Upload
duongkhuong
View
230
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
BACHARELADO EM DESIGN
JÚLIA PAZZINI
VIVA O CENTRO - circuito de comida potiguar
Um projeto de design para a Cidade Alta
NATAL-RN
2016
2
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES
BACHARELADO EM DESIGN
JÚLIA PAZZINI
VIVA O CENTRO - circuito de comida Potiguar
Um projeto de design para a Cidade Alta
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado como requisito para
obtenção do título de Bacharel em
Design pela Universidade Federal do
Rio Grande do Norte.
ORIENTADOR: Prof. PhD Olavo
Fontes Magalhães Bessa
CO-ORIENTADORA: Prof. MSc Silvia
Aparecida de Alencar Matos
NATAL-RN
2016
3
JÚLIA PAZZINI
VIVA O CENTRO - Circuito de Comida Potiguar
Um Projeto de Design Para a Cidade Alta
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como
requisito para obtenção do título de Bacharel em Design
pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
ORIENTADOR: Prof. PhD Olavo Fontes Magalhães
Bessa
CO-ORIENTADORA: Prof. MSc Silvia Aparecida de
Alencar Matos
Aprovado em: ___/___/___
BANCA EXAMINADORA
Prof. PhD. Olavo Fontes Magalhães Bessa
Orientador Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Prof. MSc Silvia Aparecida de Alencar Matos
Co-orientadora Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte
Prof. Livia Maia Brasil
Membro Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Prof. MSc Ivana dos Santos de Lima e Souza
Membro Universidade Federal do Rio Grande do Norte
NATAL-RN 2016
4
AGRADECIMENTOS
À vida, porque é bela.
Aos meus pais, Gilson e Marilene, que não sabem os limites do amor e da
dedicação, e a quem eu devo tudo o que sei e sou.
Aos meus orientadores, Silvia e Olavo. Vocês são as pessoas que mais me
inspiram no design. Obrigada por terem confiado neste projeto e por todos os
ensinamentos, dentro e fora de sala de aula.
Aos meus irmãos, Caio e Igor. Vocês foram o maior presente que o pai e a mãe
poderiam me dar, tenho orgulho de ser a vossa irmã.
Ao meu avô, Aldo, que mesmo longe torce por mim.
À minha amiga Yara. Você é a irmã que sempre pedi, agradeço todos os dias
por ter alguém como você ao meu lado, nos acertos e tropeços da vida. Obrigada
por me fazer tentar e não desistir, sem você não teria conseguido.
À Janna, por me ensinar que eu posso, por me ouvir nas horas de angústia e
por todos os anos de amizade, sem você eu também não teria conseguido.
À Diana, que fez muito mais que fotos e desenhos, obrigada por vir de tão
longe e por me confiar a sua amizade a mim, este projeto também é seu. Ti amo,
sorrella.
A Shinho, por ser meu amigo da vida, do trabalho, das pausas pro café.
A todos que participaram da organização do R Design 2012 comigo, aquele
projeto mudou a minha cabeça e coração, e vocês fizeram parte disso.
Ao Politecnico di Milano, instituição que aprendi a amar e que foi minha escola
por um ano.
Aos meus amigos italianos, que mesmo longe, estão no meu pensamento, vi
tengo in cuore.
Aos irmãos Mameri Tinôco, Gabi e Mateus, e à Minduh, obrigada pela morada
sempre disponível e pelo café quentinho ao acordar.
Às minhas amigas do CEFET, Rafaella, Raqueline e Jaquieli, 4 anos foram
suficientes para nos unir para o resto da vida. Amo vocês!
E por fim, à todos que toceram por mim e que perguntavam “e o TCC?”, bem,
já deu certo.
5
“Deixe-me ir
Preciso andar
Vou por aí a procurar
Rir pra não chorar
Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar”
Cartola
6
RESUMO
Este trabalho visa propor uma solução projetual de design, diante da qual os
usuários possam reconhecer a Cidade Alta enquanto Centro Histórico-Cultural, a
partir da descoberta da comida do bairro. Para se atingir tal objetivo, foi necessário
buscar na literatura teorias que tratassem da imagem e do imaginário da cidade,
relacionando o ambiente urbano à alimentação, e esta como forte elemento da
cultura de um povo. A partir da aplicação de ferramentas do design thinking, foi
possível desenvolver a metodologia do projeto, ao viabilizar a participação dos
usuários, partes interessadas do processo de design. Além de ferramentas do
design thinking, utilizou-se neste trabalho os métodos “mapa do modelo mental” e
“exame sistemático”, com a finalidade de entender como as pessoas visualizavam a
Cidade Alta sob a perspectiva do alimento. O serviço proposto como solução
projetual às necessidades e desejos dos usuários recebe o nome Viva o Centro –
Circuito de Comida Potiguar.
Palavras-chave: imagem da cidade, localização geográfica, Cidade Alta de Natal,
comida potiguar, design participativo, design de serviços.
7
ABSTRACT
This work aims to propose a design solution on which users can recognize the
Cidade Alta - Natal as Historic-Cultural Center from uncovering the power of the
neighborhood. To achieve this objective it was necessary to find on theoretical
research concepts that treat the image and the imaginary city connecting the urban
environment to food and this is a strong element of the culture of a people. The
method used design thinking tools, it was possible to develop the project
methodology with the participation of users, stakeholders in process. Moreover this
process used design thinking tools as "map of the mental model" and "systematic
examination" in order to understand how people visualized the Cidade Alta – Natal
from the perspective of the food. The service proposed was a design solution to the
needs and desires of users receive the name: Live the center - Circuit Potiguar Food.
Keywords: image city; geographic location; Cidade Alta de Natal; potiguar food;
participatory design; service design.
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – London Design Map – East (Londres), seus marcos e vias................. 18
Figura 2 – Exemplo de uma ilustração de um mapa temático não exato.............. 22
Figura 3 – Imagem aérea da Cidade Alta.............................................................. 31
Figura 4 – Praça André de Albuquerque................................................................ 32
Figura 5 – Praça das Mães.................................................................................... 32
Figura 6 – Palácio Felipe Camarão........................................................................ 34
Figura 7 – Igreja do Galo....................................................................................... 34
Figura 8 – IFRN Cidade Alta.................................................................................. 34
Figura 9 – Beco da Lama....................................................................................... 34
Figura 10 – IX edição do Festival Pratodomundo.................................................. 38
Figura 11 – Cartaz da IX edição do Festival Pratodomundo................................. 39
Figura 12 – Balanço na árvore............................................................................... 43
Figura 13 – Método Bootcamp bootleg.................................................................. 45
Figura 14 – Redesenho do método a partir de Standford (2009-2012)................. 47
Figura 15 – Processo de ideação a partir da aplicação da ferramenta CNP......... 56
Figura 16 – Mapa do sistema do serviço “travel global | read local”...................... 57
Figura 17 – Desenho do mapa do modelo mental elaborado pelo voluntário 1.... 61
Figura 18 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 1.................. 62
Figura 19 – Desenho do mapa do modelo mental elaborado pelo voluntário 2.... 63
Figura 20 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 2.................. 64
Figura 21 – Desenho do mapa do modelo mental do voluntário 3........................ 65
Figura 22 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 3.................. 66
Figura 23 – Desenho do mapa do modelo mental do voluntário 4........................ 67
Figura 24 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 4.................. 68
Figura 25 – Investigação fotográfica: marcos referenciais.................................... 71
Figura 26 – Investigação fotográfica: pontos de alimentação............................... 72
Figura 27 – Investigação fotográfica: vias.............................................................. 73
Figura 28 – Printscreen da página web do mapa do “Concurso Nacional
Comida di Buteco” – Rio de Janeiro...................................................................... 74
Figura 29 – Printscreen da página web Foodie Map of Copenhagen…………….. 76
Figura 30 – Moleskine City Notebook………………………………………………… 77
9
Figura 31 – Histórias capturadas e compartilhas................................................... 79
Figura 32 – Padrão: recorte da área...................................................................... 80
Figura 33 – Padrão: problemas.............................................................................. 80
Figura 34 – Padrão: marcos referenciais............................................................... 80
Figura 35 – Padrão: similares................................................................................ 80
Figura 36 – Padrão: soluções projetuais ditas pelas pessoas............................... 81
Figura 37 – Padrão: características das personas................................................. 81
Figura 38 – Perfil da persona Janaína................................................................... 82
Figura 39 – Perfil da persona Fausto..................................................................... 83
Figura 40 – Perfil da persona Diana...................................................................... 84
Figura 41 – Mapa do sistema do serviço Viva o Centro........................................ 88
Figura 42 – Modelo físico do serviço Viva o Centro............................................... 89
Figura 43 – Brain dumping visual e kit de peças para o serviço Viva o Centro..... 90
Figura 44 – Paleta de cores do conceito visual..................................................... 91
Figura 45 – Mapa do serviço Viva o Centro – Circuito de Comida Potiguar.......... 92
Figura 46 – Cartão-postal meladinha..................................................................... 92
Figura 47 – Cartão-postal caldo............................................................................. 93
10
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Regiões administrativas e bairros de Natal-RN................................. 30
Tabela 2 – Marcos referenciais indicados nos mapas dos voluntários................ 69
Tabela 3 – Pontos de alimentação indicados nos mapas dos voluntários........... 70
Tabela 4 – Vias indicadas nos mapas dos voluntários........................................ 70
Tabela 5 – Lista de verificação: Comida di Buteco – Rio de Janeiro................... 75
Tabela 6 – Lista de verificação: Foodie Map of Copenhagen.............................. 77
Tabela 7 – Lista de verificação: Moleskine City Notebook................................... 78
Tabela 8 – Aplicação da ferramenta CNP............................................................ 85
11
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.................................................................................................. 14
2 REFERENCIAL TEÓRICO............................................................................... 16
2.1 OS SIGNIFICADOS DA IMAGEM E DO IMAGINÁRIO DA CIDADE........ 16
2.2 SISTEMAS REFERENCIAIS E DE LOCALIZAÇÃO.................................. 20
2.3 CIDADE, COMIDA E CULTURA................................................................ 26
2.4 CIDADE ALTA DE NATAL......................................................................... 30
2.5 COMIDA POTIGUAR................................................................................. 34
2.6 FESTIVAL PRATODOMUNDO: EVENTO DE COMIDA DO CENTRO..... 37
2.7 O DESIGN PARA CONSTRUÇÃO DE SERVIÇOS................................... 39
2.8 DESIGN PARTICIPATIVO......................................................................... 41
2.9 AS FERRAMENTAS DO DESIGN THINKING PARA AUXILIAR
PROJETOS DE DESIGN PARTICIPA
44
3 MÉTODO........................................................................................................... 45
3.1 CRIANDO REPERTÓRIO.......................................................................... 48
3.1.1 Entrevista para a empatia................................................................. 49
3.1.2 Investigação fotográfica.................................................................... 50
3.1.3 Mapa do modelo mental e exame sistemático................................. 51
3.1.4 Análise de Similares (lista de verificação)........................................ 51
3.2 CONCEITUANDO...................................................................................... 52
3.2.1 Capturar e compartilhar histórias...................................................... 52
3.2.2 Saturar e agrupar.............................................................................. 53
3.2.3 Criação de persona.......................................................................... 54
3.3 IDEANDO................................................................................................... 54
3.3.1 Como nós poderíamos?................................................................... 55
3.4 MODELANDO............................................................................................ 56
12
3.4.1 Modelagem verbal do serviço........................................................... 57
3.4.2 Mapa do sistema do serviço............................................................. 57
3.4.3 Modelar para representar................................................................. 58
3.5 ESCOLHENDO E APLICANDO O CONCEITO VISUAL........................... 58
3.5.1 Brain dumping visual e Kit de peças................................................. 58
3.5.2 Corposição........................................................................................ 59
4 RESULTADOS ATINGIDOS............................................................................. 60
4.1 CRIANDO REPERTÓRIO.......................................................................... 60
4.1.1 Entrevista para a empatia................................................................. 60
4.1.2 Mapa do modelo mental e exame sistemático................................. 61
4.1.2.1 Voluntário 1........................................................................... 61
4.1.2.2 Voluntário 2........................................................................... 62
4.1.2.3 Voluntário 3........................................................................... 65
4.1.2.4 Voluntário 4........................................................................... 67
4.1.2.5 Voluntário 5........................................................................... 69
4.1.3 Investigação fotográfica.................................................................... 69
4.1.4 Análise de Similares......................................................................... 74
4.1.4.1 Comida di Buteco – Rio de Janeiro....................................... 74
4.1.4.2 Foodie Map of Copenhagen.................................................. 75
4.1.4.3 Moleskine City Notebook……………………………………… 77
4.2 CONCEITUANDO...................................................................................... 78
4.3 IDEANDO................................................................................................... 85
4.3.1 Como nós poderíamos?................................................................... 85
4.4 MODELANDO............................................................................................ 86
4.4.1 Modelagem verbal............................................................................ 86
4.4.2 Mapa do sistema do serviço “Viva o centro”..................................... 88
4.4.3 Modelo representativo do serviço..................................................... 89
13
4.5 ESCOLHENDO E APLICANDO O CONCEITO VISUAL........................... 90
5 CONCLUSÃO................................................................................................... 94
6 DESDOBRAMENTOS FUTUROS.................................................................... 96
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................. 97
APÊNDICES.................................................................................................... 100
ANEXOS.......................................................................................................... 105
14
1 INTRODUÇÃO
A motivação em realizar esta pesquisa surgiu a partir da percepção inicial de
que a Cidade Alta não seria apenas um Centro Comercial. A surpresa que senti
quando percebi que a alimentação do bairro poderia representar um elemento
importante para o reconhecimento do bairro como Centro Histórico-Cultural, foi uma
motivação para a construção de um trajeto de comidas potiguares, por meio de
ferramentas do design.
Este Trabalho de Conclusão de Curso visa propor uma solução projetual de
design diante da qual os usuários possam reconhecer a Cidade Alta, bairro
localizado em Natal, capital do Rio Grande do Norte, como Centro Histórico-Cultural,
a partir da descoberta da comida do bairro.
Para alcançar tal objetivo, foi preciso observar e interpretar como as pessoas
se localizam na Cidade Alta, qual a relação que elas estabelecem entre o bairro e a
sua comida, ao percorrerem caminhos reais e imaginários dentro da escala urbana,
além de investigar qual a percepção sócio-cultural que elas possuem da Cidade Alta,
percepções essas especificamente ligadas à comida ali ofertada.
Nossa hipótese é que com a implantação do projeto, as pessoas reconheçam o
bairro Cidade Alta como um local caracterizado, também, pela variedade e qualidade
da sua comida, e não somente como região comercial e de oferta de pequenos
serviços.
A fim entender como as pessoas interagem com o meio urbano e como são
estabelecidas as relações humanas na escala urbana, utilizaremos conceitos de
imagem e imaginário da cidade, além de introduzir alguns meios utilizados pelo
homem para auxiliar na localização geográfica. Precisamos entender também como
o alimento pode significar um elemento que transcende o tempo e traz com ele
informações importantes sobre o território e a cultura de um povo.
No que toca a esta pesquisa, precisamos conhecer um pouco a respeito da
história do bairro da Cidade Alta e da sua alimentação, e não só, precisamos buscar
na literatura informações a respeito da comida do potiguar, e como ela encontra e
percorre diferentes caminhos no centro da Capital do estado do Rio Grande do
Norte.
Buscando responder à hipótese aqui levantada, serão utilizadas ferramentas do
design thinking aplicadas em projetos que visam incluir a participação de usuários no
15
processo do design. Fomos buscar no kit de ferramentas Bootcamp Bootleg,
proposto pela Universidade de Standford, as ferramentas necessárias para guiar o
desenvolvimento prático deste trabalho, para que ao final do processo pudéssemos
propor uma solução de design que auxiliasse no reconhecimento de um circuito de
comida dentro da Cidade Alta.
A realização da pesquisa aqui registrada nos levou a conhecer novos caminhos
dentro da Cidade Alta, berço da cidade do Natal, redirecionando o nosso olhar para
novos lugares dentro dos limites do bairro, e não só, conseguimos perceber que
muitas vezes as pessoas não conhecem a cidade onde vivem e não são motivadas
a resinificar suas experiências urbanas, o que precisamos é ocupar os nossos
ambientes, comer na rua, comer comida regional, conhecer a nossa história e
reconhecer os nossos valores culturais, ricos e motivos de orgulho. O alimento pode
significar um ponto de partida para esse reconhecimento.
16
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Neste capítulo, utilizaremos estudos científicos encontrados na literatura para
embasar a temática abordada no presente Trabalho de Conclusão de Curso. Serão
tratados temas comuns à imagem da cidade e como o design se relaciona com tal
questão.
2.1 OS SIGNIFICADOS DA IMAGEM E DO IMAGINÁRIO DA CIDADE
A construção de conteúdos sobre a cidade e seus significados é uma tarefa
complexa que necessitaria de domínio teórico com abordagens aprofundadas em
estudos da “cultura da imagem”, desenvolvidos por especialistas de diversas áreas
das ciências humanas como Filósofos, Antropólogos, Linguistas, Semioticistas,
Arquitetos e Artistas em geral; além de uma análise também aprofundada da
construção e configuração de espaços públicos, que não vem a ser o objeto de
estudo deste TCC. Dessa maneira, neste tópico será exposta uma abordagem
simplificada sobre estudos que tratam da cidade e da sua imagem, apenas no
sentido de conhecer um pouco a respeito dos conceitos ligados a este tema.
Existem diversas definições para o termo “cidade”, utilizaremos aqui aquela
dada por Lynch. Segundo o autor americano, cidade é uma “obra arquitetônica, uma
construção no espaço em grande escala; uma coisa que só é percebida no decorrer
de longos períodos de tempo” (LYNCH, 2011, p.1). O estudioso ainda nos diz que o
modo como uma cidade é vista e percebida depende de um vasto conjunto de
associações, particulares a cada cidadão, com alguma parte de sua cidade, relações
essas traduzidas em uma imagem impregnada de lembranças e significados únicos.
É nas cidades que são estabelecidas as relações sociais, e esses espaços
surgem como um resultado da relação entre o homem e o mundo, entre o homem e
o seu entorno. Tais processos urbanos, caracterizados pelo trabalho, pelas formas
de ganhar a vida e pelas relações humanas são marcados de “intencionalidade”1. O
espaço da cidade surge, então, a partir do confronto do conjunto de
intencionalidades, que é responsável pela formação da imagem da cidade, pela sua
configuração (SANTOS 19-- apud FERRARA, 2000).
1 Busca de adequação entre a estrutura, a natureza interna do objeto e a função a que se destina. (GOMES 19-- apud LIMA, 2014).
17
O urbanista americano Kevin Lynch, a partir dos estudos reunidos e divulgados
em seu livro “A imagem da Cidade”, introduziu o termo imaginabilidade2, que é
[...] a característica, num objeto físico, que lhe confere uma alta probabilidade de evocar uma imagem forte em qualquer observador dado. É aquela forma, cor ou disposição que facilita a criação de imagens mentais claramente identificadas, poderosamente estruturadas e extremamente úteis ao ambiente. Também poderíamos chamá-la de legibilidade ou, talvez, de visibilidade num sentido mais profundo, em que os objetos não são apenas passíveis de serem vistos, mas também nítida e intensamente presentes aos sentidos (LYNCH, 2011, p.11).
O autor dividiu o conteúdo da imagem da cidade e classificou-o em cinco tipos
de elementos: vias, limites, bairros, pontos nodais e marcos. No âmbito desta
pesquisa, focaremos em três deles: vias, bairros e marcos. Seguem os significados,
para esses elementos, segundo Lynch (2011, pp. 52-53).
