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X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1 

 

 

 

 

    THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ    

 

Resumo O objetivo desse estudo é  apresentar  as  contribuições do pensamento  de  Thomas  Hobbes  acerca  dos  elementos constitutivos de um Estado de paz. Para  tanto, procura‐se demonstrar como a ética e a razão, vinculadas, conduzem a conclusão  de  que  o  estado  civil  é  a melhor  forma  para  a preservação da vida e consequentemente, gerar e manter a paz. O  estado  surge  como possibilidade mais  evidente de fuga da situação natural de  instabilidade. Abrimos mão de nossas capacidades de auto conservação, de autodefesa e delegamos ao Estado, constituído através de um contrato, a tarefa  de  cuidar  de  nossa  segurança  e  assegurar  que possamos  viver  civilizadamente.  Assim  a  ética compreendida  como  análise  dos movimentos  internos  da mente,  isto  é,  uma  teoria  das  paixões,  será  abordada  na forma  de  instrumento  político,  isto  é,  enquanto colaboradora  da  instituição  do  poder  soberano,  que  se reveste de autoridade para a obtenção de paz e obediência. Nesse  sentido,  é  que  se  pode  derivar  do  pensamento  de Hobbes uma  educação  volta  à paz; uma  educação que  se alicerça pelo governo do poder político.  Palavras‐chave: Thomas Hobbes, ética, educação, paz, estado  

 Francieli Constantini 

Universidade Federal de Santa Catarina francieli‐[email protected] 

     

 

 

 

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 THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ  Francieli Constantini 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.2 

 

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Introdução 

Faz‐se necessário, no contexto atual, refletir sobre os valores, as regras sociais e 

políticas, os direitos,  as  liberdades e muitos outros  conceitos que  fundamentam nossa 

sociedade.  Nessa  prerrogativa,  a  reflexão  filosófica  acerca  da  política,  torna‐se  um 

importante instrumento de auxílio à nossa educação enquanto cidadãos nos fornecendo 

uma base para o exercício da cidadania. Do momento histórico em que vivemos emergem 

importantes  questões  que  exigem  atenção  à  sua  complexidade  e  a  abertura  para  se 

refletir possíveis soluções. A natureza e a causa dos conflitos, tanto entre seres humanos, 

quanto entre Estados, é um assunto presente no transcorrer da história da filosofia, que 

alcança até os dias atuais, escopo de problemáticas, críticas e reflexões. 

Embora  todos  os  avanços  já  realizados  pela  humanidade,  principalmente  em 

relação  ao progresso  científico  e  tecnológico, há  ainda  lacunas  e  incertezas quanto  às 

questões  relativas à vida humana em  sociedade.   Problemas  como a paz,  justiça, bem‐

estar social são ainda objeto de estudos e reflexões, haja vista que, a ação humana e os 

conflitos que dela derivam são fundamento da maioria dos problemas sociais e políticos 

evidenciados, sendo a guerra e a violência seu principal subproduto. Uma coisa é certa; 

nenhuma  teoria  conseguirá  resolver  todos  os  aspectos  dos  problemas  ético‐político‐

educacionais, entretanto elas, ainda  são o melhor  caminho, pois oferecem a base para 

que  se  possam  encontrar  os  meios  necessários  à  paz  e  para  uma  sociedade  mais 

igualitária. Nessa perspectiva a filosofia prática de Thomas Hobbes, dividida entre ética e 

política, que  tem por  finalidade a busca da  felicidade e do bem comum  tanto na esfera 

pública quanto privada, é uma grande aliada no enfrentamento de questões essenciais da 

vida social e humana. 

Falar  de  ética,  então,  implica  abordar  questões  relevantes  no  que  concerne  a 

construção da ordem política e como ela se relaciona com a conduta dos indivíduos que a 

compõem. Trata‐se de  investigar em que medida  à obediência  as  autoridades e  as  leis 

civis, condições para os  indivíduos viverem em paz e também num estado de bem‐estar 

social, é compatível com a ética, centrada na procura da felicidade. 

