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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES CCHLA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUÍSTICA APLICADA KLEBIA SELIANE PEREIRA DE SOUZA FORMAÇÃO DOCENTE E GÊNEROS DISCURSIVOS: o dizer, o saber e o fazer NATAL/RN 2011

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE … · têm por mim, a caçula, a eterna menina”. ... Conceição Flores, ... “Procurei deixar vocês falarem, dizerem

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE – UFRN CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES – CCHLA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUÍSTICA APLICADA

KLEBIA SELIANE PEREIRA DE SOUZA

FORMAÇÃO DOCENTE E GÊNEROS DISCURSIVOS: o dizer, o saber e o fazer

NATAL/RN 2011

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KLEBIA SELIANE PEREIRA DE SOUZA

FORMAÇÃO DOCENTE E GÊNEROS DISCURSIVOS: o dizer, o saber e o fazer

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem do Departamento de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como um dos requisitos à obtenção do título de Mestre em Letras Orientadora: Dra. Maria Bernadete Fernandes de Oliveira

NATAL/RN

2011

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Catalogação da Publicação na Fonte.

Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA).

Souza, Klebia Seliane Pereira de.

Formação docente e gêneros discursivos : o dizer, o saber e o fazer /

Klebia Seliane Pereira de Souza. – Natal, 2011.

100 f. : il.

Dissertação (Mestrado em Letras) – Universidade Federal do Rio

Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de

Pós-Graduação em Estudos da Linguagem, Natal, 2011.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria Bernadete Fernandes de Oliveira.

1. Gêneros do discurso. 2. Formação inicial. 3. Saberes docentes. I. Oliveira, Maria Bernadete Fernandes de. II. Universidade Federal do Rio

Grande do Norte. III. Título.

RN/BSE-CCHLA CDU 81'336.52

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FORMAÇÃO DOCENTE E GÊNEROS DISCURSIVOS: o dizer, o saber e o fazer

KLEBIA SELIANE PEREIRA DE SOUZA

Dissertação examinada e aprovada pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem do Departamento de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como um dos requisitos à obtenção do título de Mestre em Letras.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________

Dra. Maria Bernadete Fernandes de Oliveira Orientadora

Dra. Maria da Penha Casado Alves Examinadora Interna

Dra. Célia Maria Medeiros Barbosa da Silva Examinadora Externa

Dra. Marília Varella Bezerra de Faria Examinadora Suplente

Natal,_______ de ______________ de 2011.

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Aos que torceram por mim e me incentivaram a continuar.

Sou melhor porque tenho vocês em minha vida.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, Pai querido e amoroso, que sempre esteve ao meu lado, me guiando, me

dando forças para prosseguir e conquistar mais esse sonho. “Eu sei Senhor que as

tuas misericórdias se renovam a cada manha”.

Aos meus pais, meus maiores amores, pessoas que mesmo sem saberem o que

realmente foi este trabalho, sempre diziam de sua confiança em mim e de sua

admiração. “Onde estiver, levarei comigo a certeza do amor incondicional que vocês

têm por mim, a caçula, a eterna menina”.

Aos meus irmãos e irmãs que sempre disseram/dizem: Você consegue! Em especial

a minha irmã Tuquinha, companheira querida, amiga-irmã, amada-cúmplice, e ao

seu esposo Gilmar, pessoas que sempre me dizem para continuar. “Não sei

realmente como agradecer tanto amor. Só posso dizer-lhes: Amo vocês e muito

obrigada por tudo!”

Aos amigos e amigas que me deram força, em especial as minhas queridas mestras-

amigas-ajudadoras professoras doutoras Ilane Ferreira Cavalcante, Ana Santana e

Conceição Flores, pessoas que me incentivaram ainda na graduação a tentar

sempre melhorar. “Obrigada minhas incentivadoras, mulheres admiráveis pela

inteligência, pela sensibilidade, pela fortaleza... Vocês, sim, são mulheres

desdobráveis!”.

Às professoras pesquisadas, pela participação na pesquisa. Sem a contribuição de

vocês este trabalho não teria sido possível. “Procurei deixar vocês falarem, dizerem

de sua formação.”

Aos meus professores da graduação Dra. Edna Rangel e Dr. Romerito Silva. Vocês

contribuíram de maneira especial, no início de tudo, para que este trabalho

chegasse até aqui.

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À minha chefa querida professora Doutora Célia Maria Barbosa de Medeiros, pela

ajuda e preocupação. “Você é uma gestora exemplar”.

Aos meus amigos da UnP Mazinho e Bruno. Aos amigos que fiz na UnP, mas que

não são mais apenas de lá, professora mestre Elisete Aparecida - pessoinha

especial – Obrigada pelos “Você vai terminar, sim!”; e ao professor mestre Silvio Luís

- amigo desejável e profissional admirável – Obrigada pelos “Klé, termina esse

negócio logo!”. Vocês são maravilhosos, viu!

A minha amiga de mestrado Liédja Lira, pelas conversas, pela força, pelas palavras

de incentivo nos momentos de dificuldade. “Amigaaaa, conseguimos!”

Às professoras examinadoras da qualificação, Doutoras Renata Arcanjo e Graça

Rodrigues, pelas muitas contribuições quando este trabalho estava começando a

ganhar corpo. “Saibam que vocês contribuíram muito. Obrigada mesmo!”.

À professora Doutora Maria da Penha Casado Alves por ter percebido que minha

pesquisa daria certo. “Você é uma pessoa admirável. Um exemplo de competência,

uma professora de verdade. Gosto de suas aulas e da forma que você as conduz.”

Por fim, a minha orientadora, a quem costumo chamar de ombro-orientador-amigo,

que viu tudo acontecer, que me conduziu aos recortes necessários, que aceitou

mais esse desafio a ser vencido e, dessa vez, junto comigo. “Fizemos uma parceria

perfeita. Não poderia ter uma orientadora melhor, mais dedicada e compreensiva.

Obrigada pelo respeito, companheirismo, pelos aconselhamentos e pelo sorriso

sempre aberto. Como foram boas as nossas conversas de orientação. Aprendi muito

com você. Principalmente que para ser uma boa orientadora é preciso deixar o

orientando tentar caminhar só, pelo menos aparentemente.”

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Aqui chegamos ao ponto que talvez devêssemos ter partido. O inacabamento do ser humano. Na verdade, o inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência humana. Onde há vida, há inacabamento.

Paulo Freire

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RESUMO

Esta dissertação de mestrado, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, tem como objetivo apresentar uma análise acerca da formação inicial docente, o saber a respeito dos gêneros discursivos e sua utilização em sala de aula de profissionais polivalentes da educação básica. Assim, analisou-se, a partir dos discursos dos professores de quarto e quinto ano do ensino fundamental, se a formação inicial oferece subsídios às aulas de Língua Portuguesa, ou seja, se no processo de formação docente emergem conceitos de gêneros discursivos, quais conceitos aparecem e como esse conhecimento os auxilia em sala de aula. Para tanto, levou-se em consideração estudos realizados sobre a formação inicial docente, sobre a diversidade de saberes que compõem o saber docente e também a respeito dos gêneros discursivos segundo Bakhtin, concepção abordada nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Esta pesquisa se configura como qualitativa de base interpretativista e teve como instrumentos de coleta de dados um questionário estruturado com questões abertas e observação de sala de aula com gravação em áudio. Como resultados desta investigação, é possível destacar que a formação inicial tem deixado lacunas no que se refere ao ensino de Língua Portuguesa sobre os gêneros do discurso; que não há apenas um tipo de saber que constitui os saberes docentes e, por esse motivo, trabalhar com os saberes ditos disciplinares, especificamente o saber sobre os gêneros do discurso, é enfatizar um dentre muitos outros saberes. Palavras-chave: Formação inicial. Saberes docentes. Gêneros do discurso.

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ABSTRACT

This master dissertation presented to the Language Studies Post-Graduation Program of the Federal University of Rio Grande do Norte aims present an analysis about the initial teacher training, the knowledge about discursive genres and its usage in basic education professional classrooms. Therefore, it was analyzed, from teachers of fourth and fifth grades of elementary schools, if the initial training provides enough useful tools to be applied in Portuguese classes, i.e., if during the teacher training process concepts of discursive genres emerge, which of these concepts can be noticed and how this knowledge helps teachers in their classrooms. In order to achieve this aim, it was taken into account studies about the initial teacher training, about the knowledge diversity that is part of the teaching knowledge and also about discursive genres based on Bakhtin‟s conception, which is used in the Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). This research is qualitative of interpretative basis and has taken an opened questions questionnaire and classroom observations with audio recording data as corpus of analysis. As results of this investigation, it is possible to emphasize that the initial teacher training has left some gaps in discursive genres concepts and usage in Portuguese classes, that it is not only one kind of knowledge that compound the teacher knowledge and, because of this, working with disciplinarians knowledge, specially about discursive genres, is to emphasize one among many others. Key words: Initial teacher training. Teaching knowledges. Discursive genres.

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LISTA DE SIGLAS

PCN Parâmetros Curriculares Nacionais

LA Linguistica Aplicada

UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte

UnP Universidade Potiguar

IFESP Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy

UERN Universidade Estadual do Rio Grande do Norte

FACEX Faculdade de Ciências, Cultura e Extensão do RN

FACINTER Faculdade Internacional de Curitiba

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SUMÁRIO

1 PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE A PESQUISA__________________ 11

1.1 A LINGUÍSTICA APLICADA E A PESQUISA_____________________ 12

1.2 O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E OS GÊNEROS

DISCURSIVOS____________________________________________ 14

1.3 A PESQUISA______________________________________________ 18

1.3.1 Tipo da pesquisa e os sujeitos_______________________________ 18

1.3.2 Procedimentos para a coleta de dados________________________ 22

1.3.3 A realização da pesquisa___________________________________ 24

2 O ENSINO E OS GÊNEROS DISCURSIVOS____________________ 27

3 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E OS SABERES DOCENTES___ 37

3.1 PROFISSÃO DOCENTE: OS SABERES________________________ 38

3.1.1 Os saberes da formação____________________________________ 40

3.1.1.1 Os saberes curriculares_____________________________________ 43

3.1.1.2 Os saberes experienciais____________________________________ 44

3.1.1.3 Os saberes disciplinares_____________________________________ 45

3.2 FORMAÇÃO E SABERES EM PUBLICAÇÕES___________________ 47

3.2.1 Revista Educação_________________________________________ 48

3.2.2 Educação e Pesquisa______________________________________ 50

3.2.3 Educação & Sociedade_____________________________________ 52

4 O “OUVIR” OS DADOS_____________________________________ 55

4.1 O DIZER: UMA CATEGORIA EVIDENTE________________________ 57

4.1.1 Sobre a formação inicial____________________________________ 57

4.1.2 Sobre os gêneros discursivos_______________________________ 63

4.2 O SABER: A CATEGORIA CIENTÍFICA_________________________ 70

4.3 O FAZER: UMA CATEGORIA DA PRÁTICA_____________________ 75

4.3.1 O fazer no questionário e na sala de aula______________________ 75

5 “ÚLTIMAS” PALAVRAS____________________________________ 85

REFERÊNCIAS____________________________________________ 96

ANEXOS_________________________________________________ 101

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1 AS PRIMEIRAS PALAVRAS SOBRE A PESQUISA

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O que um indivíduo sabe não é igual ao que o outro sabe – e nem totalmente diferente – é complementar, como as partes de uma quebra-cabeças. Quando todos sabem a mesma coisa, ninguém sabe nada.

Leffa

Esta dissertação tem como objetivo apresentar uma análise a respeito dos

saberes sobre gêneros discursivos presentes na formação inicial (curso de

Pedagogia e afins) dos professores de quarto e quinto anos do ensino fundamental e

como essas formulações aparecem na prática pedagógica em sala de aula. Isso

porque os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) preconizam o ensino da língua,

a reflexão a respeito da língua, a partir de gêneros do discurso.

1.1 A LINGUÍSTICA APLICADA E A PESQUISA

Não são recentes as pesquisas realizadas pela Linguística Aplicada (LA) a

respeito da sala de aula. Afinal, o primeiro espaço investigado por essa área foi o

escolar, já que, a princípio, se pensava que o fazer da LA se limitava a esse

ambiente, aos estudos relacionados ao ensino de línguas. Sobre esse assunto,

Oliveira (2007) afirma que

Ao surgir, na década de 50 do século passado, a LA era compreendida como uma sub-área da Lingüística Teórica, cuja atividade principal era se aplicar, aos processos de ensino e aprendizagem de línguas, principalmente de línguas estrangeiras, conhecimentos sobre as línguas, produzidos pela Lingüística Teórica [...].

No entanto, a partir das diversas discussões dos pesquisadores sobre a LA,

essa deixou de ser uma subárea para assumir o status de área de conhecimento.

Celani (1992), ao questionar “Afinal, o que é Lingüística Aplicada?”, faz uma breve

retomada das interpretações a respeito dessa área, quais sejam: a LA é entendida

como ensino/aprendizagem de línguas; entendida como consumo, e não como

produção de teorias; e como área interdisciplinar.

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A autora, além de fazer essas retomadas, conclui que

[...] embora a linguagem esteja no centro da LA, esta não é necessariamente dominada pela Lingüística. Em uma representação gráfica da relação da LA com outras disciplinas com as quais ela se relaciona, a LA não apareceria na ponta de uma seta partindo da Lingüística. Estaria provavelmente no centro do gráfico, com setas bidirecionais dela partindo para um número aberto de disciplinas relacionadas com a linguagem, entre as quais estaria a Lingüística em pé de igualdade, conforme a situação, com a Psicologia, a Antropologia, a Sociologia, a Pedagogia ou a tradução. (CELANI, 1992, p. 21).

Assim, a LA passa a se relacionar com as demais áreas do conhecimento em

uma perspectiva transdisciplinar, mestiça ou INdisciplinar, como indica Moita Lopes

(2008). Ou seja, passa a ser uma área de possibilidades investigativas que

contempla não somente o espaço escolar, não apenas teorias linguísticas, mas o

social. Até porque o espaço escolar é apenas mais um dos muitos espaços sociais.

A LA, pensada como transdisciplinar, mestiça ou INdisciplinar, segundo

Celani (1992, p. 21), tem uma “natureza essencialmente humanista”; tenta “criar

inteligibilidade sobre problemas sociais em que a linguagem tem um papel central”

(MOITA LOPES, 2008, p. 14), ou seja, parte da “privação sofrida” para uma “leveza

de pensamento” (ROJO, 2006, p. 259).

Rojo (2006), ao tratar do fazer LA numa perspectiva sócio-histórica, fala da

privação sofrida e da leveza de pensamento. Em relação a esses dois pontos, a

autora defende “a transdisciplinaridade como a leveza de pensamento necessária

para compreender, interpretar e interferir nas realidades complexas representadas

pelas práticas sociais situadas”. Com relação à privação sofrida, Rojo (2006, p. 259)

afirma que

a densidade, a relevância e, muitas vezes, a urgência dos problemas postos à LA (o peso da privação sofrida) exigem uma leveza de pensamento capaz de articular, de maneira dialógica e eficaz, os saberes de referência necessários a sua interpretação e resolução.

A privação sofrida, segundo a autora, seria o problema que emerge da

sociedade. É, pois, a partir dessa compreensão de Rojo (2006) que se configura

esta pesquisa na LA. Isso porque, é a partir de uma privação sofrida, ou seja, da

dificuldade em compreender as múltiplas facetas dos saberes que compõem o saber

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docente, que se torna possível a leveza de pensamento, a assunção de uma postura

transdisciplinar, cujo objetivo é contribuir para uma reflexão acerca do amálgama

dos saberes docentes. Assim, dentre os diversos saberes que compõem o saber dos

professores, analisamos, por meio da leveza de pensamento, dessa postura

transdisciplinar que é característica da LA, os saberes dos professores a respeito do

conceito de gêneros discursivos, formulação essa presente nos documentos oficiais

que regem o ensino de Língua Portuguesa (LP) nas séries iniciais do Ensino

Fundamental, no ensino fundamental como um todo e no Ensino Médio.

1.2 O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA E OS GÊNEROS DISCURSIVOS

Um ensino de língua pautado nos gêneros discursivos, é o que indica os

PCN. Nesse documento considera-se, portanto, o ser humano como um ser social

que está inserido em diferentes práticas de uso da linguagem e sempre usando os

mais variados gêneros. Ou seja, compreende que não há prática social que não seja

permeada por gêneros, essas formas, no dizer de Bakhtin (2006, p. 262),

“relativamente estáveis de enunciados”.

Tratar da temática “gênero discursivo” parece ser redundante dada a

quantidade significativa de pesquisas e de publicações que há algum tempo circula

pelo meio acadêmico. Esse tema tem ganhado espaço nas discussões acerca da

produção de conhecimento, em especial na área dos estudos da linguagem. A

ascensão do tema se deu, segundo Rojo (2005), em parte, devido à formulação e à

publicação dos PCN, a partir de 1995.

Segundo a autora, no período de 1995 a 2000, de 95 trabalhos sobre a

temática gênero, 67% tratava de linguagem e educação. Essa porcentagem

corresponde a 63 trabalhos que abordam temas como as práticas escolares, a

formação de professores, as práticas de letramento e a avaliação ou elaboração de

material didático. (ROJO, 2005).

Da quantidade dos trabalhos desenvolvidos, apenas 10% abordavam a

formação de professores. Essa quantia de trabalhos se mostra um tanto pequena

dada a importância da formação do professor para o desenvolvimento adequado e

efetivo da educação, ou melhor, das práticas educacionais.

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Essa perspectiva de pesquisa voltada para a formação do professor, e mais

especificamente para os saberes que os docentes têm sobre essa temática, ainda é

escassa. Isso porque, se observarmos as últimas publicações que tocam na

temática dos gêneros discursivos, constataremos que essas versarão, em sua

maioria, a respeito do uso dos gêneros discursivos na escola e não sobre quais são

os saberes que os professores têm sobre os gêneros e como trabalhá-los em sala

de aula.

A partir de uma análise dos PCN de Língua Portuguesa do ensino

fundamental da primeira a quarta séries, é possível observar que esse documento

preconiza um ensino pautado nos gêneros do discurso. Para os PCN,

Todo texto se organiza dentro de um determinado gênero. Os vários gêneros existentes, por sua vez, constituem formas relativamente estáveis de enunciados, disponíveis na cultura, caracterizados por três elementos: conteúdo temático, estilo e construção composicional. (BRASIL, 2001, p. 26).

Como pode ser constatado, o conceito de gênero usado nesse documento é o

formulado por Bakhtin (2006), mas isso só é informado em nota de rodapé. Não

necessitamos e nem queremos problematizar uma nota de rodapé, no entanto, essa

tão sutil indicação pode ter gerado algumas falhas de leitura, ou mesmo passado

despercebida pelos professores, fazendo com que eles sequer percebessem tal

conceituação.

Levando em consideração as informações dadas por Rojo (2005) sobre os

trabalhos que abordam os gêneros do discurso e também a formação docente;

diante do modo sutil de como os PCN abordam a temática do ensino de língua

materna a partir dos gêneros discursivos, eis as questões que norteiam esta

pesquisa:

1. A formação inicial dos professores em Pedagogia e cursos afins contribui

para a construção de seus saberes sobre o conceito de gêneros discursivos?

2. Nesse processo de formação inicial emergem conceitos acerca dos

gêneros discursivos? Quais?

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3. Em que medida os saberes dos professores formados em Pedagogia e

cursos afins sobre os gêneros discursivos orientam as atividades em sala de

aula? Como os gêneros são abordados nesse ambiente de aprendizagem?

A proposta dos PCN não é trabalhar somente o aspecto linguístico dos

enunciados, é trabalhar gênero do discurso e, sendo assim, compreender a

dimensão discursiva do gênero é imprescindível. No entanto, o trabalho com o

discursivo nem sempre faz muito sucesso entre os professores. Como afirma Rojo

(2005 p. 207),

[...] Nossos professores de língua – seja por formação profissional, seja por falta de formação – são muito atraídos pela descrição da língua e pelo ensino de gramática. Sempre fazemos sucesso na formação de professores quando discutimos as características formais e de estilo de um texto ou gênero, a partir de nossos instrumentos. [...].

Essa atração dos professores pela descrição da língua, no dizer de Rojo

(2005), pode ocorrer em virtude da formação, ou seja, de um currículo ainda pautado

na metalinguagem sofisticada da língua, embasado em estudos que tratam apenas

da parte estrutural, ou pela falta de formação, o que ainda é muito presente no

contexto educacional brasileiro. Sobre uma formação pautada na metalinguagem,

não queremos apontar aqui que é desnecessária, pois o conhecimento do

funcionamento da língua auxilia no uso da mesma, mas é preciso um trabalho que

contemple também o aspecto prático da linguagem, o uso em seus mais variados

contextos, bem como a sua compreensão. Já a respeito da falta de professores

formados em sua área de atuação, essa é uma realidade muito comum no contexto

educacional brasileiro. Um exemplo dessa problemática é o que observamos no

Quadro 1, no qual fazemos a exposição das professoras que participaram da

pesquisa. Nesse quadro vemos que há professoras que não possuem a formação

em Pedagogia ou cursos afins, formação essa considerada como básica para o

trabalho no ensino fundamental.

Sobre a problemática da formação docente, Lopes-Rossi (2006), em um

artigo publicado no livro Gêneros textuais: reflexões e ensino, fala sobre um projeto

que desenvolve com educadores e afirma que

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O contato profissional com professores de diversas cidades de minha região – Vale do Paraíba (São Paulo) – e regiões circunvizinhas leva-me a crer que, fora dos meios acadêmicos, no entanto, o conhecimento sobre o trabalho pedagógico com gêneros discursivos ainda é bem restrito. Os professores manifestam-se muito interessados no assunto, porém, carentes de fundamentação teórica e exemplos práticos. (LOPES-ROSSI, 2006, p. 73)

No meio acadêmico, mais precisamente nos cursos de Letras, essa temática

já tem ganhado espaço, haja vista que são muitas as publicações a esse respeito.

No entanto, tal abordagem teórica pode ainda não ter chegado da forma que deveria

a outros cursos que também trabalham com formação de professores, mais

precisamente aos cursos que formam profissionais que atuam nos anos iniciais, os

cursos de Pedagogia ou similares.

Não estamos afirmando que há falhas nos currículos de tais cursos, e nem é

esse nosso objetivo. Na verdade, diante de uma sociedade com tantas práticas de

linguagem como forma de interação, os mais variados gêneros discursivos

permeiam essas práticas, e é justamente essa compreensão que pretendemos

investigar se os professores têm, como as utilizam em sala de aula e,

principalmente, se a formação inicial deu subsídios para o conceito de gênero

formulado pelas professoras e para suas práticas docentes. Afinal, para poder

orientar os alunos em suas reflexões sobre a linguagem, é imprescindível que os

docentes saibam a respeito do que estão tratando. Neste caso, especificamente,

saibam o que são os gêneros do discurso e as suas realizações nas mais variadas

situações sociais.

Assim, concordamos com Freire (2005, p. 29) quando afirma que ensinar

exige pesquisa, pois “não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino.”.

Considerando as palavras desse autor, compreendemos que pesquisa e ensino são

indissociáveis, e é nesse sentido que vemos o professor, pois esse é, ou deveria

ser, tanto responsável pela produção de conhecimento, quanto pela sua

disseminação.

Sobre esse posicionamento do professor com relação à produção e ao ensino

do saber, do professor como pesquisador e como disseminador do saber, Tardif

(2010, p. 32) faz alguns questionamentos:

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Os professores sabem decerto alguma coisa, mas o que, exatamente? Que saber é esse? São eles apenas “transmissores” de saberes produzidos por outros grupos? Produzem eles um ou mais saberes, no âmbito escolar? [...] As chamadas ciências da educação, elaboradas por pesquisadores e formadores, universitários, ou os saberes e doutrinas pedagógicas, elaborados pelos ideólogos da educação, constituiriam todo o saber dos professores?

