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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Engenharia de Alimentos ERIKA GOMES SANTOS INFLUÊNCIA DA CONCENTRAÇÃO DE NITRITO DE SÓDIO E SAIS SUBSTITUTOS AO CLORETO DE SÓDIO NA RESISTÊNCIA TÉRMICA DE CLOSTRIDIUM DIFFICILE EM CALDO DE CARNE CAMPINAS 2019

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINASrepositorio.unicamp.br/.../334789/1/Santos_ErikaGomes_M.pdfBiblioteca da Faculdade de Engenharia de Alimentos Márcia Regina Garbelini Sevillano -

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  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Engenharia de Alimentos

    ERIKA GOMES SANTOS

    INFLUÊNCIA DA CONCENTRAÇÃO DE NITRITO DE SÓDIO E SAIS

    SUBSTITUTOS AO CLORETO DE SÓDIO NA RESISTÊNCIA TÉRMICA DE

    CLOSTRIDIUM DIFFICILE EM CALDO DE CARNE

    CAMPINAS

    2019

  • ERIKA GOMES SANTOS

    INFLUÊNCIA DA CONCENTRAÇÃO DE NITRITO DE SÓDIO E SAIS

    SUBSTITUTOS AO CLORETO DE SÓDIO NA RESISTÊNCIA TÉRMICA DE

    CLOSTRIDIUM DIFFICILE EM CALDO DE CARNE

    Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para obtenção do título de Mestra em Ciência de Alimentos.

    Orientadora: Profa. Dra. Dirce Yorika Kabuki

    ESTE TRABALHO CORRESPONDE À

    VERSÃO FINAL DA DISSERTAÇÃO

    DEFENDIDA PELA ALUNA ERIKA

    GOMES SANTOS E ORIENTADA PELA

    PROFA. DRA. DIRCE YORIKA KABUKI.

    CAMPINAS

    2019

  • Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): CNPq, 130547/2013-1ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7873-6179

    Ficha catalográfica

    Universidade Estadual de Campinas

    Biblioteca da Faculdade de Engenharia de Alimentos

    Márcia Regina Garbelini Sevillano - CRB 8/3647

    Santos, Erika Gomes, 1986-

    Sa59i SanInfluência da concentração de nitrito de sódio e sais substitutos ao cloreto

    de sódio na resistência térmica de Clostridium difficile em caldo de carne /

    Erika Gomes Santos. – Campinas, SP : [s.n.], 2019.

    SanOrientador: Dirce Yorika Kabuki.

    SanDissertação (mestrado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade

    de Engenharia de Alimentos.

    San1. Clostridium difficile. 2. Produtos cárneos. 3. Esporos. I. Kabuki, Dirce

    Yorika. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Engenharia de

    Alimentos. III. Título.

    Informações para Biblioteca Digital

    Título em outro idioma: Influence of the concentration of sodium nitrite and saltssubstitutes to sodium chloride on the thermal resistance of Clostridium difficile in meat broth

    Palavras-chave em inglês:Clostridium difficile

    Meat products

    Spores

    Área de concentração: Ciência de AlimentosTitulação: Mestra em Ciência de AlimentosBanca examinadora:Dirce Yorika Kabuki [Orientador]

    Alessandra Regina da Silva Marques

    Renata Bromberg

    Data de defesa: 27-02-2019Programa de Pós-Graduação: Ciência de Alimentos

    Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

  • BANCA EXAMINADORA

    ______________________________________________________________________

    Profa. Dra. Dirce Yorika Kabuki

    Faculdade de Engenharia de Alimentos, FEA, UNICAMP

    Orientadora

    ______________________________________________________________________

    Dra. Alessandra Regina da Silva Marques

    LABTERMO

    Membro Titular

    ______________________________________________________________________

    Dra. Renata Bromberg

    Instituto de Tecnologia de Alimentos, ITAL

    Membro Titular

    A Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se

    no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria de Pós-

    Graduação da Faculdade de Engenharia de Alimentos.

  • À minha família, dedico.

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus pelo entendimento concedido e por estar sempre comigo.

    Gostaria de agradecer aos meus pais, irmãos e sobrinhos pelo amor, apoio e

    incentivo em todas as etapas.

    Agradeço ao Prof. José Luís e à Profa. Dirce por terem me aceitado como

    orientada. Em especial, agradeço à professora Dirce pelo acompanhamento, pela

    confiança, pela amizade, por todos os ensinamentos, pela experiência de PED e por

    estar sempre presente.

    A todos da LabTermo, obrigada pela oportunidade e aprendizado em

    microbiologia. Agradeço à Profa. Pilar pela confiança e pelos valiosos ensinamentos.

    Alê, você é uma pessoa maravilhosa, muito obrigada pela amizade, pelos conselhos

    e orientação no “mundo da micro”, aprendi muito com você!

    A todos os professores, funcionários e alunos da área de Microbiologia, muito

    obrigado pela ajuda! Ju, Aninha e Norma não há palavras suficientes para agradecer

    por todo apoio durante o mestrado!

    À minha amiga Ju Carusi & família, que tornaram a jornada mais leve e os

    dias mais alegres.

    Aos amigos de laboratório Marina, Taísa, Andrea, Matheus, Caio, Murilo e

    Karen agradeço pelo carinho, pelos risos e por toda ajuda.

    Aos queridos amigos da Casa da ABU, obrigada pela paciência, convivência,

    amizade, ajuda e ensinamentos. Fabi, Eltermann, Sydnei, Ricardo, Lucas, Thais,

    Baker, Aline e Érika foi muito divertido morar com vocês!

    Agradeço a todos da IPBG e da ABU pela amizade, ajuda e ensinamentos,

    guardarei com carinho todas as lembranças!

    À Sufis/Gecoq da Conab, muito obrigada pelo apoio e compreensão.

    A todos os professores e funcionários da Faculdade de Engenharia de

    Alimentos agradeço pela contribuição na minha formação.

    Agradeço aos professores membros da banca de defesa, todas as

    contribuições e sugestões tornaram meu trabalho melhor.

    Agradeço ao CNPq pelo apoio financeiro.

    O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de

    Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) código de

    financiamento 001.

  • RESUMO

    A infecção causada por Clostridium difficile (CDI) está associada ao

    tratamento com antibióticos e pode variar desde diarreia a grave colite

    pseudomembranosa. Os fatores de risco relacionados ao CDI incluem longos

    períodos de hospitalização, exposição a antibióticos, comorbidades subjacentes e

    idade superior a 65 anos. Recentemente, os casos de CDI têm sido observados na

    comunidade, em populações consideradas de baixo risco, tais como os jovens.

    Diversas pesquisas mostram que animais são portadores assintomáticos de C.

    difficile, assim a transmissão por meio de alimentos de origem animal é uma

    potencial fonte de contaminação. Todavia, faltam estudos para comprovar a

    transmissão da doença por alimentos. Além disso, os esporos de C. difficile podem

    resistir por até 2 h a 71°C em solução salina tamponada. O objetivo desta pesquisa

    foi estudar a ocorrência de C. difficile em produtos cárneos, os parâmetros de

    resistência térmica (D e z) de seus esporos em caldo de carne (72°C, 77°C e 82°C)

    e a influência da concentração de nitrito de sódio e sais substitutos na resistência

    térmica de esporos de C. difficile a 72°C, em caldo de carne, por meio de um

    delineamento fatorial 22, com triplicata no ponto central. Foram analisadas 45

    amostras de produtos cárneos adquiridas em estabelecimentos comerciais,

    entretanto nenhuma amostra apresentou contaminação por C. difficile. Na

    temperatura 72°C, a curva de sobreviventes para os esporos de C. difficile, em caldo

    de carne, pH 5,3, com 2% de NaCl e 150 ppm de NaNO2, apresentou desvio de

    linearidade (cauda), sendo que o tempo para primeira redução decimal (δ),

    determinado de acordo com o modelo Weibull, proposto por Mafart et al. (2002),

    nessa temperatura foi de 31,87 min. Já nas temperaturas de 77°C e 82°C, o valor de

    D calculado por regressão linear foi de 14,04 min e 4,23 min, respectivamente. O

    valor de z obtido por regressão linear foi de 11,4°C, com coeficiente de ajuste de

    0,988. Foi verificado que a substituição parcial (50%) de cloreto de sódio por uma

    mistura de cloreto de potássio (50%) e cloreto de cálcio (50%) não afetou a

    resistência térmica de C. difficile a 72°C em caldo de carne pH 5,3, ao nível de

  • significância de 95%. Embora o nitrito de sódio não iniba o crescimento de C.

    difficile, o efeito conjunto da concentração de nitrito de sódio e temperatura na

    resistência térmica foi estatisticamente significativo (p-valor

  • ABSTRACT

    The infection caused by Clostridium difficile (CDI) is associated with antibiotic

    treatment and can range from diarrhea to severe pseudomembranous colitis. Risk

    factors related to CDI include long period of hospitalization, exposure to antibiotics,

    underlying comorbidities and age over 65 years. Recently, cases of CDI have been

    observed in the community, in people considered to low risk, such as young people.

    Several studies show that animals are asymptomatic carriers of C. difficile, so the

    transmission from animal food is considered a potential source of contamination.

    Although there have been no confirmed cases of any foodborne disease caused by

    C. difficile. In addition, C. difficile spores may survive for 2 h at 71° C in phosphate

    buffered saline. The aim of this study was to investigate the C. difficile occurrence in

    meat products, the parameters of thermal resistance of C. difficile spores in meat

    broth (72°C, 77°C and 82°C) and the influence of the concentration of sodium nitrite

    and substitute salts in the thermal resistance of C. difficile spores at 72°C in meat

    broth, by a factorial design 22, with triplicate at the central point. A total of 45 samples

    of meat products purchased at commercial establishments were analyzed, although

    contamination with C. difficile was not found. At 72°C, the survival curve for the C.

    difficile spore in meat broth, pH 5,3, with 2% NaCl and 150 ppm NaNO2 showed

    linearity deviation (tail), the time for first decimal reduction (δ), determined according

    to the Weibull model, proposed by Mafart et al. (2002) at this temperature was 31,87

    min. At temperatures of 77°C and 82°C, the D value calculated by linear regression

    was 14,04 min and 4,23 min, respectively. The z value obtained by linear regression

    was 11,4°C, with a coefficient of adjustment of 0.988. It was found that the partial

    replacement (50%) of sodium chloride by a mixture of potassium chloride (50%) and

    calcium chloride (50%) did not affect the thermal resistance of C. difficile at 72°C in

    meat broth pH 5,3 at a significance level of 95%. Although sodium nitrite did not

    inhibit C. difficile growth, the combined effect of sodium nitrite concentration and

    temperature on thermal resistance was statistically significant (p-value

  • LISTA DE ILUSTRAÇÕES

    Figura 1. Ultraestrutura do esporo do C. difficile R20291, ribotipo 027 .................... 28

    Figura 2. Casos de CDI nos Estados Unidos ........................................................... 30

