URÂNIO EM NISA - UM TESOURO ENVENENADO

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  • 8/6/2019 URNIO EM NISA - UM TESOURO ENVENENADO.

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    -URNIO EM NISA:UM TESOUROENVENENADO

    [Ambiente]

    Textongela MendesFotografia e IlustraoTeresa Ponte

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    Portugal deixou de extrair urnio em 2001.Esta indstria deixou um rasto de crimesambientais e de doena, que continua a servisvel e a influenciar a vida das populaeslocais. Mas desde 2004 que a cotao dominrio est em alta, impulsionada pela anunciadaescassez de petrleo e pelo crescimento da

    procura de energia nuclear, tendo o seu preotriplicado desde 2000, voltando a exploraode urnio a revelar-se atractiva para as grandesempresas multinacionais.O urnio em Nisa no uma descoberta recente,no entanto, s voltou a estar em cima da mesaquando, em 2005, as empresas IBERIAN Resourcese o Grupo Narcea, em conjunto com outras duasmultinacionais de capitais australianos, pediram aogoverno portugus para fazerem prospecode urnio em Nisa.Da proposta apresentada, na sequncia daprospeco realizada no Monte Claro, constam5 exploraes a cu aberto, sendo trs delas

    de grande dimenso. A explorao prolongar-se-ia por um perodo de 6 a 8 anos e criaria 70postos de trabalho. Um dos locais de exploraoficaria a apenas 2 quilmetros de Nisa, outroperto do rio Tejo e ainda um outro perto dabarragem de Pvoa e Meadas.Num concelho conhecido pela sua enormebeleza natural, parte integrante do GeoparkNaturtejo - uma estrutura nica e que tem vindoa fazer uma aposta no turismo de qualidade, cujoexpoente mximo so as recentementeinauguradas termas da Fadagosa - a mineraode urnio poria em riscos os investimentos jfeitos e as perspectivas de futuro das

    populaes locais.Foi com o intuito de lutar contra esta ameaaque surgiu o MUN. O Movimento Urnio emNisa No, define-se como uma plataforma dedilogo, da qual fazem parte vrias associaes,cujo objectivo principal impedir que sejaefectivamente explorado urnio no concelho

    de Nisa.Paulo Bagulho, um dos porta-vozes do MUN,define o movimento como uma plataforma,entre pessoas e entre associaes com interessesno concelho, nomeadamente o verdadeirodesenvolvimento do concelho e a luta contraa explorao de urnio.

    A luta contra a explorao de urnio no concelhode Nisa no um assunto recente e leva j maisde uma dcada. Na altura, o preo do urniono estava to alto como actualmente, o damatria-prima em si era bastante mais baixa.Passada uma dcada, e com o aumento dopreo, d-se novamente o interesse dasgrandes multinacionais em vir explorar estajaziga. Isso fez despoletar outra vez o protestodos cidados do concelho, que j tinham ditoque no a esta explorao anteriormente.Neste momento contamos com mais alguns

    1 Tendo sofrido vrias alteraes ao longo dos sculos, a Sinagogafoi recuperada e inaugurada no passado a 11 de Abril, como ncleomuseolgico. Expe peas arqueolgicas que ajudam a compreendero percurso da comunidade judaica.

    No subsolo da regio de Nisaencontra-se 60% do urnioinexplorado do Norte Alentejo.Tendo em conta a cotao actual dominrio nos mercados internacionais,trata-se de uma quantia de 75milhes de euros, com perspectivasde valorizao. Mas se a perspectivaeconmica pode ser aliciante, afrieza dos nmeros perde foraquando se coloca no outro pratoda balana os impactos ambientais

    e a sade pblica. Este umtesouro envenenado.

    membros, e convocamos aqueles que de inciotinham comeado esta luta. E de uma formaespontnea surgiu algum que disse MUN, noqueremos., como explica Paulo Bagulho,reforando que este um tema nuncaencerrado e que recorrentemente, conforme asituao dos mercados, volta a estar na agenda.

