85
VANESSA DA ROCHA REGO “ALTERAÇÕES CEREBRAIS MORFOMÉTRICAS NO TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO (TEPT): UM ESTUDO DE MORFOMETRIA BASEADA EM VOXEL” TESE SUBMETIDA À UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO VISANDO A OBTENÇÃO DO GRAU DE DOUTOR EM CIÊNCIAS Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho 2 0 0 8

VANESSA DA ROCHA REGO - Livros Grátislivros01.livrosgratis.com.br/cp093376.pdf · Vanessa da Rocha Rego Alterações Cerebrais Morfométricas no Transtorno de Estresse Pós-Traumático

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  • VANESSA DA ROCHA REGO

    “ALTERAÇÕES CEREBRAIS MORFOMÉTRICAS NO TRANSTORNO

    DE ESTRESSE PÓS-TRAUMÁTICO (TEPT): UM ESTUDO DE

    MORFOMETRIA BASEADA EM VOXEL”

    TESE SUBMETIDA À UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE

    JANEIRO VISANDO A OBTENÇÃO DO GRAU DE

    DOUTOR EM CIÊNCIAS

    Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Ciências da Saúde Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho 2 0 0 8

  • Livros Grátis

    http://www.livrosgratis.com.br

    Milhares de livros grátis para download.

  • II

    Vanessa Rocha-Rego

    Alterações Cerebrais Morfométricas no

    Transtorno de Estresse Pós-Traumático

    (TEPT): Um estudo de Morfometria

    baseada em voxel.

    UF

    RJ

    V. I

  • III

    Vanessa da Rocha Rego

    Alterações Cerebrais Morfométricas no Transtorno de Estresse Pós-Traumático

    (TEPT): Um estudo de Morfometria baseada em voxel.

    Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas (Fisiologia), Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em Ciências biológicas (Fisiologia).

    Orientadora: Eliane Volchan

    Co-orientadora: Letícia de Oliveira

    Rio de Janeiro 2008

  • IV

    Vanessa da Rocha Rego

    Alterações Cerebrais Morfométricas no Transtorno de Estresse Pós-Traumático

    (TEPT): Um estudo de Morfometria baseada em voxel.

    Rio de Janeiro,15 de Dezembro de 2008

    ________________________ (Eliane Volchan, Doutora, UFRJ). ________________________ (Letícia de Oliveira, Doutora, UFF). ________________________ (Mario Fiorani Junior, Doutor, UFRJ). ________________________________________ (Ivan Luiz de Vasconcellos Figueira, Doutor, UFRJ). ____________________________________ (Mirtes Garcia Pereira Fortes, Doutora, UFF). ___________________________________

    (Jorge Moll Neto, Doutor, Rede LABS-D'Or).

  • V

    AGRADECIMENTOS

    As minhas orientadoras Eliane Volchan e Letícia de Oliveira pela orientação, compreensão e acima de tudo pela amizade.

    Aos amigos psiquiatras Ivan Figueira, Carla Marques Portella, Mauro Mendlowicz, Adriana Fiszman; William Berger, Mariana da Luz, pela ajuda com pacientes. A Mirtes e Mateus pela ajuda nos primeiros passos no uso do MATLAB, SPM, MARSBAR, WFU-pickatlas. Aos professores Michael Brammer e Janaína Mourão-Miranda pela acolhida em Londres durante o estágio no Institute of Psychiatry. Ao Jorge Moll, Fernanda Moll e Ivanei Ibramati pela colaboração no processo de aquisição das imagens. Ao Carlton Chu pela ajuda no uso da ferramenta Dartel. Ao Mario Fiorani, por seus comentários na revisão deste trabalho.

    Aos voluntários que participaram do estudo. Aos amigos Gabriela, Ana Carolina, Billy, Isabel, André, Carlos Eduardo, Camila, Thais, Nasstasja e Alessandra Lima por fazerem do laboratório um lugar muito especial.

    A minha família pelo amor, carinho e muitos momentos felizes.

    Ao meu marido Fábio pela compreensão, paciência, amizade e amor incondicional.

  • VI

    Quanto maiores são as dificuldades a vencer, maior será a satisfação.

    Marcus Cícero

  • VII

    Resumo

    Este estudo investigou através de análise morfométrica baseada em voxel (VBM) as alterações cerebrais volumétricas em vítimas de violência urbana com transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) em relação a um grupo controle exposto a trauma mas não tendo desenvolvido o transtorno.

    Ademais o volume cerebral da substancia cinzenta cerebral da amostra de pacientes foi correlacionado com escores de questionários de avaliação de reações peritraumáticas: pânico, imobilidade tônica e dissociação. Os resultados mostraram redução volumétrica do córtex cingulado anterior esquerdo (BA 32) e do córtex pré-motor direito (BA6) nos pacientes quando comparados com controles, p

  • VIII

    Abstract

    This study employed voxel based morphometry (VBM) to investigate volumetric brain alterations in victims of urban violence with Post-Traumatic Stress Disorder (PTSD) compared to a control group, which was exposed to urban violence but that did not develop PTSD.

    Additionally, grey matter volume of PTSD patients was correlated with the scores in scales that evaluated peritraumatic reactions: panic, tonic immobility and dissociation. Results showed that left anterior cingulate cortex (BA 32) and right pre-motor cortex (BA6) volumes were smaller in the PTSD group compared to the control group, p

  • IX

    Sumário 1. Introdução ..................................................................................................................1

    1.1 Elucidações sobre o transtorno de Estresse Pós-Traumático

    (TEPT) ........................................................................................................................1

    1.2 Tríade psicopatológica .............................................................................................. 2

    1.3 Reações peritraumáticas ........................................................................................... 5

    1.4 Transtorno do Estresse Pós-Traumático e alterações volumétricas no cérebro

    utilizando análise volumétrica com delimitação manual .................................................. 7

    1.5 Transtorno de Estresse Pós-Traumático e Morfometria Baseada

    em Voxel (VBM) .............................................................................................................10

    1.5.1 Alterações cerebrais no TEPT utilizando VBM ......................................................12

    1.6 Justificativa ...............................................................................................................13

    2. Objetivos ...................................................................................................................15

    3. Materiais e Métodos .................................................................................................16

    3.1 Amostra ....................................................................................................................16

    3.2 Psicometria ...............................................................................................................16

    3.3 Critérios de inclusão para os controles ....................................................................19

    3.4 Critério de inclusão dos pacientes ............................................................................19

    3.5 Critérios de exclusão para pacientes e controles .....................................................19

    3.6 Procedimento experimental ......................................................................................20

    3.7 Aquisição das imagens .............................................................................................21

    3.8 Pré-processamento da imagem................................................................................21

    3.9 Processamento da imagem ......................................................................................22

    3.10 Análise estatística ...................................................................................................25

  • X

    4. Resultados ................................................................................................................28

    4.1 Comparação Paientes X Controles ..........................................................................29

    4.2 Correlações entre reações peritraumáticas e alterações

    cerebrais no pacientes ...................................................................................................37

    5. Discussão .................................................................................................................48

    5.1 Cingulado Anterior ...................................................................................................48

    5.2 Córtex pré-motor ......................................................................................................54

    5.4 Hipocampo, Amígdala e Ínsula ................................................................................57

    5.5 Reações Peritraumáticas e Alterações Cerebrais ...................................................58

    5.6 Limitações do estudo ...............................................................................................60

    6. Conclusões ...............................................................................................................60

    Referências ...................................................................................................................62

  • XI

    Lista de Figuras:

    Figura 1A- Comparação entre pacientes e controles. Cérebro translúcido mostrando as regiões com diminuição de volume de substância cinzenta nos pacientes ...........................................................

    31

    Figura 1B- Comparação entre pacientes e controles. Cortes sagitais ilustrando regiões com volume reduzido nos pacientes ...............................................

    32

    Figura 1C- Comparação entre pacientes e controles. Cortes coronais ilustrando regiões com volume reduzido nos pacientes ...............................................

    33

    Figura 1D- Comparação entre pacientes e controles. Cortes horizontais ilustrando regiões com volume reduzido nos pacientes ...............................................

    34

    Figura 2- Comparação entre pacientes e controles. Cérebro translúcido mostrando que nenhuma região apresentava aumento de volume nos pacientes .........................................................

    35

    Figura 3A- Cérebro translúcido mostrando as regiões com volume reduzido que se correlacionam com a imobilidade tônica .........................................................

    38

    Figura 3B- Cortes coronais ilustrando as regiões com volume reduzido que se correlacionam com imobilidade tônica ............................................................

    39

    Figura 3C- Cortes sagitais ilustrando as regiões com volume reduzido que se correlacionam com imobilidade tônica ............................................................

    40

    Figura 3D- Cortes horizontais ilustrando as regiões Com volume reduzido que se correlacionam com imobilidade tônica ...........................................................

    41

    Figura 4A- Cérebro translúcido mostrando as regiões com volume reduzido que se correlacionam com a pânico ...........................................................................

    42

  • XII

    Figura 4B- Cortes coronais ilustrando as regiões com volume reduzido que se correlacionam com pânico ...............................................................................

    43

    Figura 4C- Cortes sagitais ilustrando as regiões com volume reduzido que se correlacionam com pânico ...............................................................................

    44

    Figura 4D- Cortes horizontais ilustrando as regiões Com volume reduzido que se correlacionam com pânico ...............................................................................

    45

    Figura 5- Cérebro translúcido mostrando que nenhuma região se correlaciona com dissociação .......................................................................

    46

    Figura 6-

    Anatomia do córtex cingulado anterior .....................................

    50

    Figura 7- Comparação entre em três estudos mostrando redução volumétrica do do cingulado anterior ................................................................

    53

    Figura 8- Ilustração da região pré-motora e dos movimentos produzidos após estimulação desta região em macacos .........................................................

    55

  • XIII

    Lista de Tabelas: Tabela 1- Critérios diagnósticos para o TEPT .........................................

    3

    Tabela 2- Resumo dos estudos que investigaram alterações cerebrais volumétricas no TEPT através da VBM ........................................................................

