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Vulnerabilidade Socioambiental aos Deslizamentos e Inundações em São José Dos
Campos – SP
Frederico Fernandes de Ávila¹
¹ Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE
Caixa Postal 515 - 12227-010 - São José dos Campos - SP, Brasil
1. Introdução
Nos grandes centros urbanos os deslizamentos de terra e inundações têm tomado
proporções catastróficas, uma vez que os cortes de talude, aterros, depósitos de lixo,
modificações na drenagem, desmatamentos entre tantas outras intervenções antrópicas, que
muitas vezes ocorrem sem planejamento e infraestrutura adequada, têm gerado novas relações
com os condicionantes naturais como a geomorfologia, geologia, pedologia e hidrologia
(FERNANDES et al., 2001).
A previsão de ocorrência e localização dos fenômenos de deslizamento e inundação, bem
como a identificação de possíveis reações da sociedade em condições de pré e pós desastre,
torna-se muito difícil, sendo de fundamental importância a ampliação de estudos que
considere as características ambientais intrínsecas associadas às características
socioeconômicas. Neste contexto, o conceito de vulnerabilidade se apresenta como importante
objeto de estudo, pois traz uma abordagem das características naturais do ambiente e das
relações humanas entre si e com o território, em que questões como renda, educação,
habitação, estrutura familiar, entre outras, ganha espaço para análise juntamente com as
características físico-naturais do lugar. Esse estudo integrado permite estabelecer e quantificar
a capacidade de determinadas sociedades de absorver, de se auto-organizar e de se adaptar às
condições de desastres.
O município de São José dos Campos – SP, devida as características geológicas e
geomorfológicas, se apresenta naturalmente suscetível à ocorrência de deslizamentos de terra
e inundações. Alguns estudos apontam a existência de áreas de risco a escorregamentos no
município, como os mapeamentos elaborados em 2005 (IPT/CEDEC, 2005) e 2014 (Valério
Filho et al, 2014) que demonstram que está ocorrendo um aumento significativo do número
de moradias em risco a escorregamentos na região norte.
O objetivo deste trabalho é apresentar uma análise preliminar da vulnerabilidade
socioambiental do município de São José dos Campos – SP, a partir dos dados censitários de
2010 do IBGE e da carta da suscetibilidade natural a movimentos gravitacionais de massa e
inundações em escala 1:25.000 (IPT/CPRM, 2014). Para isso, inicialmente abre-se uma
discussão do conceito de vulnerabilidade considerando diferentes abordagens de diversos
autores sobre o conceito; posteriormente são apresentadas as características naturais e
socioeconômicas do município de São José dos Campos; seguido pelos procedimentos
metodológicos implementados para o estudo; e por último são apresentados os resultados,
realizando uma discussão das diferentes características (ambientais e antrópicas) do espaço
intra-urbano e demonstrando a espacialização do Índice de Vulnerabilidade Socioambiental
de São José dos Campos (IVSA – SJC).
2. Conceito de Vulnerabilidade
O conceito de vulnerabilidade tem sido uma poderosa ferramenta analítica para descrever
estado de suscetibilidade aos prejuízos, impotência e marginalidade de sistemas físicos e
sociais, além de servir de guia de análise normativa de ações para o aumento do bem estar
através da redução do risco (ADGER, 2006). Vulnerabilidade pode ter diferentes conotações,
a depender do tipo e perspectiva da pesquisa, existindo, conforme Cutter et al. (2003), três
correntes principais: (i) identificação de condições que colocam pessoas e lugares vulneráveis
aos eventos naturais extremos (modelo de exposição); (ii) vulnerabilidade é uma condição
social, em que se mede a resistência e/ou resiliência da sociedade ao perigo; (iii) e a
integração da exposição potencial e resiliência social com o foco específico na análise local
ou regional.
Por muito tempo as pesquisas consideravam principalmente as componentes da
vulnerabilidade biofísica e do ambiente construído, ignorando os aspectos de cunho social.
