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USO DE ESTRATÉGIAS MAIS SUSTENTÁVEIS NO PROJETO DA NOVA SEDE DA AGAPAN, EM PORTO ALEGRE - RS Luiz Fernando C. Felix (1); Caroline Kehl (2); Patrícia Tillmann (3); Joaquim Vaz (4); Miguel A. Sattler (5) (1) Engenheiro civil, Mestrando pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected] (2) Arquiteta e Urbanista, Mestranda pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected] (3) Arquiteta e Urbanista, Mestranda pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected] (4) MSc, Engenheiro civil, Doutorando pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected] (5) PhD, Professor pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected] RESUMO Proposta: A AGAPAN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural – é uma organização não-governamental com sede em Porto Alegre com realizações que a colocam como das mais importantes entidades ambientalistas do Rio Grande do Sul e das mais respeitadas no Brasil. Com o objetivo da construção de sua nova sede, a instituição entrou em contato com o NORIE – Núcleo Orientado para Inovação da Edificação – no intuito de que fosse projetada uma edificação mais sustentável do que as tradicionais. Desta forma, uma equipe de alunos, sob a orientação do professor coordenador da Linha de Pesquisas em Edificações e Comunidades Sustentáveis, passou a desenvolver uma proposta. Método de Pesquisa/Abordagens: Foram usadas como ferramentas do processo a especificação de ecomateriais e de soluções tecnológicas racionais que propiciem, entre outros, o bom uso e a economia de recursos finitos, como a água e a energia, a redução da poluição, a melhoria da qualidade do ar e, conseqüentemente, a melhoria da qualidade de vida e bem estar dos usuários. Resultados: O estudo propõe o adequado aproveitamento das condições climáticas locais, o reuso de água, com tratamento de efluentes, o aquecimento ou resfriamento do ar ambiente pelo uso da inércia térmica do solo, o uso de materiais locais, renováveis e de menor impacto ambiental, e o paisagismo privilegiando o uso de espécies nativas. Contribuições/originalidade: Uso de estratégias mais sustentáveis no projeto de edificações. Palavras-chave: edificações sustentáveis; estratégias sustentáveis. ABSTRACT Proposal: AGAPAN (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural) is a NGO, based in the city of Porto Alegre, that has a tradition of involvement in environmental issues for which has acquired a wide reputation in the Brazilian scenery. Recently, AGAPAN contacted NORIE (Núcleo Orientado para Inovação da Edificação) to obtain some assistance in developing a new, and more sustainable building. A proposal was developed by a group of students led by the coordinator of the Research Group on Sustainable Buildings and Communities, to be presented in this paper. Research methods: eco materials where surveyed and specified, as well as more rational technologies that enable a better use of natural resources (such as water and energy), the reduction of pollution and the improvement of air quality. These factors were believed to increase the quality of life and well being of the building users. Results: This study proposes the use of bioclimatic architecture, the re-use of - 238 -

USO DE ESTRATÉGIAS MAIS SUSTENTÁVEIS NO PROJETO … · realizar um projeto de edificação mais sustentável que as tradicionais, a AGAPAN entrou em contato ... nos períodos quentes

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USO DE ESTRATÉGIAS MAIS SUSTENTÁVEIS NO PROJETO DA NOVA SEDE DA AGAPAN, EM PORTO ALEGRE - RS

Luiz Fernando C. Felix (1); Caroline Kehl (2); Patrícia Tillmann (3); Joaquim Vaz (4); Miguel A. Sattler (5)

(1) Engenheiro civil, Mestrando pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected]

(2) Arquiteta e Urbanista, Mestranda pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected]

(3) Arquiteta e Urbanista, Mestranda pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected]

(4) MSc, Engenheiro civil, Doutorando pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected]

(5) PhD, Professor pelo Programa de Pós Graduação da Engenharia Civil na UFRGS, Brasil, e-mail: [email protected]

