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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO FACULDADE DE FARMÁCIA JULIANA DOS SANTOS CARMO AVALIAÇÃO DE SEGURANÇA TOXICOLÓGICA DO EXTRATO MEDICINAL DE CANNABIS UTILIZADO NO TRATAMENTO DA EPILEPSIA: aspecto regulatório RIO DE JANEIRO 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

FACULDADE DE FARMÁCIA

JULIANA DOS SANTOS CARMO

AVALIAÇÃO DE SEGURANÇA TOXICOLÓGICA DO EXTRATO MEDICINAL DE CANNABIS UTILIZADO NO TRATAMENTO DA EPILEPSIA: aspecto

regulatório

RIO DE JANEIRO 2016

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Juliana dos Santos Carmo

AVALIAÇÃO DE SEGURANÇA TOXICOLÓGICA DO EXTRATO MEDICINAL DE CANNABIS UTILIZADO NO TRATAMENTO DA EPILEPSIA: aspecto

regulatório

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Farmácia da Universidade Federal do Rio de Janeiro à obtenção do grau de Bacharel em Farmácia. Orientadora: Profa. Dra. Virgínia Martins Carvalho

Rio de Janeiro 2016

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente à Deus, por ter me dado forças para eu chegar onde

estou;

À minha orientadora Profa Virgínia, por toda ajuda que me deu na

elaboração deste trabalho, por ter estado sempre solícita toda vez em que

precisei da sua ajuda e dos seus conselhos, e por ter me ensinado tantas

coisas importantes que levarei para o resto da minha vida. Agradeço por ter

confiado em mim e por toda força que me deu para a construção deste trabalho

tão lindo e de tamanha importância;

Aos professores que participaram da banca, Prof. Hilton e Prof. Mario,

por aceitarem avaliar o meu trabalho e contribuírem positivamente para sua

finalização;

À UFRJ que se tornou a minha segunda casa nesses 6 anos de

faculdade e que me proporcionou experiências incríveis, pois foi lá onde pude

ter aulas com professores excepcionais e fazer belas amizades;

À minha família, minha base, que acreditou em mim desde sempre e que

me deu todo apoio e suporte em todas as etapas da minha vida. Em especial, à

minha mãe Neuseli e ao meu padrasto Márcio, que me deram uma base

familiar para que eu crescesse uma pessoa de bem e que foram fundamentais

para a minha formação;

Ao meu namorado Cesar, que esteve ao meu lado me dando força e que

teve muita paciência comigo nesse momento estressante de final de faculdade.

E ao meu bebê peludo, Mick, meu companheirinho diário que me distrai e me

dá alegria nos momentos mais aflitos;

À todos vocês, meu eterno agradecimento.

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RESUMO

CARMO, Juliana dos Santos. Avaliação de segurança toxicológica do

extrato medicinal de cannabis utilizado no tratamento da epilepsia:

aspecto regulatório. Rio de Janeiro, 2016. Trabalho de Conclusão de Curso

(Bacharelado em Farmácia) – Faculdade de Farmácia, Universidade Federal

do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

Em diversos países há medicamentos registrados e suplementos

alimentares a base de cannabis, uma planta que apresenta inúmeros princípios

ativos sendo os mais conhecidos o Δ9-tedrahidrocannabinol (Δ9-THC) e o

canabidiol (CBD). No Brasil, muitos pacientes pediátricos portadores de

epilepsia refratária estão sob tratamento com extrato medicinal de cannabis e

apresentam uma excelente resposta terapêutica. Em 2015, a Agência Nacional

de Vigilância Sanitária (ANVISA) autorizou a importação de extratos ricos em

CBD. O extrato de cannabis rico em Δ9-THC e CBD é regulado como

medicamento em diversos países sob a marca Sativex® e nos EUA antes do

FDA aprovar o Sativex® já tinha sido aprovado o Marinol® (dronabinol, Δ9-THC

sintético) e o Cesamet® (nabilona, Δ9-THC com maior cadeia carbônica para

prolongamento dos efeitos). Os extratos de cannabis vêm sendo aprovados em

diversos países para múltiplas enfermidades e a ANVISA reconheceu suas

propriedades terapêuticas ao regular a importação. Assim, é urgente que se

proceda a avaliação de segurança considerando que o uso terapêutico já está

sendo realizado e que a exigência de estudos experimentais pré-clínicos prévio

à prescrição inviabiliza o tratamento que não pode ser protelado sob grave

ameaça ao direito à vida do paciente. Assim, este trabalho compilou os dados

de agências regulatórias sobre produtos medicinais de cannabis e o risco

toxicológico baseado nos marcadores ativos THC e CBD em comparação com

alguns anticonvulsivantes. Os resultados indicaram que THC e CBD não

apresentam maior risco toxicológico no tratamento da epilepsia.

Palavras-chave: Cannabis. CBD. Δ9-THC. Epilepsia. Regulação.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1: Estrutura química do Δ9-Tetrahidrocannabinol natural (presente na

Cannabis sativa), Dronabinol (Δ9- Tetrahidrocannabinol sintético) e Nabilona

(análogo mais lipossolúvel do Δ9- Tetrahidrocannabinol)..................................17

Figura 2: Estrutura química do canabidiol.........................................................32

Figura 3: Estrutura química do THC..................................................................35

Figura 4: Estrutura química do topiramato.........................................................41

Figura 5: Estrutura química do ácido valpróico..................................................47

Figura 6: Estrutura química da lamotrigina........................................................53

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Propriedades físico-químicas do canabidiol .................................... 32

Quadro 2: Índice de toxicidade do canabidiol ................................................... 33

Quadro 3: Propriedades físico-químicas do THC ............................................. 36

Quadro 4: Índices de toxicidade do THC .......................................................... 37

Quadro 5: Valores estimados de DL50 para Δ9-THC administrado por via oral

em ratos tratados durante 7 dias ...................................................................... 39

Quadro 6: Propriedades físico-químicas do topiramato ................................... 41

Quadro 7: Índices de toxicidade do topiramato ................................................ 43

Quadro 8: Levantamento dos casos de intoxicação por topiramato em amostra

populacional em 2005 ...................................................................................... 44

Quadro 9: Propriedades físico-químicas do ácido valpróico............................. 47

Quadro 10: Índices de toxicidade do ácido valpróico ....................................... 49

Quadro 11: Propriedades físico-químicas da lamotrigina ................................. 53

Quadro 12: Índices de toxicidade da lamotrigina .............................................. 55

Quadro 13: Informações sobre o uso do extrato de cannabis .......................... 61

Quadro 14: Índice de toxicidade e endpoint dos fármacos analisados ............. 63

Quadro 15: Estimativa das doses de THC e CBD administradas em alguns

esquemas de tratamento segundo a APEPI .................................................... 66

Quadro 16: Efeitos adversos e colaterais dos fármacos .................................. 68

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 9

2. OBJETIVO .................................................................................................... 13

2.1 Objetivo Geral ......................................................................................... 13

2.2 Objetivos Específicos .............................................................................. 13

3. MATERIAIS E MÉTODOS............................................................................ 14

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................................... 15

4.1 Regulamentação ..................................................................................... 15

4.1.1 Europa ............................................................................................... 15

4.1.2 América do Norte .............................................................................. 16

4.1.3 América Central ................................................................................. 20

4.1.4 América do Sul .................................................................................. 21

4.2 Avaliação de toxicidade ........................................................................... 30

4.2.1 Canabidiol ......................................................................................... 30

4.2.2 Tetrahidrocannabinol ......................................................................... 34

4.2.3 Topiramato ........................................................................................ 40

4.2.4 Ácido Valpróico ................................................................................. 46

4.2.5 Lamotrigina ........................................................................................ 52

4.3 Avaliação do risco ................................................................................... 55

5. CONCLUSÃO ............................................................................................... 70

6. REFERÊNCIAS ............................................................................................ 71

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1. INTRODUÇÃO

Atualmente o uso medicinal de Cannabis sativa L. (maconha) tem sido

regulamentado em vários países para tratamento de diversas enfermidades,

constituindo por vezes a única alternativa terapêutica no controle de doenças

graves e incuráveis. No Brasil, o uso terapêutico de maior prevalência é no

controle de crises convulsivas em portadores de epilepsias refratárias, neste

caso o uso da planta se dá na forma de extratos oleosos ou pasta com teores

variáveis de tetrahidrocannabinol (THC) e canabidiol (CBD), princípios ativos

mais abundantes na planta, que atuam nos receptores canabinóides

apresentando efeitos paradoxais. Enquanto o THC se relaciona aos estados de

euforia, ansiedade e psicóticos, o CBD tem mostrado efeitos depressores no

sistema nervoso central (SNC) com ação antipsicótica e ansiolítica. Evidências

científicas mostram que a modulação desses fármacos no SNC é complexa

envolvendo a modulação de diversos outros receptores como os gabaérgicos,

glutamatérgicos e serotoninérgicos. Os efeitos farmacológicos dependem da

dose e da interação entre THC e CBD que podem se apresentar em diferentes

proporções nos extratos.

Apesar do CBD ter sido isolado a partir do extrato de cannabis em 1940

por Adams et al. (1940), foi a partir da década de 1960, após a identificação do

Δ9-THC pelo grupo do professor Raphael Mechoulam, de Israel (MECHOULAM

et al., 1963), que vários trabalhos científicos vêm sendo desenvolvidos

mostrando as propriedades farmacológicas de seus compostos (MECHOULAM

et al., 1970; MECHOULAM et al., 2007; WHITING et al., 2015). Os efeitos

farmacológicos são atribuídos à interação dos canabinóides com os receptores

canabinóides distribuídos no SNC (CB1) e periférico (CB2) (LEWEKE &

KOETHE, 2008). O CBD constitui cerca de 40% das substâncias ativas da

planta (CRIPPA et al., 2009), apresentando efeitos farmacológicos paradoxais

em relação aos efeitos do Δ9-THC (MECHOULAM et al.,2007).

O sistema endocanabinóide consiste em receptores de canabinóides,

canabinóides endógenos e várias enzimas que controlam a ativação e a

disponibilidade destes endocanabinóides. O Δ9-THC se liga aos receptores

CB1 e CB2 agindo como um agonista parcial e parece exercer uma atividade

neural mista, excitatória e inibitória, em diferentes áreas do cérebro, mostrando

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não atuar somente em receptores canabinóides específicos (PERTWEE, 2008).

Ao contrário do Δ9-THC, o CBD apresenta baixa afinidade pelos receptores

CB1 e CB2, sua ação parece resultar de mediação na sinalização dos

endocanabinóides através da hidrólise enzimática ou inibição da recaptação da

anandamida, o neurotransmissor canabinóide endógeno (MECHOULAM et al.,

2002). Além disso, o CBD parece ser capaz de funcionar como um agonista

dos receptores do tipo 5-HT1A promovendo efeito ansiolítico (CAMPOS &

GUIMARÃES, 2008; FOGAÇA et al., 2014; MARINHO et al., 2015).

As epilepsias refratárias acometem principalmente crianças portadoras

de síndrome genéticas raras (CDKL5, Rett e Dravet) que tem como

característica mais debilitante as crises convulsivas que apresentam alta

frequência com alto risco de óbito e lesões neurológicas irreversíveis.

A síndrome de Rett é uma doença de herança dominante ligada ao

cromossomo X, causada por mutações no gene MECP2, com um quadro

clínico característico que ocorre principalmente nas meninas. Os sintomas

desta síndrome têm início em geral entre 6 e 18 meses de idade. Esta

condição afeta aproximadamente 1 em cada 10.000 meninas. Caracteriza-

se por perda de interesse e falta de interação com as pessoas, associada à

regressão da habilidade de comunicação e pela presença de movimentos

estereotipados, especialmente das mãos. Há ainda desaceleração da

velocidade de crescimento craniano, alterações da frequência respiratória

com períodos de apneia, bruxismo, escoliose e convulsões frequentes. Esta

síndrome é causada por mutações no MECP2 na maioria dos casos, mas

uma proporção de casos atípicos pode resultar de mutações no gene

CDKL5 (CASTELLO et al., 2007).

O gene CDKL5 fornece instruções para produzir a proteína CDKL5 que é

essencial para o desenvolvimento normal do cérebro. Embora pouco se

conheça sobre a função dessa proteína, sabe-se que pode desempenhar um

papel na regulação da atividade de outros genes, incluindo o gene MECP2. A

maioria das crianças que apresenta a mutação no gene CDKL5 sofre de crises

epilépticas que começam nos primeiros meses de vida, desenvolve problemas

na fala, na locomoção e dificuldades para se alimentar (ZHI et al., 2016).

A Síndrome de Dravet é uma encefalopatia progressiva rara que se

caracteriza por uma epilepsia grave e resistente ao tratamento convencional. É

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uma doença de origem genética e aproximadamente 80% dos pacientes

afetados apresentam uma mutação no gene SCN1A, o qual tem como função

codificar uma proteína constituinte de um canal responsável pelo transporte de

sódio através das membranas celulares. A doença geralmente aparece no

primeiro ano de vida, caracterizando-se por convulsões clônicas ou tônico-

clônicas generalizadas ou unilaterais de duração prolongada com possível

elevação da temperatura corporal (PÉREZ & MORENO, 2015).

O uso de extrato de cannabis por pacientes que apresentam alguma

dessas síndromes diminuiu significantemente o número de crises

convulsivas diárias. Visto isso e diante do clamor e pressão dos movimentos

sociais, o Conselho Federal de Medicina e a ANVISA regularam a prescrição e

importação dos extratos de cannabis recentemente (a partir de 2014, com a

última resolução em março de 2016). No entanto, tais extratos são

comercializados em seu país de origem (EUA) como suplementos alimentares

apresentando grande variação nos teores dos princípios ativos dependendo da

marca ou lote dificultando o planejamento da terapêutica.

No ano de 2015 a epilepsia foi classificada como um problema de saúde

pública pela Organização Mundial da Saúde (OMS), Organização Pan-

Americana da Saúde (OPAS) e Ministério da Saúde. Estima-se que sejam

diagnosticados no Brasil, a cada ano, 340 mil novos casos de epilepsia, com a

existência de 1,8 milhão de pacientes com epilepsia ativa, sendo elevada em

crianças portadoras de retardo mental, paralisia cerebral, autismo, alterações

psiquiátricas ou de comportamento; no caso de autismo aproximadamente 30%

das crianças podem apresentar diferentes tipos de crises epilépticas durante a

adolescência (MARANHÃO et al., 2011). As epilepsias refratárias

correspondem a 20% dos casos de pacientes epilépticos (ALVARENGA et al.,

2007) e neste cenário é crescente o número de indivíduos que buscam o

extrato de cannabis.

O uso da Cannabis sativa e seus princípios ativos são regulamentados

para uso terapêutico em alguns países da Europa, como Portugal, Holanda,

Bélgica e Espanha, em alguns estados americanos, como Califórnia, Minnesota

e a capital Washington (RONSON, 2001; ZUARDI et al., 2006; SZAFLARSKI &

BEBIN, 2014) e medicamentos a base de extratos de cannabis são produzidos

para diferentes indicações terapêuticas como Parkinson (ZUARDI et al., 2009),

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esquizofrenia (ZUARDI et al., 2006), Alzheimer (IUVONE et al., 2004), dor

neuropática presente na esclerose múltipla (ROG et al., 2005) e artrite

reumatóide (BLAKE et al., 2006) e epilepsia (HUSSAIN et al., 2015).