Isso ocorreu devido, principalmente, a dificuldade em quantificar as questões sociais, as quais
ficavam muitas vezes restritas aos registros de estimativa pós-desastre (Cutter et al., 2003).
Contudo, os estudos dos índices de vulnerabilidade social tem ganhado aceitação por
explicitar a desigualdade social e local, e contribuir para o entendimento de como grupos
sociais distintos são impactados diferentemente pelos desastres (Hummell et al. 2016).
A interação de forças sociais e ambientais determina o nível de exposição e sensibilidade
do lugar, onde as forças sociais, políticas, culturais e econômicas formam a capacidade de
adaptação (Smit e Wandel, 2006). A ação humana e as estruturas sociais estão integradas a
natureza e qualquer tentativa de separação seria arbitrária. Neste contexto é importante
destacar os conceitos de resiliência, que é a capacidade de absorção de perturbações deste
sistema, bem como a capacidade de se auto organizar e a capacidade de adaptar às
circunstancias emergenciais (Adger, 2006).
Neste sentido, a interação entre a vulnerabilidade social e a biofísica (aspectos naturais do
lugar) pode receber algumas denominações. Cutter et al (2003) classificam como
vulnerabilidade geral do lugar, enquanto que Freitas et al. (2012) de vulnerabilidade
socioambiental e outros pesquisadores também a se refere como vulnerabilidade
socioecológica (Anazwa et al., 2013; Anazwa, 2012; Adger, 2006; Pandey e Bardsley, 2015).
Freitas et al. (2012) consideram a vulnerabilidade como resultante de processos sociais e
mudanças ambientais, em que estruturas socioeconômicas produzem simultaneamente
condições de vida precárias e ambientes deteriorados, a qual ele denomina de vulnerabilidade
socioambiental. Processos sociais relacionados ao trabalho, renda, saúde, educação,
infraestrutura, habitação e saneamento, associados às características físicas e ambientais do
lugar, são determinantes para definir o nível de vulnerabilidade a alguma ameaça (eventos
naturais extremos, por exemplo).
Anazwa et al. (2013) construiu um conjunto de representações que possibilitou a
operacionalização do conceito de vulnerabilidade socioecológica, explicitando o território
através da associação de feições naturais e ambientes construídos pelo homem. O território,
suas dinâmicas e relações sociais foram reconsiderados, permitindo assim uma releitura do
conceito de vulnerabilidade em que observa as cidades em um contexto de sistemas
socioecológicos.
O conceito de vulnerabilidade socioambiental abordado por Freitas et al. (2012) trata da
questão biofísica/ambiental em cunho mais das mudanças ambientais resultantes da
degradação, enquanto que a abordagem socioecológica enfatiza mais a questão das
características naturais do ambiente, em termos de suscetibilidade natural e capacidade de
resiliência e adaptação. No entanto, o conceito socioecológico é bastante abordado em outras
áreas do conhecimento, como biologia marinha, que estuda a vulnerabilidade socioecológica
das populações marinhas associadas aos ambientes de corais. Com isso, por não existir um
consenso ainda bem definido nas terminologias associadas à vulnerabilidade, entende-se para
este trabalho que o termo ambiental seja o mais interessante para abordar as questões
biofísicas no contexto dos estudos populacionais humanos. Assim a interação entre a
vulnerabilidade social e a biofísica é tratada aqui como vulnerabilidade socioambiental.
Apesar das diferenças e diversidades conceituais de vulnerabilidade, não há uma
definição mais representativa que outra no campo cientifico, podendo assim colocar o termo
vulnerabilidade como um conceito mediador, utilizado para facilitar e mediar o diálogo entre
profissionais de diferentes áreas (Anazwa et al., 2013). Neste sentido, Marandola e Hogan
(2006) apontam para a necessidade de buscar um olhar multidimensional e de esforços
interdisciplinares para a abordagem da vulnerabilidade. Para isso eles afirmam a importância
de reconhecer que a vulnerabilidade envolve uma gama de fenômenos de natureza
multidimensional e multifacetada, que torna imperativo o diálogo e um olhar mais abrangente
diante do tema.
