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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ NÚCLEO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA – NESC Projeto de Dissertação de Mestrado em Saúde Coletiva Um estudo sobre os Efeitos Adversos à Saúde de uma População Infanto-Juvenil exposta aos agrotóxicos usados no cultivo da cana-de-açúcar. Mestranda: MARLEI ROMERO Orientador: Volney de M. Câmara

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ … · 2 “ É dever da família, da Sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ

NÚCLEO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA – NESC

Projeto de Dissertação de Mestrado em Saúde Coletiva

Um estudo sobre os Efeitos Adversos à Saúde de uma População Infanto-Juvenil

exposta aos agrotóxicos usados no cultivo da cana-de-açúcar.

Mestranda: MARLEI ROMERO

Orientador: Volney de M. Câmara

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“ É dever da família, da Sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,

com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência

familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,

discriminação, exploração, crueldade e opressão.”

Constituição da República Federativa do Brasil, Art.227, 5.10.1988

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SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................................................5 DEDICATÓRIA...........................................................................................................................................8 AGRADECIMENTOS ...................................................................................................................................8 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................................11 1.1 A TRAJETÓRIA DO ESTUDO ......................................................................................................11 1.2. A RELAÇÃO SAÚDE E TRABALHO NA ADOLESCÊNCIA ....................................................................14 1.3 JUSTIFICATIVA .................................................................................................................................15 2. O TRABALHO INFANTO – JUVENIL ..........................................................................................16 2.1 O QUADRO MUNDIAL ......................................................................................................................16 2.2 O QUADRO BRASILEIRO...................................................................................................................18 2.3 O DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ..................................................................................21 2.4. O ADOLESCENTE E SUAS TRANSFORMAÇÕES .................................................................................23 2.5 O ADOLESCENTE E O TRABALHO .....................................................................................................24 2.6. OS EFEITOS DOS AGROTÓXICOS NA SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE..................................26 3. IMPACTOS NO MEIO AMBIENTE...............................................................................................30 3.1 LEGISLAÇÃO ....................................................................................................................................33 3.2 LEGISLAÇÃO FEDERAL.....................................................................................................................34 3.3 LEGISLAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO .................................................................................34 4. A NEUROPSICOLOGIA E OS EFEITOS ADVERSOS A SAÚDE................................................35 4.1 A ATENÇÃO .....................................................................................................................................35 4.2. A MEMÓRIA....................................................................................................................................37 4.3. MEMÓRIA VERBAL .........................................................................................................................38 5. O PROGRAMA PETI ......................................................................................................................40 5.1. ASPECTOS HISTÓRICOS E GEOGRÁFICOS DO MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ ...........................................40 5.2. A IMPLANTAÇÃO DO PETI NO MUNICÍPIO .....................................................................................42 6. MATERIAIS E MÉTODOS.............................................................................................................44 6.1. OBJETIVO GERAL ...........................................................................................................................44 6.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................................................44 6.3. DESENHO DO ESTUDO.....................................................................................................................44 6.4. ASPECTOS ÉTICOS..........................................................................................................................45 6.5. LOCAL ONDE FOI REALIZADO O ESTUDO.........................................................................................46 6.6. ETAPAS E PROCEDIMENTOS DO ESTUDO DE CAMPO..........................................................................47 7. OS INSTRUMENTOS ...........................................................................................................................51 7.1. QUESTIONÁRIO ESTRUTURADO PARA OS ADOLESCENTES ...............................................................51 7.2. TESTE NEUROPSICOLÓGICO BENDER .............................................................................................52 7.3. TESTE NEUROPSICOLÓGICO TCA VIS .............................................................................................54 8. RESULTADOS............................................................................................................................55

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9 ENTREVISTAS COM MORADORES LOCAIS ...........................................................................................68 10. CONCLUSÃO.................................................................................................................................78 11 BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................................79 12 ANEXOS .........................................................................................................................................81

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RESUMO

Foi realizado um estudo seccional, comparativo, tendo como população alvo todas as

crianças e adolescentes de ambos os sexos, de 9 a 18 anos que participaram do

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI -, no município de Quissamã num

total de 55 crianças e adolescentes, moradores na área de Machadinha e sítios vizinhos.

O grupo controle foi constituído por crianças e adolescentes na mesma faixa etária e

condições sócio - econômicas semelhantes, que residem no perímetro urbano. As etapas

e procedimentos do estudo de campo incluíram: visitas de sensibilização; aplicação de

questionário; execução dos Testes Neuropsicológicos TCA Vis para medir a capacidade

atencional em tarefas repetitivas e monótonas; aplicação do Teste Bender para

identificar o nível de maturação da função Gestáltica visomotora; e, a realização de

entrevistas com moradores e trabalhadores na região. Entre os resultados obtidos,

destacam-se diferenças significativas em relação a ocorrência de acidentes de trabalho e

uma maior proporção de sintomas referidos no grupo estudo, sendo estatisticamente

significante as diferenças para desmaio, indisposição física, enjôo e dores abdominais.

No teste neuropsicológico TCA Vis o grupo estudo apresentou tendência maior para

erro por omissão e diferença significativa para erro por ação. No teste Bender o grupo

estudo apresentou reprodução diferenciada para todas as variáveis medidas: Normal,

estresse, memória imediata e memória tardia. Como conclusão, foi enfatizada a

necessidade de aprofundamento destes estudos, notadamente da avaliação

neuropsicológica.

Palavras-chave: Adolescentes; Agrotóxicos; Teste Bender; Teste TCA Vis; Saúde.

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ABSTRACT

A comparative seccional study was done, wich done, wich target, was the population of

children and adolescents of both sex, aged 9 to 18 years old, that participated in the “

PETI – Programa de Erradicação do Trabalho infantile” that means” infantile labour

eradication program”, in a total number of 55 children and adolescents, all living in area

called machadinha and neighborhood around, district of Quissamã, Rio de Janeiro State,

Brasil.

The Control group was formed by individuals with similar age and social conditions,

living in the urban area. The stage and procedures included: sensiilization visit; primer

list o questions answered by them, primer list of question answered by them,

neuropsychological TCA Vis test (to measure attention capacity in monotonous and

repeated tasks), bender test ( to identify level of maturation of visionmotor Gestaltic

function), and interview of local workers and inhabitants. The results showed

significants diference in conection with work accidents and great proportion of referring

symptoms among study group, being important statistically the differences for fait,

physical indisposition, nausea and abdominal pains. In the Neuropsychologic TCA Vis

test, the study group presented biger tendency to error/ mistake for omission and

significantive diference for action error. In the Bender test the study group showed

different and diferenciated results for all kinds of measures: norml, stress, recent

memory and late memory. As a conclusion, there is emphatically the need of deepen

this study, in special for neuropsychologic evaluation.

Key words: adolescents, agricultural of defensive, bender test, TCA Vis, health.

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Dedicatória

Aos meus pais pelo privilégio de ter tido uma vida cheia de amor e exemplo

humanitário, que contribuiu para que eu pudesse hoje estar atenta às questões sociais, e

ter recebido como herança um pouco da sensibilidade e generosidade, que acredito

tenha contribuído para me tornar um ser humano melhor.

A meus filhos, pela paciência e compreensão nas muitas horas de ausência, o que me

fez ver o quanto é grande o meu amor e a necessidade de tê-los sempre por perto.

Agradecimentos

Ao Volney, amigo e orientador, pela forma carinhosa com que me conduziu e pelo

exemplo a ser seguido.

À Malu, Maria Lucia Bosi, sempre amiga e incentivadora, seu exemplo de garra me

leva a querer mais.....

Ao Ronir, pelo exemplo que sempre foi, e disponibilidade de ajudar sempre, e ter o dom

de fazer a estatística parecer algo leve e fácil de ser compreendido; sem sua ajuda,

“jamais”.

Aos moradores de Machadinha, pelo acolhimento carinhoso e a disponibilidade de

contribuir sempre.

Aos profissionais do “Posto de Saúde de Machadinha” pela carinhosa ajuda durante o

trabalho de campo e a amizade ofertada generosamente e, verdadeiramente retribuída.

À Analice, Secretaria de Educação, pela amizade e incentivo, assim como as

Autoridades de Quissamã que disponibilizaram meios para que este estudo pudesse

acontecer.

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À grande amiga, Helena Fortes, que teve papel importantíssimo na direção dos rumos

que este trabalho tomou; com sua amizade, generosidade e o marco de estar no lugar

certo, na hora certa.

À Delvaci Santos, pela amizade, carinho e torcida, contribuindo para que a burocracia

não pesasse tanto...

À Beatriz Werdan, minha amiga e “anjo da guarda”, que sempre me socorreu com

paciência quando, ignorante em informática, lhe solicitava ajuda nas horas mais

impróprias; com todo carinho e disposição estava sempre disponível, obrigada pela

amizade...

Ao Alexandre Werdan, pelo socorro nas horas de “sufoco”, pacientemente, e obrigada

por trazer para o Brasil “três” preciosidades...

Ao Geraldo, Renato, Valéria e “tia Cleia”, sem vocês seria impossível ir adiante...

À Direção, professores, funcionários e alunos do Nesc, por tudo que me ajudaram a

construir.

Ao Cristiano Corrêa Pessanha que contribuiu generosamente, assim como todos da

Secretaria de Bem Estar Social.

Ao Nelson Reis, um amigo sempre valoroso em todas as horas.

Aos meus queridos Amigos, Andréa e Fernando, pelo carinho, hospitalidade e a certeza

da amizade para sempre...

Rita, Minha grande amiga e incentivadora, obrigada pela sua volta...

Nelma, pela amizade, colaboração e carinho, principalmente nos momentos difíceis.

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Aos meus colegas da Psicologia médica por entenderem e me incentivarem no período

que estive longe do convívio de vocês.

À Glória, em especial pela amizade, incentivo, e compreensão, quanto a minha ausência

“institucional” mas a presença sempre... no coração.

Aos mestres: Sérgio Schmidt pela orientação no caminho ainda inóspito da

Neuropsicologia no Brasil e a disponibilidade de seu precioso tempo...

Gilberto Britto por mostrar um caminho na ciência que poucos conseguem atingir como

verdadeiros cientistas, foi muito gratificante ter podido “roubar” um pouco do seu

precioso tempo.

Aos meus colegas e alunas do centro cultural, em especial a minha amiga Eliana, pela

forma simples com que encara as grandes vicissitudes da vida.

Ao Daniel, que me ajudou a organizou melhor os meus “escritos”, aguardando a sua

volta...

As minhas companheiras e amigas do Programa do PADI, pela compreensão quanto a

minha ausência, e o incentivo a mais esta jornada...

As minhas pacientes que sempre torceram carinhosamente para que eu estudasse mais.

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1. INTRODUÇÃO

1.1 A Trajetória do Estudo

Como primeira formação, a psicologia me levou por caminhos de atendimento nas

comunidades carentes, norteando sempre o meu trabalho para uma realidade que fazia

prevalecer os aspectos sociais e perceber, assim, as necessidades de prevenção. Sendo

minha maior atenção voltada para a infância e a adolescência. Posteriormente, tendo me

especializado em Saúde Pública, aproximei-me ainda mais desta área a qual hoje me

proponho a estudar.

O que me despertou para a pesquisa foi a busca da compreensão de como são os

acontecimentos; como as pessoas adoecem; e como contribuímos para tal, e ao mesmo

tempo buscamos caminhos para minimizar os estragos causados pelo próprio ser

humano.

A saúde pública sempre me fascinou, e, após ter feito o Curso de Especialização pela

Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz – ENSP – em 1992,

passei a atuar quase que integralmente neste setor. Sempre me surpreendeu a forma

como as camadas sociais menos privilegiadas da população são capazes de criar

mecanismos de sobrevivência que muitas vezes fogem a nossa compreensão, apesar dos

descasos das autoridades públicas, o que as leva a manter um nível de miserabilidade e

doença elevado, colocando nosso país em destaque negativo e, assim nos fazendo

sempre ser reconhecidos como uma “inviabilidade” pelos países ditos “do primeiro

mundo”.

Construir um objeto de estudo para verificar este fenômeno também nos obriga a fugir

do senso comum, e a criar mecanismos de exploração que nos levem um pouco mais

próximo desta transformação. O que nos inspira a realizar este estudo é a vontade de

poder identificar os possíveis caminhos do adoecer de crianças e adolescentes que estão

buscando, assim como seus pais, avós etc... sobreviverem. E como o trabalho, que

garante esta sobrevivência, pode também trazer complicações para sua saúde, muitas

vezes crônicas e incapacitantes, não permitindo a estes indivíduos um futuro promissor,

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principalmente, quando interrompem a capacidade do exercício de suas atividades

laborais.

Tendo tomado conhecimento do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI -

, do governo federal e implantado em 1998, e sabendo através de amigos residentes na

região de Quissamã que o referido programa havia sido implantado naquele município,

elaborei um breve levantamento sobre o assunto. Um dado que me chamou a atenção foi

o fato de que as crianças e adolescentes contemplados pelo programa eram, em quase

toda sua totalidade, moradores da área rural, portanto, crianças que vinham

desenvolvendo suas atividades na agricultura, mais precisamente, na lavoura de cana-

de-açúcar. Senti-me muito atraída a desenvolver este trabalho, uma vez que me remetia

a minha própria infância e adolescência, pois nasci e fui criada no interior de São Paulo,

tendo como referência a vida no campo, muitas vezes como membro eventual de

equipes que trabalhava nas colheitas de lavouras nas safras de algodão, café, milho, bem

como em outras atividades agrícolas.

Naquela época, não tendo noção do agravo que o trabalho infantil poderia acarretar no

desenvolvimento de uma criança ou adolescente, via o mesmo como algo natural que

pudesse ser desenvolvido por qualquer pessoa, independentemente de idade ou estatura

física.

O que me recordo do trabalho na roça (que foi pouco, é verdade) não me vem nenhum

tipo de violência, ou qualquer revolta pelo pouco dinheiro que se ganhava. Acho que o

que fica oculto é o perigoso. Tudo é “mistério”, o que se usa na plantação para proteger

das pragas, o ser humano não se protege dos ferimentos, dos envenenamentos, dos

baixos salários, da necessidade de trabalhar mais do que “o corpo agüenta”, da pouca

comida, e do perigo de se deixar de sonhar.

A meu ver ocorriam três situações distintas, que hoje percebo claras, ou seja: o trabalho

como lazer; como responsabilidade; ou como tortura.

No entanto, desde a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente, ficou definido

no capítulo V, Art. 60 que: “É proibido qualquer trabalho a menores de catorze anos de

idade, salvo na condição de aprendiz”. Enquanto que ocorre uma certa discrepância

segundo os diferentes órgãos que definem estes limites de idade, posto que a

Organização Internacional do Trabalho - OIT – afirma ser quinze anos a idade mínima

para o trabalho, sendo que em relação ao Brasil, para a instituição esta idade estaria em

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torno de dezesseis anos; e já a Constituição Federal Brasileira de 1988, coloca como

sendo este limite de doze anos. Tantas divergências dificultam dados mais precisos com

relação ao número de trabalhadores infanto-juvenis, assim como o cumprimento das leis

de proteção destes trabalhadores.

Outras definições do que é o trabalho infanto-juvenil são: 1) a denominada restrita,

porque exclui as tarefas domesticas não remuneradas e os serviços voluntários na

comunidade; 2) aquela denominada ampliada, que estabelece o trabalho infantil como

toda e qualquer atividade realizada por uma criança, que não seja educativa, formativa,

ou lúdica, equivalendo-se esta a uma atividade econômica, e impedindo a adequada

freqüência à escola, a convivência da criança com seus pares, ou por qualquer maneira

constrangendo seu adequado desenvolvimento biopsicossocial e 3) o trabalho

adolescente, que seria aquele realizado por pessoas, de ambos os sexos, maiores de 15

anos e menores de 18 anos.

A imprensa tem registrado algumas infelizes constatações como a de crianças em

atividades laborais, praticamente sem exceções, afastadas da escola ou em situação de

freqüência irregular; além disso, a maioria delas sujeitam-se a condições laborais

danosas à saúde (insalubres, perigosas, penosas e moralmente prejudiciais), muitas

submetidas a risco permanente de acidentes, sendo consideráveis os casos de

mutilações, queimaduras e doenças graves contraídas.1

Conforme dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF - (1997)

estima-se que na América Latina uma em cada cinco crianças trabalha, e há indicações

de que esta projeção venha aumentando. A expansão deste quadro parece ter base na

crise econômica da década de 80, que atingiu duramente a América Latina, onde o

trabalho das crianças passou a ser considerado fundamental para a manutenção do

padrão econômico da família. Entre os fatores determinantes encontram-se as políticas

nacionais de contenção do déficit público, que levam no seu bojo o corte nos

investimentos sociais (saúde e educação), e a ausência de estratégias de

desenvolvimento social e de medidas que propiciem a melhoria na distribuição de

renda.

1 PGT Notícias: A exemplo da matéria que foi publicada no jornal Diário de Natal, no caderno Opinião do dia

21.10.2000 - http://www.pgt.mpt.gov.br/noticias/noticia17.html (25/01/2002) .

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Atualmente, vemos inúmeras crianças trabalhando no mundo “civilizado”, bem como,

crianças de comunidades indígenas, muitas delas, fazendo trabalhos superiores as suas

forças, o que não é visto em sua cultura como prejudicial a saúde e o desenvolvimento,

e que, para a maioria das pessoas no mundo inteiro, não se trata de assunto relevante.

Dessa forma, o meu engajamento neste projeto se deve a visão que tenho da importância

vital de haver trabalhos e estudos nesta área, focando a discussão para essa realidade,

que nos direciona para a busca do aperfeiçoamento das leis e conscientização de toda a

sociedade.

1.2. A Relação Saúde e Trabalho na Adolescência

Razões de ordem técnica e econômica propiciaram ampla utilização do trabalho infanto-

juvenil quando o processo de produção passou a se servir das máquinas a partir da

conhecida Revolução Industrial. O trabalho, até então, era realizado principalmente pelo

homem, por causa da necessidade da força bruta, o que a mulher e a criança não podiam

executar devido à sua “fraqueza natural”. A máquina deu amplo espaço para a utilização

de “meias forças”, da mão-de-obra da mulher adulta, de crianças e de adolescentes.

Em 1980 a OIT estimou que no mundo existiam em torno de 88 milhões de crianças

menores de 15 anos trabalhando, ou seja, 20% do total de crianças. De acordo com a

Organização das Nações Unidas – ONU –, 145 milhões de crianças eram

economicamente ativas em 1981. (OLIVEIRA, 1994).

