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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
EDUARDO ZANON ROSA
A PROTEÇÃO DA INTIMIDADE E DA PRIVACIDADE DO EMPREGADO NOS PROCEDIMENTOS DE REVISTA ÍNTIMA E
PESSOAL FACE O PODER EMPREGATÍCIO
CURITIBA
2016
EDUARDO ZANON ROSA
A PROTEÇÃO DA INTIMIDADE E DA PRIVACIDADE DO EMPREGADO NOS PROCEDIMENTOS DE REVISTA ÍNTIMA E
PESSOAL FACE O PODER EMPREGATÍCIO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito, da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Prof. Jefferson Grey Sant'Anna.
CURITIBA
2016
TERMO DE APROVAÇÃO
EDUARDO ZANON ROSA
A PROTEÇÃO DA INTIMIDADE E DA PRIVACIDADE DO
EMPREGADO NOS PROCEDIMENTOS DE REVISTA ÍNTIMA E
PESSOAL FACE O PODER EMPREGATÍCIO
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, ___de ________________de 2016.
________________________________________ Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite Coordenador do Núcleo de Monografias
Universidade Tuiuti do Paraná
__________________________________________ Orientador Prof. Jefferson Grey Sant’Anna
Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná
Prof.__________________________________________ Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná
Prof. _________________________________________ Faculdade de Ciências Jurídicas Universidade Tuiuti do Paraná
AGRADECIMENTOS
A Deus, por trazer o Direito dentro de minha vida e por ter me inserido em uma
família que se revela apoio incondicional.
À minha família, pelo apoio e direcionamento dispensados no meu desenvolvimento
pessoal e profissional.
Aos meus amigos, pelos ouvidos e pelo suporte em todos os momentos em que a
vontade era a desistência desta jornada.
Aos professores, pela dedicação, pelo estímulo e pelo sentido dado em todo o processo
educativo.
“A vida só tem vida, quando todos vivem e
convivem com a verdade e dignidade.”
(José Jappur)
“A partir do momento em que se compreende
que é contrário à dignidade humana
obedecer a leis injustas, nenhuma tirania nos
poderá sujeitar.”
(Mahatma Gandhi)
RESUMO
O presente trabalho tem o propósito de demonstrar que apesar de a Constituição da República de 1988 prever igualmente a proteção ao direito à intimidade do empregado e a proteção ao poder intraempresarial do empregador, não pode este, a seu livre arbítrio, submeter seus subordinados à realização de revistas íntimas e/ou pessoais. Buscar-se-á, por meio de um trabalho de ponderação, à luz do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, as formas de compatibilizar os direitos em choque, a fim de que possa o empregado, parte hipossuficiente na relação de emprego, ser protegido. Palavras-chave: intimidade, poder intraempresarial, propriedade, dignidade da pessoa humana, revista íntima, revista pessoal.
ABSTRACT
The present paper intends to demonstrate that, although the Federal Constitution of 1988 provides, at the same time, the protection to the employee’s right to privacy and the protection to the employer’s intraempresarial power, the employer can’t, in its sole discretion, subject their subordinates to intimate and/or personal searches. We will seek, through ponderation, the Principle of Human Dignity, ways of balancing the rights in shock, so that workers, the weaker part of the employment relationship, can be protected. Key Words: intimacy, intraempresarial power, property, human dignity, intimate search, personal search.
LISTA DE ABREVIATURAS
ANAMATRA Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho
Art. Artigo
C. Colendo
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
CRFB Constituição da República Federativa do Brasil
E. Egrégio
OIT Organização Internacional do Trabalho
TRT Tribunal Regional do Trabalho
TST Tribunal Superior do Trabalho
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................ 09
2 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS 11
2.1 DIMENSÕES 11
2.2 CARACTERÍSTICAS 14
2.3 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 17
2.4 A EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS 20
2.5 DIREITO À INTIMIDADE 28
3. A RELAÇÃO DE EMPREGO 32
3.1 O PODER EMPREGATÍCIO – CONCEITO E FUNDAMENTO 36
3.1.1 Espécies de Poder Empregatício 40
3.1.2 Limites ao Poder Empregatício 42
4. REVISTA ÍNTIMA: COLISÃO DE DIREITOS FUNDAME NTAIS 46
4.1 A PRÁTICA DAS REVISTAS ÍNTIMAS: INTIMIDADE VERSUS PROPRIE-
DADE 50
4.2 REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA SUBMISSÃO DO EMPRE-
GADO À PRÁTICA DE REVISTAS 71
5 CONCLUSÃO 80
REFERÊNCIAS 84
9
1 INTRODUÇÃO
Como se sabe, os direitos fundamentais consagrados na Constituição
Federal são constantemente violados no mundo capitalista em que se vive, acarretando
diversos prejuízos ao trabalhador. Não raro, empregadores, consubstanciados no seu
poder intraempresarial e com vistas à proteção de seu patrimônio, submetem seus
empregados a situações humilhantes, realizando neles revistas íntimas e/ou pessoais, o
que acaba por violar a intimidade destes trabalhadores.
O presente trabalho objetiva, portanto, demonstrar como compatibilizar as
situações de conflito e como proteger os empregados nestes casos, tendo em vista que
a Constituição da República assegura tanto a proteção à intimidade do trabalhador (art.
5º, inciso X), quanto o poder do empregador (artigo 5º, inciso XXII). Dessa forma, as
principais questões a serem respondidas na Monografia são as seguintes: i) seria
possível ao empregador, com fundamento em seu poder intraempresarial, limitar a
intimidade do empregado? ii) Como compatibilizar esses direitos, em princípio tão
incompatíveis, e proteger o empregado do arbítrio patronal?
Optou-se por desenvolver o presente tema, haja vista sua importância no
mundo atual. Diversos são os casos analisados nos vários Tribunais do Trabalho do
País envolvendo o choque entre intimidade do empregado e poder empregatício. A
contribuição trazida pelo tema, por sua vez, será a da conscientização da importância
de se proteger a privacidade e a intimidade do empregado, pelas razões que serão
reveladas no trabalho a ser desenvolvido, bem como a forma de se realizar essa
proteção.
Para uma adequada incursão no tema, iniciou-se com um estudo geral
acerca dos direitos fundamentais insculpidos na Constituição da República Federativa
do Brasil (CRFB). Na sequência, passa-se a uma breve explanação sobre o conceito, as
dimensões e as características dos direitos fundamentais, sobre a dignidade da pessoa
humana, sobre a eficácia horizontal dos direitos fundamentais e sobre o direito à
intimidade.
No Capítulo subsequente, foi feito um estudo sobre a relação de emprego e
o poder empregatício, bem como, a seu contraponto, a subordinação do empregado,
10
tecendo diversos comentários sobre a caracterização da relação de emprego e sobre o
conceito, o fundamento, as espécies e as limitações ao poder intraempresarial
conferido ao empregador.
Por fim, abordou-se a questão da prática de revistas pelo empregador e a
necessidade de se proteger a intimidade do empregado. Tal ponto merece o maior
destaque, porquanto se trata do cerne do presente trabalho. Para tanto, iniciou-se com
o estudo das colisões entre direitos fundamentais, uma vez que a Constituição da
República assegura tanto a proteção à intimidade do empregado (art. 5º, inciso X),
quanto o poder do empregador (artigo 5º, inciso XXII). Em seguida, foi tratado acerca
da necessária ponderação entre os interesses conflituosos, a fim de demonstrar como
proteger o trabalhador do arbítrio patronal. Finalizando, as formas de reparação dos
danos acarretados em virtude da submissão do empregado ao procedimento de revistas
íntimas foram apresentadas.
Como metodologia, utilizou-se o método dedutivo, pois, a partir de uma
noção geral, foi alcançado o tema em foco, numa ordem lógica de ideias alinhadas e
sistemáticas. Nada obstante, adotou-se o procedimento qualitativo, analisando o
conteúdo do assunto de forma plena. Também se lançou mão do uso da técnica da
pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, por meio da qual diversos materiais escritos
pela doutrina, de cunho específico e geral, além de artigos e periódicos
disponibilizados na internet foram apreciados. Destacam-se os trabalhos de Rosana
Marques Nunes, Maurício Godinho Delgado, Alice Monteiro de Barros, Carlos
Henrique Bezerra Leite, doutrinadores na área do Direito do Trabalho, além das obras
de Bernardo Gonçalves Fernandes, Marcelo Novelino, Gilmar Ferreira Mendes e
Paulo Gustavo Gonet Branco e Pedro Lenza, autores de Direito Constitucional.
Ademais, são apresentados diversos julgados de Tribunais, essenciais à compreensão
do tema.
11
2 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Estabelecer um conceito para o rol de direitos considerados como
fundamentais revela-se tarefa árdua.
Diversas foram as transformações por que passaram esses direitos ao longo
da história. Ademais, não tendem à homogeneidade, revelando-se “resultado de
maturação histórica, o que também permite compreender que os direitos fundamentais
não sejam sempre os mesmos em todas as épocas” (MENDES e BRANCO, 2014, p.
135-136).
Apesar de tal dificuldade, Mendes e Branco (2014, p. 136) os justificam
como núcleo da proteção da dignidade da pessoa, bem como que a Constituição da
República Federativa do Brasil (CRFB) é onde se deve positivar referidas normas
assecuratórias dessa pretensão. Por sua vez, Tavares (2015) ressalta que em muito se
aproxima da noção de direitos naturais, corroborando com a justificativa apresentada
pelos autores antes mencionados.
Por sua vez, apresenta Fernandes (2012, p. 307) sua definição:
Nesses termos, os direitos fundamentais seriam, ao mesmo tempo, ora vistos como direitos de defesa (ligados a um dever de omissão, um não fazer ou não interferir no universo privado dos cidadãos), principalmente contra o Estado; mas ainda, como garantias positivas para o exercício das liberdades (e aqui, entendidos como obrigações de fazer ou de realizar) por parte do mesmo Estado.
A fim de melhor compreender tal conceituação, haja vista, conforme se
afirmou, as diversas mudanças por que passaram tais direitos, revela-se de crucial
importância o estudo das dimensões de direitos fundamentais.
2.1 DIMENSÕES
Os denominados direitos fundamentais não surgiram, todos, de forma
simultânea, em um dado momento. Criaram-se e desenvolveram-se, na verdade, ao
longo da história, conforme as necessidades da sociedade de cada época. Daí decorrem
as chamadas dimensões de direitos fundamentais.
12
Importante ressaltar que, apesar de muitos autores se utilizarem da
expressão “gerações” para se referirem à evolução dos direitos fundamentais, Mendes
e Branco (2014) defendem que seria mais própria a preferência pela expressão
“dimensões”, porquanto a primeira tende à idéia de que o surgimento de uma nova
geração acarreta a extinção da geração anterior, o que de fato não é verdade. Explica-
se:
Deve-se ter presente, entretanto, que falar em sucessão de gerações não significa dizer que os direitos previstos num momento tenham sido suplantados por aqueles surgidos em instante seguinte. Os direitos de cada geração persistem válidos juntamente com os direitos da nova geração, ainda que o significado de cada um sofra o influxo das concepções jurídicas e sociais prevalentes nos novos momentos. Assim um antigo direito pode ter seu sentido adaptado às novidades constitucionais. (MENDES e BRANCO, 2014, p. 138).
Observa-se, assim, que as diversas dimensões de direitos fundamentais
convivem, exercendo influência umas sobre as outras. Por conseguinte, melhor a
utilização da expressão “dimensões” para se referir à evolução dos mencionados
direitos.
Superada a questão terminológica, os direitos fundamentais de primeira
dimensão surgiram à época das Revoluções Liberais, na França e na Inglaterra, no
século XVIII, por meio das quais buscava a classe burguesa a limitação dos poderes do
Estado, em benefício do respeito às liberdades individuais.
Nesta etapa, surgiram as primeiras Constituições escritas, as quais
consagraram direitos ligados ao valor liberdade, os chamados direitos civis e políticos.
Tais direitos têm como titular o indivíduo e são oponíveis, sobretudo, ao Estado,
impondo-lhe diretamente um dever de abstenção (NOVELINO, 2010).
Corroborando tal assertiva, Fernandes (2012, p. 312) ainda assevera que
referida dimensão de direitos “inauguraria o constitucionalismo do Ocidente, no final
do século XIII e início do século IX”, revelando-se direitos com natureza de
resistência ou de oposição perante o Estado.
Esse contexto é bem explicado por Mendes e Branco (2014, p. 137), quando
lecionam que “são os primeiros a ser positivados, daí serem ditos de primeira geração.
Pretendia-se, sobretudo, fixar uma esfera de autonomia pessoal refratária às expansões
13
do Poder”, bem assim que “o paradigma de titular desses direitos é o homem
individualmente considerado.
Como exemplos de direitos de primeira dimensão têm-se: a liberdade de
consciência, a liberdade de culto, a inviolabilidade de domicílio e a proteção à
intimidade.
Já os direitos fundamentais de segunda dimensão, surgiram à época da
Revolução Industrial, no século XIX, em razão das reivindicações da classe proletária
por melhores condições de trabalho (LENZA, 2013). Buscava-se a redução das
desigualdades sociais no plano fático, a denominada igualdade material.
Os direitos são aqueles que não mais correspondiam a uma pretensão de
abstenção do Estado, mas sim os que o obrigavam a prestações sociais positivas,
estabelecendo uma liberdade real e igual para todos (MENDES e BRANCO, 2014).
Por isso, são direitos relacionados ao valor igualdade, os chamados direitos
sociais, econômicos e culturais, tais como os direitos de greve e sindical. Essa
evidenciação corresponde aos direitos de igualdade material (substancial ou real) e não
meramente formal (LENZA, 2013).
De consequência, eles exigem do Estado não uma postura de abstenção,
mas sim de ação (NOVELINO, 2010). Sobre esta fase, obtemperam Mendes e Branco
(2014, p. 137):
Os direitos de segunda geração são chamados de direitos sociais, não porque sejam direitos de coletividades, mas por se ligarem a reivindicações de justiça social – na maior parte dos casos, esses direitos têm por titulares indivíduos singularizados.
Já os direitos de terceira dimensão surgiram em decorrência da necessidade
de se atenuar as diferenças existentes entre nações desenvolvidas e subdesenvolvidas,
caracterizando-se por serem direitos transindividuais. Ensina Lenza (2013, p. 1030):
Novos problemas e preocupações mundiais surgem, tais como a necessária noção de preservacionismo ambiental e as dificuldades para proteção dos consumidores, só para lembrar aqui dos candentes temas. O ser humano é inserido em uma coletividade e passa a ter direitos e solidariedade ou faternidade.
14
Os direitos da 3ª dimensão são direitos transindividuais que transcendem os interesses do indivíduo e passam a se preocupar com a proteção do gênero humano, com altíssimo teor de humanismo e universalidade. [grifo nosso].
Fernandes (2012, p. 313) afirma serem um resgate ao teor humanístico,
tendo como destinatário todo o gênero humano, seja ele presente, seja ele futuro, tudo
fundamentado no princípio da fraternidade/solidariedade. Seriam eles: direito ao
desenvolvimento, direito ao meio ambiente equilibrado, direito à proteção do
consumidor e direito à conservação do patrimônio histórico e cultural.
Ainda, tem-se a quarta e última1 dimensão de direitos fundamentais,
relacionada ao valor pluralidade e decorrente do fenômeno da globalização. Sobre ela,
aduz Novelino (2010, p. 356): “A quarta dimensão de direitos fundamentais pode ser
associada à pluralidade. São direitos como a democracia, a informação e o pluralismo,
os quais foram introduzidos no âmbito jurídico em razão da globalização política”.
Pontua Fernandes (2012, p. 314) que “alicerçam o futuro da cidadania e da
liberdade de todos os povos em uma Era de globalização político-econômica”.
Pretendem, portanto, assegurar o direito das minorias, numa perspectiva de
globalização de direitos.
2.2 CARACTERÍSTICAS
Assim como apresentar seu conceito, revelar as características comuns aos
direitos fundamentais revela-se tarefa dificultosa. Cada doutrinador elenca as
características que entende mais adequadas.
Apresentam-se as seguintes: universalidade, historicidade, inalienabilidade,
imprescritibilidade, irrenunciabilidade e relatividade.
Os direitos fundamentais, a princípio, são considerados universais, pois
apresentam como titulares toda a coletividade, não comportando qualquer forma de
discriminação.
1 Como bem observado por Fernandes (2012, p. 314), há autores, como Paulo Bonavides (2009), que fazem referência, ainda, a uma quinta dimensão de direitos fundamentais, da qual faria parte o direito à paz, colocando-o em patamar superior onde encabeçaria a geração de direitos fundamentais.
15
A vinculação ao valor liberdade e, sobretudo, à dignidade da pessoa humana conduz [os direitos fundamentais] à sua universalidade. A existência de um núcleo mínimo de proteção à dignidade da pessoa humana deve estar presente em qualquer sociedade, ainda que os aspectos culturais devam ser respeitados. (NOVELINO, 2010, p. 353).
Entretanto, impende observar que há direitos fundamentais voltados a
titulares específicos, como é o caso dos direitos trabalhistas, atinentes apenas aos
trabalhadores (FERNANDES, 2012) e, por isso, a característica da universalidade
deve ser compreendida com cautela.
Não é impróprio afirmar que todas as pessoas são titulares de direitos fundamentais e que a qualidade de ser humano constitui condição suficiente para a titularidade de tantos desses direitos. Alguns direitos fundamentais específicos, porém, não se ligam a toda e qualquer pessoa Na lista brasileira dos direitos fundamentais, há direitos de todos os homens – como o direito à vida -, mas há também posições que não interessam a todos os indivíduos, referindo-se apenas a alguns – aos trabalhadores. (MENDES e BRANCO, 2014, p. 143).
Os direitos fundamentais são, ainda, considerados históricos, pois,
consoante se estudou, não surgiram todos de forma simultânea, mas ao longo da
história, de acordo com as necessidades de cada sociedade. Aduz Fernandes (2012, p.
331):
Historicidade: os direitos fundamentais são o resultado de um processo histórico (processo de construção) que conduz à afirmação e consolidação dos mesmos. Com isso, eles não são apenas o resultado de um acontecimento histórico determinado, mas, sim, de todo um processo de afirmação que envolve antecedentes, evolução, reconhecimento, constitucionalização e até mesmo universalização. (...). Portanto, a conclusão é de que os direitos fundamentais historicamente vão não só se agregando (créscimo de novos direitos) devido a novas querelas sociais, mas também pela mutabilidade se reinterpretando (redefinição dos direitos já existentes) a novos contextos (paradigmas) ou novas realidades sociais.
São também os direitos fundamentais considerados inalienáveis e
imprescritíveis, haja vista não possuírem conteúdo patrimonial. Dessa forma, não
desaparecem pelo decurso do tempo (imprescritíveis) e não podem ser transferidos a
outro indivíduo (inalienáveis). Fernandes (2012, p. 328), porém, faz uma ressalva
quanto à característica da inalienabilidade:
16
Para autores ligados à tradição alemã, tal inalienabilidade é resultado do princípio da dignidade da pessoa humana, razão pela qual o homem nunca poderá deixar de ser homem, tendo sempre os direitos fundamentais como peças-chave para a garantia de tal condição. Nessa ótica, ao ligar a dignidade humana à inalienabilidade de direitos fundamentais, podemos perceber que nem todos os direitos fundamentais seriam inalienáveis; estes seriam apenas aqueles que tivessem por objetivo resguardar a potencialidade do homem e sua autodeterminação.
Nessa perspectiva, Mendes e Branco (2014) exemplificam que seriam
inalienáveis o direito à vida, à saúde, integridade física e às liberdades individuais, tais
como a religiosa e de expressão. Por outro lado, estes doutrinadores ensinam que “são
frequentes – e aceitos – atos jurídicos em que alguns direitos fundamentais são
deixados à parte para que se cumpra um fim contratual legítimo”, citando como
exemplo a liberdade de expressão mitigada em face da não possibilidade de divulgação
de segredos obtidos em razão do exercício de um trabalho ou profissão.
Ainda, são os direitos fundamentais considerados irrenunciáveis, pois não
podem ser objeto de renúncia por seu titular. Além de aplicável a ressalva acima
apresentada, também se aplica a esta característica a seguinte ressalva feita por
Novelino (2010, p. 354):
Não se deve admitir a renúncia ao núcleo substancial de um direito fundamental, ainda que a limitação voluntária seja válida sob certas condições, sendo necessário verificar na análise da validade do ato a finalidade da renúncia, o direito fundamental concreto a ser preservado e a posição jurídica do titular (livre e autodeterminada).