E, considerando essas perguntas, o autor discute a problemática existente

entre os professores e os saberes. Temática que norteia esta pesquisa.

É notória a quantidade de publicações a respeito do uso de gêneros como

“objeto” de ensino da língua materna. Entretanto, esse tema ainda é desconhecido

por alguns profissionais de educação formados para serem professores de língua, é

o caso dos professores polivalentes que, entre as múltiplas áreas de ensino com as

quais trabalham, está a Língua Portuguesa.

O olhar desta pesquisa para esses profissionais se dá exatamente pelo fato

de eles serem polivalentes e porque trabalham como professores de Língua

Portuguesa, mesmo que nem sempre se considerem como tal, por terem de

trabalhar as diversas áreas de conhecimento, como história, geografia, matemática,

dentre outras. Diante dessa multiplicidade de áreas, esse profissional acaba, muitas

vezes, por não adotar um direcionamento teórico a respeito do ensino de língua

materna, orientação essa que acaba ficando nos moldes tradicionais do ensino, no

plano da estrutura, proposta que não encontra respaldo nos documentos oficiais que

orientam o ensino brasileiro.

1.3 A PESQUISA

1.3.1 Tipo da pesquisa e os sujeitos

De início, esta pesquisa tinha como objetivo ser realizada com 11 (onze)

professoras de uma escola pública municipal, localizada em um bairro da Zona Sul

da cidade do Natal, pois pretendia trabalhar com todos os professores responsáveis

pelos quartos e quintos anos da escola. No entanto, mesmo com a aceitação de

todos os docentes, houve alguns contratempos que reduziram esse número para 9

(nove). E, apesar de terem sido observadas as aulas de todas as professoras, serão

analisadas apenas 7 (sete), como explicaremos mais adiante.

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Os aspectos para a seleção da escola foi que a equipe de professores fosse

graduada, se disponibilizasse a responder o questionário e permitisse a observação

de, pelo menos, uma aula na qual trabalhasse gêneros discursivos. Esses critérios

foram determinados pelo fato de que não é fácil adentrar os espaços alheios, cujos

horários, as atividades, os afazeres já estão determinados. O pesquisador não pode

e nem deve alterar muito esse espaço para que chegue a alterar os resultados da

pesquisa.

São muitas as investigações que apresentam a escola como o espaço a ser

pesquisado e que têm o profissional da educação e os alunos como objeto de

estudo. As investigações que têm como ambiente o contexto escolar enfrentam

atualmente alguns obstáculos no sentido de conseguir a colaboração dos

professores, que se dizem cansados de serem “avaliados” pelos pesquisadores que

não dão retorno a respeito do que as pesquisas investigavam. Desse modo, é cada

dia mais comum encontrar equipes docentes que não se deixam pesquisar em

virtude do não obter retorno dos resultados. Diante disso, encontrar profissionais que

aceitem serem sujeitos de pesquisa é cada dia mais difícil. E o fato de as

professoras da escola aderirem foi de fundamental importância para a realização

desta investigação.

Esta pesquisa se configura como do tipo qualitativa, pois

A abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. (CHIZZOTTI, 2009, p. 79)

Sendo assim, para pesquisar os saberes docentes é necessário compreender

o professor em seu contexto, situá-lo no tempo e no espaço, ou seja, atinar para a

importância de uma análise em uma perspectiva socio-histórica. Dessa forma, “O

objeto não é um dado inerente e neutro; está possuído de significados e relações

que sujeitos concretos criam em suas ações”. (CHIZZOTTI, 2009, p. 79)

As professoras não são simplesmente professoras, são profissionais que

apresentam em seu processo de formação diferentes elementos que envolvem

questões subjetivas, sociais, políticas, dentre outras. Como a pesquisa objetivava

analisar os saberes desses profissionais, foi imprescindível reconhecer que esses

são sujeitos historicamente situados e responsivos, pois “Somente somos iguais no

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20

plano teórico e abstrato, no plano empírico, cada um de nós ocupa um lugar singular

e único” (BAKHTIN citado por AMORIM, 2007, p. 14), estamos no mundo de maneia

a ocupar um lugar, em um determinado tempo e compreendendo-o sob uma

determinada perspectiva de vida. Cada professor ocupa um lugar na escola e na

sociedade que não pode ser assumido por outro, pois é responsável pelo

desenvolvimento integral das competências dos alunos em cada um dos níveis da

educação, seja no ensino fundamental ou médio.

“Na pesquisa qualitativa, todas as pessoas que participam da pesquisa são

reconhecidas como sujeitos que elaboram conhecimentos e produzem práticas

adequadas para intervir nos problemas que identificam”. (CHIZZOTTI, 2009, p. 83),

Assim, as nove professoras/sujeitos que participaram da pesquisa são todas

graduadas:

Quadro 1: Professoras que responderam ao questionário e foram observadas em sala de aula

IDENTIFICAÇÃO DA

PROFESSORA

IDADE

CURSO DE FORMAÇÃO

NA GRADUAÇÃO

INSTITUIÇÃO DA GRADUAÇÃO

CURSO LATU SENSU

TEMPO DE

EXPERIÊNCIA

Professora 1 38 Pedagogia Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Alfabetização - UnP 13

Professora 2 46 Pedagogia Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN)

Educação de Jovens e Adultos

23

Professora 3 43 Pedagogia Universidade Potiguar (UnP)

Alfabetização - UnP 23

Professora 4 31 Pedagogia Universidade Vale do Acaraú (UVA)

Alfabetização - UnP 5

Professora 5 52 Normal Superior

Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy (IFESP)

Psicopedagogia - FACINTER

14

Professora 6 33 Normal Superior Serviço Social

Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy (IFESP)

Gestão Escolar –Universidade Castelo Branco

12

Professora 7 42 Normal Superior

Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy (IFESP) Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Psicopedagogia – Universidade Castelo Branco

22

Professora 8 52 Estudos Sociais Serviço Social

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Gestão Escolar - FACEX

22

Professora 9 37 Ciências Biológicas

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

15

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21

O Quadro 1 traz a representação da realidade diversificada na formação

inicial das professoras pesquisadas. As quatro primeiras são formadas em

Pedagogia por instituições diferentes, as três seguintes são formadas em Normal

Superior pelo mesmo instituto e as duas últimas não têm formação inicial específica

para o trabalho nas séries iniciais do ensino fundamental. Sendo assim, como esta

pesquisa tem o objetivo de analisar a formação inicial dos professores formados em

Pedagogia e cursos afins, as professoras 8 e 9 não estarão presentes no capítulo de

análise desta dissertação. Ou seja, o quatro de análise será o seguinte:

Quadro 2: Professoras serão analisadas segundo as categorias estabelecidas

Esta pesquisa está inserida no paradigma interpretativista, pois nessa

perspectiva “[...] não é possível ignorar a visão dos participantes do mundo social

caso se pretenda investigá-lo”. (MOITA LOPES, 1994, p. 331), pois “[...] na visão

IDENTIFICAÇÃO DA

PROFESSORA

IDADE

CURSO DE FORMAÇÃO

NA GRADUAÇÃO

INSTITUIÇÃO DA GRADUAÇÃO

CURSO LATU SENSU

TEMPO DE

EXPERIÊNCIA

Professora 1 38 Pedagogia Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Alfabetização - UnP 13

Professora 2 46 Pedagogia Universidade Estadual do Rio Grande do Norte (UERN)

Educação de Jovens e Adultos

23

Professora 3 43 Pedagogia Universidade Potiguar (UnP)

Alfabetização - UnP 23

Professora 4 31 Pedagogia Universidade Vale do Acaraú (UVA)

Alfabetização - UnP 5

Professora 5 52 Normal Superior

Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy (IFESP)

Psicopedagogia - FACINTER

14

Professora 6 33 Normal Superior Serviço Social

Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy (IFESP)

Gestão Escolar –Universidade Castelo Branco

12

Professora 7 42 Normal Superior

Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy (IFESP) Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Psicopedagogia – Universidade Castelo Branco

22

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22

interpretativista, os múltiplos significados que constituem as realidades só são

passíveis de interpretação. É o fator qualitativo, i.e. o particular que interessa”.

(MOITA LOPES, 1994, p. 332).

Portanto, não queremos fazer generalizações, mas estudar um determinado

fenômeno situado sócio-historicamente, sujeitos responsivos e com posicionamentos

axiológicos. Fato esse que faz desta investigação um estudo de caso.

Podemos destacar algumas das características do estudo de caso, segundo

André e Lüdke (1986). Para essas autoras, e esse é um tipo de estudo que visa à

descoberta de elementos que possam emergir durante a pesquisa; enfatizam a

interpretação em contexto; buscam retratar uma realidade de forma completa e

profunda; usam uma variedade de fontes de informação; revelam experiência vicária

e permitem generalizações naturalísticas, dentre outras características.

Assim, esta pesquisa visa à descoberta de novas informações acerca da

formação inicial de professores situados em um tempo e num espaço sobre os

gêneros do discurso, com o intuito de investigar a realidade vivida por esses

profissionais.

1.3.2 Procedimentos para a coleta de dados

Os procedimentos metodológicos utilizados para a realização da pesquisa

foram: 1- o questionário constituído por questões abertas e 2 - a observação. Esses

procedimentos foram selecionados com o intuito de coletar dados que atendessem a

cada uma das perguntas de pesquisa:

1. A formação inicial dos professores em Pedagogia e cursos afins contribui

para a construção de seus saberes sobre o conceito de gêneros discursivos?

2. Nesse processo de formação inicial emergem conceitos acerca dos

gêneros discursivos? Quais?

3. Em que medida os saberes dos professores formados em Pedagogia e

cursos afins sobre os gêneros discursivos orientam as atividades em sala de

aula? Como os gêneros são abordados nesse ambiente de aprendizagem?

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23

O primeiro instrumento atendeu as duas primeiras questões de pesquisa e o

segundo a terceira. O primeiro recurso tratou de responder, a partir das informações

dadas pelas professoras, se a formação inicial contribui ou não para a constituição

de saberes a respeito dos gêneros discursivos e, se contribui, quais são esses

saberes, quais são os conceitos sobre gêneros que emergem nesses ambientes de

formação.

Já o segundo instrumento, a observação, dá suporte para a resposta da

terceira questão, pois a partir da observação foi possível a realização da análise

entre o que foi respondido pelos professores no questionário e o que realmente é

feito em sala de aula.

Sobre a coleta de dados, Chizzotti (2009) afirma que na pesquisa qualitativa

os dados não são acontecimentos fixos, não são coisas isoladas e se dão em um

contexto fluente de relações. Esse autor afirma que os dados

[...] são “fenômenos” que não se restringem a percepções sensíveis e aparentes, mas se manifestam em uma complexidade de oposições, de revelações e de ocultamentos. É preciso ultrapassar sua aparência imediata para descobrir sua essência. (CHIZZOTTI, 2009, p. 84).

André e Lüdke (1986) apontam como métodos de coletas de dados a

observação, a entrevista e a análise documental. Desses três métodos indicados

pelas autoras, utilizamos a entrevista e a observação.

Na entrevista, em forma de questionário, buscamos as respostas para as

duas primeiras questões desta pesquisa. Como explicaremos mais adiante. Já na

observação objetivamos responder o último questionamento da investigação, pois

essa etapa possibilitou a realização de uma análise comparativa entre as perguntas

respondidas nos questionários e a prática em sala de aula.

Utilizamos esses dois métodos de coleta de dados devido ao fato de poderem

responder aos questionamentos da pesquisa e por se mostrarem exeqüíveis diante

do tempo destinado para a realização da investigação.

Ao tratar da observação como instrumento de coleta de dados, André e Lüdke

(1986) discutem que o ato de observar é carregado de subjetividade e, por esse

motivo, “O que cada pessoa seleciona para „ver‟ depende muito de sua história

pessoal e principalmente de sua bagagem cultural”. (ANDRÉ; LÜDKE, 1986, p. 25).

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24

Segundo essas autoras, para que a observação se torne um instrumento

válido e fidedigno de investigação científica, esse instrumento de coleta deve ser

controlado e sistematizado. Para elas, o observador deve passar por um processo

de formação que o permita observar adequadamente o que deseja e saber registrar

o que foi observado. Os registros das observações realizadas por esta investigação

encontram-se na seção de anexos.

A observação realizada foi direta, pois o pesquisador estava presente na aula

observada, e gravada em áudio. Nesta pesquisa, o observador se caracteriza como

“participante como observador” porque o pesquisador está na sala de aula, não

participando ativamente das atividades, mas observando diretamente os

acontecimentos. O pesquisador é participante do contexto de observação, é visível e

todos (discentes e docentes) sabem disso. A escolha por mais esse procedimento

metodológico se deu em virtude da necessidade da confirmação dos dados do

questionário no momento da observação.

Na observação participante, é muito mais difícil para as pessoas que estão sendo observadas mentir ou tentar enganar o pesquisador. O pesquisador está no local testemunhando o comportamento relato ao invés de confiar apenas nos relatos das pessoas a respeito de suas vidas. (MOREIRA; CALEFFE, 2008, p. 204).

Nesse caso, os sujeitos não relataram sobre suas vidas, eles responderam o

que sabiam sobre os gêneros discursivos e como esses são usados em sala de

aula. E, por meio da observação, foi possível a realização de uma análise

comparativa entre o que os professores pensam sobre a temática e como eles a

desenvolvem em sala de aula, análises essas realizadas mais adiante.

1.3. 3 A realização da pesquisa

A pesquisa teve a duração de seis meses. A princípio, tivemos um encontro

com a direção da escola para sabermos da possibilidade de adesão dos professores

e depois fizemos uma reunião com os coordenadores da escola para convidá-los a

participar da pesquisa apoiando no momento da aplicação do questionário e da

realização da observação. O primeiro contato aconteceu com a direção da escola e

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25

o segundo com as coordenadoras pedagógicas. Os primeiros contatos foram

realizados com a equipe gestora com o intuito, não de gerar uma imposição de

adesão à pesquisa por parte da direção em relação aos professores, mas para

informá-la sobre as pretensões da investigação, para obter a permissão de transitar

no espaço da escola e também para poder contar com a colaboração dessa equipe

na realização da pesquisa, no andamento das atividades de aplicação do

questionário/entrevista e na realização da observação.

No segundo momento tivemos dois encontros coletivos com os professores, o

primeiro para apresentar a pesquisa e o segundo para a aplicação do

questionário/entrevista (em anexo). A aplicação do questionário/entrevista se deu

em dois horários e dias distintos, pois agendamos essa atividade para os dias de

planejamento dos professores, para não prejudicarmos o andamento das atividades

escolares e também para recebermos os questionários no mesmo dia.

O terceiro momento foi o agendamento das observações, pois como a

pesquisa tinha o intuito de investigar uma prática na aula de Língua Portuguesa, era

necessário o agendamento dos horários para o planejamento das atividades tanto

pelo professor como também para o pesquisador. Mesmo diante da possibilidade de

o professor deixar a aula artificial em virtude do agendamento, esse planejamento foi

imprescindível, haja vista que a aula no ensino fundamental é, muitas vezes,

interdisciplinar e em outros momentos não segue o que está determinado nos

horários semanais, pois se um determinado professor inicia a aula abordando

Matemática e ele percebe que ao término do horário destinado a essa disciplina ele

não concluiu o que tinha planejado, na maioria das vezes, ele adia a aula que viria

em seguida para poder terminar a primeira.

A etapa do agendamento foi um pouco complicada porque foram necessárias

algumas visitas à escola. Havia choque nos horários destinados à Língua

Portuguesa entre algumas professoras, o que muitas vezes implicou em adiamento

das observações. Mas, terminada essa etapa, realizamos as observações e

documentamos tudo em áudio e no caderno de pesquisa1.

Terminadas essas etapas, iniciamos o tratamento dos dados digitando todos

os questionários e as observações realizadas e anotadas no caderno de anotações

1 O termo caderno de pesquisa substitui o diário de pesquisa em virtude de as anotações e as

observações realizadas não terem sido feitas diariamente. Assim, o uso do termo caderno não ocasiona uma incoerência, ao contrário do que aconteceria se adotássemos o termo diário.

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26

de campo. O momento final da pesquisa foi a análise dos dados e a comparação

dos questionários com as observações. Como veremos nos capítulos a seguir.

No capítulo dois, faremos uma retomada de publicações que abordam os

gêneros do discurso e trataremos dessa temática relacionada ao ensino de Língua

Portuguesa. Para tanto, traremos para a discussão os PCN e o conceito de gênero

formulado por Bakhtin, além das contribuições de autores que realizam suas

pesquisas sobre esse tema.

No capítulo três, nos deteremos às publicações que tratam da formação

docente e dos saberes que essa formação aborda. E veremos três saberes

classificados por Tardif (2010), quais sejam: saberes curriculares, saberes

experienciais e saberes disciplinares, a fim de elucidarmos o viés de nossa análise.

O capítulo quatro é o espaço desta dissertação reservado à análise do

corpus, que será examinado a partir de três categorias: o dizer, o saber e o fazer.

Categorias essas que emergiram da pesquisa e que somente depois de definidas

possibilitaram a realização da análise.

No quinto e último capítulo, a conclusão, faremos a considerações finais

desse trabalho que se mostra concluído neste momento, mas que ainda aponta

muitas possibilidades de continuidade.

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27

2 O ENSINO E OS GÊNEROS DO DISCURSO

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28

É por isso que tenho ouvido para todas as vozes.

Ariano Suassuna

A aula de Língua Portuguesa pautada nos gêneros do discurso nem sempre

esteve em evidência no meio acadêmico e no escolar, pois a temática dos gêneros

discursivos só apareceu com força a partir da publicação dos Parâmetros

Curriculares Nacionais (PCN). Depois da divulgação dos PCN, os gêneros passaram

a ser mais discutidos, pois a partir dessa publicação a unidade básica de ensino

passou a ser o texto.

Se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é possível tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem a palavra, nem a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com a competência discursiva, que é questão central. Dentro desse marco, a unidade básica de ensino só pode ser o texto [...]. (BRASIL, 2001, p. 36)

Nessa perspectiva, para não usarmos terminologias inadequadas a uma

abordagem na perspectiva bakhtiniana, consideraremos “texto” enquanto enunciado

formatado em gênero, já que o documento fala que o desenvolvimento da

“competência discursiva” é a questão central da formação do alunado. E, como cada

enunciado se manifesta de maneira diferente, são diversos os gêneros que

permeiam a vida cotidiana e escolar. Tudo o que falamos ou escrevemos se

organiza em gêneros e, como afirma Bakhtin (2006), é preciso dominá-los bem para

empregá-los livremente, pois

Quanto melhor dominarmos os gêneros tanto mais livremente os empregarmos, tanto mais plena e nitidamente descobrimos neles a nossa individualidade (onde isso é possível e necessário), refletimos de modo mais flexível e sutil a situação singular da comunicação; em suma, realizamos de modo mais acabado o nosso livre projeto de discurso. (BAKHTIN, 2006, p. 285)

Esse pensamento bakhtiniano a respeito dos gêneros está presente nos

objetivos gerais de Língua Portuguesa para o ensino fundamental já no primeiro

objetivo:

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Expandir o uso da linguagem em instâncias privadas e utilizá-la em instâncias públicas, sabendo assumir a palavra e produzir textos – tanto orais como escritos – coerentes, coesos, adequados a seus destinatários, aos objetivos a que se propõem a aos assuntos tratados. (BRASIL, 2001, p. 41)

Vejamos que ao passo que Bakhtin(2006) propõe o domínio do gênero, no

objetivo presente nos PCN vemos o ato de assumir a palavra, o ato de produção de

enunciados tanto oral quanto escrito. O procedimento de assumir a palavra só se

torna possível por meio do domínio do gênero, da adequação desse ao momento

comunicativo, às situações singulares do cotidiano, aos objetivos do ato

comunicativo.

Atualmente, as pesquisas a respeito dos gêneros ganharam uma proporção

que, em congressos sobre linguagem, são muitos os trabalhos que os abordam, são

muitos os trabalhos que têm os gêneros como tema base. Assim, tratar da temática

“gênero discursivo”, pode até parecer redundância, já que esse tema tem permeado

uma grande quantidade de pesquisas e de publicações há algum tempo. No entanto,

a redundância que talvez pudesse permear esta investigação estanca no momento

em que não voltamos nossa investigação para os gêneros discursivos, mas para a

formação docente em relação a essa temática.

Não são poucos os periódicos que viabilizam a divulgação das pesquisas

realizadas na academia. Em um levantamento a respeito da temática “gêneros

discursivos” na atualidade, em periódicos publicados depois do ano 2000, é possível

perceber que os gêneros estão presentes em uma quantidade relevante de

publicações. Essas pesquisas apresentam diversas abordagens que vão desde o

estudo da definição e do funcionamento dos gêneros até o trabalho desenvolvido em

sala de aula por profissionais da linguagem.

No periódico Linguagem em (dis) curso, levando em consideração apenas o

aparecimento do nome “gênero” no título, são 34 publicações durante o período de

2000 a 2010. Sendo duas em 2001, três em 2003, três em 2004, uma em 2005, 12

em 2006, uma em 2007, quatro em 2008, seis em 2009 e duas no primeiro semestre

de 2010. No tocante a temática desses trabalhos, elas são diversas assim como são

variadas as perspectivas teóricas adotadas.

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30

Mesmo sendo trabalhos distintos, em meio à diversidade de temáticas e

teorias, há uma unidade no sentido de tratarem do conceito, do uso e até da

transposição didática, o que mostra uma produção direcionada para um determinado

público, para pessoas que se interessam pelos estudos da linguagem, alunos,

professores e pesquisadores dessa área de conhecimento, que pesquisam e

produzem saberes, refletem sobre esses saberes, mas, em sua maioria, não

investigam como esses saberes chegam à sala de aula, como esses são

trabalhados, como são didatizados, se os professores realmente “sabem”.

É evidente que os saberes docentes não são compostos apenas pelos

saberes acadêmicos, mas esses fazem parte, compõem um conjunto de saberes

que permeiam e embasam a prática docente. As pesquisas sobre os saberes

docentes estão localizadas mais especificamente na área de pesquisa em

Educação. Sobre os saberes docentes, há ainda poucas investigações, mas é

possível afirmar que essa temática já tem ganhado espaço no meio acadêmico e

científico dos estudos da linguagem. Sobre as pesquisas que versam dos saberes

docentes, trataremos mais adiante.

Nos PCN de Língua Portuguesa do ensino fundamental de primeira a quarta

série há indicação de um ensino pautado nos gêneros do discurso, nas práticas

sociais, nas intenções comunicativas, em uma produção discursiva que não

acontece no vazio, mas é sempre direcionada para o outro, para alguém, pois “Fora

da escola escrevem-se textos dirigidos a interlocutores de fato” (BRASIL, 2001, p.