Estudos, sobretudo os publicados pela OIT, revelaram que o trabalho infanto-juvenil

tem uma dimensão mundial, com uma distribuição desigual entre os países

desenvolvidos e os em desenvolvimento. De acordo com as últimas estatísticas, 250

milhões de crianças entre 5 e 14 anos de idade trabalham arduamente em atividades

econômicas nos países em desenvolvimento. Quase 50% destas crianças labutam em

regime de tempo integral, e as restantes dividem o tempo com atividades escolares e

outras atividades não econômicas (HUZAK e AZEVEDO, 2000).

A realidade brasileira é de crianças e jovens inseridos precocemente no trabalho, em

prejuízo do seu desenvolvimento físico, psicossocial e moral. Há um número

significativo de crianças trabalhando nas piores condições, por exemplo: na região do

sisal, na cultura de cana-de-açúcar, na citricultura, nas carvoarias e nas ruas.

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Assim sendo, o trabalho infantil e outras formas de exploração laboral merecem atenção

especial dos governantes e da população, como forma de promover a erradicação em

todos os países, bem como, a paralisação imediata das piores formas de trabalho das

crianças e adolescentes.

1.3 Justificativa

Este estudo visa pesquisar os efeitos sobre a saúde em um determinado grupo de

crianças e adolescentes, expostos ao agrotóxico, buscando identificar os potenciais

riscos à saúde e ao desenvolvimento biopsicossocial que acrescidas às cargas físicas,

emocionais e sociais que o trabalho acarretam, uma vez que as crianças e adolescentes

são mais vulneráveis aos riscos que estes transtornos acarretam à saúde, em ambientes

de trabalho insalubres, e desenvolvendo várias afecções que apresentam nexo causal

com o ambiente em que trabalham ou com as atividades que exercem. Entre os fatores

que concorrem para uma maior suscetibilidade para a ocorrência de efeitos adversos à

saúde, estão a imaturidade do sistema imune, e da capacidade enzimática de

metabolização das substâncias químicas e o aporte nutricional insuficiente associado ao

gasto calórico aumentado pela atividade laborativa (ASMUS, 2001).

Outra conseqüência perversa do trabalho infantil sobre a saúde é o acidente do trabalho,

o que se constitui na principal causa de morbi-mortalidade entre trabalhadores jovens,

assim como a exposição a produtos tóxicos sem que se tome conhecimento dos riscos a

que estão expostos, apresentando assim um grave problema de Saúde Pública.

Portanto, um estudo neste sentido se justifica, pois muito poderá contribuir para uma

maior compreensão das dimensões do problema, possibilitando ações mais adequadas,

tanto corretivas como preventivas.

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2. O TRABALHO INFANTO – JUVENIL

2.1 O Quadro Mundial

A utilização de crianças e adolescentes nas atividades laborais é bastante antiga. Têm-se

relatos de que desde a Idade Média as crianças já ajudavam seus pais em serviços nas

propriedades agrícolas, não possuindo este tipo de atividade, porém, um caráter rígido e

árduo.

Analisando os registros históricos, mais precisamente os bíblicos, encontramos muitas

passagens que relatam o trabalho de crianças cuidando de rebanhos; ajudando seus pais

em trabalhos de carpintaria; e, como o próprio evangelho noticia, a contribuição

decisiva para a formação do menino Jesus na convivência com seu pai José, da

linhagem de Davi, o qual lhe transmitiu conhecimentos acerca do ofício que abraçara.

“José amou a Jesus como um pai ama a seu filho, tratou dele, dando-lhe o melhor que

possuía, José, cuidando daquele Menino, como lhe havia sido ordenado, fez de Jesus um

artesão: transmitiu-lhe seu ofício” (Mons. Escrivá).

HUBERMAN (1986), tecendo considerações sobre o trabalho infantil antes da

Revolução Industrial, cita que: “as crianças trabalhavam em casa, sob a direção de seus

pais, com horários e condições por estes determinados. Naquele período, o trabalho era

visto como um meio de desenvolver habilidades onde o homem, ao mesmo tempo em

que exercia suas funções, também se divertia”.

Mesmo naquela época, não tendo noção do agravo que o trabalho infantil poderia

acarretar no desenvolvimento de uma criança ou adolescente, o mesmo era visto como

algo natural, que pudesse ser desenvolvido por qualquer pessoa independente de idade

ou estrutura física. Com a Revolução Industrial, a utilização da mão-de-obra infantil

intensificou-se em virtude do aumento da necessidade de produção em larga escala,

conjuntamente com o objetivo de se cobrir o mais rapidamente possível o investimento

efetuado com a compra de máquinas. Assim se justificava o uso do trabalho das

crianças pobres dos orfanatos, e mais tarde, como os salários dos pais e das mães

operários não eram suficientes para manter a família, também os filhos foram obrigados

a trabalhar nas fábricas. Nesse caso, as condições de trabalho a que os menores ficavam

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expostos eram extremamente penosas, chegavam ao absurdo de mais de 14 horas

seguidas nas fábricas. Além de tudo as crianças trabalhavam sob a direção de um

supervisor, cujo emprego dependia da produção que pudesse arrancar de seus pequenos

corpos, com horários e condições estabelecidos pelo dono da fábrica ansioso por lucros

(HUBERMAN, 1986).

Segundo TEIXEIRA (1996), a idéia de proteção integral à criança não é recente, já

havia sido adotada na maioria dos documentos internacionais relativos à infância e a

juventude, como, por exemplo, a Declaração de Genebra de 1924; a Declaração dos

Direitos da Criança de 1959; e, principalmente, a Convenção Internacional sobre os

Direitos da Criança datada de 1989, onde foi editada e ratificada pela quase totalidade

dos membros da ONU, excetuando-se apenas Somália e os Estados Unidos da América.

Também neste documento consta a exigência de uma idade mínima para o início da

atividade laboral. Por outro lado, se analisarmos as literaturas que tratam da história da

humanidade, constata-se que as ações efetivas em relação à proteção à criança são bem

recentes, tal idéia só obteve atenção a partir do século XX, d.C.

Em 1800, início do século XIX, as crianças eram tratadas como adultos pequenos, com

direitos inferiores, eram mãos-de-obra baratas, abundantes e descartáveis. Em 1959,

com a declaração dos direitos da criança, este quadro começou a mudar. Um dos

direitos mais importantes desta declaração é o direito a uma infância feliz – entende-se o

termo “infância feliz” como sendo o direito que toda criança tem a usufruir os

benefícios considerados justos e adequados ao seu pleno desenvolvimento. Esta infância

feliz é de alto interesse social, pois, segundo MELLO (2003), está provado que uma

criança que sofreu maus-tratos durante a formação de sua personalidade será, com

grande probabilidade, um adulto violento.

No âmbito da OIT, foram editadas as Convenções 138, sobre a idade mínima para a

admissão ao emprego e 182 sobre as piores formas de trabalho infantil. A primeira

estabelece a idade mínima de 15 anos para o trabalho, e a segunda reconhece a

existência de formas de trabalho infantil que devem ser combatidas prioritariamente.

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2.2 O Quadro Brasileiro

Durante muito tempo, o trabalho infantil no Brasil tem sido tratado como conseqüência

da pobreza, como solução para amenizar seus efeitos. A sociedade aceitava que o ideal

para as crianças e adolescentes das camadas sociais menos favorecidas seria aprender

uma profissão o quanto antes, de modo a contribuir para a renda familiar e evitar a

possibilidade de ingresso na marginalidade. E ainda hoje, se observa que boa parte da

população ainda continua com este pensamento.

Uma visão descrita no início da década de 1970 foi que:

No Brasil, a força de trabalho infantil vem sendo utilizada no campo e na cidade desde

longa data. Nos primórdios da industrialização, da mesma forma que durante o período

da Revolução Industrial na Inglaterra, as condições de trabalho das crianças na indústria

brasileira eram duríssimas: muitas estruturas que abrigavam não haviam sido

originalmente destinadas a essa finalidade. Além de pouca iluminação e ventilação, não

dispunham de instalações sanitárias. As máquinas se amontoavam ao lado uma das

outras e suas correias e engrenagens giravam sem proteção alguma. Os acidentes se

amiudavam porque os trabalhadores cansados, trabalhando, muitas vezes, além do

horário, sem aumento de salário e trabalho aos domingos, eram multados por indolência

ou erros cometidos se fossem adultos, ou surrados, se fossem crianças. Em 1917, uma

pessoa que visitou uma fábrica na Mooca, na capital [São Paulo], ouviu operários de

doze e treze anos de idade, da turma da noite, que se queixavam de serem

freqüentemente espancados e mostraram, como prova do que diziam, as equimoses e

ferimentos que traziam. Incluindo citações de fotografias tiradas ocasionalmente nos

revezamentos de turmas em fábricas, onde as descrições de crianças descalças, mal

vestidas, raquíticas e com rostos inexpressivos, demonstrando assim toda a fadiga e

desolação causada por trabalhos desgastantes por longas horas além da capacidade

suportável (DEAN, 1971).

Na zona rural, a participação de crianças no processo produtivo agrícola não constitui

um fato novo nem no Brasil nem no mundo. Estudiosos dos Estados Unidos afirmam

que no setor agrícola a participação de menores ocorre principalmente em atividades de

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colheita e semeadura, dando conta de que oitocentas mil crianças engajam-se

anualmente em atividades agrícolas juntamente com suas famílias (GALASSO, l993).

No Brasil a participação de crianças como trabalhadoras autônomas nas atividades

agropecuárias, principalmente a partir dos anos 70, tomou uma dimensão tal, que não

pôde mais ser ignorada, chamando a atenção inclusive para o crescimento também do

trabalho infantil nas atividades urbanas e em processos produtivos penosos e perigosos,

como por exemplo: trabalhos em canaviais, pedreiras, carvão, etc. Chamando assim a

atenção de organizações não governamentais internacionais, que passaram a pressionar

a abertura da discussão sobre o problema, levando o Governo Federal a criar um

programa de combate a erradicação do trabalho infantil no país, através do Ministério da

Previdência e Assistência Social em 2002.

Segundo a OIT/BRASIL (2001) o trabalho infantil “tem sido tratado ora como

conseqüência da pobreza, ora como solução para amenizar seus efeitos. A sociedade

concordava ou aceitava que o ideal para crianças e adolescentes das camadas sociais

menos favorecidas seria aprender uma profissão o quanto antes, de modo a contribuir

para a renda familiar e evitar a possibilidade de ingresso na marginalidade. A política

educacional, até recentemente ainda muito voltada para manutenção e privilégios,

contribuía para esta situação, ajudando a reproduzir o ciclo de desigualdade social”.

A partir da década de 1980, com o surgimento de movimentos sociais em favor dos

direitos das crianças e dos adolescentes, o quadro brasileiro começa a mudar,

principalmente em função de:

1988 – Promulgação da Constituição Federal;

1989 – Adução da Convenção das Nações Unidas Sobre os Direitos da Criança;

1990 – Aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.

O governo federal, a partir de 1992, incluiu definitivamente o tema do combate ao

trabalho infantil na agenda nacional de políticas sociais e econômicas, tendo como

suporte técnico e financeiro o Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho

Infantil – IPEC –, a Organização Internacional do Trabalho – OIT – e o Programa do

Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF.

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Estes programas culminaram com a criação, em 1994, do Fórum Nacional de Prevenção

e Erradicação do Trabalho Infantil – FNPETI –; integrado por entidades governamentais

e não-governamentais.

Estudos continuaram mostrando que, ainda que a legislação brasileira proíba o trabalho

de crianças e adolescentes, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD –

do Instituto Brasileiro de Estatística – IBGE -, mostrou que a estimativa do número total

de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos de idade trabalhando no Brasil em 1998 era

cerca de 7,7 milhões e que este número vem diminuindo, pois em 1992 existiam 9,7

milhões de crianças e adolescentes exercendo algum tipo de atividade econômica.

Assim como estudos posteriores, do próprio PNAD, confirmavam a tendência positiva,

mas lenta, na redução do trabalho infantil, que baixou de 27% para 26% da população

de 10 a 17 anos no período. O PNAD evidenciou que o trabalho infanto-juvenil

concentra-se em atividades agrícolas e em famílias que atuam por conta própria, como

nos setores de comércio e serviços.

Segundo SCHWARTZMAN (2001), o problema apresenta-se tanto em estados pobres

quanto em áreas mais ricas do Brasil. Sendo comum que mais da metade das crianças

menores de 14 anos não receba pagamento pelos serviços os quais prestam, no entanto

esta situação começa a modificar-se a partir dos 17 anos, quando uma parcela de apenas

8% deste contingente passa a ser remunerada.

Ainda segundo SCHWARTZMAN, erradicar o trabalho infantil é hoje um dos

principais desafios no Brasil. Dadas às condições sociais que prevalecem, em boa parte

do país, esse não são um problema de fácil solução. Os ganhos dos menores que

trabalham quase sempre representam parte substancial da renda familiar já insuficiente,

e, se essas crianças e jovens deixarem de trabalhar, suas famílias não terão como mantê-

las e encaminha-las para a escola.

Além de se impor por questões humanitárias, sociais e legais, a erradicação do trabalho

infantil é importante do ponto de vista das negociações internacionais de comércio, pois

tem sido cada vez mais freqüente a utilização, por parte de representantes comerciais

dos países industrializados, o argumento do uso de mão-de-obra infantil como

justificativa para medidas contra a aquisição dos produtos exportados pelos países

emergentes.

21

Assim, como um novo esforço para reduzir o trabalho infantil no Brasil, o Ministério do

Trabalho e Emprego determinou, através da portaria nº 20, de 13 de Setembro de 2001,

e a convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho – OIT– por serem

consideradas perigosas, penosas, insalubres e degradantes, restringiu algumas atividades

que não poderão ser exercidas por menores, tais como:

Dirigir tratores e máquinas agrícolas;

Aplicar agrotóxicos;

Manejar objetos cortantes;

Colher cítricos;

Plantar, colher ou trabalhar no beneficiamento e na industrialização de açúcar e sisal; e

Trabalhar em manguezais e lamaçais ou em serviços que exijam mergulho, etc.

O quadro A.1 (Anexo I) descreve os locais e serviços considerados perigosos ou

insalubres para menores de 18 anos. Proposto na Portaria nº 20 de 13 de Setembro de

2001.

2.3 O Direito da Criança e do Adolescente

Os Programas de assistência social voltado para os grupos infanto-juvenis vêm

ocupando espaços significativos no país, através de uma política nacional dirigida

principalmente a programas desenvolvidos sob os auspícios do Estatuto da Criança e do

Adolescente − onde os maiores problemas estão concentrados nas famílias mais

carentes da população. “Assim, de uma visão vaga da política como um modo de acudir

os pobres através da ação assistencial, emergencial e benevolente do Estado ou da

filantropia, o conceito tende hoje a estar associado a um conjunto de ações públicas que

deve garantir o exercício dos direitos sociais básicos do cidadão: o direito a vida, a

saúde, a alimentação, a moradia e, especialmente para as crianças e adolescentes, o

direito ao desenvolvimento integral”, segundo o Programa de Erradicação do Trabalho

Infantil – PETI – sob a redação de Sônia Mirian Braibe.

Partindo do pressuposto que o trabalho infantil compromete as possibilidades de

desenvolvimento biopsicosocial da criança, as propostas do governo, para reverter este

22

quadro, incentivam programas que custeiam bolsas às famílias para que suas crianças

deixem o trabalho e, assim, busquem o reingresso e permanência nas escolas, assim

como também a criação de outras atividades que assegurem a alimentação, orientação

nos estudos, esporte e lazer. Dentre estes programas, se inclui o PETI.

O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI – tem como coordenação, no

âmbito nacional, a Secretaria de Estado de Assistência Social do Ministério da

Previdência e Assistência Social, por intermédio da gerência do PETI; no âmbito

Estadual, o PETI é coordenado pela Secretaria Estadual de Ação Social, e no Municipal,

ele é coordenado pela Secretaria Municipal de Ação Social, ou órgãos equivalentes.

O PETI é um instrumento de ação política, envolvendo governos, empregadores,

sindicatos, associações e outras organizações da sociedade civil, pela qual seus

signatários assumem publicamente o compromisso de intervir na prevenção e na

erradicação do trabalho infantil de forma articulada como uma forma de pacto de todos

estes segmentos.

Apesar do programa visar à retirada das crianças e dos adolescentes do trabalho

perigoso, penoso, insalubre e degradante, o alvo de atenção é a família, que deve ser

trabalhada por meio de ações sócio educativas e de geração de trabalho e renda que

contribuam para o seu processo de emancipação; para sua promoção e inclusão social,

tornando-as protagonistas de seu próprio desenvolvimento social.

O Manual de Orientação de Erradicação do Trabalho Infantil, relativo ao PETI, reforça

que a família é um núcleo natural e fundamental da sociedade, sendo, portanto, o lugar

por excelência de proteção e inclusão social. Assim destaca, como perspectiva, os

serviços e as ações assistenciais como forma de fortalecimento dos laços familiares,

levando estas famílias a perceberem-se como sujeitos participativos e com direitos aos

bens e serviços produzidos pela comunidade.

Entretanto, a eficácia do PETI fica comprometida, pois, após terem sido retiradas as

crianças entre 07 e 13 anos de idade do trabalho, ao completarem 14 anos, elas

necessitam retornar aos mesmos trabalhos, pois são desvinculados do programa e,

devido às realidades sociais e econômicas dos pais, que se encontram, na grande

maioria das vezes, nas mesmas condições anteriores, não refletindo nenhum

crescimento substancial às suas famílias que permitisse mudar suas realidades. O

programa perde assim, muito de seus objetivos gerais e específicos.

23

Outro fator dificultante é o não cumprimento por parte do Governo em manter em dia os

pagamentos, fato este que “empurra” de volta para o trabalho crianças e adolescentes

em busca de subsistência básica, a qual é a de sobrevivência própria de seus familiares.

2.4. O Adolescente e Suas Transformações

O processo de desenvolvimento no adolescente tem como ponto principal o desabrochar

para uma nova vida, cheia de transformações. Sob esta ótica, não há problemas

determinados, “tudo pode ser problema”. Existem dimensões distintas a serem

fortalecidas enquanto o adolescente se encaminha para a vida adulta, que são; segundo

Maria Izabel de Oliveira Tongu:

a física, onde transformações acontecem sem que o indivíduo possa controlar;

a sensível, é a sua capacidade de sentir, ver, ouvir e reagir aos estímulos do mundo; e

a psíquica, quando principalmente sua capacidade de escolher o que lhe faz bem, de

pensar e buscar sua individualidade.

