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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Vera Lucia Alba Rei Dias Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro: um movimento abolicionista na cidade de Santos - 1886 - 1888 MESTRADO EM HISTÓRIA São Paulo 2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Vera Lucia Alba Rei Dias

Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro: um movimento abolicionista na

cidade de Santos - 1886 - 1888

MESTRADO EM HISTÓRIA

São Paulo

2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Vera Lucia Alba Rei Dias

Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro: um movimento abolicionista na

cidade de Santos - 1886 - 1888

MESTRADO EM HISTÓRIA

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo – PUC-SP, como

exigência parcial para a obtenção do título

de MESTRE em História Social, sob a

orientação da Professora Doutora Olga

Brites.

São Paulo

2014

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BANCA EXAMINADORA

______________________________________

______________________________________

______________________________________

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Para os meus filhos, Alexandre e Fernando.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço, inicialmente, à CAPES que financiou parte desta pesquisa.

Agradeço à minha orientadora, Professora Doutora Olga Brites, não só pela acolhida

desta egressa dos bancos do Direito no Programa de História da Pontifícia

Universidade Católica de São Paulo, o que muito me honrou, mas, também, por sua

vigorosa preocupação com os rumos da pesquisa e da elaboração do texto, a fim de

que fossem consolidados de forma consentânea aos rigores da Historiografia.

Outras professoras também se fizeram fundamentais neste percurso e merecem

meu irrestrito agradecimento:

Professora Estefania Knotz Canguçu Fraga que, com sua inesgotável generosidade,

foi o braço amigo, firme e preciso, nos momentos de dúvidas. Seu apoio e sua

experiência foram imprescindíveis à conclusão desta pesquisa e dissertação.

Professora Yvone Dias Avelino, com sua absoluta elegância e tranquilidade, fez

diversas ponderações durante a banca de qualificação que muito enriqueceram este

trabalho.

A Professora Maria Apparecida Franco Pereira a quem muito devo pela

concretização desta dissertação. Seu irrestrito conhecimento da História de Santos

serviu como farol condutor e, a exemplo da Professora Estefania, foi com sua

inesgotável generosidade que agora chego ao fim desta etapa.

Professora Vera Lucia Vieira que desde o primeiro semestre do curso muito me

incentivou. Sua alegria e vivacidade foram inspiradoras.

Agradeço, também, a Mara Fernanda Chiari Pires que, de forma incansável e em

meio a seu Doutorado, sempre disse que seria possível.

Não posso deixar de mencionar Manoel, que sempre se fez presente nas minhas

ausências, dando-me tranquilidade no cuidado dos nossos filhos, Alexandre e

Fernando, também parte indissociável desta trajetória que se encerra.

E se encerra voltando ainda mais no tempo. Não há como não recordar de Hilda

Veneno e Cláudia Brito. Professoras de História do Colégio São José, em Santos,

em cujos bancos sentei durante toda a minha jornada escolar. Hilda Veneno e sua

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“pasta de atualidades” trouxe o primeiro manejo com jornais. Cláudia Brito, por sua

vez, vibrava em suas aulas. Seu entusiasmo era contagiante. Foi ela quem falou da

rudeza da ditadura e me ensinou com alegria o que significava uma Constituição.

Era 1987, logo teríamos a Carta de 1988. Da História ao Direito e, agora, do Direito

à História.

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RESUMO

Esta dissertação intenta buscar uma das origens da consolidação da ideia de Santos

como a terra da bondade e da caridade. A lida abolicionista é um aspecto dessa

construção. Não é por outra razão que já se disse que a cidade contou com lei

própria dando fim à escravidão nos idos de 1886, questão abordada neste trabalho e

afastada pelas fontes. A Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro é parte

inseparável de todo esse processo e seus personagens, de inserção no cotidiano da

cidade, foram alvo desta pesquisa, a qual trouxe, também, algumas de suas

idiossincrasias. A Câmara Municipal, com sua gente e as atribuições que lhe

competiam à época, também integra este panorama. Não se deixou à parte, ainda,

que Santos, na quadra final dos 1800 passava por intensas transformações,

projetando-se mais e mais como um polo comercial de café com seu porto que se

expandia.

Palavras-chave: Santos, escravidão, liberdade, Sociedade Emancipadora 27 de

Fevereiro.

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ABSTRACT

The aim of the present work is to reveal the origins of Santos city as ‘the land

goodness and charity’. The abolitionist fight is an important part of it and, because of

that, it was told that there was a law, in 1886, able to end slavery in its perimeter, but

the sources did not confirm it. The history and the main actors of Sociedade

Emancipadora 27 de Fevereiro are important aspects of the present dissertation, with

his idiosyncrasies, as well as the Camara Municipal role and daily life facts about

ordinary people at that time. The intense social movements and transformations at

the end of XIX century are also considered.

Key-words: Santos, slavery, freedom, Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 1

CAPÍTULO I: SANTOS: UMA CIDADE DE MÚLTIPLOS ASPECTOS 11

1.1 Santos, seu porto e seu comércio 24

1.2 A imprensa em Santos 33

CAPÍTULO II – SANTOS E SUA LIBERDADE. A CÂMARA E A ESCRAVIDÃO. UMA

LEI? 36

2.1 A Câmara e a escravidão. Uma lei? 51

2.2 As sessões da Câmara: 23 de fevereiro e 24 de março de 1886 65

CAPÍTULO III - 27 DE FEVEREIRO DE 1886 EM SANTOS: UMA SOCIEDADE

EMANCIPADORA 70

3.1 A instalação da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro 78

3.2 As ações da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro 83

3.3 A apuração de escravos em 1887 – Um duro golpe 95

Considerações Finais 110

APÊNDICE 120

ANEXO I 125

ANEXO II 132

ANEXO III 138

ANEXO IV 140

FONTES E IMAGENS 141

BIBLIOGRAFIA 148

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 1 – Brasão da Cidade de Santos 10

Imagem 2 - Cidade de Santos vista da Ilha Barnabé, 1862, Militão Augusto de

Azevedo

12

Imagem 3 - Mapa indicativo dos fortes construídos na região 15

Imagem 4 - Hospital da Sociedade Portuguesa de Beneficência 18

Imagem 5 – Excerto do mapa elaborado pela Comissão de Saneamento do

Estado de São Paulo em 1895 que destaca as fontes de água potável

20

Imagem 6 - Planta de Santos de Jules Martins, 1878 114

Imagem 7 - Theatro Guarany 115

Imagem 8 – Excerto do mapa elaborado pela Comissão de Saneamento do

Estado de São Paulo em 1895 que destaca as propriedades, as linhas de

bondes e o calçamento

23

Imagem 9 - Porto do Consulado em 1886 27

Imagem 10 – Associação Comercial de Santos 30

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Imagem 11 - Excerto de mapa da América do Sul, de Letts, Son & Co Limited.

Londres, 1883

32

Imagem 12 – Largo da Cadeia Nova (e Câmara) 66

Imagem 13 - Retrato de Rubim Cezar 75

Imagem 14 - Mapa da América do Sul nº 01, de Letts, Son & Co Limited.

Londres, 1883

116

Imagem 15 - Mapa da América do Sul nº 02, de Letts, Son & Co Limited.

Londres, 1883

117

Imagem 16 - Mapa da América do Sul nº 03, de Letts, Son & Co Limited.

Londres, 1883

118

Imagem 17 - Mapa da América do Sul nº 04, de Letts, Son & Co Limited.

Londres, 1883

119

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Escravos maiores de 65 anos 73

Tabela 2 – Escravos entre 60 e 65 anos 73-74

Tabela 3 – Libertação espontânea 75-76

Tabela 4 – Libertação concedida posteriormente à solenidade

76

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Segue o teu destino,

Rega as tuas plantas,

Ama as tuas rosas.

O resto é sombra

De árvores alheias.

A realidade

Sempre é mais ou menos

Do que nós queremos.

Só nós somos sempre

Iguais a nós-próprios.

Suave é viver só.

Grande e nobre é sempre

Viver simplesmente.

Deixa a dor nas aras

Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.

Nunca a interrogues.

Ela nada pode

Dizer-te. A resposta

Está além dos Deuses.

Mas serenamente

Imita o Olimpo

No teu coração.

Os deuses são deuses

Porque não se pensam.

Fernando Pessoa

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INTRODUÇÃO

Um caminho peculiar me levou do Direito à História e a admiração pelo Direito

do Trabalho serviu de força motriz de todo o percurso.

O ponto de intersecção entre as disciplinas, alvo de minha eleição, foi o ocaso

do trabalho escravo. Nesse diapasão, uma feliz surpresa o encontro, à partida, de

duas importantes referências a uma lei municipal que teria abolido, no perímetro da

cidade e em 27 de Fevereiro de 1886, a escravidão, aspecto que redundaria na

consolidação de uma cidade afinada com o trabalho livre. Uma cidade que se

dedicou à libertação de homens escravizados, rompendo com o status quo.

E, como santista, fruto de uma decantada terra da caridade e da liberdade,

nada melhor do que centralizar as pesquisas na minha cidade.

Entendi, a princípio, que as Atas da Câmara seriam fonte expressiva desse

momento e, portanto, retrato, ainda, do movimento abolicionista que envolvia muitos

cidadãos. As atas puderam ser consultadas na Fundação Arquivo e Memória de

Santos (FAMS), que as mantém em seu Fundo Câmara.

Deparei-me, no entanto, com atas silentes, ocupadas a tratar de assuntos

outros. No dia da edição da lei, 27 de fevereiro de 1886, sequer houve sessão na

Câmara. A preocupação encontrou ressonância nas palavras de Bloch: “Pois a

démarche natural de qualquer pesquisa é ir do mais ou do menos mal conhecido ao

mais obscuro.” (2001, p. 67).

Muitos foram, então, os passos, por vezes incertos, em direção à solução do

impasse que se instalara, mas as fontes se impuseram e formaram seu próprio

caminho.

As atas da Câmara de Santos, eleitas desde o início, se mostraram de difícil

leitura, encontrando-se em seus originais. Muitas tentativas depois, foi com

felicidade que as encontrei transcritas em um jornal da época, o Diário de Santos,

localizado, se não todos os exemplares, devido à sua destruição pela ação do

tempo, uma parte significativa sua, mantidos na Hemeroteca de Santos. Assim, pude

consolidar a ausência de discussão, na esfera da Câmara, sobre a escravidão.

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O Diário de Santos, jornal santista criado em 1872 e que teve seu ocaso em

1918, foi perscrutado como fonte primária desde 14 de fevereiro de 1886 até os

últimos dias de 1887, pois não havia para consulta aqueles relativos a 1888. O

Diário encampou a partir de 1879 a luta pela libertação dos escravos, época em que

tivera, como redator, Rubim Cezar, abolicionista vigoroso.

O jornal serviu, em um primeiro momento, à revelação do que teria havido em

Santos no dia 27 de fevereiro de 1886 para que se propalasse a edição da lei

abolicionista: fundamental a descoberta de uma entidade abolicionista, chamada

Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro. Aqui residia o cerne de toda pesquisa e,

assim, segui seus passos em busca de uma cidade livre, bem como o revés que

sofreu com a apuração de escravos feita por João Guerra e publicada no Diário de

Santos em outubro de 1886 (Anexo II). Assim é que a fundação da Sociedade

Emancipadora 27 de Fevereiro e seus atos e ações em torno da causa abolicionista

foram acompanhados através do jornal.

No particular, não se pode deixar de mencionar que a Professora Maria

Apparecida Franco Pereira formulara, em 1988, um artigo que bem apontava a

criação da Sociedade e a persistência de escravos em Santos após a ventilada lei.

O artigo, A utopia santista da libertação, pode ser encontrado em: Leopoldianum –

Revistas de Estudos e Comunicações, v. XV, n. 43, p. 95-100, ago. 1988.

Outros dois jornais, o Correio Paulistano e O Estado de São Paulo, também

foram manejados, em circunstâncias específicas, indicadas ao longo da dissertação,

para o cruzamento entre as fontes.

Utilizei-me, ainda, de documentos da Alfândega de Santos, albergados no

sítio eletrônico do Arquivo Público do Estado de São Paulo, que traziam a relação de

escravos matriculados e alforriados entre 1886 e 1888, a fim de fazer a verificação

entre aquilo que se desejava e o que, de fato, ocorreu.

Outra fonte que se fez importante foi o Livro de escrituras de compras e

vendas de escravos – 1º cartório de Santos, mantido pelo Instituto Histórico e

Geográfico de Santos. Não obstante sua riqueza, utilizei-o apenas para aferir, ainda

que parcialmente, como se dava o comércio de escravos em Santos, haja vista os

contornos desta pesquisa. Procedi à transcrição, constante no Anexo II, dos

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seguintes elementos: data da transação, nome do escravo, nome de seu vendedor e

nome de seu comprador.

A legislação vigente à época serviu de fonte para a verificação das

competências atribuídas às Câmaras Municipais e para revelar a ausência de

aptidão do ente para a formulação da alardeada lei libertadora. As posturas de

Santos de 1883 foram imprescindíveis à delimitação do espaço cabente ao

município e, nessa trilha, de suas necessidades em face de seu desenvolvimento à

míngua de qualquer estrutura sanitária.

O livro denominado História de Santos, de Francisco Martins dos Santos,

datado de 1937, foi outro balizador. O autor, um dos fundadores do Instituto

Histórico e Geográfico de Santos, bem como de São Vicente, além de membro da

Academia Paulista de História, logrou elaborar um longo e respeitado tratado sobre

a cidade, o que mereceu, nos idos de 1978, as seguintes palavras de Andrade:

Sentiu a necessidade de que uma cidade como Santos devia ter um livro à altura do seu passado. Escrever esse livro foi um ato de amor cívico, pois amava a cidade de modo que, lembrava, sempre lhe carregava o nome junto consigo. O livro resultou de uma promessa que fizera a seu pai, Américo Martins dos Santos, figura das mais importantes na cidade, outrora. Levado por sentimento de dever, trabalhou quatro anos na obra, que até hoje é a única que tenta abranger a história de Santos. (1978, p. 120)

A escravidão e ações a ela contrárias foram ali dedilhadas, motivo pelo qual o

livro de Francisco Martins dos Santos se transformou em importante fonte para a

pesquisa.

Outra fonte, O elemento servil e as Camaras Municipaes da Provincia de S.

Paulo1, de J. Floriano de Godoy, de 1887, consubstancia-se em um livro que versa

sobre a consulta feita pelo autor, dirigida às diversas câmaras da província de São

Paulo, a fim de que fosse traçado um panorama dos anseios e necessidades das

várias localidades, a partir do órgão que entendia mais representá-las, relativamente

à extinção da escravidão, que considerava inevitável. Sustentou Godoy, ainda sob o

manto do Império, que “A soberania nacional não póde ser compreendida sinão

1 O livro pode ser consultado junto ao sítio eletrônico da Biblioteca do Senado Federal: <

http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/174438>

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como que igualmente funcionada por todos os brazileiros: cada um de nós, portanto,

representa uma parcela desse ideal sublime dos povos independentes.” (1887, p. 8).

Lafayette Toledo em seu artigo Imprensa Paulista. Memória história, de 1898,

publicado pelo Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, compilou os muitos

periódicos que havia na Província, tendo sido, no que tange àqueles publicados em

Santos, importante fonte de pesquisa para a constatação de uma cidade que muito

se expressava através dos vários jornais que viu nascer e fenecer.

Também fonte de pesquisa, Guilherme Álvaro, médico sanitarista, elaborou

um cuidadoso inventário das epidemias que marcaram a cidade, consolidado em

seu livro A campanha sanitária de Santos, suas causas e seus efeitos, de 1919. É

um trabalho fundamental à melhor compreensão das dificuldades enfrentadas para o

desenvolvimento de Santos, e foi assim que o médico acabou por reproduzir seu

cotidiano, revelando uma cidade precária, sem saneamento.

Outros autores, reputados memorialistas também foram consultados. Olao

Rodrigues, Jaime Franco, Costa e Silva Sobrinho e José Luiz Promessa se

debruçaram sobre vários aspectos da cidade de Santos, franqueando seu mais

próximo conhecimento.

Dois trabalhos acadêmicos, em especial, merecem destaque, eis que

trataram, também, da escravidão em Santos, servindo, pois, a esta pesquisa. Wilson

Toledo Munhós é o autor de “Da circulação trágica ao mito da irradiação liberal:

negros e imigrantes em Santos na década de 1880”, dissertação de mestrado

apresentado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1992. O autor

esquadrinhou a ligação entre uma elite abolicionista, os escravos fugidos que se

dirigiam para Santos, a criação do Quilombo do Jabaquara e as ações de Quintino

de Lacerda. Quanto a este último, Matheus Serva Pereira nele centrou sua

dissertação: “Uma viagem possível: da escravidão à cidadania. Quintino de Lacerda

e as possibilidades de integração dos ex-escravos no Brasil”, 2011, de onde se

extrai toda a inserção de Quintino nos meandros de uma cidade que se pretendia

ver livre e que se desenvolvia.

Por fim, no que tange à bibliografia, mencione-se o livro de Ian Read. The

Hierarchies of Slavery in Santos, Brazil, 1822 – 1888, é um bem elaborado trabalho

sobre as relações entre escravos e seus senhores, centrado na cidade de Santos,

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abarcando desde a Independência até a extinção do trabalho servil. O autor,

professor de Estudos Latino-Americanos na Universidade de Soka, Califórnia,

Estados Unidos, com base em diversos conjuntos documentais, enfrentou a

influência do status detido pelo proprietário na vida do cativo. Para tal, coligiu Read,

vários dados, como de população e riqueza; preços de escravos; percentuais entre

livres e cativos; funções desenvolvidas por escravos, consideradas as atividades de

seus proprietários, além das várias características de cativos manumitidos, entre

vários outros elementos. Este farto levantamento foi manejado de forma

complementar às apurações feitas ao longo da pesquisa convertida nesta

dissertação.

Foi com alicerce nas fontes e na bibliografia que se construíram os três

capítulos desta dissertação.

O Capítulo I traz em seu bojo um panorama de Santos na década de 1880. A

primeira formação da cidade, feita aos fundos da ilha de São Vicente, não se fez de

forma arbitrária, mas por força da inconteste preocupação com sua segurança e de

seu porto, sendo apontados, ainda, os vários fortes construídos com essa intenção.

As diversas igrejas receberam apenas indicação, com o fito exclusivo de demonstrar

a forte presença católica na cidade. A expansão com as grandes avenidas,

inicialmente a Conselheiro Nébias, seguindo-se da Ana Costa, bem como a

construção de um hospital pela comunidade portuguesa são representativos de uma

cidade que crescia.

As precárias condições sanitárias da cidade também foram enfrentadas. A

ausência de esgotos, o restrito encanamento de água e a pouca iluminação

marcaram uma cidade que padeceu com as inúmeras epidemias que a assolavam,

mas que não foram suficientes para obstar o desenvolvimento propiciado por sua

vocação comercial determinada por sua proximidade com São Paulo, seu porto e

pela estrada de ferro. E o café, que sucedeu o açúcar na ordem de magnitude dos

produtos exportados, se incluiu nesse contexto. A imprensa não foi deixada de lado.

Seus vários periódicos foram trazidos, a fim de que fosse demonstrado o contexto

no qual estava inserido o jornal Diário de Santos.

Por sua vez, segue o Capítulo II a revelar uma cidade que encetava ações

contrárias à escravidão que mesmo submetida a um sistema escravagista se pôs em

movimento.

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A participação feminina vem, primordialmente, pelo relato do filho de Anna

Benvinda da Silva Bueno, importante figura na libertação de moças escravas. Surge

aí a ação de Luiz Gama e Antonio Bento, ambos abolicionistas e uma estratégia de

direcionamento dos cativos.

No entanto, questiona-se a existência da lei municipal que teria dado cabo à

escravidão em Santos em 1886 e é nessa perspectiva que a função precípua das

Câmaras Municipais é descortinada. No caso específico de Santos, o Código de

Posturas de 1883 foi utilizado para dar os contornos não só de seus poderes, mas,

dentro de sua área de atuação, dos assuntos eleitos pelo corpo de vereadores.

Os cidadãos que tomaram assento na Câmara à época de uma sensível ação

libertadora foram indicados e a relação de alguns destes com o comércio de

escravos foi identificada, a partir do confronto com Livro de escrituras de compras e

vendas de escravos – 1º cartório de Santos. A ambiguidade de alguns e do próprio

movimento que originou o Quilombo do Jabaquara, fazendo surgir a figura de

Quintino de Lacerda, também mereceu enfrentamento.

Ao fim, sepultou-se, de vez, a possibilidade de ter havido a lei libertadora,

quer seja pela impertinência legal, quer seja pela constatada ausência de sessão no

dia 27 de Fevereiro de 1886.

Derradeiramente, o Capítulo III revela a gênese da Sociedade Emancipadora

27 de Fevereiro, formada por um grupo de pessoas que se dedicaram, a partir da

libertação proporcionada pela Lei dos Sexagenários, a dar cabo da escravidão em

Santos.

A origem dessa Sociedade é demonstrada, assim como suas ações e

estratégias, bem como a frustrante constatação da persistência de matrículas de

escravos em Santos. A importante publicidade dos atos através do jornal Diário de

Santos, alinhado à causa, serviu de linha mestra ao acompanhamento da vida da

Sociedade.

É por essas linhas que alguns personagens vão se corporificando. Rubim

Cezar, jornalista e advogado; Joaquim Xavier Pinheiro, homem de múltiplas

atividades e interesses e Quintino de Lacerda, negro, ex-escravo e de grande

inserção na sociedade santista. Surgem, também, condutas contraditórias durante o

processo. Por vezes, benemerência e interesse pessoal se tangenciaram.

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Importa salientar, frente a este último capítulo que versa especificamente

sobre a Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro, que em face de sua fundação

ter-se dado por homens livres, com o intuito de libertar escravos havidos na cidade

de Santos, seus integrantes detinham um amplo espectro para a ação em

sociedade, sendo a eles possível, ainda, publicizar seus atos através da imprensa,

nominando-se.

Aos escravos, mormente aqueles fugitivos, não havia tal sorte de

possibilidades para a conquista de sua liberdade, como é sabido. Mas “[...] seus

modos de luta, muitas vezes individuais e cotidianos [...]”2(PERROT, 2010, p. 18)

são reais e acabam por surgir através da História trazida pelas fontes. É assim que

surgem os escravos Fernando, Benedicto, Manoel e Angelo.

Pires, em sua tese de doutorado “Docentes negros na universidade pública

brasileira: docência e pesquisa como resistência e luta”, ressalvando a ação dos

negros contra a servidão humana mesmo durante o regime de escravidão, indica a

busca por educação logo após o dia 13 de maio de 1888, revelando, assim, uma

inconteste e pretérita mobilização desses grupos:

Podemos dizer que o movimento negro brasileiro é anterior à República, e já estava presente nas rebeliões de escravizados, nas organizações quilombolas, em todas as formas de luta e resistência contra a escravidão. Santos (R.E., 2007) lembra-nos que tão logo a escravidão foi formalmente extinta, a educação tornou-se uma das reivindicações dos grupos negros, o que se pode provar pela carta de abril de 1889 encaminhada pela comissão formada por libertos do Vale do Paraíba, ao futuro ministro da justiça, Rui Barbosa, que assim demandava: “para fugir do grande perigo que corremos por falta de instrução, vimos pedi-la para nossos filhos...” (p. 50). No início do período republicano, grupos negros passaram a se organizar em entidades de defesa que, apesar da pluralidade de propostas e formas de atuação, tinham por singularidade o objetivo de luta contra a desigualdade social e racial e, neste sentido, a luta por educação aparecia como meio de se minimizar essa desigualdade. (PIRES, 2014, p. 36-37)

2 Michelle Perrot , em Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros, reporta-se, no

particular, ao proletariado em formação. A dificuldade da investigação sobre a formação da classe operária francesa e a idealização da França rural e da supremacia das formas organizadas acabaram por afastar as lutas e o cotidiano do proletariado. Mutatis mutandis, a repressão havida sobre os escravos acabou, assim, por escamotear sua resistência cotidiana.

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É nesse contexto de lutas, ações e resistências, ora capitaneadas por

escravos, ora manejadas por homens livres, negros ou brancos, com passos e

contrapassos, que se deve calibrar o olhar.

Na sequência da dissertação, tem-se o Apêndice I: Os Breves apontamentos

sobre as sessões havidas na Câmara de Santos nos dias 23 de fevereiro e 24 de

março de 1886 trazem as demandas sociais que foram levadas ao crivo da Câmara,

majoritariamente relativas ao espaço urbano e sua conformação. A inexistência de

qualquer assunto relativo a escravos indica que ali não foi um espaço utilizado pelos

abolicionistas. Também serviu de retrato à ausência de sessão no dia 27 de

fevereiro, data da suposta lei.

O Livro de escrituras de compras e vendas de escravos (Anexo I) foi

instrumento à demonstração, ainda que exemplificativa, das pessoas que

transacionaram escravos e da magnitude – pequena, adiante-se – desse comércio

em Santos. É por tais razões que trazem os excertos das escrituras apenas a data e

a indicação relativa ao comprador e vendedor, além do escravo.

O decreto da Assembleia Geral e a Lei 3353, de 13 de maio de 1888, Lei

Áurea, foram coligidos nos Anexos III e IV a fim de que fosse retratada a forma legal

e final da libertação dos escravos, de cunho nacional e da lavra da Princesa Isabel,

utilizando-se de sua prerrogativa garantida pelo Poder Moderador.

É, diante do quanto deduzido, imperioso assentir que a presente dissertação

buscou seguir o escólio de Bloch:

[...] a história terá portanto o direito de reivindicar seu lugar entre os conhecimentos verdadeiramente dignos de esforço apenas na medida em que, em lugar de uma simples enumeração, sem vínculos e quase sem limites, nos permitir uma classificação racional e uma progressiva inteligibilidade. (2001, p. 45)

Não se perdeu, no entanto, a atenção ao ponto de ruptura indigitado por

Foucault: “Afinal, para Foucault, ‘a existência sempre aproximativa do ponto absoluto

de interpretação seria, simultaneamente, a aproximação de um ponto de ruptura. ’

(BURMESTER, 2006, p. 39).

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Nessa trilha, o lume perseguiu o deslocamento. De lei da Câmara a

solenidade no Fórum. De ato do Estado a movimento social.

Sobreleve-se, derradeiramente, que toda a transcrição feita a partir de

documentos da época respeitou a grafia então utilizada, aspecto que não importou

em qualquer prejuízo à sua leitura.

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Imagem 1 - Brasão Oficial da Cidade de Santos

Disponível em: www.santos.sp.gov.br

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CAPÍTULO I: SANTOS: UMA CIDADE DE MÚLTIPLOS ASPECTOS

Santos é uma cidade do litoral paulista, situada na ilha de São Vicente,

balizada pelo mar e pela Serra do Mar. Fundada em 1546, encerra atualmente em

suas terras o maior porto da América Latina e o maior jardim de praia do mundo. E

foi abrigo, também, de uma intensa ação contrária à escravidão.

Muitos cidadãos santistas de outrora, em franca contrariedade às diretrizes

vigentes nos idos de 1800, romperam com o sistema escravagista que grassava

pelo país monarquista. Uma cidade de múltiplos aspectos.

Santos3 desenvolveu-se, inicialmente, no trecho compreendido entre o

Outeiro de Santa Catarina4 – cujo entorno era conhecido como “quartéis” - e o

Valongo – parte mais rica e de movimento comercial – e entre o mar e os morros.

3 Santos, elevada à categoria de cidade em 1839.

4 O Outeiro de Santa Catarina foi demolido em 1869, para a construção de uma ligação com a Rua da

Constituição. Em 1880, João Éboli, médico, construiu uma casa sobre um bloco de rocha que restava, no local em que ficava o Outeiro.

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Imagem 2 – Cidade de Santos vista da Ilha Barnabé (antiga Ilha dos Porcos), 1862 (fotografia).

Autor: Militão Augusto de Azevedo. Acervo: Instituto Moreira Salles A fotografia permite notar a primeira formação da cidade, aos fundos da baía, junto ao estuário, local, inclusive, em que se instalaram as primeiras pontes para embarque e desembarque de

mercadorias nos navios.

