122

Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

  • Upload
    lengoc

  • View
    215

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 2: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 3: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Universidade Estadualde Santa Cruz

ReitorProf. Antonio Joaquim da Silva Bastos

Vice-reitoraProfª. Adélia Maria Carvalho de Melo Pinheiro

Pró-reitora de GraduaçãoProfª. Flávia Azevedo de Mattos Moura Costa

Diretora do Departamento de Ciências da EducaçãoProfª. Maria Olívia Lisboa

Ministério daEducação

Page 4: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Ficha Catalográfica

S678 Sociologia e educação: módulo 1, volume 4/ Elabo- ração de conteúdo : Rogéria Martins e Elias Lins Guimarães.– [Ilhéus, BA] : UAB/UESC, [2009]. 121p. : il. Módulo: Pedagogia: Educação, História e Socie- dade / EAD-UESC Inclui bibliografias. ISBN: 978-85-7455-183-8

1. Educação. 2. Sociologia. I. Martins, Rogéria. II. Guimarães, Elias Lins. III. Pedagogia: Educação, História e Sociedade.

CDD 370.1

Page 5: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Coordenação UAB – UESCProfª. Ds. Maridalva de Souza Penteado

Coordenação Adjunta UAB – UESCProfª. Ms. Flaviana dos Santos Silva

Coordenação do Curso de Licenciatura em Pedagogia (EAD)Profª. Ds. Maria Elizabete Souza Couto

Elaboração de ConteúdoProfª. Ms. Rogéria MartinsProf. Dr. Elias Lins Guimarães

Instrucional DesignProfª. Ms. Marileide dos Santos de OliveraProfª. Ds. Gessilene Silveira Kanthack

RevisãoProfª. Ms. Aline de Santos Brito Nascimento

Coordenação de DesignProfª. Ms. Julianna Nascimento Torezani

DiagramaçãoJamile A. de Mattos Chagouri OckéJoão Luiz Cardeal Craveiro

Ilustração e CapaSheylla Tomás Silva

PED

AG

OG

IAEA

D -

UES

C

Page 6: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 7: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

UNIDADE I

O que permite os indivíduos viverem em sociedade: futuro no passado .................11

1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 13

2. OINDIVÍDUOEASOCIEDADE.............................................................................. 14

2.1Socialização-relaçãodoindivíduocomomeio............................................... 15

3. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO................................................ 18

REFERÊNCIAS..................................................................................................... 21

Sumário

UNIDADE II

Entrando no misterioso novo mundo: modernização e surgimento da sociologia .. 23

1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 25

2. CONTEXTOHISTÓRICODOSURGIMENTODASOCIOLOGIACOMOCIÊNCIAECOMO

DISCIPLINAACADÊMICA..........................................................................................26

2.1Aquestãosocialeosurgimentodasociologia................................................. 29

2.2Afinal,paraqueserveaSociologia?.............................................................. 33

3. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO................................................ 34

REFERÊNCIAS.....................................................................................................37

UNIDADE III

Os clássicos da sociologia: Èmile Durkheim ............................................................ 39

1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 41

2. ÈMILEDURKHEIM-ELABORAÇÕESINICIAISDOAUTOR:UMCONVITEÀSOCIOLOGIADA

MORAL................................................................................................................... 42

3. OQUEISSOTEMAVERCOMASOCIOLOGIADAEDUCAÇÃO?................................... 46

4. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO................................................ 52

REFERÊNCIAS..................................................................................................... 54

Page 8: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

UNIDADE V

Os clássicos da sociologia: Karl Marx ..................................................................... 75

1. INTRODUÇÃO...................................................................................................... 77

2. MARX-OMOTORDAHISTÓRIAÉALUTADECLASSES............................................ 78

2.1Marxeaeducação...................................................................................... 82

3. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO................................................ 85

REFERÊNCIAS..................................................................................................... 88

UNIDADE VI

Pierre Bourdieu - e os horizontes das relações de poder e a noção de habitus ......91

1. INTRODUÇÃO...................................................................................................... 93

2. PIERREBOURDIEU.............................................................................................. 94

2.1Bourdieueanoçãodehabitus...................................................................... 98

3. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO...............................................100

REFERÊNCIAS....................................................................................................103

UNIDADE VII

François Dubet – sociologia da experiência: uma nova versão da socialização

escolar .......................................................................................................................

105

1. INTRODUÇÃO....................................................................................................107

2. FRANÇOISDUBET–SOCIOLOGIADAEXPERIÊNCIA:UMANOVAVERSÃODA

SOCIALIZAÇÃOESCOLAR.........................................................................................108

2.1Conceitodedesinstitucionalização................................................................109

2.2Sociologiadaexperiência............................................................................111

3. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO...............................................113

REFERÊNCIAS....................................................................................................116

CONCLUSÃODOSAUTORES.................................................................................119

UNIDADE IV

Os clássicos da sociologia: Max Weber .................................................................. 57

1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 59

2. WEBER:UMAVIAGEMNASOCIOLOGIACOMPREENSIVA........................................... 60

3. ACONTRIBUIÇÃOWEBERIANAPARAAEDUCAÇÃO.................................................. 68

4. RESUMINDOOTEXTO:DIALOGANDOCOMOALUNO................................................ 70

REFERÊNCIAS.................................................................................................... 72

Page 9: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Ementa

Formação e desenvolvimento do pensamentosociológico. Análise dos fundamentos dasociologia da educação, articulando-os com ocotidianoescolar,ofenômenodofracassoescolar,as políticas públicas e suas implicações sociaisnocontextodasociedadetecnológica.

CargaHorária:60horas-aula

DISCIPLINA

SOCIOLOGIA E EDUCAÇÃO

Profª. Ms. Rogéria MartinsProf. Dr. Elias Lins Guimarães

Page 10: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 11: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Compreender a teorização sociológica sobre a estruturação da sociedade e o processo de socialização, o qual condiciona e assegura a vida societária.

Apresenta a problematização da relação indivíduo e sociedade, enfatizando as análises da teoria sociológica sobre a reflexão das sociedades capitalistas.M

eta

Objetivo

1 unid

ade

O QUE PERMITE OS INDIVÍDUOS VIVEREM EM SOCIEDADE: FUTURO NO PASSADO

Page 12: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 13: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

13PedagogiaUESC

Uni

dade

1

UNIDADE I

1 INTRODUÇÃO

Nesta primeira unidade, através de um enfoque

ideográfico e analítico da teoria sociológica, você terá

a oportunidade de perceber as relações e os contextos

socioeconômicos e culturais que condicionam e possibilitam

os indivíduos viverem em sociedade.

Page 14: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

14 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I o que permite os indivíduos viverem em sociedade: futuro no passado

2 O INDIVÍDUO E A SOCIEDADE

Os seres humanos são sociais,

culturais e socializados. Faz parte de sua

natureza viver na organização social.

Neste sentido, todos nós nascemos em

uma sociedade que desenvolve processos

sociais, a exemplo da socialização, através

dos quais aprendemos os costumes, as

regras, as normas, as convenções sociais,

os padrões sociais que vão, paulatinamente,

permitindo a interação com os demais

membros e com as diversas instituições.

Aos poucos, vamo-nos tornando membros, reconhecendo-nos

como atores sociais e sendo reconhecidos pelos grupos e pela

vida social como um todo.

Você, aluno, vai perceber que diversas são as abordagem

que afirmam a necessidade de os seres humanos viverem

em sociedade, a exemplo do realismo (a sociedade tem uma

existência concreta) e do nominalismo sociológico, (a sociedade

é um mero nome), ou segundo sua

origem, a partir das abordagens dos

naturalistas e a dos contratualistas. A

possibilidade de o ser humano estabelecer

uma vivência longe de qualquer

convívio parece impossível. Entretanto,

deve-se entender, conforme Berger e

Luckmann (2003), que a realidade da

vida cotidiana está organizada em torno

do “aqui” do corpo do indivíduo e do

“agora” do seu presente. Assim, a vida

cotidiana é um mundo intersubjetivo,

isto é, um mundo em que os indivíduos

participam, comunicam, interagem,

inter-relacionam, colaboram com

outros indivíduos e com as instituições

sociais, possibilitando e assegurando

uma frequente correspondência e

interdependência entre os sentidos e

significações (produção humana de

FIGURA 1 - vamos socializar, vamos interagir?

Fonte: http://www.moodle.ufba.br/course/view.php?id=8855

SAIB

A M

AIS

R

AAC

a FU V

MK

Socialização é a perspectiva de internalização ou interiorização que cada indivíduo faz das normas, condutas e valores compartilhados com o seu meio social, através das instituições morais: família, escola, comunidade, o direito etc. É um processo social básico que possibilita ao indivíduo introjetar valores, normas, comportamentos, atitudes, condutas que são necessários e fundamentais para a convivência na sociedade. Repare que esse é um conceito que vai atravessar todo o trabalho. Observe bem o que cada autor vai dizer sobre esse conceito. Vários autores, na sociologia, defendem uma construção teórica a esse respeito. Para a educação, esse é um conceito crucial para compreender os fenômenos sociais, uma vez que a escola é uma instituição moral e oferece um tipo de socialização aos indivíduos.

Naturalistas: A sociedade é instituída a partir da conjugação de um simples impulso associativo natural e da cooperação humana, cuja finalidade é obter os meios necessários para a consecução dos fins de sua existência, sejam estes morais, intelectuais ou técnicos. Seus expoentes são Aristóteles, São Tomas de Aquino e Cícero.

Contratualistas: A sociedade é o produto de um acordo de vontades, ou seja, de um contrato tácito celebrado entre os homens. Neste sentido, nega-se o fundamento do impulso associativo natural humano e concebe-se ser a vontade humana a única justificativa para a existência da sociedade. As obras de Thomas Hobbes, em especial a que foi publicada em 1651, intitulada O Leviatã, constituíram o ponto de partida para as ideias contratualistas.

Page 15: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

15PedagogiaUESC

Uni

dade

1sinais – a dança, a linguagem) construídos socialmente.

Antes da criação do campo disciplinar das Ciências

Sociais, várias abordagens foram construídas ao longo da

edificação do conhecimento sobre a formação da sociedade.

Contudo, a sociologia nasce no bojo do empreendimento do

mundo moderno para desenvolver um saber sistematizado

da realidade das sociedades ocidentais capitalistas. O Estado

Moderno exige, em razão de sua complexidade com a divisão

social do trabalho e as relações produtivas, a

necessidade de se produzir um conhecimento

mais exato para conduzir suas decisões sobre o

processo de racionalização do pensamento.

Esse modelo do pensamento racional tem

uma natureza totalitária, diferente de outras

formas de conhecimento que não tenham sido

produzidas, não submetidas aos princípios

epistemológicos (teoria) e às regras metodológicas

(método). Reside aqui uma forma de conhecimento regida pelo

modelo científico. Uma das preocupações entre os pensadores

modernos é essa: estabelecer um elemento fundante da

racionalidade científica mediada pela teoria e pelo método.

Durante muito tempo, as ciências sociais ficaram

submetidas a um modelo de explicação dos fenômenos sociais,

do modelo das ciências naturais. Isso significa que as ideias

presidiam de uma observação e experimentação, baseadas

em explicações genéricas, universais sobre os fenômenos.

Imagine você tentando explicar o fenômeno da violência por

um único aspecto... Você estaria reduzindo a complexidade

do fenômeno. Foi preciso reconhecer a especificidade do ser

humano e sua distinção radical em relação à natureza. Por

isso as ciências sociais, ao longo de sua construção do campo

disciplinar, reivindicam um postulado próprio de produção de

um conhecimento social, construindo seu próprio paradigma

científico.

2.1 Socialização - relação do indivíduo com o meio

Sendo o humano um ser eminentemente social, é

SAIB

A M

AIS

R

AAC

a FU V

MK

Racionalização do pensamento é

estabelecer um conhecimento pautado em

técnicas racionais – mediadas por um corpo

teórico e por uma metodologia apropriada

para verificação do objeto a ser investigado.

O que faz as ciências sociais produzirem um

conhecimento científico é a explicação racional

do comportamento da sociedade, segundo

sua validação teórica e metodológica. Isso

a diferencia do conhecimento científico, do

conhecimento do senso-comum ou, como

alguns chamam, dos estudos humanísticos.

Page 16: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

16 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I o que permite os indivíduos viverem em sociedade: futuro no passado

inerente a própria natureza humana a capacidade e a tendência

de agrupar-se, de unir-se aos seus semelhantes e conhecer

as estruturas socioeconômicas, as conveniências e convenções

sociais que têm importância para si e para os outros, mantendo

mútuas e constantes relações de colaboração e de dependência.

Entretanto, apesar de a vida humana decorrer dessa capacidade

de convivência, vale salientar que o ser humano ocupa um lugar

diferenciado no reino animal. Ao inter-relacionar-se com o meio

ambiente, transforma-o, adequando-o as suas necessidades,

imprimindo, através do trabalho, sentido e significado ao seu

fazer, criando cultura.

A concepção marxista, que será apresentada e discutida

adiante, é um exemplo de composição societária. Afirma que a

sociedade é uma estrutura composta de partes interdependentes

e contraditórias, em constante movimento e transformação,

não se constituindo através de um processo evolutivo, mas

mediante rupturas socioeconômicas, políticas e culturais no

seu contexto.

Autores clássicos da sociologia e também alguns mais

contemporâneos vão se debruçar sobre a explicação dessa

relação entre indivíduo e sociedade. Para Durkheim, por exemplo,

a sociedade é um todo organizado, tal como os organismos

vivos – veja a semelhança dos fenômenos da natureza com os

fenômenos sociais que o autor coloca. Esse autor ainda está

preso a um paradigma de explicação baseado no paradigma

das ciências naturais. E o que vai estabelecer a relação entre

a sociedade e os indivíduos é a coesão social, no sentido de

fazer a sociedade funcionar. A sociedade não é um somatório

de indivíduos porque ela tem regras próprias de funcionamento

que se diferenciam das consciências individuais. Os indivíduos

têm consciência própria, mas a consciência coletiva está acima

de sua consciência individual e, por isso, a sociedade exerce

uma coerção social sobre os indivíduos.

Parsons é outro que chama atenção para essa relação

entre indivíduo e sociedade. Segundo este autor, é a partir de

um sistema que os indivíduos vão encontrar as respostas para

suas necessidades, seja em relação ao sistema cultural, seja em

relação ao social ou à personalidade. E os componentes para

o funcionamento da sociedade são estabelecidos pelos papéis

que cada um desempenha na sociedade. Por exemplo: você,

Cultura é a capacidade que o homem tem de transformar o meio e adequá-lo às suas necessidades. Está ligada à capacidade humana de trabalhar. Neste processo, geram produtos materiais (equipamentos, má-quinas e utensílios) e intelectuais (ideias, valores, sistemas filosóficos, jurídicos, éticos, que orientam as normas e os comportamentos so-ciais).

Contradição entre forças produtivas e relações de produção. Por forças produtivas, entende-se a ação dos indivíduos sobre a natureza; grau de d e s e nvo l v i m e n t o da técnica e das tecnologias; proces-sos de cooperação entre os indivíduos; modos de divisão do trabalho; habilidades; c o n h e c i m e n t o s ; instrumentos. Por relações de produção, c o m p r e e n d e - s e o modo como os homens se organizam para produzir e se inteirar com outros homens.

Page 17: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

17PedagogiaUESC

Uni

dade

1enquanto indivíduo, desempenha vários papéis na sociedade:

papel de profissional, de pai, de filho etc.

Costumam identificar estes autores, Durkheim e Parsons,

como funcionalistas, pela organicidade que vislumbram na

sociedade e nas relações sociais.

Nobert Elias já trabalha com uma perspectiva mais

diferenciada. Ele diz que a sociedade é formada por indivíduos

e essa relação é associável. A relação é dinâmica, relacional,

fundindo-se, refundindo-se, numa contínua integração social.

Essa relação mútua, tensa e dinâmica entre os indivíduos

configura o fenômeno da individualização.

Como você está percebendo, a sociedade é um sistema

complexo com várias possibilidades de compreensão. Como

afirma Charon (2000), ela situa cada indivíduo e grupos,

define, elabora e distribui posições sociais, atribui papéis e

status sociais, assegura e suprime poder, privilégio e prestígio,

construindo e distribuindo identidades e perspectivas.

Entretanto, a existência humana é contraditória. As

relações humanas são complexas demais e o mundo nos

é apresentado em múltiplas realidades as quais, muitas

vezes, requerem grande esforço para sua compreensão. As

mesmas forças que trazem a individualização podem trazer a

impessoalização. Da mesma forma, os conflitos entre indivíduo

e sociedade estão sempre presentes.

Procurando atender suas necessidades e anseios,

os indivíduos unem-se, estabelecem laços de cooperação,

relacionam-se por meio de vínculos das mais variadas naturezas:

econômicos, políticos, culturais, familiares, religiosos etc. Na

sociedade, um conjunto de normas de controle social (morais,

religiosas, comportamentais, jurídicas) orienta condutas

e comportamentos, possibilitando ao homem estabelecer

formas de relações sociais. Contudo, também traz consigo a

possibilidade da criação de inúmeras limitações e interdições

que, em certos momentos e determinados lugares, são de tal

modo numerosas e frequentes que chegam a afetar seriamente

a própria liberdade humana.

Você deve perceber que a sociedade em si é dinâmica

e constitui-se num contexto amplamente complexo e que,

portanto, requer várias interpretações. Através do presente

estudo, busca-se conceituá-la, explicar seu surgimento, sua

A visão funcionalista ancora-se na analogia do corpo social a partir do corpo humano, ou seja, assim como este é constituindo de partes heterogêneas, diferentes, mas interdependentes, a sociedade é constituída de instituições com diversas e diferentes funções, que procuram manter o equilíbrio, a harmonia, a coesão social. Quando ocorre uma disfunção no corpo social, assim como no corpo humano, precisa ser imediatamente corrigida para que não comprometa o funcionamento e a organicidade do todo.

Nobert Elias chama esse processo de indiv idual ização uma dinâmica entre a sociedade e os indivíduos, que ocorre de diferentes formas em cada sociedade e em cada tempo histórico, como modos e ritmos diferenciados formados por modos particulares. Por isso, não é possível, segundo o autor, generalizar como em cada sociedade essa relação será produzida e constituída. A sociedade produz o indivíduo, na qual este se molda em contínua ação com outros indivíduos.

Page 18: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

18 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I o que permite os indivíduos viverem em sociedade: futuro no passado

evolução e a classificação das diversas formas de sociedades

que foram surgindo paulatinamente com a evolução humana.

3 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

A existência humana passa por um acúmulo de

experiências sociais que alimenta um ponto de vista científico,

a observação e a explicação dos fenômenos sociais. Isso quer

dizer que o homem é o objeto de indagações sociológicas, que

foram manifestando consistência científica somente no mundo

moderno, graças à expansão e à extensão dos princípios e do

método da ciência.

Segundo Inkeles (1980, p. 106),

[...] essas são as condições a que qualquer unidade social deve satisfazer, a fim de que a vida se mantenha e continue através das gerações. As maneiras pelas quais essas exigências preliminares são satisfeitas representam o que é caracteristicamente ação social, comparada com o que é humano, mas não pode ser distinguido do comportamento de outros animais. Ao resolver seus problemas básicos de existência, o homem cria uma série de padrões de ação que são as formas básicas de organização social. Tais formas vão desde os costumes mais simples, tais como as que governam cumprimentos e despedidas, passam por unidades de complexidade, completude e tamanhos intermediários, tais como comunidades e culminam na sociedade autossuficiente.

Como você pode perceber, o autor está analisando

sobre a relação indivíduo e sociedade, na qual existe um

padrão característico entre indivíduos que se assemelham e se

aglutinam. Ressalta, ainda, que

[...] onde quer que exista vida social, existe um padrão característico de repouso e recreação, algum desenvolvimento de artesanato, a arte, certa forma de religião que se exprime em um conjunto específico de idéia ou mitos, e freqüentemente, em ritual bem complexo (INKELES, 1980, p. 109).

O processo social denominado socialização é uma

discussão clássica na sociologia, mormente as pessoas são

Page 19: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

19PedagogiaUESC

Uni

dade

1sociais, ou seja, tendem à vida gregária, à associação humana

e dela necessitam. No decorrer da vida, a pessoa humana

aprende, introjeta, assimila os elementos socioculturais do seu

meio, o que Simmel vai chamar de “ato de entrar em relação

social” (SIMMEL apud BOUDON; BORRICAUD, 1993).

Através da linguagem cinematográfica, a exemplo do

filme “O enigma de Kaspar Hauser”, você entenderá como a

pessoa humana, ao privar-se do convívio social, isto é, viver

o isolamento social, encontra dificuldade para constituir a

estrutura de sua personalidade, constituindo-se naquilo que os

sociólogos denominam homo ferus – seria uma produção de

um indivíduo não socializado, um homem criado isoladamente

ao mundo social. 4 SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS: VAMOS

PESQUISAR E REFLETIR

Você deverá ler os fragmentos de textos abaixo e, em

seguida, responder as questões:

O processo por meio do qual o indivíduo aprende a ser membro da sociedade é designado pelo nome de socialização. O mesmo revela uma série de facetas diversas. Vista sob este ângulo, a socialização é a imposição de padrões sociais à conduta individual [...]. Conclui-se que na biografia do indivíduo a socialização, especialmente em sua fase inicial, constitui um fato que reveste dum tremendo poder de constrição e duma importância extraordinária [...]. Dependem não apenas das características individuais dos adultos que cuidam da criança, mas também dos vários grupamentos a que pertencem esses adultos. Assim, por exemplo, a natureza dos padrões de conduta aplicados a uma criança depende não somente do fato de ser a mesma um gustil ou um americano, mas também da circunstância de pertencer à classe média ou à classe operária dos Estados Unidos (MARTINS; FORACCHI, 1977, p. 204).

Segundo, ainda, estes autores,

[...] o caráter absoluto com que os padrões sociais atingem a criança resulta de dois fatores simples: o grande poder que os adultos exercem numa situação como aquela em que se encontra a criança

Page 20: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

20 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I o que permite os indivíduos viverem em sociedade: futuro no passado

e a ignorância desta sobre a existência de padrões alternativos [...]. Só posteriormente a mesma descobre que existem alternativas fora desse mundo familiar, que o mundo de seus pais é relativo no tempo e no espaço e que padrões diferentes podem ser adotados. Só então o indivíduo toma conhecimento da relatividade dos padrões e dos mundos sociais (MARTINS; FORACCHI, 1977, p. 205).

