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s v entrevista: Bernadette Devlin Londres, 08/11/71- Por Bernardo Kucinski // 1 s w 0 tema de nossa guerra não 4 a religião - éa miséria* / A G / 0 A^ Bernadette Devlin está sem comer há 48 horas. De quando mm vez V* toma uns goles de chá e isso ê tudo. 0 dia é" 21 de outubro de 1971 e,ao lado de três deputados da Irlanda do Norte, Bernadette está protestando em frente ao número 10 da Downing Street, residência oficial do Primeiro Ministro britânico, contra a prisão sem julga- mento de católicos na Irlanda do Norte. Bernadette, que cora Zk anos é" o elemento mais jovem do Parlamento britânico \ foi eleita com apenas 21 anos) tem uma longa experiência de protestos. Foi lide- rando marchas contra a discriminação política e social sofrida pelos católicos por parte ds protestantes na Irlanda do Norte que ela se tornou faxasE conhecida internacionalmente em 1968. Os jornais fixax a chamavam na época a "Fidel Castro de mini-saia". O reverendo Ian Paisley, o mais extremado dos líderes protestantes, dizia a quem quizesse ouvir que " as veias de Miss Devlin estão poluídas pelo veneno do ensinamento papista". Nessas marchas os católicos exigiam o voto universal e o fim da discriminação nos empregos e f.,;, na distribuição de casas populares. Da fama para uma cadeira em Westminster, foi apenas ura passo para Bernadette. Mas suas rixfsx diferenças com os 'british* tem origem bem mais remota do que o movimento de 1968 o as reuniões de estudantes católicos ao tempo em que ainda estudava psicologia na Universidade. Bernadette, como qualquer católico na Irlanda do Norte, já recebeu o republicanismo como herança. O avô Devlin, apessr de lutar ao lado dos ingleses ma guerra dos Boers, era ura republicano convicto. Quando vdtou à Irlanda ganhou um emprego de lixeiro mas continuou fiel ao re- publicanismo. 0 pai Devlin ( que morreu quando Bernadette tinha 9 anos) chegou a carpinteiro. Carpinteiro e republicano. Trabalhava na Inglaterra e só voltava à Irlanda nos fins de semana porque sua carteira de identidade tinha um carimbo que dizia: • suspeito político-

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s ventrevista: Bernadette Devlin Londres, 08/11/71-

Por Bernardo Kucinski / / 1 s

w0 tema de nossa guerra não 4 a religião - éa miséria*

/ A

G

/

0 A ^ Bernadette Devlin está sem comer há 48 horas. De quando mm vez

V* toma uns goles de chá e isso ê tudo. 0 dia é" 21 de outubro de 1971

e,ao lado de três deputados da Irlanda do Norte, Bernadette está

protestando em frente ao número 10 da Downing Street, residência

oficial do Primeiro Ministro britânico, contra a prisão sem julga­

mento de católicos na Irlanda do Norte. Bernadette, que cora Zk anos

é" o elemento mais jovem do Parlamento britânico \ foi eleita com

apenas 21 anos) tem uma longa experiência de protestos. Foi lide­

rando marchas contra a discriminação política e social sofrida pelos

católicos por parte ds protestantes na Irlanda do Norte que ela se

tornou faxasE conhecida internacionalmente em 1968. Os jornais fixax

a chamavam na época a "Fidel Castro de mini-saia". O reverendo

Ian Paisley, o mais extremado dos líderes protestantes, dizia a

quem quizesse ouvir que " as veias de Miss Devlin estão poluídas

pelo veneno do ensinamento papista". Nessas marchas os católicos

exigiam o voto universal e o fim da discriminação nos empregos e

f.,;, na distribuição de casas populares. Da fama para uma cadeira em

Westminster, foi apenas ura passo para Bernadette. Mas suas rixfsx

diferenças com os 'british* tem origem bem mais remota do que o

movimento de 1968 o as reuniões de estudantes católicos ao tempo

em que ainda estudava psicologia na Universidade. Bernadette, como

qualquer católico na Irlanda do Norte, já recebeu o republicanismo

como herança. O avô Devlin, apessr de lutar ao lado dos ingleses

ma guerra dos Boers, era ura republicano convicto. Quando vdtou à

Irlanda ganhou um emprego de lixeiro mas continuou fiel ao re­

publicanismo. 0 pai Devlin ( que morreu quando Bernadette tinha

9 anos) chegou a carpinteiro. Carpinteiro e republicano. Trabalhava

na Inglaterra e só voltava à Irlanda nos fins de semana porque sua

carteira de identidade tinha um carimbo que dizia: • suspeito político-

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e HBkiua nenhum patrão protestante na Irlanda lhe dava serviço.Além