    Figura 3. A: PaLoc - tcdR, tcdB, tcdE, tcdA e tcdC. B: Genes codificadores da toxina

    binária - cdtR, cdtA e cdtB ......................................................................................... 33

    Figura 4. Fluxograma de detecção de C. difficile por plaqueamento direto e com

    tratamento alcoólico para ativação de esporos ......................................................... 53

    Figura 5. Produtos de amplificação dos genes tpi nos micro-organismos isolados de

    amostras de produtos cárneos (I1-I13) e nas cepas de referência de C. difficile (VPI)

    por meio da técnica da PCR ...................................................................................... 62

    Figura 6. Curva de sobreviventes de C. difficile a 72°C, em caldo de carne, pH 5,3,

    com 2% de NaCl e 150 ppm de NaNO2 .................................................................... 66

    Figura 7. Curva de sobreviventes de C. difficile a 77°C, em caldo de carne, pH 5,3,

    com 2% de NaCl e 150 ppm de NaNO2 .................................................................... 67

    Figura 8. Curva de sobreviventes de C. difficile a 82°C, em caldo de carne, pH 5,3,

    com 2% de NaCl e 150 ppm de NaNO2 .................................................................... 67

    Figura 9. Curva TDT. ................................................................................................ 73

    Figura 10. Curva de sobreviventes a 72°C ............................................................... 74

    Figura 11. Diagrama de Pareto (Equação 2) ............................................................ 75

    Figura 12. Superfície de resposta para δ72°C (min) ................................................... 79

    Figura 13. Curva de contorno para δ72°C (min) ......................................................... 79

    Figura 14. Diagrama de Pareto (Equação 3) ............................................................ 80

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1. Classificação por tipo toxigênico e correlação com ribotipo. ..................... 34

    Tabela 2. Prevalência da contaminação de alimentos por C. difficile. ...................... 39

    Tabela 3. Planejamento de amostragem para cada temperatura de ensaio. ............ 59

    Tabela 4. Delineamento fatorial 22 com 3 repetições no ponto central para avaliação

    da combinação dos efeitos das concentrações de nitrito de sódio e blend de sais na

    resistência térmica de C. difficile a 72°C. .................................................................. 61

    Tabela 5. Variáveis e níveis utilizados no planejamento experimental. .................... 61

    Tabela 6. Parâmetros de resistência térmica a 72°C de C. difficile em caldo de

    carne, pH 5,3, com 2% de NaCl e 150 ppm de NaNO2. ............................................ 67

    Tabela 7. Parâmetros de resistência térmica a 77°C e a 82°C de C. difficile em caldo

    de carne, pH 5,3, com 2% de NaCl e 150 ppm de NaNO2. ....................................... 68

    Tabela 8. Resultados de δ72°C. .................................................................................. 74

    Tabela 9. Coeficientes de regressão do delineamento fatorial 22 para as variáveis

    concentração de NaNO2 e concentração de NaCl no blend. ..................................... 75

    Tabela 10. Análise de variância (ANOVA) do modelo linear proposto para a

    resistência térmica de C. difficile a 72°C em caldo de carne contendo NaNO2 e NaCl.

    .................................................................................................................................. 78

    Tabela 11. Coeficientes de regressão para delineamento fatorial 22 para a variável

    concentração de NaNO2. ........................................................................................... 80

    Tabela 12. Análise de variância (ANOVA) do modelo linear proposto para a

    resistência térmica de C. difficile a 72°C em caldo de carne contendo NaNO2, pH 5,3.

    .................................................................................................................................. 81

    Tabela A1. δ72°C observados e δ72°C preditos (Equação 2). ..................................... 119

    Tabela A2. δ72°C observados e δ72°C preditos (Equação 3). ..................................... 120

  • SUMÁRIO

    1. Introdução Geral................................................................................................. 14

    2. Objetivos ............................................................................................................ 16

    3. Revisão Bibliográfica .......................................................................................... 17

    3.1. Produção de carnes no Brasil ......................................................................... 17

    3.1.1. Cloreto de sódio na dieta e nos produtos cárneos................................. 18

    3.1.2. Nitrito de sódio nos produtos cárneos ................................................... 23

    3.2. Clostridium difficile .......................................................................................... 25

    3.2.1. Patogenicidade de C. difficile................................................................. 30

    3.2.2. Ocorrência em alimentos ....................................................................... 35

    3.2.3. C. difficile no Brasil ................................................................................ 46

    3.3. Resistência térmica......................................................................................... 48

    4. Material e Métodos ............................................................................................. 50

    4.1. Prevalência de C. difficile em produtos cárneos processados ........................ 51

    4.1.1. Amostras................................................................................................ 51

    4.1.2. Detecção de C. difficile .......................................................................... 51

    4.1.3. Identificação dos isolados por Polymerase Chain Reaction .................. 54

    4.2. Micro-organismo ............................................................................................. 55

    4.2.1. Preparo da suspensão de esporos de C. difficile ................................... 55

    4.2.2. Contagem da suspensão de esporos .................................................... 56

    4.3. Crescimento de esporos de C. difficile em presença de nitrito de sódio ......... 57

    4.4. Avaliação da resistência térmica de esporos de C. difficile ............................ 57

    4.4.1. Preparo de caldo de carne..................................................................... 57

    4.4.2. Resistência térmica de C. difficile .......................................................... 58

    4.4.3. Determinação dos parâmetros cinéticos de destruição térmica de C.

    difficile ............................................................................................................... 59

    4.4.4. Avaliação da resistência térmica a 72°C em diferentes concentrações de

    sais e de nitrito de sódio ..................................................................................... 59

    5. Resultados e Discussão ..................................................................................... 62

    5.1. Detecção de C. difficile em produtos cárneos processados ........................... 62

    5.2. Crescimento do C. difficile em presença de nitrito de sódio ........................... 64

  • 5.3. Determinação dos parâmetros de resistência térmica de esporos de C.

    difficile .................................................................................................................... 66

    5.3.1. Determinação dos parâmetros D e z ..................................................... 66

    5.3.2. Avaliação da influência das concentrações de NaCl e NaNO2 na

    resistência térmica de C. difficile a 72°C ............................................................ 74

    6. Conclusão .......................................................................................................... 81

    7. Referências ........................................................................................................ 82

    8. Apêndices ........................................................................................................ 119

    A. δ72°C observados e δ72°C preditos ................................................................... 119

  • 14

    1. Introdução Geral

    A carne e os produtos cárneos são gêneros alimentícios de grande interesse

    econômico. A carne desempenha um papel crucial na evolução humana e é um

    importante componente de uma dieta saudável e bem equilibrada devido à sua

    riqueza nutricional. O mérito nutricional da carne é função da sua composição de

    proteína de alto valor biológico, que contém todos os aminoácidos essenciais, bem

    como minerais biodisponíveis, vitaminas e micronutrientes como ferro, selênio, zinco

    e vitamina B12 (LEDESMA; RENDUELES; DÍAZ, 2016).

    Os produtos cárneos emulsionados são muito populares e consumidos tanto

    em nível doméstico como no mercado de alimentação rápida (BETANHO;

    SHIMOKOMAKI; OLIVO, 1994; JIMENEZ-COLMENERO; CARBALLO; COFRADES,

    2001). O consumo de produtos de origem animal, incluindo a carne e os produtos

    cárneos, tem expandido globalmente com o aumento da renda familiar. Em paralelo,

    a demanda por produtos seguros e de alta qualidade também cresceu com os novos

    conceitos de produto natural e produto rótulo limpo (ALAHAKOON et al., 2015).

    Por outro lado, muitas pessoas acreditam que o consumo de carne e de

    produtos cárneos não é saudável porque o alto conteúdo de gordura, colesterol e

    antimicrobianos pode estar associado com o desenvolvimento de doenças

    degenerativas (SERRANO et al., 2007).

    O sal tem sido utilizado desde os tempos antigos para preservação de

    produtos cárneos e constitui-se em um excelente realçador de sabor e aroma, além

    de ser o responsável pela textura característica dos produtos emulsionados, devido

    à extração das proteínas miofibrilares, que contribuem efetivamente para o aumento

    da capacidade de retenção de água, formação de gel e emulsão, bem como ligação

    de gordura na matriz cominuída e estabilizada após o cozimento. Assim, quanto

    maior a extração das proteínas miofibrilares, mais fácil é a incorporação de gordura

    nas massas, formando uma emulsão mais estável (TERRELL, 1983).

    O consumo de sódio na maioria dos países excede a recomendação

    nutricional, o que preocupa as agências de saúde pública em todo o mundo devido à

    associação entre a elevada ingestão de sódio e o desenvolvimento de inúmeras

    doenças, principalmente a hipertensão (DAHL, 1972; FRIES, 1976; LAW; FROST;

  • 15

    WALD, 1991a; 1991b; 1991c; ADROGUÉ; MADIAS, 2007). A hipertensão, por sua

    vez, é considerada fator de risco para doenças cardíacas, doenças renais e acidente

    vascular cerebral (LEWINGTON et al., 2002).

    Uma das maiores fontes de sódio na dieta é proveniente do cloreto de sódio

    que, por sua vez, é amplamente utilizado em produtos cárneos industrializados

    (WHO, 2003; ALIÑO et al., 2010) devido aos seus benefícios tecnológicos e as suas

    propriedades em conferir sabor, textura e extensão da vida útil (ARMENTEROS et

    al., 2012; SOFOS, 1983; TERRELL, 1983).

    Por outro lado, a qualidade microbiológica dos produtos cárneos está

    associada às Boas Práticas de Fabricação, como o uso de matéria-prima de

    qualidade e condições adequadas de processamento.

    Neste sentido, estudos têm demonstrado que alguns animais são portadores

    assintomáticos de C. difficile, assim a transmissão por meio de alimentos de origem

    animal é considerada como uma potencial fonte de contaminação (HENSGENS et

    al., 2012). O C. difficile já foi isolado a partir de bezerros (KEEL et al., 2007), cavalos

    (BÅVERUD et al., 2003), porcos (AL SAIF, BRAZIER, 1996; COSTA et al., 2013;

    KEEL et al., 2007), aves (ZIDARIC et al., 2008), avestruzes (FRAZIER et al., 1993),

    entre outros.

    C. difficile é um bactéria Gram-positiva, anaeróbia, produtora de esporos e

    toxinas. As toxinas produzidas pelo C. difficile causam diarreia, podendo evoluir para

    colite pseudomembranosa levando à dilatação de cólon, sepse e até morte. Este

    agente é uma das principais causas de diarreia associada ao tratamento prévio com

    antibióticos (CURRY, 2010).

    A microbiota intestinal, tanto do homem como dos animais, quando íntegra,

    impede a colonização pelo C. difficile. Todavia, os antibióticos constituem o principal

    fator de alteração da microbiota, provocando a sua substituição por micro-

    organismos resistentes aos antimicrobianos em uso, os quais proliferam e podem

    provocar quadros patológicos diversos (CARRICO et al., 2008).