ATIVIDADES

1 - Estabeleça uma relação entre socialização e controle social.

2 - Descreva sobre a diferença dos conceitos de indivíduo e sociedade (procure num Dicionário de Sociologia) e apresente duas versões teóricas sobre esses conceitos.

FILME RECOMENDADO

O ENIGMA DE KASPAR HAUSER (Jeder für und Gott gegen alle) Direção: Werner Herzog. Elenco: Helmut Döring, Bruno S, Walter Landengast e outros. Ano de Produção: 1974. País de produção: Alemanha. Duração: 109 min.

Trata-se do caso verídico de um adolescente que é encontrado, em 1828, no meio de uma praça em Nurenberg, trazendo consigo uma carta. Sujo e imóvel, chama a atenção dos transeuntes, até que as autoridades o recolhem. Herzog nos mostra como a experiência social da pessoa humana está condicionada ao contato, ao convívio, enfim, ao processo de socialização, condição fundamental para a construção das identidades psicológicas e social do ser humano.

Capa de DVD do filme: O Enigma de Kaspar Hauser

Page 21: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

21PedagogiaUESC

Uni

dade

1

RE

FE

NC

IAS BERGER, Peter; LUCKMANN, T. A construção social da

realidade. Petrópolis: Vozes, 2003.

BOUDON, R.; BOURRICAUD, F. Dicionário Crítico de Sociologia. São Paulo: Ática, 1993.

CARDOSO, F. H.; IANNI, O. Homem e Sociedade: leituras básicas de sociologia geral. São Paulo: Nacional, 1973.

CHARON, Joel M. Sociologia. São Paulo: Saraiva, 2000.

INKELES, Alex. O que é Sociologia? São Paulo: Pioneira, 1980.

MARTINS, Jose de Souza; FORACCHI, Marialice M. Sociologia e Sociedade. São Paulo: Livros Técnicos e Científicos, 1977.

Page 22: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 23: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Oportunizar ao aluno a compreensão do surgimento da sociologia no âmbito dos conflitos e das desigualdades sociais nas sociedades modernas.

Problematiza o pensamento moderno, as transformações socioeconômicas, políticas e culturais advindas com a Revolução Industrial e a sedimentação do capitalismo nas sociedades ocidentais.M

eta

Objetivo

2 unid

ade

ENTRANDO NO MISTERIOSO NOVO MUNDO: MODERNIZAÇÃO E SURGIMENTO DA

SOCIOLOGIA

Page 24: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 25: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

25PedagogiaUESC

Uni

dade

2

UNIDADE II

1 INTRODUÇÃO

Nesta unidade, você conhecerá a dinâmica do processo de

modernização das sociedades ocidentais e a efetiva discussão

sobre a produção do conhecimento racionalizado da reflexão

sociológica.

Page 26: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

26 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Eentrando no misterioso novo Mundo: modernozação e surgimento da Sociologia

2 CONTEXTO HISTÓRICO DO SURGIMENTO DA

SOCIOLOGIA COMO CIÊNCIA E COMO DISCIPLINA

ACADÊMICA

O termo modernização, segundo a Comissão Gulbenkian,

é uma resposta intelectual às ciências nomotéticas, que a ciência

moderna acabou desenvolvendo, em razão da impossibilidade

de analisar as sociedades ocidentais pela generalização da

explicação sobre as sociedades.

Nomotéticas é um termo, no paradigma científico,

voltado para explicar os fenômenos a partir de leis universais,

que precede de uma explicação objetiva, lógica e genérica

sobre fenômenos sociais. Essas universalidades estão ligadas,

sobretudo, a uma perspectiva das sociedades ocidentais,

porque esse era o conhecimento até então produzido na ciência

moderna. Quando o sistema-mundo se lançou a descobertas

de outras formas de organização societária (lembre-se dos

países que se lançaram ao mar e se depararam com outros

povos e outras sociedades...), identificou-se por sociedades

não ocidentais. Ora, se as explicações das análises sobre as

sociedades até então produzidas (lembre-se das formulações

teóricas do período iluminista) foram constituídas para uma

versão de organização societária ocidental, suas formulações

teóricas não poderiam ser aplicadas em sociedades do tipo não

ocidental. As leis gerais sobre a sociedade não serviriam como

parâmetro para analisar essas novas sociedades. Chegava-se

num impasse intelectual. Como explicar, no modelo científico,

as análises das sociedades não ocidentais?

A saída foi considerar que essas sociedades não ocidentais

estavam em posição de atraso em relação às sociedades

ocidentais e, por isso, deveriam processar uma dinâmica de

modernização para alcançarem o status social das sociedades

ocidentais. Modernização, então, seria essa capacidade de

superação de um modelo societário para outro modelo. Exemplo:

uma sociedade tradicional para uma sociedade moderna;

sociedade religiosa para uma sociedade secularizada; sociedade

estagnada para uma sociedade dinâmica etc.

Pode ser descrito como um estilo, uma maneira de pensar

e de se situar no mundo, associado a uma forma de organização

social desenvolvida na Europa a partir do século XVII. Como

Page 27: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

27PedagogiaUESC

Uni

dade

2

período histórico, não pode ser conceituado através de uma

única concepção ou entendimento. Em verdade, vincula-se a um

ideário ou visão de mundo que está relacionado ao projeto de

mundo moderno, empreendido em diversos momentos ao longo

da Idade Moderna e ligado às necessidades e consequências

da Revolução Industrial, isto é,

relacionado com o desenvolvimento do

capitalismo que, conforme Max Weber, é a

união da disciplina racional e do desejo do

lucro. Caracteriza-se como uma tentativa

de ruptura e superação do passado.

Neste sentido, vamos descortinar

esse misterioso mundo novo, fato

este que irá ajudar você, aluno, a

compreender o pensamento moderno e

o surgimento da Sociologia, ciência esta

concebida por muitos como a ciência

da crise. Considerando que qualquer

processo de mudança implica em crise,

observando que você está alimentando

um movimento de rupturas, saindo de

um modelo societário e em direção ao

outro, isso implica numa sistematização

dos conhecimentos produzidos. E onde

essa sistematização irá se consolidar?

Nas instituições de ensino...

O espírito do tempo moderno, da modernização, é, sem

dúvida, expresso, por um lado, pelas profundas transformações

sociais, econômicas e políticas que ocorreram, sobretudo,

ligadas às mudanças no ritmo de vida dos indivíduos e das

sociedades (a máquina como modelo para o ritmo de vida), ao

processo de alienação do homem (tentativa de transformação do

homem em ‘máquina’), a insurreição das classes trabalhadoras

(organização em sindicatos e participação em revoluções); e,

por outro, pela busca do desenvolvimento que, paulatinamente,

consolidam a Época Moderna.

O pensamento da época moderna colocou, no centro,

a noção de indivíduo, o livre uso da razão e sua consequente

autonomia em relação aos entraves que o impediam de escolher

e de seguir por si próprio a sua trajetória, livre do dogmatismo

SAIB

A M

AIS

A Revolução Industrial consistiu em um conjunto de mudanças tecnológicas com profundo impacto no processo produtivo em nível econômico e social. Iniciada na Inglaterra, em meados do século XVIII, expandiu-se pelo mundo a partir do século XIX. Significou algo mais do que a introdução da máquina a vapor. Ela representou o triunfo da indústria capitalista e a divisão social do trabalho, que foi pouco a pouco concentrando as máquinas, as terras e as ferramentas sob o seu controle, transformando as relações sociais e dando uma complexidade ao corpo social na mediação entre força de trabalho por trabalhadores e meios de produção – fábricas e empresas.

R

AAC

a FU V

MK

FIGURA 1 - Fonte: http://www.ensp.unl.pt/lgraca/history_cars_jakob_hi-

ghres.jpg

Page 28: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

28 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Eentrando no misterioso novo Mundo: modernozação e surgimento da Sociologia

PARA

CO

NH

ECER

Costumam ser definidos os seguintes fa-tores que contribuíram para a eclosão da Época Moderna: o desenvolvimento e a intensificação das descobertas cien-tíficas, assim como a autonomização e a fragmentação das ciências, a partir de métodos de observação e de experimen-tação sistematicamente conduzidos; o in-cremento e a aceleração dos processos de invenção técnica; a invenção da imprensa por Gutenberg (1440); os ideais críticos do livre exame, implementados pela Re-forma e o movimento de reformulação do catolicismo, a partir do Concílio de Tren-to (1545-1549, 1551-1552, 1562-1563); o incremento das viagens marítimas que conduziram à descoberta dos povos do Novo Mundo, de que se destacam a desco-berta da América, por Cristóvão Colombo (1492), e a descoberta do caminho maríti-mo para a Índia, por Vasco da Gama.

religioso de uma sociedade religiosa e de uma

predeterminação pelos extratos sociais – a

definição social dos indivíduos a partir de sua

origem social. É marcado pela ruptura com

a tradição e ocorreu na medida em que os

fundamentos e a legitimidade da experiência

tradicional de pensar e organizar a vida

em sociedade, bem como os valores e as

normas, começaram a perder a sua natureza

indiscutível e deixaram, por conseguinte, de

se impor a todos com obrigatoriedade, ou

seja, uma razão de ser.

Perceba que, ao romper com a ordem

e o pensamento medieval, fundamentados

nos costumes e na tradição que ‘escondiam’ o

mundo, a modernização, através do progresso

e do desenvolvimento científico, procura

eliminar as incertezas, a imprevisibilidade e a indeterminação.

Bauman (1999) concebe que também o ser humano, neste

movimento de ambivalência, foi tomado como objeto a ser

moldado pela racionalidade científica e técnica e também pela

racionalidade jurídica.

A ambiguidade é inseparável de toda existência humana,

e, por isso mesmo, a modernização reúne, e não poderia deixar

de reunir, eventos aparentemente opostos e contraditórios,

pois é, ao mesmo tempo, passado e presente. Esse movimento

é extremamente importante para que possamos compreender

os fenômenos sociais da atualidade.

Vivemos um grande dilema em relação aos contrastes

e ambiguidades de nossa época que se expressam nos

surpreendentes avanços científicos, tecnológicos, midiáticos,

em contraste com as desigualdades e exclusão social de grande

parte da população; na fragmentação dos grandes sistemas

explicativos, a exemplo do fordismo, do marxismo, os quais,

durante muito tempo, foram estruturantes da verdade e que,

atualmente, não respondem satisfatoriamente às emergentes

indagações no desafio de conviver com a diferença e a diversidade

em contraposição ao monoculturalismo; com a construção

de múltiplas identidades e com a desconstrução de modelos

eurocêntricos, falocêntricos; com a ambiguidade constante

VOCÊ SABIA?

Segundo Bauman (2001), a modernização é a era em que, na vida social, impera a ideia da existência do indivíduo e do individualismo, assegurando uma significativa autonomia em relação à vida comunitária e social. Neste sentido, “a apresentação dos mem-bros como indivíduos é a marca registrada da sociedade moderna” (p. 39).

Page 29: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

29PedagogiaUESC

Uni

dade

2

entre o que consideramos novo, ancorado ou trazendo dentro

dele parte do velho de difícil identificação e o velho anacrônico

e ultrapassado.

Conforme Eder (2002), o processo de racionalização da

sociedade moderna é resultante de uma dupla produção de

cultura, isto é, de processos de aprendizagem que instituem

práticas simbólicas que tentam mobilizar o universo de discurso,

a fim de legitimar as distribuições de poder e posições e de

práticas sociais que legitimam as diferenças de classes que

institucionalizam seus interesses no ato de legitimar posições e

deslegitimar outras.

Neste sentido, concebe o autor que a referida

racionalização é resultado das lutas entre as classes sociais

e que estas lutas são dependentes dos processos coletivos

de aprendizagem necessários para reproduzir as condições

culturais de sua existência.

Você, aluno, vai perceber que o resultado dessas

mudanças, no âmbito do pensamento e das técnicas e tecnologias,

condicionou a proliferação de diversas abordagens no plano do

pensamento teórico. Nessa tentativa de compreender, explicar

e interpretar as mudanças sociais nas sociedades modernas,

é que buscamos conceitos e categorias de modo a facilitar a

compreensão da realidade social.

Enfim, quando olhamos para esse quadro, percebemos

que, ao lado das mudanças edificantes, no sentido de trazerem

avanços consideráveis para boa parte da população, nos

deparamos com um conjunto de situações gravíssimas que

exigem uma nova abordagem, um novo enfoque ou as nossas

perspectivas futuras não serão nem um pouco acalentadoras.

2.1 A questão social e o surgimento da Sociologia

A Sociologia surgiu precisamente como alternativa

crítica a essa concepção de vida social. Ao longo do século

XIX, os intelectuais franceses concordavam que a ordem social

estava ameaçada de dissolução pelo crescimento nocivo do

individualismo. Para eles, a sociedade encontrava-se à beira de

um colapso. Na forma de resposta acadêmica para um desafio

ATENÇÃO

Weber identifica a racionalidade do modo moderno em torno do universo simbólico, do discurso político e do discurso científico.

Page 30: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

30 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Eentrando no misterioso novo Mundo: modernozação e surgimento da Sociologia

da modernidade, configura-se como uma ciência que procura

explicar a crise social vivenciada pelos indivíduos e pelas

sociedades europeias. Concebe-se que a Sociologia é a ciência

da crise e da ambivalência e que as mudanças e transformações

nas estruturas produtivas e nas mentalidades sedimentaram-

se através da Revolução Industrial e da Revolução Francesa.

Os antecedentes intelectuais e materiais da Sociologia

não têm consenso na literatura da área. Segundo o Relatório

Gulbekian (1993), as Ciências Sociais nascem com a preocupação

de analisar a realidade, as contradições produzidas pelos

contradições capitalistas, na convergência entre as disciplinas

de história, economia, sociologia, ciência política e antropologia.

Já segundo o Relatório de GusGinsberg apud Bottomore

(1981, p. 16), a Sociologia tem origem “na Filosofia Política,

na Filosofia da História, nas teorias biológicas da revolução e

nos movimentos para reforma social e política que julgaram

necessário empreender levantamentos das condições sociais”.

Na medida em que a sociedade se encontrava em processo

de crise, o que implicava na estruturação de um contexto de

anomia social, segundo a leitura de Durkheim (ausência de

normas, desregramento, inobservância das normas), havia

necessidade de se empreender uma observação científica da

sociedade, ou seja, empreender análises, realizar diagnósticos

possíveis e passíveis de funcionarem como ‘remédios’ para a

cura dos males sociais. Para tanto,

haveria que se descobrir as normas,

as leis que regem a sociedade e

concebê-la como um organismo

vivo.

A mudança social exigia

organizar e racionalizar esse processo

de mudança, impunha estudá-la e

entender as regras societárias que

lhe subjaziam. De 1500 a 1850, já

havia muita produção do que se

denominou chamar ciências sociais.

Beccaria já falava em desvio social

entre os fisiocratas franceses e

iluministas. Nesse sentido, há a

criação de múltiplas disciplinas das

PARA

REF

LETI

R

Filosofia política - a influência dos pensadores políti-cos, a exemplo de Montesquieu. Conforme Bottomore (1981), as contribuições da Filosofia da História à So-ciologia assentam-se no aspecto filosófico, as noções de progresso e desenvolvimento, e, no aspecto cientí-fico, os conceitos de períodos históricos e tipos sociais. Teorias biológicas da revolução - tentativa de explicar as fases da evolução social a partir da teoria biológica da evolução (evolucionismo social, darwinismo social). O levantamento social, segundo Bottomore, em si mesmo teve duas fontes: o problema social (a questão da pobreza), oriundo da compreensão de que, nas so-ciedades industriais, já não era um fenômeno natural, um castigo da natureza ou da providência divina, mas o resultado do processo excludente da natureza do ca-pital e da exploração humana. A outra foi a convicção de que os métodos das Ciências Naturais poderiam ser aplicados aos estudos da problemática, dos fenômenos humanos e que estes poderiam ser medidos e classifi-cados, como expressão do conhecimento.

Page 31: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

31PedagogiaUESC

Uni

dade

2

ciências sociais. Inicialmente as ciências sociais eram chamadas

de ciências do estado, englobando a Economia, a História, a

Sociologia, a Antropologia e a Ciência Política. Posteriormente,

a economia e a história criaram autonomia própria em seus

campos disciplinares e as ciências sociais seguiram sua

projeção, preocupadas com as consequências no processo de

modernização das sociedades.

Certamente você, aluno, está se inteirando de que, na

concepção sociológica, existem diversas abordagens teórico-

metodológicas e diferentes caminhos para interpretação da

realidade social. Plasmada nas concepções de autores clássicos,

a abordagem sociológica, na busca da compreensão das

maneiras como a sociedade se estrutura e funciona, pautou-se

na concepção positivista-funcionalista (Auguste Comte, Émile

Durkheim). Essas concepções tentam explicar a sociedade

mediante uma abordagem sistêmica, ou seja, consideram que

a sociedade é como um corpo humano e que todos os órgãos

estão integrados. Através de uma fundamentação analítico-

evolutiva, procura descobrir as normas, as leis que regem a

sociedade, ensejando que a mesma encontre uma ordem

para atingir o progresso. Ou seja, que os problemas advindos

no interior da sociedade são desvios sociais que devem ser

resolvidos a partir de uma superação para etapas sociais mais

evoluídas. Essa perspectiva analítica, embora tenha sido muito

difundida, é considerada atualmente muito polêmica. Primeiro,

por trabalhar com uma abordagem evolucionista e, outra, por

desconsiderar outros elementos que atuam na configuração

social para além dos domínios das instituições sociais.

Já a Sociologia compreensiva (Max Weber), ancorada na

análise histórica e na compreensão qualitativa dos processos

históricos e sociais, distingue o conhecimento científico dos

julgamentos de valores, combinando explicação e compreensão.

A explicação histórica estrutural-dialética (Karl Marx e

Friederich Engels) defende a dinâmica dos modos de produção,

as relações de poder e dominação e, especificamente, analisam

o desenvolvimento do capitalismo, suas contradições e sua

superação na perspectiva da construção da utopia marxista

- a da superação do modelo de sociedade capitalista para a

sociedade socialista.

Você deve notar que todo processo de construção de

Utopia, na concep-ção marxista, é a possibilidade de se alcançar, através de transformações e mudanças estru-turais, outra socie-dade, mais justa, democrática, mais igualitária, sem a exploração do homem pelo homem e não simplesmente algo inatingível, ir-realizável.

Page 32: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

32 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Eentrando no misterioso novo Mundo: modernozação e surgimento da Sociologia

conhecimento envolve interesses, racionalidades, ações e se

reporta à realidade. Neste sentido, as concepções e as análises

dos autores clássicos contribuíram, decisivamente, para a

formação e desenvolvimento da Sociologia como ciência e

disciplina acadêmica, bem como para a base de quase todas as

abordagens sociológicas posteriores.

No âmbito das ciências sociais, a Sociologia é relativamente

uma ciência nova. Diante das crises e transformações sociais,

econômicas, políticas e morais que grassavam nas sociedades

europeias e com a emergência do capitalismo, enquanto modo

de produção dominante, os homens começaram a postular

algumas questões: por que, no capitalismo, que tinha como

base o lucro, a riqueza, o progresso e o desenvolvimento,

exacerbava-se a questão social, isto é, a questão da pobreza?

De que forma as raízes das desigualdades entre os homens são

afirmadas a partir da lógica da organização do trabalho e da

produção capitalista? Como a racionalidade capitalista, pautada

no lucro e na disciplina racional, constitui historicamente o

capitalismo? Como poderiam ser interpretadas as modificações

nas concepções de vida social que o capitalismo provocou?

Bom, você deve estar notando que estavam plantados

questionamentos sobre a estruturação da realidade social

carente de uma explicação científica. O mundo estava

desencantado pela ciência, como afirmava Weber, e já não

se constituía uma explicação convincente aquela fatalista que

imperou na estrutura mental da sociedade medieval: sejais

pobres porque somente os pobres alcançam o reino do céu.

Ou seja, a pregação do conformismo como uma estratégia de

controle, de subjugação, de dominação de estamentos que

detinham o poder político, econômico e religioso.

Como você viu anteriormente, a Sociologia, nas

concepções dos filósofos sociais (Auguste Comte, Spencer), dos

filósofos e historiadores (Abade de Saint- Pierre, Giambattista

Vico, Saint-Simon, Hegel, Ferguson, que ainda não poderiam

ser considerados como cientistas sociais na acepção do termo

que modernamente empregamos), pretendeu, segundo

Bottomore (1981, p. 20-21), ser enciclopédia. Desejou dar

conta de toda a realidade social, ocupar-se da totalidade da

vida social do homem e da totalidade histórica, sob a influência

da Filosofia da História, reforçada pela teoria biológica da

Page 33: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

33PedagogiaUESC

Uni

dade

2

evolução, evolucionista; ciência positiva de caráter idêntico ao

das Ciências Naturais (modelada segundo a Física, a Biologia).

E isto se “evidencia pela concepção amplamente difundida da

sociedade como um organismo vivo”; e, por último, uma ciência

da nova sociedade industrial (“caráter ideológico e científico”),

com um objeto formal de estudo, como todas as ciências na

acepção positivista.

2.2 Afinal, para que serve a Sociologia?

É lugar comum afirmar que a Sociologia tem como

objeto de estudo a sociedade, fato este que não se constitui

uma inverdade. Entretanto, vale ressaltar que as ciências

denominadas, hoje, de humanas, sociais aplicadas, bem como

aquelas que estabelecem interfaces com a vida social, se ocupam

da problemática societária, da vida social. O fundamental é

que você, aluno, perceba que, no desenvolvimento teórico e

metodológico, os sociólogos criaram conceitos mais precisos e

categorias de análises, bem como classificações mais adequadas

para se interpretar os fenômenos sociológicos, que não devem

ser entendidos como meros fatos sociais, mas concebidos

dentro de um contorno, de uma moldura, que proporcionem

explicações e análises indispensáveis para a compreensão,

generalização e resolução de problemas que a vida social

FIGURA 2 - Interações Sociais.

Fonte: UAB/UESC. Ilustração: Sheylla Tomás

A Sociologia é uma disciplina científica e acadêmica que utiliza o cabedal teórico-metodológico para explicar de dentro de seu postulado epistemológico a realidade social. Através de uma técnica de explicação racional do pensamento social, tenta analisar o comportamento humano numa dada organização societária. Compreende que os seres humanos são seres sociais que estabelecem e vivenciam processos, padrões, conflitos sociais diferenciados e em tempos históricos definidos.

