escassez de divisas que, no seu entender, constitui um factor

condicionante do crescimento económico.

O modelo de M. Bruno foi aplicado em Israel, nos anos 60 e 70, numa altura em

que os capitais externos foram fundamentais para superar a escassez relativa, quer

em termos de factor produtivo capital, quer em termos de consumo interno.

Em relação à parte analítica do modelo, este tem por base 12 equações, em que

sete descrevem a estrutura da economia, três especificam as limitações de recursos

e duas são equações de definição. O modelo de Michael Bruno, posteriormente

reduzido a 4 equações torna-se mais eficiente, permitindo estudar a estrutura da

economia e a limitação de recursos, bem como quantificar a formação total de

capital e do PNB. Inspirando-se nas análises de Tinbergen e Theil, que

consideram vários tipos de variáveis nos modelos de política económica, Bruno

utilizou quatro tipos de variáveis, a saber:

1. Variáveis endógenas - variáveis cujo valor é determinado por forças que

operam dentro do modelo, ou melhor, variáveis que são “explicadas” pelo próprio

modelo, tais como, o produto, o consumo e o investimento.

2. Variáveis objectivo - variáveis que “suportam” a elaboração do modelo80, ou

seja, as exportações e importações, a poupança e o stock de capital, bem como a

oferta e procura de mão-de-obra.

3. Variáveis instrumentais - variáveis que, embora não sendo totalmente

controladas pelas autoridades políticas governamentais, podem ser por elas

influenciadas. Neste grupo incluem-se as despesas públicas correntes, os fluxos de

capitais, a propensão marginal a poupar, as taxas de desemprego, o crescimento da

produtividade do factor trabalho e a taxa de câmbio real.

4. Variáveis exógenas - variáveis que, embora desempenhando um papel

importante no modelo, são determinadas por forças exteriores a ele, daí não serem

79 Este estudo pretende analisar a perda de graus de liberdade de flutuação e sua possível influência no desenvolvimento económico. 80 Estas variáveis, no momento inicial do estudo, são consideradas exógenas.

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explicadas pelo modelo. Aqui consideram-se o tempo, o preço de exportação do

sector e o stock de capital81.

O modelo chama a atenção para o papel relevante desempenhado pelo

investimento estrangeiro num processo de desenvolvimento económico. M. Bruno

preocupado com as questões sociais elaborou ainda uma função Bem-estar

Social82 que traduz a existência de uma relação entre o bem-estar social, o

consumo total, o afluxo de capitais estrangeiros e o stock de capital.

1.8. RESUMO E CONCLUSÕES

O crescimento económico, entendido como um aumento do produto nacional,

permite a avaliação do desempenho de uma economia. No entanto, as conclusões

daí tiradas não são particularmente esclarecedoras já que os aspectos sociais,

organizativos e institucionais não foram tratados. Assim, torna-se necessário

recorrer ao conceito, muitas das vezes confundido ou utilizado indiferentemente,

de desenvolvimento. O desenvolvimento além da componente quantitativa

(aumento do rendimento nacional) implica alterações qualitativas no nível de

bem-estar. O desenvolvimento económico deverá ter na sua raiz competências,

factores e recursos humanos que assegurem o desenvolvimento como um processo

continuado e dinâmico capaz de se auto alimentar. O processo de

desenvolvimento é um processo de rotura criadora e inovador que deve ter como

prioridade absoluta o HOMEM numa perspectiva de longo prazo. Daí que,

perante a perenidade da actividade humana, da qualidade ambiental e dos recursos

naturais, seja extraordinariamente importante a conservação dos recursos em

condições satisfatórias para as gerações seguintes. O desenvolvimento económico,

social e humano só é efectivo quando se preocupa não apenas com a satisfação

81 Stock de capital inicial utilizado e final não utilizado. 82 A função seria do tipo (cit. Sousa, 1997, p. 294): W = W [ ( C + G ), F, K ] onde W - Bem-estar social; C - consumo privado; G - despesa pública; F - afluxo de capitais estrangeiros; K - stock de capitais ou PNB.

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das necessidades essenciais mas, também, com a instauração de um processo

dinâmico de participação dos agentes sociais, isto é, da população em geral, das

empresas, das instituições públicas e das organizações patronais e sindicais

(Reigado, 1999).

As diferentes abordagens, as variáveis utilizadas e os vários pressupostos em que

se baseiam as análises do processo de desenvolvimento, reflectem-se na

quantidade de modelos apresentados ao longo da história da ciência económica.

Os modelos de crescimento/desenvolvimento analisados permitem-nos identificar

quatro "motores" essenciais, nomeadamente: acumulação de capital/investimento,

inovação, vantagens comparativas e dimensão de mercado.

A acumulação de capital e a sua consequente aplicação nas actividades

produtivas através do investimento é, sem dúvida, o elemento comum às teorias

clássica e keynesiana. Partindo da formação e distribuição da renda fundiária e

porque a terra cultivável é escassa, Smith e Ricardo concluem que a economia

tende para um estado estacionário só possível de contrariar através do recurso a

novas técnicas de cultivo e ao comércio externo. Keynes, sob a influência da

Grande Depressão, ao contrário dos economistas clássicos, demonstra que o

equilíbrio e o crescimento económico são possíveis a níveis diversos de

subemprego dos factores de produção. Para tal, é necessário apoiar e fomentar o

investimento de capital e desincentivar a capitalização. Por outro lado, a despesa

pública (que inclui o investimento público) pode colmatar o déficit de

investimento privado de forma a manter o crescimento económico.

Considerando que a poupança dos trabalhadores é nula, parafraseando Kaldor os

capitalistas ganham aquilo que gastam e os trabalhadores gastam aquilo que

ganham (cit. Sen, 1971, p. 85), os neokeynesianos apresentam vários modelos em

que o crescimento depende directamente do investimento, da despesa pública e do

comércio externo. Kalecki, no entanto, faz referência às novas tecnologias e

Kaldor ao afirmar que o rendimento é uma função do progresso técnico inclui-o

nos elementos propiciadores do crescimento.

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No entanto, é só com Schumpeter que as novas tecnologias e a inovação, num

sentido mais lato, são reconhecidas como um motor do crescimento equacionado

numa perspectiva de desenvolvimento. É, aliás, a partir deste momento que o

desenvolvimento é entendido não como a simples expansão das quantidades, mas

um processo diferente, mais complexo e profundo que implica saltos quantitativos

e modificações qualitativas no processo económico, as quais derivam, por sua vez,

de inovações83.

As vantagens comparativas e o alargamento do mercado podem considerar-se

como os outros motores do desenvolvimento fechando, assim, o triângulo -

investimento, inovação, comércio externo - dos elementos dinamizadores do

desenvolvimento económico, social e humano sustentável84.

A abertura ao exterior proporcionada pelo desenvolvimento do sector moderno

(leia-se indústria e alguns serviços), segundo os modelos de Ranis e Fei e de

Arthur Lewis, o reforço das relações de troca entre o Norte industrializado e o Sul

pouco desenvolvido , preconizado por Findlay, ou o afluxo de divisa estrangeira e,

particularmente, o investimento directo estrangeiro, como defende M. Bruno, são

também a base de modelos de desenvolvimento.

A análise do tratamento dado às questões do crescimento versus desenvolvimento

e tendo em consideração que a economia mundial é, hoje mais do que nunca,

aberta e global leva-nos a concluir que a promoção do desenvolvimento

económico, social e humano não se enquadra num "modelo único" em que se

privilegia um elemento em detrimento dos outros. Assim, o desenvolvimento,

enquanto processo essencialmente qualitativo de alteração da realidade económica

e social em que o homem é simultaneamente o destinatário e obreiro, deve

83 Por inovação Schumpeter entende: 1) a introdução de um novo bem; 2) introdução de um novo método de produção; 3) abertura de um novo mercado; 4) conquista de uma nova fonte de oferta de matérias-primas; 5) estabelecimento de uma nova organização em qualquer produção. 84 O desenvolvimento sustentável implica, por um lado, o reconhecimento da perenidade da actividade humana e de que o desenvolvimento económico e social depende da qualidade do ambiente e dos seus recursos naturais e da respectiva conservação em condições satisfatórias e, por outro, a alteração do padrão de comportamento dos cidadãos em relação ao meio ambiente e aos recursos naturais.

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apoiar-se no triângulo formado pelo investimento público e privado, a inovação e

as relações externas (comércio e investimento85). Neste contexto, assumem

primordial importância as questões ambientais e territoriais.

Exceptuando os dualistas, que se referem explicitamente a duas regiões do globo -

Norte e Sul - e os neoclássicos com a sua breve referência à localização das

capacidades produtivas como elemento influenciador do crescimento económico,

nos modelos analisados, o factor território não foi considerado como uma variável

importante que pode e influencia, de facto, o processo de desenvolvimento. Este

não foi territorializado e, por conseguinte, não responde a questões como:

• quais as razões que levam as empresas a localizarem-se em determinado

espaço/região, ou seja, quais os factores de localização empresarial ?

• o que leva ao desenvolvimento de um determinado território ?

• qual a razão para o processo de desenvolvimento decorrer de uma forma não

homogénea pelo território nacional versus regional?

Na tentativa de dar resposta a estas questões analisaremos no capítulo seguinte,

entre outros, os modelos de localização das actividades económicas e dos

equipamentos públicos.

85 Actualmente, o Investimento Directo Estrangeiro tem um papel importante na esforço de desenvolvimento da economia. Como reflexo desta realidade veja-se a luta entre os países para atraírem o IDE concedendo benefícios fiscais e outras condições excepcionais .

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2.TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL

2.1. INTRODUÇÃO

Durante muito tempo, os economistas desenvolveram as suas análises económicas

sem terem em consideração as variáveis tempo e espaço, ou parafraseando

Marshall (1966, p. 9), os fenómenos económicos eram estudados no momento t

(ignorava-se a sua duração temporal) e no ponto p (não se considerava o factor

distância). A variável tempo é integrada na análise económica pelos marginalistas

com o desvio produtivo de Menger (1871) e com a depreciação do futuro de

Böhm-Bawerk (1889), por Alfred Marshall (1890) ao distinguir o curto do longo

prazo e por Wicksell (1898) com a teoria das antecipações e a análise ex-ante e

ex-post.

A integração do espaço na análise económica é efectuada, ainda, mais tarde. Em

1953, André Piatier afirmava que a pesquisa económica a déjà fait la révolution

dynamique, alors qu’elle n’a pas encore accompli son integration spatiale. La

théorie économique s’est renouvellée au contact du temps mais elle reste encore

rebelle à l’espace (Ponsard, C.,1955, p. 8). Em economia abstracta, como escrevia

Ponsard em 1955, os postulados e as análises são tais que a explicação é

apresentada independentemente das coordenadas espaciais, sem quaisquer

preocupações de explorar as realidades dum ponto de vista dimensional, mesmo

nos casos em que essa exploração podia ser quase imediata (citem-se, por

exemplo, os custos de transporte que são diluídos nos custos gerais). Este

raciocínio (a vida económica decorreria num único ponto) leva os economistas a

construir um mundo extraordinário, um mundo pontiforme, classificado por

Walter Isard (1960, pp. 25-26) como o país das maravilhas sem dimensões.

Cantillon (1775), considerado um dos percursores da teoria clássica de

localização, viria a afirmar que a organização do espaço assenta em princípios

extremamente simples de economias de tempo e de transportes. Ricardo (1897) ao

desenvolver a teoria da renda fundiária foi levado a analisar os ajustamentos nos

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rendimentos não só devido às diferenças de fertilidade das terras, mas também

devido à distância que separa os locais de produção dos de consumo. Mas, para os

economistas, os custos de transporte são incluídos nos custos gerais de produção.

Paradoxalmente, seria necessário esperar pela “revolução dos transportes” e pela

redução considerável do seu peso relativo nos custos, para que as despesas com o

transporte ganhem autonomia e sejam considerados como uma rubrica e,

consequentemente, passem a ser objecto de análise.

Só com Colson, Weber e Palander, no início do século XX, é que os custos de

transporte são definitivamente tratados como uma categoria especial com carácter

estratégico para os modelos de localização. Os progressos na teoria da

“tarificação” com a distinção entre custo constante e custo variável, custo médio e

custo marginal serão, ainda, mais tardios.

As funções da oferta e da procura, as propensões a consumir e a investir, etc.

aparecem igualmente como grandezas não localizadas. Efectivamente, pressupõe-

se uma mobilidade perfeita dos factores de produção e dos produtos, como se a

oferta e a procura não fossem localizadas, ou por outras palavras, o seu preço não

varia em função da sua localização. A teoria dos preços é dominada pela lei da

igualdade dos preços no mercado de factores de produção. No entanto, ao nível da

economia internacional, Ricardo reconhece que a mobilidade dos factores de

produção (mão-de-obra e capital) é imperfeita. Ohlin (1933) sublinha que as

condições de mobilidade imperfeita são comuns às trocas internacionais e às

trocas inter-regionais. Para Hoover, a mobilidade imperfeita nas trocas externas

está ligada, entre outros factores, à existência de uma “fronteira" que, além das

fronteiras políticas entre Estados, inclui todos os obstáculos físicos, jurídicos e

outros que dificultam as trocas e que, agindo como elementos de localização das

empresas, podem levar a distorções na movimentação dos factores de produção e

de produtos (Hoover, 1948, pp. 215-248).

Von Thünen, A. Weber, W. Christaller, H. Hotelling e A. Lösch são considerados

os principais representantes das teorias clássicas da localização. Assim, von

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Thünen (1826) explica a localização da empresa agrícola recorrendo às causas que

originam as diferenças de utilização da terra cultivável. Weber (1909), numa

altura em que o factor produtivo capital ganhava a maior importância, interessa-se

pela localização da empresa industrial. Para o autor, a localização óptima da

empresa será não num ponto, mas numa área definida em função dos custos de

transporte e da mão-de-obra e das economias de aglomeração. Hotelling (1929),

partindo de um modelo abstracto86, demonstra que a concorrência leva à

concentração e não, como seria de esperar, à dispersão. Christaller (1933)

desenvolve a teoria dos lugares centrais87 com a qual pretende justificar a

dimensão, o número e a distribuição de lugares centrais. Segundo Christaller há

uma lógica no padrão de ordenamento dos lugares centrais definida em função da

optimização simultânea da localização das empresas fornecedoras de serviços

produtivos em relação à localização dos concorrentes. August Lösch (1940; 1954)

distancia-se dos antecessores ao introduzir no seu modelo os mecanismos de

mercado88 e ao admitir que a hierarquia dos pontos de oferta é flexível.

Estas teorias clássicas ao privilegiarem o espaço como distância e como

condicionante de mobilidades (Reis, 1988, p. 122) não conseguem integrar, de

forma sistemática, os problemas da escolha óptima da localização com os

problemas do desenvolvimento económico. É após a II Guerra Mundial,

segundo Reigado (1999, pp. 1-6) que se faz um grande esforço no sentido da

integração. Myrdal (1956) introduz o princípio da cumulatividade dos efeitos ou

causas na concentração geográfica das actividades económicas89. Assim, e

segundo Myrdal, a localização de uma nova actividade económica, desde que

tenha uma razoável dimensão, leva ao aumento do emprego e da população que,

por sua vez, atraíria novas actividades se, entretanto, fosse formado um mercado

86 Dois vendedores de gelados estão situados em extremos opostos de uma praia fechada. 87 Segundo Christaller, a centralidade de um lugar define-se como a razão entre todos os serviços que o lugar presta e os serviços necessários aos seus residentes, o que permite ver a importância relativa de um lugar face à região em que se insere. 88 Segundo Lösch, a distribuição das matérias primas é uniforme, os custos de transporte são iguais em todos os pontos de um plano homogéneo, a população está distribuída uniformemente e tem gostos idênticos. 89 Paralelamente aos efeitos cumulativos ou spread effects, verificam-se efeitos negativos ou backwash effects

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de trabalho qualificado. Isard (1956) introduz na teoria da localização o conceito

input de transporte definido como o movimento de uma unidade de produto

ponderada por unidade de distância. Greenhut (1956; 1963) tenta determinar as

condições da localização equilibrada das empresas cujo objectivo é a

maximização do lucro90. Lefebre (1958) inclui os custos de transporte como

elementos "chave" da sua teoria de equilíbrio abandonando, por conseguinte, os

custos de transporte nulos. Allen Pred (1966) acentua as qualidades pessoais e a

managerial intelligence no processo de decisão locacional. O ambiente que rodeia

o empresário é, segundo Pred, importante no seu comportamento. De referir que o

comportamento dos agentes económicos está a mudar de um comportamento

maximizador para o de optimização. Aliás, o mapa mental, isto é, a imagem

subjectiva do conhecimento espacial que o empresário tem sobre certa localização

é, segundo, Pallenbarg (1985) um elemento que condiciona com frequência a

escolha da localização (cit. Reigado, 1999, p. 12).

A localização das actividades económicas exerce, cada vez mais, uma influência

determinante no desenvolvimento regional. A indústria é, por muitos, considerada

o sector dinâmico por excelência já que exerce fortes efeitos denominados

linkages sobre as demais actividades económicas, sendo exercidos a jusante e a

montante dessas actividades. A localização dos serviços é, dado o emprego que

proporciona e o seu volume de negócios, visto como uma das formas de promover

o desenvolvimento.

Os equipamentos terciários, tal como as actividades produtivas, têm vindo a

considerar-se extremamente importantes para o desenvolvimento nacional versus

regional levando os agentes económicos e as autoridades públicas a debruçarem-

se sobre a sua localização.

A teoria da localização, neste século, tem evoluído de um modo significativo tal

como se pode verificar no quadro 2.1.

90 Greenhhut admite ainda: 1) os custos são variáveis; 2) a procura pode ser afectada pela possibilidade da interdependência da localização; 3) introdução de inovação a qualquer momento desde que a economia seja desenvolvida.

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Quadro 2.1

Evolução da economia espacial

Dé-cada

Contribuição da economia geral à

econo-mia espacial

Problemas espaciais

Questões económicas espaciais

Teorias espaciais

Políticas Espaciais

1820 Ricardo: ignora o espaço na teoria das trocas internacionais

von Thünen: integração do espaço na teoria da renda fundiária

1890 Marshall: economias externas

1910 Microeconomia, Teoria do imperialismo

Localização óptima da empresa, substituição dos factores de produção

A.Weber: teoria da localização da indústria Prédohl: teoria das áreas de mercado

1930 Teoria dos preços de monopólio

Aspectos regionais da crise da Grã-Bretanha

Função comercial das cidades

Palander, Christaller: teoria dos lugares centrais

Início do ordena-mento do território na Grã-Bretanha

1940 Espaço – perturbação do óptimo

Lösch: localização e equilíbrio geral

1950/ 1960

Teoria do desenvolvimento

Crescimento urbano, desenvolvimento regional desigual, descentralização industrial

Domínio Hoover, Isard, Greenhut, Perroux: equilíbrio geral e localização, teoria dos pólos de crescimento Myrdal: Princípio da cumulatividade de efeitos. Análise input-output. Teoria da localização intra-urbana: modelos urbanos

Início do ordena-mento do território na França e Itália, políticas de planeamento dos transportes Política dos pólos e dos complexos industriais – políticas de alojamento

1970 Teoria do imperialismo Novas abordagens ao desenvolvimento: desenvolvimento a partir de baixo (Sthör)

Peri-urbanização Desenvolvimento regional em período de crise

Desenvolvimento territorial

Paelinck: Econometria espacial – nova economia urbana Friedmann, Stöhr: divisão espacial do trabalho – teoria do desenvolvimento autocentrado

Políticas imobiliárias - planeamento regional

1980 Economia industrial, análise de fileiras Ambiente inovador (Aydalot, Camagni, Lacour, Perrin)

Introdução no espaço de novas tecnologias – crise da urbanização

Etapas do crescimento urbano, declínio urbano, criação de empresas, tecnologia e espaço

Políticas de apoio à utilização inovadora dos recursos endógenos

1990 Economia pública, da inovação e do ambiente (ecologia)

Dotação desigual de factores imateriais de desenvolvimento, degradação ambiental

Reforço da base local de desenvolvimento

Políticas de apoio à ciência e cultura e ambiente, enquanto factores de desenvol-vimento

Fonte: Traduzido e adaptado de Aydalot, P., (1985) Economie régionale et Urbaine, Economica, Paris, pp. 12-13

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A elaboração dos modelos macroeconómicos adaptados à realidade regional

apresenta algumas dificuldades, entre as quais se destacam a falta de informação

estatística regionalizada e a existência de forças externas não controláveis pelos

responsáveis da política económica. De entre estes modelos, realçamos os

modelos de base nas exportações de Friedman (1966) que conjuga as teorias do

comércio internacional e a dos ciclos económicos.

Os modelos de desenvolvimento regional assentam em dois paradigmas, isto é, no

funcional e no territorialista. No primeiro caso, o desenvolvimento é funcional, o

seu motor é o progresso técnico e o território é considerado como o espaço onde a

actividade económica se desenrola. Pelo contrário, no desenvolvimento

territorialista, o território é um elemento activo que influencia o desenvolvimento

da região. Nesta perspectiva, o desenvolvimento regional terá lugar, em nosso

entender, devido a uma conjugação de factores endógenos (Stöhr, 1981) e de

factores externos (Hilhorst, Jacobs, 1984).

O desenvolvimento das regiões, independentemente dos factores ou paradigmas

em que se alicerça, não é uniforme em todos os espaços ou, por outras palavras, as

regiões com maior capacidade inovadora e melhor dotadas de recursos humanos e

naturais têm um desenvolvimento mais rápido assumindo-se como centros e as

restantes como periferia. Myrdal (1957), tal como outros autores, destaca os

desequilíbrios crescentes entre regiões e apela à inovação para quebrar este ciclo

vicioso.

Em posição contrária à teoria do centro-periferia parece estar a teoria dos pólos de

crescimento de Perroux (1955) segundo a qual os pólos, assentes nas indústrias

motoras e indústrias chave, têm efeitos de dispersão. O desenvolvimento regional

equilibrado seria, assim, obtido mediante a concentração do investimento em

indústrias motoras localizadas em pólos interligados entre si. Estes pólos

formariam uma rede de modo a favorecer a propagação dos efeitos de dispersão

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Pelo atrás exposto, dividimos este segundo capítulo em duas partes: na primeira

debruçamo-nos sobre as teorias da localização e na segunda analisamos os

modelos e teorias do desenvolvimento regional.

SECÇÃO I – TEORIA E MODELOS DE LOCALIZAÇÃO

2.2. MODELOS DE LOCALIZAÇÃO DAS ACTIVIDADES ECONÓMICAS

2.2.1. A teoria da localização

O problema mais simples que se coloca na análise da localização óptima é o de

uma empresa que utiliza somente uma matéria prima, produzida em M, e que a

transforma através de um processo produtivo, só numa fase, num único produto

final, transaccionado num mercado exclusivo situado em C. Admitindo que os

custos de produção são idênticos para qualquer ponto escolhido, então a sua

localização será no ponto da recta MC em que se minimizam os custos de

transporte, ou seja, no ponto Z. Se o custo por Km de matéria prima transportada

necessária para produzir uma unidade do produto final é tM e o custo por Km por

unidade de produto final transportado é tC , teremos que os custos totais de

transporte T serão:

T = tM MZ + tC CZ e CZ = MC – MZ

sendo,

MC - Distância percorrida entre o mercado de matérias primas e de produtos finais

MZ - Distância percorrida entre o mercado de matérias primas e o local onde se situa a empresa

CZ - Distância percorrida entre o mercado de produtos finais e o local onde se situa a empresa

Escolhendo Z de modo a minimizar T teremos várias situações,

nomeadamente (Richardson, 1978, pp. 43-44):

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• se tM > tC - a empresa minimizará MZ e situar-se-á em M, donde MZ = 0;

• se tC > tM - a empresa situar-se-á onde se maximiza MZ91, ou seja em C,

donde MZ = MC;

• se tM = tC - os custos de transporte serão iguais a tC MC, independentemente

da localização da empresa, o que nos conduz à indiferença locacional.

Os pontos extremos são os preferidos para a localização da empresas em duas das

três situações anteriores. Mesmo no terceiro caso, um dos pontos extremos é tão

desejável como qualquer outro. Os custos de transporte tendem a diminuir com o

aumento da distância devido aos custos com as operações nos terminais de carga

serem fixos, pelo que a empresa escolherá o sistema de transporte com o menor

custo médio para a totalidade do trajecto ou, no caso de o transporte necessitar de

vários meios, o ponto de transbordo.

Mas, será que as decisões de localização assentam exclusivamente nos custos de

transporte ? A resposta a esta questão parece-nos indicar que, paralelamente aos

custos de transporte, os motivos pessoais (proximidade ao local de nascimento92 e

à família, as preferências geográficas) têm sido importantes na tomada de decisão

locacional 93. Por outro lado, um estudo de Greenhut e Colberg (1962) sugere que

os factores de índole exclusivamente pessoal são importantes apenas quando

possuem alguma dimensão económica, tais como as relações com os fornecedores

e a banca, um ambiente ou clima agradável que atraem gestores e quadros

técnicos. Tiebout (1957) salienta que as pequenas empresas tendem a conceder

mais importância aos factores pessoais nas decisões de localização do que as

grandes. Isto deve-se, entre outras razões, ao facto de a decisão ser tomada por um

pequeno grupo de pessoas, à existência de outros objectivos importantes além da

maximização dos lucros, à dependência do capital local e das condições locais de

oferta e procura para iniciar o projecto com êxito. Contudo, a investigação do

processo de decisão sugere que as preferências espaciais se baseiam, em larga

91 Neste caso, teremos que tM – tC = 0 92 Cite-se, por exemplo, a indústria automobilística de Detroit, a fábrica de tabaco e a empresa farmacêutica Boots, ambas em Nottingham, 93 Ver Chapman e Wells, 1958; Katona e Morgan, 1950 e 1951; Malinowski e Kinnard, 1961.

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medida, em impressões e não em factos conhecidos. Aliás, para Pred (1967), a

tomada de decisão locacional é efectuada na base de informação muito imperfeita.

Gould94 (1966) e, posteriormente, Pallenbarg (1985) confirmam esta hipótese ao

apresentar o mapa mental, isto é, a imagem subjectiva do conhecimento espacial

como um factor importante na escolha da localização óptima não só pelos

consumidores, mas também pelos produtores (cit. Reigado, 1999, p. 12). O autor

considera, ainda, que os agentes económicos agem, muitas das vezes, na fronteira

da racionalidade económica, pelo que as suas escolhas devem ser abordadas de

forma probabilística.

2.2.2. A localização da actividade agrícola

Cantillon (1755) pode ser considerado como o percursor dos modelos explicativos

da organização espacial da sociedade. A organização social, segundo Cantillon,

encontra-se subordinada à terra transformada em riqueza pelo trabalho: La terre

est la source ou la matière d’où l’on tire la richesse: le travail de l’homme est la

forme qui la produit: et la richesse en elle même n’est autre chose que la

nourriture, les commodités et les agréments de la vie (Cap. I)95. À organização

social que leva a distinguir entre trabalhadores e proprietários (e Estado)

corresponde, segundo Cantillon, uma organização do espaço assente em

princípios, extremamente simples e óbvios, de economias de tempo e de

transportes, o que leva à existência de dois circuitos económicos que se

equilibram, isto é, um horizontal expresso em termos espaciais pelas

transferências campo-burgo-cidade-capital e outro, vertical, associado às classes

sociais existentes e às relações entre elas. A consideração dos fluxos e das

variações dos preços com a distância permitiu a Cantillon, muito antes de von

Thünen, aproximar-se dos círculos concêntricos e demonstrar que os preços

94 Ver Gould, 1966 e 1967; Gould e White, 1968 95 Ver, Cantillon, R. (1755) Essai sur la Nature du Commerce en Général, Londres. Como referência tomou-se a tradução para francês do INED de 1952

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determinam a distribuição das culturas à volta dos aglomerados urbanos, tendo em

consideração os meios de transporte e o seu custo.

O modelo de von Thünen, apresentado em 1826, embora tenha sido o ponto de

partida para vários autores da localização industrial, é um modelo de localização

agrícola. No seu trabalho principal, o autor admite que os produtos agrícolas são

oferecidos no mercado em situação de concorrência: a produtividade, os custos de

transporte (embora agregados nos custos gerais) e a procura, conjuntamente, irão

determinar a localização das várias produções em círculos concêntricos à

aglomeração urbana. Como os custos de transporte aumentam com a distância,

esta determina a selecção das culturas, de tal forma que a diminuição dos custos

de transporte permitirá o afastamento das explorações agrícolas do centro dos

aglomerados populacionais. Assim, os produtos agrícolas com elevada

produtividade por hectare - ha -, e que não possam ser facilmente transportados

ou que se deteriorem com relativa facilidade, disputam entre si o espaço que

rodeia o mercado. Por outro lado, a renda desse solo será elevada devido à melhor

acessibilidade ao local de venda incentivando a sua utilização intensiva.

A relação existente entre duas produções agrícolas (por exemplo, trigo e ervilhas)

pode ser generalizada para o conjunto dos sectores de actividade económica

através da equação apresentada por Polèse (1998, p. 298):

R = Σ Ei (pi – ai) – Ei fi k

onde,

R - Renda por ha. E - Rendimento por ha, para o produto i (número de unidades de i ) p - Preço unitário de venda de i a - Custo unitário de produção de i f - Custo unitário de transporte do produto i por Km k - Distância em relação ao mercado

O valor de E (pi – ai), ou seja, o preço máximo que a empresa está disposta a

pagar por um ha de terreno, depende do rendimento obtido e da diferença entre o

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preço do produto no mercado e o seu custo de produção96. Assim, a renda

fundiária máxima que a empresa pagará para se localizar no centro, é uma função

de E, ou seja, do número de unidades de produto que ela consegue obter num ha.

À medida que a empresa se afasta do ponto central, a sua renda diminuirá por

acção de k em proporções iguais a Ef97. Os elementos renda e custo de

transporte são, por conseguinte, a chave do modelo: quanto maior for o

rendimento do solo que um utilizador obtiver e quanto mais sensível ele for aos

custos de transporte (em relação a um ponto central pré-definido) mais disposto

estará a pagar para aí se instalar (ibid., p. 299).

Numa situação em que não houvesse concorrência para a ocupação dos solos,

qualquer empresa ocuparia o interior desde o centro de mercado até uma distância

em que o custo de transporte esgotasse o lucro bruto da produção. Uma vez que

esta situação não ocorre, estão criadas as condições para se gerarem os anéis ou os

círculos concêntricos de von Thünen.

Regressando à actividade agrícola, as culturas que ocupam os anéis mais

próximos apresentam lucros brutos de produção mais elevados por unidade de

terra ocupada, podendo, por isso, ser consideradas culturas nobres. As outras, isto

é, as culturas que se localizam nos círculos mais afastados têm um menor

rendimento bruto por unidade de terra ocupada, mas, devido ao seu baixo custo de

transporte, elas competem com as culturas nobres e atingem o mercado. De um

modo geral, conclui von Thünen, a empresa agrícola que estiver mais próxima

dos consumidores terá maior rendimento. Posteriormente, o autor viria a admitir

que os obstáculos naturais e as diferenças de fertilidade do solo e de condições de

acesso podiam alterar o padrão teórico dos anéis.

96 Admitindo um mercado de concorrência perfeita (p = a) e que o custo de produção inclui o lucro “normal” esperado pela empresa. 97 Ef define o declive da curva da renda. O utilizador com um Ef de valor mais baixo localiza-se no ponto, leia-se círculo, mais distante do centro populacional.

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A análise da distribuição espacial das produções agrícolas foi desenvolvida

apoiando-se num conceito de renda idêntico ao de Ricardo98. Com efeito,

enquanto Ricardo compara os resultados que se obtêm cultivando certo tipo de

solo com os obtidos em solo tido como marginal, von Thünen recorre à distância,

via custos de transporte, como factor gerador de resultados diferentes. Assim, por

exemplo, espera-se que a procura em função da distância ao mercado seja mais

elástica para um cereal do que para os vegetais frescos99.

Não obstante as limitações do modelo, a abordagem de von Thünen veio a inspirar

vários desenvolvimentos teóricos (particularmente em planeamento urbano), já

que os custos unitários de transporte e o preço do solo são, normalmente,

tomados, em meio urbano, como funções decrescentes da distância ao centro. O

grau de acessibilidade e a procura do solo nas áreas urbanas são, em regra, tidos

como determinantes dos custos de transporte e da renda urbana, pelo que,

nalgumas circunstâncias, se admite a sua complementaridade (Wingo, 1961 e

Alonso, 1964).

Partindo dos círculos concêntricos de von Thünen e generalizando os conceitos de

rendimento100 e de custo de transporte101, é possível elaborar um modelo de

utilização do solo para um espaço urbano. Alonso (1964) refere que numa cidade

centralizada (com um centro), uma empresa dedicada à produção de bens de

consumo ou a actividades de serviços terá de equilibrar, aquando da escolha da

localização, as vantagens de estar próxima do centro, em contraposição aos

aluguéis mais altos que aí se praticam ou, por outras palavras, a empresa localiza-

98 Há quem afirme que von Thünen desenvolveu o seu conceito de renda independentemente de Ricardo (Chisholm, 1968, p. 21). 99 Por exemplo, Blunden (1977, pp. 18-19), embora com um tratamento relativamente diferente, apresenta uma situação real em que se pretende decidir acerca da localização mais conveniente da produção de uma gama relativamente estreita de vegetais de alta qualidade, a cultivar em estufa, para abastecimento de uma área do S.E. da Inglaterra. 100 A noção de rendimento monetário por há, E , exprime os rendimentos que um utilizador obtém se explorar um ha de terra. A capacidade de retirar de uma unidade de terra mais rendimento que outro produtor depende, sobretudo, da intensidade de exploração e, consequentemente, das condições tecnológicas de produção. 101 A noção de custo de transporte f não se reduz aos custos directos. Para a análise do espaço urbano, f deve ser encarado como um custo de interacção espacial que inclui as comunicações interpessoais, as deslocações diárias, os custos de transacção e o custo de oportunidade do tempo consagrado às deslocações e comunicações.

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se no ponto em que o aluguer real da terra iguala o aluguer que a empresa está

disposta a pagar de forma a maximizar o lucro. A resolução deste problema passa,

segundo o autor, pela adopção do conceito de função de oferta de aluguer102

(Richardson, 1973, p. 79). Neste modelo, o aluguer de terrenos distribui as

actividades económicas espacialmente em função das necessidades de

acessibilidade. Polèse (1998), retomando este problema, apresenta a sua cidade

hipotética: o centro está ocupado por escritórios e lojas especializadas, a seguir

vem alguma indústria ligeira (confecção de vestuário por medida, artes gráficas)

e algumas funções de armazenagem e de distribuição, depois há as zonas

residenciais, zonas de indústria pesada e, finalmente, terras utilizadas na

agricultura (Polèse, 1998, p. 299). Embora não se conheça nenhuma cidade com

esta distribuição verifica-se, no entanto, em todas as grandes cidades a existência

de um ponto ou mais pontos centrais onde os preços atingem um máximo. À

medida que nos afastamos desse(s) ponto(s) os preços103 diminuem, não

uniformemente, consoante as condições locais.

Uma das críticas mais frequentes ao modelo de von Thünen é a sua

“artificialidade”. Chisholm (1968) contra argumenta, afirmando que, mesmo

quando algum aspecto do modelo não é aplicável em determinado lugar, não há

razão para generalizar a sua inaplicabilidade, do mesmo modo que, se a aplicação

não for possível em determinada escala, nada nos garante que não seja noutra. De

referir que, efectivamente, será extremamente difícil encontrar os padrões de

utilização do solo com regularidade concêntrica. No entanto, não são raros os

casos em que a ocupação do solo aponta para comportamentos que se ajustam, em

termos gerais, às conclusões esperadas da construção de von Thünen.

102 As funções de oferta de aluguer são representadas por curvas hipotéticas de isolinhas que mostram como o aluguer da terra deve variar com a distância para que a firma obtenha os mesmos lucros independentemente da ,localização (Richardson, 1973, p. 79). 103 Os preços dos solos e da sua utilização são determinados pela sobreposição das curvas de renda dos vários agentes económicos.

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2.2.3. A localização da indústria

2.2.3.1. O custo mínimo de transporte

Launhardt (1885) e Weber (1909), tidos como percursores dos modelos de

localização industrial104, consideravam os custos de transporte decisivos, pelo que

a localização mais conveniente será encontrada no ponto em que os custos de

transporte (custos de reunião das matérias-primas e os de colocação do produto

final) sejam mínimos. O custo mínimo será, assim, encontrado dentro do triângulo

de Weber ou triângulo ponderado105 em cujos vértices se situam a localização das

matérias primas (duas no exemplo), as ubiquidades, ou seja, os produtos que

podem ser obtidos em qualquer parte e os mercados de produtos finais (Reigado,

1999, p. 3). As matérias primas, por sua vez, classificam-se em quatro categorias:

ubiquidades, materiais localizados (obtidos em apenas algumas regiões),

materiais puros (integrados no produto acabado na totalidade) e materiais brutos

(perdem o seu peso no processo produtivo através da combustão ou eliminação

de resíduos) (cit. Blaug, 1990, p. 411). Das preocupações em relação às matérias

primas resultaram, por um lado, as tentativas da sua classificação em função do

grau de disponibilidade e, por outro, a utilização de índices auxiliares de

localização: o Índice material106 e o Peso locacional107.

O modelo de Weber, apresentado numa altura em que a Revolução Industrial era

uma realidade por toda a Europa e em que o factor produtivo capital se tornava

104 Launhardt, W. (1885), Mathematishe Begrundunge der Volkwirtschaftslehre, Leipzig, foi quem primeiro sugeriu a importância dominante dos custos de transporte na localização. Weber deu continuidade a essas preocupações na obra Uber den Standort der Industrien, 1909, traduzida para inglês por Friedrich, C. J. ( 1957), Alfred Weber’s Theory of the Location of Industries, Cambridge 105 Weight triangle segundo a expressão de Weber. 106 O índice material - IM - é a razão entre o peso das matérias-primas localizadas e o peso do produto final. 107 O peso locacional - PL - corresponde à razão entre o peso total a ser transportado (peso das matérias primas localizadas somado ao peso do produto final) e o peso do produto final. Assim, enquanto um PL elevado indica perdas no processamento das matérias primas com a consequente atracção das empresas para se localizarem próximo das fontes de matérias-primas, um PL baixo significa ganhos no processamento o que leva as empresas a situarem-se junto do mercado de produtos finais.

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cada vez mais importante, tinha como objectivo explicar a escolha locacional da

indústria. Antes, porém, é necessário distinguir os factores que se referem a uma

ou a poucas indústrias, daqueles que são capazes de influenciar os custos de

qualquer actividade industrial. Assim, os primeiros factores são classificados em

específicos e os segundos em gerais que, por sua vez, se subdividem, de acordo

com a escala geográfica de actuação em factores regionais (explicam a opção

locacional entre regiões) e factores aglomerativos108 e desaglomerativos109

(explicam a concentração ou dispersão da indústria em certa região ou, mesmo,

em determinado local).

Tal como o transporte, também a mão-de-obra, é analisada de forma semelhante

através do Índice de custo de mão-de-obra110 e do Coeficiente de mão-de-obra111.

Tendo em consideração as definições de índice de custo de mão-de-obra e de peso

locacional, podemos observar que o coeficiente de mão-de-obra corresponde à

razão entre o custo de mão-de-obra e o peso total a ser transportado. Assim,

enquanto a indústria ligeira se caracteriza por um coeficiente de mão-de-obra

elevado (as despesas com salários são superiores às despesas com transportes), a

indústria pesada tem um coeficiente baixo (despesas de transporte elevadas).

Com o seu modelo, Weber pretendia encontrar um ponto ou área óptima112

(também designada por crítica) para a localização da empresa, que enfrenta dois

constrangimentos (matérias primas e mercado), através do método das isolinhas.

Além dos custos de transporte (que traduzem a distância) são, ainda,

considerados, como factores de localização, os custos da mão-de-obra e as

108 O factor de aglomeração conduz à redução do custo que uma empresa, de certa indústria, obtém ao localizar-se junto de outras empresas da mesma indústria. 109 O factor desaglomerativo representa economia de custo devido à menor distância a percorrer em relação às empresas já estabelecidas. 110 O índice de custo de mão-de-obra - IC - é obtido pela razão entre o custo de mão-de-obra e o peso do produto final. Este índice permite calcular o número de unidades monetárias em salários por unidade de peso do produto. 111 O coeficiente de mão-de-obra - CM - relaciona directamente o custo de mão-de-obra com o custo de transporte, estabelecendo o quociente entre o índice de custo de mão-de-obra e o peso locacional, isto é, CM = IC / PL. 112 Para Weber, o ponto óptimo é aquele em que os custos são mínimos.

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economias de escala (Lopes, 1984, pp.177-185). Aliás, para o autor, a

concentração da mão-de-obra num determinado local pode levar à deslocação do

ponto óptimo de localização pelo que a empresa irá comparar o ganho por unidade

de produto ou, por outras palavras, a economia, devido à sua localização junto da

bacia de mão-de-obra, com o custo de transporte complementar que essa

localização implica. Recorrendo ao método das isolinhas e, particularmente, à

isolinha crítica113 Weber conseguiu associar numa única análise uma variável que

evolui no espaço de uma forma contínua e linear (os custos de transporte) e um

factor descontínuo (os custos de mão-de-obra).

Assumindo-se que o mercado do produto final é conhecido, a empresa irá

procurar uma localização onde o custo total de transporte, definido num espaço

euclidiano ou contínuo e isótropo, será mínimo:

Min Ct ; Ct = ti mi d (Mi , P)

onde,

Ct - Custo de transporte P - Localização procurada ti - Tarifa de transporte do input proveniente de Mi Mi - Localização da matéria prima ou do mercado do produto final mi - Quantidade de input ou output d (Mi , P) - Distância euclidiana entre Mi e P A técnica das isolinhas permitiu a Weber definir as condições de uma

deslocalização das empresas a partir do ponto em que os custos de transporte são

mínimos para obter uma economia de aglomeração ou de mão-de-obra. De referir,

no entanto, que esta análise da concentração industrial é insatisfatória, uma vez

que considera, apenas, as vantagens ou desvantagens no âmbito de certa indústria

113A isolinha crítica representa, em relação ao ponto em que os custos de transporte são mínimos, um custo unitário adicional igual à economia proporcionada pela localização junto da bacia de mão-de-obra, pelo que se pode verificar duas situações: 1) a economia situa-se no interior da isolinha crítica, isto é, a economia proporcionada pela localização junto do mercado de trabalho é superior aos custos adicionais, pelo que a empresa tende a localizar-se junto do mercado de trabalho; 2) o mercado de trabalho é exterior à isolinha crítica, ou seja, a economia é inferior aos custos de transporte, logo a empresa localizar-se-á na área em que os custos de transporte são mínimos.

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e não tem em consideração, entre outros factores, os efeitos cumulativos de umas

empresas na localização de outras. As várias críticas ao modelo levaram ao

desenvolvimento de trabalhos em que a empresa e a produção, a formalização do

espaço e do custo de transporte foram reconsiderados.

A introdução da substitubilidade dos factores permite, por um lado, abandonar a

hipótese simplista das funções de produção com coeficientes fixos e, por outro

lado, reforçar as ligações entre a teoria da localização e as estruturas de base do

modelo marginalista. A cada localização possível corresponde uma combinação

óptima de factores, tendo em consideração os preços relativos dos factores nesse

lugar. Assim, para cada combinação de factores só uma localização será óptima,

pelo que, a empresa escolherá, simultaneamente, uma localização e uma

combinação de factores determinando, ainda, a minimização dos custos. De

acordo com Paelinck e Nijkamp: a problemática da localização torna-se uma

generalização da teoria neoclássica da produção (1975, p. 46).

Predöhl (1925), recorrendo à substituição de inputs, expõe a sua teoria de uma

forma extremamente simples: uma empresa, um produto, um dado volume de

produção, um preço de venda (cit. Aydalot, P., 1985, p. 23). Os preços dos inputs

não são constantes no espaço, dependendo da distância entre a localização da

origem e a localização da empresa utilizadora. Daí, as empresas pretenderem uma

localização onde possam maximizar a produção perante um determinado custo .

Esta questão, mesmo ao nível teórico, é bastante complicada. Registe-se, entre

outras, as contribuições de Hoover e Isard (que considerou os inputs como

serviços à produção) na análise dos problemas colocados pela introdução da

substitubilidade dos factores na teoria da localização. Hoover (1948), embora

continue a linha de pensamento de Weber, admite que os custos de transporte114

114 Os custos de transporte, segundo Hoover, incluem os custos de transporte das matérias primas e os custos com a distribuição do produto final. Nos custos totais de transporte foi atribuído um papel relevante aos custos de transferência e aos custos terminais, já que estes influenciam os

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são directamente proporcionais à distância, ao peso transportado e à composição

da carga. Para além destes, considera ainda os factores institucionais que, muitas

vezes, influenciam, significativamente, as decisões de localização. A procura foi

outra preocupação de Hoover associando-se, assim, aos que entendem que a

questão de localização deve ser vista na óptica das áreas de mercado.

A análise das forças de aglomeração é em Hoover mais profunda do que em

Weber. Influenciando-as surgem, além dos factores considerados por Weber, as

vantagens em serviços de transferência eficientes, em mercados de trabalho

amplos e flexíveis, em serviços de protecção civil, melhores equipamentos

bancários, seguros mais eficientes, etc. Além disso, a aglomeração pode

proporcionar, por um lado, o favorecimento da especialização e a obtenção de

vantagens, em termos de maiores facilidades nas relações inter-sectoriais e, por

outro lado, uma melhor e mais eficiente utilização dos recursos humanos.

Na consideração de factores institucionais, enquanto influenciadores da

localização, Hoover (1948) salienta o papel dos impostos que, quando aplicados

independentemente dos volumes de produção, têm implicações semelhantes às das

taxas de juro mais elevadas, penalizando as localizações onde o equipamento não

se encontra utilizado em toda a sua capacidade. Outros factores especiais de

localização como por exemplo o clima que, em situações extremas de frio e de

calor, contribui para a subida dos custos, são igualmente analisados pelo autor.

Invocando Greenhut (1956), pode afirmar-se que, independentemente do quadro

da concorrência perfeita em que Hoover dominantemente se move, é na relativa

negligência da interdependência espacial que repousa a maior fraqueza do seu

trabalho, apesar da tentativa de considerar a oferta e a procura pela via das áreas

de mercado115.

Palander (1935) ao debruçar-se sobre a minimização dos custos de transporte viria

a enunciar a lei da refracção segundo a qual, num plano homogéneo, uma linha

custos totais fazendo com que estes aumentem menos do que proporcionalmente à distância percorrida. 115 Ver o ponto 2.2.3.2. desta Tese.

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recta entre dois pontos poderá não ser o caminho mais curto entre eles (cit.

Aydalot, 1985, p. 24). Assim, segundo o autor, se os custos de transporte por

unidade de produto forem diferentes de região para região, a minimização dos

custos pode exigir que o percurso entre os dois pontos (um em cada região) se

afaste da linha recta.

Para Isard (1956), definindo os inputs de transporte como o movimento de uma

unidade de peso por uma unidade de distância (ou, por outras palavras, o

dispêndio de recursos necessários para que as mercadorias se desloquem no

espaço e superem distâncias) e as taxas de transporte como o preço desse input116,

o conceito fundamental do princípio da substituição equimarginal bastaria para se

obter uma generalização correcta da teoria de localização. Assim, quaisquer que

sejam o grau de concentração ou de dispersão das fontes de inputs e mercados de

escoamento e independentemente da natureza da função de transporte, as

empresas que maximizam o lucro, localizar-se-ão de forma a equacionarem as

taxas marginais de substituição entre quaisquer dois inputs de transporte e o

inverso do rácio das suas taxas de transporte (Blaug, 1990, pp. 414-415).

Refira-se que, no entanto, a aplicação deste teorema não permite definir uma

localização óptima dado se trabalhar com funções de produção lineares e de as

empresas substituírem uns factores de produção por outros, mas sim várias

localizações tornando pouco útil a sua utilização prática.

2.2.3.2. A localização na óptica das áreas de mercado

A abordagem da localização pela óptica da minimização de custos é limitada, uma

vez que o mercado, na realidade, se comporta como uma variável. A localização

116 As variações das taxas ou tarifas de transporte não devem ser confundidas com variações de input de transporte. As tarifas dependem da estrutura de concorrência e de factores conjunturais,

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da empresa tem efectivamente que considerar as características do seu mercado e

em nada surpreenderá que a maximização das áreas de mercado possa surgir como

objectivo empresarial. Não obstante, a evolução técnica tender a facilitar a

concentração das actividades produtivas isso não impede que os serviços se

aproximem do consumidor numa clara tendência para a desconcentração e

dispersão. Como já vimos, a consideração da mobilidade de alguns factores, do

clima e dos aspectos institucionais não nos permite chegar a uma solução única,

mas apenas a hipóteses de localização alternativa. A questão da interdependência

é, também, incontornável quer pela linha da localização da produção e das suas

relações com o consumo, quer pela das vantagens em reduzir custos nos processos

de fabrico.

Segundo Palander (1935), a repartição espacial dos mercados deve ser analisada

segundo dois pontos de vista, ou seja, tomando como dados os preços, as

localizações, os custos e as possibilidades de transporte, surgindo assim a

dimensão do mercado como uma variável determinada pelos custos e admitindo a

existência de relações entre a formação dos preços e a própria dimensão do

mercado. A abordagem formal das áreas de mercado e a consideração de

condições de limitação da concorrência espacial podem tomar-se como

contribuições extremamente válidas de Palander para a teoria da localização. No

entanto, se as determinantes da localização não podiam ser vistas só na óptica de

minimização dos custos, também não o podem ser apenas sob o ponto de vista das

áreas de mercado, pelo que é importante considerá-las conjuntamente, admitindo-

se, assim, que a interdependência locativa é um factor determinante da

localização.

Lösch (1954) é o primeiro a considerar simultaneamente as teorias da localização

e a do equilíbrio económico no espaço com o objectivo de mostrar como se

localiza a produção, como determinar os limites das áreas de mercado das

empresas, como fixar o volume total de produção e os níveis de preços, numa

enquanto a quantidade de inputs de transporte depende, basicamente, do padrão tecnológico e da eficiência dos meios de transporte.

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situação em que a procura é totalmente satisfeita, ou seja, em que o problema

reside em compatibilizar a maximização dos lucros empresariais com a

optimização do sistema global. Ao rejeitar a minimização dos custos como

objectivo, Lösch considera que a escolha locacional deve procurar o maior lucro

possível introduzindo na sua análise as variações espaciais da procura. Para a

determinação espacial da procura, admite que as empresas adoptam a política de

estabelecer o preço do produto em termos FOB, adicionando-lhe o custo de

transporte para formar o preço final. Além disso, supõe que o espaço é constituído

por uma planície homogénea e isótropa, não havendo, por conseguinte, diferenças

de rendimento ou de gosto dos consumidores. Desta forma, obtém uma curva

espacial de procura117 decrescente com a distância, devido aos acréscimos de

custo de transporte. Uma vez fixado o preço, a quantidade procurada Q por

unidade de tempo variará apenas em função da distância118. A quantidade total

vendida por unidade de tempo pode ser calculada somando o volume de compras

de um número elevado de anéis concêntricos de espessura infinitesimal119. A

quantidade total procurada V será então (Clemente, 1994, p. 99):

V = 2 π . g . {0,5 [a – b . P0] . xmax2 - 0,33 b . t . xmax

3}

onde,

G - Densidade demográfica π - Raio entre o centro e a fronteira do 1º círculo concêntrico a , b - Parâmetros positivos da função linear da procura120 Se, porventura, admitirmos a existência de concorrência perfeita entre os vários

produtores, a manutenção da estrutura e a maximização dos lucros, os produtores

117 A curva da procura tem um formato linear e será Q = (a – b .P0) – b.t.x onde P0 representa o preço FOB, t a tarifa de transporte por unidade de produto e por unidade de distância, e x a distância (Clemente, 1994, p. 97). 118 Nestas condições: 1) quando x=0, a quantidade procurada é máxima e calcula-se através da expressão Qmax = a – b . P0 ;2) quando Q=0, a distância é máxima pelo que Xmax

= (a – b . P0) / b . t 119 Este calculo é possível tendo em consideração vários pressupostos, nomeadamente: 1) a densidade demográfica, nível de rendimento e padrão de preferências uniformes em toda a área de mercado; 2) a quantidade procurada por consumidor por unidade de tempo é decrescente devido ao encarecimento decorrente do custo de transporte; 3) a taxa de compras tem sempre o mesmo valor para determinada distância da fábrica, ou seja, graficamente poderíamos dizer que se situaria sobre uma circunferência cujo centro é a fábrica. 120 a – intercepto vertical da função linear da procura

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dispor-se-iam nos centros dos hexágonos regulares de igual tamanho, os quais

constituiriam a sua área de mercado.

O contributo de Lösch está na explicação das razões que levam à concentração

espacial da produção ou, por outras palavras, está no seu Modelo de equilíbrio

espacial, entendido como uma análise de equilíbrio geral da distribuição espacial

das actividades económicas. Assim, segundo o autor, se por um lado, a

concentração espacial não ocorre devido às economias de escala, capazes de

proporcionarem um custo unitário mais baixo para a produção concentrada, por

outro, a dispersão total não ocorre porque os custos de transporte a inviabilizam.

Estas duas forças têm efeitos contrários, resultando em maior ou menor

concentração, de acordo com o predomínio de uma sobre a outra.

Apesar de reconhecermos que Lösch apresenta uma primeira tentativa de

descrição das relações gerais espaciais, embora de uma forma simples (mercado

monopolista), o seu modelo tem várias limitações decorrentes de se pressupor que

(Richardson, 1969, p. 108 e Reigado, 1999, p. 6):

• a produção, as vendas e os preços dos diferentes bens são considerados

isoladamente, logo os ramos industriais são independentes entre si, tal como

os seus inputs e outputs;

• a procura de um bem depende unicamente do seu preço e não dos preços dos

vários bens disponíveis no mercado;

• todas as empresas têm os mesmos custos médios e os mesmos custos unitários

de transporte em todo o sistema espacial;

• dentro do mesmo ramo todas as empresas têm os mesmos preços dos factores

de produção.

Além das limitações apontadas refira-se, ainda, a insuficiente análise da

interdependência da localização dos diferentes bens. No entanto, a limitação mais

grave deriva da não consideração de variações espaciais nos preços, visto ter-se

b – inclinação negativa da função linear da procura

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considerado que os factores produtivos, incluindo o factor trabalho, se encontram

distribuídos uniformemente.

A maximização dos lucros, como objectivo, não dispensa o tratamento de

questões complexas como as da interdependência locativa, as da identificação das

variáveis relevantes, as da influência das grandes empresas e dos factores

subjectivos de comportamento dos empresários que, com alguma frequência,

põem em risco a optimização dos resultados como objectivo da localização

(Glasson, 1974, pp. 111-113).

Greenhut (1956; 1970) ao admitir a variabilidade dos custos e que a procura pode

ser afectada por razões de interdependência locativa, tentou furtar-se ao tipo de

condicionamentos assumidos por Lösch. O mesmo autor considera, ainda, que a

existência de interdependência entre os produtores e de economias de

aglomeração levam à concentração das actividades em determinados locais em

vez de conduzirem à sua dispersão. Tendo como ponto de partida a produção de

um bem novo (inovador) por uma única empresa que cria, assim, o seu mercado, e

admitindo custos de produção e procura independentes da localização, esta vai

acontecer no centro do mercado. A entrada de novas empresas no mercado será

feita em função da procura e da minimização dos custos, pelo que as novas

empresas procurarão localizar-se próximo da inovação ou, em alternativa, numa

área em que a procura é elevada. A situação de equilíbrio pode ser perturbada por

variações na procura, nos custos ou por outros factores, como os de ordem

psicológica121, levando a mudanças no local de implantação das empresas.

A teoria de Greenhut, tal como a de Lösch, parte do princípio que as empresas

individuais procuram maximizar os lucros. No entanto, o seu modelo tem um

121 A análise do plano da obra de Greenhut (1956, pp. 279-281) mostra a importância atribuída aos factores e à sua sistematização: 1) factores de custo (transportes, trabalho e custo de fabrico); 2) factores associados à procura (interdependência locativa em situações de preço discriminatório e não discriminatório); 3) factores associados à redução dos custos; 4) factores associados ao aumento das receitas; 5) factores pessoais de redução de custos e aumento das receitas; 6)

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maior grau de generalidade uma vez que, por um lado, permite a variação dos

custos de local para local, e por outro, admite a alteração dos custos devido à

entrada de novas empresas. A não integração dos transportes vem, contudo, a

revelar-se a limitação talvez mais importante da sua teoria geral de localização.

Henderson e Lefeber, ambos em 1958, apresentam quase simultaneamente dois

modelos de programação. Apesar dos modelos serem semelhantes, enquanto

Henderson pressupõe que a procura é perfeitamente inelástica, Lefeber considera

a procura perfeitamente elástica. A diferença, fundamental, em relação aos

modelos anteriores é o abandono do custo de transporte nulo. Desta forma, os

transportes (via custos) são integrados no modelo como determinantes da

localização e optimização da produção. Ao contrário de Isard (1956), Lefeber não

considera os transportes como bens intermédios antes, pelo contrário, os

transportes são um serviço que exige sacrifícios sociais, na medida em que

consome inputs indisponibilizando-os para a produção de outros bens.

O modelo de Lefeber estabelece um padrão de localização óptima e mostra,

simultaneamente, como esta maximiza a produção de bens finais sob o ponto de

vista dos consumidores. Segundo Reigado (1999, pp. 7-8), em termos de

equilíbrio espacial, o modelo estabelece as seguintes condições:

• valor da produtividade marginal de um factor originado por determinada

localização deve igualar o seu custo de transporte;

• os factores empregues no transporte devem receber uma renda igual à que

receberiam se fossem utilizados na produção;

• se o factor ficar inactivo num determinado local deve ter uma renda nula;

• se o mesmo factor for empregue noutro local, o seu produto marginal deve

igualar a sua renda no emprego local inicial acrescida do custo marginal de

transporte.

A introdução de pontos de consumo e de custos de transporte para os bens finais

não causam distorções ao modelo, desde que as condições normais de equilíbrio

considerações de ordem subjectiva. Apoiado numa análise empírica, Greenhut apresenta uma lista longa e sistematizada de factores.

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espacial122 sejam satisfeitas . A assunção da divisibilidade das localizações,

reforçando a ideia de que o modelo é generalizado123, significa que se, por um

lado, várias indústrias se podem estabelecer no mesmo ponto de produção, por

outro, a produção de mercadorias idênticas pode ocorrer, simultaneamente, em

vários lugares.

As localizações óptimas e as quantidades produzidas sectorialmente em cada lugar

são determinadas, entre outros factores, pelos preços de mercado, nível de

tecnologia, dotação local de factores de produção e parâmetros da função procura

de transportes. O facto de não se determinar somente as localizações, mas

também o valor maximizado do output total, a afectação óptima dos factores

produtivos e os fluxos especiais para cada mercado torna a teoria de Lefeber

muito mais vasta do que a pura teoria de localização. Daí Marques Reigado

(1999) afirmar que esta teoria é o modelo geral de equilíbrio de Walras,

modificado pela introdução das localizações da produção e consumo,

espacialmente separadas e divisíveis, ou por outras palavras, é o modelo geral de

equilíbrio integrado no espaço multiforme. No entanto, e apesar da importância

deste modelo, Lefeber introduz os preços como parâmetros e não explica quais as

suas determinantes o que, em nosso entender, constitui uma lacuna importante.

Walter Isard (1956) que, como já vimos atrás, considera possível a substituição

entre os inputs de transporte e os outros inputs mostrou como se opera essa

substituição no espaço e introduziu na análise económica as economias de escala e

de urbanização. Se há algum sentido no estudo da economia da localização, isso

deve-se ao facto de existirem certas regularidades nas variações de custos e

preços no espaço. Estas regularidades emergem fundamentalmente porque o

custo de transporte é uma função da distância. Se não fosse assim ... o padrão de

distribuição espacial da indústria, dos centros de consumo e de produção de

matérias-primas seria completamente arbitrário do ponto de vista económico

122 Os preços dos bens homogéneos diferem de lugar para lugar devido aos custos marginais de transporte. 123 Apesar de boa parte do estudo de Lefeber se limitar aos pontos de consumo, lugares de produção, factores e bens, o modelo generaliza-se para múltiplas localizações e bens.

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(Isard, 1956, p. 25). Quando uma empresa escolhe a localização entre uma fonte

de matéria-prima e o mercado de bens finais, está a decidir sobre uma combinação

particular de quantidades de input de transporte despendidas com matéria-prima e

com produto. Daí que a questão relevante, do ponto de vista da escolha locacional,

possa ser formulada do seguinte modo: como escolher a combinação óptima de

inputs de transporte com a matéria-prima e com o produto ? A resposta a esta

questão passa pela consideração dos requisitos de inputs de transporte por unidade

de produto em conjunto com os seus preços, ou seja, tarifas124. O princípio da

substituição dos factores leva-o, assim, a defender a integração da teoria da

localização na teoria neoclássica da produção.

Na integração do espaço no modelo de equilíbrio geral, a contribuição de Arrow e

Debreu (1954) é estratégica. No seu modelo consideram três tipos de bens: terra,

serviços de transporte e outros, nos quais se inclui o factor trabalho. Além disso,

considera-se a possibilidade de uma empresa ter vários estabelecimentos (logo,

várias localizações). A principal conclusão a que se chega é a seguinte: a

localização óptima só pode ser obtida quando, por um lado, o sistema de preços de

equilíbrio concorrencial não incita os agentes económicos a alterar a sua

localização e, por outro lado, qualquer deslocalização da empresa não trará ganhos

adicionais.

Esta conclusão é contestada por Koopmans e Beckmann (1957) já que, segundo

estes autores, o mercado fundiário não permite a obtenção da localização óptima.

Schweitzer, Varaya e Hartwick (1976) desenvolvem um modelo, idêntico ao de

Arrow e Debreu (1954), em que é possível gerar um equilíbrio competitivo

quando a procura de lugares é superior à oferta, o que implica uma distribuição

espacial em função da densidade de lugares por hectare e não em termos de

localização das unidades de consumo individuais.

124 Pesquisas empíricas mostram que a tarifa, expressa em unidades monetárias por unidade de peso, por unidade de distância, é decrescente com a distância devido à diluição dos custos terminais (estiva e desestiva, armazenamento e seguro).

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O carácter colectivo do equilíbrio, ou melhor, a incompatibilidade entre o

equilíbrio e as decisões individuais é a questão colocada por von Boventer (1975).

Assim, toda e qualquer decisão individual (por exemplo, a criação de uma

empresa ou a deslocalização de uma já existente) cria uma situação que desfaz o

equilíbrio anterior e exige a deslocação de todas as empresas de forma a encontrar

um novo equilíbrio. Posteriormente, Beckmann (1968) coloca uma questão

semelhante, ou seja, a entrada de uma nova empresa no mercado destrói o

equilíbrio existente, pois o custo de deslocalização inviabiliza o movimento que

restabeleceria o equilíbrio.

2.2.3.3. Modelos operativos e aplicações empíricas

A decisão de implantação de uma nova empresa é, muitas vezes, uma decisão

excepcional que dificilmente se enquadra numa tipologia de tomada de decisão

locacional. Refira-se que somente as grandes empresas sistematizam o seu

processo de decisão de escolha da localização óptima.

De acordo com Molle (1983), na maioria dos casos, ao industrial é proposta uma

localização que, após alguns ajustamentos, é aceite. É bastante raro que, neste

processo, sejam analisadas mais do que três localizações alternativas. Os critérios

considerados são igualmente poucos e, frequentemente, utiliza-se um único

critério, como por exemplo, o preço do terreno. Stafford (1974) refere que, no

Ohio, as tomadas de decisão locacional são efectuadas de forma idêntica.

Townroe (1983), sintetizando a experiência britânica, conclui que, raramente, as

empresas efectuam um estudo de custos comparativos entre diversas localizações.

Para o autor, na maioria das vezes, a escolha consiste em verificar quais as

localizações que convêm à empresa, eliminando aquelas que não se enquadram na

área pré-determinada inicialmente. Saliente-se a este respeito que esta área não

foi escolhida através de um estudo rigoroso.

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De um modo geral, as abordagens empíricas consideram os custos como a

variável determinante e têm sido dominadas pelo tratamento de situações em que,

quer o número de localizações alternativas, quer o número de inputs, é reduzido.

A existência de um número significativo de aplicações empíricas leva a deter-nos

naquelas que julgamos serem as mais importantes.

Smith (1971), apresenta o caso de uma empresa do sector da “electrónica” à qual

se põe a decisão da escolha entre 12 localizações possíveis no Canadá125. O

primeiro passo da análise envolve a especificação do processo de fabrico e das

necessidades da fábrica que vão desde os aspectos financeiros à mão-de-obra

necessária, às matérias primas, energia e água a utilizar, ao investimento e aos

meios de transporte necessários para o escoamento da produção. Por sua vez, os

custos são analisados por categorias: custos de mão-de-obra, custos de transporte

da matéria prima e do produto final, custos de instalação, impostos, etc. Neste

caso, a procura é insatisfatoriamente considerada no esquema de custos

comparativos apresentado, já que as ligações com o mercado se limitam a ter em

conta as despesas de transporte do produto final, negligenciando-se a procura

propriamente dita126.

Söderman (1975), num estudo essencialmente empírico, propõe-se observar

directamente o processo decisório das empresas industriais127 no que se refere à

localização. Considerando apenas as empresas footloose128, constata que a decisão

locacional faz parte de um conjunto mais vasto de decisões inter-relacionadas

referentes, por exemplo, ao processo produtivo, ao produto, à escala de produção

e à política de vendas.

125 Smith, (1971, pp. 320-325). O caso referido é o Fantus Company in Cost Comparison Study, Winnipeg, 1962. 126 A maior parte das tentativas para considerar a procura tem recorrido aos modelos de potencial de mercado, com a intenção de avaliar o efeito da localização sobre a procura ou sobre as receitas. Refira-se, a propósito, que a localização da fábrica e a dimensão do mercado são interdependentes. 127 Söderman baseou o seu estudo numa amostra de 25 empresas sobre a qual aplicou um questionário contendo 94 perguntas. 128 Empresas que não dependem de matérias-primas ou outras condições específicas para a sua localização.

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Conforme se verifica no fluxograma 2.1, de Söderman, entre as variáveis

explicativas e o planeamento locacional estabelecem-se cinco relações,

nomeadamente: complexidade, número de actores, contactos de negociação,

distância física e performance (cit. Clemente, 1994, p. 112). A variável

planeamento locacional é medida segundo quatro critérios alternativos, ou seja, o

número de fontes pesquisadas, a quantidade de “comportamento sistemático”, o

custo envolvido e o tempo despendido (ibid.). O tratamento estatístico da

informação permitiu concluir que os únicos coeficientes de correlação

significativos são referentes ao custo envolvido/contactos de negociação (0,670) e

número de fontes/distância física (0,399). Os resultados alcançados são, de certa

forma, decepcionantes como se verifica pela análise do quadro 2.2.

Fluxograma 2.1

Modelo decisional de Söderman

Fonte: Söderman, S., Industrial location planning: an empirical investigation of company

approaches to the problem of locating new plants, Ed. J. Wiley, Estocolmo, 1975, cit.

CLEMENTE, A. (1994), Economia regional e urbana, Editora Atlas, S. Paulo, Brasil, p. 112

NÚMERO DE ACTORES

Tamanho do Projecto

COMPLEXIDADE

PERFORMANCE

DISTÂNCIA FÍSICA

CONTACTOS DE NEGOCIAÇÃO

PLANEAMENTO LOCACIONAL

Nível de sigilo do projecto

Comportamento dos actores Conflitos

entre actores

Experiência dos actores

Actores que negociam

Capacidade de autofinanciam

Quantidade de vantagens e condições

Decisão

Competição

Causas da Mudança

Procura

Classificação da área

Atitude perante as diferenças regionais

Características da empresa

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A opção de Söderman (1975), de deixar de lado qualquer preocupação teórica e de

empreender uma análise estritamente empírico-descritiva, apresenta resultados

significativos no que se refere ao conhecimento do processo decisional das

empresas. No entanto, o modelo de decisão construído não pode ser considerado

satisfatório diante das evidências estatísticas verificadas.

Quadro 2.2 Coeficientes de correlação

Complexida

de Número de actores

Contactos de negociação

Distância física

Número de fontes (0,351) 0,040 0,376 0,399 Comportamento sistemático

(0,323) (0,014) 0,279 0,062

Custo envolvido (0,166) (0,308) 0,670 0,220 Tempo despendido (0.093) (0,091) 0,085 (0,151) Fonte: Söderman, S., Industrial location planning: an empirical investigation of company

approaches to the problem of locating new plants, Ed. J. Wiley, Estocolmo, 1975, cit. CLEMENTE, A. (1994), Economia regional e urbana, Editora Atlas, S. Paulo, Brasil, p. 112

O modelo SOMEA129, apresentado por uma empresa italiana de consultoria, é

outra tentativa empírica de modelização do processo decisional. No início dos

anos 70, a empresa desenvolveu um algoritmo baseado no conceito de zonas

elementares de planeamento, correspondentes a quadrículas em que se deve

dividir o território em análise. Assim, cada zona elementar de planeamento

apresenta certa disponibilidade de factores de interesse para a indústria.

Organizando os perfis das zonas elementares numa tabela obteremos a matriz da

oferta de factores. A procura de factores, por parte das empresas, é também

tratada no modelo dando origem aos perfis da procura de factores e,

posteriormente, à matriz da procura de factores que se subdividem em

específicos e comuns ou gerais. Os factores específicos interessam apenas a uma

ou a poucas indústrias (por exemplo, matéria-prima de determinado ramo

industrial), enquanto os factores gerais dizem respeito, teoricamente, a qualquer

129 SOMEA - Sociedade de Matemática e Economia Aplicada.

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actividade industrial (por exemplo, energia eléctrica). Num primeiro passo,

comparam-se os requisitos de factores específicos de cada segmento da indústria

com a disponibilidade de cada zona elementar, construindo-se, assim, a matriz de

possibilidades de localização. Em seguida, as matrizes de oferta e de procura de

factores gerais são comparadas para cada ramo industrial e cada zona elementar

de planeamento.

A ideia central do modelo, que consiste em comparar requisitos industriais com as

disponibilidades pelo território, mostrou-se capaz de produzir informações

inéditas e relevantes em muitos casos. No entanto, a sua aplicação está sujeita a

alguma subjectividade devido, por um lado, à desagregação da indústria num

número de ramos ou segmentos estar condicionada pela informação disponível e,

por outro lado, ao facto de o próprio território ser considerado ao nível regional

em virtude de, mais uma vez, ser escassa a informação regionalizada ao nível dos

municípios ou freguesias.

Schmenner (1982), ao analisar detalhadamente o processo de expansão das

empresas, coloca várias questões, entre as quais a de elaborar a listagem dos

factores determinantes na escolha da localização para a abertura de um novo

estabelecimento ou para a deslocalização.

Como se verifica pelo quadro 2.3, os factores considerados mais importantes para

a abertura de um novo estabelecimento são, por ordem decrescente, o clima social

favorável, o preço do terreno e a proximidade dos mercados. Para a

deslocalização, os dois primeiros factores mantêm-se e, em terceiro lugar, é citado

o custo de construção baixo. Schmenner (1982) chama, ainda, a atenção para o

facto de os novos estabelecimentos apresentarem características específicas: são,

geralmente, mais pequenos do que os antigos, utilizam tecnologias mais

modernas, beneficiam de uma sindicalização dos trabalhadores mais fraca, são

mais especializados e alteram a sua produção com mais frequência.

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81

Quadro nº 2.3 Hierarquização dos factores de localização

Factores de localização

Abertura de um novo

estabelecimento

Deslocalização

Clima social favorável 74 44 Preço do terreno baixo 60 50 Proximidade de mercados 42 22 Fiscalidade local favorável 35 19 Existência de auto estrada 35 28 Existência de ramal ferroviário 30 22 Custo de construção baixo 29 33 Nota: Percentagem de empresas que citaram o factor Fonte: Traduzido de Aydalot, P. (1985), Economie Régionale et Urbaine, Economica, Paris, p. 61

Um estudo de Hannoun e Templé (1975) sobre o processo de decisão locacional

nas grandes empresas (mais de 100 trabalhadores) criadas, em França, entre 1960

e 1970, mostra que a influência dos elementos ligados ao trabalho, quantitativos

(recrutamento de mão-de-obra e operários), qualitativos (clima social) e

monetários (salários) é bastante superior à das considerações sobre custos de

transporte, facilidade de contactos e existência de um meio económico estruturado

(cit. Aydalot, 1985, p. 62). De realçar que na escolha final da localização, os

factores ligados às preferências pessoais dos decisores, muitas das vezes ligadas

ao conhecimento empírico, têm um papel não negligenciável, levando-nos a

concordar com Gould (1966) e Pallenbarg (1985) quando estes afirmam que o

empresário ao tomar uma decisão de localização já tem um mapa mental pré-

definido.

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2.2.4. A localização dos equipamentos terciários

2.2.4.1. Breve abordagem teórica

A localização dos equipamentos terciários130, inserida na problemática da

organização do espaço, é normalmente considerada extremamente importante, tal

como a localização das actividades produtivas. Na realidade, a forma como se

localizam os equipamentos terciários é uma condicionante fundamental do

desenvolvimento, visto que, nessa localização e na sua acessibilidade, vamos

encontrar as condições necessárias para que se verifique a equidade territorial na

disponibilidade de bens e serviços básicos. Refira-se que as concepções de

desenvolvimento não podem deixar de ter em conta a produção e o seu

crescimento; simplesmente, devem tê-los como instrumentos, como meios, para

atingir da forma mais válida os fins que vêm a traduzir-se na disponibilidade dos

bens e serviços básicos por parte das populações em condições de acesso não-

discriminatório (Lopes, 1984, p. 214).

As preocupações de optimização dos resultados, quer ao nível da iniciativa

privada (responsável por grande parte da distribuição dos bens e serviços ligados à

satisfação das necessidades básicas), quer ao nível do sector público (investimento

em infra-estruturas e equipamentos do sector terciário), têm levado a procurar nas

economias de escala e nas economias externas, resultantes da concentração dos

equipamentos produtivos e terciários, vantagens económicas imediatas que,

inevitavelmente, acarretam custos sociais bastante elevados no médio/longo prazo

que se traduzem num agravamento da situação dos grupos populacionais mais

débeis e, em última análise, na redução dos níveis de desenvolvimento real. Por

130 Lopes (1984) define s equipamentos terciários, em sentido amplo, como o conjunto dos equipamentos colectivos (conjunto de instrumentos e serviços destinados a satisfazer as necessidades básicas das populações e apoiar as actividades económicas, que em última análise deveriam ainda dirigir-se à satisfação de necessidades das mesmas populações), ... os equipamentos sociais (equipamentos associados à satisfação das necessidades sociais tidas como básicas de que a alimentação, a educação, a saúde e a habitação, são os casos mais expressivos e ... equipamentos económicos de apoio às pessoas e às actividades (comércio, bancos, seguros, transportes e comunicações) e até os equipamentos administrativos, de coordenação, de apoio e de intervenção (op. cit., p. 213).

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83

outras palavras, os serviços tendem a convergir para a localização em lugares

centrais, isto é, em aglomerados populacionais que garantam à iniciativa privada

volumes mínimos de procura compensadora e aos investimentos públicos níveis

de utilização que os justifiquem. Cada aglomerado funciona como um centro cuja

importância atractiva para os equipamentos depende dos níveis de procura mínima

(bens privados e públicos) e do tamanho da “região circundante” cuja população a

ele acorrerá, isto é, da acessibilidade real das populações ao centro. Esta situação

ao conduzir os centros a organizarem-se de forma hierarquizada131 não invalida

que os mesmos, desempenhando funções raras, desempenhem, em princípio,

também todas as funções mais frequentes, isto é, os centros de ordem superior

desempenham também todas as funções de ordem inferior.

