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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA LUANNA SILVA BRAGA CUIDANDO DO CUIDADOR: história oral de profissionais de saúde JOÃO PESSOA PB 2015

UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA LUANNA SILVA BRAGA - … · 2018. 9. 6. · e Saúde. Linha de pesquisa: Políticas e Práticas ... de autoconhecimento e de redescoberta de si; além

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA LUANNA SILVA BRAGA

    CUIDANDO DO CUIDADOR: história oral de profissionais de saúde

    JOÃO PESSOA – PB

    2015

  • LUANNA SILVA BRAGA

    CUIDANDO DO CUIDADOR: história oral de profissionais de saúde

    Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, do Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Enfermagem, área de concentração: Cuidado em Enfermagem e Saúde. Linha de pesquisa: Políticas e Práticas do Cuidar em Enfermagem e Saúde Projeto de pesquisa vinculado: Práticas de Cuidado na rede formal e informal de saúde.

    Orientadora: Profª. Drª. Maria Djair Dias

    JOÃO PESSOA - PB 2015

  • B813c Braga, Luanna Silva.

    Cuidando do cuidador: história oral de profissionais de saúde /

    Luanna Silva Braga.- João Pessoa, 2015.

    141f.

    Orientadora: Maria Djair Dias

    Dissertação (Mestrado) - UFPB/CCS

    1. Enfermagem. 2. Cuidados em enfermagem. 3. Promoção da

    saúde - cuidadores. 4. Práticas de saúde - cuidadores.

    5.Profissionais da saúde - desgaste ocupacional.

    UFPB/BC CDU: 616-083(043)

  • LUANNA SILVA BRAGA

    CUIDANDO DO CUIDADOR: história oral de profissionais de saúde

    Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, do Centro de Ciências da Saúde, da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Enfermagem, área de concentração: Cuidado em Enfermagem e Saúde.

    Aprovada em 05 de fevereiro de 2015

    BANCA EXAMINADORA

    ___________________________________________________

    Profª. Drª. Maria Djair Dias - Orientadora Universidade Federal da Paraíba - UFPB

    ___________________________________________________ Profª. Drª. Maria de Oliveira Ferreira Filha - Examinadora

    Universidade Federal da Paraíba - UFPB

    ___________________________________________________ Prof. Drª. Maria de Fátima de Araújo Silveira - Examinadora

    Universidade Estadual da Paraíba – UEPB

    ___________________________________________________ Profª. Drª Jaqueline Brito Vidal Batista - Suplente

    Universidade Federal da Paraíba - UFPB

    ___________________________________________________ Profª. Drª.Fábia Barbosa de Andrade – Suplente

    Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN

  • DEDICATÓRIA

    Dedico aos meus pais João da Mata e

    Maria do Céu, amores de minha vida e

    razões do meu viver. Este singelo

    trabalho é dedicado a vocês, por

    sempre acreditarem em mim e

    entenderem o motivo de minhas

    ausências. A vocês, devo tudo o que

    sou hoje.

    Amo muito vocês, obrigada!

  • AGRADECIMENTOS

    A Deus, o meu amparo e refúgio, agradeço-te pelo dom da vida, pelas graças

    concedidas e pelos momentos em que dispersou a angústia e ansiedade do

    meu peito. Sou imensamente grata por segurar-me nos teus braços diante das

    inúmeras tribulações em minha vida.

    À Nossa Senhora, minha mãe e rainha, a quem dedico minha admiração e

    devoção.

    Aos meus pais, João da Mata e Maria do Céu por todo o amor, dedicação,

    ensinamentos e renúncias. Tenho orgulho de ser filha de vocês.

    Ao meu esposo Luann, por estar sempre ao meu lado, por me abraçar e dar

    consolo nas horas difíceis.

    À minha irmã Pricilla, bem como aos meus cunhados, pelo o companheirismo

    e apoio.

    Aos meus sogros Marinaldo e Christina, pelas palavras de motivação e apoio.

    À minha orientadora Maria Djair Dias, pelas oportunidades que me concedeu,

    por ter acreditado no meu potencial e me agraciado com preciosos

    conhecimentos e orientações. Sou grata também por suas palavras de conforto

    e por sua compreensão diante de momentos difíceis para mim.

    À professora Maria de Oliveira Ferreira Filha, por suas sábias e

    tranquilizadoras palavras, além de sua brilhante contribuição e pelo

    aprendizado nesses anos de convivência.

    À professora Fátima Silveira, pela disponibilidade e preciosas contribuições.

  • Aos colaboradores da pesquisa, pela coragem e disposição a participar deste

    estudo.

    A Universidade Federal da Paraíba, por ser o palco principal da minha

    formação profissional como Enfermeira e agora Mestre.

    Ao corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem

    (PPGENF), por proporcionarem uma valiosa troca de conhecimentos e

    experiências.

    Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem,

    especialmente Seu Ivan e Natali, pela paciência, apoio e amizade.

    À minha turma de Mestrado, por compartilharem as alegrias e angústias do

    curso, somando forças para a conclusão de cada etapa.

    Às amigas do grupo de pesquisa, pela motivação, apoio e parceria. Sem a

    ajuda de vocês, eu não teria chegado até aqui.

    À Camila Abrantes, companheira de estudos desde a graduação, agradeço

    imensamente por ter tido o privilégio de te ter como parceira de pesquisa.

    Juntas, nos ajudamos, nos demos força e alcançamos mais uma vitória em

    nossas vidas.

    Aos estudantes do estágio de docência, pela compreensão e apoio, uma vez

    que estava vivenciando pela primeira vez a arte de ensinar.

    À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

    (CAPES), pelo apoio financeiro durante a realização desse estudo.

    Às minhas grandes amigas Wilkerly, Danielma, Carolinne, e em especial,

    Angeline e Hânycka, que me acalmaram e ajudaram no momento em que

    mais precisei, acreditaram em mim quando nem eu mesma acreditava. Vocês

    fazem parte deste trabalho.

  • Aos meus alunos, que me forçaram a crescer pessoal e profissionalmente.

    Às colegas de trabalho, que me deram força e conselhos, me ajudando a

    iniciar esse complexo processo de criação.

    A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a concretização deste

    estudo.

    Meu sincero agradecimento!

  • SERES EM CONSTANTE TRANSFORMAÇÃO

    Dentro de cada um, existe um anjo. Anjo que consola compreende e apóia,

    fortalece e ampara, trazendo luz e amor a mim, a ti e a nós.

    Dentro de cada um, existe o feroz. Feroz que se lança, que briga, que luta.

    Que destemidamente enfrenta, supera e transforma as garras que a vida

    manda.

    Dentro de cada um, existe a lágrima que corre silenciosa pelos rios de nossa

    alma, percorrendo nossos lamentos, apaziguando nossos anseios, silenciando

    nossas dores e nossos vazios. Vazios que se reflete o deserto de nosso

    interior, ensolarado por saudade e carências. Num cenário que contrasta com o

    nosso oásis abundante de positividade e acertos.

    Dentro de cada um, existe o sol que faz brilhar e acender nossos sonhos,

    desejos e quimeras, trazendo a inquieta insatisfação que nos conduz à

    travessia apaixonante de busca e exploração do nosso ser.

    Dentro de cada um, existe o silêncio. Silêncio da dor aguda que nos cala,

    fazendo esparramar nossas esperanças. E nos anoitecendo para a vida.

    Dentro de cada um, também existe o ruído. Ruído do grito, do clamor que

    explode na garganta do nosso sol interior, não nos deixando aquietar nem

    acomodar.

    Dentro de cada um, existe o sim e o não. Existe o contraste das emoções. O

    positivo e o negativo das nossas ações e o conflito de opções.

    E, nesse misto de ondulações, do vai e do vem desse carrossel de

    emoções, vamos saltitando, escapando e também enfrentando verdades,

    mentiras e omissões, retratando nosso ser em constante transformação.

    (Lúcia Helena Amaral)

  • BRAGA, Luanna Silva. Cuidando do Cuidador: história oral de profissionais de saúde. 2015. 141f. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2015.

    RESUMO

    Introdução: O cuidar faz parte das necessidades básicas para a sobrevivência da vida humana, sendo frequente na maneira do homem agir e se relacionar. Porém, rotineiramente, cuidar do outro ocasiona inúmeras e complexas condições de desgaste físico e psíquico, portanto é imprescindível que o cuidador, seja ele profissional de saúde ou não, possa reservar um tempo para cuidar de si. Foi nessa perspectiva que surgiu o curso de formação de multiplicadores em oficinas - “Cuidando do cuidador”/Resgate da autoestima, que foi criado com o intuito de possibilitar um espaço de cuidado ao profissional de saúde. Objetivo: Conhecer as experiências dos profissionais de saúde em cuidar de si após a participação em um curso de formação de multiplicadores em oficinas - “Cuidando do cuidador”/Resgate da autoestima; elencar as principais mudanças ocorridas nas dimensões pessoal e profissional desses profissionais, após sua participação no curso; e identificar as possibilidades de cuidados utilizados pelos profissionais de saúde ao buscar outras práticas de cuidado. Método: Estudo qualitativo, de natureza compreensivo-interpretativo, norteado pelos pressupostos da História Oral Temática. Foi realizado no município de João Pessoa – PB, com os profissionais da rede de saúde que participaram do referido curso. Obteve-se o material empírico por meio de entrevistas gravadas com oito colaboradoras, sendo esse material analisado com base na análise de conteúdo temática proposta por Minayo. Resultados: Após a identificação dos tons vitais e dos temas presentes nos depoimentos, emergiram dois eixos temáticos: I - Participando do curso de formação de multiplicadores em oficinas – “Cuidando do Cuidador”/resgate da autoestima: um despertar para o cuidar de si na dimensão pessoal e profissional; e II - Profissionais da saúde: descobrindo possibilidades e práticas de cuidado. A partir dos relatos das colaboradoras, constatou-se que a participação nesse curso trouxe efeitos positivos nos relacionamentos interpessoais, oportunidades de auto-reflexão, de autoconhecimento e de redescoberta de si; além disso, elas perceberam que não representavam a solução dos problemas dos outros e absorvê-los lhes fazia mal. Houve também uma melhora dos sintomas relacionados ao desgaste ocupacional, como estresse, ansiedade e exaustão extrema. Dentre as práticas de cuidado realizadas, foram citadas principalmente as não alopáticas, que atendem às necessidades humanas de forma integral, como acupuntura, tai-chi-chuan, ioga, reiki, biodança, danças circulares, massagem ayurvédica, além da prática de esportes, caminhada e outras. Conclusão: De modo geral, observou-se que o curso transformou de maneira significativa a maneira como as colaboradoras percebiam e realizavam o cuidado de si, além de despertar nelas o desejo de procurar novas práticas de cuidado. Dessa forma, conclui-se que o curso está em consonância com os princípios do SUS, uma vez que seu foco baseia-se na promoção à saúde e prevenção de agravos. Palavras-chave: Cuidado. Promoção da Saúde. Trabalho. Profissionais da Saúde.

