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Universidade Federal do Paraacute
Instituto Amazocircnico de Agriculturas Familiares
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuaacuteria ndash Embrapa Amazocircnia Oriental
Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Agriculturas Amazocircnicas
Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel
Luciana Moreira dos Reis
Empoderamento de mulheres no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
de Marabaacute (PA)
Beleacutem
2018
Luciana Moreira dos Reis
Empoderamento de mulheres no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
de Marabaacute (PA)
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Agriculturas Amazocircnicas na
Aacuterea de Concentraccedilatildeo Interdisciplinar da
Universidade Federal do Paraacute ndash UFPA e
Embrapa Amazocircnia Oriental como parte dos
requisitos para obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
em Agriculturas Familiares e
Desenvolvimento Sustentaacutevel
Aacuterea de concentraccedilatildeo Agriculturas Familiares
e Desenvolvimento Sustentaacutevel
Orientador Prof Dr Gutemberg Armando
Diniz Guerra
Beleacutem
2018
Agrave Raimundinha Solino (em memoacuteria)
Em nome de toda mulher trabalhadora rural
Agrave Beta Moreira (em memoacuteria)
Ao Ademir Martins
Ao Victor Martins
Ao Mauro Silva
DEDICO
AGRADECIMENTOS
Agradeccedilo a Deus inteligecircncia suprema causa primaacuteria de todas as coisas
Agradeccedilo a Jesus tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e de
modelo
Agradeccedilo agrave Espiritualidade Superior que sempre me acompanhou ao longo da minha vida
intuindo-me e iluminando-me
Agradeccedilo a minha matildee querida Beta Moreira (em memoacuteria) por todos os ensinamentos que
recebi e por ter me incentivado a fazer o mestrado do NEAF em 2004 Um sonho meu antigo
que ficou adormecido por longos anos E que agora finalmente consegui realizar recebendo
os essenciais incentivos espirituais dela de algum lugar de onde agora vive Minha matildee foi
citada em diversas entrevistas que realizei como uma das protagonistas da histoacuteria de luta das
mulheres de Marabaacute bem como aparece na dissertaccedilatildeo atraveacutes da Comenda ldquoBeta Moreirardquo
Agradeccedilo a meu pai Ademir Martins dos Reis importante poliacutetico do sudeste paraense por
todos os ensinamentos que recebi e que tambeacutem foi citado nas entrevistas como militante da
luta por uma sociedade mais justa e igualitaacuteria tendo inclusive participado da reuniatildeo de
fundaccedilatildeo do sindicato pesquisado
Agradeccedilo aos familiares que colaboraram para que a pesquisa fosse realizada irmatilde Rita
irmatildeo Ademirzinho avoacute Deolinda avocirc Edeacutezio (em memoacuteria) avoacute Izabel avocirc Albertino (em
memoacuteria) tias Ana Cleide Isabel Ilce Cida Lurde Maria Claacuteudia Dioacute Conceiccedilatildeo Adeacute
tios Haroldo Albertino Junior Valdez Pedro e Steacutelio prima Juliana e demais familiares
Agradeccedilo agraves trabalhadoras e trabalhadores da Sociedade Espiacuterita Renascer (Marabaacute) e do
Grupo de Pais da Instituiccedilatildeo Assistencial Espiacuterita Lar de Maria (Beleacutem) Em especial agrave
Marluce Guta Cynthia Carlos Patriacutecia Felix Junior Pedro Leite e Gesson
Agradeccedilo agraves(os) amigas(os) queridas(os) Joelma Joseacute da Cruz Matheus Olga Beatriz dona
Maria Nilde Geny Maira Gaia Waldileacuteia Amaral e Manuel Amaral
Agradeccedilo agrave Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute ndash EMATER
PARAacute por me liberar oficialmente para cursar o mestrado bem como agraves(os) seguintes
colegas de trabalho Franceli Genival Leiva Leacutelia Iale Zeacutelia Glauco Nelson Jean
Francisca Cristoacutevatildeo Jonas Damiatildeo Carlos Eduardo William Guimaratildees Franccedila Rosacircngela
Barros Estela Palmeira Paulo Lobato Rosival e Paulo Pedroso
Agradeccedilo ao meu querido orientador Gutemberg Armando Diniz Guerra por sua
competecircncia sabedoria e paciecircncia nesse processo de construccedilatildeo da dissertaccedilatildeo Obrigada
por compreender e respeitar o meu tempo o que incluiu mergulhar nas minhas memoacuterias
familiares mais profundas Obrigada pelas maravilhosas disciplinas ldquoNatureza agricultura e
artesrdquo e ldquoOrganizaccedilotildees camponesas e patronais no meio rural brasileirordquo Obrigada tambeacutem
pelos momentos em Cuiarana no Alto dos Pinheiros e no Lolicas
Agradeccedilo agrave Universidade Federal do Paraacute agraves(os) servidoras(es) do INEAF ao corpo docente
do PPGAA aos colegas da turma MAFDS 2016 em especial agrave Alciene e ao Hueliton
Agradeccedilo agrave professora Maria Angeacutelica Motta-Maueacutes por me acolher nos Seminaacuterios Angel e
por todo o aprendizado que adquiri com o ldquomiuacutedordquo da Antropologia bem como agradeccedilo agraves
colegas maravilhosas dos Seminaacuterios Angel
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso por tambeacutem me acolher nos Estudos de
Gecircnero disciplina fundamental para ampliar minha mente e colaborar na construccedilatildeo da minha
maturidade acadecircmica
Agradeccedilo agrave professora Maria Luzia Miranda Aacutelvares coordenadora do Grupo de Estudos e
Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulher e Relaccedilotildees de Gecircnero ndash GEPEMUFPA por ser um exemplo
de vida Obrigada por tudo que aprendi em cada evento que participei organizado pelo GEPEM
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso e ao professor William Santos de Assis por
participarem da banca de qualificaccedilatildeo e de defesa final da dissertaccedilatildeo Na banca de
qualificaccedilatildeo forneceram aportes valiosos que colaboraram para definir o rumo a seguir
Agradeccedilo agrave professora Angela May Steward por aceitar participar das bancas (qualificaccedilatildeo e
defesa final) na condiccedilatildeo de suplente
Agradeccedilo agraves integrantes do GT de Gecircnero da ABA (Associaccedilatildeo Brasileira de Agroecologia) pelos
debates que participei no IX CBA (Beleacutem-PA) e no X CBA (Brasiacutelia-DF)
Agradeccedilo agrave professora Emma Siliprandi pelo estiacutemulo que recebi na oportunidade que tive de
conhececirc-la pessoalmente
Agradeccedilo aos familiares de Miriam Chaves em especial agrave Kelvia Chaves e agrave Glaacuteucia Chaves
Agradeccedilo a todas as lideranccedilas (poliacuteticas acadecircmicas e de movimentos sociais) que
gentilmente colaboraram com a pesquisa atraveacutes da disponibilidade de serem entrevistadas
Agradeccedilo agrave diretoria atual do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras
Familiares do Municiacutepio de Marabaacute (PA) bem como agraves(aos) dirigentes de gestotildees anteriores
em especial agraves guerreiras Dijeacute e Marta
Agradeccedilo ao meu filho Victor Martins por ser ldquoum cara altamente concentradordquo e por
colaborar diariamente no meu processo de evoluccedilatildeo Ah tambeacutem agradeccedilo a ele por ter
compreendido que precisariacuteamos nos mudar de Marabaacute para Beleacutem para que eu pudesse
cursar o mestrado Muito obrigada
Para concluir agradeccedilo ao meu marido Luis Mauro Santos Silva por sempre acreditar em
mim por seu amor diaacuterio e por suas preciosas dicas acadecircmicas
Sem Medo de Ser Mulher
Zeacute Pinto
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Por que a luta natildeo eacute soacute dos companheiros
Participando sem medo de ser mulher
Pisando firme sem medir nenhum segredo
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Pois sem mulher a luta vai pela metade
Participando sem medo de ser mulher
Fortalecendo os movimentos populares
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Na alianccedila operaacuteria camponesa
Participando sem medo de ser mulher
Pois a vitoacuteria vai ser nossa com certeza
Participando sem medo de ser mulher
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
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deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
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dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
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mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
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43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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Justiccedila do Estado do Paraacute ndash Beleacutem 2012
87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
Luciana Moreira dos Reis
Empoderamento de mulheres no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
de Marabaacute (PA)
Dissertaccedilatildeo apresentada ao Programa de Poacutes-
Graduaccedilatildeo em Agriculturas Amazocircnicas na
Aacuterea de Concentraccedilatildeo Interdisciplinar da
Universidade Federal do Paraacute ndash UFPA e
Embrapa Amazocircnia Oriental como parte dos
requisitos para obtenccedilatildeo do tiacutetulo de Mestre
em Agriculturas Familiares e
Desenvolvimento Sustentaacutevel
Aacuterea de concentraccedilatildeo Agriculturas Familiares
e Desenvolvimento Sustentaacutevel
Orientador Prof Dr Gutemberg Armando
Diniz Guerra
Beleacutem
2018
Agrave Raimundinha Solino (em memoacuteria)
Em nome de toda mulher trabalhadora rural
Agrave Beta Moreira (em memoacuteria)
Ao Ademir Martins
Ao Victor Martins
Ao Mauro Silva
DEDICO
AGRADECIMENTOS
Agradeccedilo a Deus inteligecircncia suprema causa primaacuteria de todas as coisas
Agradeccedilo a Jesus tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e de
modelo
Agradeccedilo agrave Espiritualidade Superior que sempre me acompanhou ao longo da minha vida
intuindo-me e iluminando-me
Agradeccedilo a minha matildee querida Beta Moreira (em memoacuteria) por todos os ensinamentos que
recebi e por ter me incentivado a fazer o mestrado do NEAF em 2004 Um sonho meu antigo
que ficou adormecido por longos anos E que agora finalmente consegui realizar recebendo
os essenciais incentivos espirituais dela de algum lugar de onde agora vive Minha matildee foi
citada em diversas entrevistas que realizei como uma das protagonistas da histoacuteria de luta das
mulheres de Marabaacute bem como aparece na dissertaccedilatildeo atraveacutes da Comenda ldquoBeta Moreirardquo
Agradeccedilo a meu pai Ademir Martins dos Reis importante poliacutetico do sudeste paraense por
todos os ensinamentos que recebi e que tambeacutem foi citado nas entrevistas como militante da
luta por uma sociedade mais justa e igualitaacuteria tendo inclusive participado da reuniatildeo de
fundaccedilatildeo do sindicato pesquisado
Agradeccedilo aos familiares que colaboraram para que a pesquisa fosse realizada irmatilde Rita
irmatildeo Ademirzinho avoacute Deolinda avocirc Edeacutezio (em memoacuteria) avoacute Izabel avocirc Albertino (em
memoacuteria) tias Ana Cleide Isabel Ilce Cida Lurde Maria Claacuteudia Dioacute Conceiccedilatildeo Adeacute
tios Haroldo Albertino Junior Valdez Pedro e Steacutelio prima Juliana e demais familiares
Agradeccedilo agraves trabalhadoras e trabalhadores da Sociedade Espiacuterita Renascer (Marabaacute) e do
Grupo de Pais da Instituiccedilatildeo Assistencial Espiacuterita Lar de Maria (Beleacutem) Em especial agrave
Marluce Guta Cynthia Carlos Patriacutecia Felix Junior Pedro Leite e Gesson
Agradeccedilo agraves(os) amigas(os) queridas(os) Joelma Joseacute da Cruz Matheus Olga Beatriz dona
Maria Nilde Geny Maira Gaia Waldileacuteia Amaral e Manuel Amaral
Agradeccedilo agrave Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute ndash EMATER
PARAacute por me liberar oficialmente para cursar o mestrado bem como agraves(os) seguintes
colegas de trabalho Franceli Genival Leiva Leacutelia Iale Zeacutelia Glauco Nelson Jean
Francisca Cristoacutevatildeo Jonas Damiatildeo Carlos Eduardo William Guimaratildees Franccedila Rosacircngela
Barros Estela Palmeira Paulo Lobato Rosival e Paulo Pedroso
Agradeccedilo ao meu querido orientador Gutemberg Armando Diniz Guerra por sua
competecircncia sabedoria e paciecircncia nesse processo de construccedilatildeo da dissertaccedilatildeo Obrigada
por compreender e respeitar o meu tempo o que incluiu mergulhar nas minhas memoacuterias
familiares mais profundas Obrigada pelas maravilhosas disciplinas ldquoNatureza agricultura e
artesrdquo e ldquoOrganizaccedilotildees camponesas e patronais no meio rural brasileirordquo Obrigada tambeacutem
pelos momentos em Cuiarana no Alto dos Pinheiros e no Lolicas
Agradeccedilo agrave Universidade Federal do Paraacute agraves(os) servidoras(es) do INEAF ao corpo docente
do PPGAA aos colegas da turma MAFDS 2016 em especial agrave Alciene e ao Hueliton
Agradeccedilo agrave professora Maria Angeacutelica Motta-Maueacutes por me acolher nos Seminaacuterios Angel e
por todo o aprendizado que adquiri com o ldquomiuacutedordquo da Antropologia bem como agradeccedilo agraves
colegas maravilhosas dos Seminaacuterios Angel
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso por tambeacutem me acolher nos Estudos de
Gecircnero disciplina fundamental para ampliar minha mente e colaborar na construccedilatildeo da minha
maturidade acadecircmica
Agradeccedilo agrave professora Maria Luzia Miranda Aacutelvares coordenadora do Grupo de Estudos e
Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulher e Relaccedilotildees de Gecircnero ndash GEPEMUFPA por ser um exemplo
de vida Obrigada por tudo que aprendi em cada evento que participei organizado pelo GEPEM
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso e ao professor William Santos de Assis por
participarem da banca de qualificaccedilatildeo e de defesa final da dissertaccedilatildeo Na banca de
qualificaccedilatildeo forneceram aportes valiosos que colaboraram para definir o rumo a seguir
Agradeccedilo agrave professora Angela May Steward por aceitar participar das bancas (qualificaccedilatildeo e
defesa final) na condiccedilatildeo de suplente
Agradeccedilo agraves integrantes do GT de Gecircnero da ABA (Associaccedilatildeo Brasileira de Agroecologia) pelos
debates que participei no IX CBA (Beleacutem-PA) e no X CBA (Brasiacutelia-DF)
Agradeccedilo agrave professora Emma Siliprandi pelo estiacutemulo que recebi na oportunidade que tive de
conhececirc-la pessoalmente
Agradeccedilo aos familiares de Miriam Chaves em especial agrave Kelvia Chaves e agrave Glaacuteucia Chaves
Agradeccedilo a todas as lideranccedilas (poliacuteticas acadecircmicas e de movimentos sociais) que
gentilmente colaboraram com a pesquisa atraveacutes da disponibilidade de serem entrevistadas
Agradeccedilo agrave diretoria atual do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras
Familiares do Municiacutepio de Marabaacute (PA) bem como agraves(aos) dirigentes de gestotildees anteriores
em especial agraves guerreiras Dijeacute e Marta
Agradeccedilo ao meu filho Victor Martins por ser ldquoum cara altamente concentradordquo e por
colaborar diariamente no meu processo de evoluccedilatildeo Ah tambeacutem agradeccedilo a ele por ter
compreendido que precisariacuteamos nos mudar de Marabaacute para Beleacutem para que eu pudesse
cursar o mestrado Muito obrigada
Para concluir agradeccedilo ao meu marido Luis Mauro Santos Silva por sempre acreditar em
mim por seu amor diaacuterio e por suas preciosas dicas acadecircmicas
Sem Medo de Ser Mulher
Zeacute Pinto
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Por que a luta natildeo eacute soacute dos companheiros
Participando sem medo de ser mulher
Pisando firme sem medir nenhum segredo
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Pois sem mulher a luta vai pela metade
Participando sem medo de ser mulher
Fortalecendo os movimentos populares
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Na alianccedila operaacuteria camponesa
Participando sem medo de ser mulher
Pois a vitoacuteria vai ser nossa com certeza
Participando sem medo de ser mulher
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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das Mulheres em Situaccedilatildeo de Violecircncia Domeacutestica e Familiar no acircmbito do Tribunal de
Justiccedila do Estado do Paraacute ndash Beleacutem 2012
87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
Agrave Raimundinha Solino (em memoacuteria)
Em nome de toda mulher trabalhadora rural
Agrave Beta Moreira (em memoacuteria)
Ao Ademir Martins
Ao Victor Martins
Ao Mauro Silva
DEDICO
AGRADECIMENTOS
Agradeccedilo a Deus inteligecircncia suprema causa primaacuteria de todas as coisas
Agradeccedilo a Jesus tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e de
modelo
Agradeccedilo agrave Espiritualidade Superior que sempre me acompanhou ao longo da minha vida
intuindo-me e iluminando-me
Agradeccedilo a minha matildee querida Beta Moreira (em memoacuteria) por todos os ensinamentos que
recebi e por ter me incentivado a fazer o mestrado do NEAF em 2004 Um sonho meu antigo
que ficou adormecido por longos anos E que agora finalmente consegui realizar recebendo
os essenciais incentivos espirituais dela de algum lugar de onde agora vive Minha matildee foi
citada em diversas entrevistas que realizei como uma das protagonistas da histoacuteria de luta das
mulheres de Marabaacute bem como aparece na dissertaccedilatildeo atraveacutes da Comenda ldquoBeta Moreirardquo
Agradeccedilo a meu pai Ademir Martins dos Reis importante poliacutetico do sudeste paraense por
todos os ensinamentos que recebi e que tambeacutem foi citado nas entrevistas como militante da
luta por uma sociedade mais justa e igualitaacuteria tendo inclusive participado da reuniatildeo de
fundaccedilatildeo do sindicato pesquisado
Agradeccedilo aos familiares que colaboraram para que a pesquisa fosse realizada irmatilde Rita
irmatildeo Ademirzinho avoacute Deolinda avocirc Edeacutezio (em memoacuteria) avoacute Izabel avocirc Albertino (em
memoacuteria) tias Ana Cleide Isabel Ilce Cida Lurde Maria Claacuteudia Dioacute Conceiccedilatildeo Adeacute
tios Haroldo Albertino Junior Valdez Pedro e Steacutelio prima Juliana e demais familiares
Agradeccedilo agraves trabalhadoras e trabalhadores da Sociedade Espiacuterita Renascer (Marabaacute) e do
Grupo de Pais da Instituiccedilatildeo Assistencial Espiacuterita Lar de Maria (Beleacutem) Em especial agrave
Marluce Guta Cynthia Carlos Patriacutecia Felix Junior Pedro Leite e Gesson
Agradeccedilo agraves(os) amigas(os) queridas(os) Joelma Joseacute da Cruz Matheus Olga Beatriz dona
Maria Nilde Geny Maira Gaia Waldileacuteia Amaral e Manuel Amaral
Agradeccedilo agrave Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute ndash EMATER
PARAacute por me liberar oficialmente para cursar o mestrado bem como agraves(os) seguintes
colegas de trabalho Franceli Genival Leiva Leacutelia Iale Zeacutelia Glauco Nelson Jean
Francisca Cristoacutevatildeo Jonas Damiatildeo Carlos Eduardo William Guimaratildees Franccedila Rosacircngela
Barros Estela Palmeira Paulo Lobato Rosival e Paulo Pedroso
Agradeccedilo ao meu querido orientador Gutemberg Armando Diniz Guerra por sua
competecircncia sabedoria e paciecircncia nesse processo de construccedilatildeo da dissertaccedilatildeo Obrigada
por compreender e respeitar o meu tempo o que incluiu mergulhar nas minhas memoacuterias
familiares mais profundas Obrigada pelas maravilhosas disciplinas ldquoNatureza agricultura e
artesrdquo e ldquoOrganizaccedilotildees camponesas e patronais no meio rural brasileirordquo Obrigada tambeacutem
pelos momentos em Cuiarana no Alto dos Pinheiros e no Lolicas
Agradeccedilo agrave Universidade Federal do Paraacute agraves(os) servidoras(es) do INEAF ao corpo docente
do PPGAA aos colegas da turma MAFDS 2016 em especial agrave Alciene e ao Hueliton
Agradeccedilo agrave professora Maria Angeacutelica Motta-Maueacutes por me acolher nos Seminaacuterios Angel e
por todo o aprendizado que adquiri com o ldquomiuacutedordquo da Antropologia bem como agradeccedilo agraves
colegas maravilhosas dos Seminaacuterios Angel
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso por tambeacutem me acolher nos Estudos de
Gecircnero disciplina fundamental para ampliar minha mente e colaborar na construccedilatildeo da minha
maturidade acadecircmica
Agradeccedilo agrave professora Maria Luzia Miranda Aacutelvares coordenadora do Grupo de Estudos e
Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulher e Relaccedilotildees de Gecircnero ndash GEPEMUFPA por ser um exemplo
de vida Obrigada por tudo que aprendi em cada evento que participei organizado pelo GEPEM
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso e ao professor William Santos de Assis por
participarem da banca de qualificaccedilatildeo e de defesa final da dissertaccedilatildeo Na banca de
qualificaccedilatildeo forneceram aportes valiosos que colaboraram para definir o rumo a seguir
Agradeccedilo agrave professora Angela May Steward por aceitar participar das bancas (qualificaccedilatildeo e
defesa final) na condiccedilatildeo de suplente
Agradeccedilo agraves integrantes do GT de Gecircnero da ABA (Associaccedilatildeo Brasileira de Agroecologia) pelos
debates que participei no IX CBA (Beleacutem-PA) e no X CBA (Brasiacutelia-DF)
Agradeccedilo agrave professora Emma Siliprandi pelo estiacutemulo que recebi na oportunidade que tive de
conhececirc-la pessoalmente
Agradeccedilo aos familiares de Miriam Chaves em especial agrave Kelvia Chaves e agrave Glaacuteucia Chaves
Agradeccedilo a todas as lideranccedilas (poliacuteticas acadecircmicas e de movimentos sociais) que
gentilmente colaboraram com a pesquisa atraveacutes da disponibilidade de serem entrevistadas
Agradeccedilo agrave diretoria atual do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras
Familiares do Municiacutepio de Marabaacute (PA) bem como agraves(aos) dirigentes de gestotildees anteriores
em especial agraves guerreiras Dijeacute e Marta
Agradeccedilo ao meu filho Victor Martins por ser ldquoum cara altamente concentradordquo e por
colaborar diariamente no meu processo de evoluccedilatildeo Ah tambeacutem agradeccedilo a ele por ter
compreendido que precisariacuteamos nos mudar de Marabaacute para Beleacutem para que eu pudesse
cursar o mestrado Muito obrigada
Para concluir agradeccedilo ao meu marido Luis Mauro Santos Silva por sempre acreditar em
mim por seu amor diaacuterio e por suas preciosas dicas acadecircmicas
Sem Medo de Ser Mulher
Zeacute Pinto
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Por que a luta natildeo eacute soacute dos companheiros
Participando sem medo de ser mulher
Pisando firme sem medir nenhum segredo
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Pois sem mulher a luta vai pela metade
Participando sem medo de ser mulher
Fortalecendo os movimentos populares
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Na alianccedila operaacuteria camponesa
Participando sem medo de ser mulher
Pois a vitoacuteria vai ser nossa com certeza
Participando sem medo de ser mulher
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
AGRADECIMENTOS
Agradeccedilo a Deus inteligecircncia suprema causa primaacuteria de todas as coisas
Agradeccedilo a Jesus tipo mais perfeito que Deus ofereceu ao homem para lhe servir de guia e de
modelo
Agradeccedilo agrave Espiritualidade Superior que sempre me acompanhou ao longo da minha vida
intuindo-me e iluminando-me
Agradeccedilo a minha matildee querida Beta Moreira (em memoacuteria) por todos os ensinamentos que
recebi e por ter me incentivado a fazer o mestrado do NEAF em 2004 Um sonho meu antigo
que ficou adormecido por longos anos E que agora finalmente consegui realizar recebendo
os essenciais incentivos espirituais dela de algum lugar de onde agora vive Minha matildee foi
citada em diversas entrevistas que realizei como uma das protagonistas da histoacuteria de luta das
mulheres de Marabaacute bem como aparece na dissertaccedilatildeo atraveacutes da Comenda ldquoBeta Moreirardquo
Agradeccedilo a meu pai Ademir Martins dos Reis importante poliacutetico do sudeste paraense por
todos os ensinamentos que recebi e que tambeacutem foi citado nas entrevistas como militante da
luta por uma sociedade mais justa e igualitaacuteria tendo inclusive participado da reuniatildeo de
fundaccedilatildeo do sindicato pesquisado
Agradeccedilo aos familiares que colaboraram para que a pesquisa fosse realizada irmatilde Rita
irmatildeo Ademirzinho avoacute Deolinda avocirc Edeacutezio (em memoacuteria) avoacute Izabel avocirc Albertino (em
memoacuteria) tias Ana Cleide Isabel Ilce Cida Lurde Maria Claacuteudia Dioacute Conceiccedilatildeo Adeacute
tios Haroldo Albertino Junior Valdez Pedro e Steacutelio prima Juliana e demais familiares
Agradeccedilo agraves trabalhadoras e trabalhadores da Sociedade Espiacuterita Renascer (Marabaacute) e do
Grupo de Pais da Instituiccedilatildeo Assistencial Espiacuterita Lar de Maria (Beleacutem) Em especial agrave
Marluce Guta Cynthia Carlos Patriacutecia Felix Junior Pedro Leite e Gesson
Agradeccedilo agraves(os) amigas(os) queridas(os) Joelma Joseacute da Cruz Matheus Olga Beatriz dona
Maria Nilde Geny Maira Gaia Waldileacuteia Amaral e Manuel Amaral
Agradeccedilo agrave Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute ndash EMATER
PARAacute por me liberar oficialmente para cursar o mestrado bem como agraves(os) seguintes
colegas de trabalho Franceli Genival Leiva Leacutelia Iale Zeacutelia Glauco Nelson Jean
Francisca Cristoacutevatildeo Jonas Damiatildeo Carlos Eduardo William Guimaratildees Franccedila Rosacircngela
Barros Estela Palmeira Paulo Lobato Rosival e Paulo Pedroso
Agradeccedilo ao meu querido orientador Gutemberg Armando Diniz Guerra por sua
competecircncia sabedoria e paciecircncia nesse processo de construccedilatildeo da dissertaccedilatildeo Obrigada
por compreender e respeitar o meu tempo o que incluiu mergulhar nas minhas memoacuterias
familiares mais profundas Obrigada pelas maravilhosas disciplinas ldquoNatureza agricultura e
artesrdquo e ldquoOrganizaccedilotildees camponesas e patronais no meio rural brasileirordquo Obrigada tambeacutem
pelos momentos em Cuiarana no Alto dos Pinheiros e no Lolicas
Agradeccedilo agrave Universidade Federal do Paraacute agraves(os) servidoras(es) do INEAF ao corpo docente
do PPGAA aos colegas da turma MAFDS 2016 em especial agrave Alciene e ao Hueliton
Agradeccedilo agrave professora Maria Angeacutelica Motta-Maueacutes por me acolher nos Seminaacuterios Angel e
por todo o aprendizado que adquiri com o ldquomiuacutedordquo da Antropologia bem como agradeccedilo agraves
colegas maravilhosas dos Seminaacuterios Angel
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso por tambeacutem me acolher nos Estudos de
Gecircnero disciplina fundamental para ampliar minha mente e colaborar na construccedilatildeo da minha
maturidade acadecircmica
Agradeccedilo agrave professora Maria Luzia Miranda Aacutelvares coordenadora do Grupo de Estudos e
Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulher e Relaccedilotildees de Gecircnero ndash GEPEMUFPA por ser um exemplo
de vida Obrigada por tudo que aprendi em cada evento que participei organizado pelo GEPEM
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso e ao professor William Santos de Assis por
participarem da banca de qualificaccedilatildeo e de defesa final da dissertaccedilatildeo Na banca de
qualificaccedilatildeo forneceram aportes valiosos que colaboraram para definir o rumo a seguir
Agradeccedilo agrave professora Angela May Steward por aceitar participar das bancas (qualificaccedilatildeo e
defesa final) na condiccedilatildeo de suplente
Agradeccedilo agraves integrantes do GT de Gecircnero da ABA (Associaccedilatildeo Brasileira de Agroecologia) pelos
debates que participei no IX CBA (Beleacutem-PA) e no X CBA (Brasiacutelia-DF)
Agradeccedilo agrave professora Emma Siliprandi pelo estiacutemulo que recebi na oportunidade que tive de
conhececirc-la pessoalmente
Agradeccedilo aos familiares de Miriam Chaves em especial agrave Kelvia Chaves e agrave Glaacuteucia Chaves
Agradeccedilo a todas as lideranccedilas (poliacuteticas acadecircmicas e de movimentos sociais) que
gentilmente colaboraram com a pesquisa atraveacutes da disponibilidade de serem entrevistadas
Agradeccedilo agrave diretoria atual do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras
Familiares do Municiacutepio de Marabaacute (PA) bem como agraves(aos) dirigentes de gestotildees anteriores
em especial agraves guerreiras Dijeacute e Marta
Agradeccedilo ao meu filho Victor Martins por ser ldquoum cara altamente concentradordquo e por
colaborar diariamente no meu processo de evoluccedilatildeo Ah tambeacutem agradeccedilo a ele por ter
compreendido que precisariacuteamos nos mudar de Marabaacute para Beleacutem para que eu pudesse
cursar o mestrado Muito obrigada
Para concluir agradeccedilo ao meu marido Luis Mauro Santos Silva por sempre acreditar em
mim por seu amor diaacuterio e por suas preciosas dicas acadecircmicas
Sem Medo de Ser Mulher
Zeacute Pinto
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Por que a luta natildeo eacute soacute dos companheiros
Participando sem medo de ser mulher
