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1 Universidade São Judas Tadeu Curso de Pós-Graduação stricto-sensu Arquitetura e Urbanismo Maria Adelaide Pires de Almeida Sasaqui A representação da arquitetura clássica na produção pictórica como referencial do poder das classes dominantes São Paulo 2015

Universidade São Judas Tadeu Curso de Pós-Graduação ... · A arte clássica, criada na Antiguidade, é norteada por cânones como harmonia, equilíbrio e proporção presentes

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Universidade São Judas Tadeu Curso de Pós-Graduação stricto-sensu

Arquitetura e Urbanismo

Maria Adelaide Pires de Almeida Sasaqui

A representação da arquitetura clássica na produção pictórica como referencial do poder das

classes dominantes

São Paulo

2015

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Universidade São Judas Tadeu Curso de Pós-Graduação stricto-sensu

Arquitetura e Urbanismo

Maria Adelaide Pires de Almeida Sasaqui

A representação da arquitetura clássica na produção pictórica como referencial do poder das

classes dominantes

Dissertação apresentada ao curso de Pós Graduação Stricto Sensu da Universidade

São Judas Tadeu para conclusão do curso de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Profª. Dra. Paula De Vincenzo Fidelis Belfort Mattos

São Paulo 2015

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Universidade São Judas Tadeu Curso de Pós-Graduação stricto-sensu

Arquitetura e Urbanismo

Maria Adelaide Pires de Almeida Sasaqui

A representação da arquitetura clássica na produção pictórica como referencial do poder das

classes dominantes

Dissertação apresentada ao curso de Pós Graduação Stricto Sensu da Universidade

São Judas Tadeu para conclusão do curso de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo.

Aprovada em____________________de 2015

__________________________________________________________________

Orientadora: Profª. Drª. Paula De Vincenzo Fidelis Belfort Mattos

_____________________________________________________________________

Prof.ª Dr.ª Lóris Graldi Rampazzo

_____________________________________________________________________

Prof. Dr. Fernando Guilhermo Vázquez Ramos

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Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da Universidade São Judas Tadeu

Bibliotecária: Daiane Silva de Oliveira - CRB 8/8702

Sasaqui, Maria Adelaide Pires de Almeida

S252r A representação da arquitetura clássica na produção pictórica como

referencial do poder das classes dominantes - São Paulo, 2015.

143 f. : il. ; 30 cm.

Orientadora: Paula De Vincenzo Fidelis Belfort Mattos.

Dissertação (mestrado) – Universidade São Judas Tadeu, São Paulo,

2015.

1. Arte clássica. 2. Representação arquitetônica. I. Mattos, Paula de

Vincenzo Fidelis Belfort. II. Universidade São Judas Tadeu, Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em Arquitetura e Urbanismo. III. Título

CDD 22 – 709.0403

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AGRADECIMENTOS

À Prof ª. Dra. Paula De Vincenzo Fidelis Belfort Mattos, pela dedicada orientação e por compartilhar comigo seus conhecimentos

e pela colaboração na execução deste trabalho.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela concessão da bolsa de estudo.

Aos professores que colaboraram com o avanço do curso.

À minha família, pelo apoio e compreensão.

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Resumo

Sasaqui, Maria Adelaide Pires de Almeida. A representação da arquitetura clássica na produção pictórica como referencial do poder das classes dominantes. Dissertação, Curso de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo do Programa de Pós-Graduação – PGAUR da Universidade São Judas Tadeu. São Paulo, 2015. A pesquisa trata da representação da arquitetura clássica na pintura como instrumento ideológico de poder estabelecido adotado por uma classe social dominante sobre as demais classes em diferentes períodos da história da civilização humana. O universo de imagens materiais da Arte Clássica greco-romana criada na Antiguidade é foco da releitura humanista no Renascimento italiano ressaltando os valores da nascente burguesia. Na segunda metade do século XVIII e início do XIX, novamente acorre a releitura da arte clássica, efetuada pelo neoclassicismo para enfatizar as mudanças preconizadas pela Revolução Francesa que evidenciam os valores burgueses: conquista glória, moral e bem comum, marcando um momento de renovação e modificação no comportamento da sociedade europeia. Napoleão, durante seu governo, determina o neoclassicismo como estilo Império, representando glória, conquista e poder estabelecido. No início do século XIX, o neoclassicismo chega ao Brasil em 1816, trazido pela Missão Francesa, para simbolizar o Primeiro e Segundo Reinado e destacar o jovem Império. Em todas as épocas é possível identificar a representação da arquitetura clássica na estrutura pictórica. Em todas as épocas mencionadas é possível identificar a representação da arquitetura clássica como elemento inspirador na estrutura pictórica. Palavras-chave: arte clássica; representação da arquitetura na pintura; instrumento ideológico; poder estabelecido.

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Abstract

Sasaqui, Maria Adelaide Pires de Almeida. The representation of classical architecture as an instrument of power in the pictorial production. Dissertação, Curso de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo do Programa de Pós-Graduação – PGAUR da Universidade São Judas Tadeu. São Paulo, 2015.

The research deals with the representation of classical architecture in painting as an ideological instrument of power established adopted by a dominant social class over the other classes in different periods of the history of human civilization. The material universe images of Greco-Roman Classical art created in antiquity is the focus of humanistic rereading the Italian Renaissance emphasizing the values of the nascent bourgeoisie. In the second half of the eighteenth and early nineteenth centuries, again rushes rereading of classical art, made by neoclassicism to emphasize the changes advocated by the French Revolution that show the bourgeois values: conquest, glory, moral and common good, marking a moment of renewal and change in the behavior of European society. Napoleon, during his rule, determines neoclassicism as Empire style, representing glory, conquest and established power. In the early nineteenth century, neoclassicism arrived in Brazil in 1816, brought by the French Mission to symbolize the First and Second Empire and highlight the young Empire. At all times you can identify the representation of classical architecture in pictorial structure. At all times mentioned it is possible to identify the representation of classical architecture as inspiring element in the pictorial structure. Keywords: classical art; architectural representation in painting; ideological instrument; established power.

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Índice de Imagens

Imagem 01 – Elementos da Coluna da Ordem Dórica 23

Imagem 02 – Elementos da Coluna da Ordem Jônica 24

Imagem 03 – Elementos da Coluna da Ordem Coríntia 25

Imagem 04 - Vista aérea da Acrópole e do Parthenon em Atenas 29

Imagem 05 – Templo Partenon em Atenas 29

Imagem 06 – Vila dos Mistérios 43

Imagem 07 - Vila dos Mistérios: Porta dourada 44

Imagem 08 - Vila dos Mistérios: afresco com colunas, arcos e sobreposição de planos. 45

Imagem 09 - Vila dos Mistérios: Detalhe do afresco 46

Imagem 10 - Casa dos Vettii 47

Imagem 11 - Casa dos Vettii – detalhe do afresco 48

Imagem 12 - Cúpula da Catedral - Santa Maria del Fiore 68

Imagem 13 - Santíssima Trindade com a Virgem e São João sob a Cruz 74

Imagem 14 - A Aparição da Virgem a São Bernardo 76

Imagem 15 - A Escola de Atenas 81

Imagem 16 - O Juramento dos Horácios 104

Imagem 17 - A Consagração do Imperador Napoleão e a Coroação da Imperatriz Josephine em 02 de dezembro de 1804. 107

Imagem 18 - Coroação de Dom Pedro II - M. de Araújo Porto Alegre 121

Imagem 19 - Coroação de Dom Pedro II - Rene Moreau 123

Imagem 20 - Paz e Concórdia – Pedro Américo 133

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Sumário

Introdução 11

Capítulo I

Grécia e Roma - Antiguidade Clássica 20

A construção da arte clássica protagonizada por Grécia e Roma, na

Antiguidade, período em que é criada e amplamente usada. A Acrópole e o

Partenon - A Civilização Romana - A Helenização de Roma - A Pintura

Romana de Pompéia - Vila dos Mistérios - Casa dos Vettii.

Capítulo II

Renascimento Italiano 51

O desdobramento e aplicação da Arte Clássica motivada pela disseminação do

pensamento humanista nas cidades italianas como a próspera Florença.

Transformações Culturais: Humanismo – A Evolução da Pintura Renascentista

– Fillippo Bruneleschi – Leon Batista Alberti – Masaccio – Pietro Perugino -

Rafael Sanzio, o maior pintor do Cinquecento - “Escola de Atenas” na Stanza

dela Segnatura.

Capítulo III

Neoclassicismo Francês 84

Retomada e sistematização da Arte Clássica com a criação da Academia de

Belas Artes de Paris. Aspectos históricos - As Escavações de Herculano e

Pompéia - J.J. Winckelmann – O Neoclassicismo e a Arquitetura – A Pintura

Neoclássica - A Academia - Jacques Louis David - “O Juramento dos Horácios”

e “Consagração de Napolão I e Coroação da Imperatriz Josefina na Catedral

de Notre-Dame em Paris”.

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Capítulo IV

Neoclassicismo no Brasil 109

O estilo Neoclássico é trazido pela Missão Francesa, em 1816, por solicitação

de D. João VI para atender ao reaparelhamento da nova sede metropolitana do

governo, no Rio de Janeiro, das condições indispensáveis à vida cultural.

Contexto histórico – Contexto Histórico – A vinda da Missão Francesa – O

Neoclassicismo Francês no Brasil - A condição social do artista brasileiro –

Manuel de Araújo Porto Alegre - “A Coroação de Dom Pedro II” - AIBA -

Academia Imperial de Belas Artes - A Reforma Pedreira na Academia, ou a

"Reforma Porto Alegre” - Pedro Américo - “Paz e Concórdia”.

Considerações Finais 136

Referências Bibliográficas 140

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Introdução

O objeto de estudo desse trabalho é a análise da retratação da

arquitetura clássica na pintura em períodos da história da civilização ocidental,

na releitura realizada no Renascimento Italiano, nos séculos XV e XVI, no

Neoclassicismo francês, final do século XVIII e início do XIX e no

Neoclassicismo no Brasil, no início do século XIX, com a vinda da Missão

Francesa.

A arte clássica, criada na Antiguidade, é norteada por cânones

como harmonia, equilíbrio e proporção presentes na arquitetura de templos

gregos e na arquitetura religiosa, militar e civil dos romanos, essas construções

possuem modulações e receitas idealizadas compostas por uma “ordem

arquitetônica”, este termo está no Tratado de Arquitetura escrito pelo arquiteto

romano Vitrúvio que vive no século I a. C.

Segundo Summerson (2009, p.6) a “Ordem Arquitetônica” consiste

em uma coluna sobre pedestal, cujo uso é opcional, que carrega, em seu topo,

o capitel, a arquitrave, o friso e a cornija, formando o entablamento.

Essa integração “coluna-superestrutura” que caracteriza a

arquitetura clássica é transformada em modelo a ser conservado e reproduzido

pela civilização ocidental e identificado na pintura ao longo dos períodos

artísticos e históricos.

Na reconstrução da Acrópole e do Partenon, comandada por

Péricles, estão presentes a utilização da ordem arquitetônica, a magnitude e

perfeição da arquitetura dessas construções transformam Atenas em centro

cultural e a mais poderosa cidade-estado.

A Grécia, ao se tornar posse do Império romano, deixa como parte

de seu legado: a aplicação da arte como exemplo da perfeição artística e

referência de poder.

A mais antiga retratação dos elementos da arquitetura clássica,

eternizados pela pintura, que chega até a atualidade, está nos afrescos

representantes da Pintura Romana, encontrados no sítio arqueológico de

Pompéia, cidade pertencente ao império romano, situada próxima ao vulcão

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Vesúvio que é soterrada em 79 d. C. por gigantesca erupção vulcânica e

redescoberta por escavações no século XVIII.

Na história da humanidade, a representação da arquitetura clássica

na pintura exerce o papel de instrumento ideológico que simboliza riqueza,

glória e poder perenes, no Renascimento Italiano, nos séculos XV e XVI,

momento em que os pintores empregam a perspectiva para destacar os

espaços arquiteturais com características da arquitetura clássica para

consagrar o humanismo; no século XIX, o Neoclassicismo francês, época em

que os princípios clássicos transformados em cânones, norteiam a produção

pictórica da arte acadêmica e, por fim, concluindo, na análise de obras de

pintores brasileiros, formados a partir da Missão Francesa que divulga o

neoclassicismo no Brasil, semeia o ensino da arte acadêmica e contribui para a

formação concisa de ordem intelectual e prática dos artistas brasileiros que

aplicam os aspectos da arquitetura clássica como cenário para enobrecer o

governo monárquico e a nova terra independente como exemplo de nação

desenvolvida.

Ao estudar a arte criada pelos povos do continente europeu, que

influencia o desenvolvimento e produção artística da Arte brasileira, é possível

evidenciar a forma como inicia, se estabelece e se aprofunda em nossa cultura

por meio de estudo de caso.

Tal fato é verificado na produção pictórica de Manuel de Araújo

Porto Alegre, um personagem bastante ativo no período Imperial brasileiro, tem

por objetivo a exaltação do Império que almeja o país como nação brasileira

civilizada, a vida política e a religiosidade entre as nações civilizadas do globo,

quer formar uma cultura brasileira diferenciada e que permite definir o Brasil

como nação independente, comprometida em construir a nacionalidade.

Porto Alegre, para este intento, projeta nas artes a capacidade para

transformar a sociedade imperial brasileira em uma nação culta e peculiar,

principalmente na pintura e arquitetura, pontos centrais de realização.

O método a ser aplicado a essa pesquisa está embasado na análise

formal de imagens de obras da produção pictórica que retratam e destacam os

componentes da arquitetura clássica confirmando seu papel de instrumento

ideológico que simboliza riqueza e poder estabelecido.

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O estudo de caso consiste na observação, comparação e análise

das obras pictóricas realizadas nos períodos citados acima que vem alicerçar a

influência da arte europeia na formação da arte acadêmica brasileira,

enfatizando na representação pictórica aplicada como instrumento de poder

pela classe governante no período monárquico e início do republicano e que,

ao mesmo tempo, a produção pictórica é um veículo que contribui para a

eternização da própria arquitetura clássica.

A presente pesquisa divide-se em quatro capítulos, que descreve as

etapas da difusão da arquitetura clássica representada na pintura em diferentes

épocas da história.

O primeiro capítulo se refere à construção do conhecimento, mais

exatamente, a criação da arte clássica protagonizada por Grécia e Roma, na

Antiguidade, como cita Janson (1996, p.50), período em que a arquitetura

clássica é criada e amplamente usada pela civilização greco-romana com o

objetivo de se destacarem como civilizações poderosas e que pretendem ser

conquistadoras de novas terras.

Na pintura, a Arte Clássica greco-romana é encontrada nos afrescos

pintados nas paredes das mansões da cidade antiga de Pompéia, pertencente

ao império romano, retratando a arquitetura clássica por meio das ordens

arquitetônicas, que consistem em colunas com capitéis dóricos, jônicos e

coríntios, acompanham estruturas como frontões, arquitraves, arcos e

entablamentos.

O segundo capítulo corresponde ao desdobramento e aplicação da

releitura da Arte Clássica efetuada por artistas no Renascimento italiano que

determina a disseminação do pensamento humanista nas cidades italianas,

como a próspera Florença.

Entre os séculos XIV e XV, o humanismo, cujos valores, segundo

Sevcenko (1994,p.14) estão fundamentados no programa chamado “studia

humanitats” que engloba poesia, filosofia, história, matemática e eloquência

ligadas ao domínio das línguas clássicas, latim e grego, focados sobre os

textos dos autores da Antiguidade clássica.

Tais valores da Antiguidade clássica exaltam o indivíduo, as

realizações históricas, a aspiração e disposição de ação do homem com sua

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liberdade de atuação e de participação na construção da vida social nas

cidades.

A convicção de que o homem é dono de energias criativas ilimitadas,

possuindo uma aptidão inata para a ação, virtude e a glória se conjugam

perfeitamente com as intenções da classe burguesa das ricas cidades italianas.

São várias obras que tem a referência clássica e, ao serem

analisadas, há destaque nos seus personagens, porém, nesse trabalho, o foco

está na arquitetura retratada na pintura, como acontece na obra intitulada

“Escola de Atenas”, pintada por Rafael Sanzio, entre 1509 e 1510, obra feita

para decorar o salão chamado "Stanza della Segnatura", sob encomenda do

Vaticano.

Janson (1996,p.219) esclarece que Rafael é convocado por Júlio II

para decorar uma série de aposentos do Palácio Vaticano, no primeiro, a

Stanza dela Segnatura, os afrescos referem-se a quatro domínios do

aprendizado: Teologia, Filosofia, Jurisprudência e Artes. Entre os trabalhos, o

afresco “A Escola de Atenas” é considerado como a mais perfeita

corporificação do espírito clássico do Alto Renascimento. O autor esclarece

que o tema é “a escola ateniense do pensamento” que encena a reunião de um

grupo de famosos filósofos gregos ao redor de Platão e Aristóteles, cada um

em uma pose ou atividade característica.

“Escola de Atenas” consiste no afresco que representa a Academia

de Platão, centro de estudos de matemática, filosofia, artes e ciências que

durou nove séculos e é destruída pela intolerância cristã. O pensamento

renascentista está baseado nos estudos e ensinamentos dos filósofos gregos,

reuni-los em uma mesma pintura é construir o retrato do espírito da

Renascença, ou seja, essa obra pode ser considerada a encarnação dos ideais

da época.

O terceiro capítulo relata a retomada e sistematização da Arte

Clássica com a criação da Academia de Belas Artes de Paris, no período

Neoclássico.

Vários fatos históricos motivaram a retomada da arte clássica, entre

eles, o testemunho de diversos viajantes que tiveram contato direto com as

ruínas da civilização greco-romana, a publicação de obras que versavam sobre

essas culturas antigas e a arte produzida por elas; as escavações de

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Herculano e Pompéia deixam os europeus impressionados com a arquitetura

da antiguidade; a publicação de obras por arquitetos que tiveram em Roma e

suas edificações que exibem elementos da arquitetura clássica e a publicação

das pesquisas de Johann Winckelmann, pai da arqueologia, que estuda as

ruínas de Pompéia, sua arquitetura e os afrescos antigos.

Também na França a vitória desse estilo foi assegurada depois da Revolução Francesa. A antiga e despreocupada tradição dos construtores e decoradores barrocos e rococós foi identificada com o passado que acabara de ser varrido; fora o estilo dos palácios da realeza e da aristocracia, ao passo que os homens da Revolução gostavam de se considerar cidadãos livres de uma Atenas ressurgida. (GOMBRICH,1979,p.378).

A arte neoclássica se destaca no cenário histórico francês na época

da Revolução Francesa em que esta sociedade exerce um questionamento

sobre o comportamento da aristocracia, seus exageros e riqueza. Esta

sociedade está enfastiada do rebuscamento sofisticado exibidos na arte

barroca e no rococó. A arte clássica greco-romana atrai a atenção dos

franceses por sua simplicidade e grandeza e vem representar um caminho de

transformação.

Os filósofos, moralistas, pensadores e artistas do Iluminismo coincidiam na necessidade de alicerçar seu pensamento na razão, numa fé ilimitada na experiência e num ódio, de princípio, ao absolutismo monárquico. (MIRABENT, 1991,p.7)

O Neoclassicismo coaduna com as ideias da Revolução Francesa

que corresponde ao período de busca por inovação cultural, social, política e

econômica iniciada pelos pensadores iluministas no continente europeu que se

estabelece, após o esfacelamento do absolutismo na França.

No Renascimento Italiano, a arte clássica recomendada pelo

pensamento humanista, atende aos interesses da burguesia italiana e no

século XVIII, as mudanças preconizadas pela Revolução Francesa evidenciam

os valores burgueses: conquista glória, moral e bem comum, laureando um

momento de renovação e modificação no comportamento da sociedade

europeia.

Como fazem os governantes do passado, Péricles na antiga Grécia

e Augusto, imperador da Roma antiga, a arte clássica é usada como canal de

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propaganda para promover seus interesses políticos, representando poder e

conquista. Também no século XIX, no período de governo de Napoleão

Bonaparte, a Arte Clássica é reverenciada e assume particularidades que a

distingue como estilo império.

O neoclassicismo se transforma numa arte engajada politicamente

que objetiva divulgar o bem comum e a moral, Schama (2010,p.192) afirma que

o pintor Jacques Louis David, discípulo fiel dos ideais da Revolução Francesa e

admirador de Napoleão, defende que a Arte tem o poder de chocar, fascinar,

incitar, e às vezes, aterrorizar; expressa mais que um veículo de prazer, tem a

capacidade de mudar vidas e com elas, a própria história. Acredita no poder

conversivo da Arte, na capacidade de transformar um punhado de

espectadores em uma comunidade moral, suas obras são transformadas em

propaganda para divulgar o bem comum e a moral, torna-se o maior

representante do neoclassicismo francês e inventa a moderna propaganda

visual.

Neste trabalho, são comentadas duas obras de tema histórico: “O

Juramento dos Horácios”, concluída em 1784, e, “Consagração do Imperador

Napoleão I e Coroação da Imperatriz Josefina na Catedral de Notre-Dame em

Paris”, feita entre 1806 e 1807, encomendada por Napoleão. Este último

enfatiza a era napoleônica, o novo poder estabelecido, aplicado na

representação do cenário arquitetônico que retrata a coroação de Napoleão no

interior da catedral de ‘Notre-Dame’. Na realidade, a igreja pertence ao estilo

gótico, contudo, a pintura não corresponde à realidade, pois ela é representada

dentro das características neoclássicas, o que reforça a ideia de que este

estilo, derivado da arte greco-romana, é considerado de maior importância que

os demais.

Como partidário da Revolução Francesa, David transforma suas

obras em propaganda para divulgar o bem comum e a moral, inventa a

moderna propaganda visual, torna-se o maior representante do neoclassicismo

francês.

O quarto capítulo descreve o Neoclassicismo no Brasil, trazido pela

Missão Francesa, em 1816, por solicitação de D. João VI, elevado a príncipe

regente do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve, para atender ao

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reaparelhamento da nova sede metropolitana do governo, no Rio de Janeiro,

das condições indispensáveis à vida cultural.

Como afirma Campofiorito (1983,p. 23), a Missão Francesa de 1816

tem como objetivo colocar o país em contato direto com a arte europeia em

evidência na época para atender ao gosto da corte portuguesa, acostumada

aos requintes artísticos europeus, refugiada aqui, devido á invasão de Portugal

por tropas francesas.

Os cânones clássicos, aplicados pelos pintores franceses

neoclassicistas em terras brasileiras, foram sedimentados na arte brasileira no

período do Império por meio da criação da Academia Imperial de Belas Artes,

recebe este nome por decreto de 23 de novembro de 1820.

Antes da vinda da Missão Francesa, os artistas que trabalhavam

para a construção e decoração das igrejas em estilo barroco desenhavam e

pintavam modelos de obras estrangeiras que apareciam nas ilustrações de

missais e bíblias ou mesmo em gravuras que reproduziam com fidelidade o

desenho de temas religiosos, portanto, não existia no Brasil um ensino formal e

aprofundado de arte que preparasse o artista, como profissional aparelhado

para receber encomendas de uma clientela requintada e exigente.

Os artistas da Missão são notáveis e categorizados no ambiente

artístico europeu o que representa uma credencial de caráter internacional. A

Academia de Belas Artes teve a proteção de D. Pedro II, no Segundo Reinado

o que contribui para sua perpetuação.

O trabalho da Missão Francesa, em apregoar o estilo neoclássico no

Brasil, influenciou a formação artística de várias gerações de pintores e

arquitetos, trouxe para o país, o ensino formal de arte, praticado nas escolas

especializadas do continente europeu.

Na produção pictórica do Segundo Império encontram-se detalhes

da arquitetura clássica nos trabalhos de pintores importantes do período da

nossa história como o Estudo para “Sagração de D. Pedro II”, de 1842, obra

inacabada de Manuel de Araújo Porto Alegre e “Paz e Concórdia”, de 1895, de

Pedro Américo.

Cabe acrescentar que nesse período, a influência acadêmica

corresponde ao momento de consolidação do Brasil como país soberano e

independente de Portugal e que a arte neoclássica não é trazida apenas para o

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Brasil, mas também para outras localidades da América Latina e faz parte do

processo de colonização do Novo Mundo pelos europeus.

Campofiorito argumenta que Pedro Américo pertence ao contexto

histórico marcado pelo governo de D. Pedro II, no Segundo Reinado, o

monarca exerce uma proteção sobre os artistas, exige de seus protegidos uma

conduta estética comum centrada nas influências neoclássicas, na segunda

metade do século XIX, período que a evolução das artes plásticas no Brasil

caracteriza-se pelo aparecimento de artistas nacionais definitivamente

formados pelo ensino acadêmico instaurado em 1816. Nessa fase, acontecem

as Exposições Gerais e a sequência de Prêmios de Viagem à Europa,

conferidos aos estudantes de arte que mais se destacavam. Pedro Américo foi

desenhista correto, retratista objetivo e intérprete de temas clássicos e

históricos.

Squeff (2004, p.172) explica que os pintores do Império cultuam o

trono e a Pátria de acordo com os cânones do Academismo, ou seja, são fiéis

ao sistema monárquico vigente no Brasil e concordam com o sistema de ensino

e seu conteúdo dispensado pela Academia de Belas Artes.

A Arte clássica, modelo de arte que aparece na Antiguidade, veio

nortear a arte acadêmica brasileira em seus primórdios. Institui-se como Arte

oficial no período do Império e desenvolve-se principalmente na cidade sede do

governo, na capital, no Rio de Janeiro, contribui para moldar as diretrizes da

produção artística nacional na arquitetura e na pintura nos séculos XIX e início

do XX.

As obras acima citadas são analisadas nos respectivos capítulos,

porém, todas possuem uma característica em comum: evidenciam a arquitetura

clássica como símbolo de um momento solene de reverência, de uma

sofisticação moderada, sem exageros de ostentação, de lealdade, glória, poder

e conquista.

Como afirma Baudrillard (1995, p.11) no seu livro intitulado “Para

uma crítica da economia política do signo” sobre consumo ostentatório, a arte

clássica avança os séculos significando poder, prestígio e garantindo alto

status social ao possuidor dessa arte, seja na arquitetura ou na pintura.

Nas obras mencionadas nessa pesquisa, a arquitetura clássica

assume o papel de um personagem que interage com os seres humanos. No

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Império Romano, marca o poder da civilização romana; nos séculos XV e XVI,

no Renascimento Italiano, expressa o humanismo e o poder da burguesia

italiana, e no século XIX, no Neoclassicismo, exprime idolatria, conquista,

patriotismo e poder estabelecido.

A produção pictórica efetuada nos períodos citados neste trabalho

possibilita a divulgação, expansão, popularização da arquitetura clássica que

se transforma em símbolo de poder e riqueza, e ainda, de unidade, harmonia,

proporção, racionalidade e equilíbrio e, portanto, eterniza um modelo de

beleza. Esta promoção da pintura auxilia na construção do imaginário das

pessoas como algo a ser perpetuado, seguido e reproduzido.

Como modelo a ser mantido, o que provavelmente justifique o gosto

pelo clássico que pode ser visto, na arquitetura contemporânea não autoral.

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CAPÍTULO I

GRÉCIA E ROMA – A ARTE CLÁSSICA

A obra de arte, que possui a um só tempo uma significação ideológica e que se adapta a necessidades práticas possui um valor de informação notável. Ela é por definição sincrética, mais que pluralista; pois sua riqueza não resulta de uma acumulação de intenções ou de qualidades. É uma coisa feita, uma coisa viva, realmente participante das leis de criação. Como o ato, ela engendra cadeias de consequências que escapam à vontade refletidas e à ação do criador. (FRANCASTEL, 1973, p. 40).

Francastel (1973, p.40) afirma que o homem, como ser

essencialmente criativo e comunicativo e, desde seu aparecimento no planeta,

tem criado instrumentos para se adaptar ao meio ambiente. A Arte, como um

dos instrumentos, além de ser atividade fundamentalmente humana, possibilita

ao homem transformar o mundo natural em mundo humano, é a atividade que

permite o homem aplicar suas fantasias, crenças, concepções, aspirações e

sonhos.

É na obra de arte, essencialmente produto da imaginação e

habilidade do artista, o lugar em que o homem comunica seu pensamento para

a sociedade, que dá forma aos objetos e as ideias, ou seja, o artista dá

configuração aos mitos encontrados nas diversas civilizações.

A obra de arte, seja pictórica, escultórica ou arquitetônica, é

revestida pelo caráter simbólico e representativo, essa significação intelectual

transcende fronteiras geográficas e o tempo, é transmitida às futuras gerações

e a outras sociedades diversas.

O artista elabora os objetos artísticos que são utilizados na vida

habitual dos homens, podendo significar um empréstimo da sua ação àqueles

que querem influenciar o espírito de seus semelhantes, objetivando edificá-los,

doutriná-los ou comandá-los.

O homem como ser comunicativo, tem usado a Arte e sua produção

artística como canal de comunicação para divulgar e transmitir suas convicções

políticas, religiosas e culturais, transformando-a num instrumento modelador do

comportamento e atitudes do ser humano em sociedade. A obra de arte se

constitui num universo de imagens materiais no âmbito da pintura, escultura ou

arquitetura.

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A história da arte consiste na leitura e interpretação de obras em

suas diversas manifestações realizadas por várias civilizações retratando seu

pensamento filosófico, político e social usando diversos materiais disponíveis,

submetido a um apuramento técnico e estético.

A influência da antiguidade clássica avulta, imensa, na tradição ocidental. Pelo menos até a época romântica, a arte europeia seguiu o seu caminho tortuoso com olho enviesado para trás, para o passado clássico da Grécia e de Roma. Novos movimentos de gosto e de estilo encontraram o seu ímpeto num entusiasmo novo pelos antigos. Mas se bem a admiração pela arte da antiguidade clássica permanecesse uma característica recorrente dos períodos mais vigorosos e originais da arte europeia, o clássico significou coisas muito diferentes em diferentes ocasiões, de acordo com os acidentes do conhecimento e da descoberta, a consciente ou inconsciente seletividade dos artistas e, principalmente, através das diferentes interpretações dadas a ele, dos olhos diferentes com que era visto. (OSBORNE, 1978, pg. 15).

A inspiração pela Antiguidade Clássica adquire significados

diferentes conforme o contexto histórico e filosófico. Tal fato é exemplificado

pelo Renascimento italiano, séculos XV e XVI, período em que a Antiguidade

Clássica serve como recurso intelectual para retirar o continente europeu da

Idade Média e inseri-lo na Idade Moderna, possibilita retratar a realidade de

maneira objetiva e concreta e, no Neoclassicismo, início do XIX, destaca as

glórias do governo de Napoleão.

A civilização grega atribui uma significação intelectual a um universo

de imagens materiais com características próprias presentes na escultura,

pintura e arquitetura, a sua produção artística reflete seus valores culturais e

religiosos.

O período entre os séculos IV e VI A.C., corresponde à fase áurea

da arte grega que objetiva ressaltar a supremacia cultural definitiva da cidade-

estado Atenas no mundo grego, mais precisamente, entre os anos 450-400 a.

C., na segunda metade do século V a. C., onde as expressões artísticas

regionais se integraram na procura teórica e formal de arquitetos, escultores,

pintores e ceramistas áticos, chegando à plena adaptação artística das visões

universais dos gregos.

