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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ CONRADO CURY GRAHL SOARES RELEVÂNCIA DA MORAL KANTIANA NA ÉTICA JURÍDICA CONTEMPORÂNEA CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

CONRADO CURY GRAHL SOARES

RELEVÂNCIA DA MORAL KANTIANA NA ÉTICA JURÍDICA

CONTEMPORÂNEA

CURITIBA

2014

CONRADO CURY GRAHL SOARES

RELEVÂNCIA DA MORAL KANTIANA NA ÉTICA JURÍDICA

CONTEMPORÂNEA

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. André Peixoto de Souza

CURITIBA

2014

TERMO DE APROVAÇÃO

CONRADO CURY GRAHL SOARES

RELEVÂNCIA DA MORAL KANTIANA NA

ÉTICA JURÍDICA CONTEMPORÂNEA

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do título de Bacharel em Direito no Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, __ de ______________ de 2014

______________________________________________________________

Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: Prof. André Peixoto de Souza UTP

Prof. ____________________________ UTP

Prof. ____________________________ UTP

RESUMO

Este estudo trata da teoria da moralidade elaborada pelo filósofo Immanuel Kant (especialmente em duas obras: Fundamentação da Metafísica dos Costumes e Crítica da Razão Prática) e a sua ascendência sobre os conceitos da Ética Jurídica atual. O presente tema se mostra extremamente relevante para que os profissionais do Direito desenvolvam uma melhor compreensão dos fatores envolvidos nas decisões morais, buscando, dessa forma, fomentar uma conduta mais responsável e íntegra, condizente com os fins da profissão. Para tal, pretende-se investigar a relação entre as ideias de Kant no campo da Ética, elaboradas no século XVIII, e os preceitos que balizam a conduta dos operadores do Direito na atualidade. A metodologia utilizada neste estudo foi essencialmente a pesquisa de fontes bibliográficas, considerando-se que existe um farto material referente aos dois eixos principais deste trabalho: a filosofia de Kant e a Ética Jurídica contemporânea. Esta abordagem resultou na percepção de que a Ética Jurídica dos nossos dias apresenta uma concepção mais mutável e dinâmica quando comparada ao pensamento kantiano. Contudo, alguns conceitos desenvolvidos pelo renomado filósofo permanecem extremamente relevantes e atuais. Palavras-chave: Filosofia Moral. Kant. Ética Jurídica. Deontologia.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 5

2 A TEORIA DA MORAL EM KANT E O SEU CONTEXTO DENTRO DO

PENSAMENTO OCIDENTAL ..................................................................................... 7

3 A ÉTICA JURÍDICA EM NOSSOS DIAS ............................................................ 19

3.1 A ÉTICA E A LEI ................................................................................................. 19

3.2 A ÉTICA E A DEONTOLOGIA ............................................................................ 22

3.3 A ÉTICA E A FILOSOFIA .................................................................................... 25

4 CONCLUSÃO ..................................................................................................... 33

REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 36

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1 INTRODUÇÃO

Em um mundo centrado cada vez mais na tendência de se considerar

exclusivamente os próprios interesses em detrimento do cumprimento dos deveres

morais para com nossos semelhantes, é fundamental que os conceitos basilares

para o desenvolvimento de uma conduta ética, correta, idônea sejam resgatados e

devidamente colocados em prática. Dentre os principais pensadores da civilização

ocidental, encontra-se Immanuel Kant, reconhecido universalmente por seu requinte

intelectual e pela elaboração de um sistema de pensamento considerado hermético

por muitos. Suas ideias no campo da moralidade (quando comparadas as de outros

pensadores) são especialmente desafiadoras, razão pela qual somos impulsionados

a estudá-las de forma mais aprofundada.

A observação diária indica que existe uma tensão entre o pensamento de

Kant no campo da moral e os preceitos éticos comumente aceitos e colocados em

prática pelos advogados nos países da “Civil Law”. Atualmente, a conduta moral do

advogado parece estar especialmente pautada pela coercitividade estabelecida nas

normas positivadas dos Códigos de Ética. Apenas as sanções previstas em tais

normas impediriam o profissional do Direito (assim como de qualquer área de

atuação) de agir com desonestidade e vileza para a obtenção dos objetivos

desejados. A lei moral natural, imediatamente identificável pela razão, parece não

possuir para a maioria dos advogados aquela grande força normativa preconizada

por Kant quando da elaboração de suas teorias.

Com o intuito de verificar a veracidade de tais reflexões, faz-se necessário

um estudo minucioso da filosofia moral, para que seja possível resgatarmos alguns

conceitos de essencial importância para uma conduta profissional adequada,

devidamente norteada pela probidade e pela equidade. Tal estudo se mostra

extremamente relevante não apenas do ponto de vista acadêmico, teórico, mas

igualmente para que, na prática, balizados por tais conceitos, os profissionais do

Direito se tornem referência no campo da ética, uma vez que o objetivo último da

ciência jurídica se resume à busca pela justiça, inextricavelmente ligada à

integridade de conduta.

Diante do exposto, perguntamo-nos: a teoria da moralidade elaborada pelo

filósofo Immanuel Kant (desenvolvida principalmente nas obras Crítica da Razão

Prática e Fundamentação da Metafísica dos Costumes) ainda permanece relevante

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para a Ciência Jurídica quando comparada aos preceitos básicos presentes nos

atuais Códigos de Ética voltados aos profissionais do Direito nos países da "Civil

Law"?

Em outras palavras, ainda há algo a aprender com o filósofo de Königsberg,

ou suas ideias (que defendem uma espécie de “lei natural”, derivada do pensamento

racional) já não são mais aplicáveis no campo da Ciência Jurídica?

Propomo-nos, com este estudo, debater e elucidar tal questão por meio da

pesquisa de fontes bibliográficas, considerando-se que existe um farto material

referente aos dois eixos principais deste trabalho: a filosofia de Kant (analisada no

primeiro capítulo) e a ética jurídica contemporânea (examinada no segundo capítulo,

dividido, para facilitar a compreensão do tema, em três subcapítulos, quais sejam: “A

Ética e a Lei”, “A Ética e a Deontologia” e “A Ética e a Filosofia”). Esta abordagem

permitirá a confrontação dos mencionados eixos para posterior verificação do

problema levantado, observando-se sempre a neutralidade exigida para estudos de

tal natureza.

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2 A TEORIA DA MORAL EM KANT E O SEU CONTEXTO DENTRO DO

PENSAMENTO OCIDENTAL

De acordo com Henry Sidgwick (2010), Kant desenvolve sua teoria da

moralidade em duas obras específicas: a Fundamentação da Metafísica dos

Costumes e a Crítica da Razão Prática. Destarte, partiremos desses dois trabalhos

para construir nosso estudo sobre a filosofia moral produzida pelo renomado

pensador alemão.

No prefácio à Fundamentação da Metafísica dos Costumes, Kant (2009, p.

69) propõe elaborar uma “filosofia moral que esteja inteiramente expurgada de tudo

que possa ser empírico”, significando que não se deve buscar a razão das leis

morais nas circunstâncias do mundo, mas sim nos conceitos apriorísticos, originados

diretamente da razão pura. Diferentemente do que apregoam os empiristas, a

verdadeira destinação da razão não é a felicidade ou o prazer individual (a

satisfação dos nossos desejos), mas sim a “boa vontade” que, de acordo com o

professor Robert L. Holmes (2007), da Universidade de Rochester, consiste em fazer

o que é correto pelo motivo correto (e não por medo, para obtenção de vantagens ou

qualquer outra motivação de caráter subjetivo). Quando agimos em virtude de

nossas inclinações (mesmo que em conformidade à lei moral) não há valor na nossa

conduta, visto que, de acordo com Kant, tais valores não podem ser condicionados

por qualquer pendor de cunho subjetivo: “nem o medo, nem a inclinação, mas

unicamente o respeito pela lei é aquela mola propulsora que pode dar um valor

moral à ação” (2009, p. 283). Ou ainda,

[...] é impossível representar-se em pensamento uma razão que, com sua própria consciência com respeito a seus juízos, recebesse de outra parte uma direção, pois então o sujeito não atribuiria a determinação do poder de julgar à sua razão, mas a um impulso (KANT, 2009, p. 355).

As ações morais devem ser resultado daqueles deveres que se originam

diretamente da razão (nos moldes do racionalismo cartesiano), livres das influências

do mundo externo, do mundo passível de ser apreendido pelos sentidos. A razão

determinaria “a priori” a vontade do agente e, assim, privando-se tal vontade dos

supramencionados impulsos e inclinações subjetivas, “nada mais resta senão a

legalidade universal das ações que sirva sozinha de princípio à vontade, isto é,

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nunca deve proceder de outra maneira senão de tal sorte que eu possa também

querer que a minha máxima se torne uma lei universal” (KANT, 2009, p. 133)

Depreende-se então que a “boa vontade” é aquela decorrente exclusivamente das

faculdades racionais e, ao contrário, caso tenhamos qualquer influência da

subjetividade do indivíduo sobre esta, não mais poderemos considerá-la

inteiramente “boa”. A vontade boa é aquela não determinada por causas subjetivas,

mas sim objetivamente “em virtude de razões que são válidas para todo ser racional

enquanto tal” (KANT, 2009, p. 187) Somos capazes de alterar nossa conduta porque

reconhecemos a verdade incontestável de algumas proposições, e isso nos faz ser

racionais. Para que alcancemos uma conduta adequada, devemos nos perguntar o

que um ser “racionalmente perfeito” faria em nosso lugar em uma situação similar.