Page 34: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

34 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Eentrando no misterioso novo Mundo: modernozação e surgimento da Sociologia

apresenta e a sociedade demanda.

Você, aluno, deve estar se perguntando: para que serve

a Sociologia? Em que ela poderá contribuir para você enquanto

indivíduo e para a compreensão da sociedade? Conforme

Charon (2000, p. 220), devemos considerar o seguinte:

• “ela prepara o indivíduo para diversas ocupações,

ensinando técnicas de pesquisa social, dando ao estudante

sensibilidade para os padrões das organizações e das

interações...”

• “a Sociologia pode ser aplicada à vida da pessoa. Ela ajuda

a entender por que os que estão a sua volta atuam de

determinadas maneiras; a compreender sua própria

identidade, pensamento e ação”.

• “a Sociologia é libertadora; é um passo em direção a termos

mais controle sobre nossa vida... A perspectiva sociológica

revela, no mínimo, ao indivíduo a cultura e a natureza da

sociedade...”

Enfim, você viu que a Sociologia é uma ciência que tem

como objetivo o estudo dos fenômenos sociais, utilizando-se de

métodos, técnicas e conceitos que possibilitam a compreensão

e a interpretação do social.

3 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

O texto elenca a construção do campo disciplinar da

Sociologia como uma referência de explicação da complexidade

das sociedades ocidentais. A exigência de um saber

sistematizado e racionalizado sobre as contradições do sistema

capitalista projetam uma necessidade de se compreender o

comportamento humano no âmbito das relações societárias.

O processo de modernização, como dinâmica comparativa

entre as sociedades ocidentais e não ocidentais e a discussão do

paradigma científico como modelo interpretativo na produção

do conhecimento conduzem à necessidade de novas categorias

analíticas para compreender a realidade. Nesse processo de

mudança social, configuram-se novas formas de racionalização,

Page 35: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

35PedagogiaUESC

Uni

dade

2

lógicas de pensamento que empreendem a entender as regras

que subjazem a estrutura das organizações societárias.

Sociologia é uma disciplina de análise reflexiva que

utiliza o cabedal teórico-metodológico para explicar, de dentro

de seu postulado epistemológico, a realidade social. Através de

uma técnica de explicação racional do pensamento social, tenta

analisar o comportamento humano numa dada organização

societária. Compreende que os seres humanos são seres sociais

que estabelecem e vivenciam processos, padrões, conflitos

sociais diferenciados e em tempos históricos definidos.

Seus instrumentos teóricos e metodológicos constituem

uma compreensão da sociedade e ajudam a analisar o processo

educativo, como prática das relações humanas, preenchidas de

interesses, de incorporações culturais e de legados históricos,

correspondentes a sua manifestação na contemporaneidade.

4 SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS: VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

O saber científico e o uso social são elementos-chave para

os sociólogos, mediados pelo patrimônio teórico e metodológico

e reconhecidos no campo das ciências sociais, uma vez que a

sociologia corresponde a um processo histórico de construção

social.

Como afirma Canário (2005, p. 32), desde o início da

modernidade,

[...] a ação social tende a ser percebida como contida numa fronteira natural, definida pelas fronteiras de cada Estado Nacional. Esse tipo de percepção condiciona a forma de organizar o conhecimento do social, o que permite caracterizar as ciências sociais e a sociologia, em particular, como disciplinas ‘estadocêntricas’, correspondendo à visão simplificada de uma realidade em mutação rápida.

Perceba que o conhecimento produzido pela Sociologia é

um conhecimento metodologicamente controlado, ao observar

um distanciamento com o senso comum, negativamente

marcado pela familiaridade com o social.

De acordo com Castel (2002, p. 33),

Page 36: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

36 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Eentrando no misterioso novo Mundo: modernozação e surgimento da Sociologia

[...] a dificuldade de definir, com clareza e sem ambigüidades, o que é a sociologia, liga-se a uma outra questão que é complemento desta e, igualmente, incômoda: a de saber para que serve a sociologia. Como qualquer outra atividade científica, a sociologia retira a sua pertinência do modo como se inscreve e relaciona com o meio ambiente social em que está inserida. Neste sentido, todo o trabalho de investigação sociológica representa uma resposta, direta ou indireta, a uma ‘procura’ social. Esta procura não significa, de modo algum, circunscrever o trabalho dos sociólogos a uma função instrumental relativamente a encomendas do poder, significa que os sociólogos constroem os seus objetos científicos, a partir de interrogações que têm, como ponto de partida, interrogações mais gerais do ponto de vista social. Nesta perspectiva existem questões que, porque são percebidas como perturbadoras da vida social, apelam à atenção das pessoas comuns, bem como à dos sociólogos, e constituem-se como ‘configurações problemáticas’ para as quais o sociólogo, através do seu trabalho específico, procura construir uma resposta.

Nesta mesma linha de pensamento, Bourdieu (1997, p.

49) concebe que

[...] o primeiro ato de uma ciência social realmente científica consistirá em tomar como objeto de análise a construção social dos objetos de estudo propostos pelas instâncias estatais à sociologia – é o caso, hoje, por exemplo, da delinqüência, dos bairros da periferia, da droga.

SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS:VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

ATIVIDADE

1. A partir dos comentários acima, explique como esses fenômenos sociais podem ser considerados objeto da sociologia.

2. Considerando as mudanças sociais, como poderiam ser interpretadas as modificações nas concepções de vida social que o capitalismo provocou?

Page 37: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

37PedagogiaUESC

Uni

dade

2

FILME RECOMENDADO

Cartaz de divulgação do filme: DAENS - Um grito de justiça

RE

FE

NC

IAS

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1999.

BOTTOMORE, Tom; NISBET, Robert (Org.). História da análise sociológica. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1980.

CANÁRIO, R. O que é a escola? Um “olhar” sociológico. Lisboa: Porto Editora, 2005.

CHARON, Joel M. Sociologia. São Paulo: Saraiva, 2000.

EDER, Klaus. A nova política de classes. Bauru: EDUSC, 2002.

DAENS - Um grito de justiça. Direção: Stinj Coninx. Elenco: Jan Decleir, Gerard Desarthe, Antje de Boeck e outros. Ano de Produção: 1994. País de Produção: Bélgica. Duração: 132 min.

O filme relata o processo de industrialização no norte da Bélgica, especificamente a cidade de Aalst, na qual os trabalhadores da indústria têxtil vivenciam a exploração empreendida pelos capitalistas. Apresenta, de forma clara, as contradições entre o capital e trabalho, mostrando a utilização da força de trabalho das mulheres e de crianças no processo de produção. Essa situação começa a ser questionada com a chegada de Daens, padre revolucionário, que é transferido para a cidade e assume a igreja local, contribuindo o mesmo para uma luta por direitos políticos e sociais.

Page 38: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 39: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Possibilitar, ao aluno, uma reflexão sobre a teoria sociológica e suas perspectivas interpretativas da educação e da escola.

Discussão das concepções teóricas de Durkheim e suas contribuições para a compreensão da educação.

Meta

Objetivo

3 unid

ade

OS CLÁSSICOS DA SOCIOLOGIA: ÉMILE DURKHEIM

Page 40: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 41: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

41PedagogiaUESC

Uni

dade

3

UNIDADE III

1 INTRODUÇÃO

Nesta unidade, você estudará a contribuição da Sociologia

moral de Durkheim, um dos autores da tríade dos clássicos da

Sociologia que mais se debruçou sobre a questão da sociologia

da educação. É reconhecido como precursor desse campo

disciplinar e inaugura uma sociologia da educação, focada nos

princípios morais.

Page 42: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

42 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

2 ÉMILE DURKHEIM - ELABORAÇÕES INICIAIS DO AUTOR: UM CONVITE À SOCIOLOGIA DA MORAL

Émile Durkheim é o

pioneiro da formulação da teoria

sociológica e foi extremamente

influenciado pelo cientificismo do

século XIX. Nesse sentido, sua

abordagem se preocupa em alçar a

sociologia a um status de ciência, a

partir, principalmente, do modelo

de investigação científica das

ciências naturais. Sua pretensão é

apresentar a sociologia como uma

ciência positiva, com um estudo

metódico, seguindo métodos

adequados de investigação,

separando a teoria da prática, ou seja, dotar a sociologia de

uma sólida base empírica. Se para esses cientistas as leis da

natureza são passíveis de constituição de conceitos universais,

com leis próprias, para Durkheim, a sociedade, a partir de sua

vida coletiva, também é passível de construir suas leis próprias,

independente da vontade humana, o que ele chamaria de leis

sociais. Uma das críticas que esse autor sofre é justamente por

tentar comparar as ciências sociais com as ciências da natureza.

As críticas observam que são objetos diferentes entre si, não

podem usar os mesmos métodos de investigação e o mesmo

grau de generalizações nas construções dos seus conceitos.

Observe, você, aluno, que Durkheim é um dos

precursores da Sociologia científica. Procurou, através das suas

formulações teórico-metodológicas, empreender a observação

científica da sociedade e de suas instituições. Oriundo de

uma tradição filosófica positivista, fundamentou-se na razão

humana e na sua capacidade de experimentação e observação

como a maneira de se chegar à verdade científica. Para o autor,

o método sociológico deveria possibilitar meios para atingir

o conhecimento específico sobre como a sociedade funciona.

Desta forma, o objetivo básico era descobrir as leis, as normas,

a moral que regem a vida societária. Por outro lado, na teorização

durkheimiana, encontra-se uma preocupação, estruturante em

PARA

CO

NH

ECER

FIGURA 1 - Émile Durkheim

Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Emile_Durkheim.jpg

Émile Durkheim nasceu em Épinal, província da Lorena, em 15 de abril de 1858, e faleceu em Paris, em 15 de novembro de 1917. Foi o fundador da escola francesa de sociologia, sendo considerado um dos pais da sociologia. Ao delimitar um objeto para a sociologia, estruturou as bases científicas, teóricas e metodológicas para essa nova ciência social.

Page 43: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

43PedagogiaUESC

Uni

dade

3

sua obra, que é a decomposição moral da sociedade.

Em verdade, Durkheim preocupou-se em definir um

objeto de estudo e um método para a Sociologia, concebendo,

conforme a leitura positivista, a sociedade como um organismo

social que poderia ficar ‘doente’ e ‘sadio’. Com vista à

possibilidade destes estados, a Sociologia, como instrumento e

recurso científico, tinha por finalidade explicar os mecanismos

de funcionamento da vida social e intervir na sua engrenagem

e no seu funcionamento através da aplicação de ‘remédios’ que

minorassem os males sociais.

Você deve estar percebendo que a sociologia como ciência,

de certa maneira, tinha uma função curativa, configurando-

se como uma ‘medicina social’. Na medida em que o mundo

moderno consolidava uma redução da eficácia de determinadas

instituições sociais que mantinham a ordem, o progresso moral

e a coesão social, fato este que implicava no desaparecimento de

valores, Durkheim estava preocupado com o papel e as funções

das instituições sociais no contexto da sociedade, a exemplo da

função social da educação, da religião, da família. Em verdade,

sentia o autor a necessidade de assegurar uma nova moralidade

consonante com as mudanças, transformações e crescimento

industrial e econômico insurgentes nas sociedades europeias

ocidentais, com vista ao não esgarçamento do tecido social,

como afirmava.

A comunhão de valores morais é, para Durkheim, a

condição fundamental para sedimentar a construção da coesão

social. Para ele, a moral, ou seja, conjunto de valores e juízos

que orientam a vida social é a síntese que une os indivíduos à

vida em grupo, na medida em que se materializam em regras

e normas, as quais paulatinamente orientam a conduta social e

vão condicionando a integração social, sem a qual as sociedades,

as coletividades viveriam em desarmonia.

A abordagem sociológica de Durkheim, como você já viu,

parte da premissa básica de que só é possível compreender as

relações entre os homens se compreendermos a sociedade que os

obriga e a função das instituições e das representações sociais

modeladas a partir de uma moral edificada socialmente.

Vamos explicar melhor o caminho intelectual a que o

autor nos conduz: segundo Durkheim, a Sociologia vai se

voltar para a observação dos fenômenos sociais ou fatos

SAIBA MAIS

R

AAC

a FU V

MK

Segundo a explicação de Durkheim, o estado doente é caracterizado pela existência de fatos que colocam em risco a harmonia, a coesão social, o consenso, as convenções e a convivência social, consequentemente o processo de evolução e coesão da sociedade. Ex. criminalidade. O estado sadio configura o estado de coesão e consenso social, harmonia, ou seja, implicados com a normalidade, com a conformidade social.

ATENÇÃO

Numa perspectiva fun-cionalista, instituição social é a composição de padrões de conduta duradouros que cada sociedade constrói, a exemplo da família, da moeda, da herança, do Estado, da religião.

Page 44: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

44 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

sociais dentro de um processo de construção coletiva de cada

sociedade, promovida pelos sistemas de valores. Esses modos

de agir influenciam e exercem uma coerção exterior para além

da vontade do próprio indivíduo.

Vamos exemplificar: você gostaria de usar determinado

tipo de roupa que destoa do padrão, do modelo do seu grupo,

contribuindo para o policiamento ostensivo das pessoas: da

família, dos amigos, dos indivíduos em geral? Suas referências

culturais se manifestam potencialmente nas suas aspirações

pessoais. Outro exemplo: às vezes existem momentos da vida

em que você pensa em agredir as pessoas que são próximas

a você, mas se contém porque observa que, para além das

sanções penais, sua moral também reconhece que sua

liberdade está cerceada pela liberdade do outro. Você não pode

fazer o que dá na sua cabeça... Isso porque você aprendeu,

foi educado a agir conforme essa vontade da sociedade, não

só pela escola, considerando que educação não é prerrogativa

da escola. Qualquer ação individual que fuja desse consenso

coletivo é considerada pelo autor como desvio social e deve

sistematicamente ser punida para garantir a harmonia social.

Aqui também o autor é alvo de consideráveis críticas, ao tomar

como desvio as ações que não compactuam com a dada ordem

social. Que ordem é essa? A quem se destina? A quem privilegia?

Essa vontade é passível de questionamentos, não é?

Para Durkheim, é imprescindível a existência de um

consenso e essa conformidade é construída pela cooperação

entre os indivíduos para uma vida social, ou o que ele também

chama de solidariedade. Esse é um conceito importante do autor,

na sua acepção de uma sociedade harmônica. O conceito de

solidariedade está atrelado à divisão social do trabalho. Nessa

divisão, o autor chama a atenção para as distinções sociais,

nas sociedades, a partir de sua percepção com o trabalho. Uma

sociedade com pouca divisão, uma sociedade não complexa,

em que as relações de divisão do trabalho sejam mais simples,

o autor observa um tipo de solidariedade entre os indivíduos

– solidariedade mecânica. Essa solidariedade está baseada

nas semelhanças entre os modos de trabalho do grupo social.

Numa comunidade quilombola, por exemplo, o grupo realiza

basicamente as mesmas tarefas de trabalho: caçam, plantam

etc.

Page 45: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

45PedagogiaUESC

Uni

dade

3

Numa sociedade mais complexa, como a atual, por

exemplo, em que as diferenciações no mundo do trabalho são

altamente sofisticadas, infinitas, é o que ele vai chamar de

solidariedade orgânica. Essa solidariedade não mais é dada pela

semelhança, mas pela extrema diferenciação, pois o grau de

divisão é otimizado nas sociedades contemporâneas, sobretudo

com a radicalização do capitalismo. Você precisa se integrar ao

outro porque, numa sociedade complexa, cada um realiza um

tipo de trabalho, onde um vai depender do outro.

Para os que criticavam Durkheim com relação a sua

perspectiva harmoniosa e funcionalista da sociedade, ele

se defende a partir da consideração dessa diferenciação

da sociedade – da existência de um tipo de cooperação na

diferença, a partir da solidariedade orgânica, ou seja, ninguém

pode acusá-lo de não reconhecer a existência dessa distinção.

O autor considera que temos uma representação dos

fatos sociais individualizada, mas as representações que

se cristalizam são frutos de uma representação coletiva,

pois nos detemos a experimentá-las a partir da convivência

no nosso meio (familiar, comunidade, escola, trabalho...).

Embora tenhamos nossas representações individuais (nossas

convicções, opiniões, impressões), a de maior importância

social são as representações coletivas, aquelas que gerimos

a partir de nossa inserção na vida social. Inclusive porque as

representações individuais sofrem influência dessas expressões

de um coletivo, de um consenso moral e cultural. São as duas

partes que temos: aquilo que elaboramos a partir de nossas

experiências pessoais e aquilo que trazemos dos outros, a partir

da nossa convivência em grupo.

É claro que construímos nossas próprias percepções

do mundo, mas a influência dessas referências externas tem

um peso em nossa vida e vai variar muito o grau de inserção

desses domínios, de uma sociedade para outra. Mesmo os

mais resistentes, em determinadas situações, sucumbem às

influências externas pela relação afetiva que temos com as

coisas e com as pessoas. Pensa Durkheim assim.

Para compreender melhor essa construção teórica, deve-

se observar que, para Durkheim, o ser humano se constitui

por duas partes: os estados mentais de sua vida pessoal:

suas lembranças, memória, experiências dentro de uma dada

Page 46: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

46 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

sociedade e ou suas experiências com outras sociedades. A

outra parte se constitui por um sistema de ideias e de hábitos

que exprimem os diferentes grupos sociais, suas tradições

culturais, nacionais, profissionais e referências religiosas.

Isso não parece muito simples, não é? Pois é, carece

de restaurar uma lógica cartesiana, por isso sua aproximação

das ciências naturais, distanciando-se do objeto de estudo,

para não se contaminar com as primeiras impressões ilusórias

dos fenômenos. Então é necessário tratar os fenômenos como

coisas, para se livrar das pré-noções, dos preconceitos etc.

“Coisa”, para Durkheim,

[...] é todo objeto de conhecimento que a inteligência humana não penetra de modo imediato, necessitando o auxílio da ciência. Tratar os fatos sociais como coisas, portanto, é uma postura intelectual, uma atitude moral (RODRIGUES, 2005 p. 20).

3 O QUE ISSO TEM A VER COM A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO?

Bom, compreendendo esse percurso teórico inicial,

você já deve ter observado que o autor considera que o

indivíduo está dotado de uma formação pessoal construída

pelos sistemas de valores. E, sendo a educação um sistema de

valor, principalmente, dada sua importância para o processo de

socialização dos indivíduos, o referido autor tem considerável

importância na sociologia da educação. Veja suas elaborações

teóricas sobre a educação e a sociologia:

Sua concepção de educação está ligada a uma

concepção de socialização, em que os adultos transferem e

produzem conhecimentos com as crianças no seu processo de

formação. Afinal, são os adultos que nos iniciam no processo de

conhecimento do nosso meio. A primeira infância, por exemplo,

é de total dependência. É aprender a ser membro da sociedade,

e aprender a ser membro da sociedade é aprender o seu devido

lugar nela. “Só assim é possível preservar a sociedade. Preservá-

la inclusive de sua própria diferenciação” (RODRIGUES, 2005

p. 28). Para Durkheim, o conceito de educação assumiu várias

nuances dentro do processo histórico da humanidade, de acordo

Page 47: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

47PedagogiaUESC

Uni

dade

3

com seu momento histórico e com as concepções culturais de

cada sociedade. Essa construção nas estruturas sociais altera

também as concepções educativas.

Você está percebendo que a educação, na leitura

durkheimiana, expressa uma doutrina pedagógica ancorada na

relação entre a sociedade e o ser social. Ao nascermos, somos

indivíduos e a vida social vai-nos transformando, através da

socialização, em seres sociais. Eivado ainda de uma ideia de

Hobbes, acredita Durkheim que o homem é, em sua natureza,

egoísta e, portanto, precisa ser preparado para a vida, cabendo

à educação agregar ao ser humano uma natureza capaz de vida

moral e social. Esta preparação se dá por uma ação educativa,

realizada pelas instituições sociais, a exemplo da família, das

práticas religiosas e, primordialmente, da escola.

Vale ressaltar que a transformação do indivíduo em

ser social é uma condição determinante para se viver em

conformidade com os padrões de consenso social e impõe-se,

no âmbito das relações societárias, coercitivamente, regulando

a conduta e institucionalizando a moral social, permitindo,

desta forma, uma maior integração do indivíduo e também uma

forte identificação com o sistema social. Evidentemente, para

Durkheim, a educação não é um elemento para a mudança social,

senão uma prática social fundamental para a manutenção, a

conservação e o funcionamento do sistema social.

Abordando a educação como um fato social, que você

já percebeu, a concepção durkheimiana rejeita a interpretação

da psicologia. Por um lado, no intuito de empreender uma

leitura eminentemente sociológica dos fatos sociais, ou seja, de

demarcar um objeto formal para a Sociologia enquanto ciência,

afirmando que era possível interpretar os fatos e a problemática

social sob o viés da nova ciência que estava se configurando

e, por outro, por conceber que os conteúdos da educação são

formulações que dependem da consciência coletiva, adquirindo

certa generalidade, consequentemente, independem das

vontades individuais. Expressam, neste sentido, normas e

valores desenvolvidos e institucionalizados, quer dizer, aceitos

socialmente, por uma sociedade que, em determinados

momentos históricos, adquirem natureza própria, tornando-se,

assim, ‘coisas’ exteriores, coisas que estão fora dos indivíduos.

Essas normas e valores que estão implicados na

Page 48: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

48 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

formação moral do ser social são transmitidos e assegurados

pela autoridade da família, e, principalmente, pelo educador,

que deve ser neutro e imparcial e transmissor da moral social.

Ciente de que o ser social necessita dominar a si mesmo

e impor limites aos seus desejos, sem os quais não poderia ser

feliz, Durkheim enfatiza que o princípio moral deveria ser visto

como sendo ações que perseguem fins impessoais e que se

consolidam entre as consciências coletivas.

Você está percebendo que a educação não tem,

simplesmente, a função de proporcionar conhecimento e

enaltecimento do espírito, mas assegurar a disciplina, o dever

e a conformidade (evitar as contradições entre interesses

individuais e coletivos), o pertencimento do ser social ao

grupo (desenvolver no indivíduo a personalidade quanto ao

desempenho de um papel social útil) e sua autonomia (transmitir

as múltiplas e complexas aptidões que a vida social requer e

não são transmitidas pela via hereditária). Os fins e funções

sociais da educação estão ligados à integração do indivíduo

à sociedade, constituindo o ser social em cada indivíduo.

