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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO FLAVIA KAROLINA CAMPOS A LINGUAGEM CORPORAL EM ESPAÇOS ACADÊMICOS: UM ESTUDO SOBRE O COMPORTAMENTO ETOLÓGICO DE LICENCIANDOS DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DE PEDAGOGIA DA UFMT CUIABÁ-MT 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

FLAVIA KAROLINA CAMPOS

A LINGUAGEM CORPORAL EM ESPAÇOS ACADÊMICOS: UM ESTUDO

SOBRE O COMPORTAMENTO ETOLÓGICO DE LICENCIANDOS DE

EDUCAÇÃO FÍSICA E DE PEDAGOGIA DA UFMT

CUIABÁ-MT

2011

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FLAVIA KAROLINA CAMPOS

A LINGUAGEM CORPORAL EM ESPAÇOS ACADÊMICOS: UM ESTUDO

SOBRE O COMPORTAMENTO ETOLÓGICO DE LICENCIANDOS DE

EDUCAÇÃO FÍSICA E DE PEDAGOGIA DA UFMT

Dissertação apresentada ao programa de Pós-

Graduação em Educação da Universidade Federal

de Mato Grosso como requisito para a obtenção

do título de Mestre em Educação na Área de

Educação, Linha de Pesquisa: Culturas Escolares

e Linguagens.

Orientador: Profº. Dr. Cleomar Ferreira Gomes.

CUIABÁ-MT

2011

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FLAVIA KAROLINA CAMPOS

_____________________________________

Profª. Dra. Maria do Rosário Silveira Porto

Examinador Externo

___________________________________________

Profª. Drª. Maria da Anuciação Pinheiro Barros Neta

Examinador Interno

____________________________

Prof. Dr. Cleomar Ferreira Gomes

Orientador

_____________________________

Silas Borges Monteiro

Suplente

Aprovado em___________

Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Educação – Av. Fernando Corrêa da Costa, S/nº,

Coxipó. CEP: 78060-900, Cuiabá- MT, Brasil. Fone: (65)3615-8431 / Fax: (65)3615-8429

E-mail: [email protected]

DISSERTAÇÃO APRESENTADA À COORDENAÇÃO DO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO DA UFMT

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Aos acadêmicos de Educação Física e de Pedagogia

da UFMT, à etologia emprestada para realização do

estudo de sua corporeidade.

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AGRADECIMENTOS

À CAPES por ter disponibilizado a bolsa e permitido a realização dos estudos, durante

esses dois anos de dedicação à pesquisa.

À Secretaria do PPGE, em especial à Luisa, Mariana e Jeison, por ter me atendido com

doçura e eficiência, nas horas de “socorro”.

A Cleomar F. Gomes, pela doação do saber e por despertar o meu interesse pelo tema,

me emprestando paciência, confiança e competência para a realização desse estudo.

À banca Examinadora, na pessoa dos doutores: Maria do Rosário Silveira Porto, Maria

da Anunciação Pinheiro Barros Neta, que apresentaram sugestões valiosas para o

enriquecimento do trabalho.

À minha MÃE, pelas orações e seu amor, ingredientes que me fizeram acreditar em

mim mesma.

Aos amigos por ter me escutado nas horas mais difíceis: Luciane, Cínara, Eliane,

Cidinha, Cristiane a França Alice e, em especial à Larissa por emprestar seu gravador

para a realização das entrevistas e a todos aqueles que me acompanharam nessa jornada.

Aos professores, Silas, Ozerina, Tânia, Edson, Cancionila e Daniela Freire, por

emprestar seu saber.

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Resumo

A proposta desse estudo visa interpretar os diferentes tipos de comportamentos que os

licenciandos de Educação Física e de Pedagogia da UFMT produzem quando

agrupados, em duplas ou individualmente circulam vivendo e con/vivendo em seu

cotidiano escolar. As marcas que esses diferentes tipos de comportamento apresentam

revelam uma corporeidade que está condicionalmente ligada ao ambiente em que a

circunscreve como a sala de aula, os corredores, as pistas de esportes e de práticas de

ensino-aprendizagem. Para respaldar o olhar diante da temática em questão utilizei de

uma metodologia que privilegia a imagem de movimentos gestuais, posturas dos

observados que fazem com que essas marcas nos mostrem uma comunicação não

verbal. Para o desenvolvimento deste trabalho utilizei de uma pesquisa munida de

observações sistemáticas e assistemáticas, além de um roteiro de entrevistas, quando em

campo foi possível utilizar um gravador e uma câmera fotográfica para registro de

imagens e de falas. No ato extravagante de se vestir, na expressão de rostos, na figura de

corpos pintados, furados, escarificados, na “insatisfação/satisfação” da compleição

corporal, na fadiga renitente das tarefas das práticas de ensino, e das lições de didáticas

de seu métier, no isolamento individual em agrupamentos que superlotam as salas, as

quadras, os corredores... essa corporeidade “vai se ajeitando no jeito que pode”, para ser

fiel a uma expressão de Le Breton. Apesar de alguns acadêmicos apresentarem

diferenças visíveis quanto à situação financeira e diferença de idade, “lado A e lado B”

para diferenciar a classe social e etária: “pobrinhos”, “riquinhos”, “velhinhos”, no modo

de ir e vir, no modo de ser, vestir, falar, ler, se divertir e ocupar esses espaços, eles se

assemelham em seu comportamento etológico. O trabalho pôde ver que somos todos

parecidos para produzir uma acomodação necessária no trato de pertencer a um

determinado grupo social ou a uma “tribo”. Esse tribalismo refere-se a uma vontade de

“estar junto” como prefere o sociólogo francês Michel Maffesoli.

Palavras-chave: Educação Física. Pedagogia. Comportamento Etológico.

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Resumen

El propósito deste estudio visa la interpretación de los distintos tipos de

comportamiento que los licenciados de Educación Física y de Pedagogia producen

cuando agrupados, o mismo individualmente, vivendo e con/viviendo en su quotidiano

escolar. Las marcas que estas clases de comportamiento presentan una corporeidad que

está condicionalmente ligada al ambiente que las circunscreve, como las clases de aula,

los pasillos, las pistas de deportes y de práticas de enseñanza-aprendizage. Para apoiar

la visión delante del tema en questión, utilizé de una metodologia que privilegia el

image de movimientos gestuales, las posturas de los observados, que hacen con que eses

señales nos muestren una comunicación no-verbal. Para el desarrollo de este trabajo, he

utilizado de um estudio munido de observaciones sistemáticas e assistemáticas.

Además de un plan de entrevistas, cuando en campo, fue possible utilizar una

grabadora y una cámara fotográfica, para registro de images y hablas. En el acto

extravagante de vestirse, en la expresión de rostros, en la image de cuerpos

coloreados, agujeados, molestados en la insatisfacción /satisfacción de la constitución

corporal, en el cansancio renitente de las tareas de las prácticas de la enseñansa y de

las lecciones didácticas de su “métier” , en el isolamiento individual, en

agrupamientos que llenan las aulas, las cuadras deportivas... esa corporeidad vá

“arreglandose de la manera que puede”, para ser fieles a una expresión de Le Breton.

Apesar de algunos académicos presentaren diferencias visibles cuanto a la situación

financiera y diferencia de edad, lado A y lado B , para diferenciar da clase social y

etária: “pobrecitos”, “riquitos”, “los viejos” en la manera de ir y de venir, en la manera

de ser, vestir, hablar, leer, divertirse y llenar este espacio, ellos se parecen en su

comportamiento etológico. Este estudio, portanto, pudo demonstrar que todos somos

iguales en la produción de una acomodación necesaria en el hecho de pertenecer a un

determinado grupo social o a una tribo. Esse tribalismo referese a uma gana de “estar

junto”, como él prefiere el sociólogo francés Michel Maffesoli.

Palabras-clave: Educación Física. Pedagogia. Comportamiento Etológico.

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SUMÁRIO

Introdução............................................................................................................... 10

Capitulo Teórico 18

1.1 O lido e o ouvido sobre o comportamento etológico 19

1.2 Comportamento simbionte: as trocas e o toque proxêmico numa sociedade

individual

29

1.3 o corpo no espectro tribal dos tempos atuais e a noção de costume 40

Metodologia

50

Da metodologia: O caminho percorrido

2. Método

2.1 Lócus

2.2 Dos sujeitos

2.3 Das entrevistas

2.4 Das análises dos dados

51

51

51

56

59

63

3 Categoria de Análise I: Observações das aulas de Pedagogia e Educação

Física da UFMT

3.1.1 Durante as aulas

3.1.2 Lanches, estética, trabalho e brincadeiras: a fronteira entre o prescrito e o

proscrito

3.2 Categoria de Analise II: Comunicação Verbal X Comunicação Não-Verbal

3.2.1 Piadinhas, conversinhas e outros deboches

3.2.2 Das Apresentações dos trabalhos

3.2.3 Da aula à cantina: como se comporta fora da sala de aula

3.2.4 No estágio

3.2.5 Do rito da Avaliação ao rito da Formatura

67

68

80

94

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98

102

106

110

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CONSIDERAÇÕES FINAIS 115

REFERÊNCIAS 123

ANEXOS

Instrumentos de Coleta de Dados Solicitação

127

128

Roteiro de entrevista – Alunos Pedagogia/ Educação Física – UFMT 129

Recorte das falas dos Entrevistados 130

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INTRODUÇÃO

Un vrai collectif est un ensemble de gens décidés

à se taire sur la même chose. (Daniel Sibony,

Perversions – Dictionnaire inattendu des

citations).1

pesquisa se inscreve no terreno sócio-antropológico do “Comportamento

Humano”, que utiliza dois grupos de sujeitos: alunos de Pedagogia e de

Educação Física da UFMT, no tocante a aspectos ligados a sua corporeidade.

Particularmente aqueles que investigam o ambiente que os circunscrevem, pode nos

dizer sobre a forma de se relacionar com as outras pessoas: no vestir, divertir, alimentar,

exercitar, entre outras modalidades de se comportar, e da influência que acabam

produzindo os signos que revelam o pertencimento dessa ou daquela cultura.

O termo corporeidade é noção que tomamos de empréstimo aos lingüistas e

etnólogos para dizer de expressão não-verbal do corpo, e do uso que o corpo faz do

espaço e do tempo que ocupa. As áreas de Educação Física e Pedagogia englobam, em

seus estudos, o homem de forma peculiar. A abordagem do homem nestas áreas se

assemelham em analisá-lo em “movimentos”, na Educação física; estudar suas

estruturas e funcionamento, e na Pedagogia a relação com o meio. Porém, um dos

aspectos que as relacionam em diferentes contextos é a sua “etologia” com enfoques

diversificados ao seu conceito.

1 “Um verdadeiro coletivo é um conjunto de indivíduos decididos a se calar sobre a mesma coisa” (Daniel

Sibony – Perversions Dicionário inédito de citações).

A

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O presente trabalho resulta do grupo de estudos “Gepecol”, “Corporeidade e

Ludicidade”, ligado à linha de pesquisa “Culturas Escolares e Linguagem, do Programa

de Pós-Graduação em Educação, do Instituto de Educação da Universidade Federal de

Mato Grosso.

Enquanto participante na qualidade de aluna ouvinte da disciplina “Abordagens

Sócio-Antropológicas e do esporte” da Educação Física da Universidade Federal de

Mato Grosso no ano de 2008 tomei contato com o estudo da corporeidade. Nas aulas,

sem repetições de movimentos, sem negar o lúdico e sem inibir a criatividade e a

animação dos alunos, esses encontros possibilitaram identificar uma autoconfiança, para

a abordagem com o objeto que escolhi estudar. Acho pertinente supor que o objeto

também me escolheu num encontro dialético entre o interesse do pesquisador e a pulsão

do objeto escolhido. É preciso incluir que essa escolha se justifica por desde muito cedo

eu ter uma relação curiosa sobre o que pode (prescrito) e o que não pode (proscrito) no

trato com as linguagens do corpo. Julgo auspicioso então trazer um pequeno episódio

que demarca a entrada nesse tema de estudo.

O primeiro contato da criança com a escola tem muito significado para ela.

Faz uma fissura em sua vida familiar que é feito de afetos e castigos.

Carregará por toda a trajetória escolar que lá será a sua segunda casa, porque

é assim que os pais lá nos entregam e é assim que a professora nos recebe. A

criança precisa se sentir à vontade, tomando os lugares em que passarem:

“as instituições” como sua terceira, quarta, quinta casa. Na minha primeira

escola eu me sentia muito livre. Em casa eu fora educada presa a todo tipo

de proibições. Na escola era uma casa sem proibições e me recordo que a

primeira vez que ouvi uma colega gritar um palavrão, ninguém a agrediu,

nenhum adulto apareceu para repreendê-la. Isso me soou incrível aos meus

ouvidos. Sozinha naquele pátio enorme, eu quis repetir o feito. Olhei para

um lado e para o outro e gritei “cu!”, Esse foi o meu segundo palavrão,

porque o primeiro: “desgraça” eu disse em casa quando comecei a falar.

Apanhei na boca para nunca mais pronunciar essa palavra que significa

“azar, desdita, infelicidade e falta de graça”, mas que ao julgo de minha avó

materna, “carrasca” era um terrível palavrão. À segunda vez, no pátio da

escola, pude dizer e ninguém me proibiu ou se quer me agrediu. Então disse

em alto e bom tom: “cuuuuu”. Voltei para a sala toda orgulhosa me sentindo

poderosa diante dos meus colegas que não tinham pronunciado uma palavra

tão feia. Pode parecer estranho, mas foi a partir desse evento que comecei a

me senti dona do meu próprio corpo. Livre em minha segunda casa, onde as

proibições eram totalmente diferentes de minha primeira casa, e daí por

diante eu poderia dizer algumas palavras como “cu” que é uma palavra tão

pequenina e que dependendo do jeito que se pronuncia, não podemos

considerá-la como proscrita, apesar, que dentro de minha casa, aos olhos dos

adultos, assim cresci com essas interdições de linguagem até me sentir livre

dentro das escolas, as outras casas, por onde andei.

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A etologia humana constitui-se, portanto, como uma disciplina da biologia que

visa estudar o comportamento, tanto intra-específico, ou seja, o comportamento de uma

espécie no seu meio ambiente, a partir da observação e análise das diversas facetas da

vida dos indivíduos da espécie (sobrevivência, reprodução, comportamento

territórial...); quanto ao comportamento interespecífico, isto é, a relação entre as

espécies no meio ambiente que têm em comum para compartilhar. O ser humano está

sempre recebendo estímulos do ambiente em que vive e interage, seu comportamento,

ou seja, suas respostas a esses estímulos variam muito de acordo com cada indivíduo.

Nesse sentido, propomos um estudo de comportamentos que essa corporeidade

apresenta mais apropriadamente ao conceito de Marcel Mauss (2008, p. 420) quando

define movimentos corporais como “técnica corporal”. Para esse autor “as maneiras

como os homens, sociedade por sociedade e de maneira tradicional, sabem servir-se de

seus corpos” e ainda que sejam transmitidas através da educação e que são atos

tradicionais, diferenciando-se assim dos animais provavelmente pela sua transmissão

oral.

Os objetivos dessa pesquisa são os de: 1) Interpretar os diferentes tipos de

comportamento que essa corporeidade produz, em agrupamentos, em duplas ou de

modo individual quando esses sujeitos circulam, fazendo viver e con/viver nesses

espaços que preenchem o seu cotidiano.

2) Observar suas posturas nos locais onde foram investigados, especificamente

nos movimentos de sentar, andar, agrupar-se, comer, falar sobre quais assuntos, sua

vestimenta, seus adornos, suas expressões de rosto, como se exercitam, sobre o que

sonham, suas formas de parelha, como namoram, enfim sobre esses padrões de

comportamento que perduram no processo de humanização.

3) Comparar os grupos de sujeitos quanto aos comportamentos prescritos e

proscritos, a cultura dos grupos, a realidade de cada ambiente a simbologia das próteses

e outros elementos se houver

Para efetivar um trabalho de natureza qualitativa, adotamos a idéia da biologia

evolutiva de que o homem, de animal natural se tornou cultural. No dizer de Richard

Dawkins (2007, p. 466) “o nosso cérebro evoluiu para ajudar nosso corpo a se virar no

mundo, na escala em que esse corpo funciona”. Essa é uma regra da etologia humana.

Esse comportamento sofre influências de fatores externos como bem assimilou Gomes

(2008) em uma recente pesquisa com sujeitos na cidade de Cuiabá. O clima quente-

úmido dessa cidade observou o pesquisador, “obriga a empurrar as pessoas para fora de

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suas casas”. Parece contraditório dizer, mas é justamente este comportamento putativo

que produz uma socialização quase compulsória com as pessoas desse local. Outros

fatores são atinentes a qualquer grupo social: como o ambiente físico, a luta pela

sobrevivência, as condições financeiras, a fluidez desses tempos “pós-modernos”, a

flutuação dos valores morais, a fragilidade das relações interpessoais, entre outras

expressões evidentes no trabalho de Zygmunt Bauman.

O relacionamento interpessoal depende de fatores complexos que determinam a

ação do grupo sobre o indivíduo, como também do indivíduo sobre o grupo. Supomos

que ao eleger como objeto de pesquisa o comportamento humano e seus aspectos

intrínsecos ― atitudes, crenças e relacionamentos, escolhas, manifestos por diferentes

grupos que compõem uma mesma sociedade, seja possível contribuir para a diversidade

que este estudo se refere. Estudar alunos de Educação Física e de Pedagogia pode vir a

ser um instrumento importante para ver esses sujeitos no trabalho com a educação

escolar que esses acadêmicos possam vir a ter no futuro de seu exercício profissional

com suas crianças e jovens nas escolas de cada um.

Para a construção dessa pesquisa serviram de referências os estudos de Konrad

Lorenz, (1986), Marcel Mauss (2008) David Le Breton (2006) e Edward Hall (1981).

Numa pesquisa de natureza sócio-antropológica, nos moldes que essa pesquisa

se afina, as indagações emergiram no decorrer do trabalho de campo, muitas vezes das

notas decorrentes da observação participante. Entretanto, algumas, questões

preliminarmente, moveram e orientaram a pesquisa, com a observação insistente,

ganhando contornos mais vivos, à medida que a observação e o registro dos dados

vinham avançando. Foi possível notar que as pessoas de um modo em geral se

comportam, assumindo movimentos com gestos estereotipados (sentam no mesmo

lugar, se alimentam da mesma comida, estão sempre nos mesmos grupos, se repetem

nas mesmas posturas, se advogam as mesmas crenças). O que marca as técnicas

corporais e de que forma podemos identificá-las dos licenciandos de Educação Física e

Pedagogia? No capitulo das análises de dados podemos ver o quanto as “Técnicas

corporais” fazem parte das aulas de Educação Física e de Pedagogia da UFMT, tornam

necessárias aos sujeitos, desde os aspectos biológicos, sociais, psicológicos e históricos.

Evitam as aulas com repetições de movimentos, por exemplo: as aulas de danças, GRD,

estágios...

Há uma comunicação verbal ou não verbal para identificar essa corporeidade? A

comunicação aparece nas mensagens dos sujeitos, atraem a atenção do Professor e dos

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colegas, talvez a intenção seja a de prolongar a comunicação, parecem sempre estar em

sintonia com os grupos, nos anexos podemos ver o quanto há uma necessidade de se

comunicar entre os mesmos, a partir dos recortes das falas dos entrevistados. As

estratégias de ensino aprendizagem podem ter variedades com estímulos verbais e não

verbais, visuais e táteis, com ênfase na diversidade das técnicas e procedimentos que

possam surgir ao longo das aulas. As capacidades motoras, não devem ser julgadas, mas

sim, a qualidade e a intenção corporal dos movimentos de cada sujeito são vistas

atentamente por cada indivíduo.

Os fatores econômicos, culturais, sociais interferem no comportamento de ser de

cada grupo? Os alunos tendem a se dividir por grupos como veremos nas analises de

dados as famosas “panelinhas”, quando classificam por “Burguesia e Proletariados”,

“Lado A e lado B”.

Essas são algumas interpretações com o intento de verificar o comportamento

dos licenciandos, tais como: sala/aula, pátio, pista de corrida, corredores, cantina,

eventos... demais locais onde há uma grande circulação desses sujeitos, se constituem

numa ferramenta precisa da pesquisa se juntado as outras formas de coleta dos dados.

Para o desenvolvimento deste trabalho serviu de lócus a Universidade Federal de

Mato Grosso, as salas de aula de Educação Física e de Pedagogia, cantinas e corredores,

pista de corrida, quadra poliesportiva, escolas municipais onde realizaram estágios.

utilizamos de uma pesquisa munida de observações sistemáticas e assistemáticas, além

de um roteiro de entrevistas, quando em campo foi possível utilizar um gravador e uma

câmera digital para registro de imagens e de falas um caderno de campo.

As entrevistas foram realizadas com os sujeitos da Faculdade de Educação

Física, escolhi dois alunos de cada turma desde o primeiro semestre até o oitavo, para a

realização das entrevistas sendo oito homens e nove mulheres. No curso de Pedagogia

também escolhi duas alunas de cada turma, desde o primeiro ano até o quarto, para

realizar as entrevistas, sendo o universo feminino, entrevistei 10 mulheres, foi possível

também ver as falas registradas dos entrevistados no capitulo metodológico deste

trabalho, preservando, assim suas identidades como no exemplo: (A.C.G./F – PED – 20

anos). As iniciais significando o nome, Pedagogia (PED) e/ou Educação Física (EDF)

se referindo ao Curso e 20 anos à idade ou à faixa etária.

A fala de uma entrevistada abaixo, no tocante ao que é permitido (prescrito) e o

que é interdito (proscrito) em sala de aula, mostra como vamos utilizar essas falas no

dercurso das analises:

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“(...)... Bom, você pode prestar atenção, é lógico, né? que é o primeiro,

pode fazer perguntas para os professores, tirar dúvida, você pode fazer

um questionamento também se é... ou se é a favor ou se é contra ou

que tá sendo lecionado”. (I.V.A./F – PED – 26 anos)

Foi também perguntada a outra entrevistada, sobre o que não pode fazer dentro

da sala de aula e a preocupação com a comunicação verbal é sempre visível em quase

todas as falas dos entrevistados conforme veremos abaixo:

“... Bom eu acredito que é muita conversa com os colegas quando

professor está explicando a matéria”. (R.E.G./F – PED – 32 anos)

Os dados observacionais poderão ser enriquecidos com outras categorias, a partir

do desenrolar da pesquisa, resultantes de imagens e filmagens. Entretanto, as

informações mais ricas foram colhidas em campo. Com a teoria de Marcel Mauss

(2008, p. 416), “o comportamento humano não se faz somente por uma consciência

individual, se não também pela mentalidade coletiva”.

Com base no que afirma esse autor, o homem tende a agir de forma similar ao

seu grupo seja qual ele for, para ser aceito. Interpretando Mauss, é provável que aquilo

que os entrevistados disseram, se referindo ao comportamento prescrito e proscrito,

dentro de sala de aula, por exemplo, pode ser esse comportamento o mais usual e aceito

pelo grupo. Em contrapartida, de uma perspectiva localista, como apontada por Geertz

em seu livro a Interpretação das culturas, só é possível “interpretar” a cultura do outro a

partir do convívio com suas singularidades. Para esse autor não existe distância entre

um ato técnico de um ato religioso mágico. Se comportar em uma sala de aula ou em

uma pista de esportes, ou ainda em um campo para práticas de aprendizagens escolares,

tem muito a ver com as normas estabelecidas para esses ambientes. A proscrição deve

ser entendida como um ato iconoclasta, denunciada, enquanto que a prescrição como

um ato de celebração, portanto, recomendada. Em outras palavras, o que esses

“sujeitos” disseram, se traduz como o dito popular: “o que é bom, se recomenda, o que é

ruim, se denuncia”.

Esse comportamento dispensa qualquer consideração que tenha um viés

econômico como tendo um papel decisivo no comportamento de ser de cada grupo,

Nunca é demasiado repetir: “antes de serem culturais, os homens como os animais são

mais naturais do que possam imaginar”, e essa (natureza) de cada grupo se guia por

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estereótipos extrapolam as funções acadêmicas, profissionais e sociais de cada curso. Os

pedagogos, de maioria feminina, têm uma espécie de “futuro” na “ensinagem” que terá

na escola formal seu destino. Enquanto que os acadêmicos de Educação Física, por ser

um grupo heterogêneo e mais jovem, almejam outras paragens: academias de ginástica,

pistas esportivas, treinamento de esforço físico... atividades apropriadas para “corpos

esculpidos‟, como disse um aluno da Educação Física.

Muitas informações veiculadas pelos mass media chegam ao jovem e ao adulto

de forma fragmentada e são manipuladas por interesses econômicos e valores

ideológicos, buscando seduzi-los. A Educação Física não pode fugir e nem se alienar a

essa realidade, pois é impossível negar a força que a indústria do esporte, da estética e

lazer exerce nos comportamentos juvenis.

Nesse sentido a pesquisa, de caráter etnográfico prioriza leituras sobre a temática

da corporeidade e do comportamento etológico, em especial direcionado a esses dois

grupos de sujeitos.

Aqui, por eleição, trabalhamos apenas uma categoria dos grupos de acadêmicos,

sujeitos que se fizeram para a pesquisa ― o proscrito e o prescrito. Nem precisa falar da

solicitude desses “alunos” que se prontificaram e essa disposição já valeria os créditos

de uma dedicatória no trabalho final, mas interpretar comportamentos de qualquer

“tribo” como diria o Michel Maffesolli, já é uma tarefa bem de nossos tempos.

Pelas entrevistas foi possível observar o comportamento desses dois grupos, a

partir dos relacionamentos com os colegas de sala especificamente, com os alunos de

Educação Física e de Pedagogia da UFMT, que seus sujeitos deixam escapar pelas suas

falas, eles têm muito a dizer de sua etologia que se ajeita do jeito que pode. Basta

apenas parar para ouvi-los naquilo que eles têm a dizer, quando perguntamos quais são

seus sonhos? Eles tende a nos responder:

“tô , eu gosto do curso, eu fiquei descontente com algumas

coisas que aconteceu aqui coisas de direção e tal. com o curso

em si é o que eu queria fazer e realmente eu gosto. trabalhar, eu

já trabalho mais eu gostaria mesmo dar aula de personal, fazer

uma especialização voltada para essa área, mais não voltada

para a estética mais o personal voltado para a saúde para a

qualidade de vida para o meu aluno, um idoso, uma criança”.

(D.E.B/F – EDF – 24 anos)

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“muuuiiito, apaixonada. Dar aula para criançinha (forma

apaixonada, expressa pela entrevistada: Quiançinha)”... (A.R.I/F

– EDF – 26 anos)

“há eu diria que Planos, muitos planos juntas, conversamos o

que a gente pensa da vida, como a gente quer está daqui a algum

tempo ou nossas dificuldades, a gente ajuda muito uma a outra.

Com certeza. Mestrado doutorado talvez, meu foco é escola

mais talvez eu não chegue a fazer um doutorado”. (E.L.I/F –

PED – 19 anos)

Estou é tudo o que eu queria, apesar de ter mtas coisas ...mais eu

quero ser educadora. Olha eu entrei aqui porque eu quero a sala

de aula, meu objetivo agora é tentar o mestrado futuramente o

doutorado caso eu não consiga eu vou pra sala de aula. (N.A.I/ –

PED – 23 anos)

Os dados revelam que, com esses meninos, meninas, senhoras e senhores que se

matriculam, nestes dois cursos de licenciaturas, se assemelham e também se divergem

no jeito de ser, de sonhar, de se comportar nos espaços que ocupam, como veremos no

decorrer do trabalho.

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CAPÍTULO TEÓRICO

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1.1 O lido e o ouvido sobre o comportamento etológico

Este estudo tem como objeto de investigação o “comportamento humano”, a

partir da vivência/convivência diária de dois grupos de sujeitos: (alunos de Pedagogia e

de Educação Física da Universidade Federal de Mato Grosso), no exercício de sua

formação acadêmica, para ver como eles se comportam nos espaços em que ocupam.

O antropólogo social Marcel Mauss (2003) um dos teóricos que estimula essa

pesquisa, gosta de repetir, a partir do que seria para ele “a teoria da técnica do corpo”

que em toda sociedade, “todos sabem e devem saber ou aprender aquilo que devem

fazer para lidar com seus corpos” (id., p. 420). Em todas as condições. Naturalmente, a

vida social não é isenta de “estupidez” e de “anormalidades”.