Vias. As vias são os canais de circulação ao longo dos quais o observador se locomove de modo habitual, ocasional ou potencial. Podem ser ruas, alamedas, linhas de trânsito, canais, ferrovias. Para muitas pessoas são estes os elementos predominantes em sua imagem. Os habitantes de uma cidade observam-na à medida que se locomovem por ela, e, ao longo dessas vias, os outros elementos ambientais se organizam e se relacionam. Bairros. Os bairros são as regiões médias ou grandes de uma cidade, concebidos como dotados de extensão bidimensional. O observador nele “penetra” mentalmente, e eles são reconhecíveis por possuírem características comuns que os identificam. Sempre identificáveis a partir do lado interno, são também usados para referência externa quando visíveis de fora. Até certo ponto, muitos estruturam sua cidade dessa maneira, com diferenças individuais em suas respostas a quais são os elementos dominantes, as vias ou os bairros. Isso não parece depender apenas do indivíduo, mas também da cidade. Marcos. Os marcos são um tipo de referência [...] externa. Em geral, são um objeto físico definido de maneira muito simples: edifício, sinal, loja ou montanha. Seu uso implica a escolha de um elemento a partir de um conjunto de possibilidades. Alguns marcos são distantes, tipicamente vistos de muitos ângulos e distâncias, acima do ponto mais alto de elementos menores e usados como referências radiais. Podem estar dentro da cidade ou a uma distância tal que, para todos os fins práticos, simbolizam uma direção constante. Como exemplos, podemos citar as torres isoladas, as cúpulas douradas, as grande montanhas. Até mesmo um ponto móvel, como o sol, cujo movimento é suficientemente lento e regular, pode ser usado como marco. Outros marcos são basicamente locais, sendo visíveis apenas em lugares restritos e a partir de uma certa proximidade. São eles os inúmeros anúncios e sinais, fachadas de lojas, árvores, maçanetas de portas e outros detalhes urbanos que preenchem a imagem da maioria dos observadores. São geralmente usados como indicadores de identidade, ou até de estrutura, e parecem tornar-se mais confiáveis à medida que um trajeto vai ficando cada vez mais conhecido.
2 Termo usado primeiramente por Lynch (2011) em seu livro “A Imagem da cidade”, onde aparece escrito em itálico, por ter sido traduzido diretamente do inglês para o português e não possuir equivalente na língua portuguesa.
18
A figura a seguir exemplifica os elementos da imagem da cidade aqui
estudados (bairros, vias e marcos), dispostos em um desenho de um mapa
ilustrativo do bairro de East London, na cidade de Londres, UK, no tópico a seguir
iremos discorrer mais a respeito do que são mapas. Os pontos numerados referem-
se aos locais pertencentes ao distrito de Design, instalado na região, uma pequena
amostra do que a zona tem a oferecer em Design e diversidade.
Figura 1 – London Design Map – East (Londres), seus marcos e vias.
Fonte: Adaptado pela autora a partir de London Design Map, 2011. Disponível em:
<http://londondesignmap.blogspot.com.br/> Acesso em: 26 Maio 2016.
Com a análise do mapa da figura 1 também é possível entender como os
elementos constituintes da imagem da cidade se relacionam e compõem imagens,
sendo essas únicas e particulares a cada indivíduo, repletas de valores e
significados, e se o ambiente for visivelmente organizado e nitidamente identificado,
o cidadão poderá impregná-lo com seus próprios significados e relações, se
tornando um lugar notável e inconfundível (LYNCH, 2011). Ferrara (2000)
complementa ao dizer que esta imagem particular a cada indivíduo não é estática e
19
imutável, mas altera-se conforme mudam as características e relações individuais e
sociais dos sujeitos que a produzem.
Ferrara (2000) diz que estabelecer relações é atribuir significados, ou seja,
aprender a diferença que se pode encontrar num conjunto de fatos rotineiros que,
lidos sob a ótica de diferentes indivíduos, permite traduzir o hábito, a rotina, em
alguma coisa perceptível. É nessa tradução que o Design pode atuar, ao propor
projetos que venham a interpretar e traduzir as imagens mentais das pessoas em
soluções palpáveis, promovendo o reconhecimento da cidade a partir da constituição
da sua imagem física, da sua imagem fragmentada e dos elementos que a compõe.
Para entender o que vem a ser imagem física e imagem fragmentada da cidade
percebida, utilizaremos o pensamento da estudiosa Ferrara (2000, p 22-26), que
relaciona os dois conceitos:
A imagem física é o estímulo primeiro para a percepção da imagem urbana, ela só se completa a partir da complexa relação que permite estabelecer com o repertório cultural individual e coletivo de uma população, de uma sociedade, de uma cultura. Imagem fragmentada, mas não dispersa, ao contrário, é múltipla porque corresponde à natureza da vivência e experiência do urbano; a visibilidade presente na percepção da imagem urbana é sensível e cognitiva ao mesmo tempo.
Portanto, a percepção da imagem da cidade supõe uma concreta base material
(vias, bairros, marcos) sobre a qual é gerada a tensão/produção de aspectos
imateriais, do imaginário individual e coletivo, cada vez mais representativos da
cidade; desse modo, a idealização, ou como cada indivíduo interpreta os lugares
urbanos, se dá na exata proporção em que se multiplicam as imagens da cidade
(físicas e fragmentadas) (FERRARA, 2000).
Nessa dimensão, o projeto de design do qual estamos tratando neste trabalho,
se apropriará das características referenciais e descritivas presentes no desenho
dos mapas dos modelos mentais das pessoas e dos caminhos percorridos na
cidade, visando entender como elas interpretam o bairro da Cidade Alta na
dimensão da sua imaginabilidade.
A seguir serão introduzidos alguns conceitos de sistemas referenciais e de
localização em cidades, que se fazem necessários para compreender como as
pessoas traçam seus caminhos e quais recursos são utilizados por elas para
identificar e reconhecer as partes dentro do espaço urbano.
20
2.2 SISTEMAS REFERENCIAIS E DE LOCALIZAÇÃO
Como as pessoas fazem para se localizar em locais desconhecidos ou pouco
frequentados? Como os caminhos percorridos são identificados e memorizados, ou
ainda, como a cidade é reconhecida a partir de suas partes e padrões? Lynch (2011,
p. 8) disse que “o mundo pode ser organizado em torno de um conjunto de pontos
focais, ou fragmentado em regiões designadas por nomes, ou, ainda, interligado por
caminhos passíveis de serem lembrados”.
A localização geográfica e o reconhecimento do entorno permitiu ao ser
humano fixar a sua morada e explorar a terra. Antropólogos deduziram que o
homem primitivo era profundamente ligado ao meio em que vivia; distinguia ali a
paisagem e identificava nela as suas partes significativas, tendo o meio ambiente
como parte integrante de sua cultura. Por sentir-se completamente identificado com
a natureza, não desejava abandoná-la. (LYNCH, 2011).
A nossa imagem ambiental é ainda parte fundamental do nosso equipamento
para a vida, mas ela talvez seja, hoje, muito menos viva e individual (LYNCH, 2011).
A natureza e os elementos que a compõe são recursos utilizados pelo homem para
se localizar geograficamente. Segundo Lynch (2011, p. 138):
A imagem ambiental tem como função primeira permitir uma mobilidade intencional. Um mapa concreto pode significar vida ou morte para uma tribo primitiva, como no caso dos Luritcha da Austrália Central, que se viram expulsos do seu território durante quatro anos de seca, conseguiram sobreviver devido à memória topográfica exata que os mais velhos possuíam [...], através da sua experiência anterior e de indicações dadas pelos seus antecessores. [...] A importância de ser capaz de distinguir estrelas, correntes ou cores marítimas é óbvia para os navegadores dos mares do sul, pois quando partem para atingir seus fins envolvem-se num jogo com a morte. Um conhecimento deste teor, permite um movimento que pode, por sua vez, permitir um nível de vida melhor.
As relações que o homem estabelece na escala geográfica, vão além do
material, havendo também a necessidade de analisar as relações imateriais
desenvolvidas no ambiente, a fim de compreender melhor como o ser social se
desloca e encontra caminhos. Assim:
A topografia3 [...] depende sem dúvida de coisas tão materiais como as formações geológicas, mas depende também, e muito mais do que se imagina, de representações mentais, de sistemas de valores, de uma
3 Descrição ou delineação minuciosa de uma localidade (MICHAELIS, 2009).
21
ideologia. E a tradução, a inscrição no solo da globalidade de uma cultura [...] são indissociáveis, se quisermos explicar a situação de uma sociedade no espaço e no tempo” (DUBY, 1980, pp. 130-131 apud FERRARA, 2000, p. 26).
Hoje possuímos formas de referência ao ambiente mais organizadas – através
de coordenadas, sistemas numéricos ou nomes abstratos – e apesar de alguns
problemas ainda por decifrar, parece improvável que exista atualmente qualquer
“instinto” místico associado à descoberta de caminhos. O que existe é o uso de uma
organização consistente de indicadores sensoriais inequívocos a partir do ambiente
externo. Os profissionais do Design podem auxiliar na configuração da cena total da
cidade, de modo a facilitar ao observador humano, a identificação de suas partes e a
estruturação do todo, a partir da proposta de soluções projetuais que vislumbrem as
diversas idealizações da cidade, suas partes e caminhos percorridos na escala
urbana (LYNCH, 2011). Essa solução projetual pode ser apresentada em forma de
um diagrama contendo as informações da imagem da cidade, podendo ser
apresentado em forma de mapa, como propõe Lynch (2011).
No Brasil o termo mapa é utilizado de forma generalista para identificar vários
tipos de representação cartográfica, e em alguns casos tal representação pode
aparecer em forma de uma lista de palavras e números, ou até mesmo de um
gráfico que mostre como ocorre determinado fenômeno, essas representações
também recebem o nome de mapa (ARCHELA e THÉRY, 2008).
O Instituto Brasileiro de Geografia e estatística (IBGE, 19--) estabelece as
principais características dos mapas, que são:
Representação plana;
Geralmente em escala pequena;
Área delimitada por acidentes naturais (bacias, planaltos, chapadas, etc.),
político-administrativos;
Destinação a fins temáticos, culturais ou ilustrativos.
A partir dessas características, pode-se generalizar o conceito de mapa:
Mapa é a representação no plano, normalmente em escala pequena, dos aspectos geográficos, naturais, culturais e artificiais de uma área tomada na superfície de uma figura planetária, delimitada por elementos físicos, político-administrativos, destinada aos mais variados usos, temáticos, culturais e ilustrativos (IBGE, 19--).
22
Além da função representativa, os mapas são veículos de transmissão do
conhecimento que pode ser o mais amplo e variado, ou o mais restrito e objetivo
possível, pode-se dizer que o mapa é, provavelmente, o mais sofisticado
procedimento para registrar, produzir e transmitir conhecimentos (COSGROVE,
1999 apud BONSIEPE, 2011). Um mapa deve ser elaborado de forma a comunicar
algo, e quando este está nas mãos do usuário deve permitir que o conhecimento de
poucos seja útil para muitos (LOCH, 2006 apud ARCHELA e THÉRY, 2008).
Bonsiepe (2011), conclui ao introduzir o conceito de “metabolismo cognitivo”, que
atribui função duais e interdependentes aos mapas, a função facilitadora do acesso
aos conhecimentos e a de assimilação desses conhecimentos.
Para este projeto utilizaremos apenas o conceito de mapas temáticos4 não
exatos, destinados a usos culturais e ilustrativos, na figura 2 vem apresentada uma
ilustração que exemplifica um mapa temático não exato.
Figura 2 – exemplo de uma ilustração de um mapa temático não exato.
Fonte: Livi Gosling, 2016. Disponível em: <http://livigosling.co.uk/London-Food-Essentials>
Acesso em: 26 Maio 2016.
4 Todos os mapas que representam qualquer tema, além da representação do terreno, são tidos como mapas temáticos (JOLY 2005, p.75 apud ARCHELA e THÉRY, 2008).
23
Vale ressaltar que não cabe a nós enquanto profissionais de design, apresentar
a cidade e os elementos que compõe a sua imagem com exatidão, podemos
representá-la graficamente para usos ilustrativos e culturais, levando em
consideração os elementos da cartografia5 para tal representação. Bonsiepe (2011)
trata os mapas e a cartografia como um dos maiores desafios que o design deve
confrontar. O designer deve levar em consideração todo o processo de mapeamento
para propor soluções verdadeiras, tal processo inclui a “visualização, o registro, a
apresentação e a criação dos espaços, utilizando recursos gráficos” (COSGROVE
1999, p. 1 apud BONSIEPE, 2011, p. 89).
Ao se referir aos mapas e a sua configuração, Lynch (2011, p.10) descreve
como esses devem vir representados.
[...] O mapa, seja ele exato ou não, deve ser bom o suficiente para nos conduzir ao nosso destino. Deve ser suficientemente claro e bem integrado para tornar-se econômico em termos de esforço mental: o mapa deve ser legível. Deve ser seguro e conter indicações suplementares que tornem possíveis as ações alternativas, sem grande risco de insucesso. [...] É preferível que a imagem seja aberta e adaptável à mudança, permitindo que o indivíduo continue a investigar e organizar a realidade; deve haver espaços em branco nos quais ele possa ampliar pessoalmente o desenho. Por último, a imagem deve ser, até certo ponto, comunicável a outros indivíduos [...].
Além dos mapas, a cidade e fragmentos da sua imagem podem ser
representados e comunicados através de um outro tipo de impresso, o cartão-
postal6. Fundamentalmente associado ao registro da história urbana e de suas
conquistas tecnológicas, hábitos culturais, modas e demais fatos da vida cotidiana,
foi com a invenção e o aprimoramento dos cartões-postais, que a imagem das
cidades passou a ser compartilhada por todo o mundo, atraindo capital e
despertando o desejo das pessoas em conhecê-las (FRANCO, 2006). Daltozo (2002
apud FRANCO, 2006) nos diz que os postais, além da função primária de
comunicação entre pessoas distantes, são também artigos colecionáveis que podem
ser adquiridos pelas pessoas nas cidades visitadas, para serem guardados junto aos
álbuns de fotos. Ou seja, a pessoa pode voltar com diversas fotografias de lugares
5 Na cartografia, os mapas têm características específicas que os classificam, e representam elementos selecionados de um determinado espaço geográfico, de forma reduzida, tal representação é feita utilizando símbolos gráficos (signos), que posteriormente são organizados em uma legenda, possibilitando a transcrição da linguagem escrita para a gráfica (ARCHELA, 1999 apud ARCHELA e THÉRY, 2008). 6 Um cartão em que uma mensagem pode ser enviada pelos correios sem um envelope e que muitas vezes tem uma imagem ilustrada em um dos dois lados (MERRIAM-WEBSTER, 2016, tradução nossa).
24
vistos, mas também compra e guarda os postais com o objetivo de se situar
geograficamente, reconhecer onde esteve e para visualizar melhor os locais por
onde passou, para mostrar aos amigos e familiares com riqueza de detalhes tudo o
que viu.
Os antigos utilizavam elementos da natureza para se localizar
geograficamente, com o desenvolvimento da cartografia foi possível representar a
paisagem, a cidade e os elementos que a compõe em escala através de mapas, ou
até mesmo enviar e colecionar pequenos fragmentos que compõe a imagem da
cidade sob a forma de cartões-postais. E hoje, quais as ferramentas que auxiliam as
pessoas a se localizarem espacialmente nas cidades? Com o passar dos anos e
com a modernização da vida nas cidades assistimos aos avanços nas tecnologias
da informação e da comunicação proporcionados pelas interação entre a sociedade
e a Internet (CASTELLS, 2001 apud BUGS e REIS, 2011). Com a apropriação
destas tecnologias pelo público, a Internet passa a ocupar um papel importante no
universo da percepção geográfica do espaço, onde os usuários, por sua vez,
utilizam serviços de mashups7 para criar e distribuir, de forma proativa, sua própria
informação geográfica. (MONTELLO e FREUNDSCHUH, 2005 apud BUGS e REIS,
2011). Diferentemente do passado, quando as instituições eram as principais
responsáveis pela criação e distribuição de informações geográficas, agora qualquer
pessoa pode facilmente produzir um mapa e publicá-lo online. Surge então o
conceito de “mapa interativo”8 (BUGS e REIS, 2011).
Lynch (2011) diz que os mapas devem ser bons o suficientes para conduzir o
observador humano ao seu destino, o estudioso também prevê que os diagramas
contento a imagem física das cidades podem apresentar riscos de insucesso,
segundo ele, se alguém sofrer o contratempo da desorientação, o sentimento de
angústia compara-se ao de terror, isso irá mostrar com que intensidade a orientação
dentro da cidade é importante para a sensação de equilíbrio e bem-estar, e não
somente, a palavra “perdido” remete a muito mais que a simples incerteza
geográfica, trazendo consigo implicações que o estudioso disse que poderiam levar
a um “completo desastre”. (LYNCH, 2011, p. 4)
7 Um mashup é um serviço Web ou aplicativo que integra dados e funcionalidades de várias fontes on-line (MERRIAM-WEBSTER, 2016). 8 Mapas Interativos são ambientes computacionais de uso de mapas (BUGS e REIS, 2011).
25
Mas às vezes, é no se perder que podem estar as descobertas mais
surpreendentes. O termo serendipidade9 expressa o papel do acaso nas
descobertas, graças ao qual se encontra algo que não se estava procurando. A
palavra também diz respeito a
um caráter e uma qualidade próprios da caminhada e da deambulação na cidade. O passante, ao sabor do seu humor, circula, demora-se, volta-se e descobre, na esquina de uma rua, uma passagem coberta, uma loja inédita, uma construção surpreendente. A qualidade da cidade está em permitir esses acasos e oferecer ao passante surpresas e encontros improváveis (VIVANT, 2012, p. 83).
Com a descoberta de novos caminhos o passante passa a ampliar as
idealizações da cidade, e por consequência passa a criar novas interpretações da
sua imagem, e ao ampliar o cenário de alcance da sua mente, ele aprofunda a
percepção do ambiente ao dar continuidade a um longo desenvolvimento biológico e
cultural, podendo reconfigurar a ideia urbana que havia composto previamente, ao
frequentar a cidade buscando por outras coisas senão aquelas que era acostumado
a procurar (LYNCH, 2011).
Sem dúvida, as concentrações comuns de trajetos ou locais de interações
sociais, tendem a produzir uma consistência da imagem coletiva da cidade, ao
apresentarem os mesmos elementos a várias pessoas. Relações de status ou de
história, provenientes de fontes não visuais, reforçam ainda mais essas
semelhanças (LYNCH, 2011).
A partir dos pensamentos expostos anteriormente buscou-se conhecer alguns
sistemas referencias e de localização existentes, e como esses podem funcionar
como elementos facilitadores para a localização geográfica e para traçar caminhos
dentro dos limites das cidades, ora sob a forma de diagramas analógicos (mapas
impressos e cartões-postais), ora sob a forma de diagramas digitais (mapas
interativos).
No tópico a seguir, a cidade será abordada enquanto ambiente cultural, e a
comida será apresentada como elemento que possibilita a ressignificação da
imagem da cidade presente no imaginário das pessoas. Inicialmente, este tema será
9 Também conhecido como Serendipismo, Serendiptismo ou ainda Serendipitia, é um neologismo que se refere às descobertas afortunadas feitas, aparentemente, por acaso. Fonte: Dicionário informal, 2011, online. Disponível em: < http://www.dicionarioinformal.com.br/serendipidade/> Acesso em: 25 maio 2016.
26
tratado em vias gerais, levando ao real cenário de desenvolvimento deste trabalho: o
bairro da Cidade Alta e a sua alimentação.
2. 3 CIDADE, COMIDA E CULTURA
Podemos buscar conteúdo teórico em diversas fontes para entender a relação
existente entre ambiente urbano e comida, e como o alimento pode revelar fortes
traços da expressão cultural de um povo. Folcloristas, Etnógrafos, Historiadores,
Geógrafos, Biógrafos e Antropólogos, e entre tantos, estudam essa relação. Neste
tópico introduziremos o conceito de “Cidade Criativa”10, ao tratar a comida como
elemento constituinte da cultura de um povo e unidade ressignificante da imagem da
cidade.
Antes de compreender o que vem a ser “Cidade Criativa”, precisamos resgatar
o conceito de “Cidade Tradicional”, diretamente ligado às atividades humanas de
manufaturação e ofícios, desenvolvidas dentro dos centros urbanos. Ferrara (2000,
p.20), nos diz que “a cidade tradicional marcava-se pelas suas atividades produtivas
comerciais ou industriais num tempo/espaço contíguos e determinados por clara
relação de causa e consequência”.