Pisando firme sem medir nenhum segredo
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Pois sem mulher a luta vai pela metade
Participando sem medo de ser mulher
Fortalecendo os movimentos populares
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Na alianccedila operaacuteria camponesa
Participando sem medo de ser mulher
Pois a vitoacuteria vai ser nossa com certeza
Participando sem medo de ser mulher
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
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dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
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Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
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no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
artesrdquo e ldquoOrganizaccedilotildees camponesas e patronais no meio rural brasileirordquo Obrigada tambeacutem
pelos momentos em Cuiarana no Alto dos Pinheiros e no Lolicas
Agradeccedilo agrave Universidade Federal do Paraacute agraves(os) servidoras(es) do INEAF ao corpo docente
do PPGAA aos colegas da turma MAFDS 2016 em especial agrave Alciene e ao Hueliton
Agradeccedilo agrave professora Maria Angeacutelica Motta-Maueacutes por me acolher nos Seminaacuterios Angel e
por todo o aprendizado que adquiri com o ldquomiuacutedordquo da Antropologia bem como agradeccedilo agraves
colegas maravilhosas dos Seminaacuterios Angel
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso por tambeacutem me acolher nos Estudos de
Gecircnero disciplina fundamental para ampliar minha mente e colaborar na construccedilatildeo da minha
maturidade acadecircmica
Agradeccedilo agrave professora Maria Luzia Miranda Aacutelvares coordenadora do Grupo de Estudos e
Pesquisas Eneida de Moraes sobre Mulher e Relaccedilotildees de Gecircnero ndash GEPEMUFPA por ser um exemplo
de vida Obrigada por tudo que aprendi em cada evento que participei organizado pelo GEPEM
Agradeccedilo agrave professora Denise Machado Cardoso e ao professor William Santos de Assis por
participarem da banca de qualificaccedilatildeo e de defesa final da dissertaccedilatildeo Na banca de
qualificaccedilatildeo forneceram aportes valiosos que colaboraram para definir o rumo a seguir
Agradeccedilo agrave professora Angela May Steward por aceitar participar das bancas (qualificaccedilatildeo e
defesa final) na condiccedilatildeo de suplente
Agradeccedilo agraves integrantes do GT de Gecircnero da ABA (Associaccedilatildeo Brasileira de Agroecologia) pelos
debates que participei no IX CBA (Beleacutem-PA) e no X CBA (Brasiacutelia-DF)
Agradeccedilo agrave professora Emma Siliprandi pelo estiacutemulo que recebi na oportunidade que tive de
conhececirc-la pessoalmente
Agradeccedilo aos familiares de Miriam Chaves em especial agrave Kelvia Chaves e agrave Glaacuteucia Chaves
Agradeccedilo a todas as lideranccedilas (poliacuteticas acadecircmicas e de movimentos sociais) que
gentilmente colaboraram com a pesquisa atraveacutes da disponibilidade de serem entrevistadas
Agradeccedilo agrave diretoria atual do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras
Familiares do Municiacutepio de Marabaacute (PA) bem como agraves(aos) dirigentes de gestotildees anteriores
em especial agraves guerreiras Dijeacute e Marta
Agradeccedilo ao meu filho Victor Martins por ser ldquoum cara altamente concentradordquo e por
colaborar diariamente no meu processo de evoluccedilatildeo Ah tambeacutem agradeccedilo a ele por ter
compreendido que precisariacuteamos nos mudar de Marabaacute para Beleacutem para que eu pudesse
cursar o mestrado Muito obrigada
Para concluir agradeccedilo ao meu marido Luis Mauro Santos Silva por sempre acreditar em
mim por seu amor diaacuterio e por suas preciosas dicas acadecircmicas
Sem Medo de Ser Mulher
Zeacute Pinto
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Por que a luta natildeo eacute soacute dos companheiros
Participando sem medo de ser mulher
Pisando firme sem medir nenhum segredo
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Pois sem mulher a luta vai pela metade
Participando sem medo de ser mulher
Fortalecendo os movimentos populares
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Na alianccedila operaacuteria camponesa
Participando sem medo de ser mulher
Pois a vitoacuteria vai ser nossa com certeza
Participando sem medo de ser mulher
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
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objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
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A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
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5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
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Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
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Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
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Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
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Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
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e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
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A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
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O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
Sem Medo de Ser Mulher
Zeacute Pinto
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Por que a luta natildeo eacute soacute dos companheiros
Participando sem medo de ser mulher
Pisando firme sem medir nenhum segredo
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Pois sem mulher a luta vai pela metade
Participando sem medo de ser mulher
Fortalecendo os movimentos populares
Participando sem medo de ser mulher
Pra mudar a sociedade do jeito que a gente quer
Participando sem medo de ser mulher
Na alianccedila operaacuteria camponesa
Participando sem medo de ser mulher
Pois a vitoacuteria vai ser nossa com certeza
Participando sem medo de ser mulher
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
RESUMO
O objetivo da dissertaccedilatildeo foi analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes
do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Para essa pesquisa o
empoderamento foi considerado como ampliaccedilatildeo do poder nas dimensotildees econocircmica
pessoal social e poliacutetica A pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa A metodologia abrangeu
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo A coleta de dados ocorreu
atraveacutes de a) pesquisa documental no acervo do sindicato pesquisado e no acervo da
Comissatildeo Pastoral da Terra b) pesquisa de campo atraveacutes de entrevista natildeo-diretiva com 18
pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens Com o desenvolvimento da pesquisa identificou-se
que as mulheres do STTR de Marabaacute participaram de lutas e embora obtivessem conquistas
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica no acircmbito e decorrer da militacircncia
sindical Isso eacute reflexo do caraacuteter processual do empoderamento sendo esse processo
complexo e marcado por contradiccedilotildees avanccedilos e recuos O combate agrave violecircncia domeacutestica foi
um dos indicadores de empoderamento mais citados nas entrevistas realizadas em todas as
suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral O principal desafio das mulheres
eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda permanente para superar a violecircncia domeacutestica e
a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila um trabalho de parceria e respeito entre as
mulheres e homens do sindicato pesquisado
Palavras-chave Mulheres Empoderamento Relaccedilotildees de gecircnero Sindicalismo de
trabalhadores rurais
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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07
)
43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
ABSTRACT
The goal of this paper was to analyze the empowerment process of the leader‟s women of the
rural workers (masculine and female) from Marabaacute For this research the empowerment was
considered as an implication of power on the economic personal social and political
dimensions The methodology covered bibliographic and documental research and camp
research The data collected occurred by a) Documental research on the collection of the
union researched and of the collection of the Pastoral Land Commission (CPT) b) Camp
research through non-directed interview with 18 people 11 women and 07 men With the
development of the research was identified that the women of the STTR from Marabaacute
partipated of struggles and although they achieved achievements were victims of
discrimination and domestic violence in the scope and course of the union militancy This is a
reflex of the processual character of the empowerment being this process complex and
marked by contradictions advances and retries The fight against the domestically violence
was one of the most cited indicators of empowerment on the interviews realized in all its
forms physical psychological sexual patrimonial and moral The principal challenge of the
women is to continue fighting through a permanent agenda for overcome the domestic
violence and the discrimination ensuring that a partnership and respect between the women
and men of the union surveyed
Keywords Women Empowerment Gender relations Union of the rural workers
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
55
Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
56
Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
57
Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
58
e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
59
A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
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aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA) 21
Figura 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar
Marabaacute (PA) 25
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas 39
Figura 04 Esquema da evoluccedilatildeo das entidades de representaccedilatildeo no sudeste do
Paraacute 42
Figura 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) 50
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019) 17
Quadro 02 Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os) 28
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados
dos dois grupos pesquisados 34
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute 49
LISTA DE SIGLAS
CEB ndash Comunidade Eclesial de Base
CEPASP ndash Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular
CNS ndash Conselho Nacional dos Seringueiros
CNTTR ndash Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais
CONTAG ndash Confederaccedilatildeo Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
COOCAT ndash Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins
CPT ndash Comissatildeo Pastoral da Terra
DPMR ndash Diretoria de Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas
EFA ndash Escola Famiacutelia Agriacutecola
EMATER PARAacute ndash Empresa de Assistecircncia Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute
FATA ndash Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins Araguaia
FECAP ndash Federaccedilatildeo das Centrais e Uniotildees de Associaccedilotildees do Estado do Paraacute
FECAT ndash Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins
FETAGRI ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute
FETRAF ndash Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica
INCRA ndash Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
MDA ndash Ministeacuterio do Desenvolvimento Agraacuterio
MEB ndash Movimento de Educaccedilatildeo de Base
MPA ndash Movimento dos Pequenos Agricultores
MST ndash Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
MSTTR ndash Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SOF ndash Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista
SR-27 ndash Superintendecircncia Regional do INCRA Sul do Paraacute
STR ndash Sindicato dos Trabalhadores Rurais
STTR ndash Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
SUMAacuteRIO
1 INTRODUCcedilAtildeO 14
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS 20
21 O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA 20
22 AS ETAPAS DA PESQUISA 21
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica 21
222 Procedimentos metodoloacutegicos 25
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA
FAMILIAR 31
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO 31
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR 36
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL 41
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS 41
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE
TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS 44
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute 47
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute 54
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO 54
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS
SINDICAIS 60
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO
EMPODERAMENTO 66
6 CONCLUSOtildeES 77
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS 80
APEcircNDICE A 87
APEcircNDICE B 88
APEcircNDICE C 90
APEcircNDICE D 91
APEcircNDICE E 92
APEcircNDICE F 93
APEcircNDICE G 95
ANEXO A 96
ANEXO B 100
14
1 INTRODUCcedilAtildeO
As relaccedilotildees de gecircnero ocorrem socialmente sendo caracterizadas geralmente pela
dominaccedilatildeo masculina Esse debate tem sido feito por diversas (os) autoras(es) dentre as quais
Cardoso (2011) que considera a utilizaccedilatildeo da loacutegica do patriarcado como origem da
dominaccedilatildeo masculina uma vez que a partir da visatildeo dualista de que o homem eacute mais humano
que a mulher ela estaria sujeita a tal dominaccedilatildeo Para Piscitelli (2009) o patriarcado situa e
confina a mulher no mundo privado e domeacutestico uma vez que o espaccedilo puacuteblico eacute considerado
masculino
No meio rural as relaccedilotildees de gecircnero satildeo influenciadas por variaacuteveis diversas dentre
as quais a divisatildeo sexual do trabalho e predominacircncia dos homens nas organizaccedilotildees sociais
como os sindicatos de trabalhadores rurais Cabe agraves mulheres cuidar do espaccedilo domeacutestico e
dos filhos deixando a tomada de decisatildeo para o ldquochefe de famiacuteliardquo Contudo existem no
Brasil movimentos de mulheres lutando em busca de sua autonomia empoderamento e
melhoria de qualidade de vida Em relaccedilatildeo ao empoderamento eacute compreendido de maneiras
diversas sendo apropriado ateacute mesmo por organizaccedilotildees financeiras como o Banco Mundial
(ROMANO ANTUNES 2002)
A temaacutetica geral dessa pesquisa eacute o processo de empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais sendo que o empoderamento eacute
considerado como ampliaccedilatildeo do poder em quatro dimensotildees ndash econocircmica pessoal social e
poliacutetica ndash conforme explicado por Brumer e Anjos (2010)
Na dimensatildeo econocircmica consideram-se as perspectivas de aumento da
renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da qualidade de
vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados
econocircmicos de seu trabalho A dimensatildeo pessoal compreende o aumento da
auto-estima e da autoconfianccedila Nas dimensotildees social e poliacutetica focaliza-se
a capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as
instacircncias em que ela se manifesta assim como a ampliaccedilatildeo de sua
participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221 grifo
nosso)
Segundo Scott ldquoo gecircnero eacute um elemento constitutivo de relaccedilotildees sociais fundadas
sobre as diferenccedilas percebidas entre os sexos e o gecircnero eacute um primeiro modo de dar
significado agraves relaccedilotildees de poderrdquo (SCOTT 1990 p 14) Rosaldo e Lamphere (1979)
destacam como fato universal na vida social o domiacutenio masculino de alguma forma em todas
as sociedades contemporacircneas aleacutem do que os papeis que as mulheres possuem como esposas
15
e matildees serem considerados inferiores aos dos homens Piscitelli (2009) reforccedila a relaccedilatildeo
desigual de poder entre homens e mulheres esclarecendo ainda sobre o termo gecircnero
Quando as distribuiccedilotildees desiguais de poder entre homens e mulheres satildeo
vistas como resultado das diferenccedilas tidas como naturais que se atribuem a
uns e outras essas desigualdades tambeacutem satildeo ldquonaturalizadasrdquo O termo
gecircnero em suas versotildees mais difundidas remete a um conceito elaborado
por pensadoras feministas precisamente para desmontar esse duplo
procedimento de naturalizaccedilatildeo mediante o qual as diferenccedilas que se
atribuem a homens e mulheres satildeo consideradas inatas derivadas de
distinccedilotildees naturais e as desigualdades entre uns e outras satildeo percebidas
como resultado dessas diferenccedilas Na linguagem do dia a dia e tambeacutem das
ciecircncias a palavra sexo remete a essas distinccedilotildees inatas bioloacutegicas Por esse
motivo as autoras feministas utilizaram o termo gecircnero para referir-se ao
caraacuteter cultural das distinccedilotildees entre homens e mulheres entre ideias sobre
feminilidade e masculinidade (PISCITELLI 2009 p 119)
Na agricultura familiar as relaccedilotildees de gecircnero satildeo caracterizadas por divisatildeo sexual do
trabalho bem definida e naturalizada na qual pode predominar o discurso de que os homens
satildeo responsaacuteveis pelo trabalho produtivo e as mulheres satildeo responsaacuteveis pelo trabalho
reprodutivo O trabalho produtivo refere-se agrave agricultura agrave pecuaacuteria e demais atividades
associadas ao mercado enquanto que o trabalho reprodutivo refere-se ao trabalho domeacutestico o
cuidado da horta e dos pequenos animais aleacutem da reproduccedilatildeo da proacutepria famiacutelia pelo
nascimento e cuidado dos filhos (NOBRE 2005) Ainda que a mulher desenvolva atividades
consideradas produtivas como no roccedilado por exemplo o seu trabalho eacute classificado como
ajuda Contudo no cotidiano as agricultoras familiares tambeacutem trabalham na produccedilatildeo
contribuindo no mesmo patamar que os agricultores tendo inclusive sobrecarga de trabalho
Beauvoir (2009) em sua obra atemporal eacute precisa ao dizer que
Nos campos a camponesa participa de modo consideraacutevel do trabalho rural
eacute tratada como servente frequentemente natildeo come agrave mesa com o marido e
os filhos pena mais duramente do que eles e os encargos da maternidade
acrescentam-se a suas fadigas (BEAUVOIR 2009 p 165)
Dantas (2015) complementa a discussatildeo sobre a divisatildeo sexual do trabalho no campo
El aacuterea de cultivo es el espacio de produccioacuten de gran escala donde se planta
mandioca frijol maiacutez y cereales considerados esenciales para la
supervivencia de la familia y por esto es considerado como lugar de trabajo
Por demandar el uso de herramientas mecaacutenicas de gran porte como la
cavadora el arado y la recolectora es considerado son una obligacioacuten
masculina realizada por los hombres de la familia especialmente el padre
Cuando las mujeres ejecutan atividades en este espacio su trabajo es
considerado uma ldquoayudardquo un complemento al trabajo masculino Por otro
16
lado la casa se presenta como el lugar de la mujer donde las actividades
realizadas son consideradas un no trabajo (DANTAS 2015 p 47)
Em estudo realizado por Mouratildeo (2004) no municiacutepio de Abaetetuba (PA) sobre a
anaacutelise das estrateacutegias de produccedilatildeo e reproduccedilatildeo da agricultura familiar foram identificados
os limites e potencialidades para a implantaccedilatildeo de agroecossistemas Constatou-se que
nenhuma das mulheres entrevistadas participara de treinamentos sobre a implantaccedilatildeo e
manejo dos sistemas agroflorestais como tambeacutem natildeo houve participaccedilatildeo das mulheres na
escolha das aacutereas e no monitoramento dos consoacutercios e sistemas agroflorestais Essas decisotildees
foram exclusivamente masculinas Esse exemplo corrobora o pensamento de Nobre (2005)
apresentado anteriormente
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo de mulheres no movimento sindical de trabalhadores rurais
Guerra (2013) estudando o sudeste paraense enfatiza o esforccedilo realizado pelas organizaccedilotildees
sindicais para o engajamento das mulheres no movimento atraveacutes da sindicalizaccedilatildeo das
mesmas promoccedilatildeo de reuniotildees especiacuteficas de mulheres dentre outras atividades ldquoEmbora
difiacutecil e lenta a manifestaccedilatildeo da mulher nos sindicatos vem se dando efetivamente denotando
mudanccedilas qualitativas importantes no sindicalismo ruralrdquo (GUERRA 2013 p 121)
Amaral (2007) verificou que as mulheres em sua maioria encontram-se em cargos de
menor importacircncia1 na hierarquia das estruturas sindicais como Secretaria de Mulheres e
Jovens Secretaria de Poliacuteticas Sociais e Secretaria de Organizaccedilatildeo e Formaccedilatildeo Apesar disso
a participaccedilatildeo das mulheres nos sindicatos de trabalhadores rurais proporcionou avanccedilos tais
como a criaccedilatildeo de cotas para mulheres mudanccedila no comportamento dos dirigentes e na
dinacircmica das reuniotildees e o debate de novos temas de interesse feminino direto como violecircncia
contra as mulheres e sauacutede reprodutiva (AMARAL 2007)
Boni (2004) argumenta que a busca pelo poder dentro dos sindicatos ocorre atraveacutes do
discurso da capacidade da mulher e a viabilizaccedilatildeo desse discurso se daacute por meio da ocupaccedilatildeo
de cargos na direccedilatildeo Ainda segundo Boni (2004) as mulheres muitas vezes satildeo admitidas
como companheiras de luta mas natildeo de poder o que se evidencia na dificuldade da discussatildeo
sobre as cotas miacutenimas de participaccedilatildeo de mulheres nas direccedilotildees ldquoHaacute os que sustentam ndash e
entre eles mulheres ndash que a poliacutetica de cotas pode se transformar numa simples formalidade
para conquistar espaccedilos o que natildeo significa poderrdquo (BONI 2004 p78) Sob essa perspectiva
a poliacutetica de cotas pode ser avaliada como uma estrateacutegia eleitoral e natildeo como uma expressatildeo
de poder das mulheres nas organizaccedilotildees Mas tambeacutem pode ser vista como um dispositivo
1 Cargos considerados de menor importacircncia com pouco poder de influenciar nas grandes decisotildees e
sem atribuiccedilatildeo de representaccedilatildeo
17
importante de partilhamento do poder institucional por um vieacutes historicamente
desconsiderado
Em trabalho de campo preliminar desse estudo foram entrevistadas cinco mulheres
militantes na aacuterea poliacutetico-partidaacuteria e na aacuterea de assessoria teacutecnica e sindical agraves mulheres
dirigentes do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute Segundo elas
foram elencadas as seguintes constataccedilotildees as poliacuteticas puacuteblicas (acesso agrave sauacutede educaccedilatildeo
creacutedito rural) estatildeo distantes das mulheres rurais eacute acentuado o iacutendice de violecircncia contra as
mulheres ndash violecircncia fiacutesica psicoloacutegica sexual dentre outros tipos haacute necessidade de
organizaccedilatildeo social e produtiva das mulheres para o alcance das demandas reprimidas Aleacutem
disso as proacuteprias entrevistadas relataram situaccedilotildees em que foram viacutetimas de machismo seja
em ambientes de trabalho seja em outros espaccedilos
O trabalho de campo preliminar evidenciou que a participaccedilatildeo das mulheres nas
atividades e gestatildeo da diretoria do Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute esteve reduzida em 2016 quando comparada com gestotildees anteriores ndash momentos em
que as mulheres participavam de cursos de formaccedilatildeo encontros e outras atividades em
Marabaacute e outros municiacutepios A atual diretoria empossada em 21 de junho de 2015 (com
mandato ateacute 21 de junho de 2019) eacute composta por dezoito membros sendo doze homens e
seis mulheres de acordo com o Quadro 01 e detalhamento no Anexo A O nuacutemero de
mulheres nas Secretarias eacute significativo entretanto no Conselho Fiscal as mulheres soacute
aparecem como suplentes
Quadro 01 ndash Diretoria do STTR de Marabaacute (quadriecircnio 2015-2019)
DIRETORIA EXECUTIVA
PRESIDENTE JOSEacute MARIA MARTINS CAJUEIRO
VICE-PRESIDENTE GILBERTO CAVALCANTE DA SILVA
SECRETAacuteRIO GERAL FORMACcedilAtildeO E
ORGANIZACcedilAtildeO SINDICAL
JOSEacuteLIO RODRIGUES DE ALMEIDA
SECRETAacuteRIO DE ADMINISTRACcedilAtildeO
FINANCcedilAS E ASSALARIADOSAS RURAIS
NEWTON FERNANDES DA SILVA
SECRETAacuteRIO DE POLIacuteTICA AGRAacuteRIA
AGRIacuteCOLA E MEIO AMBIENTE
ORLANDO ALVES DA LUZ
SECRETAacuteRIA DE MULHERES
TRABALHADORAS RURAIS
MARIA ALDENIR R DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE POLIacuteTICAS SOCIAIS QUEacuteZIA BRAVARES DE CALDAS
SECRETAacuteRIO DE JOVENS
TRABALHADORESAS RURAIS
LUCIVALDO SANTOS DA SILVA
SECRETAacuteRIA DE TRABALHADORESAS DA
TERCEIRA IDADE
NAZILDA ALVES DA COSTA
18
SUPLENTES DA DIRETORIA
JOCEMIR SILVA DE JESUS
JOAtildeO RIBEIRO DA SILVA
UBIRATAN GOMES DA SILVA
CONSELHO FISCAL
RONILDO CHAVES PEDROZA TIMOTEO
FRANCISCO CESAacuteRIO MOREIRA
GONCcedilALO GOMES DE ARAUacuteJO
SUPLENTES
TATIANA OLIVEIRA SALES
KALINE GOMES DOS SANTOS
CIRLENE DOS SANTOS RIBEIRO FONTE Documentos do STTR
Organizado por Luciana Moreira dos Reis (2018)
Nesse sentido pode-se questionar se tem aumentado a participaccedilatildeo das mulheres
dirigentes do referido sindicato ou se vem ocorrendo no decorrer dos anos um processo de
desempoderamento dessas mulheres Ademais considerando o caraacuteter processual do
empoderamento (AMORIM 2012) sendo esse processo complexo e marcado por
contradiccedilotildees (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES 2012) existe a possibilidade de que
nem todas estejam no mesmo niacutevel de empoderamento
Como base para essa pesquisa em acordo com os argumentos de Cardoso (2011)
Considera-se de extrema importacircncia o combate agrave violecircncia domeacutestica a
defesa pelos direitos sexuais e reprodutivos a inserccedilatildeo das mulheres na vida
poliacutetica parlamentar e a garantia da equidade no mundo do trabalho pois satildeo
exemplos de que as relaccedilotildees sociais de gecircnero natildeo se restringem ao
feminismo militante ou acadecircmico e exigem um trato de fato transversal
interdisciplinar e com articulaccedilatildeo entre ciecircncia movimentos sociais e
organizaccedilotildees de vaacuterios matizes (CARDOSO 2011 p63)
Deste modo trabalhos como este apresentam relevacircncia acadecircmica por produzir
elementos que possam contribuir para o debate teoacuterico sobre empoderamento de mulheres no
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais e apresentam relevacircncia social pois
oferece subsiacutedios para o fortalecimento desse sindicalismo Igualmente esta pesquisa possui
motivaccedilatildeo pessoal e profissional em virtude de eu ser marabaense atuando como
extensionista rural (engenheira agrocircnoma) na regiatildeo de Marabaacute pela Empresa de Assistecircncia
Teacutecnica e Extensatildeo Rural do Estado do Paraacute (EMATER PARAacute) desde 2010 e
principalmente pelo meu interesse no estudo de empoderamento de mulheres para melhor
compreensatildeo da sociedade pela perspectiva de gecircnero e possibilidade de melhor intervenccedilatildeo
na realidade Ademais acompanhei atividades do Sindicato dos Trabalhadores e
19
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute no periacuteodo (20052006) em que trabalhei na Copserviccedilos2
na Equipe Marabaacute e coordenei atividades de formaccedilatildeo para mulheres rurais enquanto
extensionista da EMATER PARAacute
Tendo em conta o debate apresentado anteriormente surgiu a seguinte questatildeo de
pesquisa Como ocorre o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
Nesse sentido essa pesquisa teve como objetivo analisar o processo de
empoderamento das mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute Portanto tendo como objeto de estudo essa temaacutetica no Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 ateacute 2017
Os objetivos especiacuteficos foram
Descrever e analisar a participaccedilatildeo das mulheres dirigentes na luta do Sindicato de
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute-PA
Caracterizar e analisar o processo de empoderamento das mulheres dirigentes do
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute ndash PA
considerando a perspectiva das mulheres e dos homens dirigentes do sindicato
Analisar indicadores de empoderamento das mulheres demonstrando como se
expressam no sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais de Marabaacute