Nesse enfoque, busca‐se analisar as contribuições de Hobbes, principalmente em 

seus escritos “Leviatã” e “De Cive” para o  campo da paz. Trata‐se de analisar, não de 

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forma  minuciosa  e  profunda  os  escritos  hobbesiano  acerca  da  paz,  mas,  sobretudo 

ressaltar as bases relevantes, para a construção de uma cultura da paz. 

 

 Ética: ciência das consequências das paixões 

Considerando que a busca da paz é o fim último do Estado político hobbesiano, e 

que grande parte das controvérsias entre os  indivíduos desde o estado de natureza até 

no estado civil, provém de opiniões divergentes  sobre a  terminologia da moral/ética, é 

preciso,  para  almejar  a  paz,  que  a  definição  dos  conceitos morais  seja  feita  de  forma 

cuidadosa e precisa. Pois enquanto houver disputas, principalmente sobre o que se pode 

considerar justo ou injusto, não haverá paz. 

Hobbes classifica a ética1 a partir da ciência relativa ao conhecimento dos corpos 

naturais,  que  se  classificam  em:  naturais  e  artificiais. A  ética  está  inserida  no  ramo  da 

ciência natural que  investiga as consequências das qualidades dos homens, o qual, por 

sua vez, é dividido em outros dois: a ciência das consequências das paixões, a ética, e a 

ciência das consequências da linguagem, a saber, a poesia, a retórica, a lógica e a ciência 

do justo e do injusto. A política, nessa mesma classificação, encontra‐se no outro ramo da 

ciência  que  investiga  as  consequências  dos  corpos  artificiais.  Assim,  nota‐se  ao 

observador que há uma clara separação em Hobbes, entre ética e política, contrariando 

uma  longa tradição que, desde Platão e Aristóteles vinculava essas duas áreas do saber. 

Ao colocar a ética e a política em ramos diferentes da ciência, o  filósofo elucida que as 

mesmas se dedicam a objetos de estudos diferentes. Se do ponto de vista do princípio 

metodológico elas não diferem por ser “o conhecimento das consequências” (HOBBES, 

2003, p.73),  isto é  ciências, do ponto de  vista do objeto elas  se  afastam  radicalmente. 

Assim  a  ética,  é  o  conhecimento  das  consequências  dos  acidentes  dos  homens, mais 

precisamente dos acidentes internos da mente, ou seja, das paixões.  

Seguindo  essa  classificação,  a  ética  pode  ser  concebida  como  uma  ciência 

descritiva  dos  movimentos  internos  da  mente.  Pois  são  dois  os  métodos  de 

conhecimento  admitidos  por Hobbes;  i)  aquele  que  parte  da  observação  e  chega  aos                                                             1 Cf. Leviatã, IX, p. 74 (quadro das ciências). Em geral, utilizamos a tradução brasileira de João Paulo 

Monteiro, Martins Fontes, 2003. 

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princípios ou causas (método analítico) e  ii) aquele que parte dos primeiros princípios e 

procede pela via da síntese. 

Pelo método  analítico,  chega‐se  ao  conhecimento  dos movimentos  da mente  a 

partir  da  experiência,  isto  é,  a  partir  da  observação  que  cada  um  pode  fazer  desses 

movimentos em si mesmo;  já o método sintético requer que a  investigação tenha  início 

na filosofia primeira, que passe daí para a geometria, da geometria para a física, e chegue 

finalmente à filosofia moral.  Nesse plano, fica evidente a divisão do projeto filosófico de 

Hobbes, a  saber, de  construir um  sistema de  filosofia que parte do estudo dos  corpos 

naturais, passando pelo estudo das disposições e costumes do homem e terminando na 

consideração sobre os deveres dos súditos. 

Nesse  plano,  o  tema  das  paixões  desempenha  um  papel  importante  no 

desenvolvimento da ética e da política de Hobbes, pois segundo consta no Leviatã, elas 

estão relacionadas tanto à guerra quanto à paz. A força das paixões também se faz notar 

nas declarações do filósofo sobre a insuficiência da razão para controlar a ação humana. 