Ao nível empresarial, as funções de direcção, gestão, organização da produção,

pesquisa e comercialização tornaram-se dominantes e são realizadas em

estabelecimentos localizados em áreas diferentes das da produção. Ao mesmo

tempo, estabeleceu-se uma hierarquia entre a actividade de gestão, num sentido

amplo, e as actividades de produção industrial. As próprias actividades de gestão

foram-se hierarquizando em função de uma especialização crescente, da revolução

informática e mecanização, transformando-se progressivamente em tarefas

comparáveis às de produção em série. Este fenómeno levou a uma concentração

das sedes sociais e de escritórios nas grandes cidades. Aydalot dá vários exemplos

desta concentração: nos anos 70, em Londres e na região Sul-Este da Grã-

Bretanha estavam concentradas 66% das sedes das 500 maiores empresas

industriais e 76% das 200 maiores; em 1969, a mesma região concentrava 85%

das sedes das empresas comerciais; na França, em 1970, os valores eram

idênticos: a região parisiense contava com 60% das sedes sociais das 1 500

maiores empresas industriais, 78% das 500 maiores ou 74% das 50 maiores

empresas comerciais (Aydalot, 1985, p. 92). O domínio dos grandes centros

parece-nos evidente o que, aliás, é confirmado pelo coeficiente de domínio,

131 Por exemplo, o comércio a retalho pode ser hierarquizado em função da existência de bens adquiridos menos frequentemente, levando a que as unidades funcionais que os vendem não

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definido como a relação entre o emprego das empresas com sede regional e o

total de emprego, cujo valor era de 212,2 para a região parisiense e de 61,2 para

a província (ibid., p. 95). Refira-se que esta tendência longe de se esbater tem

vindo, pelo contrário, a agravar-se com a criação das grandes metrópoles.

2.2.4.2. Bens e serviços centrais

De uma forma dedutiva foi Christaller (1933) quem primeiro veio a desenvolver a

teoria com a qual se pretendia justificar a dimensão, a distribuição e o número de

centros, apoiando-se nos princípios reguladores da procura e da oferta. Destas

preocupações resultariam dois conceitos básicos da sua teoria, ou seja o limiar da

procura (o mínimo de procura que justifica a iniciativa da oferta do bem) e de

alcance do bem (a distância e custo máximo que o comprador está disposto a

suportar para efectivar a aquisição)132.

Segundo Christaller, os padrões de ordenamento do território não são

determinados apenas pela agricultura e indústria, mas também pela localização

dos sectores de serviços e da habitação. O seu modelo de localização parte de

alguns pressupostos, nomeadamente:

• a população distribui-se no espaço de forma homogénea. O espaço é

isotrópico, logo a ocupação humana processar-se-ia segundo um padrão

triangular que garante a existência de distâncias iguais entre os compradores

mais próximos;

• a oferta localiza-se espacialmente num sistema de pontos, isto é, lugares

centrais;

• a procura dos bens e serviços oferecidos nesses pontos é assegurada pela

população que neles vive e pela da região complementar;

possam dispersar-se tanto quanto se dispersarão as unidades funcionais de bens com uma maior procura

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• os bens e serviços são de ordem de importância variável em função inversa da

frequência com que são necessários. Em princípio, os bens e serviços de

ordem mais elevada são aqueles cuja procura é mais rara;

• a ordem dos bens e serviços oferecidos num centro está associada à própria

ordem de importância do centro para cuja medida propõe o conceito de

centralidade133;

• um centro de ordem superior desempenha também as funções de ordem

inferior (ver figura 2.1).

Fig. 2.1 Áreas de mercado

Fonte: Polèse, M. (1998), Economia Urbana e Regional : Lógica espacial das transformações

económicas, Colecção APDR, Coimbra, p. 274 A introdução do conceito de distância económica que tem em consideração o

custo de transporte e seguro, embalagem, armazenamento e tempo necessário, no

caso de mercadorias, ou custo de transporte, tempo de viagem e desconforto, no

caso de passageiros deve-se, essencialmente, a duas razões: 1) a centralização da

oferta de bens e serviços não pode ser explicada apenas por factores geográficos;

132 Christaller (1933, p. 68) chamar-lhes-ia limite inferior e limite superior do alcance (upper limit of the range e lower limit na tradução de Baskin). 133 Gaspar (1972, pp. 52-53) define-a como um índice que representa a extensão, o valor do exercício de funções centrais do lugar na área que serve. Para Christaller (1933, p. 18), a centralidade é a importância relativa de um lugar face à região que o rodeia ou o grau em que determinado lugar exerce funções centrais.

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86

2) cada produto apresenta um certo domínio espacial, isto é, produtos de elevada

centralidade estão disponíveis apenas em alguns lugares e são procurados a longas

distâncias económicas, enquanto produtos de menor centralidade estão

disponíveis num maior número de lugares, pelo que a procura é efectuada a

distâncias menores. Dessa forma, de acordo com a centralidade dos produtos,

determinada em função da importância relativa do custo de acesso e das

economias de escala134 internas e externas à empresa e externas à indústria, é

possível construir uma hierarquia de lugares.

O modelo de Christaller (1933) assenta na análise da estrutura de centros do Sul

da Alemanha cuja centralidade aferiu, recorrendo a um índice calculado sobre a

utilização do telefone, destacando assim grandes ordens de centros135. O

ordenamento espacial encontrado por Christaller assemelha-se a uma rede de

hexágonos sobrepostos que, por um lado, corresponde ao mínimo de centros de

serviços que podem instalar-se num espaço isotrópico e, por outro, assegura

correspondência entre a oferta e a procura. O processo de construção de uma rede

de lugares centrais inicia-se pela associação das actividades de ordem idêntica em

grupos. Começando pelos produtos do fundo da hierarquia (que correspondem às

áreas de mercado mais pequenas) forma-se uma rede de pequenos lugares centrais

que, sendo pequenos, estão relativamente próximos uns dos outros e

proporcionam apenas os bens e serviços mais banais. O escalão seguinte da

hierarquia dos lugares centrais, composto por cidades maiores, além de todos os

serviços dos aglomerados populacionais anteriores, oferecerá ainda os serviços de

ordem superior e assim sucessivamente.

134 As economias de escala, em sentido amplo, compreendem as economias internas à empresa, externas à empresa mas internas à indústria e externas à indústria. Alfred Weber denominou as duas últimas por economias de aglomeração, enquanto Walter Isard denominou as externas à indústria por economias de urbanização. Hoover ao estudar os factores aglomerativos e desaglomerativos classificou as vantagens em: 1) economias de escala – internas à empresa; 2) economias de localização – externas à empresa e internas à indústria; 3) economias de urbanização – externas à indústria. 135 Aos lugares menos importantes (lugares auxiliares) atribuiu a letra H (de hilfszentrale orte) sucedendo-se a atribuição de letras associadas aos nomes utilizados na tipologia alemã: M (Marktflecken), A (Amtssdtädtchen), K (Kreisstädtchen), B (Bezirkshauptorte), G (Gaubezirk), P (Provinzialhauptorte), L (Landeszentrale).

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87

A junção das várias áreas de mercado cria uma paisagem económica com a forma

de uma rede de hexágonos sobrepostos em que, por um lado, cada habitante do

território está no interior de um sistema de zonas múltiplas e, por outro, a área de

influência dos centros de ordem inferior se insere na área dos centros de nível

superior. Assim, como sublinha Christaller, existe uma lógica no padrão de

ordenamento dos lugares centrais que é consequência da optimização simultânea

da localização das empresas fornecedoras de serviços em relação à localização

dos seus concorrentes.

O conhecimento das distâncias entre as cidades de determinada ordem permite-

nos fixar as fronteiras entre as áreas de mercado. Em princípio, as fronteiras serão

demarcadas na zona situada a meio da distância que separa dois centros do mesmo

nível. O modelo a que chegaremos observará uma hierarquia na qual se verifica

uma sequência rígida de centros associada, por um lado, à ordem dos bens e

serviços que estes oferecem e, por outro, à procura efectiva dos residentes e não-

residentes que acorrem aos centros. Saliente-se o facto de os consumidores, em

igualdade de circunstâncias (distância a percorrer, por exemplo), preferirem um

centro de ordem superior uma vez que este engloba um certo número de áreas de

influência de centros de ordem inferior.

O geógrafo americano George Zipf (1949) propôs a Lei do escalonamento urbano

ou rank-size rule segundo a qual há uma relação estatística entre o número e a

dimensão das cidades e, por conseguinte, entre a sua ordem e a sua população.

Segundo a sua formulação136, a população de qualquer cidade Pi pode ser

estimada a partir da equação:

i

gi

R

PqP =

em que, Pg - População da maior cidade Ri - Ordem da cidade i

136 Ver Zipf, G. K. (1949), Human Behaviour and the Principle of Least Effort: An Introduction to Human Ecology, Cambridge (Mass.), Addison-Wesley Press, III-A

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q - Constante a estimar De um modo geral, a relação traduzir-se-á por uma recta num gráfico logarítmico:

as cidades, ou melhor, o número que se encontra em cada classe, são escalonadas

no eixo vertical por ordem decrescente de população e distribuídas pelo eixo

horizontal segundo a sua ordem. Uma recta regular significa que a distribuição

está de acordo com a lei do escalonamento urbano. No caso contrário,

observaremos vários níveis, ou seja a relação não é perfeitamente contínua, pelo

que existem categorias identificáveis de cidades, tal como presume a teoria dos

lugares centrais.

A teoria de Christaller tem sido criticada, quer devido à sua rigidez, quer por ser

essencialmente estática, quer ainda por não considerar devidamente a

especificidade do comportamento humano. Daí que, por exemplo, Lewis (1977)

considere ser necessário ter em atenção factores explicativos adicionais que se

podem agregar em factores de ordem temporal e factores de ordem

comportamental. Wolpert (1964) considera que a diversidade do comportamento

humano é enorme, sendo quase irrealista falar de populações homogéneas. A

hipótese de que o consumidor actua sempre no sentido de minimizar o esforço

pode não ser válida já que, segundo Downs (1970), a distância é apenas um dos

factores que entra na sua formulação, para não falar do vendedor que, certamente,

tem as suas decisões de localização fortemente influenciadas por factores de

ordem psicológica.

Um produto também pode ser caracterizado pela sua centralidade avaliada em

termos de raridade com que é oferecida no mercado. Produtos encontrados em

toda a parte, por menor que seja o centro de mercado, são produtos de

centralidade inferior, enquanto que os produtos encontrados apenas em alguns

lugares de maior expressão são de centralidade superior. Além disso, há ainda

uma relação directa entre a centralidade e o tamanho da área de mercado ou, de

uma forma mais precisa, tanto o tamanho do lugar como a população da área de

mercado aumentam exponencialmente à medida que aumenta o nível de

hierarquia (Richardson, 1973, p. 87), o que é perfeitamente compatível com a

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hipótese empírica de que a diversidade de negócios num centro aumenta, de

acordo com o nível do próprio centro.

Durante quase 30 anos, a abordagem gravitacional foi um dos instrumentos mais

utilizados na análise espacial quer como modelos de trocas inter-espaciais, quer

como medida de centralidade, quer para medir a influência relativa de uma

região sobre outra (Aydalot, 1985, p. 275). De entre estes modelos, destaque-se o

modelo de localização dos parques habitacionais de Hansen (1959), o modelo de

localização do comércio a retalho, o modelo de fluxo de tráfego e o modelo de

Lowry (1964). Contudo, uma vez que estes modelos são mais utilizados no

planeamento urbano (enquanto suporte teórico de ordenamento do território),

iremos estudá-los no capítulo que dedicamos às questões do planeamento do

território137.

2.2.5. A teoria da localização e seus desenvolvimentos

Entre a teoria clássica ou tradicional da localização e a realidade existe um

desfasamento significativo o que coloca algumas dificuldades na sua utilização

para explicar as dinâmicas de localização das actividades económicas e dos

equipamentos sociais. As críticas à teoria clássica da localização são diversas. No

entanto, a ausência de um corpo teórico é, porventura, a falta mais grave que se

pode apontar à teoria clássica da localização. Salientem-se, ainda, as seguintes três

críticas:

•••• a consideração da empresa de uma forma isolada, o que leva a desprezar os

efeitos cumulativos da localização de uma empresa sobre as outras. Ressalve-

se que, no entanto, Weber e Christaller referiram este problema sem, contudo,

lhe dar um corpo teórico;

137 Ver 3º capítulo desta tese.

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•••• os custos de transporte estão no centro da teoria tradicional de localização.

Ora, a diversidade de características dos produtos é tão elevada e importante

que dificulta a generalização sobre a introdução dos custos de transporte na

teoria da localização (Reigado, 1999, p.10). Embora, Weber e Lösch tenham

relativizado o papel dos custos de transporte na explicação da localização

industrial não apresentaram uma teoria alternativa;

•••• a assunção de que os agentes económicos detêm informação completa e agem

com racionalidade é, em nosso entender, errada. A informação sobre

determinado fenómeno económico e social nunca é completa. As empresas

nem sempre têm acesso à informação necessária e em tempo útil, nem sempre

a circulação da informação é fluída pelo que a sua detenção, por parte de

algumas empresas, permite controlar o mercado. A questão da racionalidade

do agente económico é também uma questão controversa. Na realidade, o

decisor orienta a sua acção de acordo com o “mapa mental”138 do local que foi

construindo de acordo com a sua experiência, as suas preferências pessoais

(valores, cultura, etc.), as relações pessoais e de vizinhança. Assim, embora

não negando a racionalidade dos agentes económicos, parece-nos que os

factores de ordem psicológica têm um papel importante no processo de

tomada de decisão.

Além disso, as limitações relativas à informação, nomeadamente em termos

temporais, dificultam a apreciação sobre o que é racional ou não. O sistema real

está em constante evolução pelo que uma decisão que tomada ex-ante nos parece

racional poderá não o ser no decorrer do processo, ou seja, no momento ex-post.

Marques Reigado (ibid.) salienta, ainda, que a escassez de informação sobre o

futuro levanta a questão da racionalidade das decisões agora tomadas com

incidência no médio/longo prazo.

Apesar das críticas dirigidas aos modelos clássicos de localização é de realçar que

estes modelos reflectem a evolução das forças produtivas, a estrutura e

organização da economia e a própria evolução da teoria económica. Cite-se, a este

138 Ver Allen Pred (1966), Pallenbarg (1985)

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respeito, a teoria de Weber que se mantém extremamente útil quando se estuda a

localização de empresas em que os custos de transporte têm um peso importante

na estrutura de custos.

Para Weber (1972), a decisão de localização, com efeitos a médio/longo prazo,

suporta alguma incerteza pelo que a melhor escolha não é mais procurar uma

maximização impossível dos lucros, mas minimizar os riscos, adoptar uma atitude

probabilística, utilizar factores de escolha em que a racionalidade não é

estritamente monetária. A estratégia de minimização dos riscos impõe-se, logo

fazer como os outros torna-se numa opção lógica. Para Richardson (1973), em

termos gerais, a incerteza justifica a escolha de uma localização não óptima, mas

somente a viável. Smith (1971) considera que as empresas são incapazes de

quantificar, com precisão, os benefícios ligados a cada possível localização.

Assim, estas limitam-se a estabelecer dentro do território estudado os locais com

lucro e, destes, as localizações que maximizam as vantagens não monetárias. A

consideração de factores de localização não económicos (preferência por um

ambiente mais agradável, a procura de comodidades pessoais, a escolha à priori de

grandes cidades) tem uma importância crescente. Além disso, existem outros

factores - informação sobre o local de origem ou de residência do empresário, o

bem estar, a projecção social, a possibilidade de encontrar trabalhadores da sua

confiança - que influenciam a decisão. A mão-de-obra é também resistente à

mobilidade (geralmente, procura emprego próximo da área de residência)

constituindo-se num elemento a ter em consideração na localização (Johansson,

M. et all, 1991). Esta situação leva Simon a afirmar que os agentes têm um

comportamento optimizador e não maximizador (cit. Reigado, 1999, p. 11).

Pred (1966), não concordando com o pressuposto clássico da racionalidade dos

agentes económicos e da existência de informação completa, concentra a sua

atenção em duas situações: 1) disponibilidade e características da informação; 2)

especificidade do processo de escolha. O autor salienta, ainda, o papel das

qualidades pessoais e da managerial intelligence na localização, bem como o

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facto de os indivíduos agirem, com alguma frequência, nas fronteiras da

racionalidade, pelo que os resultados das escolhas devem ser abordados de forma

probabilística (ibid., p. 11). Esta abordagem, por um lado, torna possível diminuir

a má qualidade das estimativas através do cálculo das probabilidades e do estudo

de behavioural space, desde que se trabalhe com valores esperados e, por outro,

permite a sua aplicação nos casos em que a informação é deficiente ou a

diversidade de conhecimentos é grande. Refira-se que, para Marques Reigado

(1999), embora esta abordagem seja passível de aplicação com relativo sucesso a

casos isolados, o seu contributo para a explicação dos padrões de mudanças de

localização e dinâmicas regionais não é significativo. Segundo o mesmo autor, as

alterações tecnológicas e os problemas institucionais não têm o devido destaque.

Acrescente-se, ainda, que as decisões relativas ao investimento e à localização são

bastante diferentes entre as PME's e as grandes empresas nas quais se incluem as

multinacionais.

A abordagem cumulativa dos efeitos ou causas - spread e backwash effects139 - na

concentração geográfica das actividades económicas possibilitou a Myrdal (1957)

integrar, de forma sistémica, os problemas da escolha óptima da localização com

os problemas do desenvolvimento económico (ver fluxograma 2.2).

Esta teoria que aborda, simultaneamente, os problemas de localização e os da

teoria do desenvolvimento regional, assenta no princípio de que a escolha da

localização e o desenvolvimento económico, na óptica regional e mundial, só

podem ser explicados através da mobilidade espacial do capital .

O modelo, concebido para um país com um nível de desenvolvimento económico

baixo, mostra como a localização num determinado local, de uma nova actividade

económica, com razoável dimensão, teria efeitos positivos na expansão do

emprego e da população. Admitindo que o Estado não influencia a rede de feitos

cumulativos, Myrdal afirma que a dotação da região ou localidade em infra-

139 Os spread effects são efeitos cumulativos inter regionais positivos com origem na região e que se ramificam para o resto do país. Os backwash effects são efeitos cumulativos inter regionais negativos para o resto do país devido à atracção dos factores para a região.

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estruturas, equipamento, empresas públicas de grande dimensão e serviços resulta

do aumento local das receitas fiscais, o que leva a uma melhoria no ambiente

empresarial na região/local. Sendo a teoria de Myrdal um sistema integrado de

vários contributos (geografia, micro e macro economia) ela é, contudo, uma das

poucas teorias de economia regional em que o sistema económico é abordado de

forma dinâmica (ibid., p.14).

Fluxograma 2.2 Princípio das causas cumulativas

Fonte: Reigado, F. M. (1999), Planeamento e desenvolvimento regional: abordagem sistémica, p. 13 (no pelo)

A abordagem estrutural está ligada à teoria marxista e tem, nos últimos 20 anos,

evoluído no sentido da teoria macro-económica e da organização industrial. Para

Marques Reigado (1999), nesta aproximação da teoria económica aos problemas

Aumento da mão-de-obra qualificada

Localização das actividades económicas

Expansão do emprego e da

população local Desenvolvimento das “economias externas”

Melhoramento das infra-estruturas

Desenvolvimento das empresas através da polarização técnica

Expansão da produção de bens e serviços para o

mercado local

Aumento do bem estar da sociedade

Aumento das receitas fiscais

Atracção de capital e de actividades empresariais em consequência do aumento da procura

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sociais é de destacar os chamados economistas institucionais – entre os quais

citamos Gralbaight – e a chamada Public Choice School com Buchanan. Ao nível

da geografia económica são de realçar os franceses Lipietz e Castells e os anglo-

saxónicos Allen Scott e Doreen Massey (1984) que, a este respeito, escreve Quite

centrally, location and geographical mobility are key factors in the conflict

between labour and capital within production. The simple fact of distance, of

spatial separation, can be important e mais adiante one of the capital’s crucial

advantages over labour is its great, and increasing mobility (...) capital can make

positive use, in a way labour cannot, of a distance and differentiation (cit.

Reigado, 1999, p. 16).

Esta teoria que aborda, simultaneamente, os problemas de localização e os da

teoria do desenvolvimento regional, assenta no princípio de que a escolha da

localização e o desenvolvimento económico, na óptica regional e mundial, só

podem ser explicados através da mobilidade espacial do capital .

SECÇÃO II – TEORIAS DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL 2.3. TEORIAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL

2.3.1. Breve introdução

A dinâmica do crescimento regional é analisada, muitas das vezes, recorrendo a

teorias e modelos explicativos derivados do corpo teórico mais geral da

Economia. Os modelos elaborados são, muitas vezes, tentativas para levar à escala

das regiões as construções arquitectadas para o todo nacional. Saliente-se que

estes modelos têm de responder a preocupações de equilíbrio inter-regional que,

enquanto modelos de nível nacional, naturalmente ignoram. Por outro lado, o

crescimento equilibrado da economia nacional (formada por várias regiões) e em

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cada uma das regiões é extremamente difícil de atingir. No entanto, apesar das

limitações do suporte teórico proposto, o seu estudo tem interesse.

Segundo a teoria neoclássica, e de um modo bastantes simples, há crescimento

regional quando a população rural (com baixos rendimentos) se torna urbana e

industrial ou se verifica a afluência de mão-de-obra vinda o exterior, isto é, de

outra região (Borts e Stein, 1964).

A orientação do crescimento via procura (ponto central da teoria da base) veio

inspirar vários autores. Alguns como Kaldor (1970), prolongaram no domínio

regional as suas construções globais, outros como Hartman e Seckler (1967)

aprofundaram a teoria da base económica, seguindo uma metodologia muito

próxima da keynesiana, fazendo depender o produto regional do multiplicador das

exportações, do acelerador e das tendências endógenas de crescimento da região.

Kaldor apoia-se na teoria de Hicks segundo a qual o crescimento da procura

autónoma comanda o crescimento da produção a longo prazo. No contexto

regional, o principal factor será a procura autónoma externa140, pelo que o

crescimento regional dependerá do crescimento da procura de exportação à qual

se ajustarão as taxas de crescimento do consumo interno e do investimento. Ainda

segundo Kaldor, uma região ao adquirir vantagens de crescimento, tenderá a

mantê-las e até acentuá-las pela via dos rendimentos crescentes que o próprio

crescimento induz141.

Richardson (1969), ao analisar estes modelos de crescimento regional, coloca

várias dúvidas sobre a insuficiência de modelos agregados que têm sido utilizados

enquanto forem a-espaciais (Lopes, 1984, p. 123). Ao mesmo tempo chama a

atenção para a complexidade e interdependência dos fenómenos capazes de

explicar o crescimento, ao nível das regiões, vindo a concluir da necessidade de

ter em conta o processo histórico por duas ordens de razão: 1) o comportamento

140 Associa-se à teoria da base. Este modelo tem algumas dificuldade operativas ligadas à dificuldade de se obter informação relativa às exportações.

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anterior das varáveis pode ser a “chave” para a explicação dos processos actuais

de crescimento; 2) os padrões actuais de crescimento, na maioria dos casos, são

diferentes dos do passado.

No final dos anos 60, vários investigadores iniciam a análise dos processos

espaciais de difusão da inovação a partir de um ponto inicial. A questão que se

colocava era a de saber como o conjunto do espaço adoptaria progressivamente a

inovação. Para Hagerstrand (1967), apoiado em observações empíricas, a

inovação era adoptada em várias fases sucessivas: 1) difusão inicial através do

contacto directo na vizinhança; 2) disseminação progressiva pelo espaço devido

aos efeitos da vizinhança; 3) saturação no centro enquanto na periferia a taxa de

adopção é, ainda, baixa. Beckmann (1970) e Morill (1968) nas suas formulações

advogam que a distância reduz o ritmo de difusão e a taxa final de adopção de

inovação (cit. Aydalot, 1985, p. 116).

Mais recentemente, retomando-se algumas posições dos anos 50, o

desenvolvimento regional é visto como um processo que se desenvolve por

etapas. Assim, para vários autores a organização espacial das economias nacionais

evolui paralelamente às etapas de desenvolvimento nacional. Willianson (1965) a

este respeito escreve: as disparidades regionais crescentes e o dualismo Norte-Sul

crescente são típicos das primeiras etapas do desenvolvimento, enquanto a

convergência regional e o desaparecimento dos problemas Norte-Sul são

representativos das fases de maturidade do desenvolvimento nacional (ibid., p.

117). Friedmann e Richardson (1973) propuseram esquemas explicativos deste

duplo processo de divergência seguido de convergência142.

141 É o chamado efeito de Verdoorn que torna o modelo circular e cumulativo. Estes modelos de causalidade cumulativa explicam a essência da teoria da divergência entre o centro e a periferia, entre as áreas industriais e agrícolas, entre zonas urbanas e rurais. Ver Dixon e Thirlwall (1975). 142 Na sua obra Regional economic growth, Richardson coloca três hipóteses simétricas: a) o desenvolvimento nacional é, de início, polarizado e depois integrado; b) no seio de cada região, o desenvolvimento antes de se difundir é, primeiro, concentrado em poucos centros (a integração inter-regional verifica-se primeiro entre os centros das diferentes regiões); c) no seio das áreas urbanas, a descentralização progressiva beneficia a periferia.

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As assimetrias regionais que, longe de se esbaterem, têm vindo a agravar-se

deram origem a novas abordagens do desenvolvimento regional como, por

exemplo, a do centro-periferia (Friedmann, 1966, 1972) apoiada na existência de

interdependência entre actividades específicas com localizações geográficas

distintas dispostas, muitas das vezes, de acordo com as linhas de comunicação

dominantes facilitando, assim, a transmissão dos efeitos de crescimento. Perloff,

(1963) explora as vantagens do processo inter-sectorial partindo do princípio que,

embora seja possível identificar as actividades com maior capacidade de

promoção do crescimento, nem todas as regiões disporão de vantagens relativas

no que respeita ao acesso input-output resultando daí uma reduzida capacidade

de atracção para este conjunto de actividades (Lopes, 1984, p. 137).

Outras abordagens do desenvolvimento regional partem, igualmente, das

desigualdades existentes no sistema regional, ou seja, certas regiões têm

características que lhes permite criar uma organização desigual do espaço, como

por exemplo: o poder dominante das grandes unidades (teoria dos pólos de

crescimento); o carácter cumulativo dos mecanismos de crescimento (teoria da

causalidade circular de Myrdal); a lógica do capital (teoria do imperialismo); a

acção das forças que retardam ou anulam a convergência (teoria centro-periferia);

as tendências de especialização hierarquizada dos espaços (teoria da divisão

espacial do trabalho) ... Assim, o espaço não é mais, como para os neoclássicos,

um elemento a integrar, igualizar e uniformizar, mas, pelo contrário, ele é a base

da desigualdade técnica, económica e social (Aydalot, 1985, p. 112).

2.3.2. A teoria da base-exportação ou export base theory

A teoria da base-exportação tem como pressuposto que só os conjuntos

económicos de grande dimensão, tais como as nações, são capazes de ter o

crescimento económico e social em função de variáveis internas. Se

considerarmos apenas partes do espaço nacional, mais ou menos especializados,

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estes não podem, através do seu esforço interno nem das suas aptidões naturais,

sustentar um processo de desenvolvimento pelo que ficam dependentes dos sinais

vindos do exterior. Daqui conclui-se que é necessário existir uma conjuntura inter-

espacial favorável para que se verifique crescimento regional. Este pressuposto da

teoria da base está ligado à concepção de crescimento sustentado pela procura, ou

seja, a uma visão keynesiana do desenvolvimento.

De acordo com a teoria da base, e segundo Lowry143 (1964) no seio da economia

regional, deve distinguir-se dois sectores - o sector exportador ou de base e o

sector local que satisfaz a procura local - pelo que o rendimento total da região

será constituído pelo rendimento proporcionado pelas actividades de base e pelo

das actividades locais (cit. Reigado, 1999, pp. 296-298). Assumindo que as

actividades locais são uma fracção constante do rendimento total teremos que este

é, por sua vez, um múltiplo do rendimento das exportações. O valor deste

multiplicador depende do rácio despesas locais/despesas totais. Em termos

algébricos, o rendimento total virá (Aydalot, 1985, p. 121):

Ba

Y−

=1

1

onde,

Y - Rendimento total B - Rendimentos dos sectores de base ou exportadores a - Propensão média e marginal a despender localmente o rendimento

A operacionalização deste modelo levanta, contudo, duas questões importantes,

ou seja, como escolher a unidade de medida e como medir as exportações. Em

relação à primeira questão, dada a falta de informação estatística regionalizada

sobre a produção ou o rendimento, geralmente opta-se pelo emprego. A medição

das exportações, tendo em consideração a pouca informação estatística sobre o

comércio inter-regional, vem alimentando um longo debate. Hoyt (1939)

apresentou uma solução, calculando as exportações de forma indirecta, ou seja,

143 O modelo de Lowry dado ser, essencialmente, um modelo de planeamento urbano será estudado no 3º capítulo desta tese.

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recorreu ao quociente de localização144 (cit. Aydalot, 1985, p. 122). Como

facilmente se verifica, a teoria da base-exportações defende que o crescimento

económico da região dependerá da sua capacidade exportadora dos sectores

básicos enquanto os impostos, a despesa pública e o crédito obtido/concedido são

considerados como residuais que se ajustam, automaticamente, ao valor das

exportações. O fluxograma 2.3 descreve, de forma sucinta, as relações que unem

as regiões ao exterior com a originalidade de privilegiar uma única ligação

(receitas de exportação) considerando, implicitamente, que as outras ligações são

mecânicas.

Fluxograma 2.3

Factores de crescimento económico

Fonte: Aydalot, P. (1985), Economie Régionale et Urbaine, Economica, Paris, p. 125 Esta teoria da base tem sido alvo de várias críticas, nomeadamente: a) o

multiplicador das exportações pode igualmente medir outras situações; b) não tem

em consideração que as importações diminuem o valor do multiplicador; c) as

despesas do Estado não são devidamente consideradas no modelo; d) as

144 O quociente de localização é entendido como uma medida de especialização das regiões e calcula-se pela formula Ql = (xij / xi) / (Xj / X) onde x mede a actividade j ao nível regional i e X mede a actividade j ao nível nacional. No caso do quociente ser superior à unidade, a região diz-se exportadora em relação ao sector em estudo.

Impostos nacionais

Rendimento regional

Empréstimos concedidos

Empréstimos obtidos

Despesas do Estado

Receitas das exportações

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exportações dos sectores locais não são explicadas; e) o mercado intra-regional

não é considerado. Além disso, o modelo da base-exportações continua a deixar

em aberto duas questões, ou seja, como atrair as empresas das actividades básicas

e o que explica as diferenças regionais na atracção dessas empresas.

Jacobs (1984) ao tentar responder a estas questões, observa a seguinte tendência:

as regiões que conseguiram, durante décadas, formar um centro urbano com uma

rede diferenciada de actividades terão, no futuro, boas possibilidades de

desenvolvimento (cit. Reigado, 1999, p. 299). Por sua vez, os centros ou regiões

que possuem este tipo de rede tendem a ligar-se com outras congéneres formando

pontos chave do comércio mundial e de inovação económica. Ao contrário, as

regiões de monocultura ou mono indústria terão as suas possibilidades de

desenvolvimento muito limitadas. Por último, registe-se que a teoria da base-

exportações tem tido algum sucesso, essencialmente, por associar um ambiente

teórico clássico do comércio internacional com uma apresentação de tipo

keynesiana: o crescimento depende da procura.

2.3.3. A teoria dos pólos de desenvolvimento

Como já vimos o crescimento económico não surge espacialmente distribuído de

forma igual. Pelo contrário, a par dos factores naturais e históricos, os efeitos da

política económica podem ser responsabilizados pela concentração das

actividades económicas em locais específicos, enquanto outros se situam na

periferia do crescimento.

A teoria dos pólos parte do princípio que os efeitos de dispersão que irradiam de

“pontos” espacialmente localizados (empresas ou grupos de empresas,

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aglomerações populacionais, etc.) transmitem impulsos de crescimentos a outros

“pontos” – efeitos de dispersão – que podem ultrapassar os efeitos de

polarização, isto é, reabsorção dos efeitos de dispersão pelo próprio “ponto”

(Lopes, 1984, p.295).

Desenvolvida por Perroux (1955), a teoria dos pólos de crescimento (ou de

desenvolvimento) começou por sustentar que o crescimento se iniciaria a partir de

uma empresa motora ou pólo de crescimento que, por sua vez, seria formado por

um centro urbano desenvolvido. O desenvolvimento deste centro urbano

assentaria no aumento da produtividade do seu hinterland e na produtividade das

suas actividades secundárias. Nestes pólos verificar-se-ia, geralmente, dois tipos

de efeitos ou seja o efeito de aglomeração (atracção de actividades

complementares) e o efeito de ligação (consequência da criação de novas redes

viárias).

O desenvolvimento dos pólos de crescimento está profundamente relacionado

com a existência de indústrias que se costumam designar por indústrias motoras145

e indústrias chave146. Por seu turno, as actividades adicionais, ao aparecerem

como resposta aos impulsos dados pelas indústrias motoras, não se irão dispersar

pelo território mas, pelo contrário, tendem a agrupar-se junto da unidade motora.

Esta situação deve-se à pequena dimensão das empresas dependentes (actividades

adicionais) que evitam o seu isolamento ou, por outras palavras, procuram

economias externas de aglomeração, um melhor acesso aos diversos mercados e

serviços. A observação empírica mostra, claramente, que as empresas

subcontratadas costumam agrupar-se junto das empresas que procedem

regularmente à subcontratação. Perroux (1955), ao estudar os pólos de

145 Consideram-se indústrias motoras as de crescimento rápido, modernas e dinâmicas, de grande capacidade de difusão dos efeitos da inovação e com um elevado grau de interdependência sectorial. 146 As indústrias chave destacam-se, de entre as indústrias motoras, pela sua capacidade de desencadearem efeitos multiplicadores superiores à sua própria produção.

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desenvolvimento existentes147 veio a concluir que o pólo altera o seu próprio

ambiente ao criar novos tipos de consumos e comportamentos económicos, bem

como ao desenvolver necessidades colectivas.

Perrin (1983) contribui para a teoria da polarização ao demonstrar que não é o tipo

de actividade industrial o factor polarizante, mas a sua capacidade de evoluir, a

sua complexidade e a natureza das tecnologias que incorpora. Assim, para o autor,

enquanto as actividades de fabricação são, ao contrário das de transformação (por

exemplo, a indústria do aço) susceptíveis de criar uma polarização real, as

actividades quaternárias (serviços especializados, investigação, gestão de

empresas) podem promover polarizações duráveis.

Aos pólos coloca-se, entretanto, uma questão importante: o pólo, de certa forma,

pode definir-se como um conjunto de indústrias interligadas e hierarquizadas e,

simultaneamente, como um lugar de concentração dessas actividades produtivas.

Assim, para Aydalot (1985, p.130) como teoria de desenvolvimento, o pólo é um

mecanismo indutor do crescimento; como teoria espacial, o pólo explica a

concentração espacial do crescimento.

Em termos de desenvolvimento regional equilibrado, a teoria dos pólos sugere que

os investimentos em actividades motoras se concentram em “pólos” interligados

entre si que, formando uma rede, favorecem a propagação dos efeitos de

dispersão. O reconhecimento da dimensão do espaço no funcionamento da

empresa tem em vista responder a uma questão fundamental: quais as medidas

que se devem tomar para que os efeitos de crescimento, provocados pela

existência de uma indústria de base e de uma rede de relações, fiquem na região e

não se dispersem para outras regiões. Para Higins (1977) o pólo pode difundir

para o exterior um crescimento superior ao verificado no seu seio (ibid.). A

informação disponível mostra-nos que, se a difusão não se verificar de um modo

regular, o pólo concentrará em si o conjunto dos efeitos de dispersão privando os

147 A bacia do Reno, nos anos 50, era considerado como o protótipo dos pólos de desenvolvimento: a partir do carvão e do aço, os mecanismos amplificadores levaram à enorme concentração de homens, capitais e actividades num espaço restrito.

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espaços periféricos ou, então, as grandes metrópoles “recuperarão” os efeitos

deixando ao pólo um papel sem qualquer relevância no processo de fomento do

desenvolvimento.

Friedmann (1966) atento a esta situação combina na sua teoria, formulada na base

dos conceitos de centro e periferia, as teorias dos pólos de crescimento e a dos

efeitos cumulativos de Myrdal. O desenvolvimento de uma região periférica pelas

administrações pública e local tinha, para Friedmann, como objectivo a criação de

uma rede de efeitos cumulativos entre as regiões centrais até se alcançar uma

integração da economia nacional em que as assimetrias regionais eram eliminadas.

Durante quase trinta anos (dos anos 50 a 80), a noção de pólo de crescimento

parecia a interpretação mais natural do desenvolvimento espacial148. Actualmente,

a situação mudou levando a teoria dos pólos de desenvolvimento a ser objecto de

alguns ajustamentos integrando-os num corpo teórico mais vasto. De facto, a

evolução recente nos países europeus e nos EUA põe em evidência a dispersão da

indústria com novos contornos: paralelamente à industrialização das zonas

periféricas, verifica-se nos antigos centros a sua desindustrialização absoluta.

Este movimento indica que a problemática do desenvolvimento no espaço está a

inflectir-se. No plano teórico, é possível chegar a duas posições distintas, isto é,

ou se proporciona uma nova vida à óptica neoclássica vendo na concentração

polarizada um elemento que provoca atrasos no estabelecimento do equilíbrio

inter-regional, ou se questiona a validade dos indicadores, puramente materiais,

do desenvolvimento encarando esta nova forma de polarização da indústria como

uma nova forma de desenvolvimento desigual.

A teoria dos pólos embora constituindo um avanço significativo nas teorias do

desenvolvimento regional tem alguns aspectos negativos. Em primeiro lugar, as

escolhas da localização e os processo de desenvolvimento regional não são

devidamente clarificados. Em segundo lugar, é exagerado afirmar-se que o

148 A tendência para a concentração da indústria europeia em pólos começa a manifestar-se na Segunda metade do séc. XIX.

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desenvolvimento das regiões periféricas depende unicamente da localização de

uma grande empresa. Por exemplo, Aydalot (1976) apresenta o seu modelo de

longo prazo em que mostra como uma inovação fundamental desencadeia um

ciclo inter-regional. Nijkamp (1982), baseando-se na teoria das catástrofes149,

mostra como a inovação e as indivisibilidades ligadas às infra estruturas podem

levar a um enorme deslocamento do ponto de equilíbrio. E em terceiro lugar, além

dos efeitos positivos que todos reconhecemos há também efeitos negativos ou os

backwash effects de Myrdal.

2.3.4. A teoria do desenvolvimento desigual

Para certos autores, a crítica dos neoclássicos tem a sua origem na economia

internacional. Para Myrdal (1957), Bologh, Prebish, Hilgert ou Eckaus (1961) a

análise dos processos que decorrem nas relações entre espaços desigualmente

desenvolvidos põe em evidência os desequilíbrios crescentes ao nível das regiões.

Segundo Myrdal, a mobilidade dos factores não é reequilibrante e a mobilidade

dos bens n’a q’une utilité limitée en tant que substitut au mouvement des facteurs

pour réaliser l’intégration (Aydalot, 1985, p. 138). Não é a mobilidade dos bens

ou dos factores que poderá igualar as produtividades marginais dos factores mas,

ao contrário, só a realização prévia desta igualdade poderá suprimir o carácter

desequilibrante da mobilidade já que esta é um processus cumulatif engendré par

le commérce international et tendant à détruire l’equilibre des proportions de

facteurs et des prix de facteurs (ibid.). Daí, o assumir a posição de que uma

diferença inicial nos níveis de produtividade conduz necessariamente a uma troca

desigual.

149 A teoria das catástrofes ocupa-se das descontinuidades brutais no processo de desenvolvimento, quer ao nível nacional, quer ao nível regional, provocadas por fenómenos naturais ou pela actividade humana.

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Se para Perroux ou Hirschmann (1958) a relação centro-periferia pode ser o motor

do desenvolvimento, para outros esta é o suporte da desigualdade. Para Friedmann

(1972), esta relação é de natureza colonial e chega a afirmar que le fait

indiscutible est que la convergence régionale ne survient pas automatiquement au

cours de l’histoire du développement d’une nation (ibid., p. 139). Ainda, segundo

Friedmann, o centro e a periferia não se distinguem somente pela dotação de

factores mas, também, porque:

• as actividades de “ponta” concentram-se no centro;

• o ambiente cultural é mais favorável no centro;

• os rendimentos decrescentes, bloqueadores do crescimento do centro, tardam a

aparecer;

• as ocasiões de lucro são mal apreendidas e utilizadas pela periferia;

• as exportações do centro têm uma procura cada vez maior;

• a periferia, desprovida dos seus capitais e recursos humanos, tem dificuldade

em se adaptar.

No centro da clivagem centro-periferia está o domínio tecnológico e institucional

das sociedades inovadoras. Assim, enquanto os centros têm poder sobre o seu

próprio desenvolvimento, as periferias, inaptas em inovação, ficam sujeitas às

decisões provenientes do centro. Stuart Holland (1979) propõe um esquema, que

completa o de Myrdal, para caracterizar a movimentação de factores de produção

entre espaços/regiões ricas e pobres. O fluxograma 2.4, tendo em consideração a

acção perturbadora dos países menos desenvolvidos, mostra que as relações entre

regiões pobres e ricas dos países industrializados não são mais do que uma parte

do conjunto de relações bastante mais complexas.

A divisão espacial do trabalho, proposta nos finais dos anos 70 pelos ingleses

Massey e Megan (Grã-Bretanha) e pelo francês Aydalot (1976), é um ensaio para

integrar a formação dos processos centro-periferia numa concepção de conjunto

de espaços e de desenvolvimento regional. Qual a razão que leva os centros com

um nível elevado de poder e de qualificação a opor-se às periferias subordinadas

e dedicadas às tarefas rotineiras ? O elemento central da resposta a esta questão

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tem a ver com a análise do desfasamento entre as formas de produção e os modos

de vida. Efectivamente, a cada forma de organização da produção estão associadas

formas de vida quotidiana e modelos de consumo, pelo que, uma tecnologia terá

vantagens em relação a outra, não tanto pela satisfação técnica ou produtividade

aparente mas, pelos modelos sociais que permite introduzir. Aliás, toda a nova

tecnologia implica formas de funcionamento mais complexas, modos de vida mais

urbanos, mais mercados e mais e maiores custos. De um modo geral, e numa

perspectiva de longo prazo, a tecnologia vê os seus efeitos positivos sobre a

produtividade alterados pelo encarecimento correspondente dos modos de vida.

Fluxograma 2.4 Movimentação de factores de produção

Fonte: Aydalot, P. (1985), Economie Régionale et Urbaine, Economica, Paris, p. 141

O espaço reflecte o estado em que se encontra o modo de produção e determina os

modos de vida. A manutenção dos trabalhadores no seu meio original permite,

pelo menos, durante algum tempo perpetuar os modos de vida menos

dispendiosos ainda que a base económica tenha desaparecido. Este desfasamento,

entre a adaptação das formas de produção e os de consumo, é o motor da

evolução. O espaço, neste contexto, passa a ser um actor essencial do processo de

desenvolvimento: durante muito tempo o espaço continua heterogéneo permitindo

à empresa jogar com esta heterogeneidade em seu proveito.

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A evolução do pós-guerra pode ser interpretada como um processo quase cíclico

de substituição de uma forma de organização da produção por outra. O declínio

dos velhos modos de produção traduz-se, simultaneamente, pela libertação de uma

força de trabalho privada do seu emprego anterior (muitas das vezes qualificado) e

pela desqualificação da mão-de-obra, uma vez que esta não tem a qualificação

exigida pelas novas tecnologias. A estes trabalhadores não resta outra solução

senão oferecerem a sua força de trabalho às empresas estrangeiras a operarem na

região desenvolvendo-se, assim, a criação de uma nova força de trabalho

industrial proveniente de estruturas arruinadas. O progresso dos transportes e

comunicações liberta um número crescente de actividades do constrangimento da

distância, pelo que a indústria se vê “obrigada”, cada vez mais, a deslocar-se para

junto dos recursos humanos tornando os velhos centros industriais periféricos.

Estas novas formas de organização reproduzem, porventura de uma forma mais

intensa, as assimetrias de desenvolvimento verificadas entre as regiões centrais e

as periféricas.

Actualmente, as novas tecnologias têm posto em causa este modelo territorial e

podem levar as novas actividades, cujo ciclo produtivo ainda não atingiu a

maturidade, a retornarem para os velhos centros. O espaço oferece, assim, um

registo histórico ou, por outras palavras, o espaço é fruto dos estratos depostos

pelos períodos anteriores conservando, desta forma, a imagem dos modos de

produção que aí, sucessivamente, se localizaram. O espaço é, por natureza, a

expressão das desigualdades entre os modos de produção dominantes e

dominados, entre zonas dominantes e dominadas. Aos primeiros classificamos

como centros e os segundos como periferias. Enquanto o centro aparece como o

espaço de origem do modo de produção dominante e em expansão, a periferia é o

lugar dos velhos modos de produção que subsistem, de forma dispersa, em

proveito do centro.

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2.3.5. O desenvolvimento a partir dos factores endógenos

O desenvolvimento autocentrado, defendido por John Friedmann e Walter Stöhr

(1981), é, essencialmente, uma abordagem territorial do desenvolvimento e uma

crítica à sociedade de consumo das economias ocidentais. A alteração150 das

condições económicas levou à aceitação e rápida difusão das ideias relativas ao

desenvolvimento endógeno. O desenvolvimento autocentrado é passível de se

verificar a vários níveis: regional para os países ocidentais e nacional para os

países do terceiro mundo. Saliente-se, ainda, que o desenvolvimento autocentrado

representa, fundamentalmente, um novo paradigma de desenvolvimento: o

desenvolvimento territorial, o desenvolvimento from below (partindo de baixo) de

Stöhr por oposição ao desenvolvimento funcional (partindo de cima).

Ao desenvolvimento endógeno estão associadas algumas palavras-chave que

passaremos a abordar de forma sucinta (Aydalot, 1985, pp. 146-147):

• desenvolvimento territorial: geralmente, as empresas são o agente

fundamental do desenvolvimento. O espaço, por seu lado, reúne um certo número

de características técnicas que a empresa utiliza. No nosso entender, o espaço não

pode ser considerado um elemento neutro, pelo que dar ao meio o papel essencial

é tornar o território a fonte do desenvolvimento;

• necessidades básicas: o desenvolvimento é, agora, definido não em termos

quantitativos mas, em relação com as necessidades das populações (habitação,

alimentação, educação, emprego, etc.). O nível de desenvolvimento é apreciado

em função do acesso das populações ao bem-estar e não em função da posição na

divisão internacional do trabalho151;

150 O modelo de crescimento, baseado numa taxa de crescimento elevada, no nível baixo de incerteza, e custos decrescentes de energia e de transportes e em tecnologias que favoreciam a grande escala, entrou em crise. Ao nível das regiões, estas compreenderam que o modelo clássico de desenvolvimento só lhes pode trazer efeitos negativos: dependência acrescida e sem contrapartidas, exploração exaustiva dos recursos locais, degradação do ambiental e especialização em funções e sectores subordinados ou regressivos. 151 Em termos técnicos, rompe-se com a lógica da teoria de base: não é a procura externa que define o crescimento, mas as necessidade internas do território em consideração.

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109

• desenvolvimento comunitário: o desenvolvimento é fruto da participação de

toda a população;

• valorização dos recursos locais: o desenvolvimento interno da região implica

privilegiar as fileiras que utilizam os recursos naturais locais ou o uso das

tradições industriais locais;

• desenvolvimento integrado: a promoção do desenvolvimento global que

integra, numa mesma lógica, os aspectos sociais, culturais, técnicos, agrícolas e

industriais é melhor opção do que desenvolver uma ou outra especialização de

ponta;

• autarcia selectiva: as relações com as outras regiões e países não devem pôr

em causa a preferência pelos produtos locais e a diferenciação dos modos de vida;

• pequena escala: prioridade aos pequenos projectos, empresas e cidades como

forma de manter o poder de decisão na região.

O estudo do crescimento a partir de factores internos exige particular atenção ao

aumento da disponibilidade de factores produtivos através do aumento dos

investimentos, da melhoria na eficiência da produção, do nível educacional e da

formação profissional, bem como dos sistemas de transportes e comunicações. A

melhoria das infra estruturas e a introdução de inovações tecnológicas são,

igualmente, factores internos a ter em consideração. Dadas as novas tecnologias

de transporte, a superação do factor distância entre o centro de decisão e o nódulo

onde se desenvolvem as actividades produtivas, tem um custo sem significado

quando comparado com o custo total de produção. Da mesma forma, os custos de

deslocação dos agentes de decisão para os locais onde se encontram as

actividades executivas de primeira ordem ao terem pouco significado levam-nos a

identificar os nódulos das relações de dependência com as actividades executivas

de primeira ordem. De referir que o surgimento destes nódulos de relações de

actividades executivas de primeira ordem está sempre ligado à existência de um

centro urbano dimensionado e equipado para desempenhar um conjunto de

funções administrativas.

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110

A especialização, fruto da inovação, reflecte-se nas transformações das estruturas

económicas que, por sua vez, implicam transformações nas relações de

dependência e reforço das relações de interdependência. Refira-se, ainda que,

além de uma vasta rede de transportes e de comunicações, o ordenamento urbano

e do território, em termos mais gerais, o saneamento básico, a concentração das

actividades comerciais e de serviços, a existência de recursos naturais, a

proximidade de centros de formação, de investigação e inovação, são os factores

fundamentais do desenvolvimento endógeno.

O desenvolvimento endógeno assenta, ainda, na ideia de uma economia flexível

capaz de se adaptar a situações inconstantes e constitui uma alternativa à

economia de grandes unidades. O desenvolvimento endógeno é, assim, a

variedade que se opõe à uniformidade: variedade de culturas, de estatutos sociais,

de técnicas, bem como de gostos, por oposição à rigidez das formas de

organização clássica.

2.3.6. A teoria dos ciclos longos na economia regional

Após os anos 80, a problemática do desenvolvimento regional transformou-se já

que se passou a falar, mais frequentemente, do declínio e não do crescimento.

Após a crise se ter instalado, o papel extremamente importante das grandes

unidades industriais, atribuída pela teoria dos pólos de crescimento e da teoria do

centro-periferia, foi fortemente diminuído aparecendo novos dinamismos. A teoria

das catástrofes e a questão dos ciclos longos, ao nível das regiões, começaram a

chamar a atenção de alguns autores.

Nijkamp (1982) afirma e mostra como a inovação e as indivisibilidades ligadas às

infra-estruturas podem criar catástrofes (ibid., p. 152). Que factos explicam os

ciclos ao nível regional? Como podem os ciclos modelar a conjuntura nas

regiões?. A inovação e a rentabilidade do capital são, geralmente, considerados

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111

como os principais elementos da evolução. O carácter cíclico virá do facto de as

inovações de base serem os motores das fases ascendentes do ciclo económico. A

este respeito, Perroux chama a tenção para duas situações, isto é, as mudanças

tecnológicas têm conteúdo espacial e, nos modelos cíclicos de difusão de

inovação no espaço a partir de um ponto, as fases ascendentes do ciclo decorrem

em simultâneo com o desenvolvimento dos transportes e comunicações.

Nijkamp e Paelinck (1975) propuseram um modelo de flutuações inter-regionais

segundo o qual o espaço se dividia em pólos de crescimento, pólos de atracção e

regiões intermediárias (ibid., p. 151). Para estes autores, a atractividade de uma

região depende do seu stock de capital, da suas infra-estruturas e do seu stock de

informação. De acordo com determinadas hipóteses, o modelo mostra como o

sistema espacial pode evoluir e como se repartem no espaço os efeitos de difusão

e de retenção. Aydalot (1976), no seu modelo de longo prazo, descreve como uma

inovação fundamental pode dar origem a um ciclo inter-regional.

A aptidão diferenciada dos meios locais para apreenderem e procederem à difusão

da inovação, a constituição de “viveiros” de novas empresas em regiões com

elevadas densidades de pequenas e médias empresas, o comportamento espacial

das novas actividades terciárias e as estratégias in situ e de relocalização espacial

das empresas em períodos de crise (Stöhr, 1984) são novas linhas de investigação

que se abrem.

2.4. RESUMO E CONCLUSÕES

A vida económica foi estudada durante anos no tempo t e parecia decorrer num

mundo com um único ponto que Isard classificou como o país das maravilhas

sem dimensões (Isard, 1960, pp. 25-26). A integração do tempo na análise

económica só se viria a verificar com os marginalistas (Menger, seria o primeiro,

com o desvio produtivo). Embora tivesse havido tentativas anteriores de

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112

tratamento da variável espaço na teoria económica, só em meados da década de

cinquenta é que será formulada uma teoria geral que integra simultaneamente o

tempo e o espaço.

As tentativas de compreensão/explicação da distribuição espacial dos fenómenos

começaram por verificar-se, fundamentalmente, em termos de descrição das

observações recolhidas e apareceram intimamente ligadas ao “possibilismo” e à

ideia de cultura. Dado que os processos económicos ocorriam em áreas bem

definidas, a superfície da terra parecia susceptível de ser dividida em várias

regiões distintas, mas com condições humanas e físicas que se ajustavam de uma

forma harmoniosa.

Na realidade se, por um lado, a associação extrema de vários fenómenos

raramente ocorre, por outro lado, existem interacções no quadro regional, o que

levou à substituição da explicação regional de tipo descritivo pela descrição

funcional. A ideia base das relações funcionais tornou-se dominante na década

de cinquenta, partindo-se do princípio de que a localização é justificada pelas

interdependências existentes entre os recursos naturais, recursos humanos e

equipamentos.

Os primeiros modelos de localização resultam, no entanto, da generalização de

regularidades empíricas. Richard Cantillon (1755) foi o autor da primeira grande

contribuição para a discussão e explicação da localização dos aglomerados

urbanos. A localização é determinada pelas funções que os aglomerados

populacionais desempenham e, em primeira instância, pela actividade agrícola.

Cantillon atribuiu grande importância às economias de tempo e de transporte para

a definição da organização espacial da sociedade, tornando-as variáveis

estratégicas, bem como à interdependência económica.

Joahann-Heinrich von Thünen (1826), cerca de cinquenta anos depois, analisando

as produções agrícolas conclui da existência de concorrência quanto a usos

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113

alternativos do solo para a agricultura e adoptando a hipótese de uniformidade

chega, no extremo, a padrões de regularidade geométrica – círculos concêntricos.

A importância da indústria no processo de desenvolvimento económico e social

levou ao estudo da sua localização, inicialmente, sob a óptica da minimização dos

custos de transporte. Weber (1909), por exemplo, ao considerar os custos de

transporte decisivos para a tomada de decisão locacional, viria a afirmar que a

localização mais conveniente seria encontrada no ponto em que os custos

conjuntos de transporte das matérias primas, vindas de várias origens, e os de

colocação do produto final eram mínimos. A introdução da substitubilidade dos

factores, a consideração das economias de aglomeração e de factores

institucionais, os efeitos cumulativos de Myrdal (1956), o potencial populacional

de Hansen (1959) e o mapa mental de Pred (1966) e Pallenbarg (1985) viria a

tornar mais flexível a teoria da localização. No entanto, o mercado continuava a

não ser considerado como uma variável. A análise das relações espaciais permitiu

verificar a Palander (1935) que as relações técnicas entre a produção e o consumo

conduzem a situações em que a localização das unidades de produção estão

situadas junto do consumidor152.

A localização dos equipamentos terciários, de iniciativa privada ou pública, tem

vindo a ganhar uma importância equiparada à dos equipamentos produtivos. A

optimização dos resultados tem levado à sua concentração nos aglomerados

urbanos de média/grande dimensão. Christaller (1933) verificou que cidades de

dimensão populacional semelhante se encontravam distanciadas também de forma

idêntica. No seu modelo é visível a existência de uma hierarquia de aglomerados

populacionais com muitas aldeias e sucessivamente menor número de vilas e

cidades e uma única capital, cujo padrão espacial deveria aproximar-se da

configuração triangular. Neste contexto, cada centro possuiria uma área de

influência próxima da hexagonal. Os lugares, por seu turno, seriam hierarquizados

152 O facto de da evolução técnica e tecnológica permitir a concentração da produção não impede, contudo, que os serviços se aproximem do consumidor desconcentrando-se e dispersando-se.

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114

de acordo com uma rede de interdependência, na qual a centralização é uma

tendência natural.

A teoria de localização permite enquadrar, em termos teóricos, o comportamento

das empresas privadas e do próprio Estado em relação à localização dos

equipamentos produtivos e terciários. No entanto, esta teoria, tal como todas as

outras, não cobre toda a multiplicidade de aspectos que estão por detrás da

decisão locacional. Os modelos de rendimento regional são outra abordagem ao

problema da localização das actividades económicas e sociais. De entre estes

modelos, o mais simples é o modelo de base nas exportações que se baseia no

pressuposto de que o rendimento de determinada região é uma função das suas

exportações. É evidente que as exportações são importantes para o

desenvolvimento da região, contudo, será exagerado afirmar, como Friedmann

(1966), que este é sempre induzido externamente. Neste contexto, é legítimo

questionar o papel desempenhado pela oferta e pela procura interna, bem como,

pelos recursos endógenos no desenvolvimento regional.

Outro factor importante no desenvolvimento regional é a ligação existente entre

os vários segmentos dos sectores produtivos das regiões, o que torna os níveis de

rendimento regionais interdependentes vindo reforçar, por conseguinte, uma das

críticas que se fazem às teorias de base nas exportações e de base económica de

que é necessário considerar o efeito de retorno. As ligações (linkages) de

produção existentes entre as regiões significam que a oferta interna em cada

região depende de outras regiões e, ao mesmo tempo, as influencia.

O desenvolvimento regional, numa perspectiva clássica, baseia-se no paradigma

funcionalista no qual o território tem um papel secundário já que é “apenas” o

elemento no qual as empresas desenvolvem a sua actividade. As insuficiências

deste modelo levaram, no início dos anos 70, ao aparecimento do paradigma

territorialista no qual o território é um elemento relevante no desenvolvimento das

regiões, uma vez que lhe é reconhecida a sua capacidade de influenciar as

decisões de localização. É com base neste pressuposto que Stöhr, nos anos 80,

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115

chama a atenção para o desenvolvimento endógeno em que o aproveitamento dos

recursos naturais e humanos existentes na região são a base para o

desenvolvimento auto sustentado da região. Refira-se, no entanto, que ao

development from below é necessária a contribuição de factores externos

(exportações, ajudas internacionais – IDE, por exemplo – e transferências do

governo central), pelo que os recursos endógenos e os externos se complementam

e potenciam uma estratégia de desenvolvimento auto sustentado.

O processo de desenvolvimento regional, independentemente do paradigma em

que se alicerçam, têm origem em espaços desigualmente infra estruturados pelo

que a criação de pólos pode ser uma das formas, devido aos efeitos de dispersão,

de contrariar o crescimento das assimetrias regionais e, porventura, até eliminá-

las. A criação de uma rede de pólos pode, segundo Perroux (1961) conduzir ao

desenvolvimento da região, já que proporciona efeitos semelhantes aos efeitos

cumulativos de Myrdal (1957). Neste contexto, as administrações central e local

podem contribuir positivamente para o desenvolvimento regional ao

implementarem uma política de incentivo à criação de uma rede de pólos (com

efeitos cumulativos) ou regiões centrais.

A análise das teorias da localização e dos modelos e teorias de desenvolvimento

regional permitiu-nos estudar os postulados, s perspectivas e as leis em que pode

assentar o desenvolvimento económico e social ao nível regional. As teorias e

modelos estudados constituem um dos pilares em que se apoia o planeamento do

território numa dupla perspectiva, isto é, o território percepcionado como um

elemento passivo (local onde têm lugar as actividades) e como elemento activo

capaz de influenciar o modo e a velocidade como se processa o desenvolvimento

regional.

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116

3. PLANEAMENTO REGIONAL: MÉTODOS DE ABORDAGEM

3.1. INTRODUÇÃO

Após a análise crítica dos modelos de crescimento versus desenvolvimento, a

nível macro-económico e regional, bem como das teorias de localização das

actividades produtivas e dos equipamentos iremos reflectir sobre o planeamento

enquanto instrumento de análise económica e de tomada de decisões.

O planeamento, como afirma Reigado (1999) deve o seu aparecimento à evolução

da ciência económica e ao desenvolvimento das forças produtivas numa dupla

perspectiva: se, por um lado, as grandes empresas sentiram a necessidade de

planear a sua actividade a médio/longo prazo, por outro lado, a Grande Depressão

de 1929 e as sucessivas crises que se lhe seguiram vieram exigir o abandono do

laissez faire aceitando-se, por conseguinte, a necessidade do planeamento macro-

económico. Se a partir destes factos podemos concluir que o planeamento macro-

económico é recente, então o planeamento do território é ainda mais recente.

A concepção que se tem do espaço não é indiferente para o processo de

planeamento, já que, ao considerarmos o espaço como determinante do

desenvolvimento e elemento aglutinador da história (que consideramos o mais

correcto) ou como elemento passivo, estaremos a articular de forma diferente o

território e as actividades que nele se desenvolvem. Assim, em nosso entender, o

planeamento, em cada caso concreto, dependerá das condições reais do espaço

sujeito a intervenção e terá como objectivo supremo contribuir para a melhoria do

bem estar da população nele residente. O planeamento do território e, de um modo

mais geral, o planeamento macro-económico é um processo que se desenvolve a

três níveis: normativo, estratégico e tácito ou operacional (Reigado, 1999, p. 61).

O planeamento estratégico será alvo de maior atenção pelo que nos vamos

debruçar sobre os seus modelos, etapas e componentes. Em termos de modelos

destacam-se o ortodoxo concebido pela Harvard School (1981) e o interaccionista

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117

de Bryson e Einsweiller (1988). Embora, os modelos tenham algumas diferenças é

possível detectar semelhanças. Segundo Sallez (1986), podemos identificar quatro

componentes essenciais do planeamento estratégico, ou seja, definição das

escolhas estratégicas, adaptação às tendências-chave de evolução, afectação de

recursos escassos e definição de um sistema interno de informação (Neves, 1996,

p. 54). Ainda, segundo Sallez, as etapas à semelhança dos componentes são

também quatro: a determinação dos objectivos, a escolha de programas

estratégicos, a escolha de acções e as realizações e o seu controlo (ibid., p. 55). A

estas etapas poder-se-ia acrescentar uma quinta – comunicação dos resultados

alcançados e sua aprovação – o que, no entender de alguns autores próximos dos

project de ville, contribuiria para o reforço do envolvimento dos agentes

económicos e sociais nos projectos de desenvolvimento. Refira-se, por último,

que a introdução desta etapa vem reforçar a concepção de planeamento, segundo a

qual, este é um processo contínuo, deslizante de correcções e ajustamentos

constantes Reigado (1999, p. 51) pelo que, a fase de avaliação final de um plano

decorre simultaneamente com a implementação de um novo plano.

No âmbito do planeamento estratégico do território tem-se assistido, nos últimos

anos, à consolidação do planeamento urbano que, numa abordagem actual, assenta

em cinco ideias-chave (DGOTDU, 1996, p. 27):

• os problemas urbanos devem ser interpretados como sintomas de dificuldade

de ajustamento a situações de mudança;

• a intervenção dos responsáveis pela cidade pauta-se, cada vez mais, por uma

perspectiva de gestão (urban entrepreneurialism) e não de administração (urban

managerialism);

• a intervenção do planeamento deve valorizar uma cultura de transformação e

de recuperação urbana (reabilitação, refuncionalização) em detrimento de uma

cultura de expansão física da cidade (Venuti, 1990);

• a eficácia da transformação urbana depende do grau de empenhamento e da

capacidade de articulação dos diversos actores urbanos;

• não existe um modelo único de soluções para o desenvolvimento da cidade,

mas antes princípios gerais que importa adaptar a cada caso concreto.

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118

O desenvolvimento dos territórios e, em particular, das cidades implica,

necessariamente, o seu ordenamento. Daí, se encerrar este capítulo com o estudo

dos modelos de análise espacial que, de certo modo, são o suporte teórico do

ordenamento do território. Assim, abordamos os modelos gravitacionais, os

modelos de localização do parque habitacional e do comércio retalhista, o modelo

de distribuição do tráfego e o modelo de Lowry.

SECÇÃO I – PLANEAMENTO SÓCIO-ECONÓMICO

3.2. O PLANEAMENTO DOS SISTEMAS SOCIAIS

3.2.1. Génese do planeamento: breve revisão bibliográfica

O planeamento macro-económico está naturalmente ligado, por um lado, ao

desenvolvimento das forças produtivas e da própria ciência económica e, por

outro lado, à ruptura institucional desencadeada pela revolução socialista russa153.

Determinar o lugar e as funções que exerce o planeamento na actualidade,

significa estudar as formas de desenvolvimento da produção, a sua concentração

baseada na divisão do trabalho e o fomento do desenvolvimento a nível

internacional, nacional e regional/local. O planeamento é assim, antes de mais,

sócio-económico e integra os planos regionais e setoriais.

A função social do planeamento macro-económico consiste em substituir a força

espontânea do mercado por uma actividade conscientemente dirigida ou, por

palavras de Marx, o que primeiro distingue o pior arquitecto da melhor abelha é

aquele que, antes de construir um favo de cera, já o construíu no próprio

cérebro (op. cit., p. 185154). Refira-se, no entanto, que a própria possibilidade de

planear depende da existência de condições específicas que, por sua vez,

153 Verificada em Novembro de 1917. 154 Capital, Tomo I (ed. russa).

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determinam os princípios e métodos de articulação dos planos, o seu conteúdo

económico e formas orgânicas. Os diferentes níveis de utilização do planeamento

estão igualmente relacionados com o sistema económico dominante, isto é, os

países com grande ascendente socialista inclinam-se a praticar a planificação,

enquanto aqueles onde predomina a influência capitalista são menos propensos

a isso (Tinbergen, 1964, p. 73). Efectivamente, na ex-URSS, o planeamento surge

ligado às profundas transformações sociais e económicas operadas em 1917. O

primeiro plano de longo prazo155 teve como suporte técnico o modelo de Feldman

que, por sua vez, se apoiou nos esquemas de reprodução alargada de Marx e nos

trabalhos de Dmitriev156.

As dificuldades de afirmação do planeamento na sociedade capitalista, por um

lado, e a direcção central da economia na ex-URSS, por outro lado, levou a que

entre 1920 e meados da década de 40 não se dessem passos importantes ao nível

do corpo teórico.

Após a II Guerra Mundial, verifica-se um aprofundamento da base teórica do

planeamento o que, mais uma vez, reflecte as condições objectivas da época.

Paralelamente, no domínio das técnicas auxiliares de planeamento, registam-se

progressos de extrema importância como, por exemplo, na modelização macro-

económica (modelos de Harrod-Domar, Kalecki e Klein-Goldenbergen157), no

domínio da contabilidade nacional e da estatística (Kuznets, Hicks, Colin, Clark e

Stone). Landauer (1947) ao publicar, em 1944, The Theory of Economics

Planning dá um contributo importante no esforço de teorização do planeamento

definindo-o como a coordenação das actividades económicas por um órgão

comunitário através dum esquema que descreva em termos quantitativos e

155 Conhecido por Plano GOELRO ou de electrificação geral do país. 156 Dmitriev recorrendo à teoria de valor de Marx publicou, em 1904, os primeiros quadros input-output. 157 Este modelo foi publicado em 1955 tendo por base a economia dos EUA entre 1929 e 1952, exceptuando os anos de 1929 e 1945. O modelo de longo prazo é formado por 23 equações e 42 variáveis podendo ser ordenado numa série de sub-modelos de acordo com o objectivo de estudo. A distinção entre os sectores monetário e real, bem como a introdução da carteira de títulos,

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qualitativos o processo produtivo tal como se deseja que ocorra no futuro (cit.

Reigado, 1999, p.8). Esta definição, sendo relativamente avançada para a época,

sugere-nos que o planeamento pode desempenhar algumas das funções,

geralmente, atribuídas ao mercado.

Myrdal (1963), que sintetizou158 os progressos verificados nas décadas de 40 e 50

ao nível do planeamento, considera que este se tornou, gradualmente, num

instrumento da política económica dos países ocidentais, não porque tenha sido

conscientemente assumido, mas sim devido à necessidade de fazer face aos

problemas concretos a que o mercado já não conseguia dar resposta. Keynes

chegou, mesmo, a defender uma ampliação das funções do governo, relacionada

com a tarefa de coordenar a tendência para o consumo e estimular o investimento

de capital e adianta ser o planeamento o único meio possível de evitar a

destruição total das formas económicas actuais e como condição para que a

iniciativa individual funcione com êxito (op. cit, 1949, p. 367).

O crescimento da escala e complexidade das economias a par dos importantes

progressos verificados, como veremos adiante, quer ao nível dos debates teóricos

quer no desenvolvimento de técnicas e metodologias de implementação e controlo

de execução dos planos, levam a que vários países ocidentais comecem a pôr em

prática programas de fomento económico de curto e longo prazo entre os quais se

destacam o Plano Marshall, cujo objectivo era a reconstrução da Europa após a II

Segunda Guerra, e o Plano Monnet159, que preconizava a concentração de meios

para impulsionar os sectores básicos da economia francesa. A este, seguiram-se

outros planos que viriam colocar a prática francesa num lugar de destaque. A

Holanda, reconhecida internacionalmente pelos seus contributos teóricos, viria a

ter os seus primeiros resultados com o Primeiro Memorando sobre a

Industrialização da Holanda (1948-1952). A Noruega elabora os seus primeiros

planos de médio prazo em 1947 e, a partir de 1954, estes planos terão a duração

enquanto determinante do nível de consumo, são elementos que distinguem este modelo dos até aí conhecidos. 158 Ver a obra, publicada em 1951, The Trend Towards Economic Planning.

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de quatro anos acompanhando a legislatura parlamentar. A Bélgica cria, em 1959,

o Instituto de Programação com a atribuição de estudar as perspectivas

económicas para 1965 e que virá a elaborar o Programa de Expansão Económica

(1962-1965). A Itália160, à semelhança da França, investe nos planos quinquenais.

A Grã Bretanha viria a criar em 1961 o Conselho Nacional de Desenvolvimento

Económico com atribuições no âmbito do planeamento. Os EUA, embora não

tenham uma prática relevante ao nível prático, deram, contudo, um importante

contributo na área da investigação econométrica.

Num mundo dividido em dois grandes blocos económicos, com lógicas de

funcionamento completamente diferentes, não há uma uniformidade na definição

do âmbito e natureza do planeamento. Para Kornai (1971) o planeamento tem

como objectivos primordiais a recolha de informação, a coordenação e a

intermediação das actividades chegando a defini-lo como a process of cognition

and comprise (cit. Reigado, 1983, p. 23). Esta concepção de planeamento, apesar

de se ter consolidado nos últimos anos, evoluiu em duas direcções distintas.

Herzog (1972) e Fedorenko (1977) defendem que só é possível falar de

planeamento em países socialistas. Efimov (1972) reafirma esta ideia ao

considerar que no capitalismo só se pode falar de programação e não de

planeamento, visto o sector nacionalizado ser insignificante e o “planeamento” se

reduzir a recomendações. Para o autor, enquanto a programação capitalista não

deixa de ser um formulário de boas intenções, o planeamento reflecte a

regularidade com que actuam as leis económicas do socialismo (Efimov 1972, p.

15). Bettelheim (1968) chega mesmo a afirmar que a planificação é a forma

específica de organização de um determinado tipo de sociedade (cit. Reigado,

1983, p. 25) e identifica o planeamento com a ciência económica do socialismo na

qual se integraria e a partir da qual se desenvolveriam os outros ramos das

ciências sociais.

159 Este plano foi elaborado para o período 1946/47 – 1952/53.

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Todaro (1971), pelo contrário, sustenta que o planeamento só se pode verificar

nos países capitalistas dado este consistir no esforço do Governo para conseguir o

crescimento rápido da economia sem tensões inflacionistas e com um nível de

emprego elevado através de políticas fiscais e monetárias adequadas. Myrdal

(1963) manifesta-se no mesmo sentido ao escrever que o planeamento deve ser

entendido como o conjunto de tentatives conscientes entreprises par le

gouvernement d’un pays, habituellement avec la participacion d’autres

collectivités, pour coordonner d’une manière plus rationnelle les politiques

nationales afin d’atteindre plus rapidement et plus complètement les buts

souhaitables pour un développement futur, déterminés par le processus politique

au cours de sa transformation (cit. Caire, 1972, p. 40).

Abstraindo-nos da polémica sobre a utilização do planeamento num ou noutro

sistema económico161, parece-nos importante sublinhar que o funcionamento da

economia é um processo de complexas interdependências dentro dos e entre os

diversos subsistemas [que o integram] e entre estes e o seu meio ambiente

(Reigado, 1999, p. 9). À definição apresentada está subjacente uma concepção

sistémica dos circuitos económicos que podemos estender ao planeamento.

Chadwick (1971) considera-o um sistema conceptual genérico de extraordinária

importância e justifica a sua afirmação escrevendo que pela criação de um quadro

conceptual autónomo mas em perfeita correspondência com os sistemas reais,

poderemos compreender os fenómenos da mudança, antecipá-los e procurar

então a optimização dos sistemas reais através do aperfeiçoamento dos sistemas

conceptuais (ibid., p. 9).

Van Court (1972) partilha desta concepção de planeamento que introduz um

estímulo importante à modelização. Neste contexto, destaque-se Lange (1965)

pela interpretação sistémica dos quadros input-output. Por seu turno, Kornai

160 O Relatório Saraceno, precedido do Plano Vanoni (1955-1964), é o resultado da primeira fase dos trabalhos da Comissão Nacional para a Programação Económica e está na base do plano para 1965-1969. 161 Esta questão perdeu a sua actualidade em virtude de, nos anos 90, a experiência socialista na Europa de Leste ter sido abandonada e de se questionar os seus resultados noutras regiões do mundo.

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(1971) sublinha a necessidade de se considerar no processo de planeamento um

elemento de controlo independente da esfera real, mas em paralelo com esta.

A ligação às teorias da decisão e dos jogos, bem como as alterações ao nível

conceptual da política económica verificada no bloco socialista nos finais de 60

levaram vários economistas, entre os quais se destacam Johansen (1978) e Kornai

(1971), a debruçarem-se sobre esta questão.

O planeamento económico a nível global é, pois, recente e mais recente o é ainda

a nível regional, embora nos planos de recuperação do pós-guerra na Europa

Ocidental (Planos Marshall e Monnet), e em Portugal nos Planos de Fomento (em

especial, a partir do IIIº), estivessem presentes algumas preocupações com o

planeamento e desenvolvimento regional. Refira-se que, segundo Kalinski (1970),

a formulação de políticas e planos regionais deve-se, por um lado, à existência de

territórios-problema com as implicações daí decorrentes ao nível das políticas de

âmbito nacional e, por outro lado, à necessidade de dar concertação e eficiência

às acções de política global e de política sectorial e de criar uma base espacial

integradora para as próprias acções de política urbana (Lopes, 1984, p. 273).

O interesse pelo planeamento regional parece, assim, ter derivado não de aspectos

globais no funcionamento da economia, mas de problemas específicos sentidos

localmente como, por exemplo, o congestionamento nos grandes centros urbanos,

a pressão imobiliária, a resposta insuficiente por parte dos serviços públicos ou o

desemprego crescente. Apesar destes problemas serem, de certa forma, urbanos

tornou-se evidente que era necessário alargar a área de estudo à região envolvente

e, até, mais distantes162. Refira-se, ainda, que o problema chave do planeamento

regional está intrinsecamente ligado ao grau de autonomia das regiões ou, por

outras palavras, ao grau de centralização/descentralização no processo de tomada

de decisões. Embora, nas décadas de 50 e 60, a concepção dominante tinha sido a

162 É hoje aceite pacificamente que a solução para o desemprego urbano, por exemplo, passa pela criação de emprego em meio rural eliminando, assim, as migrações.

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124

da centralização163 o debate tem sido intenso e não perde a sua actualidade.

Johansen164 (1978), sobretudo ao nível da compreensão do processo de tomada

de decisão, destaca-se no debate centralização/descentralização. Questões como

a definição dos princípios que presidem à repartição e articulação das

competências aos níveis central e regional, ou até onde podem ir as escolhas e

meios regionais numa economia nacional/internacional em que a globalização

crescente da actividade económica é uma variável a ter em consideração ou,

ainda, como resolver a conflitualidade entre os órgãos funcionais e órgãos

territoriais encontram-se no centro das dificuldades sentidas nas várias

experiências de planeamento independentemente da abordagem ser funcional ou

territorial.

