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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA CURSO DE GEOGRAFIA – BACHARELADO CESAR BUNO FAVARÃO A indicação dos cafés produzidos na face sulmineira da serra da Mantiqueira: um estudo de caso sobre APROCAM Alfenas/MG 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA NATUREZA

CURSO DE GEOGRAFIA – BACHARELADO

CESAR BUNO FAVARÃO

A indicação dos cafés produzidos na face sulmineira da serra da Mantiqueira: um estudo de caso sobre APROCAM

Alfenas/MG

2011

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CESAR BUNO FAVARÃO

A indicação dos cafés produzidos na face sulmineira da serra da Mantiqueira: um estudo de caso sobre APROCAM

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como parte dos requisitos para a aprovação na disciplina de Trabalho de

Conclusão de Curso II e obtenção do título de Bacharel em Geografia pela Universidade Federal de Alfenas – MG, sob orientação do Professor Doutor Flamarion Dutra Alves.

ALFENAS/MG

2011

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SUMÁRIO

1 - INTRODUÇÃO........................................................................................................9

2 - METODOLOGIA.....................................................................................................3

3 - ELEMENTOS TEÓRICOS - Meio técnico científico informacional e especialização produtiva das regiões......................................................................5

3.1 - - Redes, território e eficiência

produtiva.....................................................................................................5

3.2 - Sul de Minas e circuito espacial produtivo do café........................9

3.3 - Diferenciando: indicação de procedência x denominação de origem.............................................................................................................13

4 – O SUL DE MINAS E PRODUÇÃO CAFEEIRA: Organização da região competitiva................................................................................................................21

5 – CONCLUSÕES...............................

6 - REFERÊNCIAS................................................................................................

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1 - INTRODUÇÃO

Ao longo do século XX, sobretudo, a partir de sua segunda metade, com a

criação do Instituto Brasileiro do Café (IBC), o Estado brasileiro criou diversas

políticas com o intuito de regular a produção cafeeira. As políticas adotadas eram,

basicamente, de controle do preço e da quantidade de café produzida, com forte

incentivo à substituição dos cultivares de menor rendimento por plantas que

possibilitassem maior produtividade. As políticas internas de preços vigoravam de

acordo com as políticas internacionais elaboradas pela Organização Internacional do

Café (OIC). Esta Instituição, formada pelos principais países produtores e

importadores de café, passou a ser a responsável pela criação de acordos

internacionais de cotas e tabelamento de preços. A forte regulação interna e externa

do mercado não estimulava o aumento e a diferenciação da qualidade do café entre

as diferentes regiões produtoras brasileiras. Havia uma tradição de políticas públicas

voltadas apenas para a regulação dos preços e da quantidade produzida, em

detrimento da qualidade, o que fez o café brasileiro ser reconhecido pelo mercado

internacional como um produto de baixa qualidade.

O início da década de 1990 é um marco da desregulamentação do mercado

cafeeiro (SAES, 1995), com a extinção do IBC e, também, com o fim dos Acordos

Internacionais do Café estabelecidos pela OIC. Esta década marca o início da

competitividade entre os produtores sitos em diferentes regiões produtoras para a

melhoria e reconhecimento da qualidade do café produzido. A “desregulamentação”

fez com que os produtores começassem a se organizar em torno de cooperativas e

associações regionais, com o objetivo de melhorar a qualidade e padronizar seus

produtos. Foram criados, assim, os selos de garantia de procedência do café,

levando a construção de um circuito espacial produtivo referente a esse tipo de

produção.

Minas Gerais se tornou um caso emblemático, ao delimitar em 1995, através

de medidas oficiais, quatro regiões produtoras de café: Sul de Minas, Cerrado,

Jequitinhonha e Montanhas de Minas (Zona da Mata). Conferindo a cada uma delas

um “certificado de origem” da produção (Certicafé). A iniciativa tomada pelos

produtores juntamente com o governo mineiro fez com que outras regiões

produtoras de café do país também criassem selos de origem do produto como o

caso do café irrigado da Bahia. No Sul de Minas existem diversas associações de

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produtores com o objetivo de valorizar a produção de cafés diferenciados, como a

Associação dos Produtores de Café da Mantiqueira (Aprocam), sediada na cidade

de Carmo de Minas/MG.

As fazendas associadas à Aprocam estão localizadas na microrregião

localizada na Face Sulmineira da Serra da Mantiqueira, dentro do entorno

denominado Circuito das Águas, uma das regiões cafeicultoras mais antigas e

tradicionais de Minas Gerais. A partir da década de 1990, a Aprocam iniciou um

processo gradativo de aprimoramento da tecnologia cafeeira regional, com a busca

de novos cultivares, contratação de consultorias especializadas e instalação de infra-

estrutura para melhoria da qualidade do café. A Associação conseguiu junto ao

governo de Minas Gerais, a indicação de procedência dos cafés produzidos na

Região da Face Sulmineira da Serra da Mantiqueira.

