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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL ISADORA DE MELO DANTAS SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL A ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE (PSC): UM ESTUDO SOBRE SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O CONTEXTO SOCIAL DOS SOCIOEDUCANDOS. Natal/RN 2019

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO … · vezes que precisei, quantas vezes fui e voltei e eles estavam de braços abertos para mim. Eles, com seus limitados estudos,

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL

ISADORA DE MELO DANTAS

SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL A ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO

DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E DE

PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE (PSC): UM ESTUDO SOBRE

SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O CONTEXTO SOCIAL DOS

SOCIOEDUCANDOS.

Natal/RN

2019

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ISADORA DE MELO DANTAS

SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL A ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO

DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E DE

PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE (PSC): UM ESTUDO SOBRE

SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O CONTEXTO SOCIAL DOS

SOCIOEDUCANDOS.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do título de bacharel em Serviço Social sob orientação da professora Ma. Mônica Maria Calixto.

Natal/RN

2019

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro Ciências Sociais Aplicadas - CCSA

Dantas, Isadora de Melo.

Serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de

medida socioeducativa de liberdade assistida (LA) e de prestação

de serviço à comunidade (PSC): um estudo sobre sua contribuição para o contexto social dos socioeducandos / Isadora de Melo

Dantas. - 2019.

89f.: il.

Monografia (Graduação em Serviço Social) - Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências Sociais

Aplicadas, Departamento de Serviço Social. Natal, RN, 2019.

Orientadora: Profa. Ma. Mônica Maria Calixto.

1. Serviço Social - Monografia. 2. Política de Assistência

Social - Monografia. 3. Serviço de Proteção Social - Adolescentes - Monografia. 4. Medidas socioeducativas - Monografia. I.

Calixto, Mônica Maria. II. Universidade Federal do Rio Grande do

Norte. III. Título.

RN/UF/CCSA CDU 364-78

Elaborado por Shirley de Carvalho Guedes - CRB-15/404

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ISADORA DE MELO DANTAS

SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL A ADOLESCENTES EM CUMPRIMENTO

DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E DE

PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE (PSC): UM ESTUDO SOBRE

SUA CONTRIBUIÇÃO PARA O CONTEXTO SOCIAL DOS

SOCIOEDUCANDOS.

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para obtenção do título de bacharel em Serviço Social sob orientação da professora Ma. Mônica Maria Calixto.

Data de aprovação: Natal/RN, ___/___/____

BANCA EXAMINADORA

________________________________________________________

Prof.ª MS.ª Mônica Maria Calixto (Orientadora)

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

________________________________________________________

Prof. Fernando Gomes Teixeira

(Examinadora) Universidade Federal do Rio Grande do Norte

________________________________________________________

Rafaela Nascimento da Silva (Examinadora externa)

Assistente Social no CREAS Sul. CRESS/RN - 5221

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Dedico este trabalho aos profissionais do Serviço Social que tive o prazer de conviver, por abrirem o campo da reflexão crítica que tanto respondeu inquietações que eu já possuía antes mesmo de entender meu próprio ser e por serem pilares de luta em uma sociedade tão desigual. Dedico também aos adolescentes que passaram pelo Serviço de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto do CREAS/Sul pela força de tentar resistir à condição de exclusão dada a eles pelo Estado.

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AGRADECIMENTOS

A gratidão é o sentimento que me move, é o que busco sentir todos os

dias por cada passo dado, porém, ao final de um processo árduo e intenso como

a graduação, esse sentimento vem de forma amplificada.

Menciono em meus agradecimentos primeiramente a minha mãe, Niza,

que partiu dessa vida em 2006, com 37 anos, quando eu tinha 16. Ela, sem

dúvida nenhuma foi o meu maior exemplo de vida, como mulher, mãe,

profissional, ser humano íntegro, com a luta arraigada em sua essência, energia

e vitalidade em suas veias até seu último suspiro. Sempre vi isto dentro de casa,

é minha raiz e por este motivo sou fruto do que ela plantou. Minha mãe, mulher,

negra, mãe de três, solteira, de origem humilde, parte de uma família de 6

irmãos, teve seu destaque. Socióloga, pós-graduada, militante, envolvida com

causas relacionadas aos Direitos Humanos, refugiados e adolescentes em

contexto de violência, docente. Foi com ela que aprendi a essência da luta antes

mesmo de ter consciência do que isso significava, pois ela me ensinou sendo

ela mesma, fazendo, sendo exemplo. Obrigada, mãe.

Agradeço a oportunidade de poder ter ingressado na Universidade

Federal do Rio Grande do Norte - UFRN que era o princípio do meu sonho, estar

exatamente nela. Para tanto, já que minha trajetória escolar foi completamente

irregular por condições particulares de vida, eu precisei ingressar em um

cursinho preparatório que correspondesse às minhas condições financeiras que

não eram grandes, e agradeço também por ter tido essa oportunidade. Mas

antes disso, eu precisei de orientação, e mencionei isso para apontar que o

responsável por esta tarefa, foi o meu pai.

Agradeço ao meu pai, Luiz, por ter me orientado, me apontado os

caminhos que eu deveria seguir sempre visando minha expansão intelectual e

minha independência pessoal e financeira. Agradeço-o por ter me acolhido

quando necessitei me dando todas as condições físicas - de espaço – e

psicológicas ao me incentivar através de sua força racional diante do jogo que é

a vida, como ele mesmo diz. Agradeço-o por ser um exemplo de intelectualidade

na minha vida e por ter me deixado o maior ensinamento que eu poderia ter: a

prática da leitura, pois os frutos dela são imensuráveis e impagáveis.

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Agradeço aos meus avós maternos, Cícera e Heronides, que na ausência

da minha mãe (não só nela, mas a vida toda) me acolheram sempre e todas as

vezes que precisei, quantas vezes fui e voltei e eles estavam de braços abertos

para mim. Eles, com seus limitados estudos, sempre me incentivaram a não

desistir da graduação. A sabedoria da minha avó me elevou imensamente, em

muitas lições de afeto, cuidado, incentivo, força, muita força e amor, muito amor.

Devo muito a ela. A eles dois.

Eu agradeço aos meus irmãos, Tiê e Emanuel, que de forma direta ou

indireta me fortaleceram e são extensão de mim.

Estendo meus agradecimentos a toda minha família, tios e primos, pois

são parte do meu convívio diário. À minha tia e madrinha, minha dinda Heliane

por ser sempre pilar nos meus momentos difíceis, de ordens diversas, e por ter

estado sempre a postos para me estender a mão todas as vezes que precisei. À

Fernanda e Renato por tantos momentos de amizade compartilhados.

Obrigada ao meu amor, meu parceiro, marido, companheiro, amigo,

Paulinho. Sem você do meu lado, tudo seria mais difícil. Obrigada pela

compreensão do meu ser que parece que só você tem a capacidade de ter. As

dificuldades do dia a dia se tornavam mais leves por você estar sempre ao meu

lado dividindo tudo. À minha sogra, Ana, pelo amável acolhimento de todos os

dias.

Sou grata a amigas que são verdadeiros anjos especiais e me deram tanta

força nessa trajetória:

À Aninha por estar sempre presente em momentos bons e ruins, pela

fidelidade a mim, por me incentivar e por acreditar em mim incondicionalmente.

À Alda, com sua calma, clareza, paciência e sabedoria sempre me

apoiando, compreendendo tantas emoções e por acreditar em mim

incondicionalmente.

À Rita, por conseguir ser tão presente mesmo não morando em Natal,

sendo suporte todas as vezes necessárias, me ouvindo incansavelmente, me

incentivando, acalentando, fortalecendo, emanando tanto amor e cuidado que

eu sempre sentia daqui e também por acreditar em mim incondicionalmente.

À Clara Cavalcante por me fazer acreditar na vida em momentos críticos,

por me amar durante toda uma vida e por ter me resgatado de volta à existência.

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À Simone Ribeiro que tive o prazer de reencontrar depois de tantos anos

e que se tornou inspiração e afeto para mim.

Obrigada às minhas amigas de infância que compartilharam comigo uma

vida inteira: Allana Rachel, que nunca esteve longe de mim apesar da distância

física; Thauany Macêdo, minha irmã, parceira de vida, incondicionalmente ao

meu lado, sempre. Nosso encontro é de almas!; Luna Pinheiro, também uma

irmã que só me faz crescer e tanto me ensina; E ao meu amigo Leonardo,

sempre de portas abertas com sua energia maravilhosa me acolhendo e

apoiando.

Obrigada à minha orientadora de estágio obrigatório curricular, a

assistente social Rafaela Nascimento que foi maravilhosa nas orientações, na

compreensão das limitações que apresentei durante um ano em campo, por todo

rico conhecimento que me passou durante esse período, pela disponibilidade em

contribuir com minha formação mesmo após o término do estágio, pelo exemplo

de profissional admirável e extremamente competente. Jamais esquecerei sua

contribuição na minha formação e sua generosidade.

Agradeço à equipe do CREAS – Sul onde estagiei, em especial José

(socioeducador) e Marília (psicóloga) pelas contribuições e aprendizados

disseminados a mim, ainda que indiretamente.

Gratidão à minha orientadora da monografia, Mônica Calixto que

pacientemente soube respeitar meu tempo, também compreendendo os

percalços, apoiando e me transferindo orientação e conhecimento que muito

contribuiu para o final deste ciclo. Suas palavras sempre me fortaleceram.

Gratidão à Clarice Maia que conheci na universidade e tenho o prazer de

ter estendido essa relação para além das paredes da sala de aula, construindo

uma amizade concreta, sólida e cheia de luz.

Obrigada às minhas companheiras de turma, todas, sem exceção.

Estivemos juntas durante quatro anos e compartilhamos muitos momentos que

ficarão em meu coração.

Quero agradecer a quem esteve mais perto de mim durante esse período,

algumas mais no início, outras mais no final, mas cada uma com seu brilho e

importância para mim. Mayara Nazaré, amiga doce e forte que levarei para a

vida. Kathiúsca Mafra, companheira sempre disposta a ajudar. Emilly Bezerra,

tão especial e prestativa que muito me ajudou de forma extremamente generosa.

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Laís, nossa Lalá, meiga e divertida sempre disposta a dividir os momentos

difíceis, amiga que muito me incentivou. Mariana Júlia, pela aproximação e apoio

mais intensos na reta final, mas que sempre foi parceira. Fernanda Tássia, pelo

apoio e que me rendeu muitas gargalhadas por sua irreverência e alegria.

Firmamos uma aproximação na reta final que foi fundamental para a superação

dos momentos difíceis durante a escrita da monografia. Gratidão a vocês.

Por fim, quero agradecer ao Departamento de Serviço Social por conduzir

o curso de forma excepcional, aos docentes que, além de todo conhecimento

transferido, me compreenderam em momentos difíceis. Alguns especiais fizeram

total diferença na minha trajetória e sem eles eu não teria prosseguido, obrigada

à coordenadora e professora Miriam pela compreensão e incentivo de me fazer

continuar sempre.

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“Se queres a tua vida, trata de roubá-

la, porque ela não lhe será dada de

graça”.

Lou Salomé

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RESUMO

Este estudo apresenta uma análise sobre a contribuição do Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e Prestação de Serviço à Comunidade (PSC) no contexto de vida dos adolescentes que passaram por ele após o cometimento de ato infracional. É relevante analisar os rebatimentos sociais que este Serviço causa na vida dos socioeducandos, compreendendo os limites e possibilidades das políticas sociais na sociedade de classe e as perspectivas que estas podem se concretizar para adolescentes que vivem à margem da sociedade pelas circunstâncias de um sistema excludente e desigual. Este estudo é qualiquantitativo, utilizando-se do método dialético e procedimento histórico e comparativo e técnica de pesquisa bibliográfica e documental com coleta de dados em campo. Ressalta-se a contribuição em discutir a Política de Assistência Social, dentro de sua densidade, de forma ampla e específica no que diz respeito ao adolescente, bem como a perspectiva ampla do Serviço de Medidas Socioeducativas e defesa do Meio Aberto com vista a garantir o fortalecimento da convivência sociofamiliar e comunitária em uma perspectiva de superação do ato infracional, assim como a garantia de direitos básicos ao núcleo familiar. Além de abordar a política de assistência tão relevante em sua proposta no contexto social desses adolescentes, problematiza-se o lugar que eles ocupam na sociedade permeada por desigualdade que tem como raiz a exclusão social. Por fim, conclui-se que o Serviço apresenta uma proposta de materialização do que é preconizado legalmente, visualizando o adolescente como um ser singular, para além de um autor de ato infracional, que possui um contexto histórico e social, abordando suas demandas na perspectiva de totalidade, desconstruindo os estigmas impostos a eles pela sociedade, não tendo a capacidade de ir além na contribuição positiva na vida dos adolescentes por barreiras impostas pelas lacunas que o Estado não preenche como deveria cumprir de acordo com o que consta nas legislações voltadas para este campo. Palavras-chave: Serviço de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto. Ato Infracional. Política de Assistência Social.

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ABSTRACT

This paper presents an analysis towards the contribution of the Child and Teenager Social Protection Services, fulfilling the Socio-educational Measure of Assisted Liberty (AL) and the Community Services Provision (CSP), regarding the lives of teenagers who were submitted to it after commit felony. It is relevant to analyse the social blow back this service causes on the lives of the social educators prospects, understanding the limits and possibilities of the social politics on class society and the perspectives that might come to reality for those adolescents who live at the society’s border by a excluding and unequal system. This paper is quali-quantitative, using a dialectical method, historic and comparative procedure, and bibliographic, documental research with collection of field data. It notice the contribution of discussing the Social Work politics, inside its density, in a wide and specifically regards of adolescents, as the wide perspective of the Socio-educational Measure Services and defense of an open environment, looking for guarantee the reinforcement of the socio-familiar and community living, in a felony overcome situation, as the guarantee of basic rights for the family core. Beyond the approach of an important social working politics proposed on those teenagers social environment, we deconstruct their place in society perpetrated by unequalty that have as roots social exclusion. At last, we conclude that this service presents a materialization proposition about what is legally recommended, visualizing the adolescent as singular being, besides a felon, who have a historic and social context, approaching its total perspectives demands, deconstructing the stigmas imposed to them by society, not being able to go further on the positive contribution on those teenagers lives also imposed by the holes that the state does not fulfill as they should according to what consists in the legislation towards this specific field.

Tags: Open Environment Socio-educational Measure Services. Infractional Act. Social Assistance Politics.

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LISTA DE SIGLAS

CBCISS – Centro Brasileiro de Cooperação e Intercâmbio de Serviços Sociais

CEBs – Comunidades Eclesiais de Base

CEME – Central de Medicamentos

CF – Constituição Federal

CFESS – Conselho Federal de Serviço Social

CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas

CNAS – Conselho Nacional de Assistência Social

CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente

CRAS – Centro de Referência de Assistência Social

CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social

FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

FUNABEM – Fundação Nacional para o Bem-estar do Menor

ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente

DATAPREV – Empresa de Processamento de Dados da Previdência Social

IAPs – Institutos de Aposentadorias e Pensões

IAPAs – Instituto Nacional de Administração da Previdência Social

INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INPS – Instituto Nacional de Previdência Social

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LA – Liberdade Assistida

LBA – Legião Brasileira de Assistência Social

LOAS – Lei Orgânica de Assistência Social

LOPS – Lei Orgânica da Previdência Social

MDS – Ministério do Desenvolvimento Social

MPAS – Ministério da Previdência e Assistência Social

NOB – Norma Operacional Básica

NOBRH - Norma Operacional Básica de Recursos Humanos

PAEFI – Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e

Indivíduos

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PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra em Domicílios

PNAS – Política Nacional de Assistência Social

PSC – Prestação de Serviço Comunitário

RN – Rio Grande do Norte

SAM – Menores e o Serviço de Assistência aos Menores

SEAS – Serviço Especializado em Abordagem Social

SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo

SINPAS – Sistema Nacional de Assistência e Previdência Social

SUAS – Sistema Único de Assistência Social

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................... 16

2 PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL: DA ORIGEM À CONQUISTA

COMO POLÍTICA DE DIREITO. ....................................................................... 22

2.1 SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO DE

PROTEÇÃO SOCIAL: DAS SOCIEDADES PRÉ-CAPITALISTAS À

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AS INFLUÊNCIAS HISTÓRICAS

DURANTE ESSE PROCESSO..........................................................................22

2.2 RELAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL COM A POLÍTICA DE

ASSISTÊNCIA SOCIAL: LUTAS, AVANÇOS, CONQUISTAS E

REGULAMENTAÇÕES. ................................................................................... 41

3 SOCIEDADE, ADOLESCÊNCIA E ATO INFRACIONAL: ANÁLISE

CRÍTICA DAS PARTICULARIDADES DESSA RELAÇÃO. ............................ 58

3.1 RELAÇÃO DO ADOLESCENTE AUTOR DE ATO INFRACIONAL

NOS INCURSOS DA SOCIEDADE CAPITALISTA E A POLÍTICA DE

ATENDIMENTO A CRIANÇAS E ADOLESCENTES. ....................................... 59

3.2 SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL A ADOLESCENTES EM

CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA EM MEIO ABERTO -

LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

(PSC) E SEUS REBATIMENTOS NO CONTEXTO SOCIAL DO

SOCIOEDUCANDO. ......................................................................................... 71

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................... 86

5. REFERÊNCIAS .................................................................................. 88

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1 INTRODUÇÃO

Este estudo é fruto de um longo caminho vivenciado na academia

desencadeando um despertar para a área dos adolescentes envolvidos em

contexto de violência, mais especificamente os autores de atos infracionais e,

principalmente, sobre seus lugares ocupados nos espaços desta sociedade

capitalista, as formas existentes para apresentar novas perspectivas a esses

adolescentes que vivem em um caminho de marginalização que não é criado por

eles, através do Cumprimento de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto,

bem como o trabalho desenvolvido para responsabilizá-los, uma vez envolvidos

em atos infracionais, e, finalmente, como esse trabalho de assistência e

responsabilização reflete na vida deles.

O interesse pela temática já existia por identificação, porém, foi durante a

experiência do estágio obrigatório curricular que houve uma aproximação direta.

O estágio ocorreu durante um ano, de junho de 2017 a junho de 2018, no Serviço

de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medidas

Socioeducativas de Prestação de Serviço à Comunidade – PSC e Liberdade

Assistida – LA, que funciona no Centro de Referência Especializado de

Assistência Social – CREAS. Neste caso, a vivência de estágio ocorreu no

CREAS região sul de Natal – RN, e, portanto, esta pesquisa possui esta

instituição específica como referência em termos de experiência, dados

acessados, convívio interprofissional e aproximação de modo geral com o

Serviço.

O Serviço de Medidas Socioeducativas faz parte de uma cadeia de

articulação dentro da Política de Assistência Social que é parte constituinte da

Seguridade Social, juntamente com a Saúde e Previdência Social. Dentro da

Assistência Social, o Meio Aberto está inserido, de acordo com a Tipificação de

Serviços Socioassistenciais de 2009, no Serviço de Proteção Especial de Média

Complexidade por se tratar de demandas onde ocorre o risco de ameaças ou

violações de direitos, porém, sem vínculos interrompidos.

Uma sociedade que possui um sistema de produção econômico vigente

socialmente excludente por essência necessita de contribuições de estudiosos,

pesquisadores, acadêmicos e afins em termos de teoria e pesquisas para que

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se alcance um entendimento de como trabalhar a ação e aplicabilidade de

medidas e leis que contemplem a perspectiva do direito social aos adolescentes

e à sociedade de modo geral. Essas ações vêm sendo realizadas de diversas

formas há décadas e se aprimorando de acordo com os incursos da

contemporaneidade e da realidade social, inclusive pela sociedade civil através

de lutas e reivindicações por conquistas e manutenção de direitos.

