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LABORATÓRIO DE ENSINO E PESQUISA EM USINAGEM FACULDADE DE ENGENHARIA MECÂNICA UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA USINAGEM DOS METAIS Prof. Álisson Rocha Machado, PhD. Prof. Marcio Bacci da Silva, PhD. 8ª. versão, Abril de 2004

Usinagem Dos Metais - Machado e Da Silva - 2004

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LABORATÓRIO DE ENSINO E PESQUISA EM USINAGEM

FACULDADE DE ENGENHARIA MECÂNICA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

USINAGEM DOS METAIS

Prof. Álisson Rocha Machado, PhD. Prof. Marcio Bacci da Silva, PhD.

8ª. versão, Abril de 2004

Universidade Federal de Uberlândia Faculdade de Engenharia Mecânica

LLEEPPUU -- LLaabboorraattóórriioo ddee EEnnssiinnoo ee PPeessqquuiissaa eemm UUssiinnaaggeemm

Álisson Rocha Machado, PhD

Professor

Campus Santa Mônica, Bloco 1M - CEP 38408-100 - Uberlândia/MG, Brasil Fone: (0**34) 3239 4148 Ramal: 217 Fax: (0**34) 3239 4206 E-mail:

[email protected]

Márcio Bacci da Silva , PhD

Professor

Campus Santa Mônica, Bloco 1M - CEP 38408-100 - Uberlândia/MG, Brasil Fone: (0**34) 3239 4148 Ramal: 239 Fax: (0**34) 3239 4206 E-mail:

[email protected]

P R E F Á C I O

A idéia de realizar este trabalho surgiu após o meu retorno da Inglaterra em 1990, onde, durante os 4 anos anteriores, desenvolvi um programa de doutorado no Manufacturing Group da University of Warwick na cidade de Coventry, sob a orientação do prof. Dr. James Wallbank, mesmo pesquisador que veio mais tarde orientar também o prof. Marcio Bacci da Silva, com doutorado concluído em outubro de 1998. Assim que reassumi o posto de professor na Universidade Federal de Uberlândia, responsável pela disciplina de Usinagem na graduação em Engenharia Mecânica e uma outra similar na pós-graduação, senti muita dificuldade de continuar adotando o clássico livro “Fundamentos da Usinagem dos Metais” do saudoso prof. Dr. Dino Ferraresi, que até então era o insubstituível livro texto da disciplina. Esta obra continua sendo uma das mais valiosas referencias sobre o assunto de usinagem convencional na língua Portuguesa. Entretanto, ele foi elaborado no final da década de 60 e editado no início da década seguinte pela Editora Edgard Blücher Ltda. Mais de 30 anos, portanto, já se passaram, e neste período, novas técnicas e métodos de investigação foram desenvolvidos e importantes contribuições científicas foram publicadas. Os principais conceitos apresentados na obra do Prof. Ferraresi não mudaram, mas muito se aprendeu neste período e estes conceitos foram enriquecidos e, possivelmente, tornaram-se mais compreensíveis. Além disto, tópicos como materiais de ferramentas e fluidos de corte tiveram e vem tendo avanços tecnológicos consideráveis nos últimos anos o que exige constante atualização. Aproveitando parte de uma grande revisão bibliográfica que havia feito na Inglaterra no final da década de 80 e tendo como base conceitual os trabalhos do Dr. Trent, orientador de doutorado do prof. Wallbank e autor do livro “Metal Cutting”, editado pela Butterworths – Londres, já na sua terceira edição de 1991, considerado por mim a “Bíblia” dos profissionais da usinagem, resolvi então produzir algumas notas de aulas que, juntamente com as contribuições do Prof. Marcio Bacci da Silva se tornaram mais tarde este modesto trabalho. Desde o original de 1993, várias correções foram feitas. Na realidade, a cada nova impressão, corrigimos erros de ortografia e tentamos melhorar a redação. Nesta edição, a grande mudança está no capítulo 10 - Materiais para Ferramentas de Corte. O texto foi totalmente substituído, apresentando uma abordagem mais completa sobre o assunto, que na opinião dos autores, é a parte que mais se desenvolve com o avanço tecnológico.

Devo citar que experiências práticas obtidas com profissionais da área substituiram muitas horas de estudo e consulta, que contribuíram sobremaneira pela fidelidade de informações apresentadas. Entre eles, destaca-se o dinamismo e a perspicácia dos Engos Antônio Maria de Souza Júnior da Fiat Automóveis S/A; Achille Sotírios de Liambos Júnior da Shell do Brasil S/A e Francisco Carlos Marcondes e João Carocela, da Sandvik do Brasil S/A, Prof. Marcus Antonio Viana Duarte (UFU), Prof. Gilmar Guimarães (UFU), Prof. Alexandre Mendes Abrão (UFMG) e Prof. Anselmo Eduardo Diniz (Unicamp).

Agradeço muito a contribuição do técnico do LEPU – Laboratório de Ensino e Pesquisa em Usinagem da Universidade Federal de Uberlândia, Reginaldo Ferreira de Souza, responsável pela elaboração prática de todas pesquisas ali desenvolvidas que contribuíram para o enriquecimento de formação de idéias.

Trabalho importante, também, tiveram a Srta. Maria das Graças Daud, na primeira edição deste texto e os técnicos desenhistas Márcio Mellazo e Júlio C.R. Ferreira na reprodução em AutoCAD de grande parte das figuras apresentadas.

Finalmente, mas nunca menos importante foram as contribuições dos meus alunos e ex-alunos de graduação e pós-graduação. Todos, sem restrições, têm uma parcela de responsabilidade por este trabalho. Não poderia deixar, entretanto, de citar alguns nomes, pois eles foram responsáveis diretos por parcelas de diferentes conteúdos e informações aqui contidas. São eles Wisley Falco Sales, Marcelo Ferreira Motta, Jalon de Morais Vieira, Anderson Clayton Alves de Melo, Estevam Marcos de Souza, Júlio Romero Santos Fernandes, Eurípedes Barsanulpho Luz Júnior e Marcelo Fonseca Barbosa. Este último ainda foi responsável pelo árduo trabalho de editoração e diagramação desta apostila, tarefa executada com perfeição.

Prof. Álisson Rocha Machado

30.03.99

U S I N A G E M D O S M E T A I S

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 1

2. GRANDEZAS FÍSICAS NO PROCESSO DE CORTE ......................................... 7

3. NOMENCLATURA E GEOMETRIA DAS FERRAMENTAS DE CORTE ........... 16

4. FORMAÇÃO DO CAVACO ................................................................................ 38

5. CONTROLE DE CAVACO .................................................................................. 49

6. A INTERFACE CAVACO - FERRAMENTA ....................................................... 58

7. FORÇA, PRESSÃO ESPECÍFICA E POTÊNCIA DE USINAGEM .................... 79

8. TENSÕES E DEFORMAÇÕES EM USINAGEM ................................................ 90

9. TEMPERATURA DE CORTE ............................................................................. 95

10. MATERIAIS PARA FERRAMENTAS DE CORTE............................................ 108

11. DESGASTE E MECANISMOS DE DESGASTE DAS FERRAMENTAS DE

CORTE .............................................................................................................. 165

12. VIDA DA FERRAMENTA E FATORES QUE A INFLUENCIAM ...................... 206

13. FLUIDOS DE CORTE ....................................................................................... 211

14. INTEGRIDADE SUPERFICIAL ......................................................................... 222

15. ENSAIOS DE USINABILIDADE ....................................................................... 234

16. CONDIÇÕES ECONÔMICAS DE CORTE ....................................................... 240

17. CONSIDERAÇÕES AO MATERIAL DA PEÇA ................................................ 248

1

C A P Í T U L O 1

INTRODUÇÃO

“Usinagem” é um processo de fabricação. Mas o que é fabricação e qual a sua importância? A maioria dos livros especializados da área define: Fabricar é transformar matérias primas em produtos acabados, por vários processos, seguindo planos bem organizados em todos os aspectos. A importância da fabricação pode ser melhor entendida ao observarmos que todos os objetos culturais, ao nosso redor, têm formas e dimensões diferentes, com raríssimas exceções. Além disso, todo objeto é feito de um ou mais materiais e é transformado em produto acabado por uma larga variedade de processos. Portanto, não é nenhuma surpresa que nos países industrializados a fabricação compreende um terço do produto interno bruto [1] (valor de todos os produtos e serviços produzidos). A fabricação é utilizada desde o início da civilização, com a produção de vários artigos de madeira, pedra, cerâmica, barro e metal. Houve muito desenvolvimento com o passar dos anos, e nos dias atuais uma grande quantidade de materiais e processos estão disponíveis, para fabricar produtos que variam desde um simples componente, como uma esfera de aço, até produtos altamente sofisticados, como computadores, automóveis e aeronaves supersônicas.

Para se ter uma idéia do número de fatores que devem ser considerados num processo de fabricação Kalpakjian [1] usou o exemplo da produção de um simples artigo: o clipe. Primeiro ele deve ser projetado para atender o requisito funcional que é segurar folhas de papéis juntas. Para tanto, ele deve exercer uma força suficiente para evitar o deslizamento de uma folha sobre a outra. Eles são, geralmente, feitos de arame de aço, embora hoje se encontra no mercado clipe de plástico. O comprimento do arame requerido para sua fabricação é cortado e então dobrado várias vezes, para dar a forma final própria. Por sua vez, o arame é feito por um processo de trefilação a frio. Neste processo a seção transversal de uma haste longa é reduzida, ao passar por uma matriz de fieira, que também confere algumas propriedades mecânicas ao material, como resistência e dureza. A haste por sua vez, é obtida por processos como a trefilação e a extrusão de um lingote. Para evitar delongas, nenhuma informação quanto ao processo de obtenção deste lingote será abordada. A fabricação de um simples clipe envolve projeto, seleção de um material adequado e seleção de um método de fabricação para atender os requisitos de serviço do artigo. As seleções são feitas não somente com base em requisitos técnicos, mas também com base nas considerações econômicas, para minimizar os custos para que o produto possa ser competitivo no mercado.

O projetista de produtos ou engenheiro projetista, especifica formas e dimensões do produto, sua aparência, e o material a ser usado. Primeiro são feitos os protótipos do produto. Neste estágio, é possível fazer modificações, tanto no projeto original como no material selecionado, se análises técnicas e/ou econômicas assim indicarem. Um método de fabricação apropriado é então escolhido pelo engenheiro de fabricação. A Figura 1.1 mostra um diagrama do procedimento correto para se chegar à etapa de fabricação.

2

Fabricação

Desenho

Avaliação Final

Revisão do Projeto ão

Avaliação

Teste do Protótipo

Modelos Físicos e Analíticos

Análise do Projeto

Projeto do conceito

Conceito Original

Necessidade do Produto

Especificação do Material; Seleção do Processo de Fabricação e de Equipamentos; Projeto e Construção de Ferramentas e Matrizes

Figura 1.1. Diagrama mostrando o procedimento requerido para o projeto de um produto, que são etapas que antecedem a fabricação.

A seleção do material requer conhecimentos dos requisitos funcionais e de serviço do produto, e dos materiais disponíveis para preencher estes requisitos. O tratamento deste assunto requer um passeio nas propriedades dos materiais e envolve também considerações de custo, aparência, acabamento superficial, resistência à corrosão etc., que foge do escopo prático deste curso, e portanto não serão aqui abordados. Uma vasta bibliografia [1 - 4] porém, está disponível sobre o assunto.

Nos processos de fabricação, geralmente, haverá mais de um método que poderá ser empregado para fabricar um componente. A seleção de um método particular sobre outros vai depender de um grande número de fatores. Além disto, o produto final, geralmente, é o resultado de muitos processos diferentes. Na seleção do processo, os seguintes fatores devem ser considerados [1]:

· Tipo do material e suas propriedades. · Propriedades finais desejadas. · Tamanho, forma e complexidade do componente. · Tolerâncias e acabamento superficial requeridos. · Processo subsequente envolvido. · Projeto e custo de ferramental; efeito do material na vida da ferramenta ou matriz. · Sucata gerada e seu valor. · Disponibilidade do equipamento e experiências operacionais. · “Lead time” necessário para iniciar produção. · Número de partes requeridas e taxa de produção desejada.

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· Custo total de processamento.

O engenheiro responsável, portanto, tem que ter grande conhecimento dos processos e dos materiais envolvidos. Características específicas de cada processo podem ser encontradas em [1,2,5]. É evidente que a fabricação de um produto, seja ele um clipe, uma lâmpada, uma calculadora ou um automóvel, além de conhecimentos de projeto, materiais e processos, requer também grande interação entre os diversos setores dentro da empresa. E quanto mais complexo o produto, maior a necessidade de comunicação entre eles.

Um fato que não se pode deixar de registrar é a utilização de computadores nos dias atuais, em todas as etapas da manufatura. A automatização dos processos de fabricação nos leva hoje aos mais sofisticados “Sistemas Flexíveis de Manufatura” – FMS (Flexible Manufacturing System), CAD (Computer Aided Design – Projeto Assistido por Computador), CAM (Computer Aided Manufacturing – Fabricação assitida por Computador), CAE (Computer Aided Engineering – Engenharia Assistida por Computador), CAPP (Computer Aided Process Planning – Planejamento do Processo Assistido por Computador), CBS (Computer Business Systems – Sistemas de Negócios Computadorizados), CIM (Computer Integrated Manufacturing – Fabricação Integrada por Computador), entre outras, que são siglas bastante populares que têm como característica comum, o emprego do computador, eliminando falhas comuns do passado e aperfeiçoando e automatizando as várias etapas de um processo produtivo.

No meio deste processo existem as máquinas com comando numérico, NC (Numerical Control – Controle Numérico), CNC (Computer Numerical Control – Controle Numérico Computadorizado) e DNC (Direct Numerical Control – Controle Numéico Direto), que podem fazer parte de um sistema CAM. O emprego dessas máquinas revolucionou o processo produtivo, tendo impactos nos materiais de ferramentas, projetos de máquinas, mão de obra, qualidade do produto final e custos de fabricação. Entretanto, a discussão detalhada desses sistemas foge dos objetivos deste curso e aprofundamento do assunto é encontrado em [6].

A Figura 1.2 mostra a classificação dos processos de fabricação, destacando a USINAGEM.

Ao observar esta Figura uma definição simples de usinagem pode ser gerada: “Processo de fabricação com remoção de cavaco”. Na realidade, ao consultar a bibliografia, diferentes definições de usinagem serão encontradas. Uma bastante abrangente é a seguinte [7]: “Operação que ao conferir à peça a forma, ou as dimensões ou o acabamento, ou ainda uma combinação qualquer destes três itens, produzem cavaco”. E por cavaco entende-se [7]: “Porção de material da peça, retirada pela ferramenta, caracterizando-se por apresentar forma geométrica irregular”.

A usinagem é reconhecidamente o processo de fabricação mais popular do mundo, transformando em cavacos algo em torno de 10% de toda a produção de metais, e empregando dezenas de milhões de pessoas em todo o mundo [8].

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Processos deFabricação

· SEM remoçãode cavaco

· Conformação

· Outros

· Fundição· Soldagem· Metalurgia do pó

· Laminação· Extrusão· Trefilação· Forjamento· Estampagem

· COM remoçãode cavaco

· USINAGEM

· Não-Convencional

· Jato d’água· Jato abrasivo· Fluxo abrasivo· Ultrasom· Eletroquímica· Eletroerosão· Feixe de elétrons· Laser· Plasma· Química· Fotoquímica

etc......

· Convencional

· Torneamento· Fresamento· Furação· Aplainamento· Mandrilamento· Serramento· Brochamento· Roscamento· Retificação

etc......

Figura 1.2. Classificação dos processos de fabricação.

Apesar desta popularidade, trata-se, ainda, de um processo bastante imprevisível e a definição paradoxal que se segue, relata com precisão toda a sistemática que envolve o mesmo: “É um processo, complexo e simples ao mesmo tempo, onde se produzem peças, removendo-se excesso de material, na forma de cavacos”. É “complexo” devido às dificuldades em se determinar as imprevisíveis condições ideais de corte. É “simples” porque, uma vez determinadas as condições ideais de corte, o cavaco se forma corretamente, dispensando qualquer tipo de ação especial do operador. As condições ideais de corte consistem de: (1) material e geometria adequada da ferramenta de corte; (2) velocidade de corte e avanço adequados para uma profundidade de corte pré-determinada; (3) fluido de corte adequado; tudo isto para ser usado em uma máquina-ferramenta pré-escolhida, para usinar um determinado material. Estas condições ideais de corte são aquelas capazes de produzir peças dentro de especificações de forma, tamanho e acabamento ao menor custo possível.

Usinagem tem ainda a peculiaridade de ser um processo essencialmente prático, envolvendo um número de variáveis bastante grande. Shaw [9] resume o problema da seguinte maneira “. É praticamente impossível PREVER a performance no corte dos metais. Entretanto, isto não quer dizer que estudos detalhados dos processos de usinagem não têm valor. Cada ponto fundamental que é detalhadamente estudado e propriamente interpretado contribui para o

5

ENTENDIMENTO do processo, e entendimento é o passo mais próximo da capacidade de prever”.

A seguir, um exaustivo número de definições se faz necessário, nos capítulos: “Grandezas Físicas no Processo de Corte” e “Nomenclatura e Geometria das Ferramentas de Corte”, para compreensão dos capítulos subsequentes, que são: “Formação do Cavaco”, “A Interface Cavaco-Ferramenta”, “Força, Pressão Específica e Potência de Usinagem”, “Tensões e Deformações em Usinagem”, “Temperaturas de Corte”, “Materiais para Ferramentas de Corte”, “Desgaste e Mecanismos de Desgaste das Ferramentas de Corte”, “Vida da Ferramenta e Fatores que a Influenciam”, “Fluidos de Corte”, “Integridade Superficial”, “Ensaios de Usinabilidade”, “Condições Econômicas de Corte” e “Considerações ao Material da Peça”.

Sem dúvidas a abordagem de todos esses tópicos faz deste curso um dos mais completos sobre a usinagem dos materiais metálicos. As maneiras que serão tratadas esses tópicos têm como objetivo oferecer informações suficientes para que o engenheiro ou o técnico de usinagem possa compreender de maneira simples, complicadas teorias sobre o processo de usinagem. O entendimento de tópicos importantes, como: O Mecanismo de Formação do Cavaco, Geração de Calor e Distribuição de Temperatura, Forças de Usinagem e Desgaste das Ferramentas de Corte, coloca o técnico de Usinagem estimulado e seguro nas tomadas de decisões para melhoria do processo produtivo. Pelo menos, este é o maior objetivo deste curso. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. KALPAKJIAN, S. “Manufacturing Processo for Engineering Materials”. Addison-Wesley Publixhing Company, 1985, 839 pags, ISBN 0-201-11690-1.

2. DE CARMO, E.P.; BLACK, J.T. and KOHSER, R. “Materials and Process in Manufacturing”, Macmillan Pub. Com., New york, 7th edition, 1988, 1172 pages, ISBN 0-02-946140-5.

3. ASKELAND, D.R. “The Science and Engineering of Materials”, PWS Publishers, USA, 1984, 748 pages, ISBN 0-534-02957-4.

4. CHIAVERINE, V. “Aços e Ferros Fundidos”, ABM, São Paulo, 4a edição, 1979, 504 pags.

5. LINDBERG, R.A. “Processes and Materials of Manufacture”, Allyn and Bacon, USA, 4th edition, 1990, 864 pags, ISBN, 0-205-12031-8.

6. GROOVER, M.P. “Automation, Production Systems, and Computer Integrated Manufacturing”, Prentice Hall Int., Ed., USA, 1987, 808 pags, ISBN 0-13-054610-0.

7. FERRARESI, D. “Fundamentos da Usinagem dos Metais”, Editora Edgard Blücher Ltda, São Paulo, 1970, 751 pags.

8. TRENT, E.M. “Metal Cutting” 2nd Edition, Butterworths, ISBN 0-408-10856, 245 pags.

9. SHAW, M.C. “Metal Cutting Principles”, Oxford University Press, 1984, ISBN 0-19-859002-4, 594 pags.

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C A P Í T U L O 2

GRANDEZAS FÍSICAS NO PROCESSO DE CORTE

2.1. INTRODUÇÃO

O princípio usado em toda máquina ferramenta para se obter a superfície desejada é providenciar um movimento relativo apropriado entre a peça e a ferramenta, escolhida adequadamente. Assim, para o estudo da usinagem é necessário a definição das grandezas físicas no processo de corte.

A norma ABNT NBR 6162/1989 — Movimentos e Relações Geométricas na Usinagem dos Metais – Terminologia [1], trata justamente destes conceitos. A seguir são apresentadas algumas definições básicas baseadas nesta Norma.

Os conceitos se referem a um ponto genérico da aresta cortante, dito “Ponto de Referência”. Nas ferramentas de barra este ponto é fixado na parte da aresta cortante próximo à ponta da ferramenta. 2.2. MOVIMENTOS

Os movimentos no processo de usinagem são movimentos relativos entre a peça e a aresta cortante. Se referem à peça considerada parada.

Devem se distinguir dois tipos de movimentos, os que causam diretamente a saída de cavaco e os movimentos que não tomam parte diretamente na retirada de cavaco. Movimentos que causam diretamente a saída do cavaco

· Movimento de Corte: movimento entre a peça e a ferramenta, o qual sem o movimento de avanço origina somente uma única retirada de cavaco.

· Movimento de Avanço: movimento entre a peça e a ferramenta, o qual juntamente com o movimento de corte origina retirada contínua de cavaco.

· Movimento Efetivo: movimento resultante dos movimentos de corte e avanço, realizados ao mesmo tempo.

Movimentos que não tomam parte direta na formação do cavaco

· Movimento de Aproximação: movimento entre a peça e a ferramenta, com a qual a ferramenta, antes da usinagem, é aproximada à peça.

· Movimento de Ajuste: movimento entre a peça e a ferramenta para se determinar a espessura de material a ser retirada (ou a profundidade de corte).

· Movimento de Correção: movimento de correção entre a peça e a ferramenta para se compensar o desgaste da ferramenta, ou outra variação.

· Movimento de Recuo: movimento entre a aresta de corte e a peça, com o qual a ferramenta, após a usinagem, é afastada da peça.

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2.3. DIREÇÕES DOS MOVIMENTOS

Deve-se distinguir as direções dos movimentos que causam diretamente a retirada de cavaco.

Direção de Corte: direção instantânea do movimento de corte. Direção de Avanço: direção instantânea do movimento de avanço. Direção Efetiva: direção instantânea do movimento efetivo de corte.

Definições análogas são válidas para os movimentos que não causam a retirada de cavaco diretamente.

As Figuras 2.1, 2.2 e 2.3 ilustram essas direções para o torneamento, furação e fresamento, respectivamente.

Figura 2.1. Direção dos movimentos de corte, de avanço e efetivo, no torneamento.

Figura 2.2. Direção dos movimentos de corte, de avanço e efetivo, na furação.

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Figura 2.3. Direção dos movimentos de corte, de avanço e efetivo, no fresamento discordante.

2.4. PERCURSOS DA FERRAMENTA NA PEÇA

Percurso de Corte Lc: é o espaço percorrido pelo ponto de referência da aresta cortante sobre a peça, segundo a direção de corte.

Percurso de Avanço Lf: é o espaço percorrido pelo ponto de referência da aresta cortante sobre a peça, segundo a direção de avanço. Nos casos em que haja movimento de avanço principal e avanço lateral, devem-se distinguir as componentes do percurso de avanço.

Percurso Efetivo Le: é o espaço percorrido pelo ponto de referência da aresta cortante sobre a peça, segundo a direção efetiva do corte.

A Figura 2.4 ilustra os percursos da ferramenta na peça.

ae

Figura 2.4. Percurso de corte Lc, percurso de avanço Lf e percurso efetivo Le para o fresamento discordante.

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Definições análogas são válidas para os movimentos que não tomam parte diretamente na retirada de cavaco. 2.5. VELOCIDADES

Velocidade de Corte VC : é a velocidade instantânea do ponto de referência da aresta cortante da ferramenta, segundo a direção e sentido de corte. Para processos com movimentos de rotação, a velocidade de corte é calculada pela equação 2.1.

V nC = × ×p f / 1000 [m/min] (2.1)

onde, f = diâmetro da peça ou da ferramenta em mm; n = número de rotações por minuto.

Velocidade de Avanço Vf: velocidade instantânea do ponto de referência da aresta cortante da ferramenta, segundo a direção e sentido de avanço. É dada por:

V f nf = × [mm/min] (2.2)

onde, f = avanço em mm/volta; n = número de rotações por minuto.

Velocidade Efetiva de Corte ve: velocidade instantânea do ponto de referência da aresta cortante da ferramenta, segundo a direção e o sentido efetivo do corte. É calculada vetorialmente como se segue:

r r rV V Ve C f= + [m/min] (2.3)

Além destas podemos ter também as velocidades de aproximação, de ajuste, de correção e de recuo. 2.6. CONCEITOS AUXILIARES

Para melhor compreender os conceitos relacionados aos diferentes processos de usinagem são necessários alguns conceitos auxiliares.

Plano de Trabalho Pfe: é o plano que contém as direções de corte e de avanço, passando pelo ponto de referência da aresta cortante. Neste plano se realizam os movimentos que tomam parte na retirada de cavaco, Figuras 2.5 e 2.6.

No plano de trabalho é interessante ainda definir os ângulos da direção de avanço e da direção efetiva de corte.

Ângulo da Direção de Avanço j: é o ângulo entre a direção de avanço e a direção de corte. Nem sempre a direção de avanço é perpendicular à direção de corte, assim por exemplo no fresamento este ângulo varia durante o corte.

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Ângulo da Direção Efetiva de Corte h: é o ângulo da direção efetiva de corte e a direção de corte.

Figura 2.5. Plano de trabalho Pfe, ângulo da direção de avanço j e ângulo da direção efetiva h no torneamento.

Figura 2.6. Plano de trabalho Pfe, ângulo da direção de avanço j e ângulo da direção efetiva h no fresamento concordante (j > 90o).

Considerando a Figura 2.5, pode-se desenvolver a seguinte expressão:

tgv

v v v vf

f c c f

hj

j

j

j=

+=

+

sen

.cos

sen

cos / (2.4)

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Nota-se que, como na maioria dos casos vf <<< vc, o ângulo h é desprezível (nos processos de roscamento, h assume valores consideráveis pois o avanço é razoável).

Superfícies em Usinagem: são as superfícies geradas na peça pela ferramenta. Devem-se distinguir a superfície em usinagem principal e a superfície em usinagem secundária, onde a primeira é gerada pela aresta principal de corte e a segunda pela aresta secundária de corte (Figura 2.7).

Figura 2.7. Superfície principal e secundária de usinagem. 2.7. GRANDEZAS DE CORTE

São as grandezas que devem ser ajustadas na máquina direta ou indiretamente.

Avanço f: é o percurso de avanço em cada volta (mm/volta) ou em cada curso da ferramenta (mm/golpe).

No caso de ferramentas que possuem mais de um dente, como no caso do fresamento, distingue-se o avanço por dente fz, (Figura 2.8). O avanço por dente é o percurso de avanço de cada dente, medido na direção do avanço da ferramenta, e corresponde à geração de duas superfícies em usinagem consecutivas. Vale a relação:

f f zz= . (2.5)

onde, z = número de dentes.

O avanço por dente pode ainda ser decomposto no avanço de corte fc e avanço efetivo de corte fe, mostrados na Figura 2.8.

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Figura 2.8. Avanço por dente fz, avanço de corte fc e avanço efetivo fe no fresamento discordante.

Avanço de Corte fc: é a distância entre duas superfícies consecutivas em usinagem medida na direção perpendicular à direção de corte no plano de trabalho.

f fc z= .senj (2.6)

Avanço Efetivo de Corte fe: é a distância entre duas superfícies consecutivas em usinagem medida na direção perpendicular à direção efetiva de corte no plano de trabalho.

( )f fe z= -.sen j h (2.7)

Profundidade ou Largura de Usinagem (ou de corte) ap: é a profundidade ou largura de penetração da ferramenta na peça, medida numa direção perpendicular ao plano de trabalho.

Penetração de Trabalho ae: é de importância predominante no fresamento e na retificação. É a penetração da ferramenta em relação à peça, medida no plano de trabalho e numa direção perpendicular à direção de avanço, Figura 2.9.

Penetração de Avanço af: grandeza de penetração da ferramenta, medida no plano de trabalho e na direção de avanço.

Figura 2.9. Largura de usinagem ap, penetração de trabalho ae e penetração de avanço af, no fresamento periférico.

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2.8. GRANDEZAS RELATIVAS AO CAVACO

São grandezas derivadas das grandezas de corte, e são obtidas através de cálculos, Figura 2.10.

Figura 2.10. Grandezas relativas ao cavaco, para arestas de corte retilíneas.

Largura de Corte b: é a largura calculada da seção transversal de corte a ser retirada, medida na superfície em usinagem principal, segundo a direção normal à direção de corte. Em ferramentas com aresta cortante retilínea e sem curvatura na ponta, tem-se:

bap

r

=senc

(2.8)

cr é o ângulo de posição da aresta principal de corte.

Largura Efetiva de Corte be: é a largura calculada da seção transversal efetiva de corte a ser retirada, medida na superfície em usinagem principal, segundo a direção normal à direção efetiva de corte. Pela Figura 2.10, têm-se:

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( )b be r= -. sen .cos/

1 2 2 1 2h c (2.9)

Espessura de Corte h: é a espessura calculada da seção transversal de corte a ser retirada, medida normalmente à superfície em usinagem principal e segundo a direção perpendicular à direção de corte. Em ferramentas com aresta de corte retilíneas:

rc χsen.fh = (2.10)

Espessura Efetiva de Corte he: é a espessura calculada da seção transversal efetiva de corte a ser retirada, medida normalmente à superfície em usinagem principal e segundo a direção perpendicular à direção efetiva de corte.

( ) 2/12r

2e

ηtg.χsen1

hh

+= (2.11)

Seção Transversal Efetiva de Corte A: é a área calculada da seção transversal de um cavaco a ser retirado, medida no plano normal à direção de corte.

Seção Transversal de Corte Ae: é a área calculada da seção transversal efetiva de um cavaco a ser retirado, medida no plano normal à direção efetiva de corte.

Na maioria dos casos:

A a fp c= . (2.12)

A a fe p e= . (2.13)

Em ferramentas sem arredondamento na ponta da aresta cortante:

A b h= . (2.14)

A b he e e= . (2.15)

Para maiores informações deve ser consultada a norma NBR 6162. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

1. ABNT, NBR 6162, “Movimentos e Relações Geométricas na Usinagem dos Metais -Terminologia”,1989.

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C A P Í T U L O 3

NOMENCLATURA E GEOMETRIA DAS FERRAMENTAS DE CORTE

3.1. INTRODUÇÃO

A geometria da ferramenta de corte exerce influência, juntamente com outros fatores, na usinagem dos metais. É necessário, portanto, definir a ferramenta através dos ângulos da cunha cortante.

A norma brasileira que trata desse assunto é a norma da ABNT NBR 6163/80 – Conceitos da Técnica de Usinagem – Geometria da Cunha Cortante – Terminologia [1]. As definições apresentadas a seguir são baseadas nesta norma. 3.2. DEFINIÇÕES

As seguintes definições adotadas são necessárias para a determinação dos ângulos da cunha cortante de uma ferramenta de usinagem. As definições são melhores compreendidas através das Figuras 3.1 a 3.12.

Cunha de Corte: é a cunha formada pelas superfícies de saída e de folga da ferramenta. Através do movimento relativo entre a peça e a ferramenta, formam-se os cavacos sobre a cunha de corte.

Superfície de Saída Ag: é a superfície da cunha de corte sobre a qual o cavaco se desliza.

Superfície de Folga: é a superfície da cunha de corte, que determina a folga entre a ferramenta e a superfície em usinagem. Distinguem-se a superfície principal de folga Aa e a superfície secundária de folga A’a.

Arestas de Corte: são as arestas da cunha de corte formada pelas superfícies de saída e da folga. Deve-se distinguir a aresta principal de corte S e a aresta secundária de corte S’:

- Aresta Principal de Corte S: é a aresta de corte cuja cunha de corte, observada no plano de trabalho, e para um ângulo da direção de avanço j = 90o, indica a direção de avanço. - Aresta Secundária de Corte S’: é a aresta de corte cuja cunha de corte, observada no plano de trabalho, e para o ângulo da direção de avanço j = 90o, indica a direção contrária a direção de avanço.

Ponta de Corte: parte da cunha de corte onde se encontram as arestas principal e secundária de corte.

Ponto de Corte Escolhido: ponto destinado à determinação das superfícies e ângulos da cunha de corte, ou seja as definições se referem a um ponto da ferramenta, dito ponto de corte escolhido ou “Ponto de Referência”.

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Figura 3.1. Cunha de Corte da Ferramenta.

Figura 3.2. Arestas de corte e superfícies da cunha de corte de uma ferramenta de torno.

Figura 3.3. Arestas de corte e superfícies da cunha de corte de uma fresa frontal.

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Figura 3.4. Arestas de corte e superfícies da cunha de corte de uma broca helicoidal.

3.3. SISTEMAS DE REFERÊNCIA UTILIZADOS NA DETERMINAÇÃO DOS ÂNGULOS DA CUNHA CORTANTE.

Para a determinação dos ângulos na cunha de corte é necessário empregar um sistema de referência. Normalmente são empregados dois sistemas de referência, para um estudo racional dos ângulos da ferramenta e dos ângulos efetivos ou de trabalho:

- SISTEMA DE REFERÊNCIA DA FERRAMENTA - SISTEMA EFETIVO DE REFERÊNCIA

O sistema de referência da ferramenta é necessário para a determinação da geometria da cunha de corte da ferramenta, durante o projeto, execução e controle da mesma. O sistema efetivo de referência é necessário para a determinação da geometria da cunha de corte da ferramenta, durante o processo de usinagem. Além destes, outro sistema de referência poderá ser necessário para a determinação do posicionamento da ferramenta em relação à máquina.

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No sistema de referência da ferramenta, os planos são identificados pela palavra ferramenta e recebem o símbolo P, com um índice para a sua diferenciação. No sistema de referência efetivo, os planos são identificados pela palavra efetivo e os mesmos símbolos do sistema de referência da ferramenta, além do índice e. 3.3.1. Planos do Sistema de Referência

As definições dadas a seguir correspondem às figuras 3.5 e 3.6.

Plano de Referência: · Plano de Referência da Ferramenta - Pr: plano que passando pelo ponto

de corte escolhido, é perpendicular à direção admitida de corte. Esta é escolhida de maneira que o plano de referência da ferramenta seja o mais possível paralelo ou perpendicular à uma superfície ou eixo de ferramenta.

· Plano de Referência Efetivo - Pre: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é perpendicular à direção efetiva.

Nas ferramentas de torneamento e aplainamento, o plano de referência da ferramenta Pr é um plano paralelo ou perpendicular à superfície de apoio do cabo. Nas ferramentas de fresamento ou furação, ele é um plano que contém o eixo de rotação das mesmas.

Plano de Corte: · Plano de Corte Principal da Ferramenta - Ps: plano que passando pelo

ponto de corte escolhido, é tangente à aresta de corte e perpendicular ao plano de referência da ferramenta.

· Plano de Corte Secundário da Ferramenta – Ps': plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é tangente à aresta secundária de corte e perpendicular ao plano de referência da ferramenta.

· Plano de Corte Efetivo - Pse: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é tangente à aresta de corte e perpendicular ao plano de referência efetivo Pre.

Plano Ortogonal: · Plano Ortogonal da Ferramenta - Po: plano que passando pelo ponto de

corte escolhido, é perpendicular aos planos de referência e de corte da ferramenta.

· Plano Ortogonal Efetivo - Poe: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é perpendicular aos planos de referência e de corte efetivos.

O plano ortogonal é conhecido na maioria das literaturas como PLANO DE MEDIDA.

Plano de Trabalho: · Plano Admitido de Trabalho - Pf: plano que passando pelo ponto de corte

escolhido, é perpendicular ao plano de referência e paralelo à direção admitida de avanço. É escolhido de tal forma que fique o mais possível paralelo ou perpendicular à uma superfície ou eixo da ferramenta, respectivamente.

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· Plano de Trabalho Efetivo - Pfe: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, contém as direções de corte e de avanço. Neste plano se realizam os movimentos responsáveis pela retirada de cavaco, como definido no Capítulo 2.

Plano Dorsal: · Plano Dorsal da Ferramenta - Pp: plano que passando pelo ponto de

corte escolhido, é perpendicular aos planos de referência da ferramenta e admitido de trabalho.

· Plano Dorsal Efetivo - Ppe: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é perpendicular aos planos de referência efetivo e de trabalho.

Além destes planos são definidos ainda no sistema de referência da ferramenta:

· Plano Normal a Aresta de Corte Pn (ou PLANO EFETIVO NORMAL À ARESTA DE CORTE Pne): plano que, passando pelo ponto de corte escolhido, é perpendicular à aresta de corte S.

· Plano Ortogonal à Superfície de Saída Pg: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é perpendicular à superfície de saída e ao plano de referência da ferramenta.

· Ângulo de Posição do Plano Ortogonal à Superfície de Saída dr: ângulo entre o plano admitido de trabalho e plano ortogonal à superfície de saída, medido no plano de referência da ferramenta.

· Plano Ortogonal à Superfície de Folga Pb: plano que passando pelo ponto de corte escolhido, é perpendicular à superfície de folga e ao plano de referência da ferramenta.

· Ângulo de Posição no Plano Ortogonal à Superfície de Folga qr: ângulo entre o plano admitido de trabalho e o plano ortogonal à superfície de folga, medido no plano de referência da ferramenta.

Veja a seguir as figuras 3.5 a 3.12.

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Figura 3.5. Planos do Sistema de Referência da Ferramenta.

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Figura 3.6. Planos do Sistema de Referência Efetivo.

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Figura 3.7. Planos do Sistema de Referência da Ferramenta numa ferramenta de torneamento.

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Figura 3.8. Planos do Sistema de Referência Efetivo numa ferramenta de torneamento.

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Figura 3.9. Planos do Sistema de Referência da Ferramenta numa fresa cilíndrica.

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Figura 3.10. Planos do Sistema de Referência Efetivo numa fresa cilíndrica.

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Figura 3.11. Planos do Sistema de Referência da Ferramenta numa broca helicoidal.

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Figura 3.12. Planos do Sistema de Referência Efetivo numa broca helicoidal.

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3.3.2. Ângulos da Cunha Cortante

Os ângulos da cunha cortante destinam-se à determinação da posição e da forma da cunha de uma ferramenta.

Devem-se distinguir os ângulos do sistema de referência da ferramenta dos ângulos do sistema de referência efetivo. No primeiro, os ângulos são identificados com o acréscimo da palavra ferramenta e os símbolos representativos com o índice identificador do plano no qual são medidos, no segundo, é adicionada a palavra efetivo, e acrescenta-se ainda o índice “e” no símbolo.

Se o ângulo for referente à uma aresta secundária de corte, os símbolos recebem um apóstrofo (‘).

As definições apresentadas a seguir são mostradas nas figuras 3.13 a 3.18.

Ângulos Medidos no Plano de Referência · Ângulo de Posição da Ferramenta cr: ângulo entre o plano de corte da

ferramenta Ps e o plano admitido de trabalho Pf, medido no plano de referência da ferramenta. É sempre positivo e situa-se sempre fora da cunha cortante, de forma que o seu vértice indica a ponta de corte. Este ângulo indica a posição da aresta de corte.

· Ângulo de Posição Efetivo cre: ângulo entre o plano de corte efetivo Pse e o plano de trabalho efetivo Pfe, medido no plano de referência efetivo Pre.

· Ângulo de Posição Secundário da Ferramenta c’r: ângulo entre o plano de corte secundário da ferramenta Ps e o plano admitido de trabalho Pf, medido no plano de referência da ferramenta. É sempre positivo e situa-se sempre fora da cunha cortante, de forma que o seu vértice indica a ponta de corte. Este ângulo indica a posição da aresta secundária de corte.

· Ângulo de Posição Secundário Efetivo c’re: ângulo entre o plano de corte secundário efetivo P’se e o plano de trabalho efetivo Pfe, medido no plano de referência efetivo Pre.

· Ângulo de Ponta da Ferramenta er: ângulo entre os planos principal de corte Ps e secundário de corte P’s medido no plano de referência da ferramenta.

Vale portanto a seguinte relação:

c e cr r ro+ + =| 180 (3.1)

Ângulos Medidos no Plano de Corte: · Ângulo de Inclinação da Ferramenta ls: ângulo entre a aresta de corte e

o plano de referência da ferramenta Pr, medido no plano de corte da ferramenta Ps.

· Ângulo de Inclinação Efetivo lse: ângulo entre a aresta de corte o plano de referência efetivo Pre, medido no plano de corte efetivo Pse.

O ângulo de inclinação é sempre um ângulo agudo, cujo vértice indica a ponta de corte. Ele é positivo quando, observando-se a partir da ponta de corte, a aresta de corte encontra-se na região posterior em relação ao plano de referência, orientando-se para tanto segundo o sentido de corte.

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Ângulos Medidos no Plano Ortogonal · Ângulo de Saída da Ferramenta go: ângulo entre a superfície de saída Ag

e o plano de referência da ferramenta Pr, medido no plano ortogonal da ferramenta Po.

· Ângulo de Saída Efetivo goe: ângulo entre a superfície de saída Ag e o plano de referência efetivo Pre, medido no plano ortogonal efetivo Poe.

O ângulo de saída é sempre um ângulo agudo. Ele é positivo quando, a interseção entre a superfície de saída e o plano ortogonal encontra-se na região posterior em relação ao plano de referência, orientando-se para tanto segundo o sentido de corte.

· Ângulo de Cunha da Ferramenta bo: ângulo entre as superfícies de saída Ag e de folga Aa, medido no plano ortogonal da ferramenta Po.

· Ângulo de Cunha Efetivo boe: ângulo entre as superfícies de saída Ag e de folga Aa, medido no plano ortogonal efetivo Poe.

· Ângulo de Folga da Ferramenta ao: ângulo entre a superfície de folga Aa e o plano de corte da ferramenta Ps, medido no plano ortogonal da ferramenta Po.

· Ângulo de Folga Efetivo aoe: ângulo entre a superfície de folga Aa e o plano de corte efetivo Pse, medido no plano efetivo ortogonal Poe.

Vale a seguinte relação:

a b go o oo+ + = 90 (3.2)

Estes ângulos definidos anteriormente podem ser medidos também em outros planos. As definições apresentadas aqui são consideradas as mais importantes, para maiores informações deve-se consultar a norma NBR 6163.

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Figura 3.13. Ângulos da Ferramenta numa ferramenta de torneamento.

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Figura 3.14. Ângulos Efetivos numa ferramenta de torneamento.

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Figura 3.15. Ângulos da Ferramenta numa fresa de faceamento.

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Figura 3.16. Ângulos Efetivos numa fresa de faceamento.

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Figura 3.17. Ângulos da Ferramenta numa broca helicoidal.

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Figura 3.18. Ângulos Efetivos numa broca helicoidal.

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3.4. FUNÇÕES E INFLUÊNCIA DOS ÂNGULOS DA CUNHA CORTANTE.

Ângulo de Folga (ao) · Evitar atrito entre a peça e a superfície de folga da ferramenta. · Se ao é pequeno, a cunha não penetra convenientemente no material, a

ferramenta perde o corte rapidamente, há grande geração de calor e prejudica o acabamento superficial.

· Se ao é grande, a cunha da ferramenta perde resistência, podendo soltar pequenas lascas ou quebrar.

· ao depende principalmente de: resistência do material da ferramenta e da peça a usinar. Geralmente 2o £ 14o.

Ângulo de Saída (go) · Influi decisivamente na força e na potência necessária ao corte, no acabamento

superficial e no calor gerado. · Quanto maior go menor será o trabalho de dobramento do cavaco. · go depende principalmente de:

· resistência do material da ferramenta e da peça a usinar. · quantidade do calor gerado pelo corte. · velocidade de avanço (vf).

· go negativo é muito usado para corte de materiais de difícil usinabilidade e em cortes interrompidos, com o inconveniente da necessidade de maior força e potências de usinagem e maior calor gerado na ferramenta.

· Geralmente -10o £ go £ 30o.

Ângulo de Inclinação (ls): · Controlar a direção de saída do cavaco. · Proteger a quina da ferramenta contra impactos. · Atenuar vibrações. · Geralmente -4o

£ ls £ 4o.

Ângulo de Posição (cr): · Distribui as tensões de corte favoravelmente no início e no fim do corte. · Aumenta o ângulo de ponta (er), aumentando a sua resistência e a capacidade de

dissipação de calor. · Influi na direção de saída do cavaco. · Produz uma força passiva na ferramenta, reduzindo vibrações. · Geralmente 30o £ cr £ 90o. Em perfilamento pode ser maior que 90o. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

1. ABNT NBR 6163, “Conceitos da Técnica de Usinagem - Geometria da Cunha Cortante – Terminologia”, 1980.

C A P Í T U L O 4

FORMAÇÃO DO CAVACO

Uma maneira de estudar a formação do cavaco durante a usinagem é fazer simplificações em relação ao processo de fabricação. Isto é feito no corte ortogonal [1,2]. É um procedimento universal e as considerações que se seguem caracterizam a operação.

4.1. O CORTE ORTOGONAL

No Corte Ortogonal a aresta cortante é reta, normal à direção de corte e normal também à direção de avanço, de maneira que a formação do cavaco pode ser considerada como um fenômeno bidimensional, o qual se realiza num plano normal à aresta cortante, ou seja, no Plano de Trabalho, Figura 4.1. Esta Figura ilustra alguns exemplos de usinagens que se aproximam do corte ortogonal no torneamento.

Figura 4.1. Exemplos de Corte Ortogonal [2].

Além das simplificações citadas, são feitas as seguintes considerações que permitem um tratamento matemático simplificado do corte ortogonal e que pode ser estendido para outras operações de usinagem [2]:

o tipo de cavaco formado é contínuo, sem formação da aresta postiça de corte. não existe contato entre a superfície de folga da ferramenta e a peça usinada. a espessura de corte h (igual ao avanço) é pequena em relação à largura de corte b.a aresta de corte é maior que a largura de corte b. a largura de corte b e a largura do cavaco b’ são idênticas.

Com todas estas simplificações e considerações o corte ortogonal costuma ser representado como mostra a Figura 4.2.

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Figura 4.2. O Corte Ortogonal.

Este modelo é usado para estudadar o mecanismo de formação do cavaco, os fenômenos envolvidos e as forças atuantes no processo. Os resultados assim obtidos podem ser estendidos ao corte tridimensional, às vezes, com algumas ressalvas.

4.2. MECANISMO DA FORMAÇÃO DO CAVACO

O mecanismo de formação do cavaco pode ser explicado considerando o volume de metal representado pela seção “klmn”, da Figura 4.3, se movendo em direção à cunha cortante.

Figura 4.3. Diagrama da cunha cortante [1].

A ação da ferramenta recalca o volume “klmn”. Neste ponto o metal começa a sofrer deformações elásticas. Com o prosseguimento do processo o limite de escoamento é vencido e o material passa a se deformar plasticamente.

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Deformações plásticas continuam acontecendo até que as tensões não são mais suficientes para manter este regime. Assim fica definido uma zona de cisalhamento primária (Figura 4.4), que para facilitar o estudo ela é representada por apenas um

plano, definido pela linha OD da Figura 4.3.

Após o material entrar no regime plástico, o avanço da ferramenta faz com que as tensões ultrapassem o limite de resistência do material, ainda dentro da zona de cisalhamento primária, promovendo a ruptura, que se inicia com a abertura de uma trinca no ponto “O” (Figura 4.3) e que pode se estender até o ponto “D”,

segundo o plano definido pela linha OD . A extensão de propagação da trinca, que depende principalmente da ductilidade (ou fragilidade) do material da peça, vai determinar o tipo do cavaco, isto é, contínuo ou descontínuo.

Após passar pela região de cisalhamento primária, ao volume de material “klmn” só resta movimentar-se por sobre a superfície de saída da ferramenta e sair como um componente, ou lamela do cavaco. Entretanto, ao atravessar a zona de cisalhamento primária ele se deforma plasticamente para um novo formato “pqrs” (Figura 4.3). Poderá ser encontrado na literatura, o tratamento desta etapa de movimento por sobre a superfície de saída como sendo um sistema simples de atrito de Coulomb, sem maiores conseqüências para o processo. Isto não é correto. O cavaco, na maioria dos casos, ao atravessar a superfície de saída da ferramenta sofre ainda altíssimas deformações plásticas cisalhantes, numa pequena região junto à interface com a ferramenta, desenvolvendo ali altíssimas temperaturas, o que compromete a resistência das ferramentas. Esta região é definida como zona de

cisalhamento secundária (plano definido pela linha OB da Figura 4.3) e pode ser vista na Figura 4.4.

Figura 4.4. Esquema mostrando as zonas de cisalhamento primária e secundária.

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O entendimento das condições dessa interface cavaco-ferramenta é de importância capital para a análise do processo de corte, e será tratado em separado no capítulo 6.

Ao imaginarmos que adjacente ao volume de material representado por “klmn” da Figura 4.3, existe outro volume de material similar, e subsequente a este, existe outro, e assim sucessivamente, verificamos que o mecanismo de formação do cavaco é um processo cíclico, com cada ciclo dividido em 4 (quatro) etapas, bem definidas (já discutidas anteriormente), a saber:

1. Recalque (deformação elástica) 2. Deformação plástica.3. Ruptura. 4. Movimento sobre a superfície de saída da ferramenta.

Cada volume de material que passar por um ciclo, formará uma lamela de cavaco.

4.3. ÂNGULO DE CISALHAMENTO E GRAU DE RECALQUE

Durante um ciclo de formação do cavaco, definido no item anterior, a etapa de deformação plástica (etapa no 2) acontece por um determinado período, o que define uma zona de cisalhamento primária (Figura 4.4). Foi observado também, que para simplificar o estudo, esta zona é representada por um plano (linha OD da Figura 4.3), denominado plano de cisalhamento primário. O ângulo é definido como sendo o ângulo formado entre esse plano de cisalhamento primário e o plano de corte (Figura 4.3).

Verifica-se experimentalmente, que a espessura do cavaco, h’, é maior que a espessura do material a ser removido, h (espessura de corte), ver Figura 4.5a, e o comprimento de cavaco correspondente é por conseguinte, mais curto. Da mesma maneira a velocidade de saída do cavaco, vcav, é menor que a velocidade de corte, vc (Figura 4.5b).

O grau de recalque, Rc, é definido pela relação:

cav

cc v

v

h

'hR (4.1)

Considerando a Figura 4.5a, o ângulo de cisalhamento pode ser determinado pela medição direta da espessura do cavaco, h’, assim:

tgRc

n

n

cos

sen(4.2)

onde n é o ângulo de saída normal, neste caso igual a o.

O valor do grau de recalque, Rc, e portanto do ângulo de cisalhamento, , é uma boa indicação da quantidade de deformação dentro da zona de cisalhamento

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primária. Pequenos valores de (altos valores de Rc) significaram grande quantidade de deformação no plano de cisalhamento primário, e vice-versa.

VCAV

a) b)

Figura 4.5. a) Espessura de corte h, espessura do cavaco h’ e ângulo de cisalhamento ;b) Triângulo de velocidades no corte ortogonal. Vc = velocidade de corte; Vcav = velocidade de saída do cavaco; Vz = velocidade de cisalhamento.

As condições da interface cavaco-ferramenta exercem papel importante no processo, influenciando diretamente o valor do ângulo .

Nesta interface, está localizada a zona de cisalhamento secundária, que oferece resistência ao movimento do cavaco, onde uma grande quantidade de energia é consumida. Grande resistência ao movimento do cavaco gera baixos valores de , e aumenta o comprimento da zona (plano) de cisalhamento primária [3]. e Rc dependem, portanto, das condições da interface cavaco-ferramenta, e isto é função do material da peça, material da ferramenta, condições de corte e do emprego ou não de fluido de corte.

O ângulo de cisalhamento é difícil de ser medido, entretanto, pode ser determinado pela equação 4.2. A direção definida por este ângulo, representa a direção de cisalhamento máximo e pode portanto ser estimado. Vários pesquisadores fizeram tentativas de estimar o valor teórico deste ângulo, e duas delas são apresentadas abaixo.

Teoria de Ernest e Merchant [4]:

2 ne arc g kcot ( ) (4.3)

onde: = ângulo de atrito médio entre o cavaco e a ferramenta.

k = constante do material da peça. ne = ângulo de saída normal efetivo.

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Teoria de Lee e Shaffer [5]:

ne 4(4.4)

4.4. TIPOS DE CAVACO

Durante a usinagem uma nova superfície é gerada na peça, ou pela formação de um cavaco contínuo, quando se usina materiais dúcteis, ou pela formação de um fluxo de elementos de cavacos quebrados em pedaços, quando se usina materiais frágeis. Existem várias vantagens de produzir cavacos curtos, como se verá no próximo capítulo. A quebra dos cavacos pode ocorrer naturalmente durante a sua formação, como no caso de usinagem de bronze e ferro fundido, ou sua quebra pode ser promovida ao se usar quebra-cavacos. Neste caso, provavelmente, apenas a forma do cavaco irá se alterar. Quanto ao tipo existem pelo menos três possibilidades: cavacos contínuos, descontínuos e segmentados. Entretanto, numa classificação mais detalhada, os tipos de cavacos são:

a. Cavaco contínuo b. Cavaco parcialmente contínuo c. Cavaco descontínuo d. Cavaco segmentado.

Para os três primeiros tipos (a, b e c), a classificação depende muito da ductilidade (ou fragilidade) do material da peça e das condições de corte. O último tipo (d) são cavacos produzidos geralmente na usinagem de materiais de baixa condutividade térmica, na presença de “cisalhamento termoplástico catastrófico (ou adiabático)” [6].

a. Cavacos Contínuos.

Serão formados na usinagem de materiais dúcteis, como aços de baixa liga, alumínio e cobre (ver Figura 4.6 a). O metal cisalha na zona de cisalhamento primário com grande quantidade de deformações (da ordem de 2 a 5 mm/mm), permanecendo em uma forma homogênea, sem se fragmentar. Apesar da forma de fita desses cavacos não apresentar, normalmente, nenhuma evidência de fratura ou trinca, uma nova superfície está sendo gerada na peça e isto tem que envolver fratura. Cook et al [7] explica a formação do cavaco contínuo da seguinte maneira: um campo de tensão de tração se desenvolve na ponta da ferramenta, como resultado da curvatura imposta pela cunha cortante, produzindo a trinca necessária para separar o material. Depois desse campo de tensão de tração, o material está sujeito a elevada tensão de compressão, e a propagação da trinca será interrompida ao chegar nesta região, garantindo a formação de cavaco contínuo.

A tensão normal no plano de cisalhamento primário será, portanto, uma importante variável para determinar se o cavaco será contínuo ou descontínuo, e ela é fortemente influenciada pelo ângulo de cisalhamento, , e pelas condições da interface cavaco-ferramenta (zona de cisalhamento secundária).

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A análise do problema, entretanto, deve levar em consideração dois importantes fatores: primeiro que deve existir uma tensão cisalhante no plano primário suficientemente elevada para garantir a abertura e propagação da trinca na aresta de corte da ferramenta; segundo que o nível da tensão de compressão que atua no plano de cisalhamento primário pode (ou não) interromper a propagação dessa trinca. A complexidade da análise se deve ao fato de que tanto o primeiro como o segundo fatores são dependentes das condições da interface cavaco-ferramenta, isto é, quem promove a tensão cisalhante no plano primário, necessária para a abertura da trinca, é a restrição que o cavaco tem ao se movimentar na superfície de saída da ferramenta, e quanto maior esta restrição, maior será essa tensão. É também esta mesma restrição que vai promover a tensão de compressão no mesmo plano primário, que poderá congelar a propagação da trinca, e quanto maior a restrição, maior será esta tensão.

Algumas variáveis podem atuar no sentido de favorecer a propagação da trinca, por diminuir a restrição ao movimento do cavaco no plano secundário e, por conseguinte, a tensão normal que tende a congelá-la e ao mesmo tempo reduzir a tensão cisalhante responsável pela abertura da trinca. Isto pode ser conseguindo, por exemplo, pela adição de elementos de livre-corte, como o chumbo, telúrio, selênio, enxofre (com manganês) etc., ao material da peça. Estas adições, além de reduzir as tensões normais de compressão no plano primário pelas suas ações lubrificantes, reduz a tensão cisalhante necessária para a abertura de trinca e fragiliza o material, facilitando ainda mais a propagação da mesma. A geometria da ferramenta, principalmente o ângulo de saída, a velocidade de corte, o avanço, a profundidade de corte, inclusões no material (quantidade, forma, tamanho e dureza) e a rigidez da ferramenta são também variáveis importantes no processo de formação do cavaco.

