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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO Centro de Ciências da Saúde Departamento de Medicina Social Programa de Pós-Graduação Integrado em Saúde Coletiva Mestrado ISIS DANIELLA CARVALHO SILVA POLÍTICA NACIONAL DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES: UMA ANÁLISE A PARTIR DO TRIPÉ EPISTEMOLÓGICO-CRÍTICO Recife 2014

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO Centro de Ciências … · À Thaís, minha prima ou irmã mais velha, como queiram, em quem eu me inspiro na luta e na forma como cuida dos seus

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO Centro de Ciências da Saúde

Departamento de Medicina Social Programa de Pós-Graduação Integrado em Saúde Coletiva Mestrado

ISIS DANIELLA CARVALHO SILVA

POLÍTICA NACIONAL DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES:

UMA ANÁLISE A PARTIR DO TRIPÉ EPISTEMOLÓGICO-CRÍTICO

Recife 2014

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ISIS DANIELLA CARVALHO SILVA

POLÍTICA NACIONAL DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES:

UMA ANÁLISE A PARTIR DO TRIPÉ EPISTEMOLÓGICO-CRÍTICO

Dissertação apresentada pela discente Isis Daniella

Carvalho Silva, sob a orientação do Professor

Marcelo Luiz Pelizzoli para fins de conclusão do

Mestrado em Saúde Coletiva do Programa de Pós-

Graduação Integrada em Saúde Coletiva - UFPE.

Recife 2014

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ISIS DANIELLA CARVALHO SILVA

POLÍTICA NACIONAL DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES:

UMA ANÁLISE A PARTIR DO TRIPÉ EPISTEMOLÓGICO-CRÍTICO

Dissertação apresentada pela discente Isis Daniella

Carvalho Silva, sob a orientação do Professor Marcelo

Luiz Pelizzoli para fins de conclusão do Mestrado em

Saúde Coletiva do Programa de Pós-Graduação

Integrada em Saúde Coletiva - UFPE.

Aprovado em 21/08/2014

BANCA EXAMINADORA:

_________________________________________________

Professor Marcelo Luiz Pelizzoli (presidente)

_________________________________________________

Professora Maria Beatriz Lisbôa Guimarães

_________________________________________________

Professora Islândia Maria Carvalho de Sousa

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À Isadora que logo logo nasce e ao Marcus Vinícius que acaba de nascer, pois inundam a minha vida de amor.

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AGRADECIMENTOS

Enquanto frequentava as aulas do mestrado e a cada dificuldade ou a cada

alegria, eu pensava no momento de agradecer àqueles que estavam ali de alguma

forma contribuindo para que eu crescesse academicamente, profissionalmente,

pessoalmente e afetivamente. Chegou esse momento e todas as memórias jorram

em minha mente, não somente as que vêm desde o tempo que sou mestranda, mas

dos diversos momentos que me fazem o que sou hoje. Agora se faz o exercício da

gratidão e nem sei se todas as pessoas estarão justamente contempladas aqui, mas

de qualquer forma, a cada uma delas sem exceção, enviei minha energia de

gratidão da forma como me foi possível.

De praxe, inicio agradecendo a Deus, a quem dirijo minha crença de um amor

infinito.

Depois agradeço a mim mesma, que venho aprendendo a me reconhecer

enquanto aquela responsável por tudo o que me acontece, inclusive todas as

vitórias, que são minhas porque trabalhei para que fossem vitórias.

Aos meus pais, Marcus e Kátia, aqueles que me amam incondicionalmente e

sei que estão bem juntinho de mim para o que eu precisar e também para o que eu

não precisar. Painho que ama loucamente toda a minha “malcriação” e Mainha, a

professora mais incrível que eu conheço, e que acredita com toda força que eu sou

a mais sabida, a mais bonita, a mais legal, a mais competente...Também os amo

incondicionalmente.

Ao meu marido, Jefferson, esse não me larga nunca, mesmo exausto sempre

fez um afago enquanto eu madrugava estudando. Ele que me ensina a cada dia

sobre cuidar de quem a gente ama e que trouxe ao meu olhar a simplicidade que se

é viver. Também não o largarei nunca. O amo mais que o céu.

Ao meu irmão, Marcus André, meu auxiliar para assuntos de informática, que

me salvou quando achei que havia perdido um capítulo inteiro. Não só por isso, mas

pelo companheiro que sempre foi e pelo amor tímido e sincero que eu sei que me

devota. Ah, e também pelo sobrinho lindo que ele me deu, Marcus Vinícius, uma

amor que não cabe em mim. Estarei sempre a postos para o que eles precisarem.

À minha sogra-mãe, a quem eu chamo Querida, por cuidar de mim igualzinho

cuida de seus filhos e quem topa qualquer parada comigo. À minha cunhada-irmã,

Mayara, a quem eu vi crescer e que hoje muito me orgulha pelo seu caráter e sua

competência, quem eu considero minha irmã caçula, minha amiga pra todas as

horas.

À Vovó Antônia, que se foi, mas deixou seu amor e elegância de legado e

também de herança o amor pela docência.

Às minhas tias, em especial, Tia Telma e Tia Tânia, que sempre buscam por

mim e que fielmente torcem por minhas vitórias e fazem o que podem pra me ajudar,

sempre.

Às Primas Carvalho, essa entidade de meninas e mulheres passionais e

unidas em suas diferenças e semelhanças, que estão sempre por perto.

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À Thaís, minha prima ou irmã mais velha, como queiram, em quem eu me

inspiro na luta e na forma como cuida dos seus.

À Juliana, para mim, Juju, minha amiga e também co-orientadora, a quem

sempre sempre recorro e sempre, sempre ela me dá a mão.

Às Chinoquinhas do meu coração, Érika, Cláudia e Naianna, as que

compartilharam comigo as aventuras da graduação e que hoje compartilham comigo

as aventuras de sermos terapeutas ocupacionais, esposas e mães. Construímos

juntas um espaço seguro de amor. Estarei com vocês até que possamos

compartilhar as aventuras de sermos bisavós.

Ao meu afilhado, Fernando, de quem eu morro de saudade.

À Carlos Augusto, meu chefe do trabalho à época das disciplinas, quando os

horários eram os mais malucos e ele quebrou o meu galho nos horários de trabalho.

Aos colegas do mestrado, companheiros de sala de aula, em especial, Juliana

Lourenço, Karina, Luana, Marciana e Hérika Dantas. E àqueles que o mestrado me

presenteou, Lúcia, Emerson, Mariana, Vasco e Juliano, agora companheiros para a

vida.

À Lúcia, por ser a pessoa afetuosa sem medidas que é e por ser a melhor

obstetra do mundo.

Aos professores e funcionários do PPGISC, por toda dedicação à docência,

em especial a Professora Heloísa, de quem eu nunca esquecerei e a Moreira, que

me atura com muita paciência.

Às professoras Maria Beatriz e Islândia, que compõem a minha Banca

Examinadora, pelo pronto aceite de participar da construção desse trabalho.

Ao meu orientador, Marcelo Pelizzoli, por todas as lições que me ensinou e

por toda liberdade que me proporcionou.

À minha terapeuta, Fabiana Padilha, por toda a sua competência e amor pelo

que faz.

Aos amigos, Careli, Tayguara, Guilherme Assunção, Aline Cavalcanti,

Pollienne, Joyce Tereza, Adriana e Procópio, Dany e Biovani, Viviane e Ednilson,

Cláudia e Laédson, Márcio Daniel, Ana Flávia, Fátima Rios, “Pimentinhas”, Leila

Nunes, Bruno Lúcio, Adriana e Edbugue, Daniele Carneiro, Kátia Cilene, Joabe,

Fabiana Bello, por serem meus amigos.

À minha filha, Isadora, que ainda vai nascer, mas a quem já dediquei a minha

vida inteira, a quem devoto o meu mais puro amor. Ela esteve dentro de mim

durante todo o tempo que escrevi essa dissertação e ainda estará na hora que eu

estiver apresentando, logo depois ela vem ao mundo e terá uma mamãe Mestre em

Saúde Coletiva, ela faz parte disso.

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RESUMO

Esse trabalho tem como objeto a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Sistema Único de Saúde (PNPIC), publicada em 2006, tomada para análise utilizando o Tripé epistemológico-crítico, dentro de uma perspectiva de crítica ao modelo biomédico e sob o olhar interpretativo da hermenêutica filosófica inspirada em Gadamer. A inserção da hermenêutica filosófica vem contribuir com a crítica epistemológica, política e ética, os três níveis conjugados de entendimento que constituem o Tripé epistemológico crítico. A fim de analisar a PNPIC, essa dissertação discute os conceitos de promoção em saúde e integralidade e traça historicidades na construção dessa política nos contextos internacional e nacional. A PNPIC se propõe a defender uma visão integrativa de saúde, mas se constata nesse estudo que seu texto vem representar a convivência de racionalidades médicas diversas sem, no entanto, eximir-se de sofrer a hegemonia do modelo biomédico. A PNPIC marca a institucionalização, com abrangência nacional, das Práticas Integrativas e Complementares no SUS e vem também representar a crescente demanda por cuidado com ética.

Palavras-chave: Política de saúde. Hermenêutica. Terapias complementares.

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ABSTRACT

This work has as object the “Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Sistema Único de Saúde (PNPIC)”, published in 2006, taken for analysis using the epistemological-critical tripod, within a critical perspective of the biomedical model and under the interpretive view of philosophical hermeneutics inspired in Gadamer. The insertion of philosophical hermeneutics contributes to the epistemological critique, politics and ethics, the three combined levels of understanding that constitute the epistemological-critical tripod. In order to analyze the PNPIC, this work discusses the concepts of health promotion and completeness and traces historicities in the construction of this policy in international and national contexts. The PNPIC proposes to defend an integrative view of health but, in this study, it was noted that its text comes to represent the coexistence of diverse medical rationales, without, however, exempt itself from suffering hegemony of the biomedical model. The PNPIC marks the institutionalization of a national scope of the Integrative and Complementary Practices of SUS and also represents the growing demand for care with ethics.

Keywords: Health Policy. Complementary Therapies. Hermeneutics.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária

CIPLAN – Comissão Interministerial de Planejamento e Coordenação

CNS – Conferência Nacional de Saúde

INAMPS – Institituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social

MNPC – Medicina Natural e Práticas Complementares

MTC – Medicina Tradicional Chinesa

MT/MCA – Medicina Tradicional/Medicina Complementar e Alternativa

NASF – Núcleo de Apoio à Saúde da Família

OMS – Organização Mundial da Saúde

PICS – Práticas Integrativas e Complementares em Saúde

PNPIC – Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares

PNPS – Política Nacional de Promoção em Saúde

SIA/SUS – Sistema de Informação Ambulatorial/Sistema Único de Saúde

SUS – Sistema Único de Saúde

WHO – World Health Organization

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Gráfico 1 – Publicação em PICS. Período de 2006 a 2013 ..................... 37

Quadro 1 – Subgrupos de trabalho para formulação da PNPIC ............. 45

Fluxograma 1 – Caminho de formulação da PNPIC ....................................... 47

Quadro 2 – Recomendações da OMS e objetivos da PNPIC no SUS..... 51

Esquema 1 – Tripé Epistemológico-crítico .................................................. 65

Quadro 3 – Dimensões do Tripé Epistemológico-crítico .......................... 85

Quadro 4 – Dos modelos presentes na saúde contemporânea ............... 86

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SUMÁRIO

1 Introdução ............................................................................................ 12

1.1 Metodologia .......................................................................................... 22

2 Apresentando a Política de Práticas Integrativas e

Complementares..................................................................................

25

2.1 Promoção da saúde e determinantes sociais ........................................ 25

2.2 Pensando a Integralidade ...................................................................... 31

2.3 Historicidade da Institucionalização das Práticas Integrativas e

Complementares ....................................................................................

38

2.4 Construindo a Política Nacional ............................................................. 42

2.5 A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no

SUS ........................................................................................................

46

3 O Aporte Filosófico e o Tripé Epistemológico-crítico ...................... 51

3.1 Sobre Hermenêutica Filosófica .............................................................. 52

3.2 Tripé epistemológico-crítico ................................................................... 60

3.2.1 Dimensão Epistemológica ..................................................................... 61

3.2.2 Dimensão Política .................................................................................. 64

3.2.3 Dimensão Ética ...................................................................................... 67

3.3 Hermenêutica Filosófica para a saúde .................................................. 70

3.4 A Hermenêutica Filosófica como lente para análise da PNPIC no

SUS ........................................................................................................

75

4 Analisando a PNPIC no SUS ............................................................... 78

4.1 Dimensão Epistemológica ..................................................................... 80

4.2 Dimensão Política .................................................................................. 85

4.3 Dimensão Ética ...................................................................................... 91

5 Considerações Finais .......................................................................... 98

Referências ...................................................................................................... 103

Anexo ............................................................................................................... 111

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1. INTRODUÇÃO

Reconhece-se que, no século XX, as Ciências Sociais/Humanas trouxeram à

tona grandes contribuições críticas, ao propor a “escavação filosófica e sociológica”

sobre o saber instituído, a fim de dar visibilidade e resgatar “às formas soterradas de

saber e sociabilidade”. No campo da saúde, essa escavação tem permitido emergir

explicações diferentes das visões técnicas dominantes, no sentido de buscar a

integralidade e a humanização; bem como, compreender como a exclusividade

epistêmica/paradigmática produziu um conhecimento-regulação normativo e

excludente, ou reducionista (PELIZZOLI, 2011).

A ciência, para ser verdadeira e corresponder ao seu escopo social, deve

encarnar o ideal de objetividade, do mesmo modo que o aspecto crítico e histórico

do seu fazer. Isto significa colocar-se questionamentos epistemológicos contínuos,

estruturando constantemente uma teoria ampliada e crítica do conhecimento a ser

aceito, na medida em que o que sustenta uma ciência são os paradigmas

escolhidos, verificados e validados (PELIZZOLI, 2011). A partir do que prega Kuhn,

tomando a base da ciência como resolução de problemas, fica a cargo dos

paradigmas determinar quais as questões que deverão estar sujeitas ao exame

científico, assim como quais as perguntas e metodologias devem ser aplicadas para

a sua resolução. Kuhn assume a existência de anomalias em todos os paradigmas,

estejam essas anomalias em níveis aceitáveis de erro, a ponto de poderem ser

ignoradas, ou em um nível excessivo quando põem em dúvida os paradigmas

dominantes e esses entram em estado de crise (KUHN, 2003; PIM, 2009).

A Saúde, enquanto instituição social moderna, é marcada eminentemente

pelo modelo de ciência que a direciona. O cartesianismo seria o grande condutor

paradigmático dos procedimentos biomédicos e cuja abordagem físico-química (e

alopática) e cirúrgica interventora estaria ligada ao modo dominante de “combater

doença”, que lida com dimensões parciais e fragmentárias de abordagem do corpo

humano – físico-químico-mecânico – que acaba concentrando-se em aspectos

patológicos lineares da saúde. Além do mais, tal abordagem acabaria por casar-se

com as demandas do mercado da saúde (doença) (PELIZZOLI, 2011).

Esse estudo considera que, atualmente, o campo da Saúde encontra-se em

crise, e são muitos os problemas para os quais o modelo biomédico não pode

apresentar soluções efetivas (LUZ, 2011).

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A doença objetivada e o corpo físico fragmentado seriam os objetos nos quais

se concentram os esforços do modelo biomédico vigente na atualidade, cujas

influências do paradigma cartesiano e do positivismo trouxeram à tona a ideia do

“ser humano-máquina”, divorciado das outras dimensões emocional-mental e

ambiental do humano. Tem-se, conjuntamente, uma racionalidade médica ocidental

que perdeu de vista “o doente” e o que esse doente traz consigo no que diz respeito

ao processo saúde-doença visto de uma perspectiva integral, como os aspectos

emocionais, mentais, sociais, culturais e ecológicos (FONTES,1999).

Em uma sociedade onde o cartesianismo impera e, conjuntamente, é

dominada pela tecnociência, haveria uma enorme e constante preocupação em

garantir o primado do racional. A razão não é um dado natural assim como é a

inteligência, pois trata-se de um conjunto historicamente construído de

procedimentos, regras e coerções, que corresponde a uma vontade de possuir uma

visão coerente dos fenômenos e do mundo, sendo portadora de um aspecto

incontestavelmente lógico (JAPIASSU, 2006). Essa escavação filosófica e

sociológica sobre o saber instituído deve ser decorrente do que Japiassu (2006)

chama de “crise da razão ocidental”, onde a racionalidade vigente vem sofrendo

desconfiança e desencantamento, devendo-se ao fato da mesma ignorar seu caráter

evolutivo complexo, ser intolerante às paixões, emoções e mistérios, e prestar culto

aos meios em detrimento dos fins.

A racionalidade do paradigma cartesiano trouxe conquistas importantes,

entretanto seus limites de ordem epistêmica, política e ética são obstáculos (ao

produzir verdades, ao estabelecer relação de pretenso controle total, encarando o

mundo e o homem como objetos e ao estruturar o poder a partir dessa concepção).

Não estaríamos então diante da necessidade de superar sua “incapacidade para o

diálogo” (GADAMER, 2000) desenhando uma revisão paradigmática não só no

campo da saúde, mas no contexto do fazer ciência e do produzir conhecimento ? Da

crise paradigmática adviria a crise em saúde, e assim sendo, marcada por

problemas políticos e éticos e por problemas relacionados aos limites epistêmicos do

modelo biomédico. Torna-se nítida a incapacidade desse modelo de atender

satisfatória e efetivamente à complexidade da díade saúde-doença (NUNES;

PELIZZOLI, 2011).

Ivan Illich (1975) já apontava que o modelo biomédico, em consonância e

conectado com as estruturas social e política, incute nas pessoas a ideia de que elas

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desejam ser consumidoras dos cuidados médicos de abordagem meramente físico-

química, de modo que este consumidor se torna dependente no seu próprio

processo de cura. O indivíduo é então o solicitante do meio (cuidados médicos) de

sua própria exploração, pois ele não tem o poder de controlar politicamente o

sistema médico; tal sistema se anunciaria como sanitário, sem de fato sê-lo, e traria

aos seus usuários uma intervenção técnica que pouco tem a ver com o que seja

saúde.

Até onde esse modelo se proporia a ser um modelo de ciência aberto à

verdade e complexidade dos fatores envolvidos na saúde humana, livre de

interesses mercantis e capaz de permitir o diálogo dos diversos saberes, métodos e

abordagens, para além da lógica do mercado (PELIZZOLI, 2011) ? Ou tratar-se-ia

de um modelo disciplinador e especializador que não alcançou uma verdadeira

prática inter, trans ou metadisciplinar e cuja predominância na saúde considera a

medicina apenas como uma ciência mecânico-físico-química, além de se configurar

em uma superposição de disciplinas com pouco diálogo? A lógica da estrutura

especializadora justificar-se-ia por se tratar da saúde enquanto um campo complexo

que necessita de muitos especialistas, mas que em vez de fazerem dialogar os seus

núcleos e compreenderem-se enquanto partes de um todo maior que a própria união

das partes, promove a fragmentação do ser humano e de seu contexto (PELIZZOLI,

2011). Esse pensamento que compartimenta o organismo humano para fins de

compreendê-lo e controlá-lo, também coloca às tecnologias duras o papel de

interventora no combate aos sintomas das doenças e, consequentemente, torna a

qualidade de vida dependente das inovações tecnológicas.

Há questionamentos acerca da associação entre melhoria de qualidade de

vida e desenvolvimento científico e tecnológico quando não conectado a outros

fatores sociais e culturais. As pessoas estariam satisfeitas com esse culto às

tecnologias e inovações que se apresentam continuamente no campo da saúde?

Essas tecnologias e inovações respondem às reais demandas de cuidado em saúde

e de cura da população como um todo? Significa “fazer saúde” inundar

continuamente o campo da saúde com novidades nos modos e instrumentos

artificiais de intervir? Quem seriam os beneficiários desse progresso? Há qualidade

na vida das pessoas que acreditam sobreviver graças a cada avanço da medicina?

Martins (2011) coloca: qual a validade “daquela equação simplista que atrelava a

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melhoria da qualidade de vida social ao desenvolvimento científico e tecnológico

considerado à parte sem conexão com outros fatores culturais”?

Quando Illich aponta os limites da medicina hegemônica por meio da

Iatrogenia, na sua obra “Nêmesis da Medicina” (1975), ele abre as portas para uma

visão integrativa da saúde, e consequentemente para as práticas “alternativas” e

para a tradição. O chamado “avanço” pode ser também algo que vem a configurar

uma grande contradição no campo da saúde, tendo em vista a crescente falta de

respostas efetivas das práticas regulares da medicina, pois nunca antes detivemos

tantos equipamentos, conhecimentos especializados e tecnologia em cuidados em

saúde, e ainda assim as pessoas nunca se sentiram tão mal cuidadas, além da

avalanche de doenças crônicas pelo mundo (LUZ, 2011).

Sobre a dimensão do cuidado, Barreto (2011) aponta para a gravidade de um

país com uma diversidade cultural tão ampla como o Brasil importar currículos que

se coadunam com um modelo de saúde que se fecha em um conhecimento

utilitarista, reprodutor, julgador e fragmentado, que além de tudo é pouco efetivo em

responder aos desafios sociais que lhes apresenta.

Barreto (2011) constata a grande falha de não contemplar aos profissionais

de saúde o estudo da filosofia, antropologia, física contemporânea, religiões, entre

tantos outros conhecimentos que permitiriam um olhar realmente amplo e integrativo

do cuidado. O autor lembra que nas tradições, os (as) cuidadores (as),

relacionavam-se através de trocas recíprocas de bens e afetos, e podiam ser

reconhecidos por “sua sabedoria, capacidade de acolhimento, amorosidade e

profunda atenção e cuidado”.

Defende-se que no campo da saúde, a noção de cuidado deve ser o centro,

abordando-se a saúde, diferente do modelo biomédico e medicalizador que enfatiza

a doença e falha na promoção e condições de saúde (PELIZZOLI, 2011;

NASCIMENTO et al, 2013). Identifica-se aí um paradoxo quanto às práticas dos

chamados profissionais de saúde, que estão mais ocupados com a doença e cujas

dificuldades de tratar o tema saúde são enormes (FONTES,1999; BARRETO, 2011).

O aspecto relacional, sempre relevante, sofre um empobrecimento, é reduzida

a uma relação objetificada, em que o “destinatário” do cuidado é apenas lugar de

aplicação de procedimentos; a ênfase das práticas em saúde está nas ferramentas

materiais e saberes estruturados da clínica e da epidemiologia (MERHY, 2000).

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Ayres (2011) assinala a compreensão, no senso comum, acerca do cuidado

em saúde que seria “(...) um conjunto de procedimentos tecnicamente orientados

para o bom êxito de um certo tratamento.” Dessa forma, a noção de cuidado em

saúde é mantido em torno dos recursos e medidas terapêuticas e procedimentos

aplicados. Em uma civilização marcada pelo desenvolvimento tecnológico e pela

lógica do mercado, constitui-se desafio conceber o outro como alteridade. Na

perspectiva da hermenêutica filosófica, o outro representa a si mesmo e às suas

intenções; o outro não é objeto e com o outro é possível estabelecer diálogo

(NUNES; PELIZZOLI, 2011).

Da forma como está, a saúde não mais seria reconhecida como campo de

cuidado, no sentido em que se unem sabedoria e afeto, mas sim, um dos mais

efetivos meios de angariar lucros e escravizar os indivíduos e coletivos (MARTINS,

2011).

Illich já apontava que a melhoria na qualidade de vida tornou-se desejo de

todos e está diretamente associada ao aumento da difusão da saúde enquanto

produto, tornando, à época, a indústria dos cuidados médicos um dos grandes

setores econômicos de mais rápida expansão (1975). Hoje é um setor dos maiores

gerador de lucros, de onde surgem grandes inovações, que tampouco visam

promover a real saúde, e onde pesquisadores buscam não necessariamente a

solução efetiva, a cura para problemas que são preveníveis, mas os escopos de

pesquisa dos financiadores da mesma ou das Escolas epistemológicas já aceitas e

com mais poder.

Martins (2011) aponta que as inovações promissoras em medicina avançada,

demonstrada na realidade, se tornaram modelos de vitrine de um capitalismo médico

privado e especulativo, que além de tudo, tem um caráter claramente

desumanizante. Ele aponta para uma realidade, nos últimos anos, em que os

investimentos financeiros são muito mais significativos para pesquisas em cirurgia

plástica e estética que produzem inovações tecnológicas que os mais ricos podem

pagar, do que para investimentos em ações e medicamentos que combatam as

epidemias que assolam as regiões mais empobrecidas. Para esse autor, a área de

saúde foi descoberta pelo capitalismo especulativo como das mais promissoras em

termos de retorno material financeiro e de curto prazo, e isso se confirma quando se

traz à tona as tentativas, na última década, do poder privado de se apropriar de

fatias cada vez maiores dos recursos do Sistema Único de Saúde

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O raciocínio mecanicista e a lógica capitalista de mercado apropriados pelas

atividades biomédicas são o pano de fundo para os problemas de ineficácia,

ineficiência, ideologia do lucro e desigualdade de atendimento à população que

envolvem o campo da saúde, sendo esses problemas apontados como grandes

contribuintes da crise atual do campo da saúde. Tal crise, no entanto, poderá ser

devidamente combatida caso haja mudanças na estrutura conceitual e ideológica

dominante das atividades biomédicas atuais (FONTES,1999). Será que a aprovação

de uma política que promete introduzir a visão integrativa de saúde ao SUS é

suficiente para combater esses fracassos do modelo biomédico? É esse o objetivo

de uma política que introduz formalmente racionalidades diversas da racionalidade

biomédica ao sistema de saúde brasileiro?

A crítica que se enceta neste contexto ao se referir ao modelo biomédico

serve para apontar e tentar esclarecer seus limites e dessa forma possibilitar a

aposta em novas possibilidades que lhes integrem e não para descartá-lo como um

todo. Não se pode negar os benefícios que as inovações recentes proporcionam a

inúmeras pessoas, principalmente na busca por curas, no entanto faz falta que a

modernização científica e tecnológica considere os fatores que lhe norteiam (éticos,

naturalistas, culturais e políticos).

De fato, o que se pretende nesse estudo, é argumentar em defesa da lógica

integrativa, cujas práticas em saúde buscam compreender o indivíduo adoecido em

um contexto complexo e multirrelacional e oferecer uma intervenção mais ampla que

considera a dimensão social, e tenta controlá-la através da prevenção de doenças,

cujas ações terapêuticas não se reduzem às manifestações fisiopatológicas, e que

entende o ser humano doente como ser ecológico que sofre influências psíquicas,

sociais e culturais e que tem clareza da complexidade dos fenômenos que envolvem

o processo saúde/doença (FONTES, 1999). Assim, estaria a Política Nacional de

Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) advogando em prol desse

movimento em defesa da lógica integrativa em saúde?

Parece indiscutível que a ampliação do olhar acerca dos paradigmas e das

práticas sociais possa ser o caminho para se adotar em definitivo a visão integrativa

em saúde e buscar e/ou validar modelos outros, hoje aceitos pela comunidade

científica e também pela maior parte da população apenas como “complementares

ou alternativos”, mas que são valorizados e desejados pela população. Mas

questiona-se, como se daria essa “ampliação do olhar”? institucionalizar práticas

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consideradas integrativas e complementares seria uma prova de abertura de

horizontes quanto às práticas em saúde? A institucionalização das PIC por meio de

uma política pública de saúde evidenciariam uma ampliação de paradigmas ou

serviriam ao modelo biomédico de saúde apenas como se fossem complementá-lo?

Aprofundar-se nas reflexões sobre integralidade em saúde e práticas em

saúde que fogem ao modelo biomédico conduz-nos a uma inovação que está

justamente em resgatar as tradições em saúde, abrindo espaços fecundos de

valorização do potencial humano, amparados por uma ética de cuidado. Isso vem a

fragilizar os aparatos institucionais com orientação dentro do paradigma cartesiano

(BARRETO, 2011). Como a defesa de uma visão de saúde integrativa pode romper

a manutenção do molde cartesiano de conceber saúde?

Trata-se de uma reflexão que tem sido feita nos últimos sessenta anos, por

meio de um número crescente e significativo de publicações, documentos técnicos

internacionais e políticas públicas que defendem a visão integrativa de saúde, ao

mesmo tempo que apontando para os limites terapêuticos hegemônicos (BARRETO,

2011).

Reconhece-se, dessa maneira, a complexidade do campo da saúde e, por

isso, este deve ser continuamente analisado sob diversos âmbitos (epistemológico,

político e ético), a fim de ser orientado por uma “ciência com consciência”

(HUSSERL; MORIN, 2000), e não estar sujeito ao reducionismo, cuja abordagem

dos problemas e soluções é unilateral, e alcançar considerável e satisfatório avanço

em suas ações (PELIZZOLI, 2011).

Pretende-se que essa ampliação de paradigmas, com o uso do tripé

epistemológico-crítico, adotando as lentes da hermenêutica filosófica que valoriza a

tradição e os valores não objetificadores, nos distancie do modelo reducionista, o

qual liga-se à mercantilização da doença. Assim, favoreça uma promoção efetiva da

Saúde baseada na integralidade e na recuperação da dimensão ambiental-natural.

Isto se configura como grande desafio para o sistema de saúde que precisa,

com urgência, lidar com sua crise e criar possibilidades de reconstrução política,

epistemológica e ética. Nesse sentido, a partir de um resgate filosófico e sociológico,

novas propostas e modelos, diferentes do modelo dominante no campo da saúde,

constituem um cenário em que a hermenêutica filosófica contribui para a crítica por

meio do tripé epistemológico-crítico, cuja intenção é refletir sobre as práticas de

conhecimento (NUNES, PELIZZOLI, 2011).

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O tripé epistemológico-crítico, ou simplesmente tripé epistemológico, foi

proposto por Pelizzoli (2011, 2013) a partir da perspectiva de que quando se conduz

uma discussão de paradigmas epistemológicos, se chega naturalmente às

dimensões políticas/sociais e éticas envolvidas. Tal tripé serve como ferramenta de

análise do saber envolvido em determinadas práticas, em especial aqui o caso da

saúde. O tripé epistemológico-crítico de análise é constituído por três dimensõesr:

epistemológica; político-econômica e institucional e a dimensão ética, que conduzem

a uma discussão nesses três níveis de entendimento conjugados, que serão

discutidos no segundo capítulo dessa dissertação.

Em qualquer perspectiva epistemológica, adotada como norteadora da

produção de conhecimento válido, é possível identificar limitações; admiti-las

significa o avanço a partir de um esforço de abertura a outros paradigmas, que pode

chegar a um diálogo com outras perspectivas. Faz-se necessária uma reflexão

epistemológica profunda, a fim de analisar as conquistas e os obstáculos dos

modelos adotados nas Ciências da Saúde; apostando na episteme enquanto raiz do

conhecimento e da verdade como prática social (FOUCAULT, 2004).

Defende-se que essa análise deva adotar uma perspectiva que aborde os

problemas e as soluções do campo da saúde multidimensionalmente e de forma

conjugada. Para tanto propõe-se o uso do tripé epistemológico, enquanto

instrumento investigativo capaz de abrir o olhar para os princípios da saúde

integrativa (PELIZZOLI, 2011).

Os aportes éticos-filosóficos do tripé epistemológico são fundados na

hermenêutica filosófica, cujo ponto de partida crítico está na investigação dos limites

do saber moderno. Inicia-se esse estudo com uma breve crítica ao paradigma

cartesiano admitindo seus problemas e limites e, diante de uma crescente demanda

por reestruturação no campo da saúde, abre-se o olhar para outros paradigmas que

apontem na direção do cuidado integrativo em saúde. Na crítica ao paradigma

cartesiano, a partir da perspectiva hermenêutica filosófica, pode-se levantar

problemas nas três dimensões do tripé epistemológico-crítico. A hermenêutica

filosófica traria um olhar profundo e interpretativo que serviria à crítica ao modelo de

validação científica, às relações, aos poderes e à ética, e se constituiria enquanto

conjunto compreensivo-interpretativo aberto ao diálogo e dinâmico (ROHDEN, 2002

apud NUNES; PELIZZOLI, 2011).

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Com a perspectiva de abertura ao diálogo, buscando novas compreensões e

propondo ampliar horizontes, esse estudo, como apontado ao longo dessa

Introdução, discute a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares

no Sistema Único de Saúde (PNPIC/SUS), através da conjunção das três dimensões

que constituem o tripé epistemológico crítico.

O momento atual traz consigo uma gama cada vez mais ampla de políticas

nacionais, defendidas como ferramentas que visam ao bem-estar da população

como um todo. Com a saúde não é diferente, e pode-se aí apontar o surgimento de

políticas voltadas para a Humanização em Saúde, para a Promoção em Saúde e a

Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPIC),

publicada pela Portaria GM Nº 971, em 03 de maio e 2006.

Essa emergência de políticas no campo da saúde seria, de acordo com Luz

(2011), resultado de uma crescente e continuada busca por “cuidado à saúde” pela

sociedade contemporânea, que vislumbra o aumento exponencial, nas últimas duas

décadas, do sofrimento e adoecimento humanos. Luz (2011) aponta como causa

para isso as condições sociais adversas à vida que caracterizam o mundo urbano

atual, geradas em grande parte pela ordem social do trabalho vigente, onde o modo

social de viver resulta em danos ao meio ambiente, aos seres humanos e aos seres

vivos em geral, danos que deveriam ser evitados.

Assim faz-se relevante uma análise dos problemas e soluções da e para a

saúde, contidas a partir do discurso da PNPIC, colocando-se a possibilidade de

estarmos em um estágio claro de transição de paradigmas ou, de outro modo, a

visão integrativa em saúde estará relegada a ser apenas complementariedade e/ou

alternativa.

Desde o início da década de 2000, a OMS produz documentos e resoluções

que assinalam a necessidade de uma prática integral no cuidado à saúde, bem

como a inclusão de práticas não biomédicas, reforçando o compromisso de

estimular a implantação e o desenvolvimento de políticas de Medicina Tradicional –

MT e Medicina Complementar e Alternativa - MCA nos sistemas de saúde dos

países-membros, principalmente no setor público, respeitando pilares fundamentais

como a estruturação de uma política, garantia de segurança, qualidade e eficácia,

ampliação do acesso e o uso racional (GALHARDI; BARROS; LEITE-MOR, 2013;

THIAGO; TESSER, 2013; SOUSA et al, 2012).

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A integralidade do cuidado à saúde se constitui como princípio doutrinário do

Sistema Único de Saúde (SUS) e isso aponta para a oferta dessas práticas

integrativas no Brasil. Pode-se falar em reconhecimento social, acadêmico e

institucional dessas terapias, em um pluralismo terapêutico que contempla a

biomedicina hegemônica em um ambiente cada vez mais medicalizado. O pluralismo

nos cuidados em saúde pode, no entanto, contribuir para a desmedicalização parcial

do cuidado profissional, tendo em vista serem socialmente valorizadas e desejadas

(THIAGO; TESSER, 2013).

Vem à tona, portanto, os questionamentos acerca da incorporação da

racionalidade médica chamada “alternativa”: a implantação da PNPIC significaria a

incorporação de racionalidades diferentes da racionalidade biomédica

contemporânea? Ou seria apenas uma incorporação de técnicas, por meio da

apropriação delas pelo modelo biomédico, a exemplo do uso da acupuntura, com a

lógica reducionista? Mantendo-se o utilitarismo mercadológico dominante, as

práticas tradicionais manteriam suas características do cuidado integrado, afetivo,

cuja sabedoria é respeitada e as trocas de bens e afetos são recíprocas?