Conforme Durkheim (1997, p. 54), “a educação tem o objetivo

superpor ao ser que somos ao nascer, individual e associal, um

ser inteiramente novo que ultrapassa a natureza individual”.

Partindo deste pressuposto, assegura Durkheim (1973,

p. 47):

[...] a criança só pode conhecer o dever através de seus pais e mestres. É preciso que estes sejam para ela a encarnação e a personificação do dever. Isto é, que a autoridade moral seja a qualidade fundamental do educador. A autoridade não é violenta, ela consiste em certa ascendência moral. Liberdade e autoridade não são termos excludentes, eles se implicam. A liberdade é filha da autoridade bem compreendida. Pois, ser livre não consiste em fazer aquilo que se tem vontade, e sim em se ser dono de si próprio, em saber agir segundo a razão e cumprir com o dever. E justamente a autoridade de mestre deve ser empregada em dotar a criança desse domínio sobre si mesma.

Dentro de um mesmo período histórico, podemos observar

diferentes concepções educativas, em razão das diferenças

culturais. Uma concepção de educação numa sociedade

militarizada, como a sociedade espartana, é muito diferente

SAIBA MAIS

R

AAC

a FU V

MK

Uma das bases da compreensão soci-ológica sobre a edu-cação tradicional, con-servadora, está as-sentada na teorização durkheimiana, a qual, mesmo depois de sofrer todo um processo de críticas e desconstrução, encontra-se ainda muito presente nas nossas escolas.

Page 49: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

49PedagogiaUESC

Uni

dade

3

de uma sociedade política, como a sociedade ateniense, onde,

para a primeira, a virtude da sociedade centra-se no corpo e

na vitória. Por conseguinte, as instituições escolares estariam

voltadas para a construção de uma sociedade guerreira, forte,

obediente, marcada por uma educação militarizada. Já na

sociedade ateniense, por exemplo, a virtude do homem está

na sua retórica, no seu domínio de uma concepção política da

sociedade, onde as instituições sociais fomentam um cabedal

de instrução humanística, voltada para a construção de uma

sociedade política.

Outro exemplo, a partir das evidências históricas, é

FIGURA 2 - A Escola de Athenas. Afresco do pintor renacentista italiano Rafael Sanzio (1483-1520), retrata importantes pensadores da Antiguidade. Ao centro, caminhando estão Platão (esquerda) e Aristóteles (direita).

Fonte: UAB/UESC

considerar as diferenças dos modelos educativos de uma

sociedade renascentista ou romana. A escola hoje, ainda que

se tenha muita herança das práticas pedagógicas jesuíticas

(memorização etc.), é muito diferente de uma de 1650, por

exemplo. Para Durkheim, isso ocorre em razão de os sistemas

educativos não serem produzidos por uma consciência

individual, mas sim por uma consciência coletiva, geracional

das sociedades, que muda, se altera, se transforma a partir da

aquisição de conhecimentos.

Pode-se antever que a educação, na abordagem

Page 50: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

50 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

durkheimiana, constitui um processo de transmissão e

perpetuação cultural no sentido amplo do termo (valores,

normas, atitudes, experiências, imagens, representações),

cuja função principal é a reprodução do sistema social. Nesse

sentido, Durkheim (1973, p. 52) afirma:

Em resumo, longe de a educação ter por objeto único e principal o indivíduo e seus interesses, ela é antes de tudo o meio pelo qual a sociedade renova perpetuamente as condições de sua própria existência. A sociedade só pode viver se dentre seus membros existe uma suficiente homogeneidade. A educação perpetua e reforça essa homogeneidade, fixando desde cedo na alma da criança as semelhanças essenciais que a vida coletiva supõe.

Durkheim comparou todos os sistemas educativos e

analisou que não existe sistema educacional que não tenha

duplo aspecto: uno e múltiplo. Para ele, o sistema educacional

prioriza fixar as ideias nas consciências dos educandos a partir

das concepções de dever, do direito e da natureza humana – é

a construção coletiva dos sistemas de valores.

Segundo o autor, a educação é a ação exercida por

adultos sobre as gerações que ainda estão despreparadas para

a vida. Busca impor às crianças determinados números de

estados físicos e morais reclamados pela sociedade. O indivíduo

se constitui, gradativamente, a partir da experiência que

adquiriu ao longo do curso de sua vida. O ser social não nasce

espontaneamente, ele é construído dentro de um processo, a

partir da sua convivência pessoal e coletiva, num determinado

sistema de valores, crenças e moral. Por isso os indivíduos

respeitam as leis políticas e morais, a partir de um consenso

coletivo, representado pelo reino social, ou seja, o reino moral,

constituído por ideias e ideais coletivos. Toda vida social, para

esse autor, se dá nesse meio moral. O autor concebe esse meio

moral como uma confluência de sistemas de valores promovida

pelos fenômenos sociais, a exemplo da religião, da moral, do

direito, da economia e da educação. A educação assim satisfaz,

antes de tudo, às necessidades sociais.

Outra questão polêmica do autor é o entendimento

da educação sob o viés da coercitividade. Essa percepção

do autor é fruto da sua crença absoluta na possibilidade de

Page 51: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

51PedagogiaUESC

Uni

dade

3

uma conformidade social entre os indivíduos, uma vez que

todos devem observar os sistemas de valores vigentes. Essa

perspectiva teórica trabalha com a ideia de um funcionamento

coeso e harmônico das sociedades, em que a educação será

imprescindível para a garantia desse consensual coletivo. É o

que alguns críticos chamam de visão funcionalista da sociedade,

como você já viu na Unidade I.

O caráter social da educação consiste na socialização

metódica das novas gerações, distinguindo o ser individual e

a constituição dos estados mentais. A educação confunde-se

com o próprio processo de socialização, considerando que o

conhecimento cooperativo adquirido em uma geração é o que o

homem foi capaz de acumular e encontrar meios de transmitir

indefinidamente pelas gerações. Para Durkheim, a educação

é o que distingue os homens de outros animais e o que faz

superar-se diante dos seus próprios limites.

O autor valoriza o papel do Estado para a educação,

uma vez que a escola é uma instituição social com funções

específicas, voltada para a preparação de atitudes das gerações

futuras, para moldar, com ações práticas, as gerações mais

recentes no convívio de uma dada sociedade. Embora Durkheim

considere que, nas diferentes sociedades, houve formas

diversas de processar a educação, ele considera que existe uma

base comum entre as sociedades, pois não existe povo que não

sistematize certo número de ideias, sentimentos e práticas que

a educação devesse ressaltar.

Durkheim entendia a educação como uma ação diferente

da ação da pedagogia. Para ele, a educação tem um caráter

prático no processo de aprendizado e a segunda teria como

foco principal as teorias relacionadas a uma atividade para

processar a educação. Segundo o autor, os pedagogos clássicos

consideravam o processo pedagógico a partir de uma concepção

de um modelo único de educação, independente das condições

sociais e históricas. Para ele, não há uma só sociedade, a

educação é o processo da própria sociedade. É o meio pelo

qual a sociedade se renova, perpetuando as condições de sua

própria existência. Os fins da educação são fins sociais e os

meios pelos quais esses fins podem ser plenamente atingidos

devem ter, necessariamente, caráter social. Durkheim, hoje,

seria resistente a uma percepção da educação enquanto uma

SAIBA MAIS

R

AAC

a FU V

MK

O Estado, para Durkheim, é uma ins-tituição social voltada para a disciplina moral orientadora da conduta dos indivíduos na so-ciedade.

Page 52: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

52 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

mercadoria, por exemplo, uma vez que são lógicas distintas.

Então, para quem comunga com a abordagem teórica de

Durkheim, deve, antes de tudo, acreditar que é possível captar

o objeto de estudo, distanciando-se dessa vivência social, e

deve considerar a educação um sistema de valores que vai dar

conta de socializar os indivíduos integralmente, de modo que

ele trafegue nas redes sociais de forma harmônica. Vamos ao

próprio autor para clarear isso:

A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações que não se encontram ainda preparadas para a vida social; tem por objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no seu conjunto, e pelo meio moral a que a criança, particularmente, se destine (DURKHEIM, 1978, p. 28).

Vale ressaltar que existem outras elaborações teóricas do

autor, com categorias de análise importantes para a investigação

sociológica; contudo, estamos limitando-nos a apresentar uma

abordagem sucinta e inicial de Durkheim para a sociologia da

educação.

4 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

A obra de Durkheim marca o nascimento da

institucionalização da Sociologia clássica. Durkheim aconselhava

o cientista a estudar os fatos sociais como coisas, fenômenos

que lhe são exteriores. A generalidade de um fato social

representava, para Durkheim, o consenso social e a vontade

coletiva.

A escola é uma instituição com funções específicas

para uma educação moral. A sociedade, para Durkheim, é

percebida como uma organização de funções, assegurando a

sua integração através de diversos órgãos e instituições. Essa

é uma perspectiva caracterizada por funcionalista, na qual

a escola desempenha papel fulcral na integração social e na

preservação da anomia.

Page 53: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

53PedagogiaUESC

Uni

dade

3

As atitudes das gerações adultas para moldar com

ações práticas as gerações mais recentes ao convívio de uma

sociedade são um dos componentes básicos do caráter moral

da educação. Sua obra tem como problemática principal a

integração social, na qual ele encara essa integração como

uma socialização metódica dos indivíduos. Esse seria o melhor

caminho, segundo o autor, para evitar a anomia social.

SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS:

VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

5 6 REFERÊNCIAS

SAIBA MAIS

R

AAC

a FU V

MK

Anomia social é um termo usado por Durkheim, e também Robert Merton, para explicar a ausência do cumprimento das regras sociais, uma vez que se considera que toda sociedade é regulada por normas. Quando essas regras são dissolvidas, a sociedade encontra um estado de anomia, de desintegração de suas regras.

FILME RECOMENDADO

EM NOME DE DEUS

Direção: Peter Mullan. Produção: Frances Higson. Elenco: Geraldine McEwan, Anne-Marie Duff, Dorothy Duffy, Nora-Jane Noone e EileenWalsh. Local de publicação: Inglaterra, Produtora: Miramax Films / Europa Filmes , 2002. DVD.

O filme retrata o cotidiano de jovens e adolescentes submetidas a uma educação rígida e extremamente moralista sob os desígnios dogmáticos de um convento irlandês. A coerção exercida sobre essas jovens traça seus destinos, mas também apresenta uma reação a uma estrutura societária determinista, colocando em questão o determinismo social. Observe as capacidades individuais de superação e de submissão.

Cartaz de divulgação do filme: EM NOME DE DEUS

ATIVIDADE

Considere o que foi exposto acima e faça as seguintes atividades:

1. Apresente o duplo aspecto da educação concebido por Durkheim, identificando as funções sociais da educação.

2. Faça um comentário crítico sobre o conceito de educação do autor.

Page 54: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

54 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Emile Durkheim

RE

FE

NC

IAS

DURKHEIM, Emile. As regras do método sociológico. São

Paulo: Editora Nacional, 1972.

DURKHEIM, Emile. Da divisão do trabalho social. Rio de

Janeiro: Martins Fontes, 1997.

DURKHEIM, Emile. Educação e sociologia. São Paulo:

Melhoramentos, 1978.

DURKHEIM, Emile. Coleção Os Pensadores. São Paulo:

Abril Cultural, 1980.

RODRIGUES, A. T. Sociologia da Educação. 6. ed. Rio de

Janeiro: Lamparina, 2007.

Page 55: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 56: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 57: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Possibilitar ao aluno uma reflexão sobre a teoria sociológica e suas perspectivas interpretativas da educação e da escola.

Discussão das concepções teóricas de Weber e suas contribuições para a compreensão da educação.

Meta

Objetivo

4 unid

ade

OS CLÁSSICOS DA SOCIOLOGIA: MAX WEBER

Page 58: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 59: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

59PedagogiaUESC

Uni

dade

4

UNIDADE IV

1 INTRODUÇÃO

Nesta unidade, você terá a oportunidade de analisar a

contribuição de Max Weber para a Sociologia da educação, a

partir de seu método compreensivo.

Page 60: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

60 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

2 WEBER: UMA VIAGEM NA SOCIOLOGIA COMPREENSIVA

A contribuição teórico-

metodológica de Max Weber é de

fundamental importância para a

sedimentação da sociologia como

ciência e para a compreensão e a

interpretação dos valores aos quais

os atores aderiram na vida societária

e as obras que construíram.

Entretanto, as contribuições

abrangem não somente a sociologia,

mas também algumas áreas de conhecimento como o Direito, a

Antropologia, a Economia e a Pedagogia.

Para Weber, o que predomina, na sociedade capitalista,

além da divisão em classes sociais e do mercado, é a

racionalização, o prestígio social e as associações de prestígio

ou de status dentro das classes. Diferente de Durkheim, não

tem a preocupação de comparar as ciências naturais e as

ciências sociais, na medida em que considera que o método

generalizante se afasta da realidade em algum sentido; até

porque o autor não considera a existência de grandes diferenças

lógicas entre essas ciências.

A preocupação do autor é uma compreensão da realidade

a partir de uma determinada subjetividade nas ações sociais.

Para Weber, tanto o mundo natural como o mundo social são

constituídos de fontes inesgotáveis de acontecimentos. Por

conseguinte, a essência da sociologia não é encontrar leis

gerais do comportamento social humano, é necessário, sim,

compreender em seu contexto de sistema subjetivo e, assim,

compreender interpretando a ação social, explicando-a

casualmente.

Para explicitar melhor o que o autor chama de ação

social, vamos a sua definição:

[...] A ação que especificamente tem importância para sociologia compreensiva é, em particular, um comportamento que: 1. está relacionado ao sentido subjetivo pensado daquele que age com referência

Ação social é a ação dotada de sentido e significado próprios que os atores sociais atribuem a sua conduta, correlacio-nando-os com o comportamento dos demais indivíduos.

PARA

CO

NH

ECER

Maximillian Carl Emil Weber, intelectual alemão, jurista, economista, nasceu em Erfurt, em 21 de abril de 1864, e faleceu em Munique, em 14 de Junho de 1920. É considerado também como um dos fundadores da sociologia. Sua produção teórica e metodológica possibilitou a compreensão dos processos de racionalização e de dominação

do mundo moderno.

Figura 1 - Max Weber (1984)

Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Max_Weber_1894.jpg

Page 61: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

61PedagogiaUESC

Uni

dade

4

ao comportamento de outros; 2. está co-determinado no seu decurso por esta referência significativa e, portanto, 3. pode ser explicado pela compreensão a partir deste sentido mental (subjetivamente) (WEBER, apud RODRIGUES, 2007, p. 54).

É uma conduta humana em que o sujeito (ou sujeitos) da

ação lhe atribui um sentido subjetivo, com um sentido dentro

das relações sociais. Esse sentido deve ser compreendido,

apreendido a partir de uma compreensão da realidade. Não é uma

coisa em si, estanque, dotada de um conceitual universalizante,

mas ela se determina a partir de uma compreensão que se

aplica sobre ela.

Exemplo: Você tem uma determinada compreensão

sobre casamentos monogâmicos e outras culturas orientais

têm outras. A compreensão dessas ações deve observar

mecanismos e construções subjetivos que dizem respeito aos

sentidos e significados que determinadas culturas imprimem

às relações sociais. Assim, cada cultura expressará um olhar

sobre a ação social.

Um exemplo mais fácil, então: quando você vai para a

escola, está realizando uma ação social. O que o faz ir para a

escola? É uma racionalidade que pode ter diversos motivos,

mas que implica num cálculo, num planejamento de sua vida na

sociedade. Comumente, nem reparamos nisso, mas realizamos

a ação social dentro de uma condensação de expectativas

recíprocas ou como imposições mediante sanção. Ou seja,

para Weber, o indivíduo leva em consideração, no momento

de agir, o comportamento dos outros, e isso também implica

em se relacionar com as normas sociais consolidadas vigentes,

institucionalizadas, que vão interferir sobre o seu agir.

Como você está percebendo, os comportamentos dos

atores são interpretados como sendo dotados de intencionalidade,

como sendo ações orientadas pelas ações de outros. Bom, daí

você deve imaginar que, se é desse modo, cada um compreende

a realidade de acordo com suas referências.

Esse tipo de conclusão procura entender a realidade a

partir de uma perspectiva positivista, ou seja, procura um grau

de conceituação universalizante, a partir de conceitos gerais,

leis gerais que se apliquem para o social, assim como leis

gerais para as ciências da natureza. Você está começando a

ATENÇÃO

A compreensão do sentido que os indivíduos dão a sua conduta é uma preocupação weberiana. Em verdade, Weber procurava explicar, com-preender e interpretar o significado, as intenções e as motivações das condutas humanas.

Page 62: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

62 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

perceber as distinções teóricas entre os autores? Weber nega

que o conhecimento possa ser uma cópia ou reprodução total da

realidade, pois a considera infinita e inesgotável. Para o autor,

as ciências humanas centram seu interesse no ser humano e,

nesse sentido, manterão uma relação com os conceitos gerais

diferenciados das ciências naturais. Se, nas ciências naturais,

as leis mais valiosas são as universalizantes, gerais, nas

ciências humanas, para esse autor, as leis mais gerais são as

mais vazias de compreensão, pois se afastam da realidade a

ser compreendida, não se consegue captar o sentido que está

mergulhado na subjetividade da ação.

Concebia Weber que o processo histórico de racionalização

empreendido pelos seres humanos sobre o mundo foi

significativo para estruturação da ciência positiva e racional.

Esta é uma condição fundamental para o constante progresso

do conhecimento científico, na medida em que o conhecimento

é uma busca incessante dos homens, ele é universal e infinito.

Entretanto, para se alcançar a objetividade do conhecimento,

a objetividade científica, há que se separar a ação prática da

ação científica.

Vamos para outro exemplo: Você trabalha. Ir ao trabalho

é uma ação social que você realiza dentro de um conjunto de

interações: ali estão colegas de trabalho, lógica laboral etc. e, é

óbvio, com determinados interesses. Você inicialmente poderia

dizer, lógico, preciso ganhar dinheiro para me manter, manter

minha família... mas existem outros interesses em jogo nas

relações de trabalho: o tipo de trabalho, as relações com a

empresa, com os colegas, as condições laborais, sua necessidade

de ocupar um espaço reconhecido, sua preocupação com o

status social etc. Ou seja, você tem uma racionalidade que lhe

permite calcular esses interesses e agir segundo suas projeções,

dentro dessas outras realidades que cercam. Dependendo de

sua racionalidade, você vai imprimir outras necessidades na

sua ação inicial de trabalhar. Estudar mais, por exemplo, fazer

um determinado curso... enfim, cada indivíduo se cerca de uma

racionalidade para construir e reelaborar uma determinada ação

social. Essa racionalidade é que deve ser captada pelo cientista

para se descobrir o sentido da ação social. E, é claro, você

pode agir de acordo com essa racionalidade que não poderá

desprezar, das expectativas recíprocas no jogo de interação

SAIBA MAISR

AAC

a FU V

MK

Concebia Weber que a ciência deveria se separar dos valores. Uma coisa é a esfera da política, in-fluenciada pela paixão, pelos valores; outra coisa seria o mundo da ciência, objetivo, imparcial, neutro em constante busca da verdade, Consequentemente, o cientista deveria estar pautado na neutralidade axiológica (neutralidade quanto aos valores).

Page 63: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

63PedagogiaUESC

Uni

dade

4

social, de acordo com as regras sociais, uma vez que existe

uma ordem social.

Para Weber, não é qualquer pessoa que pode apreender

esse sentido da ação social. Somente o cientista social pode

capturá-la de acordo com o método por ele realizado. Então

essa história de ver a realidade, o fato social, como uma coisa

é complicada..., pois aquilo que você vê numa determinada

ação, não necessariamente é o mesmo que o outro vê num

mesmo meio cultural... E pode até

nem ser um fenômeno social, na

medida em que eu não observo

assim... Usando o mesmo exemplo do

casamento, anteriormente aplicado,

para as sociedades ocidentais,

os casamentos poligâmicos são

considerados um absurdo, é uma

traição para com as esposas. Em

algumas sociedades orientais, isso

não só não é considerado traição,

mas pode ser considerado um valor,

uma virtude na sociedade.

Isso ocorre porque a apreensão dessa realidade é dada a

partir do sistema de valores (parece que aqui chegamos a uma

aproximação com o pensamento de Durkheim...), esse mesmo

sistema de valores que é construído socialmente nas diferentes

realidades sociais e que é compartilhado e socializado de forma

subjetiva, de diferentes formas, pelos indivíduos, conforme a

interação, a aceitação desses valores por eles apreendidos.

Weber vai dizer que essas distintas formas de captação dos

sistemas de valores, assumindo significados diferentes nos

indivíduos (exemplo do casamento), ocorrem em razão

dos diferentes tipos de racionalidades que os indivíduos se

constituem na absorção dessas referências culturais e sociais.

Sendo assim, Weber também vai dizer que essa apreensão

da realidade, para compreender uma determinada ação, precisa

ser dotada de método, por isso não pode ser realizada por

qualquer um. “O objeto do conhecimento social não se impõe

já dado à análise, mas é constituído nela própria, através dos

procedimentos metódicos do pesquisador” (COHN, 1979, p. 20).

Qualquer que seja o método, o cientista deve fazer um corte

FIGURA 2 - Fonte: http://www.sxc.hu/browse.phtml?f=download&id=967285

Page 64: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

64 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

do real para estabelecer seu objeto, não é possível observar

o todo, pois ele não acredita nessa generalização dos fatos.

Os critérios de definição do objeto estão atrelados à direção

do interesse do cientista. Você deve estar se questionando

então... ah, mas isso é um problema, pois essa relação com os

valores, com esse interesse pessoal pode ser perigosa para a

compreensão da realidade... como vamos conseguir apreender

esse corte, na medida em que os valores são muito elásticos?

Weber não tem problema com isso, pois acredita que

é possível chegar a conclusões objetivas e válidas, mesmo

tendo relação com valores, observando cuidadosamente esses

interesses a seu distanciamento com o objeto. O que não pode

ocorrer é julgamento de valor por parte do cientista, pois senão

não temos uma compreensão da realidade, mas temos uma

argumentação do senso-comum. Rodrigues (2007) oferece um

resumo dessa arguição:

A realidade é concebida por Weber, então, como encontro entre os homens e os valores aos quais eles se vinculam e os quais articulam de modos distintos no plano subjetivo. As ciências sociais (que prefere chamar de ciências da cultura) são vistas como a possibilidade de captação da interação entre os homens e valores no seio da vida cultural, isto é, a captação da ação social. Como a realidade é infinita, apenas um fragmento de cada vez pode ser objeto de conhecimento. O ‘todo’ (a sociedade) que supostamente pesaria sobre as partes (os indivíduos), para Weber, é literalmente incompreensível se for tratado como um todo, como uma coisa. Pela simples razão de que este todo reside na interação entre as partes e não é possível conhecer todas elas ao mesmo tempo, porque são muitas e porque se renovam a cada dia. Fluxos da mudança e cristalizações da permanência se combinam na vida social. A sociedade, para Weber, não é um bloco, é uma teia (p. 52-53).

