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Cartografias Universidade Federal do Rio Grande do Sul Instituto de Artes Departamento de Artes Visuais Projeto de Graduação em Cerâmica Fernanda Barroso Bruno de Carvalho prof. Orientador: Rodrigo Núñez banca: Ana Maria Albani Carvalho Cláudia Zanatta.

Universidade Federal do Rio Grande do Sul Instituto de ... · peças. T oda peça cerâmica precisa secar e queimar , e nesses processos, podem ser cuidadas, mas n ão controladas

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Cartografias

Universidade Federal do Rio Grande do SulInstituto de Artes

Departamento de Artes Visuais

Projeto de Graduação em Cerâmica

Fernanda Barroso Bruno de Carvalho

prof. Orientador: Rodrigo Núñezbanca: Ana Maria Albani Carvalho

Cláudia Zanatta.

CARTOGRAFIAS

Cartografias é uma proposta de trabalho que consiste na confecção e montagem de três mapas cerâmicos, tendo como referência os mapas turísticos das três cidades escolhidas: Belo Horizonte, Porto Alegre e Maceió. A área central é selecionada e cada quadra é construída em cerâmica, tal qual o seu formato apresentado no mapa impresso. Apenas o formato das quadras interessa para a construção das cartografias cerâmicas. Assim, o desenho das ruas é formado pelos espaços existentes entre as peças montadas no chão. Todas as peças são feitas mantendo a proporção de escala.

Este trabalho possui:166 peças de 8 cm de altura Belo Horizonte126 peças de 4 cm de altura Porto Alegre75 peças de 2 cm de altura Maceió

Material:Faiança em pasta, com acréscimo de chamote.

Forma:As formas geométricas correspondem ao desenho do formato das quadras. O formato do conjunto de quadras também interessa. Assim, para cada área central deverá ser considerado o desenho formado pelo conjunto de quadras, compreendidas numa área determinada pelas ruas consideradas principais.

Mapas:Foram selecionados três mapas referentes às cidades de Belo Horizonte, Porto Alegre e Maceió. A escolha dessas cidades como referência para essa proposta, corresponde a relação pessoal estabelecida com cada uma delas. A altura das peças e o tamanho da área central selecionada correspondem ao tempo de permanência em cada local. Assim, todas as peças correspondentes ao mapa de Belo Horizonte possuem 8 cm de altura; todas de Porto Alegre possuem 4 cm e todas as peças de Maceió possuem 2 cm de altura. A cartografia cerâmica correspondente à Belo Horizonte possui 166 peças, Porto Alegre possui 126 e Maceió 75 peças.

Regras de confecção:A argila deve ser bem amassada para retirar possíveis bolhas de ar. Nesse momento, deve-se acrescentar o chamote para dar estrutura à matéria - e sovar o barro até ficar homogêneo. Depois, deve ser aberta em placas e cortadas de acordo com o formato da quadra e a altura da peça. No caso da cartografia correspondente a Belo Horizonte, cada lado deverá ser cortado no formato e na altura desejados e montado de maneira a fechar a peça.

Para confeccionar as peças correspondentes à cartografia de Porto Alegre, as placas deverão ser mais grossas para alcançar a altura proposta. O formato da quadra é cortado duas vezes, ocado e, após unido de forma que a peça fique fechada.

Para Maceió, o formato de cada quadra é cortado apenas uma vez, em função da altura proposta.

TODAS as peças deverão ser manipuladas no momento da confecção.Uma vez terminada a construção das peças, estas deverão secar da forma mais gradual e uniforme possível, para se evitar rachaduras e deformações. As peças deverão ficar sobre um jornal e, pelo menos 1 (uma) vez por semana, recomenda-se virá-las até que seque por completo. Para as peças maiores, esse procedimento deverá se repetir no mínimo 3 (três) vezes por semana, tendo o cuidado de cobrir a peça com um plástico, principalmente as pontas. No caso das peças que compõem Maceió, por ter a menor altura, além de virá-las com freqüência, deverão secar sob o apoio de um peso que pode ser um saquinho de areia para manter a estrutura da peça, de maneira que envergue o mínimo possível durante o processo de secagem. As peças só deverão ser queimadas depois que estiverem completamente secas, à temperatura de 1200º C. Para a montagem do forno, não poderão ser sobrepostas e deverão estar apoiadas na menor superfície, para que se evite possíveis distorções, causadas pela alta temperatura. Poderão ocorrer variações de cor devido a quantidade de peças no forno, proximidade da resistência ou de uma fornada para a outra. Observadas essas regras, as peças estarão prontas para a montagem. Cada uma deverá ser numerada de acordo com o mapa referência. Isso irá auxiliar na montagem das cartografias cerâmicas de acordo com o desenho de seu mapa impresso. As peças só poderão ser retiradas do lugar, para uma nova montagem, depois que esse trabalho se realizar de acordo com a proposta do projeto Cartografias.

8 cm

4 cm

2 cm

Sei que não quero contara história dos espaços já construídos.

Por mais ontens que se guardem mesmo por amor ou saudadenão faremos amanhecer jamais.

Gostaria, sim, de mostrar o espaçoainda não visto o espaço reinventado de assombrose sem alardemas que se mostra novo, sempre novo.

Nada é mais vulgar que o espaçonem nada mais vivo quanto a luz

Quando a descoberta se faz sentiré no presente que antecipo o futuromesmo no tempo em que se armam as forçaspara desvendar a forma clara.Creio Tenho fé na forma que não deixa restoQue estampa e calaComo a fala do poetaque mesmo em silêncio contém o mundo.

