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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ GUILHERME BOVO OS PROBLEMAS E AS PERSPECTIVAS DOS DIREITOS DOS ANIMAIS: EXPERIMENTAÇÃO E MAUS TRATOS CURITIBA 2014

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ GUILHERME …tcconline.utp.br/media/tcc/2015/04/OS-PROBLEMAS-E-AS-PERSPECTIVAS...GUILHERME BOVO OS PROBLEMAS E AS ... Código Civil de 2002, por Edvaldo

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

GUILHERME BOVO

OS PROBLEMAS E AS PERSPECTIVAS DOS DIREITOS DOS ANIMAIS: EXPERIMENTAÇÃO E MAUS TRATOS

CURITIBA

2014

GUILHERME BOVO

OS PROBLEMAS E AS PERSPECTIVAS DOS DIREITOS DOS ANIMAIS: EXPERIMENTAÇÃO E MAUS TRATOS

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Profª Dra. Thaís Goveia Pascoalato Venturi

CURITIBA

2014

GUILHERME BOVO

OS PROBLEMAS E AS PERSPECTIVAS DOS DIREITOS DOS ANIMAIS: EXPERIMENTAÇÃO E MAUS TRATOS

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, _____ de ___________________ de 2014.

_______________________________________________________

Curso de Direito Universidade Tuiuti do Paraná

Orientadora: Prof. Doutora Thaís Goveia Pascoalato Venturi

Professor 2 (Titulação e nome completo) Instituição 2

Professor 3 (Titulação e nome completo) Instituição 3

A minha família e a minha Lady – obrigado por me darem tanta felicidade à minha vida.

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente à Professora Thaís Goveia Pascoalato Venturi, orientadora que foi tão importante na minha vida acadêmica e no desenvolvimento desta presente monografia.

Meu agradecimento especial vai para meus pais Maria de Lourdes e Atilio Bovo Filho, e para meu irmão Atilio Bovo Neto, os quais sempre me apoiaram para prestar este Curso de Direito e que me ajudaram de todas as formas possíveis durante o decorrer do curso para que eu pudesse realizar esse sonho de colar grau. Obrigado por tudo, amo muito todos vocês.

Agradeço especialmente ainda, a minha linda namorada Natuany, que além de ser minha inspiração para tudo, é simplesmente tudo em minha vida, minha guia, minha anja da guarda, meu sorriso de cada manhã, meu sonho de toda a noite e minha futura esposa com a Graça de Deus. Obrigado por tudo meu amor, te amo mais que tudo.

Por fim, agradeço minha “mais que humano” que me deixou em outubro do ano passado, minha cachorrinha Lady Bovo, que me inspirou desde o começo para a realização deste trabalho, com suas brincadeiras, suas lambidas, seu temperamento inconfundível e sua mais doce meiguice, e, claro, seu jeito único de dar sempre amor para todos de sua família. Amo você e sempre amarei minha Deusa do Egito.

“O sonho é como um rio, sempre mudando à medida que flui.”

Garth Brooks

RESUMO

O presente trabalho visa o estudo e a verificação das legislações pertinentes aos animais, demonstrando seus direitos essenciais, em face de experimentos científicos por parte de entidades privadas, que poderiam caracterizar crimes contra os animais, e quais seriam as punições aplicadas aos possíveis agressores. Os animais não podem ser submetidos a atos de crueldade e tortura nos testes e experimentos científicos, embora a Lei n.° 11.794/2008 regulamentar esses procedimentos, é notória a necessidade de substituição dessa prática por recursos alternativos, pois experimentos como o teste de irritação dos olhos em coelhos, testes armamentistas e dentários, dentre outros, geram aos animais dor e sofrimento, mesmo que houvesse muitos benefícios para a espécie humana. Para tanto, atualmente há métodos modernos que podem fazer substituir o uso de animais em pesquisas e experiências.

Palavras-chave: Legislações; animais; experimentos científicos; recursos alternativos;

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................... 8

2 APONTAMENTOS ESSENCIAIS DAS RELAÇÕES JURÍDICAS ................. 9

2.1 Características e elementos formadores de uma relação jurídica ................ 10

2.2 Sujeitos de uma relação jurídica ................................................................... 11

2.2.1 Da pessoa física ........................................................................................... 11

2.2.2 Da pessoa jurídica ........................................................................................ 15

2.3 O OBJETO DE UMA RELAÇÃO JURÍDICA ............................................... 18

2.4 Bens e Coisas .............................................................................................. 18

2.4.1 Classificação dos bens ................................................................................. 21

2.4.2 Bens considerados em si mesmo ................................................................. 22

2.4.2.1 Bens imóveis ................................................................................................ 22

2.4.2.2 Bens móveis ................................................................................................. 23

2.5 Fato propulsor .............................................................. ............................... 26

3 OS ANIMAIS NO SISTEMA JURIDICO VIGENTE: SUJEITOS DE

DIREITOS OU MERAS “COISAS”? .......................................... ...............................27

3.1 Da fauna terrestre ......................................................................................... 27

3.1.1 Classificação da fauna brasileira eitos de uma relação jurídica ................... 29

3.1.2 Finalidades da fauna .................................................................................... 29

3.2. O uso de animais para o ensino e para a pesquisa ...................................... 30

3.2.1 MÉTODOS ALTERNATIVOS E A LEI N.º 11.794/2008 .............................. 34

3.2.1.1 Dos crimes contra a vida “consciente” dos animais ...................................... 39

4 OS PRINCIPAIS CASOS DE MAUS TRATOS ANIMAL OCORRIDOS

NO BRASIL ............................................................................................................... 46

4.1 Farra do boi .................................................................................................. 46

4.2 Rinhas de galo .............................................................................................. 49

4.3 Rodeios ........................................................................................................ 51

4.4 Exibição de animais em circos ..................................................................... 55

4.5 Sacrifício de animais no candomblé ............................................................. 58

4.6 Caso do Instituto Royal ................................................................................. 60

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 64

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 65

ANEXO A – MANIFESTO DE CAMBRIDGE ............................................................ 69

8

1 - INTRODUÇÃO

A Constituição Federal, as leis infraconstitucionais como a Lei Arouca e a

própria Lei de Crimes Ambientais, incluindo a Portaria do IBAMA e Decretos

Federais, trazem em seu bojo a proteção a fauna ambiental brasileira (silvestre,

doméstica e exótica), impondo restrições na ideia de propriedade dos animais ao

coibir crueldades e maus tratos diante deles, ao passo que o entendimento

firmado pelo Código Civil de 2002, ao se referir aos animais no Livro Do Direito

das Coisas, considera-os como bens, aonde os proprietários poderiam fazer o que

quisessem com os animais que lhes pertencem.

Existe uma necessidade do uso de animais em laboratórios e trabalhos de

pesquisa e ensino, no entanto, os métodos alternativos de pesquisa, são

procedimentos que podem substituir ou reduzir completamente o número de

animais utilizados ou que diminuam o grau de dor ou de sofrimento causado aos

não-humanos, cabendo ao Conselho Nacional de Controle de Experimentação

Animal (CONCEA), monitorar e avaliar a introdução de dessas técnicas

alternativas que substituam o uso dos animais em ensino e pesquisa cientifica.

Para tanto, a Lei Arouca restringe o uso de animais apenas para as

pesquisas que tenham a finalidade de melhorar e prolongar a vida do ser humano,

desde que as instituições estejam credenciadas e sob a fiscalização do CONCEA,

permitindo inclusive a utilização de animais em experimentos que testem a

segurança e eficácia dos remédios desenvolvidos para o tratamento de doenças

nos humanos, mas devendo sempre prezar pelo bem estar e pela saúde do

animal.

Ademais, sabe que os animais são submetidos a diversos tipos de maus

tratos, abusos e crueldade, não apenas em estudo e pesquisa científica, mas

também no caso das rinhas de galo, dos rodeios e inclusive da farra do boi que

originou a mortandade de inúmeros bovinos no Sul do Brasil, aonde os mesmos

além de não serem alimentados durante dias, são cruelmente mortos em

afogamentos, quando não o são por meio de torturas.

9

2 – Apontamentos essenciais das Relações Jurídicas

As normas de direito regem condutas humanas dentro de qualquer

sociedade democrática, pois o indivíduo vivente nela está sempre em interação

com o outrem, influenciando ou alterando as suas condutas, o que faz dar início as

relações sociais que, regidas por normas jurídicas, transformam em relações de

direito.1

Dentre os fundamentos básicos de todos os ordenamentos jurídicos

existentes e pré-existentes, paira a figura da relação jurídica, que tornou-se o

núcleo da Teoria Geral do Direito Civil substituindo o até então centro do sistema

que se vinculava a função do sujeito.2

Orlando Gomes ensina que a relação jurídica pode ser observada de duas

maneiras.

A primeira seria o vínculo entre dois ou mais sujeitos de direito que obriga

um deles, ou os dois, a ter certo comportamento em sociedade. Do mesmo modo,

pode ser visto como o poder que determinada pessoa possui sobre determinado

bem, ou coisa.

A segunda forma de manifestação das relações jurídicas é oriunda da lei,

pois todos os seus efeitos são atribuídos pela mesma ou pelo poder sobre a coisa,

conforme acima descrito.3

O autor faz imergir em tela que as relações jurídicas são criadas e

estabelecidas pela norma, ou por ela reconhecida quando se originam de fatos

naturais, como o nascimento, a morte e a filiação. As relações jurídicas, ainda

podem ser estabelecidas pela força legislativa, como é o caso da relação entre o

Fisco e o seu ora contribuinte.4

Um dos elementos essenciais de uma relação jurídica são os sujeitos nela

existentes, que se localizam em pretensões geralmente opostas. Tais indivíduos

1 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 1º volume: Teoria Geral do Direito Civil. 24º edição. Revista e atualizada de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. 2 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 85. 3 Ibidem. Pág. 86. 4 Idem. Pág. 86.

10

são chamados de partes, e delas se distinguem os terceiros da relação, que são

pessoas fora daquele vínculo, mas que possuem determinado interesse na causa5.

Como indica Orlando Gomes, a existência das relações de direito estão

admitidas e vinculadas a três ordens de raciocínio: entre uma pessoa e uma coisa;

entre duas pessoas; e, entre uma pessoa e determinado lugar.”

Alguns exemplos clássicos de relações jurídicas são: a propriedade; as

relações obrigacionais como os contratos e declarações unilaterais; as relações

familiares de casamento e parentesco; e as relações sucessórias entre sucessor e

herdeiro/legatário6.

2.1 – Características e elementos formadores de uma relação jurídica

Toda relação jurídica é uma relação social, mas nem toda relação social é

uma relação jurídica7.

Para Orlando Gomes, a partir do momento que algum fato ou um

acontecimento começa a surgir em virtude de um ato voluntário ou não de um

individuo de forma que invada o campo jurídico, tal evento dará lugar a um fato

jurídico, passando assim a conter sujeitos (ativo e passivo) determinados ou

determináveis para uma relação jurídica8.

Nessa linha, Carlos Roberto Gonçalves, leciona que os indivíduos que

compõem uma relação jurídica serão sempre humanos, haja vista que entidades

místicas, como almas e santos litúrgicos, bem como os animais, não são

considerados sujeitos de direito, pois apesar destes últimos merecerem uma tutela

legislativa, não possuem capacidade para adquirir direitos9.

5 Ibidem. Pág. 87. 6 Ibidem. Pág. 90. 7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 97. 8 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 90. 9 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 98.

11

Orlando Gomes analisa a composição de uma relação jurídica a partir de

três elementos essenciais que fazem dela mecanismos de formação, sendo estes:

a) Sujeito (pessoas); b) Objeto (bens); e, c) Fato propulsor (vínculo Jurídico).

Assim, em toda relação jurídica se verifica a presença de pelo menos um

sujeito (pessoas) de direito, sendo ele já nascido com vida ou nascituro. Requer

ainda, a presença de um objeto (bens ou coisas), isto é, o bem ou a coisa que

recai sobre o poder do sujeito de direito na relação, ou ainda, conforme cita

Orlando Gomes,

“Para ser objeto de direito, precisa a coisa ter os seguintes requisitos: economicidade, permutabilidade e limitabilidade, isto é, ser suscetível de avaliação pecuniária, podendo submeter-se ao domínio da pessoa e sendo o uso quantidade limitados.”

Por fim, para completar os elementos formadores de uma relação jurídica,

aparece o fato propulsor (vínculo jurídico), sendo este um acontecimento em

decorrência de um ato humano voluntário ou não voluntário que produzem efeitos

no campo jurídico.10

2.2 - Sujeitos de uma relação jurídica:

2.2.1 – Da pessoa física

Pessoa Física é aquela dotada de direitos e obrigações.11

Para Maria Helena Diniz, os sujeitos (ativo ou passivo) entre suas demais

peculiaridades, caracterizam-se por serem um dos elementos substanciais de uma

relação jurídica, onde que o sujeito denominasse de pessoa natural, de modo que

esta é ser humano capaz de assumir direitos e obrigações.12

10 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 91/92. 11 AMARAL, Francisco. Direito Civil. Introdução. 4º edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2002. Pág. 215. 12 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 1º volume: Teoria Geral do Direito Civil. 24º edição. Revista e atualizada de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. Pag. 143.

12

A pessoa física ou natural, para Carlos Roberto Gonçalves é aquela que

basta nascer com vida, que automaticamente contrai direitos e deveres para si,

isto é, adquirindo sua personalidade jurídica, o sujeito possui desde logo aptidão

para ser titular de direitos e obrigações perante a sociedade.13

O artigo 1º do Código Civil corrobora esta ideia ao prever que “toda pessoa

(seja ela física ou jurídica) é capaz de direitos e deveres na ordem civil”.14

Todavia, conforme dispõe Orlando Gomes, o dispositivo citado acima sofre

restrições pelo próprio ordenamento jurídico, pois o exercício dos direitos não é

permitido senão aos que se enquadram em certas determinações legais, como é o

caso das pessoas capazes plenamente (capacidade de fato aliada à capacidade

de direito15) e legitimadas16.

A pessoa física, conforme alude o artigo 2º do Código Civil17 tem-se o

nascimento com vida do sujeito como a principiologia da personalidade jurídica,

resguardando e tutelando o nascitura desde de sua concepção.

Ainda, essa mesma Carta, em seus artigos 1.799, I e 1.800, §4º, prevê que

até o futuro sujeito de direitos, que ainda não fora concebido (prole eventual) até o

prazo de dois anos da abertura da sucessão testamentária, poderá receber a titulo

de herança bens deixados pelo testador. Desta forma, o ordenamento pátrio tutela

não apenas os indivíduos nascidos com vida ou concebidos, mas sim também a

prole eventual.18

13 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág.100. 14 PORTAL DA LEGISLAÇÃO – PRESIDENTE DA REPÚBLICA. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em 20/07/2014, às 21h43. 15 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil. Volume 1. São Paulo: Saraiva, 2003. Pág. 156. Todas as pessoas naturais têm personalidade, mas nem todas são capazes. 16 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 149. 17 Artigo 2º do Código Civil: “A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida , mas a lei põe a salvo, desde a concepção os direitos do nascituro.” 18 Artigo 1.799 do Código Civil: “Na sucessão testamentária podem ainda ser chamados a suceder: I – os filhos, ainda não concebidos, de pessoas indicadas pelo testador, desde que vivas estas ao abrir-se a sucessão. Art. 1.800 do Código Civil: “No caso do inciso I do artigo antecedente, os bens da herança serão confiados, após a liquidação ou partilha, a curador nomeado pelo juiz. §4º - Se, decorridos dois anos após a abertura da sucessão, não for concebido o herdeiro esperado, os bens reservados, salvo disposição em contrario do testador, caberão aos herdeiros legítimos.

13

Para Carlos Roberto Gonçalves, a partir do momento que a criança se

desligue da mãe, independentemente do tempo, e os mesmos constituírem dois

sujeitos, dois corpos separados ainda que conectados pelo cordão umbilical, há o

nascimento com vida desde que o infante tenha respirado.

Leciona Gonçalves que,

“Se respirou, viveu, ainda que tenha perecido em seguida.”

Do mesmo modo Caio Mário, entende que a vida do novo sujeito configura-

se no momento em que se opera a primeira troca oxicarbônica no meio ambiente.