Com a decadência do fenômeno do industrialismo e com o consequente
abandono dos bairros populares e das zonas industriais em grandes centros
urbanos mundiais, o território se tornou um ambiente passível de ressignificação11,
contribuindo para a revalorização da cidade e das suas partes através de novas
experiências urbanas (VIVANT, 2012). É nesse contexto que surge a ideia de
“Cidade Criativa”, termo que se refere à instalação e promoção de atividades
culturais como elementos ressignificantes da imagem da cidade.
Contrapondo a ideia restrita de “cidade tradicional” e ressaltando a força da
imagem da cidade a partir da dimensão criativa, revelada por seu dinamismo
cultural, Vivant (2012, p. 10), diz que:
As grandes cidades sempre foram espaços de manifestação da singularidade e da criatividade. Mas tratava-se de uma faculdade marginal. Para Richard Florida (20--), a efervescência criativa passa agora para o
10 A expressão “cidade criativa” pode ser interpretada como um projeto político liberal no sentido norte-americano do termo, ou seja, mais tolerante em matéria de costumes e de escolhas de vida (VIVANT, 2012, p. 23). 11 Aqui, o termo ressignificar se refere às novas formas de se olhar pra cidade, em busca do alargamento da imagem mental, particular a cada cidadão.
27
centro da cidade e de sua atividade, tornando-se até mesmo o motor do seu desenvolvimento econômico.
Para além de um simples “efeito de moda”, a noção de cidade criativa convida
à redescoberta das qualidades da cidade: lugar de manifestações culturais diversas,
de encontros imprevistos, de experiências inéditas, de novas maneiras de ser e de
fazer, de multidões e de diversidade de recursos (VIVANT, 2012).
Sendo a cidade um ambiente criativo, onde tradição e inovação se encontram,
Montanari (2008, p. 27) faz uma comparação entre essas duas formas de olhar para
o meio urbano para definir cultura. Segundo o autor
O que chamamos de cultura coloca-se no ponto de intersecção entre tradição e inovação. É tradição porque constituída pelos saberes, pelas técnicas, pelos valores que nos são transmitidos. É inovação porque aqueles saberes, aquelas técnicas e aqueles valores modificam a posição do homem no contexto ambiental, tornando-o capaz de experimentar novas realidades. Inovação bem sucedida: assim poderíamos definir a tradição.
E como reconhecer a alimentação enquanto forte expressão da dinâmica
cultural de um povo, como elemento ressignificante da imagem da cidade?
Cascudo (19-- apud JUNIOR, LEITE e MOTTA, 2007, p.21) fala que “Comer é
pertencer12”. Logo, ao levar em consideração a relação de pertencimento
proporcionada pela comida, utilizaremos o pensamento de Marchi (2008, apud
RODRIGUES, 2014) para entender a ligação existente entre o comer e o pertencer.
Segundo o autor: “a construção das identidades culturais locais é feita pelas
experiências urbanas vividas nos lugares da vida cotidiana, e que estes lugares são
os responsáveis pela criação do sentimento de pertencer à cidade”. Montanari
(2008) ainda diz que a comida é de fato entendida pelas culturas como expressão
direta de pertencimento social, o modo de se alimentar deriva de determinado
pertencimento social e ao mesmo tempo o revela.
A comida é, então, fator de construção das identidades culturais dentro das
cidades. Montanari (2008) contribui ao dizer que comida é cultura quando produzida,
preparada e consumida, e entre as várias formas de identidade sugeridas e
comunicadas pelos hábitos alimentares, a que se manifesta com maior intensidade e
12 A relação de “pertencimento”, significa que precisamos nos sentir como pertencentes a tal lugar e ao mesmo tempo sentir que esse tal lugar nos pertence, e que assim acreditamos que podemos interferir e, mais do que tudo, que vale a pena interferir na rotina e nos rumos desse tal lugar (RODRIGUES, 2014).
28
clareza é a identidade de pertencer a um território, o qual o historiador definiu como
“o comer geográfico”. Para Montanari (2008), uma cultura de território é reconhecida
por meio da sua cozinha, dos seus produtos e das suas receitas.
Cascudo (1983), ao se referir à comida como cultura, coloca o “alimentar-se”
como algo inerente ao ser humano, sendo essa, ação natural, a qual o homem
cercou de cerimonial e transformou lentamente em expressão de sociabilidade
repleta de significados e simbologias, um rito de iniciação para a convivência, para a
continuidade dos contatos.
O gosto é, portanto, um produto cultural, resultado de um realidade coletiva e partilhável, em que as predileções e as excelências destacam-se não de um suposto instinto sensorial da língua, mas de uma complexa construção histórica (MONTANARI, 2008, p.11).
O ato de comer não é uma realidade subjetiva e incomunicável, mas coletiva e
comunicada, ainda mais, constitui uma “experiência de cultura” que nos é passada
juntamente com outras variáveis que definem os “valores” de uma sociedade. Jean-
Louis Flandrin (19-- apud MONTANARI, 2008, p.96) utilizou a expressão “estruturas
do gosto” para se referir ao caráter coletivo e compartilhado de tal experiência.
Para Cascudo (apud JUNIOR, LEITE e MOTTA, 2007), a alimentação é uma
permanência do verdadeiro patrimônio cultural de um povo, constatando que a
eleição de determinados sabores é sedimentada através dos séculos e não se
modifica facilmente. Como processo contínuo e transpassando as barreiras do
tempo, a cultural regional é fortemente representada através de sua culinária.
Montanari (2008, p.11) diz ainda que
as cozinhas típicas e regionais são processos de lentas fusões e mestiçagens, desencadeadas nas áreas fronteiriças e, depois, arraigadas nos territórios como emblemas da autenticidade local, mas cuja natureza é sempre híbrida e múltipla [...] (MONTANARI, 2008, p.11).
Ao ligar diretamente os conceitos de cultura, alimento e território, Montanari
(2008) ressalta a importância em se reconhecer a alimentação típica e regional
como fonte de informações ricas a respeito do território e da cultura de um povo, e
como fator de construção da identidade local, fazendo com que o consumo do
alimento venha a significar novas experiências a serem vivenciadas, no
entendimento que a comida seja atrativo para se conhecer e redescobrir a cidade
onde se vive, alargando o repertório e o imaginário dos seus habitantes.
29
Após introduzir e relacionar os termos cidade, comida e cultura, iremos
apresentar no tópico a seguir, o cenário de desenvolvimento deste projeto, a Cidade
Alta de Natal, abordando seus valores histórico-culturais, e apresentando alguns
dados básicos do bairro
30
2.4 A CIDADE ALTA DE NATAL
Conforme Lei Ordinária N° 3,878/89, Natal está dividida em quatro Regiões
Administrativas (doravante denominadas RA), a Cidade Alta compõe um dos bairros
da RA Leste, conforme vem demonstrado na tabela 1.
Tabela 1 – Regiões administrativas e bairros de Natal-RN.
Fonte: SEMURB 2, 2014.
De acordo com dados demográficos, o bairro da Cidade Alta compreende uma
área total de 116,41 Ha, onde, segundo dados de 2010, estavam distribuídos no
local 2.259 domicílios particulares permanentes, com uma população residente
estimada em 7.382 habitantes (SEMURB 2, 2014). Na figura 3 vem apresentada
uma imagem aérea que corresponde a área ado bairro e são apontados os bairros
que fazem limite ao seu território.
31
Figura 3 – Imagem aérea da Cidade Alta.
Fonte: SEMURB 2, 2014.
A Cidade Alta é o berço da Cidade do Natal, constituindo o primeiro núcleo de
povoamento urbano, iniciado a partir de onde, hoje, localiza-se a Praça André de
Albuquerque (figura 4). A escolha estratégica feita pelos portugueses para a
instalação da colônia, permitia visualizar do alto a entrada da barra do rio Potengi e
os Potiguara, instalados na antiga Aldeia Velha. Neste local foi construída a capela,
a casa da Câmara e a Cadeia, além do pelourinho13. Foram fixadas duas cruzes,
delimitando o espaço urbano de Natal, uma às margens do baldo, e a outra, nas
proximidades da atual Praça das Mães (figura 5) (SEMURB 2, 2014).
13 1 Coluna ou armação de madeira levantada em lugar público, junto da qual se expunham e castigavam os criminosos. 2 Aparelho giratório de madeira, que também servia para castigo de criminosos (Michaelis, 2009).
32
Figura 4 – Praça André de Albuquerque. Figura 5 – Praça das Mães.
Fonte: Autora, 2016. Fonte: SEMURB 2, 2014.
Xarias, (comedores de xaréu14), assim eram chamados os moradores que
viviam no primeiro bairro da capital potiguar, lugar de muitas histórias, ainda
encontradas em seus logradouros (SEMURB 2, 2014). Verificamos aqui que o termo
utilizado para se referir aos habitantes locais da Cidade Alta caracteriza a comida
como elemento de identidade local (SEMURB 2, 2014).
Por apresentar valores histórico-culturais significativos para o patrimônio da
cidade e por carecerem de recuperação e revitalização, os limites geográficos do
bairro da Cidade Alta foram definidos como Área de Operação Urbana15, a ser
regulamentada por lei. Ainda incide sobre a área do bairro uma Zona Especial de
Preservação Histórica, a ZEPH (SZ1 E SZ2), conforme disposto na Lei Municipal
n° 3.942/90, que institui a ZEPH (SEMURB 2, 2014). O Plano Diretor de 2007, criou
uma Zona Especial de Interesse Histórico - ZEIH, com perímetro mais amplo do que
o da ZEPH (ver mapa no anexo 2). É possível entender, porém, que ao criar a Zona
Especial de Interesse Histórico, o Plano Diretor de 2007 reforçou a visão do
patrimônio histórico e cultural sobre os bairros, Cidade Alta e Ribeira (IBAM, 2010).
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM
(2010), no início da década de 90, a preocupação com o Centro Histórico (composto
pelo bairro da Cidade Alta e da Ribeira) já começava a ser incorporada na legislação
municipal (Lei 3.942/90 que instituiu a ZEPH). Em 1997 foi aprovada a primeira, e
única até hoje, Operação Urbana em Natal, mas que não contemplou o bairro da
14 Peixe marinho, da família dos Carangídeos (Caranx hippos) (Michaelis, 2009). 15 É aquela área que apresenta valores histórico-culturais significativos para o patrimônio da cidade e que carecem de formas de recuperação e revitalização (IBAM, 2010).
33
Cidade Alta. A lei da Operação Urbana Ribeira vigorou por quase dez anos e foi
reeditada em 2007 com algumas alterações, passando a ter sua aplicação como
“possibilidade” em outras áreas, com o objetivo de promover “transformações
urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental” (IBAM, 2010,
p.21). Em 2010 foi proposta pela assessoria técnica do IBAM à Secretaria Municipal
de Meio Ambiente e Urbanismo – SEMURB, a Operação Urbana Consorciada
Centro Histórico de Natal (OUC Centro Histórico), uma proposta de revisão da lei da
Operação Urbana Ribeira, tal proposta prevê a ampliação dos limites contemplados
anteriormente e a recuperação e revitalização do Centro Histórico – parte-se do
pressuposto de que a operação deve incorporar o conjunto de bairros que abrigam
esse Centro Histórico – desde Santos Reis, onde se localiza o Forte dos Reis Magos
– até à Cidade Alta (IBAM, 2010).
Em 2010, o Centro Histórico de Natal foi tombado pelo IPHAN (Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), constituindo mais uma iniciativa que busca
orientar a política de preservação e revitalização da área. O tombamento federal do
Centro Histórico de Natal abre uma perspectiva interessante, uma vez que a área
pertencente a ZEPH da Cidade Alta passa a estar protegida por um instrumento
bastante forte (IBAM, 2010).
A SEMURB – Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, mapeou e
divulgou no Anuário da Cidade do Natal de 2014, trinta e seis marcos que compõe o
circuito histórico, turístico e cultural da Cidade Alta. O mapa resultante vem
apresentado no anexo 1. Dentre estes marcos históricos, merecem destaque neste
trabalho, por estarem presentes na imagem mental das pessoas consultadas na fase
prática da pesquisa, o Palácio Filipe Camarão (figura 6), inaugurado em 07 de
setembro de 1922 e atual sede do Executivo Municipal, a Igreja do Galo ou Igreja de
Santo Antônio (figura 7), terceira igreja a ser construída na cidade, mais
especificamente entre os anos de 1763 e 1766, o prédio do antigo Liceu Industrial
(figura 8), construção do início do século XX e atual sede do IFRN Cidade Alta e o
Beco da Lama (figura 9), ponto de encontro de artistas, intelectuais e boêmios e
local de realização de diversos eventos culturais, como o Festival gastronômico
Pratodomundo, que será apresentado com mais detalhes no tópico 2.6. Tal evento
exalta a comida servida nos bares e restaurantes do logradouro e demais pontos de
alimentação da Cidade Alta que estejam inscritos no festival.
34
Figura 6 – Palácio Felipe Camarão. Figura 7 – Igreja do Galo.
Fonte: Autora: 2016. Fonte: Autora: 2016.
Figura 8 – IFRN Cidade Alta. Figura 9 – Beco da Lama.
Fonte: Autora: 2016. Fonte: Autora: 2016.
Após apresentar o cenário de desenvolvimento deste projeto, o bairro da
Cidade Alta, introduziremos a seguir a comida potiguar enquanto elemento
carregado de significados territoriais e da cultura popular, a fim de compreender as
relações culturais ligadas ao alimento típico do estado do Rio Grande do Norte, para
posteriormente apresentar o Festival Pratodomundo, evento de comida que
acontece na Cidade Alta.
2.5 COMIDA POTIGUAR
O Norte-rio-grandense carrega em seu nome, “apelido mais carinhoso, o
significado constante da comida, o ato natural de comer” (CASCUDO, 19-- apud
JUNIOR, LEITE e MOTTA, 2007). Potiguar, este é o adjetivo utilizado empiricamente
para se referir ao Norte-rio-grandense, ou ainda, Rio-grandense-do-norte. De acordo
com a etimologia da palavra encontrada em dicionário, o termo utilizado pelos
35
nascentes nas terras do Rio Grande do Norte é originário do tupi poti’war e significa
“o que come camarão” (HOUAISS, 2009).
Há quem também se dirija a um “potiguar” fazendo uso do termo “papa-
jerimum”. Nos verbetes do Dicionário do folclore brasileiro, vamos encontrar
referências para responder porque papa-jerimum é o nome dado aos Norte-rio-
grandenses.
Funda-se numa tradição de que o presidente da província Lopo Joaquim de Almeida Henriques, que administrou de 30 de agosto de 1802 a 19 de fevereiro de 1806, mandou fazer roçados de mandioca e melancia (não se fala nas abóboras famosas) e com elas pagara “possivelmente16” aos funcionários públicos com essas cucurbitáceas (CASCUDO, 19-- apud JUNIOR, LEITE e MOTTA, 2007, p.27).
Devemos lembrar que uma cultura pode ser reconhecida por meio da sua
cozinha, dos seus produtos e das suas receitas (MONTANARI, 2008). A comida
brasileira, e por consequência a potiguar, foi constituída, principalmente, a partir de
referências trazidas das culturas portuguesa, indígena brasileira e africana
(CASCUDO, 1983). Ao olharmos os símbolos da presença europeia, percebe-se
também a influência dos indígenas e dos africanos, culturas diversas, causadoras da
construção do hoje potiguar. A comida também pode compor o Patrimônio Cultural17
de um povo, por exemplo, como o que aconteceu recentemente com a ginga com
tapioca18, considerada iguaria potiguar, e que foi criada na praia da Redinha; em
Natal (SEMURB 2, 2014). O exemplo aqui dado demonstra a vasta relação existente
entre comida e território.
No que se diz respeito à culinária potiguar, existem especificidades
encontradas na comida do litoral, na comida da zona da mata, do agreste, do sertão
(JUNIOR, LEITE e MOTTA, 2007). Podemos então deduzir que é na capital, no
centro da cidade, coração do município, onde esses sabores se encontram?
16 Na fonte pesquisada não se fala especificamente do pagamento. 17 Hoje, ao tratar de Patrimônio, o mais abrangente termo a ser usado é Patrimônio Cultural, deixando de lado a ideia de preservar apenas os bens de “pedra e cal” ao incluir a preservação dos bens ditos imateriais. De acordo com o professor Hugues de Varine-Boham, o Patrimônio Cultural é agrupando em três categorias: primeiramente, engloba os elementos pertencentes a natureza, ao meio ambiente. [...] O segundo grupo de elementos refere-se ao conhecimento, às técnicas, ao saber e o saber fazer. O terceiro grupo é formado pelos objetos, artefatos e construções obtidas a partir do meio ambiente e do saber fazer (LEMOS, 2008 apud SEMURB 2, 2014). 18 Patrimônio Imaterial da Cidade do Natal, a Ginga com Tapioca foi criada na praia da Redinha, por volta dos anos 1940. A receita é simples e consiste em temperar pequenos peixes (espécie de sardinha tipo “manteiga” ou “azul”) com sal, fritá-los numa mistura de óleo de soja com um pouco de azeite de dendê, espetá-los em um palito e rechear a tapioca (goma de tapioca com coco). Fonte: FRANÇA, Tádzio. "Imortalizando a ginga com tapioca"; Tribuna do Norte. Disponível em: <http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/imortalizando-a-ginga-com-tapioca/278910> Acesso em: 14 jun 2016.
36
Junior, Leite e Motta (2007, p.25), falam da comida potiguar de acordo com a
ocasião, manuseio e feitura, seja durante a sua produção, preparo ou consumo.
As comidas de acordo com a ocasião: comidas do dia-a-dia, inhame cozido com manteiga, feijão-verde e galinha guisada ou então comidas de festa como a rabanada, fatia de parida ou fatia dourada feita de rodelas de pão embebidos no leite, passada nos ovos, fritas no óleo e pulverizadas com açúcar e canela; ou ainda na rua, para comer rápido: queijo de coalho na brasa, amendoim, castanha confeitada, entre tantas outras. As comidas potiguares e o seu manuseio: Caranguejo só é bom se comido de mão, martelando em tabuinha de madeira com batedores também de madeira. Já bolo confeitado, bolo de noiva, deve ser comido com talheres em prata especial; canjica de milho é prato socializador, quando vizinhos se presenteiam com generosos travessas no tempo da festa de São João; farinha de mandioca deve ser provada na feira antes de comprar para avaliar se a farofa ou o pirão terá qualidade. As vertentes em fazer comida: assar, cozer, guisar e fritar. Hoje poderia se incluir um novo processo: o “aquecer” ou “esquentar” com o emprego do forno micro-ondas, que é ferramenta cada vez mais presente nas cozinhas contemporâneas.
A experiência de comer vai muito além da comida, da nutrição ou da dieta. A
comida não se encerra em sais minerais, vitaminas e antioxidantes. Ela é capaz de
identificar a multiculturalidade regional, como é o caso da comida potiguar, uma
fonte de criação e de adaptação permanente do povo, que reinventa o alimento ao
traduzir produtos e ingredientes típicos em uma “nova cozinha” de base regional,
nacional (JUNIOR, LEITE E MOTTA, 2007).
Por apresentar fortes traços culturais, a comida regional potiguar comunica os
costumes e os laços históricos do seu povo, a sua produção, mas muitas vezes os
regionalismos e os modos de produção, preparo e consumo do alimento, são
substituídos por uma cozinha “internacional”, que Cascudo (1983, p. 43) diz ser uma
“derradeira submissão humana à sugestão da propaganda comercial”. O estudioso
potiguar afirma que estamos caminhando para o que dizia Berthelot a Théofile
Gautier, depois de uma ceia improvisada na Paris cercado pelos alemães em 1871:
— Je mange sans comprendre (como sem compreender) (CASCUDO, 1983).
Retomamos o que foi dito no tópico que tratou sobre “cidade, comida e cultura”,
ao lembrar que o alimento é elemento ressignificante da imagem da cidade, e que
comer é pertencer, e tal experiência só se torna coletiva e compartilhada ao se
compreender aquilo que comemos, reconhecendo a nossa cultura através de tal
experiência, indo além do “se alimentar”.
Podemos inferir que o reconhecimento e valorização da Cidade Alta enquanto
Centro Histórico-Cultural de Natal, pode vir através do consumo do alimento nos
37
logradouros do bairro, e o fato de já existir no bairro um evento que exalta o alimento
que é preparado ali, reforça a relação entre o alimento e o território.