Essas são questões que constituem verdadeiros desafios às práticas

integrativas, para que elas de fato sejam integrativas, para que não permaneçam no

local do “alternativo” e coexistam contaminadas pelo utilitarismo, pelo foco na

doença e reduzidas a técnicas não relacionadas ao contexto e às necessidades

daquele que demanda cuidados.

Esse estudo, portanto, apresentará uma discussão acerca do (con)texto da

PNPIC, pautado nas três dimensões do tripé epistemológico contemplados nesses

questionamentos. Será, dessa forma, relevante apresentar argumentos que

evidenciem os traços das “racionalidades médicas” presentes ou não no discurso da

PNPIC, utilizando-se estudos como os da autora Madel Luz, cuja categoria central

de trabalho é a de racionalidade médica, resultando na elaboração de seis

dimensões analíticas comparativas para as distintas racionalidades médicas:

cosmologia, morfologia, dinâmica vital (fisiologia), doutrina médica, sistema de

diagnose e sistema de intervenção terapêutica.

O uso do tripé epistemológico-crítico poderia, deste modo, permitir uma

abordagem multidimensional dessa política, apontando o cuidado, as instituições

envolvidas e conceitos na sua proposta de ações e serviços (ênfase na atenção

primária), que devem garantir a prevenção de agravos, a promoção e a recuperação

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da saúde, por meio do cuidado continuado, humanizado e integral, contribuindo para

a resolubilidade do SUS - com qualidade, eficácia, eficiência, segurança,

sustentabilidade, controle e participação social.

1.1 Metodologia

Inicialmente, consideramos “método” numa perspectiva da hermenêutica

filosófica, como “caminho” reflexivo, a partir dos sentidos dos textos e cotejados com

as realidades vividas, dados e percepções do pesquisador, bem como dos sujeitos

em diálogo (GADAMER, 2006).

De modo convencional, trata-se aqui de um estudo com abordagem

qualitativa, numa pesquisa exploratória na busca por maior familiaridade com as

dimensões epistemológicas, políticas e éticas presentes na Política Nacional de

Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, trazendo à tona aspectos da dita

crise atual na saúde e sua relação com o modelo de saúde dominante. Por

conseguinte, pergunta-se acerca de caminhos para se vislumbrar possibilidades

diferentes de se prover saúde, inferir a importância da visão integrativa em saúde,

que parece resgatar a tradição, mas não exclui de todo o modelo biomédico vigente.

A escolha para a análise da PNPIC, dentre os diversos instrumentos

metodológicos, é pela pesquisa documental ou análise documental, uma

metodologia pouco explorada e do qual podem se extrair e resgatar uma riqueza de

informações que possibilitam ampliar o entendimento de objetos, cuja compreensão

necessita de contextualização histórica e sociocultural (SÁ-SILVA; ALMEIDA;

GUINDANI, 2009). Nessa perspectiva, utilizamos de estratégia documental, que é

quando a pesquisa se restringe à análise de documentos ou fontes documentais

como livros, documentos legais, revistas, arquivos em mídia (APPOLINÁRIO, 2009).

Cellard (2008) defende que o uso de documentos em pesquisas permite

acrescentar a dimensão do tempo à compreensão do social e que a análise

documental favorece o processo de maturação ou de evolução de conceitos,

comportamentos, práticas, entre outros. Sá-Silva, Almeida e Guindani (2009)

afirmam que se trata de um procedimento que utiliza métodos e técnicas para a

apreensão, compreensão e análise de documentos dos mais variados tipos. A

análise documental busca identificar informações factuais nos documentos, a partir

de questões e hipóteses de interesse (SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009).

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Aplicamos nessa dissertação o que Minayo (2008) defende quando aponta

que a metodologia inclui concepções teóricas de abordagem, dentro de um conjunto

de técnicas que possibilitam a apreensão da realidade e o potencial criativo do

pesquisador. Utilizamos acervo teórico que aborda os seguintes marcadores

interligados: modelo biomédico, racionalidades médicas, promoção de saúde,

integralidade e visão integrativa de saúde, tripé epistemológico-crítico, práticas

integrativas e complementares em saúde, políticas de saúde, ética e epistemologia a

partir de uma visão ampla da Política Nacional de Práticas Integrativas e

Complementares em Saúde, sob a perspectiva de reflexão hermenêutica filosófica.

O levantamento bibliográfico apresenta autores clássicos, considerados

aportes filosóficos fundados na reflexão hermenêutica filosófica, com foco em

Gadamer e, em segundo lugar, em Foucault, além dos comentadores com esta

influência. Ivan Illich que apresenta os cuidados de saúde enquanto fonte de lucros e

meio de explorar os indivíduos e o coletivo, além de falar em iatrogênese e, dessa

forma, abrir portas para práticas integrativas em saúde; Olney Fontes, que indica os

limites do modelo biomédico vigente, cuja influência cartesiana o torna fragmentador

e especializador, onde o homem é considerado uma máquina; Thomas Kuhn, que

disserta sobre paradigmas, admitindo haver anomalias em todos eles; Madel Luz,

cujo objeto de pesquisa são as racionalidades médicas, e Marcelo Pelizzoli que criou

o tripé epistemológico-crítico e defende uma visão integrativa de saúde, com

influência da hermenêutica filosófica (vide bibliografia ao final).

A referida análise documental tem como principal objeto de investigação o

texto da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS e as

palavras-chave: Política de Práticas Integrativas e Complementares, Tripé

epistemológico-crítico, visão integrativa de saúde, modelo biomédico,

Hermenêutica filosófica.

O primeiro capítulo apresenta a Política Nacional de Práticas Integrativas no

SUS, discutindo, inicialmente, a promoção da saúde a partir da perspectiva de que o

processo saúde-doença sofreria determinação social e segue tecendo argumentos

acerca da integralidade. Tais discussões são relevantes, pois a Organização

Mundial da Saúde (OMS) propôs que as políticas de saúde também contemplassem

a Medicina Tradicional e a Medicina Complementar e Alternativa (MT/MCA), a partir

do olhar sobre os determinantes sociais do processo saúde-doença e do desafio da

integralidade do cuidado.

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Assim, busca-se o crescente reconhecimento social, acadêmico e institucional

das Práticas Integrativas e Complementares (PIC) favorecido pela crise do modelo

biomédico que culminaria na publicação da PNPIC. Segue-se com a historicidade da

institucionalização das PIC tanto no contexto mundial, quanto no contexto brasileiro,

relatando ainda os caminhos da elaboração propriamente dita da PNPIC, e conclui-

se com a apresentação sistematizada, com base nos tópicos contidos no texto da

referida política.

O segundo capítulo traz o aporte filosófico, a hermenêutica filosófica, adotada

nesse estudo e que também fundamenta o Tripé epistemológico-crítico, um

instrumento investigativo escolhido a fim de analisar o texto da PNPIC. Destarte,

apresenta-se o referido tripé a partir da discussão das suas três dimensões, que

resultarão na eleição dos aspectos de cada uma, aplicadas ao texto da PNPIC para

fins de análise. E, concluindo este capítulo, justifica-se a adoção da hermenêutica

filosófica como lente para a análise a que se propõe essa dissertação. O terceiro e

último capítulo discorre acerca da análise do texto da PNPIC, a partir das dimensões

epistemológica, política e ética, em função da busca do entrosamento final do objeto

da dissertação.

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2. APRESENTANDO A POLÍTICA DE PRÁTICAS INTEGRATIVAS E

COMPLEMENTARES

2.1 Promoção da Saúde e Determinantes Sociais

Não há como negar a degradação das condições de vida que são refletidas a

partir da pobreza no mundo capitalista em crise. O mundo vem enfrentando uma

crise econômica e financeira que demanda a adoção, em caráter de urgência, de

medidas para reduzir os crescentes impactos sanitários e ambientais, e evitar que as

condições de saúde piorarem e se deteriorarem ainda mais os sistemas universais

de serviços de saúde e proteção social (OMS, 2011). Além do mais, há uma relação

direta ou de proporcionalidade entre disparidades sócio-econômicas e disparidades

na saúde (SILVA, 2008).

Sendo assim, para um país como o Brasil, marcado pelo modelo neoliberal de

globalização econômica, onde evidencia-se uma sociedade marcada pelas

desigualdades, a promoção em saúde deve se incluir no modelo de reflexão de

determinantes sociais (SILVA, 2008). É indissociável discutir promoção da saúde no

Brasil e refletir sobre o enfrentamento de uma realidade de iniquidades históricas de

grandes proporções; esse é um desafio de todos aqueles que constroem políticas

públicas (CAMPOS; BARROS; CASTRO, 2004). Nessa conjuntura, a promoção da

saúde deve buscar modelos de atenção que extrapolem a assistência em saúde

reduzida ao que se chama – pretensamente - de “curativa”, próprio ao escopo do

assim chamado “modelo biomédico”1.

Um dos focos da promoção da saúde é que suas ações reduzam as

diferenças no estado de saúde da população e assegurem oportunidades e recursos

igualitários para capacitar todas as pessoas a realizar completamente seu potencial

de saúde (OTTAWA, 1986).

A promoção da saúde foi então definida na Primeira Conferência

Internacional sobre o assunto como “o processo de capacitação da comunidade para

1 Para uma análise crítica tanto do modelo biomédico quanto da ideia de que tal modelo é “curativo”,

enquanto outros modelos humanizadores seriam “cuidadores”, ver Pelizzoli, 2010 e 2013.

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atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior

participação no controle deste processo” (OTTAWA, 1986).

A OMS aponta para os múltiplos significados que o conceito de promoção da

saúde possibilita, alguns dos quais podem ser compreendidos enquanto princípios:

perspectiva holística, visão intersetorial e multiestratégias. Na perspectiva holística,

conduz a reconhecer as dimensões física, mental, social e espiritual do

indivíduo/coletivo; a partir da visão intersetorial, as iniciativas em promoção da

saúde devem contar com a colaboração de distintos agentes e setores; e as

multiestratégias irão incluir políticas de desenvolvimento, mudanças organizacionais,

educação e comunicação, dentre outros fatores (ANDRADE; COSTA, 2010).

A fundamentação conceitual e a discussão acerca da promoção da saúde

vem ganhando destaque, a partir dos anos 1980, através das conferências

internacionais, patrocinadas pela Organização Mundial de Saúde. O texto da

Declaração de Alma-Ata (1978) já continha uma perspectiva de ampliação da visão

do cuidado da saúde em sua dimensão setorial e de envolvimento da própria

população, superando o campo de ação dos responsáveis pela atenção

convencional dos serviços de saúde.

Seguindo essa linha, é desde a Carta de Ottawa (1986) que o termo

promoção da saúde tem evoluído em seu conceito, quando veio abranger mais do

que somente a redução a um tipo de consideração da biologia humana, não

colocando o peso da saúde exclusivamente no setor saúde (que deve “combater

doenças”), e avançando para além de um estilo de vida saudável no sentido médico,

pois vai na direção de um bem-estar global. E se a saúde é, entre outros, resultado

dos modos de organização social da produção, como efeito da composição de

múltiplos fatores, há de se ratificar que o setor saúde também deva estar engajado

no processo de oferecer às pessoas condições de vida melhores e estimulá-las a

exercer plenamente a sua cidadania (CAMPOS; BARROS; CASTRO, 2004).

No entanto, não é idéia do século XX, na saúde pública, abordar as condições

de saúde ligadas a fatores macroeconômicos e sociais. Entre 1820 e 1830, Villermé,

na França, demonstrava as diferenças das taxas de mortalidade entre as classes

ricas e pobres. Na metade do século XX, Virchow afirmava a necessidade de lutar

contra as desigualdades sociais, por considera-las a principal origem das doenças.

As abordagens marxistas da medicina social, entre os anos 60 e 70, defendiam a

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influência dos fatores macrossociais e do contexto político-econômico sobre as

condições de saúde da população e da própria prática médica, entre outros estudos

(CAPRARA, 2003).

É neste contexto, que se reconhece que fatores políticos, econômicos,

sociais, culturais, ambientais, comportamentais e biológicos podem tanto favorecer

quanto prejudicar a saúde (OTTAWA,1986). É quando a promoção em saúde surge

no campo da saúde coletiva, norteando ações em prol da melhoria nas condições de

vida, a partir de um enfoque também político e técnico do processo saúde-doença,

fazendo adentrar nesse processo, o cuidado (SILVA, 2008), o qual é, nada menos,

que o sentido primeiro da Saúde.

É numa reflexão sobre as influências dos aspectos sociais sobre a saúde dos

indivíduos e da população que evolui o conceito de promoção de saúde. Se por um

lado avança o conceito, de outro visões simplificadas da promoção da saúde

permanecem na prática dos profissionais de saúde e na concepção dos sistemas e

serviços de saúde. A diferença entre a teoria e a prática pode, em alguns casos,

tornar-se abismal.

O desafio posto é que não é mais possível responder satisfatoriamente a

uma série de mudanças no processo saúde-doença na sociedade brasileira - onde

se verifica o envelhecimento da população e uma aceleração no aumento da

morbidade e mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis, numa transição

demográfica e epidemiológica (MALTA et al, 2006) - com as mesmas ações e

tecnologias de trabalho, com a atual e tão propagada organização dos serviços de

saúde que priorizam o sintoma e as ações biomédicas individuais e sintomáticas.

No Brasil, ainda é incipiente e também contraditória a discussão que envolve

a promoção da saúde, já que predomina a hegemonia do modelo biomédico na

saúde (SILVA, 2008). O próprio Ministério da Saúde (2010) reconheceu que o

aparato biomédico não consegue modificar os condicionantes nem determinantes

mais amplos do processo saúde-doença que vem se apresentando. Em especial,

quando se está preso em operar em um modelo de atenção e cuidado marcado, na

maior parte das vezes, pela centralidade dos sintomas e seu mero apagamento ou

manutenção.

A recomendação é que o setor saúde avance, gradativamente, no sentido da

promoção da saúde, além das suas responsabilidades de prover serviços clínicos e

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de urgência (OTTAWA,1986). O que se deseja é que avance para além de uma

abordagem cartesiana de saúde, notadamente objetificadora, em busca de uma

postura abrangente capaz de perceber e respeitar as necessidades do indivíduo, da

comunidade e seu contexto cultural. De respeitar o indivíduo como ser integral que

é, e dentro dos efeitos que seu ambiente lhe impõe 2. Desde a Conferência

Internacional de Alma-Ata (1978), a OMS vem apontando a insuficiência da medicina

tecnológica e especialista para a resolução de problemas de saúde de dois terços da

humanidade (NASCIMENTO et al, 2013).

As transformações das ações fundamentadas nesse conceito evoluído de

promoção da saúde, segundo compromisso firmado na Carta de Ottawa, devem

romper com a fragmentação do modelo assistencial vigente, superando a cultura de

medicalização; e devem promover mudanças no estilo de vida e favorecer a

autonomia dos sujeitos e dos grupos sociais. A responsabilidade pela promoção da

saúde é compartilhada por todos, sendo assim, requer a cooperação intersetorial e a

articulação dos vários segmentos sociais no planejamento, realização e avaliação

das ações, transcendendo o setor saúde. Tais articulações também devem estar

direcionadas às necessidades específicas da população, onde o empoderamento e

a participação social assegurados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) é que

poderiam garantir uma concreta e efetiva participação dessa população na tomada

de decisões e na elaboração das políticas públicas, não fosse, no Brasil, o caso

dessa participação social ser organizada e distinguida por marcas oligárquicas de

poder ou jogos de força (SILVA, 2008).

Os indivíduos precisam de um empoderamento de suas necessidades e

condições de saúde. Se esses indivíduos não forem capazes de controlar os fatores

determinantes de sua saúde, eles não poderão realizar completamente seu potencial

de saúde. Esse empoderamento e a real participação social se fazem quando há a

posse e o controle pela comunidade dos seus próprios esforços e destinos.

Com esse avanço no conceito, ao considerar-se que a promoção da saúde

vai além dos “cuidados de saúde” convencionais, ela coloca a saúde na agenda de

prioridades dos políticos e dirigentes em todos os níveis e setores. A política de

2 Sobre o conceito de cartesianismo e de objetificação, ver Pelizzoli, 2007 e 2010, e Gadamer, 2006.

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promoção da saúde deve combinar legislação, medidas fiscais, taxações e

mudanças organizacionais, entre outras abordagens. Recomenda-se que seja uma

ação coordenada com fins de proporcionar à população equidade em saúde e na

distribuição da renda e políticas sociais (OTTAWA,1986).

Cada vez que se discute promoção da saúde, se reafirma o valor essencial da

equidade em saúde e se reconhece o direito fundamental de qualquer indivíduo e a

qualquer tempo de gozar do mais alto nível de saúde que se possa atingir. Quando

não há a equidade, não é possível que haja satisfatoriamente um desenvolvimento

sustentável e uma melhora na qualidade de vida e bem-estar de todos (OMS, 2011).

A Carta de Ottawa (1986) defende a saúde, que é construída pelo cuidado de

cada um consigo mesmo e com os outros, pela capacidade de tomar decisões e de

ter controle sobre as circunstâncias da própria vida, e pela luta para que a sociedade

ofereça condições equitativas de saúde. Na perspectiva de uma saúde que se

constrói e se vive na rotina, nas atividades diárias, nos espaços individuais e

comuns, nos direitos e deveres, vem à tona o cuidado, a integralidade (ou holismo) e

a ecologia, temas essenciais no desenvolvimento de estratégias para a promoção da

saúde.

A promoção da saúde é uma estratégia relevante ao enfrentamento dos

problemas sanitários e à melhoria da qualidade de vida da população, pois tem uma

relação indiscutível com os compromissos éticos da política e do sistema de saúde

brasileiro (CAMPOS; BARROS; CASTRO, 2004).

Tendo-se em vista o compromisso ético de cada um com o cuidar da saúde

de sujeitos e coletividades, Campos, Barros e Castro (2004) sugerem o

questionamento de como se pensa a promoção da saúde no Brasil e no que ela

poderá auxiliar na geração de outros modos de atenção e de gestão da saúde, de

criação do viver e de outras realidades ou vivências sociais. Chega-se aqui, com

uma proposta de uma Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) que seja

transversal, cujas ações sejam a articulação e integração das várias áreas técnicas

especializadas, os vários níveis de complexidade e as várias políticas específicas de

saúde (CAMPOS; BARROS; CASTRO, 2004).

Esse desafio coube ao gestor federal do SUS, que propôs uma política

transversal, integrada e intersetorial, que ao seu ver dialoga com as diversas áreas

do setor sanitário, os outros setores do Governo, os setores privados e não-

governamentais e a sociedade, compondo redes de compromisso e co-

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responsabilidade quanto à qualidade de vida da população, convocando todos a

serem partícipes no cuidado com a saúde (BRASIL, 2010).

O Ministério da Saúde (2010) defende que a atenção à saúde no Brasil tem

sim investido na formulação, implementação e concretização de políticas de

promoção, proteção e recuperação da saúde e definiu, desde setembro de 2005, a

Agenda de Compromisso Pela Saúde, que agrega o Pacto em Defesa do SUS, O

Pacto em Defesa da Vida e o Pacto de Gestão; neles consta um conjunto de

compromissos sanitários que deverão ser prioridades inequívocas de cada ente

federativo, cada qual com suas responsabilidades. O Ministério da Saúde considera

isso “um grande esforço na construção de um modelo de atenção à saúde que

priorize ações de melhoria da qualidade de vida dos sujeitos e coletivos” (BRASIL,

2010).

Com esse entendimento, a institucionalização da promoção da saúde no SUS

se deu com a aprovação da Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS),

publicada sob Portaria Nº 867, de 30 de março de 2006. Para o Ministério da Saúde

(2010), essa publicação ratifica o compromisso da gestão da época com a

ampliação e qualificação das ações de promoção da saúde nos serviços e com a

gestão do SUS.

A PNPS se apresenta com macro-prioridades entre as quais dá-se especial

relevância ao aprimoramento do acesso e da qualidade dos serviços prestados no

SUS, a ênfase é dada aos seguintes eixos temáticos: Modos de viver, Condições e

relações de trabalho e Ambientes (BRASIL, 2010).

Quando se reconhece a saúde enquanto direito de todos e dever do Estado,

não obstante, é o Estado que detém o poder de deliberar, implantar e avaliar as

políticas de saúde, mesmo que ocorram as conferências municipais, estaduais e

federais, mas não haja uma participação popular, não há como garantir que sejam

oferecidas ações de cuidado integral com qualidade. Isso se confirma quando

crescem as edificações que recebem a população com o objetivo de identificar

sintomas e tratá-los, em detrimento de ações que encontrem os indivíduos em seus

espaços de vida, em suas atividades, com seus costumes, em seus grupos, onde

eles vivem o pertencimento.

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2.2 Pensando a Integralidade

A Lei Orgânica da Saúde (Lei nº8.080/90), em seu artigo 7º, que dispõe sobre

os princípios e diretrizes do SUS, aponta que o Sistema é organizado

constitucionalmente de acordo com as seguintes diretrizes: descentralização,

atendimento integral e participação da comunidade. A integralidade da assistência é

definida como “o conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e

curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de

complexidade do sistema”. (CARVALHO; SANTOS, 2006). Ou seja,

constitucionalmente o sistema sanitário brasileiro encontra-se comprometido com a

integralidade da atenção à saúde, quando suas ações e serviços são solicitados a

trabalhar pela promoção, proteção e recuperação da saúde, com a descentralização

e com a participação social (BRASIL, 2010).

Assim, a integralidade e a gestão participativa são ao mesmo tempo

compromissos da promoção da saúde e um compromisso ético do SUS (CAMPOS;

BARROS; CASTRO, 2004). A integralidade é reconhecida como imagem objetivo

ou ideal regulador dentre os princípios constitucionais do SUS, além de que tem se

destacado por seu potencial de resgatar as dimensões subjetivas e sociais como

constitutivas do saber-fazer em saúde (WENCESLAU; RÖHR;TESSER, 2014). É

preciso estar sempre chamando a atenção para a integralidade, repensando

aspectos importantes da organização do processo de trabalho, gestão, planejamento

e construção de novos saberes e práticas de saúde (CECÍLIO, 2001). Sem, no

entanto, distanciar os níveis de atenção.

Caprara (2003) afirma que algo já tem sido feito no que se refere a pensar a

integralidade na formação de médicos. A autora relata que uma proposta de

concepção integrada, denominada “humanidades médicas”, vem sendo

desenvolvida na formação em medicina e, para tanto, prevê a incorporação de

elementos das ciências humanas (filosofia, psicologia, antropologia, literatura) nos

cursos de graduação e especialização. Tal concepção reconhece que não há como

separar os componentes materiais, físicos, dos componentes experienciais. Desse

modo, a medicina é entendida como forma de auto-exploração.

O objetivo das “humanidades médicas” enquanto área de reflexão e

pensamento é explorar como a experiência humana lida com as experiências do

outro, seja esse outro paciente ou médico, digam suas experiências respeito à

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saúde, à doença e/ou ao sofrimento. O que se pretende é interferir no diálogo entre

médico e paciente, melhorando as capacidades comunicacionais do médico e, ao

mesmo tempo, aprofundando a narrativa do paciente, aperfeiçoando a relação

desses dois sujeitos, na tentativa de estabelecer novas formas de bem-estar.

É grave vislumbrar que a abordagem do processo saúde-doença do atual

cenário epidemiológico brasileiro sofre com a polarização entre atenção clínica e

promoção da saúde, pois esta polarização não contribui para a melhoria da

qualidade de vida da população, tampouco para a ampliação da resolubilidade das

ações sanitárias em curso e, inevitavelmente, se afasta da integralidade do cuidado

(CAMPOS, 2006).

Mais uma vez, há de se apontar o fracasso em eficiência dos modelos

assistenciais em saúde dominantes de cuidarem da saúde, e há de se reforçar a

ideia de que a eficácia poderá ser alcançada quando as práticas de saúde

materializarem a integralidade como direito e enquanto serviço às pessoas

(PINHEIRO, 2001). Isso talvez se explique por ser a integralidade o princípio mais

negligenciado no âmbito do SUS, mesmo tendo sido uma questão posta pela

Reforma Sanitária Brasileira, no final dos anos de 1980, a constatação é de que a

política estaria se concentrando nas questões de financiamento e descentralização

(PAIM,2009).

Propor um novo modelo de atenção à saúde não significa apenas tirar do

centro o papel do hospital e das especialidades e priorizar a atenção primária em

saúde, mas, muito mais do que isso, significa concentrar-se no indivíduo enquanto

ser integral, com necessidades próprias, que se beneficiaria, ou melhor, participaria,

de um cuidado integrativo.

O entendimento da integralidade, com o avanço nas discussões da promoção

da saúde, passou a abranger as dimensões da qualidade da atenção e do cuidado,

o que faz aumentar a responsabilidade do sistema de saúde. A integralidade exige a

articulação e sintonia entre as estratégias de produção da saúde, bem como o

deslocamento da atenção da perspectiva estrita do seu adoecimento e dos seus

sintomas para o acolhimento de sua história, de suas condições de vida e de suas

necessidades em saúde, respeitando e considerando suas especificidades e suas

potencialidades nas ações de saúde (BRASIL, 2010).

A integralidade deverá ser encarada como meio de permitir aos indivíduos

vislumbrar a saúde enquanto exercício da sua cidadania. A quem estaria implicado

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na construção de uma política de saúde cujo eixo seja a integralidade, resta superar

os obstáculos que advém do modelo de cuidado fragmentado do ser, para então

implantar inovações no cotidiano dos serviços de saúde, nas relações entre os

níveis de gestão do SUS, nas relações destes com a sociedade e principalmente no

cuidado (PINHEIRO, 2009).

A integralidade, bem como a promoção de saúde, estariam intimamente

ligadas à visão de saúde que cada indivíduo/coletividade tem. Isso se constrói das

próprias experiências do ser humano, experiências essas eivadas pelo contexto

sócio-político e cultural do qual faz parte. Vivências constituídas pelas experiências

de adoecer, curar-se e ser curado. Experiências pautadas em suas crenças e em

suas possibilidades de refletir sobre o seu bem-estar.

Numa sociedade onde as pessoas são alienadas e convivem pacificamente

com as enormes diferenças sociais a que todos estão submetidos, onde as pessoas

se deixam conduzir por modelos de beleza, onde ser magro é ser bonito, mas se

alimentam mal, se submetem a cirurgias deformadoras e ignoram a boa alimentação

e a prática de exercícios, bem como uma vida afetiva saudável; onde a natureza não

é respeitada e as pessoas não aprendem a conhecer sobre si mesmas e entender

suas potencialidades, não vislumbram o animal natural que são e a natureza da qual

fazem parte; onde bem-estar significa viver luxuosamente, por vezes trabalhando

exaustivamente e acreditando ser lazer sair para beber, fumar e se trancar em um

lugar fechado (com centenas de pessoas e muito barulho como são as casas de

show e da forma como costumam se divertir a maioria dos jovens hoje em dia); a

contar destes poucos exemplos esta não pode ser uma sociedade que favorece aos

seus indivíduos uma visão de saúde ou vida “saudável”, integral.

Essas são concepções centrais do individualismo atual que expressam o

triunfo de valores do capitalismo, principalmente entre os jovens :“o uso do corpo

como forma de obtenção de status social, o consumismo como valor de prestígio e

diferenciação social e o sucesso como valor fim para a vida”; e que fazem surgir

novas práticas de saúde que valorizam a tríade beleza-vigor-juventude e cujo

referencial de saúde está nas belezas das formas corporais e no sentir-se bem

consigo mesmo (NASCIMENTO et al, 2013).

Foram os determinantes sociais do processo saúde-doença e o desafio da

integralidade do cuidado que conduziram a Organização Mundial da Saúde a propor

as Medicina Tradicional e Medicina Complementar e Alternativa para comporem as

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políticas de saúde (GALHARDI; BARROS; LEITE-MOR, 2013; THIAGO; TESSER,

2013; SOUSA et al, 2012). Integrar e inserir a MT/MCA aos sistemas oficiais de

saúde, com foco na atenção primária de saúde (BRASIL, 2011) é um grande

desafio, compondo quiçá um choque de paradigmas em saúde

Outro argumento incisivo, que tornou o assunto da MT/MCA uma relevante

questão da saúde pública de repercussão mundial e cujo reconhecimento partiu da

OMS, de outras entidades sanitárias, de agências internacionais e de governos, deu-

se a partir da constatação de que essas práticas são apropriadas por milhões de

pessoas, alcançando níveis percentuais significativos nos chamados países em

desenvolvimento, onde a oferta de serviços de saúde por parte dos governos é

incipiente em face das crescentes demandas e, ao mesmo tempo, em países

desenvolvidos, esses níveis percentuais também são significativos e significam

gastos expressos em milhões de dólares (ANDRADE; COSTA, 2010).

Ao reconhecer que o processo saúde-doença é engendrado socialmente, se

reconhece também o caráter histórico, político, significativo e singular da saúde.

Reconhece-se que saúde e doença relacionam-se com os modos das mais diversas

relações das pessoas, inclusive com a relação que estabelecem com as suas

respectivas qualidades de vida. Isso faz demandar da sociedade mudanças

profundas nos modos de produção do cuidado (NUNES; PELIZZOLI, 2011).

Assim, desde o início da década de 2000, a OMS produz documentos e

resoluções específicas que apontam a necessidade de uma prática integral no

cuidado à saúde, bem como a inclusão de práticas não biomédicas, reforçando o

compromisso de estimular a implantação e desenvolvimento de políticas de MT/MCA

nos sistemas de saúde dos países-membros, principalmente no setor público. Neste

lugar, deve-se respeitar pilares fundamentais como a estruturação de uma política

para o setor, garantia de segurança, qualidade e eficácia, ampliação do acesso e o

uso racional (GALHARDI; BARROS; LEITE-MOR, 2013; THIAGO; TESSER, 2013;

SOUSA et al, 2012).

A integralidade do cuidado à saúde se constitui como princípio doutrinário do

SUS e isso aponta para a oferta dessas práticas integrativas no Brasil. Há uma

tendência da medicina ocidental de recorrer, em especial, às técnicas terapêuticas

de medicinas orientais, como a acupuntura, que está dentro da Medicina Tradicional

Chinesa (MTC). Isso se afirma como fato de importância ascendente na medicina

ocidental, onde se pode observar o esforço de reconhecer a eficácia de aspectos

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terapêuticos que são parte de sistemas médicos coerentes e integrados e de

comprová-los e legitimá-los (LUZ, 200?).

A crise do modelo biomédico de saúde, com seus altos custos e apoio

intensivo em tecnologias, favorece um contexto mundial para as Práticas

Integrativas e Complementares em Saúde (PICS), que tem seu uso disseminado por

centenas de países. Inclusive economicamente, há uma movimentação crescente

com o comércio de medicamentos fitoterápicos chegando a 30% do comércio de

medicamentos em geral (BRASIL, 2009), além de uma gama de práticas de saúde

alternativa pagas.

Esse crescimento pode ser apreciado nas produções científicas,

apresentadas no gráfico 1 que se segue, em pesquisa no banco de dados em

saúde, BIREME. Utilizando como palavra-chave “Práticas Integrativas e

Complementares em Saúde”, foram apontados 100 (cem) documentos, desde 2006

até o ano de 2013, dos quais 77 (setenta e sete) publicados na língua portuguesa.

Observa-se que a inserção das racionalidades médicas alternativas e

complementares na formação médica segue na direção da integralidade. O potencial

da integralidade de apontar para o resgate das dimensões objetivas e sociais como

constitutivas do saber-fazer em saúde se presentifica através de mudanças

curriculares e experiências inovadoras na educação profissional em saúde, as quais

tem buscado integrar os conteúdos e metodologias de ensino-aprendizagem às

teorias e práticas que resgatem:

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as experiências dos sujeitos envolvidos no processo de trabalho, suas histórias de vida, afetos, projetos pessoais e coletivos, além da análise e intervenção em torno dos determinantes históricos, sociais e políticos do processo saúde-doença (WENCESLAU; RÖHR; TESSER, 2014, p.128).

Pode-se, também, falar em reconhecimento social, acadêmico e institucional

dessas terapias, em um pluralismo terapêutico que contempla a biomedicina

hegemônica em um ambiente cada vez mais medicalizado. O pluralismo nos

cuidados em saúde pode, no entanto, contribuir para a desmedicalização parcial do

cuidado profissional, tendo em vista serem socialmente valorizadas e desejadas

(THIAGO; TESSER, 2013).

No entanto, pode-se inferir que essa legitimidade vem sendo construída, em

alguns casos, há séculos, já que as MT/MCA são práticas que constituem

patrimônio dos povos tradicionais e possuem um enraizamento cultural de longa

data, em diversas regiões do planeta, na maioria dos casos assentadas em práticas

indígenas e/ou em sistemas refinados como o Ayurveda indiano e a Medicina

Tradicional Chinesa. Tudo isso, por si só, assegura legitimidade social comprovada

(ANDRADE; COSTA, 2010).

Porém, há o risco, talvez já concretizado, da institucionalização por meio de

políticas para as PICS, e de descontextualizar sistemas médicos diferentes do

modelo biomédico de saúde, apropriando-se de algumas de suas técnicas, sem

considerar o significado filosófico, vital e profundo dessas práticas, que em geral

envolvem aspectos maiores da vida de um sujeito. De algo modo, o modelo

biomédico vigente, apoiado no paradigma cartesiano, ainda hoje o mais influente,

contribui para uma compreensão limitada do que venha a ser integralidade e, dessa

forma, distancie cada vez mais os indivíduos de sua “desfragmentação” e

“desambientação”.

A maior dificuldade em reconhecer as diferenças entre o modelo de saúde

dominante e as PICS seria, segundo o Ministério da Saúde (2009), pela diferença

entre a guerra e a harmonização no ato de curar. No modelo biomédico, o foco é na

abordagem objetificadora da doença e, consequentemente, o fim é identificar e

combater (termo que a Epidemiologia herdou das expressões de guerra) possíveis

agentes das doenças, de modo a obter o retorno às funções “normais” do corpo e à

“boa saúde”. Já nas PICS e na MT/MCA a pessoa é vista e cuidada, em uma

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abordagem holística, ou seja, integrando níveis diferentes, bem como dimensões

que recuperam uma visão natural do processo saúde-doença. O que é boa saúde

numa abordagem cujo foco é a doença, pode ser bem diferente do que é boa saúde

numa abordagem totalizante do indivíduo.

Diante da base das políticas de saúde no Brasil – em acordo com a base

predominante do atual modelo biomédico – que tem o foco na doença e ainda assim

de forma superficial (PELIZZOLI, 2007), a publicação da Política Nacional de

Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PNPIC) tem sido apontada

como evidência de uma recente escavação filosófica e sociológica sobre o saber

instituído contra o reducionismo epistêmico, bem como a favor da inclusão da lógica

integrativa na saúde, que combina o núcleo duro de diferentes práticas do saber,

para além da perspectiva reducionista ou excludente (BARROS, 2006).