Levando em consideração todas essas questões, este trabalho

apresenta o panorama da regulação internacional e a avaliação do risco

toxicológico do uso de extratos de cannabis no tratamento de epilepsias com

base comparativa em alguns anticonvulsivantes. Considerando o clamor social

e as recentes publicações da ANVISA sobre a regulação do uso medicinal de

compostos canabinóides e, inclusive da planta Cannabis sativa, torna-se

necessária a avaliação de segurança toxicológica prevendo-se que a utilização

terapêutica desse composto deve transcender a prescrição por uso compassivo

em território nacional.

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2. OBJETIVO

2.1 Objetivo Geral

Avaliar a segurança do uso terapêutico de produtos a base de THC e

CBD com base nas diretrizes regulatórias nacional e internacional, comparando

com medicamentos de uso convencional para tratamento da epilepsia como

topiramato, ácido valpróico e lamotrigina.

2.2 Objetivos Específicos

Levantar e descrever a regulamentação internacional e nacional do THC,

CBD e extratos de cannabis.

Levantar e descrever os dados de toxicidade aguda e crônica do THC,

CBD e extratos de cannabis.

Comparar a toxicidade do THC, CBD e extratos de cannabis com os

fármacos de referência para tratamento da epilepsia, uma das enfermidades

para a qual os compostos canabinóides de interesse são indicados.

Avaliar o risco toxicológico do uso terapêutico de THC, CBD e extratos

de cannabis na epilepsia.

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3. MATERIAIS E MÉTODOS

Foi realizada uma pesquisa nas seguintes agências regulatórias:

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) do Brasil, Food and Drug

Administration (FDA) dos Estados Unidos da América (EUA), Health Canada do

Canadá, European Medicines Agency (EMA) da União Européia (UE),

Autoridade Nacional do Medicamento (Infarmed) de Portugal, Agência

Española de Medicamentos y Productos Sanitarios da Espanha, Administración

Nacional de Medicamentos, Alimentos y Tecnología Médica (ANMAT) da

Argentina, Ministerio de Salud Publica (MSP) do Uruguai, Ministerio de Salud

(MINSAL) do Chile e Instituto Nacional de Vigilancia de Medicamentos y

Alimentos (INVIMA) da Colômbia.

Realizou-se também uma revisão de literatura através de pesquisas nas

bases de dados eletrônicas Medline, The Cochrane Library Database, Lilacs,

Knowledge, PubMed, SciELO e no Toxicology Data Network (TOXNET) do

United States National Library of Medicine (NIH), utilizando os descritores

“cannabis toxicity”, “cannabidiol toxicity”, “tetrahydrocannabinol toxicity”,

“marijuana toxicity”, “dronabinol”, restringindo-se a apenas os estudos

relacionados à temática da toxicidade.

A busca adotou como critério de exclusão os estudos que avaliaram o

abuso e dependência de cannabis em contexto urbano de uso recreacional.

Somente foram incluídos os estudos da forma fumada e vaporizada que

tenham uso medicinal e cultural como é o caso de países como Jamaica e

Índia.

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4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Regulamentação

4.1.1 Europa

A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) aprovou o uso do

canabidiol para tratamento de asfixia perinatal, síndrome de Dravet, esclerose

múltipla e futuramente para tratamento de glioma (tumor no cérebro).

4.1.1.1 Holanda

Na Holanda, farmácias autorizadas comercializam, desde 2003, uma

linhagem padronizada de Cannabis sp., conhecida como Bedrocan, são flores

de cannabis com 22% de THC e menos de 1% de CBD. O medicamento,

administrado por inalação com auxílio de um vaporizador, foi inicialmente

indicado para êmeses associados à quimioterapia, perda de peso e dor

neuropática associada à síndrome da imunodeficiência adquirida – AIDS, tendo

sido relatados resultados positivos também para o tratamento de dor crônica,

glaucoma e esclerose múltipla.

4.1.1.2 Portugal

Em Portugal, até o ano 2000, a cannabis era considerada ilegal e seu

consumo era considerado crime. A descriminalização se deu através da Lei Nº

30/2000 que "define o regime jurídico aplicável ao consumo de estupefacientes

e substâncias psicotrópicas, bem como a proteção sanitária e social das

pessoas que consomem tais substâncias sem prescrição médica". A lei refere

que "a aquisição e a detenção para consumo próprio das substâncias referidas

não poderão exceder a quantidade necessária para o consumo médio

individual durante o período de 10 dias" que seria de 20 gramas.

Em 2014, Portugal autorizou pela primeira vez a plantação de cannabis

para fins medicinais, concebida pela Autoridade Nacional do

Medicamento (Infarmed). Portugal acolheu uma plantação para produção de

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medicamentos no Reino Unido, para serem utilizados no alívio da dor derivada

da doença oncológica, na esclerose múltipla e na epilepsia.

4.1.1.3 Espanha

O Código Penal Espanhol (art. 368) proíbe a venda de cannabis, mas

não proíbe a sua utilização, além disso, a lei não faz distinção entre a maconha

medicinal da maconha recreativa, sendo assim é legal a venda de sementes e

cultivo de cannabis para uso pessoal apenas em locais privados.

Na Espanha, mais especificamente em Barcelona, existem vários

“Clubes Sociais de Cannabis” que funcionam em espaços privados, são

destinados apenas a maiores de idade, impõem um limite para a quantidade de

cannabis que cada membro pode adquirir e são organizações sem fins

lucrativos. Os clubes frequentemente prestam diversos serviços aos seus

associados como: apoio jurídico, aconselhamento terapêutico, informação para

reduzir riscos associados ao consumo, e também desenvolvem atividades

políticas e/ou recreativas. O único medicamento aprovado na Espanha que

utiliza extrato de cannabis é o Sativex®.

4.1.2 América do Norte

4.1.2.1 Estados Unidos da América

Nos EUA, 24 estados mais a capital Washington têm o uso medicinal da

cannabis legalizado sob a regulação do FDA (Food and Drug Administration) que

apóia a investigação científica e o desenvolvimento de medicamentos

produzidos a partir da cannabis. Até agosto de 2016 os extratos ricos em CBD

eram registrados como suplementos alimentares, mas devido às evidências

terapêuticas apresentadas, o FDA vem revendo a regulação e os padrões de

qualidade adotados para esses extratos. Visto isso, em outubro de 2016 o FDA

decidiu excluir o CBD da definição de suplemento alimentar e passou a ser

considerado como uma substância a ser "autorizada para a investigação como

um novo fármaco". Até o momento o FDA não aprovou pedido de

comercialização para medicamento a base de cannabis e segundo a agência

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reguladora ainda não encontrou um produto que seja seguro e eficaz para

qualquer indicação (FDA, 2016).

Com base em estudos pré-clínicos e clínicos, o FDA aprovou dois

medicamentos para uso humano, Marinol® e Cesamet®, o primeiro tem como

fármaco o ∆9-tetrahidrocannabinol obtido por via sintética denominado

dronabinol e o segundo é a nabilona que apresenta estrutura química quase

idêntica ao ∆9-tetrahidrocannabinol, diferindo no prolongamento da cadeia

carbônica que confere maior lipossolubilidade e efeito mais prolongado (figura

1).

Figura 1: Estrutura química do Δ9-Tetrahidrocannabinol natural (presente na

Cannabis sativa), Dronabinol (Δ9- Tetrahidrocannabinol sintético) e Nabilona

(análogo mais lipossolúvel do Δ9- Tetrahidrocannabinol).

Fonte: HONORIO et al., 2006.

A aprovação do Marinol® pelo FDA ocorreu em 1985 na forma

farmacêutica de cápsulas gelatinosas contendo dronabinol na apresentação

oleosa para o tratamento de náuseas e vômitos associados à quimioterapia

antineoplásica em pacientes refratários a outros medicamentos e, mais tarde,

em 1992 para o tratamento da anorexia associada com a perda de peso em

Δ9-Tetrahidrocannabinol (Δ9-THC) natural

Dronabinol (Marinol®)

Nabilona (Cesamet®)

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pacientes com a síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS). Também em

1985 o FDA aprovou o Cesamet® na forma farmacêutica de cápsulas para o

tratamento de náuseas e vômitos associados à quimioterapia.

A dose habitual de Cesamet® (nabilona) é de 1 ou 2 mg duas vezes por

dia. A primeira dose deve ser administrada na noite antes de se iniciar a

administração de medicamentos quimioterapêuticos, já a segunda dose é

geralmente administrada 1 a 3 horas antes da quimioterapia. Se necessário, a

administração de Cesamet® pode ser continuada até 24 horas após o agente

quimioterapêutico ser administrado. A dose diária máxima recomendada é de 6

mg em doses divididas. Entretanto, a bula do medicamento adverte que a

segurança e eficácia de Cesamet® na população pediátrica não foram

estabelecidas não sendo recomendado o uso nesta população de pacientes

(BULA CESAMET®, Valeant Canada limitée/Limited).

Já o Marinol® (dronabinol), quando utilizado para estimular o apetite de

pacientes com AIDS, inicialmente, administra-se 2,5 mg por via oral duas vezes

por dia, antes do almoço e do jantar. Se clinicamente indicado e na ausência

de efeitos adversos significativos, a dosagem pode ser gradualmente

aumentada até no máximo de 20 mg/dia, administrados em doses divididas.

Porém, quando o Marinol® é utilizado como antiemético em pacientes que

fazem quimioterapia, administra-se uma dose inicial de 5 mg/m2 (equivalente a

8,5 mg para um adulto médio de 70 kg cuja superfície corporal é de 1,7 m2,

segundo Lucas & Laszlo, 1980), 1 a 3 horas antes da quimioterapia, em

seguida, Marinol® é administrado a cada 2 a 4 horas após a quimioterapia, para

um total de 4 a 6 doses/dia. Marinol® não é recomendado para pacientes

pediátricos em casos de anorexia relacionada com a AIDS, pois não há

estudos que envolvam esta população, comprovando sua eficácia e segurança.

Mas ele pode ser utilizado para o tratamento da êmese induzida por

quimioterapia em pacientes pediátricos, com a mesma dosagem que é

administrada em adultos, sendo administrado com precaução devido aos seus

efeitos psicoativos (BULA MARINOL®, Unimed Pharmaceuticals).

Ao serem aprovados pelo FDA como medicamentos, infere-se que tais

produtos foram submetidos a rigorosos processos de avaliação farmacológica e

de toxicidade sendo considerados seguros e eficazes para suas respectivas

indicações e dosagens.

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Se por um lado o ∆9-THC sintético e a nabilona foram considerados

seguros e eficazes, o FDA pontua que os medicamentos derivados de plantas,

incluindo a cannabis, têm maior dificuldade de manter uma alta qualidade lote a

lote. Estes produtos que podem ser produzidos a partir de uma única fonte

vegetal ou a partir de uma combinação de diferentes partes da planta podem

ter efeitos através de mecanismos desconhecidos ou não definidos, o que torna

difícil determinar se o produto está causando a mudança de estado de um

doente, ou se a mudança está relacionada com algum outro fator. Por tais

razões, um fator importante para o desenvolvimento de medicamentos

produzidos a partir de uma droga vegetal é a identificação de uma fonte que irá

fornecer a qualidade necessária e consistente, lote a lote. Neste sentido, o FDA

sugere que a produção de medicamentos a base de cannabis seja realizado a

partir da extração dos canabinóides ou seus derivados sintéticos e não do

extrato bruto da planta, no qual não há exatidão da concentração das

substâncias.

4.1.2.2 Canadá

No Canadá, em julho de 2013, foi implementado o “Marihuana for

Medical Purposes Regulations” (MMPR) – ou Regulamentação da maconha

para fins medicinais – que é um conjunto de regulamentos voltados para

produção, distribuição e uso da maconha medicinal. Esse programa MMPR foi

criado para substituir o “Marihuana Medical Access Regulations (MMAR)”,

criado em julho de 2001, destinado a definir claramente os casos e as formas

em que o acesso à maconha para fins médicos seria permitido. Continha três

componentes principais: autorizações para possuir maconha seca; licenças

para a produção de maconha, que incluem licenças de produção para uso

pessoal e licenças de produção para pessoas designadas à plantação; e

acesso ao abastecimento de sementes da cannabis ou a planta seca.

O MMPR trata a cannabis como qualquer outro narcótico usado para fins

medicinais através da criação de condições para um novo comércio industrial,

que é responsável pela sua produção e distribuição. De acordo com a Health

Canada, os regulamentos irão fornecer acesso a cannabis de qualidade

controlada para fins médicos, produzidas em condições seguras, aos

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canadenses que precisam dela, e também irão permitir mais opções de cepas

de cannabis e fornecedores comerciais licenciados.

Em agosto de 2016, a Health Canada anunciou a criação do “Access to

Cannabis for Medical Purposes Regulations (ACMPR)” para substituir o MMPR.

O ACMPR permitirá acesso moderado a cannabis para fins médicos para os

canadenses que tenham sido autorizados a usar cannabis medicinal pelo seu

médico, continuando a ter a opção de comprar de forma segura e com controle

de qualidade de um dos 34 produtores licenciados pela Health Canada. Os

canadenses também vão ser capazes de produzir uma quantidade limitada de

cannabis para seus próprios fins médicos.

4.1.3 América Central

4.1.3.1 Jamaica

Desde 1972, os cientistas da Jamaica na Universidade de West Indies

(UWI) - Departamento de Farmacologia - estudaram as propriedades da

cannabis, desenvolvendo uma série de produtos pioneiros, incluindo: Canasol,

e mais tarde Cantivert, para tratar glaucoma; Asmasol para o tratamento da

asma; e Canavert para náuseas. Os produtos são bastante utilizados no

Caribe, Europa e Ásia, mas permanecem ilegais nos Estados Unidos.

Em fevereiro de 1983 o governo da Jamaica aprovou o Canasol, uma

solução oftálmica desenvolvida a partir da maceração da cannabis (ou “Ganja”)

com posterior filtração e esterilização. O Canasol apresenta associação de

THC e CBD e é indicado como coadjuvante em tratamento de glaucoma de

fase tardia com finalidade de diminuir a pressão intraocular.

Entretanto, o uso da cannabis em si, para uso pessoal, esteve ilegal por

todos esses anos e somente em abril de 2015 que ela passou a ser

parcialmente descriminalizada. A nova lei (Dangerous Drugs Amendment Act

2015) legaliza o cultivo de até cinco plantas de cannabis, a posse de até “2

onças de ganja” (56,7 gramas) e o uso da planta para fins religiosos. Além

disso, os turistas com prescrição de cannabis medicinal podem solicitar uma

autorização para comprá-lo localmente. A nova lei afirma também que

instituições de ensino superior credenciadas ou outro organismo aprovado pelo

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Conselho de Pesquisa Científica podem solicitar uma autorização para cultivar

a cannabis em prol da investigação científica, em terras apropriadas para o

cultivo.

Em certos locais da Jamaica, principalmente na área rural, o consumo

da cannabis é muito elevado tanto por homens quanto por mulheres, seja de

forma recreacional, em rituais religiosos ou para uso medicinal. As mulheres

jamaicanas que são adeptas ao uso da cannabis, ao engravidarem continuam

fazendo uso e por conta desse fato muitos estudos foram desenvolvidos para

avaliar as implicações perinatais e desenvolvimento neurocomportamental de

seus filhos, em comparação com as grávidas que não faziam uso da cannabis,

pois sabe-se que o THC atravessa a barreira placentária e pode ser encontrada

no leite materno de mulheres (HAYES et al., 1991).