34), ou seja,

[...] a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados e, mesmo que não haja um interlocutor real, este pode ser substituído pelo representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor. A palavra dirige-se a um interlocutor

2. (BAKHIN; VOLOCHINOV,

1999, p. 112)

Dessa forma, a escola é em ambiente propício para a reflexão em torno dos

gêneros usados nas mais variadas situações cotidianas de interação pela

linguagem. Isso porque “a palavra é uma espécie de uma ponte lançada entre mim e

2 Grifo do autor.

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31

os outros [...] é território comum entre o locutor e o interlocutor”. (BAKHTIN;

VOLOCHINOV, 1999, p. 112). E

O domínio da língua tem estreita relação com a possibilidade de plena participação social, pois é por meio dela que o homem se comunica, tem acesso à informação, expressa e defende pontos de vista, partilha ou constrói visões de mundo, produz conhecimento. Assim, um projeto educativo comprometido com a democratização social e cultural atribui à escola a função e a responsabilidade de garantir a todos os seus alunos o acesso aos saberes lingüísticos necessários para o exercício da cidadania, direito inalienável de todos. (BRASIL, 2001, p. 23)

É a partir dessa perspectiva de uso da linguagem, dessa interação pela

linguagem, da linguagem como forma de participação social, que aparece tanto no

dizer de Bakhtin e Volochinov (1999) como nos PCN, que podemos problematizar o

ensino de Língua Portuguesa pautado em textos, em gêneros, e a relação do

docente com esse saber.

A concepção, a construção teórica de gênero discursivo usada nos PCN é a

formulada por Bakhtin (2006). Para o profissional que trabalha com o ensino de

língua é imprescindível a definição desse conceito norteador da prática em sala e

tão presente no dia a dia. E foi por considerarmos esses saberes fundamentais para

o desenvolvimento consciente e competente do trabalho docente que surgiram as

questões que norteiam esta pesquisa, questões essas já informadas no capítulo

anterior desta dissertação, mas que serão retomadas para justificarmos o porquê de

cada escolha.

A primeira delas é “A formação inicial dos professores em Pedagogia e cursos

afins contribui para a construção de seus saberes sobre o conceito de gêneros

discursivos?”. Essa pergunta questiona os conhecimentos formulados na formação

inicial a fim de observar se os professores já estudaram sobre gêneros discursivos e

se compreenderam a temática. A segunda, “Nesse processo de formação inicial

emergem conceitos acerca dos gêneros discursivos? Quais?”, está relacionada à

abordagem teórica, à perspectiva teórica adotada na formação, pois os PCN

propõem o conceito de gênero bakhtiniano. Já a terceira pergunta de pesquisa, “Em

que medida os saberes dos professores formados em Pedagogia e cursos afins

sobre os gêneros discursivos orientam as atividades em sala de aula? Como os

gêneros são abordados nesse ambiente de aprendizagem?”, busca compreender

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“se” esses saberes estão em sala de aula e “como” são tratados, como são

abordados pelos docentes.

No levantamento realizado das pesquisas e das publicações sobre gêneros

do discurso, observamos que a maioria traz experiências com o uso de gêneros em

sala de aula, sobre algumas abordagens teóricas que norteiam tais práticas, mas

não a respeito dos saberes que os professores têm. Outro ponto também relevante é

que essas publicações são feitas a partir de textos de pesquisadores vinculados a

grupos de pesquisa sobre o tema, na maioria das vezes, por alunos de programas

de pós-graduação, e não pelos próprios professores, o que demonstra que parte dos

profissionais/educadores ainda não se percebeu como pesquisador e, portanto,

ainda não se vê como agente de seus próprios conhecimentos.

A respeito dessa relação de produção de conhecimento e ensino, Tardif

(2010, p. 35) afirma que

Os educadores e os pesquisadores, o corpo docente e a comunidade científica tornam-se dois grupos cada vez mais distintos, destinados a tarefas especializadas de transmissão e de produção dos saberes sem nenhuma relação entre si.

Os pesquisadores organizam os saberes que os professores usam em sala

de aula. Somente para uma ilustração de como os estudos sobre essa temática têm

ganhado espaço nas publicações da área há uma quantidade significativa de

publicações sobre gêneros que tem entrado nas salas das universidades, institutos,

mas com muito mais recorrência nos cursos de Letras e nos programas de pós-

graduação vinculados à área dos estudos da linguagem. Essas publicações tratam

do assunto gênero sob diferentes pontos de vista, sob distintas abordagens teóricas.

Algumas revisam teóricos de abordagens sócio-semióticas, como, por exemplo,

Martin e Fairclough; sócio-retóricas, como Sweles e Bazerman; e abordagens sócio-

discursivas, como Bakhtin e Bronckart, dentre outros. (MAURER; BONINI; MOTTA-

ROTH, 2006).

Além de publicações de estudos sobre os teóricos que trabalham com o

conceito de gênero, há aquelas que abordam o uso de gêneros das mais diversas

esferas de atividades sociais e também as que versam sobre o tratamento dado pela

escola, ou seja, que tratam da didatização dessas formas. As publicações voltadas

para a escola são mais numerosas e nelas ganham repercussão o trabalho com os

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gêneros fábula, bilhete, resumo, artigo de opinião, notícias, dentre outros. Além de

publicações que dão conta da presença de cada um desses gêneros em sala de

aula. Há alguns autores que tentam ensinar, a partir da sequência didática, como

tratar os Gêneros orais e escritos na escola (2004), como Schneuwly e Dolz.

Sem levar em consideração o termo usado para nomear os gêneros, ou seja,

levando em consideração tanto as perspectivas teóricas que os nomeiam como

gêneros textuais quanto as que os trabalham como gêneros discursivos, já existe

uma produção respeitável sobre o assunto.

A coletânea Gêneros catalizadores: letramento e formação de professores,

publicado em 2006, trata da “[...] interlocução formador/formando,

professor/aprendiz; a emergência e objetivação de papéis e identidades em contexto

de ensino e de formação de professor; e a (re)construção de objetos de

ensino/aprendizagem da escrita.” (SIGNORINI, 2006, p. 08).

Esse livro é dividido em duas partes que são denominadas “Parte 1: A

interlocução formador/formando mediada por gêneros escritos” e “Parte 2:

Articulação e objetivação de saberes lingüístico-discursivos através de gêneros

escritos”. Nos artigos desse livro, são trabalhados gêneros, como bilhetes, relato

reflexivo e tomada de notas, ou seja, há artigos que apresentam pesquisas voltadas

para o uso dos gêneros em sala de aula, ou seja, “gêneros discursivos que

favorecem o desencadeamento e a potencialização de ações e atitudes

consideradas mais produtivas para o processo de formação, tanto do professor

quanto de seus aprendizes”. (SIGNORINI, 2006, p. 8).

Como essa coletânea, existem outras. Gêneros textuais e práticas

discursivas: subsídios para o ensino da linguagem (2002) é uma das que se

dedicam aos estudos sobre essa temática. Esse livro se divide em três partes. Quais

sejam: Parte 1 – Gênero e ensino, Parte 2 – Análise de gêneros acadêmicos e

institucionais e Parte 3 – Análise de textos midiáticos. Esse trabalho trata,

especificamente, de ensino e análise, a primeira parte aborda aspectos mais

teóricos, mais conceituais, e a segunda e a terceira analisa diferentes gêneros

acadêmicos e midiáticos, como resenha acadêmica, redação de vestibular, folder

bancário, cartas ao editor, cartas-pergunta, dentre outros.

Gêneros textuais: ensino e produção (2005) também aborda a mesma

temática, pois como o próprio título já revela trata do ensino de língua a partir dos

gêneros e nos dois últimos artigos isso fica evidente, pois ambos tratam de analisar

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gêneros. Um artigo se dedica à análise de notícias e o outro a de cartuns e crônicas,

ou seja, se empenham no procedimento de análise.

É sabido por grande parte dos pesquisadores e interessados pela temática

dos gêneros que para tratar desse assunto há uma necessidade de se retomar os

postulados bakhtinianos. Um dos textos mais conhecidos do autor sobre essa

temática é o “Os gêneros do discurso”, texto escrito entre 1951 e 1953 e publicado

em 1979. Esse é um capítulo da obra Estética da Criação Verbal, livro publicado em

1979.

Bakhtin inicia esse capítulo já comentando a respeito da ligação existente

entre os diferentes campos da atividade humana e o uso da linguagem. E, diante da

diversidade desses campos, o autor compreende que há também uma

multiformidade no uso da linguagem. Assim, ainda no primeiro parágrafo, ele afirma

que “o emprego da língua efetua-se em forma de enunciados concretos e únicos”

(BAKHTIN, 2006, p. 261) e que esses enunciados são compostos por conteúdo

temático, estilo e construção composicional, ou seja, já nas linhas iniciais de seu

texto fala sobre os gêneros do discurso, dos enunciados, desses “[...] tipos

relativamente estáveis [...].” (BAKHTIN, 2006, p. 262).

A partir de então, o autor fala da diversidade infinita dos gêneros e os

diferencia em primário e secundário. Segundo o autor, a questão dos gêneros

discursivos nunca tinha sido verdadeiramente colocada, pois os estudos de gêneros

destinavam-se, em sua maioria, à investigação dos gêneros literários e uma parte ao

estudo dos gêneros retóricos e cotidianos.

Quanto à diferenciação dos gêneros primários dos secundários, esses se

diferenciam de tal maneira que os primários são gêneros usados nas situações

cotidianas imediatas e os secundários são mais complexos e acabam por incorporar

e reelaborar os gêneros primários. Para Bakhtin (2006, p. 268), “os enunciados e

seus tipos [...] são correias de transmissão entre a história da sociedade e a história

da linguagem”, o gêneros são responsáveis tanto pela construção da história social

como também pelas modificações na língua, mudanças essas ocorridas

socialmente.

Sobre os estudos a respeito dos gêneros do discurso, Rojo (2005, p. 194)

afirma que

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Desafortunadamente no Brasil – como alhures – o texto de Bakhtin mais conhecido, lido e citado, quando se fala de gêneros, é, sem dúvida, Os gêneros do discurso de 1953, publicado, com seus inéditos póstumos, em 1979. No entanto, a idéia de uma releitura não-formalista do conceito de gêneros (nesse caso, literários) aparece na obra do círculo desde 1926 e, com certeza, já em 1929, em Bakhtin/Voloshinov, Marxismo e filosofia da linguagem.

No texto em que Rojo faz essa afirmação, ela também nos chama a atenção

para um conceito muito mais complexo do que o de “tipo relativamente estável de

enunciado”, conceito esse mais plural, que se relaciona com o conceito de

dialogismo, heteroglossia, cronotopos, plurilinguísmos, hibridismos, de forma que “a

noção bakhtiniana de gênero do discurso seja colocada, de uma vez por todas,

como um objeto discursivo ou enunciativo, e não como uma forma ou tipo, palavras

infelizmente escolhidas por Bakhtin [...]. (ROJO, 2005, p. 196).

Outro ponto a ser considerado também é que, além de o conceito de gênero

aparecer em Marxismo e filosofia da linguagem, no livro Estética da criação verbal,

mais especificamente no capítulo “O enunciado como unidade de comunicação

discursiva. Diferença entre essa unidade e as unidades da língua (palavras e

orações)”, também há uma complementação à compreensão desse conceito, pois

nesse capítulo o autor apresenta o enunciado como elo na cadeia enunciativa, fala

sobre a escolha dos gêneros determinada pelo campo da comunicação discursiva e

também pela intencionalidade do falante.

Além disso, o autor afirma que

Falamos apenas através de determinados gêneros do discurso, isto é, todos os nossos enunciados possuem formas relativamente estáveis e típicas de construção do todo. Dispomos de um rico repertório de gêneros de discursos orais (e escritos). Em termos práticos, nós os empregamos de forma segura e habilidosa, mas em termos teóricos podemos desconhecer inteiramente a sua existência. (BAKHTIN, 2006, p. 282).

O uso dos gêneros discursivos é o uso da linguagem, pois não podemos usar

a linguagem sem que essa esteja configurada em gêneros. E, mesmo sem ter essa

consciência, os empregamos livremente e temos um repertório ilimitado deles,

repertório esse que nos permite interagir com o mundo por meio da linguagem.

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Como pode ser visto no discurso bakhtiniano, não é apenas em um

determinado capítulo que o autor versará sobre essa temática, pois os gêneros são

retomados em distintas partes da obra bakhtiniana. Em outro momento desse

capítulo sobre o enunciado, o autor fala que se não fosse os gêneros e se nós não

os dominássemos não haveria comunicação, pois para ele “[...] é preciso dominar

bem os gêneros para empregá-los livremente.” (BAKHTIN, 2006, p. 284).

Esse domínio dos gêneros não se configura como um poder exercido pelo

interlocutor sobre essa prática. É, sim, uma relação de conhecimento, de saber o

que é, como se configura e como e quando usá-los de maneira adequada. A relação

do sujeito com os gêneros é uma relação dele com a linguagem, ou seja, ele se

constitui pela linguagem, mas também é constituído por ela. O sujeito é constituinte

do gênero, pois não há gênero sem um locutor/autor, não existe gênero sem quem o

utilize. Em contrapartida, esse sujeito produtor é também interlocutor, haja vista que

a linguagem é sempre produzida direcionada a alguém, um gênero sempre está

direcionado a um interlocutor, que por sua vez é também locutor.

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3 A FORMAÇÃO DE PROFESSORES E OS SABERES DOCENTES

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Como professor crítico, sou um “aventureiro” responsável, predisposto à mudança, à aceitação do diferente.

Paulo Freire

A formação docente vem sendo estudada há algum tempo sob diversas

perspectivas. Desde a caracterização do professor enquanto profissional, até a

constituição dos saberes que esses têm e como se utilizam deles.

Numa perspectiva histórica, é possível observar que a profissão de professor

já sofreu diversas modificações. Do surgimento da profissão até os dias atuais é

possível perceber o quanto a própria definição de o que é ser professor tem sido

alterada. O fato é que já foram percorridos muitos caminhos até se chegar à atual

concepção sobre o profissional professor e sobre a profissão docente. Somente na

atualidade é que se chegou à compreensão de que esse profissional tem

especificidade de saberes e de atribuições para o desenvolvimento de sua profissão.

3.1 PROFISSÃO DOCENTE: OS SABERES

Fazer uma classificação do saber docente não é uma tarefa que pode ser

desenvolvida com muita facilidade. Sobre essa temática, um questionamento surge

imediatamente: é possível dizer que há apenas um tipo de saber que norteia o

professor em sua atuação em sala de aula? Tardif (2010, p. 9) não pergunta se há

um tipo, um saber apenas. Esse autor lista dez questionamentos em torno dos

saberes docentes na introdução do livro Saberes docentes e formação profissional

(2010). Nesses questionamentos, o autor não pergunta qual é o saber do professor

ou se existe apenas um, pergunta “Quais são os saberes docentes que servem de

base ao ofício de professor?” (p. 9). Isso implica afirmar que não há um saber

orientador da docência, mas um conjunto de saberes.

Segundo esse autor, o professor não decide sozinho o seu saber profissional,

haja vista que esse saber é produzido socialmente e é resultante de negociações

entre grupos. Assim, “o que um „professor deve saber ensinar‟ não constitui, acima

de tudo, um problema cognitivo ou epistemológico, mas sim uma questão social [...]‟

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(TARDIF, 2010, p. 13), pois os saberes não são estanques e mudam

constantemente. Tardif (2010) afirma que não se constitui um problema cognitivo ou

epistemológico o que deverá ser ensinado pelo docente, pois o que será ensinado é

determinado pelo social. No entanto, sabemos que qualquer que seja a prática de

sala de aula, essa será embasada em uma determinada epistemologia, afinal nada

acontece no vazio e toda prática contém uma orientação teórica. Tal orientação não

está posta desde sempre e sofre alterações de acordo com as necessidades da

sociedade.

Nesse contexto de mudanças, esta pesquisa investiga se os professores já

aderiram aos saberes mais atuais acerca do ensino de Língua Portuguesa, ou se

permanecem nos moldes tradicionais, no uso apenas da metalinguagem como base

do ensino.

É em meio à produção constante de conhecimento, às novas descobertas e

às novas perspectivas de ensino que se encontra o professor, sujeito desta

pesquisa, e esta investigação, pois se os conhecimentos mudam, os saberes

necessários à docência também se modificam.

Por isso, no âmbito da organização do trabalho escolar, o que um professor sabe depende também daquilo que ele não sabe, daquilo que se supõe que ele não saiba, daquilo que os outros sabem em seu lugar e em seu nome, dos saberes que os outros lhe impõem ou lhe atribuem. (TARDIF, 2010, p. 13).

O professor não está só para decidir o que deverá saber, mas é sujeito de

uma estrutura que decide o que, diante de tantos conhecimentos, deve ser

ensinado. E, por esse motivo, esse profissional tem um papel relevante diante do

contexto educacional, ele é quem dá a palavra final, é quem determina o que fará

em sala, se seguirá ou não determinações.

A prática docente é permeada por diversas condições de produção de

saberes e fontes de conhecimentos. Além disso, o professor não é um profissional

que adentra uma sala de aula apenas par executar uma determinada tarefa. Ele é

um profissional que realiza uma aula, ministra um conteúdo, mas tudo isso em um

contexto no qual há uma relação entre sujeitos, alunos com alunos e alunos com

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professor. O docente é o responsável pelo processo de ensinagem3 e, assim,

“Ensinar é agir com outros seres humanos; é saber agir com outros seres humanos

que sabem que lhes ensino; é saber que ensino a outros seres humanos que sabem

que sou professor” (TARDIF, 2010, p. 13).

Entretanto, ensinar não é somente isso. Poderíamos acrescentar a essa

definição de o que seria ensinar, segundo Tardif, que ensinar é saber o que ensino

ao outro e para qual objetivo esse saber é ensinado. A definição de o que seria

ensinar não se esgota com essa acepção, mas vemos que a conceituação do

ensinar passa pelo agir com outros, pela conscientização desses outros em relação

à constituição do professor enquanto profissional e também pelos elementos que

juntos compõem o educador, elementos esses que pensamos nesta dissertação

como saberes.

Na prática docente há uma diversidade de saberes e, dentre esses, queremos

destacar aqueles que se configurariam como saberes “impostos”, como os presentes

nos PCN. Não estamos tratando de imposição no sentido de ordem, até porque esse

seria um tema que possibilitaria uma outra dissertação, mas pensamos “imposição”

no sentido de organização do ensino, de parâmetro a ser seguido. Os PCN indicam

que a atuação docente deve ser realizada numa perspectiva que possibilite o

desenvolvimento integral dos discentes, proporcionando a reflexão sobre a

linguagem e seus usos.

Para que seja possível essa intervenção do professor, alguns saberes se

tornam imprescindíveis. Tardif (2010) afirma que os saberes dos professores são os

saberes deles e por esse motivo são impregnados de subjetividade, pois são

construídos durante a vida desse profissional, durante o desenvolvimento individual,

social e histórico da pessoa que se profissionaliza como docente. Esse autor indica

que é possível definir o saber docente como um saber plural, constituído, pelo

amálgama, mais ou menos coerente, de saberes advindos da formação profissional

e de saberes disciplinares, curriculares e experienciais. (TARDIF, 2010). Esses

saberes listados por Tardif (2010) aparecem em outros autores com nomes

diferentes e com conceitos semelhantes. Dessa forma, passemos a uma breve

3 Termo usado para indicar prática social complexa efetivada entre os sujeitos do processo ensino

aprendizagem, professor e aluno, que engloba tanto a ação de ensinar quanto a de aprender.

(ANASTASIO, 2011).

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retomada de como se organizou e se organiza os saberes nos curso de formação

docente, quais são e para que sevem os saberes desses profissionais.

3.1.1 Os saberes da formação

O processo de formação docente tem levantado muitos questionamentos

sobre quais os saberes que devem ser enfatizados, quais devem ser mais bem

explorados na formação inicial para que ao fim dessa etapa aconteça uma formação

integral desse sujeito, cuja função social será formar cidadãos.

A formação inicial dos professores já passou por diferentes etapas e

configurações. Afinal, em diferentes momentos da história, deu-se ênfase a um

determinado tipo de saber. Segundo Lima (2004, p. 15), é possível distinguir, do

curso de Pedagogia, três fases, quais sejam:

[...] a primeira vai do seu nascimento em 1939, na Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade do Brasil até a Lei nº 5.540 (Brasil, 1968) – mais conhecida como “Reforma Universitária”; a segunda, da Lei nº 5.540 até a LDB, instituída pela Lei nº 9.394 (Brasil, 1996), e a terceira, dessa época até os dias atuais.

Na primeira fase, segundo a autora (1999 apud LIMA, 2004, p. 16), o curso

era organizado em duas etapas constituídas da seguinte forma: três anos pra

formação do bacharel e mais um ano de estudos de didática para formação do

licenciado nas disciplinas que formavam o curso de bacharelado. A segunda fase foi

o momento da instituição de habilitações profissionais, pois a partir de um

determinado momento do curso, os alunos optavam em se especializar em uma

determinada área do trabalho escolar. Ou seja, essas duas etapas da formação

inicial do pedagogo tinham como base o domínio dos conteúdos das disciplinas e da

técnica para transmiti-los. (LIMA, 2004)

Essa formação era considerada como fragmentada, haja vista que na primeira

fase preparava-se o bacharel para somente depois formar o licenciado e na segunda

a formação se dava de acordo com as funções a ser desenvolvidas na escola, tais

como docência, supervisão, administração, orientação escolar, dentre outras. (LIMA,

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2004) Nessas etapas não havia a preocupação de uma formação integral do

professor, havia uma ênfase na formação especializada do profissional.

Segundo Lima (2004, p. 16), essas duas fases do curso foram influenciadas

pelo paradigma da racionalidade técnica, no qual o conhecimento científico era visto

como nocional e imutável, “[...] o saber escolar estritamente como conjunto de

conhecimentos eruditos, valorizados pela humanidade [...]”. Dessa forma, ao

profissional em formação, cabia “saber” e “transferir”.

A terceira fase do curso foi iniciada em 1996 e se estende até os dias atuais.

Essa é caracterizada pela substituição da concepção de conhecimento científico

como nocional e imutável pela compreensão de que o homem e sua interação com o

meio e com os outros homens é responsável pela construção do conhecimento. De

acordo com Lima (2004, p. 17)

Tal mudança vem acompanhada de outras, principalmente as referentes ao papel da escola e à concepção de conhecimento escolar, de profissão docente e de formação de professores. A demanda das classes populares pela instituição escolar mudou o sentido outrora atribuído à educação para a vida. São outras vidas que agora correm à escola – além daquelas oriundas das classes média e alta, clientela por excelência dos períodos anteriores -, exigindo um novo projeto que atenda a essas diferentes vidas e que tenha, portanto, como norte, a superação das desigualdades sociais.

Dessa forma, a formação do profissional não poderia mais ser pautada em

conhecimentos absolutos e em saberes irrefutáveis, pois dele passou a ser, a partir

de então, exigida a compreensão de que o conhecimento está sempre em

construção –não é mais imutável –; a análise da educação como um compromisso

político, carregado de valores éticos e morais; a consideração sobre o

desenvolvimento da pessoa e a colaboração entre iguais; além da capacidade de

conviver com a mudança e com a incerteza. (LIMA, 2004)

Assim, a formação do professor não poderia continuar ajustada a um aparato

de conhecimentos e de técnicas de ensino. Essa formação passou a estar atrelada a

um aprender a ser professor, a um conjunto de saberes que constituem esse

profissional enquanto docente que desenvolve sua prática de maneira competente e

reflexiva. Essa formação diz respeito também a uma compreensão de que sua

formação é um continuum, ou seja, uma formação que não se dará apenas no curso

de formação inicial, mas se estenderá durante sua vida.

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Nesse sentido, os saberes da formação profissional são aqueles relacionados

às ciências da educação e da pedagogia. São os conhecimentos mediados pelas

instituições de formação de professores, como as escolas normais e as faculdades

de ciências da educação, mas também são saberes que emergem da vida cotidiana

em sala de aula, saberes esses que são formulados na prática docente. Tais

saberes são divididos por Tardif (2010), como saberes curriculares, saberes

experienciais, e saberes disciplinares. Passemos aos saberes caracterizados por

Tradif (2010), considerando também as contribuições de outros autores.

