Gyorgy Lukács – Introdução aos escritos estéticos de Marx e Engels – pp. 100-119
• Problema: Escritor burguês dá as costas às questões essenciais quando identificado com sua classe (Eugène Sue).
• Arte adapatada à superfície da sociedade capitalista deforma e falseia a realidade.
• Mas o que é essa “realidade” que deve ser buscada? Seu sentido é estético? É histórico? É social?
Validade “eterna” de uma obra?
• Marx se questiona qual elemento nos deleitaria ao lermos uma epopéia grega hoje.
• Solução de Marx suscita dois grandes complexos a serem mais bem esclarecidos:
1 – qual sentido a significação do mundo representado pela arte possui no conjunto da evolução humana?2 – Qual o posicionamento do artista, o sujeito da representação, nessa evolução?
Reflexo da Realidade
• No materialismo dialético a realidade existe independentemente dos homens, devendo ser apreendida por meio de uma tomada da consciência do sujeito (Kant, Hegel e Marx).
• Criação artística se insere neste modo de apreensão, pois é forma de reflexo do mundo exterior na consciência do artista.
• Há peculiaridades próprias ao mundo da arte, no entanto, que devem ser ressaltadas, leis que a distinguem de outras formas de reflexo.
Teoria do reflexo
• Existe desde os gregos: Mímesis, ou seja, representação do mundo.
• Meta de quase todos os grandes artistas foi reprodução artística da realidade em sua integridade e totalidade.
• Estética Marxista, para Lukács, deve ser contrária ao vanguardismo (renúncia ao passado). Deve incorporar conjunto de valores reais desenvolvidos na história da humanidade, esclarecendo conceitos e aspirações pretéritas em novo patamar.
Realidade “representada” para Lukács
• Cerne da estética marxista é conceito de “realismo”.
• Não é a superfície dos fatos, soma de eventos casuais e momentâneos, a representação epidérmica e fotográfica da realidade (naturalismo).
• Tampouco é formalismo, ou seja, um idealismo que eleva as formas artísticas da arte à autonomia completa (estilizacão livre do real).
Abismo da teoria estética burguesa: fenômeno X essência.
• Maneira anti-dialética de enxergar o mundo separa os dois conceitos como se fossem categorias distintas.
• Uns forçam mais a visão fenomênica, outros a essencial. Estacionam na antítese, sem síntese (arte medieval, impressionista e naturalista, por exemplo).
Dialética entre essência e fenômeno.
• Ambos são momentos da realidade objetiva, manifestações inextricáveis produzidos pela realidade, não pela consciência.
• Realidade, no entanto apresenta diversos graus: fugaz, epidérmica, instantânea, tendênciais, duradoura.
• Essência estática contraposta a um fenômeno, após a visão dialética, transforma-se em um fenômeno ligado à outra essência, e assim ao infinito.
Verdadeira arte
• Aprofunda a captação da vida ao máximo em sua totalidade onidirecional.
• Apreende o momento em que o fenômeno se manifesta na essência e em que a essência se revela no fenômeno.
• “A verdadeira arte, portanto, fornece sempre um quadro de conjunto da vida humana, representando-a no seu movimento, na sua evolução e desenvolvimento” p. 105.
• “A arte deve tornar sensível a essência” p. 107.
Arte x Ciência
• Ciência identifica e sistematiza leis abstratas que regulam interação entre fenômeno e essência.
• A arte conduz à intuição pela sensibilidade desse movimento como unidade viva.
• Categoria que esclarece o modo específico de apreensão artística da realidade em contraposição a outros modos é o de tipo.
Tipo
• Ultrapassa visão de que fenômeno é único.• Ultrapassa conceitos de gênero, média,
generalização idealizante.• No tipo convergem todos os traços da unidade
dinâmica que ata todas as contradições de determinada sociedade.
• O eterno e o determinado, o concreto e a lei, o indivíduo e o momento social universal: aqui reside o tipo, o elo expressivo que dá vida a tais categorias.
