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Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa UNIÃO BANCÁRIA EUROPEIA E A RECAPITALIZAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO PORTUGUÊS. MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM CIÊNCIAS JURÍDICO-FINANCEIRAS Autor Rúben André Duarte Maurício Professor Orientador Professora Nazaré Saldanha Póvoas da Costa Cabral Lisboa 2018

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Universidade de Lisboa

Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

UNIÃO BANCÁRIA EUROPEIA E A RECAPITALIZAÇÃO DO SISTEMA

FINANCEIRO PORTUGUÊS.

MESTRADO PROFISSIONALIZANTE EM CIÊNCIAS JURÍDICO-FINANCEIRAS

Autor

Rúben André Duarte Maurício

Professor Orientador

Professora Nazaré Saldanha Póvoas da Costa Cabral

Lisboa

2018

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Universidade de Lisboa

Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

UNIÃO BANCÁRIA EUROPEIA E A RECAPITALIZAÇÃO DO SISTEMA

FINANCEIRO PORTUGUÊS.

Rúben André Duarte Maurício

Dissertação de mestrado, no âmbito do curso de

Ciências Jurídico-Financeiras da Faculdade de

Direito da Universidade de Lisboa, para obtenção

dо título de mestre. Orientador: Prof. Nazaré

Cabral.

Lisboa

2018

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Agradecimentos

Quero em primeiro lugar agradecer a todas as pessoas que tornaram, de uma

maneira ou de outra, possível a dissertação desta tese. Não posso deixar o meu mais

grato e profundo agradecimento, a cada uma delas.

Em primeiro lugar, o meu sincero obrigado à Professora Nazaré Cabral por toda a

informação, apoio, orientação e profissionalismo com que se sempre pautou em todas as

reuniões ou dúvidas por mim colocadas ao longo desta investigação.

Agradeço aos meus pais pelo esforço que fizeram, e continuam a fazer, para que

eu pudesse chegar até aqui e realizar os meus objetivos, pelo carinho e confiança que

depositaram em mim, obrigado pais, por tudo. O meu especial obrigado à minha avó

materna por ter tornado tudo isto possível, por ser o exemplo de pessoa que quero

seguir. A ela, o meu grande obrigado.

Não posso deixar de agradecer à pessoa que mais motivação me deu e que mais

aturou os meus medos e ansiedades, ao longo desta dissertação, à minha Nhe. O meu

obrigado por todas as vezes que teve de me aturar, apoiar e motivar, sempre que era

preciso.

Por fim, o meu obrigado ao meu grupo de amigos, Alziras, por toda a motivação

que me foram dando ao longo destes anos e, acima de tudo, porque o sucesso sem

amigos para partilhar, não faz de todo sentido algum.

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Resumo

Após a recente crise que se abateu sobre a Europa, todo o sistema financeiro foi

posto em causa. A crise foi como um alerta para todos aqueles que achavam que a Zona

Euro estava livre de eventos trágicos como este. Vários países viram a sua dívida

soberana aumentada, havendo um aumento tanto da dívida pública, como da dívida

privada, o que levou a que muitos países necessitassem de um resgate financeiro.

Perante esta crise, foi proposto em junho de 2012, pelo Conselho Europeu, que

fosse criado um mecanismo capaz de quebrar o ciclo vicioso entre os Estados e o

sistema bancário e, ao mesmo tempo, que fosse capaz de ajudar a resolver a crise e a

evitar o aparecimento de novas crises como esta.

Neste contexto, na presente dissertação pretendemos fazer uma análise da União

Bancária Europeia, demonstrando os seus mecanismos e de que forma poderá a mesma

ser a solução para futuras crises Europeias e, em especial, se será uma medida positiva

para um sistema financeiro de Portugal.

Palavras-chave: União Bancária; Mecanismo Único de Supervisão; Mecanismo

Único de Resolução; Sistema de Garantia de Depósitos; Crise do Euro.

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Abstract

After the recent crisis that hit Europe, the entire financial system was called into

question, the crisis was as a warning to all those who felt that the Euro Zone was free of

tragic events like this. Several countries saw their sovereign split widened, both public

debt and private debt increased, leading many countries to need a bailout.

In line with the wake-up call of this crisis, the European Council proposed in June

2012 that a mechanism be set up to break the vicious cycle between states and the

banking system and at the same time to solve the crisis and avoid the emergence of new

crises like this.

In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to

the Banking Union, demonstrating its mechanisms and how it could be the solution for

future European crises and , if it will be a positive measure for a Portuguese financial

system.

Key words: Banking Union; Single Supervision Mechanism; Single Resolution

Mechanism; Deposit Guarantee System; Euro crisis.

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Índice de Abreviaturas

AIG – American International Group

BA – Banco Atlântico

BCE – Banco Central Europeu

BCP – Banco Comercial Português

BES – Banco Espírito Santo

BNU – Banco Nacional Ultramarino

BP – Banco de Portugal

BRRD – Bank Recovery and Resolution Directive

CE – Comunidade Europeia

CECA – Comunidade Económica do Carvão e do Aço

CGD – Caixa Geral de Depósitos

CUR – Conselho Único de Resolução

EM – Estado-Membro

FDIC – Federal Deposit Insurance Corporation

FUR – Fundo Único de Resolução

MUR – Mecanismo Único de Resolução

MUS – Mecanismo Único de Supervisão

RGICSF – Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras

SGDB – Sistema de Garantia de Depósitos Bancários

TFUE – Tratado de Funcionamento da União Europeia

UBE – União Bancária Europeia

UE – União Europeia

UM – União Monetária

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Índice:

1. Introdução .................................................................................................................................................. 1

2. O que é a União Bancária Europeia. ..................................................................................................... 4

2.1. Autoridade Europeia de Supervisão - MUS ......................................................................................... 6

2.1.1. Membros do MUS ................................................................................................................. 8

2.1.2. Poderes de supervisão e investigação ......................................................................... 9

2.2. Mecanismo Único de Resolução - MUR............................................................................................... 15

2.2.1. Fundo Único de Resolução - FUR ................................................................................. 22

2.2.2. Relação entre o Conselho Único de Resolução (CUR) e o Banco de Portugal ............................................................................................................................................................... 23

2.2.3. Aplicação do MUR .............................................................................................................. 24

2.3. Sistema de Garantia de Depósitos Bancários - SGDB ...................................................................... 25

2.3.1. Objetivos ................................................................................................................................ 26

2.3.2. Quem financia ...................................................................................................................... 28

2.3.3. Como funciona .................................................................................................................... 29

3. UBE e a Europa........................................................................................................................................ 32

3.1. A crise Europeia ....................................................................................................................................... 32

3.2. Confronto entre exemplos Americanos e Europeus ........................................................................ 36

3.2.1. Irlanda e Nevada ................................................................................................................ 36

3.2.2. Florida e Espanha .............................................................................................................. 40

3.2.3. Nevada e Letónia ................................................................................................................ 42

3.3. Zona Euro antes da UBE ......................................................................................................................... 46

4. UBE e Portugal ........................................................................................................................................ 48

4.1. A evolução do sistema bancário Português ....................................................................................... 48

4.1.1. O revirar do sistema financeiro .................................................................................... 49

4.1.2. Após crise de 2008 ............................................................................................................ 52

4.2. Exemplo prático – BES ........................................................................................................................... 52

4.2.1. Impacto no sistema financeiro de Portugal ............................................................. 53

5. Conclusão ................................................................................................................................................. 55

6. Referencias .............................................................................................................................................. 59

7. Anexos ....................................................................................................................................................... 63

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Índice de gráficos

Gráfico 1 – Preço dos imóveis (Nevada e Irlanda) ......................................................................... 37 Gráfico 2 – Desemprego (Nevada e Irlanda) ..................................................................................... 38 Gráfico 3 – Dívida Pública (Nevada e Irlanda) .................................................................................. 40 Gráfico 4 – Desemprego (Florida e Espanha) ................................................................................... 41 Gráfico 5 – Preço dos imóveis (Florida e Espanha) ........................................................................ 42 Gráfico 6 – PIB (Nevada e Letónia) ....................................................................................................... 43 Gráfico 7 – Preço dos imóveis (Nevada e Letónia) .......................................................................... 44 Gráfico 8 – Desemprego (Nevada e Letónia) ..................................................................................... 45

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1. Introdução

“Developments in the financial system remain in many ways the hidden story of

the European crisis. The dominant storyline follows the mantra that ‘it’s mostly

fiscal’. This narrative dates the start of the crises to late 2009, when the Greek

government started losing market access in the wake of revelations about its

misreporting of its past fiscal position. The narrative is punctuated by the sovereign

assistance programs extended to Greece and Ireland 2010, Portugal in 2011, and

Cyprus in 2013; the protracted negotiations that lead to the Greek government’s

default on its obligations to private-sector creditors in March 2012; and the ongoing

drama following the Greek elections of January 2015.”

Foi com este texto que Nicolas Véron (2015), um economista francês e uma

das mentes mais influentes nas finanças internacionais, começou por explicar no

seu artigo “Europe’s radical banking union” a evolução temporal e geográfica da

crise que se abateu sobre a Europa. Num resumo bastante simples e eficaz, Nicolas

Véron afirma que a maior parte dos desenvolvimentos no sistema financeiro

europeu ficaram a dever-se a crises económicas. Fica demonstrada assim uma

fragilidade existente na própria UE, mais precisamente no sector financeiro.

Porém, o problema não se pode resumir a este sector, é importante realçar a

missão da UE em querer criar uma UM e, consequentemente, criar condições de

estabilidade económica e financeira.

Desde o tempo da CECA, a UE tem vindo a crescer e a criar novos mecanismos

de estabilidade económica, fortemente motivada pela necessidade de se proteger

dos novos desafios económicos e financeiros.

O problema levanta-se com o surgimento de eventuais crises capaz de afetar

todos os países existentes na Comunidade Europeia.

Como resultado destes acontecimentos, foi possível avaliar as principais

falhas do sistema bancário e financeiro da UE e, constatar-se que a UE carecia de

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mecanismos institucionais para lidar com choques macroeconómicos (Mylonakis,

2013).

Numa tentativa de solucionar os problemas então existentes, criam-se novos

mecanismos e, novas soluções foram encontradas para fazer face aos mesmos,

Profissionais e grandes pensadores nas vertentes de economia e finanças são

chamados a resolver os problemas e a desenvolver novos mecanismos capazes de

prever futuros acontecimentos similares.

Após várias iniciativas comunitárias, foi assumido o projeto de criação da

UBE, como sendo aquele que reúne mais consenso no sentido de ajudar a resolver

a atual crise e a prevenir futuras crises, fortalecendo assim o sistema e a

integridade da Zona Euro (Sousa e Caetano, 2013). Foi também amplamente aceite

que a UBE é uma componente essencial e necessária para que o euro consiga

sobreviver como moeda única da UEM (Sibert, 2012).

O presente estudo pretende dar a conhecer, à luz de argumentos jurídicos e

financeiros, como foi possível a criação da UBE com os seus três principais

mecanismos, como funcionam e, sobretudo, como é que uma economia como a de

Portugal poderá e, irá reagir a este novo sistema bancário criado pela UBE.

Como tal, o principal objetivo desta dissertação passa por identificar as

principais características da UBE e, de uma forma crítica e analítica, apresentar as

principais dificuldades na sua aplicação e os problemas que possam surgir, e que já

surgiram, perante a sua aplicabilidade.

Por ser um tema recente, o seu estudo é relevante para que se possa

perceber se a UBE poderá trazer, para economias como a de Portugal, mais

vantagens ou desvantagens.

O presente trabalho está organizado em quatro capítulos. O primeiro, onde

se aborda a criação da UBE e todos os seus mecanismos e a aplicabilidade de cada

um. No segundo capitulo, é abordada a crise de 2008, desde a sua origem até à

necessidade da criação da UBE, onde se explora as diferenças existentes entre os

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E.U.A e a EU, de forma a perceber a escolha deste sistema. O terceiro capítulo

apresenta de que forma a crise de 2008 atingiu Portugal e, como o país reagiu

perante os problemas que daí resultaram, nomeadamente, o caso do Banco BES.

Por fim, no quarto e último capítulo, é elaborada uma breve análise deste estudo de

forma a se poder concluir sobre os benefícios e desvantagens da UBE na Europa e,

mais concretamente em Portugal.

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2. O que é a União Bancária Europeia.