3. Área de Estudo
O município de São José dos Campos está localizado na região do Vale do Paraíba,
Estado de São Paulo. Segundo o Censo Demográfico do ano de 2010 realizado pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, São José dos Campos possuía uma população
total de 629.921 habitantes, sendo que destes 97,7% correspondem à população vivendo em
área urbana e somente 2,3% a população vivendo na área rural do município. O município
correspondia por uma densidade demográfica de aproximadamente 572 habitantes/km².
De acordo com o Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, São José dos Campos
obtém um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 0,807, considerado
como muito alto e ocupando a 24ª posição do ranking brasileiro de IDHM.
Alvares et al (2013) afirma que no município de São José dos Campos predomina um
clima oceânico sem estação seca com verão quente na porção sul associado a superfícies
topograficamente rebaixadas, enquanto na porção norte predomina o mesmo com verão
temperado em decorrência de altitudes mais elevadas (Figura 1A e 1B).
As características físicas do município de São José dos Campos expõem um quadro de
fatores que indicam o potencial natural para a ocorrência de deslizamentos e inundações. O
município é constituído por dois conjuntos geológicos/geomorfológicos distintos: terrenos
cristalinos formados por rochas ígneas e metamórficas, com destaque na região norte,
associado a relevo do tipo morrotes, morros e serras (Serra da Mantiqueira, ao norte); e
cobertura sedimentar predominante na região central e sul associada a planície do rio Paraíba
do Sul, além de colinas e tabuleiros (Figura 1C). Essa clara correlação entre as características
geológicas e geomorfológicas, que condiciona a existência de áreas com alta suscetibilidade à
ocorrência de escorregamentos na região com formação geológica magmática e metamórfica;
também havendo áreas de risco em encostas íngremes relacionadas com a formação geológica
sedimentar, mas em menor quantidade (Mendes et al. 2016). Em regiões de planície de
inundação do rio Paraíba do Sul e afluentes, onde predominam rochas sedimentares, também
condiciona a existência de áreas com alta suscetibilidade à ocorrência de inundações.
O Instituto de Pesquisa Tecnológica do Estado de São Paulo (IPT), em parceria com o
Serviço Geológico do Brasil (CPRM), elaborou a carta de suscetibilidade natural a
movimentos gravitacionais de massa e inundações de São José dos Campos em escala
1:25.000 (IPT/CPRM, 2014). A suscetibilidade aos escorregamentos e inundações foi
classificada como baixa, média e alta e a sua distribuição espacial pode ser observada na
Figura 1D.
4. Procedimentos Metodológicos
Para a elaboração do Índice de Vulnerabilidade Socioambiental do município de São José
dos Campos (IVSA – SJC), foram trabalhados com dados censitários, bases cartográficas de
diferentes fontes, imageamento de satélite, mapeamento das características físico naturais do
município e utilizado alguns programas de geoestatística, SIG e banco de dados. Todos os
materiais, métodos e procedimentos utilizados são apresentados a seguir, juntamente com os
critérios e as variáveis adotadas para a definição dos grupos de indicadores que determinaram
o IVSA – SJC.
Figura 1: Mapas de precipitação anual média (A), altimetria (B), geológico-estrutural (C) e
de suscetibilidade ao Movimento de Massa e Inundação (D) do município de São José dos
Campos (Adaptado de: IPT/CPRM, 2014).
4.1 Bases Cartográficas e Dados Censitários
A B
C D
Os indicadores socioeconômicos foram adquiridos a partir dos dados censitários de 2010
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE e as variáveis foram trabalhadas para
cada um dos 1073 setores censitários de São José dos Campos, que foram espacializados a
partir da malha censitária de 2010. A caracterização dos aspectos físico naturais do município
foi obtida a partir da carta da suscetibilidade natural a movimentos gravitacionais de massa e
inundações em escala 1:25.000 (IPT/CPRM, 2014).
