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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOBIOLOGIA NARA PAVAN LOPES VARIABILIDADE ACÚSTICA NOS BOTOS-CINZA (Sotalia guianensis, VAN BENÉDÉN, 1864) NATAL 2016

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE … · Um dos principais sons emitidos pelos golfinhos em suas interações é o assobio ... (produz sons mais agudos) ou animais de maior

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM PSICOBIOLOGIA

NARA PAVAN LOPES

VARIABILIDADE ACÚSTICA NOS BOTOS-CINZA (Sotalia guianensis,

VAN BENÉDÉN, 1864)

NATAL

2016

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NARA PAVAN LOPES

VARIABILIDADE ACÚSTICA NOS BOTOS-CINZA (Sotalia guianensis,

VAN BENÉDÉN, 1864)

DEFESA DA DISSERTAÇÃO APRESENTADA AO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

PSICOBIOLOGIA DA UNIVERSIDADE

FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, COMO REQUISITO PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE MESTRE EM PSICOBIOLOGIA (ÁREA: COMPORTAMENTO ANIMAL).

Orientadora: Profa. Dra. Renata

Santoro Sousa- Lima

NATAL

2016

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NARA PAVAN LOPES

VARIABILIDADE ACÚSTICA NOS BOTOS-CINZA (Sotalia guianensis,

VAN BENÉDÉN, 1864)

Natal, 08 de abril de 2016

Banca avaliadora

______________________________________

Profa. Dra. Renata Santoro Sousa-Lima

Departamento de Fisiologia – UFRN

Orientadora

_____________________________________

Dra. Fernanda Camargo

Fundação Pró-TAMAR – BASE CLBI, RN

Membro externo

___________________________________

Prof. Dr. Artur Andriolo

UFJF

Membro externo

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AGRADECIMENTOS

A realização deste mestrado foi um processo de grande amadurecimento em minha vida

e só tenho a agradecer a todos aqueles que tiveram envolvimento. Principalmente agradeço aos

meus pais, que, mesmo estando longe, me apoiam com um amor que é maior que o mundo!

Com vocês tenho uma dívida eterna, que só posso pagar com amor! Em seguida, agradeço pelo

suporte imenso da família, que me compreende e apoia o caminho que sigo na vida.

À Renata, minha orientadora, por ter me proporcionado esta experiência única de fazer

ciência, de um jeito muito especial, e pelas orientações fundamentais, que me amadureceram

muito ao longo do trajeto!

Aos meus queridos Daniel, Júlia, Gustavo, Fernanda, Mel, Lara, Paulo e Thamires, por

me ajudarem (muito!) nas coletas e análises de dados, pois sem vocês não teria feito a metade

do que fiz! Muito obrigada mesmo!

À Aline, minha irmã de alma, que está comigo sempre no coração, e que me ajuda a

fazer a caminhada da vida, me acompanhando a cada passo e me fazendo ver a riqueza e a

felicidade que há nessa vida, sempre olhando o lado positivo de tudo e com muita paciência

para se viver!

Por fim, a todas as energias boas que trouxeram pessoas maravilhosas no meu caminho

e me fizeram amadurecer profissional e pessoalmente, afinal...

“Quem de dentro de si não sai, vai morrer sem amar ninguém”

Vinicius de Moraes

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RESUMO GERAL

Na comunicação o sinal é transmitido por um emissor e pode carregar informações a respeito de sua identidade, seu tamanho, seu status sexual, suas habilidades para luta e sobrevivência. Múltiplos fatores podem interferir nessa comunicação, alterando o sinal emitido em consequência de variação no ambiente, na morfologia corporal, na aprendizagem social e na transmissão cultural. Sinais acústicos podem variar entre populações. O dialeto é a variação nos sinais de duas populações que trocam genes e variação micro ou macrogeográfica, dependendo da distância, existe entre populações onde não há intercâmbio de indivíduos. Estes termos não estão bem estabelecidos na comunidade científica e muitas vezes são considerados sinônimos ou são usados incorretamente, por isso foi feita uma revisão para explicar os termos envolvidos na variação acústica. Uma padronização dos termos foi proposta esclarecendo os processos que podem ou não estarem relacionados com a evolução desta tipo de variação. A variação acústica está presente em sinais de odontocetos (golfinhos e outros cetáceos com dentes, Ordem

Cetartiodactyla), que usam esta modalidade de comunicação na mediação de interações sociais, para obtenção de alimento e para orientação espacial. Um dos principais sons emitidos pelos golfinhos em suas interações é o assobio (som tonal de frequência modulada). O objetivo desse estudo foi comparar os assobios dos botos-cinza (Sotalia guianensis) coletados em Baía

Formosa, RN (6o 22' S; 35

o 00' W) com dados publicados das demais localizades na América

Latina. Os resultados mostram correlações significativas entre frequência máxima e final e entre inicial e mínima, tanto em Baía Formosa, quanto nos outros locais, indicando uma preponderância de assobios com modulação de frequência ascendente para a espécie em toda sua distribuição. A duração teve uma correlação negativa significativa com a frequência inicial

em todos os locais comparados (p < 0,00001 e r2 = 0,71) e pode indicar que existe um limiar

fisiológico para produção de assobios muito agudos. A análise de componentes principais dividiu os locais em dois grupos maiores, porém não foi devido a uma variação latitudinal. Provavelmente diferenças no método de amostragem (equipamentos com taxas de frequência limite distintas e parâmetros de análise espectral distintos), variações no ambiente, diferenças

nas frequências de filhotes (produz sons mais agudos) ou animais de maior porte (emite frequências menores) e aprendizagem vocal social podem estar mascarando efeitos geográficos nos padrões vocais.

Palavras-chave: variação geográfica, dialeto, boto-cinza, Rio Grande do Norte, assobios,

variação acústica, comunicação

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ABSTRACT

In communication a signal is transmitted by a sender and can carry information about its

identity, size, sexual status, ability to fight and to survive. Multiple factors can interfere with

this communication, varying the output signal as a result of variation in the environment, body

size, social learning and cultural transmission. Acoustic signals may vary within species

between populations. Dialects are signal variations of two populations that can exchange genes

and geographic variation micro- or macro-geographic, depending on the distance, occurs when

individuals from different populations don’t mix. These terms are not well established in the

literature and are often considered the same or used errouneously, thus a revision was made to

clarify the terms involved in acoustic variation. A standardization of terms is proposed and

clear deffinitions presented based on the processes that may or may not be related to the

evolution of variability. Odontocetes (toothed whales, Order Cetartiodactyla) use acoustic

communication in the mediation of social interactions, to obtain food and to navigate. One of

the main sounds produced by dolphins in their interactions is the whistle (frequency modulated

tonal sound). This study aimed to compare whistles of estuarine dolphins (Sotalia guianensis)

collected in Baía Formosa, RN (6o 22' S; 35° 00' W) with published data from other sites in

Latin America. The results show significant correlations between maximum and end

frequencies as well as between initial and minimum frequencies in Baía Formosa as well as in

all other places, indicating a preponderance of frequency ascending whistles used by the

species along its distribution. The duration had a significant negative correlation with the initial

frequency at all locations tested (p <0.00001 and r = 0.71) and suggests a physiological

threshold for high frequency whistles. The principal component analysis divided sites into two

major groups, but the discrimination was not related to latitudinal variation. Sampling

differences (equipment with distinct sample rates) and analyses with different parameter values

likely resulted in different results. Other likely explanations are: variations due to the

environment, presence and percentage of calves in the data samples (producing higher

frequency sounds) or larger animals (emit lower frequencies) and social vocal learning.

Key-words: geographic variation, dialect, estuarine dolphin, Rio Grande do Norte, whistles,

acoustic variation, communication

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO GERAL ..................................................................................................................... 10

2. OBJETIVOS ............................................................................................................................................. 17

3. MANUSCRITO 1 .................................................................................................................................... 18

RESUMO ....................................................................................................................................... 18

INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 19

OBJETIVOS ................................................................................................................................. 21

MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................................... 22

RESULTADOS ............................................................................................................................. 22

DISCUSSÃO ................................................................................................................................. 36

CONLCUSÃO .............................................................................................................................. 42

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................43

4. MANUSCRITO 2 .................................................................................................................................. 52

RESUMO.........................................................................................................................................52

INTRODUÇÃO...................................................................................... .......................................54

OBJETIVOS............................................................................................................................. .....58

MATERIAL E MÉTODOS.....................................................................................................58

ÁREA DE ESTUDO...................................................................................................................58

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COLETA DE DADOS..................................................................................................59

ANÁLISE DE DADOS................................................................................................................60

RESULTADOS............................................................................................................................. .60

ANÁLISE DE CORRELAÇÃO ENTRE AS VARIÁVEIS..........................60

ANÁLISE DE COMPONENTES PRINCIPAIS...............................................69

DISCUSSÃO......................................................................................... .......................................70

CONCLUSÃO.............................................................................................................................78

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................80

5. CONCLUSÃO GERAL ........................................................................................................................ 88

6. REFERÊNCIAS GERAIS ................................................................................................................... 89

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Introdução Geral

É importante compreender as origens da diversidade para se entender a evolução

biológica por trás dela (Campbell et al, 2010). Para compreender processos evolutivos como

adaptação, especiação e seleção sexual, deve-se estudar as forças da seleção natural que estão

influenciando o processo de comunicação (Amézquita et al, 2006).

A visão clássica da comunicação envolve um emissor (que manda o sinal), um sinal e

um receptor (que recebe o sinal do emissor). Contudo, há outros fatores que podem influenciar

a comunicação que a visão clássica não aborda. Tyack (2000) redefine o conceito de

comunicação considerando 5 fatores que podem influenciar na interpretação do sinal e afetam o

conceito clássico de comunicação. O primeiro ele chama de “anúncio”, no qual o emissor

poderá produzir um sinal de anúncio que tem a função de modificar a decisão do receptor, ao

invés de trocar informações com ele. O segundo fator chama-se “comunicação tônica”, na qual

o receptor nem sempre responderá rapidamente a mensagem contida no sinal do emissor, como

diz a visão clássica. Isso acontece com fêmeas de algumas espécies, quando escutam o sinal

dos machos e demoram a respondê-los. Outro fator é a “manipulação”, na qual um emissor

emite um sinal para enganar o receptor quanto ao seu tamanho, por exemplo. O quarto é

chamado de “ alterações do ambiente” e pode causar interferências nos sinais a medida que

passam por ambientes com diferenças de ruídos, por exemplo. O receptor, então, poderá

interpretar o sinal de forma a saber a distância que o emissor está dele e a qual profundidade do

oceano ele se encontra, por exemplo. Por último está o fator de “aprendizagem social e

comunicação interespecífica”, no qual pode haver interceptação do sinal por um terceiro

indivíduo, que aprenderá informações sobre o contexto do sinal emitido pelo emissor.

Sinais acústicos podem se mostrar bons modelos para estudar a evolução da

comunicação, uma vez que a variação, nesse caso, é mais fácil de quantificar (Morisaka et al,

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2005) e pode ser acumulada em pouco tempo por espécies ou populações, tendo um impacto

grande na resposta do receptor (Campbell et al, 2010). Há um grande interesse pelo estudo da

evolução do sinal transmitido entre um emissor e um receptor e uma parte desse interesse se dá

pela possível existência da relação entre a variação do sinal e o processo de especiação (Podos

& Warren, 2007), podendo, então, causar isolamento reprodutivo.

Entender as causas da evolução do sinal se mostra fundamental para compreender o

modo como os animais se comunicam. Por mais que existam muitas causas que tentem explicar

e hipotetizar a variação do sinal, a importância relativa a respeito ainda se mantém

desconhecida ou pouco estudada (Irwin & Irwin, 2008). A possibilidade de uma variação

intraespecífica gerar especiação ao longo do tempo, mostra a grande capacidade dos seres vivos

se adaptarem a diversos locais (Morton, 1975), se relacionarem com co-específicos e

optimizarem suas capacidades de reprodução (Irwin & Irwin, 2008).

Um dos principais processos que causam a evolução do sinal é a seleção sexual (Irwin

& Irwin, 2008). Fêmeas tendem a ter preferências (que podem mudar depedendo do local) por

sons específicos e induzem os machos a vocalizarem nesses padrões. Em espécies de pássaros,

fêmeas geralmente preferem machos que cantam canções longas e complexas (Kroodsma,

1976).

Outro ponto crucial envolve as causas estocásticas, as quais envolem mutações e

isolamento, mas principalemente a seleção social (Irwin & Irwin, 2008). Esta última é

fundamental, pois sinais que passam por esse processo podem mostrar mudanças evolutivas

rápidas e não premeditadas dentro de populações (Irwin & Irwin, 2008). Indivíduos podem ter

grande facilidade de aprender cantos novos para se adaptarem aos grupos de animais e esses

grupos, ao longo do tempo, podem mostrar divergências entre os sinais emitidos por cada um,

além de diferenças genéticas (Marshal et al, 1999, Mundinger, 1995).

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Dentro da seleção social há a aprendizagem vocal, que envolve a capacidade do

indivíduo de modificar a estrutura acústica da vocalização, baseada em seu sistema auditivo

(Tyack, 2008), a partir de suas interações sociais. A aprendizagem vocal pode influenciar em

alguns aspectos da comunicação e, segundo Janik (2014), há a aprendizagem vocal contextual,

no qual os indivíduos aprendem a associar sinais que já existem com contextos novos, o que

pode interferir no uso do sinal (quando ele será usado) e no significado que ele carrega

(aprendizado por compreensão). Desse modo, o animal é capaz de associar a produção do som

com contextos de aprendizagem. Outra aprendizagem é relacionada com a habilidade de

produzir sons que são similares ou distintos de um modelo acústico previamente sabido (Janik

& Slater, 2000). A principal distinção entre as duas formas de aprendizagem está em como os

animais aprendem contextos diferentes para utilizar um sinal já existente, ou se os animais

modificam as características acústicas de um som para ele ser mais ou menos parecido com o

som que escutaram (Tyack, 2008).