No estudo realizado por Dreher et al. (1994), foi observado que as mães

que usavam a cannabis fumada durante a gravidez relataram que houve

aumento do apetite, diminuição das náuseas e da fadiga. Em relação aos

bebês, a comparação entre os recém-nascidos cujas mães usavam ou não a

cannabis durante a gravidez mostrou que no primeiro e no terceiro dia de

nascimento dos bebês não houve diferenças significantes em relação ao

reflexo, irritabilidade, estabilidade autonômica, orientação, entre outros critérios

analisados. Ainda, ao analisar os bebês de mães que fizeram uso de cannabis

no trigésimo dia de vida foi observado uma melhora significante nos critérios de

orientação, estabilidade autonômica e reflexo (DREHER et al., 1994).

4.1.4 América do Sul

4.1.4.1 Chile

No Chile foi criado um projeto de Lei No 20.000 em 2005 em substituição

a Lei No 19.366 (sobre o tráfico ilícito de entorpecentes e substâncias

psicotrópicas) cujo objetivo foi despenalizar o cultivo da cannabis e também

seu consumo privado, para fins medicinais e recreativos. Tal projeto entrou em

vigor no ano de 2015 e determinou-se que para semear, plantar e cultivar

plantas do gênero Cannabis deve-se obter uma autorização destinada somente

para uso pessoal, sendo proibida a comercialização que fica ainda configurada

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tráfico podendo o transgressor estar sujeito às penas de reclusão e multa. A

aprovação e sansão da Lei sofrem grande influência dos movimentos sociais

que congregam pacientes que já utilizavam medicinalmente a cannabis a

despeito da proibição.

Um exemplo dos movimentos que influenciaram na regulação é a

Fundação Daya, uma instituição sem fins lucrativos, composta por profissionais

de diversas áreas, dentre elas médicos e farmacêuticos, que tem como objetivo

ajudar pacientes oncológicos em tratamento, pessoas com epilepsia refratária e

com dor crônica. Esta fundação, em parceria com uma associação denominada

Mama Cultiva Chile, que reúne mães de pacientes com epilepsias refratárias,

câncer e outras enfermidades graves promove oficinas de cultivo e produção

de extratos de Cannabis sativa. Além desse projeto relacionado ao autocultivo,

a Fundação Daya obteve autorização para cultivar e fornecer matéria prima

para produção de extratos padronizados serem utilizados em futuros estudos

clínicos com vistas na aprovação de fitomedicamento pela Agência Sanitária

para comercialização em escala industrial.

4.1.4.2 Argentina

Na Argentina a situação é parecida com a do Brasil, não há legislação

vigente que autorize o uso medicinal de substâncias derivadas da cannabis e

tampouco é permitida a produção e comercialização da cannabis estando na

mesma na lista de plantas proibidas. De acordo com a Administração Nacional

de Medicamentos, Alimentos e Tecnologia Médica (ANMAT) a cannabis

encontra-se na Lista IV – Drogas de uso proibido, assim como sua resina, óleo

e semente, conforme o artigo 3º da Lei 17818/68. Apesar da proibição a

ANMAT tem recebido muitas solicitações para o uso compassivo do extrato de

cannabis por pacientes com epilepsia refratária a outros tratamentos e alguns

pedidos vêm sendo aprovados, havendo, no entanto, enorme burocracia para

importação de extratos em caráter excepcional, burocracia esta que é repetida

todas as vezes que há importação, mesmo que seja para o mesmo paciente.

Neste país a importação de medicamentos a base de cannabis é

permitida em caráter excepcional para uso compassivo, atendendo-se aos

critérios dispostos na regulamentação No 840/1995, no qual, dentre outras

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disposições, estabelece que o uso compassivo desses medicamentos seja

estritamente individual, limitado a um paciente, que se encontra nas seguintes

situações clínicas: enfermidades que comprometam a vida do paciente; que

possam evoluir para uma invalidez; que o deixe incapacitado

permanentemente; ou que deteriorem a qualidade de vida.

À semelhança do Chile e outros países em que a organização de

coletivos precedem o processo regulatório, na Argentina existe um grupo

chamado CAMEDA (Cannabis Medicinal Argentina) de pais e pacientes,

cannabicultores, profissionais da saúde, biólogos, químicos e médicos que se

dedicam ao desenvolvimento e implementação da regulação do uso da

cannabis para fins medicinais, terapêuticos e científicos. Recentemente,

simbolizando vários movimentos semelhantes de autocultivo, foi oficializado o

projeto Mamá Cultiva Argentina influenciado pela experiência chilena em que

mães de pacientes que utilizam medicinalmente a cannabis se organizaram

para capacitar mães para o autocultivo e a produção de seus próprios extratos

com apoio de grupos mais experientes.

4.1.4.3 Uruguai

O Uruguai, mais especificamente nos anos de 2013 e 2014, na época

presidido por José Mujica, foi o país mais audacioso e pioneiro na regulação da

Cannabis sativa. Este país foi o primeiro na América Latina a legalizar

inteiramente o acesso à cannabis, e além do uso recreativo foram

estabelecidas as bases para a produção farmacêutica. Atualmente já ocorre a

dispensação de cannabis em farmácias licenciadas pelo Instituto de Regulação

e Controle da Cannabis (IRCCA) de maneira segura, com venda controlada,

sendo realizado o controle da dispensação e do armazenamento do produto.

Preparando o país para a regulação total, o “Miniterio de Salud Publica”

aprovou a Lei No 19.172 de 20 de dezembro de 2013, que alterou a Lei No

14.294 de 31 de outubro de 1974, prevendo no artigo 5º da Lei No 19.172

exceções para plantação, cultivo, colheita e comercialização de plantas que

causam dependência física ou psíquica. A autorização para finalidade de

investigação científica ou para elaboração de produtos terapêuticos de

utilização médica já tinha sido prevista pela Lei Nº 14.294 de 1974, porém, a

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Lei 19.172 abre exceções exclusivamente para a cannabis, como a plantação,

cultivo e colheita, assim como a industrialização de cannabis de uso psicoativo,

devendo ter autorização pelo IRCCA (Instituto de Regulação e Controle de

Cannabis), e também a plantação, cultivo e colheita, assim como a

industrialização de cannabis de uso não psicoativo, que deverá ser autorizado

previamente pelo “Ministerio de Ganadería, Agricultura y Pesca”.

Desta forma, os cultivos de cannabis para fins de investigação científica

ou para a elaboração de produtos terapêuticos de utilização médica (contendo

ou não compostos psicoativos, inclusive o THC), são supervisionados pelo

Ministério da Saúde Pública e autorizados previamente pelo Instituto de

Regulação e Controle da Cannabis (IRCCA).

No Uruguai a cannabis contendo psicoativo foi descrita como as

sumidades floridas com ou sem fruto da planta fêmea do gênero Cannabis,

exceto as sementes e as folhas separadas do talo, incluindo seus óleos,

extratos e preparações de uso farmacêutico, cuja concentração de

tetrahidrocannabinol (THC) natural, seja igual ou superior a 1% do seu

peso/volume. Enquanto a cannabis de uso não psicoativo foi descrita como as

plantas do gênero Cannabis cujas folhas e flores não contenham mais de 1%

de THC e cujas sementes não contenham mais de 0,5% de THC. (URUGUAI,

Lei No 19.172)

4.1.4.4 Colômbia

Na Colômbia, no final de 2015, houve a legalização do uso terapêutico

da cannabis por meio do Decreto No 2467 de 22 de dezembro de 2015, que

regulou o cultivo, transformação, importação e exportação da cannabis e seus

derivados para fins terapêuticos. O Decreto permitiu a emissão de licenças

para a posse de sementes de cannabis e que se cultive a planta com fins

exclusivamente médicos e científicos. Apesar da recente regulação, o uso da

cannabis com fins medicinais já era permitido desde 1986 pela lei No 30,

emitida pelo Congresso da República da Colômbia, que introduziu a norma

sobre a dose mínima de porte e consumo pessoal de algumas drogas ilegais,

incluindo a cannabis. Posteriormente, em 1994, a “Sentencia C-221”, proferida

pela Corte Constitucional, despenalizou a dose mínima de porte e consumo

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pessoal e, no caso da cannabis, estabeleceu a quantidade de até 20 gramas

da planta para consumo próprio, que não seria passível de sansão do Estado

baseado no direito constitucional da livre personalidade.

Segundo o decreto colombiano, os cultivadores devem solicitar uma

licença do Conselho Nacional de Entorpecentes (CNE), enquanto os

fabricantes e exportadores de produtos a base de maconha devem optar por

uma autorização do Ministério da Saúde. O decreto também prevê a vigilância

das unidades de transformação de cannabis e dos locais de armazenamento,

pela polícia, o CNE e o Ministério da Saúde. Com a publicação do Decreto, o

Instituto Nacional de Vigilância de Medicamentos e Alimentos (INVIMA) fica

responsável por definir os requisitos e mecanismos para que se comercializem

os produtos a base de cannabis.

Em março de 2016 este Instituto aprovou a avaliação farmacológica de

segurança e eficácia do produto Sativex®, com previsão de aprovação e

registro sanitário em prazo aproximado de 6 meses para comercialização na

Colômbia pelo laboratório Biopas S.A..

4.1.4.5 Brasil

No Brasil a RDC Nº 03/2015 (Publicada no DOU, em 28 de janeiro de

2015, seção I) determinou a inclusão do canabidiol (CBD) na lista C1 da

Portaria 344/98 (Portaria sobre o regulamento técnico de substâncias e

medicamentos sujeitos a controle especial), estando na mesma classificação

de medicamentos como ácido valpróico e carbamazepina, que são

anticonvulsivantes, e olanzapina que é um antipsicótico, por exemplo. Em 6 de

maio de 2015 a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publicou no

Diário Oficial da União a RDC No 17 no qual estabeleceu os critérios e os

procedimentos para a importação, em caráter de excepcionalidade, de produto

à base de canabidiol em associação com outros canabinóides, dentre eles o

THC, por pessoa física, para uso próprio ou realizada pelo responsável legal

pelo paciente, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para

tratamento de saúde.

Como no Brasil ainda não há produção e comercialização do extrato da

cannabis para fins medicinais, resta a importação sob as condições exaradas

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pela RDC No 17 que na época de sua publicação determinou que o produto

importado deveria ser constituído de derivado vegetal, possuir teor de THC (Δ9-

tetrahidrocannabinol) inferior ao de CBD (requisito alterado pela RDC 66/16),

ser produzido e distribuído por estabelecimentos devidamente regularizados

pelas autoridades competentes em seus países de origem para as atividades

de produção, distribuição ou comercialização, conter certificado de análise,

com especificação e teor de canabidiol e THC, e que atenda às respectivas

exigências regulatórias das autoridades competentes em seus países de

origem. Embora os extratos aprovados na RDC No 17 de 6 de maio de 2015

entrem no Brasil como medicamentos, nos EUA esses extratos foram

aprovados pelo FDA como suplementos alimentares e nesta forma

comercializados.

Em 2015, quando foi publicada a RDC No 17, o texto da resolução foi

categórico em proibir a importação de produtos contendo teores elevados de

THC e a planta ou partes da planta:

Somente será permitida a importação de produtos à base de Canabidiol quando a concentração máxima de THC for de conhecimento da Anvisa; Não poderá ser importada a droga vegetal da planta Cannabis spp. ou suas partes, mesmo após processo de estabilização e secagem, ou na sua forma rasurada, triturada ou pulverizada; Não poderão ser importados cosméticos, produtos fumígenos, produtos para a saúde ou alimentos que possuam na sua formulação o Canabidiol em associação com outros canabinóides e/ou a planta Cannabis spp. (ANVISA, RDC N

o 17/2015)

Para realizar a importação os pacientes devem se cadastrar junto à

ANVISA, em nome do próprio paciente e, caso aplicável, o responsável legal

e/ou responsável pela intermediação da importação, que pode ser uma

entidade hospitalar, unidade governamental ligada à área da saúde, operadora

de plano de saúde ou entidade civil representativa de pacientes legalmente

constituída, para o atendimento exclusivo e direcionado ao paciente

previamente cadastrado na ANVISA. A aprovação do cadastro dependerá da

avaliação da ANVISA e, caso aprovado, terá validade de 1 (um) ano.

No Brasil há uma controvérsia em relação à regulamentação da

cannabis e dos canabinóides, atualmente a Cannabis sativa encontra-se na

lista E de plantas proscritas que podem originar substâncias entorpecentes

e/ou psicotrópicas, assim como todos os sais e isômeros das substâncias

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obtidas a partir da planta. Desta forma, o THC, princípio ativo do Sativex® que é

um medicamento aprovado em 24 países (sendo 18 deles europeus) como

Canadá, Austrália, Inglaterra e, mais recentemente, a França, e fabricado pela

GW Pharmaceuticals ficou impedido de entrar no país.

Diante das diversas indicações terapêuticas do THC e da pressão sócio-

política exercida pela representação de pacientes, houve a publicação no

presente ano da RDC No 66 de 18 de março de 2016 permitindo a importação

de produtos que possuam as substâncias canabidiol e/ou tetrahidrocannabinol

(THC) ou partes da planta, quando realizada por pessoa física, para uso

próprio, para tratamento de saúde, mediante prescrição médica. Para a

importação desses produtos se aplicam os mesmos requisitos estabelecidos

pela RDC No 17/2015 citada anteriormente alterando, no entanto, a parte que

proíbe a importação de extratos ricos em THC ou a planta.

Segundo a RDC No 66/2016, os medicamentos registrados na ANVISA

que possuam em sua formulação a substância tetrahidrocannabinol (THC),

desde que sejam atendidas as exigências a serem regulamentadas

previamente à concessão do registro, estão livres dos controles referentes à

lista F2 de substâncias psicotrópicas, onde o THC se encontra.

Entretanto, a importação de produtos a base de canabinóides gera

custos elevados, o que inviabiliza o acesso de muitas pessoas ao tratamento.

Uma saída seria a produção nacional que reduziria muito o custo, garantindo

fácil acesso nos sistemas de saúde e a valorização do produto nacional. No

entanto, ainda há questões de ordem legislativa e de regulação sanitária a

serem enfrentadas.

A ANVISA informou, no dia 22 de novembro de 2016, uma atualização

do anexo I da Portaria SVS/MS nº 344/98 que incluiu na lista A3 medicamentos

registrados na ANVISA derivados da Cannabis sativa, em concentração de no

máximo 30 mg/mL para tetrahidrocannabinol (THC) e canabidiol (CBD). O

motivo desta atualização foi a fase final do processo de registro do

medicamento Mevatyl® (no exterior é comercializado como Sativex®), assim, o

medicamento será prescrito da mesma forma que outros medicamentos

psicotrópicos já em uso no Brasil, terá a tarja preta e só poderá ser

comercializado com prescrição médica especial. O medicamento está em

processo de registro, portanto, até o momento não há nenhum produto

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disponível para venda no Brasil à base de substâncias derivadas da cannabis.

(ANVISA, 2016)

4.1.4.5.1 Plantas Medicinais e Fitoterápicos

Considerando que a Cannabis sativa é uma planta com propriedades

medicinais podendo ser usada em sua forma in natura por meio de

vaporização, preparação de chás ou outras formas de produção doméstica, se

justifica neste trabalho o estudo da regulação sanitária das plantas medicinais

em território nacional considerando uma possível inserção da cannabis neste

âmbito regulatório. As plantas medicinais são aquelas capazes de aliviar ou

curar enfermidades e têm tradição de uso como remédio em uma população ou

comunidade. Para usá-las, é preciso conhecer a planta e saber onde colhê-la e

como prepará-la.