    14

    Tabela 3- Características demográficas e psicométricas pareadas entre os grupos e intensidade da gravidade do transtorno .......................................................

    28

    Tabela 4- Características demográficas e psicométricas não pareadas entre os grupos ..................................................

    29

    Tabela 5- Regiões com volume reduzido no TEPT ..................................

    30

    Tabela 6- Comparação entre pacientes e controles. Após análise de regiões de interesse ......................................

    36

    Tabela 7- Regiões com volume reduzido no TEPT que se correlacionam com imobilidade tônica ..........................

    38

    Tabela 8- Regiões com volume reduzido no TEPT que se correlacionam com pânico ............................................

    42

  • XIV

    Lista de Anexos: ANEXO 1- Artigo publicado da primeira fase deste estudo ...........................................66

    ANEXO 2- Inventário de sintomas do TEPT...................................................................71

    ANEXO 3- Questionário de experiências dissociativas...................................................72

    ANEXO 4- Escala de imobilidade tônica_adaptada .......................................................75

    ANEXO 5- Escala de reações físicas de pânico ........................................................... 76

    ANEXO 6- Roteiro para reorientação das Imagens........................................................77

    ANEXO 7- Roteiro para o pré-processamento das imagens..........................................79

    ANEXO 8- Roteiro para o cálculo do volume cerebral total ...........................................83

    ANEXO 9- Roteiro para a construção do modelo PTSD < CONTROL ..........................84

    ANEXO10-Roteiro para a construção do modelo de correlação das escalas e com

    volume cerebral...............................................................................................................85

  • 1

    1. Introdução

    1.1 Elucidações sobre o transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT)

    Estudos em diferentes paises afirmam que cerca de 1,3% a 37.4% dos

    indivíduos expostos a uma situação de violência grave, definida como ameaçadora à

    integridade física e emocional, desenvolverão um quadro de transtorno de estresse

    pós-traumático (TEPT) (Van et al., 2008). A organização Mundial de Saúde afirma

    que, embora seja difícil obter estimativas precisas, bilhões de dólares são

    consumidos anualmente em cuidados de saúde demandados por vítimas de

    violência. Outros tantos bilhões de dólares podem ser contabilizados como prejuízo

    às economias nacionais, em termos de perda de produtividade, judiciais e perda de

    investimento (Dahlberg L.L. & Krug, 2006). Devido aos efeitos deletérios que

    acarreta para a sociedade, a violência deve ser considerada como um importante

    problema de saúde pública, demandando pesquisas que desvendem seus

    mecanismos de ação nos processos de adoecimento e que possam subsidiar o

    desenvolvimento de ações para seu enfrentamento. Para isso, um importante passo

    é a realização de estudos sobre a patogenia do TEPT.

    O TEPT foi reconhecido pela primeira vez como uma entidade nosológica em

    1980, com a sua inclusão na terceira edição do Manual Diagnóstico e Estatístico

    para Transtornos Mentais (American Psychiatric Association., 1994). Antes de sua

    inclusão no DSM-III já tinha sido descritas síndromes similares durante a Guerra

    Civil Americana, a I Guerra Mundial, a II Guerra Mundial e a Guerra do Vietnã,,

    termos como "coração de soldado", "coração irritável","choque da granada",

    "neurose de combate" e fadiga operacional" foram utilizados para descrever o

    quadro de agitação psicomotora, hipervigilância e hiperstimulação fisiológica

  • 2

    resultantes de graves traumas psicológicos. Os sintomas foram observados tanto em

    veteranos quanto nos civis (p.ex. sobreviventes dos campos de concentração

    nazistas e das bombas atômicas no Japão).

    Atualmente o diagnóstico do TEPT, segundo o DSM-IV, Manual Diagnóstico e

    Estatístico para Transtornos Mentais (American Psychiatric Association., 1994) é

    constituído de seis critérios (tabela 1). O critério A é dividido no critério A1 definido

    como exposição a evento traumático no qual a pessoa experimentou, testemunhou

    ou tomou conhecimento de morte ou ferimentos graves e no critério A2 no qual a

    pessoa respondeu com intenso medo, impotência ou horror. A presença do critério

    A é determinante para prosseguimento da investigação diagnóstica. Além do critério

    A, para o diagnóstico de TEPT é necessário a presença de um sintoma de

    revivescência (critério B), três sintomas de evitação (critério C) e dois sintomas de

    hiperexitabilidade (critério D). Os sintomas devem iniciar até os seis primeiros meses

    após o evento e ter duração superior a um mês (critério E) e devem causar

    sofrimento clinicamente significativo, prejuízo social ou em outras áreas importantes

    do funcionamento (critério F).

    1.2 Tríade psicopatológica

    Os sintomas de revivescência, entorpecimento e hiperexitabilidade formam a

    “tríade psicopatológica” do TEPT (ver em Figueira e Mendlowicz, em 2003).

    Revivescência do trauma

    As revivescências podem se apresentar sob diversas formas: sonhos vívidos,

    pesadelos, pensamentos ou sentimentos incontroláveis, flashbacks. Tais

    recordações são intrusivas, pois surgem na mente e tendem a permanecer nela

  • 3

    ainda que o paciente tente evitar estes pensamentos. Essas recordações intrusivas

    comumente provocam sentimentos de medo, terror, raiva, impotência,

    vulnerabilidade e vergonha (Figueira & Mendlowicz, 2003).

    Tabela 1: critérios diagnósticos para transtorno de estresse pós-traumático A. Exposição a um evento traumático no qual os seguintes quesitos estiveram presentes: (1) a pessoa vivenciou, testemunhou ou foi confrontada com um ou mais eventos que envolveram morte ou grave ferimento, reais ou ameaçados, ou uma ameaça à integridade física, própria ou de outros; (2) a resposta da pessoa envolveu intenso medo, impotência ou horror. Nota: Em crianças, isto pode ser expressado por um comportamento desorganizado ou agitado B. O evento traumático é persistentemente revivido em uma (ou mais) das seguintes maneiras: (1) recordações aflitivas, recorrentes e intrusivas do evento, incluindo imagens, pensamentos ou percepções. Nota: Em crianças pequenas, podem ocorrer jogos repetitivos, com expressão de temas ou aspectos do trauma; (2) sonhos aflitivos e recorrentes com o evento. Nota: Em crianças podem ocorrer sonhos amedrontadores sem um conteúdo identificável; (3) agir ou sentir como se o evento traumático estivesse ocorrendo novamente (inclui um sentimento de revivência da experiência, ilusões, alucinações e episódios de flashbacks dissociativos, inclusive aqueles que ocorrem ao despertar ou quando intoxicado). Nota: Em crianças pequenas pode ocorrer reencenação específica do trauma; (4) sofrimento psicológico intenso quando da exposição a indícios internos ou externos que simbolizam ou lembram algum aspecto do evento traumático; (5) reatividade fisiológica na exposição a indícios internos ou externos que simbolizam ou lembram algum aspecto do evento traumático. C. Esquiva persistente de estímulos associados com o trauma e entorpecimento da responsividade geral (não presente antes do trauma), indicados por três (ou mais) dos seguintes quesitos: (1) esforços no sentido de evitar pensamentos, sentimentos ou conversas associadas com o trauma; (2) esforços no sentido de evitar atividades, locais ou pessoas que ativem recordações do trauma; (3) incapacidade de recordar algum aspecto importante do trauma; (4) redução acentuada do interesse ou da participação em atividades significativas; (5) sensação de distanciamento ou afastamento em relação a outras pessoas; (6) faixa de afeto restrita (por ex., incapacidade de ter sentimentos de carinho); (7) sentimento de um futuro abreviado (por ex., não espera ter uma carreira profissional, casamento, filhos ou um período normal de vida). D. Sintomas persistentes de excitabilidade aumentada (não presentes antes do trauma), indicados por dois (ou mais) dos seguintes quesitos: (1) dificuldade em conciliar ou manter o sono (2) irritabilidade ou surtos de raiva (3) dificuldade em concentrar-se (4) hipervigilância (5) resposta de sobressalto exagerada. E. A duração da perturbação (sintomas dos Critérios B, C e D) é superior a 1 mês. F. A perturbação causa sofrimento clinicamente significativo ou prejuízo no funcionamento social ou ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo. Especificar se: Agudo: se a duração dos sintomas é inferior a 3 meses. Crônico: se a duração dos sintomas é de 3 meses ou mais. Especificar se: Com Início Tardio: se o início dos sintomas ocorre pelo menos 6 meses após o estressor.

  • 4

    Esquiva e entorpecimento emocional

    Os pacientes usam uma série de estratégias emocionais, cognitivas e

    comportamentais para diminuírem o sofrimento e o terror causado pelas

    revivescências traumáticas e pelos sintomas de hiperestimulação autonômica a eles

    associados. Essas estratégias resultam em comportamentos variados de esquiva e

    no desenvolvimento de um entorpecimento emocional (anestesia emocional).

    A esquiva corresponde a uma tentativa desesperada de evitar contato com

    tudo que relembre o trauma. O paciente evita falar, pensar ou ir a locais associados

    ao trauma. A evitação pode assumir formas sutis. Para fugir das lembranças

    considera-se que o paciente possa desencadear processos dissociativos que são

    definidos como uma ruptura nas funções cognitivas integradas da consciência,

    memória, identidade ou percepção do ambiente. A dissociação poderia ter um efeito

    de manter fora da consciência os pensamentos e sentimentos penosos.

    Pode ocorrer também a redução de interesse ou da participação em

    atividades que antes lhe eram importantes. O entorpecimento psíquico (numbing) é

    outra manifestação dos mecanismos psicológicos através dos quais os pacientes

    com TEPT se apresentam "anestesiados" para as emoções o que atenua o terror,

    pânico e sofrimento intoleráveis acarretados pelos sintomas de revivescência do

    trauma. Esse sintoma acarreta não só atenuação do afeto negativo derivado das

    memórias dolorosas, como também as emoções positivas. Pacientes com TEPT

    apresentam dificuldade de rir, chorar, amar, ou seja, vivenciar e manifestar seus

    sentimentos (Figueira & Mendlowicz, 2003).