Ele entende que existem métodos para além do

quantitativo (muito utilizado pelas ciências naturais como

“garantia” de cientificidade), como o método qualitativo, em

que a significação dos fenômenos vai ser realizada a partir dos

valores científicos do cientista.

O método utilizado pelo Weber é o método compreensivo,

por isso é conhecido como pai da Sociologia Compreensiva.

Page 65: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

65PedagogiaUESC

Uni

dade

4

Ele inaugura um método em que tenta buscar apreender o

sistema subjetivo dos sistemas de valores na interpretação

da ação social. Neste sentido, não busca encontrar leis gerais

do comportamento humano, mas sim a compreensão de uma

determinada ação social e não usar essa interpretação como

uma lei geral social.

No seu método, Weber introduz elementos fortemente

qualitativos, combinando explicação e compreensão. Segundo

Cohn (1979),

Não se pode presumir que a realidade social empírica tomada como um todo tenha uma ordem interna e leis gerais capazes de impor a qualquer pesquisador a simples busca da fidelidade a ela. A tarefa do conhecimento científico consiste na ‘ordenação racional da realidade empírica’. Ou seja: não se trata de reproduzir em idéias uma ordem objetiva já dada, mas de atribuir uma ordem a aspectos selecionados daquilo que se apresenta à experiência como uma postura ativa do pesquisador, que não é concebido como um metódico registrador de ‘dados’, mas tampouco é mero veículo para a introdução de tais ou quais ‘visões do mundo’ nos resultados da pesquisa (p. 22).

Weber está chamando atenção justamente para essa

realidade empírica, ou seja, dessa circunstância histórica. A

análise comparativa não opera, então, na busca do que seja

comum a várias ou todas as configurações históricas, mas, pelo

contrário, permitirá trazer à tona o que é peculiar a cada uma

dessas realidades.

Também estabelece a necessidade de criação de um tipo

ideal para garantir esse corte na realidade. Esse tipo ideal seria

um elemento para compreensão do objeto, mas que não pode

ser encontrado na realidade. É uma espécie de modelo, um

elemento meramente formal para a compreensão da realidade,

baseado em um exagero unilateral da realidade. O tipo ideal

é uma construção racional que nunca ou dificilmente vamos

encontrar na realidade, já que seu conteúdo configura uma

arbitrária realidade. Não se trata de uma média, mas de um

exagero unilateral que, no entanto, permite uma comparação

com a realidade. O tipo ideal não é encontrado empiricamente,

mas confronta-se empiricamente com a realidade. Não é uma

hipótese, mas uma orientação.

Então ficou claro agora que a conclusão, que muitos

Page 66: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

66 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

costumam defender nas ciências humanas, não é passível de

cientificidade, pois não se tem possibilidades de comprovações,

é uma opinião equivocada... Primeiro, porque não existem

só métodos quantitativos e, depois, porque esse status de

cientificidade não é prerrogativa das ciências naturais e das leis

gerais. A compreensão da realidade pode garantir conclusões

e interpretações da realidade que sejam tão válidas para o

social, quanto os conceitos universais das ciências naturais.

Evidentemente, há que ficar claro que essas interpretações

não são opiniões do cientista, são frutos de um exaustivo

esforço teórico, dotado de método científico, que garante uma

determinada conclusão sobre os fenômenos sociais. A questão

de as sociedades contemporâneas terem uma inclinação

para esse tipo de conclusão é outra questão... Com certeza,

marcada por interesses que foram construídos historicamente

e culturalmente. Esse é um bom debate, no qual não vamos

entrar nesse momento.

Voltando à questão da racionalidade das ações sociais,

vamos aprofundar mais essa abordagem, pois ela tem

contribuições importantes para a sociologia da educação, pode

nos ajudar muito a compreender determinadas ações hoje na

escola, afinal não é para isso que estamos mergulhando nesse

campo disciplinar? Vamos explorá-lo mais.

Weber, ao não aceitar essas ideias de uma sociedade

coercitiva, que imprime nos indivíduos determinados

comportamentos de forma externa e estanque, considera que a

sociedade é uma fonte muito rica de diversas interações entre

os indivíduos, onde se veiculam redes entre si e estabelecem

conexões entre os indivíduos que devem ser recuperados pelos

cientistas para compreender uma determinada realidade. A

educação, então, não pode ser considerada um instrumento

absoluto de transmissão de conhecimento, onde os indivíduos

vão captar suas mensagens para aprender a ser um membro

da sociedade. A educação é mais uma fonte inesgotável de

possibilidades de interações que os indivíduos estabelecem,

mediados por suas racionalidades. Essa racionalidade vai sendo

elaborada por um complexo de valores ou razões outras, como

o próprio interesse do indivíduo.

Como você está percebendo, a Sociologia de Max Weber

aponta para outra compreensão. A sociedade não é somente uma

Page 67: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

67PedagogiaUESC

Uni

dade

4

forma de controle e coerção do ator social que, ao não respeitar

a ordem, ameaça a obediência dentro do padrão estrutural da

mesma sociedade, de forma exterior e coercitiva que determina

o comportamento dos indivíduos. Weber procura defender que

é o resultado de inúmeras interações, resultantes das ações

sociais dos indivíduos, dotadas de sentido e significado, que

condicionam uma conduta plural que possibilita aos atores

sociais agirem de um certo modo. A sociedade não é aquilo que

pesa sobre os indivíduos, mas aquilo que se veicula entre eles

Por outro lado, Max Weber é um dos autores clássicos

que está preocupado com as explicações das diferenças sociais.

Para tanto, analisa os processos de dominação nas sociedades,

estabelecendo sistemas de classificações e estratificações

sociais que advêm da ordem econômica, cultural, religiosa. Este

conceito está relacionado à ideia de autoridade, constituindo-

se um elemento fundamental para se analisar a estruturas das

organizações e das instituições sociais, a exemplo do Estado.

A lógica da racionalidade, da obediência à lei e da

institucionalização das pessoas a partir das regras vai se

disseminando entre as pessoas a partir de determinados tipos de

ações, como as ações racionais, orientadas por uma associação

racional com fins, com cálculo, definida pela existência de regras

gerais, compartilhadas entre os indivíduos e instituições, sejam

as estabelecidas pelas convenções sociais, sejam as constituídas

pelas sanções, como o direito. Mas também Weber considera

as ações irracionais, orientadas pelos valores e pelos sentidos

tradicionais, afetivos. Repare que o autor está tentando buscar

o conteúdo do sentido reciprocamente compartilhado das ações

desses indivíduos, buscando observar o grau de legitimidade,

de validação dessas ações entre os indivíduos. Suas ações são

realizadas dentro de um tipo de racionalidade, dentro de uma

ordem social.

No livro Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, o

autor vai trazer a ideia de tipificação social, apresentando uma

ligação entre o desenvolvimento do capitalismo e a ascensão do

protestantismo, mostrando como, nesse processo, surge uma

nova ética, diferente da ascese católica. A ética protestante

traz uma nova visão do mundo, porque atrela a salvação à ideia

do trabalho, concepção significativa para o desenvolvimento

capitalista.

Dominação, na abor-dagem weberiana, é conceituada como a “possibilidade de encontrar obediência para ordens especi-ficas (ou todas) dentro de determinado grupo de pessoas” (WEBER, 1991, p. 139). Na sociedade capitalista, encontram-se vários tipos de dominação, entretanto há uma prevalência da domi-

nação burocrática.

PARA CONHECER

Weber concebia o Estado como um ente violento que detém o monopólio da força, mas essa violência é legal (afeita aos limites da lei) e legitima (tem reconhecimento e assenta-se nas normas sociais e jurídicas). Precisando o conceito weberiano, Estado é uma comunidade humana que pretende, com êxito, o monopólio legítimo da força física dentro de um determinado território.

Page 68: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

68 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

3 A CONTRIBUIÇÃO WEBERIANA PARA A EDUCAÇÃO

Você, aluno, vai perceber que Max Weber não elaborou

de forma sistemática uma teoria pedagógica ou uma teoria da

educação, como pretendeu Durkheim e quiçá Karl Marx. Porém,

através dos conceitos construídos e da estruturação de categorias

de análise, tornou-se possível formular uma compreensão,

tanto do processo pedagógico, quanto do sistema educacional

e de suas expectativas dentro da sociedade capitalista.

Em verdade, o que pretendia Weber era tornar

compreensíveis as potencialidades constitutivas da vida social,

ao analisar as ações dos atores e as relações sociais que, no

processo de interação, iam sendo construídas. Concebe o autor

que a estrutura fornece as regras e os recursos envolvidos

na atuação dos atores. Desta forma, na medida que a vida

social foi se racionalizando, as estruturas de dominação

se burocratizaram, pautando-se num direito racional e

as empresas capitalistas, necessitando de empregados

que estivessem afeitos à lógica

capitalista, reivindicam processos

educativos que, paulatinamente,

vão se transformando em uma

educação racionalizada que

possibilite o ”desencantamento

do mundo e do homem” (livre dos

dogmas religiosos), e obediente e

observante ao direito racional. A

racionalização e a burocratização

alteraram radicalmente os modos

de educar.

Nesta perspectiva, a

educação deve ter duas finalidades

pedagógicas: transmitir o

conhecimento especializado

(pedagogia do cultivo) e preparar

o aluno para uma conduta de vida

(pedagogia do treinamento).

Você, aluno, deve ter

VO

SABI

A?

Algumas características são concebidas por Weber para entender a burocracia moderna, a exemplo das atividades regulares necessárias aos objetivos, de forma fixa como deveres oficiais; autoridade formal; com-petência, hierarquia fixa, dentre outras.

Conforme Weber, o desencantamento do mundo é aquele que não é mais o mundo do sobrenatural e dos desígnios de Deus ou dos imperadores senão o mundo do império da lei e da razão.

ATE

ÃO

Pedagogia do cultivo - o objetivo desta educação é preparar o homem culto para a camada social na qual vive, possibilitando-lhe comportamentos interiores (reflexibilidade) e exteriores (sociabilidade) na vida (WEBER, 1971).

Quanto à pedagogia do treinamento, a educação tinha como objetivo desenvolver os talentos humanos, porém, com o crescimento da burocratização, da racionalização, da dominação política e das grandes corporações capitalistas privadas, a educação passa a ter o objetivo de formar um homem cada vez mais especializado, que busca apenas ascensão social, a riqueza material e o status privado não um homem que busque sua liberdade.

Page 69: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

69PedagogiaUESC

Uni

dade

4

percebido que a educação para Weber é o modo pelo qual

os homens são preparados para exercer as funções que a

transformação causada pela racionalização e pela burocratização

da vida lhes exigiu e colocou à disposição. Então, na medida em

que ocorre a racionalização do mundo, historicamente, torna-

se um fator de estratificação social, um meio de distinção, de

obtenção de honras, de poder e de prestígio social. Importância

disso para educação é justamente a questão dessa racionalização

nos mecanismos de acesso a bens materiais por parte dos

indivíduos que se submetem à educação sistemática.

Como os exemplos anteriores, submeter-se a um

modelo educativo está constituindo uma ação social, dotada

de uma racionalidade, que é fundamental para o Estado. Por

quê? Ora, o sentido da educação para Weber tem a ver com

o sentido de uma burocratização que passa pela obediência à

lei, pelo treinamento das pessoas para administrar as tarefas

burocráticas do Estado. Segundo Rodrigues (2007), Weber

privilegia dois aspectos:

[...] de um lado, a constituição de um direito racional, um dos pilares do processo de racionalização da vida, e de outro, a constituição de uma administração racional em moldes burocráticos. O direito racional oferece as garantias contratuais e a codificação básica das relações de troca econômica e política que sustentam o capitalismo e o Estado moderno... (p. 64).

Com essa ideia, o autor entende que a educação vai

promover um cabedal de conteúdo e de disposições para a

institucionalização dos indivíduos, de modo a conferir uma

racionalidade dentro do sistema burocrático do Estado,

extremamente conveniente à constituição do Estado moderno,

à lógica capitalista. Repare que esse momento passa a

ter um caráter especial no percurso teórico do autor, no

dimensionamento das relações sociais. Esse novo processo

dentro dos referenciais históricos é importante no processo

de disseminação da formação do Estado, a partir das próprias

lógicas dos indivíduos, regido e orientado por um funcionamento

politicamente treinado e politicamente orientado com base em

regulamentos racionais. A lógica capitalista também, nesse

momento, exige uma racionalidade, pautada no lucro, no

cálculo dos custos e benefícios e, é claro, vai precisar de uma

Page 70: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

70 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

máquina estatal voltada para dar conta desse sentido.

A educação para Weber, então, diferente de Durkheim,

tem outra concepção, não mais preocupada com a organicidade

da sociedade, para compor um corpo harmônico social; mas,

sobretudo, é palco das grandes diferenças, mediada pelo seu

nível de racionalidade histórica, que permite visualizar um fator

de estratificação social entre os indivíduos, onde o status, as

honras, o poder e o dinheiro funcionam como elemento de

mediação social e com extrema funcionalidade para despertar

o carisma, para preparar o aluno para uma conduta de vida e

transmitir um conhecimento especializado.

Assim mesmo, com toda essa colocação a respeito da

educação, Weber não se mostrava dos mais otimistas, porque

entendia que o capitalismo reduzia tudo a uma lógica bem

reduzida da acumulação do capital, inclusive, as disposições

educacionais.

4 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

Para Weber, a sociedade não seria algo exterior e superior

aos indivíduos, ela também pode ser compreendida a partir de

um conjunto de ações individuais reciprocamente referidas. Por

isso, define como objeto da sociologia a ação que os indivíduos

constroem, orientando-se pela ação dos outros. Nem toda

ação será social, mas apenas aquelas que expliquem alguma

orientação significativa, visando outros indivíduos.

Weber não analisa as regras e normas sociais como

exteriores aos indivíduos. Pelo contrário, as normas e regras

sociais são o resultado do conjunto de ações individuais, sendo

que os agentes escolhem, o tempo todo, diferentes formas de

conduta.

A educação é o meio pelo qual ela prepara, na formação

das crianças, as condições essenciais de sua própria existência.

A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre

aquelas não amadurecidas pela vida social.

Quando se estuda historicamente a maneira pela qual

se formaram e se desenvolveram os sistemas de educação,

percebe-se que eles dependem da religião, da organização

Page 71: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

71PedagogiaUESC

Uni

dade

4

política, do grau de desenvolvimento das ciências, do estado

das indústrias.

Toda e qualquer educação, a do rico e a do pobre, a

que conduz às carreiras liberais, como a que prepara para

as funções industriais, tem por objetivo fixar essas ideias na

consciência dos educandos. Resulta que cada sociedade faz o

homem certo ideal.

SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS:

VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

ATIVIDADE

1. Levando em consideração a teoria social de Weber, discuta com colegas e descreva como a educação pode ser compreendida, observando a relação entre sujeito e racionalidade.

2. Estabeleça uma relação entre a burocratização do Estado e a educação nesse processo.

FILME RECOMENDADO

Cartaz de divulgação do filme: ELIZABETH - The golden age

ELISABETH. Direção: Shekhar Kapur. Produção: Tim Bevan, Eric Fellner e Alison Owen. Elenco: Cate Blanchett, Geofrey Rush, Christopher Eccleston, Joseph Fiennes, Richard Attenborough. Local de Publicação: Inglaterra/França. Produtora: 20th Century Fox Film Corporation. 2007. DVD

A ambiência é o período de transição entre a Idade Média e a Idade Moderna. O reinado de Elizabeth I foi fundamental para desintegração do feudalismo, onde a frágil monarquia medieval evoluiu na direção de uma monarquia centralizada e forte, contribuindo para a emergência do capitalismo. Uma fase de consolidação (entre os séculos XVI e XVII), onde a burocratização atinge seu apogeu, definindo o conceito moderno de Estado. Vale observar a consolidação do Estado e as mudanças a partir da constituição das relações econômicas.

Page 72: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

72 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Max Weber

RE

FE

NC

IAS

COHN, Gabriel (Org.). Sociologia: Weber. São Paulo: Ática,

1996. (Coleção Grandes Cientistas Sociais, 13).

RODRIGUES, A. T. Sociologia da Educação. Rio de Janeiro:

Lamparina, 2007.

WEBER, M. Ensaios de sociologia. Rio de Janeiro: Zahar

Editores, 1971.

WEBER, M. Ética Protestante e o espírito capitalista. São

Paulo: Cia das Letras, 2004.

WEBER, Max. Economia e sociedade. Brasília: Editora da

UNB, 1991.

Page 73: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 74: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 75: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Possibilitar a compreensão dos processos históricos e epistemológicos dos principais conceitos marxistas para a análise da realidade social.

Apresentação de conceitos chaves da Sociologia marxista.

Meta

Objetivo

5 unid

ade

OS CLÁSSICOS DA SOCIOLOGIA: KARL MARX

Page 76: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 77: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

77PedagogiaUESC

Uni

dade

5

UNIDADE IV

1 INTRODUÇÃO

Nesta unidade, você terá a oportunidade de conhecer

um dos principais autores da Sociologia: Marx. Nessa etapa,

os pressupostos históricos e conceituais da sociologia marxista

são contemplados, bem como as relações entre sociologia e

educação, mediadas pelos conceitos chaves do referido autor:

classes, luta de classes, divisão do trabalho, fetichismo da

mercadoria, mais-valia e alienação.

Page 78: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

78 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Karl Marx

2 MARX - O MOTOR DA HISTÓRIA É A LUTA DE CLASSES

Esse autor tem um

grande destaque no pensamento

ocidental do século XIX, e mais

acentuadamente no séc. XX, ao

promover um corte epistemológico

dentro das referências teóricas

no Ocidente. Ao mergulhar

especificamente nos mecanismos

estruturantes das sociedades

capitalistas, procura esmiuçar as

forças sociais emergentes nesse

novo momento histórico, tentando

compreender como essas forças são

capazes de reproduzir a estrutura

social e controlar as consciências

dos homens.

Com certeza, você já ouviu falar em Marx e conhece a fama

de suas reflexões, sobretudo ao ganhar destaque por seu caráter

dialógico que avança o pensamento sociológico, propriamente

dito. É muito comum ouvir pessoas se declarando marxistas

ou se referindo a uma abordagem marxista. Pela recorrência

do uso do termo e para evitar os modismos de natureza

pouco substancial, é interessante ler os textos marxistas e se

aprofundar no debate. Para os desavisados, atenção e cuidado:

Marx tem uma abordagem densa e acentuadamente de viés

econômico, sobretudo pelas mudanças sociais que ele presenciou

na oportunidade da Revolução Industrial, principalmente a

partir das relações de trabalho.

Marx combina duas vertentes de pensamento ao encarar

a realidade e funda-se também dentro da reflexão filosófica.

Essa vertente dupla do pensamento marxista – sociológico

e filosófico, que converge muitos admiradores, se constitui,

simultaneamente, por um pensamento um analítico, tanto na

perspectiva sociológica, quanto no pensamento normativo,

na perspectiva filosófica. O que seria isso, então? Repare. O

viés sociológico tenta analisar a realidade com suas extremas

contradições sociais estruturais, a partir das contradições das

PARA

CO

NH

ECER

FIGURA 1 - Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/8/87/Karl_Marx.png

Marx foi um dos grandes pensadores do século XIX, filósofo alemão, autor de um legado teórico fátuo para a sociologia moderna. Segundo este autor, o capitalismo era o principal responsável pela desorientação humana. Nesse sentido, defendia a ideia de que a classe trabalhadora deveria unir-se, a fim de derrubar os capitalistas, detentores dos meios de produção, e aniquilar de vez a característica abusiva deste sistema. Para Marx, o sistema capitalista era o maior responsável pelas crises, que se viam cada vez mais intensificadas pelas grandes diferenças sociais.

Segundo Marx, a estrutura social caracteriza-se como um sistema de relações sociais, no qual os grupos humanos se posicionam uns diante dos outros e todos diante da produção social, fato este que determina lugares diferenciados e hierarquizados de prestígio, poder e riqueza. A estrutura social comporta a infraestrutura e também a superestrutura (valores, ideologia, representações, ideias, leis).

ATE

ÃO

Page 79: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

79PedagogiaUESC

Uni

dade

5

próprias condições materiais concretas entre as relações sociais

de uma sociedade capitalista, segundo o autor. Nesse particular,

Marx vai explicar essas contradições a partir da mercadoria e

como a força de trabalho passa a ser também uma mercadoria.

Segundo o autor, há uma tendência histórica nas relações

sociais das coisas se mercantilizarem.

O viés filosófico vai vislumbrar como a sociedade deveria

ser, por isso normativa, projetando uma possibilidade para

transformá-la. Essa distinção é importante na sociologia para

não se confundir pensamento militante com pensamento

analítico.

Nesse caminho que ele defende, ao tentar elucidar os

mecanismos da sociedade capitalista, Marx vai fundo nos

referenciais históricos da humanidade, desde os primórdios da

civilização, procurando uma lei geral que rege a humanidade.

A essa lei geral, ele definiu como as leis da história. Segundo

Rodrigues (2007, p. 33), baseado nos manuscritos de Marx,

essas leis seriam algo como o seguinte:

O que move a história é a luta entre as classes sociais. Compreendendo esta chave, o investigador (e, principalmente, o transformador) social compreenderia a natureza da sociedade capitalista e a direção na qual ela estaria se transformando, graças a suas contradições internas (p. 33).

[...] mas a divisão social do trabalho não é uma simples divisão de tarefas [...]. Ela é também a expressão da existência de diferentes formas de propriedade no seio de uma dada sociedade num dado tempo histórico. As relações de propriedades, por sua vez, dizem respeito aos tipos de relações sociais predominantes numa sociedade a partir dos tipos de propriedades vigentes (p. 33).

Nessa acepção, Marx determina ainda três tempos

históricos marcantes da história da humanidade, que

caracteriza bem as forças produtivas desenvolvidas, onde os

homens acabam constituindo relações sociais de produção.