A dissertaccedilatildeo conta com esta introduccedilatildeo um capiacutetulo sobre a metodologia trecircs outros
capiacutetulos e as consideraccedilotildees finais O terceiro capiacutetulo trata sobre o empoderamento da
mulher Nele apresento um breve histoacuterico sobre a histoacuteria das mulheres no Brasil
perpassando pelo empoderamento da mulher ndash temaacutetica central da pesquisa ndash e pelas relaccedilotildees
de gecircnero e agricultura familiar No quarto capiacutetulo apresento um breve histoacuterico do
sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais no Brasil analiso a participaccedilatildeo da
mulher no referido sindicalismo e reflito sobre a histoacuteria do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Marabaacute No quinto capiacutetulo apresento as mulheres do sindicato
pesquisado analisando-as a partir da participaccedilatildeo delas na estrutura sindical e a partir dos
discursos das lideranccedilas sindicais (mulheres e homens) Ao fim desta dissertaccedilatildeo apresento as
conclusotildees com base nas pistas e reflexotildees de cada capiacutetulo ao longo do processo de escrita
da dissertaccedilatildeo 2 Copserviccedilos Cooperativa de Prestaccedilatildeo de Serviccedilos prestadora de serviccedilo de assistecircncia teacutecnica
criada em 1998 pelo Movimento Sindical dos Trabalhadores Rurais (MSTR) do sudeste paraense
20
2 DELINEAMENTOS METODOLOacuteGICOS
21O MUNICIacutePIO DE MARABAacute E O CONTEXTO DA PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no acircmbito do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais do municiacutepio de Marabaacute (Paraacute) pertencente agrave mesorregiatildeo sudeste
paraense (figura 01) com uma populaccedilatildeo de 266932 habitantes e aproximadamente 15200
Km2 mantendo uma densidade populacional de 154 habitantes por Km
2 (IBGE 2016) A sua
populaccedilatildeo eacute predominantemente urbana com cerca de 80 residindo no espaccedilo urbano
Quanto agrave divisatildeo por sexo a populaccedilatildeo marabaense manteacutem uma proporccedilatildeo proacutexima entre
homens e mulheres mas ainda prevalecendo percentual maior para os homens (505) As
atividades agropecuaacuterias ainda se mantecircm estrateacutegicas para a economia municipal sendo que
os setores de serviccedilos e produccedilatildeo industrial reservam maior importacircncia para a economia
local
Marabaacute eacute um dos centros urbanos mais importantes do Paraacute por concentrar boa
infraestrutura e sediar a maioria dos oacutergatildeos da administraccedilatildeo federal e estadual em atividade
na regiatildeo (ASSIS 2007)
Segundo Almeida (2016) durante vaacuterias deacutecadas do seacuteculo XX a histoacuteria da regiatildeo de
Marabaacute referiu-se agrave histoacuteria das lutas que resultaram na constituiccedilatildeo de oligarquias locais
ligadas ao comeacutercio e fortalecidas pelo domiacutenio da terra tendo fornecido para o restante do
paiacutes variados produtos dentre os quais merecem destaque o laacutetex a castanha-do-Paraacute
(Bertholletia excelsa HBK) peles de animais diamantes e cristais de rocha A partir do
ciclo da castanha foi consolidada a oligarquia local e os grandes latifuacutendios surgiram
funcionando mais tarde como pivocirc dos inuacutemeros conflitos ocorridos na regiatildeo (ALMEIDA
2016)
Dentre as oligarquias locais a famiacutelia dos Mutran exerceu relevante influecircncia
econocircmica e poliacutetica no municiacutepio de Marabaacute principalmente a partir da segunda metade da
deacutecada de 1950 do seacuteculo passado e sobretudo entre 1988 e 1991 ndash periacuteodo em que ldquoo entatildeo
chefe da famiacutelia controlava os trecircs poderes no municiacutepio de Marabaacute a Prefeitura a Cacircmara
Municipal e o Judiciaacuteriordquo (PETIT 2003 p186) Cabe ressaltar que a famiacutelia dos Mutran
exerceu notaacutevel influecircncia no comando do sindicato pesquisado em seus anos iniciais
21
FIGURA 01 Mapa de localizaccedilatildeo geograacutefica de Marabaacute (PA)
FONTE Guimaratildees (2016)
A delimitaccedilatildeo temporal da pesquisa (BRUMER et al 2008) referiu-se ao periacuteodo de
existecircncia do sindicato em questatildeo ou seja desde a sua fundaccedilatildeo ocorrida em 20 de
dezembro de 1980 (GUERRA 2013) ateacute 2017
22AS ETAPAS DA PESQUISA
221Caminhos da construccedilatildeo empiacuterica
O tiacutetulo inicial do projeto de pesquisa era ldquoEmpoderamento de mulheres camponesas
e agroecologia no municiacutepio de Marabaacute-PArdquo uma vez que eu pretendia estudar grupos
produtivos de mulheres rurais preferencialmente organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) relacionando-os agraves dimensotildees da agroecologia
22
Durante o mecircs de junho de 2016 realizei contatos telefocircnicos e por mensagens atraveacutes de
correio eletrocircnico (e-mail) e aplicativo whatsapp com lideranccedilas (um homem e duas
mulheres) do MST com o objetivo de viabilizar visita aos projetos de assentamentos do MST
no municiacutepio de Marabaacute ndash a proposta da visita seria a identificaccedilatildeo dos referidos grupos
produtivos
O primeiro trabalho de campo de caraacuteter exploratoacuterio (Campo I) foi realizado no
periacuteodo de 20 a 28 de setembro de 2016 no municiacutepio de Marabaacute Apesar dos contatos feitos
anteriormente agrave ida ao campo natildeo foi possiacutevel visitar nenhum projeto de assentamento do
MST localizado em Marabaacute
Considerando que ldquoa tarefa de pesquisa precisa ser reduzida ao que eacute possiacutevel ser
realizado pelo pesquisadorrdquo (GOLDENBERG 2004 p75) considerando que os recursos e o
tempo para a realizaccedilatildeo da pesquisa no acircmbito de um curso de mestrado satildeo limitados e
considerando que o objeto de estudo pode adquirir consistecircncia que redimensione a pesquisa
decidi pela mudanccedila do objeto de estudo optando por focalizar na luta das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A mudanccedila do
tema tambeacutem se deu no processo de reflexatildeo e aproximaccedilatildeo agrave temaacutetica trabalhada pelo meu
orientador e aleacutem disso em virtude de reconhecida lacuna sobre essa abordagem no referido
sindicato
Durante o campo exploratoacuterio realizei entrevistas com cinco mulheres que satildeo
lideranccedilas histoacutericas no municiacutepio com o objetivo de se conhecer a trajetoacuteria de vida das
entrevistadas bem como identificar as principais conquistas das mulheres do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute dentre outras questotildees elencadas no roteiro
(APEcircNDICE A) As entrevistas ndash do tipo natildeo diretiva de acordo com a proposiccedilatildeo de
Michelat (1987) ndash foram realizadas em locais escolhidos pelas mulheres variando entre local
de trabalho e residecircncia As entrevistas foram gravadas com permissatildeo das entrevistadas
sendo garantido o anonimato (GOLDENBERG 2004) das mesmas Os recursos utilizados
para registro foram gravador e bloco de anotaccedilotildees
Ainda durante o campo exploratoacuterio realizei pesquisa documental na
Superintendecircncia Regional do INCRA3 do Sul do Paraacute (SR-27) com sede em Marabaacute com o
3 INCRA Instituto Nacional de Colonizaccedilatildeo e Reforma Agraacuteria
23
objetivo de obter informaccedilotildees a respeito do nuacutemero de mulheres que constam na Relaccedilatildeo de
Beneficiaacuterios (RB)4 dos projetos de assentamento do municiacutepio de Marabaacute bem como
nuacutemero de mulheres assentadas que acessaram creacuteditos rurais A intenccedilatildeo foi de obter pistas
de indicadores que demonstrassem o niacutevel de empoderamento das mulheres nas dimensotildees
poliacutetica e econocircmica
Realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de Marabaacute no intuito de obter
informaccedilotildees a respeito da Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo e Comenda ldquoBeta Moreirardquo incluindo
a relaccedilatildeo de mulheres que foram homenageadas com as referidas comendas Desde 2007 a
Cacircmara Municipal de Marabaacute realiza Sessatildeo Solene em homenagem ao Dia Internacional da
Mulher concedendo comendas agraves mulheres que contribuem para o desenvolvimento do
municiacutepio Como eu estava no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de pesquisa tinha o interesse
de conhecer as mulheres homenageadas para saber se eram ligadas ao Movimento Sindical
dos Trabalhadores Rurais (MSTR)
A Comenda ldquoMiriam Chavesrdquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 022007
Trata-se de homenagem agrave Miriam Chaves Gomes (1917ndash2007) natural de Imperatriz (MA)
Passou a residir em Marabaacute em 1942 Trabalhou como professora da Escola ldquoJoseacute Mendonccedila
Vergolinordquo Foi a primeira mulher a se eleger e exercer o mandato de vereadora de Marabaacute
pelo Partido Social Progressista (PSP) no periacuteodo de 1951 a 1954 Fontes orais relataram que
Miriam Chaves foi a primeira mulher a usar maiocirc e a andar de bicicleta e de lambreta5 no
municiacutepio de Marabaacute Promovia corridas de bicicleta no bairro Velha Marabaacute reunindo os
jovens da eacutepoca bem como participava das atividades do Clube de Matildees Aleacutem dos projetos
poliacuteticos e sociais nos quais se engajava era considerada a melhor doceira da cidade seus
bolos de casamento e aniversaacuterio eram disputados pelos abastados da eacutepoca e tambeacutem
confeccionava vestidos de noiva considerados belos Foi agraciada com o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense atraveacutes do Decreto Legislativo nordm 461 de 11 de dezembro de 2001
4 Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) do Programa Nacional de Reforma Agraacuteria (PNRA) A primeira
atividade do processo de assentamento eacute a seleccedilatildeo realizada simultaneamente agrave obtenccedilatildeo de terras e
aos levantamentos baacutesicos para sua caracterizaccedilatildeo As normas de seleccedilatildeo em vigor desde 1981 vecircm
passando por mudanccedilas e adequaccedilotildees O resultado eacute a Relaccedilatildeo de Beneficiaacuterios (RB) da entidade
familiar assentada (INCRA 2016)
5 Lambreta veiacuteculo de duas rodas semelhante agrave motocicleta muito usada nas deacutecadas de 50 e 60 do
seacuteculo XX (fonte httpwwwdicionarioinformalcombrlambreta)
24
A Comenda ldquoBeta Moreirardquo foi instituiacuteda atraveacutes do Projeto de Resoluccedilatildeo 032007
Trata-se de homenagem agrave Albertina Sandra Moreira dos Reis (1954ndash2006) natural de Beleacutem
(PA) conhecida como professora Beta Passou a residir em Marabaacute em 1980 Trabalhou no
Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB) Centro de Educaccedilatildeo Pesquisa e Assessoria Sindical
e Popular (CEPASP) Como educadora popular proferiu palestras sobre o meio ambiente
organizaccedilatildeo sindical educaccedilatildeo produccedilatildeo do Jornal Popular e outros Funcionaacuteria puacuteblica
municipal concursada desde 1995 trabalhou como orientadora pedagoacutegica nas escolas de
Marabaacute de 1995 a 1996 Exerceu o cargo de Secretaacuteria Municipal de Educaccedilatildeo em 1996 na
gestatildeo do prefeito Haroldo Bezerra voltando a ocupar esse cargo em 1997 na gestatildeo do
prefeito Geraldo Veloso Exerceu ainda a funccedilatildeo de supervisora nas Escolas Municipais de
Ensino Fundamental Salomeacute Carvalho e Pedro Cavalcante Recebeu o tiacutetulo de Cidadatilde
Marabaense na Cacircmara Municipal por indicaccedilatildeo do vereador Miguel Gomes Filho conforme
o Decreto Legislativo nordm 31517 de 17 de dezembro de 1997 A Cacircmara Municipal de Marabaacute
aprovou o Decreto Legislativo nordm 555 de 06 de marccedilo de 2007 denominando de Albertina
Sandra Moreira dos Reis (Professora Beta) a escola na Folha 06 bairro Nova Marabaacute A
autora da proposiccedilatildeo foi a vereadora Vanda Reacutegia Ameacuterico Gomes A escola foi inaugurada
em janeiro de 2008
Retomando agrave descriccedilatildeo do campo exploratoacuterio visitei a sede do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute onde tive a oportunidade de conversar com
dois integrantes (dois homens) da atual diretoria aleacutem de dois integrantes (uma mulher e um
homem) de diretorias anteriores realizando assim a primeira aproximaccedilatildeo com o objeto de
estudo da pesquisa sendo possiacutevel ainda articular as futuras imersotildees no campo Ademais
acompanhei agricultoras familiares durante a comercializaccedilatildeo de seus produtos na Feira da
Agricultura Familiar ndash realizada aos saacutebados em espaccedilo em frente agrave sede do sindicato Dona
Dijeacute (Figura 02) eacute militante no sindicato desde 1992 e uma das lideranccedilas que se envolveu
intensamente na implantaccedilatildeo e consolidaccedilatildeo dessa feira ndash fundada em 11 de novembro de
2006 Segundo Amador (2017) o perfil dos feirantes eacute diverso com presenccedila ativa das
mulheres Miranda (2008) esclarece que a Feira da Agricultura Familiar de Marabaacute foi criada
atraveacutes da parceria entre a Copserviccedilos e o STTR de Marabaacute
25
FIGURA 02 Dona Dijeacute comercializando produtos na Feira da Agricultura Familiar Marabaacute (PA)
Foto Luciana Moreira dos Reis (2016)
Concordando com Brumer et al (2008) o estudo exploratoacuterio adquire importacircncia
iacutempar para orientar as escolhas acertadas no processo de pesquisa Nesse caso foi
fundamental para a definiccedilatildeo do objeto de estudo e possibilitou a primeira aproximaccedilatildeo com
os sujeitos da pesquisa
222 Procedimentos metodoloacutegicos
Essa pesquisa eacute um estudo de caso do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (PA) com abordagem qualitativa Em relaccedilatildeo agrave natureza das fontes realizei
pesquisa bibliograacutefica pesquisa documental e pesquisa de campo (SEVERINO 2007)
Na pesquisa documental analisei registros impressos tais como documentos
elaborados pelo sindicato (convocatoacuterias e atas de reuniotildees e assembleias do sindicato pautas
de reivindicaccedilotildees listas de frequecircncias dentre outros) textos da imprensa escrita do
municiacutepio de Marabaacute (reportagens sobre o sindicato em questatildeo especialmente no Jornal
Correio do Tocantins) acervo de entidades parceiras na luta sindical rural (especificamente o
acervo da Comissatildeo Pastoral da Terra) A pesquisa documental objetivou resgatar fatos
histoacutericos relacionados ao sindicato O atual presidente do sindicato esclareceu que o arquivo
seria organizado melhor posteriormente visto que muitos documentos estavam encaixotados
em virtude de que as diretorias anteriores natildeo tiveram a preocupaccedilatildeo em organizar o arquivo
26
Foi durante essa etapa da pesquisa que ocorreu a Chacina de Pau D‟Arco no dia 24 de
maio de 20176 sendo que dos dez mortos sete eram da mesma famiacutelia o casal Jane Julia de
Oliveira e Antonio Pereira Milhomem seus trecircs filhos e dois sobrinhos No dia seguinte agrave
chacina enquanto eu realizava a pesquisa documental na sede da CPT quatros integrantes da
CPT estavam organizando a homenagem que seria prestada aos trabalhadores assassinados
em protestopasseata7 com saiacuteda do Campus I da Unifesspa ateacute a sede do Instituto Meacutedico
Legal (IML) de Marabaacute Aleacutem disso realizei pesquisa documental na Cacircmara Municipal de
Marabaacute a fim de complementar as informaccedilotildees a respeito das Comendas ldquoBeta Moreirardquo e
ldquoMiriam Chavesrdquo citadas anteriormente Pelo que pesquisei nenhuma mulher dirigente do
STTR de Marabaacute (das direccedilotildees de 1994 ateacute a atual) recebeu essa homenagem Apenas duas
diretoras foram homenageadas pela Cacircmara Municipal de Marabaacute com a concessatildeo do tiacutetulo
de Cidadatilde Marabaense Francisca Marta Alves Moreira8 e Maria de Jesus Lopes Noleto (dona
Dijeacute)9
Embora os sujeitos da pesquisa (APPOLINAacuteRIO 2006) sejam especialmente as
mulheres dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute
(gestatildeo atual e gestotildees anteriores) para que o processo de empoderamento dessas mulheres
fosse analisado detalhadamente foi necessaacuterio ter contato com demais sujeitos mulheres (e
homens) que trabalharam eou trabalham prestando assessoria teacutecnica social e sindical ao
sindicato homens dirigentes do sindicato (gestatildeo atual e gestotildees anteriores)
6 No dia 24 de maio de 2017 dez trabalhadores rurais sem terra (nove homens e uma mulher) foram
mortos em uma accedilatildeo da Poliacutecia Militar (PM) e da Poliacutecia Civil do estado do Paraacute supostamente
organizada para cumprir mandados de prisatildeo contra ocupantes da Fazenda Santa Luacutecia
Acampamento Nova Vida A operaccedilatildeo foi conduzida pela Delegacia de Conflitos Agraacuterios (DECA)
com apoio de contingente policial de Redenccedilatildeo Conceiccedilatildeo do Araguaia e Xinguara (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrnoticiasacervomassacres-no-campo110-para3982-pau-d-arco-2017)
7 Cerca de 250 pessoas entre estudantes professores e militantes de movimentos e organizaccedilotildees
sociais saiacuteram agraves ruas de Marabaacute no Paraacute no dia 25 de maio ao final da tarde para denunciar e
protestar contra as autoridades policiais responsaacuteveis pelo Massacre de Pau D‟arco a 350 km dali que
vitimou 10 camponeses sem terra no dia 24 (Fonte
httpswwwcptnacionalorgbrpublicacoesnoticiasconflitos-no-campo3800-ato-publico-em-
maraba-pa-denuncia-massacre-de-pau-d-arco)
8 Projeto de Decreto Legislativo 202011 apresentado pelo vereador Aleacutecio Stringari (Aleacutecio da
Palmiteira) 9 Projeto de Decreto Legislativo 932011 apresentado pelo vereador Gerson Augusto dos Santos
Varela (Geacuterson do Badeco)
27
Aleacutem da pesquisa documental parte da coleta de dados ndash comumente citada em
termos gerais como ldquotrabalho de campordquo (MANN 1970) ndash foi realizada atraveacutes de entrevista
natildeo diretiva (MICHELAT 1987) com a utilizaccedilatildeo de roteiro de entrevista papel caneta e
gravador sendo que as (os) entrevistadas (os) assinaram o termo de autorizaccedilatildeo de uso de
imagem e depoimentos (APEcircNDICE G) O segundo campo foi realizado no periacuteodo de 16 a
26 de maio de 2017 Os roteiros estatildeo detalhados nos APEcircNDICES (B C D E e F)
Considerei como terceiro campo o periacuteodo de uma semana (10 a 16 de julho) que passei em
Marabaacute em julho de 2017 no qual consegui realizar duas entrevistas ndash com um homem que
foi assessor do sindicato e com uma mulher (vice-presidente de gestatildeo anterior) com duraccedilatildeo
de 1h44m e 2h04m respectivamente Apesar de terem sido somente duas entrevistas foram
essenciais para minha compreensatildeo sobre o contexto histoacuterico e sobre a participaccedilatildeo das
mulheres nas lutas diaacuterias do sindicato Para entrevistar a vice-presidente de gestatildeo anterior
tive que me deslocar ao seu lote em projeto de assentamento que dista aproximadamente 140
km da sede de Marabaacute Considerei como quarto campo a entrevista que realizei no mecircs de
setembro de 2017 com a primeira mulher presidente da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e
Trabalhadoras na Agricultura do Paraacute (FETAGRI PARAacute) eleita em marccedilo de 2017 em
Beleacutem do Paraacute Os roteiros serviram de base para as entrevistas sendo que as mesmas
variaram de 24 minutos a 02h04minutos conforme a disponibilidade de cada entrevistada (o)
No total foram entrevistadas 18 pessoas sendo 11 mulheres e 07 homens de acordo
com o Quadro 02 Atribuiacute nomes fictiacutecios agraves(aos) entrevistadas(os) para preservaccedilatildeo de suas
identidades conforme orientaccedilatildeo de Oliveira (2014) ldquoEacute preciso garantir-lhe que seraacute
guardado sigilo quanto agraves informaccedilotildees e que natildeo haveraacute identificaccedilatildeo do informante na
redaccedilatildeo final do relatoacuterio da pesquisardquo (OLIVEIRA 2014 p87)
28
Quadro 02 ndash Relaccedilatildeo das (os) entrevistadas (os)
Nordm DATA NOME LOCAL DA ENTREVISTA DURACcedilAtildeO
01 200916 MADALENA Folha 27 Bairro Nova Marabaacute 01h09min
02 210916 JOANA ANGEacuteLICA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h20min
03 220916 SANDRA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 01h12min
04 260916 LINDA Bairro Liberdade 01h18min
05 270916 NINA Bairro Velha Marabaacute 44min
06 180517 CLAacuteUDIO Bairro Velha Marabaacute 24min
07 180517 FRIDA Bairro Velha Marabaacute 01h52min
08 190517 TEREZA Folha 31 Bairro Nova Marabaacute 50min
09 190517 LUIacuteS Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 39min
10 220517 ITAMAR BairroVelha Marabaacute 41min
11 220517 VANA Bairro Nova Marabaacute 01h33min
12 230517 MILTON Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 55min
13 230517 VALDIR Agroacutepolis INCRA Bairro Amapaacute 29min
14 230517 SIMONE Bairro Velha Marabaacute 01h33min
15 240517 SAULO Bairro Velha Marabaacute 56min
16 110717 JOAtildeO Folha 31 Nova Marabaacute 01h44min
17 140717 MARIA Zona rural de Marabaacute 02h04min
18 010917 DANDARA Bairro Umarizal Beleacutem 34min
Fonte Luciana Moreira dos Reis (2016 2017)
Das onze mulheres entrevistadas quatro foramsatildeo dirigentes do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute duas foram vice-presidentes de gestotildees
anteriores dentre outros cargos uma foi Secretaacuteria de Juventude Rural e uma eacute a
atualreeleita Secretaacuteria de Poliacuteticas Sociais Tentei marcar entrevista com outras mulheres ex-
29
dirigentes poreacutem devido dificuldade de deslocamento10
natildeo foi possiacutevel entrevistaacute-las em
virtude de natildeo coincidir com o periacuteodo em que estive em Marabaacute As outras mulheres
entrevistadas satildeo duas satildeo lideranccedilas poliacuteticas (uma eacute filiada ao Partido dos Trabalhadores e
a outra eacute filiada ao Partido Socialista Brasileiro) uma era a presidente do Conselho Municipal
de Defesa dos Direitos da Mulher de Marabaacute (COMDIM) ndash no periacuteodo em que foi
entrevistada uma era a titular da Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a
Mulher11
ndash no periacuteodo em que foi entrevistada uma eacute agente da Comissatildeo Pastoral da Terra
uma eacute professora da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute (Unifesspa) e uma eacute a
primeira mulher presidente da FetagriPA eleita em 2017 Optei por entrevistar tambeacutem
outras mulheres que natildeo satildeo dirigentes do sindicato uma vez que algumas delas foram
assessoras do sindicato tendo acompanhado de perto a luta das referidas mulheres A
entrevista com a presidente da FetagriPA teve como objetivo conhecer o panorama estadual
no qual o STTR de Marabaacute estaacute inserido Ademais no iniacutecio da construccedilatildeo do projeto de
pesquisa interessava-me em compreender a participaccedilatildeo das mulheres em Marabaacute em vaacuterias
categorias Posteriormente em conjunto com meu orientador afunilei para o sindicalismo de
trabalhadores e trabalhadoras rurais principalmente por manifestaccedilotildees do senso comum de
que as mulheres natildeo tinham ingerecircncia nem representaccedilatildeo alguma nessa entidade
Dos sete homens entrevistados um foi assessor do sindicato (trabalhando na Comissatildeo
Pastoral da TerraCPT Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins AraguaiaFATA e Copserviccedilos) e seis
dirigentes o atualreeleito presidente dois dirigentes da atual gestatildeo (Tesoureiro e Secretaacuterio
Geral) um dirigente de gestatildeo anterior (Secretaacuterio de Poliacutetica Agraacuteria e Agriacutecola) e dois
presidentes de gestotildees anteriores (dentre outros cargos) Dois homens entrevistados estavam
presentes no dia em que o sindicato foi fundado no mecircs de dezembro de 1980 no Bairro
Morada Nova constituindo-se portanto em personagens histoacutericos ndash o que seraacute detalhado no
item 43 da dissertaccedilatildeo
As entrevistas foram analisadas qualitativamente destacando que devido agrave
singularidade de cada uma realizei o cruzamento das mesmas entre si atraveacutes das leituras
verticais e horizontais conforme proposiccedilatildeo de Michelat (1987) Aleacutem disso durante a
10
Uma delas mora em assentamento que dista mais de 200 km da sede de Marabaacute entrei em contato
com o filho que explicou que dificilmente a matildee se desloca para a sede 11
A Coordenadoria Especial de Poliacuteticas Puacuteblicas para a Mulher eacute um oacutergatildeo vinculado diretamente agrave
Secretaria de Assistecircncia Social da Prefeitura Municipal de Marabaacute
30
pesquisa empiacuterica estive baseada na recomendaccedilatildeo de Oliveira (2000) olhar ouvir e
escrever
Nesse sentido a anaacutelise dos dados coletados permitiu identificar se a participaccedilatildeo das
mulheres no sindicato especificado representa formas de empoderamento nas dimensotildees
econocircmica pessoal social e poliacutetica (BRUMER ANJOS 2010) bem como nas esferas
puacuteblica e privada
31
3 EMPODERAMENTO RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
31 MULHERES HISTOacuteRIA E EMPODERAMENTO
Emma Siliprandi (2015) analisando os movimentos de mulheres na atualidade
comenta sobre o conjunto das lutas feministas ao longo da histoacuteria que proporcionaram no
final do seacuteculo XX o comeccedilo da assimilaccedilatildeo do feminismo em instituiccedilotildees como
universidades igrejas governos e partidos poliacuteticos Aleacutem disso legislaccedilotildees foram
modificadas oportunidades foram abertas para que as questotildees das mulheres se tornassem
puacuteblicas A seguir as principais conquistas apontadas por Siliprandi (2015)
Instituiccedilotildees internacionais comeccedilam a ter que dar respostas agraves reivindicaccedilotildees
das mulheres em 1975 a Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas (ONU) instituiu a
Deacutecada da Mulher na primeira Conferecircncia Mundial da Mulher no Meacutexico
e estabeleceu em seu Plano de Accedilatildeo que as mulheres fossem tratadas
legalmente em situaccedilatildeo de igualdade com os homens em todos os paiacuteses do
mundo Em 1979 com a aprovaccedilatildeo da Convenccedilatildeo sobre a Eliminaccedilatildeo de
Todas as Formas de Discriminaccedilatildeo contra a Mulher (Convention on the
Elimination of All Form of Discrimination Agaisnt Women (Cedaw) criou-
se um clima poliacutetico internacional que estimulava os paiacuteses a reverem as
suas constituiccedilotildees e aparatos legais removendo dispositivos que
representassem empecilhos agrave igualdade formal entre homens e mulheres
Muitos paiacuteses modificaram suas legislaccedilotildees apoacutes esse periacuteodo e criaram
estruturas puacuteblicas para a promoccedilatildeo dos direitos das mulheres
(SILIPRANDI 2015 p 41)
Em relaccedilatildeo agrave luta da mulher por sua emancipaccedilatildeo Toledo (2001) descreve as trecircs
grandes ondas ocorridas nos tempos modernos
A primeira foi no final do seacuteculo XIX e iniacutecio do XX com o movimento
sufragista e a luta por outros direitos democraacuteticos A segunda foi no final
dos anos 60 e iniacutecio dos 70 com os movimentos feministas que visavam
basicamente a liberaccedilatildeo sexual E a terceira no final dos anos 70 e iniacutecio dos
80 de caraacuteter sobretudo sindical e protagonizada principalmente pela mulher
trabalhadora latino-americana (TOLEDO 2001 p 75)
Remontando o debate ao fim do seacuteculo XIX com o advento da Repuacuteblica Soihet
(2013) comenta sobre a mudanccedila significativa nas aspiraccedilotildees das mulheres brasileiras
principalmente em relaccedilatildeo ao trabalho remunerado Mulheres dos segmentos meacutedios e
elevados da sociedade passaram a busca-lo sendo um dos motivos o processo de
industrializaccedilatildeo ndash os produtos consumidos pelas famiacutelias passaram a ser adquiridos no
mercado dando lugar a crescente necessidade de contribuiccedilatildeo financeira por parte das
32
mulheres Aleacutem disso Soihet (2013) aponta que as mulheres buscavam a realizaccedilatildeo
profissional e autossuficiecircncia econocircmica
Para Matos e Borelli (2013) uma das maiores transformaccedilotildees dos uacuteltimos cem anos
foi a presenccedila marcante e evidente das mulheres no mundo do trabalho Segundo as autoras
alguns confundem ldquotrabalho femininordquo com as funccedilotildees domeacutesticas os cuidados com a famiacutelia
e a casa jaacute outros entendem que ele envolve as atividades remuneradas realizadas no proacuteprio
domiciacutelio e mesmo a participaccedilatildeo das mulheres no mercado de trabalho
Siliprandi (2015) frisa que apesar da situaccedilatildeo das mulheres ter melhorado em termos
de direitos civis em comparaccedilatildeo ao iniacutecio do seacuteculo XX ainda persistem desigualdades
flagrantes quando se compara com a situaccedilatildeo dos homens ldquoTanto no que diz respeito agraves
condiccedilotildees estruturais e econocircmicas de acesso aos meios fiacutesicos para a sua sobrevivecircncia
como com relaccedilatildeo agrave possibilidade de realizaccedilatildeo de projetos autocircnomos de vida por conta da