    O MUN afirma-se como um conceito, um conjuntode pessoas que lutam pelo desenvolvimentosustentvel do concelho. E que afirmamperemptoriamente que a explorao de urniono o caminho. Consideram-se um movimentototalmente apartidrio, e assim desejam continuar,apesar de, e como salienta Paulo Bagulho svezes isso ser difcil, porque as pessoas temligaes polticas. Basta o Francisco Louapoiar-nos, ou elementos de outras formaespartidrias e surgem logo conotaes. H umaluta enorme da parte do movimento para clarificaressa situao. Neste movimento existemprioritariamente pessoas, e a grande maioria

    delas no tem vontade poltica sobre o assuntoou vontade de o colocar duma forma poltica.O tema Urnio em Nisa No, e independentementeda cor poltica que cada membro tenha, estamosde acordo sobre este aspecto.Uma das aces visveis do MUN tem sido oapoio dado pelo movimento causa dos mineirosdas antigas minas da Urgeiria. Na Urgeiria foidescoberta primeiro a jaziga, foi intervencionadanuma altura em que no existia um grandeconhecimento sobre as questes ligadas radioactividade e ligadas contaminaoinerente lexiviao e todo o processo detratamento do urnio. Neste momento aquela

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    como de turismo de sade, como projectotermal, com os percursos pedestre que possui,com o seu Tejo, com a entrada no Geopark...75 milhes de euros so uma nfima parte doPIB, pouco mais de 0, 3% e estamos a falar de75 milhes de euros divididos por 8 ou 10 anosde explorao. Isto diludo no PIB nacional uma gota de gua. Que nem sequer serve parajustificar o que nos querem fazer.Os pontos de explorao localizar-se-iam entreNisa e Monte Claro, entre Castelo de Vide e abarragem do Poio e outro ponto localizado nazona das termas. Todo o concelho ficaria minado,inviabilizando investimentos j feitos eprojectos futuros.Para alm das trs a cinco crateras a cuaberto, com trinta metros de profundidade evrias dezenas de metros de dimetro, para oMUN a nica coisa que a explorao de urniopode trazer para o concelho litros e litrosno solo de cido sulfrico usado para fazer o

    enriquecimento do urnio e poeira radioactivano ar durante os anos de explorao activa.Para alm disso, os nossos cursos de guapassam perto das zonas de explorao, e soescassos. Todos esses pequenos cursos degua que sero afectados vo desaguar aoTejo, que ir ficar ainda com mais metaispesados. No apenas a questo do urnio,ao fazer-se o rasgamento do solo coloca-seem contacto com a chuva outro tipo demetais pesados, o resultado da lexiviao quevai ocorrer. Chumbos e alumnios vo serarrastados para o Tejo. E o Tejo no faz s

    parte do concelho de Nisa, patrimnioNacional. Perante todos estes dados, a nica respostapara que continue a haver apoiantes para estacausa parece ser a falta de informao ouinteresses econmicos, que nada se preocupamcom o meio ambiente ou com as populaeslocais. por isto que esta ideia surgiu, paraque a chama no se apague, sublinha PauloBagulho, porque esta espada de Damcles irestar sempre sobre as nossas cabeas.Dizem-nos que importante explorar o urnio,porque isso benfico para o pas, porque cria

    emprego numa regio em que h muitanecessidade de trabalho.Quem defende ento esta explorao?Segundo o MUN, so as multinacionais queexercem presso. Mas h tambm estruturas,como o Ministrio da Economia, que definemquais os recursos que tem valor econmico, eeste um deles. E so pessoas que no estopreocupadas com a questo ambiental. Sepensarmos em toda a regio envolvente, serodezenas de milhar de pessoas que podero serdirectamente afectadas com a explorao deurnio aqui em Nisa.

    As jazigas esto colocadas no corao doconcelho, ao p dos seus habitantes. Da jazigade Monte Claro avista-se Monte Claro e Nisa.Portanto, todos os desperdcios iriameventualmente passar pelos nossos cursos degua e ir parar ao Tejo. Alm disso, o urnio oxidado, e depois transportado daqui jcomo xido de urnio. Nada seria feito aqui ano ser essa operao, atravs de camiescisterna que iriam circular pelo pas, carregadosde xido de urnio. E haver sempre apossibilidade de um acidente com um veculodestes, e um extravasamento de milhares delitros de xido de urnio. Se isso acontecer, oxido pode entrar nos solos, nos cursos degua. A probabilidade de isso acontecer podeser reduzida, mas se os camies nocircularem, ento essa probabilidade ser nula.A questo do urnio algo que no podemosdissociar da questo que a energia nuclear.Para Paulo Bagulho, estamos a ir na direco

    errada. O paradigma do petrleo existe htantos anos e j se chegou concluso queteremos de o substituir, recorrendo-se paraisso a uma srie de energias alternativas. Noconcordo que a energia nuclear seja uma delas.Teremos de conseguir substituir o petrleo porenergias suficientemente limpas e que sejamefectivamente alternativas, mas o nuclear apenas outro paradigma, o sermos sustentadospor uma energia que partida parece limpa,mas que na realidade no o . No o porqueproduz resduos a seguir sua utilizao nascentrais nucleares. At acontecer o desastre

    Esta uma questo pertinente. Valerafinal a pena avanar para a exploraode urnio, tendo em conta a pesadafactura que nos deixar para o futuro?

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    em Chernobyl, toda esta situao estavaencoberta e dizia-se que era impossvelacontecerem esses acidentes. Porque que seest a aumentar o nmero de centrais e a

    explorao de urnio? Est-se a ir por umcaminho que pode ser extremamente complicadode resolver para as geraes futuras. esta amudana de paradigma que se nos pe, maisuma razo que nos leva a combater a questodo urnio em Nisa.Este um assunto que por enquanto estarrumado na gaveta, mas Paulo Bagulho ressalva:j tentmos diversas vezes ouvir a opinio dogoverno, mas no obtivemos nenhuma resposta,nem positiva nem negativa. Para j, no se pensaem avanar com o processo, sabemos apenasque os dossiers esto preparados para se lanarum concurso. Se isso acontecer, ser mais difcil

    travar a explorao. Temos pretendido e no temosconseguido discutir o assunto no Parlamento.Antes das eleies a altura seria ideal para seabordar o assunto, mas no sei se o conseguiremos.Temos feito questo de explicar populaoo que defendemos. Vamos s escolas, levamosinformao detalhada, fazemos algumas palestras.Infelizmente, estamos numa regio onde aspessoas no se envolvem nos assuntos. E no seenvolvendo, no procurando informao, maisfacilmente se aceita a informao que se recebepela primeira vez. Essa a razo para as palestrasque fazemos, o tentar passar a nossa mensagem.Fizemos tambm a Marcha da Indignao at zona da prospeco entre Nisa e o Monte Claro,chamando a ateno da populao.O MUN funciona assim como um vigilante, umabase de discusso e de clarificao de ideias.Porque s opinies esclarecidas podem avaliarcom clareza os riscos que a explorao deurnio comporta e, principalmente, perceber seas mais-valias econmicas podem compensartodos os malefcios inerentes.No necessrio estar sempre a realizaractividades contra a explorao do urnio, o que necessrio termos sempre uma chama acesa,para o dia em que for necessrio atear a fogueirae continuar a luta, Conclui Paulo Bagulho.

    ConversoDepois de modo o minrio, extradoo xido de urnio concentrado (yellowcake) atravs de um processo qumico.A seguir, o urnio (U308) transformadonum gs corrosivo, o hexaflureto deurnio (UF6).

    Extraco

    Bomba nuclear

    Central deenergia nuclear

    CICLO DE EXTRACO DO URNIO

    Mina superfcie

    Depsito deminrio deurnio

    Filtragem no local

    Mina superfcie

    EnriquecimentoO gs hexaflureto de urnio contm uma relaode istopo e do U-235 de 0,7 para 99,3 por cento,respectivamente. O processo de enriquecimentofaz-se com o objectivo de concentrar ou aumentar

    a quantidade de istopo U-235, capaz de fissonuclear, o processo pela qual a energia produzida

    num reactor nuclear. Normalmente atigem-seconcentraes de istopo U-235 entre os 3,5 e 5

    por cento.

    EFEITOS DA RADIOACTIVIDADE NA

    SADE DAS POPULAESEm Portugal, o caso da mina da Urgeiria o mais flagrante. Aps o encerramento damina em meados da dcada de 90, mais de115 operrios faleceram com doenas doforo oncolgico. Um estudo realizado naregio comprovou que a populao,

    passada dcada e meia, continua a apresentardiminuio das funes da tiride, diminuioda capacidade reprodutiva e diminuio dosglbulos vermelhos, brancos e plaquetas.Est provado que a exposio radiao,mesmo que seja a baixos nveis, implica umaelevada taxa de mortalidade infantil, doenascrnicas nos pulmes, pele e olhos. Tem

    tambm implicaes graves na sade

    reprodutiva, gerando fetos commalformaes. A radioactividade pode aindaprovocar alteraes do nosso cdigogentico, que se perpetua por geraes. largamente conhecida a relao entre aexposio radioactividade e oaparecimento de doenas oncolgicas.

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