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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE EDUCAÇÃO- CURSO DE PEDAGOGIA
TRABALHO DE CONCUSÃO DE CURSO
KALLYNNY VARELA BORGES DA SILVA
RETALHOS DE VIDA PARA TESSITURA DE MINHA SUBJETIVIDADE
NATAL
2016
2
KALLYNNY VARELA BORGES DA SILVA
RETALHOS DE VIDA PARA TESSITURA DE MINHA SUBJETIVIDADE
Memorial de formação acadêmica
apresentado ao Curso de Pedagogia da
Universidade Federal do Rio Grande do
Norte- UFRN, no semestre letivo 2016.2,
como requisito parcial à obtenção do Grau
de Licenciado em Pedagogia.
Orientadora: Professora Drª Kilza Fernanda Moreira de Viveiros
NATAL
2016
3
KALLYNNY VARELA BORGES DA SILVA
RETALHOS DE VIDA PARA TESSITURA DE MINHA SUBJETIVIDADE
Memorial de formação Acadêmica apresentado ao Curso de Pedagogia da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, no semestre letivo 2016.2,
como requisito parcial à obtenção do grau de Licenciado em Pedagogia.
Aprovado em: ____/_____/_______
Banca Examinadora:
___________________________________________________________________
Professora Dra Kilza Fernanda Moreira de Viveiros – UFRN - Orientadora
___________________________________________________________________
Professora Dra. Maria Da Paz Siqueira de Oliveira - UFRN
___________________________________________________________________
Professor Msc. Alexandre Remo Miranda de Araújo
4
FICHA DE CATALOGAÇÃO
5
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todas as crianças e suas infâncias, em especial a todas
aquelas que pude contribuir de alguma forma ao seu processo educacional!
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AGRADECIMENTO
Agradeço primeiramente a Deus, pelo dom da vida!
A minha família, em especial minha mãe, meu esposo e minha sogra por todo
incentivo diário!
A todos os meus alunos, que muito contribuíram para busca da minha formação, em
especial Gabriella, Anna Laura, Allana, Marina, Maria Clara, Francisco, Thaís e
Sarah!
A minha orientadora Kilza Fernanda Moreira de Viveiros, por todo incentivo, carinho
e exemplo de profissional!
A toda equipe da escola, Instituto Reis Magos, por toda educação recebida e
credibilidade a mim confiada desde aluna à profissional, especialmente a Geisa e
Tonita!
Ao NEI- CaP/UFRN por toda experiência e formação, em especial aos queridos
Analice Cordeiro, Sandro, Fátima , Adele,Teresa, Uiliete, Massilde e Vanisa.
A todos os professores que tive ao longo de minha formação acadêmica,
especialmente aos professores : Walter, Tadeu, Moisés, Giane, Mariangela, Jacyene
e Cristina !
7
A SAUDADE é a memória do afeto
A MÚSICA é a memória da alma
O ABRAÇO é a memória do corpo
A AMIZADE é a memória que constrói
O TEMPO é a memória que não espera
O AMOR é a memória que dá sentido.
(GALVÂO)
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RESUMO
SILVA, Kallynny Varela Borges da. Retalhos de vida para tessitura de minha
subjetividade. 2016. Pag.31. Monografia (Curso de Pedagogia). Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, 2016.
Este relato se constitui um memorial, trabalho final do curso de Pedagogia, onde retrato minhas experiências através de um texto autobiográfico, objetivo com este trabalho refletir sobre minha trajetória escolar e acadêmica, contextualizando algumas etapas com marcos históricos, intencionando também tecer relações com teorias estudadas no decorrer de minha formação acadêmica. Para construção dessa autobiografia a fundamentação teórica se deu através de ANGOTTI (2006), CRAIDY (2011), CANDAU (2006), DEMO (2014), LEJEUNE (2013), FERREIRA (2006), FREIRE (2011), KOLH: REGO, (2003), SMOLKA (2000), RAPOPORT (2012), entre outros autores. O memorial contém momentos importantes sobre minha formação acadêmica, no âmbito de Ensino, Pesquisa e Extensão, onde pude me identificar como pessoa e profissional da educação, especificamente no trabalho com crianças pequenas da Educação Infantil que foi o campo de Estudo que me despertou maior interesse. Concluo os relatos considerando a grandiosidade que é a escrita autobiográfica, principalmente no período de conclusão de um ciclo acadêmico, pois através deste percebi o interminável vir a ser inerente ao ser humano durante sua trajetória de vida, onde as formações e práxis contribuem de modo inquestionável para formação pessoal e profissional de um ser humano, sobretudo para àqueles que se dedicam à educação.
Palavras Chaves: Memórias, Prática Docente, Educação Infantil.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................10
1. A DELICADEZA DOS PRIMEIROS RETALHOS ...........................................13
1.1 O “B”, “A”, “BA” DA DA TESSITURA ..............................................................15
1.2. O AFETO NA CONSTRUÇÃO .........................................................................16
1.3. A MUDANÇA NA LINHA NECESSÁRIA ..........................................................17
1.4. A FORMAÇÃO DA COLCHA TÃO SINGULAR ...............................................18
2. O RETALHO SUPERIOR .................................................................................20
2.1. O RESULTADO.................................................................................................24
CONSIDERAÇÕES (...) ....................................................................................28
REFERÊNCIAS ................................................................................................30
10
INTRODUÇÃO
A vida não é máquina mecânica, reprodutiva, mas construção e permanente reconstrução biológica e histórica, dotada de sujeito inalienável. ( Pedro Demo)
Corroborando com o autor acima citado que diz que a vida não é máquina,
porém uma construção permanente e incessante é que inicio este trabalho. Objetivo
escrever uma reflexão a cerca da vida, em específico da minha vida, minhas
memórias, partindo das raízes, dos fundamentos que me constituíram gente, pessoa
e profissional que sou hoje: um memorial.