As respostas a esses questionamentos são denominadas por Kant de “imperativos”

(dentre os quais estão os “imperativos categóricos”, que independem de condições

empíricas e são consequentemente dotados de grande força normativa).

Na obra supramencionada, Kant define os imperativos como “fórmulas para

exprimir a relação de leis objetivas do querer em geral com a imperfeição subjetiva

da vontade deste ou daquele ser racional, por exemplo, da vontade humana” (2009,

p.189), classificando-os em hipotéticos (funcionam como meio para se obter outra

coisa desejada) e categóricos (representam ações necessárias por si mesmas, não

objetivando qualquer outro fim, conforme mencionado acima). Os últimos apontam o

caminho para valorar as nossas ações, considerando-as moralmente aceitáveis ou

não. Na realidade, Kant afirma que existe um único imperativo categórico (com

alguns desdobramentos identificáveis em suas obras) a saber: “age apenas segundo

a máxima pela qual possas ao mesmo tempo querer que ela se torne uma lei

universal” (2009, p. 215). O imperativo categórico é o único que traz aquela

necessidade característica de uma verdadeira lei. Ademais, o imperativo deve ser tal

que tome “a humanidade, tanto em tua pessoa quanto na pessoa de qualquer outro,

sempre ao mesmo tempo como fim, nunca meramente como meio” (KANT, 2009, pp.

243, 245). Verifica-se aqui no pensamento do nobre filósofo a preocupação altruísta

com o outro, essencial para o desenvolvimento das relações humanas em qualquer

grau. Há ainda, de acordo com Kant, uma terceira variante do imperativo: devemos

agir conforme máximas que se harmonizem com um reino de fins verossímil (ou

seja, os fins devem ser encontrados em comunidade). Cabe aqui salientar que, se

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não estivéssemos sujeitos à influência das inclinações, o imperativo seria

desnecessário, visto que a lei da razão estaria livre de qualquer influxo negativo.

É importante ressaltar que, de acordo com o pensador alemão, a vontade

não está em posição de submissão quanto à lei representada pelo imperativo, mas

atua igualmente como autolegisladora. Essa vontade “universalmente legislante” é a

que melhor convém a um imperativo categórico, uma vez que não está subordinada

a qualquer condição ou inclinação subjetiva (deparamo-nos aqui com um aspecto

importante do pensamento kantiano: a liberdade é o despreendimento absoluto das

paixões mundanas no que se refere ao dever moral). Trata-se do princípio da

“autonomia da vontade”, diretamente ligada às ideias de dignidade e liberdade. Tal

liberdade consiste na “propriedade da vontade de ser para si mesma uma lei”

(KANT, 2009, p. 349) Ademais, a “autonomia da vontade” estabelece, assim como o

imperativo categórico, que não se deve “escolher de outro modo senão de tal modo

que as máximas de sua vontade também estejam compreendidas ao mesmo tempo

como lei universal no mesmo querer.” (KANT, 2009, p. 285). A vontade enquanto

autolegislante deve levar em conta o ponto de vista dos demais seres racionais com

os quais nos relacionamos. Assim, conclui-se que as ações compatíveis com o

princípio da “autonomia da vontade” são lícitas e moralmente válidas, enquanto

aquelas que não se adequam a este podem ser consideradas ilícitas em sua

essência (KANT, 2009).

Kant salienta ainda (na mesma obra) que, nos casos em que a vontade

busca a lei que a determina em lugares que não seja a sua própria aptidão a legislar

de forma universal, isto é, persegue a lei na qualidade dos objetos pertencentes ao

mundo empírico e não na razão pura, teremos como resultado a “heteronomia”,

fenômeno que nos levará sempre a “imperativos hipotéticos” (aqueles caracterizados

por funcionarem como meio para a obtenção de outros fins que não eles mesmos).

Cabe aqui uma demonstração para elucidar a diferença entre os imperativos

hipotético e categórico, uma vez que tais conceitos são essenciais para que se

entendam os ideais éticos preconizados pelo nosso filósofo. Kant exemplifica o

“imperativo hipotético” por meio da seguinte proposição: “não devo proferir mentiras

se quiser ter uma boa reputação”. Fica claro nessa afirmação que o fato de não

mentir visa a um outro fim (a conquista de uma boa reputação), distinto da proibição

da conduta pelo seu próprio desvalor moral. O “imperativo categórico”, fruto da razão

pura, colocaria a afirmação de uma forma diferente: “não devo proferir mentiras,

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ainda que isso não me acarrete qualquer desonra”. Aqui temos verdadeiramente um

dever que emana da vontade autolegislante (razão), revestindo-se de um valor moral

pleno.

Assim, ao longo da Fundamentação, Kant revela a polaridade entre o mundo

sensível (empirismo) e o mundo do entendimento (racionalismo), polaridade esta

que acompanhou séculos de desenvolvimento do pensamento ocidental (antes que

o academicismo da horrível e praticamente ininteligível filosofia da linguagem

prevalecesse nos círculos filosóficos). Segundo o pensador alemão, o mundo

sensível não seria cognoscível em sua essência, uma vez que é “filtrado” pela mente

humana, estando sujeito, dessa forma, à sensibilidade inerente a cada espectador.

O mundo do entendimento, por sua vez, permaneceria sempre o mesmo, visto que

seus preceitos chegam imediatamente à consciência humana, sem qualquer tipo de

intermediação dos sentidos. Entretanto, o entendimento não pode produzir conceitos

senão aqueles que se prestam a “subsumir as representações sensíveis a regras”

(KANT, 2009, p. 369), ou seja, o entendimento utiliza-se do mundo empírico para

abstrair e derivar os seus conceitos (nesse sentido, de acordo com Richard Tarnas

(2001), não podemos afirmar que Kant seja um racionalista ao estilo de Descartes,

visto que tal racionalismo puro, despido de qualquer evidência sensorial, não

constituiria uma opção viável para explicar o funcionamento do conhecimento

humano. Da mesma forma, o empirismo puro, sem o auxílio das estruturas

axiomáticas da razão, inviabilizaria a epistemologia tal como entendida por Kant).

Assim, o mundo inteligível determina também o mundo sensível, colocando esse

último sob o imperativo de suas leis. Apartada desses dois conceitos está a “razão”

que, de acordo com Kant, é “espontaneidade pura”, completamente independente de

qualquer influxo do mundo empírico (KANT, 2009). Tal independência de causas

oriundas da esfera sensível é o fundamento da “liberdade” humana, ideia tão

celebrada nas obras do filósofo (conforme analisado acima). Esses conceitos de

“razão”, entendimento e mundo sensível deveriam, no nosso ponto de vista,

preceder toda a análise da teoria moral do pensador alemão, visto que são

essenciais para entender a natureza e os liames de sua filosofia. Porém, optou-se

por seguir a ordem presente na Fundamentação, onde Kant menciona as referidas

noções apenas ao final do texto (fazendo referências à sua obra anterior Crítica da

Razão Pura).

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Por fim, Kant afirma na supracitada obra que o mundo inteligível é

especialmente importante para o ser racional, visto que produz em nós “um vivo

interesse na lei moral mediante o magnífico ideal de um reino universal dos fins em

si mesmos, ao qual só podemos pertencer enquanto membros se nos comportarmos

cuidadosamente segundo máximas da liberdade como se fossem leis da natureza”

(2009, p. 407).

Na outra obra relevante para sua teoria moral, a Crítica da Razão Prática,

Kant desenvolve ainda mais as ideias presentes na Fundamentação da Metafísica

dos Costumes.

A princípio, é feita uma distinção entre “máximas” e “leis práticas”, sendo que

as primeiras são válidas apenas para a vontade de um dado sujeito. Contrariamente,

as “leis práticas” são proposições válidas “para a vontade de todo ente racional”

(KANT, 2011, p. 32), confundindo-se, portanto, com o conceito de “imperativo”, já

anteriormente delineado.

Na sequência, Kant volta a condenar o papel das inclinações pessoais sobre

a “vontade autolegislante”. Assim, reforça-se o fato de que os impulsos originados

da faculdade de apetição (sentimentos de prazer ou desprazer) acabam por minar a

força da razão. Só a razão pura pode determinar uma lei de validade universal

(KANT, 2011). Aqui, mais uma vez o pensador alemão se posiciona contra a filosofia

de cunho empirista: a felicidade, o contentamento (defendido pelos empiristas como

o fim último do ser humano, cada um almejando o seu próprio bem-estar) não é obra

de “uma posse originária e uma bem-aventurança [...], mas um problema imposto ao

indivíduo por sua própria natureza finita, porque ele é carente” (KANT, 2011, p. 42).

Destarte, tudo aquilo que resulta do mundo empírico não pode ser considerado uma

lei na acepção kantiana, em virtude da variação inerente aos apetites de cada

indivíduo (é fato incontestável que não há um pensamento uniforme no que se refere

à subjetividade).

Na obra em questão, Kant ressalta uma vez mais o papel da vontade no seu

sistema moral, afirmando que não pode existir nenhum outro fundamento para esta

senão aquela “forma legislativa universal”. A vontade deve ser independente do

mundo dos fenômenos (sensorial), caracterizado pela causalidade. Tal

independência deve ser denominada “liberdade” (KANT, 2011). Em outras palavras,

a determinação da vontade deve ocorrer de acordo com a lei moral, livre de qualquer

condição sensível, para que as ações sejam consideradas moralmente relevantes.