A abordagem funcionalista tem a sua raiz na teoria micro e macro económica, isto

é, combina a economia de mercado com o planeamento. Em termos de conteúdo,

o planeamento funcionalista é constituído por programas sectoriais ventilados por

regiões em que estas se ficam por simples objectos de planeamento (Lopes, 1984,

p. 278) e, consequentemente, têm um papel passivo em todo o processo de

planeamento. A abordagem territorialista é, em nosso entender, efectivamente

mais aberta aos problemas do ordenamento do território e da qualidade do meio

ambiente, tem um carácter mais pluridisciplinar, apela à descentralização das

decisões públicas e valoriza as dinâmicas regionais. Nesta concepção do

planeamento, as regiões emergem como sujeitos activos de pleno direito

responsabilizando-se pela definição dos objectivos e das estratégias e o controlo

da execução, havendo naturalmente que promover a conciliação entre os vários

planos regionais (concertação inter-regional) e de os acomodar dentro das

capacidades globais dos meios (ibid., p. 278).

As insuficiências, ao nível teórico, de ambas as abordagens têm a ver com um

problema fundamental, de ordem epistemológica, levantado pela análise espacial

nas ciências humanas e sociais. Efectivamente, a matriz de pensamento legada

163 Ver TINBERGEN, J., (1964), Central Planning, Yale University Press, New Haven

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125

pela tradição científica das ciências exactas e, particularmente, os modelos

espaço-temporais mostram-se inadaptados, já que estes são do tipo systèmes

fermés e toutes chouses restant égales par ailleurs (Perrin, 1978, pp. 216-217).

Ora, na realidade os sistemas humanos comportam-se como sistemas abertos em

retroacção165 com o meio envolvente. Todas estas questões sugerem a necessidade

de um aprofundamento ao nível da análise e construção teórica do planeamento

regional.

3.2.2. O sistema social no processo de planeamento

Os sistemas, e de uma forma muito particular o social, caracterizam-se, entre

outros aspectos, pela sua extraordinária capacidade de evolução. Os sistemas

estão em mutação constante, antes e depois da nossa análise. A dinâmica

contínua dos sistemas está intimamente relacionada com a incerteza relativa ao

meio ambiente e aos resultados das acções programadas (Reigado, 1999, p. 52).

Além disso, o conhecimento exaustivo de todos os elementos dos sistemas sociais

é impossível, quer devido ao seu elevado grau de complexidade, quer à evolução

constante dos próprios sistemas o que gera, por sua vez, mais incerteza166 ao

planeador. A incerteza proveniente do meio envolvente deve-se à constante

mutação, em função de novos condicionantes e potencialidades, do próprio

sistema e do seu ambiente específico e genérico. Mas, a própria imagem que

temos do sistema social e do seu funcionamento também não é constante já que ao

dispormos de mais informação e experiência somos levados a vê-lo de uma forma

qualitativamente diferente. Além disso, como afirma Reigado (1999), o facto de a

mente humana não ser capaz de abarcar um “sistema” para além de uma certa

164 Sobretudo ao nível da compreensão do processo de tomada de decisão. 165 Sobre este mecanismo falaremos mais adiante. 166 A incerteza está ligada a três importantes fontes, ou seja, ao comportamento do sistema face a alterações do meio ambiente, à hierarquia de valores e às estratégias dos actores de desenvolvimento e às interacções das mesmas sobre o sistema objecto das acções a desenvolver.

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126

complexidade leva-nos a socorrer de modelos que, como já vimos atrás, são um

quadro simplificado da realidade ou, por outras palavras, uma generalização

abstracta de como certos fenómenos realmente ocorrem. Convém, contudo não

absolutizar a sua importância dado que todas as simplificações possibilitadas

pelos princípios, leis e modelos devem ser confrontadas com a realidade que

traduzem de forma a serem validados ou reelaborados de acordo com as novas

observações. Este processo é, em termos metodológicos, vital para o estudo dos

sistemas sociais e económicos. Nenhuma ciência social – observa Herskovits

(1954) – pode cumprir os seus objectivos se desatender ao princípio de que os

problemas só podem ser compreendidos com clareza e os dados somente podem

lograr uma interpretação válida mediante a constante e contínua referência

cruzada entre as hipóteses e os factos (cit. Rossetti, 1988, p. 55).

Os modelos, no âmbito do planeamento, caracterizam-se de acordo com o prazo

de projecção, o modo de inserção da variável tempo, o número de variáveis e de

relações, a forma matemática das relações, a aptidão do modelo para revelar um

óptimo social e os tipos de utilização (Babeau e Derycke, 197.., p. 25). Em termos

nacionais, é possível distinguir os modelos de política económica (geralmente de

curto prazo), os modelos de estudo das variantes (geralmente de médio prazo) e os

modelos de projecção a longo prazo.

A informação, entendida como um conjunto de dados (imagens, textos,

documentos, voz, etc.), tem vindo a assumir uma importância extraordinária no

processo de decisão. Perroux (1964) sublinha o papel fundamental da informação

na sociedade moderna e o poder dos indivíduos, empresas e organizações

proporcionado pela sua capacidade de receber, criar e transmitir informação.

Bateson (1984) concebe a informação como a différence qui crée une différence

(op. cit., p. 234). Drucker (1993), por seu turno, chega a defender o primado da

informação/conhecimento sobre o binómio capital/trabalho como factor de

sucesso. A informação torna-se, assim, na base de um novo tipo de gestão das

empresas e organismos em que a tomada de decisão é efectuada com o máximo de

informação disponível.

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127

Mas, se por um lado, os órgãos de planeamento não desempenham a sua função

sem informação, por outro, é importante saber usá-la de modo a que o

planeamento se torne mais eficiente. A utilização eficiente da informação depende

também do tempo de acesso, isto é, a recolha, tratamento e disponibilização da

informação deve ser efectuada de um modo rápido tornando possível a redução da

incerteza e, consequentemente, do risco no processo de tomada de decisão.

A gestão da informação167 tem, assim, como objectivo apoiar a tomada de decisão

dos planeadores tornando mais eficiente o conhecimento e a articulação entre os

vários subsistemas que constituem o sistema sócio-económico. Refira-se que a

gestão da informação assenta num Sistema de Informação168 - SI - que,

assegurando a ligação entre os vários subsistemas, permite o processamento de

dados provenientes das várias fontes e subsequente análise. Nijkamp (1984)

enfatiza a importância dos sistemas de informação ao integrá-los na própria

análise política como se depreende das suas palavras ... se definirmos a análise

política como a investigação sistemática de elementos, factos, estruturas,

relações, conflitos e efeitos inerentes na escolha ou no decurso de acção é claro

que os sistemas de informação são parte dessa análise política (cit. Reigado,

1999, p. 35).

O desenho dos sistemas de informação é variável, indo desde um sistema

compreensivo que sirva, eventualmente, todas as necessidades dos planeadores e

decisores até uma versão específica para determinado problema. Nos últimos

anos, segundo Nijkamp, foram sendo elaborados sistemas de informação

adaptativos (ver o fluxograma 3.1) que, situando-se numa posição intermédia,

respondem melhor às características do processo de planeamento e de tomada de

decisão (perspectiva de longo prazo, interacções entre decisores e grupos de

interesses, efeitos de retroacção).

167 Wilson (1989) define a gestão da informação como o controlo eficaz de todos os recursos de informação relevantes para a organização, tanto de recursos gerados internamente como os produzidos externamente e fazendo apelo, sempre que necessário, à tecnologia de informação. 168 Araújo (1993) define sistema de informação, numa perspectiva tecnológica, como um conjunto de elementos com funções específicas no desempenho de tarefas de gestão da informação residente em computador.

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128

Fluxograma 3.1 Sistema de Informação

Fonte: Adaptado de GUESNIER, B., (1980), “Le Systeme d’Information Regional” in Revue d’Economie Régionale et Urbaine, nº 4-2, 3

Necessidades do Sistema de Informação: • Análise da situação • Previsão, simulação

Determinação dos dados a recolher

Pesquisa das fontes

Ministérios e Organismos Públicos

INE Associações Patronais

Sindicatos

Instituições de Ensino e de Formação Profissional

Administração Regional/Local

IPSS

Centros de Investigação Científica

MODELOS: • Análise • Processamento • Previsão

INTEGRAÇÃO e FUSÃO

SISTEMA de INFORMAÇÃO

TABELAS : • Correspondência de nomenclaturas • Reagrupamento geográfico

Análise crítica dos resultados

RESULTADOS: • Tabelas, mapas, gráficos • Previsões, simulações • Plano

Outras

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129

O sistema de informação apresentado é adaptativo já que, não sendo rígido,

permite a análise crítica dos resultados e sua correcção aos vários níveis, isto é, ao

nível dos modelos utilizados, das próprias necessidades do sistema e dos dados a

recolher através de um processo iterativo. Neste sistema destaque-se a fusão e

integração dos dados que, se por um lado, é um processo para se proceder à

elaboração de uma chave de agregação169, por outro, estabelece uma ligação com

outros dados representativos da interdependência entre os dados ou do fenómeno

analisado. Estabelecida a chave de agregação e classificada a informação

disponível estamos em condições de realizar a fusão da mesma, obtendo o

quadro que caracteriza determinada entidade do sistema sócio-económico. A

capacidade de auto avaliação e de correcção aumenta a qualidade da informação

utilizada pelos planeadores, reduz a incerteza sobre a evolução do sistema

económico e social e contribui para atribuir aos sistemas de informação um papel

central no processo de planeamento que se desenrola por ciclos.

Os ciclos do planeamento (McLoughlin, 1969), como se verifica no fluxograma

3.2, integram a caracterização e avaliação do ambiente, a formulação dos

objectivos, a inventariação das linhas de acção, o balanceamento linhas de

acção/meios disponíveis e selecção das acções a implementar, que modificando as

relações entre os indivíduos (e grupos) e o ambiente justifica o reiniciar de novo

ciclo, com a identificação das necessidades, a formulação dos objectivos, a

inventariação das políticas, a selecção/avaliação, a acção, ... (op. cit., pp. 94-

103). Numa óptica sistémica, o planeamento é constituído por inputs (decisões a

tomar) e outputs (resultados das decisões “iniciais” e decisões geradas pelo

próprio sistema), o que permite introduzir no processo um mecanismo de

retroacção170 de dois tipos, isto é, negativa e positiva. Assim, enquanto as

retroacções negativas conservam constantes os valores e asseguram o equilíbrio

geral do sistema, as retroacções positivas tendem a romper o equilíbrio e a

transformar o sistema noutro com características diferentes.

169 Entende-se por chave de agregação uma característica particular do período, lugar ou sector.

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130

Fluxograma 3.2 O planeamento como um processo cíclico

Fonte: Lopes, A. S. (1984), DESENVOLVIMENTO REGIONAL: Problemática, Teoria,

Modelos, 2ª ed., Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, p. 281

O controlo das acções e a possibilidade da sua correcção, permitidos pelo

mecanismo de retroacção, conferem um carácter adaptativo do planeamento e

aumentam a eficácia do mesmo, ao contrário dos regulamentos determinísticos e

das actualizações periódicas do planeamento tradicional. Nesta situação de

controlo limitado sobre o sistema real e, por conseguinte, de incerteza Blackman

(1940) apoia a concepção de que o planeamento deve permitir a correcção de

estratégias, medidas e acções ao longo do ciclo de acordo com as alterações

entretanto verificadas no sistema sócio-económico, ou seja, o planeamento

initiates a course of action which produces events experienced by the agent, in the

light of which modifies the plan; so that in a sequence of phases, the plan is

continuously initiating action or being modified by the results f action; and this

modification is not merely a more efficacious employment of means to an

originally intended end (a continuous adjustment on the feedback principle), but

also a modification of the end in view, a revision of intention ... a development in

understanding (cit. Gillingwater e Hart, 1978, p. 141).

170 Alguns sistemas reais caracterizam-se pela sua capacidade de auto regulação. Neste caso, os desvios entre o planeado e o real, detectados pelo sistema, são automaticamente corrigidos, embora com algum desfasamento temporal, através de mecanismos autoreguladores.

ANÁLISE ESCALA DE VALORES OBJECTIVOS

MEIOS INVENTARIAÇÃO DE POLÍTICAS

AVALIAÇÃO/SELECÇÃO DE POLÍTICAS

ACÇÃO

CUSTOS/BENEFÍCIOS SOCIAIS

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131

Nesta definição, ou seja, no planeamento deslizante está implícito que o processo

continua mesmo após a aceitação e implementação da estratégia inicial,

entretanto, alterada em função dos resultados obtidos tornando-se um processo, de

certo modo, contínuo. A introdução do circuito de retroacção, embora com algum

desfasamento devido à não coincidência temporal quer entre o desencadear das

acções (iniciais ou de correcção) e a ocorrência dos resultados, quer ainda entre o

momento em que se decide efectuar determinadas correcções e a sua introdução

efectiva, permite verificar se os resultados correspondem aos objectivos fixados

embora, nada nos diga sobre as causas dos eventuais desvios.

Esta questão, ou melhor, quais as razões que levaram a desvios podem e são

definidas e analisadas no decorrer do próprio processo de planeamento, uma vez

que este assenta num modelo conceptual que inclui o modelo de funcionamento

do fenómeno/realidade sobre a qual se vai actuar, do sistema sócio-económico nos

seus vários níveis e do comportamento do meio ambiente e das relações entre este

e o sistema. Um conjunto de valores e de objectivos que definem as principais

linhas de orientação são, igualmente, parte integrante do modelo conceptual de

planeamento. Mas, a concepção que temos do sistema não é estática. Na realidade,

a evolução do sistema e do seu meio ambiente influencia a concepção que temos

do mesmo, levando-nos a reformular o modelo conceptual que, por sua vez, se

deverá reflectir no modelo de planeamento provocando novas alterações no

sistema real e seu ambiente. Este encadeamento de acções no processo de

planeamento é obtido endogenamente, isto é, através do sistema informativo de

relações internas (Reigado, 1999, p. 59) que assegura o ajustamento imediato do

processo ao modelo conceptual sempre que se verificam, por um lado, alterações

no sistema de valores e objectivos e, por outro lado, uma evolução do próprio

processo de planeamento.

O desenvolvimento do sistema e do seu meio ambiente, isto é, do mundo real

também provoca alterações exógenas ao processo de planeamento. Daí a

necessidade de se dispor de um sistema informativo de relações externas (op. cit.,

1999, p. 59) que canalize as informações sobre as acções desencadeadas, via

processo de planeamento, sobre o mundo real. Um segundo grupo de relações

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132

externas garante que as mudanças no mundo real (sistema e meio envolvente) se

vão reflectir ao nível do processo de planeamento e do próprio modelo

conceptual.

Da análise do fluxograma 3.3 verifica-se que a cada tipo de fluxo de informação

corresponde uma retroacção específica, ou seja, self conscientious feed-back, task

oriented feed-back e learning feed-back (ibid., p. 59) que, embora, tenham

objectos de análise diferenciados contribuem para um mesmo fim: o aumento dos

níveis de qualidade do processo de planeamento. Assim, enquanto a primeira

retroacção funciona como sinal de aviso para todos os intervenientes no processo

de planeamento sobre as alterações internas do sistema, isto é, do modelo

conceptual e do processo de planeamento devido a alterações verificadas no

sistema económico e social, a segunda (claramente orientada para os objectivos)

fornece a informação relativa ao nível de realização do plano e a terceira e última

retroacção disponibiliza a informação relevante sobre o desenvolvimento no

próprio sistema e no meio que o envolve, ou seja, indica as razões de eventuais

insucessos.

Fluxograma 3.3

Circuitos de informação no processo de planeamento

Legenda:

- Relações internas - 1º Tipo de relações externas - 2º Tipo de relações externas

Fonte: Adaptado de REIGADO, F. M., (1999), Desenvolvimento e Planeamento Regional:

abordagem sistémica, p. 57 (no prelo)

PLANEAMENTO

MODELO CONCEPTUAL PROCESSO

MEIO ENVOLVENTE

SISTEMA SÓCIO-ECONÓMICO

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133

O circuito de retroacção e as projecções forecasting, segundo o mesmo autor, são

dois modos diferentes de considerar a dinâmica do sistema sócio-económico no

processo de planeamento. Através da utilização de projecções forecasting é

possível incorporar nova informação relativa ao futuro no processo de

planeamento, recorrendo à extrapolação, exploração e especulação. Assim,

enquanto que com a extrapolação se efectua uma previsão do comportamento do

sistema e do seu meio envolvente, a exploração possibilita testar a possibilidade

lógica da ocorrência e desenvolvimento de novos fenómenos; a especulação

permite-nos aferir as probabilidades de se verificarem as hipóteses colocadas

inicialmente. Paralelamente, através das projecções forecasting normativas,

procura-se construir uma imagem consistente do futuro que seja um guia para a

tomada de decisões no processo de planeamento.

Não obstante, a utilização do circuito de retroacção e das projecções forecasting, o

planeamento ou, melhor, o seu output (projecções, planos, etc.) é necessariamente

probabilístico (Irwin, 1966) dado o controlo limitado sobre o sistema económico e

social extremamente volátil e a falta de informação, de certo modo, crónica e

inevitável.

3.2.3. Do espaço ao território no planeamento

Sob o ponto de vista teórico, o desenvolvimento, tal como já foi referido

anteriormente, tem ignorado o espaço como se aquele partisse de lógicas de

crescimento numa leitura estática e nacional do território. O crescimento

económico, sob influência do progresso técnico e tecnológico, levou à banalização

dos espaços e à internacionalização do capital. Além disso, o facto das sociedades

contemporâneas parecerem condenadas a viver a desterritorialização da produção

e das suas duas manifestações dominantes: a verticalidade da dependência e a

horizontalidade da concorrência (Lacour, 1985, p. 840) levou a economia, as

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134

políticas de ordenamento do território, as políticas urbanas e o crescimento

urbano, comandadas por lógicas funcionais e funcionalistas, a descobrir os limites

destas políticas e a redescobrir a importância do territorial e da diferença.

A análise do papel do espaço no desenvolvimento económico e social levanta

novas questões e obriga, em qualquer caso, o economista a sair dos caminhos já

trilhados da sua disciplina (Rallet, 1988, p. 375). Assim, as análises de tipo

espaço-lugar, abordando o espaço como superfície de suporte ou lugar de

concentração de actividades, têm a sua raiz na teoria de localização. As análises

do tipo espaço-sistema baseiam-se numa lógica de tipo cibernético e estão

relacionadas com os modelos macro-económicos regionais e, mais recentemente,

com as abordagens em termos de dependência ou de domínio. As análises em

termos de espaço-território surgem a partir, por um lado, das reflexões sobre os

paradigmas de desenvolvimento e, por outro lado, do debate regionalismo/

regionalização. Hoje, mais do que nunca, é necessário organizar as cidades,

recompor os meios rurais e pensar como minimizar os efeitos negativos destas

medidas, por um lado, adaptadas ao período em que vivemos e, por outro lado,

necessárias às vontades e necessidades políticas. Isto leva a que os processos de

desenvolvimento tenham efeitos complexos, perversos e contraditórios que, se

verificam em períodos e lugares diferentes. Lacour (1985) designa-os por pares

infernais: valorização e desvalorização, integração e desintegração e, por último,

estruturação e destruição da estrutura (ibid., p. 842).

Os processos de desenvolvimento decorrem num espaço não homogéneo,

observável ou não, onde se inscrevem uma série de elementos como o relevo e as

rochas, as águas e os solos, o clima e a vegetação, as actividades económicas e

sociais, etc. que permitem a sua individualização. Durkheim (1973) considera o

espaço, tal como o tempo, uma categoria do entendimento, ou seja, ambos são

representações colectivas que exprimem realidades colectivas (...) coisas sociais,

produtos do pensamento colectivo (cit. de Silvano, 1997, p. 3), pelo que a tomada

de consciência em relação ao espaço não é um processo linear, mas sim

progressivo. A noção de espaço evolui, assim, desde uma concepção em que este

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135

é visto como uma disponibilidade rara e hostil até ao espaço-território. O espaço

é, assim, sucessivamente percepcionado como (Lacour, 1995, pp. 23-26):

• espaço disponível, raro e hostil, mas maleável. Esta tese, adoptada nos

modelos de optimização, leva-nos ao espaço-factor que se declina em espaço-

conquista, espaço-esforço, espaço-custo, espaço-recompensa, espaço-lugar

(op. cit., p. 24);

• espaço compreendido como um perigo, uma ameaça. Além das catástrofes

naturais, directa ou indirectamente provocadas pelo homem, a saturação dos

solos e a poluição fragilizam o espaço e tornam-no perigoso pelo que se deve

garantir o seu bom uso optimizando os comportamentos a montante (estudos

de impactos, por exemplo) e a jusante (ordenamento e gestão eficientes);

• espaço refúgio e espaço símbolo. O espaço-refúgio, ao simbolizar a

solidariedade, transcende a arrogância das civilizações e a mercantilização dos

comportamentos e dos homens. O espaço-símbolo, enquanto testemunho de

uma história, obriga à valorização e reparação dos espaços fragilizados pela

economia, as guerras ou as catástrofes naturais e industriais;

• espaço-território, lugar privilegiado de contestação e de tomada de

consciência. O espaço torna-se pretexto, objecto de contestação ou, mesmo,

alavanca. O espaço é concreto e imediato, mas, é também geral. Por exemplo,

o buraco na camada de ozono, embora seja uma ameaça relativamente

abstracta e não directamente localizável, constitui uma federação de oposições

e de rejeições. Neste contexto, o território mundial estrutura-se segundo um

pensamento e as acções têm uma ordem universal: o nuclear, os oceanos.

Em termos regionais, o espaço é o produto de um campo de forças caracterizado,

segundo Van Geenhuizen e Ratti (1995), por três dimensões: a abertura, a

durabilidade e a capacidade criativa (cit. Ratti, 1997, p. 527). A abertura

significa comunicação entre as diferentes partes que compõem o sistema (região

ou cidade) e os centros-sistemas (capacidade de beneficiar de economias de escala

e de variedade). A durabilidade considera não só a capacidade ambiental de

garantir um desenvolvimento sustentável mas, também o seu conteúdo sócio-

cultural aqui assumido como um “constrangimento”. A capacidade criativa ou

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territorialidade171 representa a dimensão pela qual passa a capacidade do sistema

local de responder pelos objectivos, normas e comportamentos estratégicos, bem

como aos desafios internos e externos ao sistema.

O espaço regional activo, entendido como um campo de forças meso-económicas,

tem uma abordagem espacial consubstanciada em dois eixos: um vertical e um

horizontal. No eixo vertical, descrito por Raffestin (1986) em termos de

territorialidade (Ratti, 1997, p. 529), situam-se as tensões entre níveis espaciais

diferentes, isto é, entre o global e o local. No eixo horizontal situa-se o campo de

forças dos espaços funcionais das empresas, isto é, o espaço de produção e o de

mercado. Neste eixo inclui-se, ainda, uma terceira categoria de relações, ou seja,

espaços de apoio (ibid., p. 529). Este espaço de apoio, através de e para além do

sistema de preços, tem um papel de conexão entre espaços de produção e espaços

de mercado e caracteriza a trajectória de desenvolvimento de realidade sectorial

tal como a territorialidade permite a conexão entre o local e o global.

Das dependências mútuas entre a política, a economia, o espacial e o social nasce

uma organização territorial do desenvolvimento ou, por outras palavras, nasce um

território que vai sendo construído e reconstruído, vivido e representado, ou, se

quisermos, um espaço histórico, cuja existência fluiu no tempo e se foi moldando

em função da forma como as comunidades dele se foram apropriando e

manipulando (Vilaça et all, 1998, p. 35). O território resulta, assim, d’une

création de l’activité humaine: ce sont les hommes-agissants qui font le territoire

(Passet, 1995, p. 9). Polanyi, sublinha que é a pessoa humana, portadora de

valores, que está no centro do processo de criação do território e não o indivíduo

reduzido às dimensões de consumidor, força de trabalho ou centro de custos

(ibid., p. 9).

171 Em ciências sociais a territorialidade é um paradigma que exprime uma relação complexa e dinâmica entre um grupo humano e o ambiente, pelo que a territorialidade de um país/região é, então, uma construção, um produto sócio-cultural, económico e político ou um processo complexo através do qual uma sociedade cria a sua capacidade de resposta (interna e externa) à mudança.

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137

A introdução do território na análise conduz-nos a inventariar a pluralidade dos

sistemas locais de produção e a variedade das trajectórias de desenvolvimento. A

análise das diferentes formas de coordenação territorial das actividades permite

romper com uma longa tradição de modelos económicos, de tipo funcional, que

atribuem um papel determinante à presença de funções económicas privilegiadas e

de sectores avançados. A presença ou não deste tipo de funções permitiria definir

uma hierarquia de países e uma evolução, por estádios de desenvolvimento

obrigatório, para os países menos desenvolvidos.

Noutros termos, a análise dos territórios mostra que o desenvolvimento se

desenrola a partir de um sistema de inter-relações, de circulação de informação, de

produção e de reprodução de valores que caracterizam um modo de produção. Isto

significa que os factores críticos do desenvolvimento estão, historicamente,

enraizados na realidade social e local e não são facilmente transferíveis para

outros espaços: o desenvolvimento aparece, em definitivo, como um processo

social e não como um processo unicamente técnico. O território torna-se, assim,

um factor privilegiado do desenvolvimento na medida em que inclui todos estes

factores - históricos, culturais, sociais – que estão na base de modelos específicos

de organização da produção (os mundos reais da produção de Salais e Storper,

1993) e da contínua interacção entre a esfera económica e a esfera social.

A riqueza do conceito de território reside na sua inscrição em temporalidades

diferentes, isto é, no longo e no curto prazo. A concepção do território como uma

construção histórica (que) encontra o seu princípio unificador nas práticas

sociais de momento (Schapira, 1997) implica a apreensão das diversas

modalidades de construção: umas terão um caracter integrador, jogarão o papel de

cimento identificador e contribuirão para a sua edificação; outros, dada a sua

volatilidade, destabilizarão a construção e poderão diminuir o ritmo de

sedimentação dos processos sociais e institucionais. Inscrito no longo prazo, mas

também nas praticas sociais de momento, o território sendo diferente do espaço,

não é mais a pura e simples cópia modernizada do espaço dos anos 70 (Pailliart,

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1993, p. 150), mas o sinal de novas interrogações sobre a estruturação social do

espaço.

O território ao possuir uma dinâmica própria, não é mais um simples receptáculo

no qual os agentes económicos (empresas, fundamentalmente) extraem os

recursos. Além disso, é sobre o território que as mutações na esfera do trabalho

ganham um certa visibilidade. De tudo isto resulta a impossibilidade de concebê-

lo, apenas, como dotação de factores, pelo contrário tem uma lógica própria e a

capacidade de não só produzir mas, também, se apropriar de externalidades

positivas e de as potenciar levando-nos a conceber o território como um agente

socialmente inovador.

Do atrás exposto, concluiu-se que os territórios são evolutivos, isto é, têm uma

história que testemunha uma sucessão de fases e de novas situações às quais se

têm de adaptar. A noção de território reflecte esta dinâmica, pelo que este,

segundo Kherdjemil (1999), vai sendo apreendido como uma expressão de

identidade de um grupo (Le Berre, 1992), um espaço fluído, consolidado ou

disperso (Fremont, 1976) um elemento activo do desenvolvimento a nível local

ou, ainda, um espaço de relações. Assim, se na primeira noção se realça o acto de

nascimento do território, assente numa dinâmica conflituosa de apropriação do

espaço, na segunda destaca-se a tipologia do território segundo a qual o espaço

económico172 evolui para um espaço que resulta da dinâmica funcional dos

sistemas produtivos. Na terceira noção de território, apela-se ao desenvolvimento

que pressupõe o seu ordenamento e a actuação de vários actores entre os quais o

próprio território, na última destaca-se o papel importante que as relações

estabelecidas entre os vários actores têm no desenvolvimento regional e local e na

própria estruturação e dinâmica dos territórios.

O território, considerado como o espaço onde se desenrolam as relações, está

associado a uma imagem vivida e interiorizada no subconsciente humano. É o

território do instinto ligado a valores pessoais com facetas tão numerosas, variadas

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139

e multiformes em virtude dos comportamentos se diferenciarem em função da

idade, do sexo ou da situação social. O território, escreve Fremont (1976, p. 91),

não pode ser compreendido na sua plenitude se não juntarmos às contribuições

anteriores este último cimento que são as relações vividas, isto é, assimiladas no

mais profundo da intimidade psicológica de cada um.

Os aspectos estruturados e estruturantes do território são, igualmente, assinalados

por Lacour (1996, p. 35) ao afirmar que um território é um espaço que, num dado

momento, por certas razões, por certo período, pode realizar uma intermediação

múltipla “global” entre múltiplas trajectórias possíveis sob o efeito de actores

variados e variáveis, logo no território tem lugar a objectivação dos

comportamentos e dos processo dos actores (ibid., pp. 34-35). Esta definição dá-

nos uma grelha de leitura da dinâmica de estruturação espacial ao indicar pontos

de referência sobre o modo como as especificidades do território se articulam

com a dinâmica espacial de conjunto. Além disso, esta definição ajudar

igualmente a compreender a articulação entre o global e o local visto descodificar,

parcialmente, as motivações das acções empreendidas pelos actores do

desenvolvimento.

Na evolução dos sistemas territoriais não há nada de linear nem de progressivo:

estes são marcados pela descontinuidade da crise, da contradição e da incerteza.

Lacour (1996) utiliza a expressão tectónica dos territórios173 para descrever este

processo de construção de um território.

Os diferentes comportamentos dos vários agentes gera concorrência pela

ocupação do espaço-território” nas zonas onde a posição económica é mais

favorável. As primeiras preocupações teóricas em relação à formação de uma

estrutura de utilizações do espaço encontram-se na obra de von Thünen (1826) na

qual se viriam a inspirar várias gerações de autores entre os quais destacamos

172 O espaço económico é entendido como o local onde o homem se estabelece em função de oportunidades económicas. 173 A tectónica é a parte da geologia que estuda as deformações da crosta terrestre devido às forças internas que sobre ela se exerceram in Dicionário Enciclopédico da Língua Portuguesa (1992), Publicações Alfa, Vol. II, p. 1145

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140

Lösch (1940) e Dun (1951). No final do século XIX, Marshall contribui para a

base de uma teoria de utilização dos solos urbanos174. Já no século XX, os

modelos mais interessantes175 são os de Wingo (1961), Alonso (1964), de Lowry

(1964), que iremos analisar, e o de Muth (1969).

Nos modelos globais de utilização do espaço atrás enunciados, a variável central é

a renda fundiária pelo que qualquer utilização dos solos176 conduzirá a resultados

idênticos. Huriot (1978) reforça esta opinião e cita um modelo simplificado de

três tipos de utilizadores, elaborado por Alonso (1964), cujo resultado mostra

claramente a hierarquização das actividades económicas em função da renda

fundiária. Assim, e segundo o modelo, o centro é ocupado pelas empresas de

serviços visto pagarem uma renda fundiária mais elevada pela utilização do solo.

À volta do centro formam-se dois anéis concêntricos: o primeiro é reservado às

residências visto proporcionarem uma renda intermédia e o segundo destina-se às

empresas agrícolas uma vez que estas estão ligadas à menor renda fundiária.

Este tipo de modelos tem, contudo, várias insuficiências. A primeira, segundo

Strawczinski (1971), deriva do modelo ser elaborado a partir da combinação de

sub-modelos177, em que cada um trata de um caso particular levando a utilizações

174 Nos últimos anos têm-se vindo a desenvolver várias pesquisas sobre a utilização residencial do espaço urbano. As reflexões da maior parte dos autores neoclássicos contemporâneos deram origem a transposições, mais ou menos elaboradas, das teorias de utilização agrícola dos solos para o estudo da estrutura de utilizações urbanas. 175 Estes modelos de utilização dos solos pressupõem que: 1) espaço físico é sempre percepcionado como uma plataforma uniforme no que diz respeito à sua topografia e fertilidade, sem limites precisos, onde se encontra um centro de mercado ou, de um modo mais genérico, um único centro de atracção; 2) o espaço considerado deve ser alocado aos utilizadores; 3 ) o espaço é apropriado e existe um mercado fundiário (mercado de utilização do espaço) que possui, de um modo geral, as características de um mercado livre. 176 Por exemplo, na utilização dos solos para a construção de habitação o ponto de equilíbrio caracteriza-se por uma repartição da renda dos solos e densidade de utilização regularmente decrescente em função da distância ao centro 177 Quando nos preocupamos com a utilização do espaço para o produtor agrícola, o centro adquire um papel de um lugar de concentração da procura: é lá que este pode vender toda a sua produção; o centro torna-se um lugar de concentração da oferta de trabalho o que pressupõe a residência dos potenciais agentes da oferta no centro; para a as empresas do sector comercial, o centro é um lugar de concentração da procura; para os residentes, trabalhadores e procura de bens e serviços, o

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141

do espaço contraditórias entre si que nem a polarização à volta de um centro

consegue mitigar. A segunda insuficiência advém da determinação de um

equilíbrio puramente estático, formado a partir da existência de um centro à priori

e de um espaço não utilizado. Ora na realidade, o problema de utilização do

espaço coloca-se em termos de transformação das ocupações já existentes

possuidoras de uma carga história importante como sublinha Castells (1981) ao

escrever, toute forme de la matière a une histoire ou mieux encore, elle est son

histoire (cit. Thierau, 1993, p. 269). Por último, os modelos neoclássicos são

modelos de procura de espaço. Efectivamente, enquanto os motivos económicos

para a sua procura são analisados detalhadamente negligencia-se a definição de

uma função de oferta de espaço que tenha em consideração a estrutura existente

das utilizações e os obstáculos à passagem de uma utilização para outra. Na

realidade, as transformações na utilização do espaço são lentas devido à existência

de estruturas com custos elevados e uma vida relativamente longa tornando,

assim, a mobilidade dispendiosa e ineficiente quando esta se verifica antes da

obsolescência técnica ou económica das estruturas construídas.

A utilização do espaço físico, iniciando-se com os impulsos de crescimento,

resulta da combinação da procura de bens e serviços, de factores espaciais e das

funções de produção (ver fluxograma 3.4). O modelo apresentado destaca as

relações fundamentais privilegiadas (posição económica das zonas, raridade do

espaço em cada zona e rigidez na ocupação do espaço) que, em termos dinâmicos,

geram o equilíbrio na utilização do espaço a par de uma determinada estrutura. A

formalização do modelo178 é efectuada com a ajuda de um programa matemático

que integra comportamentos de optimização de curto prazo limitados pela inércia

natural da ocupação dos espaços existentes.

A articulação diferenciada, no tempo e espaço, da procura de bens e serviços,

factores espaciais e funções de produção, resulta no desenvolvimento sócio-

económico territorialmente desequilibrado ou, por palavras de Perroux (1955), la

centro é um lugar de concentração da oferta de bens e serviços bem como um lugar de concentração da procura de trabalho.

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croissance n’apparait partout à la fois, elle se manifeste en des points, ou pôles

de croissance, avec des intensités variables et avec des effects terminaux

variables pour l’emsenble de l’economie (cit. por Alves (1996, p. 22). No entanto,

a intervenção dos agentes económicos e da Administração Pública pode atenuar os

desequilíbrios (ou agravá-los), por um lado, facilitando e promovendo a

mobilidade dos recursos naturais e humanos e, por outro lado, utilizando as novas

tecnologias ambientalmente mais puras. Neste contexto, o planeamento179 sócio-

económico, e de um modo particular, o planeamento do território (sub avaliado

nas décadas de 70 e 80) começa de novo a ocupar um lugar de destaque permitida

pela a revalorização dos aspectos espaciais no desenvolvimento sustentável. A

nível nacional, a elaboração e implementação dos Planos Regionais de

Desenvolvimento – PDR -, embora com algumas deficiências, insere-se nesta

lógica.

Fluxograma 3.4 Modelo de utilização do espaço físico

Fonte: Huriot, J. M., (1978), “Utilization de l’espace et dynamique économique” in Revue

d’Economie Régionale et Urbaine, nº 1, p. 141

178 Ver Huriot, J. M., (1978), “Utilization de l’espace et dynamique économique” in Revue d’Economie Régionale et Urbaine, nº 1, pp. 119-148 179 Este planeamento, como já vimos anteriormente, é concebido não como um processo de elaboração de um documento tecnicamente perfeito e rígido mas, de um plano deslizante que permite adaptações em função dos resultados que se vão obtendo com a sua implementação ou porque, condicionalismos externos, alteraram profundamente as condições inicias.

Impulsos de crescimento: - crescimento demográfico - progresso científico e tecnológico - progresso sócio-cultural - situação internacional

Factores espaciais: - posição económica - preço de utilização do espaço

Procura de bens e serviços: - produtos alimentares - bens industriais - habitação - serviços

Funções de produção: - processos de produção - bens produzidos - custos de produção

Procura de espaço económico (rendimento das actividades): - agricultura - indústria - construção de habitação - equipamentos colectivos

Procura de espaço físico: - superfícies - localizações

Oferta de espaço físico: - superfícies das zonas - rigidez de ocupação Estrutura de utilização do

espaço físico

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143

O planeamento do território diz-se regional ou urbano porque o seu objecto é a

região ou a cidade, mas tal não implica que os aspectos físicos, supostamente

relacionados exclusivamente com o espaço, tenham à priori qualquer primazia. O

conteúdo específico do planeamento em cada caso dependerá das condições

concretas do espaço a planear e terá como objectivo principal a melhoria dos

níveis de bem-estar das populações residentes ou, por outras palavras, o

desenvolvimento social e económico. Aliás, partilhamos a ideia de Massey

(1984) segundo a qual não existem processos puramente espaciais ou sociais não-

espaciais pelo que a dicotomia social/espacial nos parece impossível de sustentar.

O facto de os processos sociais - escreve Massey - ocorrerem no espaço, os factos

da distância ou da proximidade, da variação geográfica entre áreas, do carácter

e significado individuais de regiões e lugares específicos – tudo isto é essencial à

operação dos processos sociais. Tal como não há processos puramente espaciais,

também não há processos sociais não-espaciais (op. cit., 1984, pp. 52-53). O

planeamento do território reflecte esta especificidade do processo de

desenvolvimento social e económico sustentável, ou por outras palavras, o

planeamento reflecte uma situação inquestionável: território e sociedade são

indissociáveis.

SECÇÃO II – PLANEAMENTO DO TERRITÓRIO

3.3. O planeamento do território

3.3.1. Os modelos de ocupação do território

A ocupação do território não se verifica uniformemente em todo o espaço

habitado pelo homem pelo que os modelos de ocupação do território são variados

e tendem a projectar a dinâmica de procura de espaço das actividades com maior

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144

impacto no desenvolvimento, bem como o seu padrão de utilização do solo. A

procura de espaço para alojamento e lazer é, em condições idênticas às anteriores,

parte integrante dos modelos de ocupação de território. Mas vejamos, mais em

pormenor, o padrão de utilização destes elementos. As actividades industriais

características da primeira e segunda revoluções, mostraram-se fortes

consumidoras de espaço, quer pela extensão das actividades, quer pela função de

armazenagem de matérias primas, bens intermédios e produtos acabados.

Actualmente, uma situação idêntica é protagonizada pelas actividades ligadas à

logística da distribuição uma vez que, necessitando de grandes espaços, tendem a

concentrar-se nas periferias mais próximas dos grandes mercados consumidores.

A implantação das actividades económicas e consequente concentração da

população conduz à instalação de redes e sistemas de suporte (por exemplo,

transportes, telecomunicações, energia, abastecimento de água, tratamento de

resíduos e de efluentes). A concentração da procura/oferta de alojamento e

condições de lazer nos grandes centros urbanos foi a resposta encontrada para

satisfazer os requisitos claramente objectivos de mobilização, utilização e

reprodução da mão-de-obra, na maioria dos casos, deslocada dos seus locais de

origem.

Na década de 70, a nova distribuição das actividades económicas no espaço, quer

pelas características quer pela dimensão, dá lugar a novas formas de organização

da produção em que o território emerge com um papel activo. A abordagem

territorial, pressupondo a análise das diferentes formas de coordenação territorial

das actividades, rompe com a longa tradição de modelos económicos de tipo

funcional que atribuem um papel determinante à presença de funções económicas

privilegiadas e de sectores avançados que, em conjunto, definem uma hierarquia

de países e uma trajectória de evolução obrigatória para os países menos

desenvolvidos.

O território torna-se, então, num factor privilegiado de desenvolvimento na

medida em que inclui os factores históricos, culturais e sociais nos quais se

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baseiam os modelos específicos de organização da produção ou, como diz Salais e

Storper (1993), os mundos reais da produção e a contínua interacção entre a

esfera económica e a esfera social. A análise dos territórios mostra, como já

vimos, que o desenvolvimento se desenrola a partir de um sistema de inter-

relações, de circulação de informação, de produção e de reprodução de valores

que caracterizam um modo de produção.

No centro desta nova abordagem sobre o papel do território no desenvolvimento

estão as análises dos distritos industriais, dos sistemas produtivos locais e do meio

inovador desenvolvidos a partir de experiências como, por exemplo, a Terceira

Itália, o Jura suíço ou o Sillicon Valley. A análise da industrialização difusa e a

sua sistematização, sob a forma de distrito industrial, tem origem na Itália

(Bagnasco, 1977; Brusco, 1982; Garofoli, 1981, 1983; Fuà e Zacchia, 1985) em

que o Norte industrializado das grandes empresas se opõe ao Sul sub-

industrializado e agrícola, emergindo no Centro e Norte-Este uma realidade mais

complexa caracterizada pela presença difusa de pequenas empresas exportadoras

especializadas em determinado ramo da indústria. O sucesso do distrito industrial

reside nas economias de aglomeração, fortemente ancoradas no território e de

reduzida irreversibilidade dado estarem profundamente ligadas às estruturas

históricas e sociais dos distritos.

A segunda forma de organização da produção, numa perspectiva territorial, está

ligada ao conceito de sistema produtivo local que, em cerca de década e meia,

conheceu uma rápida evolução. Assim, enquanto Wilkinson (1983) introduz a

noção de sistema produtivo180, Garofoli (1984) classifica o sistema produtivo de

local de forma a reflectir a profunda simbiose entre os fenómenos económicos e

sócio-culturais. A consideração da influência de regulações locais no sistema

produtivo dará origem ao sistema produtivo localizado (Raveyre e Saglio, 1984;

Courlet e Pecqueur, 1991; Ganne, 1992; Courlet e Soulage, 1994). O conceito de

sistema produtivo local traduz fenómenos originais de desenvolvimento

180 O sistema produtivo é constituído pela força de trabalho, meios de produção e métodos de organização da produção, estrutura da propriedade, controlo da actividade produtiva e contexto sócio-político no qual se verifica o processo de produção.

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localizado e que se verificam em economias desenvolvidas e em

desenvolvimento. Assim, qualquer modelo de organização da produção baseado

na presença de economias externas e de conhecimento não transferíveis e na

introdução de formas específicas de regulação que identificam e salvaguardam a

originalidade da trajectória de desenvolvimento (Courlet, 1999, p. 537) pode

ser considerado um sistema produtivo local.

Por último, analisemos o meio inovador, isto é, um ambiente tecnológico e de

mercado que integra e endogeniza o saber fazer, as regras, as normas e valores e o

capital relacional. O meio inovador é um colectivo de actores com recursos

humanos e materiais (Aydalot, 1986; Maillat e Senn, 1993; Maillat, 1994;

Camagni, 1995; Sabel, 1996; Braczyk, Cook e Heidenreich, 1998; Cook e

Morgan, 1998) e está ligado a um sistema de produção localizado que

compreende as empresas, os custos de investigação e de formação, instituições de

financiamento, associações sócio-profissionais e, ainda, órgãos de Administração

Pública com autonomia para formular as suas escolhas estratégicas (ibid., p.

536). A existência de um meio inovador181 estimula a confiança e a convergência

de pontos de vista levando as empresas a ultrapassar as barreiras habituais da

concorrência para discutir os problemas tecnológicos comuns, trocar experiências

e, eventualmente, procurar soluções comuns.

A abordagem do desenvolvimento reorientada no sentido da valorização do

território tem a ver, de certa forma, com o esgotamento do paradigma fordista de

produção. Nestas circunstâncias, o aparelho produtivo ou reage de forma

acomodativa reflectindo a perda de posições competitivas a prazo e declínio das

181 Bramanti (1999, p. 634), centrando-se no conceito de território, sistematiza as abordagens ao meio inovador da seguinte forma: 1) como lugar de nascimento de tecnologia e inovação, isto é, o progresso advém de um processo de alocação de recursos existentes que, num processo de construção colectiva, se transformam em recursos específicos (Gaffard, 1990); 2) como lugar de coordenação das actividades industriais, isto é, de ligação entre as economias externas territoriais as trajectórias organizacionais e inter-organizacionais das empresas (Veltz, 1993); 3) decisão política de localização, capaz de criar e redistribuir recursos ... (Storper e Harrison,

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147

actividades ou, pelo contrário, tem reacções de ajustamento activo, isto é, produz

novos factores de competitividade. A acomodação ou o ajustamento activo têm

consequências ao nível do espaço e da consolidação das estruturas sectoriais de

actividade, que se traduzem no reforço de posições de hierarquia das cidades ou

de deslocalização de investimentos e actividades com a consequente perda

progressiva de prestígio e capacidade de influenciar as decisões locativas.

Este quadro de evolução conduz-nos a duas noções que ajudarão a explicar o ciclo

de vida dos territórios, ou seja, as noções de ciclo de produto e nova economia de

produção. A noção de ciclo de produto182 nasce ligada aos desenvolvimentos

teóricos do comércio internacional assumindo a ruptura com os postulados

clássicos da localização das empresas e das actividades183. Segundo Vernon

(1979), as estratégias locativas das grandes empresas transnacionais são função de

custos espacialmente diferenciados da produção, os quais são formados a partir

das diferentes dotações de recursos de localizações alternativas. Assim, nas

diferentes fases do ciclo de vida de um dado produto, o óptimo da produção

ocorre em espaços que oferecem a dotação de factores minimizadores dos custos

pelo que a capacidade de proporcionar os factores estratégicos de localização

determinaria o potencial de atractividade dos diferentes espaços alternativos.

Esta abordagem, que valoriza particularmente a capacidade de regeneração dos

factores de competitividade, é interessante para a dinâmica de renovação das

regiões ou das grandes cidades. Perante esta dinâmica a dotação de recursos

económicos por parte dos territórios, na área dos factores de excelência (ensino

superior, centros de investigação, oferta de serviços estratégicos), permite-lhes a

reconfiguração de vantagens competitivas num contexto de concorrência aberta e

de globalização da economia.

1991); 4) como lugar gerador de formas de interdependência ... (Storper, 1995; Cook e Morgan, 1998). 182 Ver Vernon, R., (1979), “O comércio e o investimento internacionais no ciclo do produto” in Teorias do Comércio Internacional, Série I, CEDEP, vol. 9, pp. 51-71, ISE, Lisboa 183 A localização de empresas e actividades, como já vimos no segundo capítulo, seria determinada em função dos custos de produção e de transporte.

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148

A nova economia de produção (Veltz, 1991) valoriza, sobretudo, os aspectos

relacionados com a transformação qualitativa da procura de factores de

localização associada à mudança dos sistemas produtivos. A evolução das

tecnologias de informação e, em particular, a utilização das mesmas pelos

sistemas de produção e de distribuição contribuem fortemente para o

aparecimento de novas formas de estruturação de actividades internas nas

empresas e introduzem novos critérios na procura de factores de localização que

tendem a valorizar os factores de excelência.

Ainda, segundo Veltz (op. cit.), a dinâmica de integração das diferentes

componentes produtivas, a qual se tem constituído num complexo processo de

base técnica, tende a transversalizar e a horizontalizar as organizações,

sistematizando os ciclos produtivos da concepção à distribuição. Esta nova

filosofia tem na sua base uma lógica de estruturação em rede interna (através dos

seus departamentos/secções ou estabelecimentos) e externa (no quadro de

relações de parceria ou de subcontratação). Do ponto de vista das estratégias

espaciais, observa-se a tendência para a concentração nas capitais ou grandes

cidades das funções que asseguram a coesão do modelo, libertando para a

periferia, em primeiro lugar, as funções técnicas de fabrico. Neste quadro

conceptual, isto é, na perspectiva funcionalista o território é um espaço passivo

que não é, por si próprio, produtor de uma dinâmica, mas somente o lugar de

localização das actividades económicas. Neste caso, não se procura tanto tirar o

melhor partido do espaço em si, mas pesquisar a melhor distribuição possível das

pessoas e das actividades num dado espaço (Pecqueur, 1987, p. 28).

A redução do ciclo de vida dos produtos devido à difusão acelerada de práticas de

automação flexível no sentido de, por um lado, reforçar a capacidade de resposta

ao mercado e, por outro lado, reduzir o hiato entre o momento de concepção e o

de fabrico tem como consequência espacial a perda de importância das condições

de acessibilidade184 em favor de factores de diferenciação específicos.

184 Aliás, as condições de acessibilidade têm tendência a homogeneizar-se em função da difusão de redes de transporte, energia e telecomunicações.

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149

Paralelamente assiste-se à transformação das estruturas de trabalho cuja

característica mais visível é a expansão do terciário industrial185 que, necessitando

de recursos humanos com qualificações médias e superiores, origina a

dinamização de mercados de trabalho de quadros especializados e profissões de

enquadramento.

Uma evolução do tipo atrás descrito tende a reforçar as vantagens locativas dos

centros urbanos de média e grande dimensão dada a importância dos mercados de

trabalho qualificado, da presença de serviços estratégicos e de factores de

inovação tecnológica nas novas estratégias de localização (Veltz, 1991, p. 679).

Este padrão territorial remete-nos para uma relativa desintegração regional já que

tendo em vista a forte polarização em torno das áreas urbanas, ligadas pelo efeito

rede, ao assegurar níveis elevados de integração e desenvolvimento no seio das

próprias redes promove a formação de “autênticos desertos” nos territórios que se

situam fora destas redes polarizadas. Por outras palavras, as assimetrias inter e

intra-regionais longe de se esbaterem são, pelo contrário, agravadas devido à forte

integração e desenvolvimento dos territórios pertencentes às redes e à estagnação

ou, mesmo, aceleração do declínio das restantes áreas.

Tal como os produtos e as empresas também as regiões e cidades têm um ciclo de

vida. Estas nascem a partir de um conjunto de actividades (formas de ocupação

humana) que se concentram num determinado território; estas actividades

crescem e geram necessidades de segurança, de infra-estruturas básicas, de

equipamentos de apoio, etc., cuja satisfação supõe uma lógica de organização

espacial, de urbanismo e de planeamento (Neves, 1996, pp. 14-15). Ora, o

sucesso ou insucesso desta evolução impõe o comportamento do ciclo de vida das

cidades e, de um modo mais geral, das regiões, o qual é acelerado à medida que a

difusão da informação entre os diferentes territórios e a envolvente económica

mundial incentiva a mobilidade dos capitais e recursos humanos.

185 O terciário industrial tem a ver com as fases a montante (concepção de produtos, marketing) e a jusante (distribuição e comercialização) do ciclo de produção propriamente dito.

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150

O ciclo do território decompõe-se em cinco fases, nomeadamente: infância,

crescimento, controlo, maturidade e crise (Forn, 1989, p.31). Em cada uma destas

fases é possível identificar as necessidades progressivas de adaptação do

planeamento e de intervenção dos responsáveis daí que, sob o ponto de vista, das

prioridades e níveis de intervenção do planeamento se observe uma evolução com

as seguintes características:

1. no início com a infância, o binómio actividades/recursos tem um papel

determinante e o cenário físico (o local) deve adaptar-se-lhe;

2. durante a fase de crescimento, o teste à capacidade do território em suportar a

concentração das actividades e recursos tende a dar a primazia ao planeamento

urbano, às infra-estruturas e equipamentos com o objectivo de assegurar níveis de

crescimento compatíveis com a dimensão e características do território;

3. a fase de controlo pressupõe o alcance de uma plataforma de estabilização em

que os mecanismos de gestão do território (planos de desenvolvimento regional,

planos directores municipais, planos de urbanização, etc.) regulam as formas de

uso e apropriação do solo pelos agentes públicos e privados;

4. na fase de maturidade assiste-se a uma certa inércia sem subordinação visível

entre o binómio actividades/recursos e o bloco território;

5. com a emergência dos factores de crise, ocorre uma ruptura nos equilíbrios

levando a que os blocos actividades/recursos e território (valorizando a sua

especificidade e individualidade) sejam reavaliados e se procure o

desenvolvimento de novas actividades produtivas e de serviços que permitam

iniciar um novo ciclo.

Na evolução cíclica dos territórios, e em particular das cidades, o diálogo entre as

actividades económico-sociais e o planeamento é permanente. Aliás, esta

estratégia foi seguida pela maioria das grandes cidades europeias que tiveram um

processo de crescimento centrado no dinamismo das actividades produtivas de

base industrial. Estas no seu processo de expansão geraram correntes migratórias,

alargaram as áreas urbanas e configuraram aglomerações metropolitanas com

lógicas produtivas, de ocupação humana e de organização espacial específicas

num processo que conduziu à criação de uma imagem própria e poder de atracção.

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151

Como refere Forn (1989, p. 31) a duração do ciclo (do território) é variável,

dependendo de diversos factores: um, geral, ligado às transformações dos modos

de produção; outros, particulares, ligados à evolução de cada formação

económico-social em particular, por um lado, e, por outro, aos factores

envolventes (formação dos estados nacionais, redistribuição de praças

financeiras, emigração maciça ligada à crise da agricultura). Estes elementos,

além da contextualização do seu desempenho, pressupõem a análise do

dinamismo e da capacidade de adaptação dos diferentes actores cujas estratégias

empresariais ou de acesso à habitação, ao emprego ou a diferentes serviços se

projectam no território. É também um pressuposto a análise da emergência e do

desenvolvimento de situações de crise que, sobretudo após o primeiro choque

petrolífero nos anos 70, têm atingido duramente o tecido económico e social de

vastas regiões/cidades do sistema urbano e mundial.

Na segunda metade da década de 80 emerge a questão metropolitana levando May

(1994, p. 3) a afirmar que se participe d’un retour, des regards sur la ville,

longtemps abandonnée au profit du local. Esta mudança de unidade territorial de

análise186 deve ser entendida não só como mais um sinal de renascimento da

dimensão urbana, mas também como uma mudança no sistema de actores e na

origem das formas de liderança. Efectivamente, vem ganhando consistência um

novo quadro de funcionamento económico das cidades (Sallez, 1993) determinado

pela transição do local para o global que correspondendo a transformações

técnicas e organizacionais da produção induzem a reformulação de estratégias das

grandes empresas, quer a nível interno, quer face ao mercado. A recomposição

espacial que favorece as regiões e as grandes cidades está associada, conforme

assinala May, à capacidade de oferecer às empresas vantagens decisivas187 na sua

localização. Paralelamente, as transformações técnicas e organizacionais da

186 Ver conferência de Nicole May no Colóquio Internacional, de Lille, “ Cities, Enterprises and Society at the XXIst century”, em Março de 1994 187 May (1994, p. 14) enumera cinco vantagens decisivas das metrópoles: a) presença de importantes equipamentos de formação superior e de investigação públicos e privados; b) fortes contingentes de mão-de-obra qualificada; c) importância e qualidade dos serviços prestados às empresas (nomeadamente de serviços “avançados”); d) oferta imobiliária variada e abundante; e) boas infra-estruturas de transporte e de comunicação (nomeadamente em matéria de ligações internacionais).

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152

produção ao levarem à divisão espacial dos investimentos e actividades originam

a consolidação de redes de cidades viabilizando a expansão e a melhoria das

actividades aí existentes através da fixação dos factores de atractividade para o

investimento, o emprego e a habitação, quer dos agentes internos, quer dos

externos, numa óptica de transferência intra-regional e a uma escala mais

reduzida, numa óptica de transferência intra-urbana.

Neste contexto de rápidas mudanças, os aspectos “físicos” do território perdem

importância no planeamento territorial uma vez que estes não podem ser

analisados separadamente da compreensão das relações entre o uso económico do

território e do uso dos solos e da espacialidade. Os circuitos económicos, a

acumulação de capital e a constituição dos interesses sectoriais são também, em

última análise, responsáveis pela transformação das estruturas territoriais. Assim,

sempre que se procura uma abordagem global e compreensiva do território

objecto de planeamento terá que existir um processo de diálogo dada a

impossibilidade de dissociar o “físico” do “económico” em planeamento

territorial (Henriques, 1990, p. 87), ou seja, a territorialidade e a funcionalidade,

ligadas e complementares uma da outra, estão em constante interacção. As forças

territoriais tiram as suas bases nas estruturas sociais construídas pela história de

um determinado espaço. Os laços funcionais estão marcados pelas relações de

interdependência (Greffe, 1984, p. 190).

3.2.3. Os níveis de planeamento territorial

3.2.3.1. O planeamento normativo e operacional

O planeamento, como já vimos, pretende regular e influenciar os processos sócio-

económicos gerados na sociedade ou, por outras palavras, o objectivo do

planeamento é prever a evolução da realidade económica e social orientando-a

para a realização de determinados objectivos. O processo de planeamento passa,

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153

naturalmente, por várias fases que vão desde a preparação dos programas de acção

até à avaliação de todo o processo e seus resultados, passando pelas etapas

intermédias da escolha e execução dos programas. Num sentido mais restrito, o

processo de planeamento define-se como a determinação dos objectivos e dos

meios para os atingir.

A definição de planeamento, em sentido lato, indica que este se desenvolve de

forma sistemática e iterativa, isto é, além do processo passar por várias fases

(como já vimos anteriormente), estas podem ser percorridas mais do que uma vez

e os resultados entretanto obtidos podem ser introduzidos como informação na

etapa seguinte. O processo de planeamento, que acabamos de descrever

sucintamente tem três níveis: normativo, estratégico e tácito ou operacional

(Reigado, 1999, p. 61).

O planeamento normativo, entendido como um processo dinâmico de cognição,

de aprendizagem e de troca de informação (ibid., p. 31), por um lado, implica a

concordância entre os valores e as normas padrão com as alterações verificadas no

sistema económico e social, e por outro lado, é a este nível de planeamento que se

decide qual a direcção a tomar pela sociedade como um todo e seus elementos

constituintes. A um nível intermédio, isto é, ao nível do planeamento estratégico

toma-se a decisão sobre quais os objectivos a alcançar. Refira-se que esta decisão

baseia-se nas preferências, funcionalidade e afectação óptima dos recursos

disponíveis. Por último, o planeamento táctico ou operacional é, essencialmente,

de curto prazo já que envolve a implementação das opções tomadas

anteriormente. Neste nível de planeamento a questão importante a definir

relaciona-se com o modo de implementar as estratégias de forma a atingir os

objectivos previamente fixados.

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154

Quadro 3.1 Níveis e questões fundamentais do planeamento

Normativo ⇒ Para onde queremos ir ? Estratégico ⇒ Com que meios ? Operacional ⇒ Como vamos actuar ?

Fonte: REIGADO, F. M., (1999), Desenvolvimento e Planeamento Regional: abordagem

sistémica, (no prelo), p. 61

O planeamento normativo advém da dificuldade em assegurar o equilíbrio geral

num ambiente de incerteza. A consideração das “incertezas endógenas”, isto é, o

reconhecimento dos planos dos diferentes agentes coloca alguns problemas uma

vez que se trata de recondicionar o sistema de informação mútua. Pelo contrário, a

tomada em consideração da incerteza em relação ao comportamento do meio, ou

seja, aquela que parte dos diferentes Estados do mundo, da intervenção das novas

tecnologias ou da descoberta de novas fontes de energia, entre outras, é bastante

mais complexa.

A incerteza, qualquer que seja a sua natureza, é um elemento que condiciona o

planificador e o único meio de atenuar os seus efeitos negativos passa pela

abertura de canais de informação fluídos e de uma selecção rigorosa da

informação relevante a ser trocada o que, conjuntamente, permitirá elevar o seu

nível de qualidade. A informação sobre o meio ambiente, o debate acerca da

hierarquia de valores e a coordenação e cooperação entre os diversos actores do

desenvolvimento económico-social contribuem para a diminuição da incerteza.

Daí que a informação continue a ser uma das chaves do bom funcionamento do

processo de planeamento. Pese embora o facto de a organização deste sistema de

informação implicar custos estes são, certamente, inferiores aos proveitos que

advêm da sua implementação.

Harrod (1973) fundamenta, igualmente, a importância do planeamento normativo

a partir do desvio entre o crescimento máximo possível da economia e a taxa de

crescimento efectiva. Assim, a partir do momento em que se verifica este desvio,

colocam-se problemas relacionados com o espaço necessário ao crescimento da

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155

produção empresarial e, mais complexo, com a instabilidade que advém da sub

utilização dos recursos. Torna-se, assim, importante para o bom funcionamento

dum sistema, onde o investimento tem um papel determinante, que os empresários

beneficiem de informação sobre as possibilidades reais da economia de tal forma

que as suas projecções sejam ajustadas à realidade. Nestas condições, as

projecções dos empresários serão idênticas às dos técnicos de planeamento

ganhando o sistema estabilidade e um nível mais elevado de desempenho. Esta

ideia encontra-se na base do planeamento francês através da noção de redutor das

incertezas. O autor, que lamenta a reduzida utilização desta abordagem, chega a

afirmar cette idée a obtenu autrefois quelque succès ... si lon en parle peu

aujourd’hui, cela tient selon moi à un déclin manifeste de la qualité de la

réflexion économique (Harrod, 1973, p. 119).

Não obstante reconhecer-se a importância do planeamento normativo é, com

alguma frequência, que lhe são colocadas algumas críticas entre as quais

destacamos a dos custos “elevados” que envolve a aquisição da informação

necessária ao planeamento, a qualidade e utilidade da mesma, bem como a

“imposição” pelo mercado deste nível de planeamento. Ora, esta desconfiança em

relação aos resultados do planeamento não é correcta. Na realidade, o planeador

não domina as fontes e não pode ser o único responsável pela qualidade da

informação.

É por todos conhecida a dificuldade em obter a informação desejada, quer porque

não está disponível (níveis diferentes de desagregação, não coincidência da

nomenclatura territorial utilizada, séries temporais interrompidas, etc.), quer

porque os organismos oficiais têm critérios diferentes na recolha e tratamento da

informação188. Esta situação conduz à necessidade de, muitas das vezes, se

recolher a informação primária junto das populações, empresas e organismos

públicos o que se, por um lado, melhora a qualidade da informação obtida, por

outro lado, conduz ao agravamento de custos. Contudo, dado a informação ser

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156

essencial para o planeamento atingir os seus objectivos (a melhoria do bem-estar

das populações), parece-nos que o seu custo financeiro é algo que teremos de

assumir. Aliás, em nosso entender, a questão dos custos deve ser colocada em

termos de uma relação custos financeiros com a implementação de um sistema de

informação eficiente e os benefícios sociais que este possibilita ao se introduzir

um factor de qualidade no processo de planeamento. Além disso, a redução da

incerteza nos processos de decisão proporcionada pela qualidade da informação

deve ser valorizada constituindo-se num proveito.

3.3.2.2. O planeamento estratégico: modelos e etapas

O conceito de planeamento estratégico tem origem no quadro teórico e

metodológico da gestão de empresas, sendo definido por Sorkin (1985, p. 1) como

um processo sistemático para gerir a mudança e criar o melhor futuro possível.

Trata-se de um processo criativo de identificação e acompanhamento das acções

mais importantes, tendo em atenção as forças e fraquezas, bem como as ameaças

e oportunidades. Este conceito, aplicado ao sector público, é definido por Arthur

Anderson & Co como um processo para gerir a mudança e para descobrir os

caminhos de futuro mais promissores para as cidades e as colectividades locais.

Este processo consiste em colocar no centro das atenções as fraquezas e as

oportunidades das cidades e das colectividades locais (cit. Padioleau, 1990, p.

159). Os primeiros elementos teóricos do planeamento estratégico das

organizações datam dos anos 60, num período de crescimento e de consolidação

das grandes empresas dos EUA. O aprofundamento desta teoria está ligado, por

um lado, à emergência e desenvolvimento da crise e, por outro à preocupação de

determinação de estratégias de gestão que melhor se adaptam a uma oferta

limitada de recursos, num cenário de rápidas e frequentes mudanças. A

apropriação dos referenciais e práticas do planeamento estratégico pelas

administrações central e local verifica-se na década de 80. Esta apropriação,

inscrita por Padioleau (ibid., p. 157) num movimento de racionalização da acção

188 A este respeito é já clássica, por exemplo, a diferença de valores entre o INE e o IEFP em

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157

pública urbana, corresponde ao reconhecimento de que a Administração Pública,

de um modo geral, poderia retirar vantagens da utilização de modelos gestionários

das grandes empresas para conduzir o seu território, bem como para escolher e

acompanhar os programas (projectos e acções de renovação da região, município

ou cidade189) que compõem essa acção pública.

A interpenetração crescente das economias, quer ao nível regional, quer ao nível

dos países, conduz a uma utilização mais intensa do planeamento estratégico

territorial sendo necessário, contudo, alterar o seu conteúdo e técnicas. O

planeamento estratégico abarcará assim um número limitado de decisões sobre

grandes sectores económicos e equilíbrios macroeconómicos que garantirão o

desenvolvimento do país/região e o pleno emprego dos recursos naturais e

humanos.

Em termos de modelos de planeamento estratégico territorial, destacam-se duas

grandes correntes de pensamento que deram origem ao modelo ortodoxo e ao

modelo interaccionista (Padioleau, 1990, p. 159). O grau de detalhe com que se

chega às escolhas estratégicas por parte dos actores e a importância atribuída à

função de implementação constituem os elementos fundamentais da distinção

entre os modelos de planeamento estratégico.

O modelo ortodoxo desenvolve-se a partir da metodologia de planeamento

estratégico concebida pela Harvard School e foi aplicado, pela primeira vez, em

1981 na cidade norte-americana de São Francisco. O planeamento estratégico,

funcionando como um ciclo (ver fluxograma 3.5), inicia-se com a análise da

envolvente e selecção dos problemas-chave e termina com o controlo e avaliação

da execução do plano. Entre estas etapas, e seguindo a ordem natural das mesmas,

teremos a formulação das missões, a análise interna e externa, a definição e

quantificação das metas, objectivos e estratégias a implementar, a elaboração do

plano de acção e, por último, a implementação do plano estratégico.

relação ao desemprego em Portugal.

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158

A este modelo além da crítica de que está “demasiado” ligado à sua matriz

fundadora (consultoria à gestão de empresas) fazem-se mais algumas,

nomeadamente:

• no plano de acção estão programados os recursos humanos e financeiros

necessários à implementação do plano o que denota a sua estreita ligação com

o ciclo orçamental da instituição;

• insuficiência dos mecanismos de produção de consensos na elaboração do

plano estratégico o que é agravado pelas características das instituições

públicas (conflitos de tutela, culturas de intervenção, estruturas de motivações

e objectivos pretendidos com a participação);

• ausência de referências à metodologia de escolha das estratégias

nomeadamente, por parte dos intervenientes, numa perspectiva de maximizar o

binómio potencialidades/oportunidades e de minimizar o par

debilidades/ameaças.

Fluxograma 3.5

Modelo ortodoxo de planeamento estratégico

Fonte: PADIOLEAU, J. G., (1990), “Un mouvement de rationalisation de l’action publique

urbaine: le planning stratégique” in Wachter, S. (org.), Politiques publiques et territoires, Logiques Sociales, Paris, p. 161 (Adaptação de Arthur Anderson & Co)

189 A primeira experiência em planeamento estratégico de cidades teve lugar, em 1981, em São Francisco. Um pouco mais tarde foram encetadas experiências idênticas em várias cidades europeias: Amesterdão, Birmingham, Barcelona e Lisboa.

Selecção dos

problemas-chave Formulação das missões

Organização da reflexão estratégica Radiografia da

envolvente

Controlo-avaliação

Implementação Plano de acção

Análise interna e externa

Metas, objectivos e estratégias

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159

A tentativa de correcção dos aspectos negativos do modelo ortodoxo conduz ao

surgimento do modelo interaccionista que é, segundo Padioleau (1990, p. 168),

tributário da influência das correntes da disciplina das políticas públicas, que

distingue entre a política poder (que anula os interesses e vontades pessoais a

favor do colectivo) e a política programa de acção (que desenvolve a relação

entre recursos e objectivos). Daí deriva a incorporação de elementos internos às

atribuições e competências das instituições públicas, ao seu próprio estatuto

jurídico-legal, à envolvente política (ciclos eleitorais, natureza do mandato) e aos

constrangimentos de dotação e execução orçamental.

O modelo iterativo de planeamento estratégico do território (ver fluxograma 3.6),

embora reproduza as principais características do modelo ortodoxo, tem, no

entanto, um conjunto de elementos que permitem a introdução das especificidades

já referidas para as instituições públicas, nomeadamente:

• mandatos (representação dos cidadãos por um determinado período de

tempo);

• missões e valores (delimitação das atribuições e competências dos órgãos de

gestão territorial e o sistema de interesses em presença);

• descrição da região no futuro (tradução dos resultados da discussão dos

problemas estratégicos que envolvem conflitos de interesses, diferenças entre

objectivos, meios de acção alternativos, etc.).

A apropriação destes elementos é operacionalizável com alguma facilidade

recorrendo ao conceito de sistema e, por extensão, aos contributos da análise

sistémica. A noção de sistema é aqui essencial uma vez que o planeamento das

organizações (operadores públicos do sector empresarial, regiões, cidades ou

sistemas190) tem como característica principal o envolvimento de unidades que

estruturam recursos de diversa ordem, desenvolvem a sua actividade em função de

objectivos previamente definidos e respondem a estímulos provenientes da

sociedade ou do mercado, consoante a natureza dos bens que produzem ou dos

serviços que prestam. A transformação destes sistemas, enquanto resposta à

190 Sistemas de transportes, rede de telecomunicações, rede de equipamentos escolares, etc.

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160

alteração da sua envolvente externa, implica a actuação sobre variáveis-chave do

seu desenvolvimento, isto é, sobre aquelas que podem viabilizar a mudança.

Fluxograma. 3.6

Modelo interaccionista de planeamento estratégico

Fonte: Extraído de Bryson & Einsweiller, 1988 (cit. Neves, 1996, p. 52)

A definição da estratégia de planeamento deve, segundo Bryson e Einsweiller

(1988), incluir um conjunto de características das quais destacamos: a) a recolha

selectiva de dados de acordo com as dimensões-chave da envolvente global da

organização ou território; b) o envolvimento dos principais actores do processo de

desenvolvimento; c) a concertação das expectativas e interesses dos agentes

envolvidos; d) a formulação de alternativas/opções para a evolução e respectiva

avaliação; e) a avaliação dos efeitos futuros das decisões e medidas adoptadas no

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161

presente; f) as decisões devem ser centradas nos pontos-chave; g) a boa

implementação das acções previstas.

O planeamento estratégico territorial é, assim, marcadamente interaccionista e

pressupõe a evolução para situações de concertação de interesses ou, como afirma

Padioleau (1990, p. 172) ... la planification stratégique interactionniste s’efforce

d’activer des solidarités d’intérêts ou de sentiments (valleurs, idéologies, etc.)

entre les partenaires de l’action publique.

Não obstante existirem, como vimos, várias abordagens ao planeamento

estratégico do território ainda está em aberto a questão do seu faseamento. A

explicação para esta situação passa, em nosso entender, pelas ópticas de

abordagem adoptadas: os autores que chegam ao planeamento estratégico vindos

das práticas e experiências de gestão e planeamento das organizações do sector

empresarial têm tendência para elaborarem modelos que configuram um ciclo

estratégico com vários pontos de passagem intermédios; os autores que estiveram

ligados à análise regional e planeamento territorial têm uma visão que privilegia

grandes blocos de estruturação da metodologia nos quais se integram as tarefas

que, por sua vez, concretizam os pontos intermédios.

Na primeira abordagem, a elaboração do plano estratégico inicia-se pelo acordo

de partida ou plan for planning passando, sucessivamente pelos mandatos,

missão, envolvente externa, questões estratégicas, estratégia e, finalmente, a

descrição da organização no futuro após o que estaremos em condições de

implementar as acções definidas e controlar os seus efeitos (Bryson e Einsweiller,

1988). A envolvente externa revela-se particularmente importante já que do

estudo aprofundado dos principais constrangimentos/tendências ao nível das

políticas públicas, dos aspectos económico-sociais e tecnológicos e, também, da

capacidade competitiva e de colaboração das outras organizações pode elaborar-se

um quadro geral de oportunidades e constrangimentos. Nesta envolvente há ainda

a considerar os recursos, a estratégia actual e o desempenho da própria

organização o que nos permite uma avaliação das forças e fraquezas. O

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162

cruzamento desta informação permite-nos elaborar uma matriz com os pares

oportunidades/ameaças e forças/fraquezas que conduzem ao levantamento das

questões estratégicas e à definição de estratégias a implementar tendo em

consideração as alternativas políticas e as dificuldades. Da discussão das várias

alternativas, em termos de estratégia, sairá a proposta principal, as acções e

programas de trabalho numa visão conjunta que nos dará a descrição da

organização ou do território no futuro, ou seja, teremos o plano estratégico

elaborado.

A segunda abordagem do planeamento estratégico, cujos autores estão mais

ligados à análise regional, baseia-se nas experiências dos projects

d’agglomération ou propjects de ville française (Courson, 1993, p. 49) e nas

contribuições, sobretudo, no que diz respeito aos componentes essenciais e etapas

do planeamento estratégico, de Sallez191 (1986). Neves (1996, p. 54), citando estes

dois autores, enumera as quatro componentes do planeamento estratégico a saber:

1. definição das escolhas estratégicas ou, por outras palavras, definição das

grandes linhas de desenvolvimento com coerência global entre si. Estas

devem, por um lado, motivar um consenso institucional alargado e, por outro

lado, possuir um horizonte de longo prazo192;

2. adaptação às tendências-chave de evolução que exige atenção em relação ás

consequências das mudanças, em termos de oportunidades e ameaças, mas

também ter presente as tendências do passado em termos de comportamentos

e práticas interiorizadas pelos agentes sociais e económicos193;

3. afectação de recursos escassos que se mostra muito importante já que as

escolhas estratégicas determinam, com frequência, a qualidade da afectação

191 Desde meados da década de 80 que Alain Sallez tem publicado um conjunto de trabalhos em que articula o funcionamento dos sistemas económicos com a organização dos territórios. Destaque-se, a este respeito, a coordenação da edição de Les villes lieux d’Europe para a DATAR em 1993. 192 Esta expressão é variável segundo a natureza e os objectivos pelo que pode ser de 5 anos para um plano da empresa, de 10 anos para um plano de pormenor de determinado local ou de 30 anos para um plano regional. 193 Um exemplo que se pode apontar é a tendência para a concentração de actividades em determinadas regiões ou cidades que a pouco e pouco foram criando uma imagem de tradição e de especialização (por exemplo: Vale do Ave - indústria têxtil, Marinha Grande - indústria vidreira, Leiria - plásticos e moldes, Covilhã - lanifícios).

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163

de recursos raros (espaciais, humanos e financeiros) por parte das cidades e,

num sentido mais lato, dos territórios;

4. definição de um sistema interno de informação, ou seja, definição dos

instrumentos de controlo que permitam o conhecimento das dinâmicas

internas das organizações urbanas e regionais, do seu passado e presente, bem

como o conhecimento de elementos prospectivos que contribuam para

antecipar e orientar as evoluções do território.

Independentemente do tipo de abordagem, o planeamento estratégico do território

é um processo com quatro etapas: a definição dos objectivos, a escolha de

programas estratégicos, a escolha de acções e as realizações e seu controlo

(Sallez, 1986, p. 301). Assim, a primeira etapa consiste na determinação do

objectivo principal tendo em consideração os constrangimentos exteriores, as

forças e debilidades das organizações e as suas motivações. Este objectivo

principal é, geralmente, decomposto em sub objectivos que, em conjunto, devem

contribuir para a programação estratégica194. Do ponto de vista da condução do

processo de planeamento, esta etapa desempenha um papel essencial, quer seja

pela identificação rigorosa da composição do sistema de actores a envolver na

fase das escolhas estratégicas, quer pela definição dos parâmetros a serem

respeitados no diagnóstico. Por outras palavras, nesta fase dos trabalhos de

planeamento estará definido o nosso modelo conceptual do território.

A escolha de programas estratégicos, enquanto segunda etapa do planeamento

estratégico (com características essencialmente técnicas), corresponde à procura

dos melhores instrumentos para atingir os objectivos já definidos. Perante o

objectivo principal, enquanto os diversos actores (privados, de intermediação de

interesses, responsáveis da Administração Central e Local), apresentam os vários

programas alternativos, os serviços encarregam-se de avaliar, no plano técnico e

financeiro, as propostas, o que leva a uma troca intensa de informação entre o

nível técnico e o nível político ou decisional. Apoiando-se no quadro de

194 Por exemplo, o objectivo de descongestionar os centros urbanos capitais de distrito pode desdobrar-se em objectivos de concentração urbana em centros secundários a 30 Km da capital de distrito e de reforço da rede de transportes.