  • BRAGA, Luanna Silva. Caring for the Caregiver: Oral history of health professionals. 2015. 141f. Dissertation (Master of Science in Nursing) - Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2015.

    ABSTRACT Introduction: The caring is part of basic needs for the survival of human life, and is often in the way of the man act and relate. However, routinely, caring for the other causes numerous and complex conditions of physical wear and psychic, therefore it is imperative that the caregiver, be it health professional or not, you can book a time to take care of themselves. It was from this perspective that emerged the training course for multipliers in workshops - "Caring for the caregiver" /ransom of self-esteem, which was created in order to provide a space for the care and health professional. Objective: To know the experiences of health care professionals in caring for themselves after their participation in a training course for multipliers in workshops - "Caring for the caregiver" /ransom of self-esteem; enumerating the main changes in personal and professional dimensions of these professionals, after their participation in the course; and identify the possibilities of care used by health professionals to seek other care practices. Method: Qualitative study of nature-comprehensive interpretative guided by assumptions of Thematic Oral History. It was performed in the city of Joao Pessoa - PB, with the public health professionals who participated in the course. We obtained the empirical material through recorded interviews with eight collaborators, and this material has been analyzed on the basis of thematic content analysis proposed by Minayo. Results: After the identification of vital tones and themes present in the testimonies, emerged two thematic axs: I - participating in the training course for multipliers in workshops - "Caring for the Caregiver" /ransom of self-esteem: a wake-up call for the pamper yourself in personal dimension and professional; and II - health professionals: discovering opportunities and care practices. From the reports of the collaborators, it was noted that the participation in this course brought positive effects in interpersonal relationships, opportunities for self-reflection, self-knowledge and the rediscovery of the self; in addition, they realized that they were not the solution to the problems of others and absorbs them made them evil. There was also an improvement of the symptoms related to occupational wear, such as stress, anxiety and extreme exhaustion. Among the practices of care performed, were cited especially the not allopathy, that meet human needs in an integrated way, as acupuncture, tai-chi-chuan, yoga, reiki, biodance, circular dances, Ayurvedic massage, in addition to the practice of sports, walking and other. Conclusion: In general, it was observed that the course has changed significantly the way in which the collaborators perceived and practiced self-care, in addition to awaken in them the desire to seek new practices of care. Thus, it is concluded that the course is in line with the principles of the SUS, since its focus is based on health promotion and disease prevention. Keywords: Care. Health Promotion. Work. Health Professionals.

  • BRAGA, Luanna Silva. Cuidando al Cuidador: Historia oral de los profesionales de la salud. 2015. 140f. Tesis (Master em ciencias de enfermería) - Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2015.

    RESUMEN Introducción: El cuidado se parte de las necesidades básicas para la supervivencia de la vida humana, y a menudo se encuentra em el caminho del hombre y se refieren a ley. Sin embargo, periódicamente, el cuidado para el resto de causas múltiples y complejas condiciones de desgaste físico y psíquico, por lo tanto es imprescindible que el personal sanitario, ya sea profesional de la salud o no, se puede reservar um tiempo para cuidar de sí mismos. Es desde esta perspectiva que surgió el curso de formación de multiplicadores em los talleres, "Cuidando al cuidador" /rescate de la autoestima, el cual fue creado com el fin de oferecer um espacio para el cuidado y profesional de la salud. Objetivo: Conocer la experiencia de los profesionales de la salud em el cuidado de sí mismos después de su participación em un curso de formación de multiplicadores em los talleres, "Cuidando a los cuidadores" /rescate de la autoestima; enumerando los principales câmbios em las dimensiones personales y profesionales de estos profesionales, después de su participación em el curso; e identificar las posibilidades de atención utilizados por los profesionales de la salud a buscar otras prácticas de atención. Método: Estudio cualitativo de la naturaleza interpretativa completa guía temática de hipótesis de Historia Oral. Fue realizado em la ciudad de Joao Pessoa - PB, com los profesionales de salud pública que participaron em el curso. Hemos obtenido el material empírico mediante entrevistas grabadas conocho colaboradores, y este material ha sido analizada sobre la base de análisis de contenido temático propuesto por Minayo. Resultados: Después de la identificación de tonos vitales y temas presentes em los testimonios, surgieron dos ejes temáticos: I - participantes em el curso de formación de multiplicadores em los talleres, "Cuidando a los cuidadores" /rescate de la autoestima: una llamada de atención para mimar se em la dimensión personal y profesional; y II – los profesionales de la salud: descubrirlas oportunidades y las prácticas de cuidado. De los informes de los colaboradores, se observó que la participación en este curso trajo efectos positivos em las relaciones interpersonales, oportunidades para la auto-reflexión, conocimiento de sí mismo y el redescubrimiento de la legítima; además, se dieron cuenta de que no eran la solución a los problemas de los demás y les absorbe les hizo mal. También se registró una mejora de los síntomas relacionados com el desgaste profesional, tales como el estrés, la ansiedad y agotamiento extremo. Entre las prácticas de atención realizadas, se mencionaron especialmente el no la alopatía, que satisfacer las necesidades humanas de manera integrada, como la acupuntura, el tai-chi-chuan, yoga, reiki, biodança, danzas circulares, massajes ayurvédicos, además de la práctica de deportes acuáticos, caminatas y otros. Conclusión: En general, se observó que el curso ha cambiado de manera considerable la forma en que los colaboradores y practica el auto-cuidado, además de despertar em ellos el deseo de buscar nuevas prácticas de atención. Por lo tanto, se concluye que el

  • curso es en línea com los princípios del SUS, desde su enfoque está basado em la promoción de la salud y la prevención de las enfermedades. Palabras clave: Cuidado. Promoción de la Salud. Trabajo. Los profesionales de la Salud.

  • LISTA DE SIGLAS

    ACS: Agente Comunitário de Saúde

    AB: Atenção Básica

    APS: Atenção Primária à Saúde

    CAAE: Certificado de Apresentação para Apreciação Ética

    CAIS: Centros de Atenção Integral à Saúde

    CAISI: Centro de Atenção Integral à Saúde do Idoso

    CAPS: Centro de Atenção Psicossocial

    CCS: Centro de Ciências da Saúde

    CEO: Centro de Especialidades Odontológicas

    CEP: Comitê de Ética em Pesquisa

    CEREST: Centro de Referência de Saúde do Trabalhador

    CNS: Conselho Nacional de Saúde

    CPICS: Centro de Práticas Integrativas e Complementares

    CTA: Centro de Testagem e Aconselhamento

    DS: Distritos Sanitários

    ESF: Estratégia Saúde da Família

    GEPSMEC: Grupo de Estudos e Pesquisas em Saúde Mental Comunitária

    HO: História Oral

    HOT: História Oral Temática.

    HOV: História Oral de Vida

    PACS: Programa Agentes Comunitários de Saúde

    PB: Paraíba

    PIBIC: Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica

    PPGENF: Programa de Pós-Graduação em Enfermagem

    SAMU: Serviço de Atendimento Médico de Urgência

    SMS: Secretaria Municipal de Saúde

    SUS: Sistema Único de Saúde

    TCI: Terapia Comunitária Integrativa

  • TCLE: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

    TO: Tradição Oral

    UFPB: Universidade Federal da Paraíba

    USF: Unidade de Saúde da Família

  • SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 17

    1.1 Contextualização da problemática e aproximação com o objeto de estudo ... 18

    1.2 Objetivos ........................................................................................................ 25

    2 REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................ 26

    2.1 O Cuidado humano e a formação do profissional de saúde ........................... 27

    2.2 Autoestima e suas inter-relações ................................................................... 34

    3 PERCURSO METODOLÓGICO ....................................................................... 38

    4 APRESENTAÇÃO DO MATERIAL EMPÍRICO ................................................ 47

    4.1 Glória .............................................................................................................. 48

    4.2 Ana Suely ....................................................................................................... 50

    4.3 Luciene ........................................................................................................... 55

    4.4 Tattiana .......................................................................................................... 62

    4.5 Giovana .......................................................................................................... 66

    4.6 Lécia ............................................................................................................... 68

    4.7 Karina ............................................................................................................. 71

    4.8 Cristiane ......................................................................................................... 76

    5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DO MATERIAL EMPÍRICO .................................... 79

    5.1 Participando do curso de formação “cuidando do cuidador”: o despertar

    para o cuidar de si na dimensão pessoal e profissional ....................................... 80

    5.1.1 Cuidar de si na dimensão pessoal .............................................................. 80

    5.1.2 Cuidar de si na dimensão profissional ......................................................... 94

    5.2 Profissionais da saúde: descobrindo possibilidades e práticas de cuidado.... 103

    6 REFLEXÕES FINAIS ........................................................................................ 116

    REFERÊNCIAS .................................................................................................... 120

    APÊNDICES ........................................................................................................ 134

    ANEXOS .............................................................................................................. 139

  • INTRODUÇÃO

  • 18

    1.1 Contextualização da problemática e aproximação com o objeto de

    estudo

    O cuidar é considerado uma necessidade básica e, portanto, é

    imprescindível para que o ser humano possa coexistir de maneira saudável no

    mundo. Para isso, é preciso que estejam presentes: o cuidar de si, o cuidar do

    outro e o ser cuidado. Além disso, ele é indispensável para o desenvolvimento

    humano uma vez que envolve à nossa sensibilidade para com o outro, a

    compaixão pelas pessoas que sofrem, e a valorização da sensibilidade, da

    cordialidade e da gentileza no lugar das coisas materiais(1).

