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V JORNADAS AEP SERRALVES · Dr. Paulo Nunes de Almeida 11 Dra. Ana Pinho 15 Palestra de Abertura 19 Primeira Sessão - Moderador: Prof. Luís Valente de Oliveira 37 Dr. Luís Marques

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V JORNADAS AEP SERRALVES

"Portugal no Mundo"

23 de outubro de 2014

FUNDACOES AEP | SERRALVES´

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TítuloV JORNADAS AEP | SERRALVES

EdiçãoFundação AEP

Pré ImpressãoDébora Luz

Depósito Legal394306/15

ISBN 978-989-98453-6-7

Porto, junho 2015

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INTRODUCAO 5

PROGRAMA 6

COMUNICACOES

Sessão de Abertura 11

Dr. Paulo Nunes de Almeida 11Dra. Ana Pinho 15

Palestra de Abertura 19

Primeira Sessão - Moderador: Prof. Luís Valente de Oliveira 37Dr. Luís Marques 41Eng.º Miguel Lisboa 47Dr. Ricardo Afonso 55Dr. Fernando Vieira 59Eng.º Carlos Alves Duarte 73

Segunda Sessão - Moderador: Manuel Passos Rodrigo 79 Eng.º Luís Mira Amaral 83Dr. Jónio Reis 89Dr. João Taborda 95

Terceira Sessão - Moderador: Eng.º Vergilio Folhadela Moreira 105Dr. Sérgio Marques 109Dra. Marta Maia 117Dra. Luísa Duarte 123Dr. Bernardo Brito e Faro 129

Quarta Sessão - Moderador: Dr. Carlos Abrunhosa de Brito 135Embaixador Francisco Seixas da Costa 139Eng. º Vital Morgado 149

Quinta Sessão - Moderador: Dr. Manuel Cavaleiro Brandão 161Eng.º José Rui Felizardo 165Dr. Cláudio Sunkel 173Prof. Jorge Gonçalves 185

Sessão de Encerramento 197Eng.º José António Ferreira de Barros 199Dr. Artur Santos Silva 201

INDICE´

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INTRODUCAO

Paulo Nunes de AlmeidaPresidente da Fundação AEP

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As exportações, o investimento estrangeiro em Portugal e o investimento português em países que nos dêem retorno assegurado parecem ser os caminhos mais promissores para sair da crise económica que estamos a atravessar. Por isso se impõe debater estes temas com profundidade.

Foi o que aconteceu nas V Jornadas das Fundações AEP e de Serralves realizadas no Porto em 23 de Outubro de 2014.

Passámos em revista: as ligações de Portugal ao exterior; o investimento estrangeiro em Portugal; a actividade e o investimento português no mundo; a organização do comércio externo e o papel das universidades na projecção de Portugal no mundo. Nas diversas sessões intervieram personalidades conhecedoras dos assuntos que trataram, tendo sido unânime a opinião de que as matérias tratadas eram de manifesto interesse, merecendo a reflexão feita e as informações transmitidas.

Neste volume reúnem-se os textos que nos foram facultados pelos oradores. Estamos gratos a todos, não só pelas exposições que fizeram, como também pela permissão que nos deram de prolongar o seu efeito pela disponibilidade de uma versão escrita das mesmas. Esta ajuda a rememorar as Jornadas e a colher dados e informações que se revelaram importantes para abordar os diferentes temas.

A todos estamos gratos.

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PROGRAMA

09:00 Rececao dos Participantes

09:30 Sessao de Abertura

Presidente do Conselho de Administracao da Fundacao AEP Dr. Paulo Nunes de Almeida

Conselho de Administracao da Fundacao de Serralves Dra. Ana Maria Pinho Macedo Silva

09:45 Palestra de Abertura Dr. Jaime Nogueira Pinto

10:15 Primeira sessao - As Ligacoes de Portugal ao Exterior Moderador: Prof. Luís Valente de Oliveira

Dr. Luis Marques - Rangel Invest, SA Eng.º Miguel Lisboa – TAKARGO – Transporte de Mercadorias SA Dr. Ricardo Afonso - Transdev Portugal Dr. Fernando Vieira - ANA - Aeroporto do Porto

12:00 Segunda sessao - O Investimento Estrangeiro em Portugal Moderador: Manuel Passos Rodrigo

Lingjiang Xu – Fosun Eng.º Mira Amaral – Banco BIC Dr. Jónio Reis – Bosch Portugal Dr. João Taborda – EMBRAER

13:00 Almoco

14:00 Terceira Sessao - A Atividade e o Investimento Portugues no Mundo Moderador: Eng.º Vergílio Folhadela Moreira

Dr. Sérgio Marques - Parfois SADra. Marta Maia – Jerónimo MartinsAlberto Couto Alves - ACA, SADr. Bernardo Brito e Faro - Sogrape Vinhos, SA

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14:00 Quarta Sessao - A Organizacao do Comercio Externo Moderador: Dr. Carlos Abrunhosa de Brito

Eng.º Vital Morgado – Administrador da AICEPEmbaixador Francisco Seixas da Costa

15:10 Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo Moderador: Dr. Manuel Cavaleiro Brandão

Eng.º José Rui Felizardo - CEIIA - Centro Para a Excelência e inovação na indústria automóvelDr. Cláudio Sunkel – IBMC – Instituto de Biologia MolecularProf. Jorge Gonçalves – Universidade do Porto

17:00 Sessao de EncerramentoEng.º Jose Antonio Ferreira de BarrosPresidente do Conselho de Curadores da Fundação AEP

Palestra de encerramentoDr. Artur Santos Silva Presidente do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian

23 de outubro de 2014 - Auditorio Fundacao de Serralves´

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COMUNICACOES´

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SESSÃO DE ABERTURA

Presidente do Conselho de Administração da Fundação AEPDr. Paulo Nunes de Almeida

Administradora da Fundação de SerralvesDra. Ana Pinho

Palestra de AberturaDr. Jaime Nogueira Pinto

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Muito bom dia!

Vamos dar início às V Jornadas Fundação AEP | Fundação de Serralves e começo por agradecer a presença de todos os participantes.

A sessão de trabalhos será longa, pelo que temos de ser muito rigorosos com o tempo para dar oportunidade a todos de nos transmitirem o que consideram importante sobre o tema que vamos abordar.

Como devem estar recordados das I Jornadas realizadas em 2010, discutimos “Portugal 2020”, nas II Jornadas abordamos o tema da “Re-industrialização” e nas III Jornadas a “Internacionalização da economia portuguesa”, no ano passado o tema foi “ o papel do Estado no desenvolvimento” e este ano vamos discutir “ Portugal no Mundo”.

Em primeiro lugar gostaria de agradecer à Fundação de Serralves na pessoa da Dra. Ana Pinho, estimada colega, a parceria que mais uma vez estamos a levar a cabo, para a realização destas V Jornadas. Mais uma vez a Fundação AEP e a Fundação de Serralves estão a dar o exemplo do que deve ser feito, privilegiando a parceria ao individualismo e trazendo para discussão temas de relevante interesse nacional.

Uma palavra para as duas equipas, quer a da Fundação AEP quer a da Fundação de Serralves, que trabalharam na organização das mesmas e uma palavra muito especial para o Sr. Prof. Dr. Luís Valente de Oliveira, que tem a responsabilidade da sua organização.

Agradecemos ao nosso patrocinador exclusivo, a KPMG, que à semelhança dos anos anteriores, patrocina e apoia estas jornadas empresariais, bem como o programa COMPETE que nos apoia na divulgação das jornadas e dos seus resultados. Por fim, agradeço a todos os participantes e a todos os oradores, os quais não vou referenciar agora, pois serão apresentados à medida que cada um dos painéis se realizar, pelos respetivos moderadores.

Na Sessão de abertura e para além das palavras que vos serão dirigidas por estas duas instituições organizadoras, vamos ter connosco o Dr. Jaime Nogueira Pinto, que dispensa apresentações e a quem agradeço muito reconhecidamente a sua presença. Estou certo de que o nosso convidado abordará este tema com a pertinência que o mesmo justifica e também com a qualidade e a frontalidade que o caracteriza.

No encerramento teremos o Sr. Eng.º José António Barros, presidente do Conselho de Curadores da Fundação AEP, e o Sr. Dr. Artur Santos Silva, que tem tido uma relação muito

SESSAO DE ABERTURA

Presidente do Conselho de Administração da Fundação AEPDr. Paulo Nunes de Almeida

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forte com estas duas fundações, co –promotoras destas iniciativas.

Porquê o tema Portugal no Mundo, pergunto. Acima de tudo pela atualidade face à importância que no atual contexto da globalização se deve dar ao nosso posicionamento no mundo e à grande dependência que o nosso crescimento tem e terá relativamente às relações com o exterior. Abordar este tema, não só de uma forma genérica, mas também centrando a análise em cinco grandes áreas:1ª – As ligações de Portugal ao exterior, 2ª – O investimento estrangeiro em Portugal,3ª – A atividade e o investimento português no mundo,4ª – A organização do Comércio externo e as universidades e5ª - A projeção de Portugal no mundo, é com toda a certeza o melhor caminho para podermos tirar conclusões que possam contribuir para o maior desenvolvimento do nosso país. Esta é a missão das duas fundações promotoras deste Evento. Começando pelas ligações de Portugal ao exterior, não podíamos deixar este tema de fora dado a sua atualidade. O transporte de pessoas e bens, sendo por rodovia, por mar ou pelo ar, as ligações intermodais e as tecnologias de informação e comunicação são áreas que merecem a nossa atenção e que serão determinantes para o desenvolvimento de Portugal e em especial a região Norte. É um tema em relação ao qual a AEP, conjuntamente com outras associações e confederações, tem dado grande atenção, como é exemplo a futura ligação ferroviária do nosso país à vizinha Espanha e daí para a Europa. Portugal não deve e não pode desperdiçar a última oportunidade que advirá no novo pacote de fundos comunitários, para definitivamente ter uma ligação rápida por ferrovia ao centro da Europa que sirva a indústria de bens transacionáveis localizada preferencialmente nas regiões Centro e Norte do país.

No que respeita ao investimento estrangeiro em Portugal e investimento português no mundo, segundo e terceiro temas das Jornadas, temos hoje bons exemplos que confirmam a importância desses assuntos. Portugal é hoje um país procurado por muitos investidores estrangeiros e, nas apresentações que constituem o segundo painel, vamos saber porquê. Não seremos nós a falar de nós próprios, mas ouvir outros a dizer o porquê de terem escolhido o nosso país para investir. Fará bem com certeza à nossa auto-estima, a mesma que alavanca investimentos de Portugal no Mundo e que no terceiro painel serão tratados na primeira pessoa por empresas e empresários arrojados que foram pelo mundo fora internacionalizando os seus negócios, mantendo em Portugal os centros de decisão.

Sessao de abertura | Dr. Paulo Nunes de Almeida~

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Chegando à quarta sessão vamos debater a organização do comércio externo, valorizando o papel das instituições e da diplomacia económica. É constantemente referido o grande aumento que as exportações tiveram face ao PIB, passando em poucos anos de uns modestos 29% para uma cifra mais valorizada superior a 40%. “É muito bom”, dizem uns, reforçando o protagonismo dos empresários, “ainda é pouco”, dizem outros, comparando com países como a Áustria, a Bélgica e a República Checa. O que dirão os nossos convidados, vamos ouvi-los.

Por último, mas não menos importante, as universidades e a projeção de Portugal no Mundo. Reconhecidamente, o conhecimento e a inovação são cada vez mais os motores das economias dinâmicas e competitivas. Esta evidência reforça a importância da ligação entre o saber e o fazer, tornando clara a necessidade da concertação de dois mundos, muitas das vezes com mentalidades e finalidades distintas.

Vamos ouvir três especialistas nesta área que nos vão trazer, com toda a certeza, notícias que muitos de nós desconhecemos. Quantos estudantes e investigadores estrangeiros temos nas nossas universidades? Muitos, com toda a certeza! E esse sentido inverso, esses jovens portugueses que andam por esse mundo fora, concorrendo ao mais alto nível com jovens de todo o mundo, dignificando o nosso país e o nosso sistema de ensino. Não têm ainda, a notoriedade de um Mourinho ou de um Cristiano Ronaldo, mas um dia, acreditem, isso vai acontecer e quando isso acontecer outros “Mourinhos” e outros “Cristianos Ronaldos” vão aparecer.

Finalizando, gostaria de realçar que temos tentado trazer a estas Jornadas a discussão de temas com mais profundidade e fugir um pouco do que no dia a adia se discute em Portugal, muitas das vezes sem grandes resultados e consequências. Chega de abordagens simplistas e pouco fundamentadas que muitas das vezes só servem para alimentar polémicas e encher páginas dos jornais, sem se tirar daí grande benefício para o país.

Desejo a todos, umas boas Jornadas, um bom dia de trabalho e pedia à Dra. Ana Pinho que nos fizesse a sua apresentação.

Muito obrigado!

SESSAO DE ABERTURA~

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Bom dia. Começo por saudar todos os presentes nesta quinta edição das Jornadas Empresariais AEP / Serralves que decorrem neste auditório do museu, criação de um dos nomes maiores da arquitetura mundial, Álvaro Siza, que é, indiscutivelmente, um bom exemplo de Portugal no Mundo!

Faço esta breve intervenção de abertura em representação do Presidente da Fundação de Serralves, o Senhor Engenheiro Luís Braga da Cruz, ausente do país por motivos diretamente relacionados com o tópico que nos traz hoje aqui, pois encontra-se neste momento em Luanda, no 10º Encontro de Fundações da CPLP, organizado pelo Centro Português de Fundações, que também dirige.

Tal como ocorreu em anos anteriores, a Fundação AEP e a Fundação de Serralves decidiram unir os seus esforços na organização destas Jornadas que, desta vez, estão subordinadas ao tema “Portugal no Mundo”. E como se adivinha do seu Programa e das personalidades que nele participam, a presença de Portugal no mundo será, seguramente, aqui encarada numa perspetiva proativa de busca das melhores soluções para o nosso País.

E, neste contexto, não posso deixar de falar um pouco de “Serralves no Mundo”, enfatizando algumas das características mais marcantes no domínio da nossa relação com o exterior.

Neste ano de 2014, Serralves celebra um duplo aniversário – os 25 anos da Fundação e os 15 anos do seu Museu. Gostaria de destacar que a ambição internacional esteve na génese deste projeto, refletindo a visão dos que mais diretamente estiveram ligados à sua criação - um dos quais, o Senhor Professor Luís Valente de Oliveira, aqui hoje presente - tendo sido sempre apoiada pelos seus Fundadores, Estado, Mecenas e Patronos. Desde o início, foi objetivo desta Instituição contribuir para a projeção internacional do nosso país, e, ao longo dos anos, Serralves foi confrontando os públicos portugueses – e o crescente número de visitantes estrangeiros – com o diálogo permanente entre o que de melhor se vai pensando e produzindo em Portugal e no estrangeiro.

A Visão de Serralves passa, de facto, por se afirmar, nacional e internacionalmente, como um centro de excelência no domínio da arte contemporânea e, embora orgulhosa da sua localização, a Fundação sempre teve no mundo o seu horizonte, como espectador e como interlocutor.

Muito antes do crescente fluxo turístico a que assistimos nos últimos anos, e que leva hoje a (boa) imagem da cidade do Porto a todas as geografias, Serralves já era dos nomes

Administradora da Fundação de SerralvesDra. Ana Pinho

SESSAO DE ABERTURA~

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portugueses conhecidos e reconhecidos no estrangeiro. Para isso contribuiu o facto de o seu Museu ter sido dirigido desde o início – com total independência do ponto de vista artístico – por figuras de grande relevo internacional. É significativo relembrar que o primeiro Diretor do Museu, Vicente Todoli, deixou Serralves para ir comandar um dos mais importantes museus do mundo: o Tate Modern, em Londres e a atual Diretora do Museu, Suzanne Cotter, tem um longo e prestigiante trajeto profissional internacional, tendo abandonado a cidade de Nova Iorque, onde residia, e a liderança do projeto do Guggenheim em Abu Dhabi, para vir dirigir o Museu de Serralves, na sequência de um muito concorrido concurso internacional, com mais de 100 candidatos.

Mas é também importante referir que Serralves funciona bem no Mundo a partir de Portugal e sem esquecer a realidade portuguesa, numa instituição onde estrangeiros trabalham, dia a dia, em perfeita sintonia com portugueses, igualmente profissionais e com uma longa dedicação - dos quais destaco a sua diretora-geral, aqui presente, Odete Patrício - cada um beneficiando das experiências diversas dos outros e todos, em conjunto, contribuindo para que Serralves seja uma “Instituição do Mundo”.

Desde sempre, Serralves trouxe a Portugal artistas que viajam e apresentam o seu trabalho pelo mundo inteiro, que foram espalhando a surpresa de encontrarem no Porto – nas palavras do próprios - uma das instituições museológicas onde melhor se trabalha, onde a sua obra é exposta de forma mais cuidada, sensível e inteligente - e onde, já agora, deram ótimos passeios, admiraram lindíssimos locais e foram muito bem recebidos. E todos sabemos o quanto o “passa a (boa) palavra” é importante!

Também a internacionalização dos artistas portugueses tem beneficiado desta vocação transnacional de Serralves: quer porque o seu trabalho é aqui visto pela primeira vez por diretores de museu e curadores estrangeiros que nos visitam regularmente e que, muitas vezes, convidam depois os nossos artistas para integrarem a programação dos seus espaços, quer porque Serralves tem conseguido estabelecer importantes parcerias com entidades congéneres espalhadas pelo mundo, para a organização conjunta de exposições individuais de artistas nacionais.

A programação do Museu, hoje reconhecida como uma das mais interessantes a nível europeu, foi aliás possível graças à colaboração frequente com legitimantes museus estrangeiros como, entre muitos outros, o MACBA, de Barcelona, o Reina Sofia, de Madrid, o Tate Modern e a Whitechapel Art Gallery de Londres, a Pinacoteca do Estado de São Paulo e os Whitney Museum e Salomon R. Guggenheim Museum, de Nova Iorque.

Sessao de abertura | Dra. Ana Pinho~

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É minha convicção que é na partilha de realidades e experiências diversas e na exposição a diferentes ideias e formas de trabalhar que as instituições se dinamizam, se enriquecem e se superam.

Uma das exposições que apresentamos neste momento, da artista iraniana Monir Sharoudy Farmanfarmaian, organizada em associação com o reputado Guggenheim de Nova Iorque, onde vai estar exposta a partir de março do próximo ano, é paradigmática do reconhecimento internacional do Museu de Serralves, que assim integra o circuito dos museus mais prestigiados do Mundo.

Não menos significativo é o facto do Museu de Serralves estar atualmente a colaborar com a Bienal de São Paulo na sua internacionalização, estando prevista a apresentação desta prestigiadíssima Bienal fora do Brasil, pela primeira vez, em Serralves, no outono de 2015.

Pensamos que a Fundação de Serralves tem ajudado a promover a imagem de Portugal no estrangeiro, posicionando-nos como um país criativo, dinâmico, rigoroso e mostrando um Portugal moderno, empreendedor e cosmopolita. Um renovado Portugal que desta forma vai conseguindo substituir-se à imagem de um país cinzento, estático e conservador, pouco atrativo para turistas e para investidores.

Para concluir, e porque muito se tem discutido sobre a ligação entre os mundos empresarial e cultural, devo aproveitar para reafirmar que Serralves, a par com muitos outros bons exemplos, é a prova de que estes dois universos não são incompatíveis e, bem pelo contrário, o desenvolvimento cultural tem um impacto muito benéfico na economia. Um país sem cultura poderá até ser rico de bens materiais, mas nunca será respeitado nem verdadeiramente relevante no mundo!

Termino agradecendo à Fundação AEP, na pessoa do seu Presidente, o Senhor Dr. Paulo Nunes de Almeida, ter continuado a depositar em Serralves a confiança de nos ter como instituição parceira para estas Jornadas e desejando que estas sejam, mais uma vez, um êxito.

Muito obrigada a todos!

SESSAO DE ABERTURA~

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Vou tentar hoje destacar alguns aspectos do panorama internacional que podem determinar a geopolítica e a geoeconomia das potências e dos grandes espaços.

Num momento de dúvidas, interrogações, riscos e ameaças, do Médio Oriente às fronteiras da Europa, começo pelas áreas e situações que podem pôr em causa, com maior intensidade e proximidade, a paz e a estabilidade internacionais, tentando perceber as suas causas e consequências. Enuncio depois algumas características da actual ordem ou desordem mundial, analisando a sua interacção com a Economia e a Cultura.

Por fim, deixo algumas considerações sobre o que nós portugueses – colectivamente, como povo e Estado, e individualmente, nas empresas e na vida cívica e pessoal – fizemos e podemos fazer, não apenas para sobreviver, mas para viver com a dignidade e a independência de uma nação antiga, pioneira, experiente nas rotas do mundo, criadora e comunicadora de tanta coisa grande e importante para a Humanidade.

OS RISCOS

O Estado Islamico

Desde o Verão de 2014 que as atenções mediáticas se concentram numa entidade político-militar surpreendente e mal identificada que começou por dar pelo acrónimo inglês de ISIS (Islamic State of Iraq and Syria) mas que, rapidamente, foi rebaptizada de IS, Islamic State ou Estado Islâmico, talvez por intuição dos seus dirigentes, mestres nas artes da propaganda.

Assim, sob a designação de um Estado mais vasto, uma designação simbólica e desligada da base territorial (100.000 km2 do noroeste do Iraque e do nordeste da Síria, com cerca de 7 milhões de habitantes), a força militar comandada por Al Baghdadi assumia uma vocação universalizante no mundo islâmico, reforçada pela referência ao califado, a tradicional autoridade político-religiosa da Umma, a comunidade dos crentes. O exército do califa Al Baghdadi, que se auto-intitula chefe dos fiéis, conta com uns 30.000 combatentes, convictos, fanatizados e bem armados, graças ao material norte-americano capturado à tropa de Bagdad. Dos quadros, uns são antigos oficiais do Exército de Saddam Hussein e outros têm longa experiência na guerra do Afeganistão, na guerrilha antiamericana no Iraque e na luta contra o clã Assad na Síria. A maioria são sunitas do Iraque e da Síria, em revolta contra os respectivos governos, mas há muitos voluntários dos países islâmicos

PALESTRA DE ABERTURADr. Jaime Nogueira Pinto

SESSAO DE ABERTURA~

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do Magrebe – tunisinos e marroquinos – e também sauditas e jovens ocidentais, alguns aventureiros, outros (a maior parte) oriundos das comunidades muçulmanas da Europa, das Américas e da Oceânia.

O Estado Islâmico quebrou a tradicional tolerância do Islão – não nos esqueçamos que, no Império Otomano, viviam em relativa tranquilidade muitos milhões de cristãos e judeus, mediante obediência civil e o pagamento de um imposto agravado. Ao contrário, estes novos muçulmanos exterminam os infiéis que não se querem converter e proclamam uma vontade expansionista ou de reconquista das antigas fronteiras do Islão.

Este aparecimento fulminante do Estado Islâmico, além de passar um atestado de incompetência aos serviços de inteligência e segurança, incapazes de o prever, tem como causa próxima a errática política ocidental, sobretudo norte-americana, em relação à região. Depois da chamada Segunda Guerra do Golfo, a invasão do Iraque impulsionada pelos neoconservadores da Administração George W. Bush foi uma operação militar eficaz mas que redundou num desastre político. Depois, a política externa de Barack Obama, quer em relação às Primaveras Árabes, quer na crise síria e na questão palestiniana, veio, paradoxalmente, reforçar esse desastre. Há ainda as causas remotas, que vêm da partilha do Médio Oriente, em Outubro de 1916, consagrada pelo pacto franco-britânico que carrega o nome dos dois burocratas que o assinaram – o ex-cônsul francês em Beirute, Charles Georges Picot, e o conselheiro para o Médio Oriente de Lord Kitchener, Mark Sykes.

Este pacto Sykes-Picot, assinado nos princípios do fim do mundo eurocêntrico, dividia o Médio Oriente entre zonas de influência francesa e inglesa, zonas de onde se iam expulsar os turcos. No fundo, tratava-se de estabelecer protectorados imperialistas sobre povos antigos, com elites nacionais emergentes. Esta colonização tardia, secreta e indirecta, pretendia usar como homens de mão ou de palha os potentados locais, que se julgavam manipuláveis.

Assim se criou o Médio Oriente dos nossos dias, instável, mal governado e dividido, quer em termos de regimes, quer em termos de fronteiras. Daqui também o ciclo infernal e violento da mudança política – das monarquias hereditárias para os regimes laicos militares e de partido único, convertidos em dinastias familiares: os Assad, os Hussein e os Mubarak. Seguiram-se as Primaveras Árabes e os seus contraproducentes resultados, multiplicando as linhas de inimizade na região e desencadeando uma espécie de hobbesiana guerra de todos contra todos.

Sessao de abertura | Palestra de Abertura - Dr. Jaime Nogueira Pinto ~

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Este caos não tem solução sem a compreensão das suas causas próximas e remotas, que acabaram por convergir. E o antagonismo israelo-árabe, derivado da situação na Palestina e de uma solução sempre adiada, mantém os países ocidentais reféns e manietados em muitas das suas iniciativas. Mas é preciso cuidado com a abordagem simplista e maniqueísta que extrai daqui um “perigo islâmico” global para o Ocidente, ou que preconiza a exportação dos modelos político-sociais euroamericanos como elixir mágico e curativo para todos os problemas. Já se viu – com a invasão do Iraque em 2003 ou a guerra da NATO no Afeganistão – que a exportação da democracia nas asas dos bombardeiros ou nas lagartas dos tanques é um desastre. E, com as Primaveras Árabes, talvez se tenha percebido que nem sempre nas “eleições livres e justas” o povo escolhe os democratas, ou aqueles que os nossos media ou opinion makers decidem apontar como os bons da fita.

Nos últimos dez anos, o Ocidente abriu, à toa, demasiadas garrafas com génios cativos, que eram muito bons até se revelarem péssimos. Tentou depois fazê-los voltar para dentro das respectivas garrafas, mas não teve nem a vontade nem os meios para o fazer. As ajudas ou armas económicas tão pouco têm capacidade de resolver situações limite de inimizade radical ou ligadas a interesses nacionais determinantes. Pense-se no retraimento progressivo em relação às posições americanas de países aliados de Washington, como a Turquia e a Arábia Saudita, e perceber-se-á a medida desta desconfiança. Como temos visto nos últimos tempos, O Estado Islâmico veio para ficar e a solução mais optimista parece ser a de o conter nos seus limites actuais.

A nova Russia de Putin

Outra área de risco, e esta mais próxima, é a fronteira que separa a Ucrânia e a Europa Oriental da Rússia. Do mesmo modo que os serviços de inteligência foram incapazes de prever a erupção do Estado Islâmico, também em relação ao líder da Rússia, Vladimir Putin, os políticos ocidentais demonstraram grande incapacidade de análise.

Mais uma vez, por preconceito ideológico e com a arrogância que caracteriza parte das elites políticas, burocráticas e mediáticas ocidentais, foram esquecidas a lições da História, da Cultura e até as imposições da Geografia. Preferiu-se a retórica maniqueísta e diabolizante ou mesmo a acção directa clandestina.

SESSAO DE ABERTURA~

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Na Primavera deste ano de 2014, a União Europeia resolveu encorajar os ucranianos que pretendiam aproximar-se da Europa a baterem-se contra a Rússia; isto depois de os ter mantido, anos a fio, numa espécie de sala de espera humilhante.

Vladimir Putin tem um percurso pessoal e político muito interessante, um percurso que valeria a pena estudar fora das lendas urbanas das biografias sensacionalistas. Quadro médio do antigo KGB, Putin usa os seus anos obscuros para escrever e defender uma tese de doutoramento sobre “a importância dos recursos energéticos para o poder nacional”. É um homem discreto, que cresce na sombra do clownesco e corruptíssimo Boris Yeltsin, de quem se fez, no Ocidente, um herói democrático. Putin chega ao poder a partir da Segurança de Estado e dirige uma recuperação económica e tecnológica da economia russa através da modernização e da reforma do sector energético. Depois, põe na ordem os chamados oligarcas, ou os super-ricos do pós-comunismo, explicando-lhes que podem ser ricos à vontade, desde que não se metam na política do Estado, que, essa, é com ele.

Putin não é nem um ressuscitador do comunismo soviético nem um novo Hitler, sedento de conquista global. É um nacionalista russo, puritano, realista, que cuidou da aliança com a Igreja Ortodoxa e de reunificar e reconciliar ideologicamente a História russa dos últimos 200 anos, reintroduzindo a ordem no caos mafioso deixado pelo seu antecessor. Na antecâmara do Gabinete, tem o retrato de Nicolau I, um Czar autoritário, religioso e nacionalista; o homem da guerra da Crimeia. E na Rússia de Putin fazem-se filmes em que generais Brancos da Guerra Civil, como o almirante Kolchak, são bem tratados.

Putin é um nacionalista histórico, realista e pragmático, que não quer perder a face perante os compatriotas. E note-se que a alternativa são os nacionalistas radicais e ultra-ortodoxos, inimigos do Ocidente, e não propriamente democratas centristas e humanitários. Putin sintetizou forças diversas e a sua Rússia continua a ser o segundo poder militar da terra. Não terá aspirações de domínio universal – como o comunismo internacional – nem a exaltação feérica e wagneriana de Hitler, mas tem uma agenda de restauração do prestígio e do poder nacional russo. Não pode, por isso, perder a face num ponto essencial para a alma russa nas áreas históricas da Ucrânia e da Rússia Branca. Os estrategas e funcionários ocidentais deviam ter percebido melhor este ponto: é que, para Putin, a Crimeia ou mesmo a Ucrânia Oriental são muito mais importantes do que para nós.

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A linha de fronteira de contenção da NATO passa pela Polónia e pelos Estados Bálticos. Nem mais nem menos. Se se tivesse dado à Ucrânia um estatuto semelhante ao da Finlândia na Guerra Fria, tudo seria diferente.

Dito isto, a zona oriental da Europa continua a ter uma previsibilidade que nada tem que ver com o alto risco inerente a uma área fragmentada e com protagonistas não estatais poderosos e irracionais como é o Médio Oriente e parte do Magrebe.

Na verdade, Putin – que influencia mas que não controla os nacionalistas russófilos da Ucrânia Oriental – procura agora uma saída airosa para a crise. Sabe que tem capacidade militar e recursos energéticos para recuperar espaços de influência perdidos no colapso da União Soviética e que a arma do gás natural é um elemento de pressão sobre a Ucrânia e a União Europeia, mas sabe também que lhe está a ser altamente prejudicial e arriscado envolver-se num confronto com os Estados Unidos e enfrentar uma escalada de sanções económicas e financeiras que pode levar a uma ruptura da economia russa.

A Rússia – e parte substancial da sua classe dirigente – tem a experiência histórica do grande poder, em termos militares e diplomáticos, e sabe como gerir, diplomaticamente, um mundo que vive com ressentimento a hegemonia americana. Putin vai procurar salvaguardar, na Europa, as boas relações com a Alemanha, com a Itália e com a França para contrabalançar a hostilidade natural da Polónia e dos Estados Bálticos. E vai, apesar de um capital de dificuldades históricas e culturais, progredir na aproximação à China, consolidando-se na Eurásia, para satisfação dos seus homólogos chineses que a hostilidade norte-americana atirou para os braços do Urso. No mesmo sentido de alargamento geoeconómico da Eurásia, visitou a Índia em meados de Dezembro, onde foi recebido pelo primeiro-ministro Narendra Mori. Putin e Mori falaram em aumentar o comércio bilateral (actualmente nos 10 biliões de dólares) e assinaram acordos no campo nuclear e no sector petrolífero e do gás. Também foram assinados protocolos no âmbito da Defesa e convencionadas políticas de entendimento na estabilização do Afeganistão, do Iraque e da Síria. São sinais claros da reacção russa ao cerco da NATO e às consequentes sanções.

Os dentes do dragao

Um terceiro ponto de risco é a Ásia-Pacífico, onde o poder nacional chinês pode confrontar-se com vizinhos como o Japão ou o Vietname. Os Estados Unidos podem ter reforçado estas

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tensões e exaltadas as desconfianças de Pequim ao declarar, na revisão do seu conceito estratégico, a prioridade da Ásia-Pacífico. Fizeram-no na qualidade de apaziguadores de tensões regionais, a fim de proteger aliados novos e antigos, como a Índia, o Vietname, a Indonésia, a Austrália, a Coreia do Sul e Taiwan, inquietos com o poder de Pequim. Mas os chineses entenderam a manobra como uma acção destinada a contê-los – e não gostaram.

Para a China, como para todas as grandes e antigas nações, a História tem um peso significativo e um sentido que se tem que levar em conta. E essa História, nos últimos duzentos anos e até às reformas de Deng Xiau Ping, foi uma história de abusos, invasões e humilhações impostas pelo estrangeiro, com base no poder material das armas: pelos ingleses com as guerras do ópio; pelos europeus e americanos no rescaldo da revolta dos Boxers; pelos japoneses numa invasão militar caracterizada por grande violência e opressão; e até pelos soviéticos, em 1949, apesar de aliados na fraternidade comunista.

Não nos podemos esquecer que há duzentos anos a China era a primeira economia do mundo. Deng, nacionalista e realista, percebeu o que movia o mundo contemporâneo e quis fazer a ponte da China com esse movimento. E o que movia o mundo não eram os slogans do marxismo-leninismo sobre produtividade, eram as realidades eternas do poder. Assim, tratou de dotar a China de um sistema económico compatível com a mudança e os interesses nacionais e fazer que a sua população arrancasse para o desenvolvimento e tornasse o país poderoso, ou seja, forte economicamente para poder ser forte politicamente. Daqui resultou um nacionalismo autoritário reformista, um capitalismo de direcção central, em que a economia é livre, mas só dentro dos objectivos estratégicos definidos pelo poder.

A China está rodeada de um anel de países com quem os Estados Unidos mantêm relações políticas e económicas de aliança e interesse: desde a Índia ao Japão, passando pela Indonésia, pela Austrália, pelas Filipinas e até – quem o diria há quarenta anos? – pelo Vietname.

Esta contenção actua face a um sistema que tem que gerir grandes equilíbrios internos entre crescimento, urbanização, criação de classe média e manutenção da hegemonia do Partido face a elementos centrífugos, sempre presentes.

A corrente prova de força em Hong Kong, as velhas tensões no Tibete, no Sinkiang, o objectivo central da reintegração pacífica de Taiwan, estão sempre presentes no pensamento estratégico do governo chinês, do qual podemos encontrar uma interessante

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síntese programática no estudo de um académico da Universidade de Pequim, o Prof. Wang Jisi: Marching Westwards. The Rebalancing of China’s Geostrategy. Nesse estudo de 2012, o Prof. Wang admite a natural ascensão do poder da China, a caminho da paridade com os Estados Unidos. Outro interessante documento estratégico é Creative Involvement. The

Evolution of China’s Global Rule, do Prof. Yizhou.

O actual líder da China, o Presidente Xi Jinping, parece consciente destas grandes constantes internas e internacionais e dos riscos e oportunidades implicados na possibilidade de a China vir a assumir um papel no mundo compatível com a sua dimensão demográfica, económica e histórica, sem que desperte uma coligação hostil na região Ásia-Pacífico, alimentada pelos receios dos poderes locais ameaçados. A sua “via do Ressurgimento” aponta para uma unidade de vigilância dos pontos de tensão interna – Tibete, Sinkiang, Hong Kong – e da periferia do anel do Pacífico, a Oriente; mas também para uma grande estratégia, a Euroasiática, assente na construção de vias de comunicação que liguem o Império do Meio ao Ocidente europeu – de Pequim a Berlim, passando pela Rússia e por algumas das antigas repúblicas da União Soviética. São as novas Estradas da Seda. Xi começou já por combater o fenómeno escandaloso da corrupção dos altos cargos do partido. Iniciou a depuração por altos dirigentes, como o ex-ministro da Segurança Zhon Yongkang e o antigo ministro do Comércio Bo Xilai, chegando agora a quadros superiores de multinacionais petrolíferas chinesas, como a CNPC e a CNOOC.

E O QUE FAZ O OCIDENTE?

O que faz o Ocidente, ou seja, o mundo euroamericano perante estes movimentos dos seus ex-inimigos ideológicos da Guerra Fria, dos Estados continuadores da União Soviética e da República Popular da China?

Numa primeira fase, nos finais do Império Soviético, dominou a política realista de George H. Bush, que cuidou de não humilhar o vencido e promover uma “aterragem suave”, no rescaldo da derrota e do desmembramento da União Soviética.

Mas seguiu-se-lhe a euforia ideológica americana dos anos noventa. Levou-se a NATO até às fronteiras da Rússia e procurou-se também, como arma ideológica, impor aos vencidos as instituições político-económicas dos vencedores. Foi a década da hegemonia americana, os anos da Presidência Clinton, da euforia do Fim da História, em que se acreditou que, daí

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para diante, todo o mundo, da Ásia Central às florestas do Congo, seria liberal-democrático e viveria em paz, em estáveis economias de mercado.

Era a profecia de Francis Fukuyama do “fim da História”, reescrevendo o que Hegel afirmara depois das guerras napoleónicas.

Alguns sinais premonitórios deviam ter alertado os mais optimistas: a década do colapso da União Soviética e da libertação da Europa Oriental, da consolidação do “milagre económico chinês”, da transição pacífica na África do Sul, da emergência das economias indiana e brasileira, fora também o tempo das guerras civis nos Balcãs, do genocídio do Ruanda, das guerras étnicas da Libéria e da Serra Leoa. Ou seja, a História podia acabar mas mesmo que acabasse, nunca acabava para todos.

A Europa e os Estados Unidos quiseram proceder à evangelização democrática sem se darem conta de que havia pressupostos culturais, políticos e religiosos na experiência histórica do modelo: o Cristianismo e a Nação. E que, na ausência de Cristianismo e de Nação, o sistema democrático não funcionava ou funcionava mal.

Os ataques da Al Qaeda, pela sua magnitude e pelos alvos escolhidos – os símbolos do poder do país líder do mundo – foram a certidão de óbito desse optimismo. Também durou pouco a reacção de solidariedade em volta da resposta norte-americana e das operações no Afeganistão, que levaram ao derrube do poder dos Talibãs em Kabul, anfitriões do terrorismo internacional e base da galáxia Bin Laden. Os planos da Administração Georges W. Bush , ao confundirem a guerra antiterrorista com o ataque e o derrube do governo de Bagdad, puseram-lhe fim.

Sadam Hussein podia ser – e era – um tirano da pior espécie, mas não tinha nada que ver com os terroristas religiosos da Al Qaeda, nem possuía armas de destruição maciça utilizáveis contra os Estados Unidos, de quem tinha um medo quase paranóico. Por isso, a Segunda Guerra do Golfo dividiu os aliados ocidentais – com a França e a Alemanha a oporem-se nas Nações Unidas, bem como a Arábia Saudita e a Turquia, aliados regionais importantes. Hoje sabemos que a operação conduziu à divisão do Iraque, a uma ainda maior fragmentação do Médio Oriente e à criação de entidades supra territoriais – como o Estado Islâmico – bem mais difíceis de controlar, como suportes do terrorismo, que Estados convencionais com domicílio, governo e palácio presidencial – esses sim, ao alcance das “nossas” armas de destruição maciça.

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É certo que não se repetiram macro atentados contra os Estados Unidos e a Europa, o que abona a favor da capacidade preventiva da campanha antiterrorista. No entanto, é sobretudo à politização da Al Qaeda que se deve o abandono dos ataques apocalípticos em favor de acções mais pensadas e, sobretudo, preferencialmente dirigidas a alvos muçulmanos. Mas é também certo que os custos das operações no Afeganistão e no Iraque resultaram em mais um complexo tipo Vietname, levando ao retraimento americano, não só no Afeganistão e no Iraque, mas no próprio Médio Oriente e, em geral, no mundo. A Administração Obama, além de se mostrar híper-cautelosa em relação a qualquer intervenção externa – sobretudo se implicar baixas em combate – governa muito ao sabor de sondagens de opinião. O que é preocupante num superpoder em que muitos ainda confiam.

Isto não tem evitado escândalos de espionagem norte-americanos, como o ocorrido com a Alemanha, que levou ao limite a cólera do ministro Schauble e as sequelas dos casos Wikileaks e Snowden, que aumentaram a desconfiança dos aliados em relação à correcção política do “grande irmão” americano.

É certo que a economia dos Estados Unidos recuperou mais rapidamente que a europeia da crise financeira de 2008 e que o FED e o Tesouro responderam com plasticidade e bom senso à crise e aos seus ónus económico-sociais, em contraste com a rigidez germânica quanto às dívidas soberanas e à política do Euro. E que a revolução energética adivinhável a partir do shale-gas vai alterar, não só a equação energética mundial, mas também os próprios dados da Geopolítica e Geoeconomia convencionais. No entanto, estes progressos energéticos aumentaram os receios de desengajamento dos EUA no Médio Oriente, semeando grandes inquietações nos poderes locais.

A Europa e a Alemanha

A Europa e a União Europeia também não se apresentam em grande forma: a tentativa de passagem do que era uma bem-sucedida associação económica e até financeira para uma integração confederal-federal a caminho de um super-Estado europeu sem o cimento histórico-cultural da nação está a redundar em fracasso. As resistências aos projectos integradores são visíveis no progresso dos partidos eurocépticos em Estados essenciais para a construção europeia, como a França e a Grã-Bretanha, e no correspondente

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crescimento do bloco soberanista no Parlamento de Estrasburgo. Mais graves ainda são as tendências separatistas, adiadas mas não neutralizadas, em países como o Reino Unido, com a Escócia, e a Espanha, com a Catalunha.

Esta crise permanente da União Europeia não é tão estranha se pensarmos um pouco naquilo que faz o poder económico das nações e aquilo que os países europeus hoje produzem. A Europa não tem recursos energéticos nem alimentares bastantes; com excepção da Alemanha e mais duas ou três economias muito especiais, deixou de ter uma indústria exportadora e deixou de ser a fábrica do mundo; sistemas sociais generosos, que outrora significavam um avanço civilizacional, tornaram-se insustentáveis pelo lado dos custos. As mudanças da demografia afectam os Estados que, como unidades produtivas na competição económica mundial, ficam pouco atractivos para os mercados. E em países como a França e a Suécia, a imigração não-europeia tende a desencadear uma crise de identidade, com efeitos traumáticos em parte das populações.

A Europa, ao habituar-se a ser defendida pelos Estados Unidos e a cultivar uma cosmovisão kantiana, para não dizer panglossiana, deixou de gastar com a Defesa e de ter poder militar ao nível do estatuto que reclama. O que é ainda mais grave, quando economicamente atravessa dificuldades e corre o risco de deflacção e de estagnação à japonesa.

O Velho Continente tem conseguido manter uma certa qualidade de vida, num quadro de decadência do poder, até porque aqueles que ganham fortunas noutros continentes vêm aqui investir no luxo, no conforto e na segurança que ainda oferece. Também no mundo Antigo se vivia muito bem em cidades decadentes como Antioquia ou Alexandria.

A própria indefinição estratégica do país líder da Europa Continental, a Alemanha, reunificada com coragem e à pressão por Helmut Kohl na agonia da União Soviética, é sintomática desta indecisão. Como escreve Timothy Garton-Ash, a Alemanha não deseja secretamente mandar na Europa por meios financeiros ou económico-financeiros, nem se propõe vingar duas derrotas e humilhações consecutivas pagando as contas dos seus consórcios europeus deficitários ou financeiramente débeis para os poder comandar politicamente. Mandará se isso lhe acontecer naturalmente e sem grandes custos. De todos os países europeus, a Alemanha é quem tem mais escolhas. Sempre teve.

Esquece-se às vezes, essa grande indecisão histórica da Alemanha, entre Ocidente e Leste; esquece-se que, no século XIX, houve uma tensão entre a Alemanha de Frankfurt

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e a Prússia de Berlim. E que foi esta – a Prússia –, com o seu poder militar e a vontade do Chanceler Bismarck, que fez a unificação. E que essa unificação do mundo germânico – em volta da Prússia dos Hohenzolern e não do sul católico bávaro ou mesmo do Império dos Habsburgo – teve consequências.

Drang nach Osten, a marcha para o Leste, é uma tentação e uma tradição latente nas Alemanhas reunificadas: podendo ir da Aliança ideológica com a Rússia czarista sustentada por Bismarck, à tentação dos nacionais-bolcheviques entre duas guerras, ou mesmo à agressão político-militar do III Reich na campanha da Rússia e nos seus planos económico-demográficos para a Grande Planície leste-europeia.