As plantas medicinais são conceituadas como toda e qualquer planta,

cultivada ou não, utilizadas pelo homem com propósitos terapêuticos. As

drogas vegetais notificadas têm origem nas plantas medicinais e, de acordo

com a Resolução – RDC No 10, de 9 de Março de 2010, são definidas como

“plantas medicinais ou suas partes, que contenham substâncias, ou classes de

substâncias, responsáveis pela ação terapêutica, após processos de coleta ou

colheita, estabilização e secagem, quer sejam íntegras, rasuradas ou

trituradas”.

Através da RDC No 10/2010 que a ANVISA passou a regular a

produção, o comércio e o uso de drogas vegetais, liberando-as para utilização

pela população na forma de produtos industrializados, para os quais são

estabelecidos e controlados requisitos de qualidade, segurança e forma de uso.

Segundo esta resolução, drogas vegetais são produtos de venda isenta de

prescrição médica, são utilizadas para tratamento sintomático de doenças de

baixa gravidade, padronizadas para cada uma das espécies selecionadas,

sendo assim não são enquadradas como medicamentos e, portanto, não

podem indicar cura de doenças.

E é pelo fato de que plantas medicinais são destinadas ao tratamento

sintomático de doenças de baixa gravidade e não precisarem de prescrição

médica que não é possível a comercialização de plantas medicinais que

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contenham em sua composição substâncias psicoativas de controle sanitário

como as listadas na Portaria 344/98, sejam elas depressoras ou estimulantes.

Neste sentido, a normativa sanitária impede o uso da cannabis como droga

vegetal e havendo interesse médico do uso em sua forma in natura, como é o

caso do uso vaporizado da cannabis para controle de dor neuropática,

sintomas da doença de Parkinson e esclerose múltipla, seria necessário a

ANVISA formular resolução específica.

Outra regulação possível para os extratos de cannabis é aquela

relacionada aos fitoterápicos, quando a planta medicinal é industrializada para

se obter um medicamento, tal medicamento é classificado como fitoterápico. O

processo de industrialização diminui contaminações por microorganismos,

agrotóxicos e substâncias estranhas, além de padronizar a quantidade e a

forma certa que deve ser usada, permitindo uma maior segurança de uso. Além

disso, é necessário que o fitoterápico seja padronizado para um ou mais

princípios ativos em relação aos seus teores e que isso seja declarado na bula.

Os medicamentos fitoterápicos industrializados devem ser registrados na

ANVISA/Ministério da Saúde antes de serem comercializados (ANVISA –

pôster fitoterápicos).

Segundo a resolução RDC Nº 48, de 16 de março de 2004 emitido pela

ANVISA que dispõe sobre o registro de medicamentos fitoterápicos, este

medicamento é definido como:

Medicamento obtido empregando-se exclusivamente matérias primas ativas vegetais. É caracterizado pelo conhecimento da eficácia e dos riscos de seu uso, assim como pela reprodutibilidade e constância de sua qualidade. Sua eficácia e segurança é validada através de levantamentos etnofarmacológicos de utilização, documentações tecnocientíficas em publicações ou ensaios clínicos fase 3. Não se considera medicamento fitoterápico aquele que, na sua composição, inclua substâncias ativas isoladas, de qualquer origem, nem as associações destas com extratos vegetais. (ANVISA, RDC Nº 48/2004)

Antes do registro de fitoterápicos deve-se notificar a produção de lotes-

piloto, exceto para produtos importados, e no momento do registro a empresa

deverá protocolizar um processo único, com relatórios separados para cada

forma farmacêutica. A segurança e a eficácia dos medicamentos fitoterápicos

devem ser comprovadas por uma das opções seguintes: ensaios não clínicos e

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clínicos de segurança e eficácia ou registro simplificado.

A Cannabis spp. está presente na lista de espécies que não podem ser

utilizadas na composição de produtos tradicionais fitoterápicos, de acordo com

a RDC No 26, de 13 de Maio de 2014, que difere medicamentos fitoterápicos de

produtos tradicionais fitoterápicos.

A RDC No 26/2014 afirma que medicamentos fitoterápicos são aqueles

obtidos com emprego exclusivo de matérias primas ativas vegetais cuja

segurança e eficácia sejam baseadas em evidências clínicas e que sejam

caracterizados pela constância de sua qualidade. Já os produtos tradicionais

fitoterápicos são obtidos com emprego exclusivo de matérias primas ativas

vegetais cuja segurança e efetividade sejam baseadas em dados de uso

seguro e efetivo publicados na literatura técnico científica e que sejam

planejados para serem utilizados sem a vigilância de um médico para fins de

diagnóstico, de prescrição ou de monitorização. Além disso, os produtos

tradicionais fitoterápicos não podem ser destinados ao manejo de doenças,

distúrbios, condições ou ações consideradas graves, não podem conter

matérias primas em concentração de risco tóxico conhecido e não devem ser

administrados pelas vias injetável e oftálmica.

Considerando o cenário de uso atual em que os extratos de cannabis

são utilizados para o controle de um quadro clínico extremamente grave que é

a epilepsia refratária, o reconhecimento da ANVISA ao autorizar sua

importação e que o uso medicinal da cannabis é milenar tendo sido registrada

na farmacopeia chinesa há cerca de 2 mil anos com difusão para diversos

países e bastante utilizada em comunidades tradicionais indígenas e

comunidades de origem africana no tratamento de diversos quadros

patológicos, torna-se clara a necessidade de discussão da RDC Nº 26/2014

que parece não ser aplicável a alguns produtos fitoterápicos de uso tradicional,

como é o caso da cannabis.

4.2 Avaliação de toxicidade

4.2.1 Canabidiol

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O canabidiol (CBD) é um componente da Cannabis sativa e constitui até

40% dos extratos da planta. No entanto, as concentrações de CBD são

altamente variáveis e dependem das condições de crescimento, os diferentes

fenótipos de cannabis e na parte da planta analisada (BERGAMASCHI et al.,

2011).

O CBD interage com o sistema endocanabinóide (PERTWEE, 2008),

mas diferentemente do Δ9-THC, apresenta baixa afinidade pelos receptores

CB1 e CB2. Sua ação parece resultar de mediação na sinalização dos

endocanabinóides através da hidrólise enzimática ou inibição da recaptação da

anandamida (MECHOULAM et al., 2002), aumentando a concentração no meio

extracelular deste neurotransmissor canabinóide endógeno. Além disso, o CBD

parece ser capaz de funcionar como um agonista dos receptores do tipo 5-HT1A

e por um mecanismo ainda desconhecido parece agir em diferentes áreas do

cérebro (MECHOULAM et al., 2007).

O canabidiol tem inúmeras ações farmacológicas, incluindo ansiolítica,

antipsicótica, anti-emética e propriedades anti-inflamatórias. O CBD tem

demonstrado seu potencial de uso na terapêutica farmacológica de doenças

neurológicas, tais como distúrbios epiléticos, ansiedade, esquizofrenia, doença

de Parkinson e Alzheimer (MECHOULAM et al., 2002; RUSSO & GUY, 2006;

CRIPPA et al., 2011; SZAFLARSKEI & BEBIN, 2014).

Os produtos à base de canabidiol liberados para importação no

Brasil por pacientes que tenham cadastro na ANVISA, segundo a RDC No

17/2015, estão associados com outros canabinóides, dentre eles o THC por se

tratar de um extrato vegetal. São eles: Cibdex Hemp CBD Complex (Gotas) 1 a

2oz, Cibdex Hemp CBD Complex (Cápsulas); Hemp CBD Oil 2000 mg

Canabidiol- 240 mL; Real Scientific Hemp Oil (RSHO) CBD 14-25% 3-10g

(Pasta) e Revivid LLC Hemp Tincture 500mg (22:1 CBD/THC) (Gotas) – 30mL,

todos produzidos por empresas americanas e, portanto, não possuem eficácia

e segurança avaliadas pela ANVISA.

4.2.1.1 Propriedades físico-químicas

O canabidiol (CBD), cuja estrutura química está representada na figura

2, apresenta número de registro no CAS 13956-29-1, é um composto isolado

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do extrato da Cannabis sativa. No quadro 1 está apresentado as propriedades

físico-químicas, no qual observa-se que o CBD é praticamente insolúvel em

água, mas solúvel em solventes orgânicos como etanol, metanol, éter, benzeno

e clorofórmio (DRUGS FORUM, 2016).

Figura 2: Estrutura química do canabidiol

Fonte: MECHOULAM et al., 2002

Quadro 1: Propriedades físico-químicas do canabidiol

Propriedades Físico-Químicas Valor

Peso Molecular 314.466 g/mol

Constante de Dissociação - pKa 9.64

Coeficiente de Partição octanol/água – Log Kow 8.010

Solubilidade em água 250 mg/L a 25 oC

Ponto de ebulição 188,5 oC

Ponto de fusão 67 oC

Fonte: Chemical dictionary online e Toxnet (ChemIDplus)

4.2.1.2 Dados Farmacocinéticos

O CBD sofre efeito de primeira passagem bastante significativo no

fígado e uma grande parte da dose é excretada inalterada nas fezes

(HUESTIS, 2005). A biodisponibilidade do CBD pela via fumada é em média de

31% (intervalo de 11% a 45%) (HUESTIS, 2005) enquanto que por via oral está

em torno de 6% devido ao significativo efeito de primeira passagem (WELTY et

al., 2014). Após doses únicas em seres humanos, o tempo de meia-vida do

CBD quando administrado por via oral é cerca de 1 a 2 dias (WELTY et al.,

2014). Além disso, o CBD, assim como o THC, apresenta alta afinidade pelas

proteínas séricas (YOO et al., 1994).

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33

Estudos mostraram que mesmo administrando CBD e THC em

quantidades equivalentes, o CBD estava sempre em menores concentrações

plasmáticas quando comparado ao THC (HUESTIS, 2005).

4.2.1.3 Toxicidade

Canabidiol apresenta uma toxicidade muito baixa em seres humanos e

em outras espécies. A DL50 após administração intravenosa em macacos

rhesus foi de 212 mg/kg (ROSENKRANTZ et al., 1981). A DL50 por via oral não

foi criteriosamente estabelecida, mas em 1981 Rosenkrantz et al. mostraram

que é necessária uma dose oral de CBD 20 a 50 vezes maior do que a via

intravenosa para iniciar intoxicações graves (ROSENKRANTZ et al., 1981). A

última informação obtida sobre a DL50 do CBD por via oral em camundongo em

1946 descrito por S. Loewe, no qual dizia que era > 12,7 mg/Kg, ou seja, um

estudo bastante antigo que não apresenta precisão no valor da DL50, além de

ser muito abaixo dos valores da DL50 dos outros fármacos.

CBD não causa alterações relevantes no SNC, além disso, estudos não

revelaram efeitos teratogênicos ou mutagênicos induzidos por CBD

(DALTERIO et al., 1984).

Os índices de toxicidade são apresentados no Quadro 2.

Quadro 2: Índice de toxicidade do canabidiol.

Animal Teste Via Dose Efeito

Cão DL50 Intravenosa > 254 mg/kg

Macaco DL50 Intravenosa 212 mg/kg Cardíaco: arritmias

Comportamentais:

contração muscular

ou espasticidade

Respiratório:

Dispneia

Nota: DL50: Dose Letal 50%.

Fonte: ChemIDplus: base de dados sobre substâncias químicas no Toxnet (rede de dados em

toxicologia da biblioteca nacional de medicina dos EUA – NIH). Disponível em:

https://chem.nlm.nih.gov/chemidplus/rn/13956-29-1

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34

4.2.2 Tetrahidrocannabinol

Dois exemplos de fármacos desenvolvidos com base em compostos

canabinóides, principalmente o Δ9-Tetrahidrocannabinol, são o Marinol®

(Dronabinol, Δ9-THC sintético), desenvolvido pelo laboratório Roxane

(Columbus - EUA) e o Cesamet® (Nabilone, análogo mais lipossolúvel do Δ9-

THC), desenvolvido pelo laboratório Eli Lilly (Indianápolis - EUA). Estes

medicamentos são comercializados para controle de náuseas produzidas

durante tratamentos de quimioterapia e como estimulantes do apetite, durante

processos de anorexia desenvolvidos em pacientes com síndrome da

imunodeficiência adquirida (AIDS) (HONORIO et al., 2006).

Outro medicamento à base de Cannabis sp. é o Sativex®, produzido pela

indústria farmacêutica britânica GW Pharmaceuticals em parceria com a Bayer,

é um extrato de Cannabis sativa contendo Δ9-THC e CBD, além de outros

derivados canabinóides da planta, cada pulverização de 100 microlitros contém

2,7 mg de delta-9-tetrahidrocannabinol e 2,5 mg de canabidiol. Trata-se de um

extrato hidroalcoólico administrado na forma de spray oral, possibilitando a

absorção dos canabinóides pela mucosa bucal. Os resultados de seu uso

demonstraram ser clinicamente relevante no tratamento de dores neuropáticas

decorrentes da esclerose múltipla (PAMPLONA, 2014).

O Sativex® (extrato natural de Cannabis sativa) foi aprovado pela

primeira vez no Canadá em 2005 para o tratamento da espasticidade

(aumento, velocidade dependente, do tônus muscular, com exacerbação dos

reflexos profundos, decorrente de hiperexcitabilidade do reflexo do estiramento)

(TEIVE et al., 1998) causada pela esclerose múltipla, e agora também pode ser

prescrito neste país para o tratamento da dor neuropática e dores provenientes

do câncer (GW Pharmaceuticals, Health Canada grantsfull approval of Sativex

for the treatment of spasticity due to Multiple Sclerosis). Na Espanha, a

comercialização do Sativex® foi aprovada em 2010 pela Agência de

Medicamentos exclusivamente como tratamento auxiliar para a melhora dos

sintomas em pacientes com espasticidade moderada à grave devido à

esclerose múltipla que não tenham respondido aos tratamentos convencionais

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35

(Agência Española de Medicamentos y Productos Sanitarios, Nota informativa

del Comité de Evaluación de Medicamentos, 2010).

O dronabinol (Marinol®) é um fármaco de referência para avaliação do

risco toxicológico de extratos medicinais de cannabis visto que é registrado

como medicamento e, portanto atendeu os critérios de avaliação de eficácia e

segurança exigido pelas agências regulatórias de medicamentos.

4.2.2.1 Propriedades físico-químicas

Tetrahidrocannabinol (THC) é o composto químico com propriedades

euforizante e alucinógena. Cannabis contém aproximadamente 60 diferentes

produtos químicos chamados canabinoides psicoativos, dos quais o mais

importante é o tetrahidrocannabinol (THC), no qual o número do CAS é 1972-

08-3 (TOXNET, 2016).

Como pode ser observado na Figura 3 a estrutura química do THC

apresenta um grupo funcional éter e um grupo funcional fenol ligado

diretamente ao benzeno, e mesmo apresentando esses grupamentos

funcionais ele possui uma baixa solubilidade em água, como pode-se observar

na tabela. Apresenta uma solubilidade maior em lipídios ou compostos

apolares por possuir a maior parte da sua estrutura com caráter apolar, já que

possui muitos átomos de carbono e hidrogênio. Já que é uma molécula

lipofílica, quando essa substância é ingerida tem uma eliminação maior nas

fezes do que na urina. E no Quadro 3 há a descrição das propriedades físico-

químicas do THC, que mostra também a sua baixa solubilidade em água.

Figura 3: Estrutura química do THC

Fonte: HONORIO et al., 2006.

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Quadro 3: Propriedades físico-químicas do THC.