Summerson (2009, p.3) explica que a arquitetura clássica, nascida

na Antiguidade, pode ser encontrada, na Grécia, na construção de templos, e

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em Roma, na arquitetura religiosa, militar e civil. Os elementos decorativos que

identificam um edifício da arquitetura clássica, encontrados nas construções

citadas anteriormente, consistem nas formas padronizadas de colunas,

aplicadas de maneira uniformizada, que constituem aberturas e frontões

triangulares seguidos de adornos padronizados para edifícios clássicos.

O autor completa que o elemento essencial que caracteriza a

arquitetura clássica é a presença da ordem arquitetônica, unidade formada pela

‘coluna-superestrutura’ composta por coluna que suporta uma superestrutura.

Na composição da colunata de um templo, a coluna, possui ou não um

pedestal, na parte superior, possui um elemento denominado de capitel que

apoia a estrutura do entablamento e a cornija que representa os beirais do

telhado. O formato e detalhes desse capitel distingue uma ordem arquitetônica

da outra.

O universo de imagens materiais que compõe a arte produzida pela

Grécia e aperfeiçoada pelos romanos, designada como Clássica, compreende

o estilo artístico e cultural na arquitetura de templos gregos construídos com as

ordens arquitetônicas dórica, jônica e coríntia que são descritas pelo arquiteto

romano Vitrúvio em seu livro denominado “Tratado de Arquitetura”, dedicado ao

imperador Augusto, no século I a.C.

Esse manual, escrito em 27 a.C., é um documento importante

porque é o único documento deste tipo que chega até a contemporaneidade e

relata de forma ordenada os avanços e conquistas da arquitetura greco-romana

e destaca as características próprias de cada ordem arquitetônica, sua origem

e aplicação no mundo antigo.

As imagens seguintes ilustram as três principais ordens

arquitetônicas (dórica, jônica e coríntia) e seus componentes.

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Imagem 01 – Elementos da Coluna da Ordem Dórica

(http://historiadaarte2009.blogspot.com.br/2009/08/arte-grega- arquitetura.html). Acesso em 27/10/2015. 9h35min

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Imagem 02 – Elementos da Coluna da Ordem Jônica

(http://historiadaarte2009.blogspot.com.br/2009/08/arte-grega- arquitetura.html). Acesso em 27/10/2015. 9h35min

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Imagem 03 – Elementos da Coluna da Ordem Coríntia

(http://historiadaarte2009.blogspot.com.br/2009/08/arte-grega- arquitetura.html). Acesso em 27/10/2015. 9h35min

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Summerson (2009, p.4) argumenta que a arquitetura clássica tem

como objetivo primordial alcançar a harmonia inteligível entre as partes, esta

harmonia é parte integrante dos edifícios da Antiguidade, mais precisamente,

inseparável das cinco ordens arquitetônicas, descritas por Vitrúvio. É um

cânone obtido por meio da proporção, ou seja, ao se fazer com que as

proporções de todas as partes de um edifício sejam calculadas por funções

aritméticas e estejam relacionadas entre si.

O templo clássico, como um todo, da base à sua cobertura, da

fachada, composto por colunata, ornamentada com uma das ordens

arquitetônicas, o frontão, o entablamento, a cornija e o fundo, é norteado pelo

cânone da harmonia.

Guinsburg (1999, p.294) reforça esta ideia quando explana que o

ponto essencial da estética clássica é a convicção em princípios absolutos de

beleza subordinados a leis proporcionais. Esta afirmação da doutrina clássica

resulta na aplicação de cânones absolutos do belo e concebe que este é

inerente à natureza e resulta da vontade divina que cria uma grande harmonia

no macrocosmo e microcosmo. A arquitetura clássica, considerada a única

arquitetura verdadeira, não porque se ajusta à razão, mas porque se orienta no

valor incondicional das proporções que regem a harmonia do cosmos e por

meio delas se atinge a perfeição na obra arquitetônica.

Nos anos sucessivos às decisivas vitórias dos gregos sobre os exércitos persas (Salamina, 480 A.C., e Platéia, 479 a. C.), criam-se em Atenas condições para o amadurecimento de conquistas em âmbito literário, artístico e político que marcam profundamente o ordenamento do mundo grego e, em sentido mais amplo, do mundo ocidental. Sobretudo a fase inicial desse período, e em particular os trinta anos em que Péricles governa Atenas, deve ter-se afigurado aos contemporâneos como período caracterizado não apenas pela estabilidade econômica e política, mas também por realizações artísticas e arquitetônicas de esplendor inigualável. (MARQUES, 2008, p.27).

Primeiramente, o estadista e general ateniense Cimon, contribui

definitivamente para firmar o domínio de Atenas sobre os Estados marítimos

gregos e tornou-se o principal dirigente da Liga de Delos, que veio a reunir 150

cidades, cuja meta é dar prosseguimento à libertação das cidades gregas que

ainda estão sob domínio persa e enfrentar qualquer agressão.

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O plano de reformas principiou em 449 A.C., ano da paz definitiva

com os persas que desencadeou numa série de realizações encabeçadas por

Címon que inicia a sistematização da ágora e outras realizações nos bairros

residenciais. Mais tarde, projeta a construção de um grande templo dedicado a

Atena Párteno (virgem) na acrópole para substituir o arcaico, restaurado da

melhor maneira possível após as Guerras Persas, porém, uma reconstrução

efetiva só foi possível na administração de Péricles.

Péricles, homem de visão política e cultural ampla, durante o período

de seu governo, torna-se o articulador do primeiro programa de reordenação

urbanística funcional da história ocidental e tem como objeto a cidade de

Atenas, a acrópole e o Partenon.

O primeiro passo é a reconstrução de vários templos, anteriormente,

feitos de madeira, são saqueados e incendiados pelos persas, posteriormente,

são reconstruídos em mármore.

Com esta reorganização urbanística, Péricles pretende traduzir

globalmente, através de uma linguagem arquitetônica e artística apropriada e

única, a identidade, os valores políticos, éticos, religiosos e culturais do livre

povo ateniense, destacando Atenas como centro cultural e artístico e potência

bélica e econômica perante o mundo de maneira sem precedentes.

Os ateliês artísticos de Atenas e os que para lá acorriam de outros centros da Grécia, convocados a colaborar no gigantesco projeto promovido por Péricles de reconstrução da cidade e de celebração de seu papel político e cultural, foram submetidos a um esforço criativo sem paralelo. Os edifícios públicos, civis e religiosos, de Atenas e da Ática foram reconstruídos e embelezados com complexos ciclos figurativos esculpidos, as imagens de culto, renovadas, assim como as bases e os altares; erigiram-se monumentos comemorativos e donários. O aspecto global da cidade foi renovado e, com ele, o repertório tradicional das imagens. (MARQUES, 2008, p.27).

Essa determinação parece ter se originado de uma consciência

comum por parte dos atenienses sobre a ideia de sociedade como equilíbrio

harmônico entre individualidade e coletividade e entre público e privado.

Essa época de grande felicidade criativa ultrapassará o espaço e os limites cronológicos da Atenas de Péricles, nutrindo-se das energias criativas de grandes mestres como Miron, Policleto, além de Fídias e de sua escola, e em seguida, no século seguinte,

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Praxíteles, Escopas e Lisipo. A cultura moderna definirá aquela época e suas criações com o termo “clássico”, recuperando uma expressão que designa, no sistema fiscal romano, os níveis mais elevados de contribuintes. ....É necessário manter em mente esse caráter por assim dizer ‘validante’ da experiência clássica para compreender plenamente as motivações de suas recorrências, de sua reevocação e reprodução em sucessivos e diferentes momentos históricos. (MARQUES, 2008, p.28)

Péricles inicia uma era de desenvolvimento das artes, e em

particular, da pintura e arquitetura, representa o avanço dos gregos no campo

da construção em conexão com a pintura e arquitetura, preocupada com a

beleza abalizada na aplicação dos cânones gregos considerados fundamentais

em sua produção, como a proporção, simetria, equilíbrio e harmonia levando a

uma produção de alta qualidade.

A ideia de que o templo deve ser uma construção sólida e quase que

eterna é confirmada pelo historiador Janson (1996,p.56), que explica que os

templos gregos são regidos por uma lógica estrutural que os faz parecer

estáveis devido à organização harmoniosa de suas partes regidas pela própria

harmonia da natureza, edificando-os segundo unidades calculadas, tão

proporcionais que estariam todas em perfeita concordância.

O artista arquiteto trabalha sob as diretrizes do governante que

determina as obras arquitetônicas a serem construídas visando destacar o

poder e sua política ao povo, usando as imagens religiosas de maior valor

cultural para conduzir o povo aos seus objetivos políticos.

Sob as ordens de Péricles, o grande arquiteto-urbanista-artista,

Fídias, consegue realizar em Atenas o que é acertadamente determinado por

alguns historiadores da arte como “a experiência da perfeição”, iniciando o

momento da arte formalmente denominado “Clássico”, esse termo, segue na

história da civilização humana ligado à ideia de apogeu da perfeição artística

com o sentimento de vitória, glória, o auge da riqueza, conquista e poder quase

que eternos.

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Imagem 04

Vista aérea da Acrópole e do Partenon-Atenas (http://employees.oneonta.edu/farberas/arth/arth209/parthenon_gallery.html)

Acesso em 18/01/15 – 15h41min.

Imagem 05

Templo Partenon (https://www.linkedin.com/pulse/20140815180740-73035540-partenon-acr%C3%B3pole-de-

atenas-gr%C3%A9cia-antiga). Acesso em 06/05/15 – 22h09min.

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O templo grego origina-se da vontade humana de dedicar um

terreno à propriedade de um deus, construindo um lugar de culto privado no

interior de um recinto sagrado “destacado” da propriedade circundante.

A Acrópole corresponde a um componente da cidade localizado nas

partes mais altas, sua posição tem importância simbólica como elevar e

enobrecer os valores humanos e também possui valor como ponto estratégico,

pois dali a cidade pode ser eficientemente defendida. Na acrópole grega está a

construção mais nobre, a construção do templo denominado Partenon que é

ricamente construído em mármore e ornado com esculturas de Fídias por

ordem de Péricles.

O Partenon é projetado e os trabalhos estão parcialmente em

andamento em 460 A.C. sob a direção de Calícrates, porém, é permanecido

inconcluso por uma longa interrupção causada pela conturbada instabilidade

política, então, Péricles, quando ascende ao poder, exige um novo projeto que

resulta no que conhecemos hoje, fruto da preciosa colaboração entre os

arquitetos Ictino e Calícrates sob a coordenação do grande gênio de todas as

intervenções na Acrópole de Atenas, Fídias.

Como realização mais perfeita do Período Clássico da arquitetura grega, o Partenon dá um passo além em direção á integridade harmoniosa. Embora sejam poucos anos mais novo que o Templo de Poseidon, o fato de ter sido construído em Atenas, então no apogeu de sua glória e poder, proporcionou-lhe o melhor em termos de projeto, material e mão-de-obra. Apesar de seu tamanho maior, parece menos compacto do que o templo mais antigo; pelo contrário, a impressão dominante é de um equilíbrio gracioso e aprazível. (JANSON, 1996, p.53).

Os construtores e arquitetos tem papel fundamental para atingir o

objetivo de engrandecer a cidade de Atenas como cidade militar e

economicamente poderosa. O templo Partenon constitui na maior realização da

arquitetura grega do período Clássico e simboliza um modelo de integridade

harmoniosa, para alcançar essa finalidade é criado um plano audacioso, em

termos de projeto, material e mão-de-obra.

Gombrich (1979, p.66) destaca que o Partenon, maior templo

construído no estilo dórico, dedicado a Atena, deusa da Sabedoria e protetora

de Atenas, erigido no decênio 448-438 a. C., possui seus edifícios secundários

em formas do estilo jônico. É o primeiro exemplar da audaciosa associação da

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ordem dórica com a jônica num único edifício que dali em diante é pouco

frequente.

Na sua construção, os arquitetos Calícrates e Ictino aplicam

refinados cálculos matemáticos em cada um de seus componentes estruturais

e decorativos buscando evidenciar no conjunto a harmonia proporcional.

Símbolo da arquitetura grega, a estrutura e decoração do templo

expressam o espírito da civilização helênica e ultrapassa todos os outros

edifícios da Acrópole, é maior que o templo mais antigo, o templo de Poseidon,

transmite uma impressão dominante de unidade e equilíbrio.

O Partenon, projetado em escala maior para representar a orgulhosa

exibição da potência ateniense, é um templo construído como um clássico

períptero octástilo (perístase de oito por dezessete colunas) se desenvolve

sobre uma estilóbata de cerca de setenta por trinta e um metros. Possui

requintes moderados de linha e proporção, reais, mas não imediatamente

aparentes, somam-se à impressão geral de uma flexível vitalidade: os

elementos horizontais, como os degraus, não são retos e fazem uma ligeira

curva ascendente em direção à seção central; as colunas inclinam-se para

dentro, e o intervalo entre cada coluna de canto e a que vem a seguir é menor

que o intervalo padrão usado no restante da colunata.

Esses desvios intencionais da estrita regularidade geométrica não

são feitos por necessidade; dão-nos a certeza visual de que os pontos de maior

pressão estão firmemente apoiados e também proporcionam um contra-

reforço.

A monumentalização da acrópole foi rápida, porém, não o bastante

para que Péricles pudesse vê-la concluída, pois quando ele morre, só o

Partenon e os Propileus tinham sido terminados.

Com a aplicação de refinados projetos coordenados pelo gênio de

Fídias e supervisionados por Péricles e tendo a contribuição de um grupo de

notáveis personalidades artísticas, nasce a grande arte ática “clássica”, nela se

concretizou a tentativa de experimentar a perfeita unidade e a suprema beleza

do visível e do invisível: de apreender o equilíbrio constantemente dinâmico e

variável da realidade e apreciável através dos sentidos.

A síntese de genialidade projetiva e lúcida racionalidade ordenadora

e executiva obtém no Partenon seu momento mais alto, mas é o conjunto de

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todas as relações espaciais e visuais entre os grandes templos e os demais

edifícios o que resulta a sensação de uma harmonia estudada ainda que

natural.

Como consequência histórica, o resultado artístico alcançado na

Acrópole e no Partenon, aclamado como síntese de genialidade projetiva e

racionalidade ordenadora, é transmitido nas atividades monumentais que se

multiplicam em Atenas e no restante da Ática como demonstram o templo de

Hefesto na ágora, o de Posídon no cabo Súnio, o de Nêmesis em Ramnunte e

as intervenções no santuário de Artemisa Braurônia, o sucesso dos artistas da

acrópole logo transpôs os limites regionais.

O universo de imagens materiais pertencentes à arte clássica grega

(arquitetura, pintura e escultura), que convém como modelo, atua como mídia

(canais, meios) por onde comunica os ideais de beleza, harmonia e proporção

expressando as tradições religiosas, os valores culturais e o poder político da

civilização grega em expansão, conforme diferentes olhares e aspectos para a

arte produzida no continente europeu.

O ‘clássico’ ou a arte do mundo antigo greco-romano se apresenta em diferentes momentos da história, como ponto de referência para a elaboração arquitetônica. Os diferentes momentos de retomada da Antiguidade clássica como fonte de inspiração e questionamento são usualmente considerados períodos classistas. Esse constante diálogo com a antiguidade indica também o sentido de busca de uma origem onde a autoridade dos antigos funciona como pedra fundamental para a constituição do próprio percurso trilhado pela cultura ocidental. (GUINSBURG, 1999, p.293).

Na formação da Arte ocidental, mais exatamente na Arte europeia,

a representação das ordens arquitetônicas é encontrada na arte pictórica,

como nos afrescos das mansões da cidade romana de Pompéia, Itália, ainda

na Antiguidade.

Mais tarde, nos séculos XV e XVI, na produção pictórica, em

afrescos e pinturas a têmpera e a óleo do Renascimento Italiano, nesse

período, a inspiração pela arte greco-romana da Antiguidade Clássica expressa

o humanismo e no início do século XIX, no Neoclassicismo francês, para

expressar idolatria, conquista e patriotismo.

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Civilização Romana - A Helenização de Roma

A fundação de um império por Alexandre foi um evento sumamente importante para a arte grega, que de ser a preocupação de um punhado de pequenas cidades se converteu desse modo na linguagem pictórica de quase metade do mundo. Referimo-nos, sobretudo, a essa arte do período subsequente não como arte grega, mas como arte helenística, por ser esse o nome usualmente dado aos impérios fundados pelos sucessores de Alexandre em solo oriental. As opulentas capitais desses impérios, Alexandria no Egito, Antioquia na Síria e Pérgamo na Ásia Menor, fizeram aos artistas exigências diferentes daquelas que estavam acostumados na Grécia. (GOMBRICH, 1979, p.72)

O período helenístico começa em 323 A.C. com a morte de

Alexandre, o Grande, que chega a unificar a Grécia, derrota o tradicional

inimigo, a Pérsia, apodera-se de seu império e estende o seu próprio à Índia e

Egito. O objetivo de Alexandre de construir um império universal é

comprometido por sua morte.

No período helenístico, a civilização grega desenvolve-se em escala

diferente. Quando o Império é dividido, dando origem a diversas monarquias

asiáticas, e fazendo com que o mundo grego se voltasse para o lado do

Oriente. A fundação de cidades como Pérgamo na Anatólia, Alexandria no

Egito e Antioquia na Síria, realiza a união entre helenismo e orientalismo,

caráter que marca a civilização helenística.

O período helenístico termina em 146 a.C., ano da conquista da

Grécia pelos romanos. Roma, cidade capital do império romano, é a primeira

civilização a absorver os conceitos gregos, construindo um imenso patrimônio

artístico que simboliza o poder desta civilização conquistadora apresenta uma

arquitetura de caráter político, civil e religioso que serve para expressar o poder

da civilização romana.

O gênio romano, tão facilmente identificável em qualquer outra esfera de atividade humana, torna-se estranhamente enganoso quando perguntamos se existiu um estilo romano nas artes. Por que isso acontece? A razão mais óbvia é a grande admiração que os romanos tinham pela arte grega de todos os tipos e períodos. Não só importavam milhares de originais de épocas anteriores e deles faziam um número ainda maior de cópias, como também as suas próprias criações eram claramente baseadas em fontes gregas, sendo que muito de seus artistas eram de origem grega. Mas além da temática diferente, o fato é que, como um todo, a arte criada sob o patrocínio romano parece nitidamente diferente

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da arte grega e apresenta qualidades positivas não gregas que expressam diferentes intenções. (JANSON, 1996, p. 70).

Dessa forma, as imagens materiais construídas de acordo com os

cânones clássicos usados na Grécia, principalmente na produção arquitetônica,

com a presença das ordens arquitetônicas, incorporadas pelos romanos que as

adaptam às suas convenções artísticas, sociais, religiosas e políticas,

objetivam o mesmo que os gregos: engrandecer a metrópole, destacar a vitória

contra as ameaças de povos invasores, mas também, exaltar a força e a

supremacia dessas duas sociedades, cada uma em sua época.

É interessante destacar que tanto o apogeu da Grécia quanto de

Roma resulta da vitória contra a ameaça de povos inimigos; os gregos, a vitória

sobre os persas, e os romanos, na luta pelo poder, Otávio derrota Marco

Antonio e Cleópatra, no ano 31 a. C., episódio que permite a ele dar

continuidade à tradição política do desenvolvimento arquitetônico de Roma.

Desses fatos conclui-se que a produção arquitetônica grega e romana procede

com mesmo objetivo, demonstrar o triunfo contra essas ameaças, a força e a

supremacia dessas duas sociedades cada uma em seu tempo.

A arquitetura reflete uma forma especificamente romana de vida

pública e privada que será confirmada no período augustano. Engrandecer

Roma por meio da arquitetura para mantê-la como o centro administrativo do

vasto império romano, com o intuito de aumentar o poder político já era uma

manobra praticada por governantes anteriores a Otávio.

Em 27 a. C. Otávio recebe o título de Augusto depois de entregar a

“Res Publica” para o arbítrio do senado e do povo romano. No poder, Augusto

tinha o objetivo de relacionar seu nome aos tempos de glória dos deuses e

heróis, divulgando a ideia de sua descendência ligada a Marte e Vênus e ás

origens de Roma. Com esta intenção, Augusto restaura e constrói várias obras

públicas destacando a construção de templos.

Diante do cenário político da “Pax Romana”, que pode ser chamada

de “Augustana”, período de grande desenvolvimento construtivo a que Roma e

as províncias assistem, aparece Vitrúvio, arquiteto e engenheiro militar romano

que vive no século I a. C., participa das campanhas de Júlio César e que,

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quando reformado, presenteia o imperador Otávio Augusto com uma obra

sobre arquitetura, contendo dez volumes intitulados “De Arquitetura”.

Por outro lado, essas coisas deverão ser realizadas de modo que tenham presentes os princípios da solidez, da funcionalidade e da beleza. O princípio da solidez estará presente quando for feita a escavação dos fundamentos até o chão firme e se escolherem diligentemente e sem avareza as necessárias quantidades de materiais. O da funcionalidade, por sua vez, será conseguido se for bem realizada e sem qualquer impedimento a adequação do uso dos solos, assim como uma repartição apropriada e adaptada ao tipo de exposição solar de cada um dos gêneros. Finalmente, o princípio da beleza será atingido quando o aspecto da obra for agradável e elegante e as medidas das partes corresponderem a uma equilibrada lógica de comensurabilidade. (VITRÚVIO, 2007, p.82)

O texto é descritivo e histórico, expõe princípios das técnicas

clássicas dos romanos e, por conseguinte, dos gregos, institui conexões entre

o fazer e seus preceitos morais, conforme com a cultura dominante do período

augustano.

Este texto é o único tratado europeu do período greco-romano que

chegou até nossos dias e se tornou um texto norteador para outros escritos

sobre construções de ordem hidráulica, hidrológica e arquitetônica desde a

época do Renascimento.

Para a história das Artes e das culturas ocidentais, o texto vitruviano

transformou-se em canal direto com o mundo antigo, um elo com a antiguidade

clássica, um referencial absoluto para o trabalho de arquitetos e pintores.

Summerson (2009, p.6) conclui que a descrição mais completa e

antiga das ordens arquitetônicas é feita por Vitrúvio em seu tratado, detalhando

as ordens arquitetônicas: dórica, jônica, coríntia e toscana.

Vitrúvio quando escreve seu livro de Arquitetura sobre a produção

artística encontrada na arquitetura, pintura e escultura greco-romana, acaba

por colaborar na formação das diretrizes, ou melhor, dos cânones da Arte

Clássica que seriam quase imortais para a cultura ocidental.

Os cânones da Arte Clássica envolvem a proporção, modulação,

simetria, equilíbrio e harmonia, critérios que constituem as três qualidades

essenciais de uma construção arquitetônica definida por Vitrúvio como solidez,

utilidade e beleza.

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O texto de Vitrúvio inspira o pensamento renascentista italiano nos

séculos XV e XVI e mais tarde, os preceitos da Academia de Paris no

Neoclassicismo francês nos séculos XVIII e XIX.

A Pintura Romana de Pompéia

Muito pouco foi preservado, seja da pintura grega ou romana, e esse pouco se deve, em grande parte, à erupção do monte Vesúvio em 79 D.C., que soterrou edifícios construídos num espaço de tempo relativamente pequeno, deixando à nossa imaginação especular sobre o tipo de pintura que existia antes e depois da catástrofe. O que resta é capaz de surpreender o observador como sendo o aspecto mais excitante, bem como desconcertante, da arte do domínio romano. Não há dúvida que famosos projetos gregos foram copiados, e até mesmo pintores foram trazidos da Grécia, mas o número de casos em que pode seguramente estabelecer uma relação direta com a velha arte é bastante reduzido. As pinturas em telas transportáveis, como as que imaginamos atualmente ao referirmo-nos à pintura, não eram frequentes nos tempos romanos, e se por acaso eram, desapareceram todas, a exemplo das imagens em cera dos ancestrais. Pelo contrário, as pinturas faziam parte das decorações em afresco (sobre superfícies mais permanentes de gesso endurecido) dos interiores, como da Casa dos Vetti. Os painéis são dispostos num conjunto elaborado de pinturas imitando painéis de mármore e fantásticas cenas arquitetônicas, vistas através de janelas aparentes. A ilusão criada pelas texturas da superfície e cenas distantes têm um grau extraordinário de realidade tridimensional, mas tão logo tentamos analisar a relação das várias partes entre si, ficamos confusos e rapidamente percebemos que os pintores romanos não tinham uma compreensão sistemática da profundidade espacial. (JANSON, 1996, p.77)

Os romanos são conhecidos na história como conquistadores,

organizadores, administradores, empreendedores e construtores e criam um

vasto império que recebe várias influências culturais dos povos conquistados.

O resultado do sincretismo artístico obtido pelos romanos está na

influência dos etruscos e gregos na elaboração da arte romana caracterizada

pela harmonia, equilíbrio, unidade e solidez presentes na arquitetura e na

produção pictórica que expressam elegância e imponência.

A arte clássica greco-romana, descoberta no sítio arqueológico de

Pompéia, Itália, corresponde como único testemunho da pintura mural da

Antiguidade que chega até a época atual.

Quando os primeiros habitantes de Pompéia decidiram construir seu povoado na foz do rio Sarno durante a Era do Bronze, não lhes passou

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pela cabeça que a escarpa onde estavam havia sido criada, muito tempo antes, por um intenso derramamento de lava da montanha aparentemente inofensiva que assomava diante deles. O Vesúvio e as terras a seu redor foram uma das regiões agricultáveis mais importantes da península italiana durante séculos antes de 54 d.C.: extremamente fértil e verdejante, a própria encosta da montanha era cultivada com videiras e oliveiras. (LAURENCE, BUTTERWORTH, 2007, p.29)

Na Antiguidade, localizada sobre uma colina de frente para o mar e

vizinha do vulcão Vesúvio, Pompéia torna-se uma próspera e luxuosa cidade

portuária, um nobre refúgio de verão às margens do Golfo de Nápoles. É

considerada uma cidade de repouso para os ricos romanos, os quais buscam

na região de Campânia, a desejada tranquilidade não encontrada em Roma.

Na era de Augusto, sob a influência grega, então dominante, a escultura foi a principal arte; daí em diante, porém, a pintura passa a ocupar cada vez mais o primeiro plano, acabando por suplantar quase que completamente a escultura. No século III, a cópia de obras de arte gregas tinha cessado, e nos dois séculos seguintes é a pintura que domina o campo da decoração de interiores. A pintura é a arte tardia romana, tomando o lugar que pertencia à escultura na idade clássica; é a arte popular dos romanos, falando a todos na linguagem de todos. Até então, nunca houvera tamanha produção em massa de pintura, nunca a pintura tinha sido empregada com objetivos tão triviais e tão efêmeros como agora em Roma. (HAUSER, 2003, p. 109).

Ao afirmar que a pintura suplanta a escultura, Hauser elucida a

importância desta representação artística que esta técnica assume, tornando-

se elemento de destaque na decoração de interiores para expressar as

inspirações artísticas da civilização romana em grande escala.

Em Roma, a pintura exercia as funções de: noticiário, editorial, anúncio, cartaz, crônica, caricatura política, documentário e teatro filmado. A estima dos romanos pela pintura desvenda, além do prazer pelo anedótico e do interesse na documentação e nos testemunhos oculares, um certo desejo insaciável, primitivo e ingênuo por vistas e ilustrações. A demanda que essas pinturas pretendiam satisfazer era primária, rudimentar e essencialmente não-artística. O gosto por querer experimentar tudo pessoalmente, ver tudo com os próprios olhos, como se fosse possível assistir a tudo, é um tanto ingênuo; é uma percepção primitiva que rejeita como de "segunda mão" tudo o que seja descrito na forma transposta, a qual, para uma época mais requintada, constitui, na própria essência da arte. (HAUSER, 2003, p. 110).

A pintura passa então a ser importante elemento de comunicação

independente da realidade da informação que transmite. Na capital do Império,

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além de servir de canal de comunicação, a pintura funciona como arquivo de

documentação e, também, uma forma de registrar em ilustrações variados

acontecimentos da sociedade romana.

C.W. Ceram (1960, p.20) afirma que a descoberta do sítio

arqueológico de Pompéia acontece no século XVIII, em 1748, sob a

responsabilidade do espanhol militar Cavaliere Rocco Giocchino de Alcubierre,

comandante supremo, oficial dos Engenheiros Militares do Reino de Nápoles,

nação que, no referido século, se encontrava em domínio espanhol. No dia

primeiro de abril de 1748 começa as escavações, em seis de abril é achada a

primeira pintura mural. No dia dezenove é encontrado o primeiro cadáver.

Contudo, uma escavação séria só será feita a partir de 1754, quando é

descoberto do lado sul de Pompéia, os restos de túmulos e de muros antigos.

A partir desta data até a atualidade, com poucas interrupções prosseguem as

escavações.

Alcubierre realiza longas pesquisas arqueológicas na região e, com

as escavações que abrangem o período de 1738 a 1780, revela a civilização da

cidade romana destruída pela erupção do vulcão Vesúvio no ano de 79 d.C. na

Antiguidade.

Sobre a história da cidade, Luca e Magagnini relatam que Pompéia

se converte em colônia no século I a.C., época em que a classe dirigente em

ascensão, decora suas residências seguindo como modelo as domus dos

aristocratas romanos, incluindo pinturas murais com a imitação de elementos

arquitetônicos dominantes como as colunatas, pódios e telhados.

Toynbee (1972, p.109) completa que a fama de Pompéia resulta dos

imóveis particulares, desde as estruturas, decoração e aos móveis. As pinturas

murais, realizadas na técnica do afresco, se encontram nas paredes internas

das propriedades pompeanas, mansões, edifícios públicos e palácios dos

imperadores.

A técnica do afresco equivale à técnica de pintura mural realizada

sobre reboco úmido colocando as tintas diluídas em água que, ao secar, ficam

fortemente aderidas à superfície tratada. O suporte, que pode ser parede, muro

ou teto, é revestido em três camadas sucessivas de cal e tijolo triturado, de cal

e areia e de cal e pó de mármore, entre as quais é esboçado o desenho

preparatório, em seguida é feita a aplicação das tintas sobre a superfície

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preparada ainda úmida. Esta técnica difere de todas as outras formas de arte

pictórica por estar profundamente vinculada à arquitetura podendo explorar o

caráter plano de uma parede ou criar o efeito de uma nova área de espaço,

esta técnica chamada trompe l’oeil, o nome foi dado séculos depois, mas já

conhecida na Antiguidade, é uma prática artística que retrata a imagem com

intencional grau de detalhes realísticos alcançados com o uso da perspectiva e

do claro-escuro objetivando criar uma ilusão óptica que mostra objetos ou

formas em três dimensões, altera a percepção de quem as vê quanto ao

verdadeiro tamanho do espaço físico, é usada principalmente em trabalhos de

pintura ou arquitetura de grandes dimensões, explica Marcondes (1998, p.282)

em Dicionário de Termos Artísticos.

Os afrescos pompeanos, executados por mestres gregos imigrados

ou por romanos, refletem a alma da civilização romana em seu apogeu. Muitos

destes afrescos retratam a arquitetura greco-romana caracterizando um estilo

de construção com a presença de colunas, frontões, capitéis e arcos, definindo

um modelo de unidade, harmonia, proporção e equilíbrio e procuram no típico

mural “trompe-l'oeil”, mostrar como uma janela, porta ou corredor, com a

finalidade de visualmente aumentar o aposento.