do más era conhecido como o "Devlin brigão", unia espécie de apelido

familiar que servia para diferenciá-lo dos milhões de outros Uevlins

que existem na Irlanda. A mãe de Bernadette, outra Devlin ( não

prefisou mudar de nome ao casar) era de família 'arranjada*, donos

de uma taverna. 'Arranjada^ também republicana, Bernadette justi

fica sua campanha pela libertação dos presos dizendo ( além dos

argumentos morais óbvios) que a eliminação das medidas excepcionais

de repressão é um dado essencial para a desescalada da luta na

Irlanda do Norte, antepondo 5°0 -ri|il católicos a 1 milhão de protes­

tantes, KEtniEssa idéia já é aceita por muitos líderes britânicos e

viagem do líder da oposição Mr. Wilson à Irlanda está ligada a um

(2) estudo da possibilidade de eliminar o intornamento antes do iíatal.

Uma semana depois desta entrevista, a própria Bernadette liderou uma

marcha no centro de Londres, onde 20 mil pessoas pediram o fim do

internamento. Os números dão razão aos propugnarn o fim do interna

mento. Desde agosto, quando foram feitas as primeiras prisões de

acordo com o Special Powers Act, 882 pessoas já foram «fctidas, das

í 3) quais k06 continuam presns ( todos católicos)*,'Mas ao mesmo tempo

o terrorismo se multiplicou. 0 número de expJ.osões passou de uma

média mensal de 90 para 130. 0 número de soldados britaicos mortos

por franco atiradores saltou de uma média de 2 por mês para 9» Durant

os últimos três meses morreram 86 civis e militares na •'rlanda do

Norte, contra 27 mortos nos sete meses deste ano anteriores ao

internamento. Na última so.iana de outubro, logo após o senador

Kennedy ter classificado a ^rlanda do íorte de '0 Viet-nam* da

Grã Bretanha', morreram <é fnto mais soldados britânicos em °elfast

do que GIs americanos no Vietnan. MÈ unia luta popular", diz berna­

dette. "Quanto mais tropas, maior a reação. Cies podem prender

milhares e não centenas. ;ão adianta. Em seis meses começaria tudo

de novo".

Segunda filha de uma série de seis, ..ernadette conhece também outra

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das tradições católicas da Irlanda: a miséria, o desemprego crô­

nico, as condições precárias de moradia. Talvez por isso sua voz

cresce d e intensidade quando ela diz: " O tema de nossa luta não

é a religião. Isto não é uma velha guerra religiosa do tipo me­

dieval. Nossa luta é contra a miséria". Denotando cansaço, mas

falando com firmeza, Bernadette se ajeita na cana de lona esten­

dida há dois dias e duas noites em plena Downing Street e sem dar

atenção aos Rolls Royce que entram e saem continuamente, ela explica

o que pensa da atual situação na Irlanda do Norte. De K ± calças

rancheira e cabelos longos em desalinho, fumando continua ente, ela

começa por HíXEHX acusar a grande imprensa britânica ( àqual

recusa entrevistas) de deturpação e má-fé" no noticiário da Irlanda

do Norte: "Tudo o que acontece é apresentado por §les como mero (4 i

terrorismo do IRA , como ação de um pequeno grupo de gonto má e

enlouquecida. Não é nada disso".

VEJA- 0 que está acontecendo de fato na Irlanda do Norte e que a

imprensa britânica ssix não noticia corretamente?

D .VLIN- Para começar, temos agora campos de concentração na Irlanda

do Norte, erguidos pelos ingleses, onde mais de 400 pessoas estão

presas. Aliás, um de nossos problemas é que nem sabemos quantos

desses campos existem. Mas um deles é bem conhecido, o campo de

Long Kesh. E não pense que eu uso a expressão • campo dfe concentra­

ção 'em sentido figuradoj Nada disso. SaBxsaE^Bsx^HEXi Long Kesh tem

tudo aquilo que a genèe está acostumada a ver nos filmes de TV ou

nos velhos livros de histeria do nazismo: torres de vigia, cerca»

de arame farpado, holofotes, fossos em toda a volta, patrulhas do

exército britânico montando guarda. E os presos são pessoas contm

eis quais nenhuma acusação foi apresentada e nem o será no futuro.

As pessoas são presas de acordo com Special Powers Act sob a alega­

ção de que representzm ou x̂ odem vir a representar uma ameaça a

segurança do Bstado, Ou seja, o Ministro do Interior da «.irã bretanha

se arroga o direito de determinar que tais ou quais pessoas amea­

çara a segurança do país, sem se dar ao trabalho cé apresentar provas.