Considera-se que viveu a criança que tiver inalado ar atmosférico, ainda que

pereça posteriormente. Assim, desde que tenha respirado, ou seja, houve a

entrada de ar nos pulmões denota a vida, mesmo que não tenha sido cortado o

cordão umbilical e a sua prova far-se-á por todos os meios, como sejam o choro,

os movimentos e essencialmente de que se utiliza a medicina legal para a

verificação do ar nos pulmões.19

Acrescenta Orlando Gomes,

“A personalidade civil do homem começa do nascimento com vida. Não basta o nascimento. É preciso que o concebido nasça vivo. O natimorto não adquiri personalidade. Entende-se que alguém nasceu com vida quando respirou. Se viveu ou não é questão que so se resolve mediante perícia médico-legal.” 20

Carlos Roberto Gonçalves alude que a certeza que o feto chegou a nascer

com vida, isto é, respirou e viveu ao menos por alguns segundos, mesmo durante

o parte é de suma importância, pois conforme analisa a seguir,

“(...) o genitor, recém-casado pelo regime da separação de bens, veio a falecer, estando vivos os seus pais. Se o infante chegou a respirar,

17 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág.186.

20 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 129.

14

recebeu, ex vi legis , nos poucos segundos de vida, todo o patrimônio deixado pelo falecido pai, à título de herança, e a transmitiu, em seguida, por sua morte, à sua herdeira, que era a sua genitora. Se, no entanto, nasceu morto, não adquiriu a personalidade jurídica e, portanto, não chegou a receber nem a transmitir a herança deixada por seu pai, ficando esta com os avós paternos.”

Aduz o autor que para obter a constatação efetiva que a criança nasceu

respirando, se faz minuciosamente um exame clínico chamado docimasia

hidrostática de Galeno, que como já dito, analisa se o feto respirou.

Tal exame, extraí da criança falecida no transcorrer do parto seus pulmões,

que são colocados dentro da água para observar se sobrenadam.

Em contrapartida, os pulmões que não respiram iram ficar submersos

dentro da água.21

Orlando Gomes aponta em suma, que a existência da personalidade

jurídica da pessoa natural começa com o nascimento com vida do infante22 e

termina com a morte natural, podendo ser esta real ou presumida.23

2.2.2 – Da pessoa jurídica

Ao nascimento, o sujeito = pessoa natural, adquire personalidade jurídica

cuja aquisição importa em direitos e deveres na ordem civil.24

21 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 98-103. 22 AMARAL, Francisco. Direito Civil. Introdução. 4º edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2002. Pág. 215. O nascimento deve ser registrado no lugar em que tiver ocorrido o parto, no prazo de 15 dias, ampliando-se até três meses para os lugares distantes mais de trinta quilômetros da sede do cartório. 23 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 137. A morte real é aquela cujo o exame médico legal aponta a morte cerebral do paciente, estando descrita no artigo 6º do Código Civil23, sendo sua prova a Certidão de Óbito do sujeito de direito. Já a morte presumida A morte presumida ou ficta poderá ser com ou sem decretação de ausência nos termos da lei. A hipótese de decretação de ausência é aquela que o ausente desapareceu de seu domicílio sem dar notícias de seu paradeiro e sem deixar um representante, produz efeitos patrimoniais, dando lugar a abertura da sucessão provisória e depois a definitiva. A proposição de não ocorrer a declaração de ausência subsume aos sujeitos que desapareceram em alguma catástrofe, bem como os que estavam a perigo de vida em virtude de qualquer fato, sendo constatado provável a sua morte ficta. 24 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 249.

15

Na mesma linha, o homem necessita e sempre necessitou através dos

tempos se agrupar, isto é, formar grupos tomados por sua autonomia da vontade

com outros sujeitos em uma sociedade buscando atingir uma finalidade coletiva.25

Assim, Caio Mário ensina que,

“Surgem, então, as pessoas jurídicas, que se compõem, ora de um conjunto de pessoas, ora de uma destinação patrimonial, com aptidão para adquirir e exercer direitos e obrigações.”26

Maria Helena Diniz corrobora a ideia,

“Assim, pessoa jurídica é a unidade de pessoas naturais ou de patrimônios, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direitos e obrigações.”27

Neste diapasão, Carlos Roberto Gonçalves aduz que a necessidade de os

indivíduos reunirem esforços e se valerem de meios coletivos para a efetivação de

finalidades comuns, vão além das possibilidades individuais, sendo que tal

efetivação motivou a organização de pessoas e bens, com o reconhecimento do

direito, que conferiu personalidade ao grupo, diferentemente de cada pessoa vista

em unidade, passando esta a atuar na vida jurídica de um ente organizado com

personalidade própria e constituída nos termos da lei.28

As pessoas jurídicas podem ser de Direito Público ou de Direito Privado.

As primeiras, se subdividem em pessoas jurídicas de Direito Público Interno

e Externo.

As pessoas jurídicas de Direito Público Interno são classificadas como

aquelas da Administração Direta, englobando União, Estados, Distrito Federal,

25 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 215. 26 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág.249. 27 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. 1º volume: Teoria Geral do Direito Civil. 24º edição. Revista e atualizada de acordo com a reforma do CPC. São Paulo: Saraiva, 2007. Pag. 229.

28 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 216.

16

Territórios e Municípios. Já da Administração Indireta, se enquadram as

autarquias, fundações públicas e demais entes dotados de caráter público.29

Com efeito, o Código Civil traz em tela em seu artigo 41 as pessoas

jurídicas ditas de direito público interno.30

Para tanto, as pessoas jurídicas de Direito Público Externo, estão

expressas no bojo do artigo 42, do Código Civil, sendo os Estados estrangeiros e

todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público.31

O começo da existência legal de uma pessoa jurídica de Direito Privado, se

dá através da inscrição do ato constitutivo respectivo (estatuto ou contrato social)

no Registro Público, precedente quando houver necessidade, de autorização ou

aprovação do Poder Executivo.32

As pessoas jurídicas de direito privado, estão revestidas na redação do

artigo 44, do Código Civil, caracterizando-as em associações, sociedades,

fundações, organizações religiosas, partidos políticos e empresas individuais de

responsabilidade limitada.33

Com o passar do tempo, a pessoa jurídica pode sofrer várias mutações em

sua estrutura podendo levá-la a sua extinção.34

29 Ibidem. Pág. 232. 30 Artigo 41, do Código Civil: “São pessoas jurídicas de direito público interno: I – a União; II – os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; III – os Municípios; IV – as Autarquias, inclusive as associações Públicas; V – as Demais entidades de caráter público criadas por lei.” 31 Artigo 42, do Código Civil: “São pessoas jurídicas de direito público externo os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional privado.” 32 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 250. 33 Artigo 44, do Código Civil: “São pessoas jurídicas de direito privado: I – as associações; II – as sociedades; III – as fundações; IV – as organizações religiosas; V – os partidos políticos; VI – as empresas individuais de responsabilidade limitada. 34 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 299. A extinção da pessoa jurídica poderá ocorrer de quatro formas: a primeira é chamada de Convencional. A pessoa jurídica poderá ser extinta por acordo livre e mútuo de vontades de seus membros formadores. A segunda é denominada como Legal. Sendo extinta por motivo determinado e previsto em lei, como por exemplo, o falecimento de todos os sócios, ou o desfazimento do capital do ente, bem como a

17

2.3 – O objeto de uma relação jurídica

Para Carlos Roberto Gonçalves, todo o campo do direito tem seu objeto,

sendo este vinculado a uma relação jurídica que se submete ao poder dos sujeitos

de direito, como mecanismo de cumprimento de seu escopo jurídico.35

Orlando Gomes ensina que o objeto de uma relação jurídica pode ser

formado por bens, prestações que consubstanciam em atos humanos ou até

mesmo por uma pessoa.

Neste ensinar, o vocábulo bem se confunde com o objeto do direito, pois

designa as coisas e comportamentos que os indivíduos possam exigir um dos

outros, entretanto, bem e coisa são distintos.36

2.4 – Bens e Coisas

Para Caio Mário, bem é tudo que nos alegra, como o dinheiro, o qual é um

bem, como o é a casa, a herança de um parente, a faculdade de exigir uma

prestação. O bem pode ser caracterizado como o nome do indivíduo, seu status

de filho, o direito à sua integridade física e moral prevista em lei. Mas, apesar de

tudo ser tido como bens, nem todos são bens jurídicos. Nesta categoria

enquadramos a satisfação de nossas exigências e de nossos desejos, quando

amparados pelo ordenamento jurídico. Escapam à sua configuração os bens

morais, as solicitações estéticas, os anseios espirituais.”37

decretação de sua falência. A terceira hipótese de extinção é chamado de Administrativa. A sua extinção esta vinculada a uma ação do poder público, uma vez que, quando a autorização deste é cassada, seja por qualquer ato contra o ordenamento pátrio, a sua extinção é verificada. Para tanto, visualiza como sendo a última hipótese de extinção de uma pessoa jurídica, a via Judicial. Geralmente está subsumida ao desvio da finalidade que o ente presta em seu estatuto ou contrato social, sendo decidido por sentença judicial a sua extinção. 35 Ibidem, pág. 275. 36 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 179. 37 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 337.

18

Na mesma linha, Pablo Stolze Gagliano, afirma que os bens vão muito além

da natureza propriamente econômica, pois o ser humano é um ser consumista que

necessita, ao longo de sua existência a realização pessoal, que muitas vezes é

conquistada através de um bem, seja ele de cunho patrimonial ou não.38

Orlando Gomes leciona que bem contempla muito mais do que apenas a

função pecuniária, compreende sim toda sua utilidade, seja física ou ideal que

possa agir nos direitos inerentes dos indivíduos em uma sociedade.39

Retornando a Caio Mário, este indaga que,

“Tudo que se pode integrar no nosso patrimônio é um bem, e é objeto de direito subjetivo. São os bens econômicos. Mas não somente estes são objeto de direito. A ordem jurídica envolve ainda outros bens inestimáveis economicamente, ou insuscetíveis de se traduzirem por um valor pecuniário. Não recebendo, embora, esta valoração financeira, e por isso mesmo não integrando o patrimônio do sujeito, são suscetíveis de proteção legal. Bens jurídicos sem expressão patrimonial estão portas adentro do campo jurídico; o estado de filiação, em si mesmo, não tem expressão econômica; o direito ao nome, o poder sobre os filhos não suscetíveis de avaliação. Mas são bens jurídicos, embora não patrimoniais. Podem ser, e são, objeto de direito. Sobre eles se exerce, dentro dos limites traçados pelo direito positivo, o poder jurídico da vontade, e se retiram da incidência do poder jurídico da vontade alheia.”40

Ainda,

“Dizendo que são objeto dos direitos os bens jurídicos, empregamos a expressão em sentido amplo ou genérico, para compreender tudo que pode ser objeto da relação jurídica, sem distinção da materialidade ou da patrimonialidade.”41

Os bens em sua natureza podem ser tidos como corpóreos e incorpóreos.

Os bens denominados corpóreos apresentam existência concreta, física e

podem ser tocados por qualquer individuo, contudo, atualmente as diversas

38 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil, volume 1. Parte geral/ Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho – 16º edição rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 306. 39 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 180. 40

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 337. 41 Idem.

19

formas de captação de energia, como o vapor, o gás e a própria eletricidade,

também são bens materialmente corpóreos.42

Em contrapartida, os bens incorpóreos são aqueles que tem sua existência

fixada em um cenário abstrato, idealístico, sem deixar contudo, o caráter

pecuniário na relação, como os direitos autorais e de crédito.43

Se o bem pode ser considerado de natureza patrimonial ou não, a coisa é

muito mais limitada, pois se vincula essencialmente a índole econômica.

As coisas são materiais ou concretas, ao passo que um bem se reserva em

si, para indicar os imateriais ou abstratos.

A energia elétrica, os gases e vapores, um imóvel, um animal, um cadáver,

ou partes de um corpo humano já falecido, como os cabelos por exemplo, são

caracterizados como coisas que podem vir a ser objeto e passar a pertencer uma

relação jurídica.44

Assim, para uma coisa poder ser objeto de uma dada relação jurídica, tem

que reunir certos elementos e qualidades, tais como a economicidade,

permutabilidade e a limitabilidade.

Com efeito, precisa haver a avaliação econômica das coisas no sentido

jurídico, ou seja, precisa a res ter valor pecuniário de uso, permuta ou ainda, poder

sofrer a faculdade de ser apropriada em poder de um sujeito.

Orlando Gomes pondera,

“Para decidir se um objeto é coisa, não vale o critério naturalístico. O conceito jurídico de coisa obedece a critério essencialmente econômico e social. São as noções correntes, econômicas e socialmente, que indicam os objetos do mundo exterior idôneos à individualização necessária à sua utilização. É preciso que tenha existência própria, que seja suscetível de utilização e apropriação.”45

Confirmando a ideia, Gonçalves,

42 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 278. 43 Idem. 44 Ibidem, pág. 339-340. 45 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 181.

20

“Certas coisas insuscetíveis de apropriação pelo homem, como o ar atmosférico, o mar etc., são chamadas de coisas comuns. Não podem ser objeto de relação jurídica. Portanto, sendo possível sua apropriação em porções limitadas, tornam-se objeto do direito (gases comprimidos, água fornecida pela Administração Pública).”46

As coisas podem ser classificadas como res nullius, res derelicta e res

communes omnium.

A primeira, denominada “coisa sem dono”, é aquela onde a coisa jamais

fora apropriada, como os animais silvestres propriamente ditos, bem como a caça

solta, a pesca, uma vez que se acham a disposição de quem as localizar, não

obstante essa apropriação possa sofrer regulamentação para fins de proteção

ambiental.47

A segunda, também chamada de “coisa móvel abandonada”, poderá ser

apropriada por qualquer sujeito, haja vista que o titular da coisa lançou fora seu

direito, com a vontade de não possuí-la mais.48

E, por fim, existem coisas que não podem ser apropriadas ou integradas

tanto no patrimônio particular quanto no público, tendo em vista que é de todos,

como o ar, o mar, a luz, o sol, a lua, isto é, ninguém pode das chamadas “coisa

comum a todos” objeto de uma relação jurídica.49

2.4.1 – Classificação dos bens

Os bens se classificam, dentre outras formas, segundo sua mobilidade,

fungibilidade, consumibilidade, divisibilidade, disponibilidade, reciprocidade e a

natureza pública ou privada de sua apropriação, haja vista que não se podem ser

46

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 276-277. 47 Idem. 48 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 277. 49

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 338.

21

aplicadas as mesmas normas a todos os bens, pois cada bem possui

características particulares.50

Entretanto, não resta óbice que um bem possa possuir características de

outros bens concomitantemente ligada à sua própria.51

2.4.2 - Bens considerados em si mesmo

2.4.2.1 – Bens imóveis

Bens imóveis (chamados bens de raiz) são os bens que não podem ser

transportados sem destruição de um lugar para o outro, pois há bens que são

incorporados ao solo (artigo 79, CCB/02)52 e outros que a lei assim designa,

dependendo sempre tais bens de escritura pública e registro no Cartório de

Registro de Imóveis.53

Orlando Gomes, afirma que os bens imóveis devem ser considerados pela

própria natureza de ser, isto é, são coisas que não podem ser retiradas de seu

lugar sem a conseqüente alteração da sua substância, sendo as coisas residuais

os bens móveis.54

Para Caio Mário,

“Definem-se bens imóveis como sendo as coisas que não se podem transportar, sem destruição, de um lugar para o outro, calcada num critério distintivo natural, não basta, entretanto, a uma noção perfeita.”55

Os bens imóveis se classificam por: sua própria natureza, acessão e força

de lei.

50 Ibidem, pág. 341. 51 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 281. 52 Artigo 79 do Código Civil: “São bens imóveis o solo e tudo quando se lhe incorporar natural ou artificialmente.” 53 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 283-285. 54 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 195. 55 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 348.

22

Por sua própria natureza, assim os bens imóveis definidos, não podem se

transportar sem ocorrer destruição. Esta classificação inclui o solo, bem como sua

superfície, subsolo e espaço aéreo.56

As árvores, uma construção, arbustos, plantas fixadas ao solo, em caráter

duradouro, seja naturalmente ou pela ação humana, são denominados bens

imóveis por acessão.57

Finalmente, os bens imóveis determinados por lei, são os incorpóreos, que

podem ser tanto moveis quanto imóveis, contudo, o legislador com o intuito de

tutelar as relações jurídicas os definem como sendo imóveis (embarcações e

aeronaves imobilizados para hipoteca).58

2.4.2.2 – Bens móveis

Todos aqueles bens, suscetíveis a mudança de localidade, por seu próprio

movimento (animais) ou por vontade alheia (mercadorias), sem alteração de sua

essência e com valor econômico, são considerados bens móveis.59

De acordo com Caio Mário, os bens são considerados,

“(...) como móveis todas as coisas suscetíveis de deslocamento sem alteração de substancia ou de destinação econômico-social, com exceção daquelas, como se viu, que acendem às imóveis, e adquirem a natureza destas. Levando em conta a qualidade própria ou alheia do impulso, chamam-se semoventes aqueles dotados de movimento por sua própria, e simplesmente móveis os demais, distinção sem qualquer efeito prático.” 60

O mesmo autor relata que,

56 Ibidem, pág. 349. 57 GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo Curso de Direito Civil, volume 1. Parte geral/ Pablo Stolze Gagliano, Rodolfo Pamplona Filho – 16º edição rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 313. 58

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 288. 59 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 198. 60

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 352-353.