manutenccedilatildeo de padrotildees de gecircnero fortemente excludentesrdquo (SILIPRANDI 2015 p 47)
Os movimentos das mulheres rurais trazem contribuiccedilotildees significativas ao debate uma
vez que as mobilizaccedilotildees das trabalhadoras rurais elucidam a capacidade das mulheres de
vincular as reflexotildees sobre a vida domeacutestica agraves demandas dos movimentos populares Giulani
(2015) esclarece que durante muito tempo se pensou que seria difiacutecil mobilizar as mulheres
trabalhadoras porque se considerava irregular e provisoacuteria sua inserccedilatildeo no mercado de
trabalho Poreacutem estudos acadecircmicos e de militantes apontam para as seguintes constataccedilotildees
() a participaccedilatildeo produtiva das mulheres rurais eacute massiva e marcada por
uma longa jornada de trabalho mal remunerado () as mobilizaccedilotildees das
mulheres rurais tecircm ganhado visibilidade atraveacutes de manifestaccedilotildees
protestos e abaixo-assinados que reclamam o respeito agrave legislaccedilatildeo o acesso
agrave previdecircncia social e tambeacutem o direito de participar ativamente de seus
sindicatos (GIULANI 2015 p 645)
As mulheres tecircm contribuiacutedo para a efetivaccedilatildeo de algumas transformaccedilotildees
importantes como por exemplo a politizaccedilatildeo do cotidiano domeacutestico o fim do isolamento
das mulheres no seio da famiacutelia e a definitiva integraccedilatildeo das mulheres nas lutas sociais
(GIULANI 2015)
No Brasil a noccedilatildeo de empoderamento eacute utilizada inicialmente na deacutecada de 70 do
seacuteculo XX com os movimentos sociais e posteriormente passa a ser utilizada pelas
organizaccedilotildees natildeo-governamentais Desde o final da deacutecada de 90 do seacuteculo XX ocorreu uma
apropriaccedilatildeo gradual da abordagem de empoderamento por organizaccedilotildees financeiras
multilaterais (como o Banco Mundial) e agecircncias de cooperaccedilatildeo poreacutem ocasionando um
processo de despolitizaccedilatildeo dessa noccedilatildeo (ROMANO ANTUNES 2002)
33
Para Romano (2002) o empoderamento eacute visto como estrateacutegia de combate agrave pobreza
uma vez que a pobreza eacute considerada um estado de desempoderamento principalmente
quando se analisa grupos mais desempoderados e vulneraacuteveis como as mulheres idosos e
crianccedilas Dessa forma o empoderamento dos pobres e das comunidades viria a ocorrer pela
conquista plena dos direitos de cidadania
De acordo com reflexotildees de Gohn (2004) a categoria ldquoempowermentrdquo ou
empoderamento (traduzida no Brasil) natildeo tem caraacuteter universal podendo referir-se a accedilotildees de
impulso a grupos e comunidades na qual se busque a efetiva melhora de suas existecircncias e
tambeacutem pode referir-se a praacuteticas de assistecircncia a populaccedilotildees carentes e excluiacutedas ndash
conduzidas por organizaccedilotildees natildeo-governamentais do terceiro setor
Aprofundando a discussatildeo para o empoderamento da mulher as autoras Deere e Leoacuten
(2002) consideram-no precondiccedilatildeo para a obtenccedilatildeo da igualdade entre homens e mulheres
uma vez que o empoderamento da mulher transforma as relaccedilotildees de gecircnero O termo
ldquoempoderamentordquo chama a atenccedilatildeo para a palavra ldquopoderrdquo e o conceito de poder enquanto
relaccedilatildeo social Rowlands (1997 apud DEERE LEOacuteN 2002) diferencia quatro tipos de poder
(poder sobre poder para poder com e poder de dentro)
[] ldquopoder sobrerdquo representa a estaca zero de um jogo o aumento no poder
de algueacutem significa uma perda de poder para outra pessoa Por outro lado as
outras 3 formas ndash poder para poder com e poder de dentro ndash satildeo todas
aditivas um aumento no poder de uma pessoa aumenta o poder total
disponiacutevel ou o poder de todos (ROWLANDS 1997 apud DEERE LEOacuteN
2002 p53)
Deere e Leoacuten (2002) enfatizam que o empoderamento da mulher desafia relaccedilotildees
familiares patriarcais pois pode levar ao desempoderamento do homem e consequentemente
leva agrave perda da posiccedilatildeo privilegiada que ele possui
Estudo conduzido por Amorim (2012) analisou se a participaccedilatildeo das mulheres em
sindicatos de trabalhadores rurais gera empoderamento para as mesmas no acircmbito puacuteblico e
privado Para tanto a autora adotou uma perspectiva comparativa analisando mulheres
sindicalizadas e natildeo sindicalizadas As variaacuteveis que se destacaram encontram-se no quadro
03
34
Quadro 03 Comparativo entre as variaacuteveis que se destacaram na anaacutelise dos dados dos dois grupos
pesquisados
Acircmbito Natildeo sindicalizadas Sindicalizadas
Privado
1 Maior niacutevel de escolaridade
2 Liberdade para tomar decisotildees
3 Liberdade para sair de casa
4 Administra a renda
5 Renda pessoal
6 Renda familiar
7 Propriedade de bens imoacuteveis
1 Maior uso de meacutetodo contraceptivo e de
planejamento familiar
2 Propriedade de bens moacuteveis
Puacuteblico 1 Maior acesso a benefiacutecios
previdenciaacuterios
1 Maior niacutevel de participaccedilatildeo em outras
organizaccedilotildees associativas
2 Maior niacutevel de envolvimento nas
instituiccedilotildees de que participam
3 Acesso a poliacuteticas puacuteblicas FONTE Amorim (2012)
Os resultados obtidos pela pesquisa identificaram que as mulheres sindicalizadas e natildeo
sindicalizadas alcanccedilam empoderamento em esferas diferentes As primeiras apresentaram
indicadores de empoderamento na esfera puacuteblica enquanto as segundas evidenciaram
indicadores relacionados ao empoderamento em acircmbito privado (AMORIM 2012)
Em estudo sobre as caracteriacutesticas gerais das atividades de mulheres na pesca em
diferentes contextos Maneschy Siqueira e Aacutelvares (2012) identificaram as seguintes frentes
nas quais podem ser contabilizados niacuteveis de empoderamento assumidos por essas mulheres
Incluem o direito de associaccedilatildeo o acesso a espaccedilos de direccedilatildeo em
organizaccedilotildees de pescadores a busca e as possibilidades de se capacitarem
para lidar com a modernizaccedilatildeo pesqueira e ao mesmo tempo contribuir com
as lutas locais contra poliacuteticas de ocupaccedilatildeo de seus territoacuterios e a favor de
garantia de acesso aos recursos (MANESCHY SIQUEIRA AacuteLVARES
2012 p 731)
Na aacuterea da pesca interpretada genericamente como masculina haacute atuaccedilatildeo de mulheres
como demonstram as autoras citadas anteriormente No campo de sindicalismo de
trabalhadores rurais a efetiva participaccedilatildeo da mulher eacute minimizada pouco visiacutevel ou negada
nas interpretaccedilotildees generalizadas
Analisando o empoderamento numa perspectiva de gecircnero Colling (2004) considera-o
como o processo pelo qual as mulheres incrementam sua capacidade de configurar suas
proacuteprias vidas
Eacute uma evoluccedilatildeo na conscientizaccedilatildeo das mulheres sobre si mesmas sobre sua
posiccedilatildeo na sociedade As cotas partidaacuterias reconhecidas como discriminaccedilatildeo
35
positiva para corrigir seacuteculos de desigualdade satildeo reconhecidas como
tentativas de empoderamento das mulheres O empoderamento deve
capacitar as mulheres para assumir o poder levando em conta as relaccedilotildees de
poder entre homem e mulher hierarquicamente construiacutedas (COOLING
2004 p 06)
Para a entrevistada Maria (2017) as mulheres precisam se empoderar cada vez mais
ocupando o seu verdadeiro lugar ldquoEu toda vida fui assim empoderadiacutessima Sempre fui
aquela pessoa decididardquo (Entrevista com Maria em 14072017) E de acordo com a
entrevistada Dandara (2017)
Uma mulher natildeo pode de forma nenhuma deixar algueacutem decidir por ela
Qual o caminho que ela quer seguir seja ele profissional seja ele no ramo da
educaccedilatildeo ou no seu proacuteprio empoderamento mesmo Algueacutem dizer ldquoTu tem
que ir para alirdquo Natildeo eu acho que natildeo tem que ser assim E na vida
domeacutestica tambeacutem Vocecirc natildeo pode deixar uma pessoa lhe proibir de usar
determinada roupa ou cortar o cabelo ou decidir o rumo daquilo que vocecirc
tem vontade de fazer Acho que a gente tem que ter decisatildeo proacutepria
(Entrevista com Dandara em 01092017)
Essas duas falas demonstram a importacircncia das mulheres assumirem o controle de
suas proacuteprias vidas libertando-se das amarras que as impedem de evoluir social profissional
intelectual emocional e espiritualmente
Em estudo sobre a socializaccedilatildeo de agricultoras no Movimento de Mulheres do
Nordeste Paraense (MMNEPA) Silva (2008) elenca o empoderamento da mulher como um
dos objetivos do referido movimento
Para as mulheres inseridas no MMNEPA o empoderamento refere-se ao
desenvolvimento de potencialidades ao aumento de informaccedilatildeo e ao
aprimoramento de percepccedilotildees pela troca de ideias com o objetivo de
fortalecer as capacidades as habilidades e as disposiccedilotildees das mulheres para
exerciacutecio do poder compreendido por elas como crescimento intelectual
ldquoempoderamentordquo que lhes daacute condiccedilotildees de atuar em diferentes espaccedilos em
casa na comunidade religiosa no sindicato nos conselhos (SILVA 2008
p73)
Segundo Silva (2008) o IV Congresso do MMNEPA realizado em Nova Timboteua
(PA) no periacuteodo de 20 a 23 de abril de 2006 teve como um dos encaminhamentos escolher
como linhas de accedilatildeo do movimento Sauacutede sexualidade e direitos reprodutivos A
organizaccedilatildeo e o empoderamento das mulheres Desenvolvimento econocircmico popular e
solidaacuterio Mulheres e Meio Ambiente Mulheres e direitos humanos As referidas linhas de
accedilatildeo orientam os processos de capacitaccedilatildeo e demais atividades do movimento O MMNEPA eacute
uma experiecircncia exitosa sendo considerada referecircncia na articulaccedilatildeo e protagonismo das
mulheres do nordeste paraense
36
32 RELACcedilOtildeES DE GEcircNERO E AGRICULTURA FAMILIAR
A existecircncia de uma relaccedilatildeo de hierarquia entre os gecircneros explica a valorizaccedilatildeo
diferente do trabalho de mulheres e homens sendo que a base dessa relaccedilatildeo estaacute na divisatildeo
sexual do trabalho Nobre (2005) aponta para a necessidade de se entender a dinacircmica que
envolve a complexidade das relaccedilotildees de gecircnero no intuito da superaccedilatildeo das desigualdades
produzidas e reproduzidas Deve ser levado em consideraccedilatildeo por exemplo o seguinte
aspecto ldquoo processo de socializaccedilatildeo de gecircnero desenvolvendo habilidades e capacidades
diferentes nos homens e nas mulheresrdquo (NOBRE 2005 p44)
Segundo essa autora na aacuterea rural os meninos e meninas estatildeo sempre juntos ateacute por
volta dos cinco anos Apoacutes essa idade as meninas passam a seguir as matildees acompanhando-as
nas atividades domeacutesticas e ajudando-as enquanto isso os meninos passam a seguir o pai
aprendendo com ele e tendo mais tempo para brincar nas horas de lazer (as meninas tecircm
menos tempo de lazer) Aleacutem disso os rapazes podem sair mais satildeo mais independentes
enquanto que as moccedilas ficam mais em casa monitoradas pela famiacutelia
Motta-Maueacutes (1993) investigou as mulheres (e homens implicitamente) de uma
comunidade de pescadores ndash povoaccedilatildeo de Itapuaacute localizada no municiacutepio de Vigia (PA) ndash
ldquoexaminando as atribuiccedilotildees reconhecidas como proacuteprias a cada uma dessas categorias de
pessoas com base nas diferenccedilas entre os dois sexosrdquo (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 02) De
acordo com a autora a organizaccedilatildeo do sistema social da comunidade estaacute estruturada no
sentido de opor um papel masculino ativo e dominante a outro passivo e dependente das
mulheres
A atuaccedilatildeo principal da mulher em Itapuaacute se resume ao seu desempenho nas
tarefas domeacutesticas e agriacutecolas (seu trabalho nas roccedilas) Nestas pela proacutepria
natureza do trabalho que executa os cuidados com sua casa sua famiacutelia e a
produccedilatildeo de alimentos voltada sempre para o acircmbito interno da
comunidade a mulher se enquadra perfeitamente no esquema de atribuiccedilotildees
do seu sexo natildeo surgindo portanto oposiccedilotildees a sua atuaccedilatildeo Nas outras
esferas se ela se conforma ao modelo e natildeo tenta ultrapassar os limites que
lhe satildeo impostos a situaccedilatildeo permanece a mesma Se entretanto se aventura
a ir aleacutem desses limites a pressatildeo gerada pelo sistema social surge logo para
mostrar-lhe o lugar que lhe compete (MOTTA-MAUEacuteS 1993 p 208)
Estudo realizado com base nas experiecircncias dos quintais produtivos de quatro
agricultoras da regiatildeo do Sertatildeo do Pajeuacute (PE) aponta para dificuldades enfrentadas por elas
37
no iniacutecio de suas experiecircncias com os quintais dentre as quais a forte carga de trabalho
como explicado pelos autores (ALEXANDRE et al 2015)
A sobrecarga de trabalho das mulheres foi uma questatildeo levantada por todas
Elas tinham que assumir sozinhas o trabalho reprodutivo ndash cuidado da casa e
dos filhasos ndash e o trabalho solitaacuterio em seus quintais e vivenciar os conflitos
com os maridos no que se refere agrave falta de autonomia para decidirem suas
vidas Para elas a situaccedilatildeo eacute causada pela cultura machista existente na
sociedade (ALEXANDRE et al 2015 p 133)
Em relaccedilatildeo agrave participaccedilatildeo das mulheres na tomada de decisatildeo na agricultura familiar
Melo Cappelin e Castro (2010) avaliam que em assentamentos rurais o poder de decisatildeo das
mulheres eacute bem menor do que sua participaccedilatildeo efetiva na produccedilatildeo em relaccedilatildeo ao poder do
homem sobre a gestatildeo do lote Com o intuito de superar barreiras como essa Dantas e Gomes
(2014) demonstram que as mulheres rurais protagonizaram fortes processos de mobilizaccedilatildeo e
construccedilatildeo de alternativas para a superaccedilatildeo das desigualdades de gecircnero principalmente
atraveacutes da realizaccedilatildeo de projetos no periacuteodo de 2003-2013 em parceria com a Diretoria de
Poliacuteticas para as Mulheres Rurais e Quilombolas do extinto Ministeacuterio do Desenvolvimento
Agraacuterio (DPMRMDA) Os referidos projetos proporcionaram agraves mulheres resultados como
o despertar das mulheres para sua participaccedilatildeo poliacutetica no acircmbito do Programa Territoacuterios da
Cidadania melhoria nos rendimentos e qualificaccedilatildeo das poliacuteticas puacuteblicas
Jancz et al (2018) descrevem pesquisa realizada no acircmbito de um projeto de
sistematizaccedilatildeo da produccedilatildeo de mulheres rurais no Vale do Ribeira A pesquisa acompanhou a
implementaccedilatildeo do uso da caderneta agroecoloacutegica por parte de um grupo de 27 mulheres
Segundo as autoras
A caderneta agroecoloacutegica eacute um instrumento que daacute visibilidade ao trabalho
feito pelas mulheres nos quintais e roccedilas e ajuda a promover sua autonomia
Trata-se de um caderno simples com quatro colunas que organizam as
informaccedilotildees sobre o destino da produccedilatildeo o que foi vendido o que foi
doado o que foi trocado e o que foi consumido (JANCZ et al 2018 p 61)
As mulheres participantes do projeto relataram que num primeiro momento tiveram
duacutevidas sobre o que anotar na caderneta agroecoloacutegica bem como passaram por situaccedilotildees
constrangedoras no inicio da sistematizaccedilatildeo devido seus maridos e filhos darem pouca ou
nenhuma importacircncia agraves referidas anotaccedilotildees Todavia as mulheres tambeacutem relataram que o
haacutebito de organizar a caderneta agroecoloacutegica as aproximou da realidade em que vivem como
38
tambeacutem proporcionou a elas maior visibilidade e autonomia dentro da identidade da famiacutelia
(JANCZ et al 2018)
A Marcha das Margaridas merece destaque nesse debate Trata-se de uma accedilatildeo
estrateacutegica das mulheres do campo da floresta e das aacuteguas que integra a agenda permanente
do Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) e de movimentos
feministas e de mulheres do Brasil A Mobilizaccedilatildeo eacute realizada sempre no mecircs de agosto em
referecircncia agrave Margarida Maria Alves trabalhadora rural e liacuteder sindical na Paraiacuteba que foi
brutalmente assassinada em 12 de agosto de 1983 por um pistoleiro a mando de usineiros da
regiatildeo Margarida foi a primeira mulher presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Alagoa Grande Ela incentivava as trabalhadoras e trabalhadores rurais a buscarem na justiccedila
a garantia de seus direitos protegidos pela legislaccedilatildeo trabalhista (ASA 2015)
Desde 2000 campesinas quilombolas indiacutegenas cirandeiras quebradeiras de coco
pescadoras ribeirinhas e extrativistas do Brasil todo se dirigem agrave Brasiacutelia em agosto com suas
camisetas lilaacutes e chapeacuteu de palha para marchar por igualdade autonomia e melhores
condiccedilotildees de vida e trabalho para as mulheres no campo e na floresta A marcha eacute considerada
a maior mobilizaccedilatildeo de trabalhadoras rurais do paiacutes Para Barbosa e Melo (2015) a marcha eacute
um dos maiores siacutembolos de mobilizaccedilatildeo e conclamaccedilatildeo pelo fim da violecircncia contra a
mulher e pela paz no campo ldquoMargaridas Marias Rosas Joanas Teresas Antonias Vitoacuterias
Joaquinas Franciscas ou quaisquer que sejam seus nomes elas carregam consigo a esperanccedila
e a aposta em um futuro melhorrdquo (BARBOSA MELO 2015 p 10) As margaridas
marcharam em 2000 com 20 mil mulheres 2003 com 40 mil mulheres 2007 com 70 mil
mulheres 2011 com recorde de participaccedilatildeo de 100 mil mulheres e 2015 com 70 mil
mulheres em Brasiacutelia (LOURENCcedilO 2015)
De acordo com as mulheres entrevistadas para essa pesquisa elas participaram das
ediccedilotildees da Marcha das Margaridas em Brasiacutelia Natildeo consegui precisar a quantidade Poreacutem
as entrevistadas relataram a importacircncia de vivenciar eventos dessa magnitude Aleacutem disso
os diretores entrevistados tambeacutem relataram que as mulheres participaram O entrevistado
Claacuteudio (2017) esclarece que havia no sindicato em gestotildees anteriores um grupo que
organizava a participaccedilatildeo das mesmas Na I Marcha das Margaridas em 1997 segundo o
entrevistado Luiacutes (2017) participaram trinta e cinco delegadas sindicais aproximadamente
Conforme depoimento do entrevistado Milton (2017) houve momentos em que ele articulou a
participaccedilatildeo das mulheres solicitando ajuda de custo para a tesouraria do sindicato
39
A Marcha das Margaridas quem fazia articulaccedilatildeo para levar as mulheres era
eu Quando desistia eu ia nos acampamentos fazia a articulaccedilatildeo e agraves vezes
ateacute eu pedia para o diretortesoureiro do sindicato para aquelas que queria ir
mas natildeo tinha o dinheiro para ir para gastar com alguma coisa eu fazia a
articulaccedilatildeo para o cara gastar pelo menos uma ajuda para cada uma delas
para elas participarem para elas verem A minha vontade eacute que as mulheres
vissem como as coisas funcionavam Aiacute elas participavam muito (Entrevista
com Milton em 23052017)
A entrevistada Maria (2017) enfatiza que o apoio do sindicato para que as mulheres
viajassem era ldquopraticamente zerordquo
Como era a Federaccedilatildeo [FetagriPA] que articulava o papel do sindicato era
soacute chamar as mulheres ldquoVocecircs vai ou natildeo vairdquo porque a Federaccedilatildeo
pressionava os sindicatos que tinha que ter as mulheres tinha que ter tantas
mulheres E tinha vez que eles natildeo davam conta Por exemplo bem aqui [no
assentamento em que Maria mora onde eu a entrevistei] aiacute essas mulheres
natildeo tinham condiccedilatildeo de pagar a passagem aiacute eles natildeo pagavam natildeo queriam
pagar nem a passagem da pobre da mulher para ir (Entrevista com Maria em
14072017)
Aleacutem dos entraves relacionados ao apoio financeiro da diretoria do sindicato as
mulheres que queriam participar da Marcha das Margaridas enfrentavam problemas de outra
natureza como por exemplo serem impedidas pelos maridos de acordo com relato da
entrevistada Tereza (2017) ldquoEu cheguei a me inscrever para ir mas eu tava graacutevida Aiacute teve
uma crise com esse meu ex marido que ele natildeo queria que eu fosse e tudo mais E eu acabei
natildeo indo Foi a uacutenica [marcha] que eu cheguei a querer irrdquo (Entrevista com Tereza em
19052017)
A figura 03 representa o cartaz da quinta ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas
Figura 03 Cartaz da 5ordf Marcha das Margaridas
Fonte httpcaritasorgbrmargaridas-seguem-em-marcha29435
40
A 6ordf ediccedilatildeo da Marcha das Margaridas estaacute sendo planejada para agosto de 2019
tendo como reivindicaccedilotildees centrais quatro eixos ldquoEm defesa da previdecircncia social puacuteblica
universal e solidaacuteria Pela democracia e protagonismo das mulheres na poliacutetica Pela vida das
mulheres e contra todas as formas de violecircncia Pela defesa do meio ambiente e bens comunsrdquo
(CONTAG 2018 p 03)
Em relaccedilatildeo agrave luta pela terra considerando a perspectiva do Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Schwendler (2009) destaca que na fase do
acampamento a luta cotidiana assume a forma coletiva com a participaccedilatildeo de toda a famiacutelia e
com a composiccedilatildeo da coordenaccedilatildeo de cada instacircncia criada sendo formada por um homem e
uma mulher Segundo essa autora
A ldquomulher sem-terrardquo quando acampada comeccedila a romper com a sua
invisibilidade puacuteblica por meio de fatores como a socializaccedilatildeo da vida
privada pela criaccedilatildeo de espaccedilos onde comeccedila a ter voz a divisatildeo de tarefas
do espaccedilo puacuteblico e privado entre homens e mulheres as novas experiecircncias
organizativas que a condiccedilatildeo da luta exige () ao mesmo tempo que a
inserccedilatildeo das acampadas e assentadas no movimento social de luta pela terra
e em organizaccedilotildees ou movimentos especiacuteficos de mulheres tem permitido
que encontrem canais para repensar a sua condiccedilatildeo e o seu papel na
sociedade e acima de tudo para a ruptura com o isolamento da vida
construiacuteda no espaccedilo privado e sua inserccedilatildeo no espaccedilo puacuteblico elas ainda
encontram enormes obstaacuteculos na praacutetica social para a conquista da
igualdade seja nos espaccedilos da luta social do trabalho da vida familiar
(SCHWENDLER 2009 p219)
Portanto percebe-se que mesmo com os esforccedilos do MST em se promover a igualdade
de gecircnero ainda assim as mulheres necessitam lutar e batalhar para a conquista dessa
igualdade
41
4 REFLEXOtildeES SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS NO BRASIL
41 BREVE HISTOacuteRICO SOBRE O SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
A expressatildeo ldquonovo sindicalismordquo foi utilizada no Brasil para nomear o vigoroso
movimento de retomada das lutas e da mobilizaccedilatildeo social no contexto de ditadura12
a
emergecircncia de lideranccedilas fortes e de experiecircncias inovadoras que questionaram a tradiccedilatildeo
sindical anterior e ainda a explosatildeo no nuacutemero de trabalhadores filiados (FAVARETO
2006) Favareto (2006) situa o novo sindicalismo entre constrangimentos derivados de duas
ordens a evoluccedilatildeo na qualidade do conflito social agraacuterio de um lado e os arranjos e tensotildees
internos ao campo sindical de outro A reforma agraacuteria e a defesa dos direitos trabalhistas
passaram a ser as principais bandeiras do sindicalismo rural
No estado do Paraacute as organizaccedilotildees camponesas satildeo resultado de um longo processo
de construccedilatildeo em que inicialmente se confundem e disputam fazendeiros agricultores e
operaacuterios agriacutecolas A definiccedilatildeo de identidades demarcadas pelas diferenccedilas de interesses de
classe comeccedilou a ocorrer depois da deacutecada de 1950 por condiccedilotildees poliacuteticas e contradiccedilotildees
que vatildeo se definindo ao longo da histoacuteria que remonta ao iniacutecio do seacuteculo XX e no caso do
Paraacute continua inacabada13
(GUERRA 2009)
Afunilando o debate para o sudeste paraense estudo feito por Assis (2007) sobre as
transformaccedilotildees das entidades de representaccedilatildeo14
dos agricultores familiares (figura 04) e de
suas accedilotildees no sudeste paraense ndash no contexto dos anos noventa do seacuteculo XX ndash mostrou a
capacidade das referidas entidades em ldquose fazer ouvir e respeitar pelo Estado gerando
impactos significativos no espaccedilo socioeconocircmico regionalrdquo (ASSIS 2007 p 207)
12
Segundo Codato (2005) ldquoNo Brasil o regime ditatorial-militar durou 25 anos de 1964 a 1989 teve
seis governos e sua histoacuteria pode ser dividida em cinco grandes fases Uma primeira fase de
constituiccedilatildeo do regime poliacutetico ditatorial-militar corresponde aos governos Castello Branco e Costa e
Silva (de marccedilo de 1964 a dezembro de 1968) uma segunda fase de consolidaccedilatildeo do regime (que
coincide com o governo Medici 1969-1974) uma terceira fase de transformaccedilatildeo do regime (o
governo Geisel 1974-1979) uma quarta fase de desagregaccedilatildeo do regime (o governo Figueiredo
1979-1985) e por uacuteltimo a fase de transiccedilatildeo do regime ditatorial-militar para um regime liberal-
democraacutetico (o governo Sarney 1985-1989)rdquo (CODATO 2005 p83) 13
Ainda segundo Guerra (2009) a polarizaccedilatildeo entre fazendeiros e posseiros continua principalmente
no que se refere ao discurso das lideranccedilas mais expressivas das entidades patronais e trabalhistas 14
Entidades de representaccedilatildeo segundo Assis (2007) ldquoinstituiccedilotildees de caraacuteter poliacutetico eou econocircmico
reconhecidas juridicamente em atuaccedilatildeo na regiatildeo sudeste do Paraacute a partir dos anos 90 e deacutecadas
anteriores cujo puacuteblico alvo de sua accedilatildeo eram os agricultores familiares com ou sem terra
proprietaacuterios posseiros ou assentados de reforma agraacuteriardquo (ASSIS 2007 p10)
42
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43
Em relaccedilatildeo agrave formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense
Assis (2007) ressalta
A formaccedilatildeo do sindicalismo de trabalhadores rurais no sudeste paraense foi
um processo complexo resultante da articulaccedilatildeo de diferentes atores sociais
principalmente da accedilatildeo de milhares de agricultores e posseiros que
organizaram lutas de resistecircncia e pelo acesso agrave terra Militantes poliacuteticos e
de direitos humanos organizaccedilotildees natildeo governamentais (ONGs) com
diferentes inspiraccedilotildees e principalmente a Igreja Catoacutelica tiveram um papel
importante e decisivo nessa construccedilatildeo As entidades de representaccedilatildeo
(associaccedilotildees sindicatos e outras formas de organizaccedilatildeo) assumiram um
lugar de destaque em funccedilatildeo de sua importacircncia no processo de construccedilatildeo e
inserccedilatildeo dos agricultores como um ator poliacutetico no cenaacuterio regional Essas
entidades se constituiacuteram marcadas pelos complexos processos
socioeconocircmicos regionais mas estreitamente relacionados a macro-
processos que lhes atribuiacuteram caracteriacutesticas proacuteprias (ASSIS 2007 p 77)
De acordo com a figura 04 eacute possiacutevel perceber que durante a deacutecada de 90 do seacuteculo
XX houve um aumento nas formas de entidades de representaccedilatildeo comparando-se agraves deacutecadas
anteriores Nos anos 70 estavam presentes na regiatildeo sudeste paraense as delegacias
sindicais15
associaccedilotildees e sindicatos de trabalhadores rurais sendo que os sindicatos
estabeleciam relaccedilatildeo com a Federaccedilatildeo dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do
Paraacute (FETAGRI PARAacute) Nos anos 80 a complexidade aumentou uma vez que surgiram na
regiatildeo as seguintes entidades Caixa Agriacutecola Fundaccedilatildeo Agraacuteria do Tocantins-Araguaia
(FATA) Cooperativa Camponesa do Araguaia Tocantins (COOCAT) e Conselho Nacional
dos Seringueiros (CNS) O CNS estabelecia relaccedilotildees com os sindicatos (STRs) e a FETAGRI
A FATA Caixa Agriacutecola e as associaccedilotildees estabeleciam relaccedilotildees de produccedilatildeo e
comercializaccedilatildeo com a COOCAT Ademais a FATA articulava os sindicatos na perspectiva
de construccedilatildeo de referecircncias teacutecnicas que lhes permitissem resistir produzindo na terra
ocupada A partir dos anos 90 surge na regiatildeo o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) a Escola Famiacutelia Agriacutecola
(vinculada agrave FETAGRI) a Federaccedilatildeo de Cooperativas do Araguaia-Tocantins (FECAT) a
Central de Associaccedilotildees ndash vinculada agrave Federaccedilatildeo de Associaccedilotildees (FECAP) ndash e a Federaccedilatildeo
dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar (FETRAF) Segundo Assis