(Amílcar de Castro, 1999, p.24 Poema sem título, publicado no jornal Estado de Minas, 29 de ago., 1985).

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Justificativa

O poema de Amílcar de Castro, que abre esse texto, estabelece uma relação interessante com as três questões que meu projeto aborda: forma, manipulação e mapas. Logo nas duas primeiras estrofes do poema, há relação direta com minha proposta. A escolha pelos mapas dessas cidades especificamente, não passa pela questão urbana em nível de problemas sociais ou questões arquitetônicas. O fato de ser uma escolha pessoal, de cidades que fazem parte da minha vida, não significa um desejo em contar as histórias ou lembranças que possuo de cada local.

Todo o trabalho que desenvolvi em cerâmica sempre se baseou em formas geométricas e no manuseio, na minha necessidade de tocar, interagir ou ter contato com as coisas. Tudo parte disso. Desde a escolha do material ao resultado final de cada trabalho concluído. São peças que, por mais parecidas que sejam, são feitas individualmente. Todas são manipuladas no momento da confecção e, depois de prontas, continuam com essa possibilidade de manipulação. São feitas para isso também: para que se possa mexer, alterar a forma do conjunto, interagir. Por isso, não funcionam separadamente, como peças únicas. O sentido do trabalho está na possibilidade de mudança da forma final, na possibilidade de interagir com o conjunto, criando novas formas, apresentando “espaços ainda não vistos”.

Assim como Amílcar de Castro, eu também acredito na forma geométrica, na sua expressividade resultante da própria simplicidade da forma. E foi justamente o formato das quadras e a possibilidade de manuseio das peças que me levou a escolher mapas como ponto de partida. Para esse projeto, optei por montá-las da mesma maneira que encontramos nos mapas correspondentes. Quero apresentar a forma da quadra e o formato de seu conjunto, oferecer uma maneira diferente de ver aquilo que apenas percebemos.

“ver só se pensa e só se experimenta em última instância numa experiência de tocar” (Hubermann, 1998, p. 30/31).

Port

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Mapa turístico de Porto AlegreÁrea central selecionada

Projeto para a confecção das peças em cerâmica -desenho das quadras baseados no mapa turístico

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O material

A argila é um material bastante flexível, que permite e exige o trabalho com as mãos, muitas vezes, como ferramenta única, o que possibilita o contato direto com a matéria e uma manipulação constante em todas as etapas de produção, principalmente, no momento da confecção da peça. É a necessidade de tocar, de ver com as mãos que me leva a escolher esse material, mesmo que não seja o mais prático para construir o tipo de peça que proponho fazer, mesmo sem ter a garantia de que a estrutura dessas peças permaneça como foram construídas.

Construir formas geométricas em cerâmica exige um certo rigor de produção, para que a peça mantenha suas características formais de linhas, arestas e paredes retas, por isso foi preciso estabelecer regras para a confecção do trabalho¹. Quando afirmo que a argila não é o material mais prático para construir peças geométricas, refiro-me à sua maleabilidade, que ao mesmo tempo em que permite um contato constante com a matéria, exige muito cuidado para não deformar a peça ainda molhada e ao processo de produção, que envolve duas etapas fundamentais que são a secagem e a queima das peças. Toda peça cerâmica precisa secar e queimar, e nesses processos, podem ser cuidadas, mas não controladas. Os cuidados durante a secagem, para que ocorra uniforme e gradualmente, independente de fatores externos que podem influenciar, como dias muito quentes ou muito úmidos, podem evitar rachaduras e distorções na forma. Os cuidados com a queima, referentes a temperatura, tipo do forno e duração da queima, além de evitar distorções na peça, podem evitar grandes variações de cor, principalmente de uma fornada para outra. No caso desse projeto, essa variação de cor nas peças de um mesmo mapa funciona como pontos de referências, já que apesar de serem apresentadas como nos mapas impressos, as cartografias cerâmicas não possuem pontos de referência, como nomes de ruas ou localização de prédios públicos.

Todo esse cuidado que o processo exige, garante um envolvimento constante com a matéria e com a forma geométrica. Embora espere que o resultado final seja o mais próximo do que foi construído, as eventuais distorções nas peças não atrapalham, porque o fato de utilizar esse material já cumpre o principal objetivo que é o manejo - o fazer com as mãos.

O contato manual direto com o material é tão importante, que não se limita ao momento de confecção de cada peça. Reflete-se na forma geométrica e, principalmente, na possibilidade de continuar manipulando as peças, mesmo depois de queimadas.

_______________¹ Estas estão apresentadas no anexo Regras, na primeira página. Como todo processo de trabalho obedece a regras estabelecidas por mim e pelo material e o resultado final desse projeto possui características de jogos de montar, optei em fazer da introdução desse texto um pequeno manual de instrução, como as regras que acompanham os jogos tradicionais.

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“Talvez toda a questão seja saber quais palavras pronunciar, quais gestos executar, e em que ordem e ritmo, ou então basta o olhar a resposta o aceno de alguém, basta que alguém faça alguma coisa pelo simples prazer de fazê-la, e para que o seu prazer se torne um prazer para os outros; naquele momento todos os espaços se alteram, as alturas, as distâncias, a cidade se t rans f igura , torna-se c r i s ta l ina , transparente como uma libélula” (Calvino, 2003, p.148).B

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A forma

O interesse pela forma geométrica está presente desde as primeiras experiências com cerâmica. A regularidade e limpeza da forma são fundamentais para o tipo de trabalho que venho desenvolvendo, porque possibilitam inúmeros encaixes e uma grande variedade na maneira de montar e apresentar cada trabalho. A montagem das peças formam um jogo² definido pelo artista ou pelo espectador.