23

“(...) a importância do bem móvel cresce extraordinariamente. Veículos, máquinas, ações, instrumentos de alto poder e de elevado valor são móveis. Direitos expressos em títulos de sociedade são móveis e representam enorme papel na economia.”61

Os bens móveis podem ser classificados em: por sua natureza, por

antecipação e por determinação legal.

Por sua natureza, compreendem-se os bens que sem deterioração de sua

essência, podem se deslocar de uma localidade para outra como os animais

(semoventes), por sua própria força ou alheia.62

A legislação brasileira classifica os animais, conforme assevera Edna

Cardozo Dias,

“(...) silvestres como bem de uso comum do povo, ou seja, um bem difuso indivisível e indisponível, já os domésticos são considerados pelo Código Civil como semoventes passíveis de direitos reais. A natureza jurídica dos mesmos em nossa legislação constitui um grande obstáculo para um raciocínio diferente daquele que está arraigado na consciência popular, ou seja, o animal é um bem, seja da coletividade, seja propriedade particular.”63

Para Francisco Amaral os animais não são sujeitos de direito, mas sim

coisas que podem ser objetos de direito.64

Com efeito, a partir da Constituição Federativa do Brasil de 1988, os

animais (bens semoventes) independentemente de serem caracterizados ou não

membros da fauna brasileira, são amparados pela garantia constitucional, que

enseja maior força ao ordenamento vigente, pois todas as situações jurídicas

devem se conformar aos princípios constitucionais.65

61 Ibidem, pág. 347, 62 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 291. 63 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 36. 64 AMARAL, Francisco. Direito Civil. Introdução. 4º edição, Rio de Janeiro: Renovar, 2002. Pág. 211. 65 Art. 225, § 1, CF/88: “Incumbe ao Poder Público: VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.”

24

Fato esse, que se corrobora com o aludido no §3º do artigo 225, da CF/8866,

que evidenciou o objetivo de punir, mediante o auxílio do direito penal pátrio e na

Lei 9.605 de 12.02.1998, chamada Lei de Crimes Ambientais, sanções aplicadas

aos sujeitos infratores que praticam condutas lesivas ou ameaçam a vida da fauna

e da flora.

Finalmente, Danielle Tetü Rodrigues salienta que,

“(...) os Animais são protegidos da seguinte forma: primeiro, os Animais continuam sendo considerados coisas ou semoventes, ou coisas sem dono conforme os dispositivos do Código Civil Brasileiro e, nesse sentido, são protegidos mediante o caráter absoluto do Direito de Propriedade, ou seja, como propriedade privada do homem e passíveis de apropriação. Aqui se encontram os Animais domésticos e domesticados, considerados coisas, sem percepções e sensações.”67

No caso dos bens móveis por antecipação, abrange àqueles bens

incorporados ao solo, mas que podem ser separados e serem convertidos em

bens móveis, como as árvores destinadas a corte e os frutos que ainda pendem à

ser colhidos.68

Por fim, os bens móveis por determinação legislativa são aqueles que a

norma os define, como as energias, direitos reais e de crédito, ações sobre

objetos móveis, direitos autorais, dentre outros.69

Ainda, os bens móveis podem se classificar em bens fungíveis e

infungíveis, consumíveis e inconsumíveis, divisíveis e indivisíveis, singulares e

coletivos, bem como bens principais e acessórios (bens reciprocamente

consideráveis), públicos e privados (bens de uso comum do povo).70

66 §3º do artigo 225, da CF/88: “As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou pessoas jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.” 67 RODRIGUES, Danielle Tetü. O Direito e os Animais. Uma abordagem ética, filosófica e normativa. 1ª edição, Curitiba: Juruá, 2008. Pág. 68-69. Este tema será aprofundado mais no capítulo seguinte do presente trabalho. 68 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 292. 69 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 355. 70 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 282.

25

2.5 – Fato propulsor

Também denominado de vínculo jurídico ou fato jurídico, caracterizam-se

como um elemento essencial gerador de uma relação jurídica, formando-se a

partir da soma do fato, isto é, um evento de qualquer natureza que possa incidir

diretamente a originar, modificar ou extinguir uma relação jurídica, e do preceito

legal, o qual sem ele o fato não gera direitos subjetivos, tampouco um vínculo

jurídico. Assim, com a conexão de ambos, a eventualidade do fato

consubstanciado no dispositivo legal, gerará um fato jurídico.71

Com efeito, na expressão sistemática da palavra Fato Jurídico reside a

possibilidade de sua leitura no sentido lato sensu e stricto sensu.

Orlando Gomes, leciona que fatos jurídicos em sentido amplo são aqueles

acontecimentos, que dependentemente ou não, da vontade humana, o direito

comina eficácia.

Todavia, em sentido estrito, os fatos jurídicos não englobam os atos

jurídicos, isto é, os eventos dependentes da vontade humana, mas sim os fatos

naturais ordinários (como o nascimento, a maioridade, a morte ou o transcorrer do

tempo) e os extraordinários (como enchentes ou maremotos), onde os efeitos são

expressamente conferidos por lei.72

Venosa, relata que os efeitos dos fatos jurídicos em geral criam, modificam

ou extinguem direitos.

Para o autor, a aquisição dos direitos de um sujeito poderá ser originária ou

derivada.

“É originária a aquisição feita pelo titular, sem qualquer relacionamento com um titular anterior ao direito a adquirir, tanto porque o direito surge pela primeira vez (como é o caso da aquisição da propriedade pela ocupação de uma coisa sem dono – res nullius), como porque o direito já existia, como na coisa abandonada (res derelicta).

71 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 383-384. 72 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 215-216.

26

Na aquisição derivada, há relacionamento com o titular antecedente do direito, como é o caso da compra e venda.”73

Ainda, a aquisição dos direitos tem capacidade de ser de forma gratuita,

quando, por exemplo, os bens que são herdados pelo herdeiro são percebidos

sem contraprestação, ou onerosa, quando possui a incidência de uma

contraprestação (no caso da compra e venda).74

Para tanto, singular ou universal será a aquisição de direitos quando a

transmissão recai em um ou vários bens determinados ou quando ocorrer a

transmissão de todo o patrimônio do individuo ou de uma de suas partes

constituída em universalidade de direitos, respectivamente.75

Gonçalves ensina que os direitos subjetivos estão sujeitos a sofrer sempre

mutações em sua substância durante sua existência, podendo esta alteração

ocorrer nas pessoas (subjetiva) ou no objeto (objetiva) da relação.76

Outras vezes, os direitos podem vir a ser perdidos ou extintos.

Perde-se o direito quando ele se destaca do titular e passa a substituir com

outro sujeito, ou seja, troca de sujeitos em um determinado vínculo.

A extinção do direito se nota quando o mesmo desaparece, sem poder ser

usufruído ou exercido pelo seu atual titular ou por qualquer outra pessoa, sendo

que esta extinção poderá ocorrer de forma objetiva, como o perecimento do objeto

de uma relação jurídica, ou subjetiva, como o falecimento do titular de direito

personalíssimo.77

Do mesmo modo, Caio Mário assinala, que a perda do direito se configura

quando ele se separa do titular atual, e passa a se ter um novo sujeito. No que

tange a extinção, supõe-se pela destruição da relação jurídica. Dessa forma, as

73 VENOSA, Sílvio Salvo. Direito Civil. Parte Geral. 14º edição, São Paulo: Atlas, 2014. Pág. 355. 74 Ibidem, pág. 356. 75 GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. Revista, atualizada e aumentada, de acordo com o Código Civil de 2002, por Edvaldo Brito e Reginalda Paranhos de Brito. Rio de Janeiro: Forense, 2007. Pág. 219. 76 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Volume 1: Parte Geral, de acordo com a Lei n.º 12.874/2013, São Paulo: Saraiva, 2014. Pág. 326. 77 Idem.

27

faculdades jurídicas não podem ser exercidas pelo sujeito atual, nem por outro

qualquer.”78

3 - Os animais no sistema jurídico vigente: Sujeitos de direitos ou meras

“coisas”?

3.1 – Da fauna terrestre

Tem que se observar primeiramente, o artigo 225, §1º, VII da Constituição

Federal de 1988, para designar a fauna e sua tutela jurídica. Desta forma, o artigo

prescreve o seguinte: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo

para as presentes e futuras gerações. §1º Para assegurar a efetividade desse

direito, incumbe ao Poder Público: (...) VII – proteger a fauna e a flora, vedadas,

na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica,

provoquem a extinção de espécies ou submetem os animais a crueldade.”79

A Lei n.º 5.197/67 (Lei de Proteção a Fauna) em seu artigo 1º prescreve:

“Os animais de quaisquer espécies em qualquer fase do seu desenvolvimento e que vivem naturalmente fora do cativeiro, constituindo a fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais são propriedades do Estado, sendo proibida a sua utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha”.

Tal artigo revela à necessidade da proteção e preservação da fauna

terrestre, resguardando inclusive a extinção das espécies e a submissão dos

animais a crueldade. Ainda, mesmo que a Lei de Proteção a Fauna não vislumbrar

a fauna doméstica, não pode ser tutelado somente a fauna terrestre, devendo ser

considerado integrante da fauna os animais domesticados, uma vez que apesar

78 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. Volume 1: Introdução ao direito civil/teoria geral do direito civil, Rio de Janeiro: Forense, 2014. Pág. 393. 79 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17º edição, São Paulo: Malheiros, 2009. Pág. 806.

28

de não possuírem uma função ecológica e não correrem risco de extinção, devem

ser protegidos contra as praticas abusivas e mais cruéis da coletividade.80

Dessa forma, a fauna terrestre compreende dentre outras coisas, os

animais de qualquer espécie, cabendo a União e os Estados em competência

concorrente, legislar e tutelar sobre a fauna, sendo vedado na forma da lei,

qualquer tratamento hostil, cruel ou que coloquem os animais sob maus-tratos.81

Para Machado, é cediço que a proteção aos animais do Poder Público se

manifesta através do dever geral previsto na Carta Magna de 1988, mais

precisamente no artigo 225 supra mencionado, todavia, tal tutela pode cessar

quando ocorrer a morte do animal mediante justificativa aceita e expressa,

“A Constituição Federal não proibiu que a alimentação humana seja carnívora. Ao não proibir a alimentação carnívora, faz-se uma pressuposição de que tal hábito seja ditado por uma implícita necessidade. É um posicionamento que tem sofrido críticas, mas o sistema vegetariano não tem acolhimento constitucional. Entretanto, mesmo os animais que sejam abatidos para fins alimentícios não podem ficar sujeitos a crueldade.” 82

Aduz Fiorillo, que a palavra crueldade possui um significado muito

abrangente, podendo ser no sentido de “fazer o mal, ser duro, insensível,

desumano, rigoroso”. A CF/88 traz elementos que não visam diretamente a

proteger os animais, mas sim ao psicológico do homem, tendo em vista que o

homem médio não consegue vislumbrar praticas cruéis contra animais, tampouco

vê-los sofrendo, isto é, a proteção estabelecida por lei se fundamenta no sentido

humano.

Assim,

“A crueldade só estará caracterizada se a pratica contra o animal não tiver por finalidade proporcionar ao homem uma sadia qualidade de vida ou, na hipótese de estar presente esse propósito, os meios empregados não forem os absolutamente necessários à atividade.”83

80 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 182. 81 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17º edição, São Paulo: Malheiros, 2009. Pág. 806. 82 Ibidem, pág. 807. 83 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 189.

29

3.1.1 – Classificação da fauna brasileira

Segundo a Portaria n.º 93, de 07/07/1998, do IBAMA, a fauna brasileira

pode ser classificada como sendo: Fauna silvestre brasileira, a qual abrange

aqueles animais pertencentes as espécies nativas, migratórias e quaisquer outras,

aquáticas ou terrestres, que tenham seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites

do Território Brasileiro ou águas jurisdicionais. Ainda a fauna silvestre se

caracteriza pelas espécies que tenham desenvolvido sua vida natural em

liberdade ou fora do cativeiro;

Já os animais pertencentes as espécies ou subespécies cuja distribuição

geográfica não inclui o Território Brasileiro, as espécies ou subespécies

introduzidas pelo homem, inclusive domésticas em estado asselvajado ou alçado.

As espécies ou subespécies que tenham sido introduzidas fora das fronteiras

brasileiras e suas águas jurisdicionais e que tenham entrado em Território

Brasileiro são considerados da Fauna silvestre exótica.

Por fim, observa-se a Fauna doméstica, sendo compreendida nela aqueles

animais que através de processos tradicionais e sistematizados de manejo e/ou

melhoramento zootécnico tornaram-se domésticos, apresentando características

biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem, podendo

apresentar fenótipo variável, diferente da espécie silvestre que a originou, sendo

que não vivem em liberdade, mas sim em cativeiro, sofrendo com isso a

modificação de seu hábitat natural com a finalidade de propiciar ao humano um

bem estar psíquico.84

3.1.2 – Finalidades da fauna

A fauna possui diversas finalidades, dentre elas destacam-se a função

ecológica e a finalidade científica.

84 PORTARIA N.º 93, de 07/07/1998, do IBAMA. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 183-184.

30

A função ecológica é o elemento que determina a peculiaridade da fauna

como bem de natureza difusa. E, quando, a essa função não atender os requisitos

da essencial qualidade de vida e bem de uso comum do povo, não consistirá em

bem difuso, mas sim está sujeita aos ditames do regime de propriedade

estabelecido no direito civil, como é o caso da fauna domesticada.85

Já a finalidade científica, em síntese, é aquela que o animal poderá ser

usado para finalidades de experimentos, sendo considerados como verdadeiras

cobaias nos laboratórios de pesquisa, conforme disciplina o artigo 14 da Lei de

Proteção à Fauna.86

3.2 – O uso de animais para o ensino e para a pesquisa

Os animais não são coisas, como eram designados no Direito de épocas

passadas, mas são seres vivos (não-humanos) integrantes da fauna brasileira

tutelados pela Constituição Federal.87

A Fauna de Laboratório consiste basicamente nos seguintes animais para

os subseqüentes fins: a) Ratos: utilizados geralmente para se investigas o sistema

imunológico; b) Coelhos: submetidos a testes cutâneos e oculares, além de outros

atrozes procedimentos; c) Gatos: servem, sobretudo, às experiências cerebrais; d)

Cães: normalmente destinados ao treinamento de cirurgias; e) Rãs: usadas para

testes de reação muscular e, principalmente, na observação didática escolar; f)

Macacos: para análises comportamentais, dentre outras coisas; g) Porcos: cuja

85 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 186. 86 Idem e ibidem, pág. 187. MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17º edição, São Paulo: Malheiros, 2009. Pág. 795. “Artigo 14: Poderá ser concedida a cientistas, pertencentes a instituições científicas, oficiais ou oficializadas, ou por estas indicadas, licença especial para a coleta de material destinado a fins científicos, em qualquer época. §1º - Quando se tratar de cientistas estrangeiros, devidamente credenciados pelo país de origem, devera o pedido de licença ser aprovado e encaminhado ao órgão público federal competente, por intermédio de instituição cientifica oficial do País. §2º - As instituições a que se refere este artigo, para efeito da renovação anual de licença, darão ciência ao órgão público federal competente das atividades dos cientistas licenciados no ano anterior. §3º - As licenças referidas neste artigo não poderão ser utilizada para fins comerciais ou esportivos. §4º - Aos cientistas nacionais que tenham por lei a atribuição de coletar material zoológico, para fins científicos, serão concedidas licenças permanentes.” 87 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17º edição, São Paulo: Malheiros, 2009. Pág. 807.

31

pele frequentemente serve de modelo para o estudo da cicatrização; h) Cavalos:

muito utilizados no campo da sorologia; i) Pombos e Peixes: que se destinam, em

regra, aos estudos toxicológicos.88

A Lei dos Crimes Ambientais n.º 9.605/1998, em seu artigo 32 assinala, no

seu parágrafo 1º, uma pena para a experiência dolorosa ou atroz em animais

vivos (silvestres, domésticos ou exóticos), mesmo considerando os utilizados para

fins científicos, quando houver recursos alternativos, ou seja, consideram-se

ilícitas as praticas experimentais com modelos animais tão somente quando

existirem outras formas de realizar a mesma prática. O parágrafo 2º salienta que

existirá aumento da pena de um sexto a um terço, caso venha a ocorrer a morte

dos animais, nas situações previstas no artigo.