Falar da adolescência é falar de transformações, de mudanças, onde se entrevêem

grandes possibilidades, e onde se constatam enormes limitações. Portanto, não dá para

generalizar ou explicar a adolescência, e sim, ter a consciência de que existem

adolescentes cuja vida sempre tem alguma novidade imprevisível.

Para se interpretar, ou mesmo se explicar esta fase de transformações, temos que

entender o tripé que a natureza manifesta de uma maneira combinada: a biológica, a

psicológica e a cultural, que trazem ingredientes que fazem ter mobilidade e dinamismo,

que resulta na capacidade de pensar e gerar consciência. Preparando-se assim, para

viver as fases negativas, como: o desassossego, incerteza, excitabilidade, estranheza nos

movimentos, críticas do mundo em torno; assim como as fases positivas, que são:

afirmação do mundo e da vida, visão esperançosa do futuro e entusiasmo em busca

deste futuro.

Quando estas manifestações ocorrem de forma incontrolável, é a própria natureza se

manifestando. Não há como vivenciá-las de forma especial; há que se dar lugar a

responsabilidade de ter uma família dependendo do seu trabalho, da sua capacidade de

24

prover; e o menino, jovem e esperançoso, dá lugar a um ser fisicamente mal tratado pelo

esforço do trabalho, e desiludido por não poder “ousar” sonhar.

Os fatores de vulnerabilidade nesta idade constituem possíveis causas de danos, devido

aos efeitos de como se preparar para a vida; como cumprir com o dever da formação; ou

ainda, como cumprir o direito de ser cidadão.

2.5 O Adolescente e o Trabalho

Trabalho é um termo de difícil conceituação. Vários estudiosos buscaram uma

etimologia para a palavra, buscando sua conceituação. Porém a sua denominação

sociológica tem em sua tradição valores, ora depreciativos, ora penosos.

Através dos tempos o vocábulo veio sempre significando fadiga, esforço, sofrimento,

cuidado, encargo, portanto valores negativos, dos quais se afastavam os mais

afortunados; assim, MORAES FILHO (1956) diz que: “o trabalho pode ser visto de

vários ângulos, entre outros, o sociológico, o jurídico, o político, o econômico, o

filosófico. Porém, em geral, se dá mais ênfase ao trabalho sob o aspecto econômico,

como instrumento de produção, de bens e serviços. Em cada contexto histórico do

processo de produção, o trabalho assume características bem diferenciadas”.

OLIVEIRA (1994) traz uma luz sobre a historia do trabalho infanto-juvenil no Brasil e

no mundo, citando as dificuldades em se transitar leis nos parlamentos europeus que

visavam proteger o trabalho infanto-juvenil, datando de 1802 a primeira lei (Act for

Preservation of Health and Moral Apprentices Employed in Cotton and Others Mills)

assim como em 1867, dezessete leis inglesas foram editadas para proteção do trabalho

das crianças de 8 a 13 anos e dos jovens de 13 a 18 anos.

Porém, profissionais que deveriam apoiar estas leis, em nome de seus conhecimentos,

defenderam que crianças deveriam o mais cedo possível ser encaminhadas às minas.

Como o médico HANNOT, que dava um enfoque ideológico, reconhecendo que era

uma questão de “destin”, assim se expressou; segundo relato feito por Oliveira em

publicação da OIT (O Trabalho da Criança e do Adolescente).

“Eu vou mais longe e digo que é cruelmente útil fazer descer o quanto antes uma

criança que é destinada à profissão de mineiro porque, repito-o, a gente se acostuma

25

a tudo e é desde jovem, como aprovei, que se deve empenhar para aí chegar. Essa

criança se habituará a se alimentar de ar pobre de oxigênio; as posições incômodas,

que se é forçado a manter neste gênero de trabalho, tornar-se-lhe-ão familiares; ela

baseará cedo sua alimentação sobre sua respiração, cuja soma de atividade de

função será baseada sobre ela; sem peito não atingirá uma amplidão inútil e

perigosa para ela. Com efeito, eu fiz notar que os homens de tórax largo e

desenvolvido tornar-se-ão mais cedo asmáticos do que aqueles que o tem longo e

estreito. Estabelecer-se a um equilíbrio orgânico entre o meio no qual é chamado a

viver e a constituição física que lhe convier. Enfim, sua natureza será modelada por

seu gênero de vida, e ele adquirirá direito de douticelio nestas sombrias moradas

que, igual solo africano (para esta região ártica transplantado), mataria aqueles que

quisessem vir habitá-lo depois de certa idade (Neville, La condizion ouvrière ou XIX

emesiècle)”.

Os juristas se apossam de armas em seus arsenais intelectuais, para impedir que uma

legislação nova subverta várias liberdades; portanto em nome da ciência e da justiça

poderiam manifestar suas comiserações pelos pais que necessitavam do trabalho dos

filhos: as simpatias pelos entes sofredores e infelizes, e desejo de ir prontamente em seu

socorro com medidas enérgicas não podem fazer esquecer nem as liberdades do

comércio e da indústria, nem o respeito pela autoridade paterna, nem o respeito da

infelicidade própria; quem ousaria tirar de um pai ou de uma mãe sobrecarregados com

uma família numerosa, os socorros que podem receber de seus filhos? (BRAUN &

VALENTIN, 1989).

Muitas vezes o ser humano em nome de uma ideologia não se da conta da crueldade de

seus atos, e como bem temos visto na imprensa, ainda hoje encontramos trabalho

escravo; transgressão da lei onde são verificadas inúmeras crianças e adolescentes

trabalhando, o que deixa claro que o trabalho infantil está em expansão e não em

regressão como vimos através de percentuais oficiais de estudos que deixam fora várias

categorias de trabalhadores infanto-juvenis, tais como: trabalhador familiar não

remunerado, empregados domésticos, trabalhadores informais, serviços voluntários,

vendedores ambulantes.

26

Isto devido a dois fatores incontestáveis: explosão econômica e crise econômica,

somada a incapacidade crescente dos sistemas educacionais de incorporar todas essas

crianças e adolescentes em idade escolar e de lhes dispensar um ensino de qualidade,

primeiro pela inoperância do sistema; segundo pela condição físico-social destas

crianças, que em sua grande maioria carregam seqüelas de uma existência carente de

cuidados, nutrição, atenção a sua saúde e desenvolvimento.

2.6. Os efeitos dos agrotóxicos na saúde da criança e do adolescente

O uso de substâncias químicas, orgânicas ou inorgânicas, em agricultura, remonta a

antiguidade clássica. Escritos Romanos e Gregos mencionavam o uso de certos

produtos, como o Arsênico e o Enxofre, para controle de insetos nos primórdios da

agricultura. A partir do século XVI, até fins do século XIX, o emprego de substâncias

orgânicas como a Nicotina e Piretros extraídos de plantas eram constantemente

utilizados na Europa e EUA também com aquela finalidade (OMS-GENEBRA

1992.p.15)

A partir do início do século XX iniciaram-se os estudos sistemáticos buscando o

emprego de substâncias inorgânicas para a proteção de plantas, deste modo, produtos à

base de Cobre, Chumbo, Mercúrio, Cádmio, etc., foram desenvolvidos comercialmente

e empregados contra uma grande variedade de pragas, porém com limitada eficácia.

Todavia, a partir da Segunda Guerra Mundial, com a descoberta do extraordinário poder

inseticida do Organoclorado DDT e, Organofosforado SHARADAM, inicialmente

utilizado como arma de guerra, deu-se início à grande disseminação dessas substâncias

na agricultura.

Basicamente podemos classificar os efeitos dos agrotóxicos em agudos e crônicos,

sendo estes últimos ainda pouco pesquisados, embora devastadores para o organismo.

Há pelo menos 50 agrotóxicos que são potencialmente carcinogênicos para o ser

humano. Outros efeitos são de neurotoxidade retardada, lesões no Sistema Nervoso

Central, redução da fertilidade, reações alérgicas, formação de catarata, evidências de

mutagenicidade, lesões no fígado, efeitos teratogênicos entre outros, compõe o quadro

de morbimortalidade dos expostos aos agrotóxicos.

27

As principais lesões apresentadas, pelos expostos a ação direta ou indireta dos

agrotóxicos, geralmente utilizados na agricultura irrigada, segundo o médico Dr. Flávio

Zambrone, do Centro de Intoxicação da UNICAMP, estão relacionadas no Quadro I

(GARCIA, 1991).

28

QUADRO 1 – Ações ou lesões causadas pelos agrotóxicos ao homem

AÇÕES OU LESÕES CAUSADAS PELOS

AGROTOXICOS AO HOMEM TIPO DE AGROTÓXICO UTILIZADO

Lesões hepáticas Inseticidas organoclorado

Lesões renais

Inseticidas organoclorado

Fungicidas fenil-mercúricos

Fungicidas metoxil-etil-mercúrios

Neurite periférica Inseticidas organofosforados

Herbicidas clorofenóxis ( 2,4-D e 2,4,5-T)

Atrofia testicular Fungicidas tridemorfo (Calixim)

Esterilidade masculina por oligospermia Nematicida diclorobromopropano

Cistite hemorrágica Acaricida clordimeforme

Hiperglicemia ou diabetes transitória Herbicidas clorofenóxis

Hipertemia Herbicidas dinitrofenóis e pentaclorofenol

Pneumonia e fibrose pulmonar Herbicida paraquat (Gramoxone)

Diminuição das defesas orgânicas pela diminuição

dos linfócitos imunologicamente competentes

(produtores de anticorpos)

Fungicidas trifenil-estânicos

Reações de hipersensibilidade (urticárias, alergia,

asma) Inseticidas piretróides

Teratogênese Fungicidas mercuriais

Dioxina presente no herbicida 2,4,5-T

Mutagênese

Herbicida dinitro-orto-cresol

Herbicida trifluralina

Inseticida organoclorado

Inseticida organofosforado

Carcinogênese Diversos inseticidas, acaricidas, fungicidas,

herbicidas e reguladores de crescimento

Fonte: Garcia (1991)

29

A exposição continuada por período longo, em níveis relativamente baixos de

agrotóxicos, pode afetar a saúde humana, levando a casos crônicos, mal definidos, às

vezes extremamente graves , segundo Luna , Sales e Silva . (“Agrotóxicos:

Responsabilidade de todos”).

Casos de intoxicação por agrotóxicos são freqüentemente observados e relatados pelos

trabalhadores que não são capazes de entender as recomendações contidas nos rótulos

dos produtos, e que não utilizam o receituário agronômico como orientação técnica,

acarretando problemas de intoxicações agudas. Os problemas mais sérios estão nos

métodos de aplicação, na freqüência e quantidade utilizadas, geralmente maior que o

recomendado. O uso desordenado e excessivo desses produtos acarreta também impacto

econômico negativo aos agricultores, com nítidas repercussões sociais mais sérias

A ação neurotóxica retardada provocada pelos inseticidas do grupo dos organofosforado

foi comprovada recentemente em trabalho realizado no município de Vitória de Santo

Antão – PE, pelas fonoaudiólogas (TEIXEIRA e BRANDÃO, 1996), onde, dos 98

aplicadores de agrotóxicos pesquisados, 56 apresentaram perda auditiva e 42 foram

classificados dentro do padrão de normalidade , ainda segundo texto referido acima..

É importante ressaltar que, embora com riscos diretos e indiretos para os agricultores,

formuladores ou comerciantes, os agrotóxicos também estão presentes no nosso dia a

dia, através dos resíduos nos alimentos bem como nas formas domésticas de se conter

insetos, muitas vezes ignorando os riscos a que estão expostos seus familiares.

30

Avião em atividade a menos de 50 metros das residências de Machadinha – Foto tirada

durante o período de estudo.

3. IMPACTOS NO MEIO AMBIENTE

O maior e mais nocivo efeito do agrotóxico parece ser a falta de informação sobre seus

danos ao meio ambiente e o desrespeito às normas básicas de segurança no que se refere

ao seu manuseio e os excessos no ato de sua aplicação. Desenvolvidos para terem ação

biocida, são potencialmente danosos para todos os organismos vivos. Todavia, sua

toxidade e comportamento no ambiente varia muito. Esses efeitos podem ser crônicos

quando interferem na expectativa de vida, crescimento, fisiologia, comportamento e

reprodução dos organismos, e/ou ecológicos, quando interferem na disponibilidade de

alimentos, de habitantes e na biodiversidade, incluindo os efeitos sobre os inimigos

naturais das pragas e a resistência induzida aos próprios agrotóxicos. Sabe-se que há

interferência dos agrotóxicos sobre a dinâmica dos ecossistemas, como nos processos de

quebra da matéria orgânica e de respiração do solo, ciclo de nutrientes e eutrofização de

águas. Pouco se conhece, entretanto, sobre o comportamento final e os processos de

31

degradação desses produtos no meio ambiente. Os dados de contaminação ambientais

que mais parecem preocupar a opinião pública, nos países desenvolvidos, são as

contaminações do ar, do solo e, principalmente, das águas – Centro de Controle de

Intoxicações (UNICAMP,1991).

Há evidências de que algumas substâncias são transportadas a grandes distâncias pela

volatilização, retornando junto com a precipitação, contaminando áreas não tratadas,

tendo sido detectadas até em solos urbanos A maior parte dos agrotóxicos utilizados

acaba atingindo o solo e as águas principalmente pela deriva na aplicação, controle de

ervas daninhas, lavagem das folhas tratadas, lixiviação, erosão, aplicação direta em

águas para controles de vetores de doenças, resíduos de embalagens vazias, lavagens de

equipamentos de aplicação e efluentes de industrias de agrotóxicos.

A Constituição Federal em seu art. 24, inciso VI, atribui competência à União, aos

Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: florestas, caça, pesca,

fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do

meio ambiente e controle da poluição.

Segundo dados do Internacional Programme on Chemical Safety (IPCS) da Organização

Mundial da Saúde e do National Toxicology Program do National Institute of

Environmental Health Sciences (NTP/NIEHS), dos Estados Unidos, existem atualmente

mais de 750.000 substâncias químicas conhecidas. Aproximadamente 85.000 são

utilizadas quotidianamente e comercialmente, sendo que os possíveis efeitos e riscos,

para o homem e ambiente, são conhecidos somente para cerca de 7.000 destas

substâncias. Estima-se ainda, que com o grande desenvolvimento tecnológico alcançado

pela indústria química, nos últimos anos, cerca de 1.000 e 2.000 novos agentes químicos

são disponibilizados, anualmente, para os mercados: produtor e consumidor, sendo que

somente 1 a 2 % desses novos produtos têm a sua avaliação toxicológica realizada pelo

NTP, no período de um ano. (LUCIER & SCHECTEr,1998; PORTO &

FREITAS,1997).

A falta de informações e dados toxicológicos sobre as novas substâncias químicas,

devido ao ritmo acelerado de produção da industria química, levou o United Nations

Environment Programme (UNEP), através do International Registry of Potentially

Toxic Chemicals ( IRPTC), a estabelecer um registro internacional dos produtos

químicos, incluindo a avaliação de seus efeitos e toxicidade, juntamente com o IPCS.

32

Apesar da relação entre poluição ambiental e seus efeitos tóxicos à saúde humana e

ambiental ser conhecida há muitos séculos, o estabelecimento da relação de causa e

efeito entre a exposição aos diversos poluentes e a respectiva resposta do meio ambiente

e da saúde do homem somente pode ser concretizado através dos fundamentos

científicos da Toxicologia e Epidemiologia.

O homem custou a tomar consciência da íntima relação homem-ambiente-saúde, apesar

de Hipócrates, 300 anos a.C., já ter sinalizado sobre os efeitos da poluição ambiental na

saúde de uma população no seu livro Ares, Águas e Lugares. Somente em 1972, a partir

de 1ª Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, na Suécia, é que o homem passou a

se preocupar com a necessidade de preservar o meio ambiente. Em 1987, foi publicado

o Relatório Brundtland que apresentava uma nova abordagem integrada entre meio

ambiente e desenvolvimento econômico, também conhecido como crescimento

sustentável. A integração das questões de saúde e desenvolvimento social e econômico

com as questões ambientais foi referendada na 2ª Conferência Mundial sobre o Meio

Ambiente, realizada no Rio de Janeiro, em 1992.

Os poluentes ambientais, uma vez lançados ou introduzidos no meio ambiente

percorrem diferentes caminhos e rotas, a partir de sua fonte geradora, até alcançarem os

seus destinos finais, no ar, nas águas ou no solo. Este processo de difusão no ambiente e

o nível de concentração dessas substâncias, em cada ponto de percurso, dependerá da

taxa de emissão, das características de dispersão e da taxa de remoção através da

interação com agentes físicos, químicos e biológicos.

A bioacumulação pode ser definida como o processo pelo qual os organismos vivos

retêm as substâncias químicas nos seus tecidos em níveis maiores do que aquele

encontrado no meio ambiente, a partir de diferentes formas como, por exemplo, a água,

o solo e os alimentos. A bioconcentração, considerada como sinônimo de

bioacumulação, se refere ao acúmulo dos agentes químicos dissolvidos nos tecidos de

animais cujo habitat natural seja mares, rios, lagoas, como os peixes, por exemplo.

O conceito de que a toxicidade de uma substância química depende de sua respectiva

dose, conhecida como dose-resposta, tem sido melhor compreendido com o

conhecimento da toxicocinética. A toxicidade de um produto químico tem sido

determinada em função de sua concentração no seu específico sítio de ação, ou seja, no

órgão alvo. Embora esta concentração seja proporcional à sua dose, podemos observar

33

concentrações finais distintas entre compostos também diferentes, administrados na

mesma dose, em função das propriedades toxicocinéticas especificas de cada um deles.

Para a compreensão da toxicocinética, devemos entender os organismos como um

conjunto de compartimentos conectados entre si através do sistema circulatório, isto é,

dos vasos sanguíneos e linfáticos, de tal forma que as modificações ocorridas na

concentração das substâncias tóxicas absorvidas, em um período do tempo, permitam

inferir as variações correspondentes nos diferentes tecidos e órgãos, assim como na

biotransformação e eliminação dessas substâncias.

O uso indiscriminado de agrotóxicos continua matando pessoas e animais, destruindo

plantas e solo e comprovando o total descaso com as leis que regulamentam a questão.