No dia 29 de junho de 2012 a UBE foi anunciada durante uma reunião de

líderes europeus. Nicolas Véron refere “But the terms of the commitment were

ambiguously worded, and some elements were contradicted by key players in the

following days. Only the passing of time and the concrete implementation of the mid-

2012 announcement have established its watershed nature. Many participants and

observers have yet to fully wake up to its implications. Even in its current incomplete

form, banking union marks a radical change that profoundly modifies the nature of

European integration and the balance between member states and European

institutions. But a mix of healthy scepticism, misplaced cynicism and lazy inattention

has prevented a general recognition of its true significance.”

Já o presidente da CE, Durão Barroso, saudou o acordo como importante

referindo que "é um passo em frente crucial e muito substantivo no sentido de uma

união bancária e um passo em frente atempado para a integração da supervisão

financeira na Zona Euro e nos outros Estados-membros que a Comissão espera virem

a participar" (Barroso, 2012).

Desde a formação da UE que nunca se tinha ouvido falar numa união

bancária, muitos dos líderes europeus ficaram reticentes quanto a esta nova ideia,

não havia consenso e ainda existia um longo caminho a ser percorrido para se

poder traçar todos os mecanismos a serem criados.

Após algumas sessões de esclarecimentos e, com o desenvolvimento e

progressão rápida que a UBE teve, todos os líderes europeus viram que esta

solução seria perfeita para lidar com os problemas existentes e futuros na zona

económica Europeia.

A definição de UBE é apresentada pelo próprio Conselho da União Europeia:

“A União Bancária é um sistema de supervisão e resolução bancárias ao nível da EU.”

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A UBE nasceu tendo como base os artigos 114.º e 127º n.º 6 do Tratado do

Funcionamento da União Europeia. Só sendo possível, com a autorização do

Conselho Europeu conferir atribuições específicas ao BCE, relativas à supervisão

prudencial das instituições de crédito, tal como consta no art.º 127º n.º 6 do

T.F.U.E.

O seu objetivo e propósito são claros, criar um conjunto de regras capaz de

assegurar que o setor bancário na área do Euro é seguro, transparente e confiável.

A UBE pretende tornar o sector bancário da zona do Euro “seguro”, para que

se possa evitar, ou pelo menos prevenir, uma eventual crise financeira.

Schoenmaker e Siegman (2013) afirmam que o objetivo da UBE é promover a

estabilidade económica e financeira europeia. É necessário tornar o sector

bancário capaz de resistir a essas crises e que, no caso de surgimento de uma crise,

não sejam os contribuintes responsáveis pelo pagamento da resolução dos bancos

que possam vir a fechar.

Como tal, é imperativo que haja transparência no sector bancário, que se

torne clara a forma de resolução dos problemas bancários, dando total

conhecimento aos contribuintes que a resolução não passará pelos pagamentos de

impostos. Essa responsabilidade ficará a cargo do setor bancário, como iremos

perceber mais à frente.

Por fim, e como resultado da segurança e da transparência no setor

bancário, torna-se evidente que o contribuinte passará a ter mais confiança nos

seus Bancos. É bastante importante salientar este aspeto, na medida em que a UBE

poderá, de certa forma, garantir essa confiança que há muito foi retirada aos

contribuintes.

Zettelmeyer et al (2012) consideram que uma UBE baseada nos países da

Zona Euro pode ser crucial para a sobrevivência e estabilidade da Zona Euro.

Pisani-Ferry et al (2012) defendem que o BCE é uma instituição com

recursos e credibilidade significativa. Porém, defendem a possibilidade da

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existência de alguns riscos para as instituições da EU, como a acumulação de

instrumentos de política sob a sua autoridade. Assim, os autores consideram que

existem duas opções:

• um único supervisor dotado de autoridade de resolução, que seria

uma nova instituição;

• ou uma combinação de supervisão do BCE, com supervisão paralela

(e coordenada) pela autoridade de resolução (que está previsto ser

criada).

2.1. Autoridade Europeia de Supervisão - MUS

O MUS, pensado e criado com base na construção de uma UBE, reflete a

preocupação e o cuidado que é exigido na supervisão de um sistema económico de

várias realidades distintas. O Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho de 15

de outubro de 2013, que confere ao BCE poderes no âmbito da supervisão

prudencial das instituições de crédito, no seu preâmbulo, diz-nos o seguinte:

“A atual crise financeira e económica veio demonstrar que a fragmentação do

setor financeiro pode ameaçar a integridade da moeda única e do mercado interno.

É, pois, essencial intensificar a integração da supervisão bancária, a fim de reforçar a

União, restaurar a estabilidade financeira e lançar as bases da recuperação

económica.”

Mais uma vez se destaca a importância que a crise financeira teve nas

decisões adotadas pelo CE e pelo BCE. A realidade que se veio a descobrir, sobre o

sistema financeiro e económico da Zona Euro, levantou diversas dúvidas e

preocupações sobre o papel de supervisão no sistema bancário. Tendo inclusive

criado a necessidade, dentro da UE, da criação de um mecanismo capaz de

supervisionar, direta e indiretamente, cerca de 3600 bancos.

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Em 4 de novembro de 2014, entrou em funcionamento o MUS, composto

pelo BCE e pelas Autoridades Nacionais1 competentes, no caso de Portugal, o BP.

Ambas as instituições ficam responsáveis pela supervisão bancária da UE, porém,

essa responsabilidade é dividida, com base em critérios quantitativos e

qualitativos. O MUS classifica as instituições de crédito como significativas, ou não

significativas, sendo regularmente atualizada a classificação de todas as

instituições de crédito2.

No caso de serem consideradas instituições significativas, ficam sob a

supervisão direta do BCE, no caso de não serem consideradas significativas, ficam

sob a supervisão indireta do BCE e supervisão direta das respetivas Autoridades

Nacionais.

Tal como é defendido pelo próprio BP, “A existência de um sistema bancário

europeu sólido e resiliente, devidamente regulado e sujeito a uma supervisão

harmonizada e de elevada qualidade, é fundamental para garantir a confiança dos

depositantes, a segurança dos fundos confiados às instituições e a correta alocação

da poupança ao investimento produtivo, condição essencial para o crescimento

sustentado da economia europeia.”. É de salientar a importância da criação do MUS.

Além de assegurar que todos os “movimentos” dados pelas instituições de crédito

são fiáveis e responsáveis, consegue ao mesmo tempo reforçar a confiança dos

depositantes, com o compromisso de uma supervisão competente e consciente.

1 O artigo n.º 2, al. 2, do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho de 15 de outubro de 2013, define o conceito de autoridade nacional competente como uma entidade que deverá ser designada por um Estado-Membro participante nos termos do Regulamento (UE) n.º 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013 e da Directiva 2013/36/UE. 2 De acordo com o artigo n.º 2, al. 3, do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho de 15 de outubro de 2013, são consideradas instituições de crédito as que preenchem os requisitos previstos no artigo 4.º, ponto 1, do Regulamento (UE) n.º 575/2013.

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Garantir a segurança e a solidez do sistema bancário europeu, promover a

integração e a estabilidade financeira da Europa e garantir uma supervisão

coerente, são os três principais objetivos do MUS.

O comissário europeu do Mercado Interno e Serviços Financeiros, Michel

Barnier, afirmou que “com este acordo os países da UE demonstraram que a Europa

é capaz de agir”, considerando que “o supervisor bancário é um elemento

fundamental para a estabilidade da Zona Euro, para além de ser um "grande passo"

em direção à união bancária, o pilar fundamental da nova arquitetura da união

económica e monetária” (Barnier, 2012).

2.1.1. Membros do MUS

Fazem parte do MUS todos os países da Zona Euro. Contudo, países que

optaram por não ter como moeda única o Euro, também podem fazer parte do MUS

e, usufruir da mesma supervisão e proteção que os restantes países da Zona Euro

têm. Para tal, é necessário que as Autoridades Nacionais competentes desse EM

estabeleçam uma cooperação estreita com o BCE.

A aceitação por parte do BCE dessa cooperação estreita com a Autoridade

Nacional do EM, esta sujeita a 3 condições3:

- Em primeiro lugar, o EM tem que notificar os restantes Estados Membros,

a CE, o BCE e o EBA, demonstrando assim a sua vontade de querer se unir ao MUS;

- Em segundo, essa mesma notificação terá que assegurar que a Autoridade

Nacional aceita e respeita todas as orientações ou pedidos emitidos pelo BCE, tal

como, em prol do princípio da transparência, fornecer todas as informações sobre

as suas instituições de crédito, de modo a que se possa avaliar, de forma completa,

as mesmas;

3 Essas três condições estão previstas no artigo 7 n.º 2, al a, b e c, do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 Do Conselho de 15 de outubro de 2013

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- Por fim, o EM terá que legislar de forma a garantir que a sua Autoridade

Nacional competente cumpre com o que lhes é exigido, perante medidas

requeridas pelo BCE.

A decisão é publicada no Jornal Oficial da União Europeia, havendo o prazo

de 14 dias após a sua publicação para ser aplicada (artigo 7 n.º 3 do Regulamento

(UE) N.º 1024/2013 do Conselho).

Darvas e Wolff (2013) defendem que o MUS é o primeiro elemento da UBE,

considerando que, por si só, o mecanismo não pode trazer os benefícios da UBE,

mas pode oferecer uma série de vantagens, tais como promover a integração

financeira, melhorar a supervisão dos bancos transfronteiriços, assegurar uma

maior coerência das práticas de supervisão, aumentar a qualidade da supervisão,

evitar eventuais distorções da concorrência e fornecer informações de supervisão.

Assim, uma melhor supervisão bancária reduziria a probabilidade de falências

bancárias e, por consequência, o custo para os contribuintes.

2.1.2. Poderes de supervisão e investigação

O BCE, no âmbito do MUS, é detentor de poderes de supervisão e de

investigação, sendo importante salientar que, no exercício dos respetivos poderes,

o BCE e as autoridades nacionais competentes devem cooperar estritamente4.

Para o efeito, o BCE, nos termos do artigo 16.º n.º 2 do Regulamento (UE)

N.º 1024/2013 do Conselho, dispõe em especial dos seguintes poderes:

1- “Exigir que as instituições detenham fundos próprios superiores ao

previsto nos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo,

relacionados com os elementos dos riscos e os riscos não cobertos pelos

atos aplicáveis da União;

4 Artigo 9 n.º 2 do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho

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2- Exigir o reforço das disposições, processos, mecanismos e estratégias;

3- Exigir que as instituições apresentem um plano para restabelecer a

conformidade com os requisitos de supervisão por força dos atos a que se

refere o artigo 4.º, n.º 3, primeiro parágrafo, e fixar um prazo para a sua

execução, incluindo melhorias a esse plano no que se refere ao âmbito e ao

prazo;

4- Exigir que as instituições apliquem uma política específica de

constituição de provisões ou de tratamento de ativos em termos de

requisitos de fundos próprios;

5- Restringir ou limitar as atividades, operações ou redes de balcões das

instituições ou solicitar o desinvestimento de atividades que apresentem

riscos excessivos para a solidez de uma instituição;

6- Exigir a redução do risco inerente às atividades, aos produtos e aos

sistemas das instituições;

7- Exigir que as instituições limitem a remuneração variável em termos

de percentagem dos lucros líquidos, quando essa remuneração não seja

consentânea com a manutenção de uma base sólida de fundos próprios;

8- Exigir que as instituições utilizem os lucros líquidos para reforçar a

base de fundos próprios;

9- Limitar ou proibir as distribuições pela instituição aos acionistas,

associados ou detentores de instrumentos de fundos próprios adicionais de

nível 1 (Additional Tier 1) quando a proibição não constitua um caso de

incumprimento da instituição;

10- Impor requisitos de liquidez específicos, incluindo restrições aos

desfasamentos dos prazos de vencimento entre ativos e passivos;

11- Exigir a divulgação de informações adicionais;

12- Destituir a qualquer momento os membros dos órgãos de

administração das instituições de crédito que não cumpram os requisitos

previstos nos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3, primeiro parágrafo.”

Os poderes de investigação atribuídos ao BCE justificam-se pela

necessidade que existe em haver uma supervisão minuciosa às instituições de

crédito, sendo importante que se consiga investigar a fundo todos os

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procedimentos e operações que são realizados por essas instituições. Como tal, o

BCE, ao abrigo do artigo 11 nº 1 do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho,

pode proceder a todas as investigações, que considere necessárias e justificadas,

junto de qualquer pessoa referida no artigo 10.º n.º 1, do mesmo regulamento e as

entidades alvo dessas investigações devem, em prol de uma estreita cooperação,

fornecer ao BCE sempre que lhes é pedido:

1- Documentos exigidos pelo BCE;

2- Livros e registos da instituição alvo da investigação, podendo

inclusive tirar cópia dos mesmos;

3- Explicações orais ou escritas;

4- Cooperação e ajuda na inquirição para recolha de informações que

estejam em conformidade com o objeto da investigação.