  • 5

    Hiperestimulação autonômica

    Esses sintomas são mais facilmente observáveis e incluem a irritabilidade,

    insônia, sobressalto excessivo e hipervigilância. Nesse estado de hiper-reatividade

    psicofisiológica estímulos mínimos provocam taquicardia, taquipnéia, aumento da

    sudorese e reações de sobressaltos. A hiperestimulação também pode se expressar

    através de queixas somáticas, tais como: fadiga, cefaléias, tremores e tonteiras

    comprometendo a qualidade de vida dos pacientes com TEPT (Figueira &

    Mendlowicz, 2003).

    1.3 Reações peritraumáticas

    Quando um indivíduo vivencia uma situação estressante de ameaça a vida,

    diferentes reações peritraumáticas (no momento do trauma), tais como dissociação,

    pânico e imobilidade tônica, podem ser deflagradas. Há um aumento crescente de

    estudos que investigam como essas reações poderiam estar relacionados com o

    TEPT (Ozer et al., 2003; Lawyer et al., 2006; Fiszman et al., 2008).

    A dissociação peritraumática é caracterizada por alterações temporárias na

    percepção do ambiente e na ruptura das funções cognitivas. São características

    desta reação a redução da percepção (sair do ar), distorção do tempo (tempo em

    câmera lenta), despersonalização (sensação de estar fora do corpo), desrealização

    (sensação de estar num sonho) e agir no piloto automático. Estudos propõem que a

    dissociação é uma adaptação para minimizar o impacto emocional do evento

    traumático pela redução ou alteração da percepção da experiência traumática (Van

    der Kolk & Van der Hart, 1989). Dentre as reações peritraumáticas a dissociação e

    mais estudada com inúmeros estudos mostrando sua associação com o

    desenvolvimento e a gravidade do TEPT em vítimas de acidente natural (Koopman

  • 6

    et al., 1994), ex-combatentes de guerra (Marmar et al. 1994; O'Toole et al., 1999;

    Tichenor et al., 1996), vítimas de acidente de carro (Ursano et al., 1999) e

    sobreviventes de trauma físico (Michaels et al., 1999; Shalev et al., 1996).

    A reação de pânico peritraumático é caracterizada pela hiperestimulação

    fisiológica com participação importante do sistema nervoso autonômico. Os sintomas

    mais comuns são falta de ar, tonteira ou sensação de desmaio, coração acelerado,

    tremores ou abalos, sudorese, náusea ou desconforto abdominal, dormência ou

    formigamento no corpo, ondas de calor ou calafrios, sufocação e dor no peito. Nixon

    e Bryant, em 2003 observaram que 77% de uma amostra de vítimas de um evento

    traumático deflagraram reações de pânico peritraumático. Mais recentemente,

    estudos começaram a investigar associação entre as reações de pânico

    peritraumático e o TEPT. Os indivíduos que experimentaram mais fortemente essas

    reações também tinham maior risco de desenvolver o TEPT e serem mais graves

    (Nixon & Bryant, 2003; Lawyer et al., 2006; Tucker et al., 2000).

    Dentre as reações peritraumáticas a imobilidade tônica é uma das menos

    estudadas e é deflagrada frente a uma situação ameaçadora e inescapável. É

    caracterizada por uma paralisação motora temporária com a percepção do ambiente

    preservada. Foi relatada em mulheres e crianças vítimas de abuso sexual (Galliano

    et al., 1993; Heidt et al., 2005) e em vítimas de violência urbana (Fiszman et al.,

    2008). Estudos em várias espécies Sugerem que a imobilidade tônica diminua a

    chance de morte frente a um ataque, (Gallup, 1977). Porém está reação adaptativa

    pode apresentar conseqüências desastrosas a longo prazo (Hofer, 1970).

    Recentemente, nosso grupo foi o primeiro a publicar um estudo que mostrou

    associação entre a imobilidade tônica e a gravidade do TEPT(Rocha-Rego, 2008)

  • 7

    Este estudo mapeou as reações peritraumáticas de imobilidade tônica,

    dissociação e pânico dos pacientes vítimas de violência urbana, atendidos no

    ambulatório de pesquisa do transtorno do estresse da UFRJ, e investigou essas

    reações como preditoras da gravidade dos sintomas de TEPT (anexo 1). As três

    respostas peritraumáticas foram associadas com a gravidade dos sintomas de

    TEPT. Nosso resultado mostrou sendo a imobilidade tônica o melhor preditor da

    gravidade dos sintomas de TEPT. Este trabalho ressalta a importância de se incluir

    as respostas peritraumáticas na investigação da patogenia do TEPT.

    1.4 Transtorno do Estresse Pós-Traumático e alterações volumétricas no cérebro

    utilizando análise volumétrica não automatizada.

    Aproximadamente há 15 anos iniciaram os estudos sobre alterações cerebrais no

    TEPT utilizando análise volumétrica não automatizada. Neste tipo de análise existe a

    necessidade de se determinar a priori a estrutura a ser investigada. Dentre as

    estruturas investigadas nestes trabalhos estão hipocampo, amígdala e córtex

    cingulado anterior. A delimitação das bordas anatômicas das estruturas em foco é

    realizada manualmente.

    Estudos de ressonância anatômica no TEPT observaram diminuição do

    volume do hipocampo em combatentes de guerra (Bremner et al., 1995; Gilbertson

    et al., 2002 ; Gurvits et al., 1996), vítimas de abuso sexual na infância (Bremner et

    al., 1997; 2003; Stein et al., 1997), policiais (Lindauer et al., 2004), pacientes de

    emergência hospitalar (Wignall et al., 2004), e pacientes com queimaduras graves

    (Winter & Irle, 2004). Contudo outros estudos não observaram redução volumétrica

    do hipocampo em veteranos de guerra (Schuff et al., 2001), crianças e adolescentes

    que sofreram maus tratos (De Bellis et al., 2001; 2002), mulheres vítimas de abuso

  • 8

    na infância (Pederson et al., 2004), pacientes recrutados numa emergência

    hospitalar (Bonne et al., 2001) e mulheres vítimas de violência causada pelo marido

    (Fennema-Notestine et al., 2002). Portanto, ainda são controversos os achados de

    alteração volumétrica hipocampal no TEPT.

    A maioria dos estudos não observa redução volumétrica da amígdala (Bonne

    et al., 2001; De Bellis et al., 2001; Gilbertson et al., 2002; Gurvits et al., 1996;

    Fennema-Notestine et al., 2002; Wignall et al., 2004). Uma exceção é o estudo de

    Pavlisa e colaboradores, (2006) que observaram diminuição do volume da amígdala

    em pacientes com TEPT crônico (n=11) quando comparados com um grupo controle

    (p=0.031), Entretanto, muitos estudos com ressonância magnética funcional (fMRI)

    atribuem à amígdala papel fundamental na fisiopatologia do TEPT (Liberzon et al.,

    1999, Shin et al., 2004, Lanius et al., 2006) Estes estudos sugerem que a

    hiperatividade da amígdala estaria associada aos sintomas de hiperexcitabilidade

    observados no TEPT (e.g., insônia, irritabilidade e hipervigilância), (Liberzon et al.,

    1999; Shin et al., 2004). Há portanto uma inconsistência entre os estudos de

    ressonância magnética funcional que apontam para o envolvimento da amígdala no

    TEPT e a maioria dos estudos de ressonância anatômica volumétrica que não

    relatam alterações morfológicas nesta estrutura.

    Em nosso levantamento encontramos cinco estudos que investigaram

    alterações volumétricas no cingulado anterior todos encontraram redução do volume

    desta estrutura. Rauch e colaboradores (2003), observaram diminuição do cingulado

    anterior pregenual em nove enfermeiras combatentes de guerra com TEPT em

    comparação com nove enfermeiras combatentes sem TEPT.

    Woodward e colaboradores observaram diminuição do córtex cingulado anterior em

    51 pacientes com TEPT ex-combatentes nas guerras do Vietnã e Golfo. (Woodward

  • 9

    et al., 2006). Kitayama e colaboradores também observaram redução volumétrica do

    cingulado anterior em oito pacientes TEPT vítimas de abuso sexual (Kitayama et al.,

    2006).

    Karl e colaboradores (2006), reuniram numa meta-análise diferentes estudos

    de alterações volumétricas cerebrais no TEPT. Esta meta-análise incluiu dezenove

    estudos, a maioria investigou alterações no hipocampo cuja delimitação para

    realização da analise volumétrica é mais evidente. Outras regiões de mais difícil

    delimitação foram menos estudadas como o cingulado anterior e a amígdala. Todos

    investigaram hipocampo sendo que doze observaram redução de volume e sete não

    observaram alterações. Onze investigaram amígdala e nenhum encontrou alterações

    significativas desta estrutura. Quatro estudos investigaram o cingulado anterior e

    todos observaram redução desta estrutura.

    O objetivo da meta-análise foi integrar quantitativamente os achados da

    literatura sobre alterações volumétricas cerebrais no TEPT e avaliar o efeito de

    diferentes variáveis moderadoras que poderiam influenciar nos achados, tais como:

    metodologia, gênero, idade, tempo de trauma, técnica utilizada na ressonância,

    gravidade, comorbidades, medicação, duração do TEPT. As análises foram

    conduzidas com a formação de dois grupos de estudos homogêneos: 1) estudos que

    comparavam pacientes com TEPT e controles com trauma, 2) estudos que

    comparavam pacientes com TEPT e controles sem trauma. O número de pacientes

    de cada estudo influenciava o peso que este estudo teria na análise. Os principais

    achados desta meta-análise foram: significativa diminuição bilateral do hipocampo;

    analisando o grupo de estudos 1 (TEPT X controle com trauma) observou-se uma

    diminuição bilateral do hipocampo apenas nos estudos que utilizaram pacientes com

    TEPT grave; Nos grupos 1 e 2 observou-se diminuição no córtex cingulado anterior e

  • 10

    amígdala bilateral. Os autores concluíram que a redução do hipocampo poderia ser

    influenciada pela idade de exposição ao trauma e poderia ser observada em

    amostras graves não medicadas e que as alterações volumétricas não eram restritas

    só ao hipocampo (Karl et al., 2006).