Os cavacos contínuos são indesejáveis pois eles podem causar muitos problemas, e se eles não quebram naturalmente, um quebra-cavaco deve ser usado para promover a sua fragmentação. O cavaco será então fragmentado, mas não da mesma maneira daqueles do tipo “c” abaixo.

Uma variação do tipo de cavaco contínuo, é o cavaco contínuo na presença da aresta-postiça-de-corte (APC) [8] (ver Figura 4.6b). Esse fenômeno será discutido com detalhes no capítulo 6, e é um fator importante que afeta o acabamento superficial e desgaste da ferramenta.

b. Cavacos parcialmente contínuos

É um tipo intermediário entre os cavacos contínuos e descontínuos, onde a trinca se propaga só até uma parte do plano de cisalhamento primário. É muitas vezes [2] denominado de cavaco de cisalhamento. Sugere-se [7] que dois fatores são importantes: (i) a energia elástica acumulada na ferramenta pode não ser suficiente para continuar a propagação da trinca. O cavaco perderá contato com a ferramenta, interrompendo assim, o crescimento (propagação) da trinca; (ii) a presença de grande tensão de compressão no plano de cisalhamento primário, um pouco além da ponta da ferramenta, que supressa a propagação da trinca.

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c. Cavacos descontínuos.

Os cavacos descontínuos são mais comuns quando usinando materiais frágeis, como o bronze e os ferros fundidos cinzentos, que não são capazes de suportarem grandes quantidades de deformações sem fratura. Entretanto, baixas velocidades, ângulo de saída pequeno e grandes avanços podem também gerar cavacos descontínuos em certos materiais semi-dúcteis. Com o aumento da velocidade de corte o cavaco tende a se tornar mais contínuo, primeiro porque a geração de calor é maior e o material por conseguinte mais dúctil, segundo porque é mais difícil a penetração de “contaminantes” na interface cavaco-ferramenta ou plano de cisalhamento secundário (pois o tempo disponível diminui) para reduzir a tensão normal ao plano de cisalhamento primário que permitiria a propagação da trinca.

A Figura 4.6c mostra o cavaco descontínuo. A trinca, neste caso, se propaga por toda a extensão do plano de cisalhamento primário, promovendo a fragmentação do cavaco. A zona de cisalhamento secundária (interface cavaco-ferramenta) também tem influência no processo. Inicialmente, a componente de força tangencial à superfície de saída é menor do que a força necessária para promover o escorregamento do cavaco. Haverá então, o desenvolvimento de uma zona de material estática, e separação do cavaco ocorrerá com o aumento da relação força tangencial/força normal.

Figura 4.6. Tipos de cavacos: (a) cavaco contínuo; (b) cavaco contínuo com APC; ( c) cavaco descontínuo [8].

Estudando a formação de cavacos descontínuos, Palmer e Riad [9] filmaram o corte ortogonal de aços carbono, ligas de cobre, alumínio e titânio, a velocidades de corte muito baixas. Simultaneamente, as forças de corte e avanço foram monitoradas. Os autores variaram avanço, profundidade de corte e ângulo de saída da ferramenta. Além de observarem uma relação direta do comportamento das componentes de força de usinagem com a formação do cavaco, eles construíram curvas que identificam o tipo do cavaco com os parâmetros variados como ilustra a Figura 4.7 (usinagem do latão).

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Figura 4.7. Tipo de cavaco em função da profundidade de corte e do ângulo de saída. x = cavacos contínuos; = cavacos parcialmente contínuos; o = cavacos descontínuos [9].

d. Cavacos segmentados.

Os cavacos segmentados são caracterizados por grandes deformações continuadas em estreitas bandas entre segmentos com muito pouca, ou quase nenhuma deformação no interior destes segmentos. É um processo totalmente diferente daquele verificado na formação do cavaco contínuo. Cook [10] e Shaw et alli [11] explicaram qualitativamente as características de segmentação dos cavacos. Em seus modelos, a taxa de diminuição na resistência do material, devido ao aumento local da temperatura (devido às deformações plásticas) iguala ou excede a taxa de aumento da resistência devido ao encruamento, no plano de cisalhamento primário. Isto é peculiar a certos materiais com pobres propriedades térmicas, como o titânio e suas ligas. O cisalhamento para formar o cavaco começa a ocorrer em um plano de cisalhamento primário particular, quando as tensões impostas pelo movimento da ferramenta contra a peça excedem o limite do escoamento do material. A energia associada com esta deformação é convertida em calor imediatamente, e devido as pobres propriedades térmicas do material, altas temperaturas são desenvolvidas, localmente. Isto vai provocar o amolecimento localizado do material e, portanto as deformações continuam na mesma faixa (plano) de material, ao invés de se mudarem para novo plano de material adjacente, à medida que o material se movimenta, como ocorre na formação dos cavacos contínuos [11, 12]. Com o prosseguimento da deformação, existe uma rotação no plano de cisalhamento, que começa a se afastar da ponta da ferramenta e se movimenta por sobre a superfície de saída. Esta rotação vai prosseguindo até que o aumento de força devido a esta rotação excede a força necessária para deformar plasticamente material mais frio, em outro plano mais favorável. Este processo já foi referido como “cisalhamento termoplástico catastrófico” [6] ou “cisalhamento adiabático” [13] e resulta num processo cíclico de produção de cavacos na forma de uma serra dentada (ver Figura 4.8).

45

Figura 4.8. Cavaco segmentado [14].

É verificado experimentalmente que muitos materiais podem sofrer cisalhamento termoplástico catastrófico, dependendo da temperatura desenvolvida durante a usinagem (velocidade de corte) e de suas propriedades térmicas. Recht [6] apresentou o critério para um material sofrer cisalhamento termoplástico catastrófico (efeito do amolecimento devido ao aumento de temperatura superar o efeito de encruamento) e a velocidade de corte acima do qual ele ocorre foi denominada de “velocidade de corte crítica”. Para o Inconel 718 esta velocidade é de 61 m/min e para o aço AISI 4340 a velocidade crítica encontrada foi de 275 m/min [15,16].

4.5. FORMAS DE CAVACOS

Quanto à forma, os cavacos são classificados como: - cavaco em fita. - cavaco helicoidal. - cavaco espiral. - cavaco em lascas ou pedaços.

Entretanto, a norma ISO [17] faz uma classificação mais detalhada da forma dos cavacos, de acordo com a Figura 4.9.

fragmentado

Figura 4.9. Formas de cavacos produzidos na usinagem dos metais [17].

46

O material da peça é o principal fator que vai influenciar na classificação quanto à forma dos cavacos. Logicamente o tipo do cavaco também vai influenciar. Cavacos contínuos, parcialmente contínuos e segmentados podem cair em qualquer “forma” da Figura 4.9, dependendo das condições de corte e do uso ou não de quebra-cavacos. O tipo de cavacos descontínuos só podem ser classificados quanto a forma, como lascas e pedaços.

Quanto as condições de corte, em geral, um aumento da velocidade de corte, uma redução no avanço ou um aumento no ângulo de saída, tende a mover a forma do cavaco para a esquerda da Figura 4.9, isto é, produzir cavacos em fitas (ou contínuos, quanto ao tipo). O avanço é o parâmetro que mais influencia e a profundidade de corte o que menos influencia na forma dos cavacos. A Figura 4.10 mostra como as formas dos cavacos são afetadas pelo avanço e pela profundidade de corte [18].

Figura 4.10. Efeito do avanço e da profundidade de corte na forma dos cavacos [18].

Na realidade a forma dos cavacos longos é que causam os maiores problemas relativos à segurança e produtividade e, portanto, estas formas de cavacos exigem cuidados especiais (controle).

Apesar das condições de corte poderem ser escolhidas para evitar, ou pelo menos reduzir a tendência de formação de cavacos longos em fita (contínuos, parcialmente contínuos ou segmentados), até o momento, o método mais efetivo e popular para produzir cavacos curtos, é o uso de dispositivos que promovem a quebra mecânica deles. Estes dispositivos são popularmente conhecidos como “quebra-cavacos”. Esta teoria será abordada a seguir, no capítulo 5.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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5. LEE, E.H. and SHAFFER, B.W. “The Theory of Plasticity Applied to a Problem of Machining”, Journal of Applied Mechanics, vol. 18(4), pp. 405-413.

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8. BOOTHROYD, G. “Fundamental of Metals Machining and Machine Tools”, International Student Edition, Mc Graw-Hill, 5th Printing, 1981, ISBN 0-07-085057-7.

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12. SHAW, M.C. “The Assessment of Machinability”, ISI Special Report, London, 1967, pp. 1-9.

13. LE MAIRE, J.C. and BACKOFEN, W.A. “Adiabatic Instability in Orthogonal Cutting of Steel”, Metal Trans, vol. 3, 1972, pp. 477-481.

14. KOMANDURI, R. and VON TURKOVICH, B.F. “New Observations on the Mechanisms of Chip Formation when Machining Titanium Alloys”, Wear, vol. 69, 1981, pp. 179-188.

15. KOMANDURI, R. and SHROEDER, T.A. “On Shear Instability in Machining a Nickel-Iron Base Superalloy”, Trans ASME, J. Eng. Industry, vol. 108, May 1986, pp. 93-100.

16. KOMANDURI, R.; SHROEDER, T.A.; HARZA, J.; VON TURKOVICH, B.F. and FLOM, D.G. “On the Catastrophic Shear Instability in High Speed Machining of an AISI 4340 Steel”, Trans ASME, J.Eng. Industry, vol. 104, May 1982, pp. 121-131.

17. ISO “Tool Life Testing with Single-Point Turning Tools”, ISO 3685, 1977. 18. SMITH, G.T. “Advanced Machining - The Handbook of Cutting Technology”, IFS

Publications, 1989, ISBN 1-85423-022-6.

48

49

C A P Í T U L O 5

CONTROLE DE CAVACO

Na fabricação de peças por usinagem, as principais preocupações estão voltadas para a qualidade das peças produzidas, isto é, acabamento superficial e tolerâncias obtidas, e na produtividade com baixo custo. A produtividade sempre está relacionada com a taxa de desgaste das ferramentas de corte que é função do processo, das condições de corte, do uso ou não de fluídos de corte, entre outros fatores. Isto levou os principais pesquisadores da área de usinagem, a concentrarem seus trabalhos em assuntos relacionados com o mecanismo de formação dos cavacos, forças e temperaturas de usinagem, mecanismos de desgaste das ferramentas de corte, integridade superficial, e muito pouca pesquisa se dedica ao estudo do controle do cavaco. Por esse motivo, são raros os artigos encontrados na literatura, que discutem o assunto de maneira abrangente. Entretanto, no corte contínuo (principalmente no torneamento) de materiais dúcteis a altas velocidades, o controle do cavaco pode se tornar imperativo e o fator mais importante numa linha de produção.

Como se viu no capítulo anterior, a baixas velocidades de corte os cavacos, geralmente, apresentam boa curvatura natural, e portanto fogem da forma de cavacos longos, e não apresentam maiores problemas. Com a introdução da nova geração de ferramentas de corte, com maiores resistências ao desgaste, permitiu-se um aumento nas velocidades de corte de tal maneira, que os cavacos longos produzidos exigiram um controle rigoroso de sua formação. Isto se torna mais crítico ainda, com a crescente utilização de máquinas CNC, onde a ausência da interferência do homem não permite a produção de tais formas de cavacos.

A produção de cavacos longos pode causar os seguintes problemas principais.

I. Eles têm baixas densidades efetivas, isto é, ocupam muito espaço, o que causam problemas econômicos no manuseio e no processo de descarte, ou reaproveitamento.

II. Eles podem se enrolar em torno da peça, da ferramenta ou de componentes da máquina e estes cavacos, a temperaturas elevadas e com arestas laterais afiadas, representam um verdadeiro risco à integridade física do operador.

III. Quando eles se enrolam na peça, apesar de afetar pouco o acabamento superficial, produzem uma superfície não atrativa, e podem causar danos à ferramenta.

IV.Eles podem afetar forças de usinagem, temperatura de corte e vida das ferramentas.

V. Podem impedir o acesso regular do fluido de corte (efeito guarda-chuva).

O estado do cavaco pode ser expresso pelo “fator de empacotamento”, R, que é definido como sendo o volume total ocupado pelo cavaco, dividido pelo volume de um sólido equivalente ao seu peso.

peso seu ao eequivalent sólido um de volume

cavaco do volume=R

50

Cavacos contínuos e longos apresentam fator de empacotamento da ordem de 50 ou superiores, enquanto cavacos em lascas ou pedaços podem ter esse valor reduzido à 3 [1].

A necessidade de se desvencilhar de cavacos longos e prejudiciais forçou o aparecimento de medidas estratégicas para promover a quebra destes, mecanicamente. Sem dúvidas, o método mais popular é a utilização de quebra-cavacos postiços ou integrais (dando-se uma forma especial à superfície de saída da ferramenta). Ambos os casos promovem uma curvatura maior nos cavacos para quebrá-lo por flexão, quando estes encontrarem um obstáculo. Os obstáculos podem ser a própria peça, a ferramenta ou o porta-ferramenta.

Outros métodos menos usuais também já foram utilizados com sucesso. Um deles utiliza a desaceleração intermitente de avanço [2]. Isto pode ser conseguido por um programa particular de computador em um sistema CNC. A desaceleração intermitente do avanço promove a quebra periódica do cavaco pela redução da espessura do cavaco até valores muito pequenos (próximo a zero), conforme mostra a Figura 5.1.

Este efeito, além de se mostrar eficiente no controle do cavaco, melhora marginalmente a rugosidade superficial [2].

Figura 5.1. Efeito da desaceleração do avanço na espessura do cavaco [2].

Um outro método é o hidráulico [3]. Neste método o fluído de corte é injetado à alta pressão na superfície de saída da ferramenta, contra a saída do cavaco. A força do jato promove a fragmentação do cavaco conforme a seqüência mostrada na Figura 5.2.

Figura 5.2. Diagrama esquemático da fragmentação do cavaco promovido pelo jato de fluído de corte à alta pressão [3].

51

A aplicação deste método na usinagem de ligas de titânio e de níquel mostrou muita eficiência no controle do cavaco. O fator de empacotamento passou de 47 para 4,7 quando a usinagem sem quebra-cavacos foi substituída pela utilização do método [3].

Na usinagem natural, isto é, sem quebra-cavacos, a capacidade de quebra dos cavacos depende principalmente de três fatores importantes: a fragilidade do material da peça, a curvatura natural do cavaco e a espessura do cavaco h’.

Quanto menor a espessura do cavaco, mais flexíveis eles são, portanto, mais difíceis de se quebrarem. Os cavacos, que já sofreram deformações intensas nos planos de cisalhamentos primário e secundário durante a sua formação, necessitam de uma determinada deformação crítica ef, para se fraturarem, após deixarem a superfície de saída da ferramenta. A deformação que o cavaco vai sofrer neste estágio é diretamente proporcional a h’/rc, onde h’ é a espessura do cavaco e rc é o raio de curvatura do cavaco [4]. Se a deformação do cavaco não for suficientemente grande para causar a fratura, é necessário tomar medidas, ou para aumentar h’ ou diminuir rc, e assim promover deformação suficiente para obter a fratura periódica do cavaco. Como h' depende principalmente do avanço (ou da espessura de corte, h), e este afeta o acabamento superficial e a produtividade, procura-se então tentar reduzir rc.

O método mais usual para aumentar a curvatura do cavaco (diminuir rc), como já foi citado, é a utilização de quebra-cavacos postiços ou integrais (superfícies de saídas das ferramentas com formatos especiais).

Na utilização desse método rc pode ser estimado, de acordo com as dimensões dos quebra-cavacos, assim:

(I). Quebra-cavaco Postiço (Figura 5.3).

( ) ( )[ ]2

ss cot.cot.trc --= flln (5.1)

onde: ln - distância do quebra-cavaco da aresta de corte. lf - comprimento de contato cavaco-ferramenta t - altura do quebra-cavaco s - ângulo da cunha do quebra-cavaco.

52

Figura 5.3. Quebra-cavaco postiço [1].

(II). Quebra-cavaco Integral, tipo I - Anteparo (Figura 5.4).

Figura 5.4. Quebra-cavaco integral, tipo I - Anteparo [1].

( )r

lf t

hc =-

+ln

'

2

2 (5.2)

(III). Quebra-cavaco Integral, tipo II – Cratera (Figura 5.5).

Figura 5.5. Quebra-cavaco integral, tipo II - cratera [1].

53

r qc n= (5.3)

onde: qn = raio da cratera do quebra-cavaco.

Obs. 1. Neste caso, o quebra-cavaco só será efetivo, se a espessura en for menor que o comprimento do contato cavaco-ferramenta, lf.

Obs. 2. Se qn for muito pequeno, o cavaco pode não seguir o contorno da cratera até que se desenvolva um desgaste significante.

Para os quebra-cavacos do tipo anteparo, seja ele postiço (Figura 5.3) ou integral (Figura 5.4), trabalhando sobre condições efetivas de quebra de cavacos, eles não terão muito efeito nas forças de usinagem, quando comparados com ferramentas planas, isto é, sem quebra-cavacos, nas mesmas condições de corte [5]. No caso de quebra-cavaco do tipo cratera, uma aresta postiça estável pode se formar ao longo da espessura en (Figura 5.5), aumentando consideravelmente o ângulo efetivo de saída, diminuindo as forças de usinagem [1].

Foi verificado também [1], que a taxa de desgaste de flanco não muda significativamente, com a aplicação de quebra-cavacos. Quanto ao desgaste de cratera, Boothroyd [1] mostrou que os quebra-cavacos do tipo anteparo (Figuras 5.3 e 5.4) reduzem a área de desgaste e os quebra-cavacos do tipo cratera (Figura 5.5) tendem a aumentá-la.

O que é importante verificar na teoria dos quebra-cavacos é se os mesmos irão garantir uma redução de rc, para que o cavaco, ao se chocar contra qualquer obstáculo (peça, ferramenta ou porta-ferramenta), tenha atingido o valor de deformação crítica na fratura, ef, que promova sua quebra. Alem disto, as ranhuras dos quebra-cavacos servem para conformar mais os cavacos, tornando-os menos dúcteis e, portanto, promovendo a redução desta deformação crítica necessária para a fratura.

As equações 5.1, 5.2 e 5.3 podem ser utilizadas para projetar quebra-cavacos eficientes. Entretanto, o projetista tem que considerar, além dos fatores já citados (fragilidade do material da peça, raio natural de curvatura, rc e espessura do cavaco, h’), outros, tais como: geometria da ferramenta (principalmente os ângulos de saída, inclinação e posição), velocidade de corte, profundidade de corte e rigidez da máquina ferramenta. Quanto menor o ângulo de saída menor o raio de curvatura natural, rc, e maior a espessura do cavaco, h'. Quanto ao ângulo de posição, além de afetar a direção de saída do cavaco, quando, normalmente, o cavaco tende a sair perpendicular à aresta de corte, ele afeta também a espessura do cavaco, que aumenta com o aumento deste ângulo. O ângulo de inclinação tem influência direta na direção de saída do cavaco. Se for negativo ele joga o cavaco contra a peça, se for positivo ele direciona o cavaco para fora dela. Um aumento na velocidade de corte tende a aumentar rc porque o comprimento de contato cavaco-ferramenta é reduzido. Além disso, a ductilidade do material é aumentada, tornando-se a quebra do cavaco ainda mais difícil.

54

Sales [6], com o objetivo de relacionar o raio de curvatura natural do cavaco, rc, com a velocidade, profundidade de corte, avanço e ângulo de saída da ferramenta, filmou a usinagem do aço ABNT 1020, no corte ortogonal no processo de torneamento em mais de 500 ensaios e por meio de um “software” de análise de imagens, mediu rc. Os resultados foram representados por um polinômio de grau três que melhor se ajustou aos pontos distribuídos, com erro calculado de 14.75%. A Figura 5.6 apresenta os gráficos obtidos, mostrando a influência individual de cada parâmetro estudado em rc.

Vc=200 [m/min] ; f=0,182 [mm/rot] ; g=6 [º]

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

1,5 2 2,5 3 3,5 4

ap [mm]

2,5

Vc=200 [m/min] ; ap=2,5 [mm] ; g=6 [º]

1

1,5

2

2,5

0 0,1 0,2 0,3 0,4

f [mm/rot] a) b)

Vc=200 [m/min] ; f=0,182 [mm/rot] ; ap=2,5 [mm]

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

2 4 6 8 10 12 14 16 18

g [º]

1,5

f=0,182 [mm/rot] ; ap=2,5 [mm] ; g=6 [º]

1

1,5

2

2,5

50 100 150 200 250 300 350

Vc [m/min] c) d)

Figura 5.6. Influência a) da profundidade de corte, b) do avanço, c) do ângulo de saída da ferramenta e d) da velocidade de corte, no raio de curvatura natural do cavaco [6].

Por meio da análise de sensibilidade adimensional, os parâmetros estudados foram ordenados em ordem decrescente de influências sobre rc, obtendo-se a seguinte ordem:

ap, f, g e Vc

Observa-se que o raio de curvatura natural do cavaco aumenta com os aumentos da profundidade de corte, do ângulo de saída da ferramenta e da velocidade de corte, dificultando a quebra do cavaco, diminuindo com o aumento do avanço, facilitando a quebra do cavaco. O comportamento dessas variáveis era esperado, exceto o efeito da profundidade de corte. Normalmente, o aumento da profundidade de corte tende a tornar o cavaco mais quebradiço (reduzindo rc), ver

55

Figura 4.10, [8]. Entretanto, este parâmetro pode atuar diferentemente, dependendo da faixa de avanço [9] e do grau de desgaste da ferramenta [10].

Na usinagem de um tubo (corte ortogonal) a velocidade de corte no diâmetro interno é consideravelmente menor que no diâmetro externo, o que causa uma curvatura do cavaco como mostrado na Figura 5.7. A profundidade de corte, neste caso, vai alterar aquela curvatura.

Figura 5.7. Curvatura do cavaco para dentro, causado pela variação da velocidade de corte ao longo da aresta [4].

A rigidez da máquina, quando baixa, pode causar vibrações e promover quebra nos cavacos, porém com conseqüências graves no acabamento superficial.

A combinação de todos estes efeitos sendo levados em consideração é que vai distribuir os cavacos nas mais diversas formas apresentadas no item 4.5, segundo os esquemas mostrados na Figura 5.8.

Os cavacos da Figura 5.8c são quebrados periodicamente quando eles encontram a superfície recém-usinada, o que pode danificar o acabamento superficial. Os cavacos da Figuras 5.8d e 5.8e, são quebrados quando eles se chocam contra a superfície da peça pronta para ser usinada. Se a direção lateral for suficiente, o cavaco com curvatura para cima pode evitar a peça mas encontrar a superfície de folga da ferramenta, formando cavacos como na Figura 5.8f. Se a direção lateral for ainda maior, podem gerar cavacos como os das Figuras 5.8h, 5.8 i ou 5.8j. Além desses, vários outros tipos podem ser observados, que representam a combinação dos cavacos mostrados na Figura 5.8 a-j [4].

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Figura 5.8. Representação da geração das diversas formas de cavaco: a) cavaco em fita, reto (ângulo de inclinação = 0o); b) cavaco em fita com direção de saída variado (ângulo de inclinação = 0o); c) cavaco do tipo arruela (ângulo de inclinação = 0o, vc variável ao longo da aresta de corte, sem curvatura para cima); d) cavaco do tipo “c” (ângulo de inclinação = 0o); e) cavaco curto na forma de “orelha” (ângulo de inclinação = 0o); f) cavaco longo na forma de “orelha” (ângulo de inclinação = 0o); g) cavaco na forma de bobina (ângulo de inclinação = 0o, vc variável ao longo da aresta de corte e curvatura para cima); h) cavaco helicoidal tubular (ângulo de inclinação positivo e grande profundidade de corte); i) cavaco do tipo “mola” (ângulo de inclinação positivo e pequena profundidade de corte); j) cavaco helicoidal cônico (combinação de c) e h), comum na furação); k) combinação de c) e d) (ângulo de inclinação diferente de zero); l) cavaco do tipo “c”, conectados [4].

Considerando estes fatores e as condições de corte, os fabricantes de ferramentas, particularmente de metal duro, desenvolvem os insertos com as mais variadas formas de quebra-cavacos. Estes fabricantes, geralmente, tem um design diferente para operações de acabamento, cortes médios e operações de desbaste. Para cada tipo de operação destas, o design do quebra-cavaco cobre uma determinada faixa de avanço e profundidade de corte.

Paulino et alli [7] usinando o aço ABNT 5140, no torneamento, testaram a eficiência de quatro geometrias de superfícies de saída de ferramentas de metal duro (uma lisa, e as demais para operações de acabamento, intermediária e de desbaste). Eles encontraram que a geometria desenvolvida para operações de

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desbaste (MR) obteve melhor desempenho quanto a uniformidade na distribuição de h’ e rc, promovendo uma quebra do cavaco mais eficaz. As geometrias lisa e de acabamento, promoveram menores deformações no cavaco e conseqüentemente se mostraram menos eficazes na quebra dos cavacos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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7. PAULINO, W.S.; SALES, W.F.; EZUGWU, E.O. e MACHADO, A.R.; “Determinação da Eficiência de Quebra-cavacos com as Principais Condições de Corte”; XIV COBEM, Bauru, São Paulo, Brasil, 1997.

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C A P Í T U L O 6

A INTERFACE CAVACO - FERRAMENTA

6.1. INTRODUÇÃO

No capítulo 4 verificou-se que a formação do cavaco é um processo periódico, com cada ciclo dividido em 4 etapas distintas. A última etapa é o movimento (escorregamento) do cavaco por sobre a superfície de saída da ferramenta. As condições nas quais acontece este escorregamento têm influências marcantes em todo o processo, particularmente, no próprio mecanismo de formação do cavaco, na força de usinagem, no calor gerado durante o corte, e conseqüentemente na temperatura de corte e nos mecanismos e taxa de desgaste das ferramentas de corte, e conseqüentemente na vida das ferramentas. É preciso, portanto, entender como se processa o movimento do cavaco ao longo da superfície de saída da ferramenta.

O conceito clássico de atrito baseado nas leis de Amonton e Coulomb (a força de atrito F, é proporcional à força normal N, isto é, F = m.N, onde m é o coeficiente de atrito) não é apropriado para todas as condições de corte dos metais, onde as pressões normais à superfície de saída da ferramenta são muito altas (podem chegar a 3,5 GN/m2, na usinagem de alguns aços; Trent, 1963). As condições da interface cavaco-ferramenta são, portanto, uma das áreas de estudo mais importante em usinagem.

Fazer isto, entretanto, tem sido um desafio muito grande, porque são poucas conclusões que podem ser tiradas de observações diretas durante o corte. As maiores dificuldades são provocadas pelas velocidades de saída dos cavacos, normalmente, muito elevadas e pelas reduzidíssimas áreas de contato cavaco-ferramenta envolvidas, o que dificultam o monitoramento on line. Apenas para exemplificar, vamos considerar uma operação de corte ortogonal de aço comum ao carbono, em que a velocidade de corte, vc, utilizada é de 240m/min, e a espessura de corte, h, igual ao avanço de corte, fc, de 0,25mm/volta, e a largura de corte, b, igual à profundidade de corte, ap, de 2,0mm. Se a espessura do cavaco, h’, obtida foi de 0,5mm, o grau de recalque, Rc, é igual a 2,0 (h’ ÷ h). Nestas condições, a velocidade de saída do cavaco, vcav, é de 120m/min (Vc ÷ Rc), ou 2,0m/s. Se o comprimento de contato cavaco-ferramenta, L, nesta operação for de 3,0mm, a área de contato será 6,0mm2 (L × b). É uma velocidade de saída do cavaco muito alta, e uma área de contato cavaco-ferramenta muito pequena para se considerar o monitoramento on line.

A maioria das teorias modernas disponíveis foi derivada de estudos desta interface, após o corte ter sido interrompido (utilizando-se quick-stops) e de medições de deformações e temperaturas naquela região.

Após contar com essas técnicas de quick stops, pode-se constatar a forte influência que as condições da interface cavaco-ferramenta exerce no processo. Teorias mais antigas sempre concentravam os estudos na zona de cisalhamento primário, como Piispanen (1937), Ernest e Merchant (1940) e Lee e Shaffer (1943), entre outros. Entre estes, Piispanen (1937) foi o primeiro a considerar o processo de

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cisalhamento no plano primário como se fosse o deslizamento de cartas de baralho, por isto o seu modelo ficou conhecido como “Baralho de Piispanen”. A figura 6.1 apresenta este modelo.

Figura 6.1. Modelo de formação de cavaco proposto por Piispanen (1937).

Neste modelo o movimento do cavaco na superfície de saída da ferramenta se dá pura e simplesmente pelo escorregamento de lamelas individuais, como se fossem cartas, desprezando totalmente o atrito e o cisalhamento dentro do material. Assim, qualquer teoria derivada deste modelo vai carregar inevitáveis erros de aproximação.

Na usinagem dos metais pelo menos três condições de interface cavaco-ferramenta podem ser encontradas:

a)- Aderência + Escorregamento;

b)- Escorregamento;

c)- Aresta Postiça de Corte - APC

Quem mais difundiu a teoria das condições da interface cavaco-feramenta nos meios científicos foi Trent, que desde 1963 identificou e definiu com muita competência a “ZONA DE ADERÊNCIA” (seizure zone ou sticking zone, da literatura inglesa) e a “ZONA DE ESCORREGAMENTO” (sliding zone, da literatura inglesa). Na condição “a” a zona de aderência se estende da aresta de corte para dentro da superfície de saída da ferramenta, tendo a zona de escorregamento se desenvolvendo ao longo de sua periferia. A Figura 6.2 identifica estas duas zonas. Linha BC = aderência, linha CD = escorregamento.

Em determinadas condições especiais, a zona de aderência pode ser suprimida, prevalecendo apenas a condição de escorregamento. Esta situação se refere à condição “b” já citada e será abordada mais tarde.

Plano de cisalhamento primário

F

g

60

Figura 6.2. Áreas de aderência e escorregamento na interface cavaco-ferramenta (Trent e Wright, 2000).

Uma outra situação diferente, é a existência da aresta postiça de corte, APC, (condição “c”) que é um fenômeno que pode ocorrer a baixas velocidades de corte. A presença da APC vai alterar completamente a geometria da cunha cortante, com efeitos em todo o processo de usinagem (força, temperatura, desgaste das ferramentas e acabamento superficial).

A possibilidade da existência de diferentes condições na interface cavaco-ferramenta impõe a necessidade de estudos criteriosos de cada uma dessas condições nos itens subsequentes, e posterior análise da influência delas nas variáveis do processo. Antes, porém, uma abordagem das condições de atrito em usinagem se faz necessária. 6.2. ATRITO NO CORTE DE METAIS

Quando duas superfícies são colocadas justapostas, a área de contato real (Ar) é muito menor que a área de contato aparente (A), devido às micro-irregularidades presentes em qualquer superfície acabada. Os contatos são estabelecidos apenas em alguns picos das irregularidades, como ilustrado na Figura 6.3.

Figura 6.3. Área de contato numa superfície levemente carregada (Shaw et alli, 1960).

Em se aplicando uma carga normal extra, os pontos de contato são deformados plasticamente, e a área de contato real (Ar) aumenta até ser capaz de

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suportar, também, esta nova carga aplicada. A força tangencial (ou de atrito), por conseguinte, aumenta proporcionalmente, e o limite de proporcionalidade é o coeficiente de atrito m, valendo, portanto, a lei de atrito de Coulomb. Se a carga normal aplicada for aumentada indefinidamente, vai existir um momento em que todos os picos das irregularidades se deformarão de tal maneira que a área real se iguala à área aparente. A força normal necessária para que isto aconteça é definida como “carga normal limite”. A partir deste valor, o aumento da força normal não altera mais a força tangencial (ou de atrito), isto é, a força tangencial não é mais proporcional à força normal. Ela passa a ser constante e assume o valor suficiente para vencer a resistência ao cisalhamento do material menos resistente. Nestas condições a lei de atrito de Coulomb não tem validade.

Shaw et alli (1960) identificam, portanto, três regimes diferentes de atrito sólido. A Figura 6.4 ilustra estes regimes. O regime I é aquele onde vale a lei de atrito de Coulomb (m = t/s = constante) e Ar <<< A. O regime III é aquele onde não existe superfície livre entre os materiais, isto é, Ar = A, e t é independente de s. Ele começa a existir a partir do valor de tensão normal limite, s2. O regime II é o de transição entre o I e o III, onde o coeficiente de atrito diminui com o aumento da carga normal. Wallace e Boothroyd (1964), entretanto, sugerem a transição brusca do regime I para o regime III, com a supressão do regime II, e a lei de atrito de Coulomb vale então até o ponto B da Figura 6.4 e a tensão normal limite passa a ser s1.

Figura 6.4. Os três regimes de atrito sólido (Shaw et alli, 1960).

Durante o corte dos metais, os regimes I e III ocorrem simultaneamente em pontos distintos ao longo do comprimento de contato entre o cavaco e a ferramenta. Zorev (1963) apresentou um modelo de distribuição de tensão na superfície de saída da ferramenta. A Figura 6.5 mostra este modelo, onde o comprimento de contato

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cavaco-ferramenta é dividido em duas regiões distintas: “a região de aderência” e “a região de escorregamento”. Segundo este modelo, a tensão normal é máxima na ponta da ferramenta e decresce exponencialmente até zero, no ponto onde o cavaco perde contato com a superfície de saída. A tensão cisalhante é constante na zona de aderência (e assume o valor do limite de resistência ao cisalhamento do material naquela região) e decresce, também exponencialmente, na zona de escorregamento, até o valor zero, no ponto onde o cavaco perde contato com a ferramenta. Na região de aderência, Ar = A e vale o regime III. Na região de escorregamento Ar <<<A e o regime I prevalece. A extensão da zona de aderência depende do valor da tensão limite slim (Figura 6.5).

Figura 6.5. O modelo de distribuição de tensão na superfície de saída da ferramenta, proposto por Zorev (1963).

Desta maneira, a força total tangente à superfície da ferramenta, é dada pela soma da força tangencial que atua em cada uma destas regiões. Considerando as duas situações individuais, Boothroyd (1981) equaciona as tensões tangenciais médias da região de aderência e da região de escorregamento e define o “ângulo de atrito médio, b” dado por (Boothroyd, 1981):

bs

èç

ö

ø÷arctg

k

fav

(6.1)

onde k é uma constante e sfav é a tensão normal média que atua na superfície de saída da ferramenta.

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6.3. ZONA DE ADERÊNCIA

Foi através de análise de micrografias da raiz do cavaco (obtidas pela interrupção brusca do corte, com o dispositivo “quick-stop”) de vários materiais usinados com aço-rápido e metal duro, que Trent (1963) obteve evidências claras de “íntimo contato” ao longo de uma grande porção da interface cavaco-ferramenta. Esta região foi denominada de zona de aderência (seizure zone), que é na realidade a confirmação da presença do regime III na interface. Sob estas condições, o movimento na interface ocorre por cisalhamento dentro do material do cavaco. Uma zona de cisalhamento intenso é formada bem próxima, mas não necessariamente na interface, que foi denominada de “zona de fluxo” ou flow zone, da literatura inglêsa (Trent, 1963).

Nesta zona existe um gradiente de velocidade. Uma camada de material em contato com a ferramenta é estacionária, mas a uma distância geralmente de 0,01 a 0,10 mm (espessura da zona de fluxo) a velocidade assume o valor da velocidade de saída do cavaco, vcav. Com este conceito, a tensão requerida para cisalhar o material a altas temperaturas e altas taxas de deformação é um fator muito importante em usinagem.

Posteriormente, mais de 25 anos após a primeira contribuição (1963), Trent publicou outro artigo importante dividido em três partes (Trent, 1988a, 1988b, 1988c), onde ele conclama que as “condições de aderências” devem ser assumidas como inevitáveis. Isto, para usinagem de praticamente todos os materiais (exceto alguns materiais de corte fácil), utilizando qualquer tipo de ferramenta de corte. Altas tensões de compressão, grandes quantidades e altas taxas de deformações, que causam altas temperaturas na interface cavaco-ferramenta, e a pureza do material da peça em contato com a ferramenta promovem as ligações atômicas nesta interface, causando aderência.

Trent (1988b) sugere que o mecanismo de deformação plástica na interface cavaco-ferramenta ocorre por dois modos diferentes: (i) a baixas velocidades de corte e avanço, com formação de Aresta Postiça de Corte, APC, ela ocorre por movimento de discordâncias, ocorrendo, portanto, encruamentos; (ii) a altas taxas de remoção de material, na zona de aderência, as deformações cisalhantes estão confinadas a estreitas bandas de cisalhamento termoplástico (zona de fluxo = flow zone). Neste mecanismo, as tensões de escoamento são reduzidas por um processo de recuperação dinâmica, que ocorre com o aumento da temperatura. A deformação plástica provavelmente envolve escorregamento dos contornos de grãos e o material se comporta praticamente como um “fluido viscoso”. A temperatura nesta região é acelerada pelo calor gerado pela deformação plástica e exerce um papel muito importante, não só ditando o mecanismo e as condições de deformação na zona de aderência, mas também influenciando diretamente os mecanismos de desgaste da ferramenta (Trent, 1988c). A Figura 6.6 apresenta uma micrografia da raiz de um cavaco de aço baixo carbono após quick stop onde se observa a presença da zona de fluxo. Isto é mais nítido na ampliação da Figura 6.6b. Nesta figura pode-se observar que no cavaco os microconstituintes do aço se apresentam deformados mais ou menos na direção do plano de cisalhamento primário. Não se pode dizer que eles estão exatamente na direção do plano de cisalhamento primário porque as deformações sofridas pelo cavaco na interface com a ferramenta (na zona de fluxo) corroboram para afastá-los desta direção.

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Na zona de fluxo observa-se que, à medida que se aproxima da interface com a superfície de saída da ferramenta, as deformações do material dentro da zona de fluxo vão aumentando rapidamente. Chegam a aumentar tanto que mais próximo da interface não se distinguem mais os microconstituintes (ferrita e perlita) por falta de resolução, com a ampliação usada nesta micrografia.

Figura 6.6. a)- Micrografia da raiz de um cavaco de aço ABNT 1010; b)- Ampliação da região indicada em a (Trent e Wright, 2000).

6.3.1. Deformações na Zona de Fluxo

Enquanto que no plano de cisalhamento primário as deformações cisalhantes são da ordem de 2 a 5 (Trent e Wright, 2000), podendo chegar a 8 nas bandas de cisalhamento adiabático na usinagem de titânio, na zona de fluxo (flow zone) as deformações são bem maiores, podendo atingir valores superiores a 100 (Trent e Wright, 2000). Este é um valor estimado, visto que é praticamente impossível de se medir tais níveis de deformações a taxas de deformações da ordem de 104 s-1 (Trent e Wright, 2000), confinadas a uma zona de fluxo de espessura bem estreita (geralmente medem de 10 a 100mm, Trent, 1988c). Trent e Wright, 2000, entretanto, propõe um modelo, o qual é apresentado na Figura 6.7.

Figura 6.7. Modelo de deformação na zona de fluxo proposto por Trent e Wright (2000).

Segundo este modelo, a deformação cisalhante na zona de fluxo é inversamente proporcional à distância da superfície de saída. No ponto Y, a porção inicial do material OabX sofreu uma deformação para Oa’b’X, enquanto que a

a b

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metade do material da porção inicial considerada, isto é, OcdX (metade de OabX) se deformou para Oc”d”X que é o dobro da deformação sofrida por ab. Correspondentemente, o material OefX, onde Oe vale ¼ de Oa, se deforma para Oe’’’f’’’X quando ele atinge o ponto Y, que é quatro vezes maior que a deformação sofrida por OabX quando este atinge o mesmo ponto, Oa’b’X.

A Tabela 6.1 mostra a variação da deformação cisalhante calculada dentro da zona de fluxo, para um exemplo, assumindo a velocidade de corte igual a 180 m/min, a velocidade de saída do cavaco de 60 m/min, espessura da zona de fluxo de 0,08 mm e o comprimento de contato de 1,6 mm.

Tabela 6.1. Deformações cisalhantes na zona de fluxo de acordo com o modelo da Figura 6.7 (Trent e Wright, 2000).

Distância da superfície de saída da ferramenta (mm)

Deformação cisalhante sobre o comprimento de contato cavaco-ferramenta (mm/mm)

Tempo sobre o comprimento de contato cavaco-ferramenta (ms)

Taxa de deformação (s-1)

80 20 1,6 1,25 x 104 40 40 3,2 1,25 x 104 20 80 6,4 1,25 x 104 10 160 12,8 1,25 x 104 5 320 25,6 1,25 x 104

2,5 640 51,2 1,25 x 104

Teoricamente, a deformação cisalhante seria infinita na superfície de saída da ferramenta, mas o fluxo laminar é interrompido a poucos micros desta superfície, devido à rugosidade superficial inerente. A capacidade dos metais e ligas metálicas suportarem tais níveis de deformações cisalhantes sem se romperem é atribuída às altíssimas tensões de compressão e elevadas temperaturas presentes naquela região. Das micrografias apresentadas por Trent e Wright (2000) é evidente que as condições de aderência podem também ocorrer na superfície de folga. Isto acontece quando o desgaste de flanco atinge determinadas proporções, eliminando o ângulo efetivo de folga. A Figura 6.8 mostra isto.

Figura 6.8. Zona de fluxo se estendendo na superfície de folga da ferramenta (Trent

e Wright, 2000).

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6.4. ZONA DE ESCORREGAMENTO

Além de aderência, condições de escorregamento são também observadas na periferia da área de contato entre o cavaco e a ferramenta (Trent, 1988a). A Figura 6.2 mostrou esquematicamente esta região. Em condições de escorregamento a área real, Ar, é muito menor que a área aparente, A, e isto é a constatação da presença do regime I, sugerido por Shaw et alli (1960). Nestas condições a zona de intenso fluxo de material (flow zone) está ausente. Ela não acontece porque as ligações que se formam são mais fracas que as ligações internas dos materiais da peça e da ferramenta, e o movimento relativo acontece justamente na interface. O deslizamento acontece por um processo conhecido por stick-slip, onde há o início da aderência, e logo em seguida ocorre o escorregamento na interface.

A presença de condições de escorregamento na periferia da área de contato cavaco-ferramenta se deve às baixas tensões de compressão atuando nestas regiões, que não favorece a presença do regime III, isto é, não favorece a presença das condições de aderência. Outro fator que dificulta a presença dessas condições é a possibilidade do acesso do oxigênio, formando óxidos que dificultam a formação de ligações metálicas fortes entre o cavaco e a ferramenta. A maior constatação da presença de escorregamento na periferia da aderência são as fotos micrográficas de cavacos de aço oferecidas por Trent e Wright (2000). A Figura 6.9 apresenta estas fotos. Na primeira foto (Figura 6.9a) é mostrada uma seção longitudinal do cavaco, bem perto de uma de suas arestas externas, isto é, na periferia da área de contato cavaco-ferramenta, onde as condições de escorregamento prevalecem. O autor foi muito feliz nesta micrografia, onde uma ação stick-slip foi detectada. Observa-se que se trata de um escorregamento pontual, como é característica das condições de escorregamento. Na segunda foto é apresentada a seção longitudinal do mesmo cavaco, só que tirado já no interior da seção transversal, a uma distancia de aproximadamente 0,5 mm de sua aresta externa. Nestas condições, já prevalecem condições de aderência, e a situação de stick-slip dá lugar à zona de fluxo.

Figura 6.9 – Seção longitudinal de um cavaco de aço. Em a)- próximo a uma de suas arestas externas e em b)- a 0,5 mm para dentro desta (Trent e Wright, 2000).

Ao fazer uma análise das condições da interface cavaco-ferramenta, Oxley (1980) tem uma opinião contrária à de Trent e argumenta que, em situações normais, isto é, sem APC, verdadeiras condições de aderência não podem ocorrer.

a b

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Oxley sugere uma condição de “quase-aderência” na interface cavaco-ferramenta, no qual a velocidade na interface, apesar de muito baixa, não é zero.

Doyle et alli (1979), após usinar cobre, alumínio, chumbo e índio com ferramentas transparentes (safira), encontraram uma zona de escorregamento próximo à aresta de corte com uma zona de aderência posterior a esta, que é exatamente o contrário àquilo que é defendido por Trent. Whight (1981) utilizou aço-rápido e também ferramentas transparentes na usinagem de vários materiais, na tentativa de elucidar o problema. Em algumas condições de usinagem ele confirmou os resultados de Doyle e colaboradores. Isto ocorreu quando ele usinou materiais macios, por curtos períodos de tempo, o que sugere que as ferramentas ainda estavam cobertas por uma camada de alguns contaminantes orgânicos, que impediam que as ligações fortes se formassem, permitindo dessa maneira que o escorregamento acontecesse. Em outras condições ele confirmou os resultados de Trent (1963, 1988a, 1988b, 1988c). Segundo Wright (1981) as condições de escorregamento (slinding) ou aderência (seizure) dependem: (i) da combinação do material da peça e da ferramenta; (ii) das condições atmosféricas; (iii) do tempo de usinagem; e (iv) da velocidade de corte. As “condições de aderência” são favorecidas por altas velocidades de corte, longos tempos de usinagem e pequenas diferenças entre o material da peça e da ferramenta.

Em outro artigo, Wright et alli (1979) havia proposto que a região da interface entre o cavaco e a ferramenta consiste de uma proporção de micro regiões em condições de aderência (seizure) e o restante em condições de escorregamento (slinding) simultaneamente. Desta maneira, para superfícies puras quimicamente, a proporção de região de aderência em relação à área total, se aproxima da unidade e não existe escorregamento na interface (condição de só aderência). Pode-se, entretanto, conseguir uma redução nesta proporção (como por exemplo, pela presença de contaminantes na interface), permitindo, assim, que ocorra algum escorregamento que, no limite (lubrificação perfeita, como no caso de alguns materiais de corte fácil) o escorregamento será total.

Alguns lubrificantes sólidos podem atuar na interface cavaco-ferramenta e suprimir a zona de aderência, caracterizando as condições especiais em que prevalece apenas a zona de escorregamento. Os lubrificantes sólidos são elementos ou compostos adicionados ao material da peça com a função de melhorarem sua usinabilidade. A presença de aditivos de livre-corte, tais como Pb, Se, Bi, Te, MnS, MoS2 no aço ou noutro material metálico funcionam como lubrificantes internos e formam um filme na interface, com resistência ao cisalhamento menor que a resistência da matriz, eliminando por completo a zona de aderência, prevalecendo totais condições de escorregamento, diminuindo assim, as temperaturas das ferramentas (Trent, 1988c). A Figura 6.10 exemplifica este efeito. Na Figura 6.10a o material é um latão 60-40 com evidente presença da zona de fluxo. Na Figura 6.10b o mesmo material recebeu a adição de Pb (as setas indicam essas adições). Como conseqüência houve o desaparecimento imediato da zona de fluxo. A adição de 2 a 3% de Pb é suficiente para promover este desaparecimento (Trent e Wright, 2000).

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Figura 6.10. Micrografia da raiz do cavaco de a) - latão 60-40 e b) – o mesmo material com adição de Pb (Trent e Wright, 2000).

Na realidade a zona de fluxo não desaparece. Ela é substituída pela zona de fluxo formada por material de livre-corte aderido na interface. A Figura 6.11 mostra uma boa quantidade de chumbo aderido na superfície de saída de uma ferramenta de metal duro após usinar o latão de livre-corte.

Figura 6.11. Presença de chumbo aderido na superfície de saída de uma ferramenta

de metal duro após usinar material contendo este aditivo sólido (Stoddart, 1979, citado por Trent e Wright, 2000).

Esta figura reforça a premissa da substituição da zona de fluxo. Estes elementos ou compostos têm a característica de possuírem baixo ponto de fusão e, portanto, nas temperaturas elevadas desenvolvidas na interface se apresentam na fase liquida, com baixa resistência ao cisalhamento. Entretanto, esta fase liquida está entre o cavaco e a ferramenta, que estão tendo contatos nos picos das irregularidades de ambos. Assim, a condição de escorregamento entre eles é que prevalece.

a b

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6.5. ARESTA POSTIÇA DE CORTE

Quando se usina a baixas velocidades de corte, um fenômeno conhecido como “aresta postiça de corte - APC” pode se apresentar na interface cavaco-ferramenta. Existe na literatura, uma quantidade enorme de artigos que trata da APC. Existem evidências de que a APC é contínua com o material da peça e do cavaco, ao invés de ser um corpo separado de material encruado, sobre o qual o cavaco se escoa (Trent, 1963). A Figura 6.12 mostra um desenho esquemático da APC, evidenciando ser esta um corpo solidário ao material da peça e do cavaco. A micrografia da Figura 6.13 confirma isto. Nesta figura a APC de uma liga de Al-Si foi obtida por quick stop, usinando numa velocidade de corte de 38 m/min (Trent e Wright, 2000).

Figura 6.12. Desenho esquemático de uma aresta postiça de corte - APC (Trent e Wright, 2000).

Durante o corte, sob altas tensões de compressão, as ligações são fortes o suficiente para evitar o escorregamento do material na superfície de saída da ferramenta. O cavaco se forma e se move por deformação plástica na região acima dos pontos “A” e “B” da Figura 6.12. Trent (1988b) explica este fenômeno da seguinte maneira: “...a primeira camada do material que se une à ferramenta, através de ligações atômicas, é encruado, aumentando assim, o seu limite de escoamento, e as tensões de cisalhamento são insuficientes para quebrar estas ligações. As deformações então continuam nas camadas superiores adjacentes, mais afastadas da interface, até que elas também são suficientemente encruadas. Pela repetição deste processo, uma sucessão de camadas formam a APC”. O tamanho da APC não pode aumentar indefinidamente. Quando o seu tamanho atinge um valor no qual a tensão de cisalhamento é suficiente para mudar a zona de cisalhamento primária (que até então acontecia acima da APC), para dentro do corpo desta, partes de sua estrutura é cisalhada e arrastada entre a superfície da peça e a superfície da folga da ferramenta, e também entre a superfície inferior do cavaco e a superfície de saída da ferramenta. A Figura 6.13 mostra este processo esquematicamente. A seqüência de quadros de 1 a 4 nesta figura mostra como o processo de crescimento da APC e cisalhamento de partes desta acontecem. É um processo que se repete ciclicamente.

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Figura 6.13. Esquema de crescimento da APC e cisalhamento de partes desta

deixando fragmentos nas novas superfícies geradas (Ferraresi, 1977).

A Figura 6.14 mostra a micrografia de uma APC onde se podem observar os fragmentos deixados como resultado deste processo de cisalhamento.

Figura 6.14. Micrografia de uma aresta postiça de corte de uma liga de Al-Si (Trent e

Wright, 2000).

Wallbank (1979) examinou a microestrutura da aresta postiça de corte de várias ligas, utilizando microscopia eletrônica e ótica. Foram encontradas várias microtrincas na zona de cisalhamento ao redor da APC (entre os pontos A e B da Figura 6.12). Estas microtrincas foram, também, consideradas responsáveis pela formação da APC.

Já foi provado experimentalmente (Willians e Rollanson, 1970) que a APC só se formará na presença da segunda fase dos materiais sob corte. Milovic e Wallbank (1983) explicaram isto teoricamente, pela presença de um sistema tri-axial de tensões nas redondezas das segundas fases deformadas, causado pela taxa de deformação diferente da segunda fase em relação à matriz. Este sistema tri-axial de tensão levará à formação das microtrincas entre os pontos A e B que irão se coalescerem e formar as trincas maiores (ou macrotrincas) nos pontos A e B, que foram consideradas também responsáveis pela formação da APC. Estes

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pesquisadores também encontraram APCs com diferentes geometrias e as classificaram de acordo com a Figura 6.15. A mudança de a) para d) é feita com o aumento da velocidade de corte. Em d), tem-se a presença da zona de fluxo (flow zone).

Figura 6.15. Variação da geometria da APC com velocidade de corte (Milovik e Wallbank, 1983).

Tanto a diferença da plasticidade relativa da segunda fase, como a temperatura desenvolvida durante a deformação plástica são responsáveis pela geometria da APC. Quando a plasticidade relativa da segunda fase se aproxima daquela da matriz, o promotor de microtrincas desaparece, eliminando, assim, a APC (Milovik e Wallbank, 1983). A importância da temperatura é ilustrada pelo trabalho experimental de Bandyopadhyay (1984) que mostrou que a APC pode ser eliminada apenas pré-aquecendo a ferramenta de corte. Quando o material é aquecido o amolecimento do material pela temperatura elimina o encruamento necessário para a formação e crescimento da APC. Este fato explica, também, o desaparecimento da APC com o aumento da velocidade de corte. Com o aumento deste parâmetro aumenta-se o calor gerado e por conseguinte a temperatura de corte também é aumentada. Portanto, vai existir um valor de velocidade de corte no qual a APC é eliminada. A este valor de velocidade denomina-se “velocidade de corte crítica, vccrítica”.

As dimensões da APC já foram muito estudadas e o gráfico da Figura 6.16 representa a variação das dimensões da APC com a velocidade de corte, normalmente encontrada na literatura (Ferraresi, 1977 e Algarte et alli, 1995).

Nota-se que a dimensão da APC cresce até atingir um valor máximo, a partir do qual começa a diminuir até o valor de velocidade de corte crítica, vccrítica, onde a APC desaparece completamente. Observa-se que para velocidades de corte menores, à esquerda do valor de dimensão máxima, a APC se encontra em “regime estável”, enquanto que para valores de velocidade de corte maiores, à direita do valor de dimensão máxima, ela se encontra em um “regime instável”, isto é, existe uma freqüência de aparecimento e desaparecimento da APC. Esta freqüência aumenta à medida que se aproxima do valor de velocidade de corte crítica, quando ela desaparece por completo.

Apesar do grande número de publicações sobre o assunto, o estudo das dimensões da APC é bastante comprometido pela falta de precisão na determinação de suas dimensões. Da Silva (1998) mostrou que tanto a largura, L, como a altura, H, variam muito ao longo da largura de corte, b. Isto prejudica seriamente qualquer conclusão tirada com relação a estas curvas.

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Figura 6.16. Variação das dimensões da APC com a velocidade de corte com identificação dos regimes estável e instável e da velocidade de corte crítica (Ferraresi, 1977 e Algarte et alli, 1995).

Em trabalho realizado no Laboratório de Ensino e Pesquisas em Usinagem – LEPU da Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Federal de Uberlândia, no curso de “Aspectos Tribológicos em Usinagem” do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, pelo aluno Washington Martins da Silva Júnior em 2003, várias espécimes de quick-stop de ligas de Al-Si foram estudadas. O objetivo do trabalho foi verificar a influência da velocidade de corte e da aplicação de fluido de corte nas dimensões da APC. As medidas foram realizadas em vários pontos ao longo da largura de corte, b. Além de observar que as dimensões médias da APC diminuem com o aumento da velocidade de corte e com a aplicação de um fluido de corte, confirmou-se a variação dessas dimensões ao longo da aresta de corte. A foto apresentada na Figura 6.17 evidencia esta variação.

200µm200µm200µm

Figura 6.17. Variação das dimensões da APC (Silva Jr, 2003).

L1

L2

b

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Esta foto é uma vista da superfície inferior do cavaco, junto à cunha de corte, obtida quando usinando a 9m/min, observada em microscópio eletrônico de varredura (MEV). Na figura observa-se que a largura da APC, L1, na região central é bem maior que a largura, L2, na região periférica da largura de corte, b (L1 > L2).

Nesta figura são observadas, também, algumas aparas de material da peça se precipitando da interface APC / superfície inferior do cavaco. Isto é uma forte indicação que existe uma liberação de material (spreading) devido aos valores elevados de tensões atuantes na região.

Este excesso de material de APC pode ser liberado, também, pelas laterais do cavaco. A Figura 6.18 mostra uma situação dessas. Neste caso, uma mini-apara lateral se evolui na face livre do cavaco. Quando isto acontece também na face posterior, esta apara irá encontrar a superfície secundária em usinagem, o que certamente vai contribuir para prejudicar o acabamento superficial da peça usinada. Entretanto, o entendimento completo do fenômeno de formação dessas aparas laterais e suas reais conseqüências à integridade da peça exigem estudos mais aprofundados.

500µm500µm500µm

Figura 6.18. Fragmentos laterais da APC de Al-Si, vc = 18m/min (Silva Jr, 2003).

Apesar de ênfases diferentes dadas por vários autores, pode-se resumir que a formação de APC é um fenômeno envolvendo deformação plástica, encruamento e formação de microtrincas. Estes fatores são fortemente afetados pelas condições de corte e temperatura.

O escorregamento (sliding) deve ocorrer em toda a região de contato cavaco-ferramenta, a baixíssimas velocidades de corte, e na periferia da zona de aderência, em altas velocidades de corte. A APC estará presente em velocidades de corte baixas e intermediárias e a zona de fluxo (presente em condições de aderência) se formará em velocidades de corte altas.