Para a realização destas investigações, o BCE pode, nos termos do artigo 13º

do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho, proceder a todas as inspeções

no local que forem necessárias, nas instalações da instituição alvo da investigação.5

Relativamente aos poderes de supervisão do BCE, têm que ser credíveis

para que possam transmitir confiança e segurança a todos os cidadãos que

contribuem para o sistema bancário. Aliás, são os próprios cidadãos que dão o que

é necessário para que o sistema bancário se possa desenvolver, são eles que com o

seu próprio dinheiro, que depositam em contas à ordem, garantem que existe

capital para que um outro cidadão possa requerer um empréstimo ao banco. Em

contrapartida, a supervisão comportamental permanece ligada às relações dos

clientes com as instituições de crédito (Rute Saraiva, 2013). Este tipo de

supervisão visa o respeito, a lealdade, a diligência e a discrição nas relações entre

as instituições de crédito e os clientes.

Como tal, o BCE tem à sua responsabilidade, a função de supervisão

prudencial, direta e indireta.

5 Artigo 12º n.º 1 do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho

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12

O MUS, em prol do supra exposto, atribui ao BCE funções específicas no

âmbito da supervisão microprudencial e macroprudencial.

Em termos de uma supervisão microprudencial, o MUS atribui ao BCE, nos

termos do art.º 4 n.º 1 do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho, as

seguintes funções:

1- “Conceder e revogar a autorização a instituições de crédito, sob

reserva do disposto no artigo 14.º;

2- Relativamente às instituições de crédito estabelecidas num Estado-

Membro participante que pretendam estabelecer uma sucursal ou prestar

serviços transfronteiriços num Estado-Membro não participante, exercer

as atribuições que incumbem à autoridade competente do Estado-Membro

de origem nos termos da legislação aplicável da União;

3- Apreciar as notificações de aquisição e alienação de participações

qualificadas em instituições de crédito, exceto no caso da resolução

bancária e sob reserva do disposto no artigo 15.º;

4- Assegurar o cumprimento dos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3,

primeiro parágrafo, que impõem requisitos prudenciais às instituições de

crédito em matéria de requisitos de fundos próprios, titularização, limites

aos grandes riscos, liquidez, alavancagem financeira, e divulgação pública

de informações sobre essas matérias;

5- Assegurar o cumprimento dos atos a que se refere o artigo 4.o, n.o 3,

primeiro parágrafo, que impõem requisitos às instituições de crédito para

implementarem disposições adequadas em matéria de governo das

sociedades, incluindo requisitos de adequação e de idoneidade das pessoas

responsáveis pela gestão de instituições de crédito, processos de gestão dos

riscos, mecanismos de controlo interno, políticas e práticas de

remuneração, bem como processos internos eficazes de avaliação da

adequação do capital, incluindo modelos baseados nas notações internas

(Método IRB);

6- Efetuar exercícios de revisão e avaliação pelo supervisor, incluindo,

sempre que adequado em coordenação com a EBA, testes de esforço e a

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13

sua eventual divulgação, a fim de determinar se os dispositivos, as

estratégias, os processos e os mecanismos implementados pelas

instituições de crédito e os fundos próprios por elas detidos asseguram

uma boa gestão e cobertura dos seus riscos, e, com base nesse processo de

revisão, impor às instituições de crédito requisitos específicos de fundos

próprios adicionais, requisitos específicos de divulgação de informações,

requisitos específicos de liquidez e outras medidas que à luz da legislação

aplicável da União possam ser adotadas pelas autoridades competentes;

7- Exercer a supervisão em base consolidada das empresas-mãe das

instituições de crédito estabelecidas num dos Estados-Membros

participantes, inclusivamente das companhias financeiras e das

companhias financeiras mistas, e participar na supervisão em base

consolidada, incluindo nos colégios de supervisores, sem prejuízo da

participação das autoridades nacionais competentes nesses colégios como

observadores, no que diz respeito às empresas-mãe não estabelecidas num

Estado-Membro participante;

8- Participar na supervisão complementar de um conglomerado

financeiro em relação às instituições de crédito que dele fazem parte e

assumir as atribuições de coordenação quando o BCE for nomeado

coordenador relativamente a um conglomerado financeiro, de acordo com

os critérios estabelecidos na legislação aplicável da União;

9- Exercer atribuições de supervisão no que respeita aos planos de

recuperação e a uma intervenção precoce quando uma instituição de

crédito ou grupo de que o BCE seja a autoridade responsável pela

supervisão em base consolidada não satisfaz ou está em risco de infringir

os requisitos prudenciais aplicáveis, bem como apenas nos casos

expressamente previstos na legislação aplicável da União relativamente às

autoridades competentes, no que respeita às mudanças estruturais

exigidas às instituições de crédito para prevenir situações de tensão

financeira ou incumprimento, excluindo quaisquer poderes de resolução.”

Porém, a área de compliance, que implica o combate ao financiamento ao

terrorismo e o combate ao branqueamento de capitais, não se encontra protegida

Page 26: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

14

nesta lista, ficando abrangida pelas competências exclusivas das ANC6, tal como

acontece com a proteção de defesa aos consumidores.

Estas áreas são da competência das ANC por um motivo. As atribuições que

são conferidas ao BCE têm que o ser de forma bastante clara, tal como vem

previsto no artigo 127º n.º 6 do TFUE, só podendo estar no âmbito de supervisão

do BCE as “atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à

supervisão prudencial”, ou seja, qualquer uma das atribuições conferidas ao BCE,

no âmbito do MUS, tem que ser especificada para que se possa cumprir com o

princípio da especialidade.

Contudo, para que esta lista de atribuições possa ser cumprida pelo BCE, é

necessário fazer uso do artigo 16.º do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do

Conselho, que prevê o seguinte:

“... são atribuídos ao BCE, nos termos do n.º 2 do presente artigo, poderes para

exigir que as instituições de crédito, companhias financeiras ou companhias

financeiras mistas nos Estados-Membros participantes tomem, numa fase precoce, as

medidas necessárias para solucionar problemas relevantes em qualquer das

seguintes circunstâncias:

a) "A instituição de crédito não satisfaz os requisitos previstos nos atos a

que se refere o artigo 4.º , n.º 3, primeiro parágrafo;

b) O BCE tem provas de que a instituição de crédito está em risco de

infringir nos 12 meses seguintes os requisitos previstos nos atos a que se

refere o artigo 4.º, n.º 3, primeiro parágrafo;

c) No quadro de um processo de supervisão realizado nos termos do

artigo 4.º, n.º 1, alínea f), ficou determinado que os dispositivos, as

estratégias, os processos e os mecanismos implementados pela instituição

de crédito e os fundos próprios e liquidez por elas detidos não asseguram

uma boa gestão e cobertura dos seus riscos.”

6 Artigo 28.º do Regulamento (UE) N.º 1024/2013 do Conselho

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15

2.2. Mecanismo Único de Resolução - MUR

O MUR “visa assegurar a resolução ordenada dos bancos em situação de

insolvência com custos mínimos para os contribuintes e para a económica real”7.

Wyplosz (2012) argumenta que é pior existir uma União Bancária parcial do que

não existir, uma vez que sem autoridade de resolução, o BCE não será capaz de

injetar liquidez no sistema.

Resulta da necessidade de criação de um mecanismo capaz de refletir um

modelo padrão, para a regulação e funcionamento da resolução, ao nível de todos

os Estados-Membros, e não membros, desde que também nele queiram participar.

Ellís Ferran, professora de Company and Securities Law, da Universidade de

Cambridge desde 2005, afirmou que o conjunto de medidas existentes para

combater eventuais crises bancárias, “é um processo especializado para lidar com

bancos em dificuldades. É uma alternativa aos tradicionais regimes de insolvência.

Os regimes de resolução são vistos como parte essencial dos mecanismos de

regulação financeira, em virtude de serem construídos especificamente em função

das características dos diversos agentes financeiros em questão”.

Como tal, em conformidade com esse conjunto de medidas, foi criado o

Regulamento do MUR (806/2014). Este Regulamento uniformiza e consagra as

regras para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de

investimento. Foi também criada a Diretiva da Recuperação e Resolução Bancária

(Directiva 2014/59/EU de 15 de Maio), que visa estabelecer o elo de ligação entre

o MUR e o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.

O MUR resulta de um complexo conjunto de princípios, procedimentos e

requisitos, resultando numa aplicação de regras que variam de acordo com o caso

em questão e com a entidade responsável pela resolução.

7 Banco de Portugal https://www.bportugal.pt/page/mecanismo-unico-de-resolucao

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16

Os objetivos da resolução encontram-se consagrados no artigo 31.º n.º 2 do

BRRD:

1- “Assegurar a continuidade das funções críticas;

2- Evitar efeitos negativos significativos na estabilidade financeira,

nomeadamente evitando o contágio, inclusive das infraestruturas de

mercado, e mantendo a disciplina do mercado;

3- Proteger as finanças públicas, limitando o recurso a apoios financeiros

públicos extraordinários;

4- Proteger os depositantes abrangidos pela Diretiva 2014/49/UE e os

investidores abrangidos pela Diretiva 97/9/CE;

5- Proteger os fundos e ativos dos clientes.”

O primeiro objetivo encontra a definição de “funções críticas” no artigo 2.º

n.º 35 do BRRD, como sendo “atividades, serviços ou operações cuja interrupção

pode dar origem (...) à perturbação de serviços essenciais para a economia real ou

perturbar a estabilidade financeira devido à dimensão (...) de uma instituição ou

grupo (...).”

Enquanto o terceiro objetivo pretende evitar futuras injeções de capital por

entidades públicas (bailout), em casos de falência.

A salvaguarda e garantia da continuidade de funções críticas por uma parte

da instituição de crédito encontram-se elencadas entre os objetivos de resolução.

Esta medida reflete o que se poderia ter sido evitado no caso Lehman Brothers8.

8 Como diz GORDON, Jeffrey & RINGE, Wolf-Gerog, “para usar o exemplo do Lehman Brothers, num “mundo” em que um SPE (Single Point Entry resolution) existe, o Lehman do Reino Unido nunca enfrentaria os procedimentos de insolvência britânicos, pois o FDIC (Federal Deposit Insurance Company) asseguraria a sua solvência e liquidação”, em GORDON, Jeffrey & RINGE, Wolg-Georg, Banck Resolution in Europe, The Unfinished Agenda of Structural Reform, European Banking Union, Oxford Univertity Press, 2015, p.517.

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17

Jens-Hinrich Binder estabelece dois aspetos importantes, o primeiro de

prevenir o contágio, o segundo, de garantir que existe uma verificação de

manutenção da disciplina de mercado9.

Contudo, existem condições e requisitos que se têm que respeitar para que

se possa proceder à resolução. Estas condições encontram-se tipificadas nos

artigos 32.º n.º 1 do BRRD e 18.º n.º 1 do Regulamento (Guilherme Martins e Tiago

Fernandes, 2017):

1- É necessário que a entidade em causa se encontre em situação ou

risco de insolvência;

2- Não exista nenhuma perspetiva razoável de uma ação alternativa;

3- A resolução tem que ir ao encontro do interesse público10.

Relativamente aos princípios essenciais, estes vêm estabelecidos nos

artigos 32.º do BRRD e 15º do Regulamento que estabelece “os princípios gerais

que regem a resolução” (Guilherme Martins e Tiago Fernandes, 2017):

1- Os acionistas da instituição objeto de resolução são os primeiros a

suportar perdas;

2- Os credores da instituição objeto de resolução suportam perdas a

seguir aos acionistas, em conformidade com a ordem de prioridade dos

créditos, nos termos do artigo 17.º, salvo disposição expressa em

contrário no presente regulamento;

3- O órgão de administração e a direção de topo da instituição objeto de

resolução são substituídos, exceto nos casos em que a manutenção do

órgão de administração e da direção de topo, no todo ou em parte, de

acordo com as circunstâncias, é considerada necessária para a realização

dos objetivos da resolução;

9 BINDER, Jens-Hinrich (Ed), Resolution: Concepts, Requirements, and Tools Bank Resolution: The European Regime, Oxford University Press, 2016, p.42 10 Entenda-se por interesse público o consagrado no artigo 18.º n.º 5 do Regulamento e artigo 32º do BRRD.