Por fim, os direitos fundamentais são considerados relativos, vez que
encontram limites em outros direitos fundamentais consagrados no texto
constitucional. Afirma o professor Lenza (2013, p. 1032):
Limitabilidade: os direitos fundamentais não são absolutos (relatividade), havendo, muitas vezes, no caso concreto, confronto, conflito de interesses. A solução ou vem discriminada na própria Constituição (ex.: direito de propriedade versus desapropriação), ou caberá ao intérprete, ou magistrado, no caso concreto, decidir qual direito deverá prevalecer, levando em consideração a regra da máxima observância dos direitos fundamentais envolvidos, conjugando-a com sua mínima restrição.
17
Observe-se que essa característica da relatividade será de fundamental
importância quando se adentrar ao estudo específico das revistas realizadas pelo
empregador em seus empregados, tendo em vista a colisão, naquele caso, de dois
direitos fundamentais: a proteção à intimidade e o direito de propriedade.
2.3 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O artigo 1º da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) de
1988, em seus incisos, apresenta como fundamentos da República Federativa do Brasil
a Soberania, a Cidadania, a Dignidade da Pessoa Humana, o Valor Social do Trabalho
e da Livre Iniciativa e o Pluralismo Político. Tais fundamentos devem ser
compreendidos como valores estruturantes do Estado Brasileiro.
A Dignidade da Pessoa Humana, prevista no inciso III do artigo
supramencionado, representa, sem dúvida, o fundamento de maior importância.
Explica Fernandes (2012, p. 298):
(...) a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CR/88) é erigida à condição de meta-princípio. Por isso mesmo esta irradia valores e vetores de interpretação pra todos os demais direitos fundamentais, exigindo que a figura humana receba sempre um tratamento moral condizente e igualitário, sempre tratando cada pessoa como fim em si mesma, nunca como meio (coisas) para satisfação de outros interesses ou de interesses de terceiros.
Haja vista seu conteúdo aberto, o que dificulta sua conceituação, Ingo
Wolfgan Sarlet (2011, p. única) apresenta uma excelente definição. Para ele:
a qualificação da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental traduz a certeza de que o art. 1.º, III, da CF/1988 (LGL\1988\3), não contém apenas (embora também e acima de tudo) uma declaração de conteúdo ético e moral, mas que constitui norma jurídico-positiva dotada, em sua plenitude, de status constitucional formal e material e, como tal, inequivocamente dotado de eficácia e aplicabilidade, alcançando, portanto, a condição de valor jurídico fundamental da comunidade. Neste contexto, na sua qualidade de princípio fundamental, a dignidade da pessoa humana constitui valor-guia não apenas dos direitos fundamentais (embora com os direitos não se confunda, em toda sua extensão), mas de toda a ordem jurídica (constitucional e infraconstitucional), razão pela qual, para muitos, se justifica plenamente sua caracterização como princípio constitucional de maior hierarquia axiológico-valorativa (höchstes wertsetzendes
18
Verfassungsprinzip). Na formulação de Jorge Miranda, que igualmente se manifestou sobre o tópico, trata-se de um “princípio axiológico fundamental” que ao mesmo tempo opera como “limite transcendente do Poder Constituinte”. [grifos nossos].
Tavares (2015, p. 439), citando inclusive o retromencionado doutrinador,
conclui que o “importante é que se chegou a um conceito minimamente definido”, ao
dispor, remetando-se ao filósofo Immanuel Kant, que a Dignidade da Pessoa Humana
deve considerar o homem como “ser em si mesmo” e não como “instrumento para
alguma coisa”.
De consequência, representa a Dignidade o núcleo axiológico do
constitucionalismo moderno, o valor constitucional supremo que irá informar a
criação, a interpretação e a aplicação de toda a ordem normativa, em especial do
sistema de direitos fundamentais (NOVELINO, 2010).
Ao consagrá-la como fundamento da ordem jurídica nacional, a CRFB/88
impõe aos Poderes Públicos o dever de respeitá-la, protegê-la e promovê-la.
O dever de respeito refere-se à proibição de atividades prejudiciais à
Dignidade. O dever de proteção, por sua vez, refere-se a uma ação positiva dos
poderes públicos na defesa da Dignidade contra qualquer espécie de violação. Já o
dever de promoção refere-se a uma atuação do Estado no sentido de proporcionar os
meios indispensáveis a uma vida digna. (NOVELINO, 2010).
A CRFB/88 também faz referência a tal fundamento em seu artigo 170,
caput, que trata da Ordem Econômica e Financeira: “A ordem econômica, fundada na
valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social (...)”.
Como a ordem econômica também é fundada na valorização do trabalho,
possível se torna estabelecer uma relação entre a Dignidade da Pessoa Humana e o
trabalhador. Obtempera Nunes (2011, p. 50, apud Ribar, 2006, p. 1.096):
O trabalhador, por ser pessoa humana, já que é digna qualquer pessoa humana, também merece ser protegido em sua dignidade, fazendo com que sejam respeitados seus direitos, porque a dignidade da pessoa humana está acima de qualquer vínculo laboral. A dignidade do obreiro faz prevalecer seus direitos, limitando, censurando, toda e qualquer manobra que possa desrespeitar o trabalhador.
19
Embora não seja o foco do presente trabalho monográfico, é interessante a
questão doutrinária posta acerca da Dignidade da Pessoa Humana, quanto ao aspecto
de ela ser ou não um princípio absoluto. Trata-se da questão de ela ser ou não
sobrepujada por outro qualquer princípio, num determinado caso concreto.
Nessa discussão, Tavares (2015, p. 443) explana que há corrente doutrinária
que dá a referido princípio textura absoluta, o que faz com que todos os outros direitos
a ele devam obediência irrestrita, sob a justificativa de que deve haver o respeito ao
mínimo invulnerável do ser humano.
Contrariamente, há doutrinadores que defendem a tese de que a Dignidade
da Pessoa Humana pode sim ser relativizada quando tomada sob a perspectiva de
princípio e regra; isto é, quando houver colisão de princípios, deve-se sopesá-los para
se extrair qual deles prevalecerá em determinada situação. Exemplifica Tavares (2015,
p. 444 apud Alexy, 1993, p. 106): “tudo depende da constatação sob quais
circunstâncias pode ser violada a dignidade humana”. Acrescenta ainda que “em regra,
tem referido a dignidade da pessoa em conjunto com um direito fundamental
específico, que, por sua vez, sempre estará sujeito a algum tipo de restrição”.
Ainda o autor:
Por mais que se tenha a dignidade como bem jurídico absoluto, o que é absoluto (e nesta linha de raciocínio, até mesmo o que é a própria dignidade) encontra-se de certa forma em aberto e, em certo sentido – como já demonstrado – irá depender da vontade do intérprete e de uma construção de sentido cultural e socialmente vinculada. (TAVARES, 2015, p. 444 apud SARLET, 2001, p.131).
Tavares (2015, p. 445), por fim, resume a divergência, discorrendo que
o conteúdo da regra da dignidade da pessoa, por sua vez, poderá sim sofrer restrições, na medida em que será delimitado pelo cotejo entre o princípio da dignidade da pessoa humana e outros princípios, cotejo no qual caberá a ponderação, óbice a qualquer pretensão totalizadora do princípio da dignidade humana.
Por todo o exposto, observa-se a importância capital que tem a Dignidade
da Pessoa Humana em nosso ordenamento jurídico. É por meio dela que se busca
20
alcançar o bem-estar de todos, preservando-se os direitos fundamentais dos cidadãos,
entre os quais a intimidade (NUNES, 2011).
Apesar de tamanha importância, impende asseverar que uma maior
preocupação com o respeito e a valorização da Dignidade da Pessoa Humana apenas
se deu após a Segunda Guerra Mundial, ocasião em que diversas atrocidades foram
praticadas por nazistas e fascistas, todas fundadas em seus então vigentes
ordenamentos jurídicos, em clara infringência a este valor supremo. Surgiu, a partir
daí, a necessidade de se proteger a pessoa humana, a fim de evitar sua redução à
condição de objeto (NOVELINO, 2010).
Também importa aduzir, por oportuno, que a aludida Dignidade não se
apresenta como um direito fundamental em si, conferido pelo ordenamento jurídico,
mas como atributo inerente de todo ser humano, independentemente se sexo, idade,
cor, etc..
Todavia, apesar de não representar um direito fundamental, a Dignidade da
Pessoa Humana com eles se relaciona. Explica-se: ao mesmo tempo em que os direitos
fundamentais surgiram como uma exigência da Dignidade de proporcionar o pleno
desenvolvimento da pessoa humana, somente por meio da existência desses direitos a
Dignidade poderá ser respeitada e protegida (NOVELINO, 2010).
Ressalte-se que, conquanto derivem os direitos fundamentais da Dignidade
da Pessoa, isto não se dá com a mesma intensidade para todos os direitos. Direitos
como a vida, a liberdade, a igualdade e a intimidade derivam diretamente daquele
valor supremo, enquanto outros, como o direito de propriedade, apenas o fazem de
forma indireta (NOVELINO, 2010). Tal diferenciação revelar-se-á de grande
importância no estudo das revistas realizadas pelo empregador, em Capítulo próprio
desta Monografia.
2.4 A EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS
Conforme apresentado, os direitos fundamentais, em sua primeira
dimensão, surgiram com o objetivo de limitar os poderes estatais, em benefício das
liberdades individuais. Tais direitos, denominados civis ou políticos, seriam apenas
21
oponíveis em face do Estado, considerado, à época, o principal responsável pelas
opressões em face dos indivíduos.
Entretanto, com o passar do tempo, percebeu-se que muitas vezes a referida
opressão decorria não somente do Estado, mas de outros indivíduos. Constatou-se,
desse modo, a necessidade de discutir a aplicação dos direitos fundamentais não
apenas às relação entre particulares e Estado, mas também às relações entre
particulares. Nesse sentido, aduz Bernardo Gonçalves Fernandes (2012, p. 347):
Na formulação clássica dos direitos fundamentais, de matriz eminentemente liberal, os direitos fundamentais representavam limites ao exercício do poder do Estado, de modo a barrar a ação usurpadora deste nas suas relações com os particulares. Com o aumento de complexidade percebido pelo direito e o desenvolvimento de novos paradigmas jurídicos, uma nova possibilidade de incidência dos direitos fundamentais foi teorizada para além da dicotomia Estado-Particular.
Ainda, Sarlet (2011, p. única):
Com efeito, com a ampliação crescente das atividades e funções estatais, somada ao incremento da participação ativa da sociedade no exercício do poder, verificou-se que a liberdade dos particulares - assim como os demais bens jurídicos fundamentais assegurados pela ordem constitucional - não carecia apenas de proteção contra ameaças oriundas dos Poderes Públicos, mas também contra os mais fortes no âmbito da sociedade, isto é, advindas da esfera privada.
Extrai-se, portanto, que Eficácia Horizontal2 se refere à aplicação dos
direitos fundamentais às relações entre particulares. Não obstante, Sarlet (2011, p.
única) esclarece não ser tão simples o entendimento sobre a aplicabilidade dos direitos
fundamentais entre particulares: “não são poucos os que continuam a sustentar, quanto
à forma da vinculação (direta ou indireta), não ser evidente que os direitos
fundamentais tenham aplicação imediata e vinculem diretamente na esfera das relações
entre particulares”.
Em resposta, pesquisaram-se três teorias acerca do assunto.
A primeira, denominada Teoria da Ineficácia Horizontal ou do State Action,
sustenta que os direitos fundamentais jamais poderiam ser aplicados às relações 2 Em contraposição à eficácia horizontal, encontra-se a eficácia vertical, que se refere à aplicação dos direitos fundamentais às relações entre Estado e particulares.
22
privadas. Adotada nos Estados Unidos3, esta corrente abarca a ideia de que todos os
direitos se voltam e vinculam única e exclusivamente ao Estado, preservando o espaço
de autonomia dos Estados-membros para legislar sobre direitos privados
(FERNANDES, 2012).
Sarlet (2011, p. única) repisa que
nos Estados Unidos continua prevalecendo a tese liberal de que os direitos fundamentais constitucionalmente reconhecidos apenas vinculam o Estado e são invocáveis tão-somente em face de uma ação estatal (state action) presumidamente ilícita, de tal sorte que as condutas eminentemente privadas encontram-se imunes a este tipo de controle e não são aferidas em face da Constituição.
Porém, apesar de negarem tal aplicação, utilizam-se de um artifício para
chegar a um resultado equivalente: dão eficácia horizontal aos direitos fundamentais
quando os atos particulares se equiparam a uma ação pública. Esclarece-nos Marcelo
Novelino (2010, p. 359):
O que se vê na prática jurisprudencial da Suprema Corte é a utilização de artifícios com o intuito de equiparar os atos privados questionados aos atos estatais. (...) Portanto, a negação é apenas aparente, uma vez que se utiliza o artifício de equiparar atos privados a atos estatais.
Na mesma linha de raciocínio, para encerrar a explicação acerca da
primeira teoria, em excelente artigo sobre o tema, Sarlet (2011, p. única) obtempera
que
os órgãos judiciais norte-americanos acabaram relativizando este verdadeiro dogma, ampliando excepcionalmente o âmbito de aplicação dos direitos fundamentais da Constituição, ao dilatarem os conceitos de Poder Público e ação estatal, destacando-se duas linhas de argumentação, em torno das quais giram a solução conferida à maioria dos casos enfrentados pelos Tribunais: a) quando um particular ou entidade privada exerce função estatal típica; b) quando existem pontos de contato e aspectos comuns suficientes para que se possa imputar ao Estado a responsabilidade pela conduta oriunda do particular.
3 Excetua-se a 13ª Emenda (proibição da escravidão), a qual se aplica também a particulares.
23
A segunda teoria, denominada Teoria da Eficácia Horizontal Indireta ou
Mediata, sustenta que, para que os direitos fundamentais sejam aplicados às relações
privadas, leis infraconstitucionais deveriam ser editadas, autorizando esta aplicação.
Como bem leciona Fernandes (2012, p. 350), “Em tal perspectiva, as normas
infraconstitucionais são interpretadas à luz das disposições constitucionais, como se
esta fosse um filtro”.
Tal procedimento evitaria uma violação à autonomia da vontade. É a teoria
adotada na Alemanha e, conforme Fernandes (2012, p. 350 apud Alexy, 1997, p. 243)
“a aplicação dos direitos fundamentais na relação entre particulares seria sempre
mediada pela atuação do legislador [...] ou mesmo pelo juiz que deveria interpretar o
direito infraconstitucional (privado) à luz das normas de direitos fundamentais”.
Válidas, mais uma vez, as lições do professor Marcelo Novelino (2010, p.
359-360):
Para este modelo os direitos fundamentais não podem ser invocados a partir da Constituição por não ingressarem no cenário privado como direitos subjetivos. A incidência direta dos direitos fundamentais nas relações entre particulares aniquilaria a autonomia da vontade, causando uma desfiguração do direito privado. Por esta razão, caberia ao legislador a tarefa de mediar a aplicação dos direitos fundamentais às relações privadas, por meio de uma regulamentação compatível com os valores constitucionais.
A terceira e última teoria pesquisada, denominada Teoria da Eficácia
Horizontal Direta ou Imediata, sustenta que os direitos fundamentais devem ser
aplicados diretamente às relações privadas, independentemente de qualquer
intermediação legislativa. Acerca dessa terceira teoria, afirma Fernandes (2012, p.
350-351):
Seus defensores afirmam que os direitos fundamentais, tal como previstos no texto constitucional, já trazem condições de plena aplicabilidade nas relações entre particulares, dispensando qualquer tipo de mediação infracons-titucional, não necessitando, portanto, da atuação (sindicabilidade) do legislador nem mesmo da interpretação da legislação infraconstitucional à luz da Constituição. Nesse sentido, com base na perspectiva da máxima efetividade a Constituição (com seu rol de direitos fundamentais) deveria ser aplicada diretamente nas relações entre particulares.
24
No Brasil, doutrina e jurisprudência têm se mostrado favoráveis a essa
aplicação direta dos direitos fundamentais às relações privadas. Observem-se os
seguintes julgados:
SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. UNIÃO BRASILEIRA DE COMPOSITORES. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS. RECURSO DESPRO-VIDO. I. EFICÁCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELA-ÇÕES PRIVADAS. As violações a direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado, mas igualmente nas relações travadas entre pessoas físicas e jurídicas de direito privado. Assim, os direitos fundamentais assegurados pela Constituição vinculam diretamente não apenas os poderes públicos, estando direcionados também à proteção dos particulares em face dos poderes privados. II. OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS COMO LIMITES À AUTONOMIA PRIVADA DAS ASSOCIAÇÕES. A ordem jurídico-constitucional brasileira não conferiu a qualquer associação civil a possibilidade de agir à revelia dos princípios inscritos nas leis e, em especial, dos postulados que têm por fundamento direto o próprio texto da Constituição da República, notadamente em tema de proteção às liberdades e garantias fundamentais. O espaço de autonomia privada garantido pela Constituição às associações não está imune à incidência dos princípios constitucionais que asseguram o respeito aos direitos fundamentais de seus associados. A autonomia privada, que encontra claras limitações de ordem jurídica, não pode ser exercida em detrimento ou com desrespeito aos direitos e garantias de terceiros, especialmente aqueles positivados em sede constitucional, pois a autonomia da vontade não confere aos particulares, no domínio de sua incidência e atuação, o poder de transgredir ou de ignorar as restrições postas e definidas pela própria Constituição, cuja eficácia e força normativa também se impõem, aos particulares, no âmbito de suas relações privadas, em tema de liberdades fundamentais. III. SOCIEDADE CIVIL SEM FINS LUCRATIVOS. ENTIDADE QUE INTEGRA ESPAÇO PÚBLICO, AINDA QUE NÃO-ESTATAL. ATIVIDADE DE CARÁTER PÚBLICO. EXCLUSÃO DE SÓCIO SEM GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. APLI-CAÇÃO DIRETA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS À AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. As associações privadas que exercem função predominante em determinado âmbito econômico e/ou social, mantendo seus associados em relações de dependência econômica e/ou social, integram o que se pode denominar de espaço público, ainda que não-estatal. A União Brasileira de Compositores - UBC, sociedade civil sem fins lucrativos, integra a estrutura do ECAD e, portanto, assume posição privilegiada para determinar a extensão do gozo e fruição dos direitos autorais de seus associados. A exclusão de sócio do quadro social da UBC, sem qualquer garantia de ampla defesa, do contraditório, ou do devido processo constitucional, onera consideravelmente o recorrido, o qual fica impossibilitado de perceber os direitos autorais relativos à execução de suas obras. A vedação das garantias constitucionais do devido processo legal acaba por restringir a própria liberdade de exercício profissional do sócio. O caráter público da atividade exercida pela sociedade e a dependência do vínculo associativo para o exercício profissional de seus sócios legitimam, no caso concreto, a aplicação direta dos direitos fundamentais concernentes
25
ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, CF/88). IV. RECURSO EXTRAORDINÁRIO DESPROVIDO. (RE 201819, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 11/10/2005, DJ 27-10-2006 PP-00064 EMENT VOL-02253-04 PP-00577 RTJ VOL-00209-02 PP-00821). [grifos nossos].
Nesta ementa, plenamente a clara a tendência da jurisprudência em aceitar a incidência direta dos efeitos dos direitos fundamentais nas relações privadas, as quais encontram limitação nesses direitos.
CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA NO CEARÁ. DISPENSA POR JUSTA CAUSA. INOBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. A controvérsia dos autos cinge-se em saber se se aplica aos processos administrativos instaurados no âmbito dos conselhos de fiscalização profissional, para apuração de falta grave, os princípios do contraditório e da ampla defesa e do devido processo legal. A jurisprudência desta Corte superior já firmou o entendimento de que os conselhos regionais e federais de fiscalização do exercício profissional não possuem natureza autárquica em sentido estrito, ao contrário, são autarquias sui generis , dotadas de autonomia administrativa e financeira, não lhes sendo aplicáveis as normas relativas à administração interna das autarquias federais. Logo, esses conselhos profissionais, como é o caso do reclamado, são considerados entes paraestatais. Nesse contexto, verifica-se que não se lhes aplica a Lei nº 9.784/99, que dispõe sobre normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, já que não pertencem à Administração Pública. Entretanto, essa tese não afasta a necessária observância dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, os quais protegem todos os brasileiros e estrangeiros, residentes aqui ou de passagem pelo território nacional. Com efeito, o artigo 5º, inciso LV, da Carta Magna assegura aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Esse dispositivo é aplicável não só aos processos judiciais, mas também aos processos administrativos, inclusive aos procedimentos instaurados fora do Poder público. Trata-se da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, reconhecida pela doutrina moderna, conferindo-lhes aplicabilidade no âmbito privado, de modo que os direitos fundamentais assegurados pela Constituição devem ser observados tanto nas relações entre o Estado e cidadãos como nas intersubjetivas. Esse entendimento garante a aplicabilidade dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal às relações de trabalho, sem prejuízo dos direitos trabalhistas previstos na Carta Magna. No caso dos autos, verifica-se que os princípios do contraditório e da ampla defesa e do devido processo legal foram violados no procedimento instaurado para apuração de falta grave do reclamante. Desse modo, constata-se que o Regional, ao manter a nulidade do inquérito administrativo instaurado para apuração de falta grave do reclamante, após o qual o obreiro foi dispensado por justa causa, conferiu aplicabilidade irrepreensível aos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, observando, fielmente, sua eficácia nas relações trabalhistas. Recurso de revista não conhecido. EMBARGOS DE [...]. (TST
26
- RR: 2673006420035070003 267300-64.2003.5.07.0003, Relator: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 15/05/2013, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/05/2013). [grifos nossos].