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Dessa forma, infere-se que a vontade só é livre na medida em que atua

independentemente da influência dos sentidos. Ainda, as máximas resultantes de

nossas inclinações querem nos fazer acreditar que são a origem da nossa vontade

(aquilo que a determina). Entretanto, “a vontade jamais é determinada

imediatamente pelo objeto e sua representação, mas é uma faculdade de fazer de

uma regra da razão a causa motora de uma ação” (KANT, 2011, p. 97). Conclui-se

que a razão determina a vontade, atuando como uma lei prática “a priori”, livre de

quaisquer influências da faculdade de apetição (ao conjunto das inclinações

resultantes dessa apetição, Kant denomina “solipsismo”, significando amor de si,

presunção). Ademais, os conceitos de “bom e mau”, seminais para as diferentes

construções éticas surgidas ao longo da história da humanidade, seriam

determinados depois da lei moral, ou seja, por meio dela (KANT, 2011).

Na sequência da Razão Prática, o filósofo alemão faz uma diferenciação

entre as ações realizadas “conforme ao dever” e as ações realizadas “por dever”.

Nas primeiras, as inclinações são os fatores determinantes da vontade (por

exemplo, “faço alguma coisa por amor aos homens ou por benevolência”). Trata-se,

nesse caso, de ações oriundas de uma “razão patológica”, escrava das propensões

subjetivas do indivíduo. As segundas, por sua vez, ocorrem exclusivamente por

causa da lei moral (é um comportamento puro, desinteressado, caracterizado por ser

um fim em si mesmo, vide a diferenciação entre os imperativos acima descritos

quando da análise da Fundamentação da Metafísica dos Costumes).

Por fim, Kant salienta que há, da parte de todos os seres racionais, uma

tentativa deliberada de justificar os atos que ofendem a lei moral,

[...] ele descobre, contudo, que o advogado que fala em seu favor de modo algum consegue fazer calar o acusador nele, tão logo ele se dê conta de que no momento em que praticava a injustiça, estava de posse do seu juízo, isto é, no exercício de sua liberdade (2011, p. 160).

Além disso, quando se trata da lei moral, a razão humana “não reconhece

diferença de tempo e pergunta somente se o evento me pertence como ato, a

seguir, porém, vincula-lhe sempre moralmente a mesma sensação, quer ele tenha

ocorrido agora ou há muito tempo” (KANT, 2011, p. 161). Dessa forma, não há

maneira de escapar ileso de eventuais ofensas ao imperativo moral proveniente da

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nossa consciência, tal desvio de conduta estará sempre lá, a nos assombrar e julgar

impiedosamente.

A Crítica da Razão Prática se encerra com a afirmação de que a força da lei

moral é garantida pelo autoexame, pelo “respeito por nós mesmos” e consequente

receio de nos tornar reprováveis a nossos próprios olhos. Destarte, a lei moral nos

faz perceber a incontestável sublimidade da existência “suprassensível”, gerando um

grande e merecido respeito por ela (KANT, 2011). Em resumo: para Kant, o valor

moral está na obediência aos preceitos objetivos originados aprioristicamente da

razão, sem qualquer influência de inclinações individuais ou paixões subjetivas

oriundas do mundo dos sentidos (contudo, lembremos que ele não rejeita por

completo o papel dos sentidos, uma vez que os mesmos são importantes para o

desenvolvimento de conceitos provenientes da reflexão, conforme visto quando da

diferenciação, analisada supra, entre o mundo sensível, o mundo do entendimento e

a razão pura).

Diante do exposto, ressaltemos mais uma vez o embate entre o racionalismo

- corrente a que alinhamos o pensamento de Kant, lembrando que, de acordo com o

professor José Manuel de Sacadura Rocha (2013), se trata de um racionalismo

diferente daquele postulado por Descartes, visto que o pensador alemão realiza na

verdade um amálgama entre a razão e a metafísica, sendo que para ele o racional é,

de certa forma, tido como o “espírito humano”, a “natureza humana”, aos moldes do

idealismo de seus conterrâneos, Hegel, Fichte e Schelling - e o empirismo no que

tange à ética, por meio de um breve histórico da evolução do pensamento ocidental

em tal matéria. Tal medida nos auxiliará a contextualizar o pensamento do filósofo

de Königsberg, inserindo-o na tradição filosófica iniciada pelos gregos.

Podemos afirmar que a ética tem início a partir do pensamento de Sócrates.

Segundo Bryan Magee (2001), Sócrates foi o verdadeiro fundador da filosofia moral.

Na concepção desse grande filósofo ateniense,

[...] o que precisávamos saber era como conduzir nossas vidas e a nós mesmos. Para nós, as questões mais urgentes eram: o que é bom? O que é certo? O que é justo? Saber as respostas a essas perguntas teria um profundo efeito em nosso modo de viver (MAGEE, 2001, p. 20).

Sócrates perpetrou uma verdadeira revolução, levando-se em consideração

que os filósofos anteriores (pré-socráticos) preocupavam-se quase que

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exclusivamente com os fenômenos naturais, distanciando-se das ponderações sobre

a motivação dos atos humanos. Algumas exceções são notáveis, como por exemplo

os “sofistas”, dentre os quais destacava-se Protágoras, famoso pela afirmação de

que “o homem é a medida de todas as coisas”. Todavia, os sofistas estavam mais

voltados para considerações práticas, em detrimento das pormenorizadas

especulações filosóficas sobre o tema, inauguradas por Sócrates.

O relato sobre o desenvolvimento da filosofia moral, descrito na sequência,

teve como base a obra História da Ética de Henry Sidgwick. De acordo com

Sidgwick (2010), para Sócrates todas as virtudes se resumiam à sabedoria

(conhecimento do bem). A ignorância seria a causa de todos os males e a liberdade,

portanto, adviria do conhecimento. Platão, seu discípulo, afirmava que ao aprender

alguma verdade abstrata (ideal), estamos tornando explícito aquilo que já trazíamos

implicitamente em nossa consciência (trata-se de rememorar verdades ocultas em

função do aprisionamento de nosso corpo). Estaríamos, segundo Platão,

aprisionados no mundo sensorial, contudo, em algum momento, já estivemos frente

a frente com a realidade última, aquilo que ele denomina “O Sumo Bem”, passível de

ser apreendido pelas faculdades racionais (SIDGWICK, 2010). Dessa forma, Platão

defendia a submissão dos impulsos não-racionais à razão. Assim, é possível

identificar uma grande semelhança entre o idealismo platônico e o racionalismo

kantiano, visto que ambos proclamam a primazia da razão.

Por sua vez, Aristóteles (discípulo de Platão) apregoava que a verdade

moral é obtida a partir de uma observação cuidadosa das concepções morais de

cada indivíduo separadamente, do mesmo modo que as leis da natureza são obtidas

pelas observações físicas particulares (denota-se aqui uma proximidade maior com

o empirismo): assim, para ele, não existiria apenas uma única verdade, imutável e

absoluta. Ainda de acordo com Aristóteles, o homem que consideramos sábio não

deve ser hábil apenas na seleção de meios para se alcançar determinados fins: ele

deve igualmente ponderar e escolher corretamente seus fins (SIDGWICK, 2010).

Deixando-se de lado as controvérsias, tanto Platão quanto Aristóteles defendem que

os atos essencialmente ruins derivam de impulsos irracionais que predominam sobre

a razão, bem como de escolhas equivocadas (“mal sob a aparência de bem”).

Ainda na Grécia Antiga, temos o desenvolvimento simultâneo de duas

correntes de pensamento que dividiriam durante séculos as atenções do mundo

ocidental (inclusive dos mais letrados dentre os cidadãos do império romano), quais

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sejam: o estoicismo e o epicurismo (Kant cita muitas vezes essas duas escolas e

seus preceitos básicos nas duas obras acima analisadas, porém sem tomar partido

por qualquer uma delas). Para os adeptos do primeiro, as paixões seriam condições

mórbidas da alma racional que nos direcionariam a julgamentos equivocados

(SIDGWICK, 2010). Buscavam, dessa forma, o bem-estar independentemente das

coisas externas (semelhante, nesse aspecto, ao pensamento kantiano). Virtude,

para os estoicos, era sinônimo de serenidade (ausência de aflição), aceitando-se o

mundo da maneira como é. Os epicuristas, por seu lado, proclamavam que a

felicidade, a paz de espírito (e não a lascívia e a luxúria, como alguns comentadores

dessa linha querem nos fazer acreditar), seriam a real finalidade da vida, sendo a

virtude um simples meio para alcançá-las (SIDGWICK, 2010). Assim, o epicurismo

afirmava que “toda conduta virtuosa e toda atividade especulativa são vazias e

inúteis, exceto quando contribuem para o deleite da vida do agente”. (SIDGWICK,

2010, p. 95) O prazer consistiria na remoção da dor, da ansiedade (tranquilidade de

espírito, e não voluptuosidade).

