7/21/2019 Aula_8_-_Estudos_Socioantropológicos (1)
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mesmo calafrio, esta mesma repulsa, em presença de maneiras de viver, de crer ou
de pensar que nos são estranhas.
O resultado é que nos recusamos a admitir a própria diversidade cultural,
preferindo repetir da cultura tudo o que esteja conforme à norma sob a qual se vive.
Mas a partir do texto da aula passada, devemos nos olhar, ou seja, pensar a nossa
sociedade a partir da ideia de diversidade cultural. Pois o texto sobre os Sonacirema
é na verdade um texto sobre nós mesmos, só que descrito a partir de um olhar de
estranhamento, o mesmo que atribuímos aos povos diferentes de “nós”. Sonacirema
é americano escrito de trás para frente e todos os rituais descritos no textos são
nossas formas de viver o cotidiano descritos por alguém que supostamente nada
conhecia da nossa cultura. A percepção de que nossa forma de vida tem muito o
que ser estranhado também nos ajuda a entender o relativismo, que estamos
discutindo.
Essa nova abordagem se tornou possível em razão da institucionalização do
trabalho de campo como método de pesquisa antropológica pelo polonês
Malinowski, em 1922. Até então era prática comum a existência dos “antropólogos
de gabinete”. Estudiosos que não visitavam as sociedades estudadas, mas
contavam com os dados obtidos por viajantes, missionários, funcionários do estado.
Essas pessoas visitavam as “sociedades exóticas”, recolhiam informações, objetos,
produziam descrições e era a partir desse material que o antropólogo trabalhava.
Tal método não poderia ter sido considerado eficaz em razão de dois motivos,
primeiro porque essas pessoas não tinham formação antropológica, segundo,
porque o antropólogo não poderia atestar a veracidade desses dados, uma vez que
não os recolheu. A partir do método do trabalho de campo como prática
imprescindível da antropologia, os estudiosos passaram a ter que viver por um
período longo com as sociedades estudadas, aprendendo sua língua, observando
diariamente seus costumes, suas regras sociais. Tal condição permitiu ao
antropólogo compreender mais profundamente a sociedade estudada e deixar de
focar a Europa como foco comparativo, a partir de onde a “sociedade exótica” era
pensada.
Com isso, trata-se de pensar que antropologia deixou de perceber, como
fizera no início, que as sociedades passariam por etapas sucessivas de um estágio
civilizatório. A partir de uma perspectiva relativista, as sociedades estudadas se
tornaram o seu próprio centro, e a Europa, ou seja, a sociedade do pesquisador,
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deixou de ser um ponto de referência comparativo para se pensar
antropologicamente a respeito das sociedades estudadas. E o evolucionismo como
disse o antropólogo Lévi-Strauss foi entendido como uma tentativa de suprimir a
diversidade das culturas fingindo reconhecê-las plenamente. Desde então o
antropólogo cunhou uma célebre frase para desqualificar o pensamento
evolucionista e aqueles que defendem essa posição teórica: Bárbaro é antes de
tudo aquele que acredita na barbárie. Portanto, a partir dessa revolução na teoria
antropológica, como salienta DaMatta (1987),
A comparação deixou de ser uma vitrine de museu, através da qual
o observador “civilizado” via e classificava todos os primitivos, para
transformar-se num espelho, onde o primeiro rosto a ser visto é o
seu próprio. Foi graças a essa perspectiva que a antropologia pôde
contribuir para a enorme renovação apresentada, sobretudo a partir
da mudança de atitude que aproximou o observador do nativo e
assim permitiu um conhecimento muito mais aprofundado das
diversas lógicas que certamente são imperativas em cada sociedade
humana. A síntese (...) não poderia mais realizar-se no plano da
história determinada pelo progresso, mas com a posição relativizada
que permite cada vez mais estudar outras sociedades sem os
prismas dogmáticos de teorias que jamais permitem sua própria
relativização. (...)
Na história da antropologia social existem, portanto, como que
duas vertentes analíticas claramente visíveis. A primeira está
representada pelo evolucionismo, onde existe uma perspectiva
totalizadora, uma sociedade tomada sempre como ponto de
referência indiscutível e uma teoria histórica que permite alinhavar
todos os costumes em termos de valores muito importantes ao
sistema ocidental. O segundo paradigma, relativista, mostra uma
tendência oposta. Aqui, trata-se de desenvolver uma visão parcial,
mas extremamente acurada da operação das sociedades humanas.
Se o evolucionismo tem por um lado a vantagem de possuir uma
posição globalizadora, não perdendo de vista os costumes de toda a
humanidade, por outro ele tem a desvantagem de não poder
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perceber as forças concretas que movem os sistemas sociais não-
familiares ao observador o qual tende a interpretá-los projetando
neles os seus próprios valores.
Conclusão
Nesse sentido, o que deve ficar claro é que se a antropologia teve início tendo
como perspectiva um linha evolucionista através das quais as sociedades
necessariamente passariam, esse paradigma rapidamente foi considerado
equivocado. A teoria antropológica superou esse paradigma ao adotar uma
perspectiva teórica relativista, isto é, que observa os “nativos” a partir do ponto de
vista do “nativo” e não do ponto de vista do pesquisador, que classificava a
sociedade estudada a partir de seus próprios valores. As sociedades passaram a ser
consideradas como tendo uma racionalidade própria, ou seja, suas crenças, seus
valores, seus costumes, se colocam ao lado da cultura do colonizador, e não abaixo
dela.
O relativismo se torna, portanto, um fundamento antropológico na medida em
que reconhece que cada ser humano vê o mundo sob a perspectiva em que nasceu.
E na medida em que reconhece que as civilizações coexistem com sistemas
próprios de crenças que não podem ser considerados superiores ou inferiores,
avançados ou atrasados, a cultura deixa de ser vista como Cultura com C maiúscula,
e passa a ser entendida como culturas, com c minúsculo e no plural. Isso ocorre
porque a antropologia não defende mais existência de uma cultura única pela qual
todas as sociedades passariam, atingindo as diferentes escalas de evolução, e
passou a defender a existências de diferentes culturas com suas especificidades.