Como se vê na última ementa, inclusive nas relações de trabalho o Tribunal
Superior do Trabalho (TST) reconhece a aplicação dos direitos fundamentais de forma
direta. Sobre este ponto, leciona Rosana Marques Nunes (2011, p. 66):
A teoria da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas mostra-se plenamente aplicável às relações entre empregado e empregador, principalmente devido à pequena autonomia da vontade exercida pelo empregado e sua visível inferioridade na relação jurídica mantida com o empregador.
Corroborando este entendimento, Leite (2015, p. 129):
Como as relações de trabalho subordinado são marcadas pela desigualdade entre os particulares, de um lado o empregador, que detém o poder empregatício, e do outro, o empregado, hipossuficiente e vulnerável, parece-nos inegável a plena aplicação da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nessas relações.
Tal aspecto, no entanto, não se revela de qualquer maneira. Em
determinados casos, como explica Lenza (2013, p. 1.038), o magistrado pode se
deparar com inevitável colisão de direitos fundamentais, como por exemplo o
princípio da autonomia da vontade privada e da livre-iniciativa de um lado e o da
dignidade da pessoa humana de outro.
Nessas situações, o próprio autor salienta a importância do exercício de
ponderação, guiado pelos princípios da razoabilidade e da concordância prática ou
harmonização. É o que se observa da ementa abaixo:
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. REPORTA-GEM JORNALÍSTICA. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E COMUNICA-ÇÃO. DIREITO DA PERSONALIDADE. COLISÃO DE INTERESSES CONSTITUCIONALMENTE TUTELADOS. PONDERAÇÃO. PRINCÍ-PIO DA CONCORDÂNCIA PRÁTICA OU HARMONIZAÇÃO. INTE-RESSE PÚBLICO DA INFORMAÇÃO. CUNHO MERAMENTE INFOR-MATIVO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. Nos dias atuais, os direitos fundamentais não podem ser entendidos unicamente sob a ótica individual, porquanto figuram em um sistema de valores objetivos perseguidos pela sociedade organizada democraticamente. Em se tratando de informações, o direito de divulgar fatos está condicionado à verdade da
27
informação. Critério da verdade subjetiva que não exige que o veiculador da notícia prove a verdade das informações, sendo-lhe proibida apenas a difusão de fatos sabidamente inverídicos. Proteção da liberdade de expressão quanto às informações não objetivamente verídicas, mas que o divulgador tinha legitimamente como verdadeiras ainda que, mais tarde, surja prova em sentido contrário. Matéria jornalística que se refere a fato social relevante para a comunidade, atinente a pretensos atos do Poder Executivo Municipal, que se insere no direito da coletividade à informação. Mediante aplicação do princípio da concordância prática ou da harmonização, os bens jurídicos constitucionalmente tutelados devem coexistir em harmonia, evitando-se o sacrifício absoluto de qualquer deles. Necessária relação de equilíbrio que deve ser perquirida com o fim de evitar que o excesso de zelo ao direito à privacidade e à intimidade não funcionem como efeito intimidador do dever de informar. Conhecimento e desprovimento do recurso. (TJ-RJ - APL: 00124516420108190014 RJ 0012451-64.2010.8.19.0014, Vigésima Segunda Câmara Cível, Relator: Rogério de Oliveira Souza. Data de Publicação: 27/01/2014). [grifo nosso].
Nessa esteira, Leite (2015, p. 130) também enaltece a imprescindibilidade
de sopesamento quando da colisão de princípios:
[...] verifica-se, de um lado, o direito do empregador à segurança do seu patrimônio (propriedade) oponível ao Estado; de outro, o direito do empregado à sua segurança pessoal, também oponível ao Estado. Se, porém, o empregado ajuizar ação em face do empregador e postular reparação por danos morais e materiais decorrentes do assalto sofrido dentro do ônibus da empresa? Parece-nos que o magistrado, neste caso, deverá analisar o caso concreto e, com base nos princípios da razoabilidade ou proporcionalidade, escolher entre dois bens juridicamente protegidos o de maior valor: a incolumidade física e psíquica do cidadão trabalhador ou o patrimônio do empregador? A nosso ver, no caso em tela, o primeiro, por estar vinculado mais fortemente ao princípio da dignidade humana, deve prevalecer sobre o segundo, que está vinculado ao direito de propriedade, sendo que este ainda encontra relativização, pois a propriedade deve ter um fim social.
A defesa pela aplicabilidade direta dos direitos fundamentais em relações
privadas, reside, nas palavras de Leite (2015, p. 134) no “fenômeno da
constitucionalização de todo o direito pátrio” e, nesse contexto, o direito do trabalho
deve também ser interpretado à luz do direito constitucional.
Em conclusão, obtempera Nunes (2011, p. 65) que a aplicação imediata
dos direitos fundamentais traz certa insegurança jurídica às relações interprivadas, em
consequência da própria natureza elástica e dinâmica dos princípios constitucionais.
No entanto, justifica sua aplicação, ao fundamento de que “a justiça é um valor de
maior peso, obtendo vantagem em termos de justiça substancial”.
28
Feito este estudo sobre aspectos gerais dos direitos fundamentais, analisa-se
o direito fundamental à intimidade.
2.5 DIREITO À INTIMIDADE
Os direitos fundamentais (e dentre eles, o direito à intimidade), desde que
observados certos critérios, podem ser aplicados diretamente às relações entre
particulares.
A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso X, prevê: “são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Sobre este dispositivo, afirma Novelino (2010, p. 409): “A Constituição
protege a privacidade (gênero), garantindo a inviolabilidade da intimidade, da vida
privada, da honra e da imagem das pessoas (espécies)”.
Mendes e Branco (2014, p. 280) explicam que o direito à intimidade faria
parte do direito à privacidade, que seria mais amplo”. Ainda, discorrem que
o direito à privacidade teria por objeto os comportamentos e acontecimentos atinentes aos relacionamentos pessoais em geral, às relações comerciais e profissionais que o indivíduo não deseja que se espalhem ao conhecimento público.
Mais, seria a vontade do indivíduo não ser foco da observação por terceiros,
de não ter seus assuntos, informações pessoais e características particulares expostas a
terceiros ou ao público em geral (MENDES e BRANCO, 2014, p. 283).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, tendo em vista a
importância da privacidade, prescreve, em seu artigo XII que: “Ninguém será sujeito a
interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua
correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à
proteção da lei contra tais interferências ou ataques”.
O Pacto de São José da Costa Rica também traz disposição semelhante:
Artigo 11 – Proteção da honra e da dignidade
29
1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas.
Fernandes (2012, p. 411) torna clara a diferença entre privacidade e
intimidade, quando escreve que enquanto a primeira, nada obstante se refira à vida
privada, se ocupa em estabelecer relacionamentos familiares, de lazer, negócios e
amorosos, a segunda reside em um “núcleo menor, que perpassa e protege até essas
relações mais íntimas ou pessoais”. Finaliza afirmando que mesmo que a privacidade
oculte informações ao público, a intimidade protege-as até mesmo contra o
conhecimento de pessoas mais próximas ao indivíduo.
Raimundo (2012, p. única) remete-se à teoria alemã das esferas de proteção
para o entendimento do que seria o direito à intimidade. Para o autor, haveria quatro
esferas (publicidade, pessoal, privada e íntima), a partir das quais se mostra possível
estabelecer um grau de proteção ao direito previsto no mencionado art. 5º, inc. X, da
CRFB/88.
Para o referido autor, a primeira esfera, denominada esfera da publicidade,
diz respeito aos atos praticados em público, cumulado com o desejo de que sejam
efetivamente de conhecimento público. Esta esfera encontra-se fora do âmbito de
proteção do art. 5º, inc. X, da CRFB.
A segunda esfera, denominada esfera pessoal, diz respeito às relações do
indivíduo com o meio social, sem que haja intenção de publicidade.
Já a terceira esfera, denominada esfera privada, diz respeito a dados
relacionados com situações de proximidade emocional.
Ambas as esferas integram a vida privada do indivíduo, encontrando-se
protegidas pelo art. 5º, inc. X, da CRFB/88.
A quarta e última esfera, denominada esfera íntima, é a mais sensível,
porquanto envolve “sentimentos intrínsecos à identidade do indivíduo e que apenas
a ele dizem respeito”. Tal esfera, sem dúvida, encontra-se no âmbito de proteção
constitucional.
30
Nunes (2011, p. 52, apud Silva, 2006, p. 68), assevera que o direito à
intimidade “abrange fatos da vida pessoal do indivíduo que até mesmo sua própria
família pode desconhecer, como por exemplo, suas preferências sexuais, hábitos,
vícios, dentre outros”.
Sobre a importância e a necessidade de se protegê-lo, afirmam Mendes e
Branco (2014, p. 280):
A reclusão periódica à vida privada é uma necessidade de todo homem, para sua própria saúde mental. Além disso, sem privacidade, não há condições propícias para o desenvolvimento livre da personalidade. Estar submetido ao constante crivo da observação alheia dificulta o enfrentamento de novos desafios. A exposição diuturna dos nossos erros, dificuldades e fracassos à crítica e à curiosidade permanentes de terceiros, e ao ridículo público mesmo inibiria toda tentativa de auto-superação. Sem a tranquilidade emocional que se pode auferir da privacidade, não há muito menos como o indivíduo se auto-avaliar, medir perspectivas e traçar metas.
Apesar de não haver qualquer previsão específica na CLT (Consolidação
das Leis do Trabalho) quanto à proteção da intimidade do empregado, o mencionado
art. 5º, inciso X, da CRFB/88 deve ser aplicado diretamente à relação de emprego, face
a eficácia horizontal dos direitos fundamentais.
Reforçando o entendimento, Leite (2015, p. 56) destaca que
A proteção à intimidade e vida privada estão assegurados na Carga Magna no art. 5º, X, segundo o qual “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”. São exemplos de violação da intimidade nas relações empregatícias, a revista íntima (CLT, art. 373-A, VI), a utilização de câmeras em vestiários ou banheiros, o assédio moral e o assédio sexual.
Expõe Alice Monteiro de Barros (2009, p. 643) que a “inserção do
empregado no ambiente de trabalho não lhe retira os direitos da personalidade, dos
quais o direito à intimidade constitui uma espécie”. Ademais, defende a doutrinadora
que nada obstante deva o empregado ser submetido ao poder diretivo do empregador,
expressão esta que será objeto de explicação em Capítulo específico desta Monografia,
não se admite a ingerência daquele, de tal forma, que afete a dignidade do trabalhador,
31
pois “o contrato de trabalho não poderá constituir um título legitimador de recortes no
exercício dos direitos fundamentais”.
Ainda, “Nota-se a tendência do Direito do Trabalho brasileiro a proteger os
direitos da personalidade do trabalhador, que corresponde, sem dúvida, à eficácia
horizontal dos direitos fundamentais”. (BARROS, 2009, p. 625).
Em contraponto, como se pode perceber, referida proteção constitucional à
intimidade, e aplicável à relação de emprego, impediria que o empregador no exercício
de seu poder intraempresarial, realizasse revistas em seus empregados. Todavia, o
aludido poder encontra fundamento em outro direito fundamental, qual seja, o direito à
propriedade privada, previsto no artigo 5º, inciso XXII, da CRFB/88.
Isto posto, como proceder em tais situações? Qual direito deverá
prevalecer? Em resposta, há evidente colisão de direitos fundamentais nestes casos e,
por isso, proceder-se-á ao estudo de alguns aspectos referentes à relação de emprego,
ao poder intraempresarial do empregador e ao direito à propriedade privada para se
permitir chegar a uma conclusão acerca do tema.
32
3 A RELAÇÃO DE EMPREGO
Denomina-se relação de trabalho o vínculo jurídico por meio do qual uma
pessoa executa obra ou serviço a outrem, mediante o pagamento de uma
contraprestação. Leciona Maurício Godinho Delgado (2013, p. 277):
A primeira expressão [relação de trabalho] tem caráter genérico: refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível.
Dentro deste gênero (relação de trabalho), há a relação de emprego, única
de suas espécies que será abordada no momento. Para sua caracterização, alguns
requisitos necessitam ser preenchidos. Da leitura do art. 3º da CLT, é imprescindível
que se trate de prestação dos serviços por pessoa física, com pessoalidade, de forma
não eventual, onerosa e subordinada.
Desta forma, para que reste caracterizada uma relação de emprego, o
empregado deve, em princípio, ser uma pessoa física (ou natural), não se
estabelecendo vínculo empregatício quando a contratação é feita para que pessoa
jurídica preste os serviços.
Ademais, deve a prestação ser realizada pelo próprio empregado, sem
constantes substituições de sua pessoa por terceiros. Sobre este elemento da
pessoalidade, contudo, faz importante observação Garcia (2013, p. 143-144): “O
contrato de trabalho, portanto, é intuitu personae. Mesmo assim, a substituição, em
uma ou outra ocasião, do empregado, com a anuência do empregador, não é apta a
descaracterizar um longo vínculo de emprego”.
O trabalho do empregado deve, ainda, ser prestado de forma não eventual,
isto é, de forma contínua e habitual. Garcia (2013, p. 144), no entanto, apresenta mais
uma concepção de não eventualidade:
Pode-se dizer, entretanto, que a não eventualidade significa a prestação de serviços ligados às atividades normais do empregador, ou seja, realizando serviços permanentemente necessários à atividade do empregador ou ao seu empreendimento.
33
A não eventualidade também pode significar a fixação do empregado em certa fonte de trabalho, que toma os seus serviços.
Nessa linha de raciocínio Cassar (2011, p. 280) clarifica que a não
eventualidade deve ser entendida sob o enfoque do empregador. Explica-se: deve-se
verificar se a necessidade do serviço ou da mão de obra prestada para a empresa é
permanente ou acidental. Alerta a doutrinadora para que não se faça uma interpretação
literal da expressão “não eventual”, porquanto resultaria em uma “falsa ilação de que o
que é episódico e fortuito” é o trabalho do empregado em relação ao tomador. Nessa
esteira, há que se enquadrar a não eventualidade de acordo com as atividades do
empregador, revelando-se presente no caso concreto quando o tipo de trabalho
desenvolvido pelo trabalhador, em relação ao seu empregador, for de necessidade
permanente para o empreendimento. Em excelente análise, a doutrinadora acima
referida conclui:
A CLT em seu art. 3º assim se referiu: “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador (..), preferindo a negativa à assertiva serviços de natureza contínua, como o fez no caso da lei do deméstico. A Intenção foi, segundo a doutrina majoritária, a de imprimir no texto legal o entendimento de que o Brasil não adotou, no conceito de empregado, a teoria italiana. Para a Itália, trabalho eventual é analisado sob a ótica do empregado, isto é, se a sua prestação de serviços, em relação àquela empresa, é esporádica, sem repetição. (CASSAR, 2011, p. 281).
Já o elemento da onerosidade significa que, pelos serviços prestados, deve o
empregado receber uma contraprestação. Pondera Leite (2015, p. 151) que o “trabalho
prestado a título gratuito, voluntário, por caridade, não é protegido pelo direito do
trabalho”, porém ressalva que a falta no pagamento de salários não pode, por si só,
descaracterizar a relação de emprego, uma vez que se pode estar diante de uma mora
salarial. Cassar (2011, p. 273), na mesma esteira, conceitua onerosidade como sendo
“vantagens recíprocas”, explicando que “A toda prestação de trabalho corresponde
uma contraprestação pecuniária ou in natura”, não havendo espaço para existência de
contrato de trabalho gratuito, efetuado apenas em virtude de fé, altruísmo ou caridade,
sem que se revele vantagem para o trabalhador.
34
Por fim, o requisito da subordinação, principal elemento caracterizador da
relação de emprego, relaciona-se à observância, pelo empregado, das ordens emitidas
por seu superior hierárquico. Sobre ele, clarifica Barros (2009, p. 241):
Finalmente, o traço, de fato, caracterizador do contrato de trabalho é a subordinação jurídica. Vista, tradicionalmente, como o “estado de dependência real criado por um direito”, a subordinação jurídica mostra-se atenuada no tocante a certos empregados, como os que executam trabalhos intelectuais. O traço característico da subordinação é a observância a diretivas constantes e analíticas sobre o modo e o tempo em que deverá ser executada a prestação de serviços.
Para melhor compreensão, Barros (2011, p. 268, apud Colin, 1971, p. 222)
caracteriza a subordinação jurídica como “um estado de dependência real criado pelo
direito de o empregador comandar, dar ordens”.
Tal subordinação gerada pelo pacto de emprego, ressalte-se, é apenas
jurídica, e não econômica, técnica ou social, conforme leciona Renato Saraiva (2010,
p. 43-44):
A subordinação apontada é a subordinação jurídica, que advém da relação jurídica estabelecida entre empregado e empregador. Em função do contrato de emprego celebrado, passa o obreiro a ser subordinado juridicamente ao patrão, devendo o trabalhador acatar as ordens e determinações emanadas, nascendo para o empregador, inclusive, a possibilidade de aplicar penalidades ao empregado (advertência, suspensão disciplinar e dispensa por justa causa), em caso de cometimento de falta ou descumprimento das ordens emitidas.
Nada obstante o já explanado, nem sempre o empregado pode estar
subordinado diretamente a ordens de um empregador. Referida subordinação, além de
jurídica, pode ser entendida como estrutural ou integrativa, ou seja, o empregado deve
estear “estruturalmente vinculado à dinâmica operativa da atividade do tomador de
serviços”, “independentemente de receber (ou não) suas ordens diretas, mas
acolhendo, estruturalmente, sua dinâmica de organização e funcionamento”.
(DELGADO, 2013, p. 296).
Todavia, importante trazer ao bojo do presente trabalho a ressalva feita por
Barros (2009, p. 270-271):
35
A subordinação não incide sobre a pessoa do empregado, dentro ou fora da empresa, “como se fosse um tutelado ou curatelado”, mas sobre a execução de sua atividade. Refere-se à matéria de serviço, ficando o empregado em igualdade de condições na formação da relação jurídica e na manutenção de suas condições essenciais.
Assim sendo, em que pese a existência de deveres de obediência e
fidelidade, não poderá o empregador ter total disponibilidade sobre a pessoa do
trabalhador. Desse modo, não é pelo fato de encontrar-se o empregado em estado de
subordinação que poderá ele ter violados seus direitos fundamentais. Tais direitos
devem ser observados, também, nas relações de emprego, haja vista a já estudada
eficácia horizontal direta dos direitos fundamentais.
Como se percebeu, a relação de empregado estabelece-se entre o
empregado, de um lado, e o empregador, de outro, por meio de um contrato de
trabalho. Prescreve o artigo 442, caput, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):
“Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à
relação de emprego”.
Delgado (2013, p. 528) alumia que referido contrato pode ser expresso
(revelada de forma explícita, com consignação dos termos ajustados) ou tácito, a
depender da manifestação de vontade no pacto efetivado.
Ainda, o autor apresenta a seguinte cautela, conjugando o conceito de
contrato de trabalho e os elementos caracterizadores da relação de emprego:
Do ponto de vista comparativo, pode-se afirmar que a pesquisa sobre os elementos fático-jurídicos4 da relação empregatícia permite responder à pergunta sobre a existência ou não da relação de emprego no caso concreto. Já a pesquisa sobre os elementos jurídico-formais5 do respectivo contrato empregatício permite responder à pergunta sobre a validade (ou não) e extensão dos efeitos jurídicos daquela relação confugurada entre as partes. (DELGADO, 2013, p. 298).
O empregado, assim, uma vez contratado, permanece sob a subordinação do
empregador, sujeitando-se às suas ordens para execução do trabalho.
4 São eles: prestação de trabalho por pessoa física, com pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação. 5 São eles: capacidade das partes contratantes, licitude do objeto contratado, forma contratual prestcrita em lei ou por esta não proibida, higidez na manifestação da vontade das partes (DELGADO, 2013, p. 298).
36
Por fim, afirma Martins (2012, p. 216) que em contraponto à subordinação
do empregado está o poder de direção do empregador, o qual dirige a atividade do
empregado, sendo ambas, todavia, decorrentes do contrato de trabalho.
3.1 O PODER EMPREGATÍCIO: CONCEITO E FUNDAMENTO
Delgado (2013, p. 664) define o poder empregatício ou poder
intraempresarial da seguinte maneira:
Poder empregatício é o conjunto de prerrogativas asseguradas pela ordem jurídica e tendencialmente concentradas na figura do empregador, para exercício no contexto da relação de emprego. Pode ser conceituado, ainda, como o conjunto de prerrogativas com respeito à direção, regulamentação, fiscalização e disciplinamento da economia interna à empresa e correspondente prestação de serviços.