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Sem levá-las a um tribunal. Eu mesmo poderia ser presa pelo que

eu penso ou pelo que possa vir a pensar. lXia verdade em todas as dé­

cadas dos 5 o anos de existência da xrlanda do ;\'orte houve a aplica­

ção do Special Powers Act. As pessoas que houvem falar da famosa d

democracia britânica devem se lembrar que dentro do chamado Keino

Unido nunca houve uma década sem que pessoas fossem presas por

5 ou mas anos sem SRExaxfars qualquer julgameio ou processo. Temos,

por exemplo, em Long Kesh, um homem que stá servindo seu décimo

primeiro ano de prisão sem que nunca tenha sido julgado IOKKSUS ou

condenado, mesmo pelos menores crimes. ""a verdade esse homem nuncr.

esteve num tribunal.

VEJA-xínr^KH A abolição do Special Powers Act era ura dos iiens

de sua famosa campanha de ~\<)6S pelos direitos civis. Acha que a

campanha fracassou?

DEVLIN- De fato, a esse respeito nao conseguimos nada. tantoassim

ue o Special Powers Act continua aendo aplicado em toda a sua

plenitude contra a minoria católica. Casas são arrombadas e chefes

de família são presos sem que consig-;,íOS localizá-los at&xx às vezes

por duas semanas. Aliás, isso nos leva a crer que estão sando tor

turados porque já" temos provas documentadas e atestados médicos

( 5)

mostrando ter havido casos de tortura .'Mas por outro lado conse­

guimos atingir uma situação de fato que o governo britânico vai ser

obrigado a engolir: o governo da -*-rlaxida do Norte já não governa

o território. A maioria católica afastou-se de todo e qualquer con

tato que signifique aceitação da autoridade local.

VEJA- Quais os objetivos políticos dessa campanha?

DEVLIN- O objetivado movimento «i resistência civil é eliminar toda

e qualquer cooperação com o governo da -"-rir nda do .Norte. Temos umr

greve de alugueis e outra de impostos. Os moradores da casas popula­

res, construídas pelos municípios, recusam-se a pagar alugueis. Ao

mesmo tempo organiaaraos comitês de rua, de bairro e de região. íío r-

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lugares onde a prefitura local já entrou em colapso, a população

católica organiza seus próprios serviços, como coleta de lixo, por

exemplo. Se eles dizem que não tem móis como pgar os funcionários,

as pessoas tornam os caminhões e fazem elas mesmas o serviço. Em

outros lugares, ande os banheiros públicos foram fenhados, nós os

reabrimos. Agora estão ameaçando cortar a luz e a água em vários

bairros católicos. Se o fizerem, tomaremos conta nós mesmos do

suprimento.

VEJA- Qual o apoio da população católica a esse movimento de re­

sistência civil?

DEVLIN- Quase total. E nenhum governo pode governar quando um terço

da população decide que não tem mais nada a ver com tal governo.Nao

como era 1968 quando nós grxxz dizíamos que não gostávamos do governo

A decisão agora foi de afastar-se e boicotar smas atividades. E o

boicote foi tão efetivo que o governo de Mr. Faulkner decidiu pre

parar novas leis permitindo cortar o fluxo de pagamentos de S S ç K X

aposentadoria, desemprego e assitência social na fonte. Quem não

paga aluguel vai ter seus benefícios descontados» na fonte. Mas

isso não nos preocupa porque o mecanismo custaria mais dinheiro

do que o que vai ser recuperado.

VEJA- Essa decisão de boicote é definitiva?

DEVLIN- E comleta. Todos O S H nossos deputados no Parlamento da

Irlanda do «orte* 'retiraram-se formando uma assembléia própria.

fossos vereadores abandonaram as câmaras municipais. Eu e mais dois da oposição

deputados/que representam a Irlanda em "estinins ter somos os únicos

que ainda participais de um organismo britânico.

VEJA- Porque?

D VLIK-Ora, porque a responsabilidade ultima do que se passa ê do

governo britânico que criou o estado artificial há 5 o anos atras.

Estado que se manteve a custa da repressão contra a rdnoria católica

e d?, concessão de privilégios a maioria protestante, criando assim

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uma polarização política baseada no sectarismo religioso. Em

1968 o governo britânico reconheceu âxx a anormalidade da situação

mas não passou diddo. Nada ou quase nada foi feito. Hoje a Irlanda

<ffo Norte ê um Estado não governável e nessas condições s<5 há duas

saídas para ivestminster: * ou o Parlamento britânico suprime o go-

vêrno corrupto e obsoleto da irlanda do Worte tomando o poder para

si e criando condições para que as pessoas possam viver na Irlanda

do Worte, ou eles chegam à conclusão que não podem fazer nada. Nest

caso, eles que se retirem com letamente e éixem o lugar a pessoas

que podem fazer alguma coisa.