Apesar das vedações legislativas, admite-se o sofrimento dos animais se

este for inevitável para a pesquisa cientifica, pois, nesta linha, o interesse público

nas descobertas científicas se sobrepõe sobre o interesse em evitar sofrimentos

aos animais.89

Elida Séguin, entende que,

“A experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos é crime que preocupa os cientistas e os docentes de biologia. O uso de animais na pesquisa cientifica evita que o homem seja cobaia, mas não justifica excesso de dor afligida aos pequenos seres.”90

Com efeito, chama-se de vivissecção a realização de experiência dolorosa

em seres vivos, anestesiados ou não, para o estudo dos processos da vida e de

doenças através de testes e experimentos científicos.91

Conforme aponta Edna Cardozo Dias, algumas práticas, ou experimentos

que se valem dos animais podem ser caracterizadas, como o: Teste de irritação

dos olhos (Draize Eye Irritancy Test), caracterizado pelo fato de que vários

88 GREIF, Sergio e TRÉZ, Thales. “A Verdadeira Face da Experimentação Animal”. A sua Saúde em Perigo – Sociedade Educacional Fala Bicho, 02º Edição. Rio de Janeiro, 2000. Pág. 200. 89 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 67. 90 SÉGUIN, Elida. O Direito Ambiental. Nossa Casa Planetária, 3º edição, Rio de Janeiro, Forense: 2006. Pág. 444. 91 A Lei n.º 6.638 de 1979 disciplinou a respeito da vivissecção animal.

32

produtos como cosméticos e produtos de limpeza são testados em olhos de

coelhos conscientes. Este teste existe desde 1944. As substâncias são testadas

nos olhos de coelhos albinos presos em aparelho de contenção, que não recebem

sedativos para aliviar a dor, sendo que o teste dura vários dias, durante os quais a

córnea e a íris são examinadas para se verificar ulceração, hemorragia, irritação,

inchação, e cegueira. O Draize Test é também condenado cientificamente, pois os

olhos dos coelhos são estruturalmente diferentes dos olhos humanos;

Há o LD 50, dose letal em 50%, que foi introduzido em 1927, e consiste em

administrar nos animais uma dose de certos produtos tais como pesticidas,

cosméticos, drogas, produtos de limpeza, para verificar a toxidade. Ocorre a morte

em 50% da aplicações. A forma comum é a ingestão forçada por via bucal,

usando-se um tubo, que vai até o intestino. Outras formas incluem injeções,

inalação forçada de vapores e aplicação de substâncias na pele. Os sinais de

envenenamento incluem lágrimas, diarréia, sangramento dos olhos e boca,

convulsões. Não se dá medicamento para aliviar o sofrimento dos animais. Os

resultados variam de uma espécie para outra e de indivíduo para indivíduo;

Nota-se os Testes de toxidade alcoólica e tabaco, onde animais são

forçados a inalar fumaça e se embriagar para, depois serem dissecados. Mesmo

já conhecendo os efeitos nocivos do álcool e do tabaco no organismo dos

humanos.

Os Experimentos na área da psicologia são caracterizados como sendo um

dos mais cruéis experimentos se realizam na área da psicologia. Tais fatos

incluem na observação do medo, no uso de estímulos aversivos, como choques

elétricos, dor, a falta de alimentação e água para aprendizagem e na indução dos

animais a estados psicológicos estressantes que servem para testar drogas já

conhecidas, como antidepressivos, soníferos, sedativos, estimulantes e

tranqüilizantes. São submetidos ainda, os animais, em operações para retirada de

parte do cérebro, para observação das alterações comportamentais.

No caso dos Experimentos armamentistas, os animais são submetidos a

radiações de armas químicas e biológicas, assim como a descargas de armas

33

tradicionais. São expostos, ainda, a gases e são baleados na cabeça, para estudo

da velocidade dos mísseis.

Nas Pesquisas dentárias, os animais são forçados a manter dieta nociva

com açúcares, e hábitos alimentares inadequados para adquirirem cáries e terem

gengivas descoladas e a arcada dentária removida;

Há casos em que os animais são lançados contra paredes de concreto.

Babuínos, fêmeas grávidas e outros animais são estraçalhados e mortos nesta

prática, sendo esta denominada de Teste de colisão.

Outro método utilizado é a Dissecação, onde os animais são dissecados

vivos nas universidades e o mesmo experimento é repetido milhares de vezes,

quando hoje já existem vídeos e outros métodos audiovisuais disponíveis;

As Práticas médico-cirúrgicas, apesar de a cabeceira do doente ser a

melhor escola, milhões de animais são submetidos a cirurgias nas faculdades de

medicina. O serviço de zoonoses costuma suprir essas Faculdades com cães e

gatos, que serão usados por alunos no treinamento cirúrgico de cisões, suturas e

ressecção de órgãos. Vários morrem durante a cirurgia (se sangram demais ou

por incompetência técnica do aluno), outros recebem dose insuficiente de

anestesia e sofrem todas as dores da operação;

Por fim, a Experimentação animal na educação, se vale dos animais para a

observação de fenômenos fisiológicos e comportamento a partir da administração

de drogas; estudos comportamentais de animais em cativeiro; estudo da anatomia

corporal; e desenvolvimento de habilidades e técnicas cirúrgicas.92

Para Fernando Araújo, o nosso reconhecimento que os interesses humanos

são sempre superiores aos de outras espécies, não justifica qualquer tipo de

exploração e experimentação dolorosa sobre os animais (não-humanos), visto que

toda experiência ou pesquisa que leve os animais ao sofrimento, a dor, ou

92 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 68.

34

qualquer outro tipo de mal, deveria ser banida, mesmo que houvesse beneficiários

e muitos benefícios para a espécie humana.93

Ainda, este autor, aponta que uma das razões pelas quais os cientistas

preferem experimentar animais em vez de seres humanos em experimentos ou

testes, é que podem ocasionar durante o procedimento lesões cerebrais profundas

e irreversíveis que os deixem com um grau de consciência e de interação com o

meio bem mais inferior que as cobaias utilizadas em experimentação. Contudo, há

outro fator, seria o fato da suspeita de irrelevância ocasional, visto que no

transcorrer dos testes ou experimentos, na maioria dos casos as cobaias são

submetidas a dores intensas, sendo que os resultados obtidos são meramente

triviais, óbvios ou simplesmente sem significado ou benefício algum para os

humanos.94

Para tanto, atualmente há métodos modernos que podem fazer substituir o

uso de animais em pesquisas e experiências.

3.2.1 – Métodos alternativos e a Lei n.º 11.794/2008

O conflito de interesses entre humanos e não-humanos é o que respeita à

admissibilidade de experimentação científica destrutiva ou dolorosa para as

cobaias. Mas sabe-se, que atualmente o progresso científico poderá sofrer

obstáculos devido à possível atribuição de direito aos animais, em especial ao não

sofrimento destes, pois muitos cientistas sustentam que análise do custo-benefício

na utilização de animais em experimentos científicos, poderá demonstrar avanços

significativos tanto na área científica quanto na área médica e biomédica.95

Para Edna Cardozo Dias, os métodos alternativos podem ser considerados

aqueles que recorrem a radiologia, química, matemática, microbiologia, dentre

93 ARAÚJO, Fernando. “A hora dos direitos dos animais”. Coimbra: Editora Almedina, 2003. Pág.96-98. 94 Ibidem. Pág. 238-239. 95 Ibidem. Pág. 233-235.

35

outros que podem fazer evitar a utilização de animais, sendo estes cobaias em

testes e experimentos científicos em laboratórios.96

Acrescenta Danielle Tetü Rodrigues que,

“Ainda que aceita a premência humana, é inadequado e ineficaz justificar a exploração dos animais simplesmente por não serem seres humanos, ou por considerá-los menos inteligentes, menos importantes, ou simplesmente por não falarem.”

A autora salienta que as experiências e testes científicos realizados com

animais em laboratórios que os levem a um estado de dor, sofrimento devem ser

definitivamente proibidos, face ao principio da igualdade e consideração dos

interesses. Não pode sacrificar animais em detrimento dos humanos e nem vice-

versa, pois aqueles muitas vezes são expostos em experiências cientificas que

não reproduzem sequer um resultado positivo e que auxilie em algum campo

societário e da ciência a espécie humana.

Não se pode denegar a vida de um animal como a de um chipanzé dotado

de consciência em relação a um humano, pois tanto a vida do homem quanto a do

animal possuem valor. A vida é muito valiosa independentemente das

características e qualidades do ser vivo. Não se trata de somente evitar a morte

dos animais, mas dar oportunidade para nascerem e permanecerem tutelados

pelo o ordenamento pátrio. A gratidão e o sentimento de solidariedade para com

os animais devem ser valores relevantes na vida do ser humano. 97

Para tanto, existem muitos métodos alternativos que preservam e protegem

a vida dos animais e afastam os maus tratos e a crueldade que estes poderão vir

a sofrer em testes de laboratórios, tais como: a Tecnologia In Vitro, onde culturas

celulares é a técnica que consiste em cultivar células isoladas fora de seu meio

normal. Tais células são provenientes de fontes humanas, animais e vegetais.

A técnica da Utilização combinada de testes, que implica na conservação

em vidro de parte ou de todo um órgão, de maneira a salvaguardar sua estrutura 96 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 69. 97 RODRIGUES, Danielle Tetü. O Direito e os Animais. Uma abordagem ética, filosófica e normativa. 1ª edição, Curitiba: Juruá, 2008. Pág. 45-55.

36

fundamental e seus caracteres bioquímicos. As bactérias e os organismos

unicelulares são freqüentemente utilizados como instrumentos de experiência. A

conjugação desse método com outros testes reduzirá o número inaceitável de

animais empregados em escolas, laboratórios industriais e universidades.

A Pesquisa epidemiológica, que utiliza voluntários, estudo clínico de casos,

relatório de autópsias e análise estatística aliada à observação mais acurada.

Permite observar os fatores ambientais ligados à doença, o que não é possível em

animais confinados.

Um material puramente humano, sem custo e que normalmente era

descartado logo após o nascimento de uma criança, agora pode ser utilizado na

prática de cirurgia microvascular e no teste de toxidades. Esse material é a

Placenta.

A Farmacologia quanta, é uma técnica computadorizada usada na química

no estudo da estrutura molecular de medicamentos para saber o efeito da droga

no órgão humano em epígrafe.

Outra técnica é o chamado Eyetex, que vem em substituição ao Draize eye

irritancy test (testes nos olhos de coelhos), e prevê o uso de uma proteína líquida

que imita a reação do olho humano.

A Cromatografia e espectroscopia é usada para separar drogas no nível

molecular para identificar suas propriedades, podendo detectar a trajetória de

drogas e seus danos aos humanos. Mais recentemente, o aprimoramento da

técnica vem permitindo mensurar insulina por métodos que não envolvam o uso

de animais, substituindo o teste LD50 na mensuração de antibióticos anti-

tumorais.

Por fim, a Pele reconstituída se vale de fragmentos de pele humana a partir

de restos de cirurgias plásticas.98

As atividades de ensino e pesquisa de animais em entidades privadas

devem observar sempre a proteção ao meio ambiente e a preservação da fauna e

da flora, sendo não apenas da União, mas do Estado, Distrito Federal e dos

98 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 69-70.

37

Municípios tal fiscalização e a regulamentação do uso dos animais em pesquisas

é de competência da União, podendo o Estado legislar suplementarmente nesta

matéria, conforme alude o art. 23, V, VI e VII da CF/1988 e artigo 24, §2º99

respectivamente.

A Lei Arouca n.º 11.794/1988, criada pelo Deputado Sérgio Arouca,

regulamentou o uso de animais em experimentos científicos.

A lei restringe o uso de cobaias apenas para as pesquisas que tenham a

finalidade de melhorar e prolongar a vida do ser humano. Também é permitido o

uso de animais em experimentos que testem a segurança e eficácia de fármacos

desenvolvidos para o tratamento de doenças. Em ambos os casos, as pesquisas

devem obrigatoriamente prezar pelo bem estar do animal utilizado.100

Para tanto, a Lei Arouca criou o Conselho Nacional de Controle de

Experimentação Animal (CONCEA) e as Comissões de Ética no Uso de Animais

(CEUAS), as quais se integram nela médicos veterinários e biólogos, docentes e

pesquisadores na área específica e um representante das sociedades protetoras

dos animais, nos termos do art. 9 da Lei 11.794/2008.

Com isso, as instituições e laboratórios devem se credenciar na Secretaria-

Executiva do CONCEA101, um órgão governamental que está em fase de

organização, e terem seus protocolos de pesquisas aprovados por uma Comissão

de Ética do Uso de Animais, conforme fixado no artigo 12 da Lei Arouca.102

99

Art. 23 da CF/88: “É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e os Municípios: V – proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência; VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas; VII – preservar as florestas, a fauna e a flora. Art. 24 da CF/88: “Compete a União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: §2º - A competência da União para legislar sobre matérias gerais não exclui a competência suplementar dos Estados. 100

Disponível em: http://www.icb.ufrj.br/Revista-Bio-ICB/Materias-Anteriores/Lei-Arouca-e-a-etica-no-uso-de-animais-233.html. Acesso em 26/08/2014, às 14h33. 101 Art. 32 do Decreto 6.899/09: “O requerimento será protocolado na Secretaria-Executiva do CONCEA, autuado e devidamente instruído.” 102 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 17º edição, São Paulo: Malheiros, 2009. Pág. 809. Art. 12 da Lei 11.794/2008: “a criação ou a utilização de animais para pesquisa ficam restritas, exclusivamente, às instituições credenciadas no Concea.” Este dispositivo legal comete dois equívocos. Primeiro, a lei não trata da criação de animais. Por segundo, quando a lei expressa que só o Concea poderá utilizar animais para pesquisa, está violando claramente o art. 23 da nossa Carta Magna.

38

Dessa forma, foi criado o Cadastro das Instituições de Uso Científico de

Animais (CIUCA), a ser implementado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e

administrado pela Secretaria-Executiva do CONCEA, destinado ao registro das

instituições para a utilização de animais em ensino e pesquisa cientifica.

Ao CONCEA, cabe monitorar e avaliar a introdução de técnicas alternativas

que substituam a utilização dos animais em ensino e pesquisa. (art. 5º, III da Lei

Arouca e art. 4º do Decreto 6.899/2009).

Para Marcelo Morales, a lei atribui competência para os Estados investirem

cada vez mais nos laboratórios de pesquisas e ensinos para que melhorem a

qualidade de vida dos animais e, consequentemente, a qualidade da própria

pesquisa, já que muitas das vezes os animais são utilizados em péssimas

condições e isso pode prejudicar não somente a pesquisa, mas as suas vidas.103

Está evidenciado pelas normas estabelecidas em lei, a obrigatoriedade da

aplicação de analgésicos ou anestésicos para aliviar o desconforto das cobaias

durante os procedimentos dos experimentos. Pois, se passarem por um enorme

sofrimento e dor durante o decorrer da pesquisa, os animais devem ser

sacrificados.104

Neste diapasão, Raphael Marchiori, afirma que,

“(...) a capacidade humana de amor e compaixão é, no mínimo, bastante limitada e não se dá conta de que explorar de forma desmedida o outro não é apenas falta de amor, mas crueldade. (...) o desejo é de respeito, limite de entender que um bicho sofrendo dentro de um laboratório é tão grave que merece agilidade e prioridade da ciência para arrumar outras soluções.”105

Philip Low leciona que,

“O mundo gasta 20 bilhões de dólares por ano matando 100 milhos de vertebrados em pesquisas médicas. A probabilidade de um remédio advindo desses estudos ser testado em humanos (apenas teste, pode ser que nem funcione) é de 6%. É uma péssima contabilidade. Um primeiro

103 Disponível em: http://www.icb.ufrj.br/Revista-Bio-ICB/Materias-Anteriores/Lei-Arouca-e-a-etica-no-uso-de-animais-233.html. Acesso em 26/08/2014, às 14h33 104 Disponível em: http://ucho.info/revolucao-dos-beagles-lei-arouca-define-regras-para-uso-de-cobaias-desde-2008. Acesso em 26/08/2014 às 14h48. 105 Jornal Gazeta do Povo. Coluna: Vida e Cidadania. “Ciência caminha para o fim do uso de cobaias, mas progresso é lento”. Artigo Raphael Marchiori – 27/10/2013. Pág. 8.