A aprendizagem pode estar envolvida em processos que mantêm tradições culturais em

animais, as quais são descritas como comportamentos aprendidos e passados para outros

membros da população, ao longo de gerações (Cerchio, 1993). Segundo este último, grupos de

tradições produzidas por uma população podem ser consideradas “cultura”, a qual seria

reproduzida e transmitida de geração para geração através do processo de aprendizagem, o que

é chamado de transmissão cultural. Conforme as tradições culturais são passadas, algumas

gerações podem modificá-las, produzindo mudanças graduais em tradições antigas e trazendo

novas para o repertório, o que é chamado de evolução cultural (Payne, 1985, Cerchio, 1993). A

evolução cultural é vista em muitas espécies de animais e pode ocorrer no comportamento

vocal dos mesmos, alterando seus repertórios e produzindo variabilidade entre eles (Rendell &

Whitehead, 2001, Ford, 2008, Slater, 1986).

A partir do estudo da comunicação acústica, tem sido possível analisar como ocorre a

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adaptação dos animais a diferentes condições do ambiente (Warren et al, 2006). A distância

pela qual o sinal viaja e carrega uma informação pode depender da amplitude e da estrutura do

som a partir de uma fonte (emissor), da característica do meio de transmissão e da capacidade

do receptor de receber e detectar o sinal (Wiley & Richards, 1978). Alterações de ruído

ambientes também podem interferir nessa transmissão, promovendo um desafio para os

animais escutarem os sons através de ruídos naturais e antropogênicos (Holt et al, 2008). Uma

vez que o som se propaga de maneira diferente em cada ambiente, a força da seleção deve

favorecer aqueles sons que optimizam a comunicação entre os animais (Morton, 1975). Desse

modo, a habituação às condições ambientais pode promover a seleção de vocalizações

diferentes para duas populações que escolheram ambientes distintos para viver, o que pode

favorecer a especiação ao longo do tempo. Esta hipótese de Morton (1975), chamada

“adaptação acústica”, argumenta que os indivíduos se adaptariam de forma diferente em

condições ambientais distintas, modificando suas vocalizações para que sua recepção seja

optimizada.

Como já foi visto, um dos principais tipos de sinais utilizados no reino animal é o

acústico e sua emissão pode variar de diversas formas em nível de espécie, população e

indivíduo. Sinais envolvidos na comunicação dentro de uma espécie são vistos em muitos taxa

no reino animal (Wilson, 1975). A capacidade de reconhecer e se comunicar com co-

específicos é necessária em muitas circunstâncias (Steiner, 1981), principalmente em animais

sociais como os cetáceos (grupo de mamíferos aquáticos que envolve misticetos, sem dentes, e

odontocetos, com dentes), uma vez que possuem uma estrutura social muito rica e um

repertório vocal extenso (Steiner, 1981). Diferenças entre espécies podem ser explicadas por

diferenças nas pressões seletivas, uma vez que tais espécies vivem em locais diferentes e

podem enfrentar situações distintas umas das outras (Steiner, 1981), provocando mudanças nas

vocalizações emitidas, utilizando de forma diferente o processo de comunicação.

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As baleias orcas (Orcinus orca) vivem em grupos sociais estáveis e organizados em

linhas maternais e muitas evidências comprovam a existência de transmissão cultural nesses

animais, que envolvem a aprendizagem social vocal e não vocal (Deecke et al, 2000). O

comportamento vocal aprendido pode ser modificado pelo hábito alimentar dos indivíduos. Há

duas populações no Alasca e na costa da Colômbia Britânica do oceano Pacífico que são

simpátricas e geneticamente distintas, sendo que uma (residente) se especializaou em forragear

peixes e a outra (transiente) se alimenta de mamíferos aquáticos (Bigg et al, 1987). De acordo

com a especialização da dieta escolhida pelo grupo de orcas, a frequência de ecolocalização

emitida é alterada. Isso ocorre, pois cada presa tem uma sensibilidade auditiva distinta e, para

ultrapassar esse obstáculo e impedir que sua presa não escute seu sonar, a orca deve adaptar seu

som para frequências em que isso não ocorra (Barret-Leonard et al, 1996), desencadeando

numa cooperação à evolução e adaptação da espécie. Sendo assim, a capacidade de percepção

das presas a respeito de seus predadores (baleias orcas, nesse caso) se mostra importante no

estudo da variabilidade da comunicação acústica, podendo acarretar em mudanças permanentes

no comportamento vocal desses grupos.

Assim como a disponibilidade de alimentos varia de acordo com o hábitat, a

temperatura de cada local também, o que pode interferir na comunicação acústica de muitos

animais, principalmente os ectotérmicos, os quais obtêm calor exclusivamente pelo ambiente

(Narins et al, 2014). Espécies de sapos de árvore (famímia Hylidae) parecem modificar seu

sistema de reconhecimento do sinal de modo que seus co-específicos respondam com

preferência aos sinais que são mais parecidos com aqueles produzidos por um emissor na

mesma temperatura que a sua própria (Gerhardt & Mudry, 1980). Além disso, conforme a

temperatura de um local aumenta, a repetição de um chamado aumenta também, enquanto que

os parâmetros de duração diminuem (Luddecke & Sánchez, 2002). Animais homeotérmicos

como mamíferos e aves não são afetados pela temperatura, uma vez que controlam a de seu

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corpo, não interferindo na produção de som (Jensen et al, 2011). Contudo, filhotes de animais

endotérmicos podem produzir variações no sinal produzido, uma vez que ainda não conseguem

manter a temperatura corporal estável, como acontece com filhotes de morcegos Epitesicus

fuscus, no estudo de Camaglan et al (2006). Nesse estudo verificou-se que a temperatura pode

alterar as vocalizações dos filhotes e, por consequência, o reconhecimento entre mães e seus

filhotes.

Outro promotor da variabilidade é o tamanho de estruturas corporais (Fletcher, 2004,

Morton, 1977, Fitch, 1997), uma vez que é sabido que animais com maior tamanho corporal

produzem sons mais graves e vice-versa, promovendo uma relação inversamente proporcional

do tamanho corporal com as vocalizações produzidas (Fletcher, 2004, Morton, 1977, Fitch,

1997). May-Collado et al (2007a e 2007b) realizaram estudos filogenéticos sobre a evolução de

componentes de frequência em sons tonais de cetáceos e verificaram que a evolução da

frequência mínima parece estar relacionada com o tamanho corporal e de grupo desses

indivíduos. Já a complexidade do assobio (medida a partir da média de pontos de inflexão dos

assobios) é influenciada pela estrutura social do grupo. Segundo May-Collado et al (2007a), o

tamanho corporal pode ter favorecido a evolução de sons com frequências baixas, as quais

permitiriam interações de longas distâncias. Contudo, esse estudo não comprova que haja uma

relação inversa entre tamanho corporal e frequência máxima.

Além desses estudos, é sabido que em baleias cachalote (Physester macrocephalus) há

uma relação entre os estalidos emitidos por elas e o tamanho corporal dos indivíduos. Segundo

Goold & Jones (1995) cada interpulso gerado nos cliques é proporcional ao comprimento do

órgão de espermacete e, portanto, proporcional ao tamanho do animal.

Com base nesses estudos, pode-se pensar que a evolução das vocalizações, a partir de

interferências corporais, de hábitat ou culturais, podem induzir a modificação de sons a ponto

de transformar uma espécie em duas ou mais, uma vez que não conseguem mais se comunicar.

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A partir do momento que se considerar o som como característica fenotípica e promotora de

divisões filogenéticas, pode-se pensar em especiação pelo som. Desse modo, se os sons

produzidos por animais forem analisados junto a outros fatores promotores da variabilidade ao

longo do tempo, como análises genéticas, pode-se fornecer evidências contundentes para

responder muito mais perguntas a respeito de filogenia, evolução, comportamento e ecologia

dos animais.

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VARIABILIDADE ACÚSTICA NOS BOTOS-CINZA (Sotalia guianensis, VAN

BENÉDÉN, 1864)

OBJETIVOS

Objetivo Geral 1: realizar uma revisão crítica sobre os conceitos de variação geográfica

acústica e dialeto.

Objetivos específicos:

- identificar os processos que contribuem para a evolução da variação geográfica

acústica e do dialeto encontrados na literatura

- apontar incongruências no uso dos mesmos nos artigos encontrados.

Objetivo Geral 2: comparar os assobios obtidos dos botos-cinza em Baía Formosa com os dados

obtidos em outras localidades do Brasil e Costa Rica .

Objetivos específicos:

- verificar se há variação latitudinal contínua dos assobios ao longo das áreas

estudadas.

- analisar a relação entre pararâmetros de frequência e duração nos assobios das áreas

estudadas.

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Manuscrito 1: a ser submetido para a revista Biological Reviews

Variação geográfica acústica e dialeto: uma revisão sobre os processos envolvidos na

evolução e manutenção da variabilidade acústica

Nara Pavan Lopes, Renata Santoro Sousa-Lima*

Departamento de Fisiologia, Centro de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, Natal, RN, Brasil.

Resumo

Na comunicação o sinal é transmitido por um emissor e pode carregar informações a respeito

de sua identidade, seu tamanho, seu status sexual, suas habilidades para luta e sobrevivência.

Múltiplos fatores podem interferir nessa comunicação, alterando o sinal emitido em

consequência de variação no ambiente, na morfologia corporal, na aprendizagem social e na

transmissão cultural. Sinais acústicos podem variar entre populações. O dialeto é a variação nos

sinais emitidos por animais de duas populações que trocam genes e variação micro ou

macrogeográfica, dependendo da distância, existe entre populações onde não há intercâmbio de

indivíduos. Estes termos não estão bem estabelecidos na comunidade científica e muitas vezes

são considerados sinônimos ou são usados incorretamente, por isso foi feita uma revisão para

explicar os termos envolvidos na variação acústica. Uma padronização dos termos foi proposta

esclarecendo os processos que podem ou não estarem relacionados com a evolução deste tipo

de variação.

Palavras-chave: dialeto, variação geográfica, comunicação, variabilidade, variação acústica

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1. Introdução

Todo sinal acústico carrega uma informação por uma distância, a qual varia, uma vez

que depende da amplitude e da estrutura do som a partir da fonte, das características do meio e

seus limites e da capacidade do receptor detectar o sinal enviado (Wiley & Richards, 1978).

Na comunicação o sinal é transmitido por um emissor e pode carregar informações a

respeito de sua identidade, seu tamanho, seu status sexual, suas habilidades para luta e sobre

suas capacidades como predador (Ey & Fischer, 2009). Segundo Ey & Fischer (2009) esse

comportamento acústico transmite uma informação, levada de um emissor para um receptor, a

qual pode ser usada como uma estratégia de reprodução (atrair fêmeas ou mostrar aos outros

machos potenciais a sua capacidade, por exemplo) ou de sobrevivência (avisar co-específicos

sobre possíveis ameaças, por exemplo). Desse modo, se alguma parte desse sinal for perdida ao

longo de sua propagação, ele pode não ser efetivo na resposta do receptor (Ey & Fischer,

2009).

De modo a evitar a perda total ou parcial do sinal transmitido, muitos animais

modificam suas vocalizações com a função de maximizar o seu alcance de propagação (May-

Collado & Wartzok, 2008). Outros animais alteram seus sinais para facilitar a comunicação

entre os grupos, possibilitando, assim, o reconhecimento de indivíduos do grupo a partir do

som (artigos). Esses tipos de modulação do sinal geram a variação acústica.

1.1 Variabilidade Acústica: Conceitos e Terminologias

Dois termos são usados principalmente para definir variações acústicas nos repertórios

dos animais: dialeto e variação geográfica. De acordo com Nottebohm (1969), os dialetos são

definidos como diferenças nos sons produzidos por populações vizinhas de indivíduos com

provável capacidade de cruzamento. Já a variação geográfica, ocorre quando há distinção nas

vocalizações de indivíduos separados por distâncias maiores, entre populações que raramente

ocorre fluxo gênico (Conner, 1981). Outros autores abordam esta variação geográfica podendo

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ser micro ou macrogeográfica. A primeira ocorre entre populações menos distantes umas das

outras, enquanto a última está presente entre populações separados por distâncias maiores

(Conner, 1981; Krebs and Kroodsma, 1980).

A distinção entre dialeto e variação geográfica em sons produzidos por animais ainda

não está clara entre os autores que abordam estes temas, uma vez que os dois fenômenos são

usados, muitas vezes, com significados semelhantes, perdendo de vista as diferenças existentes

entre eles, a partir do enfoque evolucionista (Nottebohm, 1969).

Muitos animais produzem variações em sua comunicação acústica, o que leva

estudiosos a apontarem possíveis causas da formação do dialeto como: um aprendizado social

mantido (ocorre quando indivíduos observam e imitam a ação de outros); uma tendência para

especiação ou mesmo como meio de transmissão cultural (envolve a capacidade de indivíduos

presentes em um grupo social de aprenderem e passarem novas informações para outros

indivíduos desse grupo) (Planqué, 2014).

Modificações nos ambientes, sendo elas naturais ou antropogênicas, também podem

provocar mudanças nas vocalizações (variação geográfica) de uma série de espécies que

utilizam o som como meio de comunicação. Dessa forma, cada população sofreria influências

evolutivas e ambientais distintas (Conner, 1982), que podem levar em conta ruídos locais, a

estrutura topográfica e o hábito dos animais residentes, por exemplo.

Estudos sobre variações intraespecíficas identificaram diferenças entre populações de

golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) (Wang, 1995, May-Collado & Wartzok, 2008,

Morisaka, 2005b, Baron, 2008), golfinho-pintado-do-atlântico (Stenella frontalis) (Baron,

2008), botos-cinza (Sotalia guianensis) (Azevedo & Van Sluys, 2005, Rossi-Santos e Podos,

2006), indicando que essas espécies têm variabilidade no repertório acústico e que este último

se modifica de acordo com os locais em que os animais habitam, gerando dialetos ou variação

geográfica.