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18

4- O órgão de administração e a direção de topo da instituição objeto de

resolução prestam toda a assistência necessária para a consecução dos

objetivos da resolução;

5- As pessoas singulares e coletivas respondem, nos termos do direito

civil ou penal nacional, pela sua responsabilidade na situação de

insolvência da instituição objeto de resolução;

6- Salvo disposição em contrário no presente regulamento, os credores

da mesma categoria são tratados de forma equitativa;

7- Nenhum credor deve suportar perdas mais elevadas do que teria tido

de incorrer se a entidade referida no artigo 2.º tivesse sido liquidada ao

abrigo de um processo normal de insolvência, de acordo com as

salvaguardas previstas no artigo 29.º;

8- Os depósitos cobertos são inteiramente protegidos;

9- A medida de resolução é adotada de acordo com as salvaguardas

previstas no presente regulamento.

No caso de já não haver outros procedimentos possíveis, nem condições

para o exercício da atividade por parte da instituição em causa, deverá ser aplicado

o estipulado no artigo 37.º n.º 3 da Diretiva:

1- Alienação de atividade;

2- Criação de uma instituição de transição;

3- Segregação de ativos;

4- Recapitalização interna, ou seja, Bail-in.

Na primeira medida, a alienação de atividade vem estipulada no artigo 23º

do Regulamento, “alienação de instrumentos de propriedade emitidos por uma

instituição ou da totalidade ou parte de ativos, direitos ou passivos da instituição em

causa”. João Freitas, numa publicação para o Relatório de Estabilidade Financeira

do Banco de Portugal, estabelece o seguinte: “Esta medida compreende a atribuição,

à autoridade de resolução, de poderes para decidir e executar a alienação do capital

ou do património da instituição em desequilíbrio, independentemente da vontade dos

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19

acionistas, dos credores ou dos clientes da instituição. A alienação a uma ou mais

instituições autorizadas permitirá que seja assegurada a continuidade dos serviços

financeiros prestados pela instituição que se encontra em desequilíbrio, nos casos em

que esses serviços sejam abrangidos pela transferência. Na medida em que a

alienação inclua a transferência de passivos da instituição em desequilíbrio, os

respetivos credores serão também protegidos, passando a ser titulares de um direito

de crédito sobre a instituição adquirente.”11

Fica assim assegurada a continuidade dos serviços financeiros prestados

pela instituição em causa, visando como tal, a salvaguarda dos interesses do

próprio consumidor.

A Segunda medida visa criar um banco de transição, dependendo essa

vontade apenas da autoridade de resolução do EM. É a própria autoridade de

resolução que cria o banco de transição, o seu controlo estará sempre à sua

responsabilidade.12

Relativamente à segregação de ativos, esta vem definida pelo artigo 25.º do

Regulamento e artigo 40.º do BRRD, “ativos direitos ou passivos de uma instituição

objeto de resolução ou de uma instituição de transição para um ou mais veículos de

gestão de ativos”. Esta medida tem como objetivo a obtenção, ou maximização, do

valor pelo qual a venda é realizada, ou pelo valor da liquidação do património da

instituição em causa. Pelo que, se percebe desde logo que esta medida não tem por

base assegurar a continuação de determinada atividade por parte da instituição.

Em relação à última medida, o “bail-in” vem previsto no artigo 27º do

Regulamento e artigo 43º do BRRD. Esta medida é, na realidade, um instrumento

para a absorção de perdas que levaram a que essa instituição entrasse em graves

dificuldades financeiras. O “bail-in” pode ainda ser utilizado em conjunto com as

outras medidas, no sentido em que facilita a divisão de encargos da resolução entre

os seus credores.

11 FREITAS, João, Um mecanismo de resolução para a União Bancária: Fundamentos e configuração, Relatório de Estabilidade Financeira, Banco de Portugal, Maio de 2014 p.99. 12 Artigo 25.º do Regulamento e artigo 40º do BRRD

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20

O MUS atua em conjunto com as autoridades nacionais dos Estados-

Membros e com o CUR.

O Conselho Único de Resolução (CUR) é uma instituição da EU que consiste

num comité supranacional, tendo por objetivo garantir uma abordagem uniforme e

coerente nas ações de resolução. O CUR é ainda responsável pelo funcionamento e

condições de aplicação do MUS13.

É também o responsável por todo o planeamento e resolução das

instituições que são alvo do MUS pelo BCE.

Em concordância com o estipulado nos artigos 26º, 53º e 54º do

Regulamento, as competências em sessão executiva do CUR iniciam-se quando

uma instituição em situação de colapso financeiro é identificada pelo BCE e,

consequentemente, essa instituição é comunicada ao CUR que, por sua vez, dará

então início a essa sessão executiva, onde irá tentar encontrar uma solução de cariz

privado para essa instituição.

Existem depois duas opções que podem ser tomadas no caso de não ser

encontrada uma solução de cariz privado, sendo para tal necessário averiguar se a

resolução da instituição será do interesse público. Se assim o for, será adotado um

plano de resolução14 previamente definido pelo CUR, com as medidas de resolução

possíveis de ser utilizadas e com a indicação se existe a possibilidade de vir a

recorrer ao FUR.

Neste projeto de elaboração de um plano de resolução, o CUR pode pedir

que as autoridades nacionais de resolução apresentem projetos de planos de

resolução, com as orientações e instruções dadas pelo CUR.

Por fim, e após a elaboração dos planos de resolução, nos termos do artigo

8º do Regulamento, cabe ao CUR avaliar as condições perante as quais as

13 Conforme o artigo 42º do Regulamento relativo ao estatuto jurídico do CUR. 14 Relativamente ao plano de resolução, é necessário recorrer ao artigo 8.º do Regulamento

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21

instituições podem ser objeto de resolução, tal como consta do artigo 10º do

Regulamento e artigo 15º do BRDD. Pelo que, o número 3 desse artigo esclarece

que uma instituição é “considerada suscetível de resolução se for exequível e credível

para o CUR proceder à sua liquidação ao abrigo dos processos normais de insolvência

e credível para o CUR proceder À sua liquidação ao abrigo dos processos normais de

insolvência ou à sua resolução através da aplicação de instrumentos de resolução,

evitando ao mesmo tempo, na máxima medida do possível, quaisquer consequências

adversas significativas para os sistemas financeiros dos Estados-Membros (...) ”

A Comissão tem aqui um papel importante e decisivo. Nos termos do artigo

24º “só as instituições da União podem estabelecer a política de resolução da União e

que subsiste numa margem de poder discricionário na adoção de cada programa

específico de resolução, é necessário prever o envolvimento adequado do Conselho e

da Comissão como instituições que podem exercer competências de execução nos

termos do artigo 291º do TFUE”, ou seja, a Comissão avalia os aspetos da decisão

tomada pelo CUR. A Comissão tem um prazo de 24 horas para dar o seu parecer.

Através do parecer da Comissão, três hipóteses podem suceder:

1- O programa é prontamente aprovado e o plano de resolução entra

em vigor;

2- São apontadas objeções ao nível de elementos discricionários do

programa, tendo o CUR um prazo de 8 horas para proceder às alterações

com vista à aprovação daqueles;

3- São colocadas objeções a nível de interesse público ou relativas à

utilização do FUR. Neste caso, existe uma reunião do Conselho da União

Europeia que, no prazo de 12 horas decide, sempre por maioria simples,

se as objeções são rejeitadas ou aprovadas. Caso contrário, o plano de

resolução entrará em Acão.

Resta salientar que o artigo 30º do Regulamento estabelece uma “obrigação

de cooperação e intercâmbio de informações no âmbito do MUR”. Esta obrigação

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22

resulta da natureza sensível de toda esta operação, envolvendo um bom

entendimento e funcionamento entre as diferentes entidades envolvidas no

procedimento de resolução.

2.2.1. Fundo Único de Resolução - FUR

O FUR vem previsto nos artigos 67.º e ss. do regulamento. Foi criado com o

intuito de ser necessário recorrer à utilização de meios de financiamento externos,

no caso dos recursos internos da instituição em causa não sejam suficientes.

Como tal, este fundo tem que ser financiado, estabelecendo os artigos 40º e

67º do Regulamento o seguinte: “o funcionamento do MUR deverá ser financiado

por contribuições pagas pelas instituições estabelecidas nos Estados-Membros

participantes”. Ou seja, as contribuições das instituições de crédito são as

principais fontes de financiamento do fundo.

Essas contribuições são executadas tendo como base acordos nacionais de

financiamentos, de acordo com o artigo 67º e artigo 68º do regulamento. Cada

Estado-Membro deve formar um fundo de resolução de modo a prestar auxílio

financeiro na aplicação de medidas de resolução.

Essas contribuições podem ser ex ante e ex post, dependendo da existência

ou não de fundos suficientes para cobrir os gastos decorrentes da utilização do

Fundo.15

Pode ainda existir auxílio estatal. Esse auxílio tem de ser conforme com o

artigo 107º do TFUE, no que diz respeito à sua compatibilidade com os mercados

internos, e o Regulamento não permite que façam parte do esquema de resolução

se não tiverem primeiro a aprovação da CE.

15 Artigos 70º e 71º Regulamento e artigos 103º e 104º do BRRD.

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23

2.2.2. Relação entre o Conselho Único de Resolução (CUR) e o Banco de Portugal

José Manuel Quelhas afirma que, “até Fevereiro de 2012, a inviabilidade de

um banco implicava a sua entrada em liquidação ou a sua nacionalização; a

primeira consequência provocaria efeitos diruptivos sistémicos e a segunda

oneraria as finanças públicas”16

O MUS é uma entidade que tem que lidar com diversas instituições

submetidas à sua supervisão e, como tal, existe uma preocupação em que haja um

tratamento uniforme dessas mesmas instituições. Para esse efeito, é atribuído um

papel fundamental a cada uma das autoridades nacionais de supervisão, no caso de

Portugal, ao BP.

A obrigação de cooperação e intercâmbio de informações entre o MUS e o

BP vem prevista no artigo 30º n.º1 do regulamento. O número 2 desse artigo exige

ainda que “no exercício das respetivas responsabilidades no âmbito do presente

regulamento, o CUR, o Conselho, a Comissão, o BCE e as autoridades nacionais de

resolução, na intervenção precoce e nas diferentes fases de resolução, em

conformidade com os artigos 8º a 29º devem fornecer uns aos outros todas as

informações necessárias para o exercício das suas funções”, existindo ainda a

possibilidade de celebração de um memorando de entendimento entre o CUR, o

BCE e as autoridades nacionais de resolução.

16 QUELHAS, José Manuel, “Especificamente e vicissitudes do mecanismo de resolução bancária em Portugal: Do memorando de Entendimento de 2011 à Directiva 2014/59/EU e ao Regulamento” 806/2014, Boletim de Ciências Económicas, Homenagem ao Professor Doutor José Avelãs Nunes, Vol. LVII, 2014, Coimbra Editora.

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24

2.2.3. Aplicação do MUR

As autoridades nacionais de resolução são responsáveis pela elaboração e

adoção dos planos de resolução às entidades e grupos que não sejam da

responsabilidade do CUR, conforme os artigos 7º n.º 2, nº4 alínea b) e n.º 5 do

regulamento. Estes casos consideram as instituições de crédito em causa como

“menos significativas”17.

Neste sentido, a autoridade nacional de resolução deve adotar um plano de

resolução e avaliar a resolubilidade da instituição. O BP, autoridade nacional de

resolução competente no caso de Portugal, deve prever, no plano de resolução, as

opções para a aplicação dos instrumentos, os exercícios dos poderes de resolução e

deve manter a previsão sobre as medidas de resolução que podem ser aplicadas à

instituição, cujas condições para desencadear a resolução se encontram

verificadas.

Segue-se o previsto no artigo 10º do Regulamento, a avaliação da

resolubilidade. O n.º 3 desse artigo estipula “uma entidade é considerada suscetível

de resolução se for exequível e credível para o CUR (no presente caso BP) proceder à

sua liquidação ao abrigo dos processos normais de insolvência ou à sua resolução

através da aplicação dos instrumentos e do exercício de poderes de resolução,

evitando ao mesmo tempo, na máxima medida do possível, quaisquer consequências

adversas significativas para os sistemas financeiros”.

Relativamente à avaliação, o procedimento estabelecido pelo BRRD e

transposto para o RGICSF, vem previsto no artigo 145º-H e estabelece como

finalidades:

17 Entende-se por uma instituição de crédito “menos significativa” quando se recorre aos critérios previstos no primeiro parágrafo do art 6.º n.º 4 do Regulamento (EU) nº 1024/2013.

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25

1- “assegurar que todos os prejuízos da instituição em causa (...) estejam

plenamente reconhecidos nas suas contas quando sejam aplicadas

medidas de resolução

2- sustentar a fundamentação da decisão do Banco de Portugal quanto

aos seguintes aspetos (...)18”

Uma vez realizada a avaliação, o BP pode adotar as medidas durante a

intervenção precoce, utilizando o disposto no artigo 13º do Regulamento, e pode

ainda aplicar obrigações simplificativas ou até mesmo isentar da obrigação de

elaborar um plano de resolução, nos termos do artigo 11º do Regulamento.