Segundo o Documento da organização não-governamental (ONG) World Wildlife Fund

– WWF – Relatório Planeta Vivo (2002): “uma analise de saúde ambiental do planeta –

aponta para uma diminuição preocupante de espécies animais, geralmente causadas por

deformidades provocadas por pesticidas e outros poluentes. O uso de fertilizantes, no

mundo, quintuplicou nos últimos 30 anos. No Brasil, segundo dados do Ministério da

Agricultura, foram comercializados U$$ 1,6 milhão em agrotóxicos. A cifra saltou para

U$$ 2,5 milhões no ano passado”.

A notificação e investigação das intoxicações por agrotóxicos no Brasil são precárias.

Na maioria dos Estados, as notificações não são objeto dos sistemas de vigilância

epidemiológica e sanitária. A ausência de equipamentos de saúde pública e a

precariedade do sistema de atendimento ambulatorial contribuem para o sub registro

dessas intoxicações. Nos casos registrados, segundo o Ministério da Saúde, a faixa

etária entre 20 e 49 anos concentra mais de 50 % dos registros de intoxicação por

pesticidas agropecuários.

3.1 Legislação

A legislação que trata da questão dos agrotóxicos abrange, entre outros, os seguintes

instrumentos legais:

34

3.2 Legislação Federal

A Lei nº 6.894, de 16 de Dezembro de 1980 –Dispõe sobre a inspeção e fiscalização da

produção de fertilizantes, corretivos, inoculantes, estimulantes ou biofertilizantes,

destinados à agricultura, e dá outras providências.

A Lei nº 7.802, de 11 de Julho de 1989, regulamentada pelo Decreto nº 98.816, de 11 de

Janeiro de 1990 – Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem

e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda

comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e

embalagem, o registro, classificação, o controle a inspeção e a fiscalização dos

agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências.

A Lei nº 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998 – Dispõe sobre Crimes Ambientais.

A Portaria do Ministério do Trabalho nº 3.067, de 12 de Abril de 1988. Previa no Artº

13, da Lei nº 5. 889, de 05 de Junho de 1973. Normas Regulamentadoras Rurais –

Relativas à Segurança e Saúde dos Trabalhadores.

A Portaria nº 168, de 15 de Maio de 1997 da Secretaria de Vigilância Sanitária que

institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Programa de Vigilância Sanitária dos

Ambientes e das populações expostas a Agrotóxicos, com o objetivo de estabelecer o

controle do processo saúde-doenças relacionadas com a exposição aos agrotóxicos.

3.3 Legislação do Estado do Rio de Janeiro

A Lei nº 10.692, de 27 de Dezembro de 1991, regulamentada pelo Decreto nº 15.839, de

15 de Junho de 1992. – Dispõe sobre inspeção e fiscalização dos agrotóxicos,

corretivos, fertilizantes, inoculantes, estimulantes e biofertilizantes.

A convivência com os agrotóxicos e a falta de informação da população, tem gerado um

quadro dramático de intoxicações agudas, além de não existirem informações acerca da

morbidade resultante do uso desses produtos.

35

4. A NEUROPSICOLOGIA E OS EFEITOS ADVERSOS A SAÚDE

Não há uma resposta única e simples para o enigma cérebro/mente, mais muitas

respostas ligadas aos inúmeros componentes do sistema nervoso nos seus diversos

níveis de estrutura. A falta de respostas definitivas sobre as questões do cérebro e da

mente não constitui motivo de desespero e não deve ser vista como um sinal de fracasso

nos campos científicos que se encontram atualmente empenhados em saber com certeza

como é que o cérebro cria a mente: as constatações extraídas do livro: O Erro de

Descartes, DAMÁSIO (1994 ) coloca a impossibilidade de termos certezas quanto ao

funcionamento do cérebro, pois raciocinar e decidir pode revelar-se uma tarefa árdua,

especialmente quando estão em causa nossa vida pessoal e seu contexto social e

imediato.

Quando buscamos na Neuropsicologia respostas que não encontramos na

Neurofisiologia, estamos avançando para a busca da compreensão do raciocinar e

decidir num espaço pessoal e social, com a ajuda da emoção. Estamos falando da

memória, do raciocínio e da criatividade, cujo controle é inato, e quando perdemos essa

capacidade por algum motivo, nossa existência fica limitada.

4.1 A Atenção

Um dos fatores preocupantes com relação ao nosso estudo é a atenção e a memória,

fatores estes que ficam comprometidos quando submetidos a processos de intoxicação

aguda ou crônica com maior ou menor intensidade após exposição aos agrotóxicos.

O homem recebe um imenso número de estímulos, porém, entre eles seleciona os mais

importantes e ignora os restantes. A seleção destas informações necessárias, garantem a

segurança dos programas seletivos de ação e a manutenção de um controle permanente

sobre elas, convencionalmente chamados de atenção.

O caráter seletivo da atividade consciente, que é função da atenção, manifesta-se

igualmente na nossa percepção, nos processos motores e no pensamento. Quando não há

36

essa seletividade, a quantidade de informação seria tão desorganizada e grande que

nenhuma atividade se tornaria possível.

Pelo menos dois grupos de fatores asseguram o caráter seletivo dos processos psíquicos,

determinando tanto a orientação como o volume e a estabilidade da atividade

consciente:

O primeiro grupo caracterizará a estrutura dos estímulos externos (ou a estrutura do

campo exterior);

O segundo grupo diz respeito a fatores referentes a atividades do próprio sujeito, ou

seja, estrutura do campo interno:

O primeiro fator é a intensidade (força) e estimulo (grandeza, coloração, etc.);

O segundo fator determina o sentido da atenção, que é a novidade do estímulo ou

diferença entre este e os outros estímulos (incomum, novo). As duas referidas condições

determinam o sentido da atenção (LURIA, 1979).

A organização estrutural da atividade humana é de importância essencial para a

compreensão dos fatores que dirige a atenção do homem.

A psicologia distingue dois tipos básicos de atenção: o arbitrário e o involuntário.

A atenção arbitraria só é inerente ao homem. O principal fato indicador da existência de

um tipo especial da atenção no homem, consiste em que este pode concentrar

arbitrariamente a atenção ora em um, ora em outro objeto, inclusive nos casos em que

nada muda na situação que o cerca (LURIA, l979).

A atenção involuntária é aquela em que é atraída por um estimulo forte, quer por

um estimulo novo ou por um interessante (correspondente à necessidade). Os

mecanismos de atenção involuntária são comuns no homem e no animal. (LURIA,

l979).

O homem pode ir além do limite das leis naturais da percepção, sem se sujeitar

ao efeito de um fundo homogêneo, ou fortes estruturas perceptivas mais discriminadas,

mudando segundo sua vontade as estruturas que lhe são necessárias.

Esses mesmos fenômenos da atenção arbitrária podem ser observados na atividade

intelectual, quando o próprio homem se propõe determinada tarefa e esta determina o

sucessivo fluxo seletivo de suas associações.

37

O distúrbio da atenção é um dos mais importantes sintomas do estado patológico do

cérebro, e seu estudo pode acrescentar dados importantes ao diagnóstico das afecções

cerebrais.

Clinicamente, tem se dado especial importância aos distúrbios da atenção arbitrária.

Estes se manifestam no fato de que o individuo se abstrai facilmente com qualquer

estimulo secundário, mas é impossível organizar-lhe a atenção, atribuindo-lhe uma

tarefa determinada, ou lhe dando uma instrução verbal correspondente.

A instabilidade da atenção arbitraria não surge apenas nos estados patológicos expressos

do cérebro, mas também em estados do sistema nervoso, provocados por outros fatores.

4.2. A Memória

É sabido que cada deslocamento, impressão ou movimento nosso, deixa certo vestígio, e

este se mantém durante um tempo bastante longo e em determinadas condições,

reaparece, e se torna objeto de consciência. Por isto, entendemos por memória: o

registro, a conservação e a reprodução dos vestígios da experiência anterior. Registro

esse, que dá ao individuo a possibilidade de cancelar informações e operar com os

vestígios da experiência anterior após o desaparecimento dos fenômenos que

provocaram tais vestígios.

Todo o reforço dos conhecimentos e habilidades, e a capacidade de aproveitá-los,

pertencem à área da memória. Os fenômenos da memória podem pertencer igualmente

ao campo das emoções e ao campo das percepções, ao reforço dos processos motores e

da experiência intelectual.

O estudo da memória foi uma das primeiras partes da Psicologia à qual se aplicou o

método experimental: fizeram-se tentativas de medir os processos estudados e descrever

as leis a que eles se subordinam. Vários estudiosos então passaram a desenvolver

pesquisas buscando as leis básicas de reforço de reprodução dos vestígios da memória

no homem

As imagens sucessivas constituem a forma mais elementar de memória sensorial. Elas

se manifestam tanto no campo visual quanto no campo auditivo e sensitivo geral.

(LURIA 1979).

38

4.3. Memória Verbal

A memória verbal é a modalidade mais complexa e mais elevada do homem. Não

usamos as palavras apenas para nomear os objetos; o discurso verbal não apenas

participa da formação das concepções e da conservação da informação direta: o homem

recebe o maior volume de conhecimentos por meio do sistema verbal, recebendo

informação verbal, lendo livros, e conservando em sua memória o resultado dos dados

obtidos através do discurso.

A memória visual é em grau ainda menor de fixação imediata que as palavras, sendo

uma conservação das imagens por estas provocadas, uma fixação e conservação dos

resultados da experiência direta que se forma sob o aspecto de concepções.

A memória verbal é sempre uma transformação da informação verbal, uma

discriminação do que nesta há de mais substancial, abstraindo do secundário, sendo

ainda uma retenção não das palavras imediatamente percebidas mas das suas idéias

transmitidas pela comunicação verbal. (LURIA, 1979).

Isto significa que a memória verbal sempre baseia-se num processo complexo de

recodificação do material comunicado, processo este, vinculado ao de abstrações dos

detalhes secundários e de generalização dos momentos centrais da informação.

É por isto que o homem é capaz de “gravar na memória” o conteúdo de um vasto

material obtido de informações verbais e livros lidos, sendo ao mesmo tempo

absolutamente incapaz de conservar na memória o conteúdo literal dessas informações e

leituras.

A memória verbal é também denominada “associativa” ou “lógica”. Isto porque as

palavras nunca provocam em nós noções isoladas, mas cadeias e matrizes inteiras de

elementos associativos ou logicamente conexos.

Os estados patológicos do cérebro são muito amiúde acompanhados da perturbação da

memória. Mas, até recentemente, eram muito pouco conhecidas particularidades

psicológicas que distinguem as perturbações da memória em afecções cerebrais

diferentes pela localização, bem como, os mecanismos fisiológicos que lhe servem de

base. (LURIA 1979).

39

Pesquisas neuropsicológicas minuciosas permitiram fazer uma caracterização posterior,

tanto da estrutura psicológica dessas falhas de memória quanto da analise dos

mecanismos fisiológicos que servem de base às suas perturbações.

Assim podemos buscar uma compreensão melhor de como é importante uma boa saúde

para que a memória seja preservada. Neste sentido, torna-se relevante verificar o quanto

existe de alteração na atenção e memória de pessoas que permanecem por longos

períodos expostas aos efeitos de agrotóxicos.

40

5. O PROGRAMA PETI

Os objetivos do Programa em nível Nacional são: retirar crianças e adolescente do

trabalho perigoso, penoso, insalubre e degradante; Possibilitar o acesso a permanência e

o bom desempenho de crianças e adolescentes na escola; Fomentar e incentivar a

ampliação do universo de conhecimento da criança e do adolescente, por meio de

atividades culturais, esportivas, artísticas e de laser no período complementar ao da

escola, ou seja, na jornada ampliada; Proporcionar apoio e orientação às famílias por

meio da oferta de ações sócio-educativas; Promover e implementar programas e

projetos de geração de trabalho e renda para as famílias.

5.1. Aspectos históricos e geográficos do município de Quissamã

Segundo informações do Departamento de Geografia da Universidade do Estado do Rio

de Janeiro – UERJ – e da Prefeitura do Municipal de Quissamã, o município pertenceu

ao antigo distrito de Macaé, RJ; e foi emancipado em 12 de Junho de 1988 (RUA,

2000).

Quissamã Comporta uma área de 660 km2, e sua população é de aproximadamente

15.000 habitantes; situando-se a uma altitude de 19m acima do nível do mar, tendo

clima quente e úmido, com chuvas no verão, e seco no inverno. Com relação ao solo e a

vegetação, há o predomínio do solo pondolozo (massapé), o qual é ótimo para a cultura

de cana-de-açúcar. Sua faixa litorânea apresenta solo arenoso da restinga, onde estão

sendo desenvolvidas experiências de cultivo do coco, maracujá e do caju. Tendo ainda

muitos campos de vegetação rasteira e brejos, assim como inúmeros rios, canais e

lagoas.

A partir da emancipação, Quissamã adquiriu o direito de administrar seus próprios

recursos, advindos, sobretudo, dos repasses governamentais e dos “royalties” pagos pela

Petrobrás, que em 1991 representaram 96,1% da receita total do município. Havendo

assim, a oportunidade da população usufruir de serviços antes só obtidos nas cidades de

Campos e Macaé. Quissamã sempre teve vida própria, em torno da qual desenvolveu-se

um empreendimento agrícola bastante simples em sua organização, possuindo

características típicas da tradicional sociedade rural: de um lado os senhores de engenho

41

(fazendeiros), e do outro, os escravos. Sendo que em 1845 a população da Freguesia de

Quissamã girava em torno de 2500 habitantes, dos quais 1800 eram escravos.

Em Quissamã, o sistema fundiário é vigente desde o século XVIII, baseado na

monocultura canavieira, e foi o que ditou predominantemente a distribuição

populacional em seu território.

A industrialização da produção de açúcar se deu em 1877, quando foi estabelecido o

primeiro engenho central de toda a América do Sul, gerando a ampliação da produção

de cana, que embora sendo proprietários de grandes extensões de terras, preferiam

adquirir a matéria-prima proveniente dos ex-senhores de engenho que não haviam se

industrializado. A usina modifica as atividades da população; o caráter eminentemente

agrícola passa para o campo industrial sem, contudo, ser urbano. Em suma, o que se

encontra em uma usina é, de um lado, as vantagens econômicas peculiares ao grande

desenvolvimento industrial, e do outro, os problemas econômicos e sociais gerados por

este mesmo desenvolvimento. Modificando o espaço, a usina torna-se o eixo central, a

mola que movimenta, que sustenta a estrutura social, e até política na cidade e no

campo. Paradoxalmente, a própria usina-indústria se encontra no rural, cultivando a

terra e tornando-se agroindustrial. Assim, a principal característica da agricultura do

município é a sua integração com a indústria, pois a usina exerce seu poder hegemônico

na região, na medida em que domina todo o processo produtivo da cana-de-açúcar,

causando subordinação dos pequenos proprietários de terra, e o enfraquecimento dos

movimentos de trabalhadores. Assim, mesmo sendo considerada historicamente uma

das zonas agrícolas mais importantes do Estado, principalmente no século XIX, com a

agroindústria açucareira baseada no latifúndio monocultor, cujo arcaísmo produtivo

condicionou um relativo atraso econômico, conseqüentemente, a falta de investimentos

demográficos, como principalmente os relativos à área de saúde e educação.

Hoje, a diversificação de culturas incentivada pela prefeitura tem modificado esta

realidade, através de projetos incentivadores da fruticultura irrigada, como a plantação e

envasilhamento da água de coco, uma atividade em franco crescimento, o que muda

assim o quadro para uma nova realidade econômica.

Os 50 Km que separam Quissamã da cidade de Macaé determinam uma série de fatores

que revelam realidades distintas quanto à organização espacial, sobretudo pela condição

42

urbana que Macaé vem assumindo nas ultimas décadas, contra a realidade

dominantemente rural de Quissamã.

5.2. A Implantação do PETI no Município

O Município de Quissamã implantou o programa PETI - Programa de Erradicação do

Trabalho Infantil, do Governo Federal, e estendeu os seus benefícios até a idade de 18

anos a todos os participantes.

Desde Julho de 1998, crianças e adolescentes, ex-trabalhadores de canaviais, citricultura

e oleicultura, participam do programa; que atende hoje a 450 crianças e adolescentes

entre 07 e 18 anos. O programa PETI contribui com R$ 25 per capita, e a prefeitura com

mais R$ 25, perfazendo um total de R$ 50 para cada integrante do programa. A

prefeitura, além do ensino tradicional, mantém cursos profissionalizantes através de

convênios com o Serviço Brasileiro de Aprendizagem Industrial – SEBRAI - e Serviço

Nacional de Aprendizagem Comercial - SENAC - para atender estas crianças e

adolescentes.

A exploração do trabalho infantil é decorrente do não cumprimento da Constituição

Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/90), e da

cultura perversa que consente o trabalho de crianças pobres, concorrendo com esses

problemas está a falta de fiscalização do trabalho por parte do governo, o fato de pais ou

responsáveis e/ou reivindicarem os direitos das crianças e adolescentes, levando assim a

existência de empregador/empreiteiro que visa somente o lucro com esta mão de obra e

as próprias condições sócio-econômicas das famílias de trabalhadores rurais. Tomando

por base esta realidade visível em Quissamã, o Programa de Prevenção e Erradicação do

Trabalho Infantil, em integração com os Governos Federal e Estadual assim como a

Sociedade Civil procura atender às famílias vulnerabilizadas pela pobreza e exclusão

com filhos na faixa-etária de 07 a 18 anos, que através da Prefeitura procura motivar a

permanência dos jovens nas escolas através de um segundo turno de atividades, onde as

unidades escolares ou de apoio, reforçadas com recursos humanos e materiais

asseguram a alimentação, orientação nos estudos, esporte, laser e desenvolvimento

cultural; pela Secretaria Municipal de Ação Social do Município de Quissamã, desde 12

de novembro de 2000 – Oficio-circular MPAS/SEAS.

43

A tarefa de tirar a criança e o adolescente do trabalho precoce e muitas vezes perigoso,

insalubre, penoso ou degradante não é só do Governo, mais deve se tornar uma

preocupação da sociedade brasileira como um todo. O trabalho precoce, principalmente

nas suas formas mais agressivas, tira da criança e do adolescente a oportunidade de se

desenvolver de forma integral, de estudar e de exercer sua cidadania.(Manual de

Orientações-PETI)-Secretaria de Estado de Assistência Social.