Este estudo se configura como uma contribuição sobre a Política de

Assistência Social, especialmente voltada para adolescentes autores de atos

infracionais, através da problematização do contexto social de exclusão em que

eles estão inseridos e as respostas que podem ser dadas através dos caminhos

da proteção social.

O caminho de desenvolvimento das políticas sociais iniciou-se há

décadas e perpassou por momentos árduos que se tornaram marcos na história

e devem ser destacados como processos importantes na história da política

social e do que há de concreto atualmente.

Foi através da Constituição Federal de 1988 que premissas voltadas

especificamente para crianças e adolescentes foram decretadas posicionando-

os como sujeitos de direitos, no qual foi se desenvolvendo através da

contribuição e do trabalho de diversos órgãos e entidades estreitando esses

direitos em prol de uma assistência digna para este segmento da sociedade,

criando o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, regulamentado pela lei

8.069 de 1990.

Destaca-se o ECA como uma referência mundial em termos de legislação

específica para crianças e adolescentes, porém, é necessário que se leve em

consideração que os direitos contidos no Estatuto não chegam a todos como

deveriam e que, a partir disso, o Estado solidifica uma dívida para com essa

parcela da população, pois exime o acesso igualitário como deve ser e abre

espaço para disparidades sérias.

Por exemplo, em termos de escolaridade, fator de extrema relevância

nesta fase, conforme dados da PNAD/IBGE de 2013, dos adolescentes com

idade entre 15 e 17, um terço continham o ensino fundamental incompleto e

somente 1,32% concluíram o ensino médio. Dos que possuíam entre 12 e 14

anos, que deveriam estar nos anos de conclusão do ensino fundamental, 93,3%

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tinham o fundamental incompleto e somente 3,47% haviam concluído esta fase

escolar. (SILVA; OLIVEIRA, 2015), o que limita possibilidades na vida adulta.

Trazendo dados mais recentes, de acordo com o jornal local/RN Tribuna

do Norte que aponta dados do Anuário Brasileiro da Educação Básica 2019,

divulgado pelo movimento Todos pela Educação em parceria com a Editora

Moderna e organização dos dados de acordo com as metas do Plano Nacional

de Educação (PNE), metade dos jovens de 19 anos não tinham concluído o

ensino médio em 2018. Em 2018, somente 63,6% dos jovens de 19 anos

matriculados concluíram o ensino médio.

É esse perfil, em média, que os/as usuários/as do Serviço de Medidas

Socioeducativas em Meio Aberto possuem, autores de atos infracionais que já

foram julgados pelo sistema judiciário sendo responsabilizados/as pelo ato

através do cumprimento da medida socioeducativa em meio aberto, mas que

possuem um contexto de vida permeado por violações de direitos, em sua

maioria, e que deve ser levado em consideração. Ainda sobre a escolarização,

a análise de dados desta pesquisa apresenta o quão esse fator de esvaziamento

escolar é presente na realidade desses adolescentes.

A relevância desta pesquisa está no intuito de se fazer entender e

desconstruir os estigmas que a sociedade impõe aos adolescentes autores de

atos infracionais, insuflados pela grande mídia de que representam grande

periculosidade e fazem parte de um grupo que comete atos delitivos e ficam

impunes por serem menores de idade. A realidade, analisada de forma crítica,

aponta outro cenário. Pretende-se aqui trazer o entendimento do Meio Aberto e

do trabalho realizado pelo Serviço e, principalmente, os rebatimentos que o

cumprimento da medida aponta na vida desses adolescentes. Objetivando

discutir a política de atendimento ao adolescente autor de ato infracional em

cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto, problematizando como

se efetiva a materialização desta no âmbito institucional e as respostas que os

adolescentes apresentam frente as ações desenvolvidas.

Para tanto, objetivou-se identificar o perfil dos adolescentes que estão em

cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto no CREAS região Sul,

problematizar a prevalência e causas de cumprimento e descumprimento da

medida socioeducativa no tempo previsto pela justiça, identificar se as ações do

Serviço de Medidas Socioeducativas ao adolescente têm possibilidades para

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torná-los dispostos a se envolverem e cumprir o proposto até o final do processo

e analisar os aspectos positivos e negativos que a perspectiva do Serviço de

Medidas Socioeducativas em meio aberto trouxe para a vida dos adolescentes.

Esta é uma pesquisa qualiquantitativa e para o seu desenvolvimento

utilizou-se o método dialético, baseado na premissa de uma análise que levou

em consideração uma “interpretação dinâmica e totalizante da realidade

considerando que os fatos não podem ser relevados fora de um contexto social,

político, econômico, etc” (PRODANOV; FREITAS, 2009, p.34). Como método de

procedimento, foi utilizado o método histórico em estudo do resgate de origem e

evolução das políticas sociais, tendo em vista que esse procedimento mantém o

foco “na investigação de acontecimentos ou instituições do passado para

verificar sua influência na sociedade hoje” (PRODANOV; FREITAS, 2009, p. 36)

e o método de procedimento comparativo no estabelecimento da análise de

dados, pois “procede pela investigação de indivíduos, classes, fenômenos ou

fatos, com vistas a ressaltar as diferenças e as similaridades entre eles”.

(GIL,2008 apud PRODANOV; FREITAS, 2009, p. 38).

Em termos de procedimento técnico, utilizou-se a pesquisa bibliográfica,

por ter sido “elaborada a partir de material já publicado, constituído

principalmente de: livros, revistas, publicações em periódicos e artigos

científicos, jornais, boletins, monografias, dissertações [...].” (PRODANOV;

FREITAS, 2009, p. 54) e pesquisa documental devido ao acesso a fontes que

não receberam um tratamento analítico nem foram publicados. (PRODANOV;

FREITAS, 2009).

A pesquisa documental consistiu em coleta de dados em campo, no

Núcleo do Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de

Medidas Socioeducativas em Meio Aberto, sob solicitação por meio de ofício do

Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do

Norte – UFRN autorizado pela coordenação do Serviço de Proteção Especial de

Média Complexidade.

Esclarecendo que, dentro do Meio Aberto, o adolescente pode ter seu

processo inserido em quatro categorias: processos ativos, suspensos, extintos

ou transferidos e para cada situação desta, existe motivos específicos1. Foram

1 Processos ativos: número de socioeducandos que estão efetivamente acompanhados pelas equipes de referência no cumprimento da medida socioeducativa.

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escolhidos, então, os processos extintos por cumprimento de medida concluída

que tiveram a extinção decretada no semestre de 2018.1, totalizando nove

adolescentes. Houve a coleta de dados através de indicadores que abordavam

fatores relevantes dos adolescentes referentes ao contexto social e do próprio

processo de cumprimento da medida socioeducativa quando eles chegaram ao

Serviço e quando saíram, após a conclusão do cumprimento. Portanto, houve

análise de dados que possibilitaram responder ao objeto central deste estudo: a

contribuição do Serviço de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto na vida

destes adolescentes.

Esse recorte partiu de inquietações próprias sobre o lugar que esses

adolescentes ocupam em uma sociedade desigual, que os marginalizam e

enaltece a meritocracia, sendo esta, totalmente antagônica ao sistema

condizente com a realidade social. E, a partir disso, analisar como os

adolescentes autores de atos infracionais respondem ao que o Serviço de

Medidas Socioeducativas em Meio Aberto propõe a eles em termos jurídicos, de

responsabilização pelos seus atos, mas de proteção social, fortalecimento de

vínculos familiares e comunitários e reinserção nos espaços designados a eles

pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.

Este trabalho está estruturado em uma composição de 2 capítulos. No

capítulo 1 buscou-se realizar um resgate histórico do surgimento da Política

Social no Brasil, abordando toda sua evolução ao longo dos anos. Dentro deste

capítulo, dividiu-se em uma primeira parte que irá tratar mais puramente da

origem da Política Social até sua conquista como direito constitucional e uma

Processos suspensos: número de socioeducandos que não estão sendo acompanhados pelas equipes de referência, aguardando algum despacho pelo juiz. Processos extintos: número de socioeducandos que tiveram o processo de execução extinto pelo juiz da 1ª Vara da Infância e Juventude. Motivos da extinção do processo: Medida concluída: o juiz reconhece o cumprimento satisfatório da medida socioeducativa; Perda de finalidade: o juiz reconhece que a medida no caso analisado não tem mais sentido para se efetivar; Prescrição da medida: o processo atingiu o tempo máximo estabelecido em lei para execução; Processo crime: o socioeducando está respondendo processo criminal (maior de 18 anos); Óbito: a extinção é expedida após a apresentação à 1ª Vara do documento de óbito (declaração/certidão); Idade Superior a 21 anos: o socioeducando atingiu a idade de 21 anos, prazo máximo limite para cumprimento de medida; Semiliberdade: o processo em meio aberto é extinto quando o socioeducando recebe uma outra sentença com medida de semiliberdade; Não Identificado: não foi possível identificar no banco de dados o motivo da extinção.

Processos transferidos: número de socioeducandos que mudaram de município (não residem mais no município de Natal/RN. (DEPARTAMENTO DE PROTEÇÃO SOCIAL ESPECIAL – DPSE. SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL AO ADOLESCENTE EM CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA EM MEIO ABERTO DA CIDADE DO NATAL/RN, 2019).

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segunda parte que trata mais especificamente da Política de Assistência Social

e da sua relação com o Serviço Social, analisando o surgimento de

regulamentações e legislações.

O capítulo 2 objetiva uma especificação no contexto do adolescente. Em

seu primeiro tópico, o capítulo busca problematizar a relação do adolescente

marginalizado pela sociedade capitalista e o cometimento do ato infracional, bem

como abordando as legislações próprias para este segmento da sociedade. No

segundo tópico a abordagem foi inteiramente voltada para o Serviço de Proteção

Especial a Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas em Meio

Aberto na perspectiva de desbravar o trabalho realizado com os socioeducandos

e atingir o objeto da pesquisa que é analisar os rebatimentos do Serviço na

perspectiva de vida deles.

Vale salientar que o enfoque desta pesquisa é o adolescente, porém, é

importante esclarecer que as categorias de criança e juventude, que são

distintas, aparecem ao longo do trabalho por fazer parte de um ciclo progressivo

da vida do ser humano, ou seja, não tem como separar esses conceitos em

determinados momentos, pois estão ligados na cronologia do desenvolvimento

humano e no decorrer da discussão sobre as políticas públicas, mas ficará claro

o espaço de cada um em menções realizadas mantendo o foco na adolescência.

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2 PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL: DA ORIGEM À CONQUISTA COMO

POLÍTICA DE DIREITO.

Este capítulo visa realizar a concepção da assistência social no Brasil. A

princípio é trazido elementos de como a assistência social era vista e entendida

na sociedade pré-capitalista, ou seja, como benesse e aquém da perspectiva do

direito, sendo tratada como a forma de “resolver” as necessidades da população

carente através de favores, filantropia, caridade e ajuda. Para tanto, discorre-se

sobre as fases que o desenvolvimento socioeconômico brasileiro obteve durante

o processo histórico da nossa sociedade, bem como as influências sofridas neste

âmbito de países exteriores que tiveram rebatimento no desenvolvimento da

assistência social no Brasil.

A conquista desta política social foi se adequando e se hierarquizando

com o passar do tempo como consequência de uma construção social. Será

possível, neste capítulo, o entendimento desse desenvolvimento histórico da

política social, sendo imprescindível perpassar por fatores sociais ligados a esse

processo, como a já citada categoria econômica, a organização dos

trabalhadores, os ganhos e perdas em meio a lutas, a conquista da Constituição

Federal de 1988, o surgimento da Seguridade Social e seus desdobramentos

dentro da política de assistência social, todos esses acontecimentos estão

articulados dentro desse processo histórico.

O objetivo é explicitar como foi o surgimento, o processo de

desenvolvimento, a definição de cada campo da área assistencial e como se

apresentam atualmente.

Utilizou-se nesta pesquisa, como base de referência, a perspectiva crítico-

dialética da tradição marxista2, pautada por um estudo baseado na realidade,

historicidade e criticidade.

2 O método crítico-dialético traz uma solução complexa e inovadora do ponto de vista da relação sujeito-objeto: uma perspectiva relacional que foge ao empirismo positivista e funcionalista e ao idealismo culturalista. [...] problematiza-se o surgimento e o desenvolvimento das políticas sociais no contexto da acumulação capitalista e da luta de classes (BEHRING e BOSCHETTI, 2006).

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2.1 SURGIMENTO E DESENVOLVIMENTO DO PROCESSO DE PROTEÇÃO

SOCIAL: DAS SOCIEDADES PRÉ-CAPITALISTAS À CONSTITUIÇÃO

FEDERAL DE 1988 E AS INFLUÊNCIAS HISTÓRICAS DURANTE ESSE

PROCESSO.

No chamado período pré-capitalista ou capitalismo mercantil, referente à

primeira fase do capitalismo iniciada no século XV que teve duração de três

séculos, com base nas análises de Behring e Boschetti (2006), ainda não haviam

nem indícios da perspectiva de intervenção do Estado para sanar as

necessidades emergentes da população pobre, o que levava alguns setores da

sociedade, como os de iniciativa privada e igrejas, a realizarem ações com

caráter de ajuda a essas pessoas que viviam doentes e como indigentes.

As ações realizadas por essas entidades eram esporádicas, pouco

efetivas e tinham um viés repressivo por terem como objetivo a contenção de

atos reivindicatórios por parte da população desprovida de condições mínimas

de sobrevivência vista como se vivessem fora da “ordem” da sociedade, esse

conceito de ordem era utilizado baseado na concepção dos privilegiados, que

seguiam uma moral cristã, agia em torno da ideia de exclusão da mendicância,

distantes do sentido de proteção social, tal como preconizada

contemporaneamente, abordagem que será realizada de forma mais detalhada

ao longo do texto. Paralelo à filantropia e caridade exercidas no Brasil na era

pré-capitalista, é relevante destacar três eventos a nível mundial, que refletiram

nas mudanças que ocorreram posteriormente no Brasil.

Ainda de acordo com Behring e Boschetti (2006), um desses eventos

aconteceu na Inglaterra e diz respeito à criação de seis leis entre os anos de

1349 e 1834, que representou uma das primeiras ações voltadas para os

trabalhadores e necessitados, sendo assim compreendidas e consolidadas

através de uma legislação específica. Destacamos aqui que os fatos ocorridos

no capitalismo não acontecem sem um propósito definido. A legislação citada

anteriormente continha diversos aspectos que merecem fortes ressalvas, sendo

relevante adentar nesse processo para que haja a compreensão da sua

influência no Brasil.

Vale salientar, ainda, que dentro deste período do século XVII para o

século XVIII houve o surgimento do pensamento liberal que foi fator

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intensificador da repressão aos trabalhadores por ser um sistema que se

fundamenta na representação da defesa do trabalho mercantilizado e o livre

funcionamento do mercado.

O liberalismo é um sistema relevante (no sentido de estabelecer ações

que causam impactos na sociedade, porém, positivos apenas para setores

específicos e privilegiados), pois solidifica-se na ideia do fortalecimento do

mercado como regulador das relações econômicas e sociais, o que é antagônico

à intervenção estatal na perspectiva do bem-estar coletivo, além de defender a

busca pelo interesse individual e se posicionar contra os projetos em prol da

coletividade. Afirma-se que “o predomínio do mercado como supremo regulador

das relações sociais, contudo, só pode se realizar na condição de uma suposta

ausência de uma intervenção estatal” (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 56),

determinando, portanto, uma contribuição para a solidificação da desigualdade

social.

Retomando as leis inglesas, as autoras afirmam que a primeira criada foi

o Estatuto dos Trabalhadores (1349), seguida do Estatuto dos Artesãos -

Artífices (1563), chegando posteriormente a Leis dos pobres elisabetanas (entre

1531 e 1601), a Lei de Domicílio – Settlement Act (1662), a Speenhamland Act

instaurada pouco mais de um século depois (1795), e por fim, a Lei Revisora das

Leis dos Pobres, ou Nova Lei dos Pobres - Poor Law Amendment Act (1834).

Segundo as afirmações observadas por Behring e Boschetti (2006) em

relação à representatividade destas leis, não se pode negar um avanço em

termos de concretização de uma legislação trabalhista, que foi marcada como

uma origem, porém eram primitivas e apresentavam um caráter repressor, não

protetor e tinham como fundamento impor o trabalho a todos aqueles que

dependiam de sua força de trabalho para sobreviver independentemente das

condições oferecidas a eles, sem possibilidade de negociações, objetivando

proibir a mendicância e submetê-los a condições que não eram favoráveis

(BEHRING; BOSCHETTI, 2006) .

Dentre essas seis leis destacam a Speenhamland, de 1795 como a

primeira a proporcionar uma sutil autonomia ao trabalhador, destacada pela sua

descaracterização do viés repressor tão evidente nas demais leis exatamente

por proporcionar alguns direitos importantes.

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Ela estabelecia o pagamento de um abono financeiro, em complementação aos salários, cujo valor se baseava no preço do pão. Diferentemente das leis dos pobres, a Speenhamland garantia assistência social a empregados ou desempregados que recebessem abaixo de determinado rendimento, e exigia como contrapartida a fixação do trabalhador, pois proibia a mobilidade geográfica da mão-de-obra (CASTEL, 1998, p. 178 apud BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 49)

Além disso, a Speenhamland atrasou a implementação do livre mercado

permitindo que o trabalhador “negociasse”, ainda que minimamente, o valor de

sua força de trabalho. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006).

Contudo, esse avanço se estabeleceu de forma restrita e transitória, pois,

ainda na Inglaterra, com o início da Revolução Industrial no século XVIII e com

a revogação da Speenhamland, pela Nova Lei dos Pobres, em 1834, a filantropia

voltou a ser responsável pelo vago suprimento das necessidades sociais,

retrocedendo com a ausência das já limitadas garantias implementadas aos

trabalhadores através da revogação dos direitos que tinham sido garantidos pela

lei Speenhamland.

A linhagem de regresso em termos de direitos dos trabalhadores e à

população necessitada, intensificara-se na Inglaterra do século XVIII para o XIX

no avançar do processo de industrialização que se iniciava e a evolução do

capitalismo apontando como marcante característica, neste momento da

história, a intensificação da exploração do trabalho, sendo, a propósito, a

Revolução Industrial, que se alastrou pelo mundo e, inclusive, foi o outro evento

internacional que influenciou nas transformações societárias no Brasil. Essa

Revolução diz respeito à chegada das máquinas para produção de mercadorias

em substituição ao trabalho artesanal – manufaturado - que era realizado até

então.

Ainda de acordo com as disparidades sociais que a chegada da

Revolução Industrial e o capitalismo promoveram, a evolução do processo de

precarização do trabalho - e do trabalhador - ao longo da história de seu

desenvolvimento e, finalmente, a desigualdade social como uma de suas

grandes consequências apresentando reflexos negativos em vários aspectos da

vida de indivíduos, chegamos, então, a um conceito bastante utilizado dentro das

discussões na perspectiva crítico-dialética dos processos sociais e no serviço

social que são as chamadas expressões da “questão social”.

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Ao adentrar no processo da Revolução Industrial, é necessário antes

esclarecer esse conceito através de análises realizadas por estudiosos da área

do campo da assistência social, pois são termos que serão mencionados em

diversos momentos nesse texto.

Na abordagem deste contexto de desigualdade social intrínseco ao

modelo industrial de produção e ao capitalismo concorrencial e monopolista

sustentado sobre a exploração do trabalhador, Santos (2012) faz observações

indispensáveis dentro do tema da “questão social” que subsidia o entendimento

da abordagem que será utilizada adiante. A autora traz uma premissa que deve

ser levada em consideração para o entendimento do termo “questão social”

dentro desta discussão que é o fato da forma como os estudiosos do serviço

social analisam a “questão social”, muitas vezes citada entre aspas por ser

tratada como um conceito e não como uma categoria.

De acordo com Santos (2012) a “questão social” em si, a partir da

concepção de que não pode ser alçada ao estatuto de uma categoria, e,

portanto, não existe em uma realidade, deve ser entendida como um conceito,

afirma-se a existência não da “questão social”, mas de suas expressões

determinadas pela desigualdade fundamental do modo de produção capitalista.

É explicitado na análise da autora que há um debate restrito sobre esse conceito

e que seria necessário oferecer mais que o debate conceitual. O considerável

volume de textos de circulação nacional já não pode ser relacionado à

tematização da questão social no Brasil, direção na qual é visível a escassez

bibliográfica. Desse modo, a proposição da autora visa contribuir com essa

lacuna explicitada por ela.

Acerca dessa abordagem, Santos (2012) conclui mencionando seu

posicionamento e contribuição em relação à discussão do conceito da questão

social:

Assim sendo, tentei formular [...] o mais fidedignamente possível, mas sem qualquer pretensão exaustiva – a unidade entre os fundamentos marxianos da “questão social” e algumas de suas manifestações históricas na realidade brasileira transitando entre os “núcleos de fundamentação” e sua relação dialética. (SANTOS, 2012, p.14)

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Ainda complementando e trazendo mais proposições para complementar

esse conceito, temos a afirmação trazida por Iamamoto (2007) de que a questão

social assimilada como o conjunto das expressões das desigualdades da

sociedade capitalista madura, tem uma raiz comum: a produção social é cada

vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a

apropriação dos seus frutos mantém-se privada, monopolizada por uma parte da

sociedade. A referência feita é à pequena parcela da sociedade, os capitalistas

detentores dos meios de produção, e a produção coletiva se restringe a mão de

obra necessária ao acúmulo de lucro que não são apropriados pelos

trabalhadores.

Esse processo de determinações na busca pelo enfrentamento das

expressões da questão social por parte dos trabalhadores se configura mais

intensamente com a chegada da Revolução Industrial na Inglaterra. Afirma-se

que os impactos foram alarmantes, a população rural aglomerou-se nos centros

industriais em busca de sobrevivência, pois não tinham como competir através

de suas produções manuais com as máquinas, eram impostos regimes

desumanos de trabalho, chegando a 16 horas dentro da fábrica realizando

atividades repetitivas sendo negado o acesso ao produto final ao qual os

trabalhadores fizeram parte do processo de construção.

Se as legislações sociais pré-capitalistas eram punitivas, restritivas e agiam na intersecção da assistência social e do trabalho forçado, o “abandono” dessas tímidas e repressivas medidas de proteção no auge da Revolução Industrial lança os pobres à “servidão da liberdade sem proteção”, no contexto de plena subsunção do trabalho ao capital, provocando o pauperismo como fenômeno mais agudo decorrente da chamada questão social. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p.51).

Behring e Boschetti (2006) mencionam em sua obra a Grande Crise de

1929, associados aos dois principais eventos internacionais que influenciaram

no Brasil, complementa-se com esse terceiro evento mundial que teve enorme

relevância econômica no Brasil, chamada também de Grande Depressão (ápice

de 1929 a 1932) a qual causou grande impacto mundial, desestruturou a bolsa

de valores de Nova York e regrediu números econômicos em todo o mundo,

alcançando alto índice de desemprego, queda de ações entre outras

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especificidades em nível econômico que serão mais detalhadas ao abordar,

adiante, seus rebatimentos no Brasil.

Os principais fatos históricos, sociais e econômicos que ocorreram

internacionalmente, tiveram consequências que provocaram transformações

societárias no Brasil. Adentrando nos rebatimentos desses eventos no Brasil,

iniciamos essa relação com a discussão do processo de industrialização.

Destaca-se que ele se alastrou mundialmente, porém, especificando que

sua chegada ao Brasil se deu por volta de 1930, juntamente com o processo de

evolução do capitalismo para sua segunda fase – capitalismo industrial ou

concorrencial – e também em torno do mesmo período da grande crise de 1929

que refletiu também no Brasil, ou seja, foram três grandes eventos internacionais

que se alastraram e chegaram a este país trazendo muitas mudanças,

impactando diretamente na vida da população por trazer novas formas de

produção e acarretando mudanças no sentido da produção manufatureira,

propriamente dita.

Ao tratar das modificações nas formas de produção é necessária uma

abordagem crítica que permeia a relação homem-trabalho em relação ao sentido

e significado construídos histórica e socialmente. Para Behring e Boschetti

(2006), deve-se considerar que todo esse processo de mudança internacional

com rebatimentos no Brasil, trouxe a mudança do trabalho, essencialmente

falando, nas relações sociais e suas reproduções. Isso está para além de

produção mercantil e renda, pois altera valores essenciais no Ser homem.

O sentido dessa análise, em especial, é ressaltar que o trabalho havia

representatividade na vida do homem desde os primórdios passando por toda

sua evolução histórica, porém, é possível perceber com mais clareza o

entendimento sobre a transformação da essência do trabalho para o homem

antes e após o processo de industrialização através do seguinte destaque:

Na sociedade pré-industrial ou não capitalista, as atividades de trabalho eram indissociáveis das demais atividades da vida social (Marx, 1987). Na sociedade capitalista burguesa, o trabalho perde seu sentido como processo de humanização, sendo incorporado como atividade natural de produção para a troca, independente de seu contexto histórico (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 50).

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Fica evidente uma mercantilização aguçada do trabalho, traduzido

principalmente na intenção da obtenção de lucro por parte dos burgueses,

alterando o sentido de vida social dos trabalhadores e suas condições de

subsistência e convivência social. Em termos práticos, essa mudança do sentido

do trabalho para o homem se perde como processo de humanização, excluindo

suas próprias essências sociais e reprodutivas de relação, a produção passou a

acontecer em massa e mercantilizada visando somente o acúmulo de riqueza e

o lucro para a burguesia.

Afirma-se como o fator essencial deste novo modo de produção pós-

industrialização, bem como o define, como uma dinâmica onde se estabelece “a

posse privada dos meios de produção por uma classe e a exploração da força

de trabalho daqueles que não os detém. Esta separação entre meios de

produção e produtor e a consequente subordinação direta deste ao dono do

capital permitem que se instaure o ciclo de vida do capital”. (MARTINELLI, 2011,

p.31).

É o que ela define como o seu processo de acumulação primitiva,

tornando, a partir disso, as relações produtivas mais complexas por objetivarem

a acumulação da riqueza e o lucro, sendo essas as principais características

deste modo de produção. O capitalismo mascarava a perversa realidade de que

o seu crescimento se deu à custa de muita exploração da classe trabalhadora,

onde a pobreza crescia na mesma proporção em que gerava concentração de

riqueza nas mãos da burguesia. (MARTINELLI, 2011).

O processo de globalização da produção e dos mercados intensificou a

precarização, sendo necessária a exigência de qualidade dos produtos imposta

pela competitividade intercapitalista para que seja garantido a geração de renda

dessa produção e dos mercados, complementando com a lógica da

terceirização, categoria necessária para o entendimento da precarização do

trabalho: as empresas tornam-se enxutas através da criação de uma empresa

“principal”, uma espécie de matriz, e criam ramificações menores para fornecer

produtos e serviços, instaurando o que se denomina de terceirização, e as

empresas menores - as terceiras – “tendem, cada vez mais, a precarizar as

relações de trabalho, reduzir ou eliminar direitos sociais, rebaixar salários,

estabelecer contratos temporários, o que afeta profundamente as bases de

defesa do trabalho” (IAMAMOTO, 2007, p. 31).

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Como fator intensificador desse contexto de precarização do trabalho, a

força do liberalismo incorporado pelo capitalismo apenas respondeu às

necessidades sociais de forma pouco expressiva ainda na transição do século

XIX para o XX, o que culminou em reivindicações por leis que representassem

melhorias, porém, foram avanços ínfimos sem chegar à raiz do problema,

inclusive por não ser prioridade deste sistema.

Dentro desse cenário de pequenas respostas aos trabalhadores e

necessitados, afirma-se que:

Pautada na luta pela emancipação humana, na socialização da riqueza e na instituição de uma sociabilidade não capitalista, a classe trabalhadora conseguiu assegurar importantes conquistas na dimensão dos direitos políticos, como o direito de voto, de organização em sindicatos e partidos, de livre expressão e manifestação (BARBALET, 1989 apud BEHRING E BOSCHETTI, 2006, p. 64).

Foram movimentos de extrema importância, e independentemente de não

terem conquistados a mudança da ordem social, aumentaram direitos sociais

(BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 64). Ainda é pertinente acrescentar mais um

evento fora do Brasil que rebateu dentro dele: a Revolução Russa de 1917 que

influenciou na fundação do Partido Comunista Brasileiro, em 1922,

representando a organização da esquerda no Brasil por muitos anos.

Ainda sobre o influxo dos eventos mundiais na história societária e

econômica do Brasil, nesta época – início do século XX - o cenário era de

exploração e subordinação do trabalhador – assalariado e destituído dos meios

de produção – ao capital e de aumento demográfico ao passo que se elevava os

níveis de miséria e pauperização – extrema pobreza - restando como alternativa

a esses trabalhadores submeter-se à ocupação do único espaço que lhe era

possível: a fábrica.

Aos arredores das fábricas, cidades foram formadas de forma crescente

através da habitação desses trabalhadores que necessitavam se instalar junto a

suas famílias próximo ao local de trabalho. Se desenvolveu um grande grupo

populoso urbano, proveniente de sua origem rural, destituídos de condições de

dignidade enfrentando a miserabilidade em moradias precárias e desumanas,

surgindo novas formas de relações sociais consequentes do aumento das

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relações impessoais, intensa exploração da força de trabalho exigida em menos

tempo e maior ritmo e redução do período de descanso (YAZBEK, 2010).

Além das consequências negativas que o trabalho industrial trouxe aos

trabalhadores, fazendo relação do trabalho com a geração de lucro e com a

economia, e levando em consideração que o café era o maior produto em termos

de geração de lucro neste período, representante de uma grande unidade na

economia, é pertinente mencionar que havia uma insatisfação dos empresários

que atuavam fora desta área cafeeira por falta de condições de legitimar seus

interesses econômicos.

Neste cenário de disputa, ocorre a chamada “Revolução de 30” no Brasil,

apesar de não ser consenso entre os estudiosos da área de que esse fato tenha

sido uma revolução, propriamente dita, foi um movimento caracterizado pelas

mudanças na correlação de forças entre as classes dominantes, também

trazendo consequências para os trabalhadores. Este evento designou o

enfraquecimento da economia cafeeira resultando na abertura de espaços para

outras oligarquias, como a do gado e açúcar que não tinham tanta força quanto

a do o café, trazendo assim, uma diversificação na economia do Brasil

(BEHRING; BOSCHETTI, 2006).

Fontenele (2016) destaca fatos prematuros das ações que seriam

implementadas no Brasil representando uma ideia de proteção social e que

marcaram a trajetória dessa política ao longo dos anos de 1930 (quando Vargas

assume o poder) até 1980 (processo de redemocratização). Com relevância de

exposição afirma-se que o período de 1930 a 1943 “pode ser caracterizado como

os anos de introdução da política social no Brasil” (BEHRING; BOSCHETTI,

2006, p. 106). Ressalta-se que em meio a este período (de 1964 a 1985) houve

o golpe militar que teve grandes repercussões negativas, marcadas na história

como um período nefasto sendo abordado mais detalhadamente após as ações

relacionadas à ideia de proteção social serem destacadas.

Alguns feitos impostos pelo governo a partir da década de 1930 foram a

criação do Ministério do Trabalho (1930) e da carteira de trabalho (1932), criação

do primeiro Instituto de Aposentadorias e Pensões – IAPs (1933) e daí se

desenvolveu um “sistema público de previdência” (BEHRING; BOSCHETTI,

2006, p. 106), porém, vale destacar que:

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Os IAPs ofereciam um conjunto de benefícios e serviços de acordo com a contribuição dos trabalhadores, dos empresários e do Estado, que não eram uniformes e, segundo Bravo (2000), possuíam uma orientação contencionista, diga-se, estavam menos preocupados com a prestação de serviços e mais com a acumulação de reservas financeiras. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p.107).

Ainda em 1930 foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública,

sendo o acesso bastante restritivo, e:

Em relação à assistência social, Draibe e Aureliano (1989) consideram que é difícil estabelecer com precisão o âmbito específico dessa política no Brasil devido ao caráter fragmentado, diversificado, desorganizado, indefinido e instável das suas configurações (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 107).

Entretanto, com a criação da Legião Brasileira de Assistência Social

(LBA), em 1942, primeira instituição de âmbito nacional com grande estrutura,

de natureza estatal, mas proveniente de colaboração entre o poder público e o

poder privado para atuação com as famílias dos convocados para a guerra,

ocorre uma espécie de unificação de serviços assistenciais, porém, foi através

dela que se instaurou o estigma do clientelismo na relação Estado-sociedade,

crescendo sem perder essas características assistencialistas e seletivas que

perdurou por muitos anos neste campo da assistência social.

Nos anos 1940, na vertente da juventude, surge o Código de Menores e

o Serviço de Assistência aos Menores (SAM), que tinha como objetivo a

“assistência aos menores”, de cunho asilar, atuando através de uma perspectiva

de correção, repressão e punição; em 1943, através da Consolidação das Leis

Trabalhistas – CLT, foi reconhecida a categoria dos trabalhadores pelo Estado.

A implementação da Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS),

mecanismo utilizado somente por volta dos anos 1960, já às portas do golpe

militar, objetivou uniformizar as ações da previdência; a criação do Estatuto do

Trabalhador Rural e o salário-família, ainda nesta década. (BEHRING;

BOSCHETTI, 2006). Aparentemente eram projetos de tentativas de melhorias,

mas que em sua essência não colocava o trabalhador como prioridade além de

subalternizá-lo e manter a intenção de benefício do lucro para os burgueses.

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Em seguida ocorre a ditadura militar no Brasil que permaneceu no poder

de 1964 a 1985, ou seja, perpassou o processo das primeiras ações realizadas

tidas como “proteção social” citadas acima, nesse momento histórico – no regime

ditatorial - “O Estado amplia seu nível de intervenção, tornando-se o eixo político

da recomposição do poder burguês, com a implantação de novas estratégias de

desenvolvimento [...], intensificando o nível de exploração da classe operária. ”

(YAZBEK, 2010, p.87). Nota-se um aumento do poder interventivo com foco na

ampliação dos poderes burgueses e, consequentemente, aumentando o nível de

exploração dos trabalhadores intensificando o cenário de desigualdade social no

Brasil. Neste período há uma imersão em um contexto de autoritarismo e

extrema repressão para com os operários.

Algumas medidas foram implementadas durante a ditadura militar, como

o aumento de novos segurados pelo Instituto Nacional de Previdência Social –

INPS com expansão de assistência médica previdenciária; criação da Renda

Mensal Vitalícia - RMV destinada aos idosos e inválidos com baixa renda; criação

do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS; criação do Ministério da

Previdência e Assistência Social – MPAS. (YAZBEK, 2010, p. 88).

A emergência da ditadura no Brasil, de acordo com Netto (2015)

ultrapassava as fronteiras do país diante do fato de ter feito parte de um

momento onde houve uma sucessão de golpes de Estado pelo mundo e, aqui,

aconteceu sob a liderança norte-americana, em prol de uma contrarreforma

preventiva para submeter os países à dinâmica da economia capitalista, isso já

se trata de um objetivo do golpe militar exposto de forma sucinta, além disso,

existia o desejo de realizar uma homogeneidade e profundidade da

internacionalização do capital, trazendo aqui a importante afirmação de uma real

intenção em impossibilitar os destacados e engajados sociopolíticos que

pretendessem resistir a essa subalternização ao sistema capitalista.

As particularidades históricas brasileiras, de acordo com Netto (2015),

consistem em serem discutidas a partir de análises endógenas, tendo em vista

que fatores desse movimento se moviam dentro de cada sociedade e de acordo

com ela, interferidas por seus elementos sociais particulares. E houveram linhas

de forças que foram centrais na contribuição das efetividades desejadas para o

Brasil, como a criação de um movimento econômico interno com uma linha

voltada fortemente para o mercado externo.

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Existia uma dependência externa para a prática de ações no Brasil, era

um país que se encontrava a mercê das forças econômicas exteriores,

[...] sobretudo, pelas circunstâncias próprias dadas pelo imperialismo, de uma estrutura de classes em que à burguesia não restava fundamento político-econômico objetivo para promover quer a evicção do monopólio oligárquico da terra - [...] - quer para realizar suas “clássicas” tarefas nacionais, posta a sua formação dependente e associada com os centros externos. (NETTO, 2015, p. 32).

O golpe militar no Brasil promovido pela autocracia burguesa (Fernandes,

1975 apud Netto, 2015) promoveu um novo país imerso em um conjunto de

fatores constituídos a fim de dominar o poder político se utilizando de um regime

ditatorial que introjetou na sociedade um outro projeto econômico, social e

político. Segundo Netto (2015), Florestan Fernandes trata como “descolonização

incompleta” os problemas herdados da colonização no Brasil, e afirma que

nenhum deles foi resolvido através da esfera ditatorial, muito pelo contrário,

houve intensificação e agravamento nas mais diversas atmosferas políticas e

sociais do país, “o desastre nacional em que se resume o saldo da ditadura para

a massa do povo brasileiro desenhou uma sociedade de características muito

distintas das existentes naquela em que triunfou o golpe de abril” (NETTO, 2015,

p. 29).

Daí em diante o capital monopolista, progressão do sistema no século XX,

adquiriu mais intensidade em relação aos seus propósitos econômicos e sociais.

É indispensável citar um grande sistema conflitante consequente do Golpe de

1964 que foi a perda da força progressista no Brasil ocorrido de modo repressivo,

ultra autoritário e cruel, houve:

Uma recorrente exclusão das forças populares dos processos de decisão política: foi próprio da formação social brasileira que os segmentos e franjas mais lúcidos das classes dominantes sempre encontrassem meios e modos de impedir ou travar a incidência das forças comprometidas com as classes subalternas nos processos e centros políticos decisórios. A socialização da política, na vida brasileira, sempre foi um processo inconcluso – e quando, nos seus momentos mais quentes, colocava a possibilidade de um grau mínimo de socialização do poder político, os setores de ponta das classes dominantes lograram neutralizá-lo. Por dispositivos sinuosos ou

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mecanismos de coerção aberta, tais setores conseguiram que um fio condutor costurasse a constituição da história brasileira: a exclusão da massa do povo no direcionamento da vida social. (NETTO, 2015, p. 33 e 34).

Mudanças se instalaram no país e conflitos foram inevitáveis, o regime

autocrático objetivava dominar os diversos setores da sociedade, como no

universo cultural, buscando integralizar sua própria política de forma global no

que se refere as políticas sociais. No quesito educação, umas das principais

áreas de interesse de domínio dos militares, essas mudanças se baseavam em

introduzir a concepção ditatorial neste envolto já com mudanças em termos de

qualidade e estrutura proveniente da autocracia burguesa consideradas como

conservadoras.

[...] ocorrem mudanças, que vão se efetivar durante as décadas de 1960 e 1970, no sentido de expansão e modernização do sistema de proteção social do país. Trata-se de um processo de modernização conservadora, pois essas mudanças não significaram uma ruptura com os padrões meritocráticos prevalecentes até então [...]. (YAZBEK, 2010, p.88).

O regime ditatorial não acompanhou o ritmo do mercado externo, mas

sempre manteve ligação e dependência dele, alimentou possibilidades de

crescimento para a sociedade que iam além de suas possibilidades de

concretização, ampliou o mercado interno, é fato, porém mantinha uma

cobertura limitada da política social brasileira, conduzida sob medidas

tecnocratas, conservadoras e restringindo direitos civis e políticos. (BEHRING;

BOSCHETTI, 2006).

Neste período da história do Brasil, os militares buscaram modernizar e

expandir as políticas sociais, sob a mesma lógica autoritária:

Para Faleiros (2000), no contexto de perdas das liberdades democráticas, de censura, prisão e tortura para as vozes dissonantes, o bloco militar-tecnocrático-empresarial buscou adesão e legitimidade por meio da expansão e modernização de políticas sociais. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p.136).

Registra-se como medidas realizadas: centralização da previdência social

no Instituto Nacional de Previdência Sociais (INPS), em 1966; em 1967 os

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acidentes de trabalho passam à responsabilidade do INPS; Funrural ampliou a

previdência para os trabalhadores rurais, modelo este de previdência que

passou a cobrir também empregadas domésticas (1972), jogadores de futebol e

autônomos (1973) e os ambulantes (1978). Cria-se a Renda Mensal Vitalícia

para idosos pobres sob pré-requisitos estabelecidos, criação do Ministério da

Previdência e Assistência Social em 1974, incluindo a Fundação Nacional para

o Bem-estar do Menor (Funabem) em substituição ao SAM, extinto em 1964,

mantendo o caráter punitivo que já existia.

Houve também a criação da Central de Medicamentos (CEME), Empresa

de Processamento de Dados da Previdência Social (Dataprev), após ampla

reforma esse conjunto se transformou no Sistema Nacional de Assistência e

Previdência Social (SINPAS), em 1977, compreendendo o INPS, Instituto

Nacional de Assistência Médica (Inamps) e o Instituto Nacional de Administração

da Previdência Social (Iapas). A saúde não foi priorizada pelo setor público, fator

negativo para a sociedade, atendendo interesses do próprio setor na relação da

indústria de medicamentos e artigos médico-hospitalares.

Também houve ações para fornecimento de habitação popular com

estratégias para elevar a economia, mas sem nenhuma transparência dos

gastos públicos.

Contudo, no mesmo passo em que se impulsionavam políticas públicas mesmo restritas quanto ao acesso, como estratégia de busca de legitimidade, a ditadura abria espaços para a saúde, a previdência e a educação privadas, configurando um sistema dual de acesso às políticas sociais: para quem pode e para quem não pode pagar. Essa é uma das principais heranças do regime militar para a política social [...] outra herança é a de que, mesmo com uma ampliação dos acessos públicos e privados, milhões de pessoas permaneciam fora do complexo assistencial-industrial-tecnocrático-militar. (FALEIROS, 2000 apud BEHRING E BOSCHETTI, 2006, p. 137. Grifo dos autores).

Essa dinâmica da autocracia burguesa seguiu-se e durante os últimos

anos do regime ditatorial – do final dos anos 1970 para 1980 - se iniciou um novo

processo de união entre determinados setores da sociedade com intuito de

mobilizar reivindicações por mudanças diante de um regime autoritário que já se

estendia por quase vinte anos e era, obviamente, incapaz de manter o bem-estar

coletivo, além de começar a haver um desgaste desse modelo vigente do golpe

militar com rebatimentos negativos na economia.

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Não havia perspectiva de mudança no quadro de desigualdade social

extrema em que o Brasil vivenciava e com a chegada desse momento da história,

de acordo com Yazbek (2010), percebe-se que a sociedade civil se articula

através de movimentos sociais na busca pela redemocratização e pela conquista

do Estado Democrático de Direito, trazendo força para o movimento sindical e

organizações da população e comunidades ligadas a fragmentos progressistas

da Igreja Católica.

Esses movimentos sociais demonstram um nível de consciência e capacidade de organização em Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), sindicatos, organizações profissionais liberais, meios universitários, Igrejas e imprensa. Expressam-se em greves, reivindicações coletivas, movimentos contra a carestia, movimento por eleição direta para Presidência da República, pelo respeito a direitos humanos, entre vários outros. (YAZBEK, 2010, p. 88)

Neste contexto de luta pela redemocratização, o Brasil adentra nos anos

de 1980 com uma imagem extremamente negativa em termos econômicos –

conhecida como a década perdida – porém traz elementos importantes da

emergência de “conquistas democráticas, em função das lutas sociais e da

Constituição de 1988” (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p.138).

Para a economia foi um período desastroso onde ocorreu de forma

generalizada entre outros países com processos de endividamento,

empréstimos e um cenário economicamente grave trazendo consequências

sociais como empobrecimento intenso no Brasil, aumento da demanda nos

serviços públicos diante da limitação dos direitos, desemprego, informalização

na economia, prioridade dos produtos para exportação em contraponto às

necessidades internas. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006).

Não foi através do que Behring e Boschetti chamam de “Assembleia

Nacional livre e soberana, mas de um “Congresso constituinte”, que trouxe

ganhos para a classe trabalhadora. O movimento operário superou a força que

a elite estabelecia sobre ela:

Sua presença e sua ação interferiram na agenda política ao longo dos anos 1980 e pautaram alguns eixos na Constituinte, a exemplo de: reafirmação das liberdades democráticas; impugnação da desigualdade descomunal e afirmação dos

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direitos sociais; reafirmação de uma vontade nacional e da soberania; [...] direitos trabalhistas; e reforma agrária. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 141).

A análise segue sob as perspectivas de Behring e Boschetti (2006), que

afirmam que a nova agenda neoliberal3 se fazia presente e incomodava,

tornando a Constituinte um processo árduo de disputas de hegemonias, mas que

desenhou, entre outras pautas, o processo de surgimento da Seguridade Social

– mais aprofundada adiante -, grande conquista para a classe trabalhadora.

Destaque também para a conquista da primeira eleição direta presidencial

no Brasil pós ditadura militar, enviesando para uma crise política devido aos

eixos opostos dos dois candidatos principais que chegaram ao segundo turno –

Luís Inácio Lula da Silva e Fernando Collor de Mello. Era a permanência da

disputa entre a classe operária – representada por Lula – e a classe dominante

– representada por Collor, efervescendo todo processo de luta por interesses de

classe após tantas mobilizações já efetivadas pelos operários para derrubada do

militarismo.

O grande destaque nesse processo – 1988/1989 - foi a conquista da

redemocratização e configuração de uma Constituição baseada pelos princípios

de “universalização, responsabilidade pública e gestão democrática” (BEHRING;

BOSCHETTI, 2006, p.144). Daí nasce o conceito de Seguridade Social que

precisa ser abordado como mais uma das grandes conquistas em termos de

direitos para a população garantida na Constituição Federal de 1988, marco na

sociedade brasileira na consolidação da democracia, considerada como a Lei

fundamental e suprema do país, podendo ser designada como ápice de todo

processo de luta pela redemocratização do Brasil após o Golpe de 1964.

(BRASIL, 2017).

Após a CF/1988 houve avanços e conquistas no campo da saúde e

previdência, que são os outros dois setores que compõem a Seguridade Social

junto à Assistência Social, porém, o foco desta pesquisa se limita à assistência

social. É importante ressaltar também que houveram medidas dentro desse

3 Como já abordamos o liberalismo, especificamos aqui que o neoliberalismo, como o próprio nome sugere, é uma renovação do liberalismo clássico, defendendo a liberdade de mercado, intervenção mínima do Estado em políticas públicas e na economia.

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processo da constituinte consideradas como negativas para a classe

trabalhadora, como:

A contraditória convivência entre universalização e seletividade, bem como o suporte legal ao setor privado, em que pese a caracterização de dever do Estado para algumas políticas [...], a derrota das emendas sobre a reforma agrária e a vitória dos ruralistas, grandes proprietários de terra (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 145).

Mas, dentro de uma das maiores conquistas da constituinte, temos a

implementação da Seguridade Social, e especificando melhor esse sistema, fica

evidenciado que “com a Constituição de 1988 são colocadas novas bases para

o atual Sistema de Proteção Social brasileiro com o reconhecimento de direitos

sociais das classes subalternizadas em nossa sociedade” (YAZBEK, 2010, p.

89). Firmando uma nova percepção sobre o campo da proteção social, se tornou

um marco para a sociedade, passando, então, a Assistência Social a compor,

juntamente com a Saúde e a Previdência Social, o tripé da Seguridade Social.

A partir de então, de acordo com a análise de Couto (2009), a assistência

social é uma política de direito não contributiva que se configurou como tal após

um longo processo de reivindicações da classe trabalhadora, como evidenciado

até aqui. Antes disso não era considerada política social pública nem era

entendida como parte constituinte do campo do direito, da universalização dos

acessos nem como responsabilidade do Estado. Isso significa que a parcela da

sociedade que vivia em situações de vulnerabilidade, extrema pobreza e,

portanto, marginalizada, não tinha acesso a uma série de direitos que se

configuram como básicos para vivência humana.

Como já afirmado em outros momentos, os indivíduos que integravam

esse contexto viviam sem perspectiva de garantia dessas necessidades e sem

meios e respaldo algum para buscar e cobrar a efetivação delas, por isso existia

fortemente um caráter de assistencialismo, benevolência e conservadorismo nas

ações voltadas para essas pessoas e foi a partir da Seguridade Social

implementada na CF/1988 que esse quadro mudou efetivamente trazendo a

perspectiva do direito aos cidadãos.

Em articulação com as outras políticas da Seguridade Social (Saúde e

Previdência Social), a assistência social tem o dever de fornecer à população a

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segurança de sobrevivência, de acolhida e de convívio familiar. Além disso,

assegurou o direito à população de participar das decisões e deliberações

relacionadas à assistência social a partir do surgimento dos Conselhos de

Assistência Social.

Portanto, diante dos elementos sóciohistóricos expostos até aqui, se faz

necessário entender que dentro de todo o contexto da Proteção Social até a

Constituição Federal de 1988 no Brasil houveram ganhos e perdas, avanços e

retrocessos, luta de classes e disputas de correlação de força de interesses de

cada setor da sociedade. A contradição é condição permanente da realidade da

dinâmica dentro de uma democracia que foi conquistada a duras penas e os

ciclos de discussão política e econômica continuarão e permanecerão enquanto

houver democracia e interesses distintos dentro de uma sociedade dividida,

como consequência de um sistema político e econômico não igualitário.

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2.2 RELAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL COM A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA

SOCIAL: LUTAS, AVANÇOS, CONQUISTAS E REGULAMENTAÇÕES.

O Serviço Social no Brasil apresenta, em seu histórico de

desenvolvimento como profissão, ampla conexão com a política social. Como

explicitado no capítulo anterior, temos como pano de fundo da construção

histórica dessa relação a grande crise capitalista mundial de 1929 e seus

rebatimentos no Brasil e a Revolução Industrial chegada neste país em 1930,

quando houve notória intensificação das expressões da questão social. Porém,

como vimos, ao entrar no período do regime militar em meados dos anos 1960

temos o Serviço Social envolvido de forma mais direta no enfrentamento desse

quadro de extrema pobreza e desigualdade social intensificados nesta década.

Antes deste período, de acordo com Netto (2015), o serviço social no

Brasil interferia de forma homogênea, caminhando de acordo com os

acontecimentos da época ditatorial, não confrontava formas de abordagens, era

uma unidade carente de uma perspectiva significativamente teórica, avançando

dentro de um consenso posto pelo sistema e isso só começou a mudar em torno

dos anos 1970.

Há de se colocar, segundo Netto (2015), como fator importante nesse

processo de evolução do serviço social e superação da autocracia burguesa a

laicização4: “tal laicização, com tudo o que implicou e implica, é um dos

elementos caracterizadores da renovação do Serviço Social sob a autocracia

burguesa” (Netto, 2015, p. 169). A laicização foi importante, pois trouxe uma

independência do fazer profissional em relação ao estigma de caridade.

Não se pode negar que houve contradição nesses acontecimentos, onde

a autocracia burguesa ainda criava espaços para se auto gestar, o intuito do

regime militar era mobilizar profissionais para que atendessem aos seus

interesses, mas as lutas sociais dos estudantes, parte dos profissionais e a

introdução teórico-metodológica e crítica-analítica que o Serviço Social se

4 “A ruptura com este cenário tem suas bases na laicização do Serviço Social, que as condições novas postas à formação e ao exercício profissionais pela autocracia burguesa conduziram ao ponto culminante; são constitutivas dessa laicização a diferenciação da categoria profissional em todos os seus níveis e a consequente disputa pela hegemonia do processo profissional em todas as suas instâncias (projetos de formação, paradigmas de intervenção, órgãos de representação, etc.)”. (NETTO, 2015, p.169).

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engendrava trazia a possibilidade e iniciativa de questionamentos a essa ordem

burguesa e autoritária, inclusive foi encontrando lacunas no regime militar que

gerou inquietação e questionamentos dos profissionais, estudantes e envolvidos

em movimentos sociais que buscavam superar essa ordem.

Esse processo de renovação do Serviço Social pode ser entendido com a

seguinte afirmação:

Entendemos por renovação o conjunto de características novas que, no marco das constrições da autocracia burguesa, o Serviço Social articulou, à base do rearranjo de suas tradições e da assunção do contributo de tendências do pensamento social contemporâneo, procurando investir-se como instituição de natureza profissional dotada de legitimação prática, através de respostas a demandas sociais e da sua sistematização, e de validação teórica, mediante a remissão às teorias e disciplinas sociais. (NETTO, 2015, p.172).

Entende-se, através da análise de Netto (2015) que o processo de

renovação do Serviço Social foi permeado por disputas de legitimidade nas

práticas e de valorização da teoria, notado como um avanço. O intuito principal

desta pesquisa não é detalhar o processo de renovação da profissão sob a

autocracia burguesa5, mas citá-lo como fator importante na relação do Serviço

Social com a política de Assistência Social contemporânea.

Portanto, no intuito de realizar uma síntese com os principais fatos desse

processo que a profissão enfrentou objetivando a superação do

conservadorismo, passando por fases de reconceituação e reatualização, é

conveniente nos reportarmos a alguns fatos marcantes desse processo, como o

importante sustentáculo dado pelo Centro Brasileiro de Cooperação e

Intercâmbio de Serviços Sociais (CBCISS), aos quatro fundamentais seminários

de teorização (Seminário de Araxá em 1967; Teresópolis em 1970; Sumaré em

1978; Alto da Boa Vista em 1984), ao crescimento da área da pesquisa dentro

das academias com cursos de pós-graduação questionadores da ordem

burguesa, à formação de agências e categorias profissionais, entre outros

5 Ver o processo de renovação da profissão do Serviço Social na obra de Jose Paulo Netto: “Ditadura e Serviço Social, uma análise do serviço social no Brasil pós-64” onde ele é registrado detalhadamente.

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percursos enriquecedores para, então, entrar no processo de ruptura com o

tradicionalismo da profissão existente até então.

Temos o desenvolvimento do acesso acadêmico à origem da teoria

marxista com fortalecimento de análises teóricas, estando esse fator totalmente

ligado com as bases do processo de renovação do Serviço Social. (NETTO,

2015). O pluralismo se fazia presente de forma legítima, e ainda é uma realidade

que, em algumas vertentes, liga a profissão ao conservadorismo, mas essa

relação com o marxismo abriu possibilidades de crescimento intelectual, teórico

e prático, sendo referência teórica e metodológica, inclusive para a criação dos

códigos de ética da profissão em 1947, depois 1965, 1975, 1986 e sua última

versão construída em 1993.

Os Códigos de Ética do Serviço Social acompanharam o processo

histórico social e foram evoluindo de acordo com o progresso da profissão, das

regulamentações, dos estudos e teorias. Também foi referência para a

construção do Projeto Ético Político da Profissão que caminhou junto a esse

processo de avanços expostos e apresenta orientações em relação à

perspectiva e direção da profissão, ele

Tem em seu núcleo o reconhecimento da liberdade como valor ético central – a liberdade concebida historicamente, como possibilidade de escolher entre alternativas concretas; daí um compromisso com a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais. Consequentemente, o projeto profissional vincula-se a um projeto societário que propõe a construção de uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe, etnia e gênero. (NETTO, 1999, p. 404-5 apud BRASIL, 2016)

Através desse avanço a profissão se conectou com as necessidades da

população de forma totalmente distinta do que era nos primórdios. Como vimos,

o surgimento e desenvolvimento da política de assistência social foram

permeados por negações e preconceitos que giram em torno da ideia de uma

política estigmatizada pela visão do clientelismo e caridade. Couto e Silva (2009)

reafirmam:

O caminho percorrido pela sociedade brasileira no trato do campo da política pública apresenta-se eivado de contradições, onde por um lado a garantia constitucional da Seguridade Social e do tripé que a compõe (Previdência Social, Saúde e

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Assistência Social) vai buscar romper com a forma tradicional do trato do campo da proteção social brasileira e por outro é necessário o enfrentamento do enraizamento dos pré-conceitos que permeiam a compreensão corrente sobre o papel do Estado e da sociedade brasileira. Esses pré-conceitos serão mais evidenciados no campo da assistência social, uma vez que o preceito constitucional de “dever do Estado e direito do cidadão” não encontra um solo histórico propício. (COUTO; SILVA, 2009, p. 32).

Além de tratar do solo da assistência social no Brasil, é pertinente, ainda,

fazer menção à análise de Couto (2015) no que se refere ao objeto de disputa

que o campo da política social representa para a classe trabalhadora e para o

capital. Isso se dá, de acordo com a autora, devido à capacidade que a política

de assistência social possui em atender interesses das duas classes quando

pode corresponder ao alcance de direitos universais para os trabalhadores, fator

positivo para esse grupo ou representar uma forma de atenuação de possíveis

conflitos gerados por mobilizações do proletariado que visa reivindicação de

direitos, beneficiando, neste último caso, os capitalistas.

Dentro desta disputa afirma-se que o serviço social foi fundamental,

Teve e [...] tem uma participação indiscutível na construção e na defesa dos direitos sociais, econômicos, políticos e culturais, nesse país onde o termo direito não faz parte do cotidiano daqueles que não têm acesso a ele por meio das políticas sociais. (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 192. Grifo nosso).

Além disso, a categoria obteve mais força e legitimação através de leis

que foram promulgadas no intuito de estabelecer a regulamentação da profissão

determinando fatores legais imprescindíveis no trato da política de assistência

social à população.

Em relação à legislação em torno do Serviço Social e da política de

assistência social, é propício iniciar esse momento mencionando a Lei Orgânica

da Assistência Social – LOAS, n° 8.742 de 1993 que regulamentou os pontos

inseridos na Constituição Federal de 1988 referentes à política de assistência

social, estabelecendo critérios para assegurar o direito do cidadão e a atuação

profissional sendo uma das primeiras e principais leis a serem promulgadas

neste âmbito.

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A Assistência Social é um direito constitucional não-contributivo, que deve

assegurar a quem dela necessitar e a LOAS veio para organizar esta política

como tal, estabelecendo critérios, regras e normas objetivas. O intuito era

construir uma rede de proteção social de forma legal e de modo a serem

cumpridas, estabelecendo uma organização mais clara para o acesso de

profissionais e usuários às leis que regulamentam o direito à assistência social,

bem como reforçá-las (BRASIL, 2009).

Em seu artigo 1° consta que:

A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas (BRASIL, 2009).

E em torno dessa definição clara no que diz respeito à Política de

Assistência Social como direito garantido ao cidadão outras ações foram se

concretizando em prol deste campo da Seguridade Social e do profissional

atuante na área. Onze anos depois, em 2004, A Política Nacional de Assistência

Social – PNAS veio fortalecer a LOAS, sendo implementada por meio do

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – MDS, da Secretaria

Nacional de Assistência Social – SNAS e do Conselho Nacional de Assistência

Social – CNAS, compromissada em materializar as diretrizes da LOAS,

aprimorar e efetivar a Assistência Social como política pública, sendo resultados

de um amplo processo de construção coletiva.

O empenho da construção e efetivação da PNAS também girou em torno

de se tornar mais um componente forte desta política e já visando preparação e

construção do Sistema Único de Assistência Social – SUAS (BRASIL, 2005).

Seguindo o processo de construção e aprimoramento da política de

Assistência Social, o SUAS foi implementado em 2005, mas só regulamentado

em 6 de julho de 2011, pela Lei 12.435, representando uma conquista histórica

para a política de Assistência Social no Brasil. Na ocasião em que o Projeto de

Lei da Câmara n°189/2010, conhecido como PL SUAS foi sancionado, o

Conselho Federal de Serviço Social - CFESS e alguns Conselhos Regionais de

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Serviço Social - CRESS foram representados através da presença de

conselheiros na cerimônia.

O Projeto, que altera a Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS contém

em seu texto, aprovado e sancionado, que a prestação de assistência social se

tornaria descentralizada e a gestão passaria a ser compartilhada entre governo

federal, estados e municípios.

A representação destas mudanças para os assistentes sociais, usuários

e para o próprio serviço foi extremamente relevante, pois fornece margem legal,

através de normas jurídicas universais, para que os profissionais possam cobrar

a efetivação dos serviços voltados aos usuários, bem como para a luta por

melhoria nas condições do próprio trabalho. Além disso, representou um maior

reconhecimento pelo Estado no que diz respeito aos direitos dos cidadãos e

esforço e compromisso do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à

Fome – MDS e demais gestores da política de assistência social (CFESS, 2011).

O SUAS é mais um sublime reconhecimento para esta área, ampliando a

cobertura da Política de Assistência Social no país estando entre os marcos da

política social, assim como a LOAS e a PNAS que já faziam esse papel atuando

na consolidação da assistência social como política de Estado (BRASIL, 2011).

A PNAS aborda conceitos extremamente completos em relação a toda

política de assistência social, nela é posto que a proteção social tem como

essência a garantia de três fatores fundamentais para alcançar as necessidades

sociais, são eles: “a garantia da segurança de sobrevivência (de rendimento e

de autonomia); de acolhida; de convívio ou vivência familiar” (BRASIL, 2005, p.

31). Para cada categoria dessa, existe uma pesquisa aprofundada que justifica

a garantia da política ser baseada nelas. Sobre a segurança de sobrevivência, o

texto da PNAS especifica:

A segurança de rendimentos não é uma compensação do valor do salário mínimo inadequado, mas a garantia de que todos tenham uma forma monetária de garantir sua sobrevivência, independentemente de suas limitações para o trabalho ou do desemprego. É o caso de pessoas com deficiência, idosos, desempregados, famílias numerosas, famílias desprovidas das condições básicas para sua reprodução social em padrão digno e cidadã. (BRASIL, 2004, p. 31).

No que diz respeito à segurança de acolhida é exposto que:

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Entende-se como uma das seguranças primordiais da política de assistência social. Ela opera com a provisão de necessidades humanas que começa com os direitos à alimentação, ao vestuário e ao abrigo, próprios à vida humana em sociedade. A conquista da autonomia na provisão dessas necessidades básicas é a orientação desta segurança da assistência social. É possível, todavia, que alguns indivíduos não conquistem por toda a sua vida, ou por um período dela, a autonomia destas provisões básicas, por exemplo, pela idade – uma criança ou um idoso –, por alguma deficiência ou por uma restrição momentânea ou contínua da saúde física ou mental. (BRASIL, 2005, p. 31).

Já sobre a segurança de convívio ou vivência familiar, é exposto sobre a

possibilidade de existir

A necessidade de separação da família ou da parentela por múltiplas situações, como violência familiar ou social, drogadição, alcoolismo, desemprego prolongado e criminalidade. Podem ocorrer também situações de desastre ou acidentes naturais, além da profunda destituição e abandono que demandam tal provisão. A segurança da vivência familiar ou a segurança do convívio é uma das necessidades a ser preenchida pela política de assistência social. Isto supõe a não aceitação de situações de reclusão, de situações de perda das relações. É próprio da natureza humana o comportamento gregário. É na relação que o ser cria sua identidade e reconhece a sua subjetividade. A dimensão societária da vida desenvolve potencialidades, subjetividades coletivas, construções culturais, políticas e, sobretudo, os processos civilizatórios. As barreiras relacionais criadas por questões individuais, grupais, sociais por discriminação ou múltiplas inaceitações ou intolerâncias estão no campo do convívio humano. A dimensão multicultural, intergeracional, interterritoriais, intersubjetivas, entre outras, devem ser ressaltadas na perspectiva do direito ao convívio (BRASIL, 2005, p.31).

Fica claro, através das regulamentações, que o Estado é o responsável

por essa garantia à população necessitada da assistência, através da garantia

da cidadania, universalização da cobertura e do acesso aos serviços (BRASIL,

2005).

Em um maior aprofundamento no sentido do progresso da política de

assistência social e tendo em vista que seu funcionamento se dá a partir da

articulação com outras políticas sociais, programas e serviços que juntos

promovem a aplicabilidade do direito ao cidadão, entende-se que a assistência

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social não é possibilitada de forma singular nem deve ser parâmetro de

resolução de situações individuais ou grupais, por partir do princípio de que as

necessidades sociais das pessoas possuem origem comum, ou seja, possuem

raiz na desigualdade social e de classe que desencadeiam no surgimento das

expressões da questão social. Esse é o processo que resulta nas situações de

precariedade e, sobretudo, ao não acesso aos direitos que devem ser garantidos

pelo Estado (BRASIL, 2011).

Em novembro de 2009, através da Resolução 109, considerando

resoluções do CNAS, PNAS, NOB/SUAS, NOBRH/SUAS, deliberações em

Conferências, Plano Nacional de Assistência Social e ações do MDS6, foi

aprovado a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais baseado em

níveis de complexidade dos casos do SUAS, norteado por estudos que são

realizados pelos órgãos e secretarias responsáveis, baseados nas

fundamentações teóricas e metodológicas que subsidiam as conclusões acerca

desse contexto social.

Sendo assim, de acordo com a Tipificação, dentro da Política de

Assistência Social tem-se uma subdivisão em Serviços de Proteção Social

Básica, Serviços de Proteção Social Especial de Média Complexidade e

Serviços de Proteção Social Especial de Alta Complexidade, os quais serão

diferenciados para maior compreensão, enfatizando que será abordado com

mais detalhes a Proteção Especial de Média Complexidade por ser a que se

responsabiliza pelo Serviço foco dos objetivos propostos nesta pesquisa.

6 O Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), em reunião ordinária realizada nos dias

11 e 12 de novembro de 2009, no uso da competência que lhe conferem os incisos II, V, IX e XIV do artigo 18 da Lei n.º 8.742, de 7 de dezembro de 1993 – Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS); Considerando a Resolução CNAS n.º 145, de 15 de outubro de 2004, que aprova a Política Nacional de Assistência Social (PNAS); Considerando a Resolução CNAS n.º130, de 15 de julho de 2005, que aprova a Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social (NOB/SUAS); Considerando a Resolução CNAS n.º 269, de 13 de dezembro de 2006, que aprova a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único de Assistência Social (NOBRH/SUAS); Considerando a deliberação da VI Conferência Nacional de Assistência Social de “Tipificar e consolidar a classificação nacional dos serviços socioassistenciais”; Considerando a meta prevista no Plano Decenal de Assistência Social, de estabelecer bases de padronização nacional dos serviços e equipamentos físicos do SUAS; Considerando o processo de Consulta Pública realizado no período de julho a setembro de 2009, coordenado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS);

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Quadro síntese disponibilizado na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. (MDS,

2009).

A proteção social básica diz respeito ao cumprimento de objetivos de

prevenção de reais fatores de risco por meio do fortalecimento de vínculos

familiares e comunitários, bem como à realização de um trabalho voltado a

proporcionar condições reais de desenvolvimento de potencialidades para

indivíduos que estejam sob o risco de vivenciar situações de

Vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação (ausência de renda, precário ou nulo acesso aos serviços públicos, dentre outros) e, ou, fragilização de vínculos afetivos – relacionais e de pertencimento social (discriminações etárias, étnicas, de gênero ou por deficiências, dentre outras) (BRASIL, 2005, p. 33).

Dentro da proteção social básica, busca-se evitar que ocorra a violação

de direitos e a perda do vínculo familiar e comunitário, é um trabalho preventivo,

que conta com projetos, programas e serviços voltados para este objetivo em

torno do acolhimento adequado para cada situação demandada no serviço de

acolhimento.

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A instituição de referência na proteção básica é o Centro de Referência

de Assistência Social – CRAS e é nesta instituição que há o funcionamento dos

serviços que contam com a atuação de equipes multiprofissionais com

assistentes sociais, psicólogos e educadores sociais. O CRAS é uma instituição

de natureza pública estatal e está inserida nas zonas mais precárias das cidades

de todo o país. É nesta instituição que se organiza e materializa o trabalho

preventivo de interrupção de vínculos comunitários e familiares, bem como de

esclarecimento e encaminhamento da população necessitada de benefícios

permanentes ou eventuais, sendo considerada como instituição de porta de

entrada aos serviços socioassistenciais.

Os serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica deverão se articular com as demais políticas públicas locais, de forma a garantir [...] ações desenvolvidas e o protagonismo das famílias e indivíduos atendidos, de forma a superar as condições de vulnerabilidade e a prevenir as situações que indicam risco potencial. Deverão, ainda, se articular aos serviços de proteção especial, garantindo a efetivação dos encaminhamentos necessários. (BRASIL, 2005, p. 34-35).

Essa definição da função da proteção social básica consta na PNAS de

forma completa e compreensível concluindo o trabalho que é executado nessa

instância, que:

Realiza, ainda, [...] o mapeamento e a organização da rede socioassistencial de proteção básica e promove a inserção das famílias nos serviços de assistência social local. Promove também o encaminhamento da população local para as demais políticas públicas e sociais, possibilitando o desenvolvimento de ações intersetoriais que visem a sustentabilidade, de forma a romper com o ciclo de reprodução intergeracional do processo de exclusão social, e evitar que estas famílias e indivíduos tenham seus direitos violados, recaindo em situações de vulnerabilidades e riscos. São considerados serviços de proteção básica de assistência social aqueles que potencializam a família como unidade de referência, fortalecendo seus vínculos internos e externos de solidariedade, através do protagonismo de seus membros e da oferta de um conjunto de serviços locais que visam a convivência, a socialização e o acolhimento, em famílias cujos vínculos familiar e comunitário não foram rompidos, bem como a promoção da integração ao mercado de trabalho (BRASIL, 2005, p. 35).

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A Proteção Social Especial de Média Complexidade abrange as

demandas através da organização da oferta de serviços, programas e projetos

de caráter especializado, destinado a famílias e indivíduos em situação de risco

pessoal e social, por violação de direitos. Neste caso, se adentra em situações

mais delicadas no sentido de diversos tipos de contextos que desaguam na

exclusão social, como a pobreza, miséria, indigência, dissuasão social, entre

outras. Aborda as situações onde houveram violações de direitos, porém,

quando os vínculos familiares e comunitários ainda não foram interrompidos.

O trabalho é voltado para um acolhimento baseado na perspectiva do

fortalecimento desses vínculos, isto significa abranger esse conceito de

fortalecimento de vínculos para além de fatores socioeconômicos, mas inclusão

em seu contexto familiar, social e cultural buscando trazer protagonismo às

famílias e indivíduos dentro da lógica do acesso aos seus direitos sociais

buscando evitar que não cheguem a ser apartados. Dentro das demandas que

chegam ao serviço de média complexidade, podemos dizer que:

A modalidade de atendimento assistencial (é) destinada a famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e, ou, psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas sócio-educativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras (BRASIL, 2005, p. 37).

Neste sentido, de acordo com a PNAS, a estratégia técnico-operacional

deste segmento da proteção social necessita de uma boa estrutura de atenção

especializada e continuada, é importante ressaltar esse enfoque na perspectiva

especializada diante da complexidade das demandas.

Em relação à instituição de referência para estes serviços, programas e

atendimentos, existe o Centro de Referência Especializado em Assistência

Social – CREAS, ele se configura como uma instituição de natureza pública

estatal, com abrangência municipal ou regional e atuação territorial. Comporta

equipes de referência multiprofissional para o atendimento de indivíduos e

famílias que vivem sob risco pessoal ou social em decorrência da violação de

direitos e vulnerabilidade (BRASIL, 2011).

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Como exemplo de situações atendidas nas unidades, podem ser citadas

as questões dos demais tipos de violência, a exploração sexual, tráfico de

pessoas, cumprimento de medidas socioeducativas, entre outros, com viés

voltado para a capacidade de proteção, conscientização e promoção de direitos

humanos e socioassistenciais através dos serviços disponibilizados pela política

de assistência social. O CREAS trabalha com o Serviço de Proteção e

Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos – PAEFI, Serviço

Especializado em Abordagem Social – SEAS e o Serviço de Proteção Social aos

Adolescentes em Cumprimento de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto.

(BRASIL, 2011).

Além de focar na efetividade da disponibilização dos recursos para o

investimento na superação da situação apresentada pelo usuário, um resultado

positivo depende também de um trabalho realizado de forma articulada com

outras instituições da rede de atendimento para a reconstrução das situações de

violação. Com os serviços que também são de responsabilidade do CREAS, a

Abordagem de Rua, Serviço de Habilitação e Reabilitação na comunidade das

pessoas com deficiência e Cuidado no Domicílio, a proteção social especializada

de média complexidade se completa (BRASIL, 2005).

Os objetivos do CREAS se constituem na oferta de serviços que propicie

acolhida e escuta qualificada visando o fortalecimento da função protetiva da

família; na interrupção de padrões de relacionamentos familiares e comunitários

com violação de direitos; na potencialização dos recursos para a superação da

situação vivenciada e reconstrução de relacionamentos familiares, comunitários

e com o contexto social, ou construção de novas referências, quando for o caso;

no acesso das famílias e indivíduos a direitos socioassistenciais e à rede de

proteção social; no exercício do protagonismo e da participação social;

prevenção de agravamentos e da institucionalização (BRASIL, 2011).

A atenção ofertada nos CREAS possui como eixos norteadores o

atendimento especializado e qualificado; o território e localização em que a

instituição se encontra; o acesso aos direitos socioassistenciais; a centralidade

na família no sentindo de fortalecimento de vínculos e protagonismo social;

mobilização e participação social; trabalho em rede (BRASIL, 2011).

O CREAS está inserido em todo território nacional e Natal – RN possui

uma desta instituição em cada zona da cidade: norte, sul, leste e oeste. Antes

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de abordar as particularidades desta região, é importante ressaltar os aspectos

da territorialização que são fundamentais dentro do funcionamento da política de

assistência social.

O aspecto da territorialização consta no artigo 5° da Norma Operacional

Básica da Assistência Social - NOB/SUAS, aprovada em dezembro de 2012,

verificada e deliberada pelo CNAS e consta como uma das diretrizes

estruturantes do sistema SUAS. A PNAS também aborda a territorialização com

extrema relevância necessária diante das particularidades da realidade brasileira

que não é homogênea e da intensa desigualdade social que reflete de diferentes

formas em cada espaço geográfico.

Considerando a alta densidade populacional do País e, ao mesmo tempo, seu alto grau de heterogeneidade e desigualdade socioterritorial presentes entre os seus 5.561 Municípios, a vertente territorial faz-se urgente e necessária na Política Nacional de Assistência Social. Ou seja, o princípio da homogeneidade por segmentos na definição de prioridades de serviços, programas e projetos torna-se insuficiente frente às demandas de uma realidade marcada pela alta desigualdade social. Exige-se agregar ao conhecimento da realidade a dinâmica demográfica associada à dinâmica socioterritorial em curso (BRASIL, 2005, p. 43).

Como consta no texto da PNAS, com base em leituras territoriais advindas

de equipes profissionais se confirma a necessidade da descentralização do

atendimento social aos indivíduos incorporando o envolvimento de políticas

locais, levando em consideração o cotidiano, cultura, historicidade e trazendo a

intersetorialidade na busca pela resolução de demandas similares dentro de um

mesmo território.

Dessa forma, uma maior descentralização, que recorte regiões homogêneas, costuma ser pré-requisito para ações integradas na perspectiva da intersetorialidade. Descentralização efetiva com transferência de poder de decisão, de competências e de recursos, e com autonomia das administrações dos microespaços na elaboração de diagnósticos sociais, diretrizes, metodologias, formulação, implementação, execução, monitoramento, avaliação e sistema de informação das ações definidas, com garantias de canais de participação local. Pois, esse processo ganha consistência quando a população assume papel ativo na reestruturação (BRASIL, 2005, p. 44).

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O intuito é uma política pública que agregue os aspectos relevantes da

territorialização para a efetivação da política de assistência social,

descentralizada e intersetorial, no sentido de trabalhar a assistência para

minimizar as necessidades de um grupo que as possuam em bases parecidas

no mesmo contexto social, e articulação em rede entre os setores da política de

assistência social.

Assim, a operacionalização da política de assistência social em rede, com base no território, constitui um dos caminhos para superar a fragmentação na prática dessa política. Trabalhar em rede, nessa concepção territorial significa ir além da simples adesão, pois há necessidade de se romper com velhos paradigmas, em que as práticas se construíram historicamente pautadas na segmentação, na fragmentação e na focalização, e olhar para a realidade, considerando os novos desafios colocados pela dimensão do cotidiano, que se apresenta sob múltiplas formatações, exigindo enfrentamento de forma integrada e articulada (BRASIL, 2005, p. 44).

Retomando a Tipificação Nacional e para concluir, temos dentro dela o

Serviço de Proteção Especializado de Alta Complexidade, divididos de acordo

com níveis de agravamento, natureza e especificidades das demandas sociais.

Os serviços de proteção social especial de alta complexidade são aqueles que garantem proteção integral – moradia, alimentação, higienização e trabalho protegido para famílias e indivíduos que se encontram sem referência e, ou, em situação de ameaça, necessitando ser retirados de seu núcleo familiar e, ou, comunitário. Tais como: Atendimento Integral Institucional; Casa Lar; República; Casa de Passagem; Albergue; Família Substituta; Família Acolhedora; Medidas socioeducativas restritivas e privativas de liberdade (semiliberdade, internação provisória e sentenciada); Trabalho protegido (BRASIL, 2005, p. 38).

Partindo dessa exposição a respeito da importância da territorialização

dentro da política de assistência social e concebendo a realidade das distinções

de cada região é que ressaltamos as particularidades da região sul de Natal,

onde se encontra o CREAS, protagonista desta análise.

De acordo com a revisão do Plano Diretor de Natal de agosto de 2017, a

região administrativa sul é composta por sete bairros: Lagoa Nova, Nova

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Descoberta, Candelária, Capim Macio, Pitimbu, Neópolis e Ponta Negra. São

esses bairros que o CREAS - Sul atende as demandas.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE,

do censo 2010 a região possui 166.491 habitantes, correspondendo a 20,71%

da população de Natal, que ocupam 51.243 domicílios e cujo valor do rendimento

médio mensal, o mais alto da cidade que possui uma média de 1,78, é de 3,45

salários mínimos. Ou seja, é uma região que possui aspectos positivos em

relação às outras regiões da cidade, com menos habitantes e abrangendo menos

bairros, refletindo, portanto, na demanda do CREAS e do Meio Aberto. Esses

fatores influenciam diretamente no atendimento, pois se possui um menor

número de casos, a equipe consegue fazer um acompanhamento mais

minucioso.

Comparado com as outras regiões em que a demanda é maior, nota-se

diferença na capacidade de acompanhar os casos de forma que permita a devida

atenção. Isso não significa que o trabalho nas outras regiões seja insatisfatório,

mas é evidente que quanto maior a demanda, mais dificuldade em investir mais

tempo em cada caso.

O fato de a região sul ser, também, acima da média em termos

econômicos no munícipio, como consta nos dados explicitados, há uma

desigualdade social menor em relação aos bairros maiores e com menos poder

econômico, essa é outra particularidade do CREAS - Sul. No entanto, é uma

região litorânea onde o trabalho informal aparece fortemente.

De acordo com os dados da pesquisa documental realizada no Serviço de

Medidas Socioeducativas em Meio Aberto da região sul, percebe-se que a

informalidade no trabalho encontra-se presente de maneira considerável no

contexto familiar dos socioeducandos, seja como única fonte de renda ou para

complementá-la.

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Gráfico 1- Origem da renda familiar dos adolescentes socioeducandos do

Meio Aberto do CREAS Sul:

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

Inclusive, os próprios adolescentes possuem alta incidência de

experiência com trabalhos informais, tanto quando chegam ao Serviço quanto

quando termina de cumprir a medida, neste último caso, a incidência da

informalidade no trabalho é menor, mas não percebe-se grandes evoluções.

Gráfico 2 - Inserção no mercado de Trabalho

Formal no momento de chegada ao serviço:

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

32%

21%15%

32%

Trabalho Formal Trabalho Informal

Trabalho Formal e Informal Não informado

78%

11%

11%

Trabalho Informal Trabalho Formal Nunca trabalhou

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Gráfico 3 - Inserção no mercado de Trabalho

Formal no momento de saída do serviço:

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

Além desses fatores, a integração da equipe é de extrema relevância para

o atendimento das demandas e acompanhamento dos casos que chegam ao

Serviço, e nesta instituição há uma integração interdisciplinar integrativa e

consensual onde as discussões de casos apresentam fluidez positiva, somando

no processo de acompanhamento aos adolescentes.

67%

11%

22%

Trabalho Informal Trabalho Formal Desempregados

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3 SOCIEDADE, ADOLESCÊNCIA E ATO INFRACIONAL: ANÁLISE CRÍTICA

DAS PARTICULARIDADES DESSA RELAÇÃO.

O entendimento do contexto que envolve o adolescente inserido em

situações de violência, mais precisamente de sua relação com a prática do ato

infracional perpassa por diversos campos, é necessário que haja uma

compreensão crítica em relação ao que significa a fase da vida que diz respeito

à adolescência, ao contexto social que permeia a vida desses indivíduos, a lógica

de uma visão estigmatizada desses adolescentes, em especial os advindos de

famílias em situação de pobreza, por parte da sociedade capitalista, suas

consequências e seus rebatimentos negativos na vida destes.

Esse entendimento que iremos buscar segue a linha de análise e

referência utilizada até então, ou seja, uma “compreensão dialética das relações

sociais, nas quais os sujeitos produzem e reproduzem valores, comportamentos

e atitudes como forma de dar significado a sua existência” (VOLPI, 1999, p. 53).

É necessário que se faça uma relação entre os aspectos sociais e a

prática do ato infracional, o que não significa, porém, que esse entendimento

seja sinônimo de justificativa para o cometimento de atos que infringem as leis

nem de impunidade como muito se dissemina no chamado senso comum e na

grande mídia, mas através de uma análise crítica é possível estabelecer essa

relação que deve ser levada em consideração nesta discussão. São

adolescentes em situação de pobreza os quais são negligenciadas suas

necessidades e com seus direitos sociais violados, são vistos como ameaça à

sociedade burguesa.

Dentro deste capítulo, pretende-se analisar o contexto social do

adolescente autor de ato infracional, a prática do ato por ele cometido, a relação

desses fatos com a sociedade e com sua história no que diz respeito aos

processos de surgimento e evolução da política de assistência e proteção social

voltada para o adolescente.

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3.1 RELAÇÃO DO ADOLESCENTE AUTOR DE ATO INFRACIONAL NOS

INCURSOS DA SOCIEDADE CAPITALISTA E A POLÍTICA DE ATENDIMENTO

A CRIANÇAS E ADOLESCENTES.

A política de assistência social se desenvolveu com um alcance lento e

desigual, tanto de forma ampla, no que se refere à população, quanto no sentido

específico de, durante muito tempo, não haver uma atenção especial a

determinados grupos, neste caso, os adolescentes. Então novos anseios e

necessidades surgiram por parte da sociedade, pois as políticas públicas dignas

para os adolescentes não eram pensadas adequadamente nem postas, o que

só aconteceu tardiamente.

A relação da adolescência com a sociedade foi se constituindo em fatos

que merecem ser considerados para que se estabeleça o entendimento

pretendido no que diz respeito a adolescentes em contexto de violência e a

sociedade capitalista. O fato de crianças e adolescentes terem sido inseridos

dentro da indústria no período de ascensão da Revolução Industrial no Brasil nos

anos de 19307, permite a afirmação de que as consequências desse fato foram

se construindo historicamente, com rebatimentos negativos que implicaram em

um cenário que foi se constituindo e tomando formas diferentes ao logo dos anos

de acordo com as transformações societárias, mas sempre influenciando o

processo sócio histórico desses indivíduos.

Por exemplo, de acordo com a tese de Ferreira (2016), no século XIX e

XX teve-se uma juventude vista como incompatível com a coerência entre

desenvolvimento físico, intelectual e financeiro. O mercado utilizou essa imagem

ao seu favor e os viu como um público consumidor em potencial, o que não

significou progresso em termos de direitos. Já no período pós-guerra, a autora

afirma que houve uma intensificação da exclusão social devido fatores

econômicos que afetou adolescentes e jovens, e dez anos depois a globalização

do mercado aprofundou essa exclusão.

7 Esta fase foi abordada no primeiro capítulo deste estudo de forma mais detalhada. Ver tópico 2.1, página 22.

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A realidade histórica de parte dos adolescentes era permeada por

exclusão, marginalização de adolescentes vistos como fora da “ordem” pela

sociedade, estigmatização dos que possuíam algum envolvimento com delitos,

preconceito, falta de planejamento e atenção voltada para esse grupo.

Como Estado não interveio tão rapidamente no quesito de proteção social

voltada para os adolescentes de forma específica e elaborada, os adolescentes

em situação de vulnerabilidade, com necessidades básicas negligenciadas e

direitos negados, eram de responsabilidade da igreja católica, assim como a

população necessitada, em geral, também era. Os direitos voltados para

crianças e adolescentes também fizeram parte de um processo gradativo e

fincado em lutas por conquistas, configurados também como um processo social.

De acordo com Volpi (1999), a partir do século XIX, é que se iniciou um

processo de abordagem com legitimidade na história de crianças e adolescentes

excluídos socialmente através de uma análise voltada para atendimento a esse

segmento. Em sua análise consta que:

Uma primeira etapa que pode denominar-se de caráter penal indiferenciado, que se estende desde o nascimento dos códigos penais de corte nitidamente retribucionista do século XIX, até 1919. A etapa do tratamento penal indiferenciado se caracteriza por considerar os menores de idade, praticamente da mesma forma que os adultos. Com a única exceção aos menores de sete anos, os quais se considerava, conforme a velha tradição do direito romano, absolutamente incapazes, cujos atos eram equiparados aos dos animais. A única diferença para os menores entre 7 e 18 anos consistia, geralmente, na diminuição da pena em um terço em relação aos adultos. Assim, a privação de liberdade por um tempo um pouco menor que dos adultos e a mais absoluta promiscuidade constituíam uma regra sem exceções (MENDES, 1999, apud VOLPI, 1999, p. 23, 24).

Após esta primeira etapa, foi promulgado em 1830, o Código Criminal do

Império do Brasil, como a primeira legislação voltada para os adolescentes

intervindo na responsabilização penal destes. Neste caso, os menores de 14

anos eram isentos de responsabilização criminal:

O Código Criminal do Império (1830) colocava a maioridade penal absoluta a partir dos 14 anos, mas crianças a partir de oito anos poderiam ser julgadas como adultos, pegando pena perpétua, caso fosse avaliado que agiram com discernimento. Durante a República, o Código Penal Republicano (1890),

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também determinava a inimputabilidade absoluta até os 09 anos de idade e submetia aos maiores de 09 e menores de 14 anos à análise do discernimento (SILVA; OLIVEIRA, 2015, p. 17).

Essas análises do discernimento dos adolescentes foram questionadas e

criticadas, por dependerem de testes que não tinham base especializada para

avaliação de uma subjetividade em uma época onde o caráter predominante era

punitivo sem levar em consideração a historicidade do sujeito. Segundo as

afirmações de Volpi (1999), o juiz determinava o destino dos que possuíam idade

entre nove e catorze anos, podendo leva-los a casas de caráter carcerário

divididos com adultos por não ter instituição específica para eles e a submissão

a abusos dentro desses ambientes.

Dentro da realidade histórica dos direitos das crianças e adolescentes, no

século XX, mais precisamente em 1927, houve a promulgação do primeiro

Código de Menores, proposto por Mello Matos em 1902, dando início a etapa

tutelar, incluindo esse grupo em um ordenamento jurídico. (Volpi, 2001). Temos

o objetivo do Código de Menores de 1927 disposto em seu artigo 1°: “O menor,

de um ou outro sexo, abandonado ou delinquente, que tiver menos de 18 anos

de idade, será submetido pela autoridade competente às medidas de assistência

e proteção contidas neste Código” (BRASIL, 1927, não paginado).

Porém, apesar da utilização do termo proteção8 no artigo 1° do Código de

Menores, seu cunho manteve o traço punitivo e repressivo existente marcado

pela característica de assistir crianças e adolescentes que se encontravam em

situação irregular através de postura repressiva e em situação de desamparo. A

partir deste Código, novos procedimentos foram adotados no tratamento a

crianças e adolescentes envolvendo, inclusive, seus responsáveis:

A partir desse momento o “menor” passava a receber sanções judiciais pelos seus atos, por meio de processo penal. De acordo com o Código de Menores (BRASIL, 1927), o delinquente, autor ou cúmplice de um ato qualificado como crime ou contravenção, era submetido à figura do Juiz de Menores. O juiz avaliava a conduta do acusado, devendo considerar na aplicação da sentença a idade, a situação social, o estado psicológico, mental e moral, e a situação econômica e moral de seus pais ou responsáveis (FERREIRA, 2016, p. 27).

8A mencionada “proteção” no artigo 1° do Código de Menores de 1927 estava aquém do conceito de proteção social que hoje é constitucional e possuía caráter fortemente punitivo e repressor.

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O Código de menores de 1927 reduzia todas as questões complexas da

criança “vítima, infratora ou negligenciada numa única categoria arbitrária de

menores abandonados”9 (Volpi, 1999, p. 26). Ou seja, minimizando e

simplificando uma série de questões sociais sérias e complexas à uma única

determinação de abandono.

A partir desses procedimentos os encaminhamentos eram realizados,

envolvendo decisões entre recolhimento em instituições, entrega à

responsabilidade de uma pessoa capacitada a assumi-la ou encaminhamento a

locais para menores de 18 anos, a depender da gravidade do ato (FERREIRA,

2016).

Esse poder de decisão judicial, segundo Costa (2012) interferia na

autonomia da família sobre seus filhos, pois retiravam deles o poder de decisão

de acordo com os julgamentos aplicados em cada caso baseados,

principalmente, em fatores econômicos.

Na era Vargas, nos anos de 1940, foi implementado o Serviço de

Assistência ao Menor – SAM10, ainda durante a vigência do Código de Menores

de 1927. Não inovador, mantinha caráter repressivo, punitivo, violento e de

correção que visava ações de higienização no que diz respeito a eliminar das

ruas as crianças e os adolescentes que representavam “risco” para sociedade e

houve a percepção de que “[...] correspondia a um sistema penitenciário para a

população de menor idade” (COSTA, 2012, p. 7). A violação de direitos fez, no

passado, e faz parte das vivências que esses adolescentes são submetidos na

contemporaneidade.

O gráfico quatro aponta a incidência de situações de violação de direitos

vivenciadas por parte dos adolescentes que tiveram seus processos analisados

neste estudo, de diferentes especificidades, advindas de contextos distintos que

não se objetiva adentrar.

9 Artigo 26 do Código de Menores de 1927. 10 Já mencionado superficialmente na página 17 deste trabalho durante o resgate histórico da proteção social, trazendo neste capítulo elementos mais concisos sobre o Serviço.

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Gráfico 4 - Incidência de violações de direitos sofridas pelos

adolescentes socioeducandos do Meio Aberto do CREAS Sul:

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

A visão era a manutenção da ordem da sociedade através de uma política

reducionista, de ajustamento social através do confinamento. Em 1964, depois

de 20 anos de funcionamento, o SAM foi extinto após denúncias e repercussão

negativa diretamente relacionados ao Serviço que tomaram grandes proporções

em termos de graves situações que ocorriam dentro da instituição, como

violência, falta de higiene, superlotação, tratamento desumano (BRITO; SILVA,

2016).

Os próprios internos se posicionaram em protestos contra os abusos

cometidos contra eles. Houve também influência de processos econômicos e

políticos no país neste período e algumas medidas foram implementadas de

forma parcial pelo governo Vargas voltadas para a educação:

Considera-se que nesse momento toda a estrutura educacional foi reorganizada, principalmente através das Reformas Capanema, que entre outras ações: criou o SENAI, o SENAC as Leis Orgânicas do Ensino Secundário, Ensino Comercial, Ensino Primário, Ensino Normal e Ensino Agrícola. (COSTA, 2012, p. 8)

Porém, haviam intenções claras na realização dessas medidas:

As intencionalidades para a educação nesse momento, que era o de fomentar o modelo econômico que necessitava de mão de obra qualificada para a manutenção do desenvolvimento no país. Enquanto havia uma dualidade no acesso aos cursos do

8

1

0

2

4

6

8

10

Sim Não informado

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ensino superior, para as camadas mais favorecias, cabia aos filhos dos membros das camadas populares os ensinos técnicos e profissionalizantes, para alimentar a demanda do país. (COSTA, 2012, p. 8).

Sem alternativas para permanência do SAM, O Serviço foi extinto por vias

legais e em 1964 foi implementado uma nova instituição afim de assistir esses

adolescentes, a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor – FUNABEM que

visava um funcionamento opositor à repressão exercida no SAM e com

finalidades de reintegração familiar, porém, não foi isso que ocorreu.

Houve um desdobramento criando-se as unidades estaduais, Fundação

Estadual do Bem-Estar do Menor – FEBEM, orientadas pelo Código de Menores

de 1927 ainda vigente, ou seja, através de um caráter punitivo. E como essa

implementação se deu no ano em que houve o golpe militar no Brasil, Brito e

Silva (2016, p.7), afirmam que

No regime militar, período compreendido entre 1964 e 1980, o Estado intervia de forma autoritária tendo em vista a manutenção da ordem, isso recaiu sobre a política de infância e juventude, assim como sobre as instituições de atendimento à mesma, a exemplo da FUNABEM que visava à integração do menor na comunidade, mas teve que ajustar-se ao autoritarismo e à tecnocracia predominante em tal regime, funcionando como um meio de controle social.

A duração do Código de Menores de 1927 foi de 40 anos, até que houve

sua remodelação para o Código de Menores de 1979. As leis e formas de

abordagens a crianças e adolescentes não passaram por grandes evoluções. O

sentido da legislação permanecia girando em torno da doutrina da situação

irregular11 que se definia através de

[...] privação de condições essenciais à subsistência, saúde e instrução, por omissão, ação ou irresponsabilidade dos pais ou responsáveis; por ser vítima de maus-tratos; por perigo moral, em razão de exploração ou encontrar-se em atividades contrárias aos bons costumes, por privação de representação

11 “Entre os casos considerados como situação irregular, encontrava-se o autor de infração penal que, dependendo da avaliação do juiz de menores, eram aplicadas as mesmas medidas do Código anterior, além de: advertência; colocação em lar substituto; imposição do regime de liberdade assistida; colocação em casa de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional, ocupacional, psicopedagógico, hospitalar, psiquiátrico ou outro que estivesse adequado às normas vigentes”. (FERREIRA, 2016, p. 27).

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legal, por desvio de conduta ou autoria de infração penal. (FALEIROS, 2011 apud BRITO; SILVA, 2016, p.7, 8)

A visão do Estado para esse grupo permaneceu negligente, de acordo

com Brito e Silva (2016), onde não havia investimento em políticas públicas, não

se priorizava a escolarização, autonomia familiar para conduzir seus próprios

filhos que se viam inseridos em um contexto de violação de direitos proveniente

da omissão do Estado sendo, inclusive, culpabilizados por isso e sendo

obrigados a saírem de cena por implementação de Códigos que atuavam na

perspectiva de repressão e punição.

Sob o discurso de “proteção”, naturalizavam a falta de oportunidades e

elevavam a meritocracia como um mecanismo possível a todos, o que não

alcançava os desprovidos de privilégios que acabavam por serem punidos sem

chance de vivenciar políticas públicas de prevenção sendo responsabilizados

pela situação de miséria vivida, na chamada “individualização da pobreza em

que cada sujeito era responsável pela sua situação social” (FERREIRA, 2016,

p.28).

Esse quadro de repressão a crianças e adolescentes durou muitos anos,

como especificado, e passou a se tornar insustentável, de modo que a própria

população clamava por mudanças, por atenção especial a este grupo, políticas

voltadas para suas particularidades, extinção de um modelo de repressão injusto

que não agregava nos aspectos sócios e familiares necessários nessa fase de

desenvolvimento do adolescente. Era necessário um olhar técnico especializado

para esta parcela da sociedade levando em consideração o acesso a direitos de

responsabilidade do Estado extinguindo as arbitrariedades do governo.

E então, somente no período de luta pela redemocratização do país contra

o regime militar, protagonizado por diversas pautas de reivindicações de diretos

negados, no período de 1980 e 1990, os movimentos sociais entram em cena e

a cobrança pelos direitos voltados especificamente para crianças e adolescentes

fizeram parte desse grande momento da história.

A Constituição Federal de 198812 entrou em cena, solidificando aparatos

legais que eram voltados especificamente para crianças e adolescentes, além

12 O processo de conquista da Constituição Federal de 1988 foi abordado com mais detalhes no primeiro capítulo deste estudo, onde foi destrinchado todo o caminho histórico percorrido para o alcance deste marco na sociedade brasileira.

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de orientações, de acordo com Ferreira (2016), e incentivos internacionais, da

luta brasileira pela redemocratização e pelo alcance dos direitos humanos

voltados para crianças e adolescentes.

A “desinstitucionalização” (1990), no espírito do ‘desmonte do entulho autoritário’, a Constituição Federal estabeleceu diversos dispositivos legais para inibir as arbitrariedades do Estado sobre o cidadão. Para a proteção dos direitos da criança, a Constituição impôs a regulamentação do seu artigo 227, do qual originou-se o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), abrigando sob sua tutela não mais apenas a criança em situação social de risco, mas toda ‘pessoa em fase de desenvolvimento’[...] (SILVA,1997, p.34-35 apud BRITO; SILVA, 2016, p. 8).

O artigo 227 da CF/1988 determina:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 1988).

Este artigo foi o princípio da exigência da priorização da criança e do

adolescente como sujeitos de direitos perante a lei, e a partir disso, em 1990, foi

aprovada, decretada e sancionada a lei N°8.069/90 referente ao Estatuto da

Criança e do Adolescente – ECA, marco na sociedade brasileira em relação a

conquista dos direitos da criança e do adolescente e se tornou referência mundial

em termos de atenção especial voltada para este segmento da sociedade.

É uma legislação rica, completa e que dignifica a criança e ao adolescente

aos direitos apropriados a eles. Alguns artigos são imprescindíveis de citação

pela característica completa e de oferta da dignidade que todo cidadão tem

direito.

Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente; Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico,

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mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade; Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem; Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (BRASIL, 1990).

Após artigos dedicados aos direitos da crianças e adolescentes na

CF/1988, mesmo com a instauração do ECA, atores judiciais especializados

possuem direito de intervenção a depender da situação em que o adolescente

se encontre no que diz respeito ao âmbito jurídico, porém as decisões devem

ser embasadas pelo que consta no ECA. É um trabalho e acompanhamento

interdisciplinar e multiprofissional dentro de cada especificidade de demanda em

relação a esses sujeitos.

É importante ressaltar que existem críticas e não há possibilidade de

exercer na íntegra o que o Estatuto preconiza diante dos diversos entraves

existentes na sociedade capitalista e não igualitária. Existem resquícios de

estigmas do passado atrelados a esses adolescentes, principalmente no que diz

respeito aos autores de atos infracionais e observações relevantes a serem

consideradas:

O ECA inaugurou uma nova ordem jurídica e institucional para o trato das questões da criança e do adolescente, estabelecendo limites à ação do Estado, do Juiz, da Polícia, das Empresas, dos adultos e mesmo dos pais, mas não foi capaz ainda de alterar significativamente a realidade da criança e do adolescente. A mudança de nomenclatura, substituindo os rótulos pejorativos de “menor”, “infrator”, “abandonado” e etc., estabeleceu a cultura do “politicamente correto”, mas quem estava nas ruas ou nas instituições antes do ECA, hoje, se adulto, está no Sistema Penitenciário ou continua sendo portador das marcas e dos estigmas incorporados durante a infância (SILVA, 2001, p.9).

Partindo para as especificidades dos objetivos propostos nesta pesquisa

e adentrando nos processos de responsabilização é pertinente mencionar o fato

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de que o ECA atribui deveres e protagonismo às crianças e adolescentes, óbvio

que com o aparato da proteção integral do Estado e responsabilização da família

junto a esse processo.

Os adolescentes que cometem ato infracional deverão ser submetidos ao

processo judicial ao qual será decidido de que forma será aplicada a

responsabilização pelo ato cometido através do cumprimento da medida

socioeducativa estabelecida a ele pelo juiz. Consta no Art. 100 do ECA: “Na

aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas,

preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e

comunitários” (BRASIL, 1990, p. 61). No Parágrafo único do artigo 100°

mencionado, constam princípios extremamente dignos de serem respeitados por

todas as instâncias que abordam crianças e adolescentes, inclusive a categoria

de segurança militar.

O Título III do ECA trata Da Prática do Ato Infracional onde iremos tomar

como referência para subsidiar as especificidades necessárias neste capítulo

que é o Serviço de Proteção Especial aos Adolescentes em Cumprimento de

Medida Socioeducativa em Meio Aberto e os possíveis avanços e rebatimentos

que esse Serviço pode causar na vida desses adolescentes.

O ECA garante direitos individuais, garantias processuais e trata das

medidas socioeducativas de forma detalhada. Além disso, especifica o processo

de remissão, das medidas pertinentes aos pais ou responsável, do conselho

tutelar, do acesso à justiça, da justiça da infância e da juventude, entre outros

capítulos complementares. Portanto, entende-se que existe uma cadeia de

articulação entre instâncias e órgãos, agregando políticas públicas de

assistência e proteção integral, inserindo a família e a comunidade no processo

de assistência a crianças e adolescentes normatizado pelo ECA.

Abordando os órgãos principais que estão à frente da defesa das crianças

e dos adolescentes, há de se expor a criação do Conselho Nacional dos Direitos

da Criança e do Adolescente - Conanda que foi criado em torno do mesmo

período do ECA, em 1991, pela lei 8.242.

Este órgão tem autonomia para fiscalizar o poder público e administrar

recursos, orçamentos em ações voltadas para a população infanto-juvenil, bem

como ações voltadas para os direitos da criança e do adolescente proveniente

de organizações governamentais e não-governamentais, além de poder

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deliberar diretrizes para o funcionamento dos Conselhos Estaduais, Distrital e

Municipais e Conselhos Tutelares, entre outras atribuições que configura o

CONANDA como uma das linhas de frente dentro dos órgãos responsáveis pelas

crianças e adolescentes, de extrema importância administrativa e em termos de

gerir a implementação das ações que impactam positivamente na vida desses

adolescentes (BRASIL, 2019).

Em articulação com o ECA e sob regulamentação do CONANDA através

da resolução 119/2006 e pelo Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo -

Resolução 160/2013 do Conanda - (BRASIL, 2019), considerado como mais um

avanço na regulamentação dos direitos das crianças e dos adolescentes, em

janeiro de 2012 foi instituído pela lei 12.594 o Sistema Nacional de Atendimento

Socioeducativo – SINASE, que é um órgão coordenado pela Secretaria Nacional

dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério dos Direitos Humanos

(SNCDA/MDH).

O SINASE é voltado para a regulamentação da execução das Medidas

Socioeducativas contempladas no ECA, por meios de um conjunto articulado de

princípios, regras e critérios. De ordem nacional, está inserido nos sistemas

estaduais, distrital e municipais, articulados com outros serviços da política de

proteção social (BRASIL, 2012). Em seu capítulo I, Das Disposições Gerais,

objetiva:

I - A responsabilização do adolescente quanto às consequências lesivas do ato infracional, sempre que possível incentivando a sua reparação; II - a integração social do adolescente e a garantia de seus direitos individuais e sociais, por meio do cumprimento de seu plano individual de atendimento; III - a desaprovação da conduta infracional, efetivando as disposições da sentença como parâmetro máximo de privação de liberdade ou restrição de direitos, observados os limites previstos em lei (BRASIL, 2012).

Sobre a atuação da SNDCA/MDH na coordenação do SINASE, fica

esclarecido que

Como órgão gestor nacional do Sinase, a SNDCA/MDH articula ações com instituições do Sistema de Justiça; governos estaduais, municipais e distrital; e outros ministérios, estabelecendo diretrizes nacionais de atuação – como aquelas

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previstas pelo Plano Nacional de Atendimento Socioeducativo, além de parâmetros arquitetônicos, de segurança, de gestão e de socioeducação para unidades. Além disso, busca informar profissionais da socioeducação, veículos de imprensa e setor produtivo, entre outros, para que o processo de responsabilização do adolescente possa adquirir um caráter educativo, (re)instituindo direitos, interrompendo a trajetória infracional e promovendo a inserção social, educacional, cultural e profissional (BRASIL, 2019).

No estabelecimento da relação entre o contexto social do adolescente

inserido no contexto de violência, autor de ato infracional, e o processo de

desenvolvimento das políticas públicas voltadas especificamente para este

grupo é possível compreender a relevância e extrema necessidade desses

avanços e importância destas conquistas.

Como a contradição já foi apontada aqui e é fator intrínseco na realidade

humana juntamente com os processos de desigualdade social que são reflexos

do sistema econômico e político vigentes, é possível compreender que esses

direitos não chegam para todos que necessitam, e, como visto nas estatísticas

apresentadas neste capítulo, fica claro qual a parcela da população jovem perde

mais com essa realidade.

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3.2 SERVIÇO DE PROTEÇÃO SOCIAL A ADOLESCENTES EM

CUMPRIMENTO DE MEDIDA SOCIOEDUCATIVA EM MEIO ABERTO -

LIBERDADE ASSISTIDA (LA) E PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE

(PSC) E SEUS REBATIMENTOS NO CONTEXTO SOCIAL DO

SOCIOEDUCANDO.

Em termos de definição no que concerne as legislações que assistem os

adolescentes, principalmente os envolvidos em contextos de violência, os

destaques principais a serem abordados neste tópico são as determinações do

CONANDA, SINASE e ECA. O CONANDA determina que o SINASE seja o

condutor na efetivação na execução das Medidas Socioeducativas. Na

Resolução 113/CONANDA/2006 consta todo aparato legal que subsidia essa

organização dentro da política:

Os programas de execução de medidas socioeducativas são destinados ao atendimento dos adolescentes autores de ato infracional, em cumprimento de medida judicial socioeducativa, aplicada na forma da lei, em decorrência de procedimento apuratório, onde se assegure o respeito estrito ao princípio constitucional do devido processo legal (BRASIL, 2006, art. 19°).

O CONANDA determina ainda:

§ 1º Os programas de execução de medidas socioeducativas para adolescentes autores de ato infracional obedecerão aos parâmetros e recomendações estabelecidos pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente - Conanda e, complementarmente, pelos demais conselhos dos direitos, em nível Estadual, Distrital e Municipal; § 2º Estes programas se estruturam e organizam, sob forma de um Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE [...]. (BRASIL, 2006, art. 19°).

De acordo com o Conanda os princípios norteadores da estruturação e

organização dos programas requerem pedagogia no processo do conteúdo

socioeducativo sobre as ratificações; utilização do projeto político-pedagógico na

composição do atendimento socioeducativo; participação dinâmica e eficiente

dos adolescentes no atendimento socioeducativo; respeito à singularidade do

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socioeducando durante o acompanhamento do mesmo; respeito e acatamento

ao cumprimento do processo socioeducativo; horizontalização no

compartilhamento de informações e saberes por parte da equipe multidisciplinar;

estratégia de métodos que pensem na instauração do desenvolvimento de

perspectivas em aspectos diversos de vida para os adolescentes; respeito à

diversidade de qualquer natureza do adolescente e participação ativa familiar e

comunitária no processo socioeducativo (BRASIL, 2006).

Através dessa cadeia de normatizações que solidificam de forma

articulada a política de atendimento ao adolescente, O ECA vem preconizar e

trazer definições claras relacionadas aos atos infracionais, em seu Título III, “Da

Prática do Ato Infracional”, no Capítulo I, Das Disposições Gerais: “Art 103.

Considera-se ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção

penal.” Acrescentando no Art 104. “São penalmente inimputáveis os menores de

dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta Lei” (BRASIL, 1990). Em

relação a crianças, o art. 101 orienta as medidas protetivas cabíveis.

Adentrando especificamente nas determinações das medidas

socioeducativas, no Capítulo IV do ECA consta as seis medidas socioeducativas

que poderão ser aplicadas ao adolescente autor de ato infracional, são elas:

advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviço à comunidade

(PSC); liberdade assistida (LA); inserção em regime de semiliberdade;

internação em estabelecimento educacional. Além disso, pode ser aplicada

qualquer uma das previstas no art. 101 (medidas protetivas), I a VI13.

A ordem percorrida pelo adolescente que comete ato infracional e é

apreendido consiste em um processo, muitas vezes, longo e burocrático por

motivos diversos, desde o momento da apreensão até o final do cumprimento da

medida, se esta for determinada em juízo. Tanto a burocratização dos serviços

13 Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente

poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas: I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos. (BRASIL, 1990).

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contribui para isto, como a subjetividade de cada adolescente em seu processo

individual de enfrentar a responsabilização pelo ato cometido.

O adolescente só pode ser privado de sua liberdade em caso de flagrante

da autoria do ato infracional ou por ordem da autoridade judiciária competente,

identificando e informando os responsáveis, bem como orientando-os – o

adolescente e a família - acerca de seus direitos. Deve-se averiguar a

possibilidade de liberação imediata, podendo sair com o responsável e

permanece aguardando a audiência, ou, quando não for cabível, ocorre a

internação durante o processo de espera da sentença em um tempo máximo de

45 dias. (BRASIL, 1990).

Uma vez cometido o ato infracional pelo adolescente e ocorrida sua

apreensão, ele poderá ser encaminhado para o Centro Integrado de

Atendimento ao Adolescente Infrator14 - CIAD, que é a instituição onde ele

poderá ficar, no máximo, os 45 dias citados, internado provisoriamente

aguardando a decisão judicial sobre seu processo que pode ser sua liberação

ou aplicação de medida socioeducativa. Se não for liberado, deverá aguardar a

audiência judicial que ocorre na Vara responsável onde se dará a decisão da

medida a ser aplicada de acordo com o que estabelece o ECA.

Os adolescentes possuem direito de defesa técnica por advogado,

assistência judiciária gratuita aos necessitados, bem como a solicitação da

presença de seu responsável. (BRASIL, 1990). Quando ocorre a necessidade

de ser julgado, o juiz especializado na área da adolescência determina qual a

medida socioeducativa o autor do ato irá cumprir e por quanto tempo, sendo

após esse procedimento que o adolescente é encaminhado ao Serviço de

Medida Socioeducativa.

Esse encaminhamento ocorre através do envio do processo ao CREAS –

ao Serviço, quando em meio aberto - e após seu recebimento pela equipe do

Serviço, começam os trabalhos de assistência ao socioeducando. Se a aplicação

da medida for referente a um ato infracional mais grave, é possível que o

adolescente tenha que cumprir imediatamente a medida em meio fechado que o

14 Termo arcaico em desuso que reforça o estigma que os autores de ato infracional carregam historicamente e alimenta preconceitos na sociedade que reproduz ideias do senso comum. Denominação do Centro Integrado ainda não foi modificada.

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ECA dispõe de duas formas, como citado acima: inserção em regime de

semiliberdade ou internação em estabelecimento educacional. Porém, aqui será

tratado do Serviço de Medida Socioeducativa em Meio Aberto e se trata das

medidas de Prestação de Serviço à Comunidade - PSC e Liberdade Assistida –

LA, com funcionamento no CREAS.

O Meio Aberto recebe os processos provenientes do sistema judiciário de

adolescentes entre 12 e 18 anos incompletos que cometeram o ato infracional,

porém o cumprimento da medida pode ser estendido até os 21 anos, já que,

ocorrem casos de atrasos no tempo previsto para terminar o cumprimento

integral. As medidas de PSC e LA variam de três a seis meses para serem

cumpridas, mas, de acordo com os dados coletados em pesquisa documental,

os adolescentes levam cerca de dois anos para concluir, por motivos diversos.

O adolescente fica no aguardo do contato da equipe do Serviço para

marcação do atendimento inicial para que nele sejam estabelecidos os

esclarecimentos necessários a respeito do cumprimento da medida.

Os esclarecimentos a respeito do processo de cumprimento da medida

socioeducativa se iniciam de imediato no primeiro atendimento do adolescente

na instituição (atendimento inicial), onde ele deve ir acompanhado por um

responsável. De acordo com a análise dos dados coletados, dos nove

socioeducandos que estavam em cumprimento de medida, seis tinham somente

a mãe como responsável. Neste atendimento ocorre os esclarecimentos acerca

do funcionamento do CREAS e do Serviço de Medida Socioeducativa, bem como

no que consiste o seu cumprimento e seu acompanhamento integral pela equipe

multidisciplinar.

O acompanhamento social da LA e PSC mobiliza e articula a rede,

ocorrendo na PSC a inserção dos adolescentes nas instituições parceiras do

Serviço e na LA a inserção e acompanhamento em cursos, frequência na escola

e a participação no Grupo de adolescentes (uma espécie de oficina) que foi

convencionado no município de Natal onde é proposto discussões de temas

relevantes do cotidiano e o envolvimento deles nesse processo pedagógico.

Além disso, há uma preocupação e ação voltadas para a inserção da família na

rede socioassistencial e intersetorial objetivando viabilizar o acesso aos seus

direitos. Neste caso, percebe-se a dificuldade de inserção que pode ser causada

pela falta de identificação do perfil do adolescente com os cursos e atividades

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que a rede disponibiliza. As oficinas possuem boa adesão. O compromisso com

a frequência na escola também é uma das prioridades da LA.

Gráfico 5 - Encaminhamentos a cursos e artes no momento de

chegada ao Serviço

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

Gráfico 6 - Encaminhamentos a cursos e artes no momento em que

saem do Serviço

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

45%

44%

11%

Sim Não houve interesse Já realizava algum tipo de atividade relacionada

45%

44%

11%

Concluíram

Não houve interesse

Já realizava algum tipo de atividade relacionada

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Gráfico 7 – Situação escolar no momento em que chegam ao Serviço

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

Gráfico 8 – Situação escolar no momento em que saem do Serviço

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

33%

67%

Frequentando a escola Ausentes da escola

56%

44%

Frequentando a escola Ausentes da escola

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Vale ressaltar que a equipe do Serviço possui autonomia para sugerir e

solicitar ao judiciário a mudança de medida socioeducativa ou a suspensão dela

quando se apresentam dificuldades importantes, como, ameaça de morte e de

diversas ordens e problemas de saúde mental.

Para o acompanhamento, existe dois documentos essenciais tidos como

referência neste acompanhamento ao adolescente: o Plano de Atendimento

Individual – PIA e o Prontuário SUAS, este, presente em outros serviços da rede

socioassistencial.

Através do PIA é possível fazer registros em diálogo com o adolescente

sobre as diversas esferas de vida dele e, neste momento além das percepções

sobre o sujeito na forma como ele chegou ao Serviço, são traçadas metas que

deverão ser atingidas ao longo do cumprimento da medida socioeducativa. O

diálogo gira em torno dos deveres do adolescente durante esse período, como

se dará o processo de responsabilização do ato cometido através do

cumprimento da medida, direitos, do estabelecimento de metas relacionadas as

principais esferas da vida do socioeducando, como saúde, situação de

escolarização, convívio social e comunitário, relação com drogadição,

experiência de trabalho, identificação profissionalizante, documentos pendentes,

relação familiar, situação de habitação, renda, esporte, cultura e lazer, além dos

dados pessoais, como, data de nascimento, cor, sexo, endereço, filiação, entre

outros. A pesquisa mostra alguns indicadores relevantes:

Gráfico 9 – Disposição sobre raça/etnia/cor dos socioeducandos

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

0 1 2 3 4 5 6

Cor/Raça/Etnia

Branco Pardo Preto

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O PIA se trata de um documento bastante completo e que soma no

acompanhamento ao adolescente. É através dele que os registros são feitos da

situação em que o socioeducando se encontra quando inicia a medida e ao final

do processo existe uma avaliação dos resultados para que seja verificado o que

foi alcançado, de acordo com suas possibilidades.

Outro documento fundamental é o prontuário SUAS que existe em toda

Rede15 de assistência social e consta todas as informações necessárias sobre a

vida do adolescente inserido no Serviço, se trata de, além, das suas informações

pessoais, dos registros internos de todos os procedimentos realizados pela

equipe para com o adolescente. São documentos sigilosos que só a equipe do

Serviço possui acesso. Além disso, se trabalha com relatórios de todos os

profissionais e pareceres sociais e psicológicos. Toda comunicação com o

sistema judiciário é realizada através de memorandos formais e relatórios de

situação inicial, atual e final acerca do cumprimento da medida pelo adolescente,

assinados e protocolados.