2.3. Sistema de Garantia de Depósitos Bancários - SGDB

Um sistema capaz de proteger depósitos até um certo valor foi um dos

principais objetivos da criação da UBE, tendo inclusive se tornado no seu terceiro

pilar. Nem todos os Estados-Membros estão de acordo quanto ao caminho que

deve nortear o SGDB, porém, existe uma concordância total que a sua criação e

utilização constituem uma das maiores mais-valias da UBE.

Este sistema protege os depósitos em caso de falência do banco através do

reembolso desses depósitos, até um certo limite (Avaro e Sterdyniak, 2013)

O SGDB é regido através da Diretiva 2014/49/EU do Parlamento Europeu e

do Conselho de 16 de abril de 2014, que veio proceder às alterações da Diretiva

94/19/CE, reformulando o seu texto legal na íntegra.

A Diretiva 2014/49/ EU realça que: “A presente diretiva constitui um

instrumento essencial para a realização do mercado interno na ótica tanto da

18 Os aspetos encontram-se previstos nos pontos decorrentes da alínea.

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26

liberdade de estabelecimento como da liberdade de prestação de serviços financeiros

no setor das instituições de crédito, reforçando simultaneamente a estabilidade do

sistema bancário e a proteção dos depositantes. Tendo em conta os custos da

insolvência de uma instituição de crédito para a economia no seu conjunto e o seu

impacto negativo na estabilidade financeira e na confiança dos depositantes, é

conveniente não só prever o reembolso dos depositantes, mas também permitir uma

flexibilidade suficiente dos Estados-Membros para que os SGD19 possam pôr em

prática medidas que reduzam a probabilidade de futuros créditos sobre os SGD. Essas

medidas deverão sempre respeitar as regras em matéria de auxílios estatais20.”

2.3.1. Objetivos

Os três grandes objetivos do SGDB, tendo por base o excerto supra, são os

seguintes21:

1- Harmonizar a proteção dos depósitos em toda a EU;

2- Prevenir os levantamentos motivados pelo pânico (ou corrida

aos bancos) nos casos em que um banco deixe de ser viável;

3- Contribuir para a estabilidade financeira geral no mercado

único.

De acordo com o Comissário responsável pelo Mercado Interno e Serviços –

Michael Barnier – “O objetivo final é pôr um travão à utilização do dinheiro dos

contribuintes para salvar os bancos.” (União Europeia. Comissão Europeia, 2012)

19 Sistemas de Garantias de Depósitos, segundo a definição dada pelo Banco de Portugal, são: “sistemas existentes em cada Estado-Membro que reembolsam os depositantes (até um certo limite) em caso de insolvência do seu banco e de indisponibilidade dos depósitos.” 20 Diretiva “2014/49/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 16 de abril de 2014 relativa aos sistemas de garantia de depósitos. 21 Banco de Portugal, http://www.consilium.europa.eu/pt/policies/banking-union/single-rulebook/deposit-guarantee-schemes/

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27

No primeiro objetivo, é de realçar a importância que o SGDB impõe na UBE.

Em toda a EU existem diferentes tipos de sistemas de garantias de depósitos (SGD),

todos eles com características muito diferentes uns dos outros.

Impõe-se como tal, a necessidade de harmonizar os mecanismos para que

se possa nivelar, de igual forma, a proteção dada a todos os depósitos,

independentemente do SGD a que estão associados no seu Estado-Membro.

Este objetivo não é apenas importante para a segurança dos depósitos, mas

também para a próprio acesso à atividade das instituições de crédito e o seu

exercício fica agora mais fácil, uma vez que foram eliminadas certas diferenças

entre as legislações dos Estados-Membros, no que se refere às regras em matéria

de SGD, harmonizando-se assim as regras relativas à garantia de depósitos

(Dionísio, 2014).

O segundo objetivo visa, claramente, reduzir o efeito sistémico no sistema

bancário. Durante a mais recente crise bancária, houve um aumento enorme e

descoordenado, de levantamento de depósitos por parte dos depositantes. De

modo geral, as pessoas deixaram de ter confiança no sistema bancário, dado que

não havia indícios ou garantias de que os depósitos estivessem seguros nas

instituições de crédito.

Os depositantes beneficiam, através desta diretiva, de um acesso bastante

melhorado aos SGD, graças não só a uma redução dos prazos de reembolso, como

também a uma cobertura mais alargada e clarificada e, para além disso, a um

reforço de informação e a sólidos requisitos de financiamento.

Por fim, relativamente ao terceiro objetivo, é importante realçar o que a

Diretiva 2014/49/UE, no seu preâmbulo, explica: “Durante a recente crise

financeira, o aumento descoordenado dos níveis de cobertura na União levou, em

certos casos, a que os depositantes transferissem o seu dinheiro para instituições de

crédito em países que garantiam montantes de depósitos mais elevados. Este

aumento descoordenado reduziu a liquidez de algumas instituições de crédito num

período de dificuldades. Em períodos de estabilidade, a existência de diferentes níveis

de cobertura poderá levar os depositantes a escolherem a maior proteção dos seus

depósitos, em detrimento dos produtos de depósito mais adequados para cada um

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28

deles. Estes diferentes níveis de cobertura poderão resultar em distorções da

concorrência no mercado interno. Por conseguinte, é necessário assegurar um nível

harmonizado de proteção dos depósitos por parte de todos os SGD reconhecidos,

independentemente da sua localização na União. No entanto, por um período

limitado, certos depósitos ligados à situação pessoal dos depositantes deverão poder

beneficiar de um nível mais elevado de cobertura.22”

2.3.2. Quem financia

Em termos gerais, qualquer banco presente num Estado-Membro é

obrigado a fazer parte do SGDB, cabendo ao Estado-Membro em questão

identificar a autoridade administrativa com competência nacional, ou seja, o seu

SGD23.

É da responsabilidade dos Estados-Membros “assegurarem que os SGD

disponham de mecanismos adequados para determinarem as suas responsabilidades

potenciais.24”, de modo que os Estados-Membros consigam assegurar que, até 3 de

julho de 2024, os recursos financeiros à disposição de um SGD atinjam no mínimo

um nível-alvo de 0,8% do montante dos depósitos cobertos dos seus membros.

Caso o financiamento fique aquém do nível-alvo, será necessário utilizar o disposto

no artigo 10º n.º 2 da Diretiva 2014/49/UE e retomar o pagamento das

contribuições até que o nível-alvo seja atingido.

Para que se possa então atingir o nível-alvo, os Estados-Membros podem

incluir, nos seus meios de financiamento disponíveis, compromissos de

pagamento25.

22 Diretiva “2014/49/EU do Parlamento Europeu e do Conselho de 16 de abril de 2014 relativa aos sistemas de garantia de depósitos, (19). 23 Artigo 3º n.º 1 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de Abril de 2014. 24 Artigo 10º n.º 1 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de Abril de 2014. 25 Artigo 10.º n.º 3 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de Abril de 2014, onde ainda se acrescenta: “A percentagem total de compromisso de pagamento não pode exceder 30% do montante total dos recursos financeiros disponíveis obtidos nos termos do presente artigo”.

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29

O n.º 10 do Artigo 4º da Diretiva prevê que os Estados-Membros assegurem

que os SGD realizem regularmente testes de esforço dos seus mecanismos. No caso

de haver algum problema detetado numa instituição de créditos, que torne

provável o acionamento dos SGD, estes têm que ser informados o mais

rapidamente possível.

Estes testes são efetuados pelos menos de três em três anos, podendo ser

com mais frequência, caso seja necessário.

2.3.3. Como funciona.

Os Estados-Membros são obrigados, nos termos do artigo 6º n.º 1 da

Diretiva 2014/49/UE, a assegurarem um montante mínimo garantido nos

depósitos, que se fixam no valor de 100 000 EUR.

Porém, existem certos depósitos cuja proteção excede o valor supra, por um

período mínimo de três meses e um máximo de 12 meses26:

1- “Depósitos decorrentes de transações imobiliárias relacionadas com

propriedades residenciais privadas;

2- Depósitos com objetivos sociais definidos no direito nacional,

associados a determinados acontecimentos da vida do depositante,

nomeadamente casamento, divórcio, aposentação, despedimento,

despedimento por extinção do posto de trabalho, invalidez ou morte;

3- Depósitos com objetivos definidos no direito nacional, baseados no

pagamento de prestações de seguros ou de indemnizações por atos de

violência ou condenação indevida.”

26 Artigo 6º n.º 2 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de abril de 2014.

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30

Os SGD estão obrigados a assegurar que o montante reembolsável esteja

disponível no prazo de sete dias úteis, a contar da data em que as autoridades

administrativas procedam à determinação a que se refere o artigo 2º nº1 ponto 8,

alínea a) da Diretiva, ou então, quando a autoridade judicial proferir a decisão a

que se refere o mesmo artigo na sua alínea b)27.

Contudo, nos termos do nº 2 do artigo 8º da Diretiva, podem os Estados-

Membros, apenas durante o período de transição com termo a 31 de dezembro de

2013, regerem-se pelos seguintes prazos de reembolso:

a) “20 Dias úteis, até 31 de dezembro de 2018;

b) 15 Dias úteis, de 1 de janeiro de 2019 a 31 de dezembro de 2020;

c) 10 Dias úteis, de 1 de janeiro de 2021 a 31 de dezembro de 2023.”

Como o período de transição apenas termina a 31 de dezembro de 2023, no

caso de não se conseguir disponibilizar o montante reembolsável no prazo de sete

dias, os SGD têm a obrigação de garantir que os depositantes tenham acesso, no

prazo de cinco dias, a um montante adequado dos seus depósitos, a fim de fazerem

face ao custo de vida28. O valor do montante adequado irá ser deduzido no

montante total reembolsável.

Os reembolsos supra, podem ser diferidos nos seguintes casos29:

1- “Se desconheça se a pessoa em questão tem direito a receber o

reembolso ou se o depósito é objeto de litígio;

2- O depósito esteja sujeito a medidas restritivas impostas por governos

nacionais ou por organismos internacionais;

3- Em derrogação do n.º 9, não se tenham registado operações relativas

ao depósito nos últimos 24 meses;

4- O montante do reembolso seja considerado como parte de um saldo

temporariamente elevado, na aceção do artigo 6º n. º2, ou;

27 Artigo 8.º n.º 1 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de abril de 2014. 28 Artigo 8.º n.º 4 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de abril de 2014. 29 Artigo 8º nº 5 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de abril de 2014.

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31

5- O montante do reembolso seja pago pelo SGD do Estado-Membro de

acolhimento nos termos do artigo 14º nº2.”

O montante reembolsável fica disponível sem haver necessidade de

apresentar um pedido ao SGD competente. Basta apenas que a instituição de

crédito comunique as informações necessárias que lhe forem solicitadas pelo

SGD30.

É importante, para que este mecanismo atue na perfeição, que os

depositantes tenham os conhecimentos e as informações do que devem fazer, caso

tenham que ser reembolsados. Como tal, os Estados-Membros asseguram que as

instituições de crédito disponibilizem aos seus depositantes, e aos potenciais

depositantes futuros, as informações necessárias para a identificação do SGD, de

que a instituição em causa, e as suas sucursais, são membros na União31.

Estas informações deverão ser prestadas aos depositantes antes da

celebração do depósito, tal como consta do artigo 16º n.º 2 da Diretiva.

30 Artigo 8.º n.º 6 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de abril de 2014. 31 Artigo 16.º n.º1 da Diretiva 2014/49/UE de 16 de abril de 2014.

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32

3. UBE e a Europa

3.1. A crise Europeia

De todas as crises financeiras e económicas alguma vez sentidas, nenhuma

delas chegou ao patamar da crise que se abateu sobre o mundo no ano de 2008. Foi

de facto uma crise que se desenvolveu silenciosamente e talvez devido a esta

característica se possa justificar o grande impacto que teve nos mercados a uma

escala global.

A UE, como instituição importante na economia global, foi um dos maiores

prejudicados pela crise de 2008. Tanto a nível financeiro e económico, como

também a nível social e político. Houve instituições de créditos a serem forçadas a

abrir insolvência, Estados-Membros com dívidas públicas a triplicarem, a

percentagem de desempregados subiu a pico e surgiu uma instabilidade bastante

acentuada a nível político, que se traduziu em diversos métodos, ou caminhos,

utilizados para se fazer face a esta crise.