    O cuidado se manifesta na maneira do homem agir e se relacionar

    socialmente com seus iguais. A prática, por conseguinte, é o próprio ato de

    cuidar traduzido em ações. Portanto, as práticas de cuidado são ações

    cuidativas multiplicadas por qualquer indivíduo/profissional que anseia

    benefícios para com a saúde do próximo e, para tal, utiliza o conhecimento

    científico e/ou popular de saúde(2).

    Rotineiramente, cuidar do outro ocasiona inúmeras e complexas

    condições de desgaste físico e psíquico, desse modo, é imprescindível que

    haja, na relação de convivência, seja com o enfermo ou com a própria equipe

    de trabalho, um feedback para que seja possível avaliar os efeitos positivos e

    negativos dessa relação de troca com o intuito de entender o que precisa ser

    melhorado e evitado durante as interações uns com os outros. Com isso, é

    possível proporcionar bem-estar a todos os envolvidos. Além disso, estes

    comportamentos podem ajudar na valorização e reconhecimento dos

    cuidadores, permitindo que os mesmos sejam observados e valorizados por

    sua responsabilidade e doação para com o próximo(3,4).

    Assim como é importante cuidar do outro é, também, imprescindível que

    o cuidador, seja ele profissional de saúde ou não, possa criar espaços de

    cuidado para estabelecer consigo e com o próximo um tempo para cuidar de si,

    uma vez que esta relação é dialética: à medida que se cuida do outro, há um

    cuidado, também, de si mesmo.

    No que diz respeito aos profissionais de saúde, tem-se observado que

    estes constantemente deixam de cuidar de si devido ao modo de vida

  • 19

    acelerado, a jornada dupla de trabalho, além das obrigações com as atividades

    fora do mundo do trabalho, porém ligadas a vida pessoal e familiar. Muitos

    submetem-se a excessivas jornadas de trabalho, inúmeras vezes,

    ultrapassando as 60 horas semanais, em prol da sobrevivência mais digna,

    embora esta possa lhe causar danos físicos e psíquicos devido ao excesso de

    trabalho(5).

    Estas transformações na vida dos profissionais vêm ocorrendo em todo

    o mundo desde o surgimento do capitalismo. O atual mundo globalizado tem

    ocasionado profundas mudanças, principalmente no mundo do trabalho, que,

    ao introduzir novas formas de gestão e tecnologias, sejam elas industriais ou

    informatizadas, reorganizam toda a dinâmica produtiva, diminuindo os postos

    de trabalho e aumentando a produção de serviços, provocando a expansão do

    setor e a consequente sobrecarga do profissional(6).

    A mecanização dos serviços ocasionou o aumento da taxa de

    desemprego e de rotatividade de pessoal nos estabelecimentos de saúde,

    dificultando as relações de trabalho uma vez que atrapalha a formação de

    vínculos entre usuários, profissionais e equipes de trabalho, e impede a

    identificação e o conhecimento da realidade de saúde da comunidade(7).

    Voltando-se, especialmente, para a área da saúde, o que tem sido

    observado nas instituições é que os gestores e responsáveis por tal local

    utilizam-se de ferramentas para diminuir os custos, por meio da exploração dos

    profissionais, com aumento gradativo da jornada de trabalho, redução da mão

    de obra e desvalorização do profissional por meio dos baixos salários

    oferecidos. Estes lidam, ainda, com o sofrimento do outro e com o risco de

    contrair doenças, fazendo-lhes suportar um conjunto de angústias e

    conflitos(8,9).

    Desta maneira, atuar em serviços com tantas dificuldades, como as

    citadas anteriormente, leva ao estresse psicológico do indivíduo, ao risco de

    ansiedade, depressão e outras doenças psíquicas, bem como o desgaste físico

    pelo qual passam estes profissionais, uma vez que suas respectivas jornadas

    de trabalho são extensas, pesadas e, por vezes, noturnas. Este tipo de

    adoecimento ocorre como consequência do contexto organizacional da

    instituição em associação à situação interpessoal e as características da

    personalidade de cada ser humano.

  • 20

    Pesquisas comprovam que as dificuldades de relações, pessoais ou

    profissionais, e desafios enfrentados no trabalho ou com a família interferem na

    saúde física e psíquica dos profissionais de saúde. É o que mostra um estudo

    de revisão integrativa a respeito do absenteísmo por parte dos enfermeiros, tal

    pesquisa aponta que as principais doenças responsáveis pelo não

    comparecimento dos profissionais ao trabalho foram o adoecimento mental, a

    doença osteomuscular e as doenças do aparelho respiratório. Estas foram

    atribuídas ao fato deste precisar lidar diariamente com a angústia e sofrimento

    dos pacientes, bem como quanto aos riscos ergonômicos e químicos aos quais

    estão expostos(10).

    Um estudo realizado com trabalhadores da Atenção Primária à Saúde de

    Minas Gerais constatou que 41,6% dos entrevistados apresentavam indicação

    positiva para esgotamento profissional(11). Em outra pesquisa, os profissionais

    de uma equipe de pronto atendimento de São Paulo relataram sintomas físicos,

    como cefaleia, taquicardia, sensação de fadiga e dores nas pernas, resultantes

    de estresse emocional ou que surgiam após atendimentos de emergência(12).

    Duas pesquisas realizadas no município de João Pessoa – PB

    constataram o sofrimento vivenciado pelos profissionais da Estratégia Saúde

    da Família (ESF). A primeira foi realizada com 145 profissionais, dos quais 49

    se encontravam com risco para ansiedade e depressão(13). A segunda mostrou

    que 104 dos 170 profissionais entrevistados estavam apresentando a Síndrome

    de Burnout, doença definida como um estresse crônico relacionado ao trabalho

    que ocasiona o baixo rendimento das pessoas na execução de seus afazeres e

    interferindo, ainda, em suas vidas pessoais(5).

    Portanto, avaliar e acompanhar a saúde destes profissionais torna-se de

    extrema importância, assim como, cuidar deles na tentativa de evitar o

    processo de adoecimento e melhorar a qualidade da atenção prestada ao

    usuário. Um profissional que compreende a importância do cuidar de si é capaz

    de cuidar do outro, fazendo dessa relação uma possibilidade real de

    transformação para quem cuida e quem é cuidado(14).

    Dessa forma, é primordial que os gestores da saúde promovam espaços

    de cuidado para esta parcela da população que, repetidas vezes, sofrem

    devido as dificuldades e desafios diários no mundo das relações de si consigo

  • 21

    mesmo, de si com os familiares, de si com o trabalho, equipe multiprofissional e

    usuário, dentre outros problemas de cunho superior.

    Para enfrentar tal problemática foi implementado, no município de João

    Pessoa, o curso de formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando do

    Cuidador/resgate da autoestima, com o intuito de oferecer espaços de cuidado

    e capacitar profissionais com potencial para trabalhar com grupos a fim de que

    estes possam realizar oficinas de intervenção psicossocial para as equipes de

    saúde e usuários, minimizando o risco de adoecimento mental das pessoas. O

    referido curso surgiu através de uma parceria do Grupo de Estudos e

    Pesquisas em Saúde Mental Comunitária (GEPSMEC) da Universidade

    Federal da Paraíba (UFPB) com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) e o

    Centro de Referência de Saúde do Trabalhador (CEREST).

    Foi realizado na tentativa de oferecer aos profissionais da saúde, um

    apoio terapêutico no sentido de criar um espaço onde exista uma relação

    dialética de cuidado estabelecida no momento em que o profissional, também,

    se cuida ao cuidar do outro. O curso é potencializador de mudanças na vida

    das pessoas provocando uma verdadeira revolução no jeito de estabelecer

    relações consigo mesmo, com a família, equipe de trabalho e usuário dos

    serviços de saúde. Faz o indivíduo revisitar sua própria história de vida e

    enxergar que lugar ocupa no mundo das relações, despertando-o para a

    compreensão de que é preciso trabalhar traumas e medos existentes, para,

    dessa maneira, transformar a sua vida positivamente, entendendo que é

    necessário valorizá-la.

    Para que isso seja possível, o curso traz conteúdos que ajudam o

    profissional a resgatar sua autoestima, a valorizar o autoconhecimento e o

    trabalho em equipe. Ajuda-o a acessar a confiança em si e no outro, e a

    acreditar no seu poder resiliente para compreender o seu papel diante dos

    desafios que a vida impõe.

    Essa formação possui 80h, sendo 40h presenciais, em momento de

    imersão, com temáticas abordadas através de uma parte teórica e outra

    prática. Esta última é baseada em “dinâmicas vivenciais” que foram inspiradas

    nas diversas culturas indígenas e proporcionam aos participantes um encontro

    consigo e com sua cultura, alimentando sua identidade na busca pelo

    autoconhecimento, além de promover aos participantes o resgaste de sua

  • 22

    herança cultural, competências e habilidades possibilitando uma maior

    compreensão de si. Quanto as outras 40h, estas são para o participante

    multiplicar as ações aprendidas no seu local de trabalho realizando encontros

    para cuidar da equipe de trabalho e/ou usuários(15).