Segundo Severino,
o Memorial constitui, pois, uma autobiografia, configurando-se como uma narrativa simultaneamente histórica e reflexiva. Deve então ser composto sob a forma de relato histórico, analítico e crítico, que dê conta dos fatos e acontecimentos que constituíram a trajetória acadêmica- profissional de seu autor. ( p.257, 2016)
Para tecer a composição desse relato histórico é necessário buscar
informações na memória e para isso organizei minha escrita como quem organiza
um tecido e todos os instrumentos necessários à construção de uma tecelagem.
Assim usei uma terminologia metafórica para melhor sintetizar essa história e os
resultados dela, a minha formação de educadora.
Nessa perspectiva se torna necessário o debruçamento sobre reflexões que
tratam da memória como fundamento essencial para a escrita de um memorial,
desta maneira trago algumas reflexões dos autores abaixo:
Essa busca na memória, esse passeio curioso, disciplinado, prazeroso, é, com o passar do tempo, um passeio que nos mostra determinadas erosões. Como a terra muda, a memória também sofre variações, erosões, lapsos, fissuras. Quanto mais o tempo passa, às vezes, maiores as fissuras. Já, às vezes, por mais que o tempo passe, a nitidez das imagens e dos sons de certos momentos da própria história continua intacta. (FREIRE; GUIMARÂES, 2011, p. 29)
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Continuando o discurso sobre a memória, BAKHTIN/VOLOCHINOV 2010a,
p.117 apud ARAÙJO, 2014 nos diz que “O mundo interior e a reflexão de cada
indivíduo têm um auditório social próprio bem estabelecido, em cuja atmosfera se
constrói suas deduções interiores, suas motivações, apreciações etc.”.
Para um estudioso, não há nada mais valioso que se apropriar de sua
história, biografia para a partir do conhecimento de si, poder refletir, se descobrir e
buscar seus ideais etc. Esse exercício do próprio conhecimento é bastante difícil
para algumas pessoas. O autor abaixo citado nos fala que a autobiografia é uma
narrativa que consta a vida do autor pressupõe que haja identidade de nome entre o autor (cujo nome está estampado na capa), o narrador e a pessoa de quem se fala. Esse é um critério muito simples, que define, além da autobiografia, todos os outros gêneros da literatura íntima (diário, autorretrato, autoensaio). (LEJEUNE, 2005, p.24 apud GONÇALVES, 2013)
Essa narrativa como já mencionei, é uma tarefa que exige esforço, para
parar, selecionar fatos e pensar sobre sua vida, sobre si e sua história. A autora
supracitada abaixo afirma que
A definição de sentidos para a própria vida engaja o homem em uma sociobiográfica profunda: intricada invenção de si, que é tanto única e pessoal como enraizada na sua experiência social. Esse é o fundamento da construção social da realidade (Borges; Luckman construção, 1966), da base social das expectativas (Garfinkel, 1967) dos entendimentos compartilhados (Becker, 1963), das pressuposições sociais (Goffman, 1954), entre outras perspectivas para uma abordagem multirreferencial entre a sociologia, a psicologia e a educação. Como experiência social paradigmática, esses sentidos também caracterizam o processo cotidiano de socialização e formação do Eu escolar, deixando uma marca indelével em todos aqueles que passaram por essa experiência. (...) Por outro lado, a narrativa autobiográfica também pode ser compreendida como o registro de experiências sociobiográficas, reveladoras não apenas da construção da personalidade profunda do sujeito e do individuo, mas também esclarecedoras da estruturação de formas e sentidos das instituições e situações sociais de convivência e pertencimento. (SMOLKA,2000,p. 19)
Nós somos seres sociais, culturais, carregados de marcas, crenças e
ideologias que em algum momento de nossas vidas nos foi apresentados. Sobre as
vivências o autor abaixo diz que
constituem o tecido do nosso quotidiano. Nem sempre estas vivências ficam na nossa memória ou propiciam uma ocasião de aprender qualquer coisa recente que vai ficar, enquanto recurso novo, daqui para frente. Pode ser uma ideia nova , um comportamento novo, um saber-fazer num campo de atuação consigo mesmo, com os outros em situações específicas, com
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objetos ou máquinas. È suficiente se referir às competências genéricas transversais que desenvolvi no livro ‘ Experiências de vida e formação’(...) para perceber que a experiência é produzida por uma vivência que escolhemos ou aceitamos como fonte de aprendizagem particular ou formação de vida. Isto significa que temos que fazer um trabalho de reflexões sobre o que foi vivenciado e nomear o que foi aprendido. (JOSSO,p.136, 2009)
Por acreditar que todas as nossas vivências, que poderíamos chamar de
retalhos, compõem um tecido maior que é a vida, e por isso escolhi o título deste
trabalho. Nascemos, crescemos, aprendemos diversas coisas durante toda a nossa
jornada. Vamos passando por processos mentais que nos levam ao
amadurecimento e que vão nos constituindo quem somos.
Iniciarei os relatos das minhas memórias no capítulo um, cujo título nominei:
A delicadeza dos primeiros retalhos, onde buscarei as memórias de minha infância,
educação infantil que vivi, contextualizando os relatos com os acontecimentos
históricos da época.
Posteriormente, o subtítulo: O ‘B’, ‘A’, ‘BA’ da Tessitura, onde relatarei
memórias do meu processo de alfabetização.
Em seguida o subtítulo: O afeto na construção, que retomarei o meu ensino
fundamental I.
Após uma mudança de instituição de ensino, vem o subtítulo: ‘ A colcha tão
singular, que falarei de memórias do ensino fundamental II e concluirei o primeiro
capítulo relatando as vivências do meu ensino médio.
O segundo capítulo, vem intitulado: O retalho superior, onde retomarei minha
entrada na Academia no Curso de Letras Língua Portuguesa, seguindo e finalizando
com o subtítulo: O Resultado, que é o ingresso em meu segundo Curso de
Graduação, o curso de Pedagogia, este que estou concluindo.
Em cada Capítulo como já mencionei, farei relatos de minhas memórias de
vida, tecidos por acontecimentos históricos de cada época.
Finalizo o Memorial com as considerações finais tecidas e organizadas
durante as vivências desses retalhos de minha vida, que muito contribuiu e
contribuirá para o fazer e refazer da minha subjetividade, para minha formação
enquanto educadora.