O objetivo do programa, ao oferecer a “bolsa criança cidadã”, é o de criar condições

mínimas para que a família possa prover suas necessidades básicas e completar sua

renda, embora haja muitos casos em que a bolsa seja o único meio de sobrevivência da

mesma.

Como resposta, se espera a dinamização da gestão municipal na área social,

buscando uma otimização de setores ligados a vocação econômica das regiões, através

de parcerias entre os diversos poderes e organizações da sociedade civil, com as três

esferas do governo e também do setor privado.

44

6. MATERIAIS E MÉTODOS

6.1. Objetivo Geral

Trata-se de um estudo para avaliar os efeitos nocivos à saúde de crianças residentes no

município de Quissamã, Estado do Rio de Janeiro, incluídas no Programa de

Erradicação do trabalho Infantil (PETI) causados pela exposição à agrotóxicos, usados

nas lavouras principalmente de cana-de-açúcar, na comunidade de Machadinha, área

rural daquele Município.

6.2. Objetivos Específicos

Avaliar a exposição de crianças e adolescentes aos agrotóxicos;

Levantar dados sócio-demográficos, atividades laborativas, saúde e lazer;

Verificar através de teste neuropsicológico possíveis efeitos causados a “atenção” pela

exposição aos agrotóxicos;

Verificar através de teste neuropsicológico possíveis efeitos causados a “memória” pela

exposição aos agrotóxicos;

Verificar a influência dos agrotóxicos usados na região, segundo a visão de moradores e

trabalhadores da região.

6.3. Desenho do estudo

Foi realizado um estudo seccional, comparativo, tendo como população alvo todas as

crianças e adolescentes de 9 a 18 anos que participam do Programa de Erradicação do

Trabalho Infantil – PETI -, num total de 55 crianças e adolescentes, de ambos os sexos,

moradores da área de Machadinha e sítios vizinhos na área rural, sendo chamado grupo

de estudo.

O grupo controle foi constituído por crianças e adolescentes na mesma faixa etária e

condições socioeconômicas, que residem no perímetro urbano de Quissamã e são

estudantes do CIEP, que fica no centro da cidade. Procuramos nos aproximar o mais

45

possível do grupo de estudo, sendo que os alunos eram solicitados aleatoriamente,

respeitando apenas a idade e sexo, garantindo assim, o mínimo de variabilidade entre os

grupos.

A escolha do grupo controle foi em razão da não exposição direta aos efeitos dos

agrotóxicos usados na região rural. A condição principal seria morar no perímetro

urbano desde o nascimento e nunca ter trabalhado em lavoura.

.

6.4. Aspectos Éticos

Como todos os projetos realizados no Curso de Mestrado em Saúde Coletiva do NESC,

este estudo incorpora os aspectos éticos recomendados pela Resolução 196/96 sobre

Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, e não apresenta atividades que possam causar

danos de dimensão física, psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual

nestas pessoas. Em anexo, estão apresentados os “Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido dos indivíduos”, devidamente assinados pelos participantes e seus

representantes.

O projeto contempla a divulgação dos resultados do projeto em primeiro lugar para os

sujeitos da pesquisa.

No tocante à análise crítica dos riscos e benefícios, o estudo verificou a existência de

transtornos para a saúde, que poderão subsidiar o encaminhamento para tratamento

específico, além de oferecer subsídios para programas preventivos tanto para o setor

saúde, como para o de educação formal, assim como educação ambiental. Cabe ressaltar

que o projeto não apresenta procedimentos que possam causar danos à dimensão física,

psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual a estas pessoas.

As informações geradas serão de uso exclusivo da equipe de pesquisa e o pesquisador

responsável garante que nenhum estranho à equipe de pesquisadores terá acesso aos

dados, para que se preserve a confidencialidade das informações, quando for o caso.

Não obstante, a divulgação dos resultados da pesquisa deverá ser pública e em primeiro

lugar endereçada aos sujeitos da pesquisa.

Os sujeitos da pesquisa terão garantia de livre consentimento (modelo em anexo) após

total esclarecimento de todos os benefícios e possíveis riscos que poderão advir do

processo investigatório.

46

6.5. Local onde foi realizado o estudo

Machadinha, local do Município de Quissamã onde foi realizado o estudo, fica na área

rural do município e tem uma população entre 380 e 450 habitantes, e está em fase de

adaptação para transformação em pólo turístico, visto ser uma região onde a grande

maioria dos moradores é de descendentes de escravos, que trabalhavam nos canaviais,

abastecendo a 1ª usina de açúcar do país. E onde há um grande acervo Histórico a ser

mostrado naquela localidade, uma vez que esta população ainda cultiva muito da cultura

adquirida de seus antepassados.

Hoje, a prefeitura de Quissamã, tem um projeto para transformar Machadinha em um

pólo turístico, onde a intenção é preservar o conjunto representativo de um núcleo

cultural que conta com o tombamento da sede da Fazenda Machadinha, construída antes

da abolição da escravidão (l888), sendo que o conjunto era composto de fábrica,

engenho, senzala ou habitação de empregados e capela. A denominação do nome

Machadinha não fica totalmente esclarecida, visto ter três versões, sendo uma de que o

nome fora surgido após a descoberta de uma pedra muito antiga esculpida na forma de

um machado, a outra designação seria em função de um machado indígena, encontrado

na região e outra sugere ao nome de um grande proprietário de terras da região, no

século XVII, Capitão José de Barcelos Machado.

Danças como o Fado, Jongo, Fitas e Tambor, fazem parte da estória deste povo, assim

como suas comidas típicas, que são memórias de uma África muito próxima.

Quando os canaviais crescem ao redor de Machadinha, é como se fizessem um bordado

colorido no centro de uma grande toalha verde. E ai começam, hora, a chuva branca

vinda de um avião, hora, o vermelhão das queimadas chegando na época das colheitas, e

é exatamente neste período que acontecem as grandes mortandades de pequenos

animais que não conseguem escapar dos efeitos dos produtos químicos, jogados por

aviões em pelo menos duas épocas do ano, ou pelo fogo abrasador, levando junto, além

da fertilidade da terra a alma melancólica pela destruição.

Enquanto a usina esteve fechada, agravou-se o estado de miserabilidade na região,

assim como o agravamento do alcoolismo, uma vez que a demanda de trabalho gira em

torno do plantio e colheita da cana.

47

Logo que cheguei a Machadinha, conheci a restauradora Helena Fortes, da

Universidade de Viçosa que ali se encontrava fazendo um trabalho de restauração do

acervo histórico de toda as peças encontradas na região desde os tempos dos barões.

São muitas relíquias encontradas, peças raras que estavam quebradas ou se deteriorando

pelo mau estado de conservação. Como o trabalho é minucioso e a cada etapa da

restauração precisa ser documentada com fotos, portanto havia sempre uma máquina

fotográfica à disposição. E foi em uma manhã quando estávamos próximas à capela que

ouvimos o barulho de um “avião”, que pudemos fotografá-lo em plena atividade a

menos de trinta metros das residências no momento em que borrifava agrotóxico no

canavial ao redor de Machadinha. O avião quase tocava o solo ao executar sua

atividade, fazendo todo o entorno de Machadinha, como os relatos de moradores que já

estavam acostumados a identificá-los em suas atividades. Foi neste momento que

percebi que apesar das crianças e adolescentes estarem fora do trabalho nos canaviais,

não somente eles, mas todos os moradores de Machadinha estavam incontestavelmente

sendo contaminados pelos resíduos de agrotóxicos que ali são depositados

regularmente, em determinadas épocas, durante o plantio até a colheita nos canaviais.

6.6. Etapas e procedimentos do estudo de campo

As etapas do estudo de campo estão apresentadas a seguir:

Os principais procedimentos realizados em ambos os grupos incluíram a aplicação de:

.Visitas de sensibilização na comunidade e secretarias de Bem Estar Social, Educação e

saúde.

Aplicação de questionário para ambos os grupos, com a finalidade de confirmar ou não

a exposição aos agrotóxicos, assim como dados sócio-demográficos, atividades

laborativas, renda familiar, saúde, lazer, etc.

Execução do Teste Neuropsicológico, feito através do teste TCA VIS para medir a

capacidade de sustentar a atenção em tarefas repetitivas e monótonas;

Aplicação do Teste Neuropsicológico Bender para determinar o nível de maturação da

função Guestáltica visomotora, (memória);

48

Realização de entrevistas com moradores e trabalhadores na região.

Em um primeiro momento houve contato com os secretários responsáveis pelas

secretarias, em princípio de Bem-estar Social onde recebi informações do coordenador

do Projeto PETI Cristiano Corrêa Peçanha onde tive todo o apoio e as informações

necessárias para começar a estruturar o trabalho de campo.

Após informações sobre todas as comunidades onde o PETI atuava, suas características

e o número de crianças e adolescentes cadastrados no programa, ficou decidido que

começaria pela comunidade de Machadinha, por ser a que mais tinha crianças e

adolescentes que trabalhavam na lavoura e ser um local rodeado por canaviais e outras

plantações que fazem uso de agrotóxicos.

Nesta reunião ficou estabelecido que a secretaria disporia de um meio de transporte para

me levar a comunidade, o que foi feito durante todo o período em que o trabalho de

campo foi efetuado.

As visitas eram feitas as 2ª o dia todo e 3ª feira, até as 12 horas, para a coleta de dados.

A Secretaria de Educação atuou de forma importante no projeto, pois todas as crianças

participantes do PETI, devem freqüentar a escola, para receberem a bolsa que o

Governo Federal faz jus a cada um dos inscritos, foram também de suma importância

informações dadas pela direção da escola sobre as crianças inscritas no Programa PETI.

O apoio da Secretaria, assim como uma carta de recomendação me apresentando, e

facilitando o acesso a todas as escolas do município, tornou o trabalho mais fácil.

A Secretaria de Saúde também foi contatada, e se colocou a disposição,

disponibilizando espaço em qualquer unidade de saúde para que fosse viabilizado a

aplicação dos instrumentos na população em estudo (testes BENDER e TCAvis).

Um reconhecimento do lugar foi feito, onde pude estar no espaço onde atua o Programa

PETI, que é o mesmo da associação de moradores e onde acontece todos os eventos

importantes da comunidade. Fica em uma das casas de Senzala, com um salão, cozinha

e banheiro, até então uma área rural de Quissamã.

O posto de saúde também faz parte do complexo da senzala, fica situado onde foi o

armazém da fazenda Machadinha. Fica no mesmo terreno que a Capela (nos fundos).

Neste posto de saúde foi disponibilizada uma sala onde pude trabalhar. Inicialmente na

49

sala onde guardam medicações e posteriormente na sala do dentista, nos dias em que

não havia atendimentos odontológicos.

Foi feito um primeiro encontro com os responsáveis pelas crianças e adolescentes

participantes do programa PETI, a fim de que compreendessem que tipo de estudo seria

feito e que instrumentos seriam utilizados. Mesmo não sendo método invasivo, os

responsáveis receberam todos os esclarecimentos e assinaram o termo de consentimento

esclarecido (em anexo).

Para execução do Projeto na área de estudo fiquei sediada no município de Quissamã,

no centro, aonde chegava no domingo à noite, deslocando-me através de um carro

cedido pela Secretaria de Bem Estar Social, que me pegava na porta da prefeitura às 8h

de 2ªfeira me levando para a comunidade de Machadinha, onde permanecia até as 17

horas. Na terça ficava na comunidade ate 12 horas. Normalmente saíamos às 8h, da

prefeitura, junto com outros profissionais que participavam de outros programas e

ficavam em comunidades no trajeto para Machadinha, continuando a viagem por mais

30min. mais ou menos, e voltando com o mesmo carro às 17h.

Chegava por volta das 8:45, iniciando as entrevistas, sendo ajudada pelo agente de

saúde do posto (Marciano) que é morador e conhece todos os habitantes da comunidade,

podendo assim facilitar meu contato com as crianças e adolescentes. O local onde as

crianças tem atividades do PETI, fica há uns trinta metros do Posto de Saúde, onde eram

feitos os testes. Marciano (agente de saúde) avisava a monitora do PETI, e ela

encaminhava as crianças e adolescentes para que eu pudesse proceder a aplicação dos

testes, eram encaminhados dois alunos de cada vez.

Os mais jovens, de 12 e 13 anos, iam contentes atrás de novidades, as com mais idade

14 em diante eram mais resistentes, tinha receio e achava que ”aquilo” era para

descobrir se eram ”malucos”. Muitas vezes fui até o PETI, conversar e convencer os

adolescentes a fazerem o teste.

Apenas um garoto se recusou de início, mas ia sempre com os colegas (como

companhia) quando sugeri a ele que respondesse o questionário, e se depois não

quisesse fazer o teste, não insistiria. Após responder o questionário e ver que não estava

investigando se teria voltado a trabalhar, mesmo participando do Programa, (o que é

proibido, e existe uma fiscalização por parte do conselho tutelar), não mais ficou

50

resistente e fez todos os testes sem problemas. No total ficava com cada participante

entre 1 hora e 30 min. a 2horas.

É importante frisar que todos os instrumentos foram aplicados por mim, os apoios

recebidos foram apenas no sentido de facilitar meu trabalho.

As vezes os meninos resistiam em deixar o futebol para irem ao Posto de Saúde,

fazerem os testes, porem quando viam os colegas retornando, comentando como eram

os testes, a resistência era quebrada e eles mesmos pediam para fazerem os testes.

Inicialmente estava programado para irmos a todos os pólos do PETI, onde seria feito

uma amostra representativa da população alvo pertencente ao PETI. Eram crianças que

não estavam mais trabalhando na lavoura, pois uma das exigências do PETI é que não

mais trabalhassem, porem esta condição muitas vezes não pode ser cumprida pela falta

de pagamento do valor referente à bolsa, e as crianças e adolescentes voltavam para o

trabalho, como forma de sobreviverem, uma vez que o governo atrasa o pagamento das

bolsas, às vezes em até quatro meses, e não raro, este é o único recurso que a família

tem para sobreviver, quando os responsáveis pelo sustento da mesma encontram-se

desempregados.

Quando presenciei o avião borrifando agrotóxico tão próximo das residências, percebi

que mesmo não estando trabalhando na lavoura, estavam recebendo diretamente

resíduos do produto uma vez que todo entorno de Machadinha é de plantação de cana e

portanto, não há como escapar da contaminação. Nem todos os pólos do PETI, ficam

perto de lavouras, são outras atividades como a pesca, por exemplo, o que

comprometeria o estudo. Assim, após analisarmos a situação optei por fazer o estudo

apenas no pólo de Machadinha, com todas as crianças do PETI, com idade entre 9 e 18

anos, estruturando assim o “grupo de estudo”

Como havia iniciado por Machadinha, onde havia mais crianças que saíram de trabalhos

na lavoura, permanecia o dia todo na região, até as l7horas, quando a condução

destinada a me levar de volta chegava, ficando algumas vezes horas sem ter ninguém

para testar, uma vez que é freqüente terem que voltar para suas casas para fazer a

própria refeição e a dos irmãos mais novos, pois a maioria moram com os avós, ou com

o pai que trabalha na lavoura, sendo comum também os pais ou responsáveis serem

alcoólatras. Assim, tinham que sair mais cedo para fazerem os trabalhos domésticos, e

se aprontarem para pegar o ônibus que os levava para a escola, sendo que alguns deles

51

moravam em sítios longe de onde ficava a sede do PETI, tendo assim estas crianças seu

tempo limitado até as 10horas, o que me sobrava entre uma e duas horas, em cada

período para trabalhar com eles, às vezes conseguia entrevistar apenas duas ou três

crianças durante todo o dia.

Nos horários que não estava testando as crianças e adolescentes, ia conhecendo as

estórias fantásticas daquela comunidade de descendentes de escravos, que ainda hoje

vivem nas mesmas residências “Senzala” onde seus ancestrais viviam a mais de 350

anos, vivendo quase nas mesmas condições que eles, são as mesmas casas, ainda de

chão batido, as telhas originais, feitas pelos escravos “nas coxas”, hoje com telhado

precário onde a chuva penetra por buracos que o tempo se encarregou de fazer. E assim

continuam ainda preservando a mesma cultura no preparo dos alimentos, na forma das

danças e de organizarem suas festas, guardando suas estórias e lendas, passadas pelos

mais velhos. Machadinha é reconhecida como uma grande família, onde de alguma

forma quase todos são parentes. As brigas pelo poder relacionado à associação de

moradores, assim como os “casos de suicídio” que como reza a lenda, a cada geração

três vidas de jovens são necessários para acalmar os espíritos; não costumam ser

comentadas na comunidade, mas o relato das pessoas “de fora” que contam, sobre as

mortes, relatam que as mesmas são de maneira parecida, sendo porém um assunto que a

população não gosta de comentar. Por outro lado, ficam a vontade e satisfeitos de

contarem as estórias que ouviam de seus avós sobre o tempo da escravidão e a forma

com que viviam, e a opção por continuarem morando em machadinha mesmo depois de

serem libertados.

7. Os Instrumentos

7.1. Questionário estruturado para os adolescentes

Uma entrevista com cada participante do estudo, individualmente (semi-estruturada)

com dados sobre identificação, história ocupacional incluindo exposição aos

agrotóxicos e dados de morbidade. (questionário em anexo)

52

7.2. Teste Neuropsicológico Bender

O teste “Visual Motor Gestalt” foi desenvolvido por Lauretta Bender em 1938 a partir

de conceitos e materiais dos fundadores da Psicologia Gestalt: Max Wertheimer; Kurt

Koffka e Wolfgang Köhler. Bender escolheu desenhos de Wertheimer’s (1923),

baseados nos princípios da Psicologia Gestalt e foi usado principalmente como

ferramenta clínica para observar o desempenho de seus pacientes.

A facilidade da administração do teste Bender contribuiu para torná-lo popular e muito

aplicado pelos psicólogos. Ao longo do tempo modificações e revisões foram sendo

feitas, tendo sido feito uma variação do teste sob stress, por Lezak (1995) e padronizada

por Brito e Santos (em 1996), assim como estudos posteriores os levaram a acrescentar

em 1998, mais modalidades de administração: (imediata e tardia).

Estudos desenvolvidos a partir do teste Bender mostrou que a idade, classe social,

fatores sociais, grupo étnico e nível de escolaridade impacta significativamente no teste

(koppitz 1975), bem como, indicadores emocionais são medidas importantes (Brito e

colaboradores 1998), o que pode levar à detecção de dificuldades na aprendizagem,

tornando assim uma ferramenta importante para a neuropsicologia.