Toynbee (1972, p.8) esclarece que é possível discernir Quatro

Estilos Pompeanos de pinturas murais, desde o século II a.C. até o último

quartel do século I d.C. Em comum, aplicam a representação de elementos

característicos da arquitetura greco-romana.

O Primeiro estilo, o mais simples e antigo é conhecido como Estilo

da Incrustação ou Estilo de Alvenaria. Imita, com a utilização da pintura,

revestimentos de mármores coloridos, passa a impressão que toda a parede

parecesse revestida de mármores estrangeiros, material utilizado na decoração

dos palácios. A parede, dividida horizontalmente em três partes: com alto

rodapé, na parte imediata ao solo; na região média, que corresponde ao campo

da pintura; e, uma terceira de acabamento, ao modo dos entablamentos.

O Segundo Estilo, denominado de arquitetônico, procura exprimir

expressão tridimensional, ou seja, expressa profundidade por meio da pintura

para dar a ilusão de blocos salientes, de janelas abertas com paisagens,

pessoas, animais, aves e jardins ao longe. As paredes são pintadas para

ampliar os limites do ambiente. Distinguem-se pela compartimentação do

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campo a ser decorado com aplicação das ordens arquitetônicas como moldura,

a arquitetura colunaria que enquadra a parede, tem os espaços vazios

preenchidos com pinturas de cenas que, são cópias de obras dos habilidosos

pintores gregos, ou cenas teatrais gregas.

Terceiro Estilo, também conhecido como Estilo Ornamental, domina

todos os recursos de profundidade nas paredes que expressam sua solidez. As

colunas, as arquitraves e outros elementos arquitetônicos são reduzidos a

simples elementos decorativos.

O Quarto Estilo, denominado de cenográfico, resulta da junção dos

dois estilos anteriores e exalta o caráter teatral na decoração, a mitologia é

usada como tema para compor cenas figurativas organizadas segundo as

estruturas arquitetônicas em perspectiva. Na decoração aparecem espirais,

rosáceas e ornamentos metálicos e também cores vivas e contrastantes.

A seguir, exemplos de afrescos pompeanos com aplicação da

arquitetura greco-romana.

Vila dos Mistérios – Pompéia

Luca e Magagnini (2010, p.18) assinalam que a Vila dos Mistérios

corresponde ao Segundo Estilo pompeano e que os textos de Vitruvio são a

melhor fonte para compreender a origem e significado dos desenhos

decorativos.

Na sua obra sobre arquitetura, no quinto livro, capítulo seis, relata

que o teatro, nos três gêneros de cenas, trágico, cômico e satírico, as

decorações são diferentes. As cenas trágicas são decoradas com colunas,

frontões estátuas. As cômicas representam edifícios privados e balcões e as

satíricas são decoradas com árvores e outros elementos campestres seguindo

estilo paisagístico.

Tendo como base a obra de Vitrúvio, as investigações realizadas

para entender a origem das perspectivas arquitetônicas murais aplicadas nas

pinturas de cenários provêm das decorações ambientais usadas nas

representações teatrais que, por sua vez, imitam a arquitetura dos grandes

edifícios helenísticos que revelam o luxo e riqueza almejados pelos clientes

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pompeanos que querem imitar as preferências dos lugares aristocráticos

romanos.

As representações de elementos arquitetônicos nas paredes

objetivam criar perspectivas cujos detalhes possibilitem evocar luxuosos

edifícios localizados em áreas amplas. Para expandir mais estes espaços

reduzidos, o decorador aplica fortes contrastes de cores, como o azul celeste

para abrir a parte superior da parede.

Nos outros compartimentos, sejam eles de primavera, de outono ou de verão, e também nos átrios e nos peristilos, foram constituídas pelos antigos normas concretas de pintura a partir de determinadas realidades. Com efeito, a pintura apresenta-nos a imagem daquilo que é ou pode ser, tais como homens, edifícios, naves, bem como todas as coisas restantes de cujos corpos harmoniosos e distintos se retiram exemplos de figurada semelhança. Por isso, os antigos que instituíram os princípios de acabamentos imitaram primeiro as variedades e as aplicações das placas de mármore e, depois, das várias possibilidades de distribuição dos cornijas, molduras e bandas reparadoras. Posteriormente, dedicaram-se a imitar também as figuras dos edifícios, as saliências proeminentes das colunas e dos frontões; em lugares ao ar livre, como êxedras, devido ao tamanho das paredes, desenharam frontes de cenas segundo os gêneros trágico, cômico ou satírico. Nos passeios portificados, por causa dos espaços em profundidade, representaram variedades de paisagens, mostrando figurões com características de determinados locais: deste modo se pintam portos, litorais, rios, fontes, canais, templos, bosques, montes, rebanhos, pastores, assim como, em alguns lugares, grandes quadros. (VITRÚVIO, 2007,p.358)

No sétimo livro, explica que no século I a.C., começam a reproduzir

edifícios com colunas e frontões em perspectiva para emoldurar as pinturas

murais que representam cenas de inspiração trágica, satírica e cômica.

A Vila dos Mistérios, primeiramente, uma construção modesta

erguida no século II a.C., é transformada em uma vila luxuosa no século I a.C.

Moradia rural com edificações que formam o centro de uma

propriedade agrícola situa-se a pequena distância da área urbana de Pompéia,

além da porta de Herculano.

O Salão dos Mistérios está localizado no grande ambiente de planta

retangular, com suas paredes decoradas por afrescos, tendo como função

original receber visitas, mais tarde, é transformado em espaço destinado a

usos particulares e domésticos dos proprietários da vila.

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A Vila dos Mistérios deve seu nome ao afresco em que são

representados os principais momentos de um rito de iniciação nos mistérios

dionisíacos.

Para Janson (1996, p.79), os Mistérios Dionisíacos, fazem parte de

um culto semi-secreto de origem muito antiga que foi trazido da Grécia para a

Itália e muitas das poses e gestos são extraídos do repertório da arte grega

clássica.

O autor acrescenta ainda que a Vila dos Mistérios possui uma

grandiosidade de projeto e coerência de estilo que são únicos na pintura

romana. O artista representa as passagens do ritual dando vida às formas,

demonstrando ser, o artista, herdeiro dos mestres da pintura grega.

O conjunto pictórico é composto por 29 figuras em tamanho natural,

com desenho pormenorizado e a modelação de frisos estatuários de

personagens humanas, divinas e mitológicas, demonstram o trabalho de um

pintor altamente especializado.

O artista que cria o friso da Vila dos Mistérios coloca suas figuras

numa estreita faixa verde contrastando com uma disposição regular de painéis

vermelhos, separados por listras negras como se fosse um palco com figuras

em série, que representam seu estranho e faustoso ritual.

As imagens subsequentes ilustram a retratação de elementos da

arquitetura clássica como expressão de suntuosidade e luxo, delineiam colunas

com fustes de caneluras, capitéis dóricos, jônicos e coríntios, arquitrave e

entablamentos. Todas evidenciam a habilidade dos artistas para representar a

construção do espaço e planos sobrepostos.

Nas imagens que seguem é possível evidenciar os elementos

arquitetônicos da cultura greco-romana.

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Imagem 06 Vila dos Mistérios

(Fonte: “El Arte de Pompeya” – Blume, 2010)

Este afresco do início do século 1 a.C., representa em primeiro plano

quatro colunas que apresentam fustes com caneluras verticais e capitel

coríntio, com suas folhagens, detalhe marcante desta ordem arquitetônica

sobre estes, estão a cornija e arquitrave pintadas em amarelo, alternadas por

um friso estreito em vermelho, formando o entablamento, sobre elas foram

representados três arcos plenos apoiados nestas quatro colunas.

Estes arcos possuem a mesma distância entre si, dividindo o espaço

de maneira proporcional e simétrica, estabelecendo harmonia no conjunto. Este

estilo de Pompéia possui a característica de “abrir” a parede devido à ilusão

das alas arquitetônicas.

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Imagem 07 Vila dos Mistérios - Porta dourada

(Fonte: “El Arte de Pompeya” – Blume, 2010).

Esta imagem apresenta porta decorada com ornamentos gregos e

está emoldurada por colunas e pilastras. O vermelho identifica o estilo

pompeano.

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Imagem 08 Vila dos Mistérios: afresco com colunas, arcos e sobreposição de

planos. (Fonte: “Itália Antiga” – Edições Folio, 2006).

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Imagem 09 Vila dos Mistérios. Detalhe do afresco.

(Fonte: “El Arte de Pompeya” – Blume, 2010).

Colunas com capitéis coríntios e arquitraves são evidenciadas. No

fundo, colunas coríntias sustentam teto circular.

Casa dos Vettii - Pompéia

Luca e Magagnini (2010, p.18) afirmam que a Casa dos Vetti

corresponde a uma “domus”, propriedade urbana ampla e luxuosa, com

afrescos pertencentes ao quarto estilo pompeano, compostos por

representações que imitam os elementos arquitetônicos combinados com

grande variedade de figuras.

Toynbee (1972, p.109) acrescenta que a pintura mural do quarto

estilo é a mais frequente encontrada em Pompéia porque, após o terremoto de

62 d.C., muitas casas danificadas são redecoradas neste estilo. Os afrescos da

Casa dos Vettii são da segunda metade do século 1.

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Imagem 10 Casa dos Vettii

(Fonte: “El Arte de Pompeya”, Blume, 2010. Casa dos Vetti).

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Imagem 11 Detalhe de afresco da Casa dos Vettii.

(Fonte: “El Arte de Pompeya” – Blume, 2010).

Construída em torno de duas áreas centrais a céu aberto, é uma das

casas mais famosas de Pompéia, representa um documento essencial para o

estudo da pintura clássica romana e é considerada uma das mais importantes

construções da cidade, recebe este nome em tributo a seus proprietários, dois

libertos bem-sucedidos.

A escavação cuidadosa da casa preserva quase todos os afrescos

de suas paredes que são terminados depois do terremoto de 62 d.C., assim,

como está em bom estado de conservação, serve de exemplo para estudar

uma habitação da classe alta e observar como as pessoas afirmam o seu

prestígio através da construção de edifícios luxuosos, é possível observar que

a riqueza da decoração era diretamente proporcional à capacidade econômica

dos proprietários.

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As pinturas murais representam o IV Estilo, para criar jogos de

perspectiva foram feitos com um cromatismo muito variado, além disso, os

temas arquitetônicos são alternados com cenas mitológicas.

Observando o afresco da Casa dos Vettii, o primeiro plano é

composto por uma parede externa que forma uma janela, pintada em amarelo,

em posição frontal, na sua parte inferior estão pintadas faixas gregas em linhas

esbranquiçadas. Do lado direito da janela há um módulo retangular pintado em

amarelo. A janela centralizada expressa a sensação de profundidade como se

“abrisse” para um espaço (segundo plano).

O segundo plano apresenta características de uma construção

arquitetônica clássica greco-romana contendo colunas jônicas sustentando um

friso trabalhado.

Esta construção arquitetônica sugere um terceiro plano em

profundidade que é formado por uma construção arquitetônica sugerindo um

cômodo aberto. Este cômodo é formado por duas paredes perpendiculares

entre si, na parede na lateral direita, pintada em rosa, que é possível visualizar,

possui uma janela formada por uma coluna com fuste contendo caneluras em

tom esbranquiçado e capitel jônico, ao fundo, a outra parede perpendicular,

pintada em verde, há uma porta aberta que sugere outro plano; na lateral

esquerda aberta deste cômodo é formada por duas colunas de capitel jônico

contendo fuste com caneluras verticais em tom esbranquiçado. A parte superior

deste cômodo, do lado interno apresenta um forro trabalhado. Do lado externo

exibe um entablamento com arquitrave, friso e cornija trabalhados e pintados

em tonalidade rosa.

A pintura romana, feita com a técnica do afresco, encontrada no sítio

arqueológico da cidade de Pompéia, na Itália, serve como modelo para os

artistas do estilo neoclássico no século XIX. Estas casas de Pompéia que eram

pertencentes as famílias de maior poder aquisitivo do período utilizam nas suas

representações pictóricas elementos da arquitetura clássica, o que enfatiza a

ideia de que esta arquitetura é referencial para situações de poder

estabelecido.

Terminada a Antiguidade, o universo de imagens materiais da Arte

Clássica no âmbito da arquitetura, pintura e escultura, criada e disseminada por

gregos e romanos, articulada sob os cânones da harmonia, proporção,

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modulação, equilíbrio e unidade para expressar a beleza perfeita, transforma-

se para outras civilizações subsequentes da história humana em símbolo de

requinte, glória e poder que consagra uma sociedade dominante que sobrepuja

outros povos menos desenvolvidos.

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CAPÍTULO II O RENASCIMENTO ITALIANO

Criada pelos humanistas italianos e retomada por Vasari, a noção de uma ressurreição das letras e das artes graças ao reencontro com a Antiguidade foi, seguramente, fecunda como fecundos são todos os manifestos lançados em todos os séculos por novas gerações conquistadoras. Essa noção significa juventude, dinamismo, vontade de renovação. O termo ‘Renascimento’, mesmo na acepção estrita dos humanistas, que o aplicavam, essencialmente, à literatura e às artes plásticas, parece-nos atualmente insuficiente. Com que haveríamos de substituir a palavra ‘Renascimento’? Com que outro vocábulo designaríamos essa grande evolução que levou nossos antepassados a mais ciência, mais conhecimentos, maior domínio do mundo natural, maior amor pela beleza? Na falta de melhor, conservei, portanto, ao longo de todo este trabalho, a palavra consagrada pelo uso. No âmbito de uma História total, significa (e não pode significar outra coisa) a promoção do Ocidente numa época em que a civilização da Europa ultrapassou, de modo decisivo, as civilizações que lhe eram paralelas. (DELUMEAU, 1994 p.19)

A história da civilização humana em geral é assinalada por

modificações ideológicas que alteram a direção de sua evolução. O

Renascimento é um desses momentos que induzem o homem a refletir sobre

sua maneira de viver, delineando um novo rumo e adquirindo novas posturas.

O homem europeu do Renascimento, em especial os florentinos, ao

efetuar o regresso à Antiguidade para rever as fontes da beleza e do saber

mobilizam esses conhecimentos como meio de progredir e desvinculá-lo da

Idade Média e constroem obras que representam um marco como

desenvolvimento da civilização humana, lançando o Ocidente europeu para a

Idade Moderna.

O termo Renascimento se refere ao retorno ideal às formas da Antiguidade clássica enquanto verdadeira fonte da beleza e do saber. O período histórico que se acreditou merecedor de tal nome cultivava a leitura dos clássicos gregos e latinos em busca de uma linguagem que fosse universal, recuperando os modelos e as regras da arte antiga. (BIYNGTON, 2009, p.7)

O Renascimento Italiano corresponde ao período da história da

civilização europeia que resulta de condições históricas que envolvem

mudanças sociais, culturais, políticas e econômicas, consiste no movimento

artístico e intelectual que nasce do humanismo, ressuscitando uma cultura e

valores que têm estado sepultados por séculos, corresponde ao período da

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história europeia que abrange os séculos XV a XVI onde ocorrem profundas

modificações na religião, nas ideias e no comportamento que refletem na

produção artística de grandes mestres da pintura, escultura e arquitetura

renascentista por meio de uma releitura da arte clássica greco-romana.

Lucien Febvre, no livro Michelet e a Renascença (1994, p.46)

reivindica para Michelet a paternidade da noção de Renascença para definir

um período da história humana ocidental. Este autor não cria a palavra, mas a

noção histórica, o conhecimento de uma fase, a compreender e a definir, da

história humana do Ocidente. Como precursor, ele cria a noção antes mesmo

que seus contemporâneos estejam prontos para compreender o sentido

profundo deste período histórico. Defende estes conceitos no livro

Renascença, publicado em 1855, cinco anos antes de Jacob Burckhardt

escrever A Cultura do Renascimento na Itália.

No começo do século XV, a Itália não era uma unidade social, nem cultural, embora o conceito de Itália existisse, e alguns homens educados de outras regiões entendessem a língua toscana. Era simplesmente uma expressão geográfica. Mas a geografia influencia a sociedade e a cultura. Sua geografia encorajava os italianos a dedicar ao comércio e à indústria mais atenção que seus vizinhos. Localização central da Itália na Europa e o fácil acesso ao mar permitiram que seus comerciantes se transformassem em intermediários entre Oriente e Ocidente, uma vez que seu terreno, um quinto montanhoso e três quintos acidentado, desestimulava a agricultura. Não é de surpreender, portanto, que cidades italianas – Gênova, Veneza e Florença – tenham desempenhado papel de liderança na revolução comercial do século XIII, ou que em 1300 cerca de 23 cidades do norte e centro da Itália tivessem populações de 20 mil ou mais habitantes cada. As cidades-repúblicas eram a forma dominante de organização política no século XII e começo do século XIII. Uma população urbana relativamente numerosa e um alto grau de autonomia urbana permitiam que o homem leigo educado assumisse uma excepcional importância. (BURKE, 2010, p.9)

Durante os séculos XV e XVI, o Renascimento Italiano se manifesta

no período que corresponde à transição do Feudalismo para o Mercantilismo,

possui caráter eminentemente urbano e desenvolve-se nas cidades italianas,

situadas geograficamente de forma favorável ao comércio de especiarias com

as rotas comerciais do Oriente, organizadas em cidades-estados ou repúblicas

independentes, se estabelecem como prósperos centros urbanos mercantis.

Essas cidades, para obterem valor comercial e prestígio social, recorrem à

produção artística de caráter individual protagonizada por artistas talentosos

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que criam obras de arte de grande valor no âmbito da arquitetura, pintura e

escultura.

O Renascimento não se teria configurado na elevada e universal necessidade histórica que foi se se pudesse abstrair tão facilmente dessa Antiguidade. Nesse ponto temos de insistir, como proposição central deste livro: não foi a Antiguidade sozinha, mas sua estreita ligação com o espírito italiano, presente a seu lado, que sujeitou o mundo ocidental. Nas artes plásticas, no entanto, e em várias outras esferas, sua dimensão é notável, fazendo com que a aliança entre duas longínquas épocas culturais de um mesmo povo se revele una, porque autônoma em suas partes, e, por isso, legítima e fecunda. (BURCKHARDT, 2009, p.177)

O Renascimento surge não de um polo, mas da combinação de

sociedades e culturas que se disseminam sobre a abundante geografia física e

humana que compõe o Mediterrâneo, região responsável pelo florescimento de

civilizações da história ocidental, sendo que as artes plásticas refletem o modo

claro a correspondência de ideais estéticos dos dois momentos.

As mudanças de ordem econômica, social e cultural permitem a

formação do Estado moderno, que, por sua vez, com suas características,

beneficia os objetivos comerciais da burguesia, essa classe social promove o

mecenato para conceber e criar uma arte que representa as ideias inspiradas

nos valores humanistas que coadunam com os interesses comerciais e

empreendedores dos ricos comerciantes e são registradas na produção

pictórica e arquitetônica de artistas dos séculos XV e XVI.

Nunca uma civilização dera tão grande lugar à pintura e à música, nem erguera ao céu, tão altas cúpulas, nem elevara ao nível da alta literatura tantas línguas nacionais encerradas em tão exíguo espaço. Nunca no passado da humanidade tinham surgido tantas invenções em tão pouco tempo. Pois o Renascimento foi, especialmente, progresso técnico; deu ao homem do ocidente maior domínio sobre um mundo mais bem conhecido. Ensinou-lhe a atravessar oceanos, fabricar ferro fundido, a servir-se das armas de fogo, a contar as horas com um motor, a imprimir, a utilizar dia a dia a letra de câmbio e o seguro marítimo. (DELUMEAU, p. 23, 1994)

O homem renascentista se desvincula do sistema feudal e da igreja

medieval que passa a ser concebida como retrógrada e ultrapassada para

construir uma concepção mais dinâmica de si e da sociedade e compõe uma

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visão mais ampla e realista do mundo ao seu redor por meio do pensamento

humanista e concebe uma consciência global de si mesmo, no espaço, no

tempo e no universo, conquista o mundo visível fundamentado na razão, na

matemática e no conhecimento científico, essas noções constituem os pilares

da produção artística do Renascimento Italiano. Chamado também de

Renascimento Cultural, revela transformações no pensamento do homem

europeu nas concepções filosóficas, na arte, na religião e na ciência e permite

reavaliar sua atitude de viver em sociedade, o conjunto dessas modificações

leva a estabelecer um novo paradigma que altera a evolução da civilização

europeia.

No âmbito das invenções técnicas, o período renascentista produz

uma grande variedade que desencadeia o progresso material na sociedade

ocidental que amplia o conhecimento sobre a geografia do globo terrestre e o

torna bem mais conhecido.

A civilização mediterrânea, que, desde a queda do Império Romano, era a civilização ocidental, havia muito que aperfeiçoava as suas capacidades manuais. Uma história da técnica, por breve que seja, trará uma prova suplementar, mas decisiva, da poderosa vitalidade da Europa na ocasião em que começou a distanciar-se dos outros continentes. O século XV foi mais inventivo que o século XVI, época particularmente perturbada. O avanço decisivo situa-se, em especial, entre o meio do século XV, assinalado pelo aparecimento da imprensa, e 1530, data em que Cellini criou o primeiro balance para cunhar moeda, mais ou menos copiado das prensas de impressão. O momento culminante do progresso parece situar-se entre 1450 e 1470, pois é nestes vinte anos que podemos assistir ao aparecimento não só da imprensa como ainda da mola espiral, da primeira fortificação moderna e do rodete de alhetas. Deste modo, a partir do Renascimento a técnica não só atraiu as atenções dos poderes públicos como passou a fazer parte integrante da cultura. (DELUMEAU, 1994, p.151)

As inovações tecnológicas resultam de uma nova postura diante da

natureza por parte de alguns europeus que constitui a prática da observação

meticulosa e ordenada da mesma, essa acuidade, exercida pelo observador

por meio de pesquisas e estudos, compõe uma postura chamada de científica.

Mas o grande feito da Renascença não foi a imitação estrita dos edifícios romanos (isso coube aos arquitetos dos séculos XVIII e XIX), e sim o restabelecimento da gramática da Antiguidade como disciplina universal, a disciplina herdada do passado remoto da humanidade e aplicável a todos os empreendimentos dignos de nota. (SUMMERSON, 2009, p.23)

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O universo de imagens materiais da arte do Renascimento italiano

compreende a aplicação e o desdobramento da Arte Clássica greco-romana na

arquitetura, escultura e pintura. O retorno ao passado resulta do contato do

meio artístico italiano com a produção artística dos povos antigos pagãos,

possibilita a reflexão em viver num mundo concebido por outras ideias e

filosofias e proporcionam uma visão mais dinâmica do ser humano em

sociedade e no mundo.

A cidade de Roma, repleta de ruínas das construções arquitetônicas

no estilo clássico greco-romano, feitas na época do Império Romano, norteiam

o trabalho e criação de arquitetos e pintores renascentistas.

A produção artística do Renascimento italiano é financiada pela por

ricos comerciantes italianos, que estabelece uma reorganização urbanística

nas cidades-estados.

Transformações Culturais - Humanismo

Janson (1996, p.168) observa que o início da visão renovadora da

história começa no século XIV, por volta dos anos de 1330, e que, o

Renascimento resulta do pensamento de um homem, o poeta italiano Petrarca

que sintetiza dois elementos relevantes do Renascimento: o individualismo e o

humanismo.

O historiador ressalta que Petrarca e seus sucessores humanistas,

não são neopagãos, sabem que o mundo greco-romano está decididamente

acabado e que só é possível reviver no nível intelectual as conquistas e a glória

das realizações antigas na arte e nas ideias. Os homens do Renascimento

italiano não querem reproduzir com exatidão as obras da Antiguidade, mas

objetivam igualar-se a elas e, se puder superá-las.

Os pensadores humanistas buscam harmonizar a filosofia clássica

com o cristianismo, na pintura e na arquitetura de construção de igrejas, que

são concebidas como templos pagãos. Os arquitetos aplicam o repertório de

conhecimentos técnicos baseados no estudo das estruturas clássicas.

Letts (1982, p.7) reitera as ideias de Janson e afirma que, de forma

processual, ocorre a descoberta dos manuscritos antigos por todo continente

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europeu feita por literatos do fim do século XIII e do XIV, período que

corresponde ao final da Idade Média. Quando descobertos, os manuscritos de

textos antigos são armazenados nas bibliotecas dos mosteiros, os religiosos

copiam e guardam livros de Cícero, Virgílio e Aristóteles. Estes revelam uma

valorização da natureza, do corpo humano e do merecimento pessoal

induzindo a um novo respeito pelo homem e pela natureza, que compreendem

como criação de Deus.

O autor ressalta que o poeta Petrarca, ao rever os conhecimentos

antigos, redescobre a importância dos estudos liberais, ou como Cícero

denomina, studia humanitatis que consiste nos estudos essenciais a um

homem livre nas épocas grega e romana, como a gramática, a retórica (arte de

fazer discursos), a história, a poesia e a filosofia moral que possibilitam a uma

pessoa falar, ler e escrever como indivíduo culto.

Sevcenko (1994, p.15) acrescenta que os humanistas, como

cristãos, admiram a perfeição e expressão da cultura desenvolvida dentro do

paganismo e almejam redefinir a palavra do Evangelho dentro dos moldes da

experiência e dos valores da Antiguidade Clássica. A inspiração na Antiguidade

clássica leva os pensadores e artistas a estudar e crer na estética dos antigos

gregos e romanos como modelo ideal. O Humanismo, ao valorizar o estudo da

cultura da Antiguidade Clássica, promove o desenvolvimento do conhecimento

científico e enfatiza o racionalismo, a crença na razão humana como alicerce

desse conhecimento, obtido através da observação e experimentação, na

busca do entendimento das leis que regem o mundo. A invenção da imprensa

propicia o acesso dos leitores às concepções dos autores humanistas. Assinala

que o Renascimento altera a vida do homem europeu para se adaptar às

mudanças econômicas, políticas e sociais causadas pelo mercantilismo. A

classe emergente da burguesia transforma as relações comerciais para

aumentar o lucro e expandir seus negócios.

O autor afirma que o movimento humanista busca abolir a tradição

intelectual medieval e procura construir novas raízes para compor uma nova

cultura efetuando uma reforma educacional por meio da atualização,

dinamização e revitalização dos estudos tradicionais a partir da exclusão

completa dos manuais de textos medievais e aplicação do programa dos studia

humanitatis (estudos humanos) que compreendem poesia, filosofia, história,

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matemática e a eloquência. Os estudos humanísticos possibilitam a

aprendizagem e domínio das línguas clássicas, o latim e o grego. Conclui,

dizendo que o Renascimento não divide o passado de acordo com o plano

divino da salvação, mas privilegia as ações humanas. É o primeiro período da

história a ser consciente de sua própria existência e denomina um termo para

se designar.

A evolução da Pintura Renascentista

Na Itália, os séculos XV e XVI foram, certamente, um período de inovação nas artes, uma época de novos gêneros, novos estilos, novas técnicas. O período é cheio de “primeiros”. Foi a época da primeira pintura em óleo, da primeira gravura em madeira, da primeira gravura em metal e do primeiro livro impresso (embora essas inovações cheguem à Itália vindas da Alemanha e dos Países Baixos). As regras da perspectiva linear são descobertas e postas em uso por artistas[...] Na pintura também, o retrato emerge como gênero independente, seguido, um tanto mais lentamente, pela paisagem e pela natureza-morta. Na arquitetura, o desenvolvimento, ou mesmo, talvez, a intenção do planejamento urbano consciente ocorreu no século XV. (BURKE, 2010,p.9 e 25)

A conquista da representação da realidade e da arquitetura clássica

greco-romana resulta do processo criativo que principia no Trecento, século

XIV, reflete a transposição da arte medieval para a renascentista; continua no

Quattrocento, corresponde à fase áurea do período; e termina no Cinquecento,

denominado de Alto Renascimento.

Segundo o comentário do pintor Albrech Dürer, a expressão perspectiva significa “ver através”. Essa impressão inédita de olhar-se para uma parede pintada e parecer que se vê para além dela, como se ali tivesse sido aberta uma janela para outro espaço, o espaço pictórico, era o principal efeito buscado pelos novos artistas. A pintura tradicional, gótica ou bizantina, praticamente se restringia ao plano bidimensional das paredes, produzindo no máximo um efeito decorativo. O novo estilo artístico multiplicava o espaço dos interiores e, com a preocupação de dar às pessoas, aos objetos e paisagens retratados a aparência mais natural possível, parecia multiplicar a própria vida. Uma arte desse tipo impressionava muito mais os sentidos que a imaginação, convidava muito mais ao desfrute visual do que à meditação interior. Era uma arte que remetia o homem ao próprio homem e o induzia a uma identificação maior com seu meio urbano e natural, ao contrário dos estilos medievais que predispunham as pessoas a penetrarem nos universos imateriais das hostes celestiais. A arte renascentista, portanto, mantinha uma consonância muito maior

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com o modo de vida implantado no Ocidente europeu como incremento das relações mercantis e o desenvolvimento das cidades. (SEVCENKO, 1994, p.32)

Enquanto, na Idade Média, a pintura no plano bidimensional é

confeccionada para favorecer a revelação e aceitação, sem questionamento do

humilde povo cristão, do dogma da fé católica de que tudo no universo nasce

da vontade de Deus e prepara as pessoas para idealizar e adentrar nos

conceitos imateriais e celestiais. No Renascimento, acontece o contrário, a

pintura renascentista aplica a perspectiva como recurso que possibilita trazer o

homem para o meio humano real e concreto que vive em determinado tempo,

em determinada sociedade, esta, inserida no espaço urbano, regida por

normas, e estes fatores fazem parte de um contexto maior, um mundo natural,

representando a dinâmica racional do mundo mercantilista articulado pela

burguesia.

A percepção da tela pintada, através dos sentidos, com aplicação da

perspectiva linear, que amplia o espaço pictórico, sugere diversos espaços

interiores com a retratação de pessoas, objetos e paisagens, permite ao

observador “integrar-se” e “incluir-se” neste espaço, porque o ponto de fuga

desta perspectiva está na altura dos olhos deste observador, levando a

centralizá-lo no mundo natural e real, possibilitando sentir-se vivo e participador

do mundo real e material.

Os artistas do Renascimento projetam na arte renascentista as duas

características fundamentais, razão e realidade, buscando construir uma arte,

como a pintura, que retrate o mundo e o espaço circundante o mais próximo do

real e natural, para atingir essa meta, o artista do Renascimento aprofunda seu

conhecimento técnico na representação da realidade com a técnica da

perspectiva. Os artistas buscam a representação do espaço natural

acrescentando, a paisagem. A introdução da paisagem na pintura é

incorporada tanto na produção pictórica renascentista como em toda pintura

europeia até o princípio do século XX. A Arte Renascentista é um instrumento

de comunicação importante retratando histórias que valorizam a sociedade

para a qual é produzida.

Gombrich (1979, p.167) afirma que os habitantes da península itálica

conheciam o fato de que, muitos séculos atrás, Roma era a sede da capital de

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um poderoso império, centro do mundo antigo, desmantelado por tribos

germânicas, godos e vândalos. Acreditar na concepção de um renascimento

associa-se na mente dos romanos com a convicção de uma ressurreição da

grandeza de Roma coincide com o período de realizações lideradas pelas

aspirações humanistas no século XV. É o momento dos grandes feitos do

Renascimento Italiano.