    No fim do ano de 2013, a Diretoria de Atenção à Saúde do município de

    João Pessoa, preparou um relatório sobre o impacto dos cursos realizados na

    rede de saúde e intersetorialidade da cidade. Este foi entregue aos gestores da

    rede municipal de saúde e consta o panorama demonstrativo geral para que

    fosse possível visualizar os resultados obtidos através destas Formações. O

    primeiro curso foi realizado no ano de 2010 e desde então mais seis

    aconteceram, totalizando sete cursos, no qual o último foi realizado em 2013.

    Assim, 279 profissionais de saúde foram capacitados para atuarem como

    multiplicadores desta nova ferramenta de cuidado. Destes, 134 atuavam na

    atenção básica, 89 na rede de média complexidade, 20 na alta complexidade e

    36 na rede intersetorial. O quantitativo de usuários beneficiados com as

    oficinas de resgate da autoestima foi de 15.231 pessoas(16).

    Tal ação estratégica de promoção à saúde atingiu um importante

    número de pessoas portanto, é válido continuar qualificando as equipes da

    rede de saúde do município a fim de fortalecer e potencializar a capacidade de

    operar mudanças, de produzir respostas mais qualificadas aos problemas e

    dificuldades no cotidiano.

    Foi nesta perspectiva que surgiu o interesse de pesquisar sobre a

    temática das práticas de cuidado voltada para os profissionais da saúde. Desta

    maneira, tive a oportunidade de desenvolver uma pesquisa pelo Programa

    Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) que teve como objetivo

    investigar o sofrimento psíquico em profissionais de saúde que participaram do

    curso de formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando do

    Cuidador/resgate da autoestima.

    Meu estudo como bolsista do PIBIC, teve o objetivo de investigar a

    contribuição deste curso na diminuição do estresse e do risco de sofrimento

    psíquico em profissionais da saúde. Os resultados desta pesquisa apontaram

    para um universo de adoecimento desses profissionais, pois constatou-se que

    67% da amostra estudada apresentou estresse no início do curso ao passo

    que, em seu término, este percentual diminuiu para 46%. Com relação ao risco

  • 23

    de sofrimento psíquico, no início do curso, 40% dos participantes apresentaram

    risco para ansiedade e depressão, enquanto que, em seu término, esta

    porcentagem reduziu para 23%(17).

    Estes resultados mostraram a importância deste curso como importante

    ferramenta de cuidado na diminuição do adoecimento psíquico dos

    profissionais de saúde, revelando, também, que é possível cuidar dos

    indivíduos utilizando-se das tecnologias leves, promovendo o

    autoconhecimento e o empoderamento a fim de reduzir a medicalização

    indiscriminada e provocar mudanças efetivas na maneira de fazer o cuidado.

    Ainda, tive a oportunidade de participar como apoiadora do 4º curso de

    formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando do Cuidador/resgate da

    autoestima, momento em que foi possível participar um pouco do processo de

    reflexão que o curso propicia junto aos participantes e toda a equipe envolvida.

    Foi gratificante perceber que aquelas pessoas saíram renovadas, com a

    autoestima resgatada e o mais importante, entendendo que precisam reservar

    um tempo para cuidar de si nessa relação de cuidado.

    Portanto, é possível pensar que, antes de participar do curso, os

    profissionais enfrentavam, cotidianamente, inúmeras dificuldades e desafios

    que os desestabilizavam emocional e fisicamente, chegando até a provocar

    doenças. No momento em que realizaram o curso, vivenciaram episódios de

    imersão nos quais puderam fazer uma viagem para dentro de si, com a

    oportunidade de realizar as paradas necessárias para percorrer o tempo da

    compreensão e do entendimento dos fatos. Ao término do curso, eles voltam

    para a realidade, para os mesmos desafios e dificuldades, porém, olhando e

    vivenciando este processo de um jeito novo e diferente, tentando compreender

    e perdoar para, desse modo, ressignificar as suas vidas.

    Então, os participantes deste curso são capazes de realizar um processo

    de ação-reflexão-ação, passando a agirem de uma maneira diferente devido a

    potência e revolução que o curso promove no interior de cada ser humano.

    Diante destas experiências, nasceu o interesse em aprofundar o meu

    conhecimento a respeito desta temática que me instigou a buscar respostas a

    questões relevantes a respeito do cuidar de si desses profissionais. Dessa

    maneira, surgiram as seguintes questões norteadoras: O curso de formação de

    multiplicadores em oficinas – Cuidando do Cuidador/resgate da autoestima

  • 24

    despertou nos profissionais de saúde o desejo de continuar no processo de

    cuidar de si? A participação no curso motivou os profissionais da saúde a

    buscarem outras possibilidades de cuidados? Quais práticas de cuidado estes

    profissionais estão desenvolvendo? Quais as mudanças, nas dimensões

    profissional e pessoal, que mais têm marcado o dia a dia desses profissionais

    após a participação no curso?

    Esta pesquisa justificou-se diante da relevância da temática proposta,

    uma vez que é fato a necessidade de se criar uma rede de cuidados com a

    finalidade de promover e fortalecer o cuidar de si dos profissionais de saúde.

    Um espaço que possa valorizar o acolhimento, o autoconhecimento, a escuta

    qualificada e a partilha capaz de favorecer o equilíbrio físico e psíquico desta

    população, além de prevenir o adoecimento.

    O estudo mostrou-se relevante, também, pois permitiu que fosse

    investigado se os participantes continuaram realizando encontros para o

    desenvolvimento de ações de autocuidado após o curso de formação de

    multiplicadores em oficinas – Cuidando do Cuidador/resgate da autoestima,

    visto que o processo de cuidar de si é contínuo e precisa ser continuado em

    vista de promover mudanças efetivas na qualidade de vida e contribuir para a

    consolidação das práticas de cuidado na rede de saúde do SUS.

    Na enfermagem, esta pesquisa contribui de maneira significativa, assim

    como, para todos os profissionais da área da saúde, pois proporciona a

    reflexão sobre o jeito de cuidar de si e do outro, além de abordar o quão

    importante pode ser o cuidar dos profissionais da saúde objetivando-se de

    evitar o adoecimento deles.

  • 25

    1.2 Objetivos

    Geral:

    - Conhecer as experiências dos profissionais de saúde em cuidar de si a partir

    de sua participação no curso de formação de multiplicadores em oficinas –

    Cuidando do Cuidador/resgate da autoestima.

    Específicos:

    - Elencar as principais mudanças ocorridas nas dimensões pessoal e

    profissional que marcaram o dia a dia dos profissionais da área da saúde após

    a realização do curso de formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando

    do Cuidador/resgate da autoestima.

    - Identificar as possibilidades de cuidados utilizados pelos profissionais de

    saúde ao buscar outras práticas de cuidado.

  • REFERENCIAL

    TEÓRICO

  • 27

    2.1 O Cuidado humano e a formação do profissional de saúde

    Diante da exposição a diversos fatores que contribuem para o aumento

    do estresse, seja ele laboral ou da vida cotidiana, é primordial que os

    indivíduos possuam alguma forma de autopreservação, de modo que o corpo e

    a mente possam aliviar a pressão que os rodeia constantemente.

    Amplamente falando, pode-se chamar esse mecanismo de

    autopreservação de cuidado. Um dos principais objetivos do cuidado é a

    manutenção do estado de saúde do indivíduo, que deve ser visto

    integralmente. Waldow(18) cita ainda, mais objetivos do cuidado, como aliviar,

    ajudar, favorecer, fazer, dar; seja na saúde ou na doença, o cuidado está

    presente tanto como forma de viver tanto quanto na forma de se relacionar.

    Uma das características deste mecanismo é sua capacidade de ser

    inerente às pessoas e, de acordo com Boff(19), o cuidado aparece quando a

    existência de alguém tem algum significado para nós, e, portanto, passamos a

    prestar atenção nas necessidades desse outrem, a ter atenção, cautela,

    desvelo e consideração pelo bem-estar dele(a). Ainda de acordo com esse

    autor, cuidar, além de ser um ato, é uma atitude que revela preocupação, uma

    responsabilidade, um envolvimento afetivo para com o outro e consigo(20).

    Prover cuidados a alguém é uma matéria complexa. Não se trata apenas

    de manejar as causas biológicas da dor, por exemplo, mas lidar com ela,

    compreendendo o psicológico, o social e espiritual que a permeia. Até porque,

    há um ser humano por trás daquela dor, não apenas uma dor que está naquele

    ser humano. É primordial atentar-se para o modo como as ações de cuidado

    são realizadas, tendo em mente práticas integrais, além do contexto de vida ao

    qual está inserido quem é cuidado(21).

    A palavra cuidado e suas diversas definições vêm sendo exploradas ao

    longo do tempo. Na antiguidade, significava “cura” e relacionava-se com “amor”

    e “amizade”. Outras variações semânticas podem estar relacionadas ao

    cuidado, como “cogitar”, “pensar”, “colocar atenção”, “mostrar interesse”,

    “revelar uma atitude de desvelo” e de “preocupação”. Independentemente do

    significado, o cuidado e o cuidar constituem o ser humano e tudo que tem vida

    depende dele(22).

  • 28

    Para Martin Heidegger, por exemplo, o cuidado é reconhecido como o

    alicerce da existência humana; “é o próprio ser do ser humano (ser-aí, da-

    sein)”. Esse filósofo alemão afirma que o modo-de-Ser cuidado desvela a

    maneira concreta como é o ser humano no mundo(23,19,24).

    Heidegger aponta muito positivamente para o fato de que se o ser do humano é um estar lançado no mundo, numa reconstrução constante de si mesmo e desse mundo, elucidada pela ideia de Cuidado, será justo assumir que as práticas de saúde, como parte desse estar lançado, tanto quanto dos movimentos que o reconstroem, também se elucidam como Cuidado. Também no plano operativo das práticas de saúde é possível designar por Cuidado uma atitude terapêutica que busque ativamente seu sentido existencial

    (24, p.22).

    Já Jean Watson, que propôs a Teoria de Cuidado Transpessoal, afirma

    que “quando duas pessoas juntas com as suas histórias de vida únicas são

    postas numa transação de cuidar, abrange uma ocasião real (um evento), no

    qual a experiência e a percepção estão a tomar lugar da própria ocasião”(25).