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Vocalizações de grupos mais próximos tendem a ter características de parâmetros

acústicos semelhantes (Rossi-Santos & Podos, 2006) e uma explicação para isso é a interação

entre os grupos. Quanto mais os indivíduos interagem, mais semelhantes serão suas

vocalizações (Bázua-Duran, 2004).

Populações que se separam por distâncias maiores tendem a produzir vocalizações mais

diferenciadas, uma vez que sofrem interferências distintas tanto bióticas quanto abióticas. Pode

haver mudanças nas condições de hábitat e nas relações intra e interespecíficas dos animais que

modifiquem o sinal transmitido, produzindo variações em forma de dialeto e/ou variação

geográfica na forma de comunicação, que passem de geração para geração. Desse modo, os

indivíduos sofreriam pressões seletivas distintas, podendo conduzir à especiação (Campbell,

2010, Jones & van Parijs, 1993).

Sendo assim, será discutido a seguir os processos envolvidos na variação do sinal, que

promovem a variação acústica e o dialeto. Os assuntos foram divididos em seções, as quais

explicam os processos relacionados com hábitats, interações sociais e morfologia corporal.

2. Objetivos

Objetivo Geral: realizar uma revisão crítica sobre os conceitos de variação geográfica

acústica e dialeto.

Objetivos específicos:

- identificar os processos que contribuem para a evolução da variação geográfica

acústica e do dialeto encontrados na literatura

- reformular a terminologia de variação acústica

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3. Material e Métodos

Foi realizado um levantamento da literatura através da, ferramenta de busca do Google

Acadêmico e da base literária ISI Web of Science. As palavras chaves utilizadas foram: dialect,

acoustic variation, geographic variation, plasticity, vocal learning, cultural transmission.

A busca foi feita procurando artigos que relacionassem a variação acústica com fatores

como ruído, tamanho corporal, aprendizagem vocal, plasticidade e transmissão cultural, como

promotores da produção de dialetos os variações geográficas.

4. Resultados

4.1 Fatores Geradores de Variabilidade Acústica

4.1.1 Genética

Quando se procura compreender os fatores que geram variabilidade nos sons emitidos por

diferentes populações de uma mesma espécie, é importante compreender a estrutura dessas

populações, observando a existência prévia de variação em outros elementos, sejam eles genéticos,

morfológicos, anatômicos, comportamentais ou mesmo relativos à composição dos agrupamentos e

à forma como os grupos se relacionam. Além disso, o conhecimento da posição geográfica dessas

populações e das características ambientais a que cada uma está submetida é fundamental para que

se possa entender as diferenças observadas (Whitehead et al, 1998). Na maioria dos casos,

indivíduos que se assemelham geneticamente, possuem padrões vocais semelhantes, o que pode

ocorrer, pois esses fatores estão diretamente correlacionados ou por processos como transmissão

cultural, uma vez que em cetáceos é sabido que a comunicação acústica é aprendida em ambiente

social e transmitida culturalmente (Whitehead et al, 1998).

Indivíduos, no geral, têm uma pré-disposição genética que os permite serem capazes de

associar informações e aprendê-las como fatores necessários de alteração (mudanças no

hábitat) e de transformação ao longo do tempo (aprendizagem vocal e transmissão cultural).

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Mas além disso deve haver uma combinação da pré-disposição genética com a presença desses

fatores motivacionais, para assim, quando juntos, formarem uma mudança fenotípica.

Uma grande pergunta que se deve fazer é “a que ponto a diferença observada entre

indivíduos é gerada por causas genotípicas ou por condições ambientais?” (adaptada de

Dobzhansky, 1962). Hinde (1970) alega que só se pode falar em diferenças genéticas gerando

alterações em comportamentos, se os animais estudados se mostrarem geneticamente distintos,

mesmo criados juntos em ambientes similares. Mundinger (1995) verificou que pássaros das

famílias Coraciidae e Fringilidae, ao serem criados em cativeiro juntos desde o nascimento,

diferem nas suas preferências no aprendizado vocal e ele alega que essas preferências por

aprendizados distintos é geneticamente herdável.

A variação geográfica ou o dialeto são, então, as mudanças fenotípicas mais visíveis (no

que se refere à variabilidade acústica), mas que envolvem uma série de aspectos morfológicos,

fisiológicos e comportamentais dos indivíduos (McLean & Stuart-Fox, 2014), que estão por

trás delas. Mudanças em hábitats podem provocar mudanças nas vocalizações, através de

estratégias de reprodução, por exemplo. Fêmeas podem ter preferências por cantos específicos

(seleção sexual) e machos, que se inseriram há pouco tempo neste ambiente, aprendem essa

preferência. Isso envolve tanto aprendizagem vocal, quanto alteração em hábitat, assim como

seleção sexual e social, como ocorre com espécies de sapos no estudo de Gerhardt & Mudry

(1980). Animais podem modificar parâmetros de frequência de suas emissões acústicas de

modo a não serem percebidas por suas presas, sendo assim, suas vocalizações seriam

diferentes, se esses animais tivessem preferências alimentares distintas, como ocorre com as

baleias orca (Orcinus orca) no artigo de Barrett-Lennard et al, 1996. Esse comportamento

também envolve aprendizagem vocal e condições ambientais (possibilidades alimentares).

Outro aspecto que pode envolver tanto a seleção sexual quanto social é a competição

entre indivíduos por recurso. A seleção social é extremamente dependente da densidade de

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indivíduos (Arnqvist, 1992, McLean & Stuart-Fox, 2014). Em polimorfismo, a seleção social é

capaz de alterar a frequência de genes se aquele traço cromático no indivíduo o permitir ganhar

dos outros, em resposta, por exemplo, a preferência de fêmeas ou para mostrar sua capacidade

com relação a outros machos (McLean & Stuart-Fox, 2014). Em som isso já foi observado em

baleias jubarte por Darling & Bérubé (2001) em uma hipótese que alega que o canto de um

macho possa ter uma relação de interação entre outros machos, mostrando seu status como

macho adulto ou reforçando aspectos como dominância (macho mais forte, por exemplo). A

seleção social por competição vocal já foi vista também em filhotes de coruja-das-torres, Tyto

alba (competição entre os filhotes por recursos) (Dreiss et al, 2015), por exemplo. Rendell et al

(1999) verificaram em seu estudo sobre espécies de baleias, que duas espécies próximas

geneticamente, com tamanhos semelhantes, com uso de hábitat em regiões parecidas,

mostraram variabilidade vocal em seu repertório. Segundo os autores, a necessidade de manter

as espécies separadas (evitar hibridização) levou a pressão seletiva de variação nas

características de seus chamados vocais. Isso mostra que, mesmo sendo espécies semelhantes

geneticamente, o comportamento vocal se mostrou divergente entre elas, evidenciando que a

seleção social representou um papel forte nesta mudança comportamental.

4.1.1.1 Tamanho e Formato de Estruturas (mais)

A morfologia pode influenciar as propriedades físicas das vocalizações dos animais

indiretamente através de mudanças no tamanho e formato de estruturas corporais. Estas

estruturas são impressões individuais e estão associadas com especificidades da voz, sendo

responsáveis pela produção de características de freqüência em espécies de anuros, aves e

mamíferos, por exemplo (Shy, 1983, May-Collado et al 2007a e b, Fitch & Reby, 2001,

Fletcher, 2004).

A frequência fundamental é considerada um dos principais componentes da vocalização

e sua produção está ligada à vibração das cordas vocais dos animais que as possuem, as quais

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se localizam junto à laringe (Hamdan et al, 2012). A modificação dessas estruturas pode causar

transformações na vocalização produzida, podendo alterar a frequência de sua emissão, por

exemplo (Hamdan et al, 2012).

Os formantes também são característicos do som e podem alterar a emissão deste

último; eles são determinados pelo tamanho e formato do trato vocal e pelo movimento da

língua, dos lábios e do palato mole (Evans et al, 2006).

A massa da estrutura vibratória que produz o som pode influenciar nos parâmetros de

frequência e amplitude do som emitido, além do comprimento do trato vocal, que também foi

identificado como modificador do som produzido (Ryan & Brenowitz, 1985; Wich et al, 2008).

Com relação a aspectos corporais dos cetáceos, o tamanho foi idenficado como um dos

maiores promotores da variação de frequência mínima em sons tonais, observando uma relação

inversamente proporcional entre essa frequência e o tamanho corporal do indivíduo (May-

Collado et al, 2007a). Em baleias cachalote (Physester macrocephalus) é sabido que há uma

relação entre o intervalo dos cliks emitidos por elas e o tamanho corporal dos indivíduos.

Segundo Goold & Jones (1995) há um tempo de atraso entre os pulsos de clique e esse atraso é

proporcional ao comprimento do órgão de espermacete e, portanto, proporcional ao tamanho do

animal.

Segundo May-Collado et al (2007a) a relação negativa entre o tamanho corporal e a

frequência mínima em sons tonais de cetáceos pode mostrar que houve uma seleção de sons de

baixa frequência, que permitem comunicações a longas distâncias. Contudo, esta seleção que

ocorreu ao longo da história evolutiva foi controlada pelo tamanho corporal dos animais (May-

Collado et al, 2007a), o que mostra que os animais de maior porte corporal eram favorecidos na

comunicação acústica e na sobrevivência, sendo selecionados pela natureza ao longo do tempo.

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4.1.2 Hábitat

O ambiente acústico de um lugar pode influenciar em grande escala a evolução dos

atributos do som produzido pelos animais (Badyaev & Leaf, 1997). Alguns estudos (Shy, 1983,

Tubaro & Segura, 1995) observaram divergências intraespecíficas da composição sonora de

sinais, sendo elas correlacionadas às propriedades acústicas dos hábitats estudados

(Slabbekoorn & Smith, 2002). Tais propriedades podem ser: reverberações, atenuações

dependentes de frequência e flutuações de amplitude irregulares (Badyaev & Leaf, 1997;

Nemeth et al, 2006).

Segundo Wiley & Richards (1982), a reverberação é o resultado da dispersão refletiva

do som em superfícies, definida como a quantidade de energia que retorna à fonte de som, e é

característica de hábitats fechados. A atenuação acústica envolve a perda de energia ao longo

de sua propagação. Pode haver uma dispersão grande ou pequena, a partir da frequência

emitida, uma vez que os objetos no caminho possuem valores de impedância diferentes em

suas superfícies. A impedância acústica é uma propriedade do meio que caracteriza sua

resistência à propagação do som.

Dentre os obstáculos à propagação do som, podem estar objetos característicos da

fisionimia do local. Fundos de mar rochosos são fontes importantes de reverberação, já os

arenosos são bons refletores (permite que a maior parte da energia sonora continue sua

trajetória) (Paula, 2007). Fundos de lama, porém irão absorver a energia sonora, o que impede

que uma parte chegue ao destino final (Paula, 2007). Outros obstáculos são objetos ou seres

vivos como os peixes, que possuem bexigas natatórias aeradas, o que reflete o som (Paula,

2007). Além deles, objetos pequenos ao longo da trajetória do som podem interferir, pois

funcionam como refletores múltiplos de som, emitindo ecos para todas as direções (Paula,

2007).

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A flutuação irregular de amplitude pode ser causada por heterogeneidades não-

estacionárias (tais como correntes marinhas e ventos) no meio em questão, o que irá degradar

ou mascarar as características de modulação de amplitude do sinal transmitido (Wiley &

Richards, 1978). Um meio com muita turbulência pode gerar flutuações de amplitude, por

exemplo.

Quando se trata de uma comunicação a longa distância, o receptor deve decifrar sinais

que chegam de territórios distantes. Desse modo, o indivíduo usa os padrões de modulação de

amplitude e, com a flutuação irregular da mesma, o sinal permitirá a transmissão de pouca

informação (Wiley, 1991).

Essa variação nos padrões acústicos gerou uma série de hipóteses para explicar as

diferenças nas características dos sinais acústicos em diferentes ambientes (Nemeth et al,

2006). Em alguns casos, a diferença de hábitat pode causar divergências de sinais, porque

diferentes frequências de som viajam melhor em diferentes ambientes, ou mesmo porque tais

ambientes possuem padrões de ruído ambiente distintos (Irwin et al, 2008).

As frequências mais baixas são capazes de viajar distâncias maiores (uma vez que são

menos atenuadas) e, por conseguinte, alcançar os emissores de forma mais eficaz, enquanto que

as mais altas têm maior probabilidade de se dispersarem por folhagens de árvores ou outras

barreiras naturais do que frequências baixas, as quais só são afetadas por objetos maiores

(Badyaev & Leaf, 1997). Segundo Tubaro & Segura (1995), a reverberação pode influenciar no

comprimento das notas recebidas em um som (referidas como “elementos”) e o tempo entre as

notas. Desse modo, algumas espécies tendem a modificar seus sinais acústicos, para que o

receptor possa compreender de forma clara sua mensagem.

Os ruídos bióticos podem influenciar na variação do sinal e podem ser causados por

sinais de outras espécies ou por coespecíficos, como ocorre em algumas espécies de insetos e

anuros que produzem coros ou em pássaros que vivem em colônias (Brumm et al, 2004). No

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sistema onde há coro, um animal vocalizador deve tentar receber uma resposta antes que o

resto dos coespecíficos comece a vocalizar, causando um ruído ambiente (Brumm et al, 2004).

A distância entre as populações tem sido vista como um importante promotor da

variabilidade (Baron et al, 2008, Wang e tal, 1995, Azevedo e van Sluys, 2005), como visto em

Wang et al (1995) e Azevedo e van Sluys (2005), em golfinhos nariz-de-garrafa e botos-cinza,

respectivamente, foram observadas mais variações acústicas entre indivíduos mais distantes

entre si do que próximos uns dos outros. Pode haver diferenças físicas dos hábitats, alterações

nos ruídos bióticos e causados pelo homem, falta de contato social entre uma população e outra

ou divergências genéticas que geram essa variabilidade. Além disso, segundo Camargo et al

(2006) ao comparar grupos diferentes da mesma espécie, pode-se coletar dados de tamanhos de

grupo diferentes em atividades sociais variadas, o que também poderá interferir nas emissões

sonoras dos animais.