    Houve duas principais mudanças na epidemiologia da CDI ao longo dos

    últimos anos. A primeira foi um aumento na incidência e severidade de CDI

    associado ao tratamento hospitalar, com muitos surtos, altas taxas de mortalidade e

    pior resposta ao tratamento. Isto foi em grande parte atribuída ao surgimento e

    disseminação do ribotipo NAP1/027, mas outros fatores, como o aumento no uso de

  • 16

    fluoroquinolonas, também podem estar envolvidos. A segunda mudança tem sido o

    crescente aparecimento da doença na comunidade, o que inclui indivíduos jovens e

    pessoas tradicionalmente consideradas de baixo risco (DUPONT et al., 2008;

    WEESE, 2010).

    Várias pesquisas sobre C. difficile em alimentos estão sendo publicadas em

    outros países, no entanto, no Brasil, ainda são escassos os trabalhos científicos

    nesta área. Poucos trabalhos sobre a resistência térmica de C. difficile ou a

    detecção do micro-organismo em alimentos processados foram encontrados na

    literatura. Portanto, os objetivos deste trabalho foram determinar os parâmetros de

    resistência térmica de C. difficile em caldo de carne, verificar sua ocorrência em

    produtos cárneos e determinar o perfil toxigênico dos isolados.

    2. Objetivos

    Os objetivos desta pesquisa foram:

    Determinar a ocorrência de C. difficile em produtos cárneos;

    Determinar a influência de nitrito de sódio no crescimento de C.

    difficile em meio de cultura;

    Determinar os parâmetros de resistência térmica (D e z) do C. difficile

    em caldo de carne a 72°C, 77°C e 82°C;

    Determinar o efeito da concentração de nitrito de sódio e sais

    substitutos ao cloreto de sódio na resistência térmica do C. difficile

    em caldo de carne, pH 5,3, a 72°C.

  • 17

    3. Revisão Bibliográfica

    3.1. Produção de carnes no Brasil

    Preve-se que a produção global de carne bovina irá crescer 1% em 2019,

    atingindo aproximadamente 63,6 milhões de toneladas (USDA, 2018).

    O Brasil é um grande produtor mundial de proteína animal e tem no mercado

    interno o principal destino de sua produção. Em 2016, a produção brasileira de

    carnes (bovina, suína e de aves) foi estimada em 26,35 milhões de toneladas

    (EMBRAPA, 2017a). Já em relação à carne bovina, em 2015 o país se posicionou

    com o maior rebanho de gado bovino (209 milhões de cabeças), o segundo maior

    consumidor (38,6 kg/habitante/ano) e o segundo maior exportador (1,9 milhões

    toneladas), sendo que 80% da carne bovina consumida pelos brasileiros são

    produzidas no próprio país (EMBRAPA, 2017b).

    De acordo com as projeções do Ministério da Agricultura, Pecuária e

    Abastecimento (MAPA), a produção de carne (bovina, suína e aves) deverá

    aumentar em 12,6 milhões de toneladas até 2018/2019, o que corresponde a um

    acréscimo de 51% em relação à produção de carnes de 2008 (MAPA, 2016b).

    Por outro lado, o consumo de carne e de produtos cárneos tem sido

    associado ao aumento dos riscos de desenvolvimento de doenças crônicas, como

    obesidade, câncer e acidente vascular cerebral. As mudanças nas exigências dos

    consumidores e a crescente concorrência tem impulsionado a busca de novos

    ingredientes e novas tecnologias para processamento de produtos cárneos (WEISS

    et al., 2010).

    No que diz respeito aos suínos, o uso de alimentação controlada, à base de

    ração de milho e farelo de soja, junto com o bom manejo, permitem que a produção

    alcance ótimo níveis zootécnicos e de conversão alimentar. A adoção desses

    métodos em conjunto com a evolução genética permitiu a redução de gordura da

    carne em 31%, bem como do colesterol (10%) e das calorias (14%) (MAPA, 2016a).

  • 18

    3.1.1. Cloreto de sódio na dieta e nos produtos cárneos

    A ingestão de sódio em todo o mundo está acima da necessidade fisiológica,

    que é de 230 a 460 mg/dia. A maioria da população adulta tem ingestão média de

    sódio maior que 2.300 mg/dia e para muitos, principalmente em países asiáticos, a

    ingestão é maior que 4.600 mg/dia (BROWN, 2009).

    De acordo com dados publicados pela WHO (2007; 2010), a ingestão de

    sódio nos Estados Unidos foi estimada em 3.466 mg/dia e no noroeste do Japão em

    torno de 10.600 mg/dia. No Canadá a estimativa foi de 3.500 mg/dia (PENZ;

    JOFFRES; CAMPBELL, 2008). No Brasil, a partir dos dados da Pesquisa de

    Orçamento Familiar de 2008/2009 (POF) realizada pelo Instituto Brasileiro de

    Geografia e Estatística (IBGE, 2010), estima-se que a ingestão média de sódio é de

    4.700 mg/dia por pessoa (equivalente a quase 12 g de sal). A maior parte do sódio

    disponível para consumo foi proveniente do sal de cozinha e de condimentos a base

    desse sal (76,2%). A fração proveniente de alimentos processados com adição de

    sal representou 9,7% do total de sódio no quinto inferior da distribuição da renda per

    capita e 25% no quinto superior (SARNO, 2010).

    Em contrapartida, nos Estados Unidos a principal fonte de ingestão de sódio

    são os alimentos processados, representando 77% (SEBASTIAN, 2013). Na França,

    esse número chega a 80% (DELAHAYE, 2013) e no Reino Unido os produtos a base

    de carne vem em segundo lugar como maior fonte do consumo diário de sódio, atrás

    somente dos produtos a base de cereal, isto representa 980 mg/dia do consumo

    total de 2.560 mg/dia (WHO, 2007). Já nos países asiáticos e em muitos países

    africanos, o sal adicionado no preparo do alimento e presente em molhos e

    temperos representa a principal fonte de sódio da dieta (IBRAHIN et al, 1995). De

    acordo com a Avalição de Saúde e Nutricional Chinesa (Chinese Health and

    Nutrition Survey) realizada em 2002, 72% da ingestão de sódio foi proveniente de

    sal adicionado durante o preparo dos alimentos e 8% proveniente de molho de soja

    (LI et al., 2005).

    O consumo excessivo de sal pode levar ao aumento do volume de sangue,

    causando pressão sobre os vasos, aumentando as chances de desenvolver

    hipertensão arterial. Projeções indicam um aumento de 1,15 bilhões de hipertensos

  • 19

    em países em desenvolvimento até 2025. Existe uma variabilidade na prevalência

    global de hipertensão, estando presente em 35% da população latino americana, 20

    a 30% da população chinesa e indiana e 14% nos países da África (MITTAL;

    SINGH, 2010). A alta ingestão de sódio ainda está relacionada com a formação de

    cálculos renais (CIRILLO et al., 1994), câncer de estômago (TSUGANE et al., 2004),

    asma (CAREY et al., 1993) e osteoporose (DEVINE et al., 1995; MARTINI et al.,

    2000).

    Evidências indicam que a redução do consumo de sódio diminui riscos de

    doenças cardiovasculares (COOK et al., 2007; CHANG et al., 2006; PENZ;

    JOFFRES; CAMPBELL, 2008). A ingestão diária de menos de 2 g de sódio é

    benéfica para a pressão arterial e não apresenta efeito adverso significativo sobre os

    lipídios do sangue, os níveis de catecolaminas ou a função renal (BROWN, 2009).

    A OMS recomenda que sejam consumidos no máximo 2.000 mg de sódio/dia

    por pessoa, o equivalente a 5.000 mg de cloreto de sódio (WHO, 2012).

    Entre todas as categorias de alimentos industrializados, os produtos cárneos

    contribuem com aproximadamente 16-25% do consumo total de sódio recomendado

    (WHO, 2003).

    Trinta e duas iniciativas para redução do consumo de sal em diferentes

    países foram identificadas, sendo a maior parte na Europa (19 países). A maioria

    dos países possuem metas de consumo de sal variando de 5.000 a 8.000 mg/dia.

    Vinte e seis dessas estratégias foram conduzidas pelo governo, cinco por

    organizações não governamentais e uma por indústria. Essas estratégias incluíram

    reformulação de alimentos, iniciativas de sensibilização dos consumidores e ações

    de rotulagem (WEBSTER et al., 2011).

    A Finlândia representa um dos melhores exemplos de campanhas de redução

    de sódio a nível mundial. Na década de 70, os trabalhos foram iniciados com

    regulamentação das indústrias de alimentos, educação dos consumidores,

    reformulação de produtos, rotulagem e ações voluntárias das indústrias de

    alimentos. Este esforço resultou na redução de 40% do consumo de sódio, em 1972

    o consumo era 5.600 mg/dia, já em 2002 era 3.200 mg/dia (APPEL et al., 2012;

    KARPPANEN; MERVAALA, 2006).

    No Canadá, a indústria tem reformulado produtos para redução de sódio. O

    chamado “Sodium Working Group” foi formado pelo governo em 2007 com apoio dos

  • 20

    setores alimentícios e da saúde para supervisionar a redução de sódio na dieta de

    acordo com a Referência Dietética de Ingestão Americana e Canadense “Canadian

    and American Dietary Reference Intakes” (MOHAN; CAMPBELL; WILLIS, 2009). Em

    2010 o grupo publicou o relatório “Estratégias para Redução de Sódio no Canadá”

    (Sodium Reduction Strategy for Canada), que inclui 33 recomendações. O objetivo é

    reduzir o consumo de sódio na população de uma média de 3.400 mg/dia para 2.300

    mg/dia em 2016, com novas metas para redução posterior. É ainda recomendado

    que seja considerado como ingestão adequada 1.500 mg/dia para a idade adulta,

    com níveis mais baixos para outras faixas etárias (CAMPBELL; STRANG; YOUNG,

    2011).

    Na França, as estratégias para redução no consumo de sódio, iniciaram em

    2004, com colaboração das indústrias. Foram realizadas reformulações de produtos

    e desenvolvimento de rotulagens opcionais para teor de sódio, porém sem uma

    regulamentação.

    Todavia, não ocorreram muitas mudanças para a indústria alimentícia, exceto

    para o setor de panificação (WHO, 2007).

    Lançada em 2003, a campanha de redução da ingestão de sódio no Reino

    Unido teve como objetivo reduzir o consumo de sal de 9.500 mg/dia para 6.000

    mg/dia, equivalente a uma redução no consumo de sódio de 3.700 para 2.400

    mg/dia através da reformulação de alimentos processados, campanhas de

    sensibilização dos consumidores e melhoria das informações nutricionais nas

    embalagens (APPEL et al., 2012; INSTITUTE OF MEDICINE, 2004). A experiência

    do Reino Unido também destaca a importância de organizações não

    governamentais (ONGs) na formação de políticas, como por exemplo, o Consensus

    Action on Salt and Health, uma ONG composta por peritos científicos formada em

    1996, com o intuito de aumentar a consciência sobre os perigos da ingestão

    excessiva de sal. Seus esforços têm sido fundamentais para convencer tanto o

    governo quanto as indústrias de alimentos para prosseguir com a redução do sal

    (HE; MACGREGOR, 2009).