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1. A DELICADEZA DOS PRIMEIROS RETALHOS
“ Oh! que saudade que tenho da aurora da minha vida, da minha infância querida que os anos não trazem mais(...)” (Cassimiro de Abreu)
Nasci no ano de 1985, dia 20 de setembro na cidade de Natal/RN. Fui a
segunda filha, pois minha mãe havia perdido um bebê antes de mim. Dois anos
depois nasceu o meu irmão. Aos três anos de idade fui à escola, no ano de 1989.
Era uma escola próxima a minha casa, da rede privada.
Nesse período historicamente “A constituição de 1988 representa um marco
histórico na redefinição dos direitos de cidadania tanto do ponto de vista dos direitos
políticos como dos direitos sociais”. CRAIDY, apud MACHADO, 2011, p. 57). Antes
da constituição, a educação de crianças de 0 a 6 anos não era uma prioridade no
nosso ensino. (LANTER apud KRAMER, 2008,p. 136) .
Vivíamos a tendência da didática Histórico-Crítico, a prática pedagógica
estava começando a ser contextualizada, estavam iniciando a valorização do aluno,
visando a sua transformação social.
(...) surgiram propostas de inspiração libertária, portanto em consonância
com os princípios anarquistas. Estas geralmente se assumiam como “Pedagogia da prática” e, diferentemente dos adeptos da visão libertadora, trabalhavam com o conceito de classe. Em diálogo crítico como livro Escola e democracia, que veio a luz em setembro de 1983 (Saviani, 2006a), Oder José dos Santos publicou, em 1985, o artigo ‘ Esboço para uma pedagogia da prática’. Para ele o saber ‘ gerado na prática social’ é relegado pela escola, mas é exatamente esse saber que ‘deve ser valorizado e constituir a matéria prima do processo de ensino’ (Santos, 1985, p.23). Num primeiro momento, esse saber manifesta-se de forma imediata como prática individual. Cabe, pois, num segundo momento, ultrapassar essa aparência e captar sua natureza própria como ‘ síntese de múltiplas determinações’ que, ‘ em última instância, é social, é de classe’. (idem,ibedem). Essa circunstância faz emergir ‘ o ato pedagógico com toda sua carga política’, colocando questões como: Educação para que? A favor de quem? Dá-se, então, a diferenciação das finalidades, dos conteúdos, dos métodos, dos processos, da organização escolar, conforme os interesses de classe.’ Segue-se que o ato pedagógico é, também, um ato político’. (idem,ibidem). É nessa condição que cabe ao professor assumir a direção do processo, deslocando-se o eixo da questão pedagógica do inteiror das relações entre professores, métodos e alunos para a prática social, recuperando-se a critatividade de professores e alunos.( SAVIANI, 2011, p. 416)
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Nesse contexto, a escola em que estudei, praticava um ensino bem
tradicional. Eu estudava no maternal, que equivale hoje o nível I e eram utilizados
livros, com atividades prontas, onde era propostas pinturas, pontilhados etc.
É notório que durante a história muitas mudanças ocorreram e ocorrem,
mas, ela chega a momentos diferentes nos locais e nas instituições de ensino.
Recordo-me que possuía livros como já mencionei, e que quando vinham
atividades de pintura, minha mãe pintava, pois, ela julgava meus rabiscos um modo
“errado” de colorir. Essa prática da minha mãe me faz refletir sobre muitas outras
que julgam, talvez por não entenderem a etapa de desenvolvimento de seus filhos, a
prática de professores que abordam uma didática diferenciada, com mais brincar,
rabiscar literalmente, que são atividades próprias para o desenvolvimento de
crianças pequenas.
Esse é um exemplo que comprova que, muitas vezes nós queremos repetir
a educação que tivemos, pois é a que conhecemos e julgamos correta.
Sobre o ingresso na escola e o processo de adaptação, minha mãe me
relatou o quanto chorei nos primeiros dias, e simplesmente ela me deixava e ia
embora.
A adaptação é difícil não só para criança, mas também para a família e o educador, pois implica reorganizações e transformações para todos. A forma como esse processo é vivencia pelas pessoas envolvidas influencia e é influenciada
pelas reações da criança. (RAPOPORT, 2012, p.54)
Essa questão da adaptação e outras formas retratam o modo como era vista
a educação infantil, as crianças e as infâncias.
A educação higienista, prática que mesmo após os avanços ainda perdurava
nas escolas existentes. A criança vista como aquele ser incapaz, onde devia toda
obediência ao professor, um adulto em miniatura, que não tinha um processo de
adaptação, simplesmente era deixada na escola e os pais e professores não
compreendiam a importância de tal processo.
Na escola na qual estudei os primeiros anos, posso considerar que, existia de
modo geral o respeito pelas crianças, embora, em alguns momentos fosse notória a
prática na perspectiva da didática que mencionei anteriormente, na condição de
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criança me sentia feliz, acolhida, adorava as músicas, brincadeiras o momento do
lanche etc.
1.1 O “B”, “A”, “BA” DA TESSITURA
Ler a palavra e aprender como escrever a palavra, de modo que alguém possa lê-la depois, são precedidos do aprender como ‘escrever’ o mundo, isto é, ter a experiência de mudar o mundo e de estar em contato com o mundo.( Paulo Freire)
Meu ingresso na alfabetização, chamado em minha época de “prézinho”, foi
no ano de 1992. Dois anos anteriores tinha sido criado o ECA, o Estatuto da Criança
e do adolescente
Meu processo de alfabetização foi tranquilo e prazeroso. Aprendi de modo
tradicional, decodificando as letras, posteriormente conhecendo as famílias das
letras, como a professora, “tia”, o modo como chamávamos, ensinava.
Aprendi a ler rápido, sem dificuldades, quando saía para algum lugar
adorava ler os outdoors, sempre que os professores pediam eu lia, fui oradora da
turma e até hoje continuo com o gosto pela leitura.
Em muitos momentos estava em contato com o mundo da leitura, meu pai
era professor, as tias com as quais mais convivia e passava férias também são, e
isso muito contribuiu em todo o processo.
Uma delas adorava contar história na hora que colocava eu e meus primos
para dormir, me lembro com muito carinho e saudade dessa época.