RESUMO

Proposta: A AGAPAN – Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural – é uma organização não-governamental com sede em Porto Alegre com realizações que a colocam como das mais importantes entidades ambientalistas do Rio Grande do Sul e das mais respeitadas no Brasil. Com o objetivo da construção de sua nova sede, a instituição entrou em contato com o NORIE – Núcleo Orientado para Inovação da Edificação – no intuito de que fosse projetada uma edificação mais sustentável do que as tradicionais. Desta forma, uma equipe de alunos, sob a orientação do professor coordenador da Linha de Pesquisas em Edificações e Comunidades Sustentáveis, passou a desenvolver uma proposta. Método de Pesquisa/Abordagens: Foram usadas como ferramentas do processo a especificação de ecomateriais e de soluções tecnológicas racionais que propiciem, entre outros, o bom uso e a economia de recursos finitos, como a água e a energia, a redução da poluição, a melhoria da qualidade do ar e, conseqüentemente, a melhoria da qualidade de vida e bem estar dos usuários. Resultados: O estudo propõe o adequado aproveitamento das condições climáticas locais, o reuso de água, com tratamento de efluentes, o aquecimento ou resfriamento do ar ambiente pelo uso da inércia térmica do solo, o uso de materiais locais, renováveis e de menor impacto ambiental, e o paisagismo privilegiando o uso de espécies nativas. Contribuições/originalidade: Uso de estratégias mais sustentáveis no projeto de edificações.

Palavras-chave: edificações sustentáveis; estratégias sustentáveis.

ABSTRACT

Proposal: AGAPAN (Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural) is a NGO, based in the city of Porto Alegre, that has a tradition of involvement in environmental issues for which has acquired a wide reputation in the Brazilian scenery. Recently, AGAPAN contacted NORIE (Núcleo Orientado para Inovação da Edificação) to obtain some assistance in developing a new, and more sustainable building. A proposal was developed by a group of students led by the coordinator of the Research Group on Sustainable Buildings and Communities, to be presented in this paper. Research methods: eco materials where surveyed and specified, as well as more rational technologies that enable a better use of natural resources (such as water and energy), the reduction of pollution and the improvement of air quality. These factors were believed to increase the quality of life and well being of the building users. Results: This study proposes the use of bioclimatic architecture, the re-use of

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water, treatment of effluents, a buried pipes system that makes use of soil inertia to deliver hot or cold air into the building environment, the use of locally found materials, which can be recycled and have low impact on the environment, and the use native plant species. Contributions: More sustainable strategies in a building project.

Keywords: sustainable buildings, sustainable strategies.

1 INTRODUÇÃO

A AGAPAN - Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural é uma organização não governamental com sede em Porto Alegre, fundada no início dos anos 1970, com um imenso currículo de realizações que a colocam como uma das mais importantes entidades ambientalistas do Rio Grande do Sul e das mais respeitadas no Brasil.

A associação possui um terreno de 257m² localizado no bairro Praia de Belas na cidade de Porto Alegre, doado pela Prefeitura Municipal, onde pretende construir sua nova sede. No intuito de se realizar um projeto de edificação mais sustentável que as tradicionais, a AGAPAN entrou em contato com o NORIE (Núcleo Orientado Para a Inovação da Edificação) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde um grupo de mestrandos (sob a orientação do professor orientador da Linha de Pesquisas em Edificações e Comunidades Sustentáveis) passou a desenvolver uma proposta para edificação.

2 OBJETIVOS

Este trabalho tem como objetivo demonstrar possíveis estratégias mais sustentáveis aplicáveis ao projeto arquitetônico do prédio em que se constituirá a nova sede da AGAPAN.

3 METODOLOGIA

Inicialmente o grupo de mestrandos responsáveis pelo desenvolvimento do projeto reuniu-se com representantes da AGAPAN no intuito de conhecer o programa de necessidades da associação. Na ocasião, um anteprojeto havia sido proposto previamente pelos próprios representantes, onde se acreditava ser possível a incorporação de estratégias mais sustentáveis. Porém, o desenvolvimento do projeto, a partir de tal solução, implicava em tantas e tão significativas mudanças em sua concepção, de forma a incorporar princípios de sustentabilidade, que se optou pelo desenvolvimento de um novo projeto. Comprovou-se, assim, a necessidade de que as estratégias devam ser pensadas desde o início e não a partir de uma solução prévia. (OLIVEIRA et al., 2004).

Com este propósito, foram usadas, como ferramentas do processo, a especificação de materiais de menor impacto ambiental e de soluções tecnológicas racionais que propiciem, entre outros aspectos, o bom uso e a economia de recursos finitos, como a água e a energia, a redução da poluição, a melhoria da qualidade do ar, e consequentemente, a qualidade de vida e o bem-estar dos usuários da futura sede da AGAPAN.

4 ANÁLISE DE RESULTADOS

A partir da integração de conceitos de sustentabilidade no projeto arquitetônico, chegou-se a uma solução para o prédio que contempla, além dos requisitos da Associação, requisitos ambientais, sociais e econômicos. Apresenta-se aqui a proposta de solução arquitetônica mais sustentável, evidenciando-se cada uma das estratégias adotadas.