Manteve-se, assim, preponderantemente, até fins do século XIX:

Sabe-se que a configuração urbana de Santos até meados do século XIX era a de um sítio plano com sua povoação desenvolvendo-se junto ao seu marco inicial chamado Outeiro de Santa Catarina, às redondezas do largo em frente à igreja da Misericórdia (depois Matriz) e próximo ao convento e igreja dos Jesuítas. Era neste núcleo que as funções militares e administrativas se realizavam devido à existência de quartéis, casa do trem, do forte de Nossa Senhora do Monte Serrat (ou da Vila), da casa de câmara e cadeia e da alfândega. Quando se deu a construção do convento franciscano do Valongo, no lado oposto, a vila chegou ao limite de sua expansão. Neste segundo núcleo as funções comerciais predominavam, já que a região do Valongo estava mais próxima aos que vinham de São Paulo pelo porto geral do Cubatão. O caminho que ligava os dois núcleos urbanos deu origem, ainda no século XVII, à rua principal da vila, sendo seu trecho mais importante a chamada rua Direita, que seguia paralela ao porto até sua mudança de direção a partir dos Quatro Cantos. O trecho mais afastado do mar que segue até o

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convento franciscano do Valongo deu origem à Rua Santo Antonio. (PEDRO, 2010, p. 19)

Esta primeira ocupação da cidade, localizada às costas de sua baía não foi

uma ocorrência arbitrária. A proximidade com a subida da serra que facilitaria a

articulação da capitania com o planalto paulistano, as águas calmas do estuário e a

possibilidade de se construírem defesas foram determinantes para a eleição desse

espaço como nascedouro do núcleo urbano:

[...] uma interpretação mais atenta sobre a lógica que presidiu a escolha do fundo do estuário, isto é a porção norte da ilha de São Vicente, como local privilegiado de ocupação, deve combinar os argumentos do aproveitamento das melhores condições naturais com razões de defesa e de intercâmbio. Neste sentido, pode-se perceber que a disponibilidade de águas “calmas” e abrigadas, bem como de aguadas provindas dos morros (que forneceriam toda a pedra necessária para as construções) e de terrenos relativamente secos da planície, encontraria suporte na possibilidade de proteção do sítio escolhido (através da disposição de fortalezas às margens dos canais – o central e o de Bertioga -, e, sobretudo, na maior proximidade desse sítio em relação ao ponto de subida da serra – Cubatão -, o que facilitava o “comércio com a vila de São Paulo e povoações de serra acima”. (SALES, 1999, p. 126)

O local em que os agricultores se haviam estabelecido, mais propício para as

suas culturas, também foi um fator relevante para a ocupação inicial do núcleo

santista:

Na realidade, era ao norte da ilha de São Vicente, nas encostas do maciço santista, na ilha dos Porcos (hoje Barnabé), em trechos restritos dos setores ocidentais da ilha de Santo Amaro, e nos vales do Diana e do Jurubatuba, já no continente, que se situavam os principais agricultores da Capitania de São Vicente. Tal dispersão de setores agrícolas se deve ao fato de uma boa parte das baixadas insulares e continentais da região serem constituídas em parte por terrenos muito úmidos e salobros (manguezais) e em parte por terrenos extremamente arenosos e secos (restingas e dunas). É verdade que escapavam a tais características os trechos mais interiores das planícies de pé-de-serra, as quais, indiscutivelmente, eram dotadas de muito maior fertilidade porém sujeitas às enchentes anuais provocadas pelas fortes chuvas de verão. (ARAÚJO FILHO, 1969, p. 45-46)

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Fruto da importância dessa faixa territorial, foram estrategicamente

construídos nada menos do que oito fortes entre 1543 e 1770 e um local de apoio –

Casa do Trem Bélico -, este junto ao Outeiro de Santa Catarina, para sua defesa

contra invasões estrangeiras:

3_ O porto organizado teve origem no atual centro da cidade de Santos e era bem protegido por sucessivas cortinas de fortificações construídas em duplas e lados opostos para cruzarem fogos sobre os acessos marítimos:

(1) Ao Norte, o Forte São João (1551) e o Forte São Felipe (1557), substituído pelo Forte São Luiz (1770), realizando a cobertura avançada do acesso marítimo à ‘vila’ de Santos pelo canal de Bertioga; (2) Ao Sul, na embocadura do estuário que dá acesso à mesma ‘villa’, os espanhóis ergueram a Fortaleza de Santo Amaro (1584) e os portugueses, duas sentinelas avançadas: o Forte Augusto (1734) e o Fortim do Góes (1767); e, (3) Para a defesa aproximada foram construídos o Forte Nossa Senhora do Monte Serrat (1543) e a Fortaleza de Vera Cruz do Itapema (1738). 4_ Para prover o apoio logístico militar às fortificações, foi erguida no centro da ‘cidade velha’ de Santos a Casa do Trem Bélico (1734). (SECOMANDI, 2013, p. 88-91)

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Imagem 3: Mapa indicativo dos fortes construídos na região elaborado pela Agência Metropolitana da Baixada Santista

1-Fortaleza de Itaipu, Praia Grande, século XX; 2- Casa do Trem Bélico, Santos, século XVIII; 3- Forte Augusto, Santos, século XVIII; 4- Fortaleza de Santo Antonio da Barra Grande, Guarujá,

século XVI; 5- Forte dos Andradas, Guarujá, século XX; 6- Fortaleza de Itapema, Guarujá, século XVIII; 7- Forte de São Luiz, Guarujá, século XVIII e 8- Forte de São João, Bertioga, século XVI.

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A cidade, outrossim, embora restrita em seus limites territoriais e com baixos

índices populacionais, possuía um montante significativo de igrejas, a revelar uma

forte presença do catolicismo e da fé cristã a nortear a vida dos habitantes. Entre

elas havia a Capela da Graça (1562); a Igreja de Nossa Senhora do Carmo (1580); a

Capela do Monte Serrate5 (1613); a Igreja e o Convento de Santo Antonio do

Valongo (1640); a Igreja do Rosário (1650); a Igreja Matriz (1746); a Capela da

Ordem Terceira do Carmo (1760); a Capela Jesus, Maria e José (final do século

XVIII); além do Mosteiro de São Bento (1725) e dos Conventos de Nossa Senhora

do Carmo e de São Bento.

Eram, no entanto, precárias as condições sanitárias. Santos era desprovida

de rede de esgotos e submetida a constantes inundações, em face da ausência de

escoamento da água pluvial. A água para consumo não era encanada, sendo

retirada de fontes: os mais pobres utilizavam água salobra, de poços, outros a

compravam de ambulantes e aqueles com maiores recursos financeiros mandavam

seus escravos a irem buscar. Promessa dá conta desta função ao se reportar a um

inventário datado de 1853 da Ordem Terceira da Penitência: “Dizem que, não

havendo em Santos água encanada, o maior serviço desses escravos era o

transporte de água da bica do morro de São Bento para o Convento de Santo

Antonio.” (1930, p. 54-55).

A limpeza pública era adstrita a uma pequena área central, pelo que o lixo

produzido, no mais das vezes, era lançado em riachos que cruzavam a cidade ou na

praia de areia lodosa. O calçamento, de pedras, era incipiente. Não é por outra

razão que padeceu das diversas epidemias que seguidamente a assolaram já nos

idos do século XVIII.

Segundo Guilherme Álvaro (1919), a primeira grande epidemia de febre

amarela vista em Santos data de 1853, quando vinte, dos duzentos e vinte óbitos

ocorridos na cidade, foram causados pela doença. À época a cidade não encerrava

grande contingente de pessoas. O censo feito em 1854 revelou a existência de

7.855 habitantes, dos quais 3.189 eram escravos, ou seja, 40,60% da população

eram cativos.

5 Padroeira de Santos, assim declarada em 1954. Comemora-se em 8 de setembro.

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Nessa quadra, o porto já era elemento importante da urbe com os cais do

Bispo e do Consulado, realizando transporte de cabotagem e também para o

exterior. O porto do Bispo situava-se junto ao Valongo, bairro de comércio de

serviços, com residências da mais alta classe e casas comerciais. Entre ambos os

portos havia, como ligação, a Rua Santo Antonio e a Rua Direita (hoje Rua XV de

Novembro).

E foi com a proibição do sepultamento em igrejas, havido em maio de 1850,

que a cidade acabou por se expandir para os lados do Paquetá, uma área

encharcada, de mangue. Estabeleceu-se ali o Campo Santo Municipal, o Cemitério

do Paquetá6 (inaugurado em 1853). Já existia, então, o Caminho da Barra

(Boqueirão), com algumas residências e chácaras e já havia alguma habitação na

praia do Embaré, mas nenhuma havia no José Menino, que servia apenas como

passagem para São Vicente.

Santos seguia sua rotina, padecendo de diversas moléstias.

Alguns integrantes da colônia portuguesa, preocupados com a situação à qual

seus conterrâneos, cujo contingente só aumentava, eram expostos em Santos,

reuniram-se e fundaram em 21 de agosto de 1859 uma sociedade de beneficência:

A cidade de Santos, conquanto se assinalassem alguns progressos, continuava a amedrontar os habitantes, com periódicas epidemias e outras doenças mortais, como a tuberculose, disenterias, pneumonias, coqueluche, anginas, e os casos comuns de febre amarela, sem extensão vultosa. O Hospital da Santa Casa de Misericórdia não comportava ainda grande número de doentes. Muitos tratavam-se nas próprias casas. Os médicos eram poucos. Um ou outro residia em Santos. Na colônia portuguesa havia certa inquietação porque os seus membros aumentavam dia a dia, pela crescente imigração, e se encontravam na emergência dolorosa de qualquer surto epidêmico, violento, por causa das péssimas condições sanitárias da cidade que se agravavam à medida que os aglomerados de famílias se concentravam em casebres colectivos, nas proximidades do centro comercial e à margem dos riachos. Tornou-se ansiosa a ideia da construção dum hospital para os numerosos portugueses que aqui viviam e trabalhavam no comércio e nos misteres mais humildes e insalubres. (FRANCO, 1951, p. 69-70)

6 O Cemitério do Saboó é inaugurado posteriormente, em 1892.

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Foi longo o caminho até a concretização do hospital e, antes disso, atenta às

necessidades dos portugueses que se estabeleciam em Santos, a Beneficência

manteve um convênio com a Santa Casa de Misericórdia de Santos7, para o

tratamento de seus sócios (Cf. PEREIRA e FRUTUOSO, 2009, p. 98). Apenas em

06 de janeiro de 1878, foi inaugurado o Hospital da Sociedade Portuguesa de

Beneficência, localizado próximo do Cemitério do Paquetá, na Rua João Otávio, 82

(Imagem 4):

Imagem 4: Hospital da Sociedade Portuguesa de Beneficência.

Cartão Postal de Editores Pontes et Comp. Bazar de Paris. Data aposta no canto superior direito: 1904.

Disponível em: sítio eletrônico Ebay

Apesar das doenças8, todas ligadas às condições sanitárias da cidade,

Santos se enriquecia. A estrada de ferro chegou em 1867, sendo sua estação

construída no local onde havia o Convento de Santo Antonio, no Valongo que,

7 Criada em 1 de novembro de 1543, promovida por Brás Cubas.

8 Dramática a situação em 1889, quando o porto é interditado pelo governo imperial.

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portanto, foi demolido, remanescendo apenas a sua igreja. Sinal de seu

desenvolvimento comercial, em 22 de dezembro de 1870, é fundada a Associação

Comercial.

A primeira captação de água, esta advinda do rio das Pedras, em Cubatão, foi

feita em 1871 pela Companhia de Melhoramentos da Cidade de Santos9, de John

Frederic Russel, Thomaz e seu irmão, Ignacio Wallace da Gama Cochrane10 e

Eduardo Everett Bennet11, os quais ainda se obrigaram à instalação de mais quatro

chafarizes: Porto do Bispo, Praça dos Andradas, Largo do Carmo e Rua do Quartel,

bem como à manutenção dos seis então existentes. Neste ano deu-se, também, a

contratação de serviços para a iluminação da cidade com gás de hulha - este

substituído apenas em 1903 por iluminação elétrica. Ambas as obras, de água e

iluminação, não ampliaram significativamente os serviços e tiveram seu termo final

em 1872, ano em que novo censo é elaborado. Apurou-se, desta feita, a existência

de 10.120 habitantes, sendo 1.606 escravos, observando-se, pois, um importante

decréscimo na relação entre livre e cativo (15,9%). A ligação da cidade com o

Paquetá se consolidava e nascia a Vila Nova. Surgia a primeira linha de bondes

puxados por muares e a cidade via, ainda, aumentar o movimento de seu porto e do

tráfego com o interior, agora facilitado pelo trem que aqui chegava.

9 A Melhoramentos se associou, ainda, a Domingos Moutinho, a quem havia sido dada, em 1870, a

concessão do transporte de cargas e passageiros, introduzindo o sistema de tramroad em 1871. A empresa denominada The City of Santos Improvements Company Limited sucedeu a Companhia de Melhoramentos da Cidade de Santos em 1881. 10

Vereador em Santos de 1865 a 1876. 11

Empresários do Rio de Janeiro, Corte.

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Imagem 5: Excerto do mapa elaborado pela Comissão de Saneamento do Estado de São Paulo, em

1895, que destaca as fontes de água potável. Disponível em: Blog Novo Milênio

A partir do mapa é possível visualizar-se o caminho percorrido pela estrada de ferro e seu termo junto ao Valongo, bem como a canalização da água de Cubatão para Santos, sendo a primeira

datada de 1871.

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A cidade, porém, continuava a sofrer com as epidemias e, alcançando o

montante de 10.000 habitantes em 1878 (Imagem 6) e 15.000 em 1886, ainda

encerrava condições inadequadas de saneamento, mantendo-se sem sistema de

esgotos, sendo utilizadas, para o despejo, fossas nos quintais e fazendo-se, ainda,

seu descarte em riachos e na praia.

Intensificava-se a vida na cidade, que passou a ter um importante centro de

lazer, já não mais improvisado em um armazém. O Theatro Guarany surge na Praça

dos Andradas, inaugurado em 07 de dezembro de 1882 (Imagem 7).

Em 1867, por iniciativa de Ignácio Wallace da Gama Cóchrane12, foi aberta a

Avenida Conselheiro Nébias, que fazia a ligação entre o centro da cidade e a Barra,

servida por bondes puxados por muares13. Anteriormente, tal ligação era feita pelo

Caminho da Barra, que se estendia desde a Igreja Matriz até a praia, junto ao bairro

do Boqueirão. A construção da nova via derivou das alterações pelas quais a cidade

se submetia em face de seu desenvolvimento:

A Avenida Conselheiro Nébias participou ativamente não só do processo de desenvolvimento e expansão da cidade em direção a porção sul da ilha como também da primeira fase de expansão da cidade para fora dos limites do centro, com a construção dos bairros Paquetá e Vila Nova nas cercanias da avenida, merecendo atenção especial da municipalidade nos dois momentos. Entretanto, verifica-se que na medida em que sua porção próxima ao porto deixou de ser ocupada pela elite, a área foi abandonada também pelo Poder Público. (MAZAVIEIRO, 2008, p. 34-35)

À época já se consolidava, também, a Vila Mathias (antigo Pasto das

Vigárias), surgindo ali uma importante via em 1887, chamada de Ana Costa. Um

comerciante de nome Gonzaga construiu um botequim e repouso no começo da

praia ao fim de tal via, local que ganhou seu nome. Nos novos arrabaldes,

Guilherme Álvaro apontou que predominante a ocorrência de impaludismo (malária)

e, no ano da Proclamação da República, assim descreveu a cidade:

Em 1889, Santos, que havia se desenvolvido à revelia de quaisquer planos ou cuidados sanitários dos seus dirigentes, contava com

12

Engenheiro de Ferrovias 13

Em 1909 passam a circular os bondes elétricos.

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20.000 habitantes alojados em cerca de 2.000 casas, compreendidas as dos arrabaldes da Barra, Vila Mathias e Vila Macuco nascentes. A cidade ainda não possuía esgotos, tinha poucas ruas calçadas, quase todas mal niveladas e sem sarjetas capazes de promoverem o escoamento das águas pluviais, donde frequentes inundações nas épocas das chuvas.

A água do abastecimento público já era escassa, usando-se ainda os poços que criavam os pátios e quintais, ao lado das fossas latrinas. O aspecto de Santos era francamente colonial, do tipo o mais antiquado; a casaria em geral feia, baixa e desgraciosa bordava ruas estreitas, e os ribeiros dos primeiros tempos do povoado, o Macaia, o S. Bento, o S. Jerônimo, o do Carmo e o dos Soldados atravessavam a descoberto as zonas as mais centrais e populosas, recebendo impurezas de toda a sorte que as águas não tinham força de conduzir para o mar. As praias sujas, negras, lodosas, desde o Valongo até o Paquetá, eram o repositório de quase todo o lixo da cidade, onde a limpeza pública, rudimentar, custava 38:000$000 anuais, permanecendo ali as imundícies à espera das maiores marés, que carregavam-nas para a correnteza consumidora do canal. (ÁLVARO, 1919)

Observa-se, pois, que por todo o período em que a escravidão foi um regime

chancelado pelo Império, Santos era uma cidade de pequenas dimensões e

insalubre. Este panorama começa a mudar com as obras sanitárias iniciadas em

1889, ao final feitas por Saturnino de Brito14, com canais de drenagem, sendo o

primeiro inaugurado apenas em agosto de 1907.

14

Inicialmente, em 1891, é contratado o engenheiro sanitário Estevan Fuertes para elaborar o saneamento de Santos. “A situação sanitária chegara a tal ponto que o governo estadual foi impelido a agir. Santos transformara-se num foco irradiador de doenças para o interior, colocando em risco a entrada de imigrante e o funcionamento do porto. Os fretes e, consequentemente, as importações encareciam devido às sobretaxas de risco cobradas pelas companhias de navegação. Os marinheiros recusavam-se a embarcar para este porto e os vapores que se dirigiam ao Prata já não faziam escala.” (GAMBETA, 1984, p. 20-21)

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Imagem 08: Excerto do mapa elaborado pela Comissão de Saneamento do Estado de São Paulo, em 1895, que destaca as propriedades, as linhas de bondes e o calçamento da cidade de Santos.

Disponível em: Blog Novo Milênio O mapa é hábil a apontar a ocupação territorial havia à época, ainda entre o Valongo e o Outeiro,

mais significativamente, mas já com expansão para o Paquetá e Vila Mathias.

Apesar desse quadro sombrio, a cidade apresentava uma forte vocação para

o comércio.

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1.1 Santos, seu porto e seu comércio

A vocação santista para o comércio é vetusta e o Porto de Santos já há muito

se articulava dentro desse panorama.

Após esgotadas as minas de ouro em Minas Gerais, dá-se o incentivo ao

desenvolvimento da cultura agrícola, mormente para a exportação. É nesse passo

que em 1765 é autorizada a livre navegação, não mais se obrigando à observação

estrita de rotas de que incluíam Portugal, amplificando-se, pois, a importância dos

portos para a economia da colônia. Aquele situado em Santos, próximo

geograficamente do planalto paulista, deu paulatino impulso à produção canavieira e

à fixação, na cidade, de um comércio exportador de açúcar.

Entretanto, além de suas frágeis condições estruturais, restritivas à sua

operação, tinha, ainda, de superar a dificuldade de comunicação com São Paulo – e

seus espaços de produção:

A má conservação das estradas, os perigos da Serra do Mar e as más condições de travessia da Baixada Santista, prejudicaram de maneira extraordinária o comércio do açúcar, o grande comércio de açúcar que levou São Paulo, pelos menos o planalto paulista, a integra-se pela primeira vez nas correntes do comércio internacional. A estrada de Santos e suas articulações com o interior prejudicavam de maneira bastante sensível o comércio do primeiro produto paulista a ser requisitado pela economia mundial. [...] (PETRONE, [s.d.], p. 186-187).

A descida da Serra do Mar era feita por carregadores que poderiam levar um

par de dias ou mais para alcançar Cubatão. Neste núcleo consolidou-se a “Barreira

do Cubatão”, local de coleta de impostos, arrendado pela Fazenda Real a

particulares a partir de 1778. De Cubatão, toda mercadoria devia atravessar por

canoas, posto que inexistente ligação seca com Santos até 1827, quando se

concluem as obras da estrada Cubatão-Santos. Tal forma rudimentar de

movimentação de mercadorias gerava perdas pelo perecimento do açúcar, produto

de trato frágil e incompatível com umidade e água.

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Em 1790 iniciaram-se os trabalhos para a melhoria do Caminho do Mar,

empreitada logo finalizada. O assentamento de pedras, estreito, conhecido como

“Calçada do Lorena”, não possibilitava o trânsito de carroças, apenas de pessoas e

de animais, mas tornou-se rota fundamental ao escoamento do açúcar que se

tornara o produto de exportação por excelência e o sustentáculo econômico da

Capitania de São Paulo. Outra via a sucedeu apenas 50 anos depois, a Estrada da

Maioridade.

O aguardente, produzido em menor escalada, também foi um produto que

encontrou saída para sua distribuição no porto de Santos:

A cidade de São Paulo, capital da capitania de mesmo nome, na primeira metade do século XIX possuía freguesias rurais que produziam cana-de-açúcar. Essa produção, contudo, tinha como alvo a fabricação de aguardente, que tanto atendia a demanda do mercado consumidor citadino, como escoava para o litoral, via Caminho do Mar, até a vila de Santos. Na costa da capitania de São Paulo essa produção de aguardente era redistribuída no continente, via comércio de cabotagem, ou seguia para Portugal. (MOURA, 2012, p. 74)

Com tais implementos é certo que “[...] ao longo do último quartel do século

XVIII até a terceira década do século XIX, a vila santista se torna um fundamental

entreposto comercial na Província de São Paulo.” (CARLO, 2011, p. 92).

Conforme dados trazidos por Petroni, a partir de 1841 nota-se uma queda

significativa da exportação de açúcar, aguardente e café pelo porto de Santos,

causada pela ocorrência de uma geada, recuperando-se apenas entre 1843-1846,

sendo que em 1845-1846 se registrou a maior exportação de açúcar pelo porto de

Santos, à ordem de 548.742 arrobas e 20 libras de açúcar. A autora ainda esclarece:

1846-1847 é, certamente, o ano mais importante, o ano decisivo para a cultura canavieira. Os agricultores do hinterland de Santos, a partir de então, resolvem abandonar o cultivo da cana-de-açúcar para se dedicarem ao do café. O “quadrilátero do açúcar” vai transformar-se em zona cafeeira. O café plantado em 1846-1847 produzirá, em 1850-1851, ano em que ultrapassa, em volume, a exportação de açúcar pela Barreira do Cubatão. Estranha coincidência! No ano de maior exportação de açúcar também foram formados grandes cafezais, e daí a pouco produzirão tanto, que o açúcar passará para o segundo lugar nas exportações de Santos. O açúcar paulista neste

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ano já tinha, inclusive, importância no quadro geral das exportações brasileiras. A média anual de sua exportação, no qüinqüênio de 1844-1845 a 1848-1849, foi de 7 551 980 arrobas. (sic, s.d., p. 162)

Assim é que, em meados do século XIX, a exportação de café ultrapassou a

exportação de açúcar pelo porto de Santos e nos idos de 1870 se observam grandes

mudanças no comércio internacional com o aumento da produção de café que,

então, se transformava na base econômica da Província. Santos e seu porto

tornaram-se importantes componentes dessa nova engrenagem.

Até 1870 o porto contava com cerca de dez pontes que serviam de acesso às

embarcações atracadas: Alfândega, Becco do Arsenal, Onze de Junho, Praia,

Consulado15, Capella, Sal, Estrada de Ferro, Banca e do Bispo16.

Era um meio bastante precário para embarque e desembarque das

mercadorias e de pessoas e, juntamente com os armazéns (trapiches) à beira

d’água que recebiam e depositavam os bens negociados e os pontões,

embarcações menores que transportavam para a terra as mercadorias dos navios

que não conseguiam espaço para atracação, não foram capazes de suprir a

crescente demanda de movimentação de produtos, mormente após a construção da

São Paulo Railway17, em 1867, que ampliou o comércio entre o Planalto Paulista e o

porto. Foram vários os percalços gerados pela falta de infra-estrutura:

[...] A partir de 1867, quando se inaugurou a primeira ligação ferroviária do litoral para o planalto, passando pela capital paulista, aquêle movimento de barcos tornou-se, então, bem maior, trazendo cada vez mais sérios problemas de movimentação de cargas, em virtude das precárias condições do porto. As embarcações de alto mar ficavam a mais de 100 metros de distância dos locais onde eram depositadas as mercadorias e ligadas aos velhos trapiches por pontes de madeira, por onde transitavam os escravos e outros trabalhadores do porto, transportando nas costas a maior das espécies de carga, além das já centenas e milhares de sacas de café descidas do planalto, anualmente.

Logo perceberam os administradores da Província as queixas dos negociantes sobre a precariedade das condições do porto, que, como os demais do País, não fora ainda organizado. As mercadorias

15

Junto ao Outeiro de Santa Catarina 16

Junto ao Valongo 17

“Seus objetivos eram claros. O café que descia, os produtos e trabalhadores que subiam.” (LANNA, 1996, p. 55).

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se amontoavam às margens do estuário, da Praça da Alfândega ao Valongo, em pátios de terra, improvisados e exíguos, sofrendo as conseqüências de permanecerem ao relento, particularmente nos meses de verão, quando as chuvas aumentavam. Além do mais, as próprias autoridades sentiam-se impotentes para garantir aos proprietários as mercadorias desembarcadas, dado a uma verdadeira “indústria da rapinagem” que se organizava em Santos, no sentido de se apoderarem de partes do que era desembarcado nas praias do estuário, ou mesmo para a cobrança das tarifas alfandegárias, em virtude do caos em que ficavam as cargas de exportação e importação. (ARAÚJO FILHO, 1969, p. 68)

Imagem 09: Porto do Consulado em 1886, reprodução fotográfica de tela de Benedicto

Calixto. Acervo: Fundação Pinacoteca Benedicto Calixto.

Disponível em: Blog Novo Milênio Da imagem é possível observar as condições do porto, insuficientes para a movimentação das mercadorias frente, principalmente, à melhoria do transporte com o advento da estrada

de ferro, em 1867.

Finalmente, após o desinteresse da concessão dada a Conde Estrela e

Francisco de Aguiar Pertence e à própria Província de São Paulo, foi por intermédio

do Decreto 9979, de 12 de julho de 1888, que a Princesa Isabel, Regente, concedeu

a José Pinto de Oliveira, C. Gaffrée, Eduardo P. Guinle, João Gomes Ribeiro de

Avellar, Alfredo Camillo Valderato, Benedicto Antonio da Silva e a Ribeiro, Barros &

Braga, vencedores da concorrência, a autorização para a construção de novas

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instalações no porto de Santos, no trecho compreendido entre a Rua Brás Cubas e o

Valongo18. Em 2 de fevereiro de 1892 atracava, junto ao Valongo, o primeiro navio

no novo porto que então encerrava 260m. A sua expansão inicial seguiu até 1909

quando o cais atingiu 4.720 metros. As obras do porto contribuíram, ainda, para o

saneamento da cidade, pois foi necessário o aterramento das praias lodosas por

onde se erguiam os pontões, mas deixaram descontentes os comerciantes locais,

alijados nesse processo de expansão que acabou por direcionar o comércio

portuário às mãos da Companhia Docas.

Anteriormente à construção da estrada de ferro em 1867, o café era

transportado em lombo de burro, trazido por tropeiros que desciam a Serra do Mar.

Com a São Paulo Railway, a remessa do café para Santos foi evidentemente

facilitada, implementando, definitivamente, sua exportação através do porto. É diante

desse cenário que a característica inicial de local de residência da elite santista

detida pelo Valongo, que passava a contar com a estação da estrada de ferro, cede

passo a um espaço eminentemente comercial. Mas não é só. Consolida-se a

vocação da cidade, que se torna “praça de comercialização do café”19, além de se

transformarem os seus espaços pelo desenvolvimento do tráfego portuário:

[...] Se, para atender a maior movimentação comercial, a construção de “pontes” representa o primeiro (1857) equipamento do aparelho portuário (articulado em terra a um armazém alfandegado – “trapiche” -, onde as mercadorias importadas ou para exportar ficavam guardadas), no entanto seria a inauguração da linha ferroviária da São Paulo Railway (1867), cuja estação no Valongo seria construída sobre os terrenos onde outrora existira o Convento de São Francisco, o investimento em infra-estrutura que marca o ponto de inflexão do desenvolvimento da cidade. Articulada pela ferrovia a um sempre mais vasto e rico território cafeeiro, a cidade transforma sua estrutura, muda sua imagem, sinalizando a importância das funções comerciais que ela passa a desempenhar.

A ação reformadora teve início com a derrubada do Outeiro de Santa Catarina (1869, época em que o convento do Valongo já havia sido demolido para dar lugar às instalações ferroviárias) e seria impulsionada pelas novas exigências “técnicas” (desconhecidas antes da eclosão do café) em termos de armazéns, oficinas e

18

Araújo Filho ressalta: “É digno de nota que os contratantes da construção do porto de Santos eram todos brasileiros, iniciaram os trabalhos e os levaram a efeito com capitais exclusivamente nacionais, e com técnicas e chefe de serviços (D. Oscar Weinschenck), exclusivamente brasileiros. É de se notar também que, apesar do pequeno capital que possuíam, jamais o governo concorreu com um centavo para tal obra.” (1969, p. 72). 19

Nas precisas palavras de Pereira e Frutuoso, 2009, p. 95.

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depósitos: transformar-se-ia o espaço urbano, retificando o traçado (largo da Matriz, Largo e rua do Rosário, rua 15 de Novembro) e substituindo a arquitetura, inclusive religiosa (Matriz, Rosário, capela da Graça), por espaços e edifícios interessados à nova ordem social e econômica que se instaurava. O arruamento estendeu-se, desenvolvendo uma malha ortogonal mais regular, a leste, até o Paquetá, e a norte, até a altura do largo Sete de Setembro, no sopé da montanha, enquanto as ruas existentes começaram a ser alargadas, valorizando os terrenos marinhos até então aparentemente desprezados, como sugere o contraste entre a anterior orientação das quadras, “de costas” para a praia, e a localização de edifícios de consulados e hotéis nas áreas mais próximas da estação, particularmente naquela, compreendida entre a Rua Santo Antonio e a Rua da Praia, que ficaria conhecida como Quatro Cantos. (SALES, 1999, p. 127-128)

É nesse contexto de desenvolvimento que em 22 de junho de 1875, a Câmara

de Santos, ao elaborar a resposta à solicitação feita pelo presidente da Província,

traça o retrato de uma cidade que não possuía agricultura em seu território e cujos

trabalhadores haviam se direcionado à intensa atividade comercial, a qual absorvia

grande número de mão de obra e era considerada “mais fácil e vantajosa”:

a indústria agrícola é nula e mesmo em terrenos propícios que eram usados quando havia menos escassez de braços e estes não encontravam mais fácil e vantajosa aplicação no trabalho constante e crescente de uma cidade como Santos, cujo tráfico comercial é imenso e demanda o concurso de grande número de trabalhadores. Algumas famílias pobres que ainda vivem em sítios, quase todos situados à beira mar, não se aplicam à lavoura e mantêm-se apenas com o pouco que lhes produz a pesca. (apud Lanna, 1996, p. 44,45)

Com o incremento do comércio exterior pelo café, o porto de Santos tornou-

se, também, polo exportador de produtos agrícolas brasileiros e importador de

manufaturados. Deu-se, como corolário, a instalação, na cidade, de inúmeras casas

importadoras e exportadoras, aglutinadas, em seus interesses, na Associação

Comercial de Santos.

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Imagem 10: Associação Comercial de Santos. Cartão Postal.

Acervo: Laire José Giraud Disponível em: Blog Novo Milênio

A entidade, fundada em 1870, teve, como seus primeiros presidentes, comissários de café.

Esta entidade, constituída em 1870, é a mais antiga agremiação paulista de

classe e, embora de objetivos mais abrangentes, dedicou seus primeiros 50 anos,

preponderantemente, às atividades “[...] da importação e da exportação de café,

embora envolvesse esporadicamente também outros produtos como o algodão.”

(PEREIRA, 1995, p. 10). Esse é o motivo pelo qual 12 dos 14 cidadãos que a

presidiram nos inaugurais 50 anos eram comissários de café (Cf. PEREIRA, 1995, p.