(2007) o surgimento dessas novas entidades se deu em virtude de um processo complexo de
15
Pereira (2015) explica o que eram as delegacias sindicais ldquoAs delegacias sindicais eram
prolongamentos das estruturas de poder internas aos STRs numa determinada aacuterea ou comunidade
quase sempre ocupadas por lideranccedilas dos trabalhadores rurais daquelas localidades que
encaminhavam as reivindicaccedilotildees dos posseiros em luta pela terrardquo (PEREIRA 2015 p 283)
44
deslegitimaccedilatildeolegitimaccedilatildeo dos aparelhos sindicais tradicionais sendo que as referidas
entidades apresentam interesses diferenciados
Eacute nesse contexto complexo marcado por tensotildees e conflitos rurais em que o Sindicato
dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute estaacute inserido Guerra (2013) enfatiza o
apoio da Comissatildeo Pastoral da Terra (CPT) no processo de fundaccedilatildeo do sindicato sendo que
houve varias reuniotildees em que se discutiu a necessidade da organizaccedilatildeo para que se
conseguissem conquistas frente ao latifuacutendio e ao grande capital
Havia receio dos trabalhadores em assumir cargos no sindicato temendo
represaacutelias Conseguir doze pessoas para formar a comissatildeo inicial foi uma
dificuldade A Assembleia de Fundaccedilatildeo contou com pouco mais de
cinquenta pessoas no dia 20121980 (GUERRA 2013 p 95)
O primeiro presidente do sindicato foi Joatildeo Honorato de Paula conhecido como Joatildeo
do Cupu que exerceu mandato no periacuteodo de 1980 ateacute 1983 (GUERRA 2013) Com o
assassinato do advogado Gabriel Pimenta Joatildeo do Cupu abandonou o cargo e apenas a
famiacutelia sabe onde ele se encontra desde essa eacutepoca O mandato do atual presidente finda em
2019 Ele foi eleito em 2011 ndash para mandato de quatro anos ndash e reeleito em 2015 Desde a sua
fundaccedilatildeo o sindicato foi presidido exclusivamente por homens num total de oito presidentes
De acordo com as entrevistadas Vana (2017) e Frida (2017) e os entrevistados Saulo (2017) e
Itamar (2017) eacute real a possibilidade de que em 2019 seja eleita a primeira mulher presidente
do STTR de Marabaacute
42 A PARTICIPACcedilAtildeO DA MULHER NO SINDICALISMO DE TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS
As Comunidades Eclesiais de Base e grupos de mulheres organizados pela Comissatildeo
Pastoral da Terra ndash na deacutecada de 1970 do seacuteculo XX ndash contribuiacuteram significativamente na
historia do movimento de mulheres trabalhadoras rurais Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014)
descrevem a origem do movimento de mulheres trabalhadoras rurais no Brasil ocorrida na
deacutecada de 1980 do seacuteculo XX momento em que ocorria a abertura democraacutetica e a
consolidaccedilatildeo do movimento de mulheres e feminista no Brasil Segundo essas autoras
surgiram agrave eacutepoca vaacuterios conselhos de direitos como os conselhos de educaccedilatildeo da mulher os
foacuteruns e os conselhos de promoccedilatildeo da igualdade racial
Conforme Esmeraldo (2013) o movimento sindical de trabalhadores rurais tem a
funccedilatildeo poliacutetica de instrumentalizar ndash com informaccedilotildees e lutas ndash a formaccedilatildeo da consciecircncia
45
dessa categoria profissional para acessar direitos De acordo com discussatildeo anterior referente
agrave divisatildeo sexual do trabalho presente na agricultura familiar percebe-se que ldquoa praacutetica e o
discurso poliacutetico no movimento sindical natildeo fogem agrave regra pois a entidade apoia-se na
reproduccedilatildeo e defesa do gecircnero masculino como representaccedilatildeo da categoria profissional de
trabalhador ruralrdquo (ESMERALDO 2013 p245)
Eacute interessante apresentar a discussatildeo sobre participaccedilatildeo proposta por Bordenave
(2013) ldquoAs pessoas participam em sua famiacutelia em sua comunidade no trabalho na luta
poliacutetica Os paiacuteses participam nos foros internacionais onde se tomam decisotildees que afetam os
destinos do mundordquo (BORDENAVE 2013 p11) Esse autor aponta duas bases
complementares da participaccedilatildeo base afetiva e base instrumental sendo que nem sempre
ocorre o equiliacutebrio entre essas bases
Poreacutem agraves vezes elas entram em conflito e uma delas passa a sobrepor-se agrave
outra Ou a participaccedilatildeo torna-se puramente ldquoconsumatoacuteriardquo e as pessoas se
despreocupam de obter resultados praacuteticos ndash como numa roda de amigos
bebendo num bar ndash ou ela eacute usada apenas como instrumento para atingir
objetivos como num ldquocomandordquo infiltrado em campo inimigo
(BORDENAVE 2013 p 16)
Existem questotildees-chave na participaccedilatildeo de um grupo ou organizaccedilatildeo qual eacute o grau de
controle dos membros sobre as decisotildees e quatildeo importantes satildeo as decisotildees de que se pode
participar (BORDENAVE 2013) Quando se trata da participaccedilatildeo das mulheres em
associaccedilotildees e sindicatos rurais geralmente elas natildeo participam de cargos de lideranccedila natildeo
aparecem nos espaccedilos puacuteblicos predominantemente masculinos todavia as mulheres
conseguem exercer outro tipo de poder ldquoElas podem ser excluiacutedas da autoridade embora
exerccedilam todos os tipos de poder informal Seu status pode ser derivado de suas relaccedilotildees com
os homens embora elas sobrevivam a seus maridos e paisrdquo (ROSALDO 1979 p48) Como
por exemplo nas conversas dessas mulheres com seus respectivos companheiros que satildeo
lideranccedilas e consequentemente na maneira que esses diaacutelogos impactam nas decisotildees deles
Agraves vezes as mulheres mandam mais do que os homens entretanto isso natildeo aparece
publicamente
Moreira Maneschy e Aacutelvares (2014) comentam os principais entraves agrave participaccedilatildeo
das mulheres nas associaccedilotildees e sindicatos rurais reconhecimento da atividade de trabalhadora
rural natildeo discriminaccedilatildeo do trabalho dificuldade de conciliaccedilatildeo das tarefas domeacutesticas com a
presenccedila nos espaccedilos puacuteblicos coletivos de decisatildeo violecircncia domeacutestica sofrida pelas
46
mulheres e ausecircncia de atendimento agraves vitimas nas aacutereas rurais Eacute comum os maridos
elencarem obstaacuteculos como por exemplo permitir que as mulheres participem das reuniotildees
apenas depois de concluir as tarefas domeacutesticas ou cuidar dos filhos aleacutem disso haacute situaccedilotildees
de retaliaccedilotildees sofridas por essas mulheres ao retornarem das reuniotildees (satildeo viacutetimas de
violecircncia fiacutesica satildeo discriminadas publicamente dentre outras situaccedilotildees) Pesquisa realizada
por Paulilo (2009) corrobora essa questatildeo sendo a repressatildeo sexual e a exposiccedilatildeo ao ridiacuteculo
apontadas como instrumentos eficazes de controle dos homens em relaccedilatildeo agraves mulheres
Estudo feito por Guerra (2013) sobre sindicalismo rural aponta para destaque especial
na participaccedilatildeo das mulheres nas decisotildees que dizem respeito agrave famiacutelia e na realizaccedilatildeo de
atividades produtivas inclusive com o reconhecimento pelos homens da habilidade maior das
mulheres em muitas operaccedilotildees como a colheita do arroz e o fabrico de farinha Para Marin
(1998) apesar da existecircncia de formas mais ou menos veladas de discriminaccedilatildeo que as
mulheres satildeo vitimas no interior de organizaccedilotildees sindicais eacute possiacutevel constatar que haacute uma
atualizaccedilatildeo dos seus programas de atividades incluindo plataformas de lutas das sindicalistas
e das camponesas
Pesquisa realizada por Farias et al (2017) sobre a participaccedilatildeo de cinco mulheres
camponesas que se constituiacuteram lideranccedilas e dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais de Rondon do Paraacute apontou para o rompimento com a cultura dos
papeis cristalizados como femininos possibilitando reformulaccedilotildees das relaccedilotildees e
representaccedilotildees de gecircnero
Sob a direccedilatildeo de mulheres o STTR de Rondon do Paraacute tem mantido seu
caraacuteter combativo no enfrentamento do trabalho escravo e no apoio agraves
ocupaccedilotildees de terra e luta pela reforma agraacuteria Em decorrecircncia de suas
accedilotildees tem sido alvo de ameaccedilas contra suas vidas cotidianamente sob
muitas tensotildees (FARIAS et al 2017 p 82-83)
Farias et al (2017) destacam que desde 2002 com a eleiccedilatildeo de Joelma para o cargo de
presidecircncia as mulheres tecircm se mantido dirigentes do STTR de Rondon do Paraacute Joelma eacute
viuacuteva do sindicalista Dezinho ldquoassassinado pelo latifuacutendio em Rondon do Paraacute no ano de
2000rdquo (FARIAS et al 2017 p 79) De acordo com as narrativas das cinco mulheres a palavra
ldquoempoderamentordquo tem sido recorrente evidenciando categoria operacional e estrateacutegica nos
seus discursos de identidade
47
43 O SINDICATO DOS TRABALHADORES E TRABALHADORAS RURAIS DE
MARABAacute
Conforme apresentado anteriormente o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de
Marabaacute foi fundado em 20 de dezembro de 1980 segundo Guerra (2013) Poreacutem essa data eacute
contestada uma vez que em conversa informal16
com Ademir Martins dos Reis17
presente na
reuniatildeo de fundaccedilatildeo a data vaacutelida eacute 10 de dezembro de 1980 Aleacutem disso a data de 10 de
dezembro tambeacutem eacute citada na mateacuteria publicada na paacutegina 08 do Jornal Correio do Tocantins
de 03 a 09 de junho de 1994 sobre o processo eleitoral do ano de 1994 Intitulada ldquoOposiccedilatildeo
desbanca situaccedilatildeo no Sindicato dos Trabalhadoresrdquo a mateacuteria informa sobre a vitoacuteria da
Chapa 02 presidida por Francisco Ferreira de Carvalho derrotando a Chapa 01 que tinha
como titular o entatildeo presidente Francisco Barbosa da Silva (Chicoacute)
O presidente eleito garantiu que jamais tomaraacute alguma decisatildeo em seu
mandato de 3 anos sem antes consultar a sua categoria O STR-Marabaacute
fundado em 10 de dezembro de 1980 possui em seus quadros cerca de 8
mil associados dos quais apenas 50 desse nuacutemero estatildeo quites com suas
obrigaccedilotildees estatutaacuterias (Correio do Tocantins 1994 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo ao processo de fundaccedilatildeo do sindicato o entrevistado Milton (2017)
destaca elementos importantes
Naquela eacutepoca a gente ia fazer uma reuniatildeo era no quintal de algueacutem laacute em
Morada Nova ateacute chamava Juacutelio Ele cedia o quintal dele para noacutes Era
debaixo de uns peacutes de manga Aiacute o pessoal conversava a discussatildeo da
criaccedilatildeo do sindicato e da ocupaccedilatildeo que ia ter A primeira ocupaccedilatildeo que teve
hoje ela taacute no municiacutepio de Ipixuna conhecida antigamente como Pau Seco
e hoje eacute o Assentamento Fortaleza
() Aiacute fizemos aqui a discussatildeo naquela eacutepoca quem participava das
discussotildees ndash eu era um rapazinho novo mas eu lembro ndash era o Padre
Humberto (da Igreja) o Ademir Martins aiacute foi a eacutepoca que chegou o Mano
na regiatildeo o Wambergue Quando para criar o sindicato marcava aquela
reuniatildeo a gente ia laacute para o quintal do seu Juacutelio Ele ateacute morreu jaacute tambeacutem
Aiacute conversava as conversas eram baixinhas porque para os vizinhos do lado
natildeo escutar porque ningueacutem sabia se tinha inimigo (Entrevista com Milton
em 23052017)
A extremada concentraccedilatildeo da propriedade da terra existente no sudeste paraense
obrigou centenas de famiacutelias camponesas chegadas agrave referida regiatildeo a ocupar como
16
Conversa informal realizada em 18 de marccedilo de 2017 em minha residecircncia em BeleacutemPA 17
Ademir Martins dos Reis trabalhava na coordenaccedilatildeo do Movimento de Educaccedilatildeo de Base (MEB)
em 1980 Ele lembra com precisatildeo por ter associado o dia 10 de dezembro ao dia em que a
Organizaccedilatildeo das Naccedilotildees Unidas adotou a Declaraccedilatildeo Universal dos Direitos Humanos (DUDH) ndash em
1948
48
posseiros aacutereas formalmente reservadas agrave coleta de castanha eou fazendas agropecuaacuterias
(PETIT 2003) Eacute nesse contexto que ocorre o conflito do ldquoPau-Secordquo ndash Castanhal Cametauacute
destacando-se pela violecircncia com que se deu e que teve como desfecho a morte do advogado
dos posseiros Gabriel Pimenta (EMMI 1999) Pereira (2015) descreve os desdobramentos
juriacutedicos aos acusados do assassinato o fazendeiro Nelito seu empregado Marinheiro e o
pistoleiro conhecido por ldquoOuriccediladordquo (EMMI 1999) Convergindo com o depoimento do
entrevistado Milton (2017) o autor Assis (2007) enfatiza que foram os posseiros envolvidos
no conflito do Castanhal Pau-SecoCametauacute que forccedilaram a criaccedilatildeo do STR de Marabaacute agrave
revelia da FetagriPA que natildeo demonstrava interesse em criaacute-lo
A eleiccedilatildeo reuniu 40018
agricultores de vaacuterias localidades em clima tenso A
pressatildeo do regime militar e da oligarquia local ainda era tatildeo forte que o local
escolhido para a Assembleia foi o distrito de Morada Nova a 12 km da
cidade de Marabaacute onde apoacutes a sua fundaccedilatildeo permaneceu como sede por
algum tempo (ASSIS 2007 p88)
Os coordenadores das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tambeacutem contribuiacuteram
nesse processo de criaccedilatildeo conforme depoimento do entrevistado Joatildeo (2017)
A partir das Comunidades Eclesiais de Base com todos esses coordenadores
e coordenadoras que tinha foi muito faacutecil A dona Ana de Itainoacutepolis do
Rato era animadora laacute da Matrinchatilde participou O Chicatildeo do Murumuru
participou o Higino do Murumuru participou () Entatildeo conseguimos criar
o sindicato na Igreja de Morada Nova () E o primeiro presidente foi o Joatildeo
do Cupu O segundo foi o Antocircnio Chico (Entrevista com Joatildeo em
11072017)
Segundo Emmi (1999) os conflitos em aacutereas de castanhais situam-se como
componentes decisivos da crise do poder oligaacuterquico sendo que alguns conflitos merecem
destaques por se tratar ldquoda reaccedilatildeo articulada da oligarquia contra o inimigo comum os
trabalhadores que se organizam passando a questionar os direitos dos latifundiaacuterios da
castanhardquo (EMMI 1999 p128) Para essa mesma autora o ano de 1985 do seacuteculo passado foi
marcado por ldquochacinasrdquo em aacutereas de castanhais ou seja conflitos em que devido agrave violecircncia
praticada ocorreram muitas mortes ndash conflitos nos castanhais Pau Ferrado Surubim Ubaacute
Fortaleza e Princesa
O quadro 04 organizado por Guerra (2013) apresenta as principais ocorrecircncias do
STR de Marabaacute ateacute o ano de 1991 enquanto que o Anexo B apresenta a Carta Sindical do
18
Haacute contradiccedilatildeo no nuacutemero de participantes na reuniatildeo de fundaccedilatildeo do STR de Marabaacute Para Assis
(2007) participaram 400 agricultores enquanto que para Guerra (2013) participaram cinquenta De
acordo com o entrevistado Joatildeo (2017) presente na ocasiatildeo participaram aproximadamente 200
pessoas
49
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabaacute datada em 10 de dezembro de 1984 A Carta
Sindical aprova os seus Estatutos sociais e reconhece-o como oacutergatildeo representativo da
categoria profissional ldquotrabalhadores ruraisrdquo integrante do Plano da Confederaccedilatildeo Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura Esse documento soacute era emitido para os STRs que
passassem pela triagem do INCRA e da Delegacia Regional do Trabalho (DRT) agecircncias
governamentais que cuidavam da organizaccedilatildeo da parte legal dos STRs (ASSIS 2007)
Quadro 04 Principais ocorrecircncias do STR de Marabaacute
DATA OCORREcircNCIA FONTE
1965 Fundaccedilatildeo de uma cooperativa de pequenos produtores
COPEMA frustrada pela maacute administraccedilatildeo
VELHO 1972122 e
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
1969 Abertura da PA 150
061979 Ocupaccedilatildeo das Fazendas Fortaleza I e II Francisco Barbosa
10121980 Fundaccedilatildeo do STR Assume Joatildeo Honorato de Paula (Joatildeo do
Cupu) como primeiro presidente
Francisco Barbosa
18021982 Assassinato do advogado Gabriel Pimenta Comissatildeo Pastoral da
Terra
1983 Com a renuacutencia de Joatildeo Honorato de Paula intimidado pela
morte do advogado Gabriel eacute eleito Antonio Francisco da
Silva para assumir a presidecircncia da entidade
Francisco Barbosa
(Chicoacute)
10121984 Outorga da Carta Sindical pelo Ministeacuterio do Trabalho e
Previdecircncia Social
Carta Sindical
120585 Eleiccedilatildeo de Antonio Francisco da Silva para cumprir mandato
de 3 anos
Ata do STR
200588 Eleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer mandato
ateacute 1991
Ata do STR
01061991 Reeleiccedilatildeo de Francisco Barbosa da Silva para exercer
mandato ateacute 1994
Ata do STR
FONTE Documentos do STR
Organizado por GUERRA (2013) e atualizado por Luciana Moreira dos Reis (2017)
A primeira deacutecada do sindicato foi caracterizada pela luta por sua democratizaccedilatildeo
uma vez que as diretorias natildeo estavam do lado dos trabalhadores e trabalhadoras rurais
considerando a influecircncia da famiacutelia dos Mutran citada anteriormente Os processos eleitorais
foram acirrados conforme detalhamento do entrevistado Luiacutes (2017)
Aiacute trabalhamos outra histoacuteria a oposiccedilatildeo sindical Porque no sindicato tinha
a Adelina era a chefona e Haroldo Bezerra natildeo sei quem mais O sindicato
era desses poliacuteticos natildeo era dos trabalhadores E noacutes tava naquela ideia do
Avelino Ganzer de ldquosindicato combativordquo Fomos em 85 [1985] perdemos a
eleiccedilatildeo Foi com o Pedro Leite Em 88 [1988] noacutes perdemos com o Arnaldo
Em 91[1991] noacutes natildeo botamos diretoria porque noacutes tava tudo desgastado
Porque em 88 [1988] noacutes ganhava mas o Luiacutes Carlos entrou com uma chapa
contra a nossa aiacute duas chapas do mesmo lado da oposiccedilatildeo aiacute sabia que
perdia neacute
50
() Eram trecircs chapas A chapa da situaccedilatildeo e duas da oposiccedilatildeo Noacutes
conversamos com o Luiacutes Carlos ldquovamos fazer uma alianccedila entre noacutes porque
vocecircs natildeo tem voto tanto nossordquo Noacutes fizemos 559 eles [a outra chapa de
oposiccedilatildeo] fizeram 192 e o pessoal [a situaccedilatildeo] fizeram 680 Noacutes dava de
chicotadas neles Aiacute noacutes perdemos Aiacute em 91 [1991] noacutes fizemos alianccedila
ldquoVocecirc vai para laacute como secretaacuterio [geral] para organizar para em 94 [1994]
noacutes ganharrdquo Como de fato eu ganhei [em 1994] Fizemos alianccedila e eu saiacute de
Secretaacuterio Geral Isso o Mano intermediando o Gatatildeo todo mundo
intermediando a alianccedila eu queria ser vice eles [a situaccedilatildeo] natildeo deixaram
Soacute deixaram ser o secretaacuterio geral [em 1991] Em 94 [1994] fiquei como
presidente a chapa deles tiveram 458 votos () e noacutes demos uma lavagem
neles de 715 (Entrevista com Luiacutes em 19052017)
Portanto a partir de 1994 com a vitoacuteria da oposiccedilatildeo sindical a diretoria iniciou um
processo de formaccedilatildeo poliacutetica para os trabalhadores e trabalhadoras rurais bem como se
intensificou a criaccedilatildeo das delegacias sindicais A figura 05 representa a sede do sindicato que
funciona nesse local desde o ano de 1984
FIGURA 05 Sede do Sindicato Marabaacute (PA) Foto Luciana Moreira dos Reis (2017)
A questatildeo da luta pela terra estava diretamente ligada agrave Igreja Catoacutelica19
A
entrevistada Simone (2017) esclarece que havia a presenccedila da Igreja Catoacutelica em cada local
19
ldquoApoacutes o Conciacutelio Vaticano II (1962-1965) a Igreja Catoacutelica sobretudo na Ameacuterica Latina por
meio da accedilatildeo de vaacuterios padres freiras leigos(as) os jovens da accedilatildeo catoacutelica foram inseridos em
atividades pastorais sociais e poliacuteticas em defesa dos empobrecidos com vistas agrave construccedilatildeo de uma
sociedade justa e igualitaacuteriardquo (LIMA 2015 p41)
51
onde os posseiros estavam organizados ldquoo pessoal sempre estava ali animando Era em
Itupiranga Marabaacute (vaacuterias regiotildees) Jacundaacute Nova Ipixunardquo (Entrevista com Simone em
23052017) Prefaciando o livro ldquoA Igreja dos Oprimidosrdquo Paulo Freire (1981) destaca a
caminhada da Igreja em selar seu compromisso com os pobres
Falar desta caminhada eacute falar da Igreja profeacutetica eacute falar do processo mesmo
em que ela assumindo profundamente a mensagem dos evangelhos eacute tatildeo
velha quanto esta mensagem sem ser tradicional e eacute tatildeo nova quanto ela
sem ser modernista A Igreja profeacutetica eacute a igreja da esperanccedila esperanccedila que
soacute existe no futuro futuro que soacute as classes oprimidas tecircm pois que o futuro
das classes dominantes eacute a pura repeticcedilatildeo de seu presente de opressores
(FREIRE 1981 p 10)
Pereira (2015) considera a Igreja Catoacutelica como talvez a uacutenica instituiccedilatildeo da sociedade
civil com projeccedilatildeo poliacutetica nacional que naquele momento estava envolvida nas questotildees de
terra apoiando os posseiros A contribuiccedilatildeo da Igreja Catoacutelica trata-se de interessante
contradiccedilatildeo por ser uma instituiccedilatildeo extremamente conservadora de modo geral mas que
naquele periacuteodo foi fundamental na luta dos trabalhadores rurais e tambeacutem no estiacutemulo ao
protagonismo das mulheres
Em relaccedilatildeo agraves conquistas do sindicato a luta pela terra eacute a principal Marabaacute tem 77
projetos de assentamento (INCRA 2017) e em todos eles excetuando-se o PA 26 de Marccedilo o
sindicato esteve na frente no processo da luta para que as famiacutelias pudessem ser assentadas A
lista dos principais assentamentos estaacute descrita pelo entrevistado Itamar (2017)
Tivemos inuacutemeras desapropriaccedilotildees no municiacutepio Nesse periacuteodo foi
importante a desapropriaccedilatildeo da Trecircs Poderes da Joseacute Pinheiro e Pouso
Alegre Na Trecircs Poderes satildeo trecircs nuacutecleos ou um nuacutecleo com trecircs
assentamentos A Boa Sorte laacute em Parauapebas que teve conflito e tudo
mais () O Talismatilde tambeacutem O Belo Vale o Boa Esperanccedila do Burgo
Tudo jaacute do meu tempo para caacute Desse periacuteodo para caacute () entatildeo satildeo
conquistas grandes E daiacute as conquistas dos creacuteditos Grandes
acampamentos O Sindicato de Marabaacute era protagonista desse negoacutecio
porque era o maior que tinha Acampamento de oito dez mil pessoas no
INCRA que levava meses e tudo mais Foi muita conquista Em 9798
[19971998] teve um acampamento grande Depois teve outro muito grande
mas natildeo me lembro bem o tempo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O acampamento na sede da SR-27 do INCRA em novembro de 1997 foi um marco
porque em nenhum momento da histoacuteria da regiatildeo um contingente tatildeo grande de
trabalhadores e trabalhadoras rurais havia conseguido se organizar para permanecer tantos
52
dias acampados (vinte dias) sendo que a repercussatildeo foi imediata e o INCRA Nacional
precisou intervir nas negociaccedilotildees com o movimento social (INTINI 2004)
O entrevistado Milton (2017) reforccedila o depoimento do entrevistado Itamar (2017)
enfatizando o acampamento de 1997
A verdadeira conquista foi em 97 [1997] uma ocupaccedilatildeo que noacutes fizemos
aqui com 12 mil15mil trabalhadores aqui nesse INCRA que soacute de Marabaacute
naquela eacutepoca ndash foi de 97 [1997] para 98 [1998] ndash uma ocupaccedilatildeo grande que
a gente prendeu o Victor Hugo que era o Superintendente na eacutepoca De uma
canetada soacute foram criados no municiacutepio de Marabaacute doze projetos de
assentamento (Entrevista com Milton em 23052017)
Interessante frisar que nesses processos de ocupaccedilatildeo agrave sede do INCRA em Marabaacute as
mulheres participavam apenas ldquoservindo de massa para aumentar o bolordquo (Entrevista com
Simone em 23052017) uma vez que o protagonismo era dos homens
() as mulheres vinham tambeacutem as mulheres vinham Mas era muito difiacutecil
vocecirc ver uma mulher na linha de frente no microfone falando para
reivindicar alguma coisa () Ainda predominava o machismo muito grande
() na hora aqui para poder firmar tudo isso junto ao INCRA junto aos
oacutergatildeos o protagonismo era dos homens (Entrevista com Simone em
23052017)
Outras conquistas importantes do sindicato relacionam-se a organizaccedilatildeo dos
trabalhadores criaccedilatildeo da Feira da Agricultura Familiar ndash citada no item 221 da dissertaccedilatildeo
desenvolvimento e infraestrutura dos assentamentos tais como creacuteditos rurais Habitaccedilatildeo
Fomento PRONAF Programa Luz para Todos estradas encaminhamento dos benefiacutecios
previdenciaacuterios ndash aposentadoria salaacuterio-maternidade pensatildeo por morte salaacuterio-reclusatildeo
conquistas especiacuteficas para as mulheres (seratildeo detalhadas no capiacutetulo cinco) e criaccedilatildeo da
Escola Famiacutelia AgriacutecolaEFA
No decorrer dos anos mudanccedilas importantes foram implementadas no Estatuto do
STTR de Marabaacute sendo que as referidas mudanccedilas ocorreram de ldquocima para baixordquo A
Assembleia de 27 de novembro de 2009 estabeleceu o acreacutescimo do termo trabalhadoras
rurais ao nome do mesmo uma vez que o sindicato foi criado Sindicato dos Trabalhadores
Rurais Aleacutem disso estabeleceu o respeito agraves cotas de mulheres jovens e idosos Em 02 de
junho de 2015 houve nova alteraccedilatildeo estatutaacuteria A Assembleia aprovou que o Sindicato dos
53
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute passaria a ser denominado Sindicato dos
Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute
Atualmente o sindicato eacute responsaacutevel pela homologaccedilatildeo das rescisotildees de contrato dos
assalariados rurais ndash pessoas que trabalham em fazendas em regime celetista O movimento
sindical tem discutido a criaccedilatildeo do Sindicato dos Empregados Rurais de Marabaacute Quando essa
criaccedilatildeo for efetivada haveraacute uma separaccedilatildeo e o futuro sindicato seraacute o responsaacutevel pelas
homologaccedilotildees citadas anteriormente conforme explicaccedilatildeo do entrevistado Saulo (2017)
Era Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais O que estaacute
acontecendo hoje noacutes fizemos uma assembleia fazendo uma mudanccedila no
estatuto Hoje o nosso sindicato estaacute Sindicato dos Trabalhadores
Agricultores e Agricultoras Familiares do Municiacutepio de Marabaacute Noacutes jaacute
fizemos essa separaccedilatildeo Hoje noacutes estamos representando o Sindicato dos
Agricultores e Agricultoras Familiares e a gente estaacute concluindo hoje daqui
uns trinta quarenta sessenta dias o Sindicato dos Empregados Rurais do
Municiacutepio de Marabaacute () O sindicato dentro da programaccedilatildeo que a gente
estaacute fazendo ele ser concretizado por noacutes vai ser uma coisa ligada agrave gente
Entatildeo talvez eu possa ser presidente talvez possa ser outro mas pessoa
ligada ao sindicato ligada agrave Fetagri porque natildeo pode correr o risco de cair na
matildeo de patronal Porque natildeo tem como dar certo Entatildeo tem que ficar na
matildeo de pessoas que jaacute faz a luta que defende o trabalhador () Vai ser o
Sindicato dos Agricultores e vai ser o Sindicato dos Empregados Rurais
com diretorias completamente diferentes (Entrevista com Saulo em
24052017)
A entrevistada Frida (2017) complementa as informaccedilotildees a respeito da criaccedilatildeo do
sindicato dos empregados rurais ldquoOs sindicatos do sudeste ligados agrave Fetagri jaacute tem essa
conversa () aqui tem essa historia tambeacutem mas ainda natildeo estaacute decidido () mas eacute preciso
fazer logo porque natildeo podemos continuar homologando se noacutes natildeo somos mais representantes
delesrdquo (Entrevista com Frida em 18052017)
A atual diretoria do sindicato eacute alvo de vaacuterias criacuteticas O entrevistado Milton (2017)
discorda da forma de gestatildeo Segundo ele haacute uma seacuterie de lideranccedilas igualmente insatisfeitas
ldquoNa verdade a bandeira do movimento foi desasteada enrolada e engavetada que natildeo aparece
mais E para levantar essa bandeira vai dar trabalho Vai dar um trabalho grande natildeo eacute faacutecil
natildeordquo (Entrevista com Milton em 23052017)
54
5 AS MULHERES DO SINDICATO DOS TRABALHADORES E
TRABALHADORAS RURAIS DE MARABAacute
51 A PARTICIPACcedilAtildeO DAS MULHERES NA ESTRUTURA DO SINDICATO
Num sindicato como eacute o de Marabaacute ele eacute um sindicato que tem que ter uma
pessoa realmente de garra para poder comandar porque eacute um sindicato
grande e a pessoa que tem que estar na frente precisa ter muito pulso para