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4.1 Solução arquitetônica

De acordo com o programa de necessidades requisitado pelos representantes da AGAPAN, o prédio deveria conter os seguintes compartimentos: área de escritório; biblioteca; auditório; cyber café; cozinha; área de lazer com churrasqueira. Considerando as limitações do terreno, assim como a solução prévia proposta pelos representantes da Associação, optou-se por um partido em quatro pavimentos.

Figura 1 – Implantação do projeto no terreno.

Tendo em vista a orientação solar do terreno, optou-se por implantar as salas de permanência prolongada longe da fachada oeste (figura 1), esperando, com isso, minimizar a necessidade de condicionamento de ar no edifício. Feito isso, os sanitários foram localizados a oeste e a circulação no centro.

Figura 2 – Planta baixa do primeiro pavimento.

A figura 2 mostra a planta baixa do primeiro pavimento. Neste pavimento haverá um hall de entrada, com uma pequena recepção, e a circulação vertical, um jardim a oeste, sanitários e o cyber café, com aberturas voltadas para sul e para um jardim de inverno voltado para o norte, a cozinha do café e um banheiro de serviço.

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Figura 3 – Planta baixa do segundo pavimento.

No segundo pavimento (ver figura 3) se localizam o auditório com aberturas voltadas para norte e sul, a varanda com pergolado (figura 4b), os sanitários e uma área de circulação que poderá servir também como foyer do auditório.

Figura 4 – Representação gráfica de vista geral do edifício (a) e da varanda com pergolado no detalhe (b).

A figura 5 mostra a planta baixa do terceiro pavimento. Nele se localizam a biblioteca, também com aberturas voltas para o norte e sul, sanitários e circulação. No quarto pavimento (ver figura 6), haverá a área de escritórios, onde, no terceiro pavimento, está a biblioteca (pavimentos-tipo).

Figura 5 – Planta baixa do terceiro pavimento.

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Figura 6 – Planta baixa do quarto pavimento.

O quinto e último pavimento (figura 7) não ocupa a área das demais planta, sendo sua maior porção ocupada por uma cobertura verde (terraço-jardim) com pergolado e o restante por um salão de festas para os funcionários, com salão de refeições, sanitários e cozinha com churrasqueira.

Figura 7 – Planta baixa do quinto pavimento.

Foram explorados esteticamente alguns elementos que destacam e identificam o edifício com sua função de sede de um órgão ambiental (Figura 8). O uso de vegetação bastante presente, bem como os pergolados de madeira, manifestam os objetivos da instituição e convidam os usuários externos (transeuntes e usuários da cidade) a conhecer o local. A turbina eólica inserido na esquina representa um ícone da sustentabilidade ambiental, da energia limpa, e foi ali colocado para ser um ícone na cidade e estimular o público sobre as questões ambientais. Provavelmente ele não teria utilidade enquanto gerador de energia, mas devem ser feitos os testes adequados para identificar essa possibilidade.

Figura 8: Representação gráfica da fachada sul.

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4.2 Estratégias relativas à eficiência energética

4.2.1 Sistema de ventilação utilizando a inércia térmica do solo

Tendo por objetivo diminuir o consumo de energia necessário à climatização do auditório, foi proposto utilizar a inércia térmica do solo para aquecer o ar ambiente nos períodos frios e resfriá-lo nos períodos quentes. A proposta inclui a pré-instalação de dutos, com diâmetro de 250mm, enterrados a 1,5m de profundidade sob a construção, para circulação do ar captado do ambiente externo, junto à área arborizada do jardim, filtrado e em baixa velocidade (Figura 9). O ar, movimentado por ventiladores centrífugos, ao passar pelos dutos, troca calor com o solo, aquecendo-se (nos períodos frios) ou resfriando-se (nos períodos quentes), para ser distribuído no ambiente através de grelhas de ventilação embutidas no forro. A vazão de ar nos dutos corresponde à necessidade de renovação higiênica do ar no auditório. Desta forma equipamentos convencionais de condicionamento de ar, são responsáveis pela circulação do ar no ambiente e contribuem para a sua climatização em períodos críticos. (VAZ; SATTLER, 2004)

(a) (b)

Figura 9: Corte longitudinal esquemático mostrando a captação de ar pelos tubos enterrados (a) e o insuflamento no auditório (b).