No estudo feito por Amorim et al (2016), realizou-se uma comparação entre os sons

pulsados de populações do boto da Amazônia (Inia geoffrensis) em duas áreas de proteção

ambiental. A partir das análises verificou-se que os parâmetros de frequência e estruturas

temporais dos pulsos modificavam de acordo com condições abióticas de turbidez da água. No

ambiente com águas claras os sons produzidos sofriam mais influência de atenuação e

dispersão ao longo da propagação, uma vez que essa água é rica em sedimentos. Desse modo,

os pulsados possuíam parâmetros de frequência mais graves. Já no ambiente de águas negras

possibilita uma melhor propagação do som, o que permite que os animais produzam sons com

duração maior, com menos taxa de repetição, uma vez livres dos obstáculos vistos da água

clara (Amorim et al, 2016). Segundo os autores, essas condições abióticas mostram que esses

animais possuem uma sensibilidade acústica e que a alteração do sinal entre os dois locais e

entre as duas populações analisadas podem promover a variação geográfica acústica.

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A temperatura do ambiente também pode influenciar a produção de vocalizações em

animais ectotérmicos (poikilotérmicos), mudando aspectos como a frequência, a duração e a

amplitude dos sons (Jensen et al, 2011). Variações acústicas mediadas pela temperatura são

capazes de influenciar o modo com que o receptor reconhece o indivíduo ou espécie que está

emitindo o sinal (Camaclang et al, 2006). Isso ocorre, pois com a alteração da densidade do

meio (em função da flutuação de temperatura), a velocidade de propagação do som também de

altera, uma vez que ela está relacionada com a densidade do meio. Com maiores densidades, o

som se propaga mais rápido e vice versa.

4.1.3 Influências Antrópicas

O ruído também faz parte do ambiente acústico e também é capaz de influenciar a

comunicação entre emissores e receptores (Wiley & Richards, 1978). Para poder receber,

interpretar e responder um sinal, este último deve ser detectável através do ruído ambiente e tal

detectabilidade depende de dois parâmetros: relação sinal-ruído (RSR) e a capacidade auditiva

de detecção do receptor através do efeito de mascaramento (Patricelli & Blickey, 2006). Se o

valor da RSR for abaixo da capacidade de detecção do receptor, então esse sinal é mascarado

pelo ruído ambiente.

Na comunicação acústica, o ruído pode mascarar os sinais, interferindo na transferência

de informações entre um dos participantes da comunicação, podendo causar erros de

interpretação e/ou de detecção do sinal pelo receptor (Hotchkin & Parks, 2013). Ele pode ser

abiótico (vento, ondas, precipitações, movimento tectônico, folhas e galhos) ou biótico

(crustáceos, peixes, insetos, aves, mamíferos, incluindo o ser humano) (Moore et al, 2012).

Dentre os ruídos antropogênicos pode-se encontrar os originados pela urbanização, pela

exploração, extração ou transporte de minerais (Hotchkin & Parks, 2013) embarcações,

veículos automotivos, entre outros. Os ruídos causados pelo ser humano no oceano podem ser

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divididos em duas categorias: intencionais (sonares ou exploração sísmica) e não intencionais

(motores de barcos e cavitação) (Parks et al, 2007).

Segundo Hotchkin & Parks (2013) modificações no sinal podem ser de curto ou longo

prazo. As de longo prazo foram vistas em nível de população em espécies de aves e cetáceos

(mamíferos aquáticos), nas quais os animais mudaram seus sinais acústicos por anos ou até

mesmo décadas, o que pode ser um indicador de plasticidade vocal, capacidade de aprendizado

ou influências genéticas (Hotchkin & Parck, 2013). Quando se trata de modificações a curto

prazo, indivíduos são capazes de alterar suas vocalizações por milissegundos até horas,

aumentando a amplitude vocal, alterando componentes espectrais do chamado que sobressaem

os do ruído, ou alterando a duração da vocalização (Hotchkin & Parks, 2013).

Já foi observado que cada ambiente possui características únicas de transmissão do som

e de distribuição diária do ruído ambiente (Schneider et al, 2008). Como cada som se propaga

de forma distinta em um hábitat, a força de seleção deve favorecer os sons que permitam uma

transmissão mais eficiente, de acordo com padrões de pressão e tipo de fonte sonora (Morton,

1975). Isso mostra que os animais se ajustam a essas condições, modificando o uso da

comunicação acústica e das estruturas do sinal para poder aumentar a eficiência da propagação

(Fischer, 2009).

Esses ajustes foram estudados por Morton (1975) em sua hipótese chamada “adaptação

acústica”. Segundo ele, os hábitats acústicos podem gerar forças seletivas que favorecem

alguns aspectos do som, mais que outros. Estes aspectos seriam, por exemplo, sons tonais puros

que tenham um alcance relativamente pequeno em aves que vivem em florestas e perto do

chão, ou sons extremamente moduláveis que seriam usados em espécies de hábitats abertos.

Pela visão de Morton (1975), as características acústicas dos hábitats serviriam como um

suporte com o qual outras formas de seleção (seleção sexual, disputa de território e identidade

da espécie, por exemplo) se baseariam para modificar o som.

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Segundo Slabbekkoorn & Boer-Visser (2006), pode-se ver essa variação fenotípica

como um reflexo do desenvolvimento da variação genética e também de um sinal de

plasticidade para se adaptar a diferentes condições ambientais. Desse modo, certos encontros

entre indivíduos promoveriam interações sonoras, o que pode gerar modificações nos seus

repertórios vocais. Além disso, hábitats com perturbações de ruídos podem interferir tanto na

composição das vocalizações quanto nas relações sociais.

Os sinais de comunicação dos cetáceos, por exemplo, podem ser alterados e ajustados

para lidar com ambientes diferentes e em resposta a esse estado (May-Collado & Wartzok,

2010, Esch et al, 2009, Buckstaff, 2004). Indivíduos podem alterar o modo de emissão do sinal,

ou o período do dia no qual será emitido, para não correr o risco da mensagem não chegar ao

seu receptor. Isso pode ocorrer por causa de ruídos antropogênicos, ou das características da

geofonia e biofonia do hábitat estudado, por exemplo. Em baleias franca do norte (Eubalaena

glacialis), Parks et al (2007) observaram modificações nos parâmetros vocais de comunicação,

verificando que em condições com muito ruído, houve um aumento da frequência máxima e

mínima e uma diminuição na taxa de chamado. Em golfinhos da espécie Tursiops truncatus

Buckstaff (2004) verificou que houve um aumento da taxa de repetição dos assobios emitidos,

o que foi interpretado pelo autor como uma possibilidade de aumentar a propabilidade de

detecção dos assobios, antes do som ser mascarado pelo ruído das embarcações. Esse

comportamento também foi visto para a espécie de golfinho Sousa chinensis no artigo de Parijs

& Corkeron (2001).

4.1.4 Aprendizagem Vocal e Transmissão Cultural

Ao se falar sobre a evolução da linguagem, faz-se, na maioria das vezes, uma

comparação direta com a linguagem humana, ressaltando sua complexidade (Janik, 2013).

Outros animais já mostraram capacidades de aprendizagem vocal e, com ela, transmissão

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desses aprendizados culturalmente, tais como aves da ordem Psittaciformes, primatas não

humanos, elefantes e mamíferos aquáticos (Deecke et al, 2000, Krutzen et al, 2005, Tyack,

2008, Stoeger & Manger, 2014, Richards et al, 1984, Foote et al, 2006)

Muitos estudos têm sido feitos para demonstrar o aprendizado vocal, entretanto eles não

mostram definições sobre o que constitui o aprendizado vocal e como ele pode ser classificado

(Janik & Slater, 2000). Segundo Janik & Slater (2000) tal comportamento vocal possui três

passos: produção, compreensão e uso do que se aprendeu.

Janik & Slater (2000) alegam que o sistema respiratório (permite a passagem de ar, sob

pressão) pode mudar alguns parâmetros do som, tais como a duração e a amplitude, uma vez

que este sistema altera o estado respiratório dos músculos. Já o sistema de fonação (aparatos

que produzem o som) modifica parâmetros como a frequência absoluta e a modulação, pois

pode mudar o estado da estrutura que produz o som (seringe ou laringe). O sistema de filtro

(todas as estruturas de filtro ou ressonância entre o órgão de fonação e o ambiente externo)

pode alterar, por exemplo, a distribuição da energia relativa, uma vez que pode modificar o

estado das estruturas de filtro.

Em contextos que envolvem a aprendizagem vocal, o indivíduo aprende como associar

um sinal que já existe com novos contextos de sua realidade social, o que pode interferir e

modificar quando o sinal é usado ou o seu significado que é carregado para o receptor e,

consequentemente, a interpretação deste último (Janik, 2014). Desse modo, este

comportamento de aprendizagem pode ser feito aprendendo com um modelo externo ou

improvisando um som qualquer (Nottebohm & Liu, 2010), que pode ser uma mistura de

modelos externos com o próprio canto do indivíduo.

Podem ocorrer outros tipos de aprendizagem vocal, tais como o uso da aprendizagem,

no qual o emissor aprende a usar seus sinais de vocalização somente em contextos específicos,

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e a aprendizagem por compreensão, em que o receptor aprende a alterar sua resposta de acordo

com a vocalização do emissor (Nowicki & Searcy, 2014).

Dentre as aves, a ordem Psittaciformes representa um importante grupo com evidências

de aprendizado vocal, na qual indivíduos aprendem desde o nascimento a ouvir cantos e formar

a memória desses traços de cantos (Tyack, 2008). Outros animais mostrarm capacidade de

aprendizado vocal, vistos em mamíferos como elefantes, mamíferos aquáticos e primatas não

humanos, por exemplo (Stoeger & Manger, 2014, Richards et al, 1984, Foote et al, 2006,

Krutzen et al, 2005).

Desse modo, a aprendizagem social pode ser vista como uma ferramenta importante

para os indivíduos, uma vez que pode afetar escolhas de parceiros, forrageio, reconhecimento

de predadores e manuseio de intrumentos.

A transmissão cultural pode ser entendida como o aprendizado social de

comportamentos ou informações com coespecíficos e já foi reportada em vários animais, como

primatas, cetáceos e aves (Garland et al, 2011, Deecke et al, 2000). Para um traço

comportamental ser considerado como culturalmente transmitido ele deve ser adquirido em

contextos de aprendizagem social, a partir de coespecíficos, transmitindo-o de maneira

constante para as próximas gerações (Boyd & Richerson, 1996). Tal comportamento pode ser

propagado de pais para filhos (transmissão vertical), de gerações passadas para mais jovens

(transmissão oblíqua) ou entre indivíduos de idades ou gerações semelhantes (transmissão

horizontal) (Garland et al, 2011).

Em populações que vivem em sociedades, comportamentos individuais variam

culturalmente e podem ser transmitidos de geração para geração (Krutzen et al, 2005) e,

quando se torna estável, pode inclusive modificar a evolução biológica de espécies (Rendell &

Whitehead, 2001).

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Os cetáceos (grupo de mamíferos aquáticos que envolvem odontocetos e misticetos) são

vistos como seres com capacidades cognitivas avançadas e complexas em sua comunicação

(Janik, 2013), o que despertou interesse de pesquisadores para a elaboração de estudos

comparativos a respeito da evolução da comunicação complexa nesses animais (Janik, 2014).

Em mamíferos aquáticos, a variação cultural pode ser uma das responsáveis da variação

acústica, visto que os pinípedes (CARNIVORA: PINNIPEDIA) e cetáceos estão dentre os

poucos grupos de mamíferos nas quais a imitação e o aprendizado social foram documentados

(Ford, 2008). Isso pode significar que a transmissão de padrões vocais através de gerações pode

depender mais de mecanismos culturais do que genéticos (Ford, 2008). A variedade de

maneiras que a aprendizagem social pode influenciar a comunicação vocal, mostra que é

necessária uma revisão das teorias sobre o assunto, que possa esclarecer e melhor definir os

tipos de variação nos comportamentos acústicos animais, para poder comparar espécies e

entender a influência dos possíveis fatores na ocorrência de aprendizagem na comunicação

animal (Janik & Slater, 2000).

Já foi verificado em baleias com dentes, tais como belugas (Delphinapterus leucas) e

orcas (Orcinus orca), que o aprendizado vocal e outros aspectos da capacidade cognitiva desses

animais são causados pelo comportamento social e as necessidades de se manter em uma

sociedade grande, com muitas relações sociais sendo mantidas dentro dos grupos (Janik, 2014).

Desse modo, aspectos da comunicação sonora seriam mantidos para reafirmar a coesão

espacial do grupo e negociar relações sociais, uma vez que há muitos ruídos no ambiente

acústico marinho e, para ultrapassar esse obstáculo, esses animais usariam modificações como

modulação de frequência, por exemplo (Janik, 2014).

As baleias orcas (Orcinus orca) vivem em geral em grupos estáveis de ordem matriarcal e

podem emitir vocalizações chamadas cliks, pulsos de ecolocalização, assobios tonais e chamados

pulsados (Deecke et al, 2000). Dentre esses animais, pode-se observar repertórios

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vocais únicos entre grupos, os quais são considerados dialetos vocais (Deecke et al, 2000).

Estes últimos são considerados muito estáveis entre os grupos de orcas, uma vez que Ford

(1989) não identificou nenhuma diferença em certos chamados usados por alguns grupos em 30

anos de estudo e observação. Desse modo, o dialeto poderia funcionar como um facilitador da

comunicação do grupo, uma vez que os indivíduos que o usam seriam rapidamente

identificados como pertencentes da mesma ordem matriarcal de indivíduos, além de reduzir o

efeito de mascaramento por outros sons provindos de outras linhas matriarcais ou outras fontes

sonoras.