Mais tarde, com a vitória definitiva do cristianismo sobre o paganismo na

Idade Média, teremos um processo de suma importância para o desenvolvimento da

ética jurídica como a entendemos hoje, visto que a ideia de “conduta correta” passou

a ser determinada pela interpretação de leis codificadas (leis canônicas). Por óbvio

que tal codificação foi um processo lento, sendo que os preceitos do direito canônico

foram fruto do desenvolvimento do neoplatonismo (caracterizado pelo afastamento

deliberado do mundo material e uma crescente preocupação com o mundo

“suprassensível”) e da teologia do novo testamento (especialmente as epístolas

paulinas). Grande influência exerceu também Tomás de Aquino, a quem tocou

conciliar a teologia com a razão (com particular referência à filosofia de Aristóteles).

De acordo com ele, Deus teria implantado seus princípios imutáveis na mente

humana, assim como uma disposição natural para a realização plena desses

princípios (disposição que chamava de “sinderese”, e que guarda algumas

semelhanças com a lei moral apriorística de Kant). O mau costume e a má educação

impediriam o exercício correto de tais princípios. Todavia, é importante salientar que

Tomás de Aquino não rejeitava as leis humanas, necessárias para nos orientar em

situações não abarcadas pela intuição dos mencionados princípios divinos

(SIDGWICK, 2010).

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A Idade Moderna vê o aparecimento da ideia de “jus naturale” (lei natural)

que, segundo Hugo Grotius, um dos seus principais idealizadores, seria parte da lei

divina (identificamos ainda aqui uma forte influência eclesiástica). De acordo com

Grotius, o “jus naturale” consistiria no “ditado da reta razão”, a indicar que

determinado ato é moralmente infame ou moralmente necessário (SIDGWICK,

2010). Nota-se que o conceito de “lei natural”, com normas provenientes da razão,

teve enorme impacto para o posterior desenvolvimento da filosofia kantiana.

Contudo, cabe ressaltar que a lei moral, tal como prelecionada por Kant, é

autoimposta, diferentemente do que defendem os jusnaturalistas.

Na sequência do nosso breve relato sobre a história da ética, surge um

divisor de águas. As ideias de Thomas Hobbes engendrariam uma grande revolução

na história do pensamento moral, assentando os alicerces do empirismo tal como

entendido hodiernamente. Para Hobbes (de acordo com Sidgwick, na

supramencionada obra), os apetites do homem seriam direcionados à preservação

de sua vida e ao prazer. Os fins da ação humana seriam fixados pela natureza e não

pela razão, responsável apenas por revelar os meios para se obter aqueles fins.

Dessa maneira, Hobbes sustenta que as paixões são muito mais fortes que as leis

da razão. Há também um certo pessimismo nas ideias do filósofo inglês, para quem,

caso todos os temores fossem afastados, aquilo que um indivíduo buscaria seria o

domínio sobre os demais (SIDGWICK, 2010). A propensão humana ao egoísmo

demandaria, dessa maneira, a necessidade de leis positivadas, caracterizando-se

assim uma visão legal da moralidade. Também para John Locke os princípios éticos

não estariam implantados na mente humana, existindo a necessidade do contato

com o mundo dos sentidos para que estes aflorassem à consciência: não existiriam

qualidades morais objetivas, apenas aquelas decorrentes das observações, que

atenderiam somente às demandas de determinado grupo particular (SIDGWICK,

2010). David Hume, assim como Locke, defendia que a razão humana por si só não

era competente para produzir sentimentos de culpa ou aprovação moral. Hume

afirmava ainda que a noção de “utilidade” seria o fundamento de diversas virtudes

(SIDGWICK, 2010). Destarte, a Ética consistiria naqueles valores que nos trazem

satisfação, e independeria de aspectos religiosos ou da existência de um direito

natural inato, conforme explica o professor José Manuel de Sacadura Rocha (2013).

Aqui verificamos uma conexão entre o empirismo e o utilitarismo, que se

desenvolveria posteriormente com o pensamento de Jeremy Bentham. De acordo

17

com este, o valor moral de uma conduta se daria pela equação entre os prazeres

(proporcionaria uma tendência dos atos ao bem) e dores (ao contrário, ensejaria

atos maus) do indivíduo (SIDGWICK, 2010). No mesmo sentido, John Stuart Mill,

sustentava que o fim último do homem consistiria na felicidade, diretamente ligada à

obtenção do prazer (SIDGWICK, 2010). Podemos afirmar que o utilitarismo, fruto

imediato do empirismo britânico, é o contraponto do pensamento kantiano, uma vez

que relega a razão a um segundo plano, conferindo ao mundo dos sentidos o papel

determinante das ações morais.

Na França, Helvetius daria um passo rumo à codificação dos princípios

morais ao proclamar que o legislador era o moralista mais eficaz (SIDGWICK, 2010).

Augusto Comte, pai da Sociologia, sustentava que o ideal moral por meio de

métodos abstratos (como a lei apriorística de Kant) não poderia subsistir, devendo-

se levar em conta especialmente o estudo da sociedade em suas diversas fases

para que se alcançasse tal ideal (SIDGWICK, 2010): temos aqui os primórdios do

relativismo moral, pelo qual cada sociedade desenvolveria seus próprios preceitos

éticos em função de sua organização característica. Porém, apesar da existência de

tal relativismo moral, Comte defendia que o Direito deveria ser construído de

maneira objetiva (SIDGWICK, 2010), com leis perenes e estáveis (ideia que mais

tarde ensejaria o desenvolvimento da corrente denominada “Positivismo Jurídico”).

Dentre os alemães, além de Kant temos alguns outros expoentes no que se

refere ao pensamento moral, como por exemplo Hegel, para quem a “vontade

universal” seria o fim último da humanidade. Essa vontade seria revelada nas leis e

na sociedade (senso comum), sendo que a consciência individual, subjetiva, deveria

ser resistida em prol de tal “totalidade” (SIDGWICK, 2010). Dessa forma, conforme

explicita o professor Thadeu Weber, para Hegel o ético seria “resultado do processo

de mediação que inclui limitação, argumentação e negociação. Sou livre e autônomo

na medida em que sou membro de uma instituição social” (WEBER, 2013, p.118).

Schopenhauer, por sua vez, identificava a moralidade com a negação da vontade,

visto que esta seria a origem de toda a dor, dor que se sobrepõe a todo o prazer,

tanto em quantidade quanto em intensidade (Bryan Magee curiosamente sustenta

que, com Schopenhauer, a filosofia ocidental encontraria, pelas vias da razão, os

preceitos do budismo, ao considerar a vontade como ponto de partida de todo o

sofrimento).

18

Após o aparecimento de Kant, houve a já mencionada polarização da teoria

moral entre intuicionistas/racionalistas e empiristas/utilitaristas. Alguns importantes

defensores da filosofia kantiana apareceram na Inglaterra, berço do empirismo. Price

e Reid, de acordo com Sidgwick afirmavam, nos moldes de Kant, que as ideias

morais são derivadas da “intuição da verdade ou discernimento imediato da natureza

das coisas pelo entendimento” (2010, p. 210). A supramencionada polarização

perdura até os dias de hoje (conforme será visto no capítulo referente à ética

contemporânea). Contudo, há em nossos dias correntes distintas que buscam a

resposta para a grande questão da ética, qual seja: as regras morais são ou não

certezas absolutas?

Tais correntes compreendem a denominada “construção científica da

moralidade”, que defende uma “ética evolucional”, segundo a qual o fim último do

ser humano seria a preservação da espécie, e não a felicidade (SIDGWICK, 2010),

conforme advogavam alguns empiristas como J. S. Mill. Também as “teorias

psicológicas da moralidade” tem atualmente um importante papel, defendendo que

os valores morais tem uma relação direta com as emoções (SIDGWICK, 2010)

Verifica-se, nessa última corrente, uma tendência maior à subjetividade.

No próximo capítulo, analisaremos mais de perto a ética contemporânea na

sua vertente jurídica, com o escopo de construir uma conclusão sobre a relevância

da teoria moral de Kant para o Direito.

19

3 A ÉTICA JURÍDICA EM NOSSOS DIAS

3.1 A ÉTICA E A LEI

Muitas são as fontes que se referem à ética jurídica e aos valores inerentes

ao operador do Direito (leis esparsas, códigos, tratados, costumes, correntes de

pensamento etc.). Todavia, visto que o direito pátrio foi (via Portugal) enormemente

influenciado pelo normativismo que caracteriza a “Civil Law” desenvolvida no

continente europeu, não podemos prosseguir o nosso estudo sem que se realize

uma breve análise da legislação vigente no Brasil, no que concerne ao assunto.

Quando analisamos a lei de forma fria, dificilmente identificamos traços do

primor intelectual que permeia a elaboração de uma teoria filosófica da moralidade.

Percebe-se que os Códigos de Ética do Direito são voltados essencialmente a

assuntos práticos da profissão jurídica, com foco precipuamente nos direitos e

deveres do operador do Direito (o que o advogado pode ou não fazer perante o juiz;

casos de suspensão, exclusão etc.). Ainda, de acordo com José Manuel de

Sacadura Rocha (2013), devemos recordar que o Direito pátrio foi (e ainda é)

amplamente influenciado pela Escola da Exegese (que tem como base o Positivismo

de Comte), caracterizando-se por ser um sistema objetivamente fechado, com pouca

margem para interpretações. No entanto, é possível divisar na lei alguns pontos

importantes que denotam a influência e a aplicação das teorias morais anteriormente

analisadas, conforme relacionados a seguir:

No preâmbulo ao Código de Ética e Disciplina (CED) da OAB1,

identificamos os princípios que nortearam a sua elaboração, dentre os

quais a função social da advocacia. Nesse sentido, o professor Araujo

Junior sustenta que “devem ser resguardados os interesses sociais e

coletivos, acima dos interesses individuais”. (2007, p. 19) Tal função

social está implícita na alteridade que caracteriza o imperativo

1 “O CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, ao instituir o Código de

Ética e Disciplina, norteou-se por princípios que formam a consciência profissional do advogado e representam imperativos de sua conduta, tais como: [...] pugnar pelo cumprimento da Constituição e pelo respeito à Lei, fazendo com que esta seja interpretada com retidão, em perfeita sintonia com os fins sociais a que se dirige e as exigências do bem comum.”