39

passo é desenvolver abordagens não invasivas. Não acho ser necessário tirar vidas para estudar a vida. Penso que precisamos apelar para nossa própria engenhosidade e desenvolver melhores tecnologias para respeitar a vida dos animais. Temos que colocar a tecnologia em uma posição em que ela serve nossos ideais, em vez de competir com eles.”106

Os métodos alternativos ao uso de animais em experimentos científicos são

procedimentos que podem substituir totalmente os animais, ou reduzir o número

dos mesmos utilizados, ou, ainda, diminuir o grau de sofrimento causado aos

animais em testes e pesquisas.107

Para Levai, insistir na experimentação animal é cultivar um erro

metodológico, cujo maior lesado será sempre o homem.108

Assim sendo, a Constituição Federal, por opção do legislador brasileiro,

veda o uso de animais em experimento e pesquisas, quando existentes meios

alternativos, porquanto, inexiste qualquer confronto com a Lei n.°11.794/2008, pois

esta, como já demonstrado acima, regula o procedimento para o uso científico de

animais, reconhecendo a necessidade de substituição dessa prática por recursos

alternativos, haja vista que os animais são seres não-humanos sensíveis dotados

de direito à vida, ao livre desenvolvimento de sua espécie, da integridade de seu

corpo e de seu organismo, o não sofrimento e à liberdade, sendo tutelados em

face de qualquer forma arbitrária de maus tratos ou abuso não apenas pelo Texto

Constitucional, mas sim pelas legislações infraconstitucionais.109

3.2.1.1 – Dos crimes contra a vida “consciente” dos animais

Para David B. Edelman, os humanos não são os únicos com as estruturas

neurológicas que geram consciência, haja vista que os mamíferos, aves e até

alguns seres invertebrados, como o polvo, possuem sistemas neurológicos. 106 Disponível em: http//contatoanimal.blogspot.com.br/2013/01/a-declaracao-de-cambridge.html. Acesso em 29/08/2014 às 14h20; 107 SANTOS, Cleopas Isaías. Afinal, o que se deve entender por “recursos alternativos” no crime de crueldade experimental de animais (art. 32, § 1º da Lei n.º 9.605/98)?. Congresso Internacional de Ciências Criminais, 02º edição, 2011. Pág. 133. 108 LEVAI, Laerte Fernando. Direito dos Animais. O direito deles é nosso direito sobre eles. Campos do Jordão: Editora Mantiqueira, 1998. Pág. 72. 109 Jornal Gazeta do Povo. Coluna: Justiça e Direito. “Uma Prática Obsoleta!”. Artigo Danielle Tetü Rodrigues. – 01/11/2013. Pág. 9.

40

Esta consciência “animal” seria a capacidade de perceber um cenário

integrado por meio de visões, cores, formas e assim mantê-lo em sua memória, ou

seja, a aptidão do animal em observar e guardar o que realmente viveu nos

momentos de sua existência.110

Nesta linha, Danielle Tetü Rodrigues, analisa que os animais são sujeitos

de direitos, mas com uma personalidade própria e autônoma, “sui generis”, posto

que possuem sentimentos e sensações similares aos dos humanos, sentem dor,

medo, fome, frio, angústia, alegria. Enfim, eles tem consciência, e esse fato é

incontroverso devido ao Manifesto de Cambridge.111

Ainda, Philip Low,

“Quando um cachorro está com medo, sentindo dor, ou feliz em ver seu dono, são ativadas em seu cérebro estruturas semelhantes às que são ativadas em humanos quando demonstramos medo, dor e prazer. Um comportamento muito importante é o autorreconhecimento no espelho. Dentre os animais que conseguem fazer isso, além dos seres humanos, estão os golfinhos, chipanzés, cães e uma espécie de pássaro chamada pica-pica.”112

Salienta ainda Danielle, que a Constituição Federal e as leis

infraconstitucionais de proteção a fauna ambiental brasileira, impõe restrições na

ideia de propriedade dos animais ao coibir crueldades e maus tratos diante deles,

pois caso fosse apenas levando em conta o entendimento firmado pelo Código

Civil de 2002, os proprietários poderiam fazer o que quisessem com o bem

(animais) que lhes pertencem.113

Ademais enquanto o Código Civil traz a ideia dos animais como coisas/bens

perante seus donos/proprietários, no âmbito penal, a lei traz em seu bojo o seu

110 Disponível em: http//contatoanimal.blogspot.com.br/2013/01/a-declaracao-de-cambridge.html. Acesso em 29/08/2014 às 14h20; Tais análises foram comprovadas por meio da Declaração de Cambridge sobre Consciência Animal, publicada no dia 07 de julho de 2012 realizada e assinada por um grupo de 25 médicos neurocientistas na Universidade de Cambridge. (Manifesto de Cambridge traduzido em anexo). 111 Jornal Gazeta do Povo. Coluna: Justiça e Direito. “Até onde vão os Direitos dos Animais”. Artigo Joana Neitsch – 25/10/2013. Pág. 6. 112 Disponível em: http//www.altosestudos.com.br/?p=51966. Acesso em 24/08/2014 às 21h17; 113 Jornal Gazeta do Povo. Coluna: Justiça e Direito. “Até onde vão os Direitos dos Animais”. Artigo Joana Neitsch – 25/10/2013. Pág. 6.

41

âmbito de proteção a fauna silvestre, doméstica ou exótica, condenando qualquer

forma de crueldade ou abuso contra os animais.

Helita Barreira Custódio, afirma ser a crueldade praticada contra os

animais,

“(...) toda ação ou omissão, dolosa ou culposa (ato ilícito), em locais públicos ou privados, mediante matança cruel pela caça abusiva, por desmatamentos ou incêndios criminosos, por poluição ambiental, mediante dolorosas experiências diversas (didáticas, científicas, laboratoriais, genéticas, mecânicas, tecnológicas, dentre outras), amargurantes práticas diversas (econômicas, sociais, populares, esportivas como tiro ao vôo, tiro ao alvo, de trabalhos excessivos ou forçados além dos limites normais, de prisões, cativeiros ou transportes em condições desumanas, de abandono em condições enfermas, mutiladas, sedentas, famintas, cegas ou extenuantes, de espetáculos violentos como lutas entre animais até a exaustão ou morte, touradas, farra do boi ou similares), abates atrozes, castigos violentos e tiranos, adestramentos por meios e instrumentos torturantes para fins domésticos, agrícolas ou para exposições, ou quaisquer outras condutas impiedosas resultantes em maus-tratos contra animais vivos, submetidos a injustificáveis e inadmissíveis angústias, dores, torturas, dentre outros atrozes sofrimentos causadores de danosas lesões corporais, de invalidez, de excessiva fadiga ou de exaustão até a morte desumana da indefesa vítima animal.”114

O Decreto 24.645 de 1934 definiu trinta e uma figuras típicas de maus-

tratos contra os seres não humanos em seu art. 3º115.

114 CUSTÓDIO, Helita Barreira. Condutas lesivas à fauna silvestre. Revista de Direito Civil, Imobiliário, Agrário e Empresarial, 1993. Pág. 87. 115 Art. 3º do Decreto 24.645/34 - Consideram-se maus tratos: I - praticar ato de abuso ou crueldade em qualquer animal; II - manter animais em lugares anti-higiênicos ou que lhes impeçam a respiração, o movimento ou o descanso, ou os privem de ar ou luz; III - obrigar animais a trabalhos excessivos ou superiores às suas forças e a todo ato que resulte em sofrimento para deles obter esforços que, razoavelmente, não se lhes possam exigir senão com castigo; IV - golpear, ferir ou mutilar,voluntariamente, qualquer órgão ou tecido de economia, exceto a castração, só para animais domésticos, ou operações outras praticadas em benefício exclusivo do animal e as exigidas para defesa do homem, ou interesse da ciência; V - abandonar animal doente, ferido, extenuado ou mutilado, bem como deixar de ministrar-lhe tudo que humanitariamente se lhe possa prover, inclusive assistência veterinária; VI - não dar morte rápida, livre de sofrimento prolongados, a todo animal cujo extermínio seja necessário para consumo ou não; VII - abater para o consumo ou fazer trabalhar os animais em período adiantado de gestação; VIII - atrelar, no mesmo veículo, instrumento agrícola ou industrial, bovinos com eqüinos, com muares ou com asininos, sendo somente permitido o trabalho em conjunto a animais da mesma espécie; IX - atrelar animais a veículos sem os apetrechos indispensáveis, como sejam balancins, ganchos e lanças ou com arreios incompletos, incômodos ou em mau estado, ou com acréscimo de acessórios que os molestem ou lhes perturbem o funcionamento do organismo; X - utilizar, em serviço, animal cego, ferido, enfermo, fraco, extenuado ou desferrado, sendo que este último caso somente se aplica a localidades com ruas calçadas; XI - açoitar, golpear ou castigar por qualquer forma a um animal caído sob o veículo, ou com ele, devendo o condutor desprendê-lo do tiro para levantar-se; XII - descer ladeiras com veículos de tração animal sem utilização das respectivas travas, cujo uso é obrigatório; XIII - deixar de revestir com o couro ou material com idêntica

42

A Lei das Contravenções Penais, em seu art. 64116, apesar de citar sobre a

crueldade e os trabalhos excessivos dos animais, não definiu tais termos.

Os ilícitos penais praticados contra a fauna brasileira eram tutelados pelo

Decreto Federal 24.645/1934 e pela LCP tipificados como sendo meras

contravenções penais, fixando sanções leves aos infratores.

Após, a Lei dos Crimes Ambientais fora publicada (Lei n.º 9.605, de 12 de

fevereiro de 1998), coibindo mediante penas administrativas e penais crimes

contra o meio ambiente, bom como a vivissecção, ou qualquer abuso ou maus-

tratos aos animais, de forma indistinta, bem como o ato de feri-los ou mutilá-los é

qualidade de proteção, as correntes atreladas aos animais de tiro; XIV - conduzir veículo de tração animal, dirigido por condutor sentado, sem que o mesmo tenha boléia fixa e arreios apropriados, com tesouras, pontas de guia e retranca; XV - prender animais atrás dos veículos ou atados às caudas de outros; XVI - fazer viajar um animal a pé, mais de 10 quilômetros, sem lhe dar descanso, ou trabalhar mais de 6 horas contínuas sem lhe dar água e alimento; XVII - conservar animais embarcados por mais de 12 horas, sem água e alimento, devendo as empresas de transportes providenciar, sobre as necessárias modificações no seu material, dentro de 12 meses a partir da publicação desta lei; XVIII - conduzir animais, por qualquer meio de locomoção, colocados de cabeça para baixo, de mãos ou pés atados, ou de qualquer modo que lhes produza sofrimento; XIX - transportar animais em cestos, gaiolas ou veículos sem as proporções necessárias ao seu tamanho e números de cabeças, e sem que o meio de condução em que estão encerrados esteja protegido por uma rede metálica ou idêntica, que impeça a saída de qualquer membro animal; XX - encerrar em curral ou outros lugares animais em número tal que não lhes seja possível moverem-se livremente, ou deixá-los sem água e alimento por mais de 12 horas; XXI - deixar sem ordenhar as vacas por mais de 24 horas, quando utilizadas na exploração do leite; XXII - ter animais encerrados juntamente com outros que os aterrorizem ou molestem; XXIII - ter animais destinados à venda em locais que não reúnam as condições de higiene e comodidades relativas; XXIV - expor, nos mercados e outros locais de venda, por mais de 12 horas, aves em gaiolas, sem que se faça nestas a devida limpeza e renovação de água e alimento; XXV - engordar aves mecanicamente; XXVI - despelar ou depenar animais vivos ou entregá-los vivos a alimentação de outros; XXVII - ministrar ensino a animais com maus tratos físicos; XXVIII - exercitar tiro ao alvo sobre patos ou qualquer animal selvagem ou sobre pombos, nas sociedades, clubes de caça, inscritos no Serviço de Caça e Pesca; XXIX - realizar ou promover lutas entre animais da mesma espécies ou de espécie diferente, touradas e simulacros de touradas, ainda mesmo em lugar privado; XXX - arrojar aves e outros animais nas casas de espetáculos e exibi-los, para tirar sortes ou realizar acrobacias; XXXI - transportar, negociar ou caçar, em qualquer época do ano, aves insetívoras, pássaros canoros, beija-flores, e outras aves de pequeno porte, exceção feita das autorizações para fins científicos, consignadas em lei anterior. 116 Art. 64 da LCP: “Tratar animal com crueldade ou submetê-lo a trabalho excessivo: Pena – prisão simples, de dez dias a um mês, ou multa, de cem a quinhentos mil reais. § 1º Na mesma pena incorre aquele que, embora para fins didáticos ou científicos, realiza em lugar público ou exposto ao público, experiência dolorosa ou cruel em animal vivo. § 2º Aplica-se a pena com aumento de metade, se o animal é submetido a trabalho excessivo ou tratado com crueldade, em exibição ou espetáculo público.”

43

crime punível com pena de detenção e multa, sejam eles domésticos,

domesticados, silvestres, ou exóticos.117

Nota-se ainda que os crimes previstos nos artigos 31 e 32 da Lei citada

acima são praticados contra a fauna silvestre, doméstica e exótica.118

Imperioso afirmar que Edna Cardozo Dias ao tecer linhas sobre as sanções

imputadas aos crimes praticados contra a fauna previstos na Lei de Crimes

Ambientais, revela que estas são alguns dispositivos legais que tutelam tal meio,

117 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 65. 118 Art. 31 da Lei 9.605/98: “Quem mata, persegue, caça, apanha, utiliza espécies da fauna silvestre, nativos ou em rota migratória, sem a devida permissão, licença, ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida, deve ser imposta sanção de detenção de seis meses a um ano, e multa. Ainda, o parágrafo primeira desse artigo, relata que incorre nas mesmas penas quem impede a procriação da fauna, sem licença, autorização ou em desacordo com a obtida; quem modifica, danifica ou destrói ninho, abrigo ou criadouro natural; quem vende expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente. § 2º, estabelece que no caso da guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o Juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena. § 3º, cita que são espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras. § 4º prevê o aumento de pena da metade, se o crime é praticado: I — contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração; II — em período proibido à caça; III — durante a noite; IV — com abuso de licença; V — em unidade de conservação; VI — com emprego de métodos ou instrumentos capazes de provocar a destruição em massa. § 5º a pena é aumentada até o triplo se o crime decorre de caça profissional. § 6º as disposições deste artigo não se aplicam aos atos de pesca. Art. 32 da Lei 9.605/98: “Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos: Pena — detenção, de três meses a um ano, e multa. § 1º — Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. § 2º -Ocorre aumento de pena de um sexto a um terço, se ocorrer a morte do animal, conforme o artigo 54 dessa lei expressa.” Art. 54 da Lei 9.605/98: “Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora.” Pena: reclusão, de um a quatro anos, e multa. § 1º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa. § 2º Se o crime:I - tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana; II - causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população; III - causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade; IV - dificultar ou impedir o uso público das praias; V - ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos: Pena - reclusão, de um a cinco anos. § 3º Incorre nas mesmas penas previstas no parágrafo anterior quem deixar de adotar, quando assim o exigir a autoridade competente, medidas de precaução em caso de risco de dano ambiental grave ou irreversível.

44

no entanto, esta lei julga pela licitude do abate animal em certos casos, como para

saciar a fome do individuo ou de sua família, quando sua propriedade ou lavoura

está sob risco de ataques destruidores de animais ou quando estes forem

prejudiciais a sociedade.119

Ainda, o artigo 46 do Decreto 6.899/2009, instituiu infrações administrativas

a pessoas físicas ou jurídicas, que viola dispositivos legais não apenas deste

Decreto, mas também de outras leis como a Lei Arouca.120

As infrações administrativas serão punidas nos termos dos artigos 49 a 57

do Decreto 6.899/2009.

Verificado algum tipo de maus tratos ou crueldade perante aos animais, o

artigo 3º do Decreto 24.645/1934 e artigo 47 do Decreto 6.899/2009, expressa que

qualquer cidadão deverá recorrer ao Ministério Público, que é titular da ação penal

119 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 75. Art. 37 da Lei 9.605/98. “Não é crime o abate de animal, quando realizado: I - em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família; II - para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais, desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente; III – (vetado); IV - por ser nocivo o animal, desde que assim caracterizado pelo órgão competente.” 120

Art. 46 do Decreto 6.899/2009: “Considera-se infração administrativa toda ação ou omissão, de pessoa física ou jurídica que viole as normas previstas na Lei n.º 11.794 de 2008, neste Decreto e demais disposições legais pertinentes, em especial: I – criar ou utilizar animais em atividades de ensino e pesquisa cientifica como pessoa física em atuação autônoma; II - criar ou utilizar animais em atividades de ensino e pesquisa cientifica sem estar credenciado no CONCEA ou em desacordo com as normas por ele expedidas; III – deixar de oferecer cuidados especiais aos animais antes, durante e após as intervenções recomendadas nos protocolos dos experimentos que constituem a pesquisa ou programa de aprendizado, conforme estabelecido pelo CONCEA; IV – deixar de submeter o animal a eutanásia, sob estrita obediência às prescrições pertinentes a cada espécie, conforme as diretrizes do Ministério da Ciência e Tecnologia, sempre que, encerrado o experimento ou em qualquer de suas fases, for tecnicamente recomendado aquele procedimento ou quando ocorrer intenso sofrimento, ressalvada a hipótese do § 2º do art. 14 da Lei n.º 11.794/2008; V – realizar experimentos que possam causar dor ou angústia sem sedação, analgesia ou anestesia adequadas, ressalvada a hipótese do inciso VI; VI – realizar experimentos, cujo objetivo seja o estudo dos processos relacionados à dor e à angustia sem autorização especifica da CEUA; VII – utilizar bloqueadores neuromusculares ou relaxantes musculares em substituição a substâncias sedativas, analgésicas ou anestésicas; VIII – reutilizar o mesmo animal depois de alcançado o objetivo principal do projeto de pesquisa; IX realizar trabalhos de criação e experimentação de animais em sistemas fechados em desacordo com as condições e normas de segurança recomendadas pelos organismos internacionais aos quais o Brasil se vincula; X – realizar em programa de ensino, vários procedimento traumáticos num mesmo animal, sem que todos os procedimentos sejam executados durante os efeitos de um único anestésico ou sem que o animal seja sacrificado antes de recobrar o sentido; XI – realizar pesquisa científica ou atividade de ensino reguladas por este Decreto sem supervisão de profissional de nível superior, graduado ou pós-graduado na área biomédica, conforme norma do CONCEA, vinculado a entidade de ensino ou pesquisa por ele credenciada; XII – exercer as atividades previstas no art. 11 da Lei 11.794/2008

120 sem a competente licença do Ministério da Ciência e Tecnologia.