O início desta poderosa crise teve os seus alicerces nos Estados Unidos da

América, onde um dos maiores bancos de investimento, Lehman Brothers, foi

obrigado a abrir falência. Isto conjugou-se com o colapso da maior companhia de

seguros do Mundo, a AIG. A queda destas duas poderosas instituições despertou o

início de uma crise, cuja origem só agora foi possível perceber e entender.

Depois da crise da Grande Depressão, os EUA viveram 40 anos sem uma

única crise financeira e com crescimento económico. Este tempo de auge

económico dos EUA ficou a dever-se aos seguintes fatores:

• Os bancos eram, na sua maioria, empresas locais

• Era proibido especular com as poupanças dos clientes

Page 45: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

33

• Os bancos de investimento, que transacionavam ações e obrigações,

eram sociedades pequenas e privadas, onde os sócios entravam com o

seu próprio dinheiro.

Para que se perceba as diferenças existentes entre o sistema bancário

tradicional e o sistema bancário moderno, é necessário comparar um banco nos

anos 70 com um banco no presente ano.

Tabela 1: Evolução dos números do Banco Morgan Stanley

N º d e

F u n c i o n á r i o s

N º d e

e s c r i t ó r i o s

C a p i t a l

A n o 1 9 7 2 1 1 0 1 1 2 $ M i l h õ e s

A n o c o r r e n t e 5 0 . 0 0 0 , 0 0 V á r i o s e m t o d o

o M u n d o .

M i l h a r e s d e

m i l h õ e s d e

E u r o s

Como se pode constatar, houve um enorme crescimento dos bancos de

investimento, não foi apenas o Morgan Stanley que cresceu e se espalhou pelo

Mundo, todos os outros bancos de investimento assim o fizeram.

O motivo, pelo qual estas instituições cresceram e se tornaram influentes

nos mercados, reside nas alterações legislativas que ocorreram nos EUA e que

permitiram o fasto e rápido crescimento dos bancos. Foi no mandato do Presidente

Ronald Reagan que se abriu o caminho para a desregulação financeira, permitindo

que as instituições de crédito fossem autorizadas a investir com o dinheiro dos

depósitos dos seus clientes. Isto deu margem a que esses investimentos

apresentassem uma taxa de risco bastante elevada comparativamente com as taxas

utilizadas antes da desregulação.

Além dos investimentos de risco com dinheiro dos depósitos, foi dada

permissão a que ocorressem fusões entre os bancos e companhias de seguros. Foi

Page 46: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

34

nestes moldes que nasceu a Citigroup, surgindo assim a maior companhia de

serviços financeiros do mundo. A partir desde momento começaram a surgir as

grandes instituições financeiras, muitas delas criadas pela fusão de várias

entidades de crédito que, na altura, sozinhas, não seriam capazes de se impor no

mercado.

Com o crescimento das instituições financeiras e com a ajuda das fusões das

mesmas, foram nascendo firmas gigantescas, de dimensão enorme, em que a queda

de uma, podia ameaçar todo o sistema, tal como veio a acontecer com o Lehman

Brothers.

A falta de regulação, que terá originado estas fusões e este crescimento

exponencial das instituições financeiras, não foi o único motivo existente para

justificar a crise. Houve outros fatores que se juntaram entre si para tornar ainda

mais instáveis os mercados financeiros, tais como:

• Falta de supervisão

• Inovação tecnológica

• Criação de novos produtos financeiros

A falta de supervisão deixou espaço de manobra para que as instituições de

crédito pudessem realizar lavagens de dinheiro, enganar clientes e até mesmo

falsificar a contabilidade32.

A inovação tecnológica veio a par com a criação dos novos produtos

financeiros. Através da internet, começou a ser possível subscrever produtos

financeiros e a comprar-vender ações nos mercados. Foi inclusive, criado um novo

tipo de produto financeiro que veio, na altura, revolucionar as oscilações dos

mercados, os produtos derivados. Foram como uma espécie de mina para muitos

agentes financeiros, porém, foram também um grande impulsionador para que o

mercado caísse na especulação e na crise.

32 Exemplos: J. P. Morgan caso de suborno em Alabama; Riggs bank lavou dinheiro para o ditador chileno August Pinochet; Credit Suiss lavou dinheiro ao Irão violando sanções impostas pelo EUA.

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35

Estes produtos derivados não foram regulados, tiveram a sua explosão no

ano 2000, onde também começaram a nascer novos produtos tendo como base os

derivados, tudo por conta da falta de regulamentação destes produtos33.

Como refere Coeuré (2013), a falência do Lehman Brothers propagou a crise

financeira até à Zona Euro por vários motivos.

Vítor Constâncio (2013) afirma que os Estados-Membros da Zona Euro

foram afetados pela crise mundial devido a 2 fatores:

• O número de bancos na Zona Euro demasiado expostos aos

mercados financeiros dos EUA.

• Quando a revalorização do risco desencadeado pela crise dos

subprime dos EUA se materializou, houve diversas consequências

adversas para a estabilidade financeira local desses Estados-Membros.

Por fim, na sequência da crise de 2008, ficou ainda evidente a espiral de

contágio que o risco bancário transmite para a dívida pública, ficando clara a

existência de uma dependência entre os Estados e a Banca (doom loop, diabolic

loop) (Paulo Camara, 2015). Foram acumulados grandes desequilíbrios no sistema

bancário europeu, que apenas se conseguiram ajustar, aos poucos, graças à atuação

dos Estados. Um exemplo claro da ajuda que os Estados prestaram aos bancos,

foram as garantias que os governos nacionais prestam aos mesmos em situação de

insolvência. Angeloni et al (2012) explica que os bancos emitem títulos de dívida

que os Estados autorizam e garantem, permitindo assim aos bancos a possibilidade

de encararem os seus credores com mais confiança e segurança, uma vez que o

Estado tem que dar cobertura a essas garantias.

33 Na altura, foram muitas as tentativas de regulação dos derivados, contudo, a pressão e o lóbi das grandes instituições de crédito acabaram por não deixar que as mesmas fossem devidamente reguladas e controladas.

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36

3.2. Confronto entre exemplos Americanos e Europeus

É importante termos como exemplo Daniel Gros e Ansgar Belke (2015) que

comparam os vários países europeus com Estados dos EUA, na forma como agiram

após a crise, e os resultados obtidos por ambos.

Essa comparação foi feita entre Irlanda e Nevada, Espanha e Florida, Letónia

e Nevada. Tanto a Irlanda como a Espanha faziam, e continuam a fazer, parte da

Zona Euro, enquanto a Letónia durante a crise não pertencia a essa zona. Contudo,

o seu sistema bancário era composto maioritariamente por bancos dos países

Nórdicos, pertencentes à Zona Euro, e contava com a proteção e segurança da

união bancária nórdica.

Os gráficos apresentados foram elaborados consoante os dados recolhidos

no artigo “Banking Union as a Shock Absorber” de Daniel Gros e Ansgar Belke. Não

foi possível inserir dados atualizados por falta de informação estatística.

3.2.1. Irlanda e Nevada

Irlanda e Nevada partilham várias características, dentro das quais: o

número da sua população, o PIB é aproximado e ambos passaram por uma forte

crise que levou à recessão, gerando os mesmos níveis de desemprego.

As mais importantes semelhanças, que Daniel Gross e Ansgar Belke

apontam no seu estudo, são derivadas do forte crescimento das vendas de casas,

com a consequente quebra após a subida dos valores dos imóveis.

Os preços dos imóveis subiram bastante entre 2007 e 2008, tendo baixado a

pique nos anos seguintes, como ilustrado no gráfico nº 1.

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37

Gráfico 1 - Preço dos Imóveis (Nevada 1 e Irlanda)

O desemprego foi igualmente sentido em ambos, não havendo muitas

variações de valores, e ambos com o mesmo padrão de crescimento, como

ilustrado no gráfico n.º 2.

0

50

100

150

200

250

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 20136

Nevada Irlanda

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38

Gráfico 2 - Desemprego (Nevada e Irlanda)

Pese embora que ambos tenham reagido de forma igual à crise e a recessão,

Belke e Gross apontam uma diferença principal entre os dois. Quando se iniciou a

recessão, o Estado do Nevada não sofreu qualquer tipo de crise financeira e não

teve que ser resgatado pelo seu Governo. Ao contrário do que aconteceu com a

Irlanda, que não conseguiu lidar com o problema e necessitou de ajuda externa

para equilibrar as suas contas.

É nestes termos que Belke e Gross apresentam a grande diferença entre os

EUA e a UE a nível de resolução. Enquanto nos EUA a crise de um Estado é tratada

e resolvida a nível federal, envolvendo a ajuda dos demais estados e da própria

Federação dos EUA, na Zona Euro essa entreajuda não acontece. A Irlanda não

contou com a ajuda dos restantes Estados-Membros, ou sequer da EU, na resolução

da sua crise. Para que tal fosse possível, o FU já deveria existir na altura.

Com a criação da UBE, a Irlanda talvez não chegasse a sofrer a recessão que

teve, com o MUS em pleno funcionamento não seria possível, pelo menos, chegar

aos valores a que se chegou. Porém, mesmo que o MUS não fosse capaz de prever

estes acontecimentos, a Irlanda não necessitaria de recorrer a ajuda externa, ou de

serem os seus contribuintes penalizados com aumento de impostos, nesta fase, o

FR poderia ser ativado.

0

2

4

6

8

10

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14

16

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Nevada Irlanda

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39

Algo parecido com o FR da UBE foi utilizado no Estado do Nevada. Muitos

dos bancos desse Estado foram obrigados a abrir falência, todavia, não se sentiram

grandes diferenças no sistema bancário do Nevada, uma vez que foi segurado pelo

FDIC, que assegurou as perdas e transferiu as operações para bancos de maiores

dimensões.

Belke e Gross salientam a importância da partilha de riscos. No caso da

Irlanda teria sido bastante útil para a saúde financeira do país, tal como foi decisiva

no Estado do Nevada.

Sem essa partilha de riscos a Irlanda foi obrigada a fazer face à crise

sozinha, suportando todos os custos inerentes. Como resultado, a dívida pública

subiu a pique enquanto a dívida do Estado do Nevada não se alterou, tal como

consta do gráfico nº 3.

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40

Gráfico 3 - Dívida Pública (Nevada e Irlanda)

3.2.2. Florida e Espanha

Belke e Gross comparam Florida e Espanha, mesmo com a diferença de

números de população e de PIB, conseguem explorar os dados de ambos e chegar a

conclusões pertinentes, nomeadamente, no campo do desemprego, onde existiu

uma grande diferença de valores.

Nesse campo, a Espanha sempre teve um nível mais elevado quando

comparado com o Estado da Florida. No ano de 2000, a Florida registava uma taxa

de desemprego abaixo dos 5%, enquanto Espanha rondava os 12%. Como tal, no

início da crise em 2008, o nível de desemprego disparou em ambos os países,

Florida nos 5% e Espanha nos 10%. Com o passar dos anos e o evoluir da crise,

Florida registou no ano de 2010 o seu pique de 11%, pelo qual se veio a diminuir,

encontrando-se em 2013 em 7%. Espanha, desde 2008 viu o nível de desemprego a

subir até 2013, onde ficou registado um valor de 26%.

Atualmente, o nível de desemprego na Florida está registado em 3,8% e,

Espanha tendo reduzido um pouco os seus níveis, encontra-se agora com 17,1%,

como se pode constatar no gráfico n.º 4.

0

20

40

60

80

100

120

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2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Nevada Irlanda

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41

Gráfico 4 - Desemprego (Florida e Espanha)

Em relação aos preços dos imóveis, Florida começou a sentir os seus efeitos

mais cedo do que Espanha. Como se pode ver pelo gráfico nº 5, Espanha pode ter

sentido os efeitos mais tarde, mas a situação piorou bastante comparativamente

com Florida, que conseguiu fazer face à subida de preços e, em pouco tempo,

voltou a reduzir os seus preços para os níveis normais.

0

5

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2000 2001 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Florida Espanha

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Gráfico 5 - Preço dos imóveis (Florida e Espanha)

Uma vez mais, a diferença reside na forma como o Estado da Florida foi

afetado em comparação com o que se sucedeu em Espanha. O Governo espanhol foi

obrigado a receber um empréstimo de 60 bilhões de Euros para ajudar a financiar

o setor da Banca, sendo que esse empréstimo terá que ser pago na sua totalidade

acrescido dos devidos juros. É importante salientar que os bancos que operam na

Florida têm uma rede de partilha de riscos com todas as outras instituições

bancárias dos EUA, não sendo sequer calculado valores de juros a serem pagos.