Outras informações como as regiões geográficas do município, malha ferroviária e
rodoviária, hidrografia e loteamentos, foram adquiridos juntamente com a prefeitura
municipal, cujos levantamentos são do ano de 2010. No que se refere à informação espacial
de áreas construídas, foi adquirida a partir do zoneamento ecológico econômico do estado de
São Paulo em escala de 1:10.000 para do ano de 2010 (SMA/CPLA, 2012).
4.2 Variáveis e Indicadores
O IVSA – SJC foi definido a partir de 13 indicadores classificados em 6 grupos
temáticos. Os indicadores e os respectivos grupos são apresentados na Tabela 1, juntamente
com as variáveis utilizadas e os cálculos aplicados. Em seguida é apresentada uma descrição
mais detalhada dos critérios utilizados para a definição de cada grupo temático.
Tabela 1: Indicadores e variáveis para definição da IVSA-SJC.
GRUPOS
TEMÁTICOS INDICADORES VARIÁVEIS CÁLCULOS
Financeiro
Renda Domiciliar Renda dos domicílios¹ Estratificação do Indicador em faixas de rendimento
Concentração de baixa
renda Renda dos domicílios¹ Proporção de domicilio com renda até 3 salários
Educacional Alfabetização > 5 anos Alfabetização, total¹ Proporção da população alfabetizada com mais de 5
anos
Infraestrutura
Habitacional
Abastecimento de Água Domicílio, características
gerais¹ Proporção de domicílios com acesso a rede de
abastecimento de água
Rede Coletora de Esgoto Domicílio, características
gerais¹
Proporção de domicílios com acesso a rede coletora
de esgoto
Serviço de Coleta de Lixo Domicílio, características
gerais¹ Proporção de domicílios atendidos pela coleta
publica de lixo
Pavimentação Domicílio, características
gerais¹ Proporção de domicílios em ruas pavimentadas
Bueiros Domicílio, características
gerais¹ Proporção de domicílios com bueiros próximos
Dependência Social Razão de Dependência Idade, total¹ Razão entre: População de 0 a 14 anos + População
de 60 anos ou mais pela População de 15 a 59 anos
Estrutura Familiar
Mulher Chefe de Família Responsável pelo domicílio,
mulheres¹
Proporção de domicílios chefiados por mulheres em
relação ao total de domicílios
Pessoas por habitação Domicílio, moradores¹ Média entre o número total de habitantes pelo
número de domicílios
Ambiental
Suscetibilidade
Movimento de Massa
Carta da suscetibilidade
natural - IPT/CPRM
Classificação numérica para as classes Alta, Média e
Baixa
Suscetibilidade Inundação Carta da suscetibilidade
natural - IPT/CPRM Classificação numérica para as classes Alta, Média e
Baixa
¹ Variáveis extraídas dos dados censitários do IBGE 2010.
- Financeiro: O grupo financeiro foi estabelecido considerando a renda domiciliar e a
concentração de baixa renda. A renda domiciliar foi estratificada em 5 categorias: sem
rendimento; até 2 salários mínimos; entre 2 e 5 salários mínimos; entre 5 e 10 salários; e
maior que 10 salários. Foi adotada uma escala evolutiva para os rendimentos e posteriormente
realizada uma ponderação matemática. O rendimento domiciliar indica a capacidade de
cobertura do orçamento doméstico, de aquisição de bens e consumo e quando avaliado
espacialmente, indica a distribuição de renda domiciliar pelo município. O indicador
concentração de baixa renda foi calculado para os domicílios com até 3 salários mínimos,
sendo importante para agregar peso ao grupo financeiro e também indicar espacialmente onde
se concentra as famílias de baixa renda. Domicílios com maior renda tendem a ser munidos
por melhores infraestruturas e assim obtendo melhores condições de suportar eventos naturais
extremos.