45

pública incondicionada, através de representação, para representar os animais em

Juízo.

Com efeito, com a promulgação do Decreto supra citado, o legislador

reconheceu indiretamente que os animais não podem ser tidos como meras

“coisas” conforme sinaliza o Código Civil, pois se caso fossem, o Ministério

Público não teria legitimidade para substituí-los em Juízo.121

Ademais, o projeto do novo Código Penal em seus artigos 132 e 393, prevê

o aumento de pena para o sujeito que abandonar animais.122

Por fim, abaixo está alguns dos projetos de lei propostos no Congresso

Nacional que abarcam na tutela dos animais:

PL 6.602/2013: Autor: Deputado federal Ricardo Izar (PSD-SP). Proíbe o

uso de qualquer espécie animal em pesquisas e testes laboratoriais para

desenvolvimento de produtos cosméticos.

PL 6.434/2013: Autor: Deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ). Institui o

Sistema Único de Saúde Animal (SUS Animal).

PL 215/2007: Autor: Deputado federal Ricardo Tripoli (PSDB-SP). Cria o

Código Federal de Bem-Estar Animal. A este projeto foi apensado o PL

6267/2013, que proíbe o uso de animais em filmes pornográficos.

PL 2.143/1999: Autor: Senador Luiz Estevão (PMDB-DF). Dispõe sobre o

registro genealógico de cães e a identificação especial de cães perigosos.

PL 4.548/1998: Autor: Deputado federal José Thomaz Nono (PSDB-AL).

Modifica o art. 32 da Lei n 9.605/1998, que trata de sanções penais e

administrativas para condutas lesivas ao meio ambiente.123

121 RODRIGUES, Danielle Tetü. O Direito e os Animais. Uma abordagem ética, filosófica e normativa. 1ª edição, Curitiba: Juruá, 2008. Pág. 124-125. 122 Art. 132: “Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal,à criança abandonada ou extraviada,ou à pessoa invalida ou ferida,ao desamparo ou em grave e iminente perigo, ou não pedir,nesses casos,o socorro da autoridade pública: Pena - prisão, de um a seis meses, ou multa.” § único - A pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal grave, em qualquer grau, e triplicada, se resulta a morte. Art. 393: “Abandonar, em qualquer espaço publico ou privado,animal domestico,domesticado,silvestre ou em rota migratória,do qual se detém a propriedade,posse ou guarda,ou que esta sob cuidado, vigilância ou autoridade: Pena - prisão, de um a quatro anos.”

123 Jornal Gazeta do Povo. Coluna: Justiça e Direito. “Até onde vão os Direitos dos Animais”. Artigo Joana Neitsch – 25/10/2013. Pág. 7.

46

4 – Os principais casos de maus tratos animal ocorridos no Brasil

4.1 – Farra do Boi

É uma pratica e um costume alusivos do Estado de Santa Catarina,

localizados principalmente nos municípios de: Garoba, Paulo Lopes, Palhoça,

Santa Amaro da Imperatriz, Biguaçu, Governador Celso Ramos, Tijucas, Porto

Belo, Itapema, Comburiu, Penha e Barra Velha.

A Farra do Boi inicia-se quando o boi é solto e perseguido pelos "farristas“,

que seriam homens, mulheres, velhos e até crianças, que carregam pedaços de

pau, facas, lanças de bambu, cordas, chicotes e pedras. Todos eles perseguem o

boi, que, no desespero de fugir, corre em direção ao mar, onde acaba se

afogando, ou quando não vai ao mar, vai em direção às vilas, podendo invadir

casas, hotéis ou qualquer lugar onde o animal possa se esconder dessa tortura.

Quando isso acontece, é comum pessoas serem feridas e terem danos na esfera

patrimonial.124

Nesta linha, Edna Cardozo Dias leciona,

“O bicho pula e escoceia, tenta cornear os mais próximos, mas a lâmina aguda de mil facas e até canivetes transformam-no em uma posta de sangue. Abrindo caminho, ele corre... e tropeça ... e cai. Porrete em riste, os mais selvagens, já lambuzados do sangue da vítima, malham, malham até a morte do indefeso. Está consumada a ‘Farra do Boi.”125

Antes de iniciar o “espetáculo”, o boi é confinado, sem alimento disponível

por vários dias, pois com isso aumenta em demasia o desespero do animal, aliado

a isto, a comida e a água são colocados num local onde ele possa ver, mas não

possa alcançar.

São diversas as causas que podem gerar a mortandade dos bois neste

evento, aonde os farristas se valem de vários métodos cruéis para causar mais

ainda o sofrimento dos animais. A tortura pode ser vista de várias formas, como 124 Disponível em: http://www.pea.org.br/Crueldade/farra/index.htm. Acesso em 09/09/2014, às 9h01. 125 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 82.

47

por exemplo, os animais são banhados em gasolina e depois incendiados até a

morte. Pode ainda, ser atirada pimenta nos olhos dos animais/bois que,

geralmente, são arrancados posteriormente. Os Participantes quebram os cornos

e patas do animal e cortam seus rabos, sendo que os bois podem ainda serem

esfaqueados e espancados, mas há um certo "cuidado“ para que o animal

permaneça vivo até o final da "brincadeira".126

Tais torturas citadas podem continuar por três ou mais dias, tendo o seu

término com a morte do boi e a divisão de sua carne entre os participantes, dito

farristas.

A Farra do Boi tem seu auge na Semana Santa, onde alguns dizem que é

um ritual simbólico, uma encenação da Paixão de Cristo, onde o boi representaria

Judas; outros acreditam que o animal representa Satanás e torturando o Diabo, as

pessoas estariam se livrando dos pecados. Mas hoje em dia a Farra do Boi não

tem nenhuma conotação religiosa.

Com efeito, na tentativa de coibir a Farra do Boi prática preponderante do

Estado de Santa Catarina, diversas organizações como a WSPA-Brasil (Word

Society For Protection Of Animals), a ACAPRA (Associação Catarinense De

Proteção Aos Animais) e a APA (Associação de Proteção aos Animais), bem como

a sociedade civil através de várias e fortes pressões sobre o governo brasileiro

conseguiram, no ano de 1997, a proibição da Farra do Boi, através do Recurso

Extraordinário número 153.531-8/SC; RT 753/101 em território catarinense, por

força de acórdão do Supremo Tribunal Federal, na Ação Civil Pública de n.o

023.89.030082-0.

Conforme decidiu o Supremo Tribunal Federal, a Farra do Boi é

intrinsecamente cruel, é crime, punível com até um ano de prisão, para quem

pratica, colabora, ou no caso das autoridades, omite-se de impedi-la.127

126 Disponível em: http://www.pea.org.br/Crueldade/farra/index.htm. Acesso em 09/09/2014, às 9h01. 127 Disponível em: http://jus.com.br/artigos/20059/farra-do-boi-analise-juridica-e-sociologica-acerca-de-sua-proibicao-e-criminalizacao#ixzz3CujDorJF. Acesso em 11/09/2014 às 10h00.

48

EMENTA: COSTUME – MANIFESTAÇÃO CULTURAL – ESTÍMULO – RAZOABILIDADE – PRESERVAÇÃO DA FAUNA E DA FLORA – ANIMAIS – CRUELDADE. A obrigação de o Estado garantir a todos o pleno exercício de direitos culturais, incentivando a valorização e a difusão das manifestações, não prescinde da observância da norma do inciso VII do artigo 225 da Constituição Federal, no que veda prática que acabe por submeter os animais à crueldade. Procedimento discrepante da norma constitucional denominado “farra do boi”. (STF- Rext: 153.531-8 SC, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 03/06/1997, Segunda Turma, Data de Publicação: 13-03-1998).

A Segunda Turma, por maioria, entendeu que a Farra do Boi é uma

manifestação cultural proibitiva, pois os farristas submetem os animais a

crueldade, ofendendo assim claramente o disposto no inciso VII do § 1º do art.

225 da Carta Magna.

Por contrário, o voto vencido do Min. Maurício Corrêa, este entendia, que o

Estado devia garantir a todos o pleno exercício dos direitos culturais, bem como

proteger as manifestações das culturas populares tal como dispõe o art. 215 caput

e respectivo § 1º da Constituição Federal, coibindo eventuais excessos praticados

em face dos animais.

Contudo, preponderou o entendimento do artigo 225 da Constituição

Federal que garante que "Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,

impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo

para as presentes e futuras gerações", proibindo a Farra do Boi.

Após, com a promulgação da Lei dos Crimes Ambientais de 1998, a

proibição da Farra do Boi seguiu-se para a sua criminalização, que dispõe sobre

as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao

meio ambiente e consequentemente ao animais, como já mencionado em tópicos

anteriores, o artigo 32 de tal Lei, atribui detenção, de 3 meses à 1 ano, e multa

para quem praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres,

domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, podendo aumentar em caso de

morte do animal.128

128 Idem.

49

4.2 – Rinhas de galo

A expressão rinha, no Brasil, é utilizada para designar briga entre animais,

sendo que as mais comuns têm sido as brigas entre galos, canários e cães,

geralmente nestes é utilizado na briga a raça de Pitbulls.

Os animais mencionados acima são preparados e programados para matar

ou morrer, sendo introduzidas doses de hormônios (anabolizantes) para ficarem

mais fortes e aguentarem por mais tempo a rinha, além de ficarem confinados em

pequenos locais insalubres, passando por uma situação imensa de perturbação

física e mental.129

Neste período de preparação, no caso do galo, a partir dos 2 meses de vida

o animal é trancado em gaiola e por volta de um ano o galo, já está preparado

para a briga e passará por mais 69 dias de trato. No trato, o animal é pelinchado,

ou seja, o galo tem as penas de seu pescoço cortadas, como as coxas e debaixo

de suas asas, bem como tem suas barbelas e pálpebras operadas.

O animal toma banho a cada dois dias, com escova e sabão de coco, pois

deixam a pele mais firme e resistente. Já a alimentação, o animal só faz uma

refeição por dia e quase não tem vida sexual, fazendo também vários exercícios

diários, sendo que um deles, o “treinador” segurar o galo com uma das mãos no

papo e a outra no rabo, jogá-lo para o alto e o deixar cair no chão, com o intuito de

fortalecer suas pernas.

Chegado o momento do galo ser levado às rinhas, a luta dura

aproximadamente 75 minutos, com 4 rounds de 15 minutos e 3 intervalos de 5

minutos. Termina a briga, se o animal morrer ou estiver muito ferido, ou for

nocauteado, porém, se o galo ficar de pé durante um minuto sem cair ao chão, a

luta continuará.

129 Disponível em: http://www.ranchodosgnomos.org.br/boletim/rinhas.htm. Acesso em 15/09/2014

às 17h01.

50

Com efeito, as brigas de galos são comprovadamente cruéis, pois há um

inequívoco maus tratos dos animais participantes, desde a sua preparação para a

rinha, até quando efetivamente está dentro do campo de batalha.130

Para tanto, o objetivo de todas as rinhas é ganhar dinheiro com as apostas.

A Lei Fluminense n.º 2.895/1998 foi editada com o objetivo de legitimar a

realização de exposições e de competições entre aves não pertencentes à fauna

silvestre, todavia, tal lei foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal

Federal via ADIN n.º 1.846, aonde o Ministro Celso de Mello e os demais

Ministros, por unanimidade, afirmaram que a Lei Fluminense viola o preceito

estabelecido no art. 225 “caput” e seu § 1º, VII da Carta Magna, pois fora

comprovado que as rinhas de galos expõem a submissão dos animais à

crueldade.

Abaixo encontra-se a ementa da ADIN n.º 1.846:

EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade – Briga de Galos (Lei Fluminense n.º 2.895/98) – Legislação Estadual que, pertinentes a exposições e a competições entre aves das raças combatentes, favorece essa prática criminosa – diploma legislativo que estimula o cometimento de atos de crueldade contra galos de briga – crime ambiental (Lei n.º 9.605/98, art. 32) – meio ambiente – direito à preservação de sua integridade (CFR, art. 225) – prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade – direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão) que consagra o postulado da solidariedade – proteção constitucional da fauna (CF, art. 225, § 1º, VII) – descaracterização da briga de galo como manifestação cultural – reconhecimento da inconstitucionalidade da Lei Estadual impugnada – Ação Direta Procedente. (STF – ADIN n.º 1.846 RJ, Relator: Min. Celso De Mello, Data de Julgamento: 26/05/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 14-10-2011).

O Decreto n.º 24.645 de 1934, ainda em vigor, estabelece medidas de

proteção aos animais, e na literalidade de seu artigo 3º elenca um rol não taxativo

do que se considera maus-tratos aos animais , expressos em seus 31 incisos já

citados no capítulo anterior, onde as rinhas de galos, apresentam formas

consideradas maus-tratos em praticamente todos os incisos deste artigo.

130 DIAS, Edna Cardozo. Tutela Jurídica dos Animais. Tese de Doutorado apresentada ao curso de doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais aprovada, Minas Gerais, 2000. Pág. 78.

51

Com a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 225, § 1º, inciso VII,

como já observado, traz como incumbência do poder público e de todos os

particulares a tutela da fauna, afastando-lhe a submissão à crueldade dos animais,

bem como para aqueles que praticam rinha está expressa no artigo 32, caput da

Lei de Crimes Ambientais, que prevê detenção de 3 meses a 1 ano, agravando-se

essa pena de 1/6 a 1/3 no caso de morte dos animais, além da pena de multa.

Sabe-se que, atualmente, embora seja expressamente vedada no Brasil

desde 1998, a prática continua acontecendo na clandestinidade.

4.3 – Rodeios

A pratica dos rodeios é realizada principalmente nos estados de Roraima,

Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e em São

Paulo, ocorrendo neste último um dos mais conhecidos e importantes rodeios do

país, o rodeio de Barretos.

Geralmente nos rodeios são utilizados bovinos, equinos e caprinos, todos

expostos à pretensa dominação do ser humano no momento e até antes da

realização do evento.

Os animais expostos nas arenas são forçados a se comportar de maneira

violenta, sendo que tal comportamento é devido a ferramentas de tortura que são

constantemente utilizadas para enfurecer os animais.

A Lei Estadual n. 10.359/99 e a Lei Federal n. 10.519/02 regulamentam o

rodeio e os instrumentos que podem ser utilizados nos animais.

Algumas de tais ferramentas consistem em: (i) agulhadas elétricas e

pedaço de madeira pontiagudo; (ii), o sedém ou sedenho, que é uma espécie de

cinta, de crina e pêlo, que se amarra na virilha do animal e que faz com que ele

pule, pois o mesmo é puxado com força no momento em que sai para a arena; (iii)

pregos, pedras, alfinetes e arames em forma de anzol são colocados nos

sedenhos ou sob a sela do animal, para lhe enfurecer ainda mais. (iv) as peiteiras,

que consiste em uma corda ou faixa de couro, juntamente com um sino, são

colocados ao redor do corpo do animal, logo atrás da axila, sendo que o barulho

52

do sino causa um enorme desconforto e estresse para o animal à medida em que

ele pula; (v) esporas, muitas vezes pontiagudas, são aplicadas pelo peão tanto na

região do baixo-ventre do animal como em seu pescoço, provocando lesões e

perfuração do globo ocular; (vi) choques elétricos e mecânicos são aplicados nas

partes mais sensíveis do animal antes da entrada à arena. (vii) às vezes, golpes e

marretadas são deferidos à cabeça do animal velho ou cansado, seguido de

choque elétrico, que produzem convulsões e podem levá-los até a morte.131

Sabe-se que além dos golpes e marretadas, o sedém, além do estímulo

doloroso, pode também provocar rupturas viscerais, fraturas ósseas, hemorragias

subcutâneas, viscerais e internas. Dependendo do tipo de manobra e do tempo

em que o animal fique exposto a tais fatores pode-se evoluir até a morte.

