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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
CÂMPUS UNIVERSITÁRIO DO ARAGUAIA
INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
CURSO DE AGRONOMIA
BEM-ESTAR ANIMAL: INFLUÊNCIA NA PRODUÇÃO DE BOVINOS
DE CORTE
Fabyane Alves Melo
Barra do Garças-MT
Outubro-2018
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
CÂMPUS UNIVERSITÁRIO DO ARAGUAIA
INSTITUTO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
CURSO DE AGRONOMIA
BEM-ESTAR ANIMAL: INFLUÊNCIA NA PRODUÇÃO DE BOVINOS
DE CORTE
ACADÊMICO: Fabyane Alves Melo
ORIENTADORA: Profa. Dra. Patrícia Gelli Feres de Marchi
Trabalho de Curso (TC) apresentado ao
Curso de Agronomia do ICET/UFMT, como
parte das exigências para a obtenção do
Grau de Bacharel em Agronomia.
Barra do Garças-MT
Outubro-2018
OFEREÇO
À minha família,
Por todo apoio e dedicação dedicado à mim.
Dedico
À minha mãe Jaine Maria Alves, ao meu irmão Felype Augusto Alves Melo e aos
meus avós maternos.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradeço a Deus, por estar presente em todos os momentos
da minha vida, gerando forças para seguir sempre em frente.
À minha família que fez de tudo para que eu pudesse realizar os meus
estudos, sempre depositando confiança em mim e apoiando em minhas escolhas. Em
especial à minha mãe que sempre esteve ao meu lado, não me deixando desanimar
perante s momentos difíceis, me dando força, carinho, respeito, educação e apoio.
Minha imensa gratidão a professora Dra. Patrícia Gelli Feres de Marchi por ter
me concedido o privilégio de ser sua orientanda e aprendiz, pelo conhecimento que
me proporcionou durante a graduação, pelas orientações prestadas, por ter
depositado confiança em mim, por sua dedicação, paciência e pela amizade.
À todos que me ajudaram de alguma forma, em especial a Lucas Morais,
Vinicius Moraes, Gustavo Lopes, Ana Carolina Valadão, Josiane Gonçalves, Isabella
Assef, Fabrício Ferreira, João Augusto, Mateus Oliveira e outros amigos.
SUMÁRIO
Página
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 9
2. REFERENCIAL TEÓRICO ................................................................................. 11
2.1 BOVINOCULTURA ............................................................................................ 11
2.2 BEM-ESTAR ANIMAL ........................................................................................ 12
2.3 ESTRESSE E QUALIDADE DA CARNE ............................................................ 15
3. MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................. 17
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................... 18
5. CONCLUSÕES .................................................................................................. 29
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 30
LISTA DE FIGURAS
Página
Figura 1. Prevalência das raças encontradas nas propriedades. ............................. 18
Figura 2. Caracterização da infraestrutura das instalações. ..................................... 19
Figura 3. Curral representando propriedades com condições satisfatórias (A) e
condições medianas (B) para tal item avaliado. ........................................................ 20
Figura 4. Cochos representando propriedades com condições satisfatórias (A) e
condições medianas (B) para tal item avaliado. ........................................................ 21
Figura 5. Fornecimento adequado de alimentos e água. ......................................... 22
Figura 6. Presença de sombreamento adequado. .................................................... 22
Figura 7. Existência de vocalizações. ....................................................................... 23
Figura 8. Presença de lesões e dores. ..................................................................... 24
Figura 9. Sentimento de medo expressado pelos animais. ...................................... 25
Figura 10. Existência de mistura de lotes. ................................................................ 26
Figura 11. Quantidade de funcionários nas propriedades. ....................................... 26
Figura 12. Equipe tecnicamente treinada. ................................................................ 27
RESUMO
A bovinocultura representa a atividade agropecuária mais lucrativa do Brasil,
caracterizada por grande e constante crescimento e desenvolvimento, o que torna o
país um dos principais protagonistas mundias na produção e comércio de carne
bovina mundial. No Brasil, a preocupação com o bem-estar extrapola os cuidados com
os animais, busca-se, além do aumento da produção como consequência de melhores
condições de conforto dos animais, o fornecimento de alimento com melhor qualidade
para a população brasileira. Portanto, as preocupações com a forma como as
espécies de produção são mantidas e a preservação dos animais utilizados na
produção alimentícia é de suma importância. Diante disso, objetivou-se com esse
trabalho foi quantificar e qualificar a importância do bem-estar animal na pecuária de
corte, dentro da estrutura produtiva de pequenas e grandes fazendas, através da
observação direta de alguns aspectos relevantes que asseguram o bem-estar animal.
Foram visitadas dez propriedades no estado de Goiás-GO, nas quais os animais
foram avaliados durante o manejo habitual. Avaliou-se características relacionadas às
instalações, fornecimento adequado de alimentos e água, sombreamento,
vocalizações, lesões e dores, bem como equipe de trabalho e treinamento técnico. As
propriedades apresentaram instalações satisfatórias, fornecimento de alimento e água
adequados e dispunham de sombreamento pertinente, assegurando a qualidade de
vida dos animais. Verificou-se a presença de lesões e dores em todas as
propriedades, bem como as vocalizações. O sentimento de medo foi observado
apenas em algumas propriedades. Quanto à equipe técnica, constatou-se que todos
funcionários haviam concluído algum tipo de treinamento técnico.