Conforme Hobbes, mesmo  que  a  razão  aponte  para  a  elaboração  de  um  artificio  que 

possa dar conta de limitar a violência a qual os homens estão submetidos numa condição 

natural,  o  contrato  será  insuficiente  para  instaurar  uma  condição  pacifica  sem  a 

instituição de um soberano dotado de poder absoluto para usar a  força contra aqueles 

que não respeitam os acordos. E este poder soberano, ao usar a espada, também estará 

agindo  sobre  as  paixões,  na medida  em  que  as  ameaças  de  punição  despertam  nos 

homens uma paixão fundamental para induzi‐los a paz, o medo. 

A análise das paixões, centrada no conceito de  ‘conatus’2  revela uma  teoria que 

concebe  o  homem  submetido  a  uma  série  causal  de  eventos  sobre  a  qual  não  tem 

controle, e os desejos aparecem sempre provocados pelo movimento do mundo exterior. 

A teoria das paixões envolve algo mais do que a simples descrição sobre os movimentos 

internos da mente. Ela produz uma análise do conceito de bem e mal, também essencial à 

                                                            2  Hobbes  usou  o  termo  conatus  principalmente  em  sentido  mecânico.  Em  De  Corpore,  o  conatus  é 

apresentado  como  um  movimento  determinado  pelo  espaço  e  pelo  tempo,  e  mensurável numericamente. Em De homine, aparece como um movimento voluntário ou “paixão” que precede a ação  corporal  e  que,  embora  “interno”,  possui  determinações  e  propriedades  mecanicamente exprimíveis (Dicionário de Filosofia, Loyola, 2004, p.518). 

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ética  hobbesiana.  No  Leviatã,  imediatamente  após  descrever  as  paixões,  o  filósofo 

apresenta sua concepção sobre o bem e o mal. 

Mas, seja qual for o objeto do apetite ou desejo de qualquer homem, esse objeto  é  aquele  a  que  cada  um  chama  bom;  ao  objeto  de  seu  ódio  e aversão chama mau, e ao de seu desprezo chama vil e  insignificante. Pois, as palavras “bom” e "mau" e “desprezível” são sempre usadas em relação à pessoa que as usa (HOBBES, 2003, p. 48, grifos do autor). 

 

Bem e mal então, não são definidos em si mesmos ou em relação aos objetos, mas 

unicamente  em  relação  às  paixões.  Bem,  é  o  nome  dado  aos  objetos  pelos  quais  o 

homem  sente  apetite,  e mal,  aqueles  pelos  quais  sentem  aversão.  “Não  há”,  afirma 

Hobbes “nada que seja simples e absolutamente, nem há qualquer regra comum do bem 

e do mal que possa ser extraída dos próprios objetos” (HOBBES, 2003, p.58). Bem e mal 

não são nada em si mesmos e muito menos podem ser definidos como propriedade dos 

objetos. São apenas nomes que atribuímos às coisas quando as desejamos ou evitamos. 

Essa  definição  de  bem  e  do mal  é  central,  porque,  a  partir  dela,  Hobbes  pôde,  por 

exemplo, descrever a condição natural da humanidade como aquela em que não há um 

acordo moral sobre o qual seja possível estabelecer as bases para a convivência pacífica. 

A falta dessa medida comum do bem e do mal esta também na origem das condições de 

instabilidade do estado natural. 

Desse modo, tendo em vista que não há bem e mal objetivos, com base nos quais 

possamos  estabelecer  as  regras  de  convivência,  é  preciso  que  tais  regras,  não  sendo 

naturais ou sobrenaturais, sejam estabelecidas de maneira artificial. Da impossibilidade de 

um acordo no estado de natureza devido à inexistência de uma autoridade comum, é que 

Hobbes  indica que a única  forma de se  instituir uma convivência pacífica é a submissão 

das  vontades  individuais  á  vontade  do  soberano;  ou  seja,  se  entre  duas  pessoas  é 

impossível  que  haja  acordo  a  respeito  do  bem  e  do  mal,  resta  que  ele  possa  ser 

encontrado por intermédio da instituição de um árbitro que possa decidir. 