O Sul de Minas, ao longo do século XX, se consolidou como a principal região

brasileira produtora de café. Para atender às demandas desta produção e se tornar

uma região funcional a produção do café, foram criados diversos sistemas técnicos e

normativos com o intuito de tornar eficiente a rede de produção. Várias são as

competências infra-estruturais (sistemas de transporte, de armazenamento e de

comunicação), institucionais (criação de Estações Aduaneiras do Interior, Recintos

Exportadores, associações de produtores, selos de indicação de procedência,

cooperativas, incentivos fiscais e leis de desoneração das exportações) e

estratégicas/operacionais (conhecimento técnico sobre a produção, presença de

operadores logísticos e transportadores especializados no transporte do café)

criadas para dar fluidez ao circuito espacial produtivo do café e, conseqüentemente,

aos seus principais agentes econômicos.

Dentre os fatores que conformam a configuração da rede de produção à

região do sul de minas, a atribuição da “Indicação de procedência” ao café produzido

pelos associados da Aprocam, se destaca como uma das variáveis. Nesse contexto

torna-se importante analisar a produção de café da face sulmineira da Serra da

Mantiqueira sob a ótica da atribuição dos selos de indicação de procedência,

entendendo a obtenção do selo como reflexo da necessidade cada vez maior das

regiões de integrar-se de forma mais competitiva no mercado global, sendo a

valorização de alguns aspectos naturais e ou humanos uma alternativa de

sobrevivência para essas regiões. Assim como é necessário analisar as

especificidades desse tipo de produção que leva os selos de indicação de

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procedência, não só como mais uma forma de manifestação da complexa divisão

territorial do trabalho no meio-técnico-científico-informacional³. Segundo Santos

(1996) as possibilidades que o grande capital encontra no meio técnico-cientifico-

informacional de selecionar espaços no território para a prática determinadas

atividades econômicas gera uma fragmentação espacial, alguns lugares são

beneficiados pelo movimento global do capital enquanto outros são excluídos,

variando de acordo com as vantagens que esses lugares podem oferecer a

reprodução desse capital), mas também uma forma de produção capaz de

estabelecer uma relação diferenciada com o território. Diante isso, torna-se

importante apresentar algumas definições de selos e certificações relacionadas ao

agronegócio, assim como diferenciá-los, afinal cada um representa práticas

diferentes.

Tomando como estudo de caso a produção cafeeira dos produtores da

Associação dos Produtores de Café da Mantiqueira esse trabalho irá analisar o

circuito espacial produtivo do café dos associados à Aprocam e as relações

estabelecidas dentro desse circuito e parte importante que compõe a rede de

produção do café no Sul de Minas.

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2 - METODOLOGIA

No marco teórico-conceitual foram apontadas as definições de circuito

espacial produtivo, região, rede, meio técnico científico informacional e território para

explicar os processos decorrentes da ocupação das terras para a prática do

agronegócio. A metodologia consiste na realização de pesquisa e revisão

bibliográfica de textos relacionados ao agronegócio do café e as dinâmicas

territoriais do Sul de Minas; à execução de atividades técnicas e à realização de

pesquisas de campo.

Foram realizadas entrevistas, abordando basicamente aspectos referentes à

formação da associação, as especificidades da produção com indicação de

procedência, parcerias com órgãos governamentais, padronização da produção e

marketing, assim como foi feita a análise e interpretação de dados referentes à

produção de café em Minas Gerais.

Atividades técnicas:

• Elaboração de um mapa dos municípios participantes da

APROCAM

• Criação de um organograma de fluxos representando circuito

espacial produtivo. Elaboração de tabelas e mapas sobre a produção de café

no Sul de Minas, em especial, a região onde se localiza as fazendas dos

produtores associados à Aprocam, a partir dos bancos de dados disponíveis

no Anuário Estatístico do Café (Gazeta Mercantil), no Cecafé (Confederação

dos Exportadores de Café), na ABIC (Associação Brasileira da Indústria de

Café), na Produção Agrícola Municipal (IBGE), no Cadastro das Unidades

Armazenadoras (Conab) e nas Estatísticas Coffee Business.

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3 - ELEMENTOS TEÓRICOS - Meio técnico científico informacional e

especialização produtiva das regiões

No atual período da globalização, as possibilidades técnicas e normativas,

sobretudo aquelas relacionadas ao aumento da circulação e da comunicação,

promoveram um aprofundamento da divisão territorial/internacional do trabalho, com

a exacerbação da especialização produtiva regional. Para Santos (1996), a

emergência de uma unicidade técnica mundial, associada a uma maior capacidade

de conexão entre os lugares, permitiram às grandes corporações uma atuação em

escala planetária e tornou incompreensível a noção de região como sendo uma

subárea autônoma. Para o autor cada segmento produtivo organiza o subespaço

segundo uma modalidade própria e a região seria a arena de determinadas funções

da sociedade total em um dado momento.

Para Santos (1988) a afirmação do novo paradigma produtivo e o aumento –

pelo ao menos para alguns agentes – dos fluxos materiais e informacionais fez com

que o modo de produção dominante se tornasse mundial, ao mesmo tempo em que

a produção passou a se especializar regionalmente. As regiões passaram a

estabelecer vínculos mais intensos com áreas distantes, tornando-se funcionais às

ordens e demandas externas. A comunicação entre parceiros econômicos – à

montante e à jusante -, graças às novas redes é acompanhada de uma seletividade

espacial. A importância estratégica da localização geográfica foi, de fato, ampliada

(DIAS, 2009), ampliando o movimento dialético local-global.