4.2.2 Parede dupla

A construção das paredes externas de vedação do prédio se constituirá por dois panos de alvenaria com uma camada de ar intermediária, com a finalidade de propiciar um melhor isolamento térmico do edifício. Sugere-se que o pano de alvenaria externo seja de tijolos maciços, visto que ficarão aparentes, mas o pano interno seja de tijolos do tipo seis-furos, diminuindo a carga das paredes, facilitando a instalação dos conduítes e diminuindo a carga energética da construção.

4.2.3 Vidro duplo

As aberturas terão vidros duplos. O vidro duplo é um conjunto composto por um vidro refletivo e um vidro comum, separados por uma câmara de ar, a qual permite melhorar as condições de conforto térmico e acústico, reduzindo o consumo de energia com ar condicionado. Além disso, possibilita o uso de áreas envidraçadas para maior luminosidade natural para os ambientes, o que reduz o uso de energia para iluminação. Como a grande maioria das aberturas da edificação se encontra na fachada sul, evitam-se perdas térmicas significativas.

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4.2.4 Cobertura verde

Considerando a incidência solar e tendo em vista a tendência de coberturas vegetais estabilizarem as temperaturas e evitarem os extremos no interior da edificação, seu emprego, além de privilegiar aspectos estéticos e de integração ao meio ambiente, contribuirá no isolamento térmico dos ambientes. A cobertura verde será aplicada na forma de um jardim elevado na área do terraço da edificação, beneficiando assim as condições de conforto térmico do pavimento adjacente e criando um espaço de convivência ao ar livre para os usuários em contato com a natureza, apesar da localização bastante urbana da AGAPAN (MORAIS, 2004).

4.2.5 Elevador pneumático

Devido à necessidade de acessibilidade universal, que também foi contemplada nos sanitários do edifício, sugerimos a implantação de um elevador pneumático, a fim de economizar energia. Essa opção de elevadores já se encontra no mercado com pequena capacidade de carga, sendo denominado muitas vezes como elevador doméstico, tendo em vista a sua aplicação em habitações. O público geral deve utilizar a escadaria e, já que o edifício tem somente cinco pavimentos (ficando as funções diárias até o quarto), isso se torna perfeitamente viável, além de saudável, para os usuários.

4.3 Estratégias relativas à gestão do uso da água

4.3.1 Aproveitamento da água da chuva

De forma a racionalizar o consumo de água no prédio, a reserva de água foi dividida em duas partes, sendo a primeira – de água potável – abastecida pela concessionária local, e dispondo de um reservatório superior. A segunda parte, abastecida pela chuva, contará com uma cisterna localizada logo abaixo do nível das calhas. Esta água abastecerá os pontos de consumo destinados à irrigação das áreas verdes do prédio e limpezas em geral (MANO; SCHMITT, 2004).

4.3.2 Tratamento dos efluentes

Os resíduos líquidos gerados na edificação foram tratados de forma distinta: como águas negras, aquelas provenientes dos vasos sanitários; e como águas cinzas, aquelas provenientes de pias e lavatórios. As águas negras serão conduzidas, por tubulação apropriada, até o digestor e posteriormente a um filtro, ambos anaeróbios. Enquanto que as águas cinzas passarão por uma caixa de gordura e filtro de areia. Após, as águas serão conduzidas para um leito de evapotranspiração e, posteriormente, para polimento em um espelho d’água com plantas aquáticas, no jardim (ERCOLE, 2003).

4.4 Estratégias relativas à seleção de materiais

A obra deverá fazer uso de materiais de construção disponíveis na região, de forma a minimizar os custos e impactos ambientais causados pelo seu transporte.

4.4.1 Estrutura de concreto pré-moldado

Visando a racionalização e a qualidade da construção, bem como o aumento da vida útil de seus componentes estruturais, pela possibilidade de reutilização dos mesmos ao final da vida útil do prédio, os pilares, vigas e lajes da construção foram definidos em concreto pré-moldado.

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4.4.2 Tijolo cerâmico

Tendo por objetivo o uso de técnica construtiva que empregue mão-de-obra local e por ser considerado um material de baixo impacto ambiental no Rio Grande do Sul (SATTLER et al., 2003), foi definido o uso de tijolos cerâmicos para compor as alvenarias.