Palavras-chave: Gado de corte; Instalações; Qualidade de vida animal; Estresse
animal.
ABSTRACT
The cattle represents the most profitable agricultural activity in Brazil, characterized by
a great and constant growth and development, which makes the country one of the
main world in the production and commerce of beef. In Brazil, the concern for welfare
goes beyond animal care. In addition to increasing production as a consequence of
better animal comfort conditions, the search for better quality food for the Brazilian
population is sought. Therefore, the concern with the way the species of production
are maintained and the preservation of the animals used in the production of food is of
paramount importance. Therefore, the objective of this work was to quantify and qualify
the importance of animal welfare in beef cattle, within the productive structure of small
and large farms, through the direct observation of some relevant aspects that ensure
animal welfare. A total of ten farms were visited in the state,Barsil, in which the animals
were evaluated during the usual management. Characteristics related to facilities,
adequate supply of food and water, shading, vocalizations, injuries and pains, as well
as work team and technical training were evaluated. The properties had satisfactory
facilities, provided adequate food and water and had a suitable shading, ensuring the
quality life of the animals. It was verified the presence of lesions and pains in all the
properties, as well as the vocalizations. The feeling of fear was observed only in some
properties. As for the technical team, it was found that all employees had already
completed some type of technical training.
Keywords: Cattle; Installations; Quality of animal life; Animal stress
9
1. INTRODUÇÃO
O Brasil é considerado um dos principais protagonistas mundiais na produção
e comércio de carne bovina, resultado proveniente de sistema estruturado e bem
desenvolvido que alavancou o aumento da produtividade e da qualidade do produto
brasileiro. Em 2015, com cerca de 209 milhões de cabeças bovinas, o Brasil foi
considerado o país detentor do maior rebanho comercial mundial. Além disso, ocupou
o segundo lugar no ranking de consumo (38,6 kg/habitante/ano) e de exportação (1,9
milhões toneladas equivalente carcaça) de carne bovina mundial (EMBRAPA, 2017).
De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e
Agricultura (FAO, 2011), nos últimos 500 anos o rebanho mundial de bovinos dobrou,
e estima-se que nos últimos 25 anos a produção global aumentou 91%, atingindo 9
milhões de toneladas em 2010. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE
(2017) revela que no final do ano de 2017 foram abatidas 7,98 milhões de cabeças de
bovinos sob algum tipo de serviço de inspeção sanitária no país, sendo essa
quantidade 7,6% superior à registrada nos trimestres anteriores e 9,0% maior que a
registrada no mesmo período em 2016.
Alguns aspectos relacionados ao manejo bovino apresentaram alterações
significativas nos últimos 50 anos, com isso, houve um aprimoramento do
conhecimento e associação do comportamento, fisiologia e bem-estar dos animais. A
melhoria do bem-estar animal promove o aperfeiçoamento da produção, porém,
apesar da reconhecida importância de se respeitar os animais, pouco se sabe como
identificar ou aferir as condições em que os animais estão sendo criados. No Brasil, a
preocupação com o bem-estar extrapola os cuidados com os animais, busca-se, além
do aumento da produção como consequência de melhores condições de conforto dos
animais, o fornecimento de alimento com melhor qualidade para a camada cada vez
mais expressiva da população brasileira (BROOM; FRASIER, 2010).
Nos últimos anos, a bovinocultura de corte vem apresentando
desenvolvimento rápido, porém grande parte das pesquisas são direcionadas quase
que estritamente às áreas de nutrição, melhoramento genético e reprodução. Essas
abordagens contribuem muito para o mercado da carne, porém acaba comparando o
animal com uma “máquina”, onde se torna dependente apenas da sua nutrição para
responder aos anseios da produção. Esse fato mostra a despreocupação com a
biologia do animal, o que tem impedindo a compreensão de certas respostas
10
encontradas nos trabalhos de pesquisa direcionados ao aumento de produção e/ou
relacionados a melhoria da qualidade da carne (PARANHOS et al., 2002).
A criação dos animais deve ser realizada da forma mais próxima possível de
suas características naturais, onde seja proporcionado equilíbrio e harmonia em seu
habitat natural, pois os animais possuem sentimentos, emoções e preferências. O
ambiente de acondicionamento dos animais deve disponibilizar de amplos espaços
para facilitar a sua movimentação, abrigo que proporcione conforto térmico, água e
alimentação de qualidade que satisfaçam suas necessidades fisiológicas. Vale
salientar que para obter-se um produto final de melhor qualidade, o bem-estar animal
deve ser levado em consideração (KOKNAROGLU; AKUNAL, 2013).
A preocupação com o bem-estar, ou seja, com a forma como as espécies de
produção são mantidas e a preservação dos animais utilizados na produção
alimentícia torna-se imprescindível, portanto existe a necessidade de
desenvolvimento de pesquisas que investiguem e analisem os aspectos críticos
relacionados à produção bovina, pois estes influenciam diretamente no desempenho
dos sistemas produtivos pecuários e na obtenção de um produto final de maior
qualidade (SILVA; BORGES, 2015).
Diante do exposto acima, objetivou-se com esse trabalho realização de
estudos que venham quantificar e qualificar a importância do bem-estar animal na
pecuária de corte, dentro da estrutura produtiva das fazendas.