VEJA- Há quem coopere a situação de hoje na Irlanda do Norte com

a situação na Algéria há dez anos atrás. Outros comparam a luta

dos católicos com a dos negros nos Estados Unidos. <^ual a sua

opin.ião sobre a classificação da luta na Irlanda como uma 'guerra

de libertação nacio.ial'?

DEVLilí- Acho que não se trata exatamente de uma luta de libertação

da minoria católica, nossos direitos, afinal, ssax os direitos pelos

quais lutamos, estão intimamente ligados aos direitos dos próprios há

protestantes, principalmente os assalariados. Não/na Irlanda, por -

exemplo, aquele tipo de discriminação em bloco sofrida pelos negros

nos Estados Unidos. Não ê umaquestão de negros e brancos, de catálic

à protestantes. È o sistema todo na Irlanda do Norte que precisa ser

mudado. & preciso convencer os trabalhadores protestantes de que

eles tem osníesrnos interesses que os caflicos

VEJA- Sua opinião então é de que se trata de uma luta de classes?

DEVE1N- Não. A Inta não e'de classes. A solução, sim, ê de classe.

VEJ;\- Como se ex lica, então, que os assalariados protestantes

permaneçam <è tal firma leais a um governo conservador cora 5G a;ios

de existência?

DEVXxN- Ora, o _stado já foi criado com essa intenção. O ribeiro

governan te da '~rl nda do Corte declarou: * criamos um estaúo pro-

testants para um parlamento protestantes. P arn alcançar esse objetivo

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eles criaram todo um mito de 'ameaça papista'. infundiram na

população protestante o medo de serem esmagados ou encurralados

pelos católicos, veja, por exemplo, o que aconteceu na década de 3

quando praticamente em todos os países do mundo houve ui.ia violenta

depressão eonomica. ^a Irlanda do Norte, a culpa pela crise foi

jogada em cima do IRA. Líderes sindicais que tentaram organizar

marchas contra o desemprego foram internados naquela ocasião, como

sendo agitadores do IRA, fossem eles católicos ou protestantes. &£

Através desse mecanismo eles conseguiram manter a divisão sectária

da população ao longo da fronteira religioda, Mas a verdade ê que

os assalariados protestantes tem privilégios apenas paarginais em

relação aos católicos. Tem preferência nos empregos, na distri­

buição de casas populares. Mas no fim acabam recebendo os mesmo sa­

lários miseráveis e pagando os mesmos alugueis altos. Acontece qu.;

eles estão viciados por esses 50 anos de privilégios marginais. Por

isso não adianta gora chegar aos trabalhadores protestantes e dizer.

* de agora em diante é a igualdade absoluta'. Essas pessoas vao

reagir naturalmente. assa ê a razão pela qual, na minha opinião,

a única solução para a luta na Irlanda do Norte ê um aumento subs­

tancial nos recusrsos ^ disposição de toda a coletividade, casas,

empregos, salários, etc.^a verdade nós não lutamos por religião,

lutamos por causa da miséria. A diserminação tem que acabar imedia­

tamente, se o governo britânico que a paz na Irlinda do Norte, Mas

para a discriminação aebar é preciso uma transformação econômica.

VEJA- a sua opinião, então, a pura e simples retirada das tropas

britânicas não resolveria absolutamente ndda?

D K V L I N - I S S O seria o mesmo que o governo britânico lavar as mãos.

Se eles se decidirem por essa saída, então que proclamem clara:ieaite

que renunciam a qualquer direito sobe^ a Irlanda do Norte. Mas o

que aconteceria depois...Só ÜKKjixxxHfeKxDeus sabe. i^les que intro­

duzam as r-forraas necessárias, e então sim, retirem a tropas.

V Ü J A - Que tipo ai reformas? ^ Q T̂ a!7 . a primeira coisa a fazer

í-iF.VT.TN- ü R o governo i rxtanico quer a p*.* i

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é libertar os presos internados nos campos de concentração e abolir

as leis de excessão. Ao mesmo tempo deve ser criada a legislação

necessária para: criar um salário mínimo na região, eliminar o

enorme déficit no número de moradias, as necessário nacionaizando

a indústria de construção civil; incentivar a expansão de indús­

tria estatal na áreas de maior índice de desemprggo; forçar todas

as indústrias instaladas na Irlanda do Norte a aplicarem localmente

parte de seus lucros. .Não há uni único católico ou protestante assa­

lariado que possa ser contrário a essas medidas.