- Educacional: São José dos Campos, por se tratar de uma cidade com bom índice de
desenvolvimento municipal (IDHM) e forte na produção científica e no desenvolvimento
tecnológico, os índices de educação são geralmente altos. Na grande maioria dos setores
censitários, a taxa da população acima de 5 anos alfabetizada fica acima de 90%. Porém, para
a construção de índices de vulnerabilidade, é importante que considere o tema educação.
Indivíduos que frequentam a escola desde criança, aumenta a chance na formação de cidadãos
mais capazes de atuarem social, econômica e politicamente (Anazawa et al., 2013). Assim, a
proporção de pessoas alfabetizadas com mais de 5 anos tornou-se um indicador interessante
para abordar o tema educação.
- Infraestrutura Habitacional: O grupo foi definido considerando indicadores
relacionados às qualidades físicas das habitações e do bairro, além do acesso a serviços
públicos de limpeza e saneamento. Abastecimento de água tratada e rede coletora de esgoto
são fundamentais para a manutenção das condições de saúde e higiene da população e
favorece a regularização das estruturas hidráulicas das habitações, minimizando a existência
de vazamentos que possam contribuir para a saturação do solo e maximizar o risco de
desencadeamento de movimentos gravitacionais de massa. Os serviços de coleta de lixo
também contribuem efetivamente para as melhores condições de saúde e higiene, e ainda
reduz a possibilidade da formação de aterros construídos próximos às habitações. Depósito de
aterros formam camadas bastante instáveis nas encostas, constituindo locais preferencias para
a ocorrência dos deslizamentos. O lixo quando não recolhido adequadamente, tende também a
ser carreado por águas pluviais, entupir bueiros e ser lançado nos cursos d’águas próximos às
habitações. Isso contribui para o assoreamento dos leitos fluviais, contaminação das águas e
ainda aumenta a possibilidade de ocorrer alagamentos, enchentes e inundações. A presença de
vias pavimentadas e bueiros próximos às habitações são indicadores de maior regularização e
disciplinamento das águas pluviais nas encostas, em que a ausência pode contribuir
efetivamente para os deslizamentos de encosta e alagamentos, sendo fatores que contribuem
para a maior vulnerabilidade no local.
- Dependência Social foi definida partir da razão entre a população de crianças (0 a 14
anos) e idosos (maior que 59 anos) pela a população economicamente ativa (15 a 59 anos).
Apesar de cunho econômico, esse grupo também foi desenvolvido para abranger casos em
que seja necessária uma rápida evacuação dos domicílios, em que crianças e idosos
geralmente têm maior dificuldade na rápida remoção dos locais potencias de ocorrer um
desastre.
- Estrutura Familiar: O grupo estrutura familiar considerou a proporção de mulheres
que chefiam famílias e também o número de pessoas por habitação. Chefe de família mulher
indica uma estrutura familiar complexa devido muitas vezes as mulheres ocuparem-se de
atividades domésticas não remuneradas (Anazawa et al., 2013), além de que geralmente têm
salários mais baixos e dão maior assistência a família. Essas situações condicionam as
mulheres a terem mais dificuldade em reagir e recuperar de desastres (Cutter et al., 2003). O
maior número de pessoas por habitação também contribuem para a maior dificuldade de
evacuação e tende a ocorrer uma maior concentração de atingidos por habitação quando no
desencadeamento de desastres.
- Ambiental: O grupo ambiental foi construído a partir dos dados das cartas de
suscetibilidade natural aos deslizamentos e inundações elaboradas pelo IPT/CPRM (2014).
Anazawa et al. (2013) definiu os indicadores ambientais considerando a declividade, forma do
terreno, proximidade com corpos d’agua. No entanto, as cartas de suscetibilidade já abordam
efetivamente esses indicadores e já definem graus de suscetibilidade, variando de baixa,
média e alta suscetibilidade natural do município ao desencadeamento de inundações e
deslizamentos de encosta.