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164

potencialidades/debilidades, traçado no diagnóstico e na análise dos factores

externos, desenvolve-se a reflexão estratégica sobre os programas alternativos que

permitirá desenhar uma matriz das probabilidades de ocorrência dos factores e da

intensidade dos impactos a estes associados.

A terceira etapa - escolha de acções - tem em vista a concretização dos programas

estratégicos que se estendem ao longo de vários anos tornando necessário

enunciar o conjunto de acções em que se desdobram os programas, bem como o

seu faseamento. No final desta etapa o plano, enquanto figura jurídica, estará

aprovado pelos órgãos consultivos e organismos políticos.

Por último, a implementação de um plano estratégico induz rupturas de

comportamento face aos hábitos existentes, pelo que se desenvolve uma

verdadeira estratégia interna para o realizar (ibid., p. 310). Geralmente, a fase de

realização do plano leva à criação de organismos responsáveis pela sua execução

dotados de meios, de competências e de atribuição de responsabilidades de forma

a possibilitar-lhes a execução ou a coordenação da mesma. A reorganização de

organismos já existentes é, também, prática frequente. A realização de tarefas de

avaliação de processo e de desempenho, embora sejam prática corrente no

planeamento empresarial, só recentemente são utilizadas no planeamento espacial

enquanto processo195 contínuo, deslizante, de correcções e ajustamentos

constantes (Reigado, 1999, p. 51). A introdução de uma etapa final de

comunicação dos resultados e sua aprovação, proposta pelos autores mais

próximos dos projet de ville, deverá contribuir para o reforço do envolvimento

nos projectos de desenvolvimento económico e social por parte das empresas,

instituições, associações e residentes.

195 Como já vimos, esta definição enquadra-se no conceito de planeamento em sentido lato. Em sentido restrito, o processo de planeamento é definido como a preparação sistemática de programas de acção. Neste sentido, a escolha, o desenvolvimento e a implementação das acções previstas no plano não são consideradas fases do plano.

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165

3.4. O PLANEAMENTO URBANO: MODELOS DE ANÁLISE ESPACIAL 3.4.1. Perspectiva histórica da cidade e seu planeamento A ocupação romana da Península Ibérica impulsionou a fundação de cidades e

fortaleceu o povoamento que, anteriormente, se limitava aos castros de

populações pastoris e algumas feitorias na costa. Nos finais do século III e

princípios do século IV iniciam-se as primeiras invasões bárbaras (Francos e

Alamanos) levando as cidades da Lusitânia a adoptar planos sistemáticos de

muralhas. No século VIII, perante a pressão dos muçulmanos, os godos retiram-se

para Norte. Por volta do século X, inicia-se a reconquista cristã da Península e,

consequentemente, de Portugal. O território conquistado, tornado deserto pela

morte, fuga e aprisionamento dos que nele habitavam, necessitava urgentemente

de ser repovoado, organizado e explorado pelo que os primeiros reis de Portugal

concederam terras a alguns moradores estrangeiros, aos cruzados e às Ordens

religiosas que atraíram colonos e fundaram povoações. A consolidação das

fronteiras do reino português irá permitir o desenvolvimento da produção

agrícola, da pesca e de algumas manufacturas. O aumento da actividade

económica, impulsionada pelos descobrimentos marítimos, leva ao crescimento

das cidades medievais e à sua expansão para fora das muralhas. A primeira

revolução industrial tornou possível o crescimento acelerado da indústria e da

população operária que ao concentrar-se nas grandes cinturas industriais viria a

deixar as suas marcas no ambiente urbano (carência habitacional, bairros de lata e

ilhas, marginalização e segregação de grupos sociais, etc.). Na segunda metade do

século XX, estes problemas agravaram-se, as principais zonas urbanas cresceram

de forma anárquica, assistiu-se à diminuição da qualidade de vida das populações

e à degradação ambiental. Esta evolução da cidade vem reforçar a necessidade de

planear o seu desenvolvimento e de a estruturar, isto é, ordenar o seu território.

O planeamento urbano é visto, inicialmente, como o meio de colectivamente

reajustar o processo de desenvolvimento espacial a novas formas de produção,

utilização e apropriação do espaço urbano (DGOTDU, 1996, p. 25). Choay e

Merlin (1988) definem o planeamento urbano como o conjunto de iniciativas ou

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166

de procedimentos jurídicos ou financeiros, que permitem às colectividades

públicas conhecer a evolução dos meios urbanos, definir as hipóteses de

ordenamento respeitando quer a dimensão, quer a natureza e localização dos

desenvolvimentos urbanos e dos espaços a proteger, antes de intervir na

concretização das opções retidas (cit. Antunes, 1998, p. 16). Para outros autores,

o planeamento urbano consiste no processo de gerir mudanças de forma a alcançar

objectivos particulares respeitantes ao sistema urbano. Segundo Small e Witherick

uma parte considerável do planeamento urbano diz respeito, sem qualquer dúvida,

à melhoria dos problemas urbanos herdados ou à melhoria das condições

existentes nas vilas e cidades (ibid., p. 16). O planeamento urbano centra-se na

organização morfológica das cidades e, num plano mais vasto, nas questões

urbanísticas ligadas ao crescimento industrial e dos serviços e à consequente

concentração urbana. O método e a teoria do planeamento têm as suas origens nas

ideias do iluminismo e no pensamento técnico e racional. Enquanto, a tradição

ilumunista de progresso e modernidade fundamentou a definição de objectivos de

planeamento e desenvolvimento dos ideais utópicos do séc. XIX196 (ver figura

3.1), o pensamento técnico-racional197 forneceu os instrumentos para a construção

de um processo de planeamento capaz de interpretar e justificar tomadas de

decisão e procedimentos considerados racionais.

O desenvolvimento industrial levou à definição de soluções englobantes da cidade

projectando-se no traçado rectilíneo das vias e edifícios que, se por um lado,

facilitavam as comunicações, por outro, tinham em vista uma rápida intervenção

das forças de segurança. Esta concepção do espaço urbano foi, pela primeira vez,

implementada na França por Haussmam vindo a espalhar-se por toda a Europa e

América.

196 Os utópicos socialistas (Fourier, Cabet, Owen ....) defendem a libertação e felicidade do homem pelo progresso científico, técnico e económico e estabelecem uma relação estreita entre a natureza e o habitat, propõem o ordenamento urbano, de modo a poder exercer a sua tríplice função: habitar, trabalhar, distrair. 197 Os engenheiros sanitaristas impuseram uma legislação urbanística que definia as exigências técnicas relativamente à construção de habitação e à implementação de infra-estruturas básicas.

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167

Figura 3.1 A cidade-jardim de Howard (1898)

Fonte: Gardens Cities of Tomorrow de Ebenezer Howard, (1988), citado em MEPAT/DGODTU,

(1996), Guia para a Elaboração de Planos Estratégicos de Cidades Médias, p. 25

No início do séc. XX, começa a emergir uma nova corrente denominada por uns

de “funcionalismo” (F. Choay), por outros de “progressista” e, por outros ainda de

“racionalista” (M. Ragon). A “Carta de Atenas”, aprovada em 1933, elaborada

por Le Corbusier é apontada como o expoente máximo desta corrente de

planeamento urbanístico que considerava as necessidades humanas (habitar,

trabalhar, cultivar o corpo e o espírito) como o núcleo central para a definição da

cidade. As duas Guerras Mundiais, a descoberta de novos materiais e as

alterações das concepções estéticas contribuíram para a aceitação de Le Corbusier.

O modelo racionalista (ver figura 3.2), expresso em planos físicos de

desenvolvimento ou blueprints, dominou até finais dos anos 60, altura em que

começou a ser criticado pelo seu excessivo determinismo e pouca flexibilidade,

pela incapacidade de atender à diversidade de valores de interesses (o económico

ganhava uma importância crescente) e, por último, por continuar a assumir o

processo racional como a única forma de planeamento (Heard, 1990). A política

urbana praticada era orientada sobretudo para a regulação física da expansão

urbana apoiada na capacidade de investimento público e no zonamento enquanto

critério do uso do solo e instrumento produtor da forma urbana (ver fluxograma

3.7).

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168

Figura 3.2 A cidade do pós-guerra nos anos 70

Fonte: Central Milton Keynes de Llewelyn-Davies & Partners, 1970, citado em MPEAT/DGODU

(1996) Guia para a Elaboração de Planos Estratégicos de Cidades Médias, p. 26

Na década de 70, a descentralização, os novos níveis de planeamento sectoriais e

espaciais e a crise financeira e fiscal do Estado alterou a prática do planeamento

urbano, o papel do técnico do planeamento e do seu produto. A crise do fordismo

e Estado-Previdência, com forte incidência nas transformações urbanas, foi, em

alguns casos tão profunda que as novas ideologias neoliberais chegaram a

questionar o próprio sentido e necessidade do planeamento (Thornley, 1991;

Simmie, 1993).

Fluxograma 3.7

Envolvente económica e política do planeamento urbano racionalista

Fonte: Domingues, A. (1996), "Política Urbana e competitividade" in Revista de Estudos

Urbanos e Regionais, n.º 23, Outubro, p. 32

Regulamentos . Planos; . Zonamento; . Licenciamento de obras; . Expropriações; . Etc

Estado-Previdência

Modelo espacial dominante

Explosão periférica da indústria em torno das cidades

Grande crescimento da população e das áreas urbanas; suburbanização

Crescente importância do Estado na regulação do uso do solo e nas políticas públicas de incidência urbana

Investimentos . Rede viária; . Água, saneamento; . Habitação; . Equipamentos públicos; . Sistemas de transporte; . Etc

Fordismo

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169

Ao nível do território urbano, esta crise caracterizou-se por um processo de

desindustrialização, internacionalização do sistema económico e terciarização.

Este intenso processo de desindustrialização levou, por um lado, a identificar a

crise urbana com a crise industrial com consequências ao nível social (anulação

dos postos de trabalho, quebra no ritmo de criação de emprego) e ao nível

territorial/urbano (intensificação da degradação ambiental) e, por outro lado, à

perda de uma boa parte dos efeitos de atractividade e à acumulação das tensões

sociais agravados pelo facto da terciarização da economia ocorrer num ambiente

de forte inflação dos solos urbanos mais centrais.

A internacionalização do sistema económico caracteriza-se pela progressiva

concentração urbana das funções económicas de carácter direccional e pelo

crescente desajustamento entre o quadro de incidência das políticas local e urbana

e a regulação internacional. Ao mesmo tempo que as instâncias reguladoras se

tornam "exteriores" ao quadro urbano/local assiste-se a um processo crescente de

"desterritorialização" da actividade económica o que, em conjunto, conduz a uma

forte polarização entre cidades que funcionam como portas, placas giratórias e

nós do relacionamento internacional e as que ficam limitadas à sua influência

regional e local. Nestas condições, dada a natureza reticular dos sistemas

logísticos, as cidades-nós surgem como verdadeiras placas giratórias de um

relacionamento internacional "intercidades".

Por último, a terciarização, leia-se, a expansão e diversificação das funções e

actividades de serviços inscreve-se no processo mais geral da divisão social e

técnica do trabalho. Numa leitura territorial, o processo de aglomeração espacial

que acompanha a terciarização (tendo uma tradução eminentemente urbano-

cêntrica) implica uma dinâmica de recentragem urbana que, consoante a

composição do perfil de serviços em que determinada cidade se especializa abarca

várias temáticas: económicas, culturais, logísticas, político-administrativas, etc. A

nova política urbana (ver quadro 3.2) assenta, assim, no planeamento estratégico

como modelo de concepção e operacionalização dessa política. Ao mesmo tempo

que se defende um maior pragmatismo e pluralismo dá-se maior atenção ao

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170

processo de implementação, à procura do consenso na tomada de decisão e ao

papel do planeamento como forma de aprendizagem e de cognição. Além disso, as

repercussões espaciais da prática do planeamento urbano, isto é, a sua incidência

regional começa a ser uma das preocupações principais dos agentes envolvidos no

esforço de organização do espaço urbano.

Quadro 3.2 Desafios da nova política urbana

Urbanismo Clássico Novo Urbanismo

- Previsão. - Continuidade de tendências. - Certeza.

- Instabilidade. - Mudança. - Incerteza, probabilidade. - Oportunidades. - Racionalidade limitada.

- Antecipação da transformação. - Validação "ex-ante".

- Cenários, hipóteses. - Validação. - Dimensão estratégica.

- Quadro legislativo claro. - Normas rígidas. - Critérios de equidade fundiária.

- Desregulação ± selectiva. - Incerteza, desadaptação do quadro legal. - Flexibilidade, adaptabilidade. - Abertura. - Instrumentos informais.

- Modelos normativos. - Estratégias normalizadas, pré-determinadas. - Tecnocracia. - Racionalidade. - Mentalidade dirigista. - Rigidez.

- Plano adaptativo segundo regras. - Planeamento negocial segundo regras. - Agentes directos de transformação. - Planeamento participativo. - Inovação. - Contratualização. - Carácter operativo.

- Planos em cascata (descendentes). - Geral. - Longo período.

- Projectos específicos. - Período definido, breve. - Partes da cidade. - Fragmentação.

- Regulação da expansão urbana. - Zonamento, regulação do uso do solo.

- Qualificação. - Reorganização. - Reestruturação. - Marketing urbano. - Competitividade; atractividade.

- Planeamento/execução. - Técnicos/políticos. - Público/privado. - Interesse público.

- Investigação-acção. - Responsabilização política e técnica. - Parceria: público e privado. - Gestão de conflitos e interesses.

Fonte: DOMINGUES, A. (1996), "Política Urbana e competitividade" in Sociedade e

Território, Revista de Estudos Urbanos e Regionais, nº 23, Outubro, p.37 Os desafios do novo urbanismo exigem um planeamento estratégico que,

mantendo-se actual, pressupõe a compreensão e actuação sobre as próprias

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171

condições sócio-económicas do desenvolvimento urbano e não apenas sobre as

suas consequências ou manifestações). O planeamento deve, então, contribuir para

a criação de condições de competitividade, de consumo e qualidade de vida, de

atracção de funções de decisão, de negociação e de mobilização ou, por outras

palavras, deve contribuir para a promoção do desenvolvimento orientando-se por

princípios de cultura de transformação urbana e de desenvolvimento sustentado

(DGOTDU, 1996, p. 27). O desenvolvimento sustentado do sistema urbano e o

seu ordenamento são questões a reflectir no planeamento pelo que, neste contexto,

os modelos de análise espacial ganham uma nova importância.

3.4.2. Os modelos gravitacionais

A abordagem gravitacional foi, durante quase 30 anos198, um dos instrumentos

mais utilizados na análise espacial quer como modelos de trocas inter-espaciais,

quer como medida de centralidade, quer para medir a influência relativa de uma

região sobre outra (Aydalot, 1985, p. 275). Estas múltiplas utilizações

conduziram à elaboração de um corpo teórico e ao seu aprofundamento. Schneider

(1959) é o primeiro a evidenciar-se pela sua tentativa de aprofundar o corpo

teórico dos modelos gravitacionais uma vez que, segundo o autor, o seu

desenvolvimento é bastante menor quando comparado com as aplicações práticas

existentes.

Em 1962, Tinbergen199 utiliza o modelo gravitacional como um modelo de trocas

inter-espaciais (Aydalot, 1985, p. 275). Na mesma linha, Linnemann (1966)

afirma que o modelo permite calcular o potencial do país vendedor como uma

medida da sua capacidade de oferta, o potencial do país comprador como

198 Este período decorre entre 1954 e 1981. 199 Tinbergen fez uma análise das trocas comerciais entre 18 países.

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172

avaliação da sua capacidade de aquisição e a distância como medida das

resistências às trocas200 (ibid., p. 275).

Wilson (1967; 1974) interpreta o modelo gravitacional de um modo probabílistico

ao contrário de Niedercorn e Becholdt (1969; 1974) que sugerem uma abordagem

maximizadora das utilidades. Refira-se que a abordagem de Wilson tem como

referência grandes agregados e realça a importância das distorções causadas pela

distância “psíquica”, pelas limitações à difusão da informação e outras

características da economia espacial.

Keeble (1981) utiliza o modelo como medida de centralidade: uma região será

tanto mais central quanto menor for a distância entre esta e os centros de grande

produção. O modelo permite, igualmente, medir a influência relativa exercida por

uma região sobre outra e avaliar as escalas de influências. A observação empírica

permite concluir que uma região com um rendimento elevado exerce uma

influência maior sobre outra região com menor rendimento, nunca acontecendo o

inverso.

Além disso, os modelos de tipo gravitacional (nos quais se incluem os modelos de

potencial), ao permitirem estimar os fluxos de bens, de serviços e da população,

utilizam-se frequentemente para o estudo da localização das empresas industriais

e de serviços, bem como de infra-estruturas e de equipamento colectivo. As

simulações de fluxos de tráfego rodo/ferroviário, as previsões do volume de

negócios num dado centro comercial, a atractividade das bacias de emprego e

consequente localização dos parques habitacionais são indicadores importantes

para o planeamento e ordenamento do território, em particular, visto fornecerem

indicações para a infra-estruturação dos territórios numa perspectiva de

conciliação do desenvolvimento económico e social com a preservação e gestão

cuidada do ambiente.

200 Traduzidos em custos de transporte, tempo, distanciamento psicológico fruto do afastamento.

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173

A Lei da Gravidade Universal, segundo a qual a força de atracção entre dois

corpos (Iij)201 é directamente proporcional às massas desses corpos e inversamente

proporcional ao quadrado da distância que os separa, aplicada à economia espacial

possibilita a elaboração do modelo gravitacional que consiste, por um lado, em

considerar a intensidade dos fluxos entre dois lugares e, por outro, substituir o

conceito de massa dos corpos por um indicador de dimensão dos lugares. Assim,

o modelo gravitacional permite estimar os fluxos de bens e serviços entre dois

lugares de dimensões diferentes. A sua expressão algébrica (Clemente, 1994, p.

88) será:

cij

bj

ai

D

TTKIij

.=

onde, Ti e Tj - Dimensão dos lugares i e j, respectivamente Dij - Distância entre os corpos i e j; K - Constante de gravitação202 a, b, c - Parâmetros exponenciais203 De acordo com a Teoria dos Lugares Centrais, os parâmetros devem assumir

valores diferentes em função do conjunto de bens e serviços considerados. Por

outro lado, como já referimos, a maior ou menor disponibilidade de meios e vias

de comunicação influencia a intensidade dos fluxos que ligam os lugares. Além

disso, admite-se que os factores sociais, culturais e políticos também exercem

influência sobre os fluxos observados pelo que, os parâmetros estimados para uma

região não podem ser utilizados nos estudos de outra região.

201 ( )[ ]2/.. ijjiij DMMGI = em que Iij - grau esperado de interacção entre o cento i em relação

ao centro j; Mi e Mj - massa do corpos i e j, respectivamente; Dij - distância entre os corpos i e j; G - constante 202 O valor da constante de gravitação depende das unidades de medida utilizadas para exprimir a dimensão dos lugares e a distância entre eles. Este valor é, no sistema de medição internacional, 6,67.10-11 (Ponsard, 1988, p. 195). 203Geralmente, admite-se que os expoentes das dimensões não sejam necessariamente unitários e que o expoente da distância económica possa ser diferente de dois. O cálculo destes parâmetros pode ser efectuado linearizando a expressão algébrica do modelo, ou seja, através da fórmula lg Fij = lg K + a . lg Ti + b . lg Tj – c . lg Dij

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174

Os modelos gravitacionais204 são, por vezes, criticados como tendo apenas valor

descritivo faltando-lhes, por conseguinte, uma estrutura teórica. Esta objecção não

é, em nosso entender, totalmente válida já que nos modelos gravitacionais mais

complexos, os pesos e os parâmetros exponenciais – a, b, c - se ajustam à variável

T (dimensão do centro) e a distância é medida, não em quilómetros, mas em

termos económicos. Além disso, os modelos gravitacionais permitem testar

teorias que relacionam a dispersão desigual da actividade económica com, por um

lado, a atracção das forças de aglomeração e, por outro lado, o desejo geral dos

agentes económicos de acessibilidade reflectida na minimização dos custos.

Outra das críticas é a de que os modelos de localização do parque habitacional e

do comércio retalhista, baseados no princípio da gravitação, sendo modelos da

procura assumem que a procura iguala a oferta. Igualmente se questiona a pouca

atenção dada ao poder atractivo intrínseco de uma zona205, embora seja

considerado uma componente essencial do mecanismo de localização.

Apesar das críticas, o modelo gravitacional proporciona uma abordagem flexível

à análise da interacção espacial entre dois pontos. Além da ampla diversidade de

aplicações206 (como vimos neste capítulo), o modelo gravitacional iria dar origem

ao modelo potencial. A interpretação económica da noção de potencial depende,

fundamentalmente, da natureza das variáveis que intervêm na sua formulação.

Recorrendo à gravitação demográfica 1V2 representa o potencial da população M2

para o mercado localizado no centro da zona 1. Da mesma forma, 1V é o potencial

da população total das zonas n-1 sobre o centro da zona 1. Admitindo que o

potencial populacional permite definir uma relação de proximidade entre um

dado lugar e a população localizada noutro lugar podemos, então, considerar que

este indicador traduz uma possibilidade de deslocação, ou seja, um fluxo potencial

que será tanto mais intenso quanto maior for o potencial de população. De um

204 Por forma a assegurarem resultados coerentes, os modelos mais utilizados assumem algumas restrições em relação à origem e aos destinos dos fluxos. 205 Hayes et all (1970) define poder atractivo intrínseco de uma zona como aqueles atributos de uma área que a fazem atractiva para desenvolvimento residencial mas que não estão relacionados com a sua proximidade aos locais de emprego (cit. Lee, 1973, p. 100)

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175

modo geral, o potencial indica a posição ocupada por um ponto na superfície

onde este foi definido (Ponsard, 1988, p.199).

Stewart (1948) utiliza o potencial parcial 1V2 para estimar o fluxo com origem no

lugar 2 com destino ao lugar 1 (ibid., p. 199). Sendo m’’ uma função crescente

de M2, o potencial parcial virá:

)(

)(''

12

221

Dd

MmV =

onde,

M2 - Variável 2

D12 - Distância entre o ponto 1 e 2

Esta expressão permite quantificar o fluxo potencial entre o lugar 1 e 2 em função

da variável M2 ou, por outras palavras, hierarquizar os lugares tendo em

consideração a intensidade dos fluxos potenciais. O potencial global exprime,

assim, uma posição económica global sintetizando a relação entre a zona 1 e todas

as restantes segundo determinada variável. A expressão algébrica do potencial

global é:

∑−

=

=1

11

)(

)(''n

zi i

i

Dd

MmV

De referir que o potencial de um lugar não é apenas uma função da interacção

entre dois lugares pelo que a existência de infra-estruturas, edifícios, parque

habitacional e a qualidade do meio ambiente natural são, igualmente, factores

importantes para a localização das empresas. Para Harris (1954) e Dunn (1956), o

valor de um local deve exprimir o perfil do mercado potencial que pode ser

satisfeito a partir desse local. A noção potencial de mercado substitui-se à de

potencial de população considerando-se, agora, o valor das vendas a retalho como

a variável do modelo.

No interior da cidade, o valor de um bairro é interpretado em termos de

acessibilidade. Um bairro fortemente valorizado significa que os seus residentes

206 Neste capítulo iremos analisar vários modelos cuja base é o princípio gravitacional.

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176

podem aceder facilmente às diversas funções urbanas (comércio, serviços, etc.). O

cálculo do potencial de acessibilidade (Fustier e Rouget, 1985) depende, por

conseguinte, da natureza da função que se considera como a variável do modelo

(por exemplo, superfície de venda em m2 dos estabelecimentos comerciais,

número de quartos das unidades hoteleiras, etc.).

Ao contrário do modelo gravitacional, o modelo de potencial pode ser

operacionalizado a escalas geográficas reduzidas tais como distritos, concelhos e

freguesias. De forma a obterem-se resultados ainda mais pormenorizados, pode

dividir-se o território em análise em quadrículas, calculando-se o potencial de

cada uma, o que tornando o modelo mais operacional exige um nível mais elevado

de desagregação da informação estatística.

3.4.3. Modelo de localização dos parques habitacionais

Utilizando um modelo do tipo gravitacional, Hansen (1959) elabora um modelo

de localização da população, partindo do pressuposto que o principal factor da sua

fixação é a existência de emprego remunerado. A relação localização da

população/emprego pode ser expressa pelo índice de acessibilidade Aij que define

para cada zona a sua acessibilidade ao emprego (Lee, 1973, pp. 71-77):

bij

jij

d

EA =

onde, Ej - Emprego no lugar j

ijd - Distância entre o local de residência i e o local de emprego j

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177

O índice total para a zona i será a soma dos índices individuais207. Hansen

reconhece que um dos mais importantes factores de atracção é a existência de solo

infra-estruturado para construção de habitação ou holding capacity da zona ou

região i que designa por Hi. Combinando a acessibilidade e o solo infra-

estruturado, através da sua multiplicação, teremos o índice de desenvolvimento

potencial Di, ou seja, Di = Ai . Hi que mede a atracção de cada lugar em função

do acesso ao emprego e à disponibilidade de terreno infra-estruturado para

construção de habitação. Calculando o índice de desenvolvimento potencial para

as várias zonas concorrentes é possível determinar o índice de desenvolvimento

potencial relativo208 k o que permitirá às populações escolher a zona onde irão

construir a sua habitação.

Ainda segundo Hansen, o crescimento da população num local i, que designamos

por Gi, é igual ao produto do crescimento total da população Gt pelo índice de

desenvolvimento potencial relativo da zona i, ou seja :

( )

=

∑i

ii

iiti

HA

HAGG ou

∑=

i

i

iti

D

DGG

A utilização do modelo de localização dos parques habitacionais é faseada, ou

seja, implica a seguinte sequência de cálculos:

1. índice de acessibilidade para cada zona - Aij

2. índice de desenvolvimento potencial - Di -

3. índice de desenvolvimento potencial relativo - k

4. crescimento da população em cada zona - Gi

207 A expressão algébrica é ∑=bij

ji

d

EA

208 A expressão algébrica é ∑

=

i

ii

ii

HA

HAk

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178

Este modelo, não obstante as suas limitações ao nível de agregação e da ausência

de efeitos retroactivos da concentração de população sobre os preços dos terrenos

para construção, permite testar várias hipóteses, quer em relação às políticas de

distribuição do emprego, quer à política de preços do solo urbanizável.

3.4.4. Modelo de localização do comércio a retalho

O modelo desenvolvido por Lakshmanan e Hansen (1965) descreve os fluxos da

procura entre as zonas residenciais e os centros comerciais e estima também as

vendas de cada centro comercial. De referir que este modelo tem uma restrição: o

orçamento da população residente na zona residencial i.

Em termos formais, a despesa efectuada por cada zona residencial em cada centro

comercial será dada pela expressão (Lee, 1973, pp. 78-82):

ijib

ijajiiij CdFACS Pr== −

em que, Sij - Despesa efectuada pela zona residencial i no centro comercial j Ci - Despesa total da zona residencial i Fj - Atractibilidade do centro comercial j Ai - 1)( −−∑ b

ijj

aj dF

dij - Distância entre a zona residencial i e o centro comercial j Prij - ( ∑ −−

j

bij

aj

bij

aj dFdF / )

a ; b - Expoentes A despesa total por centro comercial será dado pelo somatório dos fluxos de

despesa de todas as zonas residenciais no centro comercial j , isto é:

∑∑∑ === −

iijij

ii

bij

aji

iij SCdFACS Pr

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179

A operacionalização do modelo exige informação sobre o orçamento para

consumo da população em cada zona residencial i, a atractibilidade dos centros

comerciais e a distância percorrida pelos consumidores. De acordo com este

modelo de localização do comércio a retalho, o volume de vendas de cada centro

comercial j é directamente proporcional ao seu poder atractivo e inversamente

proporcional, quer à distância entre a zona residencial i e o centro comercial, quer

à competição entre os centros comerciais. Os estudos empíricos ao confirmarem

esta tendência demonstraram, ainda, que os grandes centros comerciais atraem

mais compradores do que a sua dimensão à priori indicaria.

3.4.5. O modelo de distribuição de tráfego

O modelo gravitacional é aqui utilizado, fundamentalmente, para descrever a

interacção das actividades analisando a distribuição das viagens visto a

localização da mão-de-obra (zonas residenciais) e do emprego (zonas de

localização das empresas) não coincidirem. Neste modelo, o total das viagens

quer em termos de origens, quer de destinos, é conhecido pelo que é possível

estimar a quantidade de viagens a realizar entre cada par de zonas, isto é, entre a

zona de habitação e a de emprego. Isto significa que, através do modelo, é

impossível prever o local onde a viagem termina já que, quer a origem, quer o

destino, são restrições. A resolução deste problema implica a introdução de um

novo termo Bj cuja função é assegurar a satisfação das duas restrições do

modelo, ou seja, ij

ij OT =∑ e ji

DTij =∑ .

Em termos algébricos, o número de viagens por cada par de zonas será dado pela

expressão (Lee, 1973, pp. 82-87):

ijjb

ijjijiij OdDOBAT Pr== −

onde,

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

180

Tij - Viagem entre a zona i e a zona j Oi - Total de viagens com origem na zona i Dj - Total de viagens com destino na zona j Ai - 1)( −−∑ b

iji

jj dDB

Bj - 1)( −−∑ bij

jii dOA

As origens Oi e os destinos Dj são calculadas através de um processo iterativo

já que se, por um lado, a fórmula para o cálculo de Ai inclui o termo Bj , por

outro lado, o cálculo de Bj é efectuado tendo em consideração o valor de Ai. Isto

significa que estabelecido o valor inicial de Ai este deverá ser utilizado para

calcular o valor de Bj que, por sua vez, será utilizado para recalcular o novo

valor de Ai e assim sucessivamente. O processo termina quando a diferença entre

os valores anteriores de Ai e Bj e os calculados imediatamente a seguir é nula

ou muito próxima desta e, por conseguinte, sem significado económico.

3.4.6. O modelo de Lowry

Nos últimos três parágrafos analisámos alguns dos modelos utilizados para o

estudo e projecção da distribuição das actividades humanas no sistema urbano,

bem como a interacção existente entre as mesmas.

O modelo de Lowry (1964), considerado um modelo geral209, introduz duas

inovações no campo da modelização urbana ao incorporar, por um lado, na sua

estrutura a previsão e os procedimentos de localização e ao relacionar, por outro

lado, três elementos (população, emprego e transportes) do sistema urbano num

único quadro de referência. Refira-se que, neste modelo, a população é uma

função do emprego nos sectores básicos e não básicos ou de serviços de uma

economia. Além disso, no modelo de Lowry, assume-se que o emprego do sector

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181

básico tem efeitos directos e indirectos sobre a população. Formalmente virá (cit.

Lee, 1993, p. 93):

P=αB+αS

em que, P - População α - Inverso da taxa de ocupação210 B - Emprego no sector básico da economia S - Emprego no sector não básico ou de serviços

O segundo pressuposto, importante para a operacionalização do modelo de

Lowry, é que o nível de empregos nos serviços é determinado pelo nível de

população. Assim, o emprego no sector de serviços D(1) devido à procura da

população empregue nos sectores básicos P(1) é dado pela equação D(1)= βP(1)

onde ββββ é o rácio população/emprego nos serviços. Os trabalhadores empregues

nos sectores serviços têm também pessoas dependentes do seu trabalho P(2), ou

seja, P(2)= αD(1) que, por sua vez, irá gerar uma nova procura211 de empregos no

sector de serviços D(2) e assim sucessivamente até os acréscimos da procura de

emprego se tornarem insignificantes ou mesmo nulos.

A população, no modelo original, é distribuída usando o modelo potencial

(similar ao modelo de localização da população de Hansen), segundo o qual a

população residente numa determinada zona é determinada pelo somatório das

potencialidades inter-zonas da região em estudo (cit. Lee, 1973, pp. 95-97):

∑=

=n

i ij

ij

d

EGP

1

onde 209 O modelo de Lowry, ao contrário dos anteriores, considera mais do que um subsistema. Batty (1971) considera que, dado o estádio de conhecimento, devem ser considerados modelos gerais todos aqueles que representem dois ou mais subsistemas. 210 A taxa de ocupação é calculada dividindo o emprego pela população, logo α=(E/P)-1 ou α=P/E. 211 Calculada pela fórmula D(2)= βP(2)

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182

Pj - Quantidade de população residente em j Ei - Empregos básicos em i dij - Índice de viagens reflectindo as migrações entre i e j G - Factor de escala para assegurar que ∑

j

jp é igual à previsão do crescimento

total da população

Garin (1966) sugere a introdução do princípio da gravidade no modelo de Lowry

resultando deste modo uma nova versão que viria a ser mais a mais utilizada.

Assim, a actividade deslocada da zona i para a j - Tij - pode ser calculada

utilizando a seguinte expressão:

1−= ijiiij dAET

onde, Ei - Actividade a ser deslocada da zona i

1−ijji dAE - Probabilidade de interacção entre as zonas i e j

Pj - Medida de interacção da zona j

Utilizando as convenções do modelo de Hansen e representando a população da

zona j por Pj , teremos que a componente localização do parque residencial no

modelo de Lowry virá,

b

ijjiij dAiPET −=

onde Ai é calculado pela expressão ∑ −

j

bijjdP .

Seguindo as recomendações de Garin, a maioria das aplicações do modelo

integram os pressupostos da teoria da base e os procedimentos de localização.

Considere-se que Ei representa o número de trabalhadores dos sectores básicos

da zona i e Tij o número de trabalhadores do sector básico que trabalham na

zona i e vivem na zona j . Assim, a população residente na zona j que depende

do sector básico Pj(1) obtém-se multiplicando o número total de trabalhadores no

sector básico residentes na zona j (ΣTij) pelo inverso da taxa de ocupação αααα, ou

seja, ( ) ∑=i

ijj TP α1 .

Considerando que a população dependente do sector básico gera uma procura de

serviços da qual resultará mais emprego neste sector teremos que o primeiro

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183

aumento da procura de emprego no sector serviços Dj(1) será o resultado do

produto entre o rácio população/emprego no sector de serviços ββββ e a população

dependente do sector básico residente na zona j, ou seja, Dj(1) = β Pj(1). A

imputação deste tipo de emprego aos centros de serviços é efectuada recorrendo à

expressão ajiijjji dSDBS −= )1()1( onde ∑ −−=

i

ajiij dSB 1)( .

Assumindo, uma vez mais, que a medida de atractividade de uma zona é igual ao

nível de actividade aí existente (no caso emprego no sector de serviços Si), então

Sji(1) representa os empregos no sector serviços procurados pela população

residente na zona j que trabalham na zona i . O primeiro acréscimo de emprego

no sector de serviços Si(1) é, portanto, calculado somando Sji(1 ) em ordem a j .

A quantidade total de emprego nos serviços em todas as zonas é obtido somando o

emprego no sector de serviços de cada zona, isto é, ∑∑=j

jii

SS )1( .

Seguidamente, calcula-se o aumento da população dependente de Si(1)

substituindo Si(1) por Ei(1) na equação b

ijjiij dAiPET −= . Recorrendo à equação

( ) ∑=i

ijj TP α1 calcula-se, novamente, a população dependente do sector serviços

utilizando o multiplicador populacional αααα . Esta sequência de cálculos é repetida

até que os acréscimos da procura de emprego se tornem insignificantes e os totais

convirjam.

O modelo, embora relativamente simples e fácil de usar, tem alguns problemas

que derivam da sua estrutura e operacionalidade limitando, assim, a utilidade e

validade do mesmo como uma ferramenta de planeamento. Hayes (1970) critica,

ainda, o modelo de Lowry por este só considerar relações simplificadas entre

variáveis muito agregadas (por exemplo, o sector básico e o de serviços não são

desagregados). Batty (1970) considera ser necessário incorporar restrições no

quadro original de referências de Lowry dado a componente de localização do

modelo recorrer à abordagem gravitacional.

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184

No sentido de ultrapassar estas insuficiências foram feitas algumas sugestões

como, por exemplo, a desagregação de variáveis críticas (população e emprego)

que poderia conduzir a uma significativa melhoria da base teórica do modelo e até

do seu desempenho (Cripps and Batty, 1969; Wilson 1970). A tentativa de

incorporar um elemento dinâmico (Consad, 1964, Batty, 1971) foi outra forma de

melhorar o modelo de Lowry. Em termos de conclusão parece-nos que podemos

concordar com Batty (1970) quando este afirma o presente modelo providencia

um razoavelmente bom aparelho de simulação e pode ser extremamente útil se

usado com cuidado. É viável em termos de técnica e custos, e se ele for integrado

com técnicas objectivas de desenho e avaliação do sistema o planeador pode ter

uma confiança bastante elevada na previsão do modelo (cit. Lee, 1973, p. 101).

No entanto, e apesar das suas deficiências, o modelo de desenvolvimento urbano

elaborado por Lowry continua a ser um dos mais utilizados.

3.5. RESUMO E CONCLUSÕES

O planeamento territorial, tal como o planeamento macro-económico, tem a sua

génese no início do século XX. No entanto, a partir da década de 50 evoluiu

rapidamente o que pode ser explicado pelas sucessivas crises vividas um pouco

por todo o mundo e pela manutenção, ou mesmo agravamento, das assimetrias

intra e inter- regionais. Esta situação levou ao reconhecimento de que o

planeamento macro-económico (a nível nacional e depois regional) se tornou uma

necessidade e não uma intromissão inadmissível do Estado na vida económica

como advogavam os adeptos do laissez faire. Além disto, os agentes de

desenvolvimento depararam-se com um grau de incerteza elevado proporcionado,

por um lado, pela extraordinária capacidade de evolução do sistema social e, por

outro lado, pela própria imagem que temos do sistema social e seu funcionamento

também ela variável em função da informação de que dispomos e da experiência

adquirida.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

185

A redução da incerteza torna-se assim uma prioridade e também possível

recorrendo às projecções forecasting que combinam as técnicas de extrapolação,

exploração e especulação e à implementação de um sistema de informação que

responda às características do processo de planeamento e de tomada de decisão

(perspectiva de longo prazo, interacção entre decisores e grupos de interesses), ou

seja, um sistema de informação adaptativo212 nas palavras de Nijkamp (cit.

Reigado, 1999, p. 36). Outra característica importante do sistema de informação é

a sua capacidade de retroacção, ou seja, a capacidade de permitir “ajustamentos”

no decorrer do processo de planeamento do território. O circuito de retroacção,

embora nos permita verificar se os resultados correspondem aos objectivos

previamente fixados, não dá qualquer informação sobre as razões que levaram aos

eventuais desvios. Daí decorre a necessidade de introduzir, segundo Reigado

(1999, pp. 56-59), dois sistemas de informação, um de relações internas

(informação sobre o nível de realização dos objectivos e informação sobre o

ambiente contextualizado, o processo de planeamento e o modelo conceptual ) e

outro de relações externas (informação sobre as alterações no modelo conceptual

e sua integração no processo de planeamento).

A transposição dos conceitos de política económica e de planeamento (pensados

ao nível da economia nacional) para o nível local, isto é, para a região, veio pôr

em evidência um elemento até aí quase ignorado: o ESPAÇO. No entanto, isto

não implica que o planeamento de vocação territorial coloque os aspectos físicos

numa situação de privilégio. Assim, o conteúdo específico do planeamento do

território depende das condições concretas do espaço a planear e terá sempre

como objectivo a melhoria do bem estar das populações residentes. Nesta

perspectiva, a articulação do espaço (pensado como um elemento passivo ou

como determinante das actividades) com os processos e estruturas que nele

ocorrem é compatível com a forma de planear em que o espaço é autónomo. A

concepção do espaço segundo a qual este é o elemento aglutinador da história

conduz-nos a um tipo de planeamento em que a separação do espaço e o que nele

212 Nijkamp coloca este sistema de informação numa posição intermédia entre o modelo maximalista (sistema compreensivo que, eventualmente, serve todas as necessidades dos

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

186

toma lugar não é mais possível a não ser como recurso metodológico para estudar

o sistema social territorializado. Ora, a transformação do espaço ou, melhor, a

construção contínua do espaço leva-nos ao conceito de território. Esta concepção

do território e por arrastamento do planeamento territorial é, em nosso entender, a

mais correcta já que os fenómenos sociais ocorrem em determinado espaço ou,

segundo Giddens (1985), o desenvolvimento social envolve caracteristicamente

movimentos espaciais e temporais (cit. Cardoso, 1986, p. 80).

Independentemente da concepção do espaço e das formas de planeamento, a

ocupação do território obedece a modelos que tendem a projectar a dinâmica da

procura de espaço e os seus padrões de utilização, quer para as actividades

motoras, quer para o alojamento e actividades de cultura e lazer. Esta procura

evolui de forma cíclica levando-nos a concluir que o território, tal como as

empresas e os produtos, evolui em ciclos de cinco fases: infância, crescimento,

controlo, maturidade e crise (Forn, 1989, p. 31). A evolução deste ciclo de vida

dos territórios, e em particular das cidades, põe em destaque o diálogo permanente

entre as actividades económico-sociais e o território. Num contexto de rápidas

mudanças, torna-se impossível analisar os aspectos físicos do território

separadamente da compreensão das relações entre o seu uso económico e do uso

dos solos e da espacialidade que, em última instância, são responsáveis pela

transformação das estruturas territoriais. Assim se, por um lado, o planeamento do

território implica um processo de diálogo entre o “ físico” e o “económico”, por

outro lado, este organiza-se em torno de dois paradigmas de desenvolvimento: o

funcionalista e o territorialista.

A crescente interpenetração das economias nacionais e regionais, conduziu a uma

utilização mais intensa do planeamento estratégico territorial e,

consequentemente, a vários modelos. Destes destaque-se o modelo ortodoxo da

Harvard School (1981) e o modelo interaccionista de Bryson e Einsweiller (1988)

cuja raiz é o planeamento estratégico das empresas. De um modo geral, e segundo

Sallez (1986), ao nível do planeamento estratégico do território é possível

planeadores) e o modelo minimalista , ou seja, um sistema de informação específico para

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

187

identificar quatro componentes essenciais, ou seja, definição das escolhas

estratégicas, adaptação às tendências-chave de afectação de recursos escassos e

definição de um sistema interno de informação (cit. Neves, 1996, p. 54). Refira-

se que no âmbito do planeamento do território tem vindo a ganhar notoriedade o

planeamento urbano com preocupações profundas ao nível do ordenamento do

espaço urbano. Isto levou-nos a estudar vários modelos de análise espacial como

são os modelos gravitacionais, os modelos de localização do parque habitacional e

do comércio retalhista, o modelo dos fluxos de trafego e o modelo de Lowry.

Estes modelos, que se constituem na base teórica do ordenamento do território,

permitem testar várias hipóteses em relação às políticas de emprego, dos preços

do solo, bem como a estimar a atractibilidade dos centros comerciais e os fluxos

entre as zonas de habitação e de emprego.

Por último, refira-se que o planeamento do território implica a delineação e

implementação de políticas conducentes ao ordenamento do território. Esta

necessidade deve-se, antes de mais, à situação caótica em que se encontra a

grande maioria das zonas urbanas. Assim, a necessidade de, por um lado, não

repetir erros anteriores na gestão dos solos e, por outro, de dar uma unidade ao

território e inserir harmoniosamente as actividades produtivas e de lazer num

ambiente ecologicamente puro reforça o papel do ordenamento do território no

desenvolvimento sustentável. Esta questão, isto é, o ordenamento do território

será o nosso objecto de estudo pormenorizado nos dois capítulos seguintes.

responder a uma situação também ela particular.

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188

4. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO: UMA PERSPECTIVA

EUROPEIA

4.1. INTRODUÇÃO

O povoamento humano e a localização da actividade económica não são fruto do

acaso antes, pelo contrário, obedecem a regras (mais ou menos explícitas) e a uma

lógica de comportamento. Efectivamente, se na pré-história o homem escolhia o

local para se estabelecer em função das possibilidades de defesa, de caça e de

recolha de alimentos que o mesmo oferecia, mais tarde, passou-se a equacionar

outro tipo de condicionalismos à localização. O aumento da população e

consequente colonização de novos espaços, o desenvolvimento das técnicas e

tecnologias de produção, a concentração da população e da produção em espaços

reduzidos a par da polarização dos sistemas produtivos, conduziram à necessidade

de ordenar o território. Além disso, esta necessidade foi reforçada pela interacção

entre os recursos do território e as necessidades sociais. Neste contexto, o

território ganha importância e afirma-se como elemento estratégico do

desenvolvimento económico e social sustentável numa dupla perspectiva de

equidade intra e intergeracional.

O ordenamento do território pode definir-se como uma disciplina científica, uma

técnica administrativa e uma política concebida como um enfoque

interdisciplinar e global, cujo objectivo é o desenvolvimento equilibrado das

regiões e a organização física do espaço segundo um conceito que o rege

(Reigado, 1999, p. 171). Dada a complexidade e a importância do ordenamento do

território na estratégia de desenvolvimento regional, optamos por dividir este tema

em duas partes que correspondem aos quarto e quinto capítulos. Assim, neste

quarto capítulo, além de fazermos referência aos principais elementos que o

influenciam (o povoamento humano, a localização dos recursos naturais, as vias

de comunicação, o comércio internacional e a divisão administrativa) analisamos

a sua interacção numa perspectiva dinâmica. Seguidamente, debruçamo-nos sob a

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189

génese e evolução do conceito e objectivos do ordenamento do território, bem

como o planeamento físico do espaço urbano/rural.

O facto de Portugal ser membro da União Europeia e o ordenamento do território

ser, cada vez mais, equacionado numa dupla perspectiva, isto é, numa perspectiva

supranacional e de integração do nível local no nacional levou-nos a analisar o

passado recente e as perspectivas do ordenamento do território comunitário. As

políticas de ordenamento do território europeu tiveram, durante cerca de três

décadas, uma dimensão eminentemente nacional pelo que no Tratado de Roma

foram quase ignoradas. No entanto, nos anos 90, o alargamento das políticas

regionais e o reforço dos Fundos Estruturais tendo em vista a aceleração da

integração europeia e a diminuição das graves assimetrias regionais deram uma

nova visibilidade às questões do ordenamento do território traduzida na

cooperação bi ou trilateral, nas directivas comuns e, mesmo, na elaboração de um

esquema de desenvolvimento do espaço comunitário.

Apesar dos esforços no sentido de dotar a União Europeia com uma política

comum de ordenamento do território e de harmonizar os vários sistemas de

planeamento espacial, a os resultados estão aquém do desejável. Na realidade, os

vários Estados-membros preconizam soluções diferenciadas. Assim, enquanto na

França, Espanha e Itália, o ordenamento nasce no seio de uma economia

planificadora indicativa e se atribui aos aspectos económicos uma extraordinária

importância, na Inglaterra, a prática descentralizadora mais acentuada, levou à

valorização equitativa de todos os elementos que se inscrevem no espaço, sejam

económicos, sociais ou ambientais. A Alemanha, com uma prática idêntica à

inglesa, dá prioridade à gestão dos recursos naturais e conservação da natureza.

No final deste capítulo procura-se apresentar as ideias-chave que nos permitem

enquadrar o ordenamento do território português num plano supranacional, ou

melhor, no espaço europeu de que é parte integrante.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

190

4.2. O ORDENAMENTO DO ESPAÇO

4.2.1. Breves notas históricas

Desde que o homem iniciou o processo de sedentarização que se assiste à procura,

consciente ou não, da melhor localização para o desenvolvimento das suas

actividades, quer em termos de produção dos bens essenciais à sua sobrevivência,

quer para se defender das feras ou mesmo de outros indivíduos.

O território português e, de um modo mais geral, a Península Ibérica dada a sua

localização privilegiada foi, desde os tempos mais remotos213 o ponto de encontro

de vários povos. As fronteiras de Portugal do século XIII estão ligadas ao sistema

administrativo romano e muçulmano. Efectivamente, o ordenamento do espaço

peninsular e, naturalmente, do espaço que hoje é Portugal tem raízes profundas

nas reformas administrativas promovidas por Augusto214, em 27 a.C., no

povoamento e na rede de estradas romanas. Como afirma Oliveira Marques, os

romanos com o objectivo de descentralizar a administração e de civilizar os

povos construíram uma vasta rede de estradas ligando para sempre regiões que

até então se tinham mantido em maior ou menor isolamento (...) deram origem a

duas áreas desenvolvidas, uma a norte do Douro e outra a sul do Tejo, separadas

por uma vasta região escassamente povoada que, em Portugal, corresponde,

aproximadamente, à área que hoje se chama Região Centro (Reigado, 1999, p.

131). A maior concentração a Sul que caracteriza a ocupação romana e

muçulmana esteve ligada, por um lado, ao próspero comércio e ao artesanato

característico desta área e, por outro lado, à proximidade dos portos de abrigo

situados no estuário do Tejo e na costa algarvia.

À Idade Média estão associadas a circulação de mercadorias, essencialmente por

via marítima e fluvial, e a organização em rede de feiras e de pequenos mercados

213 Os fenícios de Tiro, por exemplo, começaram a instalar-se nas costas meridionais da península, no século II a.C.. A partir de 194 a.C. registam-se as primeiras confrontações entre Romanos e Lusitanos, as campanhas dos Suevos verificam-se em 441, as dos Visigodos em 470 e as invasões muçulmanas dão-se em 711-714 (Mattoso, 1992, pp. 79-316). 214 Imperador romano.

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reflectindo, assim, uma certa hierarquia urbana. O rápido desenvolvimento das

manufacturas e do comércio internacional irá influenciar, de forma decisiva, o

ordenamento urbano da Europa. A Igreja, na época da nacionalidade, trouxe

igualmente um importante contributo para a divisão administrativa do país.

A divisão administrativa tem sido ao longo da história um dos principais pilares

em que se baseia o ordenamento do território nacional. Assim, em 1299, no

testamento de D. Dinis, Portugal era constituído por cinco regiões e um

enclave215.

Em 1406, no reinado de D. Duarte, no território nacional distingue-se pela

primeira vez, o Minho de Trás-os-Montes e o Reino do Algarve. Paralelamente,

enquanto estrutura organizacional de base, as comarcas afirmam-se no

ordenamento administrativo do país.

Em 1599, nas cartas de Duarte Nunes de Leão, o Entre Tejo e Odiana, transforma-

se em Alentejo (parte do litoral e Setúbal faziam parte da Estremadura). Esta

divisão administrativa viria a perdurar por mais de dois séculos.

Em 1832, o governo provisório216, dando cumprimento à Carta Constitucional de

1826, divide o país em províncias, comarcas e concelhos. Mouzinho da Silveira

propõe a centralização da Administração régia e a atribuição de amplos poderes

aos representantes regionais do governo. Este projecto de centralização, a ser

aprovado, mudaria completamente as normas da Administração Pública. Em

1836, o Código Administrativo de Passos Manuel reintroduz, no ordenamento do

território nacional, os distritos administrativos. Além disso, na sequência da

reforma concebida para acabar com os privilégios acumulados e com a

diversidade de situações que até aí vigoravam, extinguiu217 498 dos antigos

215 As regiões eram: d’antre Douro e Minho (as actuais Trás-os-Montes e Minho), a Beira, a d’antre Douro e Mondego, a Estremadura e a d’antre Tejo e Odiana (actuais Alentejo e Algarve). O enclave era formado por Moura e Serpa (Mendonça e Évora, 1998, p. 41). 216 Instalado nos Açores e leal a D. Pedro IV. 217 Decreto de 6 de Novembro de 1836.

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concelhos, criou mais de duas dezenas de novos e fixou o seu número em 351

(Manique, 1989). Em 1842, o Código Administrativo de Costa Cabral confirma a

divisão distrital que, embora com ligeiras alterações, se iria manter vigente

durante quase um século.

Em 1936, seguindo as sugestões de Amorim Girão, o Código Administrativo de

Marcelo Caetano institui onze províncias218. Em 1959, a revisão constitucional,

embora mantendo os distritos do Código de 1933, acaba com as províncias e

define um modelo de divisão distrital ainda em vigor.

Em 1976, após a queda do regime ditatorial, o Ministério da Administração

Interna219 e o Departamento Central de Planeamento, do Ministério do Plano e

Coordenação Económica220, propõem duas delimitações regionais que, segundo

Ernesto Figueiredo, se afiguram com as mais significativas do pós-25 de Abril.

São vistas como modelos e têm-se definido opções em torno destes dois elementos

(Mendonça e Évora, 1998, p. 43). Os estudos de Proença Varão indicavam uma

divisão administrativa que se aproxima da Nomenclatura de Unidades

Territoriais – NUT - adoptada aquando da adesão de Portugal à Comunidade

Europeia. Nestes estudos, o Entre Douro e Tejo era dividido em duas regiões, uma

a Norte e outra a Sul (ibid., p.43).

A actual nomenclatura territorial para fins estatísticos, dividindo o país em sete

NUT’s de nível II221, confere aos vários territórios (leia-se regiões de

planeamento) uma maior complexidade, quer pela divisão que estabelece, quer

pelo espaço que engloba, levando a descontinuidades com divisões

administrativas anteriores, mas que traduz uma maior coerência em termos físicos

218 Minho, Trás-os-Montes e Alto Douro, Douro Litoral, Beira Alta, Beira Baixa, Beira Litoral, Estremadura, Ribatejo, Alto Alentejo, Baixo Alentejo, Algarve. 219 O Ministério da Administração Interna propõe duas áreas metropolitanas (Lisboa e Porto) e seis grandes províncias: Minho, Douro e Trás-os-Montes, Beira, Estremadura e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve. 220 O Ministério do Plano e Coordenação Económica propõe sete regiões-plano: Norte Litoral, Norte Interior, Beira Litoral, Beira Interior, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve. 221 Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo, Algarve, Açores e Madeira.

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e económicos. De referir que esta nomenclatura coexiste com a divisão

administrativa do país em distritos.

A Constituição da República Portuguesa, ao manter os distritos, mesmo que

transitoriamente, ao mesmo tempo que não estabelecia mecanismos para a rápida

concretização da autarquia regional e a fazia depender da simultaneidade da

instituição das regiões administrativas, criou as condições para a proliferação de

delegações regionais, sub-regionais e distritais sem unidade territorial ou eficácia

administrativa. Efectivamente, a indefinição de décadas acerca do modelo de

organização administrativa levou ao acumular incoerente de situações, muitas das

vezes, contraditórias na Administração Pública desconcentrada, ao aumento da

burocracia e à reduzida transparência nas políticas públicas com impacto

territorial. A análise dos serviços desconcentrados 222da Administração Pública

mostra, ainda, que estes não têm qualquer mecanismo de coordenação entre si,

nem o Estado dispõe de formas de tutela horizontal dos mesmos, apesar do seu

número ser significativo e coexistirem vários modelos de desconcentração

(Cabrita, 1998, p. 23):

• 15 casos de desconcentração, segundo o modelo distrital223 (por exemplo, Serviço Nacional de Protecção Civil, INATEL);

• 20 casos de desconcentração agrupando distritos (por exemplo,

Administrações Regionais de Saúde, Centros Regionais de Segurança Social);

• 13 casos de desconcentração seguindo o modelo das Comissões de

Coordenação Regional224 (por exemplo, Direcções Regionais do Ambiente, de

Educação, de Economia);

222 A desconcentração de competências é entendida como a operação que transfere para órgãos de nível hierárquico inferior o desempenho de funções que, desse modo, ficam mais próximas dos seus destinatários, mantendo a instância central que a ela procede a responsabilidade pela definição das normas segundo as quais tudo é feito (Oliveira, 1996, p. 25). 223 Actualmente, no continente há 18 distritos: Viana do Castelo, Braga, Vila Real, Bragança, Porto, Aveiro, Viseu, Guarda, Castelo Branco, Coimbra, Leiria, Lisboa, Santarém, Portalegre, Setúbal, Évora, Beja e Faro. 224 Actualmente, estas Comissões de Coordenação Regional (CCR) são cinco: Norte, Centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve. As CCR’s dependem do Ministério do Equipamento, Planeamento e Administração do Território.

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• 26 tipos de desconcentração seguindo outras formas de delimitação espacial diversa (por exemplo, IGAPHE225, Direcções Regionais de Agricultura,

Regiões de Turismo).

Este quadro caótico chama a atenção para a necessidade urgente do ordenamento

administrativo do território português numa dupla perspectiva de desconcentração

de competências e de descentralização da tomada de decisões. O movimento de

desconcentração, desde que acompanhada da descentralização226, é uma das

formas de contrariar a propensão para o reforço da Administração Central. A

desconcentração permitiria racionalizar o aparelho administrativo do Estado,

redistribuindo as competências pelos vários níveis (nacional, regional e local),

segundo o princípio da subsidiariedade que permite reforçar a eficácia das

intervenções públicas e simplificar os processo de decisão. Além disso, é

necessária uma reorientação da Administração desconcentrada no sentido de os

seus serviços periféricos serem integrados em serviços desconcentrados regionais.

O movimento de descentralização implica a uniformidade de tratamento, mas

também a compreensão de que se, por um lado, a variedade de respostas conduz a

um aumento da satisfação dos cidadãos por serem estes, através dos seus

representantes mais próximos, a definir as soluções que mais lhe convêm, por

outro lado, aumenta a responsabilidade pelas decisões tomadas. Neste processo é

extremamente importante a participação dos agentes locais de forma a preservar

as tradições e não criar fortes resistências às mudanças que o desenvolvimento

sempre exige. De realçar que a simultaneidade das operações de desconcentração

de competências e de descentralização da tomada de decisões, permitindo uma

aproximação entre estas e os seus destinatários, assegura um tratamento igual para

todos nos domínios em que o Estado entenda dever garanti-lo e autorizando a

que, naqueles em que tal não é imperativo, se deixe à iniciativa e ao critério das

225 IGAPHE – Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado. 226 A descentralização da tomada de decisões é entendida como a operação que impõe uma uniformidade das formas de tratamento das solicitações dos cidadãos que o estado realmente quer assegurar em paridade de condições e em relação a todos (Oliveira, 1996, p. 31).

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populações de uma dada área a responsabilidade de definir e concretizar o

caminho que preferem seguir (Oliveira, 1996, p. 35).

Em 1998, a tentativa de instituir as regiões administrativas227 no continente, que

daria início a um processo gradual de reorganização da Administração Pública e

de identificação, caso a caso, do nível mais adequado à tomada de decisão

(nacional, regional ou municipal) não teve sucesso já que foi inviabilizada pelos

resultados228 do Referendo sobre a Regionalização229. Assim, a Administração

Pública continua marcada pelo centralismo e pela baixa eficiência pelo que se

torna necessário proceder à reforma administrativa, dando coerência à divisão

territorial e proporcionando uma base sólida para o ordenamento do território

nacional. Uma das vias da reforma administrativa (urgente e necessária) seria a

criação de regiões administrativas, entendidas como autarquias locais

direccionadas para uma intervenção de base territorial nos domínios do

planeamento e da definição das prioridades de actuação da Administração Pública.

Refira-se a propósito que os Açores e a Madeira, de acordo com a Constituição da

República Portuguesa (artº 225º), constituem a única excepção do ordenamento

político-administrativo nacional visto gozarem de autonomia político-

administrativa sem, no entanto, afectar a integridade da soberania do Estado.

Esta breve abordagem histórica permite-nos identificar alguns dos principais

elementos que influenciam o ordenamento do território: as vias de comunicação, a

localização dos recursos naturais, o comércio nacional e internacional, o

povoamento e, naturalmente, a divisão administrativa do país.

227 Proposta de mapa das regiões administrativas: Entre Douro e Minho, Trás-os-Montes e Alto Douro, Beira Litoral, Beira Interior, Estremadura e Ribatejo, Lisboa e Setúbal, Alentejo e Algarve. 228 No Referendo à Regionalização, de 8 de Novembro de 1998, os resultados foram: votos contra 63,6%, votos a favor 36,4% e abstenções 51,7% - Diário de Notícias de 9 de Novembro de 1998, pp. 2-14. 229 Embora aliciante, a regionalização não será, contudo, por nós desenvolvida já que não é um dos objectivos da tese.

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196

4.2.2. Génese e evolução do conceito “ordenamento do território”

A ocupação do território é fundamentalmente resultado da interacção dinâmica

entre os recursos disponíveis do território e as necessidades das distintas

sociedades que dele usufruem. O modelo actual de ocupação do território é, por

conseguinte, consequência deste processo dinâmico, isto é, deste conflito

dialéctico que se desenrola ao longo da história (ver fluxograma 4.1). A

descrição de qualquer modelo territorial, referente a um país ou região, inicia-se

com o estabelecimento dos potenciais e condicionantes relacionados quer com as

características naturais (físicas e geográficas), quer com a evolução histórica

(social, cultural, económica e política).

Actualmente, a maior parte dos modelos territoriais distingue-se dos anteriores

pela sua maior independência em relação à fisiografia. Efectivamente, se no

passado este factor era determinante para a fixação da população e,

consequentemente, da actividade económica, na actualidade o desenvolvimento

tecnológico e a transformação do modelo económico, traduzida na globalização

dos processos produtivos, conduziu à polarização e concentração das populações

em zonas cada vez mais reduzidas e relativamente independentes da existência de

recursos naturais na sua proximidade. Refira-se que, na maioria dos casos, os

níveis de desenvolvimento das economias nacionais não está directamente

associada aos seus recursos naturais, mas sim à capacidade de os transformar, ou

por outras palavras, o desenvolvimento só é possível desde que os recursos

humanos, numa perspectiva educativo-formativa, sejam capazes de transformar os

recursos potenciais em recursos reais230.

A expressão ordenamento do território, embora numa acepção ampla que

engloba o planeamento económico regional e a economia do espaço, é utilizada

pela primeira vez, em 1947, por François Gravier (Antunes, 1998).

230 O Japão e o Brasil são dois exemplos que ilustram este postulado. Socorrendo-nos do Índice de Desenvolvimento Humano do PNUD, em 1998, verifica-se que o Japão ocupa o 8º lugar e o Brasil o 62º.

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197

Anteriormente, já Von Thünen (1826), Weber (1909) e Lösch (1940) se tinham

referido ao ordenamento do território sem, contudo, o explicitar formalmente.

Fluxograma 4.1 O trinómio recursos/território/necessidades

Fonte: Rodriguez, A. S., Dinâmica de la Ocupación del Territorio in Curso de Ordenación del

Territorio da Asociación Interprofissional de Ordenación del Territorio, FUNDICOT (citado em Reigado, 1999, p. 163)

Klaassen define o ordenamento do território como o estudo da utilização do solo

na região e a repartição desta utilização entre nós de diferente importância (op.

cit., 1965, p. 121). Para Merlin e Choay (1988, p. 29)231, é uma acção voluntária

231 Cit. in Cartas Municipais do Ambiente: Glossário, p. 77

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

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impulsionada pelos poderes públicos, que pressupõe um planeamento físico e

uma mobilização de actores (população, empresas, eleitos locais, administrações)

e que pode ser concebido a escalas muito diversas: do território de um país à de

uma cidade. Outros autores entendem-no como o conjunto de acções concertadas

visando dispor ordenadamente num território os habitantes, as actividades, as

construções, os equipamentos e os meios de comunicação. Reigado define o

ordenamento do território como a expressão espacial da política económica,

social, cultural e ecológica de toda a sociedade ou ainda como uma disciplina

científica, uma técnica administrativa e uma política concebida com um enfoque

interdisciplinar e global, cujo objectivo é um desenvolvimento equilibrado das

regiões e a organização física do espaço segundo um conceito que o rege (op.

cit., 1999, p. 171).

O ordenamento do território, sendo interdisciplinar, é composto por vários

sistemas e domínios - a demografia, os estabelecimentos humanos, a floresta, a

agricultura, a ecologia, as redes de distribuição, a conservação do património e o

recreio - que, por sua vez, se desdobram em vários sub-sistemas232.

A ocupação do território e o uso do espaço colocam problemas aos quais o

ordenamento territorial tenta responder ao constituir-se numa ferramenta de

articulação das políticas sectoriais com as decisões sobre o uso do solo. O carácter

globalizador do espaço leva a que o ordenamento do território seja uma disciplina

de síntese não só devido à sua pluridisciplinaridade (elementos de geografia,

economia, sociologia, urbanismo, direito, etc.), mas também porque exige a

integração dos vários processos que decorrem no território. O ordenamento do

território corresponde, assim, à organização ou seja a tornar orgânico todo um

sistema espacial, dispondo os seus elementos constitutivos nos locais de forma a

que estes ao desempenharem as suas funções contribuam para a evolução

232 A título de exemplo citem-se os subsistemas: urbanização, espaço rural, região de fronteira, habitação, indústria, equipamentos e serviços, ordenamento, gestão e utilização de recursos, protecção e conservação da biodiversidade, transportes, comunicações, lazer, desporto, etc..

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equilibrada do sistema económico e social, isto é, contribuam positivamente para

o bem estar das populações.

O conceito de ordenamento do território, designado Amenagement du Territoire

pelos franceses ou Town and Country Planning e Regional Planning pelos

urbanistas ingleses, foi evoluindo desde o ordenamento “normativo”, dos anos

cinquenta, até a um “novo” ordenamento com profundas preocupações ao nível da

ecologia e sustentabilidade do desenvolvimento.

A constatação de profundos desequilíbrios nas economias europeias traduzidos na

dicotomia: uma região norte que corresponde à zona industrial, activa e próspera

do país e uma região do sul, rural e condenada a produtividades menores e baixos

níveis de vida colocou o ordenamento do território na ordem do dia. A análise

mais profunda destes desequilíbrios mostra que, na realidade, há duas séries de

desequilíbrios, ou seja, um desequilíbrio profundo entre a capital e a província

devido, entre outros factores, a uma aberrante centralização que se foi agravando

durante séculos e que originou uma hipertrofia da capital e região circundante

geradora, por sua vez, de desequilíbrios demográficos, económicos e culturais

ainda hoje visíveis. A segunda série de desequilíbrios diz respeito às

desigualdades existentes entre as regiões de província, como por exemplo, o

interior português ou o Mezzogiorno italiano. A tomada de consciência das

diferenças de desenvolvimento e das condições de vida das populações de um país

suscitaram, quase por todo o lado, a implementação de medidas tendentes a uma

repartição geográfica mais equitativa das fontes de crescimento económico. Além

disso, o mau uso dos solos e o agravamento dos problemas ecológicos reforçam a

importância do ordenamento do território e, também, da elaboração e

concretização de políticas de desenvolvimento regional.

O campo de actuação do ordenamento do território será definido

progressivamente partindo-se de uma aplicação iminentemente urbana.

Efectivamente, do ordenamento urbano, ditado pela necessidade de reconstrução

das cidades, passa-se a falar de valores regionais e medidas que favoreçam a

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descentralização industrial ou a reconversão de empresas para se chegar à

promoção das condições de vida das populações que assegure uma igualdade de

oportunidades. Evoluímos assim, pouco a pouco, de uma política voluntarista de

ordenamento do território para uma política “organizadora”, ou seja, substituiu-se

a “geografia” que se contentava em descrever e analisar o espaço territorial pela

“geonomia” que pretende organizar o território tendo em vista o desenvolvimento

económico e social mais equilibrado.

A concepção de ordenamento “organizador” está bem patente no programa Por

um plano nacional de ordenamento do território apresentado, em 1950, por

Petit233 que assentava nos quatro elementos clássicos da política regional:

industrialização segundo um plano descentralizado, renovação da agricultura,

equipamento turístico e descentralização cultural. Os resultados obtidos, embora

não sendo negligenciáveis, dadas as resistências das estruturas administrativas e

psicológicas, estiveram bem longe das esperanças do legislador. Gravier (1947) ao

publicar a obra Paris et le désert français provocou um efeito de “choque” que

levaria a um esforço de reflexão profunda e de investigação sobre o

subdesenvolvimento regional, iniciado em 1933 pelos EUA (criação da Tennessee

Valley Authority) e pela Grã Bretanha, no ano seguinte, com a política das zonas

deprimidas e, depois, com o Relatório Barlow.

Apesar deste esforço, a lenta evolução das ideias e da regulamentação sobre o

ordenamento do território dão origem, nos anos 60, a políticas voluntaristas. Sem

perder o seu carácter de expressão da solidariedade nacional com as zonas

deprimidas, a política de ordenamento do território é agora percepcionada como

uma contribuição activa para o desenvolvimento económico e social do país. A

integração da política de ordenamento do território na política nacional de

desenvolvimento económico e social é assegurada pela tomada em consideração

dos objectivos regionais. A prática, contudo, não tardou a demonstrar que não

haverá ordenamento voluntarista sem um mínimo de planeamento.

233 Ministro da Reconstrução e Urbanismo francês.

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A crise económica da década de 70 e a política activa de ordenamento do

território, inspirada nas ideias de Perroux sobre o desenvolvimento polarizado,

irão ter fortes repercussões no ordenamento do território. Esta política assentava

em quatro vectores essenciais, ou seja, na industrialização descentralizada234, no

reforço da armadura urbana, no ordenamento do espaço rural e na protecção do

ambiente. O reforço da armadura urbana é percepcionada a três níveis, ou seja:

• as grandes aglomerações beneficiariam de um esforço para se equiparem,

especialmente, ao nível das actividades terciárias e “quaternárias” permitindo-

lhes, assim, fazerem a ponte entre a capital do país e as metrópoles regionais;

• as cidades médias seriam promovidas graças à celebração de contratos-

programa entre a cidade, o Estado e a região com o objectivo de melhorar o

nível de bem-estar das populações;

• as pequenas zonas geográficas à volta de pequenas cidades com fortes relações

sociais, culturais e económicas devido a características naturais ou uma longa

tradição histórica seriam, tal como as cidades de média dimensão, alvo de

contratos-programa que assegurariam a ligação entre a política de

desenvolvimento urbano e a política de ordenamento rural.

O espaço rural profundamente transformado pelo êxodo agrícola, pela

concentração das explorações e pela luta, cada vez mais intensa, entre as diversas

formas de ocupação do solo é dividido em zonas de actuação rural, zonas de

renovação rural e zonas de montanha. Os Planos de Ordenamento Rural tinham

como objectivo, por um lado, assegurar uma organização específica dos serviços e

do espaço e, por outro lado, favorecer a modernização das actividades tradicionais

e compensar a especificidade da agricultura de montanha. É com estes Planos que

a protecção e valorização do ambiente se torna parte integrante do ordenamento

do território.

A difícil conciliação dos objectivos do planeamento económico a médio prazo e

as exigências de uma conjuntura marcada pela inflação levou ao planeamento

234 Este assunto já foi referido no segundo capítulo.

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202

descentralizado, isto é, ao plano nacional que determina as escolhas estratégicas e

os objectivos a médio prazo juntam-se os planos regionais que farão das regiões

os novos actores do planeamento e do ordenamento do território. Nesta fase, a

centralização das funções do Estado dá lugar à repartição das suas competências

pelos órgãos regionais e locais, ou seja, o Estado passa agora a decidir somente

sobre o que não é exequível ao nível da Administração regional e local. Além

disso, o Estado transfere poderes para a esfera supranacional. A Comunidade

Europeia, por sua vez, acentua esta descentralização de competências através da

sua Política Regional e dos Fundos Comunitários. Estas alterações traduzem uma

mudança de paradigma uma vez que, segundo Lopes235 (1989), se substitui um

sistema de crescimento polarizado por um sistema que emerge e tem em vista o

desenvolvimento integrado (cit. Frade, 1999, p. 40). Contudo, a emergência de

regiões, como colectivo territorial, geridas por uma assembleia eleita por sufrágio

universal e directo e com um presidente com poder executivo pode levar a uma

certa ambiguidade, ou seja, poderá a descentralização que favorece o

desenvolvimento regional ser integrada no ordenamento racional do território? A

resposta a esta questão é positiva desde que, por um lado, as competências

reconhecidas à região, para traçar as suas acções e definirem as suas

competências, se exprimam no quadro das grandes opções nacionais de

desenvolvimento e de ordenamento e, por outro lado, os procedimentos de

arbitragem possam tornar as escolhas regionais compatíveis entre si e estas com

as nacionais ou, parafraseando Guichard, o desenvolvimento de um país não pode

ser nacionalmente conseguido se este não estiver territorialmente equilibrado (cit.

Lagujie, 1989, p. 30).

A OCDE (1986), baseada num estudo sobre os princípios e perspectivas da

política regional, alerta para a necessidade de definir as principais linhas

orientadoras do novo ordenamento do território dado terem-se verificado

profundas alterações nos sistemas territorial, produtivo, económico e social:

235 Lopes (1989) entende que o sentido actual do ordenamento do território não é o mesmo que existia nas décadas de 60 e 70. O carácter indicativo e centralizador de então, definido pela intenção de corrigir os desvios do mercado livre sem, contudo limitar a sua acção, é abalado pela crise económica vivida nos finais da década de 70 e década de 80.

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203

• as novas disparidades regionais que, ultrapassando largamente as disparidades

herdadas das duas anteriores revoluções industriais, provocaram novas

clivagens nos territórios nacionais;

• a vaga de inovações tecnológicas (informática, robótica, biotecnologia,

energias renováveis, materiais compósitos, etc.) que, segundo o esquema

clássico de Schumpeter estaria na origem de uma nova revolução industrial,

conduz a uma nova distribuição da população e das actividades no território.

Além disso, as novas tecnologias da informação possibilitam novas formas de

descentralização das actividades industriais e do terciário;

• a dimensão europeia, isto é, a política regional da UE até aqui considerada

como um complemento das políticas nacionais e um meio para a

convergência dos níveis de desenvolvimento das regiões deve transformar-se

numa verdadeira política de ordenamento do espaço europeu;

• a vontade política parece-nos, simultaneamente, uma evidência e uma

necessidade. Perante a diversidade e complexidade dos problemas a resolver

(as regiões encontram-se em diferentes fases de desenvolvimento) poderemos

ser tentados a concluir sobre a impossibilidade de definir uma política de

ordenamento do território deixando às regiões e aos mecanismos de mercado

a tarefa de implementar os ajustamentos necessários. Esta atitude, decerto,

levará ao agravamento das disparidades regionais, já de si tão graves, e

despoletará tensões sociais e pressões inflacionistas perigosas pelo que se

caminha para uma política de ordenamento do território solidária com as

regiões deprimidas evitando-se, assim, a desintegração da economia nacional

e europeia.

A política de ordenamento do território dos anos noventa caracteriza-se pelo

fortalecimento do que já existe, pelo estabelecimento do que ainda não há

(Uhrich, 1996, p. 1006). O ordenamento do território do final de século revela,

igualmente, o aprofundamento das características de descentralização interna e de

concentração externa que resultavam do período anterior. Assim, enquanto a

Administração regional e local atinge a estabilidade e maturidade institucional,

possuindo um lugar de maior destaque no quadro da Administração do Estado, ao

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204

nível comunitário regista-se o reforço das competências e dotações orçamentais

para o desenvolvimento regional, particularmente visível a partir do momento em

que se procedeu a mais uma reforma dos Fundos Estruturais (1988).

A ocupação do espaço pelo homem parece, assim, pressupor o seu ordenamento

devendo este contribuir, ao nível nacional, para a melhor organização do território

(descongestionamento das áreas de maior aglomeração urbano-industrial e

desenvolvimento das áreas rurais) e, ao nível supranacional ou europeu, para a

resolução dos problemas que ultrapassam as fronteiras individuais dos Estados-

membros favorecendo, assim, a criação de um sentimento de identidade comum.

Efectivamente, o ordenamento do território e, de um modo geral, as políticas

espacializadas são jogos de múltiplos actores locais, regionais, nacionais e

mesmo internacionais. Cada um dos agentes é agora levado a definir o lugar que

ocupa em relação aos outros e as relações que este conduz no seu relacionamento

com eles (Jayet, 1993, p. 55).

A política de organização territorial do Estado, percepcionada neste novo

equilíbrio de forças ainda não consolidado, reassume um novo significado e

incorpora novos conteúdos que passam pela concretização de três princípios

fundamentais, ou seja, dos princípios de gestão do património comum nacional,

do equilíbrio entre a conservação e o desenvolvimento e o da compatibilidade. Os

dois primeiros princípios estão estreitamente ligados já que gerir o património

comum pressupõe o aproveitamento integrado da componente humana com a

componente física, pressupondo igualmente a gestão da tensão entre o

desenvolvimento económico e a conservação da natureza. Isto implica que o

desenvolvimento não pode colocar em risco os ecossistemas naturais que são a

base de sustentação de vida na Terra ou, por outras palavras, o modelo de

desenvolvimento deve garantir a manutenção dos equilíbrios biológicos

indispensáveis ao equilíbrio global do planeta. É esta consciência que impõe

mudanças nos nossos comportamentos através de uma progressiva atenuação do

antropocentrismo a favor de uma relação mais equilibrada entre o homem e a

natureza (Alfonso, 1987, p. 864). Ora, o ordenamento do território tem um papel

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

205

essencial na integração espacial equilibrada dos elementos biológicos com a

actividade humana, isto é, tem um papel essencial na nova concepção do

desenvolvimento que, geralmente, designamos por desenvolvimento sustentável.