    1.5 Transtorno de Estresse Pós-Traumático e Morfometria Baseada em Voxel (VBM)

    A partir do advento da ressonância magnética, neurocientistas foram capazes

    de avaliar o cérebro vivo humano. Desde então numerosos métodos automatizados

    e semi-automatizados emergiram com intuito de melhorar a resolução e o

    processamento das imagens cerebrais. Isso permitiu observar em diferentes

    cérebros diferentes características, tais com, o formato e tamanho de uma estrutura.

    A morfometria baseada em voxel (voxel-based morphometry, VBM) é um

    desses métodos de análise de imagem anatômica que tem sido amplamente usado

    desde a década passada (Ashburner & Friston, 2000; 2001; Davatzikos et al., 2001).

    Diferente dos métodos não automatizados que necessitam da delimitação das

    bordas anatômicas das estruturas a serem investigadas. A principal vantagem deste

    método é a possibilidade de analisar imagens de alta resolução do cérebro inteiro,

    sem o viés de se investigar áreas ou estruturas em particular. Uma outra vantagem

    da VBM sobre método anatômico não automatizado é a construção de um cérebro

    modelo (template) personalizado por amostra e tomógrafo (ver métodos). O cérebro

    modelo é um espaço estereotáxico comum, no qual os cérebros dos sujeitos do

    estudo devem se sobrepor para permitir comparações entre si. Nos estudos de

    ressonância anatômica não automatizada este cérebro modelo é baseado na média

    de 250 sujeitos do estudo de Evans e colaboradores do Montreal Neurological

  • 11

    Institute (MNI) (Evans et al., 1992). Este cérebro modelo é utilizado pelo Statistic

    Parametric Mapping (programa que analisa os dados das imagens cerebrais) para

    sobrepor as imagens permitindo a comparações entre os grupos.

    Nos estudos de VBM utilizando o algoritmo DARTEL (Diffeomorphic

    Anatomical Registration Through Exponentiated Lie Álgebra) este cérebro modelo é

    criado baseado nos cérebros dos sujeitos controles e experimentais que

    participaram de um determinado estudo (ver seção 3.9, criando cérebro modelo). A

    utilização de um cérebro modelo personalizado para o estudo é importante por

    porque diferenças espúrias no contraste são diminuídas, pois as imagens dos

    indivíduos investigados se sobrepõem a um cérebro modelo criado a partir das

    imagens cerebrais dos mesmos indivíduos através de imagens capturadas no

    mesmo tomógrafo, o que elimina a influência de campos não homogêneos e não

    uniformes que são diferentes em cada máquina. Uma outra vantagem da VBM é a

    normalização ser baseada na especificidade dos tecidos (substância cinzenta,

    substância branca e líquor). O desenvolvimento da ferramenta DARTEL

    também contribui para uma melhor normalização uma vez que as imagens dos

    cérebros são normalizadas para um template otimizado o que melhora os resultados

    em termos de localização e sensibilidade (Ashburner, 2007), (para mais detalhes ver

    seção 3.9).

    Além disso, o algoritmo do método VBM tem um melhor desenpenho na etapa

    de segmentação quando comparado com algoritmos de outros métodos (ver seção

    3.9, segmentação)(Ashburner & Friston, 2000).

  • 12

    1.5.2 Alterações cerebrais no TEPT utilizando VBM

    As

    inúmeras vantagens de VBM têm estimulado vários autores a optarem por esta

    técnica. Apesar de recente, alguns estudos de ressonância anatômica no TEPT já a

    utilizaram. Yamasue e colaboradores (2003) avaliaram pessoas que foram expostas

    a sarin, num ataque terrorista no metro de Tóquio em 1995. As vítimas com TEPT

    apresentavam diminuição do cingulado anterior em comparação aos controles. Além

    disso, os autores encontraram uma correlação significativa com a gravidade dos

    sintomas quanto maior a gravidade do TEPT menor o cingulado anterior. Chen e

    colaboradores (2006) investigaram as possíveis alterações cerebrais em vítimas de

    um mesmo incêndio. Observou-se que os pacientes com TEPT apresentavam

    diminuições da ínsula e do hipocampo bilaterais e diminuição do cingulado anterior

    esquerdo. Não foi encontrada correlação entre a gravidade do TEPT e as alterações

    cerebrais. Corbo e colaboradores (2005) investigaram possíveis alterações cerebrais

    em sujeitos selecionados numa emergência hospitalar que tinham passado por um

    trauma (50% acidente automobilístico) nas últimas 4 semanas. Nos indivíduos, com

    TEPT (no caso TEPT agudo) foram encontradas diminuição no cingulado anterior

    pregenual, cingulado anterior dorsal, cingulado anterior medial e insula esquerda.

    Jatzko e colaboradores (2006) não observaram diminuição no hipocampo em vítimas

    com TEPT que testemunharam um acidente aéreo. Os estudos que investigaram as

    alterações do TEPT com VBM no nosso levantamento os e seus principais achados

    estão ilustrados na tabela 2.

  • 13

    1.6 Justificativa

    O aumento crescente da violência urbana no Brasil e no mundo pode refletir

    um crescente aumento das taxas de TEPT (Chesnais J.C., 1999; Dahlberg & Krug,

    2006). Esta constatação torna clara a necessidade de pesquisas que investiguem as

    alterações cerebrais existentes neste transtorno subsidiando estudos que visem o

    desenvolvimento de tratamentos farmacológicos e psicoterápicos, através da

    investigação de alterações cerebrais em vítimas de violência urbana que

    desenvolveram TEPT, além de estratégias de prevenção. É neste cenário que este

    estudo se insere. A escolha da técnica de análise de imageamento cerebral DARTEL

    também visa melhorar a sensibilidade e localização das alterações de volume no

    cérebro. Além disso, o estudo se propõe a investigar a associação entre alterações

    cerebrais e respostas peritraumáticas.

    Baseadas nos achados da literatura descritos anteriormente e nas propostas de

    circuitos envolvidos no TEPT as expectativas de alterações volumétricas estão no

    cingulado anterior, hipocampo e insula e não observar reduções volumétricas na

    amígdala.

  • 14

    Referência Estruturas Tipo de trauma Contraste Medicação Comorbidades

    Yamasue et

    al, 2003.

    Córtex cingulado

    anterior

    P

  • 15

    2. Objetivos

    1. Investigar as alterações morfométricas em vítimas de violência urbana com

    TEPT comparados com controles expostos a trauma através da análise global

    do volume de substância cinzenta.

    2. Investigar se a intensidade reações peritraumáticas de imobilidade tônica,

    dissociação e pânico estão associadas à variação de volume de regiões

    cerebrais, mais especificamente regiões pré-frontais.

  • 16

    3. Materiais e Métodos

    3.1 Amostra

    Trinta e dois pacientes com TEPT foram recrutados no ambulatório de

    atendimento especializado a vítimas de violência, localizado no Instituto de

    Psiquiatria da UFRJ. Destes trinta e dois, dezesseis foram selecionados e a outra

    metade apresentava um ou mais critérios de exclusão (ver critérios de exclusão,

    seção 3.5). Além do TEPT, todos os dezesseis pacientes apresentavam depressão,

    onze apresentavam transtorno obsessivo compulsivo e quatro, transtorno de pânico.

    O grupo controle foi selecionado de uma lista de aproximadamente 300

    funcionários dos Institutos de Biofísica, Bioquímica e Psiquiatria. A partir desta lista

    vinte e um sujeitos foram selecionados devido à semelhança com os pacientes em

    relação a características tais como idade, grau de escolaridade e sexo. Destes,

    dezesseis satisfizeram os critérios para inclusão e exclusão e foram incluídos no

    estudo. Um controle apresentou história de transtorno obsessivo compulsivo no

    passado. Dois controles apresentavam história de TEPT parcial no passado e quatro

    apresentavam depressão no passado. Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética

    do Instituto de Psiquiatria da UFRJ.

    3.2 Psicometria

    Os instrumentos utilizados tinham com propósito: diagnosticar o TEPT e

    outros transtornos mentais associados; avaliar a gravidade do TEPT (PCL); avaliar

    as respostas peritraumáticas (PDEQ, TIS, PRS); e avaliar características sócio-

    demográficas.

  • 17

    Diagnóstico

    O diagnostico foi realizado através de uma entrevista clinica estruturada

    (Structured Clinical Interview Diagnosis for Diagnostic and Statistical Manual of

    Mental Disorders - Fourth Edition, SCID-I for DSM-IV) (First et al., 1997; Del-Ben et

    al., 2001). A entrevista inicia-se por uma seção de revisão geral, que segue o roteiro

    de uma entrevista clínica não-estruturada, conduzida por um profissional experiente.

    Em seguida, é dividida em módulos que correspondem às categorias diagnósticas

    maiores, dentre elas: os transtornos esquizofrênicos, transtornos depressivos,

    transtornos obessessivos-compulsivos, transtorno de estresse pós-traumático, etc.

    Os critérios diagnósticos estão presentes no próprio corpo do instrumento, facilitando

    a elaboração do diagnóstico conforme a entrevista progride. No final desta entrevista

    se confirma ou não o diagnóstico de TEPT, além do diagnóstico de outros

    transtornos.

    Avaliação da gravidade do TEPT

    Foi aplicado o Inventário de Sintomas de Transtorno de Estresse Pós-Traumático,

    versão civil - Post-Traumatic Stress Disorder Checklist, Civilian Version (PCL-C)

    (Berger et al., 2004). O PCL-C é um instrumento de auto-aplicação de 17 itens

    baseados nos critérios de diagnóstico para TEPT, segundo o DSM-IV. O paciente

    indica numa escala de 1 a 5 o quanto se sentiu incomodado por cada sintoma no

    último mês. Uma das principais utilizações do PCL-C é indexar a gravidade do

    quadro de TEPT, bem como acompanhar a sua evolução. A pontuação superior a 50

    no PCL-C é considerada um indicativo de suspeição de caso de TEPT (Anexo 2 ).