Uma das regras da potência hegemónica é – deve ser - manter boas relações com cada uma das suas concorrentes mais próximas, as segundas, terceiras e quartas classificadas, a fim de que não se unam numa coligação contra ela. Assim fez a Grã-Bretanha no século XIX e os EUA no tempo de Nixon com a URSS e a China. Ora os Estados Unidos de Obama fizeram o contrário ao lançar uma espécie de pacto de vigilância e contenção à China por motivos ideológicos (por deficit democrático e por desrespeito dos direitos humanos) ao mesmo tempo que hostilizavam Putin e a Rússia, pelas mesmas razões e pelo caso da Ucrânia.

Os Estados Unidos têm despertado a hostilidade da Alemanha, tratando-a como o protegido do tempo da Guerra Fria e espiando os seus dirigentes. Ora a Guerra Fria acabou, e a Alemanha, graças às reformas económicas de Schröder, recuperou a capacidade económica e industrial. Contínua débil na defesa, como consequência de guerras mundiais perdidas e refractária a qualquer política armamentista. Tem também fortes ligações com a Rússia, apesar da tensão actual com Putin por causa da Ucrânia, e tem cultivado e multiplicado as relações com a China, quer a nível cultural, quer a nível comercial e de investimento.

Com as suas políticas hostis à Rússia, à China e até à Alemanha, não acabarão os Estados Unidos por levá-las a uma aproximação no coração da Eurásia? É uma hipótese a ter em conta.

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Uma Estranha Troika

No dia 21 de Maio do corrente ano de 2014 a China e a Rússia assinaram, em Xangai, um contrato a trinta anos para o fornecimento de gás natural russo a Pequim. O contrato começará em 2018 e a China vai financiar as infra-estruturas necessárias – entre elas um gasoduto de 4.000 Km – com um empréstimo de 50 biliões de dólares. As negociações arrastavam-se há dez anos e a aceitação por Putin indicia que, subjacente ao tratado comercial, houve uma componente geopolítica importante. O acordo deu-se em plena crise de confrontação russo-ocidental por causa da Ucrânia.

Não podem ficar dúvidas de que uma das razões principais do Acordo Sino-Russo tem que ver com uma política de poderes emergentes que se sentiram objecto da contenção directa ou indirecta dos norte-americanos. Reagiram também ao discurso político ocidental sobre a democracia e os direitos e liberdades que podem perturbar a sua estabilidade interna e que, com razão ou sem ela, vêem como uma ameaça.

Putin não podia deixar de reagir ao papel do Ocidente – e sobretudo de Washington – no derrube do pró-russo Yakubovich em Kiev. Para o Kremlin, tratou-se de uma intromissão no seu espaço vital próximo.

A resposta foi a anexação da Crimeia, onde Nicolau I se batera contra os turcos e os anglo-franceses. Daí também o apoio de Putin aos elementos russófilos da Ucrânia Oriental. Um jogo perigoso, incluindo chantagem energética, num quadro em que o presidente russo não pode perder a face.

A ignorância das características histórico-culturais da nova Rússia e a pouca atenção a fenómenos de convergência patriótica foi causadora de erros europeus e americanos na aproximação a Moscovo. Não se pode nem se deve – por incompetência diplomática, rigidez ideológica ou simples arrogância – cortar as saídas honrosas e airosas a Putin, atirando-o para decisões radicais.

No último século, alterou-se a balança dos poderes mundiais. Dantes, os cinco grandes eram europeus: agora são os Estados Unidos, a Europa, a China, a Rússia e a Índia.

Embora os Estados Unidos e a União Europeia se mantenham em número 1 e 2 na Economia mundial, têm contra eles a lógica dos grandes números e as taxas de crescimento.

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A NOVA DESORDEM MUNDIAL

Tentarei agora sumarizar algumas características essenciais neste novo mundo:

1- Passámos de um tempo, o da Guerra Fria, em que as grandes coordenadas da vida política e económica eram relativamente estáveis, para um tempo de grande indeterminação e volatilidade.Desde as categorias políticas (como as fronteiras ou as alianças interestatais e os regimes constitucionais) até aos principais factores financeiros e económicos (câmbios, preços da energia, das matérias primas, da comida), todas estas variáveis passaram a ser muito mais instáveis e indeterminadas, por força da globalização económica e financeira. Estamos a ver isso neste final de ano, com a baixa dramática dos preços do crude. Apesar das explicações conspiratórias, a realidade é que, mais que arranjos políticos entre os americanos e sauditas contra os russos ou de uma ofensiva dos sauditas para tornar ruinoso o shale-gas norte-americano, é o mercado, com toda a sua “destruição criativa” – ou simplesmente destrutiva –, que está na base desta derrocada dos preços, que tem implicações profundas na geoeconomia e na geopolítica mundiais.

2- As ideologias políticas hoje dominantes – nacionalismo e democracia – podem assumir uma forte carga desestabilizadora dos Estados e dos regimes políticos, como temos vindo a ver nos Balcãs, no Magrebe, na África Subsaariana e na Europa Oriental. E podem mesmo, como na Escócia e na Catalunha, desencadear tensões separatistas, por ora sob controlo, mas que vão continuar.

3- Em vez das grandes coligações de Estados da Guerra Fria, unidos por ideologias, interesses e riscos comuns e permanentes, há hoje tendência para a particularização e fragmentação, resultantes de uma geometria variável de políticas e acordos bilaterais. Isto porque os interesses nacionais concretos e imediatos levam à quebra ou transformação constante de alianças e de solidariedades estabelecidas. Esta geometria variável tem resultados surpreendentes: face ao Estado Islâmico, a Arábia Saudita aproximou-se do Irão xiita, enquanto, pouco tempo antes, perante o crescimento do poder do Irão, se tinha secretamente aproximado de Israel.

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4-Também não se verificam entre os novos poderes emergentes algumas das constantes da História político-social ocidental, pelo que se torna perigoso generalizar com base nessa tradição. Assim, a emergência de uma classe média na China e na Rússia pode não levar a uma democratização ou liberalização dos sistemas políticos. Vê-se aí, como nas experiências europeias do século XIX e do nacionalismo autoritário no século XX, o convívio entre a economia de mercado e o monopólio político-partidário.

5- As tendências gerais da demografia indicam que, nos próximos 15 anos, a população mundial, hoje de 7.100 milhões de pessoas, passará para 8.300 milhões. Neste acentuado crescimento, há que registar algumas especificidades e discrepâncias:

● Elevado envelhecimento no mundo euro-americano e no Extremo Oriente (Japão), com consequências económicas e políticas muito significativas, em termos de desenvolvimento e projecção do poder nacional.

● Diminuição dos “países jovens”, isto é, daqueles em que a idade média da população é de 25 anos ou menor. Estes países, que hoje são 80, não passarão de 50 em 2030.

● Continuação das migrações mas, ao contrário das grandes vagas do século XIX e princípios do séc.XX, da Europa para as Américas, os novos fluxos migratórios serão de proximidade ou até dentro das fronteiras dos Estados. Serão sobretudo ditadas por alterações climatéricas e pela urbanização acelerada e estarão também ligadas a trocas de especialistas e profissionais. Entretanto, outras migrações, semelhantes às que recebem países europeus como a França e a Suécia, podem atingir a identidade dos países-anfitriões, pela diferença cultural e pela elevada proporção dos imigrantes em relação à população indígena, desencadeando movimentos defensivos de características políticas etnocêntricas, geradores de conflitualidade.

● Uma palavra especial para África, que é demográfica mas que também é histórica. Entre o século VIII e o século XX, cerca de 17 milhões de africanos da costa oriental foram vítimas do tráfico de escravos do Oceano Índico. Entre o século XV e o século XIX, 11 milhões foram vítimas do tráfico atlântico. Uns e outros foram, contra sua vontade, levados para outras paragens. Talvez por isso a população de África se tenha mantido praticamente inalterável, enquanto as populações da Europa e da China se multiplicaram. Já não é nem será assim: a população africana cresceu sete vezes

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durante o século XX e pode crescer cinco vezes durante o século XXI, sendo a África Subsaariana a região que apresenta as maiores taxas de crescimento demográfico do mundo.

Com uma população de 180 milhões de pessoas em 1950, a África Subsaariana passou para 639 milhões em 2000 e para 831 milhões em 2010. Prevê-se que até 2100 vá, no mínimo, quadruplicar.

Esta população está também a urbanizar-se a um ritmo excecional. Em 1950, não existia em África uma única cidade com um milhão de habitantes, hoje há cerca de 40, das quais algumas, como Lagos e Kinshasa, são verdadeiros formigueiros.

Os grandes problemas dos países de África têm que ver com a sua recente, e por isso ainda incerta, estatalidade; isto é, com a criação de Estados soberanos e a construção de identidades nacionais a partir de antigos espaços ou territórios coloniais, agregados muitas vezes com base em considerações oportunistas ou através de acertos de fronteiras, decididos nas chancelarias europeias.

Neste ponto, a África Austral – e especialmente os lusófonos Angola e Moçambique – singularizam-se por uma história política diferente, mais semelhante à das nações da Europa e das Américas: guerras de independência e conflitos internos que decidiram o poder, em vez de independências outorgadas ou concedidas, que deixaram que divisões tribais e religiosas tomassem o lugar dos interesses nacionais.

E PORTUGAL?

A nossa modesta dimensão demográfica e económica actual torna-nos pequenos perante os grandes poderes, forças e tendências que regem e movem o mundo. Mas o facto de sermos um dos raros Estados nacionais em que as fronteiras políticas do Estado coincidem com as fronteiras histórico-culturais da Nação também conta, sobretudo num tempo em que a conflitualidade resulta de factores fracturantes, religiosos, étnicos ou até “regionais”, muito mais que das diferenças de renda ou da luta de classes.

Mais do que o tamanho, o nosso problema tem a ver com a falta de futuro ditada pela nossa visão e percepção da História. Esse mau relacionamento com a própria História vem de duas conclusões erradas a partir de uma premissa certa.

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A premissa certa é a de que somos uma nação muito antiga, que demonstrou na História e nos seus perigos, sob diversos regimes, políticas e circunstâncias internacionais, uma grande capacidade de viver, sobreviver e guardar a independência entre vicissitudes extremas e rupturas políticas e territoriais. Fomos os pioneiros europeus na navegação e na descoberta de grande parte das terras do globo. Com uma população pequena, sem grandes recursos agrícolas, aproveitámos então algumas vantagens políticas – a unidade e centralização do poder conseguidas numa Europa cujos Estados estavam ainda nas guerras civis e dinásticas – para tomar a dianteira numa internacionalização ditada por razões ideológicas, políticas e de sobrevivência económica.

O Infante D. Henrique teve então – apoiado pela Coroa – a faculdade de reunir os recursos humanos e técnicos, os capitais e os capitães necessários para a navegação, conquista e comércio da Expansão. E o país foi capaz de manter uma presença e influência em pontos estratégicos nos séculos XVI e XVII, do Brasil colonial às fortalezas e feitorias, que garantiam o monopólio do comércio do Índico e as rotas marítimas da costa de África e do Atlântico.

Mas de toda esta História tirámos conclusões erradas, geralmente por razões ideológicas:

À direita, exaltou-se e exalta-se miticamente a “gloriosa empresa”, como se fosse apenas uma obra de fé e espada cristãs, sem interesses materiais e racionalidade estratégica. Relegando a História portuguesa para uma impossível e inatingível grandeza, fica-se prisioneiro do passado e recusa-se o presente. Vive-se por procuração em sonhos de grandes feitos.

À esquerda, pelo contrário, quis-se e quer-se ver na História portuguesa um imperialismo beato e explorador, uma decadência motivada pela influência da Igreja católica e da fé católica no poder político, que nos retirou do número das nações progressistas e industriosas.

Sem polémica – que é interessante mas para a qual não há aqui tempo nem espaço – acho que falta perceber que a nossa grandeza e a sobrevivência nacional dependeram sempre da convergência do Estado com a Nação, das elites com o povo, do sonho de pensar um projecto com a razão fria, realista e prática de o executar; uma convergência ditada pelo imperativo do bem comum inteligentemente identificado, sem utopias futuristas nem mitos passadistas.

Sessao de abertura | Palestra de Abertura - Dr. Jaime Nogueira Pinto ~

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Se formos capazes de refazer esse espírito e de lhe seguir os caminhos; se, apesar das desgraças e degradações públicas e privadas que se têm abatido sobre o país nestes últimos tempos e particularmente no ano que agora termina, soubermos adaptar as grandes qualidades da nação e do povo – de coragem, de imaginação, de austeridade, de paciência, de resistência, de plasticidade, de respeito e percepção do outro e até de um certo sentido de humor na grande provação –, talvez possamos encarar com confiança, esperança e até optimismo o mundo dos outros, onde sempre estivemos bem e onde sempre soubemos encontrar uma razão de existir nacional e universal – isto é, própria e comum – de existir. Sozinhos ou acompanhados.

Moderador - Dr. Paulo Nunes de Almeida

Queria agradecer ao Sr. Dr. Jaime Nogueira Pinto a brilhante intervenção que nos trouxe, a abordagem global que fez, deste mundo que nós hoje vamos aqui discutir e também os alertas e as causas, muitas das vezes, do insucesso da nossa perfeita integração no mundo que nos rodeia. Acho que foi um excelente aperitivo para os oradores que se vão seguir, como disse, temos de ser muito rigorosos com a gestão do tempo e por isso eu agradeço aos meus colegas de mesa nesta sessão de inauguração e em particular ao Dr. Jaime Nogueira Pinto por ter estado connosco e ter correspondido ao convite que lhe foi feito pelo Sr. Prof. Valente de Oliveira em nome das duas Fundações e convidaria, desde já, o Sr. Professor para moderar a primeira de sessão sobre as ligações de Portugal ao exterior e os seus convidados para nos falarem sobre essas mesmas ligações que Portugal tem por esse mundo fora. Muito obrigado.

SESSAO DE ABERTURA~

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PRIMEIRA SESSÃO AS LIGAÇÕES DE PORTUGAL AO EXTERIOR

Moderador: Prof. Luís Valente de Oliveira

“Os transportes marítimos”Dr. Luís Marques - Rangel Invest SA

“As ligações ferroviárias”Eng.º Miguel Lisboa - TAKARGO – Transporte de Mercadorias SA

“As ligações intermodais”Dr. Ricardo Afonso - Transdev Portugal

“As ligações aéreas”Dr. Fernando Vieira - ANA - Aeroporto do Porto

“As tecnologias de informação e comunicação”Eng.º Carlos Alves Duarte - PT Portugal Telecom

COMUNICACOES´

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A Comissão Europeia definiu uma rede transeuropeia de transportes a que dá prioridade. Teve a coragem de definir os centros principais e os centros menos importantes, mas que ainda o são suficientemente para merecerem atenção, e estabeleceu pela primeira vez uma rede de nove corredores que atravessam a Europa, de lés a lés. Portugal, na sequência daquilo que é chamada a parceria com a Comunidade Europeia, a parceria 2020, aquilo que já foi chamado o quadro comunitário de apoio, ou o QREN, dá um enorme relevo à parte dos transportes.

Dá também relevo à parte da educação e formação, mas a parte das ligações com o mundo e com a Europa são muito importantes. Daí, quando nós tratamos da posição de Portugal no mundo, quer como local de investimento, quer como local de exportação, temos de olhar naturalmente para os transportes e para essas ligações. Nós não somos uma ilha mas temos que ter comportamentos de ilha ou perspectivas de ilha para nos ligarmos a todo o resto do mundo. E por isso a importância de todos os meios de transporte incluindo o marítimo e a preocupação de dar à logística um papel muito especial. E a preocupação de articular todos os modos de transporte, aproveitando as vantagens e as vocações de cada um desses modos de transporte. Nós hoje vamos fazer uma revisão do que são essas ligações: os marítimos, os aéreos, as ligações ferroviárias, as ligações intermodais, porque a logística vive do aproveitamento da vocação de cada transporte para o trajecto, para a carga, para o tipo de carga, para a urgência dessa carga, para o valor dessa carga e, por isso, tudo tem que ser pensado. A logística está em crescendo, a logística é uma área indispensável e é uma área de futuro. É evidente que nas telecomunicações também não pode haver falhas e por isso também as tratamos. É isso que vamos fazer hoje.

O primeiro dos sectores vai ser o dos transportes marítimos. Nós conhecemos todos, em Portugal e no Porto, em especial, a firma Rangel. Há muitos anos que ela faz bons serviços neste domínio. Temos, para nos falar dos transportes marítimos, o Dr. Luís Marques que é o administrador da Rangel Invest SA. Ele é professor, é doutorado em ciências empresariais, pela Faculdade de Economia do Porto e é professor auxiliar convidado da Universidade Católica do Porto.

Anteriormente esteve ligado aos Portos de Aveiro e da Figueira da Foz. É neste momento membro da comissão da ESPO (European Sea Port Organization) e é vogal da Associação de Promoção do Transporte Marítimo de Curta Distância, a que nós temos de dar muita importância. É preciso lembrarmo-nos de que, dentro da Europa, em relação ao transporte marítimo, ele é responsável por 40 % das ligações e com o exterior mais de 75 ou 80 %. De

AS LIGAÇÕES DE PORTUGAL AO EXTERIORModerador: Prof. Luís Valente de Oliveira

PRIMEIRA SESSAO ~

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maneira que os transportes marítimos são um transporte do futuro em muitos aspectos. Temos que lhe dar a maior atenção e é por ele que começamos a nossa análise.

Sr. Dr., fará o favor.

Primeira Sessao - As ligacoes de Portugal ao exterior | Prof. Luís Valente de Oliveira~

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PRIMEIRA SESSAO

Ora, muito bom dia a todos e muito obrigado. Muito obrigado, Sr. Professor Valente de Oliveira pelo amável convite para hoje partilharmos um pouco daquilo que é a nossa perspectiva e experiência nos transportes marítimos. Para esta apresentação, propunha-vos seguir uma agenda que começa com o primeiro ponto, necessariamente de diagnóstico, usando as palavras do Sr. Professor, revisão. Revisão daquilo que é o contributo, o papel do transporte marítimo na economia internacional, para depois irmos afunilando geograficamente pela economia europeia até à economia portuguesa. Chegados aqui, faríamos um balanço daquilo que é a estratégia recentemente anunciada para os transportes marítimos, muito focada naquilo que é o contributo dos portos em Portugal, e depois passamos para um nível de detalhe com a análise de três casos que chamaria de análise de um ponto forte e de boas oportunidades. Finalizávamos com as conclusões.

O transporte marítimo, essencialmente desde o início da década noventa do século passado, tem vindo a apresentar um crescimento, muito relacionado com aquilo que é o crescimento do comércio internacional. Este crescimento do transporte marítimo em termos quantitativos, encontra expressão num factor que multiplica por 3,6 aquilo que é o crescimento económico mundial. Mesmo ao nível das projecções para o futuro, estas projecções variam entre a manutenção deste factor multiplicativo 3,6 até aquilo que é uma revisão mais recente e em baixa, ainda não consensualizada, sobretudo para o tráfego contentorizado, deste factor multiplicativo para 1.5. Apesar de tudo, regista-se a continuidade do crescimento. Regista-se a continuidade, também, do contributo para a competitividade das economias daquilo que é o transporte marítimo. Num estudo recente, defendia-se mesmo que a contentorização é um dos drivers da globalização, portanto o transporte marítimo aqui como um factor muito relevante da globalização e em particular da competitividade das economias. A Europa não é excepção, pela sua abertura ao comércio internacional, não é a excepção àquilo que é o importante papel do transporte marítimo. Vemos nesta figura apenas os 8 pontos que têm maior expressão naquilo que são os tráfegos para a Europa, a diversificação desses tráfegos acompanham necessariamente no comércio internacional e vemos a estatística dos 90 % de peso do comércio externo naquilo que é este modo de transporte. Finalmente, Portugal e aqui, se olharmos para a estatística de movimentação de carga nos portos nacionais, acompanha de um certo modo, embora num intervalo mais baixo, aquilo que é o crescimento do transporte marítimo, sendo relevante para o efeito, o recente salto que terá continuidade, estimamos, em 2014, o recente salto naquilo que é o volume total de cargas que passam

“Os transportes marítimos”

Rangel Invest SADr. Luís Marques

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pelos portos, obviamente não é de afastar o comportamento das exportações nacionais. Ora, se é este o contexto que temos para o transporte marítimo em termos mundiais, um histórico de crescimento, uma estimativa futura de continuidade desse crescimento se tivermos em consideração o importante contributo que o transporte marítimo dá para a competitividade das economias, qual é a estratégia de Portugal para o transporte marítimo? Muito recentemente, no ano passado, um conjunto de stakeholders convidados pelo governo decidiu juntar-se e reflectir sobre estas temáticas naquilo que ficou conhecido como um plano estratégico dos transportes e infra-estruturas. Um dos capítulos de estudo, de diagnóstico e apresentação de soluções, foi precisamente este dos transportes marítimos. Esse conjunto de stakeholders começou um trabalho não olhando para uma folha em branco mas olhando para aquilo que o Sr. Prof. Valente de Oliveira referiu na sua introdução, isto é, aquilo que é o mapa das redes transeuropeias de transportes. Esta é uma alteração de paradigma ao nível de planeamento das redes de transportes na Europa, alteração cuja principal característica é a integração dos vários modos de transporte em corredores europeus. Relevante para o ordenamento, relevante para aquilo que é a política de transportes na Europa, muito relevante obviamente para um país como Portugal, que nós vemos integrado nas redes transeuropeias e no que concerne ao transporte marítimo, aqui integrado em duas das redes. Estas redes transeuropeias dividem-se nas redes, na rede core e na rede comprehensive. Na rede core, temos os portos de Leixões, Lisboa e Sines e na rede comprehensive temos, entre outros, os portos de Aveiro e de Setúbal. Muito relevante, não só fazemos parte desta rede de transportes, muito relevante se entendemos ao estado das finanças públicas, porque no Horizonte 2020 o financiamento comunitário será canalizado principalmente para as infra-estruturas que tiverem inseridas nestas redes, com uma prioridade para as infra-estruturas que estiverem inseridas na rede core. Foi com base neste mapa e nesta vontade estratégica da Comissão Europeia que se desenhou o plano estratégico dos transportes e das infra-estruturas e nesse plano identificaram-se um conjunto de constrangimentos e apresentaram-se algumas soluções. Os constrangimentos, não os vamos visitar a todos, diríamos apenas que eles estão alinhados com aquilo que é, ou o que são, os atributos de valor na decisão dos clientes mais directos, dos portos e aqueles que são os armadores, proprietários ou operadores de navios de transporte marítimo, isso é identificamos como constrangimento ao desenvolvimento do transporte marítimo em Portugal, as condições de acessibilidade marítima e a recepção de navios e as limitações à capacidade.

Apresentam-se um conjunto de soluções de melhoria da operação e realçada a vontade política de integrarmos todos os portos nacionais naquilo que é a rede transeuropeia de

Primeira Sessao - Os transportes maritimos | Dr. Luís Marques~ ´

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transportes. Continuamos a fazer parte de um maior número de soluções possível. Dentro desta rede, é fundamental para nos colocarmos naquilo que são as cadeias logísticas europeias mas também mundiais, é fundamental para acompanharmos aquilo que é a estimativa de crescimento do transporte marítimo e acompanhamos com investimento em infra-estruturas necessárias face aos constrangimentos que estão apontados, e uma solução também de base tecnológica naquilo que é um Case study, aquilo que o Sr. Prof. vai ouvindo pela sua passagem por Bruxelas, que é um Case study de sucesso dos portos e transportes marítimos em Portugal que é a janela única portuária. Tem vindo a ser, muitas vezes dado como exemplo pela Comissão Europeia esta solução tecnológica que procura, não só tornar mais eficiente aquilo que é o processo documental do transporte marítimo, mas procura congregar capacidade e oportunidades de coordenação num conjunto vasto de actores nestas redes logísticas. Ora, estas soluções deram origem a um conjunto de projectos, dos quais, perante estes cenários de crescimento de transportes marítimos, realçaria a construção de novos terminais. E naquilo que concerne à contentorização, ao transporte marítimo com base em contentores, realçava a construção de novos terminais em Leixões, a construção também de um novo terminal que tem vindo a ser explorado quanto à sua localização, em Lisboa e a ampliação do terminal 21 em Sines. E é sobre este terminal 21 em Sines que passaria para análise do primeiro caso, chamando-lhe um ponto forte e que iria procurar demonstrar o porquê desta designação, que é precisamente o caso de Sines. E o caso de Sines, este mapa é de 2008, o caso de Sines começa desde logo pelo seu posicionamento geográfico, não é só Sines, é toda a fachada atlântica de Portugal, mas em particular e se segmentarmos o transporte marítimo de contentores, naquilo que é o tráfego intercontinental, que dá origem a operações portuárias como o transhipment, o tráfego entre diferentes continentes, aquele que é o seu posicionamento geográfico, passo a redundância num posicionamento privilegiado nas principais rotas de transhipment que vemos no mapa. Sines tem evoluído não só num posicionamento geográfico mas para uma efectividade geográfica. Isto porquê? Porque ao longo de vários anos um planeamento coerente dentro daquilo que eram e foram as políticas públicas e aquilo que foi a iniciativa e a parceria privada, possibilitaram que Sines, hoje seja efectivamente uma porta de ligação de Portugal ao exterior. Sines é hoje, fruto de uma aliança estratégica entre aquele que é o maior operador mundial de contentores, a PSA, e aquele que é o segundo maior armador mundial nestas tipologias de tráfego, a MSC, coloca Portugal em rotas que passam por Sines, fazem operação portuária em Sines e coloca Portugal nestas rotas de ligação a todos os continentes. É importante um caso que chamamos de ponto forte porque se á muitos anos atrás falaríamos neste tipo de eventos,

PRIMEIRA SESSAO ~

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que Sines veria passar os navios ao largo, neste momento os navios já não passam ao largo, já tocam neste porto, possibilitando uma distribuição geográfica intercontinental já equilibrada e possibilitando e agora olhando para o futuro que Sines seja um dos poucos portos que está capacitado para receber os navios que já não são os navios do futuro, já são navios que entraram nas cadeias logísticas de transporte marítimo intercontinental, este navio que vemos no fundo da imagem, é um navio do determinado tipo post-panamax, é um navio que pelas suas dimensões tem vindo a ser procurado como investimento pelos grandes armadores mundiais, ele captura as economias de escala que são necessárias para atingir as rentabilidades pretendidas, destes armadores. É um navio que está a ser introduzido actualmente nos tráfegos intercontinentais. Aquilo que sabemos hoje é que muito possivelmente não ficaremos por esta tipologia de navios, hoje muito recentemente uma prestigiada consultora desta área dos transportes marítimos, anunciou a viabilidade técnica e económica de navios de 24000 TEUs; é a unidade de medida dos contentores o que quer dizer que portos como Sines que estão no segmento do tráfego intercontinental têm que se adaptar e preparar as suas sensibilidades marítimas e as suas infra-estruturas para esta tipologia de navios.

Aqui, a boa notícia para a competitividade da nossa economia é que muito provavelmente nós teremos acesso a esses navios precisamente devido às características infra-estruturais e às características de fundos naturais que temos em Sines. Ora, se este é o segmento do transhipment, tráfego intercontinental o Sr. Prof. Valente de Oliveira falava e bem, na sua introdução que o transporte marítimo não se limita ao tráfego intercontinental. Existe também um segmento do transporte marítimo de curta distância muito relevante diria naquilo que é a nossa proximidade geográfica entre a Europa e norte de África. Ora, nesse e este é o segundo caso que apresentaríamos hoje, nesse transporte marítimo de curta distância que nós chamamos oportunidade, o que registamos, é como oportunidade, é o potencial de crescimento de Portugal face àquilo que são os países que utilizam o shortsea shipping, transporte marítimo de curta distância e reparem, a distância que vai de Portugal aos países que mais utilizam esta tipologia de transporte já não se compara apenas com aquilo que é a tradição da Europa central e da Europa nórdica se olharmos para a utilização deste modo de transporte por Espanha e Itália, vemos que efectivamente temos aqui um potencial de crescimento muito relevante. O que falta para capturarmos este potencial de crescimento? Conhecimento não, não me parece que seja conhecimento. Nós conhecemos os atributos de valor que podem ser capturados para conseguirmos com sucesso chegarmos a uma competitividade do transporte marítimo de curta distância. Falta de apoio de políticas públicas? Não. Temos conhecimento das auto estradas marítimas o

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problema Marco Pólo talvez não muito bem sucedido. Existe neste novo quadro para 2020 uma continuidade dessas políticas públicas de apoio já não numa lógica de Marco Pólo mas numa lógica integrada transeuropeia de transportes.

Ora, se nós conhecemos os atributos de valor que nos levariam a ter sucesso e efectivamente a conseguirmos conquistar este potencial de transporte marítimo de curta distância porque é que continuamos a viver num paradoxo em que temos casos de sucesso como nos países que apresentamos e casos de insucesso; ainda recentemente ouvíamos mais uma notícia em que a linha de Riga para Nantes vai fechar e surpreendemos todos quando sabíamos que o…. dessa linha era 70% de utilização da sua capacidade e a linha estava com 75% de utilização. É claro que no mesmo dia, os nossos colegas do porto de Vigo anunciaram logo que iam tentar mudar essa linha para o porto, para o porto de Vigo; portanto continua aqui a existir uma procura forte. O que é que devemos continuar a fazer? Devemos continuar a fazer a procura dos casos que têm todos estes atributos de valor. Claramente aqui a lógica tem sido colocada muitas vezes na opção entre o transporte rodoviário ou o transporte marítimo e claramente nós temos bem perto de nós casos que têm, conseguido efectivamente ter sucesso. Veja-se por esta fotografia aqui bem perto de nós, no porto de Leixões uma companhia que recentemente anunciou o seu segundo serviço semanal, até um serviço bissemanal; num transporte marítimo que apesar ainda de uma zona de conforto toca ao porto de Rotterdam e portanto têm contacto com aquilo que é o potencial mais forte daquilo que é o transporte marítimo de curta distância; mas apesar de tudo uma tipologia de navio adequada a este transporte, uma tipologia de operação portuária adequada a este transporte e uma parceria com a administração portuária que tem todas as condições para ter sucesso.

Pensamos nós que muito existe ainda para fazer para que este transporte marítimo de curta distância consiga ter o sucesso que ambicionamos mas apesar de tudo vamos tendo a perspectiva de casos, como este caso do porto de Leixões. Uma, e um último caso e muito breve numa perspectiva diferente daquilo que pode ser a inter modalidade ligada com o transporte marítimo de curta distância. Normalmente olhamos para a inter modalidade como a conjugação e a gestão de um conjunto diferente de modos de transporte para oferecer a solução mais eficiente possível ao cliente. Olharíamos para esta inter modalidade de uma forma diferente e apenas sobre a dimensão comercial e aqui dar conta um pouco da experiência da Rangel, não só da Rangel, de outros operadores logísticos obviamente que quando assumimos a função de consultor do cliente e pomos à disponibilidade do cliente modos alternativos de transporte aquilo que temos vindo a verificar nos últimos

PRIMEIRA SESSAO ~

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tempos é que muitas vezes o cliente face ao binómio tempo preço e na sua opção entre o transporte rodoviário para o transporte marítimo vai, alguns clientes vão ajustando a sua própria cadeia de produção e a sua própria cadeia de logística embora com mais tempo mas usufruindo de condições económicas mais vantajosas no transporte marítimo. É esta a inter modalidade talvez que falte para termos uma maior agressividade comercial de promoção do transporte marítimo de curta distância junto dos principais utilizadores e é esta também uma oportunidade com certeza que podemos debater mais à frente. Em jeito de conclusões, uma oportunidade naquilo que é o segmento do tráfego marítimo intercontinental pela nova centralidade de Sines uma possibilidade que os agentes económicos em Portugal devem explorar a sua ligação a destinos mais longínquos, a sua ligação em menores períodos de tempo e usufruindo claramente de preços mais vantajosos com grande oportunidade para o tráfego marítimo intercontinental. Uma oportunidade e um desafio para o transporte marítimo de curta distância que pode efectivamente ter aqui um contributo relevante quando adoptamos uma postura mais comercial da inter modalidade. Muito obrigado.

Moderador - Prof. Luís Valente de Oliveira

Para nos falar sobre o caminho-de-ferro e sobre as ligações ferroviárias, vamos ter o Sr. Dr. Miguel Lisboa. Tem o mestrado em logística, MBA em logística e tem uma pós-graduação em gestão empresarial. Tendo sido de base engenheiro mecânico, no ramo de produção e construções mecânicas pelo Instituto Superior Técnico. Trabalha na TAKARGO – transportes de mercadorias, mas já esteve, e isso é interessante porque trabalha hoje num transportador, ligado a outros aspetos da indústria ferroviária. Trabalhou na Bombardier, trabalhou na Adetrans e trabalhou na Sorefame. Lembram-se bem na importância que teve a Sorefame entre nós como empresa de excelência? De maneira que temos hoje um quadro que teve esta acumulação, este percurso e que nos vai falar seguramente com muita propriedade sobre o transporte ferroviário.

Primeira Sessao - Os transportes maritimos | Dr. Luís Marques~ ´

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Antes de mais um agradecimento à Fundação AEP e à Fundação de Serralves pelo convite. Gostava, antes de mais, de fazer uma breve nota sobre a Takargo. A Takargo constituiu-se como empresa ferroviária em Dezembro de 2006, já lá vão alguns anos. Essa posição como empresa ferroviária integra-se na estratégia de diversificação do grupo Mota Engil na parte da logística. A Takargo em 2008 constituiu-se como operador ferroviário, porque há uma diferença entre ser uma empresa ferroviária e ser um operador ferroviária. Para ser operador ferroviário é preciso ter um conjunto de procedimentos e certificações e nós desde 2009/2010 que temos garantido um conjunto de operações a nível nacional e a nível ibérico. Tendo-nos constituído como operador ferroviário em Espanha também em 2012.

A minha apresentação vai ser, acima de tudo, focada naquilo que é a minha experiência e a experiência da Takargo, que é uma perspetiva pessoal também e é no âmbito do transporte de mercadorias. Uma primeira nota sobre aquilo que é a rede ferroviária portuguesa. A rede tem cerca de 2800 quilómetros, apenas 58% é eletrificada, portanto há uma parte substancial que não é eletrificada e cerca de 40% não tem sistemas de controlo de velocidade, nem rádio solo. Esta rede, na realidade, não é mais do que um eixo norte-sul, chamar-lhe rede até é boa vontade. Na realidade temos um eixo norte-sul que liga o Algarve ao Minho e depois temos três braços que nos ligam a Espanha. O Douro já não liga a Espanha, mas temos a linha do Douro, a linha da Beira Alta e a linha de Leste. Esta rede tem estas três ligações a Espanha, através de Elvas, Vilar Formoso e Valença e tem ligações aos principais Portos Portugueses. Algumas ligações francamente boas e desenvolvidas, como o Porto de Sines, o Porto de Aveiro; outras ligações muito limitadas, como a ligação ferroviária ao Porto de Lisboa que tem muitas restrições. Do ponto de vista de mercado, de mercadorias em Portugal, para termos uma ideia movimentaram-se por ferrovia no ano 2012, cerca de 9,7 milhões de toneladas e repartidos por estas meia dúzia de tipos de mercadorias. Contentores na sua maioria - 23% de tonelagem por contentores, o cimento, o carvão, a areia e a madeira e os siderúrgicos. Estes 6 primeiros tipos de mercadoria representam cerca de 85% de todo o volume transportado. Há 2 operadores em Portugal: a CP Carga é o operador público e a Takargo – operador privado do grupo Mota Engil. Há uma distribuição de cerca de 91% para a CP Carga e 9% para a Takargo. De referir que dados já deste ano, cerca de 75% da atividade da Takargo é internacional, portanto cruza as fronteiras portuguesas. E aquilo que temos aqui de uma forma esquemática, é aquilo que representa o mercado nacional e aquilo que representa o mercado internacional e as ligações ao exterior, na perspetiva ferroviária. A nível de fluxos nacionais, que não

PRIMEIRA SESSAO

“As ligações ferroviárias”

TAKARGO – Transporte de Mercadorias SAEng.º Miguel Lisboa

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saem a fronteira, temos cerca de 8,6 milhões de toneladas/ano; isto são dados de 2012. Fluxos Portugal-Espanha, somatório importação-exportação, pouco mais de 1 milhão. Finalmente, fluxos que tenham cruzado os Pireneus – 40 mil toneladas. Estamos a falar de 3,7% dos fluxos internacionais ferroviários e estamos a falar de cerca de 0,4% de todas as toneladas transportadas a nível nacional. Parece-me que realmente há margem de crescimento naquilo que possam ser as toneladas transportadas além Pireneus. Quando vemos que movimentamos em Portugal praticamente 10 milhões de toneladas, apenas 40 mil cruzam os Pireneus. Este é um tema polémico e há muitas perspetivas e muitas ideias sobre o tema. Este boneco acho que é interessante na perspetiva em que podemos ver que nos somos quase ilha na realidade, mas estamos rodeados de mar por todo o lado e estamos rodeados de Portos por todo o lado. Isso não é mau. Isso não é mau para o comércio internacional. É bom estarmos rodeados de Portos por todos os lados para o comércio internacional, porque o transporte marítimo é aquele que é mais eficiente e eficaz a longa distância, portanto isso é bom para o comércio internacional. A ferrovia não consegue competir com o transporte marítimo quando temos na origem um Porto, portanto as origens portuguesas têm todas um Porto ao lado. Nós somos uma faixa litoral, desde norte ao sul com Portos Atlânticos e as nossas exportações para a Europa, aquilo que seja o Norte da Europa está rodeada de Portos, aquilo que seja o Sul da Europa está rodeada de Portos, resta-nos para a ferrovia a Europa Central; é onde a ferrovia pode ter alguma competitividade. Isto são dados do INE de 2012, se nós pensarmos que a ferrovia pode ir buscar cargas ao transporte rodoviário, muito dificilmente, apesar de acontecer também, mas muito dificilmente vai haver transferência do modo marítimo para o modo ferroviário. A transferência natural será do modo rodoviário para o modo ferroviário. Dados de 2012 identificam que temos cerca de 4,7 milhões de toneladas pelo modo rodoviário, um total de importação-exportação para Alemanha e França. Um cenário otimista, sendo otimista e vamos pensar que a rodovia vai conseguir transferir 10% deste volume, destes 4,7 milhões anuais, significaria um crescimento de 12 vezes, isto é apenas um exercício teórico, nada mais, significaria um crescimento de 12 vezes em relação aquilo que se fez em 2012, que foram as 40 mil toneladas, seria um crescimento fantástico. Se este crescimento fosse feito com um comboio intermodal tipo, um comboio intermodal de caixas móveis…há um tema importante que é o seguinte, esta transferência modal é sempre feita, à partida, com carga geral. Nós não vamos transportar graneis, não vamos transportar nem carvão, nem areias ou inertes de Portugal para a Alemanha. Nós vamos transportar aquilo que os camiões transportam que é carga geral contentorizada, paletizada na maior parte dos casos. Uma solução óbvia é o comboio intermodal tipo, com caixas móveis que

Primeira Sessao - As ligacoes ferroviarias | Eng.º Miguel Lisboa ~ ~

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nas pontas, nos last miles, nos first e last miles, tem a componente rodoviária em cada uma das pontas. Um comboio tipo que possa transportar o equivalente a 34 camiões e que transporte 600 toneladas por comboio. Um comboio deste tipo para dar resposta aos 10% da carga que hoje vai para a ferrovia, para a Alemanha e para França, significariam cerca de 400 comboios ano e teríamos as tais 480 mil toneladas. Há uma nota importante que se refere à faturação Refer, isto porque? Porque a Refer, supostamente gestor de infraestrutura, será a Refer que irá assumir qualquer investimento que venha a ser feito no futuro para transportar este comboio, para transportar esta carga. Temos de perceber que hoje os operadores pagam à Refer, em valores médios, cerca de 1,5€ por quilómetro, o que significaria que num ano normal, para fazer este transporte, a Refer iria ter uma faturação de 390 mil euros. Portanto, valia a pena analisar o retorno do investimento para uma faturação de 390 mil euros/ano, considerando apenas este comboio. Este crescimento de 12 vezes em relação àquilo que temos em 2012 iria representar cerca de 5% do transporte ferroviário em Portugal e iria representar 0,6% do comércio internacional português. Dados do INE.

Não é uma conclusão precipitada, é bastante refletida resultados da experiência que tenho vivido. Este transporte além pireneus pode ser importante para alguns casos específicos e para algumas indústrias muito particulares, mas não é a ligação além pireneus que vai resolver os problemas da competitividade de Portugal, nem da competitividade logística portuguesa, se assim não é, por onde é que devemos focar? Claramente no mercado ibérico, é aí que a ferrovia pode crescer e é aí que nos podemos tornar muito competitivos. A Espanha é o principal parceiro comercial de Portugal, e há muita coisa para fazer na ferrovia a nível ibérico ou esta quase tudo para fazer na ferrovia a nível ibérico, a nível ibérico transportam cerca de 30 milhões de toneladas de ferrovia, internamente em Espanha movimentem cerca de 16,6 milhões alem pireneus 3,3 milhões claro que alem pireneus nos temos aqui a Catalunha e o país basco que são 2 polos económicos importantes espanhóis, que estão ligados a fronteira francesa a grandes fluxos do pais basco e da Catalunha, se nos virmos os tráfegos puramente ibéricos sumamos ferroviário marítimo e ferroviário nos falamos cerca de 23 milhões de toneladas ano por ferrovia temos apenas 1,1 milhões de toneladas o que representa cerca de 4%. A nível ibérico a ferrovia tem espaço importante para crescer e aí sim podemos acrescentar valor à logística das principais indústrias portuguesas. Aquilo que seria importante do ponto de vista da rede ferroviária futura seria garantir, não vou especificar aqui muito, mas 2 ou 3 temas importantes: a questão da bitola. Fala-se muito da bitola, da bitola europeia e da bitola 1668; nós temos de perceber que a bitola 1668 está espalhada por toda a rede ibérica. As fábricas todas que são

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exportadoras têm 1668. Os Portos todos têm 1668. Todos os terminais têm 1668. Se de repente vamos por uma linha 1435, nãos e fazem comboios, porque eu não estou a ver as grandes fábricas exportadoras irem gastar milhões em novas infraestruturas que não tem retorno. Portanto, nós vamos continuar a ter, durante muitos anos, uma rede convencional 1668 e uma rede 1435 que possa fazer a ligação além Pireneus. Esta mais uma vez é a minha perspetiva pessoal. Há aqui uma ligação que é absolutamente fundamental que é a ligação direta da zona sul a Badajoz. Hoje, para terem uma noção, para podermos ligar, vou-vos dar um número simples, por exemplo, a zona de Andaluzia – Huelva, se quiser ligar Huelva a Setúbal ou Lisboa por rodovia fazemos cerca de 300 quilómetros; um camião de Huelva a Setúbal são 300 quilómetros. Eu para ir de comboio de Huelva a Setúbal preciso de 600 quilómetros, porque eu tenho de ir ao Entroncamento para depois voltar para Sul, porque não há ligação a Sul. Portanto esta ligação que aqui temos, esta ligação direta que não existe, hoje a ligação é por aqui por cima, esta ligação direta é muito importante na perspetiva ferroviária. Aquilo que é importante é percebermos que a rede convencional vai continuar a existir, os milhares de vagões, as centenas de locomotivas e todos os parques industriais que existem na Península Ibérica são todos em rede convencional, as origens e os destinos de toda a mercadoria é em rede convencional e portanto isso vai continuar a existir. Aquilo que é preciso é integrar a nova rede 1435 de uma forma inteligente e eficiente na atual rede convencional, garantindo sempre a dupla bitola. Acho que Portugal é um país pequeno, com recursos muito limitados para termos uma rede ou uma linha exclusiva em 1435, porque se assim for não passam lá comboios. Vamos ter uma linha sem comboios a passar.