Essa “estupidez” que fala (id., 2003, p. 420) pode ser notada nas falas, na

comunicação verbal e não verbal e na própria expressão de ser de cada sujeito. Por

exemplo, usar uma vestimenta e um calçado que não oferecem conforto; adotar uma

postura corporal que produza um incômodo na coluna vertebral; ingerir drogas

(anabolizantes) alcalóides e álcool para rotas de fugas psicológicas, ou, ainda, se

“entupir” de alimentos gordurosos levando-se a bloquear veias e artérias... pode estar aí

o exercício dessa “estupidez”. Só isso já bastaria para dizer de como temos, ao longo do

processo de nossa humanização, prestado pouca atenção no corpo. Isso pode vir a ser

um assunto de cunho educativo se bem vinculado, discutido e interpretado nas escolas,

que acabam se prestando de lócus privilegiado, porque não dizer “natural” das pesquisas

dos programas em ciências humanas.

Segundo Edward Hall (1981, p. 158), as populações mundiais estão se

amontoando nas cidades e nesses amontoamentos as necessidades de espaço das pessoas

são concebidas “simplesmente em função dos limites de seus corpos”. Com Hall

ficamos à vontade, então, de posse de um referencial teórico-metodológico para lançar

olhar para homens, mulheres, jovens e crianças, em seus ajuntamentos, em micros

espaços urbanos e percebê-los como “animais” em busca de um melhor assento, de uma

posição segura na labuta de ir e vir, de freqüentar esses espaços para garantir a sua

territorialidade.

No dizer de Hall (1986, p. 14), a territorialidade pode ser entendida como “o

comportamento mediante o qual um ser vivo declara caracteristicamente suas pretensões

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a uma extensão de espaço, que defende contra os membros de sua própria espécie”.

Talvez seja aquilo que os alunos fazem em sala, quando protegem seus espaços, passam

a sentar sempre no mesmo lugar, defendendo assim o seu “pequeno” território

“estendido” pela sua carteira? É possível ver essa “privatização” do espaço, pelas falas

de alguns sujeitos quando perguntados por que eles sentam sempre no mesmo lugar.

Assim uma aluna da Educação Física responde: “Eu sento sempre no mesmo lugar, mas

sempre perto das pessoas que eu convivo, porque fica mais fácil o convívio com quem

você conhece...” (M.I.R./F – EDF – 26 anos). Outro colega diz: “sento sempre perto de

meus colegas, por questões de afinidade” (C.R.I./M – EDF – 22 anos).

Sentar no “mesmo lugar” e perto dos colegas como garantia de “convivência” e

“afinidade”, pode caracterizar com os sujeitos aquilo que Hall (id., p. 14) define como

sendo a “extensão de espaço, que defende contra os membros de sua própria espécie”.

Pode-se supor, também, embora os alunos não tenham dito claramente sobre essa

garantia do “espaço”, mas estar sempre no mesmo lugar suscita, com esse

comportamento de repetição, outras características da territorialidade: a segurança de

quem senta na frente garante mais atenção à explicação do conteúdo, pois se está mais

próximo do professor, de suas mídias e da matéria, além de lhe conferir status de aluno

interessado, o que nem sempre acontece quando se senta atrás.

Estar no fundo, com esse desenho de sala de aula que temos nas escolas, pode

dar à turma do “fundão” uma visão panorâmica da sala, promove a conversa “paralela”,

e o “toque” de peles, além de ficar mais perto da saída à toalete. Não importa o lugar

que se prefira no espaço da sala, mas sentando no fundo ou na frente vai comunicar essa

“pretensão” que nos fala Hall. Há uma mensagem dessa etologia, pelas características

que o próprio espaço transmite, pela extensão de espaço contra e com os membros de

sua própria espécie.

Com base no que nos lembra Montagu (1988, p. 19) “as comunicações que

transmitimos por meio do toque constituem o mais poderoso meio de criar

relacionamentos humanos, como fundamento da experiência”. As emoções se produzem

nos relacionamentos dos corpos. Há uma socialização que se efetiva, tanto num grupo

(Educação Física), como no outro (Pedagogia) quando tendem a se aproximar, a sentar

juntos, a se abraçar nos intervalos, a se agrupar para os trabalhos em grupo e a formar as

“panelinhas”, a combinar a carona da volta para casa, a se fantasiar para as festas. Nessa

hora, pelo toque das mãos e de toda a pele corporal, o estar-junto “comunitário”

superestima o espírito de “identidade”, característica primordial desses tempos líquido-

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modernos, como insiste Bauman (2003). As emoções podem vir a ser o primeiro

mecanismo de comunicação, ligação ou repulsão no meio humano e físico nessas

megalópoles de hoje em dia.

Para o David Le Breton (2009), um sociólogo do corpo, em sua obra sobre A

antropologia das emoções, dedica um subtítulo sobre a necessidade do outro. A partir

da leitura da obra Les enfants sauvages de Malson, induz que essas experiências com

crianças selvagens, na relação que se instala com o outro amplia a relação com o

mundo. (2009, p. 30). Para ele o outro é a estrutura que organiza a ordem de significado

do mundo, e, portanto, “nunca estamos sozinhos em nosso próprio corpo”. (id., p. 37).

Para esse autor, é justamente a “educação”, com seus processos de transmissão que “vai

modelar as relações com o outro, portanto com o mundo” (id., p. 35). Além de

promover um acesso à linguagem que aos poucos vai moldando as mais íntimas

aplicações de ser corpo.

Se as emoções, que trabalham com fenômenos psicológicos de aversão, dor,

afeto, segurança, conforto, ampliçao... vai deixando nossos corpos agir

“primitivamente” nos tempos atuais como muitos preferem chamar de pós-

modernidade. Nesse sentido contribui para refletir a falta de toque que a sociedade tem

sofrido. É visível nos consultórios, quando cada indivíduo assenta em sua poltrona, seu

próprio “território” a folhear sua revista, ou nos elevadores, quando as pessoas se

posicionam sempre de cabeça abaixada e não trocam palavras como se houvesse uma

regra de evitamento a ser cumprida dentro desse minúsculo lugar. Como vemos no

comportamento das grandes cidades, as crianças ao nascerem ganham quartos e

encontramos também nas falas dos pais quando chamam a atenção de seus filhos,

mandando-os “para o seu quarto”, tornando uma família com indivíduos

individualizados.

A teoria da técnica do corpo a que Marcel Mauss (2003, p. 401) dizia ser

possível fazer a partir de um estudo, de uma exposição e da descrição pura e simples das

“técnicas corporais”, parece ter eco na descrição que essa pesquisa faz com a

congruência que pude coletar através da observação, das imagens e das falas que

revelam como esses sujeitos vivem e convivem enquanto se comportam em seu habitat

escolar de formação.

Os movimentos corporais que toda sociedade “adota” para seu corpo, Mauss

chamou de “técnicas corporais” e propôs uma divisão em categorias a partir de alguns

aspectos, que variam entre os sexos (sociedade dos homens e sociedades das mulheres);

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e por idades. Por idade ele se refere às crianças se agacham com facilidade. Depois vêm

as técnicas do corpo em relação ao movimento, dos resultados e de um adestramento.

Quanto à biografia normal de um indivíduo ele enumera as técnicas da infância, criação

e alimentação da criança, técnicas da adolescência, que em certas sociedades não há

escolas para as meninas, e por fim a técnica da idade adulta que subdivide em técnica do

sono; da vigília (repouso); da atividade que compreende o movimento: corrida, dança,

salto, escalar, descida, nado, movimentos de força, lançar, segurar; dos cuidados com o

corpo que inclui esfregar, lavar e ensaboar, cuidados da boca e higiene das necessidades

naturais; as técnicas do consumo que inclui a comida, ausência ou uso da faca, a bebida;

as técnicas da reprodução (nada mais técnico que as posições sexuais) e as técnicas de

parto) e por fim as técnicas de medicação. Esses atos são mais ou menos habituais e

mais ou menos antigos na vida dos indivíduos e perduram até hoje e veremos algumas

dessas técnicas nas análises.

Segundo Mauss (2003, p. 416), “os movimentos do corpo contribuem para a

transmissão social do sentido”. Ajuda a viver o corpo, além de revelar a importância de

cuidar dele, assim como dizem fazer os alunos dessas duas licenciaturas: Pedagogia e

Educação Física, seja na forma de pisar, andar, na respiração, balanceio dos punhos ao

escrever, dos cotovelos, extensão das pernas, através do movimento do corpo inteiro.

Segundo Gomes, no seminário de Educação 2008, nos mostra como o processo

de civilização tem haver com o processo de aculturação em que o homem só pode

civilizar-se, se ele puder aculturar-se. E nos faz uma pergunta: “O que é civilizar-se?”

Para ele “Civilizar-se é deixar sua animalidade que traz desde seu „estágio placentário‟

de animal, que age por instinto, para manter sua sobrevivência e passa a civilizar-se,

para aprender a morar na cidade”.

A etologia humana, cunhada por Lorenz, a partir da etologia animal nos explica

que o comportamento do homem, seguindo uma abordagem sócio-antropológica, parte

sempre de sua primeira regra ontológica, a de que “o homem é um bicho natural que se

torna cultural”. Interpretando Lorenz é o mesmo que dizer o homem é um animal que se

torna civilizado.

Nesse sentido, a teoria de Lorenz, (1986, p. 19), nos possibilita uma reflexão de

como somos parecidos com os animais, tanto em nosso comportamento etológico como

em nossa semelhança física. A civilização, a cultura, o mal-estar da cultura, são objetos

de preocupação quando falamos de comportamento humano nos tempos atuais. Essa

metáfora do “mal-estar”, enquanto fenômeno de estudo, de Freud a Bauman tem a ver

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com uma “síndrome de ubiqüidade”. Isto é, está em todos os espaços sociais, portanto a

escola, as universidades enquanto lugares sociais são espaços “comuns” que não se

eximem dessa preocupação.

Alguns antropólogos e etólogos estudaram a evolução, o desenvolvimento

físico, cultural de cada indivíduo e de espécies. (LORENZ, 1986, p. 7), conhecido como

“o pai da etologia”, como o denominava seu mestre Julian S. Huxley, realizava seus

estudos observando peixes, aves e gansos que, desde criança, o fascinavam. O contato

com os animais e com os seres humanos, onde o levou a aprofundar cada vez mais as

investigações sobre a “psicologia dos animais” estimulou-o para o estudo da etologia

conforme pode nos mostrar todo esse processo estudado por ele que é a ciência do

comportamento, envolvendo instintos tradições, hereditariedades, mutações e rituais.

Do ponto de vista físico e do comportamento social, as características dos

animais são bem próximas das características humanas incluindo todos os sentidos:

visão, audição, olfato, tato, e paladar. São eles que propiciam o nosso relacionamento

com o ambiente. São eles que compreendem esse móvel biológico a que chamamos de

corpo. São eles que nos põem em contato com os outros e com os espaços: bio, físico,

psíquico e social. Assim pode-se concluir pela fala do aluno de Educação Física quando

perguntado, qual a disciplina que trabalha com o corpo todo que você mais gosta?:

“Eu gostei muito de ginástica geral no primeiro semestre,

assim... trabalhou bastante com o corpo. Foi bem interessante a

sensibilidade. Tudo”. (G.A.L./M – EDF – 32 anos)

Essa sensibilidade, a que se refere o entrevistado, está ligada aos sentidos, o

nosso corpo percebe o que está ao nosso redor, e isso nos ajuda a sobreviver e a integrar

com o ambiente em que vivemos. Com o perdão da tautologia que a explicação carrega,

através do tato, quando tocamos em alguma coisa, permite que sintamos a natureza

desse objeto tocado, além de precisar o seu julgamento: se quente ou frio, se rígido ou

flexível, se fragrante ou fétido. Talvez seja pela “tatilidade” que essa disciplina

disponibiliza que faz com que os alunos tenham prazer assistir a essa aula. Pela audição,

captamos e ouvimos modulações de ruídos. Pela visão, vemos as pessoas, observamos

silhuetas, as formas e sua cor. Pelo olfato, identificamos os odores. E pelo paladar,

sentimos as coisas comíveis, o sabor do mundo. Os sentidos funcionam o tempo todo

como eficientes mensageiros daquilo que pode ser “tatilizado” em nossa existência.

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As ligações motoras desenvolvidas no percurso do homem estão ligadas ao

cérebro que desenvolvem a possibilidade de descobertas. Esse achado antropológico foi

bem desenhado com a descoberta da ferramenta no filme “2001, Uma Odisséia no

Espaço”, de Stanley Kubrick (1968). Como nos parece supor pela lente de Kubrick, os

movimentos dos Homo sapiens mostram uma disputa pela territorialidade e a afirmação

do bando que se deslocam para a descoberta da ferramenta, a partir de um fêmur de uma

carcaça de zebra. Pela via da linguagem não-verbal esse movimento sugere uma

comunicação entre as rubricas estudadas por (GOMES, 2009, p. 113) que organiza a

nossa ontogênese e filogênese: ludens-sapiens-faber-demens. Com o desenvolvimento

de novas técnicas corporais, algumas atividades de perduração, como veremos a seguir,

vêm sofrendo alterações corporais importantes:

Andar: as pessoas das “megalópoles” termo usado por Maffesoli (2006, p. 95)

parecem estar sempre com pressa. Uma observação que fiz durante minha

estada na cidade do Rio de Janeiro para realizar estudos pertinentes à pesquisa

nos mostra que as pessoas andam para seus determinados destinos com suas

cabeças voltadas para o chão, parecem estar sempre insatisfeitas com alguma

coisa.

Falar: seja a comunicação verbal ou não verbal, o corpo humano usa de

sofisticada linguagem, seja no cansaço, na respiração, nas pulsações, nas

indisposições corporais. Há fala pelos gestos, pelos movimentos, pelos

silêncios.

Copular: há notícias dos sujeitos que hoje eles são mais livres para falar,

programar-se e fazer o sexo sem nenhum compromisso social, inclusive. O

kama sutra ainda é bastante conhecido entre eles.

Vestir: são as cores, os tamanhos das roupas que irão influenciar na sociedade o

qual está inserida. Os alunos da educação física vestem roupas mais leves para

poder realizar seus exercícios seja eles na quadra, na pista de corrida ou em sala

de aula.

Sentar: com os avanços tecnológicos da sociedade moderna passamos a maior

parte do tempo, sentados. A cadeira da sala de aula produz escoliose, à frente

dos computadores, das TVs e games, também nos traz problemas de postura.

Assim, conforme Le Breton (2003, p. 21) “a sociedade urbanizada torna-se uma

sociedade sentada”. O que para Bauman (2008, p. 62) essa sociedade moderna

existe em sua atividade de “individualizar-se”.

Comer: com o advento da tecnologia a alimentação tornou-se mais disponível,

portanto, com as pessoas comendo mais, promove mais obesidade. É provável

que os Neandertais tivessem dificuldades para obter comida.

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Mediante as rubricas humanas que nos “põem de pé”, pela experiência corporal

apresentada pelos sujeitos da pesquisa, nos coloca frente a uma questão paradoxal: o

sentar-se, se tomado como um movimento de perduração pode ter tido, na invenção do

utensílio cadeira, duas condutas de sentidos e significados opostos ― a mesma cadeira

que nos acomoda também nos desestrutura, causando-nos um problema de postura. A

escoliose, que a própria palavra explica, é um desvio de coluna adquirido nos bancos

escolares.

A cópula que realiza o processo, pelo qual alguns indivíduos deixam

descendentes ou cópia de seus genes, no “mistério da reprodução”, também pode trazer

a desgraça se contaminação com doenças sexualmente transmissíveis (DST) atingir seu

objetivo. Isto é, o mesmo ato que pode trazer a uma nova vida, pode também nos levar à

morte. E, assim é com o alimento que comemos que nos dignifica, traduz a nossa face

de um deus criador, mantém a nossa existência em equilíbrio, mas também pode nos

tornar obesos, hipertensos, diabéticos; a caminhada e a corrida que nos proporcionam

esse wellness pós-moderno, para ficar em paz com o modismo do termo, se feitos de

forma errada sem calçados e vestimentas apropriados em lugares e horários não

favoráveis, nos causam problemas em nossa estrutura: pele, luxações, tendinites,

contraturas, torções, estiramentos musculares, desidratação entre outros.

Algumas dessas técnicas só são solicitadas raramente no cotidiano, através de

atividades físicas para a manutenção da saúde. Para o etologista Konrad Lorenz (1986,

p. 19) falando em termos de responsabilidade humana em pé de igualdade com sua

responsabilidade científica diz “que se o naturalista percebe os perigos em que se encontram os

seres humanos como tais, cabe ao filósofo alertar à humanidade e os seres humanos contra esses

perigos”. Essa tarefa é de todos nós que lidamos com as ciências do gênero social e humano:

antropólogos, sociólogos, psicólogos e pedagogos, todos estamos convidados. Desse modo,

estudar o comportamento, a partir das mensagens que os corpos dos sujeitos (pedagogos e

fisiculturistas) emitem pode vir a servir de um “manual” que nos estimulem a pensar em nosso

próprio corpo em relação a mim, ao outro e ao mundo em que habito.

Hoje os perigos da desumanização são os mais imediatos, ao lado dos perigos de

ser destruído o meio ambiente “no qual e do qual vive” o homem. Lorenz (1986, p. 20)

já se preocupava com o futuro, com os avanços tecnológicos e com a evolução cultural e

que iríamos deixar para trás a evolução filogenética, com isso ocorre o extermínio do

meio-ambiente: o homo violens, e a “decadência” da cultura, pois os dois caminham

juntos e analisa as razões do declínio da nossa civilização e da cultura ocidental.

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Segundo Lorenz (1986, p. 117), “perderam-se os valores culturais característicos

do ser humano”, para que se recupere, a sociedade irá sofrer uma transformação radical,

na qual cabe aos jovens a responsabilidade da ação re-construtiva a responsabilidade de

conscientizá-los dos desvarios, levando em consideração os valores, as crenças, os

mitos e as exigências ditados pelos interesses sócio-culturais de cada sociedade. É

necessário re-valorar as nossas características humanas, a começar pelo respeito à vida.

Mediante o desenvolvimento cultural da humanidade se processa a passos cada

vez mais acelerados e atingiu na atualidade uma velocidade tal, que podemos dizer, sem

receio de exagero; será que, quanto mais nos aceleramos com essa ânsia de progresso,

passamos a ser insensíveis e fracos que não reagimos mais à profunda ignorância e

violência que nós mesmos produzimos?

Muitas pessoas são conscientes dos perigos trazidos à tona pelo

desenvolvimento tecnológico da humanidade, ainda assim há também

inúmeras outras cujo pensamento tecnomorfo as deixa convictas de que

qualquer desenvolvimento traz consigo, necessariamente, novos valores.

(LORENZ 1986, p. 19-21)

O pensamento tecnomorfo lembrado por esse autor procedido quanto ao

emaranhado causal de uma cadeia de eventos bem definida, pode caracterizar-se por três

atos: a definição de um objeto, passando-se por sobre o fluxo temporal como na

antecipação de algo futuro; a escolha dos meios a partir do objetivo definido, escolha

essa, portanto de certo modo retroativa; e a realização do objetivo através da seqüência

causal dos meios escolhidos (Nicolai Hartmann, apud Lorenz, 1986, p. 23).

Não nos resta dúvida de que o conhecimento humano influi no curso da

história da humanidade, e se levarmos em conta que justamente o acréscimo do

conhecimento humano é totalmente imprevisível, então o futuro curso da história

também é imprevisível. Seja ele um cérebro humano ou um computador eletrônico,

podem jamais prever os seus próprios resultados.

De acordo com a trilha evolutiva do mundo dos organismos, não pode estar

predestinada nem predeterminada desde a origem da vida. O famoso aforismo de Bem

Akiba, “de que tudo já existiu antes”, é o contrário do que constitui a verdade histórica:

“nada já existiu antes” (apud Lorenz, 1986, p. 25). Se nada existiu antes, de onde vem a

nossa existência?

O autor, David Le Breton, que tem o estudo sobre a corporeidade, trabalha o

corpo singular, múltiplo, ferido, esfacelado, como ele gosta de repetir, o corpo como

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obra de arte em perigo. É um sociólogo do corpo e para quem o corpo não é só um

estado primitivo onde deposita doenças e nem só um espaço em que se arquiva, se

anexa e se agrega pontos de cultura mais também o corpo é um cenário um espaço onde

se anexa em forma de prótese os símbolos que o homem é capaz de criar, inclusive o

corpo como metáfora, não é só um corpo múltiplo, singular, esfacelado, tem todo tipo

de corpo que está em constante mudança. Então se a gente pensar que o corpo é um

corpo natural, cultural é diretamente simbólico na sua existência e na sua negação.

Para Le Breton (2006, p. 24), “o corpo não existe, não se vê corpos, o que se vê

são homens e mulheres”. Para a medicina “nós temos um corpo” para ser medicado,

para ser tratado, e na fenomenologia de Merleau Ponty (internet, wekpédia 9 de

setembro de 2010), “nós somos um corpo”, para pensar, falar, sentir... Essas metáforas

nos deixam dúvidas para querer entender se o corpo não existe, se nós temos um corpo,

ou se nós somos um corpo. “Se nada existiu antes”, como nos diz Lorenz, o que existe

hoje? É na observação da pesquisa que pude ver o quanto o corpo é importante em

nossa existência.

Depois de uma aula “cansativa”, depois de exaustiva repetição de exercícios

físicos + mentais, qual a mensagem que advêm desses meninos e meninas na quadra de

esportes e numa sala de aula? Talvez os gestos que eles apresentam traduzem

comportamentos de sujeitos que mostram que o corpo + espírito necessitam de

descanso, para voltar a se movimentar, como veremos nas imagens abaixo:

Fig. 1. (EDF – UFMT) Fig. 2. (EDF – UFMT)

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Fig 3. (PED – UFMT) Fig. 4. (PED – UFMT)

O corpo, a partir dessas imagens, parece insatisfeito, cansado, enquanto todos os

alunos estão de pé ouvindo o professor o aluno (E.L.C./M – EDF – 24 anos) se encontra

deitado ouvindo atentamente, e não podemos esquecer que através da linguagem não

verbal o nosso corpo nos diz a todo tempo se está satisfeito ou não com suas

realizações. Ficamos livres de qualquer julgamento para não dizer de insatisfação, mas

sim de fadiga.

Como veremos noutras atividades de perduração com outras mensagens

corporais:

agrupar-se, para Michel Maffesoli (2006, p. 37) o termo “desindividualização”

nos mostra a necessidade que temos de ter contato com o outro de viver na

coletividade, de sentir e ser aceito pelo outro. Por mais que os mecanismos

tecnológicos nos impelem para um individualismo, haverá espaços, esses

sujeitos nos mostram que uma vida em coletividade é o que dá “sentido a nossa

existência”, dito com essas palavras pela maioria de nossos sujeitos.

caminhar, correr... Consoante Mauss (2008, p. 420) são “técnicas corporais”,

vivenciadas pelos alunos de Pedagogia e Educação Física, não só nos espaços

apropriados como na pista do campus ou nas quadras poliesportivas, mas a

corrida para pegar o ônibus na vinda ou na volta para suas casas, a caminhada

feita até o refeitório, nos corredores para fazer cópias dos textos, a caminhada

até à cantina... os alunos vão se “ajeitando do jeito que podem” e usam a

ferramenta que estimula a aquisição de novos padrões de comportamento que

perduram em nosso processo de humanização... os aparelhos sofisticados são

bem conhecidos são conhecidos nas academias de ginásticas, visto no estágio da

Educação Física.

Segundo Le Breton (2006, p. 17) “as qualidades do homem são deduzidas da

feição do rosto ou das formas do corpo”. Ele é percebido como a evidente origem moral

da aparência física. O corpo torna-se descrição da pessoa, testemunha de defesa usual

daquele que encarna. O homem não é o produto do corpo, produz ele mesmo as

qualidades do corpo na interação com os outros e na imersão no campo simbólico. A

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corporeidade é socialmente construída, mesmo anexada em seus valores, em sua moral e

em seus mitos.

Consoante as mudanças de curso são às vezes explicáveis por “invenções” ou

novas “descobertas”. A educação é um instrumento privilegiado, assim como o sentido

dos direitos humanos, através das invenções/descobertas, como ação/reflexão da vida

humana, que se distingue das demais formas de vida. Na evolução, são diferentes

espécies que se desenvolvem e tem diferentes respostas do meio ambiente, como forma

de sobreviverem. Os seres humanos criam sistemas de cultura, desenvolvem sua

racionalidade, a linguagem verbal, há um aprimoramento tecnológico, desenvolvem

sentimentos, poder de posses, consciência, domesticação e passividade que diversificam

entre si as cosmologias, através de estudos biológicos expressos em suas características

corporais. Assim como os animais, a metáfora do camaleão é um exemplo em que o

animal é capaz de se adaptar de diversas formas e cores no tempo exato, para sua

sobrevivência.

Conforme Lorenz (1986, p. 37) “Os caminhos da evolução são claramente

determinados pelo acaso, a uma igualmente determinada mutação a recompensa de uma

vantagem na seleção natural”. Se de fato a Etologia enquanto ciência do comportamento

estiver certa em seu aforismo, não é de se desperdiçar a sua deixa: “os homens como

animais, antes de serem culturais, são mais naturais do que possam supor”.

1.3 Comportamento simbionte: as trocas e o toque proxêmico numa sociedade

individual

Olhar os corpos de meus sujeitos e tentar entender sua mensagem, quando na

vivência diária de sua formação, com base na expressão “evolução demolidora” de

Lorenz (1986, p. 43) seria talvez a mais apropriada, uma evolução autodestrutiva que é

tão específica para o autor quando denomina de sacculinização, a partir de um de seus

exemplos mais impressionantes.

Pude ouvir e ver como eles se ajeitam, (essas interpretações serão melhor

alongadas na seção de análise dos dados) quanto aos mecanismos estratégicos de

sobrevivência neste espaço de formação. Como por exemplo, pude ver e ouvir alunos

que fazem alianças interesseiras com colegas mais inteligentes (nerds) ou mais

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abastados (riquinhos); há outros que se mostram solícitos para auferir alguma vantagem;

há outros que fingem estar em desvantagens, numa espécie de “trade-off energético” ,

conforme os estudos de Wrangham (2010, p. 91) com preguiça de pensar, oferecem

força em troca de cérebro.

Esse mapa de comportamentos, expresso por nossos sujeitos se assemelham à

sacculinização, identificada por Lorenz, baseando no exemplo do ser vivo em que o

processo de evolução autodestrutivo se passa de maneira particularmente nítida e

observável.

O caranguejo sacculina carcini é provavelmente um descendente da

subclasse dos copépodes, o caranguejo de seis pernas, cuja programação lhe

permite identificar e procurar um possível hospedeiro, o siri praieiro

encontrando o hospedeiro, com muita perícia o caranguejinho se fixa bem na

fresta entre a couraça capopeitoral e a couraça caudal, e aí se enraíza.

Infiltrando pelo corpo do hospedeiro, perfurando-o assim como o micelo de

um cogumelo perfura o solo que o alimenta. (Lorenz, 1986, p. 43 - 44)

Os simbiontes em que aparecem alguns fenômenos da evolução autodestrutiva

são, por exemplo, muitos dos nossos animais domésticos, que pouco a pouco foram

perdendo todas aquelas adaptações especializadas que haviam sido imprescindíveis para

que seus ancestrais pudessem sobreviver na selva. Todos somente ganharam algo em

relação àquelas características que são do interesse do homem e sobre as quais,

consciente ou inconsciente, este exerceu pressões de seleção. A esse processo Lorenz

(1986, p. 44) denomina de “domesticação”.

De acordo com nosso senso estético, atribuímos valores negativos à maioria

dos fenômenos aparentes da domesticação, que, segundo (Julian Huxley apud, Lorenz,

1986, p. 44), falava da “vulgarização”. O homem exerceu duras pressões seletivas sobre

uma forma selvagem que já de início se apresentava socialmente bem organizada, o que

vale para os cavalos sob o ponto de vista estético é igualmente válido para os cães sob o

ponto de vista do comportamento social, capacidade de amar, lealdade, coragem,

valentia, obediência, entre outros predicados.

Para o Homem, segundo Lorenz (1986, p. 56) “A vida do espírito humano é uma

vida super-individual, e à concretização individualmente experimentada do espírito

humano comum a todos os indivíduos chamamos de cultura”. O corpo e o espírito

humano são partes fundamentais do processo transformador das emoções,

conseqüentemente, de nosso processo evolutivo.