Machos de baleias-da-Groelândia (Balaena mysticetus) e de baleias jubarte (Megaptera

novaeangliae) produzem cantos na estação de reprodução que mudam a cada ano e todos os

indivíduos aprendem e vocalizam tal canto da mesma forma (Rendell & Whitehead, 2001).

Além disso já foi identificada transmissão cultural horizontal nas baleias-da-Groelândia, as

quais imitaram cantos de co-específicos, mostrando que a homogeneidade de vocalizações

também é mantida pela transmissão e aprendizado cultural (Rendell & Whitehead, 2001).

Em espécies de golfinhos a evidência de aprendizagem vocal social está nos sons

chamados assobios assinatura. A partir das observações de Caldwell & Caldwell (1965),

verificou-se que cada golfinho da espécie Tursiops truncatus emitia assobios com cotornos

distintos e únicos, que variam de acordo com os indivíduos, denominados assobios assinatura.

De acordo com alguns autores esse som está relacionado com o reconhecimento de indivíduos

no grupo e pode servir como chamado de contato entre eles (McCowan et al, 1998, Tyack,

2000, Kuczaj et al, 2012). Em geral os filhotes aprendem com suas mães, através da

aprendizagem social e utilizam esse som para manter contato uns com os outros.

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5. Discussão

5.1 Variabilidade Acústica

Diante de todos os fatores citados acima pode-se ver o dialeto e a variação geográfica

acústica como consequência de vários processos. Os dois podem ser influenciados por fatores

como transmissão cultural, aprendizagem social vocal, alterações em estruturas corporais e

mudanças em hábitats, envolvidos em situações de interações sociais e seleções tanto sexuais

quanto sociais.

A evolução cultural tem um papel muito importante nessas modificações fenotípicas

(Cerchio, 1993), uma vez que a transmissão cultural é observada em várias espécies de animais

como sendo um meio de alteração do sinal acústico de um grupo de indivíduos em um local

específico. Pais ensinam para seus filhotes e outros co-específicos ensinam uns aos outros o

que aprenderam, criando assim um meio de se identificarem entre si, mantendo a coesão e

identidade do grupo.

A produção do dialeto como forma de comunicação pode produzir alterações no

comportamento e na forma como os indivíduos se comunicam com outros de sua espécie ou

mesmo de outras. Alguns autores como Myiasato & Baker abordam essa variação como sendo

promotora do isolamento de indivíduos, o que pode ser mal entendido como isolamento

reprodutivo e genético e não está correto, de acordo com as definições iniciais de Nottebohm

(1969), explicadas anteriormente. Desse modo, essa afirmação pode promover algumas

perguntas, como, por exemplo, se um dialeto pode se modificar a tal ponto que leve a um

isolamento reprodutivo e genético e se transforme em variação geográfica? Não há muitos

estudos que debatam a real existência de dialetos tendo como base análises genéticas, o que é

fundamental para se reforçar a presença de uma variação, sendo ela geográfica ou em forma de

dialeto. Deecke et al (2000), contudo, consegue comprovar de forma acústica e genética a

existência do dialeto em baleias orcas, alegando que há semelhança genética entre os grupos

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estudados e que a variabilidade encontrada nas vocalizações está relacionada com aspectos

como transmissão cultural e aprendizagem social.

Com relação às baleias orcas (Orcinus orca) é necessário dar ênfase em seu

comportamento alimentar. Esse animal possui uma dieta extremamente diversificada, podendo

consumir mais de 120 espécies de peixes, cefalópodes, tartarugas e aves marinhas, pinípedes e

cetáceos (Ford & Ellis, 2006). Dois ecótipos simpátricos e geneticamente distintos vivem na

costa da Colômbia Britânica no oceano Pacífico e no Alasca e possuem dietas distintas, sendo

que um grupo se alimenta exclusivamente de peixes (residentes) e outro de mamíferos

aquáticos (transientes) (Ford & Ellis, 2006, Barrett-Lennard et al, 1996). No estudo feito por

Barrett-Lennard et al (1996) verificou-se que as emissões de ecolocalizações são distintas, ao

comparar os dois ecótipos, o que pode significar a existência de variabilidade acústica entre os

dois grupos. Tal comportamento pode ser resultado da capacidade da presa de detectar o sonar

emitido pelas baleias orcas no forrageio, sendo que cada espécie tem uma sensibilidade

acústica diferente. Desse modo, as orcas modificariam seus estalidos de ecolocalização para

faixas de frequência que suas presas não ouviriam, fazendo com que sua caça não seja afetada.

Esse comportamento é fundamental na compreensão de variabilidade acústica, uma vez que

pode mostrar que a especialização de dieta e, principalmente, a capacidade auditiva das presas

também são fatores promotores da variação no repertório acústico dos animais e devem ser

estudados em outras espécies, além das orcas. Essa diferença pode acabar limitando o fluxo

gênico entre as populações. Diferenças em estratégias de forrageio podem conduzir a

modificações nas estratégias de reprodução, levando, então, ao isolamento reprodutivo, o que é

reforçado aqui pelas diferenças no uso de hábitat (Hoelzel et al, 1998). Se isso ocorrer,

qualquer comportamento vocal utilizado pelas duas populações (ou espécies, dependendo do

ponto de vista), seja ele para uso social (assobios), quanto para navegação e caça de presas

(ecolocalização), não será compartilhado pelos dois grupos, o que pode conduzir a uma

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possível existência de variação geográfica acústica, ao invés de dialeto como vemos

atualmente.

Esse estudo mostra que há uma necessidade de aprofundar os estudos genéticos das

populações de cetáceos para detectar outras possíveis divisões simpátricas, para que desse

modo se consiga realizar uma conservação plausível baseada na diversidade genética das

espécies (Hoelzel et al, 1998).

A distância entre as populações analisadas é usada em boa parte dos estudos para

afirmar a presença de variações geográficas ou dialetos (Wang, 1995, May-Collado &

Wartzok, 2008, Morisaka, 2005, Baron et al, 2008) e é, de fato, um componente importante

para a explicação da existência de um fenômeno ou de outro, mas não é o bastante. Esta

afirmação pode gerar outros questionamentos, como a respeito da interação inter-populacional.

Se duas populações, que vivem a grandes distâncias uma da outra, forem colocadas juntas no

mesmo ambiente, haveria comunicação entre elas (acústica ou não)?

No estudo feito por Morisaka et al (2005) usa-se o termo variação geográfica para a

ocorrência de variabilidade nos assobios de 3 grupos de golfinhos nariz-de-garrafa-do-índico

(Tursiops aduncus). Contudo, não há nenhum acompanhamento genético ou mesmo de

movimentação de indivíduos para saber se há troca de animais entre os grupos. Se existe essa

troca, é muito provável que ocorra cruzamentos, o que exige a mudança de termos de variação

geográfica para dialeto. Segundo esse estudo o som é uma ferramenta mais fácil de verificar

variabilidade do que análises genéticas, porém com os estudos genéticos pode-se ter certeza da

existência de variação geográfica ou dialeto. Sem ela, na minha opinião, não há como

comprovar por completo uma coisa ou outra. Sendo assim, para diminuir os questionamentos

sobre o tema, é fundamental que se elaborem mais estudos acoplando a análise de dados

acústicos, visuais e genéticos, para assim poder fornecer evidências concretas a respeito de

divisões taxonômicas, isolamento reprodutivo e genético, ou não.

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Outra divergência encontrada entre os estudos relativos ao tema é com relação a quais

características bióticas e abióticas podem contribuir para a evolução da variação geográfica e

do dialeto. Na minha opinião e na maioria dos estudos revisados neste trabalho, alterações em

hábitats são, de fato, causadoras da formação dessas variações acústicas, uma vez que

modificam suas vocalizações, as quais podem ser diferentes entre grupos da mesma espécie,

levando a separações mais distintas desses grupos, o que pode conduzir à especiação.

Variações nas condições de diversos ambientes podem ser fundamentais para existirem

mudanças no repertório acústico dos animais. Como já foi abordado ao longo do texto,

condições de ruídos abióticos e bióticos, características de absorção, reverberação, entre outras,

permitem que os indivíduos adaptem suas vocalizações, alterando parâmetros acústicos das

mesmas, para que o sinal seja trasmitido de forma eficaz (“adaptação acústica”, Morton, 1975).

Ao modificá-los, co-específicos (sendo parentes ou não) podem aprender tais sons e utilizá-los

como um padrão ao longo do tempo. Desse modo, a adaptação a ambientes diferentes pode

transformar o repertório acústico de populações da mesma espécie, por exemplo, promovendo

variações que podem ser geográficas ou dialéticas, de acordo com posteriores análises

genéticas e visuais.

Deve-se ter muita atenção quando se separa a consequência (dialeto ou variação

geográfica) das possíveis influências no processo desse comportamento (condições ambientais,

aprendizado vocal, plasticidade, entre outros). Os dois representam funções distintas no estudo

da evolução do sinal e não podem ser misturados como uma coisa só ou com funções trocadas.

Myiasato & Baker (1999) consideram dialeto e variação geográfica como semelhantes e

misturam os termos em sua descrição, enquanto Samarra et al (2015) confunde dialeto com

variação microgeográfica, o que não pode ser repetido.

May-Collado et al (2007a e 2007b) realizaram estudos filogenéticos sobre a evolução

de componentes de frequência em sons tonais de cetáceos e verificaram que a evolução da

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frequência mínima parece estar relacionada com o tamanho corporal e de grupo desses

indivíduos. Já a complexidade do assobio (medida a partir da média de pontos de inflexão dos

assobios) é influenciada pela estrutura social do grupo. Segundo May-Collado et al (2007a), o

tamanho corporal pode ter favorecido a evolução de sons com frequências baixas, as quais

permitiriram comunicações de longas distâncias. Contudo, esse estudo não comprova que haja

uma relação inversa entre tamanho corporal e frequência máxima.

Com base nesse estudo, pode-se pensar que a evolução das vocalizações, a partir de

interferências corporais, de hábitat ou culturais, podem induzir processos morfológicos que

gerem a modificação de sons a ponto de transformar uma espécie em duas ou mais, uma vez

que não conseguem mais se comunicar. A partir do momento que se considerar o som como

característica fenotípica e promotora de divisões filogenéticas, pode-se pensar em especiação

pelo som. Desse modo, o som será quanse inteiramente suficiente como ferramenta de estudo

(em algumas espécies pode ser suficiente por completo, se analisado junto com fatores

promotores da variabilidade ao longo do tempo), porém se acoplado com análises genéticas,

pode-se responder muito mais perguntas a respeito de filogenia, evolução, comportamento e

ecologia dos animais.

Dentre todos os fatores listados para variação em cetáceos (aprendizagem social,

transmissão cultural, características de hábitat, estruturas corporais) o que é mais importante,

na minha opinião, é o tamanho corporal e, por consequência, a genética. Se o tamanho

influencia em cachalotes e em outras baleias e golfinhos, a existência de variabilidade acústica

existirá em muito mais populações do que antes pensado. Muitos autores pensam na distância

como principal influenciador da variação, mas ao considerar o tamanho, é importante olhar

para os hábitos alimentares de cada população (como visto nas baleias orcas), os tamanhos dos

indivíduos e considerá-los na avaliação de variação. Este fator pode ser o mais importante por

separar a variação acústica encontrada pelo pesquisador e a variação promotora de divisões

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populacionais intra-específicas. Pode ser que a variação ocorra somente por causa da mudança

no tamanho em algumas populações e, se analisadas geneticamente, serão vistas como

semelhantes. Se isso não ocorrer, o tamanho, acoplado ao estudo do som, será fundamental na

análise do processo de especiação e de estudos fenotípicos como os de May-Collado et al

(2007a e 2007b).

Outro problema está na classificação de variação macro e microgeográfica. Krebs &

Kroodsma (1980) classificam a variação macrogeográfica como sendo equivalente à

classificação feita por Nottebohm (1969) do termo variação geográfica, ou seja, a variação

acústica entre populações em que não há fluxo gênico. Já a variação microgeográfica seria o

equivalente ao termo dialeto, ou seja, a variação acústica entre populações próximas e onde há

possibilidade de cruzamento. Pode-se ver que há dois termos para explicar a mesma condição

de variação nas duas circunstâncias (com e sem fluxo gênico).

Quando se fala de variabilidade acústica, aborda-se dois fatores principais, que são a

distância entre as populações alvo e o fluxo gênico entre elas. Pode haver populações próximas

e com variação acústica nos seus repertórios, como visto acima por Rendell et al, (1999) e esse

caso seria chamado de variação geográfica acústica. Contudo, o termo variação geográfica

remete à distância que divide essas populações e induz o leitor a pensar que as populações

estudadas estão em locais distantes entre si e, desse modo, vocalizam diferente. Casos como

este mostram a necessidade de modificação desse termo, para abranger todo tipo de variação

acústica que ocorra em populações onde não há fluxo gênico envolvido.

Para modificar essa terminologia é preciso ver qual dos fatores é mais importante de se

considerar: distância ou fluxo gênico e, ao meu ver, o segundo é mais fundamental que o

primeiro, uma vez que estamos abordando casos de variação acústica intra-específica, que pode

ou não conduzir à especiação. Além disso, a abordagem deste trabalho abrange o grupo dos

cetáceos, os quais têm uma capacidade de mobilidade muito grande, podendo viajar muitos

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kilometros por dia, o que muda de espécie para espécie. Desse modo o fundamental é verificar

a existência de fluxo gênico ou de isolamento reprodutivo para poder classificar a variação

acústica existente e não a distância entre as populações. Acredito que uma possibilidade para

representar essa variação seria chamá-la de variação acústica dispersiva ou deriva acústica.