Em relação à ligação além Pireneus, falei há pouco do transporte intermodal; o transporte intermodal puro em caixa móvel. É uma solução teoricamente muito interessante, do ponto de vista prático muito complexa e muito pouco competitiva. Nós não podemos esquecer que não se fazem mais comboios para a Alemanha ou para França não é porque não haja infraestrutura, infraestrutura há, não há problema nenhum, não é tema, não há é preço. A solução intermodal não concorre com o preço do camião. Não podemos esquecer que a tendência na Europa é para termos os mega camiões, em Espanha já se fala nas 44 toneladas por camião, em Portugal, não sei se é do conhecimento, mas desde fábricas para Portos e Portos para fábricas já se podem fazer camiões com 60 toneladas brutas, portanto isto é tudo a favor da ferrovia. Nós temos políticas para incentivar a ferrovia e, em simultâneo, temos políticas para incentivar a rodovia. Portanto, as duas não casam uma com a outra. Nós hoje em Portugal podemos ligar qualquer fábrica e recentemente foi incluído os siderúrgicos, os produtos hortícolas, alguns químicos, algumas matérias

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perigosas, que também já podem transportar 60 toneladas por rodovia. Isto mata o comboio. Nalgumas soluções em que o comboio ainda é competitivo, mata o comboio. A solução intermodal é uma solução complexa, de uma gestão logística muito custosa e esta maior integração através do transporte do próprio trailer e, em alguns casos, do próprio cabeça motora no comboio é uma solução que é muito mais interessante do ponto de vista de custo, mas exige e seria uma transferência quase imediata de uma percentagem grande de fluxo de camiões que hoje existem por Irún, e aqui poderíamos claramente fazer isso no futuro numa rede transeuropeia, portanto com a bitola 1435, rms, por aí fora, mas aqui há uma questão fundamental, é que num transporte intermodal a relação entre o transportador ferroviário é direta com o exportador, com a indústria, neste caso a relação teria de ser com o transportador rodoviário. Tínhamos de ter uma relação de cooperação ou de coopetição, portanto é o transportador rodoviário que coopera com o transportador ferroviário, no sentido de criarmos uma solução única. É um paradigma diferente. Tem de haver uma relação de cooperação entre rodovia e ferrovia. Eu acredito nesta solução, acho que esta é uma solução de futuro para aquilo que sejam as relações além Pireneus. Mais esta relação do que o transporte intermodal em caixa móvel.

Eu gostava também de vos falar um bocadinho sobre a nossa realidade, que não é uma realidade muito risonha, temos muitos problemas e eu creio que grande parte de vos está um bocadinho longe da realidade que temos hoje no nosso país, deste ponto de vista ferroviário. A linha do Minho é uma linha que liga Portugal à Galiza, há grandes trocas comerciais entre Portugal e Galiza. A linha do Minho é uma linha que está completamente congestionada, não passa lá mais nenhum comboio. Aqui não falamos de comboios de 500 metros, nem de 400, é impossível fazer um comboio de mercadorias com mais de 300 metros e temos cantonamento telefónico. Não é só na linha do Minho, temos também noutras linhas. O cantonamento telefónico é os comboios como se faziam no faroeste há 150 anos, portanto não há nenhum controlo. Não temos rádio, não há rádio solo-comboio, não há comunicação por rádio entre o gestor de infraestrutura e o comboio; não há nenhum sistema de controlo e de segurança ativo e portanto é um sistema que não garante segurança, é um sistema que não garante eficiência, nem eficácia. São 90 quilómetros entre Nine, que é perto de Braga e Valença, temos a linha nesta situação, como há 100 anos atrás. Mas é uma linha completamente congestionada e o mercado pede comboios aqui. Atenção o mercado pede comboios aqui, mas a linha está completamente congestionada, tanto do lado português, como do lado espanhol. A linha da Beira Alta, a principal ligação a Espanha que temos hoje. Na linha da Beira Alta temos condições de conservação muito más, houve um desinvestimento total na ferrovia durante a última década. Nós hoje temos,

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para terem ideia, na principal ligação a Espanha, temos 8 restrições de velocidade a 10 quilómetros à hora. Portanto há 8 pontos na linha, que tem 150 quilómetros, que temos de andar a 10 quilómetros à hora e as velocidades médias de circulação na linha da Beira Alta são de 25 quilómetros à hora. Hoje quando queremos fazer comboios para Espanha, pela principal ligação a Espanha circulamos a 25 quilómetros à hora – velocidade média. Ainda não estamos a falar de linhas transeuropeias, isto é a nossa realidade. É a realidade. Linha de Leste não tem circulação. Tem um ou dois comboios por dia. Para terem uma ideia, entre Abrantes e Elvas, que são cerca de 150 quilómetros, temos também o tal cantonamento telefónico, não existe nada, mas mais, não há uma única estação resguardada, ou seja, entre Abrantes e Elvas, o comboio e o maquinista está entregue a si próprio. Não há ninguém a controlar aquilo que se passa em 150 quilómetros de infraestrutura. Acho que é questionável do ponto de vista de segurança, do ponto de vista de controlo e de gestão de rede, uma situação como esta. Mas mais uma vez, aquilo na linha de Elvas já não há comboios de passageiros e os comboios de mercadorias que temos são 1 ou 2 por dia.

Uma questão fundamental que tem a ver com a integração com a rede ibérica. A ferrovia tem de procurar sempre o caminho mais curto, porque o custo ferroviário é proporcional aos quilómetros percorridos. Nós tínhamos, quando começou a Takargo, quando começamos a operar, nós íamos para Madrid, tínhamos muitos comboios para Madrid, agora já não fazemos, hoje passamos em Madrid, não paramos lá. Nós vínhamos por aqui, aqui esta linha, por Valença de Alcântara, por aqui, Cáceres para Madrid. É o caminho mais curto. Entroncamento para ir para Madrid é por aqui. Nós há 4 ou 5 anos íamos por Madrid por aqui. Em Portugal esta linha foi cortada, esta ligação Valença-Alcântara deixou de estar à exploração. Do lado Espanhol a Adif não nos permite circular por aqui. Hoje, se quiser ir para Madrid do Entroncamento tenho de ir por aqui. Portanto, andamos a fazer investimentos para reduzir esta distância, para depois chegarmos a Espanha e darmos a volta toda pela Andaluzia para chegarmos a Madrid. Aquilo que ganhamos com o investimento que fazemos em Portugal, perdemos porque em Espanha não nos deixam circular pelo caminho mais curto. É absolutamente fundamental haver uma integração e um projeto integrado de investimento na ferrovia a nível ibérico. Isto é um caso real, com o qual vivemos todos os dias.

Finalmente, na Linha do Algarve não vale a pena pensar em comboios de mercadorias, não há comboios de mercadorias na linha do Algarve, há só até Loulé. Impossível pensar em comboios com mais de 200 metros e as locomotivas de grande porte não chegam a Vila Real de Santo António, param em Tavira, porque a ponte não suporta comboios pesados.

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Esta é a realidade que nos temos hoje. É importante pensarmos nas ligações além Pireneus e para França e para a Alemanha, mas temos de resolver estes problemas, porque um investimento na ferrovia nãos e faz hoje e amanha está pronto. Há um projeto para fazer alguma recuperação da Beira Alta e vai demorar 3 anos. Na ferrovia qualquer coisa demora 5 anos. Daqui a 5 anos eu não sei se cá estou. Nós temos de pensar que a situação que temos hoje e aquilo que temos de fazer para corrigir aqueles problemas todos são temas para uma década. Se tomarmos a decisão hoje, talvez daqui a 10 anos estes problemas todos que aqui estão estejam resolvidos. Isto é absolutamente fundamental, porque esta situação mata a ferrovia.

Só uma nota rápida. Temos uma liberalização do sector, é um facto. A Takargo é um operador privado que tem de apresentar resultados ao seu acionista todos os anos e nós temos de concorrer com operadores públicos em Portugal e em Espanha que nos 2 últimos anos apresentaram resultados operacionais negativos de 110 milhões de euros. Não é possível estar no mercado liberalizado e concorrencial, quando temos operadores públicos que trabalham com preços abaixo do custo. Isto é uma nota fundamental e vou ser rápido. A Takargo hoje, só para termos uma nota, transportamos cerca de 1 milhão de toneladas por ano, cerca de 75% a 80% são internacionais e estamos presentes em toda a Península Ibérica.

Uma nota final em relação à rede ferroviária de futuro, a ligação além Pireneus é importante, não é decisiva, mas é importante para podermos ter soluções alternativas à rodovia para Alemanha e França. Aquilo que é absolutamente fundamental é investir na rede ibérica, é aqui que está o grande potencial de crescimento da ferrovia e o grande valor acrescentado que a ferrovia pode trazer para a indústria, temos de ter esta rede integrada com regulação uniforme, temos de ter gestão de tráfego uniforme; a gestão de tráfego não é integrada, é muito difícil a comunicação entre a Adif, que é o gestor espanhol o gestor português. Temos de ter terminais públicos de acesso franco e igual para todos os operadores. Temos de eliminar pendentes, as pendentes são subidas e descidas que temos pela rede fora e que limitam imenso os comboios.

A principal mensagem é que a ferrovia pode crescer a nível ibérico e aquilo que é absolutamente fundamental na perspetiva das ligações de Portugal ao mundo, numa perspetiva ferroviária, é garantir uma ligação 1435 em bitola europeia além Pireneus, mas investir sobretudo nesta rede integrada ibérica. Muito obrigado.

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Moderador - Prof. Luís Valente de Oliveira

Vamos agora ouvir falar sobre ligações intermodais. Para isso, fomos solicitar ao Dr. Ricardo Afonso, que é licenciado em contabilidade e administração, versão gestão de empresas, mas que está na Transdev como membro da comissão executiva, como diretor comercial e marketing para o grupo e como gerente duma empresa participada. De maneira que ele sabe bem o que é logística e o que são relações intermodais. É a ele que vamos pedir para falar sobre isso…

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Muito obrigado, Sr. Professor, muito bom dia. Venho aqui falar um pouco sobre as relações intermodais na vertente dos passageiros, que é essa a nossa especialização.

Falando um pouco sobre a Transdev. A Transdev é uma empresa multinacional, de origem francesa, presente um pouco por todo o mundo e que opera diversos modos de transporte que vão desde os ferrys, até ao comboio, ao metro, autocarros e inclusive bicicletas. A Transdev em Portugal, que podemos ver aqui quais são as suas áreas de atividade (slides 2,3 e 4). Neste momento estamos concentrados apenas num modo de transporte que é o autocarro e podemos ver que o serviço internacional aqui à direita representa cerca de 4% do nosso volume de negócios. Isto são as atividades efetivamente para a Europa, para França, Espanha, Alemanha e Holanda, sobretudo. São 4% da nossa atividade que se concentra no estrangeiro. A nível interno estes são alguns dos nossos números, dos nossos passageiros transportados e as redes que operamos em Portugal; portanto, cerca de 25 milhões de passageiros por ano e 32 milhões de quilómetros percorridos. Indo para a intermodalidade, o que é a intermodalidade no meu ver? Efetivamente é a integração e a conjugação de vários modos de transporte com vista à obtenção de benefícios para os utilizadores, nomeadamente, benefícios de coordenação tarifária, de conjugação de ofertas de modo a propiciar um serviço eficiente. Num sentido lato intermodalidade é também a multimodalidade, que é quando há transferência entre diferentes meios de transporte, mas que também cabe dentro desta intermodalidade. Gostaria aqui de apresentar um pequeno filme que foi feito por nós com uma visão daquilo que é o futuro da intermodalidade conjugada com as novas tecnologias. O aproveitar das novas tecnologias para integrar tudo num só produto. Está aqui e até serve para descontrair um bocadinho porque tem música associada. (visualização do filme)

Parte destas tecnologias ou parte destas aplicações já estão ativas, não desta maneira totalmente integrada como vimos aqui, mas elas existem e estão em funcionamento em alguns países onde operamos.

Centrando-nos na intermodalidade. Consideramos aqui, falta aqui um meio de transporte bastante importante que é o avião, pela simples razão que nós não operamos, mas eu irei falar dele (slide 6). Aqui consideramos desde o modo mais pesado até ao modo mais ligeiro, como é a bicicleta, passando pelo metro, pelo BRT (bus rapid transit), que é o autocarro em via dedicada. Se nós repararmos neste pequeno filme, é uma geração perfeitamente integrada com as novas tecnologias e que, beneficiando dessas tecnologias, espera uma

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“As ligações intermodais”

Transdev PortugalDr. Ricardo Afonso

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resposta pronta do sistema e que tudo esteja ao alcance de um dedo. São pessoa que querem ir do ponto A ao ponto B, independentemente dos meios que vão utilizar, querem é uma solução única e conjugada e de preferência que utilize também os modos ligeiros, as bicicletas mais uma vez, já que a consciência ecológica começa a despontar cada vez mais. São pessoas que exigem um título e transporte único, uma coordenação de horário e a tal coordenação de meios, seja ela multimodal ou monomodal. Quais são esses fatores chave para a intermodalidade? Para ela poder existir de um modo eficiente? Quer se aplique a uma intermodalidade interna, quer externa. Os fatores chave são muito simples, uma entidade coordenadora que agregue todos os meios de transporte e os coordene e crie ofertas únicas, tarifários únicos; e sem essa entidade coordenadora vivemos, neste momento, de algumas ligações que são feitas internamente pelas empresas ou, quando comercialmente viável, feitas por empresas que tentam conjugar com outras, apesar dessa coordenação efetiva às vezes não existir. Obviamente que falta a fiabilidade no sistema, derivado dessa falta de entendimento, muitas vezes, existente entre as entidades, o que faz com que nem sempre essa coordenação exista de uma maneira fiável. Eficiência necessária obviamente. As pessoas esperam que quando chegam ao seu local haverá outro meio de transporte à espera, não podem ficar retidos ou dependentes de uma descoordenação que existe, para isso é necessário envolver todos os stakeholders, porque são eles que terão uma palavra a dizer também no futuro desta intermodalidade e serão eles que serão muito importantes nos hubs, que não são mais do que os terminais onde se podem conjugar os vários meios de transporte e que, neste domínio há ainda muito por fazer. Nós temos alguns bons exemplos. Os aeroportos são neste momento, exemplo de terminais, porque conjugam vários meios de transportes, desde obviamente o avião, ao autocarro e ao metro, como temos aqui no Porto, na Gare do Oriente em Lisboa. Mas muitas vezes falta a tal informação conjugada, ou seja, quem chega a determinado destino, quer vir já do seu ponto de partida com a informação correta de como vai chegar ao seu ponto de destino e não ao seu ponto intermédio. Essa informação, hoje em dia, vai existindo, mas ainda não é coordenada, nem é fiável, muitas vezes presta-se a informação apenas retirada do site de outra empresa, mas que depois, até ao longo do tempo, perde um bocado a sua validade e quem o colocou não se apercebe disso. Obviamente que tudo isto terá que ter, além da oferta conjugada, tarifas conjugadas, porque só assim é que se compreenderá no futuro a total intermodalidade, que é também a conjugação das tarifas. E quando falo da conjugação das tarifas não é apenas o somar das tarifas de cada operador, é sim uma decisão racional, a criação de uma tarifa que seja acessível e em que todos estejam dispostos a ceder a sua parte para se poder conjugar com uma tecnologia, uma mais eficiente intermodalidade.

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Aqui apenas alguns exemplos (slides 7 a 9), não de intermodalidade internacional, já que essa é mais difícil de obter. É mais difícil conjugar os interesses dos vários operadores no sentido, de se obter uma conjugação que seja inter fronteiras. Estas intermodalidades existem mais ao nível das próprias empresas que quando dominam os seus meios de transporte e é comercialmente viável, fazem essa interligação. Só aqui 3 pequenos casos, neste caso estamos a falar de Ruen (slide 7) em que são exploradas duas linhas de metro ligeiro; 3 linhas de brt, (portanto brt é o bus rapid transit), que são autocarros em via dedicada, funciona quase como o metro ligeiro; as linhas urbanas, linhas escolares, linhas noturnas e aqui não há bicicletas, mas uma base para bicicletas, porque é outro ponto muito importante para gerar intermodalidade. Temos que dar condições aos utentes que chegam ao local onde vão apanhar o transporte público e que fazem o chamado first

mile, no seu transporte individual, para poderem parquear. Portanto, temos de dar também essas condições, não pensar só no transporte em si, mas também nas condições para as pessoas chegarem aos locais. Neste caso concreto, foi criada uma base para bicicletas. O que é certo é que o aumento da procura nos últimos 10 anos foi de 22% e um índice de satisfação atingido de 82%, fruto desta intermodalidade que foi criada, ou seja, existe um passe único, existe uma conjugação e oferta, existe um fácil acesso ao sistema. Outro caso, Montpellier. Aqui a diferença é que foi criado um park & ride, ou seja, onde o cliente, ao adquirir o passe do sistema ao mesmo tempo tem acesso aos parques de estacionamento, onde pode deixar a sua viatura particular. O que é certo é que os resultados foram muito positivos com esta integração, sabendo-se que 38% do mercado envolve deslocações particulares, deslocações em viaturas particulares, lá está, não podemos esquecer os tais primeiros e últimos quilómetros, como é que eles são feitos e como é que as pessoas tem acesso aos meios de transporte. Por último (slide 9), aqui um caso mais simples, mas que tem a ver com a utilização de linhas de elétricos, portanto um modo menos poluente, com a tal intermodalidade interna a procura aumentou 68%, reduziram-se os níveis de reclamações e aumentou-se a fiabilidade nos horários; ou seja, tudo isto são os fatores que conjugam para uma boa intermodalidade. Aquilo que nós temos hoje, sobretudo em Portugal, ainda é, digamos os primórdios em muitos destes aspetos. Há conjugação, sobretudo monomodal, existe alguma coordenação a nível internacional, podemos dizer que a coordenação, as companhias de aviação e os aeroportos publicitam algumas das ofertas que existem e isso já é um ponto de partida importante, ou seja, quem nos vem visitar pode, através do site, quer da companhia de aviação, quer dos aeroportos, saber que existem outros meios de transporte para os levar para o seu destino. Simplesmente ainda não está feito de uma forma perfeitamente conjugada que permita ao utilizador

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tirar apenas, por exemplo, um bilhete que lhe dá acesso a todo o sistema. Isto são pontos que temos de considerar, pontos que temos de evoluir a nível desta intermodalidade, uma vez que sabemos, e como vimos ali no filme, todas estas pessoas, sobretudo destas novas gerações, pretendem que seja facilitado o serviço, pretendem um serviço único e de preferência com algo de verde, ou seja, com transportes em modo ecológico. Este é o ponto que temos em Portugal e ainda temos muito para trabalhar, apesar de algumas das tecnologias estarem já disponíveis e em fase de aplicação também em Portugal.

Muito obrigado.

Moderador - Prof. Luís Valente de Oliveira

Vamos agora ouvir o Dr. Fernando Vieira sobre o aeroporto do Porto e sobre as ligações aéreas de uma maneira geral. É economista pela Universidade do Porto e tem uma larguíssima experiência neste sector.

Começou na ilha de Santa Maria, no aeroporto de Santa Maria, numa ocasião em que era muito ativa ainda a instalação que lá estava, depois passou para o aeroporto de Faro, depois veio como sub -diretor para o aeroporto Francisco Sá Carneiro e hoje é o diretor, já lá vão 18 anos. É o diretor com os sucessos que sabemos, já duas versões do aeroporto, classificações do aeroporto nas melhores posições, tudo isso se deve a ele, de maneira que foi por isso que o convidei a fazer uma exposição sobre as ligações aéreas.

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“As ligações aéreas”

ANA - Aeroporto do PortoDr. Fernando Vieira

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Moderador - Prof. Luís Valente de Oliveira

Vamos finalmente ouvir o Eng.º. Carlos Alves Duarte sobre as tecnologias de informação e comunicação. O Eng.º Carlos Alves Duarte é administrador executivo da PT Portugal e Presidente da Assembleia-Geral do INESC, a que a nossa escola de engenharia está tão associada. Entrou para o grupo como administrador executivo da área de soluções empresariais e anteriormente foi General Manager da IBM Global Services e é engenheiro mecânico pelo Instituto Superior Técnico e com uma pós-graduação em engenharia de soldadura e tem o Master em gestão de Marketing e Vendas. Sr. Eng.º, fará o favor…

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Muito bom dia a todos!

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à Fundação AEP e à Fundação de Serralves o convite para estar aqui hoje. Quero igualmente cumprimentar os meus colegas de mesa e o Professor Valente de Oliveira e dizer-lhes que estas apresentações são para mim sempre um enorme problema, pois existe uma dualidade tremenda quando eu peço às minhas equipas para me produzirem estas apresentações. Se eles produzirem uma apresentação muito interessante aquilo que acontece é que deixam de estar a consultar os vossos telefones e a fazer tráfego, e portanto, nós PT sofremos na parte financeira. Se a apresentação é realmente muito aborrecida, desligam da apresentação e vão para os telemóveis. Portanto, eu nunca sei muito bem para onde dirigir estas apresentações. Mas hoje, tendo em atenção o brilhantismo das apresentações que me antecederam, se calhar preferia perder um bocadinho de dinheiro para a PT e garantir que tinham mais atenção à apresentação.

Bom, esta história do “mundo em acelerada mudança” é um eufemismo. A velocidade a que as coisas se movem nos últimos tempos é algo que sem paralelo na história da humanidade. Aproveitando esta imagem, gostaria de aproveitar para agradecer ao embaixador Jaime Nogueira Pinto a brilhante apresentação que efetuou e em linha com o que afirmou a Drª Ana Pinho, dizer que o objetivo para todos nós Portugueses seria voltarmos a atingir o que Stefan Zweig disse na sua biografia de Fernão Magalhães: “durante um breve período de tempo, esta pequena nação foi a luz que guiou a humanidade”. Realmente somos pequenos, continuamos a ser pequenos, mas se no passado conseguimos fazê-lo e conseguimos liderar a humanidade, eu acho que voltamos a consegui-lo no futuro.

Uma coisa interessante, e falando de velocidade, tenho aqui alguns factos - demorava 17 meses a chegar à China, mas a Sagres hoje demora só 21 dias. No entanto, a tecnologia é exatamente a mesma, a grande diferença entre a velocidade que se tinha antes e a velocidade que se tem agora é o conhecimento. O conhecimento que têm hoje os marinheiros que vão na Sagres e que não tinham os anteriores navegantes. É sempre fulcral tomar em atenção o conhecimento, aquilo que fazemos, para onde vamos. E, claramente, um dos temas relativos à exportação e às empresas portuguesas é muitas vezes atirarem-se para temas e geografias dos quais não têm conhecimento suficiente e isso claramente é um dos perigos e um dos grandes problemas ligados a alguns dos insucessos que alguns empreendedores portugueses sofreram nos últimos anos.

PRIMEIRA SESSAO ~

“As tecnologias de informação e comunicação”

PT Portugal TelecomEng.º Carlos Alves Duarte

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Seguramente que estes 4 dias e meio que, por via ferroviária, se demora a chegar à China estão relacionados com a contenção de velocidade da linha do Oeste, que mencionou há pouco o meu colega de painel, o Engº. Miguel Lisboa. Eu estou seguro que se não houvesse aquela contenção de velocidade, aqueles 4 dias e meio aproximar-se-iam dos 3 dias e meio, por via terrestre. Já no que se refere à TAP, não vou fazer comentários sobre as 17 horas pois, de acordo com as minhas últimas experiências, diria são bastante mais tendo em atenção o tempo de atraso nos voos. E depois, claramente puxando “a brasa à minha sardinha”, menos de 1 segundo através das telecomunicações e de tecnologias de informação.

E este slide que tenho aqui a seguir só o percebi hoje de manhã, vou ser franco, percebi-o ao vir aqui para o Porto no carro e ouvindo a rádio pois, segundo parece, e de acordo com um estudo efectuado, existem pessoas que tiram mais prazer de um novo smartphone do que do sexo, como tal é perfeitamente natural que existam mais telemóveis a ser ativados por dia, do que nasçam crianças!! Claramente as políticas de natalidade não têm de incidir sobre a fiscalidade, têm de incidir sobre convencer a Samsung e a Apple a fazerem equipamento um bocadinho piores.

Relativamente aos telemóveis e às pessoas, nós em Portugal já lideramos. Hoje em Portugal temos milhões de dispositivos móveis, temos mais do que 16 milhões de dispositivos móveis e nós Portugueses claramente somos menos de 10 milhões. Se retirarmos destes dispositivos móveis tudo aquilo que tem a ver com tecnologia, aquilo que é tecnologia a “conversar” com tecnologia, aqueles que fazemos voz, estamos a falar de praticamente 12 milhões, ou seja, cada um de nós tem mais do que um dispositivo de voz. Este slide apresenta os últimos estudos, mas a única coisa que nós sabemos dos estudos é que pecam sempre por falharem em relação ao que vem a suceder na realidade... se aqui se fala de futuro e que em 2017/2018, cada pessoa terá entre 6 a 7 dispositivos conectados à internet e se começarem a contar tudo o que têm, entre as carteiras das senhoras e os nossos bolsos dos nossos casacos, se calhar já andamos pelos 3 ou 4. Se nos lembramos que os carros agora também comunicam, se nos lembrarmos que em casa as televisões também estão a comunicar e de que existe um conjunto de pc’s, de tablets, e outros equipamentos conectados então os 7 ou 8, ou 9 ou 10 ou 11 do futuro estão avaliados por baixo.

Aqui também temos outra parte muito interessante que é a velocidade de adoção. Para aqueles que já não se lembram, o serviço móvel telefónico foi lançado em 88 em

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Portugal. Em 2 anos, o serviço móvel telefónico capturou 6.500 utilizadores. Nos 4 anos seguintes capturou 600 mil! E daí para cá tem sido sempre a acelerar, pois a velocidade de adoção é cada vez maior, o que leva também a estarmos cada vez mais dependentes destes equipamentos na nossa Vida. Por isso é que eu dizia, se cada pessoa consulta o seu telefone a cada 6 minutos e meio, eu tenho agora que fazer uma pequena pausa para todos poderem consultar o telemóvel, fazer algum tráfego… e depois eu continuo!

Não, não vou nada parar! Estava a brincar...

Falando de mudanças, todos nós no mundo empresarial, sejamos executivos, empresários, colaboradores, nós temos que ter em atenção a grande mudança dos hábitos de consumo que a nossa sociedade está a sentir... a maneira como hoje consumimos muda radicalmente a cada momento.

Cada vez há mais informação e cada vez há mais informação que nós não conseguimos processar, cada vez somos mais bombardeados com informação, alguma válida, outra nem tanto; mas esta ”enxurrada” de informação leva à criação de novos modelos de negócio. Por exemplo, se se lembrarem de já há alguns anos, um senhor chamado John Naisbitt ter escrito um livro e criado uma empresa de consultoria com muito sucesso... o livro chamava-se MegaTrends. Foi um livro que esteve nos top’s bastante tempo. O que é que este senhor faz? Uma coisa interessantíssima, tem uma equipa que a única coisa que faz é ler jornais e revistas. Depois junta todas essas notícias e a partir disso descobre tendências futuras. Portanto é uma espécie de self-fulfillment prophecy. Está ali um buraco, vou-me atirar para dentro do buraco pois se o buraco está lá é para eu cair...

É exatamente isto que temos que evitar. É o deixarmo-nos levar por aquilo que é o passado e o que aconteceu. Nós não podemos e, muito particularmente, nós como portugueses não podemos guiar a olhar para o retrovisor. Nós guiarmos a olhar para o retrovisor é olhar para onde viemos e não estarmos a olhar para onde vamos e isso é aquilo que nos falta muitas vezes. Temos que ter em atenção todos estes novos hábitos, tudo aquilo que foi criado e já está disponível para todos nós, toda a panóplia de equipamentos, toda a componente de tecnologia que hoje move as empresas. Move as empresas, porque move os nossos consumidores. Portanto, tudo o que tem a ver com mercados, tudo que tem a ver com a evolução desses hábitos, tudo que tem a ver com o futuro tem de ser olhado de uma forma completamente distinta e de que forma pode ser usado de forma diferenciada no futuro.

PRIMEIRA SESSAO ~

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Eu agradeço a apresentação da Transdev, porque acabou por fazer exatamente isso, eu nem preciso de falar, passo o filme de novo e todos podem rever aquilo que hoje a tecnologia nos pode dar e aquilo que pode dar-nos no futuro próximo. O negócio que temos aqui e que trouxe como exemplo é o do impacto das novas tecnologias e dos novos hábitos de consumo no transporte aéreo. Não é só a desmaterialização daquilo que era anteriormente um processo que muito complexo, vai muito além disso, o que existe aqui é uma mudança de modelo de negócio com a desintermediação total e absoluta daquilo que era anteriormente uma cadeia de valor bem estruturada. O negócio de transporte aéreo era claramente aquilo que hoje está muito na moda chamar o “B2B2C”. Aquilo que a tecnologia veio trazer é que passou a ser um negócio, ainda com algumas falhas, de “B2C”. Porquê? Estão a ser desintermediadas as agências de viagens. No futuro há um modelo de negócio que vai matar um conjunto de empresas. Agora, ao mesmo tempo que se transforma, gera outras oportunidades e vejam o seguinte exemplo - quando estão a tentar escolher uma viagem e consultam vários sites, experimentem fazer através de duas máquinas; vão a um site e vêem o custo de uma viagem, vêem no dia seguinte e dois dias depois. Depois, vão fazer o mesmo de uma outra máquina, e vão ver que os preços são diferentes, porque os preços sobem se voltarem várias vezes ao mesmo site e às mesmas consultas!. Mais, se forem recorrentes de compra no mesmo site o preço começa a piorar. Isto tem a ver com o modelo de negócio e a capacidade que a tecnologia fornece para auxiliar a melhorar as margens de um modelo de negócio completamente distinto do que existia. Isto é uma atenção que tem de ser tida pelo consumidor, mas que também cria oportunidades de negócio e lucro às empresas.

Neste slide refere-se a nova revolução da robótica avançada… é uma oportunidade e uma ameaça brutal para as empresas portuguesas. A robotização da produção traz uma nivelação, traz o custo de trabalho para o mesmo nível. Por um lado, podemos dizer, olhando para a China, fantástico; por outro lado, olhando para a Alemanha, péssimo. Porquê? Porque isto vai levar a que se o nível de inovação, o nível de sofisticação, o nível de automatização das empresas for o mesmo, é a flexibilização e a velocidade que vão criar a diferença entre ter sucesso ou ter insucesso. É esta área especificamente, a área da robotização, pode ser para as empresas portuguesas uma área de oportunidades extraordinária, caso se movam rapidamente. Mais uma vez, tecnologia, tecnologia a ditar o futuro.

Eu tinha de falar na PT, falo rapidamente, não vou maçá-los com isto, mas quero dizer que nós já criamos as tais estradas, as tais ferrovias, os tais aeroportos deste novo mundo para que as empresas portuguesas possam utilizá-las. Eles já cá estão!

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Além disso, a inovação não para nas “vias” diria que 99,9% das pessoas que está aqui não sabem que alguns dos equipamentos que hoje a maior empresa do mundo de equipamentos de telecomunicações, que é a CISCO, compra em Portugal e são feitos por uma empresa da PT. E isto num mercado das telecomunicações que tem o pior de dois mundos: por um lado parece-se com uma utility – capital intensivo, recursos humanos intensivos; por outro lado, é uma dot.com, tudo muda para nós a cada 3 meses as nossas ferrovias e a bitola das nossas ferrovias altera-se a cada 3 meses, os nossos portos ficam assoreados a cada semana. Temos sempre de estar a investir, temos sempre de estar a ter formação, temos sempre de estar a inovar. Aqui há uns tempos estive presente num congresso em que estava presente um administrador da Bial, que é a segunda empresa portuguesa que mais investe em investigação e desenvolvimento. Tem uma coisa interessante, é que os investimentos da Bial dão retorno a 16 anos, 18 anos! Os nossos investimentos se não derem retorno a 1 ano, estamos mortos. Porquê? Porque durante esse ano em que estamos a tentar rentabilizar esse investimento, já apareceram outras coisas. Essa é a grande diferença entre indústria baseada em tecnologia, que se move muito rapidamente, mas necessita de grandes investimentos e outras áreas da sociedade industrial, da sociedade comercial, que se movem de velocidades completamente distintas.

Portanto, claramente, enquanto eu falei, não sei se olharam 4 vezes para o telemóvel, presumo que não, mas seguramente durante este tempo a PT fez muito trabalho para todos os portugueses e para todas as empresas portuguesas.

Muito obrigado a todos, foi um prazer enorme estar aqui convosco.

PRIMEIRA SESSAO ~

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COMUNICACOES´

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SEGUNDA SESSÃO O INVESTIMENTO ESTRANGEIRO EM PORTUGAL

Moderador: Manuel Passos Rodrigo

“O investimento Angolano”Eng.º Mira Amaral - Banco BIC

“O investimento Europeu”Dr. Jónio Reis - Bosch Portugal

“O investimento do Brasil”Dr. João Taborda - Embraer

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Muito boa tarde para todos e muito obrigada pela presença. Vamos fazer um pequeno esforço para nos recolocarmos no tempo, na tentativa de compensar o atraso provocado pela derrapagem (justificada) que aconteceu com as com as intervenções do Painel que nos antecedeu.

Com muito gosto tenho a meu lado três ilustres personalidades, cuja presença muito nos honra e cuja participação nestas Jornadas em muito as enriquece.

Estar ao lado do Senhor Eng.º Mira Amaral é sempre um prazer. Será ele o primeiro a intervir neste Painel e a tarefa de o apresentar revela-se fácil de desempenhar. Todos o conhecem.

Assim - e com o seu acordo — eu vou permitir-me limitar as referências a seu respeito e a respeito do seu rico curricula a sublinhados relacionados com algumas das posições de destaque que ele ocupou na sua carreira pública e na sua vida privada.

Actualmente é Administrador não Executivo e Presidente da Comissão de Auditoria da Nova Base, tem passagens marcantes pelo Governo, pelo Ensino e pela Economia. Foi Presidente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social durante dois anos e Técnico Superior do Banco de Fomento Nacional. Foi quadro superior da EDP e integrou os Quadros Superiores da Direcção-Geral da Aeronáutica Civil.

Quanto à sua Formação Académica e só para realçar alguns dos pontos mais relevantes, que se seguiram à sua Licenciatura em Engenharia Eletrotécnica pelo instituo Superior Técnico de Lisboa, e de registar a sua Pós— graduação pelo Standford Executive Program da Universidade de Stanford (E.U.A.), e o grau de Mestre em Economia da Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, com alta classificação.

No campo do Ensino tem tido vários desempenhos, sendo de realçar o desempenho do cargo de Professor Catedrático Convidado do Departamento de Engenharia e Gestão do Instituto Superior Técnico.

Quem acompanha a vida pública do Senhor Eng.º Mira Amaral sabe que, neste ambiente, que tem frequentado, são muitas as possibilidades as contribuições para enriquecer o conhecimento, o que muito ajuda na capacidade para emitir opiniões.

Exerce actualmente o cargo de Presidente Executivo do Banco BIC Português, cargo este a que se junta o de Administrador da Agência Portuguesa de Inovação. Enfim, chegou a hora

SEGUNDA SESSAO ~

O INVESTIMENTO ESTRANGEIRO EM PORTUGALModerador: Manuel Passos Rodrigo

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Segunda Sessao - O investimento estrangeiro em Portugal | Manuel Passos Rodrigo~

de o ouvirmos sobre o tema que vai abordar: o do Investimento Angolano em Portugal.

Os sublinhados relacionados com a rica participação do Senhor Dr. Jónio Reis, que está hoje connosco nos para dar testemunho da sua experiência, enquanto agente directo de iniciativas relacionadas com o Investimento Estrangeiro em Portugal, centram-se na sua informação a propósito do método usado para avaliação das forças e das fraquezas das Empresas nacionais para dar resposta às solicitações que Ihes sejam apresentadas.

Desde logo, é de salientar a forma como o método por ele referenciado, de avaliação das suas forças e fraquezas perante as exigências de qualquer projecto, tem sido captado e adoptado pelas Empresas.

E revelou, através das impressões que nos transmitiu a propósito da sua experiência no que respeita às capacidades reveladas foram positivas. Parece, de facto, que a nossa indústria tem capacidade de concepção e de execução para dar resposta satisfatória às solicitações que vierem a ser-lhe colocadas.

A propósito da intervenção do Senhor Eng.º Joao Pedro Taborda, que também nos deu o gosto de aceitar o convite que Ihe foi formulado para colaborar connosco, importa desde logo dizer que é Licenciado em Engenharia Mecânicas e Mestre em Gestão Tecnológica, qualificações às quais se junta um Mestrado em Politicas Públicas orientadas sobretudo para a Inovação, resultante do seu envolvimento num Programa Conjunto levado a cabo a partir de uma parceria entre o Instituto Superior Técnico e a Universidade de Austin (E. U.A.).

Actualmente exerce as funções de Director de Relações Exteriores da Embraer, estando sediado em Bruxelas.

Com base na conversa que tivemos previamente, foi por ele referido que as suas duas grandes missões consistem no acompanhamento das políticas públicas das regiões onde a Embraer tem interesses e o estudo das cadeias de fornecimento nelas instaladas, sabido como e que aquela Empresa tem projectos de crescimento e de desenvolvimento em várias localizações e, portanto, precisa de saber com o que pode contar.

Anteriormente e durante bastante tempo, teve directamente sob sua responsabilidade a coordenação de todos os projectos de pesquisa e de desenvolvimento lançados pela Embraer no Brasil.

De destacar, ainda, que foi sob sua orientação que arrancou o projecto de instalação da Embraer em Évora.

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Muito obrigado, começo por agradecer à AEP, na pessoa do Sr. Presidente e do meu caro amigo Prof. Luís Valente de Oliveira, o gentil convite que me fizeram para aqui estar convosco, o que faço com todo o gosto.

Pediram-me para vos falar do investimento angolano em Portugal, e primeiro tenho de vos dizer que de facto, de acordo com a teoria económica, temos três fases no domínio do comércio externo.

A primeira fase, quando uma economia se abre ao exterior começa pelos fluxos de comércio externo (exportações e importações); a segunda fase dessa economia é a presença e o investimento direto/físico, quer de raiz industrial quer comercial, nos mercados em que está interessada; e a terceira fase (que algumas empresas americanas já são e algumas portuguesas têm tentado) é ser empresas globais no mundo, em que já não se sabe bem onde são os “headquarters”, ou sabemos onde são mas já não se confunde a empresa com o seu sítio físico de instalação. Cada nó do segmento da cadeira de valor está num certo sítio do mundo, e estão todos ligados em rede, em network, e isto é a chamada empresa global.

Vejam o que acontece com a Microsoft que tem centros de investigação na China, e portanto já não há propriamente uma ligação, nas empresas globais, entre o seu “headquarter” e a empresa. A empresa é muito mais do que um sítio físico. E portanto isso são as três fases do comércio.

Nós em Portugal, hoje em dia, falamos muito em internacionalização, mas é preciso dizer que estamos na 2ª fase de um processo de internacionalização, isto é, as empresas portuguesas que desde o tempo da EFTA se abriram à Europa (exportavam e importavam para a Europa) passaram depois, a partir de uma certa fase, a investir directamente em mercados para os quais antes exportavam. E quando falamos hoje em internacionalização isto é em termos económicos a segunda fase do processo de internacionalização. Ela começou com a abertura à EFTA e os fluxos de comércios externo e, isto, é particularmente relevante neste momento para as empresas portuguesas em Angola, sobretudo para as empresas de bebidas, e do âmbito alimentar, que são marcas muito apreciadas em Angola. É um caso típico em que a qualidade percebida pelos clientes angolanos está alinhada com a qualidade intrínseca dos nossos produtos - coisa que não acontece nos Estados Unidos, conseguimos ter produtos excelentes mas nos Estados Unidos, somos vistos

SEGUNDA SESSAO ~

“O investimento em Angola”

BANCO BICEng.º Luís Mira Amaral

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ainda como um país produtor de bens de consumo corrente de baixa qualidade e baixo preço, não conseguimos alinhar a nossa qualidade intrínseca com a qualidade percebida pelos clientes: e o que interessa é a qualidade percebida pelos clientes, se não a tivermos, esqueçam.

Em Angola isso felizmente não acontece, portanto estávamos a exportar para Angola nestes sectores, geralmente nas bebidas, e agora Angola com a pauta aduaneira exterior aumentou essa pauta. Para quê? Para travar exportações e obrigar estas empresas a investir directamente e produzir a partir de Angola, senão perdem o mercado. Isto é uma estratégia dos países emergentes que aliás os Estados unidos já fizeram em 1780 com o Secretário de Estado do tesouro americano, Alexander Hamilton.

O Dr. Vítor Gaspar só fala da primeira parte do Alexander H. e esquece-se de falar da segunda. O que é que o Alexander H. fez na altura? Mutualizou a dívida dos estados (é o que chamamos fazer “eurobonds” na fase actual da construção europeia) e centralizou isso no governo federal americano. Mas tinha consciência que não bastava assumir as dívidas, tinha de por a economia americana a crescer para, depois de assumir as dívidas, pagar as mesmas. Então o que fez? isto é o que o Prof. Gaspar não sabe (não estudou essa parte do manual) e que eu vou acrescentar, é que a seguir os Estados Unidos, como potência emergente, aumentaram a pauta alfandegária sobre o exterior e com isto fizeram a industrialização da economia americana. Isto gerou o crescimento económico americano e permitiu servir a dívida. Portanto, o que Angola está a fazer neste momento, é aquilo que outros países emergentes já fizeram, o aumento da pauta alfandegária sobre o exterior para obrigar à produção lá dentro. É isto que as nossas empresas de bebidas estão a sentir. Em termos de comércio externo, neste momento os cinco principais clientes de economia angolana são a China, a Índia, os Estados Unidos, Tailândia e Canadá. E aqui obviamente que a China é o grande comprador de petróleo a Angola e portanto assume-se como principal cliente na economia angolana.

Já no que respeita às importações, Portugal é o primeiro fornecedor da economia angolana, seguido da China, Estados Unidos, Brasil e África do Sul, e isto tem a ver com a capacidade dos nossos exportadores, até pelas razões que eu expliquei de fornecerem para Angola. Parece que neste momento a China já nos terá ultrapassado, mas em todo o caso a nossa performance para Angola é notável nesta matéria.

Passemos ao investimento direto no estrangeiro: Angola tem recebido um considerável

Segunda Sessao - O investimento em Angola | Eng.º Luís Mira Amaral ~

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fluxo de investimento direto estrangeiro, Portugal tem sido o país que mais investiu nos últimos anos em Angola um caso notável: como pequeno país temos estado à frente (seguidos dos Estados Unidos da América, Reino Unido, Espanha e África do sul) mas em contrapartida o investimento angolano no exterior ainda tem sido reduzido. O investimento direto estrangeiro em Angola tem sido maior que o investimento angolano no exterior. Isto é facilmente compreensível devido ao estado do desenvolvimento da economia angolana. Angola está num processo de várias transições, teve a transição do partido único para um regime mais multipartidário, teve a transição da guerra para a paz, e teve a transição de uma economia centralizada para uma economia de mercado. E portanto, são várias transições que Angola tem ao mesmo tempo. É fácil perceber na primeira fase do campeonato como é que foi o investimento angolano em Portugal: foi feito pela empresa pública Sonangol. Quando investe no seu core business que é a Galp pode dizer-se que está a investir como empresa petrolífera. Quando a Sonangol investe no BCP obviamente não está a investir no seu core business e portanto a leitura é a seguinte: o governo angolano está a usar a Sonangol como o seu fundo soberano, que não tinha na altura, para investir fora de Angola. E portanto, quando a Sonangol investiu no BCP a minha leitura é que a Sonangol fez o papel de fundo soberano de Angola que não tinha (já tem, mas na altura não tinha).

Naturalmente, do ponto de vista empresarial, não havia um sector privado angolano, havia grandes empresas públicas angolanas, como a Sonangol, investindo quer no seu core business quer como braço do governo angolano, fazendo o papel de fundo soberano. O investimento angolano em termos empresariais privados começou recentemente e nós sentimos isso no Banco BIC português. É evidente que os angolanos, se estão encantados com Portugal, compram aqui casas para a família passar férias, para os filhos estudarem, ou para efeitos de rendimento. E eu já fui ao Dubai intencionalmente porque ouvi dizer que os angolanos iam muito comprar ao Dubai, fui lá de propósito e fiz tudo como deve ser: fui na primeira classe dos Emirates que, passo a propaganda, é fabulosa – alias há tipos que me dizem que hoje vão para Luanda, vão de Lisboa ao Dubai, depois fazem Dubai-Luanda em primeira classe da Emirates e é mais barato que na TAP em executiva, e eu acredito que sim. Leva é mais tempo, mas quem tem tempo pode fazê-lo. Então eu fui ao Dubai e vi que aquilo é um grande supermercado para os angolanos comprarem produtos eletrónicos e carros. Mas se o angolano chegar a Lisboa ou ao Porto, instalar-se aqui num bom hotel e depois descer pelas ruas (como a Av. da liberdade em Lisboa) onde há as lojas todas, há uma diferença muito grande. Portanto a gente percebe que um angolano chega a Lisboa e instala-se no Tivoli ou no Ritz e depois faz a Av. da liberdade isto é totalmente diferente

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de ir fazer compras ao Dubai. As famílias já estão a investir há muito tempo em Portugal no “real estate” e a fazer compras devido à qualidade de vida que temos, Lisboa, Porto, Algarve. Nesse aspecto nós temos vantagens muito grandes.