4.3 Álgebra de Mapas e Estatística
Após a definição das variáveis calculadas para o estabelecimento dos indicadores, os
dados censitários de 2010 escolhidos foram separados em um banco de dados e integrado a
uma base de dados georreferenciada (malha de setores censitários) no software TerraView
(TerraView, 2011). Os dados foram calculados e normalizados por transformações lineares ( 0
a 1), gerando índices adimensionais que permitiram espacializar os indicadores de
vulnerabilidade socioambiental a partir de uma representação de natureza relacional (Equação
1). Quanto mais próximo a 1, maior a vulnerabilidade, e quanto mais próximo a 0, menor a
vulnerabilidade. Em alguns casos, para que a variação 0 a 1 continuasse a indicar
respectivamente menor e maior influência a vulnerabilidade, foi necessário aplicar uma
inversão dos valores do indicador (Equação 2).
V(ob) = valor observado
V(mx) = valor máximo
V(mn) = valor mínimo
Após a realização dos cálculos e as devidas transformações numéricas, os 13 indicadores
simples foram somados, formando os indicadores compostos, se referindo aos 6 grupos
temáticos de indicadores apresentados na Tabela 1. Após esse procedimento no TerraView
(TerraView, 2016), os dados foram transportados para o software ArcGis 10, onde cada grupo
de indicador foi convertido para um espaço celular (imagem raster). Assim, os 6 grupos de
indicadores foram somados e normalizados através do método álgebra de mapas, formando o
índice sintético final, correspondente ao Índice de Vulnerabilidade Socioambiental de São
José dos Campos (IVSA – SJC) considerando todo o limite territorial do município.
Posteriormente, a vulnerabilidade foi extraída somente para os ambientes construídos do
município, utilizando a informação de uso do solo do zoneamento ecológico econômico do
estado de São Paulo (SMA/CPLA, 2012). Esse procedimento é uma simplificação e na
continuidade dos estudos, os indicadores serão distribuídos pelas áreas construídas através de
técnicas mais avançadas de sensoriamento remoto, como a classificação supervisionada e
aplicação do método dessimétrico para a realização da distribuição proporcional dos dados do
polígono de setor censitário para as células dos ambientes construídos.
𝑉(𝑜𝑏)−𝑉(𝑚𝑛)
𝑉(𝑚𝑥)−𝑉(𝑚𝑛) (1)
1 −𝑉(𝑜𝑏)−𝑉(𝑚𝑛)
𝑉(𝑚𝑥)−𝑉(𝑚𝑛) (2)
5. Resultados
O Índice de Vulnerabilidade Socioambiental de São José dos Campos (IVSA – SJC) para
o ano de 2010 é apresentado espacialmente para todo o limite municipal no mapa da Figura 2
e especificamente para as áreas construídas no mapa da Figura 3. É possível verificar que as
diferenciações nas condições de vulnerabilidade do município refletem as diferenciações das
características do relevo, da geologia e dos fatores socioeconômicos.
As regiões central, centro-sul, centro-oeste, sudeste e leste estão associadas com as áreas
urbanas mais antigas, consolidadas e melhor estruturadas do município, onde a população
possui rendas mais elevadas, e associadas com topografias planas a suave onduladas das
colinas em rochas sedimentares e relativamente afastadas das planícies de inundação do rio
Paraíba do Sul. Essas regiões foram classificadas como as de menor vulnerabilidade dentro do
limite municipal de São José dos Campos.