Desse modo, evita-se que haja confusão entre a abordagem de níveis de distância inter-

populacional e fluxo gênico. (pensar em outros nomes)

6. Conclusão

- Variação acústica leva em conta múltiplos fatores, os quais contribuem para a

evolução e manutenção dessa (hábitat, estruturas corporais, aprendizagem social, transmissão

cultural, seleção sexual e social, pré-disposição genética)

- Há dois termos definindo a variação acústica com fluxo gênico (dialeto e variação

microgeográfica) e a variação sem fluxo gênico (variação geográfica e variação

macrogeográfica) e deve-se deixar de usar os termos que envolvem geografia no nome, pois

eles remetem a distâncias entre populações, o que já foi visto que pode não estar relacionado

com a variação acústica (populações próximas que vocalizam diferente).

- É necessário modificar a terminologia usada, trocando variação geográfica por

variação dispersiva acústica. Desse modo não se confunde padrões de distância com níveis de

fluxo gênico.

- Futuros estudos devem analisar essa variação fenotípica de forma a acoplar dados

acústicos, visuais e, principalmente, genéticos. Desse modo, pode-se fornecer evidências

concretas a respeito de divisão populacional ou de espécies, comprovando se tais indivíduos

estão em isolamento reprodutivo ou não. Isso pode facilitar a compreensão do processo

evolutivo da variação do sinal, provando que certas causas são realmente promovedoras da

variação do repertório acústico, sendo consideradas como dialeto ou variação geográfi

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Manuscrito 2: a ser submetido para a revista Journal of Acoustic Society of America

Variabilidade acústica nos botos-cinza (Sotalia guianensis, Van Beneden, 1864) de Baía

Formosa, RN: comparação com 13 populações

Nara Pavan Lopes*, Renata Santoro Sousa-Lima*, Gustavo Toledo*, Gilberto Corso**

*Departamento de Fisiologia, Centro de Biociências, Universidade Federal do Rio Grande do

Norte, Natal, RN, Brasil.

**Departamento de Biofísica e Farmacologia, Centro de Biociências, Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, RN, Brasil.

e-mail de correspondência: [email protected]

Resumo

Odontocetos (golfinhos e outros cetáceos com dentes, Ordem Cetartiodactyla) usam a

comunicação acústica na mediação de interações sociais, para obtenção de alimento e para

orientação espacial. Um dos principais sons emitidos pelos golfinhos em suas interações é o

assobio (som tonal de frequência modulada). Grupos de coespecíficos separados

geograficamente por longas distâncias podem apresentar variações nos seus assobios,

resultantes de processos ecológicos e evolutivos ligados às condições ambientais e sociais que

podem alterar suas vocalizações. Este estudo teve como objetivo comparar os assobios dos

botos-cinza (Sotalia guianensis) coletados em Baía Formosa, RN (6o 22' S; 35

o 00' W) com

dados publicados das demais localizades na América Latina. Os resultados mostram

correlações significativas entre as frequências máxima e final e entre inicial e mínima, tanto em

Baía Formosa, quanto nos outros locais, indicando uma preponderância de assobios com

modulação de frequência ascendente para a espécie em toda sua distribuição. A duração teve

uma correlação negativa significativa com a frequência inicial em todos os locais comparados

(p < 0,00001 e r2 = 0,71) e pode indicar que existe um limiar fisiológico para produção de

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assobios muito agudos. A análise de componentes principais dividiu os locais em dois grupos

maiores, porém não foi observada uma separação entre locais ao norte e ao sul. Provavelmente

diferenças no método de amostragem (equipamentos com taxas de frequência limite distintas e

parâmetros de análise espectral distintos), variações no ambiente, diferenças nas frequências de

filhotes (produz sons mais agudos) ou animais de maior porte (emite frequências menores) e

aprendizagem vocal social podem estar mascarando efeitos geográficos nos padrões vocais.

Palavras-chave: boto-cinza, vocalização, variação geográfica, assobio, Rio Grande do Norte,

variabilidade

53

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1. Introdução

É importante compreender as origens da diversidade para se entender a evolução

biológica por trás dela (Campbell et al, 2010). Para compreender processos evolutivos como

adaptação, especiação e seleção sexual, deve-se estudar as forças da seleção natural que estão

influenciando o processo de comunicação (Amézquita et al, 2006).

Os odontocetos (cetáceos com dentes, Ordem Cetartiodactyla) usam a comunicação

acústica na mediação de interações sociais, para obtenção de alimento e para orientação

espacial (Tyack, 2000). Em algumas espécies de cetáceos que vivem em grupos separados

geograficamente, podem existir alguns fatores que promovam a variação de suas emissões

acústicas (Bázua-Durán & Au, 2004), tais como a estrutura do hábitat, os ruídos

antropogênicos e naturais, a transmissão cultural e a aprendizagem social, por exemplo. Isso

pode desencadear em dois tipos de variação. O primeiro é o dialeto e é considerado como uma

variação acústica entre animais da mesma espécie cujas populações mantêm contato e existe o

fluxo gênico. O segundo é chamado de variação geográfica e pode ser micro ou

macrogeográfica. A microgeográfica ocorre com grupos que são vizinhos, enquanto que a

macro com grupos separados por longas distâncias (Conner, 1982). Estes dois tipos de variação

geográfica ocorrem em indivíduos de grupos que estão isolados geograficamente, portanto

impedidos de se acasalar.

Dialetos são comumente encontrados em aves, mas raros em cetáceos, só sendo

encontrados em chamados de Orcinus orca (baleia orca) e em Physeter macroceplahus

(cachalote) (May-Collado & Wartzok, 2008). O estudo da variação geográfica acústica é

fundamental, uma vez que fornece informações sobre biogreografia, tradições culturais,

adaptação às condições ecológicas de um ambiente, além de mostrar a extensão do isolamento

e divergência genética entre grupos ou populações (Bázua-Durán & Au, 2004, Samarra et al,

2015).

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Os golfinhos (odontocetos da família Delphinidae) produzem uma variedade de sons,

que inclui sons pulsados, como os cliques (usados como ecolocalização, para navegação e

orientação espacial) e os gritos (usados geralmente para interações sociais agonísticas)

(Frankel, 2009, Baron et al, 2008) e sons tonais de frequência modulada, chamados de assobios

(May-Collado & Wartzok, 2008, Rossi-Santos & Podos, 2006, Andrade et al, 2014). Estes

últimos são os mais estudados e usualmente relacionados a atividades sociais, tais como

reconhecimento de indivíduos, manutenção da coesão do grupo e recrutamento durante o

forrageio (Rossi-Santos & Podos, 2006, Tyack, 2000). Em geral sua frequência fundamental

varia entre 800 Hz e 28.5kHz e a duração entre 100 milissegundos e 4 segundos (Andrade et al,

2015). De acordo com estudos com as vocalizações da espécie Tursiops truncatus (golfinho-

nariz-de-garrafa) (Caldwell & Caldwell, 1965), os assobios emitidos pelos mesmos tinham

características distintas para cada animal, produzindo um padrão único de contorno, que varia a

nível de indivíduo. Essa hipótese de Caldwell & Caldwell (1965) foi denominada “assobio

assinatura” e recentemente foi observada para a espécie Sotalia guianensis em Ilhéus, BA, por

Lima & Le Pendu (2014).

O boto-cinza (Sotalia guianensis) é um cetáceo relativamente pequeno, com peso

máximo de 80 kg, podendo chegar até 220 cm de comprimento (Flores & da Silva, 2009). Sua

nadadeira dorsal é pequena e localizada no centro do dorso, em formato triangular (Leão,

2010). Esses animais habitam águas da costa ocidental do oceano Atlântico da América do Sul

e Central (Flores & da Silva, 2009). Eles são encontrado principalmente em baías, estuários e

outras áreas de águas rasas dessa costa, desde o sul do Brasil (27o35’S, 48

o35’N) até o

Nicarágua (14o35’N, 83

o14’O), com uma possível ocorrência em Honduras (15

o58’N,

79o54’O) e no Arquipélago de Abrolhos, aproximadamente a 70 km da costa do estado da

Bahia, Brasil (Flores, 2006, Flores & da Silva, 2009).

Em geral os botos-cinza formam grupos de um a seis indivíduos (Flores & da Silva,

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2009), mas já foram localizadas grandes “agregações” com mais de 250 animais na Baía de

Sepetiba e em Paraty (Flach, 2004) e por volta de 400 na Baía de Ilha Grande, sudeste do Brasil

(Flores & da Silva, 2009). O hábito alimentar desses animais varia entre peixes neríticos,

distribuídos pela coluna d’água, como da família Clupeidae e Sciaenidae e Cefalópodes, além

de camarões, caranguejos e linguados, que podem ser ingeridos ocasionalmente (Flores & da

Silva, 2009). A caça de presas pode ser observada com indivíduos solitários ou em grupos. O

aumento de estudos sobre a ecologia e o comportamento desses animais ao longo dos anos

(Lodi, 2003, Guilherme-Silveira, 2008, Monteiro-Filho, 1991, Simão & Poletto, 2002,

Nascimento, 2006, Pansard, 2009, Flach, 2008), permitiu a atualização de categoria de ameaça

para “vulnerável” no plano de ação para pequenos cetáceos do ICMBio (ICMBio, 2014).

Dentre as principais ameaças a esta espécie estão a captura acidental (durante a pesca) e

intencional, a poluição sonora e química e a diminuição de hábitat por meio de contruções de

portos, marinas e condomínios (ICMBio, 2014). Uma vez que esta espécie vive em ambientes

costeiros, esses animais são cada vez mais prejudicados pelas ações do homem. Sendo assim, é

fundamental reforçar cada vez mais o desenvolvimento de pesquisas que colaborem para o

conhecimento ecológico (Rossi-Santos, 2006) e comportamental desses animais e assim se

possa conhecer mais aspectos sobre sua ecologia comportamental para poder desenvolver

projetos de proteção plausíveis.

Um estudo feito por Azevdo e van Sluys (2005) analisou os assobios emitidos por

botos-cinza ao longo da costa do Brasil (do sul ao norte) e verifiou que há diferenças nos

parâmetros de frequência dos assobios entre os locais estudados, mas não foram encontradas

correlações entre os parâmetros de frequência e duração dos assobios. Rossi-Santos e Podos

(2006) utilizaram este estudo como base para formular uma hipótese, chamada “variação

latitudinal”, na qual os autores alegam que os botos-cinza mais ao norte do Brasil produzem

assobios com parâmetros de frequência maiores do que os animais localizados mais ao sul.

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Quanto à duração, também foi visto que ela é maior em locais mais ao norte, contudo não foi

feita nenhuma correlação entre parâmetros de frequência e duração assim como em Azevedo &

van Sluys (2005), o que pode ser importante para compreender as capacidades fisiológicas do

animal e sua relação com o comportamento vocal, como já foi visto em aves (Podos, 1997,

Podos, 2001, Vehrencamp et al, 2013). Já foi verificado que há uma predominância na emissão

de assobios em ascenção para botos-cinza (Andrade et al, 2015, Azevedo & van Sluys, 2005),

golfinho-de-dentes-rugosos, Steno brenadensis (Lima et al, 2012) e golfinho-pintado-do-

atlântco, Stenella frontalis (Azevedo et al, 2010), o que mostra que os parâmetros de frequência

podem estar correlacionados entre si, evidenciando esse padrão (ascenção) nas vocalizações

(i.e. frequência inicial correlacionada com a mínima e máxima com a final). Outros estudos

sobre comparações de assobios dos S. guianensis já foram feitos após a

formulação desta hipótese de Rossi-Santos e Podos (2006) (Andrade et al, 2015, Deconto &

Monteiro-Filho, 2013, Lima & Le Pendu, 2014, Barrios-Garrido et al, 2016, May-Collado &

Wartzok, 2009, Leão et al, 2015), sendo que alguns autores comprovam a variação latitudinal

(Lima & Le Pendu, 2014) e outros a negam (Deconto & Monteiro-Filho, 2013), alegando que

as diferenças encontradas são devido a condições ambientais distintas dos hábitats.

Visto que já foram encontrados resultados de assobios de botos-cinza para outras

regiões não vistas por Rossi-Santos & Podos (2006) e que há contradições sobre a existência de

variação latitudinal nos assobios desses animais, este estudo tem por base analisar em mais

áreas do Brasil (não antes coletados dados acústicos - Baía Formosa) e Costa Rica, se há

variação latitudinal nos assobios de Sotalia guianensis, através da comparação das

características dos assobios emitidos em Baía Formosa, RN, e em outras localidades, próximas

(Pipa e Lagoa de Guaraíras) e distantes (Cananéia, Baía de Sepetiba e Guanabara, Paraty e

Gandoca-Monzanillo), já disponíveis na literatura.

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2. Objetivos

Objetivo Geral: Comparar os assobios obtidos dos botos-cinza em Baía Formosa com

os dados obtidos em outras localidades do Brasil e Costa Rica.

Objetivo específico: verificar se há variação latitudinal contínua dos assobios

ao longo das áreas estudadas

Objetivo específico: verificar se há relações entre parâmetros de frequência e

duração dos assobios de botos-cinza nas áreas estudadas

3. Material e Métodos

3.1 Área de estudo

A área de estudo compreende a região de Baía Formosa (6o 22' S; 35

o 00' W), a 96 km

de Natal (figura 1).

Figura 1: Área amostrada neste estudo (Baía Formosa) e sua posição no Brasil e no estado do Rio

Grande do Norte.

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Baía Formosa é uma praia arenosa e a porção sul oferece proteção de falésias, com

vegetação nativa (mata secundária). As falésias são formações geológicas de rocha sedimentar,

que podem chegar a 30 m de altura e a sua presença permite a formação de baías de águas

rasas, com fundo arenoso e declive suave (Paro, 2010). Essa região é protegida dos ventos e de

correntes costeiras (Paro, 2010), o que proporciona uma estabilidade para a área, uma vez que

sofre influências somente de precipitações e marés (Leão et al, 2015). A topografia subaquática

possui um declive suave e extenso, constituído por fundo arenoso e rochoso, com profundidade

de até 7,6 m (Santos-Jr, 2006).