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Não paramos para pensar em nosso corpo. Para Le Breton (2003, p. 34) “há um

“ódio social” que se converte em um “ódio do corpo”. Preocupamo-nos somente com a

estética: o silicone, o botox, as plásticas, a lipoaspiração que constituem a sua melhor

ocupação. Estamos sempre anexando uma prótese, como sugere esse autor da

“sociologia do corpo”, num mundo que celebra essas mudanças, fazendo perder a forma

corporal.

Seja no ato extravagante de vestir, na expressão de rostos escarificados, na

insatisfação esférica do corpo, no desconforto dos poluentes sonoros, na fadiga

imagética, no isolamento individual das ágoras superlotadas... Essa corporeidade vai

“gritando”, se ajeitando no jeito que pode, feito uma crisálida a caminho de sua imago.

O termo “Sociedade Individualizada”, adotado pelo sociólogo anglo-polonês

Zygmunt Bauman (2009) que traz em seu livro sob o mesmo título, pode nos ajudar a

interpretar melhor essa conduta, como já dissemos no início da escrita desta seção. A

falta de toque de pele entre as pessoas pode ser vista em nossos dias dentro de apertados

elevadores, de barcas superlotadas, metrôs enfurecidos, impróprios para o transporte em

horário de rush, em condomínios das grandes cidades, em filas de bancos, em salas de

consultórios, em casas de show e nos cursos de licenciaturas pesquisados. É através do

toque, isto é, da tatilidade que quer dizer faculdade de tocar com todos os órgãos dos

sentidos, esse estudo pode ajudar a entender porque é que as pessoas estão cada vez

mais “individualizadas”, para ser caro à metáfora baumaniana.

Pelo que pude observar esses sujeitos, tanto de um grupo como do outro,

exercitam o toque somente nos micros-grupos (panelas), organizados por uma simbiose,

mas que por qualquer outro mecanismo organizador, como os parasitas, por exemplo. É

nessas horas que sou tentada a supor que nós somos iguais aos chimpanzés de

Wrangham (2010) e aos gansos de Lorenz (1986). Vivendo e convivendo com a briga

do território, privatizando o espaço público.

Abarrotados de pessoas, esses espaços ditam uma corporeidade e, afina uma

“técnica corporal”, lembrando a expressão de Marcel Mauss (2008, p. 421), que elimina

qualquer possibilidade de toque, qualquer experiência de pele. Com isso vivemos em

uma sociedade individualizada e que nos tornamos mais individuais.

Tomando por base a velocidade evolutiva de nossa civilização resulta em que

cada geração se torne cada vez mais diferente da que lhe antecede: “a geração dos filhos

difere mais da geração dos pais do que esta da geração das avós” (Lorenz, 1986, p. 60).

Enquanto as gerações, entre todos os povos civilizados, se tornam cada vez mais

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diferentes das anteriores e delas se afastam, tornando-as mais estranhas, no mundo

inteiro os indivíduos de uma mesma geração se tornam cada vez mais semelhantes entre

si. Assim na involução esmerada por Lorenz, na medida que cresce a cultura em seus

aspectos filogenéticos, também cresce o evitamento corporal da espécie humana.

A partir da rubrica Homo ludens, podemos tratar dos processos da evolução

criativa, que precisam ser também abordados os processos que se desenrolam no interior

do cérebro humano e ao nível coletivo, social, no espírito humano. “Os processos

criativos que se passam no homem, e somente no homem, constitue-se ao mesmo tempo

um jogo, uma brincadeira. Tomando emprestado de Friedrich Schiller, o poeta-filósofo

alemão do século 18, seu famoso aforismo “o homem só completa a sua humanidade

quando é capaz de brincar” Lorenz, (p. 63). Expõem pela potência do homo ludens as

pistas que amenizam esses evitamentos sociais.

São as crianças, que em uma determinada fase descobrem que podem repetir

seus atos assim como os animais domesticados como a exemplo dos gatos e cachorros e,

também os bebês, que ao nascer necessita de uma comunicação para se alimentar

através do choro, sentindo fome, ele chora e ganha o leite, porém todos per-seguem um

mesmo comportamento lúdico. Processos semelhantes a este provavelmente se

desenrolaram quando da especulação de qualquer nova ferramenta. Esse evento se

repete pelas linguagens (verbal e não verbal), tão visíveis nos acadêmicos, nas

realizações de provas práticas (alunos brincam com bolas, dardos, pesos) e em

momentos de aulas e quando levam seus filhos para a sala de aula.

Mediantes as linguagens usadas em bairros, em guetos. (não são linguagens

formais mais uma comunicação corporal), indícios mostram que a linguagem está

evoluindo culturalmente. É um vetor da cultura, que identifica grupos dentro da

sociedade. Como fazem os sujeitos da pesquisa, formando seus grupos, de “pobrinhos”,

“riquinhos”, “lado A”, “lado B” como veremos nas categorias de análise. Para Lorenz a

partir do ponto de vista da epistemologia evolutiva, somente uma das três é cabível. A

primeira é a da causalidade recíproca ou da interação correspondente às experiências

vivenciadas; a segunda teoria, a do paralelismo psicofísico, de duas cadeias de eventos,

que fundamentalmente não apresentam inter-relacionamento lógico. Particularmente dos

que se referem à fisiologia do cérebro e do sistema nervoso, nem minimamente nos

aproximaram da compreensão do problema do corpo e da alma e que se desenrolam de

maneira totalmente inconsciente; o terceiro posicionamento das três hipóteses para o

problema do corpo e da alma, que pode ser o único adotado pelo epistemólogo

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evolutivo, consiste na suposição de que o corpo e a alma, eventos fisiológicos e

emocionais, sejam simplesmente a mesma coisa real e verdadeira em si mesma, da qual

tomamos conhecimento por dois modos de conscientização diferentes e independentes

entre si.

Consoante as normas comportamentais, guiadas como são pelas emoções, sejam

teleonômicas. O entusiasmo e a lealdade aos amigos são considerados características

merecedoras de elogios, assim como o amor materno é considerado nobre, a inveja pelo

alimento é considerada desprezível, apesar de que também estas duas últimas formas

comportamentais humanas pertencem ao etograma que é o registro detalhado do

comportamento de um animal, dos instintos bem preservados do homem.

Esse autor considera que a rubrica Homo ludens tem a capacidade de criar

harmonias que jamais antes existiram, e tem também a capacidade de percebê-las.

Percepção é uma atividade do homem, na arte humana há sem dúvida muitas coisas

belas, cuja existência não é teleonômica no sentido da definição de teleonomia, no

sentido biológico, elegido pelo autor.

Contudo a sensação de harmonias é uma realização daquela organização dos

nossos órgãos sensores e estruturas cerebrais que conhecemos como percepção de uma

Gestalt, percepção de uma imagem.

A própria cultura criou normas comportamentais humanas que, de certa maneira,

podem servir como um substituto para as programações comportamentais humanas

inatas, funcionando como fatores estabilizantes e conservadores, e opondo-se desta

maneira a um desenvolvimento demasiadamente precipitado. Para Kant, “os

comportamentos são formados a partir da previsão de suas conseqüências” (apud.

Lorenz, 1986, p. 118). Segundo o autor:

“O homem é bom para a sua sociedade. Os mandamentos bíblicos e as

proibições sociais, surgidos ao longo do nosso desenvolvimento cultural,

obrigam-nos constantemente a violentar as nossas programações

comportamentais inatas; nos contatos com os demais membros da sociedade,

cada um de nós se acha constantemente preso na camisa-de-força das normas

comportamentais e culturais” (LORENZ, 1986, p. 119).

Desse modo explica o autor que quanto mais uma cultura se desenvolve, tanto

maior é a lacuna entre as tendências naturais humanas e as exigências culturais.

Já definimos anteriormente o “espírito humano” como o fenômeno coletivo do

que os homens conhecem, sabem fazer e desejam, em conseqüência do seu raciocínio

abstrato e conceitual bem como de sua linguagem provida de sintaxe.

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O espírito humano criou um sistema tal que, mesmo sendo complexo ao

extremo como é não tem a mínima condição de fornecer uma visão global de suas

próprias complicações. Bem como a super organização, ameaçam levar ao

empobrecimento do espírito humano e também à perda de direitos humanos essenciais.

As ameaças que as espécies humanas estão prestes a serem extintas, não seria

uma extinção e sim a “destruição” de suas características específicas, das características

que nos tornam seres humanos e não apenas animais pertencentes à espécie humana.

Ainda assim o indivíduo se sente feliz e satisfeito, visto que desde o berço foi

condicionado mediante uma doutrinação bem testada para tal, sendo-lhe a satisfação e a

felicidade proporcionadas adicionalmente por meios psicofarmacológicos.

O espírito humano marginalizou totalmente os efeitos da seleção, deixando-a

inócua, através do expediente de eliminar, quase de todo e qualquer a interferência

antagônica do meio ambiente, seus predadores, o clima, as doenças infecciosas...

A Fenomenologia das valorações humanas, muitas das normas

comportamentais inatas e também tradicionais humanas, que ainda há um tempo

historicamente bastante recente, constituíam programações bem adequadas do

comportamento social e econômico, contribuem hoje para a decadência e para a

destruição da humanidade.

Segundo Lorenz, (1986, p. 43) “O que resta de uma seleção efetiva caminha no

sentimento cultural, possa apresentar efeitos contrários aos da sacculinização genética”.

Há bons motivos para a suposição de que a evolução cultural “ascendente” depende de

modo essencialmente semelhante ao caso da evolução filogenética, de que aquele jogo

de causas e efeitos recíprocos, o qual constitui obviamente a pressuposição para a

existência de um desenvolvimento criativo de orientação “ascendente” se desenrole

entre culturas distintas. Com o desenvolvimento ultra-rápido e acelerado de uma cultura

dominada pela tecnologia traz “embutida” a conseqüência imediata de que

freqüentemente a falta de visão mais ampla leva à opção por um caminho sem retorno

possível. A partir dos estudos de Lorenz, esses mecanismos tecnomorfos levam o

homem a se distanciar da “experiência” que nos fala Larrosa, quando trocamos as

“informações” no lugar das “experiências”. Se isto for verdade, assim como um simples

software da máquina de calcular elimina minha experiência matemática com o cálculo,

o uso de máquinas nos esportes e nas salas de aulas, elimina também o meu contato com

a experiência corporal que só se pode fazer pelas vias do toque.

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“A humanidade, que pensa e age de modo tecnomorfo e cientificista

desaprenderam, como tratar com seres vivos. Se tudo o que tem alguma coisa

a ver com sensações e emoções é considerado ilusório, se há uma orientação

no sentido de se buscar uma psicologia sem alma, então, conseqüentemente,

também não se há de sentir dó de um bebê humano que, deixado sozinho

num quarto escuro, grita desesperadamente por socorro. Qualquer filhote

animal de uma espécie de atividade diurna, que ainda depende dos cuidados

maternos e paternos, fica exposto à morte praticamente certa se na escuridão

mais profunda perder a sua família. Usando assim a totalidade de suas

energias nervosas e musculares disponíveis para emitir para todos os lados os

seus pedidos de socorro” (LORENZ, 1986, p. 165).

A fenomenologia das valorações humanas, como o prazer que se sente pelo

crescimento, pelo funcionamento, lhe reforçam tal convicção. Nós, enquanto civilização

humana, nos tornamos cada vez menos capazes de suportar a dor e o sofrimento.

Enquanto a verdadeira alegria se torna inatingível pela auto-piedade com que as pessoas

evitam o desgosto a dor e o sofrimento. Podemos ver através da imagem abaixo o

sofrimento desses alunos no sol quente enquanto assistem a aula de atletismo:

Fig. 5 – Aula na pista de atletismo das 11h às 12h. (Educação Física)

Ao observar a aula na pista de corrida, pude perceber o quanto os corpos desses

alunos estavam insatisfeitos, através do cansaço, a procura por um ambiente fresco

necessitados de água, procurando por sombra, pois o clima quente da cidade faz com

que o indivíduo sinta dor, passando por um sofrimento corporal.

O “gozo”, na melhor das hipóteses, ainda pode ser adquirido sem que por ele se

pague o preço honesto de um trabalho durante amargas semanas, mas não a “alegria”,

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lampejo dos deuses. A incapacidade é causa do tédio e, por conseguinte, da grande

necessidade de “lazer” ou de diversões que tantas pessoas hoje têm. Deixar se divertir

passivamente constitui bem o contrário do jogo, que é a essência da atividade criativa

sem a qual não pode subsistir a verdadeira humanidade (Lorenz, 1986, p. 175).

O desenvolvimento intelectual humano oprime a alma humana, têm efeitos

particularmente nítidos e eficazes em tornar maiores às dificuldades a serem enfrentadas

pela juventude. Dificuldades na aceitação em receber as tradições do estresse social, as

restrições impostas pela super-organização e a especialização tornada obrigatória pela

subdivisão das tarefas, que contribui para minorar o prazer que pessoas jovens ainda

possam ter pela vida.

Para que uma tradição possa ser corretamente transmitida de geração em

geração, é necessário que esta possa identificar-se com aquela. Depende de quão fortes

sejam os elos que unem pessoas da geração mais jovem a mais velha, a extensão das

mudanças que ocorrem na cultura em causa no curso do período de vida de cada

geração. O contato e o afeto entre as gerações estão regredindo, e lamentavelmente

vemos “bons” motivos para este triste processo. Em todos os tempos os jovens já se

revoltaram contra a geração que lhes antecedeu, hoje, porém, tem-se a nítida impressão

de que foi atingido aquele ponto mais perigoso, crítico, em que a geração dos jovens se

posiciona diante da geração de seus pais como se estes constituíssem um grupo étnico

inimigo.

Já a evolução não consiste só em mudanças, mas em adaptações que requer

equilíbrio entre a estrutura fundamental da espécie e as novas informações recebidas do

ambiente. É preciso o equilíbrio, e Konrad Lorenz, ressalta que “a humanidade já

perdeu”. Pelo que pude ver com os sujeitos dessa pesquisa, as alianças que se formam

têm uma orientação diversa do afeto. A moeda de troca que precifica esses laços é

traduzida por um “ficar com o colega” substituindo o romance de outrora; ser amigo

para ganhar uma carona ou facilitar os trabalhos em grupo. É muito raro acontecer de se

criar laços de amizades duradouras durante o período de formação escolar.

Não se considera mais um processo de evolução, mas “a demolição do homem”

que consiste em abandonar velozmente todas as informações armazenadas ao longo dos

tempos, até mesmo universais e históricas e assimilar com rapidez e igualdade

quaisquer novas informações que podem danificar a máquina humana. O homem arrisca

diferenciar a espécie humana dos demais seres vivos, e mais que a crise cultural ou

ecológica é uma crise da animalidade do homem.

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Eduard Hall, um teórico que nos ajuda a pensar nesse processo de ajuntamento

social, naquilo que ele chama de proxêmica. A proxêmica se deriva da palavra grega

proxemia que significa o uso que as pessoas fazem do corpo nos espaços que ocupam.

Com Lorenz aprendemos sobre a territorialidade uma das coisas mais importantes da

etologia; sobre o uso do espaço, nos guiaremos pelos estudos de Eduard Hall com a sua

proxêmica.

A proxemia remete, essencialmente, ao surgimento de uma sucessão de nós, que

constituem a própria substancia de toda a sociedade. A constituição dos micro-grupos,

das tribos que pontuam a espacialidade se faz a partir do sentimento de pertença, em

função de uma ética específica e no quadro de uma rede de comunicação.

Para Montagu, com a noção de tatilidade, de pele de contato, não existe

comportamento sem pele, sem toque e outros que ajuda a pensar como uma educação do

corpo como um comportamento corporal e como podemos servir desses corpos, temos

prestado muito pouca atenção no corpo que temos. Sobretudo falamos sobre o meio

ambiente especial quando o primeiro ambiente que a gente tem notícia é o nosso corpo.

Segundo Roy Porter in Peter Burke (p. 292), em seus escritos sobre a história do

corpo ajuda a entender que até pouco tempo, o corpo que tem sido, em geral

negligenciado, não sendo difícil se perceber o porquê. Em seus caminhos diferentes e

por razões diferentes, elevaram a mente ou a alma e denegriram o corpo, assim nos faz

lembrar aquilo que David Le Breton (2006, p. 24), “o corpo não existe, o que existe são

homens e mulheres”.

Como disse anteriormente mais que nos faz entender que a estética do corpo esta

inserida em nosso dia-a-dia impregnada em nosso corpo que é a via régia de nossa

existência, me faz pensar (Burke in et al Sterne 1994, p. 292) naquilo que nos diz sobre

“os homens são seus corpos”, tentando demolir as velhas hierarquias culturais que

privilegiam a mente sobre o corpo, assim como a história das idéias, e no rumo da

exploração da cultura material, da qual faz parte a história do corpo.

A antropologia cultural, tanto na teoria quanto na prática, disponibilizou aos

historiadores as linguagens para a discussão dos significados simbólicos do corpo, os

historiadores a tratarem o corpo como a encruzilhada entre o ego e a sociedade, durante

a última geração nos impôs as rígidas estatísticas vitais de “nascimento, cópula e

morte”.

Muitos estudiosos advertiram de que seria simplista demais assumir que o corpo

humano existiu eternamente como um objeto natural não problemático com necessidade

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e desejos universais, afetado de maneiras variadas pela cultura e pela sociedade,

reprimido em uma época e liberado em outra. Proporcionar ao velho dualismo

mente/corpo uma nova vida, tentando-se estudar a história (biológica) do corpo

independente das considerações (culturais) da experiência e da expressão na linguagem

e na ideologia, pode constituir uma falácia. Para o autor devemos enxergar o corpo

como ele tem sido vivenciado e expresso no interior de sistemas culturais e particulares,

tanto privado quanto públicos.

Se os corpos estão presentes para nós, apenas por meio da percepção que temos

deles, então a história dos corpos devendo assim incorporar a historia de suas

percepções, pode nos ajudar a entender como os corpos se corporificam, não só a partir

da expressão dos mecanismos de perduração (comer, sentar, dormir, copular) mas,

também pela complexificação no uso que fazem no comportamento proxêmico, quando

o corpo de um parece sempre “desconfiar” do corpo do outro. Vivendo e convivendo

esses sujeitos, anexam senhas para se proteger e para se comunicar uns com os outros.

O autor nos ajuda a compreender que a antecipação e a generalização do corpo,

que foi um dia um objeto público, tornou-se privado ― com efeito, o local da vergonha

narcisista ― no interior da cultura burguesa. Na verdade, declara ele, o corpo

“desapareceu” completamente como um instrumento de erotismo, sendo substituído

pelo livro. Temos os exemplos hoje o Kama Sutra conhecido no mundo inteiro e é um

antigo texto indiano sobre o comportamento sexual humano e não só pelo livro e sim

pela mídia, pelas máquinas substituindo assim o homem pela máquina

David Le Breton (2003, p. 185), nos faz pensar numa pergunta retórica, se é que

posso dizer que é simples “sou um homem ou uma máquina?”. Essa é a sua

preocupação que tem desse corpo que está constantemente no rascunho.

Le Breton, chama de “(Re)escrevendo o Corpo”, quando enfatiza o modo como

o corpo deve ser encarado, não como um objeto de “carne e osso”, mas como uma

“construção simbólica”. Esses autor (2003), em sua obra Adeus ao corpo nos diz que

muitos de nós damos um “adeus ao corpo”, essa metáfora nos mostra uma visão de

presente, anuncia um futuro entre o real e o simbólico em que esse “adeus que damos ao

corpo” nos modifica a todo momento tratando como um objeto anexando próteses em

tudo. E para captar como queremos ser lembrados usamos a mídia, os retratos que nos

mostram como ficamos embonecados em nosso melhor aspecto.

A mente e ao corpo tem sido designados atributos e conotações distintos. A

mente é canonicamente superior a matéria. Em uma pesquisa realizada no shopping

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“Três Américas”, na cidade de Cuiabá, como parte de um relato para saber como se da

esse comportamento em espaços de grande circulação. Pude entrevistar uma jovem

adepta da Igreja messiânica japonesa, sobre a percepção corporal, eles incluem a prática

do Johei ela se pronuncia:

“JOHEI – significa (canalização de energia pela palma da mão)

Imposição das mãos na cabeça de um amigo para passar energia

positiva”. (C.A.P/F – 26 anos).

É essa canalização de energia que faz com que o indivíduo tenha contato com

os “cosmos com um ser superior” como nos disse Mont‟Alverne Agosto de 2010, em

uma palestra na UFF, que esse corpo que nos faz viver aos modos de Morin é que nos

faz “pensar, sentir e agir”.

Ontologicamente, por isso, a mente, o desejo, a consciência ou o ego tem sido

indicados como os guardiães e governantes do corpo, e o corpo deve ser seu criado.

Para Roy Porter (1994, p. 303) em aspectos mais importantes, esta subordinação

hierárquica do corpo à mente, sistematicamente degrada o corpo; seus apetites e desejos

são encarados como cegos, obstinados, anárquicos ou (no cristianismo) radicalmente

pecaminoso, ou seja, profano, pode ser encarado como a prisão da alma. Por isso o

corpo facilmente ofende, cometendo o mal ou atos criminosos. Devido a sua verdadeira

natureza “imperfeito e bestial” ele pode ser francamente desculpado pela sua “fraqueza

da carne”. Para ele as relações mente/corpo não são “inatas”, mas dependentes da

cultura. Entre o corpo e a mente, o corpo e a alma, a classe, as circunstâncias e a cultura,

e as sociedades com freqüência possuem uma pluralidade de significados.

Porter (1983, p. 310), a citar Norbert Elias, em seu estudo sobre o processo

civilizador, destaca os aspectos de controle do corpo ― corpos limpos, hábitos limpos,

conversa limpa, mentes limpas... Não deixando assim o corpo agir somente com seu

inconsciente mais ter o controle deixando o ego ser responsável por suas atitudes

desenvolvidas. Ainda hoje esse controle é ocupação privilegiada das instituições sociais.

Da família à escola vai se “lavando” os corpos das crianças, limpando da linguagem o

palavrão; tirando da natureza do corpo os contatos com as secreções, (muco nasal,

flatulências, arrotos, menstruação...); exorcizando da alma qualquer ligação com os

desejos corporais, porque seriam profanos.

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1.3 O corpo no espectro tribal dos tempos atuais e a noção de costume

Com Maffesoli ficamos mais à vontade para falar da pós-modernidade que adota

o aspecto emocional, e resgata uma sensibilidade entre as novas gerações. O autor

propõe um novo paradigma que venha substituir o paradigma do individualismo na

compreensão da sociedade contemporânea, pois, está “baseado na necessidade de

solidariedade e de proteção que caracterizam o conjunto social”. (2006, p. 37)

A visão de corpo pela metáfora “tribo”, para Maffesoli, (id., p. 37) nos permite

dar conta do processo de desindividualização e do papel de cada pessoa, que aqui

reconhece a idéia da “persona”, da máscara que pode ser mutável e que integra,

sobretudo, numa variedade de cenas, de situações que só valem porque são

representadas dentro de uma tribo.

Se para Bauman existe essa “fluidez” desse tempo atual que faz com que essas

novas tribos se juntam, se mesclam e se desfazem rapidamente, olhar os alunos de

Pedagogia e de Educação Física, foi-me possível notá-los quando se juntam para

estudar, para festas e para matar o tempo da vida social, formando assim seus grupos

dentro e fora da sala de aula, como suas famosas “panelinhas” (termo referido na

entrevista com os sujeitos).

Maffesoli chama essa multiplicidade de “paradigma estético”, no sentido de

vivenciar ou de sentir em comum. Só se existe na relação com o outro. E assim nos fala

“que não se trata só da história que construo, associado a outros indivíduos racionais,

mas de um mito do qual participo”. Esses mitos podem ser os heróis, santos, figuras

emblemáticas, ideal-tipos, mais são apenas “formas” vazias, que permitem a qualquer

um reconhecer-se com os outros. Assim as figuras míticas, os tipos sociais permitem

uma “estética” comum e que servem de receptáculo à expressão do nós. A coisa mais

comum para esses sujeitos é vê-los falar sobre resultados de jogos de futebol a partir dos

ícones de cada time, do moçinho ou do vilão de sua novela preferida porque tem no

núcleo da conversa a presença emblemática de seu galã predileto, aquele que está na

moda.

Conforme o princípio de individuação, de separação, estes, pelo contrário, são

dominados pela indiferenciação, pelo perder-se em um sujeito coletivo, o que ele chama

de (2006, p. 38), “neotribalismo” e, para o autor a sociedade é constituída por diversos

“tribalismos”, que são eles: esportivos, hedonistas, religiosos, musicais, tecnológicos,

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sendo uma “comunidade emocional” ou “nebulosa afetiva” (p. 39) que vai exprimir-se

numa sucessão de ambiências, de sentimentos, de emoções típicas da sociedade

moderna, consoante o éthos dessa comunidade. (Segundo o dicionário Houaiss: éthos

significa um conjunto dos costumes e hábitos fundamentais, no âmbito do

comportamento (instituições, afazeres...) e da cultura (valores, idéias ou crenças),

característicos de uma determinada coletividade, época ou região, de foro comunitário.

O tribalismo refere-se, a uma vontade de “estar-junto”, onde o que importa é o

compartilhamento de emoções em comum. Essa sensibilidade coletiva por um lado, está

ligada ao espaço próximo, por outro, transcende o próprio grupo e o situa numa

“linhagem” que se pode compreender, seja stricto sensu, seja em uma perspectiva

imaginária. Nas palavras do autor, é possível ver isso nesses espaços acadêmicos, como

os alunos tanto de um curso como de outro produzem nessa proximidade corporal uma

ambiência própria do grupo, nas palavras de Maffesoli da “tribo”.

A comunidade é uma abertura para o processo de integração cujo, o fundamento

do grupo é um sentimento de pertencimento experimentado pelas tribos, cuja motivação

baseia-se em qualquer espécie, emocional ou afetiva. Essa “cultura do sentimento”

conforme o autor tem como única preocupação o presente vivido coletivamente. Os

alunos formam essa coletividade esse conjunto social, nas atividades em sala, no

refeitório, nos pontos de ônibus, nos estágios e ao voltar para suas casas.

O conjunto social que fala Maffesoli possui um forte componente de sentimentos

vividos em comum. Por exemplo: “o rito funeral, perante a morte de uma pessoa, são

„obrigações morais‟ as manifestações de tristeza individual, os gritos, berros, os choros,

os cantos são necessários e somente o grupo poderá entendê-los”. Tanto a Pedagogia

quanto a Educação Física vivem e convivem esse sentimento em comum.

A estética se exprime em seus diferentes grupos, nos ritos de comer, beber,

descansar, chorar, brigar, lavorar... A ética é a insistência da estética naquilo que ela se

repete na forma de falar, vestir, se produzir e na maneira de pensar, de cada sujeito

representado no/pelo grupo. Os sujeitos de tanto conviverem juntos acabam por unificar

o discurso sobre o que pensam sobre o que podem acreditar a comunidade emocional da

sala, da panelinha. É habitual colegas defenderem colegas porque são da mesma tribo

(riquinhos, nerds, pobrinhos, jogadores de truco...)

Se a comunidade emocional é instável, aberta, o que pode torná-la, sob muitos

aspectos, com relação à moral estabelecida, Maffesoli explica com seus aspectos

extremos: a máfia, as associações de ladrões. Mas, com freqüência, esquecemos que no

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meio dos negócios impera uma conformidade semelhante, da mesma forma no meio

intelectual, e poderíamos multiplicar os exemplos à vontade. Para ele a persistência de

um éthos de grupo é, muitas vezes, considerada um arcaísmo em vias de extinção.

Na perspectiva “formista” (p. 46), a comunidade vai se caracterizar menos por

um projeto (pro-jectum) voltado para o futuro do que pela efetuação in actu da pulsão

de estar-junto. Vemos nas expressões do cotidiano, o calor humano, cerrar fileiras, fazer

uma corrente para frente, podemos pensar que talvez esteja aí o fundamento mais

simples da ética comunitária. A proximidade (promiscuidade), porque existe a partilha e

a ética de um mesmo território seja “real” ou “simbólico” (p. 46), que vemos nascer à

idéia comunitária e a ética que é o seu corolário.

Para retomar a oposição clássica, pode-se dizer que a sociedade está voltada para

a história futura. A comunidade esgota sua energia na própria criação, ou “recreação”

(p. 47), permitindo estabelecer um laço entre a ética comunitária e a solidariedade. Um

dos aspectos marcantes dessa ligação é o desenvolvimento do ritual que nós vemos em

nossas comunidades, as festas, os gestos rotineiros, ou cotidianos, o ritual lembra à

comunidade que ela é um “corpo”, A função é de reafirmar o sentimento que um dado

grupo tem de si mesmo.