comandar todas as questotildees Porque natildeo eacute faacutecil Mas as mulheres ainda natildeo
se encorajaram (Entrevista com Simone em 23052017)
Historicamente o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute eacute
conduzido por homens Haacute mulheres que se destacaram ou se destacam principalmente na
organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de assentamentos Todavia na
gestatildeo do sindicato em si as mulheres natildeo satildeo protagonistas oficiais conforme constatei na
pesquisa de campo A entrevistada Frida (2017) elenca algumas das mulheres que coordenam
ou coordenaram acampamentos e associaccedilotildees de assentamentos
Tem a Marta que eacute do Joseacute Pinheiro tem a Iacuteris que eacute do Maravilha que
tambeacutem era diretora tem a dona Neusa que eacute do Padre Josino tem a dona
Ana que eacute do Igarapeacute do Rato tem a dona Dalva que eacute coordenadora do
acampamento Estrela da Manhatilde tem a Elza que eacute coordenadora da Nossa
Senhora Aparecida que fica na Fazenda Itacaiuacutenas () tem sim muitas
mulheres no movimento Mas na cabeccedila eacute os homens (Entrevista com Frida
em 18052017)
Conforme explicaccedilotildees de alguns homens dirigentes a ausecircncia de mulheres na linha
de frente do sindicato se refere a uma estrateacutegia para protegecirc-las dos conflitos e embates
geralmente violentos e que as mulheres natildeo teriam condiccedilotildees de resolver
As mulheres apareciam pouco ateacute para ser preservada porque natildeo era faacutecil
Eu natildeo acho um pecado elas natildeo despontarem na frente porque aqui a coisa
era muito perigosa Ainda eacute Entatildeo aqui muita gente pode interpretar ldquoabafa
as mulheresrdquo mas eacute tambeacutem um pouco a questatildeo da preservaccedilatildeo Eacute mais
faacutecil para o homem lidar com essas coisas do que as mulheres Agraves vezes satildeo
casadas tem que responder isso tem que responder aquilo aiacute essas coisas a
gente sempre evitou Mas muito por respeito mesmo Porque a gente natildeo
pode perder as companheiras As companheiras ajudaram muito Vocecirc jaacute
pensou uma mulher casada jovem e todo dia estaacute na delegacia Natildeo eacute
muito faacutecil para a famiacutelia dela a estrutura familiar quebra mais do que a do
homem (Entrevista com Itamar em 22052017)
Nesse sentido os cargos ocupados pelas mulheres no STTR de Marabaacute no decorrer
das gestotildees ndash basicamente a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX ndash referem-se agrave Secretaria
de Mulheres Secretaria de Formaccedilatildeo Secretaria de Juventude Rural Secretaria de Poliacuteticas
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Sociais Vice-presidecircncia suplecircncia da diretoria e conselho fiscal Como destacado
anteriormente todos os presidentes do sindicato desde a sua fundaccedilatildeo em 1980 satildeo homens
Sobre essa questatildeo satildeo vaacuterias as possibilidades de anaacutelise sendo que o entrevistado Saulo
(2017) apresenta a seguinte
Eu avalio assim que talvez pode ser que alguma mulher natildeo se colocou agrave
disposiccedilatildeo para presidente ou talvez pela conjuntura pelo processo de
construccedilatildeo da diretoria talvez tambeacutem natildeo teve essa oportunidade Entatildeo eu
avalio por esse motivo Mas natildeo assim por discriminaccedilatildeo ou por ver que natildeo
tem capacidade de dirigir de gerar [gerir] por ser um sindicato que tem
grande enfrentamento eu natildeo avalio por esse lado (Entrevista com Saulo em
24052017)
O entrevistado Itamar (2017) defende o ponto de vista a seguir
Mas as mulheres aqui nunca se propuseram a ser presidente Tambeacutem
porque a gente sabe que natildeo eacute faacutecil O que aconteceu com o Pipira20
o que
aconteceu com outros companheiros aqui () Os confrontos todos neacute Ter
que levantar de madrugada em acampamento tem que enfrentar os despejos
O Pipira acompanhou isso muito mais de perto Tem que perder o dia sair
de casa de manhatilde e natildeo sabe a hora que chega Entatildeo nessa conjuntura natildeo eacute
faacutecil para uma mulher Principalmente uma mulher que tem marido O
marido nunca vai compreender isso () De madrugada o telefone toca
chamando a mulher para ir daqui a 200 quilocircmetros como aconteceu isso
Natildeo eacute faacutecil natildeo (Entrevista com Itamar em 22052017)
O entrevistado Joatildeo (2017) compreende a origem da ausecircncia de mulheres na linha de
frente do sindicato diferentemente dos entrevistados anteriores
A Presidecircncia que daacute prestiacutegio eacute muito raro que eacute mulher porque daacute
prestiacutegio Agora eacute muito frequente ver secretaacuteria natildeo eacute frequente ver
tesoureira questatildeo social [secretaacuteria de poliacuteticas sociais] Na secretaria
agraacuteria e secretaria agriacutecola eacute muito raro que eacute mulher () Eu acho que
aonde tem prestiacutegio aonde tem dinheiro () eacute muito difiacutecil que tenha
mulher (Entrevista com Joatildeo em 11072017 grifo nosso)
Aprofundando esse debate vale destacar o posicionamento da entrevistada Maria
(2017)
Porque ali no sindicato noacutes temos ali noacutes somos uma turma assim ldquoAh eu
defendo a categoria da mulher e talrdquo mas a mulher natildeo pode assumir cargos
para comandar cargos de cabeccedila Entatildeo assim ali eacute complicado
principalmente no Sindicato de Marabaacute Noacutes somos companheiros
ldquoCompanheiros e companheirasrdquo mas soacute nas aspinhas A mulher tem que ser
sempre laacute coordenadas por eles e natildeo eles serem coordenados por elas
Jamais jamais (Entrevista com Maria em 14072017)
20
Pipira Antonio Gomes presidente do STTR de Marabaacute nos periacuteodos de 2003-2007 e 2007-2011
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Esses depoimentos antagocircnicos corroboram o pensamento de Pimenta (2013) sobre o
processo dinacircmico da accedilatildeo poliacutetica das mulheres no sindicalismo rural resultando na
emergecircncia de identidades coletivas e poliacutetica num campo de instabilidades e tensotildees
negando as mulheres como sujeito poliacutetico insistindo em silenciaacute-las
Em relaccedilatildeo agrave poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres eacute cumprida em virtude da
cobranccedila exercida por elas todavia houve gestotildees em que as mulheres estavam presentes
apenas no papel sendo isoladas das discussotildees e decisotildees A entrevistada Tereza (2017)
esclarece que
As coisas que eu criticava os 30 que eles colocavam laacute na diretoria era soacute
para compor porque era obrigado Porque as mulheres de fato natildeo
participavam () porque o marido natildeo deixava com certeza vir laacute da zona
rural As mulheres que faziam parte da diretoria eacute porque algueacutem mandava
ldquoOlha a gente precisa preencher aqui Bota teu nome aquirdquo Entatildeo natildeo tinha
o menor interesse Era desse jeito (Entrevista com Tereza em 19052017)
Complementado a discussatildeo sobre cotas a entrevistada Maria (2017) afirma que
As mulheres soacute satildeo bem vindas laacute no sindicato na hora da luta na hora de
fazer a composiccedilatildeo para manter a cota ou entatildeo para fazer o papel de ser
secretaacuteria da Previdecircncia Social () Apesar de tantos avanccedilos de tantas
lutas de tantas batalhas Noacutes continuamos na mesmice (Entrevista com
Maria em 14072017)
O STTR de Marabaacute eacute mantido financeiramente pelas mensalidades dos(as) soacutecios(as)
em especial os(as) aposentados(os) uma vez que o desconto da contribuiccedilatildeo sindical
(correspondente a 2 do salaacuterio miacutenimo) eacute automaacutetico O sindicato adota o repasse mensal de
ajuda de custo para os membros da Diretoria Executiva Na gestatildeo 2015-2019 a Diretoria
Executiva eacute composta por nove dirigentes todavia na praacutetica somente cinco21
dirigentes
trabalham efetivamente ou seja recebem a referida ajuda de custo Essa medida foi
necessaacuteria com objetivo de reduccedilatildeo de gastos tendo atingido a Secretaria de Mulheres dentre
outras secretarias Portanto eacute um dos motivos que explica a diminuiccedilatildeo da participaccedilatildeo das
mulheres na luta do sindicato Sem recursos financeiros eacute impossiacutevel articular as mulheres
rurais principalmente considerando a dificuldade de deslocamento geograacutefico (distacircncia
condiccedilotildees das estradas) conflitos domeacutesticos dentre outros entraves
21 A ajuda de custo eacute repassada ao Presidente Vice-presidente Secretaacuterio Geral de Formaccedilatildeo e
Organizaccedilatildeo Sindical Secretaacuterio de Administraccedilatildeo Financcedilas e Assalariadosas Rurais Secretaacuteria de
Poliacuteticas Sociais
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Poreacutem a realidade aponta para ocasiotildees em que havia recursos financeiros mas que
natildeo eram priorizados pelos dirigentes para atividades com mulheres conforme depoimento da
entrevistada Vana (2017)
Quando eu precisava de uma reuniatildeo ali no INCRA Dia da Mulher dia de
alguma coisa assim que pertencia a noacutes mulheres o povo brigava comigo
Eu tirava dinheiro do meu bolso porque eu vendia muita coisa da roccedila Eu
sempre tinha o meu dinheirinho Mandava fazer aquelas faixas pedia a nota
ldquoNatildeo natildeo tem dinheiro natildeordquo [imitando voz fina] O tesoureiro dizia assim
ldquoNatildeo Noacutes estamos tudo lisordquo () Aiacute eu botava era quente ldquoSe vocecircs natildeo
tiver oacuteleo para isso eu trabalho na roccedila Eu tenho dinheiro do meu milho
disso e disso Eu boto gasolina e arrumo motoristardquo () Aiacute depois que noacutes
saiacutemos acabou Natildeo se vecirc reuniatildeo em canto nenhum Soacute vecirc soacute os machos a
gente natildeo vecirc assim as mulheres que trabalham laacute (Entrevista com Vana em
22052017)
Retomando a discussatildeo sobre a ajuda de custo duas mulheres ex-dirigentes relatam
que eram excluiacutedas desse repasse sendo que os dirigentes homens recebiam normalmente o
recurso
Eu nunca recebi ajuda do sindicato () Aiacute sempre assim tinha aquela
alegaccedilatildeo de que natildeo tinha recurso que natildeo tinha nada natildeo tinha fundo e
que tinha aquelas prioridades que era o presidente que tinha prioridade o
secretaacuterio financeiro que tinha prioridade o outro secretaacuterio que trabalhava
com a questatildeo da previdecircncia social eacute que tinha ainda a prioridade Mas eu
que era simplesmente vice secretaacuteria de gecircnero secretaacuteria de mulher Natildeo
tem recurso para isso () agraves vezes eu tirava do bolso para ir trabalhar para o
sindicato para fazer o trabalho do sindicato (Entrevista com Maria em
14072017)
Na diretoria pelo menos eu trabalhei muitos tempos () pelo menos eu
trabalhei um ano e meio fiado Aiacute que a Marta fez uma reuniatildeo com todo
mundo laacute e disse que era para mim procurar meus direitos (Entrevista com
Vana em 22052017)
Segundo a entrevistada Joana Angeacutelica (2016) eacute possiacutevel comparar a participaccedilatildeo das
mulheres nos STTRs em alguns municiacutepios do sudeste paraense enfatizando que a dinacircmica
de Marabaacute difere dos demais municiacutepios
E aqui jaacute tinha tambeacutem digamos que uma certa construccedilatildeo dessa organizaccedilatildeo
das mulheres No Sindicato de Satildeo Domingos do Araguaia elas jaacute
disputavam o espaccedilo na Diretoria mesmo ainda tendo um modelo de
sindicato que era altamente machista Quem participava do sindicato eram os
homens quem ia para a Assembleia do sindicato eram os homens quem
decidia as coisas do sindicato eram os homens
Em Satildeo Joatildeo e Satildeo Domingos as mulheres comeccedilam a dizer ldquoNatildeo noacutes
tambeacutem precisamos devemos participarrdquo Em Satildeo Domingos
particularmente elas eram 50 na diretoria do sindicato 50 eram mulheres
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e 50 eram homens Entatildeo provocado por elas comeccedila todo um debate de
ocupaccedilatildeo do espaccedilo puacuteblico pelas mulheres Isso para mim eacute fundamental
No Sindicato de Marabaacute era muito difiacutecil Tinha mulheres tem mulheres
por exemplo a Raimundinha Solino era uma referecircncia no Sindicato de
Marabaacute Ela junto com outras mulheres propunha uma discussatildeo de
participaccedilatildeo efetiva das mulheres
() e morreu no anonimato bem aqui em Marabaacute foi atropelada Ningueacutem
ningueacutem fez uma nota Natildeo saiu nada A Raimundinha era uma lideranccedila
muito importante na luta das mulheres na regiatildeo Foi discriminada porque
ficou separada do marido era uma pessoa que participava ativamente da luta
sindical e era muito importante na famiacutelia dela ela era muito importante
talvez mais do que o Orlando que era o marido dela E morreu aiacute no
anonimato o movimento sindical natildeo fez uma nota
() Uma mulher poliacutetica ajudou a construir o PT aqui ajudou no debate da
reforma agraacuteria foi a primeira secretaacuteria de gecircnero do sindicato Entatildeo era
uma mulher articulada politicamente aleacutem de ser uma pessoa muito
simpaacutetica e tal Mas foi altamente discriminada dentro do movimento Entatildeo
a estrutura sindical eacute marcada por isso (Entrevista com Joana Angeacutelica em
21092016)
Guerra (2013) corrobora o depoimento da entrevistada Joana Angeacutelica (2016) ao
afirmar que a participaccedilatildeo das mulheres eacute relevante no movimento sindical de trabalhadores
rurais e nas organizaccedilotildees populares em especial nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do Araguaia e
Jacundaacute Guerra (2013) demonstra que mesmo natildeo assumindo posiccedilotildees de direccedilatildeo as
mulheres podem ter influecircncia expressiva na militacircncia sindical o que demonstra quando
analisa o discurso dos homens em que as mulheres satildeo sistematicamente evocadas
Para Bezerra e Alves (2017) eacute forte a participaccedilatildeo e incidecircncia poliacutetica das mulheres
no movimento sindical e na organizaccedilatildeo das mulheres nos municiacutepios de Satildeo Joatildeo do
Araguaia Satildeo Domingos do Araguaia e Itupiranga sendo que a atuaccedilatildeo das mulheres na luta
pela terra deu-se de diversas formas e em diferentes espaccedilos
Como lideranccedilas nas ocupaccedilotildees de terra dirigentes ou delegadas sindicais
animadoras de comunidades ligadas agrave Igreja em casa como arrimo de
famiacutelia quando seus maridos precisavam se ausentar por conta de
mobilizaccedilotildees acampamentos dos trabalhadores ou por serem viuacutevas A
atuaccedilatildeo dessas mulheres se dava articulando a luta pelo acesso agrave terra
concomitantemente a pleito para a maior inserccedilatildeo das mulheres nas
instancias organizativas como diretoras do sindicato delegadas sindicais
dirigentes de associaccedilotildees caixas agriacutecolas bem como pela construccedilatildeo de
novas relaccedilotildees de gecircnero na famiacutelia e nos espaccedilos organizativos
(BEZERRA ALVES 2017 p67)
Rosa Elizabeth Acevedo Marin publicou em 1998 um artigo intitulado ldquoPerfil de
mulher camponesa no sudeste do Paraacuterdquo sobre a sindicalista Raimundinha Solino citada pela
entrevistada Joana Angeacutelica (2016) Marin (1998) descreve
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A iniciaccedilatildeo de Raimundinha em organizaccedilotildees ocorreu por volta dos anos 80
quando trabalhou no Movimento de Educaccedilatildeo de Base e ela ldquoficou na aacuterea
ruralrdquo O seu marido tambeacutem participava dos movimentos dos posseiros
Insistiu em dizer que durante a guerrilha do Araguaia foi um dos torturados
pelo Exeacutercito Dessa longa experiecircncia apenas fragmentada nasce a
Raimundinha camponesa com projetos alternativos para permanecer e
trabalhar na terra e igualmente a sindicalista dirigindo uma seacuterie de accedilotildees
no lugar onde mora (MARIN 1998 p6)
Raimundinha Solino tambeacutem foi citada por outros(as) entrevistados(as) dessa
pesquisa o entrevistado Luiacutes (2017) se refere a ela como uma das mulheres participantes de
curso de formaccedilatildeo ldquoEra sobre poliacutetica autonomia da mulher a mulher na poliacutetica da mulher
se ingressar na poliacutetica Nesse tempo ateacute a Raimundinha se entusiasmou e foi candidata
[sorrindo] a vereadorardquo (entrevista com Luiacutes em 19052017) A entrevistada Vana (2017)
relembra de Raimundinha com emoccedilatildeo ldquoAh foi ela que me ensinou muitas coisas Ela era
delegada do sindicato foi presidente da associaccedilatildeo ela foi da Secretaria de Mulher () A
Raimundinha me ensinou muita coisardquo (entrevista com Vana em 22052017) Segundo o
entrevistado Valdir (2017) Raimundinha teve um papel fundamental na orientaccedilatildeo agraves
mulheres do sindicato
Na poliacutetica da mulher nessa questatildeo aiacute a Raimundinha conseguiu ()
orientar as mulheres Porque tu sabe como eacute aquela poliacutetica da mulher neacute
Orientaccedilatildeo fazer aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem
qual eacute o direito que elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute
achavam que soacute tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e
ficar calada Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram
Quando noacutes terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam
falando mais forte Entatildeo a Raimundinha fez um bom trabalho fez um
trabalho muito bom naquele periacuteodo laacute () a Raimundinha foi muito fiel
com as mulheres (Entrevista com Valdir em 23052017)
Completando o ciclo de menccedilotildees agrave Raimundinha Solino a entrevistada Simone (2017)
destaca que ela era uma das mulheres que organizava os Encontros de Mulheres em conjunto
com dona Dijeacute (citada na paacutegina 20)
Tinha a Raimundinha Solino tinha a Maria de Jesus que a gente chamava
ela soacute de Dijeacute Elas duas eacute que faziam mais frente dentro do sindicato Por
exemplo vai ter um Encontro de Mulheres elas eacute que tratavam dessa
questatildeo de articular de fazer tudo que era possiacutevel para as mulheres poder
participarem Elas ficaram elas conseguiram se manter dentro dessa questatildeo
da articulaccedilatildeo do sindicato muitos anos muitos anos () Elas
permaneceram nesse processo de fazer a articulaccedilatildeo das mulheres do
sindicato nesse periacuteodo Com elas a gente pode bem dizer que a gente teve
um grande avanccedilo (Entrevista com Simone em 23052017)
60
O legado de Raimundinha Solino deve permanecer vivo sua trajetoacuteria de vida eacute um
exemplo de superaccedilatildeo determinaccedilatildeo e empoderamento servindo de exemplo agrave sociedade em
geral
52 AS MULHERES NA PERSPECTIVA DAS LIDERANCcedilAS SINDICAIS
Eu acho que a gente tem um trunfo na matildeo que eacute o seguinte agricultura
familiar o que eacute Famiacutelia Famiacutelia o que eacute Famiacutelia sem mulher famiacutelia sem
homem existe () Entatildeo essa eacute uma carta na manga que noacutes temos
portanto se eacute familiar por que teria mais homem do que mulher (Entrevista
com Joatildeo em 11072017)
Ainda tem aqueles maridos que eacute meio carrasco natildeo quer que a mulher vaacute
participar desse negoacutecio Mas eacute a questatildeo de ciuacuteme tambeacutem Eu vejo dois
pontos um eacute esse e o segundo ponto eacute que talvez ainda existe homem que
por exemplo eu jaacute vi um amigo meu dizer ldquoRapaz eu natildeo vou para um
sindicato ser diretor de um sindicato para a mulher ser presidente para eu
ser mandado por mulherrdquo Duas coisas que eu vejo de dificuldade eacute isso aiacute
(Entrevista com Milton em 23052017 grifo nosso)
Metodologicamente a entrevista eacute um excelente instrumento de pesquisa por permitir
a interaccedilatildeo entre pesquisador(a) e entrevistado(a) e a obtenccedilatildeo de descriccedilotildees detalhadas sobre
o que se estaacute pesquisando (OLIVEIRA 2014) Na praacutetica ao longo da entrevista o(a)
entrevistado(a) emite opiniotildees diversas e muitas vezes contraditoacuterias sobre o mesmo tema
(ROSA ARNOLDI 2008) ou sobre datas e eventos histoacutericos Ademais das onze mulheres e
sete homens que eu entrevistei abordei perguntas sobre discriminaccedilatildeo eou violecircncia sofridas
pelas mulheres Em momentos pontuais das entrevistas com trecircs homens tive a impressatildeo de
que os mesmos estavam respondendo o que eles consideravam que eu gostaria de ouvir
Tambeacutem ocorreu de algumas das mulheres entrevistadas descreverem situaccedilotildees em que foram
viacutetimas de agressotildees verbais nas dependecircncias do sindicato sendo que ao perguntar a
respeito do tema22 para o dirigente em questatildeo respondeu que as mulheres sempre foram
respeitadas natildeo tendo presenciado nenhum tipo de discriminaccedilatildeo ndash prevalecendo a ideia de
que quem agride esquece quem eacute agredido natildeo
Conforme abordado no item 51 da dissertaccedilatildeo as mulheres passaram a participar
efetivamente da luta do STTR de Marabaacute a partir da deacutecada de 1990 do seacuteculo XX Os
trechos dos depoimentos dos entrevistados Joatildeo (2017) e Milton (2017) no iniacutecio desta seccedilatildeo
22
Pergunta ldquoMas aqui dentro do sindicato o tempo que vocecirc estaacute aqui vocecirc chegou a perceber
alguma dificuldade que as mulheres enfrentaram aqui no sindicato Algum tipo de entraverdquo
61
simbolizam as diferentes visotildees que as lideranccedilas masculinas possuem sobre a participaccedilatildeo
das mulheres na luta sindical sendo que os elementos do segundo depoimento predominam
entre as lideranccedilas sindicais
Para a entrevistada Frida (2017) no movimento sindical de trabalhadores rurais eacute feito
o debate sobre a importacircncia das mulheres estarem agrave frente dos espaccedilos e discussotildees mas isso
natildeo tem ocorrido na praacutetica pelo menos nos uacuteltimos dez anos nem no espaccedilo do sindicato e
nem no espaccedilo domeacutestico das lideranccedilas masculinas (ou seja os homens discursam a respeito
mas natildeo tratam bem as ldquocompanheirasrdquo do sindicato nem suas esposas e demais familiares) O
entrevistado Luiacutes (2017) traz elementos importantes para o debate
Eacute porque muitas vezes as oportunidades para a mulher elas natildeo enxergaram
e os homens natildeo deram essa oportunidade delas participarem Politicamente
eacute isso Porque na hora aparece quatro mulheres e aparecem cinquenta
homens para disputar o mesmo espaccedilo Como os homens sempre tem o
caminho mais livre e tem algumas que natildeo tem coragem de ir para o embate
mesmo () Na verdade sempre os homens acham que o lugar da mulher eacute na
cozinha que a luta sindical tem que ser para homem Enquanto eu vejo o
contraacuterio a luta sindical tem que ser para todo mundo Que eacute aquela historia
do discurso o cabra diz ldquoNatildeo mas a mulher tem vez comigo tem vezrdquo Mas
seraacute que tem mesmo Seraacute que tem vez mesmo () Eu acho que tem que
ter vez Porque muitas vezes o cara diz no discurso mas na praacutetica natildeo tem
(Entrevista com Luiacutes em 19052017)
De acordo com as mulheres entrevistadas o medo eacute um fator preponderante que as
impede de ascender tanto nos espaccedilos puacuteblicos quanto privados Medo de falar medo de
defender suas ideias medo de denunciar agressotildees sofridas medo de se libertar do passado
medo de evoluir Aleacutem disso haacute o medo de ser julgada por sua condiccedilatildeo de ser mulher como
esclarece a entrevistada Simone (2017) ldquoAh se eu assumir um sindicato como eacute que eu vou
fazer e tal E se eu natildeo der conta os fulanos vatildeo dizer que natildeo dei conta porque sou mulherrdquo
(entrevista com Simone em 23052017) Diante desse contexto encontrar alternativas para
vencer os diversos tipos de medo eacute essencial para a conquista do empoderamento nas
dimensotildees pessoal social poliacutetica e econocircmica
A entrevistada Tereza (2017) relata a dificuldade em conviver com diretores mais
velhos no sindicato uma vez que era alvo de discriminaccedilatildeo e descrenccedila devido sua pouca
idade agrave eacutepoca em que foi diretora do STTR de Marabaacute o que caracteriza um conflito entre
geraccedilotildees
Eu via que eu tinha algum problema porque eu era jovem na eacutepoca eu tinha
meus vinte anos Jovem e mulher Entatildeo quem tava ali satildeo pessoas muito
antigas que estaacute no sindicato haacute muito tempo Entatildeo os homens de certa
62
forma viam a gente ali com aquele serviccedilo mesmo de escritoacuterio Que a gente
tinha que fazer aquele papel do jeito que eles mandaram e tudo mais Eles
natildeo viam a gente a nossa participaccedilatildeo de maneira como se fosse para ajudar
tambeacutem na organizaccedilatildeo dos trabalhadores (Entrevista com Tereza em
19052017)
A entrevistada Tereza (2017) conta ainda que conversava sobre essa situaccedilatildeo com
amigos de entidades parceiras e que recebia deles as seguintes orientaccedilotildees ldquoTaca a matildeo na
mesa e comeccedila a xingar () Tem que mostrar que tu tambeacutem tem poder laacute dentro tem poder
de falar tu tambeacutem eacute diretorardquo (Entrevista com Tereza em 19052017) Poreacutem ela preferia
evitar confrontos e buscava desenvolver suas atividades atraveacutes de parcerias por fora do
sindicato Ademais a entrevistada Tereza (2017) destaca que sempre era designada para
integrar conselhos municipais ou participar de reuniotildees que natildeo eram prioritaacuterias para os
dirigentes homens ldquoEntatildeo me botavam para ficar em reuniotildees o tempo todo reuniatildeo que natildeo
era de interesse deles porque sauacutede e desenvolvimento rural natildeo era interesse deles entatildeo me
botavam para depois eu soacute dizer o que aconteceurdquo (Entrevista com Tereza em 19052017)
Essa postura demonstra um limite de compreensatildeo poliacutetica sobre questotildees fundamentais e que
deveriam ser bandeiras relevantes do sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais
Sauacutede e desenvolvimento rural atribuiacutedos a temas que poderiam ser tratados por mulheres
induzem a uma reflexatildeo sobre o grau de politizaccedilatildeo dos dirigentes do sindicato Por outro
lado esses satildeo temas que se aproveitados pelo engajamento feminino poderiam tecirc-las
projetado no campo sindical de forma mais efetiva de que se tivessem assumido outras aacutereas
Pesquisando o lugar social das mulheres jovens do assentamento Nova Canaatilde no
municiacutepio de Quixeramobim sertatildeo cearense no Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST) e nas poliacuteticas puacuteblicas Sales (2010) fornece elementos que sintetizam o
desabafo da entrevistada Tereza
Nos movimentos sociais em que predominam homens haacute dificuldades de
participaccedilatildeo das mulheres e isso se agrava quando elas satildeo jovens A
diferenccedila de gecircnero e geraccedilatildeo no interior dos movimentos define padrotildees de
comportamento reforccedila as relaccedilotildees de poder e cristaliza os valores e as
hierarquias sociais (SALES 2010 p 437)
De forma geral as mulheres convivem com diversas dificuldades23
(MOREIRA
MANESCHY E AacuteLVARES 2014) para participar das reuniotildees encontros e demais
atividades como por exemplo natildeo ter a permissatildeo do marido ou natildeo ter com quem deixar os
filhos ndash para sair do lote e se deslocar agrave sede do municiacutepio ou viajar para outros municiacutepios
23
Dificuldades problematizadas no item 42 da dissertaccedilatildeo
63
Quando ocorre do marido autorizar apenas depois do teacutermino das atividades domeacutesticas o
que eacute um indicador do grau de dominaccedilatildeo ao qual a mulher trabalhadora rural estaacute submetida
no plano da poliacutetica De acordo com a entrevistada Simone (2017) trata-se de um retrocesso
Tem mulher que diz assim ldquoeu natildeo vou porque o meu marido natildeo deixardquo Aiacute
eu fico olhando ldquomeu Deus noacutes estamos no seacuteculo XXI quase no seacuteculo
XXII e eu escuto isso aindardquo Mas infelizmente eacute isso Vocecirc olha menina
nova jovem mas estaacute na zona rural aquele niacutevel de cultura ainda de que ldquoeu
soacute vou se meu marido deixarrdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Contudo eacute possiacutevel encontrar mulheres casadas que conseguiram convencer os
maridos da importacircncia de sua militacircncia poliacutetica e sindical
Tem delas que satildeo casadas e que jaacute conseguiram [politizar o marido] ()
Elas vatildeo conseguindo fazer isso Por quecirc Porque tambeacutem elas se lanccedilam
Elas fazem tipo aquela ldquoAh tu natildeo deixa natildeo mas eu jaacute to indordquo E aiacute se
lanccedila mesmo E aiacute ele vai ficando ali tendo que ceder Aiacute eles vatildeo
percebendo que de repente porque na cabeccedila deles se a mulher sair vai trair
ele vai fazer isso vai fazer aquilo Quando eles vatildeo chegando e percebe que
natildeo eacute justamente aquilo aiacute vatildeo aceitando Agora tem outros que natildeo aceitam
de jeito nenhum Por mais que vaacute natildeo sei quem dizer para ele ldquoMoccedilo natildeo eacute