Para Júlia Matera,

“A utilização de sedém, peiteiras, choques elétricos ou mecânicos e esporas gera estímulos que produzem dor física nos animais, em intensidade correspondente à intensidade dos estímulos. Além da dor física, esses estímulos causam também sofrimento mental aos animais, uma vez que eles têm capacidade neuropsíquica de avaliar que esses estímulos lhes são agressivos, ou seja, perigosos à sua integridade”.132

Apesar dos ora instrumentos utilizados nos rodeios acima citados,

causarem dor e sofrimento aos animais nos rodeios, a Lei Estadual n.º 10.359/99

e a Lei Federal n.º 10.519/02 regulamentam o rodeio e os instrumentos que

podem ser utilizados nos animais.

No tocante, tais leis colidem diretamente com o art. 225, § 1º, VII da

Constituição Federal, e o disciplinado no art. 32 da Lei de Crimes Ambientais, ao

vedar qualquer tipo de pratica de crueldade contra os animais.

Mister salientar, que a mencionada Lei nº 9.605/98, que dispõem inclusive

sobre os crimes contra a fauna terrestre, foi publicada antes da Lei nº 10.220/01,

sendo que esta última não modificou ou revogou a primeira, apenas trouxe novas

131Disponível em: http://ambiente.hsw.uol.com.br/maus-tratos-animais2.htm. Acesso em 16/09/2014 às 17h43. 132Disponível em: http://www.ranchodosgnomos.org.br/rodeios_crueldade.php. Acesso em 16/09/2014 às 17h22.

53

disposições a respeito das atividades do peão de rodeio, equiparando-o a atleta

profissional.

Já a Lei Federal 10.519 de 2002, considera os rodeios de animais, as

atividades de montaria ou de cronometragem e as provas de laço, nas quais são

avaliados a habilidade do atleta em dominar o animal, bem como estabelece

médicos veterinários para garantir a boa condição física e sanitária dos animais e

pelo cumprimento das normas disciplinadoras, impedindo maus tratos e injúrias de

qualquer ordem em face dos mesmos.133

O não atendimento das normas da Lei Federal 10.519/02 podem acarretar a

aplicação de multa, advertência, suspensão temporária ou definitiva do rodeio. A

lei não traz a tipificação de nenhum crime, todavia, o descumprimento das normas

administrativas vai claramente enquadrar-se na tipificação de abuso ou maus-

tratos do artigo 32 da Lei 9.605/98.

Nesta linha, abaixo está a Ementa da Ação Civil Pública ajuizada pelo

Ministério Público Federal em face do Município de Seropédica e da Universidade

Federal Rural do Rio de Janeiro – UFRRJ, em virtude da ocorrência de abusos e

maus tratos a animais durante a realização da XIII Expo Seropédica,

concretizadas na sede da UFRRJ.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RODEIO. MAUS TRATOS A ANIMAIS. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL. DANOS MORAIS COLETIVOS NÃO COMPROVADOS. APELAÇÕES PARCIALMENTE PROVIDAS. 1. Cuida-se de Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal em face do Município de Seropédica e da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ em razão da ocorrência de abusos e maus tratos a animais durante a realização da XIII Expo Seropédica, realizadas em terreno de propriedade da UFRRJ. 2. Não merece prosperar a tese da UFRRJ de ilegitimidade passiva, pela ausência de responsabilidade por eventuais ilícitos praticados em evento realizado em terreno cedido para o Município Apelante, uma vez que a presente ação objetiva também a sua abstenção de ceder sua propriedade para a realização de eventos que submetam animais a atos de crueldade, pedido direcionado à UFRRJ e tão somente por ela pode ser atendido, guardando pertinência subjetiva com a tutela jurisdicional pretendida. 3. Restou amplamente comprovada

133 Lei Federal 10.519/02: Art. 3

o Caberá à entidade promotora do rodeio, a suas expensas,

prover: I – infra-estrutura completa para atendimento médico, com ambulância de plantão e equipe de primeiros socorros, com presença obrigatória de clínico-geral; II – médico veterinário habilitado, responsável pela garantia da boa condição física e sanitária dos animais e pelo cumprimento das normas disciplinadoras, impedindo maus tratos e injúrias de qualquer ordem;

54

a ocorrência de maus tratos a bovinos e equinos em rodeios realizados na XIII Expo Seropédica, em grave afronta às normas reguladoras da atividade, tendo, sido utilizados instrumentos cortantes e de choque. 4. A Constituição Federal expressamente veda a prática de crueldade com animais em seu art. 225, § 1º, inciso VII, sendo tipificado como crime, pelo art. 32 da Lei nº 9.605/98, o ato de abuso e maus tratos a estes. Da mesma forma, a Lei nº 10.519/2002, que regulamenta a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio, proíbe a prática e o uso de instrumentos que cause ferimentos e injúrias nos animais, incluindo aparelhos que provoquem choques elétricos. 5. Em que pese seja legal a realização de rodeios, estes, por obvio, não podem submeter animais a atos de crueldade, devendo observar a legislação pátria no tocante ao tema. Trata-se de medida de repressão às práticas cruéis à animais, e não de rodeios. 6. Não merece reparo a sentença no tocante à proibição do Município de Seropédica de promover ou conceder licenciamento de rodeios que submetam animais a atos de crueldade; e da UFRRJ de ceder seus terrenos para tais eventos, uma vez que se trata de ordem constitucional à proteção aos animais que coíbe práticas cruéis e aptas a gerar maus tratos. 7. O Ministério Público Federal faz uma afirmativa genérica da existência de dano moral coletivo pelos maus tratos aos animais ocasionados no evento, todavia não específica a ofensa à coletividade. Assim, deixando de demonstrar de forma clara e irrefutável o efetivo dano moral supostamente sofrido pela coletividade, não é possível presumi-lo. 8. Apelações parcialmente providas. (TRF-2 - AC: 201151010117643, Relator: Desembargador Federal Guilherme Diefenthaeler, Data de Julgamento: 03/06/2014, Quinta Turma Especializada, Data de Publicação: 16/06/2014).

Nos correntes autos restou comprovado a efetiva ocorrência de maus tratos

a bovinos e equinos em rodeios realizados na XIII Expo Seropédica na UFRRJ,

em grave ofensa às normas reguladoras da atividade, tendo, sido utilizados

instrumentos cortantes e de choque aos animais, causando-lhes muita dor e

sofrimento.

Desta forma, analisando o julgado acima e demais fatos já delineados, em

que pese seja legal a realização de rodeios por todo território nacional, estes, por

óbvio, não podem submeter animais a atos de crueldade, pois seriam totalmente

contrárias ao exposto no artigo 225, §1º, VII de nossa Constituição, sendo

obrigação do Estado proibir tais práticas, além de que estas ferem o Decreto

24.645/34 e a Lei de Crimes Ambientais, que considera esses atos como crimes

de maus-tratos como já esboçado anteriormente.

Por fim, sabe-se que, desde 2011, tramita na Câmara dos Deputados o

Projeto de Lei 2086/11, elaborado pelo deputado Ricardo Tripoli (PSDB-SP) que

proíbe perseguições seguidas de laçadas e derrubadas de animal em rodeios e

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eventos similares. Pra quem descumprir a determinação legal, pode chegar a

pagar uma multa equivalente a R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

4.4 – Exibição de animais em circos

Esse espetáculo é tradicional, familiar, composto de palhaços, trapezistas,

mágicos e domadores, sendo que na maior parte das vezes, as pessoas não

conseguem visualizar os maus tratos ocasionados aos animais silvestres, exóticos

ou até dos animais domesticados, que corre por de trás do evento.

Para que o animal se apresente manso e obediente no momento do

espetáculo, isto é, como dançar, andar de bicicleta, tocar instrumentos, pular em

argolas (com ou sem fogo), cumprimentar o público, entre outras proezas, cada

espécie é treinada de uma determinada maneira. Muitas formas ou instrumentos

são utilizados neste treinamento, semelhante ao rodeio, como os choques

elétricos, sédem, esporas, chicotadas, ausência de alimentação e água,

confinamento sem a mínima condição de higiene e sujeitos a diversas doenças

sem auxilio médico veterinário.134

Para tanto, mesmo que houvesse a retirada de tais instrumentos, os

animais, sofrem maus tratos, mesmo que por via indireta, ou seja, os animais que

são utilizados nas exibições chegam no local do espetáculo muito antes da platéia

e ao serem “descarregados” para fora do caminhão frequentemente se ferem.

Durante o circo, a utilização do microfone se dá em volume extremamente

alto, especialmente próximo das potentes caixas de som, justamente onde ficam

os animais esperando o momento de serem exibidos, ferindo os sensíveis

tímpanos dos não humanos.

Com efeito, a proibição de animais em circo vigora em seis Estados e mais

de cinquenta municípios brasileiros, sendo que em São Paulo já veda está prática

desde 2005.135

134 Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.3, n.4. Bahia: Evolução, 2008. Pág. 122-124. 135 Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.1, n.1. Bahia: Evolução, 2006. Pág. 231-236.

56

Por todo já esboçado, sabemos que não apenas as leis infraconstitucionais,

mas também a Constituição Federal abrange a tutela dos animais, inclusive todos

aqueles utilizados em circos.136

No tocante, desde 1934, com o Decreto Federal n.º 24.645/34, a

apresentação de animais em circos é proibida, nos termos do seu artigo 3º, que

em rol exemplificativo traz situações que tipificam situações de maus tratos, e

especialmente em seu inciso XXX137, assim considera a exibição de animais em

casas de espetáculos para a realização de acrobacias, ou seja, exatamente as

atividades praticadas por circos.

Neste limiar, não pode deixar de indicar novamente, a vedação imposta

pela Lei de Crimes Ambientais n° 9.605/1998, em seu artigo 32, relatando que não

se pode praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres,

domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, sob pena de detenção e multa.

Desta feita, a tutela de todos os animais está em nossa legislação, sendo

crime qualquer ato de maus tratos, crueldade ou abuso em face do animal.

Corroborando essa ideia, a jurisprudência pátria obsta qualquer

participação de não humanos em espetáculo de circo, senão vejamos:

ANIMAIS DE CIRCO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPLEMENTAÇÃO DE OPÇÕES DO LEGISLADOR QUANTO AO TRATO E MANTENÇA DE ANIMAIS. PROIBIÇÃO DE QUALQUER FORMA DE MAUS TRATOS A QUALQUER ANIMAL. ILEGÍTIMA INADEQUAÇÃO DAS AÇÕES PÚBLICAS. A análise do sistema jurídico e a evolução da compreensão científica para o trato da fauna em geral, permitem concluir pela vedação de qualquer mau trato aos animais, não importando se são silvestres, exóticos ou domésticos. Por maus tratos não se entende apenas a imposição de ferimentos, crueldades, afrontas físicas, ao arrancar de garras, cerrilhar de dentes ou enjaular em cubículos. Maus tratos é sinônimo de tratamento inadequado do animal, segundo as necessidades

136 “Art. 225 da CF/88: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1° – Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (…) VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade.” Decreto Federal 24.645/1934: Art. 1° – Todos os animais no país são tutelados do Estado. Art. 2°, § 3°: Os animais serão assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, seus substitutos legais e pelos membros das sociedades protetoras dos animais.” 137 Art. 3º do Decreto Federal n.º 24.645/1934: “Consideram-se maus tratos: (...) XXX - arrojar aves e outros animais nas casas de espetáculos e exibi-los, para tirar sortes ou realizar acrobacias.”

57

específicas de cada espécie. "A condenação dos atos cruéis não possui origem na necessidade de equilíbrio ambiental, mas sim no reconhecimento de que são dotados de estrutura orgânica que lhes permite sofrer e sentir dor".(STJ, Resp 1.115.916, Rel. Ministro Humberto Martins) Evoluída a sociedade, cientifica e juridicamente, o tratamento dos animais deve ser conciliado com os avanços dessa compreensão, de modo a impor aos proprietário a adequação do sistema de guarda para respeito, o tanto quanto possível, das necessidades do animal. A propriedade do animal não enseja direito adquirido a mantê-lo inadequadamente, o que impõe a obrigação de se assegurar na custódia de animais circenses, ao menos, as mesmas condições exigíveis do chamados mantenedores de animais silvestres, mediante licenciamento, conforme atualmente previsto na IN 169/2008. Na ausência de recursos autárquicos e adequação da conduta pelos responsáveis, deve o órgão ambiental, contemporaneamente, dar ampla publicidade à sua atuação, convocando e oportunizando a sociedade civil auxiliar em um problema que deve, necessariamente, caminhar para uma solução. (TRF-4 – AC: 2006.70.00.009929-0/PR - Relator. Desembargador Valdemar Capeletti, Data de julgamento: 21/09/2009, Quarta Turma; Data de Publicação: 04.11.2009).

A decisão supra mencionada, é referente a Ação Civil Pública ajuizada pelo

Ministério Público Estadual do Paraná em face do Instituto Brasileiro do Meio

Ambiente e dos Recursos Naturais - IBAMA, em que objetiva a condenação desta

Autarquia na obrigação de fazer, consistente em fiscalizar, cadastrar e, nos casos

de irregularidade, repatriar os animais exóticos que não possuam licença ou

certificado cadastrado no órgão, utilizados em espetáculos circenses.

Foi visto nos autos, que o IBAMA detém o dever de fiscalizar a entrada de

animais exóticos no território nacional, bem como as suas condições de vida,

sendo que, no tocante, diversas denúncias foram recebidas, sendo uma delas de

um urso de um circo instalado na região metropolitana de Curitiba que escapou do

domador e entrou antes da hora no local do evento, onde crianças brincavam com

os palhaços. No meio à confusão, o público em geral correu para longe do circo,

enquanto funcionários espancavam o animal para poder dominá-lo.

Apesar das alegações de dificuldades orçamentárias, o IBAMA argumenta

que, mediante denúncia, comparece a circos e verifica a situação dos animais, se

estão sendo submetidos a maus tratos, se estão ou não sendo mutilados.

Entretanto, o Juiz Federal Márcio Antônio Rocha que havia pedido

vista dos autos, relatou em seu voto, que não há diferença entre os animais

58

domesticados, silvestres ou exóticos, bem como aduz que não há animais de

circo, nem se aceita maus-tratos meramente circenses.

Aduziu ainda que a omissão de fiscalização por parte do IBAMA não

pode se basear apenas na escusa da falta de recursos, pois o problema persiste e

deve caminhar para uma solução.

Dessa forma, o IBAMA foi condenado a fiscalizar, submeter a guarda

e mantença dos animais, nos termos da instrução normativa 169/2008138, e em

caso não atendimento no prazo de trinta dias, poderá conceder a condição de fiel

depositário a terceiro, deferindo a guarda a quem atenda as condições

estabelecidas na referida normatização. Assim, quando verificadas as precárias

condições dos animais, deverá o responsável ser nomeado depositário, dando-se

desde logo publicidade das características do animal para que agentes da

sociedade, na omissão do responsável, possam aceitar a custódia mediante

atendimento das exigências da mesma Instrução Normativa.

4.5 – Sacrifício de animais no candomblé

Como já verificado, o art. 225 da CF/88, bem como o art. 32 da Lei de

Crimes Ambientais, incriminam qualquer abuso ou maus tratos desprendidos aos

animais.

Apesar das tutelas jurídicas legislativas, os animais sofrem e são expostos

em vários rituais religiosos, onde os mesmos são utilizados de forma violenta, são

mutilados, abusados, desrespeitados e, geralmente, mortos. Assim, tais atos por

conseqüência se enquadram como crime na tipificação prevista na legislação.

No entanto, as manifestações religiosas continuam se valendo da vida dos

animais nos tratados rituais.

138 Instrução Normativa 169/2008, do IBAMA - Art. 1º Instituir e normatizar as categorias de uso e manejo da fauna silvestre em cativeiro em território brasileiro, visando atender às finalidades socioculturais, de pesquisa científica, de conservação, de exposição, de manutenção, de criação, de reprodução, de comercialização, de abate e de beneficiamento de produtos e subprodutos, constantes do Cadastro Técnico Federal (CTF) de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Naturais.

59

Para tanto, os que pregam tal religião, fundamentam suas praticas

religiosas utilizando animais pela própria CF/88, aonde em seu artigo 5º, inciso VI

da Constituição Federal diz que “é inviolável a liberdade de consciência e de

crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na

forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias.”