3.2.3. Nevada e Letónia

Tal como Belke e Gross afirmam, os estados Bálticos apresentaram até 2007

um forte crescimento nos preços dos imóveis, nos défices das contas correntes e no

PIB. Mas, com uma velocidade ainda maior, registaram a sua queda quando surgiu

a crise no ano de 2008, como se pode constatar no gráfico nº 6.

0

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250

300

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Florida Espanha

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43

Gráfico 6 - PIB (Nevada e Letónia)

Nenhum dos países Bálticos faziam parte da Zona Euro, dificultando ainda

mais o papel do Governo, que não pode contar com a ajuda, embora muito pouca,

dos restantes membros da Zona Euro. Contudo, apenas a Letónia necessitou de

ajuda externa para lidar com os problemas de certos bancos.

No que concerne ao preço dos imóveis, Nevada até ao ano de 2008 sempre

registou preços mais elevados, mas foi no ano de 2006 que os preços começaram a

cair, tendo chegado aos preços mais baixos no ano de 2011, onde se igualaram aos

preços dos imóveis da Letónia. Porém, Letónia continua a registar preços de

imóveis baixos, enquanto no Nevada continuam a crescer, como se pode constatar

no gráfico n º 7.

0

50

100

150

200

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300

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Nevada Letónia

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44

Gráfico 7 - Preço dos imóveis (Nevada e Letónia)

Relativamente ao desemprego, podemos constatar no gráfico nº 8 que os

níveis tiveram uma evolução idêntica em ambos os países. Tanto Nevada como

Letónia sentiram o efeito da crise, mas reagiram de igual modo, e conseguiram

corrigir as falhas existentes no mercado de trabalho.

0

50

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150

200

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2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2012 2013

Nevada Letónia

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45

Gráfico 8 - Desemprego (Nevada e Letónia)

Tal como Belke e Gross concluíram, a Letónia em comparação com Espanha

e Irlanda, foi a menos afetada pela crise, mesmo sendo um país que não pertence à

Zona Euro. Este facto ficou a dever-se à partilha de riscos que existem entre os

bancos dos países bálticos, permitindo uma entreajuda entre os mesmos. Contudo,

é importante salientar que o único país báltico que necessitou de um bail-out foi a

Letónia, por também ser o único que tinha um grande banco nacional.

Belke e Gross conseguiram assim fazer uma comparação precisa entre os países

europeus e os americanos, no que concerne à crise de 2008. Ficando bem

patenteado que a falta de uma partilha de riscos e de percas entre os países da

Zona Euro foi o principal motivo pelo qual estes sentiram com forte intensidade a

crise e não tiveram uma recuperação tão rápida.

Nos dias de hoje, com alguns mecanismos da UBE a operarem, o resultado viria

a ser bastante diferente. Os bancos não necessitariam de ajuda dos governos, pois

essa ajuda seria prestada pelo FR, que recorreria ao seu fundo próprio para pode

fazer face às percas da banca, existindo assim uma partilha de riscos, como

acontece nos EUA.

0

2

4

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12

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Nevada Letónia

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46

3.3. Zona Euro antes da UBE

Antes da existência de uma União Bancária, a responsabilidade da

supervisão bancária e da reestruturação e resolução dos bancos pertencia às

autoridades nacionais de cada Estado Membro. Apesar das normas de supervisão

terem sido adaptadas a nível europeu, a supervisão continua a ser executada pelos

supervisores nacionais.

No entanto, segundo Busch et al (2013), a crise revelou várias deficiências

dos sistemas regulatórios nacionais na Europa:

• Em primeiro lugar, os fracos padrões de supervisão têm

promovido a acumulação de riscos nos balanços dos bancos. Como

resultado da fraca supervisão e das distorções na economia real,

houve uma acumulação de níveis insustentáveis de dívida tanto do

setor privado como do setor público. As contínuas fraquezas da

economia real e o desenvolvimento da recessão em grande parte da

Zona Euro agravaram os problemas dos bancos. Assim, existe uma

necessidade de reduzir o excesso de capacidade no setor bancário

europeu e de resolução dos bancos que perderam o seu modelo de

negócio. No entanto, os incentivos para o concretizar são fracos a

nível nacional.

• Em segundo lugar, os riscos bancários não param nas

fronteiras nacionais. A reestruturação e resolução dos bancos em

dificuldades, a nível europeu, requer que as instituições europeias

possam intervir caso as autoridades nacionais atrasem a

reestruturação e resolução dos bancos em dificuldades. Estas

questões não são apenas relevantes para os Estados-membros da

Zona Euro, o alastramento dos riscos bancários é particularmente

importante para os membros da europa de leste da UE.

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47

• Em terceiro lugar, os mecanismos de partilha de riscos

transfronteiriços não existiam antes da crise. Os sistemas nacionais

de seguro de depósitos estão em vigor para proteger os bancos

contra choques, pelo facto de evitarem corridas aos bancos em

dificuldades. Contudo, estes sistemas têm-se mostrado insuficientes,

dada a natureza sistémica da crise, e pelo facto de não estarem

explicitamente voltados para a partilha de riscos transfronteiriços.

Durante a crise, tornou-se evidente que os riscos dos principais

bancos não podem ser segurados a nível nacional. Os riscos entre os

bancos e os Estados tornaram-se seriamente interligados, sendo que

muitos governos não têm a capacidade fiscal para apoiar os bancos

em dificuldades no seu país. Daí existirem incentivos para transferir

os riscos resultantes para o nível europeu, através do canal da

política monetária, em vez da política fiscal (Busch et al, 2013).

Nomeadamente, os bancos em dificuldades nos países em crise têm

recorrido ao refinanciamento através do BCE.

Como tal, Busch (2013) afirma que existe uma necessidade de um sistema

centralizado de responsabilidade europeia para o mercado financeiro e de

supervisão bancária, mesmo numa área como a da Zona Euro, em que existe uma

moeda única.

Os supervisores nacionais e os reguladores não foram capazes de evitar ou

limitar a acumulação de riscos no setor bancário, assim como de coordenar esses

riscos de forma eficaz na sequência da crise. Medidas ousadas para a resolução de

crises foram atrasadas pela existência de uma tolerância regulatória a nível

nacional, devido à estreita ligação entre os bancos e os Estados. Portanto, a UBE é

um avanço lógico da União Monetária e do mercado único, e constitui um elemento

indispensável da estrutura de governação do futuro da Zona Euro.

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48

4. UBE e Portugal

4.1. A evolução do sistema bancário Português

Durante vários anos a Banca em Portugal era um setor privado, exceto a

CGD que era, até à data, o único banco público a operar em Portugal. O BP, o BNU e

o BA, embora fossem bancos emissores, tinham estatuto de privado, só em

setembro de 1974 é que foram nacionalizados.

Valério (2006) (2010) esquematizou as principais épocas do sistema

bancário Português:

• 1822 a 1854 – Bancos privilegiados

• 1854 a 1891 – Liberdade bancária

• 1891 a 1931 – Polarização do sistema bancário pelo BP

• 1931 a 1945 – Sistema bancário numa época de crises e de guerras

• 1945 a 1961 – Sistema bancário na época do arranque económico

moderno

• 1961 a 1975 – Sistema bancário na época de consolidação do

crescimento económico moderno

• 1975 a 1985 – Sistema bancário na época da banca nacionalizada

• 1985 a 1998 – Sistema bancário no contexto das Comunidades

Europeias.

Foi em março de 1975 que foi decretada a nacionalização da restante banca

comercial, com a devida exceção dos bancos estrangeiros a operar na altura34. A

impossibilidade da iniciativa privada da banca foi imposta por força da

Constituição da República em 1976, em conjunto com a irreversibilidade das

nacionalizações efetuadas após o 25 de abril de 1974. Nesta fase do sistema

34 A saber, Banco do Brasil; o Bank of London & South e o Crédit Franco-Portugais.

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49

bancário português, houve uma necessidade de concentração35 e os pequenos

bancos foram desaparecendo.

Como tal, em resultado dessa concentração bancária, o sistema bancário

português era, até 1984, maioritariamente público, com mais de 95% de quota no

mercado. Sendo o Estado Português detentor da maior parte dos Bancos, as regras

eram apertadas, existiam importantes medidas regulamentares aplicadas às taxas

ativas e passivas, a concessão do crédito era mais difícil, não sendo cedido crédito a

todos, e não havia inúmeros balcões e funcionários.

4.1.1. O revirar do sistema financeiro

Em 1984, com a revisão Constitucional e com a publicação do Decreto-Lei

nº 406/83 de 19 de novembro e do DL nº 51/84 de 11 de fevereiro de 1984, foi

então autorizado o processo de abertura da atividade bancária à iniciativa privada.

Inúmeros bancos estrangeiros entraram em Portugal como o Citibank, o Chase

Manhattan, o Banque National de Paris e o Manufacturers Hanover Bank. Entre

1984 e 1994 mais de 35 bancos iniciaram a sua atividade em território português.

Com o surgimento de novos bancos, oriundos de outros países e outras

culturas, houve um aumento de sucursais de grandes bancos estrangeiros que

vieram introduzir importantes fatores de inovação (Pinho, 1999).

Em 1986 e 1997 durante o boom bolsista, a falta de conhecimentos ou de

prática ao nível dos aplicativos informáticos resultou na redistribuição dos clientes

entre as instituições de crédito. Com exceção do BCP, que direcionou a sua

atividade para a captação de segmentos de clientela específicos, médias e grandes

empresas e particulares que apresentavam um nível baixo de risco, promovendo a

qualidade nos serviços prestados. Outro fator importante para o crescimento do

BCP, nessa altura, foi a inovação tecnológica, que permitiu uma descentralização

dos serviços e as operações de compra e venda dos títulos pelo telefone,

35 Resolução do Conselho de Ministros de 28 de dezembro de 1978.

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50

justificando assim quase 20% das transações bolsistas durante a euforia da bolsa,

em 1986 e 1987.

A partir do ano 1989, o sistema bancário português, que até então ainda

detinha vários bancos públicos, foi aos poucos sendo privatizado. A quota do

mercado detida pelos bancos públicos, que em 1989 rondava os 84%, tinha em três

anos descido para aproximadamente 42% e em 1997 descia para os 20% (Carlos

Alves e Carlos Tavares, 2017).

Esta privatização ocorreu em simultâneo com a adaptação do sistema

bancário português à integração no Mercado Interno proposto pelo AUE. Segundo

Pinho (1999), esta integração foi um sucesso derivado ao acréscimo da

concorrência, resultado do processo de desregulação iniciado em 1984.

Em 1991 o BP começou a controlar a massa monetária por via indireta,

fixando reservas mínimas de caixa e promovendo operações de open market. Em

1992 foram eliminadas as taxas de juros fixadas administrativamente. Como tal,

houve um aumento incontrolável do crédito ao setor privado no decurso dos anos

90.

Muitas famílias foram encorajadas a aumentarem o seu endividamento

perante a banca por haver condições económicas bastante atrativas, tais como:

• Diminuição das taxas de juro

• Desinflação e consolidação orçamental resultante da

adoção da moeda única

• Aumento dos rendimentos reais

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51

4.1.2. Após crise de 2008

Pode assim dizer-se que nestes anos, pelo menos até 2008, ano da crise, a

banca nacional passou de maioritariamente pública para maioritariamente

privada, houve um aumento incontrolável de balcões novos, aumento do número

de trabalhadores e aumento da facilidade de acesso ao crédito, tudo em prol de

uma desregulação do sistema financeiro português.

Contudo, depois de 2007 reduz-se de novo o acesso ao crédito, os bancos

voltam a ser mais rígidos aquando das avaliações dos rendimentos dos seus

clientes. Por outro lado, mais precisamente no âmbito dos recursos, os depósitos

voltam a ganhar peso, iniciando assim uma redução significativa da alavancagem a

partir de 2011. Segundo Carlos Alves e Carlos Tavares (2017) o crescimento dos

depósitos teve grande relevância no processo de desalavancagem por três motivos:

• Arbitragem dos próprios bancos entre a venda de depósitos e de

fundos de investimento das suas sociedades gestoras de ativos;

• Maior aversão ao risco dos clientes na sequência dos problemas

ocorridos em alguns bancos e da maior proteção conferida aos depósitos

face a outros ativos financeiros;

• Menor custo de oportunidade da detenção de depósitos num

ambiente de taxas de juro muito baixas.

Carlos Alves e Carlos Tavares (2017) afirmam ainda que “o período mais

recente indicia, assim, um recentrar na atividade principal do lado dos recursos –

fruto das circunstâncias acabadas de descrever – e uma correção do excesso de

crescimento do lado das aplicações em crédito, emergindo, todavia, os efeitos

decorrentes da clara deterioração da sua qualidade.”