A PNPIC no SUS é considerada pelo Ministério da Saúde enquanto abertura

de possibilidades de acesso a serviços antes restritos a quem podia pagar e, junto

com as políticas nacionais de Atenção Básica e a Política de Promoção da Saúde,

compõe um forte arcabouço legal para a existência das práticas integrativas e

complementares no SUS. Ela oferece diretrizes e ações para a inserção de serviços

e produtos relacionados à Medicina Tradicional Chinesa/Acupuntura, Homeopatia e

Plantas Medicinais e Fitoterapia, além de criar os observatórios de saúde para o

Termalismo Social e da Medicina Antroposófica. Promete, no seu texto, contemplar

abordagens que busquem estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e recuperação da saúde por meio de tecnologias eficazes e seguras, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico, na integração do ser

humano com o meio ambiente e a sociedade (BRASIL, 2006).

Igualmente, traz uma visão ampliada do processo saúde-doença e da promoção

global do cuidado humano. Dessa forma a PNPIC no SUS propõe uma visão

integrativa em saúde a ser implantada dentro de um sistema de saúde cujo modelo

supere o reducionismo da visão biomédica, mesmo que não exclua como tal o uso

de procedimentos biomédicos.

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2.3 Historicidade da Institucionalização das Práticas Integrativas e

Complementares

As práticas denominadas alternativas, complementares, integrativas ou

holísticas têm crescido em uso e têm chamado a atenção de diversos autores

sociais. Isso retrata o ganho progressivo de espaço nos grupos civis e nas

instituições e serviços públicos de saúde (SOUZA; LUZ, 2009), em função do SUS e

da PNPIC (NASCIMENTO et al, 2013). O surgimento e desenvolvimento dessas

práticas remontam ao final da década de 1960, tendo desempenhado importante

papel no conjunto de transformações denominado contracultura (CAMPBELL, 1997;

LUZ, 1997; QUEIROZ, 2006). O movimento contracultural foi marcado por uma

juventude revolucionária que, dentre outras lutas, partiu em busca de novas

soluções terapêuticas, também como símbolos de uma ‘revolução cultural’(SOUZA;

LUZ, 2009).

A institucionalização da MT/MCA vem se dando descontinuamente. No

entanto, vem sendo construída a partir de marcos internacionais e nacionais nessa

institucionalização, como segue. Pode-se afirmar que foi a partir da Conferência

Internacional sobre Atenção Primária em Saúde em Alma-Ata, 1978, que a OMS

passou a recomendar a incorporação da Medicina Tradicional na atenção primária

em saúde, partindo-se da admissão de que grande parte da população depende das

práticas tradicionais como recurso terapêutico, no nível primário de cuidado em

saúde (OMS, 1978; BRASIL, 2011). Desde então, a OMS defende a crescente

popularização e valorização das práticas integrativas (OMS, 2002) e por isso vem

reforçando essa recomendação através da instituição de programas, da publicação

de documentos e organização de eventos sobre o tema.

Logo em seguida, ainda no final da década de 1970, e de forma mais

específica, a OMS instituiu o Programa de Medicina Tradicional, com a finalidade

principal de formular políticas na área. A partir daí, a OMS vem se pronunciando em

seu compromisso de incentivar os Estados-membros a formularem e implementarem

políticas públicas para uso racional e integrado da MT/MCA nos sistemas nacionais

de atenção à saúde. Deste modo, suas resoluções têm sido formuladas valorizando

o potencial da Medicina Tradicional em seu conjunto, bem como fornecendo

informações e orientações técnicas que propiciem, segura e eficazmente, as práticas

da MT/MCA (BRASIL, 2011).

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O marco seguinte aconteceu no início dos anos 2000, com a publicação da

Estratégia da OMS para a Medicina Tradicional para 2002-2005. Importante

documento que preconiza o desenvolvimento de políticas, observando os seguintes

requisitos: segurança, eficácia, qualidade, uso racional e acesso, este último

ampliado e com ênfase nas populações pobres. Tal documento observa o papel e

objetivos da própria OMS nesse campo e também o diagnóstico, desafios e

potencialidades da MT/MCA (OMS, 2002).

O documento subsequente, o National Policy on Traditional Medicine and

Regulation of Herbal Medicines, produzido em Genebra, em 2005, discute, como o

nome anuncia, a situação mundial sobre as Políticas Nacionais de MT/MCA e

medicamentos oriundos de plantas medicinais (OMS, 2005). Ainda em Genebra, no

ano seguinte, foi promovida pela OMS, uma reunião em que se tratou o tema da

Integração da Medicina Tradicional nos Sistemas Nacionais de Saúde e o

principal objetivo foi discutir a situação do desenvolvimento da MT/MCA nos

sistemas nacionais de saúde à época. Foi naquele ano, com a aprovação da PNPIC

no SUS e a apresentação desta no referido evento, que o Brasil passou a integrar o

grupo de países que possuem Políticas Nacionais de MT/MCA (BRASIL,2011).

Também em 2006, mais uma reunião técnica de especialistas, dessa vez em

Milão, Itália, discutiu as diretrizes para capacitação básica e segurança em

Fitoterapia, nas áreas de Medicina Tradicional Chinesa, Ayurveda, Naturopatia e

Medicina Unani (BRASIL, 2011).

Em 2007, uma parceria entre o governo chinês e a OMS promoveu a

Conferência Internacional de Medicina Tradicional Chinesa para Cooperação

em Ciência e Tecnologia, que debateu temas relacionados à MT/MCA, de modo

gera,l e ressaltou a contribuição e impacto positivo da Medicina Tradicional Chinesa

à saúde no mundo. Dessa Conferência, resultaram a Declaração de Beijing de

Cooperação Internacional em Medicina Tradicional Chinesa em Ciência e

Tecnologia e a criação do Comitê de Especialistas para o Programa

Internacional de Medicina Tradicional Chinesa para Cooperação em Ciência e

Tecnologia (BRASIL, 2011).

Foi no WHO Congresso on Traditional Medicine, em 2008, também na

China, que foi produzida a Declaração de Beijing que, entre outras coisas, confere

relevância à Medicina Tradicional e sugere que ela seja preservada e amplamente

divulgada. Que os governos, sendo responsáveis pela saúde da população, devem

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formular políticas para a integração das práticas integrativas aos sistemas nacionais

de saúde com garantia de adequabilidade, segurança e efetividade (BRASIL, 2011).

A “Prestação de Serviços e Avaliação em Medicina Tradicional nos Sistemas

de Saúde” foi tema do II Workshop sobre Medicina Tradicional, do qual

participaram 14 países convidados pela OMS, entre eles o Brasil, único

representante da América Latina. Na oportunidade, o País pôde apresentar a PNPIC

no SUS, bem como seus avanços (BRASIL, 2011; RODRIGUES et al, 2011;

BRASIL, 2011).

No Brasil, alguns eventos merecem destaque na regulamentação e tentativas

de integração das práticas integrativas ao SUS e na construção da Política Nacional

(BRASIL, 2005). Primeiro, a institucionalização da assistência homeopática na rede

pública de saúde, em 1985, com a celebração de convênio entre o Instituto Nacional

de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), a Fiocruz, a Universidade

Estadual do Rio de Janeiro e o Instituto Hahnemaniano do Brasil.

Em 1986, um marco importante para a Saúde no país devido à forte

participação popular e ao seu caráter democrático, a 8ª Conferência Nacional de

Saúde, que deliberou, em seu relatório final, pela "introdução de práticas alternativas

de assistência à saúde no âmbito dos serviços de saúde, possibilitando ao usuário o

acesso democrático de escolher a terapêutica preferida". No ano de 1988,

destacaram-se as resoluções da Comissão Interministerial de Planejamento e

Coordenação (CIPLAN) nº 4, 5, 6, 7 e 8, de março de 1988, que fixaram normas e

diretrizes para o atendimento em homeopatia, acupuntura, termalismo e em técnicas

alternativas de saúde mental e fitoterapia.

Por meio da Portaria Nº 2543/GM, de 14 de dezembro de 1995, instituíu-se o

Grupo Assessor Técnico-Científico em Medicinas não-Convencionais. Em 1996,

ocorreu a 10ª Conferência Nacional de Saúde que, em seu relatório final, aprovou a

“incorporação ao SUS, em todo o País, de práticas de saúde como a fitoterapia,

acupuntura e homeopatia, contemplando as terapias alternativas e práticas

populares”. Já a inclusão das consultas médicas em homeopatia e acupuntura na

tabela de procedimentos do SIA/SUS, estabeleceu-se em 1999, através da Portaria

GM Nº 1230 de outubro daquele ano.

A 11ª Conferência Nacional de Saúde, em 2000, recomendou incorporar

práticas não convencionais de terapêutica como acupuntura e homeopatia na

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atenção básica. Reforçada pelas recomendações da 1ª Conferência Nacional de

Vigilância Sanitária, em 2002, de inserir as PIC na rede pública. No ano de 2003, foi

constituído um Grupo de Trabalho no Ministério da Saúde com o objetivo de elaborar

a Política Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares (MNPC) no

SUS.

Nesse mesmo ano, foi publicado o relatório da 1ª Conferência Nacional de

Assistência Farmacêutica, com ênfase na importância de ampliação do acesso aos

medicamentos fitoterápicos e homeopáticos no SUS, além do relatório final da 12ª

CNS, que deliberou a efetiva inclusão da MNPC no SUS, incluída na Agenda

Nacional de Prioridades em Pesquisa, em 2004, após ter sido publicado o

Diagnóstico brasileiro de inserção da MNPC no SUS. No ano de 2005, um Decreto

Presidencial de 17 de fevereiro criou Grupo de Trabalho para elaboração da Política

Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

Um ano decisivo, em que se pode enumerar quatro leis que

institucionalizaram as PIC, foi 2006. A primeira foi a Portaria GM Nº971/MS,

publicada no Diário Oficial da União de 3 de maio de 2006, que aprovou a Política

Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS. Seguem-se as

Portarias que aprovaram o observatório de medicina antroposófica no SUS,

incluindo com o código 068 o serviço PICS na Tabela de Serviços/Classificação do

Sistema de Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde de Informações do

SUS; e o Decreto Presidencial que aprovou a Política Nacional de Plantas

Medicinais e Fitoterápicos e deu outras providências.

Os anos seguintes são marcados pela ampliação dessa legislação que

aborda e institucionaliza as PICS. Destaca-se a inclusão de medicamentos

fitoterápicos e homeopáticos no Elenco de Referência de medicamentos e Insumos

complementares para a Assistência Farmacêutica na Atenção Básica, em 2007.

Aliás é sobre medicamentos fitoterápicos e homeopáticos a maior quantidade de

leis, onde se tem verificado os maiores avanços. Destaque também para a inclusão

das PICS nas áreas prioritárias, bem como de profissionais ligados às PICS na lista

de especialidades dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF), em 2008. E,

em 2009, a adequação do serviço especializado 134 como Serviço de Práticas

Integrativas e sua classificação 001 para Acupuntura.

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2.4 Construindo a Política Nacional

Percorrem-se os caminhos que culminaram em uma demanda urgente de

aprovação da PNPIC no SUS. A partir dessa história, enumeram-se os grupos que

trabalharam especificamente para a elaboração e, consequentemente, para a

aprovação da política para PICS no Brasil. O Instituto de Estudos, Formação e

Assessoria em Políticas Sociais (Polis) defende que uma política pública é

desenvolvida em cinco fases:

a identificação de uma questão a ser resolvida ou um conjunto de direitos a serem efetivados, a partir de um diagnóstico do problema; a formulação de um plano de ação para o enfrentamento do problema; a decisão e escolha das ações prioritárias; a implementação (através de leis e procedimentos administrativos); e a avaliação dos resultados alcançados (TEIXEIRA; SERAFIM; MORAES, 2006).

A fase de identificar um conjunto de direitos a serem efetivados iniciou-se

quando se vislumbrou um processo crescente de legitimação dessas práticas, tendo

em vista as deliberações, fruto dos seguintes eventos: Conferências Nacionais de

Saúde; 1ª Conferência Nacional de Vigilância Sanitária, em 2001; 1ª Conferência

Nacional de Assistência Farmacêutica, em 2003; 2ª Conferência Nacional de

Ciência, Tecnologia e Inovação em Saúde, realizada em 2004 (BRASIL, 2006b).

Essa fase teve continuidade no momento em que os representantes das

Associações Nacionais de Fitoterapia, Homeopatia, Acupuntura e Medicina

Antroposófica organizados, em 2003, conquistaram a constituição, pelo Ministério da

Saúde, de um grupo de trabalho para discutir e implementar ações que findassem

na elaboração da Política Nacional.

Esse grupo de trabalho deveria ser coordenado pelo Departamento de

Atenção Básica/SAS, junto com a Secretaria Executiva, contando com a participação

de representantes das Secretarias de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos e

de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde/MS; Agência Nacional de Vigilância

Sanitária (Anvisa); e Associações Brasileiras de Fitoterapia, Homeopatia,

Acupuntura e Medicina Antroposófica (BRASIL, 2006b). Dessa maneira, iniciou-se a

fase de formulação de um plano de ação.

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Naquele mesmo ano, o próximo passo dado foi a criação de quatro subgrupos

de trabalho: Homeopatia, Fitoterapia, Medicina Antroposófica, Medicina Tradicional

Chinesa/Acupuntura (Quadro 1), delimitados devido às especificidades de cada uma

das diversas áreas. Cada grupo foi orientado a seguir o plano de ação elaborado

pelo grupo gestor, mas tinha autonomia de definir as estratégias que utilizaria para

seguir esse plano. Assim, à exceção do

subgrupo de MTC/Acupuntura que adotou as reuniões técnicas, os outros

subgrupos optaram por fóruns de abrangência nacional e mais as reuniões técnicas

(BRASIL, 2006b).

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Quadro 1 – Subgrupos de trabalho para formulação da PNPIC

Fonte: BRASIL/Ministério da Saúde, 2006.

O caminho que se seguiu e pode ser observado no Fluxograma 1, desenha as

fases de decisão e escolha das ações prioritárias e de implementação da política

pública em seu desenvolvimento que, nesse caso, se fez com a publicação em

Diário Oficial da União da PNPIC no SUS.

Subgrupo de Trabalho – MTC/Acunputura Subgrupo de Trabalho – Homeopatia

Secretaria de Atenção à Saúde

(Coordenação)

Secretaria Executiva

Secretaria de Gestão no Trabalho e

Educação na Saúde

Secretaria de Ciência, Tecnologia e

Insumos Estratégicos

Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA)

Gov. do Distrito Federal – Sec.de Saúde

Município de São Paulo – Sec. de Saúde

Município de Campinas – Sec. de Saúde

Associação Médica Brasileira de

Acunputura (AMBA)

Sociedade Médica Brasileira de

Acunputura (SMBA)

Secretaria de Atenção à Saúde

(Coordenação)

Secretaria Executiva

Secretaria de Gestão no Trabalho e

Educação na Saúde

Secretaria de Ciência, Tecnologia e

Insumos Estratégicos

Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA)

Associação Médica Homeopática

Brasileira (AMHB)

Associação Brasileira de Farmacêuticos

Homeopatas (ABFH)

Associação Brasileira de Cirurgiões

Dentistas Homeopatas (ABCDH)

Subgrupo de Trabalho – Plantas Medicinais e Fitoterapia

Subgrupo de Trabalho – Medicina Antroposófica

Secretaria de Ciência, Tecnologia e

Insumos Estratégicos (Coordenação)

Secretaria Executiva

Secretaria de Atenção à Saúde

Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA)

FIOCRUZ – Farmanguinhos

Associação Nacional de Fitoterapia em

Serviços Públicos

Insituto Brasileiro de Plantas Medicinais

(IBPM)

Associação Brasileira de Fitomedicina

(Sobrafito)

Rede Latino-Americana Interdisciplinar de

Plantas Medicinais (RELIPLAN)

Secretaria Estadual de Saúde de Santa

Catarina

Secretaria de Atenção à Saúde

(Coordenação)

Secretaria Executiva

Agência Nacional de Vigilância Sanitária

(ANVISA)

Associação Brasileira de Medicina

Antroposófica (ABMA)

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Fluxograma 1 – Caminho de formulação da PNPIC.

Coordenação-geral do processo de

formulação da Política Nacional

Secretaria Executiva / Ministério da Saúde (MS).

Secretaria de Atenção à Saúde / MS.

Subrupos de Trabalho

Avaliação pelas Câmaras Técnicas dos Conselhos Nacionais de Secretários

Estaduais e Municipais de Saúde. +

Pactuação na Comissão Intergestores

Tripartite (2005).

Consolidação dos trabalhos dos subgrupos +

Elaboração da Proposta da Política Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares

Realização de diagnóstico situacional das práticas no SUS:

- Inserção das PICS no SUS; - Levantamento da capacidade instalada; - Nº e perfil dos profissionais envolvidos; - Capacitação dos recursos humanos; -Qualidade dos serviços, entre outros.

CNS recomenda (2005): - Submissão do documento da proposta para avaliação; - À Comissão de Vigilância Sanitária e Farmacoepidemiológica.

+ Inúmeras reuniões técnicas dessa comissão com

técnicos do MS.

Nova submissão da proposta de política à

aprovação pelo CNS

RECOMENDAÇÕES: - Revisão do texto da MTC/Acupuntura; - Inclusão da prática do Termalismo Social/Crenoterapia.

RESTRIÇÕES: - Conteúdo da proposta da MTC/Acupuntura; - Nome da Política.

Constitui-se subcomissão para discutir e

elaborar a proposta final a ser avaliada pelo

CNS em 2006.

Representantes do CNS; Técnicos da MS; Consultores externos.

Aprovação e publicação

da PNPIC no SUS (2006).

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2.5 A Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementare no SUS

Ao apresentar o percurso histórico das PICS, entendemos que a PNPIC no

SUS (anexo I) não resultou somente de uma recomendação da OMS, no decorrer de

mais de três décadas, que defendeu essa institucionalização por acreditar ser essa

uma alternativa de se promover saúde no mais alto nível e de forma integral.

Derivou também uma demanda da própria população brasileira, que de

alguma forma já experimentava essas práticas, tendo em vista um levantamento

realizado em 2004, que apontava para 232 municípios, dos quais 19 capitais,

distribuídos em 26 Estados brasileiros, que já contemplando as PICS em políticas

locais (BRASIL, 2006). Tudo isso resultou em uma necessidade de normatização e

harmonização das PICS na rede pública de saúde em nível nacional. Assim, se

configura uma trajetória das PICS que passou e ainda passa pela legitimidade social

e que chegou à institucionalização em Política Pública.

Uma Política Pública intervém na realidade social, pois existe para efetivar e

garantir direitos. É, portanto, instrumento utilizado para coordenar programas e

ações públicas (TEIXEIRA; SERAFIM; MORAES, 2006). “Política Pública é a forma

de efetivar direitos, intervindo na realidade social. Ela é o principal instrumento

utilizado para coordenar programas e ações públicos” (SOUZA, 2006).

Assim, políticas públicas contemplam diretrizes e linhas estratégicas de

atuação governamental, as quais devem orientar legislação, programas, projetos e

atividades para o desenvolvimento econômico e social do país (BRASIL, 2011;

RODRIGUES et al, 2011). É a Constituição Federal Brasileira de 1988 que confere

ao ente federativo a competência para elaborar e executar políticas públicas

(BRASIL,2006c)

Para o Ministério da Saúde (2006b) a PNPIC no SUS é reconhecida por vir

atender a necessidade de conhecer, apoiar, incorporar e implementar experiências

que já à época de sua publicação e aprovação já estavam sendo desenvolvidas na

rede pública de diversas localidades brasileiras, de modo desigual, descontinuado e

com falhas relevantes quanto ao registro, fornecimento de insumos e ações de

acompanhamento e avaliações. De tais experiências, destacam-se aquelas que

foram observadas na referida política.

O Ministério da Saúde esclarece, através da Portaria Ministerial da PNPIC no

SUS, que “entende que as Práticas Integrativas e Complementares compreendem o

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universo de abordagens denominado pela OMS de Medicina Tradicional e

Complementar/Alternativa” (MT/MCA) (BRASIL, 2006). Não há consenso a respeito

da nomenclatura MT/MCA, devido às diferentes realidades e práticas no mundo.

Para a OMS, de um modo geral, o termo Medicina Tradicional se refere às práticas

médicas originárias da cultura de cada país, como a medicina tradicional chinesa e a

medicina indígena, entre outras. A definição para Medicina Tradicional (MT) é o

conjunto de conhecimentos, habilidades e práticas baseadas em teorias, crenças e experiências indígenas de diferentes culturas, explicáveis ou não, utilizadas na manutenção da saúde, tão bem quanto em prevenções, diagnósticos ou tratamentos de doenças físicas e mentais (OMS, 2005).

A Medicina Complementar/Alternativa (MCA) refere-se ao conjunto e práticas

de cuidado em saúde que não são parte da tradição própria do país e não são

integradas dentro do sistema de saúde dominante (OMS, 2005; RODRIGUES et al,

2011). Já nos países onde o sistema de saúde realiza ações com base na

biomedicina, o conjunto diversificado de ações terapêuticas que difere da

biomedicina ocidental recebe o nome de Medicinas Tradicionais/Complementares e

Alternativas (SOUSA et al, 2012).

A Portaria 971/2006 foi construida com base no inciso II do art. 198 da

Constituição Federal de 1988, que dispõe sobre a integralidade da atenção como

diretriz no SUS. É embasada, ainda, no parágrafo único do art. 3º da Lei Nº8.080/90,

que regulamenta o SUS, e diz respeito às ações destinadas a garantir às pessoas e

à coletividade condições de bem-estar físico, mental e social, como fatores

determinantes e condicionantes de saúde. Completa sua fundamentação com o

documento “Estratégia da OMS sobre Medicina Tradicional 2002-2005”.

A Portaria supracitada apresenta sua resolução em três artigos: o Art. 1º

aprova na forma do Anexo a PNPIC no SUS. Esse anexo é quem descreve a política

em quatro itens: Introdução, Objetivos, Diretrizes e Implementação das Diretrizes,

Responsabilidades Institucionais, Glossário e Bibliografia. A Introdução explica que o

campo das PICS contempla sistemas médicos complexos e recursos

terapêuticos. A PNPIC adotou a expressão “sistemas médicos complexos”,

associando-a aos estudos do projeto das racionalidades médicas (NASCIMENTO et

al, 2013).

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Sistemas médicos complexos são abordagens do campo da MNPC que

possuem teorias próprias sobre o processo saúde/doença, diagnóstico e terapêutica

(LUZ, 2003). Todo sistema médico tem uma finalidade teórica e prática comum que

é a de restabelecer a saúde dos seres humanos (LUZ, 200?). Recursos terapêuticos

são aqueles instrumentos utilizados nos diferentes sistemas médicos complexos.

Os sistemas médicos complexos e os recursos terapêuticos envolvem

abordagens cujo objetivo é estimular os mecanismos naturais de prevenção de

agravos e recuperação da saúde, fazendo uso de tecnologias reconhecidas como

eficazes e seguras. As abordagens para serem consideradas no campo das PICS

devem conter ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo

terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade,

assim como devem compartilhar de uma visão ampliada do processo saúde-doença

e de uma promoção global do cuidado humano (BRASIL, 2006).

A PNPIC no SUS aborda a Medicina Tradicional Chinesa – Acupuntura e a

Homeopatia que são sistemas médicos complexos e as Plantas Medicinais e

Fitoterapia e Termalismo Social/Crenoterapia que são recursos terapêuticos. O

desenvolvimento da MTC/Acupuntura em caráter multiprofissional, para as

categorias profissionais presentes no SUS e em consonância com o nível de

atenção, se deu através da PNPIC (NASCIMENTO et al, 2013).Tais sistemas

médicos citados compartilham de um paradigma “bio-energético ou vitalista”, em

oposição ao paradigma “bio-mecânico” característico da medicina ocidental (LUZ,

200?).

Na Introdução consta o percurso histórico internacional e nacional de

comunicados e resoluções das PICS, também apresentado nessa dissertação.

Consta um breve levantamento prévio dos municípios que, em 2004, já dispunham

de políticas que contemplavam as PICS e ratifica que a PNPIC atende às diretrizes

da OMS e busca avançar na institucionalização das PICS no SUS. Então, são

apresentados os sistemas médicos complexos e recursos terapêuticos que são

abordados na política.

Quanto aos objetivos, o documento denominado “Estratégia da OMS sobre

Medicina Tradicional 2002-2005” aponta o que as políticas nacionais sobre MT/MCA

devem preconizar, a fim de potencializar as MT/MCA enquanto fontes de cuidado

em saúde, a saber: Político, a aprovação de uma política nacional sobre MT/MCA

tanto oferece uma base sólida para essas práticas, quanto vem trazer garantias

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normativas e legais para uma boa prática das MT/MCA e, também, estimular e

definir incentivos financeiros para a pesquisa, educação e formação no tema.

Segurança, eficácia e qualidade, que deverá estimular um aprofundado

conhecimento acerca das práticas que venham a ser valorizadas por aquele país, a

fim de assegurar que sejam conhecidos os seus benefícios e malefícios e que essas

práticas se enquadrem nos padrões de qualidade aceitos nacionalmente; Acesso,

primeiro apontando as limitações na ampliação desse acesso e priorizando o acesso

às populações mais pobres; Uso racional, que envolve a qualificação e

regulamentação dos prestadores de serviços em MT/MCA, bem como uma boa

comunicação entre esses e os consumidores, além do uso adequado de produtos

necessariamente de qualidade assegurada e prover o público de informação e

orientação. Sendo assim, os objetivos da PNPIC no SUS atendem a essas

recomendações da OMS, como se pode verificar no Quadro 2 a seguir, que

relaciona as orientações da OMS com os objetivos da PNPIC no SUS.

Quadro 2 – Recomendações da OMS e objetivos da PNPIC no SUS

Recomendações da OMS Objetivos da PNPIC no SUS

Política: bases de ação

sólida em MT/MCA

Incorporar e implementar as PICS no SUS (...); (...)

“promovendo o envolvimento responsável e

continuado dos usuários, gestores e trabalhadores,

nas diferentes instâncias de efetivação das políticas e

saúde.”

Segurança, eficácia e

qualidade: crucial para a

divulgação da MT/MC

“Contribuir para o aumento da resolubilidade do

Sistema e (...) garantindo qualidade, eficácia e

segurança no uso.”

Uso racional: assegurar a

conveniência o custo-

efetividade

“Promover a racionalização das ações de saúde,

estimulando alternativas inovadoras e socialmente

contributivas ao desenvolvimento sustentável de

comunidades”; “Estimular as ações referentes ao

controle/participação social,” (...).

Acesso: fazer com que a

MT/MCA esteja disponível e

acessível

(...) “com ênfase na atenção básica, voltada para o

cuidado continuado, humanizado e integral em

saúde”; (...)”ampliação do acesso às Práticas

Integrativas e Complementares,”(...);

O anexo em questão continua com a enumeração de onze diretrizes, a saber:

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1. Estruturação e fortalecimento da atenção em PICS no SUS;

2. Desenvolvimento de estratégias de qualificação em PICS para profissionais no

SUS, em conformidade com os princípios e diretrizes estabelecidos para Educação

Permanente;

3. Divulgação e informação dos conhecimentos básicos da PICS para profissionais

de saúde, gestores e usuários do SUS, considerando as metodologias participativas

e o saber popular e tradicional;

4. Estímulo às ações intersetoriais, buscando parcerias que propiciem o

desenvolvimento integral das ações;

5. Fortalecimento da participação social;

6. Provimento do acesso a medicamentos homeopáticos e fitoterápicos na

perspectiva da ampliação da produção pública, assegurando as especificidades da

assistência farmacêutica nestes âmbitos na regulamentação sanitária;

7. Garantia do acesso aos demais insumos estratégicos da PNPIC, com qualidade e

segurança das ações;

8. Incentivo à pesquisa em PICS com vistas ao aprimoramento da atenção à saúde,

avaliando eficiência, eficácia, efetividade e segurança dos cuidados prestados;

9. Desenvolvimento de ações de acompanhamento e avaliação da PICS, para

instrumentalização de processos de gestão;

10. Promoção de cooperação nacional e internacional das experiências da PICS nos

campos da atenção, da educação permanente e da pesquisa em saúde;

11. Garantia do monitoramento da qualidade dos fitoterápicos pelo Sistema Nacional

de Vigilância Sanitária.

O texto do anexo segue com o tópico de Implementação das Diretrizes, esta

delimitada a partir de cada modalidade terapêutica identificada e amparada pela

política em questão. Na sequência, são apontadas as Responsabilidades

Institucionais, enumeradas de forma específica para cada um dos três níveis de

gestão: federal, estadual e municipal.

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3. O APORTE FILOSÓFICO E O TRIPÉ EPISTEMOLÓGICO-CRÍTICO

Neste trabalho, consideramos a inspiração hermenêutica como um

instrumento teórico importante para embasar as análises acerca da Política Nacional

de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde, buscando identificar a

organização das práticas e os objetivos que a referida política de saúde pretende

alcançar, principalmente, a partir da Hermenêutica Filosófica, designada

genericamente como “a arte e a ciência da interpretação” e da

compreensão/significado. Esse texto pretende, assim, superar o horizonte

estritamente formal da reflexão epistemológica da Saúde e de suas políticas.

A Hermenêutica Filosófica se apresenta como uma possibilidade

compreensiva ao mesmo tempo que metodológica potencializadora da mobilidade

crítica e da atitude epistemológica lúcida na pesquisa em saúde. E para essa

dissertação, é compreendida como um campo de hipóteses de diálogo, como um

modo de pensar que pode representar aberturas de significações para os estudos da

Saúde e, mais especificamente, para os estudos em políticas de saúde. Tais

políticas podem pretender ser a institucionalização dos direitos em saúde dos

indivíduos e coletivos, e podem pretender ser a tradução do que as pessoas e seus

líderes entendem por saúde.

Hermenêutica, inicialmente entendida como arte da interpretação, tem para a

palavra que lhe denomina duas origens. Segundo Lawn (2007): uma origem que se

refere ao conhecimento oculto e secreto digno de interpretação, e outra que remete

à mitologia grega, com o deus grego Hermes, o deus mensageiro, aquele que traduz

para os homens as mensagens que não estão ao alcance da compreensão humana,

que aproxima do homem o que era distante e obscuro. Tal origem, para Palmer

(2006), faz o processo hermenêutico ser entendido enquanto possibilidade de

transformar aquilo que não está ao alcance da compreensão humana em algo que a

inteligência humana possa compreender.

Os aportes éticos-filosóficos fundados na Hermenêutica Filosófica têm como

ponto de partida crítico a investigação dos limites do saber Moderno, marcado pela

dimensão epistemológica cartesiana. Assim, iniciou-se, nesse trabalho, uma crítica

ao paradigma cartesiano, admitindo seus problemas e limites e, diante de uma crise

na saúde já bastante estudada, convida-se para olhar para outros paradigmas que

apontem na direção do cuidado integrativo em saúde. Tal é a sugestão de

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superação dos limites impostos a todas as ciências estruturadas a partir do

reducionismo do racionalismo cartesiano moderno.

3.1 Sobre Hermenêutica Filosófica

A Hermenêutica Filosófica traz um olhar profundo e interpretativo que serve à

crítica ao modelo de validação científica moderno, contabilizando aí as relações

institucionais, os poderes instituídos e a ética como configuradora das relações e

valores estabelecidos em torno do procedimento científico e, posteriormente,

industrial.

Os conceitos-chave para a compreensão hermenêutica da realidade instituída

são: compreensão e entendimento; lógica da pergunta e da resposta (diálogo);

consideração da tradição, da autoridade e do preconceito; consciência histórica

efetiva (ou histórica continuamente influente); temporalidade e fusão de horizontes.

Gadamer, filósofo principal depois de Heidegger que veio a desenvolver a

Hermenêutica Filosófica, encorajou-se a partir da necessidade de desenvolver uma

espécie de “analítica” do sentido, de desenvolver uma discussão que se

aprofundasse nas relações intrínsecas entre ethos e linguagem (AYRES, 2005;

2007a). De algum modo, é preciso compreender as dominantes culturais por trás de

todo modelo científico.

Tal filosofia busca desenvolver uma reflexão para além do discurso evidente e

toma como base a discursividade na compreensão do que se chama de realidades e

obras humanas, lançando mão de uma série de procedimentos analíticos e

rompendo radicalmente com uma aspiração objetivista (AYRES, 2005; 2007a).

Expande-se aqui a noção de verdade, avançando para além da perspectiva

racionalista cartesiana, acompanhada de crítica ao reducionismo do modelo de

ciência dominante e sua prepotência que reside na crença de que se exerce controle

sobre o objeto investigado e, pressupostamente, sobre o mundo. Tece crítica não ao

fato da técnica em si como parte do homo sapiens, mas à tentação objetificadora e

determinista que a tecnociência moderna exerce e constrói sobre a vida social.

A hermenêutica gadameriana não é contra a ciência como tal, pois a defende

como necessária, mas se contrapõe tanto ao seu desvio de intenções quanto à sua

divinização cujos efeitos são a fascinação, o deslumbramento e aturdimento. E se a

ciência se delineia na crença do metodicamente controlável, ela se delimita pois a

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alcançar somente uma mínima parte da experiência da vida. O método –

fundamental em ciência ainda hoje – não define a verdade, nem a esgota. A relação

entre verdade e método é de tensão complementar e o esforço está em desvencilhar

o conceito de verdade de uma visão e entendimento científicos stricto sensu,

reducionista (ROHDEN, 2011).

Compete à hermenêutica a missão fundamental de uma epistemologia que

não esteja restrita à dimensão formal e fragmentária da construção do

conhecimento, dimensão essa tão valorizada no Positivismo. Tal desafio se impõe à

medida que as ciências, quando questionadas quanto à sua consistência teórica e

são expostas suas dificuldades empíricas e/ou conceituais, em geral, seguem uma

tendência de submissão aos pressupostos e axiomas positivistas, apreendendo e

solucionando seus impasses epistemológicos em um plano eminentemente formal,

matemático (AYRES, 2005; 2007a).

Romper com uma aspiração objetivista e com uma epistemologia que não

esteja restrita à dimensão formal deste tipo significa contradizer o olhar

epistemológico do Cartesianismo, para o qual o mundo, o corpo, a vida, são

objetificados, reduzidos a objetos que se relacionam e definem físico-químico-

mecanicamente mensuráveis. Esse paradigma tendeu a colocar-se como Razão

única e oniabrangente. O progresso e o desenvolvimento, bem como a razão e a

ordem são metas de uma sociedade incluída que acredita estar diante da verdade

científica que desemboca surpreendentemente numa racionalidade instrumental, ou

a razão controladora. Dessa forma, articulam-se modos sutis de universalização de

discursos, legitimação de intencionalidades, manutenção de poderes, engessamento

e automatização das instituições (NUNES; PELIZZOLI, 2011). É preciso superar

essa alienação tanto epistemológica quanto estética vigente ainda hoje, a do

Cartesianismo, indo em direção a uma ciência complexa, interpretativa, aberta,

“com consciência”. E assim, Gadamer vem contradizer essa razão única e

oniabrangente afirmando que a verdade existe em outras experiências fora dos

escaninhos das ciências pautadas no cartesianismo epistemológico. A experiência

da arte, como exemplo fundamental citado no primeiro capítulo de Verdade e

Método, configura um encontro especial com o mundo, oferece uma compreensão,

uma verdade.