11
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 BOVINOCULTURA
Desde a descoberta do Brasil, o desenvolvimento da economia brasileira foi
estruturada através da economia rural. As expedições que trouxeram os primeiros
colonizadores até a região tinham como objetivo explorar as riquezas naturais do país,
porém acabaram encontrando uma oportunidade de também produzir. Devido as
características climáticas e topográficas da região, os colonizadores resolveram trazer
de seus países de origem, plantas e animais para se desenvolverem nesse território,
uma vez que este apresentava atributos favoráveis (SANTOS, 2017).
Dentre os fatores importantes que serviram para impulsionar a criação de
gado no Brasil, destaca-se a ocorrência de Segunda Guerra Mundial. Foi neste
período de guerra que ouve o aumento da procura de carne bovina produzida em
países de terceiro mundo, como o Brasil, e isso despertou o interesse de entrada de
grandes frigoríficos estrangeiros no país, principalmente na região Centro-oeste que
apresentava o maior rebanho do Brasil, chegando representar 35% do efetivo nacional
de bovinos (SILVA; BOAVENTURA, FIORAVANTI, 2012).
Atividades relacionadas à criação de gado de corte alcançaram destaque no
contexto social por representarem a principal tarefa que fornece proteína de origem
animal para a população e por representar fonte de matéria-prima para a indústria.
Supondo que o abate bovino fosse cessado, aproximadamente 49 segmentos
industriais entrariam em crise pois dependem diretamente dos subprodutos bovinos
(RESENDE FILHO; BRAGA; RODRIGUES, 2001).
As características climáticas e topográficas da maior parte do Brasil são
favoráveis para as atividades relacionadas à bovinocultura. Existe uma grande
diversidade do rebanho brasileiro em relação a cada estado, e isto pode ser
relacionado à fatores como o tipo de prática de manejo seguida. Em estados mais
desenvolvidos destacam-se as práticas agrícolas que envolvem menor espaço de
terra por cabeça de gado, como por exemplo o confinamento e semi-confinamento. Já
em estados que apresentam menor desenvolvimento, são observadas técnicas de
pastejo utilizando grandes áreas, explicando o porquê da variação da quantidade de
cabeças bovinas por estado (SANTOS, 2017).
12
De acordo com ABIEC (2017), o estado de maior destaque nacional foi Mato
Grosso, com rebanho estimado em 30.258.870 cabeças, seguido de Minas Gerais
(24.368.597 cabeças) e Goiás (22.754.548 cabeças), colocando o Centro-Oeste como
a região com a maior concentração do efetivo nacional.
A produção animal brasileira apresentou grande evolução nos últimos anos,
porém faz-se necessário ainda, ampliar a busca pela interação dos diferentes
segmentos da cadeia produtiva, objetivando melhorar os ajustes entre as esferas
produtiva, industrial e consumidora. Os sistemas de produção animal podem
apresentar maiores benefícios quando há o melhoramento dos objetivos específicos
e das condições de bem-estar e qualidade de carne, uma vez que estes não são
analisados isoladamente, por isso necessita-se a realização de pesquisas
multidisciplinares. Consequentemente torna-se imprescindível entender sobre o bem-
estar animal, aumentar o conhecimento sobre a tipologia bovina, aprimorando a
interação entre o homem e o animal, diminuindo as consequências interferentes na
qualidade da carne em relação ao pH, coloração, aspecto, suculência, maciez, vida
de prateleira, entre outros (PARANHOS DA COSTA, 2000).
2.2 BEM-ESTAR ANIMAL
A terminologia “Bem-estar animal” possui significado característico que pode
sofrer influência perante as diversas visões e culturas da população que compõem a
sociedade. Devido à isso, há um enorme debate na comunidade científica a respeito
da designação do conceito de bem-estar animal e, principalmente, de sua aplicação
aos contextos científico e produtivo. Podemos encontrar duas frentes principais que
avaliam o bem-estar de animais criados em cativeiro de forma diferente, uma leva em
consideração as características biológicas dos animais em determinada situação, a
outra estuda as experiências individuais (MENDL, 2001).
Há décadas, tal terminologia vem sendo descrita por diversos autores que
utilizam diferentes definições para interpretá-la. Para Broom (1986) o bem-estar
animal indica o estado do animal frente às suas tentativas de adaptação ao ambiente
onde está acondicionado.
Hurnik (1992) cita que o bem-estar animal refere-se ao estado de harmonia
entre o animal e o local onde vive, definido por características físicas e fisiológicas
ótimas e alta qualidade de vida do animal. Para o autor, os animais indicam sinais
13
claros de sofrimento como dor, angústia, medo, frustração e raiva. Sendo o estado
físico indicador a saúde mental do mesmo. É difícil denotar o nível de satisfação que
o animal apresenta sobre o lugar onde está acondicionado, por isso alterações de
comportamento podem indicar insatisfação com seu meio. O animal pode sofrer
mentalmente mesmo estando com ótimas condições físicas e estar saudável.Já que
determinar o grau de satisfação do animal quanto ao ambiente é de difícil mensuração
tendo como alternativa observar o comportamento do animal situações como seleção
de animais pela sua genética e pressão objetivando alta produtividade, podem gerar
grande sofrimento aos animais.
Outro conceito relacionado ao bem-estar animal foi mencionado por Fraser et
al. (1997). Neste caso, são reunidas as três principais ideias éticas que são analisadas
pelas pessoas da sociedade em relação à qualidade de vida dos animais, de acordo
com os autores. Primeiramente os animais deveriam sentir-se bem, ou seja, estar
livres do sentimento de medo e dor e poder ter a liberdade de desfrutar de situações
prazerosas. Ainda, os animais deveriam ter suas necessidades de saúde,
crescimento, e comportamento satisfeitas e por fim, os animais deveriam viver de
acordo com a sua maneira natural de adaptação.