    Segundo Baggio(26), a definição do cuidado deve surgir do interior do

    sujeito, o qual é influenciado por seus valores, crenças e experiências

    vivenciadas.. Ao cuidar do outro, deve-se levar em consideração, o suprimento

    de suas necessidades com “sensibilidade, presteza e solidariedade”,

    conjugando integridade física e emocional, “num processo de troca entre

    cuidador e ser cuidado”.

    Portanto, nota-se que a essência deste ato encontra-se no âmago da

    inter-relação pessoal em que sempre haverá um mínimo de afetividade entre

    cuidador e ser cuidado, num processo de intercâmbio de vidas e realidades

    entre eles.

    Após uma breve definição de cuidado, sigamos ao objeto deste estudo

    dissertativo: o cuidado direcionado a si mesmo. Primeiramente, faz-se

    necessário enfatizar que existem diferenças semânticas entre o cuidado de si e

    o cuidar de si, quais sejam: este indica a ação do cuidado de si, aquele

    denomina o ato de cuidado para consigo.(27).

    A prática do cuidado de si consiste primordialmente em perceber que a

    própria pessoa precisa de cuidados, tais como promover um equilíbrio físico,

    emocional e social em suas atividades cotidianas. Ao cuidar de si, o ser

    humano estrutura-se, entra em sintonia consigo e com o mundo. O modo como

  • 29

    cuida de si e do outro transparece o ser humano que é, pois, se o cuidado de si

    for inadequado ou inexistente, o ser humano pode se desestruturar, trazendo

    prejuízos a si e àqueles com quem ele se relaciona(28).

    Para cuidar de si, a pessoa necessita sentir-se como o outro, olhar-se interiormente do mesmo jeito como se mostra exteriormente e, ainda, precisa sentir-se unida consigo. Porém, só é possível observar o crescimento do outro, se o indivíduo compreende o que significa para si crescer e busca satisfazer suas próprias necessidades. A relação com o outro acontece do mesmo modo como a pessoa se relaciona consigo mesmo

    (23, p.18).

    Desde a Antiguidade, as noções de cuidado de si já começavam a ser

    delineadas e inspiraram diversos filósofos, em especial Sócrates. Na doutrina

    deste, podíamos encontrar as seguintes expressões: “conhecer a si mesmo” e

    “cuidar de si mesmo”. A primeira significa “examinar-se interiormente e

    conhecer a própria alma, assim como cuidar de si revela cuidar da própria

    alma. O cuidado de si é, portanto, indissoluvelmente cuidado dos outros” (29). O

    homem que quisesse ter uma vida feliz teria que conhecer a si mesmo, e, por

    conseguinte, cuidar de si, de seu interior, da sua alma.

    Os termos supracitados não devem ainda ser confundidos com o

    conceito de autocuidado, formulado por Orem. Considera-se autocuidado uma

    atividade do indivíduo reconhecida pelo mesmo e direcionada para uma

    finalidade. Refere-se a um ato realizado para si mesmo ou para ajustar fatores

    que afetam seu próprio desenvolvimento. O autocuidado tem como objetivo a

    prática propriamente dita de ações de cuidado, que promove o

    desenvolvimento individual(30).

    Diante do exposto, tendo em vista uma busca constante pelo bem-estar

    biopsicossocial por meio do cuidado de si, nota-se o desenvolvimento de novas

    tecnologias de cuidado, que vêm se apresentando mais eficientes do que os

    meios convencionais, e, muitas vezes, ultrapassados.

    Com a decadência e limitações do modelo biomédico, a busca por

    outros modelos de assistência à saúde intensificou-se. Neste contexto, as

    práticas integrativas e complementares se inserem para atender as

    necessidades, com estratégias terapêuticas diferenciadas, focadas na visão

    global do ser humano, utilizando-se de ferramentas mais simples e menos

  • 30

    intervencionistas, promovendo um equilíbrio entre humanização, ciência e

    tecnologia(31).

    Diversas práticas não alopáticas estão inseridas na Medicina Tradicional

    Chinesa, que é um dos exemplos de práticas integrativas e complementares.

    Estes recursos terapêuticos consideram o indivíduo em sua dimensão holística,

    sem descartar sua singularidade diante do processo saúde-doença,

    contribuindo para um cuidado integral do ser(32). Além disso, elas constituem

    outra opção de solução e alívio para aqueles que desacreditam ou não

    obtiveram resultados satisfatórios com a medicina tradicional ocidental.

    A Medicina Tradicional Chinesa caracteriza-se por um sistema médico integral, originado há milhares de anos na China. Utiliza linguagem que retrata simbolicamente as leis da natureza e que valoriza a inter-relação harmônica entre as partes visando a integridade. Como fundamento, aponta a teoria do Yin-Yang, divisão do mundo em duas forças ou princípios fundamentais, interpretando todos os fenômenos em opostos complementares. O objetivo desse conhecimento é obter meios de equilibrar essa dualidade

    (32, p. 13).

    Atualmente, observa-se um crescente interesse nas práticas de cuidado

    integrativas e complementares de saúde, visando promover, proteger e

    recuperar a saúde dos indivíduos. Diferentemente das práticas de cuidado

    alopáticas, que fazem uso de fórmulas medicamentosas, curando apenas o

    órgão debilitado, as práticas integrativas abordam mecanismos naturais que

    estimulam a prevenção de agravos e recuperação da saúde, com base na

    escuta acolhedora, no vínculo terapêutico, na visão ampliada do corpo, o qual

    passa por um processo de saúde-doença, e na promoção do cuidado e

    autocuidado humano(32). De acordo com Saraiva(2):

    (...) o aumento da demanda por essas práticas de cuidados, não alopáticas, deve-se, em especial, a crise na saúde, culminada pelo capitalismo globalizado e pela mercantilização da medicina. Como resultado, acaba-se priorizando as alterações e lesões corporais, já que grande parte dos serviços é pautada em diagnóstico e tratamento de doenças, ficando pouco espaço para a atenção, acolhimento e atenção dos sujeitos e seus sofrimentos, gerando agravos psicossociais.

    (2, p.15).

    Dentre a práticas integrativas e complementares contempladas no

    âmbito da Medicina Tradicional Chinesa, podemos destacar a Homeopatia,

    Fitoterapia e da Medicina Antropofísica. Neste estudo, oportunamente,

  • 31

    abordaremos algumas práticas não alopáticas, são elas: reiki, acupuntura, ioga,

    biodança, florais, meditação e aromaterapia.

    O reiki, técnica que utiliza as mãos para obter a cura, tem sua essência

    na energia vital que dá movimento ao que existe no universo. Atua sobre os

    chakras, centros energéticos que circulam continuamente no corpo, e sobre a

    aura, que se refere ao campo energético que circunda o organismo humano.

    Como benefícios do reiki, podemos citar: relaxamento físico e mental, redução

    de estresse e ansiedade, alívio das dores, promoção do sentido de

    autocuidado, elevação da espiritualidade, equilíbrio e harmonização do corpo,

    mente e espírito(2,32,33).

    Outra prática, que vem sendo realizada há séculos é a acupuntura,

    técnica milenar que utiliza agulhas para promover a cura. É considerada como

    medicina tradicional nos países do oriente, enquanto que nos países onde a

    forma de medicina praticada é alopática, consiste de uma terapia integrativa e

    complementar. A ação da acupuntura se deve ao realinhamento e

    redirecionamento da energia, através da estimulação de pontos específicos por

    agulhas finas metálicas, podendo ainda fazer uso de laser, pressão, dentre

    outros(34).

    Tal recurso terapêutico aborda de modo integral e dinâmico o processo

    saúde doença no ser humano através do “estímulo preciso de locais

    anatômicos definidos por meio da inserção de agulhas filiformes metálicas”. O

    estímulo nesses locais provoca a liberação de neurotransmissores no sistema

    nervoso central, além de outras substâncias que promovem analgesia,

    restauração de funções orgânicas e modulação imunitária(32).

    “A ioga consiste em um método de auto-regulação consciente que

    conduz à integração física, mental e espiritual da personalidade humana e

    possibilita a relação harmônica do homem com o que o rodeia(35).” Baseia-se

    na busca do equilíbrio físico e mental por meio de técnicas de postura física

    (asanas), respiração (pranayamas) e meditação (dhyana), promovendo

    mudanças e benefícios nas funções psíquicas cognitivas e afetivas, na

    coordenação psicomotora, nos processos de atenção e concentração. Além de

    promover melhorias na área mental, a ioga proporciona melhoras na parte

    física, pois também é considerada uma atividade física. Por ser de baixo

  • 32

    impacto e relativamente leve, pode ser realizada por pessoas de diversas

    faixas etárias(35,36).

    De acordo com Reis(37), a biodança consiste em um método vivencial,

    tendo a finalidade de desenvolver os potenciais saudáveis do indivíduo. Tal

    prática auxilia na “reeducação afetiva, no cuidado solidário, no

    desenvolvimento da criatividade e fortalecimento de uma identidade positiva”,

    sempre tendo a dança como meio de expressão pessoal. Essa autora ainda

    revela que:

    A biodança consiste em exercícios específicos que, ativando nossa potencialidade afetiva, realizam este significado primordial da dança como conexão. Em síntese, ao falar da dança como movimento integrativo, pretende-se enfatizar que, ao dançar, o ser humano conecta-se consigo próprio, com seus semelhantes e com a Natureza (37, p.9)

    No que se refere à terapia com florais, esta compreende uma terapia

    vibracional, cujo fundamento é o potencial energético das flores. As essências

    florais utilizadas são feitas a partir de plantas silvestres, flores e árvores, e

    tratam distúrbios na personalidade, com o objetivo de harmonizar o corpo

    etério, emocional e mental(38). Ainda em consonância com esse estudo, houve

    diminuição no nível de ansiedade e nos comportamentos atribuídos às pessoas

    ansiosas, como preocupação, impaciência, tensão, nervosismo, apreensão e

    etc., ao fazerem uso das essências Impatiens, Cherry Plum, White Chestnut e

    Beech. Vale ressaltar que existem diversas essências, cada uma com um

    objetivo específico e direcionadas a outras manifestações psicológicas.