O terceiro princípio - a compatibilidade - traduz a coerência das decisões tomadas

aos vários níveis institucionais, com responsabilidades no ordenamento do

território, quer no interior do país (Estado, região, município), quer na sua

dimensão externa (Comunidade e Estados-membros). O ordenamento do

território representa uma mais valia incontestável quando é democrático, global,

funcional e prospectivo. Assim, ao mesmo tempo que se deve assegurar a

participação da população e dos seus representantes políticos, criando um quadro

institucional favorável à sua mobilização, terá de se efectuar a coordenação,

articulação e integração das várias políticas sectoriais com a de ordenamento do

território, aos níveis europeu, nacional, regional e local. A existência de

consciências regionais baseadas em valores, cultura e interesses comuns que se

sobrepõem frequentemente às divisões administrativas do país, e ultrapassam

mesmo as fronteiras nacionais, têm que ser equacionadas à luz das realidades

constitucionais dos vários países. Além disso, o ordenamento ao ser prospectivo,

deve analisar e integrar as tendências e o desenvolvimento a longo prazo dos

fenómenos e actuações económicas, sociais, culturais, ecológicas e meio

ambientais na sua actuação.

4.2.3. Os objectivos do ordenamento do território

O ordenamento do território, como vimos no parágrafo anterior, é uma actividade

globalizante e pluridisciplinar com objectivos muito concretos e interligados entre

si e que podemos sistematizar em:

• desenvolvimento sócio-económico equilibrado das regiões, quer a nível

nacional, quer ao nível supranacional (leia-se europeu);

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

206

• melhoria da qualidade de vida das populações;

• gestão responsável dos recursos naturais aliada à protecção do meio ambiente;

• utilização racional do território.

O indivíduo e o seu bem-estar, assim como a sua interacção com o meio ambiente,

constituem o ponto central do ordenamento do território, numa perspectiva de

desenvolvimento sustentável236. O ordenamento do território, estendendo-se a

quase todas as políticas nacionais e comunitárias, é considerado um instrumento

prático da integração da integração no esforço de coesão económica e social, bem

como um meio importante para a integração do ambiente nas políticas sectoriais.

O 5º Programa do Ambiente (1992a) reconhece este papel importante ao

ordenamento, já que pode fornecer ... as regras básicas do desenvolvimento sócio-

económico e da “saúde” ecológica de um país, região ou localidade.

A questão do desenvolvimento equilibrado das regiões aliada à da

sustentabilidade é extremamente importante para a União Europeia e, muito

particularmente, para um país como Portugal em que as assimetrias regionais

(numa dicotomia litoral/interior) são enormes. Efectivamente se, por um lado, nos

últimos anos se verificou um crescimento dos sectores geradores de emprego

pouco exigentes em qualificações e, consequentemente, com baixos níveis de

produtividade, por outro lado, consolidou-se um núcleo restrito (em termos de

peso relativo no emprego total e de concentração geográfica) de actividades da

236 O conceito de desenvolvimento sustentável representa uma tentativa de ir mais além do simples enunciado dos limites físicos do crescimento económico e de procurar como, em que termos e em que proporção os objectivos sócio-económicos tradicionalmente ligados ao crescimento podem ser conciliados com a preocupação de qualidade ambiental e as preocupações de equidade intertemporal (O’Connor, 1991). Para alguns, o desenvolvimento sustentável tenderia a tornar-se o paradigma do desenvolvimento para os anos 90 (Lele, 1989). O desenvolvimento sustentável é portanto multidimensional visto conduzir às dimensões económica, social e ecológica. Por outro lado, trata-se de um conceito normativo apreendido por Barbier e Markandya (1990) como um vector de objectivos sociais desejáveis, ou seja uma lista de atributos que a sociedade procura alcançar ou maximizar (cit. Faucheux e Noël, 1995, p. 286). O desenvolvimento sustentável é, geralmente, interpretado de duas formas. A primeira, qualificada de sustentabilidade fraca, conduz à regra de Hichs-Hartwick-Solow (HHS), segundo a qual a sustentabilidade é tratada como uma nova forma de eficiência económica estendida à gestão dos serviços da natureza. A segunda, ou a dita sustentabilidade forte, considera que a eficiência é um critério inadequado para satisfazer as preocupações do desenvolvimento sustentável pelo que os seus defensores propõem regras de sustentabilidade implicando, seja o estado estacionário (Daly, 1991), seja uma vontade de integrar preocupações económicas e ecológicas (Common e Perrings, 1992; Perrings, 1994).

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207

indústria, dos serviços e do conhecimento com produtividades elevadas e de

criação de emprego qualificado. Este modelo extensivo e dual de crescimento

económico conduziu a uma acentuada litoralização do território português237, isto

é, levou à criação de uma faixa costeira, descontínua a Sul, com uma forte

concentração de recursos humanos e actividade económica, e um vasto interior

(Alentejo, toda a zona de fronteira luso-espanhola e algumas bolsas do litoral)

com baixa densidade populacional, dotação insuficiente de infra-estruturas e

equipamentos, bem como um reduzido número de centros urbanos de média

dimensão.

Os índices sectoriais de desenvolvimento humano, em 1997, confirmam a

existência e, de certo modo, quantificam as disparidades regionais já enunciadas.

Recorrendo aos índices de educação, esperança de vida, conforto e PIB Real

per capita e estabelecendo três níveis de desenvolvimento (elevado, intermédio e

baixo) verifica-se que o interior e, em especial, a Beira Interior238 se encontra

geralmente no nível inferior de desenvolvimento (ver quadro 4.1).

Quadro 4.1

Índices sectoriais de desenvolvimento humano (1997)

Níveis NUT’s III Índice de Educação – IEDU Elevado

Intermédio Baixo

0,958 a 0,903 0,894 a 0,862 0,860 a 0,779

SE BIN, BIS, CB e PIS

Índice de Esperança de Vida – IEV Elevado Intermédio Baixo

0,862 a 0,859 0,856 a 0,843 0,840 a 0,795

BIS e PIS BIN, CB e SE

Índice de Conforto239 - IC Elevado Intermédio Baixo

0, 983 a 0,949 0,946 a 0,929 0,927 a 0,881

BIS SE, CB, BIN e PIS

Índice do PIB real per capita – IPIB/DPP

Elevado Intermédio Baixo

0,920 a 0,473 0,463 a 0,411 0,402 a 0,285

BIS PIS e CB BIN e SE

Fonte: Cónim, C. N. P., (1999), POPULAÇÃO E DESENVOLVIMENTO HUMANO. Uma

Perspectiva de Quantificação, Departamento de Prospectiva e Planeamento, Ministério do Planeamento, Lisboa, pp. 40-56

237 Os eixos de Aveiro-Valença e Leiria-Setúbal concentram 70% da população residente no litoral ou 14% da população da Península Ibérica (MEPAT, 1998a, p. III-2). 238 A Beira Interior integra as seguintes Nut’s III: Beira Interior Norte (BIN), Beira Interior Sul (BIS), Cova da Beira (CB), Serra da Estrela (SE) e Pinhal Interior Sul (PIS). 239 Neste índice considera-se a percentagem de população que dispõe de energia eléctrica, instalações sanitárias e água canalizada.

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208

Os índices sintéticos, isto é, os índices de desenvolvimento humano, de

desenvolvimento económico e social e de desenvolvimento social mostram que a

situação da Beira Interior se agrava um pouco. Exceptuando a Beira Interior Sul,

todas as sub regiões se situam no nível de desenvolvimento mais baixo (ver

quadro 4.2).

Quadro 4.2 Índices sintéticos de desenvolvimento humano (1997)

Níveis NUT’s III Índice de Desenvolvimento Humano – IDH/ONU

0,943 a 0,919 0,917 a 0,895 0,895 a 0,874

BIS BIN, SE, CB e PIS

Índice de Desenvolvimento Económico e Social – IDES/DPP

0,928 a 0,803 0,798 a 0,751 0,747 a 0,727

BIS BIN, CB, SE e PIS

Índice de Desenvolvimento Social – IDS/DPP

0, 930 a 0,902 0,900 a 0,873 0,872 a 0,839

BIS SE, CB, BIN e PIS

Fonte: Cónim, C. N. P., (1999), POPULAÇÃO E DESENVOLVIMENTO HUMANO. Uma

Perspectiva de Quantificação, Departamento de Prospectiva e Planeamento, Ministério do Planeamento, Lisboa, pp. 82-89

A distância que separa o litoral, com maiores índices de desenvolvimento, do

interior traduz ritmos de desenvolvimento quantitativa e qualitativamente

diferentes. Neste contexto e sendo o território um elemento activo do

desenvolvimento regional, é necessário inserir o interior português nas dinâmicas

competitivas globais, num espaço de equidade social e territorial, num uso

sustentável dos recursos naturais e num território inovador e criativo

(MEPAT240,1998b) recorrendo, por um lado, à utilização de novos instrumentos

de ordenamento do território como os Planos Prioritários de Desenvolvimento

Urbano (PPDU) e as Zonas de Localização Prioritária (ZDL) e, por outro lado,

ao reforço do papel catalisador dos Programas de Desenvolvimento Integrado

(PDI) ... (ibid.).

240 MEPAT – Ministério do Equipamento, do Planeamento e Administração do Território

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

209

A utilização racional do território, em conjugação com os objectivos definidos

anteriormente visa, por um lado, controlar a implementação, a organização e o

desenvolvimento dos grandes centros urbanos e industriais e das grandes infra-

estruturas e, por outro lado, a protecção e o desenvolvimento das zonas rurais de

forma a que estes dois espaços se integrem e se complementem.

Estes objectivos, sendo gerais e por conseguinte consensuais, encontram-se

definidos no articulado da actual Lei de Bases da Política de Ordenamento do

Território e de Urbanismo (artº 6º). De entre os objectivos aí enunciados,

destacamos os seguintes:

a) a melhoria das condições de vida e de trabalho das populações, no respeito

pelos valores culturais, ambientais e paisagísticos;

b) a distribuição equilibrada das funções de habitação, trabalho, cultura e

lazer;

c) a criação de oportunidades diversificadas de emprego como meio para a

fixação de populações, particularmente nas áreas menos desenvolvidas;

d) a preservação e defesa dos solos com aptidão natural ou aproveitados para

actividades agrícolas, pecuárias ou florestais ...;

e) a adequação dos níveis de densificação urbana e a aplicação de uma política

de habitação que permita resolver as carências existentes;

f) a reabilitação e a revitalização dos centros históricos e dos elementos de

património cultural classificado, bem como a recuperação ou reconversão de

áreas degradadas e/ou de génese ilegal.

A par destes grandes objectivos do ordenamento do território é possível, em

função do tipo de população predominante e das condições geofísicas do

território, traçar objectivos particulares. Assim, assumindo a diversidade do

território europeu, Reigado (1999, pp. 174-175) classifica-o em regiões rurais,

urbanas, fronteiriças, de montanha, pobres, em decadência e, por último, em

regiões costeiras e ilhas. A esta multiplicidade de regiões corresponde

naturalmente uma diversidade de objectivos particulares, nomeadamente:

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210

• regiões rurais – dada a sua função agrícola prioritária torna-se necessário criar condições de vida aos seus habitantes idênticas às das regiões urbanas, quer ao

nível económico, social, cultural e ecológico, quer em termos de infra-

estruturas e equipamentos. O desenvolvimento da rede urbana, das estruturas

sócio-económicas e dos transportes deverá ser efectuado de modo a permitir a

conservação e ordenamento da paisagem numa óptica de desenvolvimento

sustentável e equilibrado;

• regiões urbanas – atendendo ao seu importante papel no desenvolvimento da

Europa e, em particular, do país, estas regiões apresentam, com alguma

frequência, problemas de crescimento (densidades populacionais elevadas,

poluição sonora e atmosférica, taxas de utilização dos equipamentos próximas

da ruptura, etc.). O equilíbrio destas regiões exige a implementação de planos

de ocupação dos solos em que se privilegie o cidadão e a melhoria do seu bem-

estar. Neste contexto, a revalorização do património arquitectónico e cultural

deve integrar-se numa política de ordenamento do território e do espaço

urbano;

• regiões fronteiriças – na qual nos integramos exigem, de um modo muito

particular, uma política de coordenação das políticas públicas de ambos os

lados da fronteira tornando-a permeável e permitindo, por um lado, o

estabelecimento de processos de consulta e de cooperação transfronteiriça e,

por outro, o uso comum de equipamentos e infra-estruturas. A articulação com

Espanha é inevitável e a integração das economias portuguesa e espanhola será

uma realidade. Actualmente, segundo Jorge Gaspar, na energia,

telecomunicações, banca tudo se faz integrado com este país (cit. Madeira,

1999);

• regiões de montanha – têm um papel importantíssimo ao nível ecológico,

cultural, agrícola e de reserva de recursos naturais. As pressões de que são

alvo, dada a fragilidade do seu ecossistema, terão de ter como resposta uma

maior atenção na elaboração e implementação das políticas de ordenamento do

território que contribuam, por um lado, para o desenvolvimento equilibrado e,

por outro, para a sua preservação tendo em vista as gerações vindouras;

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211

• regiões pobres – estas regiões que, por razões históricas, se debatem com

debilidades estruturais e más condições de vida e de trabalho necessitam de

medidas excepcionais, quer da Administração Central, quer da União Europeia,

de forma a serem criadas as condições que permitam o início de um processo

de desenvolvimento apoiado, fundamentalmente, nos seus recursos humanos,

naturais e culturais, pelo que se torna necessário proceder à integração destas

regiões em planos de ordenamento do espaço urbano e rural, numa lógica de

articulação de todo o território nacional, sob o risco de se verificar uma

progressiva desertificação e degradação ambiental;

• regiões em decadência – a diminuição substancial da actividade económica em

consequência da reestruturação industrial, envelhecimento do equipamento e

das suas infra-estruturas e da mono especialização exigem uma política de

revitalização específica para estas regiões;

• regiões costeiras e ilhas – o turismo de massas, o transporte marítimo e a

industrialização exigem uma política específica que assegure o

desenvolvimento e a urbanização destes territórios apoiados nos recursos

endógenos e nas necessidades económicas e socais regionais, bem como na

protecção do seu meio ambiente relativamente frágil.

Esta tipologia de regiões deveria, em nosso entender, considerar ainda as regiões

susceptíveis a catástrofes naturais. No território europeu há regiões que integram

vulcões em actividade ou adormecidos, outras estão situadas próximo ou sobre

falhas tectónicas (o risco sísmico é elevado) e outras, ainda, localizam-se junto a

importantes corredores internacionais de tráfego marítimo. A especificidade

destas regiões exige, sobretudo, ao nível do ordenamento do território e da

localização das infra-estruturas e equipamento produtivo e colectivo um

tratamento especial de modo a prepará-las para a eventual ocorrência de

catástrofes.

A prossecução destes objectivos gerais e particulares exige a definição, por um

lado, da entidade ou entidades responsáveis pelo ordenamento do território e, por

outro, dos instrumentos a utilizar. Recorrendo à Lei de Bases da Política de

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212

Ordenamento do Território e de Urbanismo, publicada em 11 de Agosto de 1998,

verifica-se no seu artº 4º, que ao Estado, às Regiões Autónomas e às Autarquias

Locais compete a promoção, necessariamente articulada, de políticas activas de

ordenamento do território. Convém, contudo, realçar que não basta a

Administração Pública central e local promover o ordenamento do território, pelo

que é necessário dar-lhe um estatuto de cidadania reforçando os mecanismos

existentes de acesso à informação e fomentando a participação útil e efectiva dos

cidadãos nas decisões da administração e na plena garantia à tutela jurisdicional

do direito a um correcto ordenamento do território.

Em relação à segunda questão, isto é, aos instrumentos de gestão do território, a

resposta encontra-se no artº 9º da mesma Lei que enumera e caracteriza,

sumariamente, os vários instrumentos: Programa nacional da política de

ordenamento do território e Planos regionais, intermunicipais (facultativos),

municipais, especiais e com incidência territorial da responsabilidade dos

diversos sectores da Administração Central. Embora possuam características

próprias, os instrumentos de ordenamento do território (regulamentados pelo

Dec.-Lei nº 380/99 de 22 de Setembro) estão interligados entre si influenciando-se

mutuamente ou, por outras palavras, um plano de ordenamento do território de

nível inferior ao mesmo tempo que exerce uma certa influência no plano com uma

posição hierárquica superior deverá enquadrar-se no mesmo plano.

4.2.4. O ordenamento do espaço rural/urbano

Ordenar o território, como vimos, consiste em implementar um conjunto de

medidas articuladas que regulamentem a utilização do espaço, de modo a

melhorar as condições de vida das populações, a desenvolver as actividades

económicas e a valorizar os recursos e o património, evitando perturbar

gravemente os equilíbrios naturais. A necessidade de organizar o território torna-

se mais evidente e premente pelo facto de grandes zonas do território estarem

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

213

afectadas, por um lado, com a constante regressão e degradação da paisagem rural

e, por outro lado, com o acelerado e desregrado crescimento da paisagem urbana.

O rápido desenvolvimento dos centros urbanos que se tornaram os centros

económicos e, em certa medida, os centros de poder têm quase monopolizado a

atenção dos planeadores do território deixando as zonas rurais para um claro

segundo plano. O êxodo da população rural para as cidades à procura de melhores

condições de vida, traduzida no acesso a emprego mais aliciante e a toda uma

gama de serviços só disponíveis nas grandes cidades, tornou-se num movimento

natural que urge inflectir criando-se uma rede de médias e pequenas cidades,

dotadas de infra-estruturas, equipamentos e com uma boa oferta de serviços, em

articulação com o mundo rural despoluído e rico, em termos, de património

natural, cultural e arquitectónico.

O século XX poderá ficar na história da humanidade, como o século da mudança

de uma sociedade predominantemente rural para uma sociedade urbana: em 1900

menos de 10% da população mundial vivia em cidades enquanto que actualmente

metade da população do planeta é urbana (Albergaria, 1999, p. 2). Na União

Europeia a evolução é idêntica já que 49% da população vive em áreas urbanas241

que, por sua vez, correspondem a 3,5% da superfície total da mesma deixando

antever uma elevada densidade populacional, sobretudo, nas grandes cidades da

Europa Central e do Norte (CE, 1999a, p. 23). Efectivamente, a população

europeia concentra-se ao longo de um grande eixo urbano formado por cidades da

Bélgica, Holanda, Alemanha e Norte de Itália. A maior parte das outras áreas

urbanas de elevada densidade populacional (Roma, Paris, Sul-Este e Norte-Oeste

da Inglaterra e Copenhaga) situam-se na proximidade do eixo anterior. À volta da

zona central europeia, a configuração das áreas de povoamento é mais polarizada

e as áreas urbanas importantes estão separadas por vastos territórios de baixa

densidade populacional. De referir que as áreas rurais ocupam 80% do território

da União e aí vive, cerca de, 24% da população europeia (ibid., p. 23).

241241 Segundo os critérios adoptados pela União Europeia, consideram-se áreas urbanas aquelas em que a densidade populacional é superior ou igual a 500 habitantes por Km2. As áreas rurais, por sua vez, têm uma densidade populacional menor ou igual a 100 habitantes por km2.

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214

Em Portugal, assiste-se igualmente a uma urbanização242 crescente do território.

No final de 1998, havia oficialmente 121 cidades, das quais 92% se situavam no

Continente. De referir que a dimensão média das cidades do Continente é

reduzida (menos de 30 000 habitantes) o que está de acordo com o facto de 70%

das mesmas terem menos de 2 000 habitantes (Albergaria, 1999). Além disso

verifica-se, ainda, que entre 1864 e 1991, a população a viver em áreas agora

consideradas cidades triplicou (ver quadro 4.3) enquanto a população cresceu

apenas 144,8%. Em 1991, 86% da população do Continente vivia em concelhos

urbanos e concentrava-se em cerca de 55% da respectiva área (MEPAT, 1998,

p. 1).

Quadro 4.3

Evolução da população das cidades do Continente segundo a dimensão

Dimensão Nº 1991 1981 1900 1864 Tx. Cresc. 1991/1864

1 2 3 4 5 6 8=(3-6)/6 Menos de 10 000 hab. 39 250 709 257 049 128 595 99 271 1,53 Entre 10 e 20 000 hab. 36 508 574 496 209 226 462 167 878 2,03 Entre 20 e 30 000 hab. 17 413 731 408 399 129 684 86 429 3,79 Entre 30 e 100 000 hab.

17 976 523 943 305 209 212 142 928 5,83

Mais de 100 000 hab. 2 965 866 1 115 305 517 939 279 660 2,45 Total 111 3 115 403 3 240 267 1 211 892 776 166 3,01

Fonte: ALBERGARIA, H., (1999), “A dinâmica populacional das cidades do Continente

português”, comunicação apresentada no VI Encontro da APDR, Braga, 1 e 2 de Julho, p. 11

Em termos regionais, verifica-se uma distribuição irregular da população urbana e

algumas alterações no que se refere ao peso relativo das diferentes regiões (ver

quadro 4.4), nomeadamente:

• a região de Lisboa e Vale do Tejo, embora tenha atingido o pico em 1981,

vem mantendo e reforçando uma posição dominante desde o início;

242 O Conselho Superior de Estatística, em 1998, aprovou a seguinte classificação das freguesias (INE, 1998): freguesias urbanas: freguesias integradas em cidades ou aquelas que possuam densidade populacional superior a 500 habitantes por Km2. ou um lugar com população residente superior ou igual a 5 000 habitantes; freguesias semi-urbanas: freguesias não urbanas que

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215

• a região Norte, apesar de algumas flutuações, em 1991, mantinha uma posição

semelhante à que detinha em 1864;

• as regiões do Centro, Alentejo e Algarve são as que apresentam, em termos

relativos, a maior perda de população (entre 3,5 a 2,9 pontos percentuais).

Quadro 4.4 Evolução da repartição da população citadina do Continente entre 1864-1991

1991 1981 1970 1960 1950 1940 1930 1920 1911 1900 1864

Norte 30,4 27,9 29,2 29,2 28,3 28,8 28,6 29,6 30,5 31,1 31,0 Centro 12,9 12,1 12,4 12,5 12,6 12,5 12,8 13,0 13,8 14,6 16,4 Lisboa 45,9 49,8 48,4 47,1 47,3 46,6 45,9 44,9 42,6 40,0 36,0 Alentejo 5,3 5,4 5,7 6,3 6,6 6,6 6,6 6,5 6,8 7,2 8,3 Algarve 5,4 4,8 4,3 4,9 5,3 5,5 6,0 6,0 6,3 7,2 8,3

100,0 100,0 100,0

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100,0

100,0

100,0 100,0 100,0 100,0

Fonte: ALBERGARIA, H., (1999), “A dinâmica populacional das cidades do Continente

português”, comunicação apresentada no VI Encontro da APDR, Braga, 1 e 2 de Julho, p. 13

O critério adoptado para a definição de urbano e rural foi o de considerar urbanas

as áreas com uma densidade populacional elevada. Este critério parece-nos

razoável já que a especificidade dos espaços urbanos está ligada à proximidade

dos agentes económicos e dos contactos frequentes que essa concentração

proporciona às famílias e aos sectores de actividade (Sullivan, 1995). O espaço

urbano, como todas a s criações humanas, tem uma organização interna (variável

ao longo da história e de acordo com as sociedades) que estabelece correlações

entre os componentes de molde a funcionar como um sistema. Para Simões Lopes

(1984) a organização do espaço urbano tem a ver com o uso do solo, com a

adaptação e utilização que se lhe dá para acomodar diferentes actividades

humanas resultantes da aglomeração de pessoas em áreas urbanas. Claval (1987)

diz mesmo que, sem um mínimo de regulamentação a cidade achar-se-ia

rapidamente destruturada e Salgueiro (1992) refere, igualmente, que os problemas

colocados pelo crescimento urbano e a multiplicação de iniciativas que visam o

possuam densidade populacional superior a 100 habitantes por Km2. ou um lugar com população residente superior ou igual a 2 000 habitantes; freguesias rurais: as restantes.

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território, tornam necessário regulamentar a construção, disciplinar a expansão e

repensar a localização das diversas actividades que partilham o espaço.

O tempo em que as noções de cidade e de campo se distinguiam sem equívocos e

se opunham já vai longe. A cidade escondia-se atrás de uma couraça protectora de

muralhas e a partir daí reinava o espaço rural (Beaujeu-Garnier, 1993). A cidade,

apesar de ser uma criação da sociedade rural, viria a ter um ascendente, quer pela

acumulação de riqueza e respectivo “prestígio” que lhe anda associado, quer pela

concentração de poder civil, militar, e religioso que desde logo aí se radicou. O

crescimento urbano surge-nos, assim, como um factor incontornável que se

manifesta de várias formas (Lopes, 1984):

• em termos internos ao próprio centro urbano;

• pelo desenvolvimento dos seus subúrbios;

• pela degradação das suas áreas internas e adjacentes.

A cidade surge-nos hoje como uma entidade complexa e dinâmica, ao ponto de

ser cada vez mais complicado estabelecer, com exactidão, os limites entre o

espaço urbano e o espaço rural tal é a interpenetração e a mutação constante nas

áreas periurbanas. Como afirmava Le Corbusier (1977), a cidade clássica

desaparece e a aldeia (organismo rural coerente) acusa os estigmas duma

decadência acelerada em resultado do brusco contacto com a grande cidade que a

desequilibra e a desertifica. A civilização do século XX fez explodir as cidades e,

consequentemente, estenderem-se desorganizadamente violando o espaço e a

organização social rural que se vê impotente face à necessidade crescente de

espaço urbano.

O meio rural e o meio urbano são, assim, conjuntos com espaços de interacção

cada vez mais fortes e onde se foram criando forças de carácter contraditório cuja

compreensão se mostra fundamental para a conservação e valorização destes dois

espaços. Assim se, por um lado, o espaço urbano progride à custa do rural, por

outro lado, o tecido urbano (enquanto veículo de penetração de factores de

adulteração da identidade rural) é indispensável para proporcionar ao meio rural

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os serviços regionais ou mesmo locais especializados, transportar as inovações

externas e criar as condições para a inovação local. Daqui deriva a necessidade de

articulação destes dois territórios que, complementando-se, podem potenciar as

suas aptidões de modo, por um lado, a evitar uma evolução desvirtuante da vida

rural e, por outro lado, a não pôr em causa a dignificação da vida urbana. Por

outras palavras, o ordenamento e as políticas de desenvolvimento terão de ter um

carácter de discriminação positiva de forma a não se destruir a identidade destes

territórios e, assim, utilizar a especificidade como elemento do seu

desenvolvimento.

A integração dos territórios urbanos e rurais numa rede policêntrica deve ser, em

nosso entender, uma das prioridades da política de ordenamento do território, quer

a nível nacional, quer a nível municipal, impedindo a continuação da expansão

urbana desordenada e especulativa que se tem verificado no país. Uma política

eficaz de ordenamento do território deverá, portanto, abranger o “desenho” da

paisagem na qual se inclui a zonagem ecológica, o sistema hídrico, a

compartimentação cultural, as infra-estruturas viárias, os equipamentos e a

recuperação/transformação dos sistemas de utilização do espaço pelas actividades

(agrícola, florestal, lúdica e urbana) numa perspectiva de desenvolvimento social

e cultural das populações.

4.3. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO NA UNIÃO EUROPEIA

4.3.1. Breves considerações

As políticas de ordenamento do território, iniciadas um pouco por toda a Europa

após a carta de Atenas nos anos trinta, tiveram até aos anos noventa uma

dimensão nacional, pelo que foram quase totalmente ignoradas aquando da

assinatura do Tratado de Roma243. Embora na década de 60 se esboce a primeira

estratégia comum de ordenamento do território dos Estados-membros, só em

1982, o Conselho da Europa adoptou a Carta Europeia do Ordenamento do

243 Assinado em 1957 pelos Chefes de Estado da Comunidade Económica Europeia

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

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Território, no seguimento das Cartas Europeias do Património Cultural, do Solo e

da Água, definindo de forma inovadora os grandes objectivos que deveriam

orientar as políticas de ordenamento do território, de melhoria da qualidade de

vida e de organização das actividades humanas no continente europeu. Em

Novembro de 1989, na primeira reunião de Ministros responsáveis pela Política

Regional, realizada em Nantes, surge novamente na ordem do dia o debate sobre

os problemas do ordenamento do território, ainda que ligados à realização do

Mercado Único.

O alargamento das políticas regionais verificado nos anos 90, intimamente ligado

com a aceleração do processo de aprofundamento da integração europeia, e os

Fundos Estruturais (recentemente restruturados) têm como objectivo apoiar a

reestruturação do espaço europeu, apoiando prioritariamente as regiões mais

desfavorecidas. Assim, o ordenamento territorial na União ganha uma importância

nunca vista devido a factores de ordem política e económica, nomeadamente:

• a queda do muro de Berlim com a consequente reunificação da Alemanha;

• o desmoronamento da União Soviética e do bloco de leste;

• a globalização e mundialização das economias nacionais;

• o aprofundamento da integração europeia e crescente importância, quer das

entidades subnacionais (regionais e locais), quer das organizações comunitárias

(Parlamento Europeu, Comité das Regiões, etc.);

• o processo de alargamento da União ao Centro e Norte da Europa e a países

do Mediterrâneo;

• a manifesta incapacidade das medidas e políticas sectoriais, quer a nível

nacional, quer a nível da União, de conduzirem à eliminação/esbatimento das

assimetrias regionais;

• a deficiente e escassa articulação nacional das políticas de ordenamento do

território entre os Estados-membros (especialmente visível nas regiões de

fronteira).

Em Lieja (1993), numa iniciativa conjunta dos Estados-membros e da Comissão,

deu-se início à elaboração de um documento que servisse de guia para o

desenvolvimento da política territorial europeia. Assim, desde Lieja a Potsdam

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219

(1999), as várias presidências rotativas da União Europeia têm colaborado na

elaboração da Estratégia Territorial Europeia – ETE - que estabelece como

objectivos prioritários: a coesão económica e social, o desenvolvimento

sustentável e a competitividade equilibrada do território europeu. Esta estratégia

é inovadora visto, por um lado, os objectivos se combinarem através de uma

abordagem territorial e, por outro lado se relacionarem de forma directa formando,

assim, três pares: coesão/equilíbrio, desenvolvimento sustentável/protecção e

competitividade territorial/desenvolvimento. Paralelamente, procedeu-se à

elaboração do Esquema de Desenvolvimento do Espaço Comunitário – EDEC -

com o objectivo de melhorar a implementação das políticas comunitárias e

aumentar a sua eficácia e relevância. Além disso, a ETE/EDEC poderá contribuir

para aumentar os níveis de cooperação entre os Estados-membros e entre estes e a

Comissão, bem como levar as autoridades responsáveis pelo ordenamento do

território a uma maior ponderação das questões de desenvolvimento territorial

europeu numa fase precoce.

A elaboração e implementação de uma política de ordenamento do território

europeu, contudo, enfrenta as mesmas dificuldades sentidas ao nível nacional, ou

seja, a dispersão das competências sectoriais e a multiplicidade de agentes que

actuam no território. A sobreposição de níveis administrativos e as dificuldades

levantadas pelos Estados-membros sempre que têm de ceder competências a favor

de políticas mais globais agravam as dificuldades sentidas no ordenamento do

território. Actualmente, a política de ordenamento do território nos países da

União, exceptuando alguns projectos pontuais, é realizada fundamentalmente

através das políticas sectoriais244 pelo que a necessidade de pensar o território em

termos supranacionais, isto é, em termos da União Europeia vem reforçar a

actualidade das orientações inscritas ETE/EDEC.

A dimensão europeia é, hoje em dia, frequente nas políticas espaciais na maioria

dos Estados-membros. Na realidade são cada vez mais frequentes, quer as

consultas entre os Estados sobre questões transnacionais, quer a troca regular de

244 A Política Agrícola Comum ou os intervenções em infra-estruturas financiadas pelo FEDER têm uma extraordinária incidência territorial.

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220

informação sobre planeamento do território num quadro multi lateral. Além das

orientações saídas das cimeiras internacionais, alguns Estados-membros têm

elaborado documentos245 nos quais são traçadas estratégias comuns para a sua

política nacional de ordenamento do território ou para problemas específicos de

planeamento246. Saliente-se ainda, neste âmbito, os programas e projectos ligados

ao desenvolvimento espacial coerente de regiões pertencentes a vários países que

encontraram em problemas idênticos uma plataforma para a colaboração247. Neste

contexto, é de salientar a iniciativa comunitária INTERREG II-C (cooperação

transnacional) que aborda, entre outros aspectos importantes do desenvolvimento

sustentável, a cooperação em matéria do ordenamento do território, a prevenção

da seca mediante a utilização racional dos recursos hídricos, a prevenção das

inundações e a gestão das bacias hidrográficas, bem como a utilização

sustentável dos recursos naturais (CE, 1998, p. 144).

Não obstante este esforço no sentido de dotar a União com uma política comum

de ordenamento do território os resultados alcançados estão longe do desejável.

Efectivamente, o alargamento das políticas regionais e dos Fundos Comunitários,

e em particular dos Fundos Estruturais, não conseguiram provocar as alterações

pretendidas no ordenamento económico e social do espaço europeu. Pelo

contrário, as tendências para o agravamento das, já de si profundas, assimetrias

regionais parecem acentuar-se. Assim, por exemplo, enquanto entre 1986 e 1996

o índice do PIB per capita248 no Luxemburgo passava de 137,3 para 168,5, em

Portugal os valores eram, respectivamente, 55,1 e 70,5 (CE, 1999a, pp. 234-240).

Num processo paralelo, a política de desenvolvimento regional e as políticas

orientadas para o fortalecimento do Mercado Único e para o reforço da coesão

económica e social, embora implementadas a ritmos diferentes e com impactos

diferenciados (por vezes, até contraditórios) no ordenamento do território, vão

245 Cite-se, por exemplo, a Quarta Nota do Governo Holandês, a Horizon 2108 da Dinamarca, o Raumordnungpolitshe Orientirungsrahmen alemão. 246 Por exemplo: o Segundo Esquema Estrutural do Benelux debruça-se sobre o desenvolvimento rural, os principais eixos de desenvolvimento e a política de localização; o Baltique 2010: visão prospectiva e estratégias deve servir de base para as iniciativas de desenvolvimento integrado nas fronteiras da Alemanha, Dinamarca e futuros membros nórdicos da União. 247 Cite-se, a título de exemplo, programa piloto ATLANTIS (regiões do eixo atlântico) ou o INTERREG (regiões de fronteira). 248 Este índice para os quinze países da União tem o valor 100 (EUR15=100).

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221

moldando a União Europeia. A situação é idêntica no que diz respeito aos

programas de apoio ao desenvolvimento transfronteiriço já que, ao ficarem aquém

das expectativas geradas, têm consequências ao nível da coesão económica e

social e da criação da Europa dos cidadãos.

4.3.2. Os sistemas de ordenamento do território na Europa

Os desenvolvimentos económicos resultantes, directamente ou indirectamente, do

Mercado Único traduzidos no acréscimo de concorrência para atrair os

investimentos internacionais e na maior mobilidade das empresas e do emprego, a

par da necessidade de, por um lado, criar emprego nas regiões deprimidas e

periféricas e, por outro lado, estreitar os laços comerciais e económicos com os

Estados exteriores à União, colocam novos desafios aos sistemas de planeamento

espacial europeu. As grandes redes transeuropeias (incluindo as de energia e

telecomunicações), o número crescente de problemas ambientais, a dimensão

internacional dos problemas demográficos, o rápido aumento do número de

imigrantes provenientes da Europa Central e de Leste e do Norte de África e dos

refugiados vindos de outras partes do mundo, bem como a polarização social

traduzida na distanciação cada vez maior entre bairros ricos e bairros pobres, estes

marcados por forte desemprego, criminalidade e miséria são, igualmente desafios

importantes à capacidade dos sistemas de planeamento físico, económico e social

do território. Neste contexto, realce-se ainda a importância do financiamento do

sector público dado o seu papel decisivo na aplicação dos planos.

Os sistemas de ordenamento do território dos vários Estados-membros, sendo

bastante diversificados, resultam da conjugação de vários factores, tais como a

história, a geografia e as tradições culturais, o estádio de desenvolvimento da

economia e do sistema urbano, a orientação política e ideológica dos Estados-

membros, o regime de direitos de propriedade e de utilização dos solos ou a

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222

organização do Estado (CE, 1995, p. 141). Mas, vejamos as características

principais dos sistemas de ordenamento de alguns países que traduzem, de forma

exemplar, a diversidade de experiências neste domínio (ibid., pp. 147-160) :

• Bélgica - o sistema atravessa um período de transição: a região Flamenga tem

um sistema a três níveis (região, província e comuna) baseado em dois tipos

de planos (plano de estrutura249 e plano de aplicação); a região Valã tem um

sistema a dois níveis (regional e comunal) em que cada um deve elaborar o

plano estrutural para a região250 e o esquema de estrutura. As comunas

elaboram ainda planos de afectação251; a região de Bruxelas-capital tem um

sistema a dois níveis (regional e comunal com dois planos cada (plano de

desenvolvimento e plano de afectação). Os planos elaborados pelas comunas

são, posteriormente, aprovados pela região;

• Alemanha – o sistema, bem consolidado e combinando o federalismo com a

autonomia local, está organizado a três níveis: o Bund (Federação), os Länder

(Estados federados) e as Selbstverwaltungskörperschaften252 (autoridades

locais). O Ministério federal tem como função definir com os Länder um

documento geral de orientação e coordenar o planeamento especializado a

nível do Bund e as medidas de planeamento tomadas pelos Länder. Cada Land

elabora uma lei de planeamento (Landesplannungsgesetz) e adopta: um

programa de desenvolvimento (Landesentwicklungsprogramm), planos de

desenvolvimento (Landesentwicklungspläne) e planos regionais

(Regionalpläne). As cidades e comunas elaboram um plano indicativo de

utilização dos solos (Flächennutzungplan) e um plano coercivo de utilização

do espaço (Bebauungsplan). De referir que o controlo do planeamento e da

construção faz-se com a ajuda de um único instrumento, ou seja, a licença de

construção (Baugenehmigung);

• Grécia – o sistema de ordenamento do território é composto por: 1) uma lei

constitucional; 2) um conjunto de planos de desenvolvimento a nível nacional,

regional e de prefeitura (anartyxiaka programmata); 3) uma hierarquia de

249 Este plano forma o quadro director de conjunto. 250 Figura similar ao Plano Regional de Ordenamento do Território português. 251 Planos de sector e planos específicos de ordenamento. 252 Estas compreendem os Kreise (círculos), as Städte (cidades) e as Gemeinden (comunas).

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

223

planos legalmente coercivos: terrenos dentro do plano (entos schediou),

sistema de planeamento local pormenorizado (poleodomiki meleti), plano de

conjunto para a cidade (geniko poleodomiki schedio), esquemas directores

estratégicos para Atenas e Tessalonica (rythmistiko schedio); 4) instrumentos

legislativos ou de acção nacionais que regem o desenvolvimento das zonas

não abrangidas pelos planos (ektos schediou); 5) regulamentos gerais de

construção (GOK) aplicáveis a todo o país;

• Espanha – a Constituição de 1978 transferiu os poderes e competências de

ordenamento para as diferentes instâncias regionais pelo que as 17

Comunidades Autónomas podem elaborar as suas próprias leis sobre o

ordenamento do território nos domínios que não são da competência do

Estado253. Posteriormente, uma lei de ordenamento do território (1992) viria a

incluir no seu clausulado todos os instrumentos de planeamento espacial

propostos pelas diferentes regiões (Comunidades Autónomas). Além desta lei,

existe uma quantidade de diplomas legislativos254 que, não visando

directamente o ordenamento, têm sobre este implicações. Daqui resulta um

leque complexo de instituições e instrumentos de planeamento e ordenamento

do território espanhol;

• França – a autoridade pública é composta por 4 escalões: 1) o governo

nacional que define as regras e toma as grandes decisões sobre o

ordenamento; 2) as regiões que participam na coordenação do

desenvolvimento económico; 3) os departamentos que fornecem uma

assistência técnica às pequenas comunas do mundo rural; 4) as comunas que

se responsabilizam pelas infra-estruturas locais, planeamento local e

determinação da validade das propostas de ordenamento. Embora só o Estado

tenha poder legislativo e nenhuma colectividade territorial possa tutelar outras,

a sobreposição das competências, em questões de ordenamento do território,

leva a fortes e complexas inter relações entre as autoridades de diferentes

níveis. Os principais elementos do sistema são o Código do Urbanismo

253 Ao Estado cabe a elaboração de um Pano Nacional que sirva de quadro aos objectivos e políticas de planeamento espacial. Além disso, o Governo central elaborou um Plano Director de infra-estruturas para o período de 1993-2007 que abrange todo o território espanhol. 254 Diplomas sobre as zonas costeiras, auto-estradas, recursos hídricos, protecção dos espaços naturais, da fauna e da flora selvagem.

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224

(âmbito nacional), os Esquemas Directores (Schéma Directeur) elaborados por

um conjunto de comunas e os Planos de ocupação dos solos – POS – cuja

responsabilidade é da comuna;

• Itália - o sistema de ordenamento, revisto em 1990, opera aos seguintes

níveis: 1) ao nível nacional elabora-se toda uma série de planos sectoriais nos

quais se inclui um plano geral dos transportes; 2) os planos regionais, ou seja,

os Piani Territoriali di Coordinamento fornecem orientações sobre a

utilização dos solos aos escalões inferiores da Administração Pública; 3) a

nível local, elaboram-se os esquemas directores (Piani Regolatori Locali) que

definem a utilização dos solos através de um processo de divisão do território

em zonas para cada comuna;

• Inglaterra - embora o Governo central conserve uma influência e um poder de

controlo consideráveis, o sistema de planeamento espacial britânico é

descentralizado cujos principais elementos são: 1) as orientações nacionais

emanadas pela Administração Central; 2) planos de desenvolvimento não

coercivos: os esquemas directores com orientações globais e os planos locais

com orientações específicas; 3) um sub sistema de emergência de planos

unitários de desenvolvimento nas zonas metropolitanas; 4) um sub sistema

rigoroso de controlo para a maior parte dos vários tipos de ordenamento e de

alteração na utilização dos solos255.

Os sistemas de ordenamento e as práticas de planeamento espacial confrontam-se

com a necessidade de se adaptarem constantemente à evolução dos sistemas

económico, social e territorial europeu, bem como ao processo de globalização e

internacionalização da economia. Esta transformação constante não impede,

contudo, que se desenhem algumas tendências, nomeadamente (ibid., 1995, pp.

144-145):

• surgimento de um planeamento espacial mais global e complexo que reflecte

o facto das preocupações do planeador do território serem cada vez mais

amplas, abarcando desde a sustentabilidade do desenvolvimento económico

aos problemas com os transportes, o turismo, a habitação, a gestão dos

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resíduos urbanos e industriais, a qualidade da água e a protecção da natureza.

Da mesma forma, a avaliação (ex-ante e ex-post) das políticas sectoriais têm

um novo parâmetro: os impactos ao nível regional e territorial;

• consideração das forças de mercado traduz a sofisticação dos factores de

atracção do investimento estrangeiro e a flexibilização na escolha da

localização das empresas;

• simplificação dos processos de planeamento aliada a uma maior

descentralização das responsabilidades. Estas duas tendências,

aparentemente, contraditórias têm a ver com o prazo demasiado longo para a

tomada de decisão sobre a implementação de uma determinada infra-estrutura.

Assim, paralelamente à simplificação dos processos de tomada de decisão

eliminando circuitos e níveis de decisão, muitas das vezes sobrepostos, e

burocracias desnecessárias na Comissão Europeia e Administrações pública e

local é imperioso, apoiando-se no princípio da subsidiariedade, descentralizar

competências aproximando, assim, os decisores dos beneficiários das decisões

de ordenamento, ou seja, dos cidadãos;

• consenso crescente sobre o modo de actuação do planeamento espacial

perante os novos desafios. Os problemas ambientais e demográficos, os

impactos do Mercado Único e da mundialização da economia e as grandes

redes transeuropeias de transportes e comunicação levam os planeadores do

território e a classe política europeia e nacional, numa óptica de solidariedade,

a considerarem imprescindível:

• concentrar o crescimento nas zonas urbanas já existentes, regenerando as

cidades e promovendo a utilização dos locais subaproveitados;

• desenvolver uma política global de gestão do ambiente com o objectivo de

controlar a poluição na fonte, proteger e reforçar o ambiente natural;

• desenvolver uma acção global e multimodal no que diz respeito às

questões de mobilidade e aos transportes;

• utilização crescente de meios técnicos modernos e sofisticados como a

medida à distância e imagens por satélite.

255 A única excepção prende-se com as utilizações agrícolas e silvícolas.

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226

Apesar das tendências e dos esforços de harmonização dos vários sistemas de

planeamento do território, dos instrumentos, e mesmo, de conceitos, as soluções

preconizadas pelos países da União são diferentes. Assim, é possível distinguir

dois grupos de países, isto é, os seguidores de uma linha teórica idêntica à do

legislador francês (Portugal, Itália e Espanha) que privilegiam os aspectos

económicos do ordenamento do território e o grupo dos países com uma linha

diferenciada. Neste caso, citemos a Inglaterra que valoriza, de modo idêntico, as

componentes sociais, económicos e ambientais e a Alemanha que faz da gestão

equilibrada dos seus recursos naturais e da preservação do meio ambiente os

elementos centrais do planeamento físico do território.

4.3.3. O TERRITÓRIO DA UNIÃO EUROPEIA

4.3.3.1. Caracterização das grandes regiões

Em 1990, na reunião de Ministros de Turim, foi proposto um estudo prospectivo

sobre o território europeu que viria a ser apresentado, em Haia, sob o título

EUROPA 2000 - Perspectivas para o Desenvolvimento do Território da

Comunidade no qual se chama a atenção para o facto de o território europeu se

encontrar sujeito a um amplo leque de pressões directas e indirectas resultantes

de desenvolvimentos sócio-económicos, bem como de intervenções provenientes

de uma multiplicidade de autoridades nacionais e regionais responsáveis pelo

planeamento (C.E., 1992, p. 25). Em 1995, o relatório EUROPA 2000+ -

Cooperação para o Ordenamento do Território Europeu256 sugere a nova

organização do espaço europeu em 8 grupos territoriais (ver mapa 4.1) que

reflectem o desaparecimento das fronteiras internas da União e a criação do

Espaço Económico Europeu (CE, 1995, p. 171):

• as Regiões do Centro das Capitais que compreende o Sudeste da Inglaterra, a

metade sul dos Países Baixos, a Bélgica, o Norte e o Nordeste da França

256 Este Relatório analisa os factores mais importantes para a organização do território (povoamento e mobilidade da população, o investimento internacional, as redes transeuropeias de

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227

(inclui a Bacia Parisiense), o Luxemburgo, o Centro-Oeste e o Sudoeste da

Alemanha;

• o Arco alpino, compreendendo o Centro-Este da França, o Norte da Itália, a

Suíça e a Áustria;

• a Diagonal continental, que agrupa o Centro e a parte central do Sudoeste da

França, a parte Central do Norte e o interior da Espanha;

• os cinco novos Länder alemães (o território da antiga RDA);

• a Região Mediterrânica, que se estende ao longo da costa da União desde a

Andaluzia (Espanha), até à Grécia e inclui o Este da Espanha, o sul da

França, a maior parte da Itália e toda a Grécia, bem como as ilhas

mediterrânicas da União;

• o Arco Atlântico, que se estende do Norte da Escócia até ao sul de Portugal

Continental e inclui a Irlanda, a parte ocidental do Reino Unido, o Oeste da

França, o Noroeste da Espanha e Portugal Continental;

• as regiões do Mar do Norte, formadas pelo este da Escócia, o Norte, o Centro

e Este da Inglaterra, o Norte dos Países Baixos, o Noroeste da Alemanha e

toda a Dinamarca;

• as regiões ultraperiféricas, que compreendem os departamentos ultramarinos

da França (Guadalupe, Guiana, Martinica, Reunião), as Canárias, os Açores

e a Madeira).

Embora Portugal continental seja incluído no arco atlântico, algumas das suas

regiões têm mantido uma cooperação com outras regiões transnacionais

europeias: as Regiões Centro e Alentejo aderiram à Conferência de Regiões da

Diagonal Continental Europeia (CORDIALE257) e a Região Norte está a

desenvolver um projecto conjunto sobre as regiões de montanha258.

telecomunicações, de transporte e de energia, a protecção dos espaços abertos e os recursos hídricos). 257 A Conferência de Regiões da Diagonal Continental Europeia - CORDIALE – é formada pelas regiões de Aragón, Midi-Pyrénes, Extremadura, Centro, Castilla y León, Alentejo e Limousin. Em 20 e 21 de Abril de 1999 teve lugar em Cáceres uma Assembleia Geral. 258 O projecto intitula-se Adaptation des montagnes du Sud-Oueste europeen a la construction europeenne et la mondialisation e são participantes além da CCR Norte, o Conseil Régional du Limousin (França), a Diputación General de Aragón (Espanha), a Université de Limoges (França) e o Centre d ’́Etudes et de Recherches Appliquées au Massif Central à la Moyenne Montagne et aux Espaces Ruraux Fragiles - CERAMAC - (França).

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228

Mapa 4.1 As grandes regiões do território comunitário

Fonte: COMISSÃO EUROPEIA (1992), EUROPA 2000 – PERSPECTIVAS PARA O DESENVOLVIMENTO DO TERRITÓRIO DA COMUNIDADE, Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, Bruxelas, Luxemburgo, p. 73

A abordagem adoptada tem como principal objectivo salientar a importância das

dinâmicas transnacionais que farão evoluir a configuração do território europeu

Estes territórios têm características sociais e económicas diversas que procuramos

sintetizar no quadro 4.5.

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229

Quadro 4.5 Principais indicadores das regiões interiores e marítimas da União em 1991

Regiões interiores Regiões marítimas EUR

12 1 2 3 4 5 6 7 8

Superfície (% EUR 12) 11,2 12,6 18,8 4,7 9,8 21,1 8,4 100 População (% EUR 12) 25,9 15,9 6,0 4,6 8,4 13,5 13,4 100 Densidade (hab./Km2) 337 184 47 242 126 94 232 153 PIB/hab. (EUR12=100) 116 122 87 33 62 80 99 100 Tx. desemprego (% 1991-2-3)

7,6 4,6 10,1 14,1 18,9 10,0 8,6 9,4

Repartição do emprego (%): • agricultura • indústria • serviços

2,7

32,4 64,7

5,6

39,2 55,2

10,1 30,1 59,8

8,9

44,7 46,4

15,9 21,9 62,2

16,0 30,4 53,6

4,6

29,7 65,7

6,4

33,2 60,4

Elegibilidade aos Fundos Estruturais (% da população) • Objectivo 1

21,4 2,4

23,7

-

62,7 26,2

100,0 100,0

100,0 100,0

72,3 41,4

35,6 3,6

51,6 26,6

Legenda: 1 - Centro das Capitais 5 - Mediterrâneo Central 2 - Arco Alpino (exceptuando a Suíça e

a Áustria) 6 - arco Atlântico

3 - Diagonal Continental 7 - Mar do Norte 4 - Novos Länder

Fonte: COMISSÃO EUROPEIA (1995), EUROPA 2000+ Cooperação para o Ordenamento do Território Europeu, Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, Bruxelas, Luxemburgo, p. 173

A Europa em que vivemos e se desenha para o futuro (mapa 4.2) apresenta três

níveis de desenvolvimento diferentes (Reigado, 1999, pp. 157-160):

• o eixo do Reno, estruturado em forma de “banana”, com forte concentração da

oferta de potencial científico e tecnológico, de infra-estruturas e equipamentos

e de centros urbanos de grandes dimensões. Este eixo, embora apresente alguns

desequilíbrios em termos de crescimento, tem um dinamismo económico

elevado e a mais intensa e melhor estruturada rede de transportes e

comunicações, apesar de evidenciar alguns sinais de saturação e de pré-ruptura;

• o arco atlântico encontra-se numa situação intermédia em termos de dotação

de equipamentos e infra-estruturas, oferta de potencial científico e tecnológico

e densidade populacional. Além disso, o sistema urbano é desequilibrado com

uma situação e evolução demográfica contrastante visto alternar sub regiões

densamente povoadas com certas zonas rurais pouco povoadas. A perificidade

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230

do arco atlântico é, ainda, evidenciada pela ligação muito deficiente às grandes

redes de transporte259;

• o eixo mediterrânico e diagonal continental que, tendo condições geofísicas

diferentes, se caracterizam pela fraca dotação de equipamentos e infra-

estruturas, reduzida dinâmica económico-social aliada a uma baixa densidade

populacional e reduzido potencial científico e tecnológico. Em relação à

diagonal continental é possível distinguir três tipos de zonas (CE, 1995, p.

190): 1) zonas extremamente urbanizadas ou influenciadas pelas dinâmicas

metropolitanas (Tipo A) que compreendem os aglomerados de Madrid e

Toulouse, a província de Guadalajara (Espanha) e os departamentos Eure-et-

Loire e do Loiret (próximos de Paris); 2) as zonas rurais que dispõem de uma

estrutura urbana ou que estão profundamente integradas nas redes das

cidades médias (Tipo B) ... Saragoça, Valladolid, Pampelona, Tours, Dijon e

Limoges; 3) as zonas rurais frágeis e debilmente estruturadas por duma rede

de centros urbanos (Tipo C) com progressivo despovoamento.

Embora, o relatório Europa 2000+ não apresente os mecanismos de articulação

entre as várias regiões ou iniciativas chama, no entanto, a atenção para a

necessidade de implementar políticas transnacionais como meio de reforçar os

vínculos entre as regiões e as novas formas de conceber as perspectivas territoriais

que transcendem as fronteiras nacionais.

259 As regiões francesas são uma excepção.

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231

Mapa 4.2

Fonte: Reigado, F. M., (1999), Desenvolvimento e planeamento regional: abordagem sistémica, (no prelo), p. 157

4.3.3.2. O Esquema de Desenvolvimento do Espaço Comunitário

Na última década, a União Europeia tem feito progressos assinaláveis nos

domínios do ordenamento do território e do desenvolvimento regional. O Fundo

Europeu de Desenvolvimento Regional deixou de ser o “caixa” passivo, de março

de 1975, que pagava segundo a procura e em proporção das quotas nacionais

definidas pelos Estados-membros para se passar a uma programação que leve em

consideração: 1) a avaliação do progresso em conformidade com o plano

aprovado e dos resultados físicos; 2) a avaliação aprecia o impacto final do

programa em termos económicos e sociais e, cada vez mais, considera a eficácia

do sistema de gestão; 3) o controlo financeira avalia o respeito das regras de

dispêndio dos fundos (CE, 1999, p. 139). Em termos de concepção de

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232

desenvolvimento também se verifica uma evolução. Assim, enquanto no 5º

Relatório sobre o estado das regiões, a União sublinha a importância decisiva, no

desenvolvimento regional, dos recursos humanos e dos equipamentos de

transporte, já no 6º Relatório se chama a atenção para o facto do crescimento

económico não depender somente dos factores tangíveis (investimento público em

infra-estruturas e equipamento, investimento empresarial), mas também de

factores mais intangíveis e, sobretudo, da estrutura institucional. Os factores como

o capital social, a eficiência e eficácia da Administração Pública são, cada vez

mais, reconhecidos como elementos fundamentais do desenvolvimento regional.

A União estabeleceu, por iniciativa própria, vários programas, patrocinou a

elaboração de estudos prospectivos sobre o território europeu, entre os quais

salientamos os relatórios Europa 2000 e Europa 2000+”, as acções TERRA260, as

Acções-piloto de ordenamento do território261 o Esquema de Desenvolvimento

do Espaço Comunitário – EDEC - e a Estratégia Territorial Europeia - ETE.

Assumindo a elevação dos níveis de bem-estar das populações apoiado no

desenvolvimento económico sustentável e equilibrado, como objectivo último da

União Europeia, ao território são colocados novos desafios, pelo que este deverá

ser mais competitivo, viável e mais solidário, isto é, organizado de forma mais

equitativa e no respeito pela coesão económica e social. Neste contexto, e segundo

a Comissão Europeia (1995, pp. 16-47), as iniciativas de ordenamento do

território devem:

1. oferecer alternativas aos eixos mais sobrecarregados (das redes

transeuropeias de telecomunicações, de transporte e de energia,) que visem

servir as zonas desfavorecidas;

260 O convite à apresentação de propostas foi em 1996. Com uma dotação global de 20 milhões de ecus, a Comissão seleccionou 15 projectos-piloto a decorrer durante três anos: 5 projectos relativos a bacias fluviais, 5 a zonas costeiras, 3 a património cultural ameaçado, 2 a zonas rurais de acesso difícil e 1 a zonas com problemas de erosão. A assistência técnica do programa será iniciada em 1998 (CE, 9º Relatório Anual dos Fundos Comunitários – 1997, p. 48). 261 São quatro as acções-piloto a executar: periferia Norte (DK, FIN, S, N), Espaço alpino/Alpes orientais (A, I, D), “Archi-med” Mediterrâneo do sudeste (GR, I, Malta, Chipre) e “Porta do Mediterrâneo” (E, P, Marrocos). Cada acção-piloto tem uma dotação de 20 milhões de ecus (ibid. p.48) .

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233

2. privilegiar o desenvolvimento das cidades de dimensão intermédia e as redes

de cidades pequenas e médias como centro de organização e de irrigação das

regiões;

3. incluir a conservação do ambiente e da biodiversidade, bem como a luta

contra a sua deterioração;

4. contribuir para a integração e harmonização dos territórios europeus (com

particular destaque para as regiões periféricas);

5. contribuir para o reequilíbrio da estrutura urbana, a preservação dos espaços

rurais periurbanos (regiões do Centro das Capitais e do Mar do Norte) e a

revitalização das cidades rurais (diagonal continental e zonas interiores das

orlas atlânticas e mediterrânicas da União);

6. zelar pela coerência entre a repartição espacial dos empregos e da população

activa.

No seguimento do relatório Europa 2000+, o Comité de Desenvolvimento

Espacial iniciou em Lieja (1993), como já foi referido, a preparação do Esquema

de Desenvolvimento do Espaço Comunitário e a Estratégia Territorial Europeia

com o objectivo de construir um quadro global de referência com características

prospectivas que possibilite a preparação das políticas de desenvolvimento e

ordenamento do território europeu aos vários níveis de intervenção (comunitário,

transnacional e nacional) num contexto, por um lado, de aumento das disparidades

de desenvolvimento entre as regiões europeias porventura agravadas com o

desenvolvimento das redes transeuropeias e, por outro lado, de globalização da

economia e evolução das tecnologias de informação. A ETE/EDEC, cuja primeira

versão oficial foi apresentada em Noordwjik (1997) e a versão final em Potsdam

(1999), aborda as três componentes do território europeu, ou seja, a análise dos

componentes do território europeu de acordo com sete critérios de diferenciação

espacial - situação geográfica, riqueza económica, integração social, integração

territorial, pressão do uso do solo, recursos naturais e património -, um estudo

estratégico sobre a cooperação campo-cidade na Europa e a cartografia das opções

transnacionais.

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234

O estudo estratégico sobre a cooperação campo-cidade na Europa que consistindo,

basicamente, na compilação das várias fontes de informação, se centra em quatro

aspectos fundamentais:

• as principais tendências que configuram o território europeu;

• as funções territoriais e o potencial económico do sistema urbano europeu

(tipologia das cidades);

• a selecção de assuntos de interesse para a cooperação no desenvolvimento

rural e urbano;

• os possíveis campos de intervenção política e de cooperação campo-cidade.

O terceiro estudo, isto é, a representação cartográfica das opções técnicas

alternativas tem um carácter experimental e debruça-se fundamentalmente sobre a

diversidade, a complementaridade e cooperação no sistema urbano, as relações

campo-cidade, a acessibilidade, infra-estruturas e transportes, os recursos naturais

e gestão da água.

Os estudos efectuados e apresentados em Noordwjik (1997) permitiram concluir

que o modelo geográfico das actividades e de uso do solo em cada Estado-

Membro é cada vez mais influenciado por processos externos, resultantes de

forças económicas, sociais, físicas e outras, ou do impacte das políticas

comunitárias. Por outro lado, os Estados-membros e as regiões, ao organizarem o

seu território de acordo com as suas directrizes políticas terão de identificar,

compreender e ponderar os processos e questões de carácter territorial que

ultrapassam as fronteiras nacionais e, por isso, possuem ou adquirem dimensão

europeia. De referir, ainda, que as questões territoriais europeias são sobretudo,

mas não exclusivamente, aquelas que ocorrem a nível continental e transnacional

visto nelas se integrarem também os problemas que se manifestam a nível

regional ou local.

A compreensão das principais questões territoriais da Europa passa, por um lado,

pela compreensão de que as políticas comunitárias não têm um efeito neutro sobre

o desenvolvimento territorial da União Europeia e, por outro lado, pelo

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235

conhecimento de algumas especificidades e tendências das quais destacamos (CE,

1997, pp. 12-16):

• demográficas: taxa relativamente baixa de crescimento demográfico, aumento

da idade média da população, importância crescente da migração tanto no

crescimento demográfico como na distribuição da população;

• económicas: distribuição irregular das grandes, média e pequenas empresas,

internacionalização do comércio dentro da Europa, impacto da União

Económica e Monetária e do aprofundamento do processo de liberalização

económica, impacto das novas tecnologias da comunicação;

• ambientais: redução e gestão dos resíduos, alteração do clima, perda de

biodiversidade, elevada acidificação dos solos e intensiva utilização de

pesticidas.

Ao nível do território há também algumas tendências a consideração (ibid., pp. 17- 44): • alteração nas estruturas urbanas: formação de redes e agrupamentos de

cidades, alteração do potencial económico das cidades, continuação do

processo de expansão urbana, crescente segregação social nas cidades,

melhoria insuficiente da qualidade do ambiente urbano;

• alteração do papel e da função das áreas rurais motivada pela crescente

interdependência com as áreas urbanas;

• alterações na agricultura, base económica das áreas rurais: intensificação,

diversificação e marginalização;

• alterações nos transportes, comunicações e acesso ao conhecimento:

persistência de situações de incoerência a nível transfronteiriço, aumento dos

fluxos de transportes, aumento do congestionamento e dos pontos de

estrangulamento de tráfego, repartição desigual da acessibilidade no território

europeu, tendências para a concentração e afirmação de corredores de

desenvolvimento, assimetrias na difusão da inovação e do conhecimento;

• pressão permanente sobre o património natural e cultural da Europa: perda

de biodiversidade e áreas naturais, utilização insuficiente e poluição da água,

pressão permanente sobre paisagens culturais, pressões crescentes sobre o

património cultural.

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236

Este quadro realça a necessidade de um processo de tomada de decisões

coordenado não só a nível horizontal (entre sectores ao mesmo nível geográfico),

mas também verticalmente (entre níveis administrativos). O EDEC/ETE reflecte

três grandes objectivos para o território europeu: a) um sistema mais equilibrado e

policêntrico de cidades e uma nova relação campo-cidade; b) igualdade de

acesso às infra-estruturas e ao conhecimento; c) a gestão e desenvolvimento

prudentes do património natural e cultural (CE, 1997, pp. 62-83).

O equilíbrio do sistema urbano implica o aumento da complementaridade entre as

cidades tendo em vista a obtenção de benefícios da concorrência económica entre

elas superando, simultaneamente, as suas desvantagens. As vias para se atingir

esta situação vai desde a cooperação efectiva entre cidades, assentes em interesses

comuns e nos contributos de todas as partes envolvidas até à formação de redes de

cidades geograficamente próximas. Estas redes de cidades é podem desempenhar

vários papeis, isto é, podem contribuir para a distribuição de funções entre as

cidades de média dimensão e as grandes metrópoles, evitar uma polarização

excessiva em torno de determinada área metropolitana ou o declínio de

metrópoles em situação difícil, procurar complementaridades entre as cidades do

litoral congestionadas e as cidades do interior em declínio. A criação de redes

entre as pequenas cidades situadas em regiões de baixa densidade populacional e

economicamente débeis é também importante visto que a utilização em comum

dos recursos pode proporcionar a cada cidade participante os meios de que, só por

si, não poderia dispor.

A expansão das cidade e a difusão de um estilo de vida urbano deram origem a

zonas “híbridas”, isto é, zonas em que não se distingue de forma clara e objectiva

o espaço urbano do rural. A revitalização económica de muitas zonas rurais, em

especial nas regiões mais remotas, dependerá cada vez mais da regeneração da

economia das cidades e não da preservação de um sector agrícola em declínio. Em

várias zonas rurais assiste-se à diversificação da sua base económica, numa

perspectiva de complementaridade e o desenvolvimento sustentável, equilibrando

as funções estruturalmente determinantes (centradas na integração de actividades

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237

alternativas tais como o turismo e o lazer), mas não permitindo, todavia, que elas

se tornem predominantes em excesso.

Como já foi referido, a circulação de pessoas, mercadorias e informação através

da Europa é marcada por uma tendência para a concentração e a polarização que a

liberalização dos mercados dos transportes e das telecomunicações acentuam.

Além disso, numa economia mais incorpórea em consequência da sociedade da

informação, a concorrência entre as regiões (na Europa e no mundo) baseia-se

cada vez mais na capacidade de inovação e no conhecimento, isto é, no nível geral

de instrução e qualificações da população activa, pelo que se impõe uma

combinação de melhores acessos às regiões e uma utilização mais eficiente e

sustentável das infra-estruturas, conjugada com uma ampla difusão do saber e da

capacidade de inovação. A melhor acessibilidade, apesar de se tratar de uma

questão à escala da Comunidade, não depende somente da conclusão das

principais redes transeuropeias, mas também de medidas complementares de

desenvolvimento territorial para desenvolver ligações secundárias e fornecer um

serviço universal no sector das telecomunicações (CE, 1997, p. 71). O acesso ao

saber é, sem dúvida, importante para a competitividade europeia pelo que as

regiões, e em particular as mais desfavorecidas, devem ser capazes de enfrentar o

desafio da sociedade da informação, quer aumentando a sua capacidade de

inovação, quer participando activamente nas novas oportunidades económicas. Ao

governo, por seu lado, cabe promover a incorporação do ensino superior e a

investigação no tecido económico e criar as condições para o aumento do nível

geral de instrução e qualificação da população.

O terceiro objectivo tem a ver com a enorme riqueza natural da Europa, de grande

diversidade, mas que em muitos lugares se encontra ameaçada pela actividade

humana. O património cultural, enquanto expressão de identidade, transforma-se

num bem mundial caracterizado por uma grande riqueza e diversidade. Ora este

património, que se divide em áreas protegidas, áreas sensíveis mas não protegidas

e paisagens rurais de carácter cultural, exige a adopção de medidas específicas que

se adaptem às condições e características regionais. O ordenamento do território

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tem potencialidades para desempenhar um papel relevante, por um lado, no

controlo dos riscos susceptíveis de surgirem devido à actividade humana ou da

própria natureza e, por outro lado, na protecção das populações e dos recursos.

A água será um dos grandes motores do desenvolvimento no próximo século, pelo

que as políticas de gestão e da qualidade dos recursos hídricos deverão ser

integradas com o ordenamento do território. As estratégias de ordenamento do

território tendentes a apoiar as políticas de gestão da quantidade e qualidade da

água têm uma importância primordial nas zonas transfronteiriças e transnacionais,

uma vez que as bacias hidrográficas e os lençóis freáticos constituem recursos

comuns.

A diversidade das paisagens culturais europeias constitui, simultaneamente, um

registo histórico e uma expressão da interacção humana com a natureza. Os

esforços despendidos para conservar as paisagens regionais deve ser visto como

estímulo ao desenvolvimento económico já que constituem uma atracção turística

e contribuem para a captação de investimento. Este património exige uma gestão

cuidadosa e diversificada que vai desde a protecção dos locais de interesse

especial até à recuperação das paisagens afectadas pelo desleixo. De referir que,

com alguma frequência, os esforços para preservar o cultivo extensivo dos

terrenos agrícolas se afigura como a melhor medida para impedir que as terras

fiquem ao abandono. Esta situação é particularmente evidente nas zonas

ecológicas sensíveis, como por exemplo, nas montanhas e zonas costeiras. O

património urbano europeu não consiste apenas nos imóveis, pelo contrário, as

suas cidades são lugares de vida social intensa e de realização de acontecimentos

culturais. Contudo, muitas cidades europeias estão expostas a graves pressões de

comercialismo e da uniformidade cultural que eliminam a individualidade e a

identidade de cada cidade e levam, frequentemente, à desagregação da estrutura e

da vida social das cidades, pelo que é necessário e urgente encontrar uma resposta

adequada através de estratégias de desenvolvimento que incluam, em especial, o

ordenamento físico e uma política para o uso do solo.

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239

As políticas sectoriais têm, naturalmente, uma abordagem territorial e a sua

aplicação coordenada, horizontal e verticalmente, trará mais valias ao

desenvolvimento do território europeu. De referir ainda que as opções políticas

diferem consoante a escala e o âmbito da sua aplicação que, num contexto

europeu, terá três níveis:

• o nível europeu que permite a coordenação entre as políticas agrícolas,

sociais, regionais, do ambiente e dos transportes, ou seja aquelas que são

mais relevantes para o desenvolvimento territorial;

• o nível transnacional é considerado “pivot” para uma integração completa

das opções de política territorial visto ser a este nível que se podem formular

estratégias territoriais claras. Em termos de estratégias transnacionais, estas

poderiam desempenhar um papel positivo como directrizes para a

diferenciação das políticas sectoriais comunitárias nas diferentes regiões da

União e para a coordenação entre essas políticas comunitárias e as

correspondentes políticas nacionais. Aliás, o princípio da abordagem

integrada já está a ser aplicado no programa INTRREG II-C, em sete

grandes áreas de cooperação transnacional, no Mar Báltico (VASAB 2010,

Conferência de Visby, Declaração de Estocolmo ...) e as quatro acções-piloto

nos termos do artº 10 do FEDER (ibid., p. 88);

• nível regional/local. A sua importância advém do facto de as comunidades e

administrações aos níveis regional e local estarem entre os actores essenciais

no domínio do ordenamento do território europeu. Estes actores além das

iniciativas que promovem e pelas quais se responsabilizam são, muitas das

vezes, imprescindíveis para a implementação de políticas transnacionais já

que estas necessitam da complementaridade propiciada pelas políticas ao

nível regional e local.

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240

4.4. RESUMO E CONCLUSÕES

O problema do desenvolvimento regional sustentável que temos vindo a estudar

está intimamente ligado às questões do território enquanto elemento que suporta

toda a actividade humana, quer fornecendo os recursos, quer como local onde se

desenrola essa actividade. Ressalve-se, no entanto, que o território ao contrário do

que possa parecer tem vindo a assumir um papel activo com capacidade de

influenciar o desenvolvimento sócio-económico. As relações que se estabelecem

entre os recursos e as necessidades, sendo dialécticas e dinâmicas, não se podem

desligar do território pelo que este é, cada vez mais, um elemento estratégico do

desenvolvimento sustentável. A crescente concentração da população e das

actividades produtivas nas grandes cidades com os consequentes problemas de

poluição, sobrecarga dos equipamentos e de infra-estruturas e o agravamento dos

problemas sociais (a exclusão social é, porventura, um dos mais visíveis e graves)

a par da desertificação de vastas áreas do território colocam as questões do

ordenamento do território na ordem do dia. Mas, o que é o ordenamento do

território, quais os seus objectivos e instrumentos?

A resposta à primeira questão podemos encontrá-la nas várias definições deste

conceito. Assim, para Merlin e Choay (1988), ordenamento do território é uma

acção voluntária impulsionada pelos poderes públicos, que pressupõe um

planeamento físico e uma mobilização de actores (população, empresas, eleitos

locais, administrações) e que pode ser concebido a escalas muito diversas: do

território de um país à de uma cidade (cit. Antunes, 1998, p. 15). Reigado define-

o como uma disciplina científica, uma técnica administrativa e uma política

concebida como uma enfoque interdisciplinar e global, cujo objectivo é o

desenvolvimento equilibrado das regiões e a organização física do espaço

segundo um conceito que o rege (op. cit., 1999, p.171).

A segunda questão, ou seja, para que serve o ordenamento do território tem uma

resposta clara na actual Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e

de Urbanismo (artº 6º) que podemos sintetizar em quatro grandes objectivos: 1)

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241

desenvolvimento sócio-económico equilibrado das regiões, quer a nível nacional,

quer ao nível supranacional (leia-se europeu); 2) melhoria da qualidade de vida

das populações; 3) gestão responsável dos recursos naturais aliada à protecção do

meio ambiente; 4) utilização racional do território. Já em relação aos

instrumentos, a Lei de Bases prevê o Programa nacional, os Planos Regionais, os

Planos Intermunicipais (facultativos), os Planos Municipais, os Planos especiais e

os Planos sectoriais com incidência espacial262. O sistema de ordenamento do

território adoptado em Portugal (como veremos no capítulo seguinte) diferencia-

se dos existentes nos restantes Estados-membros da União Europeia apesar de,

nos últimos anos, se terem feito alguns progressos no que diz respeito à

harmonização, quer das políticas, quer dos sistemas e instrumentos.

A crescente integração da economia europeia exige que o território seja

percepcionado em termos supranacionais, isto é, em termos da União. No relatório

Europa 2000, apresentado pela Comissão Europeia (1992), o território continental

português263 é incluído na região Arco Atlântico que apresenta níveis médios de

desenvolvimento. Apesar disso, as Regiões Centro e Alentejo aderiram à

Conferência de Regiões da Diagonal Continental Europeia (CORDIALE264) e a

Região Norte está a desenvolver um projecto conjunto sobre as regiões de

montanha. No seguimento deste trabalho, em 1995, surge um novo relatório

Europa 2000+ a chamar a atenção para a necessidade de implementar políticas

transnacionais como meio de reforçar os vínculos entre as regiões e as novas

formas de conceber as perspectivas territoriais que transcendem as fronteiras

nacionais. Além destes relatórios, a União Europeia iniciou as acções TERRA265e

262 Por exemplo, citemos os planos de desenvolvimento da agricultura, os planos de bacia hidrográfica e os planos municipais de intervenção florestal. 263 Os Açores e a Madeira são consideradas regiões europeias ultraperiféricas. 264 A Conferência de Regiões da Diagonal Continental Europeia - CORDIALE – é formada pelas regiões de Aragón, Midi-Pyrénées, Extremadura, Centro, Castilla y León, Alentejo e Limousin. Em 20 e 21 de Abril de 1999 teve lugar em Cáceres uma Assembleia Geral. 265 O convite à apresentação de propostas foi em 1996. Com uma dotação global de 20 milhões de ecus, a Comissão seleccionou 15 projectos-piloto a decorrer durante três anos: 5 projectos relativos a bacias fluviais, 5 a zonas costeiras, 3 a património cultural ameaçado, 2 a zonas rurais de acesso difícil e 1 a zonas com problemas de erosão. A assistência técnica do programa será iniciada em 1998 (CE, 9º Relatório Anual dos Fundos Comunitários – 1997, p. 48).

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242

as Acções-piloto de ordenamento do território266 e elaborou o Esquema de

Desenvolvimento do Espaço Comunitário e a Estratégia Territorial Europeia

com o objectivo de construir um quadro global de referência com características

prospectivas que possibilite a preparação das políticas de desenvolvimento e

ordenamento do território europeu aos vários níveis de intervenção (comunitário,

transnacional e nacional) num contexto, por um lado, de aumento das disparidades

de desenvolvimento entre as regiões europeias porventura agravadas com o

desenvolvimento das redes transeuropeias e, por outro lado, de globalização da

economia e evolução das tecnologias de informação. A ETE/EDEC, cuja

preparação foi iniciada em Lieja (1993) e aprovada em Potsdam (1999), reflecte

três grandes objectivos para o território europeu: a) um sistema mais equilibrado e

policêntrico de cidades e uma nova relação campo-cidade; b) igualdade de

acesso às infra-estruturas e ao conhecimento; c) a gestão e desenvolvimento

prudentes do património natural e cultural (CE, 1997, pp. 62-83).