No território brasileiro existem diversos exemplos de constituição de regiões

especializadas em um tipo de produção. Os casos mais emblemáticos são as

regiões produtoras de commodities agrícolas e minerais. O destino à exportação da

maioria da produção, a presença de firmas transnacionais, a criação de sistemas

técnicos e normativos com o intuito de viabilizar a produção, a especialização

funcional das cidades locais são características comuns presentes na maioria

dessas regiões. A respeito da especialização produtiva das regiões no meio técnico

científico informacional

Santos (1996) divide o meio geográfico em três períodos: meio natural, meio

técnico e meio técnico científico informacional. Esse terceiro período é caracterizado

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basicamente por uma produção do espaço amparada em objetos técnicos com alto

grau de ciência agregado e orientada pela lógica do mercado global. Devido ao alto

grau de intencionalidade na localização e criação desses objetos técnicos, esses

objetos também podem ser considerados informacionais.)

Castillo e Frederico (2010) afirmam:

Dentre as manifestações geográficas emergentes nesse contexto, destacam-se: 1) o aprofundamento da especialização regional produtiva e 2) a grande carga de racionalidade que preside o movimento de mercadorias. Essas forças fazem parte, na verdade, de um mesmo processo e atuam sobre (e contra) a lógica, considerada “irracional”, dos territórios. Desse embate entre uma lógica das redes e uma lógica dos territórios, resultam ilhas de eficiência produtiva, obedientes a parâmetros internacionais de qualidade e custos, e também corredores de fluidez material, em meio à viscosidade de vastas áreas, nas quais a mobilidade é precária ou mesmo inexistente (CASTILHO;FREDERICO, 2010, p. 20)

Além de que, há embate entre o comando técnico da produção relegado a

sociedade local em detrimento do comando político dessa produção, esse segundo

comando, podendo ser realizado em cidades distantes ou cidades denominadas

cidades globais. Assim como Santos (1996, pag. 184 e 185) explicita: “Este

comando se baseia na configuração técnica do território, em sua densidade técnica

e, também, de alguma forma, na sua densidade funcional a que podemos

igualmente chamar densidade informacional. Já o controle distante, localmente

realizado sobre a parcela política da produção, é feito por cidades mundiais e os

seus relês nos territórios diversos.”

3.1 - Redes, território e eficiência produtiva

As redes são fundamentais para viabilizar a fluidez informacional e material

de qualquer produção e o êxito produtivo de uma região dependerá em todas as

estâncias da efetividade da rede formada no território. Nesse sentido, Santos (1996)

atenta para a importância do papel das redes no meio técnico-científico-

informacional:

Como se produzem, cada vez mais, valores de troca, a especialização não tarda a ser seguida pela necessidade de mais circulação. O papel desta, na transformação da produção e do espaço, torna-se fundamental. Uma de suas conseqüências é, exatamente, o aprofundamento das especializações produtivas, tendentes a convocar, outra vez, mais circulação. Esse círculo vicioso - ou virtuoso? - depende da fluidez das redes e da flexibilidade dos regulamentos. (SANTOS, 1996, p.241).

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Na tentativa de inserir-se de modo mais competitivo na economia global

algumas regiões procuram ressaltar suas vantagens comparativas, diante as

possibilidades materiais e imateriais dos lugares, além valor histórico herdado em

alguns casos. Segundo Santos (1996, p.269) “cada lugar busca realçar suas virtudes

por meio de seus símbolos herdados ou recentemente elaborados, de modo a

utilizar a imagem do lugar como imã”. Desse modo Moreira (2007,p.61) afirma que:

Daí a valorização contemporânea do território. Lugares ou segmentos de classes inteiros podem ser incluídos, ou, ao contrário, excluídos, dos arranjos espaciais, a depender de como os interesses se aliem e organizem o acesso do lugar às informações da rede. E, deste modo, um caráter novo aparece na luta política, e em decorrência do que é o novo caráter do espaço, exigindo que se reinvente as formas de ação. (MOREIRA, 2007 p.61)

Com as mudanças ocorridas no paradigma produtivo a partir da década de

1970 (HARVEY, 1992; BENKO, 2002), fluxos se tornam mais importantes para a

explicação de uma determinada situação, o padrão geográfico é definido pela

circulação (SANTOS; 1996). As redes nesse sentido assumem uma posição central

na produção e determinam a viabilidade e eficiência da produção. Para Santos

(1996) a rede não se dá de modo homogêneo no espaço nem no território, algumas

áreas escapam ao desenho reticular da rede, por isso deve-se levar em

consideração o aproveitamento social e as desigualdades de uso das redes, assim

como o papel dos agentes no processo de regulação e controle do funcionamento.