A seguir, apresentaremos o Festival Pratodomundo, evento que se concentra
principalmente no Beco da Lama, e recentemente, começou a contar com a
participação de outros restaurantes da Cidade Alta, extrapolando os limites de uma
única viela.
2.6 FESTIVAL PRATODOMUNDO: EVENTO DE COMIDA DO CENTRO
Após pesquisa bibliográfica sobre os eventos de comida da Cidade Alta de
Natal e do não reconhecimento dessas informações em fontes acadêmicas,
trazemos para este trabalho uma visão, talvez até do senso comum, sobre o que é
visto e divulgado a respeito do evento Pratodomundo. Mas antes, faz-se necessário
introduzir brevemente o local aonde nasceu o festival, o Beco da Lama.
Anteriormente denominado de Beco Novo, o Beco da Lama, situado na rua Vaz
Gondim, Cidade Alta, é um marco da memória local, caracterizando-se desde sua
origem, por ser lugar de alegria e das artes. Segundo a pesquisadora Nesi (2002, p.
46 apud SEMURB 2, 2014),
o Beco Novo era um animado e movimentado logradouro público de Natal. Em 1841, o primeiro teatro da cidade foi destruído por um incêndio. Tratava-se de um barracão de palha situado na atual Gonçalves Ledo. Como a Sociedade do Teatro Natalense, proprietária do barracão, não dispunha dos recursos necessários à sua recuperação, os grupos amadores então passaram a representar em teatrinhos improvisados, instalados em algumas ruas de Natal. No Beco Novo eram frequentes aquelas representações.
A cidade dona do título de “noiva do sol”, conhecida por suas praias e dunas,
pulsa vida no Beco da Lama, lugar ideal para quem procura entender a alma do
natalense, e o Festival Pratodomundo é um dos eventos que encontram lugar no
beco (SEMURB 2, 2014).
Conhecido também como Festival Gastronômico do Beco da Lama, o festival
Pratodomundo é considerado a festividade gastronômica mais antiga do Rio Grande
do Norte. Em 2014 aconteceu a 11ª edição do festival (figura 10), que contou com a
participação de 7 botequins da Cidade Alta. A última edição do Pratodomundo
(2014) foi realizada pela Sociedade dos Amigos do Beco da Lama e Adjacências
(doravante denominada SAMBA) e contou com o apoio da Prefeitura de Natal e do
Sebrae. A partir de 2014 a SAMBA possibilitou que novos restaurantes se
38
inscrevessem no evento, democratizando o acesso de novos sócios e
estabelecimentos da Cidade Alta ao festival (NATAL, 2014).
Figura 10 – IX edição do Festival Pratodomundo.
Fonte: NATAL, 2014.
O festival funciona da seguinte maneira19, cada botequim participante escolhe
um petisco para concorrer ao Pratodomundo, e o estabelecimento só pode cobrar,
no máximo, 10 reais por cada petisco. Um júri formado por três especialistas da área
de culinária e gastronomia, saboreia os tira-gostos e julga os concorrentes, levando
em consideração não só o petisco servido, como também as boas práticas de
higiene e organização durante o preparo, criatividade e originalidade, harmonia do
sabor e fidelidade entre o prato e a receita escrita. Os três primeiros lugares são
premiados com troféus e prêmios em dinheiro. A seguir (figura 11), o cartaz de
divulgação da IX edição do festival, onde consta a lista de bares e restaurantes
participantes daquela edição (SAMBA, 2014).
19 As edições mais recentes (2012, 2013 e 2014) seguiram este tipo de regulamento.
39
Figura 11 – Cartaz da IX edição do Festival Pratodomundo.
Fonte: SAMBA, 2012.
Conhecer um pouco a respeito do Festival Pratodomundo e do seu
funcionamento será fundamental para propor soluções projetuais de Design que
venham a permitir o reconhecimento da Cidade Alta enquanto Centro Histórico-
Cultural de Natal, direcionando o olhar para a comida ali produzida, preparada e
consumida, e possibilitando que novas experiências sejam vivenciadas no bairro.
Nos próximos tópicos iremos transcorrer a respeito de como os conhecimentos
em design podem ser utilizados para compor serviços, ao utilizar ferramentas e
métodos do design participativo.
2.7 O DESIGN PARA A CONSTRUÇÃO DE SERVIÇOS
Quando se fala em "design" atribui-se esse termo quase sempre à criação de
produtos industriais ou gráficos, mas nos últimos anos vem sido observada uma
mudança nesse discurso, que mostra claramente que os conteúdos de projeto estão
em transformação (TSCHIMMEL, 1998).
40
Bonsiepe (2011) trata o design enquanto projeto, e assim o descreve:
O design é uma categoria própria, autônoma, já que se encontra na intersecção entre indústria, mercado, tecnologia e cultura (prática da vida cotidiana) [...] Enquanto as ciências enxergam o mundo sob a perspectiva da cognição, as disciplinas do design o enxergam sob a perspectiva do projeto (BONSIEPE, 2011, p. 17-19).
Ainda segundo o designer alemão, com a difusão da tecnologia digital,
começou a surgir uma corrente dentro do discurso projetual afirmando que as
principais questões colocadas a um designer são os aspectos simbólicos dos
produtos, pois as questões relacionadas às funções perderam a importância, mas
não devemos negar tais aspectos nem conferi-lhes papel tão dominante. Enquanto
projetistas devemos buscar o equilíbrio entre os aspectos técnicos dos objetos e
seus aspectos semânticos, sem privilegiar um lado ou o outro, e essa interação
entre a função de determinado produto físico ou semiótico (supracitado gráfico) e o
usuário é configurada como serviço (BONSIEPE, 2011).
O “design de serviços” enquanto projeto acadêmico surgiu primeiramente em
1989, com a criação da disciplina "Indústria de Serviços e Design " na Escola
Superior de Design de Colônia (TSCHIMMEL, 1998). Pouco mais tarde, a Domus
Academy italiana colocou o design de serviços no centro da formação e investigação
(ERLHOFF, MAGER e MANZINI apud TSCHIMMEL, 1998).
No panorama atual, o design de serviços é visto como uma abordagem em
constante evolução, e ainda hoje não existe uma definição comum ou uma
linguagem claramente articulada associada ao design de serviços (STICKDORN E
SCHNEIDER, 2014, p. 31).
Utilizaremos então algumas abordagens acadêmicas que procuram definir
“design de serviços”. O The Compenhagen Institute of Interaction Design (2008 apud
STICKDORN E SCHNEIDER, 2014, p. 32) prega o design de serviços como uma
prática interdisciplinar que combina diferentes métodos e ferramentas oriundos de
diversas disciplinas. Trata-se de uma nova forma de pensar, e não de uma nova
disciplina acadêmica, autonôma (STICKDORN e SCHNEIDER, 2014). Liveiwork
(2010 apud STICKDORN e SCHNEIDER, 2014) relaciona o design de serviços a
práticas projetuais, e complementa seu discurso quando diz que o design de
serviços é a aplicação de habilidades e processos já estabelecidos no campo do
projeto aplicados ao desenvolvimento de serviços, ao permitir a melhora dos já
existentes ou ao propor soluções inovadoras.
41
Como no desenvolvimento de projetos de design de produtos industriais ou
semióticos, o aspecto central de um projeto de design de serviços deve estar no
valor e na natureza das relações entre pessoas e pessoas, entre pessoas e coisas,
entre pessoas e organizações e entre organizações de diversos tipos (STICKDORN
e SCHNEIDER, 2014).
As práticas projetuais em design de serviços devem colocar as pessoas no
centro do design, deve levar em consideração os desejos e as necessidades dos
seres humanos, ao interpretar o projeto como prática interativa (TSCHIMMEL, 1998).
Mas como conceber um serviço levando em consideração as atitudes e
comportamentos das pessoas? O produto "serviço" é influenciado por muitos fatores
em movimento, e a função dos designers é a de empatizar as necessidades das
pessoas e buscar incluí-las no processo de design, propondo serviços que venham a
responder às suas necessidades e desejos.
No tópico a seguir será abordado o design participativo como metodologia que
auxilia os designers durante uma atividade geradora (projeto), ao incluir as pessoas
no processo e na dinâmica projetual.
2.8 DESIGN PARTICIPATIVO
A principal diferença do design com relação a outras disciplinas é a
preocupação com o “usuário” a partir de um enfoque integrador, que tem no
“humanismo projetual”
o exercício das capacidades projetuais para interpretar as necessidades de grupos sociais e elaborar propostas viáveis, emancipatórias, em forma de artefatos instrumentais e artefatos semióticos. Por que emancipatórios? Porque humanismo implica a redução da dominação e, no caso do design, atenção também aos excluídos, aos discriminados (BONSIEPE, 2011).
A elaboração de propostas de design emancipatórias e que interpretem as
necessidades dos grupos sociais, e por consequência, das pessoas que neles estão
inseridas, se torna viável se incluirmos as pessoas na dinâmica projetual, e é isso
que propõe o design participativo enquanto metodologia de projeto.
Por que design participativo? Antes de mais nada, devemos esclarecer que
termos como usuários, consumidores, clientes, compradores, e tantos outros são
limitantes e antiquados. Knemeyer (apud MARCUS, 2003) propôs substituir o termo
“usuário” por “participante”, quando esse não for atribuído aquele que usa
42
determinada interface, artefato ou serviço. Segundo o autor, o termo “usuário” possui
conotações negativas, como algo que está pronto para ser usado, em uso, ele diz
ainda que devemos priorizar a comunicação interativa e personalização nos
processos de design, possibilitando que as pessoas se sintam mais valorizadas e
ativas diante dos produtos com os quais interagem. Para Norman (2008, p.71) “o
desafio do design é manter as virtudes enquanto remover as barreiras”, e tais
nomenclaturas na maioria das vezes limitam a participação das pessoas no
processo e na dinâmica projetual, definindo o indivíduo como mero “destinatário”.
Águas (2012 apud OLIVEIRA, 2013) nos diz que o processo de design sofreu
mudanças significativas nas últimas décadas e que existe a necessidade de
rediscutir o antigo paradigma que dizia ser o designer o único responsável pelas
ideias, pela condução da fase de pesquisa e de estudos de mercados, o que acaba
colocando as pessoas sob a perspectiva de meros sujeitos utilizadores. Norman
(2008) complementa ao dizer que o designer deve inserir as pessoas no processo
do design, pondo as ferramentas em suas mãos, para que assim elas venham a
criar vínculos mais afetivos com seus os objetos.
A participação que se fala aqui vai muito além dos testes de usabilidade feitos
com usuários reais de determinados sistemas (produtos e serviços), no caso
específico deste projeto, estamos falando do envolvimento direto das pessoas na
composição do serviço, conseguimos tal grau de participação ao posicionar o próprio
usuário no papel de criador de artefatos de seu mundo, ao colocá-lo como “parte
interessada”20 nos processos de design, modificando a relação entre aquele que cria
(designer) e aquele que usa (usuário) (BARANAUKAS, MARTINS E VALENTE,
2013).
Podemos buscar na arquitetura e no urbanismo exemplos pioneiros de
experiências que colocavam as pessoas como partes interessadas, ao incluí-las
ativamente no processo de projeto, já no início da década de 80, em países da
Europa e nos Estados Unidos. Christopher Alexander foi um dos primeiros arquitetos
a ver a participação ativa das pessoas nas fases de pesquisa e gestão do design
com bons olhos. (AUNE; BERKER; SØRENSEN, 2002-2006). Em seu livro “The
20 Partes interessadas são pessoas que, individualmente ou como representantes de grupos sociais, têm interesses no desenvolvimento de determinado produto ou serviço ou em suas consequências (sociais, econômicas, políticas, etc.). São conhecedoras de seu mundo, e trazem esse conhecimento para a situação do design (BARANAUKAS, MARTINS E VALENTE, 2013).
43
oregon expirience”21 (1975), Christopher utiliza o cartoon “balanço na árvore” (figura
12) para demonstrar como a opinião e os desejos do indivíduo, além da sua visão
em relação ao ambiente, influenciam completamente o resultado alcançado com um
projeto.
Figura 12 – Balanço na árvore.
Fonte: Adaptado de Meek, B. L.; Heath, P. M., Guide to Good Programming Practice, 1980.
.
Segundo Eskine (1982 apud AUNE; BERKER; SØRENSEN, 2002-2006), a
participação se torna verdadeira quando o indivíduo, antes encontrado à margem do
processo de produção do pensamento, de análise, resolução de problemas e
tomada de decisão, se liberta da sua posição de menos privilegiado e se torna
cidadão com importância e valor, contribuindo efetivamente para uma sociedade
melhor e que se auto respeita.
21 Não foram encontrados registros de exemplares traduzidos para o português.
44
Será que as pessoas, além de usarem produtos e serviços, também não
estabelecem com eles relações que transcendem a utilização? Segundo Marcus
(2003, p.32) “Precisamos ser sensíveis às culturas das pessoas com quem
trabalhamos e nas nossas relações com elas” e não nos posicionarmos distantes de
suas realidade, assumindo uma postura especialista e egoísta. Um dos poderes da
mente humana, segundo Norman (2008, p. 33) “é a capacidade de sonhar, de
imaginar e de planejar”, então, porque não sonhar, imaginar e planejar
conjuntamente?
2.9 AS FERRAMENTAS DO DESIGN THINKING PARA AUXILIAR PROJETOS DE
DESIGN PARTICIPATIVO
O processo de design é uma mistura de ações intuitivas e intencionais, como
bem colocou Lupton (2013). Devido a mudança do paradigma projetual, novas
abordagens metodológicas surgiram a fim de dinamizar processos de geração em
projeto, uma dessas abordagens é o design thinking. O conceito de design thinking
refere-se a processos de concepção, pesquisa, modelagem e interação com as
partes interessadas do projeto de design, são métodos e ferramentas que auxiliam a
prática projetual para a solução não linear de problemas, e que pode ser utilizados
em projetos de design participativo (LUPTON, 2013).
As ferramentas de concepção envolvem a captura visual das ideias, com
esboços, listas, diagramas e mapeamento (LUPTON, 2013), e tais técnicas são
utilizadas para propor soluções em projetos de produtos (formais e semióticos) e
serviços.
No capítulo a seguir será apresentado o método e o conjunto de ferramentas
que foram utilizadas neste projeto, a fim de propor uma solução de design que
responda aos objetivos deste trabalho.
45
3 O MÉTODO
A metodologia aqui aplicada vem buscar no design thinking (DT) as
ferramentas necessárias para auxiliar o processo de design, viabilizando a
participação das partes interessadas na realização da fase prática desta pesquisa,
tomando como base a estrutura proposta no design kit Bootcamp bootleg,
documento criado pelo Stanford University Institute of Design (2009-2012), que
consiste em uma compilação de ferramentas projetuais aplicados em processos de
design thinking. No desenho do método proposto por de Standford (figura 13), o
processo de Design é dividido em cinco modos e cabe ao designer selecionar dentre
as ferramentas propostas, a que melhor se encaixa às diretrizes do projeto.
Figura 13 – Método Bootcamp bootleg.
Fonte: Adaptado de Stanford University Institute of Design, 2009-2012.
Visando adaptar o método supracitado ao objetivo de se criar um projeto para a
Cidade Alta de Natal, levando em consideração a relação que as pessoas
estabelecem com o bairro e a sua comida, e que viabilizasse o reconhecimento da
46
Cidade Alta enquanto centro Histórico-Cultural, sentiu-se a necessidade de
redesenhar o caminho metodológico que seria desenvolvido ao longo deste projeto.
É importante entender que o método escolhido dever ser coerente com o
projeto que se pretende desenvolver. Para Brown (2010), o design deve ser visto
como um percurso, e a resolução dos problemas deve caminhar para atender às
necessidades e desejos das pessoas, logo, as soluções projetuais não surgem de
um pensamento estritamente analítico, vêm com o desenrolar do processo, do
caminho metodológico percorrido.
O método aqui apresentado subdivide-se em seis fases, que são: criando
repertório, conceituando, ideando, modelando, escolhendo alternativas
projetuais e testando. As nomenclaturas apresentadas no modelo de Standford
(2009-2012) foram traduzidas para o português e revisadas, e inclui-se à estrutura
uma nova fase (escolhendo alternativas projetuais), sucedendo a fase de criação do
modelo. A fase de testes é prevista no método aqui proposto, mas devido às
limitações de tempo, optou-se por desenvolvê-la no futuro.
O redesenho do método está representado na página seguinte (figura 14),
nota-se que o modelo resultante está esquematizado horizontalmente, mas é posto
de maneira fluída, permitindo que o projetista caminhe avante ou retorne às etapas
anteriores, sempre que houver a necessidade (linhas tracejadas). Também estão
descritas detalhadamente as etapas (1 a 6) e subetapas (A a K) que o compõe, as
ferramentas e técnicas projetuais que deverão ser aplicadas em cada momento (O
que e como?) e os resultados esperados ao fim de cada fase, aqui caracterizados
como troféus, que simbolizam elementos condicionais para o fim de uma etapa e o
início de uma nova.
47
Figura 14 – Redesenho do método a partir de Standford (2009-2012).
Fonte: Autora, 2016.
48
Cada fase será detalhada a seguir, dos tópicos 3.1 ao 3.5, conforme a ordem
de execução demonstrada na figura acima. Em cada etapa virão apresentadas as
definições das ferramentas e técnicas selecionadas a partir do método de Standford
e de outras fontes metodológicas, necessárias para a realização deste trabalho. Os
resultados obtidos durante o desenvolvimento prático metodológico através da
aplicação das ferramentas do design participativo e suas técnicas, serão relatados
no capítulo 4.
3.1 CRIANDO REPERTÓRIO
Durante esta fase o designer assume um olhar “estrangeiro” em relação ao que
se quer observar. Esta etapa é primordial em processos de design que colocam as
pessoas ativamente como partes interessadas do projeto e que têm a empatia22
como elemento indispensável (STANDFORD, 2009-2012).
Aqui pretende-se conhecer:
As diferentes tipologias de frequentadores da Cidade Alta, através da
realização de uma entrevista aberta;
Quais os caminhos percorridos pelos indivíduos a partir da análise do
desenho de mapas dos seus modelos mentais e a aplicação de um exame
sistemático em campo;
Os lugares vistos em campo sob a ótica dos entrevistados, por meio de
registro fotográfico dos marcos referenciais;
Análise de similares através de pesquisa.
Abaixo, segue a explicação de cada ferramenta do design que deverá ser
utilizada nesta fase prática do projeto, objetivando a criação de repertório acerca das
pessoas, trajetos, lugares e similares.
22 A empatia é o hábito mental que nos leva a pensar nas pessoas como pessoas, e não como “ratos de laboratório” ou desvio-padrão (BROWN, 2010, p.46).
49
3.1.1 Entrevista para a empatia23
Aqui queremos entender como as pessoas que frequentam a cidade alta
estabelecem suas relações com o bairro e a sua comida. Ao compreender as
escolhas e comportamentos dos indivíduos, podemos identificar suas necessidades
e as possíveis abordagens por meio do design (STANDFORD, 2009-2012).
Utilizaremos como guia para a entrevista, uma lista com perguntas abertas
(apêndice 1). Uma entrevista investigativa com questões abertas é uma ferramenta
importante para a coleta de dados qualitativos, os quais priorizam a investigação a
partir das percepções pessoais dos entrevistados (ROSA e ARNOLDI, 2008). Este
tipo de entrevista é utilizada para a obtenção de informação relevante para todos os
objetivos do estudo, para isso, utiliza-se como guia uma lista com questões redigidas
previamente, e aplicadas da mesma forma para todos os entrevistados, tendo como
resultado respostas livres e abertas (PATTON, 1990 apud ROSA e ARNOLDI, 2008).
O que pretende-se com a aplicação deste tipo de entrevista, é que as pessoas
falem abertamente sobre os questionamentos levantados, para que assim, elas
participem da construção do discurso. O papel do entrevistador é o de encorajar
histórias e deixar que as pessoas falem, sem sugerir respostas às questões.