    Com relação à aromaterapia, autores(39) revelam que esta abordagem

    faz uso de concentrados voláteis, chamados de óleos essenciais. Estes são

    retirados de plantas aromáticas e buscam balancear as emoções, incrementar

    o bem-estar físico e mental, podendo ser interiorizados por meio de inalação,

    ingestão ou uso tópico. Pesquisas demonstram que a aromaterapia auxilia na

    redução do estado de ansiedade(39) e dos níveis de estresse e ansiedade em

    discentes de graduação na área da saúde(40). No entanto, um estudo afirmou

    que o uso da aromaterapia não foi capaz de alterar a percepção da

    autoestima(41).

    A meditação é uma prática milenar e possui vários benefícios a nível

    mental e espiritual. A meditação pode ser definida como um conjunto de

  • 33

    práticas que desenvolvem a focalização da atenção, o que conduz à diminuição

    do pensamento repetitivo, à reorientação cognitiva e melhora da aptidão para

    lidar com pensamentos automáticos. Fisiologicamente, a meditação pode levar

    a um hipometabolismo basal, fazendo com que a mente fique alerta e

    possibilitando o controle de determinados processos psicobiológicos

    involuntários, sendo, portanto, considerada uma técnica eficaz de

    biofeedback(42).

    Ainda em conformidade com as autoras supracitadas, relativamente a

    outro estudo, além da relação com a psicoterapia, a meditação também passou

    a ser uma intervenção clínica utilizada como ferramenta para tratamentos

    coadjuvantes de transtornos psicológicos. Entre os benefícios da meditação

    podemos citar: redução do estresse, da ansiedade, de pensamentos

    distrativos; controle de afetos negativos induzidos; melhora na memória de

    trabalho e em escores de inteligência; maior autoconsciência; autorregulação

    emocional; proporciona maior conexão espiritual e melhora na qualidade do

    trabalho e na tomada de decisões(43).

    Os recursos terapêuticos supracitados são apenas algumas das

    dezenas de opções disponíveis à população em geral e aos profissionais de

    saúde que desejam desenvolver o hábito de cuidar de si e, assim, promover

    um cuidado mais efetivo do outro. Cabe ao profissional ter a consciência e

    compreensão de que seu corpo não é uma máquina, esperando que ela

    funcione a todo vapor sem apresentar falhas ou defeitos.

    O profissional dessa área pode ser considerado o mais suscetível a

    todos os males advindos da profissão, por estar sempre em contato com o

    sofrimento e vulnerabilidade do outro e, muitas vezes, pela necessidade de se

    sujeitar a condições de trabalho estressantes. Por esse mesmo motivo, deve

    ter cuidado redobrado em relação a si mesmo.

  • 34

    2.2 Autoestima e suas inter-relações

    Dia após dia, somos cercados por diversos fatores que influenciam a

    forma como nos relacionamos com nós mesmos. Dependendo da percepção

    que temos do nosso ser, que pode ser positiva ou negativa, pode-se

    desencadear processos de adoecimento que afetam nossa interação com o

    meio em que vivemos e com as pessoas com quem nos relacionamos.

    É impossível não associar autopercepção à autoestima. O indivíduo, ao

    se perceber diante de tudo que o rodeia, procede a uma interpretação e

    consequente avaliação de sua posição como ser humano naquela

    circunstância. Além disso, a autoimagem é relevante nesse processo, pois

    auxilia no desenvolvimento de um autoconceito positivo e, portanto, na

    promoção da qualidade de vida.

    O autoconceito compreende um constructo cognitivo e comportamental,

    tendo bastante utilidade na predição e explicação das atitudes de uma pessoa,

    enquanto que a autoestima limita-se a um componente avaliativo da área

    afetiva do self, isto é, o autoconceito representa o que sabemos sobre ele e a

    autoestima refere-se a como o julgamos e o percebemos(44).

    Coopersmith(45) define a autoestima como sendo:

    [...] a avaliação que o indivíduo faz, e que habitualmente mantém, em relação a si mesmo. Expressa uma atitude de aprovação ou desaprovação e indica o grau em que o indivíduo se considera capaz, importante e valioso. Em suma, a autoestima é um juízo de valor que se expressa mediante as atitudes que o indivíduo mantém em face de si mesmo. É uma experiência subjetiva que o indivíduo expõe aos outros por relatos verbais e expressões públicas de comportamentos. (45, p. 4-5)

    O conceito de autoestima está relacionado principalmente à sensação

    de sentir-se bem ou mal consigo mesmo, aliado à aceitação. Se for uma

    sensação positiva, o indivíduo tende a ver-se como sendo suficientemente bom

    e capaz, sem que haja necessariamente uma atitude de superioridade em

    relação às outras pessoas. Sendo negativa, o ser humano se rejeita, se

    despreza e está insatisfeito com o que vê de si próprio(41). Branden(46) também

    explica autoestima da seguinte forma:

  • 35

    Ter uma autoestima elevada é sentir-se confiantemente adequado à vida, isto é, competente e merecedor, no sentido que acabamos de citar. Ter uma autoestima baixa é sentir-se inadequado à vida, errado, não sobre este ou aquele assunto, mas errado como pessoa. Ter uma autoestima média é flutuar entre sentir-se adequado ou inadequado, certo ou errado como pessoa e manifestar essa inconsistência no comportamento – às vezes agindo com sabedoria, às vezes como tolo – reforçando, portanto, a incerteza.

    (46, p. 6)

    De acordo com o autor supracitado, a autoestima possui dois

    componentes que, se somados, refletem a nossa habilidade de compreender e

    dominar as adversidades da vida e de reconhecer que temos o direito de

    sermos felizes: a autoconfiança e o autorrespeito. Além disso, a autoestima

    está embasada em seis pilares, que se complementam, para que o indivíduo a

    possua de forma saudável. São eles: viver conscientemente, autoaceitação,

    autorresponsabilidade, autoafirmação, intencionalidade e integridade

    pessoal(46).

    O primeiro pilar refere-se à responsabilidade e o respeito para com os

    fatos da realidade, seja no mundo exterior ou no nosso interior. Viver

    conscientemente está intrinsecamente relacionado à independência intelectual

    de cada um de nós, pois não devemos pensar com a mente do outro, e sim, ter

    o nosso próprio entendimento de como tudo funciona. Quanto mais se viver

    conscientemente, mais confiança será dedicada à mente e mais respeito se

    dará ao seu valor como pessoa(46).

    A autoaceitação implica em nossa vontade de nos vermos e

    percebermos que há coisas que não podem ser mudadas, principalmente

    quando estamos diante do espelho, além das atitudes de aprovação ou

    desaprovação das nossas condições na realidade. Aceitar-se “significa

    vivenciar, sem negação, que um fato é um fato” e que rejeitá-lo afetará a

    capacidade de desenvolver a autoconfiança e o autorrespeito(46).

    Autoaceitação, autoconhecimento, autoimagem e autoestima em muito

    se complementam, o que pode ser percebido no excerto a seguir:

    A natureza da auto-imagem (sic), base para a autoestima, reside no conhecimento individual de si mesmo e no desenvolvimento das próprias potencialidades, na percepção dos sentimentos, atitudes e idéias (sic) que se referem à dinâmica pessoal. [...] a autoestima faz parte de um processo de identidade que leva ao conhecimento próprio, à valorização de possibilidades, à confiança na superação e à tentativa de se auto-atualizar (sic) e de se auto-realizar (sic)

    (47,p. 105-

    106).

  • 36

    O pilar da autorresponsabilidade consiste em ter a percepção e o

    entendimento de que apenas o sujeito e só ele é o responsável pelas escolhas

    que faz, pela realização de seus sonhos e pela busca da felicidade, não

    podendo incumbir a outras pessoas a culpa pelas consequências de seus

    próprios atos, assumindo assim o papel de vítima diante da vida e de seus

    infortúnios(46).

    Já a autoafirmação compreende a habilidade de viver de forma autêntica

    e de respeitar primeiramente sua opinião em detrimento da opinião dos demais,

    buscando o realismo diante daquilo que se é. O pilar da intencionalidade

    refere-se aos objetivos e planos que temos para a vida, as intenções que

    temos para com o mundo, trilhando um caminho para o que desejamos realizar

    durante o nosso curso de vida. Finalmente, o pilar da integridade pessoal diz

    respeito à coerência dos nossos padrões, crenças, comportamentos e

    convicções com os nossos valores declarados(46).

    Portanto, a autoestima promove o autoconhecimento e vice-versa, pois,

    quando o indivíduo está ciente de si e do outro, este se vê aberto a agir ativa e

    positivamente frente às possibilidades que nos são apresentadas pela vida.

    Portanto, de acordo com Sá(48):

    [...] nossas atitudes e posturas diante das situações são reflexos dos pensamentos que temos sobre nós; portanto, o autoconhecimento nos dá as respostas para entender a nós e ao outro. Isso fortalece uma influência às nossas escolhas e decisões

    (48, p.100).

    Nesse sentido, podemos inferir que o sujeito é o principal responsável

    por seus problemas e crises, sendo também considerado como a solução

    destes. É o que afirma Barreto(49), ao mencionar o pensamento sistêmico, que

    enfatiza o fato de que tais conflitos apenas serão resolvidos quando se analisa

    um contexto que compreenda o biológico, o psicológico e a sociedade, pois os

    seres humanos não podem ser vistos isoladamente. É como se um órgão de

    um sistema estivesse comprometido; é impossível não haver envolvimento dos

    outros órgãos e sistemas, uma vez que estão interligados.