Em contrapartida, as regiões mais afastadas das áreas urbanas consolidadas, como a norte,
extremo sul, extremo sudeste e regiões rurais, possuem os piores indicadores, onde
concentram as populações de menor renda, as habitações e bairros com infraestruturas
inferiores, associados com superfícies de topografia onduladas a montanhosas, em que o
relevo se caracteriza por morros, serras e escarpas em formação geológica magmática e
metamórfica, que se caracterizam por superfícies naturalmente com alta suscetibilidade à
ocorrência de escorregamentos. Na região norte, bairros construídos na planície de inundação
do rio Paraíba do Sul, também obtiveram valores maiores para a vulnerabilidade
socioambiental. Alguns bairros são marcados pela proximidade ao rio, onde a suscetibilidade
a inundação é classificada como alta.
Após uma avaliação mais geral do município, alguns bairros foram selecionados para uma
observação do IVSA de forma mais detalhada, onde são observados, através de um gráfico do
tipo radar, quais os valores dos indicadores que definiram a vulnerabilidade socioambiental
do local. Os quatro bairros selecionados foram: Pinheirinhos, no extremo sul do município;
Jardim Cristina no centro-norte, na planície de inundação do rio Paraíba do Sul; Havaí e
Canindú, região norte, onde existem várias casas em áreas de risco a escorregamentos; e
Floradas de São José, na região centro-sul. Os bairros foram escolhidos para representar
diferentes características de vulnerabilidade socioambiental e também obter maior
representação espacial da cidade, abrangendo diferentes regiões.
O bairro Pinheirinhos, situado no extremo sul de São José dos Campos, se caracterizava
no ano de 2010 por ocupação irregular (invasão), com infraestrutura urbana inadequada em
relevo acidentado. O maior valor de IVSA do bairro é de 1.0 (Figura 4), o maior identificado
dentre os limites do município estudado. Os indicadores ambientais, representado pela alta
suscetibilidade aos escorregamentos de encosta, financeiros, referente à baixa renda dos
domicílios e à concentração de domicílios com renda abaixo de 3 salários e também os
indicadores de infraestrutura habitacional, caracterizada pela ausência de pavimentação,
bueiros, e baixo acesso a distribuição de água tratada, a rede coletora de esgoto e a coleta de
lixo, foram fatores preponderantes para caracterizar o bairro com alto valor de vulnerabilidade
socioambiental. Importante destacar que atualmente o bairro foi desapropriado judicialmente
para reintegração de posse, não existindo habitações no local.
O bairro Jardim Cristina, localizado na região centro-norte de São José dos Campos, está
situado na planície de inundação do rio Paraíba do Sul e em local de alta suscetibilidade a
inundação. Os bons indicadores educacionais, boas condições de infraestrutura habitacional e
baixa dependência social, contribuíram para que o bairro não obtivesse valores muito altos de
vulnerabilidade socioambiental, apesar da alta suscetibilidade a inundação. No entanto, a
baixa renda dos domicílios, contribuiu, juntamente com o indicador ambiental, para o valor de
IVSA de 0,67 (Figura 5).
Figura 2: Mapa da vulnerabilidade socioambiental de São José dos Campos considerando
todo o limite municipal.
Figura 3: Mapa da vulnerabilidade socioambiental de São José dos Campos, considerando as
áreas construídas e enfatizando as áreas urbanas.
Figura 4: IVSA do bairro Pinheirinhos, extremo sul de São José dos Campos.
Figura 5: IVSA do bairro Jardim Cristina, centro-norte de São José dos Campos.
Os bairros Havaí e Canindú são núcleos de expansão habitacional a norte da mancha
urbana original de São José dos Campos, caracterizados por terrenos altamente suscetíveis aos
escorregamentos. Os bairros ganham destaque por possuírem 500 moradias em setores de
risco Alto e Muito Alto a escorregamentos, mapeadas geotecnicamente por Valério Filho et
al. (2014). O IVSA da região é de até 0.89, podendo ser considerado alto. A alta
vulnerabilidade se justifica pelo alto valor do indicador ambiental, financeiro e infraestrutura
habitacional (Figura 6). Os bairros foram mapeados como alta suscetibilidade natural aos
escorregamentos e os dados censitários indicaram baixo poder aquisitivo da população e
infraestrutura habitacional precária, não existindo pavimentação e bueiros, e ainda existindo
número elevado de habitações que não são atendidas por abastecimento de água tratada, rede
coletora de esgoto e serviços de coleta de lixo.