Portugal, enquanto Estado-Membro da União Europeia, participou na elaboração

desta estratégia e, obviamente, irá implementá-la. A integração do território

português na ETE/EDEC será objecto de análise no próximo capítulo dedicado ao

ordenamento do território português.

266 São quatro as acções-piloto a executar: periferia Norte (DK, FIN, S, N), Espaço alpino/Alpes orientais (A, I, D), “Archi-med” Mediterrâneo do sudeste (GR, I, Malta, Chipre) e “Porta do Mediterrâneo” (E, P, Marrocos). Cada acção-piloto tem uma dotação de 20 milhões de ecus (ibid. p.48) .

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243

5. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO NACIONAL

5.1. INTRODUÇÃO As questões do ordenamento do território foram durante décadas negligenciadas

pela Administração Central gerando-se, em consequência, um território

deficientemente estruturado com graves assimetrias entre o litoral e o interior,

quer ao nível da actividade económica, quer ao nível da dotação de infra-

estruturas e equipamento colectivo. O poder local, durante décadas submetido a

uma centralização muito forte, só com a revolução do 25 de Abril readquiriu

alguma autonomia e responsabilidades, entre as quais destacamos, as

competências no âmbito do ordenamento municipal que, contudo, passariam para

um segundo plano (à semelhança do que se passava a nível nacional) recriando-se,

assim, o quadro nacional à escala municipal.

O ordenamento do território exige o manuseamento de grande quantidade de

informação diversificada, mas com uma característica comum (a

georeferenciação) o que contribuiu para o desenvolvimento dos Sistemas de

Informação Geográfica. No caso português, a experiência na criação e

desenvolvimento do Serviço Nacional de Informação Geográfica (SNIG) é, em

muitos aspectos, inovadora. A curta história deste Serviço vai desde os anos

setenta, altura em que se iniciou o projecto da Base de Dados do pólo de

desenvolvimento de Sines, até ao lançamento do SNIG na Internet em 1995 e à

criação recente (Junho de 1999) de uma interface específica para o cidadão (o

GEOCID) poder aceder à informação geográfica digitalizada sem que o mesmo

tenha de recorrer a sofisticados e caros produtos informáticos. Paralelamente, à

implementação do SNIG, procedeu-se à criação da Base de Dados de

Ordenamento do Território com o objectivo de recolha e tratamento da

informação necessária à elaboração e monitorização dos planos de ordenamento

do território.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

244

Os planos de ordenamento do território, enquanto instrumentos privilegiados da

política de gestão do território, têm uma forte componente ambiental. Aliás, a

protecção e gestão do ambiente estão ligados ao planeamento do território e à

sustentabilidade do desenvolvimento sócio-económico formando um trinómio.

O planeamento ambiental foi sendo construído e evoluiu desde uma fase

caracterizada por um optimismo exagerado quanto ao crescimento ilimitado das

economias até à fase actual em que o princípio activo passou a ser o da

preservação e não o princípio intermédio do poluidor-pagador. Em relação aos

instrumentos de planeamento ambiental, Fraga (1995, p. 231 e segs.) divide-os em

três grupos: planos que possuem um conteúdo protector do ambiente, planos

especificamente ambientais e medidas que se efectivam através dos planos de

ordenamento do território. Já em relação ao ordenamento do território, a Lei de

Bases prevê três níveis geográficos a que correspondem dois níveis

administrativos. Os instrumentos, leia-se planos de ordenamento, classificam-se

conforme a sua abrangência territorial ou administrativa em regionais,

intermunicipais, municipais, especiais e sectoriais de incidência territorial.

A problemática do ambiente/desenvolvimento/ordenamento é interessante e

complexa pelo que iremos abordá-la numa perspectiva teórica e prática. Assim, o

presente capítulo estrutura-se em três partes sendo a primeira dedicada à

informação - sistemas de informação geográfica e base de dados do ordenamento

do território -, enquanto suporte do planeamento territorial. Na segunda parte,

trataremos de um componente essencial do desenvolvimento sustentável - o

ambiente - que além dos seus instrumentos específicos se realiza através dos

planos de ordenamento. Por último, a nossa atenção centra-se nos vários

instrumentos de ordenamento do território – programa e planos regionais,

especiais e municipais – visando o estudo dos conteúdos programáticos e o grau

de cobertura do território continental. Após o balanço sobre o estado do

ordenamento do território, encerramos o capítulo tecendo algumas considerações

sobre os planos de ordenamento no limiar do terceiro milénio.

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245

5.2. A INFORMAÇÃO NA ELABORAÇÃO DOS PLANOS DE ORDENAMENTO

5.2.1. Introdução aos sistemas de informação geográfica

Actualmente, e em diversos domínios, é possível constatar algum desajustamento

entre as potencialidades postas à nossa disposição pelas tecnologias de informação

e comunicação e os sistemas de informação existentes, que suportam processos

decisionais na Administração Pública, entre os quais o de ordenamento do

território. Informação completa e consistente aos níveis nacional, regional e

municipal/local sobre as dinâmicas da alteração dos padrões de uso do solo e, em

alguns casos, dos processos de planeamento do uso do solo, é bastante difícil de

obter. Esta situação advém, segundo Alves (1997), da conjugação de factores

decorrentes da relevância atribuída ao ordenamento do território no quadro das

políticas públicas, da própria natureza do ordenamento do território, do quadro

institucional, normativo e regulamentar vigente, da organização do sistema

estatístico e das limitações de carácter tecnológico.

Durante várias décadas, as questões do ordenamento do território tiveram um

papel secundário no quadro das políticas públicas e só com o X Governo

Constitucional é que estas questões ganharam um espaço de intervenção mais

amplo no conjunto das políticas com a criação do MPAT267. As sucessivas

alterações da orgânica dos Ministérios e dos respectivos serviços competentes, a

par da dispersão do quadro de atribuições e competências por diversas instituições

conduziu à ausência de um centro de racionalidade comum e de um observatório

de acompanhamento no âmbito da política de ordenamento do território. Além

disso, o quadro normativo tem sido pouco claro e exigente quanto ao nível e ao

conteúdo da informação técnica a oferecer nos instrumentos de planeamento e na

instrução dos processos de pedido de licenciamento de alteração do uso dos solos,

bem como do processo inter-institucional.

267 MPAT – Ministério do Planeamento e Administração do Território

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246

Ao contrário de outros tipos de dados, habitualmente tratados pelos sistemas de

informação, a informação sobre ordenamento do território é georeferenciada, isto

é, inclui indicações acerca da posição, possíveis ligações topológicas e

características das entidades (espaços delimitados e definidos geograficamente)

que representam (Burrough, 1986). Assim, esta informação, para além de estar

relacionada com localizações específicas, é também composta por espaços

geográficos e dados alfanuméricos, textos e atributos268 que os caracterizam.

A origem dos Sistemas de Informação Geográfica está ligada, pelo menos em

parte, a tarefas relacionadas com o ordenamento do território. A necessidade de

fazer o inventário de terras canadianas, de um modo fácil e rápido, levou à

utilização de tecnologia informática e ao consequente desenvolvimento do

Canadian Geographical Information System (1964). McHairg (1969) e o

Laboratório de Cartografia de Harvard são, igualmente, considerados os pioneiros

da utilização de Sistemas de Informação Geográfica no ordenamento do território

(Chrisman, 1988). De um modo geral, os sistemas de Informação Geográfica são

utilizados para o estudo da capacidade de acolhimento das actividades humanas

no território, isto é, para a análise do modo como as características do território

afectam as actividades humanas e, por outro lado, dos efeitos destas actividades

sobre o território (Alegre, 1983).

O ordenamento do território exige dois tipos de actividades complementares. A

primeira, tem a ver com a análise das relações que as distintas actividades e usos

dos solos (agrícola, urbano, industrial, etc.) mantêm com os diferentes factores

físicos (topografia, tipo de solo, etc.) e sociais (posição social das actividades,

necessidades de acessibilidade e acesso a centros urbanos). Conhecidas as

incidências que estes factores têm sobre as formas de ocupação do solo podemos

passar ao segundo tipo de actividades, ou seja, podemos determinar os lugares

268 Machado ( 1992) entende por atributos de segundo nível ou de iniciativa do utilizador as informações básicas comuns a qualquer sistema de georeferenciação (divisão política, hidrografia, rede viária, etc.) e informações temáticas (localização no espaço de múltiplos objectos que podem ser populações, conjuntos de bens, de actividades ou simples entidades, bem como a sua evolução temporal e características: distribuição de infra-estruturas, dos edifícios, dos transportes, das características e usos do solo, da riqueza, do emprego, etc.). A posição geográfica corresponde ao atributo de primeiro nível e é criado automaticamente pelo SIG.

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247

mais adequados para receber cada uma das actividades humanas que precisam de

se estabelecer. Esta abordagem dá origem a dois enfoques nos estudos de

ordenamento do território, ou seja:

• enfoque descritivo que pretende informar sobre as relações entre

determinadas propriedades do território e as actividades humanas. Esta

abordagem necessita de vários tipos de análise que vão desde a simples

descrição (cartografia temática, inventário da situação, etc.) à descrição

multivariada, mediante a classificação do território em unidades homogéneas.

Finalmente, definem-se áreas de associação/repulsa de uma actividade

humana (característica dependente) com combinações de factores físicos

(variáveis explicativas);

• enfoque normativo/prescritivo, cujo objectivo consiste na procura de decisões

sobre as restrições/recomendações em relação ao uso do território, apoia-se na

informação anterior, classifica-a e gera novas variáveis com valores

significativos para a actividade em estudo.

Este processo de manipulação da informação obriga à utilização de numerosas

capacidades dos SIG e, em especial, da que designamos por manipulação espacial

da informação. A inclusão nos Sistemas de Informação Geográfica de métodos de

avaliação multicritério e novos procedimentos de análise estatística vêm reforçar o

seu papel e transforma-os numa ferramenta essencial para o ordenamento do

território. Aliás, a digitalização da cartografia nacional269, a cartografia de dados

geo-referenciáveis e a utilização de imagens de satélites no âmbito do

planeamento/ordenamento do território é indispensável para a actualização

permanente de toda a informação de âmbito municipal, sub-regional, regional e

nacional.

As possibilidades de utilização dos SIG são “infinitas” indo, entre outras, desde a

monitorização e controle dos incêndios florestais, ao planeamento das áreas de

reflorestação e seu acompanhamento, ao ordenamento da florestas nas suas várias

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248

componentes (espaço de lazer, espaço de produção de produtos florestais e espaço

de preservação do ambiente), à monitorização e controle da poluição das reservas

naturais de águas, à realização de simulações e optimização de implementação de

redes de infra-estruturas e de equipamentos, à elaboração e gestão dos planos de

ordenamento das albufeiras, dos planos directores municipais, de pormenor e de

urbanização até a análises sócio-económicas. Além desta versatilidade e elevada

operacionalidade registe-se, ainda, por um lado, a enorme economia de meios

humanos, técnicos e financeiros e por outro lado, a elevada qualidade do produto

final.

5.2.2. A experiência portuguesa na utilização dos SIG

A experiência portuguesa na criação e desenvolvimento dos SIG é, em muitos

aspectos, exemplar. As dificuldades encontradas na produção automática de

mapas, na constituição de Bases de Dados Territoriais e sua integração nos

Sistemas de Informação Geográfica, puseram a descoberto as grandes deficiências

estruturais existentes ao nível da Administração Pública e do tecido empresarial,

bem como a dificuldade da Universidade em assumir um papel de antecipação dos

saberes que a sociedade necessita.

A primeira utilização de tecnologias de tipo SIG verificou-se em Portugal, nos

anos setenta, no projecto da Base de Dados do pólo de desenvolvimento de Sines

e na informação recolhida pelas Comissões de Planeamento Regional e outros

órgãos de planeamento (em ficheiros informáticos) com o objectivo de,

posteriormente, as representar cartograficamente em SYMAP. Nos anos oitenta,

tiveram lugar várias iniciativas dispersas, entre as quais se salientam os primeiros

esforços de informatização da cartografia básica existente nos Serviços

Cartográficos do Exército e no Instituto Geográfico e Cadastral. Refira-se, ainda,

o projecto de criação da Base de Dados para Análise Regional - BDAR – que

269 Esta cartografia que cobre todo o território nacional é disponibilizada pelos Serviços

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249

associava módulos de informação concelhia e distrital com tratamento

cartográfico e matemático270 e o pioneirismo do Ministério do Ambiente (Serviço

Nacional de Parques, Reservas e Património Natural) ao implementar um sistema

nacional integrado de gestão de áreas protegidas271.

A fase de consolidação dos SIG inicia-se em 1986 com a publicação do Despacho

SEIC 2/86, de Fevereiro, que cria um Grupo de Trabalho para o desenvolvimento

dum Sistema Nacional de Informação Geográfica272 - SNIG – dado o

ordenamento do território requerer não só o acesso, em tempo real, a informação

abundante, actualizada e facilmente acessível relativa a diferentes sectores e

disciplinas, como exige também a disponibilidade de meios de análise dessa

informação capazes de permitir a tomada de decisões tão correctas, justas e

oportunas quanto possível (Henriques, 1990). Esta abordagem, de tipo top-down,

surge na altura em que a Comunidade Europeia lançou o Programa CORINE e em

que se começava a sentir a necessidade de infra-estruturas nacionais de

informação geográfica em resposta, quer à crescente disseminação de informação

no formato digital, quer à popularização dos primeiros sistemas de informação

geográfica.

O Sistema Nacional de Informação Geográfica273 - CNIG -, embora criado em

1990, só viria a tornar-se uma realidade em termos “físicos”, em 1995, quando foi

lançado na Internet. O SNIG, estando em pleno desenvolvimento, integra o nó

Cartográficos do Exército e pelo Instituto Geográfico e Cadastral. 270 Este projecto decorreu de 1979 a 1985 numa colaboração do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa com o Laboratório Nacional de Engenharia Civil. 271 Ainda em desenvolvimento. 272 A temática tratada no SNIG é vastíssima, citando-se a título de exemplo (Abreu, 1996, p. 81): a)preparação da digitalização de toda a cartografia de base (militar, cadastral, agrícola, florestal, geológica, etc.); b) estudo e modelização de indicadores ambientais; c) gestão de Planos de Ordenamento de Áreas Metropolitanas, de Municípios, de Albufeiras e áreas envolventes, de parques tecnológicos, etc.; c) caracterização biofísica de bacias fluviais, definição de Normas para a qualidade do ambiente urbano, Produção de Cartas de Risco de Incêndio florestal, predição dos locais de ignição, modelização do comportamento do fogo, Defesa contra cheias, Distribuição do crime em áreas urbanas, Produção de atlas sócio-económicos, Modelização de trajectos urbanos em ambiente de risco; d)Detecção Remota; e) Cartografia temática. 273 Dec.-Lei nº 53/90 de 13 de Fevereiro. O sistema é constituído por uma rede de Sistemas de Informação Geográfica (SIG) que liga entre si os serviços produtores de informação georeferenciada organizada em base de dados, o Centro Nacional de Informação Geográfica (CNIG) e os Sistemas de Informação Geográfica de âmbito local, regional ou nacional.

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250

central do Centro Nacional de Informação Geográfica274 e as ligações à Rede de

Dados da Comunidade Científica Nacional (Universidades e Laboratórios de

Pesquisa) e à Internet, aos sistemas informáticos das Comissões de Coordenação

Regional, a algumas Câmaras Municipais (a título experimental) e ao

Departamento de Estatística do Ministério do Emprego e Segurança Social. Além

destas instituições (ligadas em rede) é cada vez maior o número de unidades de

investigação estatais e académicas (entre as quais a UBI275) a desenvolverem

Sistemas próprios, bem como de empresas que prestam serviços de consultoria

geral, de apoio à implementação de sistemas ou de tratamento especializado da

informação.

Em Junho de 1999, foi inaugurada o interface específico para o cidadão, o

GEOCID, mais apelativa e directa, tanto em termos gráficos como em temos de

navegação e acesso à informação (Henriques, et all, 1999, p. 38). O CNIG

pretende, ainda, contribuir para o aumento do número e tipo de utilizadores do

SNIG desenvolvendo, para tal, a criação de módulos temáticos dedicados a áreas e

utilizadores específicos (educação e ambiente). Apesar deste cenário favorável,

levantam-se algumas preocupações, sobretudo, ao nível da disponibilidade da

informação e do pessoal qualificado. Assim, na prática de gestão do território

pensamos ser fundamental garantir, por um lado, protocolos normalizados de

transferências de informação gráfica e alfanumérica e dos programas de

tratamento e, por outro lado, o acesso à informação e segurança dos dados

existentes. Em relação à formação estamos perante um desafio e uma

preocupação, quer ao nível básico (a integrar no ensino secundário e universitário

de acordo com os níveis e especialidades), quer na componente profissional que

274 O CNIG tem o apoio de três instituições: a Fundação para o Cálculo Científico Nacional (FCCN) que funciona como o Internet Service Provider do SNIG, o Departamento de Engenharia Civil do Instituto Superior Técnico e o Grupo de Análise de Sistemas Ambientais da Universidade Nova de Lisboa que colaboram na investigação e desenvolvimento de soluções para a disseminação das bases de dados de informação geográfica e utilização de tecnologias multimédia e de tecnologias associadas à WWW do SNIG (Henriques et all, (1999), p. 39). 275 Projecto de Criação do Centro Transfronteiriço de Informação Geográfica, no âmbito do INTEREG II, a decorrer no triénio 1997/1999. Este Centro tem dois pólos idênticos, um sediado na UBI e o outro na Universidade de Salamanca.

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251

se deverá adequar às configurações de cada sistema e ser fornecida no próprio

ambiente de trabalho.

5.2.3. A Base de Dados do Ordenamento do Território

No seguimento dos trabalhos de implementação do Sistema Nacional de

Informação Geográfica foi criada, em 1994, a Base de Dados do Ordenamento do

Território276 - BDOT - cujo conteúdo deverá integrar os diversos instrumentos de

planeamento e acompanhamento de alteração de uso do solo previstos na lei e

assegurar, simultaneamente, a maior cobertura possível de temas e de

instrumentos de acordo com a legislação vigente e a flexibilidade que permita a

inclusão de outros instrumentos, tendo como pressuposto o estabelecimento de

uma rede que materialize um sistema integrado de informação acessível a

qualquer utilizador (ver fluxograma 5.1).

Um dos elementos essenciais da BDOT é a cartografia que, tendo sido uma tarefa

manual de cartógrafos, pode ser automatizada por intermédio de meios

informáticos (utilizando os SIG277, por exemplo) tendo em vista a obtenção de

resultados de superior qualidade, mais rápidos, uniformes e de custos

significativamente mais baixos. A generalização georeferenciada define-se como

o processo ou processos de abstracção de dados geográficos disponíveis a

determinado nível, tendo em vista determinado objectivo, que envolve sempre a

necessidade de uma modificação/adaptação dos objectivos cartográficos em

função de uma redução de escala, para a produção de representações gráficas

(mapas) claras ou a adaptação/selecção da informação geográfica disponível

para fins analíticos (Silva e Painho, 1997, p. 113). Desta definição emergem dois

segmentos distintos: a generalização cartográfica (produção de mapas) e a

276 Despacho nº 97/94 de 11 de Dezembro

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252

generalização orientada para a modelação que, segundo Weibel (1995), tem como

objectivo principal o controlo da redução dos dados nos domínios espacial,

temático ou temporal, bem como a derivação de bases de dados a variados níveis

de precisão e resolução (ibid.).

Fluxograma 5.1 Enquadramento da Base de Dados de Ordenamento do Território

Fonte: Alves, R. A. (1997), “Informação sobre o estado do ordenamento do território:

passado, presente e futuro” in Sociedade e Território, Revista de Estudos Urbanos e Regionais, nº24

A recolha da informação de base, considerada uma etapa extraordinariamente

importante na construção da BDOT, é efectuada através de várias técnicas que

vão desde os métodos clássicos (entrevistas, observação directa, etc.) à

inteligência aplicada. Estas técnicas, com extraordinárias potencialidades,

apresentam características e utilidade diversa que procuramos sintetizar no

quadro 5.1.

277 Um SIG – Sistema de Informação Geográfica – é composto fundamentalmente por quatro elementos: o hardware, o software, a base de dados e o quadros técnicos responsáveis por construir, implementar e utilizar o sistema.

Política de ordenamento do território

Base de dados de ordenamento do território

- BDOT -

Monitorização (avaliação)

Instrumentos

Evolução da realidade Implementação

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253

Quadro 5.1 Métodos de aquisição de conhecimento

Técnicas Complexidade e

Utilidade Potencialidades Características e

Problemas Métodos clássicos (entrevista, observação directa, etc.)

- Útil a curto e médio prazo - Média complexidade - Possível automatização parcial

- Fornecem uma boa base de Trabalho

- Ideal para serem aplicados em grandes organismos produtores de cartografia

- O conhecimento adqui- rido permite explicações

sobre o mesmo - Necessita de experts

Análise dos documentos dos Produtores de Cartografia

- Útil a curto prazo - Baixa complexidade - Difícil automatização

- Boa fonte de conhecimentos e procedimentos

- Descrições vagas - As especificidades

raramente são explica- das - Possíveis conflitos

entre as regras Análise de Mapas (Reverse Engineering)

- Útil a curto prazo - Média complexidade - Difícil automatização

- Regras semi-formais de conhe- cimentos e procedimentos

- A ideia original que orientou a generalização pode ser obscurecida Por posteriores actuali-

zações - O mapa final pode não

revelar modificações intermédias

- Difícil definir a sequên- cia de operadores utili- zados

Machine Learning - Útil a curto e médio prazo - Alta complexidade - Possível automatização total

- Interpreta variado número de factos extraídos por Reverse Engineering - Melhora regras iniciais, adquiri-

das pelas outras fontes

- Poucas experiências realizadas utilizando Esta técnica em carto-

grafia

Redes Neurais (Machine Learning)

- Útil a curto e médio prazo - Alta complexidade - Possível automatização total

- Não é muito útil dado não existirem explicações - Permite a substituição da abor- dagem algorítmica por uma abordagem holística

- Poucas experiências realizadas utilizando esta técnica em carto-

grafia

Inteligência Aplicada - Útil a curto e médio prazo - Média/Alta complexidade

- Permite avaliação imediata dos operadores de generalização

- Aquisição de conhecimento atra- vés da acção Homem-/máquina - Permite a integração de conhe- cimento adquirido em função de várias fontes

- Necessita a coordena- ção humana - Poucas experiências

realizadas utilizando esta técnica em carto- grafia

Fonte: Adaptado de Weibel, R., (1995) “Three essencial Building Blocks for Automated

Generalization” in Muller, J-C, Lagrange, J-P and Weibel, R., (ed.), GIS and Generalization – Methodology and Practice, GISDATA 1, Masser, I.and Salgé F. (SerieEdt.), London, Taylor & Francis Ltd., pp. 56-70, cit. Silva e Painho (1997, p. 119)

Os fluxos de informação entre as várias entidades, muitas das vezes com trabalhos

já realizados e arquivos residentes em cada uma delas, têm características distintas

dado coexistirem temas e instrumentos com processos administrativos da

responsabilidade de uma só entidade e outros que envolvem entidades externas ao

ministério de tutela (ver fluxograma 5.2). A intensidade dos fluxos e a

complexidade da informação (as transformações dos padrões actuais de uso e

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

254

ocupação do solo assumem múltiplos aspectos) implicam a existência de uma boa

rede de comunicação de dados e o estabelecimento de um conjunto de normas e

rotinas processuais sobre a captura, o carregamento e a transferência de dados no

âmbito do ordenamento do território. Além disso, sendo a BDOT aberta, isto é,

integrada na rede pública de dados que permite o acesso generalizado torna-se

necessário garantir a segurança e confidencialidade da informação, nos termos da

lei, pelo que se utiliza níveis de privilégio de acesso ou filtros.

Fluxograma 5.2 Fluxos de informação da BDOT

Legenda: INE - Instituto Nacional de Estatística CCR - Comissão de Coordenação Regional DGOTDU

- Direcção Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano

A L - Administração Local (Câmaras Municipais) O E - Outras Entidades Fonte: Adaptado de Alves, R. A. (1997), “Informação sobre o estado do ordenamento do

território: passado, presente e futuro” in Sociedade e Território, Revista de Estudos Urbanos e Regionais, nº24

Este conjunto de situações implica a necessidade de estabelecimento de

protocolos de três tipos, nomeadamente:

• entre instituições com competências complementares nos fluxos de

informação estabelecidos na lei (por exemplo, produtor de informação ou de

estatísticas);

Entidades de tutela

Cidadãos

Outras instituições

BDOT

INE

CCR

DGOTDU

A L

O E

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255

• entre ministérios e instituições que partilham competências no ordenamento

do território, tendo em vista a obtenção de níveis de informação mais

completos e coerentes (por exemplo, Autarquias Locais, Instituto Nacional de

Estatística, Conservatórias do Registo Predial, Comissões de Coordenação

Regional);

• entre entidades responsáveis pelo ordenamento e entidades de outros

ministérios responsáveis por instrumentos específicos que interessam a este

domínio (por exemplo, entidades responsáveis pelos Planos de Ordenamento

de Áreas Protegidas, de Albufeiras de Águas Públicas, etc.).

As actividades a desenvolver no âmbito do PROGIP278 e do PROSIG279 podem

ser consideradas como um subsistema da Base de Dados do Ordenamento do

Território uma vez que, o primeiro envolve a realização de duas acções: a

digitalização dos Planos Municipais de Ordenamento do Território e o

desenvolvimento de uma aplicação informática para a gestão eficiente de planos

de ordenamento. O segundo, isto é, o PROSIG tem como objectivo o apoio à

execução de SIG’s ao nível municipal entendidos como instrumentos de

monitorização do planeamento territorial e, em particular, do território municipal,

traduzida numa atitude de contínua observação e análise sistemática a empreender

em paralelo com a implementação do plano municipal.

Decorridos cinco anos desde o lançamento do PROSIG e quatro anos de execução

financeira é já possível fazer um balanço provisório, não só em relação ao grau de

adesão dos municípios, mas também e sobretudo à capacidade de realização das

acções elegíveis, do impacto estruturante no ordenamento do território municipal

e da organização da sociedade de informação. A adesão dos municípios pode

278 PROGIP - Programa de Apoio à Gestão Informatizada dos Planos Municipais de Ordenamento do Território. Este programa, desenvolvido pelo INESC sob contrato do CNIG, permite a “navegação” e consulta específica orientada do PDM, a análise de pedidos de Informação Prévia e Licenciamento e a obtenção de indicadores estatísticos associados. 279 PROSIG - Programa de Apoio à Criação de Nós Locais do Sistema Nacional de Informação Geográfica. De referir que esta aplicação informática, desenvolvida no âmbito do PROGIP, inclui a componente do licenciamento da transformação do uso e ocupação do solo apresentando-se, assim, como o veículo principal para o fornecimento de informação técnica sobre o plano municipal, as acções que transformam o território e a articulação entre os dois.

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256

apreciar-se pelo número de protocolos celebrados. Como se verifica pela leitura

do quadro 5.2, foram celebrados 92 protocolos que cobrem 178 municípios, ou

seja 64,5% do total continental.

Quadro 5.2 Protocolos celebrados no âmbito do PROSIG

Municípios 1995 1996 1997 1998 1999 Total

A título individual 23 11 20 10 9 73 Associações ou Agrupamentos 5 4 4 4 2 19

Total 46 30 53 30 19 178

Fonte: MOURÃO, M. e GASPAR, R., (1999), “Sistemas de Informação nos municípios” in

Fórum SNIG, Revista Semestral do CNIG, Ano III, Nº 5, Novembro, p. 44 A simples leitura destes indicadores dão uma ideia errada sobre os avanços

registados na utilização das novas tecnologias de informação. Na realidade, uma

parte significativa dos municípios abrangidos não revelou qualquer iniciativa no

sentido de proceder à instalação do respectivo Sistema de Informação Geográfica.

Aliás, a debilidade dos SIG’s municipais é uma realidade devido a três factores

essenciais (Mourão e Gaspar, 1999, pp. 46-47):

• escassez de quadros nas autarquias e fortes condicionamentos à sua

contratação;

• dificuldade do mercado em disponibilizar informação cartográfica em formato

digital necessária ao planeamento e gestão municipal levando à orientação dos

esforços municipais no sentido de colmatar essa falha;

• tendência para o isolamento destes projectos que acabou por comprometer o

empenhamento dos poderes públicos.

Não obstante, e apesar das limitações já referidas, a experiência adquirida é

considerada positiva e levou ao alargamento do seu horizonte temporal280, até o

final de 2000, de forma a se atingir os objectivos subjacente à criação do

PROSIG. A implementação dos sistemas de informação municipais permite uma

280 Despacho nº 17720/99 de 10 de Setembro.

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257

maior operacionalidade à monitorização dos Planos Directores Municipais que,

segundo Lobo (1990), se estrutura em três níveis (cit. Silva, 1997, pp.183-184):

• operacional da execução dos planos, ou seja, a concretização da ideia de

futuro pretendida explicada pelos planos;

• do próprio território objecto do plano ou que nele influi – a realidade em

permanente transformação;

• aderência entre plano e sistema territorial.

Estes três níveis de monitorização articulam-se e implicam, por sua vez, o

acompanhamento de vários elementos, processos ou estados como se pode

verificar no quadro seguinte.

Quadro 5.3 Monitorização dos Planos Directores Municipais

Nível Monitorizações especiais

A - Execução dos planos A1 – Elementos Formais Fundamentais (Regulamento, Planta de Síntese, Planta Actualizada de Condicionantes) A2 – Objectivos do Plano A3 – Acções (outros planos de ordem inferior, estudos, projectos, obras e outras iniciativas)

B - Território objecto do plano B1 – Processos de transformação do território B2 – Estado e funcionamento do Sistema Territorial

C - Aderência entre plano e sistema territorial

C1 – Estratégia C2 - Impactes

Fonte: Elaborado a partir de SILVA, J. P. (1997), “Os SIG’s e a Monitorização do Processo de

Planeamento Urbanístico” in USIG 95 – III Encontro sobre Sistemas de Informação Geográfica, Lisboa, 27 a 29 de Setembro, pp. 183-184

Numa perspectiva sistémica, o Sistema Nacional de Informação Geográfica e a

Base de Dados do Ordenamento do Território representam um contributo muito

importante para o conhecimento dos múltiplos aspectos que assumem a ocupação

e a organização do território, bem como a simulação de cenários prospectivos.

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258

5.3. A COMPONENTE AMBIENTAL NO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO 5.3.1. O binómio ordenamento/protecção do ambiente

A protecção e gestão do ambiente, estando interligados com o planeamento físico

do território, formam dois domínios essenciais para o desenvolvimento

equilibrado e duradouro. Não obstante, existem algumas teses que defendem o

primado da política de ordenamento do território sobre a política ambiental e

outras que defendem o contrário. Assim, para uns, o ordenamento do território é

uma política global que condiciona o conteúdo da protecção ambiental, tal como o

faz para outras questões sectoriais como sejam a localização industrial, a gestão

energética, a implantação da rede viária ou a construção de infra-estruturas de

apoio à população e à actividade económica. Para outros, a defesa do ambiente

sobrepõe-se e comanda as finalidades do ordenamento do território com o

subsequente condicionamento do seu conteúdo. Puig (1980, p. 16) chega a afirmar

que o imperativo universal ambientalista implica que se deixe claramente exposta

a prioridade e o caracter axial, dentro do ordenamento do território, das

previsões próprias da planificação ambiental, sem que, em caso algum, possam

as leis e os planos permitir a inversão de valores.

Em nosso entender, a radicalização das posições não é acertada já que, na

realidade, o ordenamento do território (entendido como a conciliação do espaço

com o homem, as suas actividades e o meio ambiente garantindo o futuro das

gerações vindouras) é, antes de mais, uma política instrumental e horizontal, dado

que nela desaguam todas as políticas com impactos territoriais. A sua função é a

de, por um lado, proporcionar a convergência dos interesses próprios de cada

política sectorial e, por outro lado, coordenar através dos seus mecanismos (leia-

se, planos) a propensão “egoísta” de muitas das escolhas realizadas no seio da

política industrial, de transportes, de obras públicas, de energia, de saúde, de

educação e, naturalmente, do ambiente. O ordenamento do território faz, assim, a

síntese e a espacialização de todos estes vértices com o objectivo de realizar uma

política de desenvolvimento regional e local sustentável ou, como diz Ramón

(1987, p. 152), o desenvolvimento dentro da conservação.

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259

A protecção do ambiente, por seu lado, é objecto de uma política vertical que

torna efectivas algumas das suas prescrições através de técnicas de planeamento.

Refira-se que, contudo, a política ambiental não deixa de assumir um lugar

especial e transversal, no quadro das outras políticas, já que as suas regras

influenciam as opções tomadas noutras áreas. A título de exemplo, o requerimento

para a instalação de um parque industrial numa área na qual não haja um Plano

Director Municipal em vigor, deve ser acompanhado de uma planta de

condicionantes onde estejam assinaladas as Áreas Protegidas existentes, um

extracto das cartas da Reserva Ecológica Nacional e da Reserva Agrícola

Nacional e um estudo de impacte ambiental281.

O planeamento ambiental, que entrou na rotina do planeamento na década de 80,

era, até aí, utilizado principalmente como referência ao ordenamento do espaço

ecológico, natural, designando-se como ordenamento biofísico, tal como foi

introduzido pelo arquitecto paisagista americano McHairg (1969). A sua

utilização noutras áreas do planeamento deve-se à necessidade de atenuar ou

eliminar o conflito existente entre o ambiente natural e o desenvolvimento físico-

urbanístico e sócio-económico. Para Partidário (1993, pp. 10-11), de um modo

geral, o planeamento ambiental refere-se ao processo de planeamento que integra

factores ambientais, sociais e económicos em todas as intervenções de

planeamento do uso do espaço (Nesbitt, 1990; White, Sage, Rodammer e Peter

Jr., 1985). Outros autores salientam a incorporação da componente ambiental no

planeamento de projectos (Simmons e Allett, 1990). Ortolano (1984) destaca a

importância da incorporação de procedimentos de avaliação de impacte ambiental

e de medidas de controle de poluição no planeamento do ambiente. Planeamento

ambiental é, ainda, definido como uma tentativa de atingir maior racionalidade e

estabelecer uma estratégia viável no processo de tomada de decisão em relação à

protecção e gestão dos recursos naturais (Baldwin, 1985; Davis, Compagnoni e

Nanninga, 1987).

281 Artº 5º, alíneas a), b) c) e e) do Dec.-Lei nº 232/92, de 22 de Outubro.

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260

Em Portugal, a estratégia de planeamento ambiental veio a ser delineada na Lei de

Bases do Ambiente, e mais tarde no Plano Nacional do Ambiente que, por sua

vez, se articula com o Plano Nacional de Desenvolvimento Económico e Social e

o Plano Nacional de Ordenamento do Território. A integração do ambiente no

planeamento do território e do desenvolvimento económico e social deve-se ao

facto das variáveis físico-ecológicas, sociais e económicas se encontrarem em

profunda articulação e interacção (ver fluxograma 5.3) e tem como objectivo o

estabelecimento do equilíbrio entre a exploração dos recursos naturais e a

protecção do ambiente, segundo princípios de gestão sustentada de recursos, no

curto e longo prazo, e por forma a tingir, como objectivo último, benefícios sócio-

económicos para as populações.

Fluxograma 5.3 Modelo de planeamento ambiental integrado

Percepção ambiental

NECESSIDADES HUMANAS BÁSICAS

ESTRATÉGIAS DE DESENVOLVIMENTO

DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO

Fonte: PARTIDÁRIO, M. R. (1993), “A Integração da Componente Ambiental no Processo de

Planeamento” in Sociedade e Território – Revista de Estudos Urbanos e Regionais, Ano 6, Nº 18, Junho, p.11

BENEFÍCIOS SÓCIO-ECONÓMICOS

PROTECÇÃO AMBIENTAL

EXPLRAÇÃO DE RECURSOS

GESTÃO SUSTENTADA

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261

As estratégias de planeamento fornecem, por sua vez, um conjunto de medidas

técnicas e legais fundamentais para assegurar a sustentabilidade do

desenvolvimento em condições de equidade intra e intergeracional. O

desenvolvimento económico sem uma abordagem integrada deste tipo resulta em

poluição e degradação do património natural tal como o passado recente e a

realidade actual têm demonstrado. Um aspecto importante a ter em consideração é

o da sensibilidade das populações à qualidade ambiental, que depende do nível de

satisfação das suas necessidades básicas e da sua maior ou menor receptividade a

medidas de gestão sustentada dos recursos e de protecção ambiental, pelo que o

seu envolvimento e colaboração é uma condição sine qua non para a protecção

eficaz do ambiente.

Nas circunstâncias actuais, Ambiente/Desenvolvimento/Ordenamento são os

elementos de um do triângulo que se articulam e se influenciam mutuamente, pelo

que as opções de desenvolvimento e os mecanismos para as implementar, terão de

ser necessariamente diferentes das que se têm utilizado no pós-guerra.

5.3.2. A realização do planeamento ambiental através do ordenamento do

território

No quadro das economias ocidentais, a política do ambiente foi sendo construída

através de um enriquecimento sucessivo dos seus objectivos e dos seus

instrumentos, bem como em função da evolução económica e social dos países.

Numa primeira fase, caracterizada por um optimismo generalizado quanto ao

crescimento ilimitado das economias, as medidas ambientais incidiam apenas

sobre a protecção dos recursos naturais, em termos de raridade, diversidade ou

especificidade paisagística sem, contudo, implicar qualquer restrição significativa

no tocante à sua utilização.

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262

A segunda geração da política de ambiente coincide com o aumento progressivo

das acções de controlo sobre os índices de poluição atmosférica, hídrica e sonora,

em resultado de uma rápida e desregrada industrialização. A estratégia das

autoridades públicas passa pela fixação de parâmetros de emissão de cargas

poluentes e introdução do princípio poluidor-pagador. Os primeiros Programas

de Acção sobre o Ambiente da Comunidade Europeia, iniciados em 1973, são

característicos desta política de ambiente.

A política ambiental contemporânea baseia-se na concepção do desenvolvimento

equilibrado e sustentável que permite a convergência da qualidade do ambiente e

a manutenção dos ecossistemas com o progresso económico e social das

comunidades. O princípio activo é, agora, o princípio da prevenção e a sua plena

execução passa necessariamente pelo planeamento das actividades humanas e

aproveitamento racional dos recursos físicos que, afinal, não são inesgotáveis

como se “apregoava” até há bem pouco tempo.

A política de conservação da natureza da União Europeia no interior do seu

território baseia-se em duas Directivas282 que, estabelecendo as bases para a

protecção e conservação da fauna selvagem e dos habitats da Europa, apontam

para a criação de uma rede ecologicamente coerente de áreas protegidas - Rede

Natura 2000 – constituída por:

• Zonas de Protecção Especial - ZPE - destinadas a conservar 182 espécies e

sub-espécies de aves;

• Zonas Especiais de Conservação – ZEC - que visam conservar 253 tipos de

habitats, 200 animais e 434 plantas.

A tarefa de estabelecer estas zonas é da competência da cada Estado-Membro.

Antes, porém, é elaborada uma Lista Nacional de Sítios e submetida à apreciação

da Comissão Europeia para que, através de um processo de análise e discussão

282 Directiva do Conselho 79/409/CEE relativa à protecção das aves selvagens (conhecida por "Directiva das Aves") adoptada em Abril de 1979 e a Directiva do Conselho 92/43/CEE relativa a

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263

bilateral, possam integrar os Sítios de Importância Comunitária. Portugal tem

três parcelas do seu território incluídas nas seis zonas biogeográficas em que se

divide a Europa Comunitária, ou seja, o continente insere-se nas regiões atlântica

e mediterrânica e os Açores e a Madeira na região macaronésia (ver mapa 5.1).

Mapa 5.1 REGIÕES BIOGEOGRÁFICAS DA UNIÃO EUROPEIA

Em 1997, Portugal entregou à União uma primeira lista de sítios283 (ver mapa 5.2)

e, posteriormente, em Março de 2000, foi apresentada para discussão nacional

conservação dos habitats naturais e da fauna e flora selvagens (conhecida por "Directiva Habitats") adoptada em Maio de 1992. 283 Esta lista inclui ainda: a) nos Açores: Costa e Caldeirão - Ilha do Corvo, Caldeira, Capelinhos, Monte da Guia, Ponta do Varadouro e Morro de Castelo Branco - Ilha do Faial, Zona Central - Morro Alto, Costa Nordeste e Ilhéu de Baixo - Ilha das Flores, Restinga e Ponta Branca - Ilha Graciosa, Ponta dos Rosais e Costa NE e Ponta do Topo - Ilha de S. Jorge, Lagoa do Fogo, Caloura-Ponta da Galera e Banco D. João de Castro (Canal Terceira) - S. Miguel, Baixa do Sul (Canal do Faial), Montanha do Pico, Prainha e Caveiro, Ponta da Ilha, Lajes do Pico e Ilhéus da Madalena - Ilha do Pico, Ponta do Castelo e Ilhéu das Formigas e Recife Dollabarat (Canal S. Miguel - Sta. Maria), Serra Santa Bárbara e Pico Alto e Costa das Quatro Ribeiras - Ilha da Terceira; b) na Madeira: Ilhas Desertas, Laurisilva da Madeira, Maciço Montanhoso Central da Ilha da Madeira, Ponta de S. Lourenço, Ilhéu da Viúva, Achadas da Cruz, Moledos - Madalena do Mar, Pináculo, Ilhéus do Porto Santo, Pico Branco - Porto Santo e Ilhas Selvagens.

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264

uma segunda lista284 que, a ser aprovada, eleva a 21,3 a percentagem do território

nacional protegido.

Mapa 5.2 1ª Lista Nacional de Sítios – Continente

Fonte: Instituto de Conservação da Natureza

O 5º Programa de Política e Acção em Matéria do Ambiente e Desenvolvimento

Sustentável (CE, 1992), ainda em execução, tem entre os seus principais

objectivos a integração do ambiente nas políticas e acções empreendidas em cinco

284 A 2ª lista da Rede Natura 2000 inclui: Corno do Bico (Paredes de Coura); serra de Arga; Samil; Minas de Santo Adrião; Romeu; litoral norte de Esposende; barrinha de Esmoriz; serra da Feita e Arada; serra da Estrela; rio Paiva; Cambarinho; dunas de Mira, Gândara e Gafanhas; complexo da serra do Açor; Sicó/Alvaiázere; Azabuxo (Leiria); serras de Aire e Candeeiros; Peniche/Santa Cruz; serra de Montejunto; Nisa/Lage da Prata; Fernão Ferro/Lagoa de Albufeira; serra de Monfurado; Alvito/Cuba; Moura/Barrancos; Arade/Odelouca; ria de Alvor; barrocal/serra do Caldeirão e cerro da Cabeça (Vasconcelos, H., Diário de Notícias, 16 de Março de 2000).

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265

sectores-chave (indústrias transformadoras, transportes, energia, agricultura e

turismo) de forma a, por um lado, evitar a ocorrência de problemas ambientais e,

por outro lado, minimizar os impactos dos desastres ambientais. Neste contexto,

nos últimos 20 anos, a indústria tem tido uma atitude mais positiva para com a

política do ambiente reduzindo os resíduos e recorrendo a tecnologias mais limpas

e de baixo consumo de energia. O sector de turismo continua a crescer e prevê-se

que continue a aumentar o seu potencial de emprego que representa, actualmente,

1,6 milhões de postos de trabalho na União Europeia (CE, 1996, p. 8).

O ambiente é uma componente cada vez mais importante dos fundos estruturais

da União, quer ao nível da política agrícola (oportunidades de financiamento

oferecidas em troca da adopção de programas agro-ambientais285), quer ao nível

da política regional. A este nível saliente-se a atribuição, em 1994, de 1 000

milhões de ecus a projectos no domínio do ambiente financiados pelo Fundo de

Coesão, o financiamento regional da renovação urbana e o sistema de

financiamento para o ambiente (LIFE)286. Em 1997, além da inclusão de uma

nova rubrica orçamental (B2 – 1600) que consagra os aspectos ambientais na

política de coesão, o FEDER e o Fundo de Coesão financiaram acções ligadas ao

ambiente em mais de 50 milhões de ecus.

Em termos nacionais, a expressão financeira das acções actualmente consideradas

de protecção do ambiente eram inscritas no programa de investimentos sectoriais,

isto é, da agricultura, silvicultura e pecuária (protecção e conservação dos recursos

florestais), da investigação científica e da habitação e urbanismo (saneamento

básico). Nos trabalhos preparatórios do Plano de Médio Prazo 77/80 o ambiente

aparece, pela primeira vez, individualizado. Contudo, e apesar da existência do

Ministério do Ambiente e Recursos Naturais desde 1990287, só em 1991, a

Administração Central viria a expressar as suas intenções de investimento

relacionados com o ambiente em PIDDAC. Nesse ano a despesa em ambiente

285 Estes programas foram introduzidos aquando da reforma da PAC em 1992. 286 Este sistema entrou em vigor em Dezembro de 1992. 287 Dec.-Lei nº 94/90 de 20 de Março.

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266

representava 1% do investimento total em PIDDAC e evoluiu até os, cerca de,

4,5% em 1996 (Gonçalves, A., 1996, p. 272). De referir que, embora o PIDDAC

reflicta o carácter horizontal do ambiente, o Ministério do Ambiente tem

absorvido o maior volume de investimentos (85 a 97% do total) canalizado para a

monitorização do estado do ambiente, gestão dos recursos hídricos, elaboração

dos planos de ordenamento da orla costeira, conservação da natureza com especial

atenção para aos habitats particularmente frágeis, raros ou ameaçados e o

estabelecimento de um sistema de gestão de resíduos. De referir ainda, que as

acções no âmbito do PIDDAC são financiadas através do orçamento nacional e

dos Fundos Comunitários que actualmente são sensivelmente equivalentes (ver

quadro 5.4).

No III Quadro Comunitário de Apoio será afectado à conservação da natureza, no

âmbito do Plano Operacional do Ambiente, um total de trinta milhões de contos,

até 2006 resultante de uma componente de fundos comunitários e outra de fundos

nacionais. Há também a possibilidade de mobilizar o programa LIFE, e as

medidas agro-ambientais (Pereira288, P., 2000).

Quadro 5.4 Fontes de financiamento do investimento no ambiente

288 Pereira, Pedro Silva, Secretário de Estado da Conservação da Natureza e Ordenamento do Território, na apresentação pública da lista da segunda fase da Rede Natura 2000.

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267

Apesar da evolução positiva verificada nos últimos 20 anos, a Comissão Europeia

no 9º Relatório Anual dos Fundos Comunitários - 1997, numa avaliação

intercalar do II QCA, sugere o reforço das intervenções no domínio do ambiente

(CE, 1998, p. 115) e chama a atenção para a importância do respeito pelas

prescrições em matéria de ambiente e conservação da natureza e, em especial, da

Directiva Habitats que constitui a raiz da Rede Natura 2000.

Os instrumentos de planeamento ambiental tal como a política têm evoluído em

resposta à crescente complexidade e profundidade dos problemas ambientais. Os

instrumentos de planeamento ambiental, segundo Fraga (1995, p. 231 e segs.),

podem dividir-se em três grupos:

• planos que possuem um conteúdo protector do ambiente. A sua acção tem

como objectivo a articulação racional do conjunto das potencialidades

económicas, físicas e infra-estruturais decorrentes de cada espécie de recurso.

A título de exemplo, citemos os Planos Municipais de Intervenção Florestal

(Dec.-Lei nº 423/93, de 31 de Dezembro), o Plano Nacional da Água e os

Planos de Bacia Hidrográfica (Dec.-Lei nº 45/94, de 22 de Dezembro) e o

Plano Nacional de Resíduos que se integra no Plano Nacional de Política de

Ambiente (Resolução de Conselho de Ministros nº 38/95, de 21 de Abril);

• planos especificamente ambientais cuja vocação é de explicitar e coordenar

as acções de conservação e as actividades permitidas dentro da área

protegida. O parque nacional, a reserva e o parque natural e, ainda, a área

protegida de âmbito regional e local, devem possuir obrigatoriamente o

respectivo Plano de Ordenamento elaborado ou sujeito a parecer, conforme o

caso, pelo/do Instituto de Conservação da Natureza. Estes planos contemplam

as medidas de salvaguarda e a gestão dos usos dominantes da área protegida

(artº 14º, 15º e 26º do Dec.-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro);

• medidas que se efectivam através dos planos de ordenamento do território. O

ordenamento físico é, de um modo geral, percepcionado como a expressão

mais característica do planeamento de ordem ambiental. A delimitação da

RAN e da REN nos planos regionais e municipais de ordenamento do

território são um exemplo deste tipo de medidas.

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268

Apesar do importante papel do planeamento ambiental, este não esgota a

problemática da política do ambiente. O planeamento ambiental é apenas uma das

faces desta política, ou seja, é a que está ligada à promoção da gestão e

regeneração dos recursos naturais. Efectivamente, grande parte das regras de

protecção ambiental ganha operacionalidade e efectividade práticas através dos

instrumentos privilegiados do ordenamento do território (planos regionais,

municipais e especiais). Por sua vez, a gestão e organização eficazes do território

com vista à melhoria das condições de vida do homem, enquanto finalidade

absoluta do planeamento do espaço físico, ficará amputada sem a consideração

das questões ambientais que, com maior ou menor consciência, representam uma

necessidade tão premente como quaisquer necessidades básicas colectivas ou

individuais.

No domínio do ambiente, o ordenamento jurídico português possui algumas

figuras que, mantendo uma relação privilegiada com o ordenamento do território,

se servem dos seus meios para ganhar maior operatividade. Efectivamente, as

Áreas Protegidas, a Reserva Agrícola Nacional e a Reserva Ecológica Nacional

não dependem da execução de planos de ordenamento do território e têm

identidade própria como elementos integrantes de uma estratégia jurídico-material

de salvaguarda dos valores ambientais.

A actividade de planeamento ambiental e físico do território apoia-se em duas

Leis de Base, isto é, a Lei de Bases289 do Ambiente (1987) que define seis

componentes ambientais naturais (o ar, a luz, a água, o solo vivo e subsolo, a flora

e a fauna) e três componentes ambientais humanos (a paisagem, o património

natural e construído e a poluição), assim como identifica os instrumentos da

política de ambiente, entre os quais destacamos além dos planos municipais e

supramunicipais de ordenamento do território, o plano nacional de ambiente e a

reserva ecológica nacional e a Lei de Bases290 da Política de Ordenamento do

Território e de Urbanismo (1998) que, no seu art.º 5º, explicita os princípios gerais

do ordenamento do território dos quais destacamos o da economia (utilização

289 Ainda por regulamentar. 290 Regulamentada pelo Dec.-Lei nº 380/99 de 22 de Setembro.

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269

ponderada dos recursos naturais e culturais) e o da coordenação (articulação e

compatibilização do ordenamento com o desenvolvimento económico e as

políticas sectoriais).

Apesar dos princípios enunciados, os instrumentos de gestão do território (e

particularmente, os planos de ordenamento do território) ao darem prioridade aos

aspectos sócio-económicos do desenvolvimento e à captação de investimentos

para infra-estruturas parecem subalternizar a política de ambiente. A razão desta

situação, para Vítor Martins, em declarações ao Público291, está no facto de que só

recentemente os economistas estão a passar da economia-espaço-recursos

naturais para o novo paradigma do território-economia-ambiente em que o

território, como entidade mais complexa do que o espaço, atribui ao ambiente um

papel que não tinha na noção de espaço. Ao nível da Administração Pública é

também visível esta reorientação ao considerar, pela primeira vez, no Plano

Nacional de Desenvolvimento Económico e Social 2000-2006 (PNDES) que o

ambiente é um dos pilares essenciais de uma estratégia de desenvolvimento

sustentável (MEPAT, 1998a, p. VIII-21). O actual modelo de crescimento

económico português produziu um passivo ambiental importante (ibid., p. VIII-

21) cuja recuperação exige elevados custos económicos e ambientais. Assim, o

novo modelo de crescimento deverá contribuir para (ibid., p. VIII-21):

• a transformação estrutural da economia portuguesa se processe num quadro

de valorização económica, social e ambiental dos recursos naturais;

• integração efectiva do ambiente nas políticas de coesão social, territoriais e

de desenvolvimento sectorial ...;

• a diminuição das crises ambientais e sobre a saúde humana, associados aos

processos de introdução e uso de novos produtos e processos tecnológicos.

291 19 de Abril de 1999

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270

5.3.2.1. As Áreas Protegidas

A experiência portuguesa inicia-se com a publicação em 1970, da Lei nº 9/70, de

19 de Junho, que previa a criação de parques nacionais que podiam integrar

reservas integrais, naturais, de paisagem e biofísicas, e de outro tipo de reservas,

ou seja, as reservas botânicas, zoológicas e geológicas. Ao abrigo deste diploma

viria a surgir a primeira área protegida em Portugal – o Parque Nacional do Gerês.

De então para cá, esse número tem aumentado, embora a sua área total não

ultrapasse os 8% do território nacional (Frade, 1999, p. 80).

Em 1976, é publicado o Dec.-Lei nº 613/76, de 27 de Julho que, embora crie um

regime incipiente, reflecte no seu preâmbulo algumas das ideias que orientam a

actual política ambiental nacional e internacional. Assim, além de fazer uma

referência implícita à necessidade de agir preventivamente, através da gestão

racional dos recursos naturais e salvaguarda da sua capacidade de renovação,

afirma explicitamente a integração da componente ambiental no ordenamento do

território, como elemento base de qualquer política de progresso económico,

social e cultural.

Em 1993, o Dec.-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro (actualizado pelo Dec.-Lei nº

231/97 de 16 de Agosto), introduz uma profunda alteração no regime jurídico das

Áreas Protegidas com o objectivo de criar uma Rede Nacional de Áreas

Protegidas, repartida por figuras de dimensão nacional, regional ou local e de

estatuto privado, já prevista na Lei de Bases do Ambiente. A partir de 1997, as

áreas protegidas292 subdividem-se em:

• áreas protegidas de interesse nacional, ou seja, o parque nacional, a reserva

natural, o parque natural e o monumento natural;

• áreas protegidas de interesse regional ou local ou áreas de paisagem

protegida

• áreas protegidas de estatuto privado ou sítios de interesse biológico.

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271

As áreas protegidas são zonas especiais do território constituídas, na sua grande

maioria, por terrenos de propriedade privada, e nelas vivem mais de duzentos mil

pessoas, o que obriga à articulação dos valores de protecção ecológica com a

garantia de uma qualidade de vida razoável às populações residentes. Nestas

áreas, as actividades ligadas à terra e à floresta são, geralmente, bastante apoiadas.

Além destas actividades económicas, o turismo com características particulares

(ecológico, cultural e científico) é hoje visto como uma ocupação que valoriza

estas áreas contribuindo, assim, para a criação de riqueza na região e,

consequentemente, de criação de condições para a fixação das populações. Apesar

destes esforços, as áreas protegidas vivem sob a ameaça de se tornarem “ilhas”

votadas ao abandono.

O risco de isolamento e abandono pode ser atenuado se, por um lado, estas zonas

forem integrados no quadro de uma gestão activa através de um plano de

ordenamento deste espaço que equilibre, no interior do perímetro de protecção, o

nível de vida das populações com os objectivos de preservação biofísica e, por

outro lado, a gestão destas áreas seja aberta, isto é, esteja em permanente

comunicação com as zonas que envolvem a área protegida transpondo os critérios

definidos no planos de ordenamento do território regionais e municipais às outras

acções que se exercitam sobre a mesma unidade territorial, e muito

particularmente à RAN e à REN. Como se afirmou no 1º Congresso de Áreas

Protegidas, em 1987, estas são uma componente da política de ambiente, um

instrumento da conservação da natureza e uma figura do ordenamento do

território.

292 Dentro das áreas protegidas podem ser estabelecidas reservas integrais de forma a proteger, única e exclusivamente, os conjuntos biológicos e onde a presença humana não é tolerada, excepto para investigação científica ou monitorização ambiental.

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272

De acordo com o Dec.-Lei nº 151/95, de 24 de Junho (alterado pela Lei nº 5/96

de 29 de Fevereiro), a decisão de elaborar os Planos Especiais de Ordenamento293

(PEOT), entre os quais se incluem os Planos de Ordenamento de Áreas

Protegidas – POAP -, compete ao membro do Governo de quem depende o

organismo responsável pela sua elaboração. O modo de articulação com os Planos

Regionais de Ordenamento do Território e os Planos Municipais de Ordenamento

é igualmente definido pelos diplomas anteriores.

Actualmente, os POAP encontram-se em várias fases de elaboração, exceptuando

os quatro já aprovados, quatro estão em elaboração, quatro encontram-se em

concurso público ou em adjudicação e dois em processo de revisão (ver quadro

5.5).

Quadro 5.5 Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas aprovados ou em elaboração

Quant

. Parques ou Reservas Situação

4 PNAC Peneda/Gerês; PN Sintra/Cascais; PN Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina; PN Ria Formosa

Aprovado

4 PN Montesinho; PN Alvão; PN Arrábida; RN Estuário do Tejo

Em elaboração

4 PN Douro Internacional; PN Tejo Internacional; PN Serra S. Mamede; PN Vale do Guadiana

Em concurso publico/adjudicação

2 PN Serra da Estrela; PN Serra D’Aire e Candeeiros Em revisão

Legenda:

PNAC - Parque Nacional PN - Parque Natural RN - reserva Natural

Fonte: Elaborado a partir de MEPAT – Ministério do Equipamento, do Planeamento e da

Administração do Território (1998b), Relatório do Estado do Ordenamento do Território – 1997, Lisboa

Além dos quatorze parques ou reservas com existência legal existem, no

continente, mais cinco áreas protegidas ainda não delimitadas por Decreto

Regulamentar294, nomeadamente: RN do Paul de Arzila; RN Estuário do Tejo;

293 Segundo a Lei são Planos Especiais de Ordenamento os Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC), os Planos de Ordenamento de Albufeira de Águas Públicas (POAAP) e os Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas (POAP).

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273

RN Sapal de Castro Marim/V.R.S. António; RN Berlengas e RN Dunas de S.

Jacinto (MEPAT, 1998b, p. 209).

5.3.2.2. A Reserva Agrícola Nacional

A protecção dos solos agrícolas constitui uma medida estratégica com vista a

assegurar a manutenção de determinado número de hectares vinculados à

produção de bens alimentares como prevenção face a uma absoluta dependência

alimentar do exterior ou, mesmo, um estrangulamento ocasional devido a um

conflitos armados ou debilidades económicas temporárias. A delimitação de uma

Reserva Agrícola Nacional – RAN - deverá, assim, constituir-se numa das

principais preocupações da Administração Central promovendo a utilização

racional dos solos e impedindo a sua destruição. A realização destes objectivos,

bem como do regime jurídico administrativo depende da efectiva delimitação das

áreas da RAN que, sendo um trabalho complexo, se integra na política de

ordenamento do território.

Em 1970 e 1976 foram publicadas duas leis sobre o uso dos solos que incidiam

unicamente sobre os solos para edificação e expansão urbana deixando, por

conseguinte, os solos rústicos sem quaisquer regras. Os Dec.-Lei nº 356 e 357, de

8 de Julho de 1975, vieram colmatar esta falta ao darem um enquadramento

jurídico à salvaguarda das zonas rurais, em geral, e dos terrenos de maior aptidão

agrícola, em particular.

Em 1982, através do Dec.-Lei nº 451/82, de 16 de novembro, é formalizada a

Reserva Agrícola Nacional da qual fazem parte os solos nacionais com maior

294 Estas áreas são: RN do Paul de Arzila; RN Estuário do Tejo; RN Sapal de Castro Marim/V.R.S. António; RN Berlengas e RN Dunas de S. Jacinto.

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274

aptidão para a prática da agricultura295 que são cartografados e identificados nos

planos regionais e municipais de ordenamento do território. O Dec.-Lei nº 196/89,

de 14 de Julho, trouxe uma maior operacionalidade e rigor à tarefa de delimitação

e conservação das áreas integrantes da RAN. A confluência da Reserva Agrícola

Nacional com os planos de ordenamento tornou-se mais intensa em resultado da

dupla vocação que lhe é atribuída pelo Estado ao inscrever na lei (...) contribuir

para o pleno desenvolvimento da agricultura portuguesa e para o correcto

ordenamento do território (artº 1º). O Dec.-Lei nº 274/92, de 12 de Dezembro,

revendo alguns aspectos da disciplina jurídica da RAN, torna obrigatória a

inclusão da sua carta, aprovada pela Comissão Regional da Reserva Agrícola, nos

planos de ordenamento.

Para um país como Portugal, com uma reduzida percentagem do solo afecta à

RAN (os solos mais produtivos abrangem apenas 12% do território nacional)

pretendia-se impor regras bastante rígidas em relação à desanexação do solo o que

não veio a acontecer assistindo-se, pelo contrário, a uma gestão casuística que, a

pouco e pouco, permite a sua destruição pela ocupação humana, pelas infra-

estruturas, pelas albufeiras, por práticas agrícolas pouco adequadas e pela

ignorância e irresponsabilidade de muitos dos que tomam decisões neste País

(Espenica, 1994, p. 95). O processo de constituição da Reserva Agrícola Nacional

sofreu um grande impulso a partir de 1989 acompanhando, quase sempre, a

elaboração dos Planos Directores Municipais. Em Outubro de 1999, a maioria

dos concelhos do continente (269) tinham a Carta da Reserva Agrícola Nacional

publicada faltando, apenas, um concelho das CCR’s do Centro e de Lisboa e Vale

do Tejo, dois concelhos da CCR Norte e três concelhos da CCR Alentejo.

295 Os solos que integram a RAN são os das classes A, B e da subclasse Ch e, na sua falta, os solos de classe C.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

275

5.3.2.3. A Reserva Ecológica Nacional

A regulamentação da REN tem sido feita por sucessivas aproximações num

esforço ambicioso de implementar uma conservação da natureza, fora das Áreas

Protegidas, através de ecossistemas litorais e interiores e da intensificação dos

processos biológicos indispensáveis à plena e equilibrada integração da actividade

humana. A conservação da natureza é, assim, conseguida graças a um

condicionamento na utilização das áreas com características biológicas especiais.

Em 1983 é criada a Reserva Ecológica Nacional pelo Dec.-Lei nº 321/83, de 5 de

Julho. Este novo diploma, mais abrangente do que Dec.-Lei nº 613/76, considera

no seu preâmbulo a Reserva Ecológica Nacional, juntamente com a Reserva

Agrícola Nacional, instrumentos privilegiados da política de ordenamento do

território nacional, promovendo uma utilização equilibrada dos recursos naturais

sem, contudo, comprometer o desenvolvimento económico e social das regiões. A

Reserva Ecológica Nacional, surge com uma forte componente “ordenamentista”

em resposta ao caos instalado, sobretudo a partir da década de 70, ao nível do

ordenamento do território. A delimitação da REN296 é considerada uma

condicionante de ordem superior pelo que passa a integrar todos os instrumentos

de ordenamento do território, designadamente os Planos Regionais, os Planos

Especiais, os Planos Directores Municipais e os Planos de Urbanização e de

Pormenor. Esta reserva obriga a um forte posicionamento quanto à manutenção

e/ou alteração do uso dos solos com o objectivo de salvaguardar as situações que

podem pôr em causa a utilidade do território como suporte biofísico indispensável

ao desenvolvimento económico, social e cultural297.

A falta de delimitação da REN pelo poder central e a urgência em defender

algumas zonas em perigo (não abrangidas pelo Dec.-Lei nº 613/76) levaram à

296 A REN abrange três tipos de áreas: 1) as zonas costeiras; 2) as zonas ribeirinhas, águas interiores e áreas de infiltração máxima ou de apanhamento; 3) as zonas declivosas. 297 O regime da REN encontra-se regulamentado no seu artº 4º da seguinte forma: Nas áreas de REN são proibidas as acções de iniciativa pública ou privada que se traduzem em operações de loteamento, obras de urbanização, construção de edifícios, obras hidráulicas, vias de comunicação, aterros, escavações e destruição do coberto vegetal.

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276

criação de um regime transitório até 1992. O Dec.-Lei nº 213/92, de 12 de

Outubro, vem reafirmar o papel importante dos planos de ordenamento do

território e abrir um espaço de manobra que faltava à Reserva Ecológica Nacional

para esta deixar de ser interpretada como absolutamente restritiva e proibitiva e,

pelo contrário, seja compreendida como uma figura de planeamento ambiental que

permite o exercício das actividades que não perturbem o equilíbrio biológico e a

protecção dos ecossistemas. O problema reside, então, na determinação dos usos

compatíveis na área da REN que pode ser efectuada de dois modos:

• se não existe um Plano de Ordenamento Municipal, cabe às Direcções

Regionais do Ministério do Ambiente confirmar, através de parecer, a

compatibilidade das acções;

• se houver um Plano Municipal válido, será através deste que se aferirá da

compatibilidade das acções a desenvolver na área da REN.

Em 1995, o Dec.-Lei nº 79/95, de 20 de Abril, determina que a aprovação da

Reserva Ecológica Nacional se passe a fazer por Resolução do Conselho de

Ministros. A outra alteração importante tem a ver com a possível não

correspondência entre a delimitação aprovada em Conselho de Ministros e a

delimitação feita no Plano Director Municipal. Neste caso, é obrigatório proceder-

se à compatibilização duas delimitações prevalecendo a primeira.

A criação de um quadro legal para a Reserva Ecológica Nacional, onde se prevê

uma regulamentação uniforme para um conjunto de ecossistemas diversificados,

representa uma filosofia jurídica inovadora com a vantagem de, por um lado,

construir um sistema de regulação único e, por outro lado, eliminar a dispersão de

leis e procedimentos administrativos. Contudo, este procedimento não exclui o

risco de extremar a uniformização e descurar as possibilidades de utilização

específica de cada conjunto biofísico pelo que alguns países europeus preferem a

projecção e formalização de um regime sectorial de protecção ou, por outras

palavras, cada “unidade físico-natural” é objecto de um diploma particular.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

277

Em Setembro de 1997, cerca de 97% dos municípios do continente, ou seja, 266

tinham delimitada a Reserva Ecológica Nacional faltando apenas quatro concelhos

da CCR Lisboa e Vale do Tejo, outros quatro da CCR Alentejo e um da CCR

Algarve (MEPAT, 1998b, p. 224). Esta situação é alterada se considerarmos

apenas os municípios que têm a sua REN publicada em Diário da República.

Assim, em Outubro de 1999, ainda havia 57 dos 276 municípios do continente

sem a sua carta publicada, destes 24 pertencem à região de Lisboa e Vale do Tejo,

19 ao Norte, 10 ao Algarve e 4 ao Alentejo.

5.4. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO NACIONAL

5.4.1. É urgente ordenar o território português

Á medida que se aproxima o final do milénio, o mundo confronta-se com o

problema da conciliação do crescimento demográfico e dos padrões de consumo

com as disponibilidades de recursos naturais. Reconhece-se que, por um lado, o

ritmo do uso dos recursos naturais é insustentável, a degradação ambiental não

pode continuar e, por outro lado, o sistema económico predominante não promove

o desenvolvimento sustentável.

A Cimeira da Terra, no Rio de Janeiro, em 1992, entre as acções mundiais refere

expressamente o desenvolvimento sustentável como uma prioridade na agenda

da comunidade internacional (CNEUD, 1992, § 2.1). Ao mesmo tempo, foi

assumido que só a sustentabilidade do desenvolvimento permitiria inverter,

simultaneamente, a pobreza e a degradação ambiental. A esta Cimeira, sob a égide

da ONU, seguiram-se outras298 claramente sectorializadas, mas ligadas entre si

por um denominador comum: o HOMEM. Assim, o desenvolvimento humano não

pode ser separado do conceito de desenvolvimento sustentável uma vez que este

298 Como, por exemplo, a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (Cairo, 1994), a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação (Paris, 1994), a Cimeira Mundial sobre Desenvolvimento Social (Copenhaga, 1995), a HABITAT II (Istambul, 1996), etc.

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278

não envolve apenas a dimensão ambiental do desenvolvimento, mas também a

dimensão humana. Daí se considerar que o desenvolvimento tem de ser centrado

no homem, com preocupações sobre a capacitação humana, participação,

igualdade entre os sexos, crescimento equitativo, redução da pobreza e

sustentabilidade a longo prazo (PNUD, 1998, p. 14). A concretização destes

objectivos passa pela definição e implementação de, entre outras, uma política de

desenvolvimento em que o território é assumido como um elemento central (daí

deriva a importância do seu ordenamento) tendo em vista a equidade intra e

intergeracional no acesso ao bem-estar colectivo (rendimento, educação, cultura,

saúde, direitos políticos, ambiente e ecologia).

A ideia, muito comum em Portugal, de que no nosso estádio de desenvolvimento,

a qualidade do espaço não é compatível com o caminho do progresso tem de ser

definitivamente erradicada. Embora, nos últimos anos se tenha assistido a uma

progressiva consideração dos princípios ecológicos nos mais diversos sectores de

actividade há, ainda, muito para fazer. Neste sentido, não se pode ser credível

qualquer política ou estratégia de desenvolvimento que não inclua a qualidade do

ambiente como um dos vectores essenciais do bem-estar das populações. Da

mesma forma, um território arruinado pelo mau uso e ocupação anárquica, é um

território perdido para a comunidade e para o País pelo que é necessário

implementar uma correcta política de ordenamento do território, isto é, ordenar e

impor as soluções adequadas através do planeamento, tendo em consideração os

valores sócio-culturais e ecológicos, que devem presidir à gestão dos recursos

naturais e da localização das actividades vitais do homem. Como afirma Mendes

(1991, p. 11) em matéria de ordenamento do território, os desenvolvimentos são

rápidos e complexos: as forças que os estimulam são muitas vezes contraditórias.

O progresso da ciência e da técnica, a evolução dos valores e normas e, acima de

tudo, uma mais acérrima e consciente defesa dos interesses individuais pela

qualidade de vida e pela participação social, são tudo aspectos responsáveis pelo

número crescente de elementos a ter em conta na preparação de uma estratégia e

política de ordenamento do território.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

279

Em Portugal, as opções de política económica, as normas ambientais e sectoriais

em vez de se articularem, tendo em vista o desenvolvimento sustentável, entram

frequentemente em conflito. Além disso, exceptuando no XIV Governo

Constitucional, as questões ambientais e do ordenamento do território têm estado

sob a responsabilidade de Ministérios diferentes o que restringia, por um lado,

uma unidade de pensamento e de acção e, por outro, reduzia a eficácia de uma

política global e correcta de desenvolvimento já que o ordenamento do território

não existe sem os estudos de caracterização local que permitem definir com rigor

a aptidão biofísica, ambiental e paisagística do terreno. Efectivamente, não se

pode continuar a separar o ordenamento do território das questões ambientais e de

qualidade de vida, uma vez que esta separação artificial impede a implementação

de uma verdadeira política integrada de ambiente e desenvolvimento (ver

fluxograma 5.4). Além disso, as políticas de ordenamento do território e do

ambiente terão de actuar de forma integrada e a todos os níveis (nacional, regional

e local) sobre o conjunto de factores que condicionam a localização das

actividades e do habitat humano. Assim, estas políticas deverão incidir, quer ao

nível das áreas urbanas, quer ao das zonas rurais de forma a incentivar a

preservação dos seus recursos, a reestruturação e hierarquização dos aglomerados

populacionais, bem como zonificar o uso do solo de acordo com a sua vocação

natural.

A falta de uma verdadeira política de ordenamento do território durante muitos

anos provocou graves problemas (forte concentração da população e actividades

produtivas na faixa litoral, poluição dos recursos hídricos, construção de

habitação dispersa, muitas das vezes, em zonas de inundação, dunas, etc.). A

recente aprovação299 da Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e

de Urbanismo e a subsequente regulamentação suplementar300 poderão contribuir

para inverter a tendência até aqui verificada.

299 Aprovada em agosto de 1998. 300 Dec.-Lei nº 380/99, de 22 de Setembro, define o regime aplicável aos instrumentos de ordenamento do território.

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280

Fluxograma 5.4

Interface entre Ambiente e o Ordenamento do Território

SISTEMA AMBIENTAL

Fonte: Mendes, J. L. M. F. (1991), Política do ambiente – da Rua do século a Maastricht, F. C. T., Monte da Caparica

É do conhecimento geral que o país se confronta com várias dificuldades que vão

desde as assimetrias regionais às disparidades de repartição dos rendimentos,

que se traduzem por contrastes sociais muito vincados, desde a frágil estrutura

económica, extremamente dependente do exterior, às deficientes condições de

existência de muitos dos seus habitantes (Brito, 1997, p. 102), mas, em nosso

entender, o deficiente ordenamento do território constitui a maior dificuldade

apesar de quase todos os municípios terem o seu Plano de Ordenamento aprovado

(somente 4 concelhos ainda não têm o seu plano aprovado e publicado em Diário

Ordenamento do

Território

REDE URBANA e TRANSEUROPEIA

DESENVOLVIMENTO REGIONAL e LOCAL

GESTÃO DOS

RECURSOS

NATURAIS

PROTECÇÃO DA NATUREZA

LAZERES

CONSUMO

TECNOLOGIA

IMPACTES AMBIENTAIS

AGRICULTURA INDÚSTRIA TRANSPORTES ENERGIA

HABITAT

MINAS

RESÍDUOS

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281

da República301). Em relação à cobertura do território nacional pelos restantes

instrumentos de ordenamento a situação é bastante pior.

Os planos de ordenamento para além de serem instrumentos de carácter

preventivo que se ocupam sobretudo com a definição dos condicionamentos

localizados no espaço, da actuação dos homens, têm também um conteúdo activo,

de procura e de reposição de equilíbrios perdidos, procurando abranger toda a

actuação humana sobre o território. Os planos de ordenamento definem-se como

instrumentos que procuram subordinar o ordenamento do território à realização de

dois objectivos vitais: manter o equilíbrio ecológico e promover o

desenvolvimento sustentável.

5.4.2. Os instrumentos de ordenamento do território

5.4.2.1. A precedência dos planos urbanísticos

O plano de reconstrução de Lisboa, destruída pelo terramoto de 1755, embora

com características marcadamente urbanísticas, é considerado um dos primeiros

planos de ordenamento. No entanto, só em 31 de Dezembro de 1864 viria a ser

publicado o primeiro decreto (de impacto reduzido) que determinava as regras

sobre as ruas e edificações no interior das cidades, vilas e povoações e previa a

elaboração de planos gerais de melhoramentos, obrigatórios para as cidades de

Lisboa e Porto, facultativos para as restantes vilas e cidades do reino.

Nos anos trinta, do século XX, publicaram-se dois importantes diplomas

específicos sobre questões urbanísticas. Em 1932, o Dec.-Lei nº 21697, de 30 de

Setembro, menciona pela primeira vez os planos de urbanismo, com

preocupações essencialmente estéticas, da responsabilidade da Direcção Geral de

301 Dados recolhidos pelo autor .

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282

Edifícios e Monumentos Nacionais. Em 1934, o Dec.-Lei nº 24802, de 21 de

Dezembro, que não provocou grandes alterações, atribuía às Câmaras Municipais

a tarefa de elaboração dos planos gerias de urbanização e obrigava o Estado a

uma comparticipação financeira. Um novo impulso é dado, na década de quarenta,

com a aprovação do Dec.-Lei nº 33821, de 5 de Setembro de 1944, que

completando e reforçando os objectivos e princípios contidos no diploma de 1934,

obrigava as Câmaras Municipais a elaborarem não só planos gerais de

urbanização, mas também planos de expansão para as localidades com mais de 2

500 habitantes, desde que entre dois censos gerais da população demonstrassem

uma apreciável expansão demográfica, e para as localidades de reconhecido

interesse turístico, recreativo, climático, histórico ou outro. Além destes planos

podiam ser elaborados planos parciais de urbanização que tinham um carácter

transitório e incidiam sobre uma determinada área do espaço urbano. No mesmo

ano, o Dec.-Lei nº 34173, de 6 de Dezembro, previa a elaboração de anteplanos

de urbanização (equivalentes aos planos gerais de urbanização) destinados às

colónias ultramarinas.

Em 1959, é publicado o Dec.-Lei nº 2099, de 18 de Agosto de 1959, que

determina a elaboração de um plano regional, ou melhor, do Plano Director do

Desenvolvimento Urbanístico da Região de Lisboa, cujos trabalhos decorreriam

até 1964. Este plano, segundo Mendes (1990, p. 171) definia, em linhas gerais,

uma nova estrutura urbanística, assente em critérios de rendibilização das infra-

estruturas, transportes e equipamentos e na dinamização da vida local, através

do controlo de crescimento dos aglomerados. A Guerra Colonial, desviando as

atenções para situações mais imediatas, levou a Administração Central a não

assumir os seus compromissos perante as Autarquias nem a aprovar o plano. Em

1972, sem êxito, tentou-se retomar a sua elaboração. Já em relação ao Porto, o

Plano Director da Região do Porto teve início em 1964 e arrastou-se até 1973

(Dec.-Lei nº 124/73 de 24 de Março).