O Estado surge então, como uma restrição que o homem  impõe sobre si próprio 

como  forma de cessar o estado de guerra de  todos contra  todos, a  fim de promover a 

humanidade  a  um  estado  de  maior  organização  e  segurança;  haja  vista  a 

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incompatibilidade da natureza humana em se instituir em sociedades onde não exista um 

poder acima do poder individual. E é no próprio homem, nem tanto nas paixões como na 

razão, que se encontra a saída para a guerra.   A concordância mais clara apontada pelo 

filosofo é acerca da vida e da morte. Há varias passagens em que Hobbes aponta que 

existe concordância avaliativa em relação a elas. Pois, segundo Hobbes, ainda que bem e 

mal sejam subjetivos, considerados em virtude das paixões as quais são extremamente 

volúveis entre os homens, todos concordam, com raríssimas exceções, que a vida é um 

bem e a morte é um mal. 

Todos consideram a vida como um bem e a morte como um mal. Raras exceções 

ocorrem3. Portanto, a autopreservação, será o grande bem a ser perseguido e a morte o 

grande mal a ser evitado. Assim, é em relação à vida e a morte que todas as outras coisas 

são  julgadas  como boas ou más; e  seguindo  essas premissas,  a  conclusão pode muito 

bem ser que aquilo que o homem avalia como bem é o que preserva a vida, e, portanto 

conduz a paz. 

 

Estado de Natureza 

Em Hobbes encontramos a  ideia de homem submetido desde sempre a  lógica de 

movimentos  naturais  e  instintivos,  gerador  de  paixões  e  desejos,  fundamentados  em 

aversões  e  atrações  naturais  que  deságuam  em  posturas,  por  vezes,  denominadas 

egoístas. Mas esse “egoísmo” não é senão os movimentos naturais dos corpos, que pode 

ser  fomentado em  larga escala  a depender da direção que o próprio homem dá  à  sua 

história. Hobbes é taxativo no sentido de não aceitar uma natureza humana tranquila em 

que  cada  indivíduo  é  complacente  com  o  desejo  do  outro,  condescendente  com  suas 

vontades e avesso ao conflito. O mecanismo físico‐biológico a que estamos submetidos 

não  é  apaziguador  e  posto  que  este  homem  possa  criar  novos  e  infinitos  objetos  de 

desejos, pode  também aumentar em grande escala os conflitos com seus semelhantes. 

                                                            3 Hobbes  admite  que,  em  alguns  casos,  as  pessoas prefeririam  a morte  a  uma  vida  de  sofrimento,  por 

exemplo, no De Cive, ele afirma que um filho preferiria a morte a cumprir uma ordem de matar seus pais (HOBBES, 2002, DCi, VI. 13 p.108‐9). 

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Pois,  como  consequência  da  guerra  de  todos  contra  todos, Hobbes  conclui  que  nada 

pode ser injusto.  

Desse modo, o  hipotético  e  imaginário  Estado de Natureza  é  apresentado pelo 

inglês como uma dedução de como seria o comportamento humano se fosse suspenso o 

estado político. Em tal estado, seguindo a dinâmica do mecanicismo, Hobbes estabelece 

que  só  a  necessidade  governa  o mundo  das  coisas  e  dos  seres,  só  as  leis mecânicas 

devem explicar a instauração da ordem física ou social. Portanto a única realidade natural 

e  tangível é o  individuo que deve ser estudado em sua natureza e na dinâmica de suas 

paixões  e  desejos.  Pois,  pelo  desejo,  o  homem  procura  a  felicidade  não  como  ‘finis 

ultimus’ porque este não existe, mas como satisfação dos desejos imediatos, uma vez que 

a  vida  humana  é  um  constante  desejar  e  a  felicidade  não  é  outra  coisa  senão  uma 

ininterrupta realização dos desejos. 