Os procedimentos de administração das modalidades do teste serão descritas a

seguir:

O examinado realiza uma tarefa gráfica com os modelos a mostra, conduzido pelo

examinador, após este receber todas as informações necessárias, como devera proceder,

sendo informado que é uma reprodução gráfica. O teste está associado a diversas

funções de inteligência, percepção visual, habilidade motora manual, memória,

conceitos temporais e especiais e capacidade de organização ou representação, podendo

medir no sujeito o nível de maturação da função guestaltiva visomotora através da copia

das figuras guestálticas, estabelecendo assim o nível de maturação do individuo; é usado

também como teste projetivo.

O teste é suscetível a diferenças, que são:

Atrasos globais na maturação,

Incapacidades verbais especificas,

Fenômenos de dissociação que perturbam o conjunto da personalidade,

Desordens dos impulsos,

Desordens perceptuais,

53

Desordens confusionais.

A guestáltica pode ser definida como aquela função do organismo integrado, o qual

responde a um conjunto de estímulos dada como um todo, sendo a mesma resposta a um

conjunto, um padrão, uma guestalt. Todos os processos integrados do sistema nervoso

se produzem em conjuntos, padrões e guestalt.

É importante ver como surgem genericamente as guestalts nas crianças e quais são os

processos de amadurecimento (maturação).

A psicologia da Guestalt, tal como foi desenvolvida por Wertheimer, Kohler e Koffka,

deu um novo impulso a psicologia guestalt, e com ela também uma nova compreensão

para apreender as relações entre o todo e suas partes, pois mostrou que a percepção não

pode ser interpretada como uma soma de sensações singulares (particulares).

O organismo não responde a estímulos locais com respostas locais. Responde o

conjunto de estímulos com um processo total, que é a resposta do organismo em seu

conjunto a situação total.

O teste tem 4 etapas de aplicação - normal, stress, memória imediata e memória tardia,

sendo composto por 9 (nove) pranchas cada uma com um desenho especifico.

1ª Normal – é solicitado a cópia do desenho que será mostrado através de pranchas,

uma a uma, para serem copiadas, sempre respeitando o tempo de cada indivíduo.

2º STRESS - O indivíduo é apresentado ao teste pela 2ª vez, mudando as instruções para

que faça o mais rápido que puder, ao mesmo tempo em que o aplicador vai interferindo

ruidosamente no ato da aplicação para gerar stress.

3º Memória Imediata – É solicitado que seja feito o desenho de todas as figuras,

anteriormente mostrado através das pranchas, utilizando somente a memória.

4º Memória Tardia - Após 30 minutos, solicitar que desenhe todas as figuras

representadas nas pranchas, novamente utilizando apenas a memória.

Todas as etapas são cronometradas e as atitudes dos pesquisados, atentamente

observadas acerca de reações diferenciadas. As evidências obtidas indicam que os

pacientes com disfunções consistem no exame da memória de recenticidade.

Nas disfunções apresentam uma dissociação entre a preservação da memória de

reconhecimento e um comprometimento da memória para a ordenação temporal dos

estímulos.

54

7.3. Teste Neuropsicológico TCA Vis

O teste neuropsicológico TCA Vis (Teste Computadorizado de Atenção Visual) foi

desenvolvido em 1999 por Schmidt e Manhans, com registro no Instituto Nacional de

Propriedade Industrial e reconhecido no ano de 2004 pelo Conselho Federal de

Psicologia, para uso clínico.

O TCA Vis foi o primeiro CPT (Continuos Performance Teste) para Windows no

mundo, e ele consta como um conjunto de testes usado por neuropsicólogos para medir

a atenção – que é um domínio cognitivo importante, assim como a linguagem, memória

e cognição em geral – em atividades monótonas e repetitivas. O teste é apresentado ao

examinando, tendo o mesmo um tempo de 5min. para um treinamento, que só iniciará

quando o testando se apresentar apto; e , apesar de ser um teste computadorizado, não é

necessário ter conhecimento prévio ou mesmo ter qualquer familiaridade com um

computador, é um teste de fácil aplicação.

O número de omissões, número de erros, tempo de reação e variabilidade do tempo de

reação são informações relevantes para se obter subsídios que nos levam a identificar

uma pessoa com déficit de atenção ou sua condição atencional no momento. Outro

fator que pode comprometer a atenção seria uma lesão cerebral difusa. É, portanto, o

primeiro nível de avaliação neuropsicológica e que abre caminho para se entender os

distúrbios de aprendizagem.

55

8. RESULTADOS

Participaram do estudo 110 crianças e adolescentes, sendo 55 de cada grupo (estudo e

controle). Pela Tabela 1 observa-se que estes dois grupos eram iguais para as variáveis

idade e sexo. Cada um dos dois grupos apresentou 63,3% dos menores na faixa etária de

9 a 14 anos e 36,4% de 15 ou mais. Quanto ao sexo 56,4% eram do sexo masculino e

43,6% do sexo feminino. O questionário foi aplicado em todos os 110 indivíduos do

estudo, no teste neuropsicológico TCAvis, foram aplicados no grupo de estudo em 44

indivíduos, sendo no grupo de comparação 45, por interferência de vários fatores como

o tempo em que permaneciam no pólo do PETI e que dificultaram a aplicação na

totalidade do universo pretendido.

Não houve diferença significativa em ambos os grupos, para a escolaridade, sendo

94.5% no grupo estudo e sua totalidade l00% no grupo controle, na categoria ensino

fundamental incompleto. Quanto ao tempo de vinculação ao PETI no grupo estudo,

63,5% dos adolescentes estavam vinculados entre 6 meses a 2 anos, 23% acima de dois

anos e 13,5% com até 6 meses de veiculação.

A Tabela 2 mostra a distribuição de variáveis sobre exposição a produtos químicos da

população infanto-juvenil estudada. Quanto ao contato com produtos químicos, 25,5%

dos entrevistados do grupo de estudo confirmaram ter tido algum tipo de contato, 27,3%

alegaram não ter tido nenhum contato e 47,3, são integrantes do PETI, embora nunca

tenham trabalhado na lavoura. Com relação a freqüência deste contato 23,6% relataram

ser eventual, 7,3% alegaram ser semanal este contato , sendo de apenas 1,8% o contato

diário, observando que variava a forma deste contato, uma vês que a maioria não

borrifava o produto mas ajudava na preparação ou na hora de guardar; o que fazia com

que a grande maioria ficasse confusa na hora de responder, 40% não usavam nenhuma

proteção durante o manuseio, sendo apenas 7.3% usavam algum tipo de proteção. A

proteção na cabeça em que 36,4% se referiam tratava-se simplesmente de um boné, e

quanto ao local em que eram guardados os produtos, 7,3% referiam ter um local

apropriado para fazê-lo, 16,4% relataram não ter um local específico para guardar o

56

produto e 10,9% afirmaram que o produto era guardado em suas residências, sem

nenhum cuidado especial.

Uma comparação da distribuição de variáveis sobre morbidade referida da população

infanto-juvenil estudada está apresentada na Tabela 3. Nota-se que o grupo de estudo,

num total de 23,6% referiram ter tido algum problema de saúde nos últimos 15 dias na

época do inquérito, e 76,4% alegaram que nenhuma ocorrência havia ocorrido neste

período, sendo muito próximo deste resultado o grupo de comparação com 27,3% para

sim e 73,7% para nenhuma ocorrência. Resultado semelhante também ocorreu para os

dois grupos, quando a pergunta foi para alguma ocorrência nos últimos 5 anos.

Houve diferença estatisticamente significante (Qui Quadrado Yates Corrected

X2 = 4,95 p< 0,02) em relação a ocorrência de acidente de trabalho durante a vida

produtiva, com uma maior proporção (27,3% para o grupo de estudo, e 9% no grupo

controle, que relataram apenas acidentes em pequenas tarefas caseiras).

Nas ocorrências com doenças causadas pelo trabalho, verificou-se um total de 21,8%

confirmando algum tipo de problema de saúde como conseqüência do trabalho, sendo

que 25,5%, alegaram não perceberam nenhum tipo de problema relacionado ao trabalho,

52, 7, nunca trabalharam, assim como o grupo comparação.

A Tabela 4 mostra uma comparação da distribuição das variáveis sobre sintomas

referidos entre os grupos estudo e comparação. Ocorreu uma maior proporção em todos

os sintomas referidos para o grupo estudo, sendo esta diferença significativa para a

variável desmaio (X2 = 3,64 p< 0,05) e para indisposição física (X2 = 3,66 p< 0,05) e

altamente significativa para as variáveis enjôo (X2 = 16.17 p< 0,001) e dores

abdominais (X2 = 33.85 p< 0,001).

Não descartando os possíveis sintomas relacionados a exposição aos agrotóxicos, temos

que levar em consideração a proximidade no que se refere as condições

socioeconômicas dos dois grupos, pois ambos estão sujeitos a inúmeros problemas de

saúde como: desnutrição, verminoses, anemias, gerados pela péssima qualidade de vida,

acrescidos com uma dieta pobre e ausência de saneamento na região em que ambos os

grupos residem, tornando assim esta população ainda mais vulnerável

57

TABELA 1: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS DE IDENTIFICAÇÃO DA

POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA.

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

Grupo Estudo Grupo

Comparação

N % N %

Idade (anos)

9 a 14 anos 35 63.6 35 63.6

15 ou mais 20 36.4 20 36.4

Sexo

Masculino 31 56.4 31 56.4

Feminino 24 43.6 24 43.6

Escolaridade

Fundamental Incompleto 52 94.5 55 100

Fundamental 1 1,8 - -

2º Grau Incompleto 2 3,6% - -

Tempo Médio de Vinculação no Programa

Até 6 meses 10 13,5 - -

6 meses a 2 anos 33 63,5 - -

Acima de 2 anos 12 23,0 - -

58

TABELA 2: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS SOBRE EXPOSIÇÃO Á

AGROTÓXICOS DA POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

Contato com Agrotóxicos Número % Sim 14 25.5 Não 15 27.3 Não se aplica 26 47.3 Frequência de Contato Diário 1 1.8 Semanal 4 7.3 Eventual 13 23.6 Nenhum e não se aplica 37 67.3 Manuseio de Agrotóxicos Sim 13 23.6 Não 12 21.8 Não se aplica 30 54.5 Uso de Roupa Especial para Proteção Sim 4 7.3 Não 22 40 Não se aplica 29 52.7 Uso de Proteção Especial na Cabeça Sim 20 36.4 Não 6 10.9 Não se aplica 29 52.7 Local de Guarda dos Produtos Casa 6 10.9 Outro local não apropriado 9 16.4 Local Apropriado 4 7.3 Não se aplica 36 65.5

Das crianças e adolescentes que tiveram contato com agrotóxicos, apenas 12 tinham

função de trabalhar com o produto.

59

TABELA 3: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS SOBRE MORBIDADE REFERIDA

NA POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA.

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

Grupo Estudo Grupo Controle

N % N %

Problema de Saúde nos Últimos 15 dias Sim 13 23.6 15 27,3

Não 42 76.4 40 73,7

Acidente de Trabalho durante Vida

Produtiva

Sim 15 27,3 00 0,0

Não 40 73,7 55 100,0

Internação nos Últimos 5 anos Sim 23 41.8 24 43.6

Não 23 41.8 22 40

Não se aplica 9 16.4 9 16.4

Ocorrência de Doença relacionada ao

Trabalho

Sim 11 21,8 - -

Não 14 25,5 - -

Não se aplica 29 52,7

Diferença estatisticamente significante através do teste de comparação de proporções

(Qui Quadrado Yates Corrected) para a variável acidente de trabalho durante a vida

produtiva X2 = 4,95 p< 0,02.

60

TABELA 4: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS SOBRE SINTOMAS REFERIDOS

DA POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA –

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

Grupo Estudo Grupo

Sintomas Referidos N % N %

Dores de Cabeça 46 83.6% 43 78.2% Enjôo 36 65.5% 14 25.5%

Dores nas Costas 20 36.4% 17 30.9%

Dores Abdominais 48 87.3% 17 30.9%

Tontura 29 52.7% 19 34.5%

Desmaio 9 16.4% 2 3.6%

Falta de Ar 17 30.9% 16 29.1%

Indisposição Física 31 56.4% 20 36.4%

Diferenças estatisticamente significantes através do teste de comparação de proporções

(Qui Quadrado Yates Corrected) para as variáveis:

Enjôo: X2 = 16.17 p< 0,000;

Dores abdominais: X2 = 33.85 p< 0,000;

Desmaio: X2 = 3,64 p< 0,05;

Indisposição física: X2 = 3,66 p< 0,05;

61

RESULTADOS DO TESTE NEUROPSICOLÓGICO TCA Vis

Pela Tabela 5 e Gráfico 1, observamos que existe uma tendência do grupo estudo (3,2%

para 1,6%) em relação ao grupo comparação, referente ao Erro por Omissão, que

representa um estado de “distração” (Mann-Whitney = 802.500; Wilcoxon W =

1.837.500; Z = -1.583 p = 0,113).

Quanto ao Percentual de Erro por Ação (Tabela 6 e Gráfico 2), observa-se uma

diferença significativa entre o grupo de estudo e o de comparação, que representa um

estado de “impulsividade motora” (Mann-Whitney = 715.000; Wilcoxon W =

1.750.000; Z = -2.259 p = 0,024).

Pela Tabela 7 e Gráfico 3, pode-se verificar que não existe diferença significativa entre

os grupos estudo e comparação para a variável Tempo de Reação (Mann-Whitney =

915.000; Wilcoxon W = 1.905.000; Z = -0,616 p = 0,538).

No tocante à Variabilidade do Tempo de Reação (Tabela 8 e Gráfico 4), as diferenças

entre os dois grupos estudados não mostraram significância estatística (Mann-Whitney

= 838.500; Wilcoxon W = 1.873.500; Z = -1,243 p = 0,214).

Através destes quatro tipos de testes, pode-se concluir que a capacidade tensional do

grupo estudo está mais afetada que a do grupo comparação.

62

TABELA 5: PERCENTUAL DE ERRO POR OMISSÃO NO TESTE TCA Vis. –

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

PERCENTUAL DE ERRO

POR OMISSÃO

GRUPO ESTUDO (n = 44)

GRUPO COMPARAÇÃO

(n = 45)

Média 3,2 1,6

Desvio Padrão 7,7 2,9

Mínimo 0 0

Percentil 25 0 0

Mediana 1,1 0,6

Percentil 75 3,3 1,7

Máximo 48,9 14,4

GRÁFICO 1 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO PERCENTUAL DE ERRO POR

OMISSÃO

4544N =

Grupo

Não expostoExposto

Per

cent

ual d

e er

ro p

or o

mis

são

60

50

40

30

20

10

0

-10

65676276

5824

44

63

TABELA 6: PERCENTUAL DE ERRO POR AÇÃO NO TESTE TCA Vis. –

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

PERCENTUAL DE ERRO POR AÇÃO

GRUPO ESTUDO (n= 44) GRUPO COMPARAÇÃO (n = 45)

Média 9,7 7,2

Desvio Padrão 6,0 5,5

Mínimo 0,6 0,6

Percentil 25 5,2 3,1

Mediana 9,7 5,0

Percentil 75 13,0 11,7

Máximo 27,8 23,3

GRÁFICO 2 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO PERCENTUAL DE ERRO POR

AÇÃO

4544N =

Grupo

Não expostoExposto

Per

cent

ual d

e er

ro p

or a

ção

30

20

10

0

-10

43

64

TABELA 7: TEMPO DE REAÇÃO NO TESTE TCA Vis. –

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

TEMPO DE REAÇÃO

GRUPO ESTUDO (n= 44) GRUPO COMPARAÇÃO (n = 45)

Média 411 417

Desvio Padrão 104 54

Mínimo 39 298

Percentil 25 362 373

Mediana 407 403

Percentil 75 473 458

Máximo 840 552

GRÁFICO 3 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO TEMPO DE REAÇÃO

4544N =

Grupo

Não expostoExposto

Tem

po d

e re

ação

1000

800

600

400

200

0

-200

13

44

65

TABELA 8: VARIABILIDADE DO TEMPO DE REAÇÃO NO TESTE TCA Vis. –

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

VARIABILIDADE DO TEMPO DE REAÇÃO

GRUPO ESTUDO (n= 44) GRUPO COMPARAÇÃO (n = 45)

Média 115 106

Desvio Padrão 43 42

Mínimo 57 52

Percentil 25 87 78

Mediana 113 96

Percentil 75 135 128

Máximo 228 296

GRÁFICO 4 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DA VARIABILIDADE DO TEMPO

DE REAÇÃO

4544N =

Grupo

Não expostoExposto

Var

iabi

lidad

e do

tem

po d

e re

ação

400

300

200

100

0

5844

66

RESULTADOS DO TESTE NEUROPSICOLÓGICO BENDER

Foram observadas diferenças para os quatro tipos de memória, com nítido agravamento

da capacidade de retenção de memória no grupo de estudo em relação ao grupo

comparação (ver Tabela 9).

Tabela 9 – RESULTADOS DO TESTE BENDER

MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.

GRUPO ESTUDO GRUPO COMPARAÇÃO

NORMAL

Média 1,2024 0,5710

Desvio Padrão 1,76355 1,29792

ESTRESSE

Média 0,7598 0,2463

Desvio Padrão 1,20558 0,95782

MEMÓRIA IMEDIATA

Média 0,5183 - 0,2317

Desvio Padrão 1,20184 0,90558

MEMÓRIA TARDIA

Média 0,4461 -0,1907

Desvio Padrão 1,64363 0,86661

A facilidade na aplicação e compreensão do teste Bender foi fundamental para a escolha

do mesmo no estudo, considerando que existem integradas disfunções patológicas no

produto final da reprodução viso-motora.

67

Os resultados analisados mostraram que o grupo de estudo teve reprodução

diferenciada, relativamente ao grupo de comparação, para todas as modalidades do

teste: Normal, Estresse, Memória Imediata e Memória Tardia, com significância

estatística para a modalidade Memória Imediata. As outras modalidades sugerem uma

diferença quando voltadas para uma análise mais qualitativa.

Quando fazemos uma análise mais complexa dos resultados, nos deparamos com um

olhar mais atento à representação dos erros apresentados durante o teste, que nos

permitem inferir as seguintes dificuldades neuropsicológicas: Planejamento pobre;

Incapacidade de organização; Uma instabilidade emocional, que resulta em um pobre

controle motor e escassa capacidade de integração; Tolerância menor à frustração;

Ansiedade e conduta retraída; Impulsividade e agressividade.