Para Raffestin (1993) o controle das redes supõe o controle dos homens e de

suas ações, o controle das redes estaria ligado ao exercício do poder, ou seja, quem

obter o controle da comunicação e dos fluxos imateriais terá o controle da circulação

e dos fluxos materiais. Para o mesmo autor (1981) as redes constituem um meio de

se produzir o território, nesse sentindo e referindo-se a mobilidade geográfica

Raffestin (1980, p.185) afirma: “a rede faz e desfaz as prisões do espaço tornando

território: tanto libera como aprisiona. É porque ela é ‘instrumento’, por excelência,

do poder”.

A respeito do poder das redes, Santos (1988) sugere que alguns agentes são

privilegiados pelo controle das redes, os lugares e os indivíduos usufruem de modo

diferente das redes, alguns atores hegemônicos servem-se de todas as redes e

utilizam do território de modo mais efetivo aos seus interesses. Para verificarmos as

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redes, Santos (1998) propõe dois tipos de enfoque: o genético e o atual. O genético

refere-se ao processo de formação de determinada rede, ou seja, a reconstituição

da história da rede, seus processos de formação. Já o enfoque atual seria o

funcionamento presente da rede, ou seja, como os elementos da rede se relacionam

na atualidade. Nesse sentido, Moreira (2007,p.57) afirma que:

A organização em rede vai mudando a forma e o conteúdo dos espaços. É evidente que a teoria precisa acompanhar a mudança da realidade, ao preço de não mais dela dar conta. Uma vez que muda de conteúdo – já que ele é produto da história, e a história, mudando, muda com ela tudo que produz –, o espaço geográfico muda igualmente de forma. A forma que nele tinha importância principal no passado, já não a tem do mesmo modo e grau na organização no presente. (MOREIRA, 2007 p.57)

3.2 - Sul de Minas e circuito espacial produtivo do café

O Sul de Minas é um caso exemplar da configuração de uma região

especializada em um tipo de produção. As políticas territoriais aplicadas pelos

agentes públicos e privados têm como objetivo central conferir fluidez ao circuito

espacial produtivo do café. Nesta perspectiva, foram criadas na região uma série de

competências infra-estruturais (Porto Seco do Sul de Minas, Redex de Poços de

Caldas e Guaxupé, armazéns específicos, sistemas de comunicação), institucionais

(presença de agentes da Receita Federal para o rápido desembaraço das

mercadorias, selo de indicação de procedência café, corretores, cooperativas,

empresas exportadoras), Instituições de pesquisa e ensino (ensino técnico e

superior), Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER, Embrapa, INPI) e

também operacional (transportadores e operadores logísticos especializados em

café).

Várias regiões espalhadas por todo o país se tornaram especializadas e

funcionais a essa produção como pode ser verificado no sul e leste de Minas Gerais,

leste de Rondônia, cerrado mineiro, sul da Bahia, norte do Paraná, noroeste do

Espírito Santo. Essas regiões se especializaram em um determinado tipo de

produção e ao mesmo tempo passaram a manter relações cada vez mais intensas

dentro de um circuito espacial produtivo (SANTOS & SILVEIRA, 2001) que extrapola

o próprio país.

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3.3 - Diferenciando: indicação de procedência x denominação de origem

Existem dois tipos de certificação para os produtos relacionados à origem dos

produtos, sendo importante ressaltar a diferença entre selos de indicação de

procedência e selos de denominação de origem. A indicação de procedência e

denominação de origem não são sinôminos, apresentam diferentes objetivos e

representam diferentes atividades. Como aspecto normativo, os selos no Brasil são

concedidos pelo INPI (Instituto Nacional de propriedade Industrial). Seguem as

definições apresentadas pelos INPI em relação a cada uma das modalidades:

A respeito da definição oficial dada pelo INPI (2009) sobre Indicação de

Procedência no Brasil, considera-se:

Indicação de Procedência – IP caracterizada por ser o nome geográfico conhecido pela produção, extração ou fabricação de determinado produto, ou pela prestação de dado serviço, de forma a possibilitar a agregação de valor quando indicada a sua origem, independente de outras características. Ela protegerá a relação entre o produto ou serviço e sua reputação, em razão de sua origem geográfica específica, condição esta que deverá ser, indispensavelmente, preexistente ao pedido de registro. Desta forma, os produtores ou prestadores, através de sua entidade representativo, deverão fazer prova desta reputação ao pleitear o reconhecimento junto ao INPI a Indicação de Procedência, juntado documentos hábeis para tanto (INPI, 2009).

A respeito da definição oficial da Denominação de origem no Brasil,

considera-se:

A Denominação de Origem – DO cuida do nome geográfico “que designe produto ou serviço cujas qualidades ou características se devam exclusiva ou essencialmente ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos”. Em suma, a origem geográfica deve afetar o resultado final do produto ou a prestação do serviço, de forma identificável e mensurável, o que será objeto de prova quando formulado um pedido de registro enquadrado nesta espécie ante ao INPI, através de estudos técnicos e científicos, constituindo-se em uma prova mais complexa do que a exigida para as Indicações de Procedência (INPI, 2009).