Os voluntários deverão ser convocados a partir da divulgação da pesquisa no
grupo de alunos de Design da UFRN na rede social Facebook e serão selecionados
conforme o interesse em participar do projeto. Definiu-se que para este trabalhado
serão entrevistadas 5 pessoas, e nenhuma informação a respeito delas será
divulgada. Para que isso não ocorra, para cada entrevistado será criada uma
persona, mudando suas características físicas e criando novas informações
pessoais ligadas ao personagem. Falaremos mais à frente como se dará a
composição de personas.
A entrevista se desenvolverá em escritório, os diálogos verbalizados serão
gravados e transcritos posteriormente (a transcrição das entrevistas na íntegra
encontra-se dos anexos 3 ao 7).
23 Esta ferramenta vem proposta no método de Standford (2019-2012) com o nome original interview for empathy.
50
3.1.2 Mapa do modelo mental e exame sistemático
Com a conclusão da entrevista e ao se iniciar o levantamento de repertório a
partir da fala das pessoas, iremos conhecer os trajetos percorridos por essas na
Cidade Alta. Utilizaremos como base para a realização desta subetapa o método
proposto por Lynch (2011), o qual se divide em dois momentos. Em um primeiro
instante, ainda em escritório, será solicitado que os entrevistados façam um desenho
de um mapa da idealização (modelo mental) que possuem do bairro, relacionando
sempre à sua comida. O roteiro da atividade está detalhado no apêndice 2.
Para o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT, 2003) um modelo mental é
uma representação do intelecto individual de cada ser, que corresponde àquilo que
está sendo representado, e que normalmente retém determinados aspectos de dado
objeto ou evento.
O que pretende-se com a aplicação desta técnica, é entender qual a imagem
mental que os indivíduos têm do bairro, da sua culinária e dos caminhos percorridos
na Cidade Alta, representados através do desenho de um mapa.
Em um segundo momento, os voluntários participantes do projeto, serão
levados a campo, e ali serão convidados a fazer pequenos trajetos em seu espaço,
descrevendo-os e discutindo-os no próprio local. Durante o percurso, um novo mapa
deverá ser criado por cada um. Esta ferramenta recebe o nome de exame
sistemático (LYNCH, 2011), e faz com que as pessoas identifiquem novos caminhos
e pontos referenciais que não foram lembrados com o desenho do mapa do modelo
mental. Ao final da atividade, serão feitas algumas perguntas aos participantes,
utilizando a mesma estrutura de entrevista aplicada no tópico anterior. O roteiro da
atividade do exame sistemático está detalhado no apêndice 4.
Com o desenho dos mapas (modelo mental e reconhecimento de campo),
queremos descobrir qual a imagem que as pessoas têm da Cidade Alta e da sua
comida, e também dos caminhos ali percorridos (imaginários e reais), permitindo a
identificação dos marcos referenciais que servirão de base para a realização e
aplicação da próxima ferramenta: investigação fotográfica.
51
3.1.3 Investigação fotográfica24
Os processos de design que envolvem empatia, visam entender a rotina das
pessoas e as tarefas específicas desempenhadas dentro do contexto de suas vidas.
Uma Investigação fotográfica pretende compreender a experiência do usuário
através de seus olhos, levando o projetista a conhecer os ambientes frequentados
por eles, o que provavelmente não seria possível sem consultar as pessoas.
A partir da fala das pessoas e das informações coletadas com o desenho de
todos os mapas, será criada uma lista com os marcos referenciais, servindo de guia
para o registro fotográfico em campo.
Ao aplicar este método vamos conhecer os lugares frequentados pelas
pessoas e registrar fotograficamente seus detalhes e particularidades, para a criação
de um repertório imagético da Cidade Alta e seus pontos de alimentação.
3.1.4 Análise de similares25
Com a criação de repertório acerca das pessoas, dos trajetos percorridos por
elas e dos marcos referenciais ligados à alimentação apontados em campo, faz-se
necessário conhecer soluções similares ao projeto em desenvolvimento.
A análise de similares é um recurso que objetiva o levantamento de dados
prévio, auxiliando no processo de geração de ideias (ideando). Logo, para que se
possa analisar as soluções similares existentes, iremos utilizar como método base
uma adaptação daquele proposto por Pazmino (2015), denominado lista de
verificação.
O que interessa a este projeto é apenas uma breve descrição a respeito de
cada similar, levando em consideração seus pontos positivos e negativos. Segundo
Pazmino (2015), as características positivas podem permanecer ou ser melhoradas
e as negativas podem significar o nascer de novas soluções. Ainda segundo a
autora, é importante que se crie o hábito de encontrar os aspectos negativos de
muitos produtos ou serviços que estão ao nosso redor, para que assim, sejam
propostas soluções inovadoras.
24 Esta ferramenta vem proposta no método de Standford (2019-2012) com o nome original User Camera Study e
aqui a utilizaremos de forma adaptada. 25 Utilizaremos aqui uma adaptação da ferramenta “lista de verificação”, que é uma ferramenta de análise que serve para organizar de forma exaustiva os atributos do produto, servindo para detectar deficiências de características que devem ser superadas ou mantidas (PAZMINO, 2015).
52
3.2 CONCEITUANDO
É na fase de conceituação que as vivências de campo serão descompactadas
e os resultados serão sintetizados em necessidades reais e insights26. É uma fase
de "foco" para maior compreensão dos usuários e de reconhecimento da área de
estudo (STANDFORD, 2009-2012), neste caso, do bairro da Cidade Alta.
A partir de todo o repertório criado no decorrer da fase anterior (criando
repertório) e com a aplicação de ferramentas do design selecionadas a partir do
design kit Bootcamp bootlag (STANDFORD, 2009-2012), serão identificados os
problemas para abordagem futura, o recorte da área aonde o projeto será aplicado e
as tipologias de usuário.
Mais do que simplesmente definir os problemas a serem trabalhados, o
projetista deverá levar em consideração as descobertas feitas durante o processo de
empatia (criando repertório). Compreender as pessoas, os trajetos percorridos na
Cidade Alta, os lugares vistos e os similares será fundamental para criar uma
solução de design bem sucedida. Abaixo, seguem as duas ferramentas utilizadas
para identificar os problemas e o recorte da área (“compartilhar e capturar histórias”
e “saturar e agrupar”) e para a idefinição das tipologias de usuários (criação de
persona).
3.2.1 Compartilhar e capturar histórias27
O compartilhamento das informações possuem pelo menos três objetivos
principais. Primeiro, ele permite que se exponha rapidamente o que foi visto e ouvido
em campo. Segundo, ao se escutar e sondar para se obter mais informações,
nuances e significados diversos são capturados a partir das experiências
vivenciadas. Terceiro, ao capturar cada detalhe interessante a partir do estudo de
campo, se inicia o processo de síntese, em que as informações irão convergir em
problemas reais e no recorte específico da área que o projeto irá atingir.
(STANDFORD, 2009-2012).
A ferramenta posta em prática consiste em transformar a fala das pessoas e o
que foi observado durante os caminhos percorridos em campo em palavras-chave,
26 A partir do dicionário Merriam-Webster (2016): a capacidade de entender as pessoas e as situações de uma forma muito clara (tradução nossa). 27 Título original em inglês: Story Share-and-Capture (STANDFORD, 2009-2012).
53
que serão escritas em notas autoadesivas, posteriormente dispostas em uma
superfície plana. Estas “notas” se tornarão parte do espaço de saturação e depois
serão separadas em grupos organizados a partir de padrões que serão visualizados
no espaço saturado e esclarecendo do objeto de estudo (ferramenta saturar e
agrupar). O objetivo final é entender os problemas de projeto a serem solucionados
e o recorte da área dentro do bairro da Cidade Alta, levando em consideração o
repertório criado e o que o que cada voluntário entrevistado disse, viu e esboçou no
desenhos dos dois mapas (modelo mental e exame sistemático).
3.2.2 Saturar e agrupar28
A ferramenta anterior auxilia no processo de “desempacotar” os pensamentos e
experiências vividas em campo, transformando-as em informações tangíveis e
visuais. Com o espaço repleto de palavras-chave (criadas com a aplicação da
ferramenta “compartilhar e capturar histórias”), é o momento de usar as descobertas
para explorar os temas e padrões que emergiram anteriormente, e agora se movem
em direção à identificação das necessidades/desejos significativos das pessoas
consultadas e das ideias que irão informar as soluções de design (convergir).
(STANDFORD, 2009-2012)
O início da síntese das informações coletadas se dará neste momento, quando
organizaremos as notas autoadesivas em grupos de partes relacionadas (estes
serão descritos no capítulo 4), podendo levar a um novo conjunto de grupos. Este
modo de agrupar também é útil para refletir sobre as semelhanças entre um grupo
de produtos, objetos ou usuários. Com este processo, pretendemos identificar os
problemas de projeto, as tipologias de usuário e o recorte da área dentro da Cidade
Alta, delimitando o local para a atuação.
O objetivo final é sintetizar dados em resultados interessantes e criar ideias que
possam ser úteis durante a próxima fase, onde serão geradas propostas de
soluções de design para os problemas aqui levantados.
28 Título original em inglês: Saturate and Group. (STANDFORD, 2009-2012).
54
3.2.3 Criação de persona29
Com as tipologias de usuários delimitadas com a aplicação da ferramenta
“saturar e agrupar”, iremos criar personagens baseados no perfis daqueles que
foram entrevistados e observados em campo. Concentraremos a nossa atenção nas
características marcantes de cada caráter e nos aspectos relevantes ao projeto.
A criação de persona30 é um método de síntese dos conhecimentos adquiridos,
que foram condensados anteriormente. Os personagens criados não
corresponderão fielmente às pessoas entrevistadas durante a fase “criando
repertório”, os perfis originados devem informar características ficcionais àquelas
observadas em campo, podendo incluir dimensões "típicas", tendências e outros
padrões que foram levantados a partir do grupo de entrevistados. Essas
características que irão compor o perfil podem conter também informações
demográficas, qualidades estranhas e hábitos, ou fatores de motivação pessoais
particulares.
O personagem criado, além do perfil composto, será representado através de
um desenho e receberá um nome inventado. Além dessas informações que
caracterizam a identidade das personas e que vêm indicadas no método Bootcamp
bootleg (STANDFORD, 2009-2012), serão levantados as preferências alimentares
pessoais de cada personagem dentro da Cidade Alta, onde será possível visualizar
a relação que cada um estabelece com o bairro e a sua comida.
3.3 IDEANDO31
É nesta fase do projeto que as respostas aos problemas devem começar a
aparecer como ideias de soluções projetuais. “Idear” é um processo para a geração
de conceitos e resultados, e corresponde a uma etapa de “foco”, onde os
conhecimentos adquiridos em campo e a visão do projetista serão fundamentais
para o surgimento de propostas e ideias inovadoras (STANDFORD, 2009-2012).
Como a aplicação da ferramenta “saturar e agrupar” foram verificados padrões
a partir do espaço saturado com informações recolhidas em campo, a partir desses
29 Título original em inglês: Composite Character Profile (STANDFORD, 2009-2012). 30 O termo persona representa uma pessoa com mente, corpo e sentimentos. A palavra é usada para expressar a ideia de um ser humano que representa um comportamento (PAZMINO, 2015). 31 No método de Standford (2009-2015), esta etapa vem identificada como Ideate, termo em inglês que significa: formar uma ideia ou concepção (MERRIAM-WEBSTER, 2016, tradução nossa).
55
padrões foi criada uma lista com as “situações problema”. Essa lista será o ponto de
partida para a realização desta etapa, através da ferramenta “Como nós
poderíamos?” para a geração de ideias projetuais, que deverão significar possíveis
soluções aos problemas de projeto levantados.
3.3.1 Como nós poderíamos?32
“Como nós poderíamos?” (CNP), são pequenas perguntas que impulsionam o
processo de geração de propostas de soluções33, tomando como base as “situações
problema” listadas na fase de conceituação (conceituando).
Nesta fase, será criada uma série de indagações (perguntas-chave) para cada
problema levantado, essas questões deverão ser amplas o suficiente para que haja
uma vasta gama de soluções, mas abastantemente específicas, para não atrapalhar
o andamento metodológico com profusão de perguntas que não sejam relevantes
para serem respondidas. Deve-se notar que o âmbito apropriado das questões
abordadas poderá variar de acordo com o rumo do projeto e do progresso do
trabalho de pesquisa.
Com os problemas previamente identificados em com as “perguntas-chave”
elencadas de acordo com cada problemática, capturadas com a aplicação do
método CNP, serão selecionadas as perguntas mais pertinentes (amplas mas
suficientemente específicas), que serão respondidas através de soluções projetuais.
No que concerne aos objetivos delimitados para este projeto, será selecionada
a ideia que venha a solucionar a maior parte das adversidades encontrados com o
desenvolvimento da pesquisa, levando em consideração as necessidades e desejos
das pessoas que foram consultadas na fase de empatia, bem como os ambientes
observados, os caminhos percorridos na Cidade Alta e os similares analisados
(criando repertório). A seguir (figura 15), vem esquematizado como se dará o
processo de ideação, com o emprego da ferramenta “Como nós poderíamos?” de
forma adaptada, objetivando chegar a uma solução de projeto.
32 Título original em inglês: How Might We...? (STANDFORD, 2009-2012), ferramenta utilizada de forma adaptada. 33 Como ideias de soluções entende-se produtos ou serviços relacionados ao projeto.
56
Figura 15 – Processo de ideação a partir da aplicação da ferramenta CNP.
Fonte: Autora, 2016.
3.4 MODELANDO
Com todas as informações recolhidas na fase “criando repertório”, as
problemáticas identificadas a partir das observações feitas e com a tradução dessas
em propostas de projeto, uma solução de design deverá ter sido escolhida dentre o
vasto repertório de ideias geradas, a mesma será descrita a partir de modelagem
verbal e em um mapa do sistema, e posteriormente será criado um modelo
representativo da ideia. Aqui definiremos modelo como uma manifestação física em
menor escala de algo ainda a ser feito (ESCOBAR, 2013).
No método Bootcamp bootleg (STANDFORD, 2009-2013), esta etapa do
processo de projetar recebe o nome de “prototipar”, mas como um protótipo é um
modelo em sua fase final de projeto e já pronto para a fabricação (BROWN, 2010),
utilizaremos o termo “modelar” ao invés de “prototipar”, porque o que nos interessa
neste Trabalho de Conclusão de Curso é representar verbalmente,
esquematicamente e fisicamente o conceito de design.
Brown (2010) nos fala sobre a importância de se criar modelos a fim de
elucidar problemas complexos a partir de uma série de experimentos iniciais, e que
esse método costuma ser a melhor forma de decidir entre vários direcionamentos
possíveis. O autor complementa ao dizer que “quanto mais rapidamente tornarmos
nossas ideias tangíveis, mais cedo poderemos avaliá-las, lapidá-las e identificar a
melhor solução”. (BROWN, 2010, p. 85). Seguem as ferramentas que serão
utilizadas nesta fase do projeto.
57
3.4.1 Modelagem verbal do serviço
A modelagem verbal está ligada ao domínio de vocabulário para representar as
ideais projetuais, ou seja, para descrever, nomear, definir e conceituar verbalmente
(GOMES, 2014 apud ROSSELLI, 2012). Conforme as necessidades da autora, a
linguagem (modelagem verbal) poderá assumir diferentes formas, linguagem
coloquial ou informal, linguagem formal ou erudita (ROSSELLI, 2012).
A partir da construção do discurso, o sistema será apresentado na dimensão
da sua ideia, possibilitando que sejam criadas imagens mentais das possíveis
soluções dos problemas projetuais.
Com a modelagem verbal do serviço composta, será criado um mapa do
sistema do serviço, que permitirá visualizar o sistema do mesmo.
3.4.2 Mapa do sistema do serviço34
O mapa do sistema é uma descrição visual do serviço de ordem técnica,
ondem vem demonstrados: os diferentes atores envolvidos, suas ligações mútuas e
os fluxos de materiais, energia, informação e recursos através do sistema (Morelli,
2007 apud SERVICE DESIGN TOOLS, 2009, tradução nossa). Abaixo (figura 16),
vem esquematizado um exemplo de um mapa do sistema do serviço.
Figura 16 – Mapa do sistema do serviço “travel global | read local”.
Fonte: Service Design Tools, 2009.
34 Título original em inglês: System map (SERVICE DESIGN TOOLS, 2009).
58
3.4.3 Modelar para representar35
Esta é uma ferramenta que permite a geração de artefatos de baixa resolução
que sondam diferentes aspectos da solução de design (STANDFORD, 2009-2012).
O objetivo aqui é traduzir a ideia em um modelo representativo físico, permitindo que
o designer visualize aspectos formais da solução de design.
O modelo apresentado como resultado representativo da ideia deverá permitir
modificações, por isso será elaborado em um material alternativo que permita tais
alterações e interferências representativas. A qualidade técnica e acabamento do
modelo de teste não importa aqui, e sim a representação da ideia e do que
pretende-se ser provado, levando em consideração as características das personas
identificadas na fase de criação (criando), isto deverá estar bastante claro antes da
elaboração do modelo em si.
A meta com a aplicação da ferramenta “modelar para testar”, não é criar um
modelo funcional, mas decidir se a solução de projeto escolhida tem ou não valor
funcional, isso se dará com o reconhecimento dos pontos fortes e fracos do projeto
para identificar novos direcionamentos que serão reconhecidos na fase conseguinte
(escolhendo). (BROWN, 2010).
3.5 ESCOLHENDO E APLICANDO O CONCEITO VISUAL
Com o modelo estrutural criado e com as devidas observações feitas, será
desenvolvido o conceito visual do serviço, que será aplicado, primeiramente, apenas
no modelo físico da solução projetual. Para isso, serão utilizadas duas ferramentas
que auxiliarão na elaboração do conceito visual (Brain dumping visual e Kit de
peças) e uma para definir as cores que serão usadas no modelo final (corposição),
que será testado futuramente.
3.5.1 Brain dumping visual e Kit de peças
A aplicação da ferramenta servirá para gerar alternativas gráficas para a
identidade visual da solução de design proposta, buscando referências visuais no
que foi observado em campo a partir das imagens recolhidas com a investigação
fotográfica (criando repertório).
35 Título original em inglês: Prototype to Test (STANDFORD, 2009-2012). Aqui o que será testado é a
representatividade da ideia projetual, para posteriormente serem aplicadas ao modelo os conceitos visuais.
59
O brainstorming tradicional é uma atividade verbal geralmente realizada em
grupos. A técnica do brain dumping visual transforma o brainstorming em uma mídia
visual, mais adequada ao trabalho individual. Este processo começa por uma
criação de esboços, e a partir deles serão concebidos diversos desenhos (LUPTON,
2013).
A fim de guiar a geração de alternativas a partir da criação dos desenhos,
durante o brain dumping visual, iremos levar em consideração a criação de um Kit
de peças a partir dos desenhos gerados. Um Kit de peças nada mais é do que uma
ferramenta de design baseada em sistemas, que permite criar um conceito visual
aberto e não estático, permitindo assim, a criação de uma alternativa visual viva.
(LUPTON, 2013). Enquanto as identidades gráficas tradicionais são sistemas
fechados com regras fixas, o kit de peças permite a criação de um sistema aberto e
flexível.
Com a aplicação dessas ferramentas, contemporaneamente, será possível definir
um conceito visual para o serviço, que será aplicado no modelo físico criado na fase
modelando. Pretende-se criar uma opção que possa produzir infinitas variações do
sistema, combinando os elementos existentes.
3.5.2 Corposição
Utilizaremos esta ferramenta para a justificar a escolha de cores que irão
compor o conceito visual. Esta técnica foi criada em disciplinas de uso na cor do
design, com o objetivo de criar um roteiro para que os alunos criassem suas próprias
paletas de cor, a partir dos princípios de composição de cor, existentes em literatura
(DANTAS, 2015).
A paleta será criada a partir de uma imagem capturada na subfase
investigação fotográfica (criando repertório). A imagem deverá ser inserida no
software Adobe Illustrator e editada através da aplicação do filtro de photoshop
pixelizar > cristalizar com tamanho de célula 70 para facilitar a captação de cores
através da ferramenta conta-gotas. A paleta composta pelas cores pinçadas
aleatoriamente e conforme a inspiração do designer, será organizada sob um círculo
cromático para ser equilibrada (DANTAS, 2015).