    Nos Estados Unidos, no período entre 2001/2002 a 2005 houve um aumento

    no consumo de sódio de 3.329 mg/dia para 3.436 mg/dia (MOHAN; CAMPBELL,

    WILLIS, 2009). Os governos estaduais e municipais estão desenvolvendo iniciativas

    para reduzir o consumo de sódio na população e a nível federal o programa Pessoas

  • 21

    Saudáveis 2020 (Health People 2020). O Instituto de Medicina do Canadá e dos

    Estados Unidos estabeleceu um nível tolerável de ingestão de 2.300 mg/dia para

    adultos (HE; MACGREGOR, 2009; INSTITUTE OF MEDICINE, 2004).

    Desde 2010, o governo brasileiro promove, por meio do Ministério da Saúde,

    discussões com instituições e organizações envolvidas direta e indiretamente com a

    redução do consumo de sódio. Em relação aos alimentos processados, estabeleceu-

    se em 2007, um termo de cooperação entre o Ministério da Saúde e a Associação

    Brasileira das Indústrias de Alimentação (ABIA), principal associação representativa

    do setor produtivo no Brasil, com o objetivo de trabalhar propostas para a

    reformulação desses alimentos (NILSON; JAIME; RESENDE, 2012). De acordo com

    a RDC nº 360 de 2003, da Agência de Vigilância Sanitária (ANVISA), o valor diário

    de referência (VDR) adotado para o sódio é de 2.400 mg (BRASIL, 2003).

    Um dos principais desafios na redução de sódio, para a indústria de

    alimentos, esbarra no aspecto econômico, visto que o cloreto de sódio é um dos

    ingredientes mais baratos utilizados no processamento de produtos cárneos e é o

    responsável por auxiliar o desenvolvimento das propriedades funcionais, sensoriais

    e de conservação nos produtos (DESMOND, 2006).

    A maioria dos produtos cárneos processados e emulsionados contêm

    quantidades variadas de sal e são associados como produtos com alto conteúdo de

    sódio. A principal fonte do sódio é o NaCl, porém outros ingredientes utilizados

    também afetam o conteúdo final de sódio nesses produtos, tais como: tripolifosfato

    de sódio, nitrato de sódio, eritorbato ou ascorbato de sódio, nitrito de sódio e

    glutamato monossódico (MAURER, 1983).

    A Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008/2009 apresentou tabelas de

    composição nutricional de alimentos consumidos no Brasil, nas quais os teores de

    sódio para salsicha foram de 1.74,71 mg/100 g, salsicha light 1.257 mg/100 g,

    mortadela 930 mg/100 g e mortadela light 716 mg/100 g (IBGE, 2010).

    Paes et al. (2011) avaliaram nove marcas de salsichas embaladas à vácuo do

    mercado brasileiro, foram encontrados os seguintes teores de sódio 745 mg/100 g,

    900 mg/100 g, 870 mg/100 g, 1.010 mg/100 g, 1.100 mg/100 g e 1.355 mg/100 g.

    Sais clorados (KCl, MgCl2 e CaCl2), fosfatos e sais orgânicos, são

    apresentadas como alternativas para uma substituição parcial de NaCl e,

  • 22

    consequentemente uma redução de sódio na elaboração de produtos processados

    (RUUSSUNEN, POULANNE, 2005).

    O KCl exerce um efeito de percepção de gosto salgado semelhante ao NaCl,

    enquanto MgCl2 e CaCl2 exercem um efeito de percepção de gosto salgado menor.

    Porém, efeitos sensoriais indesejáveis como sabor amargo e metálico são

    percebidos quando esses sais substitutos são utilizados (PÉREZ-JUAN; FLORES;

    TOLDRÁ, 2007).

    O cloreto de potássio é o substituto do sal mais utilizado em alimentos com

    baixo ou reduzido teor de sal/sódio. Entretanto, a substituição de cloreto de sódio

    por cloreto do potássio superior a 50% resulta em gosto amargo e na perda do gosto

    salino (DESMOND, 2006). Diversas pesquisas atuais concentram-se em minimizar

    os gostos amargo e metálico por meio do uso combinado de cloreto de potássio com

    outros sais supressores do gosto amargo (como glutamato monossódico, sulfato de

    magnésio e aminoácidos) (KILCAST; DEN RIDDER, 2007).

    A redução do teor de sal sem utilização de algum sal substituto pode resultar

    em um sabor brando indesejável e uma significativa perda de outros atributos, tais

    como vida útil, textura ou retenção de água. O uso de mistura de sais ou cloreto de

    potássio ajuda a manter a força iônica que exerce importante efeito funcional nos

    produtos cárneos (TERRELL, 1983).

    A substituição de aproximadamente 35% de NaCl (2,5%) por cloreto de

    potássio (KCl) ou cloreto de magnésio (MgCl2) em salsichas de carne suína ou peru,

    não apresentou alteração da aceitabilidade global do produto recém produzido, com

    decréscimo na aceitação global após 6 semanas de armazenamento refrigerado

    (HAND, TERRELL, SMITH, 1982).

    Bidlas e Lambert (2008) avaliaram a capacidade de cloreto de potássio em

    substituir o NaCl como um agente conservante. Neste estudo, foi verificado que o

    KCl em uma substituição molar direta de 1:1, possui efeito conservante similar ao sal

    comum.

    Horita et al. (2011) testaram diferentes concentrações e combinações de

    NaCl, KCl, MgCl2 e CaCl2 em mortadelas com teor reduzido de gordura. A

    substituição de 50% de NaCl por KCl, não apresentou diferença significativa em

    relação a proposta com 2% de NaCl. Além disso, a substituição do cloreto de sódio

    por outros sais não comprometeu a estabilidade microbiológica em até 45 dias de

  • 23

    prateleira, especialmente com relação ao crescimento de micro-organismos

    psicrotróficos.

    Pesquisas tem demonstrado que o aumento na ingestão de potássio, que

    proporcionalmente eleva o nível de potássio plasmático, inversamente se associa à

    diminuição da pressão sanguínea e à diminuição da mortalidade por acidente

    vascular cerebral e por doenças cardíacas (WHELTON, 1997; 1999).

    3.1.2. Nitrito de sódio nos produtos cárneos

    Nitratos e nitritos são aditivos alimentares, classificados como conservantes

    de acordo com a Legislação Brasileira de Alimentos, ou seja, são substâncias

    adicionadas aos alimentos que visam evitar sua deterioração (BRASIL, 1998). Além

    do papel de conservante, os nitritos são utilizados no processo de cura de produtos

    cárneos para retardar o processo de oxidação dos lipídios evitando a rancidez e a

    formação de off-flavor, fixar e desenvolver cor pela formação de nitrosomioglobina,

    pigmento de coloração rósea (ALMUDENA; LIZANO, 2001; PETENUCI et al., 2004).

    O termo “curado” relativo a produtos cárneos processados é entendido

    universalmente como a adição de nitrito ou nitrato juntamente com sais e outros

    ingredientes à carne para melhorar a preservação (PEGG; SHAHIDI, 2000). Para

    produtos curados, o nitrito é um ingrediente único e diferencial, para o qual não há

    substituto capaz de prover as características desejadas nos produtos como salsicha,

    mortadela, bacon e presunto (SEBRANEK; BACUS, 2007).

    O nitrito de sódio também é considerado um dos ingredientes essenciais na

    fabricação de produtos cárneos devido à inibição do crescimento de Clostridium

    botulinum (WEISS et al., 2010).

    Além disso, a concentração de nitrito em produtos cárneos curados diminui

    durante o processo de produção e a vida de prateleira. Pardi et al. (1994) estima que

    50% do nitrito adicionado é perdido em 24 horas e menos de 10% permanece após

    7 dias.

    Apesar dos benefícios tecnológicos, a redução da utilização de nitritos tornou-

    se fundamental para a indústria pelo efeito tóxico do excesso de nitrito na dieta, com

  • 24

    a formação endógena de nitrosaminas que apresentam efeito cancerígeno

    (JAKSZYN; GONZALEZ, 2006).

    A ingestão diária elevada de íons nitrito a partir de alimentos e água ocasiona

    acúmulo desses íons no sistema digestório, ocorrendo absorção e consequente

    entrada na corrente sanguínea. Estes íons podem agir sobre a hemoglobina,

    originando a metahemoglobina, a qual não transporta o oxigênio, limitando a

    capacidade do sangue de carregar oxigênio para os tecidos (YUE; SONG, 2006).

    Nos Estados Unidos, é proibida a adição direta de nitrito ou nitrato em

    produtos cárneos naturais e processados orgânicos (USDA, 2005; USA, 2016). A

    estratégia utilizada pela indústria foi adicioná-los indiretamente por meio de

    ingredientes que em sua composição possuam alto teor nitrato, como sal marinho,

    condimentos e aromatizantes naturais. Outra alternativa é utilizar sucos

    concentrados ou o pó de vegetais vastamente conhecidos como fonte de nitrato,

    com concentração entre 1.500 e 2.800 ppm, como o aipo, a alface e a beterraba

    (SEBRANEK; BACUS, 2007).

    A legislação vigente no Brasil estabelece como quantidade residual máxima

    para nitritos e nitratos, respectivamente, 150 mg/kg e 300 mg/kg (BRASIL, 1998).

    Em uma pesquisa realizada em Recife sobre o teor residual de nitrito e nitrato

    de sódio em 54 amostras de salsichas tipo hot dog foi constatado que 56% das

    amostras estavam em desacordo com o limite máximo especificado para nitrato na

    legislação (300 mg/kg). Em relação ao nitrito, foi verificado que 18% das amostras

    apresentaram valores acima de 150 mg/kg (MELO FILHO; BISCONTINI; ANDRADE,

    2004).

    Já em Salvador, foi verificado que 44,44% das amostras de salsichas (5/11

    salsichas de ave e 7/16 salsichas de carne suína e bovina com ave) apresentaram

    teor de nitrito acima de 150 mg/kg (ANDRADE; TRIGUEIRO, 2008).

    Oliveira et al. (2017) analisaram a concentração de nitrito de sódio de 270

    amostras de embutidos (salsicha, mortadela e linguiça frescal) de três diferentes

    marcas, obtidas no comércio de Avaré - SP e região. Entre esses produtos, a

    concentrações médias de nitrito variaram de 29,25 a 249,80 ppm. As amostras de

    linguiça das marcas A e C apresentaram um teor de nitrito superior a 150 ppm.