Para (ABRAMOVAY, 2006, apud CHADDAD, 1996) as indicações geográficas

estão entre as soluções que se apresentam para ampliar e estabilizar as margens,

principalmente, no caso da produção em pequena escala em regiões delimitadas. O

conceito de indicação geográfica permite associar a qualidade do produto à região

onde foi produzido, quando se consideram as indicações de procedência, e/ou às

tradições culturais, quando se levam em conta as denominações de origem. No caso

da diferenciação através da Denominação de Origem segundo Coutinho, (2003,

p.01) esse tipo de certificação implica na “estruturação de redes locais de produção,

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promovendo o desenvolvimento local sustentado. É um processo complexo:

havendo uma dimensão organizacional, pela mobilização das redes de produção, e

uma dimensão jurídica, amparada por acordos internacionais. No Brasil, existem leis

que protegem a Denominação de Origem, sendo o Ministério da Agricultura,

Pecuária e Abastecimento a instituição reguladora”. Nesse sentido, Souza (2006,

p.02) afirma que:

A valorização material e simbólica de parâmetros ambientais e sociais da produção e comércio é capaz de formar redes de cooperação que funcionam dentro de uma lógica distinta da estrutura vigente, e proporciona maiores ganhos a atores sociais que estavam em alguma desvantagem no mercado de commodities por não terem a qualidade e identidade de seus produtos devidamente recompensada e reconhecida.

No caso das produções certificados com selos indicação de procedência ou

denominação de origem ainda segundo Souza (2006, p.61) “o território e o saber,

assim como a forma de inserção no mercado, dão o conteúdo local, aquilo que

caracteriza a história, a tradição, a tipicidade, a originalidade, a raridade e outros

parâmetros de qualidade que diferenciam o produto especial da commodity”. Estes

produtos com essa certificação agregam valor ao produto, diferenciando-o dos

demais produtos commodity, sendo uma alternativa mais rentável e menos

suscetível as oscilações do mercado.

A autora (2006) ainda atenta para a diferença entre os selos de origem e/ou

procedência e os selos ambientais:

Assim como as marcas, as indicações geográficas também dependem da proteção de uma estrutura legal para limitar a utilização do sinal de qualidade e evitar o uso indevido e a diluição de significado. Porém, há uma diferença importante entre os selos de origem e os selos de qualidade ambiental e social com relação aos direitos de propriedade e estruturas de governança, que influenciam as formas de organização nos territórios e dependem das habilidades dos atores sociais para construí-las.

Nesse sentido de valorização do território e a construção de uma identidade territorial para realçar os valores da produção, Santos (2002) afirma:

O território não é apenas o conjunto dos sistemas naturais e de sistemas de coisas superpostas. O território tem que ser entendido como o território usado, não o território em si. O território usado é o chão mais a identidade. A identidade é o sentimento de pertencer àquilo que nos pertence. O território é o fundamento do trabalho, o lugar da residência, das trocas materiais e espirituais e do exercício da vida.

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4 – O SUL DE MINAS E PRODUÇÃO CAFEEIRA: Organização da região

competitiva

A produção de café se configura como a atividade econômica dominante no

Sul de Minas, configurando-se como a principal região produtora do território

brasileiro. O Brasil é o maior produtor e exportador de café, sua produção

corresponde em média a 30% da produção mundial, produzindo anualmente pouco

mais de 30 milhões sacas de 60 kg (safra 2007/2008). Desse montante, 80% dos

grãos são destinados à exportação, sendo o país responsável por 30% das

exportações mundiais. Existem 16 estados brasileiros produtores de café, dentre os

quais, os seis maiores (Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo, Bahia, Paraná e

Rondônia) respondem por 97% da produção total. Minas Gerais é o principal estado

produtor, correspondendo em média, nas últimas safras, a 50% da produção

nacional (ANUÁRIO ESTATÍSTICO DO CAFÉ, 2008).

O Sul de Minas é uma região tradicional na produção de café (TAUNAY,

1945), e atualmente, configura-se como a principal região produtora do estado. Na

safra 2006, foram produzidas pouco mais de 10 milhões sacas, correspondente a

metade da produção de Minas Gerais e 25% da produção nacional (IBGE). Se fosse

um país, a região se aproximaria da Colômbia e do Vietnã como o segundo maior

produtor mundial. Além do Sul de Minas, o estado de Minas Gerais possui também

outras duas importantes regiões produtoras, o Triângulo Mineiro e a Zona da Mata.

As três regiões mineiras juntas são responsáveis por 50% da produção de café da

variedade Arábica no território brasileiro.

4.1 - Selos Indicação de procedência e apropriação do território

A atribuição dos selos indicações de procedência representa um processo de

certificação no qual a informação sobre assim como os aspectos naturais e ou

sociais de uma porção do território, são evidenciados em um esforço para valorizar

determinado produto.

A primeira IP concedida no Brasil foi a do café do Cerrado Mineiro –

Requerida pelo CACCER – e obtida em 28 de janeiro de 1999. O CACCER

Conselho das associações de cafeicultores do cerrado foi fundada em 1992 e

nasceu com intuito de valorizar os cafés produzidos no Cerrado mineiro, dando todo

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aparato informacional e técnico sobre a produção de cafés especiais e o

agronegócio.