Referido poder tem por fundamento legal o art. 2º, caput, da CLT, e
autoriza o empregador a organizar, controlar e disciplinar a prestação subordinada de
serviços pelo empregado (GARCIA, 2013, p. 339).
Interessante análise faz Nunes (2011, p. 25 apud Magano, 1984 p. 164)
quando assegura que este poder e sua consequente subordinação por ele gerada são tão
fundamentais ao contrato de trabalho quanto a obrigação de trabalhar e de receber a
remuneração. Sopesa a autora, entretanto, que “o empregador tem direitos não sobre a
pessoa do empregado, mas sim sobre o modo como sua atividade é exercida”.
Barros (2009, p. 584), apresenta três principais teorias existentes para
explicar o fundamento do poder empregatício: institucional, contratual e da
propriedade privada.
Para a autora, a teoria institucional dá substrato jurídico ao poder
empregatício, sob o fundamento de que é este é necessário para que seja garantido o
interesse social da empresa, almejando um bem comum de ordem econômico-social
(DELGADO, 2013, p. 674). Mais claramente, Barros (2009, p. 584) leciona que o
poder diretivo se funda sob um “caráter mais político e social do que jurídico”.
Corroborando tal entendimento, Leite (2015, p. 237):
37
Como o próprio nome [teoria institucionalista] está a indicar, esta corrente parte da premissa de que a empresa constitui uma instituição social, um agrupamento social organizado. E, para realizar sua finalidade institucional, aqueles que a dirigem têm o direito – mais que isso, o dever – de constranger seus membros a adequares suas condutas a esse fim, valendo-se, para tanto, do poder de impor sanções disciplinares aos transgressores.
Na sua ótica, Garcia (2013, p. 340) explana que referida teoria legitima o
poder empregatício como forma de “perpetuação da atividade empresarial”.
A teoria contratual, por seu turno, sustenta que o poder empregatício
decorre do próprio contrato de trabalho, ao qual se submete o empregado. Afirma
Barros (2009, p. 584) que se trata da teoria mais hegemônica e consistente, porque o
fundamento jurídico da existência do poder empregatício reside no próprio contrato de
trabalho. É dizer: é consectário do ajuste entre empregado e empregador, este último
ficando responsável pela organização e disciplina do ambiente de trabalho.
Mais, para Delgado (2013, p. 777), “Efetivamente o pacto de vontades
(expresso ou tácito), que dá origem à relação de emprego, importa em um conjunto
complexo de direitos e deveres interagentes de ambas as partes, em que se integra o
poder empresarial interno”. Isso porque, na visão deste autor, o contrato é fonte das
mais assimétricas/hierárquicas ou equilibradas/dialéticas relações.
Justificando este posicionamento, Leite (2015, p. 237) afirma que “Se o
contrato decorre da vontade das partes, o empregado já sabe de antemão que sua
atividade laboral estará subordinada (juridicamente) às ordens legais e legítimas do
empregador, que dirige a prestação pessoal do seu serviço”.
Por fim, a terceira teoria pesquisada – a da propriedade privada –,
fundamenta o poder empregatício por ser o empregador o titular do empreendimento
empresarial e que, por isso, teria aquele o poder de organizar, controlar e disciplinar os
fatores de produção, no caso o trabalho desenvolvido no empreendimento (GARCIA,
2013, p. 340). Nesse arrazoado, afirma Barros (2009, p. 584): “esse poder conferido
ao empregador reside no fato de ser a empresa objeto do seu direito de propriedade,
logo, o empregador comanda porque é dono”.
O poder empregatício, afirma Nunes (2011, p. 29), é inerente à condição de
empresário, antecedendo ao contrato de trabalho. Dessa maneira, estaria fundamentado
38
no próprio direito de propriedade, haja vista ser o empregador o titular/dono do
empreendimento empresarial.
Tal direito de propriedade encontra-se previsto no artigo 5º, inciso XXII da
Constituição da República de 1988, consistindo num direito fundamental. Prescreve o
dispositivo: “é garantido o direito de propriedade”.
Quanto ao conceito desta espécie de direito, obtemperam Mendes e Branco
(2014, p. 322):
O conceito de propriedade sofreu profunda alteração no século passado. A propriedade privada tradicional perdeu muito do seu significado como elemento fundamental destinado a assegurar a subsistência individual e o poder de autodeterminação como fator básico da ordem social. Como observado por Hesse, a base da subsistência e do poder de autodeterminação do homem moderno não é mais a propriedade privada em seu sentido tradicional, mas o próprio trabalho e o sistema previdenciário e assistencial instituído pelo Estado.
Isso porque, segundo os autores, foi necessário o abandono desse conceito
estritamente civilístico (particular) para identificar um conceito que adentrasse à seara
constitucional, devendo, nos termos do art. 5º, XXIII, a propriedade atender a sua
função social.
Consoante Fernandes (2012, p. 403), o direito de propriedade, atualmente,
abrange não somente a propriedade sobre bens móveis e imóveis, mas também outros
valores patrimoniais. Veja-se:
A atual proteção à propriedade (art. 5º, XXII, e art. 170, II, da CR/88) é abrangente, incluindo o patrimônio e sob esse título os direitos reais, os direitos pessoais e as propriedades literárias e artísticas, as invenções e as descobertas. Mas a noção de patrimônio inclui ainda o conjunto, não apenas de direitos, mas ainda de obrigações de um indivíduo. Coligado ainda ao direito de propriedade está a proteção constitucional à herança (art. 5º, XXX, da CR/88).
Nunes (2011, p. 35-36) também afirma:
Cumpre observar que a propriedade tratada pela Constituição Federal de 1988 em vários artigos deve ser lida como um conjunto de propriedades, ou um “conjunto de institutos jurídicos relacionados a distintos tipos de bens”, não apenas relacionado com a propriedade da empresa, mas sim dos meios
39
de produção, das invenções, dos produtos, das estratégias de atuação no mercado, dentre outros.
Observa-se, assim, que o atual conceito de propriedade transcende à
concepção privatística estrita, abarcando outros valores de índole patrimonial, como as
pretensões salariais e as participações societárias (MENDES e BRANCO, 2014, p.
323).
Trata-se a propriedade, assim, de típico direito individual de primeira
geração, ligado ao valor liberdade.
Entretanto, como os demais direitos fundamentais, não pode a propriedade
ser considerada um direito absoluto (relatividade dos direitos fundamentais). Dispõe o
art. 5º, XXIII da CF/88: “a propriedade atenderá a sua função social”. Em seu art. 170,
incisos II e III, previsto no Título dedicado à Ordem Econômica, a Constituição da
República também se refere à função social da propriedade:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) II - propriedade privada; III - função social da propriedade;
A importância da noção de função social reside no fato de que não mais
pode a propriedade ser considerada como legítimo direito individual, uma vez que, nos
ensinamentos de Nunes (2011, p. 35), nada obstante continue a fazer parte do rol dos
direitos individuais, a inserção do princípio da função social, que baliza o exercício
daquele direito, modificou a natureza da propriedade. É dizer: a propriedade deve ser
exercida sob a ótica da justiça social.
Afirma ainda a autora:
Devido à afetação da propriedade privada pela função social, está eliminado o conceito de propriedade como fonte de poder pessoal ilimitado, de forma que a atuação do empregador somente será legítima se voltada à efetiva consecução dos fins e valores da ordem econômica. (...) O princípio da função social da propriedade impõe ao proprietário da empresa, ou a quem detém o poder de controle, o dever não apenas de não exercê-lo em prejuízo de outrem, mas de exercê-lo em benefício de outrem.
40
Isso significa que a função social da propriedade impõe o exercício de comportamentos positivos por parte do detentor do poder em relação à propriedade. (NUNES, 2011, p. 35)
Sendo assim, ao exercer seu poder intraempresarial, fundado no direito de
propriedade, deverá o empregador atender aos interesses da coletividade. Assevera
Nunes (2011, p. 36) que
(...) o direito de propriedade dotado de função social, tido como fundamento do poder de direção e a natureza jurídica deste poder apontam como um direito-função do empregador, de forma que a empresa não possa visar somente ao lucro, buscando também atender aos interesses dos trabalhadores e da coletividade como um todo.
Poderá o empregador, desse modo, praticar atos visando à proteção de sua
propriedade e patrimônio, mas sempre tendo em vista a função da propriedade e os
interesses da sociedade. Poderá ele, sim, exercer seu poder intraempresarial, mas
nunca violar a dignidade da pessoa do trabalhador através do exercício desse poder.
Vistos o conceito de poder empregatício, sua natureza jurídica e seu
fundamento, passa-se agora ao estudo de suas espécies.
3.1.1 Espécies de Poder Empregatício
São as espécies de poder empregatício: poder diretivo (ou organizativo),
poder regulamentar, poder disciplinar e poder fiscalizatório (ou de controle).
O poder diretivo, segundo Delgado (2013, p. 666), seria
(...) o conjunto de prerrogativas tendencialmente concentradas no empregador dirigidas à organização da estrutura e espaço empresariais internos, inclusive o processo de trabalho adotado no estabelecimento e na empresa, com a especificação e orientação cotidianas no que tange à prestação dos serviços.
Para Leite (2015, p. 235, apud Nascimento, 1994, p. 184), é a “faculdade a
ele [empregador] atribuída de determinar como a atividade do empregado deve ser
exercida” e referido poder decorre de Lei, vez que previsto no art. 2º da CLT.
41
Dessa forma, por meio dessa vertente do poder empregatício, Garcia (2013,
p. 339) esclarece que se trata justamente do fator de subordinação jurídica do
empregado face o empregado.
Por meio desse poder, o empregador organiza seu estabelecimento
empresarial, determinando as funções a serem exercidas por cada empregado, bem
como o local de trabalho e sua jornada. Vê-se, assim, que o poder diretivo (ou
organizativo) é básico e fundamental à própria existência da empresa. Garcia (2013, p.
340) observa:
O empregador, como já estudado, é quem corre os riscos de seu empreendimento, não podendo transferi-lo ao empregado. Desse modo, o ordenamento jurídico autoriza que ele possa organizar a sua atividade empresarial, de forma a alcançar os resultados almejados.
Por outro lado, o poder regulamentar seria “o conjunto de prerrogativas
tendencialmente concentradas no empregador dirigidas à fixação de regras gerais a
serem observadas no âmbito do estabelecimento e da empresa” (DELGADO, 2013, p.
666).
Todavia, aduz o autor que essa vertente não se basta para perceber uma
identificação própria do poder empregatício, porque a “atividade regulamentar seria
simples meio de concretização externa das intenções e metas diretivas colocadas no
âmbito do estabelecimento e da empresa”. (DELGADO, 2013, p. 667).
Já o poder disciplinar seria “o conjunto de prerrogativas concentradas na
figura do empregador dirigidas a propiciar a imposição de sanções aos empregados em
face do descumprimento de suas obrigações contratuais” (DELGADO, 2013, p. 670).
Se não houvesse como ser assegurado, o poder de direção consistiria em
mera ficção jurídica. A autoridade, no caso, o empregador, deve possuir mecanismos
para fazer valer suas ordens. É importante, assim, que haja na empresa formas para
assegurar, juridicamente, a observância e o cumprimento das normas editadas pelo
empregador. Daí a necessidade do poder disciplinar.
Importante apresentar, porém, a observação feita por Garcia (2013, p. 342):
42
De todo modo, a punição abusiva ou excessiva pode ser questionada pelo empregado. Aliás, a ilicitude em questão pode, inclusive, acarretar ao empregador o dever de reparar eventual lesão a direito do empregado, de ordem pessoal ou material. Basta imaginar a hipótese de advertência abusiva do empregador, humilhando o trabalhador, em violação de direitos da personalidade, gerando o dever de indenização por danos morais.
Por fim, há o poder fiscalizatório, caracterizado por ser
(...) o conjunto de prerrogativas dirigidas a propiciar o acompanhamento contínuo da prestação de trabalho e a própria vigilância efetivada ao longo do espaço empresarial interno. Medidas como controle de portaria, as revistas, o circuito interno de televisão, o controle de horário e frequência, a prestação de contas (em certas funções e profissões) e outras providências correlatas é que seriam manifestação do poder de controle. (DELGADO, 2013, p. 668).
Tal poder, inerente à figura do empregador, permite a ele fiscalizar seus
empregados durante a jornada de trabalho, a fim de aferir se as atividades estão sendo
executadas conforme pactuado e se estão de acordo com as finalidades da empresa.
Para o presente estudo, apresenta-se o poder fiscalizatório (ou de controle)
como o mais relevante, haja vista a possibilidade de colisão com o direito à intimidade
do empregado. Neste sentido, assevera Nunes (2011, p. 30):
O poder de controle ou fiscalizatório é o que mais tem possibilidade de chocar-se com o direito à intimidade do trabalhador, pois é largamente usado para fiscalizar as atividades exercidas pelo trabalhador e se as ordens dadas pelo empregador estão sendo cumpridas.
Vistas as espécies de poder empregatício, embora seja este fundamental à
atuação empresarial, não é absoluto, devendo sempre respeitar os direitos
fundamentais dos empregados. Sendo assim, necessário agora o estudo dos limites
impostos a esse poder.
3.1.2 Limites ao Poder Empregatício
Conforme se aduziu, encontra o poder empregatício fundamento no direito
à propriedade privada, previsto no art. 5º, inciso XXII da CRFB/88. Viu-se também
43
que em razão de seu caráter relativo não podem os direitos fundamentais ser
considerados absolutos; encontram limitações em outros direitos fundamentais
previstos no ordenamento jurídico6.
Desse modo, não pode o poder intraempresarial do empregador ser exercido
de qualquer forma. Limites devem ser impostos a seu exercício. Aqui no Brasil,
poucas são as regras específicas a respeito do tema. Como exemplo, cita-se o artigo
373-A, inciso VI, da CLT, que trata da revista íntima em mulheres:
Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado: (...) VI - proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias.
Outro exemplo se encontra no art. 1º da Lei 13.271/2016, que dispõe sobre
a proibição de revista íntima de funcionárias nos locais de trabalho e trata da revista
íntima em ambientes prisionais.
Delgado (2013, p. 669), especificamente no que tange ao poder de controle,
afirma que, em outros países, há um contingenciamento mais firme do poder
intraempresarial:
Existem ordens jurídicas mais avançadas do que a brasileira que estabelecem firme contingenciamento ao exercício de tais atividades de fiscalização e controle internas à empresa, em benefício da proteção à liberdade e dignidade básicas da pessoa do trabalhador. O Estatuto dos Direitos dos Trabalhadores da Itália (Lei n. 300, de 20.5.70), por exemplo, veda a presença permanente (não o ingresso excepcional) de guardas de segurança no estrito local de cumprimento das atividades laborais obreiras (art, 2º); veda, como regra, o “uso de instalações audiovisuais de outros aparelhos com fins de controle a distância das atividades dos trabalhadores”, além de submeter a utilização de instalações eventualmente necessárias em face de outros objetivos ao “prévio acordo das comissões de representantes sindicais na empresa, ou então, na falta destas, a comissão interna (art. 4º); veda, também, como regra, as inspeções pessoais de controle sobre o trabalhador, admitindo-as, com restrições, em certos casos, sempre mediante acordo entre o empregador e as comissões de representantes sindicais na empresa ou, na falta destas, com a comissão interna (art. 6º).
6 Ressalte-se, mais uma vez, por oportuno, a possibilidade de incidência direta dos direitos fundamentais às relações privadas trabalhistas, ante a Teoria da Eficácia Horizontal Direta dos Direitos Fundamentais.
44
Porém, o fato de o ordenamento jurídico brasileiro não abarcar muitas
regras específicas acerca da limitação do poder empregatício não significa que o
empregado brasileiro está desamparado. Existem regras e princípios gerais aptos a
conferir a proteção necessária.
Num primeiro momento, deve o referido poder empregatício respeitar sua
função social e atender aos interesses da coletividade (art. 5º, inciso XXIII, CRFB/88).
Apesar de estar legitimado pela ordem jurídica a praticar atos no intuito de proteger
seu patrimônio, não poderá o empregador, em hipótese alguma, violar da Dignidade da
Pessoa Humana, valor supremo da ordem constitucional e Fundamento da República
Federativa do Brasil (art. 1º, inciso III, CF/88).
O estado de subordinação do empregado, traço característico da relação de
emprego, não implica sua sujeição. O empregador, assim, apenas controla o modo
como os serviços são prestados e nunca a própria pessoa do empregado. Neste toar,
deve sempre respeitar os direitos fundamentais em geral, dentre eles os direitos da
personalidade. Nunes (2011, p. 32): “É evidente que os direitos da personalidade
também fazem fronteira com o poder de controle do empregador, pois é nesse
momento que se manifesta o direito à intimidade do empregado”.
Apenas a título exemplificativo, destacam-se como direitos fundamentais a
serem observados aqueles previstos no artigo 5º, caput (igualdade), inciso III (ninguém
será submetido a tratamento desumano ou degradante), inciso X (privacidade), incisos
IV, VI, VIII, IX, XIII e XV (liberdade), dentre outros, todos da Constituição da
República.
Cita-se, ainda, como limite a ser observado pelo poder empregatício, as
disposições do Preâmbulo da Constituição da República, bem assim o art. 3º, incisos I
e IV, também da Carta Maior, os quais elencam objetivos fundamentais da República
Federativa do Brasil. Assevera Godinho (2013, p. 669):
(...) a Constituição pretendeu instituir um “Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social ...” (Preâmbulo da CF/88; grifos acrescidos). A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, constituída em Estado Democrático de Direito (art. 1º, III, CF/88),
45
que tem por alguns de seus objetivos fundamentais “construir uma sociedade justa e solidária”, além de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º I e IV, CF/88).
Barros (2009, p. 585), especificamente quanto ao poder diretivo, afirma que
este possui limites externos, impostos pela Constituição, por outras leis, pelo contrato,
e pelas normas coletivas, e um limite interno, relacionado à boa-fé. Leciona a autora,
assim, que não está o empregado obrigado a acatar ordens que lhe exijam uma conduta
ilícita, que acarretem a si ou a outrem risco de morte, que o exponha a situações
vexatórias ou que sejam alheias à relação de emprego. Quanto a este último aspecto,
aduz:
Isso porque, em regra, a vida privada do empregado, seus costumes, amizades, ideias, orientação sexual e opiniões estão fora do campo de incidência do poder diretivo do empregador, como também suas crenças religiosas, convicções políticas, liberdade sindical, o que se deduz do art. 5º, inciso X, da Constituição Federal de 1988, quando considera invioláveis a intimidade e a vida privada das pessoas, como também os incisos IV, VI, VIII, XVII do mesmo diploma, que garantem a liberdade de pensamento, de crença religiosa, de convicção política ou filosófica e de associação para fins lícitos. Nessas situações, justifica-se a desobediência extralaboral. (BARROS, 2009, p. 586)
Contudo, importante observar que, apesar de se encontrar limitado, é
legítimo e legalmente fundamentado o poder intraempresarial do empregador, podendo
ser livremente exercido, desde que observadas as limitações impostas. O assunto será
retomado no próximo Capítulo, quando da análise da proteção do direito à intimidade.
A partir de agora, adentrar-se-á no estudo das revistas, dando enfoque sobre
como proceder nos casos em que o direito à intimidade do empregado colide com o
direito de propriedade do empregador.
46
4 REVISTA ÍNTIMA: COLISÃO DE DIREITOS FUNDAMENTAIS
Conforme anteriormente estudado, apresentam os direitos fundamentais a
característica da relatividade. Em outras palavras, não existem direitos fundamentais
absolutos. Todos encontram limitações em outros direitos previstos em nossa ordem
constitucional.
Além disso, entende a doutrina que não haveria hierarquia entre os direitos
fundamentais. A posição topográfica que ocupam na Constituição seria apenas um
elemento circunstancial, e não revelador de uma superioridade entre os mesmos
(FERNANDES, 2010).
Assim, Mendes e Branco (2014, p. 236) esclarecem que existe colisão entre
direitos fundamentais quando se identifica conflito decorrente do exercício de direitos
fundamentais por diferentes titulares.
Sendo assim, como solucionar um caso em que ocorre a colisão entre duas
normas consagradoras de direitos fundamentais? No caso objeto desta Monografia,
como conciliar proteção à intimidade com o direito de propriedade, ambos previstos
como direitos fundamentais pela Constituição da República?
Em alguns casos, a própria Constituição prevê a solução para o caso
(exemplo: liberdade de associação e proibição de associação com caráter paramilitar –
art. 5º, XVII). Em outros, remete a solução do conflito a uma lei ordinária (exemplo:
liberdade de profissão, desde que respeitada a legislação ordinária no que se refere à
qualificação profissional – art. 5º, XIII). Todavia, existem colisões que não encontram
solução em fórmulas predeterminadas, devendo ser analisadas a partir do caso
concreto (NUNES, 2011).