Os dados nos direcionaram a reconhecer que pessoas expostas a produtos químicos, têm

uma performance diferenciada na reprodução do teste, com tendência significativa para

transtornos neuropsicológicos.

68

Avião em atividade próximo de machadinha

9 Entrevistas com Moradores Locais

Foi buscada através das entrevistas a descrição do contexto comunitário a partir dos

dados não estruturados. Fiquei interessada em fazê-las buscando perceber o imaginário

dessas pessoas a respeito do tema em estudo. Este tópico não pretende ser exaustivo

como uma análise qualitativa, mas apenas servir como um olhar para ilustrar e inspirar

novos estudos ou apontar novos objetos.

Dessa forma, foram feitas sete entrevistas não diretivas, com seis moradores na

localidade e uma pessoa que lá trabalha. O número de entrevistas não foi estipulado a

priori, pois julgamos que em um determinado momento elas seriam suficientes, com

base na recorrência das categorias empíricas no discurso dos entrevistados.

No decorrer de todo o trabalho de campo, vivenciamos algumas situações que poderiam

ser descritas como surpresas. Sempre nos surpreendemos diante de questões onde o

fator humano está em foco.

69

São pessoas representativas da comunidade que moram e trabalham na região, e foram

escolhidos aleatoriamente entre os moradores que se dispuseram a colaborar conosco,

tendo a grande maioria nascido na comunidade de Machadinha, onde alem de morar

trabalham ali mesmo.

As mesmas serão identificadas apenas pelas iniciais dos nomes, visando sigilo para

maior tranqüilidade das mesmas. C...entrevista de n.01, é agente de serviços gerais, no

posto de saúde de Machadinha e mora na comunidade desde o nascimento, hoje com

36.anos.

M.R.P entrevista de n. 02, é agente comunitário de saúde, mora próximo a comunidade,

também em área rural, no sitio Santa Luzia, trabalha no Posto de Saúde da comunidade

e tem 26.anos.

M.H.S entrevista de n. 03 é agente comunitária de saúde, trabalha no Posto de Saúde da

comunidade e é uma das pessoas da comunidade descendente de escravos e tem direito

a posse em uma das casas da “senzala”, tem 46 anos.

C...entrevista n.04, morador da comunidade , hoje com 72 anos, aposentado, nasceu em

Machadinha, neto de escravos, e um dos mais antigos, conta as estórias que ouvia dos

avós que o criaram.

A.D.A entrevista n. 05, morador do bacurau, vizinha de Machadinha, é um dos

adolescentes que fazem parte do PETI, tem 15 anos.

G.R.A entrevista n. 06, nasceu e foi criada em Machadinha, neta de escravos, também

mora em uma das casas da “senzala”, atual presidente da associação de moradores,

respeitada pelos mais velhos e temida pelos mais jovens, tem 62 anos.

M.J.S.P entrevista n. 07, Professora a 7 anos em Machadinha, onde hoje é Diretora do

colégio municipal da região, localizado próximo a “senzala”, moradora de Quissamã,

área urbana, tem 48 anos.

As entrevistas nortearam-se por assunto objeto do estudo, tendo os resultados apontado

uma homogeneidade no que se refere as concepções das informações a partir do

material coletado.

A descrição se organiza em torno de um conjunto de aspectos que nos impactaram e

julgamos relevantes para complementar o estudo em questão. Parece-nos enfim,

enriquecedor pontuar os nós críticos articulados pelos entrevistados como uma

70

contribuição no sentido de pensarmos em mudanças futuras que valorizem a Saúde no

meio-ambiente enquanto preservação do ecossistema..

Em síntese, verificamos a visibilidade e o impacto no processo de pulverização dos

produtos tóxicos no cotidiano da comunidade.

“...É, quando o avião vem próximo a plantação que vai despejar o (veneno), dá pra

gente ver aquele jato saindo de trás dele, parecendo até esquadrilha da fumaça, aquele

jato bem forte dá pra vê visivelmente que está despejando (veneno) e solta muita

quantidade e bem próximo a lavoura(...)“(Entrevista 05).

Está descrito em Toxicologia Ambiental. Brasil/MS/Funasa... Que diariamente

inalamos, individualmente, cerca de 10 a 20 mil litros de ar contendo inúmeros tipos de

poluentes sob forma de gases e partículas respiráveis como fibras e até microorganismos

vivos. Enquanto outros são lançados e disseminados amplamente n atmosfera,

responsável pelo transporte e veiculação desses poluentes para os demais

compartimentos ambientais.

“...É duas vezes no ano, vários dias, porque uma vez eles colocam “veneno” pra mata

a cana pra fazer nova plantação, aí passam seis meses eles colocam de quatro a cinco

meses, “remédio” pra matar o mato, entendeu? Eles botam pra mata a cana, primeiro

“veneno”, depois eles botam quando a cana esta crescendo, “veneno”pra mata a cana

e até se usa o próprio avião pra bota adubo, enche de adubo e sai espalhando pelas

cana(...) (Entrevista 03).

“...Muitas vezes, já aconteceu comigo, que eu vinha pro trabalho e o avião passa

jorrando “remédio”, que eu chego aqui espirrando, de nariz entupido, com alergia, só

por causa do “veneno” que eles jogam na cana(...) Entrevista 03).

“...Várias pessoas reclamam que estavam parados e o avião passa, joga o “remédio”

que eles não têm nem cuidado de desligar aquela bombinha quando as pessoas estão

71

passando, ele não ta nem ai, direto com tudo, joga mesmo, não quer nem saber quem

esta lá embaixo, seja mato, que seja gente, eles jogam mesmo” (Entrevista 03).

Nestas falas, o primeiro aspecto a ressaltar é o reconhecimento da técnica, no uso dos

agrotóxicos. O segundo aspecto é o quão invasivo é esse processo, e os transtornos que

o mesmo acarreta na saúde da população. Continuando a preocupação com que se

estuda as formas de continuação do meio ambiente Brasil/MS/Funasa, coloca que, “em

se tratando de poluição ambiental, a utilização, única e simplesmente, dos limites de

concentração das substâncias tóxicas, presentes no meio ambiente, a fim de subsidiar

medidas e ações de controle dos riscos à saúde não tem se mostrado completamente

efetiva. Este tipo de controle dos níveis de poluentes no meio ambiente, baseado

somente nos limites máximos previamente estabelecidos pelos órgãos ambientais, sem

levar em consideração a quantificação da exposição da população, isto é, o

conhecimento dos hábitos populacionais quanto ao tipo de uso dos recursos do

ambiente, não contempla, como um todo, o entendimento do conceito de risco” (

Klaassen &Eaton, l99l).

Outro aspecto é a desinformação sobre a natureza do produto e as críticas quanto ao

descaso que a população enfrenta frente aos anseios de obter respostas sobre suas

reivindicações. Esse limiar entre reconhecimento & desconhecimento parece-nos um

dado importante que se manteve na fala dos entrevistados.

“... Mas acho que ninguém tem informação (...) o quê que é isto! Ninguém passo pra

gente o que é isso, pra que isso? Até aí eles fazem e gente sem saber de nada (...) de

onde é esse avião, pra quê? Eu acho que eles deveriam colocar esse veneno em

horário...sei lá! Mais cedo ou mais tarde “. (Entrevista 01).

“...Que é normal, que eles tem que usar, que muitas vezes fica sem resposta e continua

todo ano fazendo isso (...) todo ano”. (Entrevista 03)

A legislação estabelecida para limites de tolerância é regulamentada pela Portaria n-

3214 de 08 de junho de 1978 (NR-15, anexo n-11), do ministério do Trabalho. (essa

norma regulamentadora faz menção aos “agentes químicos cuja insalubridade é

72

caracterizada por limite de tolerância e inspeção no local do trabalho. (Livro Noções

gerais de toxicologia ocupacional, Paulo Eduardo de Toledo salgado pg 103).

Estas leis visam apenas a insalubridade dos trabalhadores, e qual lei, protegerá uma

população inteira de crianças, mulheres e idosos, expostos constantemente, sem

nenhuma informação sobre o que estão derramando sobre suas cabeças?

“...É ! Eu queria pedir que tomassem providência, que é proibido uso de aviões pra

botar esses “venenos” em plantações, que pode causar um prejuízo maior ao meio

ambiente, inclusive as crianças que estão brincando aí, tudo que é lugar e também no

caminho; Machadinha, sítio, está sempre o avião colocando esses “venenos”, pode

prejudicar a saúde de alguém mais grave, ninguém sabe o risco que a gente está

correndo, até mesmo um adubo”. (entrevista 02)

Verificamos que, entre nossos entrevistados houve um reconhecimento do impacto

ambiental pela observação empírica e experiência não científica, destacando os

prejuízos a Fauna, Flora, Água e ao Solo O homem ainda está longe de saber tudo o que

está entre o Céu e a Terra e existem muitas coisas que tecnicamente não se resolvem. O

ciclo da vida é fundamental; as plantas verdes com a ajuda de sua clorofila captam a luz

solar que, em presença do gás carbônico e água transforma em substância química, seja

a fotossíntese, ou quimiossíntese, em que o pigmento verde das plantas age como

catalisador, assim as plantas servem de alimento para animais e homens, que formam

seus corpos tanto com os minerais, bem como com substâncias orgânicas. Assim

pensamos a vida, na sua pureza ideológica, mas desde que o homem começou a sua

evolução na busca de tudo controlar, ele foi perdendo gradativamente a sua ligação com

a natureza, com Deus, com a religião e com a moral do livro agroecologia (Ana

Primavesi,1997)

“...Ah! isso ai, eu acho que pode ser benefício pra lavoura, mas acho uma agressão à

natureza, porque eu tenho notado que as árvores e os pássaros que haviam antes aqui,

deixou de existir. Muitas vezes você encontra passarinho morto por aí em conseqüência

desse “remédio”, algumas plantas poderiam nascer, não existem mais, principalmente

as árvores frutíferas de antigamente; a cana era mais distante da curva, daquela curva

73

pra lá, que eu me lembre, de lá não via cana. Esse campo era infestado de frutas; era

goiaba, laranja, arasas, frutas assim normais do campo. Não existe mais isso, então

com a chegada da cana pra perto da fazenda “Machadinha” e com esse envolvimento

(...) com essa “química que eles colocam aí, mudou muita coisa, inclusive pra saúde do

pessoal”. (Entrevista 04)

Com uma alimentação modificada adaptada à geração de lucros mas não à saúde,

culturas agrícolas, animais e o próprio homem degeneram, apesar de toda engenharia

genética. (livro Agroecologia (Ana Primavesi) pg 11.

“...Ah! na maioria das vezes, muitas vezes a gente esta lá em casa, seis horas da

manhã, o avião já ta botando “veneno” aí na cana, nas roças próximo, inclusive no

canal onde a maioria da população do sítio Santa Luzia pesca e , devido a esse

“veneno”, que eles colocam aí nas plantações, ocorre a morte de outros animais

silvestres, inclusive cobras que é um animal que vive escondido, o”veneno” é tão forte

que ocasiona a morte de muitos animais, já cansei de ver canário da terra morto por aí,

(...) é papa capim, tizil, biquim, vê muito passarinho desses mortos depois que eles

botam esse “inseticida” que eles colocam nos canaviais”. (Entrevista 02)

“...Aqui em Machadinha, várias vezes mesmo, dentro do poço. Teve uma época que a

gente tinha que compra plástico pra tapar, pro “veneno” não cair no poço, de verdade

mesmo, que já tava caindo”. (Entrevista 03)

“...Olha só (...) depois de uns tempos a gente passou a perceber que onde o avião

passou a plantação ficou toda queimada como se fosse um fogo (...) eu percebi isso

depois que esse avião passou ficou tudo queimado” (Entrevista a1)

Verificamos que surgiu, como de relevância os danos à saúde, ressaltando os sintomas

físicos mais facilmente percebidos como: dores de cabeça, alergias, enjôo, bronquite,

dores no corpo, acidentes com instrumentos de trabalho, e os neurológicos e

comportamentais como: aprendizagem, memória, atenção, agressividade e suicídio.

Assim as concepções sobre o adoecimento não são sempre ligados ao que causa o

74

problema de saúde, mas busca uma compreensão através das diferentes dimensões e

complexidades.

“...As vezes aparece com náuseas do cheiro do “herbicida”, muita gente aparece com

vômito e com enjôo. Várias crianças ficam com bronquite alérgica”. (Entrevista 01)

“...Ah! de adolescentes eu já vi caso de se queixarem muito de dores pelo corpo, dores

de cabeça, uma vez arranhão de arame, mexe com cerca, e por aí” (...) Entrevista 02

“...Ele trabalhava o dia todo a troco de um prato de comida, sem direito a café, aí eu

chamei ele pra ir lá pra casa e ele foi, e está lá até hoje, na verdade quando eu tirei ele

da roça, ele tava com sete anos na lavoura trabalhando”. (Entrevista 03)

“É! Você se corta com a folha e até mesmo com o próprio facão, você corre mais risco

de se cortar com o facão porque a palha pode escorregar o facão, e aí o facão (...)

corta a gente” ( Entrevista 03)

“...Olha, as crianças daqui têm um problema, que eu estou esse tempo todo e não

consegui constatar o porque disso, e sempre falo com os coordenadores, com os

professores que não sei porque que termina o ano como se eles aprendessem, aquela

coisa básica, aquele ensino que foi dado; quando retornam, eles voltam como se

nunca tivessem visto nada, nada...; até um pouco, um período assim, as férias de Julho,

que são 20 dias e não 30, porque estudam um pouco em Julho, né? Eu fico... (Gente, o

quê que é isso que essas crianças quando voltam, voltam na esta zero) E não é só os

pequenos não, são os maiores também; crianças que até sabe escrever o nome, seu

próprio nome, esquecem. Gente, eu não sei o quê que acontece com essas crianças, o

que disso, aí a gente fica conversando pra ver, pra fazer uma pesquisa , aí as

professoras já vem, aí eu aviso, faz um teste aí pra ver se.... –“Continua alguns,

continua sim, outros não tão legal”. Agora, a maioria é sempre os maiores, maior que

eu digo é assim, as crianças da segunda série, da terceira, da quarta,...até da quarta

75

série. Ainda brinco com eles, “(vocês estão comendo muita casca de queijo, tão ficando

muito esquecidos. Não é possível, vocês já viram tudo isso!”. (Entrevista 06)

“...Tem uma criança aqui, que é muito agressiva, quando ele se irrita, eu acredito que

seja porque ele mora com a avó. Não tem carinho da mãe; ele é até uma pessoa ótima

de se lida, mas depois que ele se irrita, não respeita ninguém, aí eu acredito que isso

seja falta de carinho”. (Entrevista 02)

A neurotoxicidade de alguns compostos químicos pode se manifestar através de

alterações e disfunções motoras, sensoriais, comportamentais, cognitivas, de memória e

de desenvolvimento. Exposições crônicas podem comprometer a velocidade de

condução dos nervos periféricos por afetar diretamente a bainha de mielina. Doença de

Parkinson e de Alzheimer, esclerose lateral amiotrófica e neuropatias periféricas graves

parecem estar correlacionadas com exposições crônicas às substâncias tóxicas

ambientais. Efeitos crônicos de compostos orgânicos voláteis podem ser avaliados

através de testes neurocomportamentais.(Brasil/MS/Funasa 2000 4.6 MR

“...Agridem não só com palavras, mas fisicamente, com soco no outro; semana passada

mesmo, eu tive que intervir, erram até primos, só porque um esbarrou, começo dando

murro na prima. Eu falei; “que é isso filho, não pode bater assim não, ainda mais que

vocês estudam na mesma escola, moram na mesma comunidade...” (Entrevista 06)

“...Você esta falando, e ele não quer te obedecer, perde mesmo o controle, você segura,

ele tenta te morder e não se controla não, não quer nem saber que sou eu, que é a

professora que está falando com ele, fica descontrolado. Melhorou um pouco, mas

ainda tem alunos assim, isso mais os maiores”. (Entrevista 06)

“...Recentemente, três suicídios, todos os três, enforcamento. O primeiro foi..., era

aluno do grupo da noite de jovens e adultos; ele estudava à noite e o terceiro ele era

menor; menos de 14, na época ele estava com quatorze anos, mas estudava de dia

conosco. Esse eu fui até o local e não gosto nem de lembrar como que, eu vi né? Não

parecia assim ter sido ele, uma coisa horrível! Não estava com o corpo totalmente

76

pendurado, estava com a metade do corpo no chão, só a cabecinha assim com a corda

no pescoço; numa árvore baixinha (...) Aí teve perícia, tudo assim, né; ficava todo

mundo –“Gente, cadê? não tem nada ali!” nada onde ele se bateu, nada, não parecia

nada, um troço muito incrível. Agora os outros foi em período de férias (eu não vi.)”

(Entrevista 06)

Observamos, ainda, que, na prática, a consistência e uniformidade na visão sobre o

processo do que causa os problemas de saúde, vêm no bojo também dos transtornos

causados na vida cotidiana; quando a informante se refere ao “banho de veneno” a que

foi exposta no trajeto de casa para o trabalho.

“...Eu ouvi um barulho de avião, vi que o avião veio se aproximando e pensei que ele

fosse parar de jogar o “veneno”, mas na verdade, ele não parou”

“...Ah, foi rápido que ele vinha e aí, ia até uma distância, eu tentava correr para ele

não voltar, ai depois ele voltou e não jogou, aí quando vinha, ele jogava”

“...Caiu na minha cabeça, caiu nos meus braços, minha roupa ficou cheia de pinguinho

branco; minha pele secou e ficou na minha pele”

“...Química que poderia me prejudicar, ter um câncer de pele, eu perder a visão, queda

de cabelo, pensei tudo isso na hora”(...) (Entrevista 01)

Os efeitos acumulativos se observam quando uma substância causa um efeito adverso

que é imperceptível por si mesmo, e, se elimina do sistema depois. Com freqüência a

soma destes pequenos efeitos somente são observados quando os danos já são

irreversíveis.( segundo livro de toxicologia ambiental –Lilia. Albert pg 9.)