11). Um, em particular, merece destaque: Antonio de Lacerda Franco (1885-1886),

homem de vulto na cidade, que deu liberdade a uma outra personalidade que integra

a História de Santos, Quintino de Lacerda.

As casas comerciais tiveram franca participação no desenvolvimento da

cidade, na medida em que instavam as autoridades em busca das melhorias tão

prementes. É nessa trilha que se solicitaram licenças e permissões, inclusive para

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que elas próprias realizassem os serviços necessários. A construção de pontes e

armazéns e providências quanto ao transporte de mercadorias foram questões

perseguidas pelos comerciantes e que contribuíram para a transformação do

contorno da cidade:

Entre diversos problemas enfrentados nas práticas do comércio exterior, notou-se que a atuação desse grupo de comerciantes junto à administração municipal foi decisiva para que suas necessidades pudessem ser atendidas, fazendo com que esse tipo de comércio interviesse na transformação do centro comercial santista, ao necessitar de suportes materiais para que suas atividades se realizassem. (PEDRO, 2010, p. 40)

Além disso, representativo da importância dos negociantes no seio da

sociedade santista, é o serviço consular, atividade por eles também assimilada. As

funções consulares tanto implementavam o comércio praticado no local e que se

espraiava além-mar, como tendiam ao atendimento de uma população imigrante que

crescia. A relevância desses serviços pode ser constatada pelos mapas elaborados

em Londres, em 1883. O conjunto de mapas (Imagens 14, 15, 16 e 17) traz a

assinalação, como forma de informação, das localidades em que havia consulado

britânico no Brasil. Ao todo podem ser apurados quatro consulados – no Grão Pará,

em Pernambuco, no Rio de Janeiro e em Santos – e dez vice-consulados

espalhados pelo país. Do excerto ora colacionado é visível a indicação das cidades

do Rio de Janeiro e Santos20 como detentoras de Consulados Britânicos, o que

revela, também, a importância e a projeção do porto de Santos:

20

Pedro indica que em 1887 Francis Hampshire de F. S. Hampshire & C. era o representante consular da Grã-Bretanha (2010, p. 48).

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Imagem 11: excerto de mapa da América do Sul de 1883, produzido por Letts, Son & Co Limited. Londres

Acervo de David Rumsey Map Collection – Cartography Associates Há indicação da existência de Consulado Britânico nas cidades de Santos e do Rio de Janeiro. A

demanda pelo órgão revela a intensa vida comercial em Santos e sua inserção no comércio exterior.

A expansão cafeeira e a construção da estrada de ferro junto à cidade

portuária propiciando o escoamento do produto de ampla penetração nos mercados

exteriores serviram à formação de uma intensa vida comercial em Santos, mola

propulsora para seu desenvolvimento.

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1.2 A imprensa em Santos

Em Santos, vários foram os títulos publicados. Alguns de vida efêmera,

muitos de verve altiva e tenaz em seus claros propósitos, fossem republicanos,

monarquistas, de classe ou de clubes recreativos. Assim é que a imprensa compôs

o cotidiano da cidade21.

Não é por outra razão que o Diário de Santos, fundado em 1872, foi

fundamental para esta pesquisa. É necessário, porém, retroagir um pouco.

Em 2 de setembro de 1849 a cidade vê seu primeiro jornal publicado,

intitulado Revista Commercial.

O periódico foi fundado por Guilherme Délius, um culto médico alemão,

natural de Hamburgo. Não obstante as dificuldades do ofício, Délius conseguiu

mantê-lo até 1865, quando o vende para Antonio Pereira dos Santos. O jornal é

ainda vendido por mais duas vezes. Encerra-se após vinte e três anos de atividade,

em 1872, nas mãos dos irmãos João Carlos e Jorge Elias Behn. De linha liberal,

incorporara a luta pela abolição da escravidão, tendo feito publicar entre janeiro e

março de 1851, em fragmentos sucessivos, o consagrado discurso proferido por

José Bonifácio na constituinte de 1823.

Em 1872 surge, por seu turno, o Diário de Santos, republicano e longevo –

durou por quarenta e seis anos, até 1918. Em 1879 dá início a uma incansável

campanha abolicionista.

Ambos os periódicos tiveram grande importância na cidade. Mas não foram

vozes solitárias. Outros houve entre 1849 e 1872, anos de nascimento da Revista

Commercial e do Diário de Santos, em número indicativo de uma cidade inquieta:

1850: Mercantil e Nacional; 1851: Médico Popular e Precursor; 1853: Paranapiacaba

(ou no ano de 1858, cf. TOLEDO, 1898, p. 382); 1855: Popular, Juventude e Clamor

Público; 1857: Comercial; 1859: Itororó; 1860: Progresso; 1861: Civilisação; 1863:

Caboclo; 1864: Santista; 1867: Lirio, Mercantil e Rabecão; 1869: Pirilampo, Correio

de Santos, Commercio de Santos e 1870: Imprensa.

21 Apuração dos títulos feita a partir do confronto entre Lafayette de Toledo e Olao Rodrigues.

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Posteriormente, novos títulos surgiram, observando-se uma notável expansão

após 1884, ano em que ao menos nove22 jornais são lançados. Em 1885 podem ser

apurados entre seis e sete títulos23, ao passo que em 1886 são seis24 e o ano de

188725 ultrapassa a média, com onze títulos. Finalizando o período da escravidão,

em 1888, são apontados sete títulos26.

É uma época de campanha abolicionista e muitos jornais o encetam em suas

páginas, como a Revista do Commercio e o Diário de Santos, este, mormente sob a

redação do fulgurante Rubim Cezar, entra de modo virulento nesse movimento. São

feitos, também, jornais manuscritos, que, dessa forma, buscavam anonimato. Nos

idos de 1881 e 1883 surgem O Porvir, O Embrião, O Pirata, O Guarani, O Periquito e

O Papagaio.

Em 1884 surge o Alvòr. Valis, ao se referir ao periódico, conta que “Os seus

proprietários e redactores, todos empregados no commercio, eram moços de 15 a

18 annos e, além do jornal, tinham uma especie de sociedade secreta, onde se

planejou e executou-se muitas fugas de escravos.” e “...constituiam a vanguarda do

partido republicano de Santos...” (apud TOLEDO, 1898, p. 373), a revelar que se

tratava de um jornal abolicionista e republicano, cujas palavras associaram-se à

ação de homens ainda jovens. O Piratiny, em idênticos moldes e também

republicano, com os mesmos proprietários e redatores27, o sucede.

Vinte e Sete de Setembro foi um periódico vinculado à Sociedade

Emancipadora 27 de Fevereiro, entidade que, objeto do presente estudo, foi peça

importante na ação de libertação dos escravizados. Note-se que a Sociedade

utilizou-se de outro jornal para dar visibilidade às suas atividades e que era de

grande inserção na sociedade santista, qual seja, o Diário de Santos, claramente

afinado com suas pretensões de liberdade.

22

O Alvòr, O Apóro, Diário do Comércio, Escolar, Jornal de Annuncios, Jornal da Tarde, A Luta, Tombo’a, O Furo e o Correio de Santos que, para Toledo, seria de 1885 (Cf. Toledo, 1898, p. 374) 23

Correio de Santos (1884 ou 1885), O Collegial, O Piratiny, O Popular, Revista, O Typografo e Santos Andaluzia. 24

Dez de Outubro, Ensaio, Ideia Nova, O Pince-Nez, Vinte e Sete de Setembro e Gazetinha 25

O Colibri, O Bilontra, Flor de Maio, Imprensa, O Incolôr, O Reclame, A Villa da Redempção, Santista, O Desfalque, A Procelária e Farpas 26

O Lepdóptero tem seu nascedouro em 1882 para Toledo (p. 379) e em 1888 para Rodrigues. Os demais são: Cidade de Santos, Diário da Tarde, Flora, Luz, Luiz Gama e Procéla 27

Guilherme Mello, Augusto de Carvalho, Arthur Andrade, Luciano Nogueira, Joaquim Montenegro, Antonio Augusto Bastos e Vicente de Carvalho, este colaborador.

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Vila da Redempção (1887), outra folha libertária, foi uma publicação feita em

homenagem a José Bonifácio de Andrada e Silva e tomou para si o nome que se

atribuíra ao Quilombo do Jabaquara. Sua destinação era tão-somente a propaganda

abolicionista, não obstante tenha se declarado republicano, encerrando-se ao fim da

escravidão.

Luiz Gama, folha distribuída em 21 de maio de 1888 pelo clube com idêntico

nome, de cunho cívico-social, destinou-se à comemoração da derradeira libertação e

em seu primeiro número trouxe estampado um artigo de Rubim Cezar, jornalista e

advogado, consagrado abolicionista.

Pode-se observar que a busca pelo fim do trabalho servil esteve ligada à

pretensão de se ver transformado o país em república, haja vista o número

significativo de publicações que abraçavam os dois ideais. Sobressai, também, a

face jovem da imprensa de Santos: Alberto Souza, junto com Gastão Bousquet, em

1885, fundaram um semanário denominado Revista quando tinham quinze anos

incompletos (cf. Toledo, 1898, p. 382), além de atuarem em várias redações à

época, assim como aqueles vinculados ao Alvòr, que, como visto anteriormente,

eram também todos imberbes.

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CAPÍTULO II – SANTOS E SUA LIBERDADE. A CÂMARA E A ESCRAVIDÃO. UMA LEI?

A cidade de Santos fez-se contrária à escravidão. Não obstante a ausência da

adesão absoluta, a cidade viu a ação de muitos cidadãos que se dispuseram à

libertação de vários escravos e que deram abrigo àqueles fugidos em suas terras já

conhecidas pelo seu franco acolhimento. Rigorosamente, foi uma movimentação

popular, inexistindo qualquer lei municipal que desse cabo à servidão humana.

A tarefa, de aparência inglória, trazia ainda os inúmeros riscos que lhe eram

inerentes, em face da ruptura com um sistema legal, coercitivo, pois; e amparado,

assim, por todo o poder estatal.

Não se pode perder de vista que um forte interesse privado se impunha,

diante da condição jurídica de res do escravo. Ensina o Direito Romano que o

escravo era desprovido de qualquer traço de personalidade, enquadrando na

categoria de coisa: Servus est res. Assim é que se consubstanciava, o escravo, em

propriedade alheia e o seu senhor sobre ele detinha absoluto domínio:

Do mesmo modo que as coisas, o escravo pode ser objeto de propriedade, pode ser vendido e, mesmo, destruído. O servus pertence ao dominus, que sobre ele exerce o mais absoluto dominium.

Dominica potestas é a relação jurídica, que liga o dominus ao servus,

acentuando a subordinação deste àquele. (CRETELLA JÚNIOR, 1987, p. 91)

Perdigão Malheiro28 acentuou tais características legais, afirmando que o

escravo “[...] é havido por morto, privado de todos os direitos, e não tem

representação alguma [...]” (1976, p. 35).

28

Perdigão Malheiro escreveu A escravidão no Brasil. Ensaio Histórico, Jurídico e Social entre 1866 e 1867, como relata Édison Carneiro na introdução da edição consultada, de 1976. Morto em 1881, não viu o fim da escravidão.

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Dessa propriedade escrava se auferiam lucros, quer fosse pelo seu comércio

em si, ou seja, por sua venda e compra, quer fosse pelo trabalho humano que dali

se retirava gratuitamente sob as várias formas de coação impostas. Era, pois, uma

mercadoria valiosa.

O “Livro de Escrituras de Compras e Vendas de Escravos” do 1º Cartório de

Santos é uma mostra desse comércio. Elaborado entre março de 1879 e janeiro de

1884 registra o comércio de algumas almas e seus negociantes (excerto no Anexo

I).

Em aproximadamente 52 meses houve 64 transações ali registradas. A

maioria se referiu a apenas um escravo, demonstrando que a cidade não possuía

um significativo comércio de cativos. O comprador de maior vulto – Francisco Pinto

da Silva - negociou 10 escravos.

Ainda nesse sentido, além do lucro auferido pela venda e compra, sequer a

libertação do escravo restava incólume a uma contraprestação. Importa salientar, no

particular, a constatação trazida por Cunha, de que “Apesar de José Bonifácio

propor que o direito de o escravo comprar sua alforria entrasse na letra da lei desde

1823, isso não se deu até a Lei do Ventre Livre, isto é, 1871, e novamente sob os

protestos dos senhores.” (2012, p. 71), sendo, anteriormente, como esclarece a

autora, um direito apenas costumeiro29. Esta tese é ratificada por Slenes ao indicar

que “The right of a bondsman to amass a pecúlio (savings) was part of Roman Law

and was recognized by custom in Brazil, although it was not given explicit status in

the laws of the country until 1871.”30 (1975, p. 508).

A compra pelo escravo de sua própria liberdade, um direito tardio, ainda

implicava em benefícios econômicos para o senhor, fosse concedida gratuitamente

ou submetida a condições:

[...] To be sure, freedom granted unconditionally, as a gift, might provide indirect economic benefits to the master by encouraging

29

A letra da lei que carreou ao mundo jurídico a alforria: Lei nº 2040, de 28 de setembro de 1871, artigo 4º, parágrafo 2º: “O escravo que, por meio de seu peculio, obtiver meios para indemnização de seu valor, tem direito a alforria. Se a indemnização não fôr fixada por acordo, o será por arbitramento. Nas vendas judiciaes ou nos inventarios o preço da alforria será o da avaliação.” 30

Livre tradução da autora: O direito do escravizado a acumular o pecúlio (economias) era parte do direito Romano e foi reconhecido pelo costume no Brasil, embora não tenha sido concedido explicitamente nas leis do país até 1871.”

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38

those who remained slaves to work harder and more willingly. ... Nonetheless, other types of grants of freedom would give slaveowners more immediate and tangible returns, without sacrificing this demonstration effect. Manumission that was conditional on the satisfactory completion of a specified period of service would probably induce greater cooperation and higher productivity from the slaves who benefited from it. Manumission that required a future monetary payment would give even more direct compensation to the slaveowner. Both types of conditional grants of freedom, however, would still demonstrate the value of submissive behavior to the individuals who remained bondsmen. Finally, unconditional manumission granted in return for an immediate cash payment would represent the most secure and probably the most attractive form of compensation to the slaveowner for his “generosity”; at the same time, it might help to encourage habits of thrift, hard work, and compliance among the remaining members of the slave community. (SLENES, 1975, p. 507-508)31

Ademais, agiam os senhores, seus capatazes e capitães do mato sem

qualquer limite ou controle, no entre muros, porquanto, “[...] a gestão dos negócios

do Estado se fazia com o apoio e mesmo o concurso pessoal das elites regionais.”

(CARDOSO, 2010, p. 105), sendo nítida a relação entre ambos entabulada com o

fito de recíproca proteção:

[...] o Estado brasileiro consolidou-se como máquina de defesa das elites econômicas e políticas (entre nós grandemente coincidentes) contra inimigos internos representados: pelo povo pobre e sem ocupação; pelas elites separatistas provinciais, em especial no Nordeste e no Sul; e, muito particularmente, pela massa de cativos, que, pensava-se, podia reeditar aqui o “haitianismo”, sinônimo de sangrenta revolução escrava. (CARDOSO, 2010, p. 99-100)

31

Livre tradução da autora: Certamente, a liberdade concedida incondicionalmente, como um presente, devia trazer benefícios econômicos indiretos para o senhor, encorajando aqueles que permaneciam escravos a trabalhar mais e com mais disposição. No entanto, outros tipos de concessão de liberdade dariam aos proprietários de escravos retornos mais imediatos e tangíveis, sem sacrificar os efeitos da demonstração. A manumissão que era condicional à conclusão de um período especificado de trabalho deveria provavelmente induzir maior cooperação e produtividade superior dos escravos que dela se beneficiariam. A manumissão que exigia um futuro pagamento monetário daria ainda mais diretas compensações para os senhores. Ambos os tipos de concessão de liberdade condicionais, no entanto, ainda demonstrariam o valor do comportamento submisso para os indivíduos que permaneceram cativos. Finalmente, a manumissão incondicional concedida em troca do pagamento imediato de dinheiro representaria a mais segura e provavelmente a mais atraente forma de compensação ao proprietário de escravos por sua “generosidade”, ao mesmo tempo, isso deve ajudar a encorajar hábitos de poupança, trabalho pesado e submissão entre os demais membros da comunidade escrava.

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39

Ainda nessa trilha, precisa a colocação de Castro: “Nas sociedades ditas

tradicionais, o privado se opunha ao público antes como poder do que como direito.”

(2011, p. 338).

Há ainda um aspecto que também merece destaque, porquanto lado violento

da moeda escravidão, que é a subsunção dos escravos a pena diversa daquelas

dirigidas ao resto da massa da população. Mas não é só. Maior rigor, no que tange à

modalidade da pena, também se consolidou.

O Código Criminal, Lei de 16 de dezembro de 1830, ao tratar das penas,

arrolava as então admitidas: morte, na forca, nos casos de morte da vítima; galés

perpétuas ou não; prisão perpétua ou não, com ou sem trabalho; banimento;

desterro; degredo; multa e suspensão ou perda do emprego. No entanto, para os

escravos havia ainda um outro tipo de punição: os açoites32.

Por seu turno, a Lei nº 4 de 10 de junho de 1835 estabeleceu a pena de morte

aos escravos que matassem, ferissem gravemente ou cometessem qualquer grave

ofensa física ao seu senhor ou sua mulher e descendentes ou ascendentes, ao

administrador e ao feitor e suas mulheres. Considerando-se que não havia pena de

morte para casos que não redundassem na morte da vítima, clara, pois, a punição

mais severa imposta aos escravos pela legislação pátria, evidenciando a intenção de

mais e mais submetê-los ao medo. Perdigão Malheiro, jurista à época da escravidão,

não ignorou o maior rigor da letra da lei direcionado aos cativos, tecendo críticas

pertinentes, inclusive no que tange à sua ineficácia:

Esta legislação excepcional contra o escravo, sobretudo em relação ao senhor, a aplicação da pena de açoites, o abuso da de morte, a interdição de recursos, carecem de reforma. Nem estão de acordo com os princípios da ciência, nem esse excesso de rigor tem produzido os efeitos que dele se esperavam. A história e a estatística criminal do Império têm continuado a registrar os mesmos delitos. E só melhorará à proporção que os costumes se forem modificando em bem do mísero escravo, tornando-lhe mais suportável ou menos intolerável o cativeiro, e finalmente abolindo-se a escravidão. Esta mancha negra da nossa sociedade estendeu-se à legislação, e denegriu algumas de suas páginas, quando sem isto o nosso Código Penal é um dos mais perfeitos dos tempos modernos. (1976, p. 47)

32

“Art. 60. Se o réo fôr escravo, e incorrer em pena, que não seja a capital, ou de galés, será condenado na de açoutes, e depois de os sofrer, será entregue a seu senhor, que se obrigará a trazel-o com um ferro, pelo tempo, e maneira que o Juiz designar. O numero de açoutes será fixado na sentença; e o escravo não poderá levar por dia mais de cincoenta.”

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40

Cunha traz um dado que subvertia, no entanto, tal ordem legal afirmando que

“Mesmo em casos de segurança pública, evitava-se condenar à morte ou degradar

insurretos se fossem escravos” (2012, p. 69), ou seja, protegia-se a coisa (escravo-

propriedade) de seu perecimento. Chalhoub aponta essa conduta de forma objetiva:

[...] Brasil Gerson, em pesquisa realizada no Jornal do Commercio e no Diário Oficial, encontrou o registro de 195 pedidos de graça de escravos condenados à morte despachados favoravelmente por d. Pedro II entre 1850 e 1875. A maior parte das penas foi comutada em galés perpétuas. (2011, p. 221)

Resta evidenciado, pois, que os cativos foram mantidos sob o jugo de seus

senhores de forma legitimada, resguardados pela lei. Foi um sistema legal,

alinhavado em um país que dispunha de um sofisticado corpo legislativo, que

chancelou a servidão humana. Luiz Felipe Alencastro é pontual:

Tributado, julgado, comprado, vendido, herdado, hipotecado, o escravo precisava ser captado pela malha jurídica do Império. Por esse motivo, o direito assume um caráter quase constitutivo do escravismo, e o enquadramento legal ganha uma importância decisiva na continuidade do sistema: ao fim e ao cabo, a escravidão desaba de um dia para o outro – de 13 para 14 de maio de 1888 -, quando uma lei de quatro linhas revoga seu fundamento jurídico. (2001, p. 17)

Assim se afigura possível vislumbrar todo o espectro de forças sobejamente

coercitivas dominado e livremente manipulado pelo regime escravagista. Toda e

qualquer tentativa de solapá-lo não seria medida simples e demandaria um

arcabouço de estratégias e de atividades habilmente manejado.

Na cidade de Santos, “[...] de uma população citadina, de humores

republicanos, composta de muitos imigrantes, voltada para o comércio e os serviços,

e, portanto, desvinculada dos grupos rurais majoritários que anelavam a

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manutenção do regime servil, [...], que lançou mão tanto de estratégias legais, [...],

como de atividades ilegais” (ROSEMBERG, 2006, p. 196) houve um unívoco repúdio

à barbárie institucional, ainda que não absoluto. Rosemberg relata a convivência de

duas correntes abolicionistas complementares, uma de cunho conservador e outra

de caráter popular. Consequentemente, a urbe acabou por gerar uma ampla rede de

apoio aos vários atos que se sucederam para por fim à escravidão.

Read, ao afirmar que “Despite the strong presence of farming in Santos and

São Sebastião townships before 1850, large plantations with many slaves were

relatively rare.”33 (2012, p. 46) desnuda uma importante característica da cidade,

concernente ao fato de que os escravos ali existentes não se destinavam ao

trabalho em grandes lavouras, no eito, sendo possível concluir, nesse passo, que

sua economia não estava calcada na atividade agrícola, não tornando, assim,

imprescindível a mão-de-obra escrava. Era, pois, uma terra fértil e multifacetada

para o abolicionismo:

A diversificação de apoio social ao abolicionismo tem a ver com o processo de modernização que atingiu o país pelos anos 1870, mas também com o fim do tráfico negreiro. Quando a entrada de africanos estancou, o escravo, antes mercadoria acessível à maior parte da população, virou bem precioso, cuja posse concentrou-se nas famílias de mais renda e nas regiões vinculadas ao agronegócio. Desde aí havia um grande contingente de famílias no país com poucos ou nenhum escravo e, portanto, sem interesse econômico direto na manutenção da escravidão. Daí a ampla base social potencial que o movimento abolicionista podia tentar conquistar. (ALONSO, 2001, p. 184).

Conta, por sua vez, o memorialista Francisco Martins dos Santos, em seu

livro datado de 1937, que a cidade de Santos já há muito via demonstrações

contrárias ao trabalho servil, movimentando-se em atos abolicionistas, com

associações para tal fim e periódicos que vociferavam ideias libertárias. Vários foram

os defensores do fim da escravidão.

Nos idos de 1823, José Bonifácio de Andrada e Silva, santista nascido em 13

de junho de 1763, foi figura de destaque, tendo formulado representação, junto à

Assembleia Geral Constituinte, de um projeto que buscava a gradual extinção do

trabalho servil. Em sua exposição de motivos surge evidente sua fé cristã ao

33

Livre tradução da autora: “Apesar da forte presença de lavoura nas cidades de Santos e São Sebastião antes de 1850, grandes plantações com muitos escravos eram relativamente raros.”

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demonstrar o descabimento da escravização de outro ser humano, bem como a

impertinência e as nefastas consequências do permissivo legal a lhe dar suporte,

observando-se, ainda, a pontual a responsabilização da escravidão por um cenário

de dor e de degradação:

[...] Não basta responder que os compramos com o nosso dinheiro; como se o dinheiro pudesse comprar homens! – como se a escravidão perpétua não fosse um crime contra o direito natural, e contra as leis do evangelho, como disse. As leis civis, que consentem esses crimes, são não só culpadas de todas as misérias que sofre essa porção da nossa espécie, e de todas as mortes e delitos que cometem os escravos, mas igualmente o são de todos os horrores que em poucos anos devem produzir uma multidão imensa de homens desesperados, que já vão sentindo o peso insuportável da injustiça, que os condena a uma vileza e miséria sem fim. (Andrada e Silva, apud CALDEIRA, 2002, p. 208)

Outros também são mencionados por Francisco Martins dos Santos alçados à

condição de precursores do movimento abolicionista em Santos: Xavier da Silveira,

Luiz Gama, Antonio Bento, Francisco Martins dos Santos, Alexandre Martins

Rodrigues, Luiz Ernesto Xavier, Augusto Fomm, Hyppólito da Silva, Padre Francisco

Gonçalves Barroso, Sacramento Macuco, Antonio Manoel Fernandes, João Otávio

dos Santos. Joaquim Xavier Pinheiro, também fez parte da primeira quadra do

movimento. Foi peça suprema na formação da Sociedade Emancipadora 27 de

Fevereiro, entidade que merecerá destaque nestas linhas.

Entidades com distintos fins também se aliavam à luta pela igualdade.

Fundada em Santos, em agosto de 1859, por vinte portugueses, a Sociedade

Portuguesa de Beneficência D. Pedro V era uma associação destinada a prover o

bem estar entre seus compatriotas. A Sociedade Portuguesa inaugurou, em 6 de

janeiro de 1878, o Hospital da Sociedade Portuguesa de Beneficência, onde já se

praticava o ideário abolicionista:

Na Beneficência, cuja diretoria, eleita no princípio do ano, era presidida pelo Comendador Manuel Pereira da Rocha Soares, e em reunião de 22 de março, receberam uma lista de adesões da Sociedade Emancipadora “27 de Fevereiro”, para ser assinada pelos sócios. Aconteceu que muitos diretores se encontravam fora da cidade, em veraneio pelo interior da Província, e não puderam participar activamnete do movimento. No entanto, a directoria

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declarou que muitos sócios da Beneficência já haviam aderido à humanitária causa, logo no início da campanha de propaganda, e no próprio Hospital não se admitiam escravos mas somente homens livres, para serviços internos, com remuneração mensal. Isso não obstou que, atendendo a solicitações do Major Xavier Pinheiro, a Beneficência albergasse muitos escravos foragidos, vestindo-os e alimentando-os, de cuja missão se encarregava o antigo diretor Luís José de Matos, um dos mais ardorosos abolicionistas, com a cooperação de muitos outros portugueses. (FRANCO, 1951, p. 196-197)

Ademais, como bem assinalado por Andrade, “A participação das mulheres

nos movimentos cívicos, em São Paulo, ainda está para ser estudada.” (2000, p.

98). Santos revela que a primeira mulher a mobilizar-se em atos em prol da

libertação foi Dona Francisca Amalia de Assis Faria que recebia negros fugidos,

transformando seu quintal em “um pequeno quilombo” (1937, p. 5).

Costa, nesse contexto, registra a intransigente atuação de um grupo de

mulheres que, destemidamente, se opôs à presença da força policial na cidade de

Santos:

Certa vez, já às vésperas da Abolição, tendo sido enviado um trem com numerosa força e um delegado para pôr termo ao quilombo, não foi possível nem o desembarque. Um grupo de mulheres, provavelmente pertencentes a algumas associações femininas em prol da Abolição, que se tinham multiplicado na década de 1880, cercou o trem, barrando as portinholas e manifestando ruidosamente seu desagrado. Só se resolveu o impasse com a intervenção do superintendente da São Paulo Railway, William Speers, e do chefe do tráfego, Antonio Fidelis, que decidiram fazer remover o trem. Voltou este para São Paulo, com toda a tropa. (1998, p. 373)

Retomemos Wilma Therezinha de Andrade. Um interessante relato sobre uma

importante figura feminina é feito por esta historiadora. Trata-se de Anna Benvinda

da Silva Bueno.

Anna, nascida em Santos, em fins de 1832, era filha de Anna Margarida da

Graça Martins Bueno e de Antonio Manoel Silva Bueno, este um homem de projeção

política, tendo, inclusive, se alçado à Assembleia Constituinte, dissolvida por ato do

Imperador em 1823. Mas não foi só. Conta Andrade que Antonio Manoel foi o

fundador da Sociedade Defensora da Liberdade e Independência Nacional, além de

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ter sido vereador, na Câmara de Santos, de 1829 a 1832. Seu falecimento foi

precoce, em 1838. Porém, sua filha seguiu seus passos.

Casada com um sobrinho de José Bonifácio, Martim Francisco de Ribeiro de

Andrada Filho, na cidade de São Paulo, para onde se mudara, Anna Benvinda

presidiu uma sociedade para alforriar moças escravas fundada em 1870,

denominada “A Emancipadora”34.

Publicou-se, em 13 de maio de 1918, ou seja, trinta anos após a edição da Lei

Áurea, um longo relato da lavra de seu filho, Antonio Manuel Bueno de Andrada.

Este relembra que seu pai fundara a sociedade libertadora, tendo sua mãe assumido

a presidência. Aqui se revela uma pequena discrepância com o quanto declinado por

Andrade, ao afirmar que Anna Benvinda teria fundado a entidade. No entanto,

certamente, como bem assinalado por Andrade, Anna Benvinda foi sua idealizadora.

À época, com doze anos, tornou-se, Bueno de Andrada, cobrador da então

novel associação. Muitos ajudaram na lida abolicionista, mas um em especial, por

ele mereceu destaque: Luiz Gama, que, advogado, patrocinava causas em prol dos

escravizados, mesmo não detendo riquezas, sendo de grande vulto aquela que se

denominou “causa Netto”, cujo trâmite deu-se em Santos e culminou com a

libertação de mais de cem escravos. Próximos, Luiz Gama alçou Antonio Manuel à

condição de perito avaliador de escravos em processos judiciais.

Conta, também, que quando da morte prematura de Luiz Gama, ocorrida em

24 de agosto de 1882, Antonio Bento, ex magistrado e francamente contrário à

escravidão, o sucedeu na luta abolicionista. É ele quem funda o jornal “Redempção”,

um “club revolucionário”, nas palavras de Antonio Manuel Bueno de Andrada. O

grupo se robustecera e os homens de ação acabaram por receber a alcunha de

“Caifazes de Antonio Bento”. Tais personagens logravam dar fuga aos escravos no

eito, porém encontravam dificuldades para mantê-los em São Paulo fora do alcance

de policiais e de capitães do mato.

Assim que, como aduz Bueno de Andrada, as cidades de São Paulo e

Santos, muito especialmente, emergem em torno da liberdade:

34

Alonso aponta que a Senhora Martim Francisco fundou, em São Paulo, a Sociedade Redentora da Criança Escrava (2011, p. 187).