O bairro Floradas de São José, localizado na região centro-sul do município, foi
classificado como baixa vulnerabilidade, obtendo o IVSA de 0,29. Ao observar a Figura 7
verifica-se que todos os indicadores de vulnerabilidade foram considerados baixos, estando
mais próximos a 0. O bairro se caracteriza por urbanização consolidada e domicílios com
renda mais elevadas em região classificada como de baixa suscetibilidade a escorregamentos
e ausência de suscetibilidade a inundação. O grupo de indicador que obteve valor de
vulnerabilidade um pouco mais elevado foi estrutura familiar. A variável que contribui para
isso foi à existência de mulheres chefes de família. Porém, se comparado com os bairros
anteriormente avaliados, esse indicador ainda pode ser considerado baixo.
Deste modo, o estudo da vulnerabilidade socioambiental de São José dos Campos
indicou, de forma geral, que apesar do município ser classificado com IDHM muito alto, um
dos maiores do Brasil (24ª posição), os indicadores apontaram para existência de
desigualdades socioeconômicas que coincidem com as variações das características físico-
naturais. Observa-se que o norte e sul do município são caracterizados por regiões de alta
suscetibilidade a escorregamentos e inundações e ocupadas por populações de menor renda,
estruturas habitacionais inferiores e com isso obtendo altos valores de vulnerabilidade
socioambiental. Em contrapartida, as regiões mais centrais estão mais associadas às
superfícies planas e de baixa suscetibilidade natural e ocupadas por domicílios com rendas
maiores e maior acesso às infraestruturas habitacionais, sendo classificada em sua maioria
com baixos valores de vulnerabilidade socioambiental. Isso provavelmente reflete a
desigualdade socioeconômica existente no Brasil e a lógica do mercado imobiliário que, ao
longo dos anos, teve uma tendência a valorizar as regiões centrais e afastar as pessoas de
baixa renda para as áreas periféricas e de menor valor de mercado, como os terrenos de maior
tendência aos escorregamentos e inundações e as áreas de risco. No entanto, essa discussão
pode ser ampliada em outro momento, quando na continuidade dos estudos do IVSA – SJC.
Figura 6: IVSA dos bairros Havaí e Canindú, norte de São José dos Campos.
Figura 7: IVSA dos bairros Havaí e Canindú, norte de São José dos Campos.
6. Considerações Finais
O Índice de Vulnerabilidade Socioambiental de São José dos Campos (IVSA – SJC)
permitiu observar e quantificar os diferentes níveis de vulnerabilidade no espaço intra-urbano
do município. As variáveis definidas para o estabelecimento da vulnerabilidade são
particulares às características da região estudada e o IVSA – SJC está coerente com as
informações físico-naturais e socioeconômicas. Verificou-se que as regiões onde a estrutura
urbana já se encontra bastante estabelecida, tenderam a obter menores índices de
vulnerabilidade, pois além de melhor infraestrutura, estão relacionadas com superfícies de
menor suscetibilidade a movimentos de massa gravitacionais e inundações. A espacialização
das maiores vulnerabilidades está relacionada com o relevo mais acidentado das regiões norte
e sul do município, e também próxima ao leito do rio Paraíba do Sul, associada com os
bairros de baixa renda.
O estudo apresentado é preliminar e pretende-se estender a metodologia para os anos de
1991 e 2000 e verificar a variação/evolução temporal da Vulnerabilidade Socioambiental de
São José dos Campos. Objetiva-se também realizar uma classificação supervisionada de
imagens landsat do município para os respectivos anos e extrair as informações de áreas
construídas. Posteriormente realizar uma distribuição dos dados dos setores censitários às
células das áreas construídas aplicando o método dasimétrico.
7. Referências Bibliográficas
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