20

kantiano: agir segundo uma máxima que possa se tornar uma lei

universal, tomando-se o ser humano sempre como fim em si mesmo;

O art. 20 do mesmo conjunto de leis2 estabelece, de acordo com o

autor retromencionado, os impedimentos éticos do advogado para a

postulação:

O advogado deve abster-se de patrocinar, por impedimento ético, as causas: a) contrárias à ética, à moral ou à validade de atos jurídicos em que tenha colaborado, orientado ou conhecido em consulta; b) em que tenha sido convidado pela outra parte, se esta lhe revelou segredos ou obteve seu parecer, ainda que não tenha se efetivado a contratação (ARAUJO JUNIOR, 2007, p. 27).

Encontramos aqui, como em outras regras do Código de Ética,

conceitos abertos (como por exemplo “causas contrárias à ética e

moralidade”) que demandam um julgamento moral, passível de ser

realizado em sua plenitude apenas após a compreensão adequada do

funcionamento dos processos relacionados a tais escolhas morais.

Essa base é oferecida unicamente pelo estudo das humanidades,

dentre as quais as teorias da moralidade anteriormente analisadas.

Ressaltemos também, conforme dito acima, que a legislação possui

vários outros conceitos abertos, que não apresentam uma definição

legal e são dependentes de avaliações morais para sua correta

delimitação, tais como: “idoneidade moral” para inscrição como

advogado, crime “infamante” etc.;

Proibição de diversos atos condenáveis por parte do operador do

Direito, como nos casos de proibição das lides temerárias (vide artigo

32 do Estatuto da OAB)3, aquelas perpetradas unicamente para lesar a

2 “Art. 20. O advogado deve abster-se de patrocinar causa contrária à ética, à moral ou à validade de

ato jurídico em que tenha colaborado, orientado ou conhecido em consulta; da mesma forma, deve declinar seu impedimento ético quando tenha sido convidado pela outra parte, se esta lhe houver revelado segredos ou obtido seu parecer.” 3 “Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou

culpa. Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.”

21

outra parte. Aqui, vislumbramos novamente o papel do imperativo

categórico e sua preocupação com o próximo.

O imperativo também é identificável nos preceitos éticos básicos que norteiam

o advogado universalmente no exercício de sua profissão. De acordo com Geoffrey

C. Hazard Jr. e Angelo Dondi (2011) na obra Ética Jurídica: Um Estudo

Comparativo, que realiza uma análise das normas de ética profissional presentes na

legislação de diversos países, tais preceitos, também denominados “virtudes” ou

“valores” profissionais, são os seguintes: a) competência: consiste no conhecimento

do advogado e nas técnicas utilizadas para empregar tal conhecimento; b)

independência: refere-se à autonomia profissional em relação a interesses alheios;

c) lealdade: conduta leal para com seus clientes; d) sigilo: relativo à guarda

adequada de informações concernentes aos clientes ou seus negócios; e)

responsabilidade: conduta honrosa e honesta para com os tribunais e demais

colegas. As três últimas virtudes, em especial, revelam igualmente aquela

preocupação do filósofo de Konigsberg para com o próximo. Tais virtudes recaem

nas concepções kantianas do homem como fim em si mesmo, conforme estabelece

uma das variantes do imperativo categórico, analisadas no capítulo anterior.

Ressalvadas as observações realizadas acima, é possível verificar que a lei

deixa pouco espaço para elucubrações de cunho filosófico e moral, fato que denota

(conforme dito acima) a enorme influência que ainda exerce, nos países adeptos da

“Civil Law”, o legalismo originado da corrente de pensamento denominada

Positivismo Jurídico, elaborada por Hans Kelsen (sob influência do Positivismo de

Augusto Comte) e que, segundo José Manuel de Sacadura Rocha (2013), enxerga o

Direito como uma ciência quase exata, orbitando incansavelmente ao redor da

“norma jurídica”. Consequentemente, de acordo com as ideias de Kelsen, as leis

determinariam os valores. Miguel Reale – igualmente citado por Rocha (2013) - na

sua Teoria Tridimensional do Direito, defende uma posição muito mais plausível ao

afirmar que, na realidade, os valores (relacionados eminentemente a aspectos

culturais) é que determinariam as leis.

Geoffrey C. Hazard Jr. e Angelo Dondi (2011) sustentam também que a

“legificação” da ética jurídica teria um efeito negativo sobre a coercitividade das

regras morais:

22

A formalização legislativa de normas consuetudinárias debilita em certa medida a força moral dessas normas, desviando a atenção dos princípios normativos e seu espírito para a definição legalista. A formalização também transfere a exigência do cumprimento das regras pelo mecanismo de pressão social dos colegas de profissão para a exigência de seu cumprimento exercida pela autoridade estatal (HAZARD JR. e DONDI, 2011, p. 205).

Ademais, Hazard Jr. e Dondi salientam ainda que “as normas jurídicas

modernas não expressam um espírito moral claro, mas, sim, transigências muito

bem negociadas entre valores sociais discordantes e interesses políticos

conflitantes” (2011, p. 394).

A lei (com suas frias disposições sobre o que o advogado pode ou não fazer,

bem como sobre as eventuais sanções a que está sujeito pela desobediência a tais

preceitos legais) não constitui, dessa forma, fonte suficiente para realizar o exame a

que se propõe este estudo. Destarte, a referida fonte deverá ser buscada em obras

contemporâneas de Deontologia e Filosofia Jurídica.

3.2 A ÉTICA E A DEONTOLOGIA

As obras de Ética Jurídica raramente mencionam os fatores que envolvem

uma decisão moral. Tal análise surgirá em sua plenitude nas obras de Deontologia,

termo criado por Jeremy Bentham e que deriva do grego “deontos” (dever) e ”logos”

(tratado), isto é, “a ciência dos deveres no âmbito de cada profissão” (LANGARO,

1992, p. 3). A Deontologia não leva em consideração apenas os códigos de ética,

em uma análise fria e simplista da lei, mas também os preceitos da filosofa moral e

da filosofia do direito.

Para Langaro, o mais importante princípio da moralidade consiste em que

“devemos buscar o bem (entendido como a satisfação plena da finalidade do

homem) e evitar o mal” (1992, p. 16). O caráter obrigatório de tal busca é o que o

autor chama de “dever”. Ele aponta a existência de 4 teorias que explicariam essa

obrigatoriedade:

a) a primeira afirma que ela decorre do fato de existir uma sanção contra

quem não a obedece. Porém, de acordo com o autor, essa sanção pressupõe a

existência de uma lei moral prévia, que será obedecida em função de uma inclinação

natural do indivíduo no sentido de buscar o dever em questão;

23

b) a segunda consiste na “razão independente”, pela qual toda a

obrigação moral possui como fundamento exclusivo a razão. Contudo, para Langaro

a razão apenas nos indica caminhos, não nos obriga a agir;

c) a terceira é denominada de “pura autoridade”: a obrigação seria um

“decreto arbitrário de Deus” (LANGARO, 1992, p. 20);

d) a última, “teoria da escola empírica”, sustenta que as ideias de bem e

mal são produtos da experiência, da sociedade e dos seus costumes. Segundo o

autor, ela falha pelo relativismo que dá aos conceitos morais, tornando-os

extremamente instáveis. Langaro defende a imutabilidade dos preceitos morais, a

existência de uma “lei natural” e está, nesse sentido, muito mais próximo de Kant

que dos empiristas.

De importância especial para nosso estudo é o fato de que Langaro atribui um

papel fundamental à lei que emana de nossa razão, guardando, dessa forma,

semelhanças significativas com o pensamento de Kant, conforme a citação a seguir:

[...] chega-se à conclusão de que, existindo um bem, existindo uma lei moral como decorrência desse bem, uma lei da razão universal, aplicável a todos os homens, em todas as suas ações, existirá também, como consequência, um dever, um dever a seguir a lei moral, a lei natural que a consciência moral encontra dentro de si e da própria natureza humana. Daí a existência do dever – o dever de praticar o bem e evitar o mal (LANGARO, 1992, p. 16).

Há semelhanças também no fato de Langaro (1992) afirmar que a intenção

deve estar em conformidade com os fins do ato (atentando-se para o fato de que a

utilização de um meio reprovável maculará sobremaneira o fim considerado como

bom em si mesmo), vide a regra de conduta moral pela qual devemos “atender ao

dever moral com a intenção de estarmos agindo de conformidade com o bem que

ele é. Assim, não basta cumprir o dever; é preciso ter a intenção, desejar cumprir o

dever, cumpri-lo com a intenção de cumpri-lo“ (LANGARO, 1992, p. 29).