Quando o autor se refere ao ritual ratifica que este serve de anamnese à

solidariedade que “implica a mobilização da comunidade”. O ritual, na sua

repetitividade, é o indício mais seguro desse esgotamento e assegura a perdurância do

grupo na atenção que se volta àquilo que une. Há uma união explícita nos rituais de

chegada, nos dias de avaliação, nos enfretamentos das tarefas das aulas de estágios,

porque não para a festa. Esses rituais se repetem, para dizer com o autor, aquilo que a

tribo usa para “enfrentar em conjunto, de maneira quase animal”, a renitência das duras

tarefas. Viver a vida cotidiana poderá ser o resultado de um sentimento coletivo que

ocupa um lugar privilegiado na vida social. É essa sensibilidade comum que favorece

um éthos centrado na proximidade.

São os valores tribais que, em certos momentos caracterizam uma época. Esses

valores podem cristalizar por atacado o que em seguida vai difractar no conjunto do

corpo social. O momento tribal pode ser comparado ao período de gestação: alguma

coisa é aperfeiçoada, provada, experimentada, antes de decolar para uma expansão

maior. Segundo a expressão de W. Benjamin a vida cotidiana poderia ser “o concreto

mais extremo” (p. 52) que permite compreender que o vivido e a experiência partilhados

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podem ser o fogo depurado do processo alquímico onde nascem e crescem os valores

sociais.

Segundo o autor a ética é o cimento que fará com que diversos elementos de um

conjunto formem um todo, assim temos as emoções, e aos sentimentos coletivos e a

partir daí se ajustem ao meio natural, como fazem os sujeitos pesquisados. Algumas

manifestações dessa ética corriqueira, por que, como expressão da sensibilidade

coletiva, ela nos introduz, na vida dessas tribos que na massa constituem a sociedade

contemporânea.

O Costume remete ao banal, à vida de todos os dias, ao que segundo G. Simmel

é “uma das formas mais típicas da vida social” (p. 53). Trata-se quase de um código

genético que limita e delimita a maneira de estar com os outros muito mais do que

poderia fazê-lo a situação econômica ou política. É nesse sentido que, depois da estética

(o sentir em comum) e da ética (o laço coletivo) o costume é, seguramente uma boa

maneira de caracterizar a vida cotidiana dos grupos contemporâneos, a propósito de

“nossos” sujeitos aqui estudados.

A ética que cimenta a vida social dos grupos pode ser vista pelos sujeitos. Assim

que chegam nas sala eles se cumprimentam com aperto de mão, abraços e e outros

toques de sua proxemia de eleição. Além dos ritos de chegada esses contatos físicos são

feitos também nas aulas práticas quando precisam movimentar seus corpos, se esticarem

e retorcerem. Necessitando da ajuda do outro habitualmente vão encurtando a distancia

entre os corpos.

A palavra costume cabe aqui, com sua acepção mais ampla, e próxima da sua

etimologia (consuetudo): o conjunto dos usos comuns que permite a um conjunto social

reconhecer-se como aquilo que é. Trata-se de um laço misterioso, que não é formalizado

e verbalizado, como tal, senão acessória e raramente (os tratados de etiqueta ou de boas

maneiras por exemplo).

A duplicidade, o ardil, o querer-viver se exprimem por meio de uma

multiplicidade de rituais, de situações, de gestuais, de experiências, que delimitam um

espaço de liberdade. A cotidianidade se fundamenta em uma série de liberdades

intersticiais e relativas. a hora do cafezinho , dos telefonemas, da ida à cantina ou para

até mesmo um jogo subito de cartas ― o truco na educação física ―, marcam ou

ritualizam o que aqui chamamos de costume. Os costumes têm essa função: é para a

vida quotidana aquilo que o ritual é para a vida religiosa stricto sensu.

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O gosto e a sensibilidade, fazendo parte do universo de subjetividades que

constitui esta “conquista do presente”, podem ser entendidos como elementos

constitutivos deste "cimento" que aglutina os indivíduos em grupos, especialmente na

cidade.

A sensibilidade não mais se inscreve em uma racionalidade orientada e

teleológica, mais é vivida no presente, e se inscreve em um espaço dado hic et nunc

(aqui agora) dessa maneira “faz cultura” (p. 58) no cotidiano.

É a compreensão do costume como fato cultural que pode permitir uma

apreciação da vitalidade das tribos metropolitanas. É dessas tribos que surge essa aura

“a cultura informal” na qual volens nolens (p. 58) estamos imersos e que remete a

proxemia. Por exemplo as redes de amizades, a religação é vivida, sem qualquer

projeção, seja qual for. As redes de amizades são pontuais, com auxilio da tecnologia

formam os reagrupamentos.

Alguns encadeamentos proxêmicos não deixa de apresentar efeitos secundários,

como por exemplo a ajuda mútua é o resultado de uma antiga sabedoria, uma sabedoria

popular, na qual é bom acreditar, e que sabe, que em todos os sentidos do termo, a vida

é dura para os pobres... O dinheiro é dificil de ganhar, entre próximos, se devem ajudar

e dar assistência. Há uma ligação ínitima entre a proxemia e a solidariedade que

privilegia o corpo coletivo.

O costume, como expressão da sensibilidade coletiva, permite, o stricto sensu,

um ex-tase no cotidiano, beber junto, jogar conversa fora, falar dos assuntos banais que

pontuam a vida de todo dia provocam o “sair de si” (p. 61) e, por interese médio disso

criam a aura específica que serve de cimento para o tribalismo. O dionisíaco remete à

promiscuidade sexual e a outras esfervescências afetuais ou festivas, mas também

permite compreender a elaboração das opiniões comuns, das crenças coletivas ou da

doxa comum. Na fala a seguir, podemos ver esse comportamento festivo quando

perguntado ao entrevistado, sobre o que eles conversam na sala, nos intervalos e fora da

universidade:

“Ah! Geralmente a gente fala de um aluno, ou outro assim que a gente

fez alguma coisa engraçada na sala, e a gente vai pagá (tirar sarro do

colega) dele no outro dia assim, a gente comenta sobre isso entendeu?

E fora da universidade é mais a vida cotidiana é mais o que vai ser

feito, vamos supor – hoje vai ser final de semana assim, e prolongado,

aí a gente vai fazer uma “festinha”, falamos como vai ser a cota que

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vai dá de festa e progride com relação a isso”. (V.I.L./ M – EDF – 22

anos)

É nesse momento festivo que os alunos se encontram, se juntam para formar

suas “tribos” de afinidades, ou numa linguagem atual, suas “redes” de interesses.

Ao desenvolvimento teconológico, o crescimento das tribos urbanas favoreça

uma “palabre informatizada” que retome os rituais da antiga Ágora. É preciso obsevar a

multiplicação das televisões ou das rádios locais que não favorece sensibilidade, com

isso não diminui a importância concedida ao costume. Esse costume produz

sociabilidade para uma comunidade dada. Os bairros viverão, talvez muito pouco

distantes dos que animavam as tribos ou os clãs que constituíam sociedades tradicionais.

Segundo Maffesoli (p.65), após o período do “desencantamento do mundo”,

agora há um verdadeiro reencantamento do mundo cuja lógica é tentar traçar. Com as

massas que funcionam em tribos que se agregam em massas tendo como cimento

principal uma emoção ou uma senisbilidade vivida em comum.

É nessa perspectiva esquemática que convém apreciar a apreensão do vitalismo:

o fato de que nele a vida se faz muito mais presente que o nada. Ao invés da separação,

da alienação e da atitude crítica que a exprime, importa agora analisar a afirmação da

vida, o querer viver societal, que mesmo de maneira relatividsta serve de suporte à vida

cotidiana vista de perto.

Sabemos que uma e outra, entretanto, apóiam-se no primado da experiência, em

um vitalismo profundo e em uma visão mais ou menos explícita da organicidade dos

diversos elementos do cosmos. “Para conseguir as múltiplas explosões de vitalismo que

caracterizam todos esses grupos ou tribos, em imediato, dos múltiplos aspectos de sua

existência coletiva”. (p. 71)

A religião, aqui, é aquilo que liga. Porque existe o ombro a ombro, a

proximidade física. E ao chamar de Religião, aquilo que nos une a uma comunidade,

que é da ordem da fé, de algo que é matriz comum, que serve de suporte para o estar

junto. O gesto, na biblioteca com os livros, na quadra com a bola, na cantina para a

parada do café, no pátio com o jogar-conversa-fora faz essa religação de uma vida em

comum, dos sujeitos pesquisados.

Parece ser a multiplicação dos pequenos grupos de redes existenciais. Espécie de

tribalismo que se baseia, ao mesmo tempo, no espírito de religação, “re-ligare” e no

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localismo “proxemia, natureza”. Assim como “as meninas da Pedagogia” que estão

sempre juntas, algumas têm uma ligação fora da universidade.

É essa proximidade que dá todo o seu sentido ao que se chama o “divino social”

(p. 84), este não tem nada a ver com uma qualquer dogmática ou inscrição institucional.

Assim como os deuses dos Lares, causa e efeito do ajuntamento familiar, o divino de

que falamos permite recriar nas inumanas e frias metrópoles os cenáculos onde nos

mantemos aquecidos, os espaços da socialidade. As grandes cidades transformam-se em

campos onde os bairros, os guetos, as paróquias, os territórios e as diversas tribos que os

habitam substituíram as aldeias, lugarejos, comunas e cantões de antigamente, assim

como fazem os sujeitos.

Segundo o autor, “manter-se aquecido” (idem p. 85), é uma maneira de

aclimatar-se ou de domesticar um meio ambiente que, sem isto, seria ameaçador.

Pesquisas empíricas no meio urbano destacam muito bem esses fenômenos.

A desumanização real da vida urbana produz agrupamentos específicos com a

finalidade de compartilhar a paixão e os sentimentos. Não podemos esquecer que os

valores dionisíacos referentes ao sexo e aos sentimentos religiosos, que nos parecem tão

atuais, são ambos as modulações da paixão. O divino social tem a função de adaptação,

de conservação e encontramos nas explosões de revolta. Na verdade, a religião

compreendida dessa forma é a matriz de toda vida social. Permite explicar a perdurância

das sociedades através das histórias humanas.

A religião popular é realmente um conjunto simbólico que permite e fortalece a

manutenção do laço social. Uma igreja não se mantém sem fiéis, assim como “as

escolas não se mantém sem alunos” (grifo meu). O éthos comunitário designado pelo

primeiro conjunto de expressões remete a uma subjetividade comum, a uma paixão

partilhada, enquanto tudo o que diz respeito à sociedade é essencialmente racional. Uma

comunidade pode se orientar para uma certa racionalidade ou finalidade, um

grupamento familiar é como uma comunidade e, por outro lado, explorado, sentido

como uma “associação” (p. 110), pelos seus membros. Além da religião e da

comunidade, existe uma outra noção relevante, que é a do povo.

Poderia nos explicar a perdurância das sociedades que sustentam através dos

séculos. Querer viver o coletivo que requer uma atenção mais aguda por parte do

observador social. A identidade do ponto de vista sociológico é apenas um estado de

coisas relativo e flutuante. Fica entendido que a “identidade” (p. 117) diz respeito tanto

ao indivíduo quanto ao agrupamento no qual este se situa: é na medida em que existe

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uma identidade individual que vamos encontrar uma identidade nacional. A identidade

em suas diversas modulações consiste, antes de tudo, na aceitação de ser alguma coisa

determinada, ser isto ou aquilo; processo que em geral, sobrevém tardiamente no devir

humano ou social.

A multiplicidade das experiências e dos valores, tudo aquilo que caracteriza a

juventude dos homens e das sociedades. Cria-se uma alma coletiva, na qual as atitudes,

as identidades e as individualidades se apagam. Cada um participa desse “nós global”

(p. 118). Ao contrário do político que, paradoxalmente, se apóia no “eu” e no distante, a

massa é feita de “nós” e de proximidade. A comunidade “esfervecente” pode ser, ao

mesmo tempo, evanescência individual e reapropriação da pessoa.

O indivíduo é livre, ele contrata e se inscreve em relações igualitárias. Podemos

dizer que o indivíduo tem uma função, e a pessoa, um papel, as formas de agregação

podem privilegiar seja o político, seja o termo usado por Maffesoli que ele chama de

socialidade. A analogia que poderíamos fazer com as pessoas, mas também com os

móveis, as roupas, os apartamentos, como esse princípio de similitude, que está na base

do “nós”, do povo, da massa, é um intermediário entre o mundo natural e o mundo

social. Não há mais separação entre o cosmos e o social, nem tampouco no interior do

todo social. Estamos na presença do que se pode chamar aculturalização da natureza, e a

naturalização da cultura.

Nunca estamos sozinhos, pois sentimos sempre em nós uma porção de pessoas,

através das memórias ou as lembranças coletivas, sejam elas públicas, privadas, ou

familiares, que fazem de um bairro, de uma cidade, lugares onde vidas se sedimentam,

transformando-os em lugares habitáveis, permite estabelecer um feedback entre o grupo

e a pessoa. E para além da monumentalidade urbana ou rural (palácio, igreja,

monumentos diversos), esse feedback se exprime em todas as cerimônias de

comemoração. Segundo Maffesoli (p. 121), “só existimos como corpo”.

O autor nos diz o que “é certo que a base de tudo isso é a situação de face a

face”, ou pelo olhar, existe sempre algo de sensível na relação de sintonia. Aquilo que

Montagu (1989) nos chama a atenção no título do livro, “Tocar, o significado humano

da pele”. Ainda insiste o autor falar da “materialidade” do estar-junto; o vaivém da

massa-tribo é a sua ilustração (p. 131). O vaivém massas-tribo, trata-se antes de ir-e-vir

de um grupo a outro do que da agregação a um bando, a uma família, a uma

comunidade. Ao contrário da estabilidade induzida pelo tribalismo clássico, o

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neotribalismo é caracterizado pela fluidez, pelos ajuntamentos pontuais e pela dispersão.

Um exemplo é o espetáculo da rua nas megalópoles modernas.

A estética é um meio de experimentar, de sentir em comum e é, também, um

meio de reconhecer-se. O culto do corpo, os jogos da aparência só valem porque se

inscrevem em uma cena ampla onde cada um é ao mesmo tempo ator e espectador. O

estar junto permite tocar-se, todos os prazeres populares são prazeres de multidão ou de

grupo.

“Existem momentos abstratos, teóricos, puramente racionais, e outros em

que a cultura, no seu sentido mais amplo, é feita de participação e de

„tactilidade‟. O retorno da imagem e do sensível, em nossas sociedades,

remete certamente a uma lógica do tocar”. (MAFFESOLI, 2006, p. 134)

Os ritos de massas e ritos tribais são perceptíveis nos diversos ajuntamentos

esportivos, que pelo viés do processo mediático, assumem a importância que todos

conhecemos e encontramos no consumo das grandes lojas de departamentos, dos

hipermercados, dos centros comerciais que é certo, vendem produtos, mas antes de tudo

destilam simbolismo, quer dizer, a impressão de pertencer a uma espécie comum. São

essas séries de reconhecimentos, de pessoas e de lugares que fazem desse caldo de

signos de cultura um conjunto bem ordenado.

Essa territorialização acontece em diferentes partes das praias brasileiras, são em

lugares distintos de encontro, conforme o grupo a que se pertence. Existe um constante

movimento de vaivém entre as tribos e a massa, que se inscreve em um conjunto que

tem medo do vazio. Isso acontece nas ruas, nas praias, na musica, nas lojas, em

inúmeras ruas de pedestres, é uma ambiência que talvez lembre o ruído permanente, a

agitação desordenada das cidades mediterrâneas e orientais. O autor tenta nos mostrar

que eles se apóiam em uma lógica tribal, que não pode existir-se não inserida na massa,

através do encadeamento da rede. Todas essas coisas se contrapõem à seriedade, ao

individualismo, à separação. Será importante ficar atento as atitudes grupais que têm

tendência a se desenvolver em nossas sociedades.

O termo laço que vimos anteriormente, se designa ao laço familiar, de amizade e

deve ser compreendido em sua acepção mais estrita, isto é, a da necessidade, aquilo que

a associação mutualista medieval enumerava sob a rubrica “obrigação” (p. 227). De

fato existe um reconhecimento desses grupos uns pelos outros. As diversas tribos

urbanas fazem cidades. Porque são diferentes e às vezes até mesmo opostas. A vida

social é como uma cena onde, por um momento, se operam cristalizações.

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No quadro de uma sociedade complexa, cada um vive uma série de experiências

que não tem sentido se não dentro do contexto global. Participando de uma

multiplicidade de tribos, as quais se situam umas com relação às outras, cada pessoa

poderá viver sua pluralidade intríseca; suas diferentes mascaras se ordenando de

maneira mais ou menos conflitual, e ajustando-se com as outras que a circundam.

Obriga a repensar a misteriosa relação que une o “lugar” e o “nós”.

A “cultura corporal de movimento”, termo muito usado na área da Educação

Física, caracteriza-se, entre outras coisas, pela diversidade de práticas, manifestações e

modalidades. Muitas informações da mídia que chegam ao jovem e ao adulto de forma

fragmentada são manipuladas por interesses econômicos e valores ideológicos,

buscando seduzi-los. A Educação Física não pode fugir nem se alienar a essa realidade,

pois é impossível negar a força que a indústria do lazer exerce nos comportamentos e

atitudes.

Para tanto, a formulação desse estudo se baseia fundamentalmente na

necessidade de aprofundar os conhecimentos relacionados às tendências que norteiam a

prática pedagógica da Educação Física, especialmente, o comportamento humano,

ligado e aquilo que se prega sobre o didatismo nos cursos de Pedagogia, aqui os dois

núcleos espaciais que serviram de estudo.

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METODOLOGIA

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Da metodologia: o caminho percorrido

2. Método:

Esta seção do trabalho é onde descrevo os passos da levada a campo com as

técnicas, as observações e as interpretações dos dados coletados. A pesquisa de caráter

qualitativo, nos moldes de uma etnografia, conforme assevera Cleomar Gomes (2001, p.

46) no Capitulo Metodológico de sua tese de doutoramento “é um método de imersão

no espaço de vivência do grupo estudado, onde o pesquisador participa pelo menos

superficialmente do contexto local, podendo observar as interações que se dão nesse

contexto”. Esse método de investigação prioriza o levantamento de leituras sobre a

temática corporeidade e, sobre o comportamento etológico, em particular, àquelas que

se direcionam à análise e interpretação dos dois grupos de sujeitos, a saber, alunos de

Pedagogia e de Educação Física da Universidade Federal de Mato Grosso.

Foi de muito proveito um olhar sobre suas percepções corporais no labor

acadêmico, no cotidiano de seus cursos, sobremaneira, aquele que não tirava de foco o

comportamento etológico desses sujeitos no ato de ser um “humano” social.

Como instrumentos para a coleta dessas informações, me equipei com máquina

fotográfica, com um roteiro de entrevista, com um gravador e de filmagens, embora

estas foram imprecisas na hora de sua utilização. Utilizei também como heurísticas as

observações sistemáticas e assistemáticas que muito me foram úteis no percurso da

investigação.

2.1 Lócus

A pesquisa foi realizada na Universidade Federal de Mato Grosso, situada em

Cuiabá, no bairro Boa Esperança com os cursos de Educação Física e de Pedagogia. O

propósito foi o de observar como esses grupos de alunos se comportam, agregando a

esse comportamento alguns aspectos que compõem os elementos complexos dessa

etologia. Como se enxergam no espaço que ocupam; como se vêem enquanto corpo

nesse lócus escolar; o que esperam com a formação no curso que escolheram. Para isso

foi importante vê-los nos simples movimentos de se sentarem, vestir, falar, o que

comem na hora do intervalo, no que dão importância, como e o quê aprendem, sobre o

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que eles conversam. Assim, as categorias se juntam pelo aquilo que vi, escutei e

fotografei e, que, portanto, apresentarão como resultados nas análises, no decorrer do

texto. A seguir essas imagens dão uma visão do lócus pesquisado:

Fig. 6. Instituto de Educação (IE – UFMT)

Fig. 7. Instituto de Educação (IE – UFMT)

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Fig. 8. Cantina Instituto de Educação (IE– UFMT)

Fig. 9. Faculdade de Educação Física (EDF – UFMT)

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Fig. 10. Quadra Poliesportiva (EDF– UFMT)

Fig. 11. Pista de esporte (EDF – UFMT)

Supus que observar as condições em que a instituição se encontra em relação às

salas e suas instalações: se são salubres, se têm ar condicionado e cadeiras confortáveis,

e outras disposições, tanto para os alunos como para seus professores, na Pedagogia

como na Educação Física, pudessem dizer de alguma interferência no comportamento

desses sujeitos. Em 2009 a sala do segundo semestre de Educação Física estava com

problema no teto, e isso incomodava alunos e professores com problemas de

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infiltrações, com risco de acidente na instalação elétrica, porém em 2010 o problema foi

resolvido. As salas da pedagogia não tinham uma boa iluminação, em 2010, o problema

também foi resolvido.

O que me chama atenção, pode não parecer, mas os problemas ligados à

instalação de uma sala de aula, ou da reforma na piscina que prejudica o aprendizado da

natação, ou a falta de um equipamento de retroprojetagem de slides, assim como em

toda a universidade pública brasileira, como veremos nas imagens, pode fazer eco no

comportamento dos alunos que lá estão.

Os corredores, pista, quadra, refeitório e banheiros, apresentam condições de

higiene, todos os corredores têm lixeiras, a pista de caminhada e de exercícios, o

refeitório... todos estão sempre limpos, as senhoras que cuidam da universidade deixam

o ambiente agradável. Os próprios alunos cuidam bem da quadra poliesportiva, não

usando salto que possa estragar o piso, que foi reformado há pouco tempo, guardam os

materiais utilizados nas aulas práticas, não riscam as carteiras e paredes, conservando o

ambiente sempre limpo e agradável, como veremos na imagem a seguir:

Fig. 12. Os alunos guardam os materiais utilizados nas aulas práticas e conservam no ambiente

limpo (EDF – UFMT)

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2.2 Dos sujeitos

Ao pesquisar com o olhar etnográfico, colhi o máximo de informação a respeito

do comportamento em seu cotidiano durante o período em que os alunos de Pedagogia e

de Educação Física se encontravam na universidade (UFMT), desde sua chegada até o

encerramento do mesmo.

Os caminhos percorridos para a coleta de dados foram semelhantes para os dois

cursos, o que pode ser considerado como um procedimento da pesquisa, assim, no

primeiro semestre foram coletadas as observações, sistemáticas e assistemáticas relativo

ao ambiente e ao comportamento dos indivíduos pesquisados. No segundo semestre

acompanhei as aulas externas dos alunos de Educação Física que eram realizadas nas

quadras poliesportivas e na pista de corrida da instituição. No curso de Pedagogia, além

das aulas em sala, pude acompanhar, também, as alunas em seu estágio “observacional”

na escola municipal de Cuiabá, “Antônio Ferreira Valentim” situada no bairro

“Barbado”.

O primeiro contato com o lócus foi, preferencialmente, mediado pelos

professores que disponibilizaram a minha entrada em suas aulas, após apresentar uma

solicitação de entrada no campo que segue o documento em anexo. Não tive sucesso

com todos os professores, que não permitiram a minha entrada em algumas aulas.

Algumas observações puderam ser feitas no primeiro semestre, que se juntaram às

observações + as entrevistas que foram realizadas no segundo semestre.

Os alunos de Educação Física se mostraram com expressiva boa vontade, a

ponto de a maioria querer participar da pesquisa, me concedendo entrevistas, mas como

seria inviável pelo volume de dados, elegi dois alunos de cada turma, que no curso é

divido por semestres, como veremos nas análises sobre a “conversa paralela”, que

segundo esses sujeitos: “incomoda o andamento da aula” (K.A.T./F – EDF – 20 anos).

Não era vantagem para a pesquisa a interferência dos professores, para dizer o que

seria observado, portanto, foram dados que não foram relevantes para o estudo, o que

era importante nesse momento eram as falas dos alunos.

A espera fora da sala de aula foi de grande valia para que eu pudesse coletar mais

dados para a pesquisa, nos corredores, nas cantinas, na sala dos professores, na sala de

informática, no ponto de ônibus em outros ambientes de circulação desses sujeitos. Um

trabalho do tipo etnográfico sempre tem a chance, pelo que aprendi, de sair do lócus

privilegiado da observação e ainda assim encontrar informações importantes que

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dissesse algo a respeito do objeto em pauta, no caso, o comportamento etológico desses

alunos.

Tudo o que coletei nos dois cursos, (Pedagogia e Educação Física) foi registrado

em gravador, em filmagens, e em um caderno de campo. As alunas da Pedagogia foram

arredias ao fazer suas imagens, sempre se esquivando da máquina de fotografia, Tive

muita dificuldade para a escolha da imagem que captasse aquele ângulo desejável e que

pudesse trazer, no detalhe, no contorno da foto, a mensagem, isto é, a informação

etnográfica para se juntar à minha observação e ao registro das falas desses sujeitos,

aquilo que alguns teóricos consideram como dados da “triangulação”.

Para enxergar o comportamento desses alunos supomos que ao trazer num

quadro o gabarito de gestos, atitudes, e os modos de ser desses sujeitos, chamamos de

prescrição e proscrição, para melhor compreendê-los em seu cotidiano da sala de aula,

dos espaços para as práticas esportivas e dos ambientes ocupados por sua proxemia,

aquilo que é permitido, aceito como norma, como ordinário ― sagrado, e aquilo que

deve ser admoestado, interdito, esconjurado e proibido ― profano.

COMPORTAMENTOS PRESCRITOS E PROSCRITOS

Prescritos Proscritos

Pedagogia (Sala de aula/Fora da sala)

Silêncio, atenção, postura formal, desligar

aparelhos eletrônicos. Respeitar o

professor. Prestar atenção nas aulas.

Conversar, atender ao celular, sentar-se

desleixadamente, usar roupas vulgares,

cochilar, não soltar flatulências. Falar alto,

dormir em sala, comer dentro da sala, tirar

a roupa, agredir fisicamente/verbalmente

o colega, vestir-se de forma inadequada.

Dar faniquitos para chamar atenção.

Ed. Física (Sala de aula /Fora da sala)

Fazer perguntas, argumentar, ficar em

silêncio, sentar de forma adequada, ter um

bom comportamento

Jogar papel no colega, Fumar, fazer piada

com a/o professor, peidar (chulo), xingar ,

bater, gritar, arrastar a carteira, bater a

porta, usar o celular, revistas de fofoca,

namorar/copular, rabiscar a cadeira/parede

Nas entrevistas coletadas, as categorias Proscrito e Prescrito ajudam a enxergar

no espaço dessa instituição o que é sagrado e profano; aquilo que pode e o que não

pode, conforme o comportamento desses sujeitos pode mostrar. Um dado importante é

que toda vez que é perguntado sobre o que é interdito eles, tanto de um grupo como do

o outro, tendem, num primeiro plano se referirem “a ficar nu”. Tirar a roupa em público

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dá a, eles pelo tom da resposta, pela expressão facial com que “encaram” a pergunta,

uma sensação de desconforto corporal. Eis que surge uma preocupação exacerbada

desse “bicho” homem, que em seu processo de civilização, tendo que se cobrir com

vestimenta, voltar a ficar nu (homem é naturalmente nu), traz com a questão um

problema ontológico. Talvez esses meninos tenham algo a dizer sobre esse corpo nu,

como nos mostram as falas a seguir:

“tudo é permitido, só não pode ficar pelado. Ficar pelado é

terrível só de pensar”. (E.L.T./M – EDF – 19 anos)

“desviar a atenção do professor, que tá tentando explicar...

coisas assim (risos), que vêm na cabeça, coisas absurdas como

de repente tirar a roupa (risos) não pode. (V.A.L./M – EDF– 32

anos)

O homem tende a agir de forma similar ao seu grupo seja qual ele for. Para ser

aceito, traz ao indivíduo um bem-estar, no sentido de “vivenciar ou de sentir em

comum” como prefere acentuar Michel Maffesoli (2006, p. 37). E, através dessas

contribuições da prescrição e proscrição, a meu ver, é que consiste na aplicação da

perspectiva etológica do comportamento humano. Com base na teoria de Marcel Mauss

(2008, 416), o comportamento humano não se faz somente por uma consciência

individual, se não também pela “mentalidade coletiva”. Os grupos quando tendem a se

comportar de forma semelhante acabam produzindo “símbolos”, através de sua

corporeidade.