Propriedades Físico-Químicas Valor

Peso Molecular 314.46 g/mol

Constante de Dissociação - pKa 10.6

Coeficiente de Partição octanol/água – Log Kow 6.97

Solubilidade em água 2800 mg/L a 23 oC

Ponto de ebulição 250 oC

Ponto de fusão 66 oC

Fonte: Toxnet (ChemIDplus e HSDB)

4.2.2.2 Dados Farmacocinéticos

Dronabinol é administrado por via oral, na formulação de solução em

óleo de gergelim em cápsulas gelatinosas, e devido ao efeito de primeira

passagem do metabolismo hepático e elevada solubilidade lipídica, apenas 10

a 20% da dose administrada atinge a circulação sistêmica. A ligação do

dronabinol e os seus metabólitos à proteína plasmática é de cerca de 97%,

principalmente à lipoproteínas (BULA MARINOL®, Unimed Pharmaceuticals).

Dronabinol sofre um extenso metabolismo hepático de primeira

passagem, principalmente por hidroxilação microssomal, produzindo

metabólitos ativos e inativos. Delta-9-THC e o seu principal metabólito ativo,

11-OH-delta-9-THC, estão presentes em concentrações aproximadamente

iguais no plasma. As concentrações tanto do fármaco quanto do metabólito

atingem o pico máximo aproximadamente 0,5 a 4 horas após a dosagem oral e

apresenta seu declínio ao longo de vários dias (BULA MARINOL®, Unimed

Pharmaceuticals).

Dronabinol e os seus produtos de biotransformação são excretados

principalmente por via fecal e urinária. A avaliação da excreção com dronabinol

radiomarcado mostrou que a excreção biliar constitui a principal via de

eliminação com cerca de metade de uma dose oral excretada nas fezes em 72

horas, enquanto no mesmo período a excreção urinária foi de 10 a 15% da

dose administrada. Menos de 5% de uma dose oral é eliminada de forma

inalterada nas fezes. Após a administração de uma dose única, baixos níveis

de metabólitos de dronabinol foram detectados por mais de 5 semanas na urina

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e fezes (BULA MARINOL®, Unimed Pharmaceuticals).

Um estudo comparativo realizado por Wall et al. (1982) verificou que a

meia-vida biológica variou de 25 a 36 horas após administração por via

intravenosa e oral. A biodisponibilidade por via oral foi determinada em 10% a

20% para ambos os sexos (WALL et al., 1982)

4.2.2.3 Toxicidade

Sinais e sintomas de intoxicação leve por ingestão de cápsulas de

Marinol® (Dronabinol, Δ9-THC sintético) incluem sonolência, euforia, percepção

sensorial exacerbada, percepção alterada do tempo, a conjuntiva avermelhada,

boca seca e taquicardia; intoxicação moderada inclui perda de memória,

despersonalização, alteração de humor, retenção urinária e redução da

motilidade intestinal; e intoxicação grave inclui diminuição da coordenação

motora, letargia, fala arrastada e hipotensão postural. Pacientes apreensivos

podem sofrer reações de pânico e convulsões podem ocorrer em pacientes

com distúrbios convulsivos existentes. A dose letal humana estimada de

dronabinol intravenosa é de 30 mg/kg (2.100 mg/70 kg). Apresentou sintomas

significantes no SNC em estudos antieméticos com doses orais de 0,4 mg/kg

(28 mg/70 kg) de Marinol® cápsulas. (BULA MARINOL®, Unimed

Pharmaceuticals)

Os índices de toxicidade são apresentados no Quadro 4.

Quadro 4: Índices de toxicidade do THC.

Animal Teste Via Dose Efeito

Cão LDLo Oral 525mg/kg Comportamentais:

sonolência,

contração muscular

ou espasticidade

Gastrointestinais:

náuseas ou vômitos

Macaco DL Oral > 3150 mg/kg

Macaco DL50 Intravenosa 125 mg/kg

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38

Animal Teste Via Dose Efeito

Camundongo DL50 intracerebral > 12,58 mg/kg

Camundongo DL50 Intraperitoneal 168 mg/kg Comportamentais:

sonolência e

analgesia

Camundongo DL50 Intravenosa 42 mg/kg Respiratório:

depressão

respiratória

Comportamentais:

excitação e ataxia

Camundongo DL50 Oral 482 mg/kg Gastrointestinal:

hipermotilidade

(diarréia)

Comportamentais:

excitação e tremor

Camundongo DL50 Subcutânea > 11 mg/kg

Rato DL50 Intraperitoneal 373 mg/kg Comportamentais:

tremor e excitação

Gastrointestinal:

hipermotilidade

(diarréia)

Rato DL50 Intravenosa 29 mg/kg Comportamentais:

excitação e ataxia

Respiratório:

depressão

respiratória

Rato DL50 Oral 666 mg/kg Comportamentais:

tremor e excitação

Gastrointestinal:

hipermotilidade

(diarreia)

Nota: DL: Lethal dose; DL50: Dose Letal 50%; LDLo(Lethal Dose Low):menor dose tóxica.

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Fonte: ChemIDplus: base de dados sobre substâncias químicas no Toxnet (rede de dados em

toxicologia da biblioteca nacional de medicina dos EUA – NIH). Disponível em:

https://chem.nlm.nih.gov/chemidplus/rn/1972-08-3

Vários índices de toxicidade referidos pelo Toxnet no Quadro 4 foram

retirados de Thompson et al. (1973) que realizaram um estudo comparando a

toxicidade aguda oral do THC em ratos, cães e macacos. Nos ratos foram

administradas doses entre 225 e 3600 mg/kg durante 7 dias. A toxicidade foi

caracterizada por grave hipotermia, bradipneia, rápida perda de peso,

imobilidade, ataxia, tremores musculares e prostração. Segue abaixo o quadro

com os resultados da DL50 encontrados, no qual podem ser observados valores

maiores para ratos machos, que pode ser devido ao efeito protetor da

testosterona sobre os efeitos cardiovasculares.

Quadro 5: Valores estimados de DL50 para Δ9-THC administrado por via oral

em ratos tratados durante 7 dias.

DL50 (mg/kg)

Composto % Pureza Veículo Cepa Macho Fêmea

Δ9-THC 90% 2,5% EtOH

em óleo de

gergelim

Wistar-

Lewis

1160

(850–1580)

860

(640–1160)

90% 2,5% EtOH

em óleo de

gergelim

Fischer 1910

(1390–2680)

1040

(820–1320)

96% Óleo de

gergelim

Fischer 1015

(780–1320)

800

(630–1010)

Nota: DL50: Dose Letal 50%.

Fonte: Thompson et al., 1973.

Já nos cães e nos macacos foram administradas doses orais únicas de

Δ9-THC entre 3000 e 9000 mg/kg e não foram letais a estes animais. Sinais

tóxicos predominantes em cães foram sonolência, ataxia, prostração,

anestesia, tremores, hipotermia leve, salivação, vômitos e anorexia. Sinais

tóxicos em macacos foram hiper-reatividade a estímulos, letargia, sonolência,

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ficaram amontoados, com movimentos lentos, apresentando procedimentos

alimentares anormais e sedação. Não ocorreram alterações histopatológicas

tanto em cães quanto em macacos (THOMPSON et al., 1973).

Geiwitz (2001) descreveu os valores de NOEL (No Observed Effect

Level - dose na qual não se observou efeito, seja farmacológico ou tóxico) e

LOEL (Low Observed Effect Level – menor dose na qual se observou efeito,

seja farmacológico ou tóxico) para os efeitos psicoativos de THC. O LOEL

encontrado foi de 0,2 a 0,3 mg/kg, correspondendo a uma administração de 10

- 20 mg de THC em uma única dose para um adulto médio (aproximadamente

70 Kg), já o NOEL foi de 0,07 mg/kg, correspondendo a uma administração de

5 mg para um adulto médio.

Assim, a dose única de 5 mg de THC pode ser considerada dose de não

efeito ou o NOAEL para efeitos psicotrópicos e certos efeitos físicos. A mesma

dose única de 5 mg pode ser considerada como o LOAEL para redução no

desempenho psicomotor e alguns outros efeitos físicos. Os efeitos de uma

única dose de THC geralmente duram de 4 a 6 horas, com uma duração

máxima de até 12 horas, em doses mais elevadas. Assim, a ingestão de uma

dose oral de 5 mg de THC, duas vezes por dia num meio lipofílico, equivalente

a 10 mg tomadas ao longo de um dia, representa o NOAEL para efeitos

psicotrópicos e o LOAEL para a redução do desempenho psicomotor

(GROTENHERMEN et al., 2001).

4.2.3 Topiramato

O topiramato é indicado como monoterapia ou adjuvante no tratamento

de crises epilépticas tanto em adultos quanto em crianças acima de 2 anos. Os

mecanismos de ação do topiramato incluem o bloqueio de canais de sódio

voltagem-dependente e potencialização dos efeitos mediados pelo ácido gama-

aminobutírico (GABA), de induzir o fluxo de íons cloreto para dentro dos

neurônios. O topiramato é ainda um antagonista do receptor de glutamato, do

subtipo kainato (GARZON, 2002).

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41

4.2.3.1 Propriedades físico-químicas

Topiramato apresenta número de registro no CAS 97240-79-4, é um

anticonvulsivante indicado no tratamento de epilepsia e migrânea. Sua

estrutura química está representada na figura 4 e suas propriedades físico-

químicas no quadro 6. Solúvel em soluções alcalinas contendo em sua maioria

hidróxido de sódio ou fosfato de sódio e tendo um pH de 9 a 10. É muito

solúvel em acetona, clorofórmio, dimetilsulfóxido e etanol (TOXNET, 2016).

Figura 4: Estrutura química do topiramato

Fonte: JOHANNESSEN, 1997.

Quadro 6: Propriedades físico-químicas do topiramato.

Propriedades Físico-Químicas Valor

Peso Molecular 339.37 g/mol

Constante de Dissociação - pKa 11.09

Coeficiente de Partição octanol/água – Log Kow - 0.33

Solubilidade em água 9,8 mg/L (temperatura não

especificada)

Ponto de ebulição 421 oC

Ponto de fusão 125 oC

Fonte: Chemical dictionary online, Toxnet (HSDB) e Drug Bank

4.2.3.2 Dados Farmacocinéticos

O topiramato é um medicamento em forma de comprimido para ser

administrado por via oral. Utilizado como tratamento adjuvante em epilepsia a

dose total diária recomendada para crianças (acima de 2 anos) é de 5 a 9

mg/kg/dia, dividida em duas tomadas. A administração do medicamento deve

ser iniciada com 25 mg (ou menos, baseado na faixa de 1 a 3 mg/kg/dia)

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administrados à noite durante a primeira semana. Posteriormente, a dose deve

ser aumentada em 1 a 3 mg/kg/dia (dividida em duas tomadas), à intervalos de

1 ou 2 semanas, até alcançar uma resposta clínica ótima. Doses diárias de até

30 mg/kg/dia foram bem toleradas nos estudos realizados (BULA TOPAMAX®,

Janssen-Cilag Farmacêutica Ltda.).

O topiramato utilizado como monoterapia em crianças acima de 2 anos

de idade a dose inicial varia de 0,5 a 1 mg/kg à noite, durante uma semana. A

seguir a dose deve ser aumentada em 0,5 a 1 mg/kg/dia à intervalos de 1 a 2

semanas, dividida em duas tomadas. A dose deve ser orientada pelo resultado

clínico. A dose-alvo inicial recomendada para o topiramato em monoterapia em

crianças é de 3 a 6 mg/kg/dia. Crianças com crises de início parcial de

diagnóstico recente receberam doses de até 500 mg/dia (BULA TOPAMAX®,

Janssen-Cilag Farmacêutica Ltda.).

O topiramato apresenta rápida absorção no trato gastrointestinal

atingindo picos de concentração plasmática após 1 a 4 horas da administração

e apresenta uma biodisponibilidade de 80%. Em um ensaio com indivíduos em

jejum e alimentados, a taxa de absorção do topiramato foi ligeiramente

diminuída quando administrado com alimento e a extensão de absorção foi

equivalente indicando que o topiramato pode então ser administrado com

alimentos, sem que interfira na absorção do medicamento (JOHANNESSEN,

1997).

Este medicamento apresenta metabolização moderada, 70% da dose

administrada é eliminada na forma inalterada na urina, sendo apenas 30%

metabolizada pelo fígado gerando seis metabólitos (formados por hidroxilação,

hidrólise e glicuronidação), nenhum dos quais constituem mais de 5% de uma

dose administrada. Além disso, há evidências de reabsorção tubular renal de

topiramato (JOHANNESSEN, 1997).

O topiramato apresenta baixo grau de ligação às proteínas plasmáticas,

aproximadamente 15%, e seu tempo de meia-vida de eliminação plasmática

está entre 20 e 30 horas (JOHANNESSEN, 1997).

4.2.3.3 Toxicidade

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43

Doses terapêuticas de 200-1000 mg/dia têm sido relatados para reduzir

a taxa de convulsão em mais da metade dos pacientes adultos com epilepsia

parcial resistente; os efeitos adversos mais frequentes associados o uso

adjuvante de topiramato em doses terapêuticas incluem sonolência, tonturas,

ataxia, distúrbios da fala, retardamento psicomotor e nistagmo. (LANGMAN et

al., 2003).

Os índices de toxicidade são apresentados no Quadro 7.

Quadro 7: Índices de toxicidade do topiramato.

Animal Teste Via Dose Efeito

Rato DL50 Intraperitoneal > 1.500 mg/kg NR

Nota: DL50: Dose Letal 50%; NR: não referido.

Fonte: ChemIDplus: base de dados sobre substâncias químicas no Toxnet (rede de dados em

toxicologia da biblioteca nacional de medicina dos EUA – NIH). Disponível em:

https://chem.nlm.nih.gov/chemidplus/rn/97240-79-4

Estudos pré-clínicos in vivo, avaliando a toxicidade aguda do topiramato,

estimaram a DL50 após administração por via oral do topiramato em ratos e

camundongos, no qual foi observado uma variação de 2.338 a 3.745 mg/kg

(GLAUSER, 1999).

Existem casos registrados de overdose ao topiramato (quadro 8) cujos

dados foram coletados em centros de intoxicação, foram 567 casos, nos quais

a situação mais frequente de intoxicação foi erro na administração terapêutica

em pacientes com idade de 5 a 9 anos (48,6%) e a segunda situação mais

comum em pacientes com idade de 10 a 14 anos (25,6%). A situação de

intoxicação mais comum entre os pacientes com idade entre 20 e 59 anos

(54,9%), 15 e 19 anos (65%) e 10 e 14 anos (38,5%) foi intencional/suspeita de

suicídio (LOFTON & KLEIN-SCHWARTZ, 2005).

O topiramato não resultou em efeitos tóxicos em 352 (62,1%) pacientes.

Em pacientes sintomáticos os efeitos clínicos mais comuns relatados foram

sonolência/letargia (15,5%), tontura/vertigem (24,9%), agitação (4,9%),

confusão (3,9%), náusea (2,6%), vômitos (2,5%), ataxia (1,8%) e tremor (1,8%)

(LOFTON&KLEIN-SCHWARTZ,2005).

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44

Quadro 8: Levantamento dos casos de intoxicação por topiramato em amostra populacional em 2005

Idade

(anos)

Dose (mg) Efeitos clínicos Nível

sanguíneo

(µg/mL)

Tratamento Comentários

5 Desconhecida Sonolência, dormência,

agitação, nistagmo,

movimentos repetitivos com a

boca e espasticidade; os

sintomas foram resolvidos ao

longo de 24 horas.