  • 18

    Avaliação das respostas comportamentais no momento do trauma

    • Questionário de Experiências Dissociativas Peritraumáticas - Peritraumatic

    Dissociative Experiences Questionnaire (PDEQ) (Marmar et al., 1998; Fiszman et al.,

    2005). O PDEQ contém 10 itens sobre experiências que podem ocorrer durante ou

    imediatamente após o evento traumático, tais como: sensação de “sair do ar”, agir

    no “piloto automático”, alteração da noção de tempo, sensação de irrealidade,

    sensação de flutuação, desconectar-se do corpo, dificuldade de entender o que está

    acontecendo e desorientação têmporo-espacial. Para cada item, o individuo pontua

    de 1 (não aconteceu) a 5 (aconteceu extremamente). O escore total varia entre 10 e

    50, (Anexo 3 ).

    • Escala de Imobilidade Tônica – Tonic Immobility scale (TIS) (Fuse et al., 2007;

    Fiszman et al., 2008). A avaliação da imobilidade tônica foi realizada através de 4

    questões adaptadas da escala TIS (Rocha-Rego et al., 2008), são elas: Marque o

    quanto você se sentiu congelado ou paralisado durante o acontecimento, marque o

    quanto você se sentiu incapaz de se mexer mesmo que ninguém estivesse lhe

    prendendo durante o acontecimento, marque o quanto você sentiu incapaz de gritar

    mesmo tendo vontade durante o acontecimento, marque o quanto você se sentiu

    incapaz de escapar mesmo tendo vontade. Cada item poderia ser pontuado numa

    escala de 0 a 6 e a pontuação total é calculada pela soma de todos os valores das

    respostas (Anexo 4).

    • Sub-escala de Reação Física – Physical Reaction Subscale (PRS). A PRS é

    composta por 11 perguntas referentes às reações físicas na crise de pânico que

    podem ocorrer durante ou imediatamente após o evento traumático (Resnick et al.,

  • 19

    1994). Estas reações incluem: falta de ar, tonteira ou sensação de desmaio, coração

    acelerado, tremores ou abalos, sudorese, náusea ou desconforto abdominal,

    dormência ou formigamento no corpo, ondas de calor ou calafrios, sufocação, dor ou

    desconforto no peito. Para cada item a pontuação varia entre 1 (nunca) e 4

    (extremamente). A pontuação total é calculada pela soma de todos os valores das

    respostas (Anexo 5).

    Avaliação das características sócio-demográficas.

    Aplicou-se um questionário em que constavam a identificação pessoal,

    endereço, telefone, escolaridade, estado civil e renda familiar dos participantes.

    3.3 Critérios de inclusão para os controles.

    • Ter sido vítima de violência urbana

    • Ter características de idade, grau de escolaridade e sexo semelhantes as dos

    pacientes.

    • Ter pontuação na escala de gravidade abaixo de 50 e ter no maximo um

    grupo de sintomas preenchido.

    • Ausência de outros transtornos mentais atuais.

    3.4 Critério de inclusão dos pacientes

    • Ter o diagnóstico de TEPT

    3.5 Critérios de exclusão para pacientes e controles

    • Condições médicas graves,

    • Quadros psicóticos graves (p.ex, esquizofrenia, transtorno bipolar, etc),

    • Risco de suicídio,

  • 20

    • Retardo mental, analfabetismo, demência,

    • Graves transtornos de personalidade (p.ex., borderline, anti-social, etc),

    • Abuso de álcool e outras substâncias químicas,

    • Implante metálico,

    • Claustrofobia,

    • Gravidez.

    3. 6 Procedimento experimental

    No primeiro dia de atendimento é realizada a avaliação pelo psiquiatra do

    critério A1 para diagnóstico de TEPT (ver segundo parágrafo da introdução) e

    investiga-se o trauma. Se este critério for confirmado, um próximo atendimento é

    marcado para semana seguinte e o psiquiatra inicia a entrevista utilizando o SCID-I.

    Caso contrário o sujeito é encaminhado para outro ambulatório dentro da mesma

    instituição. A entrevista utilizando o SCID-I, na maioria das vezes, é realizada nas

    próximas duas consultas do paciente. Uma vez, confirmado o diagnóstico de TEPT o

    paciente é convidado pelo experimentador a participar do estudo e preenche o termo

    de consentimento. A partir daí, se for o caso, os pacientes são medicados, e

    acompanhados uma vez por mês no ambulatório. À medida que eles comparecem

    ao ambulatório os dados psicométricos são coletados e quando a coleta termina, o

    experimentador marca o dia do exame de ressonância. No dia do exame de

    ressonância, realizado na clínica LAB´S de botafogo, o paciente é recepcionado pelo

    experimentador e pelo psiquiatra. Em seguida, preenche uma ficha cadastral e são

    confirmados novamente os critérios de exclusão para o exame (por exemplo,

    marcapasso, implante metálicos, etc.). A seguir, o paciente é acomodado no

    tomógrafo pela equipe do LAB´S e tampões de ouvido são colocados no paciente

    por causa do barulho gerado pela máquina. O paciente tem a cabeça fixada por um

    sistema de contenção e é instruído a não mexer. Além disto, o paciente é informado

  • 21

    que poderá se comunicar com o psiquiatra e interromper o exame a qualquer

    momento, se assim o desejar, através de um dispositivo de comunicação entre o

    paciente e a equipe que conduz o experimento. O exame tem a duração média de

    30 minutos. Durante o exame, em momentos específicos o psiquiatra conversa com

    o paciente para avaliar seu estado geral e para tranqüilizá-lo. No final do exame, o

    psiquiatra e experimentador prestam assistência ao paciente até ele deixar a clínica.

    O procedimento experimental referente aos controles iniciou-se com uma

    visita do experimentador aos sujeitos previamente selecionados através da lista de

    funcionários. O convite para participar do estudo era feito após se explicar o objetivo

    do mesmo. Confirmado os critérios de inclusão e descartados os de exclusão o

    exame de ressonância era agendado. No dia agendado também foi realizada uma

    entrevista psiquiátrica para confirmar a ausência de TEPT e de outros transtornos

    atuais. Em seguida realizou-se o exame de ressonância.

    3.7 Aquisição das imagens

    As imagens foram coletadas, na clínica LAB´S de Botafogo, num tomógrafo

    por ressonância magnética funcional (PHILIPS Medical Systems, The Netherlands)

    de 1.5 tesla. Uma série contínua, de 160 imagens sagitais de alta resolução

    ponderadas em T1, foi adquirida com os seguintes parâmetros: TR/TE/FA/FOV: 8.1

    ms/ 3.7 ms/ 8 deg/ 256 mm, Matrix: 256 x 256, resolução de 1mm2.

    3.8 Pré-processamento da imagem

    Utilizando o programa MRIcro todas as imagens T1 foram avaliadas através

    de inspeção visual quanto a ausência de artefato. Depois, todas as imagens foram

    convertidas e re-orientadas para a visualização no SPM e por fim as imagens foram

  • 22

    alinhadas para que o zero estereotáxico estivesse centrado na comissura anterior.

    Nenhuma imagem foi excluída nestes processos. Um tutorial sobre o pré-

    processamento conduzido nas imagens encontra-se no anexo 6.

    3.9 Processamento da imagem

    O processamento das imagens foi realizado através da toolbox DARTEL do

    SPM5, que ocasiona melhoria na localização e sensibilidade dos resultados da

    análise de VBM (Ashburner, 2007). O processamento da imagem pode ser dividido

    em segmentação, criação de um cérebro modelo, criação da deformação - warped

    (modulação), suavização e normalização para o espaço MNI. Um tutorial sobre o

    processamento conduzido nas imagens encontra-se no anexo 7.

    Segmentação

    As imagens T1 de cada sujeito foram segmentadas em substâncias cinzenta,

    branca e liquor. Tradicionalmente, os métodos de segmentação se baseiam

    exclusivamente no histograma de intensidade dos voxels ou no co-registro do

    volume de cada sujeito com uma imagem de referência (template) na qual a

    distribuição dos diferentes tecidos é previamente conhecida. O SPM5 combina essas

    duas etapas num único processo, melhorando o resultado final da segmentação,

    conhecido como “unified segmemtation” (Ashburner & Friston, 2005). O

    procedimento consiste numa série de interações envolvendo classificação dos

    tecidos baseado num mapa de probabilidades de tecidos, correção de não

    uniformidade de intensidade e normalização das imagens. No final deste processo,

    para cada sujeito são geradas uma imagem segmentada de substância cinzenta,

    branca e liquor.

  • 23

    Criando cérebro modelo (template)

    A utilização da ferramenta DARTEL resultou na construção de seis cérebros

    modelos. O primeiro cérebro modelo constituía-se na imagem média dos volumes

    originais de todos os sujeitos e o último constituía-se na média dos volumes co-

    registrados, após as cinco interações precedentes de co-registro e cálculo do volume

    médio. Em cada etapa na construção do cérebro modelo eram calculadas as

    transformações não-lineares que minimizam a diferença quadrática média entre as

    imagens. O primeiro cérebro modelo foi baseado na imagem média de substância

    cinzenta e branca originais de todos os sujeitos. Em seguida, as imagens de

    substância branca e cinzenta de cada sujeito foram deformadas para se ajustarem a

    esse primeiro cérebro modelo (imagem média). Com base nas imagens cerebrais

    deformadas que se ajustaram ao primeiro cérebro modelo calculou-se um segundo

    cérebro modelo. Esse processo ocorreu novamente, um terceiro cérebro modelo foi

    criado utilizando as imagens cerebrais que foram deformadas e se ajustaram ao

    segundo cérebro modelo. Esse processo se repetiu até a construção do sexto e

    último cérebro modelo. No final desta etapa foram salvos os parâmetros de

    deformação que descreviam o melhor ajuste entre as imagens.