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Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/1918

E mais, o filho de Anna Benvinda aponta a absorção da mão de obra dos

fugitivos, a partir de então remunerada, junto ao cais do porto, nas atividades de

carga e descarga do café:

Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/1918

De fato, da reprodução dos Relatórios da Associação Comercial de Santos

(MUNHÓS, 1992, p. 85.), observa-se que a partir do segundo semestre de 1878 o

volume de sacas de café de 60 kg ultrapassa o montante de 1.000.000, atingindo, no

que tange ao período em que ainda grassava a escravidão, entre o segundo

semestre de 1886 e o primeiro de 1887, o quantum de 2.478.498, circunstância hábil

a demonstrar a crescente demanda por mão-de-obra. Ademais, ratificando esta

constatação, o quadro estatístico elaborado pela Associação dos Empresários da

Construção Civil da Baixada Santista – ASSECOB, aponta o significativo aumento

da tonelagem média dos navios que aportavam em Santos: em 1886 foi de 445, ao

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passo que em 1887 houve um incremento bastante significativo, à ordem de 700

toneladas. Em 1883, havia 14 pontes, “ocorrendo ocasiões em que não chegavam

para o movimento do porto” (ASSECOB, 1984, p. 44), sendo que em 1889 havia 23,

ou seja, foram construídas 9 pontes em 6 anos, apurando-se, portanto, que se tratou

de um período de grande aumento de movimentação de carga.

Há, ainda, um outro indicativo da absorção do trabalho escravo junto ao porto

de Santos. Knudsen resgatou parte da história de Dona Helena Monteiro da Costa.

A senhora, já idosa, é filha de um escravo que, traficado para o Brasil, logrou fugir

do eito e encontrar abrigo em Santos. Maninho, seu pai, falecido em 1940, com 110

anos, aposentou-se como estivador.

O surgimento do Quilombo do Jabaquara, local de reconhecido destino dos

escravos fugitivos, também é demonstrado por Bueno de Andrada:

Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/1918

Dados sobre o Quilombo do Jabaquara são oscilantes.

Santos indica que em 1882, por iniciativa de Xavier Pinheiro, idealizou-se a

criação do reduto para a reunião dos escravos, “[...] como refugio geral e único, ao

envez de se ocultarem nos quintaes e porões das casas amigas, na impossibilidade

de serem colocados nos sítios visinhos.” (SANTOS, 1937, p. 12). Quintino de

Lacerda foi escolhido para que “mantivésse em ordem e arrefecesse os seus

impetos naturaes e comprehensiveis, porquê aproximava-se a phase heroica do

movimento e tornava-se necessária uma acção pensada, conjunta e definitiva.”,

sendo que “Ao cabo de um anno contava o Jabaquára mais de quinhentos

indivíduos, vigiado pela atalaia do morro [...]” (SANTOS, 1937, p. 13).

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Munhós, por seu turno, após detido cruzamento de alguns dados que apurou,

estatui que o Quilombo do Jabaquara teria sua criação não em 1882, mas no

segundo semestre de 1886, “[...] no contexto de iminente repressão policial ao

quadro urbano de acoutamento de escravos foragidos em Santos.”(1992, p. 47).

Era um quilombo em franca comunicação com a cidade, localizado perto de

seu centro que se tornava mais e mais comercial e protegido pela rede de

abolicionistas que lhe deu forma:

Enquanto o quilombo tradicional se esconde, o quilombo abolicionista procura uma outra estratégia de sobrevivência e tem na boa localização uma das suas características mais marcantes. Sabiam os quilombolas tirar vantagem da moderna rede de transportes urbanos que se implantou na segunda metade do século XIX. Não é certamente por acaso que tanto o quilombo do Jabaquara, na cidade portuária de Santos, como o quilombo do Leblon, na periferia da cidade do Rio de Janeiro – os dois quilombos abolicionistas clássicos – surgiram exatamente nas proximidades de estações terminais de bondes puxados a burro. A boa rede de comunicação e transporte facilitou muito a articulação dos quilombos ao movimento político abolicionista. (SILVA, 2003, p. 19)

No que tange à população escrava que habitava na cidade, para lá

direcionada por um ventilado acolhimento, de grande serventia o inconformismo de

um santista, publicado em 16 de junho de 1887 no jornal, Correio Paulistano, de

circulação na cidade de São Paulo e de linhagem escravocrata (Cf. MUNHÓS, 1992,

p. 57). O missivista alardeia uma enorme quantidade de escravos albergados em

Santos, em vista da atividade de “um tal e qual A. B.” – certa referência a Antonio

Bento - à ordem de dois mil, calculando, junto ao Jabaquara, o montante de

trezentos. Embora se declare, ao final, abolicionista, o autor do texto, não

identificado, opõe-se ao livre trânsito dos fugitivos na cidade, sustentando que o

lugar deles é junto a seus proprietários. Nessa toada, pugnava por medidas policiais

e sustentava que há na urbe abolicionistas de lucro, indigitando Xavier Pinheiro e

José Teodoro dos Santos Pereira (Santos Garrafão). Outro aspecto de especial

relevância é a informação atinente ao constante embarque de escravos em vapores

com destino a outras províncias.

E aqui novamente curial o citado apontamento feito por Bueno de Andrada.

Antonio Bento, talvez orientado pela provável incapacidade de a cidade absorver

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tamanho contingente de escravos, formulou um expediente tendente à sua

distribuição e à sua sobrevivência. Assim, os fugitivos eram encaminhados a

fazendas distintas daquelas de onde se haviam evadido, nas quais trabalhavam

mediante contraprestação:

Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/1918

Outro exemplo da inserção dos escravos na vida cotidiana da cidade são os

elementos de um processo judicial reportado por Rosemberg. José Manuel de

Arruda, sócio de uma firma, notificara à polícia em julho de 1884 a falsificação da

assinatura de um funcionário seu, cujo intento fora a subtração de 4.700 sacas de

café. A autoria fora a atribuída a Fernando, um negro que fazia a limpeza da firma.

Depois da colheita de algumas provas, ouviu-se o acusado – Fernando Magalhães

de Arruda, escravo e alfabetizado. Ao fim concluiu-se que Fernando lograra formular

um bem elaborado plano para angariar dinheiro para a compra de sua liberdade.

Sua autonomia e sagacidade são aspectos de seu viver na cidade:

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Essa preliminar do depoimento de Fernando ilustra o grau de autonomia que os escravos assumiam no ambiente das cidades. Provavelmente alugado para a firma Arruda & Viegas pelo espólio de Maria Ignacia de Arruda, o jovem cativo, alfabetizado, além do domínio dos instrumentos mercantis que permeavam as atividades corriqueiras de Santos, imersa já no fragoroso comércio cafeeiro, mostrava traquejo nos negócios e destreza em manejar a intrincada cadeia comercial – compra, venda, entrega -, sopesando, como se verá a seguir, receitas e despesas; lucros e barganhas, até atingir, dentro da economia do possível, uma situação vantajosa para sua condição de cativo. Habilitado em manusear títulos de crédito num grau de sofisticação que extrapola o simples mercadejar informal das miudezas prosaicas de tabuleiro, Fernando, a crermos nos peritos, pôde amealhar a vultosa quantia de 1 conto e 800 mil réis. (ROSEMBERG, 2006, p. 163).

Todo esse panorama santista de acolhimento e inserção de cativos

reverberou para além da Serra do Mar, tamanha sua envergadura e eficácia. O

jornal Correio Paulistano, em 24 de outubro de 1886, trouxe em seu bojo uma

publicação que bem dá conta da construção que se fez em torno da cidade, local no

qual se desconfiava encontrarem-se refugiados os escravos fugitivos, os quais

teriam sido ali seduzidos:

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Fonte: Correio Paulistano, 24/10/188635

Certamente é neste contexto de ações que se insculpiu a ideia de que, na

cidade de Santos, deu-se a abolição da escravidão no dia 27 de fevereiro de 1886,

através de uma lei de âmbito municipal, como indicado por Gitahy (1992, p. 34) e

Rosemberg (2006, p. 195).

Ocorre que inexistente a lei. Sequer viável à Câmara a sua edição.

35 O anúncio traz a oferta de 800$00 para a captura dos escravos fugidos: “Acham-se fugidos em SANTOS os seguintes escravos: Leonor, preta, de 50 annos mais ou menos, natural da Cananéa; Anacleto, preto, de 21 annos, filho de Leonor; Egydia, parda, de 20 annos; Jacintha, fula, de 24 annos; Estes escravos foram comprados em IGUAPE e CANANÉA para a fazenda do sr. Manoel Antonio de Menezes, no RIBEIRÃO PRETO. Os 2 primeiros, Leonor e Anacleto, vieram no vapor Aymoré em Novembro de 1885 e desappareceram ao desembarcar em SANTOS, e os 2 ultimos, Egydia e Jacintha, vieram pelo vapor de Março e desappareceram poucos dias depois do desembarque. Desconfia-se que todos foram seduzidos e estão acoitados em SANTOS. Protesta-se, para todos os efeitos da lei, contra quem lhes der couto. Gratifica-se com a quantia acima ou 200$00 por cada um, além de todas as despesas de viagem de ida e volta a quem for levar a fazenda MONTE Bello, do sr. Manoel Antonio de Menezes, ESTAÇÃO DE CRAVINHOS, ESTRADA DE FERRO MOGYANA ao sr. Antonio José de Mello”.

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51

Em verdade, distinto da abolição, de caráter amplo, geral, ao qual se

submeteria todo o país, como, de fato, ocorreu em 13 de maio de 1888, o que se

deu na cidade de Santos foi um amplo processo de libertação de escravos,

promovido por cidadãos comuns, desprovidos de qualquer legitimidade para

consolidar a desejada extinção absoluta do regime escravagista, sendo assim o

escólio de Pereira: “Terra de comerciantes, dos comissários de café, e de outros

grupos progressistas, abrigar os escravos fugidos e lutar pela sua emancipação total

é programa que se impôs dentro de sua postura antiescravagista.” (1988, p. 99).

Deu-se, evidentemente, uma libertação condicionada a fatores possíveis.

Houve aqueles que conseguiram sua libertação por meios e acertos por eles

próprios elaborados. Houve, no entanto, aqueles beneficiados por alforrias, cujo

pagamento fora amealhado junto a pessoas ou entidades que assim se dispuseram,

alguns ainda sujeitos a trabalho em prol de seu antigo senhor. Houve outros

libertados sem qualquer tipo de contraprestação. Houve, ainda, aqueles que, em

fuga de outras localidades, mormente do interior cafeeiro do estado de São Paulo,

encontraram na cidade um refúgio seguro.

A cidade encerrava, portanto, a proteção e a convivência de pessoas que

alcançaram sua libertação de mais de uma forma, amparada e reconhecida, ou não,

pela lei. Mas não se tratou de um ato legal, mas sim de um movimento social que

alcançou significativa projeção no dia 27 de fevereiro de 1886.

2.1 A Câmara e a escravidão. Uma lei?

Atestou Gitahy que “A 27 de fevereiro de 1886, uma lei municipal aboliu a

escravatura na área sob sua responsabilidade.” (1992, p. 34), tendo ainda

Rosemberg, de idêntica forma, se reportado ao fato, nestes termos: “ [...] uma lei

municipal fez de Santos cidade livre ainda em 1886.” (2006, p. 195).

Ocorre, porém, que não obstante consentâneo com o histórico das ações

empreendidas por cidadãos santistas, não seria possível à municipalidade produzir

tal norma jurídica, haja vista as disposições legais vigentes à época.

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52

A Constituição de 1824, em seu artigo 167, determinou a existência de

Câmaras, em todas as cidades e vilas. Posteriormente, a Lei de 1º de outubro de

1828 deu a elas nova forma a e estabeleceu as atribuições. Concretamente, como

preleciona Luiz Felipe de Alencastro, houve o intento de esvaziar o poder municipal:

“Desde 1828, o Primeiro Reinado começa a erodir o autonomismo municipal,

restringindo a competência das câmaras às matérias econômicas locais e proibindo

que os vereadores deliberassem sobre temas políticos provinciais ou gerais”

(ALENCASTRO, 2011, p. 17).

Miriam Dolhnikoff revela, ainda nesse sentido, que havia a intenção de

neutralizar os poderes municipais em defesa da autonomia provincial, empreitada

iniciada pela Lei de 1828. A Assembleia Legislativa, à qual se atribuíra a aprovação

das posturas e do orçamento municipais, submetia, assim, as câmaras ao que

chamou de “ação disciplinadora” (DOLHNIKOFF, 2007, p. 119).

É nessa toada que a Câmara, composta por membros eleitos36, foi

considerada uma corporação apenas administrativa (artigo 24 da Lei de 1º de

Outubro de 182837), a ela incumbindo atos meramente ordinatórios, como a

contratação de obras que a ela fossem necessárias, além de outros de cunho

apenas administrativo38. A sua mais importante atividade restou circunscrita às

“Posturas”39, deliberações que estabeleciam obrigações no âmbito do Município,

pertinentes à polícia40 e à economia do território e tendentes à organização da vida

urbana41.

Ademais, as Posturas Municipais teriam vigência por um ano, enquanto não

fossem confirmadas, eis que, para sua validade, eram submetidas ao crivo dos

Conselhos Gerais (Assembleias Legislativas da Província), os quais detinham a

36

Artigos 2º e 3º da Lei de 1º de Outubro de 1828 37

“Art. 24. As Camaras são corporações meramente administrativas, e não exercerão jurisdicção alguma contenciosa.” 38

Artigos 48, 49, 50 da Lei de 1º de Outubro de 1828 39

Ibidem artigo 64

40 A Lei nº 105 de 12 de maio de 1840, por sua vez, veio esclarecer, limitando a ação à polícia de natureza administrativa (art. 1º). 41

Ibidem artigo 71: “As Camaras deliberarão em geral sobre os meios de promover a manter a tranquilidade, segurança, saúde, e commodidade dos habitantes; o asseio, segurança, elegância, e regularidade externa dos edifícios, e ruas das povoações, e sobre estes objectos formarão as suas posturas, que serão publicadas por editaes, antes, e depois de confirmadas”.

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53

prerrogativa de sua alteração e revogação (artigo 72 da Constituição de 1824). A Lei

nº 16, de 12 de agosto de 1834, em seu artigo 10, ratificou tal subsunção.

Para o período que interessa a este estudo, tem-se que Santos contou com o

código de Posturas outorgado pela Resolução nº 43 da Assembleia Legislativa

Provincial de São Paulo, de 6 de agosto de 1883. No caso, além de um Plano de

Edificação ao seu final, os dez títulos do Código de Posturas de 1883 encerram 170

artigos, assim disciplinados:

TÍTULO I EDIFICAÇÕES, ALINHAMENTOS, ETC.

TÍTULO II MATADOURO, AÇOUGUES, MERCADOS E CURRAES

TÍTULO III COMÉRCIO, INDÚSTRIA, ETC.

TÍTULO IV TRÂNSITO, ANIMAIS SOLTOS, ETC.

TÍTULO V HIGIENE E SALUBRIDADE

TÍTULO VI USO DE MATERIAS INFLAMÁVEIS, INCÊNCIOS E PEDREIRAS

TÍTULO VII ESPETÁCULOS, DIVERTIMENTOS, ETC.

TÍTULO VIII COSTUMES, SEGURANÇA E COMODIDADES PÚBLICAS

TÍTULO IX INUMAÇÕES

TÍTULO X DISPOSIÇÕES GERAIS

A partir da observação dos itens eleitos na sua elaboração, consonantes com

o quanto estatuído pelo artigo 66 da Lei de 1º de outubro de 1828, é extraído o

espaço de ação detido pela Câmara de Santos (Imagem 6) para reger a vida na

cidade. Além disso, não se pode perder de vista que Santos passava por mudanças

significativas, haja vista sua franca expansão propiciada pelo comércio de café, seu

porto e sua nova estrada de ferro, padecendo, ainda, com as precárias condições

sanitárias.

Logo nos primeiros artigos, assentados junto ao Título I, depreende-se que à

Câmara incumbia a fiscalização das obras e construções havidas na área do

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Município, aliás, conforme as prescrições contidas no Plano de Edificação que ela

própria elaborara e que seguia ao final do referido Código de Posturas.

Havia um número significativo de diretrizes, tais como alinhamento e

nivelamento das construções, linha do arruamento, aterramento do terreno,

calçamento, obrigação de murar terrenos, além da ocupação do espaço público. Era,

ainda, exigida licença prévia, da lavra do Presidente da Câmara, para todas as

construções ou reformas, revelando-se um inquestionável poder atinente à formação

e desenvolvimento da própria cidade.

Junto ao Título II, havia a regulação relativa às atividades do matadouro, de

açougues, mercados e curraes, direcionada, evidentemente, à salubridade do

município.

Imperioso, à época, como estampado no artigo 19, a visita diária do médico

da Câmara ao matadouro. Estabelecidos, também, os horários nos quais as carnes

deveriam ser transportadas para os açougues, aos quais, ainda, impunha-se

estabelecer em locais “[...] dos mais salubres e suficientemente arejado, fechadas as

portas com grades de ferro, de fórma a ser perfeita a circulação de ar no interior”

(art. 23), “[...] além de “[...] todo revestido de azulejos [...] ” (art. 25, caput), onde “

...as carnes estarão nos açougues pendentes de ganchos de ferro e cobertos com

panos brancos que serão conservados sempre limpos. O pessoal destes

estabelecimentos será obrigado a trazer sempre, quando em serviço, aventaes

brancos e limpos ...” (art. 24).

Conta Rosemberg que um comerciante da cidade, de nome Andreoti Ranzini,

intentava comercializar carne oriunda de São Paulo, sem a devida licença municipal,

sendo, por conseguinte, alvo da ação do procurador do município, José Rubim

Cezar. Ao fim, ao cidadão renitente, foi imposta uma multa. De se notar, além da

preocupação com a saúde pública, o grau de organização da cidade relevado pelo

inconformismo do advogado, transcrito pelo autor em comento:

[...] A comarca de Santos não pretende impedir o commercio livre, mas entende que está nas linhas do seo dever impedir que um dos principais gêneros do commercio publico que está sujeito a sua fiscalização; tanto que dispões d’um edifício para abaterem-se as rezes e confeccionou um regulamento para o matadouro que está debaixo da inspeção do médico da comarca, ficasse a mercê da

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exploração particular que poderia com o intuito de lucro sacrificar a saúde pública. (Rubim Cezar, apud ROSEMBERG, 2006, p. 81)

O comércio e a indústria também se submetiam à normativa da Câmara.

Várias eram as condições estabelecidas para tais atividades.

Era imprescindível, como deduzido no artigo 30, a obtenção de Alvará de

Licença, da lavra do Presidente da Câmara. Além do horário em que se permitia seu

funcionamento42, no perímetro da cidade fora proibida a instalação de qualquer

forma de estabelecimento que exalasse vapores nocivos e tornassem impuras as

águas potáveis ou que causasse incômodo à vizinhança. Também fora objeto de

regulação o uso de equipamentos que utilizassem fogo – “[...] estejam em lugares

espaçosos e fora da contiguidade de outros prédios [...]” (§ 3º do art. 31), além da

colocação dos tubos das chaminés “ [...] com altura superior ao mais alto andar das

casas que lhe ficarem próximas [...]” (§ 4º do art. 31). Por sua vez, obrigatória a

aferição de pesos e medidas uma vez por ano (art. 36). Necessária, ainda, a

matrícula de cocheiros (e seus veículos), o registro dos documentos de médicos,

dentistas e parteiras.

No entanto, há dois exemplos máximos do poder de controle social da

Câmara. O primeiro era a obrigação de manutenção, em hotéis e hospedarias, de

um livro que, numerado e rubricado pelo Presidente da Câmara, deveriam ser

inscritos os nomes, a naturalidade, a procedência e idade provável dos hóspedes e

que seria, diariamente, apresentado à autoridade policial, ao passo que o outro era a

obrigação detida pelos proprietários de “[...] oficinas de imprimir, litografar e gravar

[...]” de declararem à Câmara a rua e o número do prédio em que estivessem

instalados seus estabelecimentos, além do “[...] título da folha e o nome do editor

responsável pelas suas publicações.” (art. 40).

Há mais. Questões inerentes à vida citadina também se faziam presentes.

O trânsito público, de pessoas, veículos e animais, se revelou uma

preocupação, estampada pelo Título IV do vetusto Código de Posturas de Santos,

mormente em uma cidade que possuía um grande número de carroças que

42

“Artigo 44 – Os estabelecimentos comerciais ou industriais não poderão conservar-se abertos depois do toque de recolher e abrirão depois das 5 horas da manhã. Excetuam-se os hotéis, restaurantes, botequins, bilhares e cafés que poderão estar abertos até meia-noite e as boticas que quando mesmo fechadas são obrigadas a abrir quando nelas se bater...”

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transportavam, também, mercadorias para o porto. Sobreleve-se que aos escravos

foi direcionado o comando do artigo 6443, que previa a captura daquele que fosse

encontrado na rua após o toque de recolher, sem licença de seu senhor. Tal

previsão guarda sintonia, apenas, com a ordem contida no artigo seguinte, de nº 65,

elaborado com o fito de obstar o trânsito de animais soltos pela cidade44. No

particular, exemplo da atuação da Câmara, é o aviso estampado no jornal Diário de

Santos do dia 3 de abril de 1886:

Fonte: Diário de Santos, 03/04/1886

É certo, porém, que a Câmara se submetia à interferência dos munícipes.

Era, pois, uma via de mão dupla, tanto o ente exercia seus poderes por toda a

43

“Artigo 64 – Todo o escravo que for encontrado na rua depois do toque de recolher, sem licença do respectivo senhor, será detido até que este o reclame.” 44

“Art. 65 – Todo animal que fôr encontrado a vagar nas ruas da cidade e seus arredores, será recolhido ao deposito publico e o seu dono multado em dez mil réis além da despeza que for feita. Se três dias aunnuniciada a apprehensão não fôr o animal reclamado será vendido em hasta publica effectuada pelo fiscal ou qualquer guarda urbano e o seu produto, deduzida a multa e despezas, será entregue a quem de direito. Ficam compreendidos nas disposições deste artigo os animais que forem entregues no deposito por aquelles que os prenderem em seus terrenos.”

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cidade, como se sujeitava à sua população. Jocosa a nota do dia 13 de abril de

1886, estampada no Diário de Santos45:

Fonte: Diário de Santos, 13/04/1886

A regulamentação da higiene na cidade, alinhavada ao longo do Título V, se

deu através da obrigação de os moradores se vacinarem, bem como com o

impedimento da existência, dentro de seu perímetro, de enfermarias para o

tratamento de doenças contagiosas e a determinação da escolha, pela Câmara, do

lugar em que seriam estabelecidos hospitais, enfermarias e casas de saúde.

Ademais, a condição dos gêneros alimentícios era fiscalizada, garantindo-se que

fossem próprios para o consumo. Aos cortiços se impediu a lotação acima de sua

capacidade, obrigando-se-os à caiação nos meses de julho ou dezembro. O

escoamento das águas era norma imperativa, quer fossem aquelas próprias ou

recebidas em servidão. Corpos sólidos que causassem incômodo ou prejudicassem

a saúde não poderiam ser lançados nas ruas, praças, sarjetas, valas ou 45

Esta sessão não houve, por falta de número, como anunciou o jornal do dia 16 seguinte.

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encanamentos e o material fecal não poderia ser lançado em canos de drenagem.

Também não era permitido ter porcos, matar corvos, manter cães em açougues

enquanto ali houvesse carne, a venda de frutas verdes, o banho em fontes públicas,

sendo obrigatória a limpeza de testadas, passeios e sarjetas e a caiação ou pintura

de casas. Dava-se, ainda, o controle do leite vendido, fosse obstando sua extração

de animais doentes, feridos ou magros, fosse estabelecendo a utilização de latas ou

vasos de louça para seu acondicionamento ou fiscalizando-se sua pureza. Impedido

o uso, pelas casas comerciais, de vasilhames de cobre e outros metais prejudiciais à

saúde. O lastro dos navios, sua carga e descarga, deveriam ocorrer de modo e em

locais determinados pela Câmara. Entretanto, tais previsões não lograram afastar a

insalubridade da cidade.

A segurança física também foi alvo de determinações, junto ao Título VI.

A manutenção de grandes quantidades de material inflamável não era

permitida, assim como lançar-se busca-pé e tiros de armas de fogo46. A queima de

fogos de artifício e fogueiras dependiam de licença do Presidente da Câmara. A

ação em incêndios foi deduzida, incumbindo-se aos responsáveis pelos sinos das

igrejas seu toque para o alerta e responsabilizando-se a todos por sua extinção.

Previu-se a possibilidade de concessão de licença para a exploração de pedreiras,

impondo-se várias obrigações relativas à segurança aos seus concessionários.

Os espetáculos e divertimentos não foram esquecidos.

Logo à entrada do Título VII, no artigo 120, tornou-se imperiosa a obtenção de

licença e o pagamento de imposto a todos os espetáculos que gerassem lucro.

Proibiu-se a tourada, a exibição de “judas” em sábado (art. 122), o jogo de entrudo

(art. 123), as mascaradas (art. 124) e a exposição de animais ferozes (art. 126).

Sabe-se, porém, que não obstante o caráter coercitivo das disposições, havia

quem as infringisse. Relata Rosemberg, a partir de processos criminais que

examinou, um episódio no qual um cidadão português, de nome Lino José de

Mattos, queixou-se contra Bernardo dos Santos Porto, eis que em 7 de março de

1886, dia de entrudo, este lhe teria lançado várias injúrias, em face de sua negativa

de ver-se por ele molhado (Cf. ROSEMBERG, 2006, p. 35). Curioso, no particular, é

46

Pedro relata a aplicação de multa, pela Câmara, à importadora Wilson, Sons & C., no montante de 30$000, por infração ao artigo 105 do Código de Posturas, em face de irregular armazenamento de carvão de pedra, produto inflamável. (2010, p. 44).

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notar que o queixoso possuía a mesma origem da brincadeira praticada durante as

“folias do momo”, qual seja, portuguesa:

O jogo do entrudo, de origem portuguesa, era a forma tradicional de se brincar durante estes dias. A brincadeira consistia, basicamente, em deixar molhado o transeunte desavisado. A partir do XIX, faziam-se bolas de cera, recheadas com água-de-cheiro ou qualquer outro líquido, e as pessoas se divertiam jogando, pelas ruas e janelas das casas, estas bolas, chamadas de laranjinhas, que estouravam e deixavam a todos ensopados. (LANNA, 1996, p. 131)

Ocorre, porém, que a prática perdeu prestígio, dando lugar a bailes de

carnaval, mais ordeiros e elitizados, a justificar a ação criminal. Lanna acrescenta

que em 1880, segundo o jornal Diário de Santos, o entrudo foi “violento e grosseiro”

(1996, p. 133).

O Título VIII traz em seu bojo diversas disposições sobre “Costumes,

Segurança e Comodidades Públicas”.

Vedados os jogos de azar, permitindo-se casa de bilhar e jogos considerados

lícitos, mediante licença e desde que o solicitante firmasse, junto à Polícia, um termo

em que se obrigasse a não permitir jogos ilegais. Todos estavam obrigados a se

trajar decentemente em locais públicos, inclusive nas praias, sendo proibidos “ [...]

proferir palavras desonestas ou injuriosas [...]” e a “ [...] prática de atos ofensivos à

moral e bons costumes [...]” (art. 132). Alaridos, gritos e cantos que perturbassem o

sossego também não eram permitidos. As edificações também passavam pelo crivo

do Código: nelas não se podia nada fixar, inclusive toldos, sem finalidade útil e

mediante licença que lhe fosse precedente. Vasos e congêneres que

representassem perigo eram obstados, animais bravos não poderiam estar soltos,

os corredores de moradias deveriam permanecer iluminados enquanto o portão

estivesse aberto, os andaimes deveriam ser iluminados durante a noite. Os

mendigos só poderiam esmolar se autorizados pela Polícia e era proibido o

ajuntamento ruidoso de pessoas – e escravos (art. 146). Por sua vez, não se poderia

vender bebida alcóolica àquele que já estivesse embriagado e a ninguém se permitiu

comprar mercadoria a preço ínfimo, que denunciasse sua condição de furtado. A

cada jardim público se atribuiu um guarda para zelar por sua conservação.

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As inumações mereceram três artigos os quais, alinhados no Título IX,

tendiam à garantia de sua ocorrência apenas em lugares previamente estabelecidos

e à proibição das dobras dos sinos.

Por fim, as disposições gerais, contidas no Título X, visavam à garantia da

eficácia das disposições do Codex, as quais encerravam em si, quase que

exclusivamente, penas pecuniárias em caso de infração.

O Código de Posturas é retrato da capacidade legislativa das Câmaras, que

era, como já mencionado, ainda dependente do aval da Assembleia Legislativa da

Província de São Paulo.

Aquele havido em Santos, em 1883, fruto das tensões, disputas e conflitos da

cidade, contém normas relativas à formação da própria urbe, através das previsões

destinadas às edificações. Outras questões intrinsicamente ligadas à vida citadina

tais como o trânsito, higiene e salubridade de estabelecimentos, organização das

atividades comerciais e industriais, além da saúde pública, moral e sossego, foram

ali dedilhadas, tudo em conformidade com o estatuído pelos artigos 66 e 71 da Lei

de 1º de outubro de 1828.

Reflexo da limitação imposta ao Município, apenas duas referências foram

feitas a escravos no Código de Posturas de 1883: ambas articuladas no sentido de

cercear seu comportamento e sua ação em sociedade (art. 64 e 146), distantes,

pois, de sua almejada libertação. Mas assim não se pode encerrar a questão. Este,

particularmente, é um silêncio bastante eloquente.

Barbosa, discorrendo sobre leis imperiais de desescravização, esclarece que

as posturas municipais tiveram papel importante junto ao mercado de trabalho que

germinava, posto que a elas também eram subsumidos os escravos.

Exemplificativamente o autor relata que se exigia dos escravos a exibição de ordem

escrita por seus senhores quando atuavam em atividades comerciais, facilitando,

assim, a aferição dos fugitivos (Cf. BARBOSA, 2008, p. 131).

Tais modalidades de controle, no entanto, não se vislumbram no diploma

santista. Resta claro, assim, que a Câmara local se absteve de exercê-las,

certamente porque afinada com a libertação dos escravos e com a ação

abolicionista que se desenrolava.

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A Câmara47, em um período bastante sensível do movimento

antiescravagista, entre 1883 e 1889, tinha uma composição equilibrada entre

liberais, conservadores e republicanos, circunstância que não é bastante à sua

qualificação como uma casa vinculada à causa da abolição ou não, eis que a ação

libertária também se dava de forma suprapartidária:

O fato da maior parte das associações abolicionistas ter se formado no curso da situação liberal não significava alinhamento entre o movimento e o partido. A relação com o Partido Liberal é fato estampado na proximidade de Patrocínio, Nabuco e Gama, líderes abolicionistas, com políticos liberais; os três entraram na vida pública puxados por essas mãos. Contudo, havia também membros do Partido Conservador no movimento, o caso de Antonio Pinto, de Gusmão Lobo e de Antonio Bento, líder em São Paulo. E porção bem considerável dos abolicionistas não ficava de um lado, nem do outro: eram republicanos. Muitas vezes, os abolicionistas se apresentavam como se compusessem partido autônomo ou movimento suprapartidário, o que era mais o caso. Essa atuação independente se praticou em situações decisivas, com apoio massivo do movimento tanto a governos Liberais – o de Manuel de Souza Dantas (1884-1885) –, quanto a Conservadores – o de João Alfredo (1888) – quando comprometidos com medidas abolicionistas. (Alonso, 2011, p. 15)

Integravam a Câmara santista:

1883 - 1886:

João Octávio Dos Santos Liberal

Benedito Narciso do Amparo Sobrinho Conservador

José Antonio Pereira dos Santos Conservador

José Proost de Souza Conservador

Joaquim Manoel Alves de Lima Republicano

Francisco Martins dos Santos Júnior Liberal

Francisco de Paula Ribeiro Republicano

Dr. Manoel Maria Tourinho Liberal

Joaquim Xavier Pinheiro Liberal

47

Conforme relação feita por Francisco Martins dos Santos (1986, p. 176)

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62

Suplentes que tomaram assento na Câmara48:

João Nunes de Carvalho

Dr. José Lobo Vianna

João Xavier da Silveira

José Proost de Souza

Joaquim Manoel Alves de Lima

Francisco Martins dos Santos Júnior

Francisco de Paula Ribeiro

Dr. Manoel Maria Tourinho

Joaquim Xavier Pinheiro

Balthazar Olynto de Carvalho e Silva

João Maria das Neves

Belisário Soares Caiuby

1887-1889:

João da Silva Oliveira Pinto Liberal

Félix Bento Vianna Conservador

Guilherme José Alves Souto Republicano

Américo Martins dos Santos Republicano

João Manoel Alfaia Rodrigues Júnior Conservador

Lucas Alves Fortunato Conservador

Constâncio Vaz Guimarães Conservador

Tito de Souza Rodrigues Liberal

Júlio Conceição – presidente em 1889 Conservador

48 Não consta a indicação do alinhamento político.

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63

Suplentes que tomaram assento:

Padre Francisco Gonçalves Barros Republicano

José Torres Rossmann n/c

Antonio Carlos da Silva Teles Republicano

Constata-se, a partir da análise das escrituras coligidas ao Anexo I que alguns

desses vereadores transacionaram escravos.

Benedito Narciso do Amparo Sobrinho, reputado conservador, foi vereador e

bastante atuante, envolvido com os assuntos da cidade, como se denota dos

extratos das Atas deduzidos no Apêndice, tendo adquirido um escravo (Anexo I).

Félix Bento Vianna, também integrante da Câmara santista e de linhagem

conservadora, presidiu a casa no dia 20 de maio de 1886, no qual se celebrou o fim

definitivo do trabalho servil, e vendeu 1 escravo e comprou outros 3.

Francisco Martins dos Santos Jr., também vereador, representou sua firma na

venda de um escravo.

Não resta dúvida de que era legal a propriedade de escravos, bem como sua

venda e compra, além de que não se afigura sequer razoável atestar que o

movimento abolicionista foi assimilado de forma unânime. Porém, ainda que dentro

desse espectro de possíveis descompassos, é certo que muitos cidadãos foram

contrários à escravidão e não enfrentaram a ação direta de opositores.

Exemplo dessa conduta transversa, é o também vereador Joaquim Xavier

Pinheiro em duas legislaturas, 1877/1880 e 1883/1886, reputado liberal, mentor da

criação do Quilombo do Jabaquara49, fundador da Sociedade Emancipadora 27 de

Fevereiro e, controvertidamente, detentor de escravos, tendo sido assim censurado:

49

Santos aponta que, além de Xavier Pinheiro, participaram da reunião em que se criou o Quilombo do Jabaquara: Guilherme Souto Geraldo Leite, Julio Backeuser, Santos Pereira (Garrafão), Ricardo Pinto de Oliveira, Júlio Maurício, Constantino de Mesquita, Joaquim Fernandes Pacheco, Theóphilo de Arruda Mendes, José Ignácio da Glória, Affonso Veridiano, Antonio Augusto Bastos, Luiz de Mattos, dentre outros não listados. (1937, p. 12)

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64

Houve, porem, a lamentar na ultima phase do seu trabalho, o aproveitamento tirado por ele dos numerosos escravos confiados ao sei asylo, empregando-os nos rúdes trabalhos do sitio distante, apenas a troco do esconderijo e comida, nada lhes pagando contra as combinações feitas entre os chefes abolicionistas, naturalmente com o fito de ressarcir-se dos prejuízos verificados com a sua colaboração nas despesas da campanha, como viagens, alimentação dos refugiados de Jabaquára, compra de alforrias, custeio de acções judiciaes e outras de apparecimento constante. (SANTOS, 1937, p. 9)

Xavier Pinheiro era um próspero empresário. Fora dono de uma fábrica de

cal, de um trapiche, além de ser acionista da Companhia de Carris de Ferro da

cidade, detendo, certamente, muitos interesses relativos à mão-de-obra. Xavier

Pinheiro foi, ainda, major, delegado de polícia e, como já mencionado, vereador.

Assim é que se perpassa a criação do Quilombo do Jabaquara, momento em

que surge a figura de Quintino de Lacerda, negro liberto por Lacerda Franco. Foi a

Quintino que se atribuiu a guarda e a manutenção do quilombo, destino dos fugitivos

que chegavam a Santos.

Pereira debruçou-se sobre a vida de Quintino de Lacerda e trouxe à sua

dissertação, Uma viagem possível: da escravidão à cidadania. Quintino de Lacerda

e as possibilidades de integração dos ex-escravos no Brasil, vários termos de uma

ação de interdito possessório proposta em 24 de fevereiro de 1886. Benjamin

Fontana, autor da ação, dizia-se proprietário das terras do Jabaquara, onde se

instalara o quilombo, e acusava Walter Wright de tê-las invadido, sendo viável a

Pereira, a partir dessa documentação, atestar a dinâmica ali existente:

Esse início da contenda judicial entre Fontana e Wright nos dá indicativos valiosos a respeito da ocupação promovida nas terras do Jabaquara. Uma questão está vinculada à exploração dessas terras através da construção das benfeitorias e das plantações listadas. Afinal, quem cuidava das bananeiras, dos pés de cana e dos mandiocais? O galinheiro provavelmente era de responsabilidade de Quintino de Lacerda, afinal no ano de sua morte os autos de arrecadação realizados para a elaboração de seu inventário listaram um número muito grande de aves, principalmente galinhas. É possível imaginar que a relação entre Fontana, Quintino de Lacerda e os escravos fugidos não se resumia ao auxílio dos dois primeiros para o sucesso da ação de rebeldia escrava contra seus senhores. A relação ambivalente de Quintino com os habitantes do Jabaquara começa a se desenhar com maior clareza. (2011, p. 216).

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65

Como se vê, não se tratava de mero acolhimento de fugitivos. Os escravos

encontravam trabalho no Jabaquara, na lida da terra: “Os ex-escravos e escravos

que partiam rumo ao Jabaquara na década de 1880 apresentavam-se como uma

mão de obra ociosa e que deveria ocupar-se na lógica do trabalho assalariado para

o movimento abolicionista paulista de que Quintino de Lacerda era membro.”

(PEREIRA, 2011, p. 219).

Quintino de Lacerda não pode ser considerado como uma figura isolada

nesse contexto. Houve sua expressa indicação pela elite santista para o mister,

como anteriormente posto. Era ele a pessoa talhada para o ofício, tido como homem

forte e de caráter. Escorado estava, em seu cotidiano, por essa mesma elite que se

espraiava pelos espaços de poder da cidade: ora com assento junto à Câmara, ora

em perfeita consonância com outros poderes constituídos, a ponto de transformar

um ato judicial de libertação oficial dos sexagenários em uma festa cívica onde se

deu a criação da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro, como se verá a seguir,

e com amplo apoio de uma combativa imprensa, que contava, ainda, com o Diário

de Santos, capitaneado por Rubim Cezar, também advogado em prol da causa

abolicionista.

2.2 As sessões da Câmara: 23 de fevereiro e 24 de março de 1886

O exame das atas da Câmara de Santos indica que ocorreram sessões nos

dias 23 de fevereiro de 1886 e 24 de março de 1886, não tendo havido sessão no

dia 27 de fevereiro de 1886, circunstância que sepulta, de vez, a propalada

ocorrência de edição da lei. A rigor, na cidade de Santos, não houve qualquer

movimento do órgão em tal sentido.

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66

Imagem 12: Largo da Cadeia Nova (e Câmara), inaugurada em agosto de 1865 (fotografia).

Autor: Militão Augusto de Azevedo. Acervo: Instituto Moreira Salles. Disponível em: Blog Novo Milênio

A edificação persiste até os dias de hoje e é situada na Praça dos Andradas, centro de Santos.

A fim de trazer à baila um panorama das questões versadas pelos

vereadores, espelhando, assim, o concreto campo de atuação da Câmara, curial

traçar as atividades havidas nessas duas sessões, uma antecedente e outra

posterior ao dia 27 de fevereiro de 1886, brevemente relatadas no Apêndice.

A Câmara, além de registrar uma ata relativa a cada sessão, em livro próprio

por ela mantido, fazia publicar, integralmente, nas páginas do jornal Diário de

Santos, seu conteúdo. A publicação habitual da atuação da Câmara franqueava à

população conhecer de suas competências, orientações e das questões tratadas,

aproximando-a da população. Viabilizava, também, o exercício do poder de

fiscalização pelos cidadãos. Era, pois, um órgão que respirava os ventos da

democracia.

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67

Inegável que a Câmara, inserida no cotidiano da cidade, era um órgão que

efetivamente representava seus interesses. Por tais razões é que J. Floriano de

Godoy, senador do Império, entendeu por bem fazer uma consulta às Câmaras da

Província de São Paulo sobre a escravidão, o que redundou em um livro

denominado “O elemento servil e as Camaras Municipaes”, de 1887.

Na longa digressão que faz o autor, a justificativa para consulta seguiu estas

razões:

[...] quando se trata de esclarecer problema que profundamente interessa o organismo social; quando se quer ter conhecimento exacto do modo pelo qual a nação pensa acerca da satisfação de uma necessidade urgente, as informações que então podem ser ministradas pelo elemento municipal, constituido, sobretudo, para o

fim de velar pelos interesses de suas circumscripções, têm um valor que as torna, muitas vezes, mais preciosas, que as provindas do elemento eleitoral que, na constituição da representação nacional,

não póde agir sinão – política e partidariamente. (GODOY, 1887, p. 4)

O autor teceu, também, crítica à Lei 3270/1885 (Lei dos Sexagenários), por

sua alegada insuficiência para a extinção gradual do trabalho servil, dando margem,

assim, como aduziu, à atuação de abolicionistas “desorganizando a faina agrícola e

perturbando a ordem publica” (GODOY, 1887, p. 30). A preocupação,

evidentemente, dava-se com a “lavoura”, “fonte das riquezas publicas deste paiz”

(GODOY, 1887, p. 31), o que o levou a apresentar, em setembro de 1887, um

projeto que dava fim à escravidão, obrigando os libertos à prestação de serviços a

seus ex-senhores por três anos. Godoy sem se opor à abolição, defendia

tenazmente os interesses dos agricultores e acabou por concluir que a solução

estava no trabalhador livre nacional.

Apenas vinte e três câmaras encaminharam resposta. A cidade de Santos

não atendeu à pesquisa, provavelmente por não se tratar de urbe detentora de

fazendas produtivas, localidades primordialmente destinatárias do questionamento:

“Si VV. SS. Entenderem que esta consulta merece resposta, muito grato ficarei; no

caso contrario, restar-me-ha a tranquilidade da consciência, por ter cumprido com

meu dever, consultando os imediatos representantes da lavoura, quando a sorte

desta vai ser decidida.” (GODOY, 1887, p. 78).

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68

De toda forma, a pretensão do senador é hábil à demonstração do papel

desempenhado pela Câmara à época, corolário de sua imbricação com os assuntos

da cidade.

Embora silente, houve, na Câmara Municipal de Santos, em 20 de maio de

1888, uma sessão comemorativa, relativa à Lei Áurea50. Vários munícipes a ela se

dirigiram e, sob a presidência de Felix Bento Vianna, após lidos telegramas de

felicitações de acadêmicos santistas, da comissão central dos festejos da Capital,

além de um ofício dos professores da cidade, autoridades, homens e mulheres em

comunhão consignaram nos assentamentos daquela Casa a definitiva abolição da

escravidão em terras brasileiras, alinhavada nos seguintes termos:

Aos vinte dias do mês de Maio de mil oitocentos e oitenta e oito, nesta Cidade de Santos, em Paço da Câmara Municipal, presentes a uma hora da tarde, os Senhores Vereadores abaixo assignados, sob a Presidência do Senhor Tenente Coronel Felix Bento Vianna, que abrindo a sessão, declarou o seguinte: O motivo especial da presente sessão é todo commemorativo de faustoso acontecimento que se deo com a promulgação da humanitária lei de treze de Maio. Ficará consignado na prezente acta que esta Camara recebeo com a mais viva satisfação e com o mais patriótico enthusiasmo a noticia da sanção e promulgação da referida lei, que veio colocar a Nação Brasileira no verdadeiro nivel moral que lhe competia entre os Povos civilisados. Que, como demonstração do justo regosijo publico, se deve já telegrammas de felicitação a sua Alteza Imperial Regente em nome do Imperador, a assembléia geral legislativa e ao Ministerio de dez de Março. Esses telegrammas são do seguinte theor: a Camara Municipal da cidade de Santos reunida hoje em sessão especial se congratula com sua Alteza Imperial Regente, em nome de sua Majestade o Imperador, com a assembleia geral legislativa, com o glorioso Ministerio de dez de Março e com a Nação Brasileira pela promulgação da Lei salutar de treze de Maio que veio eliminar para sempre a instituição da escravatura no Brasil. Santos, vinte de Maio de mil oitocentos e oitenta e oito. Felix Bento Vianna Presidente. Para constar lavra-se o presente termo, digo presente acta que é assignada pelos Senhores Vereadores, pelos cidadãos presentes e por mim Joaquim Pereira Morais. Secretario da Camara que a subscrevi.

50

A data da libertação dos escravos, 13 de maio de 1888, ficou gravada no ideário da cidade de Santos. Em 13 de maio de 1889 houve dupla comemoração no Theatro Guarany: uma relativa ao primeiro aniversário da Lei Áurea e outra que veio na sua trilha, qual seja, a instalação da Associação Protetora da Infância Desvalida de Santos (Asilo de Órfãos). Ainda nesse sentido, dez anos depois, também em um 13 de maio (1899), as crianças abrigadas foram transferidas para a nova sede do Asilo de Órfãos. (Cf. SILVA, 1992, p. 18).

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A Câmara de Santos, junto à parcela de sua população que para lá se dirigiu,

fizeram dali um espaço de manifestação onde o fim do trabalho servil foi pontuado

com uma sessão “especial”, exclusivamente comemorativa.

Este registro na Câmara é indicativo, pois, da dissonância existente entre o

poder estabelecido e emanado pela Monarquia com aquele existente na cidade de

Santos.

Há de se consignar, por fim, que todo esse processo, como já visto, não

restou ileso de ambivalências e contrapassos. Felix Bento Vianna, presidente da

sessão especial, era proprietário de escravos, como indicado no item antecedente

(2.1).

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CAPÍTULO III - 27 DE FEVEREIRO DE 1886 EM SANTOS: UMA SOCIEDADE EMANCIPADORA

Deu-se, na cidade de Santos, no dia 27 de fevereiro de 1886, um importante

passo para o fim da existência de escravizados em seu solo.

O jornal Diário de Santos publicou em suas páginas, em 14 de fevereiro de

1886, edital da lavra do magistrado Ledo Vega, convocatório para uma audiência

pública extraordinária que determinara realizar-se às 11 horas do dia 27, na qual

deveriam ser apresentados os escravos maiores de 60 e 65 anos. Ao fim do edital

foram arrolados os escravos nessa condição matriculados nos Municípios de Santos

e da Conceição de Itanhaém.

Os efeitos desta convocação, no entanto, ultrapassaram seus limites formais.

O referido ato teve sua gênese na Lei nº 3270, de 28 de setembro de 1885,

também conhecida como Lei dos Sexagenários. Tal lei determinou nova matrícula

aos escravos, atribuindo-lhes preço máximo deduzido em tabela, à exceção

daqueles com idade superior a 60, sujeitos a “arrolamento especial” (§ 5º do art. 1º).

Estes estariam livres, contudo, deveriam, a título de indenização por sua alforria,

prestar serviços a seus senhores por três anos, permanecendo, ainda, em sua

companhia após o cumprimento da obrigação, na forma do § 1351 do art. 3º da lei em

tela. Restava, assim, ao senhor, o dever de alimentá-los, vesti-los e cuidá-los na

doença, podendo, em contrapartida, beneficiar-se de serviços compatíveis com as

forças do liberto.

A lei em comento traz em seu bojo disposição bastante à conclusão de que os

maiores de 65 anos e aqueles que completavam tal idade antes dos três anos de

trabalho indenizatórios não estariam submetidos àquela tal previsão. Teriam sido,

pois, lançados à própria sorte.

51

“§ 13. Todos os libertos maiores de 60 anos, preenchido o tempo de serviço de que trata o § 10, continuarão em companhia de seus ex-senhores, que serão obrigados a alimentá-los, vesti-los, e tratá-los em suas moléstias, usufruindo os serviços compatíveis com as forças deles, salvo se preferirem obter em outra parte os meios de subsistência, e os Juízes de órfãos os julgarem capazes de o fazer.”

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71

Curial ressaltar que os §§ 17 e 18 de referido artigo 3º estabeleceram a

obrigatoriedade do labor a todos os libertos, sob pena de prisão, bem como

obstaram a sua transferência para outra Província, salvo hipóteses alheias à sua

vontade (§ 19), mitigando-se, assim, a liberdade propalada. De qualquer forma, a

libertação destes poucos escravos, ainda que nesses termos tão restritivos, se fez

de forma festiva e ruidosa. No periódico do dia 17 seguinte, além da reiteração do

edital, veio estampada a seguinte notícia:

Fonte: Diário de Santos, 14/02/1886

“Sem onus algum” (sic), é bastante à demonstração do entendimento regente

à época. A libertação de escravos com idade superior a 65 anos foi considerada

uma benesse.

No dia da sessão, no entanto, uma voz fez-se dissonante desse espírito

alegre que pairava sobre as libertações. Sob o título “Os veteranos da escravidão”,

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R.C. fez longo manifesto que, publicado no mesmo Diário de Santos, expôs toda sua

fúria contra o ato que considerou, às escâncaras, aviltante. Os escravos libertos

qualificou como “miseráveis que se abeiram do túmulo”, chamando-os de “machina

estragada, animal intragável”. Máxima expressão de sua angústia, intitulou de

infâmia aquilo que declarou como “ [...] salutar providência de só declarar livres os

negros de 65 anos. Os que já não podem prestar serviços a seus senhores!”, assim

prosseguindo:

Cálculo medonho, hipocrisia revoltante, blasfêmia atirada ao céu, lodo a empartar as prescrições do Direito. O espírito da lei atual é uma torpeza, ou antes não é lei é o túmulo de que fala a Bíblia caiado de branco e a esconder podridões. Pelas leis antigas o sr. era obrigado a tratar escravo enfraquecido pela idade. Posto que muito distante o velho legislador estava mais perto da justiça do que os reformadores atuais. A reforma só atendeu ao interesse dos proprietários a quem diz: - gozem, gozem até os últimos momentos e quando inteiramente imprestável atirai à rua a escrava que amamentou vossos filhos o infeliz que da terra arrancou os elementos de vossa fortuna. A esses podeis abrir a porta que não leva a vida e sim à miséria [...] (R.C., Diário de Santos, 27/02/1886)

O anonimato do manifesto é significativo de uma possível solidão. Relativo

anonimato, é certo.

A lei, não obstante ter, de fato e ao fim, devolvido a liberdade a pessoas dela

arrebatadas, o fez de forma ampla e irrestrita apenas em relação a ínfima parcela de

escravizados, parcela esta já há muito alquebrada e vilipendiada em sua dignidade,

estorvo a seus proprietários, consolidando-se, assim, como impositiva de uma nova

condição: o abandono dos maiores de 65 anos.

O edital convocatório trouxe em seu bojo o rol contendo o nome de 13

escravos maiores de 65 anos e outros 21, entre 60 e 65 anos (relativamente a

Santos. Em Conceição de Itanhaém havia uma escrava de 61 anos, Maria), que

seriam albergados pela lei, aos quais seria concedida liberdade absoluta ou, ao

segundo grupo, mediante prestação de serviços, como previsto em lei:

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Escravos maiores de 65 anos (Tabela 1):

ESCRAVO PROPRIETÁRIO

Bento Henrique Porchat

Fernando Idem

Seraphim Idem

Bernardo Idem

Thomaz Idem

Valentim Antonio Ferreira da Silva

Ventura Albino Ferreira dos Santos

Mariana Thomaz Antonio de Azevedo

Fortunato Luiza Maria Botelho

Eliza João Baptista de Lima (herança)

Antonio Antonio José da Silva Bastos

Fabiano Major Joaquim Xavier Pinheiro

Camillo João Certiat

Note-se que um destes, Fabiano, de propriedade de um integrante da

sociedade santista: Major Joaquim Xavier Pinheiro, também vereador.

Escravos entre 60 e 65 anos (Tabela 2):

ESCRAVO PROPRIETÁRIO

Antonio Souza Queiroz & Vergueiro

Vidal idem

Matheus Major Xavier Pinheiro

Frederico Idem

Manoel Joaquim Antonio Villas Boas Oliveira

Virginia Manoel Pereira da Rocha Soares

Benedicto Lalanne & Irmão

Manoel idem

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Angelo Idem

Martinho José Joaquim de Azevedo

José João Certiat

Joaquim Henrique Porchat

Miguel idem

Domingos Maximiliana Pereira Bueno

Roza Joaquina Roza do Amor Divino

Jose João de Andrade Bastos

Quiteria Luiza Maria Botelho

Luiz Antonio Marques de Carvalho

Maria Salome Boaventura Rodrigues de Souza

Antonio Valencio Augusto Teixeira Leomil

Dionizio Vicente Barboza

Não se afigura demasiado estatuir que, ao passo em que em Santos eram 34

os então libertados, o Diário de Santos (em 03/03/1886) trazia a notícia de que em

São Paulo, em 02 de março de 1886, em audiência realizada pelo juiz de órfãos, 214

foram os sexagenários declarados livres.

No dia 27 de fevereiro de 1886 (sábado), nas dependências do Fórum de

Santos, junto ao salão do Tribunal do Júri, como noticiou a edição de 28 de fevereiro

de 1886, fez-se a declaração de liberdade, desonerando-se quase que a

integralidade dos então libertos da prestação obrigatória de serviços52. E aqui, é

possível afirmar, desfaz-se o anonimato do autor de tão sofrida ode: Dr. Rubim

Cezar, redator do matutino comparece à sessão e manifesta-se na tribuna, logo

após discurso do Juiz de Direito. Outros cidadãos assim também o fizeram, alguns

na forma de poesia53.

52

Srs. Lalanne e irmão encontravam-se na Europa e havia um senhor residente em Conceição de Itanhaém que não pode ser convocado. 53

Dr. Heitor Peixoto, Juvenal Pacheco, Arthur Vital d’Oliveira e Gastão Bousquet. Com poesias: Aprígio de Macedo, João Guerra e Augusto Zany.

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75

Imagem 13 – Retrato de Rubim Cezar

(fotografia), publicado no jornal A Tribuna de 26 de janeiro de 1939

Disponível em: Blog Novo Milênio

Na mesma oportunidade, o Major Xavier Pinheiro, concedeu dez cartas de

liberdade, três sem ônus e as demais com a obrigação de trabalho por dois anos,

mediante, desde aquele momento, o pagamento de salários (não houve indicação

dos beneficiados). Outros senhores também libertaram seus escravos, não tendo

constado se imposta alguma condição:

Libertação espontânea (Tabela 3):

ESCRAVO IDADE PROPRIETÁRIO

Francisco 28 Dr. Manoel Homem de Bittencourt

Francisco 28 José Benedicto de Castro

Orozimbo 21 João dos Santos Bandeira

Guilherme n/c Sr. Souza Queiroz & Vergueiro

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n/c n/c João Baptista da Silveira Ferraz

O jornal de 17 de março de 1886 elencou outros 12 escravos, cujas

liberdades foram posteriormente concedidas (em 14 de março de 1886):

Libertação concedida posteriormente à solenidade (Tabela 4):

ESCRAVO PROPRIETÁRIO CONDIÇÃO

Felippe João Favot prestação de serviços por 3 anos

Brigida José Moreira de Sampaio pecúlio de 400$000

Maria Michilina Quirino Cardozo prestação de serviços por 3 anos a Julio Affonso Teixeira

Luzia Capitão João Sabino Pinto sem condição

Antonio Antonio Macuco prestação de serviços por 4 anos

Sebastião Francisco Manoel Fernandes sem condição

Ilegível Major Xavier (embora ilegível, é certa a referência a Xavier Pinheiro)

Ilegível (provável prestação de serviços)

Sophia José Antonio de Azevedo pagamento, pela própria, da quantia de 500$rs.

Amaro Josepha Maria do Espirito Santo pagamento, pelo próprio, da quantia de 240$rs.

João Antonia Maria de Jesus sem condição

Rita Idem sem condição

Mathilde Joanna Rodrigues sem condição

De todo o exposto, é possível apurar-se que a solenidade acabou por

redundar na libertação de 61 escravos, assim:

escravos maiores de 65 anos (tabela 1) 13

escravos entre 60 e 65 anos (tabela 2) 21

escravos indicados e libertados na própria solenidade – libertação espontânea 5

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77

(tabela 3)

cartas de alforria concedidas pelo Major Xavier Pinheiro, sem indicação do escravo

10

libertações concedidas posteriormente à solenidade (14/03/1886) – Diário de Santos, 17/03/1886 (tabela 4)

12

TOTAL 61

Obs. Se considerarmos que a publicação de 13/03/1886 traz uma libertação promovida pelo Major Xavier Pinheiro que havia concedido 10 cartas durante a solenidade, este total é da ordem de 60 escravos.

Porém, ainda um outro fato relevante ocorreu, como revelou o Diário de

Santos de 28 de fevereiro de 1886: a proposta de fundação, por Xavier Pinheiro, de

uma sociedade emancipadora, denominada 27 de Fevereiro, “[...] que com vigor

impulsione o abolicionismo nesta cidade que mais do que em qualquer outra

provincia, conta grande numero de partidários” (sic), intentando consolidar-se como “

[...] uma corporação que bem póde obter a gloria de emancipar o muuicipio de

Santos” (sic).

Esta Sociedade florescia através dos novos ventos trazidos pela Lei do Ventre

Livre de 1871, que introduziu a possibilidade de o próprio escravo fazer-se livre

através do pagamento de sua alforria54:

A possibilidade de autocompra legalizou e estimulou a multiplicação do que os abolicionistas até então já praticavam: a auto-organização da sociedade, formando associações para batalhar donativos e assim comprar alforrias. Isto é, o que antes se fazia em pequena escala a despeito do Estado, poderia agora se multiplicar, sob amparo da lei e, eventualmente, de recursos públicos. (ALONSO, 2011, p. 177).

Evidencia-se, do quanto exposto, que, não obstante tenham os cidadãos

santistas se declarado contrários ao regime escravagista que vigia à época, não

lograram, a 27 de fevereiro de 1886, levá-lo a termo. O que se pode apurar, diante

do quanto ora revelado, é ter-se considerado a solenidade ocorrida em 27 de

fevereiro de 1886 como uma cabal decretação do fim da escravidão de Santos, 54 Como se vislumbra da Tabela 4, relativamente a Sophia e Amaro.

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assimilando-se-a como uma norma imperativa, legal. No entanto, havia, naquele

momento, trabalho servil em Santos. Outra não foi a constatação de Lanna: “A

cidade foi declarada território livre em 1886. Apesar deste ‘fim antecipado da

escravidão’, foram registrados escravos na cidade até 1888. Além disso, muitos dos

escravos ditos livres estavam submetidos a alforrias sob contrato de prestação de

serviços.” (1996, p. 191).

3.1 A instalação da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro

A Sociedade, então, passa a surgir.

Francisco Martins dos Santos aponta que em 2 de março, no Salão do Júri do

Fórum de Santos, foi instalada a Sociedade, sob a presidência do Major Xavier

Pinheiro. Relata o memorialista que, dentre outros, estavam presentes o juiz Ledo

Vega, Heitor Peixoto, Gastão Bousquet e João Guerra, todos, evidentemente,

reconhecidos abolicionistas (1937, p. 33).

Em 9 de março de 1886 fez-se publicar, no Diário de Santos, convite a todos,

chamando, ao Paço Municipal, no dia seguinte, para a discussão e aprovação do

estatuto da novel sociedade. Como se observa do conteúdo do convite, a entidade

que surgia era inspirada em vertente democrática, na medida em que tornara

público, antecipadamente, o teor das diretrizes que serviriam, a partir de então, para

guiar sua atividade, viabilizando, ainda, a discussão de seus termos. Clara restou,

também, a intenção de conclamar o maior número de pessoas alinhadas com sua

finalidade, bem como nítida a preocupação com a celeridade dos trabalhos:

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79

Fonte: Diário de Santos, 09/03/1886

De idêntica forma, o estatuto também seguiu ali estampado em sua

integralidade, dando-se a ele, pois, absoluta publicidade. Merece inicial relevo o

artigo 1º que, preciso em seus contornos, estabeleceu, objetivamente, que a

finalidade da associação que então surgia era tão-somente a rápida extinção do

elemento servil na cidade de Santos, dentro dos limites da lei:

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80

Fonte: Diário de Santos, 09/03/1886

Logo a seguir, junto ao artigo 2º do estatuto, fez-se consignar que a

Sociedade poderia promover, também, a libertação de escravos de outras Comarcas

que estivessem residindo em Santos.

Várias foram as disposições acerca da organização da entidade que nascia.

Estabeleceu-se a existência de uma diretoria eleita por escrutínio secreto, com a sua

composição: presidente, vice-presidente, orador, dois secretários, dois tesoureiros e

oito conselheiros. As atribuições de cada função foram também descritas ao longo

de diversas disposições. A sociedade, pois, pretendia-se pública e organizada.

Por seu turno, aos sócios foi destinado o Capítulo 3º, onde foi aduzido que a

eles competia “Promover por todos os meios ao seu alcance o desenvolvimento

progressivo da associação” (§ 2º, artigo 14), sendo a sua adesão à Sociedade feita

de forma onerosa, por intermédio de contribuição mensal mínima de 1$000 réis55.

Previstas, ainda, assembleias gerais e extraordinárias.

Derradeiramente, junto ao artigo 24 das Disposições Gerais, consolidou-se

uma regra de preferência a ser observada pela Sociedade para as libertações,

privilegiando-se os mais velhos:

55

Aquele que deixava de contribuir por três meses seria eliminado, conforme art. 16.

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81

Fonte: Diário de Santos, 09/03/1886

Outros dois artigos, ademais, são especialmente reveladores do estrito intento

atribuído à Sociedade por seus criadores. Nesse contexto, obstou-se qualquer

discussão sobre temas distintos de seu objetivo, bem como a imperatividade de sua

extinção ao fim definitivo da escravidão, verbis:

Fonte: Diário de Santos, 09/03/1886

Fonte: Diário de Santos, 09/03/1886

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Depreende-se, do exposto, que a Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro

constituiu-se como uma entidade civil, organizada estruturalmente e alinhada

formalmente com o ordenamento legal e positivo já vigente à época.

Prosseguindo em sua atividade, logo a seguir, no dia 11 de março, a

Sociedade fez publicar, no Diário de Santos, um pedido: deveriam, os senhores de

escravos que desejassem receber módicas quantias pela liberdade de seus cativos,

com a obrigação de prestação de serviços – como previsto na lei -, bem como

aqueles que quisessem conceder cartas de “plena liberdade”, dirigir-se a qualquer

um dos que chancelavam aquele chamado, a fim de que fossem todas as cartas

entregues na posse da diretoria da entidade, no dia 14 seguinte. Assinavam a

publicação: Xavier Pinheiro, Lucrecio F. Fernandes, Raymundo G. Corvello, Augusto

R. Zany e J. Fernandes Pacheco. Nesta data, ainda, é feito o convite aos sócios e às

suas famílias para a inauguração da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro no

dia 14 de março, às 7 horas da noite, no Teatro Guarany, em Santos. Evidente um

tom de gala atribuído à solenidade.

Destacou-se, em 14 de março, uma matéria sob o título “A proxima libertação

da cidade de Santos”, a qual demonstra o entusiasmo dos jornais de São Paulo com

a possibilidade do fim da escravidão na cidade de Santos, em clara tentativa de se

imprimir mais cores ao evento que se anunciava para aquela noite, cujo efusivo

excerto assim veio redigido:

Fonte: Diário de Santos, 14/03/1886

Como não poderia deixar de ser, a instalação foi objeto de notícia publicada

em 16 de março. Deu-se relevo ao júbilo da festa, pranteada com a presença de

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homens da capital. O discurso do presidente da Sociedade, Major Xavier Pinheiro,

também se fez registrar, assim como o de seu orador oficial, dr. Rubim Cezar.

No dia seguinte, ratificando-se a envergadura do ocorrido, publicou-se a

relação dos escravos libertos durante a cerimônia do dia 14 de março, como

alinhavado na Tabela 4.

Novamente denota-se o empenho em tornar público, não só aquilo que era

pertinente à Sociedade, mas, também, o ato de concessão da liberdade, seus

autores, seus beneficiados e suas condições. Esta conduta, se não lograva

conquistar a todos, diante da prevalência de um Estado escravista, tornava a

Sociedade mais próxima daqueles que com sua pretensão se afinavam,

familiarizava outros com os processos de libertação e com a construção de uma

Nação livre e até, muito provavelmente, acabava por provocar algumas mentes

indiferentes.

Apesar de tamanho esforço de parcela dos cidadãos santistas, contrários à

servidão humana, seguia, no país, e de forma legal, a escravidão.

3.2 As ações da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro

O Diário de Santos publicava em 12 de março de 1886 edital elaborado pela

Inspetoria da Alfândega, tornando pública a matrícula e o arrolamento dos escravos,

no interregno compreendido entre 30/03/1886 e 30/03/1887, nos termos da Lei nº

3270/8556, ressaltando que seriam considerados libertos aqueles escravizados que

não fossem alvo de matrícula, bem como aos não arrolados (entre 60 e 65) seria

dispensada a prestação de serviços, pelo que o ato omissivo do senhor de escravos

era bastante à conquista da liberdade, circunstância evidentemente facilitadora para

a libertação.

56

“Serão considerados libertos os escravos que no prazo marcado não tiverem sido dados á

matricula, e esta clausula será expressa e integralmente declarada nos editaes e nos annuncios pela imprensa, onde a houver. Serão isentos de prestação de serviços os escravos de 60 a 65 annos que não tiverem sido arrolados.” (§ 7º do artigo 1º da Lei nº 3270 de 1885).

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Não obstante o espectro legal nacional a chancelar o regime, inclusive com

novas matrículas, o matutino continuava em sua luta, celebrando, em nota, no dia 21

de março de 1886, a libertação de dois escravos, sem qualquer condição. Tal fato

seguiu-se durante toda a campanha abolicionista: as libertações mereciam registro

entusiasta.

Nota-se, por seu turno, que a Sociedade 27 de Fevereiro, sem qualquer

receio, dava publicidade de seus encontros, conforme chamados publicados nos

meses de abril e maio:

Fonte: Diário de Santos, em 04/04/1886

Fonte: Diário de Santos, em 27, 29, 30/04 e 02/05/1886

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Fonte: Diário de Santos, em 02/05/1886

Fonte: Diário de Santos, em 23/09/1886

A Sociedade segue, assim, seu caminho, certamente organizando-se nessas

reuniões, traçando estratégias de atuação, inclusive para perseguir recursos para

seus intentos.

Em 09 de abril de 1886, o Diário enalteceu a posse de 12 cartas de libertação

pela Sociedade, atribuindo tal conquista ao “mais sympathico acolhimento” por parte

da população. No dia seguinte o jornal anunciou a ocorrência de um espetáculo,

uma opereta, chamada “O Cavalheiro Mignon”, com fins humanitários, eis que sua

renda destinava-se aos cofres da Sociedade. No dia 13 o matutino estampou o êxito

da empreitada, revelando que a quantia de 600$000 fora arrecadada. Em 15 de abril

a Sociedade agradeceu, “penhoradíssima” ao diretor da empresa de espetáculo.

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86

Imperativo consignar, nesta toada, que desde a concepção de seus estatutos

até a arrecadação havida em um espetáculo que lhe beneficiava, a associação

humanitária levava ao conhecimento de todos. Certamente a cidade, como um todo,

acolhia suas atividades e, portanto, a Sociedade utilizava-se do jornal para expor-se

e angariar a ajuda necessária ao seu intento. Caso houvesse repulsa ao desiderato

abolicionista, evidentemente a entidade agiria sub-repticiamente, o que não

corresponde à realidade evidenciada pelo Diário de Santos. O que também se pode

constatar é que tal espectro de comportamento adotado pela Sociedade tornou-a

referência de prática abolicionista.

E foi nessa trilha que, em publicação datada de 25 de setembro de 1886, no

Diário de Santos, relatou-se que durante uma reunião da Sociedade ocorrida no dia

23 antecedente (cujo chamado fora publicado, como acima referenciado), Benedicto,

Manoel e Angelo a ela dirigiram-se, à procura de socorro. Sustentavam todos

possuírem mais de 65 anos, ainda que pelos registros de suas matrículas tal idade

não teria sido alcançada, vendo-se, assim, ilegitimamente, obrigados à prestação de

serviços (note-se que os três constavam entre os escravos de 60 a 65 anos a serem

libertados, sob condição, na sessão do dia 27 de Fevereiro de 1886 – Tabela 2). Os

membros da Sociedade dirigiram-se, ao fim da sessão, já no período noturno, à

residência de um dos sócios da empresa Lalanne & Irmão, à qual remanesciam

vinculados os indivíduos, obtendo, imediatamente, a almejada plena liberdade para

aqueles escravizados.

O que se extrai da narrativa, é, inicialmente, a extrema utilidade da

publicidade dada às ações da Sociedade. Além da inegável presteza de suas

atitudes, é notório o respeito que a entidade gozava em seu ambiente de atuação.

Se assim não fosse, não teria obtido pronto êxito na empreitada levada a termo

durante a noite. A sua inserção social também é flagrante, haja vista terem, os

escravizados, a ela recorrido, ou seja, conheciam e reconheciam sua ação.

Outro aspecto que merece destaque, no particular, é a atitude positiva de

Benedicto, Manoel e Angelo. Os três detinham conhecimento do direito que os

amparava e de um meio através do qual poderiam fazê-lo valer - a Sociedade. Não

eram, pois, alheios a seu entorno e inertes seres a depender da benesse de outrem.

Inevitável cogitar-se, ainda, que os três teriam se utilizado, na verdade, não de um

direito, mas de um bom subterfúgio, afinal, no dia 27 de fevereiro, oportunidade em

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que alguns senhores se dispuseram a libertar seus escravos, alguns sem condição,

os seus proprietários não se fizeram presentes, uma vez que em viagem. Não seria

demais considerar que o trio, ainda que de forma tardia, teria se aproveitado do

espírito libertário que se assentou no dia 27, para alcançarem algo que talvez a eles

também sido franqueado graciosamente, se os representantes de Lalanne & Irmãos

tivessem comparecido.

A notícia em comento trouxe, também, o resultado de um levantamento

realizado por João Guerra, entregue à Sociedade, acerca da quantidade de

escravos havidos em três municípios. A apuração resultou em 237 na cidade de

Santos, 29 em São Vicente e 19 em Conceição de Itanhaém e foi alvo de

publicação, junto ao Diário de Santos, nos dias 01 e 02 Outubro de 1886. Maria

Apparecida Franco Pereira, a partir de tais dados, concluiu que a Comarca de

Santos não era, pois, um “centro escravocrata”, apontando, ainda, que “Num total de

237 cativos em Santos, pertencentes a 123 proprietários, 44 têm mais de um

escravo, ou seja, 21 têm 2; 12 têm 3; 2 têm 4; 1 tem 7; 1 tem 9; 2 têm 14.” (1988, p.

98-99).

No que tange aos escravos identificados em Santos por João Guerra, foi

elaborada, para melhor informar esta dissertação, uma tabela a partir do conteúdo

trazido pelo periódico, transcrevendo-se o nome do escravo, sua idade e seu

proprietário, lançada junto ao Anexo II. Com base neste descritivo pode-se estatuir,

ainda, que: 140 escravos eram homens (59%) e 97 mulheres (41%); 16 foi a idade

mínima declarada – aqui se deve levar em conta que a Lei do Ventre Livre é de

1871, portanto os menores de 15 anos em 1886 eram nascidos livres - e 58 a idade

máxima.

Quanto aos proprietários, a maioria, à ordem de 78%, aproximadamente, era

composta por homens, seguindo-se 19% de mulheres e 3% de “firmas”. As

mulheres, totalizando 22 proprietárias, detinham 28 escravos, 13 do sexo masculino

e 15 do sexo feminino. Se considerarmos o montante geral já citado, de 140

escravos homens e 97 escravas, constata-se que percentual maior do trabalho servil

feminino encontrava-se, naquele momento, vinculado às mulheres proprietárias.

Importa ressaltar que junto à primeira publicação relativa ao levantamento, a

Sociedade esquadrinhou a dificuldade enfrentada durante o levantamento dos dados

que serviram à produção da lista de escravos, enaltecendo o que qualificou como

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“louvável tarefa”, indicador, outrossim, da falta de exatidão dos dados lançados nas

repartições públicas consultadas. Ao fim, efusiva a saudação endereçada a João

Guerra:

Fonte: Diário de Santos, 01/10/1886

Pelo visto, a Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro teria, de fato, de

empreender muitos esforços para alcançar seu desiderato de extinguir a escravidão

em Santos. Ao que tudo indica, caminhava e fazia um bom trabalho.

Não se deve deixar de mencionar que um outro encontro da Sociedade,

ocorrido em 28 de setembro de 1886, também fora relatado no dia 30 subsequente,

exultando a entrega de uma carta de liberdade a Afra e a libertação da escrava

Benedicta.

Dirigindo-se conforme seu desiderato, a Sociedade, através do Diário de 21

de outubro de 1886, convidou a todos para a recepção e conferência que seria

proferida por José do Patrocínio que chegava a Santos e entregaria “[...] várias

cartas de liberdade [...]”. Pereira considera que “A visita de José do Patrocínio, em

1886, à cidade mostra que Santos era importante no cenário abolicionista.” (1988, p.

96).

No dia seguinte, em 22 de outubro de 1886, o Diário cravou notícias sobre a

chegada do abolicionista, afirmando, de forma peremptória, que em breve não mais

haveria escravos em Santos. O matutino prossegue no dia 23 a saldar José do

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Patrocínio, afirmando a grandeza de sua conferência. Em consonância com o ideário

da Sociedade Emancipadora, o jornal registrou, ainda, a entrega que esta procedeu,

de uma pena de ouro ao nobre conferencista, bem como a dação de doze cartas de

liberdade. Foi um evento solene que se encerrou com cerca de duas mil pessoas

acompanhando o abolicionista até seu hotel, festivamente.

Além das ações diretas promovidas pela Sociedade, é certo que a sua

atuação inspirava a outros. Em 30 de outubro de 1886 vários advogados,

publicamente, em anúncio estampado no Diário de Santos, declararam,

conjuntamente, que a partir daquele dia não mais patrocinariam quaisquer causas

contrárias à libertação dos escravos57.

A verve abolicionista já havia, de fato, se espalhado. Sob o título “O grande

monumento”, o Diário encetou em suas páginas, em 13 de novembro de 1886, uma

matéria de autoria do jornal “A Província de São Paulo”. Este exaltava a população

santista, apontando a inexistência de escravos em seu território.

Em 21 de novembro, porém, o jornal santista trouxe o relato de um momento

crítico, a busca de negros fugidos ocorrida no dia 19 antecedente. Quatro escravos,

que já se encontravam recolhidos à cadeia, foram conduzidos à estação de trens por

um grande corpo policial, fortemente armado, a fim de que fossem devolvidos aos

seus senhores. Muitos assistiram ao fato indignados. Mas já no largo da estação

ocorreu uma altercação entre a população e os policiais, culminando em luta

corporal. Estando em franca desvantagem, as pessoas do povo feriram-se.

Houve, no entanto, uma redenção no trágico episódio: um negro lançou-se ao

mar e conseguiu fugir, sendo amparado por um homem que, ludibriando a polícia,

deu-lhe resgate. A narrativa desse instante é expressiva:

57

José da Silva Vergueiro, Eduardo Carlos Ferreira da Silva, José Rubim Cezar, Luiz Ernesto Xavier, Heitor Peixoto, Leão Luiz Ribeiro, João Alves Corrêa do Amaral, João Galeão Carvalhal, Inglez de Souza, Tito de Souza Rodriguez, Antonio da Silva Jardim, Francisco de Assis e Oliveira Braga Filho

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Fonte: Diário de Santos, 21/11/1886

Fonte: Diário de Santos, 21/11/1886

A ação policial foi alvo, mais uma vez, de veemente repulsa publicada em 23

de novembro, na qual se fez uma pontual e bem colocada referência a

considerações tecidas sobre a escravidão no Brasil pelo jornal norte-americano,

Wayne County Herald, de Ohio, vinculando o comércio de café naquelas pradarias à

persistência do trabalho servil, nestes termos:

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Fonte: Diário de Santos, 23/11/1886

A posição adotada pelos munícipes foi bastante ao fim daquele imbróglio que

se estabelecera com a polícia e cuja ameaça era real e ampla:

A crise em Santos durou mais quatro dias. No dia seguinte ao do incidente nas docas, duas dúzias de policiais chegaram de São Paulo e, três dias mais tarde, rumores de um ataque iminente aos escritórios do Diário de Santos (um perigo real à luz da destruição da redação da Gazeta da Tarde no ano anterior por cerca de cinqüenta “capoeiras” que a invadiram) trouxe uma multidão de mais de mil pessoas para sua defesa. Com essa demonstração de determinação popular, a crise esvaiu-se, mas tornara-se aparente que a população de Santos estava compromissada com o abolicionismo. Esta informação depressa chegou aos escravos do interior e estes não

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tardaram a encaminharem-se às centenas para as vizinhanças do porto do café. (Conrad, 1975, p. 293).

O ocorrido acabou por repercutir em outros jornais, O Paiz, Gazeta de

Notícias, Gazeta do Povo e O Intransigente, como noticiou o matutino Diário de

Santos nas edições de 24 e 27 de novembro de 1886.

O evento fora tratado, também, no âmbito do Estado e Lanna o revela ao

mencionar o envolvimento da população livre de Santos no processo de libertação

dos escravos e a progressiva incapacidade das autoridades em recolher os fugitivos.

Assim, a autora traz o Relatório apresentado pelo chefe de polícia ao presidente da

Província:

Estavam presos cinco escravos fugidos da cadeia local. Aproveitando que este fato coincidiu com manifestações para honrar a memória de José Bonifácio, em novembro de 1886, alguns “especuladores, desses que de há muito exploram em seu exclusivo proveito a generosa idéia da libertação dos cativos, aproveitaram para excitar os ânimos... atacam a chácara do negociante Floriano de Camargo onde estavam hospedados os que reconduziriam os escravos de Joaquim Ferreira Camargo Andrade”. Estes esperam alguns dias para ver se alguém se dispõe a comprar a alforria dos ditos escravos. Como isto não acontece preparam-se para voltar. Então, nas proximidades da gare da estrada de ferro inglesa “um grupo de pessoas do povo, composto na sua máxima parte de carregadores que ali se achavam propositalmente, veio de encontro à força e agrediu-se a pechas e pauladas. (Relatório apresentado à Assembleia Legislativa Provincial de São Paulo apud LANNA, 1996,

p. 189-190)

O aparato policial pretendendo, claramente, objetar a ação, tratou de

desqualificar seus agentes. Denominou-os inicialmente de “especuladores”,

colocando-os, portanto, no patamar de gatunos, criminosos a explorar a causa

libertadora. Na sequência, disse que eram carregadores, intentando identificá-los

como pertencentes a uma baixa classe social, sem representatividade no âmbito

social, o que, definitivamente, não correspondia à realidade.

O jornal em destaque, qual seja, o Diário de Santos, adotava claramente a

linha abolicionista. Seu editor, Rubim Cezar, como já mencionado, participou

ativamente de todo o movimento, tendo atuado, inclusive, como advogado

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representante de escravos. Lanna assim o identificou nos autos da Ação de

Liberdade de Adelaide, escrava de Dona Marcelina Ferreira da Silva e em uma

comunicação que fizera junto ao Juiz Municipal de Santos em benefício da preta

Sofia (1996, p. 184-185 e 196). Bueno de Andrada ressalvou o nome de Rubim

Cezar, salientando sua competência na atividade jurídica:

Fonte: O Estado de São Paulo, 13/05/1918

Por tais razões é compreensível a omissão de certos fatos relativos ao

ocorrido. Lanna, no entanto, traz três telegramas expedidos entre 24 e 25 de

novembro de 1886 a partir dos quais é possível extrair-se um outro panorama da

cidade:

Grandes tumultos pelas ruas. Pretos armados. Ameaçam invadir a cadêa e quartel. É necessário força de cavalaria em número suficiente para dispersão. Urgência. (DAESP, Telegramas, Ordem 6037 de 1886. Telegrama do Delegado da Polícia de Santos ao Chefe da Polícia de São Paulo, de 24/11/1886, apud MACHADO, 1994, p. 150)

Reservado. Ao Chefe da Polícia de São Paulo. Estado da cidade em completa desordem. Um grupo de mil pessoas entre ellas 500 pretos armados de paus e revólveres, reuniram-se na tipographia do Diário de Santos, onde houveram discursos e vivas à república e à Sociedade Abolicionista. Percorreu as ruas com aclamações e distúrbios. Polícia ameaçada, tencionavam atacar a Cadea e Quartel...

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(DAESP, Telegramas, Ordem 6037 de 1886. Telegrama do Delegado da Polícia de Santos ao Chefe da Polícia de São Paulo, de 25/11/1886, apud MACHADO, 1994, p. 150)

Quanto a estes dois primeiros comunicados, sobressai o fato da referência a

um perigo que tinha cor: pretos. Denota-se, ainda, que o medo e a insegurança da

polícia estão diametralmente opostos à segurança havida no Diário de Santos, onde

a suposta turba se concentrara.

Chegou a força de linha. Convem que ella volte toda hoje mesmo pelo trem da tarde; ao contrário correrá sério risco a tranqüilidade pública; não são precisos outros meios para a sua manutenção além dos que já tive a honra de indicar hoje à Excia em meu primeiro telegrama. É urgente que VExcia dê suas ordens para regressar a força hoje mesmo.58

Este último, distintamente dos outros dois, é da lavra do Juiz de Direito da

Comarca de Santos e evidencia seu temor quanto à permanência das tropas na

cidade. Poderiam elas ameaçar a tranquilidade pública e, por isso, impunha-se o

seu retorno.

A cidade de Santos pulsava às vésperas da abolição. Porém, não obstante

todos os esforços empreendidos, quer diretamente pela Sociedade Emancipadora

27 de Fevereiro, quer pelos munícipes per si, e a despeito das inúmeras conquistas

havidas, é certo que se se dava a nova e legal matrícula a escravos, a ultimar-se em

30 de março de 1887.

58

DAESP, Telegramas, Ordem 6037 de 1886. Telegrama do Juiz de Direito de Santos ao Chefe da Polícia de São Paulo, de 25/11/1886, apud Lanna, 1996, p. 151.

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3.3 A apuração de escravos em 1887 – Um duro golpe

Como já mencionado no item anterior, vigente, à época, a Lei nº 3270 de

1885, a Alfândega de Santos fez publicar, no Diário de Santos a abertura da

matrícula dos escravos, durante o interregno que se estendeu de 30 de março de

1886 até 30 de março de 1887. Porém, mesmo com a existência, a partir de 27 de

fevereiro de 1886, e ação da Sociedade Emancipadora, houve matrículas de novos

escravos em Santos.

O Arquivo do Estado de São Paulo possui em seu acervo o resumo de tais

registros, de onde se observa que no período 57 escravos foram lançados,

relativamente à cidade de Santos, sendo estas algumas de suas condições:

GÊNERO

Homens 28

Mulheres 29

IDADE

Menores de 30 anos 38

De 30 a 40 anos 9

De 40 a 50 anos 8

De 50 a 55 anos 1

De 55 a 60 anos 1

ESTADO CIVIL

Todos eram solteiros

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PROFISSÃO

Agrícola 11

Artista 3

Jornaleiro59 43

DOMICÍLIO

Urbanos 6

Rurais 51 Alfândega de Santos: Matrícula de Escravos –

1886/1887 Acervo do Arquivo Público do Estado de São

Paulo

Ao fim do documento foi inserida a informação de que 6 destes escravos já

haviam sido libertos.

Assim, conclui-se que havia, na cidade de Santos, até 30 de março de 1887

(matrículas de 1886 a 1887), 51 escravos regularmente matriculados. Contudo, no

particular, há um aparente descompasso. Em outro mapa, datado de 24 de março de

1888, portanto dentro do período compreendido entre 30 de março de 1887 e 20 de

março de 1888, também da lavra da Alfândega de Santos, foi apontada a alforria de

84 escravos. Ora, se havia 51 escravos, como justificar-se a alforria de número

superior, ou seja, 84 escravos? A resposta, talvez, seja múltipla, porém registros

equivocados e, muito provavelmente, manipulados é a mais evidente.

Verdade é que estes dados já eram demonstrativos da força do intento

abolicionista que havia na cidade. Nesse diapasão, a notícia trazida pelo Diário de

Santos de 24 de março de 1886: o presidente da província de São Paulo estimava

que, feita nova matrícula e excluindo-se os sexagenários, o montante de escravos

na província seria da ordem de 120.000. Por seu turno, em 30 de setembro de 1887

o mesmo Diário indicava que em todo o Império projetava-se a existência de

650.000 (seiscentos e cinquenta mil escravos), contribuindo Santos, dadas as suas

características urbanas e a ação contra a escravidão, com parcela pequena desses

contingentes. 59

Certa referência a escravos de ganho.

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Conrad apontou a positiva da Sociedade 27 de Fevereiro, embora não tenha

conseguido, com a agilidade que pretendia, extirpar a escravidão do solo santista:

Apesar de Santos e as comunidades vizinhas conterem menos de trezentos escravos em 1886, a Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro dessa cidade ainda não conseguira, em outubro desse ano, convencer os residentes a separarem-se de um número significante de seus cativos. Este porto tropical ao sopé da Serra do Mar, com suas ligações econômicas com a produção das fazendas do interior, seus grandes depósitos de café e sua nova estação ferroviária, construída para o transporte do café, dificilmente teria parecido o local indicado, na realidade, para o choque decisivo na luta da escravatura. Todavia, foi aí, no centro urbano de um distrito já privado da maioria de seus escravos, que um dos mais importantes movimentos abolicionistas locais se desenvolveu e foi bem sucedido, embora por pouco tempo, no final de 1886 e início de 1887, desencadeando toda uma série de acontecimentos localmente e, depois, regional e nacionalmente, conduzindo a um rápido fim da escravatura. (CONRAD, 1975, p. 291).

É certo que a consolidação da persistência de trabalho servil a partir da

apuração feita após o encerramento do período de matrículas em 1887, ainda que

em tal montante, foi veemente repudiada.

O matutino, em 02 de abril de 1887, trouxe uma matéria sob o título

“Escravos”, que estampava a existência de 58 cativos, lamentando a nefasta

verificação e pugnando por esforços mais enérgicos para o fim da escravidão, sob

pena, como advertiu, de que “[...] o peso da humilhação será tão grande que

desapparecerão de todo as glorias do nobre commettimento e da acções generosas

já praticadas”. Qualificou-se, ali, ainda, a situação como “embaraçosa e grave”,

configurando-se, as matrículas lançadas, inegável nódoa a macular a imagem da

cidade.

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Fonte: Diário de Santos, 02/04/1887

Em 03 de abril, a notícia teve continuidade, sob idêntico título, exultando a

atividade da Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro e vaticinando que em poucos

dias não mais haveria escravos em Santos. Igualmente, em 06 de abril, seguiu-se a

manifestação, encerrando um apelo aos proprietários dos escravos matriculados, a

fim de que concedessem as libertações com a condição da prestação de serviços

“[...] durante um, dous, três, quatro, ou mesmo cinco anos [...]”, com a velada

ameaça da ocorrência de uma “[...] lucta entre proprietários e emancipadores [...]”,

garantindo-se, ao fim, que aqueles condicionalmente libertos, caso pretendessem

furtar-se das obrigações contraídas, não encontrariam apoio junto aos abolicionistas.

Inegavelmente, a revelação das matrículas foi um duro golpe para a

Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro. Em sua assembleia realizada em 31 de

março de 1887, trazida no Diário em 02 de abril subsequente, seu presidente, Major

Joaquim Xavier Pinheiro, conclamou todos os sócios a buscarem meios para a cabal

libertação. Rubim Cezar, presente à reunião, solicitou fossem concedidos poderes

discricionários para a diretoria para tal intento, o que foi aprovado. Retrato da

angústia por uma rápida solução. Há de se registrar que mesmo com tais matrículas,

é evidente o avanço da luta pela liberdade.

A situação ora vista era, pois, inequivocamente distinta daquela existente em

1823, quando havia, na cidade de Santos, 4.700 habitantes, sendo 2.000 escravos

(Cf. SANTOS, 1937, p. 2). Sensivelmente, melhor, também, daquela revelada em

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levantamento feito por João Guerra nos idos de setembro de 1886, ou seja, meses

após a criação da Sociedade, à ordem de 237 escravizados.

Diante desse quadro, a Sociedade não se quedou inerte. Movimentou-se.

Demandou contribuição financeira a uma entidade recreativa denominada “Violeta”,

obtendo a quantia de 50$000, bem como ao Club XV, tendo este doado 250$00060,

além de por à venda duzentos exemplares do discurso proferido por Ruy Barbosa.

Saiu, ainda, a campo:

Fonte: Diário de Santos, 10/04/1887

Mas não foi só. A premente necessidade de recursos monetários, gerada

após a constrangedora constatação da permanência de escravos em Santos,

redundou em outras medidas concretas, como demonstra o Diário de Santos de 15

de abril de 1887. Em reunião realizada em 13 de abril, deliberou-se, entre outras

coisas, organizar-se uma matinê em prol dos cofres da Sociedade61, além de se

60

Diário de Santos, 30 de abril de 1887 61

O espetáculo gerou 700$000, conforme jornal Diário de Santos de 01 de junho de 1887, consignando, ainda, que os músicos nada quiseram receber.

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determinar aos seus tesoureiros que liquidassem “por qualquer fórma com os srs.

socios as mensalidades atrasadas”.

Em 01 de junho de 1887, o matutino reproduziu o ocorrido em reunião da

Sociedade no dia 30 imediatamente anterior, de onde se depreende que sete cartas

de liberdade foram apresentadas. Destas, seis foram condicionais, aos escravos

Benedicta, Victoria, Joana, Ludovico, Maria e Lydia, sendo uma concedida pelo

pagamento da quantia de 300$000, relativa ao escravo Manoel.

Outras quinze libertações62 foram noticiadas em 03 de junho de 1887, sendo

todos os escravos pertencentes ao Major Julio Franco de Andrade, o qual fora

indenizado. Ainda em 26 de junho, outras cinco libertações foram anunciadas,

apontando-se que a Sociedade por elas fora responsável.

Diante de todo o narrado, inafastável o amparo que vários setores da cidade

de Santos deram à Sociedade. No entanto, não se poder perder de vista que eram

tempos de escravidão. Havia, por consequência, pessoas que a tinham assimilado,

e, nesse passo, a transformaram em um negócio comercial.

Read, após pesquisa se valendo de diversas fontes sobre a escravidão na

cidade de Santos, no período compreendido entre 1882 e 1888, destaca uma

peculiaridade que notou ao examinar várias cartas de alforria. Ao menos um terço

das cartas de liberdade de dois ofícios notários não se enquadrou nas três

categorias tradicionais (incondicional, condicional e onerosa). Havia cartas que eram

ao mesmo tempo onerosas e condicionais, outras sem qualquer indicação de seu

estado - estas as quais ele denominou “ambivalently free”63, - e ainda aquelas que

redundaram na pactuação, em apartado, de contrato de locação do escravo (2012,

p. 160).

Assim depreende-se que várias formas, legalmente acolhidas, de obtenção da

liberdade houve. Algumas, certamente, elaboradas de forma duvidosa,

configurando-se como campo fértil à ação de senhores inescrupulosos, sendo, sob

este enfoque, que se pode compreender do seguinte alerta:

62

Manoel, Alberto, Narciso, Laudelino, Nasario, Justino, José, Catharina, Maria, Joanna, Isabel, Silveria, Martinha, Othilia e Eva 63

Em tradução livre da autora: ambivalentemente livre.

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Fonte: Diário de Santos, 20/08/1887

O imbróglio, contudo, não se encerrava aí. A questão se espraiou, também,

nas áreas oficiais:

Conditionally freed slaves occupied complicated positions somewhere between slavery and freedom, a changeable and nuanced condition that was not always acknowledged by township officials. For example, some conditionally manumitted slaves in Santos were listed as slaves in other documents later. (Read, 2012, p. 161)

64

Pode-se dizer que, além da questionável liberdade conquistada, diante da

contraprestação que se impunha, seja monetária ou através de serviços, os

escravos sequer detinham conhecimento dos termos do pactuado, remanescendo,

pois, submetidos aos desideratos de seus proprietários. No particular, afigura-se

64

Livre tradução da autora: “Escravos libertados sob condição ocuparam posições complicadas em algum lugar entre escravidão e liberdade, uma condição mutável e com nuances que nem sempre era de conhecimento dos oficiais da cidade. Por exemplo, alguns escravos manumitidos condicionalmente em Santos foram registrados como escravos em outros documentos posteriormente.”

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importante registrar que o comércio de escravos em Santos encerrava suas

peculiaridades.

Read traçou seu panorama, apontando não se tratar de uma atividade

primária e exclusiva de seus agentes. A venda e compra era feita por pessoas de

diversas atividades profissionais e de forma supletiva, ou seja, não se tratava da

principal fonte de subsistência dos negociantes. Em geral, as transações advinham

de suas próprias redes sociais e referiam-se a poucos escravos. Era, pois,

descentralizado e segmentado, mormente em face de as casas de negócio

destinarem-se, primordialmente, à mercancia de café, algodão e açúcar e não ao

comércio de escravos (Cf. Read, 2012, p. 62-63), aspectos ratificados pelos excertos

das escrituras contidas no Anexo I.

A propriedade de escravos implicava, à partida, em um acréscimo ao status

social de seu proprietário, segundo o autor, sendo tais características ratificadas por

este anúncio:

Fonte: Diário de Santos, em 15/11/1887

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Outro ponto importante, era a segurança de um patrimônio que, a qualquer

tempo, poderia ser alienado, convertendo-se facilmente em dinheiro, auferido,

inclusive, do próprio escravo. Cunha traça um paralelo entre a alforria e venda,

institutos que, em tese, seriam distintos, haja vista que “[...] a lei tratava as alforrias

no mesmo título das doações [...]” (2012, p. 72), mas que acabaram por se

confundir, diante de necessidades financeiras dos proprietários.

Em uma tabela de ocupações dos escravos, relativamente aos anos de 1886

a 1888, baseada em registros do cemitério e em registros de pacientes do hospital,

Read indica que, dentre 136 escravos, 83 tinham ocupações desconhecidas, ao

passo que o restante, ou seja, de 53 escravos, ativavam-se nas seguintes funções:

17 trabalhadores domésticos

10 agricultores

10 serventes

6 cozinheiros

3 mucamas

2 carpinteiros

2 lavadeiras

1 alfaiate

1 garçom ou mordomo

1 trabalhador geral

Fonte: Read, 2012, p. 189

Este panorama de funções certamente foi propício a uma outra atividade

comercial, qual seja, o aluguel de escravos. O jornal Diário de Santos foi utilizado

para tal finalidade, tendo estampado, no período estudado, alguns anúncios neste

sentido:

Procura por alugadas:

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Fonte: Diário de Santos, 07 e 09/04/1886

Fonte: Diário de Santos, 12/05/1886

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Fonte: Diário de Santos, 04/07/1886

A oferta de alugadas:

Fonte: Diário de Santos, 04/07/1886

Fonte: Diário de Santos, 02/09/1886

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Portanto, motivos bastantes ensejavam a recalcitrância de alguns senhores

donos de escravos. Não se poder esquecer, ainda, que a escravidão gerava

dividendos ao Poder Público, haja vista a acurada cobrança de impostos:

Fonte: Diário de Santos, 12/08/1886

O que se pode observar, diante deste panorama, é a consolidação de uma

outra atividade, fruto da escravidão e de seus lucros, os caçadores de escravos, cujo

anúncio não se furtou fazer o Diário de Santos, certamente com o intento de alertar

a todos quanto o perigo à espreita:

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Fonte: Diário de Santos, 02/11/1886

Deixam de ser apresentados na presente pesquisa dados posteriores da

Sociedade Emancipadora 27 de Fevereiro até seu encerramento, uma vez que não

há edições disponíveis para consulta na Hemeroteca de Santos. De qualquer forma,

exitosa foi sua existência, tendo Costa e Silva Sobrinho, ao se reportar a Xavier

Pinheiro e à Sociedade, assim atestado:

Esta sociedade abolicionista foi por ele fundada com o fim exclusivo de libertar até o último escravo que existisse no município, o que felizmente conseguiu no prazo de um ano. Por isso, a 27 de fevereiro de 1888, numa grande festa, entregou ela as derradeiras sete cartas de liberdade concedidas pelos senhores Floriano de Camargo Andrade, João Manoel Alfaia Rodrigues Junior, José Pinto Florencio de Campos e pela senhora Felipina Gomes de Miranda. (1953, p. 104)

Costa e Silva Sobrinho indica a consecução dos objetivos da Sociedade no

prazo de um ano, no entanto, tem-se que em 1888 já se completavam dois anos de

sua atividade, oportunidade em que, um pouco antes da assinatura da Lei Áurea, no

dia 27 de fevereiro de 1888, já se considerava a cidade livre de cativos por sua

ação. Os últimos proprietários constavam na lista elaborada por João Guerra (Anexo

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II): Floriano de Camargo Andrade com 3 escravos, João Manoel Alfaia Rodrigues

Junior com 4 escravos, José Pinto Florêncio de Campos com 1 escravo e Felipina

Gomes de Miranda (consta Alexandre F. Gomes de Miranda) com 3 escravos. Pela

lista, 11 eram os escravos, razão pela qual 4 escravos desses senhores já haviam

sido libertados anteriormente.

Rigorosamente, competia apenas e tão-somente à Assembleia Geral, com a

sanção do Imperador, dispor sobre o tema. In casu, o ato que extirpou o regime

escravagista, abarcando a integralidade do Império, foi regularmente proposto pela

Assembleia Geral, a qual dirigiu ao Imperador (na verdade, à Princesa Isabel, então

regente) um decreto, julgado útil e vantajoso (Anexo III). Sancionado pela Princesa

Isabel, consolidou-se na Lei nº 3353, de 13 de maio de 1888, em seu art. 1º que “É

declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil” (Anexo IV).

Aqui se impõe uma final digressão.

A Princesa Isabel remeteu a seus pais, em 13 de maio de 1888, uma carta

relatando como se passara aquele dia. De sua leitura é possível notar a expectativa

em torno de uma ação da Monarquia que se impunha positiva para o fim cabal da

escravidão. E foi dentro das suas intransferíveis atribuições legais, de forma serôdia,

que agiu a então Princesa:

[...] Também foi com o coração mais aliviado que perto de uma hora da tarde partimos para o Rio a fim de eu assinar a grande lei, cuja maior glória cabe a Papai que há tantos anos esforça-se para um tal fim. Eu também fiz alguma coisa e confesso que estou bem contente de também ter trabalhado para idéia tão humanitária e grandiosa. A

maneira pela qual tudo se passou honra nossa pátria e tanto maior júbilo me causa. Os nossos autógrafos da lei e o decreto foram assinados à 3 e meia em público na sala que precede a grande do trono passada a arranjar depois de sua partida. O Paço (mesmo as salas) e o largo estavam cheios de gente, e havia grande entusiasmo, foi uma festa grandiosa, mas o coração apertava-se me lembrando que Papai aí não se achava! Discursos, vivas, flores, nada faltou, só a todos faltava saber Papai bom e poder tributar-lhe todo o nosso amor gratidão. Às 4 e ½ embarcávamos de novo e em

Petrópolis novas demonstrações nos esperavam, todos estando também contentes com as notícias de manhã de Papai. Chuvas de flores, senhoras e cavalheiros armados de lanternas chinesas, foguetes, vivas. Queriam puxar meu carro, mas eu não quis e propus antes vir a pé com todos da estação. Assim o fizemos, entramos no paço para abraçarmos os meninos e continuamos até a Igreja do mesmo feitio que viemos da estação. Um bando de ex-escravos fazia

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parte do prestito armados de archotes. Choviscava e mesmo choveu, mas nessas ocasiões não se faz caso de nada [...] (grifo nosso) (Princesa Isabel, apud BONAVIDES E VIEIRA, 1973, p. 786- 787)

Este comportamento de Isabel, mais afinado com o fim da escravidão, já

havia sido percebido. Priore aponta que André Rebouças noticiara a primeira

manifestação abolicionista da Princesa em 12 de fevereiro de 1888, quando

participara de uma batalha de flores para levantar fundos em prol da Confederação

Abolicionista. E era fruto de uma conjugação de fatores, que incluía a ação vista

neste litoral:

Mas houve, sim, uma mudança de atitude. “Tomou juízo [...] era tempo”, dizia Patrocínio. E a mudança não escapou a Rui Barbosa. Tal “guinada, “evolução” ou “mutação” não era questão de generosidade. E, sim, de política. Isabel finalmente cedia a uma situação criada pelos abolicionistas e pelos escravos. A atitude firme desses últimos, as fugas e rebeliões tinham um papel concreto na transformação que se operava em Petrópolis.

E Rui acusava: “Hoje a regência pratica às escâncaras, em solenidades públicas, o acoitamento de escravos. [...] Mas isso depois que, dos serros de Cubatão, se despenhava para a liberdade a avalanche negra. E o não quero do escravo impôs aos

fazendeiros a abolição.” Seu ponto de vista, hoje endossado pelos historiadores, era que o medo branco da onda negra impôs mudanças em todo o país. Explodia a “avalanche negra”, o “vu lcão negro”, enfim, a natureza descontrolada inspirava metáforas da situação. (grifo nosso) (PRIORE, 2013, p. 219)

Por seu turno, Santos, margeando os referidos “serros de Cubatão”, foi palco

de muitas ações tendentes ao fim do trabalho servil em suas terras. A Sociedade

Emancipadora 27 de Fevereiro participou ativamente de todo esse processo que

tornou a cidade sinônimo de liberdade nas palavras de Rui Barbosa acima

transcritas. Não houve submissão aos restritos limites da lei que consolidava a

escravidão por todo o Império, houve o alinhamento ao primado da liberdade e da

caridade.

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Considerações Finais

Imperioso mencionar que a cidade de Santos se manteve com dimensões

acanhadas até fins do século XIX, balizada que era pelo trecho compreendido entre

o Outeiro de Santa Catarina e o Valongo e entre o mar e os morros, desprovida,

ainda, de rede de água e esgotos, padecendo, por conseguinte, das diversas

epidemias que seguidamente a assolaram já nos idos do século XVIII.

Ocorre, porém, que a cidade contava com um importante instrumento para o

seu desenvolvimento, o porto. Em meados do século XIX, a exportação de café

ultrapassou a exportação de açúcar, transformando-se, o café, na base econômica

da Província. O porto de Santos integrou esse novo panorama, mormente com a

construção da estrada de ferro, a São Paulo Railway, em 1867, que impulsionou a

comunicação entre o interior-produtor, São Paulo e seus comerciantes e Santos

portuária. A cidade firmava, assim, sua vocação de praça de comercialização de

café. Evidencia-se, pois, que a sua economia não estava calcada na atividade

agrícola, sequer possuindo lavouras ou eito.

É nesse contexto de uma cidade que ascendia pelo comércio que se deve

perscrutar o movimento abolicionista que se desenrolou em Santos e, é dessa

forma, que surge Xavier Pinheiro.

Xavier Pinheiro, um próspero empresário, dono de uma fábrica de cal e de um

trapiche, além de ser acionista da Companhia de Carris de Ferro da cidade, fora

também major, delegado de polícia e vereador em duas legislaturas (1877/1880 e

1883/1886), foi o mentor do Quilombo do Jabaquara e da Sociedade Emancipadora

27 de Fevereiro.

Esta convergência merece análise.

Como se vê, Xavier Pinheiro, com tantas funções, orbitou em várias esferas

de poder, tendo grande inserção na sociedade santista. Foi certamente através de

sua influência que, durante um ato de Estado - a libertação de escravos encabeçada

pelo juiz de Direito Ledo Veja, motivada pela Lei dos Sexagenários e ocorrida em 27

de fevereiro de 1886 – promoveu a criação da Sociedade Emancipadora 27 de

Fevereiro, da qual fora presidente e cuja única finalidade era a extinção do trabalho

servil em Santos.

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Tal associação foi constituída como uma entidade civil, formalmente

estruturada e bastante publicizada através do jornal Diário de Santos. A Sociedade,

na persecução de sua pretensão, angariou fundos de formas distintas: fez

espetáculos, vendeu discurso de Rui Barbosa e fez pedidos de ajuda financeira e de

libertações, sempre dando publicidade de seus atos pelo Diário. Assim, a Sociedade

conseguiu conceder várias alforrias. Estas alforrias foram direcionadas a escravos

que eram de propriedade de senhores da cidade. João Guerra fez um levantamento,

apurando a existência de apenas 237 escravos em tais condições. Santos não era

um centro escravocrata.

Esse modus operandi indica que a diretriz da Sociedade era aceita em seu

meio social. Mas não só. A ação perpetrada acabou por gerar uma rede de proteção

na própria cidade que já era conhecida como reduto abolicionista com pequenos

quilombos nos quintais de alguns de seus moradores. E essa rede de proteção foi se

robustecendo.

Não é por outra razão que no incidente do dia 19 de novembro de 1886, em

que se deu busca a negros fugidos e albergados em Santos, o juiz de direito pede

que a força de cavalaria mandada a Santos retornasse com brevidade a São Paulo,

pois ela é que, naquele momento, se constituía como elemento de perigo à paz na

cidade que se pôs contrária à ação policial.

E aqui é necessário fazer um apontamento. Tais negros não eram de Santos.

Estavam aqui escondidos.

O Quilombo do Jabaquara serviu de amparo aos muitos escravos que fugiam

das fazendas do interior e que, após driblar a difícil descida pela serra do mar e a

vigilância de capitães do mato, alcançavam a cidade de Santos onde adquiriam a

condição fática de livres.

Os escravos que ali permaneciam não se confundiam com aqueles apurados

por João Guerra, beneficiários das ações da Sociedade Emancipadora 27 de

Fevereiro, muito embora estivessem todos sob o amparo de Xavier Pinheiro, quer

através da Sociedade, quer através do quilombo já constituído.

Impõe-se cogitar quais as motivações para essa dicotomia. Por que se tanto

abrigaram escravos mesmo em confronto à legislação que os constituía propriedade

e se buscou a concessão de liberdade a outros?

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É verdade que dificilmente os escravos do quilombo seriam alvo de alforrias

promovidas pela Sociedade, dada sua condição de fugidos e, portanto, perseguidos.

Seus senhores estavam no interior, onde a mão de obra escrava ainda tinha lugar

junto às lavouras, insubmissos, ainda, à aura abolicionista que se propugnava em

Santos.

Mas há um dado que pode desqualificar essa dificuldade: Xavier Pinheiro foi

proprietário de escravos. No dia 27 de fevereiro de 1886 estavam arrolados dois

escravos seus que seriam libertados por força da Lei dos Sexagenários. Nesta data,

voluntariamente e em tom festivo, ele ainda concedeu outras liberdades para

escravos seus. Parece, portanto, que a sua pretensão em ver extinto o trabalho

servil não advinha apenas de ideais. Era ele, também, como visto, empresário de

envergadura.

Não se pode perder de vista que a cidade prosperava. E prosperava por seu

comércio alavancado pelo porto, escoadouro do café. O porto de Santos, à época,

era bastante precário, contando com pontes para a atracação dos navios. Não havia

porto organizado. É certo, nessa perspectiva, que, não havendo mecanização dos

serviços de carga e descarga, a movimentação das mercadorias dependia de muitos

braços. Braços negros, braços escravos, encontrados no Quilombo do Jabaquara.

É assim que a figura múltipla de Xavier Pinheiro, integrante das classes social

e política de Santos, pode ser compreendida. Suas ações demandam estudo detido,

o que não encontrou sede nesta pesquisa, balizada que foi pela vida da Sociedade

Emancipadora 27 de Fevereiro.

É possível que Xavier Pinheiro tenha manejado com extrema maestria a ideia

de Santos abolicionista, amplificando-a por intermédio dos atos da Sociedade,

projetando a cidade como uma urbe de vanguarda, a exemplo do que ocorrera no

Ceará. Dessa forma, acabou por gerar e angariar proteção a uma necessária mão-

de-obra, integrante de um então próspero panorama de desenvolvimento que se

desenrolava na cidade-comercial.

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113

IMAGENS

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114

Imagem 6: Planta de Santos. 1878.

Autor: elaborada por Jules Martins e reproduzida por Lauro Ribeiro de Souza, em bico de pena. Disponível em: Blog Novo Milênio

Percebe-se que a cidade ainda permanecia, preponderantemente, na faixa entre o Valongo e o Outeiro, com alguma expansão para os lados do Paquetá. O mapa não

mostra a expansão para a Vila Mathias, ocorrida logo depois.

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115

Imagem 7: Theatro Guarany. Cartão Postal de Manzieri, Edictor, São Paulo, nº 29 [c.

1910]. Disponível em: Caravelas – Núcleo de Estudos da História da Música Luso-Brasileira

O teatro foi inaugurado em 07 de dezembro de 1882.

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116

Imagem 14: Mapa da América do Sul nº 01, de 1883, produzido por Letts, Son & Co Limited.,

Londres Acervo de David Rumsey Map Collection – Cartography Associates

Este mapa compõe um todo dividido em quatro partes, destinado à indicação das localidades da América do Sul com a presença de Consulados e Vice-Consulados Britânicos. O conjunto de quatro

mapas servia, ainda, à indicação de faróis e dos governos locais.

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117

Imagem 15: Mapa da América do Sul nº 02, 1883, produzido por Letts, Son & Co Limited. Londres.

Acervo de David Rumsey Map Collection – Cartography Associates. Este mapa compõe um todo dividido em quatro partes, destinado à indicação das localidades da

América do Sul com a presença de Consulados e Vice-Consulados Britânicos. O conjunto de quatro mapas servia, ainda, à indicação de faróis e dos governos locais.

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118

Imagem 16: Mapa da América do Sul nº 03, 1883, produzido por Letts, Son & Co Limited. Londres.

Acervo de: David Rumsey Map Collection – Cartography Associates. Este mapa compõe um todo dividido em quatro partes, destinado à indicação das localidades da

América do Sul com a presença de Consulados e Vice-Consulados Britânicos. O conjunto de quatro mapas servia, ainda, à indicação de faróis e dos governos locais.

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119

Imagem 17: Mapa da América do Sul nº 04, 1883, produzido por Letts, Son & Co Limited. Londres.

Acervo de: David Rumsey Map Collection – Cartography Associates. Este mapa compõe um todo dividido em quatro partes, destinado à indicação das localidades da

América do Sul com a presença de Consulados e Vice-Consulados Britânicos. O conjunto de quatro mapas servia, ainda, à indicação de faróis e dos governos locais.

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120

APÊNDICE

Breves apontamentos sobre as sessões havidas na Câmara de Santos nos dias 23

de fevereiro e 24 de março de 1886.

Sob a presidência de João Octávio dos Santos e presentes os vereadores

Benedicto Narciso do Amparo Sobrinho, João Xavier da Silveira, Joaquim Xavier

Pinheiro e o suplente João Nunes de Carvalho transcorreu a sessão na Câmara em

23 de fevereiro de 1886, divulgada no jornal Diário de Santos de 28 de março de

188665. Vejamos.

Sob a égide do título “Expediente”, três ofícios passaram pelo crivo da

Câmara. Um do Presidente da Província, tecido no sentido de que a Câmara

envidasse esforços à obtenção de maior quantidade e variedade de matérias primas

que seriam remetidas a uma exposição realizada pela Sociedade Central de

Geografia Comercial de Berlim. Outro do Visitador Apostólico da Ordem Carmelita

que respondia acerca da abertura de uma rua. O derradeiro, da Inspetoria do

Instituto Vacínico de São Paulo, informando a remessa de três tubos de linfa

vacínica.

A seguir, na sessão, vários foram os requerimentos de munícipes analisados.

Aquele elaborado por Felippina Emmerich, Benhamim Fontana e sua mulher em que

questionavam o arruamento proposto por Mathias Costa e Samuel Alves de

Azevedo em terreno cuja propriedade sustentavam lhes pertencer teve como destino

a Comissão de Obras Públicas, ao passo que À Comissão de Justiça se remeteu o

requerimento de Francisco Paulo de Coelho que pedia à Câmara que prestasse

informações ao presidente da Província em face de pedido de aforamento.

Joaquim de Souza não logrou ver deferido seu pedido de fornecimento de

tubos para a feitura do encanamento ao qual se via obrigado na frente de sua

edificação na Rua do General Câmara. Concedida a permissão, por outro lado, para

a construção de um coreto na Rua 25 de Março, para os festejos de Carnaval, como

pretendido por Eugênio de Oliveira.

65

As atas originais encontram-se disponíveis para consulta junto à Fundação Arquivo e Memória de Santos. Entretanto, a condição de documento manuscrito torna dificultosa sua leitura, afigurando-se a consulta à sua publicação em jornal mais eficaz.

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121

À Inspetoria de Obras foi endereçado o requerimento de Antonio Tibúrcio,

relativo ao conserto de seu telhado e a uma platibanda. Mathias A. Casimiro da

Costa e Samuel Alves de Azevedo reiteravam requerimento anteriormente feito,

inconformados com as questões levantadas por Benjamin Fontana e Felippina

Emmerich acerca da propriedade das terras.

Wilson, Sons & C. Limited pedia licença para a mudança de seu depósito de

carvão de pedra e para a construção de uma ponte. Por fim, foi rejeitado o pedido de

cancelamento de multa elaborado por Antonio Rodrigues Pinto.

Seguiu-se, assim, para os relatórios.

O fiscal do 1º Distrito apresentou as ocorrências, comunicou as multas que

impôs e entregou sete vigésimos de loteria apreendidos, além de noticiar a

ocorrência de um incêndio. O procurador, por seu turno, apresentou a relação de

multas cobradas.

Quanto às participações, o Presidente remeteu as contas dos trimestres de

julho a dezembro à Comissão de Contas. Benedicto Narciso submeteu um

orçamento de obras no Paço municipal que foi alvo de aprovação. Mandou-se,

ainda, pagar uma conta por consumo de gás da City Improvements.

Nas indicações, o Presidente logrou aprovar a criação de um artigo aditivo ao

Código de Posturas proibindo professores públicos e particulares de admitirem

alunos desprovidos do documento comprobatório de sua vacinação. Benedicto

Narciso, com êxito, indicou a colocação de quatro vasos sanitários em diversas

pontes de embarque.

Xavier Pinheiro denunciou a persistência de indevida destinação de esgoto,

afetando a salubridade pública. A Câmara, em face do exposto, determinou ao fiscal

toda a vigilância.

Encerrada a sessão, pode-se depreender que os assuntos tratados eram em

sua maioria, atinentes à urbanização da cidade, ocupação do espaço público e à

posse de terras. Outras questões de cunho meramente ordinatório eram

enfrentadas, como o pagamento de contas e apuração de multas. Aspecto que

sobressai é o caráter dinâmico da atuação, haja vista a pronta resolução de lançar

nova postura, no caso, relacionada ao alcance da vacinação.

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122

Tais focos de ação são justificados pelas condições da cidade à época.

Preciso o escólio de Maria Alice R. Ribeiro, trazido por Lanna, nos seguintes termos:

Santos, a cidade da malária e da varíola – das sezões e das bexigas – durante as décadas de 70 e 80, incorporou mais uma moléstia: a febre amarela. A cidade construída sobre terrenos de antigos mangues e rodeada por áreas pantanosas, de clima quente e úmido e de verões prolongados, criou condições favoráveis ao desenvolvimento da malária, da varíola, da febre amarela e da tuberculose... Mas o que de fato contou para a fixação dessas moléstias foi o descaso com que a questão sanitária foi tratada durante essas décadas. O Império praticamente nada fez. (Ribeiro apud Lanna, 1996, p. 69)

A próxima sessão foi marcada para o dia 11 de março.

Houve, contudo, um hiato de aproximadamente um mês, dando-se nova

reunião na Câmara apenas em 24 de março de 1886. Nesta compareceram os

mesmos vereadores, tendo sido tratadas, igualmente, apenas questões ordinatórias,

como se pode verificar da publicação de sua íntegra no dia 02 de maio de 1886 no

jornal Diário de Santos.

A Presidência da Província encaminhou dois ofícios, um relativo à colheita de

um produto – goma de pau de vinho -, e outro ao juramento de estrangeiros. A

Secretaria de Governo Provincial exigiu, por seu turno, a remessa de parecer sobre

um contrato celebrado com a Companhia de Melhoramento da cidade.

Dr. Silvério Martins Fontes enviou ofício dando conta de ter assumido o cargo

de Inspetor de Saúde do Porto.

À Comissão de Redação foi enviado um ofício do Chefe de Polícia de São

Paulo que remetia um projeto de Código de Posturas regulando os contratos entre

patrões, criados e amas de leite.

Bibiano da Costa Silveira, por intermédio de requerimento, insistia no

pagamento do trabalho que efetuara na planta cadastral. O requerimento de José

Fils, quanto às suas obrigações oriundas de obra foi enviado à Inspetoria de Obras

Púbicas.

Embora já deferida, foi aprovado o pedido de licença para tratamento de sua

saúde elaborado pelo ajudante de fiscal Guilherme Magno de Lima Viegas.

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123

City of Santos Improvements Company, Limited requeria a remessa, pela

Câmara, à Assembleia Provincial, dos contratos de 1882 e 1884.

Ao secretário incumbiu-se o pedido de certidão de suas atividades formulado

pela Sociedade Auxiliadora da Instrução.

Seraphim Bueno de Campos solicitou um lugar no corpo de bombeiros,

pretensão rejeitada diante da inexistência da corporação na cidade de Santos.

Fortunato Ferreira de Mello pedia providências, já tomadas, como aduzido por

Benedicto Narciso, em face do mau estado de uma boca do lobo.

Mathias da Costa pretendia ver designados nomes às ruas abertas na “Villa

Mathias”.

Pedia licença para consertar se prédio Manoel José Barreiro. Guilherme

Magno de Lima Viegas obteve a prorrogação da licença que pedia.

À Inspetoria de Obras Públicas foi encaminhado o pedido de alteração de

local do quiosque de José Correa da Silva, bem como aquele formulado por Félix

Antonio Dantas, relativamente a dois quiosques que pretendia instalar.

À Comissão de Obras Públicas enviou-se o requerimento de Adrião Luiz

Esteves que solicitava a desobstrução de uma vala.

No que tange aos relatórios da sessão, o fiscal apresentou as diversas multas

que aplicara. O procurador entregou o montante que auferiu pelas infrações e pela

venda de três animais em hasta pública, além de afirmar ter continuado a examinar

o leite vendido.

Foram, na sequência, lidas as propostas feitas para a realização da limpeza

pública, remetidas à Comissão de Obras Públicas.

Para análise oportuna ficou a proposta de Francisco Ferreira de Moraes,

atinente ao emplacamento de casas e ruas com placas de ferro batido e esmaltado.

Nas Participações, iniciou-se com a substituição, nas inspetorias e comissões,

do Sr. Pereira dos Santos, eis que enfermo.

Benedicto Narciso esclareceu a inconveniência do pedido formulado por João

Antunes dos Santos e apresentou a conta do consumo de gás do mês de fevereiro,

sendo autoriza o seu pagamento.

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124

O Presidente declarou ter enviado à Assembleia Provincial o orçamento da

Câmara para o exercício de 1887 a 1887.

Nos Pareceres, a Comissão de Contas apurou a correção dos balancetes de

receita e despesa dos meses de julho a dezembro de 1885.

A Comissão de Obras Públicas manifestou-se sobre o pedido de aforamento

perpétuo de terrenos de marinha feito por Francisco de Paula Coelho, o que seria

encaminhado ao Presidente da Província. Deu seu parecer, também, acerca do

imbróglio suscitado entre os munícipes Mathias Alberto Casimiro da Costa

acompanhado de Samuel Alves de Azevedo e Felippina Emmerich com Benjamin

Fontana e sua mulher, optando por não adotar qualquer uma das pretensões, eis

que não alinhadas às diretrizes da municipalidade.

O Sr. Benedicto Narciso foi autorizado a mandar orçar os consertos que eram

necessários fazer na ponte do Macuco.