O aspecto dominante do cartesianismo tornou-se tão intenso que inclusive

nas questões éticas, o outro é transformado em espaço de intervenção

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química/física/mecânica (NUNES; PELIZZOLI, 2011). Na visão hermenêutica da

alteridade, o outro não deve ser considerado um espaço de intervenção

objetificadora, sem que nos consideremos nós mesmos como esse espaço já que,

como fruto da natureza dialógica da existência humana, aquilo ou aquele que somos

possui dependência significativa dos que estão a nossa volta, do(s) outro(s)

(CARVALHO; GRÜN; AVANZI, 2009). O respeito ao outro se faz quando se

considera que o outro pode ter razão, tanto quanto estranheza, e que posso e devo

aprender a partir disso. Eis um dos núcleos da hermenêutica. E isso, de forma

alguma, anula a existência e a experiência daquele que está

questionando/investigando, pois considera-se que esse é afetado e pode ser

transtornado pelo processo compreensivo (ROHDEN, 2011).

A hermenêutica aposta no desafio da alteridade e segue contra o fluxo de

pensar o outro – inclusive a Natureza - como objeto dado. Se não se concebe o

outro com alteridade, anula-se a possibilidade de diálogos. Tal desafio se impõe à

civilização tecnológica, cujo cerco ao humano se faz com lógicas estratégicas e

utilitaristas (NUNES; PELIZZOLI, 2011), onde o outro está distanciado de quem

interpreta e cuja ilusão reside no entendimento de que o outro não interfere na

subjetividade de quem observa.

A Hermenêutica Filosófica tem como máxima a rejeição da redução

instrumental da racionalidade moderna e contemporânea, assinalando que no

conhecimento, junto ao caráter fragmentário e autorregulado que o tecnicismo

imprime, há a natureza integradora do sentido ético e político; e está comprometida

com o resgate crítico da historicidade do conhecimento. (AYRES, 2005; 2007a). O

tema do tempo, da historicidade, está explicitado no bojo da noção de facticidade,

desenvolvido por Heidegger em sua obra Ser e Tempo e que trata da hermenêutica

da facticidade, “da existência humana fáctica, constatável” (HEIDEGGER apud

ROHDEN, 2011). Tal noção foi apropriada por Gadamer que lhe conferiu concepção

dialógica e ética.

A separação entre o sujeito e o objeto acompanha a restrição da verdade ao

domínio exclusivamente científico. A hermenêutica gadameriana se desfaz da

absolutização outorgada ao sujeito (tomado com consciência racional, ego cogito)

pela metafísica ou filosofia moderna; os modelos estruturais do diálogo e do jogo

propostos destronam a absolutização tanto do sujeito quanto do objeto, mas os

mantêm num local de relação tensional incessante, em certo sentido retomando a

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dicotomia sujeito-objeto, sem no entanto manter a ênfase tradicional dada a um dos

pólos, deslocando essa ênfase para a relação contextual e histórica entre o sujeito e

o objeto. Estaria, desse modo, conferida à relação sujeito-objeto maior importância

do que aos pólos que estão contidos nessa relação (ROHDEN, 2011).

Gadamer, em sua obra, deixa evidenciado que pretende superar a dicotomia

sujeito-objeto na compreensão dos fatos e das obras humanos. Essa superação

envolve apontar que a dicotomia sujeito-objeto não é a única nem a maneira mais

fundamental de compreender a existência humana. No seu entendimento, estaria

comprometida a historicidade da compreensão quando adotado um distanciamento

metodológico que opta por considerar aspectos extralinguísticos de sua

determinação, olhando a linguagem como quem vê de fora. Para ele, discordando

de concepções positivistas, constitui a essência mesma do compreender o fato de

que quem compreende está incluído no que almeja compreender.

Esse comprometimento da historicidade parece ser mesmo uma

consequência encarada naturalmente pelos cientistas aos moldes cartesianos. “O

escopo desta ciência é objetivar a experiência até que fique livre de qualquer

momento histórico” (GADAMER, 1997, p.513). É pois o aparato metodológico que

garante a objetividade, por ser esse aparato também que garante que as

experiências que se situam em determinado tempo e contexto sejam repetidas por

qualquer pessoa, ou seja, os experimentos têm de ser reprodutíveis, ser passíveis a

comprovação posterior e controle; sendo assim, na ciência não há espaço para a

historicidade da experiência. E a ciência nada mais faz do que continuar com o

domínio de seus próprios métodos (GADAMER, 1997).

Somos também alienados do que é ser humano quando o nosso conceito

sobre isso não contempla nossa própria experiência como humanos (CARVALHO;

GRÜN; AVANZI, 2009). Quando Gadamer tece crítica ao Iluminismo, o faz pela

defesa traçada pelo Iluminismo quanto à “absolutização do poder da razão clara e

objetiva”, porém reconhece positivamente que ao Iluminismo está relacionado o

destaque dado ao “papel do sujeito-agente e sua tarefa de libertar-se da tradição e

do preconceito” e dessa forma assume a tarefa de determinar sua própria história

(ROHDEN, 2011). Nós pertencemos ao mundo de um modo integral, mesmo se nos

colocamos como espectadores, nós somos parte do mundo de nossa experiência e

não estamos no controle do mundo.

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O conceito de jogo – para além da ideia de controle - elimina as rígidas

fronteiras entre sujeito e objeto; jogo é o modo fundante de compreensão

(CARVALHO; GRÜN; AVANZI, 2009). O jogo entre aquele que interpreta e o que é

interpretado não está limitado à subjetividade daquele que olha, mas ao caráter de

alteridade em jogo. O jogo se inicia quando inicia-se a interação já com fins pré-

estabelecidos para essa interação, e mesmo em meio a regras, mesmo quando se

tem esse planejamento e pensa-se conhecer o interpretado e o contexto em que ele

está inserido, ainda assim o resultado do jogo está inevitavelmente fora de controle.

Por isso, no jogo, é preciso manter uma postura de abertura e flexibilidade, para que

assim seja garantido um diálogo verdadeiro (NUNES; PELIZZOLI, 2011). O diálogo,

tanto quanto o conhecimento do mundo, é um tipo de jogo. “É preciso saber viver”,

ou, de outro modo, é preciso saber jogar.

Assim, outra crítica é lançada à dicotomização da teoria e da experiência, a

partir da qual, segundo observação de Gadamer (2006), os achados científicos e o

saber pautado na experiência estão muitas vezes em lados opostos, ficando para o

método científico a atribuição de tornar a experiência segura. Nessa configuração, o

papel da ciência seria o de aliar a experiência a um método, possibilitando um saber

direcionado e o domínio do cientista sobre a técnica. Isso vai de encontro ao que a

Hermenêutica Filosófica defende, pois que a ciência necessita de aplicação prática,

de que o saber prático do ser humano deveria ser objeto da ciência, onde o ser é

capaz de fazer a partir também de sua experiência e não somente a partir do mero

domínio de uma técnica. Gadamer reforça essa argumentação citando Kant, do qual

parte a afirmativa de que o início do conhecimento se dá através da prática, e assim,

parte da ideia de que o entendimento é uma experiência hermenêutica, cujo desafio

reside na busca pela produção de sentido para as vivências humanas.

Na construção de novos sentidos há que se considerar todo um conjunto de

sentidos no que se quer expressar, pois mesmo a linguagem humana quase sempre

se apresenta com limitações, talvez por uma extensa defasagem no auto-

conhecimento a que as pessoas não se atentam, e/ou pelos sentidos tão

consolidados pela objetificação, vinda do cartesianismo. Desse modo, a perspectiva

Hermenêutica Filosófica vem apresentar um interminável círculo dialético da

pergunta e da resposta, que se inicia quando se encaram as perguntas enquanto

ferramenta para romper com o pensamento e conhecimentos dominantes e,

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consequentemente, fazer surgir mais perguntas e novas respostas (GADAMER,

2006).

Somos receptores e não controladores da verdade que a linguagem revela,

porque a linguagem não é idêntica ao mundo, tendo em vista que uma infinidade de

relações de sentidos está posta em uma estrutura finita que é uma sentença ou uma

palavra, no entanto o mundo e a linguagem não podem estar desvinculados. Assim,

estariam para Gadamer colocados aos modelos estruturais de diálogo e jogo, entre

outros, o papel de contribuir para a compreensão da verdade sem esgotá-la e

reconhecendo-a como histórica (ROHDEN, 2011).

É através da complexa “dialética de pergunta e resposta”, no reino

intersubjetivo da linguagem, que se dá o compreender incessante que permite à

humanidade estabelecer e instituir historicamente o seu mundo, sempre em

processo de fazer-se. Essa compreensão leva o diálogo a ser defendido enquanto

modelo estrutural para compreender e explicitar a verdade, diferente do que defende

o método científico dominante (ROHDEN, 2011). Gadamer encara o acesso ao outro

como uma “fusão de horizontes” e, como já dito, recusa o distanciamento da

linguagem. Não que a “fusão de horizontes” seja um evento controlado pela

linguagem ou mesmo pela tradição, mas está sim sujeita à tradição, quando da

distinção entre o horizonte da tradição do horizonte histórico que se faz no presente

(ROHDEN, 2011). Para Gadamer, aquele que interpreta decodifica a sua própria

experiência a partir das necessidades e possibilidades que o outro traz em seu

horizonte linguístico, ou seja, aquele que interpreta não está decodificando uma

experiência externa a si, ao seu mundo. O que aquele que interpreta possibilita ao

outro, interpretado, é a proposição de questões que, na verdade, suscitarão

ineditismo para esse interpretador (GADAMER, 2008).

A atitude hermenêutica está comprometida com a repercussão do próprio ato

de interpretar, permitindo uma aproximação com a totalidade do horizonte

historicamente constituído pela ciência. Os seus constructos exercem o resgate da

historicidade e intersubjetividade das ciências, bem como o faz com a própria

reflexão epistemológica (AYRES, 2005; 2007a).

A Hermenêutica Filosófica se constitui enquanto conjunto compreensivo-

interpretativo aberto ao diálogo e dinâmico que serve a numerosas interpretações

nos campos científico, ético, político, teológico e jurídico (ROHDEN, 2002 apud

NUNES; PELIZZOLI, 2011). Sob tal perspectiva não é possível a apreensão total da

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verdade; não é possível o sujeito ser mero espectador da realidade já que ele

integra essa realidade; dependemos da atitude compreensiva do mundo e do estar

no mundo que constitui nossa subjetividade (NUNES; PELIZZOLI, 2011). A verdade

é aquilo que aparece no diálogo, esse é o meio para que se dê a interlocução entre

diferentes filosofias, diferentes experiências, a fim de se constituir um solo comum

de encontro de diversos interlocutores, pelos quais possa haver a construção de

relações cujo objetivo seja validar argumentos oriundos de diferentes prismas

interpretativos sobre um mesmo tema (GADAMER, 1997).

Toma-se nesse texto, a noção de compreensão como lugar constitutivo da

experiência, o modo fundamental de estar no mundo; não em seu sentido cognitivo

como habilidade linguística de entender, explicar ou ainda expressar certa

experiência humana do mundo (CARVALHO; GRÜN, AVANZI, 2009), mas como

atividade que constitui o humano enquanto cultura, construtor de mundos.

A compreensão é um campo de encontro, não é um saber pronto, vai-se

aprendendo à medida que se vai vivendo. A marca do encontro compreensivo é a

conversação ou o diálogo em que se é interpelado pelo outro, desenhando-se o

exercício de alteridade, o compreender-se e compreender o outro (CARVALHO;

GRÜN, AVANZI, 2009). Na compreensão do mundo, a Hermenêutica Filosófica tem

como um dos fundamentos a experiência, unidade que sintetiza a relação entre o

sujeito e o mundo, a partir da qual a essência e o sentido das coisas vão se

desenvolver e assim ampliam-se os horizontes (NUNES, PELIZZOLI, 2011).

O termo “horizonte”, conforme Lawn (2007), foi usado inicialmente por

Nietzsche e Husserl, para se referir a determinado ponto de vista ou perspectiva de

mundo. Gadamer (1997) entende o horizonte como o alcance da visão que inclui

tudo que pode ser visto, cada perspectiva de mundo, mas que não se trata de uma

fronteira rígida, pois se desloca conosco em consonância com nosso avanço, e cada

vez mais convida a avançar. Cada sujeito, então, cria seu ponto de vista acerca do

mundo por intermédio de um horizonte.

O horizonte é o que te permite ver e a abertura contínua de horizonte é a

grande experiência que propõe a hermenêutica. Daí uma expressão importante é a

“fusão de horizontes”, que surge da tentativa de estabelecer entendimento com

outros e, dessa forma, configura-se o movimento de horizontes, que avançam ou

recuam conforme se estabelece o diálogo, o encontro de perspectivas, modificando

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a forma como o sujeito se relaciona com o mundo e consigo mesmo (AYRES, 2005;

2007a).

Gadamer (1997) desenvolveu a noção de fusão de horizontes vinculado ao

tema da facticidade; assim, a noção de fusão de horizontes aponta para o intérprete

marcado pela historicidade e aberto a um horizonte mais amplo quando de seu

encontro com a tradição. Mas o filósofo afirma ser obra da tradição ou, mais

especificamente, da linguagem, a autoria da fusão de horizontes. Ou seja, os

intérpretes não estabelecem o horizonte, pois dependem da tradição a qual estariam

atrelados alguns de seus interesses, no entanto, os intérpretes não são por isso

passivos, pois ao se permitirem acessar outro(s) horizonte(s) criam algo novo. Esse

argumento estaria vinculado à defesa de Gadamer de que o ser humano está sob a

tutela da história (KUSCH apud ROHDEN, 2011), e nessa direção o ser humano é,

em grande parte, determinado pela tradição, já que não possui controle total sobre

ela (ROHDEN, 2011).

Assim, esses apontamentos levam à consideração de que a fusão de

horizontes produz, de qualquer modo, algo novo, mesmo que a interpretação se dê

de uma prisma pré-delineado pela tradição, que faz parte de quem interpreta, mas

que também faz parte de quem é interpretado.

Segundo Palmer (2006), a fusão de horizontes é ponto essencial da

experiência hermenêutica. Somente quando se tem algo estranho, é que se tem algo

novo, é que se tem a experiência como tal. Assim, olha-se o mundo acontecendo,

fica-se atento a todos os saberes que se mostram e reconhece-se que todos se

relacionam com esses saberes, com esses sentidos de mundo. Há elementos de

cada horizonte que recuam e outros que avançam. Nessa direção, será uma criação

nova toda experiência hermenêutica verdadeira, assim como será mais uma

revelação do ser, que acontece a seu tempo e historicamente, que não poderia ter

ocorrido antes. O hermeneuta não determina o sentido de algo, ele olha, dialoga

com o que se mostra, com os sentidos que se mostram, considerando que a

realidade é uma construção cultural e também biológica de sentido, onde a verdade

é mutável, aparece e se esconde o tempo todo.

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3.2 Tripé epistemológico-crítico

Quando se conduz uma discussão de paradigmas epistemológicos, se chega

naturalmente às dimensões políticas/sociais e éticas envolvidas. Neste sentido,

Pelizzoli (2011, 2013) propõe um Tripé epistemológico-crítico de análise do saber,

envolvido em determinadas práticas, em especial, no caso da saúde.

O Tripé epistemológico-crítico foi concebido a partir da percepção de que a

“ciência” vem se presentificando e se consolidando na função da “tecnociência em

conjunção com o mercado”, cooptando as concepções cartesianas, dentro das quais

não cabem a complexidade e o diálogo de saberes, nem mesmo cabe a

epistemologia devido ao seu potencial crítico. As tecnologias têm sido eleitas

partindo-se de uma lógica das corporações, por seus potenciais de gerarem lucros,

em detrimento de tecnologias brandas, sustentáveis, antigas (tradição) que podem

significar soluções simples e de base (estruturais) para a população. Tal Tripé se

propõe a ser analítico quanto às visões de ciência e do papel dos campos do

conhecimento e torna-se extremamente útil para a análise dos discursos e práticas

no modelo biomédico (PELIZZOLI, 2011).

Em qualquer perspectiva científica/epistemológica, adotada como norteadora

da produção de conhecimento válido, é possível identificar limitações, e admiti-las

significa um avanço a partir de um esforço de abertura a outros paradigmas, que

pode chegar a um diálogo com outra perspectiva.

Faz-se necessária uma reflexão epistemológica profunda a fim de analisar as

conquistas e os obstáculos dos modelos epistêmicos adotados nas Ciências da

Saúde e, apesar de apostar na episteme enquanto raiz do conhecimento e da

verdade como prática social (FOUCAULT, 2004), defende-se que essa análise deva

adotar uma perspectiva ampla que aborde os problemas e as soluções do campo da

saúde, multidimensionalmente e de forma conjugada. De tal modo, reitera-se o uso

do Tripé epistemológico-crítico, o qual permite uma análise mais ampliada no que se

refere aos paradigmas e às práticas sociais e que se constitui como instrumento

investigativo capaz de direcionar o olhar para os princípios da saúde integrativa,

para a qual o bom profissional de saúde enfatiza e promove a saúde e deve

posicionar-se contra o mercado da doença (PELIZZOLI, 2011).

A escolha do Tripé epistemológico-crítico é movida pelo intento de não

abordar os problemas e soluções em saúde unilateralmente, contribuindo para que a

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análise da PNPIC no SUS não caia no reducionismo. Na crítica ao paradigma

cartesiano, a partir da perspectiva Hermenêutica Filosófica, o Tripé epistemológico-

crítico de análise constitui-se de três dimensões, apresentados no Esquema 1, a

saber: a dimensão epistemológica, a dimensão político-econômica e institucional e a

dimensão ética, que conduzem a uma discussão nesses três níveis de entendimento

conjugados (PELIZZOLI, 2011).

Esquema 1 – Tripé Epistemológico-crítico

Não se tratam de níveis hierarquizados por relevância, mas níveis que devem

ser conjugados a fim de que se estabeleça uma análise crítica, uma discussão

ampliada do saber em jogo. No entanto, é conferido ao nível ético a relevância de

que se faça presente nas análises, pois não sendo dessa maneira, não faz sentido

discutir mudanças e correções nos níveis epistemológico e político, que ficam

extremamente vulneráveis (PELIZZOLI, 2011). O coração da defesa da verdade em

ciência, política e relações sociais tem a ver com o coração humano (valores, ética).

3.2.1 Dimensão Epistemológica

Fazem parte dessa dimensão de análise, os alicerces de fundamentação da

ciência, as lentes através das quais se olha o objeto a ser estudado. A dimensão

epistemológica envolve o modelo de conhecimento de estudo, a posição do

Nível Ético

Nível Político Nível

Epistemológico Stricto

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investigador, os contextos de pesquisa, os paradigmas vigentes, a historicidade e a

episteme dominante (PELIZZOLI, 2011), como temos demonstrado até o momento

com a crítica ao cartesianismo e a dimensão hermenêutica.

No campo da saúde, reflete-se na escolha de um modelo de procedimento e

validação científica. No caso do modelo biomédico, está na dimensão

epistemológica a fundamentação que considera o corpo humano ou suas partes

como objeto fragmentário, o próprio olhar/paradigma cartesiano que gera a

abordagem reducionista.

A valorização do saber especializado do modelo biomédico de saúde é reflexo

da episteme da modernidade, que no decorrer do século XX fez surgir novas

especialidades originadas de "disciplinas mães", configurando-se em um conjunto de

subdisciplinas especializadas emergentes no campo científico (LUZ, 2009).

O importante estudo da categoria das Racionalidades Médicas emergiu no

início da década de 1990 com o objetivo de estudar “sistemas médicos complexos” e

terapêuticas tradicionais, complementares e alternativos. Foi formulada em um

contexto de fortalecimento do discurso em favor da preservação e valorização da

natureza e de tendência antitecnológica, tendência essa que simboliza uma rejeição

do modus operandi da medicina especializada e tecnificada e, dessa forma,

antinatural. Também em um contexto que questiona o pensamento fundante do

modelo de saúde dominante, abrindo espaço para uma proposta de promoção da

saúde que tira o foco de combate às doenças e, por consequência, abre espaço

para um conjunto de sistemas terapêuticos e práticas de medicação e cuidados, com

tendências aos processos naturais de cura.

Nessa ampliação de olhares e até proposição de novos olhares sobre o que

funda o campo da saúde, o estudo das racionalidades médicas marca território,

propondo a comparação das medicinas homeopática, tradicional chinesa e ocidental

contemporânea, partindo de uma hipótese central contrária ao senso comum de

defesa do saber biomédico como único aceito, defendendo a coexistência de

racionalidades médicas distintas na cultura atual. Nessa direção, esse estudo serviu

de aporte teórico ao texto da PNPIC.

Denomina-se Racionalidades Médicas aqueles sistemas médicos complexos

estruturados segundo seis dimensões, todas estruturadas em termos teóricos,

práticos e simbólicos: Morfologia Humana, Dinâmica Vital Humana, Doutrina Médica,

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Sistema de Diagnose, Sistema Terapêutico e Cosmologia (NASCIMENTO et al,

2013).

A dimensão apontada pelas Racionalidades Médicas como Cosmologia pode

ser marcada como uma dimensão epistemológica, pois tem caráter elaborado e

sistemático que qualifica as raízes filosóficas dessas racionalidades. A Cosmologia

está inserida em sua própria cultura e possui raízes em um universo simbólico. As

imagens, as metáforas, as representações e as concepções fazem parte desse

universo simbólico que por sua vez fazem parte de um imaginário social que não se

rende ao plano de proposições teóricas e empíricas que o método científico

demonstra (NASCIMENTO et al, 2013).

A visão cosmológica ou dimensão epistemológica da biomedicina difere da

visão cosmológica das medicinas ayurvédica e tradicional chinesa. A dimensão

epistemológica da biomedicina está sustentada na Física Clássica Newtoniana e na

metáfora cartesiana do corpo como máquina direcionada pela mente racional. Já a

dimensão epistemológica das medicinas ayurvédicas e tradicional chinesa tem seus

fundamentos em filosofias religiosas, o conhecimento védico na Índia e o

conhecimento do taoísmo chinês, respectivamente (NASCIMENTO et al, 2013).

Pode-se apontar para dois paradigmas importantes em saúde, o paradigma

biomédico, dominante, e o paradigma vitalista que orienta os sistemas médicos

complexos e recursos terapêuticos que serão resgatados nas PNPIC.

O paradigma biomédico ou da normalidade-patologia tem raízes no período

Renascentista, quando se dá a ascensão do discurso da ciência e o homem se

distancia da natureza crendo-se senhor dela e não parte da mesma; discurso que

separou a natureza do humano e também do sagrado, colocando-a como objeto de

conhecimento passível de ser controlada com fins utilitários. Em consonância com

essa visão de dominação sobre a natureza, enfatiza concepções materialistas,

mecanicistas, centradas no combate às doenças e no controle do corpo biológico e

social. É fundada na concepção de cura enquanto controle de doenças e toma como

ferramenta de execução a tecnologia (LUZ, 2009; NASCIMENTO et al, 2013).

As práticas em saúde e as representações simbólicas sobre corpo, saúde,

doença, tratamento e cura retratam os conhecimentos adquiridos em estudo. Da

mesma forma a experiência deveria influenciar na produção de conhecimentos.

Portanto, a prática está relacionada ao conhecimento e, nessa direção, a dimensão

epistemológica deve estar retratada por meio das práticas. Contudo, a Episteme

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vigente reduz essa relação à dimensão tecnológica. Episteme, segundo Foucault

(2004) são as condições discursivas que constituem uma epistemologia, o conjunto

das relações epistemológicas entre as ciências humanas.

Sistemas médicos distintos estão implicados na cultura pós-moderna –

unificada, fragmentária e sincrética – e, dessa forma, suas representações e

paradigmas, muitas vezes, se fundem e/ou se confundem nas concepções que as

pessoas e grupos têm acerca de saúde.

3.2.2 Dimensão Política

Essa dimensão refere-se fundamentalmente à relação de forças/influências

institucionais (PELIZZOLI, 2011). O modelo cartesiano conduz para que a

abordagem no campo da saúde seja elaborada com fins econômicos privados,

visando ao lucro. Para que seja resultado de um jogo de forças entre as instituições

que detêm mais poder, cujo enfoque seja dado ao combate à doença. O respaldo

desse argumento está na própria compreensão da realidade social contemporânea,

cujos pontos de partida são, por um lado, uma perspectiva macroeconômica, pela

qual estamos submetidos às leis de uma economia capitalista globalizada e, por

outro, uma perspectiva socioantropológica, em que a sociedade vive um processo

de transformação cultural com uma valorização crescente do individualismo,

consumismo, da busca do poder sobre o outro e do prazer imediato a qualquer custo

(CARVALHO; LUZ, 2009).

O Estado (ou os governos) – altamente comprometidos com o capital privado

– é quem decide e implementa políticas públicas ou outras instituições que

participam do processo decisório. A visão pluralista aponta que o Estado reflete tão-

somente as pressões dos grupos de interesse. Já a visão simplificada do elitismo

defende que o Estado opta sempre por políticas definidas exclusivamente por

aqueles que estão no poder. Enquanto que as concepções estruturalistas e

funcionalistas afirmam que o Estado elege políticas que servem apenas aos

interesses de determinadas classes sociais.

Todavia, sociedades e Estados complexos como os constituídos no mundo

moderno estão mais próximos da perspectiva teórica daqueles que defendem que o

Estado tenha um espaço próprio de atuação e, ao mesmo tempo, permeável a

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influências externas e internas, ou seja, o Estado teria uma autonomia relativa.

Nesse sentido, defende-se que, além dos governos, outros segmentos como os

grupos de interesse e os movimentos sociais, cada qual com influências variáveis

que dependem do tipo de política formulada e das coalizões que integram o

governo, se envolvem na formulação de políticas públicas (SOUZA, 2006).

Há relevância crucial das instituições/regras para a decisão, formulação e

implementação de políticas públicas (SOUZA, 2006). Mas há relevância também na

participação da sociedade civil, na elaboração e na gestão destas políticas,

principalmente por meio dos Conselhos municipais, estaduais e nacionais. Portanto,

estes espaços e os documentos por eles produzidos configuram-se como

instrumentos importantes dessa dimensão política.

Nessa cenário, dimensão política se constitui também do Controle Social, que

deve ser uma prática relevante à construção, implantação e implementação de

políticas de saúde e que pressupõe o emponderamento dos usuários do Sistema

Único de Saúde, como cidadãos ativos, mas aos quais não se apresenta, de forma

contundente, as PIC como alternativas a serem adotadas nas práticas de saúde.

Essa parece ser uma tentativa do Brasil de implementar políticas públicas de

caráter participativo, impulsionadas tanto pelas propostas dos organismos

multilaterais, quanto pelos mandamentos constitucionais e pelos compromissos

assumidos por alguns partidos políticos visando à inserção de grupos sociais e/ou

de interesses na formulação e acompanhamento de políticas públicas,

principalmente nas políticas sociais. Souza (2006) afirma que os governos

continuam tomando decisões sobre situações-problema e desenhando políticas para

enfrentá-las, mesmo que delegando parte de sua responsabilidade, sobretudo a de

implementação, para outras instâncias, inclusive não-governamentais.

Assim, Políticas Públicas podem ser definidas como o campo do

conhecimento que busca analisar a ação do Governo e, ao mesmo tempo, quando

necessário, propor mudanças no rumo ou curso dessas ações. Cabe às políticas

públicas: permitir distinguir entre o que o governo planeja e o que de fato executa;

envolver diferentes atores e níveis de decisão, mesmo que seja materializada

através dos governos; ser abrangente, sem limitar-se a leis e regras; ser uma ação

intencional, com objetivos a serem alcançados; promover impactos no curto prazo.

As políticas públicas acontecem seguindo uma trajetória de decisão, proposição,

seguidas da implementação, execução e avaliação (SOUZA, 2006). Nesse sentido,

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uma política é pública quando as decisões tomadas são públicas e não privadas. Por

meio delas, direitos são efetivados, através da intervenção na realidade social,

devendo ser o principal instrumento utilizado para coordenar programas e ações

públicos (TEIXEIRA; SERAFIM; MORAES, 2006).

Mesmo com esses instrumentos políticos, ainda não se conseguiu formar

coalizões políticas capazes de equacionar minimamente a questão de como

desenhar políticas públicas capazes de impulsionar o desenvolvimento econômico e

de promover a inclusão social de grande parte da população. Os conflitos que fazem

parte das decisões sobre política pública geram resultados que são influenciados

também pelo desenho das próprias políticas e pelas regras que regem suas

decisões, elaboração e implementação. Após desenhadas e formuladas, elas devem

se desdobrar em planos, programas, projetos, bases de dados ou sistema de

informação e pesquisas, até que sejam postas em ação e, consequentemente,

submetidas a sistemas de acompanhamento e avaliação (SOUZA, 2006).

Destacam-se três momentos importantes na consolidação de uma política

nacional: o processo de desenvolvimento da política; a aplicação das estratégias e

atividades orientadas a alcançar os objetivos da política e a avaliação do efeito das

atividades e ajustes do programa. A OMS defende que esse processo pressupõe

planejamento cuidadoso, participação de todos os que estão envolvidos e que seja

considerada, ininterruptamente, a dinâmica política do país (RODRIGUES, et al,

2011)

É certo que para a elaboração das políticas há um encontro de valores,

interesses, opções e modos diversos de enxergar o mundo. Mais uma vez se afirma,

então, que as políticas públicas são resultados das disputas entre atores distintos.

Sendo assim, a fim de que realmente garantam direitos, precisam sempre ser

acompanhadas e debatidas por uma maior diversidade de atores sociais possível,

mesmo que cada ator esteja de posse de suas distintas necessidades e visões de

mundo. Nesse sentido, a dimensão epistemológica, influencia profundamente as

proposições e tomadas de decisões que estão contempladas na dimensão política.

Esse discurso desenha, portanto, a legitimação do uso da Hermenêutica Filosófica

como lente adotada para a análise da dimensão política da PNPIC.

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3.2.3 Dimensão Ética

A principal relevância da dimensão ética se deve à necessidade de que uma

ciência verdadeira – e verdade, desde os gregos, está ligada à justiça – precise

apoiar-se ou recuperar a ética (PELIZZOLI, 2011). Justiça se constitui em uma

espécie de retórica ética máxima e a ansiedade absoluta pela justiça realizada é

fundamento de toda ação humana. Assim, ética é vontade de justiça em realização a

qualquer tempo, em todos os sentidos, para nós e para o outro (SOUZA, 2007).

Uma grande luta que está travada hoje é entre humanização e

desumanização, entre uma cultura da vida e uma cultura da morte. Nesse contexto,

a ética vem a ser uma ponte entre as ciências e as mais diversas tecnologias e

intervenções na vida social (MOSER, 2002). Isso posto, evidenciam-se os desafios

da Ética quanto às suas possibilidades reais frente aos rumos da sociedade de

consumo no capitalismo, cuja racionalidade tecnocientífica encontra consonância

com a desumanização e objetificação das relações pessoais e ecológicas mais

básicas. Crê-se que é a partir desse desafio da ética tradicional diante da

racionalidade tecnocientífica, cujas intervenções são catastróficas e imprevisíveis

que, aos poucos, surge a bioética enquanto novo paradigma, pautado mais na ética,

na postura de defesa socioambiental e em detrimento do lucro (PELLIZOLI, 2007b).

O ocidente tornou a (tecno)ciência a sua verdade racional fundante, onde

tudo mais é sacrificado. No entanto, a racionalidade faz parte de uma dimensão

ética da própria realidade humana. Na modernidade industrial, estabeleceu-se como

algo que acontece segundo a ordem regular das coisas, pensar-se primeiro os

interesses científicos, para só então e, talvez não, pensar e resolver os problemas

éticos decorrentes. A contemporaneidade tem se desenhado em situações

complexas e dolorosas, criadas pelo próprio cientificismo, as quais a ciência não

consegue apresentar soluções. Isso parece impor que essa hierarquia entre ciência

e ética seja invertida, pois a ciência vem se concretizando sem consciência. Ciência

com consciência é aquela que tem a ética como base. A ética é, portanto, a

possibilidade fundante e metacientífica da realidade científica. A consciência da

ciência é a ética, ou seja, “a reflexão sobre seu antes, durante e depois, seu sentido

humano e histórico e, direta ou indiretamente, seu sentido vital” (SOUZA, 2007).

A ética é o fundamento da vida humana, quando refletida e quando levada à

sua concretude, sentido maior de seu conteúdo. O humano é alguém que se

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compreende como ser de relações boas, que tende à felicidade. A ética é o próprio

fundamento da possibilidade de pensar o ser humano, de pensar sobre a condição

filosófica fundamental que é a condição humana, esta que como tal impõe limites

próprios. A ideia de pensar pressupõe a ética. Ética é então “substância humana da

própria humanidade” (SOUZA, 2007).

Souza (2007) afirma que não existe pensamento enquanto tal fora de alguém

que pensa, que por sua vez é fruto humano (histórico-social) das relações. A saber,

não existe o humano sem o tempo e a história, assim como não existe o

pensamento que não seja a expressão humana de linguagem, nas suas mais

diversas formas, expressando racionalidades plurais. Isso corrobora a ideia da

Hermenêutica Filosófica sobre historicidade e linguagem como expressão humana e,

também, com os estudos das Racionalidades Médicas que apontam para a

coexistência possível de mais de uma racionalidade médica na cultura atual.

Ser humano é prover e viver na multiplicidade das significações, uma

multiplicidade qualificada ou, em termos filosóficos, multiplicidade ética, relacionando

o agir de uns para com os outros, e dos sentidos desse agir marcados, a priori, pela

diferença determinada pela questão dos valores éticos e morais. O agir é um

fundamento do ser humano de solidez e complexidade, e não se faz com

neutralidade. A não-neutralidade é essencial ao ser humano e, em termos

filosóficos, a não-neutralidade é tanto resultado da reflexão original sobre a condição

humana quanto a possibilidade de tal reflexão. Assim como o ser humano é por

excelência não-neutro, é mito que a ciência seja neutra. Dessa forma, pode residir

na não-neutralidade a possibilidade de um elo de aproximação entre ciência e ética,

pois ambas são produtos humanos e, como já dito, não há nada humano que seja

neutro (SOUZA, 2007).

Cada ato concretamente realizado do ser humano possui especificidade única

e não-neutralidade e, em todos os momentos, o ser humano define a continuidade

ou não de sua existência enquanto existência humana. Nesse sentido, a ética é

impensável fora de um lugar de sua realização. A estrutura ética de base é o que

permite ao ser humano pensar a partir do seu preciso lugar no mundo, com a

condição que tente compreender e se relacione com este universo que lhe cerca e

de que alguma forma é ele. Assim, a ética é também relação qualificada com o

outro, é alteridade (SOUZA, 2007).

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O nível ético é o locus por onde se revela a (in)capacidade para a

sensibilidade humana, sociabilidade básica e a solidariedade ou para o cuidado

incorporado (PELIZZOLI, 2011). Sendo assim, é necessário adentrar com o sentido

do cuidado nessa discussão, como tratar, respeitar e atender o ser humano em seu

sofrimento, acolhendo e reconhecendo esse sofrimento, em grande medida, como

fruto da própria fragilidade social do ser humano. Isso solicita que a noção de

cuidado seja ampliada enquanto ação integral, cujos significados e signos estejam

voltados para a compreensão de saúde como direito de ser, e não somente um nível

de atenção do sistema de saúde ou mesmo um procedimento técnico simplificado.

Birman (apud PINHEIRO; MACHADO; GUIZARDI, 2011) alerta para o

desamparo difuso na sociedade, que gera uma demanda por cuidado para o que os

cuidados dispensados pelo modelo biomédico de saúde não dão conta por si só.