  • 24

    Criando deformação (warped)

    Nesta etapa as imagens de substância cinzenta de todos os sujeitos sofreram

    as deformações estabelecidas na etapa de anterior e foram moduladas. A

    modulação age compensando os efeitos da deformação espacial decorrente do

    ajuste das imagens a um template. Durante estas deformações é inevitável que

    alterações volumétricas sejam introduzidas. Como exemplo, podemos considerar

    uma situação em que o lobo temporal de um sujeito é a metade do lobo temporal do

    template. Durante o processo de deformação o volume do lobo temporal do sujeito

    será duplicado para se ajustar ao template. Isto também resultará na duplicação do

    volume de substância cinzenta nessa mesma região para o sujeito em questão. Para

    solucionar este problema, a imagem de substância cinzenta normalizada é modulada

    multiplicando-a pelo seu volume relativo antes e depois da deformação. Se a

    deformação resultou na duplicação do volume do lobo temporal, a modulação

    diminuirá pela metade a intensidade do sinal de substância cinzenta. A modulação

    tem o efeito de preservar a quantidade total de sinal de substância cinzenta original

    dentro de cada voxel

    No final desta etapa foram geradas imagens de substâncias cinzentas co-

    registradas e moduladas, no qual cada voxel constituía-se na probabilidade de ser

    substância cinzenta juntamente com os seus parâmetros de deformação.

    Em seguida, estas imagens de substância cinzenta são suavizadas com um

    filtro espacial de 8 mm FWHM. Esse alisamento melhora ainda mais o co-registro

    entre os sujeitos.

  • 25

    Normalização das imagens para espaço MNI.

    Após a suavização, as imagens cerebrais de todos os sujeitos foram

    normalizadas para o espaço MNI.

    3.10 Análise estatística

    Especificação do modelo

    Testes estatísticos ao nível de cada voxel foram realizados nas imagens

    processadas usando modelo linear generalizado (GLM). Neste estudo foram

    realizados testes t para comparar os volumes de substância cinzenta entre pacientes

    com TEPT e controles, e correlação para testar a associação entre as escalas

    peritraumáticas e os volumes de substância cinzenta dos pacientes.

    No GLM, o modelo é representado como uma matrix. Cada linha da matrix

    corresponde à imagem cerebral de um sujeito, enquanto cada coluna é algum efeito

    modelado. As variáveis de confusão são um exemplo de efeito modelado. As

    variáveis de confusão são aquelas que podem explicar parte do resultado, gerando

    uma interpretação errada dos mesmos. Como possíveis variáveis de confusão nos

    identificamos sexo, grau de escolaridade, idade, tempo de trauma e volume cerebral

    total. Para o cálculo de volume cerebral total ver anexo 8.

    Inicialmente, havíamos identificado sexo, idade, tempo de trauma, grau de

    escolaridade e volume cerebral total como possíveis variáveis de confusão a serem

    incluídas no modelo. Porém, apenas as variáveis de confusão que explicavam

    diferenças estatisticamente significativas entre os volumes cerebrais dos dois grupos

    testados (pacientes X controle) foram mantidas no modelo final. Assim, o modelo

    final baseado no qual os resultados serão apresentados, incluiu apenas o volume

    cerebral total como variável de confusão (ver anexo 9).

  • 26

    Os parâmetros utilizados na construção do modelo que compara as

    diferenças volumétricas cerebrais entre TEPT e controles estão descritos no anexo

    10. Já o anexo 11 descreve parâmetros utilizados na construção do modelo que

    correlaciona as alterações volumétricas cerebrais dos pacientes com as diferentes

    escalas.

    Uma vez estabelecido os parâmetros que constituem o modelo, este foi

    estimado.

    Região de interesse (ROI)

    A seleção das regiões de interesse foi baseada nos achados da literatura de

    TEPT e VBM. As imagens das regiões de interesse foram obtidas do programa WFU

    pickatlas do SPM5 que possui várias imagens de diferentes estruturas cerebrais. As

    regiões de interesse selecionadas foram: amígdala, cingulado anterior, insula e

    hipocampo. Após a seleção das regiões de interesse, a análise estatística foi

    realizada com a ajuda da ferramenta marsbar do SPM5.

    O modelo definido para as análises de ROI foi o mesmo adotado para

    estimar as diferenças de volume cerebral entre pacientes com TEPT X controle, ou

    seja, um modelo para teste t com volume cerebral total como variável confundidora.

    Inferência estatística

    Um primeiro teste t foi realizado para testar a hipótese que o volume de

    substância cinzenta do grupo de pacientes era menor do que volume de substância

    cinzenta do grupo controle. Um segundo teste t foi realizado para testar a hipótese

    que o volume de substância cinzenta do grupo de pacientes era maior do que

    volume de substância cinzenta do grupo controle.

  • 27

    No terceiro teste estatístico foi usada correlação para testar a associação

    entre o volume individual de substância cinzenta dos pacientes e a variação na

    escala de imobilidade tônica peritraumática. O mesmo foi feito para as escalas

    peritraumáticas de dissociação e pânico.

    Nas análises de região de interesse foi usado teste t para testar a hipótese

    que o volume de substância cinzenta de uma determinada região de interesse era

    menor nos pacientes do que nos controles.

    Os resultados serão apresentados tanto para um nível de significância de

    0.001 não corrigido, como para um nível de significância mais rigoroso, ou seja, 0.05

    corrigido. As figuras ilustram os resultados com um nível de significância de 0.001

    não corrigido.

  • 28

    4. Resultados

    A tabela 3 mostra o resultado do pareamento das características

    demográficas entre pacientes e controles. Além das características pareadas a

    tabela mostra a intensidade da gravidade do TEPT. Como desejado no grupo

    controle, a pontuação na escala de gravidade é bem abaixo do valor indicativo

    (cinqüenta) de um possível diagnóstico do TEPT. As características demográficas e

    psicométricas que não foram pareadas estão ilustradas na tabela 4. A variável tempo

    de trauma foi significantemente diferente entre os dois grupos (p = 0.004), contudo

    não se configurou como variável de confusão na investigação das alterações

    cerebrais (ver métodos, seção 3.10 e anexo 9)

    Características TEPT (n=16) CONTROLES (n=16) N % N %

    Gênero Mulher 9 56.25 9 56.25 Homem 7 43.75 7 43.75 Tipo de Evento Traumático Violência com arma de fogo 13 81.25 13 81.25 Acidente de trânsito 3 18.75 2 12.05 Tentativa de estupro _ 0 1 6.25 Média Desvio Padrão Média Desvio Padrão Nível educacional (anos) 10.53 2.59 11.41 3.51 Psicometria Gravidade do transtorno 68.13 9.08 25.56 7.36

    Tabela 3: Características demográficas e psicométricas pareadas entre os grupos e

    intensidade da gravidade do transtorno.

  • 29

    Características TEPT (n=16) CONTROLES (n=16) N % N % Estado civil Solteiro 1 6.25 2 11.76 Casado/união estável 12 75.00 13 82.36 Divorciado/viúvo 3 18.75 1 5.88 Psicometria Média Desvio Padrão Média Desvio Padrão Imobilidade Tônica 12.31 8.13 _ _ Dissociação 24.81 11.75 _ _ Reações Físicas de Pânico 24.69 7.27 _ _ Tempo de Trauma (meses) 35.88 57.85 135.88 116.56

    Tabela 4: Características demográficas e psicométricas não pareadas entre os

    grupos. O tempo de trauma era diferente entre os grupos (p = 0.004).

    4.1 Comparação Paientes X Controles

    Após a comparação entre pacientes e controles o resultado mais robusto foi a

    redução de volume de sustância cinzenta no córtex cingulado anterior esquerdo (BA

    32) e córtex pré-motor direito (BA6) (p< 0.05, corrigido). Diminuições do volume de

    substância cinzenta no sulco temporal superior direito e no sulco parietal superior

    direito foram observadas apenas quando o nível de significância empregado era

    menos rigoroso (p

  • 30

    Também se investigou a existência de regiões cerebrais cujo volume de

    substância cinzenta estivesse aumentado no grupo de pacientes em comparação

    aos controles. Não se observou aumento de volume cerebral nos pacientes (figura

    2).

    Região Coordenadas MNI Cluster size Z score P uncorrected FDR-corr FWE-corr

    X Y Z (voxels) (max vox) (max vox) (max vox)

    Pré-Motor Direito 53 -1 35 975 5.01 0.0000 0.016 0.017 Cingulado Anterior Esquerdo -12 54 10 242 4.14 0.0000 0.039 0.222

    Sulco Parietal Superior Direito 31 -76 47 83 4.16 0.0000 0.092 0.903

    Sulco Temporal Superior Direito 53 -25 -3 52 3.37 0.0000 0.158 0.994

    Tabela 5: Comparação entre pacientes e controles. Regiões com volume reduzido no TEPT e

    suas coordenadas no espaço MNI. Número de voxels e o nível de significância para cada

    região.

  • 31

    Figura 1A: Comparação entre pacientes e controles. À esquerda, cérebro translúcido

    mostrando as regiões com diminuição de volume de substância cinzenta nos

    pacientes. À direita, matrix que representa o modelo estimado usado na inferência

    estatística (seção especificação do modelo).

  • 32

    Figura 1B: Comparação entre pacientes e controles. Cortes sagitais da esquerda

    para direita ilustrando regiões com volume reduzido nos pacientes, p

  • 33

    Figura 1C: Comparação entre pacientes e controles. Cortes coronais de posterior

    para anterior ilustrando regiões com volume reduzido nos pacientes p

  • 34

    Figura 1D: Comparação entre pacientes e controles. Cortes horizontais de dorsal

    para ventral ilustrando regiões com volume reduzido nos pacientes, p

  • 35

    Figura 2: Comparação entre pacientes e controles. À esquerda, cérebro mostrando que

    nenhuma região apresentava aumento de volume nos pacientes. À direita, matrix que

    representa o modelo estimado usado na inferência estatística.

  • 36

    Dentre as hipóteses a priori, existia a expectativa de se observar diminuição

    volumétrica do hipocampo e insula nos pacientes em comparação aos controles.