Os primeiros trabalhos em cerâmica são formas geométricas que funcionam como módulos. A mesma forma é repetida e confeccionada uma a uma, compondo um conjunto. O que interessa são as possibilidades de montagem desse conjunto.

Primeiro trabalho em cerâmica utilizando formas Geométricas, módulos e montagens.

A diferença dos primeiros trabalhos para esse projeto é que, nos primeiros, não havia um ponto de partida definido para fazer a primeira peça, nem um objetivo de montagem como resultado final. Pelo contrário, nos primeiros trabalhos a montagem das peças é totalmente experimental, sem planejamento prévio. Esse processo que estabeleci se assemelha àquele estabelecido por Amílcar de Castro. Em um trecho de seu depoimento registrado no livro Amílcar de Castro, o artista diz:

“Eu gosto do que eu estou fazendo e é só isso, o resto é conseqüência. Eu não tenho plano, sou improvisador do momento. Não tenho nada premeditado, o que acontecer, aconteceu. (...)” (Castro, 1999, p.36).

______________²JOGO: coleção ou série de coisas emparelhadas ou que formam um todo. (minidicionário Soares Amora,1999, p.408)

Módulos geométricos feitos em louça.Proposta de montagem

Belo Horizonte detalhe

Porto Alegredetalhe

Maceiódetalhe

Anexos

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Essa é a diferença para este projeto - Cartografias. Todo o processo criativo obedece regras que eu mesma imponho, desde a preparação para começar o trabalho, até o que se pode fazer após o trabalho apresentado.

A forma geométrica remete aos jogos infantis de montar, como os blocos lógicos, e convidam o espectador para a possibilidade de tocar ou construir novas formas. Mas, como todo processo específico desse trabalho, estabeleci uma regra para isso também. A questão da manipulação posterior ao trabalho já concluído, por parte do espectador é possível, depois que o trabalho se realize da maneira imaginada para cumprir um determinado objetivo, seja para o espaço de exposição que foi projetado ou pela proposta inicial apresentada. Antes de remeter ao jogo, quero que fique claro que, naquele momento, são cartografias.O trabalho existe como cartografia representando essas cidades, quando são montados da maneira fiel, tal qual está representado em seus mapas turísticos. A partir do momento em que se cumpre essa função, cada mapa cerâmico poderá se transformar em outros mapas ou formas que representam a imaginação de seu manipulador, deixando de representar as cidades-referência.

A forma geométrica está presente de duas maneiras no meu trabalho: como módulo (peça unitária) e como conjunto. O conjunto final apresentado nunca resulta numa escultura fixa, porque é composto por módulos que são apenas encaixados ou ordenados. O tipo de ordenação que proponho nesse trabalho é diferente daquela proposta por Amílcar de Castro. Trabalho com a forma geométrica através da seriação, que permite uma variação de ordenamentos das peças, entre si e no espaço. Já Amílcar de Castro trabalha com o ordenamento da forma única e com experimentos de apresentação desse trabalho no espaço. Para confeccionar suas esculturas, o artista utiliza desenhos e projetos, no qual estabelece em uma única peça a ordem dos elementos que a compõem: o corte, a dobra, o formato. Primeiramente, as esculturas de Amílcar são desenhos, depois maquetes em papel, se o artista gostar, se transformam em maquetes de ferro. Essas maquetes de ferro são decisivas para definir quais as esculturas serão ampliadas. Esse processo está nos depoimentos do artista, registrados no livro Amílcar de Castro. O ponto em comum desse processo de trabalho de Amílcar com Cartografias é o projeto: primeiro desenho, depois maquetes, que no meu caso, já resulta no resultado final proposto. Mas, a identificação com o trabalho de Amílcar está além de pontos em comum no processo de trabalho. Está, sobretudo, na vontade e na determinação de trabalhar com a forma geométrica.

Amilcar de Castro - escultura em ferro, 23 x 30 x 30 x 1,4.

A cidade possui as dimensões do caráter público. O mapa não. As cartografias que proponho ainda possuem um caráter mais familiar, porque além da escala reduzida e da representação de lugares reais e relativamente conhecidos pelo público local, esse trabalho remete aos jogos de montar. Esse caráter familiar que o projeto possui é muito importante, porque é justamente o elo de ligação entre trabalho e público e é essa identificação por parte do espectador, que permitirá que a proposta de manipulação das peças posterior ao trabalho apresentado se realize. Por isso faço questão de deixar claro quais foram os mapas escolhidos, quero que o espectador saiba disso.

Quando Suely Rolnik escreve sobre perfil do cartógrafo, no texto “Cartografia Sentimental”, me identifico especialmente com duas características: a de fazer prevalecer o que se propõe e “se colocar sempre que possível na adjacência das mutações cartográficas”4. É exatamente isso que estou fazendo nesse projeto. Estabeleci uma proposta e pretendo estar por perto, no momento das manipulações cartográficas. É difícil ter uma conclusão sobre a proposta de manipulação de um trabalho que ainda não foi exposto. Mais difícil ainda, quando se estabelece um determinado momento para que essa manipulação aconteça. Mas, o que acho interessante nesse projeto é que ele representa - e apresenta - questões muito importantes para mim: a forma, a manipulação e o mapa dessa três cidades. O material que escolhi e todo processo de trabalho que desenvolvi, supre minha necessidade de manejo. O resultado que busco e consigo obter nos trabalhos, em relação com a forma geométrica e as possibilidades de montagem, refletem essa necessidade de manipulação que não se limita ao meu fazer. Procuro repassar no resultado final proposto o mesmo prazer que sinto em manipular a matéria em todas as fases de construção da peça. Dentro do que proponho fazer, acredito que todo o processo e o resultado final deste trabalho se mostram eficazes: o material permite um contato manual constante durante todo o processo de produção; a forma geométrica, em sua limpeza e simplicidade, abre um leque de possibilidades de encaixes e montagens; os mapas fornecem a forma geométrica, compõem o jogo das peças e garantem o caráter familiar do trabalho.

Cartografias é o resultado de um processo de trabalho que se manteve coerente com as propostas que já vinha desenvolvendo e que permitiu aliar em um mesmo projeto as questões que me interessam, nesse momento. E, como os outros trabalhos, não termina com a apresentação. Permanece sempre novo a cada proposta de manipulação. Daqui para frente, depende da vontade e da necessidade de cada um em também precisar tocar para ver e realizar novos espaços, novas propostas, novas cartografias.

_____________4 Suely Rolnik Cartografia Santimental. Texto publicado no catálogo da XXIV Bienal de São Paulo, p. 30.

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Outro artista que possui um trabalho variado relativo ao tema urbano é o uruguaio Marco Maggi. Seus trabalhos de incisões delicadas na superfície de papéis podem remeter a vistas aéreas ou circuitos eletrônicos. Mas, o trabalho desse artista que mais me identifico é Construções e demolições. Nessa obra, Maggi também trabalha com formas geométricas presentes tanto no formato retangular do papel, quanto das incisões que o artista propõem nas superfícies. A maneira como apresenta esse trabalho, me remete as Cartografias. As pilhas de papel possuem a mesma função dos blocos cerâmicos, pela forma como são organizadas no espaço. Mas, a intenção de Maggi é outra. Segundo o curador da representação nacional do Uruguai, na 4ª Bienal do Mercosul, Gabriel Peluffo Linari, esse trabalho de Maggi remete “o âmbito da subjetividade, da cercania, da territorialidade do lugar, ainda que ao mesmo tempo remeta a seus opostos: indivíduo solitário-telecomunicado, ao não-lugar urbano, a assepsia de um espaço associal sem referentes possíveis de identidade e de escala”.³

Meu trabalho não passa por nenhuma dessas discussões. Procuro a forma que a cidade possui e que não temos consciência por uma questão de escala. É uma proposta a minha proposta. Por isso a manipulação por parte do espectador poderá acontecer depois que o trabalho for apresentado como tal.

Os mapas são ferramentas que auxiliam o deslocamento dos habitantes em seu espaço de convívio. Através dele, podemos perceber a cidade de uma outra maneira. A escala reduzida do mapa nos possibilita ter nas mãos o que, em tamanho real, não podemos pegar e nem podemos ver dessa maneira. A questão das escalas comentada por Robert Morris, no livro de Didi-Hubermann “O que vemos, o que nos olha”, ilustra bem a relação que nós estabelecemos com as dimensões das coisas que nos cercam:

“(...) O caráter familiar (ou íntimo) atribuído a um objeto aumenta quase na mesma proporção que suas dimensões diminuem em relação a nós. O caráter público atribuído a um objeto aumenta na mesma proporção que suas dimensões aumentam em relação a nós.”(Hubermann, 1998, p.123).

_______________³Gabriel Peluffo Linari. Texto publicado no material distribuído pela Ação Educativa da 4ª Bienal do Mercosul, 2003.

Os mapas

“além de modelo de forma, a cidade é modelo de desenvolvimento, nos limites em que isso pode acontecer sem contradizer algumas premissas postuladas, segundo uma lógica e um ritmo evolutivos próprios. A cidade ideal, mais do que um modelo propriamente dito, é um módulo para o qual sempre é possível encontrar múltiplos e submúltiplos que modifiquem a sua medida, mas não sua substância: dada uma planta em forma de tabuleiro, centralizada ou estelar, sempre é possível desenhar o mesmo esquema numa dimensão maior ou menor.” (Argan, 1998, p. 74).

Para esse trabalho, as cidades escolhidas foram apenas modelo de forma, como se refere Argan no trecho acima. O desenho formado pelo conjunto proposto é o mesmo esquema, numa dimensão menor. A escala reduzida dos mapas permite que as pessoas vejam o espaço como um todo. Em escala natural, conseguimos perceber o formato das quadras, se é quadrado ou mais retangular, mas não vemos isso. As cartografias cerâmicas permitem que o espectador veja a forma da quadra e o formato composto pelo conjunto delas. A diferença entre os mapas impressos e as cartografias cerâmicas está no enfoque. Nos primeiros, a importância está nas ruas, porque os mapas impressos são, antes de tudo, ferramentas de localização. Nos mapas cerâmicos, o enfoque está na forma das quadras e no conjunto composto por elas.