Isto começou por aí e a seguir temos de perceber: a partir do momento em que o sector privado angolano se comece a desenvolver, e que se comecem a construir grupos económicos privados angolanos, é evidente que esses grupos económicos querem internacionalizar-se, querem ir para o exterior, e então aparecem investimentos do sector privado angolano em empresas de Portugal. Um dos sectores que obviamente foi o mais mediático foi o sector dos média. Portanto toda a gente captou isso, porque era o sector mais mediático.

Depois no sector da banca também tem havido investimento angolano em Portugal. O primeiro que veio foi o BAI – Banco Angolano de Investimentos; o segundo foi o BIC que era misto, luso-angolano com Isabel dos Santos, angolana, Fernando Teles e Américo Amorim, portugueses: fizeram o primeiro Banco BIC em Angola e depois o Banco BIC Português; depois outros bancos como o BPA e agora temos assistido a outros mais pequenos, angolanos, como o BNI e o BANC a fazê-lo. Já tinha havido um, mas foi de cá para lá: foi o Grupo BFE quando fez o Banco de Fomento em Angola, e foi um investimento de Portugal para Angola, não foi de Angola para Portugal, no sector bancário. E agora estamos a ver também o investimento angolano em empresas portuguesas no sector de construção civil como tem sido visível nos jornais; e no sector da indústria talvez menos mediático, menos visível mas também já há grupos económicos angolanos a comprar empresas. E aqui devo dizer que o que eu gostaria de ver nesta matéria (por exemplo nos sectores de materiais de construção) era parcerias entre empresas portuguesas e empresários angolanos, porque os angolanos têm um ambicioso programa de habitação social, têm os recursos naturais para fazer os materiais de construção, mas não têm o “know-how” nem a competência que as empresas portuguesas nesses sectores têm. Portanto, se se conseguir montar modelos em que os angolanos entrem em Portugal na empresa portuguesa porventura aumentando o capital, e depois replica-se esta empresa em Angola para aproveitar de facto a oportunidade de mercado (o ambicioso programa de habitação social), o sector dos materiais de construção é o sector óbvio em que isto deve ser feito. De facto, já começou algum investimento angolano no sector industrial, no imobiliário e nos materiais de construção, além da construção civil. Portanto, o investimento angolano tem seguido esta trajetória, obviamente que ainda é diminuto em termos daquele que é

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o português em Angola, isto tem a ver com o estado de desenvolvimento das economias e portanto o investimento em Portugal tem sido considerado uma extensão dos projetos de internacionalização da estrutura financeira e produtiva angolana: a banca, as telecomunicações, a energia de petróleos, a construção civil e indústria, a engenharia e a arquitetura em que eles também estão a comprar, ou a entrar com parceiros portugueses nesta área. Os média, a saúde, o ambiente, a indústria e o turismo, são sectores óbvios em que Angola procura entrar em Portugal. Estes são os sectores em que eu vejo que isto esteja a acontecer. Uma palavra final nesta primeira intervenção para chamar a atenção como é que nós funcionamos nos Bancos BIC: temos dois bancos, o Banco BIC Português em Portugal e o Banco BIC em Angola (que foi aliás aí que começou em 2005, o Banco BIC Português só arrancou em 2008) e portanto temos apoiado empresários angolanos em Portugal desta forma: eles têm ativos em Angola, dão esses ativos de garantia ao Banco BIC em Angola e o Banco BIC em Angola emite uma garantia para nós; e na base dessa garantia do Banco BIC em Angola nós financiamo-los em Portugal. Logo, a existência de bancos que estão em Portugal e em Angola e podem jogar entre eles com sistemas de garantias, tem permitido o investimento angolano em Portugal – como também, devo dizer, tem permitido ajudar empresas portuguesas de construção civil que estão em Angola e que às vezes têm atrasos de pagamento de Angola a Portugal, e através de garantias do Banco BIC em Angola nós temo-los apoiado em Portugal. Se não fosse isto, a situação seria muito mais complicada para algumas delas em Portugal. É evidente que depois no fim disto há sempre um problema, que é o do kwanza não ser convertível. Está aqui subjacente um problema de autorização de transferência de divisas pelo Banco Nacional de Angola, e o que nós aqui fazemos, de acordo com a legislação cambial angolana, é agilizar o processo e poder antecipar pagamentos ou investimentos que podem levar mais tempo porque precisam de autorizações cambiais. É evidente que há aqui uma restrição ao investimento angolano em Portugal, que nós felizmente esquecemos porque estamos no euro (e isto de estar no euro é como um tipo quando tem saúde não liga à saúde, se perder saúde é que liga à sua importância) Há aí uns cómicos que advogam a saída de Portugal do euro, não sabem o que é ter uma moeda convertível, em que os empresários portugueses com esta moeda facilmente investem em qualquer parte do mundo. Os angolanos ainda não têm essa moeda convertível o que leva a mais dificuldades no investimento para Portugal ou para outros países. Chamo-vos também a atenção que o Banco BIC Português está a transaccionar kwanzas fora de Angola, isto é a primeira janela para uma abertura do kwanza ao mundo e à sua convertibilidade, mas apenas para pequenas quantias para viagens e despesas pequenas. O modelo foi feito de uma maneira muito simples: quando transaccionamos

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kwanzas em Lisboa é como se transaccionássemos dólares, ou seja quem assegura, quem corre o risco do câmbio kwanza-dólar é o Banco BIC em Angola; porque quando estamos a transaccionar kwanzas, no nosso balanço é como se transaccionássemos dólares. Depois corremos é em Portugal o risco euro-dolar. Nós fomos o primeiro banco a fazê-lo, agora há outros bancos e já casas de câmbio também estão a fazê-lo. Eu tenho vindo a chamar a atenção, que os angolanos têm o problema de uma moeda que não é convertível, nós temos uma moeda perfeitamente convertível, há aí uns tontos que querem sair dela, quando afinal nem precisamos de sair do euro para ajustar a balança externa – como se viu neste período de austeridade. Nós não ajustámos foi o monstro público, portanto o Estado não fez o trabalho de casa no período de austeridade em Portugal. Os empresários fizeram, e não precisamos de sair do euro para ter uma balança com o exterior equilibrada. E temos uma moeda que é convertível e com a qual facilmente investimos em qualquer parte do mundo. Os angolanos ainda não a têm, portanto isto é uma restrição neste momento ao investimento angolano no exterior.

Segunda Sessao - O investimento em Angola | Eng.º Luís Mira Amaral ~

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Boa tarde a todos. Gostaria, antes de mais, de agradecer o convite da AEP na pessoa do Prof. Valente de Oliveira e dizer que é uma honra a Bosch estar aqui representada.

Irei então falar-vos um pouco da Bosch, e um pouco de Portugal em termos de investimentos europeus e um pouco de como aumentar a atractividade de Portugal em termos europeus.

Vou começar pela Bosch, uma grande marca mundial, um portfólio de produtos enorme. De facto, a indústria automóvel é a base da Bosch. Facturou no último ano 46,1 mil milhões de euros tendo atingindo já os 300 mil colaboradores e tem 225 fábricas. A Bosch honra-se de continuar a querer ter fábricas ao contrário de outras marcas.

Outro dado relevante que me parece importante é o número de patentes que a Bosch todos os dias regista e, vamos ver qual é a ligação destas patentes a Portugal que penso ser uma ligação extremamente importante. A Bosch regista 20 patentes por dia útil.

Obviamente que as vendas ainda se centram muito no mercado europeu. A Bosch está intimamente ligada à Europa e 55% das vendas ainda são europa apesar de, nesta altura, o esforço de internacionalização fora da europa ser enorme, sobretudo na China. O mercado automóvel na China cresce a muitos dígitos e, obviamente, que a Bosch quer estar presente a acompanhar os clientes de sempre.

A Bosch Portugal em 2011 festejou o seu centésimo aniversário e não é fácil uma empresa estar 100 anos em Portugal e com o crescimento que a Bosch tem vindo a ter.

A Bosch, apesar de nunca ter feito um investimento de raiz em Portugal. Tudo o que tem em Portugal foi fruto de aquisições. Começou em 88 adquirindo a Vulcano, depois em 90 e com um enorme suporte do Engº Mira Amaral como Ministro da Indústria crucial para que a Bosch comprasse parte da Grundig em Braga e, nesta altura, é a nossa maior localização, em 2002, comprou sistemas de videovigilância à Philips em Ovar.

Nesta altura, como disse, temos 4 localizações: Braga, Ovar, Aveiro e Lisboa onde estão os nossos serviços centrais e as vendas.

As vendas em Portugal em 2013 (e não foi record) foram de 788 milhões de euros e a Bosch emprega cerca de 3200 colaboradores nesta altura.

O que é que faz a Bosch em Portugal? A Bosch em Portugal faz 3 segmentos de

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“O investimento Europeu”

Bosch PortugalDr. Jónio Reis

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produtos diferentes. Braga mais ligada à electrónica automóvel, desde os sistemas de displays a sistemas de controlo da direcção do carro, navegações. Em Aveiro fazemos Termotecnologia, seja caldeiras as gás, esquentadores a gás e painéis solares e em Ovar fazemos sistemas de segurança. Todas as unidades fabris estão a abrir o portfólio, as 3 unidades fabris benchmarketing da Bosch em 3 divisões diferentes e todas com crescimento registado. Nos últimos anos estas fábricas têm crescido mais de dois dígitos ao ano, o que é extremamente importante também para nós portugueses como numa empresa worldwide onde competimos, internamente dentro da Bosch, conseguimos em Portugal estar a crescer sistematicamente. A crescer em termos de colaboradores mas sobretudo, e ainda mais me honra, crescer em termos de investigação e desenvolvimento. A Bosch é a 14ª empresa mundial a investir em termos de investigação e desenvolvimento com 4,9 mil milhões de euros. A nº 1 é a Volkswagen com 9,5 e a Bosch Portugal já investiu, nos últimos anos, cerca de 195 milhões de euros em investigação e desenvolvimento, 24 milhões de euros por ano. Eu insisto na investigação e desenvolvimento como sendo uma área crucial para nós continuarmos a crescer… “nós” Bosch e “nós” portugueses.

Olhando mais para o nosso país, e esta é uma figura que eu costumo mostrar aos meus colegas Alemães, e perdoem-me a minha imodéstia mas sou português, apesar de pequenos somos o centro do mundo, pelo menos aos meus olhos, vejam a nossa localização geográfica. Pode não estar correta a nível europeu mas, claramente, está correta a nível mundial. Temos o grande continente África, que ninguém duvide nos próximos tempos será o grande continente de crescimento e temos centenas de anos de história de lidar com este continente e estamos geograficamente bem colocados e, não deixo de referir a América do Sul e a própria América do Norte.

Gostava de vos contar uma história que, por vezes, nós menosprezamos. A Bosch tem uma fábrica na costa oeste do México que é Hermosillo e nós temos um grande centro de distribuição em Nova Iorque. Um contentor de Hermosillo para Nova Iorque custa mais dinheiro que um contentor de Leixões para Nova Iorque. Isto é fundamental nos dias de hoje, não são só os custos primários de produto é também este worldwide cost que nós temos de ter em atenção.

Continuando a referir que Portugal é um ponto estratégico de plataformas e de rotas, tem infra-estruturas modernas, podemo-nos queixar, e até com alguma propriedade, dos excessivos governantes que temos tido mas, o que é certo, é que Portugal evoluiu muito e é reconhecidamente um país atractivo pelo menos falando em termos da Bosch e da

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Alemanha.

Queria, ainda, focalizar aqui, em termos do profissionalismo a qualidade dos nossos recursos humanos. Esta frase não é minha mas, penso que estamos perante a geração melhor preparada de portugueses dos últimos anos e, o que vamos fazer com ela? Vamos só coloca-las nos aviões para irem trabalhar para outros lados? Eu penso que não, penso que devemos aproveitar e, para realçar aqui a qualidade dos nossos recursos humanos tenho aqui alguns dados da AICEP para ver se não nos esquecemos.

Estes dados são benchmarkings que foram efetuados entre vários países europeus e, por exemplo, a percentagem de licenciados em ciência e engenharia em Portugal está em ranking número 2; performance e inovação por dimensão Portugal está em número 3 com a Alemanha em primeiro lugar; inscritos no ensino superior em 13º; competências linguísticas estamos com factor 7, olhem os nossos irmãos espanhóis com 2,60 em termos linguísticos e, a facilidade em contactar com estrangeiros estamos no ranking número 13. Estes são dados de 2011, actuais e, por vezes nós portugueses nos esquecemos internamente. Nós, na Bosch, como temos de lidar constantemente com os nossos colegas estrangeiros gostamos de referir isto, para atrair mais investimento para Portugal, para atrair mais investigação e desenvolvimento porque, desenganem-se se pensam que a investigação e desenvolvimento é só um gabinete de engenheiros. Com investigação e desenvolvimento é muito mais fácil atrair o restante processo produtivo. Com investigação e desenvolvimento em Portugal é muito mais fácil o tecido industrial à volta do país ser desenvolvido. É crucial nós sabermos aproveitar a melhor geração preparada de todos os tempos em Portugal. Todo este esforço que foi feito, temos de acelerar a inclusão destes jovens engenheiros e jovens licenciados que nós temos e aproveita-los ao serviço de Portugal e das empresas em Portugal.

Passámos um período conturbadíssimo com a entrada da Troika. O sentimento de pessimismo e desconfiança não era só em termos de estado. Em termos da Bosch era sentida a desconfiança em relação ao nosso país e, até por vezes, em relação aos portugueses. Quando nós pedíamos para investirem mais em Portugal durante esse período, acreditem que o período de desconfiança e pessimismo era extremamente alto.

Apesar de tudo e de todas as manobras eu penso que saímos de uma forma positiva. A taxa de exportação aumenta sistematicamente à 4 anos consecutivos com 5.7. e, a taxa de desemprego está a atingir o valor mínimo desde 2008, obviamente que é tremendamente

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alta mas, apesar de tudo, penso que conseguimos restaurar, como portugueses, os índices de confiança e, hoje, quando temos uma reunião da administração da Bosch o sentimento em relação ao nosso país e à confiança no nosso país e nos portugueses é muito maior.

Passando para o investimento directo europeu, estes são dados da AICEP de 2013 e, 95% do investimento directo em Portugal é europeu. É evidente que, infelizmente, o investimento é tão baixo que quando existe algum investimento de monta ou de chineses na EDP ou dos brasileiros no caso da PT, altera completamente a morfologia deste gráfico. Este é o gráfico de 2013, penso que o de 2014 já está ligeiramente alterado e, agora, não tenhamos dúvidas que o grande investimento directo em Portugal ainda (e infelizmente, digo eu!), porque temos a abertura de muitos outros continentes, continua a ser europeu.

Dentro de que tipo de investimento? O retalho consome 31,9%, as fábricas e a indústria 20,5% e é aqui que a Bosch se enquadra e a parte financeira em 20,8%. Todos estes números seriam interessantes, contudo temos de dizer claramente que no último ano o investimento directo em Portugal decresceu significativamente. Países como a Espanha, França decresceram na casa dos 20 e tal porcento, o Reino Unido aumentou 8,5 e a Alemanha manteve investimentos e, a Bosch tem aqui parte da responsabilidade com 17,3%. Penso que isto reflecte também a crise e a estagnação que vivemos na Europa e acaba por traduzir estes números para o nosso país.

Por último, como nos vamos tornar mais atractivos? Uma definição de estratégia da promoção de Portugal, acontece-me frequentemente nas minhas viagens pelo mundo, em termos de trabalho, ainda existirem muitas pessoas que conhecem o nome de Portugal mas não conhecem as capacidades que nós temos. Temos de ter uma política claramente de venda do nosso país, de mostrarmos como somos bons, como temos produtos bons e sobretudo como temos pessoas capazes de o desenvolver, produzir e comercializar.

Relembro-me há vinte anos atrás, estava eu na universidade, do relatório do Michael Porter, com as vantagens competitivas de Portugal. Passaram 20 anos, o contexto económico alterou totalmente, pensar na China há 20 anos atrás e pensar hoje são realidades completamente diferentes. O que é certo é que não temos mais nenhum approach semelhante a dizer quais são as vantagens competitivas de Portugal de 2014. O contexto económico alterou radicalmente e não somos capazes de nos mostrar, dizer “as nossas vantagens competitivas agora são estas”, porque o mundo não muda de 20 em 20 anos, muda todos os anos. E a situação de como vamos promover Portugal. Obviamente que

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todos queríamos que as grandes marcas, as grandes empresas investissem em Portugal mas, não nos podemos esquecer das médias empresas e o exemplo que eu trago aqui é das empresas alemãs. Não é possível, nesta altura, aos custos actuais da Alemanha, continuar a produzir na Alemanha. A Alemanha tem custos de mão-de-obra extremamente caros sobretudo para produtos de média e baixa gama, e há imensas empresas médias que têm que deslocalizar e Portugal, na minha opinião, tem o espaço mais que perfeito para investir. Agora é preciso que eles saibam, criem as mesmas condições para eles e tenham muitas dúvidas que aquelas comitivas de empresários a fazerem visitas aos países sem focalizarmos claramente quais as empresas que querem investir em Portugal e o que lhes vamos oferecer, o que lhes vamos mostrar para ter a confiança, penso que são fundamentais para que nós tenhamos um approach mais pragmático a quem realmente quer investir em Portugal e não irmos de uma forma genérica e sem focalizar.

Por último é preciso diminuir os custos de contexto e preocupamo-nos muito com os custos salariais mas esquecemo-nos muito dos custos de contexto. Continuamos a ter uma energia mais cara que a Alemanha e isso não é possível. E porquê? Continuamos a ter dificuldade ao crédito, sobretudo nas pequenas e médias empresas, continuamos com uma justiça lenta, demorada e, que de certa forma, incentiva a pouca credibilidade de empresários investindo em Portugal. Continuamos, como o Eng.º Mira Amaral dizia, a reforma do Estado custa a acontecer. Continuamos a ter uma máquina de Estado burocrática, lenta e, por vezes, difícil de explicar aos nossos colegas alemães, como temos de produzir não sei quantos relatórios, como temos de esperar meses por uma simples aprovação de uma licença industrial, isto é difícil de dizermos aos nossos parceiros e colegas alemães.

Em resumo, a Bosch acredita em Portugal, a Bosch está a pensar continuar a investir fortemente em Portugal, a Bosch acredita fortemente em Portugal e a prova disso é que os administradores todos das empresas são portugueses, já não são mais alemães e a Bosch acredita nos activos de Portugal e das pessoas. Eu penso que temos todas as condições, enquanto país, para independentemente do tamanho de revivermos o passado e olharmos para fora, para África ou Brasil porque não? E, obviamente, sabendo que estamos na Europa e que somos um parceiro fiável.

Muito obrigado.

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“O investimento do Brasil”

EMBRAER

Dr. João Taborda1

1 Diretor de Relações Externas, Embraer, Europa, África e Médio Oriente2 www2.espm.br/pesquisa/labs/observatorio-de-multinacionais-brasileiras3 Em diante designadas, respectivamente, de Embraer Metalicas S.A. e Embraer Compositos S.A.

A Embraer Portugal agradece ao Sr. Prof. Luís Valente de Oliveira e à Fundação AEP o convite para participar neste prestigioso evento e partilhar com os participantes os principais passos relacionados com os investimentos realizados em Portugal pela Embraer. Desde a conclusão do processo de privatização da OGMA em 2005, até ao anúncio em 2014 do Centro de Engenharia e Tecnologia Embraer na Europa (em diante Centro de Engenharia e Tecnologia), passando pelas duas novas fábricas em operação em Évora desde 2012.

Este trabalho da Embraer em Portugal, relevante do ponto de vista da estratégia da empresa num mercado globalizado e muito competitivo como a aeronáutica, junta-se a um conjunto de iniciativas que outras multinacionais brasileiras têm desenvolvido no exterior durante a última década e que, no caso da Embraer, se encontram focadas no objectivo de reforçarem a sua competitividade a partir da sua base no Brasil.

Dias antes deste evento, a 15 de outubro de 2014, o Observatorio de Multinacionais

Brasileiras da ESPM, escola de Comunicação, Marketing e Gestão com base em São Paulo, divulgou dados actualizados com base num estudo realizado em 400 empresas brasileiras e 1000 subsidiárias no exterior, e em que estima existirem hoje mais de 400 multinacionais brasileiras com presença em 56 países2.

Num segundo estudo derivado do primeiro, a ESPM analisou 78 subsidiárias de 39 empresas tendo verificado que este processo de internacionalização (hoje já de Globalizacao no caso da Embraer) corresponde a um fenómeno recente, citando que 69% dessas subsidiárias têm menos de 10 anos de existência. Em 71% dos casos a prioridade é a produção, com pouco ênfase ainda em áreas de investigação e desenvolvimento, com excepção das empresas Natura e Braskem e, mais recentemente, da Embraer com os seus Centros de Engenharia em Melbourne, Florida, e em Évora.

Acompanhando um pouco este movimento no seu sector em particular, a Embraer mantém hoje em curso algumas iniciativas que complementam a sequência de investimentos no Brasil que tem mantido desde a sua privatização em 1994, ao mesmo tempo que reforça o acesso aos mercados internacionais e lhe permite aceder a novo conhecimento e a tecnologias estratégicas para o seu futuro.

Destacam-se nesse quadro os três projectos empresariais já referidos e desenvolvidos

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em Portugal na última década: a privatização da OGMA em 2005 e as duas novas fábricas em Évora anunciadas em 2008 e em operação desde 2012, Embraer Portugal Estruturas Metálicas S.A. e Embraer Portugal Estruturas em Compósitos S.A.3 , junta-se a esta última o Centro de Engenharia e Tecnologia anunciado em 2014 e em fase de implantação à data da realização deste evento.

Como nota, refira-se que as duas empresas em Évora constituem as únicas fábricas da Embraer detidas a 100% pelo grupo no exterior e que trabalham em exclusivo como Fornecedores de Primeira Linha para a Casa–Mãe no Brasil.

Pertencendo ao grupo das principais empresas exportadoras do Brasil e reconhecida como uma das melhoras empresas para se trabalhar na América Latina, a Embraer trabalha assim para reunir as competências as capacidades necessárias para manter a sua competitividade a nível global, com a base sólida de atividade no Brasil associada à sua história de 45 anos, e afirmando-se perante os seus concorrentes nos três principais segmentos de mercado em que atua: Aviação Comercial, Aviação Executiva, e Defesa e Segurança. A estas junta-se ainda uma quarta área, a aviação agrícola onde, em 2004, a Embraer certificou para utilizar etanol como carburante o modelo Ipanema, o primeiro avião no mundo com essa funcionalidade.

Criacao da Embraer

A ideia de base que levou à criação da Embraer remonta ao período após a II Guerra Mundial, tendo-se começado a concretizar anos depois, em 1950, com a criação do Instituto Tecnológico de Aeronáutica, ITA, em São José dos Campos, São Paulo, seguido do início da atividade do Centro Técnico Aeroespacial, CTA, em 1954.

Mais tarde, em 1969, a Embraer iniciou a sua atividade enquanto empresa estatal, mais tarde privatizada em 1994 quando atravessava muitas dificuldades. Concluído esse processo, a combinação do talento já disponível na empresa com uma nova perspectiva focada nas necessidades de mercado, em sua grande parte trazida pelo parceiro privado, resultou a que a Embraer se viesse a posicionar nos vinte anos seguintes entre o grupo das quatro principais construtoras de jatos comerciais do mundo4.

Para além da dinâmica de investimento mantida no Brasil, o período que se seguiu à

3 Em diante designadas, respectivamente, de Embraer Metalicas S.A. e Embraer Compositos S.A.4 http://www.centrohistoricoembraer.com.br/

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privatização registou também algumas iniciativas empresariais no exterior que, para além dos projectos em Portugal já referidos, incluíram na primeira década do século a instalação de três fábricas fora do Brasil para produção final de aviões para mercados específicos: uma na China (jatos executivos) e duas nos Estados Unidos (jatos executivos e aviões de defesa).

Areas de Negocio

Com o processo de privatização a Embraer concentrou uma parte muito importante dos recursos disponíveis no segmento da Aviação Comercial desenvolvendo o jato regional Embraer ERJ-145, que se tornou familiar ao mercado Português pela presença

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desde a segunda metade da década de noventa nos aeroportos nacionais dos aviões da Portugalia, um dos primeiros clientes na Europa. Á data deste evento, e referenciando-se os dados referentes ao final do terceiro trimestre de 2014, este segmento responde por 53.3% do volume total de negócios da Embraer, contabilizando-se mais de 1,600 aviões em operação no mundo, distribuídos por 85 companhias aéreas em 59 países.

Em 1999, e com a família ERJ-145 registando resultados de mercado muito encorajadores, a Embraer lançou a família Embraer E-Jets, um dos programas que mais depressa chegou às 1000 unidades entregues, marco atingido em Setembro de 2013. Nesse mesmo ano a empresa apresentou uma nova versão deste avião, a família Embraer E-Jets E2, com novos motores, novas asas e nova tecnologia de

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cockpit, e com previsão de início de operações nas companhias aéreas em 2018. 5

O E2, que conta à data com mais de duas centenas de encomendas firmes, encontra-se em fase de desenvolvimento utilizando as capacidades disponíveis nas várias unidades da Embraer no Brasil e no exterior, incluindo na Embraer Metálicas S.A. em Évora.

A foto, recolhida a 17 de outubro de 2014, regista alguns elementos da administração executiva e administração não executiva da Embraer S.A. junto da primeira peça para o primeiro protótipo do Embraer E-Jets E2, produzida em Évora nesse mesmo dia.

Á data deste evento, de forma autónoma e nas suas respectivas áreas tecnológicas, as duas empresas da Embraer em Évora, Embraer Metálicas S.A. e Embraer Compósitos S.A. procuram reunir as condições que assegurem a produção de componentes e estruturas complexas para a linha de montagem final do E2 no Brasil.

Outro segmento de mercado onde a Embraer tem mantido uma forte dinâmica de investimento começando no Brasil, é o da Defesa e Segurança, com a Embraer Defesa e

Seguranca contando hoje com vários produtos no seu portfólio, incluindo o Super Tucano (avião de treino militar) e o Embraer KC-390 (transporte), a maior aeronave que a Embraer já projectou, e que se encontra em fase de desenvolvimento6.

No final do terceiro trimestre de 2014, o segmento de Defesa e Segurança respondia por 27.9% do volume de negócios da Embraer, contando-se mais de 50 forças armadas entre a carteira de clientes.

A foto regista o roll-out do Embraer

KC-390 a 21 de outubro de 2014 nas instalações da Embraer em Gavião

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5 www.embraercommercialjets.com.br/6 www.embraerds.com/portugues/content/home/

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Peixoto, Estado de São Paulo, correspondendo ao evento em que a aeronave sai do hangar pela primeira vez. Junto com as bandeiras do Brasil, Argentina e República Checa, a bandeira Portuguesa regista a participação do país como um dos parceiros industriais no Programa e a contribuição das organizações locais no trabalho de concepção e desenvolvimento da aeronave.

A mesma contribuição teve lugar em duas linhas: a que envolveu a OGMA, Empresa de Engenharia Aeronáutica, EEA, e o centro de inovação CEIIA; e a que disse respeito ao acordo direto entre a Casa-Mãe e cada uma das duas empresas de Évora, Embraer Metálicas S.A. e Embraer Compósitos S.A., onde foram fabricados componentes para a aeronave com base nas competências específicas instaladas.

Respectivamente, nessas duas empresas no Alentejo, foram também produzidas as maiores peças em alumínio e material compósito que a Embraer produziu em qualquer das suas unidades industriais na sua história.

Para além do produto de aviação KC-390, a Embraer Defesa e Seguranca (que integra a OGMA na sua estrutura) tem sido também a base para alguns projectos de diversificação de negócio no Brasil, abrangendo áreas como aeronaves não tripuladas, espaço, tecnologias de controlo de tráfego aéreo, radares e sistemas de vigilância de fronteiras.

A Aviação Executiva corresponde ao terceiro segmento mercado de negócio em que a Embraer atua contando com uma gama completa de produtos, desde a família Phenom

com os seus modelos 100 e 300, até ao Lineage 1000, jato de maior porte capaz de voar directamente entre Nova Deli e Lisboa7.

No final do terceiro trimestre de 2014, esta área da empresa respondia por 17.2% do volume de negócios, com mais de 800 aeronaves em operação, distribuídas por mais de 50 países.

O portfolio da Embraer para este segmento inclui ainda a gama Legacy (450, 500, 600 e 650), todos eles fornecidos pelas fábricas da Embraer em Évora, e com a particularidade de o Legacy 500 ter sido o primeiro a integrar componentes e estruturas produzidas no Alentejo.

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7 http://www.embraerexecutivejets.com.br/

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A Presenca Europeia e em Evora

A Embraer tem uma base de operação na Europa desde 1983, ano em que se instalou no aeroporto de Le Bourget, em Paris, tendo expandido mais tarde a sua atividade para um edifício na localidade de Villepinte, próxima do aeroporto Charles de Gaulle.

Desde a sua criação que esta estrutura em França visa apoiar os clientes que operam aeronaves da Embraer na Europa, África e Médio Oriente, tendo-se agregado à mesma equipas comerciais para angariar novas oportunidades na mesma região.

Neste período a Embraer intensificou a sua actividade com fornecedores europeus, de onde se destacam quatro que, para além de produzirem partes e sistemas para as aeronaves, trabalham como parceiros de risco nos principais programas da aviação comercial da Embraer: Aernnova (Espanha), Latecoere (França), Liebherr (Alemanha) e Sonaca (Bélgica).

O enfoque na Europa como fonte de tecnologia registou novo avanço em 2005 quando a Embraer começou a participar dos primeiros projectos financiados pelo Programa-Quadro da Comissão Europeia, primeiro dos quais sob a coordenação de uma PME Portuguesa, a Skysoft, hoje GMV Portugal. Isto numa fase em que se havia concretizado já a privatização da OGMA.

O ano seguinte traria o início do trabalho com o Governo Português sob coordenação da AICEP e que conduziu ao anúncio em 2008 das duas decisões de investimento em Évora, para as quais se revelaram cruciais os apoios disponibilizados pelo Quadro Estrategico de

Referencia Nacional, QREN. Com este veio assim uma nova fase da actividade da Embraer

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na Europa, marcada pelo empenho e pelo compromisso assumido de gerar um contributo para desenvolvimento regional de Évora e do Alentejo.

A foto apresenta uma vista aérea das duas empresas industriais hoje instaladas no Parque da Indústria Aeronáutica de Évora, com a Embraer Compósitos S.A. especializada em materiais compósitos (componentes e estruturas complexas) e a Embraer Metálicas S.A. em alumínio

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(também componentes e estruturas complexas).

Em vez de uma mera extensão da sua capacidade produtiva, as decisões de investimento visaram instalar em Évora duas unidades com tecnologias muito específicas no estado-da-arte, com operações industriais distintas mas integrando as melhores práticas empregues na Casa–Mãe em matéria de gestão da produção e das cadeias de fornecedores globais que caracterizam esta indústria. Assumindo esta missão, as duas empresas receberam desde o seu anúncio da designação de Centros de Excelencia.

Ao processo iniciado em agosto de 2006 que levou ao anúncio dos investimentos em julho de 2008, seguiram-se os programas de formação envolvendo os primeiros empregados em Évora, as obras, a realização dos estágios no Brasil para as primeiras chefias intermédias, a instalação dos equipamentos e a inauguração oficial em Setembro de 2012.

O bom progresso registado desde o início viabilizou as primeiras exportações para o Brasil ainda em 2012, na circunstância um estabilizador horizontal em material compósito com origem na Embraer Compósitos S.A. destinado à cauda do Embraer Legacy 500, e um conjunto de duas semi-asas em material metálico a partir da Embraer Metálicas S.A. destinado ao mesmo modelo.

No período que se seguiu as duas empresas concentraram as suas prioridades na melhoria contínua do seu processo, formação da mão-de-obra Portuguesa e em acordos com a Casa–Mãe tendo em vista a utilização das tecnologias instaladas em mais produtos da Embraer.

É então que, com base na respectiva capacidade que foi ficando disponível, cada empresa começou a trabalhar em programas como o Embraer E-Jets, Legacy 600 e, como referido no início deste texto, o avião de transporte militar KC-390. Já em 2014, é anunciado em fevereiro o Centro de Engenharia e Tecnologia e, em agosto, o início das actividades da Embraer Metalicas S.A. na fase de desenvolvimento do Embraer E-Jets E2.

Objectivos e Proximos Passos em Evora

Com as suas operações industriais integradas com a Casa–Mãe e contribuindo para o reforço da competitividade dos produtos por esta exportados e seu acesso a mercados

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SEGUNDA SESSAO ~

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fora do Brasil, é objectivo da Embraer consolidar o papel das duas empresas de Évora na sua cadeia Global de fornecimentos, reforçando a suas estratégias autónomas enquanto Centros de Excelencia nas respectivas tecnologias.

Estas estratégias assentarão na capacidade de cada uma das empresas em intensificar os seus processos de geração de conhecimento nas suas áreas de especialização, quer recorrendo aos seus quadros, quer sobretudo no âmbito de iniciativas em rede envolvendo parceiros Portugueses e do resto da Europa como Pequenas e Médias Empresas, Centros Tecnológicos, laboratórios especializados e universidades.

Por sua vez, e já no processo de implantação em que se encontra, o Centro de Engenharia e

Tecnologia procurará também inserir-se nessas dinâmicas, trabalhando entre necessidades concretas das operações em Évora e os parceiros externos, e começando pelo tema de materiais compósitos enquanto principal prioridade.

Por outro lado, o reforço permanente do papel dos Centros de Excelencia assentará também num trabalho permanente de angariação de novas atividades que mantenham a capacidade ocupada no nível mais adequado em termos de exploração das economias de escala desejadas.

Como seguimento às tarefas em curso relacionadas com o desenvolvimento do avião, um exemplo é a prioridade dada à data deste evento às ações que venham a garantir a produção em Évora de componentes e estruturas para a produção em série do Embraer

E-Jets E2.

A exemplo do que se verifica já para os produtos da Embraer fornecidos por cada uma das empresas em Évora, manter-se-á também entre as principais prioridades o desenvolvimento de cadeias de fornecedores nacionais, devidamente qualificados, e que possam produzir peças e sub-conjuntos a integrar em Évora nas linhas de produção da Embraer Metálicas S.A. e da Embraer Compósitos S.A.

Este trabalho teve início em março de 2009, mais de três anos antes da entrada em funcionamento das fábricas, tendo a Embraer trabalhado em coordenação com a AICEP na constituição de dois grupos de 10 empresas cada e que, entre outras atividades, conheceram com mais detalhe as áreas da Embraer no Brasil envolvidas no processo de subcontratação e foram acompanhadas no processo de cotação, fabrico e entrega de exemplos de peças que podem produzir recorrendo à base tecnológica instalada.

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Segunda Sessao - O investimento do Brasil | Dr. João Taborda ~

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Da possibilidade de cada uma das duas empresas estabelecer a sua respectiva cadeia de fornecedores, flexível, e produzindo peças a um preço competitivo dependerá também a própria competitividade das empresas da Embraer em Évora. Tal deve-se ao fato de, enquanto Centro de Excelencia, cada uma das empresas fabricar apenas peças de grande dimensão, muito complexas, e específicas ao setor aeronáutica, recorrendo ao mercado para as centenas de outros componentes de que necessita para completar as estruturas que exportam diretamente para o Brasil e que são integradas nas linhas finais de montagem dos aviões da Embraer.

Desta forma, as atividades da Embraer em Portugal e a partir do Alentejo manter-se-ão servindo cinco objectivos principais:

• Assegurar as dinâmicas de investimento na Embraer Metálicas S.A. e na Embraer Compósitos S.A. (formação de pessoas e tecnologia no estado-da-arte) que lhes permita manter o seu posicionamento enquanto Centros de Excelencia dentro do Grupo Embraer;

• Posicionar as tecnologias específicas instaladas nas duas empresas em programas de desenvolvimento de aeronaves da Casa–Mãe, consolidando o seu papel enquanto Centros de Excelencia nas cadeias globais de fornecedores da Embraer;

• Manter a integração completa das operações industriais com as da Casa–Mãe, partilhando e absorvendo metodologias capazes de otimizar e maximizar o valor acrescentado associado às tecnologias e processos instalados;

• Continuar o trabalho com atuais e potenciais fornecedores Portugueses ou oriundos de regiões vizinhas;

• Através da actividades do Centro de Engenharia, reforçar as atividades de investigação e desenvolvimento, quer no quadro Nacional (Programa Portugal 2020), quer Comunitário (Programa Horizonte 2020).

No seu movimento de Globalizacao numa indústria Global por natureza, esta é assim a dinâmica que a Embraer pretender manter em Portugal, país que, em conjunto com os Estados Unidos, China e México forma o grupo restrito de países onde a empresa tem investido em complemento aos seus projetos na base Brasil.

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SEGUNDA SESSAO ~

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COMUNICACOES´

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TERCEIRA SESSÃO A ATIVIDADE E O INVESTIMENTO PORTUGUÊS NO MUNDO

Moderador: Eng.º Vergilio Folhadela Moreira

“O investimento em Países Europeus”Dr. Sérgio Marques - Parfois SA

“O investimento na América do Sul”Dra. Marta Maia - Jerónimo Martins

“O investimento em África”Dra. Luísa Couto Alves - ACA, SA

“O investimento em outros países”Dr. Bernardo Brito e Faro - Sogrape Vinhos, SA

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Muito boa tarde a todos!

A sala está ainda em recomposição e esperamos que se recomponha rapidamente, mas vamos dar início à primeira sessão da tarde.

O título desta sessão é a “Atividade e o Investimento Português no Mundo”.

A atividade (e o investimento) Português no Mundo começou há muito tempo, cerca de 500 anos.

Teve muitas vicissitudes pelo meio, teve altos e baixos, infelizmente mais baixos que altos. Tenho a impressão que estamos talvez numa fase nova, e esperemos que proveitosa e com êxito, para darmos continuidade a essa nossa tradição de que temos andado um pouco afastados.

Acho que haverá alguns denominadores comuns de que aqui se vai falar e que serão comuns a várias das empresas que hoje estão aqui representadas.

Começo por dizer que, quando nós, portugueses, começamos a sério esta actividade não tanto de investir mas mais de comerciar em todo o mundo, nós (ou quem mandava cá e era competente), servimo-nos de ferramentas que ainda hoje são aquelas que normalmente se utilizam.

A primeira foi Business Intelligence. Lembro que vários governantes, mesmo antes de D. Manuel, mandaram as suas embaixadas de espiões comerciais a coberto do estatuto de embaixadores, que foram tentar perceber o que é que se passava e quais eram as áreas em que se podia atuar.

D. Manuel fez outra coisa notável. Nós hoje temos o Euro - e já de manhã foi referido pelo Eng. Mira Amaral e eu corroboro o que ele disse - uma moeda com circulação mundial. Quando Vasco da Gama foi para a Índia, partiu já convenientemente armado de uma moeda que foi a primeira moeda global, que era o Português, os 10 cruzados de D. Manuel I, o Português de ouro quase puro que, mais tarde, chegou a ser imitado e cunhado de uma forma falsa e menos pura por países do Norte da Europa. Porquê? Porque realmente foi um referencial e foi a primeira moeda que teve circulação em toda a parte. Todo o mundo aceitava o Português como meio de pagamento.

Tivemos apoio diplomático, já referi as embaixadas e, tivemos, também, apoio militar, que,

TERCEIRA SESSAO ~

A ATIVIDADE E O INVESTIMENTO PORTUGUÊS NO MUNDOModerador: Eng.º Vergilio Folhadela Moreira

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enfim, nos dias de hoje vamos admitir será menos necessário (pelo menos de uma forma tão visível) mas que não deixa de ser importante. O apoio militar é, no fundo, o que dá sustentabilidade à acção diplomática e assegura que a mesma pode ter êxito.

Tenho a impressão que estaremos hoje perante situações em que temos alguns factos que são comuns com o que, no passado, fizemos bem feito e que depois fomos perdendo…e são disso exemplo as empresas que hoje aqui vamos chamar.

Começava, seguindo a ordem, por pedir ao representante da Parfois, o Dr. Sérgio Marques, que está mais ligado ao tema dos “dinheiros” mas é diretor executivo da marca desde há 8 anos. Portanto, capaz de nos poder contar a história do que é essa empresa, que começou pequena e que se espalhou por lugares inusitados, por paragens onde já não íamos há muito e muito tempo e, com êxito!

Terceira Sessao - A atividade e o investimento portugues no mundo | Eng.º Vergilio Folhadela Moreira

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Bem, antes de mais, muito boa tarde. Gostaria de agradecer o convite da AEP. Tenho muita honra em estar aqui em representação da Parfois e espero que este “bocadinho” vos possa ser útil.

A Parfois começou há 20 anos atrás, numa loja que fazia esquina entre a Rua de Santa Catarina e a Rua Fernandes Tomás. A loja ainda hoje lá está e, portanto, é uma loja que corre bem.

Ou seja, temos 20 anos de percurso enquanto marca de acessórios de moda. A Parfois começou a crescer muito desde a altura em que foi inaugurada porque aproveitou muito o ciclo da criação de Shoppings em Portugal e, foi uma das primeiras marcas a fazer franchising e, portanto foi sempre subindo até este ano.

Optei por partilhar isto para que realmente se perceba que as empresas são feitas de sucessos, de crises e, é muito importante passar essas crises.

Estes chavões de L4L significam “Like for Like” na gíria de retalho que no fundo representa o comparativo de vendas com o período anterior, apenas para as lojas comparáveis, ou seja, excluindo as lojas que abriram e as lojas que entretanto fecharam nesse período.

Portanto, em 2005, nós tivemos uma baixa de 7% e, em 2006 de 10%. Nesta altura, como imaginam, a empresa estava numa crise muito grande, felizmente não numa crise financeira mas numa crise quase existencial e obrigou-nos a ir, digamos assim, ouvir os clientes. E, foi o que fizemos. Os clientes deram-nos algumas dicas, não que fosse novidade mas fizeram-nos sentir que o que estávamos a pensar era importante. E, grosso modo, o que eles nos disseram foi: as lojas da Parfois não são acolhedoras, nós não nos sentimos bem na loja, gostamos muito do produto mas, quando estamos dentro da loja sentimo-nos apertados e o produto está arrumado de uma forma complicada, demora-nos muito tempo.

Nós em sequência disso fizemos uma revisão grande ao que é a marca, uma reflexão grande à forma da empresa trabalhar e, definimos nesta altura, uma visão de futuro que é ainda hoje, para nós, o grande guia. Nós definimos que a Parfois deverá ser a melhor marca de acessórios onde quer que opere. E, portanto, este é o sonho e, o que significa que todos os dias, todas as opções que se tomam têm de ter isto em consideração. Será que esta opção é digna de alguém que quer ser a melhor marca de acessórios no mercado onde esteja? E, portanto, imaginem, isto ao nível da decoração, de ter uma determinada equipa

TERCEIRA SESSAO ~

“O investimento em Países Europeus”

Parfois SADr. Sérgio Marques

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em loja, faz diferença.

E, como é que nós definimos os principais pontos de ataque, os principais factores críticos para chegarmos lá? Primeiro que tudo nós definimos que devíamos estar na moda. Ou seja, a Parfois vai “atacar” (no bom sentido) o cliente que procura moda. Ao definirmos isto, vamos diferenciar-nos de muitas marcas que estão no mercado e que fornecem produtos que não são de tendência. Ou seja, produtos que são permanentes, produtos que de um ano para o outro se mantêm enquanto a Parfois segue uma linha de design de moda tendência.