Na década de 60, na União Europeia, através de iniciativas como o livro
Animal Machines, iniciou-se o debate sobre os sistemas de produção animal e a
exigência da criação de animais de forma humanitária e digna. Tal livro denunciou os
maus tratos a que os animais eram submetidos no confinamento na região da Grã-
Bretanha. A publicação conseguiu impactar e mobilizar a sociedade britânica que
acabou criando o Comitê Brambell com intuito de investigar à fundo as denúncias
descritas no livro. No ano de 1965, foi apresentado um relatório citando as cinco
liberdades mínimas que o animal deveria possuir: virar-se; cuidar-se corporalmente;
levantar-se; deitar-se e realizar o estiramento de seus membros (FARIAS, 2012).
De acordo com Farias (2012) e Leal (2007), devido à grande repercussão que
este livro gerou, em 1979 foi criado o Conselho de Bem-estar dos Animas de
Produção, que ficou conhecido pela propagação das chamadas ‘’ Cinco Liberdades ‘’,
as quais os animais devem ter:
Livres de fome, sede e desnutrição: os animais devem ter acesso a água limpa
e alimentação de boa qualidade para a assistência de sua condição física.
Livres de desconforto: os animais devem ser acondicionados à ambientes que
sejam apropriados e confortáveis;
14
Livres de dor, injúria e doenças: os animais devem possuir disponibilidade de
prevenção, de diagnóstico e de tratamento;
Livres para expressarem comportamento natural: os animais dever ter para
socialização interespecífica ou intraespecífica.
Livres de medo e estresse negativo: devem ser minimizadas situações de
estresse e condições devem ser disponibilizadas para tratamento de saúde
mental dos animais.
A preocupação com o bem-estar dos animais advém desde a sua
domesticação e produção, pois possuem papel fundamental para a sobrevivência
humana. Em 1934 o Brasil estabeleceu as primeiras medidas relacionadas ao respeito
a produção animal, através do Decreto n° 24.645. Em 29 de Março de 1952, o
Ministério da Agricultura baixou o Decreto n° 30.691 que estabeleceu a
Regulamentação de Inspeção Industrial e Sanitária de Produção de Origem Animal.
Desde então, o bem-estar animal começou a receber grande atenção em pesquisas
acadêmicas, técnicas e científicas. Juntamente com questões relacionadas ao meio
ambiente e a segurança alimentar, o bem-estar animal é relatado como um dos três
maiores desafios da agricultura (ROLLIN, 1995).
O Código Sanitário de Animais Terrestres - OIE (2014), afirma que alterações
em diversas variáveis podem ser utilizadas para diagnosticar e indicar que algo não
está ocorrendo bem em relação ao estado de bem-estar do gado. Tais alterações
podem ser relacionadas à: comportamento; taxa morbidade; taxa mortalidade; peso e
situação corporal; eficácia na reprodução; aparência física; respostas ao manejo e
complicações após procedimentos de rotina de manejo.
Webstar (2005) menciona outro fator que pode diminuir o grau de bem-estar
animal, trata-se do confinamento. A má qualidade do bem-estar neste caso pode se
agravar se o projeto não é adequado, os animais precisam de instalações limpas e
confortáveis, com fácil acessibilidade, onde os mesmo possam deitar-se e levantar-se
sem dificuldade, além de manter o contato social com outros animais.
Estudos revelam que os bovinos são animais que gostam atividades rotineiras
e que possuem excelente memória, apresentando capacidade de identificar os
indivíduos envolvidas nas suas relações, demonstrando reações específicas diante
de cada uma delas em função do tipo de experiência vivida, apresentando
aprendizado associativo e relacionando o tipo de acondicionamento que lhe é
disponibilizado. Assim, a permanência de pessoas conhecidas pelos animais durante
15
o ordenhamento, por exemplo, auxilia na minimização de efeitos negativos no
comportamento e produção de vacas leiteiras (HÖTZEL; GOMES; MACHADO FILHO,
2009; PARANHOS DA COSTA, 2006).
Dentre os indicadores que avaliam a qualidade do bem-estar animal destaca-
se o estresse fisiológico. Este pode representar resposta à algum estímulo do
ambiente, na tentativa do animal manter o equilíbrio (HÖTZEL; MACHADO FILHO,
2004).
2.3 ESTRESSE E QUALIDADE DA CARNE
Segundo Ferreira (2008), o estresse pode ser definido como resposta
biológica ou conjunto de reações ocasionadas quando um indivíduo percebe uma
ameaça à sua homeostase, ou seja, quando existe ameaça ao seu equilíbrio. O
animal quando identifica a presença de uma ameaça, fica em alerta, podendo agir de
várias maneiras em resposta a tal ameaça (lutar ou até mesmo ficar imóvel para não
ser notado), e é neste momento que acontece uma série de mudanças fisiológicas no
seu organismo, como nos sistemas nervoso e endócrino. Em estado de estresse, de
natureza física, psicológica ou social, a associação de reações fisiológicas, que
podem ser intensas e de longa duração, ocasionam desequilíbrio aos organismos,
provocando efeitos danosos.