60
4. RESULTADOS ATINGIDOS
Neste capitulo serão expostos os resultados obtidos com a aplicação do
percurso metodológico definido para este trabalho, seguindo a ordem de aplicação
das ferramentas do design, conforme visto na figura 14, no tópico 3 (o método).
4.1 CRIANDO REPERTÓRIO
4.1.1 Entrevista para a empatia
A entrevista foi realizada com três voluntários que demonstraram interesse na
postagem do facebook, sendo todos eles, estudantes do curso de Design da UFRN.
Além desses três, visando a criação de um repertório mais completo acerca da
Cidade Alta e da sua comida, notou-se que seria necessário realizar a entrevista
com algum conhecedor “especialista”, e também, com um proprietário de restaurante
instalado no local. A lista de perguntas foi a mesma para os 4 primeiros
entrevistados (apêndice 2), para o último voluntário, como não foi possível realizar
as atividades de desenho dos mapas e por esse ser aquele que frequentava a
Cidade Alta com regularidade, incorporou-se à lista de perguntas da subetapa
“entrevista para a empatia” as perguntas feitas ao final da realização do exame
sistemático.
Todas as entrevistas vêm transcritas na íntegra no a partir do anexo 3, bem
como as respostas obtidas ao final da realização do exame sistemático. As
informações e ensinamentos recolhidos com a aplicação deste método foram
extremamente esclarecedoras, nos levando a reconhecer padrões de personalidade
entre as pessoas consultadas durante a pesquisa, tais padrões foram reconhecidos
graças à aplicação da ferramenta “compartilhar e capturar histórias”. O resultado
obtido com o uso do método e as personas criadas a partir do processo de empatia,
será demonstrado mais adiante, no tópico referente a fase de conceituação.
A seguir, vêm demonstrados os mapas desenhados pelos voluntários em
escritório (mapa do modelo mental) e em campo (exame sistemático) e uma breve
análise relacionando as duas atividades. A análise que será feita aqui não visa
quantificar os pontos de alimentação, vias e marcos referencias, mas sim entender
qual a imagem que cada voluntário estabelece com a Cidade Alta e a sua comida.
61
4.1.2 Mapa do modelo mental e exame sistemático
4.1.2.1 Voluntário 1
O desenho do mapa do modelo mental feito pelo voluntário 1 (figura 17) condiz
com o que foi dito pelo mesmo durante a entrevista, o próprio se considerou “nada
conhecedor” do bairro da Cidade Alta e da comida local. Ele disse que sempre se
desloca de carro quando vai ao bairro, para em um estacionamento (ver na figura 17
pontos 5 e 6), e a partir daí anda a pé.
Com a análise do desenho podemos notar que o indivíduo não sabe identificar
as vias pelos seus nomes, e se recorda apenas dos pontos comerciais e de serviços
[1: Vitrine da Arte (loja), 2: Caixa (banco), 3: Riachuelo (loja) e 4: Costureira], os
quais usa como marcos referenciais para se localizar. Podemos notar também, ao
interpretar o rascunho do mapa, que esta pessoa possuí uma idealização comercial
do bairro, e tampouco relaciona o local com a comida ali ofertada. O entrevistado
não representou graficamente, em seu mapa, o trajeto percorrido mentalmente,
explicando que conhece muito pouco do bairro.
Figura 17 – Desenho do mapa do modelo mental elaborado pelo voluntário 1.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, Autora, 2016.
62
Já o desenho do mapa obtido com a aplicação do exame sistemático (figura
18), nos mostrou que, em campo, o voluntário 1 se colocou em uma posição de
explorador, procurando por pontos de alimentação e identificando-os em seu mapa.
Algo que também nos chamou a atenção foi o fato do usuário ter saído da sua zona
de conforto e ter ido procurar por novos caminhos, demarcando pontos de referência
diferentes daqueles presentes em seu modelo mental. Os números dispostos no
mapa correspondem aos locais visitados pelos usuários, em sequência lógica.
Figura 18 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 1.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
4.1.2.2 Voluntário 2
A imagem mental representada a partir do desenho do mapa do modelo mental
do segundo voluntário (figura 19) se mostrou bastante ampla. Enquanto fazia o
desenho, o indivíduo disse que havia muitas lembranças dos locais de alimentação
que costumava visitar durante a sua infância, mas que recentemente, tem a Cidade
Alta como um local para comprar algo que precisa, ir ao banco ou encontrar serviços
médicos, completando ao dizer que não come muito ali.
63
No desenho do mapa (figura 19) pode-se verificar que foram identificadas
poucas vias (4, 8 e 12), marcos referenciais gerais, que fazem parte da idealização
comercial que o usuário possui do bairro, bem como aqueles que fazem parte do
modelo mental mas não constam no trajeto percorrido (21 e 22). São identificados
também pontos de alimentação particulares ao paladar do entrevistado e que o
mesmo disse encontrar ali, na Cidade Alta, os referidos alimentos com melhor
qualidade (6, 10, 11 e 17). Ao traçar o seu trajeto imaginários, não estabeleceu uma
sequência lógica, disse que inicia seu trajeto no ponto 1 (IFRN Cidade Alta), pois é
ali onde salta do ônibus, e pode seguir caminhos diversos, dependendo do
compromisso que tem.
Figura 19 – Desenho do mapa do modelo mental elaborado pelo voluntário 2.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
Para a segunda parte, durante a realização do exame sistemático, foi
estabelecido o mesmo ponto de partida que o identificado no mapa do modelo
mental (IFRN Cidade Alta) e como ponto de chegada, aquele que ele considerou o
lugar que possui o melhor mate da cidade. O desenho do mapa obtido com a
aplicação da atividade vem representado na figura 20.
64
Figura 20 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 2.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
Em termos de quantidade, se comparado ao mapa apresentado anteriormente,
foram identificados poucos pontos de alimentação (6, 8, 12 e 13), supõe-se que o
voluntário tenha feito o mesmo que diz fazer quando está à procura de locais
específicos em zonas que não costuma frequentar assiduamente, destaca-se a partir
da sua fala, a seguinte passagem, onde o mesmo diz que
“[...] Às vezes eu desenho ou imprimo o mapinha, e vou colocando os pontos de referência, que eu devo procurar, por exemplo, se tiver alguma farmácia, perto de algum lugar que eu quero ir, ou alguma escola” (entrevista para a empatia, voluntário 2, anexo 4).
Ao percorrer o seu trajeto em campo, o voluntário decidiu explorar um novo
lado do bairro, e acabou descobrindo onde ficava localizado o “Beco da Lama” (6), o
qual conhecia apenas de nome, dizendo ainda que havia se perdido ali uma vez,
quando estava à procura de um sebo.
Para chegar ao seu destino final (13) foram percorridas e identificadas pelo
usuário no mapa, as mesmas vias (4 e 14) presentes no desenho do seu modelo
mental. Como observações interessantes destaca-se a identificação de uma árvore
(11) como marco referencial, que é sempre utilizada por ele para encontrar o “mate
65
2”, destacado no mapa com um símbolo de coração. Como descoberta interessante,
o usuário identificou um novo ponto de venda de mate (12) e a localização real do
Beco da Lama (6).
4.1.2.3 Voluntário 3
A partir da entrevista e da visualização do desenho do mapa do modelo mental
(figura 21), reconheceu-se este voluntário como um profundo conhecedor da Cidade
Alta e dos seus pontos de alimentação. O mesmo concentrou-se na identificação
exaustiva do maior número possível de pontos de alimentação, destacados em
verde no mapa, relacionando tais pontos com os marcos referencias que o auxiliam
na localização geográfica, esses destacados em lilás, e reconhecendo apenas duas
vias (7 e 29).
Figura 21 – Desenho do mapa do modelo mental do voluntário 3.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
Ainda em relação ao mapa do modelo mental (figura 21), um mesmo ponto de
alimentação foi identificado duas vezes (21 e 24), o entrevistado não soube dizer
com precisão onde o mesmo ficava localizado.
66
Em campo, o voluntário disse que concentraria seu trajeto em locais que
costuma frequentar à noite. O desenho do mapa do seu exame sistemático (figura
22) foi bem específico e dinâmico. Como o mesmo já possuí bastante conhecimento
em relação a gastronomia local e ao bairro em si, concentrou a construção do seu
trajeto partindo de um ponto inicial (Beco do Zé) e chegando no Bar do Nildo (8).
Não houveram descobertas in loco, apenas nos foi dada uma nova informação
com relação a uma feira gastronômica da Igreja do Galo (5), que acontece todas as
terças-feiras pela manhã, no largo da Igreja. Comparando com o mapa do modelo
mental, uma nova via (2) e um marco referencial (6) foram identificados.
Figura 22 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 3.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
67
4.1.2.4 Voluntário 4
A partir da entrevista, o voluntário 4 se considerou um conhecedor mediano da
Cidade Alta, e disse que só se lembrava de haver comido em um único lugar no
bairro. O mesmo falou ainda que só vai até ali com uma intenção: comprar tecidos e
aviamentos. Com a geração do desenho do mapa do modelo mental (figura 23), se
pôde confirmar o que foi ouvido durante a entrevista e viu-se que o indivíduo em
questão possui uma visão comercial bastante específica do bairro, relacionando-o a
um local para a compra de produtos bastante específicos.
Em seu desenho, o voluntário 4 identificou o seu ponto de partida frequente (1),
vias paralelas, as quais lembrava os nomes (2, 8 e 11), ruas reconhecidas por seus
nomes populares (4 e 10), ruas que não lembrou o nome (3, 5, 6 e 7) e o ponto de
alimentação que costuma visitar quando vai até a Cidade Alta (10).
Figura 23 – Desenho do mapa do modelo mental do voluntário 4.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
68
O mapa obtido com a aplicação do exame sistemático em campo (figura 24)
não se difere muito do desenho do mapa do modelo mental do voluntário 4. O
mesmo não explorou novos pontos de alimentação. Estabeleceu como ponto de
partida o local do início da entrevista (1) e como local de chegada o único ponto de
alimentação que possuía referência anterior (11). Para se localizar, tomou como
referência algumas vias (2, 3, 7 e 10) e marcos referenciais diversos daqueles
postos no desenho do mapa do modelo mental (1, 4, 5, 6, 8 e 9).
Figura 24 – Desenho do mapa do exame sistemático do voluntário 4.
Fonte: Desenho adaptado a partir do original, autora, 2016.
69
4.1.2.5 Voluntário 5
Para o voluntário 5, com o qual não foi possível realizar as atividades de
desenho dos mapas (mapa do modelo mental e exame sistemático), foi criada uma
lista com os Marcos Referenciais citados durante a realização da entrevista, pontos
estes que se fizeram úteis para a criação de repertório a partir da investigação
fotográfica. A lista e localidades fotografadas, vêm disponibilizadas nos resultados
da criação de repertório a partir dos locais visitados.
4.1.3 Investigação fotográfica
Como uma câmera na mão, fomos a campo para compor a pesquisa visual a
partir da investigação fotográfica. Antes de fotografar, foi necessário elencar o que
foi identificado nos desenhos dos mapas dos voluntários (tabelas 2, 3 e 4). Com as
listas criadas, pudemos guiar nosso olhar com maior facilidade, e compor três
“painéis” imagéticos, que comunicam as particularidades encontradas na Cidade
Alta a partir dos seus marcos referenciais (figura 25), pontos de alimentação (figura
26) e vias (figura 27).
Tabela 2 – Marcos referenciais indicados nos mapas dos voluntários
Fonte: Autora, 2016.
70
Tabela 3 – Pontos de alimentação indicados nos mapas dos voluntários.
Fonte: Autora, 2016.
Tabela 4 – Vias indicadas nos mapas dos voluntários
Fonte: Autora, 2016.
71
Figura 25 – Investigação fotográfica: marcos referenciais.
Fonte: Autora, 2016.
72
Figura 26 – Investigação fotográfica: pontos de alimentação.
Fonte: Autora, 2016.
73
Figura 27 – Investigação fotográfica: vias.
Fonte: Autora, 2016.
74
4.1.4 Análise de similares
Analisaremos aqui (levando em consideração os pontos positivos e negativos),
alguns exemplos de similares a produtos, serviços e eventos, obtidos a partir de
pesquisa na web, que identificam, mesmo que de forma indireta, o alimento no
mapeamento das cidades, e possibilita que a cultura local seja conhecida a partir da
comida.
4.1.4.1 Comida di Buteco – Rio de Janeiro
Considerado o maior concurso de comida de raiz do Brasil, o “Comida de
Buteco” acontece em 20 cidade do país, aqui analisaremos a edição do Rio de
Janeiro (figura 28), por ter sido citada por um dos voluntários na fase “criando
repertório”.
Figura 28 – Printscreen da página web do mapa do
“Concurso Nacional Comida di Buteco” – Rio de Janeiro.
Fonte: Comida di Buteco, 2016. Disponível em: <http://www.comidadibuteco.com.br/rio-de-
janeiro/mapa/> Acesso em: 20 Jul 2016.
75
Os bares e restaurantes que participam do “Comida di Buteco” são
selecionados pela equipe organizadora do concurso com um ano de antecedência.
Cada boteco cria um tira gosto para participar, público e júri atribuem notas que vão
de 1 a 10 em 4 quesitos: tira gosto, higiene, atendimento e temperatura da bebida. O
peso do júri e do público é equivalente, 50% cada. Os votos físicos são recolhidos a
apurados pelo instituto Vox Populi, e após apuração, é eleito o melhor petisco, e por
consequência, o melhor boteco de cada cidade participante. No site do evento
(http://www.comidadibuteco.com.br/rio-de-janeiro/) é possível conferir as edições
anteriores e acessar um mapa criado a partir de dados cartográficos do google
maps, onde estão dispostos geograficamente os bares e restaurantes participantes
do concurso (figura 28). Ao clicar sobre os balões vermelhos, o usuário pode ser
redirecionado para a página do estabelecimento referenciado. Abaixo, segue a
tabela com a análise feita, levando em consideração os pontos positivos e negativos
encontrados no similar.
Tabela 5 – Lista de verificação: Comida di Buteco – Rio de Janeiro.
Fonte: Autora, 2016.
4.1.4.2 Foodie Map of Copenhagen
Foodie Map of Copenhagen (figura 29) é um mapa interativo, desenvolvido pela
Expedia Denmark, empresa de turismo dinamarquesa. No mapa web é possível
explorar os mais diversos distritos de alimentos de Copenhagen, o usuário pode
filtrar desde o nicho e restaurantes menos conhecidos - até os mais luxuosos,
76
ranqueados pela Michelin Star36. O mapa permite que o usuário selecione os tipos
de pratos que deseja e quanto pode pagar pela comida.
Figura 29 – Printscreen da página web Foodie Map of Copenhagen.
Fonte: Foodie Map of Copenhagen, 2016. Disponível em: < https://blog.expedia.dk/copenhagen-
foodie-map/ > Acesso em: 20 Jul 2016.
Além de indicar no mapa os locais de alimentação (pictogramas de talheres em
laranja), são destacados alguns marcos referenciais importantes e que compõe a
imagem da cidade de Copenhagen. As regiões da cidade (7 no total) são
identificadas por cores diferentes. Ao clicar nos pictogramas é possível obter
informações interessantes a respeito do ponto de alimentação, tais como: o tipo de
cozinha (o site lista 12 tipos no total), a nota obtida na avaliação da Michelin Star, o
endereço do estabelecimento e o valor médio da comida. Abaixo, segue a tabela
com a análise do similar, levando em consideração os pontos positivos e negativos
encontrados a partir da aplicação da ferramenta “lista de verificação”.
36 O termo Michelin Star é um marco de qualidade de menus luxuosos e de restaurantes ao redor do mundo (ABOUT TRAVEL, 2015). Fonte: Disponível em: <http://foodtravel.about.com/od/Restaurant-Reviews/fl/What-Are-the-Michelin-Stars.htm.> Acesso em: 20 Jul2016.
77
Tabela 6 – Lista de verificação: Foodie Map of Copenhagen.
Fonte: Autora, 2016.
4.1.4.3 Moleskine City Notebook
Figura 30 – Moleskine City Notebook.
Fonte: Moleskine City Notebook, 2016. Disponível em: <
http://www.moleskine.com/br/collections/model/city-notebooks> Acesso em: 20 Jul 2016.
O Moleskine City Notebook (figura 30) é um guia que permite organizar lugares
para que não caiam no esquecimento. É possível tomar notas para lembrar de
restaurantes e lojas, de bares e atrações turísticas. Nas páginas da caderneta vem
impresso um mapa da cidade temática referente a cada edição (existem 36
variedades), o mapa resume o layout geral da cidade, incluindo mapas de grande
escala do centro da cidade, um índice alfabético das ruas e um mapa do sistema de
78
metrô. A caderneta conta com 76 páginas em branco, dando liberdade ao usuário
para interferir nos papéis, pode se escrever, anotar informações úteis para guardar
memória, impressões e experiências.
Abaixo, segue a tabela com a análise do similar, levando em consideração os
pontos positivos e negativos encontrados a partir da aplicação da ferramenta “lista
de verificação”.
Tabela 7 – Lista de verificação: Foodie Map of Copenhagen.
Fonte: Autora, 2016.
4.2 CONCEITUANDO
Aproximando-se dos dados coletados em campo (criando repertório), que teve
como centro das atenções a alimentação dentro da dinâmica do bairro da Cidade
Alta de Natal, foi possível transformar a fala das pessoas e o que foi visto em campo
em palavras-chave, escritas em notas autoadesivas que foram dispostas na parede
para melhor visualização da área de saturação. O resultado final obtido com a
aplicação da ferramenta “compartilhar e capturar histórias” vem demonstrando na
página a seguir (figura 31).
79
Figura 31 – Histórias capturadas e compartilhas.
Fonte: Autora, 2016.
80
Com a área de saturação repleta de palavras-chave, fez-se necessário aplicar
a ferramenta “saturar e agrupar” para identificar os padrões presentes nas
observações feitas e reorganizar as notas em novos grupos. Foram identificados 6
padrões, quem vem descritos na sequência de figuras (32 a 37).
Figura 32 – Padrão: recorte da área. Figura 33 – Padrão: problemas.
Fonte: Autora, 2016. Fonte: Autora, 2016.
Figura 34 – Padrão: marcos referenciais. Figura 35 – Padrão: similares
Fonte: Autora, 2016.
Fonte: Autora, 2016
81
Figura 36 – Padrão: soluções
projetuais ditas pelas pessoas.
Figura 37 – Padrão: características
das personas.
Fonte: Autora, 2016
Fonte: Autora, 2016
Com os padrões devidamente identificados e agrupados foi possível visualizar
alguns problemas (figura 33), que serão retomados no próximo tópico (4.3), com a
aplicação da ferramenta “como nós poderíamos?” (CNP), as informações
condensadas e organizadas no padrão “soluções projetuais ditas pelas pessoas”
(figura 36) também serão fundamentais para a aplicação da ferramenta CNP.
A partir do padrão “características das personas” (figura 37) foram
reconhecidos três tipologias de usuários, levando em consideração o grau de
conhecimento das personagens em relação a alimentação ofertada no bairro da
Cidade Alta (profundo conhecedor, médio conhecedor e desconhece
completamente).
Com a reorganização dos padrões criados anteriormente, foi possível compor 3
perfis de personas distintos, são eles: Janaína, a que conhece profundamente a
Cidade Alta e sua comida (figura 38); Fausto, o conhecedor mediano (figura 39); e
Diana, a que não conhece o bairro mas possui personalidade desbravadora (figura
40).
82
Figura 38 – Perfil da persona Janaína.
Fonte: Autora, 2016
83
Figura 39 – Perfil da persona Fausto.
Fonte: Autora, 2016
84
Figura 40 – Perfil da persona Diana.
Fonte: Autora, 2016.
A partir dos três perfis de pessoas criados, foi possível visualizar com melhor
clareza as três tipologias de usuário, ao atribuir a cada personalidade as
descobertas e falas recolhidas em campo. Todas as palavras-chave utilizadas para
compor os personagens foram obtidas a partir da área de saturação, possibilitando
entender as características de cada um (notas autoadesivas em laranja), o recorte
da área (notas em azul escuro), quais problemas enfrentados por cada personagem
(notas em rosa) e as sugestões dadas pelas “personagens” para resolvê-los (notas
85
amarelas), foi possível identificar também os locais frequentados por cada
personagem na Cidade Alta, isso ajudará a compor o mapa com o recorte da área.