10.5 Apenas observação. Saudável.

17 800 Prostrado; combativo,

agressivo, confuso,

desorientado, ecolalia;

sintomas desapareceram após

24 horas.

Desconhecido Carvão ativado;

fluidos intravenosos.

Abuso de substâncias;

história prévia de overdose

aguda por clonazepam;

ingeriu topiramato para

“ficar alto”.

24 4.000 Assintomático. 18.9 Lavagem

nasogástrica em 3,5

horas.

Ingestão testemunhada.

Continua...

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45

Continuação, Quadro 8: Levantamento dos casos de intoxicação por topiramato em amostra populacional em 2005

Idade

(anos)

Dose (mg) Efeitos clínicos Nível

sanguíneo

(µg/mL)

Tratamento Comentários

36 40.000

(487 mg/kg)

Status epiléptico, coma por 12

horas; sonolento até o quinto

dia;acidose metabólica não-

ânion gap persistiu até o

sétimo dia.

Desconhecido Ipecac; midazolam,

tiopental; intubação;

lorazepam para

sedação.

Convulsões tratadas com

fenitoína e topiramato.

42 20.000

(400 mg/kg)

Convulsões tônico-clônicas

generalizadas e coma com

solução dentro de 12 horas;

acidose metabólica não-ânion

gap persistiu durante 6 dias.

Desconhecido Intubação e

ventilação mecânica;

lavagem; carvão;

catártico; fluidos

intravenosos;

diazepam.

Convulsões desordenadas

tratadas com primidona,

fenitoína e topiramato;

overdose de topiramato e

naproxeno.

44 Desconhecida Parada cardiopulmonar. 170 Nenhum. Encontrado morto.

Fonte: Evaluation of toxicity of topiramate exposures reported to poison centers; AL Lofton and Wendy Klein-Schwartz; 2005.

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46

O topiramato não demonstrou potencial genotóxico quando testado em

vários ensaios in vitro e in vivo, além disso, não foi mutagênico no teste de

Ames ou no ensaio do linfoma de camundongo in vitro; e não aumentou as

aberrações cromossômicas em linfócitos humanos in vitro ou na medula óssea

de rato in vivo. Um aumento do aparecimento de hiperplasia na bexiga foi

observado em camundongos que receberam topiramato (20, 75 e 300 mg/kg)

na dieta durante 21 meses (FDA, 2012). A relevância deste achado para o risco

carcinogênico em humano é incerto; nenhuma evidência de carcinogenicidade

foi observado em ratos após a administração oral de topiramato por 2 anos em

doses até 120 mg/kg (FDA, 2012).

4.2.4 Ácido Valpróico

O ácido valpróico é destinado, isoladamente ou em combinação a outros

medicamentos, no tratamento de pacientes (adultos e crianças acima de 10

anos) com crises parciais complexas, que ocorrem tanto de forma isolada

quanto em associação com outros tipos de crises convulsivas, e no tratamento

de quadros de ausência simples e complexa. Ausência simples é definida como

breve perda dos sentidos ou perda de consciência, acompanhada por

determinadas descargas epilépticas generalizadas, sem outros sinais clínicos

detectáveis. Ausência complexa é a expressão utilizada quando outros sinais

também estão presentes (BULA VALPROATO DE SÓDIO, Laboratório TEUTO

Brasileiro S/A).

O valproato de sódio é a substância ativa que é convertida a ácido

valpróico e este se dissocia em íon valproato no trato gastrintestinal. O

mecanismo de ação do valproato de sódio ainda não é conhecido, mas sua

atividade parece estar relacionada com o aumento dos níveis do ácido gama-

aminobutírico (GABA) no cérebro (BULA VALPROATO DE SÓDIO, Laboratório

TEUTO Brasileiro S/A).

4.2.4.1 Propriedades físico-químicas

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47

O ácido valpróico apresenta número de registro no CAS 99-66-1, é um

ácido graxo com propriedades anticonvulsivantes utilizado no tratamento da

epilepsia e sua estrutura química está representada na figura 5. Apresenta

propriedades físico-químicas como: alta solubilidade em solventes orgânicos

como metanol, álcool, acetona, clorofórmio, benzeno, éter e heptano, e

ligeiramente solúvel em ácido clorídrico 0,1N (mais detalhes no quadro 9).

Apresenta-se na forma de um líquido incolor com odor característico.

(TOXNET, 2016)

Figura 5: Estrutura química do ácido valpróico

Fonte: Toxnet (ChemIDPlus), 2016

Quadro 9: Propriedades físico-químicas do ácido valpróico.

Propriedades Físico-Químicas Valor

Peso Molecular 144.21 g/mol

Constante de Dissociação - pKa 4.6

Coeficiente de Partição octanol/água – Log Kow 2.75

Solubilidade em água 2000 mg/L a 20 oC

Ponto de ebulição 222 oC

Ponto de fusão 120-130 oC

Fonte: Toxnet (HSDB e ChemIDplus) e Drug Bank

4.2.4.2 Dados Farmacocinéticos

O ácido valpróico, a ser administrado por via oral, é indicado para

tratamento da epilepsia em adultos e crianças acima de 10 anos. A dose inicial

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48

recomendada é de 10-15 mg/kg/dia devendo ser aumentada pelo médico de 5

a 10 mg/kg/semana até a obtenção da resposta clínica desejada, não

ultrapassando a dose de 60 mg/kg/dia, administrados em doses diárias

divididas (2 a 3 vezes ao dia) para alguns pacientes. De maneira geral, a

resposta ótima é alcançada com doses menores que 60mg/kg/dia, além do

mais não existem dados sobre a segurança do valproato para uso de doses

superiores a essa. Se a dose total diária exceder 250 mg, ela deve ser

administrada de forma dividida. Não foi estabelecida uma boa correlação entre

dose diária, concentração sérica e efeito terapêutico, no entanto,

concentrações séricas terapêuticas de valproato para a maioria dos pacientes

com epilepsia têm variado entre 50 a 100 µg/mL (BULA VALPROATO DE

SÓDIO, Laboratório TEUTO Brasileiro S/A).

O uso do ácido valpróico em crianças menores de dois anos apresenta

um risco aumentado em relação ao aparecimento de doenças no fígado e esse

risco diminui progressivamente em pacientes mais velhos. Visto isso, o ácido

valpróico deverá ser usado como único medicamento em pacientes pediátricos,

devendo-se avaliar cuidadosamente os riscos e benefícios do tratamento

(BULA VALPROATO DE SÓDIO, Laboratório TEUTO Brasileiro S/A).

O ácido valpróico apresenta rápida absorção pelo trato gastrointestinal,

embora a taxa de absorção de íons valproato pode variar de acordo com a

formulação administrada (líquido, sólido, ou aspersão), as condições de

utilização (por exemplo, em jejum ou pós-prandial) e o método de

administração (por exemplo, se o conteúdo da cápsula é polvilhado sobre

alimentos ou a cápsula é administrada intacta). Estudos sugerem que a

biodisponibilidade sistêmica diária total é o principal determinante de controle

de crises (DRUG BANK, 2016).

Este medicamento é altamente ligado às proteínas plasmáticas (92-96%)

(MATTSON et al., 1982) e possui tempo de meia-vida relativamente curto de 7

a 8 horas, necessitando de administração em doses diárias divididas

(MATTSON et al., 1978).

O ácido valpróico é quase inteiramente metabolizado pelo fígado. Em

pacientes adultos em monoterapia, 30-50% de uma dose administrada aparece

na urina como um glicuronídeo conjugado. β-oxidação mitocondrial é a outra

principal via metabólica, normalmente responsável por mais de 40% da dose.

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Geralmente, menos do que 15-20% da dose é eliminado por outros

mecanismos oxidativos. Menos do que 3% de uma dose administrada é

excretado inalterado na urina. (DRUG BANK, 2016)

4.2.4.3 Toxicidade

A experiência do uso de valproato em crianças tem demonstrado um

aumento de risco considerável de desenvolvimento de hepatotoxicidade fatal

em crianças com idade inferior a dois anos e esse risco diminui

consideravelmente, de forma progressiva, em pacientes mais velhos (BULA

DEPAKOTE, ABBOTT LABORATÓRIOS DO BRASIL LTDA.).

Os índices de toxicidade são apresentados no Quadro 10.

Quadro 10: Índices de toxicidade do ácido valpróico.

Organismo Teste Via Dose Efeito

Criança TDLo Oral 375 mg/kg

Hipotensão, cianose

e taquicardia não

relacionada à

hipotensão.

Criança TDLo Oral 412 mg/kg Taquicardia não

relacionada à

hipotensão, dispneia

e coma.

Criança TDLo Oral 10500

mg/kg/30D

Alterações na

estrutura ou função

do pâncreas

endócrino; náuseas

ou vômitos

Criança TDLo Não declarada 1800

mg/kg/60D

Alterações na

estrutura ou função

do pâncreas

endócrino; náuseas

ou vômitos

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Organismo Teste Via Dose Efeito

Porquinho-da-

índia

DL50 Oral 824 mg/kg NR

Humano TDLo Oral 13333

mg/kg/D

Sonolência

Homem TDLo Oral 736 mg/kg Alterações

degenerativas no

cérebro e edema

pulmonar agudo.

Homem TDLo Oral 21 mg/kg/2D-

I

Sonolência

(diminuição da

atividade geral)

Homem TDLo Oral 429 mg/kg Coma

Camundongo DL50 Intraperitoneal 470 mg/kg NR

Camundongo DL50 Oral 1098 mg/kg NR

Camundongo DL50 Subcutânea 860 mg/kg NR

Coelho DL50 Intraperitoneal 1200 mg/kg NR

Rato DL50 Oral 670 mg/kg Comportamental:

sonolência

(diminuição da

atividade geral).

Gastrointestinal:

hipermotilidade,

diarréia.

Mulher TDLo Oral 100

mg/kg/10D

Comportamental:

anestesia geral.

Cérebro e

revestimento:

mudanças na

superfície EEG;

encefalite.

Mulher TDLo Oral 330 mg/kg Pulmões, tórax ou

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Organismo Teste Via Dose Efeito

respiração: outras

alterações.

Comportamental:

coma.

Cérebro e

revestimento:

mudanças na

superfície EEG.

Nota: DL50: Dose Letal 50%; TDLo (Toxic Dose Low): menor dose tóxica registrada. NR: Não

Referido

Fonte: ChemIDplus: base de dados sobre substâncias químicas no Toxnet (rede de dados em

toxicologia da biblioteca nacional de medicina dos EUA – NIH). Disponível em:

https://chem.nlm.nih.gov/chemidplus/rn/99-66-1

Segundo a bula, a toxicidade aguda do valproato foi testada em

camundongos, hamsters, ratos, cobaias, coelhos, gatos e cães. As DL50 orais

são similares para todas as espécies de animais adultos e geralmente variaram

entre 1000 e 2000 mg/kg. Estudos de toxicidade oral sub aguda de 1 e 3

meses foram realizados em ratos e de 3 meses em cães. Em cada estudo, os

efeitos tóxicos relacionados às doses incluíram depressão do sistema nervoso

central, decréscimo do consumo de alimentos, decréscimo do crescimento e

morte. As alterações patológicas encontradas em cada estudo foram atrofia

testicular, depleção de linfócitos a partir do tecido linfóide, para doses maiores

ou iguais a 400 mg/kg em ratos e maiores ou iguais a 240 mg/kg em cães. A

dose de efeito não tóxico do valproato nos estudos com ratos foi de 270

mg/kg/dia enquanto que no estudo com cães esta dose foi de 150 mg/kg/dia

(BULA DEPAKOTE, ABBOTT LABORATÓRIOS DO BRASIL LTDA.).

Estudos de toxicidade oral crônica de 6 e 18 meses foram conduzidos

em ratos. Nos estudos de 6 meses em ratos machos a dose atingiu 393

mg/kg/dia e em fêmeas a dose de 480 mg/kg/dia, sem produzir sinais

observáveis de toxicidade. A dosagem de efeitos não tóxicos de valproato, em

estudos de 18 meses com ratos, foi de 175 mg/kg/dia em machos e 234

mg/kg/dia em fêmeas. Em estudos de 6 meses, em cães tratados com

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cápsulas de ácido valpróico, na dose de 300 mg/kg/dia, foram observados

depressão do sistema nervoso central, alterações testiculares e depleção de

linfócitos a partir do tecido linfóide. Em estudos de 12 meses, as alterações

testiculares foram notadas tanto na dose de 173 mg/kg/dia como na dose de

300 mg/kg/dia e depressão do SNC também foi observada para dose de 300

mg/kg/dia. A dose de efeito não tóxico no estudo de 6 meses foi de 173

mg/kg/dia e no estudo de 12 meses foi de 104 mg/kg/dia (BULA DEPAKOTE,

ABBOTT LABORATÓRIOS DO BRASIL LTDA.).

Estudos de irritação gastrointestinal aguda em ratos, nas dosagens de

651 e 1000 mg/kg de ácido valpróico não diluído, administrado por gavagem,

produziu ulceração. Doses de 403 e 750 mg/kg de uma solução aquosa de

valproato de sódio não foram ulcerogênicas (BULA DEPAKOTE, ABBOTT

LABORATÓRIOS DO BRASIL LTDA.).

4.2.5 Lamotrigina

A lamotrigina é uma droga antiepilética, usada no tratamento de crises

convulsivas parciais e crises generalizadas. Pode ser instituída como

monoterapia ou em terapia combinada (BULA LAMOTRIGINA, Medley Indústria

Farmacêutica Ltda.).

A lamotrigina tem uma discreta ação antifolato e isso parece inibir a

liberação de aminoácidos excitatórios, como o glutamato e em menor grau o

aspartato. Atua também no canal de sódio voltagem-dependente, bloqueando o

influxo de íons sódio e estabilizando a membrana neuronal (GARZON, 2002).

4.2.5.1 Propriedades físico-químicas

A lamotrigina, cuja estrutura química está representada na figura 6,

apresenta número de registro no CAS 84057-84-1, é um fármaco

anticonvulsivo utilizado no tratamento de epilepsia e doença bipolar. Apresenta-

se sob a forma de pó cristalino branco ou quase branco, praticamente insolúvel

em água como pode ser visto no quadro 11, facilmente solúvel em

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dimetilformamida, ligeiramente solúvel em metanol e pouco solúvel em

propanol, benzeno e acetona (ANVISA, 2016).

Figura 6: Estrutura química da lamotrigina

Fonte: COHEN et al., 1987

Quadro 11: Propriedades físico-químicas da lamotrigina

Propriedades Físico-Químicas Valor

Peso Molecular 256.10 g/mol

Constante de Dissociação - pKa 5.7

Coeficiente de Partição octanol/água – Log Kow 0.99

Solubilidade em água 170 mg/L a 25 oC

Ponto de ebulição 468 oC

Ponto de fusão 216-218 oC

Fonte: Toxnet (HSDB) e Chemical Dictionary online

4.2.5.2 Dados Farmacocinéticos

A lamotrigina, outro antiepilético bastante utilizado, pode ser instituída

como monoterapia ou em terapia combinada, é administrado por via oral e sua

dose deve ser aumentada gradualmente até atingir uma resposta adequada.