Verificamos que a atividade se rendeu à variação do tempo. As concepções sabre o

adoecimento mudaram de foco; o que matava instantaneamente, continua, só que de

maneira gradativa e sem controle, porque agora vem junto com o ar que respiramos, é o

que nos faz pensar quando analisamos a fala de uma mãe que perdeu seu filho após um

77

dia de trabalho na lavoura, fazendo o que sempre fazia com uma “bomba” nas costas

passando inseticida.

“...O meu filho morreu disso, o meu filho morreu sobre o remédio dessa cana, porque

eles não davam leite (...) pra recompensar pelo “remédio”; e meu filho foi trabalhar

com o tal do (costal), posto nas costas; levava sua garrafa de leite, mas só uma latinha

ora 8 dias que a usina mandava dar; uma latinha pra oito dias. Se lá tinha pra oito

dias, dava o que com esse “remédio brabo; então eu sou um pouco revoltada com esse

remédio. Eu pedi a meus outros dois filhos, que tenho mais dois filhos homem, enquanto

eu existir viva, se tiver esse “remédio” pra eles (...) sai fora, não vão colocar este

“remédio”, porque eu perdi um filho com esse “remédio...

“...Ressecou a garganta, ressecou o peito do meu filho, atacou o coração do meu filho;

meu filho foi embora (...) É triste para uma mãe, um filho deixar um filho no ventre da

mulher sem poder conhecer. Acabou, meu filho não recebeu o direito dele, não recebeu

nada pra deixar pro próprio filho dele que estava no ventre da mãe, da mulher dele”

“...Eu, pra mim, achei que o avião pra mata, mato, foi um troço bom... porque

melhorou um pouco pra pessoa que trabalha só no braço, porque antes as pessoas

trabalhavam com aquela bombinha nas costa” (Entrevista 07)

I

78

10. CONCLUSÃO

Queremos salientar a riqueza que marcou a trajetória deste estudo, esperando trazer

algumas respostas e também despertar o interesse em novas pesquisas no campo da

Saúde Coletiva.

Verificamos através de testes neuropsicológicos e informações recebidas, a necessidade

de estudos mais aprofundados, com a finalidade de criar estratégias para interface entre

a Erradicação do Trabalho Infanto-juvenil e garantia de uma vida mais digna e sem

riscos para a saúde da população.

Consideramos que nosso estudo ofereceu uma dupla face, composta de um viés mais

estatístico e de um outro mais qualitativo, que se complementam. Acreditamos que os

resultados possam aprofundar os achados que, por ora oferecemos como de maior

relevância, quando apontam uma homogeneidade quanto às opiniões dos entrevistados

no que se refere aos malefícios do uso de agrotóxicos em plantações, com prejuízo para

a saúde da população. No discurso dos nossos entrevistados, fica patente a sua

percepção sobre os riscos a que aquela comunidade está submetida, assim como os

prejuízos verificados a saúde daquela população; o que nos traz um alto grau de

responsabilidade na condução de iniciativas que alterem este cenário.

Como profissionais da área de Saúde Coletiva, temos a missão de exercer o papel de

agentes da sensibilização das autoridades no que se refere ao cumprimento das leis já

existentes, que podem e devem interromper o uso criminoso e desenfreado dos

agrotóxicos.

A simplicidade das palavras e sensibilidade dos entrevistados, vem ao encontro dos

resultados obtidos por técnicas mais “científicas”. Dito isso, sintetizamos nossas idéias,

reafirmando a importância da abertura para novos paradigmas em Saúde Coletiva. É

imprescindível a aliança entre as várias ciências, para que juntas, possam encontrar

melhores caminhos na transformação dos problemas em desafios que nos possam prover

de coragem para enfrentá-los. Pois qualquer programa feito para aumentar a produção,

não tem, afinal, razão de ser senão colocado à serviço das pessoas. O objetivo tem de

ser reduzir desigualdades, combater discriminações, libertar o homem da servidão;

torná-lo capaz de, por si próprio, ser o agente responsável do seu bem estar material,

79

progresso moral e desenvolvimento espiritual... Portanto, é urgente começar a

transformação, pois são muitos os homens que sofrem, e aumenta a distância que separa

o progresso de uns da estagnação e, até mesmo do retrocesso de outros. O choque entre

as civilizações tradicionais e as novidades da civilização industrial, quebra as estruturas

que não se adaptam às novas condições, que chegam ao mesmo tempo oportuníssimas,

mas com um brado de alerta.

Para se colocar acima da técnica científica, os “valores fundamentais” como: Liberdade,

Dignidade, Justiça e Saúde, resultado de uma maneira própria de resolver os problemas

do homem de maneira consciente a fim de dar um conjunto de respostas à sua situação

tanto individual, como no mundo. E o propósito é que estes dados que foram

apresentados tragam uma série de reflexões sobre o assunto, para que não seja publicado

apenas mais um estudo onde se explicite não somente a perspectiva teórica, mas

também uma conduta a ser seguida.

11 BIBLIOGRAFIA

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12 ANEXOS

ANEXO I - QUADRO I - DESCRITIVO DOS LOCAIS E SERVIÇOS

CONSIDERADOS PERIGOSOS OU INSALUBRES PARA MENORES DE

18(DEZOITO) ANOS SEGUNDO A PORTARIA Nº 20, DE 13 DE SETEMBRO DE

2001

82

1 trabalhos de afiação de ferramentas e instrumentos metálicos em afiadora, rebolo ou

esmeril, sem proteção coletiva contra partículas volantes

2 trabalhos de direção de veículos automotores e direção, operação, manutenção ou limpeza

de maquinas ou equipamentos, quando motorizados e em movimento, a saber: tratores e

maquinas agrícolas, maquinas de laminação, forja e de corte de metais, maquinas em

trabalhos com madeiras, serras circulares, serras de fita e guilhotinas, esmeris, moinhos,

cortadores e misturadores, equipamentos em fabricas de papel, guindastes ou outros

similares, sendo permitido o trabalho em veículos, maquinas ou equipamento parados,

quando possuírem sistema que impeça o seu acionamento acidental

3 trabalhos na construção civil ou pesada

4 trabalhos em cantarias ou no preparo de cascalho

5 trabalhos na lixa em fabricas de chapéu ou feltro

6 trabalhos de jateamento em geral, exceto em processos enclausurados

7 trabalhos de douração, prateação, niquelação, galvanização, anodização de alumínio,

banhos metálicos ou com desprendimento de fumos metálicos.

8 trabalhos na operação industrial de reciclagem de papel, plástico ou metal.

9 trabalhos no preparo de plumas ou crinas

10 trabalhos com utilização de instrumentos ou ferramentas de uso industrial ou agrícola com

riscos de perfurações e cortes, sem proteção capaz de controlar o risco

11 trabalhos no plantio, com exceção da limpeza, nivelamento de solo e desbote; na colheita,

beneficiamento ou industrialização do fumo.

12 trabalhos em fundições em geral

13 trabalhos no plantio, colheita, beneficiamento ou industrialização do sisal

14 trabalhos em tecelagem

15 trabalhos na coleta, seleção ou beneficiamento de lixo

16 trabalhos no manuseio ou aplicação de produtos químicos de uso agrícola ou veterinário,

incluindo limpeza de equipamentos, descontaminação, disposição ou retorno de

recipientes vazios

17 trabalhos na extração ou beneficiamento de mármores, granitos, pedras preciosas, semi-

preciosas ou outros bens minerais

18 trabalhos de lavagem ou lubrificação de veículos automotores em que se utilizem

83

solventes orgânicos ou inorgânicos, óleo diesel, desengraxantes ácidos ou básicos ou

outros produtos derivados de óleos minerais

19 trabalhos com exposição a ruído continuo ou intermitente, acima do nível de ação previsto

da legislação pertinente em vigor, ou a ruído de impacto.

20 trabalhos com exposição a radiações ionizantes.

21 trabalhos que exijam mergulho.

22 trabalhos em condições hiperbáricas.

23 trabalhos em atividades industriais com exposição a radiações não-ionizantes

(microondas, ultravioleta ou laser).

24 trabalhos com exposição ou manuseio de arsênico e seus compostos, asbestos, benzeno,

carvão mineral, fósforo e seus compostos, hidrocarbonetos ou outros compostos de

carbono, metais pesados(cádmio, chumbo, cromo e mercúrio) e seu compostos, silicatos,

ou substâncias cancerígenas conforme classificação da Organização Mundial de Saúde.

25 trabalhos com exposição ou manuseio de ácido oxálico, nítrico, sulfúrico, bromídrico,

fosfórico e pícrico.

26 trabalhos com exposição ou manuseio de álcalis cáustico.

27 trabalhos com retirada, raspagem a seco ou queima de pinturas.

28 trabalhos em contato com resíduos de animais deteriorizados ou com glândulas, vísceras,

sangue, ossos, couros, pêlos ou dejeções de animais.

29 trabalhos com animais portadores de doenças infecto-contagiosas.

30 trabalhos na produção, transporte, processamento, armazenamento, manuseio ou

carregamento de explosivos, inflamáveis líquidos, gasosos ou liquefeitos.

31 trabalhos na fabricação de fogos de artifícios.

32 trabalhos de direção e operação de maquinas ou equipamentos elétricos de grande porte,

de uso industrial.

33 trabalhos de manutenção e reparo de maquinas e equipamentos elétricos, quando

energizados.

34 trabalhos em sistemas de geração, transmissão ou distribuição de energia elétrica.

35 trabalhos em escavações, subterrâneos, pedreiras, garimpos ou minas em subsolo ou a céu

aberto.

36 trabalhos em curtumes ou industrialização do couro.

84

37 trabalhos em matadouros ou abatedouros em geral.

38 trabalhos de processamento ou empacotamento mecanizado de carnes.

39 trabalhos em locais em que haja livre desprendimento de poeiras minerais.

40 trabalhos em locais em que haja livre desprendimento de poeiras de cereais(arroz, milho,

trigo, sorgo, centeio, aveia, cevada, feijão ou soja) e de vegetais(cana, linho, algodão ou

madeira).

41 trabalhos na fabricação de farinha de mandioca.

42 trabalhos em industrias cerâmicas.

43 trabalhos em olarias nas áreas de fornos ou com exposição a umidade excessiva.

44 trabalhos na fabricação de botões ou outros artefatos de nácar, chifre ou osso.

45 trabalhos em fabricas de cimento ou cal.

46 trabalhos em colchoarias.

47 trabalhos na fabricação de cortiças, cristais, esmaltes, estopas, gessos, louças, vidros ou

vermizes.

48 trabalhos em peleterias.

49 trabalhos na fabricação de porcelanas ou produtos químicos.

50 trabalhos na fabricação de artefatos de borracha.

51 trabalhos em destilarias ou depósitos de álcool.

52 trabalhos na fabricação de bebidas alcoólicas.

53 trabalhos em oficinas mecânicas em que haja risco de contato com solventes orgânicos ou

inorgânicos, óleo diesel, desengraxantes ácidos ou básicos ou outros produtos derivados

de óleos minerais.

54 trabalhos em câmaras frigoríficas.

55 trabalhos no interior de resfriadores,casas de máquinas, ou junto de aquecedores, fornos

ou alto-fornos.

56 trabalhos em lavanderias industriais.

57 trabalhos em serralherias.

58 trabalhos em indústria de móveis.

59 trabalhos em madeireiras, serrarias ou corte de madeira.

60 trabalhos em tinturarias ou estamparias.

85

61 trabalhos em salinas.

62 trabalhos em carvoarias.

63 trabalhos em esgotos.

64 trabalhos em hospitais, serviços de emergências, enfermarias, ambulatórios, postos de

vacinação ou outros estabelecimentos destinados ao cuidado da saúde humana em que se

tenha contato direto com os pacientes ou se manuseie objetos de uso destes pacientes não

previamente esterilizados.

65 trabalhos em hospitais, ambulatórios ou postos de vacinação de animais, quando em

contato direto com os animais.

66 trabalhos em laboratórios destinados ao preparo de soro, de vacinas ou de outros produtos

similares, quando em contato com animais.

67 trabalhos em cemitérios.

68 trabalhos em borracharias ou locais onde sejam feitos recapeamento ou recauchutagem de

pneus.

69 trabalhos em estábulos, cavalariças, currais, estrebarias ou pocilgas, sem condições

adequadas de higienização.

70 trabalhos com levantamento, transporte ou descarga manual de pesos superiores a 20

quilos para o gênero masculino e superiores a 15 quilos para o gênero feminino, quando

realizado raramente, ou superiores a 11 quilos para o gênero masculino e superiores a 7

quilos para o gênero feminino, quando realizado frequentemente.

71 trabalhos em espaços confinados.

72 trabalhos no interior ou junto a silos de estocagem de forragem ou grãos com atmosferas

tóxicas, explosivas ou com deficiência de oxigênio.

73 trabalhos em alturas superiores a 2,0 (dois) metros.

74 trabalhos com exposição a vibrações localizadas ou de corpo inteiro.

75 trabalhos como sinalizador na aplicação aérea de produtos ou defensiva agrícolas.

76 trabalhos de desmonte ou demolição de navios e embarcações em geral.

77 trabalhos em porão ou convés de navio.

78 trabalhos no beneficiamento de castanha de caju.

79 trabalhos na colheita de cítricos ou de algodão.

80 trabalhos em manguezais ou lamaçais.

86

81 trabalhos no plantio, colheita, beneficiamento ou industrialização da cana-de-açúcar.

87

ANEXO II – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

NÚCLEO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA DA UNIVERSIDADE FEDERAL

DO RIO DE JANEIRO

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Declaro que estou esclarecida(o) de que:

O objetivo deste trabalho é avaliar os efeitos do trabalho na plantação de cana-

de-açúcar na saúde de crianças e adolescentes afastadas do trabalho através do

Programa de Erradicação do Trabalho Infantil “PETI”, sendo coordenado pela Dra.

Marlei Romero.

Este estudo será realizado em crianças e adolescentes pertencentes ao Programa PETI e

estudantes das escolas municipais:

A realização desta atividade não oferece riscos para a saúde do meu (minha)

filho(a) e a qualquer momento posso recusar a participação dele(a) e contactar a

Comissão de Pesquisa do NESC através dos telefones: (21) 2562 6040 e 2562 6041.

Será marcada uma data para divulgação do resultado do estudo e, caso seja

detectada alguma anormalidade, meu (minha) filho(a) será encaminhado (a) para

avaliação clínica.

Sendo assim autorizo a participação de meu (minha) filho(a) através de entrevistas e

aplicação de teste psicológico para a realização desse trabalho.

Quissamã, de de 2002

Assinatura

88

Caso você assine este termo de consentimento livre e esclarecido, seu nome e de

seu filho será mantido em sigilo. Isto significa que a divulgação dos resultados da

entrevistas será realizada sem que seja possível identificar os participantes.

ANEXO III – QUESTIONÁRIO

Número ______________

População: 1= Nunca exposto 2 = Em exposição 3= Ex. exposto

Quanto tempo afastado de contato com pesticida? Ano/mês , idade anos

Sexo: 1= Feminino Escolaridade 1= Analfabeto

2= Masculino 2 = Fundamental

3 = Fund. Incomp.

4= 2º Grau

5 = 2º Grau incomp.

Endereço: _______________________________ Bairro:___________________

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Há quanto tempo estar no programa PET? Ano/mês ,..

Com que idade começou a trabalhar? anos.

Seu primeiro trabalho foi agricultura? 1=Sim 2= Não

Quantos trabalhos teve até hoje?

Qual era seu ganho na época em que trabalhava? 1= Nenhum 2= até meio salário.

Seu último trabalho foi em canavial? 1= Sim 2= Não

Quantas horas por dia você trabalhava? 1= menos de 4 2= entre 4e 8 = 3 acima

de 8

Que horas iniciava seu dia de trabalho? ___________________________

Quanto tempo levava para chegar ao trabalho ______________________

Você tinha patrão ou trabalhava para família? 1= Patrão 2= Família

Qual o tipo de trabalho que fazia? _______________________________

Qual a meta a atingir na produção diária? _________________________

Qual o instrumento de trabalho que era utilizado?

Instrumento de trabalho 1: _____________________

Instrumento de trabalho 2: _____________________

Instrumento de trabalho 3: _____________________

Instrumento de trabalho 4: _____________________

Durante o período em que trabalhou teve contato com produtos químicos (veneno,

pesticida)? 1= Sim = Não

14a. Qual o tipo de contato? =1 Físico = 2 Exposição

15. Qual a freqüência de contato com estes produtos? 1= Diário 2= Semanal = 3

Eventualmente 9 = Nenhum

16. Você manuseava o produto? 1= Sim = Não

17. Na aplicação dos produtos químicos você continuava trabalhando?

1= Sim = Não

18. Você já fez aplicação de produtos químicos? 1= Sim = Não

19. Trabalhava com roupa especial? .................. 1= Sim = Não

20. Usava alguma proteção na cabeça? ............. 1= Sim = Não

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21. Onde eram guardados os produtos químicos? 1= Local apropriado

2= Local improvisado

3= Em casa

22. Qual o instrumento usado para borrifar o produto químico?

23. Lembra o nome de algum produto químico que fazia uso?

24. Qual tipo de roupa usava para trabalhar normalmente?

25. Seus pais trabalhavam na lavoura também? 1= Sim = Não

26. Quantas gerações de sua família trabalha na lavoura: 1= Bisavós 2= avós

3= pais 9= não sabe

27. Você gostava de trabalhar na lavoura? ................... 1= Sim = Não

28. Teve algum problema de saúde nos últimos 15 dias? 1= Sim = Não

29. Quando trabalhava ficava doente com freqüência? 1= Sim = Não

30. Já sofreu algum acidente enquanto trabalhava? 1= Sim = Não

30a. Quantos acidentes?

30b. Que tipo de acidente?

_____________________________________

31. Esteve internado por problemas de saúde nos últimos cinco anos? 1= Sim =

Não

32. Enquanto trabalhava na lavoura teve algum destes sintomas:

1=dores na cabeça

2= enjôo

3= dores nas costas

4= dores abdominais

5= tontura

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6= desmaio

7= falta de ar

8= indisposição física

33. Já teve alguma doença que você acha que foi causada pelo trabalho?

1= Sim = Não

34. Você gostava de trabalhar na lavoura? ........................... 1= Sim = Não

35. Depois que você parou de trabalhar na lavoura, sua vida melhorou?

1= Sim = Não

36. Qual a renda familiar hoje? 1= menos um salário mínimo

2 = até dois salários mínimos acima de 3 salários mínimos

37. O que você faz hoje para se divertir? _________________________

38. No futuro você gostaria de voltar a trabalhar na lavoura ? 1= Sim = Não