Neste sentido, assevera Daniel Braga Lourenço,

“As leis de proteção animal usualmente requerem seja feita uma ponderação, um balanceamento entre os interesses dos animais e dos seres humanos. Todavia, pelo fato de os animais terem natureza jurídica de propriedade, não há, em realidade, ponderação possível de ser realizada. Os interesses dos animais irão sempre ser considerados menos relevantes que o dos seres humanos, ainda quando os nossos interesses sejam meramente triviais e o deles, literalmente de vida ou de morte.”139

Em virtude dessa contrariedade, o STF já se manifestou quanto a questão

relacionada aos limites constitucionais, afirmando em sede de HC 82.424, pelo

Relator Ministro Mauricio Corrêa, que as liberdades públicas não são

incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados

os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, §2º, primeira

parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o direito à

incitação ao racismo, dado que um direito individual não pode constituir-se em

salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra.

Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade

jurídica.140

No tocante, os praticantes de rituais religiosos que utilizam o sofrimento dos

animais para a sua seita, não estão respaldados no artigo 5º, inciso VI, da

Constituição Federal, pois este não funciona como excludente de ilicitude.

A liberdade de culto, como manifestação exterior da liberdade de crença,

pode e deve, em determinadas situações, ser limitada.

139 Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.3, n.2. Bahia: Evolução, 2006. Pág. 283. 140 Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.1, n.1. Bahia: Evolução, 2006. Pág. 313-314.

60

Ademais, o uso com sofrimento de animais em rituais religiosos é proibido,

tido como crime pela Lei de Crimes Ambientais, proibido pela Constituição Federal

que repele maus-tratos aos animais.

Para Daniel Braga Lourenço,

“O respeito à liberdade de crença e às manifestações culturais dela relativas não pode ser encarado como um valor absoluto e não pode servir de manto protetor de condutas que ferem outros valores relevantes.”141

Mister salientar que o crime tipificado no artigo 32 da referida lei é crime de

ação penal pública incondicionada, cabendo ao Ministério Público promover a

ação penal toda vez que estiver diante do uso com sofrimento de animais em

rituais religiosos, pois está prática é proibida por lei.

4.6 – Caso do Instituto Royal

O Instituto Royal era uma Organização de Sociedade Civil de Interesse

Público - OSCIP e funcionava em duas cidades brasileiras localizadas em Porto

Alegre/RS e São Roque/SP.

A instituição visava estudos, pesquisas e testes pré-clínicos de

medicamentos para a cura de diversas doenças como câncer, diabetes,

hipertensão e epilepsia. Sendo que possuía autorização junto ao Conselho

Nacional de Controle de Experimentação Animal - CONCEA, para utilizar animais em

pesquisas e testes no território brasileiro.

Ocorre que, após denúncias de maus-tratos em animais usados em pesquisas

e experimentos de produtos farmacêuticos, agrotóxicos e limpeza, incluindo cães da

raça beagle, camundongos e coelhos, protetores dos animais passaram a fazer uma

manifestação em frente ao Instituto Royal a partir do dia 22 de setembro de 2013,

registrando mais tarde, um boletim de ocorrência de denúncia de maus-tratos frente as

atividades do instituto.

141 Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.3, n.2. Bahia: Evolução, 2006. Pág. 288.

61

As manifestações dos ativistas aumentaram quando informados, por meio das

redes sociais, que o Instituto Royal estava preparando o sacrifício dos animais da

unidade, sendo que neste dia, os ativistas que estavam de plantão em frente ao

instituto, observaram três vans e um caminhão entrarem no laboratório.

Diante disso, na madrugada do dia 18 de outubro de 2013, o Instituto Royal,

foi invadido por mais de cem defensores de animais que levaram cerca de 178 cães

da raça Beagle e sete coelhos, os quais eram usados nos testes de laboratório. Além

de destruírem diversas pesquisas cientificas.

Ademais, no dia 13 de novembro, outro grupo voltou a invadir a instituição de

pesquisa cientifica e, desta vez, levou duzentos camundongos de pesquisa que

haviam sido deixados no local.142

Um ativista não identificado que participou do resgate dos animais, relata que

as pessoas que resgataram os não humanos não eram vândalos, mas sim

advogados e protetores da causa animal há maios de dez anos. Afirma ainda que

os animais gritavam muito dentro do instituto, e em decorrência disso ocorreu o

resgate dos mesmos, sendo que muitos cães estavam com sinais de tumor.143

Já, para João Antônio Pegas Henriques, um dos Diretores do Instituto

Royal, afirma que os animais não sofriam maus-tratos e nem eram cometidos

qualquer tipo de crueldade contra eles, pois o Instituto seguia todas as normas do

Comissão de Ética no Uso de Animais - CEUA, além dos termos da supervisão do

CONCEA.144

Além disso, aduz que a etapa da pesquisa em cães é a última antes de o

medicamento passar a ser testado em voluntários humanos, de acordo com o

instituto, os experimentos realizados nos animais não podem ser trocados por

outras técnicas, como a in vitro.

142Disponível em: http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2014/04/antes-era-um-experimento-agora-e-um-cao-diz-dona-de-beagle-do-royal.html. Acesso em 19/09/2014 às 17h13. 143 Disponível em: http://oholocaustoanimal.wordpress.com/2014/01/27/ao-contrario-do-que-diziam-os-cientistas-beagles-resgatados-do-instituto-royal-agora-estao-saudaveis-e-alegres/. Acesso em 19/09/2014 às 17h00. 144 Disponível em: http://paginacultural.com.br/ainda-sobre-os-beagles/. Acesso em 19/09/2014 às 16h45.

62

No mesmo dia em que houve a invasão, a Prefeitura de São Roque

suspendeu o alvará de funcionamento do Instituto Royal por sessenta dias, após

uma vistoria feita no local por deputados que integrantes da comissão externa

criada pela Câmara dos Deputados, com o intuito de fiscalizar e seguir o trabalho

do Ministério Público de São Paulo e da Polícia Civil no caso das denúncias de

maus-tratos supostamente praticadas pelo instituo aos animais utilizados em

experimentos.

O presidente da comissão da Câmara, o deputado Protógenes Queiroz

(PCdoB), o qual esteve na vistoria realizada, diz que não há nada que indique que

a instituição atuava de forma correta, relatando ainda que o ambiente do instituto

era totalmente insalubre, e que havia passado mal no local.145

Após, a promotoria enviou a Justiça uma solicitação para a cassação do

alvará da instituição.

No dia 06 de novembro de 2013, o Instituto Royal anunciou o encerramento de

suas atividades em São Roque/SP.

Atualmente, a Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Sorocaba/SP está

responsável por cuidar de dois inquéritos instaurados para apurar, em segredo de

justiça, o caso ocorrido no Instituto Royal, sendo um sobre a invasão e o outro, em

conjunto com o Ministério Público de São Paulo, sobre as denúncias de maus-tratos

aos animais em testes.

Para o Delegado da DIG, em relação aos crimes que cada um dos ativistas que

participaram do resgate dos animais praticaram, irão responder de forma

individualizada, podendo ser considerados os crimes de invasão de propriedade,

depredação de patrimônio privado e furto dos animais. Contudo, se ocorrer a

comprovação do crime de maus tratos dos animais praticados pelo Instituto Royal,

haveria um estado de necessidade e emergência, o qual não se configuraria em

crime de invasão.146

145 Disponível em: http://paginacultural.com.br/ainda-sobre-os-beagles/. Acesso em 19/09/2014 às 16h45. 146

Disponível em: http://oholocaustoanimal.wordpress.com/2014/01/27/ao-contrario-do-que-diziam-os-cientistas-beagles-resgatados-do-instituto-royal-agora-estao-saudaveis-e-alegres/. Acesso em 19/09/2014 às 17h00.

63

Sabe-se que dos 178 cães levados do Instituto, quatro foram localizados

abandonados próximos à região de São Roque, Estado de São Paulo. O quinto animal

foi resgatado pelo próprio Instituto Royal, via uma ordem judicial, depois de o

laboratório descobrir por meio das redes sociais que o animal estava em uma casa.

Por fim, os demais animais resgatados pelos ativistas, encontram-se

atualmente com excelente estado de saúde, porém, somente um deles, que teve

os molares extraídos e as mandíbulas cerradas, em testes de próteses dentárias

no Instituto Royal, ainda passa por tratamento, pois não houve calcificação

completa, por causa da sua idade.147

147Idem.

64

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar dos animais serem protegidos pelo artigo 225 da Constituição

Federal e por outros meios normativos vigentes no ordenamento jurídico, é fato

que os mesmos precisam de uma tutela mais abrangente e efetiva dos seus

direitos, visto que muitos métodos de ensino e pesquisa utilizados em entidades

privadas cadastradas no CONCEA que se valem de cobaias, geram dor,

sofrimento, angústia e tristeza as mesmas, posto que, tais sentimentos e sintomas

dos não-humanos (a chamada “Consciência Animal”), são comprovados

cientificamente pelo Manifesto de Cambridge, evidenciando que os animais tem a

capacidade de exibir comportamentos intencionais, demonstrando que os

humanos não são únicos com sistemas neurológicos que geram consciência.

Ainda, são retirados de cães, gatos, cavalos, porcos e outras cobaias, o

sentimento de liberdade como sendo um ser vivo amparado pela Carta Magna.

No mais, em que pese as vedações dispostas no Decreto Federal n.º

24.645/1934 e artigo 32 da Lei dos Crimes Ambientais impondo pena para quem

cometer experiência dolorosa ou atroz em animais vivos da fauna silvestre,

doméstica ou exótica, admite-se, entretanto, o sofrimento dos animais se este for

inevitável para a pesquisa cientifica, pois, nesta linha, o interesse público nas

descobertas científicas se sobrepõe sobre o interesse em evitar sofrimentos dos

não-humanos.

A pesquisa nos mostra que há métodos alternativos que podem evitar a

utilização de animais em testes e experimentos científicos em laboratórios, como

aqueles que recorrem aos vários campos da ciência, como a radiologia, química,

matemática, microbiologia.

Conclui-se que, os animais mesmos com amparo em vários dispositivos

legais, continuam desprotegidos e inúmeras atrocidades são cometidas contra

eles ainda nos dias atuais, devendo o Direito tutelá-los lhes fornecendo a efetiva

proteção jurídica, de forma que encerre a exploração, os abusos, os maus tratos e

a submissão aos vários casos de tortura feitas pelos humanos, como é o caso da

farra do boi e do sacrifícios dos não-humanos em rituais religiosos.

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PORTAL DA LEGISLAÇÃO – PRESIDENTE DA REPÚBLICA. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em 20/07/2014, às 21h43.

PORTARIA N.º 93, de 07/07/1998, do IBAMA. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. RENATA DE FREITAS MARTINS. RINHAS: A ANTI-CULTURA BÁRBARA

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RENATA DE FREITAS MARTINS. RODEIOS: CULTURA E ESPORTE OU PRÁTICA CRUEL E DESPROVIDA DE IDENTIDADE? Disponível em: http://www.ranchodosgnomos.org.br/rodeios_crueldade.php. Acesso em 16/09/2014 às 17h22.

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Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.4, n.4. Bahia: Evolução, 2008.

Revista Brasileira de Direito Animal. – Vol.3, n.2. Bahia: Evolução, 2006.

REVOLUÇÃO DOS BEAGLES: LEI AROUCA DEFINE REGRAS PARA USO DE COBAIAS DESDE 2008. Disponível em: http://ucho.info/revolucao-dos-beagles-lei-

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RODRIGUES, Danielle Tetü. O Direito e os Animais. Uma abordagem ética, filosófica e normativa. 1ª edição, Curitiba: Juruá, 2008.

SANTOS, Cleopas Isaías. Afinal, o que se deve entender por “recursos alternativos” no crime de crueldade experimental de animais (art. 32, § 1º da Lei n.º 9.605/98). Congresso Internacional de Ciências Criminais, 02º edição, 2011.

SÉGUIN, Elida. O Direito Ambiental. Nossa Casa Planetária, 3º edição, Rio de Janeiro, Forense: 2006. SYLVIA ESTRELLA. A CRUELDADE SEM LIMITE DA FARRA DO BOI E DOS RODEIOS. Disponível em: http://ambiente.hsw.uol.com.br/maus-tratos-animais2.htm. Acesso em 16/09/2014 às 17h43. VENOSA, Sílvio Salvo. Direito Civil. Parte Geral. 14º edição, São Paulo: Atlas, 2014.

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ANEXO A – MANIFESTO DE CAMBRIDGE TRADUZIDO Declaração de Cambridge sobre Consciência

Neste dia de 07 de julho de 2012, um grupo proeminente de neurocientistas

cognitivos, neurofarmacologistas, neurofisiologistas e neurocientistas

computacionais reuniram-se na Universidade de Cambridge para reavaliar os

substratos neurobiológicos da experiência da consciência e comportamentos

relacionados, em animais humanos e não-humanos. Ainda que a investigação

comparativa neste área seja muito dificuldade pela incapacidade de animais não

humanos __ e frequentemente humanos __ para clara e prontamente

comunicarem seus estados internos, as seguintes observações podem ser feitas

inequivocamente:

*O campo da investigação sobre a Consciência está evoluindo rapidamente.

Novas técnicas e estratégias de investigação para animais humanos e não-

humanos foram desenvolvidas em número abundante. Consequentemente, um

maior número de dados é disponibilizado com mais facilidade, o que obriga a uma

reavaliação periódica de pré-concepções que persistem neste campo. Estudos de

animais não-humanos mostraram circuitos cerebrais homólogos correlacionados

com a experiência e a percepção da consciência podem ser seletivamente

acessadas e manipuladas para compreender se são de fato necessários à referida

experiência. Além disso, novas técnicas não invasivas estão já disponíveis para

mapear os correlativos da consciência nos humanos.

*Os substratos neuronais não parecem limitar-se às estruturas corticais. De fato,

redes neuronais subcorticais que são estimuladas durante a vivência de estados

afetivos em humanos, são também criticamente importantes enquanto geradoras

de comportamentos emocionais em animais. A estimulação artificial das mesmas

regiões do cérebro gera comportamentos e estados sentimentais correspondentes

em ambos, animais humanos e não-humanos. Sempre que suscitamos

comportamentos emocionais instintivos em cérebros de animais não-humanos,

muitos dos comportamentos subsequentes são consistentes com a experiência de

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estados sentimentais, incluindo os estados internos compensatórios ou punitivos.

Os sistemas associados ao afeto estão concentrados nas regiões subcorticais

onde abundam as homologias neuronais. Ademais, os circuitos neuronais que

suportam estados comportamentais/eletrofisiológicos de atenção, sono e tomada

de decisão, parecem ter surgido tão cedo, no processo evolutivo, quanto a

ramificação dos invertebrados, sendo evidentes em insetos e moluscos

cefalópodes (e.g.: polvo).

*As aves parecem oferecer, de forma surpreendente, através do seu

comportamento, da sua neurofisiologia, e da sua neuroanatomia, um processo de

evolução paralela da consciência. Evidências de níveis de consciência próximo

dos humanos têm sido, da forma mais dramática, observadas em papagaios

cinzentos africanos. As redes e microcircuitos emocionais e cognitivos de aves e

mamíferos parecem ser bastante mais homólogos do que previamente se pensou.

Além disso, certas espécies de aves, como foi demonstrado nos padrões

neurofisiológicos dos mandarins, exibem padrões neuronais de sono idênticos aos

dos mamíferos, incluindo o sono REM, que se pensava exigirem o neocórtex dos

mamíferos. Asmagpies (uma espécie de pombo), em particular, exibiram

impressionantes similaridades com humanos, grandes símios, golfinhos e

elefantes em estudos de auto reconhecimento da sua imagem refletida num

espelho.

* Nos humanos, o efeito de certos alucinógenos parece estar associado com uma

disrupção no processamento cortical de feedforward e feedback. Intervenções

farmacológicas em animais não-humanos com compostos conhecidos por

afetarem o comportamento humano, podem conduzir a perturbações similares no

comportamento dos animais não-humanos. Nos humanos, existem evidências que

sugerem que a consciência de algo, tal como na consciência visual, está

correlacionada com a atividade cortical, o que não exclui possíveis contribuições

do processamento subcortical ou cortical primitivo. Evidências de que sentimentos

de animais humanos e não-humanos emergem de redes cerebrais subcorticais

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homólogas fornecem evidências de qualia afetivas fundamentais evolutivamente

partilhados.

Declaramos o seguinte: “A ausência de neocórtex não parece excluir um

organismo da possibilidade de experiência estados afetivos. Evidências

convergentes indicam que animais não-humanos possuem os substratos

neuroanatômicos, neuroquímicos e neurofisiológicos de estados de

consciência em linha com a capacidade de exibir comportamentos

intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os

humanos não são únicos na posse dos substratos neurológicos que geram

consciência. Animais não-humanos, abarcando todos os mamíferos e aves,

e muitas outras criaturas, incluindo os polvos, também possuem estes

substratos neurológicos”.