Apesar da proximidade para com o pensamento kantiano, o fundamento da

obrigação moral para o autor não é a razão, mas sim a consciência moral. Na

prática, é difícil distinguir os dois conceitos, tanto que o próprio Langaro reconhece

24

que a consciência é, na realidade, uma “razão intuitiva”, que “automática e

espontaneamente nos dá o conhecimento imediato dos princípios primários de

nossa conduta e da conduta alheia” (1992, p. 24).

É importante salientar duas observações que o autor faz sobre a consciência:

em primeiro lugar, ela não é infalível, não tem um valor absoluto. Todavia, nunca

falha ao determinar o princípio básico da moralidade (buscar o bem e evitar o mal,

conforme visto acima). O fator variável se encontra quando da aplicação prática que

cada um de nós faz desse princípio. Em segundo lugar, a consciência que nos

interessa é aquela denominada por Langaro (1992) de “duvidosa”: estados em que

há dúvida sobre se nossa ação é lícita ou ilícita. Um exemplo consiste na seguinte

interrogação: “devemos ou não atender uma lei que é injusta, mas que é

perfeitamente legal?” (LANGARO, 1992, p. 27). Tais são as questões que incitam as

verdadeiras ponderações e decisões morais.

A Deontologia Geral tende a descartar o “legalismo” (aquela interpretação fria

dos códigos de ética), apresentando um caráter principiológico, aberto a

interpretações, procurando despertar no indivíduo uma consciência moral renovada,

voltada à dignidade da pessoa humana. Por sua vez, a Deontologia Jurídica trata

mais especificamente das qualidades necessárias ao operador do Direito no

exercício de sua profissão. Citando o francês Jean Appleton, Langaro (1992)

relaciona as seguintes qualidades essenciais à advocacia: a) cultura geral; b) amor à

profissão; c) gosto pelo trabalho. Para Georges Cohendy, igualmente citado por

Langaro (1992), as qualidades necessárias são as seguintes: a) dons naturais

(linguagem, raciocínio etc.); b) qualidades de caráter (temperamento combativo e

coragem); c) cultura geral; d) sólida cultura jurídica; e) capacidade de trabalho e

estudo constante; f) pontualidade (auxilia a angariar a confiança de clientes e

magistrados); g) arte de fazer relações (a sociabilidade essencial a qualquer

profissão). Langaro completa afirmando: “o que se exige é a capacidade técnica

aliada à capacidade ética, o que equivale a dizer: competência e honestidade

capazes de inspirar a confiança da clientela” (1992, p. 43). Por sua vez, o autor

observa que o magistrado deverá demonstrar as seguintes qualidades: probidade

(reta consciência), independência e cultura. Apesar da mencionada independência,

o juiz está sempre “submetido à Constituição, à lei e à própria consciência. Em

qualquer hipótese, ele está obrigado a cumprir a lei e deve aplicá-la, desde que tal

conduta não esteja proibida pela lei moral geral” (LANGARO, 1992, p. 69).

25

Outro aspecto importante levantado pelo autor consiste na divisão dos

deveres do ser humano em gerais e profissionais. Tais deveres podem ser

“positivos” ou “negativos”. Os primeiros estabelecem um fazer: “fazer o bem”,

“respeitar a lei” etc. Por sua vez, os últimos determinam o não-fazer: “não matar”,

“não cometer injustiças” etc. Em virtude de seu caráter permanente, os deveres

negativos se impõem com maior intensidade ao indivíduo - “antes de fazer o bem,

temos necessidade de evitar o mal” (LANGARO, 1992, p. 47) - sendo que os

positivos teriam um caráter menos obrigatório. Os deveres gerais do ser humano,

segundo Langaro (1992), seriam os seguintes: deveres relativos ao corpo (higiene,

alimentação etc.); deveres relativos ao espírito (cultivo da inteligência, da reflexão

etc.); deveres relativos à vontade (cultivo da vontade e da coragem para que se

ouça a voz da “reta consciência”); deveres relativos ao próximo (respeito ao

próximo); deveres em relação ao Estado (deveres de cidadania: voto, serviço militar,

pagamento de impostos etc.). Em contrapartida, os deveres profissionais dos

operadores do direito (que em muitos casos se confundem com as qualidades

pontuadas no parágrafo anterior) envolvem: a probidade; a veracidade; o

desinteresse e a moderação (distanciando-se da busca incessante pelo lucro); a

correção e a delicadeza no trato com o cliente; a dignidade; o sigilo profissional; a

busca por soluções amigáveis; a lealdade nos debates com os colegas; o respeito

no trato com os colegas (LANGARO, 1992).

Divisamos assim a relação direta entre a filosofia moral elaborada por Kant

(em sua busca pelos valores absolutos que devem orientar a nossa conduta) e o

posterior desenvolvimento da Deontologia, com sua análise aprofundada no que

concerne aos valores morais que devem ser respeitados pela espécie humana.

Também a Filosofia, após séculos de incansável busca por dimensões ainda

inexploradas do pensamento humano, permanece na vanguarda no que tange ao

desenvolvimento de novas perspectivas no campo da Ética, conforme será

analisado na sequência.

3.3 A ÉTICA E A FILOSOFIA

É papel da filosofia quebrar os paradigmas originados do normativismo

jurídico (como no caso da “Escola Histórica”, desenvolvida por Savigny, e do “Direito

Alternativo”, elaborado por juristas gaúchos, que defendem um sistema jurídico

26

aberto, diferente daquele postulado por Kelsen, centrado eminentemente na norma e

na obediência cega ao legalismo), desconstruindo a verdade, desvelando novos

pontos de vista, enfim, provocando nosso senso comum. A filosofia é divergente por

natureza, e é justamente essa falta de conclusividade que nos impulsiona a um

constante aprimoramento. Assim, é essencial que analisemos o papel do

pensamento contemporâneo no que tange às considerações de cunho moral.

É importante ressaltar que o pensamento das últimas décadas tem enfatizado

sobremaneira o “caráter dinâmico das experiências” (SIDGWICK, 2010, p. 290).

Segundo Henry Sidgwick (2010), filósofos de diferentes linhas como Benedetto

Croce e John Dewey, concordam em afirmar que devemos abandonar a ideia de um

fim imutável para os valores morais, em benefício de uma crença em vários fins.

Para Dewey, citado por Sidgwick (2010), o único fim moral é o desenvolvimento

humano, sendo que os princípios morais funcionam apenas como base para que se

examinem questões particulares. Para ele, os princípios não são regras obrigatórias,

mas instrumentos para se analisar uma circunstância em especial, com o “certo” e o

“errado” sendo determinados pela situação em sua totalidade, e não pela regra em

si. A partir do pensamento de Dewey, Robert L. Holmes (2007) elabora a corrente

denominada “contextualismo”, segundo a qual a moralidade é uma questão de

julgamento, não de investigação objetiva. A justificativa para tais julgamentos seria a

experiência moral de cada um (diferente do conceito de empírico como

cientificamente testável). Holmes (2007) afirma que não se trata de descartar a

validade dos princípios (uma situação particular poderia perfeitamente requerer uma

regra deontológica), mas de verificar o seu cabimento em um caso específico

(verificar se há algum tipo de conflito, qual princípio tem precedência, se se trata de

uma exceção a determinado princípio etc.) A moralidade seria um empreendimento

dinâmico, criativo, cooperativo, fruto de um esforço contínuo, com o escopo de

desenvolver um mundo melhor. Além disso, o “contextualismo” reconhece a

diversidade das crenças e práticas morais e postula que, se a humanidade se

esforçar para entender a condição humana em toda a sua complexidade, poderá

existir uma convergência no que tange a tais crenças (HOLMES, 2007).

Similarmente, Sidgwick sustenta que “a evolução da moralidade foi um

processo de consolidação do que foi obtido pela experiência e pelo pensamento do

passado” (2010, p. 296). Ademais,

27

a única autoridade moral reconhecida está na qualidade moral da experiência pelo próprio indivíduo. Em contraste com a ênfase anterior sobre princípios de aplicação universal, a peculiaridade da pessoa individual é reconhecida, e sugere-se que ele deva refletir o reino dos valores morais de seu ponto de vista distintivo (SIDGWICK, 2010, p. 298).

Assim, para muitos pensadores, demanda-se hoje um esforço mais prático

em detrimento daquela reflexão abstrata preconizada por Kant. Aceita-se também

uma crescente e dinâmica riqueza de valores, diferentemente daquelas supostas leis

imutáveis originadas imediatamente da razão. De acordo com José Manuel de

Sacadura Rocha (2013), para um dado problema talvez exista mais de um

argumento válido, conforme defende Theodor Viehweg, idealizador da corrente de

pensamento contemporânea denominada “Tópica” (oriunda de “topoi”, termo

cunhado por Aristóteles, significando a existência de várias verdades). Viehweg,

conforme análise de Rocha (2013), defende então que, diante dessa multiplicidade

de proposições válidas, somente o consenso entre as partes seria válido para a

pacificação de eventuais litígios.

Também para Chaïm Perelman (2005), não haveria mais espaço para um

sistema de verdades absolutas. Ele se posiciona contra a noção que defende as

regras morais como axiomas (similares aos das ciências exatas), passíveis de serem

simplesmente deduzidas: “o raciocínio prático, aplicável em moral, não deve inspirar-

se no modelo matemático, inaplicável no caso, e sim na virtude, caracterizada pelo

comedimento e pela consideração de aspirações diversas e de interesses múltiplos”.