Os três modos de produção declarados por Marx são: o modo

de produção escravista, na Antiguidade, em que se destaca

a oposição entre as forças entre os escravos e os senhores

de escravos, no regime de escravidão; o modo de produção

PARA REFLETIR

Segundo a concepção marxista, o desenvolvi-mento das contradições de uma forma histó-rica de produção é o único caminho de sua dissolução e do estabelecimento de uma nova forma.

ATENÇÃO

A estrutura social na abordagem marxista está em constante mudança e transformação. Dois fatores são funda-mentais para isto: a contradição entre as formas produtivas e as relações de produção (propriedade privada e produção social) e o desenvolvimento da consciência crítica e revolucionária dos dominados. (consciência em si para consciência para si).

Page 80: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

80 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Karl Marx

feudal, na Idade Média, mediado pela relação social de servidão,

que opõe servos e senhores feudais; e o modo de produção

capitalista, que promove a relação de assalariamento, opondo

capitalistas e operários.

Segundo Marx, seriam as diferentes formas dos

modos de produção correspondentes às diferentes etapas

do desenvolvimento das forças produtivas materiais que

constituem as relações sociais ao longo do percurso histórico

da humanidade. Essas oposições, identificadas pelos diferentes

modos de produção, constituem classes sociais e, dentro de

seu processo de tensionamento de ordem material, promovem

os conflitos abertos entra as classes dominantes e as classes

dominadas, promovendo o que Marx vai chamar de motor da

história – a luta de classes.

Um dos feitos mais marcantes dentro da produção

intelectual desse autor está no livro O Capital, no qual ele

mostra, com notória lucidez, que a riqueza da sociedade em

que predomina o modo de produção capitalista é dada pelo

acúmulo de mercadorias, da propriedade privada, dos meios

de produção. Mas ele vai ressaltar que justamente a partir da

mercadoria é que o império do capital se funde e se instaura.

O fetiche da mercadoria denota uma específica relação social

entre os próprios homens, à medida que assume a forma

fantasmagórica de uma relação entre coisas (MARX, 2002, p.

198).

Desta maneira, o atributo fetichista do mundo das

mercadorias provém do caráter social do trabalho. Ao

produzirem-se mercadorias, produz-se também mais-valia.

Esta surge em função da característica peculiar da força de

trabalho, uma vez que ela produz um valor excedente ao valor

que o trabalhador recebe ao vender sua força de trabalho.

O sobretrabalho não pago – a mais-valia – é a parte

do valor da mercadoria apropriada pelo capital. Ele é igual

à diferença entre o valor da mercadoria e o valor da força de

trabalho efetivamente pago pelo capital. Para Marx, todas

as mercadorias têm um valor, no qual o valor de troca é

simplesmente o seu reflexo. Esse valor representa o custo de

produção de uma mercadoria à sociedade. Pelo fato de que a

força de trabalho é a força motriz da produção, esse custo só

pode ser medido pela quantidade de trabalho que foi devotada

VOCÊ SABIA?

Ressalta-se que, na concepção marxista, a classe que mantém a dominação no plano econômico também é aquela que procura efetivar a dominação no plano ideológico com sua moral, suas ideias, sua educação, sua formulação de direito.

Page 81: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

81PedagogiaUESC

Uni

dade

5

à mercadoria.

Sendo assim, o objetivo final e motivo

maior que determina a organização do trabalho

no modo de produção capitalista é a maior

produção possível de mais-valia, isto é, a máxima

exploração possível da força de trabalho.

Assim, o processo de consumo da força

de trabalho é, ao mesmo tempo, o processo de

produção de mercadoria e de valor excedente

(mais-valia). O consumo da força de trabalho,

como o de qualquer outra mercadoria, realiza-

se fora do mercado, fora da esfera da circulação

(MARX, 2002, p. 206).

Nessa esfera, a da circulação ou da troca de mercadorias,

é que a aparência do modo de produção capitalista parece ser

absolutamente civilizada. Proprietários livres que dispõem

de direitos iguais voluntariamente, por meio de contratos,

estabelecem mutuamente relações de troca enganosamente

equivalentes.

O advento do contrato social, portanto, tem o papel

de legitimar esta situação de suposta igualdade formal

estabelecida por meio da aparente igualdade entre as partes,

que exercem sua autonomia ao pactuar livremente, não por

necessidade, mas por vontade, destituindo a relação real entre

trabalhadores e capitalistas de sua conotação de submissão e

exploração de partes concretamente diferentes (MARX, 2002).

É nesse mecanismo de abstração que o processo de alienação

se realiza.

O capital despolitiza as forças antagônicas sociais e

transforma tudo em mercadoria, inclusive a força de trabalho

humano para a realização de uma mercadoria. Ele resgata

a teoria do valor, onde a mercadoria se apresenta com suas

contradições internas ao seu uso. Ao mesmo tempo, apresenta-

se como um objeto útil, ora um valor de uso e ora como valor

de troca. É nesse intercurso que o dinheiro passa a assumir

uma posição especial nas sociedades capitalistas. A ele, todas

as mercadorias são conduzidas para encontrar a expressão do

seu valor. O dinheiro passa assumir um atributo quantitativo de

valoração para o objeto.

Em modos de produção anteriores, o comerciante podia

PARA

REF

LETI

R

A capacidade de trabalhar é o elemento edificante da condição humana, ou seja, nos transformamos em seres humanos pela capacidade de trabalhar, produzir cultura, sedimentar a transformação da natureza e adequá-la às nossas necessidades. Entretanto concebe Marx que esse caráter edificante, socializante e humanizante do trabalho, onde o indivíduo constrói-se na inter-relação com os demais indivíduos, desfaz-se sob a economia capitalista, pois o trabalho humano assume também o caráter de mercadoria que pode ser vendida e comprada.

ATENÇÃO

A teoria do valor é essencial para a compreensão da eco-nomia capitalista, e sua forma elementar - a mercadoria, incorpora um duplo caráter: valor de uso (utilidade) e valor de troca (pode ser trocada, vendida para comprar outra mercadoria).

Page 82: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

82 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Karl Marx

comprar todas as mercadorias possíveis, mas não o trabalho

como mercadoria. No capitalismo, ocorre uma inversão da

relação original sujeito-objeto para uma relação objeto-sujeito,

isto é, o ser humano passa a ser mero “fator de produção”. O

capitalista paga ao produtor pela sua força de trabalho, pelo

seu valor de troca, e sua utilização ocorre como a de qualquer

mercadoria (MARX, 2002). Assim, o tempo do trabalhador lhe

pertence e, como a força de trabalho, é inerente ao trabalhador;

mas, durante uma parte do tempo, o trabalhador pertence ao

capitalista.

Como afirma Marx (1968), essa apropriação do trabalho

pelo capital, nas condições técnicas herdadas de formas sociais

anteriores, configurou uma situação de subsunção formal, não

restando ao capital, para incremento da captação do trabalho

excedente, senão recorrer ao alongamento da jornada de

trabalho ou a intensificar o seu ritmo físico, extraindo, assim,

a mais-valia absoluta. A base técnica inicialmente subsumida

pela nova forma capitalista não foi um produto do seu próprio

desenvolvimento, mas uma base temporária para o mesmo.

2.1 Marx e a educação

Eis aqui outra diferença entre o pensamento de Marx e de

Durkheim. Para o segundo autor, o poder de coerção da sociedade

sobre os indivíduos aponta que as consciências individuais

são constituídas, reguladas por uma consciência coletiva.

Lembra? Marx, embora resgate essa acepção de dominação da

sociedade sobre os indivíduos, observando o caráter coercitivo,

reelabora-o, trabalhando sob outra perspectiva, a partir de

uma noção de dominação, não realizado na sociedade de forma

simétrica, na sociedade em geral, como prevê Durkheim, mas

sim de uma parte da sociedade sobre a outra, ou, usando as

palavras de Marx, do processo coercitivo de dominação de

uma classe social sobre a outra. Essa é uma situação colocada

historicamente no processo de luta de classes, na história dos

homens.

Como você já percebeu, a evolução histórica das

sociedades humanas é resultante das lutas de classes e, segundo

Ponce (1989, p. 169), “a educação é o processo mediante o

qual as classes dominantes preparam na mentalidade e na

Page 83: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

83PedagogiaUESC

Uni

dade

5

conduta das crianças as condições fundamentais da sua própria

existência”. Entretanto, a educação não foi objeto de reflexão

marxista, no sentido de uma formulação explícita sobre a teoria

da educação nem os princípios teórico-metodológicos da relação

ensino-aprendizagem. Contudo, sua análise sobre as relações

sociais é muito explorada na educação pela aproximação de

suas categorias conceituais para a abordagem das relações de

exploração, alienação e a divisão do trabalho nas organizações

sociais. E também na sua acepção de compreensão de

sociedade.

Nesta concepção, a educação deve ser compreendida

como um produto das relações socioeconômicas, da

estruturação da sociedade, sendo substratada nos meios pelos

quais os seres humanos produzem a sua existência, isto é, pelo

processo produtivo, pelo mundo do trabalho e no âmbito de

suas relações.

Como você percebeu, a sociedade capitalista encontra-se

estruturada entre o capital e o trabalho, fato este que possibilita

a educação, pautada numa formação unilateral, especializada

e alienada constituir-se como um instrumento de manutenção

da hierarquia social.

No entanto, segundo Marx, uma das possibilidades

de viabilizar a superação das dicotomias existentes e da

emancipação do ser humano encontrava-se na integração

entre ensino e trabalho através da educação politécnica ou

formação omnilateral, isto é, a educação intelectual (cultura

geral), a educação corporal (desenvolvimento físico - ginástica

e esporte) e a educação tecnológica (profissional polivalente -

técnico e científico). Por meio da politecnia, que deveria ser

estendida a todos, o ser humano desenvolveria seus sentidos

mais amplamente. Neste sentido, esta concepção de ensino está implicada

na construção e reprodução do conhecimento como um legado

humano, mas também como um recurso para a transformação

da sociedade e do mundo. Como analisa Marx, na sua obra,

Teses sobre Feuerbach, as mudanças das circunstâncias com a

da atividade humana, a exemplo das práticas educativas, podem

ser entendidas racionalmente como prática revolucionária. A

conquista da consciência de classe (consciência política) do

operariado de si e para si é dificultada justamente pelo fato de

Marx se remete a esse termo, a partir do conceito de trabalho, para explicar a necessidade de o homem harmonizar o tempo de trabalho com o tempo livre. Formação omnilateral é o mesmo que equilibrar a essência do trabalho, mas livre das suas acepções de dominação. Para ler mais, ver Manuscritos econômicos e filosó-ficos, de Marx e Engels.

Conforme Marx, a educação politécnica deveria combinar o trabalho produtivo com a educação. Isto resultaria na elevação da classe operária acima das classes burguesas e

aristocráticas.

Page 84: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

84 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Karl Marx

terem sido privadas dos meios que lhe permitiriam construí-

la.

Perceba, então, o caráter revolucionário e inovador da

educação pautado em um projeto político e pedagógico, estando

o mesmo implicado político e socialmente com os interesses

dos excluídos, contribuindo para a mudança e transformação

dos seres humanos e da realidade social. De resto, o papel

estratégico da escola, dos educadores e intelectuais é decisivo

para a construção da consciência de classe do oprimido,

ajudando-o na edificação do seu ser, consequentemente, na

formação de um indivíduo integralmente desenvolvido para o

qual as funções sociais não passariam de formas diferentes e

sucessivas de sua atividade.

Compreender a escola como meio de produção e o

conhecimento como ferramenta imaterial do processo de trabalho

docente, assim como as novas características determinantes

do processo de trabalho docente, pode levar a problematizar a

tese de que esse trabalho está apenas formalmente subsumido

ao capital. Isso numa perspectiva mais pessimista, uma vez

que Marx acredita que, a partir da percepção dessas forças

antagônicas na sociedade, o processo de luta de classes pode

ser constituído e a educação é vista como uma possibilidade

de emancipação com base na ruptura com a alienação dos

indivíduos.

Marx vê que a educação tem essa dupla possibilidade,

tanto no ponto de vista da emancipação, quanto do ponto de

vista da reprodução – na perpetuação da exploração de uma

classe social sobre a outra, estrategicamente utilizada pelo

capitalista como uma ideologia dominante. Ou seja, para Marx

não há possibilidade de uma educação geral, única. Conforme

o conteúdo de classe ao qual estiver exposta, ela pode ser uma

educação para alienação ou uma educação para a emancipação

(RODRIGUES, 2007).

A lógica capitalista reestruturou a produção material

e espiritual da sociedade, transformando também o espaço

escolar, impondo sua forma organizativa através da divisão

técnica e social do trabalho, da implementação de novas

formas de contratação e da alteração do nível de subsunção

dos trabalhadores da educação ao capital e/ou ao Estado.

O grau de autonomia do professor vem tornando-se cada

PARA

REF

LETI

R

Conforme Marx (1980), quanto menos for o tempo de formação profissional exi-gido por um trabalho, menos será o custo de produção do operário e mais baixo será o preço de seu trabalho, de seu salário.

Page 85: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

85PedagogiaUESC

Uni

dade

5

vez menor, seja pela ampliação de sua jornada de trabalho, seja

pelo rebaixamento de seu nível de qualificação. A cristalização

da imagem do professor como um sujeito pleno de autonomia,

de exercício intelectual inalienável, oculta as origens históricas

do processo de proletarização que tratamos.

Para responder à questão de qual seria o nível

de subsunção da categoria docente ao capital frente às

transformações discutidas, recorre-se a algumas categorias

de análise marxistas e construímos uma nova categoria –

subsunção proto-real – para explicar o processo transitório

entre a subsunção formal e real do trabalho docente ao capital.

O trabalho docente vem sendo alvo de reestruturações, como

procuramos demonstrar; no entanto, isso não quer dizer que

será necessariamente suprimido por formas objetivadas de

trabalho referentes ao ensino e à aprendizagem.

Tal estudo, ao contrário de realizar previsões que

apontem para o fim dessa forma de trabalho, visa compreender

o processo de proletarização em curso há algumas décadas,

em especial sua configuração no atual padrão produtivo, para

contribuir com a reflexão acerca da condição docente e, quiçá,

utopicamente, para a busca de estratégias de sua valorização

social.

3 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

Marx estabelece relações entre o todo e as partes,

entre o abstrato e o concreto e entre o lógico e o histórico,

tanto no que se refere ao pensamento (as relações entre as

categorias enquanto questão lógico-epistemológica), como no

que se refere à realidade histórico-social (as relações entre as

categorias enquanto questão relativa ao ser, isto é, questão

ontológica).

Na teoria marxista, o materialismo histórico tenta explicar

a história das sociedades humanas, em todas as suas épocas,

mediada pelas condições materiais, essencialmente econômicas.

A sociedade é comparada a um edifício no qual as fundações, a

infraestrutura, seriam representadas pelas forças econômicas,

enquanto o edifício em si, a superestrutura, representaria as

Page 86: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

86 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Karl Marx

ideias, costumes, instituições (políticas, religiosas, jurídicas

etc.).

Marx desenvolveu uma perspectiva histórica e sociológica.

A luta de classes é o motor das mudanças sociais. Perspectiva

histórica centrada nas classes sociais.

SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS:

VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

ATIVIDADE

A casa não é destinada a morar, o tecido não é disposto a vestir,O pão ainda é destinado a alimentar: ele tem de dar lucro.

Mas se a produção apenas é consumida, e não é também vendidaPorque o salário dos produtores é muito baixo – quando é aumentado

Já não vale mais a pena mandar produzir a mercadoria –, por queAlugar mãos? Elas têm de fazer coisas maiores no banco da fábrica

Do que alimentar seu dono e os seus, se é que se quer que hajaLucro! Apenas: para onde com a mercadoria? A boa lógica diz:

Lã e trigo, café e frutas e peixes e porcos, tudo juntoÉ sacrificado ao fogo, a fim de aquentar o deus do lucro!

Montanhas de maquinaria, ferramentas de exércitos em trabalho,Estaleiros, altos-fornos, lanifícios, minas e moinhos:

Tudo quebrado e, para amolecer o deus do lucro, sacrificado!De fato, seu deus do lucro está tomado pela cegueira.

As vítimasEle não vê.

[...] As leis da economia se revelamComo a lei da gravidade, quando a casa cai em estrondos

Sobre as nossas cabeças. Em pânico, a burguesia atormentadaDespedaça os próprios bens e desvaira com seus restos

Pelo mundo afora em busca de novos e maiores mercados.(E pensando evitar a peste alguém apenas a carrega consigo,

empestandoTambém os recantos onde se refugia!) Em novas e maiores crises

A burguesia volta atônita a si. Mas os miseráveis, exércitos gigantes,Que ela, planejadamente, mas sem planos, arrasta consigo,Atirando-os a saunas e depois de volta a estradas geladas,

Começam a entender que o mundo burguês tem seus dias contadosPor se mostrar pequeno demais para comportar a riqueza que ele

próprio criou.”

(BRECHT, Bertolt. O manifesto: crítica marxista. São Paulo, n. 16, p. 116, mar. 2003.)

Page 87: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

87PedagogiaUESC

Uni

dade

5

Os versos anteriores fazem parte de um poema inacabado de Brecht (1898-1956) numa tentativa de versificar O manifesto do partido comunista de Karl Marx (1818-1883) e Friedrich Engels. A partir desse texto, responda:

1. Por que o processo de produção material está atrelado a um universo, nebuloso e místico, da lógica capitalista?

2. O que significa uma condição livre dos homens, submetidos ao controle consciente e planejado?

3. Segundo Marx, as ideias de reprodução e emancipação da educação são vertentes possíveis, dependendo do nível e estado do desenvolvimento capitalista. Explique essa questão a partir da relação educação e neoliberalismo.

FILME RECOMENDADO

Cartaz de divulgação do filme: TEMPOS MODERNOS

TEMPOS MODERNOS. Direção: Charles Chaplin. Produção: Charles Chaplin. Elenco: Charles Chaplin, Paulette Goddard, Henry Bergman, Tiny Sandford, Chester Conklin etc. Local de divulgação: EUA, Produtora: United Artists / Charles Chaplin Productions, 1936. DVD.

Esse filme de Charles Charplin apresenta a imagem da sociedade capitalista, a partir do século XVIII, pós-revolução industrial, na Inglaterra. Nesse sentido, o filme retrata as relações sociais no mundo do trabalho e a busca desenfreada pelo lucro e pelos detentores dos meios de produção capitalista. É interessante observar, no filme, a centralidade do lucro, em detrimento da condição humana dos operários, e o processo de alienação da sociedade capitalista na divisão do trabalho.

Page 88: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

88 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Os Clássicos da Sociologia: Karl Marx

RE

FE

NC

IAS

BRECHT, B. Crítica marxista. n. 16, São Paulo, Unicamp, 2003.

BOUDON, R.; BOURRICAUD, F. Dicionário Crítico de Sociologia. São Paulo: Ática, 1993.

EDER, Klaus. A nova política de classes. Bauru: EDUSC, 2002.

MARX, K.; ENGELS, F. Introdução à crítica da economia política. São Paulo: Alfa-ômega, 1981.

MARX, K.; ENGELS, F. O Manifesto Comunista. São Paulo: Alfa-ômega, 1981.

MARX, K.; ENGELS, F. A Ideologia Alemã. São Paulo: Boitempo, 2007.

MARX, K. O Capital. São Paulo: Abril Cultural, 1932. v. 1.

MARX. K. Trabalho Assalariado e Capital. São Paulo: Global, 1980.

PONCE, A. Educação e luta de classe. 9. ed. São Paulo: Cortez; Autores Associados, 1989.

RODRIGUES, A. T. Sociologia da Educação. 6. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007.

Page 89: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 90: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 91: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Possibilitar a compreensão dos processos epistemológicos dos principais conceitos sociológicos de Bourdieu para a análise da realidade social.

Discute sobre dominação, poder e habitus em Pierre Bourdieu.

Meta

Objetivo

6 unid

ade

PIERRE BOURDIEU - E OS HORIZONTES DAS RELAÇÕES DE PODER E A NOÇÃO DE HABITUS

Page 92: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 93: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

93PedagogiaUESC

Uni

dade

6

UNIDADE VI

1 INTRODUÇÃO

Nesta unidade, uma introdução da teoria sociológica

de Bourdieu, você conhecerá os pressupostos conceituais de

sua reflexão sobre o campo da educação a partir da noção de

dominação e reprodução social. Também aprenderá o conceito

de habitus, formulação conceitual basilar na teoria sociológica

do referido autor, apropriada, aqui, para o contexto educativo.

Page 94: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

94 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Pierre Bourdieu - e os horizontes das relações de poder e a noção de habitus

2 PIERRE BOURDIEU

Esse autor traz uma contribuição importante nesse

século XX, numa perspectiva mais contemporânea para análise

sociológica. Inicialmente, retoma algumas considerações

durkheimianas com

relação à coerção social

que o sistema exerce

sobre os indivíduos, na

tentativa de mostrar o

peso da sociedade sobre

as práticas educacionais –

particularmente vai fazer

uma demonstração nas

relações de reprodução

de poder no ambiente

escolar, como reflexo

das relações de poder

na sociedade. Por outro

lado, ao abandonar essa

tese estruturalista que o aproximou de Durkheim, ele se debruça

sobre a teoria do habitus, ao reconhecer que os indivíduos

fazem ativamente um conjunto dinâmico de disposições que

envolvem a influência dos diversos ambientes sucessivamente

encontrados na vida e que, não necessariamente, existe apenas

um sistema que define suas condições de vida.

As ideias de Bourdieu não se restringiram à Sociologia

(Etnologia, Antropologia, Psicologia). Sua obra circula entre o

trabalho empírico e a teoria social. Influenciou toda a geração

de pensadores franceses e em outras partes do mundo. Foi

inovador na forma do fazer sociológico. Diferentemente de

muitos de seus contemporâneos, acreditava que a Sociologia

possuía uma função crítica fundamental: desvelar os processos

de funcionamento social, principalmente o poder. Propõe que a

Sociologia seja uma ciência total. Para Bourdieu, a S ociologia

era uma profissão e ao sociólogo cabia o aprofundamento

dos métodos para analisar objetivamente (racionalmente) os

fenômenos sociais.