Não tenho a intenção, com esse trabalho, de discutir questões referentes à vida e problemas urbanos. A cidade como tema para arte é representada, geralmente, em paisagens que retratam a arquitetura, o movimento da cidade, cenas do cotidiano, numa visão bastante sensível, principalmente no final do século passado. Com o advento da modernidade, tecnologia, guerras, o ritmo de vida foi alterado e como conseqüência, a paisagem urbana também foi. O tema urbano, na arte, passou a questionar a violência, a miséria e outros problemas das cidades. É claro, que nos dias de hoje, esse tema não se limita aos problemas. A arte contemporânea permite uma variação de interpretação e linguagem para um mesmo tema. Basta ver o catálogo da 25ª Bienal de São Paulo, cujo tema era Iconografias Metropolitanas. Uma bienal inteira dedicada a multiplicidade de abordagens que o tema permite: cultura, violência, política, ritmo de vida são apenas alguns exemplos do que se podia encontrar nessa mostra.Terraço do café a noite, Praça

do Forum, ArlesVincent Van Gogh - óleo s/ tela, 1888.

One Year Later (Stills)Jo Ratcliffe & Sebástian Diaz Morales

Vídeo de 11 minutos - 2001

Hotbed - Marco Maggicortes em papel, 2003

Mother Board IV - M. Maggiponta seca em f. de alumínio, 2000.

Seleção euro-americana da 25 Bienal de São Paulo no Chile

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Outro artista que possui um trabalho variado relativo ao tema urbano é o uruguaio Marco Maggi. Seus trabalhos de incisões delicadas na superfície de papéis podem remeter a vistas aéreas ou circuitos eletrônicos. Mas, o trabalho desse artista que mais me identifico é Construções e demolições. Nessa obra, Maggi também trabalha com formas geométricas presentes tanto no formato retangular do papel, quanto das incisões que o artista propõem nas superfícies. A maneira como apresenta esse trabalho, me remete as Cartografias. As pilhas de papel possuem a mesma função dos blocos cerâmicos, pela forma como são organizadas no espaço. Mas, a intenção de Maggi é outra. Segundo o curador da representação nacional do Uruguai, na 4ª Bienal do Mercosul, Gabriel Peluffo Linari, esse trabalho de Maggi remete “o âmbito da subjetividade, da cercania, da territorialidade do lugar, ainda que ao mesmo tempo remeta a seus opostos: indivíduo solitário-telecomunicado, ao não-lugar urbano, a assepsia de um espaço associal sem referentes possíveis de identidade e de escala”.³

Meu trabalho não passa por nenhuma dessas discussões. Procuro a forma que a cidade possui e que não temos consciência por uma questão de escala. É uma proposta a minha proposta. Por isso a manipulação por parte do espectador poderá acontecer depois que o trabalho for apresentado como tal.

Os mapas são ferramentas que auxiliam o deslocamento dos habitantes em seu espaço de convívio. Através dele, podemos perceber a cidade de uma outra maneira. A escala reduzida do mapa nos possibilita ter nas mãos o que, em tamanho real, não podemos pegar e nem podemos ver dessa maneira. A questão das escalas comentada por Robert Morris, no livro de Didi-Hubermann “O que vemos, o que nos olha”, ilustra bem a relação que nós estabelecemos com as dimensões das coisas que nos cercam:

“(...) O caráter familiar (ou íntimo) atribuído a um objeto aumenta quase na mesma proporção que suas dimensões diminuem em relação a nós. O caráter público atribuído a um objeto aumenta na mesma proporção que suas dimensões aumentam em relação a nós.”(Hubermann, 1998, p.123).

_______________³Gabriel Peluffo Linari. Texto publicado no material distribuído pela Ação Educativa da 4ª Bienal do Mercosul, 2003.

Os mapas

“além de modelo de forma, a cidade é modelo de desenvolvimento, nos limites em que isso pode acontecer sem contradizer algumas premissas postuladas, segundo uma lógica e um ritmo evolutivos próprios. A cidade ideal, mais do que um modelo propriamente dito, é um módulo para o qual sempre é possível encontrar múltiplos e submúltiplos que modifiquem a sua medida, mas não sua substância: dada uma planta em forma de tabuleiro, centralizada ou estelar, sempre é possível desenhar o mesmo esquema numa dimensão maior ou menor.” (Argan, 1998, p. 74).

Para esse trabalho, as cidades escolhidas foram apenas modelo de forma, como se refere Argan no trecho acima. O desenho formado pelo conjunto proposto é o mesmo esquema, numa dimensão menor. A escala reduzida dos mapas permite que as pessoas vejam o espaço como um todo. Em escala natural, conseguimos perceber o formato das quadras, se é quadrado ou mais retangular, mas não vemos isso. As cartografias cerâmicas permitem que o espectador veja a forma da quadra e o formato composto pelo conjunto delas. A diferença entre os mapas impressos e as cartografias cerâmicas está no enfoque. Nos primeiros, a importância está nas ruas, porque os mapas impressos são, antes de tudo, ferramentas de localização. Nos mapas cerâmicos, o enfoque está na forma das quadras e no conjunto composto por elas.

Não tenho a intenção, com esse trabalho, de discutir questões referentes à vida e problemas urbanos. A cidade como tema para arte é representada, geralmente, em paisagens que retratam a arquitetura, o movimento da cidade, cenas do cotidiano, numa visão bastante sensível, principalmente no final do século passado. Com o advento da modernidade, tecnologia, guerras, o ritmo de vida foi alterado e como conseqüência, a paisagem urbana também foi. O tema urbano, na arte, passou a questionar a violência, a miséria e outros problemas das cidades. É claro, que nos dias de hoje, esse tema não se limita aos problemas. A arte contemporânea permite uma variação de interpretação e linguagem para um mesmo tema. Basta ver o catálogo da 25ª Bienal de São Paulo, cujo tema era Iconografias Metropolitanas. Uma bienal inteira dedicada a multiplicidade de abordagens que o tema permite: cultura, violência, política, ritmo de vida são apenas alguns exemplos do que se podia encontrar nessa mostra.Terraço do café a noite, Praça

do Forum, ArlesVincent Van Gogh - óleo s/ tela, 1888.