Assim  no  estado  natural  todos  os  homens  são  livres  e  iguais,  conforme  reza  o 

direito natural. O que significa que todo homem tem direito a todas as coisas, incluindo os 

corpos dos outros. É o Estado em que cada homem é inimigo de cada homem, haja vista a 

sua  liberdade  individual de  se defender  como puder  contra os demais. Nesses  termos, 

todos  os  homens  vivem  atemorizados  pelo  risco  constante  de  morte  violenta, 

configurando assim numa condição miserável, pois 

Em tal condição, não há  lugar para a  indústria, pois seu fruto é  incerto: e consequentemente não há o cultivo da terra, nem navegação, nem o uso das mercadorias que podem ser importadas pelo mar; não há construções confortáveis,  nem  instrumentos  para  mover  e  remover  as  coisas  que precisam de grande força; não há reconhecimento da face da Terra, nem cômputo do  tempo, nem artes, nem  letras; não há  sociedade; e o que é pior do que tudo, um constante temor e perigo de morte violenta. E a vida do homem é solitária, miserável, sórdida, brutal e curta (HOBBES, 2003, p. 109). 

É preciso então, abandonar  tal condição e para  isso Hobbes aponta dois elementos 

próprios  da  natureza  humana  que  sinalizam  para  a  saída  do  estado  de  natureza:  as 

paixões  e  a  razão. Aquelas  paixões  –  como medo,  o  desejo  e  a  esperança  –  fazem  o 

homem  tender para a paz: o medo da morte ou de  ferimentos  faz o homem procurara 

ajuda, associando‐se entre si; o desejo de uma vida confortável, assim como a esperança 

de  realização por meio do  trabalho, “predispõe os homens para a obediência ao poder 

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 THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ  Francieli Constantini 

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comum”. Aliada  às paixões,  a  razão dita  às  leis de natureza  como normas de paz, em 

torno das quais os homens podem chegar a acordos para uma convivência pacífica e em 

segurança. Em vista disso, pode‐se concluir que, todos os homens concordam que a paz é 

uma boa coisa, e, portanto também são bons os caminhos ou meios para encontrá‐la.  

É  tarefa da  razão,  restringir o comportamento auto  interessado dos homens com o 

objetivo de promover de modo mais sólido e duradouro o bem individual. A razão coloca 

limites aos indivíduos, restringindo o auto interesse em nome do benefício próprio. Uma 

vez que a conservação duradoura exige a eliminação da guerra que caracteriza o estado 

de natureza, a  razão oferece normas para a construção e manutenção da paz, normas 

que  se  configuram  como  leis  morais  na  medida  em  que,  impondo  restrições  ao 

comportamento egoísta,  regem  como devemos nos  comportar em  relação aos outros. 

Para tanto, ela nos diz que, se queremos a paz, devemos nos espelhar nos outros e fazer 

com  eles  apenas  aquilo  que  gostaríamos  que  fizessem  conosco,  caso  contrário 

disseminamos a hostilidade em vez de construir a sociabilidade. 

Por meio da  razão somos capazes de acordar sobre o que devemos  fazer e de que 

modo devemos tratar os outros se queremos nos preservar. Contudo, somente a razão 

não é suficiente para garantir a conformação das ações dos homens. 

As leis de natureza (como a justiça, a equidade, a modéstia, a piedade, ou em resumo, fazer aos outros o que queremos que nos façam) por si mesmas, na  ausência  do  temor  de  algum  poder  que  as  faça  ser  respeitadas,  são contrárias  às  nossas paixões  naturais,  as quais  nos  fazem  tender para  a parcialidade, o orgulho, a vingança e coisas semelhantes. E os pactos sem a  espada  não  passam  de  palavras,  sem  força  para  dar  segurança  a ninguém.  Portanto,  apesar  das  leis  de  natureza  (que  cada  um  respeita quando  tem  vontade  de  as  respeitar  e  quando  o  podem  fazer  com segurança), se não for instituído um poder suficientemente grande para a nossa  segurança,  cada  um  confiará,  e  poderá  legitimamente  confiar, apenas na sua própria força e capacidade, como proteção contra todos os outros (HOBBES, 2003, pp. 143‐144). 