Isso em decorrência da cisão entre medicina e sujeito humano imposta pela

racionalidade moderna. A crítica das coisas, das instituições, das práticas em saúde

faz surgir a busca de cuidado que tem, portanto, sido apontada como uma das

principais demandas por atenção à saúde pela sociedade civil atual (PINHEIRO;

MACHADO; GUIZARDI, 2011).

Pode-se dizer que é “a dimensão do cuidado como motivação maior da

ciência, que serve à vida e não o inverso”. No campo da saúde, a noção de cuidado

é o centro e está relacionado às noções, tão defendidas na ética biomédica, de

justiça, beneficência, cidadania, autonomia. Considera-se o cuidado como a base

primeira e última da Saúde e da vida (PELIZZOLI, 2011).

Mas diante de uma racionalidade médica, hegemônica, que impõe uma

medicina superespecializada, que foge de uma abordagem holística e cujo foco não

é o ser humano (e dessa forma não pode ser referida como uma prática cuja base é

a ética), deve-se reconhecer outras formas de cuidado como as práticas tradicionais

e complementares, que são entendidas em sua essência como práticas cuidadoras

e que apresentam potencial transformador das relações sociais e potencial

interventor das concepções de mundo das pessoas.

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3.3 Hermenêutica Filosófica para a saúde

Ao se aproximar da discussão da saúde, Gadamer veio ampliar o debate e as

perguntas acerca dos horizontes do que se compreende como saúde e doença. A

proposta dessa dissertação vem, então, de uma motivação a partir da contundência

com que o tema saúde, em Gadamer em especial, instiga a reflexão acerca das

possibilidades para se pensar em novas concepções de cuidado, ressaltando a

grande relevância disso para abranger com integralidade a complexidade do ser

humano. Essa contundência se ratifica quando se traz do pensamento socrático a

ideia e que nada se pode saber sobre o corpo humano sem que se considere seu

contexto, seu ambiente, seu todo.

Isso vai de encontro com o modelo biomédico de saúde que não só domina o

“fazer saúde”, como domina as discussões acerca do tema da saúde, que sofrem

com o predomínio de uma atitude filosófica positivista, o que, por sua própria

característica, estabelece uma abordagem reducionista dos problemas da saúde,

uma abordagem com limites estreitos da racionalidade e das práticas biomédicas. O

foco do modelo biomédico está no combate bioquímico-mecânico à doença. No

entanto, a partir das reflexões fundamentadas na Hermenêutica Filosófica, não se

pode apostar no modelo de cuidado advindo de uma ciência estritamente redutora

das doenças, até porque ao se reconhecer que há a doença, reconhece-se também

que há saúde.

O que compromete a construção de novos sentidos na saúde, para além do

que está impossibilitado de aparecer pelas próprias limitações da linguagem humana

enquanto formas de expressão, é o ser humano estar aprisionado

inconscientemente em uma crença de que é impossível expressar os seus desejos e

necessidades no que se refere à saúde, pois está alheio a si mesmo e, a partir de

uma perspectiva positivista, é levado a buscar se desfazer bioquímico-

mecanicamente da doença, quando deveria primar por uma vida saudável/curativa.

Os seres humanos, sob as “asas” do modelo biomédico, tornam-se paradoxalmente

isentos de uma experiência integrativa e vital em saúde.

Em “O Caráter Oculto da Saúde”, Gadamer não considera que a saúde seja

algo que se possa produzir, pois saúde não se configura como algo novo. O filósofo

defende que o que se pode é restabelecer o equilíbrio natural perturbado, e esse

equilíbrio, que mantém a vida humana, seria o bem-estar (FRAGELLI, 2007). Assim,

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defende-se que o tratamento em saúde seria fortalecer os fatores formadores do

equilíbrio que pode ser ameaçado pela doença (GADAMER, 2006).

Mas dizer o que seja saúde talvez seja a maior dificuldade, já que a saúde

não é algo de que tenhamos sempre consciência, pois ela não nos acompanha de

forma preocupante como a doença. O estado de saúde não se declara por si

mesmo. A saúde se esconde e ao mesmo tempo revela-se por meio do bem-estar,

como se no estado de bem-estar o indivíduo se esquecesse de si mesmo, mas torna

a lembrar de seu estado quando em momentos de cansaço, de esforço e de fadiga.

Então, pode-se associar a saúde com a satisfação do indivíduo de ser no mundo,

pois disso faz parte a sensação de ter uma vida ativa. Ela, a doença, é que pode ser

verificada com um exame e por seu caráter de falta adverte sobre o adoecimento e

dessa forma pode-se “combatê-la”. A doença é quem aparece e, por assim ser, pode

ser medida, pode ser minunciosamente analisada e em uma ciência objetivante é

obviamente estudada e encarada como um objeto (GADAMER, 2006).

A saúde seria, assim, o que não é doença. Outra forma de dizer isso seria

assim: subtraindo-se a doença, tem-se a saúde. Isso remete ao conceito já

ultrapassado da OMS, que afirmava que a saúde é a ausência de sinais e sintomas,

é a ausência de doença. Essa é uma definição reconhecidamente reducionista e

claramente com foco na doença. O conceito de saúde da OMS, atualmente vigente,

tenta ampliar sua definição: situação de perfeito bem-estar físico, mental e social.

Essa última declaração expande o conceito, aparentemente relacionando os

aspectos físicos, mentais e sociais, acrescendo o aspecto coletivo, mas que ainda

assim é passível de críticas relevantes, pois se apresenta de forma que parece visar

à perfeição, tornando-se inatingível, distanciando cada vez mais o indivíduo de seu

auto-conhecimento, do seu reconhecimento próprio e individualizado do que seja

bem-estar, seja esse bem-estar para si e/ou seja para o seu meio social.

Segre e Ferraz (1997) observam que, partindo-se de um referencial

“objetivista”, uma avaliação do grau de perfeição e bem-estar externa ao indivíduo

estaria automaticamente elevando os termos perfeição e bem-estar a categorias que

existem por si mesmas e não estão sujeitas a uma descrição dentro de um contexto

que lhes empreste sentido, a partir da linguagem e da experiência íntima do sujeito.

Estariam aí ignorados conceitos que são contemplados e discutidos pela

Hermenêutica Filosófica, linguagem e experiência. E nessa direção, falar de bem-

estar ou perfeição só será possível para um sujeito que, respeitando e

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reconhecendo suas crenças e valores, conferisse sentido de tal uso semântico e,

portanto, o legitimasse a partir de suas próprias vivências.

Além do mais, na visão de mundo objetificadora, submete-se as coisas, as

pessoas, os objetos, à mensuração e pretenso controle. Com a saúde,

hermeneuticamente falando, isso não é possível como tal, não é da natureza

humana ser mensurável. Trata-se de um modelo de significação, portanto, sempre

em aberto. A saúde não está passível de controle, pois é um estado de

anterioridade, de adequação interna e da conformidade consigo próprio (GADAMER,

2006). Gadamer considera a saúde como ritmo de vida e se refere a fenômenos

rítmicos que provocam vitalidade e revigoramento quando decorrem sem

interferências: respiração, metabolismo e sono. Assim como essas funções vitais de

fato não são controláveis, mesmo que a indústria farmacêutica faça crer que controle

por meio da alopatia, também não é controlada a saúde. O filósofo refere-se aos

seres humanos como seres da natureza e cuja natureza ajuda a conservar o

equilíbrio que é a saúde.

O conceito de Saúde estaria disseminado pela OMS de forma restritiva e

pretensamente pregando um bem-estar completo e perfeito, o que vem a contribuir

para que os sujeitos tenham menos acesso ao reconhecimento do que seja o seu

bem-estar, distanciando-os de seus próprios desejos e necessidades de saúde e

generalizando esse ideal de saúde que claramente se faz fora de alcance. Ainda

mais, quando os meios de comunicação em massa e os serviços de marketing

fazem disseminar um modelo de pessoa saudável, que nada se relaciona com o

respeito às características individuais ou até mesmo às características de um povo.

São sempre estereótipos que preenchem os critérios de corpos com músculos

hipertrofiados e definidos, rostos esticados, peitos e nádegas siliconados e sorriso

sempre no rosto, acompanhados de roupas “da moda”, acesso irrestrito aos mais

recentes lançamentos tecnológicos e carros do ano. Tudo isso agravado pelo

desestímulo quanto à prática de atividades corporais de forma prazerosa e a busca

de uma alimentação realmente natural.

O modelo de saúde vigente, patrocinado por todo esse desserviço de saúde

acima referido, em se tratando de um modelo de saúde hospitalocêntrico e

estritamente físico-mecânico, cujo objeto é a doença, não pode favorecer de fato a

saúde, já que seu foco é debelar sintomaticamente as doenças e afastar o indivíduo

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de um fenômeno primordial, segundo Gadamer (2006), que é a preocupação com

sua própria saúde.

Um fator de complexidade aí seria, segundo a Hermenêutica Filosófica, que a

saúde se daria em um processo de esquecimento e auto-conhecimento, e mais, o

processo de adoecer e recuperar-se se dá em uma totalidade indivisível do ser

humano (GADAMER, 2006). Nessa perspectiva, faz sentido a crítica que a

Hermenêutica Filosófica faz ao Cartesianismo e, consequentemente, ao modelo

biomédico de saúde, que considera o ser humano de forma segmentada, valoriza o

saber especializado, fragmentado, muito mais tecnocêntrico do que voltado para os

aspectos humanos.

Estariam, pois, as ciências da saúde se transformando em ciências da

doença. Estaria a saúde impregnada pelo modelo de pensamento cartesiano. Em se

considerando doença como tudo aquilo que se estabelece como perturbação, como

perigoso e com o qual o ser humano tem que lidar. Há na ciência moderna espaços

que têm dificuldade de dominar, principalmente quando se tem em vista a ausência

de padrões determinantes. Segundo referenciais hermenêuticos, a impossibilidade

da saúde de ser mensurada de fato ocorre, também, porque está ligada ao estado

de ser de cada indivíduo, que deveria ser perguntado e saber responder sobre se

sentirem doentes. Residiriam aí incógnitas da saúde, as quais adviriam do

autodesconhecimento de nós mesmos, de nossa própria (in)capacidade de escuta a

nosso próprio respeito (GADAMER, 2006).

O aspecto oculto a que Gadamer (2006) se refere da saúde seria a saúde não

se declarar por si mesma, como se o ser humano só se desse conta dela quando ela

não está “presente”, quando há desequilíbrio orgânico, quando há a falta dela.

Seguindo esse raciocínio de que a saúde se mantém oculta até que seja perturbada,

reconhece-se que ela se encontra sempre em um horizonte de perturbação e de

ameaça. Nessa direção, a concepção gadameriana alerta para que o cuidado em

saúde não se dê exclusivamente quando da manifestação da doença e/ou sintomas,

pois isso seria intervir contra a doença; e quando essa intervenção contra a doença

se fizer necessária, que se evitem os excessos através da prevenção do uso de

medicamentos ou de exames laboratoriais desnecessários.

Quando se fala em cuidado, em tratamento de doenças, na Hermenêutica

Filosófica fica defendido o cuidado mediado pelo diálogo. Os profissionais de saúde,

por meio desse diálogo, estariam buscando uma atuação descentralizada de suas

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técnicas, estariam buscando uma atuação em conjunto com o paciente. Tal

colaboração ampliaria suas possibilidades de sucesso no tratamento das doenças

(FRAGELLI, 2007). Além de que, o diálogo é considerado por Gadamer (2006) como

fator que humaniza a relação médico-paciente e fator necessário às práticas de

saúde para que se ultrapasse o altíssimo valor conferido às técnicas modernas, em

detrimento de um ouvido sensível e o olhar observador de quem cuida. A crítica é

impressa na leitura que se faz do paciente a partir de valores padrões. “O paciente é

uma pessoa e não um caso” (GADAMER, 2006, p.106).

De uma perspectiva Hermenêutica Filosófica, os conhecimentos também são

adquiridos por meio do estudo (CAPRARA, 2003), cabe então a crítica de que esse

conhecimento na medicina ocidental contemporâneo tem caráter universalizante e,

ao contrário do que vem se constituindo nas práticas desses profissionais, não é

tudo que o médico precisa saber/conhecer de seu paciente, pois esse sujeito

adoecido é um ser biológico que, no momento da doença, apresenta sintomas que

podem não ser inéditos ao médico. No entanto, são também sujeitos que refletem e

vivenciam uma experiência subjetiva de doença.

Dessa forma, sempre serão inéditos a história, os desejos e a subjetividade

do indivíduo adoecido. E contra essa perspectiva reducionista, segue-se na direção

da defesa de uma relação médico-paciente em que se considere iniciar a partir de

um processo experiencial mediado pelo diálogo, que não se limite a revelar e/ou

impor os conhecimentos da medicina adquiridos em estudo. Na relação médico-

paciente, a abordagem biomédica, por suas características inerentes, fragmenta e

dificulta que o paciente se expresse.

O que desperta o interesse da medicina ocidental contemporânea é o estado

de doença, que chama a atenção por sua presença, já que a saúde, como já

referido, tem por sua característica não se revelar. É a doença que produz um

sentimento de perigo, fragiliza o indivíduo e estimula uma resposta terapêutica

(CAPRARA, 2003).

O que move essa prática médica são as tentativas de modificar o percurso da

natureza, se a doença for considerada um processo natural, ou de dominar as

manifestações patológicas que se apresentem. No entanto, dessa forma, essa

prática médica não se compromete com a concepção de saúde, e de algum modo

esquiva-se das práticas de prevenção de doenças e, mais do que isso, esquiva-se

das práticas que venham a promover saúde. A biomedicina não pressupõe

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considerar as individualidades, as peculiaridades, ao passo que seus esforços

residem no estabelecimento de normas e valores universais, e aquém do que tentar

compreender cada realidade que se apresenta, a biomedicina pressupõe sua

segurança a partir de parâmetros que devem constituir uma convenção que somente

tenha que se aproximar da realidade.

Um exemplo em que a hermenêutica se contrapõe a abordagem biomédica é

a eleição dos psicofármacos como forma exclusiva de controlar a depressão, ou a

ansiedade, ou a angústia, eliminando ou reduzindo a sintomatologia. De uma

perspectiva hermenêutica, o estado de ansiedade deve ser considerado para além

de um diagnóstico clínico, mas como um processo que permita ao indivíduo refletir

ou reelaborar sua própria existência (CAPRARA, 2003).

O referencial hermenêutico poderia permitir o redimensionamento da questão

do próprio conhecimento produzido no campo da saúde e suas relações com seus

diferentes espaços de intervenção. Há espaço sim para se pensar as relações entre

hermenêutica e saúde, partindo de Gadamer (2006), como sendo um processo de

perceber o mundo, para além do olhar biomédico, cartesiano, permitindo uma

reflexão com olhos críticos a esse modelo de cuidado chamado paradoxalmente de

“curativo”, pensando a saúde como sendo ela mesma a possibilidade natural de

esquecê-la, pois se revela em um estado de bem-estar. E a melhor maneira de

pensar a saúde é imaginá-la como um estado de equilíbrio que sempre volta a se

estabilizar em um processo contínuo.

Gadamer não pretende descartar a medicina ocidental contemporânea, mas

pretenda fazê-la estabelecer uma comunicação com a filosofia e dessa forma

ampliar sua abordagem indo além da dimensão biológica (CAPRARA,2003). O

filósofo propõe que junto aos recursos tecnológicos tão desenvolvidos e valorizados,

seja também recurso a análise do ser humano na sua totalidade, o seu ser no

mundo.

3.4 A Hermenêutica Filosófica como lente para análise da PNPIC no SUS

No campo da saúde, a proposta de escavação sociológica sobre o saber

instituído tem apontado a PNPIC no SUS, como ação de onde vem a emergir

explicações que fogem das explicações tão defendidas e difundidas pela

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racionalidade biomédica, assim como vem se configurando enquanto espaço

legítimo de defesa da inclusão da lógica integrativa na saúde (BARROS, 2006).

Na concepção gadameriana, a saúde tem de ser entendida como equilíbrio, e

esta visão se aproxima da visão dos que defendem as diferentes formas de

medicinas alternativas. Gadamer era defensor e utilizador de medicinas integrativas

e, como tal, defendia conceitos típicos dessas formas de medicina, como equilíbrio,

harmonia diálogo e globalidade (CAPRARA, 2003).

A linha de pensamento da Hermenêutica Filosófica se ocupa da existência

humana, interpretando as ações humanas a partir da reflexão filosófica. Somente

por meio de um processo de reflexão filosófica, é possível, para os filósofos da

tradição hermenêutica, aprofundar nossos conhecimentos sobre as características

constitutivas dos seres humanos. Nessa direção, o homem é mais do que um

organismo biológico e a medicina mais do que a ciência natural.

Caprara (2003) defende a utilização da abordagem hermenêutica na pesquisa

qualitativa na área da saúde, por suas premissas constituírem a base das diferentes

abordagens na análise das narrativas. Incluída na perspectiva de se buscar pelo

significado das ações na relação entre interpretante e interpretado, estaria a

experiência do indivíduo no primeiro plano da produção dos discursos científicos,

tentando superar a dicotomia sujeito-objeto na pesquisa científica. Essa autora

enfatiza que a hermenêutica abre espaço para uma nova construção de modelos de

saúde-doença, que recuperam a dimensão experiencial, assim como aquela

psicossocial. A abordagem da medicina, de uma perspectiva hermenêutica permite a

exploração da experiência humana da doença, entendendo como os pacientes lidam

com suas experiências específicas frente aos médicos, isso em relação à saúde, à

doença e ao sofrimento.

Isso posto, há de se acrescentar à defesa da Hermenêutica enquanto base

filosófica para se analisar a PNPIC no SUS, o que Gadamer defende quando se

refere ao ser humano e à tradição, de que os seres humanos não estão

inevitavelmente presos pela convenção e pela tradição, pois faz parte de sua

natureza tanto a capacidade de romper com a tradição, como a capacidade de

renová-la.

Desse argumento, pode-se inferir que se possa romper com essa hegemonia

do modelo biomédico de fazer saúde – tornado convenção que sufocou uma imensa

tradição em Saúde – principalmente quando se abordam as críticas tão bem

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fundadas ao paradigma cartesiano no campo da saúde. No entanto, os esforços não

se impõem como meios de se desfazer totalmente da medicina convencional

contemporânea, mas muito mais abrir os horizontes para modos de se fazer saúde

que abordem os indivíduos de forma holística/integral.

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4. ANALISANDO A PNPIC NO SUS

Nossa discussão para a análise da PNPIC no SUS propriamente dita se inicia

com a percepção do risco de que as PICS vêm se difundindo enquanto incorporação

de técnicas para manutenção do modelo biomédico. Ou seja, ainda não estamos

diante de uma mudança efetiva de paradigmas, e mesmo essa confrontação a que o

modelo biomédico vem sendo submetido resulta em uma transformação relevante,

mas sim numa apropriação por parte do modelo biomédico de práticas e recursos

em saúde advindos do paradigma vitalista, de modo a somente cooptá-las, inclusive

adequando-as aos moldes cartesianos, cujo enfoque está na doença e nos cuidados

em saúde como atividade lucrativa (LUZ, 2011).

Mesmo que a publicação da PNPIC no SUS signifique uma tentativa contra o

“epistemicídio”, como afirma Nélson Filice de Barros (2006), o próprio texto da

política há de se apresentar com controvérsias entre a defesa de práticas que em

sua origem são integrativas, construídas sob o paradigma vitalista, dentro de um

modelo de saúde especializador, reducionista e com foco na doença.

O estudo das Racionalidades Médicas, já mencionado nessa dissertação e

referenciado dentro da PNPIC no SUS, aponta para uma convivência ora conflituosa

ora pacífica, e parcialmente integrada entre sistemas médicos convencionais

modernos. Por vezes, há uma cooperação que contribui para uma assimilação

mútua híbrida ou sincrética, tanto em termos teóricos, quanto no que se refere às

práticas. Essa leitura expressa a presença de hibridismo e do ecletismo e, algumas

vezes, do sincretismo, na simbologia contemporânea sobre corpo, saúde, doença,

tratamento, cura etc.

As representações do corpo como máquina coexistem com as representações

bioenergéticas do corpo em uma mesma pessoa, seja ela cliente ou profissional de

saúde. Dessa forma, mesmo no usuário verifica-se o trânsito de uma racionalidade

médica a outra, a depender de como se dá seu adoecimento e dos significados que

atribui a ele. quanto aos profissionais de saúde, crescentemente conjugam

procedimentos terapêuticos ou diagnósticos de mais de uma racionalidade em sua

prática profissional (NASCIMENTO et al, 2013).

As Racionalidades Médicas estudadas comungam do fato de se constituírem

em saberes/práticas cujas concepções e proposições se pretendem demonstráveis

empiricamente, quais sejam as formas: através de tecnologias cientificamente

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avançadas, ou através de demonstração empiricamente tradicional. Além disso, a

categoria das Racionalidades Médicas considerou em seus estudos, sistemas

médicos institucionalizados e ensinados em instituições acadêmicas legitimadas,

nas culturas de origem e na cultura ocidental, mas que estão inseridos no sistema

global capitalista, provavelmente submetidas ao sistema de hierarquização de

saberes, bem como aos sistemas econômico e político.

A constatação é de que independentemente do sistema médico, as

representações por parte do usuário e dos profissionais de saúde não são puras, do

ponto de vista de sentidos e significados atribuídos; não se restringem ao universo

da racionalidade daquele sistema médico específico/dominante. Assim, por exemplo,

na Biomedicina, o compartilhamento é parcial, porque usuário e profissionais de

saúde trazem ambas a representação do corpo como máquina, do adoecimento

como incapacidade de trabalhar ou mover-se e da cura como retorno à normalidade

sintomática e à vida ativa, mas quanto à valorização de aspectos subjetivos

relacionados ao adoecimento, ela é frequente na clientela sem, no entanto,

encontrar correspondência da parte dos profissionais de saúde.

Já em outro exemplo, a Medicina Tradicional Chinesa, o compartilhamento

de representações está menos presente. Se por um lado os terapeutas têm suas

representações influenciadas por sua formação dentro de uma visão holística, por

outro, a clientela tende a perceber a acupuntura enquanto um procedimento quase

mecânico, a serviço da produção de resultados sobre a sua dor e/ou inflamação

(NASCIMENTO et al, 2013).

Essa representação, presente no usuário quanto à Acupuntura, é deveras

influenciada pela racionalidade da biomedicina, sabida dominante, hegemônica,

tanto política quanto simbolicamente. Isto corrobora com o perigo alertado no início

dessa discussão, de mera incorporação de técnicas outras ao modelo biomédico de

saúde, sem que o cuidado integrativo seja consumado.

Dentro dessa perspectiva de crítica ao modelo biomédico e sob o olhar

profundo e interpretativo da hermenêutica filosófica, cuja inserção vem contribuir

com a crítica epistemológica, política e ética, defendemos propriamente uma análise

da PNPIC utilizando o Tripé epistemológico crítico – descrito no capítulo anterior –

segundo o quadro de análise abaixo, onde constam os aspectos a serem

observados em cada dimensão:

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Quadro 3 – Dimensões do Tripé Epistemológico-crítico

Dimensão Epistemológica

Dimensão Política Dimensão Ética

Paradigma da Política;

Modelo de conhecimento de estudo;

Posição do Investigador;

Contextos de Pesquisa;

Paradigmas vigentes;

Historicidade;

Epísteme dominante.

Forças / Influências institucionais;

Propostas de Planos, Programas, Projetos, Bases de Dados ou Sistema de informação e pesquisas e de acompanhamento e avaliação.

Dinâmica política nacional.

Como a ética está colocada?

O que traz sobre cuidado?

Dimensão humanizadora

Fonte:elaboração própria.

Assim, a Epistemológica aponta o(s) paradigma(s) vigentes, qual modelo de

conhecimento de estudo, qual a posição do investigador, quais os contextos de

pesquisa, o tipo de historicidade contemplada, ou de outro modo, a Episteme

dominante, contidos na PNPIC. Já a Dimensão Política, deverá fazer apontamentos

no que se refere às forças/influências institucionais, bem como no que se refere a

propostas de Planos, Programas, Projetos, Bases de dados ou Sistema de

Informação e pesquisas e Sistemas de acompanhamento e avaliação. De igual

modo, considerações acerca da dinâmica política do Brasil que acabam

influenciando o setor saúde.

E, por último, negando-se a hierarquia de relevância, dentro da dimensão

Ética serão respondidas perguntas tais “Como a ética está colocada na PNPIC no

SUS?” e “O que a referida política traz sobre o cuidado e a dimensão humanizadora

do mesmo?”. O desafio posto para um sistema de saúde, que justifica o uso do Tripé

epistemológico-crítico, está no desvelar e lidar com a sua crise, e possibilitar uma

reconstrução político-institucional, científico (epistemológica), integrativa e bioética.

4.1 Dimensão Epistemológica

A epistemologia do campo da saúde, dos séculos XX e XXI, passa pelo

desafio de construção de uma nova narrativa teórica, reconfigurando sentidos e

explicações dominantes, abrindo-se para o intercâmbio da compreensão

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hegemônica da racionalidade biomédica com saberes e práticas em saúde advindos

de sistemas culturais diversos, ultrapassando e adquirindo caráter de

complementariedade quanto à episteme vigente (NASCIMENTO et al, 2013).

Meneses (2008) alerta para o risco de contraposição entre a racionalidade moderna

e outros saberes e experiências consideradas tradicionais por serem anteriores à

modernidade, porque isso poderia prejudicar as possibilidades de se criticar e

analisar a estrutura conceitual da modernidade.

O que ocorre, na cultura ocidental, é que nas concepções presentes nas

práticas de saúde contemporâneas, estão partilhados diversos modelos

(preventivista, promocionista, estético, vitalista) além do modelo biomédico, com

maior dominância ou soma de dominâncias de um ou mais modelos de acordo com

a especificidade de cada prática, de contextos e praticantes correspondentes

(NASCIMENTO et al, 2013). O quadro a seguir explica, simplificadamente, cada um

dos modelos mencionados.

Quadro 4 – Dos modelos presentes na saúde contemporânea

MODELO CARACTERÍSTICAS

Preventivista

Prevenir, amenizar ou ao menos deter o desenvolvimento de enfermidades crônicas.

Promocionista

Manter a saúde, não adoecer.

Estético

Beleza, vigor, juventude.

Vitalista

Expansão da vitalidade, equilíbrio, harmonia das dimensões da vida.

Fonte: NASCIMENTO et al, 2013.

As PICS vêm sustentar sentidos, significados e valores sociais distintos dos

dominantes, perante o sofrimento, o adoecimento, o tratamento e a cura de

doenças. Vem também preencher lacunas do sistema biomédico quanto à

resolutividade terapêutica de seus serviços. Está colocado, assim, o desafio à

hegemonia cultural, o de abrir-se à diversidade de saberes, diferentes lógicas e

formas de pensar e sentir, cuja demanda está na possibilidade de diálogo e

comunicação entre culturas, numa interação com ou para além da ciência moderna,

no intento de recuperar saberes e práticas de grupos sociais subalternizados,

marginalizados e desacreditados, em decorrência do capitalismo e do colonialismo.

Assim, aponta-se para a impossibilidade do modelo biomédico de saúde – amparado

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epistemologicamente no paradigma cartesiano – de atender à totalidade de

demandas de cuidado que se apresentam na atualidade.

Dessa forma, a PNPIC no SUS parece uma tentativa de incorporação do

paradigma vitalista às práticas de saúde para a população como um todo,

principalmente no nível de atenção básica. Isso seria uma forma de corresponder a

um contexto atual, mas que se iniciou em meados da década de 1960, em que

cresce e se fortalece o discurso em favor da Natureza, em uma tendência de crítica

à exacerbação tecnológica, e que vem questionando o pensamento positivista e

liberal dominante e que, provavelmente, é fruto justamente da crise do modelo

capitalista – e, nesse lugar, do modelo biomédico.

O paradigma vitalista ou da vitalidade-energia tem suas raízes presentes em

antigas tradições, e ao ser ressignificado serve como aporte a esse crescente

interesse, instigado pelo movimento de contracultura desde a década de 60 do

século XX, por mostrar-se compatível com os anseios de sustentabilidade,

pacificação, vida ecológica, em seu sentido amplo, nos níveis biológico, social e

natural. O paradigma vitalista, diferente do paradigma biomédico, centra-se na

saúde e na busca de harmonia da pessoa com seu ambiente natural e social.

Valoriza a subjetividade, a prevenção e a promoção da saúde, bem como a

integralidade do cuidado (NASCIMENTO et al, 2013).

O paradigma vitalista pode ser evidenciado nos trechos da PNPIC no SUS,

que servem à descrição dos sistemas médicos, recursos terapêuticos e abordagens

contemplados pela política:

“A Medicina Tradicional Chinesa caracteriza-se por um sistema médico

integral (...). Utiliza linguagem que retrata simbolicamente as leis da natureza e que

valoriza a inter-relação harmônica entre as partes visando à integridade.”

“A homeopatia, sistema médico complexo de caráter holístico, baseada no

princípio vitalista (...)”. Entre outros trechos.

No entanto, o paradigma biomédico marca presença em dizeres como:

“O consenso do National Institutes of Health dos Estados Unidos referendou a

indicação da acupuntura, de forma isolada ou como coadjuvante, em várias doenças

e agravos à saúde (...).”

“(...) alguns Estados e municípios brasileiros começaram a oferecer

atendimento homeopático como especialidade médica aos usuários (...)”.

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Tais trechos poderiam ser apontados como reflexo na PNPIC no SUS do

modelo biomédico, fragmentador e especializador, focado na doença. O estudo da

categoria das Racionalidades Médicas constatou a diferença existente entre

racionalidades médicas e as práticas terapêuticas. As práticas terapêuticas não se

limitam a elementos de uma dimensão de uma racionalidade médica específica.

Elas, frequentemente, são utilizadas de forma isolada, deslocadas de seu contexto

de significados, obedecendo mais a uma lógica empírica de eficácia no estilo da

biomedicina, do que a uma coerência teórica dos sistemas (NASCIMENTO et al,

2013).

Quando se lê no texto da PNPIC no SUS que o seu campo contempla

“sistemas médicos complexos” e “recursos terapêuticos”, utiliza esses termos e,

também, no Relatório de Gestão 2006/2010 – publicado em 2011 pelo Ministério da

Saúde, através da Coordenação Nacional de Práticas Integrativas e

Complementares – indica que a compreensão desses termos está fundamentada na

obra de Madel Luz, que traz as Racionalidades Médicas como categoria de estudo

de primeira ordem na pesquisa em saúde.

Pode-se, então, inferir que as Racionalidades Médicas seja o Modelo de

conhecimento de estudo desta política, além de apontar como documentos

norteadores o inciso II do art. 198 da Constituição Federal/88, que dispõe sobre a

integralidade da atenção como diretriz do SUS. O parágrafo único do art. 3º da Lei nº

8.080/90, que trata das ações destinadas a garantir às pessoas e à coletividade as

condições de bem-estar físico, mental e social, como fatores determinantes e

condicionantes da saúde, e o documento “Estratégia da OMS sobre Medicina

Tradicional 2002-2005”. A PNPIC compõe ainda forte arcabouço legal para a

existência das Práticas Integrativas e Complementares no SUS, junto às Políticas

Nacionais de Atenção Básica e de Promoção da Saúde.

Isso demonstra que a categoria das Racionalidades Médicas passou a ser

utilizada com uma perspectiva política, de modo a afirmar a legitimidade de

diferentes sistemas médicos complexos e na defesa da integração desses sistemas

médicos aos serviços públicos como prática multiprofissional, de forma integrativa e

complementar.

Dentre os sistemas contemplados no estudo das Racionalidades Médicas,

somente a Medicina Tradicional Chinesa e a Medicina Homeopática estão também

contempladas na PNPIC no SUS. O Ministério da Saúde optou pela terminologia

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Práticas Integrativas e Complementares, de modo que essa opção vem somar as

Racionalidades Médicas Vitalistas às práticas terapêuticas ditas integrativas e

complementares em saúde. Sendo assim, parece que fica destacado um papel

fundamental da PNPIC no SUS, de contribuir para a legitimação das PICS, de forma

a responder às defasagens das práticas biomédicas, sem, no entanto, questioná-las,

promovendo, nesse sentido, a incorporação dessas práticas a um modelo de saúde

tão hegemônico para a população brasileira.

Deparamo-nos no texto da PNPIC, na parte que aponta os objetivos dessa

política, com um discurso que atende enfaticamente a uma lógica bem ao estilo da

biomedicina:

“2.1 Incorporar e implementar as Práticas Integrativas e Complementares no

SUS, na perspectiva da prevenção de agravos e da promoção e recuperação da

saúde (...).

2.2 Contribuir para o aumento da resolubilidade do Sistema e ampliação do

acesso às Práticas Integrativas e Complementares, garantindo qualidade, eficácia,

eficiência e segurança no uso.

2.3 Promover a racionalização das ações de saúde, estimulando

alternativas inovadoras (...)”.

A adoção de termos como “incorporar” e “alternativa” transmite a ideia de

autossuficiência e de que não existem reflexões a serem feitas quanto ao modelo

dominante do campo da saúde, o biomédico. Assim como a essa ideia une-se a

concepção de que o modelo biomédico oferece “qualidade, eficácia, eficiência e

segurança no uso”, e as PICS irão somente contribuir para um “aumento da

resolubilidade”, como se essa resolubilidade já existisse e fosse suficiente. Além

disso, fica associado aos termos “qualidade, eficácia, eficiência e segurança” e

“racionalização das ações” o método, e a esse, não se questiona se é uma

abordagem cartesiana ou não que confere os poderes científicos validadores, por

meio do qual crê exercer controle sobre os saberes e as práticas, primando,

supostamente, pela objetividade a todo custo.

O que vem antes da PNPIC ser aprovada, descrito em sua historicidade, vem

demonstrar o reconhecimento de práticas e saberes tradicionais abandonados à

marginalidade, mas que vêm à tona à medida que surge um movimento

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contracultural que busca maior integração dos indivíduos com a natureza e o

cuidado em saúde integral. A PNPIC é sim resultado de uma luta por legitimar as

Práticas Integrativas e Complementares, entretanto não alcança estatuto diverso da

alternatividade e não dá conta, da forma como está posto no texto e na política, de

serem escolhas que venham a substituir o modelo biomédico, caso essa seja a

escolha do indivíduo ou coletividade, pois essa legitimidade está submissa à

Episteme vigente.

4.2 Dimensão Política

Qualquer política está associada a construções históricas e modos de operar

próprios de cada realidade, de cada Estado. Toda política pública está inserida

numa trajetória geral e, também, específica e constitui-se numa institucionalidade, o

que de algum modo a condiciona e dá sentido (BAPTISTA; MATTOS, 2011). Isso já

foi discutido na dimensão epistemológica. Neste momento, a discussão volta-se para

a dimensão política, onde cabem as reflexões sobre instituições e influências

envolvidas na construção da PNPIC no SUS e também a discussão, mesmo que

breve e não aprofundada, acerca da dinâmica política do país ligada ao tema.

As instituições que definem práticas e processam caminhos para a ação

política cotidiana permeiam os Estados (BAPTISTA; MATTOS, 2011), e no caso da

PNPIC no SUS há de se dar destaques diferentes às instituições e influências

internacionais e nacionais. Consta no traçado histórico das PICS enquanto tais, que

o pontapé inicial da defesa da inserção/institucionalização dessas práticas nos

sistemas de saúde nacionais foi dado pela Organização Mundial da Saúde. Essa

defesa foi se consolidando em documentos resultantes dos eventos organizados

pela OMS, a partir da Conferência Internacional sobre Atenção Primária em Saúde,

em Alma-Ata, em 1978.