One Year Later (Stills)Jo Ratcliffe & Sebástian Diaz Morales

Vídeo de 11 minutos - 2001

Hotbed - Marco Maggicortes em papel, 2003

Mother Board IV - M. Maggiponta seca em f. de alumínio, 2000.

Seleção euro-americana da 25 Bienal de São Paulo no Chile

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Essa é a diferença para este projeto - Cartografias. Todo o processo criativo obedece regras que eu mesma imponho, desde a preparação para começar o trabalho, até o que se pode fazer após o trabalho apresentado.

A forma geométrica remete aos jogos infantis de montar, como os blocos lógicos, e convidam o espectador para a possibilidade de tocar ou construir novas formas. Mas, como todo processo específico desse trabalho, estabeleci uma regra para isso também. A questão da manipulação posterior ao trabalho já concluído, por parte do espectador é possível, depois que o trabalho se realize da maneira imaginada para cumprir um determinado objetivo, seja para o espaço de exposição que foi projetado ou pela proposta inicial apresentada. Antes de remeter ao jogo, quero que fique claro que, naquele momento, são cartografias.O trabalho existe como cartografia representando essas cidades, quando são montados da maneira fiel, tal qual está representado em seus mapas turísticos. A partir do momento em que se cumpre essa função, cada mapa cerâmico poderá se transformar em outros mapas ou formas que representam a imaginação de seu manipulador, deixando de representar as cidades-referência.

A forma geométrica está presente de duas maneiras no meu trabalho: como módulo (peça unitária) e como conjunto. O conjunto final apresentado nunca resulta numa escultura fixa, porque é composto por módulos que são apenas encaixados ou ordenados. O tipo de ordenação que proponho nesse trabalho é diferente daquela proposta por Amílcar de Castro. Trabalho com a forma geométrica através da seriação, que permite uma variação de ordenamentos das peças, entre si e no espaço. Já Amílcar de Castro trabalha com o ordenamento da forma única e com experimentos de apresentação desse trabalho no espaço. Para confeccionar suas esculturas, o artista utiliza desenhos e projetos, no qual estabelece em uma única peça a ordem dos elementos que a compõem: o corte, a dobra, o formato. Primeiramente, as esculturas de Amílcar são desenhos, depois maquetes em papel, se o artista gostar, se transformam em maquetes de ferro. Essas maquetes de ferro são decisivas para definir quais as esculturas serão ampliadas. Esse processo está nos depoimentos do artista, registrados no livro Amílcar de Castro. O ponto em comum desse processo de trabalho de Amílcar com Cartografias é o projeto: primeiro desenho, depois maquetes, que no meu caso, já resulta no resultado final proposto. Mas, a identificação com o trabalho de Amílcar está além de pontos em comum no processo de trabalho. Está, sobretudo, na vontade e na determinação de trabalhar com a forma geométrica.

Amilcar de Castro - escultura em ferro, 23 x 30 x 30 x 1,4.

A cidade possui as dimensões do caráter público. O mapa não. As cartografias que proponho ainda possuem um caráter mais familiar, porque além da escala reduzida e da representação de lugares reais e relativamente conhecidos pelo público local, esse trabalho remete aos jogos de montar. Esse caráter familiar que o projeto possui é muito importante, porque é justamente o elo de ligação entre trabalho e público e é essa identificação por parte do espectador, que permitirá que a proposta de manipulação das peças posterior ao trabalho apresentado se realize. Por isso faço questão de deixar claro quais foram os mapas escolhidos, quero que o espectador saiba disso.

Quando Suely Rolnik escreve sobre perfil do cartógrafo, no texto “Cartografia Sentimental”, me identifico especialmente com duas características: a de fazer prevalecer o que se propõe e “se colocar sempre que possível na adjacência das mutações cartográficas”4. É exatamente isso que estou fazendo nesse projeto. Estabeleci uma proposta e pretendo estar por perto, no momento das manipulações cartográficas. É difícil ter uma conclusão sobre a proposta de manipulação de um trabalho que ainda não foi exposto. Mais difícil ainda, quando se estabelece um determinado momento para que essa manipulação aconteça. Mas, o que acho interessante nesse projeto é que ele representa - e apresenta - questões muito importantes para mim: a forma, a manipulação e o mapa dessa três cidades. O material que escolhi e todo processo de trabalho que desenvolvi, supre minha necessidade de manejo. O resultado que busco e consigo obter nos trabalhos, em relação com a forma geométrica e as possibilidades de montagem, refletem essa necessidade de manipulação que não se limita ao meu fazer. Procuro repassar no resultado final proposto o mesmo prazer que sinto em manipular a matéria em todas as fases de construção da peça. Dentro do que proponho fazer, acredito que todo o processo e o resultado final deste trabalho se mostram eficazes: o material permite um contato manual constante durante todo o processo de produção; a forma geométrica, em sua limpeza e simplicidade, abre um leque de possibilidades de encaixes e montagens; os mapas fornecem a forma geométrica, compõem o jogo das peças e garantem o caráter familiar do trabalho.

Cartografias é o resultado de um processo de trabalho que se manteve coerente com as propostas que já vinha desenvolvendo e que permitiu aliar em um mesmo projeto as questões que me interessam, nesse momento. E, como os outros trabalhos, não termina com a apresentação. Permanece sempre novo a cada proposta de manipulação. Daqui para frente, depende da vontade e da necessidade de cada um em também precisar tocar para ver e realizar novos espaços, novas propostas, novas cartografias.

_____________4 Suely Rolnik Cartografia Santimental. Texto publicado no catálogo da XXIV Bienal de São Paulo, p. 30.

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A forma

O interesse pela forma geométrica está presente desde as primeiras experiências com cerâmica. A regularidade e limpeza da forma são fundamentais para o tipo de trabalho que venho desenvolvendo, porque possibilitam inúmeros encaixes e uma grande variedade na maneira de montar e apresentar cada trabalho. A montagem das peças formam um jogo² definido pelo artista ou pelo espectador.

Os primeiros trabalhos em cerâmica são formas geométricas que funcionam como módulos. A mesma forma é repetida e confeccionada uma a uma, compondo um conjunto. O que interessa são as possibilidades de montagem desse conjunto.

Primeiro trabalho em cerâmica utilizando formas Geométricas, módulos e montagens.

A diferença dos primeiros trabalhos para esse projeto é que, nos primeiros, não havia um ponto de partida definido para fazer a primeira peça, nem um objetivo de montagem como resultado final. Pelo contrário, nos primeiros trabalhos a montagem das peças é totalmente experimental, sem planejamento prévio. Esse processo que estabeleci se assemelha àquele estabelecido por Amílcar de Castro. Em um trecho de seu depoimento registrado no livro Amílcar de Castro, o artista diz:

“Eu gosto do que eu estou fazendo e é só isso, o resto é conseqüência. Eu não tenho plano, sou improvisador do momento. Não tenho nada premeditado, o que acontecer, aconteceu. (...)” (Castro, 1999, p.36).

______________²JOGO: coleção ou série de coisas emparelhadas ou que formam um todo. (minidicionário Soares Amora,1999, p.408)

Módulos geométricos feitos em louça.Proposta de montagem

Belo Horizonte detalhe

Porto Alegredetalhe

Maceiódetalhe

Anexos

- m

apas,

pro

jeto

s e f

oto

s

6 11

“Talvez toda a questão seja saber quais palavras pronunciar, quais gestos executar, e em

que ordem e ritm

o, ou então basta o olhar a resposta o aceno de alguém

, basta que alguém

faça alguma coisa pelo sim

ples prazer de fazê-la, e para que o seu prazer se torne um

prazer para os outros; naquele m

omento todos os espaços se alteram

, as alturas,

as distâncias,

a cidade

se tra

nsfig

ura

, to

rna

-se

crista

lina

, transparente com

o uma libélula” (C

alvino, 2

00

3, p.1

48

).

Belo Horizonte

Mapa turístico de Belo Horizonte

Área selecionada a partir do desenho das ruas principais.

Projeto para a confecção das peças em cerâmicaDesenho das quadras baseados no mapa turísticos

12

5

O material

A argila é um material bastante flexível, que permite e exige o trabalho com as mãos, muitas vezes, como ferramenta única, o que possibilita o contato direto com a matéria e uma manipulação constante em todas as etapas de produção, principalmente, no momento da confecção da peça. É a necessidade de tocar, de ver com as mãos que me leva a escolher esse material, mesmo que não seja o mais prático para construir o tipo de peça que proponho fazer, mesmo sem ter a garantia de que a estrutura dessas peças permaneça como foram construídas.

Construir formas geométricas em cerâmica exige um certo rigor de produção, para que a peça mantenha suas características formais de linhas, arestas e paredes retas, por isso foi preciso estabelecer regras para a confecção do trabalho¹. Quando afirmo que a argila não é o material mais prático para construir peças geométricas, refiro-me à sua maleabilidade, que ao mesmo tempo em que permite um contato constante com a matéria, exige muito cuidado para não deformar a peça ainda molhada e ao processo de produção, que envolve duas etapas fundamentais que são a secagem e a queima das peças. Toda peça cerâmica precisa secar e queimar, e nesses processos, podem ser cuidadas, mas não controladas. Os cuidados durante a secagem, para que ocorra uniforme e gradualmente, independente de fatores externos que podem influenciar, como dias muito quentes ou muito úmidos, podem evitar rachaduras e distorções na forma. Os cuidados com a queima, referentes a temperatura, tipo do forno e duração da queima, além de evitar distorções na peça, podem evitar grandes variações de cor, principalmente de uma fornada para outra. No caso desse projeto, essa variação de cor nas peças de um mesmo mapa funciona como pontos de referências, já que apesar de serem apresentadas como nos mapas impressos, as cartografias cerâmicas não possuem pontos de referência, como nomes de ruas ou localização de prédios públicos.

Todo esse cuidado que o processo exige, garante um envolvimento constante com a matéria e com a forma geométrica. Embora espere que o resultado final seja o mais próximo do que foi construído, as eventuais distorções nas peças não atrapalham, porque o fato de utilizar esse material já cumpre o principal objetivo que é o manejo - o fazer com as mãos.

O contato manual direto com o material é tão importante, que não se limita ao momento de confecção de cada peça. Reflete-se na forma geométrica e, principalmente, na possibilidade de continuar manipulando as peças, mesmo depois de queimadas.

_______________¹ Estas estão apresentadas no anexo Regras, na primeira página. Como todo processo de trabalho obedece a regras estabelecidas por mim e pelo material e o resultado final desse projeto possui características de jogos de montar, optei em fazer da introdução desse texto um pequeno manual de instrução, como as regras que acompanham os jogos tradicionais.

4 13

Justificativa

O poema de Amílcar de Castro, que abre esse texto, estabelece uma relação interessante com as três questões que meu projeto aborda: forma, manipulação e mapas. Logo nas duas primeiras estrofes do poema, há relação direta com minha proposta. A escolha pelos mapas dessas cidades especificamente, não passa pela questão urbana em nível de problemas sociais ou questões arquitetônicas. O fato de ser uma escolha pessoal, de cidades que fazem parte da minha vida, não significa um desejo em contar as histórias ou lembranças que possuo de cada local.

Todo o trabalho que desenvolvi em cerâmica sempre se baseou em formas geométricas e no manuseio, na minha necessidade de tocar, interagir ou ter contato com as coisas. Tudo parte disso. Desde a escolha do material ao resultado final de cada trabalho concluído. São peças que, por mais parecidas que sejam, são feitas individualmente. Todas são manipuladas no momento da confecção e, depois de prontas, continuam com essa possibilidade de manipulação. São feitas para isso também: para que se possa mexer, alterar a forma do conjunto, interagir. Por isso, não funcionam separadamente, como peças únicas. O sentido do trabalho está na possibilidade de mudança da forma final, na possibilidade de interagir com o conjunto, criando novas formas, apresentando “espaços ainda não vistos”.

Assim como Amílcar de Castro, eu também acredito na forma geométrica, na sua expressividade resultante da própria simplicidade da forma. E foi justamente o formato das quadras e a possibilidade de manuseio das peças que me levou a escolher mapas como ponto de partida. Para esse projeto, optei por montá-las da mesma maneira que encontramos nos mapas correspondentes. Quero apresentar a forma da quadra e o formato de seu conjunto, oferecer uma maneira diferente de ver aquilo que apenas percebemos.

“ver só se pensa e só se experimenta em última instância numa experiência de tocar” (Hubermann, 1998, p. 30/31).

Port

o A

legre

Mapa turístico de Porto AlegreÁrea central selecionada

Projeto para a confecção das peças em cerâmica -desenho das quadras baseados no mapa turístico

14 3

Sei que não quero contara história dos espaços já construídos.

Por mais ontens que se guardem mesmo por amor ou saudadenão faremos amanhecer jamais.

Gostaria, sim, de mostrar o espaçoainda não visto o espaço reinventado de assombrose sem alardemas que se mostra novo, sempre novo.

Nada é mais vulgar que o espaçonem nada mais vivo quanto a luz

Quando a descoberta se faz sentiré no presente que antecipo o futuromesmo no tempo em que se armam as forçaspara desvendar a forma clara.Creio Tenho fé na forma que não deixa restoQue estampa e calaComo a fala do poetaque mesmo em silêncio contém o mundo.

(Amílcar de Castro, 1999, p.24 Poema sem título, publicado no jornal Estado de Minas, 29 de ago., 1985).

15

mar

Mapa turístico de MaceióÁrea central selecionada, de acordo com as ruas principais

Projeto para a confecção das peças em cerâmicadesenhos das quadras baseados no mapa turístico.

Maceió

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Bibliografia:

Amilcar de Castro: depoimento / [Coordenadores: Fernando Pedro da Silva, Marília Andrés Ribeiro]. Belo Horizonte: C/Arte, 1999.

ARGAN, Giulio Carlo. História da Arte como História da Cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

CALVINO, Ítalo. As Cidades Invisíveis. São Paulo: Folha de São Paulo, 2003.

HUBERMAN, Georges Didi. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: Ed. 34, 1998.

TISSINARI, Alberto (org). Amilcar de Castro. São Paulo: Cosac & Naify Edições, 1997.

CatálogosROLNIK, Sueli. Cartografia Sentimental. In. Roteiros, Roteiros, Roteiros, Roteiros, Roteiros, Roteiros, Roteiros. XXIV Bienal de São Paulo, 1998.

25ª Bienal de São Paulo Iconografias Metropolitanas Cidades. Fundação Bienal de São Paulo, março de 2002.

LINARI, Gabriel Peluffo. Origem e desvanecimento. Representação Nacional do Uruguai Marco Maggi. In. Ação Educativa da 4ª Bienal do Mercosul, 2003.

Publicação mensalBAUDSON, Michel. La Ville. In. Connaissance des Arts. Nº 503. Fevereiro de 1994.

Sites:http://www.crjbgallery.com/past/Marco%20Maggi%20C%20&%20D/pr.html

http://www11.estadao.com.br/divirtase/noticias/2002/jul/19/196.htm

http://bienalsaopaulo.globo.com/busca_artista_codigo3.asp?assunto='11734

Http://joseebienvenugallery.com/artists/Marco_Maggi/Marco_Maggi.html

http://www.mac.uchile.cl/exposiciones/bienalsaopaulo/maggi6.html

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Bibliografia:

Amilcar de Castro: depoimento / [Coordenadores: Fernando Pedro da Silva, Marília Andrés Ribeiro]. Belo Horizonte: C/Arte, 1999.

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http://www.mac.uchile.cl/exposiciones/bienalsaopaulo/maggi6.html

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Cartografias

Universidade Federal do Rio Grande do SulInstituto de Artes

Departamento de Artes Visuais

Projeto de Graduação em Cerâmica

Fernanda Barroso Bruno de Carvalho

prof. Orientador: Rodrigo Núñezbanca: Ana Maria Albani Carvalho

Cláudia Zanatta.