    Percebe-se, portanto, um misto de coparticipação e corresponsabilidade,

    tendo em vista que um sistema possui elementos em constante interação,

    sendo esse mesmo sistema o responsável por tentar reparar os danos

  • 37

    causados pelo adoecimento. Desse modo, as situações problemáticas na vida

    do sujeito fazem parte de um todo, caracterizando uma relação simbiótica e de

    interdependência, quando o indivíduo se vê como causa e como resolução de

    suas crises(50).

    Quem também discorre sobre a sistematicidade é Fritjof Capra, trazendo

    seu ponto de vista sobre a abordagem sistêmica, a qual valoriza as relações

    entre os elementos e a interdependência dos fenômenos:

    A nova visão da realidade, de que vimos falando, baseia-se na consciência do estado de inter-relação e interdependência essencial de todos os fenômenos- físicos, biológicos, psicológicos, sociais e culturais. Essa visão transcende as atuais fronteiras disciplinares e conceituais e será explorada no âmbito de novas instituições

    (51, p. 259).

    Com base nesse pensamento, é possível afirmar que a concepção

    sistêmica pode ser considerada um novo paradigma conceitual, uma vez que

    percebe o organismo vivo como um sistema integrado e não de maneira

    fragmentada, como ocorre no modelo cartesiano. A abordagem sistêmica vê o

    mundo numa perspectiva de relações e de integração, valorizando o todo e

    suas relações com as partes que o constituem. Sendo assim, o todo é o

    resultado de sua interação com seus constituintes e não a soma deles(51).

    Percebe-se, portanto, que o indivíduo é o principal responsável pelo

    desenvolvimento de sua autoestima e que, cada vez mais, este aspecto está

    em destaque no cotidiano, especialmente ao falarmos sobre o cuidado de si.

    Conforme Soares et al(52), “o cuidar de si inclui o conhecimento de si, que

    favorece uma melhor autoestima, confiança em si e na vida. Compreende

    também o cuidar da saúde, do espírito, do intelecto, de seu tempo, do lazer e

    assim por diante”. Ao longo deste estudo, abordaremos o cuidado de modo

    mais aprofundado e como este pode influenciar a maneira como lidamos com

    nossa autoestima.

  • PERCURSO

    METODOLÓGICO

  • 39

    Este estudo buscou de maneira compreensiva-interpretativa conhecer a

    experiência de cuidar de si vivenciada pelos profissionais da saúde a partir de

    sua participação no curso de formação de multiplicadores em oficinas –

    Cuidando do Cuidador/resgate da autoestima.

    Segundo Minayo(53), esta abordagem procura aprofundar e investigar a

    realidade social dos indivíduos, incluindo seus atos e relações que envolvem

    construções humanas, estabelecidas subjetivamente. Além disso, contribui

    fortemente nas ciências sociais e da saúde, uma vez que trabalha com o

    universo de significados, desejos, valores, concepções, motivos e atitudes,

    caracterizando um espaço profundo de relações que é impossível quantificar.

    Por isso, diante das importantes contribuições que poderá prover para o

    estudo, optou-se por esta abordagem.

    Considerando a importância do objeto de investigação e afim de

    subsidiar tais aspectos qualitativos, o percurso metodológico foi norteado pela

    História Oral (doravante, HO) com base nos pressupostos indicados por Bom

    Meihy(54). A escolha deste caminho metodológico ajuda a conhecer em

    profundidade o fenômeno a ser investigado. Portanto, entende-se que a HO

    viabiliza conhecer as experiências dos profissionais de saúde em cuidar de si a

    partir de sua participação no Curso de Formação de Multiplicadores em

    Oficinas - Cuidando do Cuidador.

    A HO nasceu após a Segunda Guerra Mundial quando se diferenciou de

    outras formas de entrevista, portanto, é uma metodologia recente e fruto do

    convívio urbano, atenta a fenômenos de interesse do público amplo e

    constituída por debates atentos à fundamentação de seus usos(54).

    Ela valoriza a participação social e o direito de cidadania, dessa forma,

    os excluídos, marginalizados e qualquer tipo de pessoa podem participar e

    colaborar com a HO afim de analisarem-se processos sociais com o intuito de

    fornecer e divulgar estudos de identidade e memória cultural(54). É um recurso

    moderno utilizado para produzir registros e documentos referentes à

    experiência social de pessoas e de grupos. Também é sempre uma história

    inscrita no “tempo presente” e reconhecida como história viva(54).

    Ainda para os autores supracitados, a HO é um processo de aquisição

    de depoimentos, vertidos do oral para o escrito, que deve responder a um

    sentido da utilidade prática, social e imediata. Isso não quer dizer que ela se

  • 40

    esgote no momento da sua apreensão, do estabelecimento de um texto e da

    eventual análise das entrevistas.

    Bom Meihy e Holanda(54) classificam a HO em quatro modalidades:

    História Oral de Vida (HOV), História Oral Testemunhal, Tradição Oral (TO) e

    História Oral Temática (HOT). Todas as modalidades exigem que os

    colaboradores estejam em condição mental estável para narrarem suas

    histórias de forma voluntária e independentemente de benefícios.

    Essa investigação se ancorou na modalidade da HO Temática por esta

    ser uma possibilidade de estudar um tema específico e preestabelecido,

    responsabilizando-se com o esclarecimento ou a opinião do entrevistador a

    respeito de determinado evento definido, na perspectiva de desvelar algum

    fenômeno escolhido para estudo. Segundo o autor ela “(...) é a que mais se

    aproxima das soluções comuns e tradicionais de apresentação dos trabalhos

    analíticos em diferentes áreas do conhecimento acadêmico”(55, p.162). A HO

    Temática focaliza as histórias com um objetivo específico, nesse caso, a

    história de profissionais de saúde no processo de cuidar de si.

    Esta pesquisa foi desenvolvida na cidade de João Pessoa, capital da

    Paraíba, Nordeste, Brasil. O município tem uma área territorial de 211,475 Km2

    e de acordo com o censo realizado pelo IBGE(56) no ano de 2010, dispõe de

    uma população de 723.515 habitantes.

    Com relação a saúde, a cidade está demarcada territorialmente sob a

    forma de Distritos Sanitários (DS). Existem 5 DS que contém USF’s, Centros

    de Atenção Integral à Saúde (CAIS), Centro de Atenção Integral à Saúde do

    Idoso (CAISI), Centro de Referência de Inclusão para Pessoas com

    Deficiência, Centros de Saúde, Centros de Testagem e Aconselhamento

    (CTA), Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), Centros de Especialidades

    Odontológicas (CEO), CEREST, Centro de Zoonozes, Núcleo de Portadores de

    Necessidades Especiais, Programa Agentes Comunitários de Saúde (PACS),

    Hospitais, Maternidades, Serviço de Atendimento Médico de Urgência (SAMU),

    Farmácias Populares, Laboratórios, Depósitos de Equipamentos, Almoxarifado

    Central, Diretoria de Regulação e SMS.

    Nesta rede, existem profissionais das mais diversas áreas, sejam da

    saúde, como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, farmacêuticos,

    odontólogos, fonoaudiólogos, agentes comunitários de saúde (ACS),

  • 41

    educadores físicos, psicólogos e assistentes sociais, sejam de outras áreas,

    como telefonistas, recepcionistas, jornalistas, agentes administrativos, auxiliar

    de serviços, antropólogos e outros.

    O estudo foi realizado com 8 profissionais da rede de saúde,

    pertencentes aos DS do município de João Pessoa, e que participaram do

    curso de formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando do

    Cuidador/resgate da autoestima. Este é disponibilizado para qualquer

    profissional que deseje participar, mas devido a grande procura, as formadoras

    do curso promovem uma sensibilização em horários previamente agendados

    para escolher, mediante critérios pré-estabelecidos, os membros participantes.

    Considerando a importância da contribuição dos depoentes, eles são

    compreendidos como colaboradores do projeto, uma vez que a participação

    especial, durante a realização da produção de material empírico até os passos

    finais da pesquisa, não os permite considerá-los apenas como meros sujeitos

    do estudo, pois eles têm livre arbítrio para interferir na entrevista transcriada,

    podendo acrescentar ou retirar fragmentos/retalhos. Dessa maneira, o

    colaborador tem papel ativo na história e é essencial no estabelecimento de

    uma relação de vínculo, compromisso e confiança entre o entrevistador e o

    entrevistado(55).

    Para viabilizar o caminho escolhido, foi imprescindível seguir os passos

    necessários afim de estabelecer os cinco momentos principais de sua

    realização: elaboração do projeto; gravação; estabelecimento do documento

    escrito e sua seriação, sua análise; arquivamento e devolução social(54).

    A HO se inicia com a elaboração de um projeto, que norteia e ajuda no

    planejamento do trabalho de pesquisa, o delineamento da proposta a ser

    desenvolvida, justificativa/fundamentação, os mecanismos de

    operacionalização, a forma e a evidência dos objetivos oriundos das hipóteses

    de trabalho. Desta projeção inicial, é preciso emergir perguntas como de quem,

    como e por que, e a partir disso, deve-se levar em conta fatores como a

    relevância social da pesquisa; a exequibilidade na abrangência das entrevistas,

    o local e o tempo; o diálogo com a comunidade que o gerou; e a

    responsabilidade na finalização e na devolução ao grupo(54).

    O projeto deve ser composto por tema, justificativa, problemática e

    hipóteses, corpus documental e objetivos, procedimentos, bibliografia e

  • 42

    cronograma. Além disso, é importante definir com êxito todas as etapas que

    constituem este projeto: tema, justificativa, comunidade de destino, definição da

    colônia, formação de rede, entrevista, transcrição, textualização, transcriação,

    conferência, uso e arquivamento(55).

    Com a finalidade de caracterizar este tipo de método, exige-se que seja

    definido a comunidade de destino, a colônia e a rede, fatores fundamentais

    para a escolha adequada dos colaboradores. Conceitua-se comunidade de

    destino os indivíduos que partilham de uma mesma identidade, ou seja,

    compartilham algumas características comuns. A colônia representa a primeira

    divisão da comunidade de destino e a rede é formada por uma subdivisão da

    colônia, considerada, então, a menor parcela de uma comunidade de

    destino(54).