Quadro 1. Indicações de procedência e denominação de origem no Brasil:

TIPO DE

CERTIFICAÇÃO

REGIÃO TIPO DE

PRODUTO

IP Cerrado Mineiro café

IP Vale dos Vinhedos vinho

IP Pampa gaúcho da

campanha meridional

carne

IP Paraty cachaça

IP Vale do submédio do

São Francisco

manga e uva

IP Vale dos Sinos couro

IP Região da Serra da

Mantiqueira Minas

Gerais

café

IP Pinto Bandeira vinho

IP Pelotas doce

IP Região do Jalapão do

Estado do Tocantins

artesanato do

capim dourado

IP Goiabeiras panela de barro

IP Serro queijo

DO Litoral Norte Gaúcho arroz

DO Costa Negra camarão

Fonte: http://www.inpi.gov.br/

A indicação de procedência para a região da Serra da Mantiqueira foi

concedida pelo INPI em 10 de maio de 2011 e faz parte de um processo que visa a

obtenção da denominação de origem, processo esse mais complexo e de maior

dificuldade na certificação.

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Imagem representativa do pedido de IG200704 - Região da Serra da Mantiqueira de Minas Gerais

Fonte: INPI 2011

4.2 - Programas governamentais e incentivo a produção de cafés de qualidade

O principal programa público identificado que incentiva a produção de cafés

de qualidade em Minas Gerais é o programa Certifica Minas:

O Certifica Minas é um Programa Estruturador do Governo de Minas. Executado pelo Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) e pela EMATER-MG - ambos vinculados à Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SEAPA) -, o programa garante a participação da produção agropecuária mineira nos mercados nacional e internacional. Uma das ações do Certifica Minas é o programa de Certificação de Propriedades Cafeeiras, que tem por objetivo atestar a conformidade das propriedades produtoras com as exigências do comércio mundial, possibilitando ao café mineiro consolidar e conquistar novos mercados. As orientações para adequações das propriedades são feitas pela EMATER-MG, enquanto as auditorias preliminares para checar as adequações de acordo com os padrões internacionais são realizadas pelo IMA. Concluindo o processo, uma certificadora de reconhecimento internacional faz uma auditoria final e concede a certificação às propriedades aprovadas (ABIC, 2009).

Dos municípios que constituem a área abrangida pelo projeto de delimitação

do café de indicação de procedência da face sulmineira da serra Mantiqueira, três

deles possuem propriedades cafeeiras certificadas pelo programa Certifica Minas,

são eles: Campanha, Carmo de Minas e Lambari, ao todo são 17 propriedades

cafeeiras certificadas (ABIC, 2009).

Um acordo com o SEBRAE é outro fator a ser considerado, a parceria entre a

associação e a referida instituição tem por objetivo fortalecer o marketing dos cafés

com indicação de procedência. Assim como a BSCA – Associação Brasileira de

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cafés especiais - e Illy café (torrefadora italiana) que incentivam a produção de cafés

especiais promovendo concursos que atestam a qualidade do café e premiando os

produtores melhores classificados.

Esforços no sentido de integrar objetivos de iniciativas privadas com

iniciativas do poder público consta em estudo que aborda a qualidade como

estratégia de diferenciação do mercado de cafés especiais:

O governo deu grande apoio para a promoção dos cafés a partir de experiências de sucesso, como por exemplo, o convênio firmado entre a BSCA e o Ministério da Agricultura e a APEX, em que o mesmo governo está delegando a BSCA a oportunidade e recursos para desenvolver um projeto de promoção de cafés do Brasil, no estrangeiro. Nesse sentido, há outros projetos: a) trazer torradores estrangeiros ao Brasil para conhecerem o complexo cafeeiro brasileiro inclusive, o gourmet; b)apoio aos compradores estrangeiros de cafés especiais, além do gourmet, para realizarem o marketing, apoiando o desenvolvimento do design de embalagens e de todo material promocional do café. (MAMONTOW, 2003; p.125 e 126).

4.3 - Caracterização da microrregião e da APROCAM

Figura 1 – Mapa dos municípios que compõe da microrregião delimitada pelo INPI para Indicação de procedência.

Organização: Cesar B. Favarão. Fonte: www.aprocam.com.br

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Mão de Obra

• Fixa: 13.500 empregos

• Temporária: 15.000 empregos

• Além de inúmeros empregos indiretos (APROCAM,2005).

Clima

• Temperatura média anual: 19º C – Ideal para café arábica

• Precipitação anual média entre 1.500 e 2.000 mm, com boa distribuição e com

baixa precipitação no período de colheita (maio a outubro).

• Lavouras de café localizadas em altitude que variam de 950m a 1400 metros

(APROCAM,2005).

Cultivares Plantados

• Bourbon: Amarelo e Vermelho

• Mundo Novo: Acaiá e outros

• Catuaí – Amarelo 47 e outros

• Catucaí Amarelo

• Icatu amarelo (APROCAM,2005).