Em 1965, pela primeira vez, regulamentam-se os loteamentos urbanos (Dec.-Lei

nº 46673/65, de 29 de Novembro) e, em 1969, o Relatório do Secretariado

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Técnico da Presidência do Conselho de Ministros perspectiva a política de

ordenamento do território nacional.

No início da década de setenta, destaque-se a publicação da Lei dos Solos (Dec.-

Lei nº 576/70 de 24 de Novembro) que impôs algumas regras reguladoras das

expropriações, bem como o Dec.-Lei nº 560/71, de 17 de Dezembro, que introduz

algumas inflexões no sistema de planos clarificando, por um lado, os contornos e

o conteúdo dos planos gerais de urbanização e, por outro lado, terminando com a

figura dos anteplanos e criando os planos de pormenor. Além disso, consagra o

direito de consulta aos interessados mediante o instituto jurídico do inquérito

público. Os planos de urbanização das áreas territoriais são, também, uma

inovação introduzida pelo Dec.-Lei de 1971. Embora estes planos sejam

designados de urbanização de facto, quer pela área abrangida, quer pela sua

origem central (os restantes são de origem municipal), eles aproximam-se dos

actuais Planos Regionais de Ordenamento do Território. O Dec.-Lei nº 561/71, de

17 de Dezembro, permitiu um avanço importante no planeamento territorial ao

atribuir à Direcção Geral dos Serviços de Urbanização a elaboração dos planos

gerais de urbanização das sedes dos seus concelhos e de outras povoações,

acrescentando que deveriam ser igualmente elaborados planos gerais de

urbanização ... nas áreas territoriais em que a estrutura urbana justificasse a

elaboração de planos de conjunto abrangendo vários centros urbanos e zonas

rurais intermédias ou envolventes (Brito, 1997, p. 185). Apesar de ser a

Administração Central a elaborar os planos gerais de urbanização das áreas

territoriais, e não os Municípios como seria de esperar, a experiência teve um

saldo positivo.

As preocupações com a rede urbana reflectem-se no III Plano de Fomento (1969-

1973) ao considerar-se como um dos objectivos o equilíbrio da rede urbana

conseguido pelo desenvolvimento ou a criação de centros urbanos, para que toda

a população disponha, a distâncias razoáveis, de equipamento sócio-económico

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mínimo (CM, 1969, p. 620). O IV Plano de Fomento302 (1974-1979),

considerando o ordenamento do território e a correcção dos desequilíbrios

regionais como um dos seus objectivos básicos, veio dar um conteúdo mais exacto

às intenções enunciadas no anterior plano. Este plano, embora não tivesse sido

implementado (em 1974 ocorreu a Revolução de Abril), teve uma influência

considerável no ordenamento do território nacional. Em Setembro de 1974, cria-se

o Conselho Restrito para o Ordenamento do Território que não viria a funcionar.

Em 1976, a Constituição da República Portuguesa, reflectindo as preocupações da

sociedade com a problemática do ordenamento do território, compromete o

Estado na promoção e realização do ordenamento territorial. Em 1977, é

promulgada a Lei nº 79/77, de 25 de Outubro, que define as atribuições das

autarquias e as competências dos seus órgãos e introduz a figura do Plano

Director Municipal sem, contudo, estabelecer qualquer regulamentação sobre a

sua forma ou conteúdo. Dois anos depois é publicada a Lei das Finanças Locais

que atribui às autarquias meios financeiros próprios e o direito de receberem

subsídios e parte das receitas fiscais cobradas pela Administração Central. Entre

1978 e 1979 é criada uma Secretaria de Estado com competências no âmbito do

ordenamento físico (subentende-se do território) as quais viriam, posteriormente,

a ser transferidas para outro órgão da Administração Pública.

Em 1982, o Dec.-Lei nº 208/82, de 26 de Maio, regula com maior exactidão o

Plano Director Municipal como veremos mais adiante. Em 1983, é publicada

legislação sobre os Planos Regionais de Ordenamento do Território e, em 1985,

reaparece a Secretaria de Estado com competências no âmbito do ordenamento do

302 No plano afirmava-se: Base IV: “O esforço de desenvolvimento económico e social (...) visará os objectivos seguintes: c) Ordenamento do território e correcção dos desequilíbrios regionais, tendo em conta a valorização do factor humano e o aproveitamento das potencialidades naturais de cada região, nomeadamente nas áreas menos desenvolvidas. Base VIII: Tendo em consideração os requisitos da política de ordenamento do território, e em ordem à progressiva correcção dos desequilíbrios regionais de desenvolvimento, será dada prioridade no Plano às actuações tendentes a promover: O fortalecimento e equilíbrio da rede urbana e da rede de apoio rural ....; A expansão descentralizada da indústria ...; A ocupação racional do espaço rural, visando ... as exigências do equilíbrio ecológico, da conservação do solo e da defesa do ambiente.

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território. Em 1998, como já vimos, é aprovada a Lei de Bases da Política de

Ordenamento do Território e de Urbanismo que viria a ser regulamentada no ano

seguinte.

5.4.2.2. Os níveis de planeamento territorial: nacional, regional e municipal

Nos últimos anos, quer ao nível da Administração Central, quer ao nível da

Administração Local, tem-se vindo a assistir a uma maior consciencialização da

necessidade de preservar o ambiente e de ordenar o território pelo que foram

surgindo instrumentos nesse sentido. Actualmente, a estruturação do território

nacional constrói-se a três níveis geográficos a que correspondem dois níveis

administrativos303 (central e local):

• Nível nacional revê-se num Programa ou Plano Nacional de Ordenamento do

Território (ainda não concretizado) que, adequadamente desenvolvido em

planos de implantação ou de ordenamento regional, proporcionaria ao

planeamento municipal ou sub-regional os parâmetros entre os quais se

poderiam mover e permitiria visionar, com alguma antecedência, o impacto

territorial dos programas nacionais sobre cada sub-região ou município. Este

programa deveria definir, simultaneamente, a estruturação do território

nacional e as estratégias de (Araújo, 1995):

a) racionalização da actual divisão administrativa que se revela anacrónica e de manutenção dispendiosa;

b) valorização dos recursos naturais e das vocações atribuídas a cada

segmento geo-económico-social do país, o que implica conhecer, em

profundidade, as potencialidades económicas e a sua distribuição

espacial;

c) correcção de desequilíbrios e assimetrias entre regiões e localidades

através, por um lado, da redistribuição de serviços de âmbito nacional,

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regional e local, bem como da promoção do investimento em

actividades produtivas e, por outro lado, apoio ao potencial endógeno;

d) fixação ou redistribuição da população de modo a evitar a

desertificação de certas áreas enquanto noutras se verifica o

sobrepovoamento.

• Nível regional que, abrangendo a área total ou parcial de vários municípios,

engloba:

1. os Planos Regionais de Ordenamento do Território - PROT -,

previstos no Dec.-Lei nº 176-A/88, de 18 de Maio;

2. os Planos Especiais de Ordenamento do Território - PEOT -,

regulados inicialmente pelo Dec.-Lei nº 151/95, de 24 de Junho, 9 de

Fevereiro, integram os Planos de Ordenamento da Orla Costeira, os

Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas e os Planos de

Ordenamento das Albufeiras de Águas Públicas.

• Nível municipal que, abrangendo a área de um município ou parte dela, dá

origem à elaboração dos Planos Municipais de Ordenamento do Território -

PMOT - introduzidos pelo Dec.-Lei nº 69/90, de 2 de Março, compreendem os

Planos Directores Municipais, os Planos de Urbanização e os Planos de

Pormenor.

Este conjunto de instrumentos de ordenamento do território pode desempenhar um

papel importante na adequada organização da paisagem urbana/rural desde que se

conjuguem os esforços dos vários intervenientes no processo de ordenamento do

território, na articulação dos planos com os instrumentos financeiros304, na

303 Exceptuando as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, as regiões portuguesas não dispõem de autonomia administrativa e financeira pelo que são tuteladas pela Administração Central através do Ministério do Planeamento. 304 Nos instrumentos financeiros com impacto no ordenamento do território incluem-se, entre outros, as taxas de licenciamento de operações de loteamento e obras públicas, de licenciamento de obras particulares e de infra-estruturas (cobradas pelas câmaras municipais), as taxas de licenciamento de pedreiras e outras actividades de exploração dos recursos geológicos (cobradas pelos municípios ou direcções gerais), os Fundos Nacionais como o FEF (Fundo de Equilíbrio Financeiro) atribuído às autarquias pela Administração Central, os Programas Urbanos como o PROSIURB (Programa de Consolidação do Sistema Urbano Nacional e Apoio à Execução dos Planos Directores Municipais), o PROCOM (Programa Apoio à Modernização do Comércio) ou o PER (Programa Especial de Realojamento), os Programas sectoriais como o PDF (Plano de Desenvolvimento da Floresta) e os Fundos comunitários com destaque para o Fundo de Coesão, o

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287

programação dos investimentos e, sobretudo, não se encarem estes planos como

meros regulamentos, mais ou menos estáticos, mas sim como instrumentos de

programação das intervenções da Administração Central e Local, dos agentes

económicos e da população em geral.

A Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e Urbanismo (Lei nº

48/98 de 11 de Agosto), além de definir os instrumentos de ordenamento ou de

planeamento físico do território português, formula os grandes princípios da

política de ocupação do solo, os quais irão moldar todos os programas e as opções

daí emergentes, dando-lhes uma unidade jurídico-política. Seguindo a

sistematização da Lei, estão consagrados em primeiro lugar os instrumentos de

desenvolvimento territorial, de natureza estratégica e delimitadora das grandes

linhas programáticas do planeamento, que incluem o programa nacional de

ordenamento do território (fixa os objectivos e metas fundamentais do

ordenamento), os PROT (definem as orientações para a organização do espaço

regional no quadro das medidas de amplitude nacional) e os planos

intermunicipais de ordenamento do território (elaboração facultativa por parte de

grupos de municípios tendo em vista a gestão integrada de áreas municipais

contíguas). Seguem-se os instrumentos de planeamento territorial que

estabelecem as regras de ocupação dos solos em função da respectiva vocação.

Nestes instrumentos incluem-se os PMOT que são vinculativos para as entidades

públicas e privadas. A Lei prevê, ainda, os instrumentos de política sectorial,

criados pelos vários sectores da Administração Central, isto é, pelos vários

Ministérios. Finalmente, existem os instrumentos de natureza especial, da

responsabilidade da Administração Central, materializados sob a forma de PEOT.

A falta do Programa Nacional de Ordenamento do Território conduz a uma

situação insólita: a Lei de Bases é a cobertura e, simultaneamente, constitui os

alicerces de todo o ordenamento do território.

FEOGA e o FEDER e, por último, os Programas de Iniciativa Comunitária INTERREG e

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A nova regulamentação tem a virtude imediata de consagrar as fundações que há

muito faltavam para se erigir um sólido sistema de gestão territorial e configurar

uma hierarquização dos vários instrumentos de ordenamento do território

dispersos na ordem jurídica. De referir que no período de discussão pública do

anteprojecto da Lei de Bases foram feitas algumas críticas ainda, hoje, actuais.

Entre estas destacamos as seguintes (Alves, 1997):

• o anteprojecto está imbuído de uma lógica administrativa de conservação do

território e não de ordenamento ...;

• à lógica conservacionista teria sido preferível uma lógica promocional da

gestão do território ... [que] encara o território não apenas como um sistema

físico mas, também, como um sistema humano de actividades, realizações e

aspirações, de interdependências;

• ... a visão de preservação do território é limitada e demasiada estática. A

gestão do território implica a capacidade para encontrar o equilíbrio entre a

preservação de ordem natural e criação de território.

Além disso, registe-se ainda a falta de ambição desta Lei ao restringir o

ordenamento do território à Administração Pública e não o estender ao sector

privado através do estabelecimento de protocolos e de contratos-programa.

Subsiste, ainda, alguma “confusão” entre fins e objectivos do ordenamento do

território, bem como entre instrumentos de desenvolvimento territorial e

instrumentos de planeamento territorial (não será o planeamento territorial um

instrumento de promoção do desenvolvimento do território ?). Sublinhe-se a

persistência na bipolarização da classificação do solo, através das clássicas

categorias rural e urbano, o que é hoje considerado insuficiente para enquadrar

minimamente os novos recortes funcionais do território. Será que o legislador ao

referir-se a solo rural e a solo urbano terá em mente o espaço rural e o espaço

urbano dado o solo ser um elemento físico, com determinadas características

(minerais, biológicas, de humidade e de temperatura), e o espaço compreender os

elementos físicos e humanos, eis uma dúvida que a Lei de Bases não esclarece.

Além disso, perante a urbanização crescente da sociedade moderna torna-se

CORINE.

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extremamente difícil delimitar com exactidão os limites entre o espaço rural e o

espaço urbano. Este diploma prevê, ainda, o estabelecimento do direito de

compensação e indemnização dos particulares sem, contudo, clarificar os

mecanismos pelos quais este se fará. Por último, as relações entre os vários

instrumentos de gestão territorial não estão devidamente clarificadas e não se faz

qualquer referência à articulação entre os planos sectoriais e os planos especiais o

que pode gerar algumas situações bastante complexas305 .

Apesar destes reparos, a publicação da Lei de Bases de Ordenamento e seu

diploma regulamentar representa uma inflexão positiva no rumo que tem sido

seguido na concretização da política de ordenamento do território. Efectivamente,

a prática vinha revelando a existência de planos de urbanização, seguidos dos

planos directores municipais e, só depois, os planos regionais.

5.4.2.3. Os Planos Regionais de Ordenamento do Território

Os Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT), como já vimos,

foram criados pelo Dec.-Lei 338/83, de 20 de Julho. Passados cinco anos, o Dec.-

Lei nº 176-A/88, de 18 de Maio, altera a legislação anterior que, por sua vez sofre

algumas alterações com o Dec.-Lei nº 294/94, de 12 de Outubro, e o Dec.-Lei nº

309/95 de 20 de Novembro que veio a fixar a aprovação do PROT através de

decreto regulamentar.

A necessidade de elaboração deste tipo de planos decorre das profundas alterações

que ocorrem no território devido ao desenvolvimento económico e social, ou seja,

devido aos impactos da actividade turística, da exploração agrícolas, da extracção

dos mármores e da concentração de actividades produtivas e da população em

áreas relativamente reduzidas do litoral, em particular. Esta situação leva ao

305 Por exemplo, os conflitos decorrentes das previsões de um plano sectorial na área do turismo sobre a qual incide um Plano de Ordenamento da Orla Costeira.

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estabelecimento de orientações e directrizes que, salvaguardando o património

cultural, visem o desenvolvimento harmonioso das diferentes parcelas do

território e a optimização das implantações humanas, do uso dos solos e do

aproveitamento dos seus recursos.

Os PROT, constituídos por duas peças (Regulamento e Relatório), integram a

área de vários municípios com uma certa homogeneidade em termos económicos,

sociais ou ecológicos e representam interesses ou preocupações que, pela sua

interdependência, necessitam de um tratamento integrado. Estes planos são,

assim, um instrumento privilegiado para prosseguir uma melhor localização das

actividades e do desenvolvimento equilibrado e sustentável do território nacional.

O zonamento e a organização dos elementos estruturantes do espaço regional

(traduzida na hierarquia/funções dos centros urbanos e eixos) constituem a parte

fundamental da proposta de ordenamento pelo que todos os PROT,

independentemente do seu nível, procedem à delimitação das diversas zonas de

uso dos respectivos solos.

Os Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT), sendo supra

municipais, como já vimos, incidem sobre a área de vários. Em termos de

balanço, embora tenham sido aprovados alguns Planos Regionais de Ordenamento

e outros estejam em processo de elaboração municípios (ver quadro 5.6), o facto é

que na sua totalidade estes abrangem, somente, 31,4% do território continental e

50% da população (ver mapa 5.3). Refira-se ainda que, salvo algumas excepções,

o território abrangido pelos PROT, é constituído pela faixa costeira.

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Quadro 5.6 Planos Regionais de Ordenamento aprovados ou em elaboração

Plano Concelhos envolvidos Situação

PROTAL: Algarve

Todos os municípios do distrito de Faro Em vigor

PROZED : Zona Envolvente do Douro

Gondomar, Penafiel, Marco de Canavezes, Baião, Cinfães, Resende, Castelo de Paiva, Lamego, Mesão Frio, Peso da Régua, Armamar, Sabrosa, Alijó e Tabuaço

Em vigor

PROZAG : Zona Envolvente das Barragens da Agueira, Coiço e Fronhas

Parte dos municípios de Arganil, Carregal do Sal, Mortágua, Penacova, Santa Comba Dão, e Tábua

Em vigor

PROTALI: Litoral Alentejano

Alcácer do Sal, Grândola, Santiago de Cacém, Sines e Odemira

Em vigor

PROTAM: Alto Minho

Caminha, Melgaço, Monção, Paredes de Coura, Valença e Vila Nova de Certeira, Arcos de Valdevez, Ponte da Barca, Ponte de Lima e Viana do Castelo

Em elaboração

PROTCL: Centro Litoral

Águeda, Albergaria-a-Velha, Anadia, Aveiro, Estarreja, Ílhavo, Mealhada, Murtosa, Oliveira do Bairro, Ovar, Sever do Vouga, Vagos, Cantanhede, Coimbra, Condeixa, Figueira da Foz, Mira, Montemor-o-Velho, Penacova, Soure, Batalha, Leiria, Marinha Grande, Pombal e Porto de Mós

Em elaboração

PROTAML: Área Metropolitana de Lisboa

Amadora, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Oeiras, Sintra e Vila Franca de Xira, Alcochete, Almada, Barreiro, Moita, Montijo, Palmela, Seixal, Sesimbra e Setúbal

Em elaboração

PROZEA: Zona Envolvente da Barragem do Alqueva

Alandroal, Reguengos de Monsaraz, Portel, Mourão, Moura e Barrancos

Em elaboração

PROZOM : Zona dos Mármores

Alandroal, Borba, Estremoz e Vila Viçosa A elaborar

PROTO: do Oeste

Nazaré, Alcobaça, Caldas da Rainha, Peniche, Óbidos, Bombarral, Lourinhã, Torres Vedras, Sobral de Monte Agraço, Arruda dos Vinhos, Alenquer e Cadaval

A iniciar306

Fonte: Elaborado a partir de MEPAT – Ministério do Equipamento, do Planeamento e da

Administração do Território (1998b), Relatório do Estado do Ordenamento do Território – 1997, Lisboa

Na área de um PROT podem existir um ou mais Planos Especiais de

Ordenamento (orla costeira, albufeira de águas públicas ou áreas protegidas) o que

exige um esforço de articulação e de compatibilização entre estes instrumentos de

ordenamento do território de modo a que as estratégias para o território em causa

não sejam conflituantes, mas, pelo contrário, se complementem. Refira-se, ainda,

que as propostas cruzadas existentes durante a elaboração dos PROT exigem a

procura de consensos entre os diversos Municípios envolvidos e entre estes e os

vários Ministérios.

306 Segundo informação telefónica de uma técnica do GAT de Caldas da Raínha, está previsto lançar o Concurso Público para a elaboração do PROT após o Verão de 1999.

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Mapa 5.3

Planos regionais de Ordenamento do Território

Fonte: MEPAT - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (1998c), Relatório do Estado do Ordenamento do Território - 1997, Lisboa, p. 201

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

293

5.4.2.4. Os Planos Especiais de Ordenamento do Território

A Lei de Bases refere-se ainda aos Planos Especiais de Ordenamento do

Território, já previstos pelo Dec.-Lei nº151/95, de 24 de Junho, posteriormente

reformulados pelo Dec.-Lei nº 5/96 de 29 de Fevereiro. O diploma de 1995 previa

sete tipos de Planos Especiais, nomeadamente: os Planos de Ordenamento

Florestal, os Planos de Ordenamento e Expansão dos Portos, os Planos

Integrados de Habitação, os Planos de Salvaguarda do Património Cultural,

Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas, Planos de Ordenamento de

Albufeiras de Águas Públicas e os Planos de Ordenamento da Orla Costeira. De

referir no entanto que somente os últimos três planos estavam regulamentados307,

enquanto os restantes estavam referidos em legislação dispersa308.

Em 1996, a nova legislação reduz para três os Planos Especiais - Planos de

Ordenamento da Orla Costeira, Planos de Ordenamento de Albufeiras de Águas

Públicas e Planos de Ordenamento de Áreas Protegidas -, com um regime

jurídico bastante semelhante ao dos Planos Regionais. Estes planos reflectem um

conjunto de princípios e objectivos, que vão desde a realização integrada do

ordenamento do território e a garantia de um desenvolvimento económico e social

sustentável até à sua compatibilização com a promoção e salvaguarda dos recursos

naturais, áreas agrícolas e florestais, património natural e construído, passando

pela estímulo à participação da população e pela protecção dos seus legítimos

interesses e, finalmente, pelo cumprimento do princípio da hierarquia entre os

vários tipos de planos. A principal peça dos planos especiais é o regulamento que,

explicando o regime jurídico e a estratégia a implementar, possui duas

representações gráficas:

• a planta de síntese onde, para além da classificação dos espaços de acordo

com o uso dominante, predominam os aspectos de carácter urbanístico;

307 Dec.-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro, Decreto Regulamentar nº 2/88, de 20 de Janeiro, e Dec.-Lei nº 309/93 de 2 de Setembro. 308 Por exemplo, os Planos de Salvaguarda do Património Cultural, previstos formalmente no art. 21º/5, da Lei nº 13/85, de 6 de Julho, eram referenciados no art. 2º/2 do Dec.-Lei nº 69/90, de 2 de Março, que remetia para legislação especial a criar. Posteriormente, esta disposição foi revogada pelo Dec.-Lei nº 151/95 de 24 de Junho (DR, n.º 144/95).

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• a planta de condicionantes que delimita geograficamente todas as restrições e

servidões administrativas que impedem sobre a área do plano: a Reserva

Agrícola Nacional, a Reserva Ecológica Nacional, as áreas do regime florestal

e do domínio público hídrico, as servidões aeronáuticas e as relativas à defesa

nacional.

Além deste elementos obrigatórios, há toda uma série de documentos avulsos que

podem servir para a instrução do processo como a planta de enquadramento ou os

estudos de fundamentação da proposta apresentada.

O mar, enquanto factor centralizador, determina uma faixa com características

distintivas e atractivas para o homem levando a enormes fluxos migratórios na

sua direcção e, no caso português, a fazer do litoral a zona mais intensamente

povoada e economicamente mais desenvolvida. Esta situação conduziu à

elaboração dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira 309. Os primeiros POOC

foram lançados em 1983, sem qualquer base legal, pela Direcção Geral dos

Portos. Em 1993, o Dec.-Lei nº 309/93, de 2 de Setembro, veio reconhecer a sua

existência legal e permitir a cobertura integral da orla costeira continental.

Actualmente, cinco310 dos nove planos estão aprovados, encontrando-se os outros

em fase de elaboração. Estes planos, que definem as condições de ocupação, uso e

transformação dos solos no litoral, não são, contudo, muito claros sobre as regras

a que devem obedecer a construção de aldeamentos turísticos (um dos mais graves

problemas com que se debatem as zonas costeiras).

As albufeiras, tal como a orla costeira, funcionam como um suporte biológico

importante a merecer especiais atenções. Em cada albufeira existe um perímetro

dentro do qual são proíbidas ou limitadas certas actividades (previstas na

legislação) por comportarem perigos para a sua manutenção. Actualmente, estes

perímetros são alvo de um Plano de Ordenamento de Albufeiras de Águas

309 Os POOC são: Caminha/Espinho, Ovar/Marinha Grande, Alcobaça/Sintra, Sintra/Sado, Cascais/S. Julião da Barra, Sado/Sines, Sines/Burgau, Burgau/Vilamoura e Vilamoura/V. R. S. António. 310 Os POOC aprovados são: Caminha/Espinho, Cascais/S. Julião da Barra, Sado/Sines, Sines/Burgau, Burgau/Vilamoura.

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295

Públicas - POAAP. Estes planos, em número de vinte e oito, encontram-se em

várias fases do processo de planeamento: sete estão aprovados, um em revisão,

dezoito em elaboração e dois em fase de concurso/adjudicação (ver Mapa 5.4).

Mapa 5.4 Planos de Ordenamento de Albufeiras de Águas Públicas

Fonte: MEPAT - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

(1998c), Relatório do Estado do Ordenamento do Território - 1997, Lisboa, p. 207

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As áreas protegidas representam a nossa tradição mais consistente quanto à defesa

do património natural. Nestes autênticos santuários da natureza, a presença do

homem é consentida desde que obedeça a certos parâmetros que regulamentam os

limites da actividade humana aí exercida. Os Planos de Ordenamento de Áreas

Protegidas são, pelas suas características, verdadeiros planos ambientais 311já que

a sua linha orientadora é sempre a protecção dos ecossistemas naturais e destas

dependem as decisões quanto ao aproveitamento económico e, especialmente,

para as actividades de recreio e lazer.

Entre os PEOT e os PROT, ambos de nível regional ou intermédio, existe uma

divergência quanto à natureza dos interesses que realizam. Assim, enquanto ao

PROT está reservado o ordenamento integral de um determinado território, no

qual convergem vários e distintos interesses, o PEOT contrapõe a satisfação de

um interesse público concreto que é a valorização, a protecção ou aproveitamento

de uma parcela com uma unidade intrínseca que lhe é dada por um elemento

natural ou humano agregador (o mar, um parque ou reserva, uma albufeira).

Daqui resulta que estes planos têm uma amplitude mais restrita e intenções mais

modestas do que as do PROT. Ao mesmo tempo, esta diversificação de

instrumentos de planeamento de territórios regionais cria problemas de

convivência e entrosamento, uma vez que é perfeitamente possível a existência

simultânea, por exemplo, de um PROT e um POOC sobre a mesma faixa costeira.

Apesar de a lei obrigar a uma compatibilização entre si, na prática gerar-se-ão

alguns atritos e em caso de divergência não se sabe qual o regime que prevalece.

Outra dificuldade tem a ver com as possíveis críticas por parte das autarquias que

vêm crescer os limites à sua liberdade de disposição do território municipal e

estão obrigadas a proceder à revisão dos PDM de forma a incorporarem o

disposto nos PEOT, tal como fazem relativamente ao PROT. Esta situação, no

limite, como refere Frade (1999) pode levar a um quadro algo complicado: o

PDM tem de ser revisto porque perfaz dez anos de vigência, há que rever o PDM

311 Esta a razão pela qual os analisamos no ponto

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297

para o pôr em conformidade com o articulado do PROT recém criado, é

necessário ajustar o PDM para não contrariar as normas de um PEOT e, com a

aprovação da Lei de Bases do Ordenamento do Território e do Urbanismo e sua

recente regulamentação, haverá, uma vez mais, que revê-lo para se ajustar aos

seus princípios básicos; além disto, o quadro poderá piorar se lhe acrescentarmos

os planos sectoriais e intermunicipais. Daí a necessidade de repensar as formas de

coordenação de todos estes instrumentos de ordenamento do território de modo a

evitar um dispêndio inútil de esforços, conflitos institucionais e a irracionalidade

de algumas medidas.

5.4.2.5. Os Planos Locais de Ordenamento do Território

Os Planos Municipais de Ordenamento do Território – PMOT -, como já vimos,

englobam o Plano Director Municipal, o Plano de Urbanização e o Plano de

Pormenor. Em termos de área abrangida, o Plano Director Municipal – PDM -

abrange todo o território municipal, o Plano de Urbanização – PU - abarca

apenas as áreas urbanas e urbanizáveis e, ainda, as áreas não urbanizáveis

intermédias ou envolventes daquelas. Por último, os Planos de Pormenor - PP -

têm uma área de intervenção em sub-áreas dos Planos Directores e dos Planos de

Urbanização. As características principais e os elementos de cada plano de

ordenamento do território municipal são sintetizados no quadro 5.7.

O Plano Director Municipal é o principal instrumento para a definição e

implementação de uma estratégia económica e social das autarquias e o meio mais

apropriado para a disciplina urbanística dos aglomerados populacionais. O Dec.-

Lei nº 280/82 e o Dec.-Lei nº 69/90, sendo considerados os principais diplomas de

enquadramento jurídico do PDM, não impedem, segundo Portas (1995, pp. 25-

26), a existência de várias concepções do PDM: a restritiva, a expansionista e a

de regulação variável. Assim, enquanto num PDM restritivo predominam os

interesses mais conservadores (fixação com exactidão onde e quando se pode

construir), o plano expansionista valoriza as dinâmicas de crescimento e as

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vantagens comparativas para o investimento público e privado. A terceira

concepção de PDM, isto é, de regulação variável concilia as regras pré-fixadas e

conhecidas à partida por todos (REN e RAN, por exemplo) com a iniciativa

empreendedora e a utilização das oportunidades de investimento dos sectores

público e privado.

Quadro 5.7 Análise comparada dos PMOT

PDM PU PP

ÁREA

Todo o território municipal Áreas urbanas e urbanizáveis, podendo também abranger áreas intermédias ou envolventes

Tratam em detalhe dos outros planos

C O N T E Ú D O

Estabelece uma estrutura espacial para o território do município, a classificação dos solos, os perímetros urbanos e os indicadores urbanísticos, tendo em conta o desenvolvimento, a distribuição racional das actividades económicas, as carências habitacionais, os equipamentos, as redes de transporte e comunicações e as infra-estruturas

Define uma organização para o meio urbano, estabelecendo o perímetro urbano, a concepção geral da forma urbana, os parâmetros urbanísticos, o destino das construções, os valores patrimoniais a proteger, os locais de implementação de equipamentos, os espaços livres e o traçado esquemá-tico da rede viária e das infra-estruturas principais

Define, com minúcia, a tipologia de ocupação de qualquer área específica do município. Se for área urbana, estabelece a conce-pção do espaço urbano, dispondo sobre usos do solo e condições gerais de edificação, quer para novas edificações, quer para trans-formação das existentes, caracte- rização das fachadas dos edifícios e arranjo dos espaços livres

Elemen-tos

Funda- men- tais

Regulamento Planta de ordenamento (delimita classes de espaço312 em função do uso dominantes e estabelece unidades operativas de gestão313) Planta de condicionantes actua-lizada, instalações das forças armadas e forças/serviços de segurança, servidões adminis-trativas e restrições de utilidade pública, incluindo: RAN e REN, áreas protegidas, de regime florestal, de protecção e imóveis classificados e áreas do domínio público hídrico

Regulamento Planta de zonamento (delimita cate-gorias de espaço em função do uso dominante, estabelece unidades e subunidades operativas de planea-mento e gestão que servirão de base ao desenvolvimento e indica os respectivos parâmetros urbanísticos) Planta de condicionantes (ídem ao PDM)

Regulamento Planta de implantação (define o parcelamento, alinhamento, im-plantação de edifícios, nº de pisos ou cárceas, nº de fogos e tipologia, área total de pavimento e usos, demolição, manutenção ou rea-bilitação das construções exis-tentes, natureza e localização de equipamentos, arranjos paisagís-ticos e outras intervenções)

312 Os Planos Directores Municipais definem classes de espaço, em função do uso dominante, considerando: 1) espaços urbanos, caracterizados pelo elevado nível de infra-estruturação e concentração de edificações, onde o solo se destina predominantemente à construção; 2) espaços urbanizáveis, assim denominados por poderem vir a adquirir as características de espaços urbanos. São geralmente designados por áreas de expansão; 3) espaços industriais, destinados a actividades transformadoras e serviços próprios e apresentando elevado nível de infra-estruturação; 4) espaços para indústrias extractivas, incluindo as áreas destinadas a controlar o impacte sobre as áreas envolventes; 5) espaços agrícolas, abrangendo as áreas com características adequadas à actividade agrícola, ou que as possam vir a adquirir; 6) espaços florestais, nos quais predomina a produção florestal; 7) espaços culturais e naturais, nos quais se privilegiam a protecção dos recursos naturais ou culturais e a salvaguarda dos valores paisagísticos, arqueológicos, arquitectónicos e urbanísticos; 8) espaços canais, correspondendo a corredores activados por infra-estruturas e que têm efeito de barreira física dos espaços que os marginam. 313 Unidades operativas de gestão – áreas de intervenção específica, demarcadas principalmente em função de um programa de acção que se aplicam a esse território.

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299

Quadro 5.7 Análise comparada dos PMOT

/cont. /

Elemen-tos

Comple- men- tares

Relatório (indica as principais medidas, indicações e dispo-sições adoptadas) Planta de enquadramento (abrange e assinala a área de intervenção e zona envolvente e as principais vias de comuni-cação) Programa de execução (ídem ao PU facultativo) Plano de financiamento (ídem ao PU facultativo)

Relatório (ídem ao PDM) Planta de enquadramento (ídem ao PDM) Programa de execução (disposições sobre o escalonamento temporal das obras públicas municipais e da elabo- ração ou revisão de outros PMOT’s) Plano de financiamento (estimativa de custo das realizações municipais previstas no plano e fontes de finan-ciamento por fases de execução)

Relatório (ídem ao PDM e PU) Planta de enquadramento (ídem ao PDM e PU) Programa de execução (ídem ao PU) Plano de financiamento (ídem ao PU)

Elemen-tos

Anexos

Estudos de caracterização física, social, económica e urbanística que fundamentam a solução proposta Extracto do regulamento e da planta, síntese do plano mais abrangente se existir e dispo-sições alteradas pelo plano Planta da situação existente

ídem ao PDM

ídem ao PDM e PU mais: Plantas de trabalho (elementos técnicos de modelação do terreno, cotas mestras, volumetrias, perfis longitudinais e transversais de arruamentos e traçado de infra-estruturas)

Fonte: BRITO, A. J., (1997), A Protecção do Ambiente e os Planos Regionais de Ordenamento

do Território, Livraria Almedina, Coimbra, p. 189 O Plano Director Municipal inclui um instrumento importante - inquérito público

– cujo objectivo é dar conhecimento aos munícipes e a todos os interessados em

geral do conteúdo do plano elaborado, antes de ser submetido a aprovação e

ratificação, permitindo a apresentação de sugestões, comentários e críticas. Este

instrumento, desde que bem utilizado, dá à equipa do plano uma outra visão das

repercussões que este poderá ter para o município possibilitando, assim, a recolha

de informações que permitam fazer pequenas correcções ou, inclusivamente,

alterações profundas.

O regulamento, enquanto peça integrante do PDM, fixa, entre outras, as regras

jurídicas para as zonas do território definidas no plano (traduzidas graficamente

nas plantas de ordenamento e de condicionantes). Para efeito de delimitação das

zonas em que se decompõe o território municipal prevêem-se diversas classes de

espaços (urbanos, urbanizáveis, industriais para indústrias transformadoras e

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

300

respectivos serviços, agrícolas, florestais, culturais e naturais e canais),

individualizáveis de acordo com o uso dominante. Refira-se, ainda, que o

perímetro urbano é determinado pelo espaço urbano e espaço urbanizável.

A elaboração dos Planos de Ordenamento Municipal tem tido uma evolução

positiva. Assim, até Junho de 1997 já tinham sido ratificados 244 Planos

Directores Municipais que correspondem a 86% da área continental e 90% da

população (ver quadro 5.8). Desde aí até Dezembro de 1999 foram, entretanto,

ratificados e publicados em Diário da República mais 18 PDM pelo que restam

somente quatro municípios do continente sem este importante instrumento de

ordenamento do território.

Quadro 5.8 Planos Directores Municipais por regiões de planeamento

Total de municípios NUT Até

30/06/97 1/0797 a 31/12/99 Por NUT Com PDM Sem PDM

Norte 83 1 85 84 1 Centro 67 9 78 6 2 Lisboa e Vale do Tejo 40 11 51 51 - Alentejo 39 6 46 45 1 Algarve 15 1 16 16 - Total 244 18 276 272 4

Fonte: Elaborado a partir de MEPAT – Ministério do Equipamento, do Planeamento e da

Administração do Território (1998b), Relatório do Estado do Ordenamento do Território – 1997, Lisboa, p. 206; Dados recolhidos pelo autor

Em relação aos Planos de Urbanização (PU) e Planos de Pormenor (PP) verificou-

se um maior dinamismo na sua elaboração após a entrada em vigor dos Planos

Directores Municipais. Assim, se por exemplo até 31/12/71 foram aprovados 332

PU e 50 PP, em cerca de 21 anos (1/1/72 a 31/5/794) aprovaram-se,

respectivamente, 159 e 703 planos, entre 1 de Maio de 1995 e 30 de Julho de

1996 foram aprovados 19 PU e 135 PP, nos quais se incluem alguns de índole

mais específica, como sejam os 6 Planos de Pormenor de Renovação Urbana e os

28 Planos de Pormenor de Zonas Industriais. De 1de Julho de 1997 a 31 de

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301

Dezembro de 1999 foram aprovados e publicados em Diário das República 14

Planos de Urbanização e 37 Planos de Pormenor. Estes valores mostram bem a

dinâmica existente, embora a sua distribuição por NUT apresente disparidades

assinaláveis como se verifica no quadro seguinte.

Quadro 5.9 Planos de Urbanização e de Pormenor publicados em D.R

NUT Muni-

cípios Sem data

Até 31/12/71

01/01/72 a 31/05/94

1/05/95 a 30/06/96

1/07/97 a 31/12/99

Total

PU PP

PU PP

PU PP PU PP PU PP PU PP

Norte 85 0 5 95 19 27 148 5 13 6 7 133 192 Centro 78 0 0 86 10 35 166 3 36 2 13 126 225 Lisboa V. T.

51 10 3 77 9 45 162 6 49 1 9 139 232

Alentejo 46 0 0 37 4 43 221 5 36 3 5 88 266 Algarve 16 1 0 26 0 9 6 - 1 2 4 38 11 Total 276 11 8 321 42 159 703 19 135 14 38 524 926

Fonte: Elaborado a partir de MPAT – Ministério do Planeamento e da Administração do Território

(1995), Relatório do Estado do Ordenamento do Território – 1994, Lisboa; MEPAT – Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território (1998b), Relatório do Estado do Ordenamento do Território – 1997, Lisboa; Dados recolhidos pelo autor

A análise da situação existente em relação aos vários tipos de planos de

ordenamento do território permite-nos destacar algumas situações que merecem

profunda reflexão, nomeadamente:

• insuficiente cobertura do território continental, em termos de planos regionais,

planos especiais (exceptuando os da orla costeira) e planos sectoriais de

incidência territorial;

• fraca articulação entre os vários planos, quer a nível horizontal, quer a nível

vertical;

• inexistência de um programa nacional de ordenamento do território;

• inexistência de planos intermunicipais (talvez devido a indisponibilidade dos

autarcas para cooperarem);

• má qualidade dos planos directores municipais, salvo algumas excepções,

consubstanciada em: a) número bastante elevado de restrições e proibições; b)

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302

poucas ou nenhumas orientações estratégicas para o desenvolvimento do

concelho; c) planos vagos e gerais; d) indefinição ao nível dos espaços

naturais e rurais; e) desactualização geral da cartografia utilizada; f) quase

inexistente interligação entre os PDM’s de concelhos vizinhos traduzida na

sobreposição ou não continuidade de propostas.

5.4.3. Os Planos de Ordenamento do Território no terceiro milénio Em Portugal, a perspectiva de crescimento económico adoptada até 1950 era

meramente sectorial. Com a década de 60, o crescimento urbano-industrial passou

a fazer-se sentir de forma assimétrica, gerando degradações e inevitáveis

problemas sociais. Deu-se início à rápida litoralização do país que continua ainda

hoje a verificar-se. A intensificação da mecanização da agricultura e as sucessivas

campanhas de produção sectorial contribuíram, sobretudo no sul do país, para a

extensividade da produção agrícola. A conjugação de todos estes factores levou ao

progressivo empobrecimento da diversidade paisagística do nosso território e dos

recursos naturais, razões pelas quais o desenvolvimento sustentável como

conjunto de princípios e valores sociais, ecológicos e económicos se tornou o

tema incontornável da nossa época. A Comissão Mundial para o Ambiente e

Desenvolvimento, define como ambiente sustentável aquele que procura

satisfazer as necessidades e aspirações actuais sem comprometer a possibilidade

de as gerações futuras satisfazerem as suas (cit. Brito, 1997, p. 258).

Em nosso entender, os princípios gerais do desenvolvimento sustentável podem e

devem ser assumidos nos Planos de Ordenamento do Território e, em especial,

nos Planos Regionais de Ordenamento do Território, uma vez que só à escala

regional se pode fazer a abordagem integrada e objectiva que falta ao nível da

Administração Central e municipal. Os PROT são, então, o instrumento mais

poderoso de ordenamento do território representando o plano de nível superior, a

quem se têm de subordinar e compatibilizar os PMOT (PDM, PU e PP) e, em

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303

princípio, todos os planos especiais (POAPP, POAP e POOC) e de natureza

sectorial (PDAR, PBH e PMIF).

Os PROT são planos que se sobrepõem inclusivamente aos planos sectoriais dado

que, enquanto os PROT são instrumentos de carácter programático e normativo,

os planos sectoriais têm apenas um carácter sectorial pré-definido, de conservação

e valorização do património natural ou, por outras palavras, o seu objectivo e

âmbito de aplicação é mais restrito. De referir que a eficácia dos PROT está

intimamente ligada à metodologia de elaboração, ao próprio teor das propostas

avançadas e aos meios disponibilizados na sua elaboração, mas também à

hierarquização da sua implementação, conjugação com os programas

sectoriais/operacionais e definição de acções subsequentes de acompanhamento e

monitorização. A delimitação da área geográfica de cada PROT, sendo

determinada por Resolução do Conselho de Ministros, conduz, com alguma

frequência, à elaboração de um PROT com uma dimensão territorial

excessivamente pequena (cite-se o PROZOM e o PROZEA) comparativamente

com outros que abrangem toda uma região de planeamento (por exemplo, o

PROTAL). Além disso, a actual estrutura administrativa que reserva ao Estado a

implementação das grandes redes de infra-estruturas e equipamentos colectivos,

cujo planeamento e execução promove de forma sectorial, sem a necessária

coordenação horizontal (veja-se o caso do PROTAML), espacializada em plano

próprio, cria enormes contradições no sistema de planeamento.

Ao nível dos Planos Municipais de Ordenamento do Território registe-se o

esforço de planeamento que tem vindo a ser desenvolvido pelas autarquias. No

entanto, ou por inexperiência, ou pela teia de interesses económicos dos quais

estas dependem (devido aos condicionamentos orçamentais), muitos dos PDM são

tecnicamente fracos, não se respeitaram as áreas non aedificandi, previstas na lei,

validaram-se implantações de parques habitacionais e industriais, bem como de

infra-estruturas e equipamentos que degradam o ambiente e impedem a

implementação de uma Estrutura Verde com base na REN, RAN e DPH. Registe-

se, ainda, a ausência de instrumentos de actuação ao nível das várias figuras do

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304

planeamento/ordenamento municipal, ou seja dos PDM, PU e PP. No nosso

quadro legal, a diferença entre os planos é, segundo Portas (1995), de objectiva e

não de objectivo ou objecto. Efectivamente, se a diferenciação entre os tipos de

plano fosse a escala e não a natureza ou finalidade da informação que

representam, então uma só figura de plano mediante um sistema de “janela”

permitiria descer ao cadastro onde quiséssemos, ou em sentido inverso, subir ao

conjunto do território sem soluções de continuidade. No entanto, apesar de a

maioria dos concelhos terem o seu PDM aprovado (com algumas ambiguidades

na escala) a informação imprecisa sobre os cadastros, as tendências dos

mercados, a vontade dos agentes promotores, o regime operativo da urbanização é

certamente, um dos maiores problemas que teremos de enfrentar na gestão do

território municipal.

Além disso, os Planos Directores Municipais da presente geração podem

caracterizar-se como instrumentos de divisão do território em áreas ou zonas, em

função dos usos dominantes, do solo municipal sem estratégia global e com uma

marcada incidência na regulamentação dos espaços urbanos e urbanizáveis, pelo

que a nova geração deverá apontar claramente uma estratégia de desenvolvimento

ambientalmente sustentável e cartografada.

Um sistema de planeamento do território municipal eficaz e económico

caracteriza-se por possibilitar a passagem do plano ao projecto, dado que o plano

guia e o projecto se executa. Assim, neste esforço de planeamento/ordenamento

do território é aconselhável tentar a variação de graus de

determinação/indeterminação na mesma figura de plano314 o que levaria a uma

estreita cooperação com o Município e deste com os agentes públicos e privados.

Em última análise, esta regulação variável levaria à definição de projectos

elegíveis para os Programas ou Contratos Programas que constituiriam a

componente física da estratégia municipal. Os PDM de regulação variável não se

limitam somente à flexibilização regrada do perímetro urbano, mas também à

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305

forma como se regula o solo urbano e urbanizável. Partindo do princípio que um

perímetro tem áreas com níveis diferenciados de incerteza, a aplicação de um

critério de ajustamento do grau de rigidez ao grau de convicção admissível, para

cada parte do território, permite não só ir mais longe na regulação dos tecidos

urbanos consolidados e menos naqueles que não têm tais amarras a estruturas

construídas, como também legitima que se tracem as malhas estruturantes para

aquelas áreas que, não as tendo, são consideradas preferidas ou prioritárias para

o desenvolvimento realista do Município (Portas, 1995, p. 25). Esta representação

selectiva, na escala adequada, permite uma regulação menos abstracta ou

quantitativa com ganhos, quer para os Municípios (reduz-se o número de Planos

de Pormenor a elaborar), quer para as populações (transparência de processos e de

normas com a consequente redução da insegurança para os particulares).

Dados os desfasamentos existentes entre os PDM e a legislação de protecção aos

ecossistemas fundamentais é necessário proceder à sua revisão com base nos

Planos Municipais de Ambiente - PMA - que reavaliem as situações, onde e em

que medida a edificação deve ser controlada e, simultaneamente, estudem as redes

de recolha, reciclagem e tratamento de resíduos industriais e urbanos.

A composição das equipas técnicas dos Planos de Ordenamento Municipal deve

ser regulamentada de modo a exigir técnicos com formação específica ao estudo

do meio ecológico e cultural, bem como dos mecanismos legais e institucionais

responsáveis pelas alterações do território. A deficiente composição das equipas

tem contribuído significativamente para a deformação das propostas, numa ou

noutra perspectiva, ignorando ou mesmo deturpando abordagens fundamentais.

Araújo (1994, pp.132-135) além de apontar a falta de planeadores qualificados,

como uma das razões para a dificuldade ao nível do planeamento municipal,

sugere ainda a indefinição das unidades de planeamento, a impreparação dos

gestores e a fraca participação das populações.

314 Esta variação de graus de determinação/indeterminação pode traduzir-se, eventualmente, na utilização de várias escalas e/ou sobreposição de layers com diferente tipo de informação.

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306

A questão das densidades de ocupação deverá ser abordada à semelhança do que

se passa noutros países europeus, pelo que é indispensável legislar sobre as

densidades máximas de edificação, em função da situação urbana e da relação

volume edificado/espaço público que permita a integração, no tecido urbano, dos

equipamentos e infra-estruturas necessárias. A manutenção da volumetria das

edificações, a par da recuperação dos locais históricos da cidade, eventualmente

para equipamentos colectivos, e dos espaços verdes existentes são, portanto,

indispensáveis à preservação da identidade histórica da cidade.

As periferias geralmente mal estruturadas em que os edifícios se localizam, soltos,

numa matriz predominantemente verde ou as zonas urbanas degradadas terão que

ser reconstruídos a partir do espaço público. A transformação das zonas

monofuncionais em zonas multifuncionais, integrando os equipamentos

necessários junto aos parques habitacionais (comércio, educação, culturais e

sociais), é indispensável à qualidade de vida dos residentes nestas zonas. O

planeamento das vias deve ser integrado com o dos transportes públicos e com os

percursos pedonais, privilegiando os transportes públicos, em relação ao

transporte individual e evitando o enorme corte provocado, no tecido urbano,

pelas vias rápidas que actualmente têm vindo a proliferar. Nas periferias, há ainda

que estimular a integração social, através da criação de espaços de convívio e

encontro em espaço fechado, para as várias faixas etárias e de espaços de lazer e

contemplação em espaços abertos.

O ordenamento do território é, simultaneamente, uma actuação administrativa e

um imperativo constitucional (artº 9º da constituição) pelo que não pode ter lugar

uma intervenção casuística, baseada na discricionaridade e precariedade das

soluções. Daí, a importância do planeamento, quer em termos espaciais, quer em

termos temporais para a prossecução do ordenamento do território. O papel

decisivo dos Planos de Ordenamento do Território para a correcta localização das

actividades e para o desenvolvimento equilibrado e sustentável, é enfatizado pelo

facto das suas normas e princípios vincularem as entidades públicas e privadas,

nos termos do artº 11º da Lei de Bases do Ordenamento do Território e

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307

Urbanismo, só poderá realizado com uma fiscalização eficiente (dotada de meios

humanos e materiais adequados) nas fases de elaboração e implementação dos

Planos. Efectivamente, enquanto muitas autarquias têm vindo a licenciar projectos

sem ter em conta uma perspectiva global de ordenamento do território, as

Comissões de Coordenação Regional não têm, de um modo geral, meios humanos

que permitam fazer uma fiscalização adequada na fase de execução destes

planos315 levando a que os resultados obtidos, embora bastante positivos, não

atinjam elevados padrões de qualidade.

5.5 RESUMO E CONCLUSÕES

O ordenamento do território, enquanto competência da Administração Central e

Local, tem sido esquecida, ao longo dos anos, pelo que foi dada prioridade a

outras tarefas e resolução de outros problemas.

O ordenamento do território exige o manuseamento de grande quantidade de

informação diversificada, mas com uma característica comum (a

georeferenciação) o que contribuiu para o rápido desenvolvimento das novas

tecnologias de informação e dos Sistemas de Informação Geográfica. No caso

português, a experiência na criação e desenvolvimento do Serviço Nacional de

Informação Geográfica – SNIG - é, em muitos aspectos, inovadora. A curta

história deste serviço vai desde os anos setenta, altura em que se iniciou o projecto

da Base de Dados do pólo de desenvolvimento de Sines, até ao lançamento do

SNIG na Internet (1995) e à criação (1999) de uma interface específica para o

cidadão (o GEOCID) poder aceder à informação geográfica digitalizada sem que

o mesmo tenha de recorrer a sofisticados e caros produtos informáticos.

315 A entidade coordenadora, por excelência do cumprimento da Lei no que diz respeito ao ordenamento do território, é a Inspecção Geral da Administração do Território. Esta actua, quer através de inspecções ordinárias, inquéritos, sindicâncias e averiguações sumárias, que efectua junto das autarquias locais, em nome e no exercício da tutela inspectora do Governo, ou junto dos serviços centrais desconcentrados do MPAT ou sua sob sua tutela (actualmente, MP), conforme determina o D.L. nº 64/87, de 6 de Fevereiro; quer, ainda, mediante participação da DGOT (actualmente, DGOTDU), no que diz respeito aos loteamentos urbanos.

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

308

Paralelamente, à implementação do SNIG, procedeu-se à criação da Base de

Dados de Ordenamento do Território com o objectivo de recolha e tratamento da

informação necessária à elaboração e monitorização dos planos de ordenamento

do território. Neste âmbito, é de destacar o lançamento do PROGIP e do PROSIG

(subsistemas da Base de Dados do Ordenamento do Território) com o objectivo

de, no primeiro caso, se proceder à digitalização dos Planos Municipais de

Ordenamento do Território e ao desenvolvimento de uma aplicação informática

para a gestão eficiente de planos de ordenamento. Por seu lado, o PROSIG tem

como objectivo principal o apoio à implementação do Sistema de Informação

Geográfica à escala municipal visto se entender que estes sistemas têm um papel

importante no processo de planeamento do território, conferindo-lhe maior

eficiência, desde que entendidos como instrumentos de apoio à tarefa de

monitorização desse processo e, em particular, dos Planos Directores Municipais.

Os planos de ordenamento do território, enquanto instrumentos privilegiados da

política de gestão do território, têm uma forte componente ambiental. Aliás, a

protecção e gestão do ambiente estão ligados ao planeamento do território e à

sustentabilidade do desenvolvimento sócio-económico formando um trinómio.

O planeamento ambiental foi evoluindo desde uma fase caracterizada por um

optimismo exagerado quanto ao crescimento ilimitado das economias até à fase

actual em que o princípio activo passou a ser o da preservação e não o princípio

intermédio do poluidor-pagador. Em relação aos instrumentos de planeamento

ambiental, Fraga (1995, p. 231 e segs.) divide-os em três grupos:

• planos que possuem um conteúdo protector do ambiente. A sua acção tem

como objectivo a articulação racional do conjunto das potencialidades

económicas, físicas e infra-estruturais decorrentes de cada espécie de recurso.

A título de exemplo, citemos os Planos Municipais de Intervenção Florestal, o

Plano Nacional da Água e os Planos de Bacia Hidrográfica e o Plano Nacional

de Resíduos que se integra no Plano Nacional de Política de Ambiente;

• planos especificamente ambientais cuja vocação é de explicitar e coordenar

as acções de conservação e as actividades permitidas dentro da área protegida

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309

que poderá ser parque nacional, reserva ou parque natural e, ainda, área

protegida de âmbito regional e local,. A título de exemplo, citemos os Planos

de ordenamento de Área Protegida ou os Planos de Ordenamento da albufeira

de Águas Públicas;

• medidas que se efectivam através dos planos de ordenamento do território. A

delimitação da RAN e da REN nos planos regionais e municipais de

ordenamento são um exemplo deste tipo de medidas.

Apesar do importante papel do planeamento ambiental, este não esgota a

problemática da política do ambiente. O planeamento ambiental é apenas uma das

faces desta política, ou seja, é a que está ligada à promoção da gestão e

regeneração dos recursos naturais. Refira-se, ainda, que grande parte das regras de

protecção ambiental ganha operacionalidade e efectividade práticas através dos

instrumentos privilegiados do ordenamento do território, isto é, através dos

planos de ordenamento territorial.

Já em relação ao ordenamento do território, a Lei de Bases prevê três níveis

geográficos a que correspondem dois níveis administrativos originando vários

tipos de instrumentos, ou seja, o Programa Nacional, os Planos Regionais, os

Planos Intermunicipais (facultativos), os Planos Municipais, os Planos

Especiais316 e os Planos sectoriais com incidência espacial317. De referir, contudo,

que há uma clara precedência dos planos com características marcadamente

urbanísticas sobre os planos de ordenamento. Embora, nos últimos anos, se tenha

feito um esforço notável no sentido de eliminar a deficiente organização do

território ainda há muito para fazer. A par da insuficiente cobertura do território

continental por várias figuras de plano (ver quadro 5.10) parece-nos importante,

desde já, a elaboração do programa nacional de ordenamento do território que,

definindo a estratégia e políticas do território nacional, permitiria aprofundar o

grau de articulação horizontal e vertical dos planos de ordenamento e iniciar a

316 Planos de Ordenamento das Áreas Protegidas, Planos de Ordenamento das Albufeiras de Águas Públicas e Planos de Ordenamento da Orla Costeira. 317 Por exemplo, citemos os planos de desenvolvimento da agricultura, os planos de bacia hidrográfica e os planos municipais de intervenção florestal.

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310

elaboração da nova geração de Planos Directores Municipais em que a estratégia

de desenvolvimento sustentável, devidamente cartografada em suporte digital,

seria uma das suas principais características.

Quadro 5.10 O ordenamento do território em números

Processo de elaboração Instrumentos

De Ordenamento

Território coberto Ela-

bora-dos

Ela-bor./ Rev.

Adju- dica- ção

To- tal

1. Programa nacional Todo o país * * * * 2. Plano regional Vários concelhos ou partes 4 4 32 10 3. Plano director municipal Todo o território municipal 272 4 - 276 4. Plano de urbanização Áreas urbanas ou urbanizáv. 524 * * - 5. Plano de pormenor Áreas detalhadas de PDM ou

PU

889

*

* -

6. Plano especial: - orla costeira - áreas protegidas

- albufeiras de águas pú- blicas

Faixa litoral de vários muni-cípios Parque ou reserva Área envolvente

5 4 7

4 6

19

- 4 2

9 14 28

7. Reserva Agrícola Nacional Parte do território municipal 219 57 - 276 8. Reserva Ecológica Nacional Parte do território municipal 269 6 - 276

Legenda:

- Os dados referem-se aos instrumentos ratificados e publicados em diário da República até 31 de Dezembro de 1999

- * dados não disponíveis

Paralelamente ao esforço de cobrir o país com os vários Planos de Ordenamento,

actualizar a Base de Dados de Ordenamento do Território, desenvolver o Sistema

Nacional de Informação Geográfica e criar o Observatório de Ordenamento do

Território é absolutamente necessário motivar e incentivar todos os agentes

económicos e a população em geral para esta importante questão que é o

planeamento do território nacional num contexto de desenvolvimento sustentável

cujo centro das atenções é a população residente.

Os Planos Regionais de Ordenamento do Território são, então, o instrumento mais

poderoso e central do ordenamento do território pelo que a este plano se deverão

subordinar e compatibilizar os Planos Municipais (PDM, PU e PP), todos os

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311

planos especiais (POAP, POAAP e POOC) e de natureza sectorial (PDAR318,

PBH e PMF319).

Ao nível dos Planos Municipais de Ordenamento registe-se o esforço de

planeamento que tem vindo a ser desenvolvido pelas autarquias e que deverá ter

continuidade de forma a tornarem estes planos estratégicos de desenvolvimento

do município. Paralelamente, deve-se fazer um esforço suplementar para dotar os

municípios com um serviço de informação geográfica permitindo a eliminação

das ambiguidades na escala das cartas e a informação imprecisa sobre os

cadastros, as tendências dos mercados, a vontade dos agentes promotores e o

regime operativo da urbanização. Além disso, os Planos Directores Municipais da

presente geração podem caracterizar-se como instrumentos de divisão do território

em áreas ou zonas, em função dos usos dominantes do solo municipal, sem

estratégia global e com uma marcada incidência na regulamentação dos espaços

urbanos e urbanizáveis, pelo que a nova geração deverá apontar claramente uma

estratégia de desenvolvimento ambientalmente sustentável. Não poderíamos

concluir este capítulo sem referir a importância da implementação de Programas

ou Contratos Programa a celebrar entre a Administração Central, as Autarquias e

os agentes económicos para a prossecução dos grandes objectivos estratégicos

municipais.

Ao longo deste trabalho, foram analisados os modelos macro-económicos, os

modelos de localização da actividade humana e desenvolvimento regional, bem

como o planeamento regional e, em especial, o planeamento do território e

ambiental o que nos permitiu a apreensão de conceitos, da prática europeia e

nacional ao nível, ente outros, do ordenamento do território e das questões

ambientais. A reflexão efectuada leva-me a sugerir um modelo de ordenamento

territorial para a Beira Interior320 a ser desenvolvido no último capítulo.

318 Plano de Desenvolvimento da Agricultura Regional 319 Planos Municipais da Floresta 320 A Beira Interior integra as NUT’s Beira Interior Norte, Beira Interior Sul, Serra da Estrela, Cova da Beira e Pinhal Interior Sul

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312

6. MODELO REGIONAL DE ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO

6.1. INTRODUÇÃO

O modelo de ordenamento que iremos apresentar está intimamente ligado a um

espaço - a Beira Interior - que foi sendo construído e reconstruído, vivido e

representado, ou, se quisermos a um espaço histórico geo-económico e sócio-

cultural, cuja existência fluiu no tempo e se foi moldando em função da forma

como as comunidades nele se integraram e dele se apropriaram e manipularam. O

território resulta, assim, da acção dos seus habitantes que, explorando-o, nele se

foram incorporando e com ele estabelecendo uma profunda relação. As sucessivas

revoluções tecnológicas, o crescimento da produção industrial e a globalização da

economia retiraram protagonismo aos territórios tornando alguns deles

periféricos. Contudo, embora a globalização seja dominante na lógica de

organização do espaço, à escala supranacional, nacional e local, esta não constitui

uma dinâmica aglutinadora e supressora de outras sensibilidades, ou seja, de

outras formas de estar e pensar o território. Perante a tendência da uniformização,

a diferença e a qualidade constituem-se em elementos-chave das estratégias de

desenvolvimento regional pelo que um território qualificado e com identidade

cria predisposição para a fixação da população (Fernandes, 1998, p. 68) e, em

particular, de quadros técnicos tão necessários ao desenvolvimento sustentável.

Portugal não é um país homogéneo, pelo contrário as suas regiões têm diferentes

níveis de desenvolvimento sócio-económico. A variação territorial, em termos de

população residente e recursos humanos, de actividade produtiva e inovação,

dotação de infra-estruturas, equipamentos e acessibilidades, em sentido lacto,

mostra-nos um país fortemente litoralizado com duas áreas metropolitanas

polarizadoras (Lisboa e Porto) e, no outro extremo, um vasto território fronteiriço

caracterizado pela baixa densidade demográfica, dispersão do sistema de

povoamento e falta de recursos humanos qualificados. É neste espaço periférico e

de fronteira, mas específico que a Beira Interior se insere. A utilização consciente

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313

da especificidade regional representa uma das vias de afirmação no contexto

nacional e europeu.

O modelo territorial que iremos apresentar foi elaborado numa perspectiva de

“janela” ou de zoom dado que a Beira Interior está integrada na Região Centro

que, por sua vez, se integra no país e este na Europa. O modelo apoia-se na

seguinte tipologia de intervenções (J.E., 1997, pp. 106-111):

• acções sobre o meio físico;

• acções para o fortalecimento e reequilíbrio da malha urbana;

• acções sobre as áreas “não urbanas”;

• programas de dinamização territorial.

Para além disso tomaremos como elementos importantes o facto de se tratar de

uma região de fronteira, as características do seu relevo, do solo e coberto vegetal,

a riqueza dos recursos hídricos e do património natural e cultural e a forma como

se tem verificado o povoamento da região.

Dada a heterogeneidade do território nacional e a metodologia adoptada para a

elaboração do modelo territorial da Beira Interior optamos por dividir o presente

capítulo em três partes. Assim, na primeira parte – integração do modelo

territorial nacional na estratégia europeia – analisamos três cenários de

desenvolvimento do tecido produtivo e do território nacional tendo em

consideração a posição que ocupamos na União Europeia, o Esquema de

Desenvolvimento do Espaço Comunitário e a Estratégia Territorial Europeia.

Os cenários de evolução da região centro – segunda parte deste capítulo - inicia-

se com a caracterização social, económica e ambiental. Após esta introdução

detemo-nos na análise do espaço regional, isto é, estudamos os eixos de

desenvolvimento, o sistema urbano e as acessibilidades após o que abordamos a

estratégia de desenvolvimento.

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314

O capítulo e a tese termina com a proposta de um modelo de organização

territorial da Beira Interior. Assim, após se caracterizar física, social e

economicamente a região, apresentamos os constrangimentos e as potencialidades

de forma a determinar o capital endógeno que, associado a recursos exógenos e

políticas adequadas, formam a base do relançamento do desenvolvimento

económico e social da região. Por último, é apresentada uma proposta de modelo

de organização do território da Beira Interior.

6.2. A INTEGRAÇÃO DO MODELO TERRITORIAL NACIONAL NA ESTRATÉGIA

EUROPEIA

O indivíduo e o seu bem-estar, assim como a sua interacção com o meio ambiente,

constituem o ponto central do ordenamento do território, numa perspectiva de

desenvolvimento sustentável que concilie a multiplicidade de centros de decisão

com influência na organização do território, o carácter aleatório dos estudos

prospectivos, as limitações do mercado, as peculiaridades dos sistemas

administrativos, a diversidade das condições sócio-económicas e do meio

ambiente. Em Portugal, a adopção de um modelo extensivo e dual de crescimento

económico levou à forte litoralização do território português321 com a consequente

criação de graves e profundas assimetrias que põem em causa a coesão

económica e social do país. Neste contexto torna-se urgente inserir o interior nas

dinâmicas competitivas globais, num espaço de equidade social e territorial, num

uso sustentável dos recursos naturais e num território inovador e criativo

(MEPAT, 1998b). O território, durante longas décadas esquecido, ganha um nova

importância ao ser considerado, às portas do terceiro milénio, um importante

instrumento para uma melhor inserção na economia mundial e um veículo

privilegiado para a redução das assimetrias de desenvolvimento numa

perspectiva de sustentabilidade ou de longo prazo, pelo que a sua gestão deverá

321 Os eixos urbanos Aveiro-Valença e Leiria-Setúbal concentram 70% da população residente no litoral.

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315

ser prudente nas situações mais expostas a uma utilização mais intensiva e

ousada nas situações de risco de marginalização (MEPAT, 1998a, p.VIII-1).

A preparação do Esquema de Desenvolvimento do Espaço Comunitário,

aprovado na Cimeira de Potsdam, em 1999, desencadeou a realização de vários

estudos a nível de cada Estado-Membro tendo em vista perspectivar a integração

desses Estados neste esquema. Em Portugal, este esforço de reflexão deu origem,

entre outros, ao relatório “Portugal 2 010 – Posição no Espaço Europeu: uma

reflexão prospectiva” no qual são definidos três cenários de desenvolvimento,

suportados por vários modelos de acordo com as variáveis analisadas, ou seja, a

dinâmica de actividades e especialização internacional, a inserção geoeconómica

e o sistema urbano/organização do território (Ribeiro, 1998, pp. 12-22):

Cenário I : • modelo tradição modernizada

• modelo euroibérico

• modelo bipolar com urbanização litoral difusa

Cenário II : • modelo de renascimento industrial

• modelo euroatlântico

• modelo malha urbana polarizada

Cenário III : • modelo de terciarização internacionalizada

• modelo euroglobal

• modelo “região metropolitana atlântica”

Estes cenários, perspectivando formas diferentes de integração da economia e do

território nacional nas dinâmicas europeias e mundiais, como se verifica pela

leitura do quadro 6.1, tem reflexos profundos na forma como se poderão

desenvolver, por um lado, os sectores produtivos e, por outro lado, os sistemas

urbanos e o território de um modo geral. O primeiro cenário (conservador) aposta

na continuidade pelo que a tradição terá um peso elevado no processo de tomada

de decisão económica, social e territorial. Esta estratégia de desenvolvimento,

inserindo Portugal nas dinâmicas da Península e sendo do tipo “reacção passiva”

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316

aos desafios da construção europeia, levará, certamente, a uma subalternização

dos interesses nacionais face a Espanha.

Quadro 6.1 Descrição sintética dos cenários

Especialização internacional

Do tecido empresarial Inserção geoeconómica Sistema urbano/organização do

território

1º CENÁRIO:

• ascensão na “cadeia de valor” de pólos industriais tradicionais322;

• consolidação da fileira florestal e diversificação de produtos;

• fraco dinamismo na criação de novos pólos de especialização industrial;

• investimento directo estrangeiro (IDE) de média dimensão, pontual e disperso;

• oferta de serviços internacionais centrada no turismo de massas. Alguma diversificação de produtos e mercados;

• fraca dinâmica do processo de “Clusterização” na economia.

• Concentração nos mercados europeus e importância crescente do mercado ibérico;

• Ausência de funções geoeconómicas de valia ibérica ou europeia, com concentração destas funções em Espanha;

• Intensa exploração das complementaridades transfronteiriças;

• Acesso de mercadorias à Europa e acesso a recursos naturais, via Espanha;

• Investimento português (polarizado pelos serviços financeiros, distribuição, telecomunicações) em Espanha e algumas “economias em desenvolvimento”;

• fraco papel da C&T na internacio- nalização.

• bipolarização do sistema urbano, centrada nos Grande Lisboa e Porto. Dificuldade de afirmação de centros urbanos de dimensão intermédia, na faixa litoral;

• persistência de formas de urbanização difusa ao longo do litoral, resistências ao desenvolvimento de “redes” ou “eixos” urbanos;

• crescimento de alguns pólos urbanos no interior, paralelamente ao despovoamento rural;

• localização de alguns desses pólos nos “corredores” de aceso a Espanha e ao longo do IP2;

• desenvolvimento urbano com duas prioridades: Construir e Equipar.

2º CENÁRIO:

• redução do peso relativo de vários pólos de especialização industrial tradicionais, maior articulação de “fileiras” e densidade de “clusters” e clara ascensão na “cadeia de valor”;

• estagnação/declínio da fileira florestal e dinamização das indústrias agroalimentares;

• criação de um “cluster” Automóvel, aumento do investimento nas Indústrias Eléctricas e Electrónica e subcontratação evolutiva na Aeronáutica;

• dinamização do “cluster” Materiais, Embalagem, Artes Gráficas, Material de Escritório;

• extensão dos serviços internacionais: turismo e expansão das actividades de teletrabalho;

• forte dinâmica de “Clusterização” da economia.

• Importância dos mercados e dos destinos de investimento na Europa e na “Bacia do Atlântico”; desempenho de funções geo-económicas ibéricas e, em menor escala, europeias e globais;

• Acesso de mercadorias à Europa com maior autonomia face a Espanha, dada a maior importância do transporte marítimo;

• Exploração de complementaridades com regiões de Espanha, utilizando os portos nacionais;

• forte investimento português (sectores do cenário 1 e electricidade, ambiente e redes de transporte) preferencialmente em Espanha e “economias emergentes” da Bacia do Atlântico e da Europa Central

• forte intensidade de IDE contribuindo para a “clusterização” da economia;

• criação de uma “rede” na economia global, funcionando o território nacional como seu “nó”.

• maior estruturação urbana do litoral, com a criação de dois sistemas urbanos polarizados pelas Áreas Metropolitanas de Lisboa (AML) e do Porto (AMP), ambas ampliadas;

• desenvolvimento rápido de algumas cidades médias no litoral com efeitos polarizadores sobre cidades vizinhas (base industrial ou logística do desenvolvimento);

• concentração destes desenvolvimentos ao longo de dois “Macro-Corredores” urbanos polarizados pelas “novas” AML e AMP;

• desenvolvimento de algumas cidades e 4 “eixos urbanos” no interior, beneficiando da maior articulação com a faixa litoral e redinamização de zonas interiores localizadas ao longo do IP2;

• desenvolvimento urbano com três prioridades: Descongestionar, Habitar e Redinamizar “Centros Históricos.

322 Têxtil, vestuário, calçado, cerâmica, produtos metálicos.

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317

Quadro 6.1 Descrição sintética dos cenários /cont./

3º CENÁRIO:

• redução do peso relativo de vários pólos de especialização industrial tradicional, mas com ascensão na “cadeia de valor”, “Clusterização” e articulação entre “Clusters”;

• diversificação industrial para sectores dinâmicos a nível mundial: electrónica e comunicações, material de saúde, aeroespacial, novos veículos urbanos, aproveitamento da energia solar (atracção de investidores estrangeiros e dinâmica de PME’s nacionais);

• diversificação: “Cluster” software/Conteúdos/Audiovisual/Serviços Informáticos e Telemáticos, “Cluster” Turismo/ Lazer reforçado com a atracção de residentes estrangeiros;

• Pólos de especialização nascentes nos Serviços de Saúde, Comunicações e Serviços Aeroespaciais.

• presença em sectores e actividades com procura mundial dinâmica e forte utilização do ciberespaço;

• funções geoeconómicas, reforçadas como plataforma de valia europeia e internacional nos transportes aéreos, marítimos e telecomunicações;

• maior capacidade de interacção com regiões de Espanha, a partir das plataformas logísticas de inserção nas redes e rotas mundiais;

• maior peso da internacionalização a partir do território nacional e da inserção nas redes e rotas internacionais e no ciberespaço;

• menor dinâmica do investimento de grandes empresas portuguesa no estrangeiro;

• dinâmica do IDE no terciário e nalgumas actividades industriais inovadoras;

• Portugal sede de Agência Europeia dos Oceanos e localização de laboratórios de I&D com ele relacionados

• Sistema urbano português, constituindo um factor de aglutinação de uma “Macro-região Atlântica do sudoeste europeu”;

• Formação de duas Grandes Regiões Metropolitanas Porto/Braga e Lisboa/Setúbal, ambas fortemente internacio-nalizadas e articuladas entre si;

• Organização no litoral de várias “redes de cidades” entre as duas Regiões Metropolitanas;

• Desenvolvimento de quatro “eixos urbanos” no interior, dinamizando actividades turísticas e servindo novas zonas de localização de residências secundárias;

• Desenvolvimento urbano com três prioridades: Cidades Verdes, Cidades Digitais, Cidades com Memória Histórica.

Fonte: Adaptado de RIBEIRO, J. F., (1998), “Cenários de Longo Prazo para o Território do

continente. Uma reflexão a propósito do EDEC” in PROSPECTIVA E PLANEAMENTO, V. 3/4, MEPAT/SEDR, Departamento de Prospectiva e Planeamento, Lisboa, pp. 11-22

O segundo cenário, sendo intermédio, apela a alguma inovação, assume desafios e

reclama a participação mais ousada da Administração Pública, dos agentes

económicos e da população em geral. Este cenário, integrando a economia e o

território nacional numa Região Atlântica, faz a ponte entre um passado de

imobilismo e uma participação activa na construção europeia.

O terceiro cenário, sendo o mais ousado, é um cenário de rotura com o passado

que perspectiva a economia e o território nacional inseridos numa grande Região

Metropolitana Europeia. Neste cenário aposta-se na inovação, nas novas

tecnologias de informação, no conhecimento e na posição estratégica do território

nacional como factores de crescimento. O território será mais equilibrado já que

se, por um lado, as duas áreas metropolitanas (Lisboa e Porto) se expandem, por

outro lado, criam-se novos eixos de desenvolvimento no interior articulados entre

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Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional _______________________________________________________________________________

318

si e com as duas áreas metropolitanas nacionais reequilibrando, assim, o território

português e criando as condições para o esbatimento das graves assimetrias

regionais. As políticas a serem implementadas para atingirmos este cenário

centram-se no estímulo ao desenvolvimento simultâneo e harmonioso de

condições favoráveis à articulação entre a economia, o território e os cidadãos,

isto é, entre competitividade nacional, afirmação regional e bem-estar individual

(Sousa, 2000, p. 64).

O desenvolvimento equilibrado do território nacional (3º cenário) exige uma

distribuição diferente da despesa pública em novos moldes, ou seja, exige uma

distribuição com discriminação positiva a favor das regiões menos desenvolvidas.

Efectivamente, não é mais possível continuar com uma distribuição da despesa

pública per capita que favorece a região mais desenvolvida (Lisboa e Vale do

Tejo) e contribui, assim, para o agravamento das assimetrias regionais como

demonstram os valores seguintes: no período de 1994-1998, exceptuando as

Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira (regiões ultra periféricas) em que

esta despesa ultrapassa os 400 contos, a Lisboa e Vale do Tejo foram atribuídos

225 contos, ao Alentejo 177, ao Centro 174 e ao Norte 142 (DPP, 1999, p. 38).

Os cenários de evolução apresentados se, por um lado, não são contraditórios com

a inclusão de Portugal no Arco Atlântico, por outro lado, não excluem o

aprofundamento e consolidação das relações luso-espanholas e reforçam mesmo

essa necessidade. Nos últimos anos, têm-se vindo a desenhar e consolidar eixos de

desenvolvimento que, em alguns casos, ultrapassam o território nacional e se

podem considerar internacionais ou ibéricos (ver quadro 6.2).

A consolidação destes eixos de desenvolvimento exigem a criação de infra-

estruturas que, por sua vez, irão permitir implementar um modelo de

desenvolvimento sustentável e incluir Portugal nas redes transeuropeias de

telecomunicações, de transporte e de energia. A opção de inserção nas redes

transeuropeias tem levado a Administração Central a programar elevados

investimentos na modernização das redes de transportes e, em especial, nas

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319

ligações multimodais de Portugal-Espanha/Europa que implicam a articulação dos

transportes marítimos, aéreos, ferroviários e rodoviários. Além disso, está em

curso a construção do gasoduto de gás natural, cuja estrutura base (troços de

Setúbal/Braga e Campo Maior/Leiria) ficou concluída e operacional em Fevereiro

de 1997 (MEPAT, 1998c, p. 66).