E, portanto, nessa altura também reforçamos a equipa de design da empresa e, os produtos que vocês vêm nas lojas são desenhados todos internamente na Parfois. Temos uma equipa de designers no Porto e outra em Barcelona. A de Barcelona é pequena mas, nesta altura, foi um salto grande. Ou seja, nós para contratarmos um determinado designer, na altura, vimo-nos obrigados a abrir um escritório em Barcelona porque ele não queria vir trabalhar para o Porto apesar de gostar muito do projecto. Felizmente hoje já conseguimos atrair gente para o Porto que na altura não era possível. O Porto hoje é uma cidade atractiva. Só por curiosidade, outro dia estava a almoçar com uma pessoa de Barcelona, numa sexta-feira e perguntei “então ficas no fim-de-semana?” e ela diz “fico, vim com uma amiga minha e venho cá pelo menos um fim-de-semana por mês passar a noite de sábado para domingo.” Portanto o Porto, neste momento é muito atractivo e, isto facilita-nos muito esta parte dos expatriados.

Definimos também que iriamos ter muita variedade de produto, ou seja, já que somos especialistas em acessórios temos de ter variedade. O nosso volume de negócio assenta muito nisto: novidades em lojas todas as semanas. Porquê? Porque o preço do produto é muito acessível, é um preço razoavelmente barato e, se não houver muito movimento em loja, muitas transacções, obviamente que não é negócio. E, portanto, haver novidades, juntamente com isto, com o dinamismo na loja, ou seja, nós mudamos a apresentação da loja todas as semanas, além do produto novo e o cliente gosta de voltar à loja para ver o que há de novo. Portanto, este é um ponto-chave no nosso modelo. Se repararem o produto da montra todas as semanas é mudado.

E, depois, outro factor muito importante o visual merchandising é outro chavão de retalho quer dizer a forma de expor o produto para o cliente. E, portanto, nós começamos a tratar o produto de uma forma muito clara, para o cliente encontrar rápido o que precisa quando

Terceira Sessao - O investimento em Paises Europeus | Dr. Sérgio Marques ~ ,

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chega à loja e ser apelativo à compra.

Por exemplo, quando fazemos uma colecção de carteiras, temos um modelo grande, um modelo pequeno, um modelo médio, a traçar, a de ombro…porquê? Porque isso vai fazer com que se sinta um ambiente de moda, de colecção dentro da loja, coisa que, por exemplo, nós há 10 anos atrás fazíamos carteira a carteira e, portanto isso ao nível da exposição e da atractividade não era tão bem feito.

Outro factor importante é o serviço ao cliente que para nós é crucial. As pessoas precisam de ajuda quando estão em loja, as pessoas precisam de alguém que lhes dê apoio na compra e, nós na altura, introduzimos duas situações superimportantes. Uma foi a remuneração variável de todas as pessoas. Ou seja, aqui tratamos da parte loja, mas em toda a empresa temos remuneração variável, incluindo pessoas do centro logístico e, em paralelo, tratamos de ter um cliente mistério que vai de 3 em 3 meses às lojas avalia o serviço que vê na loja e as pessoas têm também uma remuneração variável em função dessa avaliação. Portanto, isto no final, fez com que o ciclo se fechasse e as pessoas estivessem motivadas para tratar bem os clientes.

E, enfim, também todos os upgrades que fizemos. Mudámos muito a decoração da loja, o produto enriqueceu muito e continuamos sem nunca mexer no preço. Ou seja, uma carteira equivalente hoje e há 10 anos custa exactamente o mesmo preço na Parfois e, enfim, isto inclui pelo meio subidas de IVA, foi tudo absorvido pela empresa na altura.

Definimos também valores para a empresa que para nós são importantes e são importantes desde logo no momento do recrutamento. Ou seja, quando estamos a tratar de alguém que vai ou não entrar para a empresa nós temos de avaliar se essas pessoas vão ou não estar alinhadas neste género de valores. E, os dois primeiros valores, que são os que eu saliento hoje, são os valores por norma mais fáceis de encontrar. Porquê? Porque eram valores muito vividos pela própria accionista da empresa. Não disse logo no início, mas aproveito para referir agora, a Parfois é detida a 100% pela Manuela Medeiros, uma empreendedora do Porto e, portanto, tem uma accionista única com todas as características que daí advêm. E, portanto foi muito à imagem dela a definição dos valores. O primeiro: ambição, no sentido de dizer “eu posso fazer tão bem como qualquer outro e também eu próprio posso fazer amanhã melhor do que o que faço hoje”. E, isto marca uma certa pauta. O seguinte valor tem que ver com a humildade. Humildade no sentido de reconhecer que posso aprender com quem está ao meu lado e quem está à minha frente, seja do nosso negócio ou de

TERCEIRA SESSAO ~

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outro negócio. Isto é muito importante porque as pessoas quando se fecham numa redoma e dizem “eu é que sei” as coisas não andam para a frente. E, portanto, este foi para nós também um ponto fundamental.

Para quem está menos familiarizado, isto são imagens da loja da Parfois, a área que nós mais trabalhamos é a área de 90m2, no passado trabalhávamos com áreas de 30 ou 40 m2 e, nós naquela altura, em 2007, definimos como grande objectivo em 2012 duplicar facturação. E, como tal, dissemos “temos de crescer muito em canais próprios, naqueles mercados que para nós são mais importantes.” Portanto aqui ditou um pouco a estratégia de expansão. Dissemos “no mercado europeu, por exemplo, Espanha, nós queremos ir direto, não queremos franchisar. Mas, todos aqueles países que são fora da Europa, que não são mercados maduros, vamos optar por trabalhar em franchising. E, na altura definimos que deveríamos trabalhar todos os mercados do Oriente, Europa Central e Europa de Leste. E, partimos à procura desses mercados, arranjar parceiros nesses mercados e abrir lojas. Na altura a estratégia foi esta. Foi dizer assim: esses países são menos maduros, nós se começarmos já, vamos ter “algum ganho” do que se começarmos daqui a 5 anos. Se formos agora para a Alemanha, por exemplo, a Alemanha já tem os centros comerciais todos construídos, as marcas já estão lá todas, provavelmente é preferível ir para a Alemanha quando estivermos melhor preparados e vamos ganhar massa crítica. E, portanto, no fundo, foi o que acabou por acontecer. Só para dar uma ideia, o objectivo de 2012, praticamente, foi atingido em 2010. A Parfois em 2005 faturava 25 milhões de euros e portanto fez praticamente os 50 milhões em 2010. Conseguimos antecipar quase 2 anos.

Hoje em dia nós estamos em 51 países. Os que estão a encarnado são os países que nós estamos a fazer directo. Só para dar a ideia, nós estamos em Portugal, Espanha, França, Polónia e começamos Itália e Alemanha este ano. Portanto abrimos a primeira loja em Itália e na Alemanha este ano e todos os outros países foram crescendo. De longe para nós o país maior é Espanha. Hoje estamos com 125 lojas em Espanha e com um ritmo de aberturas forte, este ano, no final do ano, deveremos ter aberto 40 lojas neste país. E, depois, não vou maça-los a contar os países todos, mas no fundo a Europa de Leste, Europa Central e Médio Oriente estamos praticamente em todos. Temos algumas incursões por África, nomeadamente Marrocos, Angola e Moçambique. E, na Ásia temos um apontamento nas Filipinas, é o único país onde estamos e, abrimos há 1 ano e meio América do Sul – começamos na Venezuela que, não vou maça-los com as peripécias mas é um País com algumas particularidades. Começamos na Colômbia, na República Dominicana, no Panamá

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e mais recentemente na Guatemala, no Peru e no Brasil.

Enfim, este tem sido o crescimento da empresa desde 2010, portanto, é um crescimento médio de 31%. Significa que as vendas de 2008 a 2013 multiplicaram por 3,5 vezes e o peso de Portugal em 2013 foi 33%, ou seja, as vendas de Portugal em loja, ainda assim, pesaram 33%. Este ano vão ficar muito perto de 25%. Portugal praticamente não tem espaço para crescer, nós em Portugal temos 114 lojas e, assim sendo, não há grande espaço para expansão. Portanto são 114 lojas num total de 525, estamos mais ou menos com ¼ das lojas em Portugal.

Gostaria ainda de dar uma ideia, que para nós era importante em termos estratégicos, não ter mais de metade do negócio em franchisados e, como tal, hoje em dia temos 55% do negócio próprio e os 45% estão a ser trabalhados com franchising. Isto são números de Dezembro, nós tínhamos 1720 pessoas no negócio direto, não contando com franchising e, no ano passado, tínhamos contratado cerca de 400 pessoas incluindo lojas, sendo que o grosso são lojas, este ano o ritmo de crescimento é, em termos de números de pessoas, muito idêntico.

Há pouco não referi, no gráfico de crescimento, nós este ano estimamos crescer 26%.

Dito isto, gostava de fazer algumas reflexões: 1º é que nós nos sentimos o David a lutar contra Golias. Nós estamos numa altura da vida em que a Parfois já não é uma empresa pequena mas também não é uma empresa grande. Quando nós estamos no mercado estamos a lutar contra os maiores do Mundo. Começa desde logo pela Inditex. Ou seja, o nosso tipo de produto é um produto que está a ser trabalhado cada vez melhor pelas marcas de roupa, portanto, a nossa concorrência, e até pela escolha que fizemos de estar no negócio da moda, a nossa concorrência são cada vez mais as marcas especializadas em acessório porque essas não estão a seguir o caminho, a maior parte delas, da moda. Ou seja, com acessórios mais permanentes e acessórios que não seguem as tendências. Agora nós, de facto, estamos a lutar contra empresas que têm meios que para nós são inalcançáveis. A Inditex se quiser contratar os 10 melhores designers para resolver um problema inesperado que tenham na bijuteria, contrata ao preço que for e não pensa duas vezes e nós não podemos fazer isso; se quiser abrir uma loja na melhor rua de uma cidade qualquer, nem pensa duas vezes, compra o edifício e abre a loja. Obviamente que nós não temos esses meios e, portanto, temos de nos munir das armas que podemos.

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O nosso modelo de negócio foi, desde o início, pensado para poder ser replicável e escalável, ou seja, eu tenho de conseguir abrir lojas como se fosse uma fábrica de lojas. Nós este ano vamos abrir mais de 100 lojas e, essas lojas, como imaginam, são mais de 100 são 2 por semana em média, sendo que há semanas em que se abrem 4 e 5 e semanas em que não se abre nenhuma…isto não é um relógio suíço, as coisas acontecem quando há oportunidade e, portanto, a empresa tem de estar preparada para abrir lojas como quase se de facto de uma fábrica de lojas se tratasse.

Em termos de cadeia de valor nós estamos nos pontos que para nós são de valor acrescentado desde o primeiro dia, nomeadamente o design, a distribuição, a cadeia logística e a marca, quando digo distribuição refiro-me às lojas propriamente ditas. Toda a parte de produção e de transporte foi sempre subcontratada a 100%.

Não queria deixar também a oportunidade para partilhar convosco algumas reflexões. Primeiro a Inditex, hoje em dia, é a maior marca de retalho de moda do mundo (vamos dizer assim aqui não me refiro à moda em particular, mas digamos a vender roupa). Partem ali de uma terrinha chamada Arteixo na Corunha. Portanto, aquilo que nós fomos ouvindo, que nós “somos o canto da Europa, estamos na periferia, aqui não há oportunidade”…Eles partiram de Arteixo. Arteixo, comparado com o Porto é uma aldeia mesmo! E, portanto, depois disto não há desculpas, qualquer pessoa em qualquer parte do mundo pode fazer qualquer coisa. E, de facto Portugal tanto pode ser periférico como pode ser central. O mundo como é redondo dá para fazer umas brincadeiras.

Muito obrigado.

Terceira Sessao - O investimento em Paises Europeus | Dr. Sérgio Marques ~ ,

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Moderador - Eng.º Vergilio Folhadela

Foi-nos apresentado algo que me permitiria sublinhar: havia conceitos claros e testados, havia uma estratégia e houve uma vontade.

E de facto, uma empresa que começou por ser pequena e que hoje começa a ganhar dimensão num canto quase esconso da Europa, fora das capitais e dos centros que ditam as tendências do mundo da moda, foi capaz de se afirmar pelo mundo inteiro, no negócio da moda, ou seja, não há impossíveis.

Os meus parabéns para quem realmente é capaz de fazer o que fizeram. Um bom exemplo que podemos adotar.

Julgo que um outro bom exemplo é o que nos vai ser apresentado agora.

Alguém que estava cá em Portugal confortavelmente instalado, há uns anos atrás, e que resolveu avançar para novos mercados. Teve uma ou outra aventura que correu mal. Mas, às vezes, é dos erros que se recolhem alguns ensinamentos. E pode ter sido isso que aconteceu. Refiro-me à Jerónimo Martins, aqui representada pela Dra. Marta Maia, sua diretora de recursos humanos para Europa e para América do Sul (Colômbia neste momento) e que, naturalmente, também nos vai dar uma visão muito ligada à dimensão humana deste negócio. Muito obrigado pela sua presença.

TERCEIRA SESSAO ~

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Foi com muito agrado que recebemos o convite para falar do investimento do Grupo Jerónimo Martins na América Latina.

O que gostaria de partilhar convosco para além daquilo que são os grandes indicadores económicos, é uma visão mais personalizada, do ponto de vista de cultura e de valores, a importância que as diferenças culturais têm na estratégia e no desenvolvimento do nosso negócio.

Tenho tido o privilégio de acompanhar o nascimento da nossa operação na Colômbia e, portanto, de alguma maneira, talvez possa partilhar convosco de viva voz a minha experiência neste país da América do Sul.

Gostaria de partilhar sobretudo três grandes ideias chave:

1.º A abordagem de Jerónimo Martins à expansão e ao crescimento internacional. Como é que nós olhamos em termos estratégicos para aquilo que são os denominadores comuns duma expansão e de um crescimento além-fronteiras.

2.º Os nossos ensinamentos e as nossas aprendizagens na experiência da Internacionalização. Nós temos três experiências de internacionalização, uma bem-sucedida na Polónia, uma mal-sucedida no Brasil e uma que ainda é um ponto de interrogação.

3.º O que levamos na nossa bagagem de Portugal e da Polónia quando nos apresentamos na Colômbia e o que é que podemos esperar deste país em termos de retorno.

Qual e entao a abordagem, qual e o denominador comum que Jeronimo Martins tem cada

vez que fala de expansao ou de internacionalizacao ?

Em primeiro lugar, somos filhos das circunstâncias onde vivemos. Existe um código genético fortíssimo de empreedorismo que vem da família Soares dos Santos. Há uma vontade de crescer e a ambição de fazer mais e melhor e isso faz toda a diferença quando uma empresa decide expandir-se internacionalmente.É um grupo que está numa família há mais de quatro gerações, e esta vontade de crescer está sempre presente.

TERCEIRA SESSAO ~

“O investimento na América do Sul”

Jerónimo MartinsDra. Marta Maia

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Em segundo lugar é uma Companhia que aprende com os erros, tem uma memória colectiva bastante forte e sabe transformar os erros em oportunidades e lições de aprendizagem para o futuro.

Tendo em consideração este pequeno enquadramento os denominadores comuns do processo de internacionalização da Jerónimo Martins são os seguintes:

• Uma abordagem de formato único, uma operação de mass market.

Não acreditamos que para o nosso tipo de actividade o nicho possa funcionar e, neste sentido, não temos tanto uma estratégia de pulverização como a mas temos claramente mais de crescimento e consolidação e, por isso, neste momento só estamos, em três geografias apenas, com 80 mil colaboradores e, a distância que temos desde o primeiro momento em que entramos num primeiro país em 95 até que voltamos a entrar num terceiro país é de quase vinte anos. Portanto, de facto, existe um exercício de dive in cada vez que entramos num país para montar um negócio.

• Foco no Core Business.

Não vamos diversificar, o nosso portfólio. Somos bons na distribuição alimentar. É na distribuição alimentar que temos as nossas competências e que acreditamos, para já, que temos as nossas forças para fazer crescer o negócio.

• O perfil de risco consistente.

Olhamos para economias relativamente emergentes com bons indicadores económicos não tanto para economias de mercado mais maduras.

Quais as aprendizagens do Processo de Internacionalizacao ?

A primeira aprendizagem: ter uma dívida controlada cada vez que nos internacionalizamos temos de garantir que nos alavancamos em dívida mas só até um determinado limite. Esta foi uma aprendizagem que saiu cara ao grupo Jerónimo Martins entre 2000 e 2002 quando passamos por um profundo processo de reestruturação; uma segunda aprendizagem: não menosprezar as questões culturais, históricas e as questões sociais do povo onde estamos a investir.

O Grupo entrou em 95 na Polónia e em 97 no Brasil, acabamos por estar simultaneamente

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em dois países e a verdade é que não tínhamos nem massa crítica, nem dimensão, nem recursos humanos para estarmos simultaneamente em duas frentes de batalha.

Seria mais fácil, à partida, acreditar que no Brasil iria correr melhor do que correu na Polónia e foi exactamente o contrário. De algum modo as diferenças culturais foram mais negligenciadas no Brasil do que na Polónia.

O Brasil era um país irmão, falávamos a mesma língua… ou pelo menos assim pensávamos. De facto não falamos a mesma língua que os brasileiros. Pensávamos que trabalharíamos do mesmo modo, de facto, não trabalhamos do mesmo modo que os brasileiros. Pensámos até que, uma vez que estávamos a comprar uma empresa que era uma cadeia de supermercados, teríamos o know-how que vinha do Pingo Doce, que era o nosso core business e portanto seria mais fácil continuar a desenvolver o modelo de negócio e isso não veio a acontecer.

No entanto, na Polónia, um país muito mais difícil que não conhecíamos, uma língua que era um obstáculo natural a qualquer coisa que quiséssemos fazer, um país frio, um país do ponto de vista do hábito do consumidor completamente diferente em termos de gastronomia e um modelo de negócio que nós não conhecíamos provou ser uma boa conquista.

Hoje olhamos para trás e vemos uma enorme história de sucesso na Polónia e uma história menos bem-sucedida no Brasil. Aprendemos que cada país é um caso único.

O que fomos encontrar na Colombia e o que podemos esperar deste Pais ?

Entrámos na Colômbia de uma forma completamente inovadora, como um entrepreneur pessoal que traz uma mochila às costas com algum dinheiro para investir mas que não tem contactos e que não tem sequer um escritório físico. A equipa da Colômbia começou em Novembro de 2011 numa pequena sala de 20m2 com uma mesa de reuniões para 6 pessoas. Não estávamos habituados a isto mas tivemos flexibilidade, coragem e resiliência para perceber que tinha de ser assim. O que é que nós vendemos aos colombianos? O que vendemos foi um sonho, uma visão e uma ambição. Depois montámos uma estratégia muito própria, teve que ver, no fundo, com aquilo que acreditávamos que poderia ser a nossa estratégia.

A nossa abordagem de recrutamento também foi diferenciadora. O primeiro empregado a

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recrutar na Colômbia foi o Director de Recursos Humanos. Não usamos executive search internacional, decidimos usar executive search local precisamente porque acreditávamos que a capacidade de network na primeira fase seria maior. Antes de convidarmos os colombianos a fazerem parte da nossa organização convidamo-los a virem à festa de natal em Portugal, ainda sem terem assinado um contrato porque tinham de perceber quem eramos nós portugueses, quem era esta gente que queria fazer a diferença e ficar na Colômbia durante muitos anos e tivemos o grato prazer de perceber depois as diferenças entre Portugal, a Colômbia e a Polónia.

O que e que nos encontramos na Colombia ?

Na ausência do CEO do Grupo passarei a ler a Carta de Pedro Soares dos Santos aos Colaboradores Colômbianos.

“Gostei da Colômbia desde o primeiro minuto em que numa viagem de estudo do país, para avaliarmos a possibilidade de iniciarmos aqui a nossa actividade, pisei o seu solo. Gostei da temperatura amena, dos sorrisos, da alegria, da atitude aberta do seu povo. Gostei de ver muitas crianças, do sentido de família dos colombianos, do orgulho que têm na sua pátria e em tudo o que nela nasce. Gostei de ver a imensidão das terras agrícolas, da força da indústria da capacidade produtiva, o compromisso crescente com a educação e a qualificação das pessoas. Sei bem que a Colômbia não é um país perfeito. Não há países perfeitos como não há empresas perfeitas, pessoas perfeitas ou vidas perfeitas. A perfeição é uma ilusão perigosa porque nos impede de ver e de sentir o que é mais importante: a vontade, determinação de um povo em superar-se e afirmar o seu país na cena mundial. Sei que a Colômbia é um país de contrastes e contradições, que o sorriso do seu povo guarda também as mágoas e a dor de uma história recente conturbada e de um presente que está ainda muito aquém do sonho, que as imensas riquezas naturais não impedem que uma grande parte da população tenha vidas muito muito difíceis e esforçadas.

Sei que apesar das maravilhas que este país encerra, o mundo habituou-se a olhar para a Colômbia através das terríveis manchetes noticiosas, reduzindo um país aos seus problemas, tomando uma parte da população por todo um povo.

Gosto de olhar para a Colômbia pelo lado da oportunidade e do enorme e promissor potencial que nela vejo, da enorme vontade de vencer que nela sinto. É das mais

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antigas Repúblicas do mundo, a democracia faz parte da sua essência. Tem uma população jovem e em crescimento, um governo empenhado em reformas estruturais e em conquistar para a Colômbia o seu lugar por direito próprio no mundo. Temos de fazer parte da nova era que se abre para este país secular, queremos contribuir para o seu crescimento investindo, criando emprego, apoiando a agro-indústria colombiana, apoiando as comunidades envolventes das zonas onde vamos operar. Queremos, acima de tudo, ajudar a mudar para melhor a vida do maior número possível de colombianos. É este o desafio que quem se junta a nós aceita, é este o entusiamos que esperamos de quem chega, é com esta missão que pretendemos que se identifique”.

Para além desta visão muito pessoal do CEO, a Colômbia é uma verdadeira democracia, é um estado de direito há mais de 100 anos. Tem uma população de cerca de 40 milhões de habitantes o que para nós é uma mais-valia porque precisamos de ter dimensão e massa crítica e é um país jovem, um país em crescimento. Tem um sistema jurídico e um sistema fiscal relativamente estáveis e tem também, um governo que quer fazer algumas reformas estruturais. É um país que sempre cumpriu com as suas obrigações fiscais, nunca entrou em default. É um país que é a terceira economia da América Latina com indicadores económicos que acreditamos podem fazer deste país um país promissor.

Quando chegámos à América Latina encontrámos uma classe média pujante, muito rica em ideias mas uma classe média milionária em expectativas. Entender isto e perceber esta cultura é fundamental para percebermos o que temos para fazer naquele país e, perceber que a abordagem que usamos na Polónia não é, de todo, a abordagem que vamos usar na Colômbia. Nós encontramos ao nível do consumidor e ao nível do colaborador enormes diferenças.

O consumidor colombiano é um consumidor muito emocional, por mais pobre que seja compra com as emoções. O conceito de pobreza na Colômbia não é igual ao da Polónia nem igual ao de nenhum país europeu. Na Colômbia, se eu perspectivar que posso ter dinheiro até ao fim da próxima semana eu sou uma pessoa feliz. Na Polónia isto é o oposto, o polaco é uma pessoa que, por todas as razões históricas é muito mais disciplinada do ponto de vista do preço, é muito mais racional quando tem de escolher o sortido e de aforrar algumas economias. O colombiano funciona ao contrário. Precisa de alguém que lhe dê mais do que aquilo que ele compra. Paga pouco por um produto mas exige muito e um elevado nível de serviço.

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Há uma série de diferenças entre os colombianos e os polacos que vão ter impacto no desenvolvimento do nosso negócio. Para além disso, mesmo ao nível dos colaboradores, chegamos à Polónia e encontramos um exército, de gente disciplinada, gente muito hierárquica, de alguma maneira até fria na abordagem, gente que distingue muito bem o que é a fronteira da vida familiar e a fronteira da vida pessoal. Na Colômbia é o oposto. São completamente transparentes, completamente afectivos. Um expatriado que chega à Colômbia, passado 3 dias já está a jantar em casa do colega e a conhecer toda a família. A Polónia, é talvez o país da Europa onde existem menos expatriados e onde existem menos estrangeiros.

Portanto, quando entramos em cada um destes países não trazemos modelos pré formatados nem fazemos copy paste, procuramos ler a realidade envolvente do nosso Consumidor e ajustamos a nossa Estratégia de Negócio ao local onde estamos a investir.

Na Colômbia e na América do Sul existe uma economia informal brutal que pode ser vista como oportunidade porque, de facto, quando olhamos para o nosso sector de actividade, para o retalho organizado, 80% do retalho na Colômbia ainda é tradicional, são as chamadas tiendas de barrio e, nós acreditamos que existe um trabalho grande que pode ser feito ao nível de introdução de algumas regras no retalho mas, não deixa de se perceber que a economia informal tem imensos perigos no dia-a-dia daquele país.

Anúnciámos 400 M€ para os primeiros 5 anos de investimento. Queremos ser um business partner considerado neste país. Queremos crescer com o país. Queremos criar emprego. Vamos tentar ajudar a dinamizar a indústria e a agricultura local e, queremos crescer com os fornecedores e apoiar as comunidades envolventes.

Por fim, deixo-vos apenas algumas conclusões, algumas notas que fomos retirando dos nossos processos de internacionalização.Em primeiro lugar olhar para as oportunidades para lá das dificuldades. Em segundo lugar perceber que temos de ter uma capacidade grande de saber ler os mercados e as realidades que nos rodeiam, ou seja, para lá dos indicadores macroeconómicos entender a cultura e os valores do povo bem como a sua história e as suas convicções. Criar equipas multiculturais, com conhecimento e disponibilidade para aprender e para desenvolver os outros. No nosso mercado em concreto não há espaço para globalização ou cópias, somos locais e agimos como tal e, as nossas marcas, são consideradas nacionais. Na Polónia somos polacos, na Colômbia somos colombianos.

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Desde já agradeço a todos, uma vez mais, o convite e agradeço a oportunidade que me deram de estar hoje aqui presente.

Moderador - Eng.º Vergilio Folhadela

Já vimos investimentos de empresas em países europeus e bem fora dessa área, também. Neste caso, na América do Sul. Enfim, aprendemos algo de geografias um pouco diferentes e, de alguma forma, um tanto ou quanto inusitadas.

Vamos agora ouvir falar de um investimento num destino que nos é muito familiar, com quem convivemos durante muito tempo, durante muitos séculos. Depois saímos de uma maneira estranha e, agora, estamos a regressar de uma forma nova e completamente diferente.

Vai falar-nos a Drª Luísa Duarte, que está aqui a substituir o seu marido Alberto Couto Alves, que teve um acidente e portanto não está em condições, pelo que lhe pediu para, sendo também membro do Conselho de Administração do grupo, fazer a apresentação sobre a fórmula que estão a utilizar para terem sucesso em Angola.

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Muito boa tarde a todos. Lamentavelmente não era eu que deveria estar aqui hoje, mas as circunstâncias não permitiram que fosse o nosso Presidente a transmitir o seu testemunho quanto à experiência do Grupo em Angola. Agradeço a Vossa compreensão e penso que poderei de alguma forma ajudar, uma vez que conheço o processo de Angola praticamente desde o seu arranque e tive o privilégio de o vivenciar. Poderei, de alguma forma, transmitir aqui aquilo que é o cunho mais pessoal deste processo.

Portanto, esta apresentação visa partilhar experiências sobre Angola. Foi o nosso primeiro processo de internacionalização e o que tem a maior expressão em termos de atividade do grupo. Haverá certamente aqui pessoas conhecedoras do mercado Angolano, que penso que podem ajudar também a que esta partilha seja mais rica e, para quem queira ir e esteja aqui à espera de colher alguma fonte de motivação, espero que possa ser útil.

A orientação desta intervenção seguirá uma lógica simples do que foi o início do processo de internacionalização em Angola, o que estamos a fazer atualmente e onde queremos ir.

A primeira questão que se coloca é: porquê Angola? E como é que nós iniciamos este processo?

Houve viagens a vários países, nomeadamente continente africano, continente americano (concretamente América do Sul) e, houve numas primeiras viagens a Angola uma percepção muito clara relativamente ao que eram os recursos do país, riquíssimos, e à estabilidade política. Estamos a falar do início da década de 2000, sensivelmente 2002, fase em que se evidenciava, acima de tudo, uma carência de infra-estruturas brutal, naturalmente expetável após o período longo de guerra que o país sofreu. Havia ainda que ressaltar que a motivação do governo para apoiar o investimento privado através de incentivos, nomeadamente à redução de carga fiscal ou mesmo isenção permitia, de alguma forma, cativar as empresas e a dinamização do tecido empresarial. De facto foi nessa senda, ao abrigo da Lei do Investimento Privado, que foi criada a AngolACA, uma empresa vocacionada para o sector da construção, que foi o setor de início da atividade do grupo e é o setor core do mesmo. Constituímos a AngolACA através da ANIP e foi com isto que começámos.

Não querendo maçá-los muito com o passado, será todavia importante termos uma ideia do rumo que levou a este processo. Como é que nós começámos? Começámos por identificar

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“O investimento em África”

ACA, SA Dra. Luísa Duarte

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Luanda como a província mais interessante sob o ponto de vista de acessibilidades, centros de decisão, etc., para nos instalarmos inicialmente e, designadamente, para começarem a instalar aquilo que seria necessário a montante da construção, que era o setor que nos levava lá em primeira instância. Instalou-se o primeiro centro industrial para fabrico de inertes, pré-fabricados, essencialmente ligados ao sector da construção. Entendeu-se também que, dada a carência do país, para ter sucesso, o processo teria de ser verticalizado. E foi assim que começou, desde a exploração dos inertes até à sua transformação e posterior incorporação na construção.

Em termos de estratégia começou-se em Luanda mas, sendo o país grande como é, tem províncias com carências enormes. Cedo percebemos que, de facto, as grandes oportunidades em termos de construção de infra-estruturas, nomeadamente viárias, estavam nas províncias.

Dada a situação de carência do país e a falta de oferta percebemos que tínhamos de ser autónomos e, portanto, a estratégia foi criar centros de valências, aliás multivalências, de suporte à operação em diferentes províncias, faseadamente. O nosso Presidente envolveu-se e esteve sempre pessoalmente presente, em diversos momentos e em todas as viagens que eram feitas nas picadas, em jipes porque não havia estradas, quando era uma aventura realizar determinadas viagens, face à inexistência de infra-estruturas mínimas. Era para o mesmo fundamental envolver-se no reconhecimento do que eram as necessidades locais, na ligação com as comunidades locais, naturalmente acompanhado de uma equipa que participou também. Ou seja, isto determinou um contacto com o terreno que pensamos ter sido determinante para nos podermos adaptar à realidade local, desde logo porque o modelo de negócio da construção desenvolvido aqui em Portugal não seria simplesmente exportável para lá.

Avançámos então com indústrias de materiais de construção, montámos o que eram à época os centros industriais que, hoje em dia, são já polos industriais inseridos em centros de multivalências, e avançámos para a área de negócios da construção. Ao nível de províncias havia obras lançadas pelos governos locais e pelo governo central, o que se revelou, assim, uma aposta muito interessante.

Hoje em dia o país está, no que é a sua rede viária principal, apetrechado. Nesta sequência, fomos implementando e consolidando a nossa posição e a relação com a província e percebemos que, desde logo, um dos setores que merecia uma aposta era o sector das

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águas. Havia muita carência e a água é um bem essencial. Começamos por mini sistemas de captação de água, que estão retratados nas imagens, que vinham colmatar uma das necessidades básicas da população. É preciso ressaltar que, cada vez que um sistema era inaugurado e estava em funcionamento, a população fazia uma festa porque era uma grande emoção ver a água a sair da torneira, quando antes andavam quilómetros para conseguir ir buscá-la. Passavam a ter água potável. Esta foi e é, até ao presente, uma área rentável. Tal como todas as áreas de atividade para as quais avançámos, esta existe no presente mas, acima de tudo, é uma área bonita e muito estimulante em termos de desenvolvimento da qualidade de vida da população.

Outra área fundamental, que com o contacto com as comunidades locais rapidamente se percebeu, foi a área dos resíduos. Inicialmente e até ao presente, realizamos a atividade de recolha e o encaminhamento para aterro (futuramente terá outros contornos, mas eu falarei disso um pouco mais à frente).

Continuámos nesta senda de construção de polos de multivalências nas diversas províncias sendo que, neste momento, estamos em 8; fomos avançando. Iniciámos a construção de infra-estruturas desportivas, que não era apenas uma área interessante para o nosso negócio, desde logo porque o próprio governo tinha fundos destinados à criação de espaços de lazer para as populações, como inclusivamente construímos o nosso AngolACA Campus, onde são realizados jogos regularmente. Não só os nossos colaboradores (que são cerca de 3000 à data de hoje, em todas as áreas de negócio que temos) podem fazer e fazem jogos regularmente, como há comunidades que nos pedem e às quais cedemos o espaço, para poderem usufruir desta facilidade. Como área de negócio, é também bastante interessante.

Por outro lado, quem conhece Angola sabe que os jardins estão devastados, há falta de construção e manutenção de espaços verdes. Esta evidência e oportunidade de intervenção surge associada à construção, na sua vertente de requalificação urbana; é extremamente importante construir e manter espaços verdes.

Em linha com esta decisão de arranque para esta atividade, construímos nos nossos polos multivalências os nossos showrooms (conforme exemplo projetado nas imagens que podem ver) e é isto que nós fazemos quando requalificamos uma área urbana. Desde reconstruir a rua, instalar infra-estruturas, arranjar os passeios, os jardins e por aí adiante. É uma área que está em expansão e terá, certamente, muito para crescer ainda em Angola. Tudo isto que

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referi até agora pressupõe a capacidade de resposta dos centros multivalências, com muita gente para dar suporte a uma operação que está em franco crescimento. Isto começou a ser um pouco pesado em termos de logística porque, designadamente, nós temos uma política de alimentação de todos os nossos colaboradores, portanto, para dar suporte às nossas cantinas começamos, e sobretudo em províncias mais carenciadas, a sentir a necessidade de fazer chegar bens alimentares em quantidade e qualidade suficiente. Surgiu a ideia de criar e abrir lojas de proximidade essencialmente vocacionadas para a distribuição alimentar, mas também higiene e conforto do lar e, ao mesmo tempo, não só servem as nossas necessidades em termos de serviços sociais como são obviamente uma fonte de negócio, porque não existe grande oferta e abrir este tipo de unidades nas províncias não é fácil, tendo em conta os constrangimentos logísticos.

Um pouco em cadeia e muito também por um gosto pessoal do nosso Presidente, sentimos a necessidade de garantir o fornecimento designadamente de produtos frescos ou hortícolas, quer às nossas lojas quer para a alimentação de todo o nosso pessoal. Dado que felizmente espaço não falta em Angola e concretamente nos nossos centros multivalências, iniciámos a exploração das mini-quintas de onde nos saem os produtos frescos que, de outra forma, se calhar não conseguiríamos obter a preços competitivos e de acordo com as nossas necessidades.

Portanto, fomos desenvolvendo gradualmente estas áreas de negócio e, agora, a questão poderia colocar-se “vamos continuar?”, “vamos diversificar?”. Mantemos uma preocupação grande com a questão da organização pois, quem conhece Angola e outros países emergentes, sabe que por vezes é necessário avançar para o terreno e agarrar as oportunidades sem que o processo de planeamento de tudo o que é o suporte funcione na altura desejada. Portanto, encontramo-nos num processo de reorganização com vista a dar resposta às solicitações e equacionamos consolidar tudo o que temos até à data, diversificando sectorialmente mas também geograficamente, até porque as províncias são bastantes e com muitas oportunidades, como já referi.

De facto, Angola tem muito para dar, consolidaremos o que temos e não descuraremos novas oportunidades a um curto prazo. Portanto, não querendo tomar aqui muito tempo, sei que estamos algo pressionados, posso dizer-lhes que avançaremos para o sector industrial, designadamente com a construção de uma fábrica de metalomecânica. Isto tudo acaba por, naturalmente, ter uma lógica. Nós temos necessidades de apoio no caso, por exemplo, do sector das águas, à construção de etar’s e etas, temos necessidades para

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a própria construção e designadamente construção civil, inclusivamente em projectos de habitação social, no projecto “uma casa para todos”. Assim como o sector da água que tem um projecto muito interessante que é “água para todos”. Entendemos que precisamos também de apoio para construir materiais para aplicarmos nesses sectores, porquanto a metalomecânica avançará a muito curto prazo, tendo projeto já perfeitamente estudado, viável.

Ainda na área dos resíduos gostaríamos de expandir para criar valor para além da recolha, designadamente pela construção de uma unidade de triagem e reciclagem de resíduos. Há mercado, com certeza com grande potencial de crescimento e estaremos ainda atentos a novas oportunidades, naturalmente e concretamente, no que toca à nossa experiência na agricultura que é um sector muito caro ao nosso Presidente. Inclusivamente está a decorrer um estudo para um projeto de grande dimensão no sector agro-pecuário.

Gostaria, em termos de ideias-chave desta apresentação deixar algumas notas: a nossa operação começou com a construção, era o nosso core, era o que nós sabíamos fazer. Naturalmente que é necessário chamar pessoas com as competências chave em diferentes áreas de negócio, porque não temos habilidade de abraçá-las todas sem o devido know-

how; é isso que estamos a fazer e temos felizmente um Grupo com pessoal muito competente. Estaremos, com certeza, abertos a candidaturas de pessoas competentes e com vontade de participar nesta aventura que é, de facto, bastante emocionante e, acima de tudo, que nos permite ver resultados.

Implementamos então em várias províncias iniciativas para verticalizar negócio ou, pelo menos, garantir uma série de valências, que nos permitam não estar dependentes de terceiros e, concretamente, daquilo que não haja ou não haja nos padrões de qualidade que nós exigimos. Isto determina o reforço destas nossas unidades de suporte. Encaramos o alargamento sectorial e geográfico numa lógica de cadeia, mas também de economia de proximidade e, portanto, de aproveitamento da nossa relação já de confiança com os locais, porque são bastantes anos de obra feita com as autoridades e comunidades locais, o que vai despoletando negócios novos. Às vezes costumo brincar, dizendo que não convém falar muito senão, uma semana ou outra é mais um negócio que aparece.

Para fechar ficaria a ideia que, fundamentalmente, estou convicta que seria a mensagem que o nosso Presidente gostaria de passar. O país tem um enorme potencial, e projetos credíveis, sustentados, são percecionados e valorizados lá. É importante o envolvimento

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pessoal de uma equipa de liderança. Concretamente no nosso caso temos a felicidade de acompanhar o nosso Presidente neste processo. O envolvimento pessoal e a construção de relações de confiança com as autoridades locais é fundamental e um projeto bem estruturado e credível será, certamente, um projeto de sucesso.

Gostaria apenas de ressaltar o valor que as autoridades dão a uma postura que assenta no investimento a longo prazo. Podia contar uma história que tive a felicidade de presenciar que foi uma deslocação de uma autoridade de Estado, um Governador Provincial ao nosso centro de valências de Benguela, o qual chegou, saiu do carro, olhou e disse “sim senhor, aqui está o exemplo de uma empresa que veio para ficar”. Valoriza-se, efetivamente, uma empresa que vá contribuir para o desenvolvimento do país e não apenas para extrair lucros de um negócio, que poderá ter um período mais curto ou não de maturidade.

É uma equipa competente, é uma equipa muito motivada que faz tudo isto possível e, também, a humildade, e isto é um traço do nosso Presidente e CEO, a humildade de perceber que vamos naturalmente ensinar (levamos competências que não existem e entretanto serão passadas através de processos de formação), mas também temos muito para aprender. De facto, este processo trouxe-nos muita maturidade em termos de reestruturação organizacional.

Muito obrigada pela vossa atenção.

Moderador - Eng.º Vergilio Folhadela

Muito obrigado.

Agora vamos ter um setor tradicional, um exportador clássico - a Sogrape – que começou a olhar para o vinho de uma forma também um pouco diferente: não produzir só cá, mas procurar outras geografias.

Acho que é dessa experiência que o Bernardo Brito e Faro nos vai dar conta, com a sua vivência já de muitos anos dentro da Comissão Executiva da Sogrape.

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Antes de mais, muito obrigado às Fundações AEP e Serralves, na pessoa do Sr. Prof. Valente de Oliveira e do Sr. Eng. Vergílio Folhadela.

Quando o Sr. Prof. Valente de Oliveira desafiou a Sogrape para fazer parte deste painel, era suposto estar aqui o Dr. Salvador Guedes, CEO do Grupo ou um dos seus irmãos mas, não tendo sido possível, encarregaram-me a mim para fazer esta apresentação.

Conto cumprir com o tempo que me foi atribuído de 20 minutos, no qual espero conseguir apresentar de um modo sucinto a carreira de internacionalização da Sogrape.

A Sogrape é uma empresa familiar do norte de Portugal ligada ao sector vitivinícola com uma forte presença, cada vez maior, a nível internacional e com uma estrutura verticalizada desde as vinhas à produção, incluindo o engarrafamento, às marcas e à distribuição e com uma aposta cada vez maior na inovação.

A Sogrape começou em 1942 com o lançamento do Mateus Rosé, principal símbolo, ainda hoje em dia, da Sogrape no mundo e em Portugal e, cada vez mais, se vai afirmando através não só do Mateus Rosé mas de outras marcas sobejamente conhecidas.

Com uma estratégia de desenvolvimento e internacionalização que passou primeiro pela diversificação dentro das principais regiões vitivinícolas nacionais, posteriormente pelo alargamento ao sector do Vinho do Porto, a que se seguiu a internacionalização da produção e, mais tarde, a distribuição internacional através da constituição de estruturas próprias nos destinos considerados estratégicos para o desenvolvimento das marcas da Sogrape.

Com o Mateus nasceu uma visão, a de dar a conhecer ao mundo os vinhos portugueses, através de um vinho rosé, associado a novas sensações e emoções e a uma imagem inovadora face ao que naquele tempo existia. Com um conceito totalmente disruptivo, um produto Rosé, meio seco, packaging diferenciador, que procurou semelhanças nos cantis de água utilizados pelos militares que lutavam na segunda Grande Guerra. Com um marketing totalmente intuitivo, teve um rápido crescimento internacional estando actualmente em cerca de 125 países, sendo que o Mateus Rosé foi o grande motor do desenvolvimento do grupo Sogrape.

Através do crescimento da marca Sogrape e do engrandecimento do grupo, iniciou-se a

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“O investimento em outros países”

Sogrape Vinhos, SADr. Bernardo Brito e Faro

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diversificação para outras regiões vitivinícolas nacionais, com a aquisição de vinhas na região dos vinhos verdes, na Bairrada, no Douro, no Dão e, mais recentemente, no Alentejo.

Posteriormente, a Sogrape avançou para a aquisição de empresas no sector do vinho do Porto, inicialmente com a compra da Casa Ferreira (detentora da marca Porto Ferreira), mais tarde com a aquisição da Forrester, que detinha a marca Offley e, em 2002, com a aquisição da Sandeman.

Desde sempre e continuadamente foi dada muita importância o desenvolvimento e lançamento de novos produtos, de forma a que a Sogrape pudesse estar permanentemente actualizada e ir ao encontro daquilo que os consumidores procuram e, principalmente, explorar mais e novas ocasiões de consumo.

Como dizia há pouco, o vinho gera emoções e sensações e, acima de tudo, é um produto muito ligado à tradição, à terra, aos valores de um país, enfim a uma série de conceitos que são caros a muitos consumidores.

Em 1997 a Sogrape avançou para a compra de uma empresa argentina, designada Finca Flichman, também ela inteiramente verticalizada, iniciando-se então o processo de internacionalização do Grupo. Mais tarde foi adquirida a Sandeman que incluía activos produtivos em Jerez de la Frontera, na Andaluzia Espanhola.

Seguiu-se então, em 2008 a aquisição da Chateau Los Boldos, no Chile e, em simultâneo, a aquisição da Framingham, na Nova Zelândia. Ou seja, de um país originário, Portugal, a Sogrape passou a deter produção de vinho directamente em cinco países. Mais recentemente foi adquirida, também em Espanha, a Bodegas LAN, uma empresa do norte de Espanha, mais propriamente de Rioja, através da qual a Sogrape passou a deter a produção nos vinhos de mesa, nomeadamente com vinhas em Rioja, e, aqui mais ao norte, na zona de Tuy, Rías Bajas.

Entretanto foi dado início ao processo de distribuição própria internacional, tendo em 2000 sido adquirida uma distribuidora para o mercado dos Estados Unidos da América, passando a partir daí a ter uma presença directa no mercado Norte-Americano, sendo hoje um dos principais destinos dos vinhos da Sogrape.

Seguiu-se Angola com a constituição, em 2006, de uma participada, passando desde então a distribuir naquele mercado os vinhos das diversas origens da Sogrape.