E através desses “símbolos” produzidos que cada grupo tendem a nos mostrar

sua etologia como veremos nas categorias quando é perguntado o que é permitido

(Prescrito), fazer em sala de aula? E o que é interdito (Proscrito)? Eles nos respondem

como veremos a seguir:

“com certeza conversar não é uma delas né? Ficar quieta, prestar

atenção, copiar do quadro, anotar o que o professor fala. Não é

permitido conversar e atrapalhar o bom andamento das aulas”.

(R.I.T./F – EDF – 20 anos).

“pelo professor, a gente tem que ficar quieto e prestar atenção

no que ele está falando, geralmente a gente conversa um

pouquinho, brinca, ri, para distrair, se não cansa, se ficar muito

tempo parado. Prescrito? é atender o celular, comer dentro da

sala, dependendo do professor”. (C.R.I./M – EDF – 22 anos)

A Educação Física e a Pedagogia têm uma etologia semelhante até mesmo nos

atos de proscrição, talvez seja esse modus vivendi revelado pelo comportamento

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individual que “cimenta” as atitudes do grupo ou do “comportamento tribal” como

pontua Maffesoli.

“eu acredito que é tudo o que é referente à aula. Tudo que

atrapalha o andamento da aula, ficar falando enquanto o colega

está apresentando um trabalho, seminário. A conversa atrapalha

o andamento da aula”. (R.E.G/F – PED – 23 anos).

“há, o aluno, é... ele pode expressar sua opinião escutar o que o

outro fala, respeita. Uma coisa assim não pode. mais pelo que

nós do quarto ano, nós adulto em sala de aula, sabemos que a

conversa paralela atrapalha tanto a gente quanto aos colegas”.

(C.E.L/F – PED – 30 anos).

Ao olhar para esses alunos e vê-los nesses micros-espaços, de prescrição e

proscrição, através de uma linguagem corporal, acrescida de informações com as

entrevistas, talvez o que esses corpos tinham num comportamento etológico é muito

mais animal do que cultural, como veremos nas análises dos dados coletados em campo.

As coisas não “naturalizam” por si só, mas é o olhar para nossa cultura que nos obriga a

ver este mundo, a representá-lo com nossa existência na linguagem de nossa etologia.

Ao acompanhar as aulas de Educação Física como aluna “ouvinte” em 2008,

observei os conteúdos trabalhados com a disciplina “Abordagens sócio-antropológicas

da Educação Física”, e assim entender todo o processo antropológico que a Ementa

discutia em sala sobre a “antropologia educacional”.

Esse contato com a disciplina foi o sprint que despertou o interesse em encontrar

ali um veio de pesquisa sobre o corpo ― um objeto que desperta interesse entre os

estudiosos de distintas áreas de conhecimento. Todos têm essa “máquina maravilhosa”

conforme gosta de pontuar Le Breton (2006), mas poucos se preocupam com ela numa

questão geral. O que vemos é uma preocupação do corpo do ponto de vista material, se

é que posso assim, dizer. Atento a esses aspectos, assim, meu olhar se dirigiu aos

estudos do comportamento etológico dos sujeitos dessa pesquisa, através das

observações, entrevistas e imagens coletadas em campo, conforme podem ser checadas

no capítulo de dados.

2.3 Das entrevistas

As entrevistas foram realizadas, se orientando pela distinção entre “gênero”,

“idade”, “classe social”... que permitiram um olhar diferente sobre o objeto em questão

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o “comportamento humano”. A seguir mostrarei como serão chamados os entrevistados

no decorrer da pesquisa, com uma sigla referente aos nome-gênero-curso-idade,

mantendo a privacidade da identidade de cada sujeito, como segue o quadro abaixo:

EDUCAÇÃO FÍSICA – UFMT

Nome Sexo Curso Idade

C.L.E. M EDF 33 anos

E.L.T. M EDF 19 anos

V.A.L. M EDF 32 anos

P.A.O. F EDF 25 anos

K.A.T. F EDF 20 anos

M.I.R. F EDF 22 anos

V.I.L. M EDF 22 anos

C.R.I. M EDF 22 anos

R.I.T. F EDF 20 anos

A.R.I. F EDF 26 anos

J.O.E. M EDF 22 anos

K.A.T. F EDF 19 anos

D.O.U. M EDF 24 anos

D.E.B. F EDF 24 anos

C.A.M. F EDF 21 anos

T.U.L. M EDF 20 anos

J.O.A. M EDF 25 anos

J.E.S. F EDF 21 anos

PEDAGOGIA – UFMT

Nome Sexo Curso Idade

E.V.E. F PED 24 anos

M.A.R. F PED 17 anos

I.V.A. F PED 26 anos

E.L.I. F PED 19 anos

R.E.G. F PED 32 anos

C.A.R. F PED 22 anos

C.E.L. F PED 30 anos

R.E.G. F PED 23 anos

N.A.I. F PED 23 anos

R.O.S. F PED 20 anos

No curso de Pedagogia, que em sua maioria é dominado pelo universo feminino

e com idades diferenciadas, foram colhidos os seguintes dados do gênero (sexo) e a

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idade, respectivamente. Da Pedagogia, dez mulheres responderam às questões. Os

alunos da Educação Física, foram entrevistados, sendo nove rapazes e nove moças. Vou

ousar a usar o termo rapazes e moças, sem a intenção de ofender ninguém, mas como a

faixa etária, em média, abaixo dos 30 anos, posso, sem susto considerá-los como moças

e rapazes. Há uma mistura de grupos (rapazes e moças) e há uma liberdade em

responder as perguntas sem intervenções dos demais.

O roteiro foi criado, com intuito de complementar e desvendar as inquietações,

orientando, assim, os entrevistados que não fugissem da temática. As entrevistas não

tiveram uma duração programada, eram feitas no final de cada aula, ou quando os

alunos se encontravam nos corredores, na troca de uma aula e outra, comportamento

habitual que facilitou encontrar esses sujeitos nos corredores, durante as aulas. O roteiro

de entrevista foi igual para os dois grupos, com respostas semelhantes em alguns

momentos, indicando um comportamento similar, entre eles.

A Pesquisa de campo teve a duração de dois anos, com algumas restrições para a

coleta dos dados, por motivos de reforma dos espaços, como piscina e sala de aula. A

partir da coleta de dados e pelas observações in loco pude observar uma preocupação

exarcebada com a aparência. As mulheres, com os cabelos, rosto, pele. Os homens, com

os gestos, suas marcas corporais (tatuagem) e suas posturas perante o grupo, como nos

mostra as imagens abaixo:

Fig. 13. Tatuagem no braço feminino (PED – UFMT) Fig. 14. Mexendo no cabelo (PED – UFMT)

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Fig. 15. Rococó no cabelo e nos pés (PED – UFMT) Fig. 16. Postura das pernas (PED – UFMT)

Fig. 17. Tatuagem no braço (EDF – UFMT) Fig. 18. Rococó no cabelo (EDF – UFMT)

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Fig. 19. Postura de pernas cruzadas (EDF – UFMT) Fig. 20. Mexendo no cabelo (EDF – UFMT)

O trabalho aqui proposto como uma tentativa de enxergar as diferenças entre

uma cultura e outra, entre um grupo e outro, sem considerar a vida econômica ou as

relações sendo um papel decisivo no comportamento de ser de cada grupo.

É importante também observar, na etologia desses alunos, suas próteses que eles

anexam em seus corpos. Não só aquelas que são para reparar um problema, um desvio,

uma perda, com a degeneração do corpo como os óculos, a dentadura, os coletes para

segurar a coluna, mas há também as próteses estéticas que só podem ser orientadas a

partir de uma demanda estético-simbólica. Na pergunta “Porque que eu me tatuo?” Isso

é um símbolo para o sujeito, talvez não se tenha a necessidade de tatuar para viver, mas

como diz Mauss, o que os homens fazem com seus corpos tem também uma orientação

mítica, simbólica e religiosa. Do Pircing no umbigo e nas orelhas, do hastafare no

cabelo, às unhas postiças, ao esmalte do dedão do pé, essas próteses estéticas têm uma

demanda mítico-simbólica que orienta cada “tribo”.

2.4 Das análises dos dados

Os dados foram tratados a partir das observações e entrevistas coletadas em

campo. Foram colhidos os seguintes dados na prescrição e proscrição: 11 alunos

disseram que o que é permitido: é “prestar atenção”, e 3 disseram que, “há uma

preocupação em ficar nu”. Na Pedagogia somente 2 alunas disseram que a prescrição

está em “prestar atenção” e o foco central do restante das alunas está em dizer que a

“conversa paralela”, atrapalha o andamento da aula. As entrevistas se encontram no

decorrer do capitulo das análises de dados, que foram feitas a partir do comportamento

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de cada sujeito, em suas brincadeiras, jogos, conversas nos corredores, cantinas, e a

partir daí, vi o quanto se parecem em sua etologia.

As observações sistemáticas e assistemáticas, e um roteiro de entrevistas com

esses sujeitos que se mostraram com boa vontade foi necessário para fornecer as

informações a respeito das questões categorizadas, conforme segue em anexo. Faço um

resumo do que se pode retirar de suas falas e das observações ao perguntar sobre “como

que você se percebe enquanto corpo?” Essa Questão fora sugerida pela professora

doutora Maria do Rosário Silveira Porto, que consta de seu parecer do Exame de

Qualificação dessa pesquisa e que foi por mim acatada.

Foi enviado por e-mail, para aqueles alunos, que puderam, me responder, sendo

três da Educação Física, dois rapazes e uma moça, e apenas uma aluna da Pedagogia,

para que pudesse nos responder essas indagações:

“De forma agradável, com uma auto-avaliação construtiva,

pensando quase sempre além da forma estética, visando

melhorar a qualidade de vida tendo como recompensa um corpo

mais bonito e saudável”. (K.A.T./F –EDF – 19 anos).

“Sarado! malhadaço sou um exemplo a ser seguido! quero muito

continuar me cuidando dando exemplos para os meus alunos”.

(D.O.U./M – EDF – 24 anos).

“Que pergunta esquisita (...) nunca parei pra perceber, mas...

vamos lá... Enquanto corpo, eu me sinto parte de algo maior, e

vejo que a minha presença é notável, quanto a tudo aquilo que

almejo, ou que faço parte. Ainda que muitos não acreditem nos

seus potenciais, só precisam saber que apenas um gesto,

expressão ou uma palavra podem mudar o mundo”. (L.U.C./M –

EDF – 26 anos).

“Enquanto corpo me percebo ligada a todo um conjunto de

outros elementos e fatores, não sendo apenas matéria, mas sim

um ser que apesar do corpo tem uma mente e tudo se liga. Para

mim não há corpo (matéria) sem tudo o mais”. (R.E.G./F – PED

– 23 anos).

É possível ver pelas falas o quanto esses sujeitos da Educação Física se

preocupam com o corpo, tentando deixá-los “sarados” como vimos na fala de um dos

entrevistados. É também possível enxergar essa preocupação com seus corpos, visando

um ideal de beleza imposto pela sociedade a qual pertence. E quando lhes são

perguntados quais são seus sonhos? Há sempre uma resposta em ter uma “academia

diferenciada” (R.I.T./F – EDF –19 anos).

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Talvez, seja essa preocupação em deixar seus “corpos necessariamente

perfeitos”, Le Breton (2003, p. 118), está relacionada também com a escolha do curso.

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ANÁLISE DOS DADOS

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3 Categoria de Análise I: Observações das aulas de Pedagogia e Educação Física

da UFMT

Ao identificar o elemento homem em seu comportamento, é possível associá-lo

aos estudos de Konrad Lorenz (1987, p. 8), que em seus estudos o comparou à etologia

dos gansos, aves e peixes, descrevendo-o numa semiologia de seus instintos e tradições,

hereditariedade, mutações e rituais.

Os laboratórios tendem a estudar os primatas, ratos, humanos, a partir de sua

etologia em campo, através do seu habitat nativo. Quando em laboratórios, os

pesquisadores tendem a observar esses comportamentos sob um alto controle com

possibilidades de registros por vários meios: “câmera de filmar, gravadores, janelas,

espelhos e outros experimentos”.

Em campo, isto é, no lócus desta pesquisa, foi possível observar a etologia dos

acadêmicos de Pedagogia e de Educação Física da UFMT, onde utilizei os seguintes

instrumentos de coleta: câmera de filmar, gravador, máquina fotográfica e um caderno

de campo.

Vivendo e convivendo no período de dois anos com esses sujeitos, pude vê-los

em seus agrupamentos para estudos, brincadeiras e em outros papéis, como se

modificam em sua estética corporal, a ponto de dizer que “os processos criativos

expressos pelo homem, e somente pelo homem, constituem um jogo, uma brincadeira,

diferente da funcionalidade que caracteriza o cotidiano dos animais”, conforme afirma

Lorenz (1986, p. 63). Ligando-se a esse autor, talvez seja possível juntar-se aquilo que

Geertz (1989, p. 143), revela em seu livro sobre a interpretação das culturas quando diz

que cada indivíduo é através do seu comportamento e do seu éthos. Para o autor “o

éthos de um povo é o tom, o caráter e a qualidade de sua vida, seu estilo moral e estético

e sua disposição; é a atitude subjacente em relação a ele mesmo e ao seu mundo que a

vida reflete.”

É com essa orientação que esse estudo se destina, isto é, ver esses sujeitos em

sala de aula, em pátios, em espaços ociosos de aulas vagas, em pistas para práticas

esportivas, em estágios para aula de campo, em cantinas para lanches, em rodas para

assuntos de uma vida sem importância, em grupinhos sobre a vida prosaica, em troças

para jogar conversa fora... A partir das observações desses grupos, cada indivíduo ou

cada grupo, pelo seu comportamento, tem a nos dizer, através da linguagem verbal e

não verbal, mais a dizer por sua vontade do que pela obrigação de estar nesses

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ambientes. Esse êthos como labora o poeta Schiller (2002, p. 27) em uma de suas cartas

sobre a educação estética do homem, nos diz sobre a vontade do homem que deve

sobrepor a qualquer imposição ou dever. É isso que deixa transparecer na etologia

desses sujeitos como veremos a seguir. Eles se comportam muito mais pela força de sua

natureza, do que pela imposição normativa da cultura.

3.1.1 Durante as aulas

Neste primeiro momento de descrição etnográfica, faço observação aos dois

grupos de sujeitos, como eles se comportam nos espaços que ocupam: na forma de se

vestir, falar, andar, se agrupar, na expressão do rosto, na postura corporal.

No segundo módulo da disciplina “Práticas no Ensino”, do curso de Pedagogia

as “alunas” assistem às aulas em agrupamentos, estão sempre nos corredores, na

cantina, cada uma em seu “grupo” correspondente, conversam, trabalham e brincam

como nos mostram as imagens abaixo:

Fig. 21. Sentam sempre em grupos (PED – UFMT)

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Fig. 22 – Estão sempre agrupadas (PED – UFMT)

Fig. 23 – Brincando com os aparelhos de celular (PED – UFMT)

As meninas de cada “grupo” tendem a se comportar de forma estereotipada. Em

algumas aulas se comportam de uma forma participativa, em outras, nos mostram cenas

de brincar com seus aparelhos de celular, com mãos acariciando o próprio corpo,

cabelos; sempre se movimentando, falam sobre unhas, cores de esmaltes, Orkut dos

professores, sobre suas fotos, familiares, dinheiro para xerocopia dos textos e, pelo que

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pude assistir são nesses momentos que mostram toda a pregnância de sua etologia do

agrupamento.

Ao observar as aulas de Educação Física, do 2°. Semestre, pude ver há uma

semelhança entre os dois cursos. Os alunos, em seus “grupos”, brincam de pegar, de

tocar o outro com limites para correr. Usando sua imaginação simbólica, a quadra de

esportes (sala de aula da Educação Física) faz a vez, neste momento, de sala de aula.

Utilizam também como espaço para brincadeiras, quando me foi possível observar que

enquanto um aluno ficava no centro da quadra ele tinha a prerrogativa de escolher quem

iria correr e quem iria tocar o colega escolhido, quer através de sua vestimenta: (calça

cotton, calça jeans, tênis branco ou preto). Essa atividade lúdica, seguindo a lógica

daquilo que Huizinga (1990, p.16) traduz como jogo é uma atividade em que predomina

a alegria, e contribui para a “promoção e a formação de grupos sociais com tendência a

rodearem-se de segredos e a sublinharem suas diferenças em relação ao resto do mundo

por meio de disfarces ou outros meios semelhantes”.

Nessas aulas de Educação Física, a partir da fartura de movimentos, expressos

com essa etologia, pude compreender aquilo Marcel Mauss (2008, p. 401), na tarefa de

pensar sobre “uma teoria da técnica do corpo”, cunhou de “técnicas corporais”. Com as

palavras do próprio autor ele entende que essa “expressão” poderia dizer melhor sobre

“as maneiras pelas quais os homens, de sociedade a sociedade, de uma forma

tradicional, sabem servir-se de seus corpos”. É possível entender com a palavra

“tradicional”, a que Mauss se refere, porque a maioria dos movimentos que vi nos

pátios, nas salas, nas pistas de esportes, nos agrupamentos para assuntos sem

importância... se constituem de gestos repetidos pelas gerações sucessivas e que,

portanto, são repassados pela “tradição”.

Quando esses meninos se juntam para brincar de correr para pegar o outro, pode

estar lá a “técnica corporal” neandertaleza da corrida necessária para a caça; quando

eles se agrupam para os assuntos sem importância pode estar aí nesses ajuntamentos

triviais, “a ação fática dos ritos utilizados como instrumentos para entrar em contato o

outro”, a que se refere Rivière (1996, p.97); quando eles se juntam para perseguir algum

colega, pode estar aqui aquilo que Willy Haas (in W. BENJAMIN, 1984, p. 74) tratou

como “a teoria gesltáltica do gesto lúdico”; quando eles asseguram um dardo para

lançar ou um lápis para escrever, pode estar aqui o salto tecnológico do Homo

habilinos, a que se refere R. Wrangham (2010, p. 95).

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Interpretando Benjamin, antes que a nossa análise desses gestos se resolva pelo

arrebatamento da existência que é preciso para a caça, da rede que cria com os afetos,

no caso da trivialidade das troças escolares, do ritmo frenético das brincadeiras infanto-

juvenis e, no salto tecnológico com a chegada da ferramenta, “é provável que já

tenhamos vivenciado essa experiência desde muito cedo” (id. p. 74). Através dos ritmos

primordiais que se manifestam nesses jogos, nesses encontros casuais e nos usos desses

objetos, é “exatamente” aí, “através desses ritmos que nos tornamos senhores de nós

mesmos”.

Desse modo, as escolhas pela cor das roupas, pela forma como está amarrado os

tênis, se usam piercings ou tatuagem, se aquele colega pertence ao meu grupo ou a

minha “tribo”, para ser cara a Michel Maffesoli (2008, p. 37), de estima servem de

motivos para uma técnica de fazer com que o corpo se movimenta em sua forma mais

variada, e seja também através do movimento corporal que o professor consegue ver e

julgar a cada aluno em seu ambiente, no momento em que avalia a precisão do gesto

técnico, no caso dos esportes ou nas lições de didática como a futura pedagoga

manipula uma retroprojetagem.

Quando conversam, no decorrer das aulas, os assuntos são sobre os exercícios

feitos. Quando não tem aula os alunos tendem a procurar por uma brincadeira para

movimentar seus corpos ou para passar o tempo. A fala de um sujeito a seguir mostra

como se dá essa opção nos momentos de intervalo:

“Socialização! Converso com os colegas e basicamente de

vez em quando vamos para quadra, faz um tipo de

atividade para passar o tempo”. (V.G.J./M – EDF – 32

anos).

A facilidade de movimentar e equilibrar seus corpos durante as aulas e nos

intervalos parece tornar esses meninos mais flexíveis, estejam em sala, na quadra

poliesportiva, quando eles tendem a trabalhar em pequenos grupos, de meninas e de

meninos. Conforme pude constatar algumas meninas tentam se misturar nos grupos dos

meninos, outras dizem que os meninos têm mais força e, portanto, não as deixam caírem

no chão. Outras preferem fazer com as meninas por questão de afinidade e leveza,

prevalecendo assim o toque corporal sem pudor. Nessa perspectiva, o comportamento

de cada sujeito é livre para jogar como quiser, sem a exigência formal de obtenção de

rendimentos ou performances.

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Com um estudo sobre os ritos, Claude Rivière, assim se declara:

“Os ritos devem ser sempre considerados como conjunto de condutas

individuais ou coletivas, relativamente codificadas, com um suporte corporal

(verbal, gestual, ou de postura), com caráter mais ou menos repetitivo e forte

carga simbólica para seus atores e, habitualmente, para suas testemunhas,

baseadas em uma adesão mental, eventualmente não conscientizada, a

valores relativos a escolhas sociais julgadas importantes e cuja eficácia

esperada não depende de uma lógica puramente empírica que se esgotaria na

instrumentalidade técnica do elo causa-efeito”. (RIVIÈRE, 1996, p.30)

Com base no que foi observado durante esses dois anos, é possível dizer que há

uma forma recorrente nas aulas práticas desses sujeitos. Predomina, assim, no rito diário

dessas aulas um ritmo e um equilíbrio envolvendo dinâmicas corporais, e uma

diversificação crescente dos movimentos, que mediante as repetições rítmicas é possível

ver uma ritualização de gestos e sua constituição do espaço operacional, como veremos

a seguir:

Fig. 24 – Imagem sobre o equilíbrio corporal (EDF – UFMT)

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Fig. 25 – Em grupo de três: equilíbrio sobre o corpo (EDF – UFMT)

Fig. 26 – Equilíbrio corporal usando dois colegas (EDF – UFMT)

Rivière, em sua obra Os ritos profanos, nos lembra que do berço ao túmulo o

indivíduo se submete a cerimônias que ele denomina de “ritos de passagem” que o

ajudam a passar de um estado a outro, de uma idade a outra como os ritos de

“nascimento iniciação, casamento e morte” (1996, p. 42).

Nesses encontros para as aulas na quadra, há sempre aquele aluno que não

participa por motivo de dor, que seu corpo produz naturalmente com a repetição dos

exercícios ou no caso das meninas quando estão “menstruadas”. Quando isso acontece

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eles ficam de longe, observando e conversando com os colegas, também

impossibilitados pelos mesmos motivos. Às vezes se aproximam de mim e falam sobre

a aula, sobre os movimentos, sobre concurso que farão para entrar na polícia, e logo

voltam ao assunto da aula, sem deixar se despertar para qualquer outra coisa que chame

a atenção do professor.

Fig. 27 – Aluna não participa da aula por causa de cólica menstrual (EDF – UFMT)

É provável que essas experiências, que os fazem se ausentar das aulas práticas

pode torná-los sensíveis com o corpo de seus alunos, quando estiverem no comando

d‟alguma turma que virão no curso de sua profissão de professor de crianças e jovens.

Sentir o seu próprio corpo e, aprender a conhecer os sinais de advertência que ele emite

pode ser uma experiência positiva quando nas aulas poderão reconhecer e saberá lidar

com o corpo do aluno que passará a maior parte do tempo sentados, de pé, cansado,

alegre, triste... Enfim, o corpo que de alguma forma tende a falar, poderá emitir um sinal

de satisfação ou de desagrado, o que nos faz lembrar de Rivière (1996, p.183), quando

diz que “não há ritualização da vida cotidiana sem ritualização das modalidades

corporais”.

Numa aula do 3°. Semestre de Educação Física, os alunos tendem a ficar

sentados ouvindo o professor falar sobre “a lista do Ensino Fundamental”, conteúdo da

aula em pauta. O professor ao fazer algumas perguntas, a respeito de teoria e prática,

tentou fazer com que os alunos pensassem sobre o assunto. Talvez os alunos nesse

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momento, sentissem seus corpos cansados, pois bocejavam muito, e alguns até saiam da

sala para tomar água e ir ao banheiro, e logo voltavam. Segundo Rivière (1996, p. 183),

“Pela familiaridade dos sinais, os ritos esconjuram o que há de perturbador em nosso

próprio corpo”. Nas entrevistas os alunos aproveitaram para falar sobre o método do

professor, criticando-o e assim justificando o seu desconforto e, portanto, a sua não-

participação. A fala a seguir mostra esse julgamento:

“esse professor é assim... se não consegue ligar o data-show não

tem aula”. (J.O.E./M – EDF – 22 anos)

Quando sentados para as aulas nas salas, os alunos se posicionam das mais

variadas formas: com pernas cruzadas, com os pés na carteira, como se tirassem um

cochilo, deixando seus corpos bem à vontade. Na disciplina do professor D, sobre

“didática pedagógica”, os alunos continuavam a ouvir com os braços cruzados o tempo

todo. No decorrer da aula, alguns alunos dão tapinhas no rosto para acordar, sugerindo

com esse gesto que o assunto da aula estava “enfadonho”. Sou tentada a dizer que esse é

um comportamento habitual no curso de Educação Física, porque esses alunos, quando

se trata de aula teórica, deixam evidente que são mais animados para aulas práticas. Os

corpos desses alunos parecem querer dizer que há um visível cansaço para esses

momentos de sala de aula. Nestas horas, há sempre uma sede súbita e uma vontade de

visitar a toalete. Uma fala a seguir traduz esse incômodo corporal:

“geralmente se a aula fica muito ou bastante... chata a gente

acaba conversando entre os alunos sobre o assunto que está

sendo trabalhado, ou saio da sala discretamente porque a aula

fica muito cansativa”. (D.E.B./F– EDF – 24 anos)

As vestimentas de alguns alunos em seu dia-a-dia são leves, outros preferem o

jeans, que é um tecido mais pesado, e não me parece apropriado para as aulas de

Educação física, que sugere o tempo todo, “a movimentação dos corpos”. As formas de

calçar são bem variadas, usam tênis, sandálias do gênero havaianas, rasteiras, chinelos,

deixando os saltos apenas para os eventos formais como em colação de grau e em bailes

de formatura. As imagens, a seguir, mostram essa etologia da indumentária e dos

calçados desses alunos:

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Fig. 28 – Forma de se calçar “Chinelo” (EDF– UFMT)

Fig. 29 – Forma de se calçar “Tênis” (EDF – UFMT)

As alunas de Pedagogia também têm a sua mais variada forma de calçar,

predominando o salto e as rasteirinhas no dia-a-dia. Além da semelhança, no modo de

se vestirem e calçarem, embora sendo de cursos diferentes, é provável que no caso do

vestuário e calçados desses acadêmicos, há uma determinação geográfica que orienta

essa escolha. Não podemos nos esquecer que estamos numa região do país de clima

muito quente e úmido, o que favorece o uso desse tipo de roupa e calçados. As imagens

a seguir ratificam esse despojamento corporal.

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Fig. 30 – Forma de se calçar “saltos” (PED – UFMT)

Fig. 31 – Forma de se calçar “rasteirinhas” (PED – UFMT)

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Fig. 32 – Forma de se calçar “sapatilhas” (PED – UFMT)

Um aspecto que me chamou a atenção diz respeito à chegada dos alunos para as

aulas. Comportamento mais comum entre os alunos da Educação Física que da

Pedagogia. Talvez porque na Educação Física, as aulas começam mais cedo, às 7h da

manhã. É nessa hora, pelo que pude observar, alguns alunos aproveitam esse tempo que

antecede à aula, para pôr a fofoca em dia. Não vi muito aluno com livro aberto,

antecipando a matéria, nem vi grupos reunidos para revisar conteúdos ou antecipar o

assunto das aulas. Esses encontros, repito, são mais usados por eles, para fazer o “estar-

junto” como nos lembra Maffesoli em O tempo das tribos (2006), ou para a “celebração

fática da vida sem importância”, aludindo Rivière em seus Os ritos profanos (1996).

À minha observação, a fofoca parece eficaz como motivo que estimula a

conversa entre os alunos e que dignifica esses grupos. Outros aproveitam o tempo para

desenhar no quadro. Assim, debochando do próprio desenho, enquanto esperam seus

colegas, vão preenchendo o tempo, quando epifaniza com esses “pequenos nadas”,

como lembra Maffesoli. Ao terminar suas imagens, sentam perto da lousa para dizer o

que representam para cada colega “homenageado” se é que posso, assim, dizer. À

medida que os colegas chegam, vão se aproximando para brincar juntos e ficam ali até o

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professor entrar em sala, deixando assim seus colegas mais descontraídos e alegres. As

imagens, a seguir, em uma sala da Faculdade de Educação Física, mostram como se dão

essas brincadeiras:

Fig. 33 – Alunos brincando de desenhar na lousa (EDF – UFMT)

Fig. 34 – Alunos brincando na lousa (EDF – UFMT)

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Fig. 35 – Alunos brincando na lousa – EDF – UFMT

3.1.2 Lanches, estética, trabalho e brincadeiras: a fronteira entre o prescrito e o

proscrito

Essa seção do estudo tenta, numa espécie de resumo, fazer uma fusão das

distintas funções a que se presta a sala de aula. Quando se pensa que lá é um espaço

“sagrado”, exclusivo do conhecimento, os alunos, tanto de um curso como de outro

ritualizam, no cotidiano desse espaço, fazendo abrigar outras funções que extrapolam o

ato do ensino, como se profanassem em atitudes proscritas, incluindo nesse espaço

assuntos de um outro ateliê. Lá também é lugar para lanches, faz a vez de instituto de

beleza, serve de balcão de negócios para vender bugigangas, reunião de grupos de

estudos e serve, ainda, como palco para jogos de cartas.

O rito, portanto, na sala de aula, à alusão do que nos ensina Rivière (1996, p.

242) pode ser encontrado no dia-a-dia onde se realiza outras necessidades. “Comer para

viver é uma evidência que remete a uma necessidade biológica e ao meio de subsistir do

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ponto de vista corporal”, mas não é só disso que é feito o homem. Rivière (id, 242) nos

lembra que “na realidade, não é somente o corpo, mas toda a pessoa que, ao comer, se

constrói uma pessoa socializada por aprendizagem repetitiva das refeições ingeridas

durante toda a infância em companhia de várias pessoas”.

As alunas de Pedagogia, parece nos lembrar dessa lição, quando trazem para a

sala de aula lanches de suas casas, além dos biscoitos, sacola de mangas (ver figura 16),

balas, bombons e outras guloseimas para se alimentarem. Esse comportamento ratifica a

teoria que Mauss (2008, p. 401) insiste em repetir sobre as maneiras pelas quais os

homens (...) de uma forma “tradicional”, sabem servir-se de seus corpos. A palavra

“tradicional”, aqui enfatiza a lembrança da escola que tivemos na infância, assim como

esses acadêmicos, mas que insistimos com esse comportamento de fazer da sala de aula

uma extensão de nossa socialidade. Nas palavras de Maffesoli (2005, p. 82) essa atitude

faz renascer uma nova concepção de tempo, usando ócio do (intervalo), quando se

privilegia uma “disponibilidade social” capaz de associar lazer, criação e o prazer de

estar-junto, tudo o que pode ser resumido com a noção de “socialidade”.

Aquelas que parecem ter mais dinheiro vão à cantina, e há, ainda, outras que

não comem no intervalo, mas que preferem utilizar esse tempo para pôr a prosa em dia

ou vender suas bugigangas e cuidar de seus bebês. É nesse momento que as meninas

brincam, conversam, negociam se socializam. A figura a seguir mostra essa

socialização:

Fig. 36 – hora das mangas para o lanche e para cuidar do Bebê (PED – UFMT)

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O uso da voz e do corpo, entre outros mecanismos, traduz uma narrativa que

pode irritar ou ser prazeroso para os mesmos. Os aparelhos de celular, de algumas

alunas tocam o tempo todo em sala de aula, acaba por estorvar o tempo que seria do

trabalho. Podemos ver na fala de uma entrevistada, o quanto incomoda essa

“competição” (grifo meu) entre barulho de celular, voz do professor e conversas

paralelas das colegas... tudo ao mesmo tempo. A fala de uma aluna do 4°. Ano de

Pedagogia enfatiza essa proscrição:

“Vai depender muito de cada professor, porque tem professor que tem

direitos maiores. Não chegar atrasado, atender celular em sala de aula,

isso incomoda muito.” (C.A.R./F – PED – 22 anos).

A preocupação com os cabelos são constantes, como vimos na imagem da

introdução deste trabalho, prendem, soltam, enrolam, arrumam e brincam, mas sem

deixar de prestar a atenção na aula. Brincam também com um bebê, filho de uma das

alunas do segundo semestre, que a cada momento vai trocando de braços ou posto no

chão, como se fosse a coisa mais natural para uma sala de aula. Isso pode ser visto na

imagem a seguir:

Fig. 37 – Apresentam trabalho de grupo com o bebê no colo (PED – UFMT)

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Fig. 38 – Bebê passa de mão em mão (PED – UFMT)

Fig. 39 – Bebê brinca no chão, com uma garrafa e faz barulho o tempo todo (PED – UFMT)

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Fig. 40 – aluna brinca com o bebê durante o intervalo (PED – UFMT)

O fato de algumas alunas levarem seus bebês para a sala, como se fosse natural,

a maioria das alunas ressente dessa atitude, que alguns consideram como uma “invasão”

e até mesmo como um gesto profano. As imagens se completam com aquilo que as

alunas nos dizem nas entrevistas como um incômodo que estorva escutar barulho de

choro de criança na alheia:

“eu acredito que uma coisa que às vezes incomoda, é o

fato de muitas mães levarem seus filhos pra sala de aula.

Acontece de três ou quatro, mães levarem seus filhos no

mesmo dia, então isso atrapalha muito a aula, e todo

mundo fica focado só nas crianças, né?” (N.A.I./F – PED

– 23 anos).

Estudar a etologia desses alunos e vê-los em seus aspectos distintos convém

acrescentar, conforme nos diz Rivière (1996, p. 66) que “em uma mesma cultura, os

ritos são comportamentos esporádicos [...] muitas vezes, caracterizam somente alguns

membros, enquanto o rito animal repetitivo caracteriza toda a espécie”. Levar uma

criança para o espaço da sala de aula pode ser um comportamento guiado pelo

“sacrifício” da maternidade, que, segundo suas mães “não tem com quem deixá-los”,

acaba sobrecarregando o ambiente instrucional da sala da aula. E, assim, é a vida do

homem, ancorada em seu corpo, como diz Le Breton (2003, p. 44) “fazendo desse corpo

o lugar onde o mundo é questionado”. A todo o tempo a natureza e a cultura tentam essa

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acomodação. O bebê com seus ruídos e preocupações, por mais que incomode o rito

sagrado da aula, acaba sendo adotado por todas as alunas, para satisfazer a “espécie

mãe”.

As alunas também falam sobre o estágio que irão cumprir numa escola situada

no bairro da periferia, e sobre o trabalho do livro didático, algumas voltam atrasadas do

intervalo e entram na sala sem o professor perceber. Ao observar suas posturas e

vestimentas é possível notar que algumas, mesmo estando uniformizadas, procuram

enfeitar o uniforme com fitas, laços e cortes no tecido, como se customizando sua roupa

se diferencia uma das outras. Interpretando Rivière, essa tentativa de se apresentar

diferente do outro é uma marca do ser humano. Há uma lição nos ritos escolares quando

crianças, mesmo de tenra idade, acrescentam um adesivo, uma cor, um broche em seu

uniforme. A mensagem educativa é: “eu sou diferente de você!” Para Rivière:

“há muitas tentativas empreendidas no sentido de modificar as aparências e

os cuidados prestados ao corpo que vão da higiene à massagem e cirurgia

estética, assim como as formas de inscrições corporais tais como a tatuagem

ou as escarificações. No momento em que as práticas evoluem, a ritualidade

também é modificada” (RIVIÈRE, 1996, p. 190-191).

As imagens dos corpos modificados com tatuagens e customizações das roupas

são vistas nas imagens abaixo:

Fig. 41 – pulseiras e tatuagens (PED – UFMT)

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Fig. 42 – tatuagem de anjo nas costas (PED – UFMT)

Fig. 43 – muitas pulseiras (PED – UFMT)

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Fig. 44 – customização do uniforme (PED – UFMT)

Fig. 45 – tiaras no cabelo e rococós nas mangas do uniforme (PED – UFMT)

A forma de sentar na sala é uma marca que tem a dizer sobre o éthos de cada

grupo de sujeitos. Tanto num curso, como no outro eles se diferenciam pela maneira

como se sentam para as aulas. Sentar com pernas cruzadas é mais freqüente no curso de

Pedagogia, enquanto que sentar bem à vontade com as pernas abertas e como se

estivessem espreguiçando compõe o modus faciendi dos alunos de Educação Física.

Vale a pena lembrar a experiência relatada por Marcel Maus (2008, p. 404), quando se

refere aos modos de andar das jovens americanas, graças à influência do cinema, que

mais tarde iria disseminar na cultura das jovens francesas.

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Se bem entendi Mauss, cada cultura constitui, a partir de sua maneira de andar,

de balançar os braços na caminhada, de carregar um volume, de empunhar as mãos,

aquilo que ele considera como uma “idiossincrasia social”, produzida no interior do

grupo, no cerne da cultura desse grupo. Desse modo é possível reconhecer um aluno de

Educação Física pelo seu andar despojado ou pelo seu jeito de sentar com as pernas

abertas, assim como, de longe, é possível identificar uma aluna de Pedagogia, pelo jeito

como carrega o seu material, sempre junto ao corpo, enquanto os de Educação Física os

carregam nas costas. Essa etologia, segundo Mauss, depende de arranjos e mecanismos

psíquicos, mais que puramente individuais.

Durante as aulas, algumas alunas imitam a atriz Dira Paes, que na novela

“Caminho das Índias”, exibida pela Rede Globo, sua personagem “Norminha” quando

anda mexe em seus cabelos e balança o corpo com meneios simulando um erotismo a

chamar a atenção dos homens. Essas alunas quando andam pela sala simulando ser a

“Norminha”, mas logo que saem da personagem, voltam para o conteúdo sobre “a

questão do método”. Talvez seja para exercer a necessidade que o corpo tem de se

movimentar de alguma forma ou para distrair ou ainda, como diria Maffesoli (2005, p.

80), o faz para esticar o seu tempo de lazer no espaço do trabalho, “para vencer o tédio.”

Além desses mecanismos de estender o tempo de distração, enquanto em grupos

aproveitam para mexer no cabelo da colega, fazem perguntas triviais à professora e,

falando sobre a linguagem, conteúdo em pauta, surge o seguinte diálogo entre duas

alunas, quando uma delas pergunta:

“E se uma criança perguntar: „professora porque a árvore

da fruta, uva, não chama uveira. E porque é parreira? A

árvore da fruta banana é bananeira?” (M.C./F – PED – 24

anos).

Outra aluna responde:

“Porque a língua portuguesa... a gramática diz que é

parreira” (A.T./F – PED – 26 anos)

Com esse comportamento “pueril”, saem da sala correndo antes da aula acabar.

Sem dar continuidade a esse diálogo, algumas alunas, exercem sua “preguiça” de deitar

na cadeira no fundo da sala, porque, talvez seus corpos estejam mesmo muito cansados.

Outras aproveitam para dançar dentro da sala como se fossem bailarinas. Para chamar a

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atenção das colegas enquanto a professora está virada de costas, atendendo outra aluna,

mas logo se refazem da brincadeira para que a professora não chame sua atenção. Uma

pergunta me fez interpelar: “por que elas não aproveitaram a curiosidade da criança

imaginária que surge na fala de (M.C)?” São esses projetos de “pedagogas” que vão

assumir as salas de aulas para crianças logo que se formarem. As imagens a seguir

mostram como a aula parece enfadonha para algumas alunas:

Fig. 46 – Aluna no fundo da sala, deitada na cadeira (PED – UFMT)

Fig. 47 – professora explicando a matéria enquanto a aluna deita na carteira (PED – UFMT)

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Outro aspecto que chama atenção, no quesito trivialidade, é o fato de as alunas

falarem sobre presilhas de cabelo que custa “super barato”, outras do grupo vizinho

conversam sobre o “dinheiro que perdeu”. Preocupam-se com as roupas que irão vestir

para dar aula no estágio e tiram dúvidas com a professora que está em sala, explicando

como devem se vestir. A professora intercede dizendo “que devem se vestir

adequadamente, porque o professor serve de exemplo para as crianças”; dá exemplos de

como não se vestir para ir a uma sala de aula: “nada de umbigo de fora”, “barriga”, e

“cofrinho à mostra”, “costas nuas”, etc. A imagem a seguir mostra uma aluna passeando

pela sala com as costas desnudas. Parece que o recado da professora encontrou eco na

indumentária dessa aluna:

Fig. 48 – aluna com costa desnuda passeia pela sala (PED – UFMT)

A professora continua a homilia dizendo que “não é preciso ir de terno mais vestir uma

roupa adequada, é necessário, não somente para professor mais para qualquer

profissão”. Uma das alunas aproveita o momento e interrompe a explicação dizendo:

Menos para uma profissão né professora? E essa profissão

só atua à noite (R.O.S./F – PED – 22 anos).

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Ao fazer essa pergunta, realiza outra, antes mesmo que a professora pudesse

responder, porque querem saber se: “irá demorar para fazer a chamada”. E assim

termina essa aula deixando essas questões para uma próxima. No dia seguinte as

meninas não se lembram da questão feita e a aula é dada normalmente.

No curso de Educação Física, não há intervalo ou “recreio”. Os alunos se

divertem quando não tem aula. A hora do lanche ocorre no vestíbulo que dá acesso às

salas de aula. Lá, como um lugar sagrado se encontram todos os dias, com uma senhora

chamada “Madalena” e seu carrinho de sorvetes. Às vezes aparece alguém de bicicleta

vendendo salgados, outras vezes são algumas alunas que trazem o que vender para tirar

algum trocado, que segundo, pude saber, serviria para a festa da formatura. Isso ocorreu

durante o ano de 2009, pois em 2010, foi inaugurada uma cantina dentro do ginásio, que

passou a garantir o breakfast desses alunos. Agora eles podem variar nos salgados,

tomar sucos, comprar água, e quando não tem aula eles aproveitam as mesas da cantina,

para ouvir música; brincar com seus laptops; jogar baralho, especialmente, o Jogo de

Truco; conversar sobre futilidades; matar o tempo; namorar e intensificar os ritos de sua

vida social. Na entrevista ao perguntar se os alunos conversam muito em sala de aula? E

em que situação? Um aluno assim me responde:

“Não... não, eu procuro prestar atenção (V.A.L./M – EDF

– 32 anos).

Outro tinha a resposta um pouco diferente, no que posso considerá-los, como mais

verdadeiros:

“Se a aula estiver desinteressante eu converso” (K. A.T/F

–EDF – 19 anos).

Essa inquietação dos alunos de participar, de prestar atenção é “sagrada” dentro

da sala de aula, onde os rituais orientam e conduzem esse comportamento denotam uma

etologia prescrita. A partir das observações pude notar que esse silêncio, que essa

participação e a atenção durante as aulas nem sempre são possíveis de acontecer.

Portanto, insisto com outras perguntas sobre o comportamento prescrito a dois

entrevistados que assim se expressam:

“Prestar atenção... fazer perguntas, participar da aula, escutar

comentários que sejam pertinentes à matéria... é isso. O que é

proscrito é distrair a aula, chamar a atenção pra si, ficar

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conversando coisas que não tem a ver com a matéria, né? Desviar a

atenção do professor que tá tentando explicar e coisas assim (risos)

que vêm na cabeça: coisas absurdas como de repente tirar a roupa,

assim... (risos) não pode...” (V.A.L./M –EDF – 32 anos). “Atenção e anotar tudo que o professor fala... Isso é o prescrito,

entendeu? (...) a conversa, a falta de atenção, assim, porque isso...

vem dizer que atrapalha o professor.” (V.I. L./M – EDF – 22 anos)

Falar do que é prescrito e proscrito, desvela o que é sagrado e profano, dentro

da sala de aula, essas categorias fazem com que os alunos pensam em seu próprio

comportamento para responder tudo àquilo que ele é, foi e não foi como sujeito, durante

as aulas. Com esses dados, os dois grupos de acadêmicos podem nos dar pistas, nos

revelar como irão se comportar diante de sua formação que está em desenvolvimento?

Pude observar que na Faculdade de Educação Física, os alunos não comem

dentro da sala de aula. Parecem ser mais disciplinados que as alunas de Pedagogia,

nesse quesito de se alimentarem dentro da sala. Seria porque o cuidado com o corpo

“sarado” é patente nesse grupo? Ou haveria uma proibição da própria Faculdade? À

primeira vista, ao reparar seus bíceps, quadríceps e peitorais, me parece que sim.

Quando não tem aula os alunos da Educação Física aproveitam também para jogar

truco. Pelo que observei esse é o jogo preferido desse grupo.

Uma cena muito curiosa chamou minha atenção que fui tentada a fazer seu

registro (ver figuras 29, 30 e 31). No meio de uma aula, em que o tema em questão

versava sobre “brincadeiras infantis”, da disciplina “Teoria e Prática do Jogo”, um

grupo de meninos, enquanto esperam a sua vez de voltar ao círculo principal, se

agrupam no interior deste círculo para jogar Truco. Esse gesto que mais parece uma

atitude “profana” nos remete àquela idéia que Huizinga (1990, p. 11) tem como

característica fundamental de todo jogo: “o fato de ser livre, de ser ele próprio

liberdade”. Brincar de Truco no interior de uma aula é subsumir a “evasão” ― o jogo de

Truco ― à vida “vida real” ― a aula propriamente dita. E isso para Huizinga se encerra

na segunda característica do jogo, o nascimento do “faz-de-conta”.

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Fig. 49 – alunos jogam truco no círculo na hora da aula (EDF – UFMT)

Fig. 50 – alunos jogam truco no círculo na hora da aula (EDF – UFMT)

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Fig. 51 – alunos jogam truco no círculo na hora da aula (EDF – UFMT)

Os alunos se organizam nesse amontoamento e conseguem brincar e prestar

atenção no que o professor tende a dizer, assim como as alunas de pedagogia brincam e

dançam em sala, enquanto segue a explicação da professora. Segundo Rivière (1996, p.

200) “a dança enquanto tal faz parte do campo do lazer”, elas se assemelham em seu

comportamento com gestos estereotipados.

3.2 Categoria de Analise II: Comunicação verbal X Comunicação não-verbal

Nesse segundo momento, de descrição etnográfica, pude observar que os

sujeitos não se comunicam somente por uma linguagem não verbal, e segundo (HALL,

1981, p. 153) “da comunicação não verbal, uma boa parte se transforma em gestos e

posição dos corpos”. Essa linguagem verbal que aparece o tempo todo, nas falas de cada

sujeito, parece que quer nos revelar alguma coisa, sobre sua etologia, e segundo o autor,

(id. p. 180), “cada pequeno centro tem efetivamente sua própria via de comunicação”.

Talvez a comunicação não verbal desempenhe várias funções que ajudam o indivíduo a

se comunicar, por isso esses sujeitos falam o tempo todo, como expressam em suas falas

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e reforçam a verbalização uma das outras. Ao perguntar a esses sujeitos, se conversam

muito em sala de aula, e em que situação? Assim se expressam:

“dizem os professores que eu converso bastante...” (E.L.T/M –

EDF – 19 anos).

“às vezes, é necessário quando o professor explana sobre

alguma situação e você já viveu aquela situação. É impossível

deixar de comentar. (M. I.R/F – EDF – 22 anos)

“quando a aula do professor tá chata, eu converso bastante”

(C.R. I/M – EDF – 22 anos).

“eu converso bastante, olha se tem assunto... eu preciso falar,

assim qualquer horário eu to conversando (R.I.T/F – EDF – 20

anos).

“Pouco, hã... essa conversa, como seria? Então eu converso

muito. Eu falo bastante com os amigos e com os professores até

demais. (C.A.R/F – PED – 22 anos).

Ao se comunicarem, os sujeitos se interagem e compartilham mensagens, sejam

elas sobre o conteúdo dado ou uma venda de produtos como vimos anteriormente,

trocam idéias, sentimentos e emoções, como nos revela esta pesquisa, talvez esse

comportamento possa ser importante para sua formação e até mesmo para o

desempenho de suas atividades.

3.2.1 Piadinhas, conversinhas e outros deboches

Chamou-me a atenção uma característica desses sujeitos. O fato de eles

tenderem a levar os assuntos da matéria, em brincadeiras. É preciso um pulso forte dos

professores, porque na etologia desses meninos e meninas, falando em sua maioria, fica

a impressão de que ainda não ascenderam ao nível de um terceiro grau. Esse

“comportamento infantil” (grifo meu) me conduz a lembrar da conferência proferida

pelo psicanalista gaúcho José Outeiral (2009) no Educere, realizado na PUC de

Curitiba. À alegoria da obra freudiana O mal-estar da civilização, o referido professor

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se propõe com um título provocativo, tratar de “O mal-estar na escola” nos tempos

atuais.

Nesta época de hoje em que ele prefere chamar de “alta modernidade”, há um

“ego ideal” que quer ser trocado por um “ideal de ego”. A consciência está apertada

pela realidade. No texto auspicioso ele enumera a guisa de um diagnóstico, pontos sobre

esse “mal-estar”, incrustados em alguns fenômenos:

1) O “Adultescente”, elemento híbrido feito de adolescente + adulto, que vai

dar no kid‟adulto, ex.: uma senhora quarentona com tênis cor de rosa, com

chuchinha no cabelo e com camiseta da Minnie, assumindo uma sala de aula.

2) que escola realize o papel da educação é preciso realizar o

sonho/desejo/utopia. 3) O Brincar (prazer, alegria de aprender/ensinar) Há

uma desivenção do brincar. A Brincadeira ficou presa na Idade Média. 4) O

Pensar é uma atividade transgressora. Pensar assusta o próprio pensador. 5) O

Adulto: devemos preservar o mundo adulto para “lutar o bom combate, na

luta entre o bem e o mal”. 6) O Extra-muro: o mal-estar se revela quando

recebe alunos alienados da realidade acadêmica, que não gosta de ler livros.

(OUTEIRAL, J. EDUCERE, PUC – Curitiba, 2009)

Numa sala do curso de Pedagogia, ao começar a aula com histórias infantis, a

professora espirra e em seguida faz um comentário dizendo que “a gripe não passou

ainda”. Uma aluna com voz alta e bom som interpela: ― “Suína, professora?” A sala

faz um silêncio pelo constrangimento, sentido pela falta de respeito com a professora B,

que depois de um longo suspiro responde à “mal-educada” aluna: “não, não é suína” e

volta a sua explicação. Todos riem, enquanto a aula continua, ouvem-se resmungos e

tosse de criança pela sala enquanto a história “O pote vazio” é contada e a aula

continua.

A brincadeira a que o professor se refere, certamente não é esta de registrar uma

falta de respeito com o professor ou com o colega. A brincadeira que ele reclama, tem

que preencher os pátios, tem que estar em encontros oportunos, distintos desses da hora

de uma séria explicação. Algumas observações mostram como essas alunas (quase

professoras) têm uma habilidade para brincar na hora da aula, quando deveriam prestar

atenção:

Muitas alunas chegam atrasadas, e é possível ouvir conversa, da

“turma no fundo da sala”, que falam o tempo todo, sobre a

apresentação dos trabalhos: “que não leram o livro para apresentar”,

enquanto a professora conta a historinha, outras alunas lêem histórias

de outros livros distribuídos em sala, eis que surge um assovio para

brincar com o bebê que se encontrava quieto em seu carrinho. O

assunto referente ao trabalho surge de como as crianças devem tratar

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os professores “tia” ou “professor” e surgem varias histórias de mães,

pais e professores também, enquanto isso acaba a aula e todas saem da

sala ficando algumas alunas em sala. Surge uma pergunta do fundo da

sala para a professora ― o que é antropomorfizado? A professora B

escreve no quadro a palavra com letras bem grandes ― É quando

damos voz humana a quem não é humano, por exemplo, um animal,

um objeto. Enquanto essa professora explica que os professores, não

importa o gênero (homens e mulheres) não devem ser agressivos com

seus alunos. Uma aluna muda o rumo do assunto, invocando a

professora a falar sobre a relação sexual e pergunta ― E na hora H,

professora? Todas as suas colegas começam a dar gargalhadas. A

professora sem se deixar perder não se importa com a “brincadeira” da

aluna e continua com sua aula.

São freqüentes as conversas do tipo “paralelas” no curso de Educação Física,

assim, como no curso de Pedagogia. É preciso que o professor solicite a atenção dos

alunos, pedindo que fiquem na sala somente aqueles que “queiram aprender”, que

tenham “boa vontade”. Há um gasto de energia desnecessário, como se estivessem

lidando com alunos do Ensino Básico. É notável um casal de namorados trocarem

carícias e informações o tempo todo além de debocharem de algum assunto que requeira

atenção. Esse comportamento “infantil” acentua um “costume” que elimina a fronteira

entre o que se considera “sagrado” e “profano”, ou comportamento proscrito e prescrito

dentro da sala de aula.

Há também aqueles professores que fazem e permitem a brincadeira na sala,

naqueles intervalos entre uma aula e outra e, mesmo durante a aula quando quer chamar

atenção sobre um assunto mais prosaico, sem deixar de ser científico, conforme pontua

o professor. Veja esse episódio numa aula de antropologia no curso de Educação Física

sobre organização espacial, lateralidade e outros aspectos da corporeidade humana:

Quando a discussão descamba para a “guerra dos sexos”, por

exemplo, o professor pergunta ― o que é o que é? Quanto maior, mais

a mulher gosta? (O professor se referia a uma vaga de estacionamento,

supondo que as mulheres têm maiores problemas quando se trata de

percepção espacial ampla. Completa ele dizendo, quase afirmando,

com a licença da ciência que nós mulheres temos mais habilidade para

se situar numa geografia restrita, enquanto os homens são mais

habilidosos com o macro). Uma das alunas distorce o assunto dizendo

que tem uns que as mulheres não gostam não, por exemplo, o de seu

colega H, um jovem de 23 anos, dizendo que é muito grande! A sala

toda ri do colega e em seguida o professor lhe retorna à colega

inquirindo como ela sabe que é muito grande? Ela responde dizendo

que deu de perceber na aula de Natação, e todos aproveitam o

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momento de descontração, quando o professor aproveita para falar

sobre o corpo e suas reações quando entra em contato com a água

muito fria. Com isso a aula continua e todos ficam muito interessados

no assunto da corporeidade. Se o professor não tivesse habilidade para

aproveitar esses eventos e encaminhar o assunto da aula para alguma

coisa aproveitável, o “proscrito” teria tomado conta do “prescrito”.

Um dos grupos da Educação Física conversa sobre dança o tempo todo em sala

de aula, parecem não prestar atenção no que é ensinado. Mas podemos ver pelas falas

desses entrevistados, como disse anteriormente, que se tiver algo para falar, não vão

esperar, falam o que pensam, é uma necessidade natural do corpo o ato de exercerem a

fala. O contato com o outro, a necessidade de estar-junto, no exercício dessa proxemia,

o poder ser “fático”, estimula a conversa, mesmo nas horas em que deveriam ficar

calados, conforme manda os ritos de uma escolarização mais ortodoxa. É provável que

tenhamos que pensar noutra estratégia de conduzir as aulas, mesmo que pensamos como

adultos num trabalho com adultos, no caso do ensino superior.

3.2.2 Das Apresentações dos trabalhos

Numa sala de Pedagogia, durante as exibições de Trabalhos, os conhecidos

“seminários”, enquanto um grupo apresenta seu trabalho, elas começam a brincar com

seu corpo empurrando uma colega contra o outra pelas nádegas, vestem blusas de frio e

mostram uma para a outra. Enquanto a professora fala, um grupo tagarela sobre

instrumentos musicais, a professora chama a atenção e diz para as meninas que os

instrumentos sexuais só mais tarde... Elas riem muito, pois estavam falando sobre esse

assunto mesmo e tentam esconder dizendo que é sobre harpa e violino e continuam

rindo muito. Enquanto estão na frente apresentam e sentem muito nervosismo, brincam

com as mãos, dançam sozinhas e voltando, assim para sua postura ereta.

O 4°. Ano de Pedagogia aparenta ter uma postura mais séria para apresentação

de trabalho fazendo interpretações dos textos literários, conforme nos mostra a imagem

abaixo. Esse comportamento, pelo que pude notar, se deve ao fato de que essas alunas

estão mais perto do exercício da profissão. No ano seguinte já deverão assumir uma sala

ou outro posto de trabalho. Essa foi uma constatação categórica, na interpretação da

etologia desses sujeitos: quanto mais maduros, mais empenhados e interessados nas

aulas, e, isso serve para os dois grupos de sujeitos analisados, denotando um

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comportamento congruente com o nível da turma. Ao contrário, nos primeiros

semestres, na Educação Física e, no primeiro ano de Pedagogia, os alunos se

comportam como se ainda estivessem no 2°. Grau de ensino. Saem muito da sala, não

prestam muita atenção ao conteúdo tratado, tem uma necessidade de conversar “fora” de

hora, não respeitam a figura do professor, além de demonstrarem não saber se é esta

profissão que querem desempenhar no futuro. Eles, lembrando Michel Maffesoli, vivem

um “presenteismo”, celebrando o hic et nunc de seu tempo, sem nenhuma perspectiva

de futuro.

A imagem abaixo mostra como as alunas do 4°. Ano se empenham na

apresentação dos trabalhos, enchendo de orgulho a sua professora, quando trazem a

história simbólica para o seu mundo real, para apresentar às colegas de uma forma mais

lúdica, vivenciando os personagens das histórias em quadrinhos, mostrando para os

colegas como serão em sua futura profissão:

Fig. 52. Preparação para apresentação de trabalho,

Contos de Monteiro Lobato (Pedagogia)

Os alunos de Educação Física apresentam seus trabalhos de uma tarefa

etnográfica, que segundo a ementa da disciplina “Abordagens sócio-antropológicas da

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Educação Física”, pude ver distribui os alunos em duplas, no máximo em trios para

saírem a campo e coletar informações a partir de um protocolo de pontos a observar,

junto a um roteiro de questões, discutidos com os alunos. Antes de sair a campo eles

devem fazer a escolha do lócus que pode ser boîtes, escolas, praças, shopping, exército,

lugares de shows, parques temáticos como o da “Mãe Bonifácia”, clubes, ginásio de

esportes, feiras, shopping Center, shop popular, oficina mecânica, supermercados,

hospitais.

O professor da disciplina motiva os alunos a apresentarem e a falarem desse

trabalho realizado por eles, mostrando e ensinando assim como é feito uma pesquisa do

tipo etnográfica. Mesmo estando ainda no 2° Semestre do curso, pude observar a

satisfação na fala e na expressão dos rostos de cada sujeito, ao apresentarem suas

pesquisas. O comportamento em sala surpreende. Os alunos comentam sobre seus

respectivos trabalhos, enquanto no canto da sala um casal de namorados aproveita para

brincar, conversar, morder a mão de sua parceira, talvez esse seja um comportamento

natural e semelhante ao dos animais quando brincam com seus parceiros como nos

lembra Lorenz. Mas esse comportamento isolado não é capaz de tirar o brilho das

apresentações dos colegas, tanto que esse evento passa despercebido do professor e dos

colegas.

Alguns trabalhos mostram a expressão corporal quando o corpo pode se exibir

de uma forma diferente: seja com movimentos da dança ou sentado, de pé, ou em

movimento, por exemplo, na boîte, ou na universidade, no caminhar, ou correr do dia-a-

dia, são nos espaços pesquisados que vamos ver como se comporta a sociedade a qual

fazemos parte. O que chama atenção durante as apresentações dos alunos é que alguns

como o caso do (C.R.I./M – EDF – 22 anos), não quis falar em sua apresentação.

Mostrando uma atitude tímida, natural, eu diria para quem está começando na carreira

de professor. O corpo mostra pelos gestos, mas que pelas palavras, toda a reação do

neófito. No decorrer da apresentação o aluno (M.A.R./M – EDF – 24 anos) esboça uma

postura de constrangimento: sua muito põe as mãos na nuca, cruza os braços o tempo

todo e se movimenta pouco, além de carregar nas gírias. Esse vício de linguagem é

muito comum nesta faixa etária e própria dos alunos da Educação Física. Expressões

como “tipo assim”, “né?”, “tá ligado?”, Véio‟, “só...”, “Maluco”... Parecem ser uma

linguagem preferencial entre os sujeitos desse grupo, mais que as alunas da Pedagogia.

Ao pesquisar em alguns locais da cidade, conforme pedia a tarefa, os alunos

apresentam o que conseguiram registrar nesses loci. O aluno (S.A.N./M – EDF – 26

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anos) durante a apresentação de seu trabalho não sabia o que significava a palavra

“adorno” (a forma de se enfeitar, de se arrumar) e isso deixou ele meio constrangido

quando perguntado por algum colega que queria pôr em prova o seu conhecimento. É

típico do grupo de acadêmicos, durante essas apresentações alguns colegas fazerem

perguntas descabidas para deixar o colega “seminarista” em maus lençóis. Sabendo que

o “colega-professor” não se preparou bem para o seminário e gozando da prelibação de

ser um expectador, faz perguntas que o colega não vai dar conta de responder. Pela

observação atenta, esse rito de constranger o colega, durante as apresentações, é mais

comum quando se tratar de um colega pertence ao seu micro grupo de pertença. É uma

ética, mais de deferência do que de deboche puro e simples. Há já anunciado no

“sofrimento” do colega seminarista uma revanche tácita: “vai ter troco!”

A imagem a seguir mostra a apresentação de trabalho dos alunos de Educação

Física:

Fig. 53 – Apresentação de trabalho – EDF – UFMT

Ao fazer a pesquisa, no ato da entrevista, o significado de “adorno” o aluno disse

que seu entrevistado de uma oficina mecânica fez piadinhas com as respostas, o aluno

ficou muito irritado querendo dar uma má resposta, mas que conseguiu se controlar. Foi

possível anotar duas piadinhas contadas pelo aluno, produto da resposta de seu

entrevistado. Perguntando a um mecânico “como eles se sentariam no seu dia-a-dia?” A

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resposta do entrevistado foi: “Com a bunda!”, e, mais uma vez o aluno tenta fazer outra

pergunta: “de que maneira vocês andam?” o entrevistado respondeu “com as pernas!”.

O aluno fez com que toda a sala se divertisse com essa situação encontrada em sua

pesquisa. Essa alegria produzida pelo episódio contado pelo “seminarista” estimulou a

turma a prestar mais atenção, o que reverteu em maior entusiasmo, denotando uma

expressiva satisfação por ter cumprido sua missão.

3.2.3 Da aula à cantina: como se comporta fora da sala de aula

Ao observar as alunas de Pedagogia, pude ver em que elas ficavam fora da sala

de aula somente nos pequenos intervalos, desfrutando dos lanches da cantina, sentadas

nos corredores, conversando sobre seus filhos, sobre concursos, com suas amigas,

quando outras aproveitam o tempo para comer e se distraem da forma que podem. Outra

observação é que essas meninas estão sempre em grupos, aproveitam esse momento de

intervalo para tirar xerox, outras meninas aproveitam o tempo para fazer seus trabalhos

em cartolinas, colam imagens, e aproveitam as poltronas dispostas nos corredores do 2°.

Andar do prédio.

Os alunos, do 1°. Semestre de Educação Física, aproveitam o “fora da sala” para

conhecer a pista de Atletismo da UFMT, o almoxarifado, onde estão os parelhos de

esportes, e outras dependências, já que o Curso de Educação Física tem muito material e

isso é motivo de curiosidade para os alunos novos. Com as aulas na pista julguei um

pouco impróprio para essa aula, porque com o clima de nossa cidade o horário de 11h às

12h, quando o sol tende a ser muito quente. É comum alguns alunos se esconderem

atrás de outros colegas, aproveitam todos os materiais, mochilas e pastas se protegerem

do sol. As imagens a seguir mostram como se dá esse desconforto:

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Fig. 54 – Aula na pista de Atletismo das 11h às 12h (Educação Física)

Fig. 55 – Aula na pista de atletismo das 11h às 12h (Educação Física)

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Fig. 56 – Aula na pista de atletismo das 11h às 12h. (Educação Física)

Fig. 57 – Aula na pista de atletismo das 11h às 12h (Educação Física)

Enquanto o professor explica o que significava cada ponto da pista se é que

posso dizer assim, alguns alunos ficavam olhando para a paisagem outros já prestavam

atenção, e outros alunos preferiram ficar mais atrás para se protegerem do sol em uma

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árvore que estava um pouco mais atrás, como nos mostra a imagem 57, onde o professor

I pára e explica sobre a técnica do Salto.

Fazendo uma brincadeira na pista, de nome “Nunca três”, os alunos quebram a

“corrente”, fazendo assim a brincadeira, individual, de dupla para trabalhar a aspectos

da corporeidade, fazendo com que eles aprendessem a trabalhar como futuros

professores. O objetivo dessa atividade se é que posso chamá-la de brincadeira, é que os

alunos fiquem sempre em estado de alerta para praticar os movimentos adequados. Essa

atividade, de nome Pega-pega, faz eles trabalharem muito com o corpo, principalmente

os joelhos e tornozelos, enfim com o movimento corporal, alguns mostravam agilidade,

condições física, com corpos mostrando ter equilíbrio para a realização dessa atividade.

Os movimentos são mais flexíveis na infância, como prefere Mauss (2008), “as

crianças tem mais facilidade de agachar do que nós adultos”, desde as séries iniciais é

trabalhado o movimento corporal, de uma forma lúdica para que a criança tenha

coordenação motora e equilíbrio, portanto é importante trabalhar o Pega-pega para

fortalecer a musculatura e as articulações. Isso me levar ver que o professor de

Educação Física parece se preocupar o tempo todo com condicionamento físico dos

alunos, o que com as “Pedagogas”, o aprendizado da criança e com sua habilidade

motor, pelo que puder registrar, há uma maior preocupação nas atividades que

envolvem as “mãos”.

Uma aluna de Educação Física preferiu não participar da brincadeira, ficando

fora da pista e sentada na arquibancada, ficando ali poucos minutos, me parecia está

insatisfeita com o calor. O professor pediu para que a aluna anotasse as observações das

aulas, mesmo com essa condição a aluna não aceitou ficar no sol, nem para pegar as

informações ela prefere não assistir a aula. Ao terminar de conhecer toda a pista os

alunos sentaram perto do professor na arquibancada, para fazer observações e um

relatório para e entregar ao professor I, a aluna (T.A.L./F – EDF – 24 anos), estava

doente e com febre, portanto, não caminhou na pista, preferindo ficar sentada na

arquibancada fazendo as anotações.

Outro aluno (R.O.G./M – EDF – 23 anos) também ficou sentado na

arquibancada porque estava de sandálias, portanto, o professor não deu autorização para

fazer essa aula e pediu para que o aluno entregasse somente um relatório. A aluna

(U.I.N./F – EDF – 20 anos) chegou atrasada, e quis participar dizendo “eu gosto de

participar professor”, e entrou na brincadeira, estava com uma vestimenta preta e leve

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bem solta em seu corpo. Não foi possível observar os alunos, na aula de natação porque

a piscina se encontra no período de reforma.

3.2.4 No estágio

Ao acompanhar as alunas (R.C./F – 32 anos e I.A./F – 26 anos) na escola

“Antonio Ferreira Valentim” em seu estágio pude notar que as meninas ficavam sempre

sentadas fazendo suas observações e anotavam também a fala da professora, além de

fazer comentários sobre um aluno “especial” que queria ficar de pé o tempo todo, a

aluna (R.E.G./F – PED – 32 anos) se expressa cochicha para sua colega (I.V.A./F –

PED – 26 anos) ― “Tadinho ele só fica de pé escrevendo no quadro”. Sua colega

(I.V.A./F – PED – 28 anos) responde: “Deixa ele, ele é especial da cabeça, não do

corpo”. As duas riem baixinho para não chamar a atenção das crianças.

Durante uma semana as alunas puderam exercer seu estágio contando histórias, e

observando o método do professor. As histórias eram de livros escolhidos em sala de

aula pela sua professora orientadora, como: “Guilherme Augusto Araújo Fernandes”.

Após contar essa história a turma da primeira série ficou muito agitada. As alunas

olharam uma para a outra e tentaram acalmar as crianças com sua fala, e mostraram

obras de Arte levadas por elas também, para serem trabalhadas, mas tudo que elas

faziam deixavam as crianças muito agitadas. Nesse momento, a professora da turma,

teve que intervir e chamou a atenção dessas crianças. O que pude perceber foi uma

imperícia, própria de começa na lida de ser professor:

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Fig. 58. Estágio (observação das alunas de PED)

Fig. 59. Alunas contam história para os alunos (PED)

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Fig. 60. Alunos brincando no parquinho sob a observação das estagiárias (PED)

As futuras professoras ficavam sempre em dupla no canto do corredor paradas e

observando como os alunos entravam em sala, em seguida elas sentavam nos fundos da

sala para fazer suas observações. Sentadas em um banco de madeira, anotavam tudo o

que viam, até mesmo quando as crianças estavam brincando no parquinho, tiravam

fotos e falavam sobre a alfabetização, sobre os cadernos dos alunos e tiravam fotos das

crianças.

A forma de se sentar, sempre com suas pernas cruzadas, imprime uma marca

etológica dessas alunas. Estando num ambiente muito quente, numa sala com quatro

ventiladores de teto fazendo barulho mais os gritos das crianças de dentro da sala, ainda

podiam contar com os grunhidos de uma serralheria. Esse primeiro contato com a

realidade da sala de aula não trouxe muita satisfação às alunas. Podemos observar em

pelas falas que se seguem que quando perguntei se estavam contentes com o curso que

escolheram, as respostas pareciam querer mudar o seu próprio conceito de ser aluna,

fazendo pensar que o trabalho de um professor para essa realidade se assemelha ao

trabalho de um herói, à alegoria de uma batalha.

“Tô... quer dizer tava até ontem (...) até... segunda feira (...)

antes de entrar na sala de aula (risos) de uma escola pública, e

na minha percepção eu acho que... um desrespeito com o

professor em sala de aula, mais foi bom pra mim né? porque eu

criticava muito eles, são uma sala com 27 alunos e uma

professora de... só uma professora né, e no caso ela não é

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pedagoga, ela só... tem capacitação em alfabetização e ainda

uma criança especial pra mim eu acho que é o fim da picada

entendeu”. (I.S.C./F – PED – 26 anos)

Outras se disseram interessadas em outras empreitadas, como a de montar a sua própria

escola e a de fazer uma carreira acadêmica.

“Eu estou. Há eu sonho é... eu sonho em fazer, pós-graduação,

mestrado, num curso de educação, doutorado. Eu sei que tenho e

acredito que tenho muita dificuldade, mas a gente não consegue

nada sem ter dificuldades” (R.E.G./F – PED – 26 anos)

Olha, tô, eu gosto muito do curso, apesar de alguns momentos a

gente achar que falta valorização, às vezes eu fico assim será

que eu deveria ter feito isso mesmo mais é o que eu gosto. Fazer

o mestrado, continuar meus estudos, doutorado, continuar nessa

área, mas principalmente para pesquisa, voltado para a saúde.

Eu tenho um sonho em montar uma escola de artes (risos).

(C.A.M./F – EDF –21 anos)

Atuar na área, com crianças, jovens, sei lá, empresa

independente disso, atuar na área e dar o meu melhor e tentar

passar tudo que eu aprendi aqui para as pessoas, eu tento pegar o

meu curso e tento passar para as pessoas princípio de valores

que hoje em dia não se tem, a gente vê uma juventude uma

nação que tá perdendo moral, sentido de valores, são princípios

fundamentais pra gente e tá muito imoral. (J.O.E./M – EDF – 22

anos)

A satisfação e a insatisfação me parecem que se encerra num paradoxo. O prazer

e o desespero nas falas desses sujeitos até mesmo em seu primeiro contato com a sala de

aula faz num só tempo sonhar e entrar em desespero. Talvez isso faça com que esses

sujeitos re-pensem e os façam falar sobre a sua própria profissão.

Os alunos de Educação Física, quando realizam seus estágios dentro do campus

da UFMT, levam os alunos de uma escola para o campo de futebol. Antes de “entrar em

campo” os futuros professores, conversam com seus alunos, e há uma distração desses

meninos que pulam e brincam o tempo todo. Esses futuros professores chamam sua

atenção o tempo todo, e realizam a aula assim como as alunas de pedagogia com uma

cota suportável de paciência.

Dentro destes diferentes grupos foi possível fazer um recorte das falas dos

entrevistados, através de um questionário de perguntas e respostas, para melhor

esclarecer as informações que pode ser retiradas através das observações e ver o quanto

os alunos de Pedagogia e Educação Física se parecem em seu comportamento como foi

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apresentado no decorrer da pesquisa. Eles têm mais de semelhança no seu

comportamento, num plano geral, do que diferenças.

3.2.5 Do rito da Avaliação ao rito da Formatura

As alunas de Pedagogia fazem provas individuais, sem consulta, outras vezes

com consulta, assim como os alunos de Educação Física, em suas avaliações, fazem

prova individual e com consulta. Ao realizar a prova com consulta alguns alunos tentam

colar, ou melhor, dizendo, como eles gostam de dizer com um eufemismo valioso:

“trocar informações com os colegas”, porque sempre se aprende alguma coisa. Alguns

grupos chegam atrasados, porque estavam tirando cópias da matéria para fazer a prova.

Pude ver que tanto num grupo quanto no outro é um procedimento “natural” esses

acadêmicos, mais com os meninos da Educação Física tirarem cópias no dia, horas antes

de começar a prova. Eles também, assim, se parecem. Por esse comportamento

renitente, foi possível notar em todos os semestres, que eles não lêem o texto antes, e

deixam sempre para fazer suas cópias e tirar as dúvidas na hora da prova. É justamente

nessas horas que os alunos nerds sofrem muito assédio.

Algumas alunas da pedagogia conseguem colar, ou como disse anteriormente

conforme os alunos de Educação Física, “trocam informações com os colegas”.

Algumas alunas tentam fazer o que sabe, no início das aulas que antecede às provas,

mas ficam bem agitadas diante da organização para realizar a prova.

Na etologia da carteira da sala há um comportamento que os acompanham desde

as tenras idades. É o fato de essas carteiras estarem sempre numa arrumação enfileirada.

Esse modo de sentar parece mais natural do que cultural nas escolas, tanto que nos dois

cursos investigados a posição das carteiras é congruente nas duas turmas, fazendo

parecer que esse sentar enfileirado determina um modus faciendi de ser escolar. Esse

sentar enfileirado que os alunos adotam para fazerem suas avaliações, à alusão da teoria

de Mauss (2008), tanto na Pedagogia quanto na Educação Física, descreve uma “técnica

corporal”, para os alunos e os professores ser e estar dentro de uma sala de aula.

O aluno desenvolve a técnica de sentar, (com pernas cruzadas, deitado nas

carteiras, sentado normal com sua coluna ereta, outros preferem descansar seus pés nas

carteiras do colega da frente, descansam seus pés no chão, assim vão se ajeitando do

jeito que podem e na forma que seus corpos se sentem mais aconchegados em seu

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ambiente habitual). Na técnica de colar, (olham por baixo dos cabelos dos colegas,

conseguem virar o corpo, sem que o professor note a sua virada, levantam para fazer

perguntas ao professor e na volta a sua carteira dão uma “espiadinha” na prova do

colega). Há a técnica de se espreguiçar, (se levantam e esticam todo o corpo, outros

conseguem alongar somente os dedos, alongam as pernas que ficam muito tempo

dobradas, fazem alongamentos com suas cabeças, voltando-a para cima, para baixo,

para o lados, fazendo com que todo o corpo seja alongado). Há a técnica de bocejar,

(alguns alunos têm a técnica de pôr a mão na boca, outros viram para os colegas para

bocejar, talvez seja para fazer com que o colega se distraia um pouco e volte fazer a sua

prova, mais descontraído). A técnica de trabalhar em grupo e até mesmo de ficar

sozinho, de emprestar o grampeador ou a borracha, para dar uma olhadinha na prova do

outro, ou ter a técnica de chegar atrasado para não fazer a prova individual. Para ter toda

essa manha, ou melhor, desenvolver essa sofisticada “técnica”, basta ser um aluno.

No final do ano de 2009 e 2010, acompanhei também a formatura do quarto ano

de Pedagogia em suas festinhas, em alguns ritos de despedida, como a “Aula da

Saudade”, onde fizeram descerramento de placa e baile de formatura, também

customizaram suas camisetas assim como vimos na customização dos uniformes das

meninas, nas imagens, 43- 44 e 45 dessa pesquisa.

As meninas se divertem muito com esse momento tão esperado, quando elas

fazem faixas para mostrar quem é a mais bela, a mais inteligente, entre outros

predicados pessoais. Nessa hora elas enfeitam a sala de comemoração com uma cor que

predomina no que pude observar durante esses dois anos em turmas diferentes, a cor

vermelha, talvez seja a cor preferida dessas alunas, por simbolizar o universo feminino?

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Fig..61.Preparação para formatura (PED – UFMT).

Fig. 62 Se agrupam para fotografar – aula da saudade (PED – UFMT).

Nas aulas de ginástica laboral os alunos fazem os exercícios conforme a

professora G ensina. Eles se esticam ao som de uma música, a professora deixa sempre

que um aluno conduza esses movimentos, talvez eles já estejam treinando para atuar em

sala como futuros professores. Nas imagens abaixo podemos ver que esses alunos

vestem roupas leves, confortáveis para realizar essa aula, que exerce a função de

movimentar o corpo.

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Ao terminar a aula todos os alunos se reúnem para fotografar para sua formatura,

alguns alunos aproveitam o momento para tirar dúvidas com a professora sobre a aula

dada, e aproveitam o momento que estão com roupas leves para fazerem suas fotos para

a formatura, realizam os bailes de formatura, usam saltos e roupas de festa deixando de

lado toda a antiga vestimenta apertada, pois agora o rito manda que sejam formais.

Fig. 63. Aula de ginástica Laboral (Educação Física)

Após a aula os alunos se divertem, conversam, e logo em seguida se agrupam

para fotografar sem se preocupar com o suor e o cheiro forte que predomina nos corpos

de um aluno de Educação Física.

Fig. 64 – Se agrupam para fotografar (formatura) – Educação Física

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Além de se agruparem para fotografar, também trabalham em congressos dentro

da instituição e fora dela, apresentando seus trabalhos, participando de grupos de

estudos a exemplo do GEPECOL ― Grupo de Estudos e Pesquisa sobre a Corporeidade

e a Ludicidade ―, sob a orientação dos professores, assim como as alunas de pedagogia

que participam de grupos de estudos como o PET, e através desses grupos podemos

observar a inquietação que esses alunos têm para descobrir um novo conhecimento e

através dos grupos de estudos, eles são remunerados para que possam assim ter um

crescimento intelectual, tendo oportunidade mais tarde de entrar num grupo de estudo e

pesquisa stricto sensu.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Todas as vozes ouvidas, imagens e observações, como nos mostram nas

análises dessa pesquisa, com alunos de Pedagogia e de Educação Física, em sala, nos

corredores, cantinas, pista de Atletismo, quadra poliesportiva, e na forma de sentar,

andar, caminhar, se vestir, se alimentar, falar dos acadêmicos da “Universidade Federal

de Mato Grosso”, conduziram a alguns esclarecimentos ou pontos em que comungam,

uma etologia no lócus onde realizou-se essa pesquisa.

O primeiro esclarecimento foi que os acadêmicos se assemelham em seu

comportamento. A Educação Física e a Pedagogia têm uma etologia semelhante mesmo

nas atitudes de proscrição. Talvez seja esse modus vivendi revelado pelo comportamento

individual que “cimenta” as atividades do grupo ou de seu “comportamento tribal”

como assevera o sociólogo francês Michel Maffesoli.

Os acadêmicos de um modo em geral se comportam, assumindo movimentos

com gestos estereotipados, muito específicos de cada situação dentro e fora da sala de

aula, que acabam orientando as suas atitudes, tão próximo daquilo que Montagu (1988)

pontuava sobre a utilização exagerada da comunicação verbal, chegando inclusive a

excluir de nossa experiência o universo da comunicação não verbal, para o nosso

acentuado empobrecimento. Para esse autor há na “ocidentalização do corpo” (grifo

nosso), uma inexistência de toque, ou seja, de uma comunicação que exclui palavras.

Essa falta de pele, a que ele se refere o autor, pôde ser visto nos encontros de pesquisa

quando os alunos tendem a sentar-se sempre no mesmo lugar, distanciando dos demais

colegas que se isolam em suas respectivas “panelinhas”.

O segundo esclarecimento, decorrente do primeiro se refere às “amizades” que

se formam dentro da sala de aula. Embora não sejam continuadas numa vida social, fora

da “academia”, mesmo assim, mantêm-se em exercícios feitos sempre com os mesmos

colegas, e que se refinam com o toque corporal entre gêneros. Esses laços celebram uma

corporeidade e afinam uma “técnica corporal”, para ser caro à expressão de Marcel

Mauss. A ausência de pele, uma marca das grandes metrópoles, no plano micro-social

da sala de aula ou no interior dos grupos, na possibilidade de toque, se releva pela

experiência de pele, pela finura do tato.

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A realidade veio mostrar que os sujeitos, observados são muito parecidos, em

sua forma de sentar, na expressão do rosto, no emprego das falas, na familiaridade das

expressões lingüísticas e corporais, como os apertos de mãos que trocam nos mostram

como são “tribais” em sua etologia. Este é o terceiro esclarecimento.

Pude ver também que tanto num grupo quanto no outro é um procedimento

“natural” desses acadêmicos, mais com os “alunos” da Educação Física tirarem as

cópias da matéria no dia, horas antes de começar a prova. Eles também, assim, se

parecem, pela escassez de tempo que dedicam ao estudo. Eles estão sempre em atraso

com o conteúdo. Alguns me confirmaram que sua agenda de tarefas está sempre

“transbordando” do tanto de “coisa que tem pra guardar”, e este pode ser o quarto ponto

em comum.

O quinto ponto em comum é o de que há uma divisão de grupos muito fechados,

formando suas “panelas”, entre uma licenciatura e outra. O corpo mostra que a cultura

molda um êthos nas pessoas desde o modo de se vestir até a maneira de se comportar

diante de uma determinada situação, que é normalmente influenciado pelo ambiente que

se ocupa, pela classe social ou pela “tribo”, para lembrar um termo usado por Michel

Mafessoli.

Os dados da pesquisa nos revelam com as informações coletadas, a partir de

imagens e conversas com os acadêmicos, que apesar de alguns apresentarem diferenças,

resultantes de sua situação financeira, no modo de ir e vir, de ser, vestir, falar, ler, se

divertir e ocupar esses lugares, eles se assemelham em quase tudo. Há um “corpo

social” tangível no modo de eles se comportarem em público. Eles se parecem em seus

assuntos cotidianos para discutirem sobre futebol, aulas, concursos, mulheres, sexo,

política, violência urbana, dinheiro, temas que monopolizam a conversa para os

“machos” e moda, namorado, novelas, futilidades, trabalho, shopping center, filhos, são

a predileção das “fêmeas”, conforme vimos nas análises.

Um apego à “territorialidade”, no uso que o “animal” faz do espaço público,

tornando-o “privado”, pode ser o sexto ponto de esclarecimento: é muito comum aquele

aluno sentar naquela carteira, naquele canto esquerdo da sala, o ano todo. Quanto aos

locais de descanso, como a cantina, os corredores, o estudo pôde mostrar que os

indivíduos de vários estilos e tribos procuram brincar, jogar Truco, como uma forma de

lazer, conforme pode ser visto pelas falas de dois sujeitos, que aqui enxergam no

Intervalo ― o antigo Recreio ―, o espaço-tempo em que o Homo ludens explora a sua

necessidade de brincar: “jogo truco, copio matéria que não tenho, converso com os

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amigos, como na cantina”. (C.R.I./M – EDF – 22 anos) e “como, jogo Vôlei, ajudo os

colegas a jogarem, jogo Truco”. (K.A.T./F – EDF – 19 anos).

Há nesses ambientes um entrosamento entre amigos que faz “quebrar” aquela

vida rotineira, aliviando o estresse cotidiano, num lugar que parece ser mais agradável

que a sala de aula. As respostas dalguns entrevistados reiteram aquilo que eles têm

vivido. Esses sujeitos só se completam mesmo quando se divertem? Para repetir com o

poeta Schiller em seu famoso aforismo: “o homem só se completa quando brinca”.

Outro aspecto do comportamento desses alunos observados está no sentido de

que esses sujeitos ficam mais à vontade no seu modo de ser e de estar no campus. Há

uma aura de contentamento e um despojamento no modo de vestir e de falar dos mais

variados assuntos. Esse pode se constituir no sétimo ponto em comum. Outros aspectos

sobre as análises como se vestem, se alimentam, se calçam, se namoram, se deslocam...

neste meio, servem de diapasão não apenas como detalhes, mas podem nos servir para

perceber que nosso corpo é regido por regras sociais que são obrigadas a cumprir. Há

uma comunicação não verbal que fala o tempo todo. Seja no ato de vestir, na expressão

dura do rosto, na insatisfação durante as aulas, no desconforto da poluição sonora, no

isolamento individual, essa corporeidade vai gritando, se ajeitando no jeito que pode.

Com base na teoria de Marcel Mauss (1974), o comportamento humano não se

faz somente por uma consciência individual, se não também pela mentalidade coletiva.

O homem tende a agir de forma similar ao seu grupo seja qual ele for, para ser aceito. E

ser aceito por algum grupo traz ao indivíduo um bem-estar, de maneira que o exterior

reflete no interior. Cada ambiente dessas duas licenciaturas forma uma idiossincrasia

social, com no uso das técnicas corporais. É através destas técnicas que podemos

identificar de qual ambiente o indivíduo pertence. Os fatores econômicos, culturais,

sociais entre outros têm um papel decisivo no comportamento de ser de cada grupo.

Antes de serem culturais, os homens como os animais são mais naturais do que possam

imaginar.

As considerações que apresento, nesta saída do “campo”, são feitas,

primeiramente, a propósito de seu caráter não finalizante. Ao vivenciar com esses

sujeitos da pesquisa durante esses dois anos, no campo da Universidade Federal de

Mato Grosso e de ter esses teóricos como interlocutores sobre a temática tratada. Com

Maffesoli me dei conta de que o estar-junto, o viver em coletividade só se dá quando

esses indivíduos vivem e convivem nesses espaços que é a sala de aula, os corredores,

as cantinas, as pistas esportivas, os espaços para vazão de sua ludicidade, os cantinhos

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para o namoro e alimentação. O estudo aqui relatado passa a ser de agora em diante não

mais que um instrumento de trabalho a servir de base para as reflexões sobre e para as

práticas do comportamento etológico na UFMT dessas duas licenciaturas de Educação

Física e de Pedagogia.

É com essa orientação que esse estudo se destina, isto é, ver esses sujeitos em

sala de aula, em pátios, em espaços ociosos de aulas vagas, em pistas para práticas

esportivas, em estágios para aula de campo, em cantinas para lanches, em rodas para

assuntos de uma vida sem importância, em grupinhos sobre a vida prosaica, em troças

para jogar conversa fora...

Como mensagem educativa, mais que uma proposição resultante da pesquisa

feita, a partir das observações desses grupos, cada indivíduo ou cada grupo, pelo seu

comportamento, tem a nos dizer, através da linguagem verbal e não verbal, mais a dizer

pela sua vontade do que pela obrigação de estar nesses ambientes. Esse êthos como

labora o poeta Schiller (2002, p. 27) em uma de suas cartas sobre a educação estética do

homem, nos diz sobre a vontade do homem que deve sobrepor a qualquer imposição ou

dever. É isso que deixa transparecer na etologia desses sujeitos como veremos a seguir.

Eles se comportam muito mais pela força de sua natureza, do que pela imposição

normativa da cultura.

Dentro destes dois grupos foi possível fazer um recorte das falas dos

entrevistados, através de um questionário de perguntas e respostas, para melhor

esclarecer as informações que pode ser retiradas através das observações e ver o quanto

os alunos de Pedagogia e Educação Física se parecem em seu comportamento como foi

apresentado no decorrer da pesquisa. Eles têm mais de semelhança no seu

comportamento, num plano geral, do que diferenças.

É provável que tenhamos que pensar noutra estratégia de conduzir as aulas,

mesmo que pensamos como adultos num trabalho com adultos, no caso do ensino

superior. Se essa etologia é boa ou ruim as evidências científicas não podem afirmar,

mas pode quem sabe, ajudar esses sujeitos como futuros professores a serem mais

tolerantes em sua conduta social.

Respondendo às questões de investigação deste trabalho, congruentes que são

com o estudo da corporeidade, as aulas e os encontros com os sujeitos que serviram de

laboratório para as observações da pesquisa puderam exibir situações em que achei por

bem traduzi-las em proposições, que aqui denomino de “mensagens educativas”. Uma

riqueza de movimentos, sem negar o Homo ludens e, sem inibir a criatividade e a

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animação dos alunos, assim, pôde registrar com seus professores as situações que

possibilitaram à autoconfiança, a auto-estima, a autonomia e o talento para a abordagem

crítica dos alunos. Segue aqui as “mensagens educativas” que em outras pesquisas

teriam o nome de proposição.

Como descrever esses sujeitos? Por serem indivíduos de faixa etária diferentes,

origem social diferente, aspirações profissionais distintas (uns querem ser treinadores

esportivos, fisiculturistas ou professores, outras querem ser gestoras escolares,

professoras ou supervisoras), mesmo assim, apresentam uma semelhança no modo de

ser e estar quando ocupam esses espaços que têm em comum. Nós como professores

universitários como trataremos esses sujeitos, em sua maioria, saindo da adolescência?

Segue aqui alguns pontos propositivos, que servirão de “mensagem educativa”.

Primeiro, se os alunos se assemelham no modo de se comportarem, que o

professor se torne mais tolerante, tirando proveito dessa etologia acadêmica. Eles estão

dizendo, a partir de uma linguagem silenciosa que preferem ser mais “naturais” no

ambiente escolar, tão cheio de normas e exigências, que sem as quais é impossível a

sobrevivência do Homo faber, qualquer que seja a sua vocação: gestor, professor,

supervisor, fisiculturista, treinador...

Segundo, que o professor aproveite as “panelas”, os micro-grupos para realizar

trabalhos coletivos como os Seminários, as Roda de conversa, os Diálogos pertinentes

ao assunto em estudo. Eles gostam de viver em grupos, eles preferem um “estar-junto”,

mesmo que seja para, como diz Maffesoli: “matar o tempo da vida social”. A deixa

pode essa: estruture uma aprendizagem que envolva mais o grupo.

Terceiro, se eles se comportam de um modo, a sair da sala para jogar Truco na

cantina, para bater papo nos corredores, para namorar e para outras desculpas

indolentes, talvez esteja aí a dica do Homo ludens à “caça” de uma aula mais

estimulante, mais criativa, mais animadora. Pode ser a hora apropriada para incluir

numa metodologia que possa tratar o assunto com o interesse deles. Como por exemplo,

pude experimentar, enquanto professora de uma escola particular, quando o assunto

parecia se esgotar, mesmo assim eles ficaram após o final da aula sem perceber que o

horário já havia terminado.

Quarto, se há no comportamento etológico desses sujeitos essa “mania

proxêmica” de se juntar aos pares ou em grupos, aproveitar com uma metodologia que

priorize o estar junto natural do grupo, diminuindo, se possível a carga dos encontros

com aulas expositivas.

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Quinto, se suas “agendas estão sempre a transbordar de tanta tarefa”, poderia

estar aí a crítica de nossa pedagogia “entupitiva”? Em todas as salas que visitei e

observei, foi possível enxergar essa reclamação. O excesso de conteúdo, sem tirar a sua

importância, pode servir de registro de aula chata ou cansativa?

Sexto, no uso que fazem do espaço ─ a territorialidade ─ sendo da natureza de

todo “bicho” (animal ou cultural), ter um ponto de segurança, ficar num lugar só, traz a

mensagem: “aqui é o lugar que eu me sinto seguro!”. Isso leva o indivíduo a confundir o

público com o privado, porque é o seu lugar de segurança, a zona de conforto, o lugar

que ele aprende ─ o sagrado. Interpretado por alguns professores como um gesto

patológico, é na verdade um traço filogenético que a etologia considera como “lócus de

segurança da territorialidade” de qualquer animal. Os animais domésticos como cães e

gatos se sentem felizes quando mantêm sempre o mesmo lugar, para alimentação e para

pouso.

Sétimo, se “o aluno não senta direito”, como pude assistir professores corrigindo

a postura, pode servir como ponto para que o “futuro professor” chame à atenção do

aluno a fazer a correção corporal de modo a escoar para outras assepsias. A mensagem

educativa seria a de trabalhar outras “limpezas”: problemas com a fala, com a escrita,

com a técnica, no caso específico da Educação Física, com as metodologias no caso das

pedagogas. Corrigir é tarefa “sagrada” de todo professor, mas não ao ponto que o aluno

sinta falta daquilo que ele mais gosta de ser, do jeito que eles mais gostam de estar:

juntos, se comportando no modo mais natural possível.

Estas são as minhas notas finais para uma pesquisa de cunho educacional.

Certamente seriam outras se os objetivos fossem outros, se a metodologia empregada

fosse outra e se as questões que “nortearam” fossem outras. Mas quem se encarrega de

investigar o lócus escolar fica refém de produzir respostas que se alinhem aos seus

objetivos, as suas questões problematizadoras e às heurísticas utilizadas.

Deixando o campo, agora, é obvio que saio com a sensação de ter esgotado

sobre o assunto, aliás, foi de longe esta a minha pretensão. Mas deixo o lócus, com a

mesma coragem para dizer que a vida é desse jeito, que há ainda e sempre muita coisa a

(des)velar, assim mesmo, para “tirar o véu” do fenômeno elegido, afinal esse é o doce

enlevo de qualquer investigação, que se pretenda científica.

É provável que o escritor mineiro João Guimarães Rosa pode traduzir com suas

doutas palavras o que o trabalho queira dizer como derradeiras palavras:

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“O correr da vida embrulha tudo, a vida é assim: esquenta

e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta.

O que ela quer da gente é coragem”. (Guimarães Rosa,

Grande Sertão: Veredas).

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REFERÊNCIAS

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ANEXOS

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Roteiro de entrevista realizado com os alunos de Pedagogia e de Educação

Física da UFMT

- Nome do aluno

- Curso

- Idade

- Naturalidade

- Endereço

1. Do que você mais gosta nas aulas? E das outras disciplinas você gosta?

2. O que você faz no intervalo?

3. Sobre o que você conversa com os amigos durante o urso?

4. Você conversa muito em sala de aula? Em que situação?

5. O que é permitido (Prescrito), fazer em sala de aula? E o que é interdito (Proscrito)?

6. Qual a disciplina que trabalha com o corpo que você mais gosta?

7. Você já se manteve irritado e calado durante as aulas. Por quê?

8. Os alunos se interagem com todo o grupo durante as aulas ou predomina os

grupinhos as “panelinhas”?

9. Como o ambiente tem favorecido o seu aprendizado? (Luminosidade, os aspectos que

a sala se encontra...)

10. Você se senta sempre no mesmo lugar e perto dos mesmos colegas?

11. Sobre o que vocês conversam na sala, nos intervalos e fora da universidade?

(Assuntos).

12. Você está contente como curso que escolheu? Com que você sonha depois de

terminar o curso?

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Tabela da fala dos alunos (Pedagogia e Educação Física da UFMT)

Curso: Educação Física: Educação Física

Do que você mais gosta nas aulas? E das outras disciplinas você gosta?

O conhecimento - Não tem o que mais gosta - Só não gosta de Química - Curte o curso - Da

parte que lida com crianças – Educação Infantil – Aulas práticas – Por enquanto o

desenvolvimento – Acho que das didáticas dos professores - O desenvolvimento – Acho que

das didáticas dos professores – De alguns professores de GRD (Ginástica Rítmica

Desportiva) – Didática – Anatomia e Biomecânica questão voltada para o corpo ‒ A questão

biológica ‒ Da maneira que o professor da aula ‒ Teoria da área humana ‒ Abordagem Sócio

Antropológica da Educação Física – Gosta de tudo ‒ Não tem área específica ‒ A que mexe

com crianças, Jovens e idosos ‒ Práticas Curriculares do Ensino Fundamental – Saúde

Escolar ‒ Diversidade das aulas- Gosta de todas.

O que você faz no intervalo?

Socialização – Conversa com colegas (Amigos) ‒ Faz um tipo de atividade para passar o

tempo ‒ Nada ‒ Espera ou vai embora ‒ Come ‒ Conversa ‒ Joga vôlei ‒ Ajuda os colegas a

jogarem ‒ Joga truco ‒ Não tem intervalo ‒ Fica na cantina ‒ Na sala de informática ‒ Vai

até a quadra para fazer uma brincadeira ‒ Jogar bola ‒ Ping-pong ‒ Alguma coisa ‒ Copia

matéria que não tem ‒ Come na cantina – Depende do que tem para fazer ‒ Ler ‒ Vai brincar

‒ Trabalho com projetos – Joga truco.

Sobre o que você conversa com os amigos durante o curso?/ Você conversa muito em

sala de aula? Em que situação?

Coisas do cotidiano – Assuntos de família – Trocam de experiências no esporte – Futebol‒

Assuntos do curso ‒ Estágio ‒ É impossível deixar de comentar uma situação – Coisas que

acontecem fora da faculdade ‒ Conversa bastante em sala ‒ Festa do final de semana –Prova

‒ Se tiver aula desinteressante conversa ‒ Coisas particulares ‒ Não ‒ Sobre a dificuldade

que teremos depois do curso ‒ Não converso – Lazer e outras coisa mais ‒ Quando a aula

não agrada conversa ‒ Questão da faculdade – Quando a aula não está atrativa – Outras

coisas – Novelas – Namorados – Sobre o que rola – Não, não gosto de conversar – Sobre as

aulas e festas – Quando a aula do professor tá chata conversa bastante ‒ Eu sou conversador

‒ Eu converso na hora que vai fazer debate ‒ Fazer perguntas é legal ‒ Tirar dúvidas da

disciplina – Sobre o grupo de pesquisa – Sair para festas ‒ Quando não vai interferir no

conhecimento conversa dentro da sala ‒ Quando não vai fazer falta – De tudo um pouco –

Festas – Mulheres ‒ E festa de novo ‒ Dizem os professores que eu converso bastante, eu

acho que não.

O que é permitido (Prescrito), fazer em sala de aula?

Prestar atenção – Fazer perguntas – Participar das aulas – Escutar comentários que sejam

pertinente a matéria ‒ Silêncio ‒ Falar baixo ‒ Ficar quieta ‒ Prestar atenção ‒ Copiar do

quadro ‒ Anotar o que o professor fala ‒ Participar ‒ Prestar atenção na explicação – Anotar

tudo o que o professor fala ‒ Pelo professor a gente tem que ficar quieto e prestar atenção no

que ele fala – Perguntar – Questionar ‒ Colocar nossa opinião – Tirar dúvidas ‒ Tudo é

permitido.

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E o que é interdito (Proscrito)?fazer em sala de aula?

Distraí a aula ‒ Chamar a atenção pra si ‒ Conversar na sala ‒ Desviar a atenção do

professor – Tirar a roupa ‒ Conversa paralela ‒ Incomodar o colega e o professor ‒ Barulho

‒ Arrastar carteira ‒ Qualquer tipo de barulho ‒ Ficar entrando e saindo da sala ‒ Conversar

‒ Atrapalhar o bom andamento das aulas ‒ Não prestar atenção ‒ Não participar ativamente

– Bater no professor ‒ Xingar o professor – Não tem muitas regras não, isso aí já vem de

berço – Desrespeito com o professore com os colegas – Só não pode ficar pelado- A

conversa ‒ A falta de atenção vem dizer que atrapalha o professor ‒ Conversar ‒ Comer na

sala de aula – Dormir ninguém falou nada ainda ‒ Brincar – Ri ‒ Atender celular ‒ Comer

dentro da sala, dependendo do professor – Bagunçar ‒ Desrespeitar o professor – Tirar a

roupa – Namorar ‒ Ficar de (amassação) dentro da sala.

Qual a disciplina que trabalha com o corpo que você mais gosta?

Ginástica Geral – Dança – Educação Escolar Infantil – Basquete – Futebol – GRD –

Fisiologia do exercício ‒ Recreativas – Anatomia – Biomecânica do Movimento –

Atividades Rítmicas –ginástica.

Você já se manteve irritado e calado durante as aulas. Por quê?

Não – Não teve esse tipo de experiência ainda – Muitas vezes já ‒ Atitude de algum

professor que não concordei – Já pelo fato de TPM – Fazer trabalho com um colega que

acabou de se irritar – Já, problemas pessoais mesmo ‒ Já por ignorância dos colegas – Não

teve motivo para se magoar na sala de aula – Já por às vezes colocar o nosso ponto de vista e

o professor ou o aluno tirar sarro ou achar infantil, isso irrita – Nunca me irritei não –

Discussões com professor – Quando a aula não tem rendimento.

Os alunos se interagem com todo o grupo durante as aulas ou predomina os grupinhos

as ―panelinhas‖?

Conversa com todo mundo – Mais ou menos – Não – Tem bastante panelinha e eu faço parte

de uma – Panelinha sempre tem – O professor faz sorteio para interagir os alunos – Não tem

grupinhos não – Predominam as panelinhas – Hum! Com certeza, principalmente na minha

sala – Existem pequenas panelinhas – A turma é integrada – Predomina – Famosa panelinha

– Sempre não jeito – Vai pela afinidade.

Nome dos grupinhos, panelinhas:

Panela inteira – Não tem nome – Grupo dos belos – Dos coloridos que tá na moda – Lado A

e Lado B (Lado A dos pobres e lado B dos ricos).

Como o ambiente tem favorecido o seu aprendizado? (Luminosidade, os aspectos que a

sala se encontra...)

Ambiente favorável – Saudável – Alunos tem hábitos saudáveis – Respeitam a aula –

Procura deixar o professor à vontade – Os professores tem se mantido de forma lúcida:

explicam bem tiram dúvidas – Melhor do que era – O teto caiu mais já arrumaram – Tá

tranqüilo – Clima bom – As carteiras não tem dificuldade – Está normal – Antes não tinha

esse ginásio – Hoje é tudo confortável o ginásio as salas tem ar condicionado – Há! o

ambiente não é favorável – Algumas salas estão boas – Algumas salas estão escuras – Não

vou dizer que é negativo porque já estive em situações piores – Não tenho que se queixar de

nada – Precisa de iluminação é muito escura – A sala do quarto semestre é melhor que a do

segundo – Pelos professores usarem data show fornece uma visualização melhor – Acha

ruim no bloco a água (da faculdade inteira) bebedouro sujo – Energia – Sim tem resposta.

Você se senta sempre no mesmo lugar e perto dos mesmos colegas?

Não – Depende do horário que chegar na sala – Sempre no mesmo lugar e perto das pessoas

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que eu convivo – Sim, sempre – Sempre – Sempre do lado A – Sempre desde o primeiro

semestre – Quase sempre – Gosta de sentar na frente mais varia, senta aqui, lá – Ninguém

senta.

Sobre o que vocês conversam na sala, nos intervalos e fora da universidade?

(Assuntos).

Música – Filmes – Esporte – Atualidades – Livros – Cinema – O assunto que o professor

estiver explanando – Baboseiras – Qualquer coisa – Tudo o que fez no dia – Trabalhos –

Profissão – Como que anda a vida – O que tem feito – MSN – Estágio – Sobre filhos – Sobre

o que fez no dia anterior – O que vai fazer no próprio dia – No final de semana – Os assuntos

não são muito interessantes – Quem ficou com quem – Quem bebeu – Quem tomou porre –

Quem tá namorando com quem – Quem terminou o namoro – Geralmente esporte – Os

homens falam sobre as mulheres – As mulheres eu não sei o que falam – Família – Sobre

tudo – Casamento – Filhos – Dos alunos – Coisas que fizemos engraçada na sala – Vida

cotidiana – Progressão de festa do final de semana – Atividades a serem realizadas – Sobre a

disciplina – Sobre monitoria – Bafão – Coisas boba – Concursos - Sobre inter universitário –

Não tem específico – Assuntos que está em alta – Fofoca de alguém da sala – Depende do

lugar que estiver – Na igreja fala sobre os mistérios – Sobre o grupo que faz parte – No

trabalho sobre academia – Com os alunos sobre dúvidas das aulas – Lá fora conversa sério

sobre coisas da faculdade – Tem hora que tá só brincando mesmo.

Você está contente como curso que escolheu?

Sim ‒ Está realmente ‒ Tô, tô contente ‒ Tô bem contente ‒ Sim e muito ‒ Estou muito

contente ‒ Tô ‒ muito apaixonada ‒ Tô muito ‒ Tô gostando ‒ Avê, muito contente velho ‒

Olha tô ‒ Eu gosto muito do curso ‒ Será que eu deveria ter feito isso mesmo, mais é o que

eu gosto ‒ Com certeza.

Com que você sonha depois de terminar o curso?

Arranjar um emprego estável – Abrir uma academia de natação e hidroginástica – Não tem

claro na cabeça, tá deixando o curso levar – Quer fazer Especialização, Mestrado, Doutorado

– Montar uma academia diferenciada, não dessas que a gente encontra nos bairros – Fazer

uma formação continuada – Se abrir bacharelado vou ter que especializar em fisiologia ou

educação física escolar – Dar aula para criancinhas – Realizar profissionalmente – Seguir

carreira – Dar aula aqui na UFMT – Empresa – Passar tudo o que eu aprendi – Continuar

nessa área principalmente pra pesquisa voltado para a saúde e tem sonho em montar uma

escola de artes – Dar aula – Vai fazer o que gosta.

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Curso: Pedagogia

Do que você mais gosta nas aulas? E das outras disciplinas você gosta?

Gosta de ver os alunos apresentarem ‒ Só teve uma disciplina mais gostou ‒ Está ansiosa

para aprender sobre uma disciplina sobre a Educação Infantil ‒ Por enquanto a disciplina de

pesquisa ‒ Psicologia ‒ Gosta das outras disciplinas também ‒ Dos conteúdos ‒ Dos

Professores ‒ Quando os professores abordam a temática políticas públicas educacionais ‒

Gosto dos professores que domina o conteúdo e não fica lendo linha por linha da apostila ‒

Interessa por todas as disciplinas ‒ Deixa eu pensar bem, aulas de campo ‒

O que você faz no intervalo?

Biblioteca ‒ xérox ‒ cantina ‒ resolve problemas burocráticos, sobre comissão de formatura

e outras reuniões do gênero ‒ converso com os colegas ‒ vai ao banheiro ‒ toma café ‒

Conversa um pouco com (R.G. 32) ‒ vai ao laboratório de informática pesquisar concursos e

outras coisas ‒ conversa e lancha ‒ vai na cantina e volta pra sala depois ‒

Sobre o que você conversa com os amigos durante o curso?/ Você conversa muito em

sala de aula? Em que situação?

Troca informação sobre a vida, estão se conhecendo agora ‒ conversa para saber como é o

primeiro ano ‒ sobre o que você já fez ‒ de onde vem ‒ alguma coisa que passou no jornal ‒

sobre o curso ‒ sobre a pedagogia ‒ raramente sobre a vida pessoal ‒ sobre alguma

indignação aí comenta alguma coisa ‒ ou algo que viu no dia-a-dia ‒ a maioria das vezes é

em relação a universidade ‒ sobre o professor que está no módulo ‒ a maneira do professor

conduzir o trabalho ‒ sobre o que acontece no dia ‒ sobre as aulas ‒ coisas mais informal ‒

está no final do ano não tem como dar descanso não ‒ conversa pouco em sala de aula ‒

conversa muito‒ fala bastante com os amigos e com os professores até de mais ‒ não, é falta

de respeito ‒ converso discretamente (risos) ‒ só respondo se perguntar ‒ conversa só o

necessário ‒ geralmente a maioria das vezes para comentar sobre o assunto que descorda ou

concorda ‒ a maioria das vezes ‒ conversa com determinadas pessoas mais do que com

outras ‒ conversa assuntos relacionados a sala ‒ Líder ‒ sobre decisões camiseta ‒

confraternizações ‒ ler o que o professor manda ‒

O que é permitido (Prescrito), fazer em sala de aula?

Não teve situação de proibição na sala de aula ‒ pode comentar sobre alguma dúvida ‒

debater quando tem uma questão ‒ prestar atenção é lógico ‒ fazer perguntas para os

professores ‒ fazer questionamento se é pós ou se é contra o que está sendo lecionado ‒ é

permitido conversar sobre a matéria ‒ debater com a professora ‒ fazer perguntas para a

professora ‒ parte dos alunos é manter uma postura perante o educador que está ali ‒ o aluno

ter uma maneira de se portar dentro da sala de aula ‒ não tem muitas normas na faculdade ‒

chegar na hora certa ‒ tem professor que não exige muito não ‒

E o que é interdito (Proscrito)?fazer em sala de aula?

Não pode atrapalhar a aula ‒ atrapalhar a professora ‒ falar no celular ‒ atrapalhar a

professora com conversa ‒ interferir quando uma pessoa estiver explicando ‒ celular ‒ eles

não falam o que não pode fazer ‒ seria ideal não conversar tanto para não atrapalhar ‒

acredita que é muita conversa entre os colegas quando o professor está explicando a matéria

‒ não interromper a aula do professor ‒ não conversar demasiadamente, escandalosamente

dentro da sala ‒ não ficar fazendo colocações previamente, por exemplo: meu vizinho, o

filho de não sei quem ‒ o fato de muitas mães levarem seus filhos para a sala de aula de 3 a 4

filhos por dia ‒ ficar focado só nas crianças ‒ do professor não está aberto a críticas, e

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quando recebê-las ter uma postura exarcebadas ficar se defendendo ao invés de manter

diálogo ‒ não chegar atrasado ‒ não atender celular ‒

Qual a disciplina que trabalha com o corpo que você mais gosta?

Depende do professor ‒ Matemática ‒ dinâmica ‒ jogos‒ tem umas disciplinas que tem uma

pedagogia mais didática e aborda dinâmica em grupo ‒ não teve nenhuma ‒ com o corpo,

assim você fala, cabeça, corpo, corpo inteiro? Psicologia, trabalha a mente que faz parte do

corpo ‒

Você já se manteve irritado e calado durante as aulas. Por quê?

Não, por enquanto não ‒ já quando eu ouvi uma coisa que não concordava e teve que ficar

quieta para não ter uma discussão maior ‒ com certeza ‒ até o tolo calado se torna sábio‒

não é bom para o coração ‒ sim muitas vezes quando quer escutar a explicação do

professor e não pode porque tem grupinho conversando ‒ não, quando fica irritada

fala ‒ já porque os colegas não compartilham da mesma idéia ‒

Os alunos se interagem com todo o grupo durante as aulas ou predomina os grupinhos

as ―panelinhas‖?

Predominam as panelinhas (grupinhos) – com certeza os grupinhos – grupinhos – a sala já

está bem dividida – eu não faço parte de nenhum.

Nome dos grupinhos, panelinhas:

Burguesia – Proletariado – os intelectuais – turma do fundão – os pobres – não tem nome –

prevalecem os grupinhos – velhinhos – riquinhos – pobrinhos – periferia – tchutchuquinhas

– patricinhas.

Como o ambiente tem favorecido o seu aprendizado? (Luminosidade, os aspectos que a

sala se encontra...)

Banheiro eu nunca fui – água tem gosto ruim – a sala é bem iluminada – a sala é bem

equipada – ar condicionado bom - as carteiras são boas – algumas carteiras são velhinhas –

só vê problema no bebedouro – ano passado não tinha conforto – não tinha luminosidade –

esse ano veio “verba” (dinheiro) para a Pedagogia – a sala está nota 100 – favorece – tem

material – tem data show – a sala em si tá legal – a estrutura ainda é precária – o tamanho da

sala não comporta o número de alunos – ficam espremidos – agora tem carteira para canhoto

– o quadro não dá para enxergar – bebedouro na porta dos banheiros – os banheiros não tem

papel – os banheiros não tem sabão freqüentemente.

Você se senta sempre no mesmo lugar e perto dos mesmos colegas?

Sempre – sempre no mesmo lugar – os alunos não tem lugar fixo – senta sempre na frente –

normalmente sim – harã! – senta no fundo- gosta de mudar de lugar – eu sento do lado de

qualquer pessoa – chega cedo e guarda lugar -

Sobre o que vocês conversam na sala, nos intervalos e fora da universidade?

(Assuntos).

Assuntos do dia-a-dia – particular – namoro – música – festa – programação da semana – o

que vai fazer – ver filme – política – sobre o curso de pedagogia – acontecimentos da mídia

– sobre uma indignação – sobre matéria – fofocas – o que fez de legal – assuntos pessoais –

organização de trabalhos - igreja - filhos – maridos – amigos – problemas familiares –

sobre o professor – sobre a postura do colega – sobre suas casas – sobre limpeza – cursos –

sobre atuar em sala de aula.

Você está contente como curso que escolheu? Com que você sonha depois de terminar o

curso?

Sim – está contente - era o sonho fazer esse curso - sonha em entrar no mercado de trabalho

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– era tudo que queria – queria ser educadora – tentar o mestrado - doutorado – muitos

planos – o foco é escola – talvez não chegue a fazer um doutorado – estava muito feliz até

ontem – tentar ajudar de alguma forma a sociedade – passar em um concurso público – fazer

uma especialização – fazer outra faculdade – quer lidar com crianças de 0 a 6 anos -