Segundo o Princípio da Unidade da Constituição, Fernandes (2012, p. 198)
explica que “uma norma constitucional não pode ser isolada do seu conjunto
sistemático no qual ela se integra”, isto é, a partir de elementos individuais inseridos
no texto constitucional, quais sejam regras e princípios, deve-se extrair uma
compreensão global, no intuito de harmonizar as tensões entre eles e até mesmo
preveni-las.
47
O método utilizado para resolver as colisões não previstas pela ordem
jurídica (a exemplo da colisão objeto deste trabalho), varia de acordo com as espécies
de normas em conflito. Os direitos fundamentais são compostos por regras e
princípios. Desse modo, a forma de solução variará a depender do tipo de norma em
questão. (NUNES, 2011).
Os princípios são mandamentos de otimização, isto é, normas que ordenam
que algo seja cumprido na maior medida possível, de acordo com as possibilidades
fáticas e jurídicas existentes no caso concreto. As regras, por sua vez, são
mandamentos de definição, isto é, normas que impõem determinações ou resultados,
que devem ser cumpridos na exata medida de suas prescrições. Discorre Marcelo
Novelino (2010, p. 139):
A aplicação de um princípio ocorre de forma gradual (“mais ou menos”), ao passo que a de uma regra, explica DWORKIN, segue a lógica do “tudo-ou-nada” (rules are aplicable in all-or-nothing fashion). Verificados os fatos nela previstos, o seu mandamento deve ser aceito.
Outrossim, leciona Nunes (2011, p. 56):
(...) a colisão entre regras é solucionada por meio de um raciocínio calcado na lógica formal, alheio a preocupações de ordem moral. Diferentemente ocorre na colisão de princípios. Os princípios possuem dimensão de peso; neste caso, o conflito é solucionado considerando o peso assumido por cada princípio dentro do caso concreto, a fim de que possa dimensionar em que medida cada um cederá espaço ao outro. [grifo nosso].
Direciona-se o foco do estudo apenas sobre a colisão de princípios, uma vez
que a prática de revistas pelo empregador envolve eminente e diretamente a aplicação
deste tipo de norma.
Quando dois princípios entram em choque, um deles tem que ceder diante
do outro. Isso não significa, entretanto, declarar inválido o princípio afastado.
Significa apenas que, em determinadas circunstâncias, um dos princípios precede o
outro, o que não impede que em outra circunstância a situação se inverta (NUNES,
2011).
48
Fernandes (2012, p. 227) explica que no caso concreto, “o valor decisório
será dado a um princípio que tenha, naquele caso concreto, maior peso relativo, sem
que isso signifique a invalidação do princípio compreendido como de peso menor”.
Observa-se, portanto, a preponderância de um vetor de interpretação axiológico
quando da colisão de princípios, ou seja, reflete-se sobre qual bem deverá prevalecer
sobre o outro na situação concreta de valoração.
Veja-se os ensinamentos de Nunes (2011, p. 57):
(...) em determinada situação concreta, os princípios têm diferentes pesos. Observado o caso concreto, e estabelece entre os princípios uma relação de precedência condicionada, o que significa que o caso concreto indicará as condições sob as quais um princípio precede outro. Os princípios podem ser cumpridos em distintos graus, sempre coexistindo, uma vez que sua aplicação é dosada segundo as necessidades do caso concreto. O conteúdo dos princípios só consegue ser determinado com base nos princípios contrapostos e nas realidades fáticas.
Posto isso, verifica-se que a técnica utilizada para solucionar a colisão de
princípios é a de ponderação. Afirma Novelino (2010, p. 145):
A ponderação se apresenta como uma técnica de decisão a ser utilizada para solucionar tais conflitos [entre princípios], sobretudo nos casos difíceis (hard cases). Por meio da ponderação de interesses opostos é estabelecida uma relação de preferência condicionada que diz sob quais condições um princípio precede ao outro.
Esta técnica da ponderação fundamenta-se no Princípio da Concordância
Prática ou da Harmonização. Segundo tal princípio, havendo uma colisão entre dois ou
mais princípios constitucionais, deve o intérprete avaliar os bens jurídicos em conflito,
realizando uma redução proporcional do âmbito de alcance de cada um deles.
Obtempera Marcelo Novelino (2010, p. 178):
A concordância prática deve servir como um parâmetro para a ponderação. Diante da existência de uma colisão entre dois direitos constitucionalmente consagrados, cabe ao intérprete buscar a harmonização dos valores envolvidos reduzindo proporcionalmente o âmbito de aplicação de cada um deles. Somente quando a redução proporcional de ambos os princípios não for possível, em razão das circunstâncias do caso concreto, deve o intérprete afasta uma norma para a aplicação da outra.
49
Repisa-se que todos os princípios que entrarem em confronto, inclusive
aquele eventualmente afastado, permanecerão válidos. Apenas não serão aplicáveis,
simultaneamente, ao caso concreto.
A doutrina, usualmente, refere-se também à proporcionalidade como
máxima a auxiliar na colisão de direitos, devendo ser compreendida como um critério
para adequação de diversos princípios ao caso concreto, em vez de tomá-la como
princípio em si. Ademais, não possui um conteúdo próprio e definido. Sendo assim,
trata-se, na verdade, de técnica para solução de conflitos (NUNES, 2011), e não como
um princípio em si.
A proporcionalidade exige a observância de três requisitos, quais sejam,
adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. Acerca destes
requisitos, assevera Nunes (2011, p. 59):
A doutrina alemã divide a máxima da proporcionalidade em três máximas parciais: adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito (ponderação propriamente dita). Assim, na análise do caso concreto deverá o aplicador do Direito verificar qual o princípio mais adequado ao caso, qual o melhor meio para a solução e ponderar, diante das possibilidades jurídicas, a melhor maneira para solucionar o caso, utilizando de fundamentação racional, ou princípio da concordância prática. A restrição de um princípio, independentemente do critério adotado, só se verifica justifica na real necessidade da prevalência de outro, o que somente poderá ser observado no caso concreto.
Na solução de colisões, importante observar, ainda, a ligação dos direitos
envolvidos com a dignidade da pessoa humana, núcleo axiológico de nossa
Constituição. Afirma Fernandes (2012, p. 298-299):
(...) a dignidade seria um superprincípio, como uma norma dotada de maior importância e hierarquia que as demais, que funcionaria como elemento de comunhão entre o direito e a moral, na qual o primeiro se fundamenta na segunda, encontrando sua base de justificação racional.
Ainda, o mesmo autor repisa que a dignidade é uma espécie de
reconhecimento da “singularidade e da individualidade de uma determinada pessoa;
razão pela qual ela se mostra insubstituível e igualmente importante para a ordem
jurídica” (FERNANDES, 2012, p. 296).
50
Assim, se no exame do caso concreto restar constatado que algum direito ou
princípio conflita com a dignidade da pessoa humana, esta dirigirá o caminho para a
solução, uma vez que a prevalência se dá pela dignidade.
Ante o exposto, no caso das revistas realizadas pelo empregador em seus
empregados, em que entram em choque dois princípios constitucionais, possível a
conclusão de que, para se compatibilizar o direito de propriedade com a proteção à
intimidade, devem ser utilizadas as técnicas da Ponderação e da Máxima da
Proporcionalidade, tendo sempre como parâmetro a dignidade da pessoa humana.
Face o exposto, abordar-se-á a aplicação destas técnicas especificamente
no caso das revistas íntimas realizadas pelo empregador.
4.1 A PRÁTICA DAS REVISTAS ÍNTIMAS: INTIMIDADE VERSUS PROPRIE-
DADE
A realização de revistas íntimas pelo empregador é prática bastante usual
em empresas que trabalham com objetos de pequeno tamanho e/ou de alto valor.
Durante a pesquisa por ela realizada, assevera Nunes (2011, p. 67) que as empresas
que mais utilizam a revista íntima são aquelas que “trabalham com roupas íntimas
femininas, remédios, cartões de crédito, joias, enfim, produtos de tamanho reduzido e
elevado valor de mercado, considerados como altamente suscetíveis à subtração e
ocultação”.
Costumam doutrina e jurisprudência fazer distinção entre as chamadas
revistas íntimas e as revistas pessoais. Segundo se afirma, a diferença entre ambas
residiria na exposição do corpo do trabalhador, no momento de sua realização. No que
pertine a esta diferenciação, Nunes (2011, p. 69):
Assim, se a revista consistir em, por exemplo, tirar os sapatos, levantar as barras da calça ou abrir o casaco, ela não é considerada íntima, mas apenas pessoal. A revista íntima, para quem faz essa diferenciação, é aquela que põe à mostra parte do corpo do empregado, como por exemplo, exigindo que ele abaixe a calça, desabotoe a camisa ou mesmo se desnude.
51
O precitado artigo 373-A, inciso VI, da CLT, prescreve como proibidas as
revistas íntimas, pelo empregador ou seus prepostos, em suas empregadas ou
funcionárias7. Por esta razão, boa parte da doutrina e da jurisprudência defende a
possibilidade de realização de revistas pessoais, com fulcro em seu poder
intraempresarial concedido ao empregador, desde que não se caracterizem como
revistas íntimas.
Já entendeu desta forma o E. Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região:
DANO MORAL – REVISTA DOS EMPREGADOS – Tratando-se de estabelecimento comercial, é justificável que a empresa utilize da revista em seus empregados, a fim de proteger seu patrimônio, desde que não empregue outros meios de vigilância. O ato de revistar se insere no âmbito do poder diretivo da empresa, mormente quando realizado em caráter geral, mediante sorteio, sem discriminação e sem abuso no exercício desta prerrogativa. Respeitadas a honra, a imagem, a privacidade e a dignidade dos empregados, não se pode falar em dano moral, razão pela qual andou bem a r. Sentença ao indeferir o pleito de indenização. (TRT 3ª Região. Recurso Ordinário nº 00742-2004-109-03-00-6. Relator: Desembargador Juiz Eduardo Augusto Lobato. Belo Horizonte/MG, 09/10/2004).
Da ementa acima, observe-se que o entendimento era a da possibilidade de
revistas para assegurar a proteção patrimonial da empresa, acaso ela não dispusesse de
outros meios de vigilância, respeitados alguns parâmetros de realização sobre o
empregado: caráter geral e impessoal, sem discriminação e praticada de forma
respeitosa, sem abuso no exercício desse poder.
Perfilha igual posicionamento o C. TST, conforme ementa abaixo:
7 A jurisprudência tem apontado, em uma leitura constitucional do art. 373-A, inciso VI, da CLT, que a vedação para realização de revistas íntimas aplica-se a empregados de ambos os sexos, e não apenas para as mulheres, tendo em vista o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da isonomia. Nesse sentido: REVISTA ÍNTIMA. ILICITUDE. DANO MORAL CONFIGURADO. APLICAÇÃO À TODOS OS TRABALHADORES. HOMENS E MULHERES. ISONOMIA. O reconhecimento constitucional do direito à intimidade e à privacidade, enquanto esferas atreladas à personalidade do humano, impõe que seja aplicável o artigo 373-A, VI, da CLT, que veda revistas íntimas nas empregadas, a todos os trabalhadores, sem qualquer restrição normativa quanto ao gênero ou forma de vinculação ao sistema produtivo. A prática empresarial de fiscalização por meio de revista intima é abusiva, acarretando grave ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade tanto da trabalhadora (art. 373-A, VI da CLT) quanto do trabalhador, o que gera o dever de compensar o dano moral sofrido. (TRT-1 - RO: 01578009820085010021 RJ, Relator: Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, Data de Julgamento: 24/09/2014, Sétima Turma, Data de Publicação: 08/10/2014). No mesmo sentido, Martinez (2015, p. 730) explica: “não há razão jurídica que autorize a proteção ora analisada apenas em favor das mulheres em detrimento dos homens, cuja intimidade deve ser igualmente preservada”.
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RECURSO DE REVISTA. REVISTA A PERTENCES. DANO MORAL. NÃO CONFIGURAÇÃO 1. A revista visual em bolsas, sacolas e demais pertences do empregado, desde que efetuada de maneira impessoal e respeitosa, caracteriza exercício regular do direito do empregador, inerente ao seu poder de direção e fiscalização, não acarretando dano moral. Precedentes do Tribunal Superior do Trabalho. 2. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST - RR: 14651820105190009, Relator: João Oreste Dalazen, 4ª Turma, 13/03/2015).
Desta ementa, infere-se que se trata tão somente de revistas pessoais, que
não adentram a esfera íntima do empregado, isto é, sem apalpação e investidas sobre o
corpo do trabalhador, limitando-se a prática de revistar objetos de propriedade do
empregado.
Verifica-se, desse modo, que, de maneira geral, consideram-se como válidas
as revistas pessoais realizadas pelo empregador, desde que não ocorra violação da
intimidade do empregado, direito constitucionalmente garantido (art. 5º, inciso X).
Data máxima vênia, entretanto, mais correta se mostra a lição de Nunes
(2011, p.69), para quem qualquer revista deve ser considerada como íntima,
independentemente de sua natureza. Aduz a autora:
(...) entendemos que qualquer revista realizada no empregado deve ser considerada íntima, independente de haver exposição de partes do corpo ou toque por parte do empregador ou seus prepostos, uma vez que a simples vistoria do corpo, mesmo vestido, já adentra a esfera íntima do indivíduo.
Afirma ainda:
Infelizmente, na maioria dos casos encontrados em pesquisa nos principais tribunais brasileiros, observa-se que as empresas, de uma forma geral, extrapolam os limites do razoável, ferindo a dignidade dos empregados. Em grande número de situações analisadas os empregados tinham que levantar a blusa e abaixar as saias ou calças, os encarregados de fazer a fiscalização, em muitos casos, apalpavam os trabalhadores, que, em algumas situações, eram ameaçados com dispensa por justa causa caso houvesse recusa na submissão à revista. Empresas de cartões de crédito obrigam seus empregados a ficar somente de roupas íntimas e andar por corredores espelhados por certo percurso, para que se verifique se não levam objetos escondidos em suas partes íntimas. O caso mais grave encontrado no decorrer das pesquisas foi praticado por uma empresa mineira, que obrigava que seus empregados ficassem nus e caminhassem certo percurso para que fosse verificado se eles não levavam
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medicamentos fabricados pela empresa em suas partes íntimas. (NUNES, 2011, p. 75)
Portanto, mais correto que sejam consideradas como íntimas todas as
espécies de revista realizadas, uma vez que, havendo ou não exposição do corpo do
empregado, sempre haverá violação de sua intimidade, até porque, nos dizeres de
Martinez (2015, p. 730), “a distinção [revista íntima e revista pessoal], entretanto,
parece despropositada, uma vez que será íntima a revista na medida em que atinja a
intimidade do empregado”. Mais, o autor defende que não é indispensável que o
procedimento de revista se dê sobre o corpo do empregado, observando que pode
existir violação da intimidade quando, ao abrir uma bolsa, possa expor conteúdo
íntimo e que era recôndito do empregado, citando, a exemplo, o uso de medicamentos
controlados e até mesmo porte de material pornográfico.
Martinez (2015, p. 731) ainda explica que abrir bolsa ou sacola pode ser tão
ou mais violador à intimidade do que tocar o corpo e cita o Enunciado nº 15 da 1ª
Jornada de Direito Material e Processual da Justiça do Trabalho, o qual dirime referida
controvérsia:
I – REVISTA – ILICITUDE. Toda e qualquer revista, íntima ou não, promovida pelo empregador ou seus prepostos em seus empregados e/ou em seus pertences, é ilegal, por ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade do trabalhador. II – REVISTA ÍNTIMA – VEDAÇÃO A AMBOS OS SEXOS. A norma do art. 373-A, inc. VI, da CLT, que veda revistas íntimas nas empregadas, também se aplica aos homens em face da igualdade entre os sexos inscrita no art. 5º, inc. I, da Constituição da República.
Corroborando este posicionamento, o julgado abaixo:
DANOS MORAIS - REVISTAS PESSOAIS - DIREITO DE PROPRIEDA-DE VERSUS DIREITOS PERSONALÍSSIMOS – EXERCÍ-CIO REGULAR DE UM DIREITO - PRINCÍPIOS CONTRATUAIS CIVIL-CONSTITUCIONAIS - VIOLAÇÃO. O paradigma atual emanado da Constituição Federal propugna pela supervalorização da dignidade da pessoa humana, princípio máximo de um Estado Democrático de Direito, o qual encontra aplicabilidade imediata por meio da eficácia horizontal dos princípios fundamentais. Outrossim, os parâmetros estatuídos em princípios maximizadores da eficácia horizontal mediata, como a boa-fé objetiva, a função social do contrato e o abuso de um direito (artigos 422, 421 e 187 do Código Civil de 2002), propugnam pela amoldação das tratativas e execução
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dos contratos enquadrados por essas cláusulas gerais com suporte constitucional. A baliza de constatação do cometimento de ato ilícito não perpassa, tão-somente, pela comparação entre o direito do proprietário de proteger seu patrimônio, portanto exercício regular de um direito e incursão dessas medidas protetivas na esfera íntima do empregado, mas sim, do objeto, método, forma e momento das revistas, devendo tais procedimentos deixar intacto o supraprincípio da dignidade da pessoa humana, instigador supremo do Bem-Estar coletivo, portanto direito intrínseco à noção de Humanidade. Nesse sentido, há que se afastar a interpretação de não violação aos direitos personalíssimos em revistas pessoais apenas porque não houve imposição de desnudar o empregado, devendo-se analisar os elementos circunstanciadores da generalização do ato investigatório/ fiscalizador e do objeto sobre o qual se funda a revista. A boa-fé objetiva imputa às partes um compromisso com os padrões de conduta reta, vigentes no meio social, no sentido de pautar o comportamento dos contratantes, tangentes de uma necessidade de respeito à confiança da outra parte e aos seus legítimos interesses defendidos contratualmente, advindos, ainda, da noção de contrato com vínculo de colaboração. O contrato de emprego é um contrato eminentemente de colaboração, onde a confiança é elemento ínsito, não deixando a menor dúvida que as partes estão imbuídas do espírito fiducial em todas as fases contratuais, mormente na sua execução. Assim, o abuso do direito (art. 187) é parâmetro normativo que visa enquadrar todo e qualquer exercício de um direito aos fins sociais, pautados na boa-fé e na prevalência da dignidade humana e, ainda, ao valor social dado ao trabalho pelo constituinte originário de 1988. Ultrapassadas essas delimitações, impossível não configurar a violação à dignidade da pessoa humana. Qualquer vistoria realizada com o intuito de verificar responsabilidade por mercadorias desaparecidas deve ser cuidadosamente levada a efeito pelo empregador, com o escopo de manter incólume a dignidade da pessoa humana do trabalhador e seus consectários, como a intimidade, a honra etc. O conjunto probatório dos autos comprova a violação aos direitos personalíssimos da reclamante, devendo a reclamada responsabilizar-se pelo extrapolamento, reparando civilmente os danos imateriais sofridos pela autora, conforme relatado na exordial. (TRT 23ª Região. Recurso Ordinário nº 00932.2007.036.23.00-1. Relator: Juiz Convocado Paulo Brescovici. Cuiabá/MT, 07/04/08).
Muito interessante a fundamentação jurídica trazida na ementa supra,
porquanto se utiliza de elementos constitucionais e de âmbito civil para justificar a
impossibilidade da realização de revistas, sejam pessoais ou íntimas. Ela afirma que a
dignidade da pessoa humana deve ser o vetor axiológico que impede referidas práticas,
bem como fundamenta na boa-fé objetiva dos contratos mais um elemento capaz de
dar azo a não realização dessas práticas, valorizando a confiança que deve existir numa
relação de trabalho.
Porém, Nunes (2011, p. 73, apud Simón, 2000, p. 147) assevera que a
opção da doutrina e da jurisprudência brasileiras, em diferenciar revistas íntimas e
pessoais, não foi feita com base no juízo de ponderação que deveria nortear a solução
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das colisões de direitos. Segundo afirma, protegeu-se apenas o direito de propriedade,
em detrimento do direito à intimidade, à vida privada, à honra, à imagem, à igualdade,
à presunção de inocência, às garantias dos acusados e ao monopólio estatal da
segurança.
No caso das revistas realizadas pelo empregador ocorre a colisão de dois
direitos considerados como fundamentais: direito à intimidade e direito de
propriedade.
Constatada esta espécie de colisão, necessário que se utilize da ponderação
por parte do intérprete constitucional, à luz do Princípio da Concordância Prática, da
Máxima da Proporcionalidade e da Dignidade da Pessoa Humana, a fim de determinar
qual dos direitos deverá prevalecer no caso concreto.