Individualidade e Realismo.
• Há autonomia do artista no projeto marxista, dado que ele deve apenas expressar a essência da realidade que existe for a dele, e não criar uma nova realidade?
• Segundo Lukács, sim, pois o artista de qualidade logra tornar sensível de maneira individualizada (subjetiva) o processo social universal (objetivo).
• Tornar acessível tal processo geral por meio de uma forma específica: eis a tarefa gloriosa do artista, o processo de subjetivação da objetividade.
Posicionamento do Artista
• Artista é investigador da direção dos processos sociais. Ele deve, portanto, definir o caráter de tais processos. Não é investigador passivo.
• Representação da realidade contém opiniões, desejos, aspirações: não é mero suporte.
• O que é distinto de utilizar a arte para afirmar a priori o que é ou como deve ser a realidade (arte de tendência).
• Tendência deve se manifestar da essência artística da obra, ou seja, da realidade em si, da qual a arte é o reflexo dialético.
• Artista deve, portanto, assumir apaixonadamente posição perante grandes questões do gênero humano.
• Só assim se distingue o que é essencial do não-essencial, do ornamental na arte.
• Deve-se amar o progresso, o bem, e repelir a reação e o mal.
• E como encarar grandes artistas realistas reacionários?
Honoré de Balzac (1799-1850)
• Honestidade estética incorruptível, isenta de vaidade.
• Após pesquisas aprofundadas e cansativas Balzac aproximou-se do real efetivo, o que colocou sua personalidade em segundo plano.
• Deixa-se envolver até às últimas consequências com a realidade essencial descoberta, ainda que ela confronte suas convicções políticas retrógradas.
• Contradições da ordem capitalista são trabalhadas em sua essência neste autor.
Triunfo do realismo
• “Só se realiza o triunfo do realismo quando artistas efetivamente grandes estabelecem uma relação profunda e séria, ainda que não conscientemente reconhecida, com uma corrente progressista da evolução humana”. P. 115.
• Deve haver a salvaguarda da integridade do homem.
• “Grandeza artística, realismo autêntico e humanismo são sempre indissoluvelmente interligados”. p. 115.
Humanismo de Marx e Engels
• Difere do mero idealismo, que pretende resgatar a essência humana por meio de ideais.
• Difere do romantismo ou de movimentos passadistas, que pretendem voltar a um tempo “idílico”.
• “só a concepção materialista da história é capaz de reconhecer que (…) a dilaceração e a mutilação da integridade humana é apenas a consequência inevitável da estrutura econômica, material da sociedade”. P. 116.
E qual essa estrutura?
• Divisão do trabalho nas sociedades de classe• Cisão entre cidade e campo• Divisão entre trabalho físico e intelectual• Exploração do homem pelo homem• Fragmentação do trabalho na ordem
capitalista e anti-humana de produção.
Sociedade socialista X capitalista
• Na sociedade capitalista todos os sentidos humanos são resumidos, dilacerados e desumanizados pelo ato de possuir (absoluta pobreza humana).
• Na sociedade socialista, após a abolição da propriedade privada, haverá a emancipação dos sentidos, das faculdades humanas outrora aprisionadas no sistema capitalista. O sentido objetivo humano encontra o subjetivo.
Visão de totalidade da estética marxista
• “se esta concepção penetra nas raízes mais profundamente entranhadas no solo, nem por isso nega a beleza das flores. Ao contrário, é a concepção materialista da história, a est;etica marxista, e somente ela, que fornece os instrumentos para uma justa compreensão deste processo na sua unidade, na sua orgânica conexõ entre raízes e flores”. P. 117.
Juízo estético e juízo histórico
• Agora se compreende porque ainda se lêem as epopéias com emoção.
• Não há separação entre juízo est;etico e histórico: exite uma unidade indissolúvel entre a análise materialista histórica, que dê conta do processo histórico, e o posicionamento da obra em seu interior.
• Desse ponto de vista irrompe o valor estético da obra.