A seguir, iremos resgatar os problemas e as possibilidades de resolução para
os mesmos, indicadas pelas pessoas, a fim de apresentar uma solução de design
inovadora que permita o reconhecimento da Cidade Alta de Natal, a partir do seu
alimento, enquanto Centro Histórico Cultural.
4.3 IDEANDO
4.3.1 Como nós poderíamos?
Com a aplicação da ferramenta “como nós poderíamos?” (CNP) sintetizamos
os problemas levantados no tópico anterior em uma tabela (tabela 8), algumas
palavras-chave foram combinadas com a intenção de juntar problemas parecidos em
um só. Na coluna central da tabela constam os questionamentos CNP, e por último,
na coluna da direita, as possibilidades de soluções projetuais que poderiam resolver
tais problemas.
Tabela 8 – Aplicação da ferramenta CNP.
Fonte: Autora, 2016.
86
Com a aplicação desta ferramenta (CNP) foi possível incluir as propostas de
soluções aos problemas identificados em campo, gerando ideias de soluções em
projetos de design. Não será possível responder à todas as necessidades e desejos
ditos pelas pessoas, mas o que pretende-se aqui é apresentar um projeto que
abarque o maior número possível dos problemas, sempre levando em consideração
os anseios das pessoas que colaboraram ativamente com este projeto. A seguir
apresentaremos a proposta projetual resultante de todo o processo acima descrito,
incialmente será feita uma modelagem verbal da ideia, depois apresentaremos um
mapa do sistema do projeto, para melhor visualização do funcionamento do mesmo
e por fim, apresentaremos o modelo físico preliminar.
4.4 MODELANDO
4.4.1 Modelagem verbal
A partir do que foi ouvido em campo, com a análise de similares, com a
identificação e visualização dos problemas a partir da aplicação da ferramenta
“como nós poderíamos?”, chegou-se a ideia de um serviço para a Cidade Alta, sua
comida e para o reconhecimento do bairro enquanto Centro Histórico cultural.
Viva o Centro – Circuito de comida Potiguar, é um serviço de mapeamento
participativo pensado para a Cidade Alta, que pretende apresentar a alimentação do
bairro ao Natalense. A partir de um aplicativo mobile com recursos de geo-
localização, disponível para as principais plataformas móveis, os usuários poderão
cadastrar os seus percursos dentro da Cidade Alta em um mapa com o desenho das
ruas do bairro, possibilitando a livre identificação dos pontos de alimentação
visitados e os marcos referenciais que utiliza para se localizar. Os mapas criados
poderão ser compartilhados a partir do aplicativo, que registra em banco de dados
todas as informações upadas no sistema. Os mapas criados serão analisados pela
equipe responsável pela plataforma, a fim de compor a versão impressa do serviço.
Há também a possibilidade de imprimir o mapa criado com o uso do aplicativo.
É possível acompanhar a programação de eventos de comida que serão
realizados na Cidade Alta (Festival Pratodomundo), avaliar os pontos de
alimentação, upar e compartilhar fotos dos pratos, acompanhar o mapa de outros
usuários, procurar por roteiros temáticos (bares, comida regional, petiscos, cafés,
festivais...), entender um pouco sobre a história do bairro a partir do alimento. A ideia
aqui é que a cada ano, as informações que foram incluídas no aplicativo sirvam para
87
compor o mapa impresso do serviço, que será disponibilizado nos pontos de
alimentação da Cidade Alta.
Os mapas impressos farão parte do serviço, e além da função de facilitar a
localização dentro do bairro, incluirão informações a respeito da comida genuína ali
encontrada. Assim, o mapa não será só um mapa estático, e sim um guia contendo
as informações do Circuito de Comida Potiguar. Devemos lembrar das indicações
para a representação em mapas dadas por Lynch (2011, p.10), segundo o autor
[...] O mapa, seja ele exato ou não, deve ser bom o suficiente para nos conduzir ao nosso destino. Deve ser suficientemente claro e bem integrado para tornar-se econômico em termos de esforço mental: o mapa deve ser legível. Deve ser seguro e conter indicações suplementares que tornem possíveis as ações alternativas, sem grande risco de insucesso. [...] É preferível que a imagem seja aberta e adaptável à mudança, permitindo que o indivíduo continue a investigar e organizar a realidade; deve haver espaços em branco nos quais ele possa ampliar pessoalmente o desenho. Por último, a imagem deve ser, até certo ponto, comunicável a outros indivíduos [...].
Assim, levando em consideração o que foi dito por Lynch (2011) e com os
aprendizados feitos em campo, o mapa que será modelado para testes de
usabilidade futuros virá representado da seguinte forma:
Capa contendo a identidade visual desenvolvida para o serviço;
Mapa em escala reduzida, contendo pontos de alimentação, marcos
referenciais e principaisvias, criado a partir dos dados levantados em campo;
Mapa da Cidade Alta, possibilitando a interferência a partir da escrita,
desenho;
Páginas destacáveis. Também é possível incluir novas páginas
Transparências e adesivos que poderão ser colocados sobre o mapa,
identificando novos roteiros, pontos de alimentação, vias e marcos referenciais.
Ficarão guardados em um bolso na contracapa;
Cartões-postais temáticos colecionáveis. Poderão ser encontrados em bares,
restaurantes e prédios históricos da cidade, a pessoa pode enviá-los ou
agregá-los à estrutura do guia;
Página check-in: ao consumir em bares e restaurantes participantes do
serviço “Viva o Centro”, solicitar o carimbo “xaréu”. A cada 10 xaréus
conquistados, o usuário terá direito a uma refeição em qualquer
estabelecimento credenciado;
88
Assim, para compreender melhor o funcionamento do sistema do serviço,
aplicamos a ferramenta “mapa do sistema do serviço”.
4.4.2 Mapa do sistema do serviço “Viva o centro”
Com a modelagem verbal do serviço descrita, precisamos entender como o
sistema funciona, para isso, foi criado um mapa do sistema do serviço “Viva o Centro
– Circuito de Comida Potiguar” (figura 41).
Figura 41 – Mapa do sistema do serviço Viva o Centro.
Fonte: Autora, 2016.
89
4.4.3 Modelo representativo do serviço
Utilizando papel ofício, tesoura, cola, post-its e uma argola metálica, foi criado
um modelo físico representativo do mapa do serviço. O resultado obtido com a
modelagem está representado na imagem abaixo (figura 42).
Figura 42 – Modelo físico do serviço Viva o Centro.
Fonte: Autora, 2016.
90
4.5 ESCOLHENDO E APLICANDO O CONCEITO VISUAL
Visando desenvolver um conceito visual para o mapa impresso do serviço Viva
o Centro – Circuito de Comida Potiguar, foram geradas alguma alternativas (figura
43) com o auxílio das ferramentas brain dumping visual e kit de peças. A partir das
alternativas geradas foi possível criar um conceito visual para o serviço, que a
princípio, foi criado para ilustrar a ideia de identidade visual, que será melhor
trabalhada no futuro.
Figura 43 – Brain dumping visual e kit de peças para o serviço Viva o Centro.
Fonte: Autora, 2016.
91
Com a aplicação da ferramenta corposição, foi criada a paleta de cores do
conceito visual (figura 44), a partir de uma imagem capturada durante a investigação
fotográfica.
Figura 44 – Paleta de cores do conceito visual.
Fonte: Autora, 2016.
Abaixo, seguem algumas páginas do mapa, com aplicações do conceito visual
(figuras 45 e 46). O mapa do serviço encontra-se em melhor resolução no apêndice
3.
92
Figura 45 – Mapa do serviço Viva o Centro – Circuito de Comida Potiguar.
Fonte: Autora, 2016.
Figura 46 – Cartão-postal meladinha.
Fonte: Autora, 2016.
93
Figura 47 – Cartão-postal caldo.
Fonte: Autora, 2016.
94
5 CONCLUSÃO
Concluímos, ao confrontar os dados obtidos com a pesquisa na literatura com
os dados levantados em campo, que apesar da Cidade Alta configurar uma Zona de
Interesse Histórico e Cultural, a imagem que permanece no modelo mental das
pessoas é a de um Centro Comercial, um local para a oferta e procura de produtos e
serviços.
Diante das entrevistas percebemos que o centro comercial tomou o lugar do
centro histórico de natal, tirando a referência inicial daquele lugar. Depois dessa
observação o objetivo do trabalho seguiu um rumo diferente, que foi possibilitar o
resgate do Centro-Histórico como um marco cultural de Natal.
Com a realização da atividade “desenho do mapa do modelo mental”,
percebeu-se que todos os voluntários reconhecem a Cidade Alta como Centro
Comercial, apesar do bairro configurar uma Zona de Interesse Histórico e Cultural,
verificou-se que há um certo desinteresse por parte do poder público em viabilizar
transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e valorização ambiental
na área. Aqui foi encontrada a lacuna que poderia ser preenchida através de um
projeto de design.
Ao longo do desenvolvimento da parte prática da pesquisa, verificou-se que a
solução projetual a qual nos referíamos, deveria compor um serviço. A implantação
do projeto Viva o Centro – Circuito de Comida Potiguar, quando realizada, poderá
permitir que as pessoas reconheçam o bairro da Cidade Alta como um local
caracterizado, também, pela variedade e qualidade da sua comida, e não somente
como região comercial e de oferta de pequenos serviços. A possibilidade do serviço
ser importante para tal reconhecimento se acentua com o fato do mesmo ter sido
composto com a participação ativa das pessoas, as colocando como partes
interessadas do projeto de design.
Para o desenrolar prático, optou-se por utilizar ferramentas do design thinking.
Os resultados obtidos com a aplicação das mesmas permitiram utilizar com maior
profundidade e relevância no projeto, tudo o que foi visto e ouvido em campo,
transformando os desejos e necessidades das pessoas em propostas e soluções de
projeto. É importante ressaltar que todo o processo vivenciado com este projeto me
fez ver a Cidade Alta com outros olhos, é o berço da nossa cidade e não damos a
ela a atenção merecida.
95
Para encerrar, é importante frisar que o processo de design é contínuo, um
projeto não deve acabar com a entrega, novas soluções podem ser geradas,
aprendizados adquiridos, por isso, o serviço Viva o Centro – Circuito de Comida
Potiguar não acaba com a entrega deste trabalho, é um desejo que ele saia do papel
e cumpra o com o objetivo proposto, apresentar um circuito de comida dentro da
Cidade Alta, Centro Histórico-Cultural de Natal.
O Centro vive, e a sua comida é o seu combustível.
96
6 DESDOBRAMENTOS FUTUROS
Havíamos previsto apresentar o protótipo final do projeto a novos voluntários,
a fim de recolher observações necessárias para futuras intervenções e aplicações,
visando obter o feedback a partir dos usuários. Testes de usabilidade preliminares
poderão ser feitos com o sistema do aplicativo, quando este for desenvolvido.
As informações disponibilizadas nos mapas devem ser ampliadas, além de
estudar novas possibilidades de transformar a fala das pessoas em novas soluções
de design.
Com os modelos alterados após a análise dos testes de usabilidade e
aplicação das solicitações feitas pelas pessoas, os mapas deverão ser impressos e
entregues em postos de alimentação da Cidade Alta, o objetivo com esta ação é
compreender se o serviço em mapa impresso haverá boa aceitabilidade. Devemos
lembrar também de retornar os resultados aos voluntários que se disponibilizaram a
participar do projeto, e ouvir a opinião dos mesmos em relação ao que foi atingido.
Por fim, é preciso desenvolver um projeto de identidade visual para o serviço,
utilizando metodologias específicas e que cumpram com tal objetivo. A identidade
aqui desenvolvida serviu apenas para representar um conceito visual para o serviço,
e aplicá-los em algumas partes do mapa impresso.
Relembrando que esses não são os únicos desdobramentos possíveis, o
projeto teve com a realização desta pesquisa, seu pontapé inicial, novas
necessidades projetuais aparecerão, e com elas novas necessidades de se intervir
através do design.
97
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
______. NATAL, 2014. Prefeitura Municipal de Natal. Disponível em:
<http://www.natal.rn.gov.br/noticia/ntc-20404.html>. Acesso em: 20 Jul 2016.
______. SAMBA. Sociedade dos Amigos do Beco da Lama. Disponível em: <
http://obecodalama.blogspot.com.br/ >. Acesso em: 20 Jul 2016.
______. Stanford University Institute of Design, 2009-2012. Bootcamp bootleg.
Disponível em: <http://dschool.stanford.edu/use-our-methods/the-bootcamp- bootleg/>.
Acesso em: 15 Maio 2016.
ARAÚJO, Luciano Magnus de. Visões da cidade: Da cidade histórica aos bairros
da Cidade Alta e Ribeira. Disponível em: <http://www.natal.rn.gov.br/bvn/
publicacoes/LucianoMA.pdf>. Acesso em: 25 Maio 2016.
ARCHELA, Rosely Sampaio; THÉRY, Hervé, 2008. Orientação metodológica para
construção e leitura de mapas temáticos. Confins: Revista Franco-Brasileira de
Geografia, N. 3, 2008.
AUNE, Margrethe; BERKER, Thomas; SØRENSEN, Knut H, 2002-2006. Needs, roles
and participation. A review of social science studies of users in technological design, A
report within the research program Smart Energy-Efficient Buildings at NTNU and SINTEF,
p. 24-28.
BARANAUKAS, M. C. C; MARTINS, M.C.; VALENTE, J. A. Coodesign de redes
digitais: tecnologia e educação a serviço da inclusão social. Porto Alegre: Penso, 2013.
BONSIEPE, Gui. Design, cultura e sociedade. São Paulo: Blucher, 2011.
BOSISIO, Arthur (coord); LEITE, Daliana Cascudo Roberti; LODDY, Raul Giovanni da
Motta. Arte e rituais do fazer, do servir e do comer no Rio Grande do Norte: uma
homenagem a Câmara Cascudo. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2007.
BRASIL, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Noções Básicas de
Cartografia. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/
cartografia/manual_nocoes/representacao .html> Acesso em: 26 Maio 2016.
BRASIL, Ministério da Ciência e Tecnologia. Instituto Nacional de Tecnologia.
98
Modelos mentais: nota técnica. 2003.
BROWN, Tim. Design Thinking: Uma metodologia poderosa para decretar o fim
das velhas ideias. Tradução: Cristina Yamagami. – 3a reeimpreensão – Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010.
CASCUDO, Luis da Camara. História da alimentação no Brasil. Belo: Horizonte: Ed.
Itatiaia; São Paulo, 1983. Pp. 13-87.
DANYAS, VANYLLA R, 2015. Fuxico no Japa em Casa: Testando o método de
criação de sistemas de Identidades Visuais. Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Design, UFRN.
ESCOBAR, Bolívar, 2013. O que é um “modelo”? Disponível em:
<http://filosofiadodesign.com/o-que-e-um-modelo/ acesso em: />. Acesso em: 25 Maio 2016.
FRANCO, Patrícia dos Santos, 2006. Cartões-postais: fragmentos de lugares,
pessoas e percepções. Métis: História e Cultura, Revista de História da Universidade de
Caxias do Sul, V. 5, N. 9, 2006, pp. 25-62.
HOUAISS, A.; VILLAR, M. D. S. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2009.
IBAM, 2010. Produto 9 do Subprojeto 2: Atualização e Consolidação da Legislação /
Projeto Modernatal.
LIMA, Elias Lopes de. O Lugar do sujeito em a natureza do espaço, de Milton
Santos. Disponível em: <http://www.ufjf.br/revistageografia/files/2014/07/Artigo-7- Revista-
Geografia-Jul2014-2.pdf/>. Acesso em: 25 Maio 2016.
LUPTON, Ellen. Intuição, Ação, Criação: Graphic design thinking. São Paulo: Editora
G. Gili, 2013.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. – 3a ed. –
São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011.
MARCUS, Aaron, 2003. When Is A User Not A User? Who Are We? What Do We
Do?. In: Interectations, Setembro-Outubro 2003, p. 28-34.
MERRIAM-WEBSTER. Dictionary. Disponível em: < http://www.merriam-
webster.com/>. Acesso em: 20 Jul 2016.
99
MICHAELIS, DICIONÁRIO. São Paulo: Editora Melhoramentos, 2009. Disponível
online em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Acesso em: 26 Maio
2016.
MONTANARI, Massimo. Comida como cultura. Tradução de Letícia Martins de
Andrade. – São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2008.
NATAL, Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB 1). Natal,
meu bairro minha cidade: Cidade Alta. 261-271. Disponível em: <
http://www.natal.rn.gov.br/bvn/publicacoes/leste_cidadealta2009.pdf>. Acesso em: 25 Maio
2016.
NATAL, Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo (SEMURB 2). Anuário
Natal, 2014. Disponível em: < http://www.natal.rn.gov.br/semurb/paginas/ctd 102.html>.
Acesso em: 25 Maio 2016.
OLIVEIRA, LORENA G. T. de, 2013. Design na praça: Co-Design na transformação
de um espaço público em Natal-RN. Anteprojeto apresentado ao Curso de Design, UFRN.
RODRIGUES, Elisa Sampaio, 2014. Design, codesign e a convivência com o
diferente: Um projeto participativo com a UFRN. Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado ao Curso de Design, UFRN.
ROSA, M. V.; ARNOLDI, M. A entrevista na pesquisa qualitativa: mecanismos para
validação de resultados. – 1. Ed. 1. reimp – Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
ROSSELLI, Bruno S, 2012. Taxonomia de meios de representação em ambientes
multidimensionais e sua aplicação na metodologia projetual. Dissertação apresentada
ao Curso de Mestrado em Design, Centro Universitário Ritter dos Reis;
SERVICE DESIGN TOOLS. Tool System Map. Disponível em: <
http://servicedesigntools.org/tools/28>. Acesso em: 20 Jul 2016.
STICKDORN, Marc; SCHNEIDER, Jakob (orgs.). Isto é design thinking de serviços:
fundamentos – ferramentas - casos. Porto Alegre: Bookman, 2014.
TASCHIMEL, Katjia, 1998. O design ao serviço dos serviços. Revista da UFP, N. 2,
V. 1, pp. 153-159, 1998.
VIVANT, Elsa. O que é uma cidade criativa? Tradução: Camilha Fialho. – São Paulo:
Editora Senac São Paulo, 2012.
100
APÊNDICES
Apêndice 1 – Lista de perguntas abertas para a entrevista investigativa.
Primeira parte (entrevista para a empatia)
1. Como você faz pra se localizar em locais desconhecidos? Você costuma
utilizar mapas para percorrer trajetos na cidade/se localizar? Você considera os
mapas um bom recurso de localização, em geral?
2. Como você se locomove na cidade, no seu dia a dia?
3. Com qual frequência você vem à Cidade Alta (frequentemente, pouco
frequente, muito frequente)? O que te faz vir a Cidade Alta, quais locais você
frequenta, o que você procura no local?
4. O quão conhecedor da Cidade Alta e de seus trajetos gastronômicos você se
considera?
101
Apêndice 2 – imagem mental – desenho do mapa do modelo mental.
Como você visualiza a Cidade Alta e seus trajetos gastronômicos? Exercício
prévio em escritório, onde o usuário vai desenhar a ideia mental que tem da Cidade
Alta e da sua comida.
1. O que te vem à mente quando você ouve falar da Cidade Alta de Natal? E
mais especificamente, da comida do bairro?
2. Gostaria que fizesse um mapa esquemático da Cidade Alta, incluindo neste
desenho as vias, localidades que servem comida e pontos de referência. Não
existe um modo certo ou errado de apresentar a sua ideia, caso você não
conheça muito bem o bairro, você pode criar locais e moldar à sua
idealização do local.
Levando em consideração o mapa desenhado, trace o seu trajeto
gastronômico, tomando como base que você se desloca entre dois pontos. Em cada
local visitado trace comentários em relação a comida, ao local onde ela é servida,
pode falar nos mínimos detalhes.
102
Apêndice 3 – Mapa do Serviço Viva o Centro – Circuito de Comida Potiguar.
Fonte: autora, 2016.
103
104
Apêndice 4 – Exame sistemático.