Delumeau (1994, p.219) relata que o cenário histórico que envolve a

cidade de Florença e que domina a vida econômica do Ocidente nos séculos

XIV e XV, com suas três gerações de grandes companhias mercantis,

testemunha a prosperidade da cidade. Depois de passar por retrocessos

políticos, readquire a posição hegemônica na política, economia e na cultura

europeia. Entre os anos de 1434 a 1492 é dominada pelos homens da família

Médici, como Cosme, Pedro e Lourenço, o Magnífico, ambos protetores de

artistas.

Florença monopoliza a região da Toscana, as cidades de Pisa e

Livorno, sendo essas duas cidades usadas para o comércio marítimo. A rica

burguesia florentina usufrui dos grandes lucros no comércio com Veneza para

garantir sua hegemonia na região e ostenta um luxo para as demais cidades

construindo obras como a catedral de Santa Maria del Fiori, produto do

arquiteto Filippo Brunelleschi. A maestria dos artistas florentinos é conhecida e

admirada por outras cidades, esse fato permite a Florença exportar artistas e

criadores talentosos como Leonardo da Vinci.

A alta qualidade artística e o excelente nível de profissionalismo dos

artistas renascentistas estão registrados no extenso conjunto de obras que

chegam até nossos dias.

Janson (1996, p.164) relata dois eventos históricos que afastam os

papas de Roma: o exílio papal, em Avignon, França, que acontece entre 1309

a 1376, e, o Grande Cisma Papal, entre 1378 e 1417, quando o Papa regressa

a Roma. Diante deste panorama histórico, ressurge Roma, esquecida por tanto

tempo, agora, como nova sede do papado, com as ações deflagradas pelos

papas empreendedores, restituituem a Roma o posto de cidade de destaque no

plano político e cultural, tornando-se no final do século XV, um importante

centro protetor das artes.

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No Quattrocento e no Cinquecento, ocorre uma releitura da Arte

Clássica e seu universo de imagens materiais, arte produzida na arquitetura e

pintura pela civilização greco-romana, com ênfase no modelo do edifício

clássico, o arquétipo da unidade-coluna-viga.

Os pintores renascentistas desenvolvem uma extensa e perfeita

habilidade para retratar os componentes da arquitetura clássica, aplicando

como recurso o desenho em perspectiva linear, essa solução permite o registro

correto da realidade objetiva e detalha os componentes arquitetônicos.

Sevcenko completa que a criação da perspectiva matemática,

também chamada de perspectiva exata, em que todos os pontos do espaço

retratado correspondem a uma norma única de projeção.

Para a história das Artes e das culturas ocidentais, o texto vitruviano

constitui em canal direto com o mundo antigo, um elo com a antiguidade

clássica, um referencial absoluto para o trabalho de arquitetos e pintores.

Vitrúvio, ao escrever seu Tratado de Arquitetura, sobre a produção

artística trabalhada na arquitetura, pintura e escultura greco-romana, acaba por

determinar as diretrizes, ou melhor, os cânones da Arte Clássica que seriam

imortais para a cultura ocidental.

A Arquitetura que, pela pena dos humanistas, nasce naquele período apresenta-se como um retour à l’odre que invoca a retomada formal da “verdadeira arquitetura”, aquela que se encontrava ainda presente nas ruínas romanas, esparramadas pelas cidades da península itálica. Mas, as ruínas da Roma imperial só serviam, pelo menos até o século XV, como simples jazidas de onde extrais pedras para as novas construções. O que mudou foi uma forma de pensar e de ver essa realidade. Parte desta mudança de perspectiva se deveu a um ato fortuito: a descoberta, em 1416, no mosteiro de Sankt Gallen, de uma cópia do De Architectura libri decem (27 a.C), um tratado romano sobre arquitetura escrito pelo arquiteto Marcus Vitruvius Pollio. Aquelas ruínas passaram a ter uma significação enorme, estudadas sob a ótica deste tratado. Não só quando coincidiram com as descrições do romano, mas também quando não. (VÁZQUEZ RAMOS, 2011, p.535)

O tratado se revela como único documento europeu do período

greco-romano que chega até nossos dias e passa a ser um texto norteador

para outros escritos sobre construções de ordem hidráulica, hidrológica e

arquitetônica desde a época do Renascimento, como afirma Summerson

(2009, p. 9).

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O texto vitruviano inspira o pensamento renascentista italiano no

século XVI e mais tarde, os preceitos da Academia de Paris no Neoclassicismo

francês nos séculos XVIII e XIX.

Giorgio Vasari (2011, p.11), que vive entre 1511 e 1574, pintor,

arquiteto e teórico, escreve uma obra sobre os artistas renascentistas,

resultando na principal fonte de informação acerca da arte renascentista

italiana. A obra intitulada “Vidas dos Artistas” comenta sobre pintores,

escultores e arquitetos, surge em 1550 e tem uma 2ª edição, em 1568, explica

a renúncia ao antinaturalismo pelos artistas renascentistas, preconizado pela

tradição bizantina. Na percepção de Vasari, a história da arte italiana obtém

progresso, sendo seu auge no século XV e serve como base para pesquisas

posteriores.

O uso da perspectiva como meio para obter a realidade

A aplicação da técnica da perspectiva na produção pictórica permite

ao pintor renascentista retratar o espaço pictórico com profundidade, pessoas,

objetos, natureza, a arquitetura clássica, inclusive as ordens arquitetônicas e

seus componentes, com mais realidade e riqueza de detalhes, que veremos

nas obras a seguir: “Santíssima Trindade com a Virgem e S. João sob a Cruz”,

de Masaccio; A Aparição da Virgem a S. Bernardo, de Perugino e “Escola de

Atenas” de Rafael.

Sevcenko (1994, p. 32) relata que o pintor Albrech Dürer define

perspectiva como “ver através” e que consiste na impressão de olhar para uma

parede pintada e perceber que se vê para além dela, como se abrisse uma

janela para outro espaço. O espaço pictórico constitui o mais importante

resultado a ser obtido pelos artistas renascentistas. Contudo, falta à técnica da

perspectiva intuitiva introduzida por Duccio, Giotto e por mestres franco-

flamengos, um acabamento rigoroso, pois nem todas as dimensões do espaço

retratado são tratadas pela mesma orientação de profundidade.

A nova concepção diverge da pintura do estilo gótico ou bizantina

que privilegia o uso do plano bidimensional das paredes resultando apenas em

efeito decorativo que predispõe as pessoas a se verem no universo imaterial.

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Graças ao empenho de outros pesquisadores renascentistas no

estudo da perspectiva como Brunelleschi e Alberti, este novo recurso técnico

permite a capacidade de impressionar mais os sentidos do que a imaginação,

privilegia o exercício da percepção visual, multiplica o espaço dos interiores e,

com a preocupação de pintar pessoas, objetos e paisagens, consente a

retratação com a aparência mais natural possível, como se possibilitasse

multiplicar a própria vida, leva o homem a observar e identificar o próprio

homem no seu meio urbano e natural, o mundo terreno e concreto, dessa

forma, a arte renascentista obtém uma concordância maior com o modo de

vida implantado no Ocidente europeu, com o incremento das relações

mercantis e o desenvolvimento das cidades.

O mérito da criação da perspectiva matemática, ou perspectiva

exata, em que todos os pontos do espaço retratado obedecem a uma norma

única de projeção é em grande parte de Filippo Brunelleschi, arquiteto

florentino, por volta de 1420.

Sevcenko (1994, p.33) descreve que Brunelleschi, fundamentado no

teorema de Euclides, estabelece uma relação matemática proporcional entre o

objeto e sua representação pictórica, institui a técnica do “olho fixo”, que

observa o espaço como que através de um instrumento óptico e define as

proporções dos objetos e do espaço entre eles em relação a esse único foco

visual. Assim o plano do quadro é interpretado como sendo uma ‘intersecção

da pirâmide visual’ cujo vértice consiste no olho do pintor e a base na cena

retratada, estabelecendo-se desse modo uma construção geométrica rigorosa,

cujos, elementos e relações são matematicamente determinados. Esse método

tem imediata aceitação dos pintores por sua qualidade de lhes proporcionar

total controle do espaço representado, que foi denominado ‘construção

legítima’.

A técnica da perspectiva é aperfeiçoada pelo arquiteto Leon Batista

Alberti quando publica seu Tratado da Pintura em 1443 que consiste na

simplificação do trabalho do pintor propondo a elaboração da perspectiva de

acordo com dois esquemas básicos: planta e elevação, que são combinados

para produzir o efeito de profundidade pretendido. O método se difunde

rapidamente e se torna em uma das propriedades fundamentais da arte

renascentista e de todo Ocidente europeu até o início do nosso século.

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O resultado pictórico da utilização da perspectiva central, ou

perspectiva linear, é que todo espaço pictórico fica subordinado a uma única

diretriz visual, representada pelo ponto de fuga, ou melhor, quanto maior a

distância com que os objetos e elementos são percebidos pelo olhar do pintor,

tanto menores eles parecem no quadro, de maneira que todas as linhas

paralelas da composição tendem a convergir para o único ponto no fundo do

quadro, que representa o próprio infinito visual, alcançando a completa

racionalização do espaço e das figuras pintadas permitindo um resultado

pictórico uniforme e homogêneo onde nada escapa ao controle geométrico

matemático do artista.

A imagem pictórica é definida em razão dos dois referenciais

principais: o olhar fixo do pintor fora do quadro e o ponto de fuga no seu fundo.

Filippo Brunelleschi

A importância de Brunelleschi para a história da arte e de Florença

fica evidente quando conhecemos o ambiente histórico em que o arquiteto está

inserido no século XV. Esta conjuntura é composta por uma sucessão de

transformações urbanas e econômicas que envolve a cidade, Ross King (2013,

p. 14) descreve que no início daquele século, Florença mantém uma aparência

rural, por trás dos muros possui trigais, pomares, vinhedos e rebanhos de

carneiros que são levados pelas ruas até o mercado, próximo ao Batistério de

San Giovanni. A maior parte da riqueza é formada pela produção e

comercialização de lã, iniciada pelos monges Umiliati, logo que chegam à

cidade, em 1239. Fardos de lã inglesa, de qualidade superior, são levados dos

mosteiros de Cotswolds para serem lavados no rio Arno, penteados, cardados,

tecidos em teares de madeira e depois, tingidos, resultando nos tecidos mais

caros e procurados da Europa.

No decorrer do século XIV, com a riqueza econômica, Florença

vivencia uma escalada de construções inéditas, dentro dos muros citadinos

explora-se pedreiras de arenito de coloração marrom-dourada; a areia do rio

Arno, após a enchente, é dragada e filtrada para ser aplicada na produção de

argamassa para a edificação de diversos prédios como igrejas, mosteiros e

palácios particulares construídos por toda parte, e também, na instalação de

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novo anel de muralhas defensivas, com oito quilômetros de circunferência e

seis metros de altura, para proteger a cidade de invasores, que só são

concluídas em 1340. Além dessas edificações, também é construído um novo

palácio do governo, Palazzo Vecchio, composto por torre sineira de mais de

cem metros.

A catedral Santa Maria del Fiore, localizada na parte central da

cidade, está em construção desde 1296, tendo como responsável por sua

construção a Ópera del Duomo, fato que atrai para Florença muitos

trabalhadores e artesãos, como carroceiros, pedreiros, metalúrgicos,

cozinheiros, e até, vendedores de vinhos, para servirem os trabalhadores na

hora do almoço.

A praça que circunda a catedral, durante o dia, fica tomada pela

massa trabalhadora que inclui ainda, carregadores levando sacos de areia e

cal até os andaimes de madeira ou nas plataformas de vime edificadas acima

dos telhados dos prédios vizinhos.

King (2013, p.16) revela que, desde o início, a edificação da catedral

está conectada com o orgulho cívico quanto à fé religiosa; o governo florentino

pretende que a igreja tenha a maior grandeza, pronta a obra, deve ser

considerada o templo mais importante de toda Toscana.

Nos derradeiros cinquenta anos, a ala sul da catedral, que

permanece incompleta, contém uma maquete em escala da estrutura, medindo

15 metros de comprimento, compondo uma visão artística da catedral quando

pronta. No entanto, na maquete está o maior enigma a ser solucionado: a

construção da grande cúpula, sua edificação representa o maior impasse da

arquitetura da época, tanto para os próprios florentinos como para toda a Itália,

é neste episódio que aparece o arquiteto Brunelleschi na história da cidade.

Vasari (2011, p.225) cita que Filippo Brunelleschi, escultor e

arquiteto, nasce em Florença em 1377, filho de Brunellesco di Lippi, notário, e

Giuliana di Giovanni degli Spini, mas não segue a profissão paterna, já na

infância, seu pai ensina-lhe os princípios das letras, mas observa que o filho

procura coisas que exigem engenho e arte manuais, passa a ensinar o manejo

do ábaco e, mais tarde, manda-o aprender a arte da ourivesaria e o desenho

com um amigo seu, Benincasa Lotti. Em 1398 inscreve-se na Corporação da

Seda e na dos Ourives em 2 de julho de 1404. Sua genialidade é reconhecida

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mais tarde, representada por imensa clareza racional que causa perplexidade

em seus contemporâneos de mentalidade medieval.

Em 1401, descreve Vasari (2011, p. 230), é aberto o concurso para

refazer as duas portas de bronze da igreja e do batistério de San Giovanni, tal

intento é comunicado a todos os escultores que vivem na região da Toscana

que são convidados e recebem, cada concorrente, recursos e um ano de prazo

para a composição de uma cena, uma para cada escultor participante, entre

eles estão Lorenzo Ghiberti e Filippo Brunelleschi. As cenas são concluídas no

mesmo ano, todas belíssimas e diferentes entre si, contudo, algumas

apresentam bom desenho e são mal trabalhadas, outras, de excelente desenho

e diligente trabalho, mas sem boa distribuição da história e perspectiva das

figuras. Ghiberti tem sua cena julgada melhor por apresentar bom desenho,

diligência, invenção, arte e figuras muito bem elaboradas.

Após o resultado do concurso, por volta de 1402, Brunelleschi e

Donato partem para Roma e ficam alguns anos, segundo o autor, a viagem ou

viagens, são situáveis entre 1402 a 1406, onde Donato estuda escultura e

Brunelleschi, arquitetura.

Em Roma, Brunelleschi observa a grandeza dos edifícios e a

perfeição arquitetônica dos templos, tanto na cidade e no campo, mede tudo

que considera bom, como as cornijas e traça as plantas dos edifícios, sem

economia de tempo e dinheiro. Concentrado no estudo das ordens antigas da

arquitetura extinta e possui dois objetivos: trazer de volta a boa arquitetura e

encontrar a maneira para abobadar a cúpula de Santa Maria del Fiore de

Florença, para tanto, estuda todas as dificuldades existentes no Panteão

romano, para descobrir como construir de maneira perfeita uma abóboda.

Como autodidata realiza estudo contínuo, anota e desenha todas as

abóbodas antigas. Quando, por ventura, encontra pedaços enterrados de

capitéis, colunas, cornijas e alicerces, providencia para que sejam feitas

escavações até tocar o fundo. Sem dinheiro, arranja trabalho como engastador

de joias para ourives conhecidos, fica sozinho em Roma, pois Donato regressa

a Florença.

Brunelleschi observa e desenha todas as ruínas de todos os tipos de

construções romanas, templos redondos e quadrados, de oito faces, basílicas,

aquedutos, termas, arcos, coliseus, anfiteatros e todos os templos de tijolos,

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dos quais extrai os métodos de assentamento e amarração, bem como o modo

de girá-los criando abóbodas, a forma de interligar pedras, sua fixação com

pinos e dentilhões; e, descobre um buraco no meio de todas as pedras grandes

esquadriadas, chega ao ferro denominado de ulivella (instrumento de ferro

constituído por três cunhas inseridas numa campânula, usado para erguer

grandes pedras sem cordas), técnica que ele renova e coloca em prática

depois. Separa todas as ordens: dórica, jônica e coríntia, seu estudo

aprofundado permite que ele consiga imaginar Roma como era antes de

arruinar-se.

Ross King (2013, p. 35) afirma que após o resultado do concurso

das portas Brunelleschi renuncia à escultura e nunca mais trabalha com

bronze, sai de Florença para viver em Roma, onde passa a morar de forma

intermitente pelos 15 anos seguintes. Neste período se dedica completamente

ao estudo das ruínas romanas com régua e compasso procura tirar as medidas

exatas das estruturas para conhecer as relações de proporção que norteiam a

arquitetura antiga, ao analisar as proporções das colunas e frontões, descobre

as medidas específicas das três ordens arquitetônicas criadas pelos gregos e

depois imitadas e refinadas pelos romanos. As ordens arquitetônicas são

regidas por razões matemáticas exatas, uma série de regras de proporção que

regulam o resultado estético, como por exemplo, a altura de um entablamento

coríntio é igual a um quarto da altura das colunas que o sustentam, enquanto a

altura das colunas é dez vezes seu diâmetro.

Constata que o Coliseu usa as três ordens: dóricas no nível inferior,

jônicas no segundo e coríntias no alto e que, durante o governo de Nero,

depois do incêndio em 64 d.C., os romanos passam a empregar em suas

construções um novo invento, o concreto, o qual tem como segredo sua

robusteza presente na composição da argamassa que contém cinza vulcânica

espalhada pelos vulcões ativos, como o Vesúvio.

Denominado de concreto pozzolana, consiste na mistura da cinza

vulcânica com a argamassa de cal, obtendo um cimento robusto e de cura

rápida, ao qual é adicionado pedras esmigalhadas. O concreto pozzolana se

combina quimicamente com a água solidificando rapidamente, mesmo debaixo

de água. Brunelleschi descobre que este concreto é empregado na construção

da Casa Dourada de Nero e que possui como característica arquitetônica mais

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interessante a construção de um salão octogonal na ala leste, encimado por

uma cúpula de diâmetro medindo 10,67 metros. Esta forma octogonal chama a

atenção de Brunelleschi por saber que a cúpula projetada para Santa Maria del

Fiore, embora maior, também é composta de oito lados.

O desenho em perspectiva é semelhante à mensuração de objetos

porque determinam as posições relativas de objetos tridimensionais a fim de

representa-los em papel ou tela. A prática da mensuração e levantamento

topográfico já é desenvolvida e aplicada na época de Brunelleschi, sua

contribuição maior é o aproveitamento de seus princípios e técnicas na arte

pictórica.

A teoria das proporções norteia a racionalização do desenho

arquitetônico, para alcançar essa meta, Brunelleschi adota o vocabulário

padronizado e regular dos antigos, apoiado no círculo e no quadrado. Como

resultado da pesquisa por um método acurado para registrar um projeto

arquitetônico no papel descobre a perspectiva científica, que pode ser

visualizada nas obras a seguir apresentadas.

Conforme afirma Janson (1996, p.196), Brunelleschi abandona o

estilo gótico que envolve arcos quebrados, colunas em vez de pilastras e

abóbodas de berço e cúpulas de preferência às abóbodas de arestas. Devido à

desvantagem da arquitetura medieval ser inflexível, o arquiteto prefere o

retorno consciente ao vocabulário arquitetônico dos gregos e romanos, elege

os elementos da arquitetura greco-romana e aplica-os nas construções à

decoração antiga, a coluna clássica apresenta-se rigorosamente definida, sua

forma varia dentro de restritos limites de proporção, pois os antigos

comparavam a coluna ao corpo humano.

Escolhe o arco plena volta, que só tem uma forma possível, a do

semicírculo; a arquitrave e seus componentes, como o frontão e a cornija,

seguem rigorosamente as regras exatas das ordens da arquitetura antiga

composta por colunas dóricas, jônicas ou coríntias.

Para o arquiteto, é primordial construir uma obra de grande

consagração de sua autoria que fique registrado na história da cidade.

De acordo com Ross King (2013, p.52), assim que chega a Florença,

Bruneleschi se envolve no projeto da cúpula. Os dirigentes procuram suas

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opiniões desde seu retorno de Roma. Em maio de 1417 a Opera del Duomo

paga-lhe 10 florins por desenhos das plantas da cúpula, feitos em pergaminho.

Em 1418, em Florença, no dia 19 de agosto, é divulgado o concurso

para a construção da cúpula principal da catedral que já vinha sendo

construída durante mais de um século.

Imagem 12 Cúpula da Catedral Santa Maria del Fiore, Florença, Itália (Fonte:https://socialsciencesalpajes.wordpress.com/2014/04/27/images-about-architecture-of-

the-renaissance/) Acesso em: 27/10/2015. 11h15min

Vasari foi o primeiro a observar que a cúpula de ‘Santa Maria del Fiore’ não deve ser relacionada apenas ao espaço da catedral e aos volumes relacionados, mas ao espaço da cidade inteira e, portanto, a um horizonte circular, precisamente, ao perfil dos morros ao redor de Florença: ‘Vendo-a se elevar a tal altura, que as montanhas de Florença parecem seus semelhantes’. ....Em De re aedificatoria, Alberti dirá que os edifícios são objetos que estão num espaço cheio de outros objetos e que, como tais, não são muito diferentes das estátuas, tanto assim que a palavra “monumento” vale tanto para certas arquiteturas como para certas estátuas, ou esculturas em relevo pleno, contanto que tenham certo conteúdo histórico-ideológico. Como objeto arquitetônico, a cúpula não tem um interesse particular, segundo Alberti, que sequer diz que se trata da catedral florentina e de seu acabamento, e que, para dizer ‘cúpula’, diz, ao contrário, estrutura.

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Em suma, a extraordinária invenção de Bruneleschi, não é, no modo de ver de Alberti, um objeto arquitetônico, mas um imenso objeto espacial, vale dizer, um espaço objetivado, isto é, representado, pois cada representação é uma objetivação e cada objetivação é perspéctica porque dá uma imagem unitária e não fragmentária, o que implica uma distância ou uma distinção, bem como uma simetria, entre objeto e sujeito, de forma que a representação não é a cópia do objeto, mas a configuração da coisa real enquanto pensada por um sujeito. (ARGAN, 1993, p.95)

A grandeza da catedral e de sua cúpula rivaliza com as colinas de

Florença. É a comprovação da capacidade dos construtores florentinos, ou

seja, que possuem talento, criatividade e conhecimento técnico suficiente para

construir obras que se equivalem em tamanho e poder como a natureza.

Para este autor, a cúpula de Santa Maria del Fiore é concebida

atualmente como símbolo universal do espírito renascentista. De acordo com

os preceitos humanistas, a cúpula de Bruneleschi representa a capacidade

técnica e criativa do homem renascentista para transformar em realidade com

estrutura física e trazer a Florença a harmonia do universo celestial, antes

somente domínio de Deus.

Florença é capaz de atingir a perfeição divina e demonstra isso por

meio do trabalho do homem, que tem a capacidade criativa e técnica para

atingir e dominar o céu além da terra e trazer para a cidade a harmonia do

universo celestial.

A burguesia renascentista se representa, realiza a releitura, nomeia,

produz, sustenta e divulga a Arte Clássica, nos moldes do humanismo, como

seu símbolo de identificação. A arte produzida na Renascença Italiana, assim

como as descobertas e realizações de Bruneleschi, tornam-se a marca

registrada do poder e expansão da burguesia renascentista, tendo Bruneleschi

como criador não apenas de estruturas arquitetônicas, mas também produtor

dessa Arte. Arte concebida como ornamento ao poder e às realizações do

período renascentista concebida pelos burgueses.

Com as colaborações de Bruneleschi é possível concretizar Florença

como a cidade, ornamentada para expressar como a mais desenvolvida e

dinâmica do Quatrocento e em todo mundo.

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Leon Battista Alberti

Blunt (2001, p.13) explica que Alberti é um homem do período

Quatrocento, sua visão de vida corresponde à dos humanistas da primeira

metade do século XV.

Nasce em 1404 em Gênova. É educado no norte da Itália, onde

estuda direito em Bolonha. Em 1428 vai para Florença, onde passa o restante

de sua vida e segue a corte papal na qual ocupa um posto de secretário de

1432 a 1464.

O autor afirma que as novas ideias renascentistas estão

contempladas nos trabalhos escritos de Alberti que apresenta formação

intelectual com predomínio de caráter enciclopédico em todas as formas de

conhecimento, concebe uma teoria que abrange todos os campos da atividade

humana, aplica-se nos estudos na política, filosofia, ciência, do saber clássico e

das artes.

Especificamente no campo das artes escreve sobre pintura,

escultura e arquitetura. Suas ideias sobre artes estão em três obras: a primeira,

tratado sobre pintura, Della pintura di Leon Battista Alberti libri tre, escrito em

1436; o segundo, o mais importante desses tratados, consiste em dez livros

sobre arquitetura, De re aedificatoria, iniciado em 1450 e que continuou

fazendo acréscimos e alterações até a sua morte, em 1472. Ressalta que a

arquitetura é a arte que mantém um elo com as necessidades práticas do

homem, esta afirmação está exemplificada na teoria arquitetônica de ordem

social que concebe toda arquitetura como uma atividade cívica. A terceira obra,

De statua, escrito pouco antes de 1464, trata-se de um manual sobre escultura.

A teoria arquitetônica é descrita no prefácio de seu tratado de

arquitetura em que faz uma exaltação da mesma, estabelece os princípios da

arquitetura civil, destaca a glória que ela é capaz de trazer para a cidade em

termos de utilidade e ornamento. No quesito utilidade, Alberti ressalta que a

arquitetura, além de convir ao comércio, provê a cidade de defesa contra seus

inimigos, constrói máquinas bélicas e permite estender os seus domínios. No

âmbito do ornamento, por meio da arquitetura é possível adornar a cidade com

suntuosos edifícios públicos, com casas particulares e monumentos históricos.

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Alberti preconiza a definição mais completa de artista como homem

concentrado em uma ocupação científica, tal concepção norteia todo conjunto

de suas anotações; o pintor deve possuir todos os canais de conhecimentos

importantes para a prática de sua arte como história, a poesia e a matemática.

No tratado sobre pintura, o primeiro livro trata da matemática e à aplicação da

geometria à pintura na forma da perspectiva.

Alberti aplica as concepções humanistas na arte, a qual seria uma

atividade humana que expressa sua capacidade pela razão, assim como na

arquitetura, em que os edifícios são construídos para atender as necessidades

da vida como para a conveniência das ocupações dos homens, apresenta o

mesmo pensamento para com a atividade pictórica, destaca a pintura histórica,

ou seja, quaisquer pinturas de temas, mais importante em relação à pintura de

figuras individuais.

A pintura histórica é a mais nobre, por ser o gênero mais difícil e

complexo por demandar competência em todos os outros, mas também porque

permite uma visão das atividades do homem como uma história ilustrada.

Alberti acredita que ao observar uma pintura é como ler uma boa história,

porque os dois são pintores, um pintando com palavras e o outro com o pincel.

Uma pintura histórica afeta o espectador profundamente porque as emoções que ele aí vê representadas serão nele despertadas; ele ri, chora ou se arrepia na medida em que os que estiverem representados na pintura demonstrem alegria, tristeza ou pavor. Por essa razão, Alberti atribui grande importância à habilidade do pintor para explicar uma ação e para mostrar as emoções por meio de um gesto ou pela expressão do rosto. (BLUNT, 2001, p.24)

A pintura histórica tem o poder de sensibilizar emocionalmente o

espectador quando o pintor tem completo domínio sobre suas habilidades

desde manuais como a prática do uso dos pincéis para obter a pincelada exata

que pode estimular uma emoção; na elaboração da composição da pintura e

aplicação do recurso da perspectiva para obter a ilusão do espaço pictórico e

determinar a localização de cada personagem; na escolha das cores, suas

tonalidades e seus matizes adequados, segundo a visão e sensibilidade do

artista, para aplicação de acordo com o tema; na posição e no movimento das

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figuras retratadas para descrever com detalhe uma ação e, o próprio pintor, ter

um bom traço e ser bom retratista para expressar as emoções, como rir, chorar

ou odiar, nos rostos dos personagens retratados. É o conjunto harmônico de

todos esses elementos trabalhados na obra que tem a capacidade de

sensibilizar o espectador para a alegria, tristeza ou pavor.

A representação da realidade constitui uma façanha que é

conquistada por pintores renascentistas, um caminho lento e cheio de

obstáculos técnicos que aos poucos foram resolvidos pela habilidade dos

artistas renascentistas, ao longo do Quatrocento.

O recurso da perspectiva que dá profundidade ao espaço pictórico e

que valoriza e amplia ambientes internos das edificações pode ser visualizado

na representação pictórica de dois artistas: Masaccio, no afresco “Santíssima

Trindade com a Virgem e S. João sob a Cruz” e Pietro Perugino, com o

retábulo “A Aparição da Virgem a S. Bernardo”, que serão comentadas a

seguir.

Masaccio

Vasari (2011, p.218) cita que Tommaso di Ser Giovanni conhecido

como Masaccio é considerado o grande inovador da pintura italiana do século

XV, filho de Giovanni di Mone, notário, e de Monna Jacopa di Martinozzo,

nasce em San Giovanni Valdarmo, por volta dos 24 anos, inscreve-se na

Companhia de São Lucas. A solução científica da perspectiva e o racionalismo

de Brunelleschi são recursos que fundamentam a formação de Masaccio, mais

do que os exemplos pictóricos de seus contemporâneos, em sua breve vida,

falece aos 26 anos em 1428, constrói uma visão pictórica que transforma a

história da pintura dando nova dimensão e permite perceber o mundo com

estruturas reais, os céus têm nuvens, as figuras têm corpo, os seus pés estão

apoiados no chão e caminham num espaço firme, projetando sombra; o claro-

escuro é capaz de reconstruir plasticamente todas as formas que expressam a

verdade terrena e individual.

Como amigo do jovem pintor, Brunelleschi, relata Vasari (2011,

p.229), ensina-o a técnica da perspectiva linear, desenvolvida pelo arquiteto,

que é aplicada no afresco “A Santíssima Trindade, a Virgem, S. João sob a

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Cruz e os doadores”, um mercador e sua esposa, considerado o primeiro

trabalho pictórico a usar as novas regras da perspectiva linear.

Gombrich (1979, p.172) explica que o jovem gênio Masaccio, aos 27

anos, inova a pintura renascentista com a aplicação da perspectiva que amplia

o espaço pictórico onde estão as figuras retratadas, tal proeza resulta na

revolução da pintura do Quatrocencento. O mural quando exposto pela primeira

vez causa perplexidade nos florentinos ao observar uma fenda na parede em

que é possível ver uma nova capela.

A perspectiva possibilita retratar as figuras bem próximas do real,

conforme esclarece Gombrich (1979, p.173), são figuras maciças, com sólidas

formas angulares, contudo, elas se revestem de sinceridade, simplicidade,

grandiosidade e são comoventes, integradas na perspectiva e enquadradas na

arquitetura renascentista.

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Imagem 13

Santíssima Trindade com a Virgem e S. João sob a Cruz (http://noticias.universia.com.br/tempolivre/noticia/2012/10/08/973156/conheca-trindade-masaccio.html) Acesso em: 15/07/2014 – 00h10min.

Janson (1996, p.196) completa que se trata do mais antigo exemplo

de representação de um espaço pictórico racional. O cenário revela o domínio

total da perspectiva científica e da retratação da nova arquitetura de

Brunelleschi, ou seja, o emprego dos elementos da arquitetura clássica greco-

romana, como pilastras sustentando capitéis coríntios e o arco meia volta

apoiado em duas colunas com capitéis jônicos. A câmara com abóbodas de

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berço não é um simples nicho, mas representa um espaço profundo onde as

figuras podem mover-se livremente, caso desejem.

