ATUALIZAÇÃO NO TRATAMENTO
FARMACOLÓGICO DA DEPENDÊNCIA
ALCÓOLICA
Interna do 4º ano de Medicina Geral e Familiar : Dra. Catarina Fonseca
Orientadora: Dra. Ana Paula Vale
UCSP MONCHIQUE
Faro, 3 de Junho de 2014
* Ribeiro C. Núcleo de Comportamentos Aditivos – APMCG. Como actuar perante o consumo
nocivo de álcool: Guia para Cuidados de saúde Primários.
1. INTRODUÇÃO
► DEFINIÇÃO ALCOOLISMO
. Intoxicação crónica pelo etanol
. Alteração dos sistemas fisiológico e psicológico
. Uso do álcool: para conforto ou evitar síndrome de abstinência alcoólica
► PROBLEMA DE SAÚDE PÚBLICA
Nível individual (Patologia psiquiátrica, gastrointestinal...), familiar, laboral
e judicial
3ª causa de morte evitável nos Estados Unidos
► 20% DOS UTENTES QUE FREQUENTAM OS CSP
SERÃO CONSUMIDORES EXCESSIVOS DE ÁLCOOL*
A MAIORIA NÃO É DIAGNOSTICADA
*Imagem de Am J Psychiatry. June 2010; 167(6): 630-639
► QUEIXAS GASTROINTESTINAIS (dor epigástrica, abdominal)
► PSIQUIÁTRICAS (cefaleias, ansiedade, depressão, perda de memória,
cansaço)
► ACIDENTES OU TRAUMATISMOS REPETIDOS
NA MAIORIA DOS CASOS NÃO É ESTABELECIDA DE FORMA OPORTUNA
A
RELAÇÃO ENTRE OS CONSUMOS E AS REFERIDAS QUEIXAS
2. COMO SUSPEITAR?
► QUESTIONÁRIOS DE DETEÇÃO (por exemplo: O AUDIT)
. Método simples para identificação do consumo excessivo
. Permite fazer uma abordagem individualizada em função do
resultado
. Identifica utentes em consumo de risco, consumo nocivo ou
dependência
COMO DETETAR?
3. COMO DETETAR?
QUEM VAMOS TRATAR? EXISTE EVIDÊNCIA QUE A DEPENDENCIA ALCOÓLICA PODE SER TRATADO
EM AMBULATÓRIO EM DOENTES SELECIONADOS*:
. CONSUMO NOCIVO (doentes selecionados)
. DEPENDÊNCIA LIGEIRA
. ausência de complicação orgânica grave ou tratamentos anteriores
. compromisso do paciente : não beber nem sair do domicílio familiar
durante a desintoxicação
. presença de um familiar responsável por: administrar a medicação
supervisionar o tratamento
. supressão de bebidas alcoólicas no domicílio durante a desintoxicação
4. QUEM VAMOS TRATAR?
*Sá Nogueira T., Ribeiro C. Abordagem terapêutica da dependência alcóolica.
Rev Port Clin Geral 2008: 24: 305-16.
COMO COMEÇAR?
VIGILÂNCIA MÉDICA COM MONITORIZAÇÃO
1. EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNÓSTICO:
. HEMOGRAMA
. IONOGRAMA
. FUNÇÃO HEPÁTICA COM GAMA-GT
2. TRATAMENTO: 2 FASES
. FASE INICIAL: DESINTOXICAÇÃO (1 a 2 semanas - individualizar)
. FASE DE MANUTENÇÃO (manter abstinência ou redução dos consumos:
poderá durar 1 a 2 anos ou mais...)
5. COMO COMEÇAR?
6. FASE DE DESINTOXICAÇÃO
► PREVENÇÃO/TRATAMENTO DOS SINTOMAS DE PRIVAÇÃO
(SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA ALCOÓLICA)
► TRATAMENTO: Supressão imediata e total do álcool
Sedação
Hidratação
Vitaminoterapia
SÍNDROME DE ABSTINÊNCIA ALCOÓLICA
. HIPEREXCITABILIDADE DO SNC (inquietação, agitação, convulsões)
. HIPERATIVIDADE DO SISTEMA AUTÓNOMO (náuseas e vómitos, taquicardia,
tremores, hipertensão arterial)
. ALTERAÇÔES COGNITIVAS
6.FASE DE DESINTOXICAÇÃO
(de semivida longa (atividade gabaérgica)
. OBJETIVO: Prevenção convulsões e do delírium do SAA
. QUANTO TEMPO?