Quadro 6.2 Classificação dos eixos de desenvolvimento

Corredores internacionais:

• eixo Irun-Portugal (na parte portuguesa acompanha o IP5) • eixo Lisboa-Madrid-França (no território nacional acompanha a A1, IP6, IP2, EN223 e

EN240 até à fronteira de Segura) Corredores ibéricos:

• eixo galaico-português (abrange toda a orla costeira portuguesa, exceptuando o litoral alentejano onde se verifica uma ligeira inflexão para o interior)

• eixo Faro-Sevilha (num futuro próximo, ligar-se-á ao eixo do mediterrâneo) Corredor nacional:

• eixo Guarda-Covilhã-Castelo Branco (eixo junto à fronteira acompanhando o IP2)

Fonte: MEPAT - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

(1998c), Relatório do Estado do Ordenamento do Território - 1997, Lisboa, p. 67

Embora consideremos que o corredor Guarda-Covilhã-Castelo Branco tem

capacidade para contrariar a tendência de desertificação que se verifica no interior

português há, contudo, além de outras medidas, a necessidade de reforçar a rede

de estradas da região com as ligações Norte-Sul (conclusão do IP2), as

transversais, isto é, eixos paralelos ao IP5 que permitam, por um lado, a ligação

do litoral português ao interior e deste a Espanha e as intra-regionais dotando a

Beira Interior de um sistema viário integrado que facilite os fluxos de tráfego inter

municipal. Esta rede, formada por estradas de vários níveis, ao mesmo tempo que

aumenta a acessibilidade inter e intra regional contribui para a fixação da

população constituindo-se, assim, num dos principais elementos de estruturação

do território.

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320

6.3. OS CENÁRIOS DE EVOLUÇÃO DA REGIÃO CENTRO

6.3.1 Caracterização social, económica e ambiental

Na Região Centro, em 1997, viviam 1,7 milhões de pessoas numa área de 23 668

Km2, ou seja, 17,2% da população nacional e 25,8% da superfície de Portugal. A

diversidade dos seus territórios, em termos naturais e sócio-culturais, e a

configuração espacial que serve de suporte à Administração Pública e à promoção

das políticas de desenvolvimento são aspectos a destacar. A articulação Norte-Sul

ou das áreas metropolitanas do Litoral Atlântico com os espaços de baixa

densidade no Interior fronteiriço, coloca a região numa posição estratégica nas

ligações entre as áreas mais dinâmicas de Portugal e no acesso à Europa. A região,

à semelhança do país, apresenta fortes desequilíbrios de povoamento, onde a uma

densidade média de 72 hab/Km2 correspondem densidades inferiores a 40

hab/Km2 na maior parte dos concelhos (Pinhal Interior e ao longo da fronteira) e

densidades superiores a 120 hab/Km2 em alguns concelhos do litoral.

Em termos sócio-económicos, a região caracteriza-se, entre outros, pelos

seguintes indicadores (CCRC, 1999, pp.17-37):

• elevado índice de envelhecimento devido, em parte, às elevadas taxas de

mortalidade e baixas taxas de natalidade. O crescimento natural da população

é negativo em todas as NUT’s III da região excepto no Baixo Vouga e no

Pinhal Litoral. As projecções demográficas, 1991-2011, publicadas pela

DGOTDU, estimam uma diminuição populacional de -4,5% a -11%. Em

termos de distribuição territorial, a evolução da população apresenta

tendências diferenciadas com três unidades territoriais do litoral (Tâmega, Ave

e Cávado) a registaram um crescimento natural de 6%, duas áreas litorais

(Baixo Vouga e Pinhal Litoral) a verificarem uma estagnação dos valores e os

espaços mais periféricos ou interiores (Pinhal Interior Sul e Beira Interior Sul)

a sofrerem diminuições significativas, respectivamente, de 9,9% e 6,8% (op.

cit., 1997, p. 58);

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321

• povoamento disperso onde não se destacam grandes cidades323. No litoral

formaram-se algumas “redes de cidades” com algumas centenas de milhar de

habitantes num raio de 20 a 30 Km;

• baixos níveis de qualificação da população, taxa de analfabetismo elevada324 a

par de taxas de escolarização, no ensino básico e secundário, relativamente

baixas e elevado abandono no final do ensino obrigatório. Além disso,

verificam-se carências de mão-de-obra com qualificações específicas em

alguns sectores de actividade;

• estrutura económica325 dominada pelos serviços (75% do VAB total regional).

A indústria representa 26% do VAB, os produtos energéticos 4%, a

construção civil 6% e a agricultura 7% (valor bastante inferior à média

nacional). No sector secundário encontram-se alguns sub-sectores inseridos

nas dinâmicas de competitividade internacional (cerâmicas, produtos

metálicos, moldes, componentes automóveis, aglomerados de madeira e pasta

de papel, vidro) a par de outros baseados nas vantagens dos baixos custos

salariais (vestuário). O sector de serviços é tradicional (61% do VAB terciário

é obtido por serviços reparação, restauração e hotelaria e serviços não

mercantis);

• poder de compra regional inferior ao valor médio nacional. O PIB per capita e

a produtividade do trabalho, em 1994, era 85% da média nacional o que

coloca a região em penúltimo lugar no ranking nacional destes indicadores. A

Região Centro, em termos de PIB per capita, ocupa a 19ª posição mais baixa

de entre as 206 NUT’s II da União Europeia (59% da média Comunitária);

• o emprego regional, em 1998, representava 19,2% do total nacional

distribuído da seguinte forma (INE, 1998, pp. 30-31): serviços - 40,9%,

indústria, construção, energia e água - 32,7%, agricultura, silvicultura e

pesca - 26,4%;

• taxa de desemprego bastante baixa (2,5% em 1998). Contudo, verificam-se

graves desequilíbrios no mercado de trabalho continuando as migrações,

323 Coimbra, sendo a maior cidade da região, terá cerca de 100 000 habitantes. 324 A taxa de analfabetismo na região é de 14,5% e no país é de 10,4%. 325 Valores referentes a 1994.

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322

sobretudo no interior, a ser um factor importante de equilíbrio do mercado de

trabalho;

• a despesa pública executada com o apoio FEDER, no período de 1994 a 1997,

totalizou cerca de 220,8 milhões de contos (equivalente a 13,7% do País, não

considerando o investimento não regionalizada). O Fundo de Coesão, nos

domínios dos transportes e ambiente totalizaram, no período 1993-1997, 18,1

milhões de contos (4% do total nacional)326. As verbas inscritas no PIDDAC

para a Região Centro foram, em 1997 e 1998, respectivamente, cerca de 112 e

151 milhões de contos, o que corresponde a 13,1% e 15,6% do total do

continente;

• insuficiência de infra-estruturas de transportes e comunicações. Refira-se, a

título de exemplo, o atraso significativo na infra-estruturação dos principais

eixos viários e a ausência de articulação entre o litoral e o interior da região;

• situação desfavorável nos indicadores de conforto e nível de vida das

populações.

Em relação à situação ambiental registe-se que, em 1998, o abastecimento

domiciliário de água cobria 92% da população residente (CCC, 1999, p. 113)

embora a quantidade e qualidade da água distribuída seja insuficiente o que se

explica, parcialmente, pelo facto dos sistemas de abastecimento serem de pequena

dimensão e se encontrarem dispersos obrigando, assim, muitos municípios a

controlarem dezenas de captações. A drenagem de águas residuais que, segundo a

mesma fonte, abrangia somente 60% da população é efectuada por sistemas de

drenagem de efluentes de pequena dimensão devido a uma orografia bastante

acidentada e ao afastamento dos aglomerados rurais. O tratamento das águas

residuais é um dos maiores problemas das autarquias (a taxa de cobertura da

população é apenas de 37%) agravado pela dificuldade em fixar os quadros

técnicos e operadores de estações de tratamento. Em relação aos resíduos sólidos

urbanos, embora a média da população abrangida ascenda a 97%, a situação é

preocupante visto estes resíduos serem depositados em lixeiras (sem qualquer

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323

tratamento) ou em aterrros sanitários. Refira-se que o Plano Estratégico de

Resíduos Sólidos Urbanos - PERSU -, apostando na política dos quatro “r”

(reduzir, reutilizar, reciclar, recuperar), preconiza a redução do montante de

resíduos sólidos urbanos depositados em aterro sanitário para um valor próximo

dos 13%, em 2005, contra os 87% em 1998 (Expresso, 14 de Março 1998).

Apesar de, nos últimos anos, se ter verificado um significativo aumento do

número de habitantes da região com acesso a água no domicílio e servidos por

redes de drenagem de efluentes e águas fluviais, não foi possível verificar padrões

elevados de qualidade da água dos meios hídricos por três razões fundamentais:

deficiente cobertura de infra-estruturas de saneamento básico, desadequação dos

sistemas de tratamento de águas residuais e descoordenação temporal na

implementação de acções de despoluição ambiental. A Região Centro, apesar de

ser a principal nascente de recursos hídricos do país e possuir as melhores e

maiores reservas de águas nacionais327, não tem gerido e preservado este

importante recurso natural de modo conveniente (estima-se que 50% da rede

hidrográfica regional regista níveis de poluição elevados) como, aliás, os Planos

de Bacia Hidrográfica têm vindo a documentar. Em todas as bacias hidrográficas

regionais (Mondego, Vouga e Liz) e em muitas sub-bacias das bacias

internacionais (Zêzere, Côa, etc.) verifica-se a existência de troços muito, ou

moderadamente, poluídos.

A qualidade do ar na região é, de um modo geral, boa. Apenas nas zonas

envolventes de alguns dos maiores pólos industriais (Estarreja, por exemplo) ou

zonas de maior tráfego automóvel dos principais aglomerados urbanos se

verificam, esporadicamente, algumas situações poluentes.

O importante coberto vegetal, a grande quantidade de áreas integradas em Parques

e Reservas (6,9% do território da região é ocupado pelas Áreas Naturais

326 Estes valores destinaram-se essencialmente à modernização das linhas ferroviárias do Norte e da Beira Alta e a projectos nos domínios do tratamento de resíduo sólidos e do tratamento de águas residuais.

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324

Classificadas), os corredores ecológicos e o relevo montanhoso proporcionam

uma qualidade paisagística sem paralelo no país tornando-se, assim, num factor de

crescimento da economia regional desde que gerido e explorado cuidadosamente,

isto é, conciliando a preservação da sua identidade e os ecossistemas aí existentes

com a actividade económica na qual o turismo de qualidade e em pequenos

grupos tem um lugar de destaque.

6.3.2. Organização do espaço regional

A delimitação de espaços sub-regionais, tendo em vista a dinamização da base

económica e do processo de urbanização, é operacionalizado através dos eixos de

desenvolvimento ou eixos estruturantes. A região Centro, como se verifica pela

leitura do mapa 6.1, tem, no seu conjunto, cinco eixos com diferentes níveis de

intensidade e estádios de consolidação, nomeadamente:

1. O eixo Ovar/Porto de Mós que se caracteriza pela melhor dotação de infra-

estruturas e equipamento (embora com deficiências ao nível do saneamento

básico) e por um tecido produtivo consolidado, dinâmico e com forte pendor

exportador, divide-se em:

• sub-eixo que, acompanhando a linha costeira, vai desde Ovar/Aveiro até

Leiria/ Marinha Grande;

• sub-eixo que, acompanhando a Linha do Norte e a auto-estrada Porto-

Lisboa, inclui Albergaria, Águeda, Coimbra, Pombal, Leiria;

2. o eixo Aveiro/Viseu/Guarda-Espanha que, acompanhando o IP5, aproximou o

litoral do interior e permitiu o alargamento da faixa litoral no sentido de Viseu

com a consequente criação de novas centralidades que, entretanto não foram

aproveitadas pelos municípios do interior minimizando, assim, o potencial de

desenvolvimento associado a esta via. Aliás, o IP5 tornou-se numa via rápida

de escoamento de recursos do interior para o litoral e da produção industrial

327 Cite-se, a título de exemplo, a albufeiras da Aguieira que garante o abastecimento do Baixo Mondego e a do Castelo do Bode que fornece água potável à Região de Lisboa e Vale do Tejo

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325

deste para a Europa Central e do Norte pelo que o seu impacto na captação de

investimento e fixação da população e das actividade produtiva no interior não

é elevado;

3. o eixo tradicional de ligação litoral-interior da região Centro, ou seja, o

corredor Celorico da Beira/Coimbra. Refira-se que, além da “Estrada da

Beira”, este eixo tem beneficiado de avultados investimentos na construção de

novas ligações rodoviárias (IP3, IC12), na modernização das estruturas

ferroviárias (Linha da Beira Alta) e na construção de equipamentos colectivos

e de apoio à actividade produtiva pelo que se pode tornar num importante eixo

estruturante da região e, especialmente, do seu interior;

4. o eixo que corresponde ao corredor urbano Guarda/Covilhã/Fundão/Castelo

Branco com um potencial elevado de recursos endógenos e condições para se

transformar num pólo de desenvolvimento do espaço interior e fronteiriço. A

construção do IP2 e rede complementar, a modernização da linha ferroviária

da Beira Baixa e o esforço concertado das autarquias e entidades regionais de

ambos os lados da fronteira (Universidade e Politécnicos, Centros de

Investigação, associações patronais e sindicais, etc.) são os elementos

estratégicos que poderão estruturar este vasto território do interior;

5. o eixo Pombal/Sertã/Castelo Branco, ainda em fase de formação, denota

alguma debilidade do aparelho produtivo, carências ao nível de infra-

estruturas, de equipamentos sociais e de apoio às empresas, bem como a falta

de recursos humanos em quantidade e qualidade.

Os sistemas urbanos, tal como os eixos de desenvolvimento, desempenham um

papel importante na organização do território. O sistema urbano da região Centro

é estruturado por uma rede de centros de pequena e média dimensão em termos

nacionais328, mas bastante pequenos à escala europeia, que têm evidenciado

ritmos e formas diferentes de crescimento (ver mapa 6.2).

(aproximadamente 3 milhões de habitantes) e produz energia. 328 Dos 78 lugares sedes de concelho, 52 têm menos de 2 500 habitantes e apenas um, Coimbra, tem cerca de 100 000habitantes. Dos restantes 25 lugares, só 10 têm uma população entre os 20 000 e 50 000 habitantes (CCRC, 1999, p. 93).

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326

Mapa 6.1 Eixos de desenvolvimento na Região Centro

Fonte: CCRC, (1999), Uma região qualificada, activa e solidária: visão sobre a região Centro

para próxima década, Coimbra, p. 101

No litoral, a consolidação dos sistemas urbanos caracterizou-se pelo crescimento

dos principais centros urbanos e das suas periferias (Coimbra, Aveiro, Figueira da

Foz, Leiria/Marinha Grande), bem como dos centros de pequena dimensão

(geralmente, sedes de concelho). No interior, o crescimento dos aglomerados

urbanos verificou-se, principalmente, nas sedes de concelho e, em particular, nas

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327

capitais do distrito devido ao fluxo da população para o centro com o consequente

despovoamento das suas zonas rurais.

Mapa 6.2 Principais aglomerados urbanos

Fonte: CCRC, (1994), ANÁLISE, DIAGNÓSTICO E PERSPECTIVAS DE

DESENVOLVIMENTO PARA A REGIÃO CENTRO, Contributos para o PDR 1994-99, Coimbra, p. 195

Numa análise mais pormenorizada dos espaços sub-regionais verifica-se a

diferenciação acentuada das densidades populacionais e formas de urbanização.

Castelo Branco e Viseu constituem dois pólos centralizadores dos respectivos

sistemas urbanos que, apesar das semelhanças, têm características que os

distinguem: enquanto Castelo Branco se tem vindo a afirmar como o centro de

uma estrela suburbana cujos vértices são Alcains, Cebolais, Retaxo e Escalos,

Viseu é um centro mais dinâmico e aberto onde, pelo seu nível de especialização

funcional, se formam dois pólos complementares (Mangualde e Tondela).

Coimbra ocupa uma situação peculiar na região dado, por um lado, tender para a

satelitização das vilas e aglomerados urbanos vizinhos (Condeixa, Miranda do

Aglomerado Habitantes Águeda 23 057 Aveiro/Ílhavo 48 158 Ovar 26 267 Castelo Branco 27 267 Covilhã 30 856 Coimbra 100 673 Figueira da Foz 36 686 Guarda 20633 Leiria 42 872 Marinha Grande 26 176 Viseu 44 164

Fonte: CCRC/INE 1991 e GEPAT

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328

Corvo, Lousã, Mealhada, Penacova) e, por outro lado, ser o centro de um sistema

policêntrico cujos vértices são a Figueira da Foz e Cantanhede. O Baixo Vouga é

talvez, na região Centro, o caso típico de um sistema policêntrico que permite a

definição e implementação de uma estratégia comum para os vários centros

urbanos que o integram. O sistema Côa/Alto Mondego é atípico por duas razões:

nem a Guarda exerce uma forte polarização sobre os aglomerados urbanos

vizinhos nem é claramente visível a tendência para a formação de eixos urbanos

locais. Apesar disso, a Guarda encontra-se numa situação geográfica privilegiada

já que, por um lado se situa no importante corredor rodo-ferroviário Aveiro/Vilar

Formoso/Espanha/Europa e, por outro lado, é um dos pólos do eixo de

desenvolvimento Guarda/Covilhã/Castelo Branco. O Pinhal Interior e as sedes dos

concelhos raianos, sendo territórios periféricos, não dispõem de um sistema

urbano consolidado pelo que a sua localização, dada a emergência de novas

centralidades proporcionadas pelo aprofundamento da integração europeia e

progressivo esbatimento das fronteira internas, poderá representar a oportunidade

para o reforço e consolidação deste sistema urbano.

Em termos gerais, o processo de urbanização e, muito particularmente, a

emergência e consolidação de sistemas urbanos locais contribuem decisivamente

para a estruturação dos territórios “sub-regionais” e a fixação da população e das

actividades produtivas. Embora, cerca de 75% da população resida a menos de 30

minutos de uma das 8 principais cidades (ibid., p. 93), as deficientes infra-

estruturas rodoviárias, sobretudo no interior, constituem um obstáculo à

articulação intra e inter regional pelo que é necessário reforçar a malha viária

existente implementando esquemas de incremento das acessibilidades sub-

regionais. O estudo da acessibilidade, em automóvel, aos principais centros

urbanos (Baltasar, 1999) confirma esta necessidade ao pôr em evidência a

reduzida acessibilidade na maior parte do território regional.

A leitura do mapa 6.3 indica-nos três manchas urbanas com boas ou razoáveis

acessibilidades (15 a 30 minutos), ou seja, uma no litoral com continuidade para

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329

Norte e Sul, uma segunda na NUT III Dão-Lafões já consolidada e a terceira na

Raia Central (paralela ao IP2) em consolidação. A par destas manchas urbanas,

um vasto território predominantemente rural (Pinhal Interior, Serras da Estrela e

do Caramulo) apresenta índices de acessibilidade automóvel bastante reduzidos o

que vem reforçar a necessidade de melhorar as condições de circulação na rede

rodoviária existente e, ao mesmo tempo, complementá-la com novas ligações de

forma a reduzir os tempos de acesso em automóvel aos centros urbanos regionais

e supra regionais.

Mapa 6.3

Acessibilidades aos principais centros urbanos

Fonte: CCRC, (1999), Uma região qualificada, activa e solidária: visão sobre a região Centro para próxima década, Coimbra, p. 100

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330

6.3.3. A estratégia de desenvolvimento da Região Centro

A região Centro tem condições para se diferenciar das restantes regiões do país

dado possuir importantes recursos, uma rede de estruturas de ensino e

investigação capaz de dinamizar o meio em que se insere pela excelência das

competências científicas e tecnológicas, recursos humanos qualificados, bem

como uma posição geo-estratégica ímpar que lhe possibilita ter um papel central

na relação do país com o exterior. Aliás, a nova geografia das redes e fluxos

reforçam a centralidade dos principais sistemas urbanos, pelo que, algumas das

cidades polarizadoras dos sistemas urbanos da Região Centro podem transformar-

se em vértices estratégicos nessas redes. Além disso, o reforço das acessibilidades

possibilita a cobertura integral e equilibrada do território por sistemas urbanos

criando-se, assim, efeitos circulares crescentes. Este quadro positivo não impede,

contudo, que se constatem importantes assimetrias territoriais, quer entre o litoral

e o interior, quer mesmo no interior destes espaços, evidenciadas por uma

distribuição desigual da população e do tecido empresarial associada a uma fraca

dinâmica demográfica e a um forte envelhecimento da população. Além disso, o

baixo nível sócio-económico e as dificuldades de integração de alguns territórios,

sobretudo os mais periféricos e do interior, são acentuados pela sua incapacidade

para aproveitar os recursos e oportunidades de que dispõem.

Tendo em consideração o quadro atrás descrito, a estratégia de desenvolvimento

da região Centro, na qual se integra a Beira Interior, assenta na promoção da

diversificação industrial, na consolidação de uma dinâmica de serviços/indústria

polarizada pelo triângulo conhecimento/saúde/lazer, na atracção de IDE

valorizador das dinâmicas endógenas, na valorização dos recursos naturais

subaproveitados e especialidades agrícolas e pecuárias, na promoção do turismo,

no aproveitamento do potencial produtivo dos grandes investimentos públicos e

desenvolvimento da intermodalidade de modos de transporte (MEPAT, 1998a).

Com esta estratégia pretende-se, igualmente, inverter a crescente litoralização da

região (à semelhança do país), revitalizando o interior e criando novas

centralidades que se abrem com o aprofundamento da integração europeia e, de

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331

um modo mais geral, com a globalização da economia. Ao nível da coesão social,

o Plano Nacional de Desenvolvimento Sócio-Económico apela ao ordenamento

do território através da consolidação dos eixos urbanos territoriais, às intervenções

específicas nas zonas de baixa densidade populacional, ao desenvolvimento de

serviços às pessoas (em especial às crianças e idosos) e à aplicação de programas

de desenvolvimento comunitário dirigidos a núcleos populacionais com

problemas específicos (ibid).

Tendo como referência o PNDES e o Plano de Desenvolvimento Regional 2000-

2006, foi elaborada a Intervenção Operacional Regional do Centro – IORC - que

reafirma a ambição de estruturar o território através de um conjunto de

objectivos e prioridades que apontam claramente para a atenção ao território, à

qualidade, ao acesso dos cidadãos aos frutos do desenvolvimento e à conjugação

da competitividade com a coesão económica e social (CCRC). A realização plena

destes objectivos, segundo a Comissão de Coordenação, passa pela definição e

implementação de acções que se enquadram em cinco eixos prioritários:

• acesso da população aos “serviços universais” e infra-estruturação do

território;

• qualificação urbana e ordenamento dos espaços constituintes das cidades;

• restituir ao meio rural, à agricultura e às aldeias capacidade de dinamização;

• valorização das potencialidades de territórios específicos;

• qualificação dos factores de competitividade da economia regional.

Os objectivos para a região, sendo ambiciosos, estão claramente relacionados com

a prioridade estabelecida pela Administração Central: promoção do

desenvolvimento sustentável das regiões e da coesão nacional. Contudo, a

estratégia e os eixos prioritários de intervenção propostos envolvem alguns riscos,

entre os quais destacamos a possibilidade de agravamento das disparidades à

escala sub-regional e, muito particularmente, ao nível das relações urbano/rural,

bem como a marginalização dos espaços mais afastados dos grandes eixos de

comunicação e sua subordinação, pelo menos na faixa fronteiriça, às lógicas de

internacionalização das principais actividades e cidades espanholas.

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332

6.4. O ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO DA BEIRA INTERIOR

6.4.1. Caracterização da região

6.4.1.1. Enquadramento geofísico e demográfico

A Beira Interior329, abrangendo uma área de 11 957 Km2 ou 13% do território

nacional, é atravessada pela Cordilheira ou Sistema Central da Península, da qual

se destacam as Serras da Estrela e da Malcata, do lado português, e as Serras da

Gata, da Penha de França e de Gredos do lado espanhol pelo que o relevo é, de

um modo geral, acidentado alternando as superfícies aplanadas com duros relevos

e bacias de abatimento. Dispõe de alguns recursos minerais, sendo de destacar as

minas de urânio, volfrâmio e estanho, as pedreiras de granito, as argilas, os

caulinos brancos (utilizados na produção de porcelanas no litoral) e areias.

Os recursos hídricos, tal como os florestais, são elevados, isto, apesar da área

ocupada actualmente por floresta ser muito inferior à correspondente aptidão

florestal e à devastação, nas últimas três décadas, de grandes áreas provocada pelo

elevado número de incêndios florestais. Só em 1999, a Beira Interior perdeu quase

25 000 hectares de mato e pinhal em mais de 2 000 incêndios e 118

reacendimentos o que, segundo a DRABI, em termos de área ardida, coloca esta

região no primeiro lugar do ranking nacional (JF, 8/10/1999). Já este ano, de

Janeiro a Março, ardeu no Parque Natural da Serra da Estrela uma área igual à do

ano passado devido, fundamentalmente, às queimadas efectuadas pelos pastores

para rejuvenescerem as zonas de pastoreio (JF, 24/03/2000).

A Beira Interior constitui a maior nascente de recursos hídricos do País. Com

efeito, têm origem nesta região os dois principais rios nacionais (Zêzere e

Mondego) que definem duas importantes bacias hidrográficas estruturantes do

território limitadas a Norte pelo rio Douro e a Sul pelo rio Tejo. Além dos

recursos hídricos à superfície, a região oferece uma abundância de águas

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333

subterrâneas que tem permitido a instalação, sobretudo nas zonas de montanha

(Serras da Gardunha e da Estrela) de unidades de engarrafamento de água de

mesa.

Saliente-se, ainda, a excepcional riqueza em termos paisagísticos, biológicos,

patrimoniais e culturais (alguns deles de grande valor e singularidade330) o que

abre boas perspectivas para o desenvolvimento do turismo de qualidade em

pequenos grupos.

6.4.1.2. Caracterização demográfica, do emprego e da actividade económica

Nas últimas décadas, a Beira Interior foi sujeita a fortes tensões demográficas

devidas, fundamentalmente, ao surto migratório dos anos 60 em direcção à área

metropolitana de Lisboa e à emigração para a Europa. Entre 1981 e 1997, a região

perdeu 54 719 habitantes o que representa um decréscimo populacional de 13%

(ver quadro 6.3) com a consequente diminuição da ocupação e aproveitamento do

território e, mesmo, desestruturação do sistema produtivo.

A análise ao nível sub regional (NUT’se III) mostra que a diminuição da

população foi diferenciada destacando-se, pela negativa, o Pinhal Interior Sul

com um decréscimo populacional na ordem dos 25% e, no extremo oposto, a

Serra da Estrela com 8,7%.

329 A região integra as seguintes NUT III: Beira Interior Norte, Beira Interior Sul, Cova da Beira, Serra da Estrela, Pinhal Interior Sul. 330 Cite-se, por exemplo, o Parque Arqueológico do Vale do Côa – PAVC - ou a Estação Arqueológica das Portas de Ródão.

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334

Quadro 6.3

Evolução demográfica entre 1981-1997

1981 1991 1997 Tx. Cresc. % (1981/1997)

Portugal 9 835 100 9 867 147 9 957 270 1,2 Região Centro 1 763 119 1 721 650 1 710 390 (1,5) Beira Interior 433 559 397 468 376 840 (13,1) Pinhal Interior Sul 60 527 50 801 45 330 (25,1) Serra da Estrela 56 991 54 801 52 030 (8,7) Beira Interior Norte 130 104 118 513 112 130 (13,8) Beira Interior Sul 86 138 81 015 77 740 (9,5) Cova da Beira 99 799 93 097 89 310 (10,5)

Legenda : Os valores entre parêntesis são taxas negativas de crescimento populacional Fonte: INE, Anuário Estatístico de Portugal – 1992 e Anuário Estatístico da Região Centro - 1998 A existência de recursos humanos qualificados é um importante elemento de

diferenciação das regiões e de atracção para as actividades económicas,

especialmente as que necessitam de processos produtivos mais sofisticados. Da

leitura do quadro 6.4 constata-se que, em 1991, 80,8% da população da região

possuía níveis de formação muito baixos, destes 22% da população não sabe ler

nem escrever e (56,26%) apenas possui o ensino básico. No entanto, esta

percentagem encontra uma boa parte da sua materialização na faixa etária da

população que está próxima ou além dos 60 anos de idade, ou seja, população que

já não está em idade activa.

Esta situação verifica-se apesar do esforço realizado no sentido de implementar,

na região, instituições de ensino de diversos graus. A Beira Interior dispõe de um

considerável número de instituições de Ensino Superior Público (Universidade da

Beira Interior, Institutos Politécnicos da Guarda e de Castelo Branco) e Privado

(Instituto Superior de Administração e Ciências Empresariais, Instituto Superior

de Matemática Aplicada e Gestão) que atraem inúmeros jovens de outras regiões.

A rede de ensino secundário e técnico-profissional é também, relativamente,

densa. Apesar desta oferta de formação científica e técnica, a região continua a

debater-se com os problemas derivados da fraca qualificação dos seus recursos

humanos o que nos leva a questionar se as estratégias de fixação dos jovens

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335

quadros é a mais correcta. Efectivamente, nos distritos da Guarda e de Castelo

Branco, apenas 2,94% da população tem habilitações de nível superior.

Quadro 6.4 NÍVEL DE FORMAÇÃO DA POPULAÇÃO

Dist. Castelo Branco Dist. Guarda Total N.º de

Habitantes %

N.º de Habitantes

% N.º de

Habitantes %

NÃO SABE LER NEM ESCREVER 50.870 23,68 37.786 20,08 88.656 22,00

LÊ E ESCREVE SEM GRAU DE

ENSINO 2.269 1,06 1.355 0,72 3.624 0,90

ENSINO PRE-ESCOLAR 3.039 1,41 3.726 1,98 6.765 1,68

ENSINO BÁSICO 115.919 53,95 110.811 58,89 226.730 56,26

ENSINO SECUNDÁRIO 33.758 15,71 26.586 14,13 60.344 14,97

CURSO MÉDIO 2.602 1,21 2.433 1,29 5.035 1,25

ENSINO SUPERIOR 6.096 2,84 5.225 2,78 11.321 2,81

ENSINO SUPERIOR/PÓS

GRADUAÇÃO 300 0,14 242 0,13 542 0,13

TOTAL 214.853 100 188.164 100 403.017 100

Fonte: “Alterações Demográficas nas Regiões Portuguesas entre 1981 – 1991”, INE, Gabinete de Estudos Demográficos, 1993

Na estrutura do emprego regional, evidencia-se o emprego ligado às actividades

agrícolas e às que exigem um baixo ou médio nível de formação, consequência

natural do nível de formação que podemos encontrar na população da região.

Entre 1981 e 1991, à semelhança do que ocorreu, quer na região Centro, quer no

país, a Beira Interior registou uma movimentação da sua população activa, por

sector de actividade, caracterizada por uma quebra de 18,1% no sector primário e

um aumento equivalente nos restantes sectores, com maior incidência no sector

terciário (13,7%), pelo que, em termos contabilísticos, os ganhos do sector

terciário quase igualaram as perdas do sector primário.

A actividade produtiva caracteriza-se por uma agricultura com alguns processos

tecnológicos desactualizados e produtos de pouco valor acrescentado, a mono

especialização industrial (lanifícios e vestuário) assente na mão-de-obra pouco

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336

qualificada e, nos baixos custos salariais e, ainda, um sector de serviços

relativamente dinâmico e pouco inovador.

Em termos do sector primário, a região destaca-se pela produção de frutos secos e

frescos, batata, azeitona e tabaco. Além disso, regista-se a criação de gado de

pequeno porte (ovinicultura e caprinicultura). A analise ao nível sub-regional

mostra-nos que na Beira Interior Norte predominam os frutos secos (amêndoa e

castanha), a Cova da Beira produz, principalmente, frutos frescos (maçã, pêssego

e cereja) e na Beira Interior Sul regista-se uma elevada produção de tabaco. Em

relação ao olival, este ocupa uma extensa área na Beira Interior exceptuando o

Pinhal Interior Sul.

Uma análise mais profunda do sector secundário revela-nos que, além dos têxteis

e vestuário, a energia e combustíveis, a indústria agroalimentar, a madeira e

mobiliário e a construção são os sub-sectores industriais com maior peso, em

termos de produção e de criação de rendimento e emprego (Reigado, 1996).

Em 1994 e 1996, na Beira Interior, apenas, se criava aproximadamente 3% do

PIBpm nacional, ou seja, 411 109 e 472 224 milhares de contos, respectivamente

(quando tem um peso de cerca de 3,7% do emprego e de 3,8% da população

nacional). O PIBpm per capita, apesar de ter aumentado no período de 1986-1994,

quer a preços constantes331, quer em termos relativos, representa apenas cerca de

70% da média nacional o que, de certa forma, reflecte o fraco grau de

desenvolvimento da região. É, ainda, de referir que, de 1994 para 1996, o PIBpm

per capita, na Beira Interior, cresceu a uma taxa anual superior à do país

(respectivamente, 8,5% e 7,6%). Numa análise mais fina, isto é, ao nível sub-

regional (ver quadro 6.5), em 1994, a sub-região Beira Interior Norte apresenta

maior PIBpm (cerca de 29%) e a sub-região Serra da Estrela é a que menor

contributo dá para o produto regional (cerca de 11%).

A produtividade no período compreendido entre 1986 e 1994, duplicou passando

de 822 contos por pessoa para 2173. Refira-se, ainda, que a produtividade da

331Valores constantes de 1986.

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337

Beira Interior representa, apenas, cerca de 70% da produtividade média nacional,

apesar de nos últimos anos se ter verificado uma aproximação. Assim, de 1986

para 1996, registou-se um aumento de 5 pontos percentuais, ou seja, passou de

71% para 76%. No entanto, é de sublinhar que, é na sub-região Beira Interior Sul

onde se verifica a maior produtividade da Beira Interior. A comparação com a

Beira Interior Norte, com os melhores valores da região para o PIB e PIB per

capita, parece denotar que tem havido alguma inovação na sub-região Beira

Interior Sul.

Quadro 6.5 Produto Interno Bruto e da Produtividade por NUTS III em 1994

/ milhares de contos/

Indicadores

Média Beira Interior

Pinhal Interior Sul

Serra da

Estrela

Beira Interior Norte

Beira Interior Sul

Cova da

Beira PIBpm 411109 52330 44733 119771 97236 97039 PIBpm em % do total da Beira Int. 100% 12,7% 11% 29,1% 23,7% 23,6% PIB per capita 1064 1093 843 1041 1227 1066 Produtividade per capita 2305 2032 2326 2227 2594 2307

Fonte: INE

Relativamente ao VABpm, verifica-se que são os Serviços Mercantis, os Produtos

Industriais e os Serviços não Mercantis que mais têm contribuído para acrescentar

valor à produção da Beira Interior (ver quadro 6.6). A análise territorializada,

indica-nos a Beira Interior Norte como a sub região que mais contribui para o

Valor Acrescentado Bruto da Beira Interior, excepto nos Produtos Energéticos

onde se destaca o Pinhal Interior Sul e nos Produtos Industriais em que a Cova da

Beira e, muito particularmente, a Covilhã apresenta o VAB mais elevado da

região.

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338

Quadro 6.6 VABpm na Beira Interior por Produto e por NUTS III em 1994

Indicadores Beira

Interior Pinhal

Interior Sul Serra da Estrela

Beira Interior Norte

Beira Interior Sul

Cova da Beira

1000 cts

% do País

1000 cts

% da BI

1000 cts

% da BI

1000 cts

% da BI

1000 cts

% da BI

1000 cts

% da BI

VABpm 378 313

2,8 48155

12,71

41164

10,9

110216 29,1

89480

23,7

89298

23,6

01- Produtos Agrícolas 40 975

7,1 5916 14,4

3450 8,4 14599 35,6

8440 20,6

8570

20,9

06-Produtos Energ. 23 249

4,0 11156

48,0

4550 19,6

2903 12,5

1887 8,1 2753

11,8

30-Produtos Industriais 78 672

2,4 5813 7.4 10093

12.8

17163 21.8

22043

28.0

23560

29.9

53-Const. e Obras Púb. 27 279

3,2 4823 17.7

3145 11.5

8163 29.9

6144 22.5

5004

18.3

68- Serviços Mercantis 151 691

2,3 15966

10.5

13657

9.0 48853 32.2

36016

23.7

37199

24.5

86-Serv. Não Mercantis

76 936

3,3 7089 9.2 8499 11.0

24504 31.8

19795

25.7

17049

22.2

69B- Prod. Imput. De Serv. Bancários

- 20 486

2,8

-

2608

-2.7

-

2229

10.9

-5968

29.1

-4845

23.7

-

4836

23.6

Fonte: INE Apesar, de nos últimos anos, se ter verificado um crescimento2 das exportações e

das importações na Beira Interior (as exportações representam, apenas, entre 1,6%

e 1,8% da média nacional e as importações cerca de 8% da média nacional) o grau

de internacionalização é, ainda bastante baixo. A taxa de cobertura das

importações pelas exportações era de 97% em 1986, de 155% em 1995 e de 134%

em 1996 (este último valor deve-se ao decréscimo registado nas exportações),

enquanto a média do país é bastante inferior (81% em 1986 e 70% nos anos de

1995 e 1996). Em termos sub-regionais, é a Cova da Beira, e em particular a

Covilhã, que apresenta maior fluxo de comércio internacional (cerca de 50%),

quer em termos de exportações, quer em termos de importações (ver quadro 6.7).

A sub-região que menos exporta é a Serra da Estrela e a que recorre menos à

importação é o Pinhal Interior Sul.

Apesar desta situação “positiva”, o modelo de especialização produtiva emergente

levanta algumas dúvidas quanto à sua sustentabilidade dado que, por um lado, se

assiste ao preenchimento não qualificante da fileira têxtil com as actividades de

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339

confecção e vestuário e, por outro lado, a reestruturação do sector dos lanifícios

tem seguido uma trajectória de integração vertical e de inovação de processos, de

modo a assegurar um poder competitivo baseado no controle de custos,

cumprimento de prazos e não valorização da combinação de recursos.

QUADRO 6.7

Comércio Internacional por NUTS III

/ 1 000 contos/ Indicadores Total

Beira Interior

Pinhal Interior Sul

Serra da

Estrela

Beira Interior Norte

Beira Interior Sul

Cova da Beira

1992: Exportações Importações Saldo Bal. Comercial Taxa de Cobertura

47864 35098 12766 136,7

3079 2006 1073 153,5

3009 3576 - 567 0,84

9073 8214 859

110,5

4702 7023

- 2321 66,9

28001 14279 13722 196,1

1996: Exportações Importações Saldo Bal. Comercial Taxa de Cobertura

58943 44105 14838 133,6

5301 2451 2850 216,3

1825 2642 -817 69,1

9620

10867 -1247 88,5

10755 8186 2569 131,4

31442 19959 11483 157,5

Fonte: INE

Os investimentos efectuados no sector, muitos deles comparticipados pela União

Europeia (Isidoro, 1996), concentraram-se na aquisição de maquinaria sem o

devido acompanhamento ao nível da qualificação dos recursos humanos (Pombo,

1996). Relativamente à emergência de novas actividades, destaque-se, por um

lado, a importância crescente da indústria do frio com elevada propensão

exportadora supra regional e, por outro lado, a ausência de criação de serviços de

apoio às empresas. Refira-se, ainda, que as empresas revelam um fraco

conhecimento dos centros tecnológicos e laboratórios existentes nos principais

aglomerados urbanos.

2 A preços correntes e a preços constantes.

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340

6.4.1.3. A qualidade de vida na Beira Interior

Ao nível da saúde, na Beira Interior, em 1997, existia em média 1,36 médicos por

mil habitantes, enquanto que no país e região Centro, havia cerca de três médicos

por mil habitantes. Relativamente às camas hospitalares por mil habitantes, a

Beira Interior apresenta, igualmente, um valor inferior ao do resto do país.

Quanto às actividades culturais tem havido, por parte das autoridades municipais,

uma certa preocupação que se reflecte na afectação de meios financeiros. Em

1997, as Câmaras Municipais despenderam 4,4 milhões de contos, em actividades

culturais, o que corresponde a 5,79% do valor nacional e 31,41% da Região

Centro (ver quadro 6.8). A distribuição destas despesas per capita, ao nível das

NUT’s III, embora seja superior à média nacional e à da Região Centro

(respectivamente, 7,65 e 8,21 milhares de escudos), não é homogénea indo desde

os 4,3 milhares de escudos na Cova da Beira até aos 17,85 na Beira Interior Norte

o que poderá dar algumas indicações sobre as prioridades dos autarcas da Beira

Interior.

QUADRO 6.8 Despesas das Câmaras Municipais em Actividades Culturais

e em Ambiente em 1997

/ milhares de escudos/

Indicadores Despesas em Actividades

Culturais Despesas em Ambiente

Total em % Per capita

Total em % Per capita

Beira Interior 4 408 307

100,0 11,70 3 338 201 100,0 8,85

Pinhal Interior Sul 427 619 9,70 9,43 287 693 8,62 6,34

Serra da Estrela 362 729 8,23 6,97 475 268 14,24 9,13 Beira Interior Norte 1 998

701 45,34 17,82 845 555 25,33 7,54

Beira Interior Sul 1 235 684

28,03 15,90 955 697 28,63 12,29

Cova da Beira 383 654 8,70 4,30 773 992 23,18 8,66

Fonte: INE

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341

No que concerne ao ambiente, verificamos que este factor ainda não assumiu uma

preocupação determinante na Beira Interior. Em 1997, as despesas dos municípios

desta região, apenas, representam 3,3% do total nacional ou 33,3% do total da

Região Centro. A distribuição sub regional das despesas per capita com o

ambiente é mais homogénea do que na cultura, indo desde os 6,34 milhares de

escudos no Pinhal Interior Sul aos 12,29 na Beira Interior Sul que ultrapassa,

ligeiramente, a média nacional situada nos 10,16 e a média da Região Centro em,

cerca de, 4 milhares de escudos. Estes valores resultam da pouca atenção que se

dá às questões ambientais e, naturalmente, pela razoável qualidade ambiental da

região.

Como vimos, os indicadores relativos à qualidade de vida (exceptuando a

componente ambiental) penalizam a Beira Interior. Os padrões atingidos não são

elevados devido, fundamentalmente, a problemas na área da saúde, actividades

culturais, de recreio e desporto, condições de habitabilidade, saneamento básico e

de apoio social.

6.4.1.4. Sistema urbano e infra-estruturação do território

A Beira interior é caracterizada, segundo Camagni (EU, 1996), pela ausência de

integração dos sistemas urbanos de nível superior, sem funções urbanas de

elevado nível de especialização (...) possuidora de um povoamento difuso,

ausência de redes de transportes nacionais e acessibilidades insuficientes a redes

transnacionais ... (cit. Reigado, 1998a, p. 43).

Apesar da perificidade da região, como já vimos, nos últimos anos tem-se vindo a

desenhar um eixo funcional apoiado em centros urbanos (Guarda, Covilhã,

Fundão e Castelo Branco) com algum dinamismo e diferentes especializações

(Mapa 6.4). Além de globalmente terem uma base industrial, ainda que pouco

diversificada, estão dotadas de razoável equipamento comercial, actividades

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342

(públicas e privadas) de apoio à agricultura, instituições de ensino superior e

centros tecnológicos o que pode revelar, de algum modo, a existência de um meio

inovador na região, bem como, as vantagens de uma estratégia conjunta.

Mapa 6.4 Modelo Territorial da Beira Interior

Legenda:

Fonte: Adaptado de CCRC, (1999), Uma região qualificada, activa e solidaria: visão sobre a

Região Centro para a próxima década, p. 103.

O sistema urbano regional é ainda formado por uma rede de pequenos centros

urbanos atraentes, inseridos num território privilegiado do ponto de vista

paisagístico e com recursos endógenos potencialmente valorizáveis. O

afastamento dos grandes focos de depredação, um passado histórico que faz parte

da memória não só da região e do País, como da própria Europa, deixaram um

Castelo Branco

Covilhã

Área de influência

Áreas em risco de Desertificação Humana

Corredor

Vias de comunicação

Polarização forte – acessibilidade Guarda

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343

património rico e variado, que constitui uma das componentes de relevo no

elenco dos recursos endógenos. O Turismo, em especial nas suas vertentes

ecológica, cultural, histórica, além das já praticadas cinegética e termal, é uma

das actividades de futuro da Beira Interior (Gaspar, J., 1993, p.86).

Relativamente às redes de acessibilidade terrestre e, em particular, às rodovias

existentes são evidentes os atrasos e carências. Esta realidade é reconhecida pela

Administração Central ao se afirmar no PNDES que (MEPTAT, 1998, pp. VIII 2-

3) ... São de assinalar as vantagens de localização conseguidas na Região Norte e

no Alentejo, enquanto na região Centro o progresso das acessibilidades se

processou a um ritmo mais lento. Face a esta afirmação parece-nos legítimo

concluir que a Beira Interior, uma vez mais, foi desfavorecida em relação à

melhoria das acessibilidades rodo e ferroviárias. Apesar disso, Contudo, a

existência de infra-estruturas aeroportuárias na região (na Covilhã e em

Monfortinho) e, sobretudo, as ligações a Espanha e ao Litoral, através do IP5 e

Linha da Beira Alta, conferem à Beira Interior uma localização privilegiada para o

acesso aos mercados da Península Ibérica e, mesmo, da Europa Central e do

Norte.

6.4.2. O potencial endógeno regional

Apesar da Beira Interior, como já vimos, apresentar fortes condicionantes, é

também verdade que a mesma dispõe de importantes recursos endógenos

disponíveis para suportarem um processo de desenvolvimento sustentável, numa

perspectiva de equidade intergeracional e de preservação e gestão do meio

ambiente, nomeadamente:

• a cadeia montanhosa da Serra da Estrela que se prolonga até à Serra da

Malcata e, já em território espanhol, às Serras da Gata, Penha de França e

Gredos;

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344

• a floresta (um dos principais recursos naturais) apesar de a área por si ocupada

ser bastante inferior à correspondente aptidão florestal. Registe-se, ainda, a

grande variedade de outros recursos vegetais que poderão vir a constituir-se em

matérias primas332 para a medicina, química, cosmética e indústria

agroalimentar;

• a maior nascente de recursos hídricos do país. Na região, nascem os principais

rios com origem em Portugal (Zêzere e Mondego) que definem duas

importantes bacias hidrográficas limitadas a Norte pelo Rio Douro e a Sul pelo

Tejo. Pela sua importância acrescente-se, ainda, os rios Alba, Côa, Távora,

Águeda, Ocreza, Ponsul e Erges e a abundância de águas subterrâneas333;

• as minas de urânio e volfrâmio, as pedreiras de granito, xisto e alguns

mármores, os barros, os caulinos brancos da Guarda e de Castelo Branco

(trabalhados em Águeda) e as areias são recursos minerais a considerar;

• o SC&T da região, formado por vários estabelecimentos de ensino superior

(público e privado), laboratórios e centros tecnológicos;

• o corredor urbano Guarda-Covilhã-Castelo Branco e a Ruta de la Plata (ligação Salamanca/Cáceres/Mérida);

• posição geo-estratégica privilegiada: a região encontra-se no centro das

ligações multimodais Portugal-Espanha/Europa. A ligação multimodal à

Europa Central e do Norte é feita através da Beira Interior, ou seja, através dos

Itinerários Principais – IP - 5, 6 e 2 (os dois primeiros IP’s ligam-se ao

IP1/A1) e das linhas ferroviárias da Beira Alta334 e da Beira Baixa;

• o património, em termos paisagísticos e biológicos335, com destaque para o

Parque Natural da Serra da Estrela, a Reserva Natural da Serra da Malcata e os

Parques Naturais do Arribas do Douro Internacional e Águeda e do Tejo

Internacional;

332 Esta possibilidade terá de ser testada através do estudo físico, químico e farmacológico das plantas, bem como de estudos de viabilidade económica. 333 Nas Serras da Estrela e da Gardunha, nos últimos anos, instalaram-se várias empresas de engarrafamento de águas de mesa. 334 A Linha da Beira Alta integra o conjunto das Redes Transeuropeias de caminho-de-ferro. 335 As Serras da Gardunha, Malcata e S. Mamede foram incluídas na 1ª Lista Nacional de Sítios de Interesse Comunitário e a Serra da Estrela na 2ª lista.

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345

• o rico património construído. Além de um número considerável de antas,

destaque-se as gravuras rupestres do Complexo Ródão-Fratel e do Vale do

Côa, as pontes, estradas e outras edificações do período de ocupação romana,

os castelos medievais, os pelourinhos, solares e casas brasonadas. Refira-se,

ainda, que várias localidades da região fazem parte do Programa Aldeias

Históricas de Portugal;

• a gastronomia e o artesanato são recursos culturais com grande importância na

região.

Os recursos atrás apontados em conjunto com as relações estabelecidas entre os

actores do desenvolvimento regional constituem um importante capital endógeno

– humano, natural, sócio-cultural, relacional e produzido pelo homem – que,

associado a recursos exógenos e políticas adequadas, formam a base do

relançamento do desenvolvimento económico e social da região que se pretende

sustentável a prazo (fluxograma 6.1). Embora alguns investigadores, como por

exemplo Camagni (UE, 1996), considerem a Beira Interior, num contexto ibérico,

como uma região geograficamente periférica e economicamente de fraco grau de

integração em toda a Península (ibid., p. 43) pensamos que o facto de a região

estar “entalada” a Norte pelo eixo Irun-Portugal, a Sul pelo eixo Lisboa-Madrid, a

Oeste pelo eixo Galaico-Português e a Leste pela fronteira espanhola deve ser

transformado num dos pontos fortes do seu desenvolvimento rentabilizando, quer

a sua posição de fronteira criando uma nova centralidade, quer desenvolvendo o

eixo Guarda/Covilhã/Castelo Branco articulando-o com a Ruta de la Plata no

sentido longitudinal quer, ainda, explorando a situação de ser a única região

nacional que é atravessada pelo principal corredor multimodal de ligação

Portugal-Espanha/Europa Central e do Norte (ver mapas 6.5 e 6.6).

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346

Fluxograma 6.1 Capital endógeno da Beira Interior

Fonte: Adaptado de Reigado, F. M. et all (1998a), Potencialidades, Modelo e Estratégias

Económicas para a Beira Interior, UBI – Núcleo de Economia, p. 136 Além do capital endógeno, o território e sua diversidade é um factor de

competitividade. A capacidade de oferecer espaços diferenciados para funções,

também elas, diferenciadas é um argumento de competitividade do país/região. O

território, enquanto espaço organizado e moldado, política, económica e

administrativamente, pela acção do homem ao longo da história encontra-se de

algum modo estruturado em seis grandes tipos de cluster: o cluster da natureza

ou dos recursos naturais (incluindo aqui o ambiente ecológico); o cluster das

actividades económicas; o cluster das actividades, dos equipamentos e das infra-

estruturas de acessibilidades físicas e sociais; o cluster dos recursos humanos

CAPITAL PRODUZIDO PELO HOMEM ( Fraco )

. Vantagens locativas . Infra-estruturas e transporte rodoviário . Loteamentos industriais . Comércio e serviços

CAPITAL HUMANO ( Fraco )

. Mão-de-obra qualificada

. Dinâmica empresarial

. Espírito de inovação

. Centros de formação profissional

. Centros de investigação regionais

CAPITAL SÓCIO-CULTURAL ( Forte )

. Artesanato

. Gastronomia

. Património cultural

. Património Histórico

. Animação cultural

CAPITAL NATURAL7

( Forte )

. Recursos vegetais

. Recursos Hídricos

. Recursos Minerais

. Recursos Cinegéticos

. Recursos Florestais

. Recursos Energéticos

. Biodiversidade

. Recursos Rurais

. Recursos paisagísticos

CAPITAL

ENDÓGENO

CAPITAL RELACIONAL ( Forte )

. Ligação Universidade/Empresas . Cooperação Instituições de

Ensino Superior e de I&D . Ligação Univ./ Administração

Local, Regional e Central

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347

com a sua história, as suas tradições e o seu sistema de valores; o cluster do

conhecimento e da ciência e tecnologia e o cluster das relações grupos (Reigado,

1999, texto mimeografado).

Mapa 6.5 Eixos de desenvolvimento na Península Ibérica

Fonte: MEPAT - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

(1998c), Relatório do Estado do Ordenamento do Território - 1997, Lisboa, p. 67

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348

Mapa 6.6 Ligação multimodal Portugal - Espanha: corredores e eixos

Fonte: MEPAT - Ministério do Equipamento, do Planeamento e da Administração do Território

(1998c), Relatório do Estado do Ordenamento do Território - 1997, Lisboa, p. 69

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349

Desta concepção de território resulta que o desempenho económico e competitivo

de uma região deixa de ser equacionado da forma tradicional, isto é, como o

resultado exclusivo da dotação de factores produtivos, de infra-estruturas e de

uma determinada configuração geográfica para estar fortemente associado às

características organizacionais do tecido sócio-produtivo. Efectivamente, a

existência de actividades estruturantes da divisão social do trabalho, a qualidade e

a intensidade das interacções condicionam profundamente o desempenho

competitivo das regiões. Não menos importante para a afirmação e

competitividade de uma região é a forma como esta se projecta e se relaciona com

o exterior e, muito particularmente no caso da Beira Interior, com as regiões

fronteiriças do país vizinho.

O território da Beira Interior, enquanto espaço de fronteira com Espanha, não

poderá ser estruturado numa perspectiva exclusivamente nacional dado que daí

resultaria a sua absorção pelo litoral sem ganhos globais no curto ou médio prazo.

A vantagem competitiva com o restante território nacional reside precisamente na

possibilidade de vir a desempenhar um papel de charneira entre o litoral português

e o interior da Extremadura e Castilla-Léon espanholas336 desde que se estruture e

equipe para ofertar os serviços necessários à fixação da população e da produção

ganhando, assim, uma consistência de território com capacidade de sobrevivência

a prazo. O reforço do sistema urbano da região e a sua articulação com Espanha é

duplamente vantajoso, isto é, se por um lado, a Beira Interior ganha uma nova

vitalidade de forma a inverter a tendência para a desertificação ao mesmo tempo

que poderá impedir, como já o dissemos, a subordinação da região à lógica

comercial de internacionalização das principais actividades e cidades espanholas.

Opor outro lado, o litoral da Região Centro também daí retira benefícios uma vez

que passa a dispor no interior (junto à fronteira) de um importante ponto de apoio

logístico na sua ligação rodo e ferroviária à Europa Central e do Norte.

336 Estas duas regiões de fronteira do país vizinho apresentam características físicas, demográficas, sociais e económicas idênticas às da Beira Interior. Além disso, na estruturação do território, a Ruta de la Plata (Salamanca/Cáceres) ocupa uma posição simétrica ao eixo Guarda/Covilhã/ Castelo Branco.

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350

6.4.3. O modelo territorial da Beira Interior Em termos metodológicos, as acções que levam ao desenho de um modelo

territorial são agrupadas em quatro tipos, nomeadamente (J.E., 1997, pp. 106-

111):

• acções sobre o meio físico (suporte do modelo territorial) que, além do

ordenamento hídrico (regularização de caudais e prevenção de inundações),

visa a protecção e gestão da natureza e o tratamento do solo não urbanizável;

• acções para o fortalecimento e reequilíbrio da malha urbana nas quais se

incluem medidas para as cidades e núcleos populacionais, infra-estruturas

(incluindo as vias de comunicação) e equipamentos;

• acções sobre as áreas “não urbanas” de forma a valorizar o património

natural, arqueológico e cultural. Nestas acções incluem-se a definição de

estratégias de recuperação e melhoramento paisagístico, de dotação de

equipamentos de turismo e lazer, de protecção, renovação e reabilitação dos

centros históricos, de utilização de parques e reservas naturais, bem como de

caminhos e roteiros turísticos;

• programas de dinamização territorial tendo em vista melhorar a eficácia

administrativa (marketing regional, desenho de novos instrumentos e

mecanismos de trabalho, controle de implementação de medidas, etc.) e os

níveis de relacionamento entre os agentes do desenvolvimento.

Além destas acções deve-se, ainda, incluir as medidas direccionadas ao potencial

científico e tecnológico, isto é, acções que conduzam, por um lado, à articulação

das instituições de ensino superior, de formação profissional e de investigação e,

por outro lado, apoiem a sua ligação ao tecido produtivo. A estruturação desta

rede de instituições e o reforço das interdependências criadas entre si e no

relacionamento com as actividades económicas contribuem, decisivamente, para a

vitalidade da região e, deste modo, para o ordenamento do território da Beira

Interior.

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351

Seguindo esta metodologia e numa perspectiva de “janela” ou de zoom, isto é,

vendo a Beira Interior integrada na Região Centro que, por sua vez, se integra no

país e este na Europa, a estruturação desta região transfronteiriça passa pela

organização de uma grande bacia agrícola, formada pela Cova da Beira, lezíria da

Idanha e pelo vale do Alagón, capaz de fornecer os mercados consumidores de

produtos frescos e frutas das duas capitais ibéricas (ver mapa 6.7). A criação desta

bacia agrícola, que podendo estender-se até aos regadios de Alqueva e Badajoz

(Espanha), decerto desempenhará um papel importante no reordenamento agrícola

e, de um modo geral, no ordenamento territorial de ambos os países ibéricos.

Mapa 6.7 A Raia Central Ibérica

Coimbra

Viseu

AveiroGuarda

Salamanca

Madrid

Cáceres

Mérida

Badajoz

Alqueva

Lisboa

Castelo Branco

Portalegre

Legenda - Vias rodoviárias - Delimitação da Península e de Portugal - Delimitação da região transfronteiriça

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352

O fortalecimento da malha urbana implica, entre outras, uma rede de vias de

comunicação rodoviária a quatro níveis:

• reforço das ligações Norte-Sul, isto é, a conclusão do IP2 e a construção de

uma via que, junto à Raia Espanhola, ligue Figueira de Castelo Rodrigo/

Almeida/Sabugal/Penamacor/ Idanha-a-Nova/Vila Velha de Ródão; • conclusão dos eixos paralelos ao IP5, isto é, o IC6 - ligação Coimbra/Covilhã

- que, via Penamacor, deveria chegar à fronteira e o IC8 - Figueira da Foz/

Castelo Branco que, articulado com o IC31 (Castelo Branco/Monfortinho),

também faria a ligação a Espanha;

• permeabilização da fronteira através da construção, a Norte do IP5, da ligação

Mêda/Pinhel/Figueira de Castelo Rodrigo/Vitigudino/Ledesma/Salamanca e

uma, a Sul, ligando Covilhã/Castelo Branco/Idanha-a-Nova/Segura/Alcântara

/Cáceres; • conclusão da rede viária intra-regional dotando esta região fronteiriça de um

sistema viário integrado que facilite os fluxos de tráfego inter e intra

municipais.

A actuação proposta sobre a rede viária é fundamental para o desenvolvimento da

região e para a permeabilização da fronteira já que sem vias de comunicação não é

possível relançar o desenvolvimento económico e reforçar a cooperação nesta

região de fronteira. De referir, ainda, que as ligações transversais são uma forma

de “fechar” a malha viária transfronteiriça ou, utilizando a expressão de Mora

Alizeda (1999), abotoar os dois lados da fronteira (ver mapa 6.8). Da mesma

forma, as ligações intra regionais são um importante veículo para a promoção da

região e para a ampliação e consolidação de um mercado interno, ou melhor,

local visto facilitar a aproximação entre o produtor e o consumidor.

Efectivamente, não é possível promover o desenvolvimento numa região com

graves problemas de acessibilidade rodoviária que se traduzem numa velocidade

média em linha recta337 de 32,8 Km/h no trajecto Coimbra/Covilhã ou 40,3 Km/h

337 Esta velocidade, calculada pela equipa técnica que elaborou o Plano Director do Município da Covilhã, indica a velocidade média (Km/h) a que se percorre a distância entre dois pontos em linha recta e obtém-se dividindo a distância (Km) pelo tempo (h).

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353

no percurso Leiria/Castelo Branco (ver quadro 6.9) e que se mantém, sem

alterações significativas, desde 1994. A situação é agravada pela reduzida

velocidade atingida na Linha da Beira Baixa, o desfasamento dos horários da CP

em relação à procura e a inexistência de transporte aéreo regular para as duas

metrópoles do país. De referir que a CCRC partilha esta preocupação ao assinalar,

como um dos factores de bloqueio ao desenvolvimento da Beira Interior, o

estrangulamento fortíssimo em matéria de infra-estruturas de transporte rodo e

ferroviário e conclui que sem a sua resolução o desenvolvimento da zona está

muito limitado (CCRC, 1999, p. 99).

Mapa 6.8 Rede viária transfronteiriça

Fonte: Reigado, F. M. et all, (1999), Estratégia de Inovação para a Região Centro: O CASO DA

BEIRA INTERIOR, Universidade da Beira Interior, p. 84

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354

Quadro 6.9 Velocidade média em linha recta

Distância (Km) Percurso

Real Em linha recta

Tempo gasto (h)

Velocidade média em linha recta (Km/h)

Porto - Vila Real 115 74,75 1,3 57,1 Aveiro - Coimbra 160 117,25 1,2 97,6 Coimbra - Covilhã 145 78,65 2,4 32,8 Leiria - Castelo Branco 168 112,75 2,8 40,3 Lisboa - Évora 150 107,25 1,7 63,1

Fonte: Plano Director do Concelho da Covilhã, 1994

A existência de uma cordilheira transfronteiriça sem graves problemas ecológicos,

fortemente arborizada e com um considerável património natural e cultural,

constitui o terceiro pilar do modelo de ordenamento territorial da região.

Efectivamente, a criação de um grande Parque Natural Transfronteiriço (um dos

maiores da Europa) que englobe as Serras do Açor, da Estrela e da Malcata, em

Portugal, e as Serras da Gata, Penha de França e Gredos, em Espanha, além de

contribuir decisivamente para o ordenamento e preservação do território pode

constituir-se num pólo de desenvolvimento assente em actividades económicas

como o turismo, a pastorícia e a exploração da floresta e flora autóctone (Reigado,

1998a). Este espaço privilegiado, procurado pelo turismo de espaços naturais e

paisagísticos, tem ainda condições para o desenvolvimento do “turismo cultural”

ligado às festividades civis e religiosas e ao rico património construído que deve,

por um lado, ser articulada com os sectores e actividades que com ele estão

relacionados e, por outro lado, acolher a componente transfronteiriça que o

Parque Natural propicia. Aliás, em nosso entender, qualquer projecto de

desenvolvimento para a Beira Interior deverá incluir a dimensão transfronteiriça e

o vector ordenamento do território. Neste contexto, a elaboração de Roteiros

Turísticos que abarquem os dois lados da fronteira luso-espanhola são

indispensáveis visto permitir ao turista saber qual a oferta de produtos,

equipamentos e de infra-estruturas que irá encontrar introduzindo no circuito

económico e valorizando o património natural, cultural e arquitectónico, a

gastronomia, o artesanato, etc..

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355

Os recursos hídricos são, tal como a montanha, a planície e as infra-estruturas, um

dos elementos determinantes do ordenamento do território, quer pelo facto de as

populações e as actividades produtivas terem tendência a localizarem-se na sua

proximidade, quer pelos constrangimentos que originam como, por exemplo, a

necessidade da construção de pontes para atravessar os rios, etc. Como se vê, a

simples passagem de um rio por um determinado território ou a existência de uma

albufeira de águas públicas condiciona a ocupação humana do espaço. Mas, a sua

influência no ordenamento do território vai mais além. Quando, por exemplo, se

despolui os cursos de água, se regula os caudais de forma a garantir o

fornecimento de água potável às populações, à indústria, ao comércio e aos

serviços, bem como para a rega, ou se utiliza a água para a prática de desportos

náuticos ou, ainda, para a pesca estamos a agir sobre o território o que implica o

seu planeamento e ordenamento. Refira-se que, tal como os cursos de água à

superfície, também as águas subterrâneas influenciam a estruturação do território

uma vez que a sua captação para a irrigação dos campos ou abastecimento de água

às populações ou, mesmo, a localização das unidades de engarrafamento obriga à

intervenção do homem sobre o território no sentido de, simultaneamente, lhe dar

uma coerência interna (ordenando-o) e enquadrar estas actividades num modelo

de desenvolvimento sustentável.

O SC&T tem, igualmente, um papel determinante na questão da dinamização e

ordenamento do território. Como sustenta Reigado (1993), o impacto do ensino

superior no desenvolvimento regional faz-se sentir na dimensão do capital fixo

público e privado, da criação de mercados locais, da formação de quadros

superiores, do apoio técnico e científico e da dinâmica cultural e atracção da

população jovem. A região além dos vários centros de investigação e de formação

profissional conta com uma rede, relativamente densa, de estabelecimentos de

ensino superior público e privado concentrada ao longo de dois corredores

Norte/Sul, isto é, do eixo Guarda/Covilhã/Fundão/Castelo Branco/Idanha-a-Nova,

do lado português, e do eixo Zamora/Salamanca338/Cáceres/Mérida, do lado

espanhol. A vasta oferta que o SC&T regional proporciona repercute-se na

338 Salamanca tem uma das mais antigas Universidades da Europa

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356

especialização produtiva da Beira Interior, sedimentando uma estratégia de

diversificação da estrutura produtiva e afirmando um novo sector económico com

elevada propensão exportadora de serviços de educação de nível superior. Além

disso, a actividade de investigação (efectuada, sobretudo, na Universidade da

Beira Interior e Institutos Politécnicos da Guarda e Castelo Branco) já se

conseguiu impor no panorama científico português e tem condições para se

expandir, quer através da consolidação e abertura de novos canais de cooperação

com o tecido empresarial regional e nacional, quer, ainda, pela inovação do

modelo organizacional das instituições de ensino superior e das empresas

(Reigado, 1999, p. 76). Nos últimos anos, a colaboração com as instituições

congéneres espanholas têm vindo a aumentar. Daí que, a ligação em rede das

várias instituições de ensino superior e de investigação e das empresas de ambos

os lados da fronteira, formando um cluster Ensino & Investigação

Transfronteiriço, seja fundamental para a intensificação dos fluxos de

“conhecimento científico” intra e inter fronteiras que, certamente, teria

consequências positivas para o desenvolvimento da Beira Interior e permitiria a

sua inserção nas redes europeia e internacional de investigação científica.

O eixo urbano estruturante desta região (Guarda/Covilhã/Fundão/Castelo Branco)

tem uma particularidade interessante: a diferenciação do processo de afirmação

destas quatro cidades. O concelho da Covilhã com uma tradição urbana mais

antiga, fortemente relacionada com a indústria têxtil (Reigado e Rogowski, 1996),

ao receber recentemente a Universidade poderá adquirir uma nova centralidade

estruturante da rede urbana, sobretudo se a virmos no contexto sub-urbano da

Cova da Beira. Outras cidades, como por exemplo o Fundão, viram no apoio às

actividades do sector primário (leia-se, agricultura) o seu principal factor de

crescimento. Guarda e Castelo Branco devem o seu desenvolvimento à instalação

de serviços administrativos motivada pelo processo de desconcentração do poder.

Fora deste eixo Norte/Sul encontram-se duas extensas faixas (a Este e a Oeste)

que associam a baixa densidade demográfica e económica à fragilidade urbana.

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357

Esta situação, que se vem desenhando desde a década de 70, leva-nos a questionar

as prioridades de reestruturação territorial, isto é, a intervenção discriminatória

positiva do Estado deve favorecer o desaparecimento dos lugares de baixa

densidade, ou, pelo contrário, deve estimular uma forte polarização nas cidades

com potencial para desempenharem um papel de maior relevo ao nível nacional?.

A resposta a esta questão passa, numa óptica de desenvolvimento sustentável, pela

articulação de duas perspectivas, isto é, a da economia industrial e da análise

territorial e institucional que valoriza, por um lado, as questões organizacionais e

da comunicação/informação e, por outro lado, as novas oportunidades para

territórios de baixa densidade surgidas com o aproveitamento de economias de

rede e de sinergias de complementaridade, bem como os novos nichos de mercado

ligados à natureza, aos valores da tradição, ao património e ao turismo. Tendo em

consideração o atrás descrito, a reestruturação do território nacional e da Beira

Interior, em particular, passa pelo estímulo polarizador dos aglomerados urbanos

com maior potencial, ou seja, o modelo de desenvolvimento regional, integrando

pólos de crescente urbanidade com o vasto hinterland rural, terá de promover uma

correcta articulação territorial.

Além disso, a estruturação do sistema urbano da Beira Interior deve articular-se

com o sistema urbano das zonas de fronteira de Castilla e da Extremadura

formando um sistema transfronteiriço coeso onde se alicerce o desenvolvimento

económico e social e a cooperação transfronteiriça. Dentro desta rede ganham

particular importância os dois eixos urbanos regionais (Guarda/Covilhã/

Fundão/Castelo Branco/Idanha-a-Nova e Zamora/Salamanca/Cáceres/Mérida),

pelo seu papel na estruturação da Raia Central Ibérica. Contudo, a par destes eixos

e para não corrermos o risco de formar um “deserto” entre eles, é necessário

implementar toda uma série de ligações transversais que, permitindo a

desconcentração da população, equipamento e infra-estruturas levaria à criação de

uma rede transfronteiriça de centros urbanos atractivos e com possibilidades de

inverter a tendência de desertificação deste vasto território.

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358

Em termos gerais, o ordenamento do território não começa e acaba com a

estruturação das vias de comunicação (estruturas rodo e ferroviárias), estas

“apenas” suportam os fluxos de pessoas e bens, daí que ordenar o território

implique compatibilizar as áreas de forte densidade populacional com as áreas

deprimidas, integrar as aldeias históricas com a cidade moderna, valorizar os

recursos naturais e o património histórico-cultural, integrar o urbano e o rural

numa rede policêntrica, formar os quadros técnicos e criar as condições para a sua

fixação na região, ou por outras palavras, pôr o território ao serviço do homem

numa lógica de equidade intra e intergeracional. As políticas sectoriais nacionais e

comunitárias, com destaque para a PAC, além das Iniciativas Comunitárias como

o INTERREG e LEADER são também “instrumentos” de ordenamento do

território. Andresen, (1999) chega mesmo a afirmar que permitir subsidiar a

tremocilha339 ou não, mais ou menos toneladas de tomate, privilegiar o replantio

de vinhas com mais de trinta anos de existência faz ordenamento do território

dado ocupar o território e gerar dinâmicas sociais, económicas e culturais.

As acções para o desenho do modelo territorial devem ser concebidas de forma

inter-relacionada pelo que o modelo territorial adoptado para a região

(regulamentado através de um Plano Regional de Ordenamento do Território),

deverá ser inovador (a perspectiva transfronteiriça é, seguramente, um dos

vectores da inovação) e apoiar-se nos recursos humanos, na rede de infra-

estruturas e de equipamentos, nos recursos hídricos, na cadeia montanhosa, na

bacia agrícola e na rede de instituições de ensino superior, de formação e de

investigação. A estratégia de desenvolvimento e de ordenamento desta região

transfronteiriça deve, por outro lado, resultar de uma ampla discussão que envolva

a Administração Central e Local, os cidadãos, as instituições e os diferentes

colectivos da sociedade civil de modo a que o empenho de todos constitua o

elemento dinamizador de um correcto ordenamento do território que concilie o

desenvolvimento económico e social com a gestão e preservação do ambiente.

Aliás, a concretização e aproveitamento das potencialidades inerentes a cada

339 Planta leguminosa.

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359

território apenas se concretizará com o envolvimento das populações locais e a

afirmação de sentimentos de pertença e de co-responsabilização por um território.

6.5. RESUMO E CONCLUSÕES O aprofundamento da integração europeia, o alargamento da União Europeia, a

globalização, as assimetrias regionais que, longe de se esbaterem, têm tendência

para o seu agravamento e a grave degradação ambiental conduziu a um novo

paradigma de desenvolvimento: o território com a sua especificidade, história e

população que o foi moldando e, por sua vez, nele se foi integrando e criando

uma identidade, é um elemento estratégico do desenvolvimento sustentável.

As disparidades de desenvolvimento verificam-se não só quando comparamos os

países entre si, mas também quando procedemos à análise das dinâmicas dentro

do espaço nacional. Portugal, além de ter o seu território deficientemente

ordenado e com alguns problemas ambientais, é bastante heterogéneo, em termos

de densidade populacional, de localização da actividade produtiva e inovação,

dotação de infra-estruturas, equipamentos e acessibilidades em sentido amplo. O

modelo de desenvolvimento seguido levou à forte litoralização dividindo o país

numa faixa litoral densamente povoada, bem dotada de infra-estruturas e

equipamento e com um tecido produtivo dinâmico, inovador e propenso à

exportação e, no outro extremo, um vasto território fronteiriço caracterizado pela

baixa densidade demográfica, dispersão do sistema de povoamento e falta de

recursos humanos qualificados. É neste espaço periférico e de fronteira, mas

específico que a Beira Interior se insere. Esta especificidade, tornando a Beira

Interior única, não pode ser visto como um “constrangimento”, mas, pelo

contrário, tem de ser percepcionado como uma das vias de afirmação no contexto

nacional e mundial.

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360

Neste contexto, o ordenamento do território da Beira Interior tem ser considerado

um subsistema do ordenamento da Região Centro que, por sua vez, é um

subsistema do nacional e este do europeu. A Beira Interior, sendo um sub-sistema

da Região Centro, é mais do que a Região Centro visto ser uma região

transnacional com fortes possibilidades de se tornar uma região piloto no sistema

de regiões europeias. O reconhecimento, pela União Europeia, desta

especificidade exige o empenho, quer das Administrações Públicas de Portugal e

Espanha, quer das Administrações Locais e dos agentes económicos. O facto de

ser uma região de fronteira com Espanha leva a que um dos vectores estratégicos

do seu desenvolvimento seja a cooperação transfronteiriça, criando sinergias e

complementaridades nos dois lados da fronteira.

O desenho do modelo territorial passa quatro tipo de intervenções, ou seja, por

acções sobre o meio físico e áreas “não urbanas”, de fortalecimento e reequilíbrio

da malha urbana e, por último, programas de dinamização territorial (J.E., 1997,

pp. 106-111). Além disso, é necessário ter em consideração que, por um lado, a

Beira Interior é uma região de fronteira e, por outro lado, esse facto deve

repercutir-se de forma activa no ordenamento do território, na regularização e

aproveitamento dos recursos hídricos, no ordenamento e valorização da floresta,

no reordenamento e modernização da agricultura, na preservação e valorização do

património natural e cultural, no planeamento e gestão integradas dos circuitos

turísticos, no desenvolvimento e reforço do próprio SC&T e das suas relações

com as empresas, pelo que a estruturação deste território terá de ser efectuada

numa perspectiva de cooperação transfronteiriça.

Assim, o modelo territorial da Beira Interior passa por:

1. organização de uma grande bacia agrícola, formada pela Cova da Beira, lezíria

da Idanha e pelo vale do Alagón que pode ser alargada a Badajoz e Alqueva;

2. dotação de uma rede de vias de comunicação que, por um lado, promova a

permeabilidade entre o Norte e o Sul da região bem como os contactos da

Beira Interior/Extremadura e Castilla-León e, por outro lado, conclua a rede

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361

viária inter e intra-regional de forma a facilitar os fluxos de tráfego

intermunicipal na região e da região com o resto do país;

3. criação de um grande Parque Natural Transfronteiriço na cordilheira

transfronteiriça (Serras da Estrela, Malcata, Gata, Penha de França, e Gredos )

que, sendo fortemente arborizada e possuindo um considerável património

natural e cultural, pode constituir-se num pólo de desenvolvimento assente em

actividades económicas como o turismo, a pastorícia e a exploração da floresta

e flora autóctone;

4. utilização da grande riqueza hídrica (à superfície e no subsolo) da região, quer

como reserva biológica e ambiental, quer nas actividades produtivas, bem

como o seu ordenamento;

5. articulação dos vários centros de investigação e de formação profissional e

instituições do ensino superior público e privado, situadas na Raia Central

Ibérica, com o tecido empresarial e sua inserção nas redes europeia e mundial

de investigação científica;

6. criação e consolidação de um sistema urbano transfronteiriço coeso que, além

de contribuir para o ordenamento do território, polarize o desenvolvimento e,

assim, contribua para a inversão da tendência de desertificação deste vasto

território;

7. articulação territorial dos pólos de crescente urbanidade com o vasto

hinterland rural valorizado e inserido nas dinâmicas produtivas através do

aproveitamento de economias de rede e de sinergias de complementaridade,

bem como dos novos nichos de mercado ligados à natureza, aos valores da

tradição, ao património e ao turismo.

O modelo territorial e a estratégia de desenvolvimento apresentados para a Beira

Interior, sendo de rotura com o passado imobilista, apela ao amplo diálogo com as

instituições públicas, privadas e da população em geral, e ao seu empenhamento

activo numa perspectiva de co-responsabilização pelo futuro deste território e de

revalorização das raízes e sentimento de pertença.

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JORNAL do FUNDÃO, 24 de Março de 2000