Como os adolescentes estão sendo acompanhados sob a presença de

um responsável, e pelo fato de haver, além do mencionado atendimento inicial,

outros atendimentos individuais e/ou familiares (atendimentos de

acompanhamento), tanto no CREAS, em espaço apropriado e reservado para

isso, quanto nas visitas domiciliares e institucionais (onde há o cumprimento da

PSC), o Serviço atende, por extensão, necessidades básicas de familiares dos

socioeducandos.

Quando há casos em que se visualizam questões mais complexas em

relação à família no sentido de violação de direitos, há articulação entre serviços

por meio de estudo de caso ou encaminhamentos adequados dentro do próprio

CREAS (pelo fato de o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a

Famílias e Indivíduos – PAEFI funcionar na mesma instituição) ou dentro da

Rede socioassistencial.

Essa afirmação diz respeito a enfatização de que dentro do Meio Aberto,

o adolescente tem o dever de cumprir a medida estabelecida para ser

15 “Conjunto de serviços destinados à superação de situação de vulnerabilidade social decorrente da pobreza ou da falta de acesso a serviços públicos e a direitos sociais”. (Brasil, 2015). “Conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, que ofertam e operam benefícios, serviços, programas e projetos, o que supõe a articulação entre todas estas unidades de provisão de proteção social”. (Brasil, 2012, p.19).

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responsabilizado pelo ato infracional cometido perante a justiça e sociedade,

mas que é visto como um ser singular, que possui particularidades e está

inserido em um contexto social, familiar e comunitário que diz respeito à sua

condição social, ou seja, ele é acompanhado em uma perspectiva de totalidade,

buscando ser enxergado todas as questões possíveis que possam revelar a

melhor maneira de abrir novas possibilidades para romper com o contexto de ato

infracional.

Esse acompanhamento é realizado pela equipe interdisciplinar do

CREAS16 e possui um caráter de busca de viabilização de direitos que o

adolescente e a família possuem e muitas vezes não têm acesso e que são

violados antes mesmo dos indivíduos terem cometido qualquer infração diante

da lei. A maioria dos adolescentes em que foram analisados os dados, não

possuía documentação completa ao chegar no Serviço, premissa básica e

fundamental de todo e qualquer cidadão.

Gráfico 10 – Adolescentes com documentação completa ao

chegarem no Serviço

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

16 Assistente Social, psicólogo e socioeducador que lidam diretamente com o processo de acompanhamento do cumprimento da medida socioeducativa do adolescente. Possui advogado para quando necessário e ainda, o coordenador da instituição na liderança e os técnicos administrativos.

9

00

1

2

3

4

5

6

7

8

9

10

Não Sim

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Gráfico 11 – Adolescentes com documentação completa ao saírem

do Serviço

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

Vale ressaltar que, dos 7 que saíram sem a documentação completa,

todos conseguiram reduzir a quantidade de documentos pendentes.

Esse é um trabalho conjunto, com toda rede e sobretudo com a família e

comunidade, exatamente pelo fato de ser realizado de forma ampla, socialmente

falando. Ou seja, o objetivo desta política de assistência ao adolescente se

materializa no fortalecimento de vínculos para além do processo de

responsabilização, na ampla perspectiva de socioeducação. O adolescente deve

cumprir medidas que não só os responsabilize pelo ato cometido, mas que

busque fortalecer o convívio familiar e social e na superação da infração

cometida e violações sofridas.

A rede socioassistencial foi mencionada e é importante enfatizá-la já que

a essência da política de assistência social funciona através da articulação com

diversos atores, instâncias, secretarias, órgãos para consolidação da execução

de serviços, programas e projetos, tanto do próprio Estado como da sociedade.

A socioeducação em Meio Aberto depende muito da rede, pois no caso

da PSC, por exemplo, os socioeducandos necessitam estar inseridos em

instituições, de preferência públicas e sem fins lucrativos, que firmam parceria

com o CREAS e se disponibilizam a recebê-los e acompanha-los nesse processo

em que eles devem realizar a prestação de serviço à comunidade, ou seja,

7

2

0

1

2

3

4

5

6

7

8

Não Sim

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alguma atividade na instituição, sendo as horas semanais e o tipo de trabalho

desenvolvido determinados pelo ECA17.

Nem sempre existe instituições suficientemente dispostas a ser parceiras

do CREAS para contribuir nesse processo, muitas vezes por receio - o que pode

ser reflexo do estigma que os socioeducandos possuem - de receber e se

responsabilizar pelo adolescente ou por não possuírem um ambiente condizente

com o perfil do adolescente resultando numa adaptação difícil e podendo gerar

a necessidade da troca da instituição de inserção do adolescente, o que

demanda procura e tempo, sendo um dos motivos de atraso no tempo

estabelecido pela justiça para cumprimento da medida. O estigma é evidente

quando, por exemplo, apontamos que o ato infracional mais cometido, dentro

dos processos analisados, é o roubo, não considerado de extrema gravidade.

Gráfico 12 – Em relação ao ato infracional cometido

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

Confirmando a existência de forte estigma desses adolescentes, vistos

como perigosos que ficam impunes, temos uma quantidade pequena que

17 Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais. Parágrafo único. As tarefas serão atribuídas conforme as aptidões do adolescente, devendo ser cumpridas durante jornada máxima de oito horas semanais, aos sábados, domingos e feriados ou em dias úteis, de modo a não prejudicar a frequência à escola ou à jornada normal de trabalho (BRASIL, 1990).

67%

11%

22%

Roubo Tráfico de drogas Violência contra a mulher

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passaram por privação de liberdade após o ato infracional cometido e apreensão.

De acordo com a assistência social voltada para eles, o trabalho é evitar a

privação de liberdade por levar em consideração que esse sistema punitivo não

possui boas perspectivas futuras que distanciem o adolescente desse tipo de

prática.

Gráfico 13 – Detenção provisória durante o aguardo do julgamento

Fonte: Coleta de dados direta (2018).

A análise de dados coletados em campo mostra que dos nove

adolescentes em que se verificou os processos, 4 tiveram descumprimento de

medida oficializados, ou seja, gerando a necessidade de comunicação à justiça

do ocorrido, necessitando voltar o processo para o judiciário para marcação de

audiência de justificação no intuito de avaliação pelo juiz do motivo pelo qual

houve o descumprimento e reanalise a reaplicabilidade da medida. Todo esse

trâmite já demanda tempo devido ao processo formal de envio e recebimento de

documentos entre o CREAS e o sistema judiciário que não é considerado rápido

e, nesse espaço de tempo, o adolescente fica apenas no aguardo.

Em alguns casos elas são reaplicadas de forma mais intensa devido terem

descumprido. Os cinco restantes não chegaram a descumprir a ponto de precisar

de nova audiência, porém atrasam o cumprimento em mais de um ano, em

média. Os motivos são variados: faltas, descompromisso, problemas

relacionados à saúde, medo de transitar em público devido ameaças sofridas,

3

6

0

1

2

3

4

5

6

7

Sim Não

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mudança de bairro e, portanto, de comarca (o processo é assumido pela CREAS

da região que o adolescente passou a residir) e também a própria mudança de

equipe no serviço ou paralisação das atividades dos funcionários por

reivindicações trabalhistas.

Vale salientar que a equipe do Serviço de Medidas Socioeducativas em

Meio Aberto trabalha com uma proposta pedagógica e procura, por conta das

próprias estratégias, trazerem o adolescente que está disperso no cumprimento

da medida socioeducativa de volta antes que seja enviado o documento à justiça,

pois isso aumenta o diálogo, a confiança, a transmissão de credibilidade ao

adolescente que já se encontra em situação social afetada e oferece mais

oportunidades do cumprimento da medida se encerrar mais rápido.

No caso da liberdade assistida – LA, o ECA determina em seu Art. 18 que

esta deve ser aplicada na necessidade de haver um acompanhamento e

orientação ao adolescente, inserindo atividades e acompanhamento escolar. A

equipe deve trabalhar no seguinte direcionamento:

I - promover socialmente o adolescente e sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os, se necessário, em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência social; II - supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula; III - diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho (BRASIL, 1990).

Isso se traduz na forma de inserção dos socioeducandos em oficinas

desenvolvidas pelo próprio CREAS, sendo uma particularidade convencionada

pela equipe da instituição em Natal/RN, onde abordam temas relacionados a

diretos constitucionais, responsabilização e temas sociais que buscam o

envolvimento do adolescente nas discussões que, muitas vezes, eles mesmos

vivenciam ou são vítimas em seus contextos de vida. Esse trabalho enriquece o

diálogo e o conhecimento, abrindo possibilidades de reflexão destes

adolescentes.

A LA também contempla a inserção dos socioeducandos em cursos

profissionalizantes que sejam compatíveis com seus interesses, sendo a

assiduidade parte da responsabilidade do cumprimento da medida e propõe o

compromisso com a frequência relacionado à escolarização. Dos dados

analisados em campo, dos nove adolescentes que cumpriram medida

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socioeducativa, sete entraram no serviço possuindo o ensino fundamental

incompleto, sendo que destes sete, seis estavam ausentes da escola. A idade

deles é entre 16 e 18 anos.

Esses dados são esclarecedores em relação a realidade social destes

adolescentes que não possuem acesso à vivência do que têm direito

estabelecido na legislação própria e adequada para este grupo, tendo em vista

que possuem dificuldade de acesso à escola devido a precariedade do sistema

público de educação resultando em falta de credibilidade por parte deles de que

essa atividade possa ser atrativa e abrir perspectivas futuras, o que promove um

distanciamento do que é primordial na realidade social desses adolescentes.

Diante de todo contexto histórico apresentado ao longo deste estudo, e

de alguns dados apresentados sobre os socieducandos é possível refletir de

forma concisa sobre as possibilidades de desenvolvimento social que estes

adolescentes possuem, ou seja, são propícios a permanecerem em uma

realidade distinta daquela preconizada pelo ECA no que se refere a direitos

básicos e fundamentais.

Em análise de dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio -

PNAD 2013 registrado por Silva e Oliveira mostra que:

Dos 10,6 milhões de jovens de 15 a 17 anos, mais de 1,0 milhão não estudavam e nem trabalhavam e 1,8 milhão conciliavam as atividades de estudo e trabalho. [...] entre os que não estudam e não trabalham observam-se as características típicas de exclusão social do país: a maior parte é da cor negra (64,87%); 58% são mulheres e a imensa maioria (83,5%) é pobre e vive em famílias com renda per capta inferior a um salário mínimo (SILVA; OLIVEIRA, 2015, p.8).

A conclusão deste estudo citado é que a maioria dos adolescentes que

trabalha é muito pobre e possui como motivação para esta atividade o desejo de

acesso a bens de consumo, o que também se apresenta como consequência da

própria estrutura do nosso sistema econômico, “[...] o fetichismo do dinheiro e da

mercadoria parece reinar com todas as pompas: ao lado da exaltação do

mercado, o cidadão é reduzido à condição de consumidor” (IAMAMOTO, 2007,

p. 36).

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Ainda com base nas análises de Silva e Oliveira (2015) é imprescindível

destacar que os direitos constitucionais dos adolescentes não são garantidos

para todos. Esse fator também pode estar ligado ao cometimento de atos

infracionais por esse grupo. As autoras afirmam que “apontar as fragilidades

sociais de renda, escola e trabalho de parte significativa dos adolescentes

brasileiros [...] é importante para evidenciar o tamanho da dívida social do Estado

e da Sociedade com esses meninos e meninas” (SILVA; OLIVEIRA, 2015, p.6).

O estudo utilizado mostra que “os adolescentes em conflito com a lei

padecem de vulnerabilidades semelhantes às fragilidades sociais de parte da

adolescência brasileira” (SILVA; OLIVEIRA, 2015, p.6).

Portanto, diante do exposto acima, é possível compreender o que

fundamenta a afirmação de que o adolescente autor de ato infracional não deve

ser culpabilizado de forma individual e pessoal nem submetido a ações

repressivas e punitivas. O ECA garante os direitos e medidas de proteção

integral a todas as crianças e adolescentes.

É nessa perspectiva que o Serviço de Medidas Socioeducativas atua, com

o objetivo de assegurar aos adolescentes que cometeram atos infracionais seus

direitos, ademais, o adolescente deve cumprir medidas que não só os

responsabilize pelo ato cometido, mas que busque fortalecer seu convívio

familiar e social e romper com a prática do ato infracional.

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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pela observação dos aspectos abordados neste estudo, entende-se que,

dentro do proposto, as informações contribuíram para a compreensão dos

contextos sociais problematizados.

A Política de Assistência social possui um histórico denso, permeado por

diversas fases em seu processo de evolução de acordo com os momentos

societários que interferiam nessas ações. Diante disso, não se pode deixar de

destacar os marcos deste campo que foram as principais legislações que

dignificaram o cidadão através da conquista de direitos. A Constituição Federal

de 1988 foi o grande acontecimento que materializou a redemocratização do

Brasil pós-golpe militar e a partir dela, houve a implementação do Estatuto da

Criança e do Adolescente, um grande feito na história dos direitos sociais para

crianças e adolescentes.

Há de se observar que fica evidente neste trabalho, diante da utilização

do método dialético, a crítica ao sistema capitalista que traz em sua essência a

desigualdade social, ou seja, as leis foram conquistadas, são sólidas e

completas, porém, não são aplicadas de forma igualitária. E é esse ponto que

traduz a realidade social de muitos dos adolescentes que cometem ato

infracional e chegam ao Serviço de Medida Socioeducativa em Meio Aberto para

o cumprimento da medida. Não se trata de justificativas, mas de romper com o

estigma do senso comum alimentado pela grande mídia em relação a esses

adolescentes.

Como resultado, pode-se afirmar que os objetivos foram atingidos.

Através dos dados desta pesquisa, reflexões foram obtidas, como o fato de o ato

infracional mais praticado dentre os processos analisados não ser considerado

de alta periculosidade, do fato de que, dos nove socioeducandos, sete chegaram

ao Serviço com o ensino fundamental incompleto e ausente da escola, tendo

uma média de 17 anos, porém, cinco saíram do Serviço ao término da medida

com suas matrículas ativas e frequentando a escola.

O estudo social está posto também para contribuir com essa

desconstrução e essa é a base da crítica estabelecida e de onde conclui-se uma

finalização satisfatória do que foi apreendido e registrado neste trabalho como

forma de contribuição a esse processo.

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O Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida

Socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e Prestação de Serviços à

Comunidade (PSC) possui uma proposta condizente com o ECA e com o

SINASE e sua materialização é concreta e positiva dentro de suas limitações. A

barreira que impede mais resultados positivos na vida desses adolescentes após

o cumprimento da medida é exatamente a lacuna que o Estado permite existir

de um contexto social desigual e excludente.

Temos um quadro de adolescentes em que a maioria não passou por

privação de liberdade e que a dependência química foi reduzida durante o

processo de acompanhamento da equipe do Meio Aberto.

Ou seja, respondendo então à questão central desse estudo, a análise de

dados e as apreensões bibliográficas permitem concluir que o Serviço de

Medidas Socioeducativas contribui positivamente no contexto sócio familiar

desses adolescentes, pois agregam medidas de responsabilização e de abertura

de novas perspectivas contrárias ao cometimento de ato infracional, nas ações

promovidas em torno do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários e

de trazer protagonismo social a esses adolescentes e familiares na mediação do

acesso aos seus direitos porém, só podem garantir esse quadro durante o

acompanhamento, levando em consideração que a realidade é dinâmica,

portanto, mutável, e que ao final do processo a maioria dos vínculos entre equipe

e adolescente são interrompidos havendo grande possibilidade de eles se

depararem novamente com o contexto social em que eram inseridos e que, como

apontado, fomenta exclusão e desigualdade social.

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5. REFERÊNCIAS

BEHRING, Elaine Rossetti; BOSCHETTI.; Ivanete. Política Social: fundamentos e história. São Paulo: Cortez Editora, 2006. BRASIL. Decreto n. 17.943-A, de 12 de outubro de 1927. Consolida as leis de assistência e protecção a menores. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1910-1929/D17943A.htm. Acesso em: 11 de jun. 2019. ______. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. 292 p.

______. Estatuto da criança e do adolescente: lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990, e legislação correlata. 9. ed. Brasília: Câmara dos Deputados, 2019. ______. Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS): Lei nº. 8.742, de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências, e legislação correlata. Brasília: Câmara dos Deputados, 2013c. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004 – Norma Operacional Básica – NOB/SUAS. Brasília, 2004a. ______. Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004; Brasília: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – Secretaria Nacional de Assistência Social, 2004. ______. RESOLUÇÃO 113, DE 19 DE ABRIL DE 2006. Dispõe sobre os parâmetros para a institucionalização e fortalecimento do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente: CONANDA. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Norma Operacional Básica NOB-Suas. Brasília 2012. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Conselho Nacional da Assistência Social. Resolução nº 109, de 11 de novembro de 2009. Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Brasília: MDS, 2009b. ______. Lei n. 12.594, de 18 de janeiro de 2012. Institui o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), regulamenta a execução das medidas socioeducativas destinadas a adolescente que pratique ato infracional; e altera as Leis nºs 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente); 7.560, de 19 de dezembro de 1986, 7.998, de 11 de janeiro de 1990, 5.537, de 21 de novembro de 1968, 8.315, de 23 de dezembro de 1991, 8.706, de 14 de setembro de 1993, os Decretos-Leis nºs 4.048, de 22 de janeiro de 1942, 8.621, de 10 de janeiro de 1946, e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),

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aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12594.htm. Acesso em 13 jun. 2019. BRITO, Angela Enerstina Cardoso de; SILVA, Karla Katiúsca. A TRAJETÓRIA DAS PROTOFORMAS BRASILEIRAS DE ATENDIMENTO À INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA: DO CÓDIGO DE MENORES AO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. 80 anos do Serviço Social: Tendências e desafios. 4º Simpósio Mineiro de Assistentes Sociais - CRESS/MG. 2016. Disponível em: http://cress-mg.org.br/hotsites/Upload/Pics/3f/3facec44-a9b1-481f-b1bc-e87428de06fa.pdf CFESS. Parâmetros para atuação de assistentes sociais na política de assistência social. Brasília: CFESS, 2011. Disponível em: http://www.cfess.org.br/arquivos/Cartilha_CFESS_Final_Grafica.pdf. Acesso em: 10 jun. 2019. COSTA, Ana Carolina Pontes. As políticas de proteção à infância e adolescência e a educação: reflexões a partir da década de 1920. In: IV CONGRESSO INTERNACIONAL DE PEDAGOGIA SOCIAL, 4., 2012, São Paulo. Associação Brasileira de Educadores Sociais. Disponível em: http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=MSC0000000092012000100003&lng=en&nrm=abn. COUTO, B. R. ; SILVA, Marta Borba . A Política de Assistência Social e o Sistema Único de Assistência Social: a trajetória da constituição da política pública. In: Jussara Maria Rosa Mendes, Jane Cruz Prates e Beatriz Gershenson Aguinsky. (Org.). O Sistema Único de Assistência Social: entre a fundamentação e o desafio da implantação. 1ed.Porto Alegre: EDIPUCRS, 2009, v. 1, p. 31-44. COUTO, Berenice Rojas. Assistência social: direito social ou benesse?. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 124, p. 665-677, Dez. 2015.

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