O estresse ainda pode ser definido como uma resposta não-específica que
atinge o indivíduo/animal exposto à situações que geram reação de estresse (como
transporte, área de espera e atordoamento), podendo ser manifestado nas áreas
fisiológicas, psicológicas e comportamentais. Pode ser conceituado ainda com o
resposta ambiental sobre um indivíduo que tem sobrecarga dos seus sistemas de
controle, impactando na sua adaptação. Diante disso, é possível verificar a clara
relação entre estresse e bem-estar. Uma vez que o bem-estar refere-se a variedade
de condições em que o animal é submetido, podendo variar de bom a ruim, pode-se
afirmar que a presença do estresse é resultado de condições insatisfatórias de bem-
estar (BROOM, 2001; CUNGI, 2006).
Existem dois meios de avaliar o estresse em animais, através da conduta
comportamental ou pela análise de indicadores fisiológicos é relacionada à uma
conduta anormal, ou seja, um comportamento que foge da sua normalidade
relacionados ao estresse. Os indicadores comportamentais são baseados na conduta
16
anormal, ou seja, no quanto o comportamento do animal se afasta daquele observado
no ambiente natural, como por exemplo, repetição de atitude, atitude sem noção
óbvia, indiferença e agressividade. Quanto aos indicadores fisiológicos são analisados
em laboratório através de fluidos e tecidos dos animais (RODRIGUES, 2011).
Situações insatisfatórias de bem-estar, como a presença de estresse, podem
resultar na produção de uma carne de qualidade inferior, impactando na produção e
nas vendas, ou ocasionando na disponibilização de produtos com qualidade inferior
(RODRIGUES, 2011). A qualidade dos produtos de origem animal pode ser avaliada
através de suas características sensoriais (cor, textura, suculência, sabor, odor e
maciez), nutricionais (perfil lipídico, perfil de ácidos graxos, concentração de proteína,
minerais e vitaminas), tecnológicas (pH e capacidade de retenção de água), sanitárias
(doenças), ausência de resíduos químicos, éticos (bem-estar do homem do campo e
dos animais) e preservação ambiental (GUERRERO et al., 2013, HOCQUETTE et al.,
2005).
A presença de estresse proporciona efeito direto sobre a qualidade e
características físico-químicas da carne. Em estado de estresse, os animais podem
apresentar aumento da temperatura corporal, diminuição do pH, ligeira desnaturação
proteica e um imediato estabelecimento do rigor mortis, com isso ocorre a alteração
na conversão normal do músculo em carne, ocasionando no endurecimento e
escurecimento da carne. Portanto, torna-se necessário minimizar as situações de
estresse dos animais durante a rotina de manejo, pois a agitação durante o manejo
pode aumentar o risco de acidentes e levar ao aumento de contusões nas carcaças
(RODRIGUES, 2011).
Como a exigência por produtos de qualidade é cada vez maior, existe a
necessidade de maior comprometimento com a produção sustentável e a promoção
do bem-estar (tanto humano como animal), assegurando a satisfação do consumidor,
ofertando produtos seguros, nutritivos e saborosos. Além disso, garantir a renda do
produtor sem causar danos ao ambiente (ALVES et al., 2016).
.
17
3. MATERIAL E MÉTODOS
O presente trabalho baseou-se em uma pesquisa caracterizada através da
observação direta de algumas propriedades, onde verificou-se aspectos relacionados
à garantia do bem-estar animal. Para esta avaliação, alguns itens foram elencados,
difundidos e ajustados de acordo com o sistema de criação de fazendas de médio
porte, fazendas pouco tecnificadas afim de identificar os pontos críticos e pontos
positivos do método de criação executado na propriedade em questão. Desenvolve-
se avaliação por meio de questionário contendo alguns dos pontos essenciais que
garantem a qualidade de vida dos animais. O questionário (ANEXO 1) teve
embasamento em um trabalho desenvolvido por Paranhos da Costa et al. (2002), em
que o autor menciona fatores fundamentais em relação às instalações, manejo e
equipe de trabalho que garantam o bem-estar animal. Aliado a isso e de acordo com
as definições de Farias (2012) e Leal (2007) que descrevem com clareza as chamadas
cinco liberdades, a ficha de avaliação foi finalizada.
Foram visitadas 10 propriedades que contemplaram os municípios de Iporá,
Ivolândia e Bom Jardim de Goiás, situadas no estado de Goiás-GO, no período de 09
de dezembro de 2017 a 26 de fevereiro de 2018. Os animais foram avaliados durante
o manejo habitual, conduzidos do pasto ao curral pelos peões montados a cavalo e
posteriormente, os mesmos foram soltos novamente ao pasto, retornando às suas
atividades normais.
As principais características que foram observadas na avaliação nas
propriedades relacionaram-se ao estado dos animais, se estes estavam livres de
fome, sede e desnutrição; livres de desconforto; livres de dor, injúria e doenças; livres
para expressarem comportamento natural; livres de medo e estresse negativo. Além
disso, foram avaliadas características das instalações e do manejo, como por
exemplo, o sombreamento (à pasto, presença de árvores, sombrites); as instalações
em si (cercas, corredores, porteiras, currais de manejo, cochos); a equipe de trabalho
(vaqueiros, peões) e o modo de apartação, manejo no curral e embarque.
A análise dos dados foi realizada utilizando o programa Windows Excel, sendo
estes expressos por meio de gráficos contendo a frequência relativa de tais.