Fundada em 7 de abril de 1948, com sede em Genebra, Suíça, A OMS

(Organização Mundial da Saúde) ou WHO (World Health Organization) é um agência

especializada das Nações Unidas, destinada a coordenadar assuntos relativos à

saúde no âmbito internacional. As Nações membro ratificaram os seus estatutos que

tem como objetivo garantir o mais alto grau de saúde para todos os seres humanos,

saúde essa entendida pela agência como um estado completo de bem-estar

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psicológico, físico, mental e social. Seu propósito primordial é a consecução, por

parte de todos os povos, dos mais altos padrões de saúde possíveis. A OMS

proporciona a cooperação técnica a seus membros na luta contra as doenças e em

favor do saneamento, da saúde familiar, da capacitação de trabalhadores na área de

saúde, do fortalecimento dos serviços médicos, da formulação de políticas de

medicamentos e pesquisa biomédica (OMS, Web).

No Brasil destaca-se, historicamente, a 8ª Conferência Nacional, que foi um

marco para confirmação do SUS e que, dentre outras recomendações, introduziu as

práticas alternativas de assistência à saúde no âmbito dos serviços de saúde.

Mesmo as Conferências Nacionais de Saúde acontecendo regularmente desde a

década de 1940, no Brasil, e junto com outros espaços de negociação virem se

consolidando como espaços de deliberação importante para a saúde, onde se

pressupõe uma participação da população como um todo, dos usuários,

trabalhadores e gestores da saúde, por meio de seus representantes, ainda não é

possível garantir que seja efetiva essa participação, no sentido de que ela

corresponda, mesmo que em grau pequeno, aos desejos e necessidades dessa

população.

Na saúde, os espaços de negociação e consenso e de controle social vem

multiplicando-se com o processo de descentralização, porém eles não se tornaram

efetivamente os principais espaços de negociação das políticas, ainda que sejam,

como já dito, reconhecidos e tenham importância no debate político. Alguns estudos

apontam para a dificuldade de se analisar a negociação que implicou em uma

orientação política e o que se encontra é o resultado superficial de um debate,

indícios de negociação que não se configuram claramente como política. Indicam

que as negociações-chave das políticas não se dão nos espaços estipulados para

essa função. Existem grupos que não pertencem aos governos e mesmo assim

pautam as decisões políticas, por meio de uma atuação em rede e com práticas de

influência (BAPTISTA; MATTOS, 2011).

Sendo assim, é óbvia a conclusão de que haja espaços invisíveis onde

também se processam políticas, não seria diferente com a PNPIC no SUS. Esse

estudo está fadado ao que os representantes do Estado decidiram por publicar,

inclusive nos relatórios de gestão. E, por isso, os apontamentos serão

principalmente aqueles possíveis de serem inferidos a partir dos documentos

oficiais. A análise que esse estudo propõe tratará dos enunciados da PNPIC no

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SUS, do discurso apresentado e mediado pelos aparatos estatais, mas, de forma

simples, tentará trazer à tona e discutir o que está por trás desses enunciados.

Ainda assim, esse estudo não se isenta de citar a defesa de Baptista e Mattos

(2011), ao produzir como organizadores e autores um livro que se propõe a discutir

caminhos para análise de políticas de saúde sem, no entanto, ter que propor uma

receita para tal tarefa, de que:

A política não pode estar restrita ao seu aspecto formal de enunciado oficial, a política precisa ser vista como uma prática de embates e conflitos de interesses, de posições e percepções do mundo, que produz acordos momentâneos e dinâmicos e que, em última instância, expressa uma forma historicamente construída de viver e reproduzir da sociedade. (BAPTISTA; MATTOS, 2011; p.63.)

A política pública é sim resultado de uma disputa de poderes e saberes e se

pode, em seus enunciados, perceber claramente a predominância de um discurso

sobre os demais que são excluídos, são pois excluídos do discurso oficial, mas não

necessariamente excluídos do cotidiano das instituições e das práticas. O que

acontece com a PNPIC no SUS, é que sua institucionalização também foi defendida

como forma de uniformizar as diretrizes específicas que deveriam reger as PICS nas

redes de saúde municipais e estaduais, entretanto são diversas as experiências no

que se refere às PICS. Não obstante, não é a proposta desse estudo produzir esses

dados. Mas está documentado aqui, que a formulação, bem como a implantação e

implementação da PNPIC no SUS, não consegue estar isenta da lógica que

mercantiliza a saúde, em sendo essa a realidade que se reconhece no Brasil.

A política pública de saúde não escapa de se vincular aos processos

econômicos, políticos, culturais e ideológicos e a sua constituição enquanto prática

social relaciona-se ao modo de desenvolvimento do País (SARRETA, 2009). Parece

que o que está disseminado na sociedade brasileira é um entendimento de Estado e

de política associado a uma concepção restrita de governo, aquela que valoriza o

papel dos aparatos estatais. O que aflige e gera desconfiança da população, é que

não se efetiva a ideia de uma orientação política (do Estado) cujo interesse é público

e atuaria, portanto, em função de um interesse maior, da própria sociedade,

expressando aquilo que cada sociedade almeja. Dessa forma, de acordo com o

primeiro entendimento, as políticas públicas passaram a ser reduzidas a um

processo político racional, gerido pelos “representantes do Estado” (governantes a

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cada tempo) que atendem a determinados critérios e normas de conduta

supostamente (e muito provavelmente só supostamente) pactuados socialmente

(BAPTISTA; MATTOS, 2011).

O que cabe como apontamento e que corrobora com o receio de que o

próprio texto da PNPIC no SUS venha a se enquadrar em uma defesa mascarada

de apropriação das PICS enquanto meras técnicas, sem significar o rompimento

com o modelo de saúde reducionista e de mercado é que, segundo Behring e

Boschetti (2008), as políticas públicas apresentam características e determinações

econômicas, sociais, políticas e culturais. Porém, quando se desvenda o significado

real da política de saúde para os sujeitos envolvidos, compreende-se o predomínio

econômico, o que não poderia ser diferente, já que as políticas públicas são

processos inscritos na sociedade burguesa, onde há o Estado regulador que deve

manter a ordem e redistribuir recursos econômicos, a fim de atender a alguns

interesses das classes e grupos sociais, tendo por finalidade e função o

desenvolvimento capitalista da nação. É o predomínio econômico que interessa ao

Estado – cujo papel de regulamentar e desenvolver as políticas públicas é

reconhecido socialmente – e que pode ser responsabilizado por alimentar o ideal de

que as políticas de saúde são inviáveis, inevitáveis e desacreditadas.

Para Baptista e Mattos (2011) a discussão acerca de políticas públicas remete

ao processo de construção de uma ação governamental para um setor, no caso o

setor saúde, onde estaria o “Estado em ação” e seriam considerados recursos,

atores políticos, espaços institucionais, planos e negociações. Dessa forma,

considerar-se-ia que caberia a um exercício analítico e racional – por meio do uso da

boa técnica analítica, o estudo e a análise dos caminhos de uma política pública –

prever e determinar mudanças. Essa construção reforça uma divisão de papéis a

serem exercidos pelo Estado e pela sociedade, como se fossem partes diferentes

que não se relacionam. O que está posto na atualidade, na realidade brasileira, é

que o Governo decide, mas delega sua responsabilidade na implementação, muitas

vezes, para o setor privado.

Na história brasileira, as estratégias regulacionistas e desenvolvimentistas

foram implementadas em geral por uma elite conservadora, na burocracia estatal, de

forma verticalizada, de cima para baixo, sem a participação da cidadania e das

classes trabalhadoras, e mais a ausência de uma cultura de bem-estar social, mais a

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concentração de renda, de propriedade e de recursos do poder, sem a

universalização dos direitos políticos e sociais da cidadania (SARRETA, 2009).

Quando se pensa as políticas públicas de saúde, deve-se ter em mente

também que a concepção de saúde da sociedade brasileira é marcada

historicamente pelo modelo “curativo”, centrado na assistência médica e nas

especialidades, tendo como referência o hospital. Por isso, e não porque seja essa a

única demanda da população brasileira, são priorizadas ações voltadas para a alta e

média complexidade. O discurso e as experiências práticas exitosas no que se

refere aos cuidados primários em saúde, à prevenção e à promoção da saúde, não

são suficientes para romper com o modelo de saúde biomédico.

Essa concepção de saúde reducionista imperando no contexto em que se

concebem as políticas públicas de saúde, são mais do que justificativas para que a

sociedade não se reconheça nessa construção. Parece não ser real a participação

dos usuários do SUS na concepção, discussão e controle social das políticas de

saúde. Entretanto, a PNPIC defende como objetivo da PNPIC no SUS “Estimular as

ações referentes ao controle/participação social, promovendo o envolvimento

responsável e continuado dos usuários, gestores e trabalhadores nas diferentes

instâncias de efetivação das políticas de saúde”. E também como diretriz traz o

“Fortalecimento da participação social”.

O controle social é um ponto problemático tendo em vista que seu caráter de

composição paritária é burlado e, no que diz respeito ao poder deliberativo que lhe é

conferido, fica transferida a responsabilidade para a sociedade civil e para o

cidadão/usuário/consumidor. Dessa forma, fica evidente a expansão do

neoliberalismo, sem qualquer resistência, e fica evidente como esse neoliberalismo

produz interferência deletéria nas estruturas formais de participação e de

interlocução entre sociedade e Estado, já que a ação política, assim como os

espaços públicos, são funcionais às propostas neoliberais que restringem o papel do

Estado e promovem a racionalização de recursos e, consequentemente,

vulnerabiliza a efetiva universalização e a qualidade do acesso à saúde (SARRETA,

2009).

Quando são apontados os grupos que participaram da elaboração textual da

PNPIC, aponta-se para a participação de representantes das Associações Nacionais

de Fitoterapia, Homeopatia, Acupuntura e Medicina Antroposófica que, no entanto,

tiveram seus trabalhos coordenados por departamentos e Secretarias e agência

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constituintes do Governo Federal (Departamento de Atenção Básica/SAS; Secretaria

Executiva; Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos; Secretaria de

Gestão do Trabalho e Educação na Saúde/MS; Anvisa). Esse grupo gestor foi quem

elaborou o plano de ação que deveria ser seguido pelos grupos de trabalho, aos

quais cabia autonomia somente na definição das estratégias para seguir esse plano.

Ainda assim, predominaram as reuniões técnicas para elaboração da proposta da

PNPIC, ficando clara a ausência da participação da população de um modo geral.

Está enunciada na PNPIC enquanto diretriz a “Divulgação e informação dos

conhecimentos básicos da PICS para profissionais de saúde, gestores e usuários do

SUS, considerando as metodologias participativas e o saber popular e tradicional.”

No entanto, a forma de trabalho em prol da construção da PNPIC no SUS nega os

saberes, desejos e experiências acumulados dos usuários. Restringe o

delineamento dessa política a um grupo seleto, que talvez tenha propriedade dos

saberes que fundam a modalidade terapêutica do grupo de trabalho do qual fizeram

parte. Isso ocorre concomitantemente à perpetuação da falta de integração entre os

conteúdos propostos, tudo isso tão característico do modo fragmentado como são

implementadas as políticas de saúde, apesar de se ter a integralidade como desafio

mais persistente para implementação do SUS e de ser esse um compromisso do

qual também parte a defesa da institucionalização das PICS.

Quanto ao texto da PNPIC no SUS contemplar o aspecto de Propostas de

Planos, Programas, Projetos, Bases de dados ou Sistema de Informação e

pesquisas e Sistemas de acompanhamento e avaliação, cabe citar as seguintes

diretrizes:

“3.8. Incentivo à pesquisa em PICS com vistas ao aprimoramento da atenção

à saúde, avaliando eficiência, eficácia, efetividade e segurança dos cuidados

prestados.

3.9. Desenvolvimento de ações de acompanhamento e avaliação da PICS,

para instrumentalização de processos de gestão.”

E a responsabilidade do Gestor Federal de “Implantar um banco de dados dos

serviços de PNPIC no SUS, instituições de ensino e pesquisa, assim como

pesquisadores e resultados das pesquisas científicas em PNPIC.”

As responsabilidades institucionais estão separadas e enumeradas por nível

de gestão: Federal, Estadual e Municipal. Na verdade, o que está descrito enquanto

responsabilidade se repete para cada instância de governo, a não ser pela

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especificação de que cada nível aja de acordo com o que lhe cabe sem, no entanto,

delimitar específica e claramente o que cabe a cada esfera de governo, o que torna

as descrições das responsabilidades evasivas, deixando margem a ações das mais

diversas, por parte de cada estado e município. Isso estaria consonante com a maior

autonomia na definição de suas políticas e ações em saúde conquistada pelos

estados e municípios, a partir da descentralização e da participação popular. Mas

isso também é controverso, quando a própria PNPIC argumenta contra a

diversidade de experiências das PICS que existiam antes da aprovação da PNPIC e

justifica a sua concepção. De igual modo, quando consta em seu texto,

destrinchando uma de suas diretrizes, o enunciado “Elaboração de normas técnicas

e operacionais para implantação e desenvolvimento dessas abordagens no SUS”, a

palavra norma se refere à regra, padrão, modelo.

A PNPIC preconiza, ainda, que a implantação de ações e/ou programas

estaduais/municipais com as práticas, esteja submetida às normas, programas e

diretrizes do SUS, das Políticas Nacionais, regulamentação da ANVISA, demanda

da população, interesse e envolvimento dos gestores e profissionais de saúde,

capacidade de produção e fornecimento de matéria-prima, estrutura física existente,

recursos financeiros, possibilidade de parcerias com instituições e existência de

regulamentações e/ou políticas.

As diretrizes e ações da PNPIC vêm convergir com outras políticas nacionais

cujas ações são apontadas como imprescindíveis para melhoria da atenção à saúde

da população e ampliação das opções terapêuticas aos usuários do SUS: Política

Nacional de Atenção Básica, Política Nacional de Promoção da Saúde, Política

Nacional de Educação Permanente, Política Nacional de Assistência Farmacêutica,

Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, Política Nacional de Povos e

Comunidades Tradicionais, Política Nacional de Biodiversidade, Política Industrial

Tecnológica e de Comércio Exterior, entre outras (RODRIGUES et al, 2011).

4.3 Dimensão Ética

A partir da ideia de que o processo saúde-doença está intimamente ligado

aos modos pelos quais as pessoas se relacionam consigo, com as outras e com

suas respectivas qualidades de vida, ou seja, que o processo saúde-doença é

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engendrado socialmente e do modo reducionista, como vem se dando a produção

do cuidado, isso demanda mudanças profundas. Cuidado não implica

necessariamente cura como está defendido pelo modelo biomédico, até porque

neste modelo entende-se cura como simples cessação de sintomas. Cuidar, nesse

estudo, não é entendido como um mecanismo que implica fins e resultados técnicos

e, por isso, não deve ser entendido como um conjunto de técnicas ou de

procedimentos terapêuticos em si (NUNES; PELIZZOLI, 2011).

Esse trabalho não pretende desconsiderar o modelo biomédico, mas sim

promover a reflexão crítica que aponte para os seus limites, tornando possível

ampliar horizontes e apostar em novas possibilidades, pensando a PNPIC enquanto

marco de resgate da tradição do cuidado em saúde. Neste aspecto, a saúde

confunde-se com um ato ético, relacional, humano, a ponto de afirmarmos que ou

temos uma prática em saúde humanizadora ou não temos a essência do campo

saúde propriamente.

O trecho da PNPIC que consta nos seus objetivos diz: “2.3 (...) estimulando

alternativas inovadoras e socialmente contributivas ao desenvolvimento

sustentável de comunidades”.

Quando se refere a “alternativas inovadoras”, não se deve esquecer as PICS

enquanto ações de saúde pautadas na tradição da saúde, em saberes milenares e,

nesse contexto, não seriam apenas práticas inovadoras, no sentido de introduzir

novidades ao campo da saúde. Inovador em geral remete à ideia de que a medicina

moderna é detentora da verdade garantida tecnologicamente e que necessita,

impreterivelmente, superar saberes e práticas tradicionais introduzindo novidades às

suas ações.

É preciso resgatar o que a metafísica negou e o que ficou perdido no percurso

de construção da hegemonia do modelo biomédico: a natureza humana enquanto

natureza dinâmica, finita, mutável e histórica, que aponta para uma ontologia de

possibilidades de estar no mundo (NUNES; PELIZZOLI, 2011). Os conhecimentos

com base na ciência moderna tendem a naturalizar aquilo que está baseado na

ciência, negando suas origens, como se as origens não exercessem qualquer

influência sobre os saberes ligados à ciência. Traz uma concepção dominante que

marca a racionalidade científica nos últimos três séculos, de que a história do ser

humano se faz por rupturas e superações técnicas, associando o passado à ideia de

atraso, sem considerar que um saber-prática específico jamais desaparece

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completamente, ao contrário, integra-se aos novos procedimentos ou às novas

teorias (LUZ, 200?). Não obstante, quando a PNPIC defende que as ações em

saúde sejam “socialmente contributivas ao desenvolvimento sustentável de

comunidades”, introduz valores que dizem respeito ao paradigma vitalista.

Os valores sustentados pelas PICS estão ligados às tradições e tendem a

favorecer a autonomia das pessoas na busca de uma vida mais harmoniosa:

equilíbrio mental e físico, com menos competitividade e agressividade, ao mesmo

tempo mais solidária nos planos familiar e social (NASCIMENTO et al, 2013).

Enquanto a biomedicina tem como categoria central a doença de modo reduzido, a

patologia, as medicinas vitalistas, presentes nas PIC, a categoria central é a saúde,

o equilíbrio. Nesse sentido, quando a biomedicina se propõe a pautar suas ações a

partir de uma sistemática de classificar doenças, síndromes, sintomas, e de buscar

uma explicação causal linear para a origem desses fenômenos, negando a natureza

como parte do homem e o homem como integrante da natureza, e daí a

complexidade de fatores, ela rejeita as tradições no que se refere aos cuidados em

saúde, cuja base reside no paradigma vitalista (e/ou também no energético), que

considera a saúde como equilíbrio dos seus componentes naturais da maneira mais

harmônica possível (LUZ, 200?).

A PNPIC pode ser apontada como a tentativa de resgatar os conhecimentos e

práticas tradicionais, deixados à marginalidade pela lógica reducionista do saber

moderno, do paradigma cartesiano. Porém, não se desamarra de todo dos

pressupostos biomédicos, inclusive no que traz acerca da dimensão do cuidado e da

ética. Uma das diretrizes da referida política aponta sim para a tradição: “3.3 (...)

considerando as metodologias participativas e o saber popular tradicional (...)”,

contudo mais uma vez de forma inespecífica.

Originalmente, o cuidado expressa nosso ser no mundo enquanto

possibilidade de compreender a si mesmo e possibilidade de ser. Não há de se

negar a historicidade desse ser, suas experiências, seus desejos, sua natureza e

seu mundo de relações/desafios. A atitude de cuidar é um modo de ser fundamental

que não pode ser concebido como estância fora de nós, pois é constitutivo da

natureza humana. O cuidado é um processo inerente à experiência de si. Ele

contempla cuidar de si, do outro, da comunidade, do ambiente. O outro é parte dos

projetos de cada ser humano. O outro como outro (alteridade) é fundamental em

vista da natureza social e dialógica do homem (NUNES; PELIZZOLI, 2011). Mas a

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alteridade foi sendo perdida pelo modelo biomédico e os processos vitais foram

sendo construídos por meio de estratégias de heteronomia e artificialismo, que

alimentam a desconfiança no que diz respeito aos processos vitais autônomos

(ILLICH, 1975).

A PNPIC traz em sua introdução um trecho que aponta aspectos que vêm a

constituir parte de sua abordagem acerca da dimensão ética:

Tais sistemas e recursos envolvem abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e recuperação da saúde por meio de tecnologias eficazes e seguras, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade. Outros pontos compartilhados pelas diversas abordagens abrangidas nesse campo são a visão ampliada do processo saúde-doença e a promoção global do cuidado humano, especialmente do autocuidado (PNPIC, 2006).

De uma perspectiva hermenêutica (Gadamer, 2006), o cuidador precisa ser

aberto e construir uma compreensão ampla de mundo, conjuntamente à amplas

formas de diálogo. O diálogo no processo do cuidar não pode ser guiado pela

negociação com fins pré-estabelecidos e estruturados por algum protocolo ou

pressuposição fechada, mas deve ser guiado para a ampliação da compreensão do

ser no cuidado. O processo de cuidado passa a ser compreendido como um

dispositivo de formação humana, quando não se limita somente aos conhecimentos

e fazeres técnicos ou procedimentais em saúde. Isso contribui para que as pessoas

busquem ser saudáveis corporalmente e, também, éticas com inserção social nas

suas vidas (NUNES; PELIZZOLI, 2011).

O cuidado como a ação integral agrega os efeitos e repercussões de

interações positivas entre usuários, profissionais e instituições, que “são traduzidas

em atitudes como: tratamento digno e respeitoso, com qualidade, acolhimento e

vínculo” (PINHEIRO; MACHADO; GUIZARDI, 2011. p. 76). Isso pode ser encontrado

no texto da PNPIC, mesmo de forma inespecífica, no seu primeiro objetivo:

2.1 Incorporar e implementar as Práticas Integrativas e Complementares no SUS, na perspectiva da prevenção de agravos e da promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em saúde (PNPIC, 2006).

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Os profissionais de saúde têm dificuldade de lidar com a saúde de forma

ampliada, pois sua formação acadêmica é guiada pelo racionalismo científico

moderno, cujas consequências reduzem e simplificam os processos do cuidado em

busca de uma saúde negada em sua natureza complexa, subjetiva, temporal,

humana. O que agrava tal situação é quando esses profissionais são principalmente

movidos por interesses econômicos e pelo status social (NUNES; PELIZZOLI, 2011).

A proposta de uma reflexão de base integrativa para o campo da saúde segue

com a pretensão de ampliar a própria visão de saúde vigente e essa proposta está

institucionalizada através da PNPIC. A partir da visão integrativa de saúde, a

promoção da saúde não se faz somente combatendo aspectos bioquímicos e

mecânicos da doença. Pelizzoli propõe que:

promover saúde é pesquisar a saúde de base: saúde popular, resgatar as tradições em saúde, conhecer algo das medicinas históricas, estudar a cura pela alimentação viva e natural, integrar a dimensão afetiva e de valorização do outro, apoiar e divulgar as práticas integrativas, integrar a `medicina` na vida das comunidades

e incluir a dimensão das relações políticas (...)(Pelizzoli, 2011a).

Aponta, também, que ser cuidador é interpretar a condição vital-social-

ambiental e emocional do sujeito em cada momento, devendo ser um promotor da

saúde antes que do mercado da doença (PELIZZOLI, 2011a). Neste sentido, os

princípios da medicina integrativa são:

1. Estabelecimento de uma relação de parceria entre o paciente e o praticante no

processo de cura;

2. Uso apropriado de métodos convencionais e alternativos para facilitar a resposta

inata de cura do corpo;

3. Consideração de todos os fatores que influenciam a saúde, o bem-estar e a

doença, incluindo a mente, o espírito e a comunidade, assim como o corpo;

4. Uma filosofia de trabalho que não rejeita a medicina convencional, nem aceita a

medicina alternativa sem uma visão crítica;

5. Reconhecimento de que a prática médica apropriada deve ser baseada em boa

ciência, dirigida e aberta a novos paradigmas;

6. Uso preferencial de intervenções naturais e pouco invasivas;

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7. Conceito, mais amplo possível, na promoção de saúde, prevenção e tratamento

de doenças;

8. O praticante deve ser modelo de saúde e cura, compromissado com o processo

de auto-exploração e autodesenvolvimento3.

As valorização das PICS e seu crescente reconhecimento na atualidade

devem ser interpretados como indicativos de que a sociedade adota essas práticas

enquanto proposta contra-hegemônica de emancipação. As competências técnico-

científicas em que se baseia o modelo biomédico não dão conta da produção do

cuidado em um contexto de direito. Essa busca pelo cuidado é uma das principais

demandas por atenção à saúde pela sociedade civil atual e se configura como uma

crítica das coisas, das instituições, das práticas e discursos em saúde (PINHEIRO;

MACHADO; GUIZARDI, 2011).

A grande contribuição que a PNPIC traz está na reflexão que levanta sobre as

limitações da biomedicina frente à complexidade do adoecimento humano e às

mudanças culturais e, ao mesmo tempo, serve à sociedade brasileira como

instrumento de embate contra a negação e desqualificação de conhecimentos

milenares e práticas tradicionais como caminho possível para uma ampliação do

cuidado (SOUSA, 2013).

A PNPIC carrega consigo um caráter ético-político cujo significado é dar

visibilidade às PICS, abrindo caminhos para compreensão das novas formas de

cuidado integral. Consequentemente, isso trará uma perspectiva de transformação

do modelo hegemônico que estrutura as instituições de saúde.

Pinheiro, Machado e Guizardi (2011) afirmam ser evidente o sucesso de

sistemas terapêuticos regidos por paradigmas distintos dos da medicina científica, o

que tornou constante a busca de outra racionalidade em saúde por diferentes grupos

sociais que anseiam por cuidado. Luz (2003) aponta que a insuficiência da medicina

moderna em responder as demandas das pessoas por cuidado fundamenta as

razões para a institucionalização das PICS, apesar disso não estar cogitado no texto

da PNPIC.

3Cf. Pelizzoli, 2012 e 2014; PERIBANEZ-GONZALES, 2011.

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A PNPIC representa um avanço na defesa do cuidado integral. E mesmo que

esteja inserida dentro de um fazer saúde e construir políticas baseado pelo modelo

biomédico e, portanto, pelo paradigma cartesiano, abre os caminhos para que o

paradigma vitalista ou outro correlato venha a conquistar espaço. Não há a

pretensão de substituir um pelo outro, mas sim que esteja à disposição de cada

indivíduo da sociedade brasileira a possibilidade de exercer sua autonomia na

escolha de que tipo de cuidado em saúde deseja, com justiça e ética.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estamos vivenciando no campo da saúde desafios evidentes, dentro dos

quais estão fragilizados os seus trabalhadores, os usuários (todos nós), e

despreparados os seus gestores. Seja consequência ou causa, está fragilizado o

molde biomédico dominante no fazer saúde. São cada vez mais valorizados as

contabilidades hospitalares como indicadores de saúde e muitos hospitais (públicos

em especial) estão cada vez mais sucateados. Os investimentos em atenção

primária em saúde são reduzidos, em detrimento de investimentos em altas

tecnologias que atendem à minoria.

A cada dia surgem novas tecnologias no tratamento de doenças e, ainda

assim, os números de mortes por doenças evitáveis são avassaladores. Políticas

são criadas e implantadas a fim de garantir o cuidado humanizado, mas não

garantem. A população mundial envelhece, porém, sua qualidade de vida é precária,

tendo em vista a progressão constante de doenças crônico-degenerativas,

principalmente relacionadas ao sistema cardiovascular. Constata-se também o

retorno de antigas endemias ou doenças que eram consideradas quase extintas,

como tuberculose, sífilis e malária.

O foco do atendimento na doença, entendida como disfunção meramente

físico-química e mecanicista, não traz ao modelo biomédico o sucesso científico de

uma ciência complexa e integrativa, e à medida que o modelo se fecha ao diálogo

com as abordagens não cartesianas, abre mão dos modelos de abordagem

tradicionais, sistêmicos, integrativos, energéticos, cruciais para a saúde humana.

Dessa forma, pode-se explicar que o fracasso desse modelo de saúde dominante se

deve ao investimento excessivo na abordagem físico-química-mecânica, que gesta

relações objetificadoras, e nos recursos terapêuticos dirigidos ao corpo doente

tomado pela intervenção tecnológica, baseada em uma medicina alopática e

hospitalocêntrica, cuja visão de saúde, como apontamos, tem sido

reducionista/cartesiana.

Apontamos neste trabalho certos limites do modelo biomédico, inserido em

uma cultura que faz crer que a qualidade de vida está associada ao poder de

compra e à posse de bens materiais, e mesmo diante da insistência em afirmar,

como consta por exemplo na “Declaração Política do Rio sobre Determinantes

Sociais da Saúde” (OMS, 2011), de que a promoção da equidade em saúde é

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fundamental ao desenvolvimento sustentável e a uma melhor qualidade de vida e

bem-estar para todos, ainda assim o foco é numa intervenção que está disponível

para quem pode pagar; quem não pode custear sua saúde depende dos serviços de

saúde públicos, muitas vezes sucateados. Essa saúde está à venda e está

compreendida de forma distorcida, a fim de atender os fins mercadológicos.

Ao reconhecer que o processo saúde-doença é engendrado socialmente,

reconhece-se também o caráter histórico, político, significativo e singular da saúde.

Reconhece-se que saúde e doença relacionam-se com os modos das mais diversas

relações das pessoas, inclusive com a relação que estabelecem com as suas

respectivas qualidades de vida. Isso faz demandar da sociedade mudanças

profundas nos modos de promoção do cuidado

Dessa forma, o modelo biomédico não produz a emancipação das pessoas

que se tornam dependentes da “instituição de saúde”. O foco da ciência moderna

não está na autonomia do cidadão, mas em produzir novos equipamentos e

tecnologia, compondo-se como tecnociência, que busca por inovações tecnológicas,

mas tem jogado fora os conhecimentos e práticas que vem com a tradição, os quais

em geral possuem visão integrativa.

Não se trata, porém, de negar os avanços técnicos da medicina de caráter

biomédico, voltada para o corpo doente e objetificado, mas de tomar consciência

das possibilidades e limites das diversas visões de saúde, ou também

“racionalidades médicas”, na tentativa de ampliar a compreensão do ser humano em

todos os seus aspectos e, dessa forma, ter mais clareza quanto à sua complexidade

em seus estados de saúde e de doença, entendidos aqui enquanto parte de um

processo vital, ambiental e sistêmico.

O campo da saúde, em sua amplitude, carrega consigo conflitos que ilustram

bem a sua crise: estabeleceu-se a dependência de um modelo que não pára de

encarecer seus custos. São cada vez mais produzidos medicamentos alopáticos que

prometem curas. Ao mesmo tempo, o uso de plantas, as abordagens naturopáticas,

um bom cultivo do corpo e da alimentação têm prevenido e curado patologias de

várias ordens e graus. O que se evidencia, é que não há uma relação direta entre

saúde e o crescimento de tecnologias invasivas, hospitalocêntricas e medicalizantes,

mas sim um estilo de vida que envolve o ambiente natural e construído e o corpo

saudáveis. Há de se ressaltar que não é suficiente proporcionar ao indivíduo doente

qualquer conduta terapêutica, por mais cara e avançada que seja, se condições

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básicas de sobrevivência como nutrição e bem-estar social e mental não estiverem à

disposição do mesmo.

Calcado em uma ciência compreendida como neutra, unitária e homogênea, o

que contradiz a realidade das disputas epistemologias complexas e interesses em

que se envolvem os saberes médicos, em altos custos monetários e em uma

crescente necessidade de sanar obstáculos políticos econômicos, o modelo

biomédico põe em xeque o seu próprio ideal de segurança, viabilidade e eficácia, e a

crença de que é avançado tecnologicamente – eficaz. No entanto, as práticas em

saúde parecem não se atualizar no mesmo ritmo. O olhar médico parece não

questionar os limites que advém do reducionismo epistêmico e excludente presente

nas tecnologias invasivas, hospitalocêntricas e medicalizantes.

Cabe reforçar, portanto, que o campo científico da saúde não é homogêneo,

pois as diferenças e conflitos em validar novas práticas nesse campo são muitas.

Pesquisas e intervenções que se contrapõem, modos de cuidado que se chocam. O

que poderia se chamar de “crise na saúde” aponta para um modelo de cuidado que

não “dá conta” da saúde das pessoas, nem mesmo no seu foco na abordagem

tecnológico físico-química-mecânica do modelo biomédico, pois as demandas são

crescentes. Daí a emergência da procura por intervenções em saúde que abordem o

sujeito de forma holística, integrativa, humanizadora.

Diante dessa compreensão, este trabalho apresentou uma proposta de

pensar a saúde com um olhar ampliado, um desafio diante de uma realidade

paradigmática reducionista, que insiste em lidar com um campo complexo e vasto,

que pertence à alteridade humana, de modo fragmentado e submetido à

tecnocracia. Ainda assim, foi motivado por um movimento que não é particular ou de

um grupo reduzido, mas um movimento crescente em busca da conexão real com a

natureza e com o resgate da tradição, que promove um cuidado que prima pelo

humano e sua harmonia.

Propomos reforçar a discussão sobre a promoção em saúde, a partir de uma

perspectiva diferente da que o modelo biomédico impõe e, sobretudo, acerca de um

dos maiores desafios impostos ao Sistema Único de Saúde: a integralidade. A

possibilidade do sentido abre horizontes e muda o tempo inteiro, horizontes que

também dialogam entre si. A partir dessa perspectiva, este trabalho buscou ampliar

horizontes, criando algo novo e estabelecendo diálogo entre o paradigma biomédico

e outras possibilidades de se fazer saúde, apontando para o resgate das tradições

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que nos determinam em grande parte, o que conduz essa dissertação a um

aprofundamento da reflexão acerca da visão integrativa de saúde, discutindo a

Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS, através da

conjunção das três dimensões que constituem o chamado Tripé epistemológico-

crítico.

A escolha pela PNPIC SUS como objeto de análise se fez por ela propor a

inclusão de uma visão mais integrativa de saúde nas políticas públicas, apesar da

ênfase em diferentes racionalidade médicas, que pudemos observar utilizando as

lentes da hermenêutica filosófica e da multidimensionalidade de análise, proposta

pelo Tripé epistemológico-crítico, conduzida pela possibilidade de defesa da

integralidade do cuidado e seu potencial crítico.

Trata-se de uma análise restrita, mas que sob olhar hermenêutico remete à

nossa implicação e dos praticantes, desconstruindo a crença na ciência moderna de

que a ciência é neutra e que a quantidade de aparatos técnicos artificiais trazem

solução para a crise da saúde. Trazemos o que nos mobiliza na Política Nacional de

Práticas Integrativas e Complementares e tentamos, através da linguagem escrita e

da nossa experiência, documentar o que reconhecemos desse política, ainda que

não seja somente isso e ainda que seu texto esteja submetido ao modelo biomédico.

Em cada um dos níveis de entendimento, epistemológico, político e ético

foram apontadas controvérsias entre uma política que se pretende introduzir o

paradigma vitalista/energético/integrativo no sistema de saúde brasileiro, mas que

no entanto está impregnada pelo cartesianismo presente no modelo biomédico.

Essa política impacta os campos econômico, técnico e sociopolítico, apesar de ter

sido aprovada em um contexto que consideramos de crise para a saúde. A sua

publicação não deixa de ser um esforço em enfrentar essa crise, resgatando a

importância da tradição e trazendo à tona a defesa ao cuidado integrativo em saúde.

Mas está inserida no sistema global capitalista, submetida aos sistemas de

hierarquização de saberes, econômico e político, e se rende aos domínios do

modelo biomédico, apresentando-se controversa em seu próprio texto, como se de

alguma forma contribuísse para a manutenção das práticas integrativas relegadas

aos conceitos de complementares e alternativas.