4.4.3 Madeira certificada

Toda a madeira utilizada na obra, seja de uso temporário ou permanente deverá ser originária de florestas manejadas sustentavelmente. O movimento com o propósito da certificação florestal é um fenômeno impulsionado pelo consumidor visando maior competitividade no contexto da sustentabilidade global. A disposição do consumidor em pagar por produtos florestais de origem sustentável representa um incentivo nessa direção, uma vez que essas normas atingiram o status de uma convenção de mercado. A certificação pode, portanto, ser categorizada como um instrumento econômico de benefício ambiental, uma vez que incorpora a existência de um estímulo financeiro, a possibilidade de ação voluntária e a intenção de manter ou conseguir melhorias na qualidade ambiental, através de sua aplicação. (MAY, 2002; FCS-BRASIL, 2002).

4.4.4 Pintura ecologicamente correta

Já estão disponíveis no mercado tintas com reduzida emissão de COVs (Compostos Orgânicos Voláteis), feita de matérias primas naturais e inteiramente isenta de derivados do petróleo. Ela deve ser usada nas paredes internas que forem rebocadas e nos forros. Por se tratar de um produto atóxico, traz benefícios aos usuários do edifício em longo prazo e, por não ter cheiro, permite a ocupação quase imediata dos ambientes. (IDHEA, 2007)

4.4.5 Utilização de materiais de demolição

Atingindo 40% menos preço que os materiais novos, os componentes usados de edificações encontram-se disponíveis em revendedoras. Sugere-se a utilização de esquadrias, instalações hidrossanitárias (cubas, pia de cozinha, tanque, etc) e elétricas (luminárias, tomadas, interruptores, etc). Segundo Hill e Bowen (1997) o reuso desses componentes evita nova extração de matéria-prima e incorporação de energia, contribuindo para a sustentabilidade das construções.

4.5 Estratégias relativas ao conforto ambiental

4.5.1 Orientação solar

A fachada principal do prédio tem orientação sul. Os ambientes de maior permanência, como o auditório e salas de escritórios foram dispostos junto ao lado leste da construção, evitando os efeitos da radiação solar incidente na fachada oeste. Para aproveitar a radiação norte, se mostrou adequado recuar a fachada do volume que contém os ambientes nobres de maneira a poder abrir janelas para essa orientação. Foi proposta prateleira de luz nesses ambientes (Figura 10) para um melhor aproveitamento da iluminação natural.

Figura 10: Representação gráfica das fachadas leste e norte, mostrando as prateleiras de luz no recuo do volume.

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4.5.2 Ventilação cruzada

Contemplando os aspectos de ventilação cruzada, foram projetados espaços interiores permeáveis ao ar externo (LAMBERTS; DUTRA; PEREIRA, 1997), os quais permitem a circulação do ar entre os ambientes internos e externos. Neste sentido estão previstas aberturas para os lados norte e sul dos ambientes de maior permanência como cyber café, auditório e área de escritórios, assim como diversas aberturas na área de circulação e caixa de escada.

4.5.3 Iluminação natural

Considerando o aspecto de iluminação natural, foram previstos dois poços de luz, que acompanham a caixa de escada. Isto possibilitou uma ampla iluminação da escadaria, a criação de aberturas voltadas para o norte, assim como a criação de jardins de inverno no pavimento térreo.

Com isto também foi previsto o uso de proteções solares, do tipo prateleiras de luz, nas janelas voltadas para o norte. Este tipo de proteção além de além de interceptar a radiação direta do sol, redireciona a luz para o forro reduzindo o ganho de calor solar e uniformizando a distribuição da luz natural no interior (LAMBERTS; DUTRA; PEREIRA, 1997).

4.5.4 Formação e interferências no microclima

Uma das propostas para o projeto, é o emprego de um sistema de ventilação alternativo, o qual realiza a captação de ar do ambiente externo, faz uso da inércia térmica do solo para alterar sua temperatura e o distribui na edificação. Neste sentido, para aumentar a eficiência do sistema, o projeto prevê também a interferência no microclima da região de captação do ar. Assim, na área destinada pelo projeto a um jardim, serão mantidas algumas espécies de vegetação presentes no terreno – objetivando, minimizar as intervenções feita pela obra – e outras serão devidamente empregadas com o intuito de filtrar o ar captado, assim como melhorar as condições de sua temperatura.