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6.6. INFLUÊNCIA DAS DIFERENTES CONDIÇÕES DA INTERFACE, NAS VARIÁVEIS DO PROCESSO

Em função da possibilidade de existência da 3 condições distintas na interface cavaco-ferramenta, que são: I – Condições de aderência + escorregamento II – Condições de escorregamento (em materiais com aditivos de livre-corte) III – Condições de APC é importante se fazer uma análise das conseqüências dessas condições nos principais parâmetros do processo de corte. 6.6.1. Influência na Temperatura de Corte A quantidade de calor gerado no plano de cisalhamento primário pode ser estimada, e a temperatura do cavaco calculada com suficiente precisão, porque o erro induzido, ao assumir uma distribuição normal de deformação no plano de cisalhamento, e ao desprezar a perda de calor durante o curto período de tempo envolvido, é pequeno. Porém, na zona de fluxo, em condições de aderência, os conhecimentos atuais ainda não possibilitam cálculo de temperatura. Isto porque: (i) as deformações (como está implícito no modelo da Figura 6.7), fluxo de tensão e a própria temperatura na zona de fluxo variam consideravelmente e não há dados disponíveis para cálculos; (ii) a quantidade de calor que flui para o cavaco e para a ferramenta é relativamente grande e difícil de calcular. Com relação à temperatura da ferramenta de corte, que em termos efetivos é o que interessa, sabe-se que o calor gerado na zona de cisalhamento primária exerce um papel secundário, porque as temperaturas desenvolvidas em regiões de deformações bem mais severas, na ponta da APC ou na zona de fluxo, são bem maiores. Desta maneira, o fluxo de calor não pode fluir do cavaco para a ferramenta e a temperatura da ferramenta é inteiramente governada pelas condições da interface.

Na presença da APC a zona de fluxo, que é a principal fonte de calor, está afastada da superfície da ferramenta. Isto significa que a distribuição da temperatura na ferramenta é menor, e depende bastante da geometria e estabilidade da APC. Como ambas decrescem com o aumento da velocidade de corte (na faixa da presença da APC), as temperaturas da ferramenta aumentam significativamente com o aumento desta variável (Trent, 1988c).

Na presença das condições de aderência a quantidade de calor gerado na zona de fluxo é imensa, e segundo o modelo de deformação apresentado na Figura 6.7, pode-se prever um aumento na temperatura do material à medida que ele se afasta da aresta principal de corte. Este aumento depende da quantidade de trabalho ali realizado e da espessura da zona de fluxo (Trent e Wright, 2000). Como as ligações entre o cavaco e a ferramenta são de caráter inteiramente metálico (Trent, 1988a), a temperatura da ferramenta será efetivamente a mesma da zona de fluxo na interface. A ferramenta funciona como um sorvedouro térmico e um gradiente de temperatura estável é criado dentro da ferramenta. A quantidade de

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calor que flui para a ferramenta vai depender da condutividade térmica da ferramenta, da geometria da ferramenta e do método de refrigeração que por ventura possa ser empregado.

Em regiões de escorregamento, apesar de não existir ainda estudos detalhados de distribuição de temperatura, pode-se afirmar que a temperatura na interface cavaco-ferramenta é bem menor que em regiões de aderência, principalmente à altas velocidades de corte, onde o calor gerado por pequenos períodos de tempo, promovem flashes de temperaturas que são indetectáveis pelos atuais métodos de medição de temperatura. Estes flashes seriam provenientes de deformações localizadas nos pontos de contato, como mostrado na Figura 6.3. 6.6.2. Influência na Força de Usinagem A força de usinagem é totalmente dependente da resistência ao escoamento no cisalhamento do material na zona de cisalhamento primária e na zona de cisalhamento secundária, e, também, do tamanho destas zonas (áreas) de cisalhamento (Trent e Wright, 2000).

Na presença da APC, as forças são geralmente baixas, porque a APC age como se fosse uma ferramenta com área de contato restrito, reduzindo efetivamente o comprimento de contato na aresta de corte (Trent e Wright, 2000). Além disto, a APC aumenta bastante o ângulo de saída efetivo, o que também faz diminuir as forças de usinagem.

Em condições de aderência na interface cavaco-ferramenta, onde se verifica total união por ligações atômicas entre as superfícies em contato, a resistência ao escorregamento, como já foi visto, é igual à resistência ao cisalhamento do material menos resistente (geralmente o da peça). Também nestas condições, a área real de contato é máxima, igual à área aparente. Tudo isto leva à conclusão que a força de usinagem é grande nestas condições.

Em condições de escorregamento no plano de cisalhamento secundário, a área de contato real é bem menor. A resistência ao movimento do material na interface é imposta apenas pelos picos de contato, o que faz reduzir a força de usinagem efetivamente. 6.6.3. Influência no Desgaste da Ferramenta Na usinagem com APC, se esta for estável, ela protege a superfície de saída da ferramenta. O desgaste neste caso é provocado apenas por adesão e abrasão na superfície de folga, causado por partes da APC, que se arrastam por entre a superfície de saída da ferramenta e a peça. No caso da APC ser instável, isto é, existir uma freqüência na sua existência, um outro importante mecanismo de desgaste, que envolve a aderência e arrastamento de micropartículas (attrition wear, da literatura inglesa) vai estar presente e acelerar o desenvolvimento de desgaste na superfície de saída.

76

Em condições de aderência, a análise se torna ainda mais complexa. A taxa de desgaste da ferramenta vai depender dos mecanismos de desgaste que prevalece na interface. As altas temperaturas desenvolvidas podem exercer influências marcantes nos mecanismos de desgaste termicamente ativados. Porém, outros fatores devem ser considerados. No mecanismo de desgaste difusivo, por exemplo, a transferência de átomos só é garantida pela existência da zona de fluxo com o gradiente de velocidade inerente. A velocidade zero na interface garante tempo suficiente para ocorrer a difusão e o fluxo de material garante a renovação contínua do material dentro dessa zona, impedindo dessa forma que aconteça a saturação, que formaria uma barreira difusiva ao processo, que eliminaria o mecanismo de desgaste. Um outro mecanismo que pode estar presente nestas condições de aderência é a deformação plástica, caso o material em usinagem tenha uma resistência (dureza) razoável. Neste caso, as elevadas temperaturas desenvolvidas na zona de fluxo, acopladas com as altas forças de usinagem desenvolvidas por este tipo de material, podem ser suficientes para vencer o limite de escoamento do material da ferramenta e provocar o colapso da mesma.

Em condições de escorregamento, as temperaturas médias são bem menores, o que faz com que os mecanismos de desgaste ativados termicamente diminuam. Porém, se verifica experimentalmente que a taxa de desgaste nestas condições pode ser maior que em condições de aderência. Isto mostra que o mecanismo de desgaste operante não envolve altas temperaturas da interface. Este é o caso do desgaste por aderência e arrastamento de micropartículas (attrition). Na zona de escorregamento há, também, a influência da atmosfera local, que tem acesso à interface. Trent (1988b) mostrou que na usinagem do aço com metal duro, o desgaste é acelerado na presença de oxigênio, e retardado na presença de nitrogênio ou argônio. Em regiões de aderência, entretanto, o desgaste não é influenciado pela atmosfera local.

Um fato interessante que deve ser ressaltado é que, como foi visto, ambas as condições, isto é, aderência e escorregamento, podem estar presentes simultaneamente e isto significa que diferentes mecanismos de desgaste podem ocorrer simultaneamente ao longo da interface. 6.7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Todo volume de informações colocado neste capítulo ratifica a importância das condições da interface cavaco-ferramenta no processo de usinagem. Mais ainda, o conhecimento destas condições deve ser incentivado, e pesquisa nesta área é fundamental. Ainda existem muitas coisas obscuras neste processo, tais como a quantificação de deformação e a distribuição de temperatura na zona de fluxo. O processo de deformação e os fenômenos que ocorrem na zona de cisalhamento primária são importantes, porém, a prática tem mostrado que o que ocorre na zona de cisalhamento secundária é tão importante quanto, e que em termos de performance de ferramentas, a zona secundária é mais importante que a primária.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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C A P Í T U L O 7

FORÇA, PRESSÃO ESPECÍFICA E POTÊNCIA DE USINAGEM

7.1. FORÇA DE USINAGEM

O conhecimento da força de usinagem que age na cunha cortante e o estudo do comportamento de suas componentes são de grande importância, não somente porque a potência requerida para executar o corte pode ser estimada, mas também, porque elas devem ser consideradas no projeto das máquinas ferramentas e de seus elementos. Ela pode ser responsável direta pelo colapso da ferramenta de corte por deformação plástica da aresta, além de influenciar no desenvolvimento de outros mecanismos e processos de desgaste. A força de usinagem pode também representar um índice de usinabilidade, além de poder ser usada como parâmetro para controle adaptativo do processo. 7.1.1. Força de Usinagem no Corte Ortogonal Para melhor entender como as forças de usinagem atuam na cunha cortante, o corte ortogonal deve ser considerado, como mostrado na Figura 7.1.

Figura 7.1. Representação das forças que agem na cunha cortante [1].

Observando a movimentação da ferramenta em relação à peça, dois grandes grupos de forças distintas são evidenciados:

· Forças provenientes da ação da ferramenta sobre a superfície inferior da cunha do cavaco, cuja resultante é Fu.

· Forças provenientes da ação da peça sobre o plano de cisalhamento primário, cuja resultante é Fu’.

B

D

80

Admitindo-se que a cunha do cavaco ODB da Figura 7.1 é indeformável, ou para manter o equilíbrio mecânico:

r rFu Fu+ =' 0 (7.1)

como mostra a Figura 7.1.

A resultante Fu pode ser decomposta em duas componentes ortogonais: FT, a força de atrito, responsável pela energia consumida no plano de cisalhamento secundário, e FN, a força normal, perpendicular a FT (Figura 7.1). Da mesma maneira, a resultante Fu’ pode ser decomposta em FZ, a força de cisalhamento, no plano de cisalhamento primário, responsável pela energia consumida para cisalhar o material naquele plano, e em FNZ, a força que exerce esforço de compressão no plano de cisalhamento primário, e é perpendicular a FZ.

A resultante Fu pode ainda ser decomposta em Fc, a força de corte, na direção de corte, responsável pelo trabalho total realizado no corte, e em Ff, a força de avanço, na direção de avanço e perpendicular a Fc no caso do torneamento. Portanto:

r r rFu Fc Ff= + (7.2)

Este sistema é melhor representado, pelo conhecido “CÍRCULO DE MERCHANT”, mostrado na Figura 7.2.

Figura 7.2. Círculo de Merchant [2].

Obtém-se o círculo de Merchant, transladando a força resultante Fu para a ponta da ferramenta, fazendo o seu módulo igual ao diâmetro do círculo. Este

81

artifício permite que a relação entre as diversas componentes da força Fu, sejam geometricamente evidentes.

As componentes Fc e Ff podem ser facilmente determinadas, pois elas agem em direções conhecidas. Dinamômetros, principalmente, à base de cristais piezoelétricos ou extensômetros elétricos, são utilizados para este fim. Conhecendo-se Fc e Ff, todas as outras componentes podem ser determinadas, em função do ângulo de saída da ferramenta g, e do ângulo de cisalhamento f, de acordo com a Figura 7.3. e Equações 7.3.

Figura 7.3. Determinação geométrica das componentes da força de usinagem em função de Fc e Ff [2].

F Fc FfT = +. sen .cosg g

F Fc FfN = -.cos .seng g

F Fc FfZ = -.cos .senf f

F Fc FfNZ = +. sen .cosf f (7.3) 7.1.2. Força de Usinagem no Corte Tridimensional Neste caso, o tratamento é idêntico ao corte ortogonal, com a diferença que agora uma terceira componente de Fu está presente, transportando a resultante da força de usinagem do plano para o espaço. A terceira componente é a força passiva Fp (projeção de Fu sobre a perpendicular ao plano de trabalho) e para o torneamento a equação 7.2 fica modificada para:

r r r rFu Fc Ff Fp= + + (7.4)

A Figura 7.4 apresenta a representação destas componentes, segundo a norma DIN 6584 [3]. Todas estas três componentes de Fu podem ser determinadas prontamente, com o auxílio de um dinamômetro, pois suas direções são claramente conhecidas.

82

Figura 7.4. Componentes da Força de Usinagem. a) no torneamento; b) no fresamento [3].

Nesta Figura, além das componentes Fc e Ff, aparecem também as componentes Ft (Força ativa = projeção de Fu sobre o plano de trabalho e Fap (Força de apoio = projeção de Fu sobre a perpendicular à direção de avanço, situada no plano de trabalho). No caso do torneamento o ângulo da direção de avanço, j = 90o e a força Fap confunde-se com Fc. No fresamento a Equação 7.2 fica modificada para a Equação 7.5, como mostra a Figura 7.4b.

r r r rFu Fap Ff Fp= + + (7.5) 7.1.3. Fatores que Influenciam a Força de Usinagem Nos capítulos 4 e 6 verificou-se o mecanismo de formação do cavaco e analisou-se as condições de interface cavaco-ferramenta, respectivamente. Mostrou-se, também, como a força de usinagem é alterada sob as diferentes condições da interface cavaco-ferramenta. Naquela análise, ficou evidente a dependência da força de usinagem com a maneira com que o cavaco se movimenta sobre a superfície de saída da ferramenta. Além da dependência das dimensões e resistência do plano de cisalhamento primário, portanto, a força de usinagem depende fortemente das condições da interface cavaco-ferramenta. De uma maneira simples e clara, pode-se afirmar que todos os fatores que contribuem para facilitar a movimentação do cavaco por sobre a superfície de saída, atuam no sentido de diminuir a força de usinagem Fu e vice-versa. Se as condições da interface se apresentarem como uma restrição ao escoamento livre do cavaco, a ação da ferramenta sobre a superfície inferior da cunha do cavaco tem que ser suficiente para vencer esta restrição. Se a restrição é grande, a força também é grande, e vice-versa. Dentro deste raciocínio, a força de usinagem pode ser considerada dependente de dois fatores principais [4]:

· Áreas dos planos de cisalhamento primário e secundário; · Resistência ao cisalhamento do material da peça, nos planos de

cisalhamentos primário e secundário.

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Com isto, qualquer parâmetro pode ser analisado, com base nos seus efeitos sobre estes dois fatores principais. Muitos deles vão atuar nos dois fatores e os resultados vão depender da predominância de um sobre o outro. Apesar da análise teórica ser de grande utilidade, as predominâncias dos fatores devem ser comprovadas experimentalmente. Com base em alguns resultados experimentais [5,6], podemos observar a influência das principais variáveis:

a) Velocidade de corte

A Figura 7.5 mostra a variação da força de corte com a velocidade de corte para alguns materiais. Para aqueles que contêm segunda fase, caso dos aços, na faixa de velocidades onde a APC se faz presente, observa-se um comportamento da força de usinagem bem característico. Inicialmente, para velocidades bem pequenas, a APC ainda está ausente e a tendência é a redução da força com o aumento da velocidade de corte devido ao aumento da geração de calor. Com o aparecimento da APC, a força de corte diminui imediatamente porque o ângulo de saída efetivo é consideravelmente aumentado e a área do plano de cisalhamento secundário é reduzida. Na medida em que a velocidade de corte aumenta, as dimensões da APC também aumentam até um valor máximo. Neste ponto a força de corte atinge um valor mínimo na Figura 7.5. O aumento da velocidade de corte além deste ponto faz com que a APC seja reduzida nas suas dimensões e entre no regime instável (ver Figura 6.15) e, por conseguinte a força de corte começa a aumentar até o ponto de velocidade crítica, em que a APC não se apresenta mais. A partir deste ponto, pela maior geração de calor e conseqüente redução da resistência ao cisalhamento do material nas zonas de cisalhamento, e pela ligeira redução na área de contato cavaco-ferramenta, a força de usinagem tende a sofrer uma ligeira redução com o aumento da velocidade de corte, notando-se que para valores bem altos de velocidades de corte, que são aqueles normalmente encontrados na indústria, o comportamento da força se torna praticamente constante.

Os outros materiais do gráfico não possuem segunda fase, pois tratam-se de metais puros e de uma liga hipoeutética de Cu-Zn (ela tem 30% de Zn, enquanto o eutético desta liga tem 36% de Zn) e, portanto não apresentam APC, fazendo com que os pontos de mínimo e máximo característicos da curva de força não se apresente. Na Figura 7.5 é importante observar, também, a relação da força apresentada pelo metal puro em comparação com a liga. Apesar de um aço com 0,19% C possuir maior resistência mecânica (e maior resistência ao cisalhamento) que o ferro puro, este último apresenta força de usinagem maior que o primeiro. Neste caso, a maior ductilidade do metal puro está garantindo maiores áreas dos planos de cisalhamento, e este fator está se sobrepondo sobre o fator resistência. O mesmo acontece com relação ao cobre puro em comparação com latão 70-30.

b) Avanço e profundidade de corte O aumento destes dois fatores, por aumentar diretamente as áreas dos planos de cisalhamento primário e secundário, causam um aumento da força de usinagem, numa proporção direta, quase que linear. Entretanto, é verificado experimentalmente que o efeito do avanço é maior que da profundidade de corte. A Figura 7.6 ilustra esta influência para três materiais diferentes.

84

Figura 7.5. Influência da velocidade de corte na força de corte [4].

Figura 7.6. Influência da seção de corte e da resistência do material da peça nas componentes de força de usinagem [7].

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c) Material da Peça De uma maneira geral, quanto maior a resistência do material a usinar, maior a resistência ao cisalhamento nos planos de cisalhamento e, portanto maior a força de usinagem (ver Figura 7.6). Entretanto, baixa resistência pode vir acompanhada de elevada ductilidade e isto pode aumentar a área da seção de corte, influenciando também a força de usinagem.

d) Material da ferramenta. A afinidade química do material da ferramenta com o material da peça pode atuar principalmente, na área da seção de corte. Se a tendência for promover uma zona de aderência estável e forte, a força de usinagem poderá ser aumentada. Se a tendência for diminuir o atrito na interface (ferramentas revestidas, por exemplo), evitando as fortes ligações de aderência, a área da seção de corte poderá ser reduzida, diminuindo a força de usinagem.

e) Geometria da ferramenta O ângulo mais influente é o de saída. Uma redução deste ângulo tende a aumentar a área de contato cavaco-ferramenta e impor uma maior restrição ao escorregamento do cavaco por sobre a superfície de saída, aumentando a força de usinagem (Figura 7.7).

Figura 7.7. Influência da geometria da ferramenta nas componentes da força de usinagem [8]

Outro ângulo que afeta a força de usinagem é o ângulo de posição, cr. Com o aumento deste ângulo, desde que o ângulo de posição lateral c’r não se altere, a força de usinagem diminui ligeiramente (Figura 7.7).

O ângulo de folga ou incidência, a0, só terá influência se utilizados valores bem pequenos (<30). Neste caso o atrito naquela região irá aumentar e, portanto afetar a força de usinagem proporcionalmente.

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f) Estado de afiação da ferramenta O desgaste da ferramenta de corte, pode alterar a geometria da ferramenta, porém o efeito maior é devido ao aumento da área de contato com o cavaco e/ou com a peça, com o crescimento do desgaste de cratera e de flanco, respectivamente. Isto faz aumentar a força de Usinagem.

g) Uso de fluído de corte O uso de fluído de corte, com a ação lubrificante, reduz a área de contato cavaco-ferramenta e diminui a força de usinagem. Entretanto, quando prevalece uma ação refrigerante, o fluído de corte pode aumentar a força de usinagem, por promover um aumento da resistência ao cisalhamento do material nas zonas de cisalhamento, pela redução da temperatura. 7.2. PRESSÃO ESPECÍFICA DE CORTE

A pressão específica de corte, Ks, é definida como a relação entre a força de corte, Fc, e a área da seção de corte, A, assim:

KsFc

A= (7.6)

como A = ap . fc = b.h, nos casos de ferramentas sem arredondamento das pontas, temos:

cp f.a

FcKs = (7.7)

A pressão específica de corte pode, também, ser entendida como sendo a energia efetiva consumida para arrancar uma unidade de volume de material da peça, assim:

pcpcc

ce a.f

Fc

a.f.v

v.FcμKs === (7.8)

que é igual a Expressão 7.7.

A pressão específica de corte é considerada um bom índice de usinabilidade dos materiais. Todos os fatores que alteram o valor de Fc, sem alterar o valor de A, alteram proporcionalmente o valor de Ks. É verificado experimentalmente que o fator mais influente é o avanço, e várias teorias foram propostas para se calcular Ks. A seguir é mostrado o resultados de algumas delas:

a) Taylor

Ksf ap

=88

0 25 0 07, ,. para FoFo cinzento (7.9)

87

Ksf ap

=138

0 25 0 07, ,. para FoFo branco (7.10)

Ksf

=200

0 07, para aços semi-doces (7.11)

b) ASME (American Society of Mechanical Engineers)

KsCz

fn= (7.12)

onde, Cz = constante do material n = 0,2 para aços n = 0,3 para FoFo

c) AWF (Associação de Produção Econômica - Alemanha)

KsCw

f= 0 477, (7.13)

onde, Cw = constante do material.

d) Kronenberg.

Ks

CksG

A

gs

fs=

æèç

öø÷

5 (7.14)

onde, Cks, gs e fs são constantes que dependem do material da peça e da

ferramenta. G = índice de esbeltez = ap

f.

e) Kienzle.

Ks Ks h z= -1. (7.15)

onde Ks1 e z são constantes do material da peça.

As constantes de cada fórmula, podem ser encontradas em tabelas, e os valores de Ks podem assim ser determinados. As fórmulas mais utilizadas são as de Kronenberg e Kienzle, por se apresentarem mais próximas a valores reais. Com estes valores de Ks, a força de corte pode, então, ser estimada. Este exercício de cálculo, pode evitar muitos contratempos, como o de se ter situações em que a potência da máquina ferramenta ser inferior à potência efetiva de corte, não permitindo, assim a utilização de parâmetros de usinagem pré selecionados.

88

7.3. POTÊNCIA DE USINAGEM

As potências necessárias para a usinagem resultam como produtos das componentes da força de usinagem pelas respectivas componentes de velocidade.

Potência de Corte - Nc

NcFc vc=

×

×60 75 [CV] (7.16)

Fc em Kgf e vc em m/min.

Potência de Avanço - Nf

NfFf vf

× ×1000 60 75 [CV] (7.17)

Ff em Kgf e vf em mm/min.

Potência Efetiva de Corte - Ne

Ne Nc Nf= + (7.18)

Para verificar a relação entre a potência de corte e a potência de avanço, vamos considerar um exercício prático. Suponhamos que na usinagem de um aço qualquer com ferramentas de metal duro usou-se uma velocidade de corte de 180 m/min, uma rotação de 600 rpm e um avanço de 0,25 mm/rev. Encontrou-se uma força de corte de 50 Kgf e uma força de avanço de 35 Kgf.

Considerando as Equações 7.16 e 7.17, temos:

Ncx

xCV= =

50 180

60 752 Nf

x x

x xCV= =

35 0 25 600

1000 60 750 0012

,,

e a relação Nc

Nf= =

2

0 00121667

,.

Este número comprova que a maior parcela de potência efetiva de corte, Ne, é dada pela potência de corte, Nc, sendo a potência de avanço, Nf, desprezível.

Assim pode-se escrever com uma boa aproximação que:

Ne » Nc (7.19)

Por esta razão a força de corte Fc, constituinte da maior parcela de potência de usinagem, é chamada “força principal de corte” [2].

A energia efetiva será consumida de várias maneiras, mas muitas delas desprezíveis, e as que realmente são de peso, são as parcelas consumidas para cisalhar o material nos planos de cisalhamento primário e secundário.

89

Assim, com uma boa aproximação pode-se escrever:

m m me s f= + (7.21)

onde: me = energia efetiva por unidade de volume de material removido (igual a pressão específica de corte, Expressão 7.8).

meFc v

v f ap

Fc

f apc

c

= =.

. . . (7.22)

ms = energia de cisalhamento por unidade de volume de material removido, no plano de cisalhamento primário, dado por:

msFz vz

v f apc

=.

. . (7.23)

onde vz = velocidade de cisalhamento, ver Figura 4.5.

mf = energia principal (ou de cisalhamento) por unidade de volume de material removido, consumida no plano de cisalhamento secundário, dado por:

mfFT v

v f apcav

c

=.

. . (7.24)

onde vcav = velocidade de saída do cavaco, ver Figura 4.5.

Potência Fornecida pelo Motor, Nm.

Nas máquinas ferramentas que apresentam um único motor para acionar o movimento de corte e o movimento de avanço, a potência fornecida pelo motor vale:

NmNc

=h

(7.20)

onde h é o rendimento da máquina ferramenta, que vale geralmente de 60 a 80%.

No caso de haver um motor para acionar cada movimento, o cálculo de Nm é separado, e o rendimento é geralmente maior.

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91

C A P Í T U L O 8

TENSÕES E DEFORMAÇÕES EM USINAGEM

8.1. TENSÕES

8.1.1. Tensões no Plano de Cisalhamento Primário As tensões no plano de cisalhamento primário podem ser calculadas usando as seguintes expressões:

Tensão Normal:

SA

FNZS =s (8.1)

Tensão Cisalhante:

SA

FZS =t (8.2)

onde, FNZ e FZ são as forças normal e tangencial, respectivamente, que atuam no plano de cisalhamento primário (ver Figura 7.1). AS é a área do plano de cisalhamento primário.

No corte ortogonal ff sen

.

sen

bhAAS == .

Portanto, a força necessária para formar o cavaco depende da resistência ao cisalhamento do material nas condições de corte e da área do plano de cisalhamento. 8.1.2. Tensões no Plano de Cisalhamento Secundário A tensão normal média que atua no plano de cisalhamento secundário de uma ferramenta de corte é de natureza compressiva e pode ser determinada dividindo-se a força normal FN pela área de contato cavaco-ferramenta. De maneira similar, a tensão cisalhante média pode também ser determinada dividindo-se a força tangencial FT pela mesma área de contato. Apesar dessas tensões médias serem algumas vezes utilizadas para análise de usinabilidade, elas não despertaram muitos interesses para estudos específicos de distribuição de tensões. As razões disto são, primeiro porque os seus valores não são precisos o suficiente, devido às dificuldades de se medir a área real de contato com precisão, e segundo porque as tensões críticas, que devem ser suportadas pela ferramenta, são as tensões máximas, e não as tensões médias.

92

Portanto, é importante conhecer a distribuição de tensão normal e a distribuição de tensão cisalhante na superfície de saída da ferramenta, mas é essencial conhecer os valores de tensões máximas.

Cálculos desenvolvidos por Zorev [1] mostraram que a tensão normal de compressão tem uma distribuição parabólica, sendo zero no ponto onde o cavaco perde contato com a ferramenta, e assumindo o valor máximo na aresta de corte (ver Figura 6.4). Ela pode ser representada pela seguinte expressão:

yC xq.=s (8.3)

onde: x = distância da zona de contato, a partir do ponto onde o cavaco perde contato com a ferramenta.

y e q = constantes.

Foi também concluído que a tensão cisalhante na zona de aderência é igual a resistência ao cisalhamento do material naquela região. Esta tensão cai a zero na zona de escorregamento, onde o cavaco perde contato com a ferramenta.

Análise experimental de distribuição de tensões, utilizando técnicas fotoelásticas [2,3] ou um dinamômetro especial com uma ferramenta bi-partida [4-6], mostraram resultados que confirmam que as tensões máximas se localizam realmente na aresta de corte, muito embora, algumas vezes a distribuição das tensões não são exatamente iguais àquelas calculadas por Zorev.

Foi verificado [5,6] que a distribuição de tensão varia com o material da peça, porque elas dependem não somente do coeficiente de atrito entre o cavaco e a ferramenta, mas também das características de deformação do material. Foi também mostrado [4] que os valores de tensões normais máximas aumentam com o aumento da velocidade de corte e avanço, mas os valores de tensões cisalhantes máximos, diminuem.

Brown e Hinds [7], também, usando técnicas fotoelásticas para analisar a distribuição de tensão em ferramentas de corte, durante a formação de cavacos segmentados, encontraram variações das tensões durante o ciclo de formação desse tipo de cavaco. Eles usaram uma resina de Epoxi como ferramenta de corte, e polietileno como material da peça. Este último material pode ser induzido a produzir cavacos contínuos ou segmentados. Eles encontraram que o aumento do pico de tensão, quando na formação do cavaco segmentado, chegava a 40% em relação à formação do cavaco contínuo. 8.2. DEFORMAÇÕES

Quando se menciona deformação em usinagem, geralmente, ela é relacionada com a deformação no plano de cisalhamento primário (ver Figura 8.1), dada por:

93

( )( ) ( )

dg

f f g= =

-

D

D

S

Y

cos

sen .cos (8.4)

Figura 8.1. Deformação no plano de cisalhamento primário [8].

A quantidade de deformação que o material sofre no plano de cisalhamento primário é muito grande. Quando o cavaco é fino (h’ pequeno), isto é, o grau de recalque é próximo da unidade, a deformação cisalhante é próxima do valor 2. Este valor pode subir para 5 ou mesmo maior, quando o grau de recalque é grande [9]. No caso particular do cavaco segmentado, o cisalhamento é ainda maior. Por exemplo, quando usinando titânio, foram encontradas deformações de 8 dentro das bandas de cisalhamento termoplástico adiabático e 1,3 dentro dos segmentos, determinados com base em observações metalográficas [10]. Além disso, a taxa de deformação no plano de cisalhamento primário é da ordem de 1000s-1 ou maior [8], que é um valor extremamente alto. Apesar de tudo isto, a abertura e a propagação de uma trinca ou mesmo a fratura, pode ser inibida pela ação da tensão de compressão.

Na zona de cisalhamento secundário, entretanto, dentro da zona de fluxo, as deformações são bem maiores que aqueles valores registrados dentro da zona de cisalhamento primário. Trent [11] sugeriu o modelo apresentado no item 6.3.1 através da Figura 6.5. Segundo este modelo as deformações aumentam à medida que o material se aproxima da interface cavaco-ferramenta, que teoricamente seria infinito na interface. Entretanto, devido a presença das irregularidades superficiais envolvidas existe uma interrupção no aumento exponencial da deformação. Desta maneira, o mesmo Trent sugere valores da ordem de 80 a 100 mm/mm de deformação dentro da zona de fluxo. Novamente, a capacidade de metais e ligas metálicas suportarem tal quantidade de deformação sem se fraturarem é atribuído aos altos valores de tensões de compressão e a elevadas temperaturas naquela região. Esse assunto já foi tratado no capítulo 6.

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95

C A P Í T U L O 9

TEMPERATURA DE CORTE

9.1. INTRODUÇÃO

Em usinagem praticamente todas energias consumidas, representadas pela Expressão 7.21, são convertidas em calor. Somente uma pequena porcentagem (1 a 3%) não é convertida em energia térmica. Parte desta pequena porção fica retida no sistema como energia elástica, e outra parte está associada à geração de novas superfícies (peça e cavaco).

A Figura 9.1 mostra as três zonas distintas, onde o calor pode ser gerado em usinagem.

Figura 9.1. Zonas de geração de calor em usinagem.

São elas:

I. zona de cisalhamento primário, zona A da Figura 9.1. II. zona de cisalhamento secundário, zona B e C da Figura 9.1. III. zona de interface entre a peça e a superfície de folga da ferramenta, zona D da

Figura 9.1.

Grande parte deste “calor gerado” é dissipada pelo cavaco, uma pequena porcentagem é dissipada pela peça e uma outra para o meio ambiente. O restante vai para ferramenta de corte. Apesar desse restante representar apenas pequenos percentuais (8 a 10%), o aumento da temperatura associado com este calor é significativo, podendo chegar, em certos casos, a 1100 ºC, o que compromete, fortemente, a resistência da ferramenta.

A equação de balanço energético fica:

QfQmaQpQcQaQaQz 21 +++=++ (9.1)

onde,

96

Qz = calor gerado na zona de cisalhamento primário. Qa1 = calor gerado na zona de cisalhamento secundário. Qa2 = calor gerado na zona de interface peça-superfície de folga da ferramenta. Qc = calor dissipado pelo cavaco. Qp = calor dissipado pela peça. Qma = calor dissipado pelo meio ambiente. Qf = calor dissipado pela ferramenta de corte.

A seguir é feita uma análise em separado, dos diversos componentes de calor gerado. 9.2. CALOR GERADO NA ZONA DE CISALHAMENTO PRIMÁRIO, QZ

A maior parte deste calor é dissipado pelo cavaco, mas uma pequena fração M, é conduzida na peça, e aumenta a sua temperatura, podendo às vezes causar problemas de precisão dimensional. Segundo Nakayama [2], no torneamento este aumento de temperatura, Dqp, depende da rotação (aumentando com o aumento da mesma), e do número de revoluções após o corte ter iniciado (a peça é aquecida pelos cortes precedentes e isto afeta o aumento da temperatura no corte subsequente).

Quanto ao aumento da temperatura do cavaco devido ao calor Qz, existe um método que permite um cálculo aproximado [3]:

( ) ( )[ ]Dqc

M Fc Ff

J c h b=

- -1 tan

. . . .

f

r =

( )[ ]

cv.b.h.c.ρ.J

FZxVZM1- (9.2)

onde: J = equivalente mecânico de calor. r = densidade do material da peça. c = calor específico do material da peça.

O aumento de temperatura no cavaco, Dqc, não é muito influenciado pela velocidade de corte, embora M diminui com o aumento de Vc. A altas velocidades, entretanto, Dqc tende a ficar constante com Vc [1]. A temperatura no cavaco pode chegar a 650o C quando usinando aços endurecidos e algumas ligas de níquel, sob certas condições de corte, mas a faixa normal de temperatura do cavaco, quando usinando aços e outros materiais comuns é de 200o C a 350o C [1]. Um forte indicativo das temperaturas nos cavacos de aços é a coloração apresentada por eles, quando são usinados sem fluido de corte. Essa coloração, normalmente marron ou azul é promovida, poucos segundos após serem produzidos, pela formação de uma fina camada de óxido que acontece a temperaturas da ordem de 250 a 350°C [1].

A temperatura do cavaco, entretanto, terá praticamente, nenhuma influência na temperatura da ferramenta, porque o tempo com que uma pequena porção do cavaco (lamela) passa sobre a superfície de saída da ferramenta, é muito pequeno (poucos milissegundos) para conduzir calor [1]. Além disso, na presença da zona de fluxo na zona de cisalhamento secundário, haverá ali o desenvolvimento de

97

temperaturas bem maiores que as temperaturas do cavaco. Assim, o calor fluirá da zona de fluxo em direção ao cavaco, e não o contrário.

9.3. CALOR GERADO NA ZONA DE CISALHAMENTO SECUNDÁRIO, Qa1

Esta é a fonte de calor mais responsável pelas temperaturas da ferramenta de corte. A temperatura da ferramenta pode não ser considerado o maior problema quando na usinagem de materiais macios e de baixo ponto de fusão, como o alumínio e o magnésio, mas se torna o fator controlador da taxa de remoção de material, quando na usinagem de materiais duros e de alto ponto de fusão, como ferros fundidos, aços, ligas de níquel e ligas de titânio.

A temperatura da interface cavaco-ferramenta aumenta com a velocidade de corte. Haverá, portanto, um limite prático na velocidade de corte, para cada par ferramenta-peça. As altas temperaturas nas ferramentas de corte não só aceleram os mecanismos de desgaste termicamente ativados, mas também reduzem o limite de escoamento dessas ferramentas. Na presença da zona de fluxo, a quantidade e a taxa de deformação são tão altas e complexas, que Trent [4] afirmou ser irrealista tentar calcular o aumento de temperatura naquela região, com o presente estado de conhecimento dos fenômenos envolvidos. Tais exuberantes quantidades de deformações sem promover encruamento do material na mesma proporção, só podem ocorrer com o amolecimento adiabático causado pelo aumento da temperatura. O processo é idêntico ao da formação do cavaco segmentado, descrito no capítulo 4, item 4.4, letra d. A temperatura na zona de fluxo, e portanto, a temperatura da ferramenta depende da quantidade de trabalho realizado para cisalhar o material e da quantidade de material que passa pela zona de fluxo, e isto varia com o material da peça [1]. Temperaturas da ordem de 1100o C na interface cavaco-ferramenta podem ser encontrados e as ferramentas de corte têm que estar preparadas para suportarem estas temperaturas durante o corte.

A Figura 9.2 mostra a temperatura máxima da interface cavaco-ferramenta (e portanto a temperatura máxima na superfície de saída da ferramenta) na usinagem de vários materiais com ferramentas de aço rápido, em função da velocidade de corte.

Figura 9.2. Temperaturas máximas da interface cavaco-ferramenta em função da velocidade de corte [1].

98

Podem-se observar temperaturas bastante elevadas em velocidades de corte bem baixas, para certos materiais.

Como visto no Capítulo 6, item 6.6, as condições da interface cavaco-ferramenta (aderência, escorregamento ou aresta postiça de corte) devem ser assumidas como os fatores mais importantes a serem considerados na influência sobre a temperatura da ferramenta de corte. A zona de fluxo, portanto, constitui uma fonte efetiva de calor, e apesar de se conhecer muito pouco sobre a influência dos elementos de liga e mudanças microestruturais nas bandas de cisalhamento termoplásticos (zona de fluxo), Trent [4] enumerou pelo menos três parâmetros metalúrgicos que influenciam a temperatura da ferramenta:

I. O ponto de fusão do principal elemento químico do material da peça. Quanto maior o ponto de fusão deste elemento, maior a temperatura da interface cavaco-ferramenta, para qualquer velocidade de corte.

II. Elementos de liga que aumentam a resistência do material da peça. Eles aumentam a temperatura da interface para qualquer taxa de remoção de material.

III. Presença de fases de baixa resistência ao cisalhamento na interface (tais como MnS e grafita). Elas podem reduzir a temperatura.

9.4. CALOR GERADO NA ZONA DE INTERFACE ENTRE A PEÇA E A SUPERFÍCIE DE FOLGA DA FERRAMENTA, Qa2

Se a usinagem ocorrer com ângulos de folga pequenos (<2º) ou se o desgaste de flanco atingir proporções consideráveis, a interface peça-superfície de folga da ferramenta se torna a terceira fonte importante de geração de calor. Neste caso, a análise é similar à zona de cisalhamento secundário, com a presença da zona de fluxo, o que promove altas temperaturas na superfície de folga, que pode levar a ferramenta de corte ao colapso [1]. 9.5. MEDIÇÃO DA TEMPERATURA DE USINAGEM

Vários métodos, práticos e analíticos, vêm sendo desenvolvidos ao longo do tempo com o objetivo de determinar a temperatura gerada durante o processo de usinagem. Porém, nenhum deles é universalmente aceito como absoluto. Dentre as técnicas analíticas modernas de determinação da temperatura de usinagem, pode-se destacar o uso de elementos finitos [5] para a obtenção da distribuição de temperatura na ferramenta de corte, na peça e até mesmo no cavaco e o uso de problemas inversos em condução de calor para estimar a temperatura na interface cavaco-ferramenta. De Melo [6], desenvolveu um método que consiste da utilização de técnicas de problemas inversos, da medição, em tempo real, da temperatura na aresta inferior oposta à aresta de corte e do uso do modelo de mapeamento elipsoidal desenvolvido por Lin et alli [7] para a estimação da temperatura na interface cavaco-ferramenta. As equações pertinentes ao método foram resolvidas por diferenças finitas. A técnica apresentou-se bastante sensível à variações de parâmetros geométricos importantes, tais como o comprimento de contato cavaco-ferramenta e o posicionamento dos sensores de temperatura. Na Figura 9.3 são mostradas curvas de temperatura estimadas pelo método utilizando ferramentas de

99

metal duro classe K10 e de cerâmica à base de Si3N4, durante o torneamento de ferro fundido cinzento.

0 25 50 75 100 125 1500

100

200

300

400

500

600

Ferramenta de metal duro Ferramenta de cerâmica

Tem

pera

tura

(°C

)

Tempo (s)

Figura 9.3. Temperaturas estimadas na interface cavaco-ferramenta em insertos de cerâmica e de metal duro (vc=98 m/min; f=0.176 mm/rot; ap=1.5 mm) [6].

Pode-se observar que, para um mesmo período de usinagem, a temperatura obtida com a cerâmica é inferior àquela obtida com o metal duro. Em princípio, este resultado é coerente, pois teoricamente as cerâmicas têm menores afinidades químicas pelos materiais ferrosos. Isto promove menor restrição ao movimento de saída do cavaco (menor atrito), gerando menor quantidade de calor e consequentemente, menor temperatura de corte quando se usa a ferramenta cerâmica. Entretanto, ao se medir área de contato cavaco-ferramenta e a força de corte nestes experimentos, as cerâmicas, contrariando as expectativas, apresentaram maiores áreas e maiores forças que as ferramentas de metal duro. Isto significa maior geração de calor proporcionado pelas cerâmicas. A explicação pelos resultados apresentados nas curvas da Figura 9.3, portanto, podem ser creditadas à menor difusividades das cerâmicas, mas confirmação disto necessitaria maiores investigações. Além disto, o método de medição da área de contato cavaco-ferramenta (marcas deixadas na superfície de saída, após a usinagem) não é preciso, o que pode induzir a erros. Pode-se considerar também que maior quantidade de calor foi gerado em uma área também maior. Isto pode garantir uma maior distribuição desse calor, garantindo menores temperaturas.

Os métodos práticos mais utilizados atualmente para a medição da temperatura de usinagem são:

a) Medição da força termoelétrica entre a ferramenta e a peça (método do termopar ferramenta-peça).

b) Medição direta por inserção de termopares na ferramenta de corte. c) Medição do calor de radiação com sensores infra-vermelhos. d) Medição utilizando vernizes termosensíveis. e) Medição por técnicas metalográficas. f) Medição usando pós-químicos. g) Medição usando o método do filme PVD

100

A seguir é apresentada uma descrição suscinta e algumas aplicações desses métodos. Maiores detalhes podem ser encontrados em [6-16].

a) Medição da força termoelétrica entre a ferramenta e a peça (método do termopar ferramenta-peça)

A técnica do termopar ferramenta-peça pode ser melhor explicada através da observação da Figura 9.4 à seguir.

Figura 9.4. Esquema para medição da temperatura de corte pelo método do termopar ferramenta-peça [6].

O ponto Q de contato da peça com a ferramenta representa a junção quente. Os pontos F1, F2, F3 e F4 representam as junções frias. A cuba é preenchida com mercúrio até que seja estabelecido o contato elétrico do disco com o elemento E, garantindo desta forma o fechamento do circuito. Originalmente este contato era feito com o uso de escovas e anéis de escorregamento, o que introduzia voltagens estranhas no sistema ocasionando erros de medição [8]. Os fios A1 e A2 fazem a conexão do sistema com o milivoltímetro V que indica o valor da f.e.m. gerada. O sistema pode ser calibrado para fornecer valores de temperatura em 0C.

Segundo Ferraresi [9], o método mais simples de calibração do termopar cavaco-ferramenta e provavelmente o mais preciso, é o mostrado na Figura 9.5. Consiste na imersão simultânea dos componentes F, C e P em um banho de sal B, aquecido pela resistência R. F é uma haste do mesmo material da ferramenta de corte, que deve ter um diâmetro de pelo menos 1/8” para garantir uma temperatura uniforme e limitar a quantidade de calor transferido à extremidade fria que, por sua vez, deve estar a uma boa distância da ponta aquecida, mantendo-se à temperatura ambiente durante a calibração. C representa o material da peça, podendo ser o próprio cavaco desta. Se o material em usinagem não produz cavaco longo, deve-se preparar uma peça longa semelhante à haste da ferramenta. A temperatura do banho é medida por um termopar cromel-alumel padrão P.

101

Figura 9.5. Calibração do método do termopar ferramenta-peça [9].

b) Medição direta por inserção de termopares na ferramenta de corte.

Consiste da inserção de termopares de pequeno diâmetro em diversas posições da ferramenta de corte. Para tanto são feitos microfuros, geralmente por eletroerosão. Uma aplicação bastante útil do método é na determinação da distribuição de temperatura em insertos de metal duro. Para tanto, as ferramentas devem ser furadas em diversas posições e profundidades. É importante que se tenha um único furo por inserto para minimizar a perturbação do fluxo de calor. Caso contrário, a determinação da distribuição de temperatura se torna uma tarefa extremamente difícil. A Figura 9.6 ilustra o método.

Figura 9.6. Método do termopar implantado [6].

c) Medição do calor de radiação.

A radiação térmica emitida durante o processo de usinagem foi medida pela primeira vez pelo famoso experimento de Schwerd [10], citado por Bickel [8], durante a usinagem de um disco através de corte ortogonal. As superfícies da ferramenta, da peça e do cavaco ficaram acessíveis, permitindo que a radiação infravermelha destas fossem focalizadas por um sistema de lentes.

A Figura 9.7 ilustra o método onde é utilizado um termopar como sensor de temperatura.

102

Figura 9.7. Medição da temperatura de corte através da radiação térmica [9].

Pode-se observar que o calor irradiado pela ponta da ferramenta está sendo projetado, por meio de um sistema de lentes, no termoelemento (termopar), o qual produz uma d.d.p. proporcional à temperatura naquela região. A f.e.m. gerada é medida através de um milivoltímetro. O sistema pode ser calibrado de modo a fornecer valores da temperatura na região da ferramenta, em qualquer unidade.

d) Medição utilizando vernizes termosensíveis.

Consiste da utilização de vernizes com capacidade de mudança de cor a determinadas temperaturas. Esta técnica é aplicada somente em superfícies acessíveis sob condições de regime permanete. Ferraresi [9], cita o uso de lápis indicador de temperatura para controlar a vida das ferramentas pluricortantes. Tal controle baseia-se no seguinte princípio: cargas iguais na aresta das ferramentas pluricortantes originam iguais temperaturas; a aresta mais carregada aquece-se mais e a menos carregada aquece-se menos.

A utilização do lápis indicador de temperatura permite determinar as ferramentas mais sobrecarregadas.

e) Medição por técnicas metalográficas.

A distribuição da temperatura de corte pode ser obtida através da inspeção metalográfica da própria ferramenta. A dureza à temperatura ambiente do aço carbono endurecido e do aço-rápido decresce após seu reaquecimento, e a redução na dureza depende da temperatura e do tempo de aquecimento. Segundo Wright e Trent [11], as ferramentas de aço carbono endurecidas começam a perder dureza a partir de 250 0C, e esta propriedade é rapidamente reduzida após um aquecimento à 600 0C. Já as ferramentas de aço rápido não sofrem amolecimento apreciável até 600 0C. Entre 600 e 850 0C a dureza cai rapidamente, mas pode voltar a subir para temperaturas de reaquecimento maiores, se forem rapidamente resfriadas. Calibrando-se a dureza versus temperatura e o tempo de aquecimento, uma família de curvas podem ser obtidas. Dearnley [12] desenvolveu uma técnica que permite avaliar a distribuição de temperatura em insertos de metal duro. Consiste na substituição do elemento ligante normalmente utilizado nesses insertos, o Co, por ferro e ferro-silício, com diferentes teores. Cada ligante utilizado possui uma temperatura específica de transformação de fase, o que permite determinar as isotérmicas nas ferramentas. Através deste método, a

103

distribuição de temperatura foi determinada numa seção transversal à aresta principal de corte da ferramenta, após usinar um aço de baixo carbono sob diversas velocidade de corte [13]. Os resultados são apresentados na Figura 9.8. Observa-se que nesta aplicação a máxima temperatura acontece à determinada distância da aresta principal de corte, e que elas crescem com o aumento da velocidade de corte.

Figura 9.8. Distribuição de temperatura na ferramenta de corte, após usinar aço de baixo carbono por 30s, com avanço de 0,25 mm/rev e várias velocidades de corte [13].

A Figura 9.9 apresenta a distribuição de temperatura para avanços crescentes obtidas pela técnica metalográfica. Verifica-se o constante aumento da temperatura e da zona afetada pelo calor com o aumento deste parâmetro.

(c)

(a) (b)

Figura 9.9. Influencia do avanço nas temperaturas das ferramentas usadas para cortar aço com avanços de a)- 0.125 mm/volta; b)- 0.250 mm/volta; c)- 0,500 mm/volta [1].

104

A influência da utilização de um fluido de corte e da direção de sua aplicação são ilustrados na Figura 9.10. Em a tem-se a usinagem sem fluido de corte, em b utilizou-se um fluido de corte aplicado sobre-cabeça e finalmente em c utilizou-se o mesmo fluido de corte, aplicado entre a superfície em usinagem principal da peça e a superfície de folga da ferramenta. Observa-se que o fluido não consegue baixar a temperatura máxima da ferramenta de 900oC.(que é a temperatura máxima detectável pelo método utilizado), mas sua aplicação aumenta nitidamente o gradiente de temperatura e reduz a zona afetada pelo calor. Isto é mais acentuado quando o fluido é aplicado entre a superfície em usinagem principal da peça e a superfície de folga da ferramenta de corte.

Figura 9.10. Contornos de temperaturas na superfície de saída das ferramentas de corte, após usinagem a) sem fluido de corte; b)- com fluido de corte aplicado sobre-cabeça; c)- com fluido de corte aplicado entre a superfície em usinagem principal da peça e a superfície de folga da ferramenta de corte [1].

f) Medição usando pós-químicos.

Esta técnica consiste da utilização de sais com ponto de fusão bem definido tais como NaCl, KCl, CdCl, PbCl2, AgCl, KNO3, para determinação da distribuição da temperatura no corpo da ferramenta de corte.

105

Kato et alli [14], determinaram a distribuição de temperatura numa superfície perpendicular ao plano de referência de ferramentas de metal duro (classe P20), cermets e cerâmicas, durante o corte ortogonal de tubos do material STKM 13A utilizando pós de sais com ponto de fusão constante, Figura 9.11.

Figura 9.11. Experimento utilizado por Kato et alli para a determinação da distribuição de temperatura no plano ortogonal de insertos (Kato et alli, 1976).

A técnica consiste, em primeiro lugar, da divisão do inserto em duas partes de iguais dimensões. Geralmente esta etapa é realizada por processo de abrasão (retificação) dos insertos, até que se alcance a dimensão desejada, ou seja, a metade do tamanho original. Para obter uma ferramenta bi-partida, pelo processo anteriormente descrito, é necessária a disponibilidade de, pelo menos, dois insertos do mesmo material. Com a ferramenta bipartida em mãos, a próxima etapa consiste em umedecer as superfícies retificadas com uma solução de silicato de sódio para melhorar a adesão do sal que será posteriormente espalhado por sobre estas superfícies. Terminadas estas etapas, as partes são unidas e processa-se a usinagem durante um tempo suficiente, até que o sistema entre em regime. Após o corte, a ferramenta é novamente separada e a isotérmica gerada pela fusão do sal é observada. Esta pode ser identificada pela linha gerada entre o sal que sofreu fusão e o que permaneceu sem transformação. Se este processo for repetido com vários tipos de sais (com pontos de fusão diferentes), e com ferramentas de um mesmo material, pode-se determinar a distribuição de temperatura no plano ortogonal à aresta da ferramenta de corte.

Casto et alli [15], utilizaram uma técnica semelhante. Com o uso de nitreto de potássio (ponto de fusão = 390 0C) posto num plano paralelo à superfície de saída de insertos cerâmicos determinaram a isotérmica gerada durante a usinagem do aço ISO C40.

h) Medição usando o método do filme PVD.

Este método foi publicado por Kato e Fujii em 1996. Consiste da deposição de finas camadas de diversos materiais com pontos de fusão específicos numa superfície perpendicular à superfície de saída de insertos de metal duro. Após a deposição do filme de um determinado material, as partes da ferramenta são unidas e posta para usinar um disco num processo de corte ortogonal como mostra a Figura 9.12.

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Figura 9.12. Montagem experimental para medir a distribuição de temperatura pelo método PVD (Kato e Fujii, 1996).

A Figura 9.13 mostra uma fotomicrografia de uma superfície de material depositado fundido em um inserto de metal duro após o corte ortogonal de um aço carbono com 0.55% C a uma velocidade de corte de 200 m/min, avanço de 0.2 mm/rev, largura de corte de 2 mm por um tempo de 5 segundos. O contorno entre a zona de filme fundido e a zona de filme não fundido é claramente identificada na figura. O material depositado neste caso foi o telúrio com um ponto de fusão de 450 0C.

Zona de filme fundido

Zona de filme não fundido

Figura 9.13. Fotomicrografia mostrando as zonas fundida e não fundida (Kato e Fujii, 1996).

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16. SHAW, M.C. “Metal Cutting Principles”, Oxford University Press, 1984, ISBN 0-19-859002-4.

108

C A P Í T U L O 1 0

MATERIAIS PARA FERRAMENTAS DE CORTE

10.1. INTRODUÇÃO

O processo de usinagem, que utiliza como ferramenta um material mais duro que o da peça, é a operação mais comum entre os processos de fabricação existentes. Baseado no princípio da dureza relativa, o surgimento de novos materiais e ligas estruturais com excelentes propriedades de resistência mecânica e elevada dureza contribui para o aparecimento de novos materiais de ferramentas mais resistentes para as operações de usinagem.

Por outro lado, a usinagem de materiais frágeis e/ou operações de cortes interrompidos (como o caso do fresamento, por exemplo) requerem materiais de ferramentas com suficiente tenacidade para suportarem os choques e os impactos inerentes a tais processos.

Como dureza e tenacidade são duas propriedades opostas (normalmente alta dureza significa baixa tenacidade e vice-versa), o balanço destas propriedades nos materiais de ferramenta de corte se tornou um desafio para os fabricantes. Mais uma vez dedicação em estudos e investimentos na pesquisa mostram-se eficientes, pois hoje pode-se encontrar no mercado grande número de ferramentas com invejáveis características simultâneas de tenacidade e dureza. A conciliação dessas propriedades foi conseguido com a produção de ferramentas com diferentes composições químicas, tamanho de grãos finos e total controle dos processos de fabricação e tratamento térmico, o que lhes confere um grau de pureza e qualidade excepcionais.

As principais propriedades que um material de ferramenta de corte deve apresentar são listadas abaixo, não necessariamente em ordem de importância. Dependendo da aplicação, uma ou mais propriedades podem se destacar.

Ä Alta dureza;

Ä Tenacidade suficiente para evitar falha por fratura;

Ä Alta resistência ao desgaste;

Ä Alta resistência a compressão;

Ä Alta resistência ao cisalhamento;

Ä Boas propriedades mecânicas e térmicas a temperaturas elevadas;

Ä Alta resistência ao choque térmico;

Ä Alta resistência ao impacto;

109

Ä Ser inerte quimicamente.

O grande número de fabricantes de ferramentas de corte existente no mercado gera uma forte concorrência entre eles, o que, de certa forma, garante produtos de alta qualidade a preços satisfatórios.

A Figura 10.1 apresenta a lista dos materiais para ferramentas de corte existentes hoje no mercado mundial. A medida que se desce na lista, ganha-se em dureza (ou resistência ao desgaste) e perde-se em tenacidade, e vice-versa. A ordem na lista, também, obedece a ordem cronológica de aparecimento das ferramentas no mercado mundial, com poucas exceções.

1. Aço Carbono

· Comum · com elementos de liga (V, Cr)

2. Aço Semi-Rápido (Baixo W)

3. Aço Rápido (Podem ser fundidos ou fabricadas pela Metalurgia do Pó)

· sem revestimento · com revestimento

4. Aço Super-Rápido (Elevado teor de V)

5. Ligas Fundidas

6. Metal Duro (Podem ser com ou sem revestimento)

Classes: · P · M · K

7. Cermets (Podem ser com ou sem revestimento)

8. Cerâmicas · Com e sem revestimento · A base de Si3N4 · A base de Al2O3

· Pura · com adições

· ZrO2 (branca) · TiC (preta ou mista) · SiC (whiskers)

9. Ultraduros · CBN – PCBN · PCD

10. Diamante Natural

Figura 10.1. Lista dos materiais para ferramentas de corte.

Sabe-se que todos os materiais de engenharia apresentam uma queda de resistência com o aumento da temperatura. A Figura 10.2 mostra o comportamento da dureza dos principais grupos de ferramentas de corte com a

SIALON

Au

me

nto

de

du

reza

e r

esi

stê

nci

a a

o d

esg

ast

e

Au

me

nto

de

ten

aci

dade

110

temperatura de trabalho. Nota-se que até mesmo o metal duro e as cerâmicas têm suas propriedades reduzidas, mas numa taxa bem menor que aquelas apresentadas pelos aços-rápidos. Isto garante a aplicação destas ferramentas em condições de corte bem mais desfavoráveis que aquelas a que podem se submeter os aços-rápidos.

Figura 10.2. Variação da dureza de alguns materiais de ferramentas de corte com a temperatura.

A Figura 10.3 apresenta um diagrama de dureza e tenacidade dos principais grupos de ferramentas de corte. Observa-se que o aumento da dureza leva a uma redução na tenacidade e vice-versa. Portanto, se a exigência for tenacidade, no caso de usinagem em cortes interrompidos, como no fresamento, por exemplo, o técnico responsável pela seleção deverá optar pela ferramenta posicionada mais a direita do diagrama, com sacrifício na dureza e resistência ao desgaste. Se a exigência for resistência ao desgaste e dureza, como no caso de usinagem de materiais resistentes e abrasivos, a escolha deverá recair naqueles materiais posicionados mais à esquerda do diagrama, com sacrifício da tenacidade.

111

Figura 10.3. Diagrama de dureza–tenacidade dos materiais de ferramentas de corte (Pastor, 1987).

As propriedades de dureza e resistência ao desgaste estão, também, diretamente relacionadas com a capacidade de imprimir altas velocidades aos processos de corte. Esta relação é ilustrada na Figura 10.4, onde observa-se a evolução das velocidades de corte nos últimos 100 anos, relacionados com o aparecimento dos diversos grupos de ferramentas de corte. Apesar de não estarem indicados, os ultraduros, surgidos na década de 80, podem apresentar velocidades ainda superiores àquelas indicadas no diagrama, em algumas aplicações.

Figura 10.4. Aumento das velocidades de corte conseguido no último século (Pastor, 1987).

nitreto de silício + TiC

cerâmica Al2O3

metal duro revestido

aço rápido

aço carbono

112

Carbono e Baixa/Média Ligas de

Aço

Aço Rápido

Liga de Cobalto Fundido

Metal DuroMetal Duro

RevestidoCerâmica

CBN Policrista-

linoDiamante

Dureza a quente aumentoTenacidade aumentoResistência ao impacto aumentoResistência ao desgaste aumentoResistência ao lascamento aumentoVelocidade de corte aumentoProfundidade de corte alta a média alta a

profundaalta a

profundaalta a

profundaalta a

profundaalta a

profundaalta a

profundaResistência ao choque térmico aumentoCusto da ferramenta aumento

TENDÊNCIAS GERAIS DE PROPRIEDADES E PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DE VÁRIOS MATERIAIS DE FERRAMENTAS DE CORTE*

*Algumas características podem se sobrepor em alguns casos. Exceções à regra são muito comuns. Em muitas classes de materiais de ferramentas, uma ampla faixa de composições e propriedades são obtidas.

Figura 10.5. Comparação das propriedades dos principais grupos de ferramentas de corte (Komanduri and Desai, 1982).

Tabela 10.1. Dados quantitativos das principais propriedades das ferramentas de corte (Abrão, 1995)

Propriedades do material da

ferramenta

Aço rápido (M2)

Carboneto de tungstênio

(M20)

Alumina branca

Alumina mista

Alumina reforçada

com whisker

Cerâmica à base de

nitreto de silício

PCBNDiamante

naturalPCD

Composição básica*

0,85%pC 4%pCr 5%pMo 6,5%pW

2%pV

80,5%pWC 10%pCo

9,5%pOutros

90-95% Al2O3

5-10% ZrO2

Al2O3

30% TiC 5-10% ZrO2

75% Al2O3

25% SiC

77% Si3N4

13% Al2O3

10% Y2O3

98%CBN 2%AlB2/

AlN

PCD 2-8% Co

Densidade

(g/cm3)7,85 14,5 3,8-4,0 4,3 3,7 3,2 3,1 3,5 3,4

Dureza à TA (HV)

850 1600 1700 1900 2000 1600 4000 100008000-10000

Dureza à 1000ºC (HV)

n.a. »400 650 800 900 900 »1800 n.a. n.a.

Resistência à fratura

(MPa·m1/2)

17 13 1,9 2 8 6 10 3,4 7,9

Condutividade térmica

(W/m ºC)37 85 8-10 12-18 32 23 100 900 560

Módulo de Young

(kN/mm2)

250 580 380 420 390 300 680 964 841

Coeficiente de expansão

térmica (x10-

6/K)

12 5,5 8,5 8 6,4 3,2 4,9 1,5-4,8 3,8

Custo aproximado por barra**

(US$)

72,54 (barra 25x25x200

mm)0,61 0,83 1,08 4,5 2,25 72-108 225-252 54-90

*por volume a menos que indicado.**custo referente à ISO SNGN 120416

A Figura 10.5 e a Tabela 10.1 apresentam, comparativamente, as principais propriedades dos diversos grupos de ferramentas de corte. Na Figura

113

10.5 apenas dados qualitativos, enquanto na Tabela 10.1 os dados são quantitativos. Numa seleção, é de extrema importância conhecer estas propriedades, mas deve-se conhecer, também, quando e onde estas propriedades são requeridas.

Na seleção do material de ferramenta de corte para uma aplicação específica, o grande número de ferramentas existentes no mercado dificulta a decisão e torna a tarefa relativamente complexa. Todas aquelas propriedades requeridas, listadas anteriormente, devem ser consideradas, mas o técnico de usinagem deve ter conhecimento e perspicácia suficientes para destacar as mais importantes, em função da aplicação a que se requer o material, pois, infelizmente, ainda não inventaram o material de ferramenta que acumulasse, simultaneamente, todas elas.

O material de ferramenta ideal deveria ter a dureza do diamante natural, a tenacidade do aço-rápido e a inércia química da alumina. Ele deve considerar, também, que nem sempre o melhor material é aquele que garante uma maior vida à ferramenta de corte. Às vezes, confiabilidade e previsibilidade da performance são mais importantes, e isto é tanto mais relevante quanto maior for o custo do material da peça.

A figura 10.6 resume a metodologia que deve ser empregada para selecionar a ferramenta de corte, sua geometria e as condições de corte para uma dada aplicação. Observa-se que o número de fatos a considerar é grande e a decisão final deve recair na ferramenta e nas condições de corte que apresentarem a melhor performance, confirmadas pelos testes experimentais realizados em laboratórios de pesquisas ou em linhas de produção.

CONTROLE OU RESTRIÇÕES

PRÁTICA DE MANUFATURA CONDIÇÕES E CAPACIDADE DAS MÁQUINAS FERRAMENTA DISPONÍVEIS REQUISITOS DE GEOMETRIA, PRECISÃO E ACABAMENTO SUPERFICIAL OUTROS REQUISITOS (disponibilidade e entrega de planejamento de ferramentas

escala de produção) DADOS ECONÔMICOS

I N P U T S

MATERIAL DAS PEÇAS

METODOLOGIA PARA

SELEÇÃO DE

FERRAMENTAS

L A B O R A T Ó R IO O U

LI N H A D E P R O D U Ç Ã O

F E R R AM

E

C O N D

D E

C O R T E

(composição química e estado metalúrgico) O U T P U T S

Þ Þ

TIPO DE CORTE FERRAMENTAS (principais candidatos) (desbaste x acabamento corte contínuo x intermitente)

(material da ferramenta específico, classe, forma e geometria da ferram.)

GEOMETRIA E TAMANHO FAIXA DE CONDIÇÕES DE CORTE

TAMANHO DO LOTE

(grupos pequenos x produção em massa)

DADOS DE USINABILIDADE

DADOS COMERCIAIS E LITERATURA TÉCNICA

INFORMAÇÕES DO FORNECEDOR (disponibilidade dos materiais; sua composição, propriedades e aplicações; tamanhos, formas e geometrias disponíveis; planejamento, entrega, custos e dados de performance)

EXPERIÊNCIA

MECANISMOS

PROCEDIMENTO PARA SELEÇÃO DE FERRAMENTAS E OTIMIZAÇÃO DE CONDIÇÕES DE CORTE

Figura 10.6. Metodologia para seleção da ferramenta de corte, sua geometria e condições de corte para uma dada aplicação.

114

A seguir apresenta-se um resumo sobre as propriedades, limitações, e aplicações dos diversos grupos de materiais de ferramentas de corte, apresentados na Figura 10.1.

10.2. AÇOS CARBONO E AÇOS LIGA

Na primeira parte do século XIX os aços comuns ao carbono e, mais tarde os aços de baixa e média liga (que foram introduzidas por Müshet em 1868), eram os únicos materiais de ferramentas disponíveis. Com o aparecimento de materiais mais resistentes, logo foram substituídos, embora ainda hoje sejam utilizados como ferramentas em aplicações de baixíssimas velocidade de corte, no ajuste de peças e na fabricação de matrizes. O maior problema é que eles perdem a dureza quando aquecidos a temperaturas superiores à de revenimento (300o a 600o C), como mostrou a Figura 10.2.

A Tabela 10.2 mostra a classificação da AISI (American Iron and Steel Institute) dos tipos de aço carbono mais comuns para ferramentas de corte. Os tipos mais utilizados são os 110 e 120.

Tabela 10.2. Classificação dos aços carbono para ferramentas de corte.

TipoDesignação

AISIC Mn Si Cr V

110 W1 0,60/1,40 0,25 0,25 - -

120 W2 0,60/1,40 0,25 0,25 - 0,25121 - 1,00 0,25 0,25 - 0,50122 W2 ,90 0,25 0,25 - 0,10

130 W4 1,00 0,25 0,25 0,10 -131 W4 1,00 0,25 0,25 0,25 -132 W4 1,00 0,25 0,25 0,50 -133 W4 1,00 0,70 0,25 0,25 -

140 - 1,00 0,25 0,25 0,35 0,20

Classe 140 (Ao carbono-cromo-vanádio)

Aços-carbono para ferramentas

Classe 110 (Ao carbono)

Classe 120 (Ao carbono-vanádio)

Classe 130 (Ao carbono-cromo)

Os aços da Tabela 10.2 são os que apresentam custos mais baixos e são, normalmente, tratados em água, tendo o carbono como o principal elemento de liga. O teor desse elemento vai regular as propriedades de dureza e tenacidade requeridas.

Além desses aços, existem também os seguintes (Chiaverini, 1979):

I. Aços para trabalho a frio ou indeformáveis: que podem ser tratados em água ou óleo, tendo como elementos de ligas principais o cromo, o tungstênio, o molibdênio, e às vezes, o cobalto. São indicados para matrizes de

115

estampagem, forjamento, corte, brochas, alargadores, calibres, punções, matrizes para compressão de pós metálicos, etc..

II. Aços resistentes ao choque: que são normalmente tratados em óleo, com teores de Si, relativamente elevados (até 2%), com baixos teores de Cr, Mo e W. Eles possuem excelente tenacidade e baixa resistência ao desgaste. Suas maiores aplicações são punções, ferramentas pneumáticas, talhadeiras, chaves inglesas, lâminas de tesouras, matrizes, etc..

III. Aços para trabalho a quente: Que podem ser tratados em óleo, ar ou banho de sal, com altos teores de cromo, tungstênio, molibdênio, silício e vanádio. São usados para matrizes para fundição sob pressão, matrizes para forjamento, punções, mandris para trabalho a quente, matrizes de extrusão, etc.. São os conhecidos aços da classificação AISI (e também da ABNT) da classe H, sendo os H12, H13, H20 e H21 os mais utilizados.

O aço para ser empregado como ferramenta deve se encontrar em seu estado de maior dureza e para atender as características de qualidade, dois fatores são fundamentais (Chiaverini, 1979):

§ Composição química § Tratamento térmico

Quanto a composição química, os principais elementos de liga presentes são:

Carbono – com a função de formar carbonetos. Estão presentes na concentração de 0.6 a 1.3%. Em casos especiais o teor pode atingir 2.0%. Teores mais elevados garantem maiores dureza e resistência ao desgaste, enquanto menores teores apresentam melhores características de ductilidade e tenacidade.

Silício – desoxidante. Estão presentes em baixos teores (0.10 a 0.30%). Dissolve-se na ferrita e tende a decompor carbonetos.

Manganês - desoxidante e dessulfurante até 0.5%. Em teores mais elevados melhora a temperabilidade consideravelmente.

Cromo – aumenta a temperabilidade, a dureza e a resistência ao desgaste. Os teores são os mais variados, podendo chegar a 14%, com C também elevado (>1.5%).

Vanádio – desoxidante e controlador do tamanho de grão e aumenta a temperabilidade. Forma carbonetos estáveis, melhorando a dureza a quente. Os teores são normalmente 0.25 a 0.35% (máximo 0.5%).

Tungstênio – formador de carbonetos. Podem ser encontrados em teores de até 4.0% (com C em torno de 1.3%).

Molibdênio – dissolve-se na ferrita e tende a formar carbonetos. Melhora a dureza a quente, a resistência, a ductilidade e a temperabilidade.

116

Quanto ao tratamento térmico, este se constitui de têmpera e revenido. No aquecimento devem-se tomar cuidados especiais para evitar crescimento de grão e descarbonetação superficial. O aquecimento em duas etapas pode diminuir tanto a tendência de crescimento de grão, como a descarbonetação, por diminuir o tempo exposto a temperaturas elevadas. No resfriamento, os aços - carbono, principalmente aqueles com altos teores de carbono, os tempos de transferência a esquerda do cotovelo das curvas TTT são curtos, portanto são difíceis de temperar. Nos aços ligas estes problemas desaparecem, podendo ser resfriados em salmora, água, óleo, banho de sal, ar, etc.. O revenimento é realizado logo após a têmpera para imediato alivio de tensões e normalmente à temperaturas de 120 a 350ºC.

A Figura 10.7 apresenta o diagrama de equilíbrio Fe – C, mostrando a faixa aproximada de teores de C normalmente encontrados nos aços carbonos para ferramentas, e as temperaturas de tratamentos térmicos, normalmente usadas. Observa-se que os mais usados estão na faixa de C de 0.8 a 1.1%, e os tratamentos térmicos de têmpera se realizam com aquecimento acima das linhas A3 e A1, dependendo do teor de carbono. Nota-se que não é necessário austenitizar a cementita (carboneto de ferro), pois a mesma já é um constituinte duro e resistente para compor os aços-ferramentas.

Figura 10.7. Diagrama de equilíbrio Fe – C dos aços carbono para ferramentas (Ferraresi, 1970).

10.3. AÇOS-RÁPIDOS

O primeiro grande impulso causado nos materiais de ferramentas aconteceu na virada do século XIX, quando Taylor e White desenvolveram o primeiro aço-rápido, contendo 0,67% C, 18,91% W, 5,47% Cr, 0,11% Mn, 0,29% V e apropriado tratamento térmico. Seu surgimento revolucionou a prática de usinagem naquela época, dando um grande aumento na produtividade. As velocidades de corte puderam ser aumentadas em uma ordem de grandeza (de 3

117

a 5 m/min) com as ferramentas de aço carbono para 30 a 35 m/min com os aços-rápidos. Exatamente por isso, estes aços levaram este nome. Hoje, comparando com os materiais das ferramentas da chamada terceira geração, eles poderiam ser chamados de “aços-devagar” ou “aços-molengões”. Deixando, porém, de lado as comparações, é certo que com o passar dos anos as propriedades destes materiais foram melhoradas, chegando-se à perfeita combinação dos elementos de liga e domínio do processo de tratamento térmico.

A prática vem contrariando aqueles que acham que os aços-rápidos estão ultrapassados. As qualidades deste grupo de materiais são tão grandes que mesmo hoje, já há mais de um século depois de descobertos, eles ainda sobrevivem no meio de vários outros grupos com fantásticas propriedades.

As aplicações dos aço-rápidos são principalmente em brocas, fresas, cocinetes, brochas, matrizes e até ferramentas de barras para aplicações em torneamentos de peças de diâmetros reduzidos, cuja velocidade de corte conseguida é inferior à velocidade econômica de corte dos materiais de ferramentas mais resistentes.

Encontra-se no mercado um variado grupo de aços-rápidos, com cada um tendo sua aplicação ótima específica. A AISI (American Iron and Steel Institute) classifica os aços–rápidos como apresentado na Tabela 10.3. Existem dois grandes grupos: i- ao tungstênio (W), identificados pela letra “T” e ii- ao molibdênio (Mo), identificados pela letra “M”.

Como se nota, os principais elementos de ligas dos aços-rápidos são (Chiaverini, 1979):

Carbono: Teores variando de 0.7 e 1.6 %. Teores mais baixos representam menores durezas no estado revenido. O aumento do teor de C aumenta a formação de carbonetos complexos o que representa maior dureza e resistência ao desgaste. O maior teor de carbono, também, levará a maior retenção de austenita na tempera, exigindo maiores tempos e temperaturas de revenimento.

Tungstênio: Formador de carboneto, responsável pela elevada resistência ao desgaste do aço-rápido, está presente em teores que podem chegar a 20%. Forma um carboneto complexo com o Fe do tipo M6C, que se dissolve apenas parcialmente na austenita em temperaturas superiores a 980°C. Quando dissolvidos eles são muito renitentes a se precipitarem, ocorrendo apenas no revenimento, em temperaturas em torno de 510°C a 595°C, na forma de W2C. Essa precipitação é um dos elementos responsáveis pelo endurecimento secundário dos aços-rápidos.

Molibdênio: Este elemento é um substituto parcial do tungstênio, formando também o carboneto duplo com o Fe. Como o peso atômico do molibdênio (10,20 g/cm3) é cerca da metade do peso atômico do tungstênio (19,12 g/cm3), a mesma porcentagem em peso produz o dobro de átomos para ligar-se no aço. Assim, para substituir 18% de W, necessita-se apenas de ~9% em peso de Mo. Devido ao menor ponto de fusão, os aços ao Mo são temperados em temperaturas inferiores aos do tipo ao W. Nos aços ao Mo a austenita residual é menos estável

118

que nos aços ao W, resultando em temperaturas de revenimento inferiores. Do mesmo modo, as durezas a quente são também inferiores. Tabela 10.3. Classificação dos aços – rápidos segundo a AISI.

AISI C Mn Si Cr V W Mo Co Outros

T1 0,70/0,75 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,10 1,00/1,20 18,00/18,25 0,70 (opc.) - -T2 0,80/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,25 2,00/2,15 18,00/18,50 0,50/0,75 (opc.) - -T2 0,95/0,98 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,25 2,00/2,15 18,00/18,50 0,50/0,75 (opc.) - -T7 0,70/0,75 0,10/0,40 0,10/0,40 4,50/5,00 1,50/1,80 13,50/14,50 - - -T9 1,22/1,28 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 3,75/4,25 18,00/18,50 0,71 (opc.) - -

T4 0,70/0,75 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,50 1,00/1,25 18,00/19,00 0,60/0,70 (opc.) 4,75/5,25 -T5 0,77/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,50 1,85/2,00 18,50/19,00 0,65/1,00 (opc.) 7,60/9,00 -T6 0,75/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,50 1,60/2,00 18,75/20,50 0,60/0,80 (opc.) 11,50/12,25 -T8 0,75/0,80 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 2,00/2,25 13,75/14,00 0,75 5,00/5,25 -

T15 1,50/1,60 0,10/0,40 0,10/0,40 4,50/4,75 4,75/5,00 12,50/13,50 0,50 (opc.) 4,75/5,25 -

M1 0,78/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,00 1,00/1,25 1,50/1,65 8,00/9,00 - -M7 0,97/1,03 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,00 1,90/2,10 1,50/1,75 8,50/8,75 - -

M10 0,85/0,90 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,25 1,90/2,10 - 8,00/8,50 - -

M30 0,80/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,10/1,40 1,50/1,80 8,25/8,50 4,75/5,25 -M33 1,05/1,10 0,10/0,40 0,10/0,40 3,50/4,00 1,05/1,25 1,30/1,70 9,25/9,75 7,75/8,25 -M34 0,87/0,93 0,10/0,40 0,10/0,40 3,50/4,00 1,85/2,25 1,30/1,60 8,45/8,95 8,00/8,50 -M42 1,05/1,10 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,10/1,40 1,30/1,60 9,25/9,75 7,75/8,25 -M43 1,15/1,25 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,60/2,00 2,50/2,75 7,75/8,20 8,00/8,50 -M46 1,20/1,25 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 3,00/3,30 1,75/2,20 8,00/8,50 8,00/8,50 -

M2 0,80/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,25 1,70/2,10 6,00/6,50 4,75/5,25 - -M3 1,00/1,10 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,25 2,40/2,55 6,00/6,25 5,70/6,25 - -

(tipo 1) M3 1,10/1,20 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,25 3,00/3,30 5,60/6,25 5,00/6,25 - -

(tipo 2) M4 1,25/1,30 0,10/0,40 0,10/0,40 4,25/4,50 3,75/4,25 5,50/6,00 4,50/4,75 - -

M6 0,75/0,80 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,25/1,55 3,75/4,25 4,75/5,25 11,50/12,50 -M15 1,50/1,60 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,75 4,75/5,25 6,25/6,75 3,00/5,00 4,75/5,25 -M35 0,80/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 3,90/4,40 1,75/2,15 6,15/6,65 4,75/5,25 4,75/5,25 -M36 0,80/0,90 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,65/2,00 5,50/6,00 4,25/5,25 7,75/9,00 -M41 1,05/1,10 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,75 1,65/2,00 6,25/6,75 3,00/5,00 4,75/5,25 -M44 1,10/1,20 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,75 2,00/2,25 5,00/5,50 5,00/6,25 11,50/12,50 -M45 1,20/1,25 0,10/0,40 0,10/0,40 4,00/4,75 1,60/2,00 6,75/8,10 4,75/5,25 5,25/5,75 -

Tipos Mo - W - Co

Tipos ao Mo - Co

Tipos ao Mo - W

Tipos ao W

Tipos ao W - Co

Tipos ao Mo

Vanádio: Aparece em teores que variam de 1 a 5 %. É desoxidante, mas forte formador de carboneto. Este carboneto é o mais duro encontrado nos aços-rápidos (~84,2 HRc para o VC em aço rápido de alto C e alto V, contra 82,5 HRc do WC nos metais duros e 75,2 HRc do carboneto de Fe-W-Mo nos aços rápidos). Toda vez que se eleva o teor de vanádio nos aços-rápidos deve se elevar também o teor de carbono pois caso contrário, ele promove a ferritização do aço, diminuindo a dureza apreciavelmente. O vanádio aumenta a dureza a quente dos aços, aumentando a eficiência no corte. Os carbonetos se alojam nos contornos de grão, impedindo o crescimento dos mesmo, durante o tratamento térmico, produzindo, portanto, aços mais tenazes. Os aços-rápidos de alto teor de carbono e alto teor de vanádio são conhecidos como aços super-rápidos, possuindo maior resistência ao desgaste e portanto, maior eficiência no corte.

119

Cromo: Aparece em teores sempre em torno de 4%. Juntamente com o carbono, são responsáveis pela elevada temperabilidade dos aços-rápidos. Ele também diminui a oxidação do aço durante o tratamento térmico.

Cobalto: Aumenta significativamente a dureza a quente, aumentando a eficiência das ferramentas em operações de altas temperaturas, como é o caso de corte de desbaste e em corte a altas velocidades. O Co se dissolve grandemente na matriz, proporcionando, por conseguinte, uma dureza média mais elevada, tanto à temperatura ambiente, como a altas temperaturas. O ponto de fusão da liga é aumentado e ele proporciona, também, uma queda na taxa de difusão dos elementos de liga, inibindo, por conseguinte a coalescência de carbonetos secundários. Isto permite temperaturas de tempera mais elevadas sem o risco de problemas sérios de crescimento de grão. Maiores temperaturas de tempera permitem maior quantidade de elementos de liga entrarem em solução e, por conseguinte aumentar a dureza a quente. O cobalto aumenta ainda a condutividade térmica do aço-rápido. Os aços com Co produzem grandes quantidades de austenita retida na têmpera, resultando em maiores endurecimentos secundários no revenimento.

Outros: O enxofre em teores de 0.05% a 0.2% pode ser adicionado, para melhorar a usinabilidade dos aços-rápidos, inclusive acabamento superficial. A tenacidade, entretanto, é afetada negativamente. O titânio pode substituir parte ou completamente o vanádio. Outros elementos como o boro e o nióbio podem também, eventualmente ser encontrados nos aços-rápidos.

Diferentemente do que acontece com os aços convencionais que são temperados e revenidos, onde a dureza exibe uma queda contínua com o aumento da temperatura de revenimento, os aços-rápidos apresentam uma elevação de dureza quando revenidos em temperaturas na faixa de 480°C a 565°C, dependendo da composição do aço. A Figura 10.8 ilustra este fato. Observa-se que o comportamento da curva, e portanto o valor de dureza final, depende não só da temperatura de revenimento, mas também da temperatura de têmpera.

Figura 10.8 Efeito da temperatura de revenido na dureza do aço-rápido, temperado em diferentes temperaturas (Ferraresi, 1970).

120

O crescimento da dureza após revenimento naquela faixa de temperatura foi denominado de dureza secundária (Chiaverini, 1979), e é causado pela combinação dos processos apresentados na Figura 10.9.

Temperatura de Revenido

Dur

eza

Temperatura de Revenido ºC

Dur

eza

(R

C)

a) b)

Figura 10.9 Dureza secundária dos aços-rápidos: a) – efeitos individuais; b)- combinação de efeitos.

A curva “A” da Figura 10.9a representa o efeito do revenimento da martensita (decomposição da martensita), causando uma queda de dureza. A curva “B” representa o efeito de precipitação de carbonetos secundários, causando uma elevação na dureza, e a curva “C” representa o efeito da transformação da austenita retida, causando mais elevação na dureza. A curva “D” é o resultado obtido pela combinação de efeitos, que é ilustrado isoladamente na Figura 10.9b.

Enquanto os efeitos do revenimento da martensita e a transformação da austenita retida em martensita são fenômenos bem conhecidos, a precipitação de carbonetos naquela faixa de temperatura precisa ser melhor entendida. Como foi dito, o tungstênio e/ou o molibdênio formam carboneto complexo com o Fe do tipo M6C, que se dissolvem apenas parcialmente na austenita em temperaturas superiores a 980°C. Portanto, em se aumentando a temperatura acima destes valores, têm-se a dissolução cada vez maior dos carbonetos complexos. Fazendo-se o resfriamento do material em altas velocidades a partir destas temperaturas, os carbonetos não se precipitam, pois as condições de mobilidade atômica e de tempo não são favoráveis. A precipitação irá ocorrer no tratamento de revenimento nas faixas de temperaturas já citadas, isto é, 480°C a 565°C, dependendo da composição do aço. Os carbonetos assim formados são denominados de carbonetos secundários e, nos aços ao tungstênio se apresentam na forma de W2C com maior dureza e textura mais fina e bem distribuídos na matriz. Garantindo assim um acréscimo de dureza considerável nos aços-rápidos.

Portanto, é importante neste tratamento, a temperatura de têmpera, que neste caso, é bem mais elevada que no caso dos aços carbono e aços ligas, onde as temperaturas são ligeiramente acima das linhas A3 e A1, do diagrama de equilíbrio Fe – C. Neste caso, as temperaturas são bem mais elevadas para garantir a maior quantidade possível de dissolução de carbonetos primários

121

(complexos de Fe/W/Mo do tipo M6C), para assim se ter maior garantia de precipitação dos carbonetos secundários durante o revenimento (do tipo M2C). A tabela 10.4 apresenta os valores médios de temperaturas de tratamento de várias classes de aços-rápidos.

Tabela 10.4 Temperaturas de tempera e revenimento de vários aços-rápidos (Ferraresi, 1970).

TipoTemperatura de

têmpera (ºC)

Temperatura de revenido

(ºC)

Dureza R.C

610 1276 565 64611 1276 565 64620 1287 565 64621 1287 565 65622 1296 565 64623 1300 538 67630 1193 552 64630 1193 552 64650 1210 554 64651 1215 554 65652 1215 554 65653 1218 554 65

Temperaturas de tratamentos térmicos para diversos aços rápidos

Quando da especificação ou seleção de um aço-rápido deve-se considerar as propriedades principais requeridas, função da aplicação, e considerar o conteúdo da Tabela 10.5.

Tabela 10.5 Influência dos elementos de ligas nas características fundamentais dos aços-rápidos (Ferraresi, 1970).

Influência de elementos de liga sobre as características fundamentais

dos aços para ferramentas

Características Elementos de liga

Dureza a quente .......................... W, Mo, Co (com W ou Mo), V, Cr, Mn

Resistência ao desgaste ............. V, W, Mo, Cr, Mn Profundidade de endurecimento . B, V, Mo, Cr, Mn, Si, Ni Empenamento mínimo ................ Mo (com Cr), Cr, Mn Aumento da tenacidade pelo

refino do grão ......................... V, W, Mo, Mn, Cr

Se o processo requerer alta dureza a elevadas temperaturas, isto é, em operações de altas velocidades de corte ou na usinagem de materiais de alta resistência, onde as temperaturas são relativamente elevadas, o principal elemento de liga do aço-rápido deve ser o tungstênio. Isto porque o carboneto de tungstênio é o mais estável, garantido a manutenção nesta forma (carboneto) a temperaturas mais elevadas que os demais. Na seqüência, o segundo mais importante neste quesito é o molibdênio, o terceiro o Co, e assim por diante. Os aços-rápidos com teores de Co que variam até um valor máximo de aproximadamente 12%, são normalmente os mais requisitados, justamente por

122

permitirem velocidades de corte da ordem de 25% a 30% maiores que seus similares sem este elemento.

Quando a resistência ao desgaste for a principal exigência do processo, a Tabela 10.5 indica que o principal elemento de liga do aço-rápido deve ser o vanádio, depois o tungstênio, o molibdênio etc.. Isto porque para a resistência ao desgaste, a principal propriedade a ser considerada é a dureza do carboneto presente. Pode-se, portanto concluir que a dureza dos carbonetos de vanádio é superior à dureza dos carbonetos de tungstênio que por sua vez é superior à dureza do carboneto de molibdênio, e assim sucessivamente, conforme a Tabela 10.5. As principais propriedades mecânicas e térmicas de vários componentes normalmente encontrados nas ferramentas de corte são apresentadas na Tabela 10.6. Observa-se que a dureza em [GNm-2] do VC é 29 HV contra 13 HV a 22 HV para o WC e 15 HV para o Mo2C. Tabela 10.6 Principais propriedades de vários componentes dos materiais de

ferramentas de corte (Gurland, 1988).

Material

Módulo de Young,

GN m-2

Coeficiente de expansão

térmica,

10-6 K-1

Densidade,

g cm-2

Temperatura de fusão,

ºC

Dureza,

GN m-3

TiC 450 7,4 4,94 3100 30 HV (50g)TaC 285 5,5 14,50 3800 18 HV (50g)Cr3C2 373 9,9 6,66 1800* 14 HV (50g)

Mo2C (hex.) 533 6,7 9,18 2500 15 HV (50g)

WC (hex.) 696 5,2 15,70 2800* 13-22 HV (50g)ZrC 348 6,7 6,56 3400 27 HV (50g)HfC 352 6,6 12,76 3900 26 HV (50g)VC 422 7,2 5,71 2700 29 HV (50g)NbC 388 6,7 7,80 3600 20 HV (50g)Diamante 1.141 1,5 - 4,8 3,52 transforma ~80 HVBN (cúbico) 680 4,8 3,48 3200* ~50 HVTiN 250 9,4 5,40 2950 25 HVBl2N2 210 3,0 3,11 1900 22 HV

Al2O3 400 8,4 3,88 204 25 HVTiH2 480 8,0 4,50 2900 34 HV

* Temperatura de dissociação

Propriedades mecânicas e térmicas de alguns elementos duros e compostos

A Tabela 10.5 apresenta ainda os principais elementos que influenciam a profundidade de endurecimento e aqueles que garantem empenamento mínimo durante o tratamento térmico. Estas são, também, características importantes, pois elas revelam a capacidade do material apresentar transformação martensítica ao longo de sua seção transversal com garantia de não sofrerem distorções devido aos choques térmicos, respectivamente.

Finalmente, a Tabela 10.5 apresenta a ordem dos elementos que garantem maior tenacidade pelo refino de grão. Novamente, o VC, lidera a lista. Estes carbonetos se alojam no contorno de grão austenítico, impedindo o crescimento

123

de grão do constituinte. Outros carbonetos também atuam neste sentido, como mostrado pela ordem da tabela.

A Tabela 10.7 é apresentada por Ferraresi (1970), para auxiliar na seleção dos aços rápidos, em função das características desejadas. A primeira coluna apresenta a ordem dos aços-rápidos que devem ser considerados se a principal propriedade requerida for resistência ao desgaste. Neste caso, o aço da classe 630 é o mais indicado. A segunda coluna se a principal propriedade requerida for a tenacidade. Neste caso deve-se escolher o aço da classe 622. A terceira coluna se a principal propriedade for dureza a quente. A tabela indica que, novamente, o aço da classe 630 é o mais indicado.

Tabela 10.7 Indicações para seleção dos aços-rápidos em função das características requeridas (Ferraresi, 1970).

Resistência ao desgaste Tenacidade Dureza a quente

Grupo 7 Grupo 1 Grupo 8630 (M1) 622 (T6) 630 (M1)650 (M2) 623 (T15) 631 (M10)631 (M10) 621 (T5) 610 (T1)610 (T1) 650 (M2)620 (T4) Grupo 2 611 (T12)621 (T5) 624 (T8) 651 (M3-1)

652 (M3-2)Grupo 8 Grupo 3 653 (M4)622 (T6) 611 (T2) 624 (T8)611 (T2) 653 (M4)

651 (M3-1) 610 (T1) Grupo 9652 (M3-2) 652 (M3-2) 621 (T5)

651 (M3-1) 623 (T15)Grupo 9 631 (M10) 622 (T6)653 (M4) 630 (M1)623 (T15) 650 (M2)

Seleção de aços rápidos

Durante a Segunda Guerra Mundial, os americanos, com receio de faltar matéria prima para fabricação de ferramentas de corte, diminuíram para metade o teor de tungstênio e molibdênio dos aços-rápidos e os batizaram como aços-semi-rápidos. A tabela 10.8 apresenta a composição dos principais aços-semi-rápidos. Estes aços apresentam propriedades de resistência e dureza inferiores aos aços-rápidos e não são comercialmente disponíveis nos dias atuais.

Outro produto deste grupo que recebeu nome específico foram os aços super-rápidos. São aqueles que possuem elevados teores de vanádio (podendo chegar a 5%). Este elemento forma carbonetos extremamente duros como já foi discutido e comentado quando da apresentação das Tabelas 10.5 e 10.6. Os aços com altos teores de vanádio apresentam durezas médias superiores e permitem o emprego de velocidades de corte maiores que os aços-rápidos convencionais.

124

Tabela 10.8 Composição dos aços-semi-rápidos usados pelos americanos na época da Segunda Guerra Mundial (Ferraresi, 1970).

Classe AISI C Mn Si Cr V W Mo

360 - 0,75/0,85 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,00/1,20 - 4,00/4,50361 - 0,85/0,95 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 1,75/2,05 - 4,00/4,50362 - 1,15/1,25 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 3,00/3,30 - 4,00/4,50363 - 1,35/1,45 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 3,90/4,40 - 4,00/4,50364 - 0,90/1,00 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 2,15/2,45 2,60/3,00 2,25/2,75365 - 0,85/0,95 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 2,10/2,40 0,80/1,20 1,80/2,20366 - 1,15/1,25 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 2,70/3,10 1,25/1,55 1,45/1,75367 - 0,90/1,00 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 2,05/2,35 1,75/2,05 1,00/1,20368 - 1,05/1,15 0,10/0,40 0,10/0,40 3,75/4,25 3,75/4,25 2,30/2,70 2,40/2,80

Composição dos aços semi-rápidos, usuais nos Estados Unidos (Grupo 300 - Classe 360)

Dois grandes avanços na fabricação de aços-rápidos foram conseguidos nos anos 70 e merecem destaques:

I - Ferramentas de Aço-Rápido Revestidas

As ferramentas que foram revestidas primeiro foram as de metal duro, no final da década de 60. Os aços-rápidos foram receber as coberturas apenas uma década mais tarde (Komanduri and Desai, 1982). Isto porque a técnica de revestimento comumente aplicada às ferramentas de metal duro é a CVD - (Chemical Vapour Deposition ou deposição química de vapor) que requer um tratamento térmico a temperaturas da ordem de ~ 1000°C. A esta temperatura a estrutura metalúrgica do aço-rápido é significativamente alterada e portanto não aplicável a este grupo de materiais para ferramentas. Só com a introdução do método de deposição PVD (Phisical Vapour Deposition ou deposição física de vapor), que usa temperaturas de tratamento inferiores (da ordem de 500°C), que as ferramentas de aços-rápidos foram recobertas com sucesso.

O conceito do revestimento é para garantir uma ferramenta com características tenazes no núcleo e duras, resistentes ao desgaste e quimicamente inertes na superfície.

Nos aços-rápidos as camadas de revestimento comumente utilizadas são de TiN e TiCN. Hoje a aplicação de ferramentas de aço-rápido revestida com estas camadas garante maiores vidas nas ferramentas e velocidades de corte superiores que as ferramentas sem o revestimento. É comum encontrar brocas, fresas, hobies e segmentos de brochas de aço-rápido revestidas. O processo de revestimento tem sido intensamente pesquisado e o domínio do processo PVD hoje garante a popularização e aplicação do método a custos bem modestos.

As ferramentas de aço-rápido são normalmente reafiadas após o desgaste excessivo na primeira vida. Isto implica em novo recobrimento sendo necessário, uma vez que a reafiação é feita pela retificação da zona desgastada, que normalmente excede a camada revestida, entrando pelo substrato. Pode acontecer que o usuário opte pela utilização da ferramenta reafiada sem novo

125

procedimento de revestimento. Neste caso, ele passa a utilizar uma ferramenta que fica com uma das superfícies sem cobertura. No caso das brocas e fresas, as ferramentas são normalmente reafiadas pela retificação da superfície de folga, ficando a superfície de saída sempre com a camada revestida. No caso de hobies, a ferramenta é reafiada pela retificação da superfície de saída, neste caso quem fica sempre com o revestimento são as superfícies de folgas.

II - Ferramentas de Aço-Rápido Fabricadas pela Metalurgia do Pó

São ferramentas fabricadas pela metalurgia do pó, muitas vezes chamada erroneamente por sinterização (sinterização é o nome do tratamento térmico, que os produtos fabricados pela metalurgia do pó sofrem), que têm a vantagem de possibilitar partículas de carbonetos muito menores e mais dispersas na matriz, além de facultar a incorporação de um número maior de elementos de liga (carbonetos) que o processo de fabricação convencional. Hoje são encontradas no mercado fresas, brocas e outras ferramentas de aço-rápido fabricadas por este processo. Um fator que limita a utilização de ferramentas de aço-rápido fabricadas pela metalurgia do pó ou simplesmente PM (de Powder Metalurgy do inglês = metalurgia do pó) são as formas complexas que algumas ferramentas possuem. O processo necessita uma matriz de compactação do pó que deve possuir o negativo do formato da ferramenta. Formas complexas dificultam esta etapa, inibindo a aplicação.

De um modo geral, as ferramentas de aço-rápido fabricadas pela metalurgia do pó apresentam as seguintes vantagens ou características em comparação com aquelas fabricadas pelo método de fundição convencional:

Ü Nas ferramentas de HSS - PM, as partículas de carbonetos são mais finas e a dispersão mais uniforme. Os pós são obtidos de aços previamente ligados, pelo processo de atomização, o que garante partículas (da ordem de 100 mm) contendo carbonetos bem finos e distribuídos, praticamente como no estado líquido. A Figura 10.10 mostra uma partícula de aço-rápido obtida por esse processo de atomização. Os pós dessas partículas serão compactados e sinterizados para formar o produto que pode ou não, ainda sofrer um processo de retificação final. Observa-se a forma esférica perfeita da partícula. Normalmente elas são selecionadas para possuírem uma dimensão uniforme e garantir homogeneidade na microestrutura.

Ü Tamanho dos carbonetos do HSS - PM é da ordem de 1 a 3 mm, enquanto que no HSS convencional, mesmo após a conformação a quente,estes valores são da ordem de 3 a 16 mm. Portanto, em média, a granulação dos carbonetos no HSS convencional é 3 vezes maiores que aqueles dos HSS - PM. A Figura 10.11 mostra a comparação dos microconstituintes dos dois tipos de HSS.

Ü HSS - PM apresenta porosidade, o que diminui a resistência a tração, mas pode apresentar melhor resistência a compressão.

Ü HSS - PM tem melhor usinabilidade na retífica que o HSS convencional, devido a granulação mais fina.

126

Ü Pelo mesmo motivo, os HSS - PM têm maior tenacidade que os HSS convencionais.

Ü O tratamento térmico do HSS - PM é mais simples que o HSS convencional, que consiste de tempera e revenimento, sem a preocupação do endurecimento secundário dos HSS convencionais.

Figura 10.10 Partícula esférica de um aço-rápido AISI T15 obtido por atomização (Komanduri and Desai, 1982).

a) b)

Figura 10.11 Micrografias do aço-rápido AISI M42 a) produzido pelo processo convencional de fundição e b) produzido pelo processo PM (Komanduri and Desai, 1982).

10.4. LIGAS FUNDIDAS

Elas formam um outro grupo de materiais de ferramentas de corte e surgiram mais ou menos na mesma época dos aços-rápidos, mas tiveram grandes aplicações somente mais tarde, durante a Segunda Guerra Mundial. São

127

ferramentas a base de Co, contendo W e Cr em solução sólida, e às vezes alguns carbonetos. Estas ligas são mais duras do que os aços-rápidos e mantém esta dureza a temperaturas mais elevadas, e em decorrência disso as velocidades de corte empregadas são maiores (em torno de 25%). A Figura 10.12 apresenta as curvas características de dureza contra a temperatura de uma liga fundida e de dois aços-rápidos. Nota-se a queda de dureza com o aumento de temperatura sendo mais branda na liga fundida.

Figura 10.12 Comportamento da dureza com o aumento de temperatura de uma liga fundida (Stellite 100, â) e de dois aços-rápidos (Ridhough, 1970).

A Tabela 10.9 apresenta quatro tipos de ligas fundidas com suas respectivas composições e propriedades. Observa-se que o maior teor de cobalto garante uma maior tenacidade ou resistência ao choque, dado pela absorção de energia no teste Izod. Por outro lado, uma maior percentagem de tungstênio (e carbono) garante maior dureza e consequentemente, maior resistência ao desgaste.

Na realidade, a não ser em aplicações muito especiais, as ligas fundidas estão caindo em desuso, tanto pela escassez de matéria-prima (e aumento do preço) como também por haver no mercado materiais que se comparam a elas e até as superam a custos menores. Quando a principal propriedade requerida for tenacidade, os aços-rápidos a superam. Quando for resistência ao desgaste, os metais duros são bem superiores.

128

Tabela 10.9 Composição e propriedades das ligas fundidas (Ferraresi, 1970).

Co 53

Cr 31

W 10

C 1,5

Ou-tros 4

Co 52

Cr 30

W 11

C 2,5

Ou-tros 4

Co 41

Cr 32

W 17

C 2,5

Ou-tros 4

Co 38

Cr 20

W 18

C 2,0

Ou-tros 12

Densidade [g/cm3]

Faixa de fusão [ºC]

Limite de resistência à

tração [kgf/mm2]

Limite de escoamento

Alongamento [%]

Dureza Rockwell A

Dureza Rockwell C

Resistência à

compressão [kgf/mm2]

Resistência ao choque Izod [kgm]

Módulo de elasticidade

[kgf/mm2]

Composição química [%]

Ligas Fundidas para Ferramentas

0

52,5

1139-1314

8,36 8,38 8,76 8,63

0,4

259

62,5

82,582,0

61,5

238

0,60,9

224

60,5

81,580,0

58,0

210

1,6

1256-1298

77

0-1

próximo do limite de resistência à tração

0

59,5

1235-1320 1166-1332

52,5

0

27,720 23,730 25,900 27,865

A Figura 10.13 apresenta a curva de vida das ferramentas de aço-rápido, liga fundida e metal duro no torneamento de um aço liga, enquanto a Figura 10.14 apresenta as faixas de velocidades de máximo rendimento para o torneamento de uma liga de alumínio com essas ferramentas. A liga fundida supera o aço-rápido, mas é superada pelo metal duro.

Figura 10.13 Vidas das ferramentas no torneamento de um aço liga (Ridhough, 1970).

129

Figura 10.14 Faixas de velocidades de máximo rendimento no torneamento de uma liga de alumínio (Ferraresi, 1970).

10.5. METAL DURO

O segundo grande impulso na área dos materiais de ferramenta de corte aconteceu com o aparecimento do metal duro. O primeiro foi com o surgimento do aço-rápido. Com os Metais duros, novamente, as velocidades de corte puderam ser aumentadas em praticamente uma ordem de grandeza (de 35 m/min com os aços-rápidos para 250 - 300 m/min com os metais duros). O advento desta classe aconteceu no final da década de 20, na Alemanha, quando Schröter conseguiu produzir em laboratório o WC em pó pela primeira vez. A mistura deste pó principalmente com o cobalto, também em pó (admite-se ainda o níquel ou o ferro, mas com resultados inferiores), trouxe ao mercado, na década de 30, um dos mais fantásticos grupos de materiais de ferramentas de corte: o metal duro.

Na época, quando foi verificado as excelentes propriedades de dureza e resistência ao desgaste desse material, os alemães logo o batizaram de “widia” (de wie diamond do alemão = como o diamante), fazendo referência à semelhança das propriedades desse material com as do diamante, o que até certo ponto é um exagero.

A grande popularidade dos metais duros, que são fabricados pelo processo de metalurgia do pó, se deve ao fato deles possuirem a combinação de resistência ao desgaste, resistência mecânica e tenacidade em altos níveis.

A ferramenta desenvolvida na Alemanha, contendo apenas WC + Co, se mostrou prodigiosa na usinagem de ferros fundidos cinzentos, mas com baixa resistência a craterização, quando usinando aços. Para superar esta séria deficiência, pesquisas logo se iniciaram, pois os aços, que são os mais

130

importantes materiais de uso geral em engenharia, não poderiam deixar de se beneficiar desta revolução. Adicionou-se, então TiC, TaC e/ou NbC aos WC + Co e verificaram que este produto reduziu em muito o problema de craterização na usinagem dos aços. As razões para isto são:

i Os carbonetos adicionados têm maiores durezas que o WC e, portanto, apresentam maiores resistências ao desgaste.

ii A solubilidade dos carbonetos adicionados no ferro é muito menor que o WC. Isto inibe a difusão, e como se verá no próximo capítulo, difusão é um dos mecanismos de desgastes mais importante a altas temperaturas.

iii A estabilidade dos carbonetos adicionados é maior que os WC. Isto implica em maiores dificuldades de dissolução e difusão desses elementos.

A norma ISO logo padronizou a classificação dos metais duros e designou de classe K aqueles contendo WC + Co. Ela é, também, conhecida por classe dos ferros fundidos ou classe dos cavacos curtos. Num sistema de cores de especificação (não do produto), também internacional, coube a este grupo a coloração vermelha. Assim, nos catálogos dos fabricantes, essa classe é sempre designada em vermelho. Quando se adiciona TiC, TaC e/ou NbC, a ISO os designa de classe P. Essa classe ficou, também conhecida por classe dos aços, ou dos cavacos longos e tem o azul como a cor de referência nos catálogos. A classe M é uma classe intermediária, quando o WC + Co possui adições de TiC, TaC e/ou NbC, mas em menores quantidades que aqueles apresentados pela classe P. Essa classe é também conhecida como a classe dos aços inoxidáveis, tendo em vista a sua maior aplicação na usinagem dos aços inoxidáveis austeníticos. A coloração padrão dessa classe é o amarelo.

A classe K é também conhecida como a classe dos não ferrosos. Elas são sempre indicadas para usinagem dos materiais não ferrosos, devido ao fato dos carbonetos adicionados na classe P e M terem maiores afinidades química com os não ferrosos que os carbonetos de tungstênio da classe K. Neste caso, a designação de classe dos cavacos curtos não se refere aos não ferrosos, pois a maioria deles formam cavacos longos (alumínio, cobre, titânio, níquel, etc.).

A letra de designação dos metais duros é sempre acompanhada de um número que representa a tenacidade e a resistência ao desgaste da ferramenta. Quanto maior o numero, que normalmente varia de 01 a 50, maior a tenacidade e menor a resistência ao desgaste. A Figura 10.15 mostra esta designação que é recomendada pela norma ISO.

A sub-classificação dentro de cada classe depende principalmente de:

Ä Composição química da ferramenta, incluindo qualidade e quantidade de carbonetos. A presença de carbonetos de titânio, por exemplo, garante maior resistência ao desgaste. A maior quantidade de cobalto por outro lado, garante maior tenacidade;

Ä Tamanho de grãos dos carbonetos. Quanto mais finos os carbonetos, maior a tenacidade da ferramenta, aliada a uma maior dureza média.

131

DESIGNAÇÃO ISO

DUREZA E RESIST. AO DESGASTE

TENACIDADE

P 01 P 10 P 20 P 25 P 30 P 40 P 50

M 10 M 20 M 30 M 40

K 01 K 05 K 10 K 20 K 30 K 40

Figura 10.15 Classificação dos metais duros segundo a norma ISO.

A variação da composição química é ilustrada pela Figura 10.16. Nos quatro gráficos desta figura, nos eixos das abscissas tem-se a variação da percentagem de Co na liga. Nota-se que o aumento do Co implica em menor dureza, maior TRS - resistência à ruptura transversal e, portanto, maior resistência ao impacto (ou tenacidade) e menor módulo de elasticidade e, portanto, menor rigidez.

A influência do refino de grão é ilustrada pela Tabela 10.10. Nesta tabela, as propriedades de duas classes de metal duro convencional, à base de WC + Co, designados por THM e THR são comparadas com as propriedades de ferramentas com as mesmas composições, mas com grãos de carbonetos ultrafinos, designados por THM - F e THR - F, respectivamente. A THR é uma classe com alto teor de Co. Nota-se que o refino de grão melhora a tenacidade em aproximadamente 50%, aumentando também a dureza média, embora piorando as propriedades térmicas.

Para selecionar uma ferramenta, portanto, o responsável técnico terá que considerar as principais características do processo. Em uma aplicação, por exemplo, no fresamento de aço com uma ferramenta P10, se estiver ocorrendo lascamentos severos devido aos choques mecânicos inerentes ao processo, aconselha-se a substituição por uma ferramenta mais tenaz, isto é, uma P20 ou P30, ou mesmo superior. Deve-se, entretanto estar ciente que ao ganhar tenacidade com esta mudança, perde-se em resistência ao desgaste. Portanto, deve-se sempre procurar aquela ferramenta que tenha tenacidade suficiente para absorver os choques mecânicos e prevenir o lascamento, mas com resistência ao desgaste máximo para garantir maior vida na ferramenta de corte.

132

Figura 10.16 Variação de algumas propriedades do metal duro com a variação do teor de Co. a)- Dureza; b)- TRS – resistência à ruptura transversal; c)- Resistência ao impacto; d)- Módulo de elasticidade (Komanduri and Desai, 1982).

Tabela 10.10 Comparação das propriedades de metal duro com tamanho de

grão convencional e com tamanho de grãos ultrafinos.

THM THM-F THR THR-F

Densidade [g/cm3] 14,9 14,8 14,6 14,4Dureza [HV30] 1600 1800 1450 1500Resistência à ruptura

transversal [N/mm2] 2000 3000 2350 3200Resistência à compressão [N/mm2] 5400 6000 5000 5300Tenacidade à fratura Kh

[Mpa K-1] 9,6 10,8 12,0 13,8Condutividade térmica

[W m-1 K-1] 80 46 70 42Coeficiente de expansão

térmica [K-1] 5,5·10-6 6,2·10-6 5,6·10-6 6,7·10-6

133

A Tabela 10.11 mostra as ferramentas mais comuns de cada grupo (P, M ou K) e suas respectivas aplicações.

Tabela 10.11 Campo de aplicação dos metais duros (Ferraresi, 1970).

Designação Campo de aplicação

Para

m

ateria

is

ferr

oso

s d

e

cava

co

long

o,

com

o

aço

s e fe

rro f

und

ido m

ale

áve

l.

P 01 Operações de acabamento fino, com avanços pequenos e altas velocidades, como torneamento e furação de precisão. Exige máquinas rígidas, isentas de vibração.

P 10 Idem – Também para aplicações em que ocorre grande aquecimento da ferramenta.

P 20 Operação de desbaste leve, com velocidades de médias a altas e avanços médios. Também em operações de aplainamento com seções pequenas de corte.

P 25 Operações de desbaste com velocidades e avanços médios.

P 30 Operações com baixas a médias velocidades de corte e seções de corte médias a grandes; torneamento, fresamento e aplainamento.

P 40

Operações de desbaste grosseiro e em condições severas de corte, como corte interrompido, mesmo em máquinas sujeitas à vibração; velocidades baixas a médias e grandes avanços e profundidade de corte; torneamento, aplainamento.

P 50 Idem – É o tipo mais tenaz, aplicações em que se usam máquinas obsoletas, onde substitui o aço rápido com grande vantagem.

Cla

sses

univ

ers

ais

: aço

s,

incl

usi

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ços-

liga,

ferr

o f

und

ido,

co

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, fe

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fund

ido

n

odu

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rro fu

ndid

o m

aleáv

el.

M 10

Operações de torneamento com velocidades médias a altas e seções de corte médias.

M 20 Operações de torneamento, fresamento, aplainamento, com velocidades de corte médias e seções de corte médias.

M 30 Idem – com seções de corte médias a grandes.

M 40

Torneamento, principalmente em máquinas automáticas.

Para

mat

eria

is d

e c

ava

co c

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o:

ferr

o

fund

ido,

aço

te

mper

ado

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eta

is

não

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oso

s,

plá

stic

os,

m

ade

iras.

K 01 Operações de acabamento fino e de precisão, como broqueamento e faceamento, com cortes leves e firmes, avanços pequenos e altas velocidades.

K 05 Operações de acabamento, como torneamento, alisamento e furação de precisão, com alta velocidade de corte.

K 10 Operações de usinagem em geral.

K 20 Idem – Com avanços e velocidades médias.

K 30 Operações de desbaste, cortes interrompidos e profundos.

K 40 Idem – Onde se tem condições muito desfavoráveis e se deve trabalhar com ângulos de saída grandes.

134

Na prática, entretanto, esta classificação ISO, que considera principalmente a composição química e as propriedades de dureza (ou resistência ao desgaste) e tenacidade, está deixando de ser adotada, sendo substituída por classificação específica dos diversos fabricantes de ferramentas de metal duro. Assim, um determinado produto, pode cobrir uma vasta faixa da classificação ISO, pois os fabricantes alegam que os seus produtos podem, perfeitamente, ser utilizados em toda aquela faixa, com resultados satisfatórios. Às vezes esta classificação pode até apresentar um mesmo produto sendo listado na classe P, M e K simultaneamente. Na realidade isto significa que os fabricantes estão enfatizando mais a aplicabilidade da ferramenta, do que propriamente o sentido da classificação original. A Figura 10.17 apresenta a relação dos produtos de um fabricante de metal duro, onde se observam os fatos descritos acima.

Figura 10.17 Classificação dos metais duros produzidos por um fabricante de ferramentas de corte (SANDVIK, Corokey, 1998).

Os metais duros são fabricados pelo processo de metalurgia do pó, que resumidamente se processa da seguinte forma. O tungstênio, na forma original, se encontra na natureza nos minérios denominados scheelita e wolframita, que podem ser encontrados no nordeste brasileiro. Após uma série de reações em meio ácido (ácido clorídrico) ele é transformado em trióxido de tungstênio, (WO3). Por meio de reações de desoxidação em atmosfera rica em hidrogênio é obtido o tungstênio puro, que é misturado com o carbono, também puro, e levado a um forno para formar o WC a temperaturas elevadas (1375°C a 1650°C) (Marcondes, 1990). O tamanho de grão do carboneto de tungstênio assim obtido é da ordem de 0,4 a 7 mm (Jack, 1987). O controle e o refino maior dos grãos de carboneto é obtido na etapa de moagem seguinte. Os carbonetos são moídos em meio líquido

135

e depois secados com spray. Esta moagem pode ser feita após a mistura com o cobalto, na proporção ideal de cada classe. Opcionalmente, a mistura com o cobalto (na forma de pós finos) pode ser feita após a moagem individual dos constituintes. A mistura é comprimida a frio em matrizes, geralmente usando uma adição de cera lubrificante para facilitar esta etapa. Esta cera será extraída do produto durante o tratamento de sinterização. Após a prensagem o produto já ganha o formato final desejado, apresentando uma porosidade da ordem de 50% em volume, e pode ser manipulado. A sinterização segue imediatamente esta etapa, e é realizada a vácuo, em temperaturas da ordem de 1500°C, com a porosidade sendo reduzida para menos de 0,01% (Jack, 1987). Esta baixa porosidade é possível de ser obtida devido à fase líquida do metal ligante presente. Após a sinterização o produto sofre uma redução de tamanho, que pode chegar da ordem de 18%. Antes de ser comercializado, normalmente, o produto é retificado, para formatar as arestas. A Figura 10.18 ilustra este processo. Nota-se que quando se tratar de produtos da classe P ou M, há também a adição de TiC, TaC e/ou NbC.

Figura 10.18. Esquema ilustrativo do processo de metalurgia do pó para obtenção dos metais duros.

O processo de metalurgia do pó, muitas vezes é denominado de sinterização erroneamente, pois sinterização é apenas o tratamento térmico do processo. É durante este tratamento que os pós adjacentes do constituinte são unidos. Essa união pode ser realizada por meio de dois mecanismos distintos a saber: transporte de material na fase sólida ou transporte de material na fase líquida. No primeiro, a união é garantida pela difusão na fase sólida dos

136

constituintes, enquanto que no segundo a união é garantida pela fusão do elemento ligante. A Figura 10.19 ilustra esses dois métodos.

Figura 10.19. Esquema ilustrativo dos dois mecanismos de união dos pós durante o processo de sinterização; a)- transporte de material no estado sólido; b)- transporte de material no estado líquido (Kalpakajian, 1984).

Ferramentas de Metal Duro Revestidas

O revestimento de ferramentas de metal duro ganhou importância muito grande, pois o mesmo pode garantir uma performance bem superior à ferramenta sem revestimento na usinagem de materiais ferrosos, que são os materiais mais utilizados na industria mecânica. Hoje, dentre todo o metal duro utilizado na indústria, a percentagem de metal duro revestido é muito grande (próximo de 90%). Outro fator que contribuiu muito para o crescimento da aplicação de ferramentas de metal duro revestidas foi o maior domínio das técnicas de revestimento e, consequentemente, o custo mais acessível do produto. Outro parâmetro comparativo é o número de produtos oferecidos pelos fabricantes. Um grande fabricante de ferramentas, possui hoje no seu catálogo (de 1998) 17 diferentes classes de metal duro revestido contra apenas 7 classes de metal duro sem revestimento. Esses revestimentos são aplicados em substratos de quaisquer classe de metal duro (P, M ou K).

Ao contrário das ferramentas de aço-rápido revestidas, que usam apenas o processo PVD, os metais duros podem receber tanto o processo PVD como o CVD. Neste caso a utilização de temperaturas elevadas do processo CVD (~1000°C) não implica em problemas para as ferramentas de metal duro, pois as mesmas não sofrem alterações metalúrgicas nestas temperaturas como as ferramentas de aço-rápido. Portanto, os fabricantes de ferramentas possuem hoje na suas linhas de produtos ferramentas revestidas pelos dois processos. A Tabela 10.12 apresenta a comparação das ferramentas de metal duro revestidas pelos dois processos (possuindo o mesmo substrato). Nota-se que o processo PVD garante a mesma tenacidade do substrato, enquanto que o processo CVD diminui

137

esta propriedade. Isto implica em problemas da aplicação de ferramentas revestidas pelo processo CVD em cortes interrompidos. A causa desta redução de tenacidade está na tensão residual de tração deixada pelo método CVD, enquanto que no método PVD a tensão residual é de compressão, igual a conseguida no substrato, após a retificação (Quinto et alli, 1988). Portanto, é a tensão residual de tração que reduz a resistência ao lascamento da aresta de corte.

Outra variável na escolha é o número de camadas revestidas apresentadas pelas ferramentas. O revestimento pode ser uma única camada de TiC, ou, mais comum, triplo revestimento de TiC, TiCN e TiN e TiC, Al2O3 e TiN, mas existe registro (Lindstrom e Johannesson, 1976 e Reiter e Kolaska, 1986, citado por Quinto et alli, 1988) de ferramentas com até 12 camadas de diferentes revestimentos. Os fabricantes explicam que cada camada tem a sua função específica e a associação de camadas permite oferecer um produto com todas as vantagens possíveis de se obter com a técnica.

Tabela 10.12 Comparação de ferramentas revestidas pelos processos CVD e PVD.

CVD - DEPOSIÇÃO QUÍMICA DE VAPOR

PVD - DEPOSIÇÃO FÍSICA DE VAPOR

TEMPERATURA DE REVESTIMENTO

APROX. 1000ºC APROX. 500ºC

TENACIDADE REDUZIDA NÃO É AFETADA

ARESTA DE CORTE ARREDONDAMENTO REQUERIDO

PODE SER QUINA VIVA

ESPESSURA DO REVESTIMENTO

ATÉ 12 mm ATÉ 4 mm

CAMADAS MULTICAMADAS TiC-TiN,

TiN-TiCN-TiN, TiC-Al2O3

TiN, TiCN,TiNAl

PRINCIPAIS APLICAÇÕES

TORNEAMENTO E MANDRILAMENTO

FRESAMENTO, ROSCAMENTO E

FURAÇÃO

VANTAGENS MAIOR RESISTÊNCIA AO DESGASTE

MAIOR RESISTÊNCIA À CRATERIZAÇÃO

GRANDE VIDA DA FERRAMENTA

REDUZ APC

MAIOR VIDA NA FERRAMENTA

SUBSTITUI FERRAMENTAS SEM

REVESTIMENTO: COM MESMA TENACIDADE,

MESMA CONFIGURAÇÃO DE ARESTA E MESMA

PRECISÃO

Normalmente, o TiC é um revestimento que é muito utilizado como a primeira camada, pois este garante uma coesão muito boa com o substrato . Além disso, o TiC é um dos mais duros revestimentos utilizados (ver Tabela 10.6), o que garante alta resistência ao desgaste. O Al2O3 tem várias vantagens. As principais são a inércia química, a dureza e, portanto, resistência ao desgaste, e um fato interessante, é a redução de sua condutividade térmica com o aumento

138

da temperatura. Isto garante uma barreira térmica interessante para a superfície da ferramenta. Salienta-se que no revestimento, ao contrário do substrato, quanto menor a condutividade térmica melhor, pois menor a quantidade de calor que irá chegar ao substrato. Para o substrato quanto maior a condutividade térmica melhor, pois o calor que chega será mais rapidamente dissipado.

A condutividade térmica do TiC e do TiN apresentam comportamentos inversos do Al2O3, como mostra a Figura 10.20. O TiN se apresenta, normalmente como a camada externa, por proporcionar baixos coeficientes de atrito entre a ferramenta e o cavaco. Este material garante menores comprimentos de contato cavaco-ferramenta devido a menor tendência de adesão dos ferrosos neste material.

Figura 10.20 Influência da temperatura na condutividade térmica dos principais revestimentos utilizados nas ferramentas de corte (Wertheim et alli, 1982).

Um outro revestimento que vem sendo usado ultimamente é o TINAL ou (TiAl)N que é um nitreto à base de Ti e Al. Este revestimento tem se mostrado excelente para a usinagem de ferros fundidos, tanto em insertos intercambiáveis como em brocas de metal duro integral. Elas podem ser aplicadas, também, na usinagem das superligas de níquel. Ensaios de furação realizados no LEPU - UFU (Laboratório de Ensino e Pesquisa em Usinagem da Universidade Federal de Uberlândia) mostraram que as ferramentas de metal duro revestidas com TINAL podem produzir até 3 vezes o número de furos que as brocas sem revestimento podem produzir.

A espessura total das camadas revestidas pode variar de 4 a 12mm. Camadas muito espessas podem fragilizar a aresta. Talvez daí a explicação de um número excessivo de camadas apresentado por algumas ferramentas. Quando se utilizam várias camadas finas, intercaladas entre si, a resistência da aresta é consideravelmente maior que se utilizar camadas singulares espessas,

139

totalizando a mesma espessura (Wertheim et alli, 1982). A explicação para este fato é que uma possível trinca que se forma na superfície, por fadiga, por exemplo, irá se propagar apenas até a interface da primeira camada, se propagando paralela a esta, posteriormente. Assim, quanto mais fina a camada, menor o caminho percorrido pela trinca perpendicularmente à superfície.

Existem hoje no mercado ferramentas de metal duro revestidas com diamante policristalino (PCD) obtidas pelo processo CVD - Deposição Química de Vapor (Clark and Sem, 1998). Neste caso com camada única, com espessuras maiores que as normais, mas inferiores a 30mm, que são aplicadas em ferramentas positivas para desbaste de materiais não ferrosos, como o alumínio, plásticos e compósitos. Com o aparecimento das ferramentas revestidas de PCD pelo processo CVD, aumentam-se as expectativas para os revestimentos de CBN para aplicações nos ferrosos. Mas isto ainda continua no campo da teoria, pois na prática, o revestimento de CBN ainda não foi produzido eficazmente como ferramenta, pois possui dois elementos (o nitrogênio e o boro), diferentemente do PCD que possui apenas um elemento (o carbono), fazendo com que o processo de crescimento da camada se torne mais complicado, por vários motivos, incluindo problemas estequiométricos.

A Figura 10.21 apresenta a linha de metal duro revestido de um fabricante de ferramentas, onde aparece a denominação da classe específica do fabricante, a identificação das camadas de revestimento, a área de aplicação dentro da classe ISO e o grupo de materiais a usinar que estas ferramentas devem ser aplicadas.

Designação ISO dos Suportes e Insertos

Devido a grande quantidade de geometrias requeridas nas ferramentas de corte foi necessária uma padronização das designações dos suportes e dos insertos. A Norma ISO 1832 de 1991 trata da matéria. Esta designação é universal e as Figuras 10.22 a 10.24 auxiliam na identificação desta codificação para as ferramentas de tornear. Primeiramente, o suporte deve ser escolhido, de acordo com sua aplicação, conforme o corte seja interno ou externo, ver Figura 10.22.

Os suportes de tornear são designados por 5 letras, seguidos de 2 números e na seqüência, mais uma letra e um número, ver Figura 10.23. A primeira letra está relacionada com o sistema de fixação do inserto no porta ferramenta. A segunda letra depende do formato do inserto (quadrado, triangular, redondo, etc.). A terceira letra depende do angulo de posição do suporte. A quarta letra é função do angulo de folga do inserto e a quinta indica se o suporte é para corte à direita, à esquerda ou neutro. Os dois números que seguem indicam a seção transversal do suporte (altura e largura). A próxima letra está relacionada com o comprimento do suporte e finalmente o último número indica o comprimento da aresta de corte do inserto. Opcionalmente outro caractere pode aparecer na seqüência, para expressar detalhes que o fabricante queira incorporar.

140

Figura 10.21 Classes de metal duro revestido da Kennametal Hertel (Kennametal Hertel, 1998).

No caso de barras de mandrilar e fresas a designação ISO apresenta alguma variação com relação aos suportes de tornear, por exigência do próprio processo, mas segue mais ou menos a mesma linha citada acima, onde se

141

procura identificar geometricamente os suportes e os insertos que neles serão montados.

Os insertos são designados por 4 letras, seguidos de 3 números, 2 letras e outro caractere, ver Figura 10.24. A primeira letra está relacionada com o formato do inserto (quadrado, triangular, redondo, etc.). A segunda letra depende do angulo de folga do inserto. A terceira letra está relacionada com as tolerâncias dimensionais da geometria do inserto e a quarta letra depende do formato da superfície de saída (se ferramenta com furo central ou não, se apresenta quebra-cavacos ou não, se positiva ou negativa). Os três números que seguem indicam respectivamente, o comprimento da aresta de corte, o a espessura do inserto e o raio de ponta do inserto. A próxima letra indica o formato da aresta (se quina viva, arredondada ou chanfrada). Na seqüência, a próxima letra indica se o corte é a direita, a esquerda ou neutro. E finalmente, a próxima letra, que é opcional, fica para uso do fabricante, para expressar detalhes pertinentes.

Figura 10.22 Identificação da operação de torneamento (Smith, 1989).

142

Figura 10.23 Designação ISO dos suportes de ferramentas de barras (Kennametal Hertel, 1998).

143

Figura 10.23 Designação ISO dos suportes de ferramentas de barras (Kennametal Hertel, 1998) (continuação).

144

Figura 10.24 Designação ISO dos insertos intercambiáveis (Kennametal Hertel, 1998).

145

Figura 10.24 Designação ISO dos insertos intercambiáveis (Kennametal Hertel, 1998) (continuação).

É importante salientar que esta designação dos insertos não se restringe apenas às ferramentas de tornear ou apenas às ferramentas de metal duro. Todos insertos intercambiáveis, independente do processo de usinagem em que ele será utilizado, devem ser codificados dentro deste padrão, não importando o material de que ele é feito (metal duro, cermet, cerâmica ou ultraduro).

10.6. CERMETS

Dois fatores contribuíram para o aparecimento das ferramentas de cermet. O primeiro foi a constatação de que a adição de TiC aumenta muito a resistência ao desgaste, principalmente de cratera, dos metais duros, quando usinando aços. O segundo foi a escassez de tungstênio durante a segunda guerra mundial, que levou várias equipes de pesquisas a concentrarem esforços no desenvolvimento de um material similar com as características dos metais duros. Assim, apesar de se ter registro de patente de cermet datada em 1931 (Kolaska e Dreyer, 1990), foi

146

a partir da década de 70 que o cermet entrou realmente no mercado, para hoje ser uma ferramenta competitiva.

Este grupo é constituído por TiC, TiN e geralmente tem o Ni como elemento de ligação. Pode ocorrer também a presença de outros elementos, tais como Al, Co, Mo ou compostos de Mo2C, TaC, NbC, WC, AlN, TaN e outros. Trata-se de um grupo considerado intermediário entre os metais duros e as cerâmicas, e as ferramentas são aplicadas principalmente no acabamento dos aços, com altas velocidades e baixos avanços, embora também possam ser usadas nas operações de desbaste. Suas principais características são a alta dureza a elevadas temperaturas e a grande estabilidade química, com pouca tendência à difusão. Hoje são ferramentas com grandes aplicações nas indústrias. A tabela 10.13 mostra as principais propriedades físicas dos cermets (a base de TiC) e dos metais duros (a base de WC).

Nota-se a maior dureza apresentada pelo cermet, garantida pela maior dureza dos TiC em relação aos WC (ver tabela 10.6), o que garante uma maior resistência ao desgaste ou maiores velocidades de corte para os cermets. A diferença de energia livre de formação entre os dois materiais garante maior estabilidade dos TiC, e portanto, maior resistência à dissolução. Outro fator importante dos TiC é a baixíssima solubilidade no ferro à elevada temperatura (0,5% para o TiC contra 7% para o WC), isto inibe a dissolução do TiC, e portanto, reduz a difusão. O cermet apresenta ainda maior temperatura de oxidação que o metal duro. A oxidação pode ser um forte acelerador de desgaste, principalmente se o desgaste de entalhe for predominante. Os pontos fracos dos cermets são as propriedades térmicas. Devido à baixa condutividade térmica e ao alto coeficiente de dilatação, o cermet tem um baixo coeficiente de resistência ao choque térmico, bem inferior ao metal duro. Daí a explicação do cermet só ser eficiente em baixos avanços, pequenas profundidades de corte e altas velocidades (operações de acabamento) na usinagem dos ferrosos. Devido à grande afinidade química do titânio com a maioria dos não-ferrosos, a aplicação dos cermets, basicamente se restringe à usinagem dos ferrosos.

A tabela 10.14 apresenta uma lista de fabricantes de cermets, com a composição química sendo apresentada para cada grau disponível. Acompanham em outra tabela as propriedades de dureza e tenacidade dos principais produtos desta classe de material para ferramenta de corte.

Tabela 10.13 Comparação das Propriedades Físicas do Cermet (TiC) com o Metal Duro (WC).

PROPRIEDADES FÍSICAS CERMET METAL DURO

DUREZA (HV) 3200 2100

ENERGIA LIVRE DE FORMAÇÃO (kcal/g - atm 1000ºC)

-35 -10

SOLUBILIDADE NO FERRO (wt% a 1250ºC)

0,5 7

147

PROPRIEDADES FÍSICAS CERMET METAL DURO

TEMPERATURA DE OXIDAÇÃO (ºC)

1100 700

CONDUTIVIDADE TÉRMICA (cal/cm·s·ºC)

0,052 0,42

COEFICIENTE DE DILATAÇÃO TÉRMICA (10-6/ºC)

7,2 5,2

COEFICIENTE DE CHOQUE TÉRMICO*

1,9 27,1

* Coeficiente de choque térmico = condutividade térmica x resistência à tração

coeficiente de dilatação x módulo de elasticidade

Tabela 10.14 Composição e propriedades dos Cermets (Brookes, 1986).

Composição dos CERMETS

Composição química

Fabricante País

Agência ou subsidiária na Inglaterra e número RS

Classe Mo2O

TaC NbC

TiC

WC

AlN

TaN

TiN

TiM

o

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tal

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Fa

se

s d

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o

Al Co Mo Ni

Out

ros

Adamas Carbide Corp

USA - T70 l l l ?

Carmet C ompany USA Pinner T ools Ltd 501

83,5 3,5 13

Duracarb by Países Ba ixos Duracarb Ltd 502

T70 l l l ?

EC Tools GmbH Alemanha - MAX1 l l l ? Feldmuhle AG Alemanha Feldmuhle

Technical Produc ts Ltd 503

Ceratip TC30

l l l ?

Kennametal Inc USA Kennametal Ltd 504

KT150 l l l ?

Kobe Steel Ltd Japão - KZ160 KZ180 KZ200

l

l

l

l

l

l

Krupp Widi a GmbH Alemanha Krupp Widi a (UK) Ltd 505

TTI l l l l

Kyocera Japão - TC30 TC40N TC60

TC60M

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Mitsubishi Metal Corporation

Japão Kingston C utting Tools Ltd 506

NX22 NX33 NX55 NX99

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NGK Spark Plug Co Ltd

Japão NGK Sparg Plug (UK) Ltd 507

N20 N40 T3N T4N T5N T35

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Nippon Tungsten Co Ltd

Japão - DUX30 DUX40

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AB Sandvik Hard Materials

Suécia Sandvik Coromant Ltd 508

CT515 l l l

Sumitomo Electric Industries Ltd

Japão Sumitomo Electric Hardmetals Ltd 509

T05A T12A T23A T25A

l

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l l

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? ? ? ?

Teledyne Firth Sterling

USA Teledyne Ltd 510

SD3 l l l l

Toshiba Tungal oy Co Ltd

Japão - N302 N308 N350

l

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l

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l

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l

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Valenite Di vision of GTE Val eron Corporation

USA Valenite-Modco (UK) Ltd 511

VC67 l l l ?

148

10.7. CERÂMICAS

Não existe na literatura uma definição clássica para os materiais cerâmicos, que possa identificar prontamente este grupo de materiais. Normalmente, quando se fala em cerâmicas as pessoas tendem a ligar o nome com os pisos, ou então com as porcelanas utilizadas nos recipientes de alimentos (pratos, travessas, potes, panelas, etc.). Quanto aos pisos cerâmicos, a propriedade requerida mais importante é a resistência ao desgaste, enquanto os recipientes de alimentos é a capacidade de resistir e armazenar calor. Portanto, as cerâmicas, as vezes, são muito mais conhecidas pelas suas propriedades, do que propriamente por uma definição clássica. A definição que segue abaixo, trata-se da união de pontos que identificam as cerâmicas oferecidos por diversos autores, ou livros (Kalpakjlan, 1984; De Garmo et alli, 1988; ASM Handbook, 1990).

“As cerâmicas são compostas de elementos metálicos e não-metálicos, geralmente na forma de óxidos, carbonetos e nitretos, e existem em uma grande variedade de composição e forma. A maioria tem estrutura cristalina, mas em contraste com os metais as ligações entre os elementos são iônicas ou covalentes. A ausência de elétrons livres faz com que as cerâmicas sejam pobres condutoras de eletricidade, e que, em seções finas, sejam transparentes. Devido às fortes ligações primárias, a maioria das cerâmicas tem alto ponto de fusão”.

Em geral, as cerâmicas possuem as seguintes propriedades que ajudam a identificá-las.

ü Capacidade de suportar altas temperaturas (materiais refratários); ü Alta resistência ao desgaste; ü Altas durezas; ü São frágeis; ü Baixa condutividade térmica; ü Boa estabilidade química e térmica; ü Boa resistência à fluência; ü Alta resistência à compressão e baixa resistência à tração.

Apesar da literatura citar o emprego das cerâmicas como ferramentas de corte desde o princípio do século, somente nos fins dos anos 50 as pastilhas à base de alumina (AI2O3) entraram no mercado, sendo atualmente um grupo bastante competitivo, principalmente na usinagem de materiais endurecidos e superligas.

Normalmente, as cerâmicas são usadas onde se requer alta dureza e resistência ao desgaste. As cerâmicas a base de alumina, apresentam excelente inércia química contra os materiais ferrosos. Entretanto, por não apresentarem tenacidades suficientes, os quebra-cavacos integrais ficam proibitivos, o que prejudicam sua aplicação nos aços comum ao carbono e baixa liga. Por outro lado, quando se tratar de aços de alta dureza, acima de 40 Rc, as cerâmicas são sempre consideradas, principalmente no corte contínuo. No corte interrompido ainda existem grandes limitações, exceto no fresamento de ferro fundido cinzento, onde as cerâmicas a base de nitreto de silício têm se mostrado eficientes.

149

No passado o que limitava a aplicação das cerâmicas era a fragilidade que elas apresentavam. Hoje, com a introdução no mercado das cerâmicas mistas, reforçadas com SiC (Whiskers) e a base de nitreto de silício, elas podem ter aplicações até nos cortes interrompidos, como por exemplo, no fresamento dos ferros fundidos cinzentos à altíssimas velocidades de corte e avanços. Isto é possível porque o grau de tenacidade conseguido nestas pastilhas é algo relativamente excepcional.

É com o aparecimento de tais materiais, juntamente com os metais duros revestidos e os materiais de ferramentas ultraduros (PCD e CBN), que os anos 80 podem ser considerados a época do terceiro grande impulso das ferramentas de corte (após os aços-rápidos com o primeiro, e os metais duros com o segundo).

As cerâmicas de um modo geral, possuem algumas propriedades melhores e outras piores que os cermets e os metais duros. A Figura 10.25 apresenta esquematicamente a comparação das principais propriedades dessas ferramentas de corte. Observa-se que as cerâmicas possuem a maior dureza a quente, a maior resistência à oxidação e menor afinidade química com o material da peça, enquanto o metal duro possui maior tenacidade e maior resistência ao choque térmico entre eles. O cermet sempre ocupa uma posição intermediária, entre o metal duro e a cerâmica, considerando qualquer uma dessas propriedades.

Figura 10.25 Esquema comparativo das propriedades da cerâmica, cermet e metal duro (Smith, 1989).

A Tabela 10.15 apresenta as propriedades mais importantes das principais ferramentas cerâmicas. Estas propriedades são comumente encontradas na literatura (North and Baker, 1984; Ezugwu and Wallbank, 1987; Momper, 1987; Tönshoff and Bartsch, 1988; Drozda, 1985). É importante analisar estas propriedades e interpretar corretamente os requisitos dos materiais para

150

ferramentas de corte para cada aplicação individual, para então poder selecionar a ferramenta corretamente.

Tabela 10.15 Propriedades das principais ferramentas cerâmicas

Material Módulo de elasticidade

(GPa)

Dureza

(GPa)

Tenacidade K1C

(MPa·m1/2)

Coeficiente de dilatação

térmica (10-6·K-1)

Condutividade térmica

(Wm-1·K-1)

Al2O3 400 17,2 4,3 8,0 10,5

Al2O3+TiC 420 20,6 4,5 8,5 13,0

Al2O3+ZrO2 390 16,5 6,5 8,5 8,0

Si3N4 / SIALON 300 15,6 6,5 3,1 9,7

SiC / WHISKER 390 18,5 8,0 6,4 32,0

O módulo de elasticidade deve ser considerado na definição da rigidez elástica da ferramenta. Quanto maior esta propriedade menor a variação elástica durante o carregamento da ferramenta. A dureza está ligada à resistência ao desgaste, enquanto a tenacidade significa a capacidade do material absorver energia antes de se romper, o que significa resistência ao choque. O coeficiente de dilatação térmica e a condutividade térmica indicam a resistência ao choque térmico. Quanto menor o coeficiente de dilatação e maior a condutividade térmica, maior a resistência ao choque térmico.

As cerâmicas podem ser divididas em dois grandes grupos: cerâmica a base de Al2O3 e cerâmica a base de Si3N4.

Cerâmica a Base de Al2O3

Podem ser puras ou com adições. As cerâmicas puras são ferramentas constituídas basicamente de finos grãos de Al2O3 sinterizados. É comum adicionar MgO para inibir o crescimento de grão. Outros constituintes, tais como óxido de cromo, titânio e níquel são às vezes adicionadas para aumentar a resistência mecânica. Estas ferramentas possuem um alto grau de dureza, resistência ao desgaste e excelente estabilidade química, mas deixam a desejar na tenacidade. Por isso é praticamente eliminada a aplicação deste grupo de material como ferramenta de corte. Quando usada, é geralmente no desbaste e principalmente no acabamento de materiais fundidos, aços tratados superficialmente ou totalmente temperados. Exigem geralmente máquinas com alto grau de rigidez, isentas de vibrações.

As primeiras ferramentas com adições apareceram nos anos 70, com altos percentuais (podendo chegar a 30%) de ZrO2 e/ou TiC principalmente, podendo ainda conter TiN, TiO2 e WC. Estas adições conferem à matriz de AI2O3 um maior grau de tenacidade para suportar maiores impactos e choques térmicos, inerentes a certos processos de corte. Uma ferramenta de AI2O3 pura tem o coeficiente de tenacidade à fratura Kic de 180 N/mm3/2, a adição de zircônia (ZrO2) pode elevar este valor a 300 N/mm3/2 com 15% de ZrO2, como mostra a Figura 10.26.

151

Observa-se que a tenacidade é melhorada para valores até 15% de ZrO2. Para valores superiores, a tenacidade começa a diminuir.

A adição de TiC (cerâmica mista ou preta), além de melhorar ligeiramente a tenacidade e a condutividade térmica, aumenta consideravelmente a dureza e a resistência ao desgaste da ferramenta (ver Tabela 10.15).

Figura 10.26 Tenacidade da cerâmica a base de AI2O3 em função do teor de ZrO2 (Abel, citado por Gruss, 1987).

Com estas pastilhas, tem-se conseguido excelentes resultados no desbaste e acabamento de aços laminados (velocidade de 3 a 6 vezes maiores que o metal duro), ótimos resultados em acabamento e superacabamento na operação de fresamento de materiais fundidos e no torneamento de aços duros.

Outra introdução no mercado nos anos 80, que teve grande receptividade, é a ferramenta cerâmica, também a base de Al2O3, reforçada com SiC (Whiskers). Estes carbonetos são adicionados em até 20% na alumina, na forma de longos cilindros, de 0,5 a 6mm de diâmetro e 10 a 80mm de comprimento (Komanduri, 1989). A mecânica do processo de aumento da tenacidade com a adição dos "whiskers" pode ser entendido como segue (Komanduri, 1989). Durante a propagação de uma trinca, apesar dos SiC permanecerem íntegros, sem se quebrarem, há a separação deles da matriz de AI2O3, e este processo absorve grande quantidade de energia de fratura e inibe a propagação da trinca. Devido a grande resistência dos "whiskers", a trinca não atravessa sua estrutura, tendo portanto que desviar-se, o que também consome energia. Tudo isto aumenta a tenacidade do material. Estas ferramentas possuem, também, maior resistência ao choque térmico, devido a maior condutividade térmica do SiC em relação à alumina (ver Tabela 10.15). As propriedades desse grupo de material são consideradas excepcionais, com aplicação na usinagem dos aços duros, aços inoxidáveis e principalmente nas superligas de níquel (Smith, 1986). A Figura 10.27 apresenta o melhor comportamento de tenacidade de uma ferramenta de AI2O3 contendo ZrO2 com a adição de SiC contra a mesma ferramenta sem SiC.

152

Esta adição também aumenta a dureza e a resistência ao desgaste, como mostra a Figura 10.28.

Figura 10.27 Tempo de usinagem e aumento do avanço para iniciar uma trinca em duas ferramentas cerâmicas, uma com outra sem adição de "Whisker", no corte contínuo de aço C 60 N, Vc = 150 m/min e ap = 2 mm. (Krupp Widia - Tech. lnf. HVT 78.521).

Figura 10.28 Desgaste nas ferramentas a base de alumina com e sem adição de "Whisker", no corte contínuo de lnconel 718, Vc = 150 m/min, f = 0,25 mm/volta, ap = 1 mm e tempo de corte = 2 min. (Krupp Widia - Tech. Inf. HVT 78.521).

153

Cerâmica a Base de Si3N4

Este grupo apareceu no mercado nos anos 80. Tratam-se de cristais de Si3N4 com uma fase intergranular de SiO2 (cristais de vidro) que são sinterizados na presença de Al2O3, Y2O3, MgO e outros. Com esses materiais tem-se conseguido excelentes resultados na usinagem das ligas de níquel e ferros fundidos. Entretanto, devido a grande interação química com o ferro a elevadas temperaturas, este grupo de material não tem tido sucesso na usinagem de aços (Bulijan e Sarin, 1985).

Um dos produtos deste grupo, que é comercializado com a marca registrada de Sialon (nome que tem origem no símbolo dos elementos que ele contém, que são Si, AI, O e N), tem mostrado bons resultados na usinagem de aços e excelentes aplicações nas superligas de níquel. A adição de AI e O nas ferramentas desse grupo diminui as interações com o ferro e permite aplicações em aços (Bulijan e Sarin, 1985). O baixo coeficiente de dilatação (ver Tabela10.15) diminui a possibilidade de trinca térmica durante a usinagem.

As cerâmicas a base de nitreto de silício possuem boa resistência ao desgaste, com tenacidade superior às das cerâmicas a base de AI2O3. Isto faz com que a aplicação destes materiais chegue ao fresamento, o que pouco tempo atrás era inadmissível para as cerâmicas.

Para compensar a deficiência de menor dureza, estas cerâmicas podem ser revestidas tanto com AI2O3 como TiC, o que garante maior resistência ao desgaste a estas ferramentas. A Figura 10.29 mostra a redução de desgaste conseguida com o revestimento de Al2O3 de uma cerâmica a base de Si3N4.

Figura 10.29 Influência do revestimento de Al2O3 numa ferramenta a base de Si3N4 no torneamento do ferro fundido cinzento, Vc = 600 m/min, f = 0,5 mm/volta, ap = 2 mm, tc = 5 min. (Krupp Widia - Tech. lnf. HVT 78.521).

154

A Figura 10.30 apresenta um diagrama que resume o campo de aplicação das cerâmicas. Nota-se que no fresamento de ferro fundido cinzento já existe aplicação de cerâmicas. No torneamento desse material, cerâmicas mistas e sialon podem ser usadas com aplicação de fluidos de corte. Na usinagem dos aços, a grande parte das aplicações fica por conta das cerâmicas mistas e óxidas (normalmente com adição de ZrO2), com pouca aplicação das sialons. A usinagem de superligas e de aços endurecidos é dividida entre a cerâmica mista, o sialon e o CBN, mas apenas no torneamento.

CERÂMICAS ÓXIDAS

TORNEAMENTO

Sem fluido de corte Com

FRESAMENTO

FERROSFUNDIDOS

DU

RE

ZA

CR

ES

CE

NT

E

DE

MA

ND

A D

E T

EN

AC

IDA

DE

DE

CR

ES

CE

NT

E

CERÂMICAS MISTASAÇOS

SUPERLIGASCORTE DE DESBASTE

LIGAS FUNDIDAS DURASAÇOS ENDURECIDOS

CBNÓXIDA

S

SIALONSÓXIDAS

CERÂMICAS ÓXIDAS: Al2O3+0,8%ZrO2

CERÂMICAS MISTAS: Al2O3+20-30%TiC, Al2O3+TiC+TiN+ZrO2, etc.

SIALONS: 80-90%Si3N4+Al2O3+Y2O3

Figura 10.30 Campo de aplicação das cerâmicas (Pastor, 1987).

As Tabelas 10.16 e 10.17 apresentam os principais produtos, composições químicas e propriedades das cerâmicas a base de óxido e a base de nitretos, respectivamente.

155

Tabela 10.16 Composição e propriedades das cerâmicas a base de óxidos (Brookes, 1986).

Composição das cerâmicas à base de óxidos

Composição química

Fabricante País

Agência ousubsidiária naInglaterra e númeroRS

GrauAl2O3 MgO TiO2 ZrO2 TiC WC TiB2 TiN W SiC

WhiskersOutros

Carboloy Systems USA Carboloy Ltd512

CerMax 440CerMax 460CerMax 490

l

l l

l

??

Cermet Company USA Pinner Tools Ltd513

CA-BCA-W

l

l

l

Feldmuhle AG Alemanha Feldmuhle TechnicalProducts Ltd514

SH20SN60SN80

l

l

l

l

l

l

GreenleafCorporation

USA - GEM1GEM2GEM3GEM9WS300

l

70l

99,9l

30l

l

Karl Hertel GmbHVerkaufs KG

Alemanha Karl Hertel Ltd515

AC5MC2

l

70 30Kennametal Inc USA Kennametal Ltd

516K060K090

Kyon 2500

l

l l

l

Kobe Steel Ltd Japão - KB90KW80

l

l

l

Krupp WidiaGmbH

Alemanha Krupp Widia (UK)Ltd517

Widalox GWidalox HWidalox NWidalox R

Widalox ZRN.anunciado

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

l

?Mitsubishi MetalCorporation

Japão Kingston CuttingTools Ltd518

XD3 l l

NGK Spark PlugCo Ltd

Japão NGK Spark Plug(UK) Ltd519

CX3HC1HC2HC6

l

l

l

l

l

l

l

???

Nippon TungstenCo Ltd

Japão - NPC A2NPC H1

l

l

l

Rogers Tool Works USA - RTW 138RTW 1322

l

l l

AB Sandvik HardMaterials

Suécia Sandvik CoromantUK520

CC 620CC 650

N.anunciado

l

l

l

l l l

l

Seco Tools AB Suécia Seco Tools (UK) Ltd521

SecoramicRVX

l

40 50 10Sumitomo ElectricIndustries Ltd

Japão Sumitomo ElectricHardmetals Ltd522

N890W80

l

l

l

Toshiba TungaloyCo Ltd

Japão - LX21LXAM

l

l

l

l

l

l

Valenite Division ofGTE ValeronCorporation

USA Valenite-Modco (UK)Ltd523

V32V33V34V44

70l

l

l l l l

30

l

l l

l

VR WessonDivision ofFansteel

USA L&TiBrock&Co Ltd524

VR97VR100

99l l

Propriedades das cerâmicas à base de óxidos

Propriedades

Nome comercial GrauDensidade

g/cm2Dureza

HRA ou HVResistência à ruptura

transversalN/m2

Coeficiente deexpansão

10-4/KFeldmuhle SH1

SH20SN50SN80

4,304,154,004,12

2250215020002000

380400450600

7,07,07,37,4

Kennametal K060K090

700910

8,28,3

Kobelco KW80KB90

3,974,24

93,694,0

750850

7,07,8

Krupp Widia Widalox GWidalox R

4,024,12

17301730

700650

NGK NTK CX3HC1HC2HC6

4,004,004,304,70

93,593,594,594,0

750800800800

8,48,0

Sandvik CC680 1500Sumitomo B90

W804,263,98

94,594,0

880790

156

Tabela 10.17 Composição e propriedades das cerâmicas a base de nitretos (Brookes, 1986).

Composição das cerâmicas à base de nitretos

Composição químicaFabricante País

Agência ou subsidiária naInglaterra e número RS

GrauSi3N4 Al2O3 Y2O2 TiN Outros

Elektroschmetzwerk KemptenGmbH Zetti GmbH

Alemanha - Zekald 3000 l l l

Feldmuhle AG Alemanha Feldmuhle TechnicalProducts Ltd525

SL100SL200

l

l

l

l

Greenleaf Corporation USA - Saox 2001GSN

l

l

l

l

Karl Hertel GmbH VerkaufsXG

Alemanha Karl Hertel Ltd526

NC1 l l

Iscar Ceramics Inc USA Iscar Tools Ltd527

Iscar l l ?

Kennametal Inc USA Kennametal Ltd528

Kyon 2000Kyon 3000

l

l

l

l

l

l

Krupp Widia GmbH Alemanha Krupp Widia (UK) Ltd529

Widia N1000Widia CN1000

l

l

l

lAl2O3

revest.Lucas Syalon Ltd UK 530 SyalonNGK Spark Plug Co Ltd Japão NGK Spark (UK) Ltd

531NTK

NTK SP4NTK SX4NTK SX7

l

l

l

l

l

l

l

Al2O3

revest.

Nippon Tungsten Co Ltd Japão - Naycon l l l

Nortron Company USA Norton Industrial Ceramics532

l l ?

AB Sandvik Hard Materials Suécia Sandvik Coromant UK533

CC680 l l l

Toshiba Tungaloy Co Ltd Japão - FX920 l l

Valenite USA Valenite534

Quantum 5Quantum 5000

l

l

l

l

l

l

Propriedades das cerâmicas à base de nitretos

Propriedades

Nome comercial GrauDensidade

g/cm2Dureza

HRA ou HVResistência à ruptura

transversalN/m2

Coeficiente deexpansão

10-4/KFeldmuhle SI100

SL2003,303,25

17001500

800750

2,32,5

Greenleaf GSN 94,0Kennametal Kyon 2000 750 3,2Lucas Syalon 3,25 91,2 1800 945 3,0NGK NTK SP4

SX2SX7

3,63,63,2

92,592,593,0

90010001100

4,0

3,2Nippon Tungsten Naycon 3,23 92,8 1000 3,6Valenite Quantum 6 3,77 90,0

A aplicação de ferramentas cerâmicas exige alguns cuidados especiais. Abaixo seguem algumas dicas para se usinar com essas ferramentas.

² Fazer um trabalho de preparação antes de iniciar o corte.

² O uso do fluido de corte deve ser evitado, se requerido, entretanto, usar o fluido em abundância na aresta de corte.

² Nunca use aresta cortante com quina viva:

ð aresta chanfrada

ð aresta arredondada

ð ferramenta com raio de ponta

157

² Use-as com as máximas condições de corte (Vc, f, ap) recomendadas.

² Use um bom sistema de grampo de fixação e bom assentamento da pastilha no suporte.

² Use-as em máquinas ferramentas rígidas, livre de vibrações.

² aumento de resistência segue a ordem:

ê

ê

ê

10.8. MATERIAIS DE FERRAMENTAS ULTRADUROS

Normalmente materiais com dureza superior a 3000 HV são denominados ultraduros. Como ferramentas de corte os ultraduros são:

Ä Diamante natural;

Ä Diamante sintético monocristalino;

Ä Diamante sintético policristalino (PCD-Polycrytalline Diamond);

Ä Nitreto cúbico de boro sintético monocristalino (CBN);

Ä Nltreto cúbico de boro sintético policristalino (PCBN).

O diamante natural foi usado como ferramenta de corte por centenas de anos, pois trata-se do material de maior dureza e resistência ao desgaste da natureza. Além disto, ele possui excelente condutividade térmica (ver Tabela 10.1). As ferramentas de diamante natural são usadas principalmente quando se requer super-acabamentos nos componentes usinados. Acabamentos superficiais da ordem de 0,025mm podem ser obtidos com estas ferramentas se o maquinário tiver rigidez suficiente (Clark e Sen, 1998). Entretanto, devido à sua fragilidade e risco de falha sob impacto e também seu alto custo, tem sua aplicação limitada como ferramentas de corte, principalmente após o surgimento dos diamantes e CBN sintéticos, que podem substituí-lo com bastante eficiência.

Os sintéticos foram produzidos pela primeira vez nos anos 50, mas apenas no final da década de 70 que eles entraram no mercado como ferramentas de corte competitivas. Tanto os PCDs como os CBNs podem ser encontrados apenas como uma camada de 0,5 a 1,0 mm, que são brasadas geralmente no metal duro WC + Co, ou então mais raramente como ferramentas totalmente sólidas.

158

O diamante sintético é obtido sujeitando o carbono, na forma de grafite a temperaturas e pressões extremamente altas. Como grafite, os átomos de carbono estão arranjados na forma hexagonal. Após o tratamento térmico ele se transforma em diamante, possuindo uma estrutura cúbica de face centrada (CFC). A Figura 10.31 ilustra a estrutura cristalina da grafite e do diamante e apresenta o diagrama de equilíbrio das duas formas.

transformação

a)

Diamante

Temperatura [K]

Grafite

b)

Figura 10.31 a)- Estrutura cristalina do grafite e do diamante. b) - diagrama de equilíbrio (Berman and Simon, 1955, citado por Heath 1986).

A transformação é muito difícil, envolvendo temperaturas da ordem de 2000ºC a pressões de 7 GPa. Para tornar mais econômico, o processo é realizado na presença de um metal solvente (normalmente o cobalto).

De maneira similar e pouco tempo depois de se obter o diamante sintético o HBN (nitreto hexagonal de boro) também foi transformado em CBN (nitreto cúbico de boro). Assim como a grafite, o HBN é frágil e escorregadio, enquanto o CBN é duro e resistente ao desgaste em menor escala que o diamante, mas superior às cerâmicas. A Figura 10.32 apresenta a estrutura cristalina do HBN e do CBN e o diagrama de equilíbrio. Para acelerar as reações, o solvente neste caso é um nitreto metálico, que reduz tanto a temperatura como a pressão de síntese para aproximadamente 1500ºC e 6 GPa respectivamente (Heath, 1986).

159

transformação

a)

Temperatura [K]

NitretoHexagonal deBoro

NitretoCúbico deBoro

b)

Figura 10.32 a)- Estrutura cristalina do HBN e do CBN b)- diagrama de equilíbrio (Heath, 1986).

Com o andamento da transformação os cristais de diamante e CBN crescem. A Figura 10.33 mostra cristais de diamantes sintéticos embebidos na massa de reação extraída da câmara de transformação.

Figura 10.33 Cristais de diamantes produzidos sinteticamente (Heath, 1986).

O desenvolvimento do processo de obtenção do diamante e do CBN a alta temperatura e pressão permite a produção de monocristais sintéticos da ordem de 8 mm. Assim é possível encontrar no mercado ferramentas de monocristais de diamantes com arestas de 8 mm de comprimento e 2 mm de espessura. Este produto sintético tem a vantagem de possuir consistência no tamanho, forma e performance não encontrada nos diamantes naturais.

160

Os policristais de diamante e de CBN (PCD e PCBN, respectivamente) são obtidos pelo processo de metalurgia do pó, usando monocristais de diamante e CBN, respectivamente. Novamente deve-se adicionar catalisadores para acelerar a sinterização. Naturalmente, durante o tratamento térmico, toda a massa do produto deve estar contida dentro da fase cúbica do respectivo diagrama de equilíbrio para evitar a reversão da fase cúbica em hexagonal. Neste processo, pode-se obter uma variedade imensa de produtos, dependendo de: tamanho de grão dos monocristais (estes dependem do tempo de permanência na câmara de transformação), solvente/catalisador empregado (devido a problemas de instabilidade térmica no produto final de PCD, a variação dos solventes utilizados são restritos, mas nos PCBN são muitos), grau de sinterização, etc., com isto obtendo-se uma variedade muito grande nas propriedades finais dos produtos, sendo, portanto possível desenvolver produtos para aplicações específicas (Heath, 1986).

A tenacidade destes policristalinos é bem superior à dos monocristais e, portanto o campo de aplicação é maior, apesar da maior dureza e resistência ao desgaste dos monocristais. Esta propriedade pode ser aumentada, aumentando-se o tamanho de grão dos policristais, pois inversamente ao que acontece com o metal duro, aqui a resistência ao desgaste cresce com o aumento do tamanho de grão (Clark e Sen, 1998). Apenas quando se exige maior integridade e precisão da aresta, como no caso de usinagem de super-acabamento, o monocristal pode superar o policristal. No caso de usar policristal, este deve ter a granulação mais fina possível, pois consegue-se melhor qualidade de aresta.

O diamante para revestir metal duro conseguido pelo processo CVD (Deposição Química de Vapor), já citado no tratamento de metal duro revestido, diferentemente do sintético (mono e policristal), é obtido à baixa pressão. Uma mistura de gás a base de carbono + hidrogênio são dissociados e depositados a altas temperaturas (~2000ºC) e pressões abaixo da atmosférica. Desta maneira cresce uma camada de diamante policristalina, que pode apresentar uma variação grande no tamanho dos grãos e na textura. Uma vantagem em relação ao diamante sintético obtido a alta pressão, pelo processo convencional, é a ausência de catalisador e consequentemente, a estabilidade térmica é maior neste produto desenvolvido pelo processo CVD (Clark e Sen, 1998). A Figura 10.34 ilustra esquematicamente o processo CVD para obtenção do diamante.

Energia de microondas, descarga elétrica ou fio quente

Hidrogênio+

MetanoAcima de 2000ºC

Substrato

Camada de diamante CVD

O diamante CVD édepositado duranteum período de tempopara formar uma finacamada

Figura 10.34 Esquema llustrativo do processo CVD de obtenção do diamante sintético para revestir o metal duro (Clark e Sen, 1998).

161

O diamante sintético tem a limitação de não poder ser utilizado na usinagem de aços ou qualquer outro material ferroso, pois ele se desintegra quimicamente quando as temperaturas ultrapassam 700ºC. Mas as ligas de alumínio, cobre puro, metais duros e materiais compostos, principalmente os MMC (compostos de matrizes metálicas) têm-se beneficiado pelo uso desse que é o mais duro material da natureza como ferramenta de corte.

Ao contrário, o CBN tem-se mostrado excelente na usinagem dos aços, ligas de níquel, ligas de titânio e ferros fundidos. O CBN sintético é termicamente mais estável, apresentando uma resistência ao ataque químico bem maior que o diamante. O CBN é estável até a temperaturas da ordem de 1200ºC, sendo portanto aplicado na usinagem dos ferrosos sem maiores problemas.

A Tabela 10.18 apresenta os principais produtos de ultraduros do mercado e as propriedades desses em comparação com outros materiais de ferramentas de corte. Observa-se que a limitação de tenacidade apresentada por algumas cerâmicas não se verifica nos PCBN, cuja tenacidade chega bem próxima à do metal duro. Por esta razão e pela neutralidade química e propriedades de dureza e resistência ao desgaste desse material, ele pode ser aplicado na usinagem de praticamente todos os materiais de uso comum em engenharia. Portanto, pode logo tornar-se o principal material de ferramenta de corte.

O que mais limita a aplicação dos ultraduros ainda é o seu alto custo de fabricação. O preço dessas pastilhas no mercado está em torno de 80 vezes o preço do metal duro e de 15 a 25 vezes o preço da cerâmica. Elas estão sendo comercializadas a um preço médio de US$ 80 a US$120 cada aresta. Com o maior domínio da técnica de obtenção este custo pode baixar, tornando este grupo de materiais ainda mais competitivo.

10.9. CONCLUSÃO

O número de ferramentas de corte disponível no mercado mundial cresceu assustadoramente, principalmente nos anos 80. Este crescimento se deu não por haver grandes quantidades de materiais similares em diferentes fabricantes, mas sim pela exigência do avanço tecnológico, para suprir as necessidades dos mais diversos grupos de materiais a usinar, visando sempre o aumento da produtividade e a economia no corte. Isto aconteceu por meio de muita pesquisa.

O que está acontecendo com os materiais da chamada terceira geração (cerâmica, PCD, PCBN, pastilhas revestidas e também os metais duros, que hoje são produzidos com qualidades excepcionais) é algo fantástico. As pesquisas não param e sempre aparecem novidades.

Com a disponibilidade de uma maior gama de materiais de ferramentas no mercado a escolha correta torna-se uma tarefa mais engenhosa, e todos devem estar cientes de que em termos de usinagem a prática da pesquisa é indispensável. Conhecer o processo e entender os mecanismos de desgaste das ferramentas é fundamental para que se chegue a uma ótima escolha, que representará economia. E esta ótima escolha só aparecerá da pesquisa. É como

162

disse oportunamente o Dr. Milton C. Shaw no prefácio de seu livro "Metal Cutting Principies": "devido à complexidade do processo de usinagem é impossível uma teoria preditiva. Uma solução prática fundamentada em muitas experiências tem que ser adotada, ao invés de se procurar o impossível". Tabela 10.18 Principais produtos e propriedades dos ultraduros (Brookes, 1986).

Principais produtos dos ultraduros

Nitreto cúbico de boro policristalino (PCBN)Fabricante ou fornecedor País

Agência ou subsidiária naInglaterra e número RS

Diamantepolicristalino

(PCD) Sólido Sobre metal duro

De Beers DiamondResearch Laboratory

África do Sul De Beers IndustrialDiamond Division535

Synate 010Synate 025

AmbonteAbraziteDBC50

General Electric (US)Speciality Materials Dept.

USA Speciality Materials536

Compax BZN

Kennametal Inc USA Kennametal Ltd537

KD100KD120

KD200

Krupp Widia GmbH Alemanha Krupp Widia (UK) Ltd538

CD10 C850

SII Megadiamond Inc USA - MecapaxSumitomo ElectricIndustries Ltd

Japão Sumitomo ElectricHardmetals Ltd540

CA 100CA 150Ca 200

BN100BN150BN200

Toshiba Tungaloy Co Ltd Japão - T-Dia DX 140 CBN BX 290Valenite Division of GTEValeron Corporation

USA Valenite-Modco (UK) Ltd541

PCD CBN

Zinner GmbH Alemanha - Zicra Zibora

Propriedades dos ultraduros

Material do insertoPropriedade 94WC 5Co

metal duroAluminacerâmica

Alumina TiCcerâmica

Nitreto de silíciocerâmica

Diamantepolicristalino

PCBNsólido

Densidade, g/cm3 14,7 3,9 4,3 3,2 3,4 3,1

Resist. à compressão, kN/mm2 4,5 4,0 4,5 3,5 4,7 3,8

Dureza Knoop HK, kN/mm2 13 16 17 13 50 28

Módulo de Young, kN/mm2 620 380 370 300 925 680

Módulo de rigidez, kN/mm2 250 150 160 120 430 280

Raio de Poisson 0,22 0,24 0,22 0,28 0,09 0,22

Coef. de exp. térmica, 10-4/K 5,0 8,5 7,8 3,2 3,8 4,9

Condutividade térmica, W·m/K 100 23 17 22 120 100

Tenacidade à fratura K1C, MN·m3/2 11 2,3 3,3 5,0 6,9 10

Finalizando, é importante salientar que a atual qualidade das ferramentas de corte permite a aplicação de velocidades de corte altíssimas e avanços excepcionais em diferentes processos de usinagem. Hoje, HSM - High Speed Machining e UHSM - Ultra High Speed Machinlng (ou HSC – High Speed Cutting) são termos comuns no meio de fabricação. Além de vantagens diretas, a aplicação desses processos elimina a operação de acabamento, o que significa ganho econômico. Toda esta evolução é um processo que depende do crescimento de todo o sistema. Não se pode falar em HSM ou UHSM sem falar em ferramentas resistentes e na evolução das máquinas-ferramentas. Aliás, este é um outro ponto importante que deve ser colocado para todos os que querem evoluir nas técnicas de usinagem: cada vez mais se exigem máquinas-ferramentas mais potentes, precisas e rígidas. Dentro desse raciocínio não é difícil concluir que os laboratórios de pesquisa são os primeiros lugares onde se

163

deve pensar assim. É preciso equipar os laboratórios adequadamente. As pesquisas os pagarão. É assim que funciona nos grandes países. Por que não no Brasil? REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABRÃO, A.M., 1995, "The Machining of Annealed and Hardened Steels Using Advanced Ceramic Cutting Tools", PhD Thesis, University of Birmingham, UK.

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165

C A P Í T U L O 1 1

AVARIAS, DESGASTE E MECANISMOS DE DESGASTE DAS FERRAMENTAS DE CORTE

11.1. INTRODUÇÃO

Por maior que seja a dureza e a resistência ao desgaste das ferramentas de corte, e por menor que seja a resistência mecânica da peça de trabalho, a ferramenta de corte sofrerá um processo de destruição que mais cedo ou mais tarde exigirá a sua substituição.

Estudar e entender os processos de destruição das ferramentas de corte são muito importantes, pois podem permitir ações coerentes e efetivas para reduzir a taxa desta destruição, prolongando a vida da aresta de corte. Embora os custos com ferramentas de corte perfazem apenas uma pequena fração do custo total de fabricação de uma peça, a preocupação persiste, pois se estas sofrem desgastes acelerados e/ou avarias freqüentes, existirá, também, a freqüente necessidade de parada da máquina para a troca destas, e isto significa custos adicionais e perda de produtividade. Além disso, o conhecimento do processo de destruição da aresta fornecerá subsídios para que haja a evolução dos materiais das ferramentas, tornando-as mais resistentes aos fenômenos negativos que ocorrem durante o processo de usinagem.

Podem-se distinguir três tipos de destruição da ferramenta de corte na usinagem: avaria, desgaste e deformação plástica, apesar de alguns autores (Trent e Wright, 2000) considerarem a deformação plástica como um mecanismo de desgaste. Os três promovem a mudança na geometria da ferramenta de corte. Os dois primeiros, geralmente, promovem a perda de massa, enquanto o ultimo promove o deslocamento de massa na ferramenta de corte. Para que o leitor possa, desde o início, compreender e distinguir esses processos de destruição das ferramentas de corte, suas definições são apresentadas a seguir.

Avaria é um processo de destruição da ferramenta de corte que ocorre de maneira repentina e inesperada, causado pela quebra, lasca ou trinca da ferramenta de corte. A quebra e a lasca levam à perda de uma quantidade considerável de material da ferramenta de corte instantaneamente, enquanto a trinca promove a abertura de uma fenda no corpo da ferramenta de corte. A quebra é mais comum em ferramentas com baixa tenacidade, como as cerâmicas e os ultraduros. Já a lasca, depende também da tenacidade da ferramenta, mas pode ocorrer até mesmo em ferramentas de aço-rápido (Santos, 2004). No caso da trinca não existe a perda de material, mas sua presença pode comprometer a continuidade do processo de corte pela sua transformação em sulco (no caso de trincas de origem térmica) ou pela promoção de uma lasca ou mesmo a quebra da ferramenta de corte. A geração da lasca ocorre quando a trinca é mais superficial, enquanto a quebra ocorrerá se a trinca for mais profunda. As trincas são comumente observadas em ferramentas de metal duro e cermets, podendo também aparecer em ultraduros e aço-rápido, enquanto que as cerâmicas, normalmente, são frágeis demais para conseguirem absorver a deformação plástica necessária para impedir a sua propagação. Assim, normalmente, uma trinca na ferramenta cerâmica é levada às conseqüências mais graves, isto é, promove instantaneamente a lasca ou a quebra da ferramenta.

166

Desgaste. A Norma ISO 3685 (1977) define desgaste em ferramentas como sendo: “mudança de sua forma original durante o corte, resultante da perda gradual de material”. Em tribologia, Hutchings (1992), em seu clássico livro sobre o assunto, define desgaste como sendo “a destruição de uma ou de ambas superfícies que compõem um sistema tribológico, geralmente envolvendo perda progressiva de material”. À destruição que Hutchings se referiu, vamos relacionar a alterações geométricas, e definir desgaste em usinagem como sendo a mudança da geometria da ferramenta de corte por perda de massa. No desgaste, ao contrário da avaria, esta perda acontece de maneira contínua e progressiva, e em proporções pequenas, às vezes a nível atômico, às vezes a nível granular ou granulares. Pode ocorrer segundo vários mecanismos e a deformação plástica pode fazer parte dos mesmos. Neste processo a temperatura desenvolvida durante o corte tem um papel decisivo, e atinge ferramentas de corte de qualquer material.

Deformação Plástica é a mudança da geometria da ferramenta de corte pelo deslocamento de massa. Ela ocorre por cisalhamento devido às altas tensões atuantes nas superfícies das ferramentas de corte. Em casos extremos vai levar à total destruição da cunha cortante da ferramenta, podendo até perder massa. É mais comum ocorrer em ferramentas com resistência ao cisalhamento relativamente baixa e com maior tenacidade, como o aço-rápido, as ligas fundidas e o metal duro. A ocorrência nas cerâmicas é difícil porque a grande fragilidade deste grupo de materiais não apresenta campo plástico suficiente para permitir o deslocamento de material, promovendo, antes, a quebra ou a fratura. É comum encontrar na literatura (Trent e Wright, 2000) o tratamento da deformação plástica como desgaste, o que é perfeitamente aceitável, uma vez que ambos promovem a mudança da geometria da ferramenta, que podem culminar em destruição total da aresta de corte.

Assim, num processo de usinagem existem duas causas fortes para substituição da ferramenta de corte, a saber:

I. Ocorrência de uma avaria (trinca, lasca ou quebra). Isto é muito raro de ocorrer no corte contínuo (torneamento), a não ser que as condições de corte usadas estão acima das condições máximas recomendadas para cada tipo de ferramenta; ou a geometria da ferramenta é inapropriada; ou mais raro ainda, quando a ferramenta de corte já possui algum defeito de fabricação (o que pode ser evitado por inspeções prévias rigorosas, antes do uso). As avarias são mais comuns no corte interrompido (fresamento), devido aos choques mecânicos e térmicos inerentes a tais processos.

II. O desgaste ou a deformação atinge proporções elevadas que pode comprometer o bom andamento do processo. O desgaste e a deformação acontecem tanto nas superfícies de folga como na superfície de saída das ferramentas, em cortes contínuos ou interrompidos.

11.2. AVARIAS NAS FERRAMENTAS DE CORTE

As ferramentas de corte usadas no corte interrompido (fresamento) são freqüentemente rejeitadas por trincamento, lascamento ou quebras. Neste tipo de operação o desenvolvimento do desgaste uniforme, na superfície de folga ou saída, será dominante apenas se a ferramenta de corte possuir tenacidade suficiente para resistir aos choques mecânicos e térmicos inerentes a tais processos. No corte interrompido, uma aresta de corte pode sofrer avarias devido aos choques

167

mecânicos originados na entrada ou na saída da peça, ou pelo choque de origem térmica, causado pela flutuação da temperatura durante um ciclo (ou revolução) da ferramenta. Esta flutuação da temperatura ocorre porque a ferramenta se aquece durante a parte ativa do ciclo (de retirada do cavaco) e se resfria durante a parte inativa do ciclo (sem retirada de cavaco). A Figura 11.1 apresenta um desenho esquemático de um fresamento frontal (ou fresamento de aplainamento), onde os ciclos ativos (de corte) e inativos (sem corte) durante uma revolução da ferramenta são destacados.

11.2.1. AVARIA DE ORIGEM TÉRMICA

Durante um corte interrompido como, por exemplo, no fresamento de faceamento, ilustrado na Figura 11.1, cada dente da ferramenta de corte experimenta uma fase ativa, de corte, período em que existe a formação do cavaco e, portanto, aquecimento da ferramenta; e uma fase inativa, sem corte, período em que não existe a formação de cavaco por aquele dente e, portanto, ocorre o resfriamento da ferramenta. Conseqüentemente, as temperaturas num corte interrompido flutuam ciclicamente, aumentando durante o tempo ativo da aresta de corte e diminuindo durante o tempo inativo.

Figura 11.1. Representação esquemática das fases ativa e inativa da aresta de corte num processo de fresamento frontal (Melo et all, 2004).

As condições térmicas das ferramentas de corte utilizadas em cortes

interrompidos têm sido investigadas por vários pesquisadores (Bhatia et all, 1986; Chakraverti et all, 1984a; Wang et all, 1969 e Palmai, 1987). O papel desenvolvido pela temperatura no tipo de falha da ferramenta de corte é bem conhecido. A variação cíclica dessa temperatura é ilustrada na Figura 11.2.

A curva a da figura representa o aquecimento da ferramenta em um corte contínuo, onde a temperatura tende a se estabilizar em um valor constante. Na prática, esse valor irá se alterar quando os efeitos do desgaste começarem a interferir no processo. A curva b representa o resfriamento contínuo da ferramenta, desde o valor constante de temperatura atingido durante o corte até a temperatura ambiente. No corte interrompido, durante o tempo ativo t1, a ferramenta se aquece até a temperatura T1. Neste momento inicia-se o tempo inativo t2, quando a ferramenta começa a se resfriar, atingindo a temperatura T’1 ao final do tempo t1 + t2.

Peça

Fase

ativ

a

Fase inativa

Fresa

168

Neste momento a ferramenta entra novamente em corte (tempo ativo) e o ciclo se repete.

t1

T const.

Figura 11.2. Variação cíclica da temperatura de corte no processo de corte interrompido (Palmai, 1987).

Resultados dessas investigações mostraram que a distribuição de

temperatura durante o ciclo depende das condições de corte (principalmente da velocidade de corte, avanço e da relação entre o tempo ativo e inativo de um ciclo), do material da ferramenta de corte e do material de peça.

A flutuação cíclica da temperatura na interface cavaco-ferramenta leva a uma modificação, também cíclica, da distribuição de tensão na região de corte da ferramenta, o que pode provocar a formação de trincas térmicas.

Isto é explicado da seguinte maneira (Ferraresi, 1977): “...a Figura 11.3.a apresenta a curva de distribuição da temperatura em relação à profundidade “x”, a partir do ponto de contato cavaco-ferramenta. A camada superficial, a uma temperatura bastante alta, se dilata. Porém, as camadas subseqüentes a temperaturas inferiores, terão uma dilatação bem menor. Como conseqüência, tais camadas impedirão o processamento de uma dilatação maior na camada superficial. Desta forma, origina-se na camada superficial tensões de compressão (Figura 11.3.b). Em conseqüência disto, haverá a determinada distância “x” da superfícies de contato, tensões de tração. Num instante de tempo seguinte, com a variação da temperatura de corte, isto é, com o resfriamento da camada de contato (devido ao tempo inativo), essa camada estará submetida à tração (processo inverso ao do tempo ativo), enquanto que as camadas subseqüentes passarão a ser solicitadas à compressão, e, em função do perfil da temperatura internamente, passa novamente à tensão de tração, à partir de uma determinada distância da superfície de saída. (figuras 11.3.c e d)...”

Além da ação cíclica do corte interrompido, esse fenômeno pode, também, ser promovido por variação de temperatura causada por acesso irregular do refrigerante de corte (Ferraresi, 1977).

169

Figura 11.3. Distribuição da temperatura e de tensões em pastilhas de metal duro, no corte interrompido (Ferraresi, 1977).

Essas flutuações cíclicas da tensão, cujas taxas dependem da rotação, que pode chegar a valores elevadíssimos (50.000 rpm), promoverão o aparecimento de trincas por fadiga, principalmente nas ferramentas de metal duro. É raríssimo encontrar citações na literatura de trincas de origem térmica em ferramentas que não sejam de metal duro. As ferramentas de aço-rápido costumam ter tenacidade suficiente para suportarem as variações de tensões, sem nucleação de trincas; e as ferramentas cerâmicas são frágeis os suficientes para lascarem ou quebrarem, sem permitirem que trincas sejam observadas em suas superfícies. Entretanto, recentemente, Santos (2004), fabricando dentes de engrenagens com fresas caracóis de aço-rápido, observou trincas de origem térmica na superfície dessas ferramentas, que eram fabricadas pelo processo de metalurgia do pó. Essas trincas, normalmente, correm perpendicularmente à aresta de corte pelas superfícies de saída e folga das ferramentas, como ilustrado na Figura 11.4. Essas trincas, que são, portanto, de origem térmica, por um processo de erosão se transformam em sulcos, conhecidos por “sulcos desenvolvidos em forma de pentes” (combcracks, da literatura inglêsa), ilustrado na Figura 11.5.

Figura 11.4. Trincas de origem térmica observadas em uma ferramenta de metal duro (Metals Handbook, 1989).

Neste processo, é importante ressaltar que a formação dos sulcos

desenvolvidos em forma de pente, ou simplesmente sulcos de origem térmica, acontece em duas etapas distintas. A primeira etapa compreende o período de

Aresta de corte

Superfície de saída

Superfície de folga

170

abertura da trinca térmica e a segunda etapa compreende o período de transformação da trinca em sulco.

Figura 11.5. Sulcos desenvolvidos em forma de pentes (Ferraresi, 1977).

O número de sulcos está relacionado com o número de trincas térmicas, que é função da variação da temperatura durante o ciclo (ou giro) de cada dente da ferramenta e do número de ciclos térmicos. Quanto maior a variação de temperatura e o número de ciclos térmicos, maior o número de sulcos. A velocidade de corte, o avanço, a tenacidade das ferramentas de corte são parâmetros influentes no processo conforme mostram as Figuras 11.6 a 11.8, respectivamente (Lehewald, citado por Ferraresi, 1977).

Observa-se na Figura 11.6 que o aumento da velocidade de corte aumenta o número de sulcos em forma de pente. Isto ocorre porque a variação de temperatura, DT, é aumentada com o aumento deste parâmetro. Em seu trabalho de doutorado, Melo (2001) encontrou resultados concordantes com os de Lehewald.

Na Figura 11.7 observa-se que o aumento do avanço faz diminuir o número de sulcos desenvolvidos em forma de pente. O aumento do avanço, segundo Ferraresi (1977), apesar de aumentar a temperatura média, tende a reduzir a variação de temperatura DT, o que promove uma redução no número de sulcos desenvolvidos em forma de pente. Este resultado, entretanto, não concorda com os resultados obtidos por Bhatia et all (1979), que verificaram que o aumento do avanço no corte interrompido provoca um aumento no DT. Melo (2001), em sua tese de doutorado,

171

também, observou um aumento discreto da quantidade de trincas térmicas com o aumento do avanço por dente, contrariando os achados de Lehewald.

Figura 11.6. Influência da velocidade de corte sobre a formação de sulcos no fresamento (Lehewald, citado por Ferraresi, 1977).

Figura 11.7. Números de sulcos em forma de pente em função do percurso de corte por dente para o fresamento com diversos avanços por dente (Lehewald, citado por Ferraresi, 1977).

A Figura 11.8 mostra que quanto maior a tenacidade das ferramentas de corte maiores são as resistências aos choques térmicos e, por conseguinte elas apresentam menores números de trincas. Neste gráfico o número de sulcos aparece

172

em função do número de cortes. Observa-se que, inicialmente, o número de sulcos cresce exponencialmente e, após um determinado valor, estabiliza. Quanto mais tenaz for a ferramenta, menor o número de trincas na estabilização.

Figura 11.8. Números de sulcos em forma de pente em função do percurso de corte

por dente para o fresamento com diversos materiais de ferramenta (Lehewald, citado por Ferraresi, 1977).

Ferraresi (1977) denominou o número de trincas na estabilização de “número limite de sulcos”, que foi observado, também por Ekemar et all (1970). O número de trincas se estabiliza porque o processo de fadiga é aliviado pela abertura dessas trincas. As cavidades das trincas absorvem o processo de dilatação e retração das superfícies da ferramenta, de tal forma que as tensões geradas não são suficientes para promover abertura de nova fissura. A distribuição uniforme e eqüidistante destas trincas ao longo da largura de corte, b, é uma evidencia forte de que esta explicação faz bastante sentido.

Melo (2001) fez ainda diversos testes de fresamento com o objetivo de estudar o comportamento de formação das trincas de origem térmica em função da profundidade de corte. O gráfico da Figura 11.9 mostra os resultados obtidos para uma ferramenta da classe ISO P25, sem revestimento, usinando aço ABNT 1045. A densidade de trincas (número de trincas dividido pela largura de corte, b) foi determinada para tempos de vida distintos, dados pelo percurso de avanço, lf, de 500, 1000 e 1500mm.

Nota-se pouca variação na densidade de trincas térmicas com a variação da profundidade de corte dentro da faixa estudada (de 1,0 a 2,5 mm). O aumento da profundidade de corte aumenta a área da seção de corte e, por conseguinte a potência e o calor gerado durante a fase ativa, mas esta maior quantidade de calor é distribuído numa área, também, maior. Como resultado a variação de temperatura, DT, não sofre grandes alterações.

173

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

3,5

4

4,5

1 1,5 2 2,5

Profundidade de corte (mm)

Den

sida

de m

édia

de

trin

cas

térm

icas

(m

m-1)

Lf = 500 mm Lf = 1000 mm Lf = 1500 mm

Figura 11.9. Densidade média de trincas térmicas em função da profundidade de corte. fz = 0,15 mm/dente; vc = 240 m/min (Melo, 2001).

Um outro parâmetro de corte de influência na formação das trincas térmicas avaliado por Melo (2001) foi a penetração de trabalho (ae). Neste caso, foram usadas penetrações de trabalho de 80, 55 e 30 mm (Figura 11.10) no processo de fresamento frontal com ferramentas da classe ISO P40, na usinagem de aço ABNT 1045. A penetração de trabalho é importante porque altera diretamente a grandeza “r”, relação do tempo ativo (aquecimento), t1, pelo tempo inativo (resfriamento), t2.

55

ae = 30 mm

80

500 mm

Barra de teste

Fresa

Figura 11.10. Penetrações de trabalho utilizadas nos testes (Melo, 2001).

O gráfico da Figura 11.11 mostra os resultados obtidos após usinagem de um percurso de avanço, lf, de 500m. Observa-se que não é verificada variação significativa na quantidade de trincas térmicas comparando-se os resultados para ae de 30 e de 55 mm. Porém, nota-se que o número de trincas caiu quando a penetração de trabalho foi de 80 mm. Atribuiu-se este comportamento novamente à variável DT. Neste caso, o aumento da penetração de trabalho provoca, como conseqüência, o aumento do tempo ativo e a redução do inativo (aumento da variável r). Desta forma, a ferramenta de corte passaria a sofrer menor variação de

174

temperatura a cada ciclo, reduzindo o DT e, conseqüentemente, as tensões térmicas sobre a aresta de corte, diminuindo, desta forma, a quantidade de trincas térmicas.

0

0,5

1

1,5

2

2,5

3

30 55 80

Penetração de trabalho (mm)

Den

sida

de m

édia

de

trin

cas

térm

icas

(mm

-1)

Figura 11.11. Densidade média de trincas térmicas em função da penetração de trabalho (ae). vc = 240 m/min; fz = 0,15 mm/dente e ap = 2,0 mm (Melo, 2001).

Em um trabalho interessante, cujo principal objetivo foi verificar a real influência da temperatura no processo de geração de trincas de origem térmica, Lehewald, citado por Ferraresi (1977), desenvolveu um sistema especial de aquecimento da ferramenta de corte por meio de uma resistência elétrica. Em seus experimentos, a temperatura da pastilha, cujo controle foi feito por um termoelemento posicionado bem próximo à aresta de corte, atingiu 400oC. Com a ferramenta aquecida, e torneando uma peça descontínua, ele registrou o número de sulcos em forma de pente em função do tempo de corte e do percurso de corte. A Figura 11.12 apresenta o esquema deste suporte especial e os resultados encontrados.

Figura 11.12. Aquecimento da ferramenta de corte e sua influência no número de

sulcos desenvolvidos em forma de pente, no processo de corte interrompido (Lehewald, citado por Ferraresi, 1977).

175

Observa-se que quando o teste foi feito sem aquecimento, com 8 min de corte (30cm de percurso de corte) 11 sulcos em forma de pente já haviam sido registrados, e que com pouco mais de 40min de corte (próximo de 200cm de percurso de corte) este número subiu para 17. O aquecimento da pastilha em 300oC fez reduzir os números de sulcos, de maneira que o quinto sulco só foi aparecer após 75min de corte (aproximadamente 325cm de percurso de corte). Quando o aquecimento foi a 400oC, praticamente eliminou os sulcos. O único sulco registrado só apareceu após 68min de corte (300cm de percurso de corte). Esta é a prova mais contundente de que o mais importante no processo é a variação de temperatura DT. O aquecimento reduz o resfriamento da pastilha, diminuindo a diferença de temperatura T1 - T1’ (Figura 11.2), reduzindo proporcionalmente a variação de tensão superficial, como abordado com auxílio da Figura 11.3, e conseqüentemente restringindo a geração de trincas de origem térmica na superfície da ferramenta.

Uma outra variável importante no processo de formação de trincas de origem térmica é o fluido de corte. Vieira et all (2001), testando vários tipos de fluidos de corte no fresamento de um aço liga, com ferramentas de metal duro (ISO P45) triplo-revestidas, onde a causa principal de rejeição das ferramentas foi os sulcos desenvolvidos em forma de pente, mostraram que com relação à vida da ferramenta, o corte a seco sempre superou a situação em que um fluido de corte foi aplicado. A Figura 11.13 mostra estes resultados, com o detalhe do desgaste de uma das ferramentas utilizadas quando se aplicou um fluido de corte sintético.

1

10

100

100 120 140 160 180 200 220

v [m/min]

T [

min

]

Dry Sol. 5% S.Synt. 5% Synt. 5% Synt. 10%

Figura 11.13. Vida da ferramenta no fresamento frontal de aço ABNT 8640, com

aplicação de vários fluidos de corte e a seco: a- Seco; b- Sintético 5%; Sintético 10%; d- Emulsionável 5%; e- Semi-Sintético 5%. No detalhe o desgaste de uma ferramenta quando se empregou o fluido sintético 5% (Vieira et all, 2001).

Pode-se observar claramente os sulcos desenvolvidos em forma de pente, além de material da peça aderido na superfície de folga. Este padrão de desgaste foi observado em todos os testes.

Melo (2001) também usou fluidos de corte em seus experimentos e confirmou o efeito negativo de fluidos de corte no fresamento frontal de aço ABNT 1045, com

b a

e d

c

176

ferramentas de metal duro revestidas, onde trincas térmicas estão predominando. Neste trabalho o autor propõe um modelo de evolução do desgaste, após intensa análise de desgaste no microscópio eletrônico de varredura - MEV. Neste modelo, a transformação das trincas térmicas em sulcos é considerada.

É importante destacar, que as trincas térmicas, além de se evoluírem para sulcos, podem, muitas vezes, interagir com trincas de origem mecânica e promoverem destacamentos de materiais das superfícies das ferramentas de corte. Podem ocorrer lascamentos menores ou maiores. Neste ultimo caso a literatura inglesa chama o lascamento de “spalling”. Sabe-se que as trincas térmicas nas superfícies de folga e de saída da ferramenta sempre se apresentam perpendiculares à aresta de corte. Trincas de origem mecânicas, como se verá adiante, se apresentam, normalmente, paralelas à aresta de corte. Assim, uma ferramenta que desenvolveu trincas de origem térmica, quando sofre choques mecânicos demasiados (devido, por exemplo, ao desgaste excessivo), e desenvolvem, também, trincas paralelas, o encontro e interações entre estas trincas são inevitáveis. A conseqüência é o spalling, como ilustrado na Figura 11.14. A continuidade da usinagem com esta ferramenta vai aumentar as áreas lascadas, com conseqüente condenação da ferramenta de corte.

Figura 11.14. Ilustração da formação de lascamentos (spalling) na presença de

trincas térmicas, no fresamento de aço com ferramenta de metal duro revestida (Metlo et all, 2004).

Wang et all (1996) apresentaram um estudo teórico-experimental que, em

princípio, contraria a análise do processo de formação dos sulcos em forma de pente, apresentada anteriormente por Ferraresi (1977). Eles simularam o ciclo térmico do corte interrompido, usando pulsos de laser em ferramentas de metal duro, medindo simultaneamente os valores de temperaturas dinâmicos. Eles concluíram que a queda de temperatura durante o tempo inativo (T1 - T’1, da Figura 11.1) é muito pequena e insuficiente para induzir tensões de tração na superfície de saída da ferramenta. Deste modo, as trincas térmicas não acontecem durante este tempo do ciclo térmico. Eles propõem que essas trincas térmicas se desenvolvem ciclicamente pelo aumento do gradiente de temperatura a cada entrada ferramenta na peça. Esta abordagem, entretanto, foi rebatida por Melo et all (2003), após

0,2 mm 0,5 mm

177

medições de temperatura, com sensor infravermelho, na entrada e na saída da ferramenta da peça.

Vários outros pesquisadores (Kakino et all, 1984; Chakraverti et all, 1984b; Bhatia et all, 1978; Yellowley e Barrow, 1976 e Chandrasekaram, 1985) têm-se dedicado ao estudo da origem dessas trincas, e eles concluíram que elas se tornam a maior causa de falhas das ferramentas, em velocidades de corte elevadas. Já a velocidades de corte baixas, as trincas de origem mecânicas são as principais responsáveis pelas falhas das ferramentas de corte.

11.2.2. AVARIAS DE ORIGEM MECÂNICA

As trincas de origem mecânicas podem ocorrer devido aos “choques mecânicos” ocorridos durante a entrada da aresta de corte na peça (The, 1977) ou durante a saída dela da peça (Pekelharing, 1978; Pekelharing, 1984; Van Luttervelt, 1984 e Ghandi e Barrow, 1985). Normalmente, elas correm paralelas à aresta de corte, tanto na superfície de saída como na superfície de folga da ferramenta, culminando em lascamentos, que podem condenar a ferramenta de corte.

a). NA ENTRADA DA FERRAMENTA NA PEÇA

No corte interrompido, fresamento, por exemplo, a cada ciclo ou giro da fresa, cada inserto ou dente que compõem a ferramenta sofre um impacto violento na entrada na peça de trabalho. Este impacto é causado porque a ferramenta vem sem sofrer qualquer tipo de carregamento mecânico no final do ciclo inativo, e entra muito rapidamente no corte (início do tempo ativo), quando passa a sofrer um pesado carregamento compressivo. Quando uma ferramenta gira em alta rotação, às vezes acima de 1000 rpm, podendo, em casos especiais, chegar a 50.000 rpm em máquinas modernas de HSC (High Speed Cutting), a ferramenta vai experimentar um número muito elevado de impactos por minuto.

Quando a situação é desfavorável, a ferramenta pode sofrer lascamento ou mesmo a quebra no primeiro ciclo ou giro. Situações desfavoráveis ocorrem quando as condições de corte são abusivas, isto é, acima das indicadas para aquela classe e geometria da ferramenta. Caso a ferramenta seja corretamente especificada ela terá a tenacidade suficiente para evitar sua quebra imediata. Entretanto, mesmo possuindo tenacidade suficiente para evitar uma avaria imediata, a ferramenta de corte vai estar sujeita a um carregamento repetitivo a cada entrada na peça, que pode levar ao aparecimento de trincas.

Uma característica importante dessas trincas de origem mecânica é que elas correm paralelas à aresta de corte, ao contrário das de origem térmicas, que se propagam perpendicularmente à aresta de corte. Elas irão propagar e podem interagir ou com outras trincas, inclusive com as de origem térmica e levar ao aparecimento de lascas, como mostrado na Figura 11.14. É evidente que quanto maior for este carregamento, mais rápido a avaria ocorrerá. Portanto, grandes profundidades de corte, grandes avanços, alta resistência da peça de trabalho, entre outros fatores, aceleram o processo de fadiga e avaria da ferramenta de corte.

178

A Figura 11.15 apresenta avarias de origem mecânica, em uma ferramenta utilizada no fresamento de aço inoxidável austenítico ABNT 304. Observa-se que grandes lascas foram destacadas da superfície de saída da ferramenta, situações típicas de avaria na entrada da ferramenta na peça.

Figura 11.15. Lascas de origem mecânica em ferramenta de metal duro utilizada no fresamento de aço inoxidável austenítico.

Normalmente, neste processo de lascamento, haverá pontos mais favoráveis à nucleação de uma lasca, que se multiplicam com o aumento do número de ciclos de carregamentos na entrada da ferramenta na peça. A área lascada aumenta até atingir proporções em que irá condenar a ferramenta de corte.

Os problemas de choques mecânicos na entrada podem ainda ser agravados pela tendência de adesão do cavaco na superfície de saída (Kabaldin, 1980). Certos materiais, como o titânio e aços inoxidáveis, têm esta tendência de promover a adesão completa dos elementos de cavacos na superfície de saída da ferramenta, que permanecem ali durante todo o tempo inativo de um ciclo. Quando a aresta reentra na peça, a presença de um elemento de cavaco, promove problemas extras de entrada. A Figura 11.16 mostra um exemplo desta adesão de elementos de cavaco na superfície da ferramenta de corte.

Figura 11.16. Detalhe de um elemento de cavaco aderido na superfície de saída de uma ferramenta utilizada para fresar aço inoxidável austenítico ABNT 304.

Esta adesão ocorre porque a superfície lascada é “virgem”, isto é, é uma superfície recém formada, portanto, isenta de impurezas e de óxido, além de se apresentarem a temperaturas elevadas, condições estas extremamente favoráveis a interação com o material da peça. Além de apresentar o problema de elementos de

Superfície da saída

Superfície de folga

179

cavacos aderidos, muitas vezes a arestas das lascas são pontos de ancoragem de material da peça, como ilustrado na Figura 11.17. O fluxo de material que passa imediatamente adjacente à superfície, que pode ser de cavaco, quando na superfície de saída, ou da peça, quando na superfície de folga, vai se depositar na região lascada, favorecendo, com o prosseguimento do corte, o desenvolvimento de outros mecanismos de desgaste, como o attrition e a difusão.

Figura 11.17. Vista da superfície de folga de uma ferramenta de metal duro utilizada no fresamento de aço inoxidável austenítico ABNT 304 com lascas e ancoragem de material da peça.

b). NA SAÍDA DA FERRAMENTA DA PEÇA

Pekelharing (1978 e 1984) foi quem mais estudou avarias em ferramentas de metal duro na saída da ferramenta da peça de trabalho. Suas investigações foram incentivadas por detalhadas análises de processos de corte interrompidos no chão de fábrica de algumas empresas em que dava consultoria. Em uma aplicação, ele observou que apenas os dentes impares de uma fresa multicortante de oito dentes apresentaram quebra da cunha, enquanto os dentes pares estavam inteiros. Isto chamou a atenção do autor que o levou a uma análise mais criteriosa e detalhada da situação, levando-o a observar o fenômeno, que ele mesmo batizou de “formação do pé”. A razão de acontecer apenas nos dentes impares será comentada posteriormente.

Pekelharing (1978), então concluiu que o lascamento excessivo de ferramentas de metal duro usadas no fresamento é devido a problemas durante a saída da aresta de corte da peça. Quando a ferramenta se aproxima da saída da peça promove uma rotação no plano de cisalhamento primário, tornando-o negativo, resultando na ocorrência do fenômeno, conhecido como “formação do pé” (foot forming), pela semelhança desse com um pé humano. A Figura 11.18 mostra a seqüência de formação desse fenômeno, que é peculiar a determinadas geometrias de saída da peça. Observa-se que à medida que a ferramenta se aproxima da borda de saída da peça, o plano de cisalhamento, que inicialmente era positivo vai diminuindo, passando para valores negativos. Isto acontece porque ao se aproximar da borda de saída da peça, a ferramenta, com seu esforço de corte, não tem a

180

restrição da resistência do material em condições normais. Devido à falta de apoio, a borda se deforma no sentido de cisalhamento negativo, até a ruptura, antes de atingir a borda, promovendo a formação do pé. A separação desta forma de cavaco no exemplo da figura acontece quando ainda faltava 0,21mm para a ferramenta atingir a borda lateral da peça.

Figura 11.18. Formação do pé (Pekelharing, 1978).

Usando técnicas de elementos finitos, Pekelharing (1984) demonstrou que,

devido à rotação do plano de cisalhamento primário, a ponta da ferramenta passa de um estado fortemente compressivo, para um estado de tração. Assim, dependendo das dimensões do corte (dimensões do cavaco), do material da peça e do material da ferramenta, esta inversão do estado de tensão pode promover a quebra da ponta da ferramenta. A Figura 11.19 detalha os valores da tensão cisalhante trativa na hora da abertura da trinca. A tensão cisalhante, que quando o ângulo de

181

cisalhamento é positivo, tem a direção da esquerda para direita na figura, passa a ter a direção da direita para a esquerda, quando o ângulo de cisalhamento atinge o valor negativo.

Figura 11.19. Distribuição de tensão na ponta da ferramenta de corte no instante em que a trinca é aberta para a formação do pé (Pekelharing, 1978).

Obviamente, este tipo de falha pode ser evitado quando a ferramenta de corte tiver a necessária tenacidade para evitar a ruptura quando da inversão das tensões na ponta da cunha. Deve-se observar, também, que quanto mais pesado for o corte (grande profundidades, grandes avanços e alta resistência do material da peça), mais crítico será o carregamento e mais susceptível estará a ferramenta de sofrer a ruptura. Se a ferramenta não resistir, a formação do pé no cavaco será a companhada de uma fratura da ponta da ferramenta, comprometendo seriamente a integridade da ferramenta. A Figura 11.20 detalha esta fratura (Pekelharing, 1978).

Figura 11.20. Formação do pé com ruptura da ponta da cunha da ferramenta de corte (Pekelharing, 1978).

182

A Figura 11.21 apresenta a explicação do pé se formar apenas nos dentes impares das ferramentas.

Figura 11.21. Formação do pé a)- em dentes impares; b)- em dentes pares (Pekelharing, 1984).

Observa-se que após o dente impar promover a formação do pé, ele deixa a borda de saída da peça chanfrada. Isto favorece a saída do dente posterior, no caso o dente par, aliviando a saída e evitando a formação do fenômeno neste dente. Em fresas com número de dentes impares, a combinação levará todos os dentes à falha após algumas rotações da fresa. Assim, este tipo de falha pode, também, ser evitado quando a aresta de saída da peça está chanfrada. Nesta situação todos dentes da fresa encontrarão a saída com a geometria mostrada em “b” da figura 11.21.

Outro parâmetro importante no processo é o ângulo de saída da ferramenta da peça, e. No fresamento, a espessura de corte, h, é máxima no centro da fresa, na direção de avanço. A espessura de corte, h, aumenta da entrada na peça até o centro, atingindo, então o valor máximo, e reduz à medida que se afasta do centro no movimento de saída da peça. Quando o ângulo de saída, e, é zero, tem-se o maior valor de espessura de corte, h, na saída da peça. Isto torna crítico o processo de formação do pé. À medida que o ângulo de saída da peça se afasta do zero (pra negativo ou positivo), o processo de carregamento na saída da ferramenta da peça vai aliviando, podendo até evitar a formação do fenômeno.

Pekelharing (1978) encontrou a supressão da formação do pé quando o ângulo de direção da saída, e, é maior que 20o ou menor que -45o, como mostrado na Figura 11.21. Estes números concordam com os apresentados pela Sandvik, (sem data).

Pode-se, portanto, evitar a falha na saída da ferramenta da peça, usando o chanfro na superfície da peça ou usando uma geometria de saída segura, conforme abordado neste item. O processo fica mais crítico quando se está faceando uma

183

superfície totalmente irregular, como por exemplo, a face superior de um bloco de motor, onde a ferramenta experimenta várias saídas, sendo impossível evitar as direções perigosas mostradas na Figura 11.21. Neste caso a sugestão é reduzir as condições de corte de maneira a aliviar o carregamento, diminuindo, por exemplo, a profundidade de corte.

- 45o

+ 20o

Figura 11.21. Ângulo de direção de saída e (Sandvik, sem data).

11.3. DESGASTE NAS FERRAMENTAS DE CORTE

Mesmo se a ferramenta de corte tiver a tenacidade suficiente para evitar uma

avaria, infelizmente, ela não está salva. Durante a usinagem dos metais a ação do corte muda a forma e, portanto a geometria original da ferramenta de corte. Verifica-se um desgaste progressivo tanto na superfície de folga como na superfície de saída da ferramenta. A Figura 11.22 apresenta as principais áreas de desgaste de uma ferramenta de corte.

Pelo menos três formas de desgaste podem ser identificadas nesta figura:

I. Desgaste de cratera (área A da Figura 11.22); II. Desgaste de flanco (área B da Figura 11.22); III. Desgaste de entalhe (notch wear, áreas C e D da Figura 11.22).

Antes que um desses desgastes atinja grandes proporções, de maneira a colocar o processo de corte em risco, a ferramenta deverá ser reafiada ou substituída.

184

Figura 11.22. Principais áreas de desgaste de uma ferramenta de corte (Dearnley e

Trent, 1982).

A Figura 11.23 mostra os parâmetros utilizados pela norma ISO 3685 (1997) para quantificar esses desgastes. Os principais são

KT = profundidade da cratera,

VBB = desgaste de flanco médio,

VBBmax = desgaste de flanco máximo,

VBN = desgaste de entalhe.

VBN VCN

Figura 11.23. Parâmetros utilizados para medir os desgastes das ferramentas de

corte (ISO 3685, 1977).

O tempo em que uma ferramenta de corte trabalha efetivamente antes de ser reafiada ou substituída é denominado de “vida da ferramenta de corte”, T. Um critério deve ser usado então, para determinar o fim de vida da ferramenta, de

185

maneira a manter o processo produtivo dentro de condições econômicas adequadas.

Em usinagem, normalmente, as ferramentas de corte se desgastam seguindo uma curva padrão, representada na Figura 11.24. Observa-se que na evolução do desgaste são distinguidos três estágios, I, II e III.

quebra

* I II III

Tempo

De

sg

aste

Figura 11.24. Comportamento do desgaste de uma ferramenta de corte com o tempo de corte.

Na ordenada o desgaste pode ser representado por qualquer um dos parâmetros que identificam os desgastes de flanco, cratera ou entalhe, mostrados na Figura 11.23 (VBB, VBBmax, VBN, ou KT).

O estágio I é o inicial, nos primeiros minutos de corte, quando o desgaste apresenta uma taxa decrescente de desgaste (a tangente à curva apresenta ângulos de inclinação decrescentes). Neste estágio, a ferramenta sofre um desgaste acelerado no início do corte, natural de adequação ao sistema tribológico envolvido, como se a cunha cortante estivesse se acomodando ao processo, passando então a apresentar uma taxa de desgaste cada vez menor com o passar do tempo, e uma primeira inflexão no final deste estágio é observada. O estágio II se caracteriza por uma taxa de desgaste constante ao longo do tempo (a tangente à curva apresenta ângulos de inclinação constantes). A ferramenta já se encontra totalmente adequada ao processo e os mecanismos específicos de desgaste operam numa taxa constante, até atingir uma nova inflexão. No começo do estágio III acontece o início de uma aceleração no desgaste, aumentando acentuadamente a taxa (a tangente à curva apresenta ângulos de inclinação crescentes), promovendo em curto espaço de tempo a quebra da ferramenta, caso o corte tenha continuidade dentro deste estágio. Isto acontece porque o desgaste atingiu níveis tão elevados, que as temperaturas e tensões envolvidas irão promover, eventualmente, o colapso da ferramenta.

186

Os técnicos envolvidos com o processo de usinagem devem, portanto, observar atentamente a evolução desta curva, para evitar que a mesma atinja o estágio III, pois dentro deste estágio o tempo para ocorrer a quebra é muito curto, tornando-se muito difícil evitá-la. As conseqüências de uma quebra de ferramenta em serviço podem representar um custo muito elevado. O mais comum é o refugo da peça, sendo, portanto, uma responsabilidade maior quanto mais nobre for o material da mesma. Materiais como superligas de Ti e Ni, aços inoxidáveis, ligas de cobre e alumínio são, normalmente, caras o suficiente para gerar maiores preocupações. Além do refugo da peça, uma quebra de pastilha pode danificar o suporte, uma vez que não raro a resta de corte é substituída pela aresta do suporte. Estes suportes são fabricados em aço comum ou aço liga, sem dureza suficiente para exercerem o papel de ferramenta. A falha do inserto ocorre repentinamente, e mesmo com um bom sistema de segurança na máquina, o dano no suporte é praticamente inevitável. Entretanto, se o inserto vier a quebrar, a conseqüência mais prejudicial é a danificação no eixo-árvore da máquina-ferramenta. Quando a aresta da ferramenta deixa de estar presente, o suporte a substitui, sem geometria e material adequados para responderem pelo processo. Isto eleva imediatamente os esforços inerentes, podendo levar ao empenamento do eixo-árvore. Quando estiverem envolvidas máquinas de concepção moderna como as atuais, o custo de reparo deste eixo pode significar uma boa soma de dinheiro.

Em operações de acabamento os critérios adotados são relacionados com parâmetros de rugosidade superficial, e portanto, na maioria das vezes muito aquém do estágio III. Mas em operação de desbaste, os técnicos de usinagem devem ter total conhecimento do comportamento da curva padrão de desgaste, para adotar critérios de fim de vida de ferramentas que evitem atingir o estágio III. Por outro lado, por questões econômicas, ele não pode determinar um critério que fique muito aquém do mesmo, porque irá condenar uma ferramenta prematuramente. O ideal é se ter um sistema de monitoramento, que poderá auxiliar com bastante segurança na definição do critério. As componentes da força de usinagem, a potência do motor de acionamento do eixo-árvore (Caldeirani Filho, 1998), a temperatura de corte, a vibração do sistema (Sousa, 1998), a emissão acústica (Pigari, 1995) são parâmetros muito usados para este fim. Todos eles têm uma correspondência muito forte com a curva padrão de desgaste. Assim, um controle de um desses parâmetros pode ser usado para indicar o final de vida da ferramenta e indicar o momento de troca da aresta cortante. Por serem poucas intrusivas e práticas, a vibração do sistema e a potência do motor de acionamento do eixo-árvore são os parâmetros mais utilizados.

Os critérios de fim de vida recomendados pela ISO (1977) para ferramentas de aço-rápido, metal duro e cerâmica, em operações de desbaste, são:

I. Desgaste de flanco médio, VBB = 0,3 mm; II. Desgaste de flanco máximo, VBBmax = 0,6 mm; III. Profundidade da cratera, KT = 0,06 + 0,3fc, onde fc é o avanço de corte em

mm/rev; IV. Desgaste de entalhe, VBN e VCN = 1,0 mm; V. Falha catastrófica.

Desta maneira, quando qualquer um dos limites for ultrapassado, recomenda-se a reafiação ou substituição da ferramenta de corte.

187

Em operações de acabamento a norma recomenda critérios baseados em parâmetros de rugosidade superficial, como o Ra.

É importante salientar que estes valores sugeridos pela norma ISO 3685 (1977) são para testes de vida de ferramenta, e industrialmente esses parâmetros podem assumir valores diferentes, pois eles dependem de vários fatores tais como: rigidez da máquina ferramenta, precisão requerida na peça, etc..., que são diferentes para diferentes companhias. Uma maneira prática muito utilizada industrialmente é permanecer usando a aresta de corte até que as peças produzidas saiam das especificações de tolerância e/ou acabamento de projetos. Entretanto, se persistir em continuar usando uma aresta de corte após um elevado nível de desgaste um alto grau de risco está em jogo, pois valores excessivos de desgaste causam aumento da força de usinagem e da geração de calor, elevando a chance de promover a falha catastrófica da ferramenta.

11.4. MECANISMOS DE DESGASTE

Em condições normais de corte, uma das formas de desgaste apresentada na

Figura 11.22 irá prevalecer, e elas se desenvolvem por vários mecanismos de desgaste. Vieregge (1970) citado por König e Klocke (1997) apresentou um diagrama, reproduzido na Figura 11.25, que se tornou clássico quando se trata de mecanismos de desgastes.

Difusão

Abrasão

Oxidação

Adesão

De

sgas

te T

ota

l

Temperatura de Corte(Velocidade de Corte; Avanço e outros fatores)

Figura 11.25. Diagrama de distribuição dos mecanismos de desgaste das ferramentas de corte (Vieregge, 1970, citado por König e Klocke, 1997).

Neste diagrama os mecanismos de abrasão, adesão, difusão e oxidação são apresentados em função da temperatura de corte, ou qualquer parâmetro que a influencia, principalmente a velocidade de corte. Em baixas temperaturas apenas os mecanismos de adesão e abrasão estão presentes e a adesão é predominante,

188

enquanto que em temperaturas elevadas, a adesão perde lugar para os novos mecanismos de difusão e oxidação. Observa-se que estes dois mecanismos vão crescendo em participação com o aumento da temperatura e que a difusão cresce numa escala exponencial. Este diagrama também salienta que o desgaste total cresce muito com o aumento da temperatura de corte.

A literatura apresenta variações na classificação dos mecanismos de desgaste, porém, grande parte dos trabalhos existentes considera pelo menos seis mecanismos diferentes (Trent e Wright, 2000 e Wright e Biagchi, 1981) sumarizados na Figura 11.26.

Figura 11.26. Mecanismos e processos de desgaste que podem acontecer nas ferramentas de corte (Trent e Wright, 2000).

Observa-se que Trent e Wright (2000) colocam a deformação plástica como mecanismos de desgaste (mecanismos 1 e 2 da figura) e que na introdução deste capítulo a deformação plástica foi considerada como um dos elementos de destruição da ferramenta de corte, no mesmo nível do desgaste e da avaria.

O mecanismos de número 3, 4 e 5 coincidem com aqueles apresentados por Vieregge (1960), citado por König e Klocke (1997), enquanto o mecanismo de número 6, na realidade é uma forma de desgaste, como apresentado na Figura 11.22. Trent e Wright destacam-no como mecanismo porque na realidade falta consenso na literatura para explicar com exatidão esta forma de desgaste. A oxidação, que não aparece destacado nos mecanismos de Trent e Wright, mas está presente, ou faz parte do desgaste de entalhe, como se verá adiante.

A seguir, estes 6 mecanismos de desgaste serão definidos individualmente.

189

11.4.1. Deformação Plástica Superficial por Cisalhamento a Altas Temperaturas

(Figura 11.26.1)

Como já citado, este não é propriamente um mecanismo de desgaste, mas sim um processo de destruição da ferramenta de corte que Trent e Wright preferiram classificá-lo como mecanismo. Ele ocorre mais provavelmente na usinagem de metais com alto ponto de fusão, em ferramentas de aço rápido. As tensões cisalhantes na interface cavaco-ferramenta nestes casos são suficientemente grandes para causar deformação plástica na superfície de saída da ferramenta de corte. Devido às altas temperaturas ali desenvolvidas, a resistência ao escoamento do material da ferramenta próximo à interface é reduzida. Como conseqüência, material é cisalhado juntamente com o cavaco e arrancado da superfície da ferramenta, formando-se assim uma cratera.

A Figura 11.27 apresenta uma metalografia de uma ferramenta de aço-rápido que foi utilizada na usinagem de aço inoxidável austenítico que não resistiu ao fluxo de material se deformando dentro da zona de fluxo e se deformou juntamente com o cavaco.

Figura 11.27. Deformação plástica superficial por cisalhamento a altas temperaturas em uma ferramenta de aço-rápido, após usinar aço inoxidável austenítico (Trent e Wright, 2000).

Observa-se claramente nesta figura que parte da ferramenta de corte é cisalhada na zona de fluxo juntamente com material do cavaco, inclusive se confundindo com o mesmo. Como resultado deste processo houve a formação da cratera na superfície de saída da ferramenta. De acordo com Trent e Wright (2000) esta deformação plástica é peculiar para as ferramentas de aço-rápido devido a baixa resistência ao cisalhamento dessas ferramentas. Segundo estes autores as ferramentas de metal duro, cermets, cerâmicas e ultraduros têm resistência suficiente para inibir este processo de deformação plástica. Entretanto, em seu trabalho de doutoramento, Ávila (2003), investigando a performance de diferentes

Ferramenta

Cavaco

vc

Peça

190

recobrimentos em ferramentas de metal duro no torneamento de aço ABNT 4340 endurecido, e utilizando um perfilômetro para analisar a cratera na superfície de saída da ferramenta, observou cotas positivas de material nas imediações da cratera, ou mais precisamente logo após a cratera. Estas cotas positivas são claras evidências de deslocamento de material da superfície, o que, portanto, inclui os revestimentos nas ferramentas revestidas. Estas cotas positivas foram encontradas, também, nas ferramentas sem revestimentos. Elas significam que houve deslocamento de material de dentro da cratera para além dela, tanto do substrato como do revestimento, e tudo indica que isto aconteceu por cisalhamento plástico, processo similar ao do aço-rápido observado por Trent e Wright (2000). A Figura 11.28 apresenta este resultado encontrado por Ávila em ferramentas sem revestimento e revestida com TiNAl.

a)

b)

Figura 11.28. Perfis das superfícies de saída de ferramentas de metal duro a)- sem revestimento e b)- revestida com TiNAl, após usinagem de aço endurecido por 16 min (Ávila, 2003).

Nota-se que após 16 min de corte a cratera desenvolvida na ferramenta sem revestimento é nitidamente maior e que a ferramenta revestida apresenta cotas positivas maiores na vizinhança das crateras que a ferramenta não revestida. Talvez isto ocorre porque a ferramenta sem revestimento, com menor resistência, permite o

191

desgaste por outros mecanismos (possivelmente difusão) ocorrer mais facilmente, aliviando o processo de cisalhamento plástico por cisalhamento a altas temperaturas. A ferramenta revestida, ao contrário, tem mais resistência a estes outros mecanismos, mas em conseqüência, o trabalho de cisalhamento naquelas regiões de cotas positivas é mais intenso. 11.4.2. Deformação Plástica da Aresta de Corte sob Altas Tensões de

Compressão (Figura 11.26.2)

Este é outro que não é propriamente um mecanismo de desgaste, mas sim um processo de destruição da ferramenta de corte que Trent e Wright preferiram classificá-lo como mecanismo.

A deformação plástica da aresta de corte sob altas tensões de compressão ocorre na usinagem dos materiais de elevada dureza. As combinações de altas tensões de compressão com altas temperaturas na superfície de saída podem causar a deformação plástica da aresta de corte das ferramentas de aço-rápido ou metal duro. Geralmente, ocorre, a altas velocidades de corte e avanço e leva a uma falha catastrófica. A Figura 11.29 apresenta um desenho esquemático produzido de uma micrografia de uma ferramenta que sofreu altas deformações de compressão na hora do corte (Trent e Wright, 2000). Neste caso trata-se de ferramenta de aço carbono, que obviamente é mais susceptível a este processo de destruição, após usinar ferro.

Figura 11.29. Deformação plástica ocorrida na ponta da cunha de uma ferramenta de aço carbono (Trent e Wright, 2000).

As tensões compressivas são máximas na aresta de corte e decrescem exponencialmente até zero, no ponto em que o cavaco perde contato com a superfície de saída. Infelizmente, a aresta de corte é a região em que a cunha é menos resistente, e dependendo da tensão promovida pelo material da peça, a ferramenta pode não oferecer resistência, e entrar em colapso. É fácil entender, portanto, que quanto mais resistente for o material da peça e quanto menos resistente for o material da ferramenta de corte, mais fácil ocorrer a destruição.

Em ferramentas de metal duro isto é também comum acontecer, mas em ferramentas cerâmicas, devido a suas baixas tenacidades, não é possível ocorrer este tipo de falha. Isto porque o campo plástico destas ferramentas é muito

192

pequeno. Se o limite de resistência for atingido, ela entra em ruptura imediatamente, promovendo a quebra imediata, sem experimentar deformação plástica.

Motta (1995), em seu trabalho de mestrado, usinando aço ABNT 8640 com ferramentas de metal duro revestidas, em altas velocidades de corte, observou a deformação plástica na ponta da cunha de corte, após a ferramenta apresentar desgaste de flanco já acentuado. A Figura 11.30 ilustra esta deformação.

Figura 11.30. Cunha de corte de uma ferramenta de metal duro revestida após

usinar aço ABNT 8640 a 300m/min (Motta, 1995).

Nota-se a presença do desgaste de flanco, com a ferramenta perdendo inclusive o revestimento, mas a deformação plástica da cunha é evidente. No início da vida a ferramenta foi resistente o suficiente para manter o corte, mas com o passar do tempo, o desgaste de flanco foi se desenvolvendo, chegando a ponto de aumentar muito o carregamento compressivo, de tal forma que culminou com a deformação plástica. Neste momento o corte tem que ser interrompido, pois a insistência com esta ferramenta, fatalmente promoverá a total destruição da cunha, pela continuidade do processo de deformação.

É importante observar que o processo de carregamento compressivo na ponta da ferramenta de corte atua como um processo de cisalhamento na superfície de folga da ferramenta. Assim, o processo de destruição, na realidade, ocorre por cisalhamento. Na destruição total a ferramenta irá apresentar um veio grande de cisalhamento na região da ponta da cunha.

11.4.3. Desgaste Difusivo (Figura 11.26.3)

Este mecanismo envolve a transferência de átomos de um material para outro e é fortemente dependente da temperatura, do tempo e da solubilidade dos elementos envolvidos na zona de fluxo (zona de cisalhamento secundário) (Machado, 1991).

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Entenda solubilidade dos elementos envolvidos como afinidade química entre os constituintes. Neste processo, o tamanho atômico é muito relevante. Átomos menores que os da matriz, podem formar soluções sólidas interticiais. Átomos relativamente de mesmo tamanho dos da matriz tendem a formar soluções sólidas substitucionais. Átomos maiores que os da matriz, não apresentam solubilidade para se difundirem na matriz.

Em usinagem, as velocidades relativas entre ferramenta-peça ou ferramenta-cavaco são altas e o tempo de contato entre esses materiais é muito curto. Isto praticamente levaria o mecanismo de difusão a ser desprezível, se não fosse a existência de uma zona de aderência (zona morta ou zona de fluxo) na interface cavaco-ferramenta (Trent e Wright, 2000). Como visto no Capítulo 6, existe um gradiente de velocidades dentro da zona de fluxo, assumindo o valor zero na interface com a ferramenta, o que garante tempo suficiente para haver difusão. As temperaturas na zona de fluxo são também elevadas o suficiente (podendo chegar a 1000oC, 1200oC) para promover o processo difusivo. A renovação constante da zona de aderência, promovida pela alta taxa de deformação, garante um fluxo difusivo também constante. Se esta zona de aderência não fosse renovada, haveria o saturamento desta zona de aderência, que funcionaria como uma barreira à difusão.

Só é concebível a existência da difusão como um mecanismo de desgaste nas ferramentas de corte durante a usinagem se existir o íntimo contato entre as duas superfícies envolvidas, neste caso entre o cavaco e a ferramenta e entre a peça e a ferramenta. Trent e Wright (2000) oferecem várias provas deste íntimo contato entre o cavaco e a ferramenta. As fotos a e b da Figura 11.31 apresentam estas evidências.

a) b)

Figura 11.31. Amostras de Quick-Stop. Em a)- a ponta da cunha da ferramenta sofreu ruptura e ficou aderida na raiz do cavaco. Em b)- uma quantidade de material do cavaco ficou aderida na superfície de saída da ferramenta de corte (Trent e Wright, 2000).

Na zona de fluxo a taxa de deformação do material do cavaco é muito grande, elevando a temperatura de corte a valores extremamente altos. A combinação de altas temperaturas com altas tensões de compressão favorecem a interação química na interface, ocorrendo ligações muito fortes, a ponto de quando da ação do quick-stop, a separação ocorrer dentro de um dos materiais envolvidos, significando que a união na interface chega a ser mais forte que dentro de um dos materiais.

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Na usinagem de aço com ferramentas de metal duro a mecânica do processo difusivo ocorre da seguinte maneira: Nas temperaturas elevadas (da ordem de 1200OC) o carbono se satura na fase cobalto com apenas 0,7%. O ferro tem solubilidade total no cobalto. Assim, o ferro do aço tende a se difundir para a fase cobalto da ferramenta, fragilizando-a e aumentando a solubilidade do carbono para 2,1%. Esta maior solubilidade do carbono na fase ferro–cobalto, promove a dissociação de carbonetos de tungstênio, formando um carboneto complexo do tipo (FeW)23C6, liberando carbono. Este carboneto complexo de ferro e tungstênio tem uma resistência à abrasão muito menor que o carboneto de tungstênio original, fragilizando, portanto, a ferramenta de corte. Os carbonetos de titânio e tântalo são mais estáveis dificultando a formação do carboneto complexo e impedindo o enfraquecimento da ferramenta de corte. Isto explica a maior resistência das ferramentas da classe P na usinagem de aço.

Logicamente, cada par ferramenta-peça irá apresentar suas reações particulares, mas todos tendem a enfraquecer a ferramenta de corte. Não só pela perda de elementos importantes da ferramenta para a peça pelo transporte atômico difusivo, mas também pela combinação com elementos da peça que irão envolver perda de carbonetos duros e abrasivos, em troca de outros menos resistentes ao desgaste.

Este mecanismo de desgaste poderá atuar tanto na superfície de saída como na superfície de folga, e a taxa de desgaste irá aumentar com o aumento da velocidade de corte e do avanço, pois o aumento desses parâmetros faz aumentar a temperatura de corte, que é a fonte de energia para o processo difusivo. Como se processa em nível atômico, no microscópio as áreas desgastadas por difusão tem uma aparência lisa, como detalhado na Figura 11.32. Trata-se de uma ferramenta de metal duro da classe ISO K20, sem revestimento, utilizada para usinar Ti6Al4V.

Figura 11.32. Vista geral do desgaste de uma ferramenta de metal duro K20, após usinar Ti6Al4V (Machado, 1990).

Observa-se que ambos o desgaste de flanco e a cratera apresentam uma textura lisa, característica da difusão. A cratera bem próxima da aresta de corte é peculiar na usinagem de ligas de titânio (Machado e Wallbank, 1990).

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11.4.4. Desgaste por Aderência e Arrastamento – Attrition (Figura 11.26.4)

Na literatura este mecanismo de desgaste é freqüentemente tratado por adesão (Hutchings, 1992; König e Klocke, 1997). Apenas a escola inglesa, influenciada pelo grande mestre Edward Trent, batizou o mecanismo de “attrition”.

Este mecanismo ocorre, geralmente, a baixas velocidades de corte, onde o fluxo de material sobre a superfície de saída da ferramenta se torna irregular. A aresta postiça de corte pode aparecer, e na sua presença o processo tem natureza menos contínua, principalmente se ela for instável. Sob estas condições, fragmentos microscópicos são arrancados da superfície da ferramenta e arrastados junto ao fluxo de material adjacente à interface. A Figura 11.33 apresenta uma situação em que predomina este mecanismo de desgaste na presença da APC. A ferramenta é de aço-rápido.

Figura 11.33. Presença da APC, promovendo attrition na superfície de saída e folga da ferramenta de corte (Trent e Wright, 2000).

Observa-se na figura que a cunha de corte da ferramenta já perdeu grande parte de material. O fluxo de fragmentos de APC, de tempos em tempos arrasta consigo grãos da ferramenta.

Em geral, a zona de escorregamento (ao invés da zona de aderência), o corte interrompido (e.g., fresamento), profundidade de corte variável, entre outros fatores, promovem o fluxo irregular de material e, portanto, favorecem a participação do mecanismo de desgaste por attrition.

O gráfico da Figura 11.25 deixou claro a redução da contribuição do desgaste por attrition, que lá é denominado adesão, no desgaste total, com o aumento da velocidade de corte. Ele é, portanto, considerado um mecanismo de desgaste característico de baixas velocidades de corte. Entretanto, isto pode ser bem relativo. Se o fluxo de material que corre na superfície de saída ou na superfície de folga for irregular, também a altas velocidades, pode favorecer o attrition. O que pode ocorrer nesta situação é a predominância de mecanismos mais fortemente dependentes da

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temperatura que o attrtion em altas velocidades (difusão ou deformações), ofuscando a contribuição deste mecanismo de desgaste, caso ele esteja presente.

Como este mecanismo se processa em nível de grãos, no microscópio, as áreas desgastadas por attrition tem uma aparência áspera. A Figura 11.34 ilustra a área desgastada de uma ferramenta utilizada para usinar Ti6Al4V. Na superfície de saída, onde esteve presente a zona de aderência, prevalece a difusão, com o desgaste apresentando um aspecto liso. Onde a zona de escorregamento esteve presente, observa-se o aspecto áspero, característico de attrition.

Figura 11.34. Detalhe da cratera formada em ferramenta de metal duro K20 após

usinar Ti6Al4V a 75 m/min.

Como o processo de perda de material é em nível de grãos, o processo favorece ferramentas com granulação mais fina. É necessário a perda de um número muito elevado de grãos finos para compensar a perda de um grão grande. A Figura 11.35 mostra outra ferramenta no processo de perda de grãos por attrition, onde o tamanho do grão pode ser avaliado no processo de desgaste.

Figura 11.35. Ferramenta de metal duro e material da peça (aço) aderido,

constatando a presença de attrition (Trent e Wrigght, 2000).

Attrition

Difusão

197

11.4.5. Desgaste Abrasivo (Figura 11.26.5)

Em sistemas tribológicos de um modo geral, o desgaste abrasivo acontece quando material é removido ou deslocado da superfície por partículas duras que podem estar soltas, entre duas superfícies com movimento relativo, ou emergindo de uma das superfícies, neste caso pertencentes a ela. No caso das partículas estarem soltas, a abrasão é considerada a “três corpos”, onde as partículas duras são livres para rolarem e escorregarem entre as duas superfícies. No caso das partículas emergirem de uma das superfícies, a abrasão é considerada a “dois corpos” (Hutchings, 1992).

Em ferramentas de corte, na usinagem, podem ocorrer os dois tipos de abrasão: a dois e a três corpos. No caso de abrasão a dois corpos, as partículas abrasivas são precipitados duros (óxidos, carbonetos, nitretos ou carbonitretos), pertencentes ao material da peça ou do cavaco. No caso de abrasão a três corpos, as partículas abrasivas são materiais da própria ferramenta, que se desprenderam por attrition, mergulhadas no fluxo de material adjacente (da peça ou da ferramenta).

O desgaste abrasivo pode envolver deformação plástica e fratura frágil, gerando perda ou deslocamento de material por microsulcamento, microcorte ou microlascamento, causados por partículas de elevada dureza relativa. O microsulcamento acarreta em deslocamento de matéria para as laterais do sulco formado, enquanto que o microcorte e o microlascamento acarretam em perda de material, gerando também sulcos.

Este mecanismo de desgaste é muito importante na usinagem com ferramentas de aço rápido, ferramentas revestidas, cerâmicas puras e cerâmicas mistas. A aparência característica do desgaste abrasivo é apresentada na Figura 11.36.

Figura 11.36. Desgaste abrasivo em ferramentas de PCBN após usinar aço ABNT 5140 (Campos, 2004).

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Nota-se claramente a presença de vários sulcos paralelos entre si, que foram formados na direção do fluxo de material tanto do cavaco como da peça. No exemplo da Figura 11.36, trata-se de usinagem de um aço ABNT 5140 (DIN 19MnCr5), endurecido a 58 HRc com ferramentas de PCBN. Mesmo com elevada dureza, o aço não seria o fornecedor das partículas abrasivas. Neste caso, possivelmente, as partículas são provindas da própria ferramenta.

Uma vista mais ampliada de regiões desgastadas por abrasão de ferramentas de PCBN na usinagem deste aço ABNT 5140 pode ser vista na foto da Figura 11.37.

Figura 11.37. Sulcos característicos da região desgastada por abrasão em ferramentas de corte (Campos, 2004).

É interessante salientar que nem sempre ferramentas menos resistentes, como o aço-rápido, por exemplo, estará mais susceptível a este mecanismo de desgaste. Apesar da menor resistência desse tipo de material para o desenvolvimento do microsulcamento, microcorte ou microlascamento, pode haver a carência da fonte de partículas duras e abrasivas para o processo.

11.4.6. Desgaste de Entalhe (Figura 11.26.6)

O desgaste de entalhe não é propriamente um mecanismo, mas sim uma forma de desgaste, e aparecem sempre nas regiões coincidentes com as laterais do cavaco (áreas C e D da Figura 11.22). Porém, ainda não existe um consenso na literatura, que explique exatamente o mecanismo que provoca o desgaste de entalhe. Pelo menos 9 diferentes prováveis causas para o desenvolvimento do desgaste de entalhe (Albrecht, 1956, Solaja, 1958, Leyesensetter, 1956 e Lambert, 1962, todos citados por Shaw, 1986) são encontradas na literatura. São elas:

1. Presença de uma camada encruada de material na superfície da peça usinada previamente.

2. Concentração de tensão devido a um gradiente de tensão na superfície livre.

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3. Formação de trincas térmicas devido a um alto gradiente de temperatura na superfície livre.

4. Presença de uma rebarba na aresta da superfície previamente usinada.

5. Uma velocidade maior na altura da profundidade de corte onde o diâmetro é maior (obviamente esta é descartável, pois o desgaste de entalhe acontece também na ponta da ferramenta, onde a velocidade é menor).

6. Presença de uma camada de óxido abrasiva na superfície previamente usinada.

7. Fluxo de material de aresta postiça de corte, paralelo, à aresta de corte (obviamente esta também é descartável, pois quanto maior a velocidade de corte, incluindo as velocidades onde a APC inexiste, mais problemática é a formação do desgaste de entalhe).

8. Fadiga da ferramenta devido à flutuação de força na superfície livre que acompanha os pequenos movimentos laterais das arestas dos cavacos.

9. Partículas da ferramenta depositadas na superfície da peça previamente usinada, que agem como pequenas ferramentas de corte para induzir o desgaste.

Por falta de consenso, é comum tratar esta forma de desgaste como um mecanismo. Ele ocorre, principalmente, na usinagem de materiais resistentes a altas temperaturas (tais como: ligas de níquel, titânio, cobalto e aço inoxidável).

Na altura da profundidade de corte, área C da Figura 11.22, ele pode se desenvolver em ambas as superfícies de saída e de folga da ferramenta, ou apenas na superfície de folga, e neste último caso tem o aspecto da Figura 11.38.

Figura 11.38. Desgaste de entalhe observado em uma ferramenta de metal duro K20 após usinagem de Inconel 901 (Machado, 1990).

Geralmente, nas regiões onde ocorre este tipo de desgaste, as condições de escorregamento prevalecem e o mecanismo de desgaste, provavelmente, envolve abrasão e attrition, e eles são bastante influenciados pelas interações com a atmosfera (Trent e Wright, 2000). Em velocidades elevadas, provavelmente a difusão pode fazer parte do processo. Isto é evidenciado pelo fato do aumento da

200

velocidade de corte aumentar a taxa de desgaste (Machado, 1990). Existem evidências para sugerir que óxidos se formam continuamente e se aderem na ferramenta naquelas regiões, e a quebra das junções de aderência entre os óxidos e a ferramenta, promovidas pelo mecanismo de attrition, pode ocasionalmente remover material da superfície desta última (Trent e Wright, 2000).

Uma outra publicação mais recente (Richards e Aspinwall, 1989) afirma, entretanto, que a teoria que prevalece é a proposta por Shaw et all (1966). Segundo estes pesquisadores, o entalhe na forma de “V” é formado pelas rebarbas produzidas nas arestas laterais do cavaco, envolvendo outros mecanismos, incluindo a aderência e arrancamento (attrition).

Shaw e seus colaboradores propuseram suas teoria após observarem uma usinagem de ligas de níquel em altas velocidades. Eles verificaram que os cavacos que caiam estavam rubros nas bordas e cinzas no centro, significando maiores temperaturas nas bordas. Esta observação lhes chamou a atenção, pois a expectativa era justamente o contrário. A partir desta observação eles começaram a estudar o processo de formação do cavaco destes materiais, utilizando a teoria da plasticidade. Em seus estudos, os autores concluem, que ao se aplicar os critérios de escoamentos de Tresca e von Mises, bastante conhecidos na literatura, as deformações se iniciam com tensões menores quando prevalece o estado plano de tensão (estado que predomina nas bordas do cavaco), que quando o estado plano de deformação prevalece (estado que predomina no centro dos cavacos). Assim, material ainda solidário à peça que está se aproximando da zona de cisalhamento primária e da ferramenta, irá sofrer deformação primeiro na suas bordas (estado plano de tensão) e só depois no centro. Com isto, materiais da bordas irão se encruarem também mais, o que impõe maior restrição ao processo de deformação, gerando mais calor e conseqüentemente maiores temperaturas nas bordas. Com temperaturas maiores nas bordas do cavaco, a ferramenta de corte estará mais susceptível de sofrer os mecanismos de desgastes já citados, nas regiões de contato com as bordas. Com certeza, entre estes mecanismos se encontra a oxidação, pois nas bordas o oxigênio da atmosfera tem acesso garantido.

A explicação oferecida por Shaw et all (1966) corrobora com a teoria de Trent e Wright (2000), que considera a oxidação seguida de atrittion como os mecanismos responsáveis pela formação do desgaste de entalhe. Portanto, as duas teorias não são conflitantes, mas complementares.

Este processo só irá acontecer em materiais que tenham alto índice de encruamento, como as ligas de níquel e aços inoxidáveis austeníticos. Nos outros materiais o índice de encruamento não é suficiente para apresentar diferenças significativas das bordas para o centro.

A seqüência de fotos mostrada nas Figuras 11.39 a 11.41 confirma a presença do mecanismo de attrition no desgaste de entalhe. Estas fotos foram tiradas em ferramentas de metal duro da classe K20 após usinagem de Inconel 901 (Machado, 1990).

A Figura 11.39 mostra o entalhe na superfície de folga da ferramenta, apresentando uma camada de material da peça aderido nesta região. Foi feito um corte no centro do entalhe e a amostra preparada metalograficametne. Este corte é visto na figura 11.40. Observa-se uma trinca grande correndo paralela à superfície de folga da ferramenta, que foi originada quando da preparação da amostra, no período de polimento com disco de diamante, devido a sobrecarga imprimida

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manualmente. A Figura 11.41 mostra uma ampliação da interface ferramenta-camada aderida, onde se observam, nitidamente, os grãos da ferramenta dentro do fluxo do material (camada aderida). Confirmação positiva da presença de attrition, no processo de desenvolvimento do desgaste de entalhe, confirmando as teorias de Shaw e de Trent e Wright.

Figura 11.39. Vista do desgaste de entalhe na superfície de folga da ferramenta utilizada para tornear Inconel 901 (Machado, 1990).

Figura 11.40. Corte transversal no centro do entalhe da ferramenta da Figura 11.39.

Figura 11.41. Detalhe ampliado da borda da superfície de folga da ferramenta mostrada na Figura 11.40.

202

O desgaste de entalhe não acontece apenas em ferramentas de metal duro, mas também nas cerâmicas. Aliás, as ferramentas mais indicadas para a usinagem das superligas de níquel são exatamente as cerâmicas, principalmente as Sialons e as Whiskers, e a forma de desgaste predominante nestas situações é, também, o entalhe (Khamsehzadeh, 2001). Os mecanismos envolvidos são também os mesmos (abrasão, attrition e até mesmo a difusão), e as condições de corte têm forte influência no processo.

11.4.7. COMENTÁRIOS FINAIS

Todos estes mecanismos (processos) de desgaste são observados na prática, mas certamente, um prevalecerá sobre os demais, dependendo, principalmente, dos materiais da peça e da ferramenta, da operação de usinagem, das condições de corte, da geometria da ferramenta de corte e do emprego do fluído de corte. Em geral, os três primeiros mecanismos (processos) são mais importantes à altas taxas de remoção de material, onde há o desenvolvimento de altas temperaturas. Os três últimos são mais importantes a baixas velocidades, onde as temperaturas de corte são baixas o suficiente para prevenir a ocorrência dos três primeiros.

A análise dos mecanismos de desgaste é complexa, mas o procedimento mais indicado é, em primeiro lugar, considerar o material da ferramenta, o material da peça e as condições de corte que se realizou a operação. Estes pontos sugerem ou eliminam a possibilidade de predominância de um ou outro mecanismo de desgaste. Segue-se então a análise direta das regiões desgastadas. Para tanto deve-se lavar as ferramentas de corte em ácidos apropriados (para retirada de material da peça que geralmente fica aderido em região desgastada, impedindo a observação da região). Com as ferramentas isentas de material aderido, segue-se a análise visual e microscópica. Primeiro no microscópio ótico, depois no eletrônico. Estas análises têm como objetivo identificar características importantes das regiões desgastadas, que forneça indicadores de predominância dos diversos mecanismos possíveis. Outros tipos de análise podem ainda ser empregados quando disponíveis, como as análises qualitativa e quantitativa superficial de elementos químicos, cujas técnicas variam. Tais técnicas podem auxiliar na identificação do desgaste difusivo. Uma vez conhecidos o(s) mecanismo(s) de desgaste(s) predominantes, várias decisões podem ser tomadas no sentido de viabilizar condições mais resistentes ao desenvolvimento de desgaste.

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C A P Í T U L O 1 2

VIDA DA FERRAMENTA E FATORES QUE A INFLUENCIAM

12.1. INTRODUÇÃO

A vida de uma ferramenta pode ser definida [1] como sendo o tempo em que a mesma trabalha efetivamente, sem perder o corte ou até que se atinja um critério de fim de vida previamente estabelecido. O fim de vida de uma ferramenta de corte será definido pelo grau de desgaste estabelecido. O tamanho deste desgaste, ou a fixação de um nível de desgaste permitido irá depender de inúmeros fatores, entre os quais podemos citar:

a) receio da quebra da aresta de corte devido ao desgaste. b) temperaturas excessivas atingida pela ferramenta. c) as tolerâncias dimensionais não são mais possíveis de se obter. d) o acabamento superficial não é mais satisfatório. e) aumento excessivo das forças de usinagem. f) etc...

Através do controle destes fatores numa operação de usinagem, pode-se saber quando a ferramenta deve ser substituída ou reafiada.

Além disso fatores econômicos podem também definir a fixação de determinado grau de desgaste (vide capítulo 16).

No capítulo anterior, verificou-se que para ensaios de fim de vida, a norma ISSO 3685 sugere valores para os diversos parâmetros de desgaste para serem usados como critério. Fixado esses valores para o critério de fim de vida de uma ferramenta de usinagem, esta (a vida) pode ser expressada de várias maneiras:

· através do tempo total de trabalho (caso de cortes interrompidos, fresamento). · percurso de corte (Km). · percurso de avanço (mm). · volume de material removido. · número de peças produzidas. · velocidade de corte para um determinado tempo de vida.

ou conforme for mais conveniente. 12.2. CURVA DE VIDA DE UMA FERRAMENTA

As curvas de vida de uma ferramenta são aquelas que expressam a vida da ferramenta, T (tempo efetivo, tempo total, percurso de corte, percurso de avanço, etc...) em função da velocidade de corte (Vc). Tais curvas são fundamentais para o estudo das condições econômicas de corte. Uma curva desta fornecerá o tempo que uma ferramenta pode trabalhar até que se atinja o nível de desgaste estabelecido.

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Além destas curvas pode-se construir os gráficos de desgaste em função da velocidade de corte, para um determinado tempo de usinagem, que permite uma melhor visualização das condições técnicas, Figura 12.1 (o comportamento da curva se deve aos diferentes mecanismos de desgaste).

Figura 12.1. Desgaste VB e KT em função da velocidade de corte, para um determinado tempo de usinagem [1].

Para se obter a curva T x Vc de uma ferramenta de corte, é necessário gráficos auxiliares que forneçam o desgaste da ferramenta em função do tempo, para várias velocidades de corte. A Figura 12.2 ilustra a obtenção da curva de vida da ferramenta T x Vc, após obtidas as curvas de desgaste em função do tempo para várias velocidades de corte.

Figura 12.2. Determinação da curva de vida de uma ferramenta T x VC [1].

Por meio das curvas de vida, se obtém a velocidade de corte Vc 60 para uma vida de 60 minutos de trabalho, uma vez especificados os desgastes e as condições de usinagem. Esta velocidade serve como índice comparativo, para medir a usinabilidade do par ferramenta-peça.

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O gráfico T x Vc da Figura 12.2 representa a região c do gráfico da Figura 12.1, que é a região economicamente mais interessante apesar do desgaste ser maior (mas a velocidade sendo maior irá permitir maior produção). Este gráfico quando representado em escala dilogarítmica, se aproxima de uma reta, Figura 12.3.

Figura 12.3. Representação em escalas logarítmicas da curva de vida da ferramenta [1].

Para a curva da Figura 12.3 têm-se a expressão:

log log .logT K x Vc= - (12.1)

onde, x = coeficiente angular da reta. K = vida da ferramenta para uma velocidade de corte 1m/min.

A expressão (12.1) pode ser escrita da forma:

T K Vcx

= *- (12.2)

que é a conhecida equação de Taylor [1-3] e representa o tempo de vida de uma ferramenta para determinada velocidade de corte.

As velocidades de corte obtidas pela equação de Taylor, podem ser usadas na otimização de um processo de usinagem [4]. As velocidades assim obtidas são denominadas velocidades ótimas de corte.

A equação 12.2 relaciona a vida da ferramenta com a velocidade de corte. Uma análise mais abrangente, que correlaciona a vida da ferramenta com outros parâmetros pode ser determinada, obtendo-se a equação 12.3, conhecida como Equação de Taylor Expandida.

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HGF VBVcapfKTE

××××= 1 (12.3)

Motta [5] usinando aço NB 8640, com ferramentas de metal duro revestidas, sem fluido de corte, no torneamento, determinou os coeficientes K, E, F, G e H da equação 12.3. Ele fez regressão linear múltipla aplicada, utilizando o método dos mínimos quadrados, e obteve a equação 12.4.

T Vc f ap VB= × × × × ×- - -163 1010 4 462 5 203 2 458 1771. . . . . (12.4)

Nota-se que os coeficientes negativos representam uma variação inversa da vida com a variável em questão.

A forma expandida da equação de Taylor representa uma situação mais realista do processo, mas um enorme tempo experimental e de análises torna-se necessário, o que a faz bastante dispendiosa, podendo levar os usuários à opção da equação simplificada. 12.3. FATORES QUE INFLUEM NA VIDA DA FERRAMENTA

A equação de Taylor é obtida experimentalmente através de testes de vida de ferramenta. Da mesma forma que inúmeros fatores influem nos mecanismos e formas de desgaste de uma ferramenta, os parâmetros x e K de equação de Taylor também variam. Abaixo segue uma lista dos principais fatores que exercem influência nos parâmetros “x” e “K”, da equação de Taylor.

- Quanto à peça: · composição química · tamanho do grão · fusão e processo de fundição · fabricação: · fundido · forjado · laminado · trefilado

· tratamento térmico: · recozimento · normalização · tempera e revenido · outros

· propriedades: · resistências a tração · ductilidade · dureza · encruabilidade

· dimensões e forma · microestrutura

- Quanto à ferramenta de corte:

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· composição · tratamento térmico · dureza e resistência ao desgaste · geometria · tenacidade

- Quanto ao fluído de corte: · propriedades refrigerantes · propriedades lubrificantes · forma de aplicação

- Quanto à máquina ferramenta: · tipo de máquina · rigidez · avanço · profundidade · velocidade de corte

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C A P Í T U L O 1 3

FLUIDOS DE CORTE

13.1. INTRODUÇÃO

Em se tratando de sistemas de manufatura, qualquer tentativa de aumentar a produtividade e/ou reduzir custos deve ser considerada. Na usinagem, o uso de fluidos de corte é uma opção, e quando ele é escolhido e aplicado apropriadamente, traz benefícios. A escolha apropriada de um fluido de corte deve recair naquele que possui composição química e propriedades corretas, para atacar as adversidades de um processo de corte específico. Ele deve ser aplicado usando um método que permite que ele chegue o mais próximo possível da aresta de corte, dentro da interface cavaco-ferramenta, para que ele possa exercer suas funções apropriadamente.

Nos últimos tempos, grandes avanços tecnológicos foram obtidos, tanto nos materiais, como nas máquinas ferramentas. Isto fez com que a demanda dos fluidos de corte crescesse consideravelmente. Alta demanda causa competitividade, que por sua vez, causa aumento da qualidade dos produtos. Outro fator que também influi no aumento da qualidade dos fluidos de corte dos dias de hoje, é a pressão exercida por Agências de Proteção Ambiental e Agências de Saúde, para que os produtos sejam comercializados com mais segurança e que causem menos mal ao meio ambiente [1]. O sucesso dos fluídos de corte nos dias atuais é também devido a avanços conseguidos nos processos de fabricação dos fluidos, mas muito mais pelo desenvolvimento de novos aditivos. Com isto, os fluidos de cortes atuais apresentam melhores propriedades refrigerantes, melhores propriedades lubrificantes, apresentam menos perigo ao operador e duram consideravelmente mais, com menos problemas de armazenagem do que os fluidos de corte de gerações passadas. 13.2. FUNÇÕES DOS FLUIDOS DE CORTE

As principais funções dos fluidos de corte são:

· lubrificação à baixas velocidades de corte; · refrigeração à altas velocidades de corte;

e menos importante:

· ajudar a retirar o cavaco da zona de corte; · proteger a máquina ferramenta e a peça de corrosão atmosférica.

À baixas velocidades de corte, a refrigeração é relativamente sem importância, enquanto que a lubrificação é importante para reduzir o atrito e evitar a formação de APC. Um fluido de corte à base de óleo deve, então, ser usado. À altas velocidades de corte, as condições não são favoráveis para a penetração do fluido de corte na interface para que ele exerça o papel lubrificante. Nestas condições a

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refrigeração se torna mais importante, e um fluido de corte à base de água, deve ser utilizado.

Como lubrificante, o fluido de corte age para reduzir a área de contato cavaco-ferramenta, e a sua eficiência vai depender da sua habilidade de penetrar na interface cavaco-ferramenta, no pequeno espaço de tempo disponível, e de formar um filme, seja por ataque químico ou por adsorsão física, com a resistência ao cisalhamento menor que a resistência do material da interface.

Ainda não está completamente claro, como o fluído de corte ganha acesso à interface, nem até onde ele pode chegar. Trent [2,3] diz que o lubrificante não tem acesso à zona de aderência. Childs e Rowe [4] também sustenta esta teoria e comenta que a atenção deve ser voltada, então, para a zona de escorregamento. Postinikov [5] sugeriu que o lubrificante penetra contra o fluxo do metal, chegando a ponta da ferramenta, por uma ação capilar, assumindo que o contato na interface não é completo (condições de escorregamento). Williams [6] assume também este ponto de vista. Alguns ensaios com ferramentas transparentes de safira [7], demonstraram que o fluido de corte ganha acesso à interface, pelos lados, ao invés de se movimentar contra o fluxo de saída do cavaco. Qualquer que seja o método de penetração, o fluido de corte, uma vez na interface, deve formar o filme lubrificante, com resistência ao cisalhamento menor que a resistência do metal. Ele pode também restringir o caldeamento (solda) do cavaco na superfície de saída, se aditivos apropriados forem adicionados. A eficiência da lubrificação dependerá das propriedades do fluido, tais como: características de molhabilidade, viscosidade, oleosidade e resistência do filme. Estas propriedades podem ser conseguidas com uma mistura adequada de aditivos.

Como refrigerantes, os fluidos de corte diminuem a temperatura de corte, tanto pelo aumento da dissipação de calor (refrigeração), como também pela redução da geração de calor (lubrificação). Quando se usa fluidos de corte à base de água, a dissipação do calor (refrigeração) é mais importante que a redução da geração do calor (lubrificação). Foi demonstrado experimentalmente [8] que a eficiência do fluido de corte em reduzir a temperatura diminui com o aumento da velocidade de corte e da profundidade de corte.

A capacidade do fluido de corte em varrer os cavacos da zona de corte, depende da viscosidade e da vazão do fluido de corte, além, é claro, da operação de usinagem e do tipo de cavaco sendo formado. Em algumas operações, tais como furação e serramento, esta função é de suma importância, pois ele pode evitar a obstrução do cavaco na zona de corte e, consequentemente, quebra da ferramenta. 13.3. RAZÕES PARA SE USAR FLUIDOS DE CORTE

O objetivo final de se usar fluido de corte é reduzir o custo total por partes usinadas ou então aumentar a taxa de produção. Isto pode ser conseguido com um ou mais dos seguintes benefícios que os fluidos de corte podem proporcionar:

· aumento da vida da ferramenta pela lubrificação e refrigeração; · redução das forças de corte devido à lubrificação, portanto redução de potência; · melhora no acabamento superficial da peça;

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· fácil remoção do cavaco da zona de corte; · menos distorção da pela ação refrigerante.

Os fluidos de corte, além de refrigerar e de lubrificar, devem ainda possuir outras propriedades que produzirá, a níveis operacionais, melhores resultados. Estas propriedades podem ser enumeradas, como segue: Anti-espumantes, anticorrosivas e antioxidantes; antidesgaste e antisolda (EP); boa umectação; capacidade de absorção de calor; transparência, inodor, não formar névoa, nem provocar irritações na pele; compatibilidade com o meio ambiente; baixa variação da viscosidade quando em trabalho (índice de viscosidade compatível com a sua aplicação). A maioria destas propriedades são conferidas aos fluidos de corte por meio de aditivos. 13.4. ADITIVOS Para conferir aos fluidos de corte melhorias em propriedades específicas, alguns produtos químicos ou orgânicos, chamados de aditivos, são adicionados. Os principais são:

· ANTIESPUMANTES - Evitam a formação de espumas que poderiam impedir a boa visão da região de corte e comprometer o efeito de refrigeração do fluido. Estes aditivos reduzem a tensão interfacial do óleo de tal maneira que bolhas menores passam a se agrupar formando bolhas maiores e instáveis. No controle das espumas geralmente usam-se cêras especiais ou óleos de silicone.

· ANTICORROSIVOS - Protegem peça, ferramenta e máquina-ferramenta da corrosão. São produtos à base de nitrito de sódio ou que com ele reagem, óleos sulfurados ou sulfonados. É recomendável usar o nitrito de sódio com precaução pois são suspeitos de serem cancerígenos. Deve-se usar baixos teores de nitrito de sódio.

· DETERGENTES - Reduzem a deposição de lôdo, lamas e borras. São compostos organometálicos contendo magnésio, bário, cálcio entre outros.

· EMULGADORES - São responsáveis pela formação de emulsões de óleo na água e vice-versa. Reduzem a tensão superficial e formam uma película monomolecular semi-estável na interface óleo-água. Os tipos principais são os sabões de ácidos graxos, as gorduras sulfatadas, sulfonatos de petróleo e emulgadores não iônicos.

· BIOCIDAS - Substâncias ou misturas químicas que inibem o desenvolvimento de microorganismos.

· ADITIVOS EXTREMA PRESSÃO (EP) - Em operações mais severas onde uma lubricidade adicional é necessária, pode-se utilizar aditivos extrema pressão. Eles conferem aos fluidos de corte uma lubricidade melhorada para suportarem as elevadas temperaturas e pressões do corte, reduzindo o contato metal-metal. São compostos que variam na estrutura e composição. São suficientemente reativos com a superfície usinada, formando compostos relativamente fracos na interface, geralmente sais (fosfato de ferro, cloreto de ferro, sulfeto de ferro, etc) que se

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fundem a altas temperaturas e são facilmente cisalháveis. Podem ser relacionados em ordem crescente de eficiência como: matérias graxas e derivados, fósforo e zinco, clorados, sulfurizados inativos, sulfurizados ativos, sulfurados e os sulfuclorados. Os mais empregados são aditivos sulfurizados, sulfurados e fosforosos.

13.5. CLASSIFICAÇÃO DOS FLUIDOS DE CORTE

Existem diversas formas de se classificar os fluidos de corte, e não há uma padronização que estabeleça entre as empresas fabricantes uma única.

A classificação mais difundida agrupa os produtos da seguinte forma:

I. Ar;

II. Aquosos: a) - água; b) - emulsões (óleos solúveis);

c) - soluções químicas;

III. Óleos: a) - óleos minerais; b) - óleos graxos; c) - óleos compostos; d) - óleos de extrema pressão; e) - óleos de usos múltiplos.

O ar comprimido pode ser utilizado com objetivo de resfriar a região de corte, por meio de um jato, puro, ou misturado a outro fluido, na interface, contra a superfície interna do cavaco, com razoável desempenho. Já a água, por ser altamente corrosiva aos materiais ferrosos, praticamente não é utilizada como fluido de corte. Enfim, as suas aplicações são bastante restritas. 13.5.1. EMULSÕES

13.5.1.1. FLUIDOS EMULSIONÁVEIS

São compostos bi-fásicos de óleos minerais adicionados à água na proporção de 1:10 a 1:100, mais agentes emulgadores que garantem a miscibilidade destes com a água. Esses emulgadores são tensoativos polares que reduzem a tensão superficial formando uma película monomolecular relativamente estável na interface óleo-água. Assim os emulgadores promovem a formação de glóbulos de óleo menores, o que resulta em emulsões translúcidas.

A estabilidade destas emulsões se deve ao desenvolvimento de uma camada elétrica na interface óleo-água. Forças repulsivas entre glóbulos de mesma carga evitam a coalescência destes. Para evitar os efeitos nocivos da água presente na emulsão empregam-se aditivos anticorrosivos tais como nitrito de sódio, que ainda é utilizado na fabricação de óleos de corte emulsionáveis. São usados ainda biocidas, que inibem o crescimento de bactérias e fungos, porém devem ser compatíveis com a pele humana e não serem tóxicos. Os elementos EP e antidesgaste usados que

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aumentam as propriedades de lubrificação, são os mesmos empregados para óleos puros. No entanto, o uso de cloro como aditivo para fluidos de corte vem encontrando restrições em todo o mundo, devido aos danos que este causa ao meio ambiente e à saúde humana. Por esta razão procura-se substituir o cloro por aditivos a base de enxofre e cálcio. Usa-se ainda gordura e óleo animal e vegetal para melhorar as propriedades de lubrificação.

13.5.1.2. FLUIDOS SEMI-SINTÉTICOS (MICROEMULSÕES)

Os fluidos semi-sintéticos são também formadores de emulsões e se caracterizam por apresentarem de 5% a 50%, de óleo mineral no fluido concentrado e aditivos e compostos químicos que verdadeiramente dissolvem-se na água formando moléculas individuais. A presença de uma grande quantidade de emulgadores, em relação ao sintético, propicia ao fluido uma coloração menos leitosa e mais transparente. A menor quantidade de óleo mineral e a presença de biocidas, aumentam a vida do fluido de corte e reduzem os riscos à saúde.

Aditivos EP, anticorrosivos, agentes umectantes, são utilizados como nos fluidos anteriores. Adicionam-se também corantes que proporcionam uma cor mais viva e aceitável pelo operador da máquina. 13.5.2. SOLUÇÕES As soluções são compostos monofásicos de óleos dissolvidos completamente na água. Neste caso não há a necessidade da atuação de elementos emulgadores, pois os compostos se reagem quimicamente formando fases únicas. Pertencendo à classe das soluções, encontram-se os fluidos sintéticos, que se caracterizam por serem livres de óleo mineral em suas composições.

13.5.2.1. FLUIDOS SINTÉTICOS

Esses óleos caracterizam-se por não conterem óleo mineral em sua composição. Baseiam-se em substâncias químicas que formam uma solução com a água. Consistem de sais orgânicos e inorgânicos, aditivos de lubricidade, biocidas, inibidores de corrosão entre outros, adicionados à água. Apresentam uma vida maior uma vez que são menos atacáveis por bactérias e reduzem o número de trocas da máquina. Formam soluções transparentes, resultando em boa visibilidade do processo de corte. Possuem agentes umectantes que melhoram bastante as propriedades refrigerantes da solução. As soluções são estáveis mesmo em água dura.

Os óleos sintéticos mais comuns oferecem boa proteção anticorrosiva e refrigeração. Os mais complexos são de uso geral, com boas propriedades lubrificantes e refrigerantes. Faz-se uma distinção quando os fluidos sintéticos contém apenas inibidores de corrosão, e as propriedades de EP não são necessárias. São chamados de refrigerantes químicos ou soluções verdadeiras, apresentam boas propriedades refrigerantes.

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13.5.3. ÓLEOS Os óleos vegetais e animais foram os primeiros lubrificantes empregados como óleos integrais na usinagem dos metais. A utilização destes, como fluidos de corte, tornou-se inviável devido ao alto custo e rápida deterioração, porém são empregados como aditivos nos fluidos minerais objetivando melhorar as suas propriedades lubrificantes.

Óleos integrais são, basicamente, óleos minerais puros ou com aditivos, normalmente de alta pressão. O emprego destes óleos nos últimos anos como fluido de corte, tem perdido espaço para os óleos solúveis em água, devido ao alto custo em relação aos demais, aos riscos de fogo, ineficiência a altas velocidades de corte, baixo poder refrigerante e formação de fumos, além de oferecerem riscos à saúde do operador. Os aditivos podem ser a base de cloro ou enxofre ou mistura destes dois dando características EP ao fluido. Fósforos, matérias graxas são também utilizadas e atuam como elementos antidesgaste. Os óleos minerais são hidrocarbonetos obtidos a partir do refinamento do petróleo cru. Suas propriedades dependem do comprimento da cadeia, estrutura e grau de refinamento.

Óleos minerais básicos empregados na fabricação de fluidos de corte podem ser:

13.5.3.1. Base parafínica: Derivam do refinamento do petróleo cru parafínico de alto teor de parafinas (ceras), que resultam em excelentes fluidos lubrificantes. Estes óleos são encontrados em maior abundância e, portanto, apresentam um custo menor, possuem alto índice de viscosidade (IV), maior resistência à oxidação, são menos prejudiciais a pele e ainda menos agressivos à borracha e ao plástico.

13.5.3.2. Base naftênica: Derivam do refinamento do petróleo cru naftênico. O uso destes óleos como básicos para fluido de corte, tem diminuído em função de problemas causados a saúde humana. Os fluidos lubrificantes são de baixa qualidade e são escassos.

13.5.3.3. Óleos minerais de base aromática: Não são empregados na fabricação de fluidos de corte. São excessivamente oxidantes, porém podem melhorar a resistência ao desgaste e apresentar boas propriedades EP, quando presentes em grandes quantidades, em óleos parafínicos. 13.6. SELEÇÃO DO FLUIDO DE CORTE

A seleção de um fluido de corte ideal é difícil, devido à grande variedade de produtos disponíveis no mercado com alto grau de competitividade. O custo é alto e a utilização de um fluido de corte tem que compensar economicamente, isto é, os benefícios devem superar o custo do produto. Existem várias operações em que o corte é realizado a seco (ar), onde economicamente não se justifica o emprego de fluido de corte. Torneamento e fresamento de ferro fundido cinzento são exemplos de operações a seco. Em contra partida, existem muitas operações, onde o emprego do fluido de corte é vital. Em termos de consumo industrial, os óleos emulsionáveis estão bem à frente dos demais. Porém, os novos produtos, principalmente os sintéticos, estão cada vez mais conquistando os consumidores.

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Os ensaios de laboratórios devem ser usados como critério de seleção correta do fluido de corte e de aditivos, apesar da maioria dos produtores fornecerem tabelas e diagramas que ajudam o consumidor a selecionar o produto. É comum encontrar na literatura tabelas completas, como a apresentada em [9], com indicação do nome do produto, descrição do produto, concentração recomendada, material a usinar, para vários fornecedores, com telefone e endereços das companhias. Estas tabelas são úteis e devem ser usadas como ponto de partida.

Pelo menos três informações relevantes devem ser consideradas, antes de se decidir por um determinado fluido de corte:

(i) Material da Peça

Metais Ferrosos

Ferro Fundido: os ferros fundidos cinzentos produzem cavacos de ruptura e são normalmente usinados a seco. Um óleo emulsionável pode, entretanto, ser útil para ajudar a remover o cavaco. Na usinagem de ferro fundido maleável, se for usado fluido de corte, este deve ser óleo puro ou algum tipo especial de emulsão. Deve-se tomar cuidados para que os cavacos não reagem quimicamente com emulsões de óleos solúveis. A usinagem de ferro fundido branco é difícil e geralmente requer aditivos EP nas emulsões.

Aços: Este grupo concentra o maior volume de material usado industrialmente e existe uma variedade muito grande de composições disponíveis. Assim, todos os tipos de fluidos de corte podem ser usados, e a escolha depende da severidade da operação e da resistência do aço. Aço inoxidável austenítico e aços resistentes ao calor, tendem a encruar de maneira idêntica às ligas de níquel, e a escolha do fluído também será similar.

Ligas Não-Ferrosas

Alumínio e suas Ligas: Podem muitas vezes ser usinados à seco. Porém, as ligas de alumínio conformadas, com alto teor de cobre, requerem um fluido de corte com alta capacidade refrigerante. Quando cavacos longos são formados, a área de contato é grande e requer lubrificação adequada. As ligas de alumínio e silício também requerem boa lubrificação. Se a precisão dimensional for importante, deve-se usar um bom refrigerante, devido ao alto valor de coeficiente térmico de expansão. Uma escolha correta seria uma emulsão com mistura de óleo mineral e gordura e a maioria das emulsões solúveis. Alumínio não exige aditivos EP e o enxofre livre ataca o metal instantaneamente.

Magnésio e suas Ligas: São normalmente usinados a seco. À altíssimas velocidades de corte, entretanto, um refrigerante pode ser utilizado. Emulsões são proibidas porque a água reage com o cavaco para liberar hidrogênio, que apresenta risco de ignição. Geralmente, se usa óleo mineral ou misturas de óleo mineral com gorduras, e como no caso do alumínio, o enxofre ataca o metal.

Cobre e suas Ligas: Em usinagem este metal pode ser dividido em três grandes grupos:

218

1. Ligas de fácil usinagem, que inclui a maioria dos latões e alguns bronzes ao fósforo fundidos. Eles possuem resistência à tração adequada e baixa ductilidade e geralmente adições de elementos de corte fácil (chumbo, selênio e telúrio). Isto significa que eles são usinados mais facilmente que as ligas de outros grupos. Uma emulsão de óleo mineral é suficiente para praticamente todas as situações.

2. Ligas de usinabilidade moderada, são os latões sem chumbo, alguns bronzes ao fósforo e bronzes ao silício. Eles tem alta ductilidade que causa alto consumo de potência e dificulta a obtenção de bom acabamento superficial. Geralmente, emulsão de óleo mineral ou uma mistura leve de óleo mineral com gordura preenchem as exigências.

3. Ligas de difícil usinagem, tais como as ligas de chumbo, as ligas níquel-prata e os bronzes ao fósforo. Eles tem baixa resistência e grande tendência ao arrancamento e, geralmente, produzem cavacos longos. Neste caso uma forte mistura de óleo mineral com gordura deve ser usado. Todos os metais amarelo serão manchados por qualquer óleo contendo enxofre livre.

Ligas de Níquel, Titânio e Cobalto: São ligas resistentes ao calor e muitas vezes chamadas de superligas. São difíceis de usinar e tem altas tendências de encruarem, principalmente as ligas de níquel. A escolha do fluído de corte dependerá da operação de corte e da tenacidade da liga e a decisão pode cair em qualquer tipo de fluido de corte. Em condições severas, os aditivos são freqüentemente usados. Enxofre livre, entretanto, pode causar descoloração da peça.

(ii) Material da Ferramenta

A escolha de um material de ferramenta para uma certa aplicação indicará o potencial da taxa de remoção de material. Esta taxa de remoção de material, por sua vez, indicará as temperaturas de corte e as tensões na ferramenta que provavelmente serão encontradas.

Como as ferramentas de aço carbono e aço liga devem ser usadas à baixas temperaturas, é essencial que se use uma refrigeração adequada. Os aços-rápidos também requerem uma refrigeração eficiente, e na usinagem de materiais tenazes, aditivos anti-solda devem ser usados.

As ligas fundidas, metais duros e cermets possuem durezas maiores que as ferramentas de aços e, portanto, suportam trabalhar à temperaturas mais elevadas. Como a taxa de remoção de material, quando se utiliza estas ferramentas, é alta, a aplicação de um refrigerante se torna necessário para aumento de vida. Os óleos emulsionáveis são usados com freqüência, mas a escolha correta deve variar de acordo com a severidade da operação. O uso das cerâmicas tem aumentado consideravelmente nos últimos tempos. Devido a alta fragilidade, deve-se tomar cuidados ao se aplicar um refrigerante, porque os choques térmicos podem causar trincas superficiais. As cerâmicas à base de nitreto de silício são menos susceptíveis a este tipo de problema, por serem mais tenazes que as cerâmicas à base de Al2O3. Se um fluido de corte vai reduzir temperatura, sem causar trincas, ele será sempre recomendado para aumentar a vida da ferramenta. Em certas aplicações, principalmente na usinagem das superligas, o desgaste de entalhe vai predominar, e neste caso, o fluido de corte deve ser usado com alguma reserva, pois a atmosfera

219

pode alterar o mecanismo de desgaste. Os materiais ultraduros (PCD e CBN) são resistentes o suficiente para suportarem os choques térmicos e não existe contra-indicação para o uso do fluido de corte.

(iii) Processo de Usinagem

A severidade dos processos de usinagem variam desde os mais pesados cortes de brochamento até os mais leves de retífica. A seleção do fluido de corte, portanto, vai variar desde os mais ativos tipos de óleo de corte até os óleos emulsionáveis de baixa concentração. É comum encontrar literaturas que orientam a escolha, de acordo com a operação de corte [9, 10].

Além destes três fatores importantes, o custo do fluido de corte pode também influenciar na decisão. Os óleos solúveis tem um bom preço no mercado, e muitas vezes este é um fator chave para a decisão.

Algumas vezes, a seleção do fluido de corte é realmente problemática, como no caso de células flexíveis de manufatura. Nestas células, várias operações de usinagem podem ser feitas, e uma variedade grande de metais podem ser usinados. É difícil, portanto, satisfazer a todas as situações. Nelson e Shaible [1] comentaram: “O fluido de corte deve suportar os vigores apresentados pelas exigentes operações de corte dos metais de difícil usinagem, o que significa desperdício de potencialidades nos materiais de corte fácil, e operações mais leves. 13.7. DIREÇÕES DE APLICAÇÃO DO FLUIDO

Existem três direções de aplicação dos fluidos de corte, como mostrado na Figura 13.1.

Figura 13.1. As três direções possíveis de aplicação do fluido de corte.

220

Taylor [11] encontrou bons resultados quando o fluido é aplicado na direção “A” (sobre-cabeça). Smart e Trent [12] entretanto encontraram a posição “C” como sendo a mais eficiente, quando usinando níquel e ferro fundido. Lauterbach [13] também encontrou esta direção, como sendo a mais eficiente na usinagem de aço. Niebusch e Strieder [14], entretanto, sugere que melhores resultados são obtidos quando o fluído é aplicado das direções “A” e “C” simultaneamente. Machado [15], no torneamento de uma liga de titânio (Ti6V4Al), encontrou bons resultados quando utilizou a direção “B” de aplicação do fluido, quando comparado com a direção sobre-cabeça. Em sua investigação o fluido foi aplicado a alta pressão (~145 atm) e funcionava como quebra-cavacos. Entretanto, este mesmo método e direção de aplicação do fluido em uma liga de níquel (Inconel 901) não apresentou os mesmos resultados, isto é, a posição sobre-cabeça apresentou vida das ferramentas superiores. 13.8. MÉTODOS DE APLICAÇÃO DOS FLUIDOS DE CORTE

Existem basicamente 3 métodos de aplicação do fluido:

a) Jorro de fluido à baixa pressão (torneira à pressão normal). b) Pulverização. c) Sistema à alta pressão.

O primeiro sistema é o mais utilizado pela sua simplicidade. O segundo método oferece vantagens sobre o primeiro, devido ao maior poder de penetração e velocidade. O terceiro método é mais engenhoso, porém, bons resultados foram obtidos com o seu emprego [15].

Nos últimos tempos, na tentativa de reduzir custos, tem-se observado uma necessidade de reduzir o consumo de fluido de corte e portanto a técnica de baixos volumes de fluidos tem sido mais investigada [16, 17]. Nesta técnica o fluido é aplicado em volumes muito baixos chegando a 10 ml/h. Normalmente, eles são aplicados juntamente com um fluxo de ar (método da pulverização), e direcionados contra a saída do cavaco, ou entre a superfície de folga da ferramenta e a peça.

Machado e Wallbank [16] utilizaram água e uma emulsão de óleo mineral utilizando um venturi para misturar esses componentes no fluxo de ar e aplicou o jato da mistura contra a saída do cavaco no torneamento de aço AISI 1045 (ABNT 1045). Verificou-se uma redução nas componentes de forças, principalmente em baixas velocidades de corte e alto avanço.

Em outra publicação, Machado et alli [17], utilizaram o mesmo método de pulverização via venturi e testaram a capacidade lubrificante de dois produtos para fluidos sintéticos. Um sem enxofre e outro com 10% de enxofre. Este método mostrou-se capaz de distinguir e classificar as características lubrificantes via medição das componentes da força de usinagem, principalmente a força de avanço, a espessura do cavaco e o acabamento superficial da peça usinada. As principais vantagens do método é a economia do consumo do fluido para obter a informação e a praticidade de execução.

221

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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2. TRENT, E.M. “Metal Cutting”, 3rd Edition, Butterworths, London, 1991, ISBN 0408108568, 245 pgs.

3. TRENT, E.M. “Conditions of Seizure at the Tool Work Interface”, ISI, Special Report 94, Iron and Steel Institute, London, 1967, pp. 11-18.

4. CHILDS, T.H.C.; ROWE, G.W. “Physics in Metal Cutting”, Rep. Prog. Physics, vol. 36, 1973, pp. 223-288.

5. POSTINIKOV, S.N. “Penetrating Ability of Cutting Fluids”, Wear, vol. 10, 1967, pp. 142-150.

6. WILLIAMS, J.A. “The Action of Lubrificants in Metal Cutting”, Journal Mechanical Engineering Science, 7 Mech E vol. 19(5), 1977, pp. 202-212.

7. HORNE, J.G.; DOYLE, E.D.; TABOR, D. “Direct Observation of Contact and Lubrification at a Chip-Tool Interface”, Proc. Ist. Int. Conf. on Lubrification Challenges in Metal Working and Processing, III Research Institute, Chicago, Illinois, USA, 7-9 June, 1978, 7p.

8. SHAW, M.C.; PIGGOT, J.D.; RICHARDSON, L.P. “The Effect of the Cutting Fluid upon Chip-Tool Interface Temperature”, Trans of ASME, vol. 73(1), 1951, pp. 45-56.

9. ANONYMOUS “Cutting Fluids: A Strean of Developments...” Machinery and Production Engineering, 3 sept, 1986, pp. 143, 145, 147, 151, 153, 156,159,163, 164, 169-171.

10. BISWAS, A.K. “Role of Cutting Fluids in Metal Cutting Operations a Review”, Chemical Engineering World, vol. XX(1), jan, 1985,m pp. 73-75.

11. TAYLOR, F.W. “On the Art of Cutting Metals”, Pub. by ASME. 12. SMART, E.F.; TRENT, E.M. “Coolants and Cutting Tool Temperatures”, Proc. of

the 5th Int MTDR Conf. Birmingham, England, sept, 1974, pp. 187-195. 13. LAUTERVACH, W.E. “Influence of Point of Application of Cutting Oil on Tool

Life”, Lubrification Engineering, june, 1952, pp. 135-136. 14. NIEBUSH, R.B.; STRIEDER, E.H. “The Application of Cutting Fluids to Machining

Operation”, Mechanical Engineering, March 1951, pp. 203-207. 15. MACHADO, A.R. “Machining of Ti6Al4V and Inconel 901 with a High Pressure

Coolant System”, PhD Thesis, University of Warwick, England, 1990. 16. MACHADO, A.R. and WALLBANK, J., "The Effect of Extremely Low Lubricant

Volumes in Machining", Wear, vol. 210, 1997, pp 76 - 82. 17. MACHADO, A.R.; da SILVA, M.B. and WALLBANK, J., " Practical Determination

of Lubricant Performance in Turning", Submetido para publicação no Transaction da ASME – Journal of Manufacturing Science and Engineering, em abril de 1999.

222

C A P Í T U L O 1 4

INTEGRIDADE SUPERFICIAL

14.1. INTRODUÇÃO

A condição de uma superfície usinada é o resultado de um processo que envolve deformações plásticas, ruptura, recuperação elástica, geração de calor, vibração, tensões residuais e às vezes reações químicas. Todos estes fatores podem ter efeitos diferentes na nova superfície, assim o termo Integridade Superficial é utilizado para descrever a qualidade de uma superfície e, portanto, engloba um grande número de variações na mesma. Desta forma o conceito de integridade superficial não pode ser definido apenas em uma dimensão e não abrange somente a rugosidade da superfície ou a sua forma geométrica. Este termo engloba também outras características da superfície e de camadas abaixo desta. A figura 14.1 mostra uma classificação de alterações que podem ocorrer numa peça usinada por um processo de usinagem convencional. São classificadas em alterações na superfície (acabamento superficial) e alterações em camadas internas da peça (alterações sub-superficiais) e descrevem a integridade superficial.

Figura 14.1. Classificação da Integridade Superficial.

14.2. ACABAMENTO SUPERFICIAL

O acabamento superficial de uma superfície usinada é a combinação de vários fatores que podem ser divididos em (Juneja e Swkhon, 1987; Shaw, 1984; Schaffer, 1988; Drozda e Wick, 1983; Sata, 1963):

Integridade Superficial

Acabamento Superficial

-Rugosidade -Ondulações -Falhas

Alterações Sub-superficiais

Fatores Mecânicos

-Deformação plástica -Rebarbas deformadas plasticamente -Microdureza -Micro ou macro trincas -Tensões residuais

Fatores Metalúrgicos

-Recristalização -Transformações metalúrgicas

223

a) Rugosidade Superficial

São irregularidades finas ou erros micro-geométricos resultantes da ação inerente do processo de corte (marcas de avanço, aresta postiça de corte, desgaste da ferramenta, etc). A rugosidade pode ser medida por vários parâmetros, alguns serão definidos mais adiante.

Em muitos casos a rugosidade é utilizada para controlar o processo de fabricação. De fato a rugosidade de uma superfície é controlada por vários parâmetros: máquina ferramenta, propriedades do material da peça, geometria e material da ferramenta e processo de usinagem. Métodos estatísticos aplicados ao resultado da medição da rugosidade de uma superfície podem identificar as contribuições relativas de cada um destes parâmetros (Whitehouse, 1997). Por exemplo, na retificação pode-se avaliar a eficiência do processo ou a proporção de grãos que perderam o corte analisando-se a rugosidade da superfície da peça.

b) Ondulações

Ondulações consistem de irregularidades superficiais ou erros geométricos cujos espaçamentos são maiores que as irregularidades consideradas como rugosidades. Pode ser causado por vibrações e deflexões da ferramenta e/ou peça, devido a forças de corte, temperaturas de corte ou erros de fixação da peça ou ferramenta. Peças longas e finas são mais sensíveis à forças elásticas e dinâmicas. Como resultado, as ondulações são mais pronunciadas. Por outro lado, peças grandes (grandes seções transversais), são rígidas e as alturas das ondulações são pequenas.

c) Falhas

São interrupções na topografia típica da superfície de uma peça. São não-intensionais, inesperadas e indesejáveis. Podem ser causadas por defeitos inerentes, tais como: inclusões, trincas, bolhas, ou podem surgir também durante o processo de corte.

Normalmente as ondulações e falhas devem ser evitadas na fabricação de uma superfície, pois representam erros de fabricação. A rugosidade superficial por sua vez é um parâmetro que é especificado de acordo com a aplicação da superfície usinada. Uma rugosidade pequena é essencial em superfícies de mancais, superfícies que requerem pintura, superfícies onde servirão de escoamento de fluidos e gases, superfícies cujo visual exige brilho e aquelas superfícies que devem refletir raios e luzes. Superfícies que trabalham sob lubrificação devem possuir uma rugosidade característica, como por exemplo as paredes dos cilindros de motores de combustão interna. O processo de brunimento neste caso tem a função de deixar a superfície com uma rugosidade que favoreça a lubrificação. A Figura 14.2 mostra todos os elementos que representam o acabamento superficial.

224

Figura 14.2. Elementos do acabamento superficial: a) rugosidade superficial; b) ondulações; c) marcas denotando direções das irregularidades; d) falhas (Juneja e Swkhon, 1987).

14.3. EFEITOS DE ALGUNS PARÂMETROS DE USINAGEM NA RUGOSIDADE SUPERFICIAL

Numa operação de usinagem onde a ferramenta é nova, não existe nenhum

atrito entre as superfíces em contato, não ocorre vibração e não há formação de APC, a rugosidade superficial será, teoricamente, formada pelas marcas de avanço deixadas na peça pela ferramenta. Estas marcas estão ilustradas na figura 14.3 para uma operação de torneamento cilíndrico externo utilizando uma ferramenta com raio de ponta r.

Figura 14.3. Marcas de avanço deixadas na superfície da peça.

225

A rugosidade superficial sofre influência de vários parâmetros de usinagem, incluindo: a geometria da ferramenta de corte, geometria da peça, rigidez da máquina ferramenta, material da peça, condições de corte e material da ferramenta (Nakayama et al, 1966; Shouckry, 1982).

Em geral a rugosidade é menor (ou o acabamento é melhor) quando:

· deflexões geradas por esforços de usinagem ou vibrações são pequenas. · a ponta da ferramenta não é aguda, ou seja, a ferramenta possui uma raio de

arredondamento. · a ferramenta e a peça estão corretamente posicionadas e centradas (evitar

desvios). · o material da peça é inerentemente puro, livre de defeitos (trintas, bolhas e

inclusões). · o eixo principal da máquina ferramenta está corretamente alinhado e as guias

sem desgastes. · a aresta de corte sem desgastes ou quebras. · corte sem aresta postiça de corte (APC).

As condições de corte têm grande efeito na rugosidade superficial. Em baixas velocidades de corte, por exemplo, onde pode ocorrer a formação da APC, o resultado é um acabamento rugoso. Um aumento no avanço em baixas velocidades de corte resulta numa superfície ainda bem pior. Isto normalmente é atribuído a um aumento no tamanho da APC (Backer et al, 1952). O efeito da APC no acabamento superficial é atribuído ao fato de que partes dela são cisalhadas durante o processo e permanecem aderidas à superfície da peça em usinagem. Portanto o acabamento superficial melhora quando aumenta-se a velocidade de corte porque a APC desaparece devido ao aumento da temperatura.

O avanço e a profundidade de corte tem grande influencia no acabamento superficial, principalmente o avanço. A altura dos picos e a profundidade dos vales das marcas de avanço tendem a aumentar com o avanço. A profundidade de corte aumenta as forças e portanto as deflexões. As alturas das ondulações também são aumentadas com a profundidade de corte.

A geometria da ferramenta tem grande efeito na rugosidade, principalmente o raio de ponta rn. Este deve ser suficientemente grande para diminuir o efeito dos dentes de serra das marcas de avanço, com apreciável melhora na rugosidade. Entretanto, um raio de ponta excessivo pode gerar vibrações.

Durante a ação da ferramenta, partes do material na frente da ferramenta são comprimidas pela superfície de folga. Uma porção deste material se recupera elasticamente e parte sofre uma deformação plástica numa direção perpendicular ao movimento da ferramenta sem, no entanto, se separar da peça. É um processo análogo ao que acontece num processo de sulcamento. Somente uma porção de material é removida em forma de cavaco, o restante fica na peça em forma de rebarbas dos sulcos formados (Buttery e Archard, 1971). Quanto menor ângulo de saída g maiores serão as rebarbas (ou fluxo lateral) de material na superfície da peça. Além deste efeito, normalmente, quanto maior o ângulo de saída menores

226

serão as forças de usinagem e, portanto, as alturas dos picos e profundidades dos vales que representam a rugosidade das superfícies serão menores.

O ângulo de folga a deve ser suficiente para prevenir o atrito entre a ferramenta e superfície usinada. O atrito gera forças adicionais que causam deflexões. O contato com atrito tende a imprimir na superfície usinada, os defeitos ou desgaste da ferramenta. Além disto, este ângulo de ser adequado para ajudar na saída de fragmentos de APC, evitando que esses fragmentos fiquem aderidos nas superfícies usinadas.

O efeito dos ângulos de posição principal e secundário, cr, c’r, é pequeno, mas uma redução no ângulo de posição diminui as marcas de avanço e melhora o escoamento do cavaco e acabamento. É comum usar c’r = 0o por um comprimento de 1,5 x f para remover parcialmente ou totalmente as marcas de avanço, são as ferramentas chamadas de arestas raspadoras. Este método, porém, pode causar vibrações. Por outro lado, o aumento do ângulo de posição lateral, aumenta a altura das marcas de avanço e prejudica o acabamento.

Além do efeito das condições de corte e da geometria da ferramenta outros efeitos devem ser levados em consideração. A rigidez do suporte da ferramenta ou inserto, por exemplo, deve possuir seção transversal suficiente para minimizar deflexões. Este efeito é crítico em operações de mandrilamento, onde a ferramenta possui um comprimento em balanço considerável.

A máquina ferramenta deve ser rígida, sem erros de alinhamento e com movimentos precisos, para que não tenha efeito no acabamento superficial. São características desejáveis:

· potência suficiente para manter a velocidade e o avanço requerido, sem problemas.

· adequada resiliência para evitar deflexões. · rigidez e amortecimento contra vibrações. · ter uma base (fundação) adequada para minimizar vibrações e transmissão para

outras máquinas. · precisão na fabricação para reduzir ao mínimo o desalinhamento. · meios adequados para suportar rigidamente a peça e a ferramenta.

O material da peça usinada também pode influenciar na rugosidade. A composição química, dureza, microestrutura e a consistência metalúrgica são fatores que podem afetar o acabamento superficial. Em geral, o acabamento superficial é melhorado com:

· uma composição química que desfavorece o aparecimento da APC. · alta dureza e baixa ductilidade. · granulação fina e alta dureza dos microconstituintes. · alta consistência nas propriedades (ao longo de toda seção transversal).

Materiais mais resistentes, suportam maiores velocidades, permitindo a eliminação da APC. Assim, metais duros e cerâmicos são melhores que HSS e aço carbono. A condutividade térmica da cerâmica é menor do que o metal duro e,

227

portanto a temperatura na interface cavaco ferramenta será maior para a cerâmica, o que reduz a APC e melhora o acabamento da superfície usinada ( Ansell e Taylor, 1962).

Em aplicações onde a tenacidade é primordial para manter a aresta de corte livre de falhas, o HSS torna-se mais adequado. Quanto menor o atrito entre a peça e a ferramenta, melhor o acabamento superficial. Neste ponto, os metais duros e as cerâmicas são superiores ao HSS. Entre os dois primeiros as diferenças são pequenas.

O fluido de corte diminui o desgaste da ferramenta e o atrito entre a ferramenta e a peça ou cavaco. Tudo isto, melhora o acabamento superficial. O fluido atuando como refrigerante, entretanto, pode aumentar a força de usinagem e aumentar a rugosidade da peça. Um revestimento aplicado sobre uma ferramenta para atuar como lubrificante, ou diminuir a afinidade química entre o material da peça e ferramenta pode também contribuir para melhorar o acabamento superficial. 14.4. MEDIÇÃO DA RUGOSIDADE SUPERFICIAL

Normalmente uma superfície usinada é examinada apenas em termos de dimensões e rugosidade superficial. A peça é examinada depois da operação de usinagem, ou mesmo durante a operação, de acordo com as tolerâncias dimensionais e rugosidade especificadas no projeto. Os erros dimensionais são fáceis de medir e controlar e dependem principalmente do processo e da rigidez da máquina ferramenta utilizada. A rugosidade por sua vez pode ser avaliada por um grande número de parâmetros.

A rugosidade superficial pode ser expressa pela determinação de parâmetros obtidos a partir do perfil da superfície. Estes parâmetros podem ser classificados em:

Parâmetros de Amplitude: são determinados “apenas” por alturas dos picos, profundidades dos vales ou os dois, sem considerar o espaçamento entre as irregularidades ao longo da superfície.

Parâmetros de Espaço: são determinados “apenas” pelo espaçamento do desvio do perfil ao longo da superfície.

Parâmetros Híbridos: são determinados pela combinação dos parâmetros de amplitude e espaço.

Entre os Parâmetros de Amplitude, o mais utilizado é o parâmetro “Ra”. Matematicamente, Ra é definido como sendo o valor médio aritmético de todos os desvios do perfil de rugosidade em relação a linha média, dentro de um comprimento de medição L (ISSO 4287/1, DIN 4768). Este valor é obtido medindo-se os desvios dos picos e vales em relação a uma linha de centro. Esta linha de centro é tal que o somatório das áreas abaixo é igual ao somatório das áreas acima do traço do perfil. A figura 14.4 mostra o significado de Ra para um perfil de rugosidade.

228

Figura 14.4. Parâmetro Ra para medir o acabamento superficial. A – perfil com a linha de centro; B – porção inferior do perfil é invertida; C – Ra é a altura média do perfil (Dagnall, 1986).

Ra é um parâmetro de controle de processo, se o seu valor alterar isto significa que o processo de fabricação também alterou. É um parâmetro muito utilizado pela industria e está disponível nos instrumentos mais simples e mais baratos de todos os fabricantes. Como é um valor médio, ele é um parâmetro estável e não é influenciado por efeitos ocasionais. Assim o parâmetro Ra isolado não é suficiente para identificar algumas características importantes da superfície, pois superfícies geometricamente bastante diferentes podem ter Ra bem próximos, mas desempenhos diferentes. A figura 14.5 ilustra perfis de superfícies diferentes que poderiam ter o mesmo valor de Ra.

Figura 14.5. Figura ilustrativa de diferentes superfícies com o mesmo valor de Ra (adaptado de Dagnall, 1986)

229

Outro parâmetro que se baseia na altura dos picos do perfil num determinado comprimento de amostragem é a rugosidade Rq, chamado de desvio médio da raiz quadrada da linha média. Pela definição matemática deste parâmetro, ele tem o efeito de ampliar os valores dos picos e vales isolados ou esporádicos, podendo assim evidenciar defeitos ou marcas em superfícies bem acabadas, como em superfícies de espelhos e lentes.

Em alguns casos é desejável ou necessário especificar a altura máxima da rugosidade (ou seja distância entre pico e vales do perfil). Neste caso, outro parâmetro, também comum em usinagem, é distância vertical máxima entre o pico mais elevado e o vale mais profundo no comprimento de amostragem, Rt. É um parâmetro que pode ser influenciado por qualquer sujeira ou irregularidade na superfície. Outro parâmetro similar a este é a rugosidade Rz, que é a média das rugosidades Rt para cinco intervalos no comprimento de amostragem. Este parâmetro é mais estável que Rt por ser um valor médio.

Além dos parâmetros definidos nos parágrafos anteriores destacam-se outros parâmetros estatísticos utilizados para avaliar a rugosidade de uma superfície. Pode-se calcular por exemplo a Kurtosis (Rku) e a Skewness (Rsk) de um perfil. Se a distribuição da amplitude de um perfil tiver uma forma gaussiana balanceada, o valor de Rku será próximo de 3. Uma superfície acidentada e áspera terá Rku menor que 3, enquanto que superfícies com muitos picos o valor será maior que 3. Uma superfície retificada, por exemplo, com um rebolo afiado, teria Rku igual a 3. A Kurtosis é uma medida da aspereza da superfície. A Skewness por sua vez, mede a simetria do perfil em relação a linha média. Este parâmetro indica se as irregularidades da superfície obtida na fabricação são em maioria picos ou vales, como ilustra a figura 14.6.

(a) (b)

Figura 14.6. Comparação entre duas superfícies com diferentes valores de Skewness: (a) Rsk positivo, (b) Rsk negativo (Smith, 2002)

Inúmeros outros parâmetros são definidos para medir a rugosidade, a escolha do parâmetro a ser utilizado depende da aplicação da superfície. Os parâmetros definidos anteriormente podem ser calculados para uma operação teórica. Na situação da figura 14.3, os valores de Ra e Rt quando o avanço f é menor que o raio de ponta rn da ferramenta, são dados por:

nnr

f

r

fRa

.2,31.318

22

== (14.1) n

tr

fR

.8

2

= (14.2)

230

A seguir são definidos teoricamente os parâmetros Ra e Rt para outras situações teóricas em função da geometria da ferramenta e avanço.

Torneamento

a) Ferramenta sem raio de ponta (Figura 14.7.a):

)cot(tan4 es

fRa

qq += (14.3)

es

t

fR

qq cottan += (14.4)

b) Ferramenta com raio de ponta (Figura 14.7b):

Quando o avanço é maior que o raio de ponta (Figura 14.7b)

( ) ( ) 2/1423 sen.sen...2cos.sen.cos1 eeneenet frffrR qqqqq --+-= (14.5)

Fresamento Tangencial (Figura 14.8):

R

fRa d

.318

2

= (14.6) R

fR d

t.8

2

= (14.7)

R = raio da fresa, fd = avanço por dente.

Fresamento Frontal (Figura 14.9):

2

2

2

2 ÷ø

öçè

æ--

=

znn

a

frr

R (14.8) DC

fR d

tcottan +

= (14.9)

a) Ferramenta sem raio de ponta b) Ferramenta com raio de ponta, (f > rn)

Figura 14.7. Perfil teórico de superfícies usinadas por torneamento.

qs qe

f ferramenta

Rt

f

Rt

ferramenta

rn

231

R Rt

f z avanço

por dente

Figura 14.8. Perfil teórico de uma superfície usinada por fresamento tangencial.

Figura 14.9. Perfil teórico de superfície usinada por fresamento frontal.

Normalmente o valor real do acabamento superficial é sempre maior que o teórico porque o valor teórico não leva em consideração vibrações, possíveis APC, etc. No entanto, partículas provenientes da APC podem preencher os vales da superfície e assim o valor real pode ser inferior que o valor teórico (Reis, 2001).

14.5. ALTERAÇÕES SUB-SUPERFICIAIS

Durante a usinagem, o processo de remoção de cavaco cria uma superfície com uma camada bastante diferente do interior. A identificação das alterações na superfície é de suma importância, principalmente em componentes que trabalharão sujeitos a altas tensões, em particular tensões alternadas (tração-compressão). É também importante para componentes que irão trabalhar à altas temperaturas e em

D

C fz

peça

ferramenta

Rt

232

atmosferas corrosivas, porque a resistência à fluência e outras propriedades mecânicas podem ser afetadas por alterações sub-superficiais. As principais alterações causadas tanto na usinagem convencional, como na usinagem não convencional são (Juneja e Swkhon, 1987; Drozda e Wick, 1983; Turkovich e Field, 1981; Field et al, 1972):

Fatores Mecânicos

Deformação Plástica: alteração bastante comum na usinagem “pesada”. Consiste da deformação plástica na superfície do componente e pode ser facilmente identificado pelas estruturas metalúrgicas alongadas na direção do fluxo de deformação.

Rebarbas Deformadas Plasticamente: podem ser fragmentos da APC. Na retífica, isto é criado pelo rebolo abrasivo durante a ação de corte dos grãos. Esta alteração, geralmente, influencia o acabamento superficial (rugosidade).

Microdureza: pode aumentar pela formação de martensita não-revenida, ou deformação abaixo da temperatura de recristalização. Pode diminuir pelo super-revenimento da martensita.

Trincas: micro ou macrotrincas podem ocorrer durante a usinagem convencional ou não-convencional. Tendem a aparecer com mais freqüência em materiais frágeis. Microtrincas são prejudiciais à fadiga e à corrosão sob tensão, portanto devem ser evitadas.

Tensões Residuais: pode ser de tração ou compressão, alta ou baixa, rasa ou profunda. A tensão de compressão é benéfica. A tensão residual introduzida por usinagem é fortemente influenciada pelo desgaste da ferramenta.

Fatores Metalúrgicos

Recristalização: qualquer metal cujas superfícies são deformadas plasticamente durante a operação de usinagem, pode sofrer recristalização quando aquecida a temperaturas superiores à temperaturas de recristalização.

Transformação de Fases: as altas temperaturas desenvolvidas durante a usinagem podem promover a transformação de fase na superfície dos componentes usinados. Na usinagem dos aços, pode ocorrer a formação de martensita frágil e não-revenida. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Ansell, C. T., Taylor, J. “The Surface Finishing Properties of a Carbide and

Ceramic Cutting Tool”, Proceedings of the 3rd International MTDR Conference, Advances in Machine Tool Design and Research, University of Birmingham, Sep., pp 225-243, 1962.

2. Backer, W. R., Marshall, E. R., Shaw, M. C. “The Size Effect in Metal Cutting”, Trans. of ASME, vol 74, pp 61-71, 1952.

3. Buttery, T. C., Archard, J. F. “Grinding and Abrasive Wear”, Proc. Instn, Mech. Engrs., vol 185, n 43, pp 537-551, 1970-71.

233

4. Dagnall, H. “Exploring Surface Texture”, 2nd edition, Rank Taylor Hobson Limited, England, 1986.

5. DROZDA, T.J.; WICK, C. “Tools and Manufacturing Engineers Handbook”, vol. 1: Machining, SME, 1983, pp.21-40.

6. FIELD, M.; KAHLES, J.F.; CAMMET, J.T. “A Review of Measuring Methods for Surface Integrity”, Annals of the CIRP, vol. 21, 1972, pp. 219-238.

7. JUNEJA, B.L.; SWKHON, G.S. “Fundamentals of Metal Cutting and Machine Tools”, John Wiley & Sons, New Delhi, India, 1987, 462 pags., ISBN 0-470-20860-0.

8. NAKAYAMA, K.; SHAW, M.C.; BREWER, R.C. “Relationship Between Cutting Forces, Temperature, Built-up Edge and Surface Finish”, Annals of CIRP, vol. 14, 1966, pp. 211-223.

9. Reis, A. M. “Influência do Ângulo de Posição Secundário da Ferramenta, Raio de Ponta e Lubrificação na Usinagem em Presença de Aresta Postiça de Corte”, Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Uberlândia, MG, 90 pags, 2000.

10. SATA, T. “Surface Finish in Metal Cutting”, Annals of the CIRP, vol. 12(4), 1963, pp. 190-197.

11. SCHAFFER, G.H. “The many Faces of Surface Texture”, American Machinist and Automated Manufacturing, June 1988, pp. 61-68.

12. SHAW, M.C. “Metal Cutting Principles”, Oxford Science Publication, New York, 1984, 594 pags, ISBN 0-19-859002-4.

13. SHOUCKRY, A.S. “The Effect of Cutting Conditions on Dimensional Accuracy”, Wear, vol. 80, 1982, pp. 197-205.

14. Smith, G. T. “Industril Metrology: Surface and Roundness”, Springer, 2002. 15. VON TURKOVICH, B.F.; FIELD, M. “Survey on Material Behavior in Machining”,

Annals of CIRP, vol. 30(2), 1981, pp. 533-540. 16. Whitehouse, D. J. “Review Article: Surface Metrology”, Meas. Sci. Technol., n 8,

pp 955-972, 1997.

234

C A P Í T U L O 1 5

ENSAIOS DE USINABILIDADE

15.1. INTRODUÇÃO

A usinabilidade pode ser considerada uma propriedade do material, mas a medida da usinabilidade depende dos parâmetros considerados. Em outras palavras, a ordem no ranking de usinabilidade de um número de materiais pode não ser o mesmo, quando obtidos em condições diferentes. Por isto, Trent [1] sugere que a usinabilidade não é uma propriedade, mas o “modo” do material se comportar durante a usinagem. Desta forma, usinabilidade é muito mais uma função do teste e não uma função de uma ou mais propriedades do material. “Em termos gerais, usinabilidade pode ser definida como sendo uma grandeza que indica a facilidade ou dificuldade de se usinar um material”.

Forças de corte, energia requerida na usinagem, vida da ferramenta, acabamento superficial, taxa de desgaste, temperatura de corte, controle do cavaco (disposição do cavaco), e mesmo algumas propriedades físicas , etc... são variáveis que podem ser consideradas como medida de usinabilidade. Porém, o processo ainda é um pouco mais complexo. Por exemplo: se a vida da ferramenta, baseada em uma certa quantidade de desgaste, é selecionada como o critério de usinabilidade, ainda é necessário especificar como isto é medido (forma de desgaste, parâmetro que é medido), o tipo de ferramenta de corte utilizada, as condições de corte, etc. Tudo isto deve ser selecionado arbitrariamente. Por isto que usinabilidade é uma função do teste, e qualquer número de usinabilidade deve acompanhar uma descrição completa do teste. Sem esta informação adicional, este número não tem significado.

Deve-se salientar que a usinabilidade não é usada apenas para quantificar a facilidade ou dificuldade de se usinar materiais. Ela pode ser usada também para quantificar a performance de ferramentas de corte, de fluidos de corte e geometrias de ferramentas. As mesmas dificuldades citadas acima são encontradas nestes casos também.

A maioria dos resultados de teste de usinabilidade publicada na literatura foram resultados de testes de torneamento, e apesar de algumas características poderem ser comuns a mais de um processo, é aconselhável não fazer extrapolações para diferentes processos.

Uma grande contribuição de ensaios de usinabilidade é a possibilidade de geração de banco de dados de usinagem, que é uma tarefa árdua mas de grande contribuição prática. A maior dificuldade de geração de banco de dados está na existência de quantidades muito grande de materiais de processamento em geral e de materiais de ferramentas. Além disso, para se ter um banco de dados confiável, deve-se utilizar critérios e procedimentos padronizados para que os dados gerados sejam transferíveis e que possa realmente ser utilizados em princípio, sem restrições. Infelizmente, em usinagem não se pode confiar integralmente nas informações contidas em bancos de dados, mas eles são extremamente úteis no

235

ponto de partida para uma determinada aplicação. Assim, por meio de ensaios de usinabilidade pode-se catalogar resultados e gerar informações práticas preciosas do ponto de vista de chão de fábrica. Informações deste tipo são encontradas nos catálogos dos principais fabricantes de ferramentas de corte do mercado mundial. Entretanto, talvez o mais completo banco de dados de usinagem já publicado está no "Machining Data Handbook" [2] do Machinability Data Center do IAMS (Institue of Advanced Manufacturing Sciences, Inc). 15.2. TIPOS DE TESTES DE USINABILIDADE

Segundo Mills e Redford [3] os testes de usinabilidade podem ser classificados da seguinte maneira:

Dois Grupos: · Requer usinagem · Não requer usinagem

Dois Sub-Grupos: · Ranking testes - R · Testes absolutos - A

Os Ranking Testes, ou testes classificatórios, são aqueles que meramente indicam a usinabilidade relativa de duas ou mais combinações de pares ferramenta-peça, para uma dada condição de corte.

Os Testes Absolutos são aqueles que indicam os méritos relativos de duas ou mais combinações de pares ferramenta-peça para uma dada faixa de condições de corte.

No primeiro sub-grupo, os resultados podem ser bastante úteis, mas os testes em si têm duas desvantagens principais. Primeiramente, um teste particular pode indicar que material “A” usina melhor que o material “B”, que por sua vez usina melhor que o material "C", entretanto, na maioria dos casos, não há indicação da magnitude da diferença entre eles, porque a medida da usinabilidade não foi relacionada com escalas previsíveis, tal como a vida da ferramenta para uma determinada condição de corte. Em segundo lugar, mesmo se o teste tem o objetivo de comparar usinabilidade de materiais da peça para uma determinada condição de corte, não existe garantia que quando as condições de corte se alterarem, o ranking permanecerá o mesmo.

Os testes absolutos são geralmente válidos para várias velocidades de corte (Equação de Taylor simples), certamente sobre uma faixa prática de variação, podendo, em outros casos, também levar em consideração mudanças nas outras condições de corte e geometria da ferramenta (neste caso a Equação de Taylor expandida).

Os testes que não requerem usinagem são sempre Ranking Testes. Os que requerem usinagem podem ser Ranking ou Absolutos. De acordo com o tempo eles podem ser classificados em:

236

· Curta duração · Longa duração

Os ranking testes são sempre de curta duração.

Os testes absolutos são quase sempre de longa duração.

Exemplos de testes que não requerem usinagem:

A letra “R” indica que o teste é um ranqueador, e a letra “A” indica que o teste é absoluto.

· Teste de composição química – R

Este tipo de teste, indica que ao se conhecer a composição química do material, pode-se relaciona-la a uma medida de usinabilidade. Czaplicki [4], citado por Mills e Redford [3], encontrou a seguinte relação para a velocidade de corte para uma vida de 60 min no torneamento de aços, com ferramentas de metal duro:

Vc60 = 161.5 – 141.4 x %C – 42.4 x %Si – 39.2 x %Mn – 179.4 x %P + 121.4 x %S (15.1)

O autor reivindica uma precisão de ± 8%, entretanto, a faixa de materiais e seus tratamentos térmicos são bastantes restritos.

Boulger et alli [5], também citado por Mills e Redford [3] encontrou a relação 15.2 para expressar a usinabilidade de aços de livre-corte.

Índice de usinabilidade = 146 – 400 x %C – 1500 x %Si + 200 x %S (15.2)

· Teste de microestrutura – R

· Outra maneira de classificar a usinabilidade dos materiais é por meio da sua microestrutura. A Tabela 15.1 mostra a relação entre a microestrutura de aços carbono e parâmetros de medida de usinabilidade . Este trabalho foi desenvolvido por Zlatin e Fields [6], citado por Mills e Redford [3]. Nota-se que um aço com 50% de perlita consegue agregar boa usinabilidade com razoável dureza.

· Teste de propriedades físicas - R

Algumas relações entre a medida da usinabilidade de materiais metálicos e suas propriedades já foram desenvolvidas. Henkin e Datsko [7], citado por Mills e Redford [3], usou técnicas de análise dimensional e obteve a seguinte relação:

100160

RC

A

HBL

BV -

·

µ · (15.3)

onde, B = Condutividade térmica do material L = um comprimento característico

237

HB = Dureza Brinell do material Ar = redução de área obtida em ensaio de tração convencional.

Relação similar foi apresentada por Janistky [8], citado por Mills e Redford [3].

rC

AHB

DV

·

µ60 (15.4)

onde, D = Constante que depende das dimensões do corte.

Tabela 15.1. Efeito da microestrutura na usinabilidade dos aços [6]

Tipo de microestrutura Dureza Brinell Vc20 [m/min]

10% - perlita e 90% ferrita 100 – 120 290

20% - perlita e 80% ferrita 120 – 140 260

25% de perlita esferoidizada 160 – 180 180

50% - perlita e 50% ferrita 150 – 180 150*

75% - perlita e 25% ferrita 170 – 190 140

100% perlita 180 – 220 145

Martensita revenida 280 – 320 105

Martensita revenida 370 – 420 46 * Valor estimado

Exemplo de testes que requerem usinagem:

· Teste de pressão (Ff) constante – R

Este teste foi proposto por Boulger et alli [9], citado por Mills e Redford [3] e pode ser usado tanto na furação como no torneamento. Pela maior simplicidade, o processo de furação é o mais utilizado. É um teste de curta duração e consiste em aplicar uma força de avanço, Ff constante e medir o tempo para se furar uma chapa de espessura fixa, ou fixar um determinado tempo e medir o percurso de avanço. A força de avanço constante pode ser facilmente conseguida em uma furadeira de coluna ou de bancada, por meio de uma roldana com um cabo de aço e um prato com pesos adaptado no eixo de avanço da máquina.

· Teste de faceamento rápido - R

Este teste foi proposto por Kraus e Weddell [10] e Lorenz [11], citados por Mills e Redford [3], e é outro teste prático e de curta duração, que consiste em facear um disco do centro para a periferia, normalmente com ferramenta de aço-

238

rápido. Com este procedimento, a velocidade de corte vai aumentando constantemente, até atingir o ponto crítico onde promove o colapso da ferramenta. Este colapso é nitidamente observado por uma simples análise na superfície usinada. A medida de usinabilidade pode ser o tempo para a falha da ferramenta, ou o percurso de avanço até atingir a falha.

· Teste de torneamento cônico – A

Este teste foi proposto por Heiginbotham e Pandey [12], citado por Mills e Redford [3] e é classificado como absoluto, porém considerado de curta duração. Neste tipo de teste utiliza-se uma peça de perfil cônico para ser usada em torneamento, iniciando no diâmetro menor para o maior do cone. Este procedimento permite um aumento progressivo da velocidade de corte, acelerando assim o final da vida da ferramenta, de acordo com um critério pre-estabelecido. Conhecendo-se as velocidade de corte inicial e sua taxa de crescimento ao longo do tempo, o desgaste de flanco da ferramenta e com a execução de dois testes, pode-se levantar as constantes da equação de Taylor. Resultados obtidos por este método se apresentam em concordância muito grande com testes de usinabilidade de longa duração descrito abaixo.

· Teste da taxa de desgaste - A (Taylor)

O melhor exemplo de teste absoluto de longa duração é o teste de vida da ferramenta, com ferramenta de tornear monocortante, especificado pela norma ISO 3685 de 1977 [13]. O objetivo desta norma é assegurar que testes sejam realizados em condições padrões para se ter dados compatíveis de fontes diferentes. Os resultados, são geralmente apresentados usando a equação de Taylor.

Maiores detalhes desses testes de usinabilidade podem ser encontrados em [3 e 4]. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. TRENT, E.M. “Metal Cutting”, 2nd Edition, Butterworths, 1984, 245 pags, ISBN -

0-408-108568. 2. IAMS, "Machining Data Handbook", 3rd Edition, Machinability Data Center , IAMS

- Isntitute of Advanced Manufacturing Sciences, Inc., Cincinnati, Ohio, USA, 1980.

3. MILLS, B.; REDFORD, A.H. “Machinability of Engineering Materials”, Applied Science Publishers, London, 1983, 174 pags, ISBN 0-85334-183-4.

4. CZAPLICKI, L. “L’usinabilite et al Coupe des Metaux”, Res. Soc. Roy. Belge Ingeniere, 12, 1962, pp 708 – 736.

5. BOULGER, F.W.; MOORHEAD, H. and GAVEY, T.M., “Superior Machinability of MX Steel Explained”, Iron Age, 167, 1951, pp 90 – 95.

6. ZLATIN, N. FIELD, M., “Evaluation of Rolled Steels, Forging and Cating Irons”, In; Machining Theory and Practice, ªS.M., Cleveland, Ohio, USA, 1950.

7. HENKIN, A. and DATSKO, J., “The Influence of Phisical Properties on Machinability”, Trans. A.S.M.E., Journal of Engineering for Industry, Novenber 1963, pp 321 – 327.

239

8. JANITZKI,.E.J., “Machinability of Plain Carbon Alloy and Austenitic Steels and its Relation to Yield Stress Ratios when Tensile Strengths are Similar”, Trans. A.S.M.E., 66, 1944, pp 649 – 652.

9. BOULGER, F.W.; SHAW M.C and JOHNSON, H.E.,”Constant Pressure Lathe test for Measuring Machinability of Free Machining Steels”, Trans. A.S.M.E., 71, 1949, pp 431 – 438.

10. KRAUS, C.E. and WEDDEL, R.R., “Determining the Tool Life Cutting Speed Relatioship by Facing Cuts”, A.S.M.E., Fall Meeting , Erie, Pennsylvania, USA, Oct. 4 – 6, 1937.

11. LORENZ, G., “Determination of Comprehensive Machinability Equations by Means of Rapid Facing Tests”, S.M.E., MR, 1970, pp 70 – 177.

12. HEGINBOTHAM, W.B. and PANDEY, P.C., “Taper Turning Tests Produce Reliable Tool Life equation”, Proc. 7th M.T.D.R. Conf., 1966, p 515.

13. ISO “Tool Life Testing with Single-Point Turning Tools”, ISO 2685, 1997

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C A P Í T U L O 1 6

CONDIÇÕES ECONÔMICAS DE CORTE

16.1. INTRODUÇÃO

Numa produção em série é necessário saber quais as condições de usinagem que vão gerar um mínimo custo de fabricação, ou seja, a determinação das condições econômicas de corte. Um aumento da velocidade de corte e avanço vão resultar em maior produção, ou seja, redução do tempo de horas trabalhadas por peça, o que implica num custo de fabricação menor. Por outro lado, maiores velocidades de corte e avanços irão aumentar o número de ferramentas gastas por peça, pois o desgaste das ferramentas é aumentado.

Assim, na fabricação de um determinado lote de peças devem ser selecionados os seguintes fatores:

· velocidades de corte · avanços · profundidade de corte · material e geometria da ferramenta · fluido de corte

Estes fatores devem proporcionar um aumento na economia na fabricação da peça.

A escolha das condições de usinagem deve ser feita através de uma análise dos diversos fatores relacionados com o tempo total e o custo total envolvidos no processo.

O tempo total de fabricação por peça pode ser dividido em vários tempos, segundo as várias etapas de fabricação. De uma maneira geral, este tempo total é composto de [1]:

· tempo de operação, e · tempo improdutivo.

De maneira semelhante o custo total de fabricação por peça é composto de:

· custo de usinagem por peça · custo do tempo improdutivo da peça · custo da ferramenta por peça.

O tempo improdutivo e o custo do tempo improdutivo envolvem várias etapas de fabricação e dependem de cada caso [2]. 16.2. VELOCIDADE DE CORTE E A TAXA DE PRODUÇÃO

Como foi dito anteriormente o tempo total de usinagem pode ser escrito como:

241

t t tt c= + 1 t t t1 2 3= + (16.1)

onde: tt - tempo total de usinagem por peça tc - tempo de operação propriamente dito t1 - tempo improdutivo (colocação, fixação e retirada da peça, tempo de troca e afiação da ferramenta). t2 - tempo de colocação, fixação e retirada da peça. t3 - tempo de troca e afiação da ferramenta.

A Figura 16.1 representa o comportamento destas variáveis em função da velocidade de corte. O ponto de mínimo na curva tt corresponde à velocidade de máxima produção (vcm).

3

Figura 16.1. Comportamento das variáveis de tempo de fabricação por peça com a velocidade de corte.

Lembrando que a vida da ferramenta de corte é obtida através da equação de Taylor:

T v Kcx. = (16.2)

quando aplicarmos à equação 16.1, devemos obter o tempo total de confecção por peça, tt, em função da velocidade de corte, do avanço, profundidade de corte e qualquer parâmetro que influencie os coeficientes x e K da equação 16.2. Se admitirmos que o avanço e a profundidade de corte sejam preestabelecidos, e os coeficientes não variam, obteremos o tempo tt em função da velocidade de corte vc, o qual para a máxima produção deve ser mínimo. Obteremos assim a velocidade para a máxima produção, vcm.

Esta velocidade também pode ser obtida experimentalmente através de um gráfico da taxa de produção (peças/hora) em função da velocidade de corte. A Figura 16.2 ilustra um gráfico demonstrativo que mostra como seria a curva da taxa de produção em função da velocidade.

242

Figura 16.2. Variação da taxa de produção em função da velocidade de corte [1]. 16.3. VELOCIDADE DE CORTE E O CUSTO DE PRODUÇÃO

Para velocidades de corte baixas o custo de produção por peça é alto, pois a produção é baixa e o tempo total é alto. Aumentando a velocidade de corte o custo de produção começa a cair até atingir um mínimo. A partir daí o custo começa a aumentar porque o desgaste das ferramentas também aumenta.

Define-se velocidade econômica de corte, vc n, como sendo a velocidade para a qual o custo de fabricação por peças é mínimo [2]. Para se determinar esta velocidade necessita-se determinar primeiramente os custos de produção. Os quais podem ser divididos em:

C - custo total da peça Mc - custo da usinagem por peça (hora/máquina, mão de obra, etc) Dc - custo de tempo improdutivo por peça (retirada e colocação da peça,

preparação da máquina, etc) Tc - custo da ferramenta mais custo de troca por peça.

Daí:

C M D Tc c c= + + (16.3)

A Figura 16.3 representa o comportamento destas variáveis com a velocidade de corte.

243

Figura 16.3. Comportamento das componentes de custo com a velocidade de corte.

O custo de fabricação por peça, vai depender da vida da ferramenta, ou seja, novamente aplicando a equação de Taylor (16.2), teremos a equação 16.3 em função da velocidade de corte (considerando constantes x e K).

A curva de custo total de fabricação por peça em função da velocidade de corte ilustrada na Figura 16.4, apresenta um ponto de mínimo que corresponde à velocidade econômica de corte vcn, definida como velocidade de corte para um custo mínimo.

Figura 16.4. Variação do custo de fabricação em função da velocidade de corte.

Este gráfico pode ser obtido também de maneira experimental, avaliando o custo total por peça para várias velocidades de corte. 16.4. COMBINAÇÃO DA TAXA DE PRODUÇÃO E CUSTO EM FUNÇÃO DA VELOCIDADE DE CORTE

Se plotarmos num mesmo gráfico as curvas de taxa de produção e custo de produção versus velocidade de corte, obteremos entre as duas velocidades determinadas anteriormente, velocidade de máxima produção, Vcm, e a velocidade

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econômica de usinagem, Vcn, um intervalo de velocidades de corte de máxima eficiência. Como é mostrado na Figura 16.5.

Figura 16.5. Intervalo de máxima eficiência.

É muito importante que as velocidades de corte utilizadas estejam compreendidas neste intervalo. 16.5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Deve ser avaliado também a influência dos seguintes parâmetros na determinação de vc n e vc m [2]:

· avanço · profundidade de corte · parâmetros x e K da equação de Taylor · número de ferramentas

Deve ser estudada também a possibilidade do emprego de uma ferramenta de corte mais eficiente, ou seja uma ferramenta que pode trabalhar à uma velocidade de corte mais alta e gera um tempo improdutivo baixo no processo. Além disso uma ferramenta de corte mais eficiente possibilita uma maior produção. Esses fatores devem entrar em confronto com o custo da ferramenta, pois uma ferramenta de corte mais eficiente tem custo mais elevado.

O custo por peça de um lote depende do tamanho do lote. A Figura 16.6 apresenta a curva que evidencia isso. Nota-se que para lotes pequenos o custo por peça é alto principalmente porque os custos de preparação que são diluídos para cada componente, têm pesos muito grandes. Para grandes números de peças, o tamanho do lote influi pouco no custo por peça, observando que a curva tende a convergir para um preço fixo baixo.

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Figura 16.6. Custo de fabricação por peça versus tamanho do lote [1].

A aplicação de uma ferramenta mais eficiente deve ser analisada cuidadosamente. A definição de uma ferramenta mais eficiente não é somente aquela que produz maior número de peças na unidade do tempo enquanto em operação, mas é também aquela que resulta em menor tempo de parada para troca da ferramenta. O gráfico da Figura 16.7 mostra a taxa de produção de duas ferramentas, sendo que a ferramenta 2 é mais eficiente que a ferramenta 1. A taxa de produção da ferramenta 1 e 2 são respectivamente P1/t1 e P2/t2. O tempo de parada para troca de ferramenta são designados por Dt1 e Dt2. As linhas tracejadas da figura representam a taxa de produção, descontando as paradas para troca de ferramenta. Assim, pode-se aumentar a taxa de produção usando-se uma ferramenta com taxa de produção maior e/ou diminuindo o tempo para troca da ferramenta (usando um sistema de troca rápida eficiente, por exemplo).

Figura 16.7. Taxa de produção de duas ferramentas diferentes [1].

Como, geralmente, o custo da ferramenta mais eficiente é mais cara, torna-se necessário fazer uma análise do que se convencionou chamar de “ponto de equilíbrio” [1]. A Figura 16.8 apresenta o gráfico do ponto de equilíbrio de duas ferramentas diferentes. A ferramenta 2 é mais cara que a ferramenta 1, como indicado pelos custos Ct2 e Ct1, respectivamente, mas produz a uma taxa mais eficiente como observado pela inclinação da curva. A quantidade de produção r1 define a faixa onde não seria econômico utilizar a ferramenta 1, muito menos a ferramenta 2, porque o investimento inicial não é recomposto, pois o número de peças é pequeno para contrabalançar o custo das ferramentas. O ponto n1 define o número de peças do lote em que o uso da ferramenta 1 passa a ser

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economicamente vantajoso, isto é, além deste ponto, a ferramenta 1 passa a gerar lucros. Na faixa r2, a utilização da ferramenta 1 é mais vantajosa que a ferramenta 2, pois os lucros são maiores com a utilização dessa ferramenta. A ferramenta 2 só passa a gerar lucros no ponto n2. No ponto n1,2 o ganho é o mesmo para as duas ferramentas, e este ponto é definido como o ponto de equilíbrio. Além desse ponto (faixa r3) é mais vantajoso usar a ferramenta 2.

Figura 16.8. Ponto de equilíbrio para duas ferramentas diferentes [1].

A Figura 16.9 apresenta o resultado de um exemplo numérico [1], onde a ferramenta 1 custa US$100,00 e permite uma margem de lucro de US$ 0,20 por peça, enquanto a ferramenta 2 custa US$200,00 com a margem de lucro de US$0,25 por peça. Desta maneira, n1 é igual a 500 peças (100/0.20) e n2 é igual a 800 peças (200/0.25) e o ponto de equilíbrio n1,2 é igual a 2000 peças [(200 – 100)/(0.25 – 0.20)]. Nota-se que a margem de lucro vai aumentando e a diferença entre a utilização das duas ferramentas também, à medida que o número de peças do lote aumenta. Para 4000 peças essa diferença atinge a cifra de US$100,00.

Figura 16.9. Gráfico do ponto de equilíbrio para as duas ferramentas do exemplo acima.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. GORCZYCA, F.E. “Aplications of Metal Cutting Theory”, Industrial Press, NY, 1987, 298 pags.

2. FERRARESI, D. “Fundamentos da Usinagem dos Metais”, Ed. Blücher Ltda., SP, 1977, 751 pags.

248

C A P Í T U L O 1 7

CONSIDERAÇÕES AO MATERIAL DA PEÇA

No capítulo 10 foi verificado que alta resistência com suficiente tenacidade são desejáveis nas ferramentas de corte para garantir a elas uma vida razoável. Por outro lado, do ponto de vista do material da peça, os papéis se invertem, ou seja, para se obter uma vida razoável na ferramenta de corte, o material da peça deve possuir, geralmente, baixa resistência e baixa tenacidade.

Para se usinar com baixas forças de corte, baixas tensões, baixas temperaturas de corte e portanto pequenas taxas de desgaste e boa usinabilidade, são desejáveis as seguintes propriedades nos materiais da peça [1]:

· baixa dureza · baixa ductilidade · baixo limite de escoamento · baixo índice de encruabilidade · alta condutividade térmica · baixa reatividade química com a ferramenta e com a atmosfera · baixa tenacidade · sem tendência à formação de APC.

Infelizmente baixa dureza é geralmente associada a alta ductilidade, que é indesejável, porque promove grandes comprimentos de contatos cavaco-ferramentas, grandes forças de usinagem e pobres acabamentos superficiais. Desta forma, tem que existir um equilíbrio entre essas duas propriedades.

Na seleção de um material, geralmente, boa usinabilidade é um fator secundário quando comparado com outras propriedades requeridas. Entretanto, onde não for comprometedor, deve-se buscar sempre o melhoramento de uma ou várias propriedades das citadas acima, mesmo que isto represente sacrifícios em outras propriedades. Por exemplo, a adição de elementos/componentes como sulfetos, chumbo, selênio, telúrio e grafite, sempre aumentará a usinabilidade enquanto que adição de partículas abrasivas duras como carbonetos, nitretos ou carbonitretos, são sempre prejudiciais, pois eles aumentarão o desgaste abrasivo da ferramenta de corte.

A seguir, será apresentado um resumo do comportamento em usinagem dos diversos materiais metálicos. Essa apresentação seguirá uma ordem crescente de usinabilidade, ou seja, apresentar-se-á os mais difíceis de se usinar primeiro, até chegar nos materiais de ótimas características de usinabilidade. 17.1. NÍQUEL E SUAS LIGAS

As principais propriedades das ligas de níquel são alta resistência mecânica à temperaturas elevadas, alta resistência à fluência, alta resistência à fadiga e boa resistência à corrosão. As principais aplicações são na indústria aeronáutica, nos componentes que trabalham a altas temperaturas (> 500o C), como pás e discos de

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turbinas, câmaras de combustão, etc. As ligas de níquel tem estrutura CFC, e as boas propriedades à elevadas temperaturas são obtidas por:

I. precipitação de fases gama primária (g‘), que também são CFC, composto de Ni3Al;

II. soluções sólidas, sendo que os principais elementos são o Cr e o Co; III. precipitação de carbonetos. Os principais são de Cr, Ti, Mo, W, Fe e Nb.

Os principais problemas na usinagem das superligas de níquel são:

a) Possuem matrizes austeníticas e como os aços inoxidáveis, eles encruam rapidamente durante a usinagem. Isto pode causar problemas em passes subsequentes;

b) A alta resistência dessas ligas são mantidas à elevadas temperaturas, e isto se opõe ao processo de deformação plástica necessária para formar o cavaco;

c) Esses materiais tem a tendência de reagirem com as ferramentas, em determinadas condições atmosféricas;

d) Tendências desses materiais se aderirem (caldearem) nas superfícies das ferramentas. Isto é mais crítico no processo de fresamento, pois a ferramenta ao sair do corte, mantém consigo o cavaco aderido à sua superfície de saída o que além de prejudicar o acabamento superficial, causa lascamento de ferramenta na reentrada do corte;

e) Tendências das ligas formarem APC à velocidades de corte baixas, o que causa pobres acabamentos superficiais;

f) A presença de carbonetos duros e abrasivos na matriz dessas superligas aumenta o desgaste das ferramentas;

g) A condutividade térmica é baixa, o que contribui para o desenvolvimento de altas temperaturas.

Todos estes fatores operando juntos ou em combinação causam altas temperaturas de corte (pode chegar a 1000oC [2]), e alta tensão de compressão na superfície de saída (pode chegar a 3.450 MPa [3]), o que leva ao desenvolvimento rápido do desgaste de flanco, cratera ou desgaste de entalhe (notch wear), dependendo da liga e das condições de corte.

Até a última década, o metal duro da classe K (ISO K10-K40) era considerado o melhor material de ferramenta para usinar as superligas. As cerâmicas disponíveis naquele tempo ainda eram muito frágeis para usinar as superligas [3,4]. Entretanto, com a introdução da nova geração de ferramentas cerâmicas, principalmente aquelas à base de nitreto de silício (incluindo os SIALONS), as aluminas + Whiskers (SiC) e as mistas (aluminas + carbonetos de titânio), o problema da falta de tenacidade foi sensivelmente reduzido, e permitiu que as cerâmicas fossem utilizadas na usinagem destas ligas, proporcionando um aumento de 14 vezes na taxa de remoção de material comparando com o metal duro (15 cm3/min para o metal duro, contra 215 cm3/min para SIALON [5]).

Ao usar metal duro, o ângulo de saída deve ser pequeno, altos avanços e baixas velocidades de corte (» 30m/min) [4]. O desgaste de flanco é crítico, embora a cratera pode se desenvolver. Vários mecanismos de desgaste podem estar presentes, mas abrasão foi encontrada como o mais importante [6]. Trent [2] entretanto sugeriu que, devido à alta resistência das ligas de níquel, as tensões na

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zona de fluxo são muito altas, o que causa a destruição da aresta de corte por cisalhamento e deformação por tensão de compressão agindo à elevadas temperaturas.

O desgaste de entalhe, muitas vezes pode predominar e neste caso, são recomendados pequenos valores do ângulo de posição (» 45o) e ângulos de saídas negativos [7].

Uma revisão sobre a aplicação de cerâmicas na usinagem das ligas de níquel é apresentado na referência [8]. Foi destacado que com o emprego de alumina reforçada com Whiskers (SiC), velocidades de corte podem chegar à 750 m/min na usinagem de algumas ligas. Estudos mais detalhados sobre a aplicação de cerâmicas (alguns com resultados apenas individuais) foram realizados por vários pesquisadores [5, 8-15].

Geralmente, o desgaste de entalhe na altura da profundidade de corte foi o responsável pela rejeição da ferramenta de corte à velocidade de corte baixas. À velocidade de corte altas, o desgaste de flanco compete com o desgaste de entalhe, dependendo do tipo de cerâmica usado. Foi encontrado [14] que SIALONS tem maior resistência ao desgaste de entalhe do que as cerâmicas mistas (alumina + TiC), mas os resultados se invertem quando o desgaste de flanco é predominante. Em outra publicação [9] quando usinando INCO 718, as ferramentas de alumina reforçadas com Whiskers superaram as SIALONS, mas os resultados foram invertidos quando na usinagem de INCO 901. Isto sugere que o comportamento das ferramentas cerâmicas na usinagem de níquel, depende da composição da liga. No processo de desgaste, attrition pode prevalecer à velocidade de corte baixa enquanto que à alta velocidade a difusão também está presente [16].

O desgaste pode ser reduzido, com o emprego de ferramenta de CBN, mas o alto custo destas ferramentas tornam sua aplicação economicamente inviável. 17.2. TITÂNIO E SUAS LIGAS

O titânio é um metal que apresenta uma alta relação resistência/peso. Apresenta também alta resistência mecânica, e isto, assim como no caso das ligas de níquel, se mantém a elevadas temperaturas. As ligas de titânio também apresentam excelentes resistências à corrosão. A maior aplicação dessas ligas é na indústria aeronáutica, como componentes do motor ou na estrutura da aeronave, mas elas são usadas também na indústria naval, química, petroquímica, eletrônica e biomédica.

O titânio e suas ligas são classificadas em quatro grupos principais:

a) titânio puro; b) ligas alpha ou quasi-alpha; c) ligas alpha-beta; d) ligas beta.

As ligas de titânio são famosas pela dificuldade de se usinarem. Essa dificuldade aumenta com o aumento do teor dos elementos de liga e o aumento da

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fase beta. A referênica [17] apresenta uma revisão geral dos problemas relacionados com a usinagem desse importante grupo de materiais. Os principais problemas na usinagem do titânio são [17]:

a) a alta resistência mecânica se mantém à elevadas temperaturas, e isto se opõe à deformação plástica necessária para formar o cavaco.

b) o cavaco do titânio é muito fino e a área de contato cavaco-ferramenta é pequena (um terço da área de contato do aço, nas mesmas condições de corte [18]) isto causa altas tensões de compressão na ponta da ferramenta, embora as forças de corte são de valores similares às do aço [19].

c) o coeficiente de atrito cavaco-ferramenta é relativamente alto, muito embora Zlatin [19] considere similar ao encontrado na usinagem dos aços.

d) as ligas de titânio tem uma tendência muito forte de se reagirem com quase todos os materiais de ferramentas de corte disponíveis no mercado, nas temperaturas de corte (³ 500o C);

e) o processo de formação do cavaco segmentado (cisalhamento termoplástico adiabático), o baixo calor específico volumétrico, a pequena área de contato cavaco-ferramenta e a zona de fluxo fina, causam altíssimas temperaturas na ponta da ferramenta (» 1100oC);

f) a formação da APC, na usinagem de certas ligas podem provocar problemas de acabamento superficial;

g) o baixo módulo de elasticidade pode causar problemas de vibrações e deflexão; h) o titânio tem a tendência de promover a ignição, e as altas temperaturas

envolvidas em usinagem exigem certas precauções; i) eles apresentam alta taxa de encruamento, muito embora, foi sugerido [20,21]

que as ligas de titânio têm uma taxa de encruamento menor que a do aço.

Todos estes fatores operando individualmente ou em combinação causam rápido desgaste, lascamento ou mesmo falhas catastróficas (deformação plástica por compressão) nas ferramentas de corte.

Apesar de altas resistências ao desgaste e boas características de tenacidade das ferramentas de corte da nova geração, que para certos grupos de materiais elas revolucionaram a taxa de remoção de material, para as ligas de titânio, usinagem contínua sendo um problema sério.

Até hoje, a ferramenta mais indicada para atacar o problema, não é ainda da classe cerâmica, mas continua sendo o metal duro da classe K. Para a maioria dos cortes interrompidos, o aço-rápido deve ser a escolha correta, enquanto que no torneamento e no fresamento frontal as ferramentas de metal duro devem ser escolhidas. A melhor classe de metal duro encontrada [17] foi a C-2 e a pior a C-8 (código da indústria americana), que se igualam às classes K20 e PO1 (código ISO), respectivamente. Quando usinando com ferramenta da classe K o mecanismo de desgaste predominante, tanto no flanco como na superfície de saída é a difusão [22]. Neste processo, há a dissolução dos WX e a formação de TiC [23].

A participação do mecanismo de attriction também foi observada por Freeman [24]. A maior resistência das ferramentas da classe K, em relação às da classe P, são justificadas pela maior preferência de ocorrência tanto de attrition, como difusão, nas ferramentas que contém adições de TiC e TaC. À velocidade de corte elevadas,

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a deformação plástica da aresta de corte também pode ser responsável pela rejeição de ferramenta de metal duro.

As ferramentas de ultraduros PCD e CBN apresentam maiores vidas que as ferramentas de metal duro, mas assim como no caso da usinagem de níquel, o alto preço desses tipos de ferramentas, torna o custo/benefício inviável de serem cogitados. 17.3. USINAGEM DE AÇO

Os aços perfazem uma grande porcentagem dos materiais utilizados na indústria metálica, para as mais diversas aplicações, devido à suas boas propriedades mecânicas, grande disponibilidade e custo relativamente baixo. Apesar de alguns aços serem fácil de se usinarem, a maioria dos metais desse grupo são de baixa usinabilidade. Talvez, um dos maiores problemas na usinagem dos aços é a produção de cavacos contínuos e, geralmente, longos. Outros fatores também contribuem para dificultar a usinagem, entre eles, o alto ponto de fusão, as altas temperaturas desenvolvidas na superfície das ferramentas (o que acontece à uma certa distância da aresta de corte) e as altas tensões de compressão. Por causa disto tudo, uma grande quantidade de pesquisa e publicações sobre a usinagem dos aços podem ser encontrados na literatura.

Nos aços os vários constituintes microestruturais podem ser classificados em ordem crescente de dureza, da seguinte maneira [25]:

· Austenita

· Ferrita

· perlita grossa

· perlita fina

· bainita

· martensita revenida (vários níveis de dureza)

· martensita

· cementita

Como regra geral, o aço puro carbono, com teor de carbono menor que 0,3% deve estar em seu estado de maior dureza possível, para se obter uma boa usinabilidade. Isto é obtido quando ele é trefilado a frio e possui uma granulação fina. Para altos teores de carbono (C > 7%) melhores resultados de usinabilidade são obtidos quando a estrutura esferoidal estiver presente. Nos aços ligas, os elementos de liga são adicionados, geralmente, para aumentar a dureza e produzir uma matriz mais resistente, tendo uma maior tendência ao encruamento. Do ponto de vista de usinabilidade os aços ligas produzirão melhores resultados que os aços comuns ao carbono (com o mesmo teor de carbono), quando a dureza daqueles forem menores que as dos aços comuns.

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Adições de enxofre (juntamente com o manganês), chumbo ou telúrio levam à produção de aços-de-livre-corte (ou aços de corte-fácil). Os aços desoxidados com cálcio geram menos desgaste nas ferramentas de corte, do que quando a desoxidação é feita com o silício. O mecanismo preciso com que essas adições atuam, melhorando a usinabilidade, ainda não está totalmente esclarecido (possivelmente pela formação de uma camada com constituintes de menores resistências ao cisalhamento que a própria matriz), mas elas permitem velocidades de corte mais elevadas, proporcionam vidas de ferramentas maiores, melhores acabamentos superficiais, menores forças de corte, menores temperaturas de corte, menores potências consumidas e melhor controle dos cavacos [28].

As ferramentas mais utilizadas na usinagem dos aços são os aços-rápidos e o metal duro. O limite de emprego das ferramentas de aço-rápido, está na dureza de 300 HV do aço. Para as ferramentas de metal duro, este limite é maior, isto é, 500 HV [2]. Quando se usa ferramentas de aço-rápido, uma cratera se desenvolve por difusão e cisalhamento plástico superficial. À velocidades de corte mais altas, as ferramentas podem se deformarem plasticamente sobre tensão de compressão. Quando se usa metal duro WC + CO (classe K) com altas velocidades de corte, acontecerá o desenvolvimento rápido da cratera e do desgaste do flanco por difusão. Adições de TiC e TaC e NbC às ferramentas (classe P), aumentarão as suas vidas. À velocidades de corte mais elevadas, a deformação da aresta por tensão de compressão pode acontecer e o mecanismo de attrition vai prevalecer à velocidades de corte baixas [2].

Ferramentas revestidas tem sido usadas com grande sucesso na usinagem dos aços, e quando estes estão nas condições de alto endurecimento, as cerâmicas apresentam melhores resultados. O uso de ferramentas revestidas e de cerâmicas permitem o emprego de velocidades de corte bem superiores. Quando usando estas ferramentas foi sugerido [26] que o desgaste de flanco e de cratera são causados por um processo de deformação plástica superficial.

Cuidados especiais devem ser tomados na usinagem de aços-inoxidáveis. Existem 4 grupos principais de aços inoxidáveis: austenítico, ferrítico, martensítico e os endurecidos por precipitações. Eles possuem alta resistência à tração e a energia necessária para usinagem é alta. Eles possuem alto coeficiente de encruamento, principalmente os austeníticos (o que pode causar sérios problemas na usinagem em passes subsequentes) e baixa condutividade térmica, o que provoca altas temperaturas na interface cavaco-ferramenta. Carbonetos abrasivos presentes nos aços inoxidáveis altamente ligados causam rápido desgaste nas ferramentas.

Adições de enxofre, selênio e telúrio sempre melhoram a usinabilidade dos aços inoxidáveis. As ferramentas de metal duro das classes M e K são geralmente utilizados na usinagem dos aços inoxidáveis, e o desgaste de flanco por difusão limita a vida da ferramenta de corte. Quando se usa aço-rápido, uma cratera desenvolvida por difusão e por cisalhamento plástico superficial se forma rapidamente [2].

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17.4. USINAGEM DE FERRO FUNDIDO

A usinagem deste grupo de material pode variar desde muito fácil de se usinar, como no caso do ferro fundido cinzento ferrítico (HB » 120), até muito difícil de se usinar, como no caso do ferro fundido branco (HB » 550). É evidente, portanto, que como no caso dos aços, a usinabilidade dos ferros fundidos vai depender da composição química e da microestrutura. A dureza do ferro fundido cinzento, e portanto o desgaste da ferramenta, aumenta com o aumento da porcentagem de perlita e cementita. os flocos de grafita no ferro fundido cinzento diminui a ductilidade do ferro, o que ajuda a quebrar os cavacos, dando um comprimento de contato cavaco-ferramenta pequeno, relativamente baixas forças de usinagem e potência consumida, baixas taxas de desgaste e altas taxas de remoção de material. O ferro fundido nodular dá maiores vidas nas ferramentas do que os ferros fundidos cinzentos, quando usinando com ferramentas de metal duro [27].

Para a usinagem de ferros fundidos, as ferramentas de metal duro (WC + Co) da classe K são as mais utilizadas, e a vida é geralmente limitada por desgaste de flanco. À velocidade de corte relativamente baixas (mas maiores que quando usinando aços) uma APC se forma e ela é mais estável e se destaca da ferramenta com uma freqüência menor que a APC dos aços. O desgaste por attrition geralmente prevalece. À altas temperaturas de remoção do material a APC desaparece e a cratera e o desgaste de flanco se desenvolve por difusão [2]. A maior temperatura é observada na região da aresta de corte, que em combinação com as altas tensões de compressão, limita a taxa de remoção de material, devido a deformação plástica da aresta de corte. Cerâmicas à base de alumina e as SIALONS tem sido cada vez mais utilizadas para usinar ferros fundidos com sucesso. 17.5. COBRE E SUAS LIGAS

O cobre tem um ponto de fusão alto (1083o C) e estrutura CFC. Apesar do alto ponto de fusão, ele não é alto o suficiente para gerar temperaturas altas no cisalhamento dentro da zona de fluxo, e causar efeitos mais sérios na vida das ferramentas de corte. Entretanto, na usinagem do metal puro, as forças de usinagem são altas e podem dificultar a usinagem. Como o alumínio, a usinagem do cobre e suas ligas são mais freqüentemente baseadas no tipo de cavaco produzidos do que no critério de vida das ferramentas. Assim quanto à usinabilidade, as ligas de cobre podem ser divididas em 3 grupos distintos, já mencionados no capítulo 13, item 13.6.

Grupo 1- Usinagem fácil: Eles apresentam a forma de cavacos quebradiços, pois as adições de elementos de livre corte funcionam como quebra-cavaco.

Grupo 2 – Usinagem moderada: Neste grupo, as ligas de cobre tem alta ductilidade, o que promove um alto consumo de potência e dificuldade de se obter bom acabamento. Quanto aos cavacos, eles apresentam a forma de espirais ou em hélice.

Grupo 3 – Usinagem difícil: São as ligas de difícil usinagem. Eles tem baixa resistência e alta ductilidade, com grande tendência ao arrancamento. Os cavacos formados são longos e contínuos.

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Geralmente, na usinagem deste metal, são utilizadas ferramentas de aço-rápido ou metal duro e ambos os desgastes de flanco ou cratera podem ocorrer. Estudos detalhados dos mecanismos de desgastes na usinagem de cobre não é abundante.

Geralmente, a usinabilidade pode ser melhorada pela conformação a frio e pela adição dos elementos de livre corte, o que pode levar a liga a ocupar posição dentro do grupo 1. A adição de chumbo, enxofre e telúrio resolvem o problema de disposição do cavaco. Esses adições agem também na interface cavaco-ferramenta, reduzindo ou eliminando a zona de fluxo, o que resulta na redução das forças e abaixamento da temperatura na interface, permitindo velocidade de corte maiores. As temperaturas de corte são baixas para o cobre puro, mas ela aumenta com a adição de zinco. Na usinagem do latão 70/30, pode-se observar temperaturas de ordem de 800oC, o que pode causar sérios problemas de desgaste.

Às baixas velocidades de corte as ligas com segunda fase formam APC, o que causa problemas de acabamento superficial. 17.6. ALUMÍNIO E SUAS LIGAS

O alumínio tem um baixo ponto de fusão (» 659o C) e pode ser usinado facilmente. Quando utilizando ferramenta de PCD, provavelmente a velocidade de corte será limitada pela potência disponível da máquina, mas não por problemas de desgaste de ferramenta. O desgaste de flanco pode ser problema apenas em algumas ligas, contendo silício. O silício em percentagens maiores (11 a 14%), superiores à do eutético (6%), apresenta o excedente como largos cristais de silício na matriz, possuindo alta dureza (> 400 HV) e alto ponto de fusão (1420o C). Isto aumenta as tensões e a temperatura na superfície de saída da ferramenta. Geralmente, as ferramentas de aço-rápido e os metais duros são usados, as primeiras com velocidades de até 300 m/min e as segundas até 600 m/min.

Na usinagem das ligas de alumínio as forças são baixas, e diminuem com a velocidade de corte. Entretanto, na usinagem de alumínio puro comercial, podem ocorrer altas forças, principalmente à baixas velocidades. Isto é devido ao grande comprimento de contato cavaco-ferramenta [2]. Os cavacos são inteiramente contínuos, e podem causar problemas. Adições de metais insolúveis de baixo ponto de fusão como o chumbo, bismuto e estanho, pode produzir cavacos mais quebradiços. 17.7. MAGNÉSIO E SUAS LIGAS

De todos os metais o magnésio é o mais fácil de se usinar. Taxas de desgaste das ferramentas é muito baixo porque o metal e suas ligas tem um baixo ponto de fusão (650o C), e as temperaturas na interface são também baixas, mesmo à altas velocidades de corte e avanço. Velocidade da ordem de 1350 m/min no desbaste e ainda maiores no acabamento podem ser usadas com boa vida nas ferramentas. As ligas se comportam muito parecido com o metal puro [2]. As forças de usinagem são baixas devido à baixa resistência ao cisalhamento do Mg, e mais importante, a área de contato é pequena numa faixa ampla de velocidade de corte

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[2]. As ferramentas utilizadas são os aços-rápidos e os metais duros, e o acabamento superficial é bom tanto em baixa como em alta velocidades de corte. Os cavacos formados são geralmente quebradiços, mesmo à altas velocidades de corte. A estrutura hexagonal é provavelmente a maior responsável pela baixa ductilidade do magnésio, promovendo pequena área de contato cavaco-ferramenta. Na realidade, o único problema que pode ocorrer na usinagem do magnésio, é a possibilidade de ignição do cavaco, a altas velocidades de corte. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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