No caso das revistas, parece mais prudente que deva prevalecer o direito à
intimidade do empregado, porque mais próxima à preservação da dignidade, motivo
pela qual inócua se mostra a distinção entre revistas pessoais e revistas íntimas.
Consoante se afirmou anteriormente, o estado de subordinação do
empregado, traço característico da relação de emprego, não implica sua completa
sujeição. O empregador, assim, apenas controla o modo como os serviços são
prestados e nunca a própria pessoa do empregado. Desse modo, deve sempre respeitar
os direitos fundamentais em geral, dentre eles os direitos da personalidade,
perfeitamente aplicáveis à relação de emprego, tendo em vista a eficácia horizontal
direta dos direitos fundamentais.
Além disso, quando do exercício de seu poder intraempresarial,
imprescindível que o empregador respeite os limites a ele impostos, entre os quais sua
função social (art. 5º, inciso XXIII, CF/88). O poder de direção deve ser exercido
sempre com proporcionalidade e razoabilidade, uma vez que não é reconhecido ao
empregador para a realização pura e simplesmente de seus interesses individuais, mas
sim para a realização dos interesses coletivos da empresa.
DANO MORAL. TRABALHO DA MULHER. REVISTA ÍNTIMA. CONSTRANGIMENTO. AUSÊNCIA DE JUSTIFICATIVA. INDENIZA-ÇÃO. A CLT, quando trata da Proteção ao Trabalho da Mulher, no art. 373-A, VI, expressamente proíbe as revistas íntimas, que devem ser consideradas não só as que se efetivam com o toque físico na pessoa da empregada, mas
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também as que ordenam remoção de peças de roupas, com exposições de partes íntimas em presença de terceiros, ou qualquer revista em pertences, bolsas ou armários em que a trabalhadora costuma guardar seus objetos pessoais, no local de trabalho. Ainda que sem contato físico, especialmente quando feitas sob os olhares de outros colegas, as revistas provocam grande constrangimento e se revestem de profunda gravidade, pois além de denotar desconfiança pelo empregador, inibem mais seriamente a empregada, que não dispõe de meios de recusa no ambiente onde prepondera o poder do empregador. Tal submissão não se justifica, sequer pela preocupação em proteger o patrimônio deste, já que se faz ao arrepio de qualquer consideração por sentimentos e valores íntimos da trabalhadora. Recurso a que se dá provimento para impor condenação em indenização por danos morais. (TRT 9 Região. RO 46512007195900 PR, 4651-2007-195-9-0-0, Relator: MARLENE T. FUVERKI SUGUIMATSU, 2ª. TURMA, Curitiba/PR, 23/07/2010). [grifos nossos].
Nesta ementa, o E. TRT 9ª Região reafirma o posicionamento de que é
irrelevante se a revista é realizada sobre o corpo, sob ordens verbais ou sobre apenas
objetos do trabalhador. Revestido de total desconfiança, não pode o empregador supor
que o empregado lhe subtrai bens da empresa e realizar revistas com o fim de proteger
seu patrimônio. Isto é medida que se mostra arbitrária e desproporcional, totalmente
contrária à fidúcia que um contrato de trabalho exige.
No que tange à observância da máxima da proporcionalidade na ponderação
entre intimidade e propriedade, ensina Nunes (2011, p. 55):
Ocorre que, no Brasil, a mesma Constituição que assegura a proteção à intimidade assegura também o direito de propriedade; logo, no ambiente de trabalho, o direito à intimidade sofre limitações, as quais não poderão, entretanto, ferir a dignidade de pessoa humana. Utilizando-se da razoabilidade, o empregador tem direito a adentrar, até certo ponto, é claro, a intimidade do trabalhador quando este se encontra dentro da empresa. (...) O que não se admite é que a inserção do empregado no ambiente do trabalho lhe prive dos seus direitos da personalidade, dos quais o direito à intimidade é uma espécie. Importante salientar que a prestação de serviços realizada por conta alheia não retira os direitos da personalidade dos trabalhadores.
A violação da intimidade do empregado, com fulcro apenas no poder
intraempresarial do empregador, assim, não se mostra quer adequada, quer necessária,
motivo pelo qual deve sempre prevalecer o direito fundamental do trabalhador.
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INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – REVISTA DE PERTENCES – CABIMENTO – Provado que, após o expediente, o autor tinha seus pertences revistados diariamente, na presença de clientes, caracterizada agressão à honra, intimidade e dignidade, é devida indenização por danos morais. O poder diretivo do empregador não é absoluto, não obstante lhe seja assegurado o direito de proteger seu patrimônio, deve fazê-lo sem violar a dignidade da pessoa humana, alçada à condição de garantia constitucional. (TRT 3.ª Região; Processo: 02010-2012-031-03-00-3 RO; Data de Publicação: 14/03/2014; Órgão Julgador: Sétima Turma; Relator: Convocado Luis Felipe Lopes Boson; Revisor: Paulo Roberto de Castro; 13/03/2014).
Da ementa, infere-se que, apesar de estar legitimado pela ordem jurídica a
praticar atos no intuito de proteger seu patrimônio, não poderá o empregador violar da
dignidade da pessoa humana, ao qual o direito à intimidade é conexo.
É certo que a própria execução do contrato de trabalho impõe limitações ao
direito à intimidade, não apenas em virtude da subordinação jurídica a que está sujeito
a que está sujeito o empregado, mas também por estar exposto à observação de seus
colegas de trabalho, sobretudo de chefes e supervisores. Porém, também é certo que a
realização de revistas em caráter sistemático, ainda que praticadas com a cautela que
configura o exercício regular de um direito, coloca o empregado em situação
desconfortável. Sendo assim, torna-se difícil conciliar a prática de revistas com a
dignidade do trabalhador.
Preocupada com o respeito à Dignidade da Pessoa Humana nas relações de
trabalho encontra-se também a OIT (Organização Internacional do Trabalho), como
aponta Nunes (2011, p. 93):
(...) reza o preâmbulo da Constituição da OIT que a não adoção de um regime de trabalho realmente humano por qualquer nação cria obstáculos aos esforços das outras nações que desejam melhorar a sorte dos trabalhadores nos seus próprios territórios. Isso demonstra a importância dada pela Organização à proteção da dignidade dos trabalhadores e de sua luta constante para melhores condições de trabalho na busca da justiça social.
Observa ainda a autora que, apesar dos diversos estudos realizados pela
Organização no que tange à prática de revistas, até o presente momento não foi
elaborada qualquer Convenção ou Recomendação a respeito do tema (NUNES, 2011,
p. 93).
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No entanto, consoante aduz, apresenta a OIT como uma de suas principais
preocupações a garantia do trabalho decente e a promoção dos direitos fundamentais.
Ora, não se pode conceber o Direito do Trabalho, muito menos o trabalho decente,
quando existe o controle abusivo de um ser humano sobre o outro.
Sendo assim, conquanto vigente a Lei 13.271/2016, a qual proíbe a adoção
de qualquer prática de revista íntima de funcionárias e de clientes do sexo feminino em
empresas privadas, os órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta,
em que pese a não existência de norma específica sobre a matéria relativamente a
trabalhadores homens, devem os objetivos da OIT ser aplicados de forma a não
permitir a prática de revista em qualquer empregado.
Não bastasse isso, a Constituição da República de 1988 determina, em seu
artigo 5º, inciso III, que ninguém será submetido a tratamento desumano ou
degradante. Ora, é indubitável que a prática de revistas pode se enquadrar no
dispositivo em questão, tendo em vista o constrangimento por que passa o empregado
durante sua realização.
Outrossim, a prática de revistas desrespeita o princípio da presunção de
inocência, insculpido no artigo 5º, inciso LVII, da CRFB/1988. Ademais, se aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, nos termos do
artigo 5º, inciso LV, da Carta Maior, como excluir da incidência desse dispositivo os
simples suspeitos, como no caso dos empregados que trabalham com objetos de
pequeno tamanho e/ou elevado valor?
Aponta José Affonso Dallegrave Neto (2011, p. única):
Não havendo dispositivo legal que permita revista por particular, o ato implica suspeição injuriosa. Se acha que o empregado é suspeito, o empregador deve dirigir-se à autoridade policial, e não simplesmente passá-lo em revista, mormente tratando diferentemente os iguais todos empregados. Atitude tal implica efetiva ofensa à dignidade humana e boa-fama do trabalhador, violando o princípio constitucional de proteção à honra das pessoas, insculpido no artigo 5ª, X.
Nessa esteira, o autor esclarece que caso suspeite de seu empregado, deve o
empregador procurar a autoridade policial competente, e não simplesmente submetê-lo
a revistas, pois, nesse caso, estaria a tratar de forma desigual os iguais (empregados).
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Tal atitude implica ofensa à dignidade da pessoa humana, violando o princípio
constitucional de proteção à intimidade das pessoas, previsto no artigo 5º, inciso X, da
CRFB/1988. Mais: a prática de revistas representa verdadeira atividade de polícia
privada, não atribuída à pessoa do empregador (DALLEGRAVE NETO, 2011, p.
única). Sobre esta questão, o julgado abaixo:
DANO MORAL – REVISTA DE EMPREGADO – USURPAÇÃO DE FUNÇÃO PÚBLICA – O DIREITO SOCIAL EMERGE DA NECESSIDADE DE SE PROMOVER A IGUALDADE MATERIAL ENTRE OS INDIVÍDUOS – PARTINDO-SE DA PREMISSA DE SE RECONHECER O OUTRO COMO IGUAL. NADA JUSTIFICA QUE O PARTICULAR, SEM QUALQUER AUTORIZAÇÃO PÚBLICA, POSSA ARVORAR-SE NO DIREITO DE REVISTA – NA LEITURA DA CONSTITUIÇÃO, OBEDECE AO PRINCÍPIO DA UNIDADE INTERPRETAR QUE O DIREITO DE PROPRIEDADE ENCONTRA LIMITES NOS DIREITOS À IGUALDADE, INTIMIDADE, VIDA PRIVADA E HONRA – A revista rotineira de empregados, sem motivo específico e feita pelo próprio empregador, revela suspeita injuriosa passível de reparação através de indenização correspondente. Isto, sem prejuízo de ofícios aos órgãos competentes por, em tese, ocorrer ofensa ao art. 328 do Código Penal – usurpação de fruição pública (Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região. Recurso Ordinário. Matéria trabalhista. Revista íntima. Recurso Ordinário nº RO 02051-2001 (20669-2001). Relator: Sergio Guimarães Sampaio. Curitiba/PR, 20/06/2001).
Atente-se que é exatamente o que se afirmou acima: a prática de revistas
rotineira revela-se usurpação de atividade do poder público pelo particular, o que deve
ser veementemente rechaçada.
Além de todo o exposto, a desconfiança não condiz com a fidúcia inerente à
relação empregatícia, até porque iria de encontro com o princípio da presunção da boa-
fé objetiva dos contratos, como preconizado pelo art. 422 do Código Civil, e
anteriormente mencionado.
A relação de trabalho não é um negócio circunstancial, nem uma fugaz transação mercantil, mas contém vínculos sociológicos pessoais e permanentes. Ainda que originada de um fato econômico, não pode resumir-se exclusivamente em direitos e deveres patrimoniais; coexistem vínculos de ordem moral e espiritual que, em uma moderna concepção do trabalho, não devemos desconhecer. (PAVELSKI, 2006, p. única)
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Por isso, o ambiente de trabalho não pode se tornar um ambiente de
desconfiança generalizada, não tendo espaço para que revistas íntimas sejam
praticadas pelo empregador, sob pena de desestabilização das relações laborais.
A prática de revista pode caracterizar, ainda, flagrante discriminação por
parte do empregador, conforme aponta Dallegrave Neto (2011, p. única):
Geralmente tal procedimento ocorre no fim do expediente por prepostos da empresa, seguranças ou chefes de setor, sendo as vítimas os empregados menos graduados. Raramente a empresa estende esse modus operandi aos gerentes, encarregados e diretores, o que já caracteriza procedimento discriminatório e ofensivo ao art. 3º, inciso IV da CF8.
Dessa forma, além de violar o art. 3º, inciso IV, da CRFB/1988, a prática de
revista afronta também as Convenções nº 100 e nº 111 da OIT, que tratam da proibição
de discriminação, ambas ratificadas pelo Brasil.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REVISTA ÍNTIMA. FUNCIONÁRIA. VEDAÇÃO LEGAL. AFRONTA AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE E DA DIGNIDADE HUMANA. CONVENÇÃO 111 DA OIT. QUANTIFICAÇÃO DA INDENIZAÇÃO. PARÂMETROS. A CLT dispõe ser vedado ao empregador proceder à revista íntima nas funcionárias (artigo 373-A, inciso VI). "In casu", é fato incontroverso que a reclamante foi submetida à revista íntima, não permitindo a norma este tipo de procedimento, ainda que haja suspeita de que a funcionária tenha cometido ato de improbidade. Aliada à legislação laboral, integra-se o entendimento de que ao empregador cabe assumir os riscos da atividade econômica (princípio da alteridade), assim como cabe ao empregado prestar seus serviços, pautando-se na boa-fé e urbanidade. Como meio de inibir condutas inadequadas de seus empregados, o empregador pode, e deve, exercer o chamado poder diretivo em prol da organização do trabalho, visando o bem estar do meio empresarial e social que abrange. No entanto, não se deve confundir poder diretivo com sujeição hierárquica. O que se estabelece entre empregado e empregador é uma relação jurídica, e não submissão pessoal do empregado "versus" supremacia empresária. Existem limites para o poder diretivo, e estes começam pelo respeito à dignidade humana do trabalhador. O empregado é pessoa, não coisa. A este cabe pensar, sentir e colaborar com o empregador, e não dispor de sua força de trabalho como se mercadoria fosse, por isso deve ser respeitado. Submeter a reclamante à revista íntima, baseando-se em "suspeita infundada", porquanto não provada, de prática de ato de improbidade, atentatório contra o patrimônio do patrão, é, no mínimo, imoral, agressivo e contrário aos princípios do direito à dignidade humana, afrontando-se o direito à
8Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação
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intimidade, de forma discriminatória. É garantia constitucional a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, à honra e imagem das pessoas. Tal poder deve ser exercido de forma responsável, coerente e dentro dos limites da razoabilidade. Neste sentido, o novo Código Civil veio regular a ocorrência de tais situações, dando-se destaque aos "Direitos da Personalidade" e sua proteção. A CONVENÇÃO 111 DA OIT, que trata da Discriminação no Emprego e Profissão, ratificada pelo Brasil, reconhece o limite ao poder do empregador, na medida em que este ofende a liberdade do empregado (como ser humano), em situações de desrespeito à dignidade humana, como no caso de prática de vistoria pessoal/corporal/aviltante e humilhante. Por tais razões, configuradas as hipóteses de abuso de direito e de prática vedada em lei, condena-se a empresa a indenizar a autora por danos morais, cuja quantificação deve-se pautar por parâmetros envolvendo a gravidade da falta, os efeitos danosos perpetrados em desfavor da obreira, o potencial econômico da empresa-infratora e, notadamente, o caráter pedagógico da indenização. Recurso parcialmente provido (TRT 3ª Região; RO 00771-2003-011-03-00-5 RO; Relatora Convocada Maria Cristina Diniz Caixeta; Revisor: Eduardo Augusto Lobato. Belo Horizonte/MG, 22/11/2003). [grifos nossos].
Pela ementa, mais uma vez a jurisprudência se mostra clara no sentido de
que a relação empregatícia deve ser pautada por uma relação de confiança entre as
partes, bem como que o empregado está sim subordinado ao empregador, porém
juridicamente, e não de forma pessoal, arbitrária e autoritária, o que não permite a
conclusão de que revistas possam ser realizadas ao bel prazer do empregador com a
justificativa de proteger seu patrimônio.
Outros motivos existem para que prevaleça o direito à intimidade do
empregado quando em colisão com o direito de propriedade do empregador. É o caso
da existência de outros mecanismos de proteção do patrimônio do empregado. Nesse
raciocínio, Nunes (2011, p. 72, apud Simón, 2000, p. 147) esclarece:
(...) a indispensabilidade para a tutela do patrimônio é o requisito que limita a própria realização da revista. Se há, por exemplo, outro tipo de controle (entrada e saída de estoque, filmagens através de circuito interno, colocação de etiquetas magnéticas, vigilância feita por serviço especializado, etc.), não há justificativa para a efetivação das revistas.
Sendo assim, deve o empregador, a fim de proteger seu patrimônio, utilizar
os recursos tecnológicos disponíveis, dispensando a realização de revistas em seus
empregados e respeitando sua intimidade. Vidal e Anello (2008, p. única) também
afirmam:
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(...) a simples vedação à revista pessoal não significa uma violação ao direito de propriedade. Isso porque, em especial com o avanço tecnológico, o empregador goza de outros meios de evitar o desvio de mercadorias. (...) Além de instalação de câmeras, podemos citar como métodos de prevenção de furtos a utilização de sensores eletrônicos de mercadorias nas portas do estabelecimento, investimento em técnicas avançadas de controle de estoque, contratação de um setor de recursos humanos para recrutamento e seleção de funcionários, dentre tantos outros.
Conquanto Barros (2009, p. 589) se posicione no sentido de que é possível
a realização de revistas, desde que de caráter geral, impessoal, mediante ajuste prévio
com entidade sindical ou com o próprio empregado, em respeito aos direitos da
personalidade, também defende a utilização de recursos tecnológicos, com o fim de
evitar a realização de revistas:
(...) a tecnologia também poderá ser utilizada para evitar ou reduzir os efeitos da revista na intimidade dos empregados A título de exemplo, a colocação de etiquetas magnéticas em livros e roupas torna desnecessária a inspeção em bolsas e sacolas, nos estabelecimentos comerciais.
Todavia, deve-se proceder com cautela, a fim de evitar que tais recursos
tecnológicos terminem por violar a intimidade dos empregados de outras formas.
Barros (2009, p. 599) ensina:
A vigilância eletrônica poderá ter um futuro promissor, desde que utilizada de forma humana, combatendo-se os abusos na sua utilização e permitindo-se o acesso do obreiro às informações que lhe digam respeito. Torna-se, entretanto, indispensável que esses instrumentos audiovisuais não sejam utilizados ilegalmente, como o objetivo de gravar, reproduzir ou divulgar aspectos de caráter íntimo ou pessoal do empregado. Logo, a inovação tecnológica na fiscalização é eficaz; inadmissíveis são as atividades que impliquem utilização indevida dos avanços mecânicos e técnicos de vigilância.
Neste mesmo sentido, já decidiu o Tribunal Superior do Trabalho:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. 1. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE 1.[...]. 2. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CÂMERAS DE VIGILÂNCIA NOS VESTIÁRIOS. O Tribunal Regional adotou a tese de que "O monitoramento por câmera em vestiário/banheiro configura abuso do poder diretivo por violar a intimidade do trabalhador", nos termos do que dispõe a Súmula nº 20 daquela Corte. Com efeito, a instalação de câmeras em área destinada à privacidade dos
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empregados não se justifica, pois não se trata de local de trabalho, mas, sim, de ambiente em que os funcionários trocam seu vestuário e guardam seus pertences particulares, de modo que o monitoramento invade a privacidade e intimidade, constrangendo os trabalhadores, os quais ficam constantemente sob o manto da desconfiança, o que, por certo, fere a dignidade da pessoa. Logo, não há falar em violação do art. 5º, X, da CF. Quanto ao valor indenizatório, verifica-se, pela transcrição acima, que o Regional, ao fixar o valor de R$3.000,00, observou os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, registrando, inclusive, que tal valor visava não só à reparação, mas também ao caráter punitivo e pedagógico da medida. Assim, não se vislumbra violação literal do artigo 5º, V, da CF. Divergência jurisprudencial inespecífica. 3. [...]. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TST AIRR-300-77.2014.5.23.0107, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, 8ª Turma, DEJT 29/04/2016).
Observe-se que o C. TST, mesmo defendendo a utilização de mecanismos
tecnológicos como forma de exteriorização do poder diretivo da empresa, apresenta
postura firme no que tange aos limites desse poder; isto é, pode ser utilizado desde que
não adentre à esfera íntima do empregado, como instalação de câmeras de vigilância
em vestiários.
Dessa forma, não poderão tais recursos tecnológicos, de alguma forma, ferir
a intimidade do empregado. Não é possível, por exemplo, a instalação de
equipamentos em banheiros, vestiários, etc., tampouco equipamentos que gravem as
conversas dos trabalhadores. Estes recursos devem ser utilizados, unicamente, para
proteger o patrimônio do empregador, nunca violando a intimidade do empregado.
Nunes (2011, p. 79) aduz:
A instalação de câmeras nos locais de trabalho é possível, quando estritamente necessário e desde que instaladas em locais visíveis; porém, defendemos que elas, em momento algum, devem gravar sons, mas apenas imagens. Se a função das câmeras é verificar se há a ocorrência de furto no ambiente de trabalho, basta a função de vídeo, não havendo qualquer necessidade da invasão de privacidade dos trabalhadores com a gravação de suas conversas diárias.