3.1.1.1 Os saberes curriculares

A palavra currículo contempla, em pedagogia, não apenas o que conhecemos

cotidianamente e que chamamos de estrutura curricular. Ela diz respeito à

organização do processo ensino-aprendizagem de modo que define abordagens,

formas de ensinar e conteúdos a ser trabalhados nas salas de aula pelos

professores.

Os saberes curriculares estão relacionados aos discursos, objetivos,

conteúdos e métodos por meio dos quais a instituição escolar categoriza os saberes

sociais. Segundo Tardif (2010, p. 38), esses saberes se apresentam “concretamente

sob a forma de programas escolares (objetivos, conteúdos e métodos) que os

professores devem aprender”.

São saberes muito específicos da profissão e do contexto escolar. Em todos

os três momentos da formação docente, apresentados anteriormente, esses saberes

se fizeram presentes, pois estão relacionados às atividades cotidianas da escola.

Esses estão relacionados a como se constitui um plano de aula, um plano de ensino,

um projeto político pedagógico dentre outros gêneros que circulam no contexto

escolar.

Tais saberes estiveram e estão muito presentes na formação inicial do

pedagogo em virtude da necessidade da preparação de um profissional que tenha

um saber sobre currículo, ensino e organização da escola. Para Shulman (1986, p.

9-10 apud MONTEIRO, 2011), o conhecimento curricular “é o conjunto de

programas elaborados para o ensino de assuntos específicos e tópicos em um nível

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dado, a variedades de materiais instrucionais disponíveis relacionados a estes

programas”.

3.1.1.2 Os saberes experienciais

Os saberes experienciais são aqueles desenvolvidos pelo professor no

exercício da profissão, ou seja, “esses saberes brotam da experiência e por ela são

validados” (TARDIF, 2010, p. 39). E, assim, incorporam-se à experiência individual e

coletiva caracterizando-se como o saber-fazer e o saber-ser. Esse é, talvez, o tipo

de saber mais valorizado pelos profissionais. Isso porque, para eles esse saber é

decisivo para a prática docente e sem ele tal atividade se torna inexequível.

Tardif (2010) aponta algumas características do saber experiencial. Para ele,

esse “é um saber ligado às funções dos professores, e através dessas funções que

ele é mobilizado, modelado, adquirido”, pois é o saber que é ativado em uma prática,

mas também é moldado por ela, “é um saber prático, ou seja, sua utilização

depende de sua adequação às funções, problemas e situações peculiares ao

trabalho”. (TARDIF, 2010, p. 109).

É em virtude dessa ligação às funções do professor e da adequação dele às

situações do cotidiano desse profissional que esse saber se configura como

interativo, haja vista ser concebido tendo como base a interação do professor com

outros sujeitos participantes do processo educativo.

Dentre as características atribuídas por Tardif (2010) a esse saber, é possível

dizer que ele é “sincrético”, “heterogêneo”, “existencial” dentre outras. Tal saber se

configura como sincrético, em virtude de estar colocado sobre diversos

conhecimentos e de um saber-fazer que se mobiliza e é usado de acordo com o que

demanda a prática profissional. É heterogêneo porque se constitui a partir de fontes,

lugares e momentos diversos, ou seja, é adquirido durante a vida, carreira ou

mesmo no decorrer da experiência de trabalho. O fato de estar ligado à vida, à

história do professor, faz com que ele seja existencial. Assim, esse saber não se

apresenta como um saber simples, mas complexo, como um amálgama constituído

por muitos saberes e de diferentes origens.

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3.1.1.3 Os saberes disciplinares

Para Tardif (2010), os saberes disciplinares são aqueles que, como seu

próprio nome já explicita, correspondem aos diferentes campos do conhecimento e

são disponibilizados pelas instituições educacionais por meio de disciplinas

específicas, por exemplo, Matemática, Literatura, Língua Portuguesa, dentre outras.

Para Tardif, esse tipo de saber é incorporado à prática do professor, no entanto, não

é um saber produzido e nem legitimado por ela.

Segundo esse autor,

A relação que os professores mantêm com os saberes é de “transmissores”, de “portadores” ou de “objetos” de saber, mas não de produtores de um saber ou de saberes que poderiam impor como instância de legitimação social de sua função e como espaço de verdade de sua prática. Noutras palavras, a função docente se define em relação aos outros saberes, mas parece incapaz de definir um saber produzido ou controlado pelos que a exercem. (TARDIF, 2010, p. 40).

Para o autor, os saberes disciplinares são postos aos professores e não

construídos por eles. São saberes que não são selecionados pelos docentes, são

apenas executados por esse profissionais. Dessa forma, podemos dizer que os

currículos escolares são revistos, reelaborados, redimensionados ao passo que

surgem novas abordagens teóricas, novos saberes. No entanto, ao professor,

caberia apenas uma constante busca pelos saberes mais atualizados, pois suas

aulas devem se adequar às atuais expectativas, às abordagens teóricas em

evidência, ou seja, estar em constante adequação às atualidades.

Tardif (2010) nomeia um dos saberes docentes como disciplinar, mas não

desenvolve muito claramente como esses saberes estão presentes na formação

profissional desses docentes, nem como esses profissionais se relacionam com

eles. Para tratarmos dessa especificidade do saber disciplinar, levaremos em

consideração o que nos explica Shulman (apud MONTEIRO, ano) a respeito da

disciplinarização dos saberes. Segundo esse autor, há, na escola, uma organização

dos conteúdos em disciplinas os quais devem ser trabalhados no cotidiano escolar.

Essa disciplinarização diz respeito à separação dos conteúdos a ser trabalhados em

sala de aula nas diversas disciplinas.

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A preocupação com esse tipo de saber é mais freqüente em professores que

trabalham com disciplinas específicas, como Matemática, Biologia, Língua

Portuguesa, dentre outras. Tal preocupação não se mostra tão presente nos

professores polivalentes. Isso acontece, talvez, em virtude da diversidade de

saberes com os quais esse professor tem contato. Diversidade que é uma

característica marcante desse docente, já que não ensina uma disciplina específica,

mas várias.

Entre essa variedade de disciplinas com a quais o professor polivalente

trabalha, está a que trabalha com a linguagem, a disciplina de Língua Portuguesa

que traz nos PCN cerca de dez objetivos a ser alcançados pelos alunos ainda no

Ensino Fundamental. Além desses objetivos, há também uma listagem de conteúdos

que devem ser trabalhados (saberes curriculares), ou melhor, no dizer de Shulman

(1986 apud BORGES, 2010), didatizados.

Shulman acredita que esses profissionais devem saber os conteúdos das

disciplinas de modo que sejam capazes de didatizá-los. A didatização, para esse

autor, diz respeito à capacidade de o professor tornar tais conteúdos em algo

ensinável, compreensível, ou seja, em um saber capaz de ser aprendido. Dessa

forma, o professor precisa saber a respeito do tema que tratará em suas aulas de tal

maneira que possa tornar esse saber apreensível.

Shulman (1986 apud BORGES, 2010), ao tratar dessa didatização dos

saberes referentes às disciplinas, convenciona chamar essa pratica de

“conhecimento pedagogizado da matéria”. Isto é, ao professor cabe saber os

conhecimentos de sua disciplina para poder organizá-los de maneira que possam

ser compreendidos pelos discentes. A partir dessa concepção de Shulman, os

saberes disciplinares “didatizados pelo professor” passam a ser saberes

reformulados, se tornam saberes transformados em ouros saberes, em saberes

pedagogizados.

Para Shulman (1986 apud BORGES, 2010), há três tipos de categorias de

conhecimento de conteúdo que se desenvolvem nos professores, são eles:

conhecimento do conteúdo da matéria ensinada, conhecimento dos conteúdos

pedagogizados e conhecimento curricular. Nesta parte do texto trataremos apenas

dos dois primeiro, haja vista que já abordamos o terceiro em um tópico anterior.

O conhecimento construído da matéria diz respeito ao saber do professor

sobre o conhecimento a ser abordado.

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Mais do que saber, é preciso compreender a matéria que vai ser ensinada para se poder criar formas para o seu ensino. Além disso, a maneira como essa compreensão é comunicada, faz os alunos perceberem o que é essencial e o que é periférico de tudo aquilo que é ensinado, o que é verdadeiro e válido no campo, bem como expressa um conjunto de atitudes e valores que influenciam a compreensão dos alunos. (MONTEIRO, 2011)

O conhecimento construído da matéria pode ser considerado a base do

conhecimento dos conteúdos pedagogizados, que

é um segundo tipo de conhecimento de conteúdo que vai além do conhecimento da matéria do assunto por si mesma, para a dimensão do conhecimento da matéria do assunto para ensinar. Inclui as formas mais comuns de representação das idéias, as analogias mais poderosas, as ilustrações, os exemplos, explicações e demonstrações, ou seja, os modos de representar e formular o assunto de forma a torná-lo compreensível para os outros. Inclui também aquilo que faz a aprendizagem de um determinado assunto fácil ou difícil, possível. (MONTEIRO, 2011)

Sobre os conteúdos pedagogizados, é possível afirmar que não se

configuram como técnicas de ensino, pois são construções pautadas em um domínio

do conteúdo disciplinar. Esse saber não se configura como técnica porque é sempre

reelaborado à medida que é ensinado.

3.2 FORMAÇÃO E SABERES EM PUBLICAÇÕES

Os trabalhos voltados para a investigação da formação docente, mais

especificamente sobre os saberes docentes, têm ganhado proporção na medida em

que são questionadas a prática docente e os saberes do profissional professor. Tais

questionamentos dizem respeito tanto ao processo de formação do professor,

quanto à constituição dos saberes usados por ele na prática cotidiana.

Internacionalmente, essa temática surgiu nas décadas de 1980 e 1990, mas no

Brasil isso só ocorreu a partir da década de 1990. Ou seja,

Nesse período, inicia-se o desenvolvimento de pesquisas que, considerando a complexidade da prática pedagógica e dos saberes docentes, buscam resgatar o papel do professor, destacando a importância de se pensar a formação numa abordagem que vá além da acadêmica, envolvendo o desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional da profissão docente. (NUNES, 2001, p. 27)

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Na pesquisa realizada em periódicos on-line, foi possível observar que essa

temática ainda está muito presente em periódicos vinculados à área de Educação,

pois só encontramos investigações a esse respeito nos periódicos Revista

Educação, Educação e Pesquisa e Educação & Sociedade.

3.2.1 Revista Educação

Na Revista Educação encontramos três publicações sobre a temática

“saberes docentes e formação de professores”, duas no ano de 2004 e uma no ano

de 2008. Os artigos publicados em 2004 são “Saberes docentes de um novo tipo de

formação profissional do professor: alguns apontamentos”, de Leite e Di Giorgi; e

“Imaginário, representações sociais e formação de professores (as): entre saberes e

fazeres pedagógicos”, de Antunes, Barcelos e Oliveira.

Leite e Di Giorgi (2004), em seu artigo, têm como propósito discutir a

formação docente, ou seja, a formação do professor e seus saberes. No primeiro

momento, os autores retomam rapidamente a temática da escola pública e dos

problemas que enfrenta essa instituição, além das novas atribuições a ela

conferidas. A partir das problemáticas que envolvem a escola, os autores discutem a

formação de professores, profissional a quem se atribui grande parte da

responsabilidade do insucesso escolar.

O problema da formação de professores, quando se fala das reformas educacionais tem o papel de mordomo, nas histórias de detetives sempre se acaba encontrando esse culpado por suas dificuldades ou insucesso. Quando ela não dá certo ou fica emperrada, atribui-se aos professores essa situação. Essa postura é internacional e no Brasil não se foge a essa norma. (KRASILCHIK, 2001 apud LEITE; DI GIORGI, 2004)

A partir dessa problemática, Leite e Di Giorgi (2004) defendem que ao

professor não deve ser atribuída toda a culpa do problema da educação e aponta

que a formação desse profissional deve ser redimensionada, pois “os cursos de

formação de professores devem possibilitar aos docentes, antes de tudo, superar o

modelo da racionalidade técnica para lhes assegurar a base reflexiva da sua

formação profissional [...]” (LEITE; DI GIORGI, 2004).

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Dessa forma, é indispensável oferecer aos professores uma formação que

proporcione ao docente a compreensão do processo de formação do aluno sob

diferentes perspectivas: cognitiva, afetiva, ética, estética, dentre outras. No entanto,

isso só será possível se houver uma mudança na formação do professor. Segundo

os autores, “se esta mudança não é suficiente, ela é certamente necessária” (LEITE;

DI GIORGI, 2004).

Assim, eles indicam que atualmente tanto o papel da escola quanto o do

professor passou por um processo de ressignificação, pois à escola não compete

somente ensinar a ler, escrever e a contar, é dever dessa instituição também ensinar

a tolerar, a respeitar a diversidade, a coexistir, a pensar, dentre outras competências

que os alunos devem desenvolver. Portanto, o papel do professor também mudou, e

com essa mudança há a diversificação dos saberes docentes necessários para o

desenvolvimento profissional.

Antunes, Oliveira e Barcelos (2004), no artigo “Imaginário, representações

sociais e formação de professores (as): entre saberes e fazeres”, estabelecem um

diálogo entre as teorias do imaginário e a formação de professores. Os autores

fazem uma exposição, no primeiro momento, sobre o que seriam as teorias do

imaginário e como elas ajudam na formação docente. Para eles,

Desenvolver a capacidade de criar e inventar é uma forma de colaborar com o fortalecimento da sociedade instituinte. Entretanto, é facilmente perceptível que a fantasia, o lúdico e a imaginação encontram-se cada vez mais distantes dos cursos de formação de professores. O que ainda predomina nas Instituições de Ensino Superior são as imagens de um local onde só o professor fala e ao aluno cabe tão somente ouvir. (ANTUNES; OLIVEIRA; BARCELOS, 2004)

Dessa forma, os autores apontam que

O conhecimento dos imaginários, dos sonhos, dos desejos, das fantasias dos(as) alunos(as) com relação aos processos formativos de Ensino Superior permitirá conhecer o sentido que a instituição possui para esses sujeitos. A necessidade do entendimento de suas falas, desenhos, olhares, gestos, pinturas, manifestações escritas e não ditas fundamentam-se no preceito de que sentidos “são construídos em confrontos de relações que são sócio-historicamente fundadas e permeadas pelas relações de poder com seus jogos imaginários”. (ORLANDI, 1998, p. 103). (ANTUNES; OLIVEIRA; BARCELOS, 2004).

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E, a partir de pesquisas que trabalham narrativas de professores, os

pesquisadores observam que esse tipo de investigação possibilita a ampliação dos

conhecimentos do processo contínuo e permanente do tornar-se professor.

Já o artigo “Construindo conhecimento em Educação de Jovens e Adultos

(EJA) integrada à educação profissional - saberes coletivos de uma rede de

pesquisadores”, de Machado, Alves e Oliveira (2008), trata de uma pesquisa a

respeito do processo de criação e construção de redes de pesquisadores que

trabalham com a Educação de Jovens e Adultos (EJA).

3.2.2 Educação e Pesquisa

Na revista Educação e Pesquisa encontramos três publicações, duas em

2007 e uma em 2008. Os artigos de 2007 são: “Saberes docentes e formação inicial

de professores: implicações e desafios para as propostas de formação”, de Almeida

e Biajone; e “Apropriação e mobilização de saberes na prática pedagógica:

contribuição para a formação de professores”, de Zibetti e Souza.

O artigo de Almeida e Biajone (2007) discute as implicações das pesquisas

sobre os saberes base para a formação inicial de professores. Para isso, os

pesquisadores analisam obras de autores como Tardif, Gauthier e Shulman. Ao

tratarem dos saberes docentes, eles abordam as concepções e as tipologias

trabalhadas pelos autores de referência e destacam que todos se dedicam a

investigar a mobilização dos saberes nas ações dos professores.

Para os autores, Gauthier procura construir uma teoria geral da pedagogia;

Tardif investiga a epistemologia da prática profissional dos professores, enfatizando

o trabalho docente; e Shulman pesquisa os conhecimentos que os professores têm

acerca dos conteúdos de ensino e o modo como esses se transformam no ensino.

Por fim, eles propõem que “[...] os cursos de formação inicial em parceria com os

professores de profissão promovam novas práticas, estágios de longa duração,

memória profissional, análise reflexiva, problematizações.” (ALMEIDA; BIAJONE,

2007), proposta essa que permeia a maioria das pesquisas que têm como objeto a

formação docente.

Zibetti e Souza (2007), a partir da temática dos saberes docentes, visam

introduzir os elementos “historicidade” e “dialogicidade” na análise realizada com o

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intuito de inserir essas categorias nos estudos referentes aos saberes de

professores. Nessa perspectiva, as autoras defendem que todo saber é construído

no cotidiano, situado historicamente e dialoga com os demais saberes.

Assim, considerando os estudos sobre os saberes docentes na perspectiva

do saber cotidiano, Zibetti e Souza retomam os estudos realizados por Rockwell e

Mercado (1986) e Mercado (1991; 2001), que se embasam em Agnes Heller sobre a

natureza e as características do saber cotidiano, e inserem a historicidade e a

dialogicidade em sua pesquisa, pois

Ao referirem-se às experiências diárias da docência, os professores destacam as marcas oriundas de diferentes épocas de sua formação ou vivencia profissional, apontando o diálogo que estabelecem entre suas percepções individuais e as linhas de pensamento provenientes de diferentes fontes. (ZIBETTI; SOUZA, 2007).

Ou seja, para as autoras, há uma constante produção de conhecimento por

parte dos professores em suas experiências profissionais diárias, o que torna

indispensável considerar a historicidade e a dialogicidade na análise desses

saberes.

O artigo do ano de 2008, encontrado na revista Educação e Pesquisa, tem

como título “Entre a lógica da formação e a lógica das práticas: a mediação dos

saberes pedagógicos”. Nesse texto, Franco (2008) procura destacar as diferentes

lógicas, a “lógica da formação” da “lógica da prática”. E, assim, discute como elas se

configuram na atualidade. No tópico “A lógica das práticas”, a autora discute a

prática não como procedimentos didático-metodológicos usados pelo professor,

pois, para ela, essa lógica não é aplicação de técnicas, mas passa pelo

posicionamento escolhido pelo professor a partir do lugar que ocupa.

As práticas estão ligadas ao social, à responsividade desse professor no

mundo. Isso porque “A lógica da prática só começa a ser desvelada a partir da

consideração desse lugar que o docente escolheu ou foi acolhido para ocupar.”

(FRANCO, 2008).

No tópico “A lógica da formação”, a autora critica os modelos pautados na

separação da teoria da prática. Para ela, não é possível separá-las, pois estão

imbricadas. Um dos problemas a respeito da lógica da formação apontados pela

autora é que a dificuldade encontra-se na constituição da lógica da formação a partir

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de interesses e problemas ligados às práticas institucionais acadêmicas, que não

têm relação com as necessidades do exercício cotidiano do ensino ou que não têm

muita repercussão sobre elas. (FRANCO, 2008).

Além das duas lógicas, a autora trata dos saberes pedagógicos e dos saberes

da formação. Ao diferenciar esses saberes, ela diferencia o “fazer” do “saber”. Para

ela, o fazer é constituído por técnicas e o saber “implica no exercício de uma prática

reflexiva, comprometida, com sentido, com intencionalidade”. (FRANCO, 2008).

Com relação aos saberes da formação, Franco (2008) trata da preocupação

constante dos professores-formadores em como formar professores

que saibam construir, no processo da prática, saberes docentes e, mais que isso, como formar docentes que saibam mobilizar os conhecimentos pedagógicos na transformação de suas práticas e dos próprios saberes que vão sendo percebidos como ultrapassados ou inadequados para algumas situações. (FRANCO, 2008).

Para essa autora, esse processo formativo só pode se concretizar a partir de

uma estruturação da experiência formativa que não se preocupe apenas com

teorias, mas coloque o sujeito em contato diretamente com a realidade, ou seja,

coloque os sujeitos “em processos de diálogos com a realidade, diálogos formativos

com sua própria identidade, diálogos que formarão capacidades de reelaboração

reflexiva a partir das contradições da existencia vivenciada.” (FRANCO, 2008). Pois,

será por meio dessa inserção no ambiente escolar que o profissional terá contato

com a realidade de sua profissão.

3.2.3 Educação & Sociedade

No periódico Educação & Sociedade, encontramos cinco artigos a respeito da

formação e dos saberes do professor publicados nos anos 2000 e 2001. No ano de

2000, há um artigo escrito por Tardif e Raymond intitulado “Saberes, tempo e

aprendizagem do trabalho no magistério”. Nesse texto os autores tratam da relação

existente entre o tempo, o trabalho e a aprendizagem dos saberes profissionais dos

professores. Esse artigo compõe o livro Saberes docentes & Formação profissional,

obra que trataremos mais adiante.

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Os textos de 2001 são: “Professores: entre saberes e práticas”, de Monteiro;

“Saberes docentes: diferentes tipologias e classificações de um campo de pesquisa”,

de Borges; “Do ensino de conteúdos aos saberes do professor: mudança de idioma

pedagógico?, de Lelis; e “Saberes docentes e formação de professores: um breve

panorama da pesquisa brasileira”, de Nunes.

Em seu artigo, Monteiro (2001) discute as possibilidades teóricas

provenientes da articulação das categorias de análise “saber docente” e

“conhecimento escolar”. No primeiro momento do estudo, a autora faz uma análise

de proposições de autores que trabalham com a categoria “saber escolar”, e no

segundo momento analisa alguns estudos relacionados à categoria “saber docente”.

Em seguida, discute a articulação dessas propostas e conclui que “a articulação das

duas vertentes pode auxiliar a iluminação de aspectos ainda pouco conhecidos da

epistemologia da prática relativos à mobilização dos saberes e competências que

são ensinados e desenvolvidos na escola.” (MONTEIRO, 2001)

A publicação de Borges (2001) tem como objetivo colocar em evidência as

diferentes tipologias e classificações das pesquisas a respeito do ensino, da

docência e dos saberes docentes. Assim, ela apresenta no primeiro momento três

estudos que fazem, a seu ver, “um bom embasamento das pesquisas” a respeito de

sua temática de estudo. As três pesquisas destacadas por ela são a de Shulman,

Matin e Gauthier et al. Posteriormente, na apresentação ela faz uma reflexão sobre

as pesquisas apresentadas e finaliza afirmando que a repercussão no Brasil de

pesquisas realizadas em outros países não é um problema. Para ela a problemática

está na forma de transferibilidade que essas pesquisas assumem. Ou seja, as

pesquisas a serem realizadas no Brasil devem respeitar e se pautar na realidade do

país. Isso porque, caso contrário, “importa-se problemas, questões, metodologias

que, em alguns casos, muito pouco têm a ver com as questões e dilemas

educacionais presentes em nossa sociedade [...]”. (BORGES, 2001).

Lelis (2001), em seu texto, apresenta uma decifração de algumas tendências

na produção intelectual a respeito da formação de professores entre os anos de

1980 e 2000. Para tanto, toma autores como Saviani (1980), Fiorentini et al (1998),

Candau (1997), Tardif, Lessard e Lohaye (1998) para exemplificar pensamentos

marcantes a respeito do papel da teoria e da prática na formação do professor. Por

fim, a autora aponta alguns cuidados a serem tomados no processo de pesquisar.

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Um deles é o cuidado para não privilegiarmos em excesso a realidade intraescolar, o

microssocial, para que não percamos a referência do todo, do social.

Para finalizarmos as publicações desse periódico e dos demais, o artigo de

Nunes (2001) faz uma retomada das pesquisas sobre a formação docente e destaca

que essa perspectiva de pesquisa surge nas décadas de 1980 e 1990 no âmbito

internacional e na década de 1990 no Brasil. A autora inicia seu texto trazendo Tardif

(1999), Nóvoa (1992), Gauthier (1998), dentre outros, que orientam as pesquisas

realizadas no país, como Pimenta (1999), Fiorentini (1998), Guanieri (1997), ou seja,

pesquisas realizadas na década de 1990.

Assim, a autora constrói um panorama das pesquisas sobre essa temática e

conclui fazendo os seguintes questionamentos: “como são transformados os

saberes teóricos em saberes práticos? Existe um „conhecimento de base‟ a ser

considerado na formação do professor? Como é constituído o saber da experiência?

Teria ele uma maior „relevância‟ sobre os demais saberes?”. (NUNES, 2001, p. 39)

Esses questionamentos feitos por Nunes em 2001 parecem ainda pouco

tocados nos dias atuais, afinal ainda não foram respondidos completamente. Desse

modo, a nossa investigação procura contribuir para a ampliação desse quadro de

pesquisa, e, portanto, teórico. A partir da leitura dos resumos dos artigos publicados

acerca da temática da formação docente, não há nenhum que se aproxime de nossa

proposta. Primeiro, porque, ao analisarem a formação inicial dos professores em

Pedagogia e cursos afins, o aspecto teórico sobre o qual versam algumas pesquisas

compreende, na maioria das vezes, teorias relacionadas ao ensino e à

aprendizagem. Segundo, porque nenhuma das pesquisas trabalha com uma área

específica do conhecimento, como é o nosso caso. Nesta pesquisa, a formação dos

professores está sendo pesquisada, mas numa ótica específica, a aula de Língua

Portuguesa, mais precisamente, o trabalho com os gêneros do discurso.

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4 O “OUVIR” OS DADOS

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O falante não é um Adão bíblico, só relacionado com objetos virgens ainda não nomeados, aos quais dá nome pela primeira vez.

Bakhtin

Na pesquisa do tipo qualitativa predeterminar o viés de análise a ser realizada

antes mesmo da coleta dos dados pode prejudicar a compreensão do que de fato os

dados dizem, do que realmente emerge do objeto estudado. No entanto, ao se

pensar em desenvolver uma pesquisa, o planejamento das atividades a ser

desenvolvidas é imprescindível. Não é possível ao pesquisador anular-se totalmente

de maneira que sua formação teórico-metodológica não interfira no momento da

interpretação dos dados. Essa é uma questão atual nas discussões a respeito da

pesquisa qualitativa. Dentre as características que evidenciam esse tipo de

pesquisa, é possível destacar a atenção ao contexto no qual as experiências

humanas estão situadas e o seu caráter interpretativista.

“Uma característica fundamental dos estudos qualitativos é sua atenção ao

contexto4; a experiência humana se perfila e tem lugar em contextos particulares”

(ESTEBAN, 2010, 129). Nos estudos qualitativos, o contexto tem um papel

fundamental na interpretação dos dados, pois se analisados esses separadamente

de seu momento histórico a compreensão pode ser alterada, pode adquirir contornos

que não fazem parte da realidade pesquisada.

Outro traço que caracteriza a pesquisa qualitativa é o seu caráter

interpretativista. Segundo Esteban (2010), Eisner distingue dois sentidos para a

interpretação, um voltado para a abordagem teórica do pesquisador e outro voltado

para os próprios dados. Na primeira abordagem, o pesquisador “trata de justificar,

elaborar ou integrar em um marco teórico seus achados” (ESTEBAN, 2010, p. 129).

Nessa abordagem, a formação do pesquisador teórica e metodologicamente se

impõe aos dados. Na segunda abordagem, o objetivo é que as “pessoas estudadas

falem por si mesmas [...]”. (ESTEBAN, 2010, p. 129). Ou seja, nesse caso, o

pesquisador deixa os dados falarem para em seguida usar uma determinada teoria.

4 Grifo do autor.

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Esta pesquisa, entretanto, ocupa um lugar considerado como o entrelugar,

pois tanto considera a primeira abordagem como a segunda, haja vista que para o

seu desenvolvimento houve uma preparação teórico-metodológica, uma formação

acerca da perspectiva teórica que poderia servir como embasamento epistemológico

para as análises, mas também a partir dos estudos realizados no corpus foram

incorporados outros vieses de análise, outras perspectivas, outras teorias.

Este capítulo de análise dos dados se organizará da seguinte forma: primeiro

faremos um estudo da categoria do dizer, em seguida a do saber e, por fim, a do

fazer. Tais categorias não foram pré-determinadas à realização da pesquisa, mas

emergiram dos dados, pois em princípio a pesquisa propunha analisar somente o

saber, mas depois da realização das etapas de pesquisa e da análise dos dados as

categorias do dizer e do fazer se impuseram como fundamentais à compreensão do

todo.

4.1 O DIZER: UMA CATEGORIA EVIDENTE

Nesta categoria “O dizer”, trataremos dos discursos dos professores em

relação à formação inicial, mais especificamente sobre o que eles dizem a respeito

dos subsídios dados pela formação inicial ao trabalho com a linguagem em sala de

aula, mais especificamente sobre o trabalho com os gêneros do discurso, sobre a

definição do que são gêneros.

4.1.1 Sobre a formação inicial

Para realizarmos o que propomos para o primeiro momento, vejamos o que

nos diz cada professora a respeito de sua formação inicial para, em seguida,

analisarmos os que nos falam sobre os gêneros do discurso. Vejamos a primeira

pergunta que compõe o questionário/entrevista:

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1 Como você avalia hoje seu curso de graduação, em relação à sua prática em

sala de aula? Você considera que os conteúdos apresentados no curso de

graduação atendem ou pelo menos dão subsídios à sua prática docente? As

disciplinas que discutiram o ensino de língua materna deram alguma

contribuição para seu trabalho com a língua?

Esse primeiro questionamento teve o de objetivo analisar como o professor se

posiciona em relação à sua formação inicial. Nessa questão foi possível contemplar

o posicionamento crítico do professor em relação à sua formação inicial, tanto com

relação à formação geral, quanto à formação específica para o trabalho como a

Língua Portuguesa. Nas respostas a esse pergunta foi-nos possível observar que

uma parte dos profissionais considerou sua formação inicial como boa e a outra

parte a apreciou como inadequada ou pouco consistente.

A consistência ou não da formação desses profissionais, especificamente,

não se dará em virtude de suas respostas, mas essas são reflexões em relação a

“um constituir-se profissional”, reflexão essa imprescindível à formação do professor.

Para iniciarmos as análises, passemos à resposta dada pela Professora 1 sobre sua

formação inicial.

No período em que eu cursei Pedagogia (1993 – 1996) os conteúdos e as disciplinas voltados ao ensino de Língua Portuguesa eram extremamente insuficientes, muito voltados aos aspectos metodológicos semelhantes aos ensinamentos do curso de magistério do nível médio. Por exemplo, minha professora da disciplina “Ensino da Língua Portuguesa nos anos iniciais” trabalhou toda a disciplina com textos de um livro que trouxe de Minas Gerais. O livro era dividido em capítulos e estes tratavam dos gêneros discursivos mais trabalhados na época como: carta, bilhete, conto, etc. Além da referida disciplina cursamos Processos de Alfabetização 1 e 2 que nos ajudou a compreender os processos de aquisição da língua escrita. Contudo, penso que as discussões e nossa formação no que diz respeito ao ensino de língua materna foram insuficientes. (Professora 1)

No discurso dessa professora é possível observar uma avaliação não muito

positiva da formação dada pelo seu curso de graduação, pois ela considera que a

formação sobre o ensino da língua foi insuficiente, ou melhor, extremamente

insuficiente. Muito embora, ela tenha estabelecido um contato com a teoria dos

gêneros discursivos em um período quando eram mínimos os estudos que

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abordavam essa temática e que ainda não existiam publicações a esse respeito. O

que nos permite observar que provavelmente tal livro falado pela professora aainda

tratasse de tipos e não de gêneros.

Para ela, os conteúdos trabalhados não atenderam às demandas existentes

na aula de Língua Portuguesa, pois não acrescentando conhecimentos se igualava

às práticas metodológicas aprendidas ainda no curso de Magistério. Como veremos

mais adiante, essa professora diz saber o que são gêneros, mas afirma que tal

saber não veio especificamente da formação inicial, mas da permanente.

Corroborando com a Professora 1, a Professora 2 afirma que

O meu curso de graduação em relação a minha prática em sala de aula, considero que recebi muita pouca contribuição. Uma vez que, o curso de Magistério e Pedagogia se ver poucas disciplina de Língua Portuguesa, o que já é um agravante qdo enfrentamos a sala de aula. Outra coisa é realidade que enfrentamos qdo chegamos nas escolas. Crianças sem acompanhamento da família, chegando no quarto quinto ano sem saber ler, escrever e contar.

Durante o curso de graduação não somos preparados para a realidade das escolas pelo menos na minha época de graduação. [sic]

A professora demonstra insatisfação com o seu curso de graduação. Como

podemos ver, ela diz que foram poucas as contribuições dadas pelo curso em

relação ao ensino de Língua Portuguesa e também a respeito da formação do

profissional professor como um todo. No dizer da professora não há uma preparação

adequada do profissional no curso de graduação. Para ela, a realidade da

graduação não é a da escola. Essa afirmação toca em um ponto ainda não

apresentado pelas professoras, a realidade falada sobre a sala de aula e a realidade

efetivamente vivida na sala de aula, tema sobre o qual já existem algumas

publicações, como vimos na revisão de literatura referente aos saberes docentes.

Essa professora também aponta para outra problemática que é a questão

família e escola, e atribui o insucesso escolar ao fato de as crianças não serem

acompanhadas de maneira devida pelos familiares. Entretanto, a tal relação não se

pode atribuir ao fracasso escolar, pois esse não é resultado de apenas uma relação,

mas de um todo complexo no qual escola e família são apenas partes consideradas

por muitos como principais, mas que ainda não tomaram consciência disso.

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Ainda sobre a resposta dada pela Professora 2, é possível observar que ela

tenta modalizar seu discurso para não expor a sua insatisfação a respeito da

formação. Quando ela diz que recebeu muito pouca contribuição, pode-se

considerar que em nada tal formação contribuiu para uma prática consciente do

ensino de língua. Podemos ver a presença do “nada” oferecido pela formação inicial

dessa docente tanto no “muito pouca contribuição” quanto no momento em que diz

“se ver poucas disciplina de Língua Portuguesa” [sic]. Nessas construções, a

professora não diz de maneira direta que não foi preparada de forma adequada pela

graduação, e usa o “muito pouca” e “poucas” para demonstrar as contribuições

irrelevantes dadas pela formação sobre a aula de Língua Portuguesa.

Para a Professora 3, a questão da formação está ligada à dificuldade de

aprendizagem de “regras gramaticais”, da apropriação de uma metalinguagem

elaborada da língua. Isso porque, ao responder a Questão 1, ela tenta modalizar o

seu discurso em relação à sua formação, mas afirma que

Em parte sim, o curso de Pedagogia é composto em seu currículo de disciplinas práticas e as metodologias na área em questão porém a Língua Portuguesa ainda é vista como um dos idiomas mais difíceis e consequentemente o aprender se torna também complicado com todas as regras que à compõe. Posso afirmar que a cada dia aprendo mais em relação a nossa língua e que na verdade a prática é meu grande apoio. [sic]

Ao usar a expressão “Em parte sim”, a professora tenta amenizar o que diz

em seguida: que a língua é vista como difícil. E ainda completa que esse motivo é o

que dificulta a aprendizagem por parte dos alunos. Veja que a professora não vê a

língua como uma prática, mas como uma estrutura sobre a qual já se determinou um

grande número de regras que devem ser cumpridas.

Essa resposta da Professora 3 nos remete ao termo usado por Faraco (2006

apud FRANK; KERSCH, 2009) para apresentar a gramática, pois vista dessa

maneira ela pode realmente ser concebida como o “bicho-papão” que aterroriza

todos os sujeitos que falam a Língua Portuguesa.

Na verdade, o discurso da professora está pautado na crença de que a

Língua Portuguesa é difícil. Segundo o autor, tal percepção é construída ainda nos

bancos escolares quando a língua é trabalhada como “um conjunto de regras de

correção”, (2006 apud FRANK; KERSCH, 2009, p. 50). Dessa compreensão da

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língua “decorre o fato de passarmos a vida torturados por dúvidas sobre o que é

certo e o que é proibido dizer ou escrever em Língua Portuguesa”. (FRANK;

KERSCH, 2009, p. 50).

Esse saber da professora de conceber a aula de língua como aula de

metalinguagem não é apenas dela, pois durante muito tempo esse tipo de aula teve

como base a memorização de dezenas de nomes e de funções. Essa prática é

considerada como reducionista porque se prende ao estudo da palavra e da frase

descontextualizadas. Nessa perspectiva de ensino, os alunos não são levados a

refletir sobre o uso, mas a decorar nomes e regras, ou seja, não pensam sobre a

linguagem, pois se fosse a reflexão sobre a linguagem a base da aula de português,

eles seriam instigados a estudar a linguagem como forma de interagir socialmente.

A Professora 4 concorda com as duas primeiras, mesmo tentando apresentar

pontos positivos. Vejamos:

O curso de pedagogia apresenta propostas de conteúdos que servem para serem aplicados em sala de aula sem maiores problemas. Durante o 2º ano do curso, cada disciplina (história, geografia, Língua Portuguesa, matemática e ciências) havia um estágio obrigatório, o que ajudou bastante na relação: teoria-prática. Não foi dado ênfase ao ensino de língua materna. Apenas era citado em aulas nas discussões coletivas.

Se fosse para responder o conceito de língua materna só com os conhecimentos adquiridos na graduação, talvez muitos alunos tivesse dificuldades, inclusive eu. [sic]

Na resposta dessa professora, podemos perceber que há uma tentativa de

defender a formação inicial como forma de autodefesa, afinal se o professor é fruto

de uma formação não qualificada pode ser considerado como um profissional não

qualificado também. Vejamos que no fim da resposta dada, ela mesma se inclui no

grupo de pessoas que não saberiam dizer o que é língua materna. Nesse momento

da resposta já é perceptível a forma como a professora construiu sua resposta para

proteger sua face.

Na primeira parte da resposta, a professora comenta que durante o curso

foram vistas propostas que serviriam como exemplos para serem trabalhadas em

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sala. Para ela, esse seria um ponto positivo para a sua formação. Ela finaliza esse

ponto dizendo que tais exemplos de atividades não apresentavam problemas em

sua aplicação. Depois, já não fala mais sobre as atividades e já inicia outro tópico no

qual ressalta que os estágios obrigatórios também são muito positivos para unir

teoria e prática. Até essa parte da resposta a professora torna evidente que não

houve, durante a sua formação inicial, reflexões que tratassem de como deveria ser

a aula de Língua Portuguesa, de quais conteúdos deveriam ser trabalhados e nem

de quais abordagens teóricas perpassam esses conteúdos.

Somente ao tratar da especificidade do trabalho com a Língua Portuguesa,

ela chega a dizer que se sente insegura em conceituar o que seria língua materna5.

Dessa forma, podemos atentar que o ensino de língua não tem sido uma das bases

da formação do professor das séries iniciais, não tem sido foco do curso de

Pedagogia e afins, mesmo sendo esses também professores de Língua Portuguesa.

Na resposta da Professora 5 há uma diferença significativa entre as demais

vistas, pois ela defende a sua formação na graduação e ainda fala das muitas

contribuições dadas pelo curso.

Ao me reportar ao início de carreira no magistério, lembro de muitas dificuldades enfrentadas por ter iniciado apenas com o curso de Magistério em nível de 2º grau. O curso de graduação me fez entrar em contato com outras concepções de educação. Descobri que havia adquirido uma formação fragmentada, insuficiente com conhecimentos deteriorados à respeito de como ensinar. O curso de formação de professores em nível de graduação no antigo IFP me deu oportunidade de rever a minha prática pedagógica em sala de aula de uma forma mais efetiva, pois enquanto eu “mergulhava” nas teorias científicas, que norteavam o meu fazer, ao mesmo tempo tinha a minha própria sala de aula como laboratório. Considerando ainda que o curso era voltado para as séries iniciais do Ensino Fundamental 1º ao 4º ano, enquanto que nas outras universidades o professor era habilitado em supervisão ou orientação. Considero que naquele momento, o curso de graduação em Pedagogia veio suprir todos os meus anseios, necessidades, tanto na prática quanto na teoria. Todas as disciplinas, seminários, estágios, contribuíram para o trabalho que desenvolvo hoje, inclusive e especialmente no que diz respeito ao ensino de língua materna, tão essencial em todas as atividades educacionais. Enquanto educadora preciso sempre construir, criar, planejar, atividade rotineiras e também de cunho científico, que (me) nortearão o meu cotidiano, e que requer grande contribuição, nesta área. [sic]

5 Usamos as expressão Língua Materna na pesquisa como correspondente à Língua Portuguesa.

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Diante dessa proteção ao processo de formação feita pela professora, é

necessário que façamos uma observação. Como está posto na resposta, essa

professora cursou a graduação concomitantemente ao seu trabalho docente, o que

pode ter gerado uma satisfação aparente, ao passo que ao exercer a profissão

durante o período de curso, é possível encontrar muitas respostas para

questionamentos que emergem durante a prática docente.

Outro ponto que devemos enfatizar é que não estamos e nem queremos

afirmar que a formação inicial não contribui para a constituição do profissional

enquanto professor. O problema apontado nesta dissertação é a formação desse

docente como aquele que, dentre todos os seus afazeres, trabalha como professor

de Língua Portuguesa.

Mesmo diante de uma defesa aparentemente eficaz do curso de formação

inicial, é possível observar a fragilidade desse processo, haja vista que a pergunta

dizia respeito à formação em relação à Língua Portuguesa. Na resposta dada pela

professora, o trabalho com a língua só aparece no terceiro parágrafo da resposta e

de maneira muito vaga, pois afirma que diferentes disciplinas contribuíram para o

desenvolvimento de seu trabalho e inclui a língua materna de maneira secundária,

quando a pergunta questiona se houve ou não contribuição da formação inicial para

o desenvolvimento da aula de português.

Essa evidência de que atuação em sala de aula e processo de formação

realizados concomitantemente proporcionam a formação de um discurso de

satisfação pelo professor está presente também na resposta da Professora 6.

A minha graduação no curso Normal Superior, de um modo geral, contribuiu bastante para a minha prática pedagógica, haja vista que eu já era professora antes de fazer o curso, então ele veio embasar teoricamente a minha prática. Os conteúdos contribuíram para melhorar a minha ação docente, em relação a didática e a metodologia de ensino. Com relação as disciplinas de Língua Portuguesa, foram duas. Na realidade, essas deixaram um pouco a desejar, pois trabalharam muitos conceitos de forma reduzida. Eu esperava uma disciplina que trabalhasse tanto a teoria quanto a prática. Mesmo assim elas tiveram a sua contribuição na minha prática pedagógica.

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Vejamos que, ao contrário da Professora 5, a Professora 6 apresenta os

pontos positivos de seu processo de formação, mas também expressa o quanto

esse foi insuficiente com relação a coisas especificas, nesse caso o ensino de

Língua Portuguesa.

A professora atribui as contribuições do curso ao fato de já estar em sala de

aula e afirma que o curso contribuiu bastante no melhoramento da ação docente e

embasar teoricamente a prática. Ao tratar da especificidade do trabalho com a

Língua Portuguesa, a professora deixa evidente que as disciplinas responsáveis

pela formação nessa área do conhecimento deixaram um pouco a desejar, pois,

para ela, trabalharam alguns conceitos de maneira reduzida, o que pode ter

ocasionado a não ligação da teoria à prática, pois a docente indica que havia uma

expectativa sobre essa relação.

Por fim, a Professora 7 afirma que

Considero que meu curso de graduação ofereceu subsídios para uma prática reflexiva acerca do meu fazer pedagógico. Essa reflexão faz ponte com... “O que trabalhar?”...”O que de melhor posso trabalhar, tendo em vista uma boa aprendizagem?” Algumas disciplinas que discutiram o ensino de língua materna deram uma grande contribuição. Oportunizaram uma reflexão de práticas negativas e de práticas positivas do uso da nossa língua, em sala de aula. Construí um conhecimento como professora de que os gêneros discursivos compoem a base para o trabalho com a língua materna, como também, o uso descontextualizado e sem funcionalidade dessa língua apenas acumula informações sem construção cultural nenhuma. [sic]

Como podemos ver, a professora demonstra satisfação com sua formação,

concordando com algumas das respostas anteriores e discordando de outras. E, a

partir desses dizeres sobre a formação, passamos aos dizeres a respeito dos

gêneros.

Podemos observar que as quatro primeiras professoras apresentam-se de

maneira insatisfeita sobre a formação inicial, mesmo tentando modalizar os

discursos. Já as três últimas professoras apresentam-se como satisfeitas em relação

à sua formação inicial, sendo que a quinta modaliza seu discurso como uma

tentativa de esconder possíveis lacunas da formação, a sexta declara sua satisfação

com a formação de as lacunas deixadas pelas disciplinas específicas da área e a

sétima conclui defendendo a formação e já trazendo informações que possivelmente

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obteve nesse processo. Para a Professora 7, os gêneros seriam a base do ensino

da língua.

4.1.2 Sobre os gêneros discursivos

Como pudemos ver, somente a última professora tocou na temática quando

abordada sobre a formação inicial. Tendo em vista que já tratamos, no decorrer

deste trabalho, da adentrada dos gêneros na escola, vejamos como essa proposição

é tratada por esses profissionais a partir das questões nas quais saberemos o que

as professoras dizem sobre os gêneros. Essas questões são 2 e 3:

2 Você participou de discussões, estudos, ou mesmo teve aulas expositivas

sobre a temática de “Gêneros do discurso”, em seu curso de graduação ?

3 Você já ouviu falar ou leu algo sobre gêneros discursivos? Quando e onde

isso aconteceu?

O objetivo das duas questões é saber se as professoras tiveram contato com

a teoria dos gêneros durante a graduação ou em qualquer outro lugar. Dessa forma,

comparar os dizeres a respeito da graduação e a sua realidade de formação. Para

continuarmos a análise da categoria “O dizer”, passemos às respostas às questões

propostas. Traremos, assim, as respostas dadas às duas questões e as

comentaremos.

Apesar de afirmar ter estudado a temática ainda na graduação, a Professora

1, ao responder aos questionamentos 2 e 3, se contradiz, pois afirma que

Questão 2 Na graduação a temática era tratada como tipos de texto e de forma superficial.

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Tive oportunidade de aprender mais sobre a referida temática em curso de formação em serviço oferecido pelo MEC em parceria com a secretaria municipal de educação, o qual se chama Gestar 1 em Língua Portuguesa. Questão 3 Sim. Por meio do curso Gestar 1 em Língua Portuguesa oferecido pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Parnamirim em convênio com o MEC. O curso utiliza módulos publicados pelo MEC, nos quais os gêneros são tratados um a um. Participei também do curso “Parâmetros em Ação” porém considero que pelo fato de ser descontínuo e utilizar uma metodologia confusa, não trouxe grandes contribuições.

Como pode ser percebido, a professora, por acreditar saber dessa temática,

afirma tê-la estudado ainda na graduação, como informa em sua resposta ao

primeiro questionamento. No entanto, na segunda resposta ela apresenta que essa

temática era tratada como tipos textuais, o que pode evidenciar certa proteção ao

processo de formação inicial ou mesmo um conflito de teorias, ou seja, confunde a

teoria das sequências tipológicas com a dos gêneros discursivos, teorias essas

distintas, mas ambas relevantes para o ensino de Língua Portuguesa. Um ponto que

merece destaque é que a discussão sobre o tema aconteceu somente em curso de

sua formação continuada, já que essa professora se apresentou no primeiro

questionamento como conhecedora da temática.