Esse processo pode levar até cinco semanas, a partir daí, começa-se a utilizar

a dose de manutenção. Sendo assim, este medicamento leva cerca de 33 dias

para que a dose de manutenção atinja níveis ótimos no organismo. A dose

efetiva usual de lamotrigina para adultos e adolescentes com mais de 12 anos

de idade está entre 100 mg e 700 mg por dia (BULA LAMOTRIGINA, Medley

Indústria Farmacêutica Ltda.). Em crianças a dose recomendada é de 5 a 15

mg/kg/dia, iniciando com 2 mg/kg/dia em duas tomadas (GARZON, 2002),

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porém na bula da lamotrigina afirma que este medicamento é contraindicado

para menores de 12 anos.

A dose pode ser aumentada gradualmente até atingir resposta

adequada, sendo estimado que tal processo pode levar até cinco semanas,

após esse período se estabiliza a dose de manutenção. Assim, são estimados

cerca de 33 dias para que a dose de manutenção atinja níveis ótimos no

organismo (BULA LAMOTRIGINA, Medley Indústria Farmacêutica Ltda.).

Se a lamotrigina for associada ao ácido valpróico, sua meia-vida

aumenta de 24 para 59,6 horas, logo a dose de lamotrigina deverá ser

diminuída para uma dose inicial em adultos de 25 mg por dia com aumentos

progressivos de 25 mg a cada duas semanas e, em crianças, 0,2 mg/kg/dia

podendo atingir doses em torno de 1 a 5 mg/kg/dia (GARZON, 2002).

A lamotrigina é absorvida rápida e completamente após administração

oral. O efeito de primeira passagem é irrelevante com biodisponibilidade

estimada em cerca de 98% sem influência da presença de alimentos durante a

absorção. O pico da concentração sérica é atingido 1 a 3 horas após a

administração do fármaco. A presença de um segundo pico, 4 a 6 horas após a

administração oral da lamotrigina, sugere a existência de recirculação entero-

hepática. Existe uma relação de linearidade entre a dose administrada e o pico

sérico, assim como entre a dose e a área sob a curva estimada, para uma dose

única oral entre 30 e 450 mg. Esta proporcionalidade também se estende a

indivíduos com doses não superiores a 700 mg/dia. O grau de ligação da

lamotrigina às proteínas plasmáticas estima-se em cerca de 55% (COHEN et

al., 1987; PECK, 1991; GOA, ROSS e CHRISP, 1993; FITTON e GOA, 1995;

GILMAN, 1995) e o volume de distribuição aparente entre 0,9 e 1,3 L/kg

demonstra intensa distribuição, independentemente da dose administrada e do

esquema de administração, ainda apresenta pouca influência de fatores

patológicos na distribuição (GOA, ROSS e CHRISP, 1993; GILMAN, 1995).

A principal via de eliminação da lamotrigina é constituída pela excreção

urinária sendo estimada em 90% após administração de dose única oral. A

detecção de uma pequena percentagem de lamotrigina nas fezes – cerca de

2% da dose administrada – sugere a ocorrência de excreção biliar, ainda que

em quantidades insignificantes (PARSONS, DICKINS e MORLEY, 1995).

O tempo de meia-vida de eliminação da lamotrigina, quando esta é

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administrada em dose única oral em pessoas saudáveis foi estimada em cerca

de 24 horas (COHEN et al., 1987).

4.2.5.3 Toxicidade

A toxicidade aguda da lamotrigina foi analisada em ratos e

camundongos, obtendo um valor de DL50 por via oral de 205 mg/kg e 245

mg/kg, respectivamente (Ficha de Segurança da Lamotrigina – U.S.

Pharmacopeial Convention).

Os índices de toxicidade são apresentados no Quadro 12.

Quadro 12: Índices de toxicidade da lamotrigina

Organismo Teste Via Dose Efeito

Homem TDLo Oral 19 mg/kg Alterações cardíaca e

sensórias,

principalmente

alterações na visão.

Contração muscular ou

espasticidade.

Homem TDLo Oral 45 mg/kg/25D-I Dermatite.

Camundongo DL50 Oral 245 mg/kg NR

Rato DL50 Oral 205 mg/kg NR

Nota: DL50: Dose Letal 50%; TDLo (Toxic Dose Low): menor dose tóxica; NR: não referido

Fonte: ChemIDplus: base de dados sobre substâncias químicas no Toxnet (rede de dados em

toxicologia da biblioteca nacional de medicina dos EUA – NIH). Disponível em:

https://chem.nlm.nih.gov/chemidplus/rn/84057-84-1

4.3 Avaliação do risco

A avaliação do risco pode ser definida como a caracterização científica e

sistemática dos efeitos adversos potenciais que podem resultar da exposição

do homem aos agentes ou atividades perigosas. Essa avaliação do risco

apresenta quatro componentes essenciais: identificação do perigo, avaliação

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da relação dose-resposta, avaliação da exposição e caracterização do risco

(CAMARGO & BARROS, 2010).

A avaliação do risco não pode ser procedida sem considerar o cenário

de exposição ao medicamento que inclui o contexto sócio econômico envolvido

no tratamento. Devido a pouca melhora das crises convulsivas com o

tratamento convencional e à busca incessante desses pais por um tratamento

que dê uma qualidade de vida melhor aos seus filhos, eles encontraram o

tratamento com extrato de cannabis que já tem sido utilizado em outros países

há bastante tempo e que se sabe da diminuição no número de crises

convulsivas por parte dos usuários.

Esses pais então decidiram se unir para conseguir importar os

medicamentos à base de cannabis, já que o uso da planta é proibido no Brasil,

e depois de muito esforço e empenho, por meio de muita burocracia eles

conseguiram a autorização da ANVISA para a importação em caráter

excepcional. Porém, um frasco da marca Revivid, por exemplo, contendo 30

mL do óleo de CBD custa entre 200 e 300 dólares, sendo que em muitos casos

é preciso mais de um frasco por mês e muitas famílias não têm condições

financeiras para importá-lo. Visto isso, e tendo como exemplo a Fundação

Daya e Mamá Cultiva no Chile que ensinam os pais a produzirem os extratos

de cannabis artesanalmente para os seus filhos, eles começaram a

desenvolver seus próprios extratos.

Em geral, a identificação do perigo e a avaliação da relação dose-

resposta são realizadas simultaneamente, pois se baseiam em fontes de

informação comuns que, dependendo do sistema experimental, podem ser

bactérias, células in vitro, animais e ou seres humanos (CAMARGO &

BARROS, 2010).

Na identificação do perigo, classifica-se toxicidade de modo qualitativo,

ou seja, se a toxicidade potencial existe ou inexiste. Na avaliação da relação

dose-resposta, a questão passa a ser sobre quais doses daquela substância

provocam efeitos adversos. A toxicidade da substância é caracterizada

quantitativamente, ou seja, estabelece relações entre as doses recebidas e a

intensidade e incidência dos efeitos provocados. É nesta avaliação que são

reconhecidas as doses sem efeito observado (non-observed effect level =

NOEL) e aquelas sem efeito adverso observado (NOAEL = non-observed

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adverse effect level). Quando não é possível determinar a NOEL ou a NOAEL,

procura-se identificar qual a menor dose com efeito adverso observado (lowest

observed adverse effect level = LOAEL) (CAMARGO & BARROS, 2010).

O terceiro componente da avaliação do risco, a avaliação da exposição,

procura atender à questão sobre quais as características da exposição a qual

determinado grupo populacional ou compartimento ambiental está exposto. Há

uma mensuração da intensidade, da frequência e da duração da exposição,

levando em consideração o tamanho e a natureza da população exposta, as

fontes e as vias de exposição, bem como as incertezas deste processo

(CAMARGO & BARROS, 2010).

A caracterização do risco é a etapa final do processo de avaliação do

risco, realizada pela consolidação crítica de todas as informações sobre a

toxicidade do agente – vias de exposição, aspectos toxicocinéticos e

toxicodinâmicos, efeitos adversos, orgãos-alvo, suscetibilidade diferencial de

espécies, indivíduos e sexos –, e sobre os níveis reais ou teóricos de

exposição, levando em consideração os princípios assumidos por falta de

informação, os julgamentos científicos e as incertezas de cada etapa do

processo de avaliação de risco. De acordo com a gravidade dos efeitos

adversos e da probabilidade de sua ocorrência, o risco estimado pode ser

considerado negligenciável, tolerável ou intolerável. Naturalmente, a qualidade

da caracterização do risco depende da qualidade das informações aportadas

pelas etapas anteriores (CAMARGO & BARROS, 2010).

No presente trabalho foi realizada a caracterização do perigo dos

fármacos utilizados no manejo da epilepsia em pacientes pediátricos, tais

como, topiramato, ácido valpróico (valproato de sódio) e lamotrigina e

pretendeu-se comparar suas respectivas toxicidades e condições de exposição

com os fármacos THC/dronabinol e canabidiol (CBD), visto que são os

principais fármacos presentes nos extratos de Cannabis sativa que vem sendo

utilizado excepcionalmente no tratamento de epilepsias refratárias. Diante das

evidências científicas e médicas é provável que o extrato de cannabis venha a

ser incorporado no arsenal terapêutico em âmbito nacional para tratamento de

epilepsias e, neste contexto, torna-se necessário avaliar seu risco em

comparação com os fármacos de uso padrão.

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58

Devido à proibição da cannabis e sua classificação como droga de

abuso pela Convenção Internacional de Drogas (Convenção das Nações

Unidas Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas)

predomina na sociedade, inclusive na área médica, a percepção do alto risco

da cannabis relacionado ao potencial de causar dependência e outros

distúrbios psiquiátricos como a esquizofrenia. Os estudos que embasa essa

percepção de risco adotam como cenário de exposição o consumo por pessoas

supostamente saudáveis que utilizam a cannabis, geralmente obtida do

mercado ilícito, sem controle de produção, na forma fumada com finalidade

recreativa podendo conter diversas outras substâncias nocivas como

agrotóxicos e metais tóxicos.

O uso medicinal dos extratos de cannabis no contexto do presente

trabalho se dá em condição de exposição diversa do uso recreacional, a

administração é por via oral na forma de extratos geralmente oleosos em

pacientes portadores de enfermidades graves com manifestações neurológicas

que se não tratadas levarão a agravos permanentes como é o caso das

convulsões. Nessa condição patológica um fármaco que atue no SNC

(psicoativo) será obrigatoriamente administrado de forma crônica se

justificando a comparação de eficácia e toxicidade para seleção do tratamento

que represente menor razão risco/benefício.

Poucos estudos toxicológicos foram realizados até o momento

abordando os extratos da Cannabis sativa. Quase todos os dados se referem

ao Δ9-THC que já é um fármaco registrado (dronabinol) e comercializado sob a

denominação comercial Marinol®. Em relação ao CBD, são encontrados um

número razoável de estudos sobre dados farmacológicos relacionados ao

mecanismo de ação e atuação em diversas condições patológicas, mas poucos

estudos toxicológicos foram publicados, embora sua toxicidade seja referida

como bastante inferior ao do THC.

Ao ser regulado pela ANVISA o extrato medicinal de cannabis teve sua

eficácia reconhecida para casos excepcionais, no entanto ainda há enorme

preocupação social e médica sobre os riscos dessa terapia justificando, desta

forma, a comparação da segurança toxicológica dos anticonvulsivantes

convencionais (topiramato, ácido valpróico e lamotrigina) com os marcadores

farmacologicamente ativos Δ9-THC e CBD.

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Os medicamentos topiramato, ácido valpróico e lamotrigina, são alguns

dos mais utilizados em crianças portadoras de epilepsia, porém, nenhum deles

são indicados para crianças menores de 2 anos. O topiramato é indicado para

crianças acima de 2 anos, o ácido valpróico acima de 10 anos e a lamotrigina

acima de 12 anos, mas provavelmente por falta de opção de tratamento estão

sendo administrados em pacientes menores de 2 anos segundo dados da

Associação de Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal (APEPI).

Entretanto, grande parte das crianças portadoras de síndromes genéticas raras

(CDKL5, Rett ou Dravet), que tem como característica as crises convulsivas

com alta frequência, são refratárias ao tratamento com os anticonvulsivantes

citados e por isso estão recorrendo ao tratamento com extrato de cannabis

medicinal, no qual observaram uma melhora significativa na diminuição das

crises convulsivas.

O Marinol® (Δ9-THC sintético) apresenta indicação terapêutica para

estimular o apetite em pacientes com anorexia portadores de HIV que tiveram

perda de peso, indica-se inicialmente, 2,5 mg de Marinol® cápsulas

administradas por via oral duas vezes ao dia, antes do almoço e do jantar.

Quando clinicamente indicado e na ausência de efeitos adversos significativos,

a dosagem pode ser gradualmente aumentada até um máximo de 20 mg/dia

administrados em doses orais divididas. (BULA MARINOL®, Unimed

Pharmaceuticals)

Como antiemético Marinol® é administrado a uma dose inicial de 5

mg/m2, administrada 1 a 3 horas antes da administração de quimioterapia, em

seguida, a cada 2 a 4 horas após a quimioterapia, para um total de 4 a 6

doses/dia. Caso a dose de 5 mg/m2 seja ineficaz, e na ausência de efeitos

secundários significativos, a dose pode ser aumentada até no máximo 15

mg/m2 por dose (BULA MARINOL®, Unimed Pharmaceuticals). E de acordo

com Lucas & Laszlo (1980), um adulto médio com 70 kg apresenta uma

superfície corporal de 1,7 m2, logo, uma dose de 5 mg/m2 equivale a 8,5 mg

para tal.

A bula do Marinol® recomenda uma precaução na prescrição deste

medicamento para crianças devido seus efeitos psicoativos e ainda não se tem

dados sobre THC para tratamento da epilepsia.

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Segundo a APEPI que forneceu dados para uso nesse trabalho, as

reações adversas aos anticonvulsivantes mais recorrentes se referem ao

topiramato responsável pelo aumento da temperatura corporal em crianças,

ausência de transpiração e aparecimento de erupções avermelhadas por todo

corpo, efeitos adversos também descritos na bula que raramente são alertados

pelo médico prescritor e na dispensação do medicamento, segundo a APEPI

que levanta a importante questão sobre a falta de informação sobre os efeitos

colaterais dos medicamentos anticonvulsivantes no momento da prescrição e

dispensação. Por outro lado, há uma grande dificuldade de diferenciar se as

manifestações desagradáveis se atribuem à enfermidade, geralmente rara, ou

aos efeitos adversos de medicamentos.

A APEPI informou algumas condições de tratamentos para nortear a

comparação do risco toxicológico dos extratos de cannabis com os

anticonvulsivantes objetos de interesse desse estudo, conforme apresentado

no Quadro 13. A APEPI ressalta que em geral o tratamento com os extratos de

cannabis não garante uma monoterapia, mas reduz muito o número de

medicamentos utilizados na politerapia, por exemplo, pacientes que antes

utilizavam 6 medicamentos (dentre eles anticonvulsivantes e ansiolíticos) após

o tratamento com cannabis reduziram este número para apenas 2, diminuindo

consequentemente as interações medicamentosas e os efeitos colaterais e

dando uma melhor qualidade de vida ao paciente. Embora seja necessário

ainda realizar um estudo observacional com aplicação de testes estatísticos, os

dados informados pela APEPI permitem abranger a discussão sobre o risco

dos extratos de cannabis em um cenário em que não se tem quase nenhuma

informação e que esse tratamento ainda carece de conhecimento médico-

científico no Brasil.

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Quadro 13: Informações sobre o uso do extrato de cannabis.