Outros estudos já foram feitos com botos-cinza nesta região (Paro, 2010, Guilherme-

Silveira & Silva, 2007, Araújo et al, 2001, Gondim, 2006, Tosi, 2007, Sartório, 2005, Queiroz,

2006), contudo poucos investigaram o comportamento acústico (Leão, 2010, Leão et al, 2015),

o que mostra uma carência de pesquisas sobre o assunto, principalmente com os botos-cinza do

litoral do Rio Grande do Norte.

3.2 Coleta de Dados

As vocalizações dos botos-cinza foram coletadas a partir de uma embarcação lagosteira

por 15 dias entre os meses de fevereiro e maio de 2015 (de 07:00 as 12:00 hs), perfazendo um

total de 75 hs de esforço amostral. As gravações foram realizadas com um hidrofone (Reson

TC4013) acoplado a um gravador digital (Fostex FR-2) usando a mesma taxa de amostragem

de Leão (2014) de 96kHz a 24 bits, para fins de comparação.. Ao ser avistado um grupo de

animais, o motor do barco era desligado e as gravações eram iniciadas, submergindo o

hidrofone até 2 m de profundidade. A amplitude das gravações eram monitoradas pelo fone de

ouvido e, se os assobios ficavam muito fracos, comprometendo a qualidade dos sinais, o barco

era reposicionado para ficar mais próximo ao grupo focal (até 150m). A posição geográfica de

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cada grupo gravado era obtida a partir de um GPS (Etrex H Garmin), e a profundidade aferida

com uma sonda portátil (Speed Tech SM-5A).

3.3 Análise de Dados

As análises dos assobios foram realizadas a partir do programa RAVEN PRO ®

1.5

(Bioacoustic Research Program, Cornell Laboratory of Ornithology) e os parâmetros

calculados com FFT de 500 pontos seguindo o mesmo protocolo adotado por Leão (2014). Os

parâmetros analisados foram: frequência inicial, frequência final, frequência mínima,

frequência máxima, frequência dominante, frequência central e duração. Tomou-se o cuidado

de utilizar apenas os assobios que apresentavam todos os parâmetros espectrais bem visíveis e

que tivesse uma razão sinal-ruído alta, destacando-se do ruído de fundo.

Para a análise estatística foi feita uma ACP (Análise de Componentes Principais) para

explorar os dados de Baía Formosa e encontrar quais dos parâmetros utilizados representavam

melhor o conjunto de dados. Em seguida foi feita outra ACP para verificar as posições das

médias dos locais comparados (Pipa (Leão et al, 2015); Baía de Guanabara (Andrade et al,

2015); Baía de Sepetiba (Andrade et al, 2015); Paraty (Andrade et al, 2015); Cananéia

(Deconto & Monteiro-Filho, 2013) e Costa Rica (May-Collado & Wartzok, 2009)),

comparando-as entre si e com Baía Formosa.

4. Resultados

4.1 Análise de correlação entre as variáveis

4.1.1 Baía Formosa

No total foram avistados 130 grupos de botos-cinza, com uma média de 4 a 5

indivíduos por grupo. As gravações computaram 17 horas e 30 minutos no total e foram

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analisados 1292 assobios dos botos-cinza em Baía Formosa (tabela 1), os quais foram

comparados com as demais localidades posteriormente.

Tabela 1: Resultados mostrando a média, o desvio padrão e a amplitude dos valores de assobios de

Sotalia guianensis para Baía Formosa (n amostral = 1292). A frequência está em kHz e a duração em

segundos.

Parâmetros Acústicos

Frequência Mínima

Frequência Máxima

Frequência Inicial Frequência Final

Frequência Dominante

Frequência Central

Duração

Baía Formosa

(N = 1292)

13,40 (±4,85) 1,68 – 41,21 18,70 (±4,73) 2,65 – 44,11 13,90 (±5,03) 1,87 – 42,37 18,30 (±4,76) 1,87 – 43,12 15,66 (±4,86) 1,42 – 43,87 15,92 (±4,57) 1,35 – 42,18 0,175 (±0,122) 0,160 – 0,696

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Em Baía Formosa os valores de frequência fundamental variaram, no geral, entre 1 kHz

e 40kHz, o que mostrou uma amplitude grande.

A ACP realizada mostrou que a frequência mínima e a inicial têm um índice de

correlação alto (r2=0,982), assim como a final e máxima (r

2=0,988), o que mostra que quando

uma tem valor alto a outra terá o mesmo padrão e vice versa (figura 4). Além disso, os valores

de frequência inicial e mínima mostraram médias inferiores às de frequência máxima e final

(tabela 1), o que evidencia mais assobios em ascenção, como foi visto e categorizado em

Andrade et al (2015) e como mostra a figura 2 abaixo.

Figura 2: Exemplos de assobios de Sotalia guianensis gravados em Baía Formosa do tipo ascendente,

como classificados em Andrade et al, 2015, com frequências iniciais menores e frequências finais

maiores. Os assobios foram retirados de um espectrograma no programa Raven Pro 1.5, sendo o eixo y

a frequência, em kHz, e o eixo x o tempo, em segundos.

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Figura 3: Correlação entre as variáveis de frequência e tempo para os dados de Baía Formosa: freqmin = frequência mínima, freqmax =

frequência máxima, deltatime = duração, pifreq = frequência dominante, freqcent = frequência central, freqini = frequência inicial e FF =

frequência final. Correlação de Spearman para duração e frequência inicial com p < 0,01 e r = 0,114 (r2 = 0,013, correlação de Spearman).

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4.1.2 Outras regiões

Na figura 4 e na tabela 2 constam as localidades elencadas (Brasil e Costa Rica) para

comparação com os resultados obtidos neste estudo (Baía Formosa).

Figura 4: Áreas amostradas pelos estudos de Deconto & Monteiro-Filho, (2013), May-Collado &

Wartzok (2009), Leão et al (2015), Andrade et al (2015) e pelo presente estudo, mostrando as áreas do

Brasil e Gandoca-Monzazillo, na Costa Rica.

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Tabela 2: Valores de frequência e duração de estudos com Sotalia guianensis ao longo da costa do

Brasil e da Costa Rica. Alguns artigos consideraram esta espécie como sendo o ecótipo marinho do

tucuxi, também chamado de tucuxi marinho ou golfinho estuarino (Sotalia fluviatilis), mas atualmente

os dois são considerados espécies distintas. A frequência é dada em kHz e a duração em segundos.

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A correlação entre frequência mínima e inicial foi forte (correlação de Spearman, r2 =

0,85, p<0,00001 ) e entre final e máxima também (correlação de Spearman, r2 = 0,90,

p<0,00001), quando comparou-se todos os locais juntos, o mesmo observado em Baía

Formosa. A duração obteve correlação significativa e negativa somente com a frequência

inicial quando todos os locais foram comparados juntos (correlação de Spearman, r2 = 0,78, p <

0,00001) (figura 5).

0.3

5

Dura

cao

0.3

0

0.2

5

0.2

0

● ● ●

8000 9000 10000 11000 12000 13000 14000 Frequência inicial

Figura 5: Relação entre a duração e frequência inicial dos assobios de Cananéia, Paraty, Baía de

Guanabara, Baía de Sepetiba, Baía Formosa, Pipa, Lagoa de Guaraíras e Costa Rica.

Com relação à variação latitudinal, pode-se observar uma continuidade (clina) dos

dados nas frequências mínima e inicial, com um aumento crescente da média da localidade

mais ao sul, Cananéia (latitude), até o estudo realizado mais ao norte, Gandoca-Manzazillo

(latitude), na figura 6. Esta hipótese foi proposta por Rossi-Santos & Podos (2006), que

66

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verificaram que as frequências inicial e mínima variavam latitudinalmente (quanto mais ao

norte, maiores seriam seus valores). A única quebra ocorre em Baía Formosa e em Cananéia,

que apresentam médias de frequência inicial e mínima ligeiramente fora do padrão observado.

Já as frequências máxima e final não possuem um padrão de continuidade (aumento, quando se

diminui a latitude), uma vez que há valores de frequência mais ao sul que se assemelham aos

mais ao norte (figura 6).

67

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68

Fig

ura

6:

Mo

stra

a d

isp

osi

ção

do

s p

arâm

etro

s d

e

freq

uên

cia

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sob

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mai

or

lati

tud

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ara

os

de

meno

r.

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4.2 Análise de Componentes Principais (agrupamento de regiões)

Com base no estudo de Lima & Le Pendu (2014), foi realizada uma ACP (Análise de

Componentes Principais) para verificar a disposição dos locais, porém, ao contrário dos

autores, não achamos 3 grupos que promovam a divisão entre sul e norte. A partir da figura 7,

poderia se obervar uma separação entre o sul (Cananéia, Baía de Guanabara, Baía de Sepetiba e

Paraty) e o norte (Cananéia, Pipa, Baía Formosa e Costa Rica), contudo Cananéia quebra essa

conformação.

Além disso esse gráfico evidencia a correlação negativa entre a duração e a frequência

inicial, mostrada anteriormente. Essa análise comprova, então, a semelhança presente entre

Costa Rica, Cananéia, Lagoa de Guaraíras e Baía Formosa, além de uma similaridade um

pouco menor entre eles e Pipa e entre Baía de Sepetiba, Guanabara e Paraty.

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Figura 7: Representação visual da ACP (Análise de Componentes Principais) com valores de frequência

e duração dos assobios de botos-cinza (Sotalia guianensis) coletados no Brasil (CAN: Cananéia; BF:

Baía Formosa; BG: Baía de Guanabara; BS: Baía de Sepetiba; PAR: Paraty; LG: Lagoa de Guaraíras;

PIPA: Pipa) e na Costa Rica (CR). Os componentes 1 e 2 explicaram 84% e 11% da variação,

respectivamente.

5. Discussão

5.1 Correlação entre as variáveis: duração e frequência inicial, frequência mínima e

inicial e máxima e final

A correlação positiva significativa encontrada entre frequência máxima e final e entre

mínima e inicial evindencia que a maior parte dos assobios produzidos é ascendente, tanto em

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Baía Formosa, quanto nas outras regiões comparadas. Isso já foi comprovado por Andrade et al

(2015), Azevedo & van Sluys (2005), Barrios-Garrido et al (2016) e May-Collado & Wartzok

(2009) para a mesma espécie analisada no presente estudo. Outra correlação encontrada é entre

duração e frequência inicial, porém esta é negativa, o que significa que assobios que têm uma

frequência inicial alta, produzem sons de pouca duração. Podos (1997) verificou algo

semelhante em aves das famílias Emberizidae e Fringilidae, percebendo que os trinados

emitidos pelos indivíduos têm uma relação negativa entre frequência e taxa de repetição, ou

seja, sons produzidos com altas frequências têm taxa de repetição pequena. A produção de

sílabas com frequências moduladas requer que o animal force a entrada do ar pela siringe e

modifique rapidamente a tensão presente nas membranas da mesma e, simultaneamente,

module o volume do trato vocal superior e a abertura do bico para sincronizar com a frequência

fundamental que queira emitir (Fletcher et al, 2006). Um exemplo dado por Podos (1997) para

explicar a situação é com relação a batida de palmas, as quais são batidas rápido (taxa alta de

oscilação) ou alto (frequências mais agudas), porém após certo tempo de bater palmas, não se

consegue mais batê-las alto e rápido ao mesmo tempo. Segundo Podos (1997) o trato vocal só é

capaz de se movimentar uma certa distância por tempo, o que é considerado um fator limitador

na emissão de vocalizações de altas frequências, uma vez que estas requerem maior

movimentação do trato vocal, enquanto que a vocalização emitida a uma taxa rápida necessita

de uma oscilação mais rápida do trato vocal. Isso torna as vocalizações de frequências maiores

mais difíceis de serem repetidas em curtos períodos de tempo (Vehrencamp et al, 2013). Sendo

assim, a diminuição da taxa de repetição vista por Podos (1997) pode ser interpretada como

uma redução dos custos energéticos de emitir esse som e pode ter ocorrido com os botos-cinza

no presente estudo. Sons com frequências maiores requerem um alto custo energético de

produção e emissão (Klump & Gerhardt, 1987, Jensen et al, 2012) e o animal pode não

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conseguir manter esse nível de frequência por tanto tempo quanto conseguiria em um som com

frequências menores. Desse modo, o indivíduo reduziria a duração da vocalização.

Os assobios são produzidos na região nasal da cabeça (Cranford, 2000), onde há um

conjunto de estruturas que produzem os sons. Odontocetos possuem um par de estruturas que

são chamadas de “lábios fônicos”/bolsa dorsal (sigla em inglês MLDB), abaixo do orifício

nasal (Frankel, 2009). A medida que o ar passa pelos lábios fônicos, é gerada uma vibração na

bolsa dorsal, criando um som (Frankel, 2009, Au & Hastings, 2008). Desse modo, a frequência

pode ser modulada a partir da quantidade de ar que passa por essas estruturas e pela tensão

presente nos lábios fônicos (Madsen et al, 2012), que também podem ter tamanhos diferentes,

modificando, assim, a frequência produzida. É possível que frequências mais agudas exijam

um controle maior dos lábios fônicos e que o animal não consiga mantê-lo por muito tempo,

resultando num assobio de curta duração. Também é possível que haja um fator limitante

dentre as frequências, sendo ele a frequência máxima. Foi observado que a frequência máxima

tem o menor índice de variabilidade (0,25), comparado com as frequências inicial e mínima

(0,32 e 0,36, respectivamente). Isso mostra que esses animais estão modulando com mais

facilidade as frequências iniciais e mínimas, enquanto que as máximas estão permanecendo

com valores semelhantes. Desse modo, o indivíduo pode aumentar ou diminuir a frequência

inicial de seu assobio, porém a máxima será mantida a mesma, o que pode explicar a duração

estar diminuindo, conforme a frequência inicial aumenta.