  • 25

    3.2. Clostridium difficile

    O C. difficile é uma bactéria anaeróbia estrita, heterotrófica (YUILLE et al.

    2015) e mesófila que pode ser encontrada no solo, na água e no trato digestório de

    mamíferos (BAUER; KUIJPER, 2015; LAWSON et al., 2016). As colônias de C.

    difficile em meio ágar C. difficile moxalactan norfloxacina (CDMNA) apresentam

    coloração acinzentada ou branca, opacas, chatas ou pouco convexas, rizoídes ou

    circulares e de tamanho variando de 2 - 5 mm (GEORGE et al., 1979) e odor

    característico de esterco de cavalo (DELMÉE, 2001). Os esporos são ovais,

    subterminais e intumescidos (LAWSON et al., 2016).

    Filogeneticamente, o C. difficile pertence à família Peptostreptococcaceae

    (LUDWIG et al., 2009). O gênero Clostridium é dividido em clusters baseados em

    análise de 16S rDNA, o C. difficile pertence ao grupo XI, outras espécies

    pertencentes a este cluster são o C. sordellii e C. bifermentans, Peptostreptococcus

    anaerobius e Eubacterium tenue (COLLINS et al., 1994).

    Yutin e Galperin (2013) sugeriram a reclassificação de C. difficile para

    Peptoclostridium difficile. Recentemente o C. difficile foi rebatizado como

    Clostridioides difficile (LAWSON et al.,2016).

    Em 2013, o odor característico do micro-organismo possibilitou a identificação

    da infecção em pessoas por um cachorro durante um surto da doença num hospital

    em Amsterdã. O cão foi treinado para sentar ou deitar quando identificasse à

    presença do odor específico do C. difficile, a análise pelo cão consistiu em andar

    entre as camas dos pacientes na ala do hospital. O cachorro realizou 651 análises,

    envolvendo 371 pacientes, foram identificados corretamente 12 dos 14 casos de CDI

    (sensibilidade 86%) e 346 dos 357 participantes CDI negativos (especificidade de

    97%) (BOMERS et al., 2014).

    O micro-organismo foi descrito em 1935 por Hall e O‟Toole, isolado das fezes

    de neonatos sadios, nascidos em Denver. Inicialmente foi denominado de Bacillus

    difficilis devido à dificuldade em isolar e manter o micro-organismo em cultura pura.

    Hall e O‟Toole observaram que a injeção da cultura líquida ou do filtrado do meio

    que continha o C. difficile em animais experimentais apresentou efeito tóxico,

  • 26

    causando lesões, parada respiratória e morte (HALL; O‟TOOLE, 1935; LYERLY;

    KRIVAN; WILKINS, 1988).

    A colite associada ao tratamento com antibiótico foi observada pela primeira

    vez em 1950, quando o uso crescente de cloranfenicol e tetraciclina foram

    relacionados com o aumento da incidência de colite pseudomembranosa (PMC)

    (GEORGE, 1984).

    Na década de 1970, a PMC atingiu proporções epidêmicas, tornando-se uma

    complicação comum ao uso de antibióticos. O tratamento com antibióticos foi

    considerado o fator desencadeante da PMC, possivelmente pela eliminação das

    bactérias entéricas, favorecendo o C. difficile (KELLY et al., 1994; LYERLY,

    KRIVAN, WILKINS, 1988).

    Todavia, somente em 1977 é que foi identificada nas fezes dos pacientes a

    toxina que causava mudanças citopáticas nos tecidos (LARSON et al., 1977).

    Bartlett et al. (1978) identificaram o C. difficile como o produtor desta toxina e o

    agente etiológico da PMC associada ao tratamento com antibióticos.

    Basicamente, qualquer antibiótico pode facilitar a infecção por C. difficile,

    porém, os antibióticos de amplo espectro com atividade contra as bactérias entéricas

    são os mais comuns (KELLY et al., 1994).

    A infecção causada por C. difficile (CDI) varia desde diarreia autolimitada a

    PMC, megacólon tóxico, sepse e morte (AMY; JOHANESEN; LYRAS, 2015;

    RUPNIK; WILCOX; GERDING, 2009).

    Os fatores de risco relacionados ao CDI incluem período longo de

    hospitalização, exposição prolongada aos antibióticos, comorbidades subjacentes e

    idade superior a 65 anos (BADGER et al., 2012).

    Para o crescimento do micro-organismo, após a ingestão de esporos, é

    essencial que a microbiota intestinal esteja desequilibrada, típica, mas não

    exclusivamente por efeito de antibióticos (KELLY et al., 1994; MOORE et al., 2013;

    SORG; SONENSHEIN, 2008). O tratamento com antibióticos é o fator de risco mais

    importante por causar alteração da microbiota, favorecendo a colonização pelo C.

    difficile e subsequente infecção (JOHNSON; GERDING, 1998). O desenvolvimento

    da doença também esta associado à falha da resposta imunológica contra as toxinas

    produzidas pelo C. difficile (SANCHEZ-HURTADO et al., 2008).

  • 27

    O micro-organismo é adquirido, em muitos casos, a partir de origem exógena:

    de um indivíduo contaminado, de pessoas que cuidam do paciente ou indiretamente

    a partir de ambiente contaminado (PAREDES-SABJA; SHEN; SORG, 2014).

    A forma vegetativa de C. difficile é sensível à presença de oxigênio e resiste

    por pouco tempo em condições aeróbias no ambiente. Já os esporos podem

    permanecer viáveis por longos períodos e resistir a diversos tipos de desinfetantes,

    favorecendo a contaminação ambiental, principalmente em hospitais (BUGGY;

    WILSON; FEKETY, 1983).

    Edwards et al. (2016) demonstraram que os esporos apresentam alta

    resistência ao etanol, peróxido de hidrogênio e clorofórmio, enquanto células

    vegetativas de C. difficile foram rapidamente destruídas por esses agentes.

    Os esporos de C. difficile possuem ultraestrutura semelhante à dos esporos

    de outras espécies do gênero Clostridium e Bacillus. Entretanto as análises por

    microscopia eletrônica de transmissão (MET) revelaram que a camada externa do

    exósporo de esporos de C. difficile exibem várias características únicas (BARRA-

    CARRASCO et al., 2013; GIL et al., 2017; PERMPOONPATTANA et al., 2011). O

    exósporo da maioria dos isolados de C. difficile apresenta projeções semelhantes a

    cabelo (Figura 1), similar ao exósporo de esporos de Bacillus cereus (PAREDES-

    SABJA; SHEN; SORG, 2014).

    Pesquisas indicam que as proteínas das camadas mais externas do exósporo

    apresentam papel relevante nas interações entre o esporo e as células do

    hospedeiro (BARRA-CARRASCO et al., 2013; PHETCHARABURANIN et al., 2014),

    semelhante ao verificado aos esporos de B. cereus (STEWART, 2015).

    Análises por MET de células Caco-2, modelo do adenocarcinoma de cólon

    humano, demonstraram que as projeções semelhantes a cabelos presentes na

    superfície dos esporos de C. difficile R20291 estavam próximas à membrana

    plasmática e às microvilosidades das monocamadas indiferenciadas e diferenciadas

    de células Caco-2, sugerindo que estas projeções do exósporo de C. difficile

    favorecem a aproximação dos esporos e das células epiteliais do intestino (MORA-

    URIBE et al., 2016).

    Além disso, foi verificado que não há espaço entre o exósporo e a capa do

    esporo, a camada mais externa do esporo está em contato direto com a capa do

    esporo, de forma semelhante à camada mais externa de esporos de Bacillus subtilis

  • 28

    (BARRA-CARRASCO et al., 2013; PAREDES-SABJA; SHEN; SORG, 2014;

    STEWART, 2015).

    Díaz-González et al. (2015) identificaram 184 proteínas no exósporo de

    esporos de C. difficile: 7 proteínas de revestimento da capa dos esporo/exósporo; 7

    proteínas possivelmente envolvidas com a resistência dos esporos; 6 possivelmente

    envolvidas na patogenicidade; 13 proteínas não caracterizadas e 146 proteínas

    citosólicas. As camadas subjacentes do esporo de C. difficile são semelhantes aos

    observados em outros esporos bacterianos (GIL et al., 2017).

    Segundo Barra-Carrasco et al. (2013), a proteína rica em cisteína do

    exósporo do C. difficile (CdeC - C. difficile exosporium cysteine - rich protein), é

    essencial na morfogênese do exósporo, das projeções semelhantes a cabelo e na

    resistência à agentes físicos e químicos. Nesta pesquisa foi verificado que os

    esporos da cepa mutante de C. difficile, sem o gene responsável pela formação da

    CdeC, apresentaram menor resistência ao etanol e ao calor, praticamente ausência

    do exósporo e não foi observado projeções semelhantes a cabelo.

    Figura 1. Ultraestrutura do esporo do C. difficile R20291, ribotipo 027, esta cepa

    apresenta os genes tcdA, tcdB, cdtB e não possui o gene ctdA. O exósporo (Ex) e a

    capa do esporo (Ct) estão identificados na figura (BARRA-CARRASCO et al., 2013).

    A CDI é causada por toxinas produzidas durante a fase logarítmica de

    crescimento das células vegetativas (RUPNIK; WILCOX; GERDING, 2009).

    Os principais fatores de virulência do C. difficile são duas exotoxinas: a toxina

    A (TcdA) e a toxina B (TcdB), formadas por monocadeias polipeptídicas de alto peso

    molecular com múltiplos domínios e estruturas com funcionalidades distintas

    (MONAGHAN, 2015). Além disso, algumas cepas de C. difficile produzem uma

  • 29

    toxina binária C. difficile transferase (CDT), associada a casos mais severos da

    doença (SCHWAN et al., 2014).

    Recentemente, a epidemiologia das infecções por C. difficile tem se tornado

    complexa, com casos de CDI sendo observados na comunidade (FREEMAN et al.,

    2010; GUPTA; KHANNA, 2014). Além do aumento na incidência de CDI, também

    tem sido verificado aumento na gravidade da infecção, altas taxas de recorrência

    sintomática e aumento significante nas taxas de mortalidade, ocorrendo em

    populações antes consideradas de baixo risco, como pacientes jovens sem doença

    prévia e mulheres peri-parto (FREEMAN et al., 2010; GAREY et al., 2008; YE et al.,

    2016).

    Um dos fatores relacionados com a crescente letalidade de CDI foi o

    aparecimento de cepas hipervirulentas conhecidas como North American Pulsed

    Field type 1 (NAP1), Endonuclease de Restrição (Restriction Endonuclease - REA)

    tipo BI e a designação baseada na tipagem molecular por meio de ribotipagem 027

    (NAP1/BI/027) (COHEN et al., 2010; FREEMAN et al., 2010; TO; NAPOLITANO,

    2014).

    As cepas hipervirulentas são caracterizadas pela produção significativamente

    maior das toxinas TcdA e TcdB e pela sua resistência à fluoroquinolonas; muitas

    vezes produzem mais esporos, em comparação com outras linhagens e sintetizam a

    toxina binária CDT (SCHWAN et al., 2014).

    O ribotipo 027 foi identificado pela primeira vez na província do Québec

    (Canadá), em 2005, como causa de surtos hospitalares de infecção severa com alta

    taxa de mortalidade (LOO et al., 2005).

    O C. difficile é a principal causa de infecção nosocomial em países

    desenvolvidos (ELLIOT et al., 2017). Nos Estados Unidos, a taxa de mortalidade por

    CDI varia entre 5 e 10%, resultando em mais de 14.000 mortes por ano

    (DUBBERKE; OLSEN, 2012; HONDA; DUBBERKE, 2014). O ônus econômico anual

    é estimado em 5,4 bilhões de dólares, dos quais 4,7 bilhões de dólares

    correspondem aos custos para o sistema de saúde e 725 milhões de dólares

    correspondem aos gastos comunitários indiretos (DESAI et al., 2016).

    A incidência de CDI aumentou substancialmente nos últimos anos (Figura 2).

    De acordo com os dados do Projeto de Custo e Utilização do Sistema de Saúde

    (Healthcare Cost and Utilization Project), a incidência de CDI nos Estados Unidos,

  • 30

    como qualquer tipo de diagnóstico, no ano 2000 foi 134.518 casos, já em 2014 foi

    361.945 casos (HCUP, 2017).

    Figura 2. Casos de CDI nos Estados Unidos (Adaptado de HCUP, 2017).

    A CDI adquirida na comunidade corresponde a um quarto de todos os

    pacientes diagnosticados com CDI (KARLSTROM et al., 1998; KHANNA et al., 2012;

    NOREN et al., 2004).

    Estudos recentes indicam que, após admissão em hospitais, é estimado que

    8% das pessoas tornam-se portadores assintomáticos de cepas toxigênicas de C.

    difficile e, para estes o risco de desenvolvimento de CDI é maior quando comparado

    com pacientes não portadores do micro-organismo (ZACHARIOUDAKIS et al.,

    2015).

    Várias pessoas que tiveram o trato digestório colonizado por cepas

    toxigênicas de C. difficile tornaram-se portadores assintomáticos (KYNE et al., 2000;

    LOO et al., 2011; MCFARLAND et al., 1986; SHIM et al., 1998). Todavia, o papel

    desempenhado por portadores assintomáticos na transmissão de CDI ainda não foi

    determinado (DONSKEY; KUNDRAPU; DESHPANDE, 2015).

    3.2.1. Patogenicidade de C. difficile

    As toxinas TcdA e TcdB entram nas células por endocitose mediada por

    receptor (PAPATHEODOROU et al., 2010).

    050.000

    100.000150.000200.000250.000300.000350.000400.000

    20

    00

    20

    01

    20

    02

    20

    03

    20

    04

    20

    05

    20

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    20

    07

    20

    08

    20

    09

    20

    10

    20

    11

    20

    12

    20

    13

    20

    14

    N° d

    e c

    aso

    s d

    e C

    DI

    (EU

    A)

    Ano

  • 31

    Ambas as toxinas TcdA e TcdB são glicosiltransferases (GTPAses) que

    inativam as GTPases da célula hospedeira, causando ruptura do citoesqueleto de

    actina, o que resulta em apoptose. Isto produz a perda da barreira epitelial intestinal

    pela abertura das junções entre as células, aumentando a permeabilidade intestinal

    e o acúmulo de fluidos, seguido pelo aparecimento de diarreia (JANK; AKTORIES,

    2008; VOTH; BALLARD, 2005).

    As toxinas TcdA e TcdB também induzem a liberação de citocinas que

    conduzem à ativação de neutrófilos, mastócitos, nervos entéricos e neurônios

    sensoriais dentro da lâmina própria do intestino. Estes, por sua vez, induzem a

    liberação de neuropeptídeos e citocinas pró-inflamatórias que resultam na resposta

    inflamatória e a formação de pseudomembrana (SHEN, 2012; SUN; HIROTA, 2015).

    A importância das toxinas A e B para a patogenicidade da CDI tem causado

    polêmica. Antigamente, acreditava-se que a toxina A era o principal fator de

    virulência no CDI, contudo estudos recentes utilizando cepas mutantes de C. difficile

    (produzindo apenas a toxina A ou B) mostraram que somente a TcdB é essencial

    para a virulência (LYRAS et al., 2009).

    Já em estudos posteriores, com modelos de infecção em hamster e cepas

    mutantes de C. difficile, foi observado que tanto as cepas TcdA-/TcdB+ como as

    cepas TcdA+/TcdB- foram capazes de causar a doença (KUEHNE et al., 2010;

    KUEHNE; CARTMAN; MINTON, 2011).

    Além da cepa hipervirulenta NAP1/BI/027, outras cepas emergentes de

    ribotipo 017 e 078 estão sendo associadas a casos graves da doença na Ásia e

    Europa (BOUILLAUT; SELF; SONENSHEIN, 2013; DRUDY et al., 2007; KIM et al.,

    2008).

    A toxina CDT é composta por duas cadeias: uma molécula apresenta

    atividade de ADP-ribosiltransferase (CDTa) e o segundo componente (CDTb) está

    envolvido na ligação da toxina às células do hospedeiro e é responsável pela

    translocação da enzima para o citosol. A CDT age sobre G-actina inibindo a

    polimerização da actina, o que facilita a colonização por indução da formação de

    saliências de células (GERDING et al., 2014).

    As cepas que produzem CDT, na ausência de TcdA e TcdB, foram

    observadas em casos de CDI em indivíduos imunocomprometidos (ANDROGA et al.,

    2015; ECKERT et al., 2015; GRANDESSO et al., 2016).

  • 32

    Além desses fatores, o C. difficile é capaz de formar um biofilme sobre

    superfície abiótica, mas a robustez do biofilme formado varia entre linhagens. As

    células bacterianas são incorporadas numa matriz composta de DNA, proteínas e

    polissacarídeos, incluindo várias proteínas da parede celular e toxinas (TcdA)

    (JANOIR, 2016; PANTALÉON et al., 2015; SEMENYUK et al., 2014). A formação de

    biofilme por C. difficile é modulada por reguladores centrais (Spo0A e LuxS), e por

    componentes de superfície tais como os flagelos e cisteína protease Cwp84

    (DAWSON et al., 2012; PANTALÉON et al., 2015).

    Existem fortes evidências sobre a capacidade de C. difficile formar biofilme in

    vivo. Em um estudo com ratos foi observado que as células de C. difficile formaram

    aglomerados em associação ao tecido danificado, o que poderia sugerir a formação

    de microcolônias (LAWLEY et al., 2009). Pesquisas demonstram que células de C.

    difficile alocam-se em comunidades multicelulares em associação com a mucosa do

    hospedeiro (SEMENYUK et al., 2015). Sabe-se que os biofilmes contribuem com a

    resistência aos antibióticos de C. difficile, bem como com o estresse de oxigênio

    (DAWSON et al., 2012; SEMENYUK et al., 2014) e em promover a persistência de

    esporos resistentes (CROWTHER et al., 2014). No entanto, torna-se necessário

    definir mais precisamente o papel da formação de biofilme em CDI e suas

    recorrências.

    Os genes tcdA e tcdB que codificam, respectivamente, as toxinas TcdA e

    TcdB estão no lócus de patogenicidade (Pathogenicity locus - PaLoc), fragmento de

    19,6 kb (BRAUN et al., 1996). Também estão codificados no PaLoc três genes

    acessórios: tcdR, regulador positivo; tcdC, regulador negativo e tcdE, gene que

    codifica uma proteína similar a holina (HUNDSBERGER et al., 1997), requerido para

    liberação de toxina (GOVIND; DUPUY, 2012) (Figura 3). Em cepas não toxigênicas,

    o PaLoc é substituído por um fragmento de 115/85 pb (BRAUN et al., 1996; DINGLE

    et al., 2014).

    Quanto à toxina CDT, os genes cdtA e cdtB codificam, respectivamente os

    componentes CDTa e CDTb, situados numa região cromossômica de 6,2 kb,

    conhecido como CdtLoc. Também está presente o gene cdtR, regulador requerido

    para expressão (CARTER et al., 2007). Nas cepas que não produzem a toxina

    binária, essa região é substituída por uma sequência de 68 pb (CARTER et al.,

  • 33

    2007). O cdtR também mostrou regular a produção das toxinas A e B em algumas

    cepas (LYON et al., 2016).

    Figura 3. A: PaLoc- tcdR, tcdB, tcdE, tcdA e tcdC. B: Genes codificadores da toxina

    binária - cdtR, cdtA e cdtB (Adaptado de ELLIOTT et al., 2017).

    A identificação por PCR-ribotipagem é um dos métodos utilizados para

    caracterizar os isolados de C. difficile (Tabela 1). Já a classificação do perfil

    toxigênico das cepas de C. difficile é baseada na variabilidade da região

    cromossômica que codifica as toxinas TcdA e TcdB (PaLoc), em relação a cepa de

    referência VPI 10463. Cada tipo toxigênico possui cepas com alterações idênticas

    nesta região do PaLoc. Atualmente são conhecidos 34 tipos toxigênicos, sendo que

    a cepa VPI 10463 pertence ao tipo 0 (RUPNIK; JANEZIC, 2016).

    A compreensão das alterações nos genes tcdA e tcdB e, consequentemente

    das propriedades funcionais das variantes das TcdA e TcdB, é fundamental em

    estudos epidemiológicos, em desenvolvimento de vacinas e no diagnóstico

    molecular (DINGLE et al., 2014; LANIS et al., 2013; RUPNIK, 2008).

    Existem várias razões pelas quais diferentes tipos toxigênicos podem se

    correlacionar com as diferentes formas da doença, por exemplo, a produção de

    toxinas com propriedades distintas. Já foi demonstrado para algumas linhagens que

    as toxinas produzidas diferem nas propriedades catalíticas em relação à cepa VPI

    10463 (CARMAN et al., 2011).

  • 34

    A heterogeneidade da sequência de aminoácidos nas toxinas resulta em

    alterações na imunorreactividade, especificidade do substrato e efeito citopático

    (RUPNIK, 2008).

    Tabela 1. Classificação por tipo toxigênico e correlação com ribotipo.

    Tipo TcdA TcdB CDT Ribotipo Cepa

    0 + + - 087 VPI 10463 0/v + + + 131 597B I + + - 102 EX 623 II + + - 103 AC 008

    IIIa + + + 080 SE 844 IIIb + + + 027 R 12087 IIIc + + + 251 CH6230 IIId + + + SLO 042 3073 IIIe + + + 251 AI 541 IV + + + 023 55767 V + + + 045 SE 881 VI + + + 127 51377 VII + + + 063 57267 VIII - + - 017 1470 IXa + + + 019 51680 IXb + + + 244 TFA/V20-1 IXc + + + 109 8785 IXd + + + SLO 228 1732874 Xa - + + 591 (CE) 8864 Xb - + + SLO 032 J9965 XIa - - + 033 IS 58 XIb - - + 288 (CE) R 11402 XIc - - + 033 OCD 5/2 XId - - + 153 (CE) TFA/V14-10 XII + + - 258 IS 25 XIII + + - 070 R 9367

    XIVa + + + 111 R 10870 XIVb + + + 122 R 9385 XVI - + + 078 SUC36

    XVIII + + - 014 K095 XIX + + - 018 TR13

  • 35

    Cont. Tabela 1.

    Tipo TcdA TcdB CDT Ribotipo Cepa

    XX + + - SLO 005 TR14 XXI + + - SLO 035 CH6223 XXII + + + 027 CD07-468 XXV + + + 027 7325 XXVI + + - 050 (CE) 7459 XXVII + + - SLO037 KK2443/2006 XXVIII + + + 126 CD08-070 XXIX + + - 001 CD07-140 XXX - + + SLO 101 ES 130 XXXI - + + SLO 098 WA 151 XXXII - + - 151 (CE) 173070 XXXIII + + - SLO 086 2402 XXXIV - + - SLO 201 CD10-055

    Fonte: RUPNIK; JANEZIC (2016).

    3.2.2. Ocorrência em alimentos

    C. difficile tem sido isolado de diversos animais e de grande variedade de

    alimentos, todavia faltam evidências para confirmar a hipótese de uma doença

    transmitida por alimentos ou zoonose. A Tabela 2 mostra um resumo da detecção de

    C. difficile em alimentos.

    Provavelmente a primeira descrição de C. difficile em alimentos foi realizada

    em 1996, por Broda e colaboradores. Nesse estudo o micro-organismo foi isolado de

    amostras deterioradas de carne embalada a vácuo.

    Em Glasgow (Escócia), das 40 amostras analisadas de saladas prontas para

    consumo, em 3 (7,5%) foi observado à presença de C. difficile. Dois isolados foram

    identificados como ribotipo 017 (toxina A-/B+) e o outro isolado foi identificado como

    ribotipo 001 (BAKRI et al., 2009).

    No Irã, esporos de C. difficile foram detectados em 1,36% (5/368) das

    amostras de alimentos prontos para o consumo. A maior prevalência foi observada

    em amostras de salada (4,29%), seguido pelo iogurte árabe (2%) (RAHIMI; AFZALI;

    BAGHBADORANI, 2015). Já para as carnes, a maior incidência de C. difficile foi

    encontrada em carne de búfalo (9%), carne caprina (3,3%), carne bovina de gado de

  • 36

    corte jovem (1,7%), carne bovina de gado leiteiro adulto (0,94%) e carne ovina

    (0,9%) (RAHIMI; JALALI; WEESE, 2014).

    Em uma casa de repouso na Bélgica foram coletadas amostras de 246

    superfícies do ambiente e 188 amostras de alimentos. O C. difficile foi detectado em

    uma amostra (0,53%) de uma a refeição composta por linguiça de porco, molho de

    mostarda e salada de cenoura, preparada na cantina da casa de repouso. O isolado

    foi identificado como ribotipo 078 (RODRIGUEZ et al., 2015).

    Um estudo realizado com 40 amostras obtidas em 5 pontos de venda no

    Texas (Estados Unidos da América - EUA) detectou C. difficile em 3 amostras

    (7,5%): uma amostra de carne suína moída, uma amostra de chouriço de porco e

    uma amostra de carne de peru moída (HARVEY et al., 2011).

    Mooyottu et al. (2015) analisaram 300 amostras de carne (100 amostras de

    carne suína, 100 amostras de carne bovina moída e 100 amostras de carne de

    frango), obtidas a partir de mercearias geograficamente distantes em Connecticut

    (EUA). O C. difficile foi observado em 2% das amostras de carne suína.

    Em outra pesquisa realizada na Bélgica, o C. difficile foi identificado em 2,3%

    (3/133) das amostras de carne bovina (duas amostras de hambúrguer e uma

    amostra de carne moída) e em 4,7% (5/107) das amostras de carne suína (duas

    amostras de carne suína moída, duas amostras de linguiça suína e uma amostra de

    linguiça fresca chipolata) (RODRIGUEZ et al., 2014).

    Em Costa do Marfim, Kouassi et al. (2014) analisaram 172 amostras de rim

    bovino cozido e 223 amostras de carne bovina cozida adquiridas de vendedores

    ambulantes entre 2009 e 2010. Foi verificada a incidência de 12,4% de C. difficile

    nas amostras (11,04% em rim e 13,45% em carne).

    Em Ontário (Canadá), o C. difficile ribotipo 078 foi detectado em 12,8%

    (26/203) das amostras de carne de frango (sobrecoxa, coxa e asa) adquiridos em

    pontos de venda. Em relação aos cortes de carne, foram positivas 9% (10/111) das

    amostras de coxa, 18% (13/72) das amostras de asas e 15% (3/20) das amostras de

    sobrecoxa (WEESE et al., 2010).

    Na Austrália, um estudo analisou raízes vegetais de cultivo orgânico e

    tradicional (batata, beterraba, cebola e cenoura), foi observada a incidência de

    contaminação por C. difficile de 30% (30/100) das amostras. Apresentaram resultado

    positivo para C. difficile 55,6% das amostras de batata orgânica, 50% das amostras

  • 37

    de batata de cultivo convencional, 22,2% das amostras de beterraba orgânica, 5,6%

    das amostras de cebola orgânica e 5,3% de cenoura orgânica. Foram identificados

    como cepas toxigênicas 51,2% (22/43) dos isolados, predominantemente A+B+CDT-

    (81,8%, 18/22). Um isolado apresentou perfil A+B+CDT+ (2,3%) (LIM et al., 2018).

    Em hospitais, na região central da Itália, foi detectada a presença de cepas

    toxigênicas de C. difficile em 0,6% (2/350) das amostras de alimentos, sendo a

    incidência de 0,3% (1/296) em amostra de alimento cozido (carne de frango) e de

    1,96% (1/54) em alimento não cozido (salada de alface) (PRIMAVILLA et al., 2019).

    Troiano et al. (2015) constataram a ocorrência de C. difficile em moluscos

    bivalves comestíveis no sul da Itália. Foram investigadas 925 amostras, das quais

    3,9% continham C. difficile. Dezoito isolados apresentaram perfil toxigênico A+/B+ e

    um isolado apresentou o perfil A-/B+. Os genes para a toxina binária foram

    detectados em 22,2% dos isolados. Quanto ao ribotipo, foram detectados: o 078/126

    em 22,2% dos isolados, o 010 em 19,4% dos isolados e o 001 em 8,3% dos

    isolados.

    Norman et al. (2014) verificaram a prevalência de C. difficile em amostras de

    peixes e frutos do mar adquiridas em supermercados no Texas (EUA). O C. difficile

    foi encontrado em 4,5% (3/67) das amostras (uma amostra de mexilhão, uma

    amostra de salmão e uma amostra de camarão).

    Na Slovênia, uma pesquisa analisou a prevalência de C. diffcile em 154

    amostras de vegetais folhosos e raízes (64 amostras de alface de cordeiro, 22

    amostras de alface, 11 amostras de folhas de dente de leão, 2 amostras de alface

    jovem, 2 amostras de rúcula, 2 amostras de radicchio, uma amostra mista de

    vegetais folhosos, 15 amostras de gengibre e 75 amostras de batata). Resultado

    positivo para a presença de C. difficile foi verificado em 18,2% (28/154) das

    amostras (28% das amostras de batata, 9,4% das amostras de vegetais folhosos e

    6,7% das amostras de gengibre). Foram isoladas 115 cepas de C. difficile, a

    incidência de cepas toxigênicas foi 8,7% (10/115) dos isolados, predominantemente

    o ribotipo 014/020 (TKALEC et al., 2019).

    Rodriguez-Palacios et al. (2010) demonstraram que os esporos de C. difficile

    sobrevivem por 2 h a 71°C. Assim, o processamento térmico atualmente aplicado

    nas indústrias de produtos cárneos pode ser insuficiente para reduzir esporos de C.

    difficile para um nível aceitável.

  • 38

    A fonte de contaminação dos animais é desconhecida, todavia foram

    observadas as mesmas cepas em animais e em seres humanos, indicando que a

    fonte de contaminação pode ser comum ou que os animais podem ser a fonte de

    contaminação da população (WEESE, 2010).

  • 39

    Tabela 2. Prevalência da contaminação de alimentos por C. difficile.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência

    Bibliográfica

    Produtos cárneos (linguiça, carne

    bovina/suína/peru moída, choriço e

    linguiça de fígado de porco)

    88 42,00 73% dos isolados identificados como

    ribotipo 078 e 27% dos isolados identificados como ribotipo 027

    Tuscon (EUA) Songer et al. (2009)

    Carne bovina, suína e de frango 84 0 - Áustria Indra et al. (2009)

    Salada pronta para consumo 40 7,50

    75% dos isolados identificados como ribotipo 017 (A-/B+) e 25% dos

    isolados identificados como ribotipo 001

    Glasgow (Escócia) Bakri et al. (2009)

    Carne moída mista (amostras compostas

    por carne suína e carne bovina)

    70 4,29

    66,67% dos isolados identificados como ribotipo AI-57 (AI refere a

    isolado na Áustria) e 33,33% dos isolados identificados como ribotipo

    053

    Áustria Jöbstl et al. (2010)

    Carne bovina embalada a vácuo 13 15,38

    Foram analisadas 8 amostras deterioradas e 5 amostras não

    deterioradas

    Estado de São Paulo Marques (2010)

    Carne de frango 203 12,80 Isolados identificados como ribotipo 078 Ontário

    (Canadá) Weese et al. (2010)

  • 40

    Cont. Tabela 2.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de

    contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência

    Bibliográfica

    Produtos cárneos (varejo) 40 7,50

    Foram analisadas amostras de carne suína moída, chouriço de

    porco e carne de peru moída Texas (EUA) Harvey et al. (2011)

    Peixes e frutos do mar 119 4,80 80% dos isolados identificados

    como ribotipo 078 e 20% apresentaram perfil toxigênico A-/B-

    Canadá Metcalf et al. (2011)

    Carne (bovina moída, bovina peça, suína e

    de frango) 147 11,50

    6,25% dos isolados apresentaram pelo menos um gene de virulência avaliado (A-/B+), 35% dos isolados apresentaram os genes tcdA e tcdB (A+/B+) e 58,75% dos isolados não apresentaram os genes tcdA e tcdB

    (A-/B-)

    Campinas Tsuchiya (2012)

    Produtos cárneos 102 2,00 Isolados identificados como ribotipo 078 Pittsburgh

    (EUA) Curry et al. (2012)

    Produtos de carne suína 31 35,48

    Isolados identificados como ribotipo 078

    Pittsburgh (EUA) Curry et al. (2012)

    Carne bovina moída 956 0 EUA Kalchayanand et al. (2013)

  • 41

    Cont. Tabela 2.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de

    contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência

    Bibliográfica

    Produtos cárneos 133 2,30

    25% dos isolados identificados como ribotipo 078, 50% dos

    isolados identificados como ribotipo 014, 12,5% dos isolados

    identificados como ribotipo UCL57 e 12,5% dos isolados

    identificados como ribotipo UCL378

    Bélgica Rodriguez et al. (2014)

    Produtos cárneos prontos para o

    consumo (rim bovino cozido e carne bovina

    cozida)

    395 12,40 - Costa do Marfim Kouassi et al. (2014)

    Carne (bubalina, caprina, ovina, bovina

    de gado de corte jovem e de gado

    leiteiro adulto)

    660 2,00

    53,9% dos isolados identificados como ribotipo 078, 30,8% dos

    isolados apresentaram os genes tcdA e tcdB, e 7,7% dos isolados

    apresentaram o gene tcdB

    Irã Rahimi, Jalali, Weese (2014)

    Peixes e frutos do mar 67 4,50

    Cepas isoladas a partir de mexilhão e salmão apresentaram o perfil toxigênico V e a cepa isolada a partir de camarão apresentou o

    perfil toxigênico XII

    Texas (EUA) Norman et al. (2014)

  • 42

    Cont. Tabela 2.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de

    contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência

    Bibliográfica

    Carne suína 100 2,00 Isolados apresentam o perfil toxigênico A-/ B- Connecticut

    (EUA) Mooyottu et al.

    (2015)

    Alimentos para o consumo em casa de

    repouso 188 0,53 Isolado identificado como ribotipo 078 Bélgica

    Rodriguez et al. (2015)

    Alimentos árabes prontos para o

    consumo 368 1,36

    20% dos isolados apresentaram os genes tcdA, tcdB e cdtB; 80% dos isolados apresentaram o gene tcdA

    e tcdB

    Irã Rahimi, Afzali, Baghbadorani (2015)

    Moluscos bivalves 925 3,90

    22,2% dos isolados identificados como ribotipo 078/126, 8,3% dos

    isolados identificados como ribotipo 010 e 19,4% dos isolados

    identificados como ribotipo 001

    Sul da Itália Troiano et al. (2015)

    Carne de frango (75 amostras de sobrecoxa com coxa, 75 amostras de peito, 60 amostras de asa, 60 amostras

    de coxa e 40 amostras de fígado)

    310 8,06

    20% dos isolados apresentaram gene tcdB e 32% dos isolados

    apresentaram o gene tcdA. Nenhum isolado apresentou gene para toxina

    binária

    Turquia Guran, Ilhak (2015)

  • 43

    Cont. Tabela 2.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de

    contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência

    Bibliográfica

    Produtos cárneos (hambúrguer, carne

    bovina moída, nugget de frango, linguiça e

    carne enlatada)

    570 1,20 83,3% (5/6) dos isolados identificados como cepas toxigênicas Irã Rahimi, Khaksar

    (2015)

    Produtos cárneos (carne bovina,

    hambúrguer após modelamento e

    hambúrguer após congelamento)

    100 7,0 28,5% dos isolados identificados como cepas toxigênicas Irã Esfandiari et al. (2015)

    Carne (bovina, ovina e caprina) 600 1,50

    61,1% dos isolados identificados como ribotipo 078. Não foi detectada

    contaminação nas amostras de carne caprina

    Jazan (Arábia Saudita)

    Bakri (2016)

    Alimento para consumo em hospital (gelatina e

    vegetais/pão/grãos) 1.871 0,22

    Isolado da amostra de gelatina identificado como ribotipo 001 e o

    isolado da amostra de vegetais/pão/grão identificado como

    ribotipo 027

    Saint Louis (EUA)

    Kwon et al. (2016)

    Comida caseira 188 1,06 Isolados identificados como ribotipo 078 Ohio

    (EUA) Rodriguez-Palacios, Ilic, Lejeune (2017)

  • 44

    Cont. Tabela 2.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência Bibliográfica

    Produtos cárneos suínos prontos para

    consumo (cólon brazado e

    pele/orelha/couro brazados)

    65 23,00 20% dos isolados apresentaram o gene tcdA e tcdB Taiwan Wu et al. (2017)

    Produtos cárneos suínos crus (carne

    moída e pele) 62 27,00 9% dos isolados apresentaram o gene

    tcdA e tcdB Taiwan Wu et al. (2017)

    Vegetais folhosos e raízes (batata,

    gengibre, rúcula, folhas de dente de leão, alface

    e radicchio)

    154 28,00 8,7% dos isolados (10/115) foram

    identificados como cepas toxigênicas, ribotipo 014/020

    Slovênia Tkalec et al. (2018)

    Raízes vegetais de cultivo convencional e

    orgânico (batata, beterraba, cebola e

    cenoura)

    100 30,00

    51,2% dos isolados identificados como cepas toxigênicas, sendo 81,8% dos

    isolados identificados com perfil A+B+CDT- (81,8%) e 2,3% dos isolados

    apresentaram perfil A+B+CDT+

    Austrália Lim et al. (2018)

  • 45

    Cont. Tabela 2.

    Alimento Quantidade

    total de amostras

    Prevalência de contaminação por C. difficile

    (%)

    Observações Local Referência Bibliográfica

    Alimento cozido para consumo em hospital (massas, arroz, sopa,

    batata, espinafre, cenoura, ervilha,

    abobrinha e carne de frango/bovina/suína)

    296 0,30 Isolado identificado como ribotipo

    014/020, perfil toxigênico 0 (tcdA+ tcdB- cdtA- cdtB-)

    Itália Primavilla et al. (2019)

    Salada para consumo em hospital (tomate e

    alface) 54 1,90

    Isolado identificado como ribotipo 126, perfil toxigênico V (tcdA- tcdB- cdtA-

    cdtB-) Itália Primavilla et al. (2019)

  • 46

    3.2.3. C. difficile no Brasil

    No Brasil, Pinto et al. (2003) estudaram a incidência de C. difficile em crianças

    no Rio de Janeiro, cepas toxigênicas de C. difficile foram identificadas por meio da

    técnica de PCR em 4,2% dos pacientes internados e em 3,5% dos pacientes não

    internados.

    Outra ocorrência de CDI foi verificada na Unidade de Tratamento Intensivo de

    Hospital Público em Santo André, no qual 44,9% (22/49) das amostras de fezes de

    pacientes apresentaram resultado positivo para as toxinas de C. difficile (MARCON;

    GAMBA; VIANNA, 2006).

    Já no Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (IPEC), Rio de Janeiro,

    foi verificado que 28,5% (6/21) dos pacientes apresentaram CDI e foram isoladas

    quatro cepas de C. difficile. Todos os isolados possuem os genes tcdA e tcdB, dois

    isolados pertencem ao ribotipo 014 e dois isolados pertencem ao ribotipo 106

    (BALASSIANO et al., 2009).

    Em pesquisa realizada em pacientes de dois hospitais de Porto Alegre

    verificou-se que 9,4% (11/116) dos pacientes apresentaram resultado positivo para

    cultura de C. difficile, tendo sido isoladas 10 cepas não toxigênicas e uma cepa

    apresentou os genes tcdA e tcdB (MONTEIRO et al., 2014).

    No Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Rio de Janeiro, 2,7% (3/74)

    das amostras de fezes de pacientes apresentaram resultado positivo para as toxinas

    de C. difficile, sendo que este foi isolado em duas (2/3) dessas amostras. Uma

    terceira cepa de C. difficile foi recuperada de uma amostra que apresentou resultado

    negativo no Ensaio de Imunoabsorção Enzimática (Enzyme Linked Immuno Sorbent

    Assay – Elisa). Os isolados apresentaram os genes tcdA e tcdB e pertencem aos

    ribotipos 014, 043 e 046 (SECCO et al., 2014).

    No Hospital Haroldo Juaçaba - Instituto do Câncer do Ceará, 23 (48%)

    pacientes apresentaram CDI, sendo que o C. difficile foi isolado em quatro (17%)

    amostras de fezes e todas as cepas apresentaram genes tcdA e tcdB. Três isolados

    foram identificados como ribotipo 014/020 e perfil toxigênico XVIII e um isolado (ICC-

    45) pertence a um novo ribotipo e ao perfil toxigênico IXb (COSTA et al., 2017).

  • 47

    Em 2011, ocorreu um surto de diarreia causada por C. difficile em leitões em

    uma granja no Rio Grande do Sul. A frequência de diarreia em leitões com até sete

    dias de idade aumentou de uma média de 2% para aproximadamente 20%. Na

    necropsia dos leitões foi observado edema de mesocólon e, na avaliação

    histopatológica, foi verificada uma colite neutrofílica necrotizante severa. Além disso,

    o conteúdo intestinal dos leitões apresentou resultado positivo para as toxinas A e B

    do C. difficile (COSTA et al., 2013).

    C. difficile também foi identificado em amostras fecais de quati (Nasua nasua),

    um mamífero pequeno urbano. No estudo, 46 quatis foram mantidos em gaiolas e

    foram coletadas amostras fecais. C. difficile foi isolado a partir de 6,5% (3/46) dos

    animais, sendo 2 cepas toxigênicas (A+/B+ CDT-, ribotipo 014/020 e 106) e 1 cepa

    não toxigênica (A-/B- CDT-, ribotipo 053) (SILVA et al., 2014).

    Silva et al. (2015) compararam os ribotipos de C. difficile isolados a partir de

    seres humanos e de animais no Brasil. As cepas estudadas de C. difficile totalizaram

    76, sendo 25 isoladas a partir de seres humanos, 23 de cães, 12 de leitões, 7 de

    potros, 7 de vitelos, uma de gato e uma de lobo guará. Entre as cepas toxigênicas,

    os ribotipos 014/020 e 106 foram os mais comuns, respondendo por 18,4% (14/76) e

    10,5% (8/76) das amostras, respectivamente. Dentre os 14 diferentes ribotipos

    detectados nos isolados a partir de humanos, nove deles também foram

    identificados em, pelo menos, uma espécie animal.

    Em Campinas, Tsuchiya (2012) estudou a incidência de C. difficile em

    amostras de carne bovina moída, carne bovina peça (coxão mole), carne suína e

    peito de frango; todas adquiridas em supermercados. A ocorrência de C. difficile foi

    observada em 11,5% (17/147) das amostras analisadas, sendo que 27 isolados

    provenientes das amostras de carne bovina moída não apresentaram perfil

    toxigênico (A-/B-). Já dentre as cepas oriundas das amostras de frango, 23 isolados

    apresentaram perfil toxigênico A+/B+, 5 isolados A-/B+ e 20 isolados A-/B-. Todos os

    isolados provenientes de peça de carne bovina (coxão mole) apresentaram perfil

    A+/B+ e não foi dete