Terceira Sessao - O investimento em outros paises | Dr. Bernardo Brito e Faro ~ ,

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Em 2008 foi constituída uma nova participada para a região da Ásia/Pacífico, com sede em Hong Kong, hoje em dia também já com escritório em Xangai.

Entretanto em 2011 foi adquirida uma nova participada no Reino Unido e que até então distribuía os vinhos da Sogrape naquele mercado.

No Brasil, foi constituída em 2012 uma nova participada que ainda está a começar a desenvolver o negócio directamente naquele mercado, onde a proximidade cultural com Portugal permite antever um grande futuro para a distribuição dos vinhos da Sogrape.

Hoje a Sogrape tem uma presença internacional neste conjunto de países, através da produção, das origens Portugal, Argentina, Espanha, Chile e a Nova Zelândia, países onde também assegura a distribuição local dos vinhos do Grupo. Acresce a estes todos os outros em que a Sogrape já tem distribuidoras próprias, sendo no resto do mundo a distribuição assegurada através de distribuidores terceiros.

Este processo de crescimento pela internacionalização levou a que a evolução do negócio da Sogrape revele um crescimento sustentável ao longo dos anos, verificando-se que de 1998 a 2013 as vendas praticamente duplicaram de valor. Ao nível dos resultados líquidos e do EBITDA a evolução também tem sido crescente, sustentada e saudável.

Em termos consolidados a origem Portugal ainda representa 67% das vendas da Sogrape, onde o vinho do Porto representa 31%, outros vinhos de Portugal 46%, onde se inclui o Mateus Rosé com 14%, da origem Argentina 10%, de Espanha 12%, incluindo o vinho de Jerez com 3%, e as origens da Nova Zelândia e do Chile, para já, representam no total cerca de 3%.

O principal mercado de destino ainda continua a ser o mercado nacional, embora com um peso cada vez menor, dada a crescente internacionalização das origens detidas pela Sogrape. Há outros destinos que continuam a crescer cada vez mais e a aumentar a respectiva influência, estando os Estados Unidos na segunda posição e Espanha na terceira.

Dos resultados da internacionalização encetada pela Sogrape, constata-se a produção vitivinícola em 5 países, através de cerca de 1400 hectares de vinhas, uma capacidade de vinificação de cerca de 52 milhões de litros, uma capacidade de armazenagem de 167 milhões de litros e de 83,5 mil garrafas por hora de engarrafamento, com uma capacidade

TERCEIRA SESSAO ~

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de armazenagem de vinho engarrafado de cerca de 685 mil caixas de 9 litros, com um total próximo dos 1000 colaboradores.

As principais conclusões que se podem retirar deste crescimento sustentado, que a Sogrape pretende continuar e reforçar, são: A Sogrape já está directamente presente nos 5 continentes, com vendas de cerca de 77,5 milhões de garrafas/ano, o equivalente a 2,5 garrafas por segundo; Dois terços das vendas ainda são de vinhos portugueses; cerca de 31% das vendas são vinho do Porto; 14% de Mateus Rosé; 80% das vendas consolidadas são realizadas fora de Portugal, sendo que, 64% na Europa. Os cinco principais mercados são: Portugal, Estados Unidos, Espanha, Reino Unido e Bélgica. Mais de 50% das vendas já são feitas através das estruturas da distribuição própria.

Ainda como resultados deste processo, constata-se o aumento do reconhecimento nacional e internacional da Sogrape, através da constante e crescente premiação nacional e internacional dos seus vinhos.

Hoje em dia a Sogrape tem um histórico de muitas e variadas experiências e com elas tem aprendido para continuar a fazer mais e melhor.

A internacionalização da Sogrape trouxe um incremento da complexidade da gestão do negócio, o que tem levado a uma permanente actualização dos processos de acompanhamento e monitorização das distintas unidades de negócio.

A Sogrape continua atenta a novas oportunidades de crescimento e desenvolvimento que surjam e que se mostrem interessantes. No entanto também deverá ter atenção ao aumento da exposição a novos riscos, principalmente políticos, económicos, sociais e financeiros. São riscos a que, no passado, a Sogrape não tinha tanta exposição.

Finalmente, gostava de endereçar uma vez mais o meu agradecimento ao Sr. Prof. Valente de Oliveira pelo facto de, através do convite feito à Sogrape, permitir publicitar não só a internacionalização do Grupo mas também as marcas por si detidas. Bebam muito!

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Moderador - Eng.º Vergilio Folhadela

Apesar de já estarmos um pouco para além da hora que seria razoável, não posso deixar de tentar enfatizar alguns denominadores comuns, porque acho que temos muito a aprender com as empresas que aqui estiveram.

De tamanhos diferentes, com negócios diferentes e, no entanto, com muitas atitudes comuns.

A primeira é: têm conceitos claros, sabem muito bem o que estão a fazer e o que querem fazer. Têm uma estratégia… e dentro desses conceitos eu enfatizaria a especialização. Todos gostam de fazer o que sabem fazer, não se metem em grandes aventuras para além disso. Sabem fazer, fazem-no bem e com segurança, desenvolvem o conceito e avançam.

Têm uma outra característica muito importante, que é muito portuguesa, que é “be local”, saber ser local, adaptarem-se bem às circunstâncias locais. Essa foi sempre a nossa grande força e continua a ser e, todos estes casos são bons exemplos dessa capacidade que nós, portugueses, temos.

Há uma outra atitude, que é a de qualquer empreendedor, homem ou mulher de negócios, que é “aproveitar a onda”, identificar ciclos, saber quando as coisas vão crescer e é a hora de “surfar” naquela onda.

Finalmente - e acho que não tem menos valor - tendo também muito que ver com a nossa forma de estar, com essa ideia do “be local”, adaptabilidade, capacidade de nos miscigenarmos e adaptarmos aos desafios que temos pela frente, que é a dimensão “pessoas”. É, no fundo, ser capaz de saber pôr calor humano nos negócios. Acho que foi uma atitude que também ficou aqui patente e que me parece que é um bom exemplo a seguir, pois nos permite fazer a diferença e tirar ainda mais partido daquilo em que somos capazes.

Muito obrigado a todos.

TERCEIRA SESSAO ~

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COMUNICACOES´

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QUARTA SESSÃO A ORGANIZAÇÃO DO COMÉRCIO EXTERNO

Moderador: Dr. Carlos Abrunhosa de Brito

“A diplomacia económica”Embaixador Francisco Seixas da Costa

“O papel das instituições”Eng.º Vital Morgado - Administrador da AICEP

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Vamos então dar início ao 4º painel destas nossas Jornadas sobre o tema “A organização do Comércio externo”.

Estamos a iniciar o nosso painel já um pouco depois da hora, em que o devíamos ter terminado e, por isso, vou-me abster de fazer qualquer tipo de comentário e passar de imediato à apresentação dos nossos convidados para que possamos disponibilizar todo o tempo ainda disponível os nossos convidados.

Eu iniciaria por apresentar o Sr. Embaixador Francisco Seixas da Costa, com uma larga experiência na área diplomática. Hoje administrador e consultor de empresas. Também, exerceu as funções de Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, entre 1995 e 2001. Desde 2003 que trabalha na área empresarial.

A ORGANIZAÇÃO DO COMÉRCIO EXTERNOModerador: Dr. Carlos de Abrunhosa de Brito

QUARTA SESSAO ~

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QUARTA SESSAO ~

“A diplomacia económica”

Embaixador Francisco Seixas da Costa

Começo por agradecer o convite que, através do Professor Valente de Oliveira , me foi dirigido pela Associação Empresarial de Portugal, para estar presente nestas V Jornadas Empresariais, organizadas com a Fundação de Serralves, neste momento do programa que é dedicado à “Organização do Comércio Externo”, para vos falar sobre a Diplomacia Económica.

Tenho um grande prazer em participar neste painel com o Eng.º Vital Morgado, moderado pelo dr. Carlos Abrunhosa de Brito.

Vou tentar evitar um discurso teórico, conceptual, mas não posso nem quero fugir a uma definição prévia, que nos permita recortar melhor aquilo de que falamos. Quando falamos de Diplomacia Económica estamos normalmente a referir-nos ao conjunto de meios que uma política pública, como é a política externa, coloca no terreno, no sentido de apoiar a ação daqueles que contam com o mundo exterior para a criação de riqueza nacional.

Neste tipo de ações podem, designadamente, juntar-se a promoção comercial, a atração do investimento produtivo estrangeiro, a criação das melhores condições possíveis para a operação dos nossos investidores no exterior, a captação dos fluxos turísticos, as negociação de quadros institucionais externos, de natureza bilateral ou multilateral, que facilitem a ação dos operadores económicos portugueses, e, finalmente, a melhoria de acesso a modelos internacionais de financiamento, para utilização por esses mesmos agentes.

Numa perspetiva mais abrangente, temos mesmo de convir que a Diplomacia Económica não é uma responsabilidade exclusiva da política externa, envolvendo as diversas dimensões do Estado que se projetam na área internacional. Com efeito, se nos concentrarmos, por exemplo, nas questões do investimento produtivo de origem externa, logo encontraremos o conjunto tradicional de critérios de avaliação da atratividade, nomeadamente os custos de contexto: a burocracia, o sistema de justiça, a legislação laboral, a segurança pública, as condições de acolhimento para os expatriados (nomeadamente em termos de saúde, educação e alojamento), as facilidades energéticas, a estabilidade fiscal, os apoios de crédito, etc.

Quero com isto dizer que o conceito de Diplomacia Económica é muito vasto e não pode

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ser reduzido àquilo que o Ministério dos Negócios Estrangeiros faz, nem mesmo à ação da estrutura de promoção comercial e de captação de investimento que é hoje a AICEP. E, claro, daqui resulta ainda mais óbvio que a Diplomacia Económica não se esgota muito menos na temática do Comércio Externo. Mas esse é o tema central que hoje aqui nos reune.

Portugal encontra-se inserido numa lógica de regras de comércio internacional que são definidas pela União Europeia, negociadas pela Comissão Europeia, com base em mandatos que lhe são conferidas pelos Estados, sentados à mesa do Conselho de Ministros. A política comercial externa é uma competência comunitária e, por essa razão, a Comissão Europeia, nas negociações que efetua em nome da União, tende a representar aquilo que se poderia designar como o interesse maioritário dos seus Estados membros. Quero com isto significar que a política comercial externa de Portugal, no tocante às regras por que se regula, é a política da UE. E que, muitas vezes, esses interesses médios se afastam dos nossos.

Melhor do que ninguém, os empresários portugueses sentiram a dificuldade que foi enfrentar a vaga liberalizadora que as então Comunidades Europeias empreenderam, no movimento de globalização. A UE ganhou então vantagens em terceiros mercados, o que permitiu neles colocar os seus produtos de maior sofisticação tecnológica. Por sua vez, abriu os seus mercados a produtos similares àqueles que a Europa menos desenvolvida produzia. Os consumidores dessa Europa mais rica passaram também a importar a custo mais baixos. Nós, que não tínhamos Nokias ou Mercedes para vender aos países terceiros, perdemos também para eles o mercado protegido que, até então, tínhamos como garantido (nomeadamente em atéria de têxteis e calçado).

Não estou aqui a fazer um juízo crítico sobre a globalização, cuja pressão e desafios também nos fez evoluir. Quero apenas sublinhar que a política comercial europeia não é neutra e nela se repercutem as desigualdades de desenvolvimento dentro da própria Europa. E com isto quero também dizer que, com custos desiguais, em especial no emprego e esforço das empresas, o mundo europeu mudou radicalmente mas a regra de que a nossa política externa, em matéria comercial, é uma competência europeia, essa não mudou e é preciso dela ter consciência permanente.

E este é o primeiro ponto que gostaria de sublinhar: os empresários portugueses necessitam de estar conscientes, como muitos já hoje estão, de que uma ação concertada com o Estado, junto das instituições comunitárias, é um passo essencial para garantir que a especificidade

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dos seus interesses é tomada em devida conta na definição das regras da política comercial da União.

Vem aí, por exemplo, um tempo muito importante, que é a definição das bases para o novo Acordo de Parceria entre a Europa e os Estados Unidos. Confesso ainda não ter a certeza de que haja condições políticas, de um e do outro lado do Atlântico, para a conclusão, com sucesso, desse megaprojeto.

Em ambos os lados, há interesses contraditórios que se defrontam. Além disso, no plano estritamente político, começa a levantar-se na Europa uma onda algo demagógica, assente no anti-americanismo primário que, por exemplo, pode vir a suscitar dificuldades na aprovação final do texto no seio do Parlamento Europeu. E, mesmo aqui em Portugal, algum populismo, a que um dos partidos do arco tradicional do poder não parece estar imune, pode vir a ter um terreno fértil contra este acordo.

Quero com isto dizer que, quando falamos de comércio externo, temos de ter uma perspetiva integrada e que os empresários e as suas associações devem ser capazes de forçar as forças políticas à instituição e operacionalização, no quadro do Estado, de modelos de representação dos seus interesses que possam ir para além de iniciativas “ad hoc”, a reboque das questões de oportunidade, como hoje muitas vezes sucede. E quando aqui falo do Estado, refiro- me também às instituições europeias, ao trabalho, com os seus congéneres do continente, junto dos comités da Comissão Europeia, mas igualmente na defesa dos nossos interesses específicos nos lóbis parlamentares, o que implica una articulação com os deputados europeus.

A minha experiência pelos corredores do governo já é de outro tempo, mas foi há menos tempo quer terminei um ciclo de mais de mais de quatro décadas na administração pública. E devo confessar-vos um segredo: não obstante o Estado, na sua ação exterior, ter tido sempre como natural finalidade e preocupação a representação, com o rigor possível, dos interesses económicos nacionais, fê-lo sempre, a meu ver, com uma excessiva liberdade interpretativa desses mesmos interesses, nomeadamente no juízo sobre o equilíbrio entre eles.

Um caso muito claro, que não vou aprofundar, foi o alargamento da União Europeia. O condicionamento externo era forte, a nossa margem de manobra era bastante estreita,

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mas devo dizer que senti então a máquina pública demasiado “à solta” nessa negociação. E digo isto com toda a consciência de quem nela teve especiais responsabilidades. De quem é a culpa? Do Estado, claro, mas também da inexistência de mecanismos de controlo e condicionamento da política externa por parte dos agentes económicos organizados. E a legitimidade das ações dos decisores políticos também passa muito por aqui.

Mas quero agora voltar às questões da Diplomacia Económica, na vertente específica do Comércio Externo, passando agora à sua dimensão bilateral.Devo começar por afirmar uma evidência: não há um modelo único de ação diplomática externa para o apoio aos agentes empresariais e para a defesa dos respetivos interesses. A Diplomacia Económica, no que respeita ao Comércio Externo, tem sempre de desenhar diversos perfis de intervenção, de acordo, não apenas com a realidade nacional com que estamos a interagir, mas, igualmente, em função do potencial, que é muito variável, das vantagens que possamos vir a extrair de cada um desses mercados.

Não vou tipificar esses modelos, mas creio que é óbvio para todos quantos aqui estão, que o trabalho em matéria de Diplomacia Económica junto de um país terceiro, por exemplo no seio de uma economia emergente, não tem rigorosamente nada a ver com uma embaixada num país membro da União Europeia.

E vou dar-lhes, precisamente, exemplos do trabalho em que estive envolvido junto de dois países-tipo, com vista a ilustrar, de forma muito clara, o que, no meu entender, se pode esperar da Diplomacia Económica.

O primeiro caso é Brasil. Trata-se de uma grande economia emergente, um país com uma considerável ambição no quadro internacional, com um papel de óbvia liderança dentro da OMC e com uma forte influência no seio do G20 e dos BRICs. No plano interno, é uma economia muito protecionista e cheia de ideosincrasias. Porque há “muitos” Brasis. No campo da sua ação externa, muitas das grandes empresas brasileiras só mais recentemente voltaram o seu olhar para mercados fora do seu “near abroad”.

Os problemas que se deparam a uma embaixada de um país que aí opere em diversas áreas económicas, como é o caso de Portugal, são muito complexos. Não existindo ainda um marco regulatório em matéria comercial e de serviços entre a Europa e o Mercosul, tudo se passa no quadro de um bilateralismo intenso, que se processa quer com o governo federal, quer com

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os governos dos 27 Estados. Frequentemente estamos perante obstáculos de natureza não pautal, desde discussão em torno de normativos protecionistas que discriminam negativamente os operadores estrangeiros até atos de pura discricionariedade, de vária natureza, que é importante tentar ultrapassar, normalmente por via política.

A especificidade das culturas, políticas e administrativas, prevalecentes dentro de cada Estado brasileiro impõe, além disso, um trabalho muito particular e específico, que muitas vezes passa por diligências diretamente junto dos governos regionais, outras vezes inclui a necessidade de um forte lóbi através de senadores e deputados influentes nos Estados.

Recordo-me que passei por tudo isso e tomei nota de ter feito diligências diretas junto de governos de 21 dos 27 Estados do Brasil, acompanhando responsáveis de empresas, utilizando os dez consulados de carreira então existentes, alguns dos muitos consulados honorários, bem como a totalidade das 11 Câmaras de comércio luso-brasileiras existentes, duas das quais foram criadas nesse mesmo período.

O exercício da Diplomacia Económica objetiva-se na promoção e apresentação das nossas empresas, na reivindicação para o cumprimento de obrigações por parte de entidades públicas, na tentativa de influência de decisões que dependem de escolhas políticas, na procura de soluções para impasses, sejam eles coisas tão variadas como novos”slots” para a aviação, proteção de denominações de origem para produtos nacionais, campanhas para evitar a tributação de produtos nacionais, facilitação de acesso a certos financiamentos por parte de empresas com capital português, inesperadas barreiras ambientais, superação provocadas por bloqueios de movimentos indígenas a certos investimentos, etc.

Quis apenas dar uma noção do mundo muito alargado da ação potencial num país da dimensão do Brasil, para melhor ilustrar o que pode ser o desenvolvimento de uma Diplomacia Económica num mercado como aquele. Mas o que referi sobre o Brasil poderá ser adaptado a outros países onde Portugal tenha interesses de dimensão similar ou ainda maior. Imagino que os meus colegas em Angola, nos Estados Unidos, no Japão, na Arábia Saudita e no Golfo, na Índia e na Rússia devem ter agendas, se não tematicamente similares, às vezes bem mais complexas e exigentes.

Faço ainda notar que esse trabalho é impossível de desenvolver sem se dispor de uma triagem de prioridades que só uma estrutura experiente como a AICEP pode fazer.

QUARTA SESSAO ~

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Mudemos agora de área: a França, que foi o meu último posto como embaixador. E aqui as coisas foram muito diferentes. Naturalmente que aí me coube, a partir de certa altura, montar iniciativas de sensibilização, no início do período de emergência financeira, com idas à televisão ou às rádio, escrever artigos em jornais ou organizar conversas de governantes com jornalistas, para tentar “sossegar”, tanto quanto era possível, a opinião pública, relativamente à atitude das nossas autoridades.

Sei que vários colegas meus, nesses tempos bem difíceis para a representação externa do Estado, desenvolveram, em outras capitais europeias, ações com objetivos similares, adaptadas naturalmente à posição e importância desses mesmos Estados.

Hoje, olhando à distância, constato contudo que o mais importante do meu trabalho foi menos tentar captar novos investimentos e, muito mais, trabalhar para garantir que os investimentos franceses que por cá estão se sentiam confortáveis e não saíam do país. Fiz isso, uma vez mais, em estreitíssima articulação com o delegado e a delegacao AICEP e também, curiosamente, com os embaixadores franceses em Lisboa, porque os nossos interesses eram comuns.

Lembro-me de, com ess finalidade, ter desenvolvido variadas diligências junto do gabinete do primeiro-ministro, junto de diversos Ministérios em Lisboa, junto de CCDR’s, junto de municípios. Pode parecer estranho que um embaixador português tenha de trabalhar assim mas não imaginam a angústia que é percebermos que, se formos pelas vias burocráticas regulares, as coisas demoram um tempo que não temos. Ou melhor, que esses empresários não têm.

Naturalmente que a questão da nossa promoção comercial também esteve sempre presente. Mas esse é um trabalho que sempre vi a diplomacia portuguesa fazer, ao longo dos tempos, com maior ou menor sucesso, mas sempre com um empenhamento da máquina diplomática que dependeu, muito simplesmente, das instruções políticas de que esta dispunha. E nem sempre essa orientação existiu.

Mas há que ter a consciência - e eu não sei se essa consciência existe - de que são muito poucas, na nossa rede externa, as embaixadas que têm uma estrutura física e meios disponíveis para poderem montar, com dignidade e eficácia, ações de promoção comercial. Quando ouço clamar pela abertura das nossas embaixadas aos eventos promocionais, vem-

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me de imediato a ideia que muitas dessas estruturas têm apenas, como pessoal diplomático, o próprio embaixador, que, quando vem de férias, é substituído por alguém ido de Lisboa. Há embaixadas que são no 3º esquerdo de uma rua num bairro de segunda classe – e, digo desde já, esse miserabilismo foi agravado nos últimos anos, por algumas decisões que não hesito de qualificar de irresponsáveis. O embaixador dispõe muitas vezes de um pessoal, na residência e chancelaria, que não ultrapassa meia dúzia de pessoas. Que se pode pedir a essas pessoas, no mundo de promoção do negócio, as quais, esmagadoramente, trabalham sem apoio local da AICEP?

Fiz parte dos privilegiados que dispunham de um razoável staff, pelo que era legítimo exigirem-me resultados. Não não me queixo. Aos embaixadores colocados nas grandes embaixadas – e estamos a falar de duas embaixadas na América, duas ou três em África, seis ou sete na Europa e uma ou duas na Ásia – pode e deve pedir-se um trabalho intenso de ajuda à promoção comercial, à captação de turismo, à promoção do investimento, a realização de diligências sobre uma multiplicidade de situações de interesse empresarial. Há ainda uma segunda linha de postos, com meios mais modestos que, contudo, têm ainda uma capacidade de organizar coisas e, naturalmente, intervir de diversas formas. Mas, volto a repetir, a esmagadora maioria dos nossos postos diplomáticos – e já nem falo na rede consular – é de uma imensa pobreza de recursos.

Alguns dos senhores estarão a perguntar-se: mas, então, se nada podem fazer, para que é que existe essa rede tão frágil de representação externa? E aqui, lamento se desiludo alguém, para quero deixar claro que, se a economia é um elemento importante e decisivo para a vida dos países, e para reescrever uma frase já clássica, há mais vida para além da economia...

O prestígio de um país, a sustentação do seu lugar no imaginário global, a sua História, a lembrança constante da sua língua e da sua cultura, é uma tarefa que, embora tendo que absorver alguns recursos, garante um prestígio que está um pouco para além das conjunturas.Somos o quarto país mais antigo do mundo, somos fiéis depositários de uma língua de expressão universal. O facto de sermos, desde há muito, o Estado mais pobre da Europa ocidental, numa crise financeira tremenda, não obstou a que, ainda há dois dias, tivéssemos sido eleitos com uma das maiores votações para o Conselho dos Direitos do Homem da ONU, que há três anos, com “troika” por cá, tivéssemos “esmagado” um país como o Canadá na eleição para o Conselho de Segurança.

QUARTA SESSAO ~

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Sem uma presença diplomática mínima, a nossa imagem como país passaria de frágil a nula – e isso é que eu gostava de dizer aos senhores empresários. A Diplomacia Económica apoia- se também nesse todo, que vai de Saramago ao prestígio criado no apoio à luta por um Timor livre, que vai do sublinhar da aventura das Descobertas a mostrar o trabalho de Siza Vieira, do Fado (e por isso foi importante ser Património Mundial da UNESCO) ao Ronaldo, de Manoel de Oliveira à nossa gastronomia.

E essa imagem também depende muito da coerência de uma política externa global, de sermos um país previsível na nossa ação externa, um país “de palavra” quando promete um voto numa organização internacional ou com o qual, por exemplo, os países africanos sabem que podem contar num qualquer fórum em que os seus interesses estejam em causa.

Não esqueçamos ainda que Portugal é, dentro da UE, uma espécie de “embaixador” dos países com os quais tem especiais relações, e isso não deixa de ser muito importante para a capacidade de manobra do país junto desses Estados. Isso é importante para a nossa Diplomacia Económica.

E digo isto com a autoridade de alguém que, um dia, ao falar a favor da Diplomacia económica, disse numa entrevista a um jornal, que aliás resultou num título que me não tornou mais popular, que as Necessidades deviam tratar “mais das batatas e menos do Kosovo”.

Termino com uma nota de natureza institucional, porque isso se liga ao cerne daquilo que aqui nos importa.

Como é sabido, o atual governo, no início do seu mandato, decidiu colocar a AICEP sob a tutela do Ministro dos Negócios Estrangeiros. Foi uma opção que, à época, foi justificada para garantir uma maior coerência da ação global externa. Entre nós, esse é um debate antigo.Devo dizer, a título pessoal, que nunca vi uma grande vantagem em colocar a AICEP (ou os seus antecessores Fundo de Fomento de Exportação, ICEP e API) numa dependência funcional plena do nosso modelo representação político-diplomática. Trata-se, a meu ver, de culturas tradicionalmente diferentes, com lógicas de inserção diversas, quer junto da Administração Pública, quer junto da sociedade civil e, muito em especial, junto do mundo empresarial. Trabalhei muito bem, e por bem mais de três décadas, com esses “heterónimos” de promoção comercial externa. Fi-lo sob a direção de 21 Ministros dos Negócios Estrangeiros (ouviram bem: 21 !) e nunca senti falta de um “merge” institucional

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para quer as coisas andassem. Aprendi, ao longo desse tempo, que, desde que haja uma orientação política clara, desde que os embaixadores sejam competentes e abertos, desde que o pessoal que trata do Comércio Externo (e do Turismo, também) saiba com eles articular-se, tudo pode funcionar bem.

Mas, voltando ao modelo instituído em 2011, foi decidido fazer a experiência, tanto mais que se vivia um ambiente favorável ao “downsizing” da máquina pública. E, para lhe dar foros de coerência total, foi determinada a extinção do “braço” económico do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que então se chamava Direção Geral dos Assuntos Técnico-Económicos – uma designação bizarra o que, no governo Sócrates, havia sido possível consensualizar para acomodar os egos da Economia e dos Negócios Estrangeiros. E as coisas lá foram funcionando, com a AICEP a ser o novo “braço” do MNE. E, diga-se desde já, com a AICEP então muito bem dirigida, tal como já o havia sido no anterior governo. A AICEP é uma excelente máquina.

Tudo assim funcionou até um dia. Nesse dia, soubemos que houve uma crise política, o ministro mudou e o antigo ministro – que antes, e denodadamente, havia defendido a lógica anterior –, revogou a ideia que ele próprio tivera e levou consigo a AICEP.

Para a sua tutela, para uma área institucionalmente difusa, que funciona entre os aeroportos e o Palácio das Laranjeiras, num modelo inédito de “diplomacia de vice-primeiro ministro”, que me dizem que, por vezes, tem a sua eficácia prática no mundo dos negócios. Mas que, reconheça-se não é um modelo institucional sustentável. Mas, até aí, tudo bem. Se as coisas funcionam minimamente, embora de forma remendada, só nos podemos congratular.

Só que o pobre do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que agora tem uma relação funcional algo diversa com a AICEP, perdeu entretanto, e pelo caminho, a sua dimensão económica e vive, ao que se sabe, num casuísmo permanente. É que a temática económica não se esgota hoje, nem naquilo que é tratado nos Assuntos Europeus, nem naquilo a que a AICEP se dedica. Para além de questões variadas de contencioso económico que ocupam o trabalho político-diplomático, desapareceram, por exemplo, estruturas que estavam a constituir uma massa crítica em matéria de negociações internacionais sobre energia ou na área ambiental.

Tudo isto é hoje tratado em modelos “ad hoc”, com mera reafectação interna dos assuntos

QUARTA SESSAO ~

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por várias estruturas, estas mesmas cada vez com menos recursos, quer humanos, quer financeiros.

Não é minha intenção fazer desta minha intervenção um terreno de polémica ou chicana política. Quero apenas chamar a vossa atenção para o facto de não se poder pedir à diplomacia um trabalho melhor e mais eficaz no terreno da Diplomacia Económica quando, com alguma ligeireza, se debilita cada vez mais o Ministério dos Negócios Estrangeiros. Se é no exterior que podem ser encontradas as principais respostas para o nosso crescimento, e se é também aí que se situam os interlocutores junto dos quais, cada vez mais, é necessário fazer valer os nossos interesses, confesso que não entendo a lógica de desbaratar uma estrutura dedicada, com grande sentido de serviço público e que é, de longe, o Ministério com menor gasto, abaixo de 1% do Orçamento Geral do Estado.

Muito obrigado pela vossa atenção.

Moderador - Dr. Carlos de Abrunhosa de Brito

Muito obrigado Sr. Embaixador Francisco Seixas da Costa, pela brilhante intervenção e pela gestão do tempo.

Vamos ouvir já de seguida o Sr. Engº Vital Morgado que, desde 1987, está ligado à AICEP com uma permanência de cerca de 9 anos em Nova Iorque e outros 8 em Madrid. Desde 2010 é administrador executivo da AICEP.

Quarta Sessao - A diplomacia economica | Embaixador Francisco Seixas da Costa ~ ´

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QUARTA SESSAO ~

“O papel das instituições”

Administrador da AICEP Eng.º Vital Morgado

Muito obrigado. Gostaria de, em primeiro lugar, cumprimentar todos os presentes e agradecer o amável convite da Fundação AEP para que a AICEP estivesse presente nestas 5ª Jornadas Empresariais.

Gostaria de cumprimentar e dar um abraço ao Dr. Paulo Nunes de Almeida, cumprimentar o Prof. Valente de Oliveira, o nosso moderador Dr. Carlos Abrunhosa de Brito e dizer que é para mim uma honra partilhar este painel com o Embaixador Francisco Seixas da Costa por quem tenho um grande apreço, eu trabalhei 18 anos no estrangeiro, nunca nos cruzámos, nunca tive o prazer de trabalhar com o Embaixador Seixas da Costa mas, muitos dos meus colegas, tiveram esse privilégio e contaram-me aquilo que fizeram durante as suas estadias nas embaixadas e, realmente, para além de um grande diplomata o Embaixador Seixas da Costa teve sempre uma grande sensibilidade para os assuntos económicos. Este conceito de diplomacia económica, embora recente em termos textuais, é uma prática diária que exercemos há muito tempo na rede externa da AICEP. No meu caso pessoal, tive a oportunidade de o praticar durante o trabalho conjunto desenvolvido com 6 Embaixadores diferentes durante a minha carreira profissional no estrangeiro.

Antes de começar a minha apresentação, queria também referir que o Dr. Miguel Frasquilho, que é o Presidente do Conselho de Administração da AICEP gostaria muito de estar aqui presente hoje, mas acontece que está em Macau, tendo-me pedido, portanto, que o representasse e eu espero estar à altura dessa responsabilidade.

Falando do comércio externo, eu penso que não podemos falar do comércio externo português sem antes fazermos algumas observações de contexto com o que se passa a nível internacional.

Portanto, iria abordar os seguintes pontos na minha intervenção:

1. As novas tendências do comércio internacional

2. O comércio externo português

3. Tipologia das empresas exportadoras

4. AICEP – A importância do apoio às empresas

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O comércio internacional teve realmente um crescimento exponencial nos últimos 30 anos e tem sido um dos motores da globalização. Hoje o comércio global de bens e serviços representa 1/3 da riqueza que se cria no mundo em cada ano, ultrapassando mais de 20 triliões de dólares.

Este crescimento exponencial ao longo destas últimas 3 décadas foi conseguido devido a uma revolução tecnológica que todos conhecem, quer ao nível das telecomunicações com o aparecimento e crescimento exponencial da Internet, quer ao nível das tecnologias de informação. Também a revolução que se verificou ao nível dos transportes, permitiu baixar os custos da deslocação de pessoas e os custos logísticos das empresas. Por último, toda a abertura de política que houve nesta área permitiu um processo de integração de mercados e de livre comércio a nível mundial. Todos estes fatores contribuíram de forma determinante para que o comércio internacional tivesse um crescimento exponencial nas últimas 3 décadas.

Quarta Sessao - O papel das instituicoes | Eng.º Vital Morgado~ ~,

O Sr. Embaixador já referiu algumas tendências do comércio internacional, eu refiro aqui também algumas que me pareceram interessantes. Assiste-se e vem-se assistindo nas últimas décadas a uma integração dos mercados com criação de grandes zonas de mercado livre quer a União Europeia quer a NAFTA, quer a ASEAN. O Sr. Embaixador já se referiu ao Mercosul. E agora mais recente a tentativa dos Estados Unidos de criarem uma zona de comércio livre quer com a Europa quer com alguns países da zona do Pacífico e da América Latina.

Paradoxalmente, essa integração de mercados coincide com uma fragmentação do processo de produção. Essa fragmentação é resultante de toda esta revolução tecnológica que já referi. Hoje as empresas para se manterem

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competitivas num ambiente global de crescente concorrência, procuram produzir cada um dos componentes dos seus produtos nos países onde conseguem obter um melhor preço/qualidade, independentemente da sua localização geográfica. Os especialistas em comércio internacional chamam a este procedimento “global sourcing” que é fundamental para manter a competitividade das empresas num mundo cada vez mais global. Portanto, hoje as cadeias de abastecimento das empresas são cada vez mais globais. Se virem, por exemplo, que um automóvel que há 50 anos se produzia todo no mesmo sítio, todas as peças eram fabricadas e montadas no mesmo local, hoje o veículo da AutoEuropa, montado em Palmela recebe componentes de mais de 50 fornecedores em mais de uma dezena de países. Ou seja, o mundo também nesse aspeto mudou e muito. Assistimos à implementação do trabalho em rede. Nós estamos todos ligados no dia-a-dia. Hoje é um problema esquecermo-nos do nosso telemóvel em casa, porque ficamos desligados do mundo, não temos acesso ao nosso mail, ficamos sem acesso á Internet. Portanto, o trabalho em rede é cada vez mais importante e a colaboração entre as empresas é também fundamental em termos de concorrência internacional. Hoje as grandes multinacionais rodeiam-se de fornecedores de grande qualidade. Estava há pouco a falar de Palmela, da Volkswagen Sharan que é montada lá. A qualidade dos automóveis são montados nessa fábrica é o resultado de um esforço conjunto entre a empresa VW e o seu conjunto de fornecedores. Quanto melhor for esse conjunto de fornecedores na criação de produtos inovadores e diferenciados da concorrência, mais competitivos são os automóveis junto dos seus potenciais compradores. Portanto não é apenas a Volkswagen mas todo um grupo de fornecedores que essa empresa consegue criar à sua volta que a tornam competitiva no mercado global.

Temos hoje um mundo multipolar, pelas razões políticas que todos conhecemos e todas estas tendências contribuíram para a afirmação de novos mercados emergentes. Assistimos ao aparecimento de novas classes médias com poder de compra, como foi o caso do Brasil e também de alguns países africanos de língua oficial portuguesa que representam novas oportunidades para as empresas portuguesas.

Temos assistido também a um aumento exponencial da concorrência. Hoje toda a gente quer exportar, todos os países querem atrair investimento estrangeiro, todos querem atrair turistas. Essa concorrência começa por se verificar no nosso mercado interno. Eu estive 8 anos em Espanha e via o número de empresas espanholas que tentavam entrar no mercado nacional.

QUARTA SESSAO ~

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Não sei se sabem mas Portugal é o terceiro mercado mais importante para Espanha, a nível mundial. Espanha exporta mais para Portugal do que para toda a Ásia ou América Latina, portanto a concorrência para as empresas portuguesas começa aqui, no nosso próprio país. Hoje mais de 17.000 empresas espanholas vendem no nosso mercado interno e mais de 1.000 estão cá implantadas, concorrendo com as nossas empresas na procura por clientes portugueses. As empresas portuguesas que querem crescer, têm de procurar oportunidades de negócio também noutros mercados. Para isso, têm que ser competitivas junto dos clientes dos mercados onde querem apostar. Podem ser competitivas conseguindo abordar esses clientes com uma oferta de preço/qualidade melhor que os concorrentes, ou apostar em produtos e serviços inovadores, focando a sua atuação em segmentos do mercado onde as possibilidades de sucesso sejam maiores.

A utilização crescente das tecnologias de informação e comunicação por parte das empresas, quer na conceção e design dos produtos e serviços, quer na sua produção e entrega ao cliente final, faz com que o ciclo de vida dos produtos e serviços seja ada vez menor, devido à necessidade que as empresas têm em ser inovadoras para serem competitivas perante a sua concorrência. Por isso, a diferenciação, a inovação, a criação de marcas são importantes para que os produtos e serviços possam ter um acesso mais facilitado aos seus consumidores, num mundo em que o aparecimento constante de novas propostas de valor é determinante para o sucesso das empresas.

Uma nova realidade é a crescente importância no sector dos Serviços. Os Serviços hoje têm um potencial de crescimento enorme. As empresas de Serviços acompanharam toda a industrialização que aconteceu nos mercados emergentes. Empresas de serviços na área financeira, na área da consultadoria, na área jurídica e também na área da engenharia têm encontrado nos mercados emergentes grandes oportunidades de negócio que permitiu o seu crescimento a nível global.

Também, a crescente urbanização das populações é hoje uma realidade, designadamente nos países asiáticos, africanos e latino-americanos. As populações tendem a concentrar-se cada vez mais nas cidades, que se tornaram polos fundamentais de desenvolvido e crescimento económico. Para a esmagadora maioria das empresas portuguesas que se internacionalizam é nestas cidades que procuram concentrar os seus negócios, tentando encontrar parceiros locais que as ajudem a desenvolver os seus negócios nesses países.

Relativamente ao comércio externo português, gostaria de vos mostrar aqui a evolução

Quarta Sessao - O papel das instituicoes | Eng.º Vital Morgado~ ~,

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das últimas duas décadas. Podem ver neste slide, a evolução das exportações portuguesas de bens e serviços, desde 1996.

QUARTA SESSAO ~

Como poderão verificar o número de empresas exportadoras foi afectado pela crise de 2009. Esta queda verificou-se essencialmente nos mercados de língua portuguesa

Gostaria de vos mostrar também a evolução do peso das exportações de bens e serviços no PIB português, que passou de 28% em 2009 para 41% em 2013, confirmando assim que as exportações têm sido um dos pilares da nossa recuperação económica.

No que se refere ao número e à tipologia das nossas empresas exportadoras, penso que é importante ter uma ideia da sua evolução nos últimos anos. No slide que vos apresento, está a evolução entre os anos 2000 e 2013.

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A expansão internacional destas empresas faz-se: 1) por proximidade geográfica e daí o facto da Europa significar quase 70% das nossas exportações de bens e serviços e Espanha representar quase 23%; 2) por proximidade cultural e linguística e daí a crescente importância dos países de língua portuguesa e também espanhola da América Latina para os negócios das nossas empresas e 3) empresas de base tecnológica que baseiam o seu negócio nas tecnologias de informação e na Internet e quando nascem têm, desde logo, uma vocação global.

Esta é a repartição geográfica das nossas exportações de bens e serviços. Como podem ver ali na União Europeia a concentração é enorme e é um dado que se vem verificando com consistência nos últimos tempos. Depois da Europa, o principal destino das nossas exportações é África, essencialmente porque Angola tem ali

Quarta Sessao - O papel das instituicoes | Eng.º Vital Morgado~ ~,

em África, portanto, para onde exportam muitas empresas de pequena dimensão que perante uma situação de crise e uma dificuldade de financiamento, tiveram de abandonar temporariamente a atividade exportadora. No entanto, como o gráfico também evidencia, tem-se verificado, nos últimos 5 anos, uma recuperação muito significativa e que todos esperamos que seja consistente.

Mas que tipo de abordagem fazem as nossas empresas quando querem crescer internacionalmente e optam pela via das exportações para entrar nos mercados internacionais?

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QUARTA SESSAO ~

um peso muito importante, cerca de 7% nos 11,6% que ali assinalo. Se repararem, vendemos atualmente mais para a África do que para toda a América, desde o Canadá ao Chile.

Um gráfico para assinalar ainda com mais evidência o peso das nossas exportações para a Europa e aquilo que a Europa representa para as empresas portuguesas que têm negócios internacionais. A barra representada a azul escuto é relativa ao ano de 1996 e a barra amarela ao ano de 2013. Como podem veriicar, existe uma concentração enorme dos nossos negócios no espaço da União Europeia.

Se virmos depois ali a zona reservada a África, tem havido um crescimento significativo dos negócios com os PALOP, algum crescimento também para o resto de África, essencialmente nos países do Magreb.

Depois nas Américas temos visto que, infelizmente, na América do Norte temos vindo a perder peso e que, na América do Sul, as coisas começam a melhorar. Há mercados da América Latina que, neste momento, são muito procurados pelas empresas portuguesas, nomeadamente a Colômbia mas também o Peru, o Chile e obviamente o Brasil com as dificuldades que o Sr. Embaixador também já referiu, enfim, um com protecionismo difícil de ultrapassar mas que, sendo um país de língua portuguesa e uma das maiores economias do mundo, ele é obviamente um mercado extremamente importante. Depois, o negócio na Ásia, onde muitas empresas estão também a tentar detectar oportunidades de negócio, onde temos a própria AICEP aumentado a nossa presença. Abrimos um escritório na Indonésia, temos um escritório em Singapura, temos um escritório também na Malásia. Estamos em Macau, estamos em Shangai e estamos em Pequim, porque sentimos que cada vez mais existe um número crescente de empresas portuguesas interessadas naquela zona do mundo e especialmente na China.

Trouxe também um gráfico do comércio externo português com os principais 10 mercados que significam 65% do total do que nós exportamos. O grande desequilíbrio, acontece nas nossas relações comerciais com Espanha. Temos um superavit importante com França, Angola e com os Estados Unidos e relações comerciais mais equilibradas com os restantes mercados.

Com a crise de 2009 e tudo aquilo que aconteceu

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no mercado interno e que todos nós conhecemos, com uma redução muito significativa da procura interna, as empresas tiveram de se virar para o exterior para diversificar os seus negócios e isso teve os seus resultados positivos.

Como vêem neste gráfico, em 1996 o negócio das empresas fora da Europa significava 20% do total e, no ano passado, esse número aumentou 50% e já representava cerca de 31%.

Quarta Sessao - O papel das instituicoes | Eng.º Vital Morgado~ ~,

Mas que tipo de empresas exportam e qual o montante das suas exportações?

No gráfico seguinte, podem ver que 103 empresas portuguesas representam quase 50% daquilo que nós exportamos. Muitas deles estiveram aqui ao longo do dia. Obviamente que este tipo de empresas tem um conjunto de recursos, quer seja recursos humanos ou financeiros, conhecimentos dos mercados, capacidade técnica que lhes permite fazer a sua expansão internacional sem o apoio da AICEP. Precisam pontualmente do nosso apoio, temos trabalhado com muitas delas e estamos sempre disponíveis para ajudar naquilo que precisam mas é um apoio pontual. Estas empresas exportam por ano mais de 50 milhões de euros, cada uma.

Depois temos um conjunto de cerca de 140 empresas que exportam no intervalo entre 25 e 50 milhões de euros/ano, cada uma, e que representam 12% do total. Depois temos outro

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conjunto de cerca de 3500 empresas que exportam entre 1 e 25 milhões de euros/ano, cada uma, que representam 35% do total. Temos depois temos um conjunto enorme de cerca de 18 mil empresas que exportam menos de 1 milhão de euros por ano, cada uma, e estas sim, são aquelas que nós procuramos ajudar porque são empresas que têm dificuldades quer em recursos humanos quer em capacidade financeira, quer em obter conhecimento dos mercados e que, a AICEP procura trabalhar, ajudá-las, incentivá-las, sensibilizá-las para a necessidade de trabalharem em conjunto para competir, tentar que elas se unam e se associem para que possam repartir os riscos e ter uma oferta mais abrangente e uma maior capacidade de negociação junto dos seus potenciais clientes.

Portanto, este gráfico dá um pouco a ideia da importância que a AICEP tem para o conjunto das pequenas e médias empresas em Portugal porque, como referi, sem muitos meios e com o incremento da concorrência a nível internacional, as empresas têm de fazer muito bem o seu trabalho de casa e precisam muito do nosso apoio.