assim Venha participar tambeacutem com a sua mulher para vocecirc saber como eacute
que eacuterdquo (Entrevista com Simone em 23052017)
Ademais para participar da militacircncia haacute situaccedilotildees em que as mulheres tiram proveito
dos arranjos familiares deixando os filhos com determinados grupos de mulheres ou ateacute
mesmo com os homens mais abertos agrave participaccedilatildeo das esposas
Estudo realizado por Antunes (2015) sobre o processo de organizaccedilatildeo para a gestatildeo do
territoacuterio quilombola de Conceiccedilatildeo das Crioulas no sertatildeo pernambucano abordou a forma
como a violecircncia adentra as narrativas de luta e conquista das mulheres da comunidade A
violecircncia contra a mulher assume centralidade nos discursos Vale destacar descriccedilatildeo de um
episoacutedio vivenciado pela autora durante evento que tratava das mulheres na luta quilombola
Cinco lideranccedilas mulheres (de diferentes quilombos) foram chamadas para a mesa e
explanaram suas ideias
Ficou claro nas falas que foram as mulheres quem primeiro se envolveram
na luta e tambeacutem foi notoacuteria a importacircncia das lideranccedilas mulheres nos
cinco quilombos Quando foi aberto o espaccedilo para a discussatildeo a questatildeo da
dificuldade de participar do movimento porque o marido natildeo deixa foi
abordada em algumas falas assim como a importacircncia de intercacircmbio com
outras comunidades para ldquotomar coragemrdquo de participar () Durante a fala
de uma lideranccedila mulher mais jovem de um dos quilombos as lideranccedilas
homens mais jovens que estavam sentadas perto de mim comeccedilaram a falar
() ldquoessa eacute fala de militante discurso pronto natildeo tem a ver com nossa
realidaderdquo () ldquotem mulher aiacute falando sobre violecircncia e apanhando em casa
64
como pode falar agraves outras sobre esse tema se natildeo resolveu o problema na
casa delardquo (ANTUNES 2015 p 88-89)
A desqualificaccedilatildeo feita pelos homens em relaccedilatildeo agraves lideranccedilas mulheres que satildeo alvos
de violecircncia se confunde com a contradiccedilatildeo vivida por essas mesmas mulheres que oscilam
entre ajudar publicamente a discutir e superar a violecircncia domeacutestica mas que optam em
ocultar suas proacuteprias dores guiadas talvez por medo ou por vergonha
Retomando o debate sobre o STTR de Marabaacute em relaccedilatildeo ao processo de organizaccedilatildeo
das reuniotildees e atividades encabeccediladas pela Secretaria de Mulheres em gestotildees passadas ndash
uma vez que na gestatildeo atual as atividades da Secretaria de Mulheres estatildeo paradas ndash a
presenccedila era majoritariamente feminina Os homens participavam dos encontros basicamente
no momento da abertura depois se retiravam para outros compromissos conforme explicaccedilatildeo
da entrevistada Maria (2017)
Quando eles faziam reuniatildeo no sindicato que era eles [que coordenavam] aiacute
tava todo mundo em peso Mas quando eram as mulheres que iam fazer
porque dificilmente as mulheres iam fazer a natildeo ser quando era alguma
reuniatildeo das mulheres eles natildeo davam muita importacircncia ldquoAh isso eacute soacute
besteirardquo Entatildeo eles natildeo davam importacircncia e natildeo participavam Agraves vezes
muito quando a gente fazia um encontrozinho agraves vezes eles iam para
aparecer laacute soacute na hora da abertura e escapuliam () Mesmo com a gente
batendo falando com a CPT (porque a CPT foi uma das entidades que nos
ajudou muito a defender essa questatildeo de gecircnero da igualdade) mesmo a
gente discutindo essa questatildeo da igualdade que temos que estar aqui ombro
a ombro o respeito pela luta da mulher a definiccedilatildeo a valorizaccedilatildeo da mulher
do papel (Entrevista com Maria em 14072017)
No periacuteodo de 1997 a 2003 a Secretaria de Mulheres24
do sindicato promoveu diversos
cursos de capacitaccedilatildeo sobre autonomia da mulher participaccedilatildeo da mulher na poliacutetica dentre
outros temas Foram momentos importantes que fortaleceram a autoestima dessas mulheres
elevando o niacutevel de empoderamento das mesmas O entrevistado Valdir (2017) esclarece
Aqueles cursos de capacitaccedilatildeo para as mulheres saberem qual eacute o direito que
elas tecircm porque ateacute naquele periacuteodo ali as mulheres soacute achavam que soacute
tinham o direito de cozinhar e pronto E atender o marido e ficar calada
Entatildeo a partir dali eu entendi que muitas coisas mudaram Quando noacutes
terminamos de tirar o nosso mandato as mulheres jaacute estavam falando mais
forte (Entrevista com Valdir em 23052017)
O fortalecimento da auto-estima das mulheres motivou-as a retomar os estudos seja
atraveacutes de cursos do ensino superior ou cursos referentes ao ensino meacutedio conforme
elucidaccedilatildeo da entrevistada Simone (2017)
24
A Secretaria de Mulheres recebeu o apoio da CPT CEPASP Fetagri ndash Regional Sudeste para
desenvolver suas atividades
65
Dessas mulheres que a gente tem trabalhado com elas muitas delas tem
procurado a se informar mais A estudar a voltar a estudar ter um niacutevel
mais tem delas que jaacute foi para faculdade estudar mesmo Outras por
exemplo que estavam ali e natildeo sabiam nem ler e escrever hoje estatildeo em um
niacutevel de escolaridade melhor Elas falam assim ldquonaquele tempo eu era cega
eu natildeo compreendia nada Apesar de ter dois olhos mas eu natildeo enxergava
nadardquo () Eu fico muito feliz quando vejo as mulheres falando isso hoje que
hoje elas jaacute tem um outro niacutevel de consciecircncia e que elas conseguem se
defender e buscar os direitos delas Isso para mim eacute muito significativo
(Entrevista com Simone em 23052017)
A formaccedilatildeo na Educaccedilatildeo do Campo25 eacute um elemento importante que traz
determinados subsiacutedios que tambeacutem colaboram no empoderamento dessas mulheres
Como grande parte delas [mulheres sindicalistas rurais] satildeo professoras e a
Educaccedilatildeo do Campo trabalha com professores trabalha com os povos do
campo acho que esse acesso ao conhecimento eacute muito importante Entatildeo
hoje elas podem elas se sentem mais a vontade ou com mais condiccedilotildees de
disputar o sindicato de disputar a cooperativa de disputar a associaccedilatildeo
porque de certa maneira ela se empodera com o conhecimento e isso eacute muito
importante para elas (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Para Sen (2000) a educaccedilatildeo e a alfabetizaccedilatildeo das mulheres tendem a diminuir as taxas
de mortalidade das crianccedilas em virtude ldquoda importacircncia que normalmente as matildees datildeo ao
bem-estar dos filhos e da oportunidade que tecircm ndash quando sua condiccedilatildeo de agente eacute respeitada
e fortalecida ndash de influenciar as decisotildees familiares nessa direccedilatildeordquo (SEN 2000 p 227)
Ademais Sen (2000) considera que ldquoa instruccedilatildeo da mulher reforccedila sua condiccedilatildeo de agente e
tende a tornaacute-la mais bem informada e qualificadardquo (SEN 2000 p 223)
Resgatando a fala inicial do entrevistado Milton (2017) nessa seccedilatildeo a respeito dos
homens que natildeo admitem serem mandados por mulheres trata-se de postura recorrente em
demais sindicatos ndash inclusive de outras categorias ndash ou seja natildeo eacute uma atitude isolada do
STTR de Marabaacute conforme eacute possiacutevel comprovar atraveacutes do depoimento da entrevistada
Dandara (2017)
No movimento sindical hoje eu avalio numa dimensatildeo mais macro porque
hoje eu estou no Estado mas noacutes ainda temos muitos problemas tanto de
discriminaccedilatildeo dessa questatildeo do homem achar que ele eacute mandado por
mulher Outro dia o companheiro falou aqui na Fetagri ldquoEu vou vender essa
mulher ela manda muito fala muitordquo Sabe Os homens ainda resistem ao
comando da mulher Eles se sentem diminuiacutedos quando uma mulher
determina algumas coisas E eu te garanto uma coisa para a gente ocupar
determinados espaccedilos vocecirc tem que estar munida de conhecimento se natildeo
vocecirc eacute engolida (Entrevista com Dandara em 01092017)
25
O Campus de Marabaacute da Universidade Federal do Sul e Sudeste do Paraacute oferta o curso de
Licenciatura em Educaccedilatildeo do Campo
66
A expressatildeo ldquoser mandado por mulherrdquo vem com toda a carga de machismo que um
posicionamento dessa natureza encerra podendo talvez materializar um comportamento
generalizado um espelho da sociedade Nesse sentido novos investimentos satildeo indicados
para se compreender como o STTR de Marabaacute consegue se sustentar com a hegemonia
masculina se reproduzindo haacute deacutecadas em suas diretorias
Ainda de acordo com a entrevistada Dandara (2017) as mulheres devem ser tratadas
com respeito pelos homens prevalecendo um trabalho de parceria na luta sindical
Eu sou uma grande defensora e aiacute eu falo muito isso aqui nas reuniotildees nas
palestras que noacutes temos que ter o equiliacutebrio com os nossos parceiros E
quando eu falo parceiro natildeo eacute parceiro de cama eu falo parceiros de
trabalho de luta noacutes temos que ter esse equiliacutebrio Sabe eu tenho o
entendimento que noacutes natildeo temos que ser maiores e nem menores noacutes temos
que nos dar as matildeos Agora com respeito Respeitando que noacutes temos
diferenccedilas noacutes somos diferentes Noacutes temos as nossas especificidades
enquanto mulheres noacutes temos que ter um olhar diferente (Entrevista com
Dandara em 01092017)
O posicionamento da entrevistada Dandara (2017) representa o esperado a ser
defendido por todos e todas as militantes de movimentos sociais seja do campo seja da
cidade
53 AS MULHERES DO SINDICATO CONSTRUINDO EMPODERAMENTO
Eu sempre acreditei que com luta a gente realmente muda essa realidade A
gente vai para uma sociedade quebrando essa cultura desse sistema que noacutes
vivemos que exclui que discrimina a mulher Eu sempre acreditei nisso Eacute
tanto se hoje noacutes estamos aqui falando se noacutes temos jaacute vaacuterios instrumentos
aiacute organizados nessa questatildeo da mulher no Brasil no nosso Estado e aqui no
municiacutepio eacute fruto da nossa organizaccedilatildeo de todas noacutes mulheres (Entrevista
com Sandra em 22092016)
A primeira conquista das mulheres do sindicato foi o direito de poder se sindicalizar
Quando o sindicato foi criado ndash e nos anos seguintes ndash elas eram dependentes dos maridos
Na regiatildeo sudeste paraense essa discussatildeo aconteceu em quatro municiacutepios Marabaacute Satildeo
Joatildeo do Araguaia Itupiranga e Jacundaacute de acordo com o depoimento do entrevistado Joatildeo
(2017)
Eacute bom saber uma coisa interessante que no sindicato pelego a mulher
recebia uma carteirinha de dependente Eu me lembro disso aqui todo
mundo feliz da vida porque tinha uma carteirinha de dependente natildeo sei o
que natildeo sei o que Aiacute a gente comeccedilou a discutir nas comunidades com os
delegados ldquoMas como entatildeo uma mulher natildeo pode ser delegada sindical
Mas ela natildeo trabalha na roccedila tambeacutemrdquo Aiacute comeccedilou principalmente as
67
mulheres que eram donas da terra que natildeo tinham marido () ldquoE aiacute natildeo
pode receber a carteirinhardquo (Entrevista com Joatildeo em 11072017)
O depoimento do entrevistado Joatildeo (2017) deixa subentendido que foram os homens
que permitiram a sindicalizaccedilatildeo das mulheres desqualificando o protagonismo das mesmas
no processo dessa conquista Muitas mulheres se tornaram delegadas sindicais
desenvolvendo papel fundamental na organizaccedilatildeo das ocupaccedilotildees e tambeacutem dos
acampamentos realizados na sede da SR-27 do INCRA em Marabaacute O entrevistado Saulo
(2017) detalha esse papel
Entatildeo nessas conquistas do processo da luta pela terra do processo de
infraestrutura do processo da luta da questatildeo previdenciaacuteria da educaccedilatildeo de
toda a estrutura do movimento a mulher foi muito importante Dentro desse
processo dentro dessa luta a gente reconhece e defende que foi um trabalho
de luta e de garra que a gente tem que respeitar e cada vez mais ceder espaccedilo
para que [a mulher] possa se engajar e possa ser reconhecida (Entrevista com
Saulo em 24052017)
Em relaccedilatildeo agrave sauacutede da mulher as mulheres apresentavam suas reivindicaccedilotildees em
reuniotildees com a Secretaria Municipal de Sauacutede nas marchas de Oito de Marccedilo dentre outros
espaccedilos As principais conquistas referem-se agrave prioridade de atendimento das mulheres da
zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas
rurais26
e a criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher
Segundo a entrevistada Simone (2017) o CRISMU foi criado em virtude das reivindicaccedilotildees
do movimento de mulheres que contou com o apoio de vereadores e outras lideranccedilas
poliacuteticas Considerei o envolvimento das mulheres nessas conquistas como indicador de
empoderamento social27
no acircmbito puacuteblico
De forma geral a entrevistada Maria (2017) sintetiza que ldquo() apesar dos avanccedilos
apesar das lutas que jaacute tivemos dos embates nacionais de Marcha de Grito a gente evoluiu
Evoluiu A gente conseguiu grandes conquistas mas natildeo foi tudo ainda aquilordquo (entrevista
com Maria em 14072017) Para a entrevistada Dandara (2017) a eleiccedilatildeo da primeira mulher
presidente da FetagriPA serve de motivaccedilatildeo para que mais mulheres disputem a presidecircncia
dos sindicatos na base resistindo e ocupando espaccedilos cada vez maiores nos sindicatos
26
As unidades de sauacutede moacuteveis satildeo ocircnibus adaptados com consultoacuterios meacutedicos e odontoloacutegicos para
atender os moradores da zona rural da cidade
27 ldquoA capacidade das mulheres de mudar e questionar sua submissatildeo em todas as instacircncias em que ela
se manifestardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
68
A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave paridade de gecircnero implementada
no 12ordm Congresso Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Rurais da CONTAG
(CNTTR) em Brasiacutelia em marccedilo de 2017 A paridade de gecircnero garante que a CONTAG teraacute
em sua direccedilatildeo 50 de homens e 50 de mulheres Portanto a partir das proacuteximas eleiccedilotildees
sindicais (no caso do STTR de Marabaacute seraacute em junho de 2019) a paridade de gecircnero seraacute
cumprida O entrevistado Saulo (2017) e a entrevistada Dandara (2017) comentam a respeito
dessa resoluccedilatildeo aprovada
Se vocecirc pegar o estatuto do sindicato hoje o estatuto atual o estatuto da
Fetagri da Federaccedilatildeo dos Trabalhadores eacute paridade eacute 50 homem 50
mulher As proacuteximas diretorias jaacute vecircm com 50 de homem e 50 de
mulher (Entrevista com Saulo em 24052017)
Hoje eu tenho uma avaliaccedilatildeo assim noacutes ateacute avanccedilamos Noacutes avanccedilamos
porque noacutes aqui no estado do Paraacute e em todo Brasil em niacutevel de movimento
sindical noacutes tivemos que implementar cotas de 30 da nossa participaccedilatildeo
porque o movimento sindical eacute muito masculino Em outras deacutecadas era um
sindicato de homens Apesar das mulheres serem filiadas E se tu me
perguntares assim ldquoAh isso mudou hojerdquo ldquoMudourdquo Hoje noacutes temos a
paridade Noacutes saiacutemos da cota de 30 para a paridade Noacutes implementamos
agora no 9ordm Congresso da Contag (Entrevista com Dandara em 01092017)
A paridade de gecircnero eacute um passo importante para construir poliacuteticas que alterem as
condiccedilotildees de participaccedilatildeo poliacutetica e sindical das mulheres consolidando um sindicalismo com
liberdade e autonomia
Retomando o debate sobre as dimensotildees do empoderamento eacute necessaacuterio
problematizar sobre discriminaccedilatildeo e violecircncia domeacutestica questotildees recorrentes entre as
mulheres entrevistadas Considerei como indicador do empoderamento pessoal28
no acircmbito
puacuteblico a existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo e no acircmbito privado a existecircncia ou natildeo de
violecircncia domeacutestica A discriminaccedilatildeo foi vivenciada por todas as mulheres entrevistadas ndash
dirigentes do sindicato bem como as demais mulheres natildeo dirigentes ndash enquanto que algumas
foram viacutetimas de violecircncia domeacutestica Apoacutes terem sido submetidas a constrangimentos de
toda ordem conseguiram superaacute-los
A entrevistada Sandra (2017) discorre sobre o seu engajamento na luta feminista
revelando a causa que a fez participar do movimento de mulheres ao longo de sua trajetoacuteria de
vida
28
ldquoCompreende o aumento da auto-estima e da autoconfianccedilardquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
69
Para te dizer que o nosso motivo para que a gente viesse a se engajar na luta
feminista esse sentimento feminista da nossa parte foi exatamente essa
indignaccedilatildeo pela discriminaccedilatildeo Noacutes percebemos o quanto antes justamente
porque eu como mulher como negra certo Eu jaacute sofri muito e sofro todo
dia se vocecirc quer saber Entendeu A gente sofre todo dia Isso na frente dos
movimentos nos lugares aonde a gente estaacute a gente sofre essa
discriminaccedilatildeo E aiacute a gente percebe que como mulher como negra como
mulher de poder aquisitivo baixo e como agora caminhando jaacute para a idade
tambeacutem Tudo isso a gente percebe () Geralmente a pessoa soacute passa a te
respeitar mais eacute a partir da tua accedilatildeo das tuas atitudes (Entrevista com
Sandra em 22092016)
Segundo a entrevistada Nina (2017) a discriminaccedilatildeo contra as mulheres eacute causada
porque os homens ldquonatildeo aceitam que as mulheres pensam que as mulheres tem ideias mulher
eacute para ser fogatildeo para ser dona de casa domeacutestica e os homens e a estrutura machista para
comandar tudo isso Eacute difiacutecil demais rdquo (Entrevista com Nina em 27092016) Para a
entrevistada Vana (2017) a impressatildeo eacute de que as pessoas natildeo confiam nas mulheres de
maneira geral
ldquo() quando vocecirc natildeo confia natildeo tem seguranccedila quem ajude tudo que vai
falar bdquoAh esse negoacutecio de mulher‟ Eu acho que a maioria eacute discriminaccedilatildeo
Ali [no sindicato] todas [mulheres] que entrar eacute [discriminada] Natildeo adianta
Primeiro ponto vocecirc natildeo tem vez Eu natildeo fui muito [discriminada] porque
eu sou dura Eu era laacute de dentro Soacute queriam que eu trabalhasse trabalhasse
trabalhasse eu natildeo tinha uma sala eu natildeo tinha uma cadeira para sentarrdquo (Entrevista com Vana em 22052017)
Dando continuidade aos exemplos de discriminaccedilatildeo vivenciados a entrevistada Tereza
(2017) cita a visatildeo deturpada dos homens dirigentes de que a mulher tem capacidade limitada
de exercer determinada funccedilatildeo Concordando com essa ideia as entrevistadas Frida (2017) e
Simone (2017) enfatizam a questatildeo da barreira e do machismo
Eacute a barreira Vocecirc soacute pode ir ateacute aqui daqui para caacute natildeo Pronto Eacute isso ()
Quando tem alguma coisa que a gente acha que natildeo eacute assim a gente chama
os companheiros ldquoCompanheiro eu acho que estaacute erradordquo Mas aiacute a gente
natildeo tem forccedila entatildeo natildeo adianta Natildeo adianta (Entrevista com Frida em
18052017)
Eu ainda hoje percebo as dificuldades dentro do sindicato com relaccedilatildeo a
estar acessando espaccedilo O machismo eacute muito muito muito grande ainda
Isso eacute uma coisa que ainda deixa elas muito retraiacutedas Porque eu percebo que
hoje noacutes temos duas lideranccedilas [mulheres] que a gente acompanhou o
processo delas nesses encontros nos movimentos e tudo enquanto e hoje
elas satildeo coordenaccedilatildeo dos seus grupos de assentamento e acampamento Mas
nunca tiveram oportunidade dentro do Sindicato de Marabaacute () O que a
gente olha a dificuldade para elas conseguirem alguma coisa dentro do
sindicato ainda eacute a discriminaccedilatildeo O pessoal discrimina muito que a mulher
70
natildeo eacute capaz de estar assumindo [cargos de direccedilatildeo] (Entrevista com Simone
em 23052017)
A resistecircncia agraves mulheres assumirem cargos formais manifestada nos diversos
depoimentos pode ser indicador de um bloqueio no qual satildeo submetidas poreacutem aponta uma
fragilidade nas estrateacutegias adotadas pelas mulheres no sentido de furar este cerco
Aprofundando o debate sobre violecircncia domeacutestica para Arauacutejo e Rodrigues (2015)
trata-se de um fenocircmeno trazido agrave luz pelos movimentos sociais de mulheres A Lei nordm
11340 criada em 07 de agosto de 2006 conhecida como Lei Maria da Penha define a
violecircncia domeacutestica e familiar em seu Art 5ordm (TRIBUNAL 2012)
Art 5ordm Para os efeitos desta Lei configura violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher qualquer accedilatildeo ou omissatildeo baseada no gecircnero que lhe cause
morte lesatildeo sofrimento fiacutesico sexual ou psicoloacutegico e dano moral ou patrimonial
I ndash no acircmbito da unidade domeacutestica compreendida como o espaccedilo de
conviacutevio permanente de pessoas com ou sem viacutenculo familiar inclusive as
esporadicamente agregadas
II ndash no acircmbito da famiacutelia compreendida como a comunidade formada por
indiviacuteduos que satildeo ou se consideram aparentados unidos por laccedilos naturais por afinidade ou por vontade expressa
III ndash em qualquer relaccedilatildeo iacutentima de afeto na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida independentemente de coabitaccedilatildeo
O Art 7ordm (TRIBUNAL 2012) apresenta as formas de violecircncia domeacutestica e familiar
contra a mulher entre outras
I - a violecircncia fiacutesica entendida como qualquer conduta que ofenda sua
integridade ou sauacutede corporal
II - a violecircncia psicoloacutegica entendida como qualquer conduta que lhe cause
dano emocional e diminuiccedilatildeo da auto-estima ou que lhe prejudique e
perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas
accedilotildees comportamentos crenccedilas e decisotildees mediante ameaccedila
constrangimento humilhaccedilatildeo manipulaccedilatildeo isolamento vigilacircncia
constante perseguiccedilatildeo contumaz insulto chantagem ridicularizaccedilatildeo
exploraccedilatildeo e limitaccedilatildeo do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe
cause prejuiacutezo agrave sauacutede psicoloacutegica e agrave autodeterminaccedilatildeo
III - a violecircncia sexual entendida como qualquer conduta que a constranja a
presenciar a manter ou a participar de relaccedilatildeo sexual natildeo desejada mediante
intimidaccedilatildeo ameaccedila coaccedilatildeo ou uso da forccedila que a induza a comercializar
ou a utilizar de qualquer modo a sua sexualidade que a impeccedila de usar
qualquer meacutetodo contraceptivo ou que a force ao matrimocircnio agrave gravidez ao
aborto ou agrave prostituiccedilatildeo mediante coaccedilatildeo chantagem suborno ou
manipulaccedilatildeo ou que limite ou anule o exerciacutecio de seus direitos sexuais e
reprodutivos
71
IV - a violecircncia patrimonial entendida como qualquer conduta que
configure retenccedilatildeo subtraccedilatildeo destruiccedilatildeo parcial ou total de seus objetos
instrumentos de trabalho documentos pessoais bens valores e direitos ou
recursos econocircmicos incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades
V - a violecircncia moral entendida como qualquer conduta que configure
caluacutenia difamaccedilatildeo ou injuacuteria
Em seguida trechos das falas que exemplificam a violecircncia domeacutestica sofrida pelas
mulheres entrevistadas
Porque naquela eacutepoca vocecirc saiacutea do cativeiro do pai e passava para o
cativeiro do marido Entatildeo era subordinaccedilatildeo total e daiacute entatildeo natildeo deu mais
para noacutes viver meu pai separou noacutes ele [marido] tentou me esfaquear
chegaram bem na hora e foi Deus quem me deu o livramento (Entrevista
com Maria em 14072017)
Eu nunca sofri violecircncia domeacutestica Eu sofri violecircncia digamos assim
moral verbal porque depois que noacutes separamos ele fez isso mas fiacutesica eu
nunca sofri violecircncia (Entrevista com Dandara em 01092017)
Eu lembro que nessa eacutepoca que eu tava no sindicato numa relaccedilatildeo
extremamente turbulenta da pessoa machista () e eu tava sofrendo de certa
forma violecircncia dentro de casa Comeccedilou com agressatildeo verbal e ateacute entatildeo eu
natildeo sabia aquilo Aiacute laacute num dia numa formaccedilatildeo no sindicato acho que era o
sindicato com a CPT aiacute foram falar sobre a Lei Maria da Penha Como
comeccedilava tudo isso tinha uma psicoacuteloga falando sobre isso Como
comeccedilava [a violecircncia] essa questatildeo da agressatildeo e tudo Eu me vi naquilo
Passou a me despertar que eu tava vivenciando aquilo dentro de casa Entatildeo
eu era uma pessoa coagida eu era uma pessoa que deixava de fazer
determinadas coisas porque o marido natildeo deixava Entatildeo foi quando eu
decidi separar () No dia que eu separei ele chegou a me agredir registrei
Boletim de Ocorrecircncia () A agressatildeo foi o estopim nesse sentido que eacute
uma coisa que eu jaacute vinha vivenciando haacute muito tempo e natildeo tinha
percebido natildeo tinha despertado ainda () Eu deixei a queixa dei entrada e
tudo Soacute que no dia da audiecircncia comeccedilou as ameaccedilas contra a minha famiacutelia
e tudo e eu acabei natildeo indo no dia da audiecircncia por ameaccedilas Fiquei com
medo de acontecer alguma coisa com a minha matildee Ele ameaccedilava todo
mundo laacute em casa Entatildeo eu acabei deixando quieto Um dos
arrependimentos que eu tenho Fiquei com medo neacute (Entrevista com
Tereza em 19052017)
De acordo com o segundo depoimento eacute possiacutevel perceber que a violecircncia domeacutestica
eacute confundida agraves vezes com a violecircncia fiacutesica todavia a Lei Maria da Penha eacute clara e direta ao
classificar as formas de violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher A entrevistada Joana
Angeacutelica (2017) exemplifica caso de violecircncia sexual
Eu me lembro que teve uma senhora do Sindicato de Marabaacute ela veio uma
vez falar comigo ldquoEi tudo que vocecirc falou aiacute eu me vi naquela sua falardquo Ela
era estuprada pelo marido quase todos os dias Entatildeo porque o sexo no
72
casamento eacute uma obrigaccedilatildeo natildeo eacute algo que faz parte do casal de vivenciar a
sexualidade (Entrevista com Joana Angeacutelica em 21092016)
Aprofundando o debate sobre o estupro a entrevistada Sandra (2017) considera-o
alarmante bem como os casos de assassinatos de mulheres
A maior violecircncia que a mulher estaacute sofrendo eacute a violecircncia fiacutesica Ainda
existe muito assassinato de mulher satildeo muitas mulheres assassinadas Isso
se na zona urbana que eacute o maior centro de maior populaccedilatildeo porque na zona
urbana eacute mais visiacutevel esses assassinatos e na zona rural eacute pior Muitas vezes
nem chega a saber quando sabe satildeo informaccedilotildees muito vagas E acontece
todo tipo de violecircncia o estupro o assassinato que eles falam que satildeo
atraveacutes do casamento E mesmo assim hoje por exemplo a mulher estaacute
sofrendo eacute uma modalidade que estaacute muito presente estaacute horriacutevel que eacute
alarmante essa questatildeo do estupro da mulher A mulher sendo estuprada
porque a mulher hoje natildeo pode andar ainda tem mais uma coisa porque a
proacutepria miacutedia sustenta isso mulheres que usam roupas curtas provocantes
estatildeo sendo estupradas Entatildeo eacute um desrespeito com a proacutepria mulher que
ainda na minha opiniatildeo no seacuteculo que estamos vivendo a mulher estaacute
sendo violentada pelos seus direitos ela natildeo estaacute tendo liberdade de ir e vir
por conta dessa questatildeo (Entrevista com Sandra em 22092016)
Apesar de serem repetitivos considero essencial publicizar todos esses depoimentos
pela pertinecircncia e gravidade do tema tratando-se ainda de empecilhos para a conquista do
empoderamento feminino Assim sendo cito mais trechos coletados das entrevistas sobre
violecircncia domeacutestica e familiar contra a mulher
A violecircncia domeacutestica natildeo eacute soacute aquela questatildeo da violecircncia fiacutesica A
psicoloacutegica eacute praticamente atuante todos os dias Porque ainda da forma que
os companheiros tratam as mulheres e agraves vezes ateacute mesmo na proacutepria
famiacutelia Os homens sempre procuram formas das mulheres se acharem com
pouca capacidade (Entrevista com Linda em 26092016)
A questatildeo da violecircncia contra a mulher eacute uma coisa que estaacute assim
escandalosa na nossa regiatildeo Eu sempre fico observando essa questatildeo das
pesquisas e sempre tenho percebido que o nosso estado eacute um dos estados
campeatildeo em violecircncia contra a mulher Para mim parece que noacutes estamos