    Ainda, segundo os autores supracitados. Vejamos: (54, p. 53 e 54):

    Comunidade de destino é formada a partir de uma postura comum de um passado filtrado pelo trauma coletivo que seria matéria de registro e verificação da história oral. (...) Colônia é a parte dividida para possibilitar o entendimento do todo pretendido, mas é necessário guardar, ao mesmo tempo, características peculiares que justifiquem a fração e manter os elos comuns ao grande grupo. (...) A rede identifica segmentos ainda mais restritos que possuam feições singulares. Deve ser sempre plural porque nas diferenças internas aos diversos grupos, residem as disputas ou olhares diferentes que justificam comportamentos variados dentro de um mesmo plano.

    Neste estudo, a comunidade de destino foi constituída pelos 279

    profissionais da rede de saúde do município de João Pessoa – PB que

    participaram do curso de formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando

    do Cuidador/resgate da autoestima. A colônia foi composta pelos profissionais

    que procuraram outras possibilidades de cuidado após a realização do referido

    curso. E a rede foi formada pelos profissionais que estavam realizando práticas

    de cuidado de si de maneira sistemática e com uma frequência semanal.

    Dessa forma, a rede foi constituída por 8 profissionais.

    A escolha dos prováveis colaboradores consistiu-se no estabelecimento

    de critérios de inclusão relacionados à temática da pesquisa e foram eles: ter

    concluído o curso de Formação de multiplicadores em oficinas – Cuidando do

    Cuidador/resgate da autoestima, ter procurado outras possibilidades de

    cuidado após o referido curso e estar realizando práticas de cuidado com

  • 43

    frequência semanal. A contrário sensu, os mecanismos de exclusão foram: não

    ter concluído o curso e não estar realizando práticas de cuidado com

    frequência semanal.

    Diante do grande número de participantes do referido curso, foi

    solicitado a SMS as listas contendo os nomes e contatos de cada profissional

    que o realizou. A partir de então, procedeu-se o início do contato, via telefone,

    com o maior número possível de profissionais a fim de descobrir e escolher,

    através de algumas perguntas, a rede que faria parte do estudo.

    Durante as ligações, indagou-se sistematicamente a cada profissional,

    se os mesmos procuraram outras práticas de cuidado após a realização do

    curso. Caso respondessem que sim, mais algumas perguntas eram feitas,

    como: “Quais foram essas práticas?”, “Onde você as realiza?”, “E com que

    frequência?”. Através das respostas, foi possível escolher os colaboradores,

    tendo como base os critérios de inclusão e a indicação de algumas pessoas

    contatadas por tais ligações.

    Foi utilizado como instrumento para a produção do material empírico

    uma ficha técnica contendo perguntas para a identificação do(a) colaborador(a)

    e perguntas de corte.

    Bom Meihy(55) ressalta a importância de definir perguntas de corte, que,

    além de guiarem todas as entrevistas, deve-se relacioná-las à comunidade de

    destino, que marca a identidade do grupo analisado. As perguntas de corte que

    orientaram todas as entrevistas desse estudo foram:

    Conte-me, esse curso foi capaz de promover algum tipo de

    mudança no seu jeito de se cuidar? E de cuidar do outro?

    Como esse curso despertou em você o desejo/necessidade de

    buscar outras práticas para cuidar de si?

    Que práticas você escolheu?

    Como você se sente ao participar dessas práticas?

    Essas práticas têm te ajudado enquanto pessoa ao longo desse

    tempo? Como?

    Essas práticas têm te ajudado enquanto profissional ao longo

    desse tempo? Como?

  • 44

    Diga-me, o que mais lhe motivou a continuar no processo de

    cuidar de si?

    Segundo Bom Meihy e Holanda(54), para a construção do corpus

    documental da investigação faz-se necessário iniciar pela pré-entrevista,

    seguida da entrevista propriamente dita e da pós-entrevista. A pré-entrevista é

    o momento em que o pesquisador prepara-se para o encontro com o(a)

    colaborador(a). É a etapa do primeiro contato com o colaborador da pesquisa,

    tendo-se como finalidade a formação inicial do vínculo entre as partes

    envolvidas e a apresentação do projeto de pesquisa com seus objetivos e

    métodos visando-se conceder todas as informações necessárias ao

    participante.

    A entrevista propriamente dita é utilizada como meio para obtenção do

    material empírico na qual utiliza-se um gravador e/ou filmadora. Esta etapa

    aconteceu no período de julho a outubro de 2014. As entrevistas foram

    gravadas individualmente, em horários previamente agendados, respeitando-se

    a autonomia das colaboradoras em escolherem o melhor dia e local para a

    realização das entrevistas, contribuindo, dessa maneira, para que as mesmas

    ficassem mais abertas e à vontade para partilharem suas experiências.

    Antes de iniciar as entrevistas foi solicitada a assinatura do Termo de

    Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), em duas vias, sendo uma para o

    colaborador e outro para a pesquisadora. Neste termo, constavam os objetivos

    da pesquisa, sua finalidade, os riscos e benefícios da mesma, além do

    posicionamento ético adotado a partir da Resolução 466/12, que trata da

    pesquisa envolvendo seres humanos.

    Após a entrevista, foi agendado um novo encontro para a realização da

    conferência do material empírico produzido e a assinatura da carta de cessão

    que legitima o corpus documental e sua publicação. Foi explicitado aos

    colaboradores que seria possível preservar suas identidades, utilizando-se da

    escolha de nomes fictícios ou, caso preferissem, poderiam usar seus nomes

    civis. Todos concordaram em divulgar seus nomes reais.

    Continuando as etapas da pesquisa, realizou-se a pós-entrevista,

    momento em que o relato oral é transformado para o escrito, sendo assim, foi

    submetido a transcrição de forma literal.

  • 45

    A textualização, etapa seguinte, inicia-se com a remoção dos vícios de

    linguagem, palavras e frases repetidas e composições sem semântica,

    preservando a essência textual. Ademais, também são retiradas as perguntas

    de corte, conferindo ao texto um corpo estético e único, possibilitando a

    identificação do tom vital da entrevista de cada colaborador, ou seja, o tema de

    maior força dentro do relato, e que servirá de guia para se proceder a análise e

    discussão do material empírico.

    O último passo, a transcriação, é o momento no qual a pesquisadora

    realiza interferências no material textualizado na perspectiva de transcriá-lo,

    tornando-o um texto de caráter narrativo.

    Concluída esta etapa, foi apresentado o texto final as colaboradoras

    para proceder a etapa de conferência, aprovação e autorização para uso e

    publicação do material produzido, mediante assinatura da Carta de Cessão.

    Durante a conferência, as colaboradas têm liberdade e autonomia para retirar

    ou acrescentar informações ao texto final dando confiabilidade ao material,

    porém mantendo o sentido original da narrativa(55).

    A análise e discussão do corpus documental contou com leituras

    exaustivas e contínuas do material empírico obtido afim de compreender a

    história vivida pelo colaborador tentando entender a subjetividade do indivíduo

    e sua maneira de se expressar linguística e sentimentalmente.

    Esta etapa foi conduzida pela técnica de análise de conteúdo temática

    que “consiste em descobrir os núcleos de sentido que compõem uma

    comunicação, cuja presença ou frequência signifiquem alguma coisa para o

    objeto analítico visado”(53). Através da identificação dos tons vitais e dos temas

    fortes trazidos pelos depoimentos dos(as) colaboradores(as) foi possível traçar

    dois eixos temáticos: 1- Participando do curso de formação de multiplicadores

    em oficinas – Cuidando do Cuidador/resgate da autoestima: um despertar para

    o cuidar de si na dimensão pessoal e profissional: cuidar de si na dimensão

    pessoal e cuidar de si na dimensão profissional e 2- Profissionais da saúde:

    descobrindo possibilidades e práticas de cuidado.

    O corpus documental foi analisado e discutido a partir dos achados

    significativos da investigação trazidos pelos tons vitais e expressões fortes,

    fundamentados pela literatura pertinente e as contribuições da pesquisadora

    com base nas suas observações, anotações e registros em caderno de campo

  • 46

    que permitiram enriquecer o diálogo na tentativa de compreender e interpretar

    o fenômeno investigado, ou seja, a experiência de cuidar de si e do outro a

    partir da participação no curso de formação de multiplicadores em oficinas –

    Cuidando do Cuidador/resgate da autoestima.

    A pesquisa obedeceu aos preceitos éticos e legais das normas e

    diretrizes propostas pela Resolução 466/12(57) que regulamenta as pesquisas

    com seres humanos, atribuídas e conferidas pela Lei nº 8.080, de 19 de

    setembro de 1990, e pela Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990.

    Primeiramente, o projeto de pesquisa foi apresentado em uma reunião do

    grupo de estudos na qual os participantes presentes fizeram recomendações

    para melhoria do projeto. Posteriormente, o mesmo foi submetido, para fins de

    aprovação, ao Colegiado do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem

    (PPGENF) da UFPB e a SMS-JP para fins de autorização à realização da

    pesquisa nos serviços de saúde desta entidade.

    Após a obtenção de tais autorizações e aprovações, o projeto foi

    encaminhado ao Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Centro de Ciências da

    Saúde da mesma Universidade (CCS/UFPB), sendo aprovado no dia

    03/07/2014, com o Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAEE)

    nº30332814.3.0000.5188.

  • APRESENTAÇÃO DO

    MATERIAL EMPÍRICO

  • 48

    Glória

    Assistente Social, 56 anos, solteira, trabalha na SEDES - Secretaria de

    Desenvolvimento Social. Mulher calma e serena, tem muita vontade de levar as

    práticas de cuidado a todos em sua volta. Mostrou-se disponível a participar da

    entrevista que foi realizada em seu local de trabalho.

    "[...] Pude parar para me cuidar, me cultivar [...].” Participei do curso “Cuid