18
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
As propriedades visitadas continham, no total, cerca de 8.346 animais machos
e fêmeas criados extensivamente à campo com finalidade comercial de vendas. A
raça predominante observada foi a Nelore (n=5573), seguida das raças Angus
(n=2500) e Girolando (n=273), como observa-se pela Figura 1.
Figura 1. Prevalência das raças encontradas nas propriedades.
No Brasil, a maior parte da carne bovina brasileira é produzida por raças
zebuínas, dentre as quais raça Nelore e Nelore Mocho representaM cerca de 80% do
total do rebanho zebuíno. O interesse dos pecuaristas pela raça Nelore está
relacionado às excelentes características produtivas (GUIMARÃES; FARIA, 2010).
De acordo com Guimarães, Faria e Lobo (2010), o gado nelore apresenta
algumas características que se sobrepõe às demais raças, como por exemplo, a maior
resistência ao calor justificada pela sua maior superfície corporal e por possuir maior
número de glândulas sudoríparas, além disso, os seus pelos auxiliam no processo de
troca de calor com o ambiente e na resistência natural aos parasitas. Afirma-se
também que seu trato digestivo é 10% menor em relação às raças de origem europeia
e com isso, seu metabolismo é mais baixo e apresenta menor exigência na
alimentação. Eles ainda apresentam, expressiva fertilidade e elevada resistência
reprodutiva.
Nelore
Angus
Girolando
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
67%
30%
3%
19
O problema do bem-estar animal, segundo Grandin (1996), está geralmente
relacionado com fatores como o estresse e lesões causados pelas instalações e
instrumentos inadequados, descontrações que impossibilitam a movimentação do
animal, a falta de treinamento técnico dos funcionários, a precariedade e falta de
manutenção dos equipamentos e o manejo inadequado. Tudo isso impacta
diretamente no bem-estar animal, assim como na proteção dos funcionários e na
qualidade da carne.
Ao analisar as instalações (cercas, corredores, porteiras, currais de manejo),
foram encontradas apenas características boas (n=5) e médias (n=5), não sendo
encontradas características ruins em tais propriedades (Figura 2).
Figura 2. Caracterização da infraestrutura das instalações.
A análise das instalações de manejo exerce grande influência no bem estar
animal. As interações sociais anormais desses animais em grupo, devido ao manejo
inadequado, podem promover e aumentar a incidência de comportamentos agressivos
(SPOOLDER et al., 2009). Portanto, os devem ser avaliadas características como tipo
de piso, currais, cochos, bebedouros, dentre outros e além disso, analisar a interação
animal/homem no momento da alimentação, manejo, vacinação, e outros, pois essas
são as principais referências problemáticas envolvendo bem-estar que podem afetar
possível o rendimentos de carcaça, a qualidade da carne, a rentabilidade e a
produtividade.
Boas
Médias
Ruins
0%
10%
20%
30%
40%
50%
50%
50%
0%
20
De acordo com Humane Farm Animal Care (2014) os ambientes (interno e
externo) onde os animais são alojados devem ser isentos de características físicas
que possam provocar machucados nos mesmos. Os currais devem possuir piso
confeccionado de material antiderrapante ou ser mantido de forma a reduzir o risco
de escorregões, com passagens, entradas e corredores das instalações que não
causem danos nos cascos dos animais, além de disponibilizar espaço adequado para
o número de animais e os mesmos devem ser mantidos em abrigos efetivos contra o
vento, área seca e confortável para o seu descanso. Quando às características
térmicas, deve-se alojar o gado em ambiente nem muito quente e nem muito frio, para
que seja evitado o estresse dos animais. No ambiente de pastejo os animais devem
ter acesso aos recursos que proporcionem alívio durante variações térmicas intensas.
Em relação às instalações, os currais apresentaram condições satisfatórias
(Figura 3A). O curral foi projetado de forma racional, resistente pelo fato de ser
desenvolvido com material de alvenaria e animal não tinha contato visual com o
ambiente externo, sendo assim planejado para facilitar o manejo e evitar que o animal
venha a se machucar, as porteiras eram desenvolvidas para abrir para os dois lados,
facilitando o manejo os corredores e seringa. Além disso, os corredores e seringas
eram confeccionados com cimento. Já a figura 3B nota-se um curral projetado de
forma tradicional, confeccionado com madeira, de forma que se houver qualquer
injúria, pode ocasionar ferimentos aos animais. Neste caso, os animais tinham acesso
visual ao ambiente externo, podendo dificultar o manejo.
Figura 3. Curral representando propriedades com condições satisfatórias (A) e
condições medianas (B) para tal item avaliado.
Em relação aos cochos, a Figura 4A representa as condições satisfatórias,
onde é possível observar o desenvolvido destes com cimento, sua localização era em
local plano, amplo e com a disponibilidade de cobertura de sombra natural. Já a
21
condição mediana é representada por um cocho confeccionado com madeira,
instalado em lugar plano, porém, longe do chão e sem cobertura alguma.
Figura 4. Cochos representando propriedades com condições satisfatórias (A) e condições medianas (B) para tal item avaliado.
Quanto ao fornecimento adequado de água e alimento (Figura 5), observou-
se que em todas propriedades (n=10) havia bom fornecimento, ofertando-se em
abundância um volumoso “capim”. Em algumas propriedades havia o fornecimento de
silo e em outras de concentrado, sendo esse fornecimento ofertado no ano todo ou
apenas no período de seca.