(PERELMAN, 2005, p. 306). Assim, a filosofia moral seria construída por meio de um

contínuo aprimoramento. Posiciona-se igualmente contra a autoridade política ou

religiosa, afirmando que “é a cada pessoa que cabe [...] a responsabilidade de

decidir-se e de agir. E apenas uma moral que faz justiça ao livre exame é que se

revela apta para salvaguardar nossa autonomia, nossa liberdade e nossa

responsabilidade”. (PERELMAN, 2005, p.328) Ademais, Perelman atribui um papel

importante à retórica (teoria que trata da argumentação) ao sustentar que esta

possui um importante papel na prevenção do uso abusivo de noções confusas

(aquelas suscetíveis de interpretações variadas), conforme segue:

[...] é pelo estudo dos procedimentos argumentativos, retóricos e dialéticos que aprendemos a distinguir os raciocínios aceitáveis dos raciocínios sofisticados, aqueles em que se procura persuadir e convencer daqueles em que se procura enganar, induzir em erro (PERELMAN, 2005, p. 684).

28

Sustenta ainda, segundo Rocha (2013), que o Direito exige uma ética e uma

educação exteriores a ele próprio, postulando a necessidade de uma ótica

multidisciplinar e de um envolvimento de toda a sociedade no que tange à Ciência

Jurídica.

Podemos inferir então que o pensamento kantiano está ultrapassado no que

tange à moralidade? Ou ainda existem aspectos de sua filosofia que podem ser

considerados de grande monta para nós, sujeitos essencialmente racionais?

Thadeu Weber (2013), diferentemente da visão empirista sustentada por

Henry Sidgwick, enfatiza que a multiplicidade de experiências e percepções

individuais inviabiliza qualquer tipo de consenso no que se refere a valores morais.

Assim sendo, a experiência individual seria um estorvo na determinação de leis

morais universalmente aplicáveis. Da mesma forma, Weber desconstrói o utilitarismo

ao afirmar que “a felicidade de um pode ser a desgraça de outro” (2013, p. 48).

Weber (2013) salienta a extrema importância das ideias de John Rawls para a

Filosofia do Direito. De acordo com Rawls (conforme exposto por Weber na obra

Ética e Filosofia do Direito), possuir faculdades morais significa ser um membro

cooperativo da sociedade, participando racionalmente da elaboração daquilo que ele

denomina “princípios da justiça”, cuja essência consiste em resguardar a igualdade

de oportunidades. Essa elaboração deveria ser realizada, de acordo com Robert L.

Holmes (2007), sob o “véu da ignorância”, termo que Rawls utiliza para definir um

estado em que ninguém soubesse exatamente, com relação aos demais, o seu lugar

dentro da sociedade (grau de riqueza ou status social). Sob tal condição de

imparcialidade, Rawls afirma, de acordo com as palavras de Holmes (2007), que os

indivíduos escolheriam basicamente dois princípios, a saber: a) igualdade de direitos

com uma maximização da liberdade (compatível, todavia, com a disposição de uma

liberdade similar aos demais); b) adequação das desigualdades intrínsecas a uma

sociedade, de forma que todos, em desejando, possam servir-se delas para

ascender econômica ou socialmente (igualdade de oportunidades).

O professor Thadeu Weber (2013) salienta que, para Rawls, a noção de

“autonomia” está justamente em participar da elaboração dos princípios da justiça,

ao contrário de Kant, para quem a “autonomia” consiste na produção não de

princípios, mas da “lei universal” originada aprioristicamente da razão. Contudo,

alinhando-se com o pensamento kantiano, Rawls enfatiza igualmente, segundo

Weber (2013), o papel da razão. Não existiriam, dessa forma, “princípios da justiça”

29

previamente dados. Esses institutos seriam construções da razão, e não

dependeriam de qualquer influência do mundo empírico ou de interesses individuais.

Ressalte-se ainda que os referidos princípios não seriam conceitos estanques,

imutáveis, estando sujeitos a modificações resultantes de uma reflexão contínua

(WEBER, 2013).

De acordo com Weber (2013), os “princípios da justiça” de John Rawls

carregam consigo uma concepção mais política, visto que são direcionados

precipuamente a orientar as instituições sociais, políticas e econômicas

(denominadas de “estrutura básica”). Segundo esse raciocínio, seria muito difícil

para a sociedade chegar a um acordo no que tange a princípios éticos, pois tal

esforço esbarraria (conforme dito acima) na multiplicidade de visões existentes. A

possibilidade de um consenso é plausível somente no que se refere à mencionada

“estrutura básica”. Apenas nessa hipótese é possível a adesão e a cooperação dos

indivíduos, sem que precisem abrir mão de suas convicções morais e religiosas.

Assim, os valores ditos políticos (em função de sua maior estabilidade) governariam

a vida social, sendo, dessa forma, condição básica para a realização dos demais

valores. Há aqui uma sensível influência da teoria psicológica da moral sobre o

pensamento de Rawls, conforme expressa Weber: “cidadãos que convivem em meio

a instituições básicas justas (democráticas) desenvolvem o senso de justiça. Isso os

leva a apoiá-las, tornando-as estáveis” (2013, p. 174).

Saliente-se igualmente que Rawls, dentro do seu contexto político, distancia-

se do utilitarismo ao afirmar que o mínimo necessário para uma existência humana

digna não está apenas na satisfação de necessidades e desejos, mas em buscar o

desenvolvimento do indivíduo como cidadão (WEBER, 2013).

Também no pensamento de Ronald Dworkin, é possível identificar algumas

influências de Kant. De acordo com Weber (2013), Dworkin ressalta a importância

de se decidir, de forma livre e autônoma, sobre questões relativas a valores. A

dignidade humana estaria fundamentada nessa liberdade de decisão. As

semelhanças dessa linha de pensamento para com aquilo que prelecionava o

filósofo de Konigsberg são observadas por Weber na seguinte citação: segundo

Kant, “a dignidade de um ser racional está no fato de poder obedecer à lei que ele

mesmo se dá, isto é, a dignidade está na autonomia” (2013, p. 33). Dworkin ressalta

ainda que a vida possui um valor intrínseco (ser humano como fim em si mesmo,

30

aos moldes de Kant), e o conceito de dignidade implica no reconhecimento disso

(WEBER, 2013).

Nos últimos anos, importantes contribuições no campo da Ética Jurídica tem

sido desenvolvidas por John Finnis, professor de Direito e de Filosofia Jurídica da

Universidade de Oxford e um dos fundadores da corrente de pensamento

denominada “Novo Direito Natural”. Finnis afirma que a Ética consiste em

“compreender dentro das ações, quais os bens reais e verdadeiros que são

alcançáveis pelo ser humano, de modo a permitir a minha participação nesses bens”

(2012, p. 3). Ele sustenta que,

sentimentos, não importando quão refinados e complexos sejam, não são os constituintes básicos nem os guias críticos para as formas básicas do bem humano. Mais fundamental para o seu valor é que o objet(iv)o em questão seja realizador, ou seja, um aspecto do florescimento humano (FINNIS, 2012, pp. 38 e 39).

Finnis (2012), aos moldes de Kant, reconhece a importância do intelecto puro

para a validade de nossas ações morais. Porém, defende (como nas teorias

psicológicas da moralidade) que há um aspecto emocional nesse processo, não

desprezando por completo o papel da experiência, visto que sentimentos e desejos

são parte integrante da compreensão do homem. Assim, ele afirma (diferentemente

de Kant, que se dá por satisfeito com o poder apriorístico da razão) que,

todos os bens se agregam em uma vida boa, ou, mais precisamente, em uma boa pessoa, se e somente se deles participamos por meio de escolhas, projetos e compromissos razoáveis - isso porque apenas por meio dessas escolhas é que a bondade de cada um e de todos esses bens básicos pode ser tanto respeitada e promovida (FINNIS, 2012, p. 75).

Nossas escolhas devem objetivar a realização humana. Devemos nos manter

abertos ao pleno florescimento humano.

Quanto às diferentes crenças morais existentes entre sociedades distintas

(relativismo moral), Finnis salienta que,

a atenção adequada aos dados históricos e antropológicos demonstra que as formas básicas do bem humano e os princípios práticos correspondentes são reconhecidos por seres humanos, tanto em pensamento quanto em ação, com quase universalidade, em todos os tempos e lugares (2012, p. 77).

31

Também o professor Robert L. Holmes (2007) refuta o relativismo moral ao

afirmar que tal posição significaria que desacordos entre diferentes culturas jamais

poderiam ser resolvidos. Finnis (2012) ressalta ainda que devemos cuidar com o

“legalismo”, segundo o qual se não há uma única solução correta para determinado

caso, então não existe nenhuma solução correta (corrente muito defendida na “Civil

Law”, sob a influência direta do positivismo jurídico). Finnis afirma veementemente

que “a escolha moral sobre muitos compromissos fundamentais é indeterminada”

(2012, p. 78). Não há, dessa forma, uma única solução correta para um evento

determinado. Temos liberdade de ação, e nossas escolhas no mundo estão abertas,

restando-nos ponderar sobre a melhor opção (FINNIS, 2012).