Daí  a  necessidade  do  Estado,  que  surgiria  a  partir  de  um  contrato,  fruto  da 

vontade  humana  e  que  necessariamente  deve  refletir  os  interesses  destes.  Tal  Estado 

seria  soberano,  em  que  seria  garantida  a  liberdade  individual,  a  propriedade,  a 

preservação da paz, a segurança e uma série de outras garantias que só seriam possíveis 

mediante um poder superior, capaz de fazer com que tais regras não sejam violadas.  

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 THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ  Francieli Constantini 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.9 

 

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Para  tornar  possível  uma  coexistência  pacífica  e  assegurar  a  sobrevivência  do 

estado civil, Hobbes, pelo primado da razão, estabelece as leis de natureza. A primeira e 

mais fundamental lei é, “que todo homem deve esforçar‐ se pela paz, na medida em que 

tenha  esperança  de  consegui‐la,  e  caso  não  a  consiga  pode  procurar  e  usar  todas  as 

ajudas e vantagens da guerra” (HOBBES, 2003, p.113). Desta lei geral é extraída a primeira 

lei especial de natureza: “procurar a paz, e segui‐la”; e o direito natural básico: defender‐

se a qualquer custo. Uma vez encontrada a possibilidade da paz,  faz‐se necessária uma 

segunda lei de natureza: Que um homem concorde, quando outros também o façam, e na 

medida  em que  tal  considere necessário para  a paz  e para  a defesa de  si mesmo,  em 

renunciar a seu direito a todas as coisas, contentando‐se, em relação aos outros homens, 

com a mesma liberdade que aos outros homens permite em relação a si mesmo. 

Em terceiro, há a lei de cumprimento dos pactos, que consiste em “que os homens 

cumpram os pactos que celebrarem” (HOBBES, 2003, p. 113). Sem esta, os pactos seriam 

vãos.  

 

A Educação e o projeto de uma sociedade de paz.  

Hobbes partindo de uma concepção antropológica de homem, como sendo produto 

de  suas  paixões  e  afecções,  sustenta  que  a  única maneira  de manter  os  homens  em 

respeito,  evitando  a  guerra  civil  é  através  da  instauração  de  um  poder  forte  e 

centralizado. Nesse processo, os homens acordariam que a melhor  solução ao  instável 

estado natural, caracterizado pelo direito natural, pelo qual todos os homens são  livres 

para usar  seu próprio poder, de maneira que mais  convém, para a preservação da  sua 

vida,  e  consequentemente,  de  fazer  tudo  àquilo  que  convém  para  este  fim,  gerando 

conflitos e  inseguranças, é abdicar deste direito,  transferindo‐os a um  representante. A 

durabilidade  e  sobrevivência  deste  estado  seriam  garantidas  se  se  os  homens  fossem 

educados para a obediência civil. 

Desta forma, embora Hobbes não seja um autor que tenha destaque nas páginas dos 

livros  de  história  da  educação,  é  inegável  que  sua  obra  possui  elementos  de  caráter 

educador, frente às novas descobertas e mudanças do homem seiscentista. 

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 THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ  Francieli Constantini 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.10 

 

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Na construção do homem social, Hobbes não vê a educação sendo realizada apenas 

pela  soberania da  razão, mas  também, em conjunto com o poder político.  Isso ocorre, 

porque muito embora a razão ofereça suporte necessário para calcular o agir humano, os 

homens  ainda  são  particularmente  objeto  de  seus  desejos  e  paixões,  que  os  torna 

suscetíveis a disputas e discórdias. 

Além do vínculo com o Estado político, a busca pela paz em Hobbes está vinculada 

também  ao  bom  uso  da  linguagem.  Desfazer  os  equívocos  deixados  pelos  filósofos 

morais e mostrar o melhor caminho para a paz através do exercício racional, é a  tarefa 

que  Hobbes  se  propõe.  A  linguagem  é  para  ele,  a  mais  útil  de  todas  as  invenções 

humanas.  Porém,  alerta  que  seu  uso  de  modo  impróprio  gera  conflitos,  guerras  e 

destruição. 

Já  no  sentido  oposto,  o  uso  adequado  e  ordenado  da  linguagem,  como  um 

instrumento que permite o mais exato raciocinar, sugere adequadas normas de paz em 

torno das quais os indivíduos podem estabelecer um acordo consensual. Tal acordo tem 

um fim específico, a saber, construir a paz mediante a instituição do estado civil. 