Segundo o Código Sanitário de Animais Terrestres – OIE (2014), o rebanho
necessita de acessibilidade à quantidade e qualidade adequada tanto à alimentos
quanto à água, atendendo assim as necessidades fisiológicas dos animais.Caso
contrário, o bem-estar é comprometido. Os alimentos devem possuir conteúdos
adequados de energia, proteína, minerais e vitamina, pois são estes elementos que
influenciam no crescimento, eficiência alimentar, eficiência reprodutiva e composição
corporal do gado.
A nutrição animal não se baseia apenas no conhecimento dos nutrientes
necessários para a vida animal, mas também na concentração adequada destes,
sabendo-se que a dieta deve ser definida de acordo com a categoria animal para se
alcançar o desempenho desejado. Portanto, além do conhecimento do valor nutritivo
dos alimentos utilizados, deve-se saber elaborar adequadamente as dietas, delinear
22
e planejar a administração nutricional do rebanho de maneira eficaz, metodológica e
econômica (PRESTON, 2006).
Figura 5. Fornecimento adequado de alimentos e água.
Ao avaliar a presença de sombreamento adequado nos locais onde se
encontravam os animais, foi verificado que todas as propriedades (n=10)
apresentavam características adequadas para os animais (Figura 6).
Figura 6. Presença de sombreamento adequado.
Alguns fatores, como sombreamento, fornecimento adequado de água,
temperatura corpórea do animal podem afetar diretamente as trocas térmicas de calor
Sim
Não
0%
20%
40%
60%
80%
100%
100%
0%
Sim
Não
0%
20%
40%
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80%
100%
100%
0%
23
sensível e as perdas de calor latente para o ambiente, levando o animal ao estresse
térmico. Esse desiquilíbrio entre o animal e o ambiente pode desencadear em sérios
problemas, tanto na produção, quanto na reprodução dos animais. Em regiões
caracterizadas por climas mais quentes, a oferta de sombreamento natural deve ser
prioridade para diminuir o estresse térmico do gado (NAVARINI et al., 2009).
O sombreamento de pastagens representa a ferramenta de aclimatação mais
apropriada à realidade do produtor, pois pode ser propiciada pela plantação de
árvores nas propriedades, tornando-se ecológica e economicamente viável. O
sombreamento serve de refúgio para os animais, impedindo que os mesmos caiam
em estresse devido ao calor.Além disso, garante a sanidade,e a qualidade do bem-
estar dos animais (OLIVEIRA; FERREIRA, 2011).
Em relação à existência de vocalizações, como berros e mugidos, foi
observado em todas as propriedades (n=10) que os animais, quando fechados no
curral de manejo, apresentavam vocalizações. Isso conforme é demonstrado na
Figura 7.
Figura 7. Existência de vocalizações.
A vocalização entre 0,5% dos bovinos é considerada normal, sendo aceitável
até 3%, inaceitável quando 4 a 10% do rebanho vocalize e quando 10% ou mais emite
tal som, instala-se um sério problema, pois a vocalização do animal durante o manejo
pode ter relação com eventos aversivos, podendo indicar que o manejo com os
Sim
Não
0%
20%
40%
60%
80%
100%
100%
0%
24
animais está sendo efetuado de modo que venha causar à estes, dor ou medo
(GRANDIN, 2001; GRANDIN, 2003).
Ao observar-se a presença de lesões e dores, todas as fazendas
apresentaram animais com tais características (n=10). Porém estas lesões eram
pequenas e o predomínio foi considerado baixo, não sendo expressivo (Figura 8).
Figura 8. Presença de lesões e dores.
A presença de lesões desencadeia no aparecimento de dores e isso acaba
prejudicando o animal, diminuindo a produção de carne, afetando a cadeia de
produção e resultando em prejuízos financeiros ao pecuarista (MIKUCKI, 2017).
Segundo a Humane Farm Animal Care (2014), não deve haver nenhum aspecto físico
no ambiente de criação que possa vir a provocar lesões nos animais.
Para Cláudio (2012), as lesões musculares representam um dos principais
problemas relacionados à qualidade na cadeia produtiva da carne e com isso vem
sendo objeto de vários estudos por representarem perdas quantitativas e qualitativas
para a indústria e, principalmente, para o produtor. Porém, muitas vezes as lesões
nas camadas superficiais dos animais não são identificadas, sendo a maior parte
destas só detectadas no período post mortem através da mudança da cor da área
lesionada na carcaça.
Curin et al. (2012) afirmam que o surgimento de novos tipos de sofrimento
resultam num confinamento intensivo dos animais com maior presença de doenças,
sendo o sofrimento o principal fator que resulta na privação física ou psicológica dos
Sim
Não
0%
20%
40%
60%
80%
100%
0%
100%
25
animais confinados, assim como a falta de espaço que impossibilita a movimentação
dos animais, causando monotonia.
Por se tratar, na grande maioria, de propriedades pequenas onde os animais
já estavam habituados com os vaqueiros e peões, o sinais de medo foi observado em
menor grau (n=3), enquanto a não prevalência de medo (n=7) nas demais
propriedades pode ser justificada também pelo fato da “lida” ser realizada em
intervalos de tempo maiores (Figura 9).
Figura 9. Sentimento de medo expressado pelos animais.
O sentimento de medo pode provocar movimentos de fuga, podendo
desencadear no aparecimento de ferimentos nos animais, impactando na produção e
na qualidade da carne. Além do medo, a mistura de lotes pode desencadear brigas
entre os animais devido ao estabelecimento de “hierarquia”, provocando injúrias nas
carcaças, vindo a interferir na qualidade do produto final. Ao analisar a existência de
mistura de lotes em tais propriedades (Figura 10), verificou-se que apenas três
propriedades (n=3) realizavam tal mistura.