O grande potencial de agravo disso pode estar na forma como, por vezes,

têm sido incorporadas essas práticas, como meras técnicas submetidas à lógica

reducionista, fragmentária e tecnicista do modelo biomédico, que por sua vez está

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submetido à lógica do mercado. Porém, isso não pode ser demonstrado por esse

trabalho, já que essa análise da política está comprometida com o que está escrito

na política e, por isso, não dá conta das experiências que vêm se dando em práticas

integrativas e complementares.

Outro mérito da publicação da PNPIC é a implicação daqueles que pensam

as políticas de saúde para que ela avance além da racionalidade médica ocidental.

É de fato crescente o reconhecimento das racionalidades fundamentadas no

paradigma vitalista/energético/integrativo e é crescente a demanda pelo cuidado em

saúde que considere e introduza mais os aspectos humanos nas vivências de quem

cuida e de quem é cuidado. Isso é deveras defendido pelos saberes populares e

advindos das tradições.

Está claro que coexistem racionalidades médicas diferentes em um mesmo

contexto, e parece que a PNPIC vem retratar essa diversidade. Mas é evidente,

também, que a racionalidade biomédica não deixa muito espaço para as outras

racionalidades e marca presença explícita na elaboração do texto dessa política.

Não poderia ser diferente, já que as políticas de saúde no Brasil seguem uma

tendência de manter o foco na doença.

Intencionamos que essa dissertação venha a inspirar outros estudos que

possibilitem a compreensão de como a PNPIC vem se apresentando na prática, haja

vista que a análise realizada aponta indícios da existência de controvérsias no seu

texto e há possibilidades, ainda, de que exista um conflito entre o que se enuncia e o

que se pratica. Outra sugestão é que as dimensões (epistemológica, político-

institucional e ética), contempladas nesse estudo, possam ser aprofundadas, cada

uma, em outras pesquisas. E mais, que os resultados da PNPIC possam ser

estudados amplamente, a fim de que se avalie sua repercussão e que resultados

obteve e, em sendo o caso, quais melhorias podem ser propostas.

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ANEXO

Ministério da Saúde

Gabinete do Ministro

PORTARIA Nº 971, DE 03 DE MAIO DE 2006

Aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde.

O MINISTRO DE ESTADO DA SAÚDE, INTERINO, no uso da atribuição que

lhe confere o art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal, e

Considerando o disposto no inciso II do art. 198 da Constituição Federal, que

dispõe sobre a integralidade da atenção como diretriz do SUS;

Considerando o parágrafo único do art. 3º da Lei nº 8.080/90, que diz respeito

às ações destinadas a garantir às pessoas e à coletividade condições de bem-estar

físico, mental e social, como fatores determinantes e condicionantes da saúde;

Considerando que a Organização Mundial da Saúde (OMS) vem estimulando o

uso da Medicina Tradicional/Medicina Complementar/Alternativa nos sistemas de

saúde de forma integrada às técnicas da medicina ocidental modernas e que em seu

documento “Estratégia da OMS sobre Medicina Tradicional 2002-2005” preconiza o

desenvolvimento de políticas observando os requisitos de segurança, eficácia,

qualidade, uso racional e acesso;

Considerando que o Ministério da Saúde entende que as Práticas Integrativas

e Complementares compreendem o universo de abordagens denominado pela OMS

de Medicina Tradicional e Complementar/Alternativa - MT/MCA;

Considerando que a Acupuntura é uma tecnologia de intervenção em saúde,

inserida na Medicina Tradicional Chinesa (MTC), sistema médico complexo, que

aborda de modo integral e dinâmico o processo saúde-doença no ser humano,

podendo ser usada isolada ou de forma integrada com outros recursos terapêuticos,

e que a MTC também dispõe de práticas corporais complementares que se

constituem em ações de promoção e recuperação da saúde e prevenção de

doenças;

Considerando que a Homeopatia é um sistema médico complexo de

abordagem integral e dinâmica do processo saúde-doença, com ações no campo da

prevenção de agravos, promoção e recuperação da saúde;

Considerando que a Fitoterapia é um recurso terapêutico caracterizado pelo

uso de plantas medicinais em suas diferentes formas farmacêuticas e que tal

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abordagem incentiva o desenvolvimento comunitário, a solidariedade e a

participação social;

Considerando que o Termalismo Social/Crenoterapia constituem uma

abordagem reconhecida de indicação e uso de águas minerais de maneira

complementar aos demais tratamentos de saúde e que nosso País dispõe de

recursos naturais e humanos ideais ao seu desenvolvimento no Sistema Único de

Saúde (SUS); e

Considerando que a melhoria dos serviços, o aumento da resolutividade e o

incremento de diferentes abordagens configuram, assim, prioridade do Ministério da

Saúde, tornando disponíveis opções preventivas e terapêuticas aos usuários do

SUS e, por conseguinte, aumentando o acesso, resolve:

Art. 1º Aprovar, na forma do Anexo a esta Portaria, a Política Nacional de

Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde.

Parágrafo único. Esta Política, de caráter nacional, recomenda a adoção pelas

Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da

implantação e implementação das ações e serviços relativos às Práticas Integrativas

e Complementares.

Art. 2º Definir que os órgãos e entidades do Ministério da Saúde, cujas ações

se relacionem com o tema da Política ora aprovada, devam promover a elaboração

ou a readequação de seus planos, programas, projetos e atividades, na

conformidade das diretrizes e responsabilidades nela estabelecidas.

Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.

JOSÉ AGENOR ÁLVARES DA SILVA

ANEXO

Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no Sistema Único de Saúde - SUS

PNPIC

1. INTRODUÇÃO

O campo das Práticas Integrativas e Complementares contempla sistemas médicos complexos e recursos terapêuticos, os quais são também denominados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) de medicina tradicional e complementar/alternativa (MT/MCA), conforme WHO, 2002. Tais sistemas e recursos envolvem abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e recuperação da saúde por meio de tecnologias eficazes e seguras, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade. Outros pontos compartilhados pelas diversas abordagens abrangidas nesse campo são a visão ampliada do processo saúde-doença e a promoção global do cuidado humano, especialmente do autocuidado.

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No final da década de 70, a OMS criou o Programa de Medicina Tradicional, objetivando a formulação de políticas na área. Desde então, em vários comunicados e resoluções, a OMS expressa o seu compromisso em incentivar os Estados-Membros a formularem e implementarem políticas públicas para uso racional e integrado da MT/MCA nos sistemas nacionais de atenção à saúde, bem como para o desenvolvimento de estudos científicos para melhor conhecimento de sua segurança, eficácia e qualidade. O documento “Estratégia da OMS sobre Medicina Tradicional 2002-2005” reafirma o desenvolvimento desses princípios.

No Brasil, a legitimação e a institucionalização dessas abordagens de atenção à saúde iniciou-se a partir da década de 80, principalmente após a criação do SUS. Com a descentralização e a participação popular, os estados e os municípios ganharam maior autonomia na definição de suas políticas e ações em saúde, vindo a implantar as experiências pioneiras.

Alguns eventos e documentos merecem destaque na regulamentação e tentativas de construção da política:

- 1985 - celebração de convênio entre o Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps), a Fiocruz, a Universidade Estadual do Rio de Janeiro e o Instituto Hahnemaniano do Brasil, com o intuito de institucionalizar a assistência homeopática na rede publica de saúde;

- 1986 - 8ª Conferência Nacional de Saúde (CNS), considerada também um marco para a oferta das Práticas Integrativas e Complementares no sistema de saúde do Brasil, visto que, impulsionada pela Reforma Sanitária, deliberou em seu relatório final pela "introdução de práticas alternativas de assistência à saúde no âmbito dos serviços de saúde, possibilitando ao usuário o acesso democrático de escolher a terapêutica preferida";

- 1988 - resoluções da Comissão Interministerial de Planejamento e Coordenação (Ciplan) nºs 4, 5, 6, 7 e 8/88, que fixaram normas e diretrizes para o atendimento em homeopatia, acupuntura, termalismo, técnicas alternativas de saúde mental e fitoterapia;

- 1995 - instituição do Grupo Assessor Técnico-Científico em Medicinas Não-Convencionais, por meio da Portaria nº 2543/GM, de 14 de dezembro de 1995, editada pela então Secretaria Nacional de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde;

- 1996 - 10ª Conferência Nacional de Saúde que, em seu relatório final, aprovou a “incorporação ao SUS, em todo o País, de práticas de saúde como a fitoterapia, acupuntura e homeopatia, contemplando as terapias alternativas e práticas populares”;

- 1999 - inclusão das consultas médicas em homeopatia e acupuntura na tabela de procedimentos do SIA/SUS (Portaria nº 1230/GM de outubro de 1999);

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- 2000 - 11ª Conferência Nacional de Saúde que recomenda “incorporar na atenção básica: Rede PSF e PACS práticas não convencionais de terapêutica como acupuntura e homeopatia”;

- 2001 - 1ª Conferência Nacional de Vigilância Sanitária;

- 2003 - constituição de Grupo de Trabalho no Ministério da Saúde com o objetivo de elaborar a Política Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares (PMNPC ou apenas MNPC) no SUS (atual PNPIC);

- 2003 - Relatório da 1ª Conferência Nacional de Assistência Farmacêutica, que enfatiza a importância de ampliação do acesso aos medicamentos fitoterápicos e homeopáticos no SUS;

- 2003 - Relatório Final da 12ª CNS que delibera pela efetiva inclusão da MNPC no SUS (atual Práticas Integrativas e Complementares).

- 2004 - 2ª Conferência Nacional de Ciência Tecnologia e Inovações em Saúde à MNPC (atual Práticas Integrativas e Complementares) que foi incluída como nicho estratégico de pesquisa dentro da Agenda Nacional de Prioridades em Pesquisa;

- 2005 - Decreto Presidencial de 17 de fevereiro de 2005, que cria o Grupo de Trabalho para elaboração da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos; e

- 2005 - Relatório Final do Seminário "Águas Minerais do Brasil", em outubro, que indica a constituição de projeto piloto de Termalismo Social no SUS.

Levantamento realizado junto a Estados e municípios em 2004, mostrou a estruturação de algumas dessas práticas contempladas na política em 26 Estados, num total de 19 capitais e 232 municípios.

Esta política, portanto, atende às diretrizes da OMS e visa avançar na institucionalização das Práticas Integrativas e Complementares no âmbito do SUS.

1.1. MEDICINA TRADICIONAL CHINESA-ACUPUNTURA

A Medicina Tradicional Chinesa caracteriza-se por um sistema médico integral, originado há milhares de anos na China. Utiliza linguagem que retrata simbolicamente as leis da natureza e que valoriza a inter-relação harmônica entre as partes visando à integridade. Como fundamento, aponta a teoria do Yin-Yang, divisão do mundo em duas forças ou princípios fundamentais, interpretando todos os fenômenos em opostos complementares. O objetivo desse conhecimento é obter meios de equilibrar essa dualidade. Também inclui a teoria dos cinco movimentos que atribui a todas as coisas e fenômenos, na natureza, assim como no corpo, uma das cinco energias (madeira, fogo, terra, metal, água). Utiliza como elementos a anamnese, palpação do pulso, observação da face e da língua em suas várias modalidades de tratamento (acupuntura, plantas medicinais, dietoterapia, práticas corporais e mentais).

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A acupuntura é uma tecnologia de intervenção em saúde que aborda de modo integral e dinâmico o processo saúde-doença no ser humano, podendo ser usada isolada ou de forma integrada com outros recursos terapêuticos. Originária da medicina tradicional chinesa (MTC), a acupuntura compreende um conjunto de procedimentos que permitem o estímulo preciso de locais anatômicos definidos por meio da inserção de agulhas filiformes metálicas para promoção, manutenção e recuperação da saúde, bem como para prevenção de agravos e doenças.

Achados arqueológicos permitem supor que essa fonte de conhecimento remonta há pelo menos 3000 anos. A denominação chinesa zhen jiu, que significa agulha (zhen) e calor (jiu), foi adaptada nos relatos trazidos pelos jesuítas no século XVII, resultando no vocábulo acupuntura (derivado das palavras latinas acus, agulha, e punctio, punção). O efeito terapêutico da estimulação de zonas neurorreativas ou “pontos de acupuntura” foi, a princípio, descrito e explicado numa linguagem de época, simbólica e analógica, consoante com a filosofia clássica chinesa.

No ocidente, a partir da segunda metade do século XX, a acupuntura foi assimilada pela medicina contemporânea, e graças às pesquisas científicas empreendidas em diversos países tanto do oriente como do ocidente, seus efeitos terapêuticos foram reconhecidos e têm sido paulatinamente explicados em trabalhos científicos publicados em respeitadas revistas científicas. Admite-se, atualmente, que a estimulação de pontos de acupuntura provoca a liberação, no sistema nervoso central, de neurotransmissores e outras substâncias responsáveis pelas respostas de promoção de analgesia, restauração de funções orgânicas e modulação imunitária.

A OMS recomenda a acupuntura aos seus Estados-Membros, tendo produzido várias publicações sobre sua eficácia e segurança, capacitação de profissionais, bem como métodos de pesquisa e avaliação dos resultados terapêuticos das medicinas complementares e tradicionais. O consenso do National Institutes of Health dos Estados Unidos referendou a indicação da acupuntura, de forma isolada ou como coadjuvante, em várias doenças e agravos à saúde, tais como odontalgias pós-operatórias, náuseas e vômitos pós-quimioterapia ou cirurgia em adultos, dependências químicas, reabilitação após acidentes vasculares cerebrais, dismenorréia, cefaléia, epicondilite, fibromialgia, dor miofascial, osteoartrite, lombalgias e asma, entre outras.

A MTC inclui ainda práticas corporais (lian gong, chi gong, tui-na, tai-chi-chuan); práticas mentais (meditação); orientação alimentar; e o uso de plantas medicinais (fitoterapia tradicional chinesa), relacionadas à prevenção de agravos e de doenças, a promoção e à recuperação da saúde.

No Brasil, a acupuntura foi introduzida há cerca de 40 anos. Em 1988, por meio da Resolução nº 5/88, da Comissão Interministerial de Planejamento e Coordenação (Ciplan), teve suas normas fixadas para atendimento nos serviços públicos de saúde.

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Vários conselhos de profissões da saúde regulamentadas reconhecem a acupuntura como especialidade em nosso país, e os cursos de formação encontram-se disponíveis em diversas unidades federadas.

Em 1999, o Ministério da Saúde inseriu na tabela Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA/SUS) do Sistema Único de Saúde a consulta médica em acupuntura (código 0701234), o que permitiu acompanhar a evolução das consultas por região e em todo o País. Dados desse sistema demonstram um crescimento de consultas médicas em acupuntura em todas as regiões. Em 2003, foram 181.983 consultas, com uma maior concentração de médicos acupunturistas na Região Sudeste (213 dos 376 cadastrados no sistema).

De acordo com o diagnóstico da inserção da MNPC nos serviços prestados pelo SUS e os dados do SIA/SUS, verifica-se que a acupuntura está presente em 19 estados, distribuída em 107 municípios, sendo 17 capitais.

Diante do exposto, é necessário repensar, à luz do modelo de atenção proposto pelo Ministério, a inserção dessa prática no SUS, considerando a necessidade de aumento de sua capilaridade para garantir o princípio da universalidade.

1.2. HOMEOPATIA

A homeopatia, sistema médico complexo de caráter holístico, baseada no princípio vitalista e no uso da lei dos semelhantes foi enunciada por Hipócrates no século IV a.C. Foi desenvolvida por Samuel Hahnemann no século XVIII. Após estudos e reflexões baseados na observação clínica e em experimentos realizados na época, Hahnemann sistematizou os princípios filosóficos e doutrinários da homeopatia em suas obras Organon da Arte de Curar e Doenças Crônicas. A partir daí, essa racionalidade médica experimentou grande expansão por várias regiões do mundo, estando hoje firmemente implantada em diversos países da Europa, das Américas e da Ásia. No Brasil, a homeopatia foi introduzida por Benoit Mure, em 1840, tornando-se uma nova opção de tratamento.

Em 1979, é fundada a Associação Médica Homeopática Brasileira (AMHB); em 1980, a homeopatia é reconhecida como especialidade médica pelo Conselho Federal de Medicina (Resolução nº 1000); em 1990, é criada a Associação Brasileira de Farmacêuticos Homeopatas (ABFH); em 1992, é reconhecida como especialidade farmacêutica pelo Conselho Federal de Farmácia (Resolução nº 232); em 1993, é criada a Associação Médico-Veterinária Homeopática Brasileira (AMVHB); e em 2000, é reconhecida como especialidade pelo Conselho Federal de Medicina Veterinária (Resolução nº 622).

A partir da década de 80, alguns Estados e municípios brasileiros começaram a oferecer o atendimento homeopático como especialidade médica aos usuários dos serviços públicos de saúde, porém como iniciativas isoladas e, às vezes, descontinuadas, por falta de uma política nacional. Em 1988, pela Resolução nº 4/88, a Ciplan fixou normas para atendimento em homeopatia nos serviços públicos de saúde e, em 1999, o Ministério da Saúde inseriu na tabela SIA/SUS a consulta médica em homeopatia.

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Com a criação do SUS e a descentralização da gestão, foi ampliada a oferta de atendimento homeopático. Esse avanço pode ser observado no número de consultas em homeopatia que, desde sua inserção como procedimento na tabela do SIA/SUS, vem apresentando crescimento anual em torno de 10%. No ano de 2003, o sistema de informação do SUS e os dados do diagnóstico realizado pelo Ministério da Saúde em 2004 revelam que a homeopatia está presente na rede pública de saúde em 20 unidades da Federação, 16 capitais, 158 municípios, contando com registro de 457 profissionais médicos homeopatas.

Está presente em pelo menos 10 universidades públicas, em atividades de ensino, pesquisa ou assistência, e conta com cursos de formação de especialistas em homeopatia em 12 unidades da Federação. Conta ainda com a formação do médico homeopata aprovada pela Comissão Nacional de Residência Médica.

Embora venha ocorrendo aumento da oferta de serviços, a assistência farmacêutica em homeopatia não acompanha essa tendência. Conforme levantamento da AMHB, realizado em 2000, apenas 30% dos serviços de homeopatia da rede SUS forneciam medicamento homeopático. Dados do levantamento realizado pelo Ministério da Saúde, em 2004, revelam que apenas 9,6% dos municípios que informaram ofertar serviços de homeopatia possuem farmácia pública de manipulação.

A implementação da homeopatia no SUS representa uma importante estratégia para a construção de um modelo de atenção centrado na saúde uma vez que:

- recoloca o sujeito no centro do paradigma da atenção, compreendendo-o nas dimensões física, psicológica, social e cultural. Na homeopatia o adoecimento é a expressão da ruptura da harmonia dessas diferentes dimensões. Dessa forma, essa concepção contribui para o fortalecimento da integralidade da atenção à saúde;

- fortalece a relação médico-paciente como um dos elementos fundamentais da terapêutica, promovendo a humanização na atenção, estimulando o autocuidado e a autonomia do indivíduo;

- atua em diversas situações clínicas do adoecimento como, por exemplo, nas doenças crônicas não-transmissíveis, nas doenças respiratórias e alérgicas, nos transtornos psicossomáticos, reduzindo a demanda por intervenções hospitalares e emergenciais, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida dos usuários; e

- contribui para o uso racional de medicamentos, podendo reduzir a fármaco-dependência;

Em 2004, com o objetivo de estabelecer processo participativo de discussão das diretrizes gerais da homeopatia, que serviram de subsídio à formulação da presente Política Nacional, foi realizado pelo Ministério da Saúde o 1º Fórum Nacional de Homeopatia, intitulado “A Homeopatia que queremos implantar no SUS”. Reuniu profissionais; Secretarias Municipais e Estaduais de Saúde; Universidades Públicas; Associação de Usuários de Homeopatia no SUS; entidades homeopáticas nacionais representativas; Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems); Conselhos Federais de Farmácia e de Medicina;

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Liga Médica Homeopática Internacional (LMHI), entidade médica homeopática internacional, e representantes do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. (ANVISA).

1.3. PLANTAS MEDICINAIS E FITOTERAPIA

A fitoterapia é uma “terapêutica caracterizada pelo uso de plantas medicinais em suas diferentes formas farmacêuticas, sem a utilização de substâncias ativas isoladas, ainda que de origem vegetal”. O uso de plantas medicinais na arte de curar é uma forma de tratamento de origens muito antigas, relacionada aos primórdios da medicina e fundamentada no acúmulo de informações por sucessivas gerações. Ao longo dos séculos, produtos de origem vegetal constituíram as bases para tratamento de diferentes doenças.

Desde a Declaração de Alma-Ata, em 1978, a OMS tem expressado a sua posição a respeito da necessidade de valorizar a utilização de plantas medicinais no âmbito sanitário, tendo em conta que 80% da população mundial utiliza essas plantas ou preparações destas no que se refere à atenção primária de saúde. Ao lado disso, destaca-se a participação dos países em desenvolvimento nesse processo, já que possuem 67% das espécies vegetais do mundo.

O Brasil possui grande potencial para o desenvolvimento dessa terapêutica, como a maior diversidade vegetal do mundo, ampla sociodiversidade, uso de plantas medicinais vinculado ao conhecimento tradicional e tecnologia para validar cientificamente esse conhecimento.

O interesse popular e institucional vem crescendo no sentido de fortalecer a fitoterapia no SUS. A partir da década de 80, diversos documentos foram elaborados, enfatizando a introdução de plantas medicinais e fitoterápicos na atenção básica no sistema público, entre os quais se destacam:

- a Resolução Ciplan nº 8/88, que regulamenta a implantação da fitoterapia nos serviços de saúde e cria procedimentos e rotinas relativas a sua prática nas unidades assistenciais médicas;

- o Relatório da 10a Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1996, que aponta no item 286.12: "incorporar no SUS, em todo o País, as práticas de saúde como a fitoterapia, acupuntura e homeopatia, contemplando as terapias alternativas e práticas populares" e, no item 351.10: “o Ministério da Saúde deve incentivar a fitoterapia na assistência farmacêutica pública e elaborar normas para sua utilização, amplamente discutidas com os trabalhadores em saúde e especialistas, nas cidades onde existir maior participação popular, com gestores mais empenhados com a questão da cidadania e dos movimentos populares”;

- a Portaria nº 3916/98, que aprova a Política Nacional de Medicamentos, a qual estabelece, no âmbito de suas diretrizes para o desenvolvimento científico e tecnológico: "...deverá ser continuado e expandido o apoio às pesquisas que visem ao aproveitamento do potencial terapêutico da flora e fauna nacionais, enfatizando a certificação de suas propriedades medicamentosas”;

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- o Relatório do Seminário Nacional de Plantas Medicinais, Fitoterápicos e Assistência Farmacêutica, realizado em 2003, que entre as suas recomendações, contempla: “integrar no Sistema Único de Saúde o uso de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos”;

- o Relatório da 12ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 2003, que aponta a necessidade de se “investir na pesquisa e desenvolvimento de tecnologia para produção de medicamentos homeopáticos e da flora brasileira, favorecendo a produção nacional e a implantação de programas para uso de medicamentos fitoterápicos nos serviços de saúde, de acordo com as recomendações da 1ª Conferência Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica”.

- a Resolução nº 338/04, do Conselho Nacional de Saúde que aprova a Política Nacional de Assistência Farmacêutica, a qual contempla, em seus eixos estratégicos, a “definição e pactuação de ações intersetoriais que visem à utilização das plantas medicinais e de medicamentos fitoterápicos no processo de atenção à saúde, com respeito aos conhecimentos tradicionais incorporados, com embasamento científico, com adoção de políticas de geração de emprego e renda, com qualificação e fixação de produtores, envolvimento dos trabalhadores em saúde no processo de incorporação dessa opção terapêutica e baseada no incentivo à produção nacional, com a utilização da biodiversidade existente no País”;

- 2005 - Decreto Presidencial de 17 de fevereiro de 2005, que cria o Grupo de Trabalho para elaboração da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

Atualmente, existem programas estaduais e municipais de fitoterapia, desde aqueles com memento terapêutico e regulamentação específica para o serviço, implementados há mais de 10 anos, até aqueles com início recente ou com pretensão de implantação. Em levantamento realizado pelo Ministério da Saúde no ano de 2004, verificou-se, em todos os municípios brasileiros, que a fitoterapia está presente em 116 municípios, contemplando 22 unidades federadas.

No âmbito federal, cabe assinalar, ainda, que o Ministério da Saúde realizou, em 2001, o Fórum para formulação de uma proposta de Política Nacional de Plantas Medicinais e Medicamentos Fitoterápicos, do qual participaram diferentes segmentos tendo em conta, em especial, a intersetorialidade envolvida na cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos. Em 2003, o Ministério promoveu o Seminário Nacional de Plantas Medicinais, Fitoterápicos e Assistência Farmacêutica. Ambas as iniciativas aportaram contribuições importantes para a formulação desta Política Nacional, como concretização de uma etapa para elaboração da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

1.4. TERMALISMO SOCIAL/CRENOTERAPIA

O uso das Águas Minerais para tratamento de saúde é um procedimento dos mais antigos, utilizado desde a época do Império Grego. Foi descrita por Heródoto (450 a.C.), autor da primeira publicação científica termal.

O termalismo compreende as diferentes maneiras de utilização da água mineral e sua aplicação em tratamentos de saúde.

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A crenoterapia consiste na indicação e uso de águas minerais com finalidade terapêutica atuando de maneira complementar aos demais tratamentos de saúde.

No Brasil, a crenoterapia foi introduzida junto com a colonização portuguesa, que trouxe ao País seus hábitos de usar águas minerais para tratamento de saúde. Durante algumas décadas foi disciplina conceituada e valorizada, presente em escolas médicas, como a UFMG e a UFRJ. O campo sofreu considerável redução de sua produção científica e divulgação com as mudanças surgidas no campo da medicina e da produção social da saúde como um todo, após o término da segunda guerra mundial.

A partir da década de 90, a Medicina Termal passou a dedicar-se a abordagens coletivas, tanto de prevenção quanto de promoção e recuperação da saúde, inserindo neste contexto o conceito de Turismo Saúde e de Termalismo Social, cujo alvo principal é a busca e a manutenção da saúde.

Países europeus como Espanha, França, Itália, Alemanha, Hungria e outros adotam desde o início do século XX o Termalismo Social como maneira de ofertar às pessoas idosas tratamentos em estabelecimentos termais especializados, objetivando proporcionar a essa população o acesso ao uso das águas minerais com propriedades medicinais, seja para recuperar seja para sua saúde, assim como preservá-la.

O termalismo, contemplado nas resoluções CIPLAN de 1988, manteve-se ativo em alguns serviços municipais de saúde de regiões com fontes termais como é o caso de Poços de Caldas, em Minas Gerais.

A Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 343, de 7 de outubro de 2004, é um instrumento de fortalecimento da definição das ações governamentais que envolvem a revalorização dos mananciais das águas minerais, o seu aspecto terapêutico, a definição de mecanismos de prevenção, de fiscalização, de controle, além do incentivo à realização de pesquisas na área.

2. OBJETIVOS

2.1 Incorporar e implementar as Práticas Integrativas e Complementares no SUS, na perspectiva da prevenção de agravos e da promoção e recuperação da saúde, com ênfase na atenção básica, voltada para o cuidado continuado, humanizado e integral em saúde.

2.2 Contribuir para o aumento da resolubilidade do Sistema e ampliação do acesso às Práticas Integrativas e Complementares, garantindo qualidade, eficácia, eficiência e segurança no uso.

2.3 Promover a racionalização das ações de saúde, estimulando alternativas inovadoras e socialmente contributivas ao desenvolvimento sustentável de comunidades.

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2.4 Estimular as ações referentes ao controle/participação social, promovendo o envolvimento responsável e continuado dos usuários, gestores e trabalhadores, nas diferentes instâncias de efetivação das políticas de saúde.

3. DIRETRIZES

3.1. Estruturação e fortalecimento da atenção em Práticas Integrativas e Complementares no SUS, mediante:

- incentivo à inserção das Práticas Integrativas e Complementares em todos os níveis de atenção, com ênfase na atenção básica;

- desenvolvimento das Práticas Integrativas e Complementares em caráter multiprofissional, para as categorias profissionais presentes no SUS, e em consonância com o nível de atenção;

- implantação e implementação de ações e fortalecimento de iniciativas existentes;

- estabelecimento de mecanismos de financiamento;

- elaboração de normas técnicas e operacionais para implantação e desenvolvimento dessas abordagens no SUS; e

- articulação com a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas e as demais políticas do Ministério da Saúde.

3.2. Desenvolvimento de estratégias de qualificação em Práticas Integrativas e Complementares para profissionais no SUS, em conformidade com os princípios e diretrizes estabelecidos para Educação Permanente.

3.3. Divulgação e informação dos conhecimentos básicos das Práticas Integrativas e Complementares para profissionais de saúde, gestores e usuários do SUS, considerando as metodologias participativas e o saber popular e tradicional:

- Apoio técnico ou financeiro a projetos de qualificação de profissionais para atuação na área de informação, comunicação e educação popular em Práticas Integrativas e Complementares que atuem na estratégia Saúde da Família e Programa de Agentes Comunitários de Saúde.

- Elaboração de materiais de divulgação, como cartazes, cartilhas, folhetos e vídeos, visando à promoção de ações de informação e divulgação das Práticas Integrativas e Complementares, respeitando as especificidades regionais e culturais do País e direcionadas aos trabalhadores, gestores, conselheiros de saúde, bem como aos docentes e discentes da área de saúde e comunidade em geral.

- Inclusão das Práticas Integrativas e Complementares na agenda de atividades da comunicação social do SUS.

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- Apoio e fortalecimento de ações inovadoras de informação e divulgação sobre Práticas Integrativas e Complementares em diferentes linguagens culturais, tais como jogral, hip hop, teatro, canções, literatura de cordel e outras formas de manifestação.

- Identificação, articulação e apoio a experiências de educação popular, informação e comunicação em Práticas Integrativas e Complementares.

3.4. Estímulo às ações intersetoriais, buscando parcerias que propiciem o desenvolvimento integral das ações.

3.5. Fortalecimento da participação social.

3.6. Provimento do acesso a medicamentos homeopáticos e fitoterápicos na perspectiva da ampliação da produção pública, assegurando as especificidades da assistência farmacêutica nesses âmbitos, na regulamentação sanitária.

- Elaboração da Relação Nacional de Plantas Medicinais e da Relação Nacional de Fitoterápicos.

- Promoção do uso racional de plantas medicinais e dos fitoterápicos no SUS.

- Cumprimento dos critérios de qualidade, eficácia, eficiência e segurança no uso.

- Cumprimento das boas práticas de manipulação, de acordo com a legislação vigente.

3.7. Garantia do acesso aos demais insumos estratégicos das Práticas Integrativas e Complementares, com qualidade e segurança das ações.

3.8. Incentivo à pesquisa em Práticas Integrativas e Complementares com vistas ao aprimoramento da atenção à saúde, avaliando eficiência, eficácia, efetividade e segurança dos cuidados prestados.

3.9. Desenvolvimento de ações de acompanhamento e avaliação das Práticas Integrativas e Complementares, para instrumentalização de processos de gestão.

3.10. Promoção de cooperação nacional e internacional das experiências em Práticas Integrativas e Complementares nos campos da atenção, da educação permanente e da pesquisa em saúde.

- Estabelecimento de intercâmbio técnico-científico visando ao conhecimento e à troca de informações decorrentes das experiências no campo da atenção à saúde, à formação, à educação permanente e à pesquisa com unidades federativas e países onde as Práticas Integrativas e Complementares esteja integrada ao serviço público de saúde.

3.11. Garantia do monitoramento da qualidade dos fitoterápicos pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

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4. IMPLEMENTAÇÃO DAS DIRETRIZES

4.1. NA MEDICINA TRADICIONAL CHINESA-ACUPUNTURA

Premissa: desenvolvimento da Medicina Tradicional Chinesa-acupuntura em caráter multiprofissional, para as categorias profissionais presentes no SUS, e em consonância com o nível de atenção.

Diretriz MTCA 1

Estruturação e fortalecimento da atenção em MTC-acupuntura no SUS, com incentivo à inserção da MTC-acupuntura em todos os níveis do sistema com ênfase na atenção básica.

1. Na Estratégia Saúde da Família

Deverão ser priorizados mecanismos que garantam a inserção de profissionais de saúde com regulamentação em acupuntura dentro da lógica de apoio, participação e co-responsabilização com as ESF

Além disso, será função precípua desse profissional

- atuar de forma integrada e planejada de acordo com as atividades prioritárias da estratégia Saúde da Família;

- identificar, em conjunto com as equipes da atenção básica (ESF e equipes de unidades básicas de saúde) e a população, a(s) prática(s) a ser(em) adotada(s) em determinada área;

- trabalhar na construção coletiva de ações que se integrem a outras políticas sociais (intersetorialidade);

- avaliar, em conjunto com a equipe de saúde da família/atenção básica, o impacto na situação de saúde do desenvolvimento e implementação dessa nova prática, mediante indicadores previamente estabelecidos;

- atuar na especialidade com resolubilidade;

- trabalhar utilizando o sistema de referência/contra-referência num processo educativo; e

- discutir clinicamente os casos em reuniões tanto do núcleo quanto das equipes adscritas.

2. Centros especializados

Profissionais de saúde acupunturistas inseridos nos serviços ambulatoriais especializados de média e alta complexidade deverão participar do sistema referência/contra-referência, atuando de forma resolutiva no processo de educação permanente.

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Profissionais de saúde acupunturistas inseridos na rede hospitalar do SUS.

Para toda inserção de profissionais que exerçam a acupuntura no SUS será necessário o título de especialista.

Deverão ser elaboradas normas técnicas e operacionais compatíveis com a implantação e o desenvolvimento dessas práticas no SUS.

Diretriz MTCA 2

Desenvolvimento de estratégias de qualificação em MTC/acupuntura para profissionais no SUS, consoante os princípios e diretrizes para a Educação Permanente no SUS.

1. Incentivo à capacitação para que a equipe de saúde desenvolva ações de prevenção de agravos, promoção e educação em saúde – individuais e coletivas – na lógica da MTC, uma vez que essa capacitação deverá envolver conceitos básicos da MTC e práticas corporais e meditativas. Exemplo: Tuí-Na, Tai Chi Chuan, Lian Gong. Chi Gong, e outros que compõem a atenção à saúde na MTC.

2. Incentivo à formação de banco de dados relativos a escolas formadoras.

3. Articulação com outras áreas visando ampliar a inserção formal da MTC/acupuntura nos cursos de graduação e pós-graduação para as profissões da saúde.

Diretriz MTCA 3

Divulgação e informação dos conhecimentos básicos da MTC/acupuntura para usuários, profissionais de saúde e gestores do SUS.

1. Para usuários

Divulgação das possibilidades terapêuticas; medidas de segurança; alternativas a tratamentos convencionais, além de ênfase no aspecto de prevenção de agravos e promoção das práticas corporais.

2. Para profissionais

Divulgação dos usos e possibilidades, necessidade de capacitação específica, de acordo com o modelo de inserção; medidas de segurança; alternativas a tratamentos convencionais e papel do profissional no Sistema.

3 Para gestores

Usos e possibilidades terapêuticas, necessidade de investimento em capacitação específica de profissionais, de acordo com o modelo de inserção; medidas de segurança; alternativas a tratamentos convencionais; possível redução de custos e incentivos federais para tal investimento.