Tive muita pena de não estar aqui durante a manhã mas estivemos em Braga com 150 empresas na Associação Industrial do Minho, com os nossos colegas de França e de Moçambique e estamos a fazer um road show por todo o país que vai decorrer até ao fim do ano e durante o ano de 2015, tentando ir ao encontro das pequenas e médias empresas, tentando capacitá-las, dar-lhes informação para que elas, quando vão para o estrangeiro estejam melhor preparadas, vão bem capacitadas para que tenham maior possibilidade de êxito. Ou seja, o core business do nosso trabalho passa por ajudar este tipo de empresas de pequena e média dimensão e apoiá-las numa fase difícil do nosso mercado interno. Procurar alternativas nos mercados externos leva estas empresas a avançar para o estrangeiro e, se estas 18 mil conseguiram outras pequenas empresas também poderão conseguir desde que se preparem bem e tentaremos, com o nosso apoio, que elas tenham sucesso.

Para concluir, gostaria de falar um pouco da AICEP. Somos uma empresa pública de natureza empresarial. Temos duas missões fundamentais: uma é atrair investimento estrangeiro para Portugal e a outra é apoiar a expansão internacional das empresas. Trabalhamos numa lógica de proximidade ao tecido empresarial. Portanto, fazem sentido estas ações que fazemos fora dos grandes centros urbanos indo assim ao encontro das empresas. Temos cerca de 60 colegas nossos aqui no Porto, em Lisboa e nas 9 Lojas de Exportação nas principais cidades do país, são gestores de clientes, que tentam resolver diariamente os problemas das empresas de uma forma mais próxima. Todas as empresas que estiveram no painel anterior têm um gestor de cliente na AICEP. Damos um apoio personalizado durante

QUARTA SESSAO ~

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todo o processo de internacionalização. Temos hoje, se não me engano, uma rede externa em 48 cidades de 42 países e estamos localizados nas Embaixadas de Portugal para que, em conjunto com os Embaixadores, possamos de uma forma mais eficiente e eficaz ajudar as nossas empresas.

Portanto, este é o tipo de trabalho que nós fazemos. Trabalhamos com empresas ou que já exportam e querem consolidar a sua posição nestes mercados ou eventualmente ir para novos mercados com novos exportadores, o que fizemos hoje de manhã em Braga ou, como já foi aqui referido, empresas que investem no exterior. Temos diversos canais de relacionamento com as empresas. Temos os gestores de cliente, temos um site na Internet que recebe cerca de 90 mil visitas por mês e um Contact Center.

Temos um conjunto de produtos e de oportunidades de negócio que divulgamos, mais de 5000 por ano. Fazemos ações de capacitação ao longo do País. Fornecemos às empresas as listas de compradores internacionais, que é de longe o principal produto que as empresas procuram quando nos contactam. Participamos nalgumas feiras, temos informação sobre mais de 100 mercados. Somos 440 pessoas, 150 estão no estrangeiro, 70 estão aqui no Porto, os restantes em Lisboa e em diversas cidades do País. Temos uma rede externa, como já vos referi, e somos a entidade que gere os apoios comunitários dedicados à promoção internacional. Estamos a encerrar o quadro comunitário entre 2007 e 2013. Apoiamos 2377 projectos individuais que tiveram, como vêm no quadro a amarelo, um incentivo público de 320 milhões de euros. Nem todos estes projectos puderam ser implementados mas, este foi o volume dos projetos aprovados e depois temos outros projetos a nível coletivo que são apresentados pelas associações. A AEP trabalha connosco já há algum tempo e, portanto, destes projectos colectivos que nós apoiamos nos últimos 7 anos aprovamos 220 projectos com incentivo público na ordem dos 210 milhões de euros. Portanto, o quadro comunitário de apoio para ajudar as empresas a fazer promoção internacional foi na ordem dos 530 milhões de euros nos últimos 7 anos.

Vamos lançar, em breve, o novo quadro comunitário de apoio. As novas verbas destinadas a promoção internacional vão ser reforçadas e, portanto, se quiserem contactar connosco para obterem informação ou para vos ajudarmos a apresentar candidaturas, para quem ainda não tem experiência nesta área, estamos completamente disponíveis para isso.

Só para terminar, dois slides sobre a questão do investimento directo estrangeiro. Nós funcionamos como one stop shop para as empresas quer portuguesas, quer estrangeiras,

Quarta Sessao - O papel das instituicoes | Eng.º Vital Morgado~ ~,

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que têm projectos de investimento em Portugal acima de 25 milhões de euros. Negociamos, quer os incentivos, quer alguns apoios à formação em nome do Estado. Algumas das empresas que estiveram aqui hoje tiveram toda essa negociação connosco como é o caso, por exemplo, da Embraer e, portanto deixo-vos aqui uma ideia que das empresas nos últimos anos quer na área dos Serviços, quer na área da Indústria negociaram projetos de investimento com a AICEP.

Muito obrigado, mais uma vez, pelo convite e foi um prazer estar aqui convosco.

Moderador - Dr. Carlos de Abrunhosa de Brito

Muito obrigado Sr. Engº Vital Morgado. Resta-me agradecer aos nossos 2 convidados as brilhantes intervenções e que, de certeza, contribuíram para todos aqueles que hoje aqui estão connosco nestas jornadas, a entender melhor a organização do comércio externo.

Dou assim, por encerrada esta sessão de forma a podermos avançar de imediato para a quinta e última sessão.

QUARTA SESSAO ~

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COMUNICACOES´

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QUINTA SESSÃO AS UNIVERSIDADES E A PROJEÇÃO DE PORTUGAL NO MUNDO

Moderador: Dr. Manuel Cavaleiro Brandão

Eng.º José Rui Felizardo - CEIIA

Dr. Cláudio Sunkel | IBMC – Instituto de Biologia Molecular

Prof. Jorge Gonçalves | Universidade do Porto

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Se estiverem de acordo, vamos então dar sequência aos nossos trabalhos. Estão todos conscientes, como a mesa está, de que houve algum deslizar nos nossos tempos e temos alguma pressão no sentido de garantir que o vosso entusiasmo não esmorece e que, portanto, farão o favor de nos acompanhar até ao fim.

Este último painel tem como tema as universidades e a projecção de Portugal no mundo. De alguma forma podemos dizer que encaixa bem no final do painel anterior porque ouvimos muito falar de exportações. Temos todos ideia da importância que as exportações têm, admito que para qualquer país, mas em particular para Portugal, tendo em conta a situação em que nos encontramos. Para o significado das exportações há uma parte de valorização que tem que ver com a qualificação dos recursos humanos e temos de reconhecer que essa é uma primeira componente que as universidades proporcionam ao colectivo nacional. Por outro lado, tem muito que ver com o que se possa adicionar em matéria de conhecimento, em matéria de investigação e inovação. E é um pouco sobre isso que hoje vamos aqui ouvir falar, dado que as universidades podem e devem contribuir muito para essa dimensão da produção nacional, em particular se a articulação e cooperação entre as universidades, o tecido produtivo e as nossas empresas for efectivamente eficaz.

Temos connosco três pessoas que tivemos muito gosto em convidar e a quem agradeço terem-se disponibilizado para colaborarem com as Fundações que organizam e promovem estas Jornadas. E vou dar de imediato a palavra ao Sr. Eng.º José Rui Felizardo, que é licenciado em engenharia mecânica pelo Instituto Superior Técnico, sendo actualmente o presidente do conselho de administração da Inteli e mais concretamente presidente da comissão executiva do Centro para Excelência e Inovação da Indústria Automóvel. É autor de muitos artigos e várias publicações e contamos muito com a qualidade da sua intervenção que está antecipadamente garantida.

Tem a palavra. Muito obrigado.

QUINTA SESSAO ~

Moderador: Dr. Manuel Cavaleiro Brandão

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QUINTA SESSAO ~

CEIIA - Centro para a Excelência e Inovação na Indústria Automóvel Eng.º José Rui Felizardo

Muito boa tarde a todos.

Sr. Prof. Valente de Oliveira, Dr. Paulo Almeida, Dr. Cavaleiro Brandão,

É uma honra para o CEiiA poder partilhar a sua curta experiência de internacionalização. Curta porque o CEiiA é um centro de inovação com 8 anos e, naturalmente, uma organização com 8 anos não tem uma experiência de internacionalização como a das empresas que vimos hoje aqui.

No entanto, o CEiiA foi criado a pensar nos mercados globais, na valorização do conhecimento das nossas universidades, na valorização do seu conhecimento numa dimensão internacional. E é exactamente isso que vou partilhar hoje, esta experiência, esta trajectória que nós, nestes últimos anos, fizemos.

Já fomos referenciados aqui pela Embraer, o que naturalmente muito nos honra. Será um dos projectos que irei comentar, nomeadamente a nossa participação no KC-390, o maior avião da Embraer, e que foi apresentado há dois dias atrás. É um orgulho para o CEiiA e para Portugal a participação neste projecto. O CEiiA foi responsável pelo desenvolvimento de mais de 40% da aeroestrutura da aeronave e isso é um facto único que nos deve orgulhar a todos, às universidades que formaram os nossos quadros, aos técnicos que têm trabalhado e principalmente a Portugal. Pela primeira vez, um avião com esta dimensão voa com engenharia portuguesa.

Irei partilhar um outro projecto de internacionalização que demonstra que as vantagens competitivas portuguesas não estão só nos recursos naturais, estão essencialmente nos recursos humanos, e que os nossos recursos humanos são realmente diferenciadores daquilo que se pode fazer no mundo.

Esse outro projecto que irei partilhar é o nosso projecto em Curitiba. Hoje a rede de mobilidade da cidade de Curitiba é gerida a partir de um sistema criado em Portugal, e que está em expansão no Brasil.

Assim, o que é o CEiiA? Somos um centro de engenharia e inovação, orientado para o desenvolvimento das indústrias da mobilidade e da aeronáutica.

Mobilidade porquê? Porque começámos no automóvel e, quando nos começámos a especializar, tivemos de integrar todos os grandes drivers e as grandes orientações da

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Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo | Eng.º José Rui Felizardo~,

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mobilidade, nomeadamente a integração dos veículos com a mobilidade de uma forma mais geral e com os sistemas de gestão em particular.

A aeronáutica surgiu por diversificação, porque as competências que detínhamos, nomeadamente na parte de cálculo de estruturas associado ao automóvel, puderam ser valorizadas ao nível da indústria aeronáutica.

Essas são as razões pelas quais nós hoje abordamos especialmente estes dois mercados e um terceiro de que irei falar mais adiante.

Como é que foi o nosso percurso entre 2006 e 2014? Começámos com uma equipa de 20 pessoas, iniciando a nossa construção de competências em engenharia e desenvolvimento de produto essencialmente em Itália. Alguns lembrar-se-ão, há uns anos atrás, de um projecto referido como P3 com a Pininfarina. Esse projecto esteve, de certa forma, na génese de todo este desenvolvimento que a organização conseguiu.

Após esta fase de desenvolvimento de competências, iniciámos a sua valorização em produtos de engenharia para mercados globais. Vendemos engenharia de Portugal para o mundo, vendemos engenharia aeronáutica para a AgustaWestland, para a Daher Socata, para a Embraer, e, na mobilidade trabalhamos com referências como a Maclaren, a Ferrari ou a Volkswagen.

Esta foi a forma como evoluímos. Começámos com cerca de 20 pessoas hoje somos 260. Somos o maior empregador de engenheiros aeronáuticos e aeroespaciais em Portugal e esperamos crescer em 2015 para perto das 300 a 340 pessoas.

O que é que fazemos? Forçamos o limite do conhecimento, “engenharizamos” criatividade, este é um dos valores que está no nosso ADN. Aplicámos isto, inicialmente, em três grandes mercados: mobilidade, aeronáutica e um novo mercado de expansão que estamos a abordar, o Oil & Gas.

A mobilidade representa, neste momento, a área de negócio mais emergente do CEiiA porque é a área em que estamos a trabalhar em produtos e serviços próprios, em que vamos da fase de concepção e desenvolvimento do produto até à relação com os operadores e ao cliente final. Na mobilidade temos duas áreas perfeitamente distintas mas complementares: a área de sistemas e a área dos devices.

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QUINTA SESSAO ~

Na parte de sistemas temos o sistema de gestão, centrado na Maia, a partir do qual, neste momento, gerimos várias redes de mobilidade no Brasil (a rede de Curitiba é um desses exemplos, mas também Brasília) e em cidades na Europa. Esperamos, em 2016, ter no nosso sistema de mobilidade cerca de 10 milhões de transacções. Porquê? Porque tanto integramos os devices desenvolvidos por nós como podemos desenvolver engenharia e serviços em cima de produtos de terceiros, como acontece com os produtos da Renault. Integramos ainda os sistemas de energia e de transportes na cidade. Hoje, os veículos da Renault do Brasil, especialmente os eléctricos, estão conectados com o nosso sistema de gestão de mobilidade, o que permite, nomeadamente, o cálculo de emissões em tempo real. O nosso sistema mobi.me é a única aplicação no mundo que neste momento faz cálculo de emissões de CO2 em tempo real, daí termos sido distinguidos com a possibilidade de fazer uma comunicação na Conferência do Clima das Nações Unidas que decorreu em Lima, no Peru, no final de 2014. E, ao termos os veículos todos conectados com o nosso sistema, criámos uma nova lógica de serviços na área da mobilidade, nomeadamente a possibilidade de um veículo poder ser pago na fatura de electricidade, ou a lógica de os seguros poderem ser pagos em função do uso. Portanto, já não estamos a falar de PowerPoint, estamos a falar de realidade, com integração de todos os sistemas de transporte, de pensar a mobilidade a partir de casa. Isto é aquilo que hoje o nosso sistema permite.

Quando falamos de devices estamos a falar de veículos de quatro e de duas rodas. Sim, sonhámos, há uns anos, desenvolver um veículo em Portugal que podia ser um veículo inteligente. Era um sonho, fizemo-lo, desenvolvemo-lo e estamos na fase de o industrializar no Brasil. Enfrentámos muitas dificuldades, naturalmente, todos estes processos as têm, mas o BE, que é o nome do veículo, foi desenvolvido com engenharia portuguesa, design português e, neste momento, está na fase dos primeiros estudos de industrialização para o mercado brasileiro e o Mercosul.

Lançámos devices de duas rodas, estamos a criar a primeira rede de objectos de mobilidade física. De que é que estamos a falar? De uma rede social de objectos que interagem entre eles, interagem com o utilizador e com o próprio sistema de gestão de mobilidade. Estamos a estudar este projecto na Califórnia por várias razões, não só pela lógica de gadget e gaming

que isto vai permitir, mas também porque há um acesso a um conjunto de tecnologias que nós vamos usar, nomeadamente redes sociais, que implicam que estejamos próximos dos nossos parceiros envolvidos. Fizemos a apresentação oficial deste conceito em Barcelona, em Novembro.

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Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo | Eng.º José Rui Felizardo~,

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Na área da aeronáutica, dividimos o nosso trabalho em asa fixa, asa rotativa e UAVs.

Na asa fixa, o grande emblema é a nossa participação no programa KC-390 da Embraer. A oportunidade e a confiança que a Embraer nos deu, ao CEiiA e a Portugal, de poder participar num projecto com estas características, permite-nos hoje estar capacitados para participar em qualquer projecto deste tipo. Dentro desta aeronave nós fomos responsáveis, como disse, por mais de 40% de desenvolvimento da aeroestrutura. É único. Nós internamente, às vezes brincamos dizendo que, depois dos grandes projectos de engenharia de barragens ou da construção civil, este é o maior projecto de engenharia em que Portugal participou.

Na asa rotativa – helicópteros – destacam-se os projectos com a AgustaWestland. Desenvolvemos trabalho para vários helicópteros, sempre na óptica de valorizarmos competências a vendermos serviços de engenharia.

Por fim, temos os UAVs. Naquele ciclo que mostrei inicialmente, falámos de desenvolvimento de competências, vendas de serviços de engenharia associados às competências adquiridas e entrada num novo ciclo que é o desenvolvimento de produtos próprios. Por produtos próprios referimo-nos a produtos desenvolvidos no CEiiA, mas não quer dizer que sejam produzidos no CEiiA, porque não nos concentramos na produção e temos parceiros de produção. Na aeronáutica o nosso produto mais recente é o UAS-30, o primeiro UAV pensado e desenvolvido para uma missão específica, e que tem que ver com a inspecção das linhas eléctricas de alta tensão. Está na fase de testes, fez os primeiros voos, correu tudo bastante bem e esperamos que em breve possamos ter este produto em operação não só no mercado nacional mas também no mercado brasileiro onde as linhas eléctricas de alta tensão são muito extensas.

Em relação ao nosso trabalho no Oil & Gas, estamos a cerca de um ano e meio de ter os primeiros trabalhos de engenharia nesta área (geralmente fazemos as previsões a mais longo prazo e depois acabamos por conseguir encurtar), nomeadamente no que diz respeito ao cálculo de estruturas essencialmente ao nível de sub sea e da exploração petrolífera. E porquê? Estamos na mesma trajectória que definimos inicialmente, ou seja, tudo o que tem que ver com o cálculo de estruturas associadas a produtos complexos, nomeadamente ligas entre metálicos e compósitos e que tenham aplicações em estruturas muito complexas como são as estruturas ao nível do sub sea. Não saliento aqui nenhum dos projectos porque são ainda muito embrionários mas, como já temos uma equipa de trabalho e investigação, não quis deixar de o mencionar e, para além do que referi para as estruturas do sub sea

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QUINTA SESSAO ~

estamos a falar também dos digital oil fields que é uma das áreas em que temos procurado reforçar.

Até agora, este caminho foi feito sempre em colaboração com universidades no âmbito de programas que nós dinamizamos, como é o caso do programa A+, que envolve várias universidades e empresas, nomeadamente o Instituto Superior Técnico, a FEUP, a Universidade do Minho, ou universidades internacionais. É um programa determinante para o CEiiA.

Chegar aqui foi uma missão possível mas, para mantermos esta posição e evoluirmos na nossa especialização, temos de fazer um grande reforço do ponto de vista de investigação e desenvolvimento, na qual estes programas bem como a ligação às universidades têm um papel determinante.

Aquilo que nós vamos ter, nomeadamente no que se refere ao Oil and Gas, daqui a cerca de 4 anos, tem de começar a ser pensado hoje. Temos de introduzir as teses de doutoramento ou as áreas específicas do ponto de vista de materiais que nos permitam futuramente ter os equipamentos, os drivers para podermos estar neste tipo de mercados.

Portanto, quando vi o programa do evento e percebi que o CEiiA estava colocado na área das universidades, apesar de não sermos uma universidade, achei que seria exactamente esse o espaço onde eu colocaria o CEiiA, porque tudo isto que o CEiiA tem feito e a forma como se está a conseguir internacionalizar assenta numa questão muito clara – a qualidade dos nossos recursos humanos.

Nós hoje temos mais de 200 engenheiros e temos talvez das equipas de maior excelência. Mas há 4 anos atrás o CEiiA tinha 20 engenheiros na indústria aeronáutica. Montar um programa com as características do KC-390 teve um nível de exigência que vai para além daquilo que eram as competências possíveis de existir numa organização como a nossa. Claro que tivemos de criar uma equipa multinacional, nós hoje temos 7 nacionalidades dentro do CEiiA e foi preciso ir buscar experiência internacional, reter conhecimento em Portugal. Contudo, para que isto não seja apenas uma passagem, é preciso que a retenção deste conhecimento possa estar muito associado às relações que nós conseguimos estabelecer, nomeadamente com as universidades portuguesas que estão envolvidas connosco.

Como nos internacionalizamos? Com transparência, com responsabilidade e respeito pelas pessoas e pelas diferenças.

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Com transparência porquê? Porque quando se aborda um programa como este com a Embraer, a confiança que se tem de passar para o lado de lá não é só uma confiança técnica, uma confiança do empenho. Tem de existir uma confiança que permita garantir que mesmo que se saiba que não existem os recursos todos no momento 0, nós vamos conseguir cumprir o acordado. Hoje, podemos dizer “nós conseguimos”. E a transparência que nós tivemos para mostrar as nossas fragilidades permitiu à Embraer ajudar-nos neste processo. Aquilo que fizemos não é um trabalho isolado de tudo o resto, resultou da colaboração que foi possível estabelecer directamente com a Embraer, com o processo de aprendizagem com a Embraer, com os engenheiros da Embraer que vieram trabalhar connosco. Este trabalho permitiu reter conhecimento em Portugal que estamos a passar para outras partes.

Portanto, independentemente de sermos pequeninos, é com grande orgulho, como português e como engenheiro, que olhamos para o KC-390 e vemos a bandeira de Portugal exposta pelo seu trabalho e pela engenharia que foi feita.

Acho que Portugal está de parabéns, a nossa engenharia está de parabéns, demos um passo muito significativo na nossa afirmação na indústria aeronáutica em Portugal.

Penso que o que temos hoje no Brasil, para além do projecto de Curitiba, do projecto de industrialização do BE e da rede social de objectos de mobilidade que estamos a desenvolver com Itaipu mas para a Califórnia, indica que este é um percurso de internacionalização que está numa fase inicial mas que está no bom caminho.

Não queria deixar de referenciar o apoio fundamental que tivemos no Brasil por parte da Embaixada Brasileira e da AICEP. A confiança que foi possível transmitir aos diferentes players com que nós interagimos no Brasil deveu-se em parte a este apoio.

Eu vou passar um vídeo para terem a percepção de como é que hoje o Brasil nos vê.

(vídeo)

Era isto que queria partilhar hoje e mostrar que, com determinação, com audácia, com competência, é possível afirmarmos a nossa engenharia no mundo. Espero que mais bandeiras de Portugal possam estar nos grandes projectos de engenharia.

Muito obrigado a todos.

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QUINTA SESSAO ~

Moderador - Dr. Manuel Cavaleiro Brandão

Sr. Eng.º muito obrigado por este magnífico depoimento e testemunho. Conforta a tal ideia de que as universidades vão contribuindo, desde logo, com a relevantíssima requalificação dos nossos recursos humanos.

Eu dava agora a palavra ao Sr. Prof. Cláudio Sunkel, que nasceu no Chile em 58, que se doutorou em Sussex, na Inglaterra. É professor catedrático de biologia molecular no instituto de ciências biomédicas de Abel Salazar e é, desde há alguns anos, director do instituto de biologia molecular e celular da Universidade do Porto, dirigindo o laboratório de genética molecular desse mesmo instituto. Tem-se dedicado à investigação com grandes resultados, coordena uma instituição de natureza internacional, colabora com umas quantas, mas eu, pelas razões que conhecem e com a aceitação do Prof. Sunkel, estou a tentar ser mais breve nestas apresentações.

Tem a palavra.

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QUINTA SESSAO ~

IBMC – Instituto de Biologia Molecular Dr. Cláudio Sunkel

Em primeiro lugar, agradecer ao Prof. Valente de Oliveira pelo convite, à AICEP, a Serralves e, começar por dizer que no meio da sessão da manhã eu refiz toda a minha apresentação porque percebi que o contexto era um pouco diferente. Ou seja, eu retiro 3 conceitos fundamentais das apresentações anteriores que penso que nesta última ficaram muito claros. A 1ª – recursos humanos, a 2ª – criatividade e a 3ª – inovação. Estes três aspetos tem como base o desenvolvimento do sistema científico nacional que tem acontecido de forma acelerada durante os últimos 25 anos. Portanto, eu queria fazer 3 coisas. A primeira é falar um pouco sobre o que é o sistema científico nacional em Portugal, qual a sua composição e qual é o seu percurso histórico. Falar um pouco sobre um caso específico que é o instituto que eu dirijo e, depois, falar 3 minutos e mostrar um filme que, neste caso, são 90 segundos, sobre o futuro do que nós queremos fazer.

O sistema científico em Portugal

Quando falamos da história recente do sistema científico nacional, podemos resumir a sua produtividade (quadro n.1), que se desenvolveu com esta dimensão e com esta escala exponencial sobretudo a partir dos anos 80. Eu cheguei a Portugal em 1987, aproveitei o comboio da integração de Portugal na Comunidade Europeia. Portugal explodiu em termos de produção científica a partir da década de 90. Esta produção científica tem tido um efeito imenso na sociedade portuguesa, e vou discordar de algumas coisas que têm sido ditas não aqui mas transmitidas pela comunicação social.

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O impacto do sistema científico nacional se mede pelas citações, ou seja, se as pessoas que também trabalham na nossa área citam os trabalhos que nos publicamos. E, este, é o percurso das citações do sistema científico nacional Português que acompanha perfeitamente o seu desenvolvimento e, portanto, tem um impacto muito significativo (quadro n.2).

Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo | Dr. Cláudio Sunkel ~,

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Muito resumidamente, o sistema científico nacional assenta nas Universidades onde esta a maior parte dos grupos de investigação, mais tarde, a partir de 2000 foram criados os laboratórios associados que alguns de vocês conhecem. As avaliações regulares do Sistema Científico e Tecnológico Nacional começaram em 96, a segunda avaliação decorreu em 99, e mais tarde em 2003. Eu próprio coordenei a avaliação que decorreu em 2007 na qual não houve nenhum avaliador português, foram todos estrangeiros ou portugueses a trabalhar no estrangeiro. Foram 25 painéis, foram avaliadas 382 unidades e os resultados são amplamente conhecidos.

O que é que permitiu esse desenvolvimento espetacular da ciência em Portugal? Eu acho que a base é sempre financeira. Foi possível porque, de facto, o investimento em ciência e tecnologia cresceu significativamente e acompanhou o desenvolvimento do sistema como um todo.

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Onde é que está Portugal em termos do seu investimento em Ciência e Tecnologia quando comparado com os parceiros da EU? Está no meio, onde se localiza o seu investimento na ciência e tecnologia (quadro n.4), está abaixo da média comunitária, está muito abaixo da média prevista para o Portugal 20/20 que foi traçada na cimeira de Lisboa.

O que é que tem acontecido com o investimento em Ciência e Tecnologia nos últimos 20 anos? Este investimento criou recursos humanos dos que hoje se falou imenso. Estos são os recursos humanos que estão na base da internacionalização, na minha perspectiva, da criatividade, da inovação e, este envolvimento de uma

QUINTA SESSAO ~

parte significativa da população portuguesa na área da investigação e desenvolvimento que se envolveu neste processo (quadro n.5).

As tendências dos últimos 4 anos são complexas, são difíceis, conhecemos a crise mas, o problema é que neste momento o financiamento dado à investigação em 2012 é menor do que aquele que havia em 2008 (quadro n.3).

Quando agora se fala na criatividade, nos recursos humanos e na inovação como motor e futuro da economia em Portugal, temos de compreender que a possibilidade de Portugal participar na criação de um avião, na modernização do calçado, dos têxteis, na criação de tecnologia na área das energias renováveis e o resultado de um trabalho que demorou muito tempo a ser desenvolvido. O que está a acontecer atualmente, nomeadamente na redução do financiamento para a ciência e a tecnologia é perigoso porque isto terá repercussões relativamente significativas nos próximos anos o que vai ser, provavelmente, difícil de recuperar.

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Será que atingimos um número razoável de pessoa envolvidas no sistema de Ciência Tecnologia em Portugal? Penso que estamos perto. De facto, se olharmos para os números e aqui calculados a mil activos da população, Portugal atualmente tem 9.2 enquanto que na Alemanha são 12.8 portanto são duas realidades bastante semelhantes. Podemos dizer que Portugal atingiu em termos europeus um número de investigadores relevante. O problema está, que de facto se separarmos esses investigadores por diferentes áreas de actividade entre as empresas, o estado, o ensino superior e as entidades privadas sem fins lucrativos nós só temos 23% dos nossos doutorados e investigadores nas indústrias, nos Estados Unidos são mais de 50%, e na Alemanha são 61%. De facto é necessário agora fazer com que pelo menos uma parte dos recursos humanos que foram desenvolvidos nos últimos anos, sejam absorvidas no tecido empresarial. È absolutamente urgente que isso aconteça e, aqui, o apelo é deixo, as empresas e que absorvam os recursos humanos qualificados e que vai ser importante reter para que a Economia Portuguesa se modernize e desenvolva. Alguém falou, anteriormente, em reter os recursos humanos em Portugal e isso é fundamental.

Podemos também perguntar se o número de licenciados e doutorados e suficiente? São mais ou menos… o número total de doutorados que estão a ser produzidos em Portugal

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anualmente é de 1200 num total de cerca de 24 mil. Mas, se nós olharmos um pouco para o perfil educacional português, olhamos para a percentagem de adultos entre 25 e 64 anos de idade com educação secundária, Portugal ainda continua atrás de muitos parceiros europeus. Portugal tem 40% com educação secundária concluída quando Alemanha tem 86%. Se olharmos para o número de doutorados por 1000 habitantes continuamos a ter menos de metade ou quase metade do número de doutorados em Portugal que há na Alemanha, 17% comparado com 32%. Portanto o número que se tem de atingir para estar perto da

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média europeia esta longe e isso ainda não foi atingido.

Então qual e a performance de Portugal nas quantificações de produtividade científica? E aqui tem surgido também na comunicação social, a ideia de que Portugal não tem uma performance muito significativa em termos de investigação e desenvolvimento. Portugal tem a performance que o seu investimento possibilita (quadro n.6).

Se Portugal faz um investimento que fica no meio da média da Comunidade Europeia o seu retorno será aquele que fica no meio da Comunidade Europeia. Contudo, se olhamos em termos totais, Portugal produz só uma pequena fracção do total da produção científica mundial (0.73%), mais baixo que a Espanha (3.1%), significativamente mais baixo que a Alemanha (5.9%) e, obviamente que os Estados Unidos (22.1%). Mas, como é que nós podemos medir o impacto do se produz em Portugal e determinar se vale a pena? Uma forma de o fazer é ver a percentagem de documentos publicados por investigadores portugueses que são reconhecidos lá fora e, de facto, são muitos (quadro n.7).

QUINTA SESSAO ~

Se vamos comparar a percentagem de documentos citados em Portugal, Alemanha, Espanha e Estados Unidos vemos que esta percentagem e praticamente idêntica para os quatro países. O que é que isso quer dizer? Que afinal o que se produz em Portugal é citado na sua maioria e numa perspectiva internacional muito semelhante ao que acontece em outros países desenvolvidos.

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Um ponto importante em termos de performance, se vamos olhar para coisas mais ligadas à inovação, Portugal continua a ficar a baixo da média europeia e portanto não podemos pensar que podemos atingir lugares ainda muito superiores se não se faz um investimento correspondente para atingir patamares mais elevados neste domínio. O que há é muitas empresas de base universitária que foram criadas, acabamos de ver uma delas que nos dá uma ideia muito clara do que está a acontecer mas, de facto, há muitos desafios e problemas que temos de ultrapassar em termos de investigação em Portugal. O primeiro ponto é definir e um consenso alargado para esta área. O país teve um consenso para a ciência e tecnologia que durou 20 anos. Se há uma área em Portugal onde se fez um investimento por consenso, mesmo quando mudaram as cores políticas foi a ciência e o resultado está a vista de todos. Portanto, é preciso pensar se nós queremos voltar a ter um consenso e voltar a ter um crescimento que continue a sustentar esta performance. Sobre tudo è preciso estabilizar as instituições. Já que elas crescem uma base muito frágil entre outras coisas pontuais que é preciso definir.

Qual é um dos desafios fundamentais que nós temos pela frente e o que e nós não fizemos? Penso que aqui os investigadores têm uma quota-parte de culpa, porque não fizeram a tradução do seu conhecimento em tecnologia e inovação ao ritmo que se devia ter sido feito. Portanto, é necessário que a interação entre a indústria e o tecido científico seja mais fluida. É necessário que exista uma transferência da tecnologia de uma forma mais ágil e dinâmica. É preciso que as empresas e o tecido industrial português acredite na criatividade dos portugueses. Como viram alguns acreditaram e tiveram imenso sucesso. É preciso que acreditem e que procurem as soluções para os problemas que têm com os investigadores portugueses porque de certeza que vão encontrar muitas soluções. E, finalmente, é necessário profissionalizar a ciência portuguesa porque 98% dos investigadores portugueses são docentes e têm de dar aulas. Eu tenho 9 horas de aulas por semana e isso torna o processo difícil de gerir, difícil de manter e torna complexo o seu desenvolvimento. Portanto, eu deixava-vos com uma ideia global, na minha perspectiva Portugal teve um desenvolvimento fantástico em termos de ciência e tecnologia e ela está a traduzir rapidamente em criatividade e inovação. E preciso agora continuar a investir e dar tempo para que os resultados da investigação científica se traduzam em valor para a sociedade.

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O Instituto de Biologia Molecular e Celular

O que é um centro de investigação em Portugal? O IBMC e uma associação privada sem fins lucrativos. A nossa missão é fazer investigação e, derivada da investigação temos de treinar os investigadores a nível pós-graduado, temos de fazer transferência de tecnologia e fazer desenvolvimento social e contacto com o público, as escolas e a sociedade em geral.

A minha visão para o chamado “contrato social da ciência” e que um instituto de investigação devia fazer ciência ao mais alto nível, fazer treino de pós-graduação, se envolver em programas de ciência e sociedade, e promover a transferecia de tecnologia o que pode tomar vária formas como os serviços, a formação de empresas ou o trabalho com empresas (quadro n.8). Não sei se será uma visão mais anglo-saxónica do meu período de 14 anos que estive na Inglaterra mas, esta é a minha visão e é o que estamos a tentar fazer no IBMC.

QUINTA SESSAO ~

O nosso instituto tem 529 colaboradores, quase 200 investigadores que vêm de 22 países diferentes e se vamos ver outros centros de investigação em Portugal acontece o mesmo. A ciência portuguesa internacionalizou-se completamente e, Portugal foi um país muito atrativo para trazer investigadores.

A que é que este centro se dedica? A estudar 3 áreas especificas: áreas de infecção e

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imunidade (não trabalhamos com ébola mas já trabalhamos com tuberculose), neurociências e aqui essencialmente as doenças neuro degenerativas e a área de biologia molecular e celular que é uma ciência fundamental. Mas, temos uma área de aplicação prática. Estamos a tentar desenvolver não só o diagnóstico mas terapêutica para varias doenças.

Uma pessoa muito conhecida em Portugal que é a Prof. Maria João Saraiva descobriu a primeira mutação que dá origem à doença dos pezinhos, paramiloidose, uma proteína que quando agrega e forma fibras, destrói os terminais nervosos, com efeitos devastadores nos doentes o que eventualmente leva a morte. A Prof. Maria João esta a trabalhar com uma empresa italiana a lançar ensaios clínicos para novas drogas que poderão eventualmente ser utilizadas numa futura terapêutica para os doentes que tem estas mutações.

Nas áreas muito mais fundamentais, posso dar como exemplo o trabalho do Prof. João Morais Cabral, professor assistente na Universidade de Yale que em 2006 decidiu voltar para Portugal. Dedica-se a estudar estas coisas estranhas como proteínas localizadas nas membranas das bactérias que regulam a passagem de nutrientes. Na imagem vêm um poro de uma membrana que deixa passar iões e, portanto, esta molécula regula o sódio que comemos e se ele sai ou fica nas nossas células. Portanto é um problema fundamental.

Quais são as outras coisas que estes centros fazem? São plataformas tecnológicas de muitos tipos….de análise celular, de imagem, de experimentação animal, e o que fazemos são projectos de investigação. Temos mais de 120 projectos em curso, temos alguns “Cristianos Ronaldos”, temos quatro, e isto é atestado a nível europeu porque ganharam esta distinção de European Research Council. Três portugueses e um suíço. Portanto, há “cristianos Ronaldos” mas é muito difícil fazê-los, é o resultado de 20 anos de trabalho. O Hélder Maiato fez o doutoramento comigo em 2003 e só teve este prémio em 2009, ou seja, teve um percurso muito longo antes de chegar a esse produto final.

Este é um perfil do nosso financiamento (quadro n.9), e como podem ver os dados do financiamento mostra claramente como e que a crise nos atingiu. Estávamos preparados porque tínhamos internacionalizado a nossa investigação e as nossa fontes de financiamento, portanto, foi possível assumir este decréscimo no financiamento nacional que tem vindo a decrescer constantemente desde 2008. Contudo o IBMC continua a aumentar o seu financiamento, embora tivemos uma pequena queda em 2012 e 2013 que foi onde se ressentiu mais. Tenho de confessar que 2015 é uma incógnita total neste momento.

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Fazemos também muito trabalho com a sociedade em termos do que são as tendências da ciência e, temos uma clínica de aconselhamento genético, temos doentes. Desenhamos os primeiros ensaios de diagnóstico que permitem fazer diagnóstico da paramiloidose, entre outras.

Algum financiamento para o IBMC vem destas atividades, é uma pena que os hospitais não nos paguem a tempo e horas porque esse é um problema complexo. Os hospitais devem vários mil milhões de euros, nós somos uma pequena parte dessa dívida. Também trabalhamos com muitas empresas, contudo são praticamente todas de fora de Portugal excepto três. A ideia e que as empresas possam vir ter connosco, pedir serviços e colaborar com os nossos investigadores em projetos de desenvolvimento e inovação.

O Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (I3S)

Qual é o futuro? E aqui um futuro muito específico do Porto porque este futuro tem que ver com o que nós queremos fazer, e isso passa pela criação de uma grande instituição de investigação e inovação em saúde que se chama I3S. Provavelmente já ouviram falar muitas vezes do I3S e agora irão ficar com uma ideia mais clara.

O financiamento da construção das novas instalações vem, basicamente, da CCDR-N, programa ON.2 e da Universidade do Porto. Isto e o resultado de uma trabalho completamente diferente do que tem acontecido muitas vezes em Portugal. Em vez de criarmos coisas pequeninas que cada um pudesse gerir e ficar a ser o diretor da sua instituição, os três

QUINTA SESSAO ~

Produzimos muitos doutorados, os nossos doutorados estão em muitas Universidade e Institutos no estrangeiro, desde a universidade de Amesterdão, aos Estados Unidos e, portanto, o “produto” português doutorado é apetecível. Nós conseguimos colocar um doutorado português em qualquer universidade do mundo, desde o MIT a Stanford porque acreditam que aquilo que nós estamos a fazer o estamos a fazer bem.

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institutos fundadores do projeto, INEB, IBMC e IPATIMUP decidimos agora que vamos fundir estas 3 instituições e criar uma grande instituição que vai ter mais de 300 investigadores. Envolve também o hospital São João, o Centro Hospitalar do Porto, o IPO, muitas faculdades da universidade do Porto. A ideia é criar massa crítica com a qual podemos competir e trabalhar a uma escala de dimensão internacional. O prédio está numa fase avançada da construção, são 14 mil metros quadrados, em frente à faculdade de economia, vai ter 350 investigadores, uma parte significativa deles são docentes universitários a outra são investigadores contratados pelos 3 institutos. No I3S queremos trazer aqui a universidade, a clínica, a indústria e a sociedade e encontrar todos as interfaces a partir das quais se pode criar valor, se pode inovar com criatividade envolvendo todos investigadores. As áreas temáticas são muito específicas. Obviamente temos no IPATIMUP a investigação do cancro, o ibmc e o ineb colaboram nas áreas de infeção e imunidade assim como em medicina regenerativa e na áreasdas doenças neurológicas. No cancro queremos fazer investigação fundamental, diagnóstico e terapêutica. Nas doenças infecciosas e medicina regenerativa queremos estudar os mecanismos infeciosos mas também a forma como e que o organismo reage, por exemplo, quando nós recebemos um implante de titânio no colo do fémur e, por algum motivo, aquilo cria uma infecção e uma reação imune e é preciso resolver esse problema. Portanto, bioengenharia juntou-se a nós através do INEB e, portanto, o que temos a fazer é compreender melhor os patogénicos mas levar este conhecimento para as áreas de medicina regenerativa. Finalmente, na área de neurobiologia queremos fazer diagnóstico, tratamento e obviamente reparação do tecido neuronal, nomeadamente em situações traumáticas assim como em doenças neurodegenerativas.

O nosso instituto I3S já foi avaliado, passou para a segunda fase da avaliação da FCT, tivemos uma visita que foi muito proveitosa ao contrário do que muita gente se queixa, portanto não me quero queixar mas, isto é o que nós gostaríamos para o futuro.

PS: O resultado da avaliações da Unidade de Investigação I3S submetida a Fundação para Ciência e Tecnologia foi conhecido no dia 22 de Dezembro tendo o I3S sido considerado como uma Unidade “Excepcional” e o projeto obtido financiamento que lhe permitira arrancar como previsto em 2015.

Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo | Dr. Cláudio Sunkel ~,

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Moderador - Dr. Manuel Cavaleiro Brandão

Penso que não tenho o direito de captar mais do vosso tempo e da vossa paciência, embora tivesse vontade de fazer um ou outro comentário. Julgo que o Prof. Cláudio Funel fez a demonstração da razoabilidade de alguns comentários, mesmo a nível internacional, nomeadamente do World and Economic Fórum a respeito do impacto de um bom relacionamento entre a industria ou a actividade produtiva e as universidades. A solução do Prof. Jorge Gonçalves para essa vontade de organizar é também uma indicação positiva.

QUINTA SESSAO ~

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Minhas senhoras e meus senhores, a todos os meus cumprimentos.

Um cumprimento especial às direções das fundações AEP e Serralves a quem agradeço o convite para participar nesta sessão.

Aceitei o convite com ingénuo entusiasmo pois só mais tarde me apercebi da dificuldade e do desafio que é falar sobre o papel das universidades na projeção de Portugal no mundo, com independência e de uma forma que seja minimamente original e assertiva e que complemente as mensagens já aqui deixadas pelos colegas de painel.

Não é uma tarefa fácil mas é uma tarefa necessária, porque a defesa da necessidade de instituições de ensino superior e de investigação fortes em Portugal e que contribuam para o progresso e para a projeção de Portugal no Mundo, não pode ser uma causa corporativa, como se o que estivesse em causa fosse apenas a defesa dos interesses dos académicos e não da importância destas instituições para a própria sociedade.

Nos cerca de 20 minutos que me disponibilizaram, procurarei trazer alguns exemplos que ilustram o papel das universidades na projeção das comunidades onde se inserem. Irei procurar ilustrar a minha apresentação com exemplos de hoje e do passado como forma de trazer diversas perspetivas e criar um distanciamento critico de um sistema que eu, enquanto académico, não posso deixar de ter.

Procurei seguir do modo mais fiel possível o tema “ As Universidades e a projeção de Portugal no mundo”, responder ao desafio que me foi colocado e apresentar argumentos demonstradores da importância das universidades como instrumentos de progresso e instituições promotoras da transformação quando as sociedades tiveram que enfrentar momentos críticos ou foram confrontadas com impasses civilizacionais.

As universidades são investimentos caros. Por isso, é bom que a sociedade conheça o retorno desse investimento! É por isso pertinente que se analise se as universidades estão a servir a sociedade Portuguesa e a ajudar a projetar Portugal no mundo com eficácia e eficiência!

Sendo juiz em causa própria, a resposta terá que ser ainda mais sólida e objetiva, para ser credível, pelo que começarei por recorrer a fontes independentes que nos comparam com o desempenho de universidades de outros países.

QUINTA SESSAO ~

Universidade do Porto Prof. Jorge Gonçalves

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No presente, Portugal tem, além da Universidade do Porto, outras universidades nos rankings, e entre as 500 melhores do mundo. Apesar de todas as vicissitudes e incertezas de financiamento que o ensino superior tem sofrido, parece-nos que se trata de uma classificação que prestigia Portugal.

Ter universidades nos rankings internacionais é prestigiante e credibilizador para qualquer país por ser visto como um reflexo da qualidade da sociedade em geral. Não é por acaso que muitos países investem tanto para ter universidades em posições de destaque nesses rankings.

É certo que as universidades portuguesas estão longe das posições de topo. Porém, se compararmos os orçamentos das universidades de topo, percebe-se que estamos já a falar de realidades completamente diferentes da realidade das universidades Portuguesas. E se tivermos em atenção que as 500 universidades de top, onde as universidades portuguesas se colocam, representam apenas 2,5% das instituições do Ensino Superior e de Investigação do mundo, temos uma dimensão mais real do significado da importância das universidades portuguesas nesses rankings. Pela forma como nos medem, as universidades portuguesas dão uma boa imagem de Portugal e são um fator credibilizador para a afirmação cientifica, tecnológica, cultural e económica de Portugal no mundo.

Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo | Prof. Jorge Gonçalves ~,

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Em 2006, tive o gosto de integrar a equipa que dirigiu a Universidade do Porto nos últimos oito anos liderada pelo Professor Marques dos Santos. Na sua candidatura a Reitor definiu como prioridade colocar a Universidade do Porto entre as 100 melhores universidades europeias no ano do seu centenário (em 2011).