A versão analítica, com a qual Bourdieu se aproxima

de Durkheim, se refere à ideia da submissão dos indivíduos

PARA

CO

NH

ECER

FIGURA 1 - Pierre Bourdieu Fonte: http://www.pointscommuns.com/img/

ecrivain/3005392.jpg

Pierre Bourdieu era filósofo de formação, foi professor na École de Sociologie du Collége de France. Dirigiu, também, o Centre d´études et de recherches, em Marselha. Foi considerado um dos grandes autores da sociologia na contemporaneidade e se debruçou aos estudos de vários temas sobre cultura, a comunicação e os modos de vida e da socialização. Particularmente no campo da educação, o referido filósofo é autor de uma sofisticada teoria sobre dominação e sobre as relações de reprodução no sistema de ensino.

Page 95: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

95PedagogiaUESC

Uni

dade

6

ao controle das estruturas sociais,

ou seja, os indivíduos estariam

submetidos a uma ordem na qual

se tornam meros reprodutores

das orientações determinadas pela

estrutura social vigente. Pierre

Bourdieu e Claude Passeron

exploram essa acepção no livro

A reprodução: elementos para

uma teoria do sistema de ensino,

publicada na década de 70. A ação

social é movida por um processo pelo

qual as estruturas se reproduzem

e, nesse particular, a instituição

escolar define que toda a ação

pedagógica é, objetivamente, uma

violência simbólica. Como assim?

Vamos explicar melhor...

Para o autor, os indivíduos

estão mergulhados num profundo

universo cultural que a escola

reproduz a partir de suas relações de poder, através de um

poder arbitrário. Nesse sentido, as estruturas determinam

suas ações e os indivíduos não percebem essa dimensão de

poder, ao iludir-se com os discursos dominantes, e pensam

que suas ações são produções próprias: mas, na verdade, são

reflexos de uma ação reproduzida. Essas relações de poder não

são produzidas pelas classes subalternas, mas

por classes dominantes e são impostas em toda a

sociedade através do sistema de ensino.

Quais são os valores e normas que são

transmitidos na escola? Segundo o autor, são os

valores das classes dominantes, que rejeitam

valores outros. Na perspectiva da dimensão

educacional, o autor coloca a escola em

evidência, apresentando como as dissimulações

dos discursos de poder estão por trás da aparente

neutralidade na escola, estão camuflados nos

discursos escolares. Como se essa instituição não

se reproduzisse, no seu interior, as relações de

R

AAC

a FU V

MK

O clássico estudo de Pierre Bourdieu e Claude Paserron analisa como as desigualdades sociais e de sucesso escolar devem ser atribuídas às diferenças culturais entre os grupos. Com base neste pressuposto, concebem que, no sistema social, existem mecanismos de distribuição desigual do “capital cultural” assente a disparidade do “ethos de classe”. Apesar disto, não parecem ser suficientes para explicar as desigualdades na escola, desde que, no seu contexto, encontram-se mecanismos propriamente escolares que asseguram a reprodução social através da perpetuação da “cultura dominante”.

SAIBA MAIS

Toda ação pedagógica é, objetivamente, uma violência simbólica porque impõe, por um poder arbitrário, um determinado arbitrário cultural. Por arbitrário cultural, entendem os autores, a concepção cultural dos grupos e classes dominantes, que é imposta a toda a sociedade por meio do sistema de ensino. A ação pedagógica visa a inculcação do arbitrário cultural e deve durar certo tempo para que o educando naturalize seu conteúdo, ou seja, o tenha como verdade. A autoridade pedagógica surge, assim, como uma implicação necessária da ação pedagógica, afirmando-se como poder de violência simbólica de forma legítima que leva os ‘receptores pedagógicos’ não só reconhecerem a legitimidade dessa mesma autoridade, como também a legitimidade da informação transmitida, interiorizando-a. Desta forma, é garantida não só a reprodução cultural, como também a reprodução social.

R

AAC

a FU V

MK

SAIBA MAIS

Discordam os autores do discurso dominante, segundo o qual a conquista de uma “escola para todos”, de caráter igualitário, tornaria possível a realização das potencialidades humanas. Concebem que, através de uma aparente neutralidade, a escola dissimula a reprodução das relações sociais e de poder vigentes, na medida em que, sob as aparências de critérios puramente escolares, estão critérios sociais de triagem e de seleção dos indivíduos que os possibilitam e condicionam a ocupar determinados papéis e postos na vida social.

Page 96: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

96 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Pierre Bourdieu - e os horizontes das relações de poder e a noção de habitus

poder na própria sociedade. Bourdieu chama isso de a face

oculta do sistema de ensino. Segundo Rodrigues (2007),

[...] Bourdieu e Passeron negam qualquer possibilidade de romper com as estruturas de reprodução e afirmam que as teorias pedagógicas na verdade são cortina de fumaça que procura ocultar o poder reprodutor do sistema que está nas mãos dos educadores. Simplesmente não há saída: o sistema de ensino filtra os alunos sem que eles se dêem conta e, com isso, reproduz as relações vigentes. Não há possibilidade de mudança (p. 73).

Como você está percebendo, a educação passa a ser

definida como reprodutora das desigualdades sociais mais

gerais, as desigualdades entre as classes, procurando manter

o predomínio da racionalidade instrumental e o ethos da classe

dominante. O campo educacional passa a ser visto como um locus

de disputa de poderes, entretanto com posições já delimitadas

pelo capital cultural e econômico herdados por determinadas

classes que procuram manter a estabilidade dos seus interesses

e posições sociais. Em assim sendo, a depender das origens

socioculturais dos jovens (‘gostos de classe’ e ‘estilos de vida’),

havia uma determinação do seu desempenho escolar.

Interrogando-se sobre as razões das desigualdades sociais

nos sucessos escolares, Bourdieu e Passeron, apud Snyders

(2005), mostram que não se trata de uma causalidade simples

e linear que torna o sucesso dependente de um único fator em

particular. Mas, sobretudo, do equilíbrio de um conjunto de fatos;

as condições materiais, o nível cultural, as relações pessoais,

a inserção cultural etc. A exemplo da posição profissional dos

pais que importa num acesso a uma boa escola; a posição

destacada de outros membros da família que proporcionam aos

jovens outros meios de identificação; êxitos; representação e

apoios. Por conseguinte, “as vantagens e desvantagens sociais

atuam em cascata de efeitos cumulativos e precisamente por

isto é muito difícil introduzir, por reforma parcial, qualquer

modificação durável” (SNYDERS, 2005, p. 23).

A ação de todo o sistema institucionalizado não é tão

somente assegurar e transmitir conhecimento novo ao aluno,

mas legitimar escolarmente aquilo que eles já adquiriram, pelo

modo organizado e sistemático de inculcação, os ensinamentos,

Percebe-se que o sistema de ensino ‘filtra’ os alunos sem que eles se deem conta e, com isso, reproduz as relações vigentes. Assim, não há possibilidade de mudança.

Page 97: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

97PedagogiaUESC

Uni

dade

6

valores e ideologias que os envolveu e os apoiou desde o

nascimento. Analisam ainda os autores que a cultura escolar

assemelha-se muito com a cultura das classes privilegiadas em

relação aos seus hábitos e aos ritos escolares, assimilando os

alunos a contribuição da escola como uma herança que lhes é

familiar, que faz parte do seu contexto. Entretanto, para outras

classes é uma conquista muito cara, é um empreendimento de

adaptação a um grupo social, uma reeducação, como aponta

Snyders. Por isso, na escola, somente triunfam aqueles que

já se beneficiaram antes do recinto escolar no meio familiar

através dos hábitos e de certo estilo de vida.

A educação, na compreensão dos autores, constitui-se

um recurso, uma prática social, importante e imprescindível,

para as estruturas de poder perpetuarem os seus sistemas

simbólicos, assegurando, assim, a sua continuidade no poder e

na dominação.

Parece radical? Pois bem, o livro A reprodução: elementos

para uma teoria do sistema de ensino em que o autor defende

essa tese, durante muitos anos ficou fora das prateleiras. É

que Bourdieu não permitiu mais sua publicação por reconhecer

a radicalidade dessa acepção teórica, não que ela não seja

atraente...Recentemente foi relançado. Essa tese é muito

explorada na educação à revelia do próprio autor, por encontrar

ressonância na análise das desigualdades sociais no universo

escolar. É uma boa discussão que vale ser considerada e por

isso a resgatamos aqui como uma inquietação sociológica.

O autor refez sua interpretação e não mais radicaliza

a partir da impossibilidade de mudança, pois reconhece que

os sujeitos também são protagonistas de uma ação, embora

também sofram influência do sistema. Sua metodologia busca

superar um dilema clássico da sociologia: o subjetivismo e o

objetivismo, o clássico dualismo entre sociedade e indivíduo.

Bourdieu tenta romper com essa questão: buscar romper

com a experiência imediata. A ruptura não é facial, pois o

pesquisador está inserido em diversas instituições. Bourdieu

busca “desnaturalizar o mundo social”, propondo-se a desvelar

as regras do jogo intelectual, político, dos pensadores, dos

cientistas.

Page 98: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

98 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Pierre Bourdieu - e os horizontes das relações de poder e a noção de habitus

2.1 Bourdieu e a noção de habitus

A obra de Bourdieu tem várias influências do

estruturalismo francês – Marx, a partir dessa concepção de

reprodução de poder e também de Weber, numa compreensão

mais alusiva do pensamento da racionalidade da ação social.

É nesse particular que ele vai resgatar o conceito de habitus,

que mereceu um esforço levado a cabo durante uma vida inteira

(1972/1977; 1980/1990; 2000/2001). A noção de habitus

é um conceito basilar formulado da teoria sociológica desse

autor. O habitus reconhece que os agentes fazem ativamente

o mundo social através do envolvimento de instrumentos

incorporados de construção cognitiva; mas também afirma,

contra o construtivismo, que estes instrumentos foram também

eles próprios feitos pelo mundo social (BOURDIEU, 1992).

Essa construção foi importante para a análise da educação

ao recuperar tanto o ponto de vista da influência do sistema

sobre os indivíduos, como também reconhecer o caráter da

individualidade do sujeito. O autor rompe com a noção comum

de divisão entre indivíduo e sociedade. Bourdieu retoma essa

questão a partir da noção de habitus, tenta captar a interiorização

da exterioridade e a exterioridade da interiorização. Vamos ver

bem como é isso...

O habitus fornece, ao mesmo tempo, um princípio de

sociação (exterioridade) e de individuação (interiorização):

sociação porque as nossas categorias de juízo e de ação,

vindas da sociedade, são partilhadas por todos aqueles que

foram submetidos a condições e condicionamentos sociais

similares (assim podemos falar de habitus masculino, de

habitus nacional, de habitus burguês etc.); individuação

porque cada pessoa, ao ter uma trajetória e uma localização

únicas no mundo, internaliza uma combinação incomparável de

esquemas. Porque é simultaneamente estruturado (por meios

sociais passados) e estruturante (de ações e representações

presentes), o habitus opera como o “princípio não escolhido

de todas as escolhas”, guiando ações que assumem o caráter

sistemático de estratégias, mesmo que não sejam o resultado

de intenção estratégica e sejam objetivamente orquestradas

sem serem o produto da atividade organizadora de um maestro

(BOURDIEU, 1992). Repare que o autor agora está considerando

As raízes do habitus encontram-se na no-ção aristotélica de hexis, elaborada na sua doutrina sobre virtude, significando um estado adquirido e firmemente estabe-lecido do caráter moral que orienta os nossos sentimentos e desejos numa situação e, como tal, a nossa conduta.

Page 99: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

99PedagogiaUESC

Uni

dade

6

que a ação social não é apenas a reprodução de uma atividade

realizada pelos indivíduos, mas também observa elementos de

uma construção particular desenvolvida por cada indivíduo a

partir dessa influência vivida e incorporada nas relações sociais.

Sendo assim, o determinismo de antes é relativizado por esses

elementos da individuação.

Simultaneamente você sofre influência, mas produz

influência também na sociedade, por isso a “interiorização da

exterioridade”. Quando você internaliza os valores e as normas

da sociedade a partir da influência da exterioridade – interioriza

o exterior; e a “exterioridade da interiorização”, ou seja, as

expressões na sociedade de sua influência, de sua ação social.

Para esta filosofia da ação disposicional, o ator econômico não é

o indivíduo egoísta e isolado da teoria neoclássica, uma máquina

computadorizada que procura deliberadamente maximizar a

utilidade na perseguição de objetivos claros; é antes um ser

carnal, habitado pela necessidade histórica que se relaciona

com o mundo através de uma relação opaca de cumplicidade

ontológica e que está necessariamente ligado aos outros

através de uma conivência implícita, sustentado por categorias

partilhadas de percepção e de apreciação (BOURDIEU, 1992).

Habitus resume não uma aptidão natural, mas social. Por

essa razão, é variável através do tempo, do lugar e, sobretudo,

através das distribuições de poder; transferível para vários

domínios de prática, o que explica a coerência que se verifica,

por exemplo, entre vários domínios de consumo – na música,

desporto, alimentação e mobília, mas também nas escolhas

políticas e matrimoniais – no interior e entre indivíduos da

mesma classe e que fundamenta os distintos estilos de vida

(BOURDIEU, 1992).

Nessa perspectiva, o habitus, assim adquirido pelo ator

social, constitui uma matriz de percepção, de apreciação e

de ação que se realiza em determinadas condições sociais. O

habitus adquirido, incorporado pelo indivíduo nos diferentes

espaços sociais em que transitou, constituirá, assim, uma

matriz de percepção, apreciação e ação pela qual ele se guiará.

Considerando que o habitus corresponde à incorporação do

social no indivíduo, sob a forma de esquemas de pensamento

e ação, é um conceito potente para pensar o processo de

constituição das identidades sociais a partir das trajetórias de

Page 100: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

100 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Pierre Bourdieu - e os horizontes das relações de poder e a noção de habitus

vida e, nesse particular, compreender as diferenças sociais e os

antagonismos no interior da escola.

A noção de habitus corresponderia a uma atitude de

conservação, unidade de análise significativa, através da

qual seria possível compreender como uma determinada

sociedade busca assegurar sua constância e se defender contra

as mudanças sociais. A ação social parece ter-se deslocado,

assim, dos agentes individuais da ação para associar-se aos

sistemas de disposição e as posições sociais específicas que ela

reflete. Seria um subproduto da luta simbólica pelo monopólio

da nomeação legítima, isto é, pela produção do senso comum.

A partir dos antagonismos sociais, o conflito seria

entendido através dos movimentos no interior dos ordenamentos

sociais em busca de maior legitimidade a um poder dominante.

O habitus como uma noção que constrange os agentes a

comportamentos específicos, exteriores aos próprios atores,

produto que é do jogo de forças dentro de campos sociais

onde se estruturam e se solidificam as práticas e as atitudes

consideradas legítimas (de um social qualquer).

O conflito para Bourdieu, deste modo, fundamenta

uma ordem e um poder de dominação legítima, reajustando

as práticas integrativas no seu interior. O conflito atualiza

dentro dos campos sociais o que as distâncias e as ausências

exprimem, recriando a dominação e o habitus formadores dos

agentes sociais em uma ordem específica.

A escola, então, enquanto um espaço de excelência das

diferenças e dos antagonismos, palco de grandes conflitos, tem

como possibilidade refletir-se a partir da noção de habitus, ao

legitimar-se dentro de uma ordem específica, revendo suas

relações de dominação.

3 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

Você viu que o autor vai mostrando como a evolução da

sociologia da educação consiste em realçar, do ponto de vista

diacrônico, como foi mudando a concepção da relação entre

escola e o social – a partir da sociologia clássica, consubstanciada

na obra de Durkheim. A essa perspectiva funcionalista, eclode

Page 101: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

101PedagogiaUESC

Uni

dade

6

o período de transformações aceleradas do Estado capitalista

e de seus sistemas educativos, como uma nova emergência da

questão social, promovendo a reprodução das desigualdades

e hierarquias sociais. As instituições de ensino, como uma

instituição social nessa concepção de Estado, ainda sob o

viés de uma perspectiva funcionalista, reproduzem, também

no interior da escola, essas mesmas contradições do Estado

capitalista, através do exercício de uma violência simbólica,

convertendo atos de exclusão do próprio sistema econômico

em atos dos próprios indivíduos. Essa Sociologia de denúncia,

da reprodução, alimenta uma variante de um determinismo

social, na medida em que uns dos seus mais importantes

pontos de apoio teórico consistiram na “hipótese inverificável

de uma vontade perversa escondida nas pregas da estrutura

social” (CANÁRIO citado por DEROUET, 2000, p. 201).

Embora muito aceita nos domínios disciplinares da

educação, essa hipótese ganhou nova acepção do próprio autor,

desmistificando a crença na objetividade da cultura escolar,

reconhecendo que a socialização escolar não é absoluta.

As transformações do Estado e dos sistemas educativos

marcam uma nova concepção desenvolvida pelo autor, a partir da

noção de habitus que ganha mais ressonância na interpretação

sociológica; o deslocamento do nível de análise e a renovação

teórica estão estreitamente associadas à emergência de novos

objetos de estudo, mais micro, a partir da “descoberta do aluno”

e de outros atores educativos, para além de uma perspectiva,

mais macro, das estruturas.

SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS:

VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

Page 102: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

102 Módulo 1 I Volume 4 EAD

Sociologia e Educação I Pierre Bourdieu - e os horizontes das relações de poder e a noção de habitus

FILME RECOMENDADO

ESCRITORES DA LIBERDADE. Direção: Richard LaGravenese Produção: Danny DeVito, Michael Shamberg, Stacey Sher Elenco: Patrick Dempsey, Will Morales, Anh Tuan Nguyen, Vanetta Smith, Imelda Staunton, Hilary Swank, Deance Wyatt. Local de divulgação: Alemanha e EUA Produtora: Paramount Pictures Brasil. 2007. DVD.

O filme retrata o desafio da educação num contexto social adverso e os antagonismos entre os paradigmas institucionalizados das relações de poder no ambiente escolar. É interessante observar como os próprios educadores podem reproduzir as diferenças socioculturais, quando cristalizam suas perspectivas educativas para determinados grupos sociais marginalizados. O filme, no entanto, num viés otimista, apresenta a batalha frente às hostilidades das relações de autoridade, a partir de um movimento individualizado, das possibilidades de superação e de transformação de uma realidade dada.

Cartaz de divulgação do filme: EM NOME DE DEUS

ATIVIDADES

A partir do comentário abaixo, responda:

O abandono, por vezes incontrolado, das preocupações relacionadas com a reprodução social e as desigualdades foi, em geral, feito à custa do abandono de uma intencionalidade crítica e da conseqüente valorização de uma sociologia mais pragmática que se aproxima mais da engenharia escolar do que da atividade de crítica global à escola e aos sistemas educativos (CANÁRIO citado por CORREIA, 1998, p. 37).

1. É possível identificar o conceito de reprodução social de Bourdieu? O que ele está chamando de reprodução escolar?

2. Explique a noção de habitus para educação.

Page 103: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

103PedagogiaUESC

Uni

dade

6

BOURDIEU, P. A reprodução: elementos para uma teoria do

sistema de ensino. Lisboa: Veja, 1978.

BOURDIEU, P. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand

Brasil, 1992.

BOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. Porto

Alegre: Zoux, 2007.

BOUDON, R.; BOURRICAUD, F. Dicionário Crítico de

Sociologia. São Paulo: Ática, 1993.

CANÁRIO, R. O que é a escola: um “olhar” sociológico. Porto:

Porto Editora, 2005.

SNYDERS, Georges. Escola, classe e luta de classe. São

Paulo: Centauro, 2005.

RE

FE

NC

IAS

Page 104: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 105: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Possibilitar a apreensão dos processos de socialização, a partir de distintas abordagens sociológicas, para a compreensão das novas configurações sociais.

Aborda os processos de socialização escolar.

Meta

Objetivo

7 unid

ade

FRANÇOIS DUBET – SOCIOLOGIA DA EXPERIÊNCIA: UMA NOVA VERSÃO DA

SOCIALIZAÇÃO ESCOLAR

Page 106: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:
Page 107: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

107UESC

UNIDADE VII

1 INTRODUÇÃO

Nesta unidade, vamos discutir uma nova abordagem

das análises sociológicas nas sociedades contemporâneas,

trazendo uma nova versão dos processos de socialização.

Essa concepção é importante para a compreensão das novas

configurações sociais na atualidade, frente aos ditames da

fragmentação das relações sociais. Você vai conhecer uma

referência da sociologia contemporânea, François Dubet, para

compreender o universo escolar hoje, com suas dinâmicas cada

vez mais inquietantes do ponto de vista prático, na nova versão

do conceito de socialização escolar.

Page 108: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

108 EAD

2 FRANÇOIS DUBET – SOCIOLOGIA DA EXPERIÊNCIA: UMA NOVA VERSÃO DA SOCIALIZAÇÃO ESCOLAR

Dubet é um sociólogo

francês, estudioso da juventude

marginalizada na França, que se

debruçou a compreender os dilemas

da escola francesa contemporânea a

partir da complexidade de seu modelo

escolar. Tem apresentado muito

destaque no campo educacional

ao propor uma nova abordagem

sobre o processo de socialização.

Ao considerar as mudanças nas

sociedades contemporâneas, novas

configurações sociais também se

desenham qualquer que seja o

desenvolvimento econômico dos

países. Todavia, parece que a

sociedade atual apresenta regulações

bem distintas e as instituições

tradicionais (escola, família, religião

etc.) parecem não serem capazes de

enquadrar novas demandas que se colocam nessa sociedade

atual.

Nesse sentido, o autor tece críticas aos conceitos

tradicionais de socialização centrados na ideia de sua

representação como interiorização pelos indivíduos da realidade

social, de suas regras e costumes. Sua reflexão se encaminha no

sentido de analisar as instituições tradicionais como incapazes

de enquadrar essas novas demandas, pois esvaziaram sua

significação e não cumprem mais o papel de controle social.

O autor tenta abordar a fragmentação dos papéis

conferidos pelas instituições sociais clássicas, na formação dos

indivíduos, alimentando um processo de desinstitucionalização

das instituições sociais morais: família, escola, igreja etc. Tenta

apresentar essa nova configuração a partir do complexo modelo

escolar francês.

SAIBA MAIS

Abordagens construídas pelos autores clássicos como Durkheim e Noberto Elias, Ver: Elias, N. O Processo civilizatório (1994).