► Individualizar e fazer desmame (1 a 2 semanas em média)
► Contra-indicadas para uso na fase de manutenção
DIAZEPAM 30-80 mg/dia CLORAZEPATO DIPOTÁSSICO 50-200mg/dia
► IDOSOS E DOENÇA HEPÁTICA: preferir BZP semivida curta a média
OXAZEPAM 50-100mg/dia LORAZEPAM 3-15 mg/dia
1. BENZODIAZEPINAS
6. FASE DE DESINTOXICAÇÃO
. OBJETIVO: Prevenção de tremores, agitação, alucinações
TIAPRIDE 800 mg/dia
(sem efeito anti convulsivante,eficaz em associação com outros fármacos de 1ª linha)
. OBJETIVO: Efeito anti convulsivante
Pode ser uma alternativa às BZD
Possíveis graves complicações hepáticas e hematológicas
Ponderar o uso dos novos anti convulsivantes (GABAPENTINA,
TOPIRAMATO, LAMOTRIGINA, OXCARBAZAPINA)
CARBAMAZEPINA 400-800 mg/dia durante 4 a 5 dias
2. ANTAGONISTA DOS RECETORES DOPAMINÉRGICOS (Tiapride)
3. ANTI CONVULSIVANTES (carbamazepina)
6. FASE DE DESINTOXICAÇÃO
. OBJETIVO:
. Correção da deficiência de vitaminas
(B6, B9, B12, C, ácido fólico e tiamina (B1))
. Prevenção do Síndrome de Wernicke (ataxia, confusão mental, alteração da motricidade ocular)
4. HIDRATAÇÃO E VITAMINOTERAPIA
CIANOCOBALAMINA + PIRIDOXINA + TIAMINA
. 1 ampola 3 ml intra-muscular nos primeiros dias
. Depois: 1 comprimido por dia
7. FASE DE MANUTENÇÃO
. OBJETIVOS:
. Manter a abstinência
. Extinguir o comportamento de procura e consumo
. Aquisição da consciência de dependência
. Manutenção da motivação
. Prevenir recaídas
.Tratar patologias psiquiátricas associadas
FÁRMACOS COM AÇÃO . NA APETÊNCIA PARA O ÁLCOOL
. NA PREVENÇÃO DAS RECAÍDAS
7. FASE DE MANUTENÇÃO
► FÁRMACOS:
1. FÁRMACOS “ANTI-CRAVING”: ACAMPROSATO, naltrexona, nalmefeno
2. FÁRMACOS ANTIDOPAMINÉRGICOS: TIAPRIDA
3. FÁRMACOS AVERSIVOS: DISSULFURAM
4. FÁRMACOS SEROTONINÉRGICOS: Inibidores seletivos da recaptação
da serotonina
5 . Fármacos ANTIEPILÉPTICOS: os novos anti-epilépticos
ESTA FASE PODERÁ DURAR 6 A 12 MESES (ou mais)
OS MAIS USADOS NOS CSP*
MENOS USADOS NOS CSP
* Cuidados de Saúde Primários
7. FASE DE MANUTENÇÃO
. OBJETIVO: ↓ desejo e compulsão para beber e ↓ número de recaídas
ACAMPROSATO 333 mg : 1 comprimidos 3x/dia antes das refeições
. Não interage com outros fármacos nem com o álcool
. Usar em associação com outros fármacos “anti-craving”
CONTRA-INDICAÇÃO: INSUFICIÊNCIA RENAL
NALTREXONA 50 mg/dia
CONTRAI-INDICAÇÃO: GRAVIDEZ E AMAMENTAÇÃO,
DEPENDÊNCIA A OPIÁCIOS
DOENÇA HEPÁTICA MODERADA A GRAVE
. ALTERNATIVAS
NALMEFENO 18mg/dia Tomar 1 a 2 horas antes da ingestão de álcool
1 comprimido por dia Desvantagem: preço
1. FÁRMACOS “ANTI-CRAVING”
7. FASE DE MANUTENÇÃO
. Útil na fase desintoxicação e na prevenção de recaídas
TIAPRIDE 800 mg/dia
2. FÁRMACOS ANTIDOPAMINÉRGICOS
7. FASE DE MANUTENÇÃO
. Não suprime o desejo de consumo: associar a acomprosato ou naltrexona
. INFORMAÇÃO a fornecer: Não consumir ou manipular substâncias que
contenham álcool como cerveja sem álcool,
vinagre, molhos, perfumes, desodorizantes,
after-shaves...
(uso controverso mas frequentemente usado nos CSP)
. OBJETIVO: dissuasão do consumo de forma voluntária, pode ser útil
nos primeiros tempos de abstinência
. Bloqueia o metabolismo do álcool: INTOXICAÇÃO POR ACETALDEÍDO
(Vasodilatação generalizada, cefaleias, taquicardia, hipotensão ortostática, sudação,
vómitos, dispneia, visão turva, vertigens, obnubilação, convulsões, disfunção hepática,
arritmias, EAM e possível morte)
MUITAS
CONTRAINDICAÇÕES
E MUITOS EFEITOS
SECUNDÁRIOS
DISSULFURAM 125-250 mg administrado por um corresponsável
Necessita CONSENTIMENTO INFORMADO
3. FÁRMACOS AVERSIVOS
7. FASE DE MANUTENÇÃO
(Pouco uso nos CSP)
ONDANSETRON 100mg/dia
BUSPIRONA 20-30 mg/dia em 3 tomas . Ansiolítico não benzodiazepínico
. Baixo potencial de abuso
. Não cria sedação nem alterações motoras quando interage com o álcool
FLUOXETINA 40-80 mg/dia
FLUVOXAMINA 100 mg/dia
SERTRALINA 50-200mg/dia SÓ PARA DOENTES COM DEPRESSÃO
4. FÁRMACOS SEROTONINÉRGICOS
7. FASE DE MANUTENÇÃO
(pouco uso nos CSP)
GABAPENTINA, TOPIRAMATO, LAMOTRIGINA, OXCARBAZAPINA
. Em estudo no “craving” com perturbação psiquiátrica associada
. Podem ser úteis em doentes com perturbações da personalidade
ou em indivíduos impulsivos
5. FÁRMACOS ANTIEPILÉPTICOS
8.SEGUIMENTO DO DOENTE
1. AGENDA DO DOENTE:
. Número de dias em que consumiu álcool
. Número de dias em que bebeu “em excesso”
. Número de bebidas num dia típico
. Número máximo de bebidas num dia
2. MONITORIZAÇÃO DA GAMA GT:
. Para avaliação da resposta ao tratamento
. Para motivar o doente
9. ESTUDOS MAIS RECENTES: NOVOS FÁRMACOS
BACLOFENO (agonista dos recetores GABA-B)
GABAPENTINA/TOPIRAMATO/LAMOTRIGINA/OXCARBAZAPINA (novos anti-epilépticos)
OLANZAPINA (antipsicótico)
VARENICLINA (aprovado para a desabituação tabágica)
CABERGOLINA (antagonista hipofisário com papel no sistema dopaminérgico)
ALOPREGNANOLONA (metabólito da progesterona com ação no sistema GABA)
GANALOXONA e BABOXADOL (análogos sintéticos de neurosteróides)
IVERMECTIN (antiparasitário com efeito no sistema dopaminérgico)
ERVA CHINESA (flavonóide purificado de Hovenia com ação no sistema GABA)
INIBEM O SISTEMA DOPAMINÉRGICO MESOLÍMBICO
10.OUTROS RESULTADOS
2 TIPOS DE ALCOOLISMO:
2 TIPOS DE INCENTIVO AO USO DO ÁLCOOL:
. Consumo de recompensa
. Consumo de “alívio”
TIPO B
(Alcoolismo precoce) TIPO A
(Alcoolismo tardio)
História familiar importante de
dependência
Traços impulsivos
Inicio do consumo < 25 anos
História familiar sem dependência
Fatores psicossociais adversos
Inicio do consumo > 25 anos
DIFERENTES PERFIS BIOLÓGICOS RESPOSTA DIFERENTE AO FÁRMACO
11. PERSPETIVAS FUTURAS
. MARCADORES GENÉTICOS (já foram identificados
vários alelos de recetores das vias neuronais envolvidas
na dependência)
. INSTRUMENTOS CLÍNICOS PARA DETERMINÇÃO DO
PERFIL DO DOENTE
. DETERMINANTES PSICOSSOCIAIS
ASSIM: ADEQUAR O FÁRMACO AO PERFIL DO DOENTE
12. CONCLUSÕES
. O melhor conhecimento dos sistemas neuronais envolvidos nos
mecanismos da dependência permitiram a investigação de novas
moléculas e o estudo de fármacos usados sem indicação.
. Os agentes mais promissores parecem ser os que inibem o
sistema dopaminérgico mesolímbico: os novos anti-epilépticos
(gabapentina, topiramato, lamotrigina, oxcarbazapina), o
baclofeno, o ondansertron e outras moléculas ainda se
encontram em fase de estudo.
. A eficácia de diferentes fármacos em diferentes subtipos de
perfis biológicos.
. Assim no futuro: tratamento da dependência alcoólica através da
determinação do perfil do doente e da administração dos
fármacos mais adequados ao subtipo identificado.
12. CONCLUSÕES
. Atualmente, na prática, a investigação ainda sugere o
acamprosato, a naltrexona oral ou o topiramato como tratamento
inicial da fase de manutenção. O tiapride é também
uma alternativa. O nalmefeno é o único fármaco recente
aprovado para o tratamento da dependência alcoólica e também
é uma nova alternativa apesar de ter como desvantagem um
custo elevado.
. A deteção dos doentes com problemas ligados ao álcool, em que
os médicos de família têm um papel fundamental é o primeiro passo
para o seu tratamento e consequente redução da mortalidade e
morbilidade associadas ao alcoolismo.
13.BIBLIOGRAFIA
1. Sá Nogueira T., Ribeiro C. Abordagem terapêutica da dependência alcóolica. Rev Port Clin
Geral 2008: 24: 305-16.
2. Ribeiro C. Núcleo de Comportamentos Aditivos – APMCG. Como
atuar perante o consumo nocivo de álcool: Guia para Cuidados de
saúde Primários. Adaptado de: - AUDIT – The alcohol Use Disorders Identification test:
Guidelines for Primary Care. Second Edition – World Health Organization 2001.Department
of Mental Health and Substance Dependence and Brief Intervention. For Hazardous and
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2001.Department of Mental Health and Substance Dependence).
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dependência do álcool: enfoque nas direções para os pesquisadores brasileiros. 2012: Arq
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11. Miller PM, Book SW, Stewart SH. Medical treatment of alcohol dependence: A systematic
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13.BIBLIOGRAFIA