    Dado que este resultado não foi observado após análise do cérebro inteiro, o

    próximo passo foi a realização de análises de região de interesse (ROI). Na análise

    de ROI o número de voxels comparados é menor caracterizando uma análise menos

    rigorosa que só deve ser utilizada quando existem hipóteses a priori. Na análise de

    região de interesse a redução volumétrica da ínsula e hipocampo.

    A amígdala também foi incluída na análise de ROI para verificar com uma análise

    menos rigorosa a não existência de redução volumétrica. Os resultados focados nas

    regiões de interesse revelaram que não havia diferença de volume entre pacientes e

    controles em nenhuma das regiões investigadas (tabela 6).

    Região t valor p não corrigido p corrigido

    Hipocampo esquerdo 0.69 0.25 0.82 Hipocampo direito 0.76 0.23 0.79 Amígdala esquerda 0.54 0.30 0.89 Amígdala direita 0.45 0.33 0.91 Insula esquerda 1.19 0.12 0.54

    Insula direita 1.08 0.15 0.61

    Tabela 6: Comparação entre pacientes e controles. As regiões de interesse

    investigadas hipocampo, amígdala, insula não mostraram redução de volume nos

    pacientes com TEPT. A tabela mostra as coordenadas MNI e o nível de significância

    de cada região.

  • 37

    4.2 Correlações entre reações peritraumáticas e alterações cerebrais no pacientes.

    Nos pacientes a correlação entre alterações cerebrais e reação de

    imobilidade tônica mostrou que menor volume do córtex occipital médio esquerdo,

    paracentral direito e temporal inferior direito estavam correlacionados com a maior

    intensidade da reação de imobilidade tônica peritraumática (p

  • 38

    IMOBILIDADE TÔNICA

    Figura 3A: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de imobilidade

    tônica peritraumática nos pacientes. À esquerda, cérebro translúcido mostrando

    regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam com a intensidade da reação de

    com imobilidade tônica, p

  • 39

    Figura 3B: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de imobilidade

    tônica peritraumática nos pacientes. Regiões cujo volume no TEPT se

    correlacionavam com a intensidade da reação de com imobilidade tônica, p

  • 40

    Figura 3C: Correlação negativa entre volume cerebral global dos pacientes e reação

    de imobilidade tônica peritraumática. Regiões cujo volume no TEPT se

    correlacionavam com a intensidade da reação de com imobilidade tônica, p

  • 41

    Figura 3D: Correlação negativa entre alterações cerebrais e reação de imobilidade

    tônica peritraumática nos pacientes. Regiões do volume no TEPT se

    correlacionavam com a intensidade da reação de com imobilidade tônica, p

  • 42

    PÂNICO

    Figura 4A: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de pânico

    peritraumático nos pacientes. À esquerda, cérebro translúcido mostrando as regiões

    mostrando regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam com a intensidade das

    reações de pânico. À direita, matrix que representa o modelo estimado usado na

    inferência estatística. (ver seção especificação do modelo).

    Região Coordenadas MNI Cluster size Z score P uncorrected FDR-corr

    X Y Z (max vox) (max vox) Pré-frontal -25 48 3 54 5.20 0.0000 0.67 Parietal inferior esquerdo -47 -69 39 52 4.31 0.0000 0.67 Occipital inferior médio -42 -70 -8 10 4.24 0.0000 0.67 Tabela 8: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de pânico

    peritraumático nos pacientes, Regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam

    com a intensidade das reações e suas coordenadas no espaço MNI. Número de

    voxels e o nível de significância para cada região.

  • 43

    Figura 4B: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de pânico nos

    peritraumático pacientes. Regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam com a

    intensidade das reações de pânico, p

  • 44

    Figura 4C: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de pânico nos

    peritraumático pacientes. Regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam com a

    intensidade das reações de pânico, p

  • 45

    Figura 4D: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de pânico nos

    peritraumático pacientes. Regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam com a

    intensidade das reações de pânico, p

  • 46

    Figura 5: Correlação negativa entre volume cerebral global e reação de dissociação,

    peritraumática nos pacientes. Regiões cujo volume no TEPT se correlacionavam

    com a intensidade das reações de pânico, p

  • 47

    Comparação entre pacientes e controles.

    Comparação entre pacientes e controles após análise de região de interesse.

    Região t valor p não corrigido p corrigido

    Hipocampo esquerdo 0.69 0.25 0.82 Hipocampo direito 0.76 0.23 0.79 Amígdala esquerda 0.54 0.30 0.89 Amígdala direita 0.45 0.33 0.91 Insula esquerda 1.19 0.12 0.54

    Insula direita 1.08 0.15 0.61

    Correlação entre alterações cerebrais nos pacientes e reação de imobilidade tônica.

    Região Coordenada MNI Cluster size Z score P uncorrected FDR-corr

    X Y Z (voxels) (max vox) (max vox)

    Occipital médio esquerdo -42 -70 -3 105 4.01 0.0000 0.935 Paracentral direito 1 -45 64 42 3.86 0.0000 0.935 Temporal inferior direito 50 -12 -26 23 3.40 0.0000 0.935

    Correlação entre alterações cerebrais nos pacientes e reação de pânico.

    Região Coordenadas MNI Cluster size Z score P uncorrected FDR-corr

    X Y Z (max vox) (max vox) Pré-frontal (BA10) -25 48 3 54 5.20 0.0000 0.67 Parietal inferior esquerdo -47 -69 39 52 4.31 0.0000 0.67 Occipital inferior médio -42 -70 -8 10 4.24 0.0000 0.67

    Região Coordenadas MNI Cluster size Z score P uncorrected FDR-corr FWE-corr

    X Y Z (voxels) (max vox) (max vox) (max vox)

    Pré-Motor Direito 53 -1 35 975 5.01 0.0000 0.016 0.017 Cingulado Anterior Esquerdo -12 54 10 242 4.14 0.0000 0.039 0.222

    Sulco Parietal Superior Direito 31 -76 47 83 4.16 0.0000 0.092 0.903

    Sulco Temporal Superior Direito 53 -25 -3 52 3.37 0.0000 0.158 0.994

  • 48

    5. Discussão

    O resultado mais robusto da comparação entre pacientes e controles foi a

    redução volumétrica do córtex cingulado anterior esquerdo (BA 32) e do córtex pré-

    motor direito (BA6). Redução do volume do sulco temporal superior direito e do

    sulco parietal superior direito também foi observada com nível de significância

    menos rigoroso. Não observamos redução volumétrica na amígdala, hipocampo e

    ínsula através da análise de região de interesse.

    Os resultados com as escalas peritraumáticas revelaram que nos pacientes

    os volumes cerebrais de algumas regiões estavam correlacionados negativamente

    com a intensidade das reações peritraumáticas de pânico e imobilidade tônica

    quando adotado um nível de significância menos rigoroso. Para a resposta

    peritraumática de dissociação estes resultados não foram observados.

    Especificamente, quanto menor o volume do pré-frontal esquerdo, parietal inferior

    esquerdo e occipital inferior médio esquerdo maior a intensidade da reação de

    pânico peritraumático. Para a reação de imobilidade tônica, quanto menor o volume

    do occipital médio esquerdo, paracentral direito e temporal inferior direito maior a

    intensidade desta resposta.

    5.1 Cingulado Anterior

    O cingulado anterior é dividido em áreas de Brodmann 24, 25 e 32

    (Brodmann,1909). Com o advento de métodos mais precisos de conectividade

    anatômica e citoarquitetura, tem se sugerido que o córtex cingulado anterior seja

    parcelado em dorsal, divisão cognitiva-motora, e rostral (pregenual e

    subgenual/subcaloso), divisão afetiva, (figura 6), (Vogt et al., 1992 ; Bush et al.,

    2000). O cingulado anterior é uma estrutura complexa envolvida em múltiplas

    funções (Bush et al., 2000), a parte ventral tem extensivas conexões com amígdala,

  • 49

    hipotálamo, núcleo accumbens, área tegmetal ventral, substância negra, núcleos da

    rafe, lócus cereleus e substância cinzenta periaquedutal, já a parte dorsal tem

    conexões com córtices parietal, pré-motor, pré-frontal lateral e área motora

    suplementar (Devinsky et al., 1995, Bush et al., 2000). O cingulado anterior rostral

    segundo Vogt (2005) integraria uma rede neural que tem como função orquestrar as

    respostas neuroendócrinas, autonômicas e comportamentais frente a estímulos

    emocionais. O funcionamento alterado desta estrutura poderia contribuir para

    respostas emocionais inapropriadas como observado no TEPT (Woodward et al,

    2006).

    Nosso resultado de redução volumétrica no cingulado anterior rostral em

    pacientes com TEPT comparados a controles com trauma é consistente com os

    achados da literatura. Rauch e colaboradores (2003) no estudo comparando nove

    enfermeiras combatentes de guerra com TEPT e sem TEPT observaram diminuição

    do cingulado anterior pregenual e subcaloso (BA25) (p= 0.031 e p=0.027,

    respectivamente). Woodward e colaboradores (2006) compararam ex-combatentes

    de guerra com TEPT e sem TEPT e observaram diminuição volumétrica do córtex

    cingulado anterior pregenual (p

  • 50

    colaboradores o resultado do presente estudo observou redução do volume do

    cingulado anterior apenas na região BA 32 (pregenual).

    Figura 6: Anatomia do córtex cingulado anterior. Ilustração retirada de Bush et al,

    2000. O contorno vermelho destaca a subdivisão dorsal cognitiva e o contorno azul a

    subdivisão ventral emocional.