Segundo Hobbes, a paz originária de um contrato mútuo que funda o estado civil é o 

único meio capaz de garantir não somente a sobrevivência do homem, mas também seu 

desenvolvimento.  A  possibilidade  do  conhecimento,  da  ciência,  do  progresso,  do 

conforto, diz Hobbes, só podem surgir do efeito da sensação de segurança e da certeza 

de  que  a  própria  vida  não  está  sendo  ameaçada.  Na  visão  de  Hobbes  a  guerra  e  os 

conflitos em geral estão  fundados na  ignorância,  tanto por parte dos  cidadãos quanto 

dos  soberanos.  Caberia  à  razão  então,  ordenar  a  busca  pela  paz,  pois,  mesmo  nos 

períodos de maior miséria do estado de natureza, permanece  intacta  a  lei natural que 

afirma ser a paz a forma mais vantajosa de conservar a vida. 

Contudo,  vivemos  em  uma  sociedade  global  e  estratificada, marcada  por  diversas 

dicotomias. O poder estatal  sua  formação e as  implicações das ações do Estado à vida 

social nem sempre convergem com as  inclinações da população. As  inter‐relações entre 

indivíduo/poder/ Estado se correlacionam e se distinguem dependendo dos interesses da 

sociedade.  É  preciso  investigar  os  ditames  dessas  questões mediante  a  finalidade  de 

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 THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ  Francieli Constantini 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.11 

 

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compreender  a  realidade  atual,  fonte  inesgotável  de  indagações  e  reflexões.  Pois  o 

sucesso de um Estado, identifica uma sociedade homogeneamente desenvolvida, em que 

são respeitados e garantidos os direitos e deveres de seus cidadãos. 

Portanto,  viver  nos  limites  do  Estado  não  é  uma  mera  questão  de  gosto  ou  de 

atualização da natureza humana, mas  sim um  artificio mecânico do homem que busca 

conquistar seus objetivos sem medo de  represálias. O homem busca aquilo que é útil à 

sua  vida.  E  a  utilidade  mais  urgente  é  a  criação  do  estado  civil,  capaz  de  instruir  e 

guarnecer o direito à vida, à paz, à propriedade, à educação, ao comércio, enfim de tudo 

que constitui o homem. Assim, a  filosofia de Hobbes, embora não  tenha um conteúdo 

genuíno  sobre  a  educação,  nos  oferece  alguns  elementos  importantes  que  podem 

auxiliar na reflexão dos caminhos para uma sociedade de paz.  

E  toda  a  argumentação  acerca  da  ética,  àquela  parte  da  filosofia  de  que  trata  as 

paixões da mente, nos mostra que essas paixões não são capazes de oferecer um padrão 

do que seja justo. Tal padrão só pode ser estabelecido artificialmente por meio do estado 

soberano  como  condição  de  estabelecer  a  paz  e  a  segurança. No  plano  político,  isso 

implica  que  o  Estado  é  o  único  capaz  de  afastar  a  guerra  e  o  conflito,  condições 

antagônicas  à  paz.  O  estado,  enquanto  limitador  e  organizador  do  conflito  passional 

humano detêm o poder e as prerrogativas para conduzir a uma situação de paz.  

Pois as paixões,  somente podem demonstrar que, por natureza, as ações humanas 

sempre  serão  definidas  em  relação  aos  desejos  individuais  não  sendo  possível  derivar 

delas outra regra comum que não seja o valor da vida. Não há, portanto, certo e errado, 

justiça e injustiça, por natureza. Tais noções somente podem ser encontradas no interior 

da vida social. Assim as reflexões éticas, políticas e psicológicas, presentes no constructo 

do  projeto  cientificista  da  filosofia  hobbesiana,  apontam  que  o  homem  precisa  ser 

considerado em toda sua totalidade, visto que é na coletividade que se perpetua. 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

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 THOMAS HOBBES E OS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DE UM ESTADO DE PAZ  Francieli Constantini 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.12 

 

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