Quanto à equipe de trabalho (vaqueiros, peões), encontrou-se o total de 20
funcionários nas propriedades analisadas, sendo que em 4 (n=4) propriedades haviam
apenas 1 funcionário, 3 propriedades (n=3) haviam 2 funcionários, 2 (n=2) continham
3 funcionários e apenas 1 (n=1) continha 4 funcionários, sendo este o número maior,
como é representado na Figura 11.
Sim
Não
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
30%
70%
26
Figura 10. Existência de mistura de lotes.
Figura 11. Quantidade de funcionários nas propriedades.
O treinamento técnico de funcionários é essencial para garantir o sucesso de
um ambiente de trabalho bem como se adequar às demandas do mercado. A
preocupação com o bem-estar animal vem causando maior interesse dos proprietários
rurais em investiram no treinamento de sua equipe, causando mudanças nas atitudes
dos funcionários que trabalham com rebanho bovino (BARBALHO, 2007; GRANDIN,
2003). A capacitação tem foco na individualidade, buscando o progresso pessoal para
assim, impactar no sistema organizacional, por meio de estágios com transferência
Sim
Não
0%
10%
20%
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10%
20%
30%
40%
40% 30%20%
10%
1 Funcionário
2 Funcionários
3 Funcionários
4 Funcionários
27
de conhecimento, fortalecimento de habilidades, mudanças de atitudes e de conceitos
(CHIAVENATO, 1998).
Analisando a qualificação técnica desses profissionais, verificou-se que todos
estes eram tecnicamente treinados (Figura 12). Em média, tais profissionais tinham
10 anos de experiência, e haviam realizado algum tipo de treinamento proporcionado
por cooperativas, lojas agropecuárias ou até mesmo por instruções simples
repassadas pelos veterinários responsáveis pelas fazendas. Não foram observados
gritos ou pancadas no momento de fechar o gado no curral nem uso de choque, tudo
era feito de forma tranquila. Verificou-se apenas um acontecimento que gerou
desconforto (uma única propriedade), sendo devido à presença de cachorros no local
e com isso houve a necessidade de utilização de “ferrão”.
Figura 12. Equipe tecnicamente treinada.
.
Um treinamento técnico não é apenas o repasse de informações sobre o modo
comportamental dos animais, mas sim um modo de investir na formação de pessoas,
envolvendo alterações no comportamento e no modo de agir com os animais, e isso
só é satisfatório quando se tem motivação. Existem fatores que interferem na
alteração do comportamento do funcionário, incluindo o reconhecimento de que o
animal é um ser consciente, dotado de sentimentos, e não representa apenas uma
fonte de renda, com isso é possível mudar os conceitos relação aos animais. Faz-se
necessário lembrar que os animais também têm sentimentos e necessidades, e que
se o funcionário não dispõem de recursos e ferramentas (físicos e psicológicos)
Sim
Não
0%
20%
40%
60%
80%
100%
100%
0%
28
adequadas de trabalhos, este não consegue desenvolver respostas ao treinamento
(BARBALHO, 2007; GRANDIN, 2003).
29
5. CONCLUSÕES
Diante do exposto neste trabalho, verificou-se que as propriedades visitadas
possuíam instalações com características satisfatórias. Além disso, estas dispunham
de sombreamento adequado no local de manejo e forneciam de forma apropriada
alimentos e água. Observou-se a presença de vocalizações em todas propriedades,
porém a presença do sentimento de medo foi detectado na minoria dos locais. Foi
detectada visualmente a presença de pequenas lesões nos animais, porém não
representando valor significativo.
Em relação à equipe técnica, como se tratavam, na grande maioria, de
pequenas propriedades, o número de funcionários era baixo, porém foi relatado que
todas propriedades já haviam disponibilizado algum tipo de aperfeiçoamento técnico
para seus funcionários.
A presente pesquisa apresenta grande importância na ampliação dos
conhecimentos sobre o bem-estar animal, pois discutir aspectos relacionados à forma
que os animais vivem nas propriedades, como são manipulados e alimentados e saber
como é a capacitação profissional das pessoas que os manipulam, torna-se muito
relevante para compreender como o ambiente que cerca o animal pode manter
influências diretas no seu comportamento.
30
REFERÊNCIAS
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34
ANEXO 1
FICHA PARA AVALIAÇÃO DE BEM ESTAR
Nome da Fazenda:
Nome do Proprietário:
Município/Estado:
Número de Animais/Animais de corte:
Instalações (cercas, corredores, porteiras, currais de manejo):
( ) Bom ( ) Médio ( ) Ruim
Observações:
Há Sombreamento onde estão os animais? (A pasto, árvores , sombrites, etc)
( ) Sim ( ) Não
Equipe de trabalho (vaqueiros, peões):
Quantos são? __________
Tecnicamente treinados? ( ) Sim ( ) Não
Há oferta de adequada de alimento e água?
( ) Sim ( ) Não
Apartação, manejo no curral e embarque: Há vocalizações (berros,mugidos)?
( ) Sim ( ) Não
Lesões e dor?
( ) Sim ( ) Não
Medo?
( ) Sim ( ) Não
Há mistura de lotes?
( ) Sim ( ) Não