Associado às melhorias dos sistemas técnicos de produção foi constatado

também, que a região era produtora de cafés diferenciados e de excelente

qualidade, devido às características edafoclimáticas, como: altitudes que variam de

900 e 1.400 m, temperatura média anual entre 18° e 22°, propícia para o cultivo da

variedade Arábica, precipitação anual média entre 1.500 e 2.000 mm, com baixa

precipitação no período de colheita, entre julho e setembro. As características

fisiográficas, somadas ao uso de técnicas agronômicas modernas, possibilitam uma

produtividade média superior a 30 sacas por hectare, praticamente o dobro da média

nacional de 16 sacas/ha. A microrregião congrega 22 municípios, somando um total

de 291.516 mil habitantes. A aprocam conta com oito mil produtores sendo 82%

desses produtores agricultores familiares (EMATER, 2009). A produção anual dos

associados gira em torno de 1.025.000 sacas (EMATER, 2009) e tem uma área de

50 mil hectares plantados. A cultura do café na microrregião gera 150 mil empregos

diretos e indiretos. Os grãos produzidos são vendidos principalmente no mercado

externo, como Japão, Estados Unidos e Europa (SEBRAE, 2011).

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4.4 - Atividades da APROCAM e padronização da produção

O início da produção cafeeira na micro-região da Serra da Mantiqueira se

deu por volta 1848 e 1858. A partir do ano de 1996 o potencial da região para

produção de cafés diferenciados foi estimulado pela melhoria do parque cafeeiro da

região, infra estruturas e técnicas referentes ao processo de produção do café foram

sendo melhoradas como: “colheita altamente seletiva usando as características de

maturação dos cultivares precoces, médios e tardios, uso de lavadores, separadores

e descascamento do café cereja” (APROCAM,2005).

Segundo consultor da APROCAM o primeiro passo para a estruturação do

projeto que visava à obtenção da denominação de origem consistiu na realização de

um amplo diagnóstico da produção conjugado com a aplicação de matriz de

qualidade para verificação das condições geográficas e respostas na xícara

(bebida). A etapa seguinte consistiu em estabelecer modificações no processo

produtivo, principalmente no sistema de secagem, para diminuir o impacto negativo

do clima úmido predominante durante a colheita e, assim, evidenciar as

características sensoriais do café na xícara. Ao mesmo tempo, foram estabelecidos

parâmetros, métricas e tudo o que é denominado de Infra-estrutura de Marketing,

norteando todas as ações visando modelos de captura de valor, tangíveis e

intangíveis, até 2005. O objetivo maior era a obtenção da Denominação de Origem,

diferentemente do que o Café do Cerrado, outro projeto de assinatura do consultor.

Os tipos de bebidas desenvolvidas a partir da combinação de sistemas de secagem,

variedades e localização rapidamente ganharam projeção no exterior, onde,

estrategicamente, foram considerados como de execução e ganho de valores mais

rápidos.

De modo geral o programa proposto e aprovado em reunião com a

APROCAM consistiu em:

1) Criar identidade visual da entidade, da região e dos cafés emblemáticos;

2) Identificar, estabelecer parâmetros e critérios para a seleção dos cafés

emblemáticos;

3) Estabelecer parâmetros e criar peças de comunicação junto ao mercado

comprador;

4) Estruturar operações comerciais diferenciadas através de modelo Direct Trade,

basicamente para Ámerica do Norte e Japão;

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5) Estabelecer forte vínculo com a mídia através da criação de notícias com apelo

institucional e de caráter inovador quanto à abordagem dos aspectos de produção

de café na região;

4.5 - Análise dos fluxos do circuito espacial produtivo do café produzido pelos

Associados da APROCAM

A rede construída no processo produtivo pela APROCAM envolve diversos atores e

agentes na organização espacial (Figura 2) demonstrando as relações de fluxos

materiais (produto café) e imateriais (informações) dentro do circuito espacial

produtivo relacionado ao café das fazendas associadas:

Figura 2 – Organograma representativo da rede de produção do café pela APROCAM. Organização: Cesar B. Favarão

Fonte e Adaptação: – www.aprocam.com.br. e www.cocarive.com.br

De forma sucinta a APROCAM define-se como uma “(...) instituição que

representa e lidera cafeicultores da micro-região localizada na Face Minas Gerais da

Serra da Mantiqueira, dentro do entorno denominado Circuito das Águas.”

(APROCAM, 2005). Localizada no município de Carmo de Minas – MG, a

Associação tem por objetivo maior fornecer informações aos produtores associados

e promover a cultura do café de qualidade e a sustentabilidade na produção.

Reuniões, cursos e palestras são organizados junto a empresas e entidades

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públicas que compartilham informações acerca do processo produtivo, das formas

de comercialização e certificação dos cafés da micro-região (APROCAM, 2005).

Constata-se que a atividade da APROCAM está relacionada ao fluxo informacional

que norteia as ações dos produtores no sentido de obtenção de um produto

diferenciado com vantagens comerciais.

O café produzido pelos associados à APROCAM, em grande parte, é

armazenado na COCARIVE, essa cooperativa localiza-se no município de Carmo de

Minas, lá são efetuados as atividades de rebeneficiamento e preparo dos cafés – da

pré-limpeza à catação e seleção eletrônica dos grãos de café (COCARIVE, 2007).