Contra a realização de revistas pelo empregador, tem-se, ainda, o já
precitado Enunciado 15 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho,
mais uma vez transcrito abaixo:
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I – Revista. Ilicitude – Toda e qualquer revista, íntima ou não, promovida pelo empregador ou seus prepostos em seus empregados e/ou em seus pertences, é ilegal, por ofensa aos direitos fundamentais da dignidade e intimidade do trabalhador. II – Revista íntima. Vedação a ambos os sexos – A norma do art. 373-A, inc. VI, da CLT, que veda revistas íntimas nas empregadas, também se aplica aos homens em face da igualdade entre os sexos inscrita no art. 5º, inc. I, da Constituição da República.
O referido Enunciado foi elaborado em novembro de 2007, na sede do TST,
em encontro organizado ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da
Justiça do Trabalho) e, apesar de não possuir efeito legal, revela tal Enunciado a linha
de pensamento da maioria dos juízes filiados à Associação. Poderá, num futuro
próximo, tornar-se Súmula do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho.
Apesar de todo o exposto, há quem entenda como possíveis as revistas,
desde que previamente ajustadas entre as partes, através de contrato individual, acordo
coletivo ou convenção coletiva. Neste sentido, assevera Nunes (2011, p. 71 apud
Romita 2005, p. 260):
(...) quando se tratar de trabalhadores do sexo feminino, a revista só será lícita em casos específicos, mediante prévio ajuste (convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo ou contrato individual de trabalho). A revista em empregadas obedece à seguinte regra: a revista só cabe quando houver prévio entendimento, com previsão das especificidades ocorrentes.
Entretanto, discorda-se desse entendimento. Nunes (2011, p. 74) explica
que
Nenhum instrumento de autocomposição entre as partes pode autorizar a prática de revistas pessoais, uma vez que a dignidade da pessoa humana e sua intimidade são direitos indisponíveis, não se admitindo a renúncia nem a invasão da esfera reservada do trabalhador. [grifos nossos].
Sendo assim, nem o contrato de trabalho nem a norma coletiva teriam o
condão de autorizar a realização de revistas, em detrimento da preservação da
intimidade do trabalhador, porquanto a proteção desse direito inclui-se entre as
garantias e direitos fundamentais da pessoa humana garantidos pela Constituição.
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No que tange especificamente às revistas previstas em contrato individual
de trabalho, realizam Vidal e Anello (2008, p. única) uma ponderação entre o direito à
intimidade e o princípio da autonomia privada.
A partir do primeiro critério, qual seja, o grau de desigualdade entre as
partes envolvidas, não restam dúvidas acerca da incidência direta da proteção à
intimidade. Não se pode negar que a relação instaurada entre empregado e empregador
é evidentemente assimétrica, revelando-se o empregado parte hipossuficiente e
tendente a se submeter às imposições do empregador, ante o receio de ser substituído
por qualquer outro empregado. (VIDAL e ANELLO, 2008).
O mesmo raciocínio se obtém a partir do segundo critério, qual seja, a
essencialidade da relação jurídica na vida do indivíduo, a qual, aliás, encontra-se aqui
em seu nível máximo, tendo em vista os elevados índices de desemprego no Brasil. É
evidente que o empregado, no momento da contratação ou mesmo no curso do
contrato, renunciaria diversos direitos fundamentais (dos quais, ressalte-se, não lhe
caberia dispor), a fim de ser contratado ou de não ser demitido (VIDAL e ANELLO,
2008).
O último critério diz respeito à efetiva autonomia da vontade do
trabalhador, no momento da contratação. Ainda que se admitisse que o empregado
aceitasse a realização de revistas, tal cláusula seria inválida, porquanto implicaria
violação do direito à intimidade e, consequentemente, da dignidade da pessoa humana,
face a indisponibilidade desses direitos. (VIDAL e ANELLO, 2008).
Após esta análise, concluem os autores:
Esse três parâmetros demonstram a necessidade de se supervalorizar o princípio da vida privada em face da autonomia de vontade, aplicando diretamente o referido direito fundamental previsto na Carta Magna para proteger os empregados da conduta inconstitucional dos empregadores de praticar revista pessoal. Diante disso, podemos afirmar que qualquer previsão contratual nesse sentido seria nula de pleno direito (VIDAL e ANELLO, 2008, p. única).
No que tange às normas coletivas, os autores também concluem que a
revista não se justificaria, porque o “sindicato estaria dispondo do direito fundamental
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dos trabalhadores a uma vida privada, bem como à dignidade, que não podem ser
dispostos nem mesmo pelos próprios.”. (VIDAL e ANELLO, 2008, p. única).
Dessa forma, mesmo havendo previsão em contrato individual ou
instrumento coletivo, deve prevalecer o direito à intimidade do empregado quando em
confronto com o poder diretivo do empregador. Isto porque, conforme leciona Delgado
(2013, p. 711), a
racionalização e atenuação do poder empregatício, em suas diversas dimensões – diretiva, normativa, fiscalizatória e disciplinar -, não inviabiliza ou restringe o bom funcionamento da livre iniciativa, também garantida pela Constituição. Apenas torna a propriedade efetivamente subordinada à sua função social (art. 5º, XXII, CF/88), colocando a livre iniciativa como valor social realmente ao lado – e não acima – do valor social do trabalho, como claramente quer a Constituição (art. 1ª, IV, CF/88).
Também há quem defenda como válidas as revistas quando feitas por
pessoas do mesmo sexo do empregado revistado.
Contudo, mais uma vez discorda-se de referido posicionamento, já que não
deixa de existir violação do direito à intimidade neste caso. Leia-se a interessante
analogia feita por Rosana Marques Nunes (2011, p. 76-77):
Interessante que façamos um paralelo com o que ocorre quando ao adentramos uma instituição bancária e somos detidos pelo segurança ao acionamento do detector de metais. Não há quem discorde que sentimos desconforto em tal situação. Porém, o desconforto é gerado sem nem mesmo sermos revistados ou termos que tirar partes das vestimentas, isso ocorre apenas diante do constrangimento de sermos parados pelo segurança e forçados a abrir bolsas e sacolas. (...) Agora, imaginemos a situação dos empregados se uma empresa que diariamente são submetidos à fiscalização, mesmo que apenas tenham que abrir o casaco, virar bolsos e levantar barras de suas calças, o que para grande parte da doutrina e jurisprudência é considerado legítimo. É inaceitável que a ação do empregador buscando proteger seu patrimônio venha a ferir a dignidade da pessoa humana. O direito do empregador, de proteger seu patrimônio, termina onde começa o direito à intimidade e dignidade do empregado.
É incontestável que, no momento da revista, submete-se o empregado a
grande constrangimento, em razão da violação de sua intimidade, o qual, porém, não é
amenizado por ser a revista realizada por pessoa do mesmo sexo. Sobre esta questão,
já houve posicionamento do C. TST:
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DANO MORAL. PRESENÇA DE SUPERVISOR NOS VESTIÁRIOS DA EMPRESA PARA ACOMPANHAMENTO DA TROCA DE ROUPAS DOS EMPREGADOS. REVISTA VISUAL. 1. Equivale à revista pessoal de controle e, portanto, ofende o direito à intimidade do empregado a conduta do empregador que, excedendo os limites do poder diretivo e fiscalizador, impõe a presença de supervisor, ainda que do mesmo sexo, para acompanhar a troca de roupa dos empregados no vestiário. 2. O poder de direção patronal está sujeito a limites inderrogáveis, como o respeito à dignidade do empregado e à liberdade que lhe é reconhecida no plano constitucional. 3. Irrelevante a circunstância de a supervisão ser empreendida por pessoa do mesmo sexo, uma vez que o constrangimento persiste, ainda que em menor grau. A mera exposição, quer parcial, quer total, do corpo do empregado, caracteriza grave invasão à sua intimidade, traduzindo incursão em domínio para o qual a lei franqueia o acesso somente em raríssimos casos e com severas restrições, tal como se verifica até mesmo no âmbito do direito penal (art. 5º, XI e XII, da CF). 4. Despiciendo, igualmente, o fato de inexistir contato físico entre o supervisor e os empregados, pois a simples visualização de partes do corpo humano, pela supervisora, evidencia a agressão à intimidade da Empregada. 5. Tese que se impõe à luz dos princípios consagrados na Constituição da República, sobretudo os da dignidade da pessoa, erigida como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito (art. 1º, inciso III), da proibição de tratamento desumano e degradante (art. 5º, inciso III) e da inviolabilidade da intimidade e da honra (art. 5º, inciso X). 6. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento para julgar procedente o pedido de indenização por dano moral." (RR-2195/1999-009-05-00, 1ª Turma, Relator Ministro João Oreste Dalazen. Publicado em 09/07/2004).
Bem trazido pela jurisprudência acima que a violação à intimidade do
trabalhador persiste mesmo que realizada a revista por pessoa do mesmo sexo, embora
em menor grau; isto porque, como relatado, a revista, ainda que apenas visual, adentra
à intimidade do empregado e fere sua dignidade, face à exposição deliberada perante
preposto da empresa.
DANO MORAL. REVISTAS ÍNTIMAS DIÁRIAS DE EMPREGADA. VIOLAÇÃO À HONRA E À INTIMIDADE DA RECORRENTE. INTELIGÊNCIA DO ART. 373-A DA CLT E DO ART. 5º, INCISO X DA CONSTITUIÇÃO. I - Consignada na decisão recorrida a ocorrência de submissão da recorrente a revistas íntimas diárias, em que pese o registro de que se tratava de empresa de transporte de valores, cuja natureza do trabalho exigia tal procedimento, e o fato de as revistas serem procedidas por pessoa do mesmo sexo, desacompanhadas de comentário desairoso, resulta ainda assim incontrastável a agressão à sua honra e intimidade, emblemática da caracterização do dano moral. II - É que se acha subjacente ao sistema de vistoria, com revista íntima, claríssimo abuso do poder diretivo do empregador, pois embora lhe caiba dirigir e fiscalizar a prestação pessoal de serviço, não lhe é dado exceder-se no exercício desse poder a ponto de atingir os valores íntimos da pessoa humana. III - Aliás, o art. 373-A, inciso IV da CLT, contém norma incisiva sobre a proibição de o empregador ou preposto proceder a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias, cuja
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infringência se deduz a ofensa à sua dignidade e intimidade como indivíduos, reforçando a convicção sobre a caracterização do dano moral do art. 5º, inciso X da Constituição. IV - Nesse sentido, é forte a jurisprudência desta Corte ao qualificar como dano moral a realização de revista pessoal de controle ou ato equivalente, conforme se constata dos seguintes precedentes: E-RR-641571/2000, DJ 13/8/2004, Min. Maria Cristina Peduzzi; RR-2195/99-009-05-00.6, DJ 9/7/2004, Min. João Oreste Dalazen; RR-641571/2000, DJ 21/2/2003, Min. Antônio José de Barros Levenhagen; RR-360902/1997, DJ 8/6/2001, Min. Vantuil Abdala. [...]" (TST-RR-5840-25.2004.5.01.0025, Rel. Min. Barros Levenhagen, 4ª Turma, DJ de 07/03/08.)
Igualmente, a ementa acima destaca a irrelevância acerca do gênero da
pessoa que pratica a revista. O que se verifica é o ato em si, que ultrapassa limites
constitucionalmente garantidos. Da jurisprudência colacionada, infere-se que a
dignidade não se preserva unicamente porque realizada revista por pessoa de igual
sexo; o que se presume é que ela é afrontada em maior grau quando realizada por
alguém de sexo diferente. Trata-se de mensurar o grau do dano provocado e não a sua
inexistência.
Existe, ainda, quem entenda como possíveis revistas efetuadas em bens do
empregado, tais como bolsas, carteiras, armários e outros espaços privativos. Nesse
caso, porém, perfilha-se do entendimento de que ainda assim é patente a violação da
intimidade e da Dignidade da Pessoa Humana. Alice Monteiro de Barros (2009, p.
593), aduz:
A partir do momento em que o empregador concede aos obreiros espaços exclusivos, obriga-se, implicitamente, a respeitar sua intimidade. Encontra-se, aqui, um clima de confiança que os empregadores, em outras situações, exigem espontaneamente de seus empregados. Em consequência, a revista realizada nessas circunstâncias implica violação da intimidade do empregado, a qual é vedada pela Constituição da República.
A autora, entretanto, faz uma ressalva, entendendo ser possível a revista
nesses casos, desde que necessária à salvaguarda do patrimônio do empregador e como
medida de segurança dos demais empregados (BARROS, 2009, p.594).
Data vênia, não se coaduna com esse posicionamento, pelas razões já
esposadas anteriormente, isto é, em havendo desconfiança por parte do empregador,
deve ele dirigir o caso à autoridade policial, e não submeter o empregado a revista. É
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imprescindível, pois, que utilize preventivamente outros mecanismos de controle e
fiscalização, já mencionados, porquanto não pode o empregador avocar para si
verdadeira atividade de polícia privada, função tipicamente estatal.
Há autores que rechaçam a prática de revista em pertences e em armários
pessoais dos empregados, a partir de uma noção lato sensu de inviolabilidade do
domicílio. Nesse sentido, Nunes (2011, p.80-81 apud Simón, 2000, p. 149-150):
(...) da mesma forma que o direito de propriedade não autoriza que o locador adentre no imóvel alugado, o empregador não poderá fiscalizar, sem o consentimento do empregado, esses bens e locais. Trata-se de dar nova dimensão à noção constitucional de domicílio, que é ampla e não pode ser confundida com mera conceituação teórica, pois sua essência concentra-se na função que representa para o indivíduo. (...) a noção constitucional de domicílio abrange os objetos, bens e locais reservados ao empregado pelo empregador, de maneira que gozam da proteção insculpida no art. 5º, XI, da Constituição Federal. Consequentemente, só poderão sofrer revista no caso de flagrante delito ou por determinação judicial.
Por isso, mesmo quando não realizadas diretamente sobre a pessoa do
empregado, não deixam as revistas de caracterizar ofensa à Dignidade da Pessoa
Humana.
Ante todo o exposto, percebe-se que a realização de revistas não é
imprescindível para a proteção do patrimônio do empregador. Porém, se realizada,
viola por si só a intimidade e a Dignidade do empregado, valores que a Constituição da
República erigiu como fundamentais em nossa ordem jurídica. Em outras palavras,
não pode o poder intraempresarial ser exercido sem observância dos direitos
fundamentais atribuídos ao trabalhador (NUNES, 2011).
Portanto, a partir de todos os argumentos apresentados, constata-se que, no
sopesamento entre direito à intimidade e direito de propriedade, prevalecerá o
primeiro, motivo pelo qual se entende como incabível a realização de revistas em
quaisquer hipóteses.
É dizer: “a subordinação do empregado e o poder diretivo do empregado
não justificam a invasão da intimidade do trabalhador e o desrespeito à sua dignidade”
(NUNES, 2011, p. 81). Há que se ter o desenvolvimento da atividade produtiva sem
aniquilação dos direitos fundamentais do empregado. A solução é plenamente viável
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por meio do uso da tecnologia e de procedimentos preventivos, como instalação de
câmeras de vigilância, utilização de detector de metais, construção de ambientes para
guarda de pertences em local próprio e sob vigilância, bem como utilização de
uniformes.
O trabalho deve ser visto como fonte de realização moral, material e
espiritual do empregado, e não como mero fator produtivo, em que se dá maior
importância ao patrimônio do empregador do que à Dignidade da Pessoa Humana.
(NUNES, 2011).
Por todas as razões trazidas, qualquer forma de revista deve, assim, ser
considerada abuso do poder intraempresarial atribuído ao empregador. E, para
sintetizar o que se concluiu, vale a leitura de excerto extraído do Acórdão da lavra da
Relatora Marlene T. Fuverki Suguimatsu, proferido em sede de Recurso Ordinário, nos
autos da RTOrd 00755-2012-670-09-00-7 do E. TRT da 9ª Região:
O réu procura se respaldar em prática que não caracterizaria a "revista íntima" de que fala o dispositivo legal. O conceito de "revista íntima", todavia, é impreciso e não encontra ainda na doutrina e na jurisprudência uma satisfatória delimitação. De toda sorte, no entendimento deste Colegiado a sua caracterização não requer medidas extremas, como toque físico ou imposição de nudez total ou parcial. Basta a exposição de pertences do trabalhador ou a verificação em bolsas, ou mesmo em armários em que costuma guardar seus objetos pessoais, no local de trabalho para se invadir a intimidade do trabalhador, e quando, menos, invadir a sua privacidade, também protegida pelo art. 5°, X, da CF/1988. A prática das revistas, ainda quando ocorra mediante amostragem, com ou sem contato físico, exceto em raras ocasiões que envolvam segurança pública, revela-se sempre constrangedora, discriminatória e inaceitável, por expor o trabalhador à desconfiança prévia do empregador. Nessas circunstâncias recai sobre o trabalhador acusação que, embora silenciosa, é capaz de afetar profundamente os seus sentimentos de honra e dignidade. Revistas pessoais no trabalho, exceto quando devidamente justificadas por relevante interesse público, são ofensivas, especialmente quando se considera que o trabalhador não dispõe de meios de recusa no ambiente onde prepondera o poder do empregador. Essa espécie de submissão fere, sem dúvida, o decoro e a dignidade, de forma que a preocupação do empregador em proteger seu patrimônio não justifica o detrimento de sentimentos e valores dos empregados. [...] O argumento de que as revistas foram apenas visuais em nada modifica o entendimento até aqui exposto. O que se coloca em discussão é o alcance do poder de fiscalização do empregador e as restrições que devem ser impostas aos meios de que se utiliza para proteger seu patrimônio, quando também estão em jogo outros bens e valores, especialmente os ligados à dignidade da pessoa humana. Mesmo que apenas visuais as revistas nos empregados
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contém risco potencial de danos. Estes se manifestam pelo abalo que o indivíduo experimenta em seus sentimentos íntimos, seja pelo simples sentimento de desconfiança, pela exposição humilhante e vexatória, ou pelo sentimento de submissão extrema ao empregador.
Patente, portanto, a necessária salvaguarda de direitos fundamentais do
trabalhador quando da busca da proteção patrimonial por parte do empregador. Valha-
se de mecanismos tecnológicos e preventivos, já mencionados, e não de revistas
pessoais e íntimas sobre o empregado, porquanto ofensivas à dignidade de qualquer
ser humano.
4.2 REPARAÇÃO DOS DANOS CAUSADOS PELA SUBMISSÃO DO EMPRE-
GADO À PRÁTICA DE REVISTAS.
O ordenamento jurídico pátrio prevê duas formas de reparação dos danos
causados pela submissão do empregado à prática de revistas pelo empregador.
A primeira forma de reparação é representada pela rescisão indireta do
contrato de trabalho firmado entre as partes. Sobre esta espécie de rescisão, aduz
Cassar (2011, p. 1159): “É a faculdade que possui o empregado de romper o contrato
por justo motivo quando o empregador praticar uma das hipóteses previstas em lei
como justa causa”.
Encontra-se prevista no artigo 483 da CLT, o qual enumera as hipóteses em
que ela pode acontecer. Observe-se:
Art. 483 – O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; c) correr perigo manifesto de mal considerável; d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
72
Interessam, no presente momento, apenas as hipóteses descritas nas alíneas
“b”, “c” e “e”.
A alínea “b” diz respeito aos casos em que o empregador, ou outros
superiores hierárquicos do empregado, o tratam com rigor excessivo. Acerca desta
hipótese, assevera Maurício Godinho Delgado (2013, p. 1258):
O tipo legal, no fundo, trata do descumprimento do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, que devem reger as ações de todo aquele que detém fatias consideráveis de poder perante alguém. Enquadra-se no presente tipo jurídico o comportamento diretivo, fiscalizatório ou disciplinar do empregador que traduza exercício irregular de tais prerrogativas, exacerbando as manifestações de poder sobre certo empregado. A intolerância contínua, o exagero minudente de ordens, em especial quando configurar tratamento discriminatório, as despropositadas manifestações de poder em desarmonia com os fins regulares do contrato e da atividade empresarial consubstanciam a presente infração.
Como se vê, trata-se, sem dúvida, de situação em que pode ser enquadrada
a revista íntima, haja vista o abuso no exercício do poder intraempresarial do
empregador nestes casos.
A alínea “c”, por sua vez, diz respeito aos casos em que o empregado
encontra-se sujeito a perigo manifesto de mal considerável. Observe-se que a hipótese
trata das situações em que, pelas condições do ambiente de trabalho ou pelo exercício
de certa atividade, o empregado é submetido a risco não previsto no contrato firmado.
Quanto ao enquadramento da revista íntima nesta alínea, Nunes (2011, p.