Algumas correntes deturpariam tal liberdade de escolha. Dessas, a mais

combatida por Finnis é o “proporcionalismo”, segundo o qual a escolha correta é

aquela que apresenta uma melhor proporção entre os benefícios futuros e os

eventuais danos, quando em comparação com outras decisões possíveis (posição

altamente utilitarista). Não há lugar aqui para um julgamento moral prévio aos

moldes do pensamento kantiano. A moralidade se resumiria, para os

proporcionalistas, a uma equação: mais prazer, menos danos (FINNIS, 2012).

Entretanto, Finnis (2012) sustenta que a moral não pode ser avaliável pelo valor ou

desvalor global dos estados de coisas decorrentes das escolhas morais (como por

meio de cálculos matemáticos), descartando assim a ideia central do

“proporcionalismo”. O autor continua, afirmando que tais visões utilitaristas

(caracterizadas por objetivar o maior bem futuro) esbarram nos três seguintes fatos:

“A contingência dos mundos possíveis”: não há como prever com

certeza as consequências futuras de uma escolha moral;

“Incomensurabilidade dos bens básicos”: como medir a dor ou o prazer

(altamente variáveis de indivíduo para indivíduo)?;

“Responsabilidade prévia do indivíduo”: existe uma responsabilidade

moral inerente ao próprio ato do indivíduo, que independe de

considerações sobre futuros males ou benefícios.

32

Contudo, apesar de rejeitar as correntes de pensamento utilitaristas, o autor

em questão não adere incondicionalmente à posição kantiana, sustentando que o

filósofo alemão deixa de observar que o entendimento humano apreende não

apenas os fins resultantes da razão em si mesma, mas também de outros aspectos

e pontos da natureza humana. Destarte, as inclinações, ao contrário do que Kant

proclamava, nos auxiliariam a delinear os valores humanos, tornando as escolhas de

alguém abertas àqueles que são os principais objetivos do ser humano: o

florescimento e a prosperidade (FINNIS, 2012). Concluímos então que, para o

professor de Oxford, existe uma tendência ao desaparecimento do dualismo “razão x

experiência”, destinando a ambas uma importância primordial para nossas decisões

morais.

Não há como encerrarmos a nossa explanação sem realizar um breve

comentário sobre a chamada “Ética Pós-Moderna”, que tem em Zygmunt Bauman

seu maior expoente. Para Bauman, de acordo com os esclarecimentos de José

Renato Nalini (2012), a condição moral seria caracterizada resumidamente por: a)

asserções essencialmente contraditórias; b) imprevisibilidade (“irracionalidade”), no

sentido de que não há como orientar tais asserções por regras; c) “não

universabilidade”, pois se trata de uma condição eminentemente subjetiva. Por

conseguinte, levando-se em consideração essas afirmações, seria impossível

elaborar qualquer tipo de regramento ético. Trata-se de uma posição extrema, que

beira o niilismo, porém significativa dentro da anárquica multiplicidade de correntes

que caracteriza o pensamento contemporâneo.

As considerações realizadas supra são suficientes para que se engendre uma

conclusão sobre a relevância do pensamento de Immanuel Kant no que tange à

Ética Jurídica contemporânea, intento que será levado a cabo na sequência.

33

4 CONCLUSÃO

Por todo o exposto, verifica-se que o pensamento de Kant foi em parte

superado, no sentido em que predomina hoje um certo “particularismo moral”,

conforme definição de Robert L. Holmes (2007): para que se considere um ato como

moralmente correto devemos levar em conta a situação específica em que tal ato é

praticado, e não regras ou princípios preexistentes. Outra constante entre os

pensadores da atualidade consiste em um amálgama entre o racionalismo e o

empirismo. Não há preeminência entre as duas correntes, considerando-se que a

dedução racional dos preceitos morais não está apartada da experiência que cada

indivíduo tem no mundo. Ademais, a “experiência” moral é dinâmica, continuamente

construída por meio da interação entre os membros da sociedade. Cabe aqui um

comentário de John Lechte sobre o pensamento de Emmanuel Levinas, para quem

a base da ética está na “alteridade”: a ética seria, desse modo, “a relação prática de

um com um outro” (LECHTE, 2010, p. 137). Assim, segundo Levinas passo a ser

eticamente responsável quando tenho consciência da existência do “outro”. Dessa

forma, rejeita-se a ideia de normas e princípios absolutos e imutáveis.

Com relação à Ética Jurídica, o normativismo continua a reinar absoluto. Em

todos os países que seguem uma orientação mais próxima da “Civil Law”, há uma

grande profusão de códigos de ética estabelecendo as formas como o advogado

deve se portar diante de determinado caso. Ignora-se o fato de ser a moralidade

uma aptidão eminentemente dinâmica e situacional. Dessa forma, do ponto de vista

jurídico, a importância de Kant (bem como dos grandes sistemas de filosofia moral)

parece estar mais no aspecto pré-normativo, no desenvolvimento da consciência

individual, sem a qual as regras positivadas nos códigos de ética passam a ser

vazias e sem sentido. As leis não abarcam todas as hipóteses que envolvem uma

determinada decisão, daí a importância dos princípios morais para preencher tais

lacunas.

A despeito das diferenças perceptíveis entre o pensamento contemporâneo e

as ideias de Kant, o grande filósofo está indubitavelmente certo ao afirmar que

devemos legislar moralmente por nós mesmos, de maneira racional: não podemos

comprometer nossa autonomia, aceitando que líderes religiosos, governantes e

sociedade (e mesmo nossas inclinações pessoais e paixões) tomem nossas

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decisões de natureza moral. Questões de tal natureza deverão ser balizadas sempre

pela razão.

Também no que se refere à dignidade humana, a influência de Kant é

perceptível:

O reconhecimento e a promoção da dignidade é uma conquista da história, mas ao mesmo tempo é uma construção da razão. Eles indicam um dever-ser, são normativos e representam uma qualidade intrínseca do ser pessoa, além de definirem o homem como fim em si mesmo (WEBER, 2013, p. 206).

Assim, verifica-se que a tese de Kant de que não se pode considerar o ser

humano como meio é, até nossos dias, um pilar fundamental da ética. O homem tem

um valor intrínseco e deve ser respeitado como fim em si mesmo. Isso deve ser

sempre levado em conta nas decisões jurídicas, bem como quando qualquer

indivíduo tiver cerceado seu direito à liberdade.

Alguns operadores do direito, envoltos no espírito do pragmatismo, poderão

perguntar: por que nos preocuparmos com teorias filosóficas que procuram

investigar a natureza da moralidade? Qual a aplicação prática de tal

empreendimento? A resposta está em uma citação do professor Langaro: “a

personalidade do profissional deriva de sua personalidade moral” (1992, p. 29). A

moralidade nos auxiliaria, dessa forma, a angariar a confiança de clientes e colegas.

Contudo, verificamos na prática que o sucesso do profissional depende

muitas vezes de seu alinhamento com os sistemas jurídicos estabelecidos, não raras

vezes caracterizados pela desonestidade, pela torpeza, pela inaptidão e pela

indiferença ao próximo. O advogado que insiste em ser ético dentro de um sistema

judicial muitas vezes corrupto tende a diminuir a sua clientela. É papel do advogado

lutar contra tais sistemas, atendendo ao clamor das leis morais. Também cabe ao

advogado atuar sempre em prol da justiça social (jamais sendo subserviente aos

interesses do Estado ou de clientes poderosos como as grandes corporações).

Ainda que não obtenhamos o sucesso desejado em tais empreitas, garantiremos ao

menos a edificante consciência de que agimos corretamente, bem como aquela

sensação inigualável de dever cumprido.

Independentemente da maior ou menor relevância da sua filosofia para os

nossos dias, Kant nos legou uma regra de ouro, a ser seguida por todo e qualquer

indivíduo em toda e qualquer sociedade: jamais devemos utilizar o ser humano

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como meio para outros propósitos, porém sempre como um fim em si mesmo. A

obediência a tal assertiva assegurará uma existência mais digna a toda a

humanidade.

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REFERÊNCIAS

ARAUJO JUNIOR, Marco Antonio. Ética Profissional. 2. ed. São Paulo. Premier Máxima, 2007.

FINNIS, John. Fundamentos de Ética. Rio de Janeiro: Elsevier, 2012. HAZARD JR., Geoffrey C.; DONDI, Angelo. Ética Jurídica: um estudo comparativo. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011. HOLMES, Robert L. Basic Moral Philosophy. Fourth Edition. Belmont: Thomson Wadsworth, 2007. KANT, Immanuel. Crítica da Razão Prática. 3. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011. KANT, Immanuel. Fundamentação da Metafísica dos Costumes. São Paulo: Barcarolla, 2009. LANGARO, Luiz Lima. Curso de Deontologia Jurídica. São Paulo: Saraiva, 1992. LECHTE, John. 50 Pensadores Contemporâneos Essenciais: do Estruturalismo à Pós-Modernidade. 5. ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2010. MAGEE, Bryan. História da Filosofia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2001. NALINI, José Renato. Ética Geral e Profissional. 9. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. PERELMAN, Chaïm. Ética e Direito. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005. ROCHA, José Manuel de Sacadura. Fundamentos de Filosofia do Direito. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2013. SIDGWICK, Henry. História da Ética. São Paulo: Ícone, 2010. TARNAS, Richard. A Epopéia do Pensamento Ocidental. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. WEBER, Thadeu. Ética e Filosofia do Direito: autonomia e dignidade da pessoa humana. Petrópolis: Vozes, 2013.