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Diretriz MTCA 4

Garantia do acesso aos insumos estratégicos para MTC/Acupuntura na perspectiva da garantia da qualidade e seguranças das ações.

1. Estabelecimento de normas relativas aos insumos necessários para a prática da MTC/acupuntura com qualidade e segurança: agulhas filiformes descartáveis de tamanhos e calibres variados; moxa (carvão e/ou artemísia); esfera vegetal para acupuntura auricular; esfera metálica para acupuntura auricular; copos de ventosa; equipamento para eletroacupuntura; mapas de pontos de acupuntura.

2. Elaboração de Banco Nacional de Preços para esses produtos.

Diretriz MTCA 5

Desenvolvimento de ações de acompanhamento e avaliação para MTC/acupuntura.

Para o desenvolvimento de ações de acompanhamento e avaliação, deverão ser criados códigos de procedimentos, indicados a seguir, para que os indicadores possam ser compostos.

Serão contemplados para a criação dos códigos SAI/SUS para registro e financiamento dos procedimentos de acupuntura as categorias profissionais regulamentadas.

1. Inserção de códigos de procedimentos para informação e financiamento

- Sessão de Acupuntura com Inserção de Agulhas agulhamento seco em zonas neurorreativas de acupuntura (pontos de acupuntura)

Sessão de Acupuntura - outros procedimentos:

a) aplicação de ventosas - consiste em aplicar recipiente de vidro ou plástico, onde se gera vácuo, com a finalidade de estimular zonas neurorreativas (pontos de acupuntura);

b) eletroestimulação - consiste em aplicar estímulos elétricos determinados, de freqüência variável de 1 a 1000 Hz, de baixa voltagem e baixa amperagem em zonas neurorreativas (pontos de acupuntura); e

c) aplicação de laser de baixa potência em acupuntura - consiste em aplicar um estímulo produzido por emissor de laser de baixa potência (5 a 40 mW), em zona neurorreativa de acupuntura

1.1 Inserção nos códigos 04.011.03-1; 04.011.02-1; 0702101-1; 0702102-0, já existentes na tabela SIA/SUS, dos profissionais faltantes - para registro das ações de promoção da saúde em MTC/acupuntura.

2. Criação de códigos para registro de práticas corporais

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Considerando que a MTC contempla em suas atividades de atenção à saúde práticas corporais, deverão ser criados códigos específicos para as práticas corporais no SUS para registro da informação:

- práticas corporais desenvolvidas em grupo na unidade, a exemplo do Tai Chi Chuan, do Lian Gong, do Chi Gong, automassagem;

- práticas corporais desenvolvidas em grupo na comunidade, a exemplo do Tai Chi Chuan, do Lian Gong, do Chi gong; automassagem;

- práticas corporais individuais, a exemplo do Tuí-Na, da meditação, do Chi Gong; automassagem.

3. Avaliação dos serviços oferecidos

Estabelecimento de critérios para o acompanhamento da implementação e implantação da MTC/acupuntura, tais como: cobertura de consultas em acupuntura; taxa de procedimentos relacionados com a MTC/acupuntura; taxa de ações educativas relacionadas com a MTC/acupuntura; taxa de procedimentos relativos às práticas corporais - MTC/acupuntura, entre outros.

4. Acompanhamento da ação dos Estados no apoio à implantação desta Política Nacional.

Diretriz MTCA 6

Integração das ações da MTC/acupuntura com políticas de saúde afins.

Para tanto, deverá ser estabelecida integração com todas as áreas do MS, visando à construção de parcerias que propiciem o desenvolvimento integral das ações.

Diretriz MTCA 7

Incentivo à pesquisa com vistas a subsidiar a MTC/acupuntura no SUS como nicho estratégico da política de pesquisa no Sistema.

1. Incentivo a linhas de pesquisa em MTC/acupuntura que:

- aprimorem sua prática e avaliem sua efetividade, segurança e aspectos econômicos, num contexto pragmático, associado ou não a outros procedimentos e práticas complementares de saúde; experiências bem sucedidas (serviços e municípios);

- identifiquem técnicas e condutas mais eficazes, efetivas, seguras e eficientes para a resolução de problemas de saúde de uma dada população;

- apontem estratégias para otimização da efetividade do tratamento pela acupuntura e práticas complementares; e

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- estabelecer intercâmbio técnico-científico visando ao conhecimento e à troca de informações decorrentes das experiências no campo da formação, educação permanente e pesquisa com países onde a MTC/acupuntura esteja integrada ao serviço público de saúde.

Deverá ser observado, para o caso de pesquisas clínicas, o desenvolvimento de estudos que sigam as normas da CONEP/CNS.

Diretriz MTCA 8

Garantia de financiamento para as ações da MTC/acupuntura.

Para viabilizar o financiamento do modelo de atenção proposto, deverão ser adotadas medidas relativas:

- à inserção dos códigos de procedimentos com o objetivo de ampliar as informações sobre a MTC/ acupuntura no Sistema e promover o financiamento das intervenções realizadas;

- à garantia de um financiamento específico para divulgação e informação dos conhecimentos básicos da MTC/acupuntura para profissionais de saúde, gestores e usuários do SUS, considerando as metodologias participativas e o saber popular e tradicional.

Consideração: deverá ser realizada avaliação trimestral do incremento das ações realizadas a partir do primeiro ano, com vistas a ajustes no financiamento mediante desempenho e pactuação.

4.2. NA HOMEOPATIA

Premissa: desenvolvimento da Homeopatia em caráter multiprofissional, para as categorias profissionais presentes no SUS, e em consonância com o nível de atenção.

Diretriz H 1

Incorporação da homeopatia nos diferentes níveis de complexidade do Sistema, com ênfase na atenção básica, por meio de ações de prevenção de doenças e de promoção e recuperação da saúde.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. garantir as condições essenciais à boa prática em homeopatia, considerando suas peculiaridades técnicas, Infra-estrutura física adequada e insumos,

2. apoiar e fortalecer as iniciativas de atenção homeopática na atenção básica, obedecendo aos seguintes critérios:;

- priorizar mecanismos que garantam a inserção da atenção homeopática dentro da lógica de apoio, participação e co-responsabilização com as ESF;

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- na unidade de atenção básica prestar atendimento, de acordo com a demanda espontânea ou referenciada, aos usuários em todas as faixas etárias;

- no caso da unidade do Saúde da Família (SF) possuir um profissional homeopata como médico do Saúde da Família, a ele deve ser oportunizada a prática da homeopatia, sem prejuízo das atribuições pertinentes ao profissional da estratégia de saúde da família;

3. apoiar e fortalecer as iniciativas de atenção homeopática na atenção especializada:

- nos ambulatórios de especialidades ou nos centros de referência, prestar atendimento, de acordo com a demanda, aos usuários em todas as faixas etárias e prestar apoio técnico aos demais serviços da rede local;

- em emergências, unidades de terapia intensiva, centros de cuidados paliativos ou em enfermarias hospitalares a homeopatia pode ser incorporada de forma complementar e contribuir para a maior resolubilidade da atenção;

4. estabelecer critérios técnicos de organização e funcionamento da atenção homeopática em todos os níveis de complexidade, de modo a garantir a oferta de serviços seguros, efetivos e de qualidade, avaliando as iniciativas já existentes nas unidades federadas e com a participação das sociedades cientificas homeopáticas reconhecidas;

5. estabelecer intercâmbio técnico-científico visando ao conhecimento e à troca de informações relativas às experiências no campo da atenção homeopática com países onde a homeopatia esteja integrada ao serviço público de saúde.

Diretriz H 2

Garantia de financiamento capaz de assegurar o desenvolvimento do conjunto de atividades essenciais à boa prática em homeopatia, considerando as suas peculiaridades técnicas.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. criar mecanismos de financiamento que garantam o acesso aos insumos inerentes à prática da homeopatia:

- repertório homeopático e matéria médica homeopática em forma impressa e em software;

2. criar incentivo para a garantia de acesso a medicamentos homeopáticos na perspectiva de:

- incentivo a implantação e/ou à adequação de farmácias públicas de manipulação de medicamentos homeopáticos, com possibilidade de ampliação para fitoterápicos, que atendam a demanda e à realidade loco-regional, segundo critérios estabelecidos, e em conformidade com a legislação vigente;

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- estíimulo à implantação de projetos para produção de matrizes homeopáticas nos laboratórios oficiais visando ano fornecimento às farmácias de manipulação de medicamentos homeopáticos locais ou regionais;

3 - garantir mecanismos de financiamento para projetos e programas de formação e educação permanente, que assegurem a especialização e o aperfeiçoamento em homeopatia aos profissionais do SUS, mediante demanda loco-regional e pactuação nos Pólos de Educação Permanente em Saúde;

4 - para a estruturação física dos serviços o Ministério da Saúde dispõe anualmente de financiamento federal por meio de convênios a partir de projetos apresentados ao Fundo Nacional de Saúde, cabendo também aos Estados e aos municípios o co-financiamento para a estruturação dos serviços de atenção homeopática;

5 - garantir financiamento específico para divulgação e informação dos conhecimentos básicos da homeopatia para profissionais de saúde, gestores e usuários do SUS, considerando as metodologias participativas e o saber popular.

Consideração: deverá ser realizada avaliação periódica do incremento das ações realizadas a partir do primeiro ano, com vistas a ajustes no financiamento mediante desempenho e pactuação.

Diretriz H 3

Provimento do acesso ao usuário do SUS do medicamento homeopático prescrito, na perspectiva da ampliação da produção pública.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. inclusão da homeopatia na política de Assistência Farmacêutica das três esferas de gestão SUS;

2. contemplar, na legislação sanitária, Boas Práticas de Manipulação para farmácias com manipulação de homeopáticos que atendam as necessidades do SUS nesta área;

3. ampliar a oferta de medicamentos homeopáticos, por intermédio de farmácias publicas de manipulação que atendam à demanda e às necessidades locais, respeitando a legislação pertinente às necessidades do SUS na área e com ênfase na assistência farmacêutica;

- criar incentivo voltado à implantação ou à melhoria de farmácias públicas de manipulação de medicamentos homeopáticos (possibilidade de ampliação para fitoterápicos), com contrapartida do município e/ou do Estado para sua manutenção e segundo critérios pré-estabelecidos

- elaboração de Banco Nacional de Preços para os materiais de consumo necessários ao funcionamento da farmácia de manipulação para dar suporte ao processo de licitação realizado pelos Estados e municípios;

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4. incentivar a produção pelos laboratórios oficiais de:

- matrizes homeopáticas visando ao seu fornecimento às farmácias públicas de manipulação de medicamentos homeopáticos, estimulando parcerias com as Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde e baseando-se na lista de policrestos e semipolicrestos definida pela Farmacotécnica Homeopática Brasileira - 2ª edição de 1997;

- medicamentos homeopáticos pelos laboratórios oficiais, objetivando seu fornecimento aos Estados e aos municípios e segundo estudos de viabilidade econômica;

5. induzir e apoiar a iniciativa local na identificação dos medicamentos – formas farmacêuticas, escalas, dinamizações e métodos empregados – necessários e mais utilizados nos serviços de homeopatia já existentes, elaborando, a partir, uma relação de orientação para a produção dos medicamentos e para as unidades de saúde, sujeita à revisão periódica e atendendo à realidade local;

Diretriz H 4

Apoio a projetos de formação e de educação permanente, promovendo a qualidade técnica dos profissionais e consoante com os princípios da Política Nacional de Educação Permanente.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. promover a discussão da homeopatia na perspectiva da Educação Permanente em Saúde, por intermédio das instituições formadoras da área, dos usuários e dos profissionais de saúde homeopatas, visando à qualificação dos profissionais no SUS;

- articular, em consonância com os princípios e diretrizes estabelecidos para Educação Permanente em Saúde no SUS, a realização de diagnóstico acerca das dificuldades e das limitações atuais na prática clínica homeopática, no que se refere à formação e à necessidade de educação permanente dos profissionais homeopatas que atuam nos diversos níveis de complexidade do SUS, da atenção básica à atenção especializada;

2. Prover apoio técnico e financeiro ao desenvolvimento de projetos e programas de formação e educação permanente que assegurem a especialização e o aperfeiçoamento em homeopatia aos profissionais do SUS, considerando:

- a adoção de metodologias e formatos adequados às necessidades e às viabilidades locais e/ou loco-regionais, incluindo o ensino a distância e a formação em serviço;

- a pactuação de ações e iniciativas no campo da Educação Permanente em Saúde e que atenda à demanda loco-regional;

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3. elaborar material informativo com o objetivo de apoiar os gestores do SUS no desenvolvimento de projetos locais de formação e educação permanente dos profissionais homeopatas, observando: os princípios e diretrizes do SUS; as recomendações da Política de Educação Permanente; os critérios estabelecidos pelas instituições homeopáticas de representação nacional, em termos das habilidades e competências dos profissionais homeopatas; e as diretrizes desta política;

4. apoiar técnica e financeiramente a estruturação física da homeopatia nos centros de referência, com atribuições: na implementação de atividades de ensino em serviço (estágios, formação e educação permanente); no desenvolvimento de pesquisas em homeopatia de interesse para o SUS; na integração de atividades de assistência, ensino e pesquisa, em articulação com princípios e diretrizes estabelecidos para a Educação Permanente em Saúde no SUS;

5. promover a inclusão da racionalidade homeopática nos cursos de graduação e pós-graduação strictu e lato sensu para profissionais da área de saúde;

6. promover a discussão sobre a homeopatia no processo de modificação do ensino de graduação;

7. fomentar e apoiar junto ao Ministério da Educação projetos de residência em homeopatia;

8. fomentar e apoiar iniciativas de criação e manutenção de Fórum Virtual Permanente, permitindo um espaço de discussão acerca da formação/episteme homeopática e modelo de atenção, de modo a tornar disponíveis produções, experiências e documentos visando à implementação da atenção homeopática no SUS;

9. apoiar a realização de fóruns de homeopatia nas três esferas de governo, objetivando a discussão e a avaliação da implantação e implementação da homeopatia no SUS;

10. estabelecer intercâmbio técnico-científico visando ao conhecimento e à troca de informações decorrentes das experiências no campo da formação, da educação permanente e da pesquisa com países onde a homeopatia esteja integrada ao serviço público de saúde.

Diretriz H 5

Acompanhamento e avaliação da inserção e implementação da atenção homeopática no SUS.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. desenvolver instrumentos adequados de acompanhamento e avaliação da inserção e implementação da atenção homeopática no SUS, com ênfase no acompanhamento e na avaliação das dificuldades de inserção identificadas e sua

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superação; e na criação de mecanismos para coleta de dados que possibilitem estudos e pesquisas e que sirvam como instrumentos no processo de gestão;

2. acompanhar e avaliar os resultados dos protocolos de pesquisa nacionais implantados, com vistas à melhoria da atenção homeopática no SUS;

3. incluir no sistema de informação do SUS os procedimentos em homeopatia referente a atividade de educação e saúde na atenção básica para os profissionais de saúde de nível superior;

4. identificar o estabelecimento Farmácia de Manipulação Homeopática no cadastro de estabelecimentos de saúde

Diretriz H 6

Socializar informações sobre a homeopatia e as características da sua prática, adequando-as aos diversos grupos populacionais.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. incluir a homeopatia na agenda de atividades da comunicação social do SUS;

2. produzir materiais de divulgação, como cartazes, cartilhas, folhetos e vídeos, visando à promoção de ações de informação e divulgação da homeopatia, respeitando as especificidades regionais e culturais do País e direcionadas aos trabalhadores, aos gestores, dos conselheiros de saúde, bem como aos docentes e aos discentes da área de saúde e comunidade em geral;

3. apoiar e fortalecer ações inovadoras de informação e divulgação sobre homeopatia em diferentes linguagens culturais, tais como jogral, hip hop, teatro, canções, literatura de cordel e outras formas de manifestação;

4. identificar, articular e apoiar experiências de educação popular, informação e comunicação em homeopatia;

5. prover apoio técnico ou financeiro a projetos de qualificação de profissionais que atuam na estratégia Saúde da Família e Programa de Agentes Comunitários de Saúde, para atuação na área de informação, comunicação e educação popular em homeopatia, considerando a pactuação de ações e iniciativas de Educação Permanente em Saúde no SUS.

Diretriz H 7

Apoiar o desenvolvimento de estudos e pesquisas que avaliem a qualidade e aprimorem a atenção homeopática no SUS.

Para tanto, as medidas a serem adotadas buscarão:

1. incluir a homeopatia nas linhas de pesquisa do SUS;

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2. identificar e estabelecer rede de apoio, em parceria com instituições formadoras, associativas e representativas da homeopatia, universidades, faculdades e outros órgãos dos governos federal, estaduais e municipais, visando:

- ao fomento à pesquisa em homeopatia;

- à identificação de estudos e pesquisas relativos à homeopatia existentes no Brasil, com o objetivo de socializar, divulgar e embasar novas investigações;

- criar banco de dados de pesquisadores e pesquisas em homeopatia realizadas no Brasil, interligando-o com outros bancos de abrangência internacional;

3. identificar e divulgar as potenciais linhas de financiamento – Ministério da Ciência e Tecnologia, Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, terceiro setor e outros – para a pesquisa em homeopatia;

4. apoiar a realização de estudo sobre representações sociais, junto a usuários e profissionais de saúde sobre homeopatia;

5. priorizar as linhas de pesquisas em homeopatia a serem implementadas pelo SUS, em especial aquelas que contemplem a avaliação da eficácia, da eficiência e da efetividade da homeopatia, visando ao aprimoramento e à consolidação da atenção homeopática no SUS;

6. apoiar a criação e a implantação de protocolos para avaliação de efetividade, resolubilidade, eficiência e eficácia da ação da homeopatia nas endemias e epidemias;

7. acompanhar e avaliar os resultados dos protocolos de pesquisa nacionais implantados, com vistas à melhoria da atenção homeopática no SUS.

4.3. NAS PLANTAS MEDICINAIS E FITOTERAPIA

Diretriz PMF 1

Elaboração da Relação Nacional de Plantas Medicinais e da Relação Nacional de Fitoterápicos.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. realizar diagnóstico situacional das plantas medicinais e fitoterápicos utilizados em programas estaduais, municipais e outros relacionados ao tema;

2. estabelecer critérios para inclusão e exclusão de plantas medicinais e fitoterápicos nas Relações Nacionais, baseados nos conceitos de eficácia e segurança;

3. identificar as necessidades da maioria da população, a partir de dados epidemiológicos das doenças passíveis de serem tratadas com plantas medicinais e fitoterápicos;

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4. elaborar monografias padronizadas das plantas medicinais e fitoterápicos constantes nas Relações.

Diretriz PMF 2

Provimento do acesso a plantas medicinais e fitoterápicos aos usuários do SUS.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. tornar disponíveis plantas medicinais e/ou fitoterápicos nas unidades de saúde, de forma complementar, seja na estratégia de saúde da família, seja no modelo tradicional ou nas unidades de média e alta complexidade, utilizando um ou mais dos seguintes produtos: planta medicinal “in natura”, planta medicinal seca (droga vegetal), fitoterápico manipulado e fitoterápico industrializado.

1.1. Quando a opção for pelo fornecimento da planta medicinal “in natura”, deverão ser observados os seguintes critérios:

- fornecimento das espécies constantes na Relação Nacional de Plantas Medicinais;

- fornecimento do memento referente às espécies utilizadas;

- utilização das espécies identificadas botanicamente, cuja produção tenha a garantia das boas práticas de cultivo orgânico, preservando a qualidade do ar, do solo e da água;

- implantação e manutenção de hortos oficiais de espécies medicinais e/ou estimulando hortas e hortos comunitários reconhecidos junto a órgãos públicos, para o fornecimento das plantas.

1.2. Quando a opção for pelo fornecimento da planta seca (droga vegetal), deverão ser observados os seguintes critérios:

- fornecimento das espécies constantes na Relação Nacional de Plantas Medicinais;

- fornecimento do memento referente às espécies utilizadas;

- utilização das espécies identificadas botanicamente, cuja produção tenha a garantia das boas práticas de cultivo orgânico, preservando a qualidade do ar, do solo e da água;

- obtenção da matéria-prima vegetal, processada de acordo com as boas práticas, oriunda de hortos oficiais de espécies medicinais, de cooperativas, de associações de produtores, de extrativismo sustentável ou de outros, com alvará ou licença dos órgãos competentes para tal;

- oferta de local adequado para o armazenamento das drogas vegetais.

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1.3. Quando a opção for pelo fornecimento do fitoterápico manipulado, deverão ser observados os seguintes critérios:

- fornecimento do fitoterápico manipulado conforme memento associado à Relação Nacional de Plantas Medicinais e à legislação pertinente para atender as necessidades do SUS nesta área;

- utilização de matéria-prima vegetal, processada de acordo com às boas práticas, oriunda de hortos oficiais de espécies medicinais, de cooperativas, de associações de produtores, extrativismo sustentável ou de outros, com alvará ou licença de órgãos competente para tal;

- utilização dos derivados de matéria-prima vegetal, processados de acordo com as boas praticas de fabricação, oriundos de fornecedores com alvará ou licença dos órgãos competentes para tal;

- ampliação da oferta de fitoterápicos, por intermédio de farmácias públicas com manipulação de fitoterápicos, que atenda à demanda e às necessidades locais, respeitando a legislação pertinente às necessidades do SUS na área;

- elaboração de monografias sobre produtos oficinais (fitoterápicos) que poderão ser incluídos na farmacopéia brasileira;

- contemplar, na legislação sanitária, Boas Práticas de Manipulação para farmácias com manipulação de fitoterápicos que atendam às necessidades do SUS nesta área.

1.4. Quando a opção for pelo fornecimento do fitoterápico industrializado, deverão ser observados os seguintes critérios:

- fornecimento do produto conforme a Relação Nacional de Fitoterápicos;

- estímulo à produção de fitoterápicos, utilizando, prioritariamente, os laboratórios oficiais;

- fornecimento de fitoterápicos que atendam a legislação vigente;

- aquisição, armazenamento, distribuição e dispensação dos medicamentos aos usuários do SUS, conforme a organização dos serviços municipais de assistência farmacêutica.

Diretriz PMF 3

Formação e educação permanente dos profissionais de saúde em plantas medicinais e fitoterapia.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. definir localmente, em consonância com os princípios e diretrizes estabelecidos para a Educação Permanente em Saúde no SUS, a formação e

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educação permanente em plantas medicinais e fitoterapia para os profissionais que atuam nos serviços de saúde. A educação permanente de pessoas e equipes para o trabalho com plantas medicinais e fitoterápicos, dar-se-á nos níveis:

1.1. básico interdisciplinar comum a toda a equipe: contextualizando as Práticas Integrativas e Complementares, contemplando os cuidados gerais com as plantas medicinais e fitoterápicos.

1.2. específico para profissionais de saúde de nível universitário: detalhando os aspectos relacionados à manipulação, do uso e à prescrição das plantas medicinais e fitoterápicos.

1.3. específico para profissionais da área agronômica: detalhando os aspectos relacionados à cadeia produtiva de plantas medicinais.

2. estimular a elaboração de material didático e informativo visando apoiar os gestores do SUS no desenvolvimento de projetos locais de formação e educação permanente.

3. estimular estágios nos serviços de fitoterapia aos profissionais das equipes de saúde e aos estudantes dos cursos técnicos e de graduação.

4. estimular as universidades a inserir, nos cursos de graduação e pós-graduação envolvidos na área, disciplinas com conteúdo voltado às plantas medicinais e fitoterapia.

Diretriz PMF 4

Acompanhamento e avaliação da inserção e implementação das plantas medicinais e fitoterapia no SUS.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. desenvolver instrumentos de acompanhamento e avaliação;

2. monitorar as ações de implantação e implementação por meio dos dados gerados;

3. propor medidas de adequação das ações, subsidiando as decisões dos gestores a partir dos dados coletados;

4. identificar o estabelecimento Farmácia de Manipulação de Fitoterápicos no cadastro de estabelecimentos de saúde.

Diretriz PMF 5

Fortalecimento e ampliação da participação popular e do controle social.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

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1. resgatar e valorizar o conhecimento tradicional e promover a troca de informações entre grupos de usuários, detentores de conhecimento tradicional, pesquisadores, técnicos, trabalhadores em saúde e representantes da cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos;

2. estimular a participação de movimentos sociais com conhecimento do uso tradicional de plantas medicinais nos Conselhos de Saúde;

3. incluir os atores sociais na implantação e na implementação desta Política Nacional no SUS;

4. ampliar a discussão sobre a importância da preservação ambiental na cadeia produtiva;

5. estimular a participação popular na criação de hortos de espécies medicinais como apoio ao trabalho com a população, com vistas à geração de emprego e renda.

Diretriz PMF 6

Estabelecimento de política de financiamento para o desenvolvimento de ações voltadas à implantação das plantas medicinais e da fitoterapia no SUS.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. para a obtenção de plantas in natura – planejar, a partir da articulação entre as esferas de competência a implantação e a manutenção de hortos oficiais de espécies medicinais ou hortas e hortos comunitários reconhecidos junto a órgãos públicos, para o fornecimento das plantas;

2. para a obtenção de plantas secas – planejar, a partir da articulação entre as esferas de competência, a obtenção de matéria-prima vegetal, processada de acordo com as boas práticas, oriunda de hortos oficiais de espécies medicinais, cooperativas, associações de produtores, extrativismo sustentável ou outros, com alvará ou licença dos órgãos competentes para tal;

3. para a obtenção de fitoterápico manipulado – criar incentivo voltado à implantação ou à melhoria das farmácias públicas de manipulação de fitoterápicos, com possibilidade de ampliação para homeopáticos, com contrapartida do município e/ou do estado para sua manutenção e segundo critérios pré-estabelecidos e legislação pertinente para atender às necessidades do SUS nesta área;

4. para a obtenção de fitoterápico industrializado – incentivar a produção de fitoterápicos, utilizando, prioritariamente, os laboratórios oficiais, assim como criar incentivo para aquisição, armazenamento, distribuição e dispensação dos medicamentos aos usuários do SUS, conforme a organização dos serviços de assistência farmacêutica;

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5. para divulgação e informação dos conhecimentos básicos da fitoterapia para profissionais de saúde, gestores e usuários do SUS, considerando as metodologias participativas e o saber popular e tradicional - garantir financiamento específico.

Diretriz PMF 7

Incentivo à pesquisa e desenvolvimento de plantas medicinais e fitoterápicos, priorizando a biodiversidade do País.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. garantir linhas de financiamento nos Ministérios da Saúde, da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, do Meio Ambiente, da Ciência e Tecnologia, nas Fundações de Amparo à Pesquisa, na Organização Mundial da Saúde/ Organização Pan-Americana da Saúde (OMS/Opas), para pesquisas sobre os itens da Relação de Plantas Medicinais com Potencial de Utilização no SUS e para estímulo à produção nacional, visando assegurar o fornecimento regular ao mercado interno;

2. incorporar à Relação de Plantas Medicinais com Potencial de Utilização para o SUS na Agenda Nacional de Prioridades em Pesquisa e Saúde;

3. estimular linhas de pesquisa em fitoterapia nos cursos de pós-graduação strictu sensu junto às universidades e aos institutos de pesquisa;

4. incentivar a realização e a aplicação de protocolos para o desenvolvimento de pesquisa em fitoterapia, relacionada aos aspectos epidemiológicos, clínicos e da assistência farmacêutica;

5. promover pesquisa e desenvolvimento tecnológico, com base no uso tradicional das plantas medicinais, priorizando as necessidades epidemiológicas da população, com ênfase nas espécies nativas e naquelas que estão sendo utilizadas no setor público e nas organizações dos movimentos sociais;

6. garantir recursos para apoio e desenvolvimento de centros de pesquisas clínicas na área da fitoterapia;

7. incentivar o desenvolvimento de estudos de farmacovigilância e farmacoepidemiologia;

8. - implantar bancos de dados dos programas de fitoterapia, das instituições de pesquisas, dos pesquisadores e dos resultados de pesquisas com plantas medicinais e fitoterápicos.

Diretriz PMF 8

Promoção do uso racional de plantas medicinais e dos fitoterápicos no SUS.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. divulgar as Relações Nacionais de Plantas Medicinais e de Fitoterápicos;

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2. garantir o suporte técnico em todas as etapas de implantação e implementação da fitoterapia;

3. envolver os gestores do SUS no desenvolvimento das ações de comunicação e divulgação, oferecendo os meios necessários (conteúdos, financiamento e metodologias, entre outros);

4. desenvolver campanhas educativas buscando a participação dos profissionais de saúde com vistas ao uso racional;

5. desenvolver ações de informação e divulgação aos usuários do SUS, por meio de cartazes, cartilhas, folhetos, vídeos, entre outros, respeitando as especificidades regionais e culturais do País;

6. incluir a fitoterapia na agenda de atividades da comunicação social do SUS;

7. desenvolver ações de farmacoepidemiologia e farmacovigilância;

8. identificar, articular e apoiar experiências de educação popular, informação e comunicação em fitoterapia.

Diretriz PMF 9

Garantia do monitoramento da qualidade dos fitoterápicos pelo Sistema Nacional de Vigilância Sanitária.

Para tanto, deverão ser adotadas medidas que possibilitem:

1. financiamento aos laboratórios oficiais de controle de qualidade;

2. implantação/inserção de sistema de informação sobre o uso, os efeitos e a qualidade destes medicamentos;

3. formação dos profissionais de Vigilância Sanitária para o monitoramento da qualidade destes medicamentos;

4. apoio aos serviços de vigilância sanitária para o desempenho neste campo.

4.4. NO TERMALISMO SOCIAL/CRENOTERAPIA

Diretriz TSC 1

Incentivo à criação de Observatórios de Saúde onde atualmente são desenvolvidas experiências em Termalismo Social, no âmbito do SUS

Para tanto, as medidas a serem empreendidas buscarão:

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1. instituir, mediante termos de cooperação técnica bipartite ou tripartite, observatório das experiências consolidadas no termalismo social, acompanhando sua inserção no SUS local;

2. desenvolver ações de acompanhamento e avaliação das práticas de termalismo/crenoterapia desenvolvidas nos serviços;

3. apoiar as iniciativas de divulgação e capacitação para ações referentes ao termalismo social/crenoterapia no SUS;

4. estimular a interlocução entre as esferas de governo e a sociedade civil visando à implantação de Projetos Piloto de termalismo nos Estados e nos municípios que possuem fontes de água mineral com potencial terapêutico;

5. estimular as esferas governamentais para realização de análises físico-químicas periódicas das águas minerais;

6. apoiar estudos e pesquisas sobre a utilização terapêutica das águas minerais;

7. Elaborar e publicar material informativo sobre os resultados dos Observatórios de Saúde.

5. RESPONSABILIDADES INSTITUCIONAIS

5.1. GESTOR FEDERAL

- Elaborar normas técnicas para inserção das Práticas Integrativas e Complementares no SUS.

- Definir recursos orçamentários e financeiros para a implementação desta Política, considerando a composição tripartite.

- Estimular pesquisas nas áreas de interesse, em especial aquelas consideradas estratégicas para formação e desenvolvimento tecnológico para as Práticas Integrativas e Complementares.

- Estabelecer diretrizes para a educação permanente em Práticas Integrativas e Complementares.

- Manter articulação com os estados para apoio à implantação e supervisão das ações.

- Promover articulação intersetorial para a efetivação desta Política Nacional.

- Estabelecer instrumentos e indicadores para o acompanhamento e avaliação do impacto da implantação/implementação desta Política.

- Divulgar a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS.

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- Garantir a especificidade da assistência farmacêutica em homeopatia e fitoterapia para o SUS na regulamentação sanitária.

- Elaborar e revisar periodicamente a Relação Nacional de Plantas Medicinais, a Relação de Plantas Medicinais com Potencial de Utilização no SUS e a Relação Nacional de Fitoterápicos (esta última, segundo os critérios da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais/Rename).

- Estabelecer critérios para inclusão e exclusão de plantas medicinais e medicamentos fitoterápicos nas Relações Nacionais.

- Elaborar e atualizar periodicamente as monografias de plantas medicinais, priorizando as espécies medicinais nativas nos moldes daquelas formuladas pela OMS.

- Elaborar mementos associados à Relação Nacional de Plantas Medicinais e de Fitoterápicos.

- Estabelecer normas relativas ao uso de plantas medicinais e fitoterápicos nas ações de atenção à saúde no SUS.

- Fortalecer o Sistema de Farmacovigilância Nacional, incluindo ações relacionadas às plantas medicinais, fitoterápicos e medicamentos homeopáticos.

- Implantar um banco de dados dos serviços de Práticas Integrativas e Complementares no SUS, das instituições de ensino e pesquisa, assim como de pesquisadores e resultados das pesquisas cientificas em Práticas Integrativas e Complementares.

- Criação de Banco Nacional de Preços para os insumos das Práticas Integrativas e Complementares pertinentes, para orientação aos estados e aos municípios.

5.2. GESTOR ESTADUAL

- Elaborar normas técnicas para inserção das Práticas Integrativas e Complementares na rede de saúde.

- Definir recursos orçamentários e financeiros para a implementação desta Política, considerando a composição tripartite.

- Promover articulação intersetorial para a efetivação da Política.

- Implementar as diretrizes da educação permanente em consonância com a realidade loco-regional.

- Estabelecer instrumentos e indicadores para o acompanhamento e a avaliação do impacto da implantação/implementação desta Política.

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- Manter articulação com municípios para apoio à implantação e à supervisão das ações.

- Divulgar a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS.

- Acompanhar e coordenar a assistência farmacêutica com plantas medicinais, fitoterápicos e medicamentos homeopáticos.

- Exercer a vigilância sanitária no tocante as Práticas Integrativas e Complementares e ações decorrentes, bem como incentivar o desenvolvimento de estudos de farmacovigilância e farmacoepidemiologia, com especial atenção às plantas medicinais e aos fitoterápicos, no seu âmbito de atuação.

- Apresentar e aprovar proposta de inclusão das Práticas Integrativas e Complementares no Conselho Estadual de Saúde.

5.3. GESTOR MUNICIPAL

- Elaborar normas técnicas para inserção das Práticas Integrativas e Complementares na rede municipal de saúde .

- Definir recursos orçamentários e financeiros para a implementação desta Política, considerando a composição tripartite.

- Promover articulação intersetorial para a efetivação da Política.

- Estabelecer mecanismos para a qualificação dos profissionais do sistema local de saúde.

- Estabelecer instrumentos de gestão e indicadores para o acompanhamento e a avaliação do impacto da implantação/implementação da Política.

- Divulgar a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS.

- Realizar assistência farmacêutica com plantas medicinais, fitoterápicos e homeopáticos, bem como a vigilância sanitária no tocante a esta Política e suas ações decorrentes na sua jurisdição.

- Apresentar e aprovar proposta de inclusão das Práticas Integrativas e Complementares no Conselho Municipal de Saúde.

- Exercer a vigilância sanitária no tocante as Práticas Integrativas e Complementares e às ações decorrentes, bem como incentivar o desenvolvimento de estudos de farmacovigilância e farmacoepidemiologia, com especial atenção às plantas medicinais e aos fitoterápicos, no seu âmbito de atuação.

Fonte: PORTARIA Nº 971, DE 03 DE MAIO DE 2006. Biblioteca Virtual Em Saúde.

Ministério da Saúde. Disponível em:

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<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt0971_03_05_2006.html>

Acesso em abril de 2012.