Recordando o processo que vivi para minha alfabetização me faz refletir
sobre o uso das cartilhas e o modo tradicional de leitura, a educação bancária que
até hoje ainda é utilizada, mesmo com os pequenos ganhos da época e dos ganhos
atuais.
Esse processo de aquisição da leitura e escrita é de extrema importância
para o indivíduo. Sobre esse processo ÁVILA diz que
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Na tentativa de entender como se dá esse processo de ler e escrever, do ponto de vista interno do sujeito, Ferreiro e Teberosky (1985) realizaram estudos que representam um salto qualitativo no conhecimento sobre a aprendizagem da leitura e da escrita. Seus estudos vão demonstrar que as crianças constroem hipóteses também a respeito da leitura e da escrita. Do mesmo modo como em um dia se tornaram falantes de sua língua materna, as crianças podem se tornar leitoras e produtoras de texto. Elas se questionam sobre os ‘ riscos’, ‘ sinais’, ‘marcas’ com os quais interagem e formulam hipóteses, colocam à prova essas hipóteses, reconstroem-nas, avançam para patamares superiores, aproximando-as cada vez mais da escrita convencional. (2006,p.31)
Mesmo com os conhecimentos sobre a psicogênese da língua escrita o
ensino em muitas turmas de alfabetização era e continua de modo tradicional e
mecânico sem levar em consideração o conhecimento de mundo das crianças, suas
produções como acima foi citado.
1.2. O AFETO NA CONSTRUÇÃO
Os sentimentos modificam o pensamento, a ação e o entorno; a ação modifica o pensamento, os sentimentos e o entorno; o entorno influi nos pensamentos, nos sentimentos e na ação; os pensamentos influem no sentimento, na ação e no entorno. ( José Antônio Marina)
Neste capítulo, falarei sobre os retalhos do meu ensino fundamental I, que
foi composto da minha primeira série à minha quarta série, que hoje é denominado
quinto ano. Isso foi entre os anos 1993 a 1996. A LDB, Lei de Diretrizes e Bases da
educação Nacional (9.394/96) foi reconhecida exatamente em 1996 e a educação
infantil foi pela primeira vez incluída parte integrante da educação básica. (LANTER,
Apud KRAMER, 2008).
Em todo o meu processo escolar, algo que muito marcou minha trajetória foi
o afeto vivido com meus professores, funcionários da escola e colegas. Até hoje,
mantenho contato com a maioria das minhas professoras da educação Infantil e
fundamental I.
Kohl e Rego, vem nos dizer sobre o afeto que
O ser humano aprende, por meio do legado de sua cultura e da interação com outros humanos, a agir, a pensar, a falar e também a sentir ( não somente como humano, mas por exemplo como ocidental, como um homem
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moderno, que vive numa sociedade industrializada, tecnológica e escolarizada, como um latino, como um brasileiro, como um paulista, como um aluno). Nesse sentido o longo aprendizado sobre emoções e afetos se inicia nas primeiras horas de vida de uma criança e se prolonga por toda sua existência.( 2003, p.13)
Essa explanação das autoras supracitadas, deixam ainda mais evidente a
importância das relações afetivas dos seres humanos no decorrer do processo
educacional e o quão é importante uma criança crescer amada, rodeada de carinho.
1.3. A MUDANÇA NA LINHA NECESSÁRIA
(...) Como são belos os dias do despontar da existência! Respira a alma inocência como perfumes a flor, o mar é lago sereno, o céu um manto azulado. O mundo um sonho domado, a vida um hino de amor (...)! (Cassimiro de Abreu)
Finalizando parte do Ensino Fundamental, quarta série, hoje quinto ano, tive
que estudar em outra escola, pois, a que eu estudava possuía até essa série. Essa
mudança ocorreu no ano de 1997, eu iria cursar a quinta série, hoje sexto ano. Na
segunda escola que estudei, permaneci até o fim do ensino médio.
Apesar de relutar por não querer mudanças, pois era muito feliz na primeira
escola, me adaptei fácil na segunda instituição, fiz novas amizades embora, tenha
continuado algumas, porque três amigas foram comigo. Minha mãe escolheu a
segunda escola por ser próxima a parada de ônibus, assim eu não precisaria
atravessar rua alguma, isso no sexto ano do fundamental com dez anos de idade.
Essa proteção da minha mãe por muito tempo me deixou insegura e
acomodada, estudos sobre o desenvolvimento da criança, o período escolar e sobre
autonomia me fazem enxergar o quão importante é para as crianças o incentivo a
sua autonomia, sua capacidade de desenvolver a independência, de resolver seus
conflitos por menores que sejam, até mesmo desde o berçário.
No ensino fundamental as atividades mais marcantes e significativas foram
aquelas nas quais pude ver concretamente os conceitos estudados. Como por
18
exemplo, em matemática, quando estudava os ângulos em geometria, o professor
nos colocava no pátio da escola e tirávamos as medidas e podíamos vivenciar na
prática o estudado.
Outra atividade marcante foi em Biologia, quando estudávamos sobre os
tipos de plantas, o professor nos levou ao jardim ao lado da escola e nos mostrou as
plantas estudadas no livro e seus tipos de raízes, ramalhete, a que se ramifica, axial
a que cresce apenas para baixo.
Em Língua Portuguesa, saímos nas ruas próximas à escola, com câmeras e
registramos as fachadas que continham erros gramaticais. Foi um debate muito
interessante.
Com outro professor de Biologia, fizemos uma simulação de Júri, sobre a
Eutanásia, tinha os advogados a favor, os contras etc.
Em geografia o professor, realizava bingos sobre os assuntos e era bem
divertido, também construíamos revistas em quadrinhos sobre os assuntos, entre
outras atividades diferenciadas.
É notório que em todos as faixas etárias, as atividades mais marcantes e
nas quais as aprendizagens são mais significativas, são naquelas diferenciadas, nas
quais o aluno aprende brincando, pratica, vivencia .
Historicamente nesse período, o campo educacional já havia alcançado
alguns avanços, como a LDB, entre outras, o que pôde ser vivenciado através da
didática utilizada pelos professores nesse período escolar.
1.4. A FORMAÇÃO DA COLCHA TÃO SINGULAR
Ninguém é sujeito da autonomia de ninguém. Por outro lado, ninguém amadurece de repente, aos vinte e cinco anos. A gente vai amadurecendo todo dia, ou não. A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. ( Paulo Freire)
19
Meu ensino médio foi entre os anos de 2001 e 2003. O terceiro ano e último
foi o primordial, ano de muitos conhecimentos e escolhas. O processo seletivo para
ingresso na Universidade pública e de qualidade era o almejado sonho de muitos
dos pais de colegas meus inclusive do meu pai.
Apesar de amar crianças, não passou pela minha cabeça cursar Pedagogia,
sempre pensava que para trabalhar com crianças teria que fazer medicina, para me
especializar em Pediatria, no entanto, biologia não era uma disciplina que me
chamasse muita atenção.
Eu e minha turma, passamos por muitas palestras conhecemos diversos
cursos, e um que me chamou atenção foi o de Terapia Ocupacional, que até então
só era oferecido pela Universidade Potiguar, UNP, pertencente a rede privada, então
já descartei, pois, eu teria que estudar na Universidade Federal.
Tínhamos aulas a semana inteira inclusive aos sábados e a aprovação era o
foco dos estudos. Eu não pensava no vestibular, mas sim em passar de ano e
acredito que isso me ajudou bastante na aprovação, por parte da minha família não
me sentia cobrada, entretanto, por ver que todos tinham a certeza da minha
aprovação, pela minha trajetória estudantil, na qual sempre fui uma aluna estudiosa,
em que passava por média, não precisava da cobrança dos meus pais, pois, ele,
meu pai, principalmente, sempre deixou claro que minha obrigação era estudar e
tirar boas notas, já que apenas estudava, enfim, por esses fatores eu me cobrava, e
no meu íntimo eu temia não ser aprovada e decepcionar a todos.
Os dias passaram e o momento da escolha chegou, tinha que fazer a opção
pelo curso que tentaria ingressar na Universidade Federal do Rio Grande do Norte,
eu não fazia ideia do que queria, então uma grande amiga me chamou para tentar
Letras- Língua Portuguesa com ela e pensando que gostava muito de ler, assim
optei.
Fui aprovada no primeiro vestibular, passei em 11º lugar, motivo de muita
felicidade para meus pais e minha família, que para todos era certa minha
aprovação.
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2. O RETALHO SUPERIOR
Um dos objetivos de qualquer bom profissional consiste em ser cada vez mais competente em seu ofício. (Antoni Zabala)
Em 2004, ingressei na Universidade Federal, um mundo novo, grandioso, no
qual fui inserida e não fazia ideia da imensidão que me proporcionaria.
Foi tudo novidade, o Campus, em comparação a escola que estudava era
um mundo, e no nosso primeiro dia de aula, o pai da minha melhor amiga, nos
levou. Meu pai estava trabalhando, e minha mãe tinha que ficar em casa com meu
irmão, então fui com eles.
Éramos as mais novas, teve o “trote”, que era umas brincadeiras realizadas
pelos alunos do curso que eram veteranos. Pedimos dinheiro nos sinais da Av.
Roberto Freire, nos sujaram de tinta. Foi uma aventura, uma brincadeira!
Eu não tinha muita dimensão do curso superior, estudava para as disciplinas
do curso, assim como, estudava para as da escola.
Novas experiências vivi na academia, e algo drástico que vivenciei foi a
relação entre professor e aluno. Na faculdade, tudo parecia diferente, os professores
eram carregados de uma sisudez, e isso me causou muito estranhamento, foi um
choque em relação a realidade a qual vivia.
Enfim, até mesmo na academia é valorosa a relação existente entre professor
e aluno para uma prática educativa rica em aprendizagens, a mediação presente
nos estudos de Vygotsky se fazem necessárias em todas as relações de ensino
aprendizagem e em todos os níveis.
No segundo ano do curso de letras comecei a estagiar por exigência do meu
pai, por um lado foi ruim por não ter aproveitado muito o curso, no sentido de não ter
muito tempo para me deleitar na biblioteca, ficar nos corredores do campus no meu
setor, onde hoje considero também um espaço educativo, não procurei nenhum
professor para tentar bolsa de pesquisa, nem de monitoria, tudo isso vim enxergar
21
muito tempo depois e por outro foi muito bom porque, o crescimento de mundo que
obtive foi grande, estudando a teoria juntamente com a prática.
Estudar a teoria ao mesmo tempo em que vivenciava a sala de aula me
ajudou a entender um pouco do sistema, como acontece a prática educativa no
âmbito escolar.
Minha primeira experiência em sala de aula foi simplesmente com turmas do
ensino Médio e uma turma de EJA- Educação de Jovens e Adultos. O estágio
remunerado pela Secretária de Educação do RN foi em uma escola estadual no
bairro em que morava.
Meu primeiro dia na escola foi bem surpreendente, pois simplesmente o
diretor da escola me levou a sala, me apresentou a turma, e ali tive que dar minha
primeira aula. Eram alunos do Ensino Médio, terceiro ano e segundo, eles ficaram
logo surpresos em estar diante de uma jovem, que era mais nova que a maioria.
Exerci por um bom tempo o papel do professor enciclopédia, aquele que
chega e deposita todo o conhecimento sobre os alunos. Eu usava uma gramática
que tinha da época do ensino médio. Simplesmente eu enchia a lousa com normas
gramaticais, ou seja, exercia uma didática tradicional. Eu entendia que tinha que
cumprir todo aquele conteúdo que me passaram, pois alguns alunos prestariam
vestibular e necessitariam de tais. Muito me surpreendeu a realidade da Escola
Pública. Mesmo sendo do mesmo bairro que residia, a realidade de muitos daqueles
alunos era diferente da minha, da que era acostumava a ver. Muitos daqueles jovens
tinham parado de estudar, para trabalhar e sustentar a família, outras engravidaram
e tiveram que cuidar dos filhos por um período.
Na EJA, Educação de Jovens e Adultos, me deparei com muitas senhoras e
também jovens que por algum motivo se afastaram da escola e por exigência
trabalhista, ou até mesmo buscando uma melhora para suas vidas, retornavam para
escola.
Nas turmas de EJA, quando eu chegava com a gramática na mão, as
senhoras diziam, “professora hoje lavei muita roupa, por favor não copie muito!”
22
Com alguns meses tive a oportunidade de fazer cursos de capacitação
oferecidos pela Secretaria da Educação e esses muito me ajudaram a entender o
movimento dos alunos da Eja- Educação de Jovens e Adultos.
Assim, comecei a trabalhar a partir da realidade deles, fazendo atividades
mais práticas e não ficando presa aqueles materiais didáticos oferecidos pela
escola, nos quais acreditava que tinha que seguir fidedignamente.
Eu estudava pela manhã na Universidade e como resido em bairros
periféricos dependendo do sistema de transporte tinha uma rotina corrida. Meu
namorado, atualmente meu esposo, que me levava a escola de bicicleta, pois era
um pouco distante. Os alunos do ensino médio tinham prazer em fazer brincadeiras
quando me viam chegar.
No terceiro ano de curso, estagiei em outra escola Estadual mais próxima a
minha casa, e a experiência foi com alunos do sexto ano e sétimo ano. Foi um
período marcante, gostei muito de lecionar nessas séries, vi muitas realidades
diferentes, ensinei assuntos que gostava bastante, pude repeti com esses alunos
atividades vivenciadas com meus professores de ensino fundamental, que foram
resignificadas, mas que puderam ser tão válidas para eles quanto para mim no
período que também as vivenciei.
No quarto ano de curso, minha experiência ainda no estágio pela secretaria
do estado, foi com turmas do nono ano e com o Projeto Mais Educação. Esse
período foi frustrante , me deparei com uma realidade bem diferente da que vivi, tive
experiências pouco exitosas, os alunos eram jovens, não me respeitavam, não
queriam estudar, enfim, não consegui concluir esse ano de experiência no nono ano,
apenas continuei no Projeto Mais Educação, que foi muito válida.
No último ano de letras, o curso tinha duração no turno que estudava de
quatro anos e meio, não tendo me identificado como queria com a atuação na área,
meu pai em uma conversa com o chefe dele, falando de minha frustração ao
lecionar para adolescentes, falou que sua esposa era diretora de uma creche da
Universidade e que eu poderia ir até lá, fazer seleção, pois lá, tinha muitos bolsistas
de diversos cursos da UFRN, e como meu pai havia dito que eu gostava muito de
criança, talvez lá fosse uma boa experiência para mim.
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Quando meu pai me disse, fiquei muito feliz e fui até a Creche da
Universidade que era a UEI- Unidade Educacional Infantil, hoje integrante do Nei-
Cap- UFRN. Fiquei encantada com o lugar, fiz uma entrevista com a diretora, que
conversou comigo e foi muito atenciosa, me explicou que gostar de criança era
diferente de trabalhar com criança etc. Com alguns dias ela me retornou e me
propôs ficar um período de experiência.
Comecei o estágio na creche e me encontrei novamente com elas, as
crianças. Todos elogiavam muito minha desenvoltura, parecia que eu tinha nascido
para estar ali, minhas habilidades artísticas, as quais sempre tive apreço, puderam
ser usadas, como por exemplo, o desenho, a pintura, a música, as fantasias, a
imaginação, pude me deleitar enquanto bolsista de uma instituição infantil, na
infância, aquele período vivenciado por mim, no qual fui imensamente feliz.
As professoras perguntavam o porquê da minha escolha por Letras, se eu
parecia ter nascido para Pedagogia. Eu nessa experiência tão exitosa na minha
carreira percebi, que não era necessário eu fazer medicina e me especializar em
Pediatria para trabalhar com as crianças, eu vivenciei enquanto estagiária que a
Pedagogia me proporcionava tudo isso, pois o Educar e o Cuidar é um binômio
indissociável na Educação Infantil.
Eu permaneci na Creche por quatro anos, estendi minha formatura em Letras
para cinco anos, e quando conclui o curso fiz reingresso automático em Língua
Francesa, para manter o vínculo com a Universidade e poder continuar o período de
descobertas na instituição.
Em 2008, ano que me formei, meu pai descobriu que estava com câncer,
então ele voltou para nossa casa e minha mãe cuidou dele. Logo após a cirurgia que
ele fez foi descoberto que teria pouco tempo de vida, o médico disse que no máximo
viveria por mais um ano e meio. Ele superou as expectativas médicas e permaneceu
conosco dois anos e sete meses. Foi um período de muitas lutas, em que eu pude
contar imensamente com todos os colegas de trabalho.
Em 2010 iniciei uma pós graduação em educação Infantil, também fui
contratada em uma escola particular, a que estudei parte do ensino Fundamental I, II
e ensino médio, dessa vez estava de volta, não como aluna mas como professora,
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colega de profissão de muitos dos meus ex-professores, foi uma experiência
exitosa.
A pós graduação que cursei foi oferecida pela UFRN, através do Nei-Cap.
Passei por um processo de seleção e fui contemplada, para mim foi extremamente
significativo. Meu trabalho final foi sobre o Educar-Cuidar no berçário, que foi uma
experiência de muitas aprendizagens para mim na Creche.
Durante os quatro anos como bolsista na creche, pude aprender muito, com
todos os profissionais, com as crianças e com a prática, “práxis”, de maneira
interdisciplinar associando a teoria à prática na área da infância.
Atuei em diversos níveis na instituição, atuando desde a mais tenra idade, os
bebês, até as crianças maiores. O primeiro ano no Estágio III, o segundo ano no
estágio I, e os dois últimos anos no berçário, com os bebês . Grande parte da minha
formação devo a essa instituição e sua prática.
2.1. O RESULTADO
Para mim é impossível existir sem sonhos.
(Paulo Freire)
Em agosto de 2011, no segundo semestre, iniciei o curso de pedagogia, já
não estava na instituição como bolsista, apenas na escola privada. Meu pai faleceu
em julho desse ano, eu sabia que seria bom ocupar minha mente, mesmo ainda
estando abalada com as mudanças. Em maio de 2012 me casei e mais mudanças
ocorreram ocasionando um maior amadurecimento em minha formação pessoal!
Continuei na escola em que trabalhava e segui cursando pedagogia, o curso
me fez sentir realizada, me abriu horizontes diferenciados.
Estudar a Educação em si, a história, evoluções sofridas que muito interferem
nos dias atuais é muito importante para um professor. As disciplinas de fundamentos
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provocaram em mim desequilíbrios necessários para novas aprendizagens que me
promovem e fazem ser uma profissional mais completa.
Em pedagogia procurei e procuro vivenciar mais profundamente os
acontecimentos acadêmicos, procurei bolsas de pesquisa, já que na prática possuo
experiências. Estagiei e lecionei do berçário até o ensino médio incluindo a
Educação de Jovens e Adultos. Assim, iniciei 2014 com a decisão de sair do
trabalho, no qual lecionava no tempo integral da escola privada em que estudei, para
me dedicar exclusivamente aos estudos. Por esse motivo também, optei por fazer
uma permuta no horário do meu curso, pois era a noite que eu estudava e a tarde a
carga horária era maior, assim conseguindo a troca de turno poderia cursar mais
disciplinas como desejava.
Ao voltar do recesso do fim do ano, no início da semana já sabendo que a
permuta de turno do curso de pedagogia da noite para tarde tinha sido aprovada, fui
conversar com minha gestora. Foi difícil convencê-la, justifiquei que queria adiantar
meu curso, que iria estudar dois horários e por isso seria difícil conciliar o trabalho
na escola com as diversas atividades acadêmicas que eu teria, sabendo que seriam
muitas pois, estava decidida a cursar o máximo de disciplinas que pudesse, e com
bastante qualidade, ou seja dedicação.
Após conversar com minha diretora fui falar com as minhas coordenadoras
que atuavam diretamente comigo e foi difícil também, elas queriam que eu ficasse e
fizeram de tudo pra eu mudar a decisão. Meus alunos quando souberam ficaram
muito tristes, e eu mais ainda com a tristeza deles. Foi difícil para mim essa decisão,
mas algo dentro de mim me motivava a tentar essa escolha, a me dar essa
oportunidade de vivenciar a academia com mais dedicação, diferente de quando
cursei a primeira graduação, muito envolvida com as atividades dos estágios, sem
tempo para atividades acadêmicas de pesquisa por exemplo.
No meu último dia na escola, a nutricionista preparou um momento, com um
vídeo maravilhoso, me surpreendendo. O fato ocorreu no auditório e foi bastante
emocionante, meus alunos e todos os funcionários foram filmados e cada um a sua
maneira registrou seus sentimentos, demonstrando muito afeto e emoção.
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Foi difícil a decisão, pois, os sentimentos que envolviam todo o trabalho na
instituição, tanto com os funcionários como com os alunos, as crianças, me
causavam dúvidas. No entanto, permaneci firme, pois acreditava que precisava
vivenciar esse novo momento.
Assim, Compartilho os pensamentos de Navarro quando ela fala sobre as
emoções nos adultos:
Acontece uma coisa parecida com os adultos. Há uma barafunda emocional que sempre os afeta. Podem encobri-la, podem expressá-la bem ou não, mas é claro que, a estas alturas, o que não se pode fazer é ignorar a sua existência. Preocupações, dúvidas, saberes, medos, emoções, projetos, desejos...tudo mexe com a gente, lutando para ajeitar-se de novo o mais equilibradamente possível, satisfazendo, assim, às nossas necessidades, aos nossos vazios, às nossas expectativas. Como professor, um andar debaixo próprio do ofício, que compartilhamos com colegas de profissão. Um andar debaixo onde fermentam tanto os lances afetivos de qualquer adulto quanto os que vêm da própria tarefa como educadores. Medo de não saber, de fracassar, de nos enganar, de ser demasiado autoritários oi permissivos, da racionalização, da espontaneidade, dos conflitos com colegas, com o diretor, com os pais, com as crianças. (2004, p.25)
Passando por essas fortes emoções iniciei o semestre, continuei a busca
pelos professores da área de educação infantil para dizer meu interesse pelas
bolsas, pela pesquisa, isso já vinha fazendo desde fim do ano de 2013, mandando
emails, indo às salas etc.
Procurei muito, fui atrás e conversei com tantos, foi bem difícil encontrar, pois
queria algo na área que me identifico, que é educação infantil. No segundo semestre
ao falar com uma professora de educação infantil, tive a chance de trabalhar como
bolsista de uma professora de educação infantil porém, que está voltada ao ensino a
distância. Com muita alegria aceitei o convite e realizei uma seleção.
O período como bolsista, inicialmente de monitoria foi muito bom, pois a
disciplina era de educação Infantil, posteriormente a professora colocou em outra
pesquisa que não era Educação Infantil, porém muito interessante.
Durante o período de quase dois anos que fiquei fora da sala de aula,
fevereiro de 2014 até março de 2016 foi muito proveitoso, mesmo não tendo a
oportunidade de ser inserida em uma pesquisa de educação Infantil. A participação
como monitora em eventos na Universidade como EPENN, a própria Cientec, onde
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pude fazer apresentação de trabalhos como pôsteres, oficinas foram de uma
aprendizagem indescritível.
Vivenciar o mundo acadêmico integralmente foi uma experiência maravilhosa,
o próprio currículo do Curso de pedagogia exige que o aluno tenha carga horária na
extensão, na monitoria, não fique restrito as atividades das disciplinas. Mesmo
aproveitando as experiências da academia senti muito falta da sala de aula, porque
para mim a práxis é essencial para uma carreira docente. A teoria sozinha não muda
nada, mas aliada a prática faz toda a diferença. Pensando na minha realidade de
professora de educação infantil corroboro com as autoras: “Refletir sobre como
percebemos as experiências das crianças pode depender da forma como vemos a
criança e do modo como ela participa do ambiente da escola de educação infantil.” (
SMITH; CRAFT, 2010, p.31)
Durante o curso de Pedagogia pude experimentar conhecimentos que
considero extremamente válidos para um profissional da educação, o que , na
Licenciatura em Letras não conheci. Conhecer e refletir sobre a historia da educação
foi extremamente válido, é algo tão essencial para carreira docente, como as
disciplinas de cálculos presentes nos primeiros semestre do curso de Tecnologia.