Custos energéticos em vocalizações de odontocetos ainda são pouco estudados,

portanto, deve-se realizar uma análise mais aprofundada da fisiologia do trato vocal e de sua

eficiência, relacionando esses fatores com os custos da vocalização de acordo com diferentes

ambientes e níveis de ruído (Jensen et al, 2012), para poder determinar correlações de

frequências com taxas de repetição e duração das vocalizações.

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Vários estudos já foram realizados, relacionando o tamanho e a massa corporais dos

animais com a produção de som (Fletcher, 2004, Morton, 1977, May-Collado, 2007 a e b),

mostrando que há uma relação inversa entre o tamanho e a massa corporais e a emissão de

frequências e uma relação diretamente proporcial do tamanho com a duração da vocalização

(Azzolin et al, 2014, Gillooly & Ophir, 2010). Sendo assim, outra hipótese é que pode-se ter

coletado sons em sua maioria de filhotes e juvenis nas áreas estudadas, uma vez que eles têm

tamanho e massa corporais menores, emitindo frequências mais agudas e, por conseguinte, com

duração menor.

5.2 Variação latitudinal x Variação nos hábitats

Quanto à comparação de todas as regiões, este estudo não corroborou por completo com

a hipótese de Rossi-Santos e Podos (2006), que alegam que os parâmetros de frequência inicial

e mínima e duração aumentam do sul ao norte, sendo mais semelhantes em áreas adjacetes.

Neste estudo, a variação latitudinal foi vista com as frequências inicial e mínima, mas não com

a máxima e a final e a duração. Na Costa Rica a média de duração foi de 0,200s enquanto que

em Paraty foi de 0,376, o que quebra a variação latitudinal com esse parâmetro.

Com relação à correlação entre áreas mais próximas, Pipa, Lagoa de Guaraíras e Baía

Formosa mostraram que, apesar de terem valores semelhantes, obtiveram diferenças

importantes de se analisar, uma vez que são áreas que distam 20 km entre si.

Segundo um estudo feito por Paro (2010) com indivíduos de Sotalia guinensis, com

base em técnicas de foto-identificação, foi observado que tais indivíduos, que habitam o litoral

sul do Rio Grande do Norte, estão possivelmente divididos em duas comunidades. O termo

comunidade foi definido como “indivíduos que dividem grande parte de sua área de vida e

interagem uns com os outros muito mais do que com membros de unidades similares em águas

adjacentes” (Wells & Scott, 1990). Uma das comunidades está compreendida entre Tabatinga,

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Lagoa de Guaraíras e Pipa, com 105 indivíduos, enquanto a outra está em Baía Formosa, com

112 indivíduos. A distância entre Baía Formosa e a Lagoa de Guaraíras é de aproximadamente

20 km. Além disso não há nenhuma barreira física aparente que impeça os animais de se

deslocarem entre estas áreas, entretanto a área após o Rio Curimataú é sugerida como divisora

destas duas regiões (Paro, 2010) (figura 8). O autor sugere, então, que essa divisão por áreas

seja devido a características comportamentais e sociais, conduzindo a preferências diferentes de

localização. Alternativamente, podem existir diferenças comportamentais (acústicas ou não)

entre os botos-cinza destas duas áreas que impeçam o intercâmbio de indivíduos entre uma

região e outra, possibilitando a divisão em dois grupos distintos de animais.

Figura 8: Mapa das áreas de estudo e sua posição no Brasil e no estado do Rio Grande do Norte. Baía

Formosa (quadrado negro) houve coleta de dados primários; Lagoa Guaraíras (círculo negro) e Pipa

(losango negro) foram utilizados dados secundários (Leão et al, 2015), Rio Curimataú (estrela negra)

atuando como possível divisão entre as duas “comunidades”.

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A partir das observações de Paro (2010), existiriam duas populações de botos-cinza

entre Pipa e Baía Formosa e, com a observação do gráfico da ACP, pode-se ver que há uma

separação maior entre Baía Formosa e Pipa do que a de Baía Formosa com a Lagoa de

Guaraíras. Com a análise dos assobios, pode-se observar uma pequena diferença entre as

médias dos parâmetros, contudo não mostra uma diferença impactante.

A frequência mínima de Baía Formosa foi a maior entre as três áreas (13400kHz – Baía

Formosa; 9350 kHz – Pipa; 10960kHz - Lagoa de Guaraíras) e entre todos os locais

comparados, o que pode significar que a coleta foi feita com vocalizações de animais de

pequeno porte (juvenis ou filhotes), uma vez que é sabido que animais menores tendem a emitir

frequências maiores (May-Collado & Wartzok, 2007). Contudo, nos outros parâmetros Pipa e a

Lagoa obtiveram valores maiores de frequência e duração, o que pode significar uma

necessidade de emitir vocalizações com frequências maiores, devido à exposição de ruídos no

ambiente. Pode existir uma diferença nessas condições do ambiente, de ruído (biótico e

abiótico) e de qualidade da água, que promovam essa variação do som. Contudo, um estudo de

Toledo et al (a ser publicado) feito com foto-identificação verificou que um indivíduo albino

foi encontrado tanto em Baía Formosa quanto na Lagoa de Guaraíras, o que pode mostrar que

há, sim, trânsito de animais entre as duas áreas, confirmando a semelhança acústica entre as

duas áreas pelo gráfico de ACP.

Diversos fatores podem desencadear em alterações nas vocalizações dos animais.

Características do ambiente podem influenciar nas variações, como a quantidade de ruído,

quantidade de objetos ao longo da trajetória do som, correntes marinhas e características da

água (turbidez, temperatura, salinidade), por exemplo. Tais fatores podem desencadear em

mudanças nas emissões acústicas dos indivíduos, que escolhem bandas de frequência distintas

na sua comunicação, para se adaptar a essa alteração de ambiente, como explica Morton (1975)

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em sua hipótese da “adaptação acústica”. Segundo ele, os hábitats acústicos podem gerar forças

seletivas que favorecem alguns aspectos do som, mais que outros. Estes aspectos seriam, por

exemplo, sons tonais puros que tenham um alcance relativamente pequeno em aves que vivem

em florestas e perto do chão, ou sons extremamente moduláveis que seriam usados em espécies

de hábitats abertos.

A crescente indústria de turismo tem se estendido para o ambiente aquático, o que deixa

os mamíferos aquáticos mais susceptíveis ao contato com os seres humanos, uma vez que os

golfinhos são animais de hábito costeiro, fazendo do boto-cinza uma espécie alvo de atividades

turísticas (Santos-Jr., 2006). Cetáceos têm um sistema auditivo que é capaz de lidar e

compensar flutuações pequenas de ruídos naturais, contudo, ruídos antropogênicos causam

flutuações muito maiores, o que pode provocar consequências ainda piores para esses animais

(Papale et al, 2015). Fatores da propriedade de transmissão e ruído ambiente, então, são

considerados pontos importantes na variação do som (May-Collado & Wartzok, 2009,

Morisaka et al, 2005). Alguns estudos feitos com a espécie Tursiops truncatus (golfinho nariz-

de-garrafa) e Delphinus delphis (golfinho comum de bico curto) verificaram que, em situações

de ruído antropogênico e natural, os golfinhos tendem a aumentar parâmetros de frequência, de

modo a compensar o efeito de mascaramento, causado pelo ruído, favorecendo uma melhor

comunicação (Papale et al, 2015). Desse modo, os indivíduos escolheriam bandas específicas

de frequência que minimizariam o ruído ambiente, para que a comunicação entre espécie-

específicos seja otimizada. Isso pode ter acontecido com os botos-cinza de Pipa e Ilhéus, pois

os animais dos dois locais sofrem influência direta de embarcações de turismo, que geram

ruídos emitidos pelo motor e pelo hélice do barco. Isso pode ter influenciado na modulação do

sinal, fazendo-os escolher bandas de frequência semelhantes entre si, mas diferentes do resto

dos locais, para melhorar a comunicação acústica em cada região. Isso reforçaria a hipótese da

adaptação acústica (Morton, 1975) e mostraria que a seleção natural favorece sinais, receptores

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e emissores que têm a capacidade de potencializar a recepção do sinal, em resposta a ruídos

ambientes e minimizar os efeitos da degradação do sinal (Endler, 1992).

Apesar de o ambiente parecer influenciar em boa parte a variação do sinal, deve-se ter

muita atenção quanto ao principal local que demonstra esta descontinuidade: Cananéia. Talvez

o hábito alimentar desses animais esteja influenciando o aumento ou diminuição de seu

tamanho corporal e é sabido que animais com peso maior, tendem a produzir sons mais graves

(May-Collado & Wartzok, 2007). É possível que o peso dos animais de Cananéia seja maior,

ou que se esteja gravando animais maiores, produzindo assim essa variação, causada pelo

tamanho corporal.

Boa parte dos estudos sugere que os nascimentos de Sotalia guianensis ocorrem ao

longo de ano todo (Rosas & Monteiro-Filho, 2002), porém foi verificado que houve uma pico

de filhotes no verão em Paraty, Paraná, Baía de Sepetiba, Baía de Guanabara e na Baía dos

Golfinhos (Rosas & Monteiro-Filho, 2002, Pereira, 1999, Geise, 1991, Araújo, 2001). Isso

pode ter influenciado na coleta de dados dos diversos locais, fazendo com que alguns

coletassem vocalizações de animais maiores e outros de juvenis e filhotes.

Cananéia é um complexo estuarino que consiste numa área protegida, diferente das

baías abertas, que ocorrem no Norte do país. De acordo com Deconto & Monteiro-Filho

(2013), a constante deposição de matéria orgânica na água, transportada pelo rio, a água fica

mais densa, o que permite que o som viage rapidamente. Desse modo, assobios de curta

duração poderiam viajar na água de maneira eficaz, permitindo ao indivíduo uma diminuição

do gasto de energia em sua produção, como foi visto com os assobios de Cananéia, com relação

a Costa Rica, Baia de Guanabara, Paraty, Baía de Sepetiba e Pipa. Os parâmetros de frequência

em Cananéia se mostraram semelhantes de Costa Rica e Baía Formosa. O crescente movimento

de embarcações de médio e pequeno porte que passam pelos canais do estuário também podem

ser os causadores do aumento de frequência nos assobios dos botos-cinza do local.

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Cada população sofre consequências diferentes de influências evolucionárias,

ambientais (Morisaka et al, 2005) e sociais, provindas de cada local habitado. Os golfinhos

possuem aprendizagem vocal, o que pode alterar a estrutura do assobio (som aprendido dentro

do grupo) de forma distinta em cada população. Morisaka et al (2005) verificaram que os

assobios se modificam ao longo dos anos de forma diferente em cada população estudada, o

que pode fortalecer as evidências de que a aprendizagem vocal esteja influenciando na

modificação dos assobios, promovendo ainda mais a variação geográfica, que seria o resultado

do acúmulo de mudanças ao longo do tempo

6. Conclusão

Segundo Conner (1982) a variação biológica comportamental só é considerada

significativa quando ocorre entre populações vizinhas, sem nenhuma barreira geográfica para

haver fluxo gênico. A variação encontrada entre os assobios de Baía Formosa e Pipa é pequena,

porém interessante de ser olhada, pois pode significar que existe uma modulação do sinal, em

resposta à utilização de ambientes diferentes, como proposto por Leão et al (2015), mas

alternativamente, pode evidenciar uma possível divisão entre duas populações se esta variação

persistir ao longo do tempo, o que corroboraria a hipótese de existência de variação geográfica

acústica entre elas. Em geral essa variabilidade encontrada em todos os locais comparados pode

ter sido causada principalemnte em função do tamanho corporal, características do ambiente

(ruídos abióticos e bióticos, qualidade da água), aprendizagem social e mudança na frequência

de amostragem dos equipamentos.

Além disso, a relação encontrada entre duração e frequência inicial mostra que há mais

aspectos da fisiologia e do comportamento desses animais que necessitam de estudos mais

aprofundados, para compreender melhor a relação entre os dois parâmetros e as condições

fisiológicas do animal.

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Estudos com coleta de material genético e marcação de indivíduos são fundamentais

para a comprovação exata da existência de variação geográfica, para, assim verificarmos as

áreas de trânsito desses animais e se eles têm DNA distinto. Além disso deve-se realizar coletas

de dados com equipamentos iguais a taxas de frequência iguais, homogeneizando os dados,

como feito por Rossi-Santos e Podos (2006). Acrescento ainda, que tais amostragens devem ser

feitas na mesma época do ano, tomando cuidado para a observação de quantidade de adultos,

juvenis e filhotes nos grupos. Desse modo podemos achar mais evidências para essas hipóteses

de variabilidade acústica e conhecer melhor as capacidades de movimento e características

comportamentais dos botos-cinza.

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CONCLUSÃO GERAL

A variabilidade acústica encontrada nesse estudo pode ser influenciada por uma série de

fatores. Um deles é o ambiente, que pode provocar flutuações de frequência e amplitude nas

vocalizações dos animais, devido à presença de ruídos bióticos e abióticos e à temperatura,

salinidade e turbidez da água (alteram a propagação do som), por exemplo. O tamanho corporal

também pode influenciar em grande parte na produção de sons, uma vez que animais menores

produzem sons mais agudos (frequências maiores) do que animais de maior porte. A

aprendizagem vocal também pode promover mudanças nas vocalizações, uma vez que grupos

distintos possuem experiências sociais distintas. O uso de equipamentos diferentes, com taxas

de frequência distintas pode provocar a perda de sons mais agudos, uma vez que ultrapassariam

a frequência limite do equipamento. Para minimizar os efeitos de erros na metologia deve-se

coletar dados com os mesmos equipamentos e com os mesmos ajustes, procurando observar a

idade dos animais coletados, bem como as características do ambiente de estudo para, assim,

comparar áreas semelhantes, animais de mesmo porte, equipamentos com os mesmos ajustes e,

desse modo, poder verificar a existência da variação e classificá-la de forma correta (variação

geográfica ou dialeto).

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