Primeira parte (percorrer trajetos em campo)
Com o mapa mental criado, agora é a vez do usuário colocar em prática o seu
percurso imaginado in loco, com papel e lápis em mãos, o mesmo irá rascunhar o
caminho do seu próprio circuito de comida, a ser percorrido no bairro. [Não falar aos
entrevistados o que eles devem fazer primeiro, apenas orientar quanto a realização
da atividade.]
Desenhar um rápido mapa da área em questão, mostrando suas características
mais importantes e interessantes, e dando a um estranho o conhecimento suficiente
para locomover-se sem muita dificuldade. Sinalizar no trajeto percorrido as vias,
pontos de referência, restaurantes, trailers, bares, botecos, estabelecimentos que
vendam alimentos que agradem ao paladar do entrevistado e tudo mais que se
considerar importante. [Sempre lembrar o entrevistado de falar como ele se sente ao
longo do percurso, a impressão de cada local, e tomar nota das reações do
entrevistado durante a realização do circuito.]
Segunda parte (impressões)
A entrevista está terminada, mas seria bom se pudéssemos conversar
livremente por alguns minutos (perguntas abertas seguindo o modelo de lista usado
na etapa “entrevista para a empatia”):
a) Você sabia que a cidade alta possuía um polo gastronômico em potencial, com
uma diversidade de opções gastronômicas?
b) Em sua, opinião a Cidade Alta é um bairro fácil de se localizar, encontrar
caminhos ou identificar partes?
c) Quais elementos da gastronomia da Cidade Alta você considera mais marcantes.
Fale a respeito de cada um brevemente.
d) Você já frequentou/percorreu circuitos gastronômicos em outras cidades? Quais?
O que você viu que te chamou a atenção?
e) Você continuirá/passará a frequentar a gastronomia da Cidade Alta?
f) Você tem alguma sugestão a fazer e que venha a ajudar na elaboração deste
projeto?
105
Anexo 1 – Circuito Histórico, Turístico e Cultura - Bairro Cidade Alta
Fonte: SEMURB 2, 2014.
106
Anexo 2 – Zona Especial de Interesse Histórico - ZEIH
Fonte: SEMURB 1, 2009.
107
Anexo 3 – Transcrição das Entrevistas com o Voluntário 1
Entrevistas realizadas em abril de 2016.
Voluntário 1
Entrevista para a empatia
1. Quando eu vou para um local que eu não conheço eu normalmente pergunto
pro meu pai, ele me ensina como chegar, me diz pontos de referência, ou então eu
pesquiso no maps (google). Eu também costumo usar mapas, mas eu não sou muito
boa, por isso eu prefiro perguntar mesmo, não consigo me localizar no mapa e não
sei em qual direção estou indo, e por isso, no meu caso, não considero os mapas
um bom recurso para localização, prefiro utilizar mapas interativos que me
direcionem e digam o caminho a seguir.
2. Eu sempre ando de carro, pois possuo eu veículo próprio.
3. Vou muito raramente à cidade alta, a última vez foi há dois meses.
Antigamente eu costuma ir bastante lá (na cidade alta), e agora raramente vou ao
bairro, e sempre que vou é com o objetivo de fazer compras ou fui uma vez na
costureira, e sempre frequento os mesmos locais, por exemplo, C&A, Riachuelo,
aquelas lojas, a vitrine da arte, e minha mãe já trabalhou na Caixa.
Eu moro em Capim Macio (bairro da zona sul) e costumo frequentar mais o
bairro de Ponta Negra (zona sul), porque fica mais perto da minha casa e as coisas
que eu faço ficam concentradas naquela região.
4. Eu me considero nada conhecedora dos pontos de alimentação do bairro, não
sei se existem locais que vendam comida próximos às lojas que costumo ir. Eu
lembro de ter almoçado uma vez em um self-service, mas não sei onde era.
Exame sistemático (impressões)
a) Não sabia a respeito, mas achei interessante, porque eu não conhecia. Tinha
alguns lugares que eu conhecia de nome (Zé reeira e Beco da Lama) mas eu nem
sabia que era aqui (Cidade Alta).
b) Têm muitos pontos de referência, mas como têm muito “bequinho”, ruazinha,
eu acho que eu precisaria de ajuda, perguntando para as pessoas. Não considero
108
que o bairro tenha partes de fácil identificação, eu não consigo me localizar muito
bem.
c) Achei interessante o fato de ter no bairro um restaurante vegano, eu não
esperava na verdade, e achei muito interessante aquele bequinho (ao se referir ao
beco da lama), onde têm aquele evento (Festival Gastronômico do Beco da Lama).
d) Quando estive no Rio, eu pude participar do evento “Comida de Boteco”, é
uma competição, onde cada boteco prepara o seu petisco mais famoso e no final
divulgam os vencedores do ano.
e) Eu gostei da experiência, mas o meu problema em frequentar o bairro é
devido ao fato de eu não morar perto daqui. Mas eu verei com outros olhos o evento
(Festival Gastronômico do Beco da Lama), talvez eu venha conferir.
f) O mais importante pra mim é dar uma visibilidade do bairro, eu acho que as
pessoas não sabem, eu por exemplo, não conhecia, eu sabia que tinham os self-
service. E para me localizar, eu tenho problema com mapas, então precisaria de
algo direto, que me ajudasse a me situar, seu eu precisar quebrar minha cabeça pra
saber como chega até determinado local. Seria bom se eu tivesse alguém que
dissesse pra mim o caminho mais fácil pra eu chegar direto no local.
109
Anexo 4 – Transcrição das Entrevistas com o Voluntário 2
Entrevista para a empatia
1. Para me localizar em locais desconhecidos, eu tento sempre ver pela internet
no mapa onde fica determinado lugar, antes de sair de casa, pra não precisar sair
com o meu celular, às vezes eu desenho ou imprimo o mapinha, e vou colocando os
pontos de referência, que eu devo procurar, por exemplo, se tiver alguma farmácia,
perto de algum lugar que eu quero ir, ou alguma escola. É sim, costumo utilizar
mapas para percorrer trajetos que eu nunca fui. Se considero os mapas um bom
recurso de localização? Sim e não, mas isso vai da sinalização da própria rua, que
às vezes eu não sei se eu devo virar à esquerda ou à direita, e talvez eu soubesse
se em cada plaquinha tivesse os números certos.
2. Eu sempre ando de ônibus no meu dia-a-dia.
3. Agora, eu acho que pouco frequente, porque meu trabalho é longe daqui, e eu
só venho aqui quando preciso resolver alguma coisa, quando vou ao médico, às
vezes preciso ir ao banco ou comprar alguma coisa que só tem aqui ou no Alecrim,
mas eu prefiro a Cidade Alta porque é mais tranquilo, ou quando venho encontrar
alguém, às vezes minha mãe.
4. Eu não como muito aqui, eu sei onde eu posso comprar comida, acho que
tem o Beco da Lama aqui, eu não faço a mínima ideia do que é, mas eu já ouvi falar,
mas os pontos mais visíveis eu sei onde ficam.
Exame sistemático (impressões)
a) Eu sabia sim, só não consigo identificar quais.
b) Eu não acho que seja fácil de localizar as partes do bairro por ruas, mas por
pontos específicos, porque não conheço muitas ruas, só duas.
c) O primeiro lugar onde provei um Mate foi aqui, então é marcante pra mim,
agora tem em outros locais da cidade, eu acho que o percurso foi aqui mesmo. O
caldo de cana também é marcante, eu lembro de às vezes minha mãe me trazer
aqui só pra tomar um caldo de cana. Também tem a geléia de coco que eu só
encontro aqui, as castanhas, que aqui eu encontro a um preço mais baixo,
geralmente tem àqueles senhores que torram ela na hora, que eu também só
encontro por aqui, e muita raramente no Alecrim. E geralmente salgados, mas eu
110
não gosto muito de salgado. São essas coisas que eu costumo lembrar de comida
aqui da Cidade Alta.
d) Eu fui em um festival de poutine (prato típico canadense) em Ottawa, e foi
bem decepcionante, estava muito frio, tinha umas barraquinhas vendendo poutine,
não tinha muita variedade, era só um lugar que vendia poutine.
e) Sim, mas eu não costumo provar nada novo aqui, primeiro porque eu não sei
onde encontrar, e segundo porque eu não sinto a necessidade de procurar um lugar
pra almoçar, por exemplo, eu vou onde eu já conheço, sei onde fica.
f) Seria interessante identificar os pontos de comida, porque eu sei daqui,
desses lugares, porque eu venho aqui desde criança, é o único conhecimento que
eu tinha. Por exemplo, o local onde comemos (Zé Reeira), é novo pra mim, eu sabia
que existia, mas nunca tinha ido, mas aquela área, do outro lado da Deodoro, não
faço ideia do que tenha por ali, então eu acho que seria interessante identificar
esses pontos, este seria o primeiro passo a ser dado.
111
Anexo 5 – Transcrição das Entrevistas com o Voluntário 3
Entrevista para a empatia
1. Há quanto tempo você abriu seu restaurante na Cidade Alta? E quais
suas impressões do Local? (Pergunta que não estava prevista no roteiro)
Abri o restaurante há um ano. Eu sou apaixonado pela Cidade, desde sempre,
eu sou formado em Produção Cultural e em Gastronomia. Como eu estudava aqui
no IFRN, eu fiquei mais próximo do bairro, eu comecei a conhecer melhor o local, as
pessoas daqui, e percebi que aqui é tipo um interior, praticamente todos os meus
amigos moram aqui, eu não moro aqui, por questões de ocasião, mas eu quero que
a minha casa fixa seja aqui, eu quero comprar um imóvel aqui.
Meus amigos são daqui, eu passo o dia aqui, a noite aqui, então pensei que
não tinha outro local pra ser o meu restaurante, foi quando fui fazer um curso no
Senac e conheci uma pessoa que estava vendendo uma lanchonete aqui, e acabei
comprando e comecei a servir almoço, em dois meses tinha fila na frente, porque eu
tenho o diferencial de empratar a comida, colocar tempero, minha comida tem pouco
sal, e não tinha isso aqui.
O problema da cidade alta é que ela é muito esquisita a noite, o movimento fica
concentrado mais perto da praça vermelha, por ali. Uma coisa que eu notei é que o
bairro é dividido em regiões que servem comida mais acessível, comida com um
valor médio, e locais com um padrão mais caro, e isso é definido a partir dos pontos
comerciais encontrados em cada parte, o que define muito bem o preço do que é
vendido na região
2. Eu costumo usar mapas, eu compro os mapas, geralmente quando vou pra
um outro país, e vou me guiando, e sim, com certeza, considero estes bons recursos
de localização.
3. Aqui na Cidade Alta eu sempre me locomovo a pé, hoje em dia eu conheço
bastante a cidade, mas antigamente eu era bem perdido, porque eu andava muito a
noite, e à noite é um outro bairro, aí eu me perdia, porque tem muito beco, e às
vezes vocês está andando e acaba se perdendo, encontrando uma coisa legal, mas
eu me localizo bem, comecei me perdendo, procurando as coisas.
4. Me considero bastante conhecedor da cidade alta, mas não conheço muito a
respeito dos pontos de alimentação matinais, pois como eu trabalho na hora do
almoço, acabo não saindo, fico preso, eu não consigo ir pra outros locais nesse
112
horário. Mas à noite eu saio bastante por aqui, eu conheço todos os locais que
funcionam no período noturno.
Exame sistemático (impressões)
a) Eu sei que uma diversidade gastronômica na cidade alta, eu acho que tem um
potencial muito grande, mas eu não consigo chamar de polo gastronômico, existe o
potencial para tal, mas o que acaba atrapalhando é que a área é muito comercial, a
alimentação local é formada em sua maioria por restaurante com comida “em quilo”,
e alguns restaurantes que tem inovado e tentado diversificar.
b) Eu acho que não, pra mim a Cidade Alta é um local fácil de chegar, mas
conhecer o centro é muito difícil, é muito entrelaçado, é cheio de esconderijo, de
coisas escondidas, que muitos natalenses não conhecem, conhecem mais a parte
comercial, e acabam esquecendo a outra parte, a parte da vida, da alimentação, do
bairro “Cidade Alta”.
c) A gastronomia de Cidade Alta é marcada por locais para se alimentar
rapidamente e ir embora, pois o bairro é um polo comercial, onde existem pessoas
que trabalham por lá e querem comer rápido no se pouco tempo de intervalo. E tem
também a parte da gastronomia boemia, os bares e restaurante que tem uma
pegada mais de festa, de noite, como é o caso do Bardalos, do Faster Pizza, do
Amarelinho, que são locais característicos da noite da Cidade Alta. E tem também
aqueles bares e restaurantes mais povão, que ao mesmo tempo oferecem música,
como o caso do Laricão, do Nildo, Nilson, entre outros.
d) Sim, já percorri, o que mais me chamou atenção foi Paris, o circuito
gastronômico de lá é maravilhoso, e o que mais me atingiu lá foi ver as pessoas
comendo na rua, sentadas nas calçadas, vendo os outros passando, gostaria que
acontecesse isso na minha cidade, mas acho que é inviável devido ao calor. Na
Alemanha peguei um circuito gastronômico muito legal, foi em Berlim, que tem uma
pegada mais undeground, onde as pessoas saem na madrugada para se alimentar,
eu sou apaixonado por isso, o que me fez lembrar muito São Paulo, e eu adoro
muito o fato de lá possuir opções pra se alimentar abertas 24 hrs, e eu acho muito
legal, isso chama muito a minha atenção. Eu sempre acabo relacionando isso ao
clima, lá talvez por ser mais frio acaba sendo mais agradável estar na rua. O que eu
mais gosto nessas cidades é estar na rua, comer na rua, ver a rua e o fato de existir
restaurantes ao ar livre.
113
e) Pelo resto da minha vida, amo a cidade alta, sou um fiel escudeiro do bairro,
espero que esse Polo Gastronômico se desenvolva, estou lá tentando mudar essa
ideia, fazendo com que cresça, dando minha contribuição, tentando modificar meu
bistrô em um formato como vi em locais que eu vi, que mesmo em locais escondidos
você pode encontrar locais confortáveis com uma comida maravilhosa. Passarei o
resto da minha vida lá.
f) Eu acho que você deveria frequentar a Cidade Alta a noite, passar uns dias,
dar uma volta, pra entender como funciona o bairro, porque ele tem um público bem
interessante.
114
Anexo 6 – Transcrição das Entrevistas com o Voluntário 4
Entrevista para a empatia
1. Geralmente eu entro em uma loja e pergunto pra alguém que trabalha lá,
então ela deve conhecer, pra mim é melhor do que perguntar pra pedestre. Depende
do lugar, quando vou buscar alguma amiga em algum lugar residencial que não
tenha um ponto de referência eu coloco no mapa, mas se for em um lugar na cidade,
eu me localizo por um prédio comercial. Eu considero sim os mapas um bom recurso
de localizar, eu consigo me localizar com facilidade utilizando-os.
2. Eu me movo em Natal de carro, mas quando venho à Cidade Alta, eu
estaciono o carro em algum local e faço os trajetos a pé.
3. Hoje em dia eu venho à Cidade Alta uma vez por mês. Eu sempre venho aqui
para comprar tecidos e coisas de armarinho, e só.
4. Eu conheço onde posso ir pra comprar tecido, a rua dos armarinhos, e onde
fica o Mate, eu não conheço tudo do bairro, mas me considero uma conhecedora
mediana, eu sei me virar no bairro.
Exame sistemático (impressões)
a) Não, imaginava que fosse mais almoço de dia dia (self service) devido a
quantidade de empresas e comércios;
b) Considero o bairro mais fácil de toda cidade.
c) Conheço pouco, mas gosto muito de comer tapioca e comprar amendoim e
milho cozido na rua. Gosto da diversidade de comida típica, barata e rápida.
d) Sim, em especial enquanto estudava na Europa. Fui em mercadinhos e
feirinhas diferentes. Na maioria das vezes esse circuito gastronômico estava
concentrado em um só espaço, então experimentava um pouco de tudo.
e) Sim, e agora quero conhecer mais.
f) Eu acho interessante mostrar ao turista ou consumidor local um pouco da
história do alimento. Por exemplo, a ginga com tapioca, porque afinal comida é
cultura. Eu pelo menos adoro saber essas coisas, é um incentivo às pessoas
experimentarem. Quem sabe até indicar se o produto só existe aqui, se é a cidade
que mais consome alimento X... Eu adoro essas curiosidades haha não sei se
encaixa no seu projeto de mapa!
115
E se o mapa indicasse onde poderiamos comer cada prato típico na região (ex:
"tapioca": restaurante A, B, C, bar X, etc...)
Eu sei muito pouco dessa questão de alimentos pela cidade, mas sempre que
recebo visita e alguém fala de um produto que só existe aqui ou que comeu o melhor
aqui, eu me pergunto o porquê de eu não saber disso ou não dar valor.
116
Anexo 7 – Transcrição das Entrevistas com o Voluntário 5
Entrevista adaptada a partir das listas “entrevista para empatia” e impressões
(exame sistemático)
1. Como você faz pra se localizar em locais desconhecidos? Você costuma
utilizar mapas para percorrer trajetos na cidade/se localizar? Você considera
os mapas um bom recurso de localização, em geral?
Procuro ter como referência um prédio alto quando estou na zona urbana e ou
uma árvore quando em zona rural. Sim, costumo utilizar mapas e concordo que
sejam bons recursos de localização.
2. Como você se locomove na cidade, no seu dia a dia?
Sempre a pé, o bom da cidade alta é você circular entre as pessoas.
3. Com qual frequência você vem a Cidade Alta (frequentemente, pouco
frequente, muito frequente)? O que te faz vir a Cidade Alta, quais locais você
frequenta, o que você procura no local?
Atualmente no mínimo uma vez por semana, principalmente no beco da lama.
Eu venho ao bairro para encontrar pessoas para uma boa conversa, manter contato
com a produção artística e a política da cidade, tomar uma boa cerveja saboreando
pratos da culinária local e ou um cafezinho bem quente no Café São Luiz. Os locais
que mais frequento são a Casa do Cordel, Sebo de Ramos, Espaço Cultural Rui
Pereira, Restaurante Bardallo´s, Bar do Naldo, o Bar de Nazaré e o Café São Luiz.
Além de alguns ateliers de artistas existentes no entorno.
4. O quão conhecedor da Cidade Alta e da sua gastronomia você se
considera?
Muito conhecedor.
5. Você sabia que a cidade alta possuía um polo gastronômico em
potencial, com uma diversidade de opções gastronômicas?
Sim, defendo esta tese já algum tempo.
117
6. Em sua opinião, a Cidade Alta é um bairro fácil de se localizar, encontrar
caminhos ou identificar partes?
Sim, apesar das ruas estreitas e muitos obstáculos de acessibilidade se torna um
bairro de fácil de deslocamento. Poderia ser melhor se tivesse no mínimo as
calçadas com um projeto de acessibilidade. Em relação à identificação dos lugares
existe sim uma imensa laguna neste aspecto.
7. Quais elementos da gastronomia da Cidade Alta você considera mais
marcantes. Fale a respeito de cada um brevemente.
No geral são as especificidades dos temperos de cada prato e bebidas servido/a nos
bares e restaurantes. Podemos mencionar o picado no bar de nazaré, o carneiro no
bar de zeiera, a meladinha no bar de nazi e os caldos do bardalos.
8. Você já frequentou/percorreu circuitos gastronômicos em outras
cidades? Quais? O que você viu que te chamou a atenção?
O de Santa Felicidade em Curitiba foi o mais marcante. O que mais chamou a
tenção foi a iniciativa do poder público em parceria com a iniciativa privada em
transformar o roteiro de restaurantes em um circuito gastronômico com infraestrutura
de limpeza, segurança, transporte público, acessibilidade.
9. Você tem alguma sugestão a fazer e que venha a ajudar na elaboração
deste projeto?
Estruturar um circuito gastronômico, artístico cultural, integrando os bares,
restaurantes, sebos, ateliers artísticos, museus e espaços culturais da cidade alta,
com foco na região denominada de beco da lama, identificando os lugares, criando
um roteiro com guiamento. Em seguida, ao mostrar a potencialidade desta região,
articular atores socais para viabilizar aspectos de infraestrutura, limpeza, segurança
e divulgação.