4.6 Estratégias relativas à integração social

Os espaços de uso coletivo do prédio foram projetados de forma a incentivar a integração dos usuários do prédio. Procurou-se criar ambientes agradáveis e convidativos, onde os indivíduos pudessem se encontrar e usufruir dos espaços para o convívio em coletivo. A varanda com pergolado, o terraço jardim e o hall da entrada foram criados para incentivar o encontro entre as pessoas. Enfatizando essa questão, foram projetados fechamentos transparentes entre o hall de entrada e os espaços do cyber café, permitindo uma maior permeabilidade visual e evitando a segregação dos espaços.

O projeto procura, ainda, estimular a educação ambiental. Por isso as tecnologias diferenciadas (as próprias estratégias sustentáveis) ficam aparentes. Por exemplo, os dutos de insuflamento de ar e os dutos de águas negras e cinzas. Dessa forma, as visitas de interessados em conhecer o edifício, turmas escolares, por exemplo, podem ver e aprender tudo também visualmente, o que torna o aprendizado mais didático.

5 CONSIDERAÇÃOES FINAIS

A experiência vivenciada pelo grupo durante o projeto mostrou que as edificações podem ser concebidas de forma mais eficiente, evitando certos desperdícios, seja nas fases de construção e operação como na fase de demolição.

Atualmente, no contexto brasileiro, ainda são poucas e bastante incipientes as tecnologias, os produtos e os serviços da área da construção com viés para sustentabilidade, mas que mesmo assim é possível se realizar projetos de edificações mais sustentáveis através da incorporação de iniciativas existentes.

Contudo os atributos de sustentabilidade devem ser considerados o mais cedo possível no projeto da edificação, sob pena de acarretarem perdas do efeito sinérgico entre as estratégias ou mesmo em re-

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trabalhos no projeto. Assim a consideração da sustentabilidade no projeto de uma edificação implica, acima de tudo, na adoção de uma visão holística da aplicação dos recursos.

6 REFERÊNCIAS

ERCOLE, L. A. S. Sistema modular de gestão de águas residuárias domiciliares: uma opção mais sustentável para a gestão de resíduos líquidos. 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio grande do Sul, Porto Alegre, 2003. 192pp.

FOREST STEWARDSHIP COUNCIL BRASIL (FSC-BRASIL). Currently certified forests and chain of custody operations. 2002. Disponível em: < www.fsc.org.br> Acesso em: 24 mai. 2007.

HILL, R.; BOWEN, P. Sustainable construction: principles and a framework for attainment. In: Construction Management and Economics. n.15, 1997. p.223-239.

INSTITUTO PARA O DESENVOLVIMENTO DA HABITAÇÃO ECOLÓGICA (IDHEA). Ecoprodutos. Disponível em www.idhea.com.br. Acesso em: 27 mai. 2007.

LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R. Eficiência energética na arquitetura. São Paulo: PW, 1997. 192p.

MANO, R. S.; SCHMITT C. M. Captação residencial de água pluvial, para fins não potáveis, em Porto Alegre: Aspectos básicos da viabilidade técnica e dos benefícios do sistema. In: CONFERÊNCIA LATINO-AMERICANA DE CONSTRUÇÃO SUSTENTÁVEL, ENCONTRO NACIONAL DE TECNOLOGIA DO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 10., 2004, São Paulo. Anais... São Paulo: ANTAC, 2004.

MAY, P. H. Certificação Florestal no Brasil: Valorização Comercial e Ambiental, para o Consumers’ Choice Council. Disponível em: <http://www.wto.org/english/forums_e/ngo_e/ccc_ cert_forest_brazil_p.doc> Acesso em: 27 mai. 2007.

MORAIS, C. S. Desempenho térmico de coberturas vegetais em edificações na cidade de São Carlos, SP. 2004. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) Programa de Pós Graduação em Construção Civil, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2004. 108pp.

OLIVEIRA, D. P. et al. Considerações sobre a introdução de requisitos ambientais para projeto de edificações no contexto brasileiro. In: WORKSHOP BRASILEIRO DO PROCESSO DE PROJETO NA CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS, 4., 2004, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, 2003.

SATTLER, M. A. et al. Estratégias Sustentáveis para o Refúgio Biológico Bela Vista. In: ENCONTRO NACIONAL SOBRE EDIFICAÇÕES E COMUNIDADES SUSTENTÁVEIS, 3., 2003, São Carlos. Anais... São Carlos: ANTAC, 2003.

VAZ, J; SATTLER, M. O Uso de Energia Geotérmica para Condicionamento Térmico de Ambientes Construídos no Sul do Brasil. 2004. Projeto de Pesquisa para Tese de Doutorado (Doutorado em Engenharia Civil), Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Porto Alegre.

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