98) faz interessante apontamento:
Em uma primeira leitura, poderíamos imaginar a aplicação da alínea c apenas aos casos de acidentes de trabalho ou típicas doenças ocupacionais. Porém, não podemos nos esquecer de que a higidez psíquica e moral do trabalhador também pode ser atacada em um ambiente de trabalho com constante pressão e desconfiança, onde o empregado é frequentemente revistado, às vezes de forma vexatória e aviltante.
Por fim, a alínea “e” diz respeito às hipóteses em que o empregador ou seus
prepostos praticam, contra o empregado ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra
73
ou da boa fama. Trata-se da prática de calúnia, injúria ou difamação, isto é, ofensas à
moral ou à imagem do trabalhador e de seus familiares (DELGADO, 2013, p. 1260).
Dessa forma, também esta alínea pode ser aplicada à prática de revistas pelo
empregador, uma vez que viola a intimidade e a dignidade do empregado, ferindo sua
moral.
Além da doutrina, também a jurisprudência reconhece a possibilidade de
rescisão indireta do contrato de trabalho no caso de submissão do empregado a revistas
íntimas, como se verifica na ementa abaixo:
DANO MORAL - REVISTA ÍNTIMA - CONFIGURAÇÃO - RESCISÃO INDIRETA. A vida privada, a honra, a imagem e a intimidade do indivíduo são invioláveis, nos termos do artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal. Evidentes o constrangimento e o abalo moral sofridos pela autora em decorrência da revista íntima e seus pertences para apuração de empregada supostamente responsável por deixar absorvente higiênico na parede do banheiro das empregadas da loja, a ensejar a condenação da demandada ao pagamento de indenização por dano moral. Os fatos que motivaram a condenação em indenização por dano moral impõem, ainda, o reconhecimento de rescisão indireta do contrato de trabalho, mormente quando o alegado pedido de demissão não contou com a assistência sindical na forma legal. Recurso desprovido. (Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região. Recurso Ordinário. Matéria trabalhista. Revista íntima. Recurso Ordinário nº 1284-2003-006-04-00-9. Porto Alegre/RS, 25/05/2007)
Delgado (2013, p. 1267) sustenta que, em quaisquer das hipóteses elencadas
no artigo 483 da CLT, pode o empregado escolher entre se afastar ou não do emprego e
ingressar com Reclamatória Trabalhista perante a Justiça do Trabalho, formulando seu
pedido de rescisão indireta e indicando os fundamentos fáticos e jurídicos para tanto.
No entanto, afirma que
(...) o não afastamento do empregado, de certo modo, pode até mesmo conspirar contra sua pretensão resolutória, uma vez que sugere, em face da permanência no serviço, que a afronta empresarial não foi, assim, afinal, tão grave como suposto.
Em caso de deferimento do pedido formulado pelo empregado, fixará a
sentença a data da resolução indireta do contrato e as verbas rescisórias devidas. Em
caso de indeferimento do pedido, prevalece a extinção do contrato, mas por simples
pedido de demissão do trabalhador.
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Ressalte-se que a rescisão indireta mostra-se bem mais favorável ao
empregado que o pedido de demissão, uma vez que, na primeira, faz jus o obreiro a
todas as verbas rescisórias, como se tivesse sido dispensado sem justa causa. São,
assim, pertinentes na despedida indireta: aviso-prévio (e sua projeção); 13º salário
proporcional; férias proporcionais, acrescidas de 1/3; liberação de FGTS, com
acréscimo de 40%; indenização adicional do art. 9º da Lei 7.238/84, se for o caso, e
outras indenizações rescisórias eventualmente existentes no caso concreto.
(DELGADO, 2013).
A segunda forma de reparação dos danos causados pela submissão do
empregado à prática de revistas pelo empregador é representada pela indenização por
danos morais.
Neste contexto, primeiramente, ressalte-se que “a noção de
responsabilidade, como gênero, implica sempre exame de conduta voluntária violadora
de um dever jurídico”. (VENOSA, 2006, p. 16).
Quando se estuda a responsabilidade civil, exsurgem três requisitos
ensejadores da referida responsabilidade e do dever de indenizar: dano, nexo causal e
conduta. Sem a presença concomitante destes três requisitos, indevido se mostra o
pagamento de qualquer indenização.
Apresenta-nos o professor Venosa (2006, p. 70), em sua obra, que “o dano
consiste no prejuízo sofrido pelo agente”. Mais: “pode ser individual ou coletivo,
moral ou material, ou melhor, econômico ou não econômico” e deve o dano ser atual e
certo, sendo indevida a reparação por danos hipotéticos (VENOSA, 2006, p. 30).
O dano, assim, pode ser conceituado como a lesão a um interesse
juridicamente tutelado, através de uma conduta humana positiva ou negativa. Esse
interesse tutelado pelo ordenamento jurídico pode ser patrimonial ou moral, dando
origem a duas espécies de dano.
O dano patrimonial é aquele que atinge bens patrimoniais da vítima. Em
outras palavras, é o dano suscetível de aferição econômica.
Já o dano moral é aquele que atinge a honra, a intimidade e a privacidade,
dentre outros direitos personalíssimos da vítima, que não podem ser aferidos
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economicamente. A possibilidade de indenização, nestes casos, foi consagrada pela
Constituição da República de 1988 (artigo 5º, incisos V e X9).
Interessa, no momento, apenas o dano moral. Segundo Venosa (2006, p.
29): “no dano moral, leva-se em conta a dor psíquica ou, mais propriamente, o
desconforto comportamental. Trata-se, em última análise, de interesses que são
atingidos injustamente”. Porém, cuida o referido autor em explicar que a indenização
pelo dano exclusivamente moral não possui a finalidade pura de se pagar pela dor
sofrida, mas que se indeniza também, além daquela experimentada, a dignidade do ser
humano aviltada.
Dessa forma, não restam dúvidas de que a submissão a revistas íntimas e
pessoais, as quais, como se estudou, apresentam-se como violadoras da dignidade da
pessoa humana e do direito à intimidade, geram ao empregado danos de cunho moral.
Além do dano, para que haja a obrigação de indenização por parte do
empregador, devem estar presentes o nexo causal e a conduta.
O nexo causal é o liame que une a conduta do ofensor ao dano por ele
provocado. Em suma, é o vínculo existente entre um comportamento e um dado
evento, que permite determinar o causador de um prejuízo. A conduta, a seu turno,
pode ser conceituada como um comportamento positivo ou negativo do agente, uma
ação ou omissão voluntária, que desemboca num prejuízo ou dano a alguém
(VENOSA, 2006).
Outrossim, no caso das revistas íntimas, deve resultar configurada a culpa
do empregador. Nunes (2011, p. 102) afirma:
A configuração da culpa do empregador tornou-se necessária a contar da Constituição de 1988, sendo que a simples culpa, em qualquer grau, gera responsabilização ao empregador (art. 7º, XXVII, CF/1988). Importante ressaltar que a tendência doutrinária e jurisprudencial em entender como objetiva a responsabilidade do empregador só diz respeito aos casos de infortunística do trabalho, não atingindo os danos decorrentes da violação da privacidade do empregado.
9V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
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Não há necessidade, todavia, de publicidade do fato ou de prova do
sofrimento e dos efetivos prejuízos sofridos para a caracterização do dano moral. Isso
porque, na lição de Barros (2009, p. 652), “a responsabilidade de reparação surge tão
logo se verifica o fato da violação (damnun in re ipsa). Não cabe cogitar, por isso, de
prova do dano moral, já que não se exige do lesado a demonstração do seu
sofrimento”.
Por conseguinte, presentes o dano, o nexo de causalidade e a conduta
culposa do empregador, este deverá indenizar o empregado, por tê-lo submetido à
realização de revistas íntimas.
Nesse sentido, a jurisprudência:
RECURSO DE REVISTA. DANOS MORAIS. CANTO E DANÇA. ABUSO DE PODER. No que se refere à configuração do dano moral, de acordo com a jurisprudência pacífica, o que se exige é a prova dos fatos que ensejam o pedido de indenização, e não a prova dos danos imateriais, esta, de resto, impossível. Portanto, o dano moral verifica-se in re ipsa (a coisa fala por si). No caso, o TRT, ante a revelia e confissão quanto à matéria de fato, em face da ausência da reclamada na audiência inaugural, presumiu verdadeiras as alegações do reclamante de que: a) era obrigado a entoar gritos de guerra e a rebolar na frente dos colegas até que o superior estivesse satisfeito com o desempenho; b) a recusa a participar do procedimento implicava a inclusão na "Orientação para Melhoria", regulamentada pelo Regimento Interno; e c) poderia ser penalizado com exclusão de aumento de salário, troca ou melhoria de função, e até demissão por justa causa, caso fosse incluído em três Orientações para Melhoria. Diante desse contexto, o Regional reconheceu o dano moral e deferiu ao reclamante a respectiva indenização. Não há, pois, como se reconhecer a violação dos art. 818 da CLT e 333, I, do CPC. Ademais, decisão diversa demandaria o reexame de provas, o que é vedado pela Súmula nº 126 do TST. Recurso de revista de que não se conhece. DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. CANTO E DANÇA. ABUSO DE PODER. No caso dos autos, a fixação do montante da indenização por danos morais em quinze mil reais foi razoável e proporcional, levando-se em conta os fatos registrados pelo TRT. Não há, pois, a alegada violação dos arts. 5º, V, da CF/88 e 944 do Código Civil. Recurso de revista de que não se conhece. (TST - RR: 13681820135040304, Relator: Kátia Magalhães Arruda, 6ª Turma, Brasília/DF, 24/10/2014).
A ementa acima apresentada clarifica e necessidade apenas e tão somente
da prova do fato danoso e não a prova em si dos danos imateriais experimentados.
Ponto tormentoso, no entanto, se mostra a fixação do quantum indenizatório
devido. Isto se dá, segundo Delgado (2013), em virtude da natureza não patrimonial do
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dano moral, a qual reduz a possibilidade de se aplicar um critério objetivo e, segundo
Barros (2009, p. 656), a compensação pecuniária decorre e arbitramento do juiz.
Barros (2009, p 657), ainda, explica que não se aplica ao dano moral a
prática de tarifação prevista na Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67), como preconizado
pela Súmula 281 do colendo TST: “A indenização por dano moral não está sujeita à
tarifação prevista na Lei de Imprensa”.
Vale, ainda, observar que a fixação do quantum não poderá, de qualquer
forma, ter como parâmetro o salário mínimo, por expressa vedação constitucional
(CRFB, art. 7º, IV10).
Godinho (2013, p. 634) afirma para a fixação do montante devido deve ser
realizado um juízo de equidade pelo magistrado:
O montante indenizatório, com respeito ao dano moral (inclusive estético), é fixado pelo órgão judicante por meio de um juízo de equidade. É claro que a sensatez (equilíbrio), equanimidade, isenção, imparcialidade devem operar sempre no exercício desse juízo de equidade. (...) Tal juízo de equidade é o único que se harmoniza com a amplitude dos comandos constitucionais incidentes à situação em análise (art. 5º, V e X, art. 7º, XXVIII, CF/88).
Nem mesmo o artigo 944 do Código Civil (“A indenização mede-se pela
extensão do dano”) afasta a necessidade de um justo e equilibrado arbitramento
judicial em situações como as de dano moral (DELGADO, 2009, p. 634).
Quando do reconhecimento do fato danoso, busca-se, por meio da
responsabilidade civil, a punição daquele que de forma injusta causou prejuízo a
outrem.
Por outro lado, responsabiliza-se alguém, também, com o intuito de
persuadi-lo, convencê-lo a não mais praticar aquela conduta. Gera a responsabilidade
civil, assim, um efeito secundário, qual seja o caráter pedagógico da medida. 10 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: [...] IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim.
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Por meio da responsabilização do agente causador de uma lesão, busca-se
também tornar público que condutas semelhantes àquela praticada pelo ofensor não
serão toleradas. Pretende a responsabilidade civil, desta forma, indiretamente, atingir a
própria sociedade, atuando na esfera preventiva.
É o que defende a jurisprudência:
RECURSO ORDINÁRIO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. QUANTUM. A finalidade da reparação do dano moral aponta para duas forças convergentes. Uma, de caráter compensatório, representa a atenuação da dor; outra, possui matiz punitivo. A pena expressa em pecúnia assume relevante significado na prevenção de novos danos. É o que a doutrina denomina caráter preventivo-pedagógico da indenização por dano moral. O quantum atinente à indenização será melhor arbitrado se alcançar o perfeito equilíbrio entre a possibilidade pecuniária do ofensor e a necessidade de reparação do ofendido, de modo tal que não represente um minus em relação àquele, incapaz de fazê-lo repensar suas atitudes, e que não configure enriquecimento sem causa deste. Recurso Ordinário da primeira reclamada conhecido e não provido. (TRT-1 - RO: 8643020115010283 RJ, Relator: Marcia Leite Nery, 5ª Turma. Rio de Janeiro, 02/10/2013).
Concluímos, pois, que deve o magistrado, prudentemente, e por
arbitramento, fixar um quantum que atenda a todos esses objetivos. O valor da
indenização, deve ser tal que sirva como sanção ao empregador ofensor, evitando que
o mesmo ou outros membros da sociedade cometam novamente o ato e que seja
compensatório para a vítima.
É nesse sentido, o Enunciado 51, editado na 1ª Jornada de Direito Material
e Processual do Trabalho:
RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. CRITÉRIOS PARA ARBITRAMENTO. O valor da condenação por danos morais decorrentes da relação de trabalho será arbitrado pelo juiz de maneira equitativa, a fim de atender ao seu caráter compensatório, pedagógico e preventivo.
Todavia, ao fixar o montante indenizatório, o magistrado não deve fazê-lo
numa medida em que se verifique ser exorbitante, “a ponto de provocar
enriquecimento sem causa do beneficiado e desarrazoado dispêndio ao ofenso”
(DELGADO, 2013, p. 636). Posiciona-se igualmente Nunes (2011, p. 105):
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O valor arbitrado deve ser estabelecido na sentença, devendo ser razoável, de forma que importe sacrifício para o ofensor, porém, não signifique enriquecimento indevido para a vítima. O valor também não poderá ser tão ínfimo, a ponto de a vítima se ver duplamente ofendida, pela agressão e pela decisão que desvalorizou sua respeitabilidade, sua personalidade. Ademais, indenizações ínfimas, além de ofender a vítima, ao invés de desestimular a conduta, podem incentivá-la.
Neste toar, é importante que o juiz fixe a indenização por danos morais em
patamar adequado, a fim de que possa a vítima, no caso, o empregado, ter protegida
sua dignidade e sua intimidade ou, pelos menos, ver compensada a violação a tais
direitos.
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5 CONCLUSÃO
Como se viu, prevê a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso
X, a proteção à intimidade do individuo: “são invioláveis a intimidade, a vida privada,
a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material
ou moral decorrente de sua violação”. Tal direito, em virtude da estudada Eficácia
Horizontal Direta dos Direitos Fundamentais, pode, pacificamente, ser aplicado às
relações privadas, entre elas a relação de emprego.
A mesma Constituição Federal, no entanto, em seu artigo 5º, inciso XXII
prevê também que “é garantido o direito de propriedade”. Consoante se afirmou, é o
direito de propriedade o principal fundamento do chamado poder empregatício, que
confere ao empregador os poderes de mando, comando, gestão e direção dentro da
empresa.
No caso das revistas íntimas realizadas pelo empregador, segundo relatado,
entram em confronto os valores acima mencionados. Neste diapasão, é imprescindível
a compatibilização dessas situações antagônicas, devendo o intérprete constitucional,
com fulcro no princípio da unidade da constituição, harmonizar eventuais tensões e
contradições existentes entre suas normas. Dessa forma, necessário que se proceda a
um trabalho de ponderação, à luz do princípio da concordância prática, da máxima da
proporcionalidade e da dignidade da pessoa humana, a fim de determinar qual norma
deverá prevalecer no caso concreto.
Na situação analisada nesta Monografia, qual seja a colisão entre a
intimidade do empregado e o poder intraempresarial do empregador quando da
realização de revistas íntimas/pessoais, diante das intromissões que aquele, parte
hipossuficiente na relação, pode sofrer em suas esferas íntima e privada por parte
deste, precisa o intérprete e aplicador do direito analisar, com a devida cautela, a
amplitude e os limites de cada direito envolvido no caso concreto.
Os direitos fundamentais alcançam todas as pessoas que atuam no mercado
de trabalho, de modo que é preciso que o empregador concilie seu legítimo interesse
em defender seu patrimônio com a necessidade do indispensável respeito à dignidade
do trabalhador (NUNES, 2011).
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A partir dos argumentos apresentados, conclui-se que toda e qualquer
revista realizada pelo empregador ou seus prepostos, em seus empregados, deve ser
considerada como abusiva e violadora dos direitos fundamentais.
O estado de subordinação do trabalhador não acarreta sua sujeição ao
empregador. Desse modo, devem ser respeitados os seus direitos fundamentais, entre
eles, a intimidade.
Além disso, consoante se apresentou, não pode o poder empregatício ser
exercido de qualquer maneira, ao livre arbítrio do empregador. Existem limites a serem
respeitados, a exemplo da função social, prevista no artigo 5º, inciso XXIII, da
Constituição Federal. Ademais, deve sempre ser utilizado de forma razoável e
proporcional, a fim de atender aos interesses de toda a coletividade, e não apenas os
interesses particulares do empregador.
A dignidade da pessoa humana, núcleo axiológico do constitucionalismo
moderno e fundamento da República Federativa do Brasil, também impõe o respeito à
intimidade do trabalhador. Conforme se aduziu, sempre que se mostrar necessário
balancear princípios em conflito, o resultado deve se aproximar ao máximo da
concretização da dignidade da pessoa humana. Nessa linha de raciocínio, deverá
prevalecer o direito à intimidade, haja vista sua ligação com a dignidade da pessoa
humana.
O trabalhador merece ser protegido em sua dignidade, fazendo com que
sejam respeitados seus direitos, uma vez que ela se situa em patamar superior a
qualquer vínculo laboral.
A realização de revistas, outrossim, configura tratamento desumano ou
degradante, o qual resta vedado pelo artigo 5º, inciso III, da CF/88, além de violação
aos princípios da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVII, da CF/88), do
contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, inciso LV, da CF/88).
A submissão dos empregados a revistas íntimas e/ou pessoais pode, ainda,
acarretar discriminação no meio ambiente de trabalho, a qual é vedada pelo artigo 3º,
inciso IV, da CF/88 e pelas Convenções nº 100 e nº 111 da OIT, ambas ratificadas pelo
Brasil.
82
Conforme se estudou, caso suspeite de seu empregado, prudente que o
empregador procure a autoridade policial competente, e não simplesmente o submeta a
revistas, pois, nesse caso, estaria a tratar de forma desigual os iguais. A prática de
revistas representa verdadeira atividade de polícia privada, não atribuída à pessoa do
empregador.
Além disso, com vistas a proteger seu patrimônio, pode o empregador fazer
uso de recursos tecnológicos, a exemplo de câmeras de vigilância e detectores de
metais.
A desconfiança não condiz com a fidúcia inerente à relação empregatícia.
Não pode o ambiente de trabalho se tornar um local de desconfiança generalizada.
Dessa forma, não devem as revistas ser realizadas pelo empregador, sob pena de
desestabilização das relações laborais.
Também não se mostra possível, como se observou, a realização de revistas
pré-ajustadas em contrato individual ou norma coletiva, ante a indisponibilidade do
direito à intimidade do empregado e da dignidade da pessoa humana. Pelo mesmo
motivo, também não se aceitam as revistas realizadas por pessoas do mesmo sexo do
empregado revistado ou sem seus bens e objetos pessoais.
Desse modo, constata-se que, na ponderação entre direito à intimidade e
direito de propriedade, prevalecerá o primeiro, razão pela se entendeu como incabível
a realização de revistas em quaisquer hipóteses.
Atualmente, considera-se o trabalho um alicerce da civilização humana,
revelando-se fator de dignidade para o ser humano. É por meio do trabalho que o
homem desenvolve sua identidade social, identificando-se como ser humano
consciente e capaz de participar da dinâmica da vida em sociedade (NUNES, 2011).
Deve, assim, ser visto como fonte de realização moral, material e espiritual
do empregado, e não como mero fator produtivo, em que se dá maior importância ao
patrimônio do empregador do que à dignidade da pessoa humana (NUNES, 2011).
Sendo assim, a fim de cumprir sua função social, é imprescindível que o
trabalho seja desenvolvido em um ambiente saudável e longe de pressões que possam
trazer desconforto e constrangimentos ao trabalhador, a exemplo das revistas íntimas e
pessoais.
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Ante todo o exposto, assume-se a postura no sentido de não serem
permitidas a realização de revistas íntimas e pessoais pelo empregador. No entanto,
impende asseverar que, violadas a intimidade e da dignidade do empregado, este faz
jus a uma justa indenização, em virtude dos danos morais experimentados, além de ser
possível a rescisão indireta do contrato de trabalho.
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REFERÊNCIAS
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