Nas respostas das professoras a seguir podemos constatar o quanto essa

temática não é trabalhada nos cursos de formação inicial e quando trabalhada

acontecem, muitas vezes, problemas teóricos, como vimos na resposta da

Professora 1, afirmando que os gêneros eram trabalhados como “tipos” na

graduação.

A resposta “Não” para a Questão 2 é muito frequente, assim como a resposta

“Sim” é uma constante na Questão 3, ou seja, os gêneros não fizeram parte do

processo de formação inicial das professoras e entraram em seu repertório de

“saberes” a partir de outras iniciativas, principalmente em virtude do processo de

formação continuada. Isso é o que podemos ver nas respostas que seguem das

professoras.

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Segundo a Professora 2, essa temática não foi tocada no período de

formação inicial, ou seja, o seu saber não está vinculado à formação inicial, mas à

permanente, formação essa normalmente oferecida pela instituição na qual trabalha.

Foi em curso de formação e em leituras feitas por conta própria que a professora

soube dos gêneros. Como vemos, as revistas são uma fonte de informação para o

professor, pois a Nova Escola aparece na resposta a seguir com essa função de

participante na formação continuada do docente.

Professora 2 Questão 2 Não. O que aprendi foi quando enfrentei a realidade da sala de aula e com estudos isolados e participando de treinamentos. Questão 3 Sim. Sempre que encontro alguns textos que fale do assunto e em um curso chamada 08 escolas a mais de 10 anos atrás. Uma fonte de leitura muito boa que considero é a Nova Escola. [sic]

Para a Professora 3, essa temática só passou a existir quando o filho dela se

preparava para o vestibular. Diferentemente da Professora 1, que procurou se

informar a respeito do que era gêneros, a Professora 3 tomou consciência desse

tema por meio do filho. Esse contato com o conceito por meio do filho, evidencia a

necessidade da formação permanente, pois em cursos de formação em serviço,

atualmente essa temática vem sendo abordada.

Professora 3 Questão 2 Muito superficialmente. Questão 3 Sim ouvi falar quando o meu filho se preparava para o vestibular. Acontecia nas aulas de redação.

Segundo a Professora 4, ela não teve contato com o conceito de gêneros na

formação inicial, mas em um curso da formação contínua. Somente quando já

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estava atuando em sala de aula é que a professora teve contato com essa

formulação.

Professora 4 Questão 2 Não. Cursei Língua Portuguesa I voltada para a prática de sala de aula, onde cada grupo teria um tema para elaborar um plano, aplicar e apresentar os resultados em sala (seminário). Porém, nas exposições em grupo um grupo falou sobre gênero discursivo. Questão 3 Sim. Ao ingressar na rede municipal do município de Baía Formosa, fiz inscrição No pró-letramento de Língua Portuguesa. Havia uma unidade que trazia orientações de como trabalhar gêneros discursivos em sala de aula. Foi em 2007. À partir daí compreendi melhor (ou um pouco melhor). [sic]

Nas respostas da Professora 5 é possível evidenciar que há ainda

professores que sequer ouviram falar dos gêneros, pois ela diz que está ouvindo

falar durante a entrevista.

Professora 5 Questão 2 Em nossa vida acadêmica, como educadoras buscamos sempre participar de eventos, mesa redonda, seminários que certamente irão subsidiar nosso trabalho. Acredito que com o passar do tempo, teorias vão se aperfeiçoando, estudos novos são feitos e surgem novos conhecimentos sobre todo e qualquer tema. Creio ter participado também de discussões sobre esta temática, talvez com outro nome. Questão 3 Estou ouvindo agora e penso sobre alguns nomes como: dissertações, crônicas e outros, mas não consigo identificar com este título.

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A Professora 5 apresenta algumas incoerências ao tentar modalizar o seu

discurso, o que causa incompreensão de seu dizer, pois na primeira resposta ela

não fala especificamente de Língua Portuguesa, na segunda ela não responde e na

terceira ela afirma estar ouvindo falar sobre essa temática no momento da

entrevista, o que demonstra, talvez, o desejo de defender o seu processo de

formação ou a sua face enquanto profissional que não teve uma formação adequada

para o trabalho com a Língua Portuguesa.

Nas respostas das professoras 6 e 7 tanto para a Questão 2, quanto para a

Questão 3, há a presença do “Sim”, o que demonstra uma coerência com as

respostas dadas à primeira questão.

Professora 6 Questão 2 Sim. Questão 3 Sim, já ouvi falar sobre gêneros discursivos tanto no curso de graduação, quanto no Profa (Programa de Formação de Professores Alfabetizadores), e no próprio ambiente escolar, isto é, na escola que trabalho. Professora 7 Questão 2 Sim. Questão 3 O primeiro contato foi de forma inconsciente... através do meio onde convivo. O segundo contato foi de forma consciente... durante o curso de graduação, justamente em discussões, estudos e em aulas expositivas. Foi possível perceber a relevância de se trabalhar com os gêneros discursivos.

Como é possível observar, há uma parcela pequena de professoras que

tiveram o contado com a teoria dos gêneros discursivos ainda na graduação e outra

em que essa aproximação só aconteceu posteriormente à formação inicial, no

processo de formação continuada. Podemos dizer que as professoras tiveram

contato com a temática em casa, durante a graduação, no Pró-Letramento, no curso

Oito escolas, na escola, no Gestar 1, no Parâmetros em Ação e no Profa. Desse

modo, é possível observar que o ato de conhecer não se dá em ambientes

específicos, pois a aprendizagem se dá de maneira constante. No entanto, isso

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também deixa evidente que a formação inicial não tem subsidiado de maneira

adequada os profissionais.

Assim, é possível observar que o saber disciplinar está sendo deixado à

margem do processo de formação dos professores e isso tem ocasionado a não

adequação do trabalho com a Língua Portuguesa aos parâmetros atuais,

principalmente às concepções e conceitos que norteiam esse ensino na atualidade.

Assim corroboramos com o dizer de Oliveira (2001, p. 159)

De nosso ponto de vista, portanto, consideramos fundamental, para que os profissionais do ensino possam intervir na realidade, ou mais especificamente na sala de aula, o domínio de conhecimentos teóricos, vez que só com o domínio da técnica não iremos muito longe, pelo contrário, entramos na roda viva das eternas substituições, sem saber o que se deixou de fazer, nem o que se está fazendo e, muito menos, por que se está fazendo [...].

Assim, é de suma importância essa formação teórica ainda na formação

inicial de modo que em formações posteriores seja possível repensar certos

conceitos e práticas a fim de aperfeiçoar o trabalho docente de maneira consciente,

sabendo o que está sendo feito, por que e para quê. Dessa forma o professor não

somente assimila teorias, mas questiona a sua funcionalidade e o porquê de um

trabalho sob o viés de uma determinada abordagem teórica, deixando de ser um

mero reprodutor para ser um produtor de conhecimento.

4. 2 O SABER: A CATEGORIA CIENTÍFICA

A categoria “O saber” tratará do saber que as professoras têm sobre a

temática em questão, ou seja, investigará quais as formulações feitas por essas

profissionais sobre o tema abordado. Para tanto, levaremos em consideração o

quarto questionamento, que tem como objetivo analisar qual o conceito de gêneros

usado pelo professor e se esse corresponde ao indicado pelos PCN. Eis o

questionamento:

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4 Você poderia falar um pouco do que você entende sobre gêneros

discursivos? Você leu algum texto sobre essa temática? Onde? Lembra do

autor do texto?

Nesse questionamento, pedimos que as professoras conceituassem o que

são gêneros, solicitamos que expusessem suas possíveis leituras, suas próprias

formulações. Nesse questionamento, observamos que as professoras, ao

responderem, demonstraram desconforto. Isso pôde ser percebido a partir dos

comentários feitos no momento em que as docentes estavam elaborando suas

respostas. Vejamos alguns:

Tem recuperação? ...Acho que já estou em recuperação. (risos)... Quando será a prova de recuperação? Porque essa prova é muito difícil. (Professora 6)

Como é que eu vou responder isso? ... Posso dizer o que eu acho realmente? Você pode me responder uma pergunta sobre os gêneros? (Professora 5)

Os trechos apresentados anteriormente são fragmentos anotados durante a

aplicação do questionário. A partir da leitura dos fragmentos acima, podemos

perceber que há uma preocupação das professoras em tentar conceituar

adequadamente os gêneros. Como pode ser constatado, as professoras sentiram

dificuldade em responder, em definir o que são os gêneros do discurso.

Os questionamentos da citação anterior demonstram o quanto os sujeitos da

pesquisa se incomodaram com o fato de acharem que não sabiam, por se sentirem

avaliados, afinal, uma pesquisa que investiga conceitos, para as professoras, tem

um teor de avaliação.

Mas a avaliação aqui proposta não é especificamente dos professores. A

avaliação a ser feita, a partir da conceituação ou não, é dos cursos de formação,

para observarmos se essa temática está contida nos currículos de formação docente

e como é trabalhada. Na verdade, essa pesquisa se constitui como uma

investigação acerca do trabalho com os gêneros na escola subsidiado pela formação

inicial ou não. Vejamos os conceitos elaborados pelas professoras:

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Para a Professora 1, os gêneros aparecem como “formas de apresentação de

um texto”. Ela acredita que gênero tem a ver com a aplicação, a situação de

elaboração nos contextos de produção, ou seja, gênero teria uma ligação com a

prática comunicativa.

Entendo que os gêneros discursivos são as diferentes formas de apresentação do texto relacionado à situação de sua aplicabilidade, ou seja, que os textos são caracterizados pela situação de sua elaboração e aplicação real. Nunca li autores específicos que tratavam do assunto de forma aprofundada. As leituras a que tive acesso foram dos textos presentes nos módulos dos cursos de formação. (Professora 1)

Ela demonstra saber que os gêneros estão vinculados a práticas cotidianas,

quando fala em “situação de elaboração real”, ou seja, ela compreende que a

produção de um texto está ligada a seu contexto, a uma realidade vivida pelo

interlocutor, pelo produtor.

A Professora 2 acredita que os gêneros são “tipos textuais”, o que pela

nomenclatura nos levaria a crer que ela confunde tipologia textual com gênero

textual/discursivo, confusão essa até bem comum na atualidade. No entanto,

observando toda a resposta dada pela professora, podemos perceber que há um

conflito até com relação ao que seria “tipo”. Os estudos relacionados aos tipos de

textos, ou melhor, das sequências tipológicas, apresentam características a respeito

das estruturas dos textos, dos aspectos lingüísticos de um determinado texto que o

faz ser de um tipo ou de outro.

Gêneros discursivos são os diferentes tipos de textos (prosa, verso, acróstico e outros) que trabalhamos usando a oralidade e a escrita. Sim já li, no momento só lembro da revista Escola e não lembro o autor. E apenas textos isolados. (Professora 2)

A confusão teórica não se faz presente apenas com relação à tipologia, mas

até sobre conceitos como “prosa e verso” sendo considerados como gêneros. A

professora parece trazer as modalidades da linguagem oralidade e escrita como se

expusesse algo que sabe. Poderíamos pensar que isso seria um indício de

compreensão do que seriam gêneros, já que são nessas modalidades que podemos

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perceber a realização, a concretização dos enunciados, dos gêneros. Outro fato que

merece ser mencionado é que a professora afirma ter leitura sobre a temática e

apenas não se lembrar dos nomes dos autores no momento de responder aos

questionamentos.

Na resposta dada pela Professora 3, podemos ver a presença de uma

definição muito parecida com a formulada por Bakhtin, quando define gêneros como

tipos de enunciados. A professora diz:

Acredito que sejam as formas de produções textuais que abordam as várias temáticas discursivas. Não lembro se já li, mas penso que sim sem noção. (Professora 3)

Como podemos ver, ela fala de “formas” de produções textuais. Se

consideramos essas produções textuais como a realização de qualquer

texto/enunciado, poderíamos relacionar a definição dela com a dada por Bakhtin. No

entanto, ela não fala das diferentes práticas discursivas, toca apenas nas diferentes

temáticas, o que estaria no plano do conteúdo dos gêneros e não trata dos gêneros

de uma forma mais geral.

Na definição da Professora 4, é como forma de identificação que os gêneros

aparecem. Identificação do que trata o texto e qual o seu objetivo. Essa professora

define os gêneros e se diz em dúvida com relação ao que seriam “tipos textuais”. E,

ao definir o que seria “tipo”, questiona se gênero e tipo seriam a mesma coisa.

Entendo gêneros discursivos como uma forma de identificar do que o texto se trata, com qual propósito foi feito. O que me deixa na dúvida é os tipos textuais. Acredito que tipo textual é relacionado a jornalístico, informativo, etc. Mas o que seria gênero discursivo? A mesma coisa? (Professora 4)

Vejamos que ela exemplifica o que seriam “tipos” usando “jornalístico” e

“informativo”, palavras essas que estão vinculadas a áreas de estudos diferentes. A

primeira estaria ligada aos estudos das esferas discursivas, campos discursivos, e a

segunda aos estudos da funcionalidade do texto, ou mesmo da composição

linguística do texto, como por exemplo, as sequências textuais

expositivas/informativas.

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A Professora 5 evidencia que não sabe e que também não está disposta a

tentar definir, mesmo tendo modalizado todo o seu discurso para que emergisse em

sua resposta certa compreensão do assunto. Nessa resposta, podemos ver o

desgaste de toda a defesa feita pela educadora ao seu curso de formação, pois no

questionamento-chave da pesquisa sua resposta foi “Não”, simplesmente, ou

melhor, inquestionavelmente. Afinal, diante de um “Não”, a discussão da resposta

dessa professora será feita somente mais adiante.

Segundo a Professora 6,

Gêneros discursivos são textos que apresentam diferentes aspectos: narrativos, argumentativos, descritivos. Sim, já li textos sobre essa temática, mas no momento só lembro dos PCNS de Língua Portuguesa de 1ª a 4ª série. (Professora 6)

Como podemos observar, para ela, os gêneros são “tipos”, são as sequências

textuais “narrativas”, “argumentativas” e “descritivas”. Vejamos que essa professora

retoma a maneira atualmente considerada incompleta da classificação das

sequências tipológicas. Isso é possível de ser percebido pelo fato de ela exemplificar

apenas com os três tipos de textos que até pouco tempo eram as únicas

classificações existentes para as formas de textos existentes e produzidos

cotidianamente. Ela ainda informa que leu sobre o assunto e indica os PCN como

fonte.

Para finalizarmos esta parte da análise, vejamos o que nos fala a Professora

7:

Eu entendo que gêneros discursivos é todo um leque de textos que oportuniza ao aluno identificá-los funcionalmente em seu convívio. Por exemplo: Nós entramos em contato com textos jornalísticos, científicos, poéticos, contos, crônicas... Esses textos estão contribuindo com todos os setores, públicos leigos, públicos esclarecidos... (Professora 7)

Nessa resposta vemos que a professora tem consciência da funcionalidade

dos variados textos, entretanto enfatiza o ato de identificação como “oportunizado”

pelos gêneros do discurso. Os gêneros não seriam práticas sociais, mas uma

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ferramenta que viabilizaria o reconhecimento de textos e suas funcionalidades.

Vemos que ela também confunde esferas discursivas com gêneros, pois quando

trata de elencar os gêneros como “jornalísticos”, “científicos” e “poéticos”, na

verdade, está adjetivando-os segundo as esferas jornalística, científica e artística.

Assim, essa professora elenca esferas e gêneros como se fossem a mesma coisa,

como se estivessem em um mesmo plano discursivo. No entanto, os gêneros se

realizam cotidianamente, nas diferentes situações sociais, são práticas discursivas

que se organizam em esferas.

Como podemos ver, são conceituações distintas, pontos de vistas

diversificados e uma problemática evidente, haja vista que na atualidade o ensino

pautado nos gêneros está embasado em uma perspectiva teórica desconhecida

pelos professores, pois todas elas apresentaram problemas na definição. Passemos

ao quinto questionamento e à terceira categoria da pesquisa: o fazer.

4.3 O FAZER: UMA CATEGORIA DA PRÁTICA

4.3.1 O fazer no questionário e na sala de aula

A categoria “O fazer” analisará as respostas que tratam de como as

professoras desenvolvem essa temática em sala. Dessa forma, levaremos em

consideração as respostas à quinta pergunta do questionário e a observação

realizada em sala de aula. Nesta categoria, faremos uma análise comparativa entre

o que elas dizem fazer e o que fazem em sala de aula. Assim, passemos ao

questionamento:

5 Você costuma usar os gêneros discursivos nas aulas de língua materna?

Como isso acontece? Exemplifique.

Como, no questionamento anterior, solicitamos que as professoras falassem

sobre o conceito de gêneros, nesse quinto pedimos para exporem se elas costumam

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usar os gêneros em sala. Observemos a resposta de cada professora à pergunta e

comparemos a sua prática.

A Professora 1 respondeu que sempre procura trabalhar com gêneros e em

sua aula essas práticas estão presentes. Vejamos o que ela diz:

Procuramos trabalhar com os gêneros por meio de projetos e atividades sequenciadas que priorizem situações de produção, leitura e análise de textos relacionados a situações de uso. Projeto ler e escrever de verdade desenvolvido em outra escola. (Professora 1)

Como podemos ver, há, segundo a professora, a ênfase na produção, na

leitura e análise de textos que estabeleçam relação com situações de usos da

linguagem, ou seja, parece haver uma preocupação de que, na escola, os alunos

tenham contato com gêneros que cotidianamente sejam utilizados por eles, seja

produzindo-os, lendo-os ou analisando-os. Parece que tais aulas seriam planejadas

tendo em vista a realidade do aluno e sua necessidade e que a professora tem um

discurso próprio em sua aula.

A aula observada (Anexo A) dessa professora tinha como tema “artigo

informativo” e “cordel”, ou seja, gêneros discursivos de esferas diferentes, um

jornalístico e outro literário. A aula da professora tratava de caracterizar cada um dos

gêneros para depois diferenciá-los. Durante a aula, a professora falou da função de

cada gênero, dos portadores de textos, ou suportes textuais, e construiu

coletivamente, com a participação dos alunos, na lousa, dois quadros cujos títulos

eram “Semelhanças” e “Diferenças”. Nos quadros, ela apontava o que os gêneros

tinham de parecido e de diverso.

Essa aula pautou-se totalmente no livro didático e a professora apenas

transpôs o que propunha essa ferramenta. Sua aula era apenas a transposição do

que estava posto no livro. Inclusive, a atividade descrita na aula, que era o último

comando da atividade de estudo do texto.

Mesmo a professora demonstrando segurança do conteúdo que estava

trabalhando em sala, fica evidente que ela apenas reproduziu os dizeres do livro, ou

seja, apenas reorganizou o discurso com que os alunos já tinham mantido contato.

Não temos, na prática dessa professora, a pedagogização do conteúdo, mas

a verbalização do que se apresentava escrito no livro didático. Dessa forma,

podemos perceber quão influente é esse instrumento, pois de ferramenta de auxílio

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ao professor, passou a ser o determinante da aula, pois é ele que determina o que e

como determinada temática será abordada.

A Professora 2 afirmou (Anexo B) que trabalha as diferentes formas de

gêneros textuais explorando de forma oral e escrita. O que, a nosso ver, seria mais

adequado com uma atividade ao contrário, em que ela trabalhasse a oralidade e a

escrita e os diferentes gêneros que emergem dessas modalidades.

Durante a aula observada, a docente desenvolveu as seguintes atividades:

leitura do livro pela professora, leitura do resumo da história pelos alunos e um

exercício proposto pela professora, o qual se dividia em interpretação do texto e em

análise linguística (ANEXO B).

Pudemos perceber que a professora selecionou uma atividade de leitura para

a aula porque acreditava que assim estava trabalhando com um gênero, nesse caso

com a leitura de um conto. Sobre o trabalho com textos literários na escola,

podemos observar que são muitas as críticas às formas como são desenvolvidas as

leituras e às fichas que acompanham essas leituras.

Sobre o ato de ler, Antunes (2003) afirma que ele possibilita ao aluno acessar

informações distintas, ou seja, a leitura dá acesso ao conhecimento produzido; dá

acesso ao prazer estético, nesse contexto, o ato de ler é concebido como deleite,

entretenimento; e possibilita a reflexão sobre as especificidades da escrita, pois, ao

ler, o aluno tem contado com as mais variadas formas de escrever, com os

diferentes gêneros.

No primeiro momento da aula, observamos a leitura como deleite, como forma

de entretenimento. No entanto, no segundo momento, a aula que estava

caminhando para a compreensão do texto de maneira interativa, foi encaminha para

um modelo tradicional e desmotivador do ato de ler literatura, haja vista que a

professora entregou um resumo da obra para que os alunos lessem.

A leitura compartilhada inicial e a proposta da recontação da história foi

desfeita pela entrega do resumo já feito aos alunos. Aos alunos coube reler a

história de maneira compilada, forma essa que desconstrói todo o valor estético do

texto literário, ou seja, se o trabalho é com a arte literária, a leitura a ser realizada

deve ser do texto em si e não de resumos ou comentários sobre o texto. Dessa

forma, um projeto que aborde a literatura dever ser pautado na leitura de literatura.

Os PCN tratam do que seriam os projetos de leitura e apontam que

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Os projetos são situações em que linguagem oral, linguagem escrita, leitura e produção de textos se inter-relacionam de maneira contextualizada, pois quase sempre envolvem tarefas que articulam esses diferentes conteúdos. São situações linguisticamente significativas, em que faz sentido, por exemplo, ler para escrever, escrever para ler, ler para decorar, escrever para não esquecer. (BRASIL, 2001, p. 62).

Sobre a leitura do conto, podemos observar que ela foi realizada de maneira

adequada, pois a leitura compartilhada é uma das formas de leitura que podem se

tornar presentes na sala de aula. Já com relação à entrega dos resumos aos alunos,

tal prática não é indicada, pois não retoma e nem explicita a estética do texto

original.

A Professora 3 acredita que trabalhar com gêneros é ocupar-se em usar uma

linguagem clara e culta, pensa que o grau de formalismo, a maneira interdisciplinar e

intertextual é lidar com gêneros discursivos.

Bem acredito que no nosso dia-a-dia usamos em nossa prática. Costumo introduzir as minhas aulas de forma interdisciplinar e intertextual resgato sempre o que já vimos usando uma linguagem clara porém culta. (Professora 3)

Dessa forma ela reafirma a falta de formação para dar aula sobre a Língua

Portuguesa e principalmente sobre gêneros, mesmo que esses estejam presentes

na aula, porque sem eles não haveria interação, não seria possível a realização da

aula.

A aula dessa professora foi o preenchimento de um “autoditado” e em seguida

a criação de frases sobre as palavras do autoditado. Uma atividade que enfatizava a

escrita de palavras soltas e frases desconexas. Não trabalhou gêneros, pois, como

vemos na forma que ela mesma explica como trabalha essa temática, ela não

aparenta ter informações sobre esse saber. Na aula dessa professora, é possível

observar que não há o trabalho com a linguagem, o que aparecem são palavras e

frases desconexas.

Segundo Antunes (2003), tal prática é

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Uma prática de escrita artificial e inexpressiva, realizada em “exercícios” de criar listas de palavras soltas ou, ainda, de formar frases. Tais palavras e frases isoladas, desvinculadas de qualquer contexto comunicativo, são vazias de sentido e das intenções com que as pessoas dizem as coisas que têm de dizer. Além do mais, esses exercícios de formar frases soltas afastam os alunos daquilo que eles fazem, naturalmente, quando interagem com os outros, que é “construir peça inteiras”, ou seja, textos, com unidade, com começo, meio e fim, para expressar sentidos e intenções.