R

AAC

a FU V

MK

PARA

CO

NH

ECER

François Dubet é sociólogo francês, pesquisador do Centre d´Analyse et d´Intervention Sociologigues – CNRS (Centre des Hautes Études em Sciences Sociales). Professor titular e chefe do departamento de sociologia da Universidade de Bordeaux II e membro sênior do Institute Universitaire de France. Atualmente vem sendo bastante referenciado na educação por suas pesquisas ligadas a jovens e aos dilemas escolares das escolas contemporâneas francesas.

FIGURA1 - François Dubet

Fonte: http://www.mps-ufeo.org/galeries_ufeo/good/francois_dubet.jpg

Page 109: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

109UESC

2.1 Conceito de desinstitucionalização

Dubet (1998) apresenta o conceito de

desinstitucionalização, em contrapartida da tradição clássica,

do conceito de socialização, no qual Parsons (1970) já

identificava nas instituições o conjunto de papéis e valores a

serem projetados nos indivíduos a partir das instituições sociais

(família, escola, igreja, comunidade, o direito etc). Segundo

Elias (1994), o processo de civilização foi tomado como

referência nas sociedades modernas a partir da construção

dessa internalização dos princípios gerais que as instituições

consolidam no sujeito. Essa internalização de normas e valores

se constrói de forma autônoma de ação e julgamento de si e de

outros, pois os indivíduos passam a se reconhecer, inicialmente,

na sua relação com o outro.

A representação da escola, por exemplo, corresponde

a esse princípio de socialização, por conta da significância

de seus valores e de suas disciplinas. Baseado no modelo

escolar francês, o autor tem como referência de socialização a

identificação do aluno ao mestre, subsidiada por uma prática

pedagógica. Assim sendo, cada modelo de instituição escolar

objetiva uma orientação de formação de pessoas. A saber:

escola elementar, formação de cidadãos franceses; escola

profissional, formação de operários; e, por fim, os liceus

clássicos, formação de homens de cultura. Essas classificações

são os segmentos de ensino do modelo francês.

Essa concepção de representação do outro, através dos

valores universais na construção da personalidade do indivíduo,

também cabe para explicar as instituições como a família e a

religião. Essa institucionalização dos valores e normas da família

é consolidada a partir de uma dada definição dos papéis sexuais

e por faixa etária a serem compartilhados pelos membros dessa

instituição e, na família moderna, além da própria definição dos

papéis sociais conferidos, tem o postulado da adequação dos

sentimentos. Para a religião, a igreja consolida-se a partir do

referencial da fé e do dogma, nas relações entre os indivíduos

e as composições sociais na sociedade.

A noção contida na sociologia clássica de que a realidade

social é um sistema integrado aos conceitos de modernidade e

as categorias Estado-nação e a divisão do trabalho não condizem

ATENÇÃO

Parsosn e Elias apre-sentam uma versão clássica no processo de socialização, a partir da ideia de internalização de papéis, produzidos a partir da interiorização de normas e valores, visando a coesão do sistema.

Page 110: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

110 EAD

com as mudanças verificadas na contemporaneidade, segundo

Dubet. A unidade e a identidade do sujeito não são mais um

dado. As relações e as dinâmicas suscitadas por essas lógicas é

que constroem a subjetividade do ator social e sua reflexividade

nesse contexto. Assim, o indivíduo social é concebido como

contendo uma subjetividade e não interpretado apenas como

simples agente da dinâmica social. Subjetividade representa,

para Dubet, a capacidade de reflexividade na experimentação.

O autor, nesse sentido, busca diferenciar a subjetividade da

noção de sujeito. Isso significa que a subjetividade é o reflexo

da ação do sujeito no contexto da realidade social. Vamos

explicar melhor essa ideia...

Os indivíduos não se relacionam mais

com a estrutura a partir de desenvolvimento

de papéis sociais apreendidos na socialização.

Há um processo de experimentação social que

reforça a individualidade. Os papéis sociais não

mais significam formas de condutas que serão

necessariamente desempenhadas pelos atores

sociais. Ao negar o modelo de socialização

clássico, defendido por Parsons (1970), no qual

as instituições sociais balizam a formação dos

indivíduos a partir de um cabedal de normas,

valores e costumes de uma dada sociedade, Dubet

resgata a própria experiência dos indivíduos como ação a ser

internalizada pelos sujeitos. Não se observa mais modelos,

papéis a serem reproduzidos, mas uma a experiência social.

Essa é a combinação de várias lógicas de ação, significando

o rompimento com a ideia de identidade/representação de

papéis e incorporação do ator de assumir várias lógicas de

ação. As combinações de lógica de ação não têm um sentido

único ou um centro. A experiência social não é uma maneira

de construir o mundo através das emoções, mas uma maneira

de construir o mundo cognitivamente, reflexivamente, através

de sua subjetividade. A experiência social se coloca entre

as ideias de uma autonomia do indivíduo e da objetivação

social. Os atores sociais não se empenham no desempenho

do papel, porque possuem uma experiência própria. A ideia de

identidade (vocação e expectativas) do ator e substituída pela

de experiência; o ator se distancia do papel.

ATE

ÃO

Experiência social é uma categoria importante na teoria de Dubet, pois vai de encontro com a socialização clássica promovida pelas instituições sociais. A experiência é outro tipo de socialização, aqui, vivenciada pelos indivíduos, nas suas capacidades de iniciativa e de escolha realizada na ação social. Só na ação social se constrói um conhecimento da sociedade, onde cada indivíduo experimenta, constrói a partir de suas práticas no meio da heterogeneidade.

PARA REFLETIR

Reiterando, instituições sociais que promovem um tipo de socialização inicial nos indivíduos: família, escola, religião etc.

Page 111: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

111UESC

Há uma separação da subjetividade do indivíduo e

da objetividade do papel. A socialização, em sua concepção

tradicional de incorporação de papéis, não se realiza nas

circunstâncias das novas configurações sociais com efetividade.

A experiência do ator, atualmente, se realiza e se inscreve

em registros múltiplos e não congruentes das expressões

sociais contemporâneas. Vamos explicar melhor esse quadro

teórico com um exemplo adotado pelo próprio Dubet, nas suas

pesquisas sobre jovens do subúrbio e professores.

É muito comum esse conflito entre juventude

marginalizada e educadores, a resistência na capacidade de

superação desses grupos sociais, em razão das mais diversas

explicações socioeconômicas. Parece um antagonismo comum,

reproduzindo muitas especulações negativas, o estigma e

resistência a ele, exagerando as características desse grupo

social. O estigma como instrumento de controle social volta-se

contra quem os estigmatiza. Para Dubet, a experiência desse

estigma faz com que esses jovens respondam, também, de

forma negativa a essa forma de violentá-los.

Dubet (1991), através de uma pesquisa sobre a

experiência escolar de estudantes do relativo ao ensino médio

francês, tenta mostrar como essa socialização se realiza como

ação da experiência. Ele mostra o assujeitamento dos jovens

sobre o seu próprio grupo na escola, a partir de uma dupla

experiência vivida no interior da instituição escolar: a experiência

de aluno e de jovem. Segundo o autor, é se autovalorizando

na experiência de jovem, que ele compensa ou se defende da

desvalorização de sua outra experiência escolar – de aluno, das

vicissitudes do julgamento escolar. O autor coloca ainda que,

em sua forma mais explícita, a resistência do “jovem” pode

tomar forma de violência. Repare que a “experiência de aluno”,

embora seja perpetrada por um modelo, um papel a cumprir,

ela escapa dessa configuração mais clássica de socialização e

recupera a mais condizente com sua experiência, sua vivência.

É essa forma de socialização que faz mais sentido para sua

condição de vida.

Page 112: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

112 EAD

2.2 Sociologia da experiência

A dominação absoluta por parte da instituição não

consegue reduzir a experiência do ator em relação aos papéis

impostos e constituiu-se uma subjetividade própria. Mesmo

no interior de uma instituição como a escola, o gerenciamento

de um modelo integralizador de condutas, normas e valores,

permite o desenvolvimento de uma socialização a partir de sua

experiência social. A experiência social se evidencia como a capacidade

de construção da realidade e de um projeto social,

concomitantemente subjetivo e cognitivo. Ou seja, uma

construção crítica do real, por meio de uma relação reflexiva

desenvolvida pelos indivíduos que julgam sua experiência e as

redefinem. Compreende a experiência social como a atividade

pela qual cada indivíduo constrói uma ação, cujo sentido e

coerência não são mais alocados por um sistema homogêneo e

por valores únicos quer servem para todos.

A funcionalidade de uma instituição ou a dominação

extrema não são elementos capazes de conformar papéis. Isso

não pode ser concebido como anomia ou desvio, mas como

necessidade de passar a interpretar a realidade a partir de

categorias como experiência social em detrimento da categoria

ação.

Nesse sentido, o objeto de uma Sociologia da experiência

é a própria subjetividade dos atores. A consciência dos atores

e a ideia que eles têm do mundo e deles próprios é a matéria

essencial. Os fatos mais objetivos não deixam de ser um fato

subjetivo. Subjetividade não é o vivido, mas a necessidade

de percepção da ação como experiência e como um drama.

A análise social observa, nesta experiência, problemas sociais

e questões que podem vir a explicar muitas ações sociais

hoje consideradas sem explicações ou, o que pior, tentando

medicalizar comportamentos considerados “desviantes”. Os

atores vivem a angústia da “experiência”, uma experiência nem

sempre das mais agradáveis de ser vivenciada. A experiência

é um projeto ético e não, necessariamente, uma realização.

Experiência é a consequência da dualidade moderna que

introduz uma separação no sujeito, criando o espaço de uma

subjetividade.

ATENÇÃO

Os indivíduos, con-forme o autor, não se relacionam mais com a estrutura a partir de desenvolvimento de papéis sociais apreendidos na sociali-zação. Há um processo de experimentação social que reforça a individualidade. Os pa-péis sociais não mais significam formas de condutas que serão necessariamente de-sempenhadas pelos atores sociais.

Page 113: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

113UESC

3 RESUMINDO O TEXTO: DIALOGANDO COM O ALUNO

Dubet aprofunda sua análise na instituição escolar

francesa, sobretudo, no modelo republicano francês. Ele

apreendeu um processo de mudança nesse mecanismo de

formação dos indivíduos, que foram se alternando até uma

determinada fase, num estado de crise. Para o autor, duas

situações promoveram esse estado de crise no universo escolar,

que, dentro de uma leitura sociológica, podemos recuperar

para a realidade brasileira.

A primeira situação se dirige mais acentuadamente ao

caráter fragmentado e desinstitucionalizador da instituição

escolar. A escola perdeu sua clareza e unidade, na medida em

que perdeu a capacidade de articular o seu desenvolvimento

e autenticidade com busca de utilidades escolares em relação

ao mercado. Aqui incide o problema da unidade e clareza de

seus objetivos, pois desencadeia uma má institucionalização

na construção desses indivíduos que estão submetidos a sua

socialização.

Outra questão observada por Dubet diz respeito aos

adolescentes e jovens que conseguem, com maior rigor,

construir experiências alternativas a esse “vazio” constituído

no processo de institucionalização das normas. Esses

valores e normas parecem estar completamente distantes

de suas aspirações e dos componentes balizadores de suas

subjetividades. É essa a representação do vazio que as

instituições têm promovido a esses jovens. Por isso, a ideia

da experiência, em que eles constroem vivências ao invés de

internalizar papéis. Por exemplo, jovens experimentam formas

de convivência no grupo, para se destacar, para se proteger

etc. Essas vivências são mais impactantes, do ponto de vista

de sua socialização, do que os valores promovidos nas escolas,

nas famílias, até porque, muitas vezes, esses valores são

produzidos de forma incoerente. Por exemplo, a escola cobra

determinados comportamentos dos alunos, de respeito, de

atenção, de disciplina, mas não se pratica da mesma forma

quando se dirigem aos alunos.

Outro exemplo, a ideia de amor deixa de ser uma

experiência pessoal para ser uma experiência social. O amor

Page 114: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

114 EAD

deixa de ser desintegrador para ser integrador. A ideia de

família duradoura e a do amor se fundem. Consequência:

mais divórcios, famílias monoparentais, novos modelos de

família. A família não está em crise, o que ocorre é uma nova

experimentação de família.

Surgem novas tecnologias sociais: conselhos conjugais,

educação sexual, imprensa feminina. A experiência individual,

concomitantemente, se torna mais subjetiva e mais social.

A experiência social é construída. Não é a expressão de um

sujeito. A ideia de concepção de mundo social único e coerente

deriva do indivíduo que organiza a experiência a partir de

formas definidas.

Outra questão colocada pelo autor, nesse processo de

desinstitucionalização, envolve a massificação escolar. Essa

situação, recorrente na contemporaneidade, funciona mediada

por um mercado, no qual os indivíduos agem de acordo com

seus recursos, promovendo uma extensa competitividade entre

os grupos sociais e estabelecimentos de estudo.

Esse drama ocorre em razão de fortes ajustes pedagógicos

conferidos para dar conta da seleção social que a escola fazia

para cada tipo de formação voltada para os diferentes grupos

sociais. Com a massificação, a seleção passou acontecer de

forma branda e fracionada, incorporada no próprio sistema,

como se fosse inerente. Dubet enfatiza que a escola, nessa

direção, perdeu sua capacidade de administrar as relações

de ordem interior e exterior, do universo escolar e juvenil. A

organização escolar incidiu numa ausência de enquadramento

da vida juvenil e destaca que os problemas de tensão entre

aluno e adolescentes/jovens estão no centro da experiência

escolar.

O desenvolvimento de uma sociologia dos atores

educativos representa uma mudança de paradigma, em

particular, na compreensão do aluno como ator que age

estrategicamente e se forma, construindo a sua experiência

na articulação de distintas lógicas de ação. Relativamente

às concepções dominantes há trinta anos “[...] as análises

sociológicas sofreram mudanças significativas: de uma lógica

de “denúncia” para uma “lógica da interpretação”, de uma

sociologia “macroestrutural” para uma “microssociologia”,

deslocando o seu foco de análise do “funcionamento das

Page 115: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

115UESC

estruturas” para o “campo fluído da construção social das

práticas e dos problemas educativos” (CANÁRIO, 2005, p. 39).

Essa sim seria uma nova abordagem para os processos de

socialização, na análise sociológica.

SUSCITANDO QUESTIONAMENTOS:

VAMOS PESQUISAR E REFLETIR?

ATIVIDADE

1. Para François Dubet, a experiência social substituiu a ação no processo de socialização na contemporaneidade. Descreva como se dá esse processo e como ele influencia a violência entre os jovens e as desigualdades sociais, segundo o autor.2. Qual a contribuição desse autor no campo da sociologia da educação? Recupere seus principais conceitos sociológicos.

FILME RECOMENDADO

Cartaz de divulgação do filme: PRO DIA NASCER FELIZ

PRO DIA NASCER FELIZ. Direção: João Joaquim. Produção: Flávio R. Tambellini e João Jardim. Elenco: não divulgado. Local de divulgação: Brasil. Produtora: Ravina Filmes / Fogo Azul Filmes, 2002. DVD.

O filme – documentário - retrata a situação de jovens da mesma faixa etária, mas em ambientes e condições socioeconômicas diferenciadas, em várias realidades brasileiras. Debruça-se a mostrar as diferentes expectativas desses jovens no enfrentamento de suas experiências de vida, junto ao preconceito, à violência, à insegurança e à esperança. O filme explora as fragilidades internas do sistema de ensino brasileiro e procura centralizar as experiências

individualizadas no caminho de superação.

Page 116: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

116 EAD

RE

FE

NC

IAS

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade e ambivalência. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1999.

BERGER, Peter; LUCKMANN, T. A construção social da realidade. Petrópolis: Vozes, 2003.

DUBET, François. Sociologia da Experiência. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.

DUBET, François. A formação dos indivíduos: a desinstitucionalização. Revista Contemporaneidade e Educação, ano III, n. 03, mar. 1998.

ELIAS, N. O processo civilizador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. v. 1.

PARSONS, T. A sociologia americana. São Paulo: Cultrix, 1970.

Page 117: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

Suas anotações

________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________

Page 118: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

118 EAD

Profa. Rogéria Martins

Socióloga, Mestre em Educação/UFBA e doutoranda em Políticas Públicas/UERJ.

Prof. Dr. Elias Lins Guimarães

Sociólogo, especialista em Sociologia - PUC/MG, mestre e doutor em Educação - UFBA/BA, professor do Departamento de Filosofia e Ciências Humanas/DFCH – UESC.

Informações sobre os autores

Page 119: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

119UESC

Gostaríamos de enfatizar que a proposta desse material

é apenas uma breve apresentação de algumas abordagens

teóricas no campo disciplinar da sociologia da educação.

O universo é imenso, tivemos que focar, muitas foram as

limitações: proposta pedagógica do curso, tamanho do material,

tempo para o critério de seleção e volume de informações.

Cada dia escrevendo, percebemos a necessidade gritante

de lançar mão de mais exemplos, mais versões teóricas, mais

interpretações sociológicas, outros autores... Enfim, o rigor

metodológico nos segurou as mãos e o teclado.

Tentamos construir uma abordagem, fomentando

inquietações, curiosidades, mais necessidade por parte do

aluno em buscar as sugestões bibliográficas e as próprias

referências que não foram aqui sistematizadas nas sugestões,

sem, contudo, serem consideradas desprezadas.

A metodologia de trabalho foi um capítulo à parte:

definimos estratégias de construção coletiva. Nesse sentido,

algumas unidades foram conduzidas individualmente, mas

com a contribuição de revisões atentas de ambos os autores

e, na unidade de Marx, registramos efetivamente uma autoria

conjunta. Dadas as nossas atividades cotidianas, o tempo de

escrever se definia de forma muito particular para cada autor

e nos isolava na escrita. Coisas de um tempo com restrições

temporais.

Estamos vivenciando uma nova versão de um modelo

educativo, e esse material é uma primeira experiência que

estamos construindo, com a nítida certeza de que precisamos

melhorar. O diálogo e a interlocução de vocês serão

CONCLUSÃO DOS AUTORES

Page 120: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

120 EAD

importantíssimos para o enriquecimento desse trabalho e, por

isso, contamos com uma avaliação cuidadosa da proposta desse

material: a linguagem, a arrumação dos textos, as atividades,

as sugestões de filmes... Enfim, demais atividades a serem

propostas para melhorar a compreensão de vocês.

Mas não podemos deixar de enfatizar: em um curso de

sociologia, bem como nos demais cursos da área de humanas,

a leitura é imprescindível! Não existe possibilidade de participar

sem essa contrapartida de vocês. A interpretação da realidade

é mediada por um corpo teórico que precisa ser conhecido e

apropriado para iniciar um debate. Sem o apoio desse inventário

teórico (que não necessariamente devem ser somente os aqui

apresentados), caímos na velha armadilha dos “achismos” e

num caldeirão de opiniões, construídas pelo senso-comum, ao

que Toquecvile chamou de tirania da opinião.

O desafio é grande, afinal a nova linguagem pedagógica

vai exigir de todos nós: vocês, enquanto alunos, e nós,

professores, um esforço considerável para compreender, sem

aquela velha linguagem escolar: nossa troca de olhares – aquela

que a gente percebe e aplica quando não estamos entendendo

uma questão...

Assim sendo, nos apropriamos de uma leitura da

professora Marilena Chauí para tentar elucidar um pouco essa

relação entre a existência de professores e alunos virtuais, mas

absolutamente reais, em tempos pós-moderno:

Se a modernidade havia caracterizado pela confiança iluminista na razão como força que libera o homem do medo causado pela ignorância e pela superstição a pós-modernidade proclama a falência da razão para cumprir a promessa emancipatória e exibe sua força opressora sobre a natureza e sobre os homens. [...] Declara-se o fim da separação moderna entre o público e privado, em benefício do segundo termo contra o primeiro, fazendo-se o elogio da intimidade e criticando-se os pequenos poderes na família, na escola e nas organizações burocráticas; nega-se a possibilidade de teorias científicas e sociais de caráter globalizante, pois não possuiriam objeto a ser totalizado num universo físico e histórico fragmentado, descentrado, relativo e fugaz. Prevalece a sensação do efêmero, do acidental, do volátil, num mundo onde “tudo que é sólido derrete no ar” [...] Os objetos são descartáveis, as relações pessoais e sociais têm

Page 121: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia:

121UESC

rigidez vertiginosa do fast food [...] tempo e espaço foram de tal modo comprimidos pelos satélites e telecomunicações e pelos meios eletrônicos, assim como pelos novos transportes, que o tempo tornou-se sinônimo de velocidade e, o espaço, sinônimo da passagem vertiginosa de imagens e sinais (CHAUÍ apud RODRIGUES 2007, p. 124),

O nosso desafio é justamente dialogar com um tempo

em que estamos perdendo a centralidade, desarticulando a

aparente e inquestionável racionalidade de uma dinâmica

considerada natural.

A partir desse novo modelo educativo, a relação entre

professores e alunos virtuais define uma nova configuração de

novos atores envolvidos no processo educativo: o professor

coletivo e o estudante autônomo (BELLONI, 1999). E, nesse

particular, sugerimos aos estudantes dessa modalidade uma

atenção primordial com a responsabilidade de sua autonomia e

da qualidade de sua formação.

Estamos abertos à experiência e receptivos à novidade,

abrindo um universo de possibilidades para o nosso cotidiano

de trabalho docente, tentando compreendê-las dentro do curso

da história, como sugere Lévy (1999), mas sem abrir mão da

perspectiva humanista dentro do conteúdo técnico de um novo

fazer pedagógico.

Contudo, fechamos esse trabalho com apenas uma única

certeza: sem uma formação teórica sólida, os novos fazeres

pedagógicos e todo o esforço que as tecnologias de informação

e comunicação acumularam para chegar até aqui de nada

valerão. O sucesso dessa empreitada é tão coletivo quanto suas

responsabilidades. Cabe a todos nós, agora, trabalhar para que

a experiência seja elemento edificante na democratização do

conhecimento, na democratização do ensino superior.

Nesse caminho tortuoso, cheio de incertezas na pós-

modernidade, talvez lançar mão da história seja um bom

caminho para alimentar nossas trajetórias. Finalizamos com

a sugestão do filme NÓS QUE AQUI ESTAMOS POR VÓS

ESPERAMOS, de Marcelo Masagão (BRASIL, 1998), para pensar

sobre a sociedade contemporânea, no século XX, um exercício

de reflexão humanista.

Os autores

Page 122: Vice-reitora Pró-reitora de Graduação Diretora do Departamento de Ciências da ...nead.uesc.br/arquivos/pedagogia/reoferta/sociologia... ·  · 2012-11-14Os clássicos da sociologia: