Departamento de Educação da Faculdade de Ciências
Universidade de Lisboa
A PROMOÇÃO DO PENSAMENTO ATRAVÉS DA DISCUSSÃO DOS NOVOS AVANÇOS NA ÁREA DA
BIOTECNOLOGIA E DA GENÉTICA
PEDRO GUILHERME ROCHA DOS REIS
Mestrado em Educação
1997
ii
iii
Departamento de Educação da Faculdade de Ciências
Universidade de Lisboa
A PROMOÇÃO DO PENSAMENTO ATRAVÉS DA DISCUSSÃO DOS NOVOS AVANÇOS NA ÁREA DA
BIOTECNOLOGIA E DA GENÉTICA
PEDRO GUILHERME ROCHA DOS REIS
Licenciado em Ensino da Biologia
Universidade de Lisboa
Tese Apresentada para Obtenção do Grau de Mestre em Educação
na Especialidade de Didáctica das Ciências
Professora Orientadora: Mariana Pereira
Este estudo foi subsidiado pelo Instituto de Inovação Educacional
1997
iv
v
AGRADECIMENTOS
Uma palavra de agradecimento a todos os que me auxiliaram nesta viagem
por �Novos Mundos�. Uma viagem marcada, muitas vezes, pela aventura, por
descobertas, por recompensas, por �Cabos da Boa Esperança�; outras vezes, por
dificuldades, por obstáculos, por �Cabos das Tormentas�.
À minha orientadora, Professora Mariana Pereira, que me guiou nesta
viagem, assinalando escolhos, ventos e correntes.
Aos meus Pais a quem tudo devo e que me incutiram o gosto pela
descoberta.
À Rute, pelo apoio precioso nesta �viagem�, eliminando escolhos e lendo e
revendo as várias versões deste �Diário de Bordo�.
A todos os professores e alunos que participaram empenhadamente e
entusiasticamente nesta aventura.
Ao Conselho Directivo da Escola Secundária Marquês de Pombal, por toda
a disponibilidade manifestada.
Às Professoras Isabel Neves e Graça Fialho pelos comentários pertinentes
a alguns �Instrumentos de Viagem�.
Ao Instituto de Inovação Educacional pelo seu apoio financeiro (projecto no
âmbito da medida 2 do SIQE � contrato nº 6/95).
vi
vii
ÍNDICE
ÍNDICE DE QUADROS xi
CAPÍTULO 1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO 1
CAPÍTULO 2 QUADRO DE REFERÊNCIA TEÓRICO 5
2.1 O ENSINO DAS CIÊNCIAS E A EDUCAÇÃO PARA A CIDADANIA 6
2.2 ENSINAR A PENSAR 14
2.2.1 Será Necessário Ensinar a Pensar? 15
2.2.1.1 Posição de Smith 15
2.2.1.2 Posição de de Bono 18
2.3 ACTIVIDADES DE DISCUSSÃO NA SALA DE AULA � IMPORTÂNCIA DA INTERACÇÃO NA CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO 23
2.3.1 Actividades de Discussão na Sala de Aula � Definição, Potencialidades e Dificuldades 23
2.3.2 A Discussão de Assuntos Controversos 26
2.3.3 A Interacção na Construção do Conhecimento 32
2.3.3.1 A construção social da inteligência 33
2.3.3.2 A aprendizagem cooperativa 37
CAPÍTULO 3 METODOLOGIA 43
viii
3.1 OBJECTO DE ESTUDO 43
3.2 ABORDAGEM SELECCIONADA 44
3.3 AMOSTRA 48
3.4 INSTRUMENTOS 50
3.4.1 As Actividade de Discussão 50
3.4.1.1 Actividade 1 54
3.4.1.2 Actividade 2 57
3.4.1.3 Actividade 3 59
3.4.1.4 Actividade 4 61
3.4.1.5 Actividade 5 67
3.4.2 Observação das Actividades 68
3.4.3 Entrevistas aos Professores 69
3.4.4 Questionário para Avaliação das Actividades pelos Alunos 70
3.4.5 Questionário para Levantamento das Opiniões dos Alunos sobre Biotecnologia 71
3.5 MÉTODO DE INVESTIGAÇÃO: OS SEIS CHAPÉUS DO RACIOCÍNIO 72
3.5.1 Raciocínio à Chapéu Branco 75
3.5.2 Raciocínio à Chapéu Vermelho 75
3.5.3 Raciocínio à Chapéu Amarelo 76
3.5.4 Raciocínio à Chapéu Preto 76
3.5.5 Raciocínio à Chapéu Verde 77
3.5.6 Raciocínio à Chapéu Azul 77
3.6 TÓPICOS SELECCIONADOS: CONTROVÉRSIAS EM TORNO DA BIOTECNOLOGIA 78
3.7 FASES DO ESTUDO 81
ix
CAPÍTULO 4 RESULTADOS 85
4.1 APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS 86
4.1.1 Dados de observação 86
4.1.1.1 Chapéu branco (factos e informações sobre a implementação das actividades) 86
4.1.1.2 Chapéu vermelho (emoções e sentimentos manifestados ou evidenciados pelo professor ou pelos alunos relativamente às actividades) 87
4.1.1.3 Chapéu amarelo (reacções positivas às actividades) 87
4.1.1.4 Chapéu preto (reacções negativas às actividades) 88
4.1.1.5 Chapéu verde (comentários ou comportamentos que sugiram alterações capazes de melhorar as actividades) 88
4.1.1.6 Chapéu azul (avaliação geral da forma como decorreram as actividades) 89
4.1.2 Dados dos Questionários de Avaliação das Actividades pelos Alunos 89
4.1.2.1 Chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites, intuições) 90
4.1.2.2 Chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens, benefícios) 93
4.1.2.3 Chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas, problemas) 96
4.1.2.4 Chapéu verde (sugestões, novas ideias, alternativas) 99
4.1.2.5 Chapéu azul (avaliação global) 101
4.1.3 Dados das Entrevistas aos professores 104
4.1.3.1 Chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites, intuições) 104
x
4.1.3.2 Chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens, benefícios) 107
4.1.3.3 Chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas, problemas) 111
4.1.3.4 Chapéu verde (sugestões, novas ideias, alternativas) 111
4.1.3.5 Chapéu azul (avaliação global) 113
4.1.4 Dados dos Questionários de Opinião sobre Biotecnologia 116
4.1.4.1 Crescimento científico e tecnológico e bem estar social 116
4.1.4.2 Engenharia genética - potencialidades e perigos 117
4.1.4.3 Análise do património genético - potencialidades e perigos 120
4.1.4.4 Os cidadãos e a Biotecnologia 123
4.1.4.5 Controlo da investigação na área da Biotecnologia 125
4.2 ANÁLISE DOS RESULTADOS 126
CAPÍTULO 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS, EXTENSÃO E DESENVOLVIMENTO 135
ANEXOS 141
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 177
xi
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1 - Síntese da Sequência das Actividades 52
Quadro 2 - Síntese do Estudo 82
Quadro 3 - Crescimento Científico e Tecnológico e Bem Estar Social 117
Quadro 4 - Sentimentos Relativamente à Engenharia Genética 118
Quadro 5 - Engenharia Genética e Melhoramento dos Seres Vivos 119
Quadro 6 - Utilização do Diagnóstico Genético 120
Quadro 7 - Diagnóstico Genético e Aborto Terapêutico 121
Quadro 8 - Diagnóstico Genético e Eugenia 122
Quadro 9 - Conhecimento das Potencialidades e dos Limites da Biotecnologia 123
Quadro 10 - Tomada de Decisões na Área da Biotecnologia 124
Quadro 11 - Controlo da Investigação na Área da Biotecnologia 125
xii
1
CAPÍTULO 1 CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTUDO
Vivemos numa época marcada por uma evolução vertiginosa da Ciência e
da Tecnologia e pelos aspectos positivos e negativos a elas associados. O
conceito de ciência como disciplina neutral, autónoma, desinteressada e desligada
da sociedade e de questões morais e sociais, tem sido progressivamente
ultrapassado desde os anos 30 e 40 (Santos, 1987; Miguéns, Serra, Simões e
Roldão, 1996). Actualmente, são evidentes as influências e a importância da
ciência e das suas aplicações tecnológicas na sociedade em geral e na vida de
cada um de nós em particular: são inegáveis tanto os seus contributos para o
desenvolvimento económico e social e para o bem estar dos cidadãos como os
seus efeitos negativos traduzidos em problemas ambientais, económicos, sociais,
culturais e éticos. A resolução destes problemas e a consequente melhoria das
condições de vida dependerão, necessariamente, da intervenção da Ciência e do
envolvimento activo e informado de toda a população. Qualquer Sociedade
democrática dependerá de cidadãos capazes de construírem opiniões
fundamentadas, de participarem em discussões, debates e processos de tomada
de decisão (Millar, 1997). Assim, torna-se vital uma educação científica, alargada a
toda a população, relevante para a vida dos cidadãos e que tenha em conta os
seus interesses e as suas diferenças (De Boer, 1991). Uma educação científica: (1)
na qual a pesquisa de informação, a argumentação, a reflexão, a tomada de
decisões e o debate, centrados em assuntos controversos, se sobreponha à
2
transmissão e à memorização acrítica de informação; e (2) que seja baseada tanto
na construção de conhecimentos como na promoção de capacidades de
pensamento e de atitudes e valores susceptíveis de assegurar, aos cidadãos do
futuro, um papel activo, construtivo e responsável na evolução da sociedade.
Em Portugal, apesar da reforma educativa, iniciada no final dos anos 80, ter
subjacente uma filosofia educativa e curricular que realça os aspectos formativos e
de desenvolvimento pessoal e social e a interacção Ciên-
cia-Tecnologia-Sociedade, tal facto teve um impacto limitado nas práticas de sala
de aula (Miguéns, Serra, Simões e Roldão, 1996). Segundo Valente (1995), o
grande desafio que se coloca ao ensino das Ciências em Portugal consiste na
passagem de uma cultura de ciência sem responsabilidade e sem paixão pelos
problemas da Sociedade para uma cultura de ciência destinada a responder às
necessidades pessoais e sociais do Homem.
No entanto, têm existido dificuldades na passagem da retórica curricular
para a prática pedagógica: importa passar das ideias à acção. Para tal, torna-se
necessário, simultaneamente, desenvolver materiais e metodologias capazes de
promoverem os objectivos atrás descritos e divulgá-los e discuti-los em contexto de
formação inicial e contínua de professores. O presente estudo procura responder a
esta necessidade através da construção, aplicação e avaliação de um conjunto de
actividades de discussão e de reflexão em grupo sobre assuntos controversos na
área da Genética e da Biotecnologia. Posteriormente, desejam-se utilizar os
conhecimentos construídos neste estudo na formação inicial e contínua de
professores � áreas de intervenção do autor deste trabalho.
Esta investigação pretende identificar indícios de eventuais potencialidades
do tema e da metodologia destas actividades no aumento da literacia científica e
na educação para a cidadania baseadas na construção e compreensão de
conhecimentos relevantes para a vida e na promoção do pensamento dos alunos.
Assim, são investigadas:
3
1. as potencialidades do tema proposto: �Os novos avanços na área da
Biotecnologia e da Genética e das suas inter-relações com a Sociedade�;
2. as potencialidades da utilização da discussão em grupo como
metodologia; e
3. as potencialidades da utilização d��Os Seis Chapéus do Raciocínio� (de
Bono, 1985, 1995) como método de tomada de decisões, capaz de
reduzir a confusão no raciocínio e de ajudar os alunos a efectuarem
escolhas pessoais através da análise das situações, da clarificação dos
seus valores e da avaliação das consequências das suas opções.
Dado que se pretendia avaliar um material didáctico, destinado à
aprendizagem em contexto natural, considerou-se importante efectuar este estudo
em contexto escolar real. Os professores e os alunos, como parte interessada no
processo de ensino-aprendizagem, não funcionaram apenas como objectos de
estudo, tendo sido convidados a contribuirem com as suas opiniões e avaliações
relativamente às actividades realizadas.
O facto deste estudo ter recorrido ao ambiente natural de sala de aula como
fonte directa de dados e de se centrar mais no processo do que nos produtos
justificou uma abordagem essencialmente qualitativa. Como instrumentos de
investigação foram utilizados questionários dirigidos aos alunos e efectuadas
observações directas das aulas e entrevistas semi-estruturadas aos professores
participantes. Tanto as respostas dos alunos ao questionário de avaliação das
actividades como as transcrições das entrevistas aos professores foram
submetidas a uma análise de conteúdo que utilizou vários níveis de categorias.
O segundo capítulo deste trabalho contém o referencial teórico que serviu
de base à discussão dos resultados da investigação. O terceiro capítulo, centrado
na metodologia, inclui as opções metodológicas da investigação, o objecto de
estudo, a caracterização da amostra seleccionada, a descrição dos instrumentos e
da metodologia utilizados e as fases da investigação. No quarto capítulo são
4
apresentados e analisados os diferentes dados recolhidos. Finalmente, no quinto
capítulo, tecem-se algumas considerações finais e sugerem-se possíveis
extensões e desenvolvimentos para o presente estudo.
5
CAPÍTULO 2 QUADRO DE REFERÊNCIA TEÓRICO
Atendendo a que o presente estudo pretende identificar indícios das
potencialidades de um conjunto de actividades de discussão e de reflexão em
grupo, sobre assuntos controversos na área da Genética e da Biotecnologia, no
aumento da literacia científica e na educação para a cidadania através da
construção e compreensão de conhecimentos relevantes para a vida e da
promoção do pensamento dos alunos, o seu referencial teórico é constituído pelos
seguintes aspectos:
• A relação entre o ensino das Ciências e a educação para a cidadania;
• As opiniões opostas de dois autores sobre a possibilidade e a necessidade
de ensinar a pensar; e
• A discussão de assuntos controversos como método pedagógico �
importância da interacção na construção do conhecimento.
A revisão da literatura sobre cada um destes aspectos, e que a seguir se
apresenta, serviu de base à discussão dos resultados do estudo.
6
2.1 O Ensino das Ciências e a Educação para a Cidadania
A real liberdade humana só existe, só se concretiza na vida do dia-a-dia, enquanto cada pessoa normal pensa, exprime-se e decide por si, medindo reflectidamente os riscos das opções e decisões, assumindo as próprias responsabilidades face aos outros membros da comunidade, seguindo os ditames da própria consciência moral, adequadamente esclarecida e afinada pelos grandes valores éticos da humanidade.
Domingues (1996, p. 72)
O conceito de cidadania pode ser definido como o vínculo entre um
indivíduo e o Estado; a matriz de onde decorrem os direitos de um indivíduo face
ao Estado (inclusivé o de participar constitutivamente na formação da vontade
soberana deste último) e as suas obrigações perante ele (Enciclopédia
Luso-Brasileira de Cultura). A educação para a cidadania, ou seja, a preparação
intelectual e afectiva dos jovens para o desempenho consciente dos seus papéis
numa sociedade democrática através do aprofundamento de valores, atitudes e
práticas constitui um dos objectivos gerais, tanto do ensino básico como do ensino
secundário, consagrados na Lei de Bases do Sistema Educativo (Lemos Pires,
1987). Este mesmo objectivo é realçado pelos programas das disciplinas de
Ciências da Natureza (5º e 6º anos) e de Ciências Naturais (7º e 8º anos) que
apontam a escola como um espaço privilegiado na preparação dos alunos para um
mundo necessariamente muito diferente do actual (Ministério da Educação, 1991 a,
b). A promoção de valores como a responsabilidade, a sensibilidade, a ponderação
e o espírito de independência é considerada, pelos autores de programas da área
de Ciências, tão importante como a aquisição de conhecimentos. Consideram que
"estes valores, devem integrar a personalidade dos alunos em formação,
possibilitando-lhes a capacidade de viver num mundo interdependente,
caracterizado pela diversidade e evolução rápida e constante", conforme vem
7
referido nos Programas de Biologia do 12º ano e de Ciências da Terra e da Vida
dos 10º e 11º anos (Ministério da Educação, 1991 c, d). Estes programas referem,
assim, como grandes objectivos do ensino em Ciências Naturais:
• O desenvolvimento do aluno como indivíduo autónomo e criativo, vivendo
numa Sociedade científica e tecnológica;
• A aquisição de um saber fazer e da capacidade de pensar por si próprio;
• O desenvolvimento da capacidade de ouvir os outros e de fundamentar as
suas opiniões;
• A aplicação de conhecimentos no desenvolvimento de atitudes morais e
sociais com vista à integração do aluno na realidade envolvente;
• A avaliação das possibilidades que os conhecimentos das Ciências
Naturais oferecem como factores de desenvolvimento das pessoas e das
Sociedades; e
• A estimulação duma visão mais humana da Ciência, fomentando a
compreensão das relações entre Ciência/Tecnologia/Sociedade e de como elas
interactuam.
A educação para a cidadania tem constituído, desde o século XVIII, uma das
principais justificações para o ensino em geral e para o ensino das Ciências em
particular. Já o Marquês de Condorcet (1743-94), matemático e político do período
da Revolução Francesa, encarava a Ciência como parte integrante dum corpo de
conhecimentos básicos indispensável à independência intelectual de qualquer
cidadão e ao desempenho de um papel activo na Sociedade (Cross & Price, 1992).
Uma posição semelhante foi defendida por John Dewey, o qual encarava a Ciência
como um elemento de libertação dos indivíduos, relativamente a um tempo e
espaço particulares, e de abertura e iluminação de horizontes intelectuais (Dewey,
1916). Bernal (1946) escreveu que a educação científica deve proporcionar a
compreensão do papel da Ciência na Sociedade de forma a que a grande maioria
dos cidadãos não envolvidos em investigação científica possa colaborar
8
inteligentemente com os cientistas e estar apta a avaliar, a criticar, os efeitos da
Ciência na Sociedade. Esta mesma opinião é defendida por autores
contemporâneos como Cross e Price (1991, 1992, 1996) e Hurd (1993, 1994).
Boateng (citado em Burkimsher, 1993) identifica três elementos necessários
à cidadania: sentimento de pertença, capacidade de obter acesso e capacidade de
participar. Destes três elementos, relacionados e interdependentes, o primeiro está
relacionado com a partilha de um conjunto de valores, o segundo e o terceiro estão
relacionados com atitudes, conhecimentos e capacidades que tornam possível a
cidadania. Burkimsher vê a escola como o principal recurso na educação para a
cidadania: �simplesmente pelo facto de pertencerem à escola, os seus membros
podem adquirir conhecimento, compreensão e capacidades, e têm a oportunidade
de desenvolver valores e atitudes (...). O exercício de direitos, responsabilidades e
deveres é demonstrado e praticado na escola� (p. 8). Defende a utilidade de
actividades como a discussão de assuntos controversos, a participação em
trabalhos de grupo e a avaliação das aulas e das disciplinas na preparação para a
vida em Sociedade. Considera o trabalho de grupo em que os alunos colaboram
com um objectivo comum como o ponto fulcral da educação para a cidadania: �A
variação da dimensão e composição do grupo permite aos alunos aprenderem a
trabalhar com pessoas diferentes� (p. 11). Realça, ainda, a importância e a
necessidade da educação para a cidadania resultar de aprendizagens, activas e
vivenciais, que proporcionem contextos para a aquisição de conhecimentos e de
capacidades como as que se encontram envolvidas em: auto-avaliação,
estabelecimento de relações, trabalho com outros, organização, comunicação,
recolha e análise de informação, tomada de decisão, expressão de opiniões,
debate e resolução de conflitos.
Actualmente, a literacia científica é considerada indispensável a uma
cidadania moderna e democrática; a participação democrática e a compreensão de
questões sociais, económicas e tecnológicas requerem uma cultura científica
9
partilhada pela vasta maioria da população (AAAS, 1989; European Commission &
Calouste Gulbenkian Foundation, 1995; ERT, 1995). A revisão da literatura
efectuada para esta investigação permitiu constatar a existência de várias
definições para o termo �literacia científica�:
• Segundo Klopfer (1985), a literacia científica deverá englobar: a) o
conhecimento de factos, conceitos, princípios e teorias significativas; b) a
capacidade de aplicar conhecimentos relevantes sobre Ciência a situa-
ções do dia-a-dia; c) a capacidade de utilizar os processos do inquérito
científico; d) a compreensão de ideias gerais sobre as características da
Ciência e as interacções Ciência-Tecnologia-Sociedade; e e) a posse de
atitudes e interesses esclarecidos relacionados com a Ciência.
• O documento Science for all americans: Project 2061, produzido pela
American Association for the Advancement of Science em 1989, aponta
como objectivos a alcançar tendo em vista a literacia científica: a) a
familiarização com o mundo natural e o reconhecimento da sua diversi-
dade e unicidade; b) a compreensão de conceitos e de princípios �chave�
da Ciência; c) a tomada de consciência da dependência entre Ciência,
Matemática e Tecnologia; d) o conhecimento da Ciência, da Matemática e
da Tecnologia como empreendimentos humanos com aspectos positivos
e limitações; e) a capacidade de efectuar formas de pensamento
científico; e f) a utilização de conhecimentos científicos e de formas de
pensamento para fins sociais. Este documento reforça a integração do
conhecimento, a diminuição da ênfase em informação detalhada e uma
maior ênfase em ideias e em capacidades de pensamento.
• Mariano Gago (1990) entende literacia científica como o desenvolvimento
de hábitos culturais capazes de permitirem, ao longo da vida, a recriação
de capacidades de compreensão e aprendizagem de conhecimentos
10
científicos básicos, bem como a sua articulação com outros domínios
culturais.
• Em 1993, Sutman define um indivíduo cientificamente literado como
aquele capaz de continuar a aprender Ciências, a desenvolver processos
científicos e a comunicar aos outros os resultados da sua aprendizagem
(Sutman, 1996).
• Shamos (1995) propõe uma definição de literacia científica que implica: a)
o conhecimento do funcionamento da Ciência e da Tecnologia; b) o
conhecimento público do que é a Ciência, mesmo que se conheça pouco
de Ciência; c) a compreensão pública do que se pode esperar da Ciência;
e d) o conhecimento de como a opinião pública relativa à Ciência poderá
ser ouvida de forma mais eficaz.
• Para Miguéns, Serra, Simões e Roldão (1996), �a literacia científica inclui
as capacidades de observar e reflectir sobre acontecimentos ou
problemas, compreender o que está em causa e usar esses
conhecimentos e capacidades de forma racional para uma tomada de
decisão informada e consciente (p. 25).
Segundo Shamos, o facto do termo �literacia científica� nunca ter sido
claramente definido em termos operacionais poderá estar na base do relativo
insucesso dos educadores em alcançarem tão almejado objectivo: �Actualmente, o
objectivo da �literacia científica� tornou-se praticamente sinónimo de ensino das
Ciências apesar da sua definição se manter vaga e de se desconhecerem os
métodos de o alcançar� (p. 158). No entanto, Bisanz, Bisanz, Korpan e Zimmerman
(1996) identificam três elementos comuns às diferentes definições de literacia
científica: a) a familiaridade com factos, conceitos e processos científicos; b) o
conhecimento de métodos e de procedimentos de investigação científica; e c) a
compreensão do papel da Ciência e da Tecnologia na Sociedade.
11
A vida de qualquer cidadão, na Sociedade em que vivemos, corre o risco de
se assemelhar a uma viagem num comboio de alta velocidade que apenas permite
aos viajantes rápidos vislumbres da paisagem; a evolução/mutação extremamente
rápida da Sociedade actual, associada à iliteracia científica, impossibilita uma
focagem/reflexão aprofundada, da maioria dos cidadãos, sobre as opções actuais
na área da Tecnologia. Porter (1986) afirma que �a Ciência torna possível a
mudança � todos necessitamos de estar preparados para julgar se queremos essa
mudança�. A resolução dos problemas resultantes dos avanços científicos e
tecnológicos não deverá ser deixada apenas aos médicos, aos cientistas ou a
qualquer outro grupo limitado; uma Sociedade na qual o poder de tomada de
decisões sobre questões científicas e tecnológicas seja privilégio de especialistas
não pode ser considerada democrática. O conceito de cidadão passivo governado
por representantes eleitos deverá ser progressivamente substituído por um
conceito de cidadão activo predisposto a participar em processos de decisão sobre
opções de desenvolvimento (Chito e Caixinhas, 1993). A Constituição Portuguesa
(Assembleia da República Portuguesa, 1996), através dos artigos 48º, 52º e 66º
que consagram, respectivamente, a participação na vida pública, o direito de
petição e de acção popular e o direito a um ambiente e qualidade de vida, prevê a
participação directa dos cidadãos. Toda a Sociedade deverá estar envolvida na
definição de políticas que controlem as profundas implicações do rápido progresso
científico e tecnológico. No entanto, este envolvimento implica uma população que
não se sinta socialmente impotente ou insignificante e que esteja informada, tanto
sobre os conteúdos científicos como sobre os conteúdos metacientíficos capazes
de fornecerem uma ideia mais real da Ciência e da sua relação com a Sociedade.
Torna-se necessário que a população esteja apta a avaliar as potencialidades e as
limitações da Ciência/Tecnologia e a compreender a dificuldade que os sistemas
legal e ético têm em acompanhar/avaliar/controlar o progresso científico e
tecnológico.
12
A escola tem um papel importante a desempenhar na preparação dos
cidadãos para um papel activo e responsável na evolução da Sociedade. Os
professores devem munir os alunos com as ferramentas necessárias à avaliação
das consequências e à correcção dos eventuais problemas resultantes do
crescimento científico e tecnológico � ferramentas como conhecimentos
científicos; conhecimentos metacientíficos sobre a natureza, as potencialidades e
os limites da Ciência; e capacidades de pensamento crítico, de tomada de
decisões, de resolução de problemas e de pensamento criativo.
Vários autores citados por Aikenhead (1994) (como Aikenhead, 1986,
Bybee, 1985, Eijkelhof, 1990, Solomon e Aikenhead, 1994) � protagonistas do
designado movimento CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade) � têm a convicção
de que um ensino das Ciências baseado no conhecimento/análise/discussão das
relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade tem a potencialidade de: a)
aumentar a literacia científica dos cidadãos; b) fomentar o interesse dos alunos na
Ciência e na Tecnologia; c) fomentar o interesse dos alunos pelas interacções
entre Ciência, Tecnologia e Sociedade; e d) ajudar os alunos a melhorar as suas
capacidades de pensamento crítico, raciocínio lógico, resolução criativa de
problemas e, especialmente, tomada de decisão, relativamente ao ensino das
Ciências. O movimento CTS também é apoiado pelas ideias de Ziman (1984).
Segundo este autor, a compreensão da Ciência � e, consequentemente, a
literacia científica � só se alcança através da análise das suas diferentes
dimensões: histórica, filosófica, psicológica e sociológica. Se se pretende que os
alunos adquiram uma imagem real da Ciência torna-se importante que tomem
contacto com a influência e a interacção destas dimensões na construção do
conhecimento científico. Assim, a escola deve transmitir tanto conteúdos científicos
como metacientíficos, principalmente os conteúdos que abordam a sociologia da
Ciência nas suas dimensões interna (relações no interior da comunidade
académica) e externa (relações Ciência/Tecnologia/Sociedade). Este autor
13
considera, ainda, que a educação CTS permite desenvolver competências sócio-
afectivas normalmente excluídas dos programas de Ciências. Ziman (1980)
identifica diferentes formas de estudar a Ciência num contexto social, das quais
destaca: a) o estudo da relevância social das aplicações da Ciência; b) a
preparação profissional dos alunos através da análise dos aspectos sociais dos
seus empregos futuros; c) a abordagem interdisciplinar; d) a abordagem histórica
da evolução da Ciência; e) a abordagem filosófica da definição de Ciência; f) a
abordagem sociológica da construção da Ciência; e g) a abordagem através de
temas problemáticos que ilustrem o papel social da Ciência e o seu funcionamento
sob influências internas e externas. Este autor salienta o facto destas abordagens
não se excluirem mutuamente e poderem ser implementadas segundo práticas
pedagógicas distintas.
Aikenhead (1994), numa revisão da investigação realizada no âmbito do
movimento CTS, faz referência a um conjunto de estudos reveladores das
vantagens deste tipo de abordagem relativamente a um ensino das Ciências
tradicional:
• Yager, Blunck, Binadja, McComas & Penick (1988), num projecto de
quatro anos envolvendo 300 professores do 4º ao 9º ano, verificaram que
os alunos sujeitos a abordagens CTS ficam mais aptos a aplicar
informação a novas situações, a actuar independentemente e a tomar
decisões.
• Wiesenmayer e Rubba (1990), numa investigação sobre o impacto de
módulos de biologia segundo uma perspectiva CTS em alunos
americanos, detectaram benefícios em termos de: a) conhecimentos
sobre interacções entre Ciência, Tecnologia e Sociedade; b)
conhecimentos e capacidades necessárias à investigação de temas CTS;
e c) conhecimentos sobre acções de cidadania.
14
• Kelly (1991), ao comparar aulas tradicionais de Ciências com as aulas de
um curso de química (Chemical Education for Public Understanding
Project) centrado em questões sociais e destinado a alunos entre 11 e 15
anos, detecta vantagens significativas destas na compreensão do risco
de poluição química, da natureza da Ciência, de processos da Ciência e
de conceitos científicos.
Aikenhead refere, também, resultados positivos de abordagens CTS na
aplicação de conceitos científicos a novas situações (Varela, 1992), na resolução
de problemas (Pedersen, 1992), na estimulação da criatividade (Penick, 1992), na
análise de argumentos (Thomas, 1985) e na promoção da responsabilidade social
dos alunos (Ramsay, 1993; Rubba, 1987). No entanto, este autor considera que os
alunos só beneficiam com o estudo das Ciências segundo uma abordagem CTS
quando: a) a orientação do professor relativamente ao ensino das Ciências está
em sintonia com a abordagem CTS utilizada; b) o ensino CTS está
significativamente integrado na disciplina de Ciências; e c) existem materiais
adequados disponíveis.
2.2 Ensinar a Pensar
Nos últimos anos generalizou-se a noção de que as capacidades de
pensamento dos alunos são inadequadas às exigências da nossa Sociedade.
Professores de todos os níveis de ensino acusam, por vezes, os seus alunos de
pensarem deficientemente. Simultaneamente, tem-se apelado a uma instrução
adequada e explícita do pensamento e de atitudes e valores como forma de
resolver este problema. Em resposta a este apelo foram propostos vários
programas e vários instrumentos com o objectivo explícito de ensinar a pensar:
15
cresce a ideia de uma escola menos centrada na transmissão de informação e
mais preocupada com o desenvolvimento do aluno. No entanto, as opiniões quanto
à necessidade de tais programas, aos métodos utilizados e aos resultados da sua
aplicação variam consideravelmente. As opiniões divergem, logo à partida, na
definição de pensamento e na possibilidade de se ensinar a pensar: Existirão tipos
de pensamento diferentes? Será o pensamento constituído por processos distintos,
resultantes de funções mentais ou actividades cerebrais distintas passíveis de
serem melhoradas/desenvolvidas?
As opiniões de Smith e de de Bono, que a seguir se apresentam, constituem
bons exemplos de posições diferentes relativamente à possibilidade de se
desenvolver o pensamento através da utilização de métodos orientadores da
atenção para determinados tipos de raciocínio e da criação e treino de padrões
mentais de rotina mais eficazes do que os naturais.
2.2.1 Será necessário ensinar a pensar?
2.2.1.1 Posição de Smith
Para Smith (1990) o pensamento é complexo, multifacetado e maior do que
a soma de eventuais partes constituintes; logo, é impossível separá-lo em parcelas
(como, por exemplo, a memória, a compreensão, a aprendizagem ou o raciocínio)
ou em etapas com sentido. Segundo este autor, o termo pensar deveria ser
relegado para a mesma categoria do termo coisa que é útil mas genérico e
impreciso. Smith, numa lista, por ele considerada breve e incompleta, enumera 76
verbos relacionados com pensamento: na sua opinião, a ideia comum de que estas
palavras correspondem a funções mentais ou actividades cerebrais distintas é
responsável pelo aparecimento de teorias complexas sobre o pensamento e o seu
ensino explícito. No entanto, acredita que todos estes termos são apenas palavras
16
sem correspondência com processos cerebrais ou capacidades específicas: �a sua
relevância é semântica, não psicológica� (p. 25).
Segundo Smith, todo e qualquer indivíduo nasce capaz de pensar e de
aprender, logo �ninguém tem que aprender a pensar� (p. 194) e �tudo aquilo que o
cérebro faz é do domínio do pensamento, mesmo aquelas coisas que são feitas
inconscientemente, habitualmente ou instintivamente� (p. 26). O pensamento de
todos os dias � por ele denominado pensamento comum � é continuamente
complexo e extremamente capaz, não constituindo uma actividade mental
ocasional e intencional mas algo sempre a acontecer e de que, frequentemente,
não se tem consciência. Tomam-se decisões, resolvem-se problemas e
raciocina-se constantemente; contudo, só se toma consciência de tais actividades
quando se depara com uma dificuldade específica.
Para este autor, o pensamento de qualquer indivíduo é prioritariamente
determinado por factores motivacionais e de personalidade e não por capacidades
intelectuais específicas. Para Smith, �pensar não consta de uma série de
capacidades adquiridas, é antes uma questão de experiência, de compreensão das
exigências e das convenções relativas a questões específicas� (p. 58). Assim,
qualquer pensamento deficiente resulta principalmente da nossa experiência, de
valores ou de disposições particulares e não da ausência de algo essencial na
nossa capacidade de pensar. Smith vê a experiência como o envolvimento numa
actividade e não como uma repetição projectada de aspectos de um todo. �O
pensamento não é uma série abstracta de regras que podem ser aplicadas em
qualquer situação. Em vez disso, pensar é sempre acerca de qualquer coisa, e tem
sempre uma finalidade. Se não compreendemos aquilo sobre o que estamos a
tentar pensar, então parecemos não saber pensar� (p. 164). Este autor acredita
que não existem capacidades gerais de tomada de decisão, de resolução de
problemas ou de raciocínio. Na sua opinião, decidir, resolver problemas ou
raciocinar dependem das circunstâncias, ou seja, da experiência relativamente a
17
cada questão ou situação; não existem técnicas aplicáveis a todas as situações.
Para Smith, a qualidade do pensamento depende da �ampla compreensão do
sujeito que pensa sobre as questões que estão a ser pensadas, a disposição para
pensar sobre estas questões e a autoridade para o fazer� (p. 193). Assim, o
pensamento depende mais da experiência do que da instrução e é mais uma
questão de preferência do que de capacidade. Sem experiência não existe
familiaridade com o assunto em questão, nem a consequente confiança que
determina a disposição e a autoridade para pensar sobre o assunto. A disposição
ou a falta de disposição para pensar sobre determinado assunto depende do
interesse que temos nele e do facto de o sentirmos ou não dentro do âmbito das
nossas competências. O direito de pensar e de exprimir pensamentos individuais
não é reconhecido/sentido por todos de igual maneira; depende das pessoas à
nossa volta, da forma como nos tratam e do nosso consequente autoconceito.
Logo, �o desenvolvimento da forma como pensamos é afectado pelo modo como
vemos o comportamento das pessoas à nossa volta, e pelo papel que vemos
ser-nos reservado nas suas actividades� (p. 194). Tornamo-nos sujeitos pensantes
quando temos oportunidade e razão para pensar; quando estamos rodeados de
pessoas que pensam; e quando promovem o nosso pensamento admitindo e
estimulando a nossa participação em argumentações, desafios e debates
baseados no respeito, e não no poder ou na exploração. Segundo Smith, só se
consegue promover o pensamento num ambiente de interesse e de respeito. O
interesse garante o envolvimento no pensamento e na aprendizagem: quando não
existe interesse, quando os assuntos são aborrecidos, pensamos noutros
assuntos, ou seja, distraímo-nos. O facto de estarmos interessados não garante a
eficácia do pensamento mas motiva-nos para nos juntarmos e aprendermos com
pessoas envolvidas em actividades que nos interessam. O respeito pelas opiniões
e pelos sentimentos dos alunos revela-se decisivo no reconhecimento do direito de
pensar e de exprimir pensamentos individuais.
18
2.2.1.2 Posição de de Bono
De Bono (1995), considera o pensamento como �uma capacidade que pode
ser aprendida, praticada e apreciada� (p. 303). Define pensar como �a capacidade
operativa com a qual a inteligência actua sobre a experiência� (p. 14). Vê a
inteligência como um potencial e o pensar como a capacidade de utilizar este
potencial. Logo, para utilizar plenamente este potencial, precisamos de
desenvolver as capacidades do pensamento. Segundo este autor, existem dois
estádios no pensamento: percepção e análise (de Bono, 1976, 1985). O
pensamento pouco eficaz resulta fundamentalmente de erros de percepção que
impedem uma análise baseada em toda a informação relevante onde, por vezes,
são negligenciados aspectos decisivos de uma situação. O maior inimigo do
pensamento é a complexidade porque conduz à confusão e aos erros de
percepção. Quando pensamos, tentamos fazer demasiado ao mesmo tempo:
emoções, informação, lógica, expectativas, valores e criatividade misturam-se
dificultando o nosso pensamento. Assim, a qualidade do pensamento poderá ser
melhorada através da utilização de instrumentos e de estruturas orientadoras da
atenção para determinados tipos de raciocínio e da criação e treino de padrões
mentais de rotina mais eficazes do que os naturais (de Bono, 1976, 1985, 1995). A
prática explícita, formal e deliberada destes instrumentos, em situações e assuntos
da vida real não contemplados pelas disciplinas convencionais, permite a
aquisição do que de Bono denomina �operacia�, ou seja, capacidades de �fazer�.
Para este autor, a operacia alcança-se através do treino do pensamento em
aspectos como: diferentes pontos de vista, prioridades, objectivos, alternativas,
consequências, cálculos, decisões, resolução de conflitos, criatividade e muitos
outros aspectos que ele considera não serem, normalmente, abrangidos pelo tipo
de pensamento usado na análise de informação. De Bono, partindo do pressuposto
que o raciocínio mais eficaz é executado de forma compartimentada, defende um
19
ensino explícito do pensamento centrado na prática/aplicação de instrumentos
simples capazes de orientarem a atenção para vários tipos de raciocínio, ajudando
a reduzir a confusão no raciocínio e a disciplinar o pensamento.
O Programa de Pensamento CoRT (Cognitive Research Trust) e o método
�Os Seis Chapéus do Raciocínio� são algumas das criações de de Bono,
conhecidas e utilizadas por escolas e empresas de todo o mundo. Ambas se
baseiam no treino de instrumentos simples destinados a aumentar a eficácia do
pensamento através da orientação da atenção para vários tipos de raciocínio. São
várias as instituições criadas por de Bono com a finalidade de preparar formadores
para a aplicação dos seus métodos.
O Programa CoRT, dividido em seis secções de dez lições cada, envolve
grupos de quatro ou cinco alunos na resolução de problemas ou na exploração de
ideias através da utilização dos instrumentos ou técnicas de pensamento
propostos. Este programa possui quatro níveis de objectivos (de Bono, 1983, p.
117):
1. Criar uma área curricular destinada ao desenvolvimento explícito das
capacidades de pensamento.
2. Desenvolver nos alunos a ideia de que o pensamento é uma capacidade
passível de ser melhorada através da atenção, da aprendizagem e da
prática.
3. Desenvolver nos alunos uma auto-imagem de pensadores.
4. Criar condições para que os alunos adquiram um conjunto de
instrumentos de pensamento transferíveis, passíveis de serem aplicados
a outras situações.
O método �Os Seis Chapéus do Raciocínio� (de Bono, 1985, 1995) foi
concebido, também, como um instrumento de orientação da atenção, para vários
tipos de raciocínio, que ajuda a reduzir a confusão no raciocínio e a disciplinar o
pensamento. Este método parte do pressuposto que o raciocínio mais eficaz é
20
executado por sectores, ou seja, de forma compartimentada. A sua designação foi
inspirada na associação inglesa entre chapéu e raciocínio, no facto dos chapéus
poderem definir o papel que um indivíduo desempenha num momento específico e,
ainda, no facto de se colocarem e retirarem facilmente. Os seis chapéus têm cores
diferentes, correspondentes a diferentes tipos de raciocínio, e podem ser utilizados
isoladamente ou segundo uma sequência pré-determinada. A utilização isolada e
ocasional dos chapéus permite a realização de um tipo particular de raciocínio ou
sugere uma alteração de pensamento. A utilização de uma sequência de chapéus
pré-determinada permite uma exploração mais rápida e eficaz de um assunto
revelando-se útil quando existe uma discussão ou um desentendimento sobre uma
questão.
De Bono (1995) defende a aplicação de cada método, ou instrumento, a
muitos temas como forma de desenvolver a capacidade das pessoas os utilizarem.
Aponta a motivação como o ponto chave dos seus métodos, razão pela qual as
actividades propostas são divertidas e especulativas. Considera, ainda, que a
melhor forma de assegurar a transferência para qualquer situação, dos
instrumentos de pensamento propostos, consiste no seu treino fora das disciplinas
tradicionais e dos seus conteúdos específicos.
Actualmente, são muitos os países que utilizam o Programa CoRT nas suas
escolas e muitas as empresas que o adaptam para a formação dos seus
funcionários. Contudo, tanto Resnick (1990) como MacLure (1991) referem que,
apesar das opiniões favoráveis dos professores e dos alunos envolvidos neste
programa, não existem estudos conclusivos sobre os seus alegados efeitos
positivos. Segundo estes investigadores, as avaliações realizadas têm sido
marcadas por resultados contraditórios e por limitações metodológicas.
Algumas investigações citadas por de Bono (1976) sugerem que o
Programa CoRT conduz a um aumento do número de ideias produzidas pelos
alunos. No entanto, estas investigações, baseadas na contagem das ideias
21
produzidas por alunos sujeitos ao programa e por grupos de controlo, apresentam
problemas relativamente às dimensões das amostras e à equivalência dos grupos
utilizados (Edwards, 1991a).
Os resultados de um estudo realizado por Tripp (1979) parecem indicar que
o programa CoRT ajuda crianças com dificuldades de aprendizagem a produzirem
ideias, proporcionando-lhes confiança para pensar. Todavia, o próprio autor
sugere que estas melhorias poderão resultar de interacções e de aprendizagens
efectuadas entre os alunos durante as discussões e não da aprendizagem de
capacidades de pensamento.
Uma das avaliações mais pormenorizadas do programa CoRT envolveu
alunos e professores de dez escolas primárias inglesas durante dois anos (Hunter-
Grundin, 1985). Neste estudo, alguns especialistas do CoRT foram incumbidos de
formar os professores participantes e de seleccionarem um conjunto de 22 lições
do programa que foi, posteriormente, aplicado aos alunos durante um ano. Como
instrumentos de avaliação foram utilizados: um teste de compreensão de leitura,
um teste de cálculo mental, um teste de raciocínio lógico, um teste de criatividade
sobre as utilizações possíveis de um tijolo ou de um pau-de-fósforo, duas
composições escritas (usadas como pré e pós-teste), gravações das discussões
em grupo e entrevistas a alunos, professores e pais. Os resultados dos testes não
evidenciaram qualquer melhoria na rapidez ou na qualidade do pensamento dos
grupos experimentais. A análise qualitativa dos dados revelou: a) um entusiasmo
inicial dos professores participantes, seguido de um desencanto progressivo no
decorrer do estudo; b) uma avaliação positiva do programa pelos alunos; e c)
poucas evidências de transferência de aprendizagem observadas por professores
e pais.
Mais recentemente, Edwards e Baldauf (1987) e Edwards (1991b) foram
responsáveis por uma série de investigações pormenorizadas sobre os efeitos do
Programa CoRT em alunos do 7º ano com idades rondando os 12 anos. Estas
22
investigações implicaram a aplicação das dez lições da primeira secção do
programa (CoRT-1 � secção destinada ao desenvolvimento de sete capacidades
específicas de pensamento), cada uma das quais com uma duração aproximada de
45 minutos. No primeiro estudo (Edwards e Baldauf, 1987), 67 alunos completaram
a secção CoRT-1 em quatro semanas e realizaram vários testes estandartizados
antes e depois do programa. Foram também efectuadas entrevistas aos alunos e
aos seus pais. O segundo estudo (Edwards, 1991b) envolveu 202 alunos de duas
escolas: um grupo experimental constituído por 115 alunos divididos por quatro
turmas (duas em cada escola) e um grupo de controlo de 87 alunos distribuídos
por três turmas (uma numa escola e duas na outra). Neste caso, o CoRT-1 foi
aplicado em cinco semanas e os alunos foram testados antes e após
(imediatamente após e quatro semanas depois) a realização do programa. Ambas
as investigações revelaram atitudes positivas dos alunos relativamente ao
programa e ao seu efeito na capacidade de pensar e melhorias estatisticamente
significativas na aptidão escolar � medida pelo teste School Ability Test de
Otis-Lennon � e na flexibilidade e na originalidade de pensamento � medidas
pelo Teste de Pensamento Criativo de Torrance.
No que respeita à investigação das alegadas potencialidades do método
�Os Seis Chapéus do Raciocínio� não foi possível localizar qualquer referência. No
entanto, as semelhanças entre este método e os instrumentos do Programa CoRT,
em termos dos seus objectivos e da sua aplicação, são grandes e evidentes.
23
2.3 Actividades de Discussão na Sala de Aula � Importância da Interacção na Construção do Conhecimento
2.3.1 Actividades de discussão na sala de aula � definição, potencialidades e
dificuldades
A discussão como método de ensino-aprendizagem consiste num processo
em que um pequeno grupo se junta para comunicar entre si � falando, ouvindo ou
através de processos não verbais � com a finalidade de alcançar objectivos de
ensino-aprendizagem (Gall in International Encyclopedia of Education, 1985). O
facto da discussão decorrer em grupos, podendo envolver duas a dez pessoas,
implica que a aprendizagem de cada aluno seja afectada pelo comportamento e
pelas influências dos restantes membros. A escolha da discussão como veículo de
aprendizagem reflecte, de forma explícita ou implícita, concepções sobre a
natureza do conhecimento, a evolução da compreensão e a importância da
autonomia intelectual e da colaboração social, bem como valores políticos
relacionados com a construção de uma Sociedade democrática (Cowie & Rudduck
in Handbook of Educational Ideas and Practices, 1990). Segundo Barbosa (1995),
numa época em que grande parte do tempo dos jovens é passado diante da
televisão e/ou do computador, a grande vantagem da escola poderá encontrar-se
nas interacções e no convívio que permite. Essa vantagem comparativa poderá ser
rentabilizada se for aproveitada para �provocar confronto de ideias e de
sentimentos, troca de pontos de vista e resolução de problemas em comum�
(Barbosa, p. 7). Para esta autora, a comunicação entre os alunos, o intercâmbio de
conhecimento e a reflexão entre grupos constituem o terreno de eleição da
aprendizagem. Bridges (1979) aponta como condições necessárias ao
envolvimento em actividades de discussão a existência de mais de um ponto de
24
vista, a predisposição dos participantes para analisar os diferentes pontos de vista
e a intenção de aprofundar conhecimentos e compreensão sobre o assunto em
discussão. Para Stenhouse (1970), as potencialidades da discussão resultam do
facto de permitirem aos intervenientes discernir a partir da interacção de diferentes
perspectivas e da análise crítica dos vários testemunhos. Solomon (1991)
considera que os métodos de aprendizagem centrados na discussão requerem
uma participação real e genuína dos alunos, a qual envolve a partilha de
experiências pessoais e de dúvidas e incertezas sobre novos conhecimentos,
apoiada num ambiente de confiança. Segundo esta autora, são estas
características que tornam este tipo de actividade de tal forma significativo e
memorável que, mesmo passadas duas ou mais semanas, os alunos são capazes
de relatar opiniões complexas discutidas em grupo (Solomon, 1991, 1992). Estas
afirmações baseiam-se num estudo efectuado com alunos de 17 anos que
frequentavam cursos de Ciência, Tecnologia e Sociedade em 14 escolas Inglesas
(Solomon, 1992). Foram analisados dados resultantes de interacção social
(gravações audio) obtidos durante a discussão, em pequeno-grupo, de assuntos
controversos apresentados aos alunos através de programas de televisão. No final,
verificou-se que a utilização repetida de actividades de discussão em
pequeno-grupo contribui positivamente para os processos de argumentação e de
reflexão e constitui uma experiência agradável e significativa em termos de
aprendizagem.
Cowie e Rudduck (1990) referindo-se às actividades de discussão
realizadas no ensino secundário, distribuem-nas por três grandes categorias:
discussão de assuntos controversos, resolução de problemas e representação de
papéis (role playing). Todas elas têm em comum o facto de promoverem
aprendizagens através da expressão e exploração de ideias, opiniões e vivências,
num ambiente de cooperação onde a discussão não é encarada como �combate
verbal�; não se trata de ganhar uma argumentação, mas de mobilizar os recursos
25
de todo o grupo com o objectivo de aumentar o conhecimento e a compreensão de
um dado assunto ou de resolver um problema. No entanto, apesar de todos os
dados de investigação que evidenciam as potencialidades da discussão na
aquisição de conhecimentos, na modificação de atitudes, no desenvolvimento
moral, na resolução de problemas e no desenvolvimento de capacidades de
comunicação, este tipo de actividade não tem sido incorporado facilmente na
prática lectiva (Gall em The International Encyclopedia of Education, 1985; Van
Rooy, 1993). São vários os factores que preocupam os professores: a limitação
imposta pelo tempo disponível e pelas rubricas programáticas, a dificuldade em
definir e seleccionar os critérios de avaliação, a dimensão média das turmas, a
inadequação dos espaços, a falta de confiança e de preparação para a
organização/gestão de discussões, a perda parcial da autoridade e do controlo
sobre o processo de ensino-aprendizagem e alguns preconceitos sobre o que é
considerado trabalho na sala de aula. A impossibilidade de preverem
antecipadamente o ritmo/evolução da actividade e a eventual falta de controlo e de
disciplina durante a discussão ameaçam os professores; normalmente, estes
acreditam que a sua eficiência é julgada pela capacidade de manterem um
ambiente de ensino calmo e ordeiro. Segundo Rudduck (1979, 1986) e Lusk e
Weinberg (1994), são também vários os problemas sentidos ou evidenciados pelos
alunos durante a realização de actividades de discussão: a excessiva dependência
relativamente ao professor, o controlo da discussão por poucos alunos, a
relutância em valorizar as opiniões dos colegas, o individualismo, a
competitividade extrema e impeditiva de um ambiente de cooperação e de partilha,
a interpretação das opiniões divergentes dos colegas como ataques pessoais, a
defesa acérrima e intransigente de opiniões com a consequente divisão do grupo
em facções e a polarização das opiniões entre rapazes e raparigas. É difícil
realizar-se uma actividade de discussão numa escola onde os alunos têm medo de
falar livremente, não são tolerantes relativamente a opiniões diferentes das suas,
26
não são sensíveis à razão, à evidência e aos argumentos, e onde os professores
não valorizam as opiniões dos alunos (Bridges, 1979). Muitos destes problemas só
serão ultrapassados quando esta metodologia deixar de ser estranha para todos
os envolvidos (professores e alunos). Rudduck (1986) refere sentir dificuldade em
transmitir os princípios duma aprendizagem centrada na discussão aos alunos
habituados às regras de um ensino expositivo; alunos que têm interiorizada uma
concepção de ensino pouco activa, muitas vezes limitada à recepção passiva de
informação debitada pelo professor, poderão resistir e funcionar como forças de
bloqueio a metodologias novas e desconcertantes que não tenham sido
previamente bem explicadas e fundamentadas. Segundo esta autora, novos
métodos e concepções de ensino-aprendizagem, que impliquem cortes profundos
com hábitos e valores enraízados, só serão possíveis se professores e alunos
exorcisarem o espírito de práticas anteriores. �Os alunos e os professores devem
aprender a não ter receio de (...) desafiar as asserções dos outros, e de verem, por
sua vez, as suas próprias ideias postas em causa. O oposto é a tirania e a
estultificação� (Smith, 1990, p. 72).
2.3.2 A discussão de assuntos controversos
�Um assunto é definido como controverso se as pessoas se encontram
divididas sobre ele e se envolve juízos de valor que impossibilitam a sua resolução
apenas através da análise das evidências ou da experiência� (Rudduck, 1986). Um
assunto controverso não pode ser resolvido apenas recorrendo a factos, dados
empíricos ou vivências na medida em que envolve tanto factos como questões de
valor. Gardner (1983) acrescenta que um assunto só poderá ser classificado de
controverso se for considerado importante por um número considerável de
pessoas. Estas definições, apesar de discutíveis, visto não englobarem,
nomeadamente, questões científicas ou matemáticas polémicas mas meramente
27
factuais, como as apontadas por Dearden (1981) (por exemplo, o comportamento
corpuscular ou ondulatório da luz), são consideradas por Wellington (1986) como
um bom critério para a selecção de assuntos controversos dignos de serem
incluídos no currículo escolar.
São várias as razões que levam diversos autores a defenderem a inclusão
de actividades de discussão de assuntos controversos nos currículos. O confronto
destes temas constitui um processo conducente à formulação e à
avaliação/reformulação de opiniões e de crenças, constituindo um elemento
essencial na educação moral e na educação para a cidadania (Harrison, 1993). A
discussão de assuntos controversos ajuda os alunos a compreenderem as
situações sociais, os actos humanos e as questões de valores controversas por
eles levantadas. Para Dearden (1981), uma abordagem completa de qualquer
disciplina passa pela referência aos seus elementos controversos. A título de
exemplo, aponta a não inclusão destes elementos nos currículos de Ciências como
responsável pela transmissão de ideias distorcidas sobre a Ciência,
frequentemente descrita como não controversa, neutra, desinteressada, altruísta.
No entanto, estas actividades justificam-se tanto pelos conteúdos como pelas
capacidades que promovem. A pesquisa de informação, a detecção de
incoerências, a avaliação da idoneidade das fontes, a comunicação de informação
recolhida e/ou de pontos de vista, a fundamentação de opiniões, o poder de
argumentação e o trabalho cooperativo constituem exemplos de capacidades que
podem ser desenvolvidas através da discussão de assuntos controversos
(Stradling, Noctor e Bains, 1984). Rudduck (1986) acredita que a exploração activa
desta metodologia pode ajudar a desenvolver o pensamento crítico e a
independência intelectual. Com esta finalidade, defende que os alunos devem ser
ajudados a encarar a controvérsia convictos do seu direito de formular opiniões e
de tomar decisões e não na expectativa de que qualquer autoridade possa decidir
e resolver em seu lugar. No entanto, professores e alunos tendem a acreditar em
28
�respostas certas� e a perpetuar uma imagem do especialista como detentor do
saber, de factos e de certezas, e não como utilizador do conhecimento na
exploração da dúvida e da incerteza. Para Rudduck, esta imagem, associada a
currículos extensos e pouco flexíveis e à dificuldade dos alunos transitarem de um
�raciocínio dualista� � segundo o qual existe sempre uma resposta certa ou errada
para qualquer pergunta � para um �raciocínio relativista contextual� � que admite
a validade de interpretações diferentes de uma mesma realidade � têm dificultado
a promoção do pensamento crítico e da independência intelectual. Considera,
mesmo, que os alunos aos 14 anos já desenvolveram �uma incapacidade treinada�
para pensarem independentemente. Neste contexto, qualquer tentativa de
alteração da mentalidade dos alunos só será possível através de uma alteração da
mentalidade dos professores que se reflicta numa mudança das práticas e do
papel do professor na sala de aula. Assim, importa refletir sobre a estratégia a
adoptar e o papel a desempenhar de forma a promover, através da discussão de
assuntos controversos, o desenvolvimento da independência de pensamento.
As implicações éticas e morais dos avanços tecnológicos e científicos na
área da Biotecnologia constituem temas óptimos para discussões alargadas a toda
a turma. Frequentemente, a Ciência é apresentada aos alunos como a solução dos
problemas mundiais; algo destituído de dúvidas e de problemas. O ensino das
Ciências raramente conduz os alunos à exploração das limitações da Ciência ou a
uma análise crítica das suas implicações sociais, económicas e éticas. Através da
discussão de assuntos controversos podemos proporcionar aos alunos uma
imagem mais realista da Ciência. Stenhouse (1970) propõe uma estratégia,
centrada na discussão de assuntos controversos, na qual o professor assume o
papel de dinamizador e garante uma posição de neutralidade, não revelando
opiniões pessoais que possam ser assumidas pelos alunos como �correctas�.
Segundo este autor, um dinamizador de discussões com sucesso: a) lança
perguntas e coloca problemas; b) pede ou efectua esclarecimentos; c) mantém o
29
ritmo e o interesse da discussão; d) ajuda os grupos a utilizarem e a potenciarem
as ideias uns dos outros; e) ajuda os grupos a definirem prioridades durante a
discussão; f) faz pontos da situação; e g) promove a reflexão e a auto-crítica
através de perguntas precisas. Com o objectivo de ajudar os professores a
melhorarem o seu desempenho como dinamizadores, sugere a gravação das
discussões e a sua posterior análise. Para tal, aponta um conjunto de tópicos
desde a causa, a frequência e a forma de possíveis interrupções do discurso dos
alunos até à equidade no seu tratamento.
Existem outras abordagens dos assuntos controversos, como as propostas
por Rudduck (1986) e por Henderson e Knutton (1990), que se caracterizam não
só pela defesa da discussão e da neutralidade do professor/dinamizador mas
também pela importância que atribuem à disponibilidade de informação.
Consideram que a adequação da discussão, como metodologia de exploração de
assuntos controversos, resulta do facto de permitir uma maior compreensão dos
temas através da exploração combinada de diferentes perspectivas construídas a
partir do exame crítico da informação disponível. Henderson (1987) refere existirem
evidências de que os alunos consideram estes debates extremamente estimulantes
e úteis. Henderson e Knutton acreditam, também, que a discussão em grupo de
assuntos controversos em Ciências permite desenvolver competências como a
construção de hipóteses, a previsão, a recolha e a análise de dados, a
fundamentação de opiniões, a comunicação e a cooperação. Estes autores
atribuem um papel crucial à informação; sem ela os alunos limitam-se a discutir as
suas perspectivas, frequentemente limitadas. Segundo Rudduck, a disponibilidade
de informação adequada e diversificada impede simples �explorações conjuntas de
ignorância�, ajudando os alunos a considerarem, explorarem e aprofundarem
perspectivas e vivências de outros membros da Sociedade expressas, por
exemplo, em programas de televisão, entrevistas, colóquios, trechos de livros,
jornais, revistas, fotografias, reproduções de quadros, poemas e dados estatísticos.
30
Henderson e Knutton referem que a informação escrita pode constituir um
obstáculo para os alunos com dificuldades de leitura. No entanto, defendem que as
competências de leitura se desenvolvem e se aperfeiçoam com o envolvimento dos
alunos nos temas em discussão. Nas abordagens dos autores referidos a
neutralidade do professor é considerada fundamental; um professor que reconhece
aos seus alunos o direito de formarem as suas próprias opiniões deve optar pela
neutralidade durante as discussões. A actuação do professor como um árbitro que
assegura a exploração adequada do tema e a equidade durante a discussão
constitui uma forma de acentuar o seu empenho na educação e não nos seus
pontos de vista. Algumas investigações realizadas por Rudduck (1986) revelam
que este comportamento do professor o torna mais compreensivo aos olhos dos
alunos; muitas vezes, estes consideram, pela primeira vez, que o professor lhes dá
tempo para pensar e ouve as suas opiniões. Tanto para Rudduck como para
Henderson e Knutton:
1. os valores fundamentais da educação devem constituir os princípios de
todo o processo que propõem;
2. o ensino deve renunciar à autoridade do professor como �especialista�
capaz de resolver questões de valores;
3. a estratégia de ensino deve manter a autoridade do professor na sala de
aula segundo regras justificadas pela necessidade de um ambiente de
responsabilidade, sensibilidade e rigor sempre que se deseja promover a
compreensão dos alunos;
4. o professor deve tomar precauções de forma a evitar a utilização da sua
autoridade na doutrinação das suas ideias nos alunos;
5. o processo deve ajudar os alunos a compreenderem como pessoas
diferentes podem aprender construtivamente em conjunto através da discussão e
da partilha e que as opiniões minoritárias também merecem ser examinadas
criticamente, em vez de ignoradas ou ridicularizadas;
31
6. as finalidades do processo devem ser a compreensão da origem e das
implicações das suas opiniões, a preparação para a reconsideração com base em
novas informações ou vivências e a promoção da responsabilidade pelas suas
opções.
Outras abordagens semelhantes para a discussão e a tomada de decisões
sobre assuntos controversos � mais concretamente sobre dilemas éticos na área
da Biologia � são sugeridas por Barman e Cooney (1986) e DeDecker (1986,
1987). Estes autores defendem o envolvimento activo dos alunos em assuntos que
requerem a resolução de problemas morais como forma de promover a progressão
do raciocínio moral. Segundo eles, este tipo de interacção obriga os indivíduos a
repensarem as suas posições sobre determinado assunto moral e pode levar à
modificação do raciocínio original através da descoberta de eventuais
inconsistências lógicas. Ambas as propostas pretendem: a) apresentar
informações objectivas e precisas sobre determinados temas; b) proporcionar
oportunidades para os alunos discutirem livremente as questões éticas associadas
a esses temas; e c) fornecer aos alunos um modelo de tomada de decisões que os
ajude a efectuar escolhas pessoais através da clarificação dos seus valores e da
avaliação das consequências das suas opções. Ambas as propostas implicam uma
estratégia faseada que visa: a) a motivação e a sensibilização dos alunos para o
assunto em análise; b) a identificação dos valores individuais dos alunos; c) a
partilha e análise em grupo dos valores individuais na tentativa de se alcançar
consenso; e d) a aplicação dos valores num processo de tomada de decisões com
base num procedimento que envolve a definição do problema, a definição de linhas
de acção possíveis, a explicitação de prós e contras de cada uma, a selecção da
linha de acção cujas vantagens ultrapassam as desvantagens, a indicação do grau
de confiança de cada aluno na linha de acção seleccionada e a análise das suas
consequências. A actuação do professor é considerada decisiva nas duas
estratégias; o professor não deverá criticar as respostas dos alunos na medida em
32
que se pretende uma exploração livre, sem temores, dos sentimentos dos
participantes. DeDecker salienta, ainda, a importância dos alunos compreenderem
que os seus valores e as suas decisões podem modificar-se ao longo das suas
vidas de acordo com as suas vivências; as decisões tomadas durante estas
actividades não constituem compromissos para toda a vida.
Nos programas de Ciências Naturais existem temas de grande actualidade e
interesse, geradores de reflexão e de debate, capazes de contribuirem, de forma
inigualável, para a aquisição e desenvolvimento dos objectivos atrás referidos
(Ministério da Educação, 1991, a, b, c, d). Temas como a Genética e a
Biotecnologia revelam-se extremamente úteis na construção e desenvolvimento de
um novo estilo de ensino pautado pela reflexão e pela avaliação crítica do impacto
dos vários conteúdos científicos na Sociedade.
2.3.3 A interacção na construção do conhecimento
São numerosos os professores e os investigadores que têm realçado, desde
há vários anos, a importância do trabalho de grupo e das interacções aluno-aluno
na sala de aula. Gartner, Kohler e Riessman (1971) e Allen (1976), por exemplo,
referem a importância do �ensino mútuo� em crianças com dificuldades: o facto de
poderem actuar como tutoras de outras crianças revela-se extremamente
gratificante e benéfico em termos sócio-afectivos. Mais recentemente, vários
psicólogos sociais, nomeadamente os seguidores de Carl Rogers, demonstraram o
valor das interacções em grupo na terapia e, especialmente, no desenvolvimento
da personalidade. No entanto, até alguns anos atrás e salvo raras excepções, o
interesse pelo trabalho de grupo centrava-se nas suas potencialidades como
prática educativa promotora do desenvolvimento sócio-afectivo individual
(Perret-Clermont, 1992): era dada pouca atenção ao eventual papel do trabalho de
grupo e da interacção social no desenvolvimento cognitivo. Geralmente, tanto o
33
trabalho intelectual como o desenvolvimento cognitivo eram vistos como
actividades e processos individuais, motivados ou apoiados por factores sociais
e/ou afectivos, mas com uma estrutura e uma dinâmica independentes destes.
A partir da década de 70, várias investigações na área da Psicologia em
geral, e da Psicologia Social em particular, centraram-se no estudo das eventuais
potencialidades da interacção entre pares no desenvolvimento cognitivo dos
indivíduos. Deste conjunto, assumem especial relevo os trabalhos sobre a
construção social da inteligência (Doise, Mugny e Perret-Clermon, 1975, 1976;
Gilly, Fraisse e Roux, 1988; Perret-Clermont e Nicolet, 1988; Perret-Clermont,
Perret e Bell, 1991; César, 1994) e os trabalhos sobre as potencialidades da
aprendizagem cooperativa (Aronson, Blaney, Stephan, Sikes e Snapp, 1978;
Sharan e Hertz-Lazarowitz, 1980; Damon e Phelps, 1989; Johnson e Johnson,
1989; Slavin ,1980, 1984, 1990).
2.3.3.1 A construção social da inteligência
Para Doise, Mugny e Perret-Clermont os factores psicossociais
desempenham um papel decisivo no desenvolvimento sócio-cognitivo, na
apropriação dos saberes e na aquisição e desenvolvimento de competências. Para
estes investigadores, que estiveram na origem da psicologia social da transmissão
do conhecimento, a chave deste progresso reside na ocorrência de conflitos
sócio-cognitivos entre os elementos do grupo de trabalho, ou seja, no confronto
interpessoal e intrapessoal de ideias diferentes (Doise, Mugny e Perret-Clermont,
1975; Mugny e Doise, 1978; Perret-Clermont, 1979). A existência de perspectivas
diferentes entre os participantes traduz-se no aparecimento de respostas
diferentes, o que desencadeia um desequilíbrio duplo: um desequilíbrio
interpessoal momentâneo pelo facto das respostas apresentadas serem diferentes
e um desequilíbrio intrapessoal pela tomada de consciência individual da
34
existência de outras respostas, o que suscita dúvidas sobre a sua própria resposta.
Para ultrapassarem este impasse as crianças têm que, simultaneamente, analisar
os pontos de vista discordantes � o que implica a existência de noções mínimas
sobre a problemática em questão � e gerir as relações interpessoais dentro do
grupo com o objectivo de chegarem a acordo. O conceito de conflito
sócio-cognitivo resulta duma concepção epistemológica construtivista e
interaccionista do desenvolvimento (Perret-Clermont, 1976/78; Doise e Mugny,
1981): implica que o sujeito construa os seus instrumentos cognitivos a partir da
acumulação e interiorização de experiências e progrida intelectualmente através
de interacções com os objectos e com outros indivíduos.
Os primeiros trabalhos destes autores foram realizados em situação
laboratorial e utilizavam como instrumentos provas piagetianas. Durante estas
experiências, as crianças eram convidadas a realizar individualmente uma tarefa
supostamente difícil para o seu nível etário, mas não inacessível. Geralmente, esta
tarefa � pré-teste � era realizada numa divisão próxima da sala de aula com a
presença do experimentador e de um anotador. O desempenho nesta tarefa inicial
fornecia informação relativa ao desenvolvimento cognitivo de cada criança e ao
domínio de determinadas operações intelectuais em jogo. Posteriormente, as
mesmas crianças eram agrupadas em conjuntos de duas ou três com o objectivo
de realizarem colectivamente uma nova tarefa envolvendo o mesmo tipo de
dificuldades cognitivas. Finalmente, vários dias depois, era aplicada novamente a
tarefa individual inicial � como pós-teste � a cada uma das crianças. A
comparação do pré e do pós-teste permite verificar o progresso resultante da
actividade conjunta. No entanto, as circunstâncias experimentais em que estes
estudos foram realizados � amostras muito reduzidas, utilização quase exclusiva
de tarefas piagetianas, crianças muito novas � tornam difícil a generalização e a
aplicação prática dos seus resultados a situações de sala de aula (Gilly, 1985;
Sánchez, 1989). Assim, numa fase posterior, com o reconhecimento da
35
necessidade de se contextualizarem mais as investigações e de se recorrer a
actividades relacionadas com as temáticas abordadas pelos currículos escolares,
foram realizadas investigações em contexto real de sala de aula.
Os estudos realizados em contexto laboratorial permitiram verificar a
importância dos processos interaccionais e do conflito sócio-cognitivo no
desenvolvimento de estratégias de resolução de tarefas bem determinadas �
conservação de quantidades e representação de relações espaciais (Doise, Mugny
e Perret-Clermont, 1975; Doise e Mugny, 1981; Perret-Clermont e
Schubauer-Leoni, 1981; Perret-Clermont e Mugny, 1985; Perret-Clermont e Nicolet,
1988). Estes trabalhos revelaram progressos significativos por parte de crianças
que tinham tido a oportunidade de interagir com colegas quando comparadas com
crianças de grupos de controlo. Variações sistemáticas na composição do grupo
experimental permitiram verificar que o número de participantes envolvidos na
actividade colectiva � dois ou três � não determina directamente o progresso
cognitivo e que este não pode ser explicado apenas pela imitação da resposta de
um colega (Perret-Clermont, Perret e Bell, 1991). De facto, uma comparação
pormenorizada dos diferentes argumentos apresentados durante a actividade
colectiva de discussão com os argumentos utilizados nos pós-testes individuais
permitiu constatar que estes últimos não se limitam a uma mera imitação dos
primeiros. Os argumentos apresentados no pós-teste pelas crianças que
progrediram para o estádio de conservação eram diferentes e cognitivamente
superiores aos apresentados pelos seus colegas durante o trabalho de grupo.
Estas crianças não se limitaram a repetir uma resposta rígida ou a imitar um
colega; produziram um raciocínio novo e defenderam-no com argumentos
(Perret-Clermont, Perret e Bell). Nestes mesmos estudos, a interacção revelou-se
um factor de progresso, tanto para as crianças que interagiram com colegas
cognitivamente mais competentes como para as que interagiram com colegas com
um desenvolvimento cognitivo não superior ao seu. No entanto, na opinião destes
36
investigadores, o progresso cognitivo só é possível através do confronto de pelo
menos duas respostas diferentes, ou seja, através do conflito sócio-cognitivo
(Perret-Clermont, Perret e Bell). Segundo os resultados obtidos, tanto o confronto
com uma resposta incorrecta como o confronto de duas respostas incorrectas
podem constituir fonte de progresso.
Uma posição ligeiramente diferente é defendida por Lumpe e Staver (1995)
no seguimento duma investigação sobre o desenvolvimento de conceitos
científicos relacionados com a fotossíntese em contexto de sala de aula. Na sua
opinião, tanto a interacção discordante como a interacção concordante entre pares
facilitam o desenvolvimento de conceitos. A investigação envolveu 28 alunos de
Biologia do ensino secundário, dos quais 21 foram distribuídos por grupos
heterogéneos de três elementos e 7 trabalharam individualmente. Tantos as
tríades como os alunos em trabalho individual realizaram as mesmas actividades
práticas e responderam às mesmas perguntas. Todas as interacções
professor-aluno e aluno-aluno (entre os que trabalhavam em grupo) foram
gravadas em audio. As concepções dos alunos foram avaliadas antes, durante e
após a realização das actividades através de um teste com perguntas de resposta
aberta. A análise qualitativa e quantitativa dos dados revelou que os alunos em
trabalho de grupo desenvolviam mais conceitos científicos correctos que os alunos
em trabalho individual. Segundo um estudo de caso efectuado com os dados
provenientes de um dos grupos, o desenvolvimento de conceitos parece aumentar
em consequência da interacção entre pares � tanto discordante como
concordante.
Outros estudos realizados em contexto real de sala de aula, com actividades
adaptadas às temáticas curriculares, revelaram vantagens � em termos de
desempenho � do trabalho em díades relativamente ao trabalho individual.
Algumas destas investigações evidenciaram a importância de factores de tipo
psico-social no desempenho dos adolescentes; o contexto em que se realiza a
37
tarefa, o tipo de tarefa ou de estratégia que se propõe influenciam
significativamente os resultados dos alunos (Carraher, Carraher e Schliemann,
1989; César, 1994; Perret-Clermont e Nicolet, 1988). Verificou-se que as respostas
dadas pelos sujeitos em contexto escolar diferiam das respostas dadas noutros
contextos. Sempre que os alunos viam as actividades propostas como uma tarefa
escolar organizavam-se de forma a que o elemento com estatuto escolar mais
elevado as realizasse o mais rápida e eficazmente possível. Parece que o seu
único objectivo consistia em despacharem-se depressa. No entanto, quando estes
mesmos adolescentes eram convidados a resolver tarefas pouco habituais,
capazes de espicaçarem a sua curiosidade, os confrontos sócio-cognitivos entre
todos os elementos do grupo aumentavam significativamente. Assim, torna-se
necessário construir actividades mais lúdicas que sejam, simultaneamente, pouco
habituais em contexto de sala de aula e capazes de envolverem os conteúdos e as
competências abordados nesse contexto. Este tipo de actividades, realizadas em
díade, revela-se mais eficaz em termos de desempenho e de progresso cognitivo
do que as tarefas tradicionais (César, 1994; Perret-Clermont e Nicolet, 1988).
Perret-Clermont (1992) considera que o desafio educacional consiste em conceber
actividades capazes de motivar os alunos e em encontrar formas de organizar o
trabalho escolar que estimulem o confronto sócio-cognitivo.
2.3.3.2 A aprendizagem cooperativa
O movimento da aprendizagem cooperativa surgiu como parte integrante de
um processo com o objectivo duplo de facilitar relações positivas entre etnias e de
aumentar o desempenho académico e as competências sociais dos alunos das
escolas secundárias (Aronson, Stephan, Sikes, Blaney e Snapp, 1978; Sharan e
Hertz-Lazarowitz, 1980; Slavin, 1980). Desde então, os métodos de aprendizagem
cooperativa foram adoptados por professores de todos os níveis de ensino
38
(Lazarowitz, Hertz-Lazarowitz e Baird, 1994). Estes métodos, em contexto de sala
de aula, envolvem a realização conjunta de tarefas por grupos de alunos com
constituição heterogénea relativamente ao desempenho académico, género, etnia,
idade, atitude relativamente ao assunto em estudo e capacidade de liderança dos
seus elementos (Lazarowitz, Hertz-Lazarowitz e Baird, 1994; Watson e Marshall,
1995). Geralmente, as tarefas propostas são estruturadas de forma a
proporcionarem atribuições específicas e contribuições individuais de cada
membro do grupo. No entanto, cada membro é responsável não só pela sua
aprendizagem individual mas também por ajudar os seus colegas a aprender.
Pretende-se que os alunos progridam cognitiva e socialmente através da
clarificação dos seus conhecimentos e da partilha das suas ideias num ambiente
de interacção dentro do grupo (Deutsch, 1949). De todos os métodos cooperativos
mais utilizados destacam-se:
1. O Jigsaw (Aronson, 1978), utilizado com material narrativo, durante o qual
cada membro do grupo fica responsável pela aprendizagem de uma parte
específica de determinado tópico juntamente com representantes dos restantes
grupos. Posteriormente, cada um dos �peritos� apresenta a sua parte do tópico ao
seu grupo de origem. A avaliação final é individual e abrange todas as partes do
tópico em estudo.
2. As investigações em grupo (Sharan e Sharan, 1984), centradas no
desenvolvimento de competências de pensamento como a análise e a avaliação,
através da realização de projectos colectivos. Neste método não existe divisão de
tarefas dentro do grupo; todos os membros trabalham em conjunto. Segundo
Phelps e Damon (1989) a colaboração entre pares constitui uma estratégia útil no
ensino de conceitos cognitivamente complexos.
3. A utilização de grupos constituídos por alunos com diferentes níveis de
desempenho no estudo de assuntos previamente apresentados pelo professor.
Conjuntos de 4 ou 5 alunos procuram que cada um dos seus elementos atinja o
39
maior nível de desempenho possível. De seguida, cada aluno é testado
individualmente. Não existe divisão de tarefas e a avaliação do grupo é feita com
base no progresso alcançado por cada um dos seus membros relativamente a
registos anteriores.
Os métodos cooperativos podem ser particularmente interessantes para as
aulas de Ciências: o seu teor prático/experimental, com as consequentes
limitações de material, e o facto da Ciência ser actualmente entendida como um
empreendimento colectivo fazem com que as aulas em grupo sejam frequentes
(Johnson, Johnson, Scott e Ramolae, 1985). Ao longo dos anos, várias
investigações revelaram alguma eficácia da aprendizagem cooperativa no aumento
do desempenho académico e no desenvolvimento de competências cognitivas e
sociais. No entanto, a heterogeneidade dos grupos nem sempre se tem revelado
decisiva na obtenção destes resultados.
Num estudo realizado por Humphreys, Johnson e Johnson (1982), o
desempenho dos alunos em aprendizagem cooperativa revelou-se
significativamente superior ao dos restantes. Esta investigação envolveu
professores de Ciências na aplicação de três métodos de aprendizagem �
cooperativo, competitivo e individual � a um grupo de alunos do 9º ano (n=44).
Tingle e Good (1990) utilizaram grupos heterogéneos de alunos do ensino
secundário (n=178) para investigarem o efeito do trabalho cooperativo sobre a
capacidade de resolução de problemas nas aulas de Química. Apesar de não
terem detectado diferenças significativas entre as capacidades desenvolvidas com
essa metodologia e as resultantes do trabalho individual, verificaram que o método
cooperativo, além de ter sido bastante apreciado tanto por professores como por
alunos, tinha desenvolvido capacidades de organização e gestão de trabalho.
Também Lazarowitz, Hertz-Lazarowitz e Baird (1994) obtiveram resultados
significativamente diferentes entre os métodos de aprendizagem cooperativa e
individual. A investigação implicou a aplicação das duas metodologias no ensino
40
de uma unidade temática de Ciências da Terra sobre as vantagens e as
desvantagens da produção de energia artificial. Várias turmas do ensino
secundário (11º e 12º anos, n=120) foram distribuídas aleatoriamente por dois
grupos: 73 alunos estudaram cooperativamente em conjuntos de 5 elementos
segundo o método Jigsaw (grupo experimental); 47 alunos estudaram
individualmente (grupo de controlo). Todas as turmas tiveram 4 horas de aula nas
quais utilizaram os mesmos jogos e actividades (filmes, observações, projectos e
actividades experimentais). No entanto, a forma como os jogos e as actividades
foram utilizadas pelos dois grupos variou consideravelmente. A utilização do
método Jigsaw pelo grupo experimental implicou que cada membro apresentasse
aos colegas do seu conjunto as leituras, investigações e aprendizagens
previamente efectuadas pelo conjunto de �peritos�. Durante esta apresentação, os
alunos eram convidados a discutirem e a clarificarem conceitos dentro do grupo e
com o professor. Quando os alunos se sentiam convenientemente preparados
eram avaliados individualmente. A utilização do método individual implicou a
realização dos jogos e das actividades divididas em unidades e sob a forma de
tarefas individuais. O papel do professor consistiu em apoiar e encorajar o trabalho
individual. Cabia ao aluno decidir a altura em que queria ser avaliado relativamente
a cada unidade. No final verificou-se que os alunos do grupo experimental tiveram
desempenhos académicos significativamente superiores aos do grupo de controlo.
Os alunos que trabalharam cooperativamente também obtiveram valores
significativamente superiores de auto-estima, número de amigos criados e
envolvimento na turma.
Apesar da heterogeneidade dos grupos constituir um elemento de quase
todos os métodos de aprendizagem cooperativa (Slavin, 1980), os resultados de
investigação não são unânimes no reconhecimento das potencialidades deste tipo
de agrupamento (Watson e Marshall, 1995). Okebukola e Ogunniyi (1984), num
estudo que envolveu 1025 alunos de Ciências, efectuaram comparações entre o
41
desempenho dos alunos em grupos de aprendizagem heterogéneos e em grupos
homogéneos constituídos por alunos com níveis de competência altos, médios e
baixos. Os melhores desempenhos ocorreram dentro dos grupos homogéneos com
nível de competência alto seguidos, sequencialmente, pelos grupos heterogéneos,
homogéneos com nível de competência médio e homogéneos com nível de
competência baixo. Hooper e Hannafin (1988) verificaram que a utilização de
grupos heterogéneos era benéfica em alunos com níveis de competência baixo e
prejudicial em alunos com níveis de competência alto. Noutro estudo, os mesmos
autores constataram que o nível de interacção mais baixo ocorre entre os alunos
dos grupos homogéneos com nível de competência baixo (Hooper e Hannafin,
1991). Tal facto apoia as afirmações de Webb e Lewis (1988, citado em Watson e
Marshall, 1995) que atribuem a eficácia da aprendizagem cooperativa ao tipo e à
frequência da interacção entre os elementos do grupo. Mais recentemente, Watson
e Marshall (1995) obtiveram resultados de investigação um pouco diferentes num
estudo realizado com 109 alunos universitários que frequentavam uma cadeira de
Ciências da Vida. Estes alunos, após terem sido ordenados de acordo com o
resultado obtido num pré-teste, foram distribuídos por grupos de 3 ou 4 elementos.
Formaram-se: a) grupos heterogéneos constituídos por um aluno com desempenho
alto, outro com desempenho baixo e os restantes com desempenho médio; e b)
grupos homogéneos de desempenho alto, médio e baixo. Tanto o método de
aprendizagem cooperativa (baseado no jigsaw) como os materiais utilizados por
cada grupo eram iguais. Embora não se tenham registado diferenças significativas
no desempenho entre os grupos, a quantidade de interacções foi
significativamente superior nos grupos heterogéneos.
Apesar da falta de unanimidade entre os investigadores relativamente à
importância (1) do conflito sócio-cognitivo � entendido como confronto de ideias
diferentes � no desenvolvimento cognitivo e (2) da heterogeneidade dos grupos
na rentabilização dos trabalhos cooperativos, os resultados de investigação
42
parecem apoiar a importância do trabalho de grupo e da interacção social no
desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos indivíduos. No entanto, como
trabalho de grupo não é sinónimo de interacção, torna-se necessário orientá-lo
com instruções claras, geri-lo com regras de trabalho bem definidas e centrá-lo em
actividades motivadoras da acção e estimuladoras da interacção.
43
CAPÍTULO 3 METODOLOGIA
A metodologia foi definida com base nos objectivos do estudo, tendo-se
recorrido a ferramentas metodológicas capazes de proporcionarem a observação e
o registo dos aspectos em análise. Assim, foram observadas, registadas e
analisadas as reacções e as opiniões dos professores e dos alunos relativamente
às actividades de discussão propostas e às eventuais vantagens e desvantagens
do tema e do método utilizados. O facto deste estudo recorrer ao ambiente natural
de sala de aula como fonte directa de dados e de se centrar mais no processo do
que nos produtos sugere, segundo Ludke e André (1986), uma abordagem
essencialmente qualitativa.
3.1 Objecto de Estudo
O presente trabalho pretende identificar indícios das potencialidades de um
conjunto de actividades de discussão em grupo, centradas nas vantagens e
desvantagens dos novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia, na
educação para uma cidadania moderna e democrática baseada na compreensão
de questões sociais, económicas e tecnológicas da Sociedade actual e na
promoção do pensamento. Considerando o método �Os Seis Chapéus do
Raciocínio� proposto por de Bono (1985, 1995) e descrito em 3.5, propõe-se a
44
alunos e a professores pensar e discutir sobre: a) alguns dos grandes dilemas
bioéticos da Sociedade actual; b) a eventual utilidade da discussão de tais temas;
e c) as potencialidades da utilização de tal método em actividades deste tipo. Este
trabalho consiste, assim, numa tarefa de pensamento sobre o pensamento de
alguns alunos e respectivos professores.
Na concepção das actividades seleccionaram-se conteúdos relacionados
com unidades curriculares. A realização das actividades de uma forma diferente
das tradicionalmente propostas pelos professores baseou-se nas opiniões e nos
resultados de investigação, focados no capítulo anterior, que realçam o papel
positivo do trabalho de grupo, da interacção entre pares e da discussão de temas
controversos no desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo. O teor controverso
dos temas e a metodologia utilizada procuram, respectivamente, suscitar e
rentabilizar a discussão.
3.2 Abordagem Seleccionada
Muitas das investigações em educação revelam pouco sobre a
aprendizagem em contexto natural. Na maior parte destas investigações, os alunos
funcionam apenas como objectos de estudo, não tendo qualquer outra
possibilidade de contribuir para os resultados finais construídos pelo investigador.
Por vezes, são ignoradas as opiniões de professores e alunos sobre as actividades
realizadas ou a metodologia utilizada. No entanto, torna-se importante que
professores e alunos, como parte interessada no processo de
ensino-aprendizagem, contribuam com as suas opiniões e avaliações para a
investigação em educação e, consequentemente, para o desenvolvimento de
novas metodologias. A transformação do sistema de ensino só tem sentido quando
resulta de uma reflexão conjunta, dos vários intervenientes, em contexto escolar.
45
Considerou-se importante efectuar este estudo em contexto escolar real:
parte-se do princípio que a sala de aula constitui o local por excelência para
avaliação de qualquer material didáctico. Utilizou-se uma metodologia
interpretativa que parte das reais opiniões dos professores e dos alunos com o
objectivo de perceber a forma como eles reagem a determinadas experiências e
como as interpretam. Pretende-se construir conhecimento relativamente às
potencialidades das actividades de discussão propostas na construção e
compreensão de conhecimentos e na promoção do pensamento de um grupo
específico de alunos. Assim, esta investigação fornecerá mais linhas de acção do
que teorias de longo alcance e mais informações contextualizadas do que
generalizações. A eventual aplicação/generalização dos resultados obtidos a
outras situações ficará a cargo dos leitores (Merriam, 1988).
Recorreu-se a diferentes fontes de informação e a múltiplos métodos de
recolha de dados, tendo em vista um processo de triangulação que, segundo
vários autores (Denzin, 1970; Cohen & Manion, 1980; Goetz & LeCompte, 1984;
Merriam, 1988; Yin, 1989; Morse, 1994), constitui uma forma de assegurar uma
elevada validade interna. A combinação de informações resultantes de fontes e
métodos distintos contribui para uma representação mais rica da situação em
estudo. �As falhas de um método são frequentemente os pontos fortes de outro, e
pela combinação de métodos, os observadores podem alcançar o melhor de cada
um e ultrapassar as respectivas deficiências� (Denzin, 1970, p. 308). Com o
objectivo de assegurar uma boa fidelidade, entre as considerações finais e as
opiniões reais dos alunos e dos professores participantes, apresentam-se diversas
citações.
Como instrumentos de investigação conceberam-se e utilizaram-se
questionários dirigidos aos alunos e efectuaram-se observações directas das aulas
e entrevistas semi-estruturadas aos professores participantes. Todas as
entrevistas foram realizadas pelo investigador e gravadas em audio. Este registo
46
permitiu o acesso posterior à totalidade do discurso e não apenas a notas
parcelares manuscritas. A transcrição integral das entrevistas feita pelo
investigador foi sujeita a análise de conteúdo visando uma análise qualitativa mais
pormenorizada.
Recorreu-se à entrevista com o intuito de perceber a perspectiva dos
professores participantes quanto às potencialidades do tema e da metodologia das
actividades desenvolvidas. O seu objectivo principal consistiu na recolha de
opiniões na linguagem do próprio sujeito permitindo ao investigador o
desenvolvimento intuitivo de uma ideia sobre a avaliação que os sujeitos fazem
das actividades executadas durante as aulas. A entrevista semi-estruturada
caracteriza-se pela utilização de um guião suficientemente flexível para permitir ao
entrevistador a recolha de dados relativos a dimensões inesperadas do tópico em
estudo (Bogdan & Biklen, 1994). Com o guião utilizado neste estudo (Anexo 1)
procurou-se garantir que os diversos entrevistados respondessem às mesmas
questões sem, no entanto, exigir uma ordem rígida nas questões. Logo, a sua
grande utilidade resultou do facto de optimizar o tempo disponível permitindo
recolher dados que, apesar de provenientes de vários sujeitos, foram susceptíveis
de uma comparação relativamente fácil.
Os questionários constituem um registo em primeira mão das opiniões
individuais dos vários alunos participantes no estudo evitando-se, assim,
interpretações ou distorções efectuadas pelo investigador. Neste estudo foram
utilizados dois questionários: um, com questões de resposta aberta, destinado a
captar toda a riqueza e pormenor das opiniões dos alunos relativamente à
metodologia e ao tema das actividades realizadas (Anexo 2); outro, constituído por
itens de resposta fechada, destinado a quantificar eventuais variações de opinião
resultantes das actividades de discussão (Anexo 3). Neste último, os alunos
utilizaram uma escala � �concordo totalmente�, �concordo�, �não tenho a certeza�,
�discordo� e �discordo totalmente� � para indicarem a sua opinião relativamente a
47
um conjunto de afirmações. Este questionário foi aplicado antes e depois da
realização das actividades de discussão, tornando possível uma análise
comparativa das respostas e a consequente detecção de eventuais diferenças
entre as mesmas.
A observação proporciona acesso directo aos acontecimentos e às
interacções sociais que constituem o foco da investigação. Permitiu, assim, captar
aspectos como o ambiente de sala de aula e os comportamentos e os comentários
de alunos e professores durante a realização das actividades. Concebeu-se um
guião de observação (Anexo 4) para efectuar uma exploração mais eficaz da
observação e uma comparação mais facilitada dos dados obtidos. Durante o
estudo, o investigador assumiu o papel de observador directo não participante, não
intervindo nas interacções que se estabeleciam na sala de aula. Com este tipo de
observação procurou-se, simultaneamente, chegar perto da �perspectiva dos
sujeitos� e reduzir ao mínimo a influência do investigador nas interacções
estabelecidas durante as actividades de discussão.
Tanto as transcrições das entrevistas aos professores, como as respostas
dos alunos ao questionário de avaliação das actividades, foram submetidas a uma
análise de conteúdo com três níveis de categorias. Numa primeira fase, os dados
foram agrupados de acordo com cinco �Chapéus do Raciocínio�: Vermelho �
sentimentos e emoções; Amarelo � aspectos positivos; Preto � aspectos
negativos; Verde � sugestão de alterações; e Azul � avaliações globais. Numa
segunda fase, os comentários de professores e alunos, correspondentes a cada
um dos �chapéus�, foram divididos por duas sub-categorias consoante diziam
respeito ao tema ou à metodologia. Numa fase final, a leitura repetida do teor dos
comentários incluídos em cada uma das sub-categorias levou à criação de novas
sub-categorias de análise ainda mais específicas. A análise das respostas aos
questionários de avaliação das actividades foi completada com o cálculo da
48
percentagem de respostas por categoria, visando conhecer a percentagem de
alunos que efectuou cada um dos comentários.
Conforme estipulado previamente com o investigador, no início do estudo
cada professor: a) informou os seus alunos acerca dos objectivos e finalidades da
investigação; b) explicou a presença do investigador; e c) solicitou a cooperação e
o envolvimento de toda a turma, realçando a importância de estudos deste tipo na
melhoria das actividades didácticas. Todos os professores tiveram o cuidado de
não revelar opiniões pessoais relativamente a eventuais potencialidades tanto do
tema como da metodologia, de forma a não influenciarem as opiniões dos alunos.
3.3 Amostra
O estudo foi realizado em contexto real de sala de aula numa Escola
Secundária de Lisboa. As principais razões que levaram à selecção desta escola
foram as características da sua população estudantil: fundamentalmente, o seu
fraco desempenho académico e a sua falta de interesse relativamente às
actividades escolares. Outras razões secundárias da selecção desta escola foram:
a) o facto do Conselho Directivo e de alguns docentes apoiarem a realização de
estudos passíveis de contribuirem para o sucesso escolar dos alunos; e b) a
facilidade de acesso resultante da sua localização geográfica.
A escola seleccionada para o estudo funciona nas instalações actuais desde
1962. Apesar de estar bem equipada, o número de estudantes tem diminuído
acentuadamente desde a década de 70. Tal facto deve-se, provavelmente, à
construção de várias escolas na zona associada ao decréscimo da natalidade e ao
envelhecimento da população residente na freguesia.
Segundo dados recolhidos pelo Conselho Directivo, no ano lectivo de
1995/96, os seus alunos eram oriundos de várias freguesias de Lisboa e de outros
49
concelhos da periferia: pode-se mesmo afirmar que a escola �sobrevivia� graças
aos excedentes das escolas dos concelhos de Oeiras, Sintra, Loures, Cascais e
Amadora. Estes mesmos dados revelavam origens culturais bastante diversificadas
� 14% de Caboverdianos, 3% de Angolanos e 3% de alunos originários dos
restantes países de língua oficial portuguesa e de países da União Europeia � e
níveis sócio-culturais baixos patentes nas habilitações académicas das suas mães
� 13,5% não tinha a 4ª Classe ou não sabia ler nem escrever; 42,3% tinha apenas
o diploma da 4ª Classe; 10,0% possuía o 6º Ano; 17,2% possuía o 9º Ano de
escolaridade; e apenas 16,6% tinha estudado além do 9º ano. No ano lectivo de
1995/96, a percentagem de alunos reprovados nos 10º, 11º e 12º anos foi,
respectivamente de 41,2%, 16,0% e 17,0%. Nesse mesmo período, a percentagem
de alunos excluídos por faltas ou que anularam a matrícula foi de 19,9% no 10º
ano e de 4,8% no 11º ano (não existindo dados referentes ao 12º ano).
O corpo docente da escola era constituído por 142 professores do quadro e
por 82 professores provisórios. Alguns, em conversas informais, referiram que os
alunos não possuíam capacidades de pensamento, eram indisciplinados e
completamente desmotivados. Nesta escola, os problemas de indisciplina e os
conflitos entre alunos são frequentes: no ano lectivo de 1995/96 realizaram-se 15
conselhos disciplinares.
A selecção das turmas baseou-se em dois critérios:
1. Os professores manifestarem disponibilidade e vontade em participar no
estudo.
2. Os alunos frequentarem disciplinas do ensino secundário cujos
programas, na opinião dos seus professores, fossem compatíveis com o
tema das actividades de discussão.
Assim, a amostra foi constituída por 5 professores e 7 turmas � 3 de
Filosofia do 10º ano, 3 de Filosofia do 11º ano e 1 de Comunicação do 12º ano �
dos cursos gerais dos agrupamentos Científico-Natural e Humanidades e dos
50
cursos tecnológicos de Electrotecnia, Informática, Mecânica e Comunicação.
Destas turmas, 6 tinham tido disciplinas de Ciências Naturais até ao 8º ano de
escolaridade e apenas 1 possuía formação nesta área superior à proporcionada
pela escolaridade básica.
Apesar dos novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia fazerem
parte do programa de Ciências da Terra e da Vida do 11º ano, o único professor
que lecciona esta disciplina na escola manifestou não ter disponibilidade para
participar.
Os docentes envolvidos eram o António e o José � professores do quadro
com, respectivamente, 16 e 5 anos de serviço � a Filomena � professora
provisória com 5 anos de serviço � e a Clara e a Aida � duas professoras
estagiárias em início de carreira. O António era professor das turmas 11º 1 e 11º 3;
o José da 10º 2; a Filomena da 12º 1; a Clara das 10º 1 e 11º 2; e a Aida da 10º 3.
Na opinião destes professores, o fraco desempenho académico da maioria dos
seus alunos deve-se à falta de conhecimentos e de métodos de estudo, a
dificuldades de aprendizagem e de organização do pensamento e,
fundamentalmente, à falta de motivação relativamente às actividades escolares.
Tanto as designações das turmas (dentro de cada ano de escolaridade) como os
nomes dos professores foram alterados propositadamente. A garantia do
anonimato procurou facilitar uma maior abertura e autenticidade dos participantes.
3.4 Instrumentos
3.4.1 As actividades de discussão
As actividades de discussão em grupo foram concebidas pelo investigador,
durante os anos lectivos de 1993/94 e 1994/95, com vários objectivos:
51
1. Motivar a participação e o envolvimento dos alunos em actividades
escolares centradas em conteúdos de várias disciplinas do ensino
secundário;
2. Criar um ambiente de interacção na sala de aula capaz de promover:
a) a construção de conhecimentos científicos e meta-científicos sobre os
novos avanços na área da Biotecnologia e da Genética;
b) o desenvolvimento de competências cognitivas, tais como a recolha e
análise de informação, a formulação de juízos de valor, a argumentação,
a análise e a avaliação de argumentos, a tomada de decisões, a
organização e gestão de trabalho e de pensamento;
c) o desenvolvimento de competências sócio-afectivas, como a
cooperação, a auto-estima, o envolvimento na turma e nas actividades
escolares e a tolerância relativamente aos colegas e às suas diferentes
opiniões.
Considera-se que a actualidade, o interesse e a controvérsia do tema em
questão encerram a potencialidade de motivar os alunos e de desencadear
reflexão e debate. Temas como a Genética e a Biotecnologia revelam-se úteis num
novo estilo de ensino/aprendizagem centrado na interacção na sala de aula e
pautado pela reflexão e pela avaliação crítica das relações entre Ciência,
Tecnologia e Sociedade.
De um total de 20 actividades com temas diferentes, o conjunto dos
professores envolvidos no estudo seleccionou apenas 5 de acordo com critérios
pessoais relacionados com o seu eventual potencial em motivar os alunos e com a
relevância das mesmas para as disciplinas que leccionam. Cada actividade
implicava dois tempos lectivos: o primeiro ocupado com a discussão do tema pelos
diferentes grupos e o segundo destinado a uma discussão geral, de toda a turma,
gerida pelo professor. As 5 actividades foram integradas numa sequência
previamente definida de 11 aulas (Quadro 1) que incluía uma sessão inicial para a
52
introdução ao tema Ciência/Tecnologia/Sociedade, a distribuição de textos
informativos sobre cada um dos temas a discutir (Anexo 5), a apresentação dos
objectivos e da metodologia a utilizar e a formação dos grupos de alunos.
Quadro 1
Síntese da Sequência das Actividades 1ª Aula Introdução: Ciência/Tecnologia/Sociedade.
Textos informativos.
Objectivos e metodologia.
Formação dos grupos.
2ª e 3ª
Aulas
1ª Actividade.
Rastreio genético para efeitos de contratação de pessoal e de aquisição
de seguros de vida.
4ª e 5ª
Aulas
2ª Actividade.
Afirmação de Francis Crick sobre eugenia.
6ª e 7ª
Aulas
3ª Actividade.
Rastreio genético da fibrose quística.
8ª e 9ª
Aulas
4ª Actividade.
Diferentes aplicações da engenharia genética.
10ª e 11ª
Aulas
5ª Actividade.
Engenharia genética: previsão do futuro da espécie humana.
Previamente, foi definido que, durante as actividades, os professores não
deveriam revelar opiniões pessoais relativamente a eventuais potencialidades
tanto do tema como da metodologia. Os textos distribuídos forneciam informação
científica sobre cada um dos temas em análise e deveriam ser lidos
individualmente, em casa, pelos alunos. As actividades previstas podiam ser
realizadas intercaladamente com outras actividades de temáticas diferentes desde
que a conclusão de toda a sequência não excedesse um mês.
A discussão dos temas decorreu de acordo com o método �Os Seis
Chapéus do Raciocínio� proposto por de Bono (1985, 1995). O assunto de cada
uma das actividades foi discutido de acordo com uma sequência de �chapéus de
53
raciocínio� pré-determinada e adequada à exploração da situação em causa. Cada
chapéu podia ser utilizado durante um período máximo de 5 minutos. A sequência
de �chapéus� variou consoante o teor da tarefa proposta. Esta metodologia surge
como um instrumento de orientação da atenção para vários tipos de raciocínio,
ajudando a reduzir a confusão e a disciplinar o pensamento. A utilização d��Os Seis
Chapéus do Raciocínio�, além de constituir uma forma de rentabilizar/potenciar a
discussão em grupo, pretende fornecer aos alunos um modelo de tomada de
decisões capaz de os ajudar a efectuar escolhas pessoais através da análise das
situações, da clarificação dos seus valores e da avaliação das consequências das
suas opções.
Os alunos foram associados em grupos de 4 a 5 elementos, visando
estimular a interacção através do aumento das probabilidades de diversificação
dos pontos de vista e valores pessoais. Tal como acontece noutros contextos
diferentes do contexto escolar, os grupos foram formados pelos próprios alunos,
sendo notória uma heterogeneidade relativamente ao género e à etnia.
O papel do professor durante a realização das actividades consistiu em: a)
motivar e sensibilizar para o assunto em análise; b) dinamizar as sessões de
discussão alargadas a toda a turma; e c) envolver toda a turma no esclarecimento
de dúvidas apresentadas pelos grupos. Durante as sessões em pequeno grupo o
professor procurou manter o ritmo e o interesse da discussão sem revelar as suas
opiniões pessoais sobre o assunto. Apenas no final da sessão de discussão
alargada a toda a turma, o professor podia apresentar as suas opiniões caso
fossem solicitadas ou consideradas pertinentes. Com este comportamento,
pretendia-se não influenciar a evolução da discussão, evitando que as opiniões do
professor podessem ser interpretadas como as �opiniões correctas� ou as
�respostas pretendidas�.
54
3.4.1.1 Actividade 1
Tema
A actividade 1 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas resultantes da
análise do genoma humano e da eventual utilização das técnicas de rastreio
genético para efeitos de contratação de pessoal e de aquisição de seguros de
vida. Nesta actividade discute-se uma notícia publicada no jornal �Público�
segundo a qual �os testes genéticos realizados para efeitos de contratação de
pessoas e de seguros de vida e saúde deverão ser banidos em quase toda a
Europa dentro de alguns anos, nos termos de um tratado em preparação no âmbito
do Conselho da Europa�. Desde 1986 que se procede ao mapeamento e à
descodificação dos 50.000 a 100.000 genes existentes nos 46 cromossomas
humanos (genoma humano) através de um empreendimento internacional
gigantesco � Projecto Genoma Humano. Este projecto permitirá: a) identificar os
genes responsáveis por doenças humanas ou os genes que contribuem para o seu
aparecimento; b) diagnosticar a ocorrência de determinada enfermidade genética,
ou a simples predisposição, antes do nascimento ou antes do aparecimento de
sintomas; c) produzir proteínas humanas desconhecidas que possuam valor
médico; e d) conhecer melhor as bases bioquímicas de aspectos fisiológicos e
comportamentais da biologia humana (Brum, McKane & Karp, 1994). Contudo,
apesar dos seus benefícios inegáveis, este projecto suscita sérias preocupações
éticas relacionadas, principalmente, com a possível invasão da nossa privacidade
� através da revelação do património genético individual � e com a eventual
alteração futura dos genes humanos com objectivos pouco claros (Archer, 1992,
1996; Barbour, 1992; Brum, McKane & Karp, 1994; Grisolía, 1992; Draper, 1992,
1995; Nolan, 1995; Penslar, 1995).
Um dos primeiros resultados do Projecto Genoma Humano consistiu na
identificação e na clonagem dos genes responsáveis por várias doenças
55
hereditárias. Este resultado permite diagnosticar a ocorrência de determinada
enfermidade genética, ou a simples predisposição, antes da implantação do
embrião (diagnóstico pré-implantatório), antes do nascimento (diagnóstico
pré-natal) ou após o nascimento de um indivíduo (diagnóstico pré-sintomático). O
diagnóstico pré-sintomático permite prever, com várias dezenas de anos de
avanço, a manifestação de doenças que, por exemplo, só se revelam depois dos
40 ou 50 anos de idade. Os seus maiores problemas resultam da detecção da
presença ou da possibilidade de doenças para as quais não existe cura. Nestas
circunstâncias, algumas pessoas manifestam-se claramente contra a sua
utilização. Frequentemente os eventuais portadores de alterações genéticas, que
só se manifestam tardiamente, optam pela não realização dos testes. Actualmente
este tipo de diagnóstico permite deslocar o foco da medicina e dos serviços de
saúde do diagnóstico das doenças actuais dos indivíduos para a detecção da
predisposição de as desenvolver. Assim, corre-se o risco das pessoas que não
apresentam qualquer sintoma de doença poderem ser classificadas de deficientes
e discriminadas por companhias de seguros de vida. Potenciais empregadores
poderão recusar empregos a estes indivíduos por não quererem arriscar eventuais
despesas médicas nem quererem gastar tempo e dinheiro a treinar um empregado
com uma esperança de vida limitada. Actualmente, nos Estados Unidos, algumas
indústrias só admitem trabalhadores cujos testes genéticos não tenham detectado
susceptibilidades a determinadas substâncias químicas. O que antigamente era
considerado doença de trabalho resultante de más condições de trabalho passou a
ser considerado como susceptibilidade genética do trabalhador a substâncias
químicas (Draper, 1992; Kitcher, 1996). Assim, diminuem-se os dias de atestado
médico e os respectivos encargos sociais e aumenta-se a produtividade das
empresas. No entanto, corre-se o risco do alargamento da aplicação destes testes
a trabalhadores já efectivos que, no caso de resultados positivos, poderiam ter que
optar entre o despedimento ou o não recebimento de indemnização em caso de
56
doença. Todos estes problemas se agravam quando a análise genética não
consegue prever, com certeza absoluta, se determinado indivíduo irá desenvolver
determinada doença, o que acontece com doenças multifactoriais como o cancro,
as doenças cardíacas e a esquizofrenia, resultantes de uma intrincada interacção
entre genes e factores ambientais.
Sequência de Chapéus Utilizada
A sequência proposta para a reflexão e discussão do tema é constituída
pelos seguintes chapéus:
1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto;
2. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos da medida descrita
no artigo em discussão;
3. Chapéu preto - Para avaliar os pontos negativos da medida descrita; e
4. Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.
A utilização inicial do chapéu vermelho permite ao aluno avançar com um
palpite ou uma intuição sem necessidade de a apoiar ou justificar. Segundo de
Bono (1995), o raciocínio deve ser iniciado com o chapéu vermelho sempre que se
prevê a existência de um sentimento forte relativamente a um assunto de forma a
expor esses sentimentos.
Também se segue o conselho de de Bono (1995) relativamente à utilização
do chapéu amarelo antes do chapéu preto numa situação de avaliação. Na opinião
deste autor, é difícil ser-se positivo depois de se ter sido negativo.
57
3.4.1.2 Actividade 2
Tema
A actividade 2 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas resultantes da
eventual utilização de técnicas genéticas na selecção de características em seres
humanos. Nesta actividade discute-se uma afirmação de Francis Crick, Prémio
Nobel da Medicina pela descoberta da estrutura da molécula do ADN, segundo a
qual �nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido como ser humano antes de
ser aprovado em testes de dotação genética; os reprovados deveriam perder o
direito à vida� (Clarke, 1989).
As técnicas de diagnóstico genético ou de terapia génica podem ser
utilizadas, não só no diagnóstico ou no tratamento de genes causadores de
doenças graves mas também na selecção de características consideradas
desejáveis. Actualmente, a amniocentese, seguida da interrupção da gravidez, é
utilizada na selecção do sexo das crianças em países como a Índia e a China. A
fertilização in vitro permite a selecção e a implantação de embriões de determinado
sexo. A engenharia genética de melhoramento, através da introdução de
determinados genes em células, poderá acentuar características consideradas
desejáveis, tais como memória, estatura e resistência a substâncias tóxicas. Em
cada um destes casos, os pais poderão seleccionar as características dos seus
filhos, o que poderá ter consequências sociais desastrosas: algumas Sociedades
poderão pretender ter mais filhos do que filhas. A selecção de características
desejáveis poderá ainda ter como objectivo o melhoramento da Sociedade, ou seja,
a sua eugenia. Apesar de desacreditada por uma aplicação abusiva e criminosa
durante a Segunda Guerra Mundial, a eugenia deve ser submetida a uma
verdadeira análise crítica. Por enquanto, utiliza-se a eugenia na selecção artificial
de características favorecendo a reprodução dos indivíduos portadores de �genes
favoráveis� (a eugenia positiva; por exemplo, a criação do banco de esperma dos
58
Prémios Nobel dos EUA), ou afastando da reprodução os que possuem �genes
desfavoráveis� (a eugenia negativa; por exemplo, o aborto voluntário em caso de
doença do feto) (Buican, 1986). No entanto, futuramente, poderá proceder-se à
modificação deliberada do genoma humano por engenharia genética de
melhoramento. Apesar do melhoramento da espécie humana ser cientificamente
desejável, provocaria uma diminuição do polimorfismo genético � única garantia
de sobrevivência da nossa espécie em caso de alterações ambientais (Buican,
1986). Archer (1996) considera que os riscos da introdução de um gene estranho
serão, certamente, maiores do que os riscos resultantes duma �reposição da
normalidade� pela introdução de um gene por terapia génica. Este autor refere que
�a adição de um gene não planeado poderia desequilibrar o organismo e causar
mais inconvenientes do que benefícios� (p. 239). A diversidade humana poderia,
ainda, ser reduzida a um estereótipo transitório e perecível de beleza, inteligência
ou de saúde (Barbour, 1992; Buican, 1986). Quem teria a competência de
determinar os �defeitos� a serem corrigidos e as características a serem impostas
às futuras gerações?
Sequência de Chapéus Utilizada
A sequência de chapéus proposta para a reflexão e discussão do tema é
idêntica à utilizada na actividade anterior:
1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto;
2. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos da eventual
aplicação do teor da afirmação em discussão;
3. Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos da afirmação; e
4. Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.
Também nesta actividade se utilizam: a) o chapéu vermelho no início da
discussão; e b) o chapéu amarelo antes do chapéu preto para avaliação da
59
afirmação. As razões justificativas são idênticas às apresentadas para a actividade
1.
3.4.1.3 Actividade 3
Tema
A actividade 3 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas resultantes da
análise do genoma humano e da eventual utilização das técnicas de rastreio
genético no diagnóstico de determinada enfermidade genética, ou no cálculo das
probabilidades dos descendentes serem portadores dessa doença. Nesta
actividade os participantes são convidados a reflectirem e a discutirem o que
fariam caso descobrissem que possuiam, bem como a pessoa com quem
desejavam casar e ter filhos, uma alteração genética responsável pela fibrose
quística, o que implicaria uma probabilidade de 25% de terem filhos doentes.
Actualmente, existem testes capazes de diagnosticar várias doenças
genéticas como a fenilcetonuria, a fibrose quística e a doença de Huntington
(Brum, McKane & Karp, 1994). Os testes de diagnóstico genético da fibrose
quística permitem detectar 90% dos genes causadores desta doença hereditária
autossómica recessiva. Trata-se de uma doença que altera o transporte de cloro e,
consequentemente, o transporte de água dentro do organismo. Estas alterações
traduzem-se num espessamento das mucosidades e na sua acumulação nas vias
respiratórias, originando doenças pulmonares crónicas, incluindo infecções
potencialmente fatais (Solomon, Berg, Martin & Villee, 1993). Até há poucos anos,
os portadores dos dois genes autossómicos recessivos morriam por volta dos cinco
anos de idade; actualmente, a utilização de antibióticos e de certas terapias de
descongestionamento das vias respiratórias permite-lhes alcançar a vida adulta.
Estes testes de diagnóstico genético, apesar de serem considerados
verdadeiros "milagres" da medicina moderna, levantam várias questões éticas de
60
difícil resposta. No caso dos diagnósticos pré-implantatório ou pré-natal, por vezes,
os resultados positivos podem conduzir a terapias correctivas (fenilcetonuria, por
exemplo). Mas sempre que é detectada uma doença genética grave e incurável o
casal enfrenta a decisão difícil de um eventual aborto. Alguns decidem interromper
a gravidez por considerarem que, caso fosse levada a bom termo, se traduziria em
sofrimento para toda a família. Outros opõem-se terminantemente por motivos
religiosos ou motivos pessoais como, por exemplo, a esperança da futura
descoberta de cura. Outros, ainda, não são capazes de resistir ao mito do �filho
perfeito�, subtilmente difundido por uma Sociedade com todas as vantagens em
diminuir os recursos destinados à assistência a deficientes, acabando por aceitar,
sem ponderação, a interrupção voluntária da gravidez (Nunes, 1996). A
progressiva utilização dos diagnósticos pré-implantatório e pré-natal conduzirá,
forçosamente, à alteração da atitude da Sociedade relativamente ao deficiente. Os
poucos deficientes que escapem à interrupção voluntária da gravidez correrão o
risco de serem discriminados (Chadwick, 1992). Teme-se, inclusivamente, que o
próprio estado possa vir a limitar o acesso destes deficientes à segurança social,
obrigando os pais a sustentarem sozinhos o encargo pelo qual optaram
voluntariamente.
Sequência de Chapéus Utilizada
A sequência proposta para a reflexão e discussão do tema é constituída
pelos seguintes chapéus:
1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto;
2. Chapéu branco - Para recolher informação sobre o assunto;
3. Chapéu verde - Para desenvolver as alternativas mais capazes;
4. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada opção;
5. Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada opção;
61
6. Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões; e
7. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos perante a opção final.
As diferenças existentes entre esta sequência e as anteriores resultam do
facto das situações serem diferentes: nas actividades 1 e 2 reage-se a uma ideia;
nesta actividade procuram-se ideias alternativas. A utilização do chapéu branco
pretende envolver os alunos na recolha de informações sobre a doença em causa.
Para tal, os alunos podem recorrer a textos previamente distribuídos pelo
professor. A inclusão do chapéu verde destina-se a alargar o leque das opções ou
alternativas com base nas informações já recolhidas. De seguida, cada uma das
alternativas é avaliada pelos chapéus amarelo e preto. As razões que levam à
utilização do chapéu vermelho no início da actividade e à utilização do chapéu
amarelo antes do preto são idênticas às apontadas para as actividades 1 e 2.
3.4.1.4 Actividade 4
Tema
A actividade 4 (Anexo 6) centra-se nas questões éticas suscitadas pelas
diferentes aplicações da engenharia genética. Nesta actividade os participantes
são convidados a sugerirem possíveis aplicações desta Tecnologia na medicina,
na pecuária, na agricultura e nas indústrias alimentar e química e a discutirem os
aspectos positivos e negativos de cada uma dessas hipotéticas aplicações.
Sabe-se que os genes existentes nos cromossomas condicionam as
características de qualquer ser vivo. Estes genes são segmentos de ADN (ácido
desoxirribonucleico) responsáveis pela síntese de uma proteína ou cadeia
polipeptídica (Archer, 1996). Por sua vez, as proteínas dominam a estrutura e o
funcionamento dos organismos. Qualquer alteração na composição química de um
gene (mutação) provoca, geralmente, uma alteração na proteína respectiva que
poderá estar na base de determinada doença genética (Archer, 1996).
62
Actualmente, através da engenharia genética é possível introduzir e tornar
funcional, num ser vivo, um gene proveniente de outro ser vivo de uma espécie
diferente (Archer, 1992). Esta técnica permite criar microrganismos capazes de
sintetizarem proteínas com interesse comercial e alterar características de plantas
e de animais.
A introdução e consequente multiplicação de genes humanos em bactérias
ou leveduras permitiu, por exemplo, a produção em massa de insulina humana
desde 1982 e a produção da vacina da hepatite e da hormona de crescimento
desde 1986 (Barbour, 1992). Desta forma, obtêm-se estes produtos em
quantidades ilimitadas e, portanto, a custos mais reduzidos.
Actualmente, investiga-se activamente a produção de microrganismos, de
plantas e de animais com características particulares através de engenharia
genética. Booth (1996), Nossal & Coppel (1989), Spinney (1996) e Wheale &
McNally (1988) apresentam as seguintes potencialidades da investigação na área
da engenharia genética:
• O aumento da tolerância das plantas a altos teores de salinidade e a
temperaturas extremas de forma a permitir o seu desenvolvimento em novos
habitats;
• A obtenção de plantas resistentes a determinado herbicida que permitam a
eliminação das ervas daninhas sem afectar as colheitas;
• A introdução do gene da proteína tripsina � tóxico para os insectos e
inofensivo para as plantas e os seres humanos � em plantas com o objectivo de
as tornar resistentes a pragas;
• O aumento do teor nutritivo dos alimentos através da indução de
alterações na sua variedade de aminoácidos essenciais;
• A introdução de genes nas plantas responsáveis pela fixação do azoto
atmosférico � genes esses existentes em determinadas bactérias � com o
objectivo de diminuir a utilização de fertilizantes e aumentar as colheitas;
63
• A incorporação de genes de peixes de águas frias em tomate fresco de
forma a torná-lo mais resistente ao apodrecimento e à geada;
• A aceleração da taxa de crescimento de animais e a produção de mais
músculo e menos gordura por alteração genética;
• A produção de galinhas resistentes à salmonela com a finalidade de evitar
intoxicações alimentares;
• A introdução em vacas de genes responsáveis pela produção do leite
humano para ultrapassar o problema dos recém-nascidos que não toleram leite de
vaca; e
• A incorporação de vírus, alterados geneticamente, em plantas com o
objectivo de se produzirem frutos capazes de imunizarem os seus consumidores
contra doenças como a hepatite B.
Actualmente já é possível dispor de seres vivos e produtos derivados
alterados geneticamente. Archer (1996), Barbour (1992), Brum, McKane & Karp
(1994) e Booth (1996) apontam como exemplos:
• bactérias em morangos alteradas de forma a não funcionarem como
núcleos para a formação de cristais de gelo;
• microrganismos que facilitam a produção de combustíveis líquidos através
da fermentação de madeira e de palha;
• bactérias que aceleram a degradação de derrames de petróleo;
• tomate mais resistente ao apodrecimento devido à incorporação de um
gene retardador da acção de enzimas que destroem a pectina;
• micorganismos possuidores de enzimas muito activas capazes de
converter detritos celulósicos em produtos alimentares; e
• ratos portadores de genes humanos responsáveis por doenças destinados
ao desenvolvimento de medicamentos.
Apesar dos seus benefícios inegáveis, estas modificações genéticas
levantam sérias preocupações éticas relacionadas com eventuais impactos
64
negativos sobre o ambiente, a saúde pública e a Sociedade e os seus valores:
Quais são as consequências da libertação no ambiente de organismos
geneticamente alterados? Que critérios deverão ser adoptados de forma a evitar
desequilíbrios ambientais graves? Quais são os impactos destas inovações
tecnológicas sobre, por exemplo, os agricultores e o Terceiro Mundo? Será
moralmente aceitável a manipulação genética dos seres vivos?
Actualmente, sabe-se que o equilíbrio de qualquer ecossistema envolve
uma rede extremamente complexa e delicada de inter-relações entre os seres
vivos que o constituem e entre eles e o meio físico. A introdução no ambiente de
um ser vivo com alterações genéticas poderia provocar um desequilíbrio de
consequências catastróficas: se a alteração genética tivesse como consequências
uma total resistência aos seus predadores clássicos e/ou o aumento da taxa de
crescimento, a sua proliferação incontrolada seria um facto. Em 1975, na
Conferência de Asilomar, definiram-se normas rigorosas de confinamento, com o
objectivo de evitarem a libertação acidental de organismos manipulados
geneticamente e potencialmente perigosos (Berg, Baltimore, Brenner, Roblin III &
Singer, 1993). No entanto, o facto de não se ter registado qualquer acidente de
saúde nos diferentes laboratórios envolvidos neste tipo de investigação levou ao
abrandamento destas normas em 1979 (Barbour, 1992). A partir dos anos oitenta,
o debate centra-se na libertação deliberada de organismos modificados
geneticamente e na eventual transferência das suas alterações a outras espécies.
Teme-se, por exemplo, que a resistência induzida de uma espécie vegetal aos
herbicidas possa passar para as ervas daninhas, originando uma praga difícil de
controlar (Barbour, 1992). Foram publicadas recomendações internacionais
(OCDE, 1986) e legislações específicas nacionais sobre esta matéria. Em Portugal,
foi transposta uma Directiva da Comunidade Europeia, através do Decreto-Lei nº
126/93 de 20 de Abril (Ministério do Ambiente e Recursos Naturais, 1993) e
regulamentada pela Portaria nº 602/94 de 13 de Julho (Ministérios da Saúde e do
65
Ambiente e Recursos Naturais, 1994) que obriga os estados membros a criarem
uma autoridade nacional responsável pela avaliação/controlo das condições em
que decorrem os diferentes projectos de investigação nacionais. Estas funções
foram atribuídas à Direcção-Geral da Qualidade do Ambiente pertencente ao
Ministério do Ambiente e Recursos Naturais. Segundo Archer (1996), a decisão de
libertar organismos geneticamente modificados para o ambiente terá,
forçosamente, que passar por uma análise caso-a-caso, acompanhada pela
realização sequencial de testes de risco em laboratório, em estufa, numa área
limitada e, finalmente, em campo aberto.
Outras preocupações éticas despoletadas pela alteração genética de seres
vivos centram-se no impacto destas inovações tecnológicas sobre, por exemplo, os
agricultores e os �países em desenvolvimento�. A possibilidade das empresas
patentearem seres vivos alterados geneticamente, aliada ao facto de apenas um
reduzido número de grandes empresas conseguir dispôr dos recursos necessários
à investigação nesta área, terá como consequências a redução da competição
económica e o consequente aumento da especulação. O patenteamento de
sequências de informação genética levará à cobrança de licenças e de direitos de
utilização sempre que, de futuro, estes conhecimentos venham a ser utilizados. Os
pequenos agricultores e criadores de gado dificilmente poderão ter acesso a estas
inovações tecnológicas, o que diminuirá a competitividade das suas explorações
face às grandes empresas. Até que ponto será lícito as grandes empresas
patentearem seres vivos, passando a lucrar com bens anteriormente ao dispôr de
toda a humanidade? Os �países em desenvolvimento� serão grandemente
afectados em todo este processo pois dificilmente terão acesso aos frutos desta
Tecnologia de ponta. Os custos elevados e o facto da investigação nesta área se
destinar, maioritariamente, à obtenção de lucros fáceis através da resolução dos
problemas dos países com grande poder económico não o permitirão. �Todos os
avanços tecnológicos são objecto de um cuidado proteccionismo que impede os
66
países em desenvolvimento de usufruírem das grandes aquisições da Ciência�
(Pintassilgo, 1996, p. 129). Buttel (citado em Barbour, 1992) refere que a produção
de morangos resistentes à geada recebeu mais atenção do que os melhoramentos
em qualquer cultura de subsistência dos �países em desenvolvimento�. Então,
como se poderá aceitar a afirmação de que a alteração genética de plantas e de
animais poderá resolver o problema da fome no mundo? Será que este problema
não poderia já ter sido resolvido através de uma distribuição e de uma utilização
racional dos alimentos? Pintassilgo considera um imperativo ético �contribuir para
a total transparência da Ciência nos domínios que afectam as Biotecnologias,
criando uma maior circulação da informação e uma total reciprocidade de
benefícios entre países desenvolvidos e em desenvolvimento� (p. 129).
Outra questão ética centra-se no papel das espécies animais em todo este
processo. Será lícita a transferência de genes entre animais diferentes? Será lícito
introduzir em animais genes responsáveis por doenças humanas? É inegável que
muitos dos avanços na área da medicina só foram possíveis graças à
experimentação em animais. No entanto, a constatação de que a experimentação é
indispensável ao progresso médico não significa que, de um ponto de vista ético,
seja pacífica a aceitação de tal prática (Osswald, 1996). Singer (1993) defende que
tanto as relações entre os seres humanos como as relações entre o homem e os
animais se devem basear no princípio moral da igualdade. Considera que o facto
dos animais não pertencerem à nossa espécie não nos dá o direito de explorá-los
nem de fazê-los sofrer voluntária e deliberadamente. Por sua vez, Osswald afirma
que a experimentação em animais é inteiramente aceitável, do ponto de vista ético,
desde que se tratem os animais com respeito, não se façam experiências inúteis
ou supérfluas e se evite o sofrimento ou a dor através de anestesia ou analgesia.
67
Sequência de Chapéus Utilizada
A sequência proposta para a reflexão e discussão do tema da actividade 4 é
constituída pelos seguintes chapéus:
1. Chapéu branco - Para recolher informação sobre o assunto;
2. Chapéu verde - Para obter o maior número de aplicações da engenharia
genática;
3. Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada uma das
aplicações sugeridas;
4. Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada uma das
aplicações sugeridas; e
5. Chapéu vermelho - Para recolher os sentimentos finais sobre o assunto.
A utilização do chapéu branco pretende envolver os alunos na recolha de
informações sobre a Tecnologia em questão. Mais uma vez, os alunos podem
recorrer a textos previamente distribuídos pelo professor. A inclusão do chapéu
verde pretende envolver os alunos na proposta criativa de aplicações da
engenharia genética na medicina, na pecuária, na agricultura e nas indústrias
alimentar e química. Este chapéu proporciona aos alunos liberdade de pensamento
em qualquer direcção. Posteriormente, cada uma das aplicações sugeridas é
avaliada através da utilização dos chapéus amarelo e preto. Desta vez, o chapéu
vermelho não se incluiu pelo facto da actividade proposta não despoletar
imediatamente sentimentos fortes. Também aqui, se utiliza o chapéu amarelo antes
do preto, de acordo com a sugestão de de Bono já referida.
3.4.1.5 Actividade 5
Tema
A actividade 5 (Anexo 6) convida os alunos a tentarem prever como será o
futuro da espécie humana atendendo a todas as inovações tecnológicas na área
68
da Biotecnologia genética, e respectivas implicações éticas, discutidas nas
actividades anteriores. Permite a abordagem de todas as questões discutidas
anteriormente e pretende funcionar como síntese das diferentes sessões.
Sequência de Chapéus Utilizada
A sequência proposta para a abordagem da actividade 5 era constituída
pelos seguintes chapéus:
1. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto;
2. Chapéu branco - Para recolher informação sobre o assunto;
3. Chapéu verde - Para desenvolver o maior número de previsões; e
4. Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos relativamente ao
cenário final previsto.
Visto a actividade poder desencadear sentimentos bastantes fortes nos
alunos, utiliza-se o chapéu vermelho tanto no início como no final da mesma. A
utilização do chapéu branco pretende envolver os alunos numa síntese da
informação discutida durante todo o conjunto de sessões. A inclusão do chapéu
verde destina-se a despoletar a criatividade dos alunos no intuito de preverem o
futuro da espécie humana, com base em toda a informação resumida
anteriormente.
3.4.2 Observação das actividades
A observação procurou detectar e registar eventuais reacções dos
professores e dos alunos às actividades. Foi utilizado um instrumento de registo,
estruturado de acordo com �Os Seis Chapéus do Raciocínio� (Anexo 4), no qual o
investigador anotou observações efectuadas na perspectiva de cada um dos
69
chapéus:
1. Chapéu branco - Factos e informações sobre a implementação das
actividades (por exemplo, número de alunos por grupo, distribuição dos grupos
pela sala).
2. Chapéu vermelho - Emoções e sentimentos manifestados ou
evidenciados pelo professor ou pelos alunos relativamente às actividades.
3. Chapéu amarelo - Reacções positivas às actividades.
4. Chapéu preto - Reacções negativas às actividades.
5. Chapéu verde - Comentários ou comportamentos que sugiram alterações
capazes de melhorar as actividades.
6. Chapéu azul - Avaliação geral da forma como decorre a actividade
realizada.
Foram observadas três sessões por turma: a primeira, na qual era
apresentada a metodologia e os objectivos das actividades; a segunda, em que os
vários grupos discutiram o primeiro tema; e uma outra, seleccionada de acordo
com a disponibilidade do investigador e os horários das turmas. Enquanto a
primeira observação procurou detectar eventuais desvios, relativamente à forma
previamente acordada, na apresentação dos objectivos e da metodologia das
sessões, a segunda e a terceira observações destinaram-se a detectar e a registar
as reacções dos professores e dos alunos às actividades de discussão.
3.4.3 Entrevistas aos professores
Após a conclusão de toda a sequência de actividades foram realizadas
entrevistas semi-estruturadas a cada um dos professores envolvidos na
investigação. Numa sala da escola, o investigador convidou, individualmente, cada
professor a pronunciar-se sobre o tema e a metodologia das actividades, através
70
da utilização sequencial de cinco chapéus do raciocínio (Anexo 1):
1. Chapéu vermelho - Emoções e sentimentos relativamente ao tema e à
metodologia utilizada.
2. Chapéu amarelo - Aspectos positivos e vantagens do tema e do método
das actividades de discussão.
3. Chapéu preto - Aspectos negativos, desvantagens e problemas do tema e
do método das actividades de discussão.
4. Chapéu verde - Sugestões para a melhoria das actividades.
5. Chapéu azul - Avaliação global das actividades realizadas.
O chapéu branco não foi utilizado na medida em que se pretendiam
conhecer os sentimentos e as opiniões dos professores e não informações
objectivas.
Cada uma das entrevistas foi registada em audio e, posteriormente,
transcrita com o objectivo de se proceder a análise de conteúdo.
3.4.4 Questionário para avaliação das actividades pelos alunos
No final da primeira e da quarta actividades de discussão foi solicitado a
cada um dos alunos participantes que efectuasse por escrito uma avaliação da
actividade de discussão. Para tal, foi entregue a cada aluno uma ficha, para
avaliação do tema e da metodologia das actividades através da utilização
sequencial de 5 �Chapéus do Raciocínio� (Anexo 2):
1. Chapéu vermelho - Sentimentos relativamente ao tema e à metodologia
das actividades.
2. Chapéu amarelo - Aspectos positivos.
3. Chapéu preto - Aspectos negativos.
4. Chapéu verde - Sugestão de alterações tendentes a melhorar as
actividades.
71
5. Chapéu azul - Avaliação global.
Também aqui não foi utilizado o chapéu branco pelo facto de se
pretenderem conhecer os sentimentos e as opiniões dos alunos e não informações
objectivas sobre as actividades de discussão.
3.4.5 Questionário para levantamento das opiniões dos alunos sobre
Biotecnologia
Este questionário pretendia verificar o impacto das actividades de discussão
nas opiniões dos alunos sobre Biotecnologia. Com o objectivo de detectar
eventuais variações de opinião, foi aplicado o mesmo questionário no início e no
final do estudo. O questionário era constituído por 22 afirmações diferentes sobre
relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade, relativamente às quais os alunos
deveriam indicar a sua opinião utilizando uma escala com cinco opções que
variava entre �concordo totalmente� e �discordo totalmente� (Anexo 3). Foram
vários os temas abordados:
�Crescimento científico e tecnológico e bem estar social� - 2 afirmações;
�A engenharia genética - potencialidades e perigos� - 6 afirmações;
�Análise do património genético - potencialidades e perigos� - 6 afirmações;
�Os cidadãos e a Biotecnologia� - 5 afirmações; e
�Controlo da investigação na área da Biotecnologia� - 3 afirmações.
O questionário foi validado por dois professores da Faculdade de Ciências
� um do Departamento de Educação, licenciado em Biologia e doutorado em
Educação; outro do Departamento de Biologia Vegetal, licenciado em Biologia e
doutorado em Genética � e pela aplicação, num estudo piloto, efectuado com uma
turma do 10º ano de escolaridade que não participou no estudo.
72
3.5 Método de Investigação: Os Seis Chapéus do Raciocínio
O método �Os Seis Chapéus do Raciocínio�, proposto por de Bono (1985,
1995), foi utilizado tanto nas actividades de discussão como na construção dos
instrumentos de recolha e análise de dados. Nas actividades de discussão, além
de constituir uma forma de rentabilizar/potenciar a discussão em grupo, pretendeu
fornecer aos alunos um método de tomada de decisões capaz de os ajudar a
efectuar escolhas pessoais através da análise das situações, da clarificação dos
seus valores e da avaliação das consequências das suas opções. A organização
dos questionários de avaliação das actividades pelos alunos, do guião de
entrevista aos professores e do guião de observação para o investigador através
d��Os Seis Chapéus do Raciocínio� teve como principal objectivo facilitar a análise
de conteúdo, assegurando a abordagem dos mesmos aspectos por alunos,
professores e investigador.
Como foi referido no Capítulo 2, de Bono idealizou �Os Seis Chapéus do
Raciocínio� como um instrumento de orientação da atenção para vários tipos de
raciocínio, que ajuda a reduzir a confusão no raciocínio e a disciplinar o
pensamento. Este método parte do pressuposto que o raciocínio mais eficaz é
executado por sectores, ou seja, de forma compartimentada. A sua designação foi
inspirada na associação inglesa entre chapéu e raciocínio, no facto dos chapéus
poderem definir o papel que um indivíduo desempenha num momento específico e,
ainda, no facto de se colocarem e retirarem facilmente. Assim, os chapéus têm
cores diferentes, correspondentes a diferentes tipos de raciocínio:
Chapéu branco: Factos, números e informação. Que informações temos?
Que informações precisamos obter?
Chapéu vermelho: Emoções, sentimentos, palpites e intuições. Que
sentimos acerca desta questão?
73
Chapéu preto: Precaução. Verdade, avaliação, encaixe dos factos. Aponta
as fraquezas, os problemas, os perigos de uma ideia. Isto encaixa-se nos factos?
Resulta? É seguro? É praticável?
Chapéu amarelo: Vantagens, benefícios, poupanças. Porquê fazer? Quais
são os benefícios? Qual é a vantagem de o fazer?
Chapéu verde: Exploração, sugestões, novas ideias. Ideias construtivas.
Alternativas à acção. Transferência. Que podemos fazer aqui? Há outras ideias
diferentes?
Chapéu azul: Raciocinar sobre o pensamento. Controlo do processo do
raciocínio. Como avaliamos o ponto em que nos encontramos? Estabelecer o novo
passo do raciocínio. Estabelecer o programa do raciocínio.
Os seis chapéus podem ser utilizados isoladamente ou segundo uma
sequência pré-determinada � �colocando� os chapéus um após o outro � o que
funciona como um guião do raciocínio (de Bono, 1985, 1995). A colocação isolada
e ocasional dos chapéus permite a realização de um tipo particular de raciocínio ou
sugere uma troca de pensamento. A utilização de uma sequência de chapéus
pré-determinada permite uma exploração mais rápida e eficaz de um assunto e
revela-se útil quando existe uma discussão ou um desentendimento sobre uma
questão. Apesar desta sequência poder variar conforme as circunstâncias e ser
estabelecida livremente pelos intervenientes, de Bono fornece algumas
orientações para a sua definição:
1. Cada chapéu pode ser utilizado mais do que uma vez numa sequência.
2. Deverá ser definido um tempo máximo para utilização dos chapéus.
3. O chapéu amarelo deve ser utilizado antes do preto pois dificilmente se é
positivo depois de se ter sido negativo.
4. O chapéu preto pode ser utilizado tanto para o levantamento das
fraquezas de uma ideia � seguido do chapéu verde na tentativa de
ultrapassar essas fraquezas � como para a avaliação final de uma ideia.
74
5. Sempre que exista um sentimento forte relativamente a um assunto, o
raciocínio deve ser iniciado com o chapéu vermelho de forma a expor
esses sentimentos.
6. Se não houver grandes impressões, deve começar-se com o chapéu
branco com o objectivo de reunir informação. Seguidamente, utiliza-se o
chapéu verde para gerar alternativas. Finalmente, alternam-se os
chapéus amarelo e preto para avaliar cada alternativa.
De Bono propõe, ainda, algumas sequências (curtas e longas) passíveis de
serem utilizadas em situações específicas. Como sequências curtas sugere:
• na avaliação rápida de uma ideia - amarelo/preto/vermelho;
• para gerar ideias - branco/verde;
• para melhorar uma ideia existente: preto/verde; e
• para resumir e apontar alternativas: azul/verde;
Como exemplo de uma sequência mais longa, destinada a procurar uma
ideia, propõe:
1. Branco: levantamento da informação disponível.
2. Verde: proposta de alternativas.
3. Amarelo: avaliação dos benefícios e da praticabilidade de cada
alternativa.
4. Preto: avaliação dos perigos e fraquezas de cada alternativa.
5. Verde: melhoramento das alternativas mais capazes e selecção final.
6. Azul: resumo e avaliação do percurso efectuado.
7. Preto: avaliação final da alternativa seleccionada.
8. Vermelho: levantamento dos sentimentos relativamente ao resultado final.
75
3.5.1 Raciocínio à chapéu branco
Pense numa folha de papel em branco. Pense numa folha de impressora. O chapéu branco significa informação neutra. de Bono (1995, p. 80)
O raciocínio à chapéu branco constitui uma focagem directa em informação
que possa ser verificada. Envolve a formulação de várias perguntas:
1. Que informação possuímos? Para levantamento de factos, números,
listas, estatísticas, conhecimento ou experiência pessoal.
2. Que informações faltam? Na eventualidade de ser necessária
informação para: a) optar entre duas explicações possíveis; b)
seleccionar a melhor acção a empreender; c) saber se determinado
material satisfaz as necessidades.
3. Como obter a informação de que necessitamos? Para definição de
metodologias de pesquisa.
3.5.2 Raciocínio à chapéu vermelho
Pense em fogo e em quente. O chapéu vermelho é para as emoções, impressões, palpites e intuições.� de Bono (1995, p. 83)
O chapéu vermelho explora e expõe os sentimentos. Para de Bono, as
emoções, os sentimentos e a intuição desempenham um papel central no
pensamento: �O alvo de pensar é dispor o mundo (na nossa mente) de modo a
podermos aplicar eficazmente a emoção. No fim, é a emoção que faz as opções e
toma as decisões.� (1995, p. 27). No entanto, considera que os sentimentos, por
vezes, afectam o pensamento impedindo um raciocínio objectivo; quando são
utilizados no início, a percepção fica limitada e a opção de acção pode ser
inadequada. Apesar disto, não defende a sua exclusão no ensino do pensar mas a
sua utilização de uma forma adequada ao pensamento, ou seja, após as
76
alternativas terem sido examinadas. Nesta altura, devem os sentimentos e as
emoções tomar a opção final. �O alvo do raciocínio é dispor as questões para que
quando finalmente fizermos a escolha emocional, esta tenha uma melhor base� (de
Bono, 1995, p. 270).
3.5.3 Raciocínio à chapéu amarelo
Pense no brilho do sol e no optimismo. O chapéu amarelo está cheio de esperança. de Bono (1995, p. 88)
O chapéu amarelo é um chapéu lógico que se concentra nos benefícios ou
efeitos positivos de um plano de acção, de uma solução para um problema, de uma
escolha ou de uma decisão. Implica a previsão de consequências futuras sobre
outras pessoas e o ambiente. Logo, preocupa-se com valores. Envolve a
formulação de várias perguntas: Pode fazer-se isto? Vale a pena ser feito? Quem
sai beneficiado? Como surgem os benefícios? Quais são as vantagens? Quais são
os valores benéficos em jogo? Quem é afectado por estes valores?
Se a utilização do chapéu amarelo não conduzir à identificação de
benefícios suficientes, deveremos abandonar a ideia. Se os benefícios são
manifestos, a questão ainda terá de ser avaliada usando o chapéu preto.
3.5.4 Raciocínio à chapéu preto
Pense num juiz severo. Pense em alguém que assinala fortemente um erro cometido. de Bono (1995, p. 86)
O chapéu preto é um chapéu lógico que se centra nos aspectos negativos.
Pretende impedir erros e conduzir à melhoria das ideias através da detecção de
eventuais problemas ou perigos. À semelhança do chapéu amarelo, implica a
previsão de consequências futuras sobre outras pessoas e o ambiente. Logo,
77
também se preocupa com valores. O chapéu preto coloca uma série de perguntas:
É verdade? Isto encaixa-se nos nossos objectivos, nos nosso valores e no que
consideramos ser correcto? Isto resulta? Qual é o seu valor? Quais são os perigos
e os problemas que podem surgir? Isto justifica-se? A estas questões é necessário
responder com razões, com provas, e não com sentimentos ou pressentimentos.
3.5.5 Raciocínio à chapéu verde
Pense na relva, em árvores, em vegetação e crescimento. Pense na energia do crescimento e da fertilidade. Pense em rebentos e em ramos. de Bono (1995, p. 92)
O chapéu verde centra-se na criatividade, permitindo dar saltos em frente
através da hipótese, especulação e provocação. Preocupa-se com propostas,
sugestões, novas ideias, novas alternativas, novas soluções, novas invenções,
novas possibilidades. Caracteriza-se pela acção e energia.
Ao contrário do pensamento à chapéu amarelo e à chapéu preto, o
pensamento à chapéu verde não implica a apresentação de razões lógicas em
defesa de sugestões ou de ideias. Apenas propõe um leque variado de opções que
será posteriormente examinado através da utilização dos chapéus amarelo e preto.
3.5.6 Raciocínio à chapéu azul
Pense no céu azul. O céu abarca tudo. Se estivéssemos no céu, poderíamos olhar para tudo cá em baixo. Com o pensamento à chapéu azul, estamos acima do pensamento; estamos a olhar para o pensamento; (...) estamos a pensar no raciocínio. de Bono (1995, pp. 94-95)
O chapéu azul proporciona uma visão global de todo o processo de
raciocínio. Permite controlar e dirigir o processo de raciocínio. Segundo de Bono, o
78
chapéu azul cobre quatro pontos:
1. Ponto de partida/focagem: Qual é o nosso problema? Em que nos
estamos a concentrar? Onde estamos no nosso raciocínio? Que
estamos a tentar fazer neste momento? Estamos a desviar-nos do rumo
traçado ou a conseguir algum resultado?
2. Definição dos passos seguintes; definição do processo/programa de
raciocínio/reflexão que poderá consistir numa sequência de chapéus:
Que fazer a seguir?
3. Ponto da situação, resumo e/ou clarificação de pontos de vista: Onde
nos encontramos? Até onde chegámos? Podemos fazer uma súmula?
Que fazer a seguir?
4. Controlo e monitorização: Cada um dos chapéus está a ser utilizado de
forma correcta? Esse tipo de raciocínio corresponde a este chapéu?
Esse chapéu deveria ser utilizado neste momento? Até que ponto não
nos estamos a desviar do rumo definido previamente?
3.6 Tópicos Seleccionados: Controvérsias em torno da Biotecnologia
Todas as actividades de discussão abordam aspectos científicos e éticos da
Biotecnologia. A selecção destes temas baseou-se em duas ordens de razão:
1- As implicações éticas e morais dos avanços tecnológicos e científicos na
área da Biotecnologia constituem um tema óptimo para discussões alargadas a
toda a turma. A grande actualidade e interesse deste tema contribuem, de forma
inigualável, para a criação de um ambiente de reflexão e de debate na sala de aula
capaz de promover o desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos alunos.
79
2- A cidadania moderna e democrática requer uma cultura científica que
habilite todos os cidadãos para uma colaboração inteligente com os cientistas e
para uma avaliação crítica dos efeitos da Ciência e da Tecnologia na Sociedade.
Torna-se imprescindível que a população esteja apta a avaliar as potencialidades e
os perigos dos novos avanços da Ciência e da Tecnologia de modo a poder
participar num processo decisório que a todos diz respeito.
Vivemos numa Sociedade polémica, marcada por desenvolvimentos
científicos e tecnológicos controversos e caracterizada por tensões sociais:
tensões entre direitos individuais e objectivos sociais, prioridades políticas e
valores ambientais, interesses económicos e preocupações relativamente à saúde
(Nelkin, 1992). Entre as tecnologias mais polémicas, a Biotecnologia assume um
relevo especial. Pode ser definida de uma forma ampla como �a aplicação de
organismos, sistemas e processos biológicos à indústria� (Royal Society, 1980).
Estes organismos biológicos são, normalmente, bactérias, leveduras, fungos e
algas. As suas aplicações vão desde o fabrico de queijo, cerveja, pão e vinho, até
ao tratamento de esgotos, controlo de poluição, agricultura e produção de
combustíveis alternativos e medicamentos.
Segundo Henderson e Knutton (1990), a Biotecnologia não constitui um
ramo recente da Tecnologia: a origem do fabrico de pão, cerveja e vinho perde-se
na história. Apesar disto, referem que o início da Biotecnologia moderna é
associada, normalmente, à utilização de microrganismos na produção de glicerol,
acetona, butanol e ácido cítrico para fins militares durante a Primeira Guerra
Mundial e à descoberta e produção industrial da penicilina durante os anos
quarenta do nosso século. No entanto, para estes autores, a grande revolução
nesta área ocorreu nos anos 80 com o desenvolvimento da tecnologia de
recombinação do ADN que permite a combinação de sequências genéticas
provenientes de seres vivos diferentes. No passado, seleccionavam-se
gradualmente as características desejáveis em plantas e em animais através de
80
cruzamentos cuidadosamente definidos ao longo de muitas gerações. Actualmente,
a alteração directa do material genético de uma espécie permite uma modificação
rápida e radical das suas características. As técnicas de recombinação de material
genético e o conhecimento crescente das funções de genes de vários seres vivos,
incluindo o homem, provocam simultaneamente esperança e temor (Buican, 1986;
Barbour, 1992): esperança na possibilidade de inúmeras aplicações na agricultura
e na pecuária e na eventual cura de centenas de doenças de origem genética;
temor de eventuais desastres ambientais provocados pela proliferação
incontrolada de seres vivos alterados geneticamente ou de uma hipotética
manipulação abusiva do património genético do Homem por ditadores e por
oligarquias sem escrúpulos. Dilemas morais profundos e fascinantes acompanham
estas proezas da Biotecnologia, particularmente as que envolvem a manipulação
do genoma humano. Segundo Boone (1995), estes dilemas resultam da natureza
completamente inovadora das opções que a Tecnologia genética proporciona.
�Muitos têm argumentado que os avanços técnicos ultrapassaram a nossa
capacidade de lidar eticamente com eles. De facto, nenhuma tradição ética parece
ser suficiente para compreender tanto a peculiaridade do dilema genético como a
multiplicidade de questões morais que ele apresenta� (Boone, 1995, p. 514).
Torna-se evidente que as aplicações da Tecnologia Genética na medicina,
na agricultura e na indústria têm inúmeras implicações sociais e éticas. As suas
influências tornam-se imprevisíveis e incalculáveis nos sistemas ecológicos e nas
próximas gerações de todos os seres vivos, incluindo o Homem. Muitas das
decisões a serem tomadas nesta área dizem respeito às gerações futuras. Assim,
torna-se vital que toda a população seja informada sobre os novos avanços na
área da Biotecnologia, especialmente no campo da Tecnologia Genética, de modo
a poder participar num processo decisório que a todos diz respeito. É neste
contexto que surge o apelo a uma nova bioética, capaz de auxiliar a Sociedade em
tão difíceis decisões: �Perante os novos poderes que a Ciência dá ao Homem
81
sobre a vida e sobre si próprio, é importante que ele segure as rédeas do
progresso e tome as decisões éticas que lhe tornem possível plasmar um futuro
autenticamente humano� (Archer, 1996, p. 32).
3.7 Fases do estudo
Este estudo compreendeu três fases (Quadro 2):
Uma primeira fase, de concepção das actividades de discussão, implicou a
selecção dos temas e a sua apresentação de uma forma simultaneamente
controversa e motivadora, capaz de desencadear discussão entre os alunos.
Numa segunda fase, de preparação do estudo, procedeu-se à selecção da
escola e das turmas e à realização de reuniões preparatórias, com os professores
envolvidos, para selecção das actividades a utilizar e para análise e discussão
pormenorizada dos restantes instrumentos de investigação e dos aspectos
científicos e éticos dos temas das diferentes actividades. De um total de 20
actividades analisadas, seleccionaram-se 5 de acordo com o seu eventual
potencial em motivar os alunos e com a relevância das mesmas para as disciplinas
leccionadas. Pretendeu-se que o número de actividades a utilizar no estudo fosse
compatível com a calendarização estabelecida pelos professores no início do ano
lectivo para cada uma das rubricas programáticas. Nestas sessões também foram
analisados e discutidos os aspectos científicos e éticos dos temas das diferentes
actividades.
Finalmente, na fase de concretização do estudo, foram utilizados os
instrumentos de investigação previamente seleccionados, analisados e discutidos.
Esta terceira fase foi iniciada com a primeira aplicação do questionário para
levantamento das opiniões dos alunos sobre Biotecnologia (aproximadamente 15
minutos), à qual se seguiu: a) a introdução ao tema Ciência/Tecnologia/Sociedade;
82
b) a apresentação dos objectivos e da metodologia das actividades de discussão;
c) a entrega de textos informativos sobre a metodologia e os temas das referidas
actividades; e d) a formação dos grupos de alunos. Seguidamente, cada um dos
professores coordenou as cinco actividades de discussão nas suas respectivas
turmas.
No final da primeira e da quarta actividades de discussão foi entregue a
cada um dos alunos participantes o questionário para avaliação das actividades.
Este questionário foi preenchido em casa e entregue ao professor no início da aula
seguinte.
Quadro 2
Síntese do Estudo 1ª Fase Concepção das actividades
2ª Fase
Preparação do estudo:
Selecção da escola e das turmas.
Reuniões preparatórias com os professores participantes.
3ª Fase
Realização do estudo:
Questionário de opinião sobre Biotecnologia.
Actividades de discussão na sala de aula.
Observação de sessões.
Questionários de avaliação das actividades 1 e 4.
Questionário de opinião sobre Biotecnologia.
Entrevistas aos professores participantes.
O investigador observou três sessões por turma: a primeira, na qual foi
apresentada a metodologia e os objectivos das actividades; a segunda, em que se
discutiu a primeira actividade; e uma outra, seleccionada de acordo com a
disponibilidade do investigador e os horários das turmas.
Após a conclusão de toda a sequência de actividades foi aplicado, pela
segunda vez, o questionário para levantamento das opiniões dos alunos sobre
83
Biotecnologia e foram realizadas entrevistas semi-estruturadas a cada um dos
professores envolvidos na investigação.
84
85
CAPÍTULO 4 RESULTADOS
Neste capítulo são apresentados e analisados os dados resultantes da
aplicação dos questionários dirigidos aos alunos e da realização de observações
directas das aulas e de entrevistas semi-estruturadas aos professores
participantes. A análise destes dados foi efectuada de acordo com a metodologia
descrita no capítulo 3.
A realização das actividades durou aproximadamente um mês e ocupou 11
tempos lectivos de cada turma participante. Três dos professores participantes
realizaram a sequência das actividades de forma ininterrupta. Duas das
professoras, dada a sua situação de estagiárias, tiveram que intercalar estas
actividades com aulas de temática e metodologia diferentes. No entanto, a
sequência integral foi realizada em menos de um mês. De um total de 167 alunos,
118 cumpriram todas as etapas do estudo.
86
4.1 Apresentação dos Resultados
4.1.1 Dados de observação
O guião de observação foi estruturado de acordo com �Os Seis Chapéus do
Raciocínio�, tendo as observações sido efectuadas e registadas na perspectiva de
cada um dos chapéus.
4.1.1.1 Aplicação do chapéu branco (factos e informações sobre a implementação
das actividades)
As diferentes sessões do estudo decorreram nas salas de aula destinadas a
cada turma. Cada grupo de 4 a 5 elementos, formado pelos próprios alunos,
juntou-se à volta de uma ou de duas mesas. Na maioria das turmas, a
heterogeneidade dos grupos relativamente ao sexo e à etnia era evidente, embora
em duas turmas os elementos masculinos fossem dominantes.
Durante as sessões observadas, os professores cumpriram todas as
instruções relativas tanto à sua actuação na sala de aula como à metodologia das
actividades. Na primeira sessão, os professores limitaram-se: a) a informar os seus
alunos acerca dos objectivos e finalidades da investigação; b) a explicar a
presença do investigador; c) a solicitar a cooperação e o envolvimento de toda a
turma, realçando a importância de estudos deste tipo na melhoria das actividades
lectivas; d) a entregar e a analisar os textos informativos sobre a metodologia e os
temas a discutir; e e) a introduzir o tema Ciência/Tecnologia/Sociedade. Durante
todas as sessões observadas, os professores tiveram o cuidado de não revelar
opiniões pessoais relativamente a eventuais potencialidades tanto do tema como
da metodologia.
87
4.1.1.2 Aplicação do chapéu vermelho (emoções e sentimentos manifestados ou
evidenciados pelo professor ou pelos alunos relativamente às actividades)
A maioria das sessões observadas foi marcada, inicialmente, por um clima
de estranheza motivado pelas actividades propostas e pela presença do
investigador. Alguns alunos demonstraram mesmo, explícita ou implicitamente,
desinteresse e aborrecimento por �mais uma actividade escolar�. No entanto, a
leitura das folhas informativas distribuídas e a discussão do primeiro tema
despoletaram um clima de entusiasmo, de interesse e de motivação. Foram
frequentes as discussões acesas em que se entrecruzaram: a) o entusiasmo, a
curiosidade, a admiração, a esperança, a preocupação e a desconfiança
relativamente aos tema abordados; b) o divertimento e alguma confusão na
utilização d��Os Seis Chapéus do Raciocínio�; e c) a dificuldade em limitar a
discussão ao tema em causa. A intolerância relativamente às afirmações dos
colegas e a defesa acérrima e intransigente de opiniões foram sentimentos
evidentes em alguns grupos.
Relativamente aos professores, os sentimentos evidenciados permitem
dividi-los em dois grupos. O primeiro, constituído pelo José, pela Aida e pelo
António, bastante entusiasmado e interessado nas actividades de discussão,
revelou facilidade na gestão deste tipo de aula. O segundo, constituído pela
Filomena e pela Clara, menos motivado, manifestou inexperiência e insegurança
na dinamização de aulas de debate.
4.1.1.3 Aplicação do chapéu amarelo (reacções positivas às actividades)
A motivação e o interesse revelado pelos alunos durante as actividades de
discussão, associados à quantidade e à qualidade das interacções estabelecidas,
constituem os aspectos positivos mais evidentes das actividades. Frequentemente,
88
o tema proposto motivou discussões complexas envolvendo outros assuntos
importantes como a eutanásia, o aborto e a discriminação. Por vezes, o
envolvimento no debate era tal que os alunos ignoravam o toque de saída,
continuando a discutir com os seus colegas e com o professor. Era notória a
satisfação com que os diferentes participantes apresentavam, ouviam e discutiam
opiniões. Também era evidente o ar de satisfação e de divertimento com que
alguns alunos utilizavam �Os Seis Chapéus do Raciocínio�.
4.1.1.4 Aplicação do chapéu preto (reacções negativas às actividades)
A observação não permitiu detectar comentários ou comportamentos que,
no conjunto, possam ser reveladores de aspectos negativos das actividades de
discussão. Contudo, foram evidentes alguns comportamentos negativos durante a
realização das referidas actividades: a falta de tolerância relativamente às opiniões
dos colegas, a relutância em valorizar opiniões diferentes, a interpretação de
opiniões divergentes como ataques pessoais, a defesa acérrima e intransigente de
opiniões com a consequente divisão do grupo em facções e alguma
confusão/indisciplina durante o debate de ideias.
Alguns alunos manifestaram, ainda, algum aborrecimento pelo facto de
terem que orientar a sua discussão pela sequência de �chapéus� indicada. Pura e
simplesmente, pretendiam apresentar conclusões ou planos de acção sem uma
explicitação das respectivas vantagens e desvantagens.
4.1.1.5 Aplicação do chapéu verde (comentários ou comportamentos que sugiram
alterações capazes de melhorar as actividades)
As dificuldades manifestadas por alguns professores no esclarecimento de
dúvidas sobre os temas em discussão e na motivação dos alunos para a realização
89
das actividades sugerem que a realização de uma sessão inicial dinamizada por
especialistas em Biotecnologia poderá ser vantajosa na transmissão de
informação, no esclarecimento de dúvidas e na motivação dos alunos.
Tendo em conta todo o interesse despoletado pelas actividades de
discussão em grupo, seria interessante aplicar esta metodologia a outros temas
actuais e controversos.
4.1.1.6 Aplicação do chapéu azul (avaliação geral da forma como decorreram as
actividades)
A avaliação global das actividades de discussão baseada nas observações
efectuadas é positiva. As potencialidades do tema para a motivação dos alunos e
para a estimulação do debate foram evidentes. A interacção estabelecida
revelou-se positiva no aprofundamento e no melhoramento das relações entre os
participantes, no desenvolvimento de capacidades de argumentação e de análise
de informação e na compreensão das relações entre Ciência, Tecnologia e
Sociedade.
4.1.2 Dados dos questionários de avaliação das actividades pelos alunos
As opiniões apresentadas resultam da análise de conteúdo das respostas
dos alunos aos questionários de avaliação das actividades de discussão (Anexo
2). Esta análise foi efectuada de acordo com a metodologia descrita no capítulo 3.
Entre parênteses são apresentadas as percentagens de alunos que efectuaram
cada um dos comentários referidos.
90
4.1.2.1 Aplicação do chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites, intuições)
Para muitos alunos (44,1%) �As vantagens/desvantagens dos novos
avanços na área da Genética e da Biotecnologia� constituem um tema interessante
e motivador. Este interesse reside, fundamentalmente, no facto do tema ser pouco
conhecido (9,3%) e na sua actualidade (7,6%), controvérsia (3,4%) e relevância
para a vida dos cidadãos (17,0%).
�Acho interessante a discussão desta matéria, uma vez que pouco se sabe acerca da biotecnologia.� (12º-1) �Esta actividade suscita grandes motivos de interesse visto que ela é-nos totalmente desconhecida.� (12º-1) �Sentimentos positivos porque trabalhámos assuntos desconhecidos/diferentes e aprendemos novas �coisas� sobre biotecnologia.� (10º-3) �Foi interessante podermos falar destes temas que infelizmente não são abordados frequentemente.� (11º-2) �Gostei de falar sobre estes assuntos pois são interessantes e ao mesmo tempo foi bom saber coisas que eu nunca imaginaria que fizessem actualmente. Senti enorme alegria em falar nisto.� (11º-2) �Penso que esta actividade é muito interessante pois ficamos a saber coisas que não sabíamos e que são muito importantes para a sociedade.� (10º-1) �Esta actividade é bastante esclarecedora e compensadora visto que é um tema actual.� (12º-1) �Eu acho esta actividade bastante interessante sobretudo pela controvérsia do tema.� (11º-2) �Os temas são polémicos e despertam interesse e curiosidade.� (12º-1) �Apreciei bastante esta actividade devido à controvérsia do tema, além de que este tema é relativamente importante à minha vida doravante.� (11º-2) �Esta actividade é interessante porque tem a ver com o dia-a-dia.� (10º-2) �Esta actividade desperta em mim sentimentos de interesse e grande curiosidade pois a biotecnologia e os assuntos que tratámos nas aulas são assuntos que dizem respeito a todos nós.� (11º-3)
91
�Pessoalmente, eu gostei e achei interessantes estas aulas visto serem sobre algo que não conhecemos muito e que nos diz respeito.� (12º-1) �Os meus sentimentos são principalmente de grande interesse e vontade de aprender coisas novas que me possam ser úteis no futuro.� (11º-3)
Outros alunos (8,5%), apesar de considerarem o tema interessante,
sentiram-se, simultaneamente, esperançados com as potencialidades da
Biotecnologia e receosos de eventuais aplicações menos correctas destes
conhecimentos:
�Os meus sentimentos são de curiosidade e receio ao mesmo tempo.�(10º-3) �A biotecnologia provoca medo e esperança.� (11º-3) �Esta actividade é interessante e preocupante e acho que todas as pessoas deviam estar bem informadas sobre o assunto.� (10º-2) �A biotecnologia é um avanço útil mas também preocupante. Graças a ele podemos ter melhoramentos quer na vida humana quer na vida animal mas provocando várias vezes danos a estes.� (11º-2) �Esta actividade por um lado pode melhorar as condições de vida de muita gente, mas se não for bem controlada pode alterar a vida para um aspecto negativo.� (10º-2) �Medo, receio e preocupação em relação a este tema pois pode provocar catástrofes com resultados imprevisíveis, mesmo sendo utilizada por pessoas com as melhores intenções.� (10º-3)
Quanto à metodologia utilizada � discussão em grupo de acordo com o
método �Os Seis Chapéus do Raciocínio� � os sentimentos dos alunos variaram
entre o interesse, a satisfação e a monotonia. A análise dos comentários dos
alunos permite concluir que os sentimentos mais generalizados foram o interesse
(11,9%) e a satisfação (17,0%):
�Gostei desta actividade. Acho que nos deu hipótese de discutir por fases um aspecto, e isso foi importante; não só chegarmos a uma
92
conclusão, como também discutirmos todos os passos para lá chegar.� (11º-2) �Esta actividade é agradável porque nos obriga a pensar e a desenvolver tipos de raciocínio ao confrontarem-nos com problemas do quotidiano sem estarmos sob pressão, pois os problemas não se passam connosco.� (10º-3) �Achei este tipo de actividade interessante. Eu, pelo menos, consegui entender melhor o problema em questão.� (11º-2) �É uma actividade que é bastante interessante ao nível da comunicação. Também nos ajuda imenso a saber analisar e a tentar encontrar soluções para os problemas em discussão.� (11º-2) �Gostei, acho que correu bem e é uma boa maneira de se conseguir analisar bastantes aspectos sobre um dado tema.� (11º-2) �Foi muito benéfica porque aprendemos a trabalhar melhor em grupo e deu-nos muitas informações.� (10º-3) �Esta actividade é bastante produtiva porque todos nós podemos discutir e enumerar os nossos sentimentos. Sinto-me elucidado em relação a este assunto.� (10º-3) �É um trabalho interessante onde cada um de nós pode exprimir as suas ideias.� (11º-2) �Foi interessante, pois além de darmos a nossa opinião pudemos debater as opiniões dos outros também.� (11º-2) �É uma actividade em que podemos expôr as nossas ideias e onde trabalhamos em grupo. Acho uma boa actividade.� (11º-2) �Penso que esta actividade faz pensar melhor sobre o assunto (...). Achei interessante a maneira como discutimos o assunto.� (12º-1)
Mas nem todos os sentimentos foram positivos. Na opinião de alguns
alunos, a utilização de uma sequência demasiado estruturada de �chapéus�
revelou-se algo monótona e limitativa da discussão e do aprofundamento do tema
(4,2%):
�Relativamente à metodologia acho cansativa, pouco atractiva. Os temas são de interesse geral mas desenvolvidos e explorados de uma forma um pouco básica pois as discussões em grupo são positivas mas a forma como a actividade está feita não conduz tanto a essa discussão.� (12º-1)
93
�Apesar de ser maçudo seguir por etapas a actividade de reflexão, acho importante pensarmos sobre os problemas da sociedade. A discussão em grupo por etapas, fecha campos no aprofundamento do problema, a novas ideias e visões, tornando o problema mais objectivo apesar da subjectividade que o engloba.� (12º-1)
4.1.2.2 Aplicação do chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens, benefícios)
Para os alunos, os aspectos positivos do tema das actividades são,
precisamente, aqueles que o tornam interessante e motivador, ou seja, o facto de
ser pouco conhecido (5,9%) associado à sua actualidade (3,4%), controvérsia
(0,8%) e relevância para a vida dos cidadãos e para o futuro da humanidade
(10,2%). Vários alunos valorizaram bastante os conhecimentos adquiridos (53,4%)
e o esclarecimento de dúvidas (9,3%) sobre um tema que praticamente
desconheciam. Na sua opinião:
�Esta actividade sobre biotecnologia é bastante educativa porque nós estávamos um bocado �às escuras� sobre este assunto.� (12º-1) �Os benefícios desta actividade foram termos aprendido coisas sobre a biotecnologia, conseguirmos reflectir sobre coisas em que nunca tinha pensado e convivermos uns com os outros.� (10º-3) �Surgiram novas ideias, foram esclarecidas muitas dúvidas.� (12º-1) �Fiquei esclarecida em relação a assuntos que desconhecia.� (11º-3) �O aspecto que me favoreceu foi a informação que me trouxe a discussão deste caso. Não possuía qualquer informação e desconhecia a existência de problemas como este.� (12º-1) �Os benefício são: uma divulgação dos vários assuntos da biotecnologia, um enriquecimento da nossa cultura geral e o pôr a sociedade estudantil a par dos assuntos da biotecnologia.� (10º-3)
94
A relevância da discussão e do conhecimento das implicações dos novos
avanços na área da Genética e da Biotecnologia ficou bem evidente em algumas
afirmações:
�É bom ter conhecimentos destas coisas, uma vez que futuramente podemos ter que tomar uma posição sobre estes assuntos.� (10º-3) �As vantagens são um maior aprofundamento acerca de algo que é muito pouco falado mas que poderá ser muito importante para o nosso futuro.� (12º-1) �Foi bom ficarmos conscientes do que se passa na sociedade actual e, principalmente, saber qual a opinião dos nossos colegas sobre isso. É como que uma preparação para o futuro, no caso de sermos confrontados com alguma destas situações.� (11º-2)
Relativamente aos aspectos positivos da metodologia, os alunos realçaram
o facto de estimular/organizar o raciocínio e de facilitar o desenvolvimento
cognitivo e sócio-afectivo através da reflexão, do debate de ideias e da discussão
de opiniões diferentes. A maior parte dos comentários centraram-se nas
potencialidades do trabalho de grupo e da interacção no desenvolvimento cognitivo
e sócio-afectivo. Segundo vários alunos (49,8%), o debate e a discussão em grupo
facilitam a resolução de problemas e a compreensão e o aprofundamento de
conteúdos, através da confrontação de diferentes conhecimentos, ideias e
opiniões:
�É uma oportunidade de conhecer novos pontos de vista e novas abordagens para todos os problemas que nos surjam. Penso que a melhor maneira de resolver problemas ou de chegar a uma conclusão ou opinião sobre algo é falando e discutindo.� (11º-1) �A discussão permite que as pessoas aprofundem conhecimentos e troquem opiniões, enriquecendo assim os conhecimentos de cada um.� (10º-3) �Ouvimos opiniões diferentes, novas ideias que nos fazem ver aquilo que não vemos.� (11º-1)
95
�Fazer um trabalho com várias opiniões leva a um melhoramento desse trabalho.� (10º-1) �Com o debate/discussão em grupo, aparecem-nos ideias mais correctas do que as nossas, em relação ao assunto em causa.� (10º-3) �Um debate é sempre positivo, do ponto de vista de troca de ideias e de esclarecimento do assunto.� (12º-1) �Os debates fornecem um maior conhecimento sobre o tema discutido.� (11º-2) �Ao debatermos ideias podemos ficar mais informados.� (11º-2) �Podem-se tirar conclusões e novas ideias a partir dessa discussão.� (10º-1) �Os debates foram muito enriquecedores para todos nós.� (11º-1) �Todos nós ficámos a saber um pouco mais e a reflectir sobre coisas e opiniões que antes nem sequer nos passavam pela cabeça.� (11º-3) �Conhecemos as opiniões de colegas e professores.� (10º-3) �Esta actividade ajudou-me a descobrir a minha opinião e sentimentos perante determinados problemas do quotidiano e esclareceu-me determinadas dúvidas.� (11º-1) �Para além de desenvolvermos as nossas próprias ideias (debatendo os aspectos positivos e negativos de vários assuntos) é sempre bom a comunicação que se estabelece na sala.� (11º-2)
Realçaram, também, a importância do trabalho de grupo e da interacção no
desenvolvimento sócio-afectivo (6,8%):
�É um óptimo meio de nos relacionarmos uns com os outros, até de nos conhecermos melhor, e de saber quais são as ideias de cada um através das opiniões.� (11º-2) �Leva-nos a ganhar mais confiança em nós próprios para com a disciplina.� (10º-3) �Maior relacionamento entre os alunos.� (11º-2) �Conseguimos tirar conclusões pensando em conjunto e respeitando as opiniões contrárias.� (10º-3) �É possível que uma actividade destas dê a entender às pessoas que elas devem pensar nas outras, que neste mundo há lugar para todos, que as pessoas não podem ser invejosas.� (10º-3)
96
�Os benefícios desta actividades foram termos aprendido coisas sobre a biotecnologia, conseguirmos reflectir sobre coisas em que nunca tinha pensado e convivermos uns com os outros.� (10º-3)
Consideraram, ainda, que �Os Seis Chapéus do Raciocínio� constituem um
método eficiente de estimulação e de orientação/organização do pensamento
(7,6%), passível de ser aplicado na análise de assuntos e de situações e na
resolução de problemas:
�A divisão do raciocínio em partes, fez com que se analisassem melhor e mais profundamente as situações.� (11º-1) �Através deste método podemos ver todos os aspectos dos problemas. Assim, vemos mais facilmente as coisas e compreendemos melhor as ideias dos outros.� (11º-1) �No início não percebi muito bem o que eram os chapéus e achei muito estranho. Agora já percebo e penso que os chapéus servem para organizarmos melhor o nosso pensamento e a escrita.� (11º-3) �Deu para desenvolver o meu raciocínio e para aumentar a minha cultura.� (11º-1) �Contribuiram para esclarecer os respectivos assuntos tratados. Serviu para conhecer melhor as minhas ideias e as ideias dos outros. Desenvolve a capacidade de raciocínio.� (11º-1) �Também nos ensina a aprender e a resolver problemas com que nos deparamos.� (11º-1) �Eu acho que se deveriam fazer mais actividades deste género porque desenvolvem o nosso raciocínio e ajudam-nos a compreender melhor a matéria.� (10º-1)
4.1.2.3 Aplicação do chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas, problemas)
Relativamente ao tema das actividades, não foram apontados pontos
negativos. Quanto à metodologia, apenas um reduzido número de alunos não
concordou com a compartimentação do raciocínio (2,5%) imposta pelos �chapéus�
97
ou considerou que a pouca flexibilidade da metodologia, resultante da utilização de
sequências rígidas de �chapéus�, a torna algo monótona (2,5%):
�(...) a própria divisão do raciocínio é um aspecto negativo, pois é muito difícil abstrairmo-nos de certos aspectos, gerando uma grande confusão.� (10º-1) �Não concordo com a metodologia utilizada. Penso que se podia fazer uma reflexão dos mesmos temas, mas não tão dispersa, isto é, não se deveria dividir o raciocínio em partes, mas sim reflectir tendo em conta essas partes, relacionando-as umas com as outras.� (11º-1) �Como a exploração dos temas é feita de uma forma linear e objectiva de mais, torna-se cansativo e perde um pouco o entusiasmo ao longo do percurso estipulado.� (12º-1) �Um perigo a salientar é a possibilidade do aluno perder o interesse pela actividade devido à sua forma esquemática e objectiva.�(12º-1) �Penso que a metodologia pouco flexível tornou um trabalho que poderia ser envolvente numa monotonia.� (12º-1)
Para os restantes alunos não existiu qualquer aspecto negativo na utilização
da metodologia. No entanto, dois deles consideraram que a reduzida experiência
na utilização d��Os Seis Chapéus do Raciocínio� provocou alguma confusão. Por
vezes, sentiram dificuldade em seguir o programa de raciocínio indicado pela
sequência de �chapéus�.
Outros aspectos negativos referidos não estão directamente relacionados
nem com o tema nem com a metodologia mas sim com a pouca prática na
realização de actividades de discussão: alguma confusão/indisciplina durante o
debate de ideias (15,3%), a falta de tolerância relativamente às opiniões dos
colegas (2,5%) e a defesa acérrima e intransigente de opiniões com a consequente
divisão do grupo em facções (7,6%). São várias as afirmações reveladoras destes
98
problemas durante as actividades de discussão:
�Na minha opinião, o único problema é que nos debates há confusão a mais, falam todos ao mesmo tempo acabando por não se chegar a conclusão nenhuma.� (12º-1) �Por vezes há intervenções que são feitas no momento errado fazendo com que se gere uma confusão de ideias que tornam esse debate pouco esclarecedor.� (12º-1) �Os aspectos negativos desta discussão foram os momentos em que todos queriam dar a sua opinião e não se percebia nada.� (11º-1) �Apenas não gostei do barulho que a turma fez durante o debate do problema.� (11º-1) �O único aspecto negativo que vejo é a possibilidade de haver discussões e por vezes desentendimentos entre os alunos.� (11º-2) �A actividade realizada leva muitas vezes a grandes exaltações por parte dos alunos.� (11º-2) �Pode gerar-se confusão.� (11º-2) �Se trabalhamos em grupo, cada um tem a sua opinião mas às vezes a nossa opinião é �atropelada� pelas outras opiniões (mas isso é da falta de organização do próprio grupo de trabalho).� (11º-3) �(...) desentendimentos entre membros do grupo.� (10º-3) �Podem originar-se problemas dentro da turma se as pessoas não aceitarem as ideias dos colegas.� (12º-1) �Por vezes chegamos a conclusões com que nem todos concordam e quando se leva a actividade para questões mais polémicas gera-se a confusão.� (12º-1) �Não vale a pena realizar esta actividade quando existem pessoas que não sabem respeitar as opiniões dos outros.� (12º-1) �Acho que houve um confronto de ideias demasiado violento.� (11º-1) �A exaltação que surge nos debates é desgastante.� (11º-2) �Algumas pessoas não compreenderem os outros e até não aceitam as opiniões dos outros.� (11º-3) �A falta de controlo da disciplina (comportamento) no trabalho de grupo.� (10º-1)
99
4.1.2.4 Aplicação do chapéu verde (sugestões, novas ideias, alternativas)
Quanto ao tema discutido, os alunos não sugeriram qualquer alteração.
Quase todos o consideraram muito interessante e bem adequado a este tipo de
actividade. Alguns alunos gostariam mesmo que o tema fosse mais discutido e
aprofundado (10,2%):
�Era giro aprofundar mais este tema, a Biotecnologia, pois é dos temas mais importantes do nosso século, é dos temas que mais polémica tem tido.� (11º-1) �Penso que este assunto é bastante importante para os alunos, pois somos nós que no futuro nos vamos debater com este problema. Mas pode ser que nesse futuro já seja demasiado tarde, por isso era bom que este assunto assumisse um papel de relevo ao nível escolar.� (11º-2) �Haver mais actividades, aprofundar mais o assunto, haver mais casos para discutir, discutir mais vezes casos destes na aula.� (10º-3) �Penso que deveriamos fazer um menor número de debates mas aprofundarmos melhor esses mesmos debates.� (11º-1)
Quanto a temas alternativos, não houve qualquer sugestão concreta. No
entanto, alguns alunos (5,9%) sugeriram a discussão de outros temas que sejam
também, simultaneamente, reais e relevantes para a Sociedade actual.
Relativamente à metodologia, as sugestões apresentadas incidiram na
realização de um maior número de actividades de discussão e na forma como a
informação foi fornecida. Vários alunos consideraram que as actividades de
discussão em grupo, tal como foram realizadas e atendendo às suas
potencialidades, deveriam ser utilizadas com maior frequência (11,0%) e,
eventualmente, por todas as turmas da escola (5,9%):
�Deveriam ser realizadas mais actividades deste tipo; ajuda-nos a analisar melhor as coisas.� (11º-2)
100
�Devia-se fazer mais actividades deste tipo porque despertam a nossa inteligência.� (10º-3) �Deviamos realizar mais vezes estas actividades para continuarmos a melhorar a nossa capacidade de pensar.� (10º-3) �Fazer mais vezes este tipo de trabalho em grupo.� (11º-2) �Acho que se deveriam fazer mais actividades como esta não só com alunos da turma como também a nível escolar.� (11º-2) �Mais debates, um maior tempo de duração. Debates a nível de turmas.� (11º-1) �Fazer mais actividades deste tipo.� (11º-3) �O debate com outras escolas, alunos, professores, etc.� (10º-3) �Ter actividades destas entre turmas.� (11º-1) �Fazer mais actividades deste género.� (11º-3)
No entanto, sugeriram alterações na forma de apresentação e na
quantidade da informação fornecida. Segundo alguns alunos, deveriam ter sido
apresentados documentários em vídeo (20,3%), artigos de revistas (0,8%),
testemunhos reais de pessoas afectadas positiva ou negativamente pela
Biotecnologia (3,4%) e realizadas palestras por especialistas nesta temática (6,8%)
e visitas a laboratórios (5,9%). Foram várias as sugestões apresentadas:
�Realizar mais vezes este tipo de actividades, ver alguns filmes, fazer visitas a laboratórios de biotecnologia.� (10º-3) �Mostrarem-nos em vídeo uma pessoa a quem já tenha acontecido algum destes casos, para nos dizer o que sentiu, como reagiu e o que pensa acerca de tudo isto.� (11º-3) �Mais textos de apoio à discussão.� (11º-2) �A vinda de técnicos especializados às escolas a fim de assegurar a melhor compreensão por parte dos alunos.� (12º-1) �Eu acho que deveria haver um debate com alguém que fosse experiente nesta matéria.� (12º-1) �Mais informação.� (11º-3) �Penso que a passagem de documentários alusivos ou a presença de uma pessoa conhecedora, poderiam ser algumas das ideias de melhoramento desta actividade.� (12º-1)
101
�Poderíamos ver filmes como complemento dos trabalhos realizados.� (12º-1) �Visitas a laboratórios de biotecnologia para que os alunos vejam de perto o que realmente é a biotecnologia.� (10º-3) �Deviam existir intervenções do exterior, por exemplo, a presença de pessoas relacionadas directamente com o problema, tanto no aspecto técnico como humano.� (11º-1) �A oportunidade de dar aos alunos mais informação sobre a biotecnologia através de revistas que contenham artigos/histórias sobre o assunto e maior discussão sobre problemas actuais que envolvam biotecnologia.� (11º-3)
Um número reduzido de alunos (2,5%) sugeriu, ainda, a utilização de outra
metodologia diferente d��Os Seis Chapéus do Raciocínio� nas actividades de
discussão. Consideraram que o eventual excesso de estruturação e o grande
número de etapas desta metodologia afectam negativamente a motivação e a
qualidade do raciocínio:
�Se o aluno tivesse a liberdade de divagar intelectualmente acabaria por criar novas perspectivas, conclusões mais repletas de informação e mais elaboradas com variados pontos de vista, ao contrário do que acontece quando se segue uma metodologia precisa.� (12º-1) �Maior liberalização no debate e maior flexibilidade nas discussões durante o mesmo para se poder desenvolver o raciocínio.� (11º-2) �Uma metodologia menos rígida em que se propusessem formas de acção por parte dos alunos e um menor número de etapas tornariam este trabalho mais motivante.� (12º-1)
4.1.2.5 Chapéu azul (avaliação global)
As avaliações globais foram positivas. Muitas salientaram o aspecto
formativo das actividades de discussão na aquisição e compreensão de
conhecimentos relevantes para a vida e na estruturação e desenvolvimento do
102
pensamento. Na opinião de vários alunos (27,1%), a motivação despoletada pelo
carácter inovador e controverso das actividades funcionou como um catalizador do
aprofundamento de conhecimentos sobre Biotecnologia e das suas relações com a
Sociedade. Consideraram, ainda, que a metodologia utilizada desenvolveu
capacidades de pensamento (10,2%). O reduzido número de aspectos negativos
salientados na avaliação global diz respeito à própria metodologia (3,4%), à
actuação do professor (0,8%) e ao clima de indisciplina durante algumas
discussões (4,2%). Como eles próprios escreveram:
�Foi bom, aprendeu-se sobre tudo o que foi falado tendo também aprendido com as opiniões dos meus colegas. Saímos das aulas mais preparados para ver o mundo.� (11º-1) �A actividade foi muito boa, para aprendermos mais coisas. Esclarecemos os pensamentos de outras pessoas, juntamente com os nossos. Resumindo e concluindo: foi uma boa actividade, aprendemos alguma coisa e aprendemos a pensar.� (10º-1) �Penso que se saldou positivamente; acho que todos partilhámos ideias, sentimentos e experiências e, assim, conseguiu-se ver mais do que um lado das coisas. Podemos não ter conseguido chegar a uma conclusão geral, mas acho que todos devemos ter a nossa opinião e discutir com outras pessoas, de modo a conseguir novas visões sobre certas coisas que são polémicas e onde não há opiniões concensuais.� (11º-1) �No global, foi uma actividade bem pensada e foi bem realizada, com o senão da escassez de informação sobre esta matéria. Eu, pessoalmente, gostei porque este tipo de coisas dá sempre lugar a discussões saudáveis e que se tornam bastante interessantes.� (12º-1) �Acho que esta actividade contribuiu de uma forma positiva para desenvolver o meu raciocínio e para ter ideias melhor formadas acerca dos assuntos tratados.� (11º-1) �Penso que a actividade realizada foi muito produtiva, dado o tema tratado. Por outro lado, a metodologia utilizada gerou uma certa confusão, pois é muito difícil dividir o raciocínio em partes. Aliás, penso que o próprio acto de raciocinar é uma forma de relacionar todos os aspectos do problema, e não de dividi-los.� (11º-1) �Este tipo de actividades é importante e interessante. Ajuda na compreensão desses assuntos. Além disso, com um certo apoio ajuda
103
a turma a raciocinar melhor e de uma maneira mais organizada.� (10º-3) �A actividade realizada é muito positiva pois só nos trouxe benefícios. O trabalhar em grupo faz-nos pensar e raciocinar sobre temas desconhecidos ou de que não tinhamos ideias concretas. Pessoalmente, gostei muito.� (10º-3) �A minha avaliação global é positiva. O trabalho estava muito bem elaborado obrigando-nos a pensar. Foi um trabalho muito interessante.� (11º-1) �De uma forma geral este projecto é bastante positivo, pelo conhecimento que fornece, as dúvidas que esclarece, as novas ideias que expõe e o interesse que causa. Mas como em todas as actividades tem também aspectos negativos, que não têm a ver com o tema e os assuntos em si, mas com os pormenores de procedimento.� (12º-1) �Acho que é uma boa maneira de trabalhar um certo tema, faz-nos pensar particular e geralmente no assunto. Deixa-nos, por vezes, trazer a situação para nós mesmos, como se fossemos as personagens. No geral, a minha opinião é bastante positiva.� (11º-2) �Acho que interessa e motiva bastante a turma que se mostra muito atenta nestas actividades.� (11º-2) �Para mim, que não sou muito interessada pela disciplina de Filosofia, até gostei. Os trabalhos realizados em grupo são sempre mais agradáveis. Enfim, gostei de realizar esta actividade e espero que haja outras.� (11º-2) �Eu gosto de fazer debates e até acho gratificante e esclarecedor, mas há sempre confusão a mais.� (12º-1) �Foi uma actividade fora do normal sobre um assunto que não é muito conhecido. No final acabamos por ficar a saber mais e formamos opiniões individuais e em conjunto sobre a matéria.� (11º-3) �Esta actividade foi bastante útil para haver um maior conhecimento sobre esta ciência que cada vez ganha uma maior importância no dia-a-dia e que será essencial para o futuro da humanidade.� (10º-2) �Devem continuar a fazer-se este tipo de actividade; elucida-nos bastante e ajuda-nos. Precisamos de estar o mais informados possível sobre este tema. Para mim quanto mais o tema for polémico mais interessante é, e para mim este tema da Biotecnologia é muito polémico, e tem muito que se lhe diga.� (11º-3) �Esta actividade é bastante interessante e gratificante, visto ser um tema que toca a todos. A actividade de reflexão e discussão é algo que ensina bastante sobretudo quando o tema é bom.� (11º-2)
104
�Quanto ao maior ruído provocado na aula, tudo poderá ficar resolvido com alguma disciplina.� (11º-2) �Sobre a actividade realizada tenho a dizer que não só eu como muitas pessoas não a percebemos assim muito bem. Muitos não estavam atentos, faltou mais atenção por parte da professora aos alunos, por vezes todos falavam ao mesmo tempo e a professora não �puxa�, não cativa os alunos que têm algo importante a dizer, é triste mas é a verdade pura. Mas esta actividade é muito interessante.� (10º-1) �A actividade em alguns grupos é melhor do que em outros, mas acho que em todos tem sido positivo.� (10º-1) �Eu tive muito prazer em fazer este trabalho pois aprendi muito e quero continuar a fazer trabalhos destes.� (10º-3) �Estas actividades levam-nos a puxar pela cabeça e prepararem-nos para um futuro próximo.� (10º-3)
4.1.3 Dados das entrevistas aos professores
As opiniões apresentadas resultam da análise de conteúdo das entrevistas
semi-estruturadas a cada um dos professores envolvidos na investigação.
4.1.3.1 Aplicação do chapéu vermelho (sentimentos, emoções, palpites, intuições)
Os sentimentos dos professores relativamente ao tema das actividades �
as vantagens/desvantagens dos novos avanços na área da Genética e da
Biotecnologia � foram bastante positivos. No seu conjunto, classificaram-no de
actual, pertinente, polémico, interessante, entusiasmante, enriquecedor, motivador
e adequado aos programas que leccionavam. No entanto, tanto a Clara como a
Filomena, apesar de referirem vários destes adjectivos, sentiram alguma
insegurança na abordagem do tema, motivada pelo facto de não se considerarem
preparadas para responderem a todas as questões dos alunos.
O António salientou a utilidade, a pertinência e a dimensão humanizante do
105
tema. Como ele próprio afirmou:
�Senti que estava a fazer uma coisa que me interessava. Tive uma sensação de grande regozijo interior e de utilidade; senti que estas actividades estavam a ser úteis para os alunos e também para mim. Aqueles conteúdos são fundamentais, ... são necessários na vida humana, na nossa existência enquanto seres que procuramos um caminho. A qualidade destes temas é importante na medida em que, pelo menos nós, saímos com algo que nos torna mais pessoas, que nos humaniza. Durante a realização das actividades, o sentimento de humanização foi muito profundo. Toda a informação que analisámos, os diálogos que tivemos, a reflexão, permitiram-me crescer. Achei extremamente interessante e bastante actual. (...) Foi a primeira vez que abordei com alguém esta temática extremamente enriquecedora.�
O José realçou o clima de entusiasmo, de interesse e de motivação
despoletado pelo tema das actividades:
�Tocámos num ponto importante, central, que é o Homem, a Sociedade e o Futuro. O que os entusiasmou. Foi motivador. Foi um dos grandes momentos em que vi os meus alunos motivados. Nunca chegavam atrasados às aulas. Estavam constantemente a fazer-me perguntas. Durante aquele tempo eles integraram-se plenamente na matéria e nas actividades. Foi espectacular. Senti estas aulas como tempo ganho, útil. São temas que acabam por puxar muitos assuntos que têm a ver com Filosofia, com a Ciência. Foi um período produtivo. (...) Fiz da aula uma mesa redonda, foi engraçado. Houve qualidade na discussão dos assuntos. Tornou-se uma aula viva, interessante.�
Quanto à metodologia utilizada � discussão em grupo de acordo com o
método �Os Seis Chapéus do Raciocínio� � os sentimentos dos professores
variaram entre o interesse, a motivação, a confusão e alguma dificuldade. O
106
sentimento mais generalizado foi de interesse:
�Achei a metodologia muito interessante. É de intriga. Sinto-me interessada e motivada para utilizar novamente a metodologia com qualquer tipo de assunto: análise de textos, ... tudo o que envolva conflitos, diferença de opiniões...� (Aida) �Achei a metodologia interessante. Os alunos não têm hábitos de trabalho, não têm método, logo esta metodologia é uma forma de criar-lhes o interesse e de os orientar.� (António) �A metodologia veio engrandecer a nossa relação, a nossa aula.� (José)
Na opinião do José e do António esta metodologia apresenta, ainda, a
vantagem de explorar os sentimentos e as emoções, não se limitando a uma mera
discussão de factos:
�A partir do momento em que realizámos estas actividades, pude ver que a exploração das emoções e dos sentimentos é também importante. Temos tendência a ter em conta apenas factos.� (José) �A escola não é só estudo planificado por disciplina, é também um conjunto de emoções, de sentimentos, que o indíviduo deve considerar.� (António)
Mas nem todos os sentimentos foram positivos. A Filomena, apesar de ter
gostado da metodologia, considerou-a demasiado estruturada, demasiado rígida.
Na sua opinião, o facto de se obedecer a uma sequência rígida de chapéus pode
desencadear reacções de rejeição:
�Acho que por vezes os chapéus eram um bocado rígidos. Às vezes os alunos ficavam um bocado fartos com a rigidez da metodologia. O método dos chapéus, que eu desconhecia, é original e tem o aspecto positivo de organizar o pensamento. No entanto, quando as coisas são muito rígidas, uma pessoa tem sempre a tentação de sair. O facto de ser rígido poderá não dar gozo.�
107
No entanto, pensa que esta rigidez também pode ser útil para os alunos pois
�os seus métodos de pensar e de reflectir costumam ser desorganizados�. A Clara
e a Filomena sentiram alguma dificuldade em limitar a discussão ao tema em
causa; os alunos acabavam por discutir muitos outros temas relacionados. A
Filomena pensa que tais sentimentos resultam da falta de prática na dinamização
de aulas de debate e do maior grau de dificulade deste tipo de estratégia: �Estas
aulas de debate são mais difíceis, não tenho muita prática deste tipo de aula�.
Vários professores referiram, ainda, alguns sentimentos manifestados pelos
alunos em relação à metodologia. Enquanto que os alunos do José �acharam
piada�, os alunos da Filomena �aborreciam-se de estarem a utilizar os �chapéus�;
queriam logo passar à discussão�. A Clara notou alguma dificuldade inicial na
distinção das funções dos diferentes �chapéus� que desapareceu com o decorrer
das actividades. Sentiu, ainda, que o número de actividades realizadas foi
demasiado, tendo notado alguma saturação nos alunos nas duas últimas sessões.
Segundo a Aida, os alunos não conseguiram perceber o espírito das actividades,
limitando-se, muitas vezes, a defenderem acerrimamente os seus pontos de vista.
Por vezes, surgiram mesmo alguns atritos motivados pela divergência de opiniões.
4.1.3.2 Aplicação do chapéu amarelo (aspectos positivos, vantagens, benefícios)
Como aspectos positivos do tema das actividades, os professores foram
unânimes no reconhecimento da sua relevância, para a vida dos cidadãos e para o
futuro da humanidade, e das suas potencialidades: a) na motivação de alunos e
professores; b) na promoção da interacção na sala de aula; e c) no
desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo dos alunos. Na opinião do José, �o
ponto central das actividades foi o tema. Outro tema provavelmente não teria
resultado tão bem..., teríamos tido dificuldade em implementar a metodologia...�.
108
A relevância da discussão e do conhecimento das vantagens/desvantagens
dos novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia ficou bem evidente em
várias afirmações:
�São temas que nos interessam como pessoas que vivemos em Sociedade, em comum. Alguns destes temas poderão até influenciar a nossa vida. Devemos tomar conhecimento destes temas para estarmos informados de modo a podermos agir de forma eficaz.� (Aida) �Centrámos a nossa discussão no Futuro. Qual poderá ser o nosso futuro? (...) É importante que os alunos tenham opiniões fundamentadas.� (José) �É um tema que não é abordado usualmente e que no fundo é muito importante no futuro e para o qual não estamos preparados. Nem há muitas informações sobre isso. No entanto, é algo que mexe com a nossa ética e a nossa moral; é algo que evolui cada vez mais e para o qual devemos estar preparados.� (Filomena)
Outras potencialidades atribuídas ao tema foram a motivação dos alunos e a
estimulação da interacção na sala de aula. Os professores entrevistados
consideraram que temas polémicos e actuais, como a Genética e a Biotecnologia,
são geradores de reflexão e de debate. Pensam, também, que a interacção
estabelecida facilitou a troca de informação e o esclarecimento de dúvidas e se
traduziu numa melhoria significativa do ambiente da sala de aula. Como eles
próprios referiram:
�Os temas são muito motivadores apesar de, à partida, os alunos acharem que aquilo era muito maçudo. Logo as palavras Engenharia Genética e Biotecnologia...; achavam que era muito técnico... (...) Mas eles gostaram imenso. Agora, volta na volta, aparecem-me com recortes de jornais ou com comentários sobre notícias que viram no telejornal.� (Filomena) �Alunos que nunca tinham intervido, participaram activamente.� (José) �O facto dos temas serem apresentados em dilemas faz com que os alunos se interroguem, se empenhem na procura de soluções.
109
Acabamos por pensar que é algo que está a acontecer connosco. E se acontecesse comigo? Qual seria a minha reacção? Os alunos acabam por pensar como adultos, a sério; não brincam. Levam o assunto a sério.� (José) �O tema despertou nos alunos uma série de interrogações sobre coisas que eles julgavam conhecer e dominar. Foi um ponto de partida para um debate extremamente frutificante para alunos e professores com base em toda a informação disponível. Eles interrogam-se sobre estas matérias e estão muito receptivos e abertos a este tipo de matérias.� (António) �Durante as aulas criou-se um ambiente de diálogo que favoreceu a discussão de dúvidas muitas vezes apenas relacionadas indirectamente com o tema. Entre os alunos começou a haver mais relação e troca de informações. Houve uma melhoria na relação e na qualidade da relação entre os próprios alunos. Houve também um aproximar do professor. (...) A relação entre mim e eles melhorou.� (António) �O ambiente mais activo e participativo melhorou o ambiente na sala de aula; aproximou mais os alunos de mim e aproximou-os muito mais uns dos outros.� (Clara) �Estas actividades tiveram um aspecto formativo quer para mim quer para os alunos. Aprendemos sobre estes temas. Muitas vezes não sabemos o que querem dizer muitos dos termos e conceitos que, frequentemente, ouvimos nos órgãos de comunicação social.� (Aida) �Nota-se que através do trabalho do grupo os alunos se interrogam sobre diversas coisas de diferente natureza que anteriormente não tinham questionado.� (António)
Na opinião de alguns dos professores entrevistados, a discussão destes
temas levou a uma alteração da imagem que os alunos tinham da Filosofia:
�Os alunos não se sentiram obrigados a encafuar matéria na cabeça; havia uma série de coisas que lhes interessavam para a sua vida. (...) Deixaram de encarar a Filosofia como algo muito abstrato, matéria que se tem que memorizar. (...) A Filosofia tem uma linguagem que por vezes nos distancia dos alunos.� (António) �Muitas vezes pensamos a Filosofia num campo mais abstracto. Neste momento posso dizer que a Filosofia desceu à Terra, ao Indivíduo e engrandeceu os meus alunos. Os meus alunos não ficaram com a noção de que a Filosofia é um conjunto de temas pouco relacionados com a vida sobre os quais se especula.� (José)
110
Outro aspecto positivo do tema, apontado pela Clara, foi a sua boa
adequação aos programas de Filosofia, mais especificamente às unidades
relativas às consequências do desenvolvimento da Ciência e aos valores éticos.
Relativamente aos aspectos positivos da metodologia, todos os professores
realçaram o facto de orientar/organizar o raciocínio dos alunos. Consideram que
�Os Seis Chapéus do Raciocínio�, além de rentabilizarem e de potenciarem a
discussão em grupo, constituem um método eficiente de orientação e de
organização do pensamento, passível de ser aplicado a várias situações. Na sua
opinião, esta metodologia:
�Obriga-os a organizarem-se, a dirigirem o raciocínio de acordo com uma metodologia, um método. O raciocínio dos alunos, se não for orientado, é muitas vezes anárquico. É um raciocínio que não leva a lado nenhum.� (António) �Dava uma boa indicação aos alunos sobre o percurso a seguir e penso que se verificou depois, ao longo de algumas sessões, uma certa evolução na forma de raciocinar. Para já, eles tinham mais prática no assunto e depois penso que foi positiva a aplicação desta organização mental a outras actividades. Não apliquei propriamente os chapéus, mas a simples referência aos chapéus permitiu-me explicar mais facilmente o objectivo de algumas actividades.� (Clara) �É muito importante porque os ajuda a organizar o seu pensamento. Como é por fases, ajuda-os a ter consciência da fase em que estão. Tiram partido da análise mais consciente de uma situação.� (Aida) �É original e tem o aspecto positivo de organizar o pensamento.� (Filomena) �Faz com que os alunos possam ser mais disciplinados em termos da organização do pensamento. Faz com que se concentrem mais e digam aquilo que sentiram e pensaram. Rentabiliza o trabalho. Esta metodologia veio ajudar-nos bastante. Houve uma maior participação dos alunos. Mesmo os mais tímidos foram capazes de colaborarem, de darem opiniões e de dizerem o que tinham sentido. A discussão dos temas sem a metodologia seria algo dispersivo. Não haveria uma sequência, uma estrutura ordenada. No fundo há uma atenção centrada. Sem esta metodologia os alunos acabam por se perder. Não vejo vantagem nas actividades sem a
111
metodologia. O tema motiva mas não garante um resultado final.� (José)
4.1.3.3 Aplicação do chapéu preto (aspectos negativos, fraquezas, problemas)
Relativamente ao tema das actividades, não foram apontados pontos
negativos. Todos os professores realçaram, mais uma vez, os aspectos positivos
do mesmo.
Quanto à metodologia, o único ponto negativo foi apontado pela Filomena.
Considera que a pouca flexibilidade da metodologia � a utilização de sequências
rígidas de �chapéus� � pode desencadear reacções de rejeição por parte dos
alunos. Curiosamente, também foram os seus alunos (12º 1) que mais referiram
este ponto.
Na opinião dos restantes professores não existiu qualquer aspecto negativo
na utilização da metodologia. No entanto, tanto o António como a Aida
mostraram-se preocupados com a sua eventual utilização sistemática, realçando a
necessidade dos professores diversificarem estratégias.
4.1.3.4 Aplicação do chapéu verde (sugestões, novas ideias, alternativas)
Quanto ao tema discutido, os professores entrevistados não sugeriram
qualquer alteração. Todos o consideraram muito interessante e bem adequado a
este tipo de actividade.
Relativamente à metodologia, as sugestões apresentadas incidiram na sua
eventual aplicação a outras áreas disciplinares, na utilização de um menor número
de actividades e na forma como a informação foi fornecida aos alunos. O José
considera que esta metodologia, dadas as suas potencialidades, deveria ser
112
utilizada pelos diferentes grupos disciplinares:
�Considero que se deveria implementar a utilização desta metodologia em todas as áreas disciplinares. Acho que seria interessante que logo no início do ano escolar se preparassem e estruturassem as aulas de forma a poder-se utilizar mais vezes esta metodologia porque é rentável tanto para o professor como para o aluno. Torna-se o resultado mais objectivo. Vêem-se resultados. Não se perde informação. Tem-se em conta todos os aspectos. Penso que no grupo disciplinar devíamos pensar seriamente em utilizar este tipo de actividades.�
Tanto a Aida como a Clara sugerem a redução do número de actividades ou
a sua discussão de uma forma mais espaçada, de modo a não saturar os alunos.
Por sua vez, Filomena sugere alterações na forma de apresentação da informação
preliminar. Considera, ainda, que não se deveriam ter imposto �Os Seis Chapéus
do Raciocínio� como método de discussão para todas as actividades. Na sua
opinião:
�Os alunos achavam engraçado que houvesse uma maior informação por parte de alguém que percebesse bem do assunto. Sugeriram imagens, vídeos... Até para os motivar, eu acho que seria importante, que no início de uma unidade destas, alguém dentro do assunto desse uma aula de introdução e de motivação. Os textos de introdução entregues aos alunos desmotivaram-nos um pouco. Teria sido bom começar antes com um vídeo ou com um seminário sobre o assunto; era capaz de os ter motivado mais, tenho a certeza absoluta.� �Seria interessante averiguar as metodologias seguidas pelos alunos se não tivessem que utilizar os chapéus. Fazerem primeiro como eles sentem. Em vez de começar logo com os chapéus, seria interessante deixá-los organizar a discussão como entendessem e depois, numa segunda fase, utilizar os chapéus e deixá-los comparar os métodos utilizados.� (Filomena)
113
4.1.3.5 Aplicação do chapéu azul (avaliação global)
As avaliações globais foram positivas. De uma maneira geral, salientaram o
aspecto formativo das actividades na aquisição e compreensão de conhecimentos
e na estruturação do pensamento.
A Aida considera que as actividades realizadas permitiram o
aprofundamento, a estruturação e a organização de conhecimentos sobre
Biotecnologia e Genética e das suas relações com a Sociedade. Na sua opinião, a
metodologia utilizada ajuda, tanto professores como alunos, a estruturarem o
pensamento.
O António destaca a importância da interacção no desenvolvimento
sócio-afectivo e cognitivo de professores e alunos:
�Sentimo-nos mais realizados quando nos manifestamos, quando nos podemos pronunciar. Nós professores precisamos muito disto. Hoje em dia ninguém diz nada a ninguém. Guarda-se o conhecimento, ninguém partilha informações. Esta partilha, este diálogo, é essencial para nos humanizarmos cada vez mais.
Considero que a minha participação neste estudo me enriqueceu e enriqueceu a escola. Foi algo muito profundo. Fomos muito ao fundo de certas questões que normalmente não são questionadas.
A organização das actividades desta forma foi benéfica tanto para mim como para os alunos. Estruturei e organizei conhecimentos adormecidos. Depois, despertei para uma série de coisas que têm a ver não só com os conhecimentos que adquiri mas também com a minha reflexão. A reflexão para mim é muito importante. Entrámos num campo científico que eu desejava aprofundar, mas os interlocutores informados são muito poucos. Foi fácil discutir e aprender.�
O António referiu, ainda, a importância da utilização d��Os Seis Chapéus do
114
Raciocínio� nas escolas:
�Acho que este método é importante porque nas escolas não se transmite organização e método de estudo. Esquecemos muitas vezes que o estudante precisa de ter um método.�
Para a Clara, a apreciação global variou consoante a turma:
�Na turma do 11º ano foi bastante positivo. Permitiu enquadrar, bastante bem, conteúdos programáticos. Em termos de raciocínio foi bastante positivo para alguns alunos. Passei a notar uma maior organização de pensamento e de redacção em alguns alunos. Na turma de 10º ano os resultados foram afectados pela indisciplina e pelo desinteresse da turma. Houve dias que correram bem, outros que correram mal. Acabei por desistir desta metodologia na última aula.�
No entanto, considerou que as actividades foram proveitosas tanto para ela
como para os seus alunos:
�Os alunos aprenderam sobre o tema; principalmente sobre eugenia que foi o tema que teve maior receptividade. No geral foi positivo para eles e para mim em termos de estratégia e de tema, ... de como agarrar o tema. Aprendi bastante em termos de conhecimento e inclusivamente em termos de metodologia: pude organizar um bocadinho melhor algumas estratégias; organizar mais o raciocínio.�
A avaliação global feita pela Filomena foi, segundo as suas próprias
palavras, �muito positiva�. Considerou muito interessantes tanto o tema como as
discussões propostas. No entanto, pensa que a metodologia, apesar de ter �o
aspecto positivo de organizar o pensamento�, pode desmotivar os alunos pela sua
rigidez.
115
O José, na sua avaliação global, salientou as potencialidades das
actividades na alteração da imagem da disciplina de Filosofia, na motivação dos
seus alunos e na organização do pensamento:
�Muitas vezes pensamos a Filosofia num campo mais abstracto. Neste momento posso dizer que a Filosofia desceu à Terra, ao Indivíduo e engrandeceu os meus alunos. Os meus alunos não ficaram com a noção de que a Filosofia é um conjunto de temas, pouco relacionados com a vida, sobre os quais se especula. Agora, nos corredores, na sala de aula, no bar, os alunos costumam perguntar-me quando é que vamos discutir mais actividades. Muitas vezes tocava para a saída e os alunos permaneciam sentados. E esse hábito manteve-se mesmo depois das actividades terem acabado. Pela primeira vez os alunos escreveram relatórios, e com vontade! O professor sai da aula com a certeza de que a aula foi bem conseguida. Os alunos estavam de tal maneira motivados que era frequente colocarem-me dúvidas (sobre os assuntos em discussão) nos corredores, no bar...�
Na opinião do José, o professor desempenha um papel decisivo na
motivação dos seus alunos:
�A atitude do professor foi rica. Acabei por saber estar numa sala de aula. Acabei por dar aulas com uma atitude, e da forma, que eu considero que é importante; estar na aula sem a limitação do tempo. É frustrante ver que os alunos muitas vezes não estão a ouvir, não estão na sala de aula. A motivação e a atenção dependem muito da forma e da atitude do professor na sala de aula. Acho que a atitude do professor também deve mudar. Quando as coisas não interessam aos alunos...�
Finalmente, referiu a importância da metodologia utilizada na organização
do pensamento:
�Creio que a metodologia disciplina o pensamento e que pode
116
ser transferida para outras situações. Passou-se do caos à ordem. Ordenou-se o pensamento. Foi um período produtivo.�
4.1.4 Dados dos questionários de opinião sobre Biotecnologia
A aplicação do questionário de opinião (Anexo 3) destinou-se a avaliar o
impacto das actividades de discussão nas opiniões dos alunos sobre
Biotecnologia. Com o objectivo de detectar eventuais variações de opinião, foi
aplicado o mesmo questionário no início e no final do estudo. O questionário era
constituído por 22 afirmações diferentes sobre relações entre Ciência, Tecnologia
e Sociedade, relativamente às quais os alunos deviam indicar a sua opinião
utilizando uma escala com cinco opções que variava entre �concordo totalmente� e
�discordo totalmente� (Anexo 3).
As opiniões dos alunos em função dos sub-temas discutidos estão
apresentadas em número e percentagem de respostas por opção, antes e depois
da realização das actividades de discussão (Quadros 3 a 11). Também foram
registadas as diferenças de opinião detectadas entre o primeiro e o segundo
questionário. Cada quadro centra-se em determinadas afirmações,
correspondentes a um dos sub-temas discutidos. Uma análise global das respostas
dos alunos permite constatar algumas alterações significativas de opinião depois
da realização das actividades de discussão.
4.1.4.1 Crescimento científico e tecnológico e bem estar social
Na opinião dos alunos participantes no estudo, existe uma associação entre
o bem estar social e o crescimento científico e tecnológico, em geral, e o
desenvolvimento da tecnologia genética, em particular (Quadro 3, afirmações 1 e
10). Esta associação, que já era nítida no início do estudo, foi reforçada pela
diminuição considerável do elevado número de indecisos � afirmação 1 � e pela
117
modificação de opiniões � afirmação 10 � após a realização das actividades de
discussão. No entanto, é de salientar o número elevado de alunos �
aproximadamente um terço � que mantém dúvidas quanto à capacidade da
tecnologia genética melhorar as condições de vida da população.
Quadro 3
Crescimento Científico e Tecnológico e Bem Estar Social
Afirmações C T C Ñ C D D T
1 O crescimento científico e tecnológico produz
Antes 7 (5,9%)
60 (50,9%)
40 (33,9%)
10 (8,5%)
1 (0,8%)
bem estar social Depois 15
(12,7%) 71
(60,2%) 23
(19,5%) 9
(7,6%) 0
(0,0%)
Diferença 8 (6,8%)
11 (9,3%)
17 (14,4%)
1 (0,8%)
1 (0,8%)
10 A tecnologia genética melhora as condições
Antes 6 (5,1%)
48 (40,7%)
43 (36,4%)
19 (16,1%)
2 (1,7%)
de vida da população Depois 5
(4,2%) 60
(50,9%) 40
(33,9%) 12
(10,2%) 1 (0,8%)
Diferença 1
(0,8%) 12
(10,2%) 3
(2,5%) 7
(5,9%) 1
(0,8%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
4.1.4.2 Engenharia genética - potencialidades e perigos
Quanto às potencialidades e aos perigos da engenharia genética, as
opiniões dos alunos são curiosas (Quadro 4, afirmações 7, 9 e 14). Embora uma
percentagem considerável se manifeste indecisa, reconhece-se que, apesar dos
alunos se terem revelado receosos e preocupados com as suas aplicações, a
esperança nas suas potencialidades é tal que muitos defenderam a sua utilização
no melhoramento dos seres vivos.
O medo relativamente às aplicações da engenharia genética parece
evidente. Para muitos alunos, o perigo de uma eventual manipulação do código
118
genético é comparável ao das armas nucleares. A discussão deste assunto veio
reforçar ainda mais este sentimento (Quadro 4, afirmações 7 e 9). No entanto,
simultaneamente, as actividades de discussão permitiram um aumento significativo
do sentimento de esperança nas aplicações da engenharia genética (Quadro 4,
afirmação 14) que resultou de uma diminuição do número de indecisos. Verifica-se,
inclusivamente, que no final do estudo o conjunto dos alunos manifesta mais
esperança do que medo.
Quadro 4
Sentimentos Relativamente à Engenharia Genética
Afirmações C T C Ñ C D D T
7 A engenharia genética provoca medo
Antes 11 (9,3%)
37 (31,4%)
34 (28,8%)
28 (23,7%)
8 (6,8%)
Depois 17
(14,4%) 48
(40,7%) 33
(28,0%) 16
(13,6%) 4
(3,4%)
Diferença 6 (5,1%)
11 (9,3%)
1 (0,8%)
12 (10,2%)
4 (3,4%)
9 A possibilidade de manipulação do código genético é tão perigosa
Antes 27 (22,9%)
40 (33,9%)
33 (28,0%)
15 (12,7%)
3 (2,5%)
quanto as armas nucleares Depois 41
(34,8%) 40
(33,9%) 29
(24,6%) 7
(5,9%) 1
(0,8%)
Diferença 14 (11,9%)
0 (0,0%)
4 (3,4%)
8 (6,8%)
2 (1,7%)
14 A engenharia genética provoca esperança
Antes 21 (17,8%)
64 (54,2%)
29 (24,6%)
4 (3,4%)
0 (0,0%)
Depois 18
(15,3%) 86
(72,9%) 10
(8,5%) 3
(2,5%) 1
(0,8%)
Diferença 3
(2,5%) 22
(18,6%) 19
(16,1%) 1
(0,8%) 1
(0,8%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
Provavelmente, é a esperança nas potencialidades da engenharia genética
que leva bastantes alunos a concordarem com a sua utilização no melhoramento
de espécies vegetais e animais, incluindo a espécie humana (Quadro 5,
119
afirmações 4, 8 e 16). Verifica-se, mesmo, que o número de opiniões concordantes
é sempre superior ao de opiniões discordantes. Contudo, o número de indecisos
quanto a um eventual melhoramento de espécies vegetais e animais, incluindo a
espécie humana, foi bastante elevado tanto antes como depois das actividades de
discussão. Com a discussão destes assuntos, as opiniões dos alunos relativas ao
eventual melhoramento das espécies vegetais e humana não sofreram alterações
consideráveis. No entanto, relativamente ao melhoramento genético das espécies
animais, verificou-se uma diminuição do número de opiniões desfavoráveis e um
aumento do número de indecisos.
Quadro 5
Engenharia Genética e Melhoramento dos Seres Vivos
Afirmações C T C Ñ C D D T
4 A engenharia genética deve ser utilizada no melhoramento da
Antes 18 (15,3%)
37 (31,4%)
27 (22,9%)
16 (13,6%)
20 (17,0%)
espécie humana Depois 17
(14,4%) 38
(32,2%) 32
(27,1%) 16
(13,6%) 15
(12,7%)
Diferença 1
(0,8%) 1
(0,8%) 5
(4,2%) 0
(0,0%) 5
(4,2%)
8 A engenharia genética deve ser utilizada no melhoramento de
Antes 9 (7,6%)
36 (30,5%)
30 (25,4%)
31 (26,3%)
12 (10,2%)
espécies animais Depois 15
(12,7%) 36
(30,5%) 44
(37,3%) 17
(14,4%) 6
(5,1%)
Diferença 6 (5,1%)
0 (0,0%)
14 (11,9%)
14 (11,9%)
6 (5,1%)
16 A engenharia genética deve ser utilizada no melhoramento de
Antes 16 (13,6%)
42 (35,6%)
35 (29,7%)
17 (14,4%)
8 (6,8%)
espécies vegetais Depois 16
(13,6%) 45
(38,1%) 34
(28,8%) 19
(16,1%) 4
(3,4%)
Diferença 0 (0,0%)
3 (2,5%)
1 (0,8%)
2 (1,7%)
4 (3,4%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
120
4.1.4.3 Análise do património genético - potencialidades e perigos
As opiniões dos alunos quanto à realização de análises ao património
genético variaram consoante a utilização sugerida para a informação assim obtida.
A grande maioria concorda que qualquer pessoa deveria fazer exames genéticos
para averiguar a possibilidade de ser portadora de genes responsáveis por
doenças (Quadro 6, afirmação 22).
Quadro 6
Utilização do Diagnóstico Genético
Afirmações C T C Ñ C D D T
18 As companhias de seguros têm o direito de conhecer o património genético das pessoas que pretendam seguros de
Antes 4 (3,4%)
14 (11,9%)
50 (42,4%)
26 (22,0%)
34 (28,8%)
vida, de forma a poderem recusar os candidatos cuja probabilidade de virem a desenvolver doenças de origem genética seja elevada
Depois 4 (3,4%)
13 (11,0%)
24 (20,3%)
30 (25,4%)
47 (39,8%)
Diferença 0 (0,0%)
1 (0,8%)
26 (22,0%)
4 (3,4%)
13 (11,0%)
22 Qualquer pessoa deve fazer exames genéticos para averiguar a
Antes 56 (47,5%)
47 (39,8%)
13 (11,0%)
2 (1,7%)
0 (0,0%)
possibilidade de ser portadora de genes responsáveis por doenças
Depois 48 (40,7%)
47 (39,8%)
16 (13,0%)
4 (3,4%)
3 (2,5%)
Diferença 8
(6,8%) 0
(0,0%) 3
(2,5%) 2
(1,7%) 3
(2,5%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
No entanto, a maioria dos alunos discorda da eventual utilização de análises
genéticas por companhias de seguros ou empregadores, sempre que essa
utilização vise recusar seguros de vida ou emprego a indivíduos que revelem
121
probabilidades elevadas de virem a desenvolver doenças de origem genética
(Quadro 6, afirmação 18). Relativamente a esta última afirmação, é interessante
verificar como a discussão deste tópico nas aulas levou à diminuição considerável
do elevado número de indecisos; no final do estudo, mais de metade destes alunos
opunha-se à utilização de diagnósticos genéticos por companhias de seguros ou
empregadores.
No caso de se detectarem deformações ou mutações genéticas no feto, a
maioria dos alunos considerou que os pais devem optar pelo aborto terapêutico
(Quadro 7, afirmação 3). Muitos consideraram mesmo que perante um feto no qual
se detecte uma doença genética grave, e se os pais optarem por ter esse filho, o
Estado deve obrigá-los a suportar sozinhos as despesas médicas resultantes
(Quadro 7, afirmação 19).
Quadro 7
Diagnóstico Genético e Aborto Terapêutico
Afirmações C T C Ñ C D D T
3 Os pais devem optar pelo aborto terapêutico sempre que saibam, através de testes de
Antes 46 (39,0%)
27 (22,9%)
20 (17,0%)
18 (15,3%)
7 (5,9%)
diagnóstico pré-natal, que o feto apresenta alguma deformação ou mutação genética
Depois 27 (22,9%)
37 (31,4%)
24 (20,3%)
24 (20,3%)
6 (5,1%)
Diferença 19 (16,1%)
10 (8,5%)
4 (3,4%)
6 (5,1%)
1 (0,8%)
19 Perante um feto em que se detectou uma doença genética grave, e se os pais optarem
Antes 18 (15,3%)
37 (31,4%)
27 (22,9%)
16 (13,6%)
20 (17,0%)
por ter esse filho, o Estado deve obrigá-los a suportar sózinhos as despesas médicas resultantes
Depois 17 (14,4%)
38 (32,2%)
32 (27,1%)
16 (13,6%)
15 (12,7%)
Diferença 1 (0,8%)
1 (0,8%)
5 (4,2%)
0 (0,0%)
5 (4,2%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
122
Contudo, depois da discussão do tema, houve uma diminuição nítida do
número de opiniões totalmente favoráveis ao aborto terapêutico e um aumento dos
que concordavam apenas, dos indecisos e dos que discordavam.
Quanto à afirmação 19 (Quadro 7), as actividades de discussão apenas
fizeram aumentar ligeiramente o número de indecisos, em detrimento das opiniões
contrárias à imposição estatal dos pais suportarem sozinhos os encargos médicos
resultantes do nascimento de um filho cuja doença genética fosse conhecida antes
do nascimento.
Em relação à eventual eliminação à nascença dos seres humanos não
aprovados em testes de dotação genética, a maioria dos alunos opôs-se
terminantemente (Quadro 8, afirmação 5). No entanto, após a discussão geral do
tema, o número de indecisões e de opiniões favoráveis aumentou.
Quadro 8
Diagnóstico Genético e Eugenia
Afirmações C T C Ñ C D D T
5 Nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido como ser humano antes de ser
Antes 0 (0,0%)
1 (0,8%)
5 (4,2%)
25 (21,2%)
87 (73,7%)
aprovado em testes de dotação genética; os reprovados deveriam perder o direito à vida
Depois 3 (2,5%)
4 (3,4%)
13 (11,0%)
24 (20,3%)
74 (62,7%)
Diferença 3 (2,5%)
3 (2,5%)
8 (6,8%)
1 (0,8%)
13 (11,0%)
20 Os indivíduos que apresentam doenças genéticas causadoras de deficiência mental ou de deformações
Antes 15 (12,7%)
20 (17,0%)
39 (33,1%)
23 (19,5%)
21 (17,8%)
devem ser impedidos de transmitir essas características aos seus descendentes, ou seja, devem ser impedidos de ter filhos
Depois 10 (8,5%)
17 (14,4%)
34 (28,8%)
33 (28,0%)
24 (20,3%)
Diferença 5 (4,2%)
3 (2,5%)
5 (4,2%)
10 (8,5%)
3 (2,5%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
123
Muitos alunos opuseram-se a que os indivíduos portadores de doenças
genéticas responsáveis por deficiência mental ou deformações fossem impedidos
de ter filhos, mesmo havendo possibilidade dessas características serem
transmitidas aos descendentes (Quadro 8, afirmação 20). No entanto, o número de
indecisos foi elevado. Depois da realização das actividades de discussão este
número manteve-se elevado, apesar do número de opiniões contrárias ter sido
reforçado.
4.1.4.4 Os cidadãos e a Biotecnologia
Na opinião dos alunos, toda a população deveria estar informada sobre os
limites e as potencialidades da Biotecnologia (Quadro 9, afirmação 11).
Consideraram que a escola deve desempenhar um papel relevante na informação
e esclarecimento da população, proporcionando espaços de debate sobre o
impacto da Biotecnologia na Sociedade (Quadro 9, afirmação 17). As actividades
de discussão pouco reforçaram estas opiniões.
Quadro 9
Conhecimento das Potencialidades e dos Limites da Biotecnologia
Afirmações C T C Ñ C D D T
11 Toda a população deve estar informada sobre os limites e as
Antes 83 (70,3%)
31 (26,3%)
2 (1,7%)
2 (1,7%)
0 (0,0%)
potencialidades da Biotecnologia
Depois 82 (69,5%)
34 (28,8%)
2 (1,7%)
0 (0,0%)
0 (0,0%)
Diferença 1 (0,8%)
3 (2,5%)
0 (0,0%)
2 (1,7%)
0 (0,0%)
17 A escola deve proporcionar espaços de discussão sobre o
Antes 65 (55,1%)
44 (37,3%)
8 (6,8%)
1 (0,8%)
0 (0,0%)
impacto da Biotecnologia na Sociedade
Depois 62 (52,5%)
53 (45,0%)
2 (1,7%)
0 (0,0%)
1 (0,8%)
Diferença 3 (2,5%)
9 (7,6%)
6 (5,1%)
1 (0,8%)
1 (0,8%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
124
Embora a maioria dos alunos tenha considerado que toda a população deve
ser consultada relativamente às decisões a tomar na área da investigação e,
particularmente, da Tecnologia Genética (Quadro 10, afirmação 15), muitos não
tinham a certeza da possibilidade e do dever dos cidadãos influenciarem, ou não,
estas decisões (Quadro 10, afirmações 6 e 21). A realização das actividades de
discussão centradas nas potencialidades e nos perigos da Biotecnologia parece ter
reforçado a opinião de que o cidadão pode e deve intervir na tomada de decisões
nesta área, embora o número de indecisos se tenha mantido elevado.
Quadro 10
Tomada de Decisões na Área da Biotecnologia
Afirmações C T C Ñ C D D T
6 Cada um de nós pode influenciar as decisões que os órgãos de
Antes 20 (17,0%)
36 (30,5%)
54 (45,8%)
7 (5,9%)
1 (0,8%)
poder tomam na área da Biotecnologia Depois 23
(19,5%) 45
(38,1%) 39
(33,1%) 9
(7,6%) 4
(3,4%)
Diferença 3 (2,5%)
9 (7,6%)
15 (12,7%)
2 (1,7%)
3 (2,5%)
15 Toda a população deve ser consultada relativamente às
Antes 38 (32,2%)
53 (44,9%)
20 (17,0%)
5 (4,2%)
2 (1,7%)
decisões a tomar na área da investigação e, particularmente, da Tecnologia genética
Depois 39 (33,1%)
53 (44,9%)
19 (16,1%)
7 (5,9%)
0 (0,0%)
Diferença 1 (0,8%)
0 (0,0%)
1 (0,8%)
2 (1,7%)
2 (1,7%)
21 Cada um de nós deve influenciar as decisões que os órgãos de
Antes 14 (11,9%)
51 (43,2%)
43 (36,4%)
8 (6,8%)
2 (1,7%)
poder tomam na área da Biotecnologia Depois 25
(21,2%) 47
(39,8%) 36
(30,5%) 9
(7,6%) 1
(0,8%)
Diferença 11
(9,3%) 4
(3,4%) 7
(5,9%) 1
(0,8%) 1
(0,8%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
125
4.1.4.5 Controlo da investigação na área da Biotecnologia
Relativamente ao controlo da investigação científica na área da
Biotecnologia, as reacções foram interessantes. A maioria dos alunos, apesar de
considerar que a limitação à liberdade de investigação compromete eventuais
descobertas úteis à humanidade, discorda da liberdade de investigação nesta área
(Quadro 11, afirmações 13 e 2). Considera mesmo que a Assembleia da República
deve criar legislação adequada ao controlo da investigação científica na área da
Biotecnologia (Quadro 11, afirmação 12).
Quadro 11
Controlo da Investigação na Área da Biotecnologia
Afirmações C T C Ñ C D D T
2 A investigação científica, na área da Biotecnologia, não deve estar sujeita a qualquer
Antes 8 (6,8%)
28 (23,7%)
22 (18,6%)
40 (33,9%)
20 (17,0%)
tipo de restrição ou de controlo; deve existir total liberdade de investigação
Depois 5 (4,2%)
20 (17,0%)
25 (21,2%)
41 (34,8%)
27 (22,9%)
Diferença 3 (2,5%)
8 (6,8%)
3 (2,5%)
1 (0,8%)
7 (5,9%)
12 A Assembleia da República deve criar legislação que controle
Antes 39 (33,1%)
59 (50,0%)
14 (11,9%)
6 (5,1%)
0 (0,0%)
a investigação científica na área da Biotecnologia
Depois 54 (45,8%)
50 (42,4%)
9 (7,6%)
4 (3,4%)
1 (0,8%)
Diferença 15 (12,7%)
9 (7,6%)
5 (4,2%)
2 (1,7%)
1 (0,8%)
13 A limitação à liberdade de investigação compromete eventuais
Antes 22 (18,6%)
51 (43,2%)
32 (27,1%)
12 (10,2%)
1 (0,8%)
descobertas úteis à humanidade Depois 7
(5,9%) 64
(54,2%) 39
(33,1%) 7
(5,9%) 1
(0,8%)
Diferença 15
(12,7%) 13
(11,0%) 7
(5,9%) 5
(4,2%) 0
(0,0%)
Nota: C T- Concordo totalmente; C- Concordo; Ñ C- Não tenho a certeza; D- Discordo; D T- Discordo totalmente.
126
Após a realização das actividades de discussão, verificou-se um aumento
do número de alunos que concorda totalmente com a publicação de legislação
restritiva pela Assembleia da República e um ligeiro aumento do número de
indecisos relativamente às vantagens/desvantagens da limitação da investigação.
4.2 Análise dos Resultados
Este estudo evidencia o papel positivo da discussão em grupo de temas
controversos, na mesma linha de opiniões e resultados de investigação referidos
no segundo capítulo. O conjunto dos resultados obtidos permite afirmar que as
actividades de discussão em grupo, centradas nas vantagens e desvantagens dos
novos avanços na área da Genética e da Biotecnologia, permitiram alcançar vários
dos objectivos propostos:
1. Estimular a participação e o envolvimento dos alunos nas actividades
escolares propostas;
2. Criar um ambiente de interacção na sala de aula que poderá promover:
a) a construção de conhecimentos sobre os novos avanços na área da
Biotecnologia e da Genética e as suas inter-relações com a Sociedade;
b) o desenvolvimento de competências cognitivas; e
c) o desenvolvimento de competências sócio-afectivas.
As potencialidades do tema para a motivação dos alunos e para a
estimulação do debate foram claras: a sua actualidade, interesse, controvérsia e
relevância para a vida dos cidadãos motivaram os alunos e desencadearam
reflexão e debate. A motivação e o interesse revelados pelos alunos, associados à
quantidade e à qualidade das interacções estabelecidas, constituem os aspectos
positivos mais evidentes das actividades de discussão. A interacção estabelecida
127
revelou-se positiva no aprofundamento e na melhoria das relações entre os
participantes, na promoção de capacidades de análise de informação e de
argumentação e na construção de conhecimentos e esclarecimento de dúvidas
sobre os novos avanços na área da Biotecnologia e da Genética e as suas
inter-relações com a Sociedade.
Os resultados obtidos contrariam a opinião, comum entre os professores da
escola, de que os alunos não têm capacidades de pensamento: a qualidade das
interacções estabelecidas durante as sessões de discussão revelaram
capacidades de raciocínio consideráveis. Este facto vê-se apoiado pela afirmação
de Smith (1990), segundo a qual o pensamento de qualquer indivíduo é
prioritariamente determinado por factores motivacionais desencadeados pelo tema
e pela metodologia e não por capacidades intelectuais específicas. Provavelmente,
a qualidade do pensamento em ocasiões específicas não está relacionada apenas
com o facto de terem sido correctamente ensinadas as capacidades adequadas,
dependendo principalmente de questões motivacionais, ou seja, da disposição
para pensar. Assim, qualquer pensamento deficiente poderá resultar,
principalmente, de disposições particulares e não da ausência de algo essencial
na capacidade de pensar, sendo mais uma questão de preferência do que de
capacidade. Neste caso, o interesse, apesar de não ter sido sinónimo de eficácia,
garantiu o envolvimento no pensamento e estimulou a interacção e a
aprendizagem com outros indivíduos.
O comportamento e a atitude dos professores durante as actividades,
solicitando e valorizando as opiniões dos alunos, tentando criar um ambiente de
respeito e de tolerância, parecem ter sido decisivos na promoção do pensamento.
Provavelmente, e tal como defende Smith (1990), o direito de pensar e de exprimir
pensamentos individuais não é reconhecido/sentido por todos de igual maneira;
depende das pessoas à nossa volta, da forma como nos tratam e do nosso
consequente autoconceito. Logo, o desenvolvimento da forma como pensamos
128
talvez seja mais afectado pelo comportamento das pessoas à nossa volta, e pelo
papel que vemos ser-nos reservado nas suas actividades, do que pela instrução de
capacidades. Talvez nos tornemos sujeitos pensantes quando temos oportunidade
e razão para pensar; quando estamos rodeados de pessoas que pensam; e
quando promovem o nosso pensamento admitindo e estimulando a nossa
participação em argumentações, desafios e debates baseados no respeito. Tal
como defende Bridges (1979), dificilmente poderá realizar-se uma actividade de
discussão numa escola onde os alunos têm medo de falar livremente e onde os
professores não valorizam e não respeitam as suas opiniões. Neste estudo, o
respeito pelas opiniões e pelos sentimentos dos alunos revelou-se decisivo no
reconhecimento do direito de pensarem e de exprimirem pensamentos individuais.
Apesar disto, também parecem existir evidências de que a qualidade do
pensamento poderá ser melhorada através da utilização d��Os Seis Chapéus do
Raciocínio�, um método orientador da atenção para determinados tipos de
raciocínio. Vários alunos e professores, opinam que este método é eficaz na
orientação e na organização do pensamento, sugerindo a sua aplicação na análise
de assuntos e de situações e na resolução de problemas. Consideraram que o
raciocínio executado por sectores, ou seja, de forma compartimentada, é mais
eficaz pois diminui a confusão e impede que sejam negligenciados aspectos
decisivos. Estas opiniões coincidem com as de de Bono (1976, 1985, 1995) que vê
a complexidade como o maior inimigo do pensamento por conduzir à confusão e a
erros de percepção.
Relativamente aos aspectos positivos do conjunto da metodologia �
discussão em grupo orientada pel��Os Seis Chapéus do Raciocínio� � os alunos
realçaram o facto de estimular/organizar o pensamento e de facilitar o
desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo através da reflexão, do debate de
ideias e da discussão de opiniões diferentes. Segundo os alunos, o debate e a
discussão em grupo facilitaram a resolução de problemas e a compreensão e o
129
aprofundamento de conteúdos através da interacção de diferentes conhecimentos,
ideias e opiniões. Estas opiniões coincidem com a de Stenhouse (1970) que realça
as potencialidades da discussão no desenvolvimento cognitivo através da
interacção de diferentes perspectivas e da análise crítica dos diferentes
testemunhos. Contudo, dificilmente se poderá distinguir até que ponto os eventuais
�raciocínios mais eficazes� terão resultado da aprendizagem de capacidades de
pensamento ou de interacções e de aprendizagens efectuadas entre os alunos
durante as discussões. Ao certo, pode afirmar-se que a maior parte dos alunos e
dos professores revelou opiniões positivas relativamente a��Os Seis Chapéus do
Raciocínio� e ao seu efeito na capacidade de pensar.
Tal como Solomon (1991, 1992), constatou-se que a utilização repetida de
actividades de discussão em pequeno grupo não só contribuiu positivamente para
os processos de argumentação e de reflexão como também constituiu uma
experiência agradável e significativa em termos de aprendizagem. No entanto,
também se identificaram alguns dos problemas sentidos por Rudduck (1979, 1986)
e Lusk e Weinberg (1994) durante a realização de actividades de discussão.
Problemas como a falta de tolerância relativamente às opiniões dos colegas, a
relutância em valorizar outras opiniões, a interpretação de opiniões divergentes
como ataques pessoais, a defesa acérrima e intransigente de opiniões, com a
consequente divisão do grupo em facções, e alguma confusão durante o debate de
ideias que foram referidos tanto por alunos como por professores. Dois dos
professores sentiram falta de confiança e de preparação para a
organização/gestão de discussões, provavelmente, por falta de prática na
realização de actividades de discussão. Curiosamente, foram os seus alunos que
emitiram a quase totalidade dos comentários negativos relativos às actividades de
discussão.
Este estudo revelou, ainda, a importância da disponibilização de informação
adequada e diversificada sobre o tema em discussão, capaz de ajudar os alunos e
130
os professores a considerarem, explorarem e aprofundarem diferentes
perspectivas e vivências. A apresentação de documentários em videograma ou a
realização de seminários, centrados nas potencialidades e nos perigos dos novos
avanços na área da Biotecnologia e da Genética, que incluam testemunhos reais
de cientistas e de cidadãos comuns, poderão estimular a interacção e fornecer
informação relevante.
Neste estudo foi nítido o papel decisivo do confronto inter e intrapessoal de
ideias � conflito sócio-cognitivo � no desenvolvimento cognitivo, social e afectivo
e na apropriação de saberes. A existência de perspectivas diferentes entre os
participantes traduziu-se no aparecimento de respostas diferentes, o que
desencadeou um desequilíbrio duplo: um desequilíbrio interpessoal momentâneo,
pelo facto das respostas apresentadas serem diferentes, e um desequilíbrio
intrapessoal pela tomada de consciência individual da existência de outras
respostas, o que suscitou dúvidas sobre a sua própria resposta. Para
ultrapassarem este impasse os alunos tiveram que, simultaneamente, analisar os
pontos de vista discordantes � com base na informação disponível sobre a
problemática em questão � e gerir as relações interpessoais dentro do grupo. Na
opinião de alunos e de professores, este confronto de ideias facilitou a troca de
informações, o esclarecimento de dúvidas, a construção de conhecimento sobre os
temas em discussão e a modificação do raciocínio original através da descoberta
de eventuais inconsistências lógicas. Permitiu, também, a discussão das questões
éticas associadas a estes temas e a consequente avaliação/reformulação de
opiniões e de crenças. O clima de diálogo e de compreensão estabelecido durante
as sessões de discussão traduziu-se numa melhoria significativa das relações
entre os diferentes intervenientes � alunos e professores � e,
consequentemente, do ambiente da sala de aula. Todos estes resultados realçam
a importância da discussão em grupo onde o desconhecimento e o teor
controverso do tema, associados a uma metodologia pouco usual, parecem ter sido
131
os principais responsáveis pela quantidade e qualidade da interacção
estabelecida.
Deste modo, este estudo apoia as opiniões de Doise, Mugny e
Perret-Clermont (1975), Mugny e Doise (1978) e Perret-Clermont (1979)
relativamente à importância do conflito sócio-cognitivo no desenvolvimento
cognitivo e sócio-afectivo dos alunos e realça as potencialidades de actividades
pouco habituais na estimulação destes conflitos. À semelhança de outras
investigações (Carraher, Carraher e Schliemann, 1989; César, 1994; Perret-
Clermont e Nicolet, 1988), este trabalho evidenciou a importância de factores de
tipo psico-social no desempenho dos alunos; a quantidade e a qualidade da
interacção social despoletada pelo tema e pela discussão em grupo poderá
explicar alguns dos resultados obtidos. A invulgaridade tanto do tema como da
metodologia motivou os alunos e estimulou o conflito sócio-cognitivo. Alunos que
se destacavam por não participarem minimamente nas actividades escolares
envolveram-se activamente nos debates.
Outro aspecto significativo das actividades de discussão parece ter sido a
sua contribuição na educação para a cidadania e na promoção da literacia
científica. Como se pode constatar pelas variações de opinião dos alunos,
detectadas durante o estudo, as actividades de discussão realizadas reforçaram o
seguinte:
1. A associação entre bem estar social e o crescimento científico e
tecnológico, em geral, e o desenvolvimento da tecnologia genética, em
particular.
2. O medo de uma eventual manipulação do código genético.
3. A esperança nas aplicações da engenharia genética.
4. As opiniões favoráveis ao melhoramento genético das espécies animais.
132
5. A indecisão relativamente à utilização da engenharia genética no
melhoramento de espécies animais, em geral, e da espécie humana, em
particular.
6. As opiniões discordantes da utilização de diagnósticos genéticos por
companhias de seguros ou empregadores.
7. A opinião de que todo o cidadão pode e deve intervir na tomada de
decisões na área da Biotecnologia.
8. A necessidade da Assembleia da República publicar legislação que
imponha restrições à investigação científica.
Pode afirmar-se que a discussão das potencialidades e dos perigos de
algumas inovações na área da Biotecnologia contribuiu para a construção de uma
imagem mais humana da Ciência e da Tecnologia, baseada na compreensão das
suas interacções com a Sociedade e na avaliação das possibilidades como
factores de desenvolvimento. Uma imagem caracterizada, simultaneamente, pelo
bem estar social e pela controvérsia resultantes das aplicações da Biotecnologia.
Constatam-se, também, algumas potencialidades destas actividades no
desenvolvimento da literacia científica tal como é definida pela American
Association for the Advancement of Science (1989) ou por Shamos (1995). Estas
potencialidades foram evidenciadas por alguns progressos:
1. Na tomada de consciência da dependência entre Ciência e Tecnologia;
no conhecimento da Ciência e da Tecnologia como empreendimentos
humanos com aspectos positivos e limitações; e na utilização de
conhecimentos científicos e de formas de pensamento para fins sociais
(American Association for the Advancement of Science, 1989).
2. No conhecimento do funcionamento da Ciência e da Tecnologia; no
conhecimento público do que é a Ciência, mesmo que se conheça pouco
de Ciência; na compreensão pública do que se pode esperar da Ciência;
133
e no conhecimento de como a opinião pública relativa à Ciência poderá
ser ouvida de forma mais eficaz (Shamos, 1995).
O conhecimento, a análise e a discussão das relações entre Ciência,
Tecnologia e Sociedade parecem ter-se revelado úteis no aumento da literacia
científica, na promoção do interesse dos alunos por questões científicas e
tecnológicas e respectivas interacções com a Sociedade e na promoção do
pensamento, tal como defendem os autores do designado movimento CTS �
Ciência, Tecnologia e Sociedade (Aikenhead, 1994).
134
135
CAPÍTULO 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS, EXTENSÃO E
DESENVOLVIMENTO
Este estudo permitiu captar algumas observações informais dignas de
destaque: o potencial motivador das actividades utilizadas; a quantidade e a
qualidade das interacções estabelecidas; o interesse e o envolvimento de
professores e alunos no trabalho desenvolvido; e a preocupação dos professores
em motivarem os alunos e em solucionarem os problemas de insucesso com que
deparam diariamente.
As actividades realizadas revelaram-se extremamente motivadoras e
eficazes na estimulação de interacções sociais na sala de aula. Foi evidente o
aspecto formativo das actividades de discussão na construção e compreensão de
conhecimentos relevantes para a vida � sobre os novos avanços na área da
Biotecnologia e da Genética e as suas inter-relações com a Sociedade � e na
estruturação e desenvolvimento do pensamento. A chave deste progresso residiu
no conflito sócio-cognitivo estabelecido entre os diferentes elementos dos grupos
de trabalho, ou seja, no confronto interpessoal e intrapessoal de ideias. A análise
conjunta dos diversos pontos de vista facilitou a troca de informações, o
esclarecimento de dúvidas, a construção de conhecimento sobre os temas em
discussão e a modificação do raciocínio original através da descoberta de
eventuais inconsistências lógicas. Permitiu, também, a discussão das questões
136
éticas associadas a esses temas e a consequente avaliação/reformulação de
opiniões e de crenças. Estes resultados sugerem novas questões, passíveis de
aprofundamento em investigações futuras. Assim, seria interessante avaliar, de
forma aprofundada, o impacto destas actividades de discussão no
desenvolvimento de competências cognitivas e no desenvolvimento moral dos
alunos.
O catalisador de todo este processo foi o teor controverso do tema
associado à possibilidade de ser discutido na sala de aula por alunos e
professores, num clima de respeito pelos valores individuais e de valorização das
diferentes opiniões. Constatou-se o enorme potencial da discussão de assuntos
controversos na motivação dos alunos e na estimulação do pensamento e da
interacção social: um potencial digno de ser explorado na sala de aula. Portanto,
parece poder afirmar-se que o pensamento de qualquer indivíduo é
prioritariamente determinado por factores motivacionais e não por capacidades
intelectuais específicas. Para os alunos envolvidos neste estudo, a disposição, ou
a falta de disposição, para pensar sobre determinado assunto foi função do
interesse do mesmo, da metodologia proposta e do comportamento das pessoas à
sua volta � o reconhecimento do nosso direito a pensar e a exprimir pensamentos
individuais.
A eficácia d��Os Seis Chapéus do Raciocínio� na orientação e na
organização do pensamento, diminuindo a confusão e impedindo a negligência de
aspectos decisivos, foi salientada por muitos dos participantes. A qualidade do
pensamento parece poder ser melhorada através da utilização de instrumentos e
de estruturas orientadoras da atenção para determinados tipos de raciocínio. No
entanto, dificilmente se poderá distinguir se esta eficácia terá resultado d��Os Seis
Chapéus do Raciocínio� ou das interacções e das aprendizagens efectuadas entre
os alunos durante as discussões. Futuramente, seria interessante responder a esta
questão através da comparação da eficácia das actividades de discussão,
137
realizadas com e sem �Os Seis Chapéus do Raciocínio�, na promoção de
competências de pensamento. Por enquanto, ao certo, este estudo revelou
opiniões positivas de muitos dos participantes, tanto em relação à metodologia
como ao seu efeito na capacidade de pensar.
Outro resultado visível das actividades de discussão foi, sem dúvida, o
aprofundamento e o melhoramento das relações entre os participantes. O clima de
respeito estabelecido, o desempenho do professor assegurando a exploração
adequada do tema e a equidade durante a discussão e o papel de destaque
atribuído aos alunos na gestão das relações interpessoais dentro do grupo,
constituiram factores decisivos no aperfeiçoamento das relações entre os
intervenientes.
Todos estas evidências realçam a importância da discussão de assuntos
controversos e da interacção social no desenvolvimento cognitivo e sócio-afectivo
dos indivíduos.
Este estudo revelou, também, o papel decisivo da disponibilização de
informação relevante e diversificada sobre o assunto em discussão na estimulação
da interacção e na exploração e aprofundamento de diferentes perspectivas e
vivências. A apresentação de documentários em videograma ou a realização de
seminários, com testemunhos reais, parecem ser as fontes de informação
preferidas pelos alunos.
Esta investigação salientou, ainda, a relevância de factores de tipo
psico-social no desempenho dos alunos: o tema e a metodologia das actividades
influenciaram significativamente os resultados. A controvérsia do tema e a
invulgaridade da metodologia revelaram-se decisivas, não só na motivação de
alunos tradicionalmente desmotivados e desinteressados mas também na
estimulação de confrontos sócio-cognitivos. Portanto, este trabalho realça a
importância da construção de actividades pouco habituais em contexto de sala de
aula e capazes de envolverem os conteúdos e as competências abordados nesse
138
mesmo contexto. Provavelmente, e tal como defende Perret-Clermont (1992), o
desafio educacional consiste em conceber actividades capazes de,
simultaneamente, motivar os alunos e estimular o confronto sócio-cognitivo.
Estas actividades revelaram potencialidades importantes no
desenvolvimento da literacia científica e na educação para uma cidadania moderna
e democrática, baseada na compreensão de questões sociais, económicas e
tecnológicas da Sociedade actual e na promoção do pensamento. A discussão das
potencialidades e dos perigos de algumas inovações na área da Biotecnologia
contribuiu para a construção de uma imagem mais real da Ciência e da Tecnologia,
baseada na compreensão das suas interacções com a Sociedade e na avaliação
das possibilidades como factores de desenvolvimento. Esta imagem é
caracterizada, simultaneamente, pelo bem estar social e pela controvérsia
resultantes das aplicações da Biotecnologia. Seria interessante verificar se esta
imagem ainda se mantem quando os alunos acabarem a sua escolaridade.
Os resultados deste estudo são aplicáveis ao nível da formação inicial e
contínua de professores de Ciências, constituindo fontes estimulantes de reflexão
sobre algumas teorias normalmente discutidas nessas situações. A realização e a
discussão de actividades deste tipo, em contextos de formação inicial e contínua
de professores, poderá levar à sua maior utilização na sala de aula. A reflexão
sobre a estratégia a adoptar e o papel a desempenhar durante a discussão de
assuntos controversos poderá eliminar algumas das inseguranças sentidas pelos
professores na dinamização de aulas de debate.
As actividades construídas para a presente investigação têm, ainda, a
vantagem de poderem ser utilizadas, na prática pedagógica, por professores de
diferentes áreas disciplinares. De facto, é possível desenvolver outras actividades
de discussão de assuntos controversos adequadas aos conteúdos programáticos
de várias disciplinas. Assim, justificam-se trabalhos futuros que identifiquem, nos
139
diferentes programas, assuntos controversos motivadores e estimuladores da
interacção social na sala de aula.
Este estudo, à semelhança de uma investigação recente realizada por Lobo
(Lobo e Gomes, 1997), mostrou que os alunos valorizam bastante as actividades e os
professores que lhes permitem participar activamente nas aulas, através da
discussão/debate de problemas actuais que consideram relevantes para a sua vida.
Futuramente, seria interessante identificar que características dos professores
estimulam a interacção e a aprendizagem na sala de aula.
Temas como os novos avanços na Genética e na Biotecnologia revelam-se
extremamente úteis a um estilo de ensino/aprendizagem inovador, centrado nas
interacções sociais na sala de aula e pautado pela reflexão e pela avaliação crítica
das relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade. A sua discussão contribui
para a educação de indivíduos capazes de enfrentarem e ultrapassarem os pequenos
e os grandes desafios das suas existências individuais e colectivas, num clima de
interacção e cooperação efectivas. Constata-se não ser fácil implementar este tipo de
metodologia; no entanto, o caminho faz-se caminhando e é discutindo, de uma forma
reflexiva e responsável, que professores e alunos aprenderão a rentabilizar a
discussão como método de exploração e de potenciação de ideias e opiniões.
140
141
ANEXOS
142
143
ANEXO 1
Guião para entrevista semi-estruturada aos professores
144
145
GUIÃO PARA ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
Dia: ___/___/___ Hora: ____ Local: _______________
1- Chapéu Vermelho: Sentimentos, emoções, palpites e intuições relativamente ao tema
e à metodologia das actividades.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
2- Chapéu Amarelo: Aspectos positivos, vantagens e benefícios do tema e da
metodologia das actividades de discussão realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
3- Chapéu Preto: Aspectos negativos, fraquezas e problemas do tema e da metodologia
das actividades de discussão realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
4- Chapéu Verde: Sugestões, novas ideias e alternativas capazes de melhorarem as
actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
5- Chapéu Azul: Avaliação geral das actividades de discussão realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
146
147
ANEXO 2
Questionário para avaliação das actividades de discussão pelos alunos
148
149
AVALIAÇÃO DA ACTIVIDADE
NOME ___________________________________ TURMA ____ ANO ____
Com esta documento pretende-se avaliar a actividade de discussão e reflexão. Assim,
utilizando os seis chapéus do raciocínio, apresente as suas opiniões sobre a actividade
realizada (tema e metodologia utilizada).
Exemplo:
1- Chapéu Branco: Factos e informação.
Realização de uma actividade de reflexão e discussão em grupo, sobre
Biotecnologia._______________________________________________________
2- Chapéu Vermelho: Emoções, sentimentos. Quais são os seus sentimentos
relativamente a esta actividade?
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
3- Chapéu Amarelo: Vantagens, benefícios. Quais são os aspectos positivos da
actividade realizada?
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
150
4- Chapéu Preto: Fraquezas, problemas, perigos. Quais são os aspectos
negativos da actividade realizada?
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
5- Chapéu Verde: Sugestões, novas ideias, ideias construtivas. Sugira formas de
melhorar a actividade realizada.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
6- Chapéu Azul: Avaliação, raciocinar sobre o pensamento. Tendo em conta tudo
o que atrás referiu, efectue uma avaliação global da actividade realizada.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
151
ANEXO 3
Questionário para levantamento das opiniões dos alunos sobre Biotecnologia
152
153
Opiniões sobre Biotecnologia NOME: ____________________________________ TURMA: _____ ANO: _____ INSTRUÇÕES: Este instrumento é constituído por várias afirmações sobre biotecnologia. Após teres escrito o teu nome, turma e ano, utiliza a seguinte escala para registares, com um X, a tua opinião sincera relativamente a cada uma das afirmações. ESCALA:
CT = Concordo totalmente C = Concordo NC = Não tenho a certeza D = Discordo DT = Discordo totalmente
CT C NC D DT
1- O crescimento científico e tecnológico produz bem estar social.
� � � � �
2- A investigação científica, na área da biotecnologia, não deve estar sujeita a qualquer tipo de restrição ou de controlo; deve existir total liberdade de investigação.
� � � � �
3- Os pais devem optar pelo aborto terapêutico sempre que saibam, através de testes de diagnóstico pré-natal, que o feto apresenta alguma deformação ou mutação genética.
� � � � �
4- A engenharia genética deve ser utilizada no melhoramento da espécie humana.
� � � � �
5- Nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido como ser humano antes de ser aprovado em testes de dotação genética (análise do património genético); os reprovados deveriam perder o direito à vida.
� � � � �
6- Cada um de nós pode influenciar as decisões que os órgãos de poder tomam na área da biotecnologia.
� � � � �
7- A engenharia genética provoca medo.
� � � � � 8- A engenharia genética deve ser utilizada no melhoramento de espécies animais.
� � � � �
9- A possibilidade de manipulação do código genético é tão perigosa quanto as armas nucleares.
� � � � �
10- A tecnologia genética melhora as condições de vida da população.
� � � � �
154
CT C NC D DT
11- Toda a população deve estar informada sobre os limites e as potencialidades da biotecnologia.
� � � � �
12- A Assembleia da República deve criar legislação que controle a investigação científica na área da biotecnologia.
� � � � �
13- A limitação à liberdade de investigação compromete eventuais descobertas úteis à humanidade
� � � � �
14- A engenharia genética provoca esperança.
� � � � � 15- Toda a população deve ser consultada relativamente às decisões a tomar na área da investigação e, particularmente, da tecnologia genética.
� � � � �
16- A engenharia genética deve ser utilizada no melhoramento de espécies vegetais.
� � � � �
17- A Escola deve proporcionar espaços de discussão sobre o impacto da biotecnologia na Sociedade.
� � � � �
18- As companhias de seguros têm o direito de conhecer o património genético das pessoas que pretendam seguros de vida, de forma a poderem recusar os candidatos cuja probabilidade de virem a desenvolver doenças de origem genética seja elevada.
� � � � �
19- Perante um feto em que se detectou uma doença genética grave, e se os pais optarem por ter esse filho, o Estado deve obrigá-los a suportar sozinhos as despesas médicas resultantes.
� � � � �
20- Os indivíduos que apresentam doenças genéticas causadoras de deficiência mental ou de deformações devem ser impedidos de transmitir essas características aos seus descendentes ou seja, devem ser impedidos de ter filhos.
� � � � �
21- Cada um de nós deve influenciar as decisões que os órgãos de poder tomam na área da biotecnologia.
� � � � �
22- Qualquer pessoa deve fazer exames genéticos para averiguar a possibilidade de ser portadora de genes responsáveis por doenças.
� � � � �
155
ANEXO 4
Guião de observação das actividades de discussão
156
157
INSTRUMENTO DE REGISTO DE OBSERVAÇÕES
Dia: ___/___/___ Hora: ____ Local: _______________
1- Chapéu Branco: Factos e informações sobre a implementação das actividades.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
2- Chapéu Vermelho: Emoções e sentimentos relativamente às actividades.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
3- Chapéu Amarelo: Afirmações ou comportamentos que evidenciem aspectos positivos
das actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
158
4- Chapéu Preto: Afirmações ou comportamentos que evidenciem fraquezas, problemas
ou aspectos negativos das actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
5- Chapéu Verde: Afirmações ou comportamentos que sugiram novas ideias capazes de
melhorar as actividades realizadas.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
6- Chapéu Azul: Avaliação geral da forma como decorre a actividade realizada.
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
159
ANEXO 5
Material informativo distribuído pelos alunos
(informações relativas à metodologia e aos temas em discussão)
160
161
ACTIVIDADES DE REFLEXÃO E DISCUSSÃO SOBRE TEMAS DE
BIOTECNOLOGIA
METODOLOGIA
As actividades de reflexão e discussão sobre temas de Biotecnologia serão
realizadas de acordo com o método �Os Seis Chapéus do Raciocínio� proposto por
Edward de Bono (1995). As cores diferentes dos chapéus correspondem a
diferentes tipos de raciocínio:
Chapéu Branco: Factos, números e informação. Que informações temos?
Que informações precisamos obter?
Chapéu Vermelho: Emoções, sentimentos, palpites e intuições. Que
pensamos desta questão?
Chapéu Amarelo: Vantagens, benefícios, poupanças. Porquê fazer? Quais
são os benefícios? Qual a é vantagem de o fazer?
Chapéu Preto: Precaução. Verdade, avaliação, encaixe dos factos. Aponta
as fraquezas, os problemas, os perigos de uma ideia. Isto encaixa-se nos factos?
Resulta? É seguro? É praticável?
Chapéu Verde: Exploração, sugestões, novas ideias. Ideias construtivas.
Alternativas à acção. Transferência. Que podemos fazer aqui? Há outras ideias
diferentes?
Chapéu Azul: Raciocinar sobre o pensamento. Controlo do processo do
raciocínio. Avaliação do ponto em que nos encontramos. Estabelecer o novo passo
do raciocínio. Estabelecer o programa do raciocínio.
As actividades a executar durante as aulas decorrerão segundo uma
sequência de chapéus pré-determinada que os alunos colocarão um após o outro
(guião do raciocínio).
162
GENÉTICA E BIOTECNOLOGIA
É graças ao conhecimento que o homem muda o mundo, e que se
transformará a si próprio. No futuro, o homem não será o mesmo. O que seremos
amanhã, é hoje que o forjamos, por meio dos avanços da ciência e da técnica;
avanços esses que possuem duas faces � uma certamente útil, a outra um tanto
ou quanto inquietante.
Decorreram quarenta anos desde a descoberta de estrutura do ADN (ácido
desoxirribonucleico � material genético) por Watson e Crick. Desde então, a sua
descoberta tem sido o catalizador de toda uma revolução na nossa compreensão
de como os genes operam.
Actualmente, a Genética e a Biotecnologia têm um impacto enorme na vida
de todas as pessoas. As suas aplicações na medicina, na agricultura e na indústria
têm inúmeras implicações sociais, sendo imprevisíveis e incalculáveis as suas
influências nos sistemas ecológicos e nas próximas gerações de todos os seres
vivos, incluindo o Homem. A Biotecnologia confere aos cientistas o poder de
alterarem as células vivas como bem entenderem.
Muitas das decisões a serem tomadas nesta área dizem respeito às
gerações futuras. Torna-se, portanto, vital que o conhecimento, a discussão e a
compreensão deste assunto constituam parte integrante do currículo de todos os
alunos.
ENGENHARIA GENÉTICA
A designação �engenharia genética� aplica-se a quatro operações
diferentes:
1- Preparação da transferência do material genético (gene) para a célula
que se pretende alterar. Normalmente, o meio de transporte (vector) destes genes
é um vírus. A introdução do gene no património genético do vírus resulta na
formação de uma quimera molecular (um �novo� vírus).
163
2- Transferência da quimera molecular (vírus + �gene estranho�) para a
célula receptora.
3- Expressão (activação) do gene introduzido na célula receptora.
4- Transformação completa do indivíduo por integração do gene estranho no
óvulo fecundado (apenas no caso dos seres pluricelulares).
Esta última operação pode provocar alterações consideráveis do património
genético. Por exemplo, a injecção, num óvulo fecundado de qualquer animal, de
um gene capaz de desencadear a produção de hormonas de crescimento, permite
obter animais de tamanho superior à média.
A engenharia genética provoca, ao mesmo tempo, medo e esperança: o
medo de uma manipulação abusiva, num futuro imprevisível, do património
genético do homem por ditadores e por oligarquias sem escrúpulos. Outro receio,
este mais próximo, está relacionado com a criação eventual, resultante de
manipulações perigosas, voluntárias ou não, dos novos germes de doenças contra
as quais a espécie humana não tem defesas naturais ou de �novos� seres vivos
que se multipliquem de forma incontrolada e devastadora nos ecossistemas do
nosso planeta.
A esperança, a longo prazo, está ligada à possibilidade de melhorar certas
carências do homem, ao passo que a um prazo mais curto trata-se de curar mais
de 2000 doenças de origem genética. Se algumas destas doenças podem ser
tratadas, a cura só pode vir da possibilidade de corrigir a estrutura do ADN
responsável pela doença, ou injectando um gene adequado nas células
deficientes. Além disso, a engenharia genética pode encontrar aplicações muito
férteis na agricultura e na zootecnia. Durante séculos, os agricultores têm-se
debatido com doenças e pestes das plantas, solos inférteis e a necessidade de
produzir cada vez mais para satisfazerem as necessidades alimentares de uma
população mundial cada vez maior. A engenharia genética, através da inclusão de
genes responsáveis pela produção de determinadas enzimas, oferece uma nova
esperança ao tornar possível a produção de plantas resistentes quer a ambientes
adversos, quer à acção nefasta de insectos, bactérias e fungos. A produtividade
também pode ser aumentada através da selecção artificial das dimensões de
raízes, sementes e frutos. Além disso, o teor nutritivo dos alimentos pode ser
164
aumentado através da indução de alterações na sua variedade de aminoácidos
essenciais. Encontramo-nos, portanto, à beira de uma revolução genética agrícola.
No entanto, sabe-se que a quantidade de cereais produzida actualmente é
suficiente para alimentar todos os habitantes do nosso planeta, e que a fome
resulta de uma distribuição e de uma utilização deficientes dos alimentos.
Nos últimos anos, os progressos na biotecnologia permitiram a criação,
através de engenharia genética, de estirpes especiais de bactérias ou fungos
portadoras de genes específicos de outros organismos completamente diferentes,
tais como seres humanos. Estes micróbios produzem compostos úteis, como a
insulina humana, as hormonas de crescimento humanas e o agente antiviral
(provavelmente anticancerígeno) denominado interferon, ou compostos
extremamente perigosos como a toxina do botulismo.
EUGENIA
Um primo de Charles Darwin, chamado Francis Galton, também cientista de
renome, fundou uma teoria acerca da eugenia, propondo o melhoramento da
espécie humana segundo os métodos praticados na selecção artificial das plantas
cultivadas e dos animais domésticos.
A eugenia encara a selecção artificial de duas maneiras: favorecendo a
reprodução dos indivíduos portadores dos genes favoráveis (a eugenia positiva;
por exemplo, a criação do banco de esperma dos Prémios Nobel dos EUA), ou
afastando da reprodução os que possuem genes desfavoráveis (a eugenia
negativa; por exemplo, o aborto voluntário em caso de doença do feto).
Desacreditada por uma aplicação abusiva e criminosa feita pelos nazis, a eugenia,
actualizada com eventuais manipulações genéticas, deve ser submetida, com as
suas sombras e claridades, a uma verdadeira análise crítica.
DIAGNÓSTICO DE ALTERAÇÕES GENÉTICAS
165
Uma das consequências da investigação dos genes responsáveis por
doenças humanas tem sido o desenvolvimento de técnicas de diagnóstico de
alterações genéticas. É hoje possível detectar estas anomalias antes ou depois do
nascimento através de, respectivamente, amniocentese ou de uma simples análise
ao sangue. Estas técnicas têm sido saudadas como "milagres" da medicina
moderna. Considere-se, por exemplo, a quantidade de pessoas que, sendo
portadoras dos alelos recessivos da Fenilcetonuria, têm sido salvas de atrasos
mentais graves. Esta doença, resultante da acumulação de um derivado da
fenilalanina (aminoácido) nas células do cérebro, pode ser diagnosticada
facilmente após o nascimento e evitada através de uma dieta. No entanto, estes
avanços recentes, têm levantado sérios problemas éticos e psicológicos.
Torna-se evidente que os testes de diagnóstico baseados em análises ao
ADN levantam novas questões de difícil resposta. Os maiores problemas resultam
do facto destes testes detectarem a presença ou a possibilidade de doenças para
as quais não existe cura. Nestas circunstâncias existem pessoas que se inclinam
para a sua não utilização.
Actualmente, a análise do património genético permite que o foco da
medicina e dos serviços de saúde se torne a detecção de tendências para
desenvolver determinadas doenças em vez do diagnóstico das doenças actuais
dos indivíduos. Assim, corre-se o risco de que pessoas que não apresentam
qualquer sintoma de doença possam ser classificadas de deficientes e
discriminadas por companhias de seguros de vida. Potenciais empregadores
poderão recusar empregos a estes indivíduos por não quererem arriscar eventuais
despesas médicas nem quererem gastar tempo e dinheiro a treinar um empregado
com uma esperança de vida limitada. Todos estes problemas agravam-se quando
a análise genética não consegue prever com certeza absoluta se determinado
indivíduo irá desenvolver determinada doença, o que acontece com doenças
multifactoriais, como o cancro, as doenças cardíacas, a esquizofrenia, que
resultam de uma intricada interacção entre genes e factores ambientais.
Exemplos de alterações genéticas passíveis de serem diagnosticadas:
Fibrose Quística - Esta doença hereditária provoca alterações no transporte
de cloro e, portanto, no transporte de água dentro do organismo, alterações essas
166
que se traduzem num espessamento das secreções humanas. Este espessamento
dificulta a eliminação do mucus das vias respiratórias. A sua acumulação provoca
doenças pulmonares crónicas, incluindo infecções potencialmente fatais. Até há
poucos anos, os portadores dos dois genes autossómicos recessivos morriam por
volta dos 5 anos de idade; actualmente, a utilização de antibióticos e de certas
terapias de descongestionamento das vias respiratórias permite-lhes alcançar a
vida adulta. Actualmente, existem testes de diagnóstico genético capazes de
detectarem 90% dos genes anormais causadores desta doença.
Doença de Huntington - Esta doença hereditária traduz-se numa
degeneração neurológica progressiva que só se manifesta entre os 35 e os 50
anos de idade. Nessa altura, os portadores desta alteração genética começam a
apresentar movimentos musculares involuntários, perda de memória, depressão e
comportamento irracional. A doença progride, irremediavelmente, até à loucura,
perda de controlo motor e, finalmente, morte. Apresenta uma incidência de 1 em
cada 2500 seres humanos. Actualmente, existem testes de diagnóstico genético
capazes de indicarem se uma pessoa apresenta, ou não, grandes possibilidades
de desenvolver a doença.
167
168
169
ANEXO 6
Actividades de discussão utilizadas no estudo
170
171
ACTIVIDADE 1: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Rastreio Genético
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.
�Os testes genéticos realizados para efeitos de contratação de pessoas e de
seguros de vida e saúde deverão ser banidos em quase toda a Europa dentro de
alguns anos, nos termos de um tratado em preparação no âmbito do Conselho da
Europa.� (Público, 13/8/94)
Apresente uma opinião fundamentada sobre a medida descrita neste artigo.
Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do
tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de tal medida.
3º- Chapéu preto - Para avaliar os pontos negativos da medida descrita.
4º- Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.
172
ACTIVIDADE 2: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Eugenia
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.
"Nenhum recém-nascido deveria ser reconhecido como ser humano antes
de ser aprovado em testes de dotação genética; os reprovados deveriam perder o
direito à vida." Apresente uma opinião fundamentada sobre esta afirmação de
Francis Crick, Prémio Nobel da Medicina pela descoberta do A.D.N..
Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do
tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos.
3º- Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada escolha.
4º- Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.
173
ACTIVIDADE 3: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Rastreio Genético
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.
Suponha que descobre que possui, bem como a pessoa com quem deseja
casar e ter filhos, uma alteração genética responsável pela fibrose quística. Logo,
a probabilidade de terem filhos doentes seria de 25%. O que faria?
Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do
tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu branco - Para recolher a informação sobre o assunto.
3º- Chapéu verde - Para desenvolver as alternativas mais capazes.
4º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada escolha.
5º- Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada escolha.
6º- Chapéu azul - Para resumir e obter conclusões.
7º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos no resultado final.
174
ACTIVIDADE 4: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Engenharia Genética
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.
Considerando que a engenharia genética torna possível a produção de
proteínas de animais ou de plantas (enzimas e hormonas, por exemplo) em
grandes quantidades, procure encontrar possíveis aplicações desta tecnologia na
medicina, na pecuária, na agricultura e nas indústrias alimentar e química.
Apresente aspectos positivos e aspectos negativos de cada uma dessas
hipotéticas aplicações.
Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do
tema:
1º- Chapéu branco - Para recolher a informação sobre o assunto.
2º- Chapéu verde - Para obter o maior número de aplicações da tecnologia
referida.
3º- Chapéu amarelo - Para identificar aspectos positivos de cada uma das
aplicações sugeridas.
4º- Chapéu preto - Para avaliar as fraquezas e os perigos de cada uma das
aplicações sugeridas.
5º- Chapéu vermelho - Para recolher os sentimentos finais sobre o assunto.
175
ACTIVIDADE 5: Discussão e reflexão em grupo
TEMA: Engenharia Genética
DURAÇÃO: 2 x 50 Minutos
Introdução + Formação de grupos: 15 min.;
Leitura da ficha: 5 min.;
Cada chapéu: 5 min. máx.;
Apresentação de conclusões e discussão: 50 min.
Tendo em conta todas as inovações tecnológicas na área da biotecnologia
genética, tente prever como será o futuro da espécie humana.
Sequência de chapéus a utilizar durante a reflexão e a discussão do
tema:
1º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos existentes sobre o
assunto.
2º- Chapéu branco - Para recolher a informação sobre o assunto.
3º- Chapéu verde - Para desenvolver o maior número de previsões.
4º- Chapéu vermelho - Para descobrir os sentimentos no resultado final.
176
177
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Aikenhead, G. S. (1986). The content of STS education. STS Research Network
Missive, 2, 18-23.
Aikenhead, G. S. (1994). A review of research into the outcomes of STS teaching.
In K. Boersma, K. Kortland, & J. Van Trommel (Ed.), Proceedings of the 7th
IOSTE Symposium (pp. 13-24). Enschede, Netherlands: National Institute for
Curriculum.
Allen, V. L. (1976). Children as teachers. London: Academic Press.
AAAS, American Association for the Advancement of Science (1989). Science for
all Americans: project 2061. Washington, DC: Autor.
Archer, L. (1992). Questões éticas e sociais da análise do genoma humano. Acta
Médica Portuguesa, 5, pp. 139-145.
Archer, L. (1996). Bioética geral: fundamentos biológicos. In L. Archer, J. Biscaia, &
W. Osswald, Bioética (pp. 17-33). Lisboa: Editorial Verbo.
Archer, L., Biscaia, J., & Osswald, W. (Coord.) (1996). Bioética. Lisboa: Editorial
Verbo.
Aronson, E. (1978). The jigsaw classroom. Beverly Hills, CA: Sage.
Aronson, E., Blaney, N., Stephen, C., Sikes, J., & Snapp, M. (1978). The jigsaw
classroom. Beverly Hills, CA: Sage.
Assembleia da República Portuguesa (1996). Constituição da República
Portuguesa. Porto: Legis Editora.
178
Barbosa, L. (1995). Trabalho e dinâmica dos pequenos grupos: ideias para
professores e formadores. Porto: Edições Afrontamento.
Barbour, I. G. (1992). Ethics in an age of technology, The Gifford Lectures 1989-
1991. London: SCM Press.
Barman, C. R., & Cooney, T. M. (1986). Science they care about. The Science
Teacher, 53, 23.
Barman, C. R., & Hendrix, J. R. (1983). Exploring bioethical issues: an instructional
model. The American Biology Teacher, 45, 24-31.
Berg, P., Baltimore, D., Brenner, S., Roblin III, R. O., & Singer, M. F. (1993).
Summary statement of the Asilomar conference on recombinant DNA
molecules. In R. E. Bulger, E. Heitman, & S. J. Reiser (Ed.), The ethical
dimensions of the biological sciences (pp. 263-269). Cambridge: Cambridge
University Press.
Bernal, J. D. (1946). Science teaching in general education. School Science
Review, 27, 150-158.
Bisanz, G. L., Bisanz, J., Korpan, C. A., & Zimmerman, C. (1996; August).
Assessing scientific literacy: questions students ask when evaluating news
reports about scientific research. Comunicação apresentada no 8th IOSTE
Symposium, Edmonton, Alberta, Canadá.
Bogdan, R., & Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação: uma
introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto editora.
Boone, C. K. (1995). Bad axioms in genetic enginnering. In J. H. Howell, & W. F.
Sale (Ed.), Life choices: a hastings center introduction to bioethics (pp. 514-
524). Washington, D. C.: Georgetown University Press
Booth, N. (1996, 27 de Janeiro). Manipulação genética �à la carte�. Expresso, 6.
Bridges, D. (1979). Education, democracy and discussion. Windsor: NFER
Publishing Company.
179
Brum, G., McKane, L., & Karp, G. (1994). Biology: Exploring Life. New York: John
Wiley, & Sons, Inc.
Buican, D. (1986). A Genética e a Evolução. Mem Martins: Publicações Europa-
América.
Burkimsher, M. (1993). Creating a climate for citizenship education in schools. In J.
Edwards, & K. Fogelman (Ed.), Developing citizenship in the curriculum (pp.
7-15). London: David Fulton.
Carraher, T., Carraher, D., & Schliemann, A. (1989). Na vida dez, na escola zero.
São Paulo: Cortez editora.
César, M. (1994). O papel da interacção entre pares na resolução de tarefas
matemáticas: trabalho em díade vs. trabalho individual em contexto escolar.
Tese de doutoramento não publicada, Universidade de Lisboa,
Departamento de Educação da Faculdade de Ciências, Lisboa.
Chadwick, R. F. (1992). Ethics, reproduction and genetic control. Londres:
Routledge.
Chito, B., & Caixinhas, R. (1993). A participação do público no processo de
avaliação do impacto ambiental. Revista Crítica de Ciências Sociais, 36, 27-
40.
Clarke, R. (1989). O homem mutante. Venda Nova: Bertrand Editora.
Cohen, L., & Manion, L. (1980). Research methods in education. London: Croom
Helm.
Cowie, H., & Rudduck, J. (1990). Learning through discussion. In N. Entwistle (Ed.),
Handbook of educational ideas and practices (pp. 803-812). Londres:
Routledge.
Cross, R. T., & Price, R. F. (1991). Towards teaching science for social
responsibility: an examination of flaws in science, technology and society.
Research in Science Education, 21, 47-54.
180
Cross, R. T., & Price, R. F. (1992). Teaching science for social responsibility.
Sydney: St Louis Press.
Cross, R. T., & Price, R. F. (1996). Science teachers� social conscience and the
role of controversial issues in the teaching of science. Journal of Research in
Science Teaching, 33, 319-333.
Damon, W., & Phelps, E. (1989). Critical distinctions among three approaches to
peer education. International Journal of Educational Research, 13, 9-19.
De Boer, G. (1991). A History of ideas in science education-implications for practice.
New York: Columbia University, Teachers College Press.
de Bono, E (1976). Teaching thinking. Londres: Penguin Books.
de Bono, E (1983). The cognitive research trust (CoRT) thinking skills program. In
W. Maxwell, Thinking: the expanding frontier (pp. 125-128). Philadelphia,
PA.: The Franklin Institute Press.
de Bono, E (1985). Six thinking hats. London: Penguin Books.
de Bono, E. (1995). Ensine os seus filhos a pensar. Lisboa: Difusão Cultural.
Dearden, R. F. (1981). Controversial issues and the curriculum. Journal of
Curriculum Studies, 13, 37-44.
DeDecker, P. F. (1986). Biology and ethics: their role in education for the 80s and
beyond. The American Biology Teacher, 48, 285-292.
DeDecker, P. F. (1987). Teaching bioethical decision making in high school: a
lesson plan. The American Biology Teacher, 49, 428-432.
Denzin, N. K. (1970). The research act: a theoretical introduction to sociological
methods. Chicago, IL: Aldine.
Denzin, N. K., & Lincoln, Y. S. (Ed.) (1994). Handbook of qualitative research.
London: Sage Publications.
181
Deutsch, M. (1949). A theory of cooperation and competition. Human Relations, 2,
129-152.
Dewey, J. (1916). Democracy & education: an introduction to the philosophy of
education. New York: Macmillan.
Doise, W., & Mugny, G. (1981). Le dévelopment social de l�intelligence. Paris:
InterÉditions.
Doise, W., Mugny, G. & Perret-Clermont, A.-N. (1975). Social interaction and the
development of cognitive operations. European Journal of Social
Psychology, 5, 367-383.
Doise, W., Mugny, G. & Perret-Clermont, A.-N. (1976). Social interaction and
cognitive development: further evidence. European Journal of Social
Psychology, 6, 245-247.
Domingues, B. (1996). Dimensão pessoal da bioética: informação verdadeira,
liberdade e influências. In L. Archer, J. Biscaia, & W. Osswald, Bioética (pp.
70-77). Lisboa: Editorial Verbo.
Draper, E. (1992). Genetic testing in the workplace: competing paradigms of
technological advance. In D. Nelkin (Ed.), Controversy: politics of technical
decisions (pp. 147-176). London: Sage Publications.
Draper, E. (1995). Genetic secrets: social issues of medical screening in a genetic
age. In J. H. Howell & W. F. Sale (Ed.), Life choices: a hastings center
introduction to bioethics (pp. 506-513). Washington, DC: Georgetown
University Press.
Edwards, J. (1991a). The direct teaching of thinking skills. In G. Evans, Learning
and teaching cognitive skills (pp. 87-106). Victoria: Australian Council for
Educational Research.
Edwards, J. (1991b). Research work on the CoRT method. In S. MacLure & P.
Davies (Ed.), Learning to think: thinking to learn: the proceedings of the 1989
182
OECD conference organized by the centre for educational research and
innovation (pp. 19-30). Oxford: Pergamon Press.
Edwards, J., & Baldauf, R. B. Jr. (1987). The effects of the CoRT-1 thinking skills
program on students. In D. N. Perkins, J. Lockhead & J. Bishop (Eds.),
Thinking: the second international conference (pp. 453-473). Hillsdale, N. J.:
Lawrence Erlbaum.
Edwards, J., & Fogelman, K. (1993). Developing citizenship in the curriculum.
London: David Fulton.
Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura (1967). Volume 5. Lisboa: Editorial Verbo.
Entwistle, N. (Ed.) (1990). Handbook of educational ideas and practices. Londres:
Routledge.
ERT, Mesa Redonda dos Industriais Europeus (1995). Uma educação europeia: a
caminho de uma sociedade que aprende. Bruxelas: Autor.
European Commission, & Calouste Gulbenkian Foundation (1995). A white paper
on science education in europe (Preliminary draft for discussion). Lisbon:
Instituto de Prospectiva.
Evans, G. (Ed.) (1991). Learning and teaching cognitive skills. Victoria: Australian
Council for Educational Research.
Gall, M. D. (1985). Discussion methods of teaching. In T. Husen, & T. N.
Postlethwaite (Ed.), The international encyclopedia of education: research
and studies (pp. 1423-1427). Oxford: Pergamon.
Gardner, P. (1983). Another look at controversial issues and the curriculum. Journal
of Curriculum Studies, 16, 179-185.
Gartner, A., Kohler, M. C. & Riessman, F. (1971). Children teach children: learning
by teaching. New York: Harper and Row.
Gilly, M. (1985). Préface. In G. Mugny, Psychologie sociale du développment
cognitif. Bern: Peter Lang.
183
Gilly, M., Fraisse, J., & Roux, J.-P. (1988). Résolution de problèmes en dyades et
progrès cognitifs chez des enfant de 11 à 13 ans: dynamiques interactives et
socio-cognitives. In A.-N. Perret-Clermont e M. Nicolet (Eds.), Interagir et
connaître - enjeux et régulations sociales dans le développment cognitif (pp.
73-92). Fribourg: Del Val.
Goetz, J., & LeCompte, M. (1984). Ethnography and qualitative design in
educational research. New York: Academic Press.
Grisolía, S. (1992). Ethical and social aspects of the human genome project. Impact
of science on society, 161, 37-43.
Harrison, J. (1993). Citizenship and core and foundation subjects: science. In J.
Edwards & K. Fogelman (Eds.), Developing citizenship in the curriculum (pp.
47-50). London: David Fulton.
Henderson, J. (Ed.) (1987). Teaching strategies in biotechnology. Report of the
TRIST 13-18 project, University of Sheffield, Division of Education (USDE),
Publication 11.
Henderson, J., & Knutton, S. (1990). Biotechnology in schools: a handbook for
teachers. Buckingham: Open University Press.
Hooper, S., & Hannafin, M. (1988). Cooperative CBI: the effects of heterogeneous
versus homogeneous grouping on the learning of progressively complex
concepts. Journal of Educational Computing Research, 4, 413-424.
Hooper, S., & Hannafin, M. (1991). The effects of group composition on
achievement, interaction, and learning efficiency during computer-based
cooperative instruction. Educational Technology, Research and
Development, 39, 27-40.
Humphreys, B., Johnson, R. T., & Johnson, D. W. (1982). Effects of cooperative,
competitive and individualistic learning on students� achievement in science
class. Journal of Research in Science Teaching, 19, 351-356.
184
Hunter-Grundin, E. (1985). Teaching thinking: an evaluation of Edward de Bono�s
classroom materials. London: Schools Council.
Hurd, P. D. (1993). Comment on science education research: a crisis of confidence.
Journal of Research in Science Teaching, 30, 1009-1011.
Hurd, P. D. (1994). New minds for a new age: prologue to modernizing the science
curriculum. Science Education, 78, 103-116.
Johnson, R., & Johnson, D. (1989). Cooperation and competition: theory and
research. Edina, MN: Interaction.
Johnson, R., Johnson, D., Scott, L., & Ramolae, B. (1985). Effects of single-sex and
mixed-sex cooperative interaction on science achievement and attitudes and
cross-handicap and cross-sex relationships. Journal of Research in Science
Teaching, 22, 207-220.
Kitcher, P. (1996). The lives to come: the genetic revolution and human possibilities.
London: Penguin Books.
Klopfer, L. E. (1985). Scientific literacy. In T. Husen, & T. N. Postlethwaite (Eds.),
The international encyclopedia of education: research and studies (pp. 4478-
4479). Oxford: Pergamon.
Lazarowitz, R., Hertz-Lazarowitz, R., & Baird, J. H. (1994). Learning science in a
cooperative setting: academic achievement and affective outcomes. Journal
of Research in Science Teaching, 31, 1121-1131.
Lemos Pires, E. (1987). Lei de Bases do Sistema Educativo: apresentação e
comentários. Porto: Asa.
Lobo, A. S., & Gomes, C. A. (1997). Diálogos sobre o vivido: Se os alunos
mandassem... Educação, Sociedade e Cultura, 7, 157-186.
Ludke, M., & André, M. (1986). Pesquisa em educação: abordagens qualitativas.
São Paulo: EPU.
185
Lumpe, A. T., & Staver, J. R. (1995). Peer collaboration and concept development:
learning about photosynthesis. Journal of Research in Science Teaching, 32,
71-98.
Lusk, A. B., & Weinberg, A. S. (1994). Discussing controversial topics in the
classroom: creating a context for learning. Teaching Sociology, 22, 301-308.
MacLure, S. (1991). Introduction: an overview. In S. MacLure & P. Davies, Learning
to think: thinking to learn: the proceedings of the 1989 OECD conference
organized by the centre for educational research and innovation (pp. ix-
xxviii). Oxford: Pergamon Press.
MacLure, S., & Davies, P. (Ed.) (1991). Learning to think: thinking to learn: the
proceedings of the 1989 OECD conference organized by the centre for
educational research and innovation. Oxford: Pergamon Press.
Mariano Gago, J. (1990). Manifesto para a ciência em Portugal. Lisboa: Gradiva.
Merriam, S. B. (1988). Case study research in education: a qualitative approach.
San Francisco: Jossey - Bass.
Miguéns, M., Serra, P., Simões, H., & Roldão, M. C. (1996). Dimensões formativas
de disciplinas do ensino básico: ciências da natureza. Lisboa: Instituto de
Inovação Educacional.
Millar, R. (1997). Science education for democracy: what can the school curriculum
achieve? In R. Levinson & J. Thomas (Eds.), Science today: problem or
crisis? (pp. 87-101). London: Routledge.
Ministério do Ambiente e Recursos Naturais (1993). Decreto-Lei nº 126/93 de 20
de Abril. Diário da República, I Série A, 92, 1922-1926.
Ministério da Educação (1991a). Programa de ciências da natureza (5º e 6º anos).
Lisboa: Autor.
Ministério da Educação (1991b). Programa de ciências naturais (7º e 8º anos).
Lisboa: Autor.
186
Ministério da Educação (1991c). Programa de ciências da terra e da vida (10º e 11º
anos). Lisboa: Autor.
Ministério da Educação (1991d). Programa de biologia (12º ano). Lisboa: Autor.
Ministérios da Saúde e do Ambiente e Recursos Naturais (1994). Portaria nº
602/94 de 13 de Julho. Diário da República, I Série B, 160, 3779-3784.
Morse, J. M. (1994). Designing funded qualitative research. In N. K. Denzin & Y. S.
Lincoln (Eds.), Handbook of qualitative research (pp. 220-235). London:
Sage Publications.
Mugny, G., & Doise, W. (1978). Socio-cognitive conflict and structure of individual
and collective performances. European Journal of Social Psychology, 8, 181-
182.
Nelkin, D. (Ed.) (1992). Controversy: politics of technical decisions. London: Sage
Publications.
Nolan, K. (1995). First fruits: genetic screening. In J. H. Howell & W. F. Sale (Eds.),
Life choices: a hastings center introduction to bioethics (pp. 495-505).
Washington, DC: Georgetown University Press.
Nossal, G. J. V., & Coppel, R. (1989). Reshaping life: key issues in genetic
engineering. Cambridge: Cambridge University Press.
Nunes, R. (1996). O diagnóstico pré-implantatório. In L. Archer, J. Biscaia, & W.
Osswald, Bioética (pp. 183-189). Lisboa: Editorial Verbo.
OCDE (1986). Recombinant DNA safety considerations. Paris: Autor.
Okebukola, P. A. O., & Ogunniyi, M. B. (1984). Cooperative, competitive and
individualistic laboratory interaction patterns: effects on students�
performance and acquisition of practical skills. Journal of Research in
Science Teaching, 21, 875-884.
Osswald, W. (1996). A experimentação no animal. In L. Archer, J. Biscaia, & W.
Osswald, Bioética (pp. 329-333). Lisboa: Editorial Verbo.
187
Penslar, R. L. (Ed.) (1995). Research ethics: cases and materials. Bloomington:
Indiana University Press.
Perret-Clermont, A.-N. (1976/78). Desenvolvimento da inteligência e interacção
social. Lisboa: Instituto Piaget. (Tradução da tese de doutoramento
defendida em 1976 na Universidade de Genebra).
Perret-Clermont, A.-N. (1979). La construction de l�intelligence dans l�interaction
sociale. Bern: Peter Lang.
Perret-Clermont, A.-N. (1992). Approaches in the social psychology of learning and
group work. In P. Stringer, Confronting social issues, Vol. 2 (pp. 97-122).
London: Academic Press.
Perret-Clermont, A.-N., & Mugny, G. (1985). En guise de conclusion: effets
sociologiques et processus didactique. In G. Mugny (Ed.), Psychologie
sociale du développment cognitif (pp. 251-261). Bern: Peter Lang.
Perret-Clermont, A.-N., & Nicolet, M. (1988). Interagir et connaître - enjeux et
régulations sociales dans le développment cognitif. Fribourg: Del Val.
Perret-Clermont, A.-N., Perret, J.-F. & Bell, N. (1991). The social construction of
meaning and cognitive activity in elementary school children. In L. B.
Resnick, J. M. Levine & S. D. Teasley (Eds.), Perspectives on socially shared
cognition (pp. 41-62). Washington, D.C.: American Psychological
Association.
Perret-Clermont, A.-N., & Schubauer-Leoni, M.-L. (1981). Conflict and cooperation
as opportunities for learning. In P. Robinson (Ed.), Communication in
development (pp. 203-233). London: Academic Press.
Phelps, E., & Damon, W. (1989). Problem solving with equals: peer collaboration as
a context for learning mathematics and spatial concepts. Journal of
Educational Psychology, 81, 639-646.
Pintassilgo, M. L. (1996). A bioética e os países em desenvolvimento. In L. Archer,
J. Biscaia, & W. Osswald, Bioética (pp. 122-130). Lisboa: Editorial Verbo.
188
Porter, G. (1986). What is science for? New Scientist, 112, 32-34.
Resnick, L. (1990). Instruction and the cultivation of thinking. In N. Entwistle,
Handbook of educational ideas and practices (pp. 694-707). London:
Routledge.
Royal Society (1980). Biotechnology. A report of Joint Working Party. Advisory
Council for Applied Research and Development. London: HMSO.
Rudduck, J. (Ed.)(1979). Learning to teach through discussion. University of East
Anglia: CARE Publications.
Rudduck, J. (1986). A strategy for handling controversial issues in the secondary
school. In J. J. Wellington, Controversial issues in the curriculum (pp. 6-18).
Oxford: Basil Blackwell.
Sánchez, M. C. (1989). Interacción entre iguales y desarrollo cognitivo. Tese de
doutoramento não publicada, Universidade de Salamanca, Departamento de
Psicologia da Faculdade de Filosofia e Ciências da Educação, Salamanca.
Santos, B. S. (1987). Um discurso sobre as ciências. Porto: Edições Afrontamento.
Shamos, M. H. (1995). The myth of scientific literacy. New Brunswick, NJ: Rutgers
University Press.
Sharan, S., & Hertz-Lazarowitz, R. (1980). A group investigation method of
cooperative learning in the classroom. In S. Sharan, P. Hare, C. Webb, & R.
Hertz-Lazarowitz, Cooperation in education (pp. 14-46). Provo, UT: Brigham
Young University Press.
Sharan, S., & Sharan, Y. (1984). Cooperative learning in the classroom: research in
desegregated schools. Hillsdale, NJ: Erlbaum.
Singer, P. (1993). Practical ethics. Cambridge: Cambridge University Press.
Slavin, R. E. (1980). Cooperative learning. Review of Education Research, 50, 315-
342.
189
Slavin, R. E. (1984). Students motivating students to excel: cooperative incentives,
cooperative tasks and student achievement. The Elementary School Journal,
85, 53-63.
Slavin, R. E. (1990). Cooperative learning: theory, research and practice.
Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall.
Smith, F. (1990). Pensar. Lisboa: Instituto Piaget.
Solomon, J. (1991). Group discussions in the classroom. School Science Review,
72, 29-34.
Solomon, J. (1992). The classroom discussion of science-based social issues
presented on television: knowledge, attitudes and values. International
Journal of Science Education, 14, 431-444.
Solomon, E. P., Berg, L. R., Martin, D. W., & Villee, C. (1993). Biology (3ª ed.).
Orlando: Saunders College Publishing.
Spinney, L. (1996, 18 de Maio). Vacinas para comer no prato. Expresso, 6.
Stenhouse, L. (1970). The humanities project: an introduction. London: Heinemann.
Stradling, R., Noctor, M., & Bains, B. (1984). Teaching controversial issues.
London: Arnold.
Sutman, F. X. (1996). Science literacy: a functional definition. Journal of Research
in Science Teaching, 33, 459-460.
Tingle, J. B., & Good, R. (1990). Effects of cooperative grouping on stoichiometric
problem solving in high school chemistry. Journal of Research in Science
Teaching, 27, 671-683.
Tripp, D. H. (1979). The use of the CoRT thinking project with exceptional children:
some outcomes of the UK evaluation. The Exceptional Child, 26, 71-81.
Valente, O. (1995). O ensino das ciências e a formação pessoal e social dos
jovens. In M. Miguéns, A. Bárrios, C. Miranda, H. Simões, F. Morgado, F.
Cid, R. Pires, P. Serra, F. Rebola & A. Teixeira (Eds.), Educação em
190
ciências da natureza: actas do V Encontro Nacional de Docentes (pp. 15-20).
Portalegre: Escola Superior de Educação de Portalegre.
Van Rooy; W. (1993). Teaching controversial issues in the secondary school
science classroom. Research in Science Education, 23, 317-326.
Watson, S. B., & Marshall, J. E. (1995). Effects of cooperative incentives and
heterogeneous arrangement on achievement and interaction of cooperative
learning groups in a college life science course. Journal of Research in
Science Teaching, 32, 291-299.
Wellington, J. J. (1986). Controversial issues in the curriculum. Oxford: Basil
Blackwell.
Wheale, P., & McNally, R. (1988). Genetic enginnering: catastrophe or utopia?
Hemel Hampstead, England: Harvester.
Yin, R. (1989). Case study research: design and methods. London: Sage
Publications.
Ziman, J. (1980). Teaching and learning about science and society. Cambridge:
Cambridge University Press.
Ziman, J. (1984). An introduction to science studies: the philosophical and social
aspects of science and technology. Cambridge: Cambridge University Press.