  • 51

    Estudos de ressonância anatômica morfométrica baseada em voxel (VBM)

    também encontraram diminuição do cingulado anterior similar aos estudos de

    delimitação manual. Corbo e colaboradores (2005) observaram diminuição no

    cingulado anterior pregenual, cingulado anterior dorsal e cingulado anterior medial

    em pacientes com TEPT agudo (n= 14, p=0.05 corrigido). Yamasue e colaboradores

    (2003) no estudo que investigou vítimas do ataque terrorista com gás sarin no mêtro

    de Tóquio em 1995, mostraram que aqueles que tinham TEPT apresentavam

    diminuição do cingulado anterior (BA 24) em comparação aos controles que também

    sofreram o ataque, mas não desenvolveram o transtorno (p=0.05, corrigido). Chen e

    colaboradores (2006) na investigação de vítimas de um mesmo incêndio com e sem

    TEPT observaram que os primeiros apresentavam diminuição do cingulado anterior

    esquerdo (p=0.001, não corrigido). Os quatro estudos citados acima (ver tabela 2)

    encontraram diminuição do cingulado anterior em regiões próximas ou similares ao

    observado no presente estudo. A figura 7 ilustra a comparação da localização da

    redução volumétrica do cingulado anterior no presente estudo e em outros dois

    outros estudos de VBM (Yamasue et al., 2003; Chen et al., 2006).

    Grande parte dos estudos que encontraram redução do cingulado anterior

    (Rauch et al., 2003; Yamasue et al., 2003; Chen et al., 2005; Woodward et al., 2006)

    explica esse achado pela hipótese de que o cingulado anterior diminuído estaria

    hipofuncionates no TEPT (Hamner et al., 1999; Pitman et al., 2001); Woodward et al,

    2006). De acordo com esta hipótese, uma ativação deficiente desta região dificultaria

    a inibição de uma amígdala hiperfuncionante (Bremner et al., 1999a; Lanius et al.,

    2001; Shin et al., 2001).

    Corroborando esta hipótese, Bremner e colaboradores (1999) conduziram um

    estudo com PET e paradigma de provocação de sintomas em 10 mulheres vítimas

  • 52

    de abuso sexual na infância com TEPT. Foi observada diminuição do fluxo

    sanguíneo no giro subcaloso direito (BA25) nestas pacientes durante a evocação de

    memórias do trauma (Bremner et al., 1999a). Lanius e colaboradores (2001) com o

    mesmo paradigma de provocação de sintomas e fMRI compararam a ativação

    cerebral de indivíduos com TEPT e controles com trauma sem TEPT vítimas de

    abuso sexual ou acidente de carro). Os indivíduos com TEPT mostraram menor nível

    de ativação no cingulado anterior (BA32) em comparação aos controles sem TEPT

    (Lanius et al., 2001). Contudo, não foi observada concomitantemente inibição da

    amígdala. Outros estudos encontram aumento da atividade tanto do cingulado e pré-

    frontal como da amígdala (Liberzon et al, 1999; Shin et al, 1997; Williams et al.,

    2006).

    Rauch e colaboradores (2003) propõem uma outra hipótese em que uma vez

    estabelecido o TEPT a amígdala hiperativa mediaria progressivamente a disfunção

    do cingulado anterior causando dano excitotóxico via projeções ascendente para

    esta região.

    Como descrito anteriormente, menos controverso e mais replicado é o achado

    de redução volumétrica do cingulado anterior no TEPT. Contudo, os mecanismos

    que levaram a essa redução e a relação desta redução com a atividade neural desta

    estrutura ainda não foram elucidados.

  • 53

    Figura 7: comparação entre as diferentes regiões do cingulado anterior com redução

    de volume em três estudos Yamasue e colaboradores, 2003; Chen e colaboradores,

    2005 e o presente estudo. Observar que os dois últimos estudos são mais

    semelhantes em termos de localização da região diminuída do que o primeiro

    estudo.

    Yamasue et al, 2003 Chen et al, 2005 Presente estudo

  • 54

    5.2 Córtex pré-motor

    O achado mais interessante e também inesperado deste estudo foi a redução

    volumétrica do córtex pré-motor direito (BA6) de pacientes quando compados aos

    controles. Na literatura do TEPT não foram encontrados estudos de ressonância

    anatômica com delimitação manual que investigaram as alterações volumétricas do

    córtex pré-motor. Os estudos empregando a metodologia automática de VBM

    também observaram diminuição desta região no TEPT. Este achado encontra

    suporte nos trabalhos de estimulação e registro de neurônios em áreas pré-motoras

    de primatas não-humanos.

    Estes trabalhos observaram a produção de movimentos defensivos em

    macacos rhesus durante aplicação de estimulação elétrica numa região pré-motora

    chamada zona polisensorial no giro precentral - PZ (figura 8). Esta estimulação em

    torno de 500ms se aproxima do disparo natural dos neurônios o que permitiu a

    observação de movimentos complexos e coordenados (Graziano et al., 2002;

    Graziano & Cooke, 2006). Graziano (2002) propõem que tanto os circuitos corticais

    e subcorticais estão envolvidos na respostas defensivas. Por exemplo, o reflexo de

    sobressalto seria dividido em dois componentes rápido-subcortical e lento-cortical.

    Graziano (2002) propõem que os circuitos cerebrais mediariam reações mais lentas,

    porém mais flexível integrando informações de várias modalidades sensoriais.

    Graziano e colaboradores sugerem que a função principal destas áreas corticais pré-

    motoras é manter a margem de segurança em torno do corpo, selecionar e

    coordenar ações que defendam o envelope corporal (Graziano & Cooke, 2006). De

    forma análoga, áreas pré-motoras em humanos também poderiam ter uma

    representação dos movimentos defensivos e de forma integrativa com diversas

    modalidades sensoriais estarem envolvidas na seleção e coordenação de

  • 55

    movimentos de defesa do invólucro corporal. Poderíamos extrapolar que no TEPT a

    redução volumétrica do córtex pré-motor poderia refletir restrição nos recursos

    cerebrais dinâmicos envolvidos na seleção e coordenação das respostas defensivas.

    A incapacitação de regular as reações defensivas após o evento traumático

    contribuiria para os sintomas de hiper-reatividade descritos no TEPT.

    Figura 8: Ilustração da região PZ e dos movimentos produzidos após estimulação

    desta região em macacos. Modificado de Graziano e colaboradores, 2002.

  • 56

    Diferente do cingulado anterior poucos trabalhos relatam o padrão de

    atividade neural do córtex motor no TEPT durante a provocação de sintomas.

    Pissiota et al., 2002).

    Bremner e colaboradores (1999a) num estudo com PET e paradigma de

    evocação de sintomas observaram que a escuta de roteiro traumático por mulheres

    vítimas de abuso sexual com TEPT provocava maior ativação no córtex motor (BA6)

    que em vítimas de abuso sexual sem TEPT. Os autores sugerem que essa ativação

    poderia representar um correlato neural da preparação motora para ação em

    resposta ao roteiro traumático.

    Pissiota e colaboradores (2002), por sua vez, conduziram um estudo também

    com paradigma de evocação de sintomas e PET em sete ex-combatentes de guerra.

    Foi observado que, em comparação à condição neutra, durante a provocação de

    sintomas os pacientes apresentavam um aumento de fluxo sanguíneo nas áreas

    sensório motoras (BA4/6). Os autores sugerem que estas regiões poderiam conter

    aspectos da memória motora necessária para preparação de luta e fuga.

    No cingulado anterior também mencionamos que, a despeito dos achados

    mais consistentes de redução anatômica em pacientes com TEPT, há resultados

    contraditórios com observações tanto de aumento quanto de redução de atividade

    no cingulado anterior de pacientes. Estudos que combinem as técnicas de VBM e

    fMRI nos mesmo pacientes poderiam ajudar a esclarecer a relação volume de

    substância cinzenta e atividade de uma determinada estrutura.

  • 57

    5.3 Hipocampo, Amígdala e Ínsula

    Nosso estudo não encontrou redução volumétrica do hipocampo após analise

    do cérebro inteiro nem após análise de região de interesse.

    Muitos estudos de ressonância anatômica no TEPT também não observaram

    diminuição do hipocampo em veteranos de guerra (Schuff et al., 2001), crianças e

    adolescentes que sofreram maus tratos (De Bellis et al., 2001; 2002), pacientes

    recrutados numa emergência hospitalar (Bonne et al., 2001) e mulheres vítimas de

    violência causada pelo marido (Fennema-Notestine et al., 2002).

    Contudo existem estudos que encontraram diminuição do hipocampo em ex-

    combatentes de guerra (Bremner et al., 1995; Gurvits et al., 1996) e vítimas de

    abuso sexual na infância (Bremner et al., 1997; Stein et al., 1997).

    Uma explicação possível para estes diferentes achados é a variação

    metodológica entre os estudos, por exemplo, amostras de características diferentes

    com histórico atual ou passado de abuso de drogas e/ou álcool ou ainda pacientes

    vítimas de abuso sexual na infância cujo cérebro ainda está em desenvolvimento.

    Além disso, Karl e colaboradores realizaram uma meta-análise que conclui

    que a redução do hipocampo era observada em pacientes graves e não medicados.

    A amostra investigada no presente estudo apesar de ser constituída de pacientes

    graves, estes também estavam medicados. Fato que pode ter contribuído para não

    ter sido observada a redução volumétrica do hipocampo neste estudo (Karl etal.,

    2006).

    Um dos critérios de exclusão deste estudo foi o uso atual ou passado de

    drogas e álcool, nossa amostra tinha menos uma variável de confusão que poderia

    acarretar redução volume hipocampal (Agartz et al., 1999).

  • 58

    Outra estrutura investigada no nosso estudo, a amígdala, também não

    apresentava redução de volume nos pacientes com TEPT. A maioria dos estudos de

    ressonância anatômica com delimitação manual (Bonne et al., 2001; Bremner et al.,

    1997; De Bellis et al., 2001; Gurvits et al., 1996; Lindauer et al., 2004; Wignall et al.,

    2004) não observaram diferenças significativas entre o volume da amígdala no TEPT

    relativo a controles. Exceto Pavlisa e colaboradores (2006) num estudo de MRI com

    delimitação manual que encontraram redução da amígdala esquerda em onze

    pacientes com TEPT crônico.

    Nosso estudo não encontrou redução volumétrica na ínsula. Na literatura do

    TEPT existem poucos estudos que investigaram essa estrutura. Nenhum estudo de

    MRI com delimitação manual investigou reduções volumétricas na ínsula. Já com a

    VBM dois estudos relatam ter observado esta diminuição de volume (Corbo et al.,

    2005; Chen et al., 2005).

    E