VEJA- Sua posição, pelo que se entende, não tem nada a ver, portantc

com a unificação pura e sin-les com a Irlanda do Sul?

DEVLIN- Há quem seja por essa união. Há quem prefira uma J-rlanda do

Norte separada. 0 que a maioria de fato quer ê sossego, Que nos

deixem viver, que nos deixem ser o que somos. Eu pessoalmente não

faço questão de uma união cora o regime reacionário da Mr. Lynch,

na Irlanda do Sul. Acho que um regime reacionário discriminará

contra os protestantes. E eu não quero aiolir a opressão contra os

católicos para instituir una opressão ontra protestantes.

VEJA- Alam das medidas de natureza econômica, que medidasf de na­

tureza institucional, por exmeplo, julga apropriadas? Um gabinete

mixto com católicos e protestantes, como sugerem agora alguns políti^

DEVLIN- Mudar estruturas de gabinete não ê o importante. Eu não me

preocuparia se houvessem nem mesmo izxx um gabinete de livre-prebis-

(7) terianos; 0 que importa ê introduzir as legislação necessária para

atacar os problemas de que já falei. E eles Sem o poder suficiente para os negros dos Estados Unidos

para fazer isso já. 0 que adiantaria,/por exemplo, se o Presidente

Nixon fosse um negro, mas continuasse o conservador que á?

VEJA- E onde entram os terroristas do IRA nessa história?

DEVLIN- 21es entram da mesma forma que os fanteraa xMegras entram

nos Estados Unidos. Eu não gosto de violência. \Tós não queremos

a violência, mas queremos a justiça. Acreditamos no nosso direito

de nos armarmos e exercemos a auto-defesa.

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VEJA- Então V. apoia as ações do IRÀ?

(8) DEVLIN- 0 IRA oficial ê um grupo que se encarrega, da defesa dos

bairros católicos quando são cometidas violências. Eu não discordo

da atuação do IRA oficial. E neu os considero ura grupo ata revolu­

cionário orgânico. * apenas uma organisação de auto-defesa.

VEJA- E qual a sua posição oci relação ao IRA provisional, acusado

de ser o agente princi;ai da campanha terrorista?

DEVLIN- ^s provisionais são urna vasta coligação que vai desde velhos

fascistas da década dos 40 até* a rapaziada que anda pelas ruas e

so indigna contra as violências das tropas britânicas. O fato de

eles existirem é" de caráter reacionário. Eu não concordo com a idéia

de que se pode abrir caminho a bomba. K uma idéia ingênua e por outro

lado uma prova de insensibilidade. A noção de que pelo fato de o

sistema na Irlanda do Norte se manter pela força ê possível mudá-lo

também pela força é falsa. Não se educa ninguém jogando bombas. Mas

ao mesmo tempo, quando alguém joga bombas em nossas asas, eu aprovo

as medidas de defesa. No que eu não acredito é" na ideologia dos

provisionais de que é possível libertar a Irlanda -5153É5!* e s^ depois

pensar num tir>o melhor de sociedade.

VEJA- Mas a imprensa britânica diz que boa parte do dinheiro arreca­

dado em sua campanha de palestras nos Estados unidos foi entregue

ao IRA, tanto ao oficial quanto ao provisional.

DEVLIN- E mentira. Outra mentira da imprensa britânica. mm

VEJA- ACha que o IRA tem potencial para manter a intensidade da

atual campanha terrorista?

DifiVLIN- A pergunta iao está bem formularia, e preciso que fique claro

que quem luta não é o IRA, é a população católica. A icleia de que

o TRA é uma terrível organisação é um mito. Cada vez que estoura uma

bomba ou um franco atirador dá ura tiro, a culpa é jogada no IRA.

As coisa- não são tão simples assim. Veja, por exemplo, o que acontece

quando as tropas britânicas resolvem fazer uma busca de armas num

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da do Norte tera Parlamento próprio, qae não entanto é subordinado

ao Parlamento britânico ew Vestmister• Bernadeète foi eleita como

representante em «estniinster - unia espácie de 'deputado federal*,

ü eleitorado na Irlanda Jb .íorte eloge deputados para o parlaneiito

local e para V/estminster. (6) È a Igreja de ían Paisley o mais

extremado dos líderes anti-católicos. (7) Há dois anos houve uma

cisão no IRA ( lixórcito "epublicano da Irlanda^ e surgiram as

facções 'oficial' e'provisional •. Amabas são ilegais e atuam.

portatito, na clandestinidade.

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