Assim, a partir do que nos diz a autora, podemos perceber que os

procedimentos usados pela professora não dialogam com a forma de trabalho

apresentada nos documentos oficiais, tendo em vista que tal prática não permite ao

aluno usar a linguagem para dizer algo a alguém, pois são atividades que não dizem

nada.

A Professora 4 afirmou que

Não faço planejamentos específicos da língua materna, mas ela está incorporada em tudo que realizamos em sala de aula. Estou no 5º ano atualmente e iniciamos o ano letivo abordando os variados tipos de texto. Durante as aulas é comum comentarmos sobre os gêneros discursivos. (Professora 4)

No discurso dessa professora podemos perceber que a aula de Língua

Portuguesa não tem um espaço reservado no horário da turma. O que vai de

encontro com as determinações nacionais, pois se não fosse necessário um horário

específico para o ensino de Língua Portuguesa, o Ministério da Educação (MEC)

não teria publicado os PCN específicos para o trabalho com a língua, com a

linguagem.

A resposta da Professora 4 ao questionamento cinco se confirma na aula,

pois a aula foi de leitura e de discussão acerca do texto lido. Embora a aula

ministrada tivesse a configuração de uma aula de leitura, uma das competências a

ser desenvolvida nos discentes, a professora a conduziu o tempo todo como se

naquele momento os alunos não estivessem tendo uma aula de Língua Portuguesa.

Para a professora, a aula realizada era de temas já trabalhados, ou seja, ela não

concebe que a leitura é uma das competências a ser desenvolvida nos alunos e que

faz parte do trabalho com a linguagem.

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Segundo Antunes (2003, p. 28), uma das características da leitura em

contexto escolar é que essa prática toma a forma de “uma atividade incapaz de

suscitar no aluno a compreensão das múltiplas funções sociais da leitura”, pois se lê

apenas para ler, não se atribui um sentido a esse ato. Afinal, o ato de ler não

acontece no vazio e não é mera decodificação, vai além da decifração de signos, faz

parte da vida social do aluno, pois

A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir de seus objetivos, do seu conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a língua: características do gênero, do portador, do sistema da escrita, etc. (BRASIL, 2001, p. 53)

Por meio da leitura o aluno adquire novos conhecimentos, se diverte e ainda

reflete sobre o uso da linguagem. No entanto, essa prática não pode acontecer de

qualquer forma, nem tão pouco utilizar quaisquer textos.

Segundo a Professora 5, dar aulas considerando os gêneros, é estimular a

oralidade, contar histórias para os alunos ou explicar tipologias.

Em muitas aulas eu costumo, incentivar a oralidade, quando conto uma história ou explico os textos informativos ou outros. (Professora 5)

Essa professora acredita que as aulas que abordam a temática em questão

são pautadas na oralidade, no falar do aluno; na contação de histórias, na oralidade

do professor ao ler um livro; e na exposição oral explicativa. E foi exatamente assim

que ela executou a aula observada. Inicialmente, a docente leu o conto O reizinho

mandão, em seguida discutiu sobre a temática do texto e, logo depois, distribuiu

uma folha de “interpretação do texto”.

Vemos a atividade de responder a uma folha de questionamentos novamente

se repetindo. A aula de Língua Portuguesa se resumiria, então, à prática de leitura e

preenchimento de uma folha de resposta? Acreditamos que não, mas na observação

realizada, para a professora essa seria uma das configurações da aula de língua,

pois tratou da questão da leitura, da compreensão do texto e ainda de gramática,

haja vista que no exercício era solicitado que os alunos encontrassem palavras que

qualificavam o reizinho.

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Podemos observar na atividade de leitura realizada pela professora,

Uma atividade de leitura puramente escolar, sem gosto, sem prazer, convertida em momento de treino, e avaliação, ou em oportunidade para futuras “cobranças”; leitura que é, assim, reduzida a momentos de exercícios, sejam aqueles da “leitura em voz alta” realizados, quase sempre, com interesses avaliativos, sejam aqueles que têm de culminar com elaborações das conhecidas “fichas de leitura”; (ANTUNES, 2003, p. 28)

Isso porque dentre as funções que poderiam ser atribuídas à aula observada,

a leitura para a resposta da ficha foi a que ficou mais em evidência, pois mesmo a

professora discutindo com os alunos sobre o texto, ela não concebeu a atividade de

leitura como encerrada e passou a responder a atividade relacionada ao texto,

fazendo da leitura uma técnica para se responder a questionamentos, apenas.

Para a Professora 6,

Durante as aulas de língua materna é indispensável o uso dos gêneros discursivos. Geralmente, uso os gêneros discursivos para trabalhar os diferentes tipos de texto, para produzir textos, para informar, para alfabetizar, para a apropriação da escrita e da leitura. Um exemplo disso e quando trabalho com a narrativa de um livro, após a leitura coletiva ou individual, discutimos sobre o texto, os personagens, a recontação de história, dentre outros fatores. Também quando trabalho com um texto informativo. [sic] (Professora 6)

Como vemos, nas primeiras linhas da resposta a professora diz que usa os

gêneros para trabalhar diferentes tipos de texto e logo informa o que, para ela,

seriam outras atribuições dos gêneros: informar, alfabetizar, apropriar-se da escrita e

da leitura. Para exemplificar uma aula na qual trabalha com gênero, enfatiza a leitura

como uma prática com gêneros, o que não deixa de ser.

Essa professora, no entanto, na aula observada (Anexo F), apresenta uma

forma totalmente diversa de seu discurso, pois dá uma aula específica sobre o

gênero “convite”. No primeiro momento, ela perguntou aos alunos se eles tinham

feito a pesquisa do que vinha no convite e se eles haviam trazido alguns

exemplares. Então, a professora pegou os convites trazidos pelos alunos e entregou

uma atividade sobre o convite.

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Nesse momento, ela promoveu a leitura de textos autênticos, de textos que

circulam cotidianamente nas práticas sociais que vivenciam os alunos. Para Antunes

(2003, p. 79), “Nada poderá justificar uma leitura que não seja a leitura de textos

autênticos, de textos em que há claramente uma função comunicativa, um objetivo

interativo qualquer”. A autora defende que os textos a ser lidos em sala tenham

autoria, data de publicação, e apareçam em um suporte da comunicação social, ou

seja, sejam textos situados sócio-historicamente. E foi dessa forma que a professora

iniciou a aula.

Depois desse momento, ela falou sobre os variados convites, sobre os

diversos conteúdos desse gênero, e sua função. Logo em seguida, listou no quadro

como deve ser estruturado o convite, ou seja, como se organiza a sua forma

composicional. Além disso, a docente entregou papéis aos alunos e pediu para que

eles fizessem seus próprios convites, o que evidencia o trabalho com o estilo e

também com a escrita de gêneros socialmente relevantes.

A esse respeito, Antunes (2003) afirma que as propostas de produção textual

na sala de aula devem se articular aos diferentes usos da escrita na sociedade,

“devem corresponder àquilo que, na verdade, se escreve fora da escola – e, assim

sejam textos de gêneros que têm uma função social determinada, conforme as

práticas vigentes na sociedade.” (2003, p. 62-63).

Como o último momento da aula, a professora entregou um convite para que

os alunos entregassem às mães, pois a escola as estava convidando a participar da

festa do dia das mães.

Na aula desenvolvida por essa professora, ela didatiza o gênero convite de

maneira que os alunos participem e construam seus próprios convites, de maneira

efetiva. Ela trabalhou em uma perspectiva interacionista da linguagem e as

produções dos alunos não tiveram como interlocutor o professor, pelo contrário,

dirigiram-se a alguns alunos ou mesmos a interlocutores de fora da escola.

Nessa aula foi possível observar que há uma diferença entre o dizer e o fazer,

e que nem sempre um dizer adequado possibilita uma aula adequada e que uma

aula adequada nem sempre está vinculada a um dizer apropriado.

A Professora 7 afirma trabalhar com gêneros. Vejamos:

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No meu entendimento, sim. Costumo trabalhar com contos, com poesias, textos jornalísticos, textos científicos, recados, textos que possam se aproximar da realidade dos alunos. Peço que os alunos (durante a rotina de realizar uma leitura no início de cada aula) que identifiquem o tipo de texto que li para eles. Costumo pedir que pesquisem textos que fazem parte de suas vidas. Costumo usar textos que gere discussão acerca do problema apresentado, como também textos que possam apresentar aos alunos outra forma de apresentação da língua, diferentemente da que costumam falar e ouvir. [sic] (Professora 7)

Vemos que a professora em seus exemplos de gêneros fica entre o que se

refeririam às esferas e aos nomes dos gêneros. Ela também aponta a atividade de

leitura como uma atividade com gênero, mas não indica exatamente como essa

atividade se pauta nessa temática.

Ela afirma que trabalha considerando os gêneros, mas ao passo que se refere

às esferas em que utilizaria os gêneros, traz o “recado” como se estivesse no

mesmo nível das demais palavras da lista feita por ela. A partir disso, torna-se

perceptível que essa docente não tem conhecimento do tema abordado pela

pesquisa.

A aula dessa professora abordou o gênero “bilhete” e foi realizada da seguinte

forma: apresentação da temática da aula “gênero bilhete”, leitura de um bilhete

sobre a realização de uma festa, escrita de um bilhete-resposta e correção dos

bilhetes.

Essa aula, apesar de tratar especificamente de um gênero, não abordou de

maneira adequada o tema, pois a professora não tratou da função social desse

gênero, não auxiliou os alunos na produção dos mesmo e a ainda indicou que o

bilhete fosse escrito no caderno e em resposta a um bilhete fictício. Direcionamentos

esses que nos fazem perceber que a professora diz saber como desenvolver o

trabalho, entretanto sua prática é permeada de dúvidas e ações equivocadas, haja

vista que gênero é prática.

Ainda sobre a prática dessa professora, ela pedagogiza o conteúdo bilhete e

realiza uma produção textual da qual ela é o único interlocutor possível dos alunos,

pois os bilhetes são escritos apenas para que ela os leia. Não houve um

direcionamento em relação à percepção do bilhete como um gênero, como uma

prática social, ou seja, não houve a orientação dessa função social do bilhete.

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Essa atitude da professora nos remete à reflexão feita por Britto (2006) sobre

o processo de interlocução em ambiente escolar. Esse autor afirma que a

escola/professor se tornou o grande interlocutor dos textos produzidos.

Na situação escolar existem ralações muito rígidas e bem definidas. O aluno é obrigado a escrever dentro dos padrões previamente estipulados e, além disso, o seu texto será julgado, avaliado. O professor, a quem o texto é remetido, será o principal – talvez o único – leitor da redação. (BRITTO, 2003, p. 120)

Dessa forma, o professor assume um papel de interlocutor que não deveria

ser seu, pois a escrita não é uma prática de um interlocutor fixo. Socialmente,

escrevemos para diferentes interlocutores e com objetivos diferentes. Essa relação

entre locutor e interlocutor determina o uso da linguagem, viabiliza a sua adequação.

Podemos observar, a partir das análises realizadas, que todas as professoras

se dizem utilizadoras dos gêneros discursivos em sala de aula. Isso é bem verdade,

pois, segundo Bakhtin (2006, p. 282) não há nada que falemos que não seja

configurado em gênero. E realmente, elas os utilizam, mas de maneira inconsciente,

afinal, “Falamos apenas através de determinados gêneros do discurso, isto é, todos

os nossos enunciados são formas relativamente estáveis e típicas de construção do

todo”. O falar, o produzir discurso é uma característica humana e como ser social

tais enunciados são construídos a partir da relação estabelecida entre o locutor e o

interlocutor em um determinado contexto, em uma determinada situação social.

No entanto, o uso do texto como unidade básica para o ensino se configura

como uma forma interativa do trabalho com a Língua Portuguesa, se configura no

trabalho com a língua a partir do conceito de linguagem como interação, uma

linguagem real e usada no cotidiano tanto dos professores quanto dos alunos, ou

seja, uma linguagem que se dá em forma de gêneros, afinal, é por meio dos gêneros

que os alunos devem fazer as suas reflexões em relação ao uso da língua e não por

meras palavras ou frases que nada dizem, por que no convívio social os sujeitos não

usam palavras soltas e desconexas, não usam frases de qualquer forma. Na vida

cotidiana, os enunciados são construídos sempre direcionados a um interlocutor e

esse determina como a linguagem deverá ser usada. Como vemos, as professoras

demonstram uma carência teórica a esse respeito.

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5 “ÚLTIMAS” PALAVRAS

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Não há nem a primeira nem a última palavra [...] Bakhtin

Conscientes do que afirma Bakhtin é que chegamos ao fim deste trabalho.

Afinal, conhecemos a realidade na qual estamos vivendo e sabemos que não somos

os primeiros a tratar dessa temática, assim como também não seremos os últimos,

pois este trabalho é apenas um elo na cadeia enunciativa e se une aos demais para

que juntos o discurso que trata da formação docente estabeleça diálogo não só

entre as pesquisas realizadas, mas com as diversas áreas que esses resultados

possam contribuir trazendo reflexões ou mesmo mudanças.

A epígrafe deste trabalho diz que “Aqui chegamos ao ponto que talvez

devêssemos ter partido. O inacabamento do ser humano. Na verdade, o

inacabamento do ser ou sua inconclusão é próprio da experiência humana. Onde há

vida, há inacabamento.” (FREIRE, 2005). É esse inacabamento que nos permite

sempre questionar o mundo, as relações humanas e, no nosso caso, a formação

docente e os saberes disciplinares que a constituem e que embasam/deveriam

embasar a prática em sala de aula.

Foi a partir das palavras desse educador brasileiro que construímos nosso

trabalho e chegamos à conclusão, às nossas “últimas palavras” sobre esta

investigação. Se concluímos, neste momento, é porque temos a necessidade de dar

por encerrada esta discussão, pelo menos momentaneamente, seguindo o princípio

da conclusibilidade formulado por Bakhtin (2006).

Às questões referentes à educação no Brasil nem sempre é dada a devida

atenção. Como vimos na revisão de literatura sobre o processo de formação do

professor, tal formação não tem sido uma temática abordada por pesquisas

brasileiras apenas, mas tem tomado um espaço relevante em investigações

realizadas em diferentes países, pois formar professores não é e nunca foi uma

tarefa fácil, que pode ser efetuada de qualquer maneira.

Uma formação docente integral demanda esforços tanto das instituições que

formam educadores, como de pesquisadores. Dos pesquisadores porque são eles

os responsáveis pela elaboração e execução de pesquisas, são eles os que

assumem o compromisso social de investigar problemáticas e tentar respondê-las.

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Das instituições, em virtude de sua prestação de contas com a sociedade, ou seja,

diante da não formação adequada dos professores, cabe a essas a reelaboração de

seus currículos de modo a atender às demandas sociais referentes à formação

desse profissional. Nesse sentido, é notória a necessidade de pesquisa e formação

caminharem juntas, complementando-se, pois a constituição docente só pode ser

repensada a partir de pesquisas e de resultados que demonstrem a necessidade de

reestruturação de cursos de formação inicial, bem como de cursos complementares

a esse processo.

Entretanto, tais pesquisas não devem enveredar apenas pelo caminho de

investigação das práticas em sala de aula sob pena de eleger como principal apenas

um dos elementos que constituem o que podemos chamar de saberes docentes.

Saberes que não são e nem devem ser vistos apenas sob o viés da prática, haja

vista que são também científicos, disciplinares. Em contrapartida, a prática não deve

ser desprezada, tendo em vista que os saberes experienciais são diversos e ainda

não foram estudados de maneira a analisar como se constituem e de que forma

esses saberes compõem o saber do profissional professor.

As pesquisas que investigam a formação inicial de professores têm levantado

questionamentos e evidenciado que muitas são as modificações a ser efetuadas nos

currículos dos cursos, principalmente no que diz respeito à parte prática, haja vista o

discurso de insatisfação referente à falta de prática ou de ligação entre teoria e

prática nos cursos de formação que reverbera nas falas dos profissionais de

educação.

Ainda com ralação a revisão de literatura sobre a formação docente, além da

prática, há também a necessidade de se rever os saberes disciplinares ministrados

nos cursos, nos quais são formados esses docentes, em quais perspectivas teóricas

os conteúdos são abordados e de que forma os profissionais em formação são

orientados a trabalhar, a desenvolver suas aulas. E, principalmente, se tais

perspectivas estão de acordo com os documentos oficiais do pais.

Outro caminho a ser tomado para a investigação do profissional docente é

compreender como se dá a formação do professor de maneira subjetiva, entender

como tal profissional se torna educador, a partir de qual momento de sua vida ou de

sua formação isso acontece. Essa compreensão do que leva o sujeito a ser

professor e o como ele torna-se docente é um viés de pesquisa que já tem ganhado

espaço no meio acadêmico, entretanto, tais pesquisas ainda não responderam

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efetivamente as perguntas sobre a subjetividade docente, o que demonstra que

ainda são insuficientes para sabermos como acontece essa construção do eu

profissional do educador.

Investigar, compreender e divulgar são palavras frequentemente usadas por

pesquisadores de um modo geral. A investigação no campo da educação quando

envolve a participação de sujeitos, como os professores, nem sempre são bem

aceitas nos contextos escolares, pois durante algum tempo, e talvez na atualidade

ainda, tais pesquisas apenas mostravam resultados não satisfatórios em relação aos

professores. Apresentavam e apresentam esses profissionais como incompetentes,

desqualificados, descompromissados, ou seja, apenas com conotações negativas.

Além disso, tais pesquisas, ao investigar, compreender e divulgar resultados

alcançados, muitas vezes não retornam aos contextos pesquisados, o que estimula

mais ainda a não participação desses profissionais, haja vista que eles não entram

em contato com o trabalho terminado, concluído. É como se eles fossem apenas

objetos de pesquisa, somente algo a ser observado, já que não são informados dos

resultados alcançados pela averiguação.

Nesse contexto, o espaço escolar torna-se cada dia mais inacessível aos

pesquisadores, pois os docentes não querem se expor, mesmo que indiretamente,

tendo em vista que eles não são apresentados de forma direta por causa dos

procedimento ético na pesquisa. Essa dificuldade observada deve/pode ser

desconstruída com o desenvolvimento de investigações que retornem aos

participantes, mesmo que seja como forma de trabalho escrito, para torná-los

conscientes de sua realidade a partir do olhar do outro, neste caso, do pesquisador.

Na revisão de literatura sobre os gêneros discursivos, observamos que as

pesquisas que tratam dos gêneros têm abordado de maneira efetiva as

classificações, as configurações e a diferentes formas como essas formas

relativamente estáveis permeiam as práticas discursivas. Podemos perceber que tal

abordagem não está mais presente apenas na academia, pois ganhou outros

espaços que ainda não tínhamos mencionado no decorrer deste trabalho, mas que

aparecem nos discursos das professoras pesquisadas. Esses espaços são as

revistas, especializadas ou não, e as salas de aula de cursinhos, além dos cursos de

formação continuada oferecidos aos professores da rede pública de ensino.

Dessa forma, é perceptível como a teoria dos gêneros do discursos está

presente nos ambientes educacionais. No entanto, ainda é pouco discutida no

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processo de formação inicial de professoras dos cursos de Pedagogia e afins, como

veremos a partir das respostas encontradas para as questões de pesquisa desta

investigação.

Leffa (2001), numa tentativa de diferenciar o texto literário do texto científico,

afirma que na realização de uma pesquisa,

é altamente recomendável que se mostre o esforço que se despendeu para dizer o que se está dizendo. Daí, por exemplo, a necessidade de explicar a própria metodologia usada para obtenção dos dados; quanto mais o autor mostrar o empenho que teve em conseguir dados confiáveis, em aprofundar a análise realizada, talvez até replicando alguns estudos, voltando aos sujeitos pesquisados e incluindo outros − toda a demonstração desse esforço contribui para a validação do que está sendo afirmado.

Assim, voltemos à realização da pesquisa para vermos os resultados, pois

uma retomada das questões de pesquisa, dos objetivos e da metodologia usada na

investigação se torna necessária para que possamos visualizar os resultados. Então,

passemos à retomada das questões que nortearam esta investigação para vermos

se foram respondidas, se os objetivos específicos traçados no início da pesquisa

foram alcançados e a quais resultados chegamos, se atingimos o nosso objetivo

geral. Essa necessidade de confirmação das decisões tomadas no início da

pesquisa atende, principalmente, a uma questão metodológica, pois ao chegar à

conclusão de um trabalho como este, uma das indagações que nos são feitas é se

chegamos ou não aos resultados esperados.

A primeira questão de pesquisa formulada foi “A formação inicial dos

professores em Pedagogia e cursos afins contribui para a construção de seus

saberes sobre o conceito de gêneros discursivos?”. Como falamos na introdução

deste trabalho, para cada questão de pesquisa, havia questões correspondentes no

questionário aplicado às professoras. Essa primeira questão de pesquisa se

relaciona diretamente com as duas primeiras perguntas do questionário, pois essas

duas questões tratavam de perguntar se a formação inicial contribui para o trabalho

com a língua materna e se durante o período de formação houve discussão ou

mesmo aula expositiva sobre os gêneros discursivos.

A partir das respostas dadas pelas professoras a essa questão é possível

afirmar que nenhuma delas teve uma formação específica sobre o trabalho com os

gêneros em sala de aula durante a formação inicial. Isso fica evidente tantos nas

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respostas “Não” encontradas de maneira direta ou de forma indireta, como na

maioria das respostas nas quais aparentemente havia, por parte das professoras,

uma necessidade de preservação de suas faces, o que justifica as respostas

veladas dadas pelas participantes.

Nas vozes das professoras, podemos observar que não somente há uma

problemática referente ao trabalho com os gêneros nessa formação, mas com a

própria aula de português, como acontece a reflexão sobre a linguagem e seu uso

na sociedade. Uma aula de língua que leve o aluno a pensar como a linguagem está

presente em sua vida e qual a relação que ele estabelece com ela e qual deve ou

pode instaurar em um momento de interação.

Antunes (2003, p. 21), ao tratar da aula de português, fala que “É possível

documentar, atualmente, uma série de ações que as instituições governamentais,

em todos os níveis, têm empreendido a favor de uma escola mais formadora e

eficiente”. Tais ações, segundo a autora, são limitadas, mas estão acontecendo na

área de formação do professor e também nas avaliações realizadas. Uma das

iniciativas do governo abordada pela autora são os PCN.

Em relação aos PCN, não se pode deixar de reconhecer que as concepções teóricas subjacentes ao documento já privilegiam a dimensão interacional e discursiva da língua e definem o domínio dessa língua como uma das condições para a plena participação do indivíduo em seu meio social. (ANTUNES, 2003, p. 21-22)

Diante disso, o trabalho com os gêneros torna-se indispensável porque eles

mesmos já se constituem como práticas sociais. Sendo assim, trabalhá-los em sala

de forma adequada permite ao discente ter o contado com diferentes práticas que

demandam distintas formas de usos da linguagem, ou melhor, ter contato e refletir

sobre essas diversificadas manifestações linguageiras que permeiam a vida em

sociedade.

Para Antunes (2003, p. 22), os PCN não só tratam dessa necessidade de

uma prática voltada para o social, mas também “[...] estabelecem que os conteúdos

de língua portuguesa devem se articular em torno de dois grades eixos: o do uso da

língua oral e escrita e o da reflexão6 acerca desses usos.” Essa autora chama a

6 Grifo da autora.

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atenção para o fato de nos PCN não ser concedida aos conteúdos gramaticais

nenhuma atenção, como era possível observar em programas de ensino anteriores,

não de modo a tratar, por exemplo, da sequência tradicional das classes de

palavras.