Este desafio mudou a forma como os rankings eram vistos em Portugal pois, até então, nenhuma universidade portuguesa tinha colocado uma fasquia tão objetiva e comparável, no seu desenvolvimento. A organização da informação, de modo a que a Universidade se pudesse comparar, permitiu fazer um diagnóstico das nossas forças e fraquezas e monitorizar a nossa evolução. No ano em que celebrou o seu primeiro centenário, em 2011, a Universidade do Porto estava já na meta que definiu, ou muito próxima, dependendo dos rankings.

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Hoje, esses eventos são mais do que meros eventos académicos, sendo frequente que sejam também formas de transferência desse conhecimento para a sociedade Portuguesa, pela presença de de todo o tipo de participantes além dos académicos.

Neste caso em particular, estes cientistas vieram discutir os avanços nas tecnologias de produção de vegetais em estufas e em fábricas vegetais. Vieram do Japão, de Israel, da Holanda e de Espanha. As suas apresentações foram ouvidas por académicos que trabalham na área e que, por essa partilha, poderão ensinar e investigar melhor. Mas estiveram também presentes empresas que estão a desenvolver tecnologia portuguesa e produtores de hortícolas e flores que estão a procurar melhorar a rentabilidade das suas explorações.

Se Portugal não tivesse universidades credíveis e um sistema científico e tecnológico de qualidade, não teríamos a capacidade para atrair a Portugal e à sociedade portuguesa, muitos dos melhores especialistas mundiais em qualquer área de conhecimento.

QUINTA SESSAO ~

Na equipa reitoral que integrei era frequente dizer-se que de pouco valia estarmos ao nível das melhores se na envolvente à universidade não havia um desenvolvimento comparável com as melhores. Por isso, foi sempre nossa preocupação colocar a universidade à disposição e ao serviço do desenvolvimento da nossa sociedade.

E procuramos fazê-lo de diversas formas. A mais óbvia é através da qualidade dos recursos humanos que formamos e pelo impacto de tais quadros no desenvolvimento das empresas e da nossa sociedade, o que já foi aqui reconhecido por vários oradores! Mas procuramos fazê-lo por muitas outras formas, algumas delas totalmente despercebidas.

Esta é uma fotografia vulgar de um grupo que se confundiria com qualquer grupo de turistas, numa cidade do norte do Portugal. Porém, o turismo que fazem é acessório do motivo principal da sua presença em Portugal. São oradores que vieram participar numa conferência, numa entre as centenas de eventos análogos que todos os anos as universidades portuguesas organizam, mostrando Portugal e o seu potencial cultural, científico e tecnológico no centro do debate do conhecimento contemporâneo de vanguarda.

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Isto tem um valor intrínseco extraordinário. É uma forma discreta que dificilmente se reconhece. Mas é fundamental para integrar Portugal na sociedade global de conhecimento e para que a nossa sociedade, incluindo as nossas empresas, possam acompanhar a evolução das fronteiras do conhecimento e poderem aperceber-se de novas oportunidades e ameaças no setor onde operam. E tal nunca se poderá fazer sem a mediação das universidades!

Mas as universidades têm-se envolvido em iniciativas mais diretamente ligadas com a valorização económica e com promoção do desenvolvimento social.

Permitam-me que fale de um projeto em que trabalhei nos últimos oito anos: o UPTEC, sigla pela qual é conhecido o parque de ciência e tecnologia da Universidade do Porto. É um bom exemplo para ilustrar a forma empenhada como as universidades participam na construção de uma sociedade mais apoiada no conhecimento.

O projeto UPTEC iniciou-se em 2006. O objetivo foi criar junto das faculdades e dos centros de investigação, condições para que as ideias de novos negócios pudessem ter hipóteses de se concretizarem.

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Como isso obrigava à existência de instalações próprias, fomos procurando ou construindo, nos diferentes campus, locais para incubar novas empresas.

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As instalações usadas para o início do projeto eram bem mais modestas que as de hoje que muitos de vós já tiveram a oportunidade de visitar

Este mapa mostra os locais onde temos vindo a instalar polos do UPTEC. Estamos instalados nos campi da Asprela, do Campo Alegre e do centro da cidade. Temos também um polo no Porto de Leixões, onde está já em funcionamento mais um campus da Universidade do Porto. Espera-se também que se possa vir a criar mais um, ligado à agricultura, em Vairão.

Os números de 2013 mostram que o UPTEC tinha já acolhido cerca de 160 projetos empresariais baseados no conhecimento (knowledge base companies).

Estes projetos empresariais estão em fases diferentes de desenvolvimento. Há casos em que o plano de negócios ainda está a maturar, em que os promotores estão a definir quem são os clientes, qual o posicionamento da empresa no mercado, a avaliar a sua sustentabilidade, quem são os parceiros tecnológicos mais importantes para poder melhorar e viabilizar o produto. Na altura tínhamos 52 projetos neste nível de maturação. Mas também tínhamos empresas (18) que cresceram de tal forma que tiveram de encontrar instalações próprias fora do UPTEC.

Para além destas novas empresas, o parque funciona também como um local de acolhimento para centros de inovação de empresas já consolidadas no mercado. A presença destes centros de inovação no parque, junto das empresas em incubação e junto das unidades de investigação da Universidade, foi visto como uma contribuição nuclear para a criação de um ecossistema de inovação dentro dos campi e como uma interface para aproximar a universidade das empresas.

Esta interface com a sociedade é um exemplo diferente da forma como a universidade pode participar na criação de uma economia de conhecimento e na mudança do paradigma de desenvolvimento de Portugal.

Mas poderá até ser visto como excessivo face ao entendimento mais comum sobre o que deverá ser a intervenção das universidades. Porém, é nosso entendimento que, sem a intervenção das universidades, muito dificilmente empresas deste género teriam condições para surgir e crescer tal é a diversidade de áreas de negócio em que estas empresas estão a atuar.

São áreas tão diversas que não há outro ecossistema que crie o “conforto” e o incentivo aos

QUINTA SESSAO ~

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seus promotores para estes darem o primeiro passo nas suas iniciativas empresariais. É a proximidade à Universidade, aos seus laboratórios, docentes, investigadores e estudantes que acaba por criar a rede de conforto que qualquer ecossistema empreendedor tão diverso acaba por necessitar. É a proximidade à Universidade e às suas redes de parcerias internacionais que lhes permite o contacto com parceiros e o conhecimento de mercados aos quais nunca teriam acesso se atuassem isoladamente.Na falta dessas condições nucleares, as universidades acabam por ser instituições muito bem posicionadas melhor posicionadas para criar as condições de acolhimento de empresas com propostas de serviços e produtos tão diversas e cujo denominador comum acaba por ser a base de conhecimento que a universidade reúne.

Os resultados começam a ser visíveis. Estas empresas já estão no mercado e os dados das exportações de 2012 mostram uma presença nestes países e algumas estão já a abrir escritórios nos Estados Unidos, no Brasil e no Reino Unido.

As empresas do UPTEC têm-se revelado também fixadoras de mão de obra qualificada em Portugal. Com base nos dados de 2013, as empresas ainda presentes no UPTEC e

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as que entretanto já concluíram o processo de incubação, já empregavam colaboradores provenientes de 15 nacionalidades diferentes.

Não podendo afirmar que esta é a solução para anular o impacto da saída de mão de obra qualificada do Pais, há que admitir que projetos deste tipo, credibilizados pelas universidades, são uma forma de Portugal se vá afirmando internacionalmente também como país de destino para mão de obra altamente qualificada.

Entende-se que se levante dúvidas se esta intervenção “extraordinária” da universidade estará, de fato, a criar empresas competitivas ou se não será apenas um “exercício académico” ou uma aventura despesista cujo investimento a sociedade nunca irá recuperar.

A questão da resiliência à competitividade internacional das empresas que começaram no UPTEC ou em parques semelhantes ainda não pode ser respondida com rigor. Os sinais são promissores . Vemos uma postura muito madura e confiante que não seria de esperar de empresas tão jovens. Os resultados financeiros conhecidos são, para já, encorajadores, mas só o futuro dirá qual a taxa de sobrevivência destas empresas. Há, porém, um dado que fica desde já: o capital de experiência para a sociedade portuguesa que estas empreendedores estão a acumular será valiosíssimo neste ou noutro projeto que possam abraçar no futuro.

QUINTA SESSAO ~

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A questão do retorno para o Estado da contribuição pública para o projeto foi sempre tida em linha de conta. Para não sermos juízes em causa própria, pedimos à Faculdade de Economia da Universidade do Porto (FEP) que fizesse uma avaliação do impacto do projeto UPTEC. O estudo mais recente que conheço foi feito com base nas contas de 2012, e mostrou que as receitas de IRC e de IRS renderam já ao Estado cerca de 6,2 milhões de Euros.

Lembre-se que estes dados poderão pecar por defeito porque não houve acesso às contas de todas as empresas; porque algumas não tinham contas por estarem no seu primeiro ano de atividade; e porque a capacidade de ocupação do UPTEC ainda estava longa da ocupação presente uma vez que parte do Edifício Central só começou a acolher empresas em 2014.

Apesar destas limitações, podemos afirmar que há expetativas fortes para o Estado recuperar todo o apoio financeiro atribuído em apenas 3 anos.

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O projeto UPTEC mereceu reconhecimento público internacional. Entre outras distinções, recebeu da Comissão Europeia, o prémio Regiostars, na classe de desenvolvimento inteligente. O UPTEC foi também considerado como um bom exemplo do bom uso de fundos comunitários e, por isso, deve ser também visto como um exemplo para a Europa, sobre a boa forma Portugal tem sabido aproveitar bem ajudas que os nossos parceiros da União nos têm concedido para Portugal se modernizar.

Felizmente este tipo de projetos não está apenas a acontecer na Universidade do Porto. Temos outros exemplos bem sucedidos em Portugal, nomeadamente na Universidade do Minho, na Universidade de Aveiro e na Universidade de Coimbra que constituem uma forma das universidades promoverem bem Portugal no mundo.

Estas intervenções mais diretas das universidades Portuguesas no desenvolvimento são muito recentes, não havendo na Europa muitos casos semelhantes. Compreendem que tenhamos dúvidas se não estaremos a desviar a universidade para áreas estranhas à sua

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missão e a violar a coerência de uma matriz que presidiu à sua criação e que foi a base para as universidades resistirem ao longo de mais de oito séculos. Compreende-se que outros, académicos ou não, menos envolvidos nestes projetos, possam ver nestas iniciativas desvios à matriz fundadora das universidades e apenas uma “deriva economicista” que apenas fragilizará a universidade.

Como universitários, estas criticas são fundamentais pois obrigam-nos a uma reflexão constante sobre o propósito e coerência da nossa prática. No caso do envolvimento das universidades nestas atividades de valorização económica e social do conhecimento, é importante percebermos se estamos a resolver um problema do presente, hipotecando a história e, através da descaracterização da missão da universidade, criar um problema maior para o futuro.

Coloca-se, por isso, a questão de saber se este envolvimento da universidade no desenvolvimento económico e no progresso das comunidades onde se insere, é causa nova.

As universidades, como as conhecemos, são uma criação da Europa Ocidental. Foi aqui que as universidades apareceram e se tornaram, a par com a igreja, a instituição mais resiliente da história ocidental. São instituições antigas que só puderam sobreviver porque se mantiveram fieis a uma matriz a partir da qual nortearam as adaptações necessárias aos contextos de cada época. Será que este envolvimento das universidades no desenvolvimento de um País ou de uma região viola ou desvirtua essa matriz fundadora?

Nos últimos minutos da minha intervenção, vamos tentar ir à história, para responder a esta dúvida!

Para tal, permitam-me que use novamente a fotografia do grupo de turistas. Peço apenas que ignorem os turistas do primeiro plano e reparem no segundo plano. Reconhecerão, com certeza, o convento de São Gonçalo de Amarante!

O que é que são Gonçalo de Amarante tem a ver com as universidades? Aparentemente, nada!! Apenas viveu num período, e teve uma experiência de vida, que o coloca com grande proximidade com as dinâmicas que levaram à criação generalizada de universidades na Europa.

Gonçalo viveu na segunda metade do século XIII. Era filho de uma família nobre da região

QUINTA SESSAO ~

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de Vizela. Inteligente, foi apoiado pelo bispo de Braga que promoveu a sua educação. Acabou por ser ordenado sacerdote e pároco de uma freguesia próxima.

Como pároco, teria a sua carreira e subsistência garantida. Porém, o seu desejo de conhecer os lugares santos, levou-o a deixar a paróquia entregue a um sobrinho. Como romeiro e peregrino, visitou os túmulos dos santos em Roma e a Terra Santa.

Esta viagem que São Gonçalo realizou não era invulgar para os eruditos da época. Este foi um período de intenso movimento de religiosos pela Europa e Palestina que viam nestas visitas aos lugares sagrados, uma fonte inspiradora para a renovação da igreja.

Durante 14 anos Gonçalo terá viajado por toda a Europa e Médio Oriente. Bebeu todos os ensinamentos que pôde, resultante dos contactos com as regiões por onde passou e por uma mudança na forma como os religiosos se começavam a relacionar com uma Europa mais urbana. O homem que regressou à sua paróquia não era o mesmo que partiu, nem o acolhimento da pessoa a quem a confiou terá sido o que esperava. Acusado de impostor, refugia-se num local remoto, junto às margens do Tâmega onde se dedica à pregação e apoiar o desenvolvimento dessas terras. O feito mais famoso é o seu envolvimento na (re)construção de uma ponte entre as duas margens do Tâmega.

Todos os milagres que a tradição lhe atribui estarão à margem da intervenção que lhe valeu o reconhecimento na época. No local existiria uma ponte romana destruída. Possuidor de excelentes qualidades oratórias e negociais, Gonçalo convenceu os proprietários da região a financiar. Foi encontrando também as estratégias para manter a disciplina e encontrar o alimento necessário para os operários irem executando a obra.

É de admitir que essa capacidade argumentativa, de liderança e de grande proximidade com as comunidades, tenha sido adquirida por contacto com ordens religiosas mendicantes, nomeadamente a Ordem dos Pregadores ou dos Dominicanos, já que alguns anos mais tarde São Gonçalo acaba por a integrar.

A Ordem dos Dominicanos, como qualquer ordem mendicante, colocava-se próxima das populações, por oposição às ordens religiosas anteriores que viviam recolhidas nos mosteiros, longe das povoações. Os Dominicanos construíram conventos dentro das comunidades, acreditando que dessa proximidade e partilha de um conhecimento que até então estava enclausurado nos mosteiros, se criariam as condições para a igreja e a sociedade se renovar. Estas ordens mendicantes, por estarem mais expostas à sociedade

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e pelo seu papel evangelizador, sentiam mais a necessidade dos seus membros terem a melhor formação possível. Sentiam também a necessidade de partilhar esse conhecimento para que mais pudessem entender melhor a palavra de Deus.

São Gonçalo, e os seus contemporâneos, testemunharam uma transformação extraordinária na Europa. Os Centros de Estudos, que estavam nos mosteiros, passaram a chamar-se Estúdios Gerais, abertos também a não religiosos. Sentia-se nessa abertura, não só a concretização de uma estratégia evangelizadora como uma contribuição para o progresso da sociedade já que, ao contribuírem para a educação da população, se iriam criar as “inteligências e as competências para haver um governo mais saudável e mais sábio”.

Neste contexto e assentes num enquadramento que procurei esboçar nestes últimos minutos, que surgiram universidades por toda a Europa a partir de finais do século XI. Este espírito está bem patente nos documentos que enquadram a criação de algumas universidades. Por exemplo, a Universidade de Coimbra, que resultou da fusão de um conjunto de escolas religiosas, tinha como propósito formar homens que ajudassem a governar o reino de uma forma mais sabedora. Na bula papal que cria a Universidade da Colónia, é dito - “Que esta instituição sirva para acabar com as trevas e para promover o desenvolvimento e a felicidade dos homens e da sociedade.”

O que a história nos parece mostrar é que a matriz fundadora das universidades foi, muito provavelmente, a promoção do desenvolvimento social. Parece-nos, por isso que, no presente, o envolvimento das universidades em formas diferentes de transferência de conhecimento para a sociedade, como é o caso da incubação de empresas, poderá estar bem alinhado com a matriz fundadora das universidades e ser um modo adequado de ajustar a matriz fundacional das universidades às especificidades do nosso tempo.

Terminava dizendo que a aposta nas Universidades durante a Baixa Idade Média serviu para abrir a sociedade europeia a uma nova fase de prosperidade, resultando dessa abertura as extraordinárias mudanças criadas pelo Renascimento e pelos descobrimentos.

Em tempos de incerteza como os que vivemos hoje, sobre o modelo social futuro, talvez fosse sensato aprender com o que a história nos diz, e voltássemos a apostar nas universidades e na sua capacidade para melhorar o nosso conhecimento do mundo, como meio para se encontrar um modelo de desenvolvimento sólido para Portugal e que o

QUINTA SESSAO ~

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projete, por boas razões, para as gerações vindouras.

Muito obrigado pela vossa atenção.

Moderador - Dr. Manuel Cavaleiro Brandão

Curiosamente, ninguém referiu um elemento que embora algo acidental, e até aleatório, não pode deixar de ser considerado um pouco sintomático da integração plena das nossas universidades na rede internacional do conhecimento e da investigação. Nomeadamente, temos, ainda que eu diga acidentalmente, um europeu, nascido em Portugal, licenciado em Portugal, que fez depois o giro do Erasmus, plenamente integrado na geração Erasmus, e que entretanto veio assumir a responsabilidade de gerir 80 mil milhões de euros, durante os próximos seis anos dedicados à investigação.

É um acidente feliz e admito que sintomático. Acho que pode ser retido. Portanto concluía agradecendo a disponibilidade, o interesse e a enorme qualidade das intervenções que ouvimos. Permito-me dirigir ainda uma palavra pessoal ao Prof. Valente Oliveira, cumprimentando-o por mais este sucesso. Ele é, por si só, a garantia de sucesso destas iniciativas. Julgo que passamos imediatamente ao encerramento, com o Engº. José António Barros e o Dr. Artur Santos Silva.

Quinta Sessao - As Universidades e a Projecao de Portugal no Mundo | Prof. Jorge Gonçalves ~ ~,

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SESSAO DE ENCERRAMENTO~

Eng.º José António Ferreira de BarrosPresidente do Conselho de Curadores da Fundação AEP

PALESTRA DE ENCERRAMENTO

Dr. Artur Santos SilvaPresidente do Conselho de Administração da Fundação Calouste Gulbenkian

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Presidente do Conselho de Curadores da Fundação AEP Eng.º José António Ferreira de Barros

SESSAO DE ENCERRAMENTO~

Estamos a chegar ao fim desta longa jornada de trabalhos, que penso ter sido para todos extremamente proveitosa.

Como não colaborei na sua organização estou perfeitamente à vontade, apesar de fazer parte dos órgãos dirigentes da Fundação AEP, para felicitar o Presidente desta Fundação, senhor Dr. Nunes de Almeida, e o senhor Professor Valente de Oliveira que, tradicionalmente e muito bem, vem organizando estas jornadas, pelo sucesso das mesmas e pela qualidade dos palestrantes convidados e das intervenções que nos deixaram.Queria, ainda, agradecer ao senhor Presidente da Fundação de Serralves o seu apoio e colaboração que permitiram a realização destas Jornadas Fundação AEP / Fundação de Serralves, que vão já na sua quinta edição.

O tema que aqui foi hoje abordado, e debatido em vários painéis e sobre diferentes óticas, é importantíssimo e deve motivar-nos, a todos, para uma séria reflexão sobre o mesmo. Portugal precisa de se abrir ao mundo, Portugal precisa de voltar a abrir-se ao mundo, e acabamos de verificar que isso é possível, como demonstraram os exemplos que hoje foram aqui apresentados, quer pela presença dos seus protagonistas fora de Portugal quer na atração para Portugal de operadores, operadores em todas as áreas, desde a económica ao conhecimento, como ficou verdadeiramente comprovado. Eu diria que nós temos tanto valor e tantas valias no conhecimento que internacionalizamos, ou que conseguimos atrair, como nas áreas da economia.

Gostaria de deixar apenas uma pequena nota, se me permitem, um contributo. Há ainda uma outra área que não me apercebi que hoje tivesse sido referida, onde hoje temos uma posição geoestratégica importante e onde poderemos vir a ter um papel particularmente relevante na Europa, que é a área da energia.

Portugal, pelas fontes naturais que tem à sua disposição, o sol, o vento e a água, pode vir a ter na energia e no seu fornecimento, no abastecimento da Europa, com base em energia não resultante de fontes fósseis, um papel particularmente importante. Portugal e Espanha, a Ibéria, dispõem de condições naturais particularmente vantajosas.O assunto está hoje a ser debatido no conselho europeu, em termos de interligações e de redes de distribuição para a Europa, sendo hoje as exportações de energia para lá dos Pirenéus praticamente residuais, e muito modestas as metas previstas para 2020.

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Ao contrário do que acontece com a maioria dos países da Europa central, as interligações com a Península Ibérica continuam a ser reduzidas, não só pela barreira natural dos Pirenéus como pela França e pelos seus lobbies da energia nuclear. Portugal terá que pugnar fortemente pelo aumento das suas exportações de energia cujo papel pode ser extremamente importante pelo seu efeito no total das exportações portuguesas, e na nossa balança comercial, pelo elevadíssimo valor acrescentado destas exportações, porque quer o vento, quer o sol, ainda não se pagam e, portanto, o valor acrescentado dessas exportações seria elevadíssimo.

Queria, agora, agradecer ao senhor Dr. Artur Santos Silva, meu estimado Amigo, que se digna encerrar estas V Jornadas Fundação AEP / Fundação de Serralves.O senhor Dr. Artur Santos Silva não necessitaria de nenhuma apresentação, nesta cidade e nesta Fundação onde todos o conhecemos: é hoje o presidente do conselho de administração da Fundação Gulbenkian, é igualmente presidente do conselho de administração do Banco BPI, que fundou, e da Partex and Gas Corporation; começou a sua carreira em Coimbra, na Universidade de Coimbra, onde chegou a ser assistente da Faculdade de Direito, foi docente da Universidade Católica, mais tarde passou por Stanford, onde fez o Stanford Executive Programme.

Nessa altura já tinha o prazer de colaborar com ele, a seu pedido, no lançamento de um projeto em que foi pioneiro e que marcou muito a sua pessoa, marcou muito a nossa cidade e marcou muito o nosso país. Falo do lançamento da SPI, primeiro como sociedade de investimentos, mas que viria a transformar-se na primeira instituição de crédito privada, depois da nacionalização da banca, no 25 de Abril, o Banco Português de Investimento, BPI.Artur Santos Silva foi, ainda, Vice-Governador do Banco de Portugal, foi Secretário de Estado do Tesouro mas, para além destes e muitos outros cargos nas áreas das finanças e da economia, o senhor Dr. Santos Silva é um homem que tem dedicado um particular carinho às áreas da cultura, e é uma das coisas que hoje também lhe devemos, essa sua paixão e essa sua presença nas áreas culturais. Como hoje aqui foi dito, não é possível que uma nação seja reconhecida, globalmente, se também não for culturalmente uma nação reconhecida.

Senhor Dr. Artur Santos Silva, a palavra é sua.

Sessao de Encerramento | Eng.º José António Ferreira de Barros~

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O tema desta conferência, “Portugal no Mundo”, é tão como vasto como interessante e muitas das suas variáveis já foram percorridas. Gostaria, no entanto, de abordar alguns aspetos importantes que julgo que merecem ainda alguma reflexão. Refiro-me, em concreto, aos problemas do emprego e do investimento privado, às questões da investigação e do ensino superior e de que forma todos estes assuntos se relacionam entre si para o futuro de Portugal.

As políticas públicas da ciência e do ensino superior no nosso país tiveram o maior sucesso e, com estabilidade, assentaram numa visão de longo prazo que naturalmente as Universidades assumiram como um desafio imperdível. Muito está ainda por fazer ao nível da translação de conhecimento e da inovação, ou seja, de como a partir da investigação e da ciência se pode transformar essa capacidade de gerar conhecimento em valor económico.

Portugal vive desde 2001 um longo tempo de declínio como há muito não conhecíamos. Desde a entrada no Euro não só não crescemos como agravamos todos os nossos desequilíbrios fundamentais. Decidimos integrar o grupo dos países fundadores mas não soubemos assumir as plenas consequências desse novo estatuto. Por isso, a economia perdeu competitividade e os desequilíbrios financeiros atingiram um nível incomportável.

Com efeito, o crescimento acumulado do PIB desde 2001 é praticamente nulo. No mesmo período, em percentagem do PIB a dívida pública passou de 55% para - líquida dos activos sobre o exterior – mais de 120%. A dívida externa total, incluindo entidades públicas e privadas, aumentou de 40% para 100% (refiro-me igualmente à dívida externa líquida dos ativos detidos sobre o exterior. Finalmente, o investimento privado anual, que representava 24% situa-se agora em apenas 14% do PIB.

Portugal, nas últimas décadas apostou, e bem, na escolarização da população jovem com maior abertura de oportunidades no ensino superior sem termo de comparação na história moderna do país.

Parece-me interessante recordar que nos anos 50, Portugal tinha 45% da população analfabeta e 30% da população apenas com 3 anos de escolaridade. Em 1974, havia 20 mil alunos no ensino secundário, e havia 30 mil alunos no ensino universitário. Estes números estão multiplicados de tal forma que, hoje, este universo estará na ordem dos 400 mil alunos, quer no secundário, quer no superior.

Palestra de EncerramentoDr. Artur Santos Silva

SESSAO DE ENCERRAMENTO~

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Por outro lado, Portugal lançou o maior programa de formação avançada até hoje realizado em especial nas áreas da ciência e da engenharia. É absolutamente prioritário criar empregos e dotar os jovens de qualificações e competências que lhes permitam posicionar-se melhor face a esta situação. A redução brusca do défice orçamental determinada pelo acordo com a troika, que teve o apoio de 90% dos deputados dos partidos que estão representados no parlamento, exigiu de imediato uma contracção do investimento público que se veio somar à quebra do investimento privado, em especial nos sectores da construção civil e obras públicas, provocando, nestes sectores, uma onda de desemprego que começou por se traduzir num regresso de emigrantes aos seus países de origem.

A política assumida de combater o desequilíbrio orçamental aumentando as receitas do estado e não através de um exercício bem mais exigente como é o de racionalizar a administração pública, melhorando a eficiência da administração central e da administração local, deu lugar a um aumento de impostos essencialmente concentrado no IVA e no IRS com significativo impacto na contracção do consumo que contribuiu para provocar forte crise nos sectores do comércio, de retalho tradicional e de serviços não qualificados, bem como no comércio de bens de consumo duradouro.

Por outro lado, se considerarmos que a maioria esmagadora das empresas portuguesas depende excessivamente do crédito, dos fornecedores, dos clientes, ou dos bancos, com capital próprio também muitas vezes insuficiente, compreendemos como a queda da procura, as restrições de crédito e os aumentos do IVA acabaram por provocar uma onda de despedimentos e de falências.

Também a decisão de contrair de forma não seletiva a despesa do Estado, com sucessivas reduções de pensões e de salários na administração pública, sem dúvida as rúbricas de maior volume na despesa pública, contraiu ainda mais a procura interna e incentivou o aumento da poupança.

O objectivo de redução drástica e rápida do défice corrente foi facilmente atingido, três anos antes do que era esperado no acordo com a troika e, do meu ponto de vista, esse era o desequilíbrio mais sério do nosso país. A racionalidade com que os agentes económicos se ajustaram deu lugar a este resultado que não tem paralelo com nenhum outro que eu conheça, de um país sem moeda própria. Com moeda própria é bem fácil fazer os ajustamentos externos, mas infelizmente hoje isso não é possível com a nossa participação no euro. De forma alguma defendo que hoje o nosso país saia do Euro mas,

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ao não termos moeda própria, não nos foi permitido ajustar muito mais facilmente e com menos dor os desequilíbrios fundamentais da nossa economia, e que com inegável êxito tínhamos conseguido em 1977/78 e 1983/85, nas duas vezes em que tivemos que recorrer à ajuda externa (FMI) para salvar o país da bancarrota.

Assim, o desequilíbrio externo foi conseguido muito antes do esperado, à custa da quebra da procura interna e com a reorientação da capacidade produtiva instalada nas empresas industriais para os mercados externos mas praticamente sem investimento adicional. E, com pouco investimento novo em sectores exigindo capital, e sem a possibilidade de emprego no estado, o emprego dos jovens ficou muito dependente da pequena iniciativa empresarial ou da precariedade.

Olhando para o futuro, há que ter uma perspectiva clara sobre as possíveis origens de novo emprego na sociedade portuguesa. O crescimento sustentável da economia vai depender de uma nova oferta dirigida ao exterior essencialmente assente no investimento em actividades no nosso país que sejam atrativas, competitivas e que beneficiem de uma procura crescente no comércio internacional.

E aí estamos ainda muito dependentes, como aliás todos os Países Membros, do que se passa na União Europeia.

Esta nova vaga de exportações não pode assentar somente numa renovação da carteira de bens industriais exportados, os serviços orientados para o exterior terão também que crescer mais rapidamente, neles se incluindo serviços prestados à distância, de desenvolvimento de software e de conteúdos digitais, serviços de engenharia, serviços de saúde ou nas indústrias culturais e de lazer.

Estas atividades não são exigentes em capital físico, têm uma reduzida componente importada e finalmente podem criar emprego jovem em larga escala a diferentes níveis de escolarização e de qualificação.

Para que o mercado trabalhe valorize o nosso capital humano acumulado, é necessário estimular o envolvimento das entidades empregadoras que deveriam ver reduzida a sua tributação ou os custos sociais associados ao emprego criado.

Em Portugal o desemprego jovem é um dos mais elevados na zona euro, o que levou o Governo e naturalmente a Comissão Europeia, porque este é um problema de toda a

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Europa e em particular nos países da Europa do Sul, a anunciar um conjunto de medidas - a maior parte dessas medidas totalmente financiadas com recursos europeus - para facilitar a inserção dos jovens no mercado de trabalho.

A situação de desemprego dos jovens com formação superior merece uma atenção muito particular. Trata-se, como muitos têm dito, da geração mais qualificada de sempre em que as famílias, o Estado, e os próprios, realizaram um investimento muito importante, e que hoje não vê no país oportunidade de iniciar a sua trajetória profissional sendo muitas vezes obrigada a emigrar para encontrar uma oportunidade de emprego.

Esta situação resulta também de um mais que provável desajustamento entre qualificações escolares e dinâmica do mercado de emprego, ou seja, de um défice de competências para transformar conhecimento adquirido em empregabilidade numa economia de mercado, no contexto da globalização, e dos avanços tecnológicos que marcam desde já o século XXI.

Pela terceira vez, em 40 anos de democracia, não fomos capazes de resolver os nossos problemas e tivemos de recorrer a um processo de ajuda externa em que participaram neste caso, agora, instituições europeias e, tal como nas duas vezes anteriores, o FMI, e no qual foi assumido o compromisso de promover reformas que conduzissem a um equilíbrio económico e financeiro sustentável.

Cumprido esse ciclo, chegou a hora de Portugal entrar numa nova fase de progresso que todos tanto ambicionamos. Temos de retomar o caminho de crescimento e de nos aproximar dos outros países europeus. Gostaria de recordar que, entre 1985 e 2000, o nosso PIB per capita medido em paridade dos poderes de compra, foi o que mais aumentou em toda a história das comunidades europeias, porque passamos de 55% da média da União Europeia de então, para 77%.

E, portanto, para que de novo retomemos a aproximação aos outros países europeus é necessário o crescimento económico e é essencial o aumento do investimento privado, variável fundamental para a criação de emprego.

Temos também de continuar a controlar o desequilíbrio externo que na década passada foi responsável por um alarmante aumento da dívida externa que, em relação ao PIB, é das maiores dos países da União Europeia e que, infelizmente, foi sobretudo resultado de um aumento do consumo público e provado e não, como já disse, resultante do crescimento do investimento privado.

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Esta é a altura de mobilizar muitos dos nossos melhores e eles estão essencialmente nas nossas universidades e nos nossos centros de investigação, para discutir realistas mas ambiciosas propostas para o futuro de Portugal.

O Prof. Cláudio Sunkel deu-nos uma visão muito positiva e com a qual eu totalmente me identifico. O Prof. Jorge Gonçalves falou-nos igualmente de um caso de extraordinário sucesso a que ele esteve intimamente ligado, a VITEC, de promoção de empreendedorismo qualificado. Tudo o que disseram só vem reforçar o meu sentimento de que a capacidade de formação e de geração de conhecimento das nossas Universidades tem de ser o primeiro recurso a mobilizar para conceber todas as mudanças de que o país precisa.

Por isso mesmo, deve ser dada prioridade absoluta à valorização do nosso capital humano e ao desenvolvimento da nossa capacidade de investigação e de translação do conhecimento, que foi um aspeto também sublinhado em que ainda temos um inegável défice. Com efeito, aumentamos muito a capacidade de investigação mas convertemos muito pouco essa capacidade de gerar conhecimento em valor económico, o que é uma fase natural num processo desta natureza. O que recomenda que sejam asseguradas condições de financiamento ao ensino superior e às instituições de investigação. Importa também recordar que assumimos desafios muito exigentes em relação ao ensino superior na estratégia da Europa 2020; para cumprir tais objectivos, as nossas Universidades têm de poder responder a um salto muito grande quanto à percentagem da população que conclui o seu primeiro grau de ensino superior.

Em quase todos os indicadores relevantes de IDI de inovação, Portugal tem vindo a piorar o seu posicionamento nos últimos anos, contrariando uma tendência muito positiva na primeira década deste século.

Importa lembrar que a evolução científica e tecnológica em Portugal na última década foi notável. Com efeito, entre 2005 e 2009, Portugal foi o país da União Europeia com a mais elevada taxa de crescimento de intensidade de ID em percentagem do PIB. Em 5 anos tivemos um aumento superior a 110%, ao passo que a União Europeia apenas cresceu 10%, apresentando Portugal um esforço de ID mais próximo da média da União Europeia. Basta lembrar que em 2000, Portugal estava apenas a cerca de 35% do valor médio da União Europeia e, em 2009, já apresentámos indicadores de ID acima de países como a Espanha e a Itália.

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Em termos da posição no índice global de inovação, no período para que se dispõe já a informação e que foi divulgado no Innovation Union Scoreboard 2014, Portugal passou para a 18ª posição quando, em 2009, estava em 16º lugar no conjunto dos países da União Europeia.

A descida para uma posição menos conveniente e este recuo no nosso progresso também se verifica no peso da despesa de ID no PIB, que depois de ter crescido de 0,8% em 2005, até um máximo de perto de 1,7% em 2009, se reduziu desde então e regredimos para 1.4% do PIB. A União Europeia melhorou de 1,8% para 2% do PIB.

Também o peso da despesa de ID no PIB do sector privado, que havia subido de 0.3% em 2005 para 0.8%, caiu ligeiramente, situando-se em 0.7%.

A este propósito deve ser assinalado que as despesas de ID empresarial no total das despesas de ID realizadas, depois de um máximo atingido em 2007, e de quedas sucessivas de 2008 a 2010, recuperaram em 2011 e em 2012, apesar do ambiente adverso, e estão próximas do valor máximo atingido em 2007.

Comparando com outros países-membros, o peso do investimento em ID em relação ao PIB do nosso país fica ainda aquém da média da União Europeia a 28, que é de 2%, e, claro, muito longe dos países mais avançados como é o caso da Suécia ou da Finlândia que estão entre 3,5% e 4%. Embora comparemos bem com os valores que registam países como a Itália e a Espanha (1,3%).

Não resisto a recordar que, quando em 2000 foi lançada a Agenda de Lisboa, liderada pelo Presidente do Conselho Europeu, o nosso Primeiro-Ministro António Guterres, Portugal estava em 0,7% de ID em relação ao PIB, a União Europeia em 1,8% e assumiu-se que a União Europeia apenas tinha elevado tal indicador, como disse, para 2%.

O nosso país em 2000, como estava muito longe, assumiu o compromisso de em termos de ID atingir o valor de 1,8% em 2010, o que então quase atingimos (1,7%). Infelizmente, a União Europeia não utilizou nem políticas, nem supervisão sobre a implementação desses compromissos e, assim, a Europa não conseguiu estar na linha da frente para ser, como ambicionara dez anos antes, o espaço mais competitivo à escala do mundo desenvolvido.

Se Portugal quer continuar a ambição de reforçar a sua competitividade, tem que estimular e apoiar o aumento do esforço em ID e do mesmo modo as politicas públicas têm que

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valorizar o trabalho dos nossos investigadores em empresas ou para empresas refletindo tal valorização nas suas carreiras.

Há que conseguir transformar grande parte desse esforço de investigação em valor económico, transferindo-o para as empresas, para a Administração Central e Local do Estado, para outras instituições e mesmo para outros países, sendo fundamental que o nosso esforço de investigação tenha um maior impacto na economia.

Tem que constituir uma preocupação prioritária, como ainda recentemente foi uma vez mais sublinhado pelo Dr. Luís Portela, numa Conferência do IPATIMUP, que a percentagem de investigadores a trabalhar em empresas ou para empresas, medido em tempo integral, aumente. É certo que se a percentagem de investigadores por mil habitantes ativos em Portugal é superior à União Europeia a 15 e claramente superior à União Europeia a 28, a percentagem de investigadores a trabalhar em empresas ou para empresas, medida em tempo integral, é pouco superior a 20% quando a média da União Europeia é aproximadamente 50% e de países como os Estados Unidos é 80%.

Este é um momento particularmente importante e especialmente oportuno para preparar o futuro considerando que se encerrou o período de vigilância mais estrita e sistemática com a troika, e se inicia um novo quadro comunitário de apoio que bem pode ser a última grande oportunidade para utilizarmos significativamente os recursos europeus que mais uma vez nos vão ser disponibilizados.

Portugal está sujeito naturalmente a um grande condicionamento em resultado das políticas europeias mas espera-se, todos esperamos, que seja cumprida a prioridade assumida pelo novo presidente da Comissão Europeia, de ser promovido, nas políticas europeias, o crescimento económico prioritariamente através do relançamento do investimento.

Por outro lado, com o “six pack”, o pacote fiscal que foi aprovado pelas instituições europeias, há um aspecto que é muito pouco referido porque não tem mecanismos de ajustamento tão eficazes quanto tem, por exemplo, o défice orçamental em relação ao PIB, os limites do défice orçamental em relação ao PIB ou os limites da dívida pública em relação ao PIB.

Refiro-me ao controlo dos excedentes da balança corrente externa e ao facto de a Alemanha, de acordo com tais regras, ter vindo a evidenciar um excedente na balança corrente, superior a 6% do PIB desde 2010, sem tomar quaisquer medidas para fazer esse

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excedente descer, apoiando-se em políticas públicas, que revertam tal excedente externo excessivo. Esta questão foi recentemente suscitada por uma jornalista portuguesa, Teresa de Sousa, e retomada por Wolfgang Munchau no Financial Times. Enquanto a Alemanha continua obcecada com o equilíbrio orçamental, tem infraestruturas de comunicações e de transportes muito insuficientes e em termos de produtividade apresenta estatísticas muito inferiores aos espaços mais competitivos do mundo, quer sejam os países nórdicos, os Estados Unidos ou a Coreia do Sul.

E ainda é mais chocante que, num momento de grande tensão politico-militar, e conforme recentemente foi evidenciado por um relatório apresentado no Bundestag e que suscitou amplo debate na opinião pública alemã, a Alemanha tem 4 submarinos mas 3 estão parados, só 70 dos 180 tanques estão em condições operacionais, e dos helicópteros de apoio à frota marinha, que são 43, só funcionam 7. Esta inoperância da estrutura militar fez como que 6 soldados alemães tivessem de esperar várias semanas para regressar do Afeganistão, uma vez que só estão a operar 24 dos 56 aviões de transporte de tropas. O controlo aéreo nos países do Báltico por parte da Alemanha, no âmbito das suas operações na NATO, também não está a ser eficientemente cumprido.

Parece-me evidente que a Alemanha tem de alterar a sua posição em relação às políticas europeias, sobretudo porque é a voz mais determinante. Não é possível haver uma recuperação na Europa sem que a Alemanha contribua com as suas políticas para um relançamento da economia.

Voltando ao terreno do crescimento do investimento privado, à excepção de dois anos, o nosso investimento privado em relação ao PIB não parou de descer ao longo deste século. Mesmo assim, no entanto, foi muito positiva a evolução da nossa balança tecnológica, com as exportações de bens e serviços de média e alta intensidade tecnológica, que representavam apenas 40% das importações em 2000 e hoje apresentamos um confortável excedente. Trata-se pois de um extraordinário salto qualitativo do nosso sistema produtivo, que muito deve ao talento dos empresários e ao contributo da inovação que os centros de investigação proporcionaram às empresas.

É também muito interessante, como todos bem sabem, lembrar que o peso das exportações totais no PIB se estima que venha a ser superior a 40% em 2014 - a previsão do Banco de Portugal é de 40,5% - quando na década de 90 era de 26% em relação ao PIB, e neste momento, estamos no valor médio da Europa dos 15 mais desenvolvidos, que é 41%, o que

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é um sinal da grande capacidade do nosso tecido exportador e da nossa competitividade.

Esta situação é tanto mais relevante se considerarmos que o nosso mais sério desequilíbrio, o da balança corrente externa, na primeira década deste século, que chegou a atingir cerca de 12% do PIB, tenha tido um excedente. Mesmo com uma recuperação do consumo e do investimento privado (o que está a acontecer desde Setembro de 2013), Portugal irá continuar a ter um excedente em 2014.

Mas para que o investimento privado possa assumir um papel decisivo no crescimento da economia e na criação de emprego, é fundamental assegurar condições de financiamento competitivas que eliminem os efeitos da fragmentação bancária. Neste aspeto, a união bancária ficou muito longe do que deveria ter sido e por isso os empresários portugueses pagam pelo crédito taxas muito superiores às de muitos outros países da Europa vistos como um melhor risco.

Espero, portanto, que o funcionamento da estratégia do Acordo de Parceria Portugal 2020 consiga corrigir tais assimetrias, sobretudo na medida em privilegia o financiamento e o investimento privado, não através de subsídios rembolsáveis mas em particular de subsídios reembolsáveis, assegurando custos financeiros muito baixos para as empresas. Contando-se igualmente com as políticas que o BCE está a lançar e a capacidade que o BEI tem de corrigir tal fragmentação bancária, canalizando recursos através do sistema bancário português a baixos custos financeiros.

A propósito ainda do que pode ser o investimento privado e do que deve ser o esforço de inovação, gostava de sublinhar um projecto promovido pela Fundação Calouste Gulbenkian que conduziu à criação da Plataforma Noroeste Global, que é uma plataforma que integrou as Universidades do Minho, Porto, Aveiro e a Católica do Porto e os municípios das quatro cidades onde elas têm sede: Porto, Aveiro, Braga e Guimarães. Com esta plataforma espera-se que se criem muito melhores condições, por um lado para ajudar as empresas em processos que suponham esforço de investigação e desenvolvimento e a sua transformação em inovação, mais fácil acesso aos fundos europeus canalisados através do Acordo de Parceria, mas também às instituições de investigação portuguesas, direto acesso a fundos europeus do Programa “Horizonte 2020”, preparando melhor projetos que suponham colaboração entre várias instituições de investigação portuguesas e estrangeiras. Estamos a falar de fundos europeus que são de perto de 80 mil milhões de euros. Acredito que esta estrutura, cuja preparação está a ser sabiamente liderada pelo

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Professor Jorge Gonçalves, virá a ter um grande impacto na aproximação das empresas dos centros de investigação porque, a par de casos de grande sucesso, há também muitos casos de défice de relacionamento. Temos, pois, casos fantásticos de sucesso em inúmeros domínios e sobretudo temos um povo extraordinário e que merece vencer e recuperar a auto-estima, o orgulho e a esperança.

Temos que ser mobilizados colectivamente pela verdade e pela esperança, com um compromisso das principais forças sociais e políticas, numa estratégia de longo prazo que transforme o nosso país numa sociedade mais moderna, mais livre e mais justa. Nunca tivemos, na nossa história, uma geração tão próxima dos países europeus mais avançados. Nenhum de nós perdoará um fracasso. O nosso caminho para a Índia, no século XXI, tem de ser feito de mãos dadas pela ciência e pelas empresas, tal como aconteceu no tempo das descobertas, entre o grande símbolo que foi a Escola de Sagres, onde se gerou conhecimento e se tratou a informação que foi sendo recolhida da melhor forma e permitiu planificar novas descobertas, e os nossos navegadores, agora os nossos empresários.

Artur Santos Silva

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