“Contando atualmente com 587 cooperados, a COCARIVE recebe em seus

armazéns uma produção média anual de 120.000 sacas de café arábica, dentre

naturais e cerejas descascados, que lhe são confiadas para preparo e

comercialização.” (COCARIVE,2007). Por outro lado, algumas fazendas possuem

seus próprios armazéns e escoam a produção diretamente ao Porto de Varginha, ou

encaminham para alguma empresa de torrefação em território nacional.

As empresas de torrefação identificadas nas relações com os produtores

associados à APROCAM foram a UNIQUE e a Carmocooffe ambas sediadas em

Carmo de Minas-MG. Essas duas empresas distribuem para o mercado interno e

externo, sendo que a UNIQUE distribui para sete estados brasileiros - Distrito

Federal, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e

São Paulo (UNIQUE, 2009). Observa-se no esquema a atuação da empresa

certificadora UTZ KAPEH, que concede certificação através do programa Utz

Certifiedi a algumas fazendas produtoras associadas. Assim como atua junto à

própria APROCAM levando informações relacionadas à execução da produção de

forma sustentável (APROCAM, 2002).

O escoamento da produção destinada ao mercado externo, passa

basicamente pelo Porto de Varginha e logo depois é escoado para o Porto de

Santos para ser enviado ao mercado exterior. O Porto de seco de Varginha está

localizado no município de Varginha porção sul de Minas Gerais e está a uma

distância de 118 km de Carmo de Minas-MG, município sede da APROCAM. Esses

dois municípios estão ligados pela rodovia federal Fernão Dias. No Porto seco de

Varginha é efetuado a “reembalagem, etiquetagem, remarcação e unitização” (Porto

Seco do Sul de Minas, 2009) do café. Após isso a carga contendo o café já estará

pronta pra ser escoada para o mercado exterior passando pelo Porto de Santos.

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A Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA) atua em conjunto com a

Specialty Coffee Association of America (SCAA) - associação norte-americana - e

tem por objetivo congregar e promover os cafés de qualidade produzidos no Brasil

no mercado exterior, além de “estimular o constante aprimoramento técnico e a

maior eficiência nos serviços referentes à comercialização destes cafés”

(BSCA,2009). O fluxo informacional é o que se sobressai nas atividades promovidas

pela BSCA, no sentido de integrar informações importantes referentes aos

processos de produção nas fazendas e promover essas informações em um

trabalho de marketing para o mercado exterior. Em Carmo de Minas sete fazendas

produtoras associadas à APROCAM estão também associadas à BSCA

(BSCA,2009).

A torrefadora italiana illycafé tem por maior objetivo congregar diferentes

tipos de cafés de qualidade para obter linhas exclusivas de cafés (Illycafé,2008). “A

mistura illy destina-se aos canais Ho.Re.Ca. (hotel, restaurante, café), ao consumo

em casa e no trabalho. Atualmente é comercializada em 140 Países, por todos os 5

continentes, e é servida em mais de 50.000 locais públicos” (Illycafé, 2008). Fazem

parte do foco da empresa illycafé as fazendas produtoras associadas à APROCAM –

“Na 15º edição do Prêmio Brasil de Qualidade do Café para Espresso, oferecido

anualmente desde 1991 pela torrefadora italiana Illycafé , teve como vencedor Pedro

Paulo Dias Chaib de Sousa, Fazenda Pico Agudo, Município de Carmo de Minas”

(APROCAM, 2002).

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5 - CONCLUSÕES

É importante ressaltar que a reunião de diversos fatores produtivos na região

do sul de Minas Gerais e que foram e estão sendo implantados ao longo do tempo é

um fator importante para a efetivação do agronegócio do café e a inserção dessa

região de modo mais competitivo no cenário econômico mundial, já que esses

elementos infra-estruturais e institucionais permitem uma maior fluidez na circulação

e comercialização do café, ou seja, para esta rede de fluxos materiais se tornarem

mais dinâmica são necessários investimentos por parte setor público e privado.

Devido à região ser tradicional no cultivo da cultura do café, iniciativas mais

organizadas como a da APROCAM, e de outras cooperativas e associações

existentes na região, aparecem com destaque. A indicação de procedência atribuída

aos cafés produzidos na face sulmineira da serra da Mantiqueira é um tentativa de

explorar um mercado mais exigente em qualidade e que paga mais pelo valor

agregado ao produto e que valorizam aspectos sustentáveis da produção. Por outro

lado, esse mercado consumidor ainda é restringido no Brasil, em vista do potencial

apresentado pelo mercado consumidor estrangeiro.

Por fim, a importância das iniciativas públicas que valorizam e viabilizam o

café especiais certificados se mostram importantes para a efetivação desse tipo de

produção - ainda que o cenário pós-desregulamentação aponte um enfraquecimento

da ação estatal na produção cafeeira - além de que observa-se uma forte influência

de empresas estrangeiras como impulsoras desse tipo de produção, empresas como

a BSCA (sede no Brasil e nos EUA) e Illycafé (italiana) trabalham mediando

informações entre produtores e consumidores promovendo o café especial, e

incentivando os produtores através de concursos que atestam a qualidade do café.

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