A segunda questão de pesquisa “Nesse processo de formação inicial

emergem conceitos acerca dos gêneros discursivos? Quais?” é um complemento da

primeira e uma ponte de ligação para a terceira questão de pesquisa. Esse

questionamento está ligado tanto às duas questões iniciais do questionário, como

também às questões três e quatro, nas quais as professoras são indagadas a dizer

onde ouviram falar sobre gêneros e defini-los, conceituá-los.

As respostas dadas pelas professoras evidenciam que tal temática não foi

abordada na formação inicial e que somente na formação continuada é que elas

tiveram contato com essa teoria. Em resposta à questão quatro, somente a

Professora 5 se nega a conceituar gêneros, as demais tentam fazê-lo, apesar de

apresentarem conflitos teóricos nas definições formuladas.

A quarta pergunta do questionário foi a questão-chave da categoria do saber.

Foi nas respostas dadas pelas professoras a esse questionamento que nos

possibilitou observar o que realmente elas sabiam do assunto. Nesse ponto da

entrevista, não foi possível mais dizer que sabia, foi preciso dizer o que sabia. Diante

disso, foi notória a consciência do não conhecimento da temática pela Professora 5,

tendo em vista a negativa de definição.

Com relação às definições apresentadas pelas demais professoras, a partir

delas, podemos perceber como é emergente a necessidade do oferecimento de uma

formação docente que trabalhe especificamente com a conceituação dos gêneros,

mas não só isso, que as auxilie numa reflexão de como trabalhá-los em sala de aula.

É possível perceber o quão imprescindível é o aperfeiçoamento docente a respeito

da aula de Língua Portuguesa como um todo, para que esse profissional possa ver

os gêneros discursivos como base para o trabalho com a leitura, com a escrita, com

a oralidade, inclusive com a gramática.

Com relação à terceira questão da pesquisa “Em que medida os saberes dos

professores formados em Pedagogia e cursos afins sobre os gêneros discursivos

orientam as atividades em sala de aula? Como os gêneros são abordados nesse

ambiente de aprendizagem?” ela retoma todas as questões da entrevista já

observadas, mas contempla também a última, que trata de como essa professora

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usa os gêneros em sala de aula. As respostas das professoras e as práticas

desenvolvidas em sala de aula falam do que elas sabem e do que fazem.

Nas respostas dadas ao quinto questionamento, vemos que a maioria das

professoras diz trabalhar nessa perspectiva, com exceção da Professora 4 que diz

não destinar nenhum espaço de sua aula para as questões do ensino de Língua

Portuguesa. Entretanto, o que observamos na prática delas foi um trabalho nos

moldes tradicionais do ensino da Língua Portuguesa, um trabalho entre a

metalinguagem e o texto como pretexto para outras atividades.

Não vamos neste trabalho apontar competência ou incompetência das

professoras participantes, pois esse não foi o nosso objetivo de pesquisa.

Precisamos, assim, dizer que essa não é uma questão de competência, pois essa

relação do trabalho do profissional professor com a sua formação inicial vai além de

um contato com os saberes disciplinares que foram o foco de nossa investigação, no

entanto não os descartam.

Os saberes disciplinares estão muito presentes no cotidiano desses

profissionais, haja vista o título de polivalentes que essas professoras carregam.

Não é preciso consultar muitos livros ou enciclopédias para compreendermos o

sentido do vocábulo “polivalente” e do trabalho que essas professoras desenvolvem

nas séries iniciais do ensino. Ser polivalente, segundo o dicionário Houaiss (2010), é

apresentar muitos valores, executar diferentes tarefas, ser versátil, multifuncional. E

são essas definições atribuídas ao termo em questão que caracterizam devidamente

o trabalho dessas docentes.

Essas profissionais precisam dar conta do que é linguagem, do que são

gêneros discursivos, da forma como devem ser trabalhados os conteúdos referentes

à disciplina de Língua Portuguesa, devem saber como desenvolver as competências

da escrita, da leitura, da oralidade, além da gramática. Concomitante a isso, elas

também devem saber matemática, geografia, ciências, história dentre outras

disciplinas sobre as quais têm de ministrar aulas. Ou seja, além dos saberes dessas

disciplinas, dos saberes disciplinares, elas precisam elaborar formas de trabalhar as

diferentes temáticas de modo que os discentes possam compreender, elas

necessitam sempre didatizar tudo para que seus alunos aprendam os conteúdos

trabalhados por elas.

Diante do exposto, o saber que pesquisamos é apenas um dentre os múltiplos

existentes e que compõem o saber do profissional professor. Como vimos, esses

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saberes podem ser experienciais, curriculares e disciplinares. Durante a pesquisa,

pudemos perceber que tais saberes não se excluem, antes se complementam. Os

saberes experienciais não existiriam sem os curriculares ou sem os disciplinares.

Assim como seriam desnecessários os saberes disciplinares ao professor, caso não

fosse preciso que ele ministrasse aulas. Na profissão docente não há um saber, nem

tão pouco um mais importante do que outro. Os saberes adquiridos pelos

professores se articulam de forma que se apresentam com uma unidade e não com

algo separado, dividido, compartimentado.

Essa compartimentação só está presente na escola e nos cursos de

formação, nas divisões do conhecimento em disciplinas ou áreas do conhecimento.

Na vida cotidiana isso não acontece, pois usamos os conhecimentos de modo

articulado, no momento de resolver determinados problemas acionamos todos os

saberes que forem necessários ao mesmo tempo.

O fato de as professoras participantes da pesquisa não formularem o conceito

de gêneros em conformidade com as orientações dos PCN e de não trabalharem na

perspectiva indicada pelos documentos oficiais demonstra o quanto a formação

inicial tem de ser repensada e reestruturada para assim atender às exigências

sociais não somente com relação ao ensino de Língua Portuguesa, mas do ensino

como um todo, que visa à formação integral do aluno, à construção da cidadania dos

discentes, tornando-os participantes efetivos da sociedade.

Essa necessidade do saber disciplinar se torna evidente dada a

especificidade da formação dos participantes, cujo trabalho a ser desenvolvido em

sala de aula não pode ser outro senão o uso e a reflexão sobre a linguagem, haja

vista que é a linguagem e os saberes acerca dela que norteiam/ou deveriam nortear

as aulas de Língua Portuguesa.

Contudo, o que vemos como resultados de tais investigações são também

resultados de uma formação inicial que não tem atendido às demandas sociais, não

tem acompanhado as mudanças sobre o ensino como um todo e, sobretudo, não

tem sido repensada com o intuito de se adequar às novas tendências teóricas e

sociais. E, a partir das considerações feitas até então, podemos afirmar que a

formação inicial dos professores a esse respeito se apresenta ainda como falha e

inconsistente.

As professoras participantes desta pesquisa não sabem o que é, não têm

noção do conceito de gêneros, não os reconhecem como prática e isso as

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impossibilita de trabalhá-los de maneira adequada em sala de aula. Essa falta de

compreensão das professoras em relação aos gêneros não permite que elas

repensem suas aulas para torná-las mais condizentes com a realidade dos alunos.

Para que isso aconteça, as professoras têm de se perceberem como sujeitos

de seus saberes. Assim, concordamos com Oliveira quando afirma que

Do nosso ponto de vista, portanto, consideramos fundamental, para que os profissionais do ensino possam intervir na realidade, ou mais especificamente na sala de aula, o domínio de conhecimentos teóricos, visto que só com o domínio de técnicas não iremos muito longe, pelo contrário, entramos na roda viva das eternas substituições, sem saber o que se deixou de fazer, nem o que se está fazendo e, muito menos, por que se está fazendo [...]. (OLIVEIRA, 2001, p. 159).

Segundo Oliveira (2001), o domínio de técnicas não conduzirá a educação a

uma efetiva intervenção na realidade, não possibilitará uma formação do discente no

que diz respeito à cidadania porque o próprio professor não tem consciência do que

está fazendo e qual o objetivo de estar fazendo. Ou seja, é apenas um reprodutor de

um modelo fornecido no qual já foi treinado a executar as suas atividades.

Diante disso, o conhecimento teórico possibilita ao docente a reflexão sobre

diferentes formulações acerca das práticas educativas e também sobre as

conceituações que norteiam a prática em sala de aula. Assim, o saber disciplinar

referentes aos gêneros do discurso torna-se indispensável ao profissional que

trabalha com a linguagem porque trabalhar com linguagem é tratar da interação por

meio da linguagem, é trabalhar com formação de cidadania, com o estar no mundo e

se posicionar nele por meio da linguagem. Nessa perspectiva, é imprescindível ao

professor uma formulação sobre o gênero para usá-la em sala de aula, mas antes

disso, o próprio conceito de linguagem.

Para finalizarmos este estudo, vejamos que o iniciamos tratando do

inacabamento humano e do fato que talvez chegamos ao ponto do qual devêssemos

ter partido. Essa reflexão acerca do ponto de chagada a do ponto de partida

realizada por Freire (2000) diz respeito à consciência do inacabametnto humano e

da necessidade de reflexão sobre o ato de ensinar realizado pelo humano que por

assim ser não está acabado.

Como epígrafe deste capítulo, trouxemos as palavras bakhtinianas que

afirmam “Não há nem a primeira nem a última palavra [...]” (BAKHTIN, 2006, p. 410),

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pois somos conscientes que não fomos os primeiros a tratar dessa temática e nem

seremos os últimos. Entretanto, como já dissemos no início desse capítulo, é preciso

concluir. Segundo Bakhtin (2006, p. 280), “a conclusibilidade do enunciado é uma

espécie de alternância dos sujeitos do discurso”. Sendo assim, não concluimos o

nosso discurso, passamos o nosso turno aos demais, para que o continuem,

sabendo que sempre há o que dizer acerca do tema sobre o qual temos discutido

nesse trabalho.

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ANEXOS

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Caderno de Pesquisa

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ANEXO A

PROFESSORA 1 – 5º ANO

Aos 15 dias do mês de abril de 2010 observamos aula ministrada pela

professora D. A. O. em sua turma de quinto ano no horário das 7h15 às 8h45. No

início da aula, a professora deu alguns informes da escola e fez a leitura

compartilhada. Em seguida, distribuiu os livros de Língua Portuguesa entre os

alunos e iniciou sua aula dizendo que os alunos tinham estudado dois “tipos” de

texto: o cordel e o artigo informativo. E que os alunos já tinham visto a diferença

existente entre um texto em prosa e um em verso.

A aula estava embasada no exercício proposto pelo livro, página 25. A

proposta de atividade foi comparar o artigo e o cordel tentando compreender as

semelhanças e diferenças.

Ela falou que todo texto tem de ter um tema, tem de falar sobre algum

assunto, ter um título, um autor e tem de ser publicado em algum lugar. Por

exemplo, o artigo é publicado em jornais ou revistas e o cordel é publicado como um

livro, “é um livrinho”.

Eis os quadros propostos pela professora:

Semelhanças

Cordel Artigo

Título Título

Falam da realidade Falam da realidade

Autor Autor

Diferenças

Cordel Artigo

Não tem “olho” Tem “olho”

É escrito em verso É escrito em prosa

Pode ser ficção Só fala da realidade

Pode divertir Serve para informar

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A professora retomou o tema de ambos os textos e os quadros construídos

juntamente com os alunos. Logo em seguida ela recolheu alguns trabalhos dos

alunos e encerrou a aula indicando para casa uma atividade do livro: páginas 26 e

27.

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O cordel usado em sala:

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O Artigo usado em sala:

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Estudo do texto:

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ANEXO B

PROFESSORA 2 - 5º ANO

Aos 26 dias do mês de julho de 2010, às 7h10, a professora M. N. R. iniciou a

sua aula do dia. No primeiro momento, a professora deu alguns avisos referentes a

ida das crianças à SPBC, fez a chamada e informou a “Agenda do dia”: 1º momento:

Livro – A colcha de retalhos, atividade de interpretação e correção da atividade de

Matemática; 2º momento: Culminância do Projeto da vovó.

Depois da escrita da agenda do dia, a professora iniciou a primeira atividade

proposta na agenda. A professora apresentou a obra, a autora e iniciou a leitura da

obra. Na medida em que lia, a professora mostrava as imagens do livros às crianças.

Depois da leitura do livro, a docente perguntou se alguém tinha uma avó

parecida com a apresentada no texto. Em seguida, ela perguntou se a turma seria

capaz de recontar a história, mas a turma disse que não conseguiria contar a história

toda. Então, a professora distribuiu um resumo da obra para os alunos lerem

silenciosamente. Ao passo que alguns alunos terminavam a leitura, a professora

pedia que aguardassem os outros terminarem.

Após a leitura silenciosa, houve uma leitura coletiva, mas dividida da seguinte

forma: um parágrafo lido pelas meninas e outro pelos meninos. E logo as crianças

começaram a responder a atividade e a professora começou a passar pelas

cadeiras orientando os alunos individualmente.

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Exercício proposto pela professora:

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ANEXO C

PROFESSORA 3– 4º ANO

Aos 10 dias de junho de 2010, observamos a aula de português ministrada

pela professora M. A. P.. Chegamos à sala às 13h10, pois a sala por funcionar no

anexo à escola, é necessário um tempo para deslocamento dos alunos da escola

sede até o anexo.

A professora iniciou a aula comentando sobre o fato de os alunos serem

liberados mais cedo, às 15h, em virtude da abertura da Copa do Mundo 2010. E, em

seguida, escreveu a agenda do dia: Acolhimento, leitura compartilhada e

Matemática.

Foi então que a pesquisadora perguntou a professora sobre a observação de

uma aula de Língua Portuguesa como haviam acordado anteriormente. A

professora, a partir do questionamento, logo modificou a agenda e, em vez da leitura

compartilhada, fez um autoditado. Não era objetivo da pesquisadora modificar a

aula, a pergunta se deu em virtude da necessidade de uma observação específica, a

aula de Língua Portuguesa. A professora modificou a aula e justificou que tinha

esquecido que havia essa especificidade.

Ao entregar a atividade, a professora perguntou às crianças a respeito da

classificação dos substantivos, e destacou os próprios e os

comuns. Eis a atividade:

Logo depois da entrega, as crianças começaram a

escrever. A professora foi a uma das cadeiras auxiliar um

dos alunos que, aparentemente, não sabia ler. Assim, a

professora auxiliou os alunos com relação ao uso das

iniciais maiúsculas nos nomes próprios.

Enquanto as crianças faziam a atividade, a professora

realizou a chamada. Ao término da atividade pela maioria da

turma, a professora solicitou que escolhessem três palavras

e escrevessem uma frase com cada uma delas. Ao pedir

que os alunos escrevessem as frases, a professora disse:

“Vamos escrever frases que tenham sentido”.

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Depois da escrita das frases, a professora corrigiu no quadro todas as

palavras do autoditado. Foi então que um dos alunos pediu para escrever um texto.

Diante do pedido desse aluno, a professora facultou aos alunos a escrita das freses

ou de um texto.

Os alunos demonstraram estar com o pensamento na aula do dia anterior na

qual tinha sido trabalhada a música “Partida de futebol” do grupo musical Skank.

A professora corrigiu as frases e os textos e finalizou a aula.

Havia 29 alunos na sala. Segundo a professora, oito alunos não sabiam ler e

três alunos eram especiais.

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ANEXO D

PROFESSORA 4 – 5º ANO

Às 7h do dia 10 de junho de 2010 todos os alunos já estavam na escola, mas

não puderam ir para a sala em virtude da chuva que estava a cair. A turma

observada em uma unidade anexa da escola, e por causa da chuva, os alunos não

podiam se deslocar. Como os alunos estavam ensaiando uma música a ser

apresentada para toda a escola, esse momento de atraso possibilitou a realização

de um ensaio no refeitório da escola.

Às 7h45 chegamos à sala e a professora iniciou a aula escrevendo no quadro

o “Roteiro do dia”: 1º momento - Encerramento da leitura de Ciça; 2º momento -

correção da atividade de casa, confecção de mapas e Inglês.

Antes de entrar na sala, a professora disse a pesquisadora que não

ministrava aulas de português, pois trabalhava a disciplina quando realizava

atividades das outras matérias.

Sobre a história de Ciça, a professora retomou toda a história e iniciou a

leitura. Depois que concluiu a leitura, a professora discutiu com os launos a respeito

da história. Nesta aula, a professora retomou outras leituras feitas em sala,

especificamente uma sobre Nelson Mandela.

A atividade proposta pela professora foi, além de leitura da história a escrita

de um resumo da mesma. Assim, toda turma, silenciosamente, desenvolveu a

atividade encaminhada.

Havia 29 alunos na sala.

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ANEXO E

PROFESSORA 5– 4º ANO

Aos 12 dias do mês de abril de 2010,observamos a sala do quarto ano.

Entramos na sala às 9h57 e imediatamente a professora apresentou a proposta de

atividade a ser realizada pelos alunos. A proposta era a leitura de “O reizinho

mandão”. Em princípio, a professora solicitou uma leitura silenciosa e em seguida

leu em voz alta para que todos acompanhassem a leitura em seus livros. Eis o texto

entregue aos alunos que não tinham livros:

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Ao terminar a leitura, a professora conversou um pouco sobre o texto e

retomou a aula anterior. Os questionamentos feitos foram: “Quem era o rei?” e

“Como era o rei?”.

A professora discutiu as leis criadas pelo reizinho e solicitou que as crianças

criassem leis para a sala. Depois desse momento, ela entregou uma folha com um

questionário relacionado ao texto: a interpretação do texto. Assim, a aula pode ser

caracterizada como de leitura e interpretação de texto.

A turma estava se mostrando um pouco agitada e a professora reclamou do

comportamento dos alunos e de como isso estava afetando o não cumprimento da

agenda do dia. Em seguida ela passou a orientar individualmente os alunos em suas

respostas. O questionário proposto foi o seguinte:

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Ainda orientando as crianças, a professora retoma a frase introdutória que

caracteriza os contos de fada: “Há muitos e muitos anos”, e logo orienta os alunos a

entregarem as questões respondidas. Ao receber as atividades, ela informa a

proposta de atividade para o dia seguinte: Produção de quadrinhos.

Nesta aula estavam presentes 35 alunos.

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ANEXO F

PROFESSORA 6 – 4º ANO

Aos 12 dias de abril de 2010, às 7h15 chegamos à sala e esperamos o início

da aula, pois a professora estava esperando os alunos que chegariam no ônibus

destinado a pegá-los em casa e levá-los até a escola. Enquanto isso, a professora

organizou a sala dispondo as cadeiras em duplas, em filas duplas. Com a chegada

dos alunos que estavam faltando, ao todo, estavam presentes 32 crianças na sala.

Às 7h25, a diretora passou pela sala para desejar bom dia aos alunos e boas-

vindas à pesquisadora. Aproveitando a oportunidade, a professora apresentou à

turma a pesquisadora.

Logo em seguida, foi feita uma oração e a professora levou os alunos para a

quadra de esportes da escola para fazer a leitura compartilhada. Houve, em

princípio, a apresentação da obra O patinho feio. Durante a leitura, a professora foi

várias vezes interrompida pelas conversas dos alunos. As crianças demonstraram-

se indisciplinadas e não acostumadas a essa prática. Além de O patinha feio, a

professora apresentou a obra Ou isto, ou aquilo de Cecília Meireles e leu as poesias

“O sonho e a fronha” e “A chácara do Chico Bolacha”. Ao retornarmos à sala já eram

7h45 e a professora solicitou que os alunos opinassem acerca da leitura feita.

Depois desse momento, a professora pediu que os alunos abrissem o

caderno na tarefa de matemática enviada para casa e recolheu os livros que

estavam com eles. Ela corrigiu no quadro a atividade e quanto conclui essa etapa da

aula já eram 8h20.

Às 8h30, apresentou a atividade do dia e solicitou que um dos alunos lesse o

bilhete. Depois da leitura, ela perguntou sobre o assunto do bilhete e pediu para os

alunos responderem o bilhete dizendo o que acham da realização da festa. Nesse

momento ela explicou que a resposta deveria ser feita no caderno individualmente

ou em dupla. Eis o bilhete entregue às crianças:

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Então a professora disse: “O que você acha da idéia de angélica?”. E um dos

alunos respondeu: “Eu achei legal”. A professora orientou apenas um dos alunos a

assinar o bilhete. Para finalizar a atividade, a professora escreveu um bilhete no

quadro:

Angélica,

Eu achei a idéia muito importante. Você pode contar com a minha ajuda.

R.

Depois da escrita do bilhete no quadro, a professora disse que os alunos

assinassem os bilhetes. E, nesse momento, tocou o aviso do intervalo. Ao retornar

do intervalo a professora escreveu novamente o mesmo bilhete, mas usando todas

as letras maiúsculas. Na volta do intervalo as crianças estavam muito agitadas. A

professora escolheu um dos bilhetes escritos pelos alunos e perguntou se eles

queria que ela lesse mais alguns. Então, ela colou os modelos dos bilhetes nos

cadernos das crianças e finalizou a proposta de atividade dizendo que as crianças

teriam mais cinco minutos para terminarem de copiar o bilhete do quadro. O

encerramento da aula de português se deu às 9h45.

Segundo a professora, há 16 crianças na sala que não saber ler.

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ANEXO G

PROFESSORA 7 – 4º ANO

Aos 14 dias do mês de maio de 2010 observamos a aula de Língua

Portuguesa da professora J. S. F., ministrada em sua sala de quarto ano. No

primeiro momento da aula a professora escreveu a “Pauta do dia” no quadro para

que os alunos escrevessem. Eis a pauta: 1. Português, 2. Recreio e 3. Revisão de

História e Geografia.

Depois desse momento, a professora iniciou a aula perguntando sobre a

pesquisa feita por eles a respeito do quem vem no convite. E, logo em seguida

escreveu no quadro o que os alunos disseram sobre o convite. As crianças

afirmaram que no convite tinha: local, data, hora e nomes referentes ao remetente e

ao destinatário.

Então, a professora foi pegando os convites trazidos pelos alunos e afirmou “o

convite é m texto epistolar”. Logo a professora entregou uma atividade sobbre o

convite:

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E escreveu no quadro:

Assunto: Convite

Existem muitos tipos de convite: para festas de aniversário, casamentos,

formatura, desfiles, palestras, festas da escola, entre outros.

O convite precisa dos seguintes elementos para ser completo:

- Nome da pessoa que stá sendo convidada;

- data, horário e local do acontecimento ou evento;

- tipo da comemoração;

- nome da pessoa ou instituição que está enviando o convite.

Depois que escreveu esse texto sobre o convite, a professora passou nas

cadeiras dos alunos para colar a atividade deles no caderno. Nesse momento

também corrigiu as atividades individualmente, dos alunos que já tinham respondido,

e respondeu coletivamente a atividade de modo que os que ainda não tinham

respondido pudessem completar a atividade.

Em seguida a professora entregou papéis aos alunos para que eles

escrevessem/criassem os seus convites. Depois do tempo destinado à escrita dos

convites, as crianças puderam ler suas produções. Foi então que um dos alunos

perguntou se poderia entregar o convite produzido e a professora respondeu que

sim. Então, outro perguntou se poderia fazer o convite para o seu vizinho, e,

novamente, a professora respondeu que sim. Nesse momento, tocou o aviso da

hora do intervalo.

Na volta do intervalo, a professora

retomou “o convite”, entregando os

convites da festa das mães que seria

realizada na escola:

Havia 19 alunos na sala. Essa turma

tem um número reduzido de alunos, pois

tem três alunos com deficiência auditiva.