Este afresco resulta da capacidade racional do artista, consente,

pela primeira vez na história, deixar acessível a todos, os dados necessários

para avaliar a profundidade desse interior pintado, desenhar sua planta e

reproduzir a estrutura em três dimensões. O espaço pictórico racional é

independente das figuras, elas o habitam, mas não o criam; caso eliminemos a

arquitetura e estaremos eliminando o espaço das figuras. O autor conclui que a

perspectiva científica, ou linear está vinculada á arquitetura renascentista, tão

diferente da anterior, a gótica.

Pietro Perugino

Mas, para que seja mais bem conhecida a evolução desse artista, começarei do princípio, dizendo que, segundo é público e notório, na cidade de Perúgia, nasceu de gente pobre um filho que foi batizado com o nome de Pietro. Criado na miséria e na carência, foi dado pelo pai a um pintor de Perugia para trabalhar como contínuo; esse pintor não era muito talentoso, mas sentia grande veneração pela arte e pelos homens que nela primavam, dizendo sempre a Pietro que quem sobressai na pintura sempre recebe bons ganhos e muitas honrarias. (VASARI, 2011, p. 430)

Conforme afirma Vasari (2011, p.430), Pietro Cristoforo Vannucci,

nome de batismo, Perugino, nasce em 1452 em Città della Pieve, perto de

Perugia, na Úmbria, região localizada a sudeste da Toscana, na Itália, filho de

Cristoforo di Pietro di Giovanni e Lucia Berti. Morre em Fontignano, Itália, em

1523. É aprendiz de Benedetto Bonfigli, Fiorenzo di Lorenzo e de Niccolò da

Foligno. Também é orientado por Bernardino di Betto, pintor da cidade de

Perugia (1454-1513), estuda pintura, aprende a perspectiva ao analisar de

perto as obras de Piero della Francesca, e chega a se formar como artista por

meio do conhecimento das mais importantes obras do pintor, espalhadas pela

Úmbria, Marche e Toscana. Em Florença, por volta de 1471, é aluno de Andrea

Verrochio, sendo um dos primeiros artistas a trabalhar com a técnica a óleo.

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Imagem 14 A Aparição da Virgem a S. Bernardo

(https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4a/Perugino,_apparizione_della_vergine_a_san_bernardo,_monaco.jpg) Acesso em: 30/10/2015. 23h31min.

Gombrich (1979, p.238) revela que este trabalho corresponde a um

retábulo que retrata a cena em que a Virgem aparece para São Bernardo, o

santo ergue os olhos de seu livro para ver a Santa Virgem em pé diante dele,

no momento, quatro anjos estão também presentes. Todos os componentes

estão em concordância obedecendo aos cânones da pintura renascentista da

época. Nenhum elemento é rígido ou forçado na disposição quase simétrica,

formando uma composição harmoniosa. Cada uma das figuras movimenta-se

com serenidade e fluência.

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O autor diz que é nessa atmosfera que cresce o jovem Rafael, que

não demora em absorver e dominar a técnica de seu professor, Perugino,

como veremos a seguir.

Rafael Sanzio, pintor do Alto Renascimento

O Cinquecento corresponde à última etapa do Renascimento

italiano. Neste momento, ocorre um retrocesso político e econômico que afeta

diretamente a próspera Florença. Os ricos burgueses italianos perdem espaço

com as navegações portuguesa e espanhola que atingem o oriente e o novo

mundo enfraquecendo e desmantelando o monopólio turco-italiano no comércio

de especiarias que eram os pilares de sua riqueza e poderio.

Sevcenko (1994,p. 64) comenta que a arte italiana chega ao auge,

na produção pictórica destacam as obras de Leonardo da Vinci, Michelangelo e

Rafael, as quais servem de referencial para identificar o estilo renascentista e

os artistas anteriores passam a ser denominados de primitivos ou pré-

renascentistas. O conjunto da obra desses três pintores influencia os rumos da

arte ocidental até o século XX.

Eles assimilam as inovações técnicas e as descobertas formais

ocorridas desde Giotto e levam a elaborar um acabamento mais cristalino

configurado num estilo homogêneo, límpido, com densidade e repleto de

significações que transcendem os próprios limites temáticos das suas obras.

Gombrich (1979, p.238) relata que Rafael Sanzio, natural de Urbino,

província de Úmbria, é aprendiz na oficina do chefe da “escola úmbria”, Pietro

Perugino, artista habilitado para conseguir a sensação de profundidade sem

interferir no equilíbrio do desenho e tem a mestria para trabalhar a técnica do

sfumato de Leonardo da Vinci, técnica que permite evitar a aparência dura e

rígida em suas figuras. Perugino, professor de Rafael, é mestre pertencente a

uma geração de artistas bem sucedidos que necessitam de uma equipe

composta por diversos e competentes aprendizes para auxiliá-lo na execução

de várias encomendas que recebem. Rafael é considerado o artista que realiza

o que muitos artistas do Quattrocento tentaram: a obtenção da perfeita

harmonia na composição com figuras se movimentando livremente.

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É nesse contexto que o pintor se desenvolve, em 1504 vai para

Florença, período em que Leonardo e Michelangelo também competem e criam

novos padrões artísticos.

Janson (1996, p.219) ressalta que Rafael Santi ou Sanzio é

considerado o maior pintor do Alto Renascimento, visto como artista, gênio e

dono de temperamento flexível, é declarado como homem do mundo, sempre

recomendado aos mecenas influentes, vive entre 1483 e 1520.

Em 1508, Rafael vai para Roma trabalhar para o papa Júlio II, o qual

pede que decore as paredes de várias salas do Vaticano denominadas de

Stanze. Nas paredes e tetos dessas salas mostra sua habilidade no domínio do

desenho perfeito e da composição equilibrada.

Alguns anos depois, quando morre Júlio II, seu sucessor é o Papa

Leão X, membro da família Medici, esse encarrega Rafael de ser o arquiteto

responsável para concluir o empreendimento da edificação da nova Igreja de S.

Pedro, depois do falecimento de Bramante.

O afresco “Escola de Atenas”, de Rafael, localizado na Stanza della

Segnatura, no Vaticano, será analisado por apresentar a arquitetura clássica

retratada na pintura como elemento que evidencia o requinte e o poder perene

estabelecido pela Igreja Católica perante seus súditos e inimigos.

Escola de Atenas na Stanza della Segnatura

Desde que o papado faz seu retorno a Roma, tem como objetivo

maior se estabelecer e prosperar politicamente nesta cidade, para tanto,

recorre a diversos meios, lícitos e ilícitos de toda sorte.

A Igreja no século XVI, voltada para atingir sua meta, articula ações

que acontecem no contexto histórico, político e religioso, como também, na

arte, mais exatamente, na arquitetura e na pintura renascentista, como

estratégia para enfatizar e disseminar seu poder, riqueza e conquistas.

Burkhardt (2009, p214) assegura que, pela ação determinada de

Júlio II em estabelecer o papado em Roma sob quaisquer circunstâncias que

sejam necessárias, denomina-o como salvador do papado. Conhecedor das

ações políticas de seu tio Sisto para mantê-lo, consegue criar uma visão vasta

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e articulada das circunstâncias, fundamentos e condições da autoridade papal

que norteiam seu próprio pontificado.

Para deixar a marca de sua forte personalidade e determinação

política em construir um espaço perene para a Igreja na história, planeja a

reconstrução da Catedral de São Pedro.

É lícito pensar que o empreendimento do novo São Pedro é parte de uma ‘ideia’, ou seja, de uma concepção global entusiasticamente aceita, mas cuja articulação concreta e ajuste dos projetos revelaram-se laboriosos. Essa ‘ideia’ era o valor do plano central absoluto; ela concluía as especulações de toda uma geração sobre propriedades artísticas e o valor simbólico do ‘Templo ideal’, ela impunha-se para Roma. (CHASTEL, 2012, p.581)

Reconstruir São Pedro para o papado significa concebê-lo como o

Templo máximo da cristandade e estabelecer raízes profundas para a fé

católica na cidade que já foi sede e símbolo de poder e conquista no passado.

Roma, no momento encontra-se desgastada, contudo, agora como sede da

Igreja Católica, passa por uma longa reformulação urbana recobrando sua

posição de metrópole importante no contexto histórico. A arte, mais

precisamente, a arquitetura, escultura e a pintura dos grandes mestres definem

este panorama.

Janson (1996, p. 219) esclarece que, a conselho de Bramante, na

ocasião em que Michelangelo começa a pintar o teto da Capela Sistina, Júlio II

convoca Rafael, em 1509, que vem de Florença para decorar uma série de

aposentos do Palácio Vaticano, a sequencia das Stanze, assumindo a direção

da decoração da Stanza della Segnatura.

O talento e maestria de Rafael são colocados á prova na decoração

da Stanza della Segnatura, onde todo o conhecimento e rigor técnico

renascentista são empregados para decorar com o universo de imagens

materiais da arte clássica greco-romana com a finalidade de dar vida ao

‘espelho doutrinal’ da cristandade, sob o comando da política pontifical de Júlio

II.

Neste local, os afrescos de Rafael referrem-se aos quatro domínios

do aprendizado: Teologia, Filosofia, Justiça e Poesia. Desses afrescos, “Escola

de Atenas” é reconhecido como a mais perfeita glorificação do espírito clássico

do Alto Renascimento.

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A marca de sua genialidade deve ser buscada na maneira como meditou esse projeto de cultura e desenvolveu suas conquistas artísticas. A sequencia dos esboços revela aperfeiçoamentos laboriosos: apreende-se ali tanto a espantosa capacidade de assimilação de Rafael como seu talento para tornar sensíveis as noções intelectuais por meio de procedimentos poéticos. Em seus desenhos, ele busca o aperfeiçoamento das particularidades fisionômicas e das atitudes, atentando para a relação entre elas e a sua continuidade expressiva: ‘O valor desses afrescos não reside na criação do detalhe, e sim na organização dos grupos. Tal como na Sistina, é a exigência clássica de subordinar integralmente o detalhe ao conjunto, mas de modo quase oposto. O essencial aqui está no jogo das relações: não há elemento perdido, inativo ou isolado, ‘o que se vê é uma quantidade de belos motivos harmônicos ligados entre si, por uma simetria evidente ou velada, ou por contraposto’. O espaço é o símbolo direto do universo espiritual e a perspectiva, um princípio de hierarquia inteligível. As figuras se distribuem como sem esforço dentro de uma construção cujo ponto de fuga coincide com o dado fundamental a ser ilustrado: a Eucaristia no Triunfo do Santíssimo Sacramento, o par Platão-Aristóteles na Escola de Atenas, a figura de Apolo no Parnaso. A partir desse topo ideal, dessa ‘ponta fina’ da visão, cada composição se deduz sem confusão. (CHASTEL, 2012, p.596)

Os afrescos criados para a Stanza obedecem aos cânones da arte

clássica, como a proporção, unidade, equilíbrio e harmonia que, por sua vez,

estão integrados pela perspectiva científica, organizam todas as figuras e

elementos, retratados com suas peculiaridades, sem estarem isoladas, mas

interligadas entre si, criando uma composição coesa, sólida e única.

Muitas obras realizadas dentro da inspiração da arte clássica greco-

romana, ao serem analisadas, há enfoque nos seus personagens. Contudo, o

afresco “Escola de Atenas”, que representa a Academia de Platão, centro de

estudos de matemática, filosofia, artes e ciências que durou nove séculos,

desde a Grécia antiga, destruída pela intolerância cristã, possui foco na

arquitetura retratada na pintura, que ocupa praticamente todo espaço pictórico,

como se fosse um personagem também, constitui componente importante da

visão humanista.

Congregar todos dos filósofos gregos representantes do

pensamento renascentista, fundamentado nos seus estudos e ensinamentos,

na mesma pintura, significa elaborar o retrato perfeito do espírito da

Renascença.

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As figuras e elementos retratados no afresco “Escola de Atenas”

constituem um todo envolvido num trabalho comum, a criação do conhecimento

científico pelo raciocínio humano, está distribuído harmonicamente dentro da

edificação clássica, que também se constitui símbolo da realização da

inteligência humana, celebra o pensamento humanista e transmite solenidade,

requinte, conquista e consagra o poder estabelecido pela política pontifical.

Imagem 15 A Escola de Atenas

(http://revistavilanova.com/etica-e-felicidade). Acesso em: 31/10/2015. 00h47min.

Chastel (2012, p.600) acrescenta, quanto à perspectiva, o centro da

composição é um ponto ideal centrado entre as cabeças dos dois personagens

centrais: a silhueta delas se acomoda precisamente na arcatura do fundo

destacada sobre o céu, e essa arcatura é reproduzida pela extensão do pórtico

central. Explica que as arcadas fechadas de abóbodas de arco pleno lembram

a basílica de Constantino. Este templo é adornado com nichos, baixos-relevos

e estátuas que o transformam numa arquitetura expressiva que evidencia a

morada do saber. O cenário arquitetônico reflete a escala, esplendor e

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harmonia dos ideais da Alta Renascença, que busca expressar sempre valores

sobre-humanos. Rafael aplica no desenho elementos da sóbria ordem dórica.

Quatro arcos plenos evidenciam aspectos da arquitetura da antiguidade.

A presença das estátuas de Apolo e Minerva está relacionada com o

conjunto de pensadores retratados na obra “Escola de Atenas”. Apolo, na sua

origem, o culto do deus, não é grego, mas indo-europeu, contudo, representa a

luz e o triunfo da inteligência sobre as trevas da barbárie: personifica as

conquistas da civilização na existência prática e nas artes. Os gregos atribuem

diversas funções como conduzir pastores, multiplicar colheitas, encaminhar os

navegantes, iluminar os artistas e as artes, proteger os médicos, zelar pela

saúde, desvendar o futuro, afirma CHASTEL (2012, p.601)

Quanto a Minerva, deusa da sabedoria, padroeira das artes úteis e

ornamentais, tanto dos homens, como a agricultura e a navegação, quanto as

das mulheres, como fiação, tecelagem e os trabalhos de agulha; também é

divindade guerreira que só protege a guerra defensiva e não se simpatiza com

violência e derramamento de sangue.

Os dois deuses mitológicos dispostos simetricamente, de acordo

com suas atribuições, sacramentam e acompanham as realizações do intelecto

humano nas ações dos pensadores retratados.

O autor observa que o gesto horizontal de Aristóteles representa a

organização do mundo pela Ética e o gesto vertical de Platão, o movimento do

pensamento cosmológico que se ergue do mundo sensível para seu princípio

ideal. A posição das mãos de ambos significa o idealismo e o realismo,

doutrinas filosóficas da Grécia antiga. Diz que os filósofos da antiguidade estão

representados de modo a mostrar o antagonismo das suas ideias, esta

representação reafirma o conceito do humanismo renascentista.

A pintura representa o conjunto dos pensadores gregos cada um em

seu campo de atividade e sua contribuição para a formação do conhecimento

humano. A perspectiva, situada na altura dos olhos do observador, permitindo

a este, ter a sensação de realidade e que está integrado à cena, projeta um

espaço com profundidade e amplitude para acomodar todos os personagens

ilustres.

A obra “Escola de Atenas” é o testemunho da consagração do

raciocínio humano, a concretização das concepções renascentistas, mais

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precisamente, registra o resultado do desenvolvimento do percurso do

pensamento renascentista na ciência, na filosofia humanista e nas técnicas

artísticas descobertas para representar a realidade, a perspectiva científica que

é capaz de dar vida própria à arquitetura clássica retratada.

A releitura da arte clássica greco-romana realizada pelos homens do

renascimento italiano ressalta o pensamento humanista e evidencia a política

da igreja católica de disseminar a ideia de poder estabelecido, que é

completamente sustentada pela burguesia que dominava o comércio da região.

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CAPÍTULO III

O NEOCLASSICISMO FRANCÊS

Contexto histórico

Se a era moderna nasceu durante a Revolução Americana de 1776 e a Revolução Francesa de 1789, esses eventos cataclísmicos foram precedidos por uma revolução do pensamento que tinha começado meio século antes. Seus porta-bandeiras foram os pensadores do Iluminismo na Inglaterra e na França – Hume, Voltaire, Rousseau, e outros que proclamavam que todas as atividades humanas deveriam ser dirigidas pela razão e pelo bem comum, mais que pela tradição e pela autoridade estabelecida. Nas artes, assim como na economia, na política e na religião, esse movimento racionalista voltou-se contra a prática dominante: o Barroco-Rococó, enfeitado e aristocrático. Na metade do século XVIII, o apelo a uma volta à razão, natureza e moralidade na arte significou um retorno aos antigos, afinal de contas, não tinham sido os filósofos clássicos os primeiros apóstolos da razão? (JANSON, 1996, p.303)

É possível constatar a articulação de fatores de ordem filosófica,

política, econômica e cultural que contribuem para a formação do estilo

neoclássico na segunda metade do século XVIII.

Os pensadores iluministas, protagonistas dessas mudanças,

consideram primordial que as atividades exercidas pela sociedade humana

devem visar o bem coletivo, norteadas pela razão. Como consequência, essas

ideias influenciam o mundo político, econômico, religioso, a ciência histórica,

como a arqueologia e as críticas contra o absolutismo levam a nascer uma

ideologia burguesa que contesta o poder reinante.

Na Arte, os preceitos iluministas propiciam questionamentos, não

escapando de debates que repercutem nas suas teorias estéticas contra os

princípios da arte dominante na época, a Arte Barroca e o Rococó, concebida

como estilo exagerado que representa a elite, disseminados pela Igreja católica

como divulgadores da fé.

Na segunda metade do século XVIII, as ideias do pensamento

iluminista convergem para uma concepção moral da arte e relembra que os

filósofos antigos são os primeiros defensores da razão.

Guinsburg (1999, p.27) completa que no pensamento filosófico, as

ideias de Descartes (séculos XVI-XVII), símbolo do racionalismo do período do

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classicismo, na sua obra “Discurso do Método” salienta a era da Razão,

fundamentada no modelo da geometria dos antigos, que considera instrumento

de todo conhecimento demonstrativo, ou seja, racional, seguro e legítimo.

Simultaneamente à retomada da Razão dos antigos, Descartes

concebe a Razão como característica do classicismo e ressalta que o método

orienta-nos a pensar, a dirigir o pensamento com a finalidade de obtermos

verdades ignoradas. Raciocinar é raciocinar pela ordem das razões que

possibilita a aquisição do mundo, sua maior meta é ver o homem como mestre

e dominador da Natureza e isso só pode se concretizar por meio da Razão

imperante.

A França deu o primeiro grande exemplo, o conceito e o vocabulário do nacionalismo. A França forneceu os códigos legais, o modelo de organização técnica e científica e o sistema métrico de medidas para a maior parte dos países. O final do século XVIII foi uma época de crise para os velhos regimes da Europa e seus sistemas econômicos, e suas últimas décadas foram cheias de agitações políticas, às vezes chegando a ponto da revolta, e de movimentos coloniais em busca de autonomia. Em primeiro lugar, ela se deu no país mais populoso e poderoso Estado da Europa. Em 1789, cerca de um em cada cinco europeus era francês. Em segundo lugar, ela foi diferentemente de todas as revoluções que a precederam e a seguiram, uma revolução social de massa, e incomensuravelmente mais radical do que qualquer levante comparável. Em terceiro lugar, entre todas as revoluções contemporâneas, a Revolução Francesa foi a única ecumênica. Seus exércitos partiram para revolucionar o mundo; suas ideias de fato o revolucionaram. E suas origens devem, portanto, ser procuradas não meramente em condições gerais da Europa, mas sim na situação específica da França. (HOBSBAWM, 1998, p.71)

No âmbito político e econômico, as consequências da Revolução

privilegiam a classe social da burguesia que inspira uma nova era norteada nos

valores burgueses: a conquista, glória, moral e o bem comum, favorecendo

suas ambições comerciais e estimulando a renovação e modificação no

comportamento da sociedade europeia.

A releitura da Arte Clássica realizada pelo estilo Neoclássico, entre a

segunda metade do século XVIII e início do XIX, ressalta o requinte e a glória

do poder estabelecido pela burguesia.

Gombrich (1979, p.378) afirma que com a vitória do estilo

neoclássico, assegurada após a Revolução Francesa e oponente ao estilo

barroco e rococó, este concebido como estilo dos palácios e da aristocracia,

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torna-se arte do passado que acaba de ser deixado para trás. Os homens

ligados à Revolução se consideram cidadãos livres de uma Atenas revivida.

Tema comum a toda arte neoclássica é a crítica, que logo se torna condenação, da arte imediatamente anterior, o Barroco e o Rococó. Adotando a arte greco-romana como modelo de equilíbrio, proporção, clareza, condenam-se os excessos de uma arte que tinha sua sede na imaginação e aspirava despertá-la nos outros. (ARGAN, 1992, p. 21)

Argan concorda com as concepções de Gombrich e acrescenta que,

com a cultura francesa da época da revolução, o modelo clássico assume um

sentido ético-ideológico e serve como resposta ideal ao conflito entre liberdade

e dever; e, atinge o valor absoluto e universal, sobrepondo-se e extinguindo as

tradições e as “escolas” nacionais. O universalismo supra-histórico é divulgado

em todo continente europeu e maximiza-se com o império napoleônico.

A partir da metade do século XVIII, os períodos históricos são

teorizados, a ordem dos fatos é sistematizada para ordem das ideias ou

modelos, os tratados renascentistas e barrocos são abandonados e trocados

por uma reflexão intelectual séria e profunda com nível teórico superior, pela

filosofia da arte.

O conceito de arte absoluta é articulado como modo de ser do

espírito humano, um ideal almejado a ser sempre alcançado, mas não será

possível, pois quando atingido acaba o conflito, a tensão, e, portanto, a própria

arte.

Argan (1992, p.11) explica que o clássico desenvolve-se no mundo

mediterrâneo no qual a relação dos homens com a natureza é clara e positiva e

se constitui um referencial na concepção de mundo e da vida, no pensamento

clássico da arte como mimese corresponde os dois planos do modelo e da

imitação. Com a articulação da estética ou filosofia da arte, a atividade do

artista deixa de ser concebida como recurso do conhecimento do real, de

transcendência religiosa ou exortação moral e leva à crise da percepção da

arte como dualismo da teoria e da práxis; o intelectualismo e tecnicismo; a

atividade artística torna-se uma experiência primária e não mais derivada, sem

outros fins além do próprio fazer-se. O autor ainda afirma que no momento em

que acontece a autonomia da Arte, questiona-se sua posição perante as outras

atividades, como seu lugar e sua função no panorama cultural e social da

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época e o artista assume essa autonomia e completa responsabilidade do seu

agir e sua realidade histórica, quer ser do seu tempo, optando em abordar nos

trabalhos as temáticas e problemas atuais, ou seja, adota postura racional em

relação à história e à realidade natural e social. O artista deixa de devanear e

vai passar a retratar fatos históricos e contemporâneos.

Argan (1992, p.12) Para o pensamento Iluminista, o homem, dono

da razão, do conhecimento cognitivo e da ideologia, que vive na natureza,

local da existência humana, antes considerada como forma ou figura criada de

modo definitivo e sempre igual a si mesma, que pode ser somente

representada ou imitada, agora, se conscientiza da capacidade que tem para

mudar a realidade objetiva por meio de atividades concretas da tecnologia

moderna, como arquitetura e da decoração, que não obedece à natureza, mas

a transforma e é percebida pelos homens por meio dos sentidos, apreendida

pelo intelecto como imagem concebida na mente, como gostaria que fosse tal

realidade e modificada com o agir.

Entre os séculos XVII e XVIII ocorrem diversos fatos históricos de

ordem cultural que incentivam o aparecimento do neoclassicismo, citam-se,

como exemplo, os depoimentos de viajantes, que vão até as ruínas greco-

romanas, as escavações de Herculano e Pompéia, a influência do pensamento

filosófico dos iluministas e publicações de estudiosos e pesquisadores sobre a

Antiguidade Clássica.

A releitura da cultura clássica greco-romana realizada no período do

Renascimento Italiano termina no século XVI, contudo, no século XVII, o

interesse pela civilização grega continua com os testemunhos dos diversos

viajantes que vão até os territórios em que se encontram as ruinas.

Mirabent (1991, p.10) explica que são vários os motivos dos

viajantes, existem aqueles que viajam por amadorismo e alguns, por interesse

arqueológico os quais mediam e desenhavam os monumentos. Essas

numerosas viagens resultam na publicação de livros e artigos sobre a arte

antiga e aumentam o interesse e admiração pela cultura clássica grega, o que

contribui para sua revalorização. Os viajantes acreditam que o contato direto

com a Grécia e suas ruinas permite um aprofundamento no cerne da cultura

grega.

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Viajantes como, por exemplo, Stuart e Revett, com apoio da Society

of Dilettanti, divulgam quatro livros sobre monumentos clássicos. Em 1674, J.

P. Babin publica um trabalho pioneiro, um livro sobre Atenas, apresentando

referências aos monumentos da capital grega.

Ainda sobre o século XVII, Guinsburg (1999, p.304) afirma que na

França, em 1671, é criada a Academia de Arquitetura, responsável por

organizar um “corpus teórico”, um código de preceitos para a arquitetura.

Entretanto, os participantes da Academia ficam excluídos da função de

construção, compete a eles a incumbência de organizar uma teoria que guie a

elaboração arquitetônica. No final do século XVII, a Antiguidade motiva um

método orientado pela aplicação das ordens arquitetônicas como a forma mais

segura para obter a harmonia. Esse cânone é concebido como atemporal e

legitimado pelo conhecimento dos antigos.

No século XVIII, Mirabent (1991, p.9 e 10) relata que o interesse

desenvolvido pelo mundo clássico, desde o final do século XVII, tem sua

continuidade quando Shaftesbury (1671-1713), defende uma reavaliação do

mundo grego devido à sua convicção que nele encontram-se as respostas

necessárias para os problemas estéticos de sua época.

O mundo greco-romano chega aos homens do século XVIII por meio

das obras de Vitrúvio, Serlio, Scamozzi e Palladio, contudo, à proporção que o

século avança, a informação sobre a Antiguidade vai sendo enriquecida e as

concepções desses arquitetos, antes concebidas como paradigmas do

classicismo romano desde o Renascimento são relegados a segundo plano.

Mirabent (1991, p.15) explica que a Itália, no princípio do século

XVIII, é incluída no itinerário dos viajantes, Roma é classificada como cidade

importante por possuir obras helenísticas. Os viajantes, além do interesse pela

Antiguidade greco-romana, colocam sua atenção nas valiosas coleções

europeias como forma de obter conhecimento, entre as coleções de destaque,

está a coleção Medici. Como exemplo, lorde Tommeley inicia sua coleção de

esculturas da arte clássica.

O viajante Julien David Leroy publica em 1758 o livro “As ruinas dos

melhores monumentos da Grécia” que possibilita conhecer uma sinopse de

obras clássicas que propiciam a concretização de uma série de projetos

arquitetônicos.

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Outro importante dado explicado por Mirabent (1991, p.11) sobre as

interpretações do mundo da antiguidade é que Giambattista Piranesi (1720-

1778), arquiteto e gravador veneziano, destaca o mundo romano em seus

trabalhos. Este estabelece-se em Roma em 1744, quando as ruínas romanas

tornam-se fonte de inspiração possibilitando realizar um estudo detalhado e

exercitar efeitos de luz e sombra em seus desenhos. Piranesi confecciona uma

série de águas-fortes em que apresenta as ruínas romanas com aspectos que

lembra a antiga grandeza de Roma e lança três obras que expressam sua

posição pessoal em que considera o legado romano superior ao legado grego.

A primeira em 1756, “Antichità Romana”, e a segunda, em 1761 com o título

“Della Magnificenza ed Architettura dei Romani” e a terceira, pelo trabalho

“Parere sul’ Architettura”, em que apresenta a concepção de um novo estilo

orientado pela arquitetura romana.

A divulgação de seu trabalho torna-se eixo norteador para

arquitetos, entre eles, Soufflot, autor do Panteão de Paris, considerado o

primeiro edifício verdadeiramente neoclássico.

As escavações de Herculano e Pompéia

Argan (1992, p.22) esclarece que com a descoberta das ruínas das

construções das prósperas cidades romanas de Herculano e Pompéia,

soterradas pelas cinzas da erupção do Vesúvio em 79 d.C., evidenciam sua

ornamentação, os hábitos e costumes da vida cotidiana que permitem precisar

e aprofundar a ideia de clássico.

As pinturas na técnica do afresco, encontradas nas residências de

Pompeia e Herculano possibilitam o estudo mais conciso da pintura antiga.

Mirabent (1991, p.11) completa que a arqueologia colabora para a

recuperação da arte clássica, as escavações das cidades antigas de Herculano

(1738) e Pompéia (1748) foram realizadas sob as ordens do rei, Carlos de

Bourbon, ou seja, Carlos VII, rei das Duas Sicílias, a pedido de seu ministro

Bernardo Tanucci. A autora esclarece que o empenho pela Antiguidade

Clássica baseia-se em objetos e pinturas, a arquitetura é tema de pesquisas

posteriores. Os achados arqueológicos são relatados numa obra chamada

“Antiguidade de Herculano”, esta publicação permite uma transformação no

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campo da ornamentação, pois os objetos encontrados contribuem como base

para o desenho decorativo.

J. J. Winckelmann

C.W. Ceram (1960, p.24) descreve Johann Winckelmann (1717-

1768) como homem erudito do século XVIII, com sensibilidade, pensamento

acessível e olhar atento para aplicar-se com acuidade aos fatos, detentor de

sabedoria para unir o alto apreço à beleza da arte antiga com os métodos da

pesquisa científica, dedica os últimos vinte anos de sua vida à pesquisa da

cultura da antiguidade, mais precisamente, sobre a arte clássica.

Publica em 1755 “Reflexões sobre a imitação das obras gregas” que

preconiza a divulgação da “nobre simplicidade” e da “serena grandeza” do

mundo antigo. Seus textos, qualificados com valor historiográfico e pela

relevância das convicções artísticas são vistos como padrões em direção à

Antiguidade Clássica. Em 1759, é nomeado inspetor das coleções do cardeal

Albani. Em 1762, publica a primeira Circular em que relata as descobertas de

Herculano, em 1763, torna-se inspetor-geral de todas as antiguidades de Roma

e arredores, conhece e estuda Pompeia e Herculano e, em 1764, publica a

segunda circular e sua obra intitulada “História da Arte da Antiguidade”,

trabalho que expõe, por meio de uma perspectiva ordenadora, a grande

quantidade de monumentos antigos e explana sobre o trabalho do historiador

dedicado à análise dos movimentos culturais, também, possibilita ao mundo

letrado europeu o acesso a uma série de informações sobre os ideais antigos.

Esse trabalho primoroso define o século XVIII como o século do “classicismo”.

Nas concepções de Guinsburg (1999, p.308), Winckelmann é o

primeiro pesquisador a aplicar o método histórico ao estudo das obras de arte

em que interpreta a história como uma série de períodos de desenvolvimento e

decadência, não é apenas um teórico, mas o fundador da arqueologia, como

arqueólogo, consolida o retorno ao antigo, é considerado poeta do movimento

neoclássico e concebe a Grécia como referência cultural.

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O Neoclássico e a arquitetura

Argan (1992, p.25) esclarece que o essencial na Arte Neoclássica,

seja na arquitetura, nas artes figurativas ou aplicadas é a idealização ou projeto

da obra, ou seja, o traço, existe na folha onde o artista o faz, é o desenho que

transforma o dado empírico em fato intelectual. Pela visão neoclássica, a

formação cultural e habilidade do artista são concebidas com relevância e que

devem ser desenvolvidas nas escolas públicas especiais, as academias.