Dados Farmacoterapêuticos

Idade Peso Posologia extrato de cannabis Conversão da dose

diária para mg/Kg

Tratamento

adicional Efeitos colaterais

5 anos 13 Kg

Revivid

3000 mg/ 30 mL:

1 mL 3x dia

Artesanal (20%):

0,7 mL 2x dia

Revivid:

23 mg/Kg

Artesanal:

21,5 mg/Kg

Clobazam e

Levetiracetam Sem efeito colateral

7 anos 14 Kg

Revivid

500 mg/ 30 mL:

2,5 mL 3x dia

Artesanal (20%): 10 gotas 3x dia

Revivid:

8,9 mg/Kg

Artesanal:

21,4 mg/Kg

Clobazam e

Lacosamida

Tentou retirar o Clobazam

e aumentou o número de

crises convulsivas

10 anos 26 Kg Artesanal (20%):

2 mL/dia

Artesanal:

15,4 mg/Kg Lamotrigina

Apresentou sonolência

apenas no início do

tratamento

22 anos 50 Kg

Revivid

3000 mg/ 30 mL:

3 mL 2x dia

Revivid:

12 mg/Kg

Oxcarbazepina,

Escitalopram e

Pregabalina

Dificuldade de dormir a

noite, com consequência

de sonolência pela manhã

Fonte: Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal (APEPI).

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Uma maneira de estimar a toxicidade dos fármacos é a comparação de

seus índices de toxicidade, tais índices são em sua maioria obtidos durante a

fase de estudos pré-clínicos do fármaco (ANTONIO et al., 2009). Por exemplo,

através dos estudos de toxicidade crônica se determinam os valores de

NOAEL, NOEL, LOAEL e LOEL.

Os índices de toxicidade não indicam isoladamente a segurança do

fármaco, sua função principal é nortear as doses que serão testadas no ensaio

clínico de fase 1 (ANTONIO et al., 2009). Por outro lado, a dose terapêutica

inicial tem uma relação de proporcionalidade com o índice de toxicidade

adotando-se a interpretação de quanto menor o índice de toxicidade menor a

segurança do fármaco. Os índices de toxicidade dos fármacos objeto desse

estudo são apresentados no Quadro 14 a título de comparação.

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Quadro 14: Índice de toxicidade e endpoint dos fármacos analisados.

Fármaco DL50 (mg/Kg) NOAEL NOEL LOAEL LOEL Endpoint

Canabidiol

> 254 (cão-IV);

212 (macaco-IV)

> 12,7

(camundongo-

oral)

ND ND ND ND ND

Δ9-THC

666 (rato-oral)

482

(camundongo-

oral)

Em óleo de

gergelim: 1015

(rato macho-

oral) e 800 (rato

fêmea-oral)

0,07

mg/Kg

0,07

mg/Kg 0,07 mg/Kg

0,2 a 0,3

mg/Kg Efeitos psicotrópicos e físicos

Topiramato

Rato e

Camundongo:

2338 a 3745

mg/Kg

ND ND ND ND ND

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Ácido Valpróico

670 (rato-oral)

1098

(camundongo-

oral)

Rato: 270

mg/kg/dia

Cão: 150

mg/kg/dia*

Ratos machos:

393 mg/kg/dia

fêmeas: 480

mg/kg/dia**

Ratos machos:

175 mg/kg/dia

Fêmeas: 234

mg/kg/dia***

ND

Ratos: >

400 mg/kg

Cães: > 240

mg/kg*

ND

Depressão do sistema nervoso

central, alterações testiculares e

depleção de linfócitos

Lamotrigina

205 (rato-oral)

245

(camundongo-

oral)

ND ND ND ND ND

Nota: ND: Não Descrito; DL50: Dose Letal 50%; TDLo: Menor Dose Tóxica; NOAEL: Dose sem Efeito Adverso Observado; NOEL: Dose sem Efeito

Observado; LOAEL: Menor Dose com Efeito Adverso Observado; LOEL: Menor Dose com Efeito Observado; *:Estudos de toxicidade sub aguda; **:Estudos

de toxicidade crônica 6 meses; ***: Estudos de toxicidade crônica 18 meses

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A comparação da toxicidade aguda (DL50 - oral) é contraditória uma vez

que o canabidiol apresenta um valor em geral menor do que os

anticonvulsivantes e até mesmo do THC, porém o CBD vem sendo tratado

como menos tóxico que o THC e de fato as evidências médicas corroboram

essa inferência, ao passo que não há registro de intoxicação com extratos ricos

em CBD. Esta contradição pode ser explicada pela proibição e "demonização

da planta" que podem influenciar gerando vieses importantes nos estudos

científicos realizados em décadas passadas que impactaram a questão

regulatória. Essa contradição indica a necessidade de atualizar os estudos de

toxicidade do CBD que, embora apresente vasta literatura sobre mecanismo

farmacológico e eficácia médica é incipiente na área toxicológica.

De acordo com os rótulos dos extratos importados de cannabis o teor de

THC é inferior que 1%, o Revivid de maior frequência de importação segundo a

APEPI, declara teor de THC inferior a 0,3%. No Brasil não há estudos sobre os

teores de THC e CBD em plantas cultivadas em território nacional, mas nos

EUA foi verificado aumento da potência da cannabis no período de 1995 a

2014, com teores ao redor de 10% de THC (média 7,9% ± 5,6%) e 0,4% de

CBD (média 0,39% ± 0,75%) (ELSOHLY et al., 2016).

Convencionou-se na área regulatória adotar o THC como substância de

maior risco toxicológico ao se legislar em relação a essa substância. Embora a

ANVISA tenha autorizado a prescrição de THC e da própria planta cannabis

(RE 66/2016), quando foi publicada a RDC 17/2015 determinou-se que o teor

de THC deveria ser inferior ao de CBD. É frequente os artigos científicos

citarem o CBD como um composto “não psicoativo” e o THC como um

“psicoativo” para referir que o CBD seria mais “seguro” para o SNC do que o

THC. Desta forma, seguindo a lógica das agências regulatórias uma proposta

de avaliação do risco de extratos de cannabis seria comparar a toxicidade do

THC em relação aos anticonvulsivantes de uso padrão. Por outro lado, como já

discutido sobre o Quadro 14, comparar os índices de toxicidade crônica do

THC, CBD e os anticonvulsivantes de interesse é um desafio talvez impossível

pelo fato de terem sido adotados endpoints discrepantes porque não se

esperava que o efeito central do THC pudesse ser terapêutico, sendo

classificado geralmente como tóxico.

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Considerando o cenário atual outra proposta de avaliação de risco seria

comparar as doses administradas do fármaco THC com as doses terapêuticas

recomendadas e seus efeitos colaterais e adversos com base no medicamento

dronabinol. Assim o Quadro 15 apresenta a estimativa das doses de THC e

CBD que são administradas em pacientes entre 5 e 22 anos.

O Quadro 15 deixa mais claro essa questão da dose diária administrada

indicada no Quadro 13 e a especulação da concentração de THC e CBD

presentes.

Quadro 15: Estimativa das doses de THC e CBD administradas em alguns

esquemas de tratamento segundo a APEPI.

Revivid (0,3% THC e 25% de CBD)

Dose diária do extrato Dose de THC Dose de CBD

23 mg/Kg 0,069 mg/Kg 5,75 mg/Kg

8,9 mg/Kg 0,027 mg/Kg 2,2 mg/Kg

12 mg/Kg 0,036 mg/Kg 3 mg/Kg

Artesanal* (~10% THC e ~0,4% de CBD)

Dose diária do extrato Dose de THC Dose de CBD

21,5 mg/Kg 2,15 mg/Kg 0,086 mg/Kg

21,4 mg/Kg 2,14 mg/Kg 0,086 mg/Kg

15,4 mg/Kg 1,54 mg/Kg 0,062 mg/Kg

Fonte: Apoio à Pesquisa e Pacientes de Cannabis Medicinal (APEPI).

Nota: *os extratos artesanais não foram dosados sendo impossível saber as concentrações de

THC e CBD, sendo adotado como parâmetro as concentrações desses canabinóides

geralmente encontradas na planta de acordo com a literatura (ELSOHLY et al., 2016).

Os cálculos demonstrados no Quadro 15 foram realizados baseando-se

na concentração de THC e CBD descritas no frasco do Revivid e em relação ao

extrato artesanal foram consideradas as concentrações descritas por Elsohly et

al. (2016). Porém, as diversas cepas da cannabis possuem diferentes

concentrações de CBD e THC e a associação APEPI relatou utilizar cepas

denominadas Harle-Tsu, planta híbrida referida como contendo alto teor de

CBD para a produção dos seus extratos artesanais. Entretanto, o referencial

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deste trabalho é o THC, que é a substância reconhecida segundo a regulação

por apresentar maior periculosidade para os usuários.

Comparando os índices de toxicidade no Quadro 14 com as doses

administradas nos pacientes descritos no Quadro 13, considerando o Revivid

com 0,3% de THC e o extrato artesanal com 10% de THC, as doses

administradas em crianças, mesmo para aquelas que usam os dois tipos de

extrato, estão abaixo da DL50 tanto do THC quanto do canabidiol, embora já

tenha sido destacada a dificuldade de interpretação de tais índices. No caso do

canabidiol que foi apresentada a DL50 por via intravenosa é possível se inferir

que a DL50 por via oral seja significativamente mais alta, uma vez que o mesmo

sofre efeito de primeira passagem com biodisponibilidade oral estimada em

torno de 6%.

A dose terapêutica de dronabinol em adultos para enfermidades diversas

da epilepsia é de no máximo 20 mg/dia para finalidade terapêutica de

estimulação de apetite e no máximo 25,5 mg/dose para tratamento da êmese.

Embora a bula do medicamento alerte que não foram definidas doses seguras

em pacientes pediátricos, dados científicos demonstram que a densidade de

receptores canabinóides do tipo 1 (CB1) é significativamente menor em

crianças sendo estas mais resistentes aos efeitos centrais do THC (GEIWITZ,

2001).

Sinais e sintomas de intoxicação leve por Marinol® incluem sonolência,

euforia, sensação sensorial aumentada, percepção alterada do tempo,

conjuntiva avermelhada, boca seca e taquicardia; à intoxicação moderada inclui

deterioração da memória, despersonalização, alteração do humor, retenção

urinária e motilidade intestinal reduzida; intoxicação severa incluem diminuição

da coordenação motora, letargia, fala arrastada e hipotensão postural (BULA

MARINOL®, Unimed Pharmaceuticals).

No Quadro 16 estão compilados os efeitos adversos e colaterais dos

fármacos em questão neste trabalho, de acordo com informações citadas

anteriormente e obtidas de informações científicas.

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Quadro 16: Efeitos adversos e colaterais dos fármacos.

Efeitos Adversos e Colaterais

CBD Arritmias, contração muscular ou espasticidade e dispnéia.

Δ9-THC

Hipotermia, bradipneia, rápida perda de peso, ataxia,

tremores musculares, prostração, sonolência, anestesia,

salivação, vômitos, hiper-reatividade a estímulos, letargia e

movimentos lentos.

Topiramato

Sonolência, tonturas, ataxia, distúrbios da fala,

retardamento psicomotor, nistagmo, agitação, confusão,

náusea, vômitos e tremor. Diminuição da transpiração e o

aumento da temperatura, transtornos do humor e

depressão.

Ácido valpróico

Sonolência, hipermotilidade gastrointestinal, diarréia,

depressão do sistema nervoso central, decréscimo do

consumo de alimentos e do crescimento, atrofia testicular e

depleção de linfócitos.

Lamotrigina

Alterações cardíaca e sensorial, principalmente alterações

na visão. Contração muscular ou espasticidade, exantema,

náuseas e vômitos, alteração tubular, incluindo

insuficiência renal aguda e necrose tubular aguda.

Analisando o Quadro 16 é possível notar que os efeitos adversos

desenvolvidos por CBD ou THC são menos severos quando comparados aos

medicamentos tradicionais para o tratamento da epilepsia, inclusive alguns

desses efeitos são semelhantes, como sonolência, ataxia e vômito.

Comparando farmacocineticamente, o CBD e o THC apresentam baixa

biodisponibilidade oral, em torno de 10%, devido ao extenso efeito de primeira

passagem enquanto que topiramato, ácido valpróico e lamotrigina apresentam

elevada biodisponibilidade oral em torno de 90%, o que significa que CBD e

THC são pouco absorvidos para a circulação sistêmica. Já em relação à

afinidade de ligação às proteínas plasmáticas todos os fármacos em questão

apresentam uma alta afinidade, com exceção do topiramato. Exceto o ácido

valpróico, que apresenta um curto tempo de meia-vida de 8h, os outros

fármacos apresentam tempo de meia-vida entre 1 e 2 dias. E devido a alta

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lipofilicidade do THC e do CBD ambos são excretados principalmente pela via

fecal.

Os dados compilados nesse trabalho indicam que a toxicidade dos

extratos de cannabis utilizando apenas THC e CBD como marcadores ativos

não é superior à toxicidade dos anticonvulsivantes topiramato, ácido valpróico e

lamotrigina. Não há estudos de segurança para THC e CBD, porém, os

anticonvulsivantes estudados tem restrição de uso em crianças (topiramato

indicado apenas para crianças acima de 2 anos; lamotrigina indicado apenas

para crianças acima de 12 anos; ácido valpróico indicado apenas para crianças

acima de 10 anos) e mesmo assim são prescritos e administrados em casos de

crises convulsivas recorrentes de difícil controle.

Apesar da necessidade de se realizar estudos observacionais de

acompanhamento farmacoterapêutico em crianças que utilizam os extratos de

cannabis, devendo estes ser padronizados quanto aos teores de princípios

ativos, é possível, pelos resultados desse trabalho deduzir que o uso de

extratos de cannabis com base apenas nos marcadores THC e CBD não

apresenta risco superior aos anticonvulsivantes estudados nesse trabalho.

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5. CONCLUSÃO

A proibição da cannabis e os estudos de toxicidade em humanos ser

baseados nas condições de uso recreativo inviabilizam a avaliação de

segurança na exposição de longo prazo dos extratos de uso medicinal,

embora a toxicidade aguda e os efeitos adversos indicarem ser

superiores aos fármacos de comparação neste trabalho.

Existe base sanitária internacional para a regulação nacional dos

extratos de cannabis podendo ser utilizada a estratégia de aproximação

das normas e regulamentos aplicada ao THC e seus derivados

(nabilona) para embasar a questão da segurança toxicológica, sem

prejuízo da necessidade de desenvolvimento de pesquisas nacionais no

âmbito de toxicológico.

A comparação dos dados toxicológicos dos anticonvulsivantes

estudados (topiramato, ácido valpróico e lamotrigina) com os

marcadores farmacologicamente ativos Δ9-THC e CBD realizada neste

trabalho mostra que os efeitos adversos do Δ9-THC e do CBD não são

mais severos do que os efeitos adversos do topiramato, ácido valpróico

e lamotrigina.

O THC, princípio ativo com maior rejeição por ter efeito psicoativo

euforizante e alucinógeno, apresenta índice de toxicidade aguda (DL50)

semelhante aos anticonvulsivantes estudados e a baixa

biodisponibilidade oral (10 a 20% para THC e 6% para CBD) indicam

maior segurança no controle das doses.

Na literatura foram encontrados mais dados de toxicidade sobre o THC

do que dos anticonvulsivantes estudados indicando a possibilidade da

agência regulatória aproveitar tais dados na avaliação de segurança pré-

clínica dos extratos com base no THC como fármaco ativo de maior

toxicidade.

As evidências demonstradas neste trabalho sugerem que os extratos de

cannabis não apresentam maior risco toxicológico do que os

anticonvulsivantes estudados (topiramato, ácido valpróico e lamotrigina).

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6. REFERÊNCIAS

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