Na graduação de Letras em 2004 tive sim, algumas disciplinas referentes a
educação, inclusive o currículo já deve ter sofrido alterações, mas, acredito que
deveriam ser oferecidas a todas as Licenciaturas mais disciplinas relacionadas ao
processo educacional.
Durante a graduação outra experiência muito válida, foram as três disciplinas
de Estágio, pude atuar em uma Centro Municipal de Educação Infantil no primeiro, e
nos outros dois pude me deleitar ainda mais com a prática do Nei-Cap-UFRN. Para
mim, esses estágios foram bastante significativos, pois buscamos a todo momento
realizar intervenções pautadas pela teorias, sempre trocando saberes com os
professores das turmas, coordenações e direção.
A pedagogia em si organiza-se em torno dos saberes que se constroem na
ação situada em articulação com as concepções teóricas e com as crenças e os
valores. A pedagogia é, portanto, um ‘espaço ambíguo’ já não de um-entre-dois, a
teoria e a prática, como alguns disseram (Houssaye et al.,2002), mas antes de um-
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entre-três, as ações, as teorias e as crenças, em uma triangulação interativa e
constantemente renovada. (FORMOSINHO, 2007,p.14)
Enfim, como fala o autor acima supracitado, a pedagogia engloba saberes
essenciais para a formação de um professor, foi um curso que desejei muito fazer e
que me completou enquanto profissional da Educação. Seu currículo sempre está
em movimento, há muitas coisas para melhorar, no entanto, a maioria dos
profissionais que compõe sua grade é muito comprometida com a Educação.
CONSIDERAÇÕES SOBRE UMA PERMANENTE FORMAÇÃO DE RETALHOS
O senhor...mire e veja que o mais importante e bonito do mundo é isto, que as pessoas não estão sempre iguais, não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam – verdade maior. E o que a vida me ensinou. Isto me alegra, montão. (Guimarães Rosa)
Realizar esse trabalho foi de extrema importância para reflexão da minha
prática, minha vida como pessoa, como profissional. Reviver alguns desses retalhos
me fazem ser mais gente, ter mais certeza do que sou, do que quero ser, porque
somos gentes, inacabadas, em um constante vir a ser como diz Paulo Freire, como
disse Guimarães Rosa, quando afirmou que não estamos sempre iguais.
É como o processo de aprendizagem corroborando com os teóricos
interacionistas, onde aprendemos e o conhecimento novo adquirido gera um
desequilíbrio em nós, nos causando uma readaptação, e assim nessa constante,
nesse ciclo que é a vida, onde vamos aprendendo coisas novas, esquecendo,
lembrando, perdendo, ganhando.
Reviver todo o processo de vida pensando no contexto histórico é de extrema
importância para ligação, entrelaçamento desses retalhos que compõe esse tecido
que é a vida. Como desde a educação infantil, o educar muito influencia o nosso vir
a ser, pessoa, gente, profissional. O contexto nos quais estamos inseridos, as
nossas culturas, muitos nos influenciam “Do ponto de vista da produção da
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sobrevivência humana, é através das instituições sociais que determinada relação
social de produção é concretizada. A escola, a igreja, a família.”( DAMIS, 1991, p.13)
Desde o início da minha vida escolar até o presente momento em que encerro
essa etapa, uma graduação no Curso de Pedagogia, pude perceber os avanços
históricos obtidos nesse percurso e o quanto esses acontecimentos influenciaram e
influenciam o âmbito educacional. Atualmente vivemos um período histórico-político
repleto de incertezas, mudanças e esses acontecimentos estão afetando
diretamente o campo educacional.
Realizar esse trabalho foi muito significativo, pois a autobiografia como já
discuti no decorrer do texto, é um gênero que muito contribui para formação do ser,
afinal, com a própria escrita muitas memórias são retomadas e ao revivê-las pode-se
compreender um pouco de todo o processo vivido, e o porquê de muitas escolhas e
modos que constituem o ser, enquanto pessoa, profissional.
Esse exercício no qual podemos refletir sobre nossos fundamentos, nossas
raízes, nos faz mais gente, mais pessoa e é algo extremamente importante para
formação de um ser, principalmente professor. Sabendo quem você é, suas raízes e
sua história, a compreendendo você pode refletir, ver e rever sua essência, sua
prática, exercício válido e significativo para todos os seres.
Em minha trajetória acadêmica, em que pude me identificar com o campo
educacional no qual quero pesquisar, em que pude reconhecer a perspectiva
histórica que quero seguir, que é a que acredito ser válida para o crescimento dos
meus alunos a interacionista, conhecer a mim mesma, refletir sobre meu processo
escolar e acadêmico, esse exercício autobiográfico me firma as marcas que me
fundamentam para me compor enquanto gente que sou, que me formei, me teci, e
me levou a corroborar com as teorias nas quais me ancoro.
Enfim, encerro essa reflexão, com as palavras de Ferreira, sobre a profissão
da docência, carreira esta que escolhi, talvez que me escolheu, que me faz mais
gente, que me coloca perto de gente, onde aprendo, ensino, me transformo em
culturas múltiplas, em uma didática intercultural como aprendi com Candau.(2006):
Ser professor é profissão de pessoas sonhadoras, generosas e Altruístas. Arquitetos de gente que, em geral, não chegou a ver os seus projetos humanos prontos. Engenheiros de ideias que não entregam suas
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construções concluídas. Médicos que não curam a febre do conhecimento. Advogados de inocentes perseguidos pela ignorância. Artistas visionários de obras incógnitas. Escritores frenéticos de versos esquecidos. Maestros pacientes na afinação de orquestras sem partituras. Contudo, o ofício de ensinar também é palco frequente de apresentações tensas e de atores incompreendidos. (FERREIRA, 2006,p.9)
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