Dentro das academias, o aspirante a artista neoclássico inicia seu aprendizado

com atividades práticas como desenhar cópias de obras antigas, o aluno deve

acatar o modelo sem emoções pessoais e ser preparado para expressar a

resposta emotiva obedecendo termos conceituais.

Mirabent (1991, p.3) ressalta que a imitação de modelos da Grécia e

de Roma atua como meio para obter uma arte asséptica e impessoal, dentro

deste contexto, as cidades de Roma e Paris tornam-se dois núcleos

fundamentais para o regresso à arte clássica. Contudo, o estilo neoclássico vai

além da ingênua reprodução da arte clássica, porque no âmbito da arquitetura,

procura encontrar e aplicar novas alternativas de soluções por intermédio das

propostas das obras construídas.

Essa concepção da arquitetura como uma ampliação de regras simples e rigorosas estava fadada a atrair os luminares da Era da Razão, cujo poder e influência continuavam a crescer em todo o mundo. Também na França a vitória do estilo neoclássico foi assegurada depois da Revolução Francesa. Quando Napoleão, posando como o paladino das ideias da Revolução, subiu ao poder na Europa, o estilo neoclássico de arquitetura tornou-se o estilo Império. (GOMBRICH, 1979, p.378)

O autor elucida que o estilo neoclássico corporifica o período de

mudanças e renovações resultantes da Revolução Francesa, concebido pelo

pensamento racionalista, tais ideias se refletem na arquitetura. No período de

Napoleão a arte clássica é vista como símbolo do poder oficial.

Segundo Mirabent (1991, p.19) a arquitetura neoclássica constitui

uma arte intelectual preconizada pelo domínio da deusa da Razão sobre o

mundo subjetivo, quanto ao aproveitamento dos elementos da arquitetura

clássica, descreve, a seguir, aspectos relevantes adotados pelo estilo

neoclássico.

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Nas edificações são aplicados frontões, colunatas e átrios, com

capitel dórico, jônico ou corítio, com realce da coluna e do dintel (elementos

essenciais da arquitetura grega). Contudo, diferenciando da arquitetura

renascentista, a neoclássica jamais sobreporá as ordens arquitetônicas,

usando somente uma em cada construção.

Mirabent (1991, p.17) destaca que priorizando a intenção

racionalista que pressupõe o funcionalismo, a construção neoclássica procura

formas simples, proporcionadas, simétricas; sugerem plantas claras em sua

distribuição, estruturados no conjunto de princípios adaptados a um

determinado objetivo, que obedece a métodos, cláusulas e raciocínios lógicos;

buscando em seu interior, o conforto e bem estar. Outro aspecto que marca a

edificação neoclássica é o planejamento, concebido com grandiosidade e

autoridade, a vontade de expressar solidez e poder possibilita a idealização de

habitações de tamanhos consideráveis, com dominância de linhas horizontais

que prevalecem sobre as verticais, constituindo uma arquitetura compacta. Em

relação à arquitetura barroca, diferencia nos seguintes aspectos,

primeiramente, por preconizar a confusão e a diversidade, a neoclássica prima

pela tendência à coesão e recupera a nitidez do contorno na criação dos

volumes arquitetônicos, nas elevações, seções e plantas, as quais privilegiam

as formas quadradas, retangulares e centralizadas. Em segundo, a arquitetura

a neoclássica permite a autonomia aos elementos decorativos, delimitando

espaços exclusivos para a pintura e escultura sem que haja miscigenação.

Na Antiguidade, a arquitetura clássica está presente nos edifícios

públicos representados exclusivamente por templos. Entretanto, na segunda

metade do século XVIII e início do XIX, nas fachadas neoclássicas, o exterior

da construção, procura expressar efeitos de imponência e de força,

transformando a tipologia exterior do templo clássico em tipologia fundamental

a ser aplicada a todas construções, sejam igrejas, palácios, teatros, bolsas

mercantis ou câmaras parlamentares.

Mirabent (1991, p.19) ressalta que nas edificações neoclássicas

observa-se a renuncia à aplicação de contrastes cromáticos e efeitos pictóricos

e prefere obter a estabilidade, a solidez e a consistência de volumes por meio

da nobre simplicidade com emprego e valorização de materiais como o tijolo, a

pedra, o mármore branco, a pedra calcária e o granito.

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Argan (1992, p.21) acrescenta que Lodoli e Milízia defendem

princípios como, além da adequação lógica da forma à função; a sobriedade do

ornamento, o equilíbrio e a proporção dos volumes, focando suas metas nas

necessidades sociais e econômicas da sociedade. Para alcançar tais metas, a

técnica não resulta da inspiração, habilidade e virtuosismo individual, agora,

compreendida como instrumento racional que a sociedade constrói e

aperfeiçoa para suas necessidades e que deve usufruir dela.

Para Argan (1992, p.22) essas reflexões levam a pensar sobre o

conceito de cidade, não como propriedade da Igreja e das famílias poderosas,

mas como resultado da expressão visível de uma coletividade norteada pelo

caráter racional que quer concretizar suas perspectivas de desenvolvimento. A

razão, não é um elemento abstrato, mas capacidade humana que deve orientar

a ordem à vida prática, deste modo, a cidade é concebida como local e

instrumento da vida social, dotada de crescimento complexo que precisa da

construção de edifícios específicos para atender a demanda social como

escolas, hospitais, cemitérios, mercados, alfândegas, portos, quartéis, pontes,

ruas, praças, etc. Para atingir este objetivo, a habilidade de engenheiros e

arquitetos deve servir aos interesses da sociedade na edificação de obras

públicas.

Argan (1992, p.23) A visão de que a construção da cidade é fruto de

concepções norteadas pelo bem comum e projeções de desenvolvimento leva

à criação de uma nova ciência da cidade, a urbanística, pensada por arquitetos

“da revolução”, Boulée (1728-99) e Ledoux (1736-1806). O caráter público deve

se sobrepor ao privado, essa concepção pertence às aspirações arquitetônicas

e urbanísticas que contemplam a cidade com unidade estilística adequada à

ordem social e são alvos das ambições napoleônicas que quer transformar

arquiteturas, estruturas espaciais, as dimensões, as funções das grandes

cidades do império em imensas praças com ruas longas guarnecidas por

grandes edifícios rigorosamente neoclássicos em sua maioria de ordem

pública. Muitas cidades europeias possuem uma fase neoclássica na sua

arquitetura que expressa o desejo de reforma e adaptação racional e refletem

uma sociedade em transformação.

Guinsburg (1999, p.304) completa que o estilo neoclássico,

primeiramente se manifesta na arquitetura e depois na pintura. Na arquitetura

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revelar-se no mundo europeu e extra europeu, entretanto, sua essência e suas

reflexões são fatos caracteristicamente franceses. Os arquitetos, estudando as

ruínas de Grécia e Roma, elegem-nas como modelo para a arquitetura

neoclássica e recuperam a aplicação dos frontões triangulares com as ordens

arquitetônicas, toscana, dórica, coríntia e jônica, fundamentados no valor

absoluto das proporções que compõem a base da teoria de toda a arquitetura

clássica.

Guinsburg (1999, p.311) argumenta que a formação arqueológica

dos arquitetos franceses contempla Roma como modelo, entre eles, Jacques-

Germain Soufflot (1713-1780) pesquisa Roma entre 1731 e 1738, faz um

levantamento arquitetônico dos templos dóricos de Paestum. Sua obra principal

é a Igreja de Sainte-Geneviève, construída em 1746. Nesta obra une a estrita

regularidade clássica com o detalhe monumental romano com base na lógica

construtiva.

Segundo Guinsburg (1999, p.291) em fins de 1750, o retorno à

Antiguidade pode ser confirmado por dois edifícios simbólicos: primeiramente,

o Panteão de Paris, que apresenta a planta em cruz grega e sua colunata é

proveniente do Panteão de Roma, em seu interior, as colunas são coríntias,

apresentando influências de Piranesi e Clérisseau; em segundo, em 1758, o

Templo Dórico de Hagley Park, de James Stuart, no experimento de

reconstrução de um edifício grego. Comparando com o classicismo

renascentista, onde o homem é o centro de suas inquietações, o

neoclassicismo é norteado pela glorificação dos valores do cidadão, reflete

uma reação moral, da procura por novos moldes de comportamento

relacionados com o ideal de vida estóico e republicano, é contrário à sociedade

cortesã e apresenta uma reação intelectual, que objetiva buscar os princípios

de uma civilização primitiva e verdadeira.

Sobre o estilo Império no período napoleônico relatado por

Gombrich, Guinsburg completa que a assimilação com a Roma imperial

estimula o entusiasmo pela arquitetura antiga. Visando a monumentalidade, os

arquitetos do período, aplicam volumes simples, procuram a simetria e os

efeitos de perspectiva e utilizam formas geométricas básicas (cubo,

paralelepípedo, semiesfera).

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O autor ainda completa que as ações de Napoleão são glorificadas

por vários monumentos: o Arco do Carroussel (1806-1808), de Percier e

Fontaine, inspirado no Arco de Sétimo Severo; o Arco do Triunfo (1806-1836),

de Raymond e Chalgrin, inspirado na arquitetura do período de Luís XIV; a

Coluna Vendôme (1806-1810), de Vivant Denon, Gondouin e Lepère, inspirada

na Coluna Trajana; O Templo da Glória (Madalena, 1807-1842), de Vignon, em

estilo coríntio, edificado sobre um alto pódio romano.

Tintelnot (1972, p.12) explica que a igreja de ‘Madelaine’, antes, na

origem, projetada por Contant d’Ivry, como igreja de cúpula sobre cruz latina,

demolida no período napoleônico, é reconstruída em forma de templo antigo,

seu novo aspecto permite reelaborar toda a perspectiva da Praça da

Concórdia. Seu arquiteto, Barthélémy Vignon (1762-1846), atribui com rigor

arqueológico, desprovido de aspiração cristã, destitui da tradição das fachadas

de duas torres e reconstrói na arquitetura neoclássica que influencia e domina

a concepção de construtores subsequentes.

A Pintura neoclássica

Mirabent (1991, p.47) argumenta que a Antiguidade clássica greco-

romana é transformada em parâmetro para a pintura neoclássica e a cidade de

Roma, com suas ruínas, é concebida como centro de inspiração pelos artistas

neoclássicos que consideram imprescindível o contato direto com Roma e

procuram auxílio para estudar ali. Os que conseguem bolsa de estudo

primeiramente expõem seus trabalhos em Roma, e depois, em seus

respectivos países. Os pesquisadores que difundem suas ideias e se tornam

expoentes do movimento neoclássico são A.R. Mengs, J.J. Winckelmann e

Francesco Milizia. Das obras, a mais relevante na pintura do período é o

trabalho de Mengs intitulado ‘Reflexões sobre a beleza e o bom gosto na

pintura’, publicado em 1762, em que concebe a Beleza, que não aparece com

perfeição na natureza, e cabe à Arte atingir tal perfeição por meio do intelecto,

da razão, da prática da habilidade artística e do conhecimento e aplicação dos

cânones clássicos, ou seja, o ideal da pintura neoclássica consiste na seleção

de belezas naturais despidas de toda imperfeição, percebidas pelo intelecto e

não com os olhos. Para a autora o artista concebe a pintura como arte liberal e

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defende a necessidade de postular regras seguras acompanhadas de método,

propõe: cuidar da verossimilhança das representações; dar a cada corpo sua

forma particular, de modo claro e simples, sem detalhes acessórios; buscar a

verdade em tudo, inclusive em particular nos gestos, nos elementos singulares,

nas cores, luzes e sombras, que não apresentem fortes contrastes; com a

verdade é possível obter a graça, a que se subordina à beleza. Tudo

apresentado com composições mais simples com poucas figuras para realçar

visivelmente a sua perfeição.

Mirabent (1991, p.54) afirma que são escassos os exemplos da

pintura antiga, com exceção dos vasos gregos e dos afrescos de Pompeia, a

pintura antiga desaparece, para substituir esta lacuna, volta-se a atenção para

a arquitetura e a escultura, mais precisamente, aos baixos relevos. a temática

predominante na pintura neoclássica, na segunda metade do século XVIII,

compreende três: a história, a moral e os retratos, também criam cenas

mitológicas e paisagens. Na pintura histórica estabelece duas vertentes: a

representação de momentos históricos da Antiguidade e a interpretação de

acontecimentos contemporâneos.

Mirabent (1991, p.50,51) explica que na segunda metade do século

XVIII, a linha se sobrepõe à cor, estabelecendo um aspecto mais gráfico do

que pictórico. Sua revalorização resulta da sua identificação com a essência

intelectual, enquadrada no uso da razão, estabelecendo o contorno de modo

firme e consistente, mostrando-se claro quando usado na pintura sem sombra.

Sobre a aplicação das cores, a gama cromática diminui e há a preferência por

cores primárias que servem para definir limites entre zonas para evitar

superposições e matizes. A luz fria e cortante contribui para tornar os volumes

dos personagens mais precisos dando solenidade ao ambiente. O pintor

neoclássico não trabalha com contrastes de luz. Para que ocorra o destaque do

tema na pintura são abolidas as decorações supérfluas e secundárias.

Argan (1992, p.22) esclarece que o pintor neoclássico está guiado

pela “evocação e perfeição do antigo” e quer mostrar sua modernidade, para

tanto, elege como temas: o retrato que revele a individualidade e sociabilidade

da pessoa, os quadros mitológicos e históricos para representar seus ideais

civis.

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Guinsburg (1999, p.290) alega que a pintura neoclássica norteia-se

por princípios que objetivam fazer de um quadro um exemplo de simplicidade,

sobriedade e dignidade, para esta aquisição, a inspiração do pintor neoclássico

é oriunda da estatuária antiga, seu trabalho prima pela conquista da forma, da

linha contínua, da pureza do traço, da perfeição do desenho, da composição

sólida, aproximadamente escultórica, privilegia cores frias e chapadas do que o

sensualismo cromático.

Gombrich (1979, p.382) acrescenta que a Revolução Francesa

propicia um enorme impulso à pintura com interesse na história e o uso de

temas heróicos. Os revolucionários franceses gostam de se considerar gregos

e romanos renascidos, e sua pintura, reflete seu gosto à veneração pela

grandeza romana. Grande parte das obras produzidas no período pré-

revolucionário possui como característica a representação de idéias como a

lealdade ao estado e à monarquia, e o dever público acima do sentimento

privado, e são essas algumas das idéias representadas na pintura de David

que é, mais tarde, o “artista oficial” do Governo Revolucionário e desenha os

trajes e cenários para eventos como o “Festival do Ser Supremo” em que

Robespierre oficia como Sumo Sacerdote autonomeado. Essas pessoas

pensam estar vivendo tempos heróicos e que os acontecimentos de seus

próprios dias são tão dígnos da atenção do pintor quanto os episódios da

história grega e romana.

A Academia

Gombrich (1979, p.379) explica que a palavra ‘academia’ recomenda

nova abordagem, deriva do nome da residência onde o filósofo grego Platão

ensina seus discípulos e gradualmente é aplicada a reuniões de homens

eruditos em busca da sabedoria. Os artistas italianos do século XVI chamam

primeiramente aos seus locais de reunião ‘academias’ para sublinhar aquela

igualdade com os humanistas que eles têm em tão alto apreço; a concepção de

academia, no século XVIII, é diferente do Renascimento italiano no século XVI,

no denominado ‘Século das Luzes’, as academias tem a finalidade de ensinar

Arte, como parte integrante do método de ensino, os professores estimulam

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seus alunos a estudarem e analisarem as obras com o objetivo de adquirir e

desenvolver a habilidade técnica dos grandes artistas.

Mirabent (1991, p.8) declara que na Revolução Francesa ocorrem

avanços em vários aspectos, como o político, social, econômico, intelectual e

jurídico, neste último, resulta na reforma que se traduz no desejo de igualdade,

de universalização e unificação das leis, declarados e legitimados pelos

Direitos do Homem. Os iluministas, como filósofos, moralistas e artistas,

convergem na posição de alicerçar o pensamento na razão, esta ideia

influencia a Arte, nas concepções e na produção artística do período, pois,

valorizando a obra de artistas que ressaltam as finalidades didáticas e moral no

seu trabalho, contribuem para o progresso social. Para alcançar tal objetivo,

ocorre a criação e difusão das academias destinadas à formação do artista,

este almeja, como um intelectual, além do valor formal do seu trabalho,

contribuir para o bem comum, por meio da sua obra, mudar o mundo.

Segundo Mirabent (1991, p.12) apesar de algumas críticas

recebidas, as academias são decisivas na formação dos principais artistas da

época e permitem um status social e intelectual mais elevado em que a

aceitação e admiração das suas obras dependem da sua formação estar

abalizada no conhecimento enciclopédico e na consciência social. Somados

aos conhecimentos técnicos e, para sustentar a relação com a Antiguidade,

estão história, mitologia, com as histórias dos heróis gregos ou romanos e a

teoria da arte para favorecer a correta formação estética. A autora ressalta que

no século XVIII, com propagação das academias por todo continente europeu,

se destaca uma das qualidades mais importantes do período, o universalismo,

que corresponde ao interesse pela felicidade e pela verdade, inerente a todos

os tempos e lugares, acrescenta-se o desejo de suprimir as fronteiras

intelectuais. Há uma convicção na universalidade do saber quanto à sua

eficácia e no progresso do espírito humano.

A criação de academias também tem razões de ordem econômica,

pois seus administradores desejam conseguir benefícios industriais conforme

proporcionassem aos artistas hábeis, desenhar qualquer tipo de objeto. O

contingente de alunos assegura, em médio prazo, que as cortes de cada país

não necessitem procurar no exterior os artistas de renome para executar seus

pedidos.

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Todas as academias têm alguns aspectos em comum como o

repúdio ao estilo barroco e rococó e o objetivo de atingir, na arte, a “nobre

simplicidade”. Para que as obras atraiam a atenção de interessados e sejam

apreciadas, os artistas devem obter uma sólida formação fundamentada no

conhecimento de caráter enciclopédico e na consciência social voltada para o

bem comum.

Além dos ensinamentos técnicos, são incluídos: a teoria da arte, a

história dos heróis gregos, romanos e a mitologia, estes dois últimos tópicos

estão frequentemente presentes nos trabalhos das academias, que colaboram

para conservar viva a relação instituída com a Antiguidade.

Como norma acadêmica, o projeto é o desenho, o traço que existe

na folha do artista, que obedece à cópia da estátua antiga, ou seja, o primeiro

passo na formação do artista neoclássico é obedecer à descrição do modelo,

deve desenhar corretamente as cópias das obras antigas.

Guinsburg (1999, p.269) destaca que já no século XVII, em 1648, é

fundada em Paris, a Academia de Pintura e Escultura, e mais tarde, em 1666, é

criada em Roma a Academia de França, nela, é ensinado aos artistas

franceses “o bom gosto e a maneira dos antigos”. Nestas academias, o modelo

acadêmico corresponde à ideia clássica concebida como dogma e exige que a

formação do artista obedeça a objetivos precisos que envolva, até, a

propaganda a serviço do Estado.

Na academia parisiense, o desenho está incluso no plano básico de

ensino que compreende cópias dos desenhos dos professores, desenhos de

modelos de gesso e de esculturas clássicas originais, e também, desenhos de

modelos vivos.

Guinsburg (1999, p.271) enfatiza que na academia, no programa de

ensino inclui os “discursos”, conferências nas quais as obras de arte são

analisadas de acordo com categorias (invenção, proporção, cor, expressão e

composição), são aplicadas notas, de zero a oitenta, aos artistas do passado.

O cânone da proporção, integrante primordial da composição, obedece às

normas da Antiguidade Clássica e deve ser aplicada com seriedade, bem como

a representação de gestos e atitudes. A viagem à Roma é parte complementar

da formação do artista, por meio dos exemplos greco-romanos é possível

observar a natureza e a proporção, a qual é uma das normas essenciais da

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composição e está intrinsicamente ligada aos cânones da Antiguidade

Clássica, tal como a representação de gestos e atitudes. Neste mesmo século,

o historiógrafo e teórico de arte francês Félibien des Avaux, no seu trabalho

“Entretiens sur les plus excellents peintres anciens et modernes” (1666-1668) é

usado como base do ensino acadêmico, que preconiza: o estudo das estátuas

antigas deve retificar a natureza; a composição é espiritual porque se configura

na imaginação e antecede a execução; o desenho, mesmo não sendo

excelente, é fundamental para ilustrar a história, a fábula, a expressão; a

beleza, que compreende a proporção, obedece à razão.

Jacques Louis David

Mirabent (1991, p.49) relata que David na sua pintura consolida as

ideias do artista e teórico alemão A. R. Mengs, norteadas pela necessidade de

um relacionamento mais próximo com a Antiguidade Clássica.

O “espírito neoclássico” concretiza em David seu maior expoente,

sua pintura difunde a imagem da Antiguidade e por meio da visão plástica

expressa o caráter e a força dos antigos e exalta a virtude. Sua obra ultrapassa

as fronteiras da França e assume importante significado em nível europeu.

Perante a pintura neoclássica, o espectador deve refletir sobre os

fatos expostos e decidir dar um rumo positivo à sua própria vida.

A pintura de David ressalta a evidente ruptura com as linhas

estéticas barrocas. Sua obra pictórica permite entender as inovações plásticas

propostas pelo neoclassicismo como a preocupação em definir com precisão o

espaço estabelecido por uma caixa de perspectiva simples. Ao seguir os

relevos clássicos, tende a situar os personagens pictóricos num único plano.

Vive na época em que a França passa por profundas mudanças

sócio-político e culturais lideradas pela Revolução Francesa. Engajado no

processo revolucionário, pertence ao grupo dos Jacobinos, apoia os ideais da

Nação-estado como liberdade, fraternidade e igualdade que influenciam

diretamente nas suas convicções políticas e artísticas, e consequentemente,

refletem na sua produção pictórica, fazendo de seu trabalho uma ferramenta

ideológica.

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O pintor considera a helenização de Roma o fato mais importante na

construção de uma arte pelos romanos. Ele mesmo almeja transformar-se

esteticamente em “grego puro”, para atingir esta meta, acrescenta em seus

quadros, objetos da Antiguidade, concretizando o interesse neoclássico pela

arqueologia. Propriamente não copia a Antiguidade, contudo, prefere ser

original e se sobrepõe a ela. O artista comenta que copia os modelos antigos e

depois transforma perante o advento de um “tempero moderno” para obter os

efeitos expressivos e gestuais, outro elemento que o relaciona com a

Antiguidade clássica é seu interesse pelo nu.

Schama (2010, p. 192) acrescenta que o pintor crê que a Arte, para

exercer atração magnética, precisa ir além de ser um veículo de prazer, deve

mudar vidas, e com elas, a própria história da sociedade humana. Concebe a

pintura como um meio de conversão, que pode levar a sociedade a se

transformar em uma comunidade moral e estabelecer uma cidadania digna. O

autor ressalta que o artista cria a moderna propaganda visual ao estabelecer o

poder coercitivo da sua pintura composta por um desfile de heróis, vítimas e

mártires que exaltam o bem comum. David produz sua obra com determinação

e paixão suprema, a pintura deve expor narrativas envolventes, necessitava

chocar, fascinar, incitar e, por vezes, aterrorizar, objetivando uma tomada de

consciência e mudança de atitude das pessoas frente a um momento histórico.

Sua produção pictórica, composta pelos aspectos comentados acima, torna-se

o principal propósito da pintura neoclássica e norteiam os trabalhos de pintores

neoclássicos posteriores. O artista, ao confeccionar cópias dos homens e

acontecimentos importantes que redimem a humanidade, ou melhor, a parte

francesa da humanidade, do antigo regime, seria um exercício de reeducação

das massas, acredita que as imagens da verdade lançadas como raios sobre

sensibilidades da maioria analfabeta e ignorante tem o poder de libertar dos

vícios do antigo regime.

O pintor protagonista da pintura neoclássica se considera um

homem novo de uma nação renascida, assim como a Igreja, que por vários

séculos, usou a pintura para promover a salvação moral, que transforma

pecadores em penitentes, se sente como um instrutor da virtude.

Schama (2010, p.196) cita que Jacques-Louis David (1748-1825)

perde o pai por volta dos nove anos, uma dupla de tios arquitetos e

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construtores se responsabilizam por sua educação e o enviam às melhores

escolas objetivando transformarem-no em advogado ou arquiteto, contudo, o

menino gosta de pintar e os tios observam algum talento incomum, foi

encaminhado para ser aluno do pintor Boucher, no início da década de 1760,

este não o aceita como aluno alegando estar muito velho e já ter alunos

suficientes. Mais tarde, é enviado ao mestre classicista Joseph-Marie Vien,

conhece Roma, o Fórum romano, estuda os textos que indicam o retorno à

solenidade antiga, conhece livros como o trabalho de Johann Winckelmann e

outros sobre as escavações de Pompéia e Herculano, tais fatos evidenciam a

presença de colunas caneladas e trajes clássicos baseados em relevos

romanos na obra de David.

Guinsburg (1999, p.269) descreve que o pintor norteia-se pelas

teorias do neoclassicismo para compilar e modificar, em forma de lei, os

ensinamentos de arte da Academia de Belas-Artes e articula conceitos

estéticos para unir valores do seu período com os ensinamentos clássicos.

Dois trabalhos de David, que em comum, utilizam elementos da

arquitetura clássica para compor como cenário: “O Juramento dos Horácios” e

“A Consagração do Imperador Napoleão e a Coroação da Imperatriz Josephine

em 02 de dezembro de 1804” são comentados a seguir.

“O Juramento dos Horácios”

Argan (1992, p.22) comenta que na obra “O Juramento dos

Horácios”, David inspira-se na moral da Roma republicana referindo-se à arte

romana do período.

Guinsburg (1999, p. 276) destaca que a ideia é derivada da peça Os

Horácios (1639). De Corneille, inspirada por sua vez na História de Roma, de

Tito Lívio. O quadro é pintado em Roma, cidade onde David completa sua

formação como pintor, iniciada com Vien, depois continuada com o contato

com Mengs, Milizia e Quatremère de Quincy.

Convicto de seus princípios, David aplica seu talento na elaboração

de pinturas de tema histórico como a obra intitulada: “O Juramento dos

Horácios”, iniciada em 1774 e concluída em 1785, encomenda do rei da

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França, Luís XVI, exalta os valores coletivos e nacionais sobre os valores

individuais, seus personagens pertencem a uma história romana, retratados em

um ambiente interno caracterizado pela arquitetura clássica com colunas, arcos

e capitéis dóricos. Durante sua permanência na cidade de Roma, o pintor cria

este trabalho por encomenda da corte, cinco anos antes da Revolução

Francesa, movimento político e social que derruba a monarquia e marca a

implantação de uma nova ordem social na Europa com objetivo de encontrar

um novo modelo para uma nova sociedade revolucionária e republicana.

Arte e política: A intenção de David era fazer um quadro de propaganda, mas não previu o sucesso que teria. Quando foi pintado, o Antigo Regime da monarquia francesa, baseado no direito divino dos reis, teria apenas mais quatro anos de vida. Em 1789 a Revolução Francesa, que David apoiou, substituiu esse regime por uma nova ordem política: a república da Nação-Estado, com seus ideais de liberdade, fraternidade e igualdade. Seu quadro heroico, autoritário e de composição impecável simboliza o novo sonho político e é um modelo do estilo neoclássico. Ironicamente, esse quadro foi encomendado pelo rei Luís XVI, que morreu na guilhotina em 1792. (CUMMING, 1996, p.71)

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Imagem 16 “O Juramento dos Horácios”

(http://www.doispensamentos.com.br) Acesso em: 04/06/2014 – 11h40min.

Mirabent (1991, p.49) relata que esta obra é concebida como a

primeira obra pictórica inteiramente neoclássica. Os acontecimentos políticos

influenciam os temas pictóricos e as composições de David, antes e depois da

revolução. Anteriormente pinta cenas violentas, e posteriormente à revolução,

reveste seus trabalhos com clima de distenção antibeligerante. A autora

destaca que o quadrilátero geométrico mostra-se evidente neste trabalho e,

como nos relevos clássicos, situam os personagens pictóricos num mesmo

plano.

Schama (2010, p.204) explica que David, com esta obra, alcança

reconhecimento no salão de 1785, devido ao tema, à composição e a técnica.

Do tema, ressalta que nunca antes se representou tão bem o conflito entre o

dever e o sentimento. Terminado o Salão, 60 mil pessoas compareceram para

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ver a obra, o quadro foi aplaudido tanto pelos críticos como pelo público. David,

depois deste sucesso de público, executa pinturas para “A Nação”.

De grandes dimensões, a obra é concebida como o paradigma da

pintura neoclássica, personifica aspectos do final do período moderno, como a

intenção da nobreza e monarquia em resgatar valores da Roma Antiga, como o

civismo, a lealdade ao Estado, a virtude, o dever público, o bem coletivo acima

do sentimento privado.

O tema desta pintura é inspirado na peça Horácio e retrata o

momento em que os três irmãos fazendo a saudação romana, no qual juram ao

homem mais velho, Horácio, que lutarão pela República Romana, embora sua

decisão traga sofrimento a seus familiares.

Mirabent (1991, p. 56) ressalta que a obra tem como finalidade

artística a regeneração dos costumes por meio da contemplação.

A cena retratada no quadro acontece em um ambiente fechado, com

aspecto cênico, onde os personagens principais estão todos em primeiro plano,

distribuídos equilibradamente com simplicidade e objetividade, graças á

construção de uma pintura linear. O ambiente é sustentado por elementos da

arquitetura clássica composto por três arcos plenos apoiados em três colunas

de textura lisa como uma ordem dórica simplificada.

Mirabent (1991, p. 50) esclarece que com a utilização de poucos

personagens, a composição ressalta a perfeita integração das figuras com

espaço arquitetônico, pois este último acomoda as figuras: cada arco pleno

aloja um grupo ou uma figura como um compartimento, uma vez que a

arquitetura de colunas dóricas que os condiciona, formam três grandes arcos

plenos que aludem o arco do triunfo, monumento da arquitetura romana,

normalmente utilizado como símbolo de vitória em uma batalha, o que garante

simetria à obra.

Sob o arco à esquerda estão três homens, os irmãos Horácios,

prestam juramento de lealdade e solidariedade a Roma com braços levantados

em direção a outro homem que toma o juramento, é o pai Horácio, situado na

direção do arco central, onde acontece a ação principal, o ritual de juramento,

levantando três espadas para o alto; e atrás deles, na direção do arco à direita

estão duas crianças e três mulheres sentadas com gestos e expressões de

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consternação. É possível observar que este ambiente ganha profundidade pelo

piso em perspectiva e que as colunas continuam no fundo, no segundo plano.

Em todo quadro, o artista repete o tema do grupo de três. Como

cada grupo está emoldurado num arco sugere seu isolamento e, ao mesmo

tempo, os vínculos que os unem. Sobressai o desenho de ordem firme e

decidido, exibindo uma gama cromática reduzida, mas, com presença de

tonalidades quentes. O contraste entre a postura heróica dos homens e a

sensibilidade das mulheres é copiado por muitos pintores.

Schama (2010, p.203 e 204) destaca que a obra ‘O Juramento dos

Horácios’ é o manifesto da fraternidade, da união masculina patriótica, uma

incitação às armas, contudo, em 1785, o momento não evidencia uma luta

política e nem uma guerra social, o panorama político tem uma reviravolta um

ano mais tarde.