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52

4.2. Exemplo prático - BES

Durantes muitos anos, o BES foi o maior banco privado português e o banco

em que os portugueses mais confiavam e depositavam as suas poupanças. Não foi

de estranhar que, no ano de 2013, após declarar graves dificuldades financeiras, a

reação das pessoas fosse de choque e medo. Durante algum tempo o BES foi alvo

de várias pressões, tanto sociais como por parte dos media, até que foi obrigado a

declarar insolvência.

O BP ao ser informado sobre a situação do BES, no dia 3 de agosto de 2014,

optou pelo instrumento de criação de uma instituição de transição, ou banco de

transição. Isto porque o BES, sendo um dos maiores bancos privados portugueses,

era portador de um enorme risco sistémico que poderia por em causa todo o

sistema financeiro e bancário de Portugal.

Como tal, toda a atividade e todo o capital do BES, foram transferidos para o

Novo Banco (banco de transição)36. Este banco de transição, intitulado de Novo

Banco, funciona como uma normal instituição de crédito, tendo inclusive a mesma

natureza jurídica, tal como resulta do Art. 4º do RGICSF.

Para que esta operação fosse possível, foi necessário a divisão de dois bancos:

• O banco BES, suportando o passivo e o ativo tóxico, cujas perdas

foram suportadas pelos acionistas;

• O Novo Banco, expurgado dos ativos tóxicos e financiado pelo fundo

de resolução .

O BP optou prontamente por esta medida considerando ser a melhor para o

sistema financeiro, proteção dos depositantes, proteção dos contribuintes e para

assegurar a continuidade das funções do BES, para que as pessoas possam voltar a

reforçar a sua confiança no sistema financeiro.

36 Anexo I: Comunicado do Banco de Portugal Sobre a Aplicação de Medida de Resolução ao Banco Espirito Santo, S.A.

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53

4.2.1. Impacto no sistema financeiro de Portugal

O facto desta medida ter sido adotada pelo BP para, de alguma forma, poder

garantir confiança aos depositantes, carece de alguma eficácia, visto que os

depósitos no Novo Banco diminuíram 10 milhões de euros face ao BES, após a

aplicação desta medida.

No seguimento desta medida, e em conformidade com o MUR, quem deve

suportar as perdas, em primeiro lugar são os acionistas e, em segundo lugar, os

credores, ficando assim os depositantes livres de qualquer tipo de encargo, ou de

serem prejudicados com a sua aplicação. Como tal, esta medida de resolução

aplicada pelo BP não foi muito bem vista pelos acionistas do BES nem pelos seus

credores, que se justificaram pelo moroso e complicado processo de reclamação de

créditos. Inclusive, os acionistas e os credores, descontentes com esta situação,

decidiram impugnar toda a operação, ativando um movimento para reivindicarem

os seus direitos37.

Um dos prejudicados com esta medida foi o banco Americano Goldman

Sachs. A 3 de julho de 2014 foi emprestado ao BES, pelo Goldman Sachs, uma

quantia total de 835 milhões de Euros, tendo o BP prometido que esse

investimento iria ser direcionado, sob forma de empréstimo, para o Novo Banco

caso o BES desmoronasse. O que acabou por não suceder, uma vez que o BP

justifica que, após o Goldman Sachs ter emprestado esse montante, este tornou-se

acionista do BES e, em conformidade com a legislação da UBE, esse montante foi

usado para suportar perdas do BES.

Em prol da medida de resolução aplicada pelo BP ao BES, foi aprovado o DL

n.º 114-B/2014, com vista a uma maior otimização desse mecanismo e à sua

inserção no sistema jurídico português.

Este DL apenas foi criado para se poder aplicar a medida de resolução ao

BES. Antes disso Portugal ainda não se tinha preparado para a entrada deste novo

37 BES –A LUTA, via caldeirão da bolsa, disponível em http://www.caldeiraodebolsa.jornaldenegocios.pt/

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54

mecanismo. Na altura não havia regulamentos no ordenamento jurídico português

para harmonizar a legislação da EU, mais precisamente, as regras da UBE. Com a

criação deste DL, foi então alterado o DL 31-A/2012 que, até à data, se baseava na

regulação nacional em matéria de regimes de resolução das instituições de crédito.

Portugal sentiu na pele a necessidade de se adaptar a este regime da UBE.

Como ficou supra explícito, Portugal à data da insolvência do BES ainda não tinha

adotado a legislação nacional em conformidade com a UBE. Foi necessário ocorrer

tal facto para que se pudesse legislar nesse sentido e, como tal, embora tenha sido

uma solução vantajosa, não foi totalmente eficaz por ter sido aplicada sem a

necessária preparação.

Pelo supra exposto, a situação do BES veio demonstrar as fragilidades

existentes em Portugal no que concerne à aplicação deste tipo de medidas. Embora

a UBE seja uma novidade e, para muitos, seja um tema um pouco confuso e

complicado. Portugal tem de garantir que tem todas as condições necessárias para

a sua perfeita aplicação.

Ninguém conseguiu prever a situação gerada pelo BES, o que forçou a

aplicação destas medidas, em tempo útil, por Portugal. Do ponto de vista positivo,

Portugal pode agora tirar as devidas ilações e concluir o que correu mal e poderia

ter corrido melhor, para que, no futuro, em caso de uma nova situação idêntica,

possa então responder de forma atempada e estruturada, de acordo com o objetivo

e fins da UBE.

Page 67: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

55

5. Conclusão

O estudo e pesquisa estão assim consubstanciados nesta presente

dissertação, na tentativa de uma exposição acerca da nova União Bancária e sobre

a sua utilização em Portugal, aplicada ao caso BES.

Derivado do carácter recente e atual da criação e funcionamento da UBE,

tiveram que ser superadas algumas dificuldades, tais como a escassez de

bibliografia sobre algumas matérias, mais concretamente, como aplicar este novo

mecanismo no sistema financeiro português.

A presente dissertação desdobrou-se em três partes: numa primeira parte

foi analisada toda a UBE, desde a necessidade da sua criação, as dificuldades

existentes, os seus mecanismos e a sua utilidade prática; numa segunda parte, foi

analisada a crise de 2008 na Zona Euro, o porquê da sua existência e a evolução da

mesma. Como tal, recorreu-se a comparações entre alguns países da Zona Euro e

Estados dos EUA, de modo a perceber as diferenças existentes entre os mesmos e

concluir se a criação de uma UBE, como a existente nos EUA, poderia ter resultado

numa melhor abordagem à crise. Por fim, na última e terceira parte, foi analisada a

utilização da UBE no sistema financeiro de Portugal, mais concretamente, o seu

efeito num caso prático como o do BES.

Foi necessária uma crise como a de 2008 para que fossem demonstradas as

fragilidades existentes no sistema financeiro da Zona Euro. Tendo como tal surgido

a necessidade da criação de um mecanismo capaz de fazer face a estes eventos,

surgindo assim a UBE.

A UBE não foi tendo um consenso firme e uniforme, foi alvo de críticas e de

diferentes abordagens, contudo, e perante a evolução drástica da crise, os países

foram convergindo numa vontade única de criar a UBE. Libertando assim a

responsabilidade única dos países perante a resolução da crise e futuras crises.

A origem da crise nos EUA deixou bem claro os resultados de uma

desregularização do sistema financeiro. Com uma maior liberdade de movimentos,

Page 68: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

56

o sistema financeiro foi capaz de criar novas operações financeiras, cada vez mais

complexas e difíceis de analisar. Houve também um grande aumento de criação de

novas instituições de crédito, desde fusões de grandes financeiras que aglomeram

as pequenas, e a criação de novas instituições com a fusão do sector bancário com

o sector de investimento ou de seguros. Esta desregularização começou nos EUA

mas acabou por afetar a Zona Euro, que para poder fazer face a esta nova

concorrência e a estes novos produtos financeiros, teve que se adaptar e deixar

que o seu sistema financeiro fosse também livre o suficiente para poder haver

espaço e capacidade de gestão e criação deste novo mundo financeiro.

A criação da UBE veio também ao encontro da necessidade que existe em

regular e supervisionar o sistema financeiro. A crise de 2008 demonstrou que o

sistema carecia de regulação e supervisão em vários aspetos, tais como: falta de

supervisão das instituições de crédito, que resultou num aumento de

comportamentos de risco; falta de regulação que tornou possível que as

instituições de crédito tivessem esses mesmos comportamentos; e, por fim, a falta

de medidas e recursos para os países poderem resolver os problemas dessas

instituições sem necessitar de recorrer a ajudas externas ou à ajuda dos seus

contribuintes.

Em comparação com alguns Estados dos EUA, foi possível perceber que a

falta de partilha de riscos na Zona Euro foi um aspeto bastante importante e

decisivo na abordagem à crise. Os EUA, na altura da crise, já tinham a sua própria

união bancária criada, a partilha de riscos foi enorme, não houve risco sistémico

praticamente nenhum porque todas as instituições de crédito se ajudavam

mutuamente. Ao contrário dos países da Zona Euro, que praticamente tiveram que

resolver as crises dos seus bancos sozinhos, sem ajuda dos restantes países, ou

instituições de crédito existentes na sua zona monetária. Como tal, foi necessário

recorrer a ajuda externa, injetando capital que teria que ser pago com os

respetivos juros, ou então, aumentando a carga fiscal dos contribuintes de modo a

poderem todos contribuir para a recapitalização da banca.

Ficou claro que a partilha de riscos existente nos EUA funcionou melhor do

que os métodos utilizados na Zona Euro. A UBE pretende tornar isso possível. Ao

criar o FGD e o MUR, cria então a partilha de riscos capaz de retirar

Page 69: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

57

responsabilidade e encargos aos estados soberanos perante as dividas e crises que

possam surgir.

Porém, estas novas medidas e estes novos mecanismos criados pela UBE

funcionam bem e são excelentes se os países aderentes souberem se preparar para

acolher tais medidas e mecanismos.

O caso BES foi um exemplo prático capaz de demonstrar a fragilidade deste

novo mecanismo, se não for devidamente acolhido pelo sistema financeiro e pela

própria legislação nacional.

Sob um ponto de vista positivo, o caso BES foi um sucesso a nível da partilha

de riscos. Não houve custos a mais para os contribuintes e o Estado Português

pouco teve que injetar na banca para a criação do banco de transição, o Novo

Banco. A utilização da medida do MUR aplicada pelo BP garantiu a estabilidade

necessária ao sistema financeiro, não deixando que a queda do BES se tornasse

num risco sistémico capaz de abalar todo o sistema financeiro.

Contudo, Portugal demonstrou que não estava devidamente preparado para

acolher a UBE e todos os seus mecanismos. Na sequência dessa fraca preparação,

houve falhas na sua aplicação. Foi necessário a criação de uma nova legislação para

que fosse possível harmonizar a legislação europeia à nacional, isto porque ainda

não tinha sido feito. Foi sobre pressão de capacidades e tempo, que se aplicou a

medida ao BES.

Porém, é destes casos práticos e reais que devemos tirar as nossas

conclusões. Ao olhar para ambos os aspetos positivos e negativos desta medida

aplicada ao BES e, se olharmos a todas a soluções que poderiam ter sido aplicadas

pelo BP, no caso de uma instituição de crédito à beira da insolvência, as medidas de

resolução do MUR, criado pela UBE, apresentam e apresentaram os melhores

resultados possíveis.

Para Costa (2014), governador do Banco de Portugal “a construção da União

Bancária está hoje dependente da resposta a uma série de problemas que resultam

da sua própria dinâmica de aprofundamento e cuja complexidade e criticidade não

podem ser menosprezadas”.

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Ficou demonstrado que a utilização da UBE, num caso concreto de uma

instituição de crédito de Portugal, foi mais vantajosa do que a aplicação de medidas

antigas e desapropriadas a este novo sistema financeiro. Como tal, a criação da

UBE é uma mais-valia para um sistema financeiro como o português, que, até

agora, era incapaz de lidar com uma crise de insolvência como a do BES, sem

recorrer a ajuda externa e ao seu próprio endividamento.

Como tal, a criação da UBE é uma mais valia para um sistema financeiro

como o Português que, até agora, era incapaz de lidar com uma crise de

insolvência, como a do BES, sem recorrer a ajuda externa e ao seu próprio

endividamento.

Page 71: Universidade de Lisboa Faculdade de Direito da …...In this context, the proposal of this dissertation is a presentation of an analysis to the Banking Union, demonstrating its mechanisms

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7. Anexos

Anexo I - Comunicado do Banco de Portugal sobre a aplicação de medida de resolução ao Banco Espirito Santo, S.A.

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