Derradeiramente, foram discutidos os termos de um novo contrato para o

serviço de abastecimento de água na cidade, os quais, aceitos pelo gerente da City

of Santos Improvements C. Limited., então presente, seriam remetidos à Assembleia

Provincial para aprovação.

Por todo o visto, a Câmara não tratou, à época, de qualquer assunto relativo a

escravos, tampouco atinente à extinção da escravidão. Rigorosamente, todas as

questões versadas nestas sessões – que antecederam e sucederam o dia 27 de

fevereiro de 1886 – foram absolutamente consentâneas com as atribuições dadas à

Câmara pelo corpo legal vigente à época, ou seja, matérias de ordem meramente

administrativa, vinculadas à vida cotidiana da cidade.

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125

ANEXO I

Excerto do Livro de escrituras de compras e vendas de escravos – 1º Cartório de

Santos

As escrituras trazem outras informações como a filiação do escravo (quando

declarada), sua idade - em quase todas as idades indicadas houve a aposição da

ressalva “mais ou menos” -, a origem dos envolvidos, o preço pago e a função

desempenhada pelo cativo, as quais não foram aqui coligidas, porquanto ora

impertinentes.

Data 07 05 1879

Escravo Agueda

Vendedor Guilhermina Hill Carneiro

Comprador José Manoel de Vasconcelos

Data 16 08 1879

Escravo Antonio

Vendedor Estevão da Cunha

Comprador José Moreira de Sampaio

Data 10 09 1879

Escravo Firmina

Vendedor Antonia Maria Lopes Ferreira

Comprador Henrique Porchat Jr.

Data 26 03 1879

Escravo Mariano

Vendedor Emília de Jesus Cortêz

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 19 06 1879

Escravo Veronica

Vendedor Felix Bento Vianna

Comprador José Peixoto

Data 20 08 1879

Escravo Maria (e ingênua Olívia)

Vendedor Tristão da Silva Calheiros

Comprador Angelo Garcia de Souza Ramos

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126

Data 12 11 1879

Escravo Affonso

Vendedor Antonia Maria de Jesus

Comprador Benedicto N. do Amparo Sobº

Data 17 12 1879

Escravo Marcolina

Vendedor Manoel G. de Argollo Ferrão

Comprador Henrique Porchat67

Data 20 02 1880

Escravo Maria

Vendedor Manoel Francisco Lagoa

Comprador João Carlos da Silva Carneiro

Data 27 02 1880

Escravo Alexandre

Vendedor Candido Melchiades da Costa

Comprador Silva Meira & Companhia69

Data 01 03 1880

Escravo Benedicto, Lauriane e

Maria

Vendedor Antonio H. da Silva Bottas

Comprador Antonio A. Proost de Souza

66

Representada por seu sócio Francisco Martins dos Santos Jr. 67

Por seu procurador Henrique Porchat Jr. 68

Por seu procurador José Feliciano da Silva Macuco 69

Representada por seu sócio Joaquim Ricardo de Castro

Data 17 10 1879

Escravo Francisco

Vendedor Martins & Irmão66

Comprador Ricardo Pinto de Oliveira

Data 29 11 1879

Escravo Raphael

Vendedor Emília de Jesus Cortêz

Comprador Luiz A. Rodrigues da Costa

Data 22 12 1879

Escravo Antonia

Vendedor Francisco Serafim Anastacio68

Comprador Amalia Fortunato de Aguiar

Data 20 02 1880

Escravo Olegário

Vendedor Julião Soares do Bom Jesus

Comprador Antonio José Ferreira

Data 28 02 1880

Escravo João

Vendedor Candido Melchiades da Costa

Comprador Antonio de Freitas Guimarães

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127

Data 05 03 1880

Escravo Magdalena

Vendedor João Antonio Oliveira

Comprador Paulo José Gonçalves Pimenta

Data 11 03 1880

Escravo Benedicta

Vendedor Henrique Ablas

Comprador Manoel Pereira da Rocha Soares

Data 29 03 1880

Escravo Adriano

Vendedor Antonio Joaquim de Oliveira

Comprador Bernardo Pereira dos Santos

Data 08 04 1880

Escravo Benedicta

Vendedor Antonio José Bento de Almeida

Comprador Felippe P. de Souza Brazil

Data 17 07 1880

Escravo João

Vendedor Antonio José da Silva Calheiro

Comprador Manoel José Barreiros

Data 02 03 1880

Escravo Justina

Vendedor Cap. João Fernandes de Oliveira

Comprador Manoel da Silva Azevedo

Data 11 03 1880

Escravo Brigida

Vendedor Antonio Pereira Liberato

Comprador José Moreira Sampaio

Data 11 03 1880

Escravo Sophia

Vendedor Manoel Pereira da Rocha Soares

Comprador Flora Candida Barboza Soares

Data 03 04 1880

Escravo Ilegível

Vendedor Ilegível

Comprador Ilegível

Data 28 06 1880

Escravo Ignes

Vendedor Antonio J. de Araújo Aguiar

Comprador Felix Bento Vianna

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128

Data 26 08 1880

Escravo Daniel

Vendedor Maj. João Fernandes de Oliveira

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 16 09 1880

Escravo Francisco

Vendedor Antonio José Bento de Almeida

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 11 10 1880

Escravo João

Vendedor Francisco Martins Soares

Comprador João de Almeida Sampaio

Data 12 03 1881

Escravo Geraldo

Vendedor Dr. Rodrigo A. M. de Barros

Comprador Cap. Gregório D. de Freitas

Data 09 04 1881

Escravo José

Vendedor Boaventura Rodrigues de Souza

Comprador Antonio P. Rodovalho & Irmão70

70

Por seu procurador José Proost de Souza

Data 22 07 1880

Escravo Laurindo

Vendedor Manoel Joaquim Barboza

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 28 08 1880

Escravo Maria

Vendedor João Carlos da Silva Carneiro

Comprador Manoel P. Nolasco da Trindade

Data 16 09 1880

Escravo Pedro

Vendedor Anna Pereira Chaves

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 26 01 1881

Escravo Serafina

Vendedor Rv. Pe. Antonio A de Sant’anna

Comprador Manoel Ferreira dos Santos

Data 18 03 1881

Escravo Maria

Vendedor Manoel P. Nolasco da Trindade

Comprador Miguel Corrêa Gomes Girão

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129

Data 08 10 1881

Escravo Maria

Vendedor Manoel Alves Ferreira da Silva

Comprador João de Azevedo Marques

Data 22 12 1881

Escravo Estevão

Vendedor Carlota de Sampaio Moreira

Comprador Carolina Augusta de Jesus

Data 08 07 1882

Escravo Luiza

Vendedor Antonio Franco da Rocha

Comprador Anna Feliciana Esquiriel

Data 26 07 1882

Escravo Barbara

Vendedor Maria da Gloria Moutinho

Comprador Felix Bento Vianna

Data 15 09 1882

Escravo Thereza

Vendedor Maria Izabel Ferreira

Comprador Luiz José de Arruda

Data 29 09 1881

Escravo Ponciano

Vendedor José C. de Souza Guimarães

Comprador Cap. Gregório B. de Freitas

Data 24 11 1881

Escravo Luiza

Vendedor Manoel Santiago Ribeiro

Comprador Elisa Haffers

Data 08 04 1882

Escravo Anastacia

Vendedor José P. Magalhães Cardozo

Comprador Felix Bento Vianna

Data 14 07 1882

Escravo Barbara

Vendedor Manoel Francisco de Moura

Comprador João de Andrade Bastos

Data 02 08 1882

Escravo Amelia

Vendedor Lola Cortez

Comprador Maria da E. de Lemos Marinho

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130

Data 15 12 1882

Escravo Josepha

Vendedor Maximiliano Alves Fernandes

Comprador João de Andrade Bastos

Data 05 02 1883

Escravo Caetana

Vendedor Francisco José Henriques

Comprador Cap. Manoel E. S. Guimarães

Data 19 04 1883

Escravo Agapito

Vendedor Maria Alexandrina de Oliveira e Anna Roza de Almeida

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 23 05 1883

Escravo Adelina

Vendedor Cecília A. Pereira Coutinho

Comprador Candida Torres R. de Campos

Data 13 07 1883

Escravo Thereza

Vendedor Luiz José Arruda

Comprador Brazilino Modesto de Castro

71 Progenitor de Vicente de Carvalho

Data 09 12 1882

Escravo Loduvico

Vendedor Juliana S. de Novaes Gonçalves

Comprador Maj. Hygino J. B de Carvalho71

Data 02 01 1883

Escravo Jacintho

Vendedor Antonio José Bento de Almeida

Comprador José Júlio da Silva

Data 06 02 1883

Escravo Justino

Vendedor Joaquim Ferreira Lisboa

Comprador João de Andrade Bastos

Data 28 04 1883

Escravo Manoel

Vendedor Luiz V. da Roza

Comprador João Miguel Bierreinlerch

Data 03 07 1883

Escravo Gertrudes

Vendedor Balleina Gonçalves de Carvalho

Comprador Joaquim Quirino L. dos Santos

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131

Data 27 10 1883

Escravo Thereza e Paula

Vendedor Maria das Dores Guimarães

Comprador Julio F. de Arruda

Data 31 10 1883

Escravo Antonia

Vendedor Bento Luiz Collaço Netto

Comprador João Bernardes Pereira

Data 29 12 1883

Escravo Magdalena

Vendedor Manoel de Jesus Couto

Comprador Hypolito C. Xavier da Silveira72

Data 24 01 1884

Escravo Bartholomeu, Venancio, Bazilio, Pedro e João

Vendedor Joaquim Sérvulo da Cunha e Anna Justa do Carmo

Comprador Henrique Porchat

72

Menor, representado por seu pai, José Xavier da Silveira

Data 16 07 1883

Escravo Manoel

Vendedor Francisca da Silva Ferreira

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 29 10 1883

Escravo Leoncio, Gulherme e Joaquim

Vendedor Maria das D. Guimarães Roza

Comprador Francisco Pinto da Silva

Data 26 11 1883

Escravo Magdalena

Vendedor Maria das D. Guimarães Roza

Comprador Manoel de Jesus Couto

Data 10 01 1884

Escravo Emília

Vendedor Vasconcelos & Companhia

Comprador João B. Gomes de Amorim

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132

ANEXO II

Transcrição da apuração de escravos na cidade de Santos feita por João Guerra,

publicada no jornal Diário de Santos nos dias 01 e 02 de outubro de 1886:

ESCRAVO IDADE PROPRIETÁRIO

01 Amaro 25 Alexandre F. Gomes de Miranda 02 Damiana 44 Idem

03 Thereza 29 Idem 04 Cesário 39 Alexandre Martins de Oliveira

05 Fortunato 18 Idem 06 Maximiano 28 Anna Alexandrina Hayden

07 Apollinario 16 Antonia Maria de Jesus

08 Estanislau 21 Idem 09 Antonia 20 Amalia Figueira de Aguiar

10 Delfina 49 Antonio Affonso Proost de Souza 11 Benedicto (fugido) 42 Idem

12 Lau iana (sic) 40 Idem 13 Maria 15 Idem

14 Joanna 37 Antonio de Lima Machado

15 Roque 37 Idem 16 Amancio 42 Antonio José Da Silva Bastos

17 Benedicta 28 Idem 18 Domingos 54 Idem

19 Ercília 39 Idem

20 Thomaz 23 Idem 21 Xisto 30 Idem

22 Candido 23 Antonio Marques de Carvalho 23 Luiza 20 Idem

24 Maria 40 Antonio Americo Lisboa 25 Benedicta 32 Antonio José Cabral da Fonseca

26 Henrique 17 Antonio Teixeira de Carvalho

27 Agricola 42 Antonio de Freitas Guimarães 28 Mauricio 31 Idem

29 Jacyntho 40 Dr. Arlindo R. Esquivel 30 Hygina 16 Arlindo Carneiro de Araujo

Aguiar 31 Ludovina 38 Idem

32 Maria 16 Idem

33 Ambrosina 20 Anna Lourença de Lima 34 Innocencia 19 Idem

35 Lino 26 Augusto da Silva Prates (herança)

36 Cypriana 17 Belarmino (alfaiate) 37 Affonso 21 Benedicto Narciso do A.

Sobrinho 38 Balbina 26 Benjamin Fontana

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133

39 Theodora 17 Bento Pereira Soares

40 Benedicto 42 Brasilia Silveira dos Santos

41 Antonio 54 Carlos Xavier de Moraes 42 Vicente 37 Idem

43 Benedicta 54 Custodio Antonio de Souza 44 Eduardo 16 Idem

45 Ricarda 38 Idem

46 Firmino (fugido) 34 Clemencia Maria do Espirito Santo

47 Germana 26 Duarte José de Almeida 48 Maria n/c Elisa Carneiro Bastos

49 Paula (fugida) 31 Eulalia Maria de Lima 50 Moysés 39 Eugenia Albuquerque Dias

51 Jacyntha 24 Carlos Martins dos Santos 52 Benedicta 30 Idem

53 Agapito 53 Idem

54 Gregorio 32 Idem 55 Joaquina 20 Francisco Antonio de Souza

56 Bernardina 34 Forjaz & Sá – em liquidação 57 Gregorio 16 Idem

58 Pedro 28 Idem

59 Albino 33 Floriano Ferreira de Camargo Andrade

60 Emiliano 27 Idem 61 Izidro 39 Idem

62 Margarida 24 Felippe Antonio da Fonseca 63 Luiza 41 Francisca Barbara Ferreira da

Silva 64 Flora 44 Francisca Emilia Fernandes

65 Anna 26 Guilherme José Alves Souto

66 Gabriella (fugida) 36 Idem 67 Januario 16 Henrique G. Moniz Brunken

68 Maria 44 Henrique da Cunha Moreira 69 Caetano 31 Candido José de Souza Soares

70 Belisario 36 Henrique Ablas (herança) 71 Salustiano n/c Idem

72 Lauriano 35 Idem

73 F[...]emias – ilegível 20 Idem 74 Fortunato 17 Idem

75 Luiz 40 Idem 76 Torquato 29 Idem

77 Thomaz 43 Idem

78 Zacarias 30 Idem 79 Euzebio 30 Idem

80 Elias 37 Idem 81 João 38 Idem

82 Leopoldina 24 Idem 83 Rosa n/c Idem

84 Balthazar 48 Henrique Porchat (herança)

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134

85 Abel 50 Idem

86 Romão 38 Idem

87 Antonio 44 Idem 88 Gonçalo 34 Idem

89 Domingos 31 Idem 90 Cypriano 33 Idem

91 Bartholomeu 39 Idem

92 Venancio 29 Idem 93 Marcolina 52 Idem

94 Eugenia 15 Idem 95 Antonio (fugido) 44 Idem

96 João (fugido) 23 Idem 97 José (fugido) 32 Idem

98 Joanna 28 Hermenegildo de Miranda e Castro

99 Magdalena 34 Hypolito Cassiano Xavier da Silveira

100 Balbina 34 Joaquim Ferreira Zimbres (João Octavio dos Santos)

101 Cecilia 29 Joaquim Benedicto Braga

102 Laurinda 31 Joaquim dos Santos Ribas 103 Amaro (fugido) 25 Joaquim Manoel Alves de Lima

104 Pedro 38 Idem

105 Benedicto (fugido) 44 João Batista de Lima 106 Pedro 23 João Octavio dos Santos

107 Paulina 31 Idem 108 Romana 21 João Pereira Rabica

109 Domingos n/c João Manoel Alfaya Rodrigues 110 Marcos 19 Idem

111 Domingos n/c Idem

112 Antonio 37 Idem 113 Feliciano (faleceu) n/c Idem

114 Jeremias 17 João Bento de Amorim 115 Benedicto 33 João Certiat

116 Honorio 54 Idem 117 João 15 Idem

118 Antonia 19 Idem

119 Sedegunda 23 Idem 120 Germano 38 João Baptista de Azevedo

Marques 121 José n/c João Favot

122 Onofre 30 João Xavier da Silveira 123 Lydia 18 João Joaquim Borges

124 Felizarda 23 João Favot

125 Miguel 22 João José Lopes 126 Izabel 27 José Felix de Oliveira

127 Flora 16 José Mariano Carneiro 128 Justina 39 Idem

129 Brandina 39 José Pinto Florencio de Campos

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135

130 Lourença 20 José Joaquim Moreira Guimarães

131 Firmo 16 Idem

132 Marcos (fugido) 21 José Alves Pinto 133 Thereza 30 José Joaquim da Silva

134 Victoria 39 José Gabriel Furtado da Silva 135 Sebastião 18 José Ferraz de Sampaio Junior

136 Maria 31 José Antonio Vieira Barbosa

137 Francisca 16 João Salustiano de Campos 138 Domingos (fugido) 58 José Azurem Costa

139 Benedicto 46 Idem 140 Custodio 41 Idem

141 Luiz 41 Idem 142 Juvencio 16 Idem

143 Elias 39 Idem

144 Aprigio 22 Idem 145 Anna 39 Idem

146 Ignez 22 Idem 147 Alberto 21 José Elias do Amaral Rocha

148 Joanna 16 José Moreira de Sampaio 149 Geraldo 17 José Carlos de Toledo Junior

150 Maria Rosa 44 Dr. José Lobo Vianna

151 Angelica 18 José Serafim Cardoso 152 Benta 16 José Ferraz de Arruda Campos

153 Romana 24 Idem 154 Afra 27 José Manoel de Vasconcellos

155 Luiz 33 Idem 156 Elesbão 28 Dr. Julio Gonçalves Furtado

157 Ambrosina 16 Joaquina Rosa do Amor Divino

158 Jussiniana 40 Idem 159 Victorino 22 Idem

160 Melvino 37 Cônego Luiz Alves da Silva 161 Pedro 36 Luiza Seidenthal

162 Maximo 32 Idem

163 João 23 Idem 164 Celicina 24 Idem

165 Glyceria (fugida) 25 Laura M. Bittencourt 166 Manoel 59 Lalanne & Irmão

167 José (fugido) 39 Idem 168 Sebastião 34 Lucas Rodrigues

169 Thomaz (abandonado) 54 Manoel Rolemberg d’Almeida (herança)

170 Catharina (nota de liberta no livro)

55 Manoel Luiz Pereira Braga

171 Anna n/c Manoel do Espirito Santos Guimarães

172 Caetana n/c Idem

173 Emygdio 34 Idem 174 Rita 31 Idem

175 Antonio 28 Idem

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136

176 Benedicto 25 Idem

177 Epifanio 28 Manoel José Martins Patusca

178 Lourenço 39 Idem 179 Maximiana 26 Idem

180 Cesario (fugido) 38 Idem 181 Benedicta 34 Manoel Lourenço da Rocha

(herança) 182 Amaro 36 Manoel José Barreiros

183 Leandro 22 Idem

184 Estanislau 35 Idem 185 Felix 25 Idem

186 Benedicto 21 Idem 187 Joaquim 29 Idem

188 Francisca 16 Idem 189 Ignacia 20 Manoel Joaquim da Silva

190 Domingos 30 Manoel Pereira da Rocha Soares

191 Joaquim 25 Idem 192 Benedicta 39 Idem

193 Moyzés 16 Manoel Lopes (herança) 194 João 23 Manoel Ferreira da Silva

195 Maria 31 Idem

196 Belmira 18 Dr. Manoel Maria Tourinho 197 Maria 23 Idem

198 Rita 26 Manoel Ignacio da Silveira 199 Dyonisio 31 Idem

200 Cassiano 21 Idem 201 João (fugido) 26 Mariano José de Jesus

202 Adão 39 Mathias Costa

203 Militão 28 Idem 204 Benedicta 22 Maria Carlota Assis Porchat

205 Pedro 28 Maria Rita Braga 206 Amelia n/c Maria de E. Lemos Marinho

207 Brigida 16 Maria Joaquina da Costa Coelho 208 Alexandre (fugido) 26 Idem

209 Frankelina 23 Narciso de Carvalho Anta

210 Caetana n/c Pacifico F. Freire (herança) 211 Izabel 16 Pedrina Jardim Martins da Silva

212 Benedicto 32 Roberto Maria de Azevedo Marques

213 Crispim 23 Idem 214 Paulino 28 Ricardo H. da Rocha Lima

215 Alfredo 29 Rosa Amelia de Sá

216 Candida 31 Idem 217 Manoel 28 Rita Corrêa dos Santos

218 Benedicto 28 Rita L. de Oliveira Azevedo (herança)

219 Antonia 17 Salvador Baptista N. Barbosa (herança)

220 Alberto 48 Souza Queiroz & Vergueiro

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137

221 Leandro 44 idem

222 Mathias 48 idem

223 Raphael 16 Theophilo de Arruda Mendes 224 Raymundo 38 Teixeira de Carvalho & Irmão

225 Manoel 32 Idem 226 Marçal 30 idem

227 João n/c Valencio Leomil

228 Guilhermina 23 Valencio Leomil Junior 229 Josepha 26 idem

230 Thereza 19 idem 231 Domingos 17 Vicente Barbosa

232 Luzia 32 idem 233 Paulo 34 João Sabino Pinto (na Conceição

de Itanhaêm) 234 Americo 36 idem

235 Vicente 24 idem

236 Amancio 22 idem 237 Gregorio 20 Idem

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138

ANEXO III

Decreto da Assembleia Geral sobre o fim da escravidão

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139

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140

ANEXO IV

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141

FONTES E IMAGENS

FONTES:

1- Fontes manuscritas:

1.1 Fundação Arquivo e Memória de Santos (FAMS) – Fundo Câmara

Atas da Câmara de Santos – fevereiro de 1886 a maio de 1888

1.2 Instituto Histórico e Geográfico de Santos

Livro de escrituras de compras e vendas de escravos – 1º cartório de Santos

2 – Fonte Impressa:

2.1 Hemeroteca Municipal Roldão Mendes Rosa – Santos (SP)

Diário de Santos, fevereiro de 1886 a dezembro de 1887

3 – Fontes documentais disponibilizadas pela internet:

3.1 Alfândega de Santos

Relação geral dos escravos matriculados no município de Santos, de 30 de março

de 1886 até 30 de março de 1887

Disponível no sítio eletrônico do Arquivo Público do Estado de São Paulo, em:

<http://www.arquivoestado.sp.gov.br/viver/escravos.php?pesq=1&descricao=&localid

ade=Santos%3B+SP&instituicao_produtora=Alfandega+de+Santos&tipologia_docum

ental=&n_ordem=&ano_inicial=1886&ano_final=1887&Reset2=Buscar>

Acesso em: 10 jan. 2013.

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142

Relação dos escravos alforriados no município de Santos, de 30 de março de 1887 a

20 de março de 1888

Disponível no sítio eletrônico do Arquivo Público do Estado de São Paulo, em:

<http://www.arquivoestado.sp.gov.br/viver/escravos.php?pesq=1&descricao=&localid

ade=Santos%3B+SP&instituicao_produtora=Alfandega+de+Santos&tipologia_docum

ental=&n_ordem=&ano_inicial=1886&ano_final=1888&Reset2=Buscar>

Acesso em: 10 jan. 2013.

3.2 Jornais

Correio Paulistano

Edição de 16/06/1886 disponível no sítio eletrônico da Biblioteca Nacional, em:

<http://memoria.bn.br/DOCREADER/DocReader.aspx?bib=090972_04&PagFis=832

8>

Acesso em: 01 fev. 2013.

Edição de 24/10/1886 disponível no sítio eletrônico da Biblioteca Nacional, em:

<http://memoria.bn.br/DOCREADER/DocReader.aspx?bib=090972_04&PagFis=832

8>

Acesso em: 01 fev. 2013

O Estado de São Paulo

Edição de 13/05/1918 disponível no sítio eletrônico de O Estado de São Paulo, em:

<http://acervo.estadao.com.br/pagina/#!/19180513-14380-nac-0003-999-3-not>

Acesso em 01 fev. 2013

Page 155: Vera Lucia Alba Rei Dias Lucia Alba Rei Dias.pdf · Revistas de Estudos e Comunicações, v. XV, n. 43, p. 95-100, ago. 1988. Outros dois jornais, o Correio Paulistano e O Estado

143

3.3 Livro

GODOY, J. Floriano de. O elemento servil e as Camaras Municipaes da Provincia de

S. Paulo. RJ: Imprensa Nacional, 1887.

Disponível no sítio eletrônico do Senado Federal, em:

<http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/174438>

Acesso em 01 set. 2012.

IMAGENS:

Agência Metropolitana da Baixada Santista

Mapa indicativo dos fortes construídos na região (imagem 3)

Disponível em: <http://www.agem.sp.gov.br/pdf/guia_circuito_dos_fortes.pdf>

Acesso em 01 jun. 2013

Biblioteca Nacional

Decreto da Assembleia Geral sobre o fim da escravidão (Anexo III)

Disponível em:

<http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_manuscritos/mss49_4_4.pdf>

Acesso em 20 jan. 2013.

Lei Áurea (Anexo IV)

Disponível em:

<http://objdigital.bn.br/acervo_digital/div_manuscritos/mssI48_17_42.jpg>

Acesso em 20 jan. 2013.

Blog Novo Milênio

Associação Comercial de Santos (imagem 5)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/>

Page 156: Vera Lucia Alba Rei Dias Lucia Alba Rei Dias.pdf · Revistas de Estudos e Comunicações, v. XV, n. 43, p. 95-100, ago. 1988. Outros dois jornais, o Correio Paulistano e O Estado

144

Acesso em 01 jul. 2013.

Largo da Cadeia Nova (e Câmara) (imagem 12)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/fotos196.htm>

Acesso em 01 jul. 2013.

Mapa elaborado pela Comissão de Saneamento do Estado de São Paulo em 1895

que destaca as fontes de água potável (imagem 6)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/>

Acesso em 01 jul. 2013.

Mapa elaborado pela Comissão de Saneamento do Estado de São Paulo em 1895

que destaca as propriedades, as linhas de bondes e o calçamento (imagem 9)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/>

Acesso em 01 jul. 2013.

Planta de Santos de Jules Martins, 1878 (imagem 7)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/mapa08g.htm>

Acesso em 01 jul. 2013.

Porto do Consulado em 1886, reprodução de tela de Benedicto Calixto (imagem 10)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/porto/portoh01.htm.>

Acesso em 01 jul. 2013.

Retrato de Rubim Cezar (imagem 13)

Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0313a.htm>

Acesso em 01 jul. 2013.

Page 157: Vera Lucia Alba Rei Dias Lucia Alba Rei Dias.pdf · Revistas de Estudos e Comunicações, v. XV, n. 43, p. 95-100, ago. 1988. Outros dois jornais, o Correio Paulistano e O Estado

145

Caravelas – Núcleo de Estudos da História da Música Luso-Brasileira

Theatro Guarany. Postal F. Manzieri, Edictor, São Paulo, nº 29 [c. 1910] (imagem 7)

Disponível em: <http://www.caravelas.com.pt/lugares.html>

Acesso em 06 jan. 2014.

David Rumsey Map Collection – Cartography Associates

Excerto de mapa da América do Sul de Letts, Son & Co Limited. Londres, 1883

(imagem 11)

Disponível em: <http://www.davidrumsey.com/>

Acesso em 10 jan. 2014.

Mapa da América do Sul nº 01, de Letts, Son & Co Limited. Londres, 1883 (imagem

14)

Disponível em:

<http://www.davidrumsey.com/luna/servlet/detail/RUMSEY~8~1~31487~1150443?qv

q=q:brazil+letts;sort:Pub_List_No_InitialSort,Pub_Date,Pub_List_No,Series_No;lc:R

UMSEY~8~1&mi=0&trs=4>

Acesso em 10 jan. 2014.

Mapa da América do Sul nº 02, de Letts, Son & Co Limited. Londres, 1883 (imagem

15)

Disponível em:

<http://www.davidrumsey.com/luna/servlet/detail/RUMSEY~8~1~31488~1150444?qv

q=q:brazil+letts;sort:Pub_List_No_InitialSort,Pub_Date,Pub_List_No,Series_No;lc:R

UMSEY~8~1&mi=1&trs=4>

Acesso em 10 jan. 2014.

Mapa da América do Sul nº 03, de Letts, Son & Co Limited. Londres, 1883 (imagem

16)

Page 158: Vera Lucia Alba Rei Dias Lucia Alba Rei Dias.pdf · Revistas de Estudos e Comunicações, v. XV, n. 43, p. 95-100, ago. 1988. Outros dois jornais, o Correio Paulistano e O Estado

146

Disponível em:

<http://www.davidrumsey.com/luna/servlet/detail/RUMSEY~8~1~31489~1150445?qv

q=q:brazil+letts;sort:Pub_List_No_InitialSort,Pub_Date,Pub_List_No,Series_No;lc:R

UMSEY~8~1&mi=2&trs=4>

Acesso em 10 jan. 2014.

Mapa da América do Sul nº 04, de Letts, Son & Co Limited. Londres, 1883 (imagem

17)

Disponível em:

<http://www.davidrumsey.com/luna/servlet/detail/RUMSEY~8~1~31490~1150446?qv

q=q:brazil+letts;sort:Pub_List_No_InitialSort,Pub_Date,Pub_List_No,Series_No;lc:R

UMSEY~8~1&mi=3&trs=4>

Acesso em 10 jan. 2014.

Ebay

Hospital da Sociedade Portuguesa de Beneficência (imagem 4)

Disponível em: <http://www.ebay.com/itm/BRAZIL-SANTOS-BENEFICENCIA-

PORTUGUESA-ED-PONTES-ET-COMP-BAZAR-DE-PARIS-

/281028834755?pt=LH_DefaultDomain_0&hash=item416e9fb5c3>

Acesso em 12 jan. 2014.

Instituto Moreira Salles

Cidade de Santos vista da Ilha Barnabé, 1862, Militão Augusto de Azevedo (imagem

2)

Disponível em: <http://fotografia.ims.uol.com.br/Sites/#1392916158994_2>

Acesso em 19 mar. 2014.

Prefeitura Municipal de Santos

Brasão da Cidade de Santos (imagem 1)

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147

Disponível em: http://www.santos.sp.gov.br/sites/default/files/so-brasao_0.jpg

Acesso em 10 jan. 2014.

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1919. Disponível em: <http://www.novomilenio.inf.br/santos/h0353.htm>. Acesso em

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AZEVEDO, Celia Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no

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BLOCH, Marc Leopold Benjamin. Apologia da história, ou O ofício de historiador. Rio

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