ainda laacute no seacuteculo XIX Eu olho do tanto que a gente jaacute tem feito formaccedilotildees
encontros a gente jaacute tem politizado pessoas com certeza mas a gente
observa que parece que noacutes ainda estamos a anos-luz para poder chegar a ter
uma sociedade que compreenda que essa questatildeo do machismo jaacute eacute coisa do
passado Mas infelizmente a gente tem que conviver com esse tipo de
situaccedilatildeo (Entrevista com Simone em 23052017)
Eu acho que a violecircncia aquela violecircncia camuflada da discriminaccedilatildeo do
preconceito a discriminaccedilatildeo e principalmente a repressatildeo psicoloacutegica que a
mulher vive dentro de casa Assim um mandonismo haacute muitas situaccedilotildees
que o homem se permite e que ele proiacutebe a mulher de sair de fazer a sua
agenda de ter liberdade Assim a mulher natildeo conquistou ainda a liberdade
73
cidadatilde que ela tem direito entatildeo eu acho que eacute uma das situaccedilotildees muito
difiacuteceis ainda para a mulher () E depois a questatildeo mesmo dos direitos eu
diria ateacute baacutesicos Por exemplo noacutes natildeo temos o acesso ainda ao cuidado
baacutesico da sauacutede isso para mim eacute uma das grandes violecircncias Por exemplo a
maioria das mulheres natildeo ter acesso agrave mamografia isso para mim eacute uma
violecircncia enorme agrave mulher Porque noacutes temos a morte de mulheres com
cacircncer de mama ainda muito forte o Paraacute infelizmente eacute campeatildeo
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A violecircncia eacute desde a ausecircncia da poliacutetica puacuteblica voltada agrave mulher na
questatildeo da sauacutede da educaccedilatildeo do lazer da cultura enfim Mas tem a
violecircncia fiacutesica mesmo dentro dessa questatildeo machista que o homem entende
que eacute dono fez o casamento ateacute namorada jaacute namorou a mulher jaacute tem
direito jaacute eacute dele jaacute eacute propriedade Por conta disso ele por exemplo acha
que pode violentar a mulher se ela natildeo tiver cumprindo com aquele
compromisso que ela assumiu com ele Independente de ela querer ainda ser
feliz com ele ou natildeo quando ela entende que o relacionamento seja namoro
seja casamento natildeo daacute mais certo que ela quer separar aiacute ela sofre esse tipo
de violecircncia e o pior de tudo eacute que o Estado fecha os olhos (Entrevista com
Nina em 27092016)
Corroborando os depoimentos anteriores Prado e Sanematsu (2017) alertam sobre as
elevadas estatiacutesticas de violecircncias cotidianas praticadas contra as mulheres no Brasil
ocupante do quinto lugar ndash destaque desumano no cenaacuterio mundial ndash entre os paiacuteses com
maior taxa de homiciacutedios de mulheres ldquoApesar de graves esses dados podem ainda
representar apenas uma parte da realidade jaacute que uma parcela consideraacutevel dos crimes natildeo
chega a ser denunciada ou registradardquo (PRADO SANEMATSU 2017 p33) Quando se trata
da violecircncia contra as mulheres rurais a tendecircncia eacute que elas sofram em silecircncio uma vez que
o isolamento geograacutefico dificulta a denuacutencia formal ou a busca de outras formas de auxiacutelio
Ao se pensar a violecircncia contra as mulheres rurais pode-se refletir sobre a
sua sobreposiccedilatildeo e potencializaccedilatildeo em contextos adversos e de exclusatildeo O
distanciamento dos recursos coletivos de atenccedilatildeo social e de proteccedilatildeo soma-
se agraves grandes distacircncias geograacuteficas dos centros urbanos onde se encontram
tais recursos favorecem a invisibilidade e o natildeo enfrentamento dessas
situaccedilotildees (COSTA LOPES 2012 p1089)
Em 2017 a CONTAG reeditou a Cartilha ldquoMulheres em luta por uma vida sem
violecircnciardquo construiacuteda e lanccedilada pela Sempreviva Organizaccedilatildeo Feminista (SOF) em 2015
Para acabar de vez com a violecircncia contra a mulher as autoras da cartilha propotildeem
Para superar a violecircncia precisamos ter poliacuteticas que alterem as
desigualdades de gecircnero e raccedila e ajudem a construir uma sociedade com
igualdade Tudo isso precisa ser feito em um soacute movimento ou seja ao
mesmo tempo em que fazemos poliacuteticas para que a violecircncia natildeo mais
74
aconteccedila eacute preciso tambeacutem apoiar e proteger aquelas mulheres que estatildeo
sofrendo violecircncia Isto significa ter poliacuteticas puacuteblicas que atendam as
mulheres de forma integral que atuem para construccedilatildeo e promoccedilatildeo da
autonomia econocircmica e pessoal que tenham assistecircncia direta como
aluguel social moradia atendimento psicoloacutegico e social e acesso agrave justiccedila e
a accedilotildees da justiccedila que penalizem o agressor bem como que garantam o
acesso agrave renda Enquanto isto na sociedade os movimentos tecircm que
continuar denunciando a violecircncia e estimular para que a populaccedilatildeo e as
mulheres sejam solidaacuterias umas com as outras Eacute preciso tambeacutem estar
atentas agrave forma como as poliacuteticas estatildeo sendo implementadas e estar alertas
para o fato de que natildeo haacute conquistas definitivas a luta eacute cotidiana
(CONTAG 2017 p 43 grifo nosso)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo econocircmica29
do empoderamento a importacircncia da renda eacute um
dos indicadores Metodologicamente a coleta de dados desse indicador natildeo foi precisa em
virtude das perguntas do roteiro natildeo o terem abordado com profundidade Poreacutem apesar dessa
limitaccedilatildeo eacute possiacutevel problematizar a partir dos dados coletados e da literatura mobilizada
Para Sen (2000) ldquotrabalhar fora de casa e auferir uma renda independente tende a
produzir um impacto claro sobre a melhora da posiccedilatildeo social da mulher em sua casa e na
sociedaderdquo (SEN 2000 p 223) Ainda segundo esse autor
A liberdade para procurar e ter emprego fora de casa pode contribuir para
reduzir a privaccedilatildeo relativa ndash e absoluta ndash das mulheres A liberdade em uma
aacuterea (de poder trabalhar fora de casa) parece contribuir para aumentar a
liberdade em outras (mais liberdade para natildeo sofrer fome doenccedila e privaccedilatildeo
relativa) (SEN 2000 p 226)
No caso das mulheres participantes dessa pesquisa trabalhadoras rurais dirigentes do
sindicato a renda rural eacute estabelecida pelas atividades agriacutecolas e natildeo-agriacutecolas Sendo que no
periacuteodo em que elas estavam ocupando cargos de direccedilatildeo havia (ou natildeo) o repasse da ajuda
de custo Conforme o que foi possiacutevel extrair da coleta dos dados as mulheres entrevistadas
constituem suas rendas atraveacutes das atividades agriacutecolas (criaccedilatildeo de gado de peixe aves roccedila
fruticultura horticultura) e natildeo-agriacutecolas (aposentadoria trabalhos temporaacuterios na cidade e
como ACS ndash Agente Comunitaacuterio de Sauacutede)
De uma maneira geral considerando as mulheres do campo e da cidade as
entrevistadas Madalena (2016) e Nina (2016) esclarecem
29 ldquoPerspectivas de aumento da renda da quantidade e qualidade nutricional dos alimentos e da
qualidade de vida da famiacutelia assim como o controle das mulheres sobre os resultados econocircmicos de
seu trabalhordquo (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
75
A mulher nunca vai ter liberdade se ela natildeo tiver autonomia financeira
Enquanto ela depender do dinheiro que ela tem que pedir do marido ela
nunca vai ter autonomia ela nunca vai poder fazer aquilo que ela entende
que eacute importante para ela Enquanto ela tiver dependecircncia financeira
(Entrevista com Madalena em 20092016)
A pessoa para ser independente tem que ter um trabalho Ficar dependendo
do marido que bate aiacute ela vai laacute e retira a queixa porque ele taacute botando
comida dentro de casa para sustentar os filhos Como eacute que vai sobreviver
(Entrevista com Nina em 27092016)
Para a entrevistada Vana (2017) eacute fundamental que as mulheres dependentes
financeiramente dos maridos se informem a respeito da violecircncia domeacutestica para se
defenderem de alguma situaccedilatildeo ameaccediladora
Porque ela fica informada neacute E natildeo fica dependendo soacute do marido Porque
quando a gente natildeo eacute informada toda coisinha ldquoMarido me daacute um dinheirordquo
e ela fica sabendo porque na hora que ele sentar a matildeo nela ela jaacute sabe para
onde vai correr Soacute se ela for muito covarda apanhar quebrar os dentes de
noite e natildeo dizer nada (Entrevista com Vana em 22052017)
Em relaccedilatildeo agrave dimensatildeo poliacutetica30
do empoderamento o indicador de ampliaccedilatildeo de
participaccedilatildeo das mulheres em instacircncias de poder pode ser considerado negativo Apesar de
que como citado na problemaacutetica o empoderamento apresenta caraacuteter processual (AMORIM
2012) sendo esse processo complexo e marcado por contradiccedilotildees (MANESCHY
SIQUEIRA AacuteLVARES 2012)
As dirigentes e ex-dirigentes do sindicato consideram que houve uma mudanccedila de
vida apoacutes a filiaccedilatildeo conforme detalhado nos depoimentos seguintes
Mudou para mim Ateacute o marido dizer assim ldquoEacute depois que ela taacute
trabalhando no sindicato ela jaacute se mandardquo ldquoEu me mando mesmo porque
agora eu conheccedilo os meus direitos Natildeo faz mais graccedila comigo natildeordquo
(Entrevista com Vana em 22052017)
A minha experiecircncia foi boa Isso amadureceu demais fez com que eu
fizesse outros cursos me interessasse tanto que ateacute hoje eu to ligada agrave zona
rural por causa disso Eu conheci diretamente fez despertar a minha vida
porque mudou praticamente a minha vida os cursos do sindicato a partir das
palestras junto com a CPT Jaacute pensou se eu natildeo despertasse essa consciecircncia
ateacute hoje natildeo taria com o risco de estar com esse homem Ele jaacute teria me
matado eu acho Jaacute teria me matado com certeza porque ele soacute falava nisso
() Entatildeo de certa forma influenciou diretamente na minha vida para
melhor Estar no sindicato foi uma grande experiecircncia de vida (entrevista
com Tereza em 19052017)
30
Ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo em instacircncias de poder (BRUMER ANJOS 2010 p 221)
76
Mudou sim Com certeza sim eu avalio assim que mudou por conta da
bagagem de conhecimento porque quando eu entrei no movimento social eu
era urbanista totalmente urbanista eu natildeo entendia nada de ruralista Entatildeo
foi aonde que eu fui aprender a conhecer a minha categoria que hoje eu sou
qualificada () Entatildeo para mim foi muito bom foi muito rico participar do
sindicato (Entrevista com Maria em 14072017)
O depoimento da entrevistada Tereza (2017) revela a eficaacutecia das praacuteticas sindicais de
formaccedilatildeo informaccedilatildeo e empoderamento pois conhecer as leis e receber orientaccedilotildees para um
comportamento combativo eacute fundamental para mudar esse quadro de violecircncia apresentado
nos depoimentos
Os principais indicadores de empoderamento analisados foram envolvimento das
mulheres nas conquistas do sindicato (dimensatildeo social acircmbito puacuteblico) renda (dimensatildeo
econocircmica acircmbito privado) ampliaccedilatildeo da participaccedilatildeo das mulheres nas instancias de poder
(dimensatildeo poliacutetica acircmbito puacuteblico) existecircncia ou natildeo de discriminaccedilatildeo (dimensatildeo pessoal
acircmbito puacuteblico) e existecircncia ou natildeo de violecircncia domeacutestica (dimensatildeo pessoal acircmbito
privado)
Para finalizar essa seccedilatildeo segue depoimento do entrevistado Luiacutes (2017)
Eu acho que as mulheres quando assumem o cargo delas satildeo muito
guerreiras elas satildeo competentes elas tentam dar o maacuteximo de si para dar
certo Elas satildeo menos concentradoras de que os homens Eu acho que o que
falta para a mulher eacute oportunidade Mas elas sempre criaram coragem e
buscaram a oportunidade delas sem ter medo de ser feliz (Entrevista com
Luiacutes em 19052017)
O entrevistado Luiacutes eacute um dos dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das mulheres como
protagonistas do sindicato
77
6 CONCLUSOtildeES
Objetivei com essa dissertaccedilatildeo analisar o processo de empoderamento das mulheres
dirigentes do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Marabaacute A pesquisa
exigiu de mim aleacutem do preparo teoacuterico-metodoloacutegico coragem e maturidade emocional por
se tratar de imersatildeo em campo polecircmico marcado por conflitos diversos e com o qual eu
tinha relativa afinidade e contato desde longo tempo embora dele natildeo fizesse parte Analisar
esse processo por dentro do sindicato tornou-se uma experiecircncia enriquecedora pessoal e
academicamente
Com o desenvolvimento da pesquisa identifiquei que as mulheres do STTR de
Marabaacute participaram de lutas variadas e obtiveram determinadas conquistas mas tambeacutem
foram viacutetimas de discriminaccedilatildeomachismo e violecircncia domeacutestica no decorrer da militacircncia
sindical As conquistas ndash classificadas como indicadores de empoderamento nas dimensotildees
poliacutetica e social ndash se referem ao acesso agrave sindicalizaccedilatildeo agraves mulheres que se destacaram como
lideranccedilas na organizaccedilatildeo dos acampamentos e das associaccedilotildees dos projetos de
assentamentos conquistas especiacuteficas relacionadas agrave sauacutede da mulher como prioridade de
atendimento das mulheres da zona rural nos postos municipais de sauacutede utilizaccedilatildeo das
unidades de sauacutede moacuteveis nas vilas rurais e apoio agrave criaccedilatildeo do CRISMU ndash Centro de
Referecircncia Integrado agrave Sauacutede da Mulher A conquista mais recente das mulheres refere-se agrave
paridade de gecircnero ou seja a partir da proacutexima eleiccedilatildeo da diretoria do sindicato a
porcentagem de dirigentes seraacute de 50 mulheres e 50 homens Esse indicador de
empoderamento na dimensatildeo poliacutetica provavelmente influenciaraacute nas outras dimensotildees
considerando que com mais mulheres nas instacircncias de poder do sindicato as demandas
feministas geralmente reprimidas estaratildeo em pauta com mais frequecircncia e visibilidade
A partir das entrevistas realizadas com as mulheres concluiacute que as relaccedilotildees de poder
satildeo caracterizadas por conflitos e tensotildees em virtude da dominaccedilatildeo masculina nas instacircncias
de decisatildeo do sindicato Todavia as mulheres conseguem construir o empoderamento nas
dimensotildees analisadas numa mescla de avanccedilos e recuos atraveacutes de enfrentamentos com os
dirigentes homens Esses enfrentamentos satildeo agravados quando se acrescenta a questatildeo
geracional por definir padrotildees de comportamento cristalizando as hierarquias sociais Na
visatildeo das mulheres o empoderamento ocorre atraveacutes de vaacuterias formas como quando as
mulheres possuem autonomia financeira (renda proacutepria) poder de decisatildeo pessoal autoestima
elevada poder de decisatildeo enquanto dirigente do sindicato quando as mulheres conseguem
78
vencer a discriminaccedilatildeomachismo quando participam ativamente da poliacutetica de cursos de
formaccedilatildeo e eventos como marchas passeatas entre outros
A partir das entrevistas realizadas com os homens concluiacute que predomina o discurso
de que os homens estatildeo na linha de frente como forma de ldquoprotegerrdquo as mulheres dos
embates Entretanto foi possiacutevel identificar homens dirigentes sensiacuteveis agrave participaccedilatildeo das
mulheres como protagonistas Na visatildeo dos homens do sindicato as mulheres constroem o
empoderamento atraveacutes da participaccedilatildeo delas no processo de luta pela terra (organizaccedilatildeo dos
acampamentos e assentamentos) da participaccedilatildeo em cursos de formaccedilatildeo que permitem
conhecer os seus direitos na implantaccedilatildeo da poliacutetica de cotas de 30 para as mulheres e
posteriormente na conquista da paridade de gecircnero cuja demonstraccedilatildeo maior foi a eleiccedilatildeo da
primeira mulher para presidecircncia da FETAGRI
O sindicalismo de trabalhadores e trabalhadoras rurais eacute uma praacutetica poliacutetica que
favorece o avanccedilo da consciecircncia profissional mas igualmente de posicionamentos
existenciais coerentes com a cidadania nas formas e conteuacutedos da modernidade A pressatildeo
externa seja no acircmbito da militacircncia sindical no niacutevel nacional seja na propagaccedilatildeo dos
direitos das mulheres nas miacutedias satildeo fatores que influem positivamente na ampliaccedilatildeo das
conquistas das mulheres no STTR em que pese a permanecircncia significativa de
posicionamentos conservadores e anacrocircnicos
A pesquisa apresentou limitaccedilotildees metodoloacutegicas referentes agrave coleta de dados do
indicador de empoderamento na dimensatildeo econocircmica (renda) contudo a problematizaccedilatildeo
ocorreu a partir dos dados possiacuteveis de serem coletados e da literatura mobilizada
A violecircncia domeacutestica foi um dos indicadores mais citados nas entrevistas realizadas
em todas as suas formas fiacutesica psicoloacutegica sexual patrimonial e moral tornando-se um
indicador de desempoderamento O aumento da denuacutencia e o combate agrave violecircncia contra a
mulher materializado em particular na Lei Maria da Penha eacute revelador da importacircncia do
debate e da promoccedilatildeo de eventos que trabalhem com essa temaacutetica
No espaccedilo da militacircncia sindical em que pesem todos os seus limites e condicionantes
em ambientes dominados por homens como o do STTR de Marabaacute haacute um favorecimento ao
debate sobre a igualdade de gecircneros e circulam informaccedilotildees e estiacutemulos nas atividades de
formaccedilatildeo que levam a um reposicionamento das mulheres no campo da poliacutetica profissional
Resta saber se esse reposicionamento surge da proacutepria base ou se eacute fruto de encaminhamentos
79
de reuniotildees de acircmbito federal eou estadual em que esses temas satildeo tratados para serem
trabalhados na base
O principal desafio das mulheres eacute continuar lutando atraveacutes de uma agenda
permanente para superar a violecircncia domeacutestica e a discriminaccedilatildeo garantindo que prevaleccedila
um trabalho de parceria e respeito entre as mulheres e homens do sindicato pesquisado
80
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Justiccedila do Estado do Paraacute ndash Beleacutem 2012
87
APEcircNDICE A ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA (CAMPO EXPLORATOacuteRIO)
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE __________________________________
ENTIDADES QUE TRABALHOU ____________________________________________
FORMACcedilAtildeO ______________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL DA ENTREVISTA __________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a luta pelas mulheres Em que local e em que movimento O
que a motivou
3 Quais pontos importantes que destaca
4 Quais pontos importantes que destaca na luta das mulheres em Marabaacute
Acontecimentos e lideranccedilas importantes
5 Principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu cotidiano
e em particular as mulheres rurais (se tiver experiecircncia)
6 Conquistas das mulheres
7 Desafios das mulheres
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
88
APEcircNDICE B ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES DIRIGENTES DO
STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
DIRIGENTE DO STTR ___________________ RELIGIAtildeO ______________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO _________ FIM ____________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo Qual
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no sindicato Houve alguma
mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no
sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
89
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do STTR de Marabaacute Vocecirc se sentiu discriminada
por ser mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por quecirc
17 Quais os desafios das mulheres do STTR de Marabaacute
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
90
APEcircNDICE C ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA MULHERES ASSESSORAS
TEacuteCNICAS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES_____________________________________________________________
__________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que a motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute) Em que gestatildeo
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Nos lugares onde trabalhou vocecirc se sentiu discriminada por ser mulher Como
reagiu
9 Quais os desafios das mulheres do sindicato
10 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
91
APEcircNDICE D ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS DIRIGENTES
(ATUAIS E EX DIRIGENTES) DO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ____________________________________________________________________
IDADE ____________________ NATURALIDADE ____________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ________________________ TEM FILHOS _____________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ______________ INIacuteCIO _________ FIM ______________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Qual funccedilatildeocargo que exerce (exerceu) no STTR de Marabaacute
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de
Marabaacute (STTR de Marabaacute) Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do STTR de Marabaacute As
mulheres participaram desses eventos
4 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo das mulheres na gestatildeo do STTR de Marabaacute eacute
importante Como vocecirc avalia essa participaccedilatildeo
5 Fale sobre a poliacutetica de cotas ou outras referentes agraves mulheres que tem sido
adotada pela organizaccedilatildeo Quais os cargos que as mulheres tecircm ocupado na
organizaccedilatildeo
6 Vocecirc percebe alguma dificuldade enfrentada pelas mulheres no seu cotidiano e
nas atividades do STTR de Marabaacute Quais
7 Existe alguma conquista especiacutefica das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
Qual
8 Quais os desafios das mulheres filiadas ao STTR de Marabaacute
92
APEcircNDICE E ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA HOMENS ASSESSORES
TEacuteCNICOS AO STTR DE MARABAacute
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ________________________
ENDERECcedilO ______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE _______________________________________________
ESTADO CIVIL ___________________ TEM FILHOS ________________________
RELIGIAtildeO ______________________________________________________________
ENTIDADES EM QUE ATUOU ______________________________________________
___________________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ________________ INIacuteCIO __________ FIM ___________
LOCAL__________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Como iniciou a assessorialuta pelas mulheres Em que local e em que
movimento O que o motivou
3 Quando passou a assessorar o Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Marabaacute (STTR de Marabaacute)
4 Em sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no
sindicato Como assim
5 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta do sindicato As mulheres
participaram desses eventos
6 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas ao sindicato
7 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades do sindicato
8 Quais os desafios das mulheres do sindicato
9 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
93
APEcircNDICE F ndash ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA PRESIDENTE ESTADUAL DA
FETAGRI
ROTEIRO DE ENTREVISTA
NOME ___________________________________________________________________
IDADE _______________ NATURALIDADE ___________________________
ENDERECcedilO _______________________________________________________________
NIVEL DE ESCOLARIDADE ________________________________________________
ESTADO CIVIL ______________________ TEM FILHOS _______________________
RELIGIAtildeO ________________________________________________________________
DATA DA ENTREVISTA ____________ INIacuteCIO________ FIM _________________
LOCAL___________________________________________________________________
IMPRESSOtildeES______________________________________________________________
___________________________________________________________________________
1 Falar da trajetoacuteria de vida
2 Quando se filiou ao Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
Como ou atraveacutes de quem se filiou ao STTR
3 Participa de alguma outra forma de organizaccedilatildeo social ou oacutergatildeo de
representaccedilatildeo poliacutetica Que tipo
4 Vocecirc considera que houve alguma mudanccedila em sua vida apoacutes a filiaccedilatildeo ao
sindicato Qual E apoacutes assumir cargo na FETAGRI
5 O que o seu maridofilho acha da sua participaccedilatildeo no movimento sindical
Houve alguma mudanccedila na sua relaccedilatildeo com seu cocircnjuge apoacutes sua
filiaccedilatildeoparticipaccedilatildeo no sindicato
6 Na sua opiniatildeo a participaccedilatildeo dos homens e das mulheres eacute igual no sindicato
Como assim
7 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens nas reuniotildees que contam com muitas
mulheres presentes
8 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo dos homens durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
9 Como vocecirc vecirc a participaccedilatildeo das mulheres durante as reuniotildees conduzidas por
mulheres
10 Como vocecirc vecirc a sua contribuiccedilatildeo para a sua famiacutelia ter uma vida melhor
11 Quem administra a renda na sua famiacutelia Qual sua renda pessoalfamiliar
12 Na sua opiniatildeo o que eacute mais importante para uma mulher poder decidir sobre
sua proacutepria vida
13 Quais pontos importantes que vocecirc destaca na luta dos sindicatos e da
FETAGRI As mulheres participaram desses eventos
14 Quais as conquistas especiacuteficas das mulheres filiadas aos sindicatos e agrave
FETAGRI
94
15 Quais os principais entraves e dificuldades enfrentados pelas mulheres no seu
cotidiano e nas atividades da FETAGRI Vocecirc se sentiu discriminada por ser
mulher
16 Caso seja mencionado algum tipo de violecircncia domeacutestica jaacute fez alguma
denuacutencia das agressotildees Se natildeo fez por que
17 Quais os desafios das mulheres da FETAGRI
18 Quais as perspectivas para o futuro em relaccedilatildeo agrave luta das mulheres
95
APEcircNDICE G ndash TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E
DEPOIMENTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARAacute
EMBRAPA AMAZOcircNIA ORIENTAL
NUacuteCLEO DE CIEcircNCIAS AGRAacuteRIAS E DESENVOLVIMENTO RURAL
PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM AGRICULTURAS AMAZOcircNICAS
Curso de Mestrado em Agriculturas Familiares e Desenvolvimento Sustentaacutevel ndash MAFDS
TERMO DE AUTORIZACcedilAtildeO DE USO DE IMAGEM E DEPOIMENTOS
Eu________________________________________________________________________
CPF____________________ RG_______________________ depois de conhecer e entender
os objetivos procedimentos metodoloacutegicos riscos e benefiacutecios da pesquisa bem como de
estar ciente da necessidade do uso de minha imagem eou depoimento especificados no
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) AUTORIZO atraveacutes do presente
termo os pesquisadores (Pesquisadora LUCIANA MOREIRA DOS REIS Orientador Prof
Dr GUTEMBERG ARMANDO DINIZ GUERRA) da dissertaccedilatildeo de mestrado intitulada
ldquoEmpoderamento de mulheres no sindicalismo rural de Marabaacute-PArdquo a realizar as fotos que se
faccedilam necessaacuterias eou a colher meu depoimento sem quaisquer ocircnus financeiros a nenhuma
das partes Ao mesmo tempo libero a utilizaccedilatildeo destas fotos eou depoimentos para fins
cientiacuteficos e de estudos (livros artigos slides) em favor dos pesquisadores da pesquisa
acima especificados obedecendo ao que estaacute previsto nas Leis que resguardam os direitos das
crianccedilas e adolescentes (Estatuto da Crianccedila e do Adolescente ndash ECA Lei Nordm 8069 1990)
dos idosos (Estatuto do Idoso Lei Ndeg107412003) e das pessoas com deficiecircncia (Decreto
Nordm 32981999 alterado pelo Decreto Nordm 52962004)
Marabaacute ndash PA ______ de _________ de 2017
_______________________________
Pesquisadora responsaacutevel
_______________________________
Sujeito da Pesquisa
96
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 01)
97
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 02)
98
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 03)
99
ANEXO A ndash ATA DE ELEICcedilAtildeO E POSSE DA ATUAL DIRETORIA DO STTR DE
MARABAacute (PAacuteGINA 04)
100
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (FRENTE)
101
ANEXO B ndash CARTA SINDICAL DO STTR DE MARABAacute (VERSO)