Consagração do Imperador Napoleão e a Coroação da

Imperatriz Josephine em 02 de dezembro de 1804

A segunda obra de David que destacamos nesta pesquisa

representa o momento que Napoleão é coroado Imperador, consagrando-o

como homem poderoso perante toda Europa, feita entre 1806 e 1807, foi

encomendada por Napoleão.

Nessa obra, a arquitetura, com traços clássicos, é usada para

enfatizar a importância do acontecimento histórico, expressa sofisticação sóbria

sem exageros de ostentação, representa a conquista, a glória, a idolatria, e a

moral.

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Imagem 17 A Consagração do Imperador Napoleão e a Coroação da Imperatriz

Josephine em 02 de dezembro de 1804.

(http://tiffanyslittleblog.blogspot.com.br/) Acesso em: 27/10/2015. 10h45min.

Mirabent (1991, p.52) revela que a preparação desta obra leva um

ano e a composição apresenta com relevância o jogo de luzes e de cores que

organizam e harmonizam o conjunto. Esta pintura retrata a cerimônia da

coroação de Napoleão Bonaparte que acontece na catedral gótica de “Notre-

Dame”. David pretende destacar Napoleão como uma grande figura da História

mundial. Quando o quadro é apresentado no salão de 1808, obtém sucesso e

Napoleão como prêmio, honra David com título oficial da Legião de Honra.

De acordo com os cânones da arte clássica, cada personagem e

cada detalhe possui autonomia, mas, sem perder a unidade.

O espaço pictórico ocupado pela catedral de “Notre-Dame”, na

pintura de David, está retratado como uma edificação neoclássica para ser

entendida como pintura histórica que ressalte a “Era Napoleônica” para

representar e enfatizar a atualidade do momento histórico e político. Contudo,

não corresponde à realidade, pois a catedral de Notre-Dame é construída em

estilo gótico, concebido como ultrapassado pelos artistas neoclássicos.

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A releitura do universo material do estilo clássico greco-romano,

articulada pelo estilo neoclássico no século XVIII e início do XIX, assume

posição relevante no governo de Napoleão, que deseja anexar sua imagem de

governante glorioso ao Neoclassicismo, transformando-o em estilo Império,

concebido como símbolo de requinte, conquista e poder estabelecido, usa-o

como instrumento ideológico para marcar a presença na história universal.

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CAPÍTULO IV O NEOCLASSICISMO NO BRASIL

Contexto Histórico

O século XIX apresenta à História da Arte no Brasil o sério desafio de ter sido a época decisiva para a formação de nossa cultura nacional. A transferência da família real portuguesa e consequente elevação do Brasil a Reino Unido e sede da Côrte; a independência política e o estabelecimento de um Estado nacional; a progressiva emancipação econômica e a passagem de um sistema exportador escravagista para outro baseado no trabalho assalariado; o surgimento de uma classe média urbana e de um comércio interno, aliado aos nascentes grupos industriais, tudo o que até o advento republicano pôde condicionar a inteligência brasileira para receber e reassimilar as influências internacionais, aconteceu de fato nesses primeiros cem anos de nossa história independente.....No momento, tão paradoxal politicamente, em que tanto a abertura dos portos proporcionada pelos interesses comerciais ingleses quando a índole absolutista de D. João VI e do príncipe D. Pedro serviram ao partido da independência, assim como o movimento constitucional das cortes portuguesas aliava-se aos interesses da colonização; no campo cultural, alimentado pelos ideais do liberalismo e da revolução francesa, tudo parecia propiciar a substituição da arte setecentista portuguesa por umas formas e conceitos importados de Roma ou Paris. (CAMPOFIORITO, 1983, p.13)

O Brasil, na condição de colônia portuguesa, herda influências

culturais da Europa como a língua, a religião, as tradições, os costumes, a arte

e, politicamente, obedece às diretrizes da metrópole portuguesa e de seus

soberanos conforme seus interesses políticos e econômicos.

Mais precisamente, a vida das pessoas na colônia é norteada

diretamente pela administração de seus colonizadores, que por sua vez, é

regida por suas ambições de conquista e poder. No campo artístico, não é

diferente, suas preferências acompanham as tendências do continente

europeu, tal fato, torna difícil o espaço para o reconhecimento e

desenvolvimento de uma arte genuinamente brasileira.

A ordem jesuíta Companhia de Jesus, exerce no Brasil sua política

de disseminação, catequese e alfabetização dos humildes dentro dos princípios

da teologia, da filosofia escolástica e traz a Arte barroca, acompanhada da

religião católica, introduzida e sedimentada na nossa cultura ao longo do

período colonial, durante o ciclo da cana-de-açúcar e o ciclo do ouro na

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construção e decoração de igrejas, norteando a organização da sociedade

brasileira.

Este panorama social, cultural e político muda com a vinda de Dom

João e da família real portuguesa para o Rio de Janeiro em 1808 que repercute

em consequências políticas, econômicas e culturais para o país, entre elas, a

elevação do Brasil a Reino Unido, sede provisória da Corte, e, a abertura dos

portos, quase que exclusivamente para atender aos interesses comerciais

ingleses.

Apesar da reestruturação política e social que resulta na construção

da cultura brasileira, a ex-colônia é concebida por estrangeiros e seus

governantes como incapaz de desenvolver uma cultura sólida e sofisticada nos

moldes dos países europeus, dessa forma, passam a sujeitar, controlar,

submeter e amoldar a receber influências internacionais, as quais interferem na

formação do pensamento cultural brasileiro até o final do século XIX.

A vinda da corte refugiada parecia dever despertar o Brasil da sua modorra, duas vezes secular; mas, como observam Spix e Martius, a chegada em massa de um grande número de europeus, o contato com uma sociedade mais civilizada introduziu, sobretudo e mais rapidamente, maior gosto pelo conforto material, pelo luxo e os encantos exteriores da vida social, muito mais do que pelo amor das artes e ciências. Nos países do Norte o requinte dos gozos da vida seguiu os progressos das artes e das ciências; no Brasil, pelo contrário, começou-se por desenvolver os prazeres dos sentidos e da vida exterior antes de aperfeiçoar as artes e as ciências. Dentre os estabelecimentos com que dotou o Brasil, quis compreender uma escola de Belas Artes, inspirado pelos conselhos do homem superior que era Antonio de Araújo Azevedo, de inteligência e erudição rara entre os homens de Estado portugueses da época. (TAUNAY, 1912, p.7)

Os costumes, comportamentos e o modo de vida dos habitantes

daqui são bem distantes dos hábitos europeus da corte portuguesa que veio

para cá. Na época, a colônia conta com muitos trabalhadores humildes, na

maioria, sem estudo e sem formação intelectual ou acadêmica, um lugar

completamente sem ambiente para o desenvolvimento das ciências e muito

menos, das artes.

Contudo, o contato, observação e admiração pelo comportamento

de um povo mais civilizado que ostenta requinte, gestos ponderados,

acostumados á comodidade material e à intensa vida social, leva o povo da

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colônia a almejar e valorizar esse modo de vida sem se dar conta que é

necessário melhorar primeiramente o nível educacional e sua condição

econômica.

A Vinda da Missão Francesa

A presença da Missão Francesa no Brasil está inserida na escalada

de mudanças sociais, culturais e no processo de reurbanização do Rio de

Janeiro que acontece após a vinda de Dom João e sua comitiva de quinze mil

pessoas em 24 de janeiro de 1808.

Bardi (1975, p.142 e 144) cita que D. João VI, ladeado por seus

ministros, pelos mentores Visconde de Cairu e pelo Conde da Barca, estão

focados em estruturar a capital no âmbito da utilidade pública, visto que o Rio

de Janeiro, na época, encontra-se em situação precária, é uma cidade com

condições higiênicas e habitacionais abaixo de qualquer decência, sem

tratamento de esgoto, a população analfabeta vive em casas insalubres.

A abertura dos portos privilegiando a Grã Bretanha, proclamada por

meio de uma Carta Régia pelo príncipe regente, D. João, em 28 de janeiro de

1808, quatro dias após sua chegada e da corte portuguesa, possibilita o

contato do povo da ex-colônia com diversas novidades, por exemplo, o vidro,

divulgado por ingleses, que substitui as rótulas e gelosias das casas por

vidraças e cortinas.

D. João estabelece um decreto sobre a interligação entre casa e rua

que resulta na melhoria da limpeza e no mobiliário das habitações, estimulando

o trabalho de fabricantes de móveis e incentivando as importações.

Sucessivamente, com a reurbanização, transforma o aspecto físico e

urbano da cidade que inclui desde caminhos capinados, ruas varridas e

calçadas lavadas, lugares da circulação do povo humilde como meirinhos,

aguadeiros e alferes, e até, muitas moradias, como sobrados que hospedam os

fidalgos, marqueses, barões e duques.

Abruptamente, a cidade tem que adaptar-se aos novos moradores e

oferece distrações do gosto da nobreza como o Convento do Carmo, onde

instala-se a sede da Corte, passa por reformas, a capela é edificada como sala

de concertos e palco de teatro. O local improvisado torna-se insuficiente e D.

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João manda construir um teatro maior para receber as atividades teatrais como

o Teatro São João, em 1812. A vida cultural varia entre teatro, bailes, saraus e

festas folclóricas como touradas e cavalhadas.

A condição de Reino Unido agrada ao monarca que se sente seguro

e autônomo na América, buscando apagar a impressão de ex-colônia, Dom

João procura realizar ações que promovam o Brasil entre outras nações,

modernizando e atualizando o país, como a instalação da tipografia régia,

editando livros científicos, romances e um jornal. A Biblioteca Real, trazida no

porão dos navios, é organizada no Carmo e aberta ao público. O Conde

Linhares, ministro do regente, constrói uma Escola de Cirurgia.

No processo de reurbanização da cidade do Rio de Janeiro, como

sede do Reino, o regente aprova pessoalmente a planta de vários edifícios

públicos e certifica-se quanto a sua modernidade, repudiando construções

“góticas”, ou seja, devem ser edificações que obedeçam aos padrões

neoclássicos. Contudo, os arquitetos e artistas brasileiros não conhecem

suficientemente os padrões neoclássicos e precisam ampliar modernizar seus

estudos na área da construção civil para acompanhar o gosto da Corte

portuguesa.

Bardi (1975, p.143 e149) explica que D. João possui hábitos

mecenísticos e concebe as artes como instrumento político e também percebe

que é necessário suprir a ex-colônia com uma instituição que desenvolva arte

nos padrões europeus. Sob este panorama, a Missão Francesa resulta de uma

articulação política em que o Conde da Barca (Dom Antônio de Araújo e

Azevedo) aconselha o Soberano, que o Marquês de Marialva (Dom Pedro José

Joaquim vito de Menezes Coutinho), responsável pelos negócios em Paris,

seja encarregado de estudar a vinda de um grupo de artistas profissionais

competentes nos padrões do neoclassicismo francês para o Brasil.

O Marquês acata a ordem real, porém, sendo principiante no

assunto, pede o parecer de Alexander von Humboldt, que por sua vez se dirige

a Joachin Le Breton, secretário perpétuo mas demissionário da Academia de

Belas Artes do Instituto de França. Le Breton organiza um grupo de artistas e

mestres de ofício: Nicolay Antoine Taunay (pintor de paisagem), Jean-Baptiste

de Bret (conhecido como Debret, pintor de história), Auguste-Henri-Victor

Grandjean de Montigny (arquiteto), Auguste Marie Taunay (escultor), Charles

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Simon Pradier (gravador), integram também o grupo um secretário, um

professor de mecânica e muitos auxiliares, como serralheiros, ferreiros,

construtores navais, curtidores e surradores de pele, carpinteiros, fabricantes

de carros e outros práticos de diversos serviços. Estes profissionais estão

acostumados a servir aos gostos e preferências das cortes europeias e, é

claro, pretendem continuar o mesmo trabalho aqui.

O objetivo da Missão Francesa é a criação de uma Academia

atuante e influente, Le Breton, devotado à sua missão em articular um ensino

acadêmico estruturado, apresenta o projeto da Academia ao Governo, este

interfere sistematicamente no projeto, o que desagrada seu criador.

Em fins de janeiro de 1816, o grupo embarca no navio cargueiro

americano Calphe, no Havre-de- Grâce; em 20 de março, desembarcam no

Rio, sendo recebidos por D. João VI, com atenciosa cordialidade.

Bardi (1975, p.143 e150) afirma que após a acomodação do grupo,

meses depois, Le Breton expõe seu projeto de trabalho para o Governo para

criação da Academia. O projeto é modificado conforme a moda da casa,

condições, pechinchas, graus e horários. Irritado e aborrecido, Le Breton

aceita, aconselha. O regente assina o primeiro decreto de fundação em 12 de

outubro de 1816 que institui a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, sendo

encomendado o projeto do edifício a Montigny, que inicia os desenhos.

Entretanto, só após dez anos será concluído. Além disso, três fatos interferem

no desempenho da academia: os falecimentos do Conde da Barca, protetor da

Missão, tempos depois, Lebreton e a manifestação de desconforto entre os

artistas locais, apoiados pelo cônsul geral francês, este desaprova a presença

dos artistas bonapartistas da Missão.

Taunay (1912, p.6) ressalta que a criação de uma Escola real de

ciências, artes e ofícios promovem e difundem a instrução e conhecimentos

indispensáveis aos homens voltados aos empregos públicos de administração

do Estado, como também, ao desenvolvimento da agricultura, mineralogia,

indústria e comércio que compõe a subsistência, comodidade e civilização dos

povos, tais concepções estão em consonância com as ideias defendidas pela

revolução industrial em andamento na Europa.

Squeff (2004, p.171) completa que os artistas componentes da

Missão deparam-se com as péssimas circunstâncias sociais, culturais e

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políticas do Brasil colônia e percebe os sérios obstáculos que tem de enfrentar

para concluir a empreitada. A pretensão de uma Academia atuante e influente

fica comprometida porque os franceses percebem que a criação de uma

academia de artes não pertence ao conjunto de prioridades de Dom João VI.

A demora do governo para inaugurar a escola leva muitos membros

da Missão a voltar para a Europa. Porto Alegre, usando um termo irônico,

afirma que a academia, no início do funcionamento, é comandada por um

“triunvirato português” liderado pelo pintor Henrique José da Silva que controla

a AIBA por 14 anos e administra de forma distanciada do projeto original,

inspirado no modelo francês.

Somente quatro anos depois, é fundada a Real Academia de

Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil, inspirada na Academia de

Londres.

Dos artistas franceses o mínimo que se deve reconhecer é que eram notáveis e categorizados no ambiente artístico europeu, o que constituía credencial de significado internacional. (CAMPOFIORITO, 1983, p.24)

Os artistas da Missão são pessoas estudadas com ótima formação

artística e com objetivos sérios para estruturar a Arte na ex-colônia, mas,

encontram diversos obstáculos como os sentimentos nacionalistas perante a

presença de um grupo artístico estrangeiro, as terríveis condições sociais e a

falta de um compromisso político devotado para a cultura, pois os homens do

governo, além de não terem conhecimento mínimo sobre a Arte, estão

inteiramente preocupados com as constantes turbulências políticas e

econômicas que assolam o Brasil, desde 1808 e que se estendem por toda

fase imperial até o advento da República, dessa forma, a Academia e o

desenvolvimento do ensino artístico profundo estão relegados ao segundo

plano, não configuram entre os interesses de primeira ordem de nossos

administradores políticos da época. Apesar de todos esses revezes, a Missão

Artística procura realizar seu trabalho com afinco na medida do possível,

ensinam àqueles interessados e formam grandes nomes da arte brasileira do

século XIX sob os cânones da arte acadêmica e do neoclassicismo francês.

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O Neoclassicismo Francês no Brasil

Durand (1989, p.3) esclarece que o período monárquico (1822-1889)

é marcado pela importação do estilo neoclássico francês praticado nas

academias de belas-artes europeias. É introduzido no Brasil na época do

declínio do barroco, característico da etapa colonial e do mecenato da Igreja,

até as primeiras manifestações locais da estética inspirada nos movimentos de

vanguarda europeia do começo do século XX. No âmbito cultural, no século

XIX, mais exatamente, no período monárquico, de 1822 a 1889, ocorre a

disseminação em terras brasileiras dos ideais do liberalismo e da revolução

francesa, materializados na arte por meio dos cânones acadêmicos do

neoclassicismo francês fundamentado nas formas e conceitos importados de

Roma e Paris. Na França, a formação do estilo francês se intensifica quando os

artistas franceses matriculam-se no Instituto de França, fundado em 1795, sob

a administração de David, pintor oficial de Napoleão, rapidamente adquire

notoriedade superior como Ecole des Beaux-Arts de Paris que norteia escolas

de Arte de toda Europa.

Campofiorito (1983, p.23) acrescenta que a Missão Francesa é

composta por dois pintores que se consagram à especialidade histórica, tal fato

está ligado às preferências das cortes europeias de encomendar pinturas que

retratem os acontecimentos de seu interesse.

O êxito que se espera da pintura corresponde ao mesmo na

arquitetura, à gravura e à escultura, conforme as preferências da classe

dominante para seus palácios, através bustos, estátuas e medalhas, integrando

o conjunto documental dos fatos e das personalidades que devem ser

perpetuadas.

No Brasil, as pessoas da corte e de condição abastada cultivam este

tipo de documentação conveniente. Tal comportamento transforma-se em estilo

oficial na formalidade padronizada de um gosto artístico determinado

configurando uma arte erudita e distante das raízes populares.

Squeff (2004, p.207) completa que as pessoas envolvidas no projeto

de legitimação da nação criada em 1822, renegam o passado colonial. É

momento de articular uma concepção de história como progresso e

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aprimoramento contínuo que estabeleça ao Império o estatuto de nação

independente, soberana e integrada com as nações civilizadas, o estilo

barroco, visto como marca do passado colonial atrasado é suplantado e

encoberto pelo estilo neoclássico e seus valores estéticos.

O Neoclassicismo representa o estilo que se destaca no panorama

de mudanças dos valores e na visão de mundo na Europa, em especial na

França e é concebido por muitos artistas da época como fator principal que

compõe uma conduta moral e ética potencialmente oposta a tudo que o

barroco evoca.

A pesquisadora conclui que o pintor Manuel de Araújo Porto Alegre,

como seguidor de Debret e David, envolvido profundamente em dois episódios

do recente Império, a proclamação da Independência e a instalação da

Academia de Belas Artes no Rio de Janeiro, concebe e compromete-se de

maneira programática ao neoclassicismo que corporifica significados e

desdobramentos que vão além do campo artístico. Na posição de estilo

representante da nação independente, cabe ao neoclassicismo, a missão

histórica de ressaltar o lugar do Império brasileiro entre as nações

desenvolvidas do mundo.

A condição social do artista brasileiro

Os artistas da Colônia raramente vinham de camadas abastadas da sociedade. Ao contrário, sendo escravos, forros, mulatos ou brancos livres, tinham uma ocupação pouco valorizada. A eles coubera uma atividade que, se muitas vezes lhes garantia a liberdade, a despeito do vínculo estrito que mantinham com os mestres de seu ofício, por certo, dificilmente significava prestígio social ou enriquecimento. Os negros e mulatos eram incorporados ao sistema corporativo de formas diversas: como escravos dos mestres; alugando seus serviços como negros de ganho; ou ainda como libertos, nesse caso teoricamente ficava aberta a possibilidade de ascensão profissional. Fora do contexto das oficinas de ofícios, nas fazendas e casas particulares, escravos eram utilizados na feitura de móveis e utensílios domésticos, na decoração e pintura das residências, realizando, muitas vezes com maestria, ofícios e atividades de artesanato. Os artistas coloniais também raramente possuíam uma especialidade: realizavam da pintura de afrescos ao douramento de móveis, da arquitetura à pintura de paredes, da estatuária à ‘encarnação’ de imagens. À falta de especialização correspondia um aprendizado

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informal, conquistado com a observação dos mestres, aos quais o aprendiz ajudava em tarefas progressivamente mais complexas, conforme aumentavam seus conhecimentos. Sem frequentar uma escola ou academia de artes, o artista da colônia tinha uma formação predominantemente prática. A realização artística estava condicionada à vontade do contratante, que participava de todas etapas do processo de criação. Nesse contexto, como dar um estatuto de artista a esses homens humildes, cujas vidas pouco ou nada tiveram de notável. (SQUEFF, 2004, p.143)

Na fase colonial, as condições da vida são profundamente difíceis,

visto que a Metrópole tem somente a preocupação em manter seu domínio e

comércio, como consequência, os artistas nativos têm uma formação

profissional incompleta, sem especialização que não permite qualidade melhor

de vida nem desenvolvimento ou aperfeiçoamento artístico.

Diante desta situação, não há uma preocupação com a organização

formal no ensino e aprendizado artístico, esta mão de obra serve apenas para

suprir os interesses da Igreja na sua disseminação no território brasileiro.

Completa este panorama, o fato que os colonizadores mantêm a

preferência pelo importado, ambicionam exibir uma magnificência artística

comparável com a que se produz em solo europeu.

A pintura não se destina mais à decoração religiosa, procura temas

diferentes como o retrato, que se expandem como a paisagem, as cenas

urbanas e a natureza morta. Esta situação exige que o artista possua uma

formação mais profunda, consistente e na qual necessita de estudo formal,

longo e complexo.

Estabelece uma concorrência acirrada entre os artistas por

encomendas realizadas pela própria corte ou pessoas ligadas a ela com

prestígio social.

Com a independência, em 1822, acentua ainda mais o fim da pintura

colonial ligada à arte barroca e principia outra direção estética que regula o

ensino artístico à Academia de Belas Artes, em que ocorre o enquadramento

da atividade pictórica nos termos de um aprendizado voltado para o estilo que

se expandiu por toda a Europa em oposição ao Barroco e Rococó, tidos como

arte do passado.

As encomendas são feitas por membros da corte, pelo imperador e

sua família, ou pessoas com alto poder aquisitivo e posição social de prestígio.

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Os artistas colocam seu talento artístico a disposição dessas

pessoas e dependem de suas encomendas para viver, a clientela geralmente

solicita os temas acadêmicos como retratos, pintura de fatos históricos ou

paisagens.

Temerosos em perder a clientela valiosa e sofisticada, os pintores

não buscam temas mais complexos ou duvidosos como costumes e tradições

do povo brasileiro, injustiças sociais como a escravidão humana e a retratação

de grupos étnicos, ou seja, nada que pudesse soar como crítica ao governo

monárquico.

Manuel de Araújo Porto Alegre

Campofiorito (1983, p.51) afirma que Manuel de Araújo Porto Alegre

(1806-1879), dono de inteligência e sensibilidade diferenciadas, tem formação

completa no âmbito da filosofia, literatura e arte, no século XIX e realiza grande

contribuição à formação da cultura nacional.

Letícia Squeff (2004, p. 23) acrescenta que Porto Alegre é um dos

personagens mais ativos do Império brasileiro. Pintor de formação escreve

poesia, história sobre música e artes plásticas. Faz projetos arquitetônicos de

igrejas e de diversos edifícios do Rio de Janeiro, entre eles, parte do edifício da

Academia Imperial de Belas Artes (AIBA).

Desde cedo demonstra aptidão e gosto inatos pelas artes, como

autodidata, principia sozinho seus estudos artísticos. Mais tarde, faz as

primeiras aulas com Debret, torna-se seu discípulo, participa da exposição da

Academia em 1829 e ganha a admiração de dom Pedro I por seus retratos.

Membro do primeiro grupo que estuda na Academia Imperial de

Belas Artes, com especialização em pintura histórica, dedica-se ao ensino

artístico e à crítica de arte.

A autora relata que Porto Alegre, vindo da província de rio Grande

de São Pedro, chega ao Rio de Janeiro após a emancipação política, momento

em que os conselheiros políticos ao redor de D. Pedro I observam a

necessidade aplicar medidas de médio e longo prazo para concretizar o

Império brasileiro.

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A cidade do Rio de Janeiro deve se reorganizar como capital e dar

destaque o Império brasileiro, percebem a necessidade de construir uma rede

de instituições, bem como normas e leis que equipassem o Estado para um

cotidiano político e administrativo consolidado e ativo.

Obedecendo ao porte de capital, a cidade deve comportar

instituições de ensino e cultura que inexistiam em outras regiões do Império,

dessa forma, D. João cria o Museu Real, a Imprensa Régia, a biblioteca Real, o

Jardim Botânico, a Escola Militar, a Escola Naval, a Academia de Medicina,

além de uma Academia de Música, de Belas Artes, do Imperial Observatório,

do Arquivo Público, do Laboratório do Estado e de algumas escolas técnicas.

Para a articulação do aparato de corte da capital é imprescindível a

contratação de pessoal. Muitos chegam á cidade em busca de uma colocação

entre os órgãos governamentais, Porto Alegre é um desses homens, que

almeja trabalhar na corte imperial.

Torna-se professor entre 1837 a 1848, e diretor da AIBA, de 1854 a

1857, período em que faz uma ampla reforma nos estatutos da instituição,

também atua como orador do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro por 14

anos.

Pinta diversos retratos de membros da família real, quadros

históricos e de paisagem. Entre as várias atividades que participa consta a

preparação da decoração da festa de coroação de dom Pedro II, seu

casamento com dona Tereza Cristina e coordena as obras da decoração do

Palácio Imperial do Rio de Janeiro.

A atuação de Porto Alegre, segundo a autora, na vida cultural da

corte é marcada por uma séria e determinada intenção em constituir uma arte

característica e impregnada com a brasilidade. Pretende que o Brasil, recém-

constituído em nação independente, transforme o Império em uma “civilização”,

uma sociedade brasileira com religiosidade e vida política.

Toda essa atividade cultural resulta na sua dedicação ao teatro, nas

belas-artes, nas revistas literárias, na poesia e na arquitetura que projeta Porto

Alegre como iniciador de diversos movimentos artísticos no período.

A articulação e formação de uma cultura propriamente brasileira

constitui uma das metas do universo intelectual brasileiro dos Oitocentos que

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exalte a originalidade do Império tropical e que destaque o Brasil como nação

civilizada do globo.

Para a concretização desses objetivos, constrói com contornos

específicos seu engajamento na elaboração dessa nacionalidade e projeta na

arte, investida de caráter estético, o potencial para transformar a sociedade

imperial em nação culta e diferenciada.

Como pintor, na sua trajetória de vida permite verificar a formulação

e reelaboração do projeto para o Império em que investe nas “belas-artes”,

mais precisamente, na pintura, na arquitetura e escultura que são seus núcleos

centrais de realização. Na AIBA, o foco está na cidade do Rio de Janeiro,

centro das suas intenções transformadoras.

Campofiorito (1983,p. 23,v.2), comenta que Manuel de Araújo Porto

Alegre (1806-1879), discípulo de Debret, ainda frequenta as aulas de escultura

com Auguste Taunay e arquitetura com Grandjean de Montigny. Seus trabalhos

recebem posição de destaque nas exposições de alunos e professores.

Empresta relevante contribuição à cultura do país como prestigioso intelectual

e artista, dono de aguçada inteligência, teve completa formação filosófica,

literária e artística em Paris, deixa obra de escritor e pintor que recebem

importância nacional. Em 1854, época em que trabalha como diretor da

Academia de Belas Artes, é agraciado por D. Pedro II com o título de Barão de

Santo Ângelo, na sua gestão reorganiza a biblioteca escolar, a pinacoteca e

reforma o ensino artístico.

Coroação de D. Pedro II

A tela “Coroação de D. Pedro II” de Manuel de Araújo Porto Alegre

representa as aspirações do pintor que retrata a corte e a alta sociedade

integrantes da jovem nação independente imperial que pretendem construir um

país culto, diferenciado e civilizado de destaque no mundo.

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Imagem 18 Coroação de Dom Pedro II

(https://pt.wikipedia.org/wiki/Academia_Imperial_de_Belas_Artes) Acesso em: 27/10/2015. 11h05min.

Squeff (2004, p.73) esclarece que Paulo Barbosa da Silva, como

protetor, possibilita a participação de Porto Alegre em diversas atividades do

Paço imperial: em nomeações, encomendas, títulos e organização de eventos

importantes que exigem a presença do imperador.

Dentre estas cerimônias imperiais, o mordomo chama Porto Alegre

para organizar a festa da sagração do jovem imperador. No quadro inacabado da

Coroação de dom Pedro II, Porto Alegre dá lugar de destaque a este amigo e

colaborador que tem sua retratação em primeiro plano.

Porto Alegre projeta a célebre Varanda da Sagração e desenha as

roupas usadas pelo monarca durante a cerimônia. Em 28 de julho de 1840 é

nomeado pintor da Imperial Câmara, assumindo total responsabilidade por

todas as iniciativas que necessitam das belas artes nos movimentados anos

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após a provação da maioridade celebrados por grandes reformas, festas e pela

fundação de diversas instituições.

No âmbito formal, ao analisar a obra intitulada “Coroação de D.

Pedro II”, realizada dentro dos cânones do estilo neoclássico francês, retrata a

arquitetura composta com elementos da arquitetura clássica greco-romana,

como colunas, com fustes, caneluras e capitel coríntio carregando a arquitrave.

Este conjunto arquitetônico neoclássico emoldura, destaca e dá

solenidade ao evento importante da história brasileira, a coroação de D. Pedro

II, com a presença da corte e pessoas importantes ligadas ao Imperador,

simbolizando a riqueza, conquista e estabelecimento do poder imperial no

Brasil.

A arquitetura neoclássica compartimenta e descreve o fato histórico

por etapas, suas colunas de capitel coríntio dividem o espaço da tela em três

partes, e consequentemente, seus personagens e ações.

O espaço da esquerda destaca a participação das pessoas que

fazem parte da corte e do clero que testemunham a coroação; no espaço

central, a presença de figuras importantes como o cardeal e membros da corte;

no terceiro espaço a direita, no plano mais alto que as demais figuras, a

presença de D. Pedro II com a coroa, e pessoas ligadas ao Paço imperial.

Contudo, D. Pedro II não concretizou a compra deste quadro, essa

pintura encontra-se inacabada. O monarca prefere o trabalho do pintor francês

François Rene Moreaux, artista de talento reconhecido para o tema da

retratística.

Bardi (1975, p.166) explica que após a vinda da Missão Francesa,

muitos artistas estrangeiros com formação deixam a Europa por motivos

políticos ou por espírito aventureiro. Da França chegam os irmãos François-

Rene Moreaux e Louis-Auguste Moreaux.

François-Rene é discípulo do Barão Gros, protagonista do

neoclassicismo europeu, que no Rio se desentende com Porto Alegre,

personalidade responsável pelas artes na capital, e lhe dedica caricaturas

satíricas com as imagináveis consequências.

Campofiorito (1983,p.25) esclarece que os irmãos Moreaux chegam

ao Rio de Janeiro em 1840 e realizam muitos desenhos e pinturas. François-

Rene, com a formação recebida no ateliê de o Barão de Gros, em Paris tem

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destaque para a pintura de história, tal fato de conhecimento da Corte que

deseja o registro para a história dos feitos nacionais considerados importantes

pelo poder vigente.

Entre os trabalhos de tema histórico estão “A Proclamação da

Independência” (1844) e o “Ato de Coroação de S.M. o Imperador” (a imagem

representa o evento de 18 de julho de 1841). Pedro II impressiona-se com o

estilo muito acirrado ao academismo francês.

O quadro da Coroação agrada a Dom Pedro II e é adquirido para

sua coleção particular, outorga a François-Rene o Hábito da Ordem de Cristo

em 1843.

Imagem 19

Coroação de Dom Pedro II (Fonte:https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Coronation_of_dom_pedro_II.jpg)

Acesso em: 27/10/2015 – 11h00.

D. Pedro II observa que o trabalho de Moreaux destaca em primeiro

plano o evento de sua coroação e a participação de pessoas importantes na

história do país, envolvidas na sua coroação.

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Squeff (2004, p. 76) argumenta que a escolha pelo trabalho do

artista francês tem outra razão. Porto Alegre, ao regressar da Europa, se

aproxima das pessoas do Paço, ganha a proteção de um dos homens mais

poderosos do Segundo Reinado, o mordomo Paulo Barbosa da Silva, nomeado

mordomo da casa Imperial em 1833, ano em que a tutoria de José Bonifácio

chega ao fim. A função de mordomo passa pelo controle das finanças da Casa

Imperial, e na prática, Barbosa serve como intermediário entre dom Pedro e o

resto da corte. Cabe também a Barbosa definir e dirigir os rituais oficiais que

incluem dom Pedro, sendo o responsável que controla a escolha de artistas,

materiais, decoração e obras para a realização dos eventos imperiais. O

mordomo chama Porto Alegre para trabalhar no evento mais importante, a

festa da sagração do jovem imperador.

Porto Alegre projeta a célebre Varanda da Sagração e desenha as

roupas usadas pelo monarca durante a cerimônia. Em 28 de julho de 1840 é

nomeado pintor da Imperial Câmara, assumindo total responsabilidade por

todas as iniciativas que necessitam das belas artes nos movimentados anos

após a provação da maioridade celebrados por grandes reformas, festas e pela

fundação de diversas instituições. A autora afirma que Paulo Barbosa da Silva

está por trás de todas as nomeações, títulos e encomendas que o artista

recebe no período.

Contudo, com a saída de Barbosa da mordomia, as encomendas a

Porto Alegre diminuem, este começa a ter problemas com outros componentes

da AIBA, mais particularmente, com o diretor Félix Émile Taunay, também

frequentador assíduo do Paço Imperial e pertencente ao grupo palaciano

oposto a Paulo Barbosa, ligado á marquesa de Maceió e a Honório Hermeto

Carneiro Leão, este grupo domina o Paço com o fim do chamado Quinquênio

Liberal. Devido às desavenças, Porto Alegre pede afastamento da instituição e

é transferido para a Academia Militar.

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AIBA – Academia Imperial de Belas Artes

A adesão de Porto Alegre ao projeto civilizador que movimentava sua geração seria profundamente marcada por sua passagem pela Academia de Belas Artes. Primeiramente como aluno de pintura e arquitetura, mais tarde como professor e publicista, seu engajamento no projeto de melhorar o Império teria um foco principal: a cidade do Rio de Janeiro. A escola fundada pelos franceses, a qual, depois de diversas modificações e crises, foi finalmente inaugurada em 1826, com o nome de Academia Imperial de Belas Artes, foi desde o começo uma instituição comprometida com a definição e divulgação de imagens do Império. Órgão concebido segundo parâmetros do reformismo ilustrado português, a AIBA esteve, de fato, desde o início, marcada pelo compromisso de auxiliar o governo monárquico num projeto civilizador. Dessa perspectiva, cabia-lhe atuar diretamente sobre a cidade do Rio de Janeiro. Suas funções incluíam, além da produção de quadros e monumentos, responsabilizar-se pela construção de edifícios públicos e pala reforma de ruas e bairros. Esperava-se que professores e alunos ajudassem a solucionar os problemas da cidade. (SQUEFF, 2004, p.107)

Concebida conforme as ideias iluministas que defendem que toda

atividade humana deve ser norteada pela razão e pelo bem comum e inspirada

na Academia Francesa de Paris, o corpo docente e discente da Academia

Imperial de Belas Artes tem papel fundamental na realização do projeto

civilizador concebido pelo governo monárquico para a construção da imagem

do “Império brasileiro civilizado” e na reforma urbana para modernização da

cidade do Rio de Janeiro para acompanhar as metrópoles europeias como

Paris.

Squeff (2004, p. 108 e 109) ressalta que a AIBA tem a missão de

estabelecer a boa reputação do novo Império entre as nações cultas e

concentra seu foco na construção da imagem civilizada da Monarquia e da

capital. Para atingir este objetivo, o neoclassicismo, inspirado na Antiguidade,

se apresenta ideal para unir a nação do Novo Mundo e sua corte orientada pela

tradição europeia.

É necessário criar uma atmosfera de antiguidade ao Império com

sede na América, unificando-o a formas e símbolos carregados de significados

seculares (universo material da arte clássica greco-romana), consagrados por

outras nações civilizadas.

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Squeff (2004, p. 170) afirma que a Academia distingue-se por

oferecer um ensino voltado inteiramente às artes plásticas e divide-se em

quatro áreas essenciais: pintura de paisagem, pintura histórica, arquitetura e

escultura, além de aulas de desenho e geometria. Os aprendizes provinham de

classes sociais mais modestas como filhos de pequenos comerciantes que não

tinham condição financeira para cursos como medicina e direito.

Squeff (2004, p. 172) descreve que a instituição funciona de forma

inconstante e insuficiente até 1831, quando são elaborados os novos estatutos

da AIBA, por Debret e Montigny, na tentativa de organizar o caráter da

instituição. Duas medidas são elaboradas pelo documento: uma concede a

dom Pedro II o título de “fundador e protetor perpétuo da Academia Imperial de

Belas Artes”, e a que coloca diretamente sob a responsabilidade do ministro do

Império, denominado como “presidente do corpo acadêmico”. O documento

registra a função da AIBA como órgão de Estado, confere a proteção do

monarca e garante espaço na agenda de um ministério.

Campofiorito (1983, p.30, v.4) explica que os métodos aplicados

correspondem às preferências do imperador, que, na condição de protetor dos

artistas, exigia dos professores e alunos uma determinada postura estética

estritamente composta pelos cânones neoclássicos fundamentados na

produção artística do maior representante do neoclassicismo francês, o mestre

Jacques-Louis David.

Campofiorito (1983, p.19) explana que mesmo que neste momento

a Europa esteja sob as concepções estéticas do romantismo expresso por

Delacroix, ou o Realismo chefiado por Courbet, e ainda, o paisagismo pela

maestria de Corot e desenvolvido pela escola de Barbizon, a pintura brasileira,

mais precisamente, o pintor brasileiro, que está em período de estudo no

exterior, não deve se influenciar e sim desprezar essas novas tendências

artístico-plásticas.

A Reforma Pedreira na Academia, ou a “Reforma Porto Alegre”.

Dentro de uma visão ampla, Squeff (2004, p.176) explica que a

Reforma Pedreira é parte integrante de um projeto de dom Pedro II que norteia-

se pela centralização, articulando formas de controle e fiscalização para

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garantir uniformidade no ensino em todos os pontos do território, eliminando os

‘localismos’ por meio de normas gerais de ensino com a finalidade de exercer a

função civilizatória dos cidadãos do Império e concretizar a identidade nacional

de um Brasil uno e coeso. Relata que Porto Alegre é chamado pelo Ministério

da Conciliação para realizar a reforma da Academia Imperial de Belas Artes por

considerá-lo capaz de preparar e implantar as mudanças necessárias, entre

1854-57. Liderado pelo marquês de Paraná, o Gabinete da Conciliação admite

entre seus componentes homens com passado liberal, como Luiz Pedreira do

Couto Ferraz.

Com o apoio pessoal do monarca, Porto Alegre realiza a maior

reforma promovida na AIBA em todo período monárquico. Diante deste

contexto, o Paço assume a função de uma forma de centro decisivo dos

assuntos culturais e artísticos que movimentam a vida dos homens da cultura

brasileira. O projeto de reforma da AIBA é aprovado, após muita oposição dos

deputados, em 23 de setembro de 1854.

A autora completa que Porto Alegre recebe cinco contos de réis

anuais que aplica na reestruturação da Academia, realiza grande reforma no

edifício da instituição, acrescentando o segundo andar e completa o projeto

inacabado de Montigny, constrói instalações para a pinacoteca e a biblioteca

especializada, faz uma reforma no interior do prédio, aparelha com novos

móveis e reorganiza o espaço das aulas.

Na organização dos novos estatutos é abordado o conteúdo das

disciplinas; as atribuições de todos os professionais da instituição, desde o

diretor, passando pelos profissores, pelo consevador da pinacoteca; as

exposições públicas, as premiações e o pensionato na Europa.

As novas normas aprimoram algumas disciplinas da AIBA que antes

eram mal estruturadas; além das cadeiras existentes, arquitetura, pintura,

escultura, desenho, gravura, paisagem e anatomia, são incluídas aulas de

desenho geométrico, desenho de ornamentos, matemáticas aplicadas e

história das belas-artes.

O curso fica dividido em cinco sessões: arquitetura (inclui as

cadeiras de desenho geométrico, desenho de ornatos e arquitetura civil);

escultura (com as cadeiras de escultura de ornatos, gravura de medalhas e

pedras preciosas e estatuária); pintura (com cadeiras de desenho figurado,

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paisagem flores, e animais, pintura histórica), ciências acessórias (que

compreendem as cadeiras de matemáticas aplicadas anatomia e fisiologia das

paixões, histórias das artes estética e arqueologia) e, finalmente, música, cujas

cadeiras são específicadas pelo Conservatório de Música.

As regras dos novos estatutos da academia preconizam que, após

minucioso estudo baseado na cópia de estátuas e bustos antigos, os alunos de

pintura histórica tem aula de modelo vivo e aprendem as “regras de compor e

agrupar”, assim como a “modelar as formas”. Finalmente, os alunos mais

adiantados o professor treinará na composição de objetos históricos, preferindo

sempre os nacionais, ou religiosos.

Destaca ainda que o rígido aprendizado que os alunos têm que

obedecer e a ênfase no conhecimento da estatuária antiga sugerem a intenção

de fazer com que a arte produzida na AIBA consagre os valores próprios ao

neoclassicismo.

A adoção dos cânones neoclássicos é parte integrante da proposta

de ensino que culmina com a depuração de uma arte peculiar. O domínio da

tradição artística clássica é fator primordial na formação acadêmica

corresponde a uma etapa e não finalidade da pedagogia praticada por Porto

Alegre. Procura convergir toda formação artística no sentido de criar obras

‘nacionais’.

Para atingir a proposta descrita acima, preocupa-se em articular um

repertório de temas que auxiliem os alunos da academia a realizar essa

intenção. É desse ponto de vista que Porto Alegre, como diretor, elabora duas

iniciativas: a formação de uma biblioteca que supra as necessidades de estudo

dos alunos como estampas trazidas da Europa. Como o governo não oferece

verbas para comprar livros, o próprio Porto Alegre se dispõe a fazer as

estampas para compor o acervo da biblioteca.

Sugere que os desenhos sejam agrupados conforme os temas:

“retratos históricos de todas as épocas do Brasil”, “retratos das notabilidades do

país”, “usos e costumes desde os tempos coloniais”, “usos e costumes das

províncias”, “estudos sobre nossos indígenas”, “festas nacionais” e “fantasias

dos artistas brasileiros”.

O projeto permite interligar os vários campos da vida artística da

corte em uma instituição: a AIBA. A medida estabelece uma visão orgânica da

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cultura e das artes: a instituição deve reunir ensino das “belas-artes” com o de

música e teatro. Na academia, são treinados todos os tipos de artistas:

músicos, cantores, atores, e também, artífices capazes de construir cenários e

figurinos. Esta é a visão do diretor da academia, o primeiro passo no sentido de

criar uma Ópera Nacional. A Imperial Academia de Música e Ópera Nacional é

fundada na biblioteca da AIBA, em 1857. Para assegurar a realização de todas

essas medidas, a Reforma Porto Alegre tem como meta constituir um novo

significado para a Academia de Belas Artes dentro do quadro das instituições

governamentais, procura fazer do órgão um centro de formação de teor

artístico completo que abrange as belas-artes, o teatro, a música e a

cenografia.

Squeff (2004, p. 218) esclarece que a coleção de estampas deve

englobar todos os aspectos do Império. As belas-artes, o desenho, a pintura, a

gravura, ocupam o espaço das letras, interpretando todos os caracteres da

nação: história, personalidades, particularidades regionais, costumes, valores,

fauna, flora. Como uma propaganda visual que exalta o Império, este seria

narrado, explicado e exaltado nas diversas imagens que compõem a

enciclopédia formada por imagens.

Squeff (2004, p. 219) destaca que, com as normas, o diretor objetiva

completar a educação dos alunos da academia: as cópias das “grandes obras”

elaboradas pelos pensionistas podem ser usadas no ensino da academia, para

familiarizar os brasileiros com a tradição europeia congregando ideias e valores

de forma eclética, o diretor promove o alto destino das belas-artes e dos

artistas formados pela AIBA: fundir tradição ocidental e essência individual,

domínio de “saberes universais” e apreensão profunda do “ser” nacional.

A arte produzida na academia é definida em função de temas

específicos: a pintura de paisagem, entendida como espaço de representação

da natureza selvagem e exótica dos trópicos ou a pintura histórica, palco de

atuação de um Estado Monárquico civilizador e ordenador, ambas permitem

uma visão ampla do Império.

Natureza e história, a monarquia brasileira representada em sua

máxima pompa, os “fatos” importantes da história, como a proclamação da

Independência, os primeiros contatos entre colonizador e os índios, os retratos

dos grandes homens do passado, todos celebram o Estado imperial grande e

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poderoso. A pintura de paisagem e a história devem compor, juntas, a auto-

imagem do Império, tal como pensado por seus funcionários, artistas e homens

de letras: como nação civilizada nos trópicos, como monarquia europeizada,

encravada no meio exótico, mas nada ameaçador, entorno natural.

Perante os olhos dos alunos da AIBA, frequentadores da biblioteca,

a “nação” adquire contornos concretos, delineados em função de

particularidades e generalidades, passado e presente, grandes feitos de heróis

e costumes cotidianos do povo. A sobreposição de imagens permite aos

artistas formados na academia a oportunidade de ter uma visão global do

Império.

Ciente dos preconceitos que cercam a atividade artística e da pouca

importância da AIBA para o governo central procura ampliar as atribuições e a

importância da Academia criando um curso voltado para o ensino técnico, com

este duplica os objetivos da Academia de Belas Artes que a torna uma

instituição única entre as congêneres no resto do mundo.

Campofiorito (1983, p. 27) esclarece que os pintores Vítor Meireles

de Lima e Pedro Américo de Figueiredo e Melo são pintores exponenciais

formados pelo Ensino da Academia no Segundo Reinado sob a proteção do

imperador Dom Pedro II que ressaltam o neoclassicismo brasileiro em seus

trabalhos.

Pedro Américo de Figueiredo e Melo corresponde ao resultado vivo

dos métodos da Missão Francesa, artista formado pela AIBA, com destaque na

pintura neoclássica, obedece às preferências do Imperador que faz de tudo

para proteger os artistas, exigindo-lhes uma conduta estética comum.

Pedro Américo

Para Campofiorito (1983, p.30), o pintor Pedro Américo de

Figueiredo Melo (Areias, PB, 29 de abril 1843 – Florença, Itália, 1905), é

representante da geração de pintores formados pelos métodos da Missão

Francesa que prosseguem a orientar o preparo de jovens artistas da Academia

Imperial de Belas Artes. Descendente de família de artistas, na infância,

manifesta sua precocidade artística que é apoiada por familiares, tendo sua

educação iniciada por seu próprio pai, o violinista Daniel Eduardo de Figueiredo

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que o alfabetiza, ensina princípios de música e procura estimular e desenvolver

a vocação, cada dia mais acentuada, para o desenho, dispondo-lhe a biografia

dos mais célebres pintores.

Cavalcanti (1973, p. 75) descreve que Pedro Américo, dono de um

talento precoce para desenho, é contratado aos onze anos como desenhista da

expedição científica do naturalista francês Louis Jacques Brunet, que percorre

o sertão de várias províncias do norte, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do

Norte, Ceará e Piauí. Durante os vários meses na expedição, realiza desenhos

de documentação da flora e da fauna locais. Em 1854, viaja para o Rio de

Janeiro devido à interferência do Barão do Bom Retiro e consegue, no mesmo

ano, matricular-se gratuitamente no colégio Pedro II. Vai para a Academia

Imperial de Belas Artes, em 1856, então dirigida pelo pintor e poeta Manuel de

Araújo Porto Alegre, mais tarde, diplomata Barão de Santo Ângelo e seu futuro

sogro.

O autor cita que na academia frequenta o curso, de maneira

brilhante, graças á sua competência como desenhista espontâneo e colorista

fluente. Ao longo do curso, alcança quinze medalhas de ouro e prata, vários

diplomas e premiações que lhe outorgam destaque e permitem que, em 1859,

como não acontece o tradicional concurso escolar para premio de viagem à

Europa, solicita e obtém de D. Pedro II a bolsa de estudos no estrangeiro.

Parte no mesmo ano para Paris e matricula-se na Escola de Belas-Artes. Na

Escola de Belas-Artes de Paris, recebeu orientação de Leon Cogniet, Horace

Vernet e Jean Domingues Ingres, mestres notabilizados do neoclassicismo na

pintura francesa. No restante de sua carreira faz diversas viagens à Europa,

entre Paris e Florença e desenvolve estudo e pesquisas no âmbito das

investigações científicas e das letras, obedecendo a intenção de personificar o

tipo ideal do artista renascentista, possuidor de espírito enciclopédico, com

habilidade para harmonizar as manifestações do sentimento com as da razão,

ou seja, a conciliação entre arte e ciência. Na Sorbonne, recebe o diploma de

doutor em Ciências Naturais. Pinta várias telas históricas e militares e retratos

de D. Pedro I, D. Pedro II e Duque de Caxias.

Perante os artistas de sua geração, Campofiorito (1983, p.32)

descreve Pedro Américo como desenhista correto, retratista objetivo, intérprete

entusiasta de temas clássicos e históricos, pintor de índole acadêmica,

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contudo, mais versátil e erudito que seus colegas brasileiros. Dos ateliês que

frequenta em Paris, Horace Vernet é que mais influencia nos quadros de

batalha. Em 1870, no Rio de Janeiro, assume temporariamente a cadeira de

pintura na Academia, nesta época o Governo faz a encomenda da tela Batalha

do Avaí, pintada em Florença, como possui prestígio junto às autoridades

florentinas, consegue realizar o trabalho dentro das dependências da biblioteca

do Convento da Santíssima Annunziata. Terminada a grande composição, é

exposta em Florença, em 1877, neste mesmo ano é transportada para o Brasil

e aqui exposta com merecido sucesso. Realiza novas viagens a Florença entre

1879 e 1885, neste último ano é conferido pelo Imperador o grau de dignatário

da Ordem da Rosa, tal honra o situa na categoria de ‘grande do Império’.

Com a proclamação da República é eleito deputado por seu

estado e membro do Congresso Constituinte (1890). Não aceita a reeleição,

desgostoso com a animosidade por se sentir enfermo, volta a Florença, pela

última vez, quando pinta a alegoria Paz e Concórdia (1900), exposta no mesmo

ano no Salão de Paris e atualmente no Palácio Itamarati.

Na interpretação de Martins (1994, p.103) esta obra compõe uma

alegoria da civilização, retrata o encontro de mundos diferentes: um cortejo

representa a sociedade antiga que se depara com outro que identifica a

sociedade moderna. Na entrada do Templo está a reprodução do seu quadro

“Independência ou Morte”. A nação brasileira, inspirada nas duas tradições,

cristã e pagã, e coroada pela Glória, segue o caminho iluminado pela

Civilização. Dois jovens oferecem frutos e vinho. Pequenos gênios carregam

coroas de louros espalhados pelo caminho por onde passa o Brasil, que, na

visão de Pedro Américo, é glorificado tanto por homens ilustres quanto por

medíocres.

A presença da obra “Independência ou Morte” reflete a concepção

de Pedro Américo sobre o sete de setembro: uma certidão visual da

independência do Brasil. Freire (2000, p. 20) explica que a pintura

“Independência ou Morte” é elaborada em 1888 e consolida os esforços do

IHGB para estabelecer a história oficial para o Império em torno da

Independência, concebida nos moldes do gênero histórico assume sentido

preciso: afirmar a Independência e seu herói, que conseguem destaque na

historiografia do século XIX. A pintura “Independência ou Morte” de Pedro

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Américo é transformada na imagem oficial da Independência, a principal

certidão visual do nascimento do Brasil Nação e destaca a presença de D.

Pedro I que, no alto de uma colina verde, em traje de gala e montado em seu

corcel, empunha a espada diante dos olhares dos “dragões” de sua Guarda

Real, proclama a Independência, é possível observar à esquerda, no canto,

perto da base do quadro, a figura solitária de um camponês, o “caipira’,

representante do povo, que, com atitude de espanto e incompreensão perante

o fato.

Imagem 20 Paz e Concórdia

(http://www.dezenovevinte.net/bios/bio_pa_arquivos/pa_1902_paxconcordia.jpg) Acesso em: 31/10/2015. 01:21

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Podemos ter ressalvas quanto ao valor dos quadros de Américo, sempre condicionados por pretensões monumentais e por certa grandiloquência retórica. Mas, sem dúvida, ele tinha consciência do valor político de sua pintura nas estratégias culturais das instituições. Como bem enxergou Gonzaga Duque em seu romance Mocidade Morta, Pedro Américo era o protótipo do pintor oficial que sabe promover a própria arte, servindo-se de modo desinibido das instituições públicas e dos meios de comunicação. O nascimento da República ofereceu-lhe a moldura ideal para uma nova tentativa, ‘Paz e Concórdia’, por exemplo, hoje no Palácio do Itamarati, no Rio de Janeiro. (AGUILLAR, 2000, p.113)

A obra “Paz e Concórdia”, localizada no Palácio do Itamaraty, no Rio

de Janeiro, evidencia a mestria e habilidade do pintor para representar

aspectos da arquitetura neoclássica com seus elementos na elaboração do

cenário arquitetônico que também tem a função de personagem no contexto

retratado. Embora a arquitetura que se apresente tenha um estilo eclético, é

possível evidenciar os aspectos neoclássicos na obra.

Carlos Lemos (1987, p. 75) em suas nove identificações das

características do estilo eclético nos apresenta no segundo item, construções

neoclássicas, no partido arquitetônico, comprometidas principalmente pela

ornamentação renascentista.

Sendo discípulo de Leon Cogniet, Horace Vernet e Jean Domingues

Ingres, mestres do neoclassicismo na pintura francesa, Pedro Américo assimila

e aplica o universo material da arte clássica com utilização dos elementos:

frontão triangular, muitas colunas com base e fustes lisos, sem caneluras, com

capitel coríntio que apoia uma arquitrave com beirais trabalhados em detalhes

dourados com esculturas.

Na colossal edificação “clássica” de formato retangular, com cor

branca que lembra o mármore, possui paredes divididas em módulos, também

se observa a presença de arcos plenos, apoiados em pilastras ou meias

pilastras. Semelhante ao Panteão romano apresenta grande teto abobadado

branco com detalhes dourados.

As figuras retratadas lembram muitos dos personagens das obras

dos pintores neoclássicos mestres de Pedro Américo que se originam na

mitologia grega, as mulheres possuem vestimenta que lembra deusas

mitológicas, esta vestimenta dá volume e movimento a todo conjunto feminino.

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Entre os cômodos internos, possui um corredor situado sobre um

teto com arco pleno e paredes com divisões modulares, onde está retratado o

quadro ‘Independência ou Morte’, pintura histórica que reverencia a

independência do Brasil.

Como cena teatral, a personagem feminina da Paz, que está à

direita do quadro, desce a escada, após fazer uma caminhada junto com outras

figuras vindas do corredor sob o arco pleno, em que festejam os

acontecimentos históricos que dignificam o país como civilização desenvolvida,

a Independência e a Proclamação da República.

A figura feminina da Concórdia, situada à esquerda, cumprimenta a

Paz com uma coroa de louros, esta ação está acompanhada por

representações das artes, do amor e da deusa alada ‘Niké’, uma deusa grega

que personifica a vitória e que oficializa o evento.

A obra ‘Paz e Concórdia’, causa a impressão de uma encenação

teatral que representa a consagração do sistema republicano (na figura da Paz)

como meio que impulsionará o país para o desenvolvimento, riqueza, conquista

e revela-se como instrumento ideológico ao Estado brasileiro para legitimar a

República como forma de poder estabelecido.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Jorge Coli (2010, p.108) afirma que a arte é formulada a partir de

programas esboçados por fatores externos, servindo de propaganda a

interesses de poderosos, celebra vivos e mortos, atendendo a normas,

exigências e vaidades, transformando-se em instrumento ideológico.

Em várias épocas da história da civilização humana, o governante

de um povo, país ou estado agrega símbolos diversos como instrumento

ideológico para se representar por todo território, para seus súditos e para

todos outros povos, amigos ou adversários, com o objetivo de estabelecer e

perpetuar seu poder, entre os símbolos usados, está a Arte, na produção

artística que envolve a arquitetura e a pintura, veículos de mensagem do poder

estabelecido.

Observando as imagens estudadas nesta pesquisa, verifica-se em

todas elas a inspiração em elementos da arquitetura da antiguidade clássica

greco-romana.

A aplicação harmônica destes elementos permite elaborar uma

construção coesa, com unidade, equilíbrio e colossal, nada é insignificante,

todos os elementos em seu tamanho proporcional levam a um conjunto único e

sóbrio.

A Arte Clássica, articulada pelos gregos, tem sua representação

máxima no século V a.C., em Atenas, durante o governo de Péricles, na

primeira reforma urbana do Ocidente, a reconstrução da Acrópole e do

Partenon, estabelece Atenas como cidade-estado poderosa no âmbito da

política, economia e da cultura. A Arte clássica, desenvolvida na arquitetura,

pintura e escultura é a porta-voz para diferenciar e destacar os poderosos

atenienses perante os povos adversários.

O Império Romano faz uma releitura da arte grega e a adapta às

suas exigências para representar o poder estabelecido, na época de Augusto,

este governante pronuncia seu governo manipulando a seu favor todo universo

material da arte clássica de maneira a ressaltar seu poder e conquista perante

os romanos e povos hostis.

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Quando termina a Antiguidade, a Arte Clássica, criada por gregos e

romanos, já está consolidada como a imagem de arte das classes ricas e

poderosas que detém o poder sobre uma determinada sociedade.

Em outros momentos da história das sociedades europeias, o

Renascimento italiano e, depois, no século XVIII e início do XIX com o

Neoclassicismo, a Arte Clássica é reverenciada como instrumento ideológico

de propaganda nas mãos de uma classe social em ascensão, a emergente

burguesia e ressurge toda vez que os europeus estão fartos do predomínio do

poder e caprichos da Igreja Católica e que a fé se sobrepõe à razão humana.

A Arte Clássica é vista como meio norteador para realizar uma

mudança profunda nas concepções: filosóficas, políticas, sociais e artísticas

que permitem construir um caminho renovador na arquitetura e na pintura e a

busca por novas concepções de vida.

Esse fato pode ser confirmado pelo Renascimento italiano, nos

séculos XIV, XV e XVI, a Arte clássica reverencia o Humanismo, período que

sucede a Idade Média, época em que a Igreja tem grande poder político e

econômico.

Depois, no século XVIII, momento em que acontece a Revolução

Francesa e que os europeus estão cansados dos excessos da Arte Barroca, a

arte da Contra-reforma, patrocinada pela Igreja Católica e dos exageros do

absolutismo, surge o Neoclassicismo.

Os europeus concebem o Neoclassicismo como um caminho, uma

busca, uma solução para uma nova concepção de vida para a sociedade

europeia que almeja o bem comum, igualdade, fraternidade e liberdade

fundamentada na razão.

No Brasil, o neoclassicismo trazido por franceses na Missão

Francesa de 1816, vem consagrar o poder estabelecido pela monarquia, no

Primeiro e Segundo Reinado, edificado nas atividades da Academia Imperial de

Belas Artes, responsável por disseminar e eternizar a Arte Clássica que

distingue o Brasil, como nação civilizada entre as demais desenvolvidas.

Hobsbawm (1984, p.9) explica que a tradição inventada compreende

um conjunto de práticas normatizadas por regras ou abertamente aceitas, de

caráter ritual ou simbólico com o objetivo de fixar determinados valores e

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princípios de comportamento por meio da repetição, estabelecendo

continuidade em relação ao passado.

Em todas as épocas da história humana o universo material da arte

clássica exerce o papel de símbolo de riqueza, glória e poder perenes. As

ordens arquitetônicas, por expressar unidade, equilíbrio, harmonia, sobriedade

e simplicidade, aplicadas na arquitetura de edificações particulares ou públicas

e retratadas na pintura ressaltam a supremacia da classe governante, tal

tradição criada na Antiguidade se reproduz na história humana de outras

sociedades que reverenciam a tradição da imagem de passado glorioso que

deve ser mantido e reproduzido como garantia de poder.

Quanto às figuras retratadas observa-se que na obra “Escola de

Atenas” e “Juramento dos Horácios”, os personagens usam trajes dos antigos,

que lembram gregos e romanos. As figuras se dividem em grupos que ocupam

determinado lugar na arquitetura organizando suas ações que simbolizam

concepções filosóficas, como é o caso dos pensadores na obra “Escola de

Atenas”.

No caso da pintura “Juramento dos Horácios” a arquitetura divide e

determina o lugar das figuras que expressam emoções e gestos controversos

que evidenciam uma tragédia. No centro e a esquerda os corpos dos homens

evidenciam pela postura rígida e ereta a decisão pelo combate e possível

morte. No grupo da direita, o grupo das mulheres que estão curvadas,

encolhidas, entulhadas pela tristeza da tragédia que se anuncia.

Nas obras “A Consagração do Imperador Napoleão e a Coroação da

Imperatriz Josephine em 02 de dezembro de 1804” e “Coroação de Dom Pedro

II” a postura ereta das figuras que testemunham um acontecimento histórico

solene. Sua posição definida pela arquitetura denuncia sua hierarquia funcional

dentro do Império.

Na tela “Paz e Concórdia”, a arquitetura divide as ações das figuras

que participam de acontecimentos importantes na história do Brasil. A figura da

Paz executa uma caminhada que sai do corredor da construção colossal onde

está a imagem da tela Independência para encontrar a figura da Concórdia que

representa a República, o cumprimento das duas é abençoado pela imagem da

Nike, deusa da vitória, na esquerda, ao alto. Alguns personagens usam trajes

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que lembram gregos e romanos. Há uma diversidade de posturas, algumas

eretas, outras curvadas, algumas festejam o momento.

A divisão do espaço pictórico é antiga, basta observar a imagem do

afresco pompeano ‘Vila dos Mistérios’ e sua repartição em três faixas

retangulares.

As obras pictóricas, feitas distintamente em épocas diversas,

possuem em comum a preservação da tradição clássica, além da evidência

dos elementos da arquitetura clássica, sua estrutura de composição similar.

A arquitetura clássica exerce duas ações: o emprego de arcos com

colunas formando corredores ou salões amplia o espaço virtual e ordena os

personagens no espaço por suas atitudes e destacam o poder e riqueza da

classe dominante de cada momento histórico em que foram confeccionadas.

Em comum as obras pretendem falar de fatos